I Simpósio Sobre a
Biodiversidade da Mata Atlântica
Florística e fitossociologia de um fragmento florestal para a caracterização dos recursos
madeireiros e não madeireiros
Sara Gütler Lübe, William Macedo Delarmelina, Marily Duarte e José Franklim Chichorro
([email protected]; [email protected]; [email protected];
[email protected])
RESUMO
O objetivo deste trabalho foi obter informações qualitativas e quantitativas dos recursos de
um fragmento florestal que possibilitem caracterizar o seu potencial ecológico e econômico.
Nesse sentido foi analisado um fragmento florestal em São José das Tores, município de
Mimoso do Sul-ES, visto que, não há muitos estudos de fragmentos florestais no Sul do
Estado do Espírito Santo. Os dados foram obtidos através de inventário, por meio de análise
de transectos em linhas de tamanhos variados, subdivididos em parcelas de 40 m². Foram
considerados produtos madeireiros e não madeireiros, no qual, foram amostradas 24 famílias,
sendo Fabaceae a mais representativa dentro da população. A composição florística constatou
86 espécies arbóreas e duas espécies não arbóreas. Os gêneros com maior riqueza foram:
Casearia, Cupania, Eugenia, Siparuna e Attalea. O índice de diversidade de ShannonWeaver foi de 4,08 e a equabilidade 0,92. As espécies de maior importância são: Cupania
scrobiculata, Siparuna arianeae, Euphorbiaceae 1, Cupania zanthoxyloides, Sapotaceae 1,
Lauraceae 1, Algernonia obovata, Fabaceae 3, Pseudopiptadenia contorta e Moldenhawera
papillanthera. Constatou-se que os produtos florestais não madeireiros correspondem a uma
alternativa de agregar valores ao fragmento, pois esses recursos podem ser extraídos de forma
sustentável, aumentando a renda da população local.
Palavras chave: Floresta estacional semidecidual, riqueza florística, potencial ecológico.
INTRODUÇÃO
A Mata Atlântica, originalmente abrangia toda a costa brasileira do Rio Grande do Norte ao
Rio Grande do Sul e se estendia, também, para a Argentina e Paraguai (MIRANDA, 2012).
Ocupava cerca de 15% do território nacional e, atualmente, mais de 93% da formação original
deste bioma já foi devastado devido a ação humana (VELOSO et al., 1991). Na Mata
Atlântica, a maior parte dos remanescentes florestais, especialmente em paisagens
intensamente cultivadas, encontra-se na forma de pequenos fragmentos, altamente
perturbados, isolados e pouco conhecidos (VIANA, 1995).
A Floresta Estacional Semidecidual no sul do Estado do Espírito Santo é um exemplo claro
desse processo, pois atualmente esse ecossistema está representado por pequenos fragmentos
isolados, particularmente em topos de morros, encostas e áreas de difícil acesso e são
tipicamente pequenos, isolados e altamente perturbados.
Apesar da importância desses fragmentos para a manutenção da biodiversidade local, existem
poucos estudos acerca dos remanescentes de Mata Atlântica na região Sul do Espírito Santo,
sendo estes, concentrados na região norte do estado, podendo citar o trabalho realizado por
Agarez et. al (2001) que trata Utilização de Índice de vegetação na classificação integrada de
fragmentos florestais no Município de Sooretama, ES. Diante dessas considerações, teve-se
como objetivo conhecer o potencial qualitativo e quantitativo de um fragmento, tanto às
espécies madeireiras e quanto aos produtos florestais não madeireiros, por meio de análise
fitossociológica.
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METODOLOGIA
O fragmento florestal estudado possui aproximadamente 6,5 ha, localizado no distrito de São
José das Torres, município de Mimoso do Sul-ES. A formação florestal estudada é a Floresta
Estacional Semidecidual. Esta região possui 71% de sua área total com relevo acidentado; o
clima é quente, com verão chuvoso e inverno seco, sendo a maior ocorrência de chuvas dá-se
entre os meses de outubro a março (Incaper, 2011). Os fragmentos florestais existentes nessa
área, em sua maioria, são localizados no alto dos morros, como é o caso do fragmento em
estudo.
A metodologia para amostragem foi composta por transectos em linhas, segundo Brower &
Zar (1984) é uma metodologia amplamente usada no levantamento de espécies florestais,
caracterizada pelo estabelecimento de faixas com comprimentos variados ao longo da área
amostral. Foram amostrados 5 transectos com distâncias de 30 m entre eles e comprimentos
variados de 160, 240, 200, 280 e 120 m, houve essa variação pois eles cortavam o fragmento
de um lado ao outro, sendo cada transecto dividido em pequenas parcelas de 40 m².
Em cada parcela foram medidas as árvores com diâmetro a altura do peito (DAP) igual ou
superior a 5 cm, com auxílio de uma fita diamétrica. Os indivíduos medidos foram
identificados com plaquetas numeradas e presas aos fustes. A altura total das árvores foi
medida com régua telescópica de 15 m de altura. Para as árvores com alturas maiores do que
15 m foram utilizados o hipsômetro Vertex III para estimar a altura total.
Após a medição e plaqueamento, foi coletado material botânico de todos os indivíduos, em
seguida, identificados. Os exemplares foram identificados segundo a classificação botânica
APG II, em famílias, gêneros e espécies, quando possível, com ajuda de bibliografia
especializada (LORENZI, 1992) e comparações com os materiais contidos na coleção do
Herbário do Departamento de Engenharia Florestal/CCA-UFES e no herbário VIES/UFES.
Os dados amostrais foram obtidos de toda a vegetação arbórea contidas dentro das parcelas.
Os cipós foram amostrados apenas em relação à infestação ou não das árvores amostradas,
visto a grande dificuldade de identificação destas espécies. Também foi observada a qualidade
do fuste e posicionamento das copas das árvores amostradas. A qualidade do fuste foi
observada de forma a qualificar o fuste como: 1- reto e saudável, sem danos aparentes e não
oco com aproveitamento total; 2- parcialmente tortuoso e, ou com poucos danos com
aproveitamento parcial; e 3- defeituoso, oco, com vários danos de tortuosidade,
apodrecimento, com pouco ou nenhum aproveitamento. Já o posicionamento da copa foi
observado de acordo com a posição em que ela se encontra no dossel, tais como: 1- suprimida
ou morta; 2- inferior; 3- intermediária; 4- codominante e 5- dominante.
Foram realizadas as análises fitossociológicas, de estrutura vertical e horizontal, para a
vegetação adulta. Para esta análise foi utilizado o programa computacional Mata Nativa III
(CIENTEC, 2010).
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Foram amostrados 163 indivíduos com DAP igual ou maior a 5 cm, em 0,1 ha, totalizando 86
espécies arbóreas. Foram identificados duas espécies de palmito, Attalea humilis e
Astrocaryum aculeatissimum, totalizando 201 indivíduos. Dos indivíduos arbóreos, 35%
foram identificadas em nível de espécie, 20,25% em nível de gênero, 28,25% em nível de
família e para 16,5% dos indivíduos nenhuma identificação.
No total foram encontradas 23 famílias das espécies arbóreas e uma das espécies não
arbóreas. As famílias de maior riqueza florística, dentre as arbóreas, são: Fabaceae (14 spp.),
Sapotaceae (8 spp.), Myrtaceae (8 spp.), Euphorbiaceae (7 spp.), Flacourtiaceae (6 spp.),
Lauraceae (4 spp.) e Sapindaceae (3 spp). A família Fabaceae também tem posição de
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destaque quanto ao número de espécies nos trabalhos de Rolim et al. (2004) em uma Floresta
Estacional Semidecidual em Linhares – ES.
Os gêneros com maior riqueza florística foram: Cupania com 16; Siparuna com 14; Casearia
com 8 e Eugenia com 5 indivíduos. Para as arbóreas e não arbóreas o gênero Attalea é mais
representativo com 174 indivíduos.
As espécies de maior representação foram: Astrocaryum aculeatissimum, Attalea humilis,
Cupania scrobiculata, C. zanthoxyloides e Siparuna arianeae. A espécie Guapira opposita
amostrada neste trabalho também foi encontrada nos trabalhos de Meira-Neto & Martins
(2000) e Silva et al. (2003), todos realizados no Estado de Minas Gerais.
O índice de diversidade de Shannon-Weaver (H’) encontrado para a amostragem foi de 4,08.
Estudos realizados na Mata Atlântica para o Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina
indicaram que H’ variou de 1,69 a 4,4 (Kurtz & Araújo, 2000). A equabilidade foi de 0,92
indicando que 92% da diversidade máxima teórica foi representada nesta amostragem.
Segundo Meira-Neto & Martins (2000), o índice de diversidade varia entre 3,2 e 4,2 e a
equabilidade (J) entre 0,73 e 0,88, para as Florestas Estacionais Semideciduais em Minas
Gerais.
Na área em estudo, 8 espécies apresentam maior número de indivíduos, sendo responsáveis
por 37,42% da densidade total observada, sendo elas: Cupania scrobiculata, Siparuna
Arianeae, Euphorbiaceae 1, Cupania zanthoxyloides, Sapotaceae 1, Sapotaceae 2, Lauraceae
1 e Casearia commersoniana. Das 86 espécies amostradas, 59 possuem baixa densidade, ou
seja, aproximadamente 65% das espécies possuem um indivíduo na área amostrada.
As espécies de maior importância levando em consideração o IVI(%), são: Cupania
scrobiculata, Siparuna arianeae, Euphorbiaceae 1, Cupania zanthoxyloides, Sapotaceae 1,
Lauraceae 1, Algernonia obovata, Fabaceae 3, Pseudopiptadenia contorta e Moldenhawera
papillanthera, representando 36,21% do total do índice de valor de importância.
De acordo com a Figura 1, a espécie Cupania scrobiculata possui o maior IVI(%) devido a
sua dominância relativa, assim como a Cupania zanthoxyloides, Algernonia obovata, ,
Fabaceae 3, Pseudopiptadenia contorta e Moldenhawera papillanthera. Já, as espécies
Siparuna arianeae, Euphorbiaceae 1, Sapotaceae 1 e Lauraceae 1 possuem o IVI(%) elevado
devido a sua maior densidade.
As frequências tiveram pouca influência na classificação do IVI(%) das espécies,
especialmente as de maior IVI(%), pois possuem frequência absoluta relativamente baixa,
variando de 8 a 28, o que indica que não estão representadas em toda a área.
A estrutura diamétrica do fragmento florestal estudado corresponde a uma distribuição
comum às florestas inequiâneas, sendo esse fato positivo quando se pensa na sustentabilidade
do mesmo.
Com relação à qualidade do fuste 68% dos indivíduos apresentaram fuste parcialmente
tortuoso e, ou com poucos danos com aproveitamento parcial; 16,5% dos indivíduos com
fuste defeituoso, oco, com vários danos de tortuosidade, apodrecimento, com pouco ou
nenhum aproveitamento e apenas 15,5% com fuste reto e saudável, sem danos aparentes e não
oco com aproveitamento total.
As árvores do fragmento variam de 2,8 a 23 m de altura, sendo que o estrato inferior é
composto por 12,3% dos indivíduos, o estrato médio por 70,55% dos indivíduos e 17,15% dos
indivíduos se encontram no estrato superior, caracterizando o fragmento como uma área de
altura total média. Segundo Souza et al. (2003), a estratificação vertical da floresta influencia
a riqueza, a diversidade, o crescimento e a produção de biomassa, sendo um importante
indicador de sustentabilidade ambiental.
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Figura 1 - Relação das dez espécies de maior IVI(%) (índice de valor de importância relativo)
encontradas no fragmento florestal de Mimoso do Sul-ES, com suas respectivas densidades
relativas (DR(%)), freqüências relativas (FR(%)) e dominâncias relativas (DoR(%)).
Quanto à infestação de cipós constatou-se que 39,3% apresentam infestação na copa ou no
tronco, as quais localizavam-se principalmente, nas bordas do fragmento.
Toda árvore possui uma utilidade, seja para madeira, produção de semente, alimentação
animal com os frutos, recuperação de áreas e outros, durante a realização do estudo verificouse possíveis usos para algumas espécies encontradas no fragmento, favorecendo o uso
sustentável pela população (Tabela 1).
Tabela 1 – Produtos madeireiros e não madeireiros produzidos por algumas espécies
encontradas no fragmento florestal em Mimoso do Sul, ES. Sendo respectivamente Medicinal
(MED), Sementes (SEM), Alimentação Animal Silvestre (AAS), Lenha (LEN), Tecnologia
(TEC) e Construção (CON)
Não Madeireiros
Madeireiros
Nome Científico
MED SEM AAS LEN TEC CON
Xylopia sericea
x
X
Trichilia aff. silvatica
x
x
X
Schefflera morototoni
x
x
x
X
Siparuna arianeae
x
x
x
Pseudopiptadenia contorta
x
x
x
X
Eschweilera coriacea
x
x
X
CONCLUSÕES
As famílias Leguminosae, Euphorbiaceae, Sapotaceae, Sapindaceae, Myrtaceae,
Flacourtiaceae e Lauraceae representam mais de um terço da riqueza florística das espécies
amostradas.
Constatou-se que o valor encontrado (4,08) para o índice de diversidade de Shannon-Weaver
(H’) indica alta diversidade de espécies arbóreas.
A estrutura diamétrica do fragmento corresponde à distribuição padrão às florestas
ineqüiâneas, ou seja, muitas árvores possuem diâmetros menores e poucas com grandes
diâmetros.
Os produtos florestais não madeireiros correspondem a uma alternativa de agregar valores a
esse fragmento, através do uso sustentável pela população local.
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