“Amazônia e o direito de comunicar”
17 a 22 de outubro de 2011 - Belém/PA
Da comunidade para o mundo: O percurso da Rádio Megacidade
Brunella VELLOSO1
Julieth CORRÊA2
Luciana COSTA3
Universidade Federal do Pará, Belém, PA
Resumo
O objetivo deste artigo é contribuir para uma pesquisa que visa mapear as rádios mais antigas
dos interiores do estado do Pará. A escolha para esse artigo foi o município de Ananindeua.
Contamos a história da rádio comunitária Megacidade FM, que foi fundada em 1998. Dessa
forma, descrevemos sua trajetória, desde o início, com um transmissor de alcance limitado,
até o contexto atual, em que vemos a sua adaptação para a web, superando assim os limites
geográficos.
Palavras-chave: rádio comunitária; Megacidade FM; rádio web, Ananindeua
Introdução
Os meios de comunicação mais antigos (televisão e rádio) cada vez mais contradizem
as versões que sugerem seus fins frente às novas tecnologias.
O rádio em especial, tem se adaptado ao longo de sua história para continuar com sua
popularidade. Utilizando principalmente a internet, o rádio por ser um veículo imediato e
eficaz, perpassa as fronteiras do desenvolvimento tecnológico buscando sua adaptação.
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Estudante de graduação do 3º semestre de Comunicação Social – Jornalismo da UFPA, [email protected]
Estudante de graduação do 3º semestre de Comunicação Social- Jornalismo da UFPA, [email protected].
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Orientadora do trabalho. Jornalista e professora da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal do Pará (UFPA).
Doutora em Ciências pelo NAEA/UFPA e pesquisadora do CNPq. Linhas de pesquisa: Comunicação e Meio ambiente,
Estudos em Rádio e Divulgação Científica. Atualmente é coordenadora da Rádio Web UFPA.
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Entretanto, mesmo com o advento da era digital, em que os meios antigos se adaptam
à web, ainda podemos encontrar rádios clandestinas buscando a concessão de freqüências
legalizadas.
É nesse cenário que a Rádio Comunitária Megacidade FM constrói sua trajetória.
Desde o começo, na busca pela concessão, até o atual momento, em que ela está prestes a se
tornar também uma rádio web.
Nesse artigo fazemos uma abordagem das principais características da Megacidade,
baseadas na entrevista ao diretor da rádio, cedida à equipe do trabalho, e também norteadas
pelas leituras a cerca dos assuntos relacionados ao rádio no Brasil.
Rádios Comunitárias no Brasil
As primeiras experiências de rádios livres no Brasil aconteceram na década de 1970,
“numa época em que o regime militar estava em vigor e os meios de comunicação de massa
estavam, de forma predominante, nas mãos de pessoas ou grupos privilegiados com a
concessão de canais, por decisão unilateral do Poder Executivo Federal.” (PERUZZO, 1998).
Algumas rádios livres não tinham envolvimento social e político, já outras focavam mais
nessas causas, entretanto, a idéia principal era sempre de se contrapor, ou pelo menos, criar
alternativas às freqüências moduladas oficiais que dominavam o rádio. Em alguns casos
ocorreu o fechamento de rádios, em que o governo militar considerava a programação
subversiva.
Dos anos 70 pra cá, pouca coisa mudou no cenário do rádio brasileiro, em relação ao
domínio de fala de uma minoria, mesmo com o crescente aparecimento de rádios livres e
clandestinas.
Durante muito tempo o Brasil seguiu sem uma lei que pudesse regulamentar as rádios
livres e também considerá-las ilícitas. Mas em 1998 aprovou-se a Lei 9.612 de Radiodifusão
Comunitária.
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A partir da criação da Lei citada, as rádios livres tornaram-se consideradas
clandestinas e por esse motivo, várias foram fechadas pela Polícia Federal. A partir de então,
muitas rádios passam a buscar, junto ao Ministério das Comunicações, a outorga de
autorização para o funcionamento, entretanto para se conseguir tal objetivo, deparam-se com
muitos obstáculos que dificultam, a começar pela burocracia em que tramitam os processos de
solicitação da freqüência.
Os desafios de uma Rádio Comunitária
A respeito das rádios comunitárias podemos encontrar no site do Ministério das
Comunicações a seguinte definição:
O Serviço de Radiodifusão Comunitária foi criado pela Lei 9.612, de 1998,
regulamentada pelo Decreto 2.615 do mesmo ano. Trata-se de radiodifusão sonora, em
freqüência modulada (FM), de baixa potência (25 Watts) e cobertura restrita a um raio
de 1km a partir da antena transmissora. Podem explorar esse serviço somente
associações e fundações comunitárias sem fins lucrativos, com sede na localidade da
prestação do serviço. As estações de rádio comunitárias devem ter uma programação
pluralista, sem qualquer tipo de censura, e devem ser abertas à expressão de todos os
habitantes da região atendida. (MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES. Disponível
em:
<http://www.mc.gov.br/radiodifusao/perguntas-frequentes/radio-comunitaria>
Acesso em: 21/05/2011)
A maioria dessas rádios surge na ilegalidade, portanto, algumas buscam a licença da
transmissão de um canal de rádio concedido pelo Ministério das Comunicações.
Uma rádio comunitária deve ser gerida por uma associação ou fundação sem fins
lucrativos e precisa basear sua programação em temas de interesses da comunidade local.
Porém, mesmo não obtendo êxito na busca de sair da ilegalidade, algumas rádios livres
possuem o caráter comunitário. Segundo Peruzzo (2010), essas rádios, são emissoras que se
assemelham as Comunitárias legalizadas “mas com a diferença de que não possuem a
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autorização para funcionar. São, de fato, rádios livres de caráter comunitarista, as quais os
setores conservadores chamam de “piratas” ou “clandestinas”.
Os processos que buscam a outorga de autorização para o funcionamento, por serem
muito burocráticos são também, em geral, muito demorados e isso é um dos fatores de
desestímulo para quem busca a legalização de uma rádio.
Apesar de a lei exigir que não haja qualquer vínculo de compromisso ou relações
financeiras entre a rádio e outras entidades, mesmo assim, a influência de políticos ainda é
fator determinante para se conseguir a legalização. Segundo Cristiano Aguiar Lopes, em
entrevista concedida ao site Balaio de Notícias, existe uma lista de exigências para se
conseguir a concessão, que muitas rádios não conseguem cumprir e o apoio de alguém
próximo à máquina burocrática facilita muito o cumprimento de tais exigências.4
O Artigo 11 da lei (Lei n° 9.612/98), que diz que a radiodifusão comunitária precisa
acontecer de forma independente e que não pode se subordinar a nenhuma outra entidade,
costuma ser infringido pelo fato de a maioria das rádios aceitarem essa subordinação como
forma de auxílio para a sua manutenção. A própria legislação não prevê nem um tipo de
auxílio por parte do Governo, isso possibilita a busca de outras formas de ajuda para o
sustento das rádios.
Segundo dados do Ministério das Comunicações, atualmente existem 4.242 rádios
comunitárias em todo o Brasil.
Megacidade; o começo de uma história
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Fonte: http://www.sergipe.com.br/balaiodenoticias/entrevistaj78.htm> Acesso em: 21/06/2011
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Em abril de 2009 comemoraram-se os 86 anos da fundação da primeira rádio no
Brasil. No mês seguinte deste mesmo ano, o Ministério das Comunicações concedeu mais um
canal de radiodifusão no Pará, a Associação Cultural de Comunicação Megacidade, que é uma
rádio comunitária do município de Ananindeua.
A Rádio surgiu em 1998 pela iniciativa dos irmãos Kleber e Claudio Góes, com um
pequeno transmissor de alcance limitado à própria rua onde moram em um prédio alugado
localizado na WE 32, no bairro Coqueiro. Desse modo, a programação musical era
acompanhada apenas pelos moradores da rua.
O sucesso entre a vizinhança incentivou a aquisição de novos equipamentos,
possibilitando o aumento do alcance da transmissão da rádio, ainda sem a autorização legal
para transmissões.
Com a frequência 101,5, a Megacidade segue com os seus serviços até o ano de 2003.
Nesse ano, por conta do aumento do número de rádios comunitárias ilegais que foram
fechadas, a Megacidade decide então, encerrar sua transmissão.
A partir desse episódio, Kleber Góes passou a buscar a legalização da rádio e em maio
de 2009, finalmente, consegue a sua meta.
A rádio teve seu alcance aumentado e passou a funcionar na frequência 87,9, a mesma
de outras duas comunitárias no município, sendo que cada uma atinge uma determinada
extensão. Segundo o proprietário, a Megacidade possui hoje o alcance de raio de 10 km.
Antes, a rádio era conhecida pelo slogan “A rádio legal de Ananindeua”, mas, hoje é
identificada pela frase “A frequência da Comunidade”.
O título de rádio “legal” cedido à Megacidade permitiu a ampliação dos programas e
da própria equipe de trabalho. Hoje, a rádio conta com 19 integrantes entre produtores,
técnicos e colaboradores. O horário de funcionamento da rádio inicia às 6h da manhã e
termina à 0h.
Toda programação é ao vivo com exceção do programa “Clássicos da Mega”, que vai
ao ar aos sábados no horário das 22h até 0h.
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As programações passaram a ter uma grande variedade, atingindo os diferentes
ouvintes, entre cristãos católicos e protestantes, jovens e idosos.
Acrescentaram-se também programas de cunho informativo, tais como Chico Melo
Show, Alô Ananindeua e o Balança Cidade.
O repassar da informação
A produção das notícias veiculadas parte preferencialmente das demandas locais,
seguidas dos fatos publicados nos grandes jornais da capital, Belém. Os comunicadores
pesquisam e colhem informações também nos órgãos públicos, mas a principal fonte é
população que costuma fazer denúncias, através de ligações.
Em entrevista concedida para esta pesquisa, Kleber fala sobre a escolha na hora de
divulgar informação: “Eu instruo eles aqui, como diretor da rádio, a não buscar muita coisa
fora, porque eu acho que a rádio comunitária tem que trabalhar mais com o local”.5
Não se pode considerar esse tipo de programação como jornalística, em virtude da
rádio não possuir uma equipe de jornalistas voltada para a produção e apuração dos
acontecimentos informados. Milton Jung fala sobre o fazer a notícia através do dever do
jornalista:
O jornalista tem o dever de aprofundar as informações recebidas. Checar os
documentos, averiguar a procedência, comparar a informações, conversar com
os personagens envolvidos, direta ou indiretamente, são alguns dos artifícios à
disposição para transformar o dossiê em notícia ou, simplesmente, jogá-la no
lixo, se comprovada a falsidade. (JUNG, 2007)
Apesar de não possuir o caráter jornalístico, os programas de cunho informativo da
rádio são muito importantes para garantir a prestação de serviços e informações para a
população local.
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Comunicação Pessoal em: 21/05/2011
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A Rádio e a Comunidade
Todos os serviços oferecidos pela programação da rádio são destinados aos interesses
da população do município. Serviços de utilidade pública como o informe de perda de
documentos, a divulgação de eventos culturais e educativos, como cursos e festividades
religiosas, são divulgados gratuitamente.
Via de regra, não é permitido às rádios comunitárias qualquer vínculo político ou com
qualquer outra entidade, para fins pessoais ou lucrativos. Porém, é necessário um mínimo de
custo para que a rádio se mantenha. Dessa forma, a relação com os anunciantes torna-se
imprescindível.
A Rádio possui como anunciantes os pequenos proprietários da localidade, que
também se beneficiam, pois, além do custo ser menor em relação às rádios comerciais,
também atinge os ouvintes locais que são exatamente os clientes potenciais.
A Megacidade FM não possui aparelhos para medição da audiência. Para testar a
popularidade de um programa, eles se utilizam dos telefonemas dos ouvintes e até mesmo de
comentários informais, feitos pela população, sobre a programação.
A rádio também tem parceria com algumas escolas públicas do bairro, onde
desenvolve práticas educativas e disponibiliza materiais necessários para o ensino de técnicas
de locução e produção de rádio.
Novos horizontes
Visando a estabilização do público e a conquista de novos ouvintes, a Megacidade
busca seu espaço no cenário virtual.
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Para garantir maior alcance de sua programação e se adaptar a esse meio digital, a
rádio lançou recentemente o site www.megacidadefm.com, que permitirá o acesso ao vivo aos
programas e também suas programações armazenadas.
A Rádio poderá ser ouvida de
qualquer parte do mundo “No primeiro teste que a gente fez no ar, pra nossa surpresa, alguém
estava escutando no Japão”.6
Através desse relato de uma ex moradora de Ananindeua, que agora encontra-se no
Japão, que por meio da internet pôde ouvir a Megacidade, podemos perceber a potencialidade
e visibilidade que uma rádio web proporciona.
Sobre as vantagens de implantação das rádios ao ciberespaço podemos ver:
Pode-se afirmar que uma das grandes vantagens obtidas entre o rádio e a
internet, por exemplo, é disponibilizar ao ouvinte um ótimo meio de manter
contato com sua cultura, país e cidade, uma vez que hoje é totalmente possível
acessar rádios de qualquer parte do mundo, assim como enviar mensagens
para qualquer parte. (COSTA; COSTA, 2009, p. 504)
A Megacidade possui agora um novo meio para transmissão, entretanto, o site
disponibilizará a programação diária da rádio e ainda não há índices que apontem para uma
verdadeira adaptação para o meio digital.
A internet abriga a convergência dos diversos meios de comunicação, entretanto, para
que ocorra de fato a adaptação destes, é necessário que ganhem uma nova linguagem que
possa abranger as diversas funções da web.
Santaella fala sobre a complexidade do meio digital:
A partir da gravação e da criação de instrumentos eletrônicos e
computacionais, a sonoridade passou a competir com a visualidade na criação
de dispositivos que funcionam como prolongamentos de habilidades auditivas,
aumentando sua complexidade. (SANTAELLA, 2001, p. 75)
Com a construção do site, a Megacidade deu o primeiro passo para a sua possível
adaptação para o ciberespaço, o que pode proporcionar uma variedade do público ouvinte e
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Comunicação Pessoal em: 21/05/2011
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provocar o surgimento de uma nova roupagem para a Rádio por meio da interatividade da
internet.
Referência Bibliográfica
COSTA, Catarina; COSTA, Luciana. In: KLOCKNER, Luciano; PRATA, Nair (Orgs.). História da
Mídia Sonora. experiências, memórias e afetos de norte a sul do Brasil. Porto Alegre: EDIPUCRS,
2009.
GÓES, KLEBER. Entrevista. Entrevistadoras: Brunella Velloso e Julieth Corrêa. Ananindeua, 2011.
Entrevista concedida para elaboração do trabalho “Da comunidade para o mundo: O percurso da Rádio
Megacidade”.
JUNG, Milton. Jornalismo de Rádio. São Paulo: Contexto, 2007.
PERUZZO, Cicilia M.Krohling. Participação nas Rádios Comunitárias no Brasil. XXI Congresso
Brasileiro de Ciências da Comunicação, Recife-PE, 9 a 14 de setembro de 1998.
_________. Rádios Comunitárias no Brasil: da desobediência civil e particularidades às
propostas aprovadas na CONFECOM. Encontro Anual da Compós realizado na PUC-Rio de 8 a 11
de junho de 2010.
SANTAELLA, Lucia. Matrizes da linguagem e pensamento sonoro, visual,
verbal: aplicações na hipermídia. São Paulo: Iluminuras, 2001
Sites
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MINISTÉRIO
DAS
COMUNICAÇÕES.
Rádio
Comunitária.
<http://www.mc.gov.br/radiodifusao/perguntas-frequentes/radio-comunitaria>.
Disponível
em:
Acesso: 21/05/2011
PLANALTO. Lei 9.612/98. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9612.htm>
Acesso: 24/05/2011
BALAIO DE NOTÍCIAS. Entrevista sobre rádio comunitária. Disponível
<http://www.sergipe.com.br/balaiodenoticias/entrevistaj78.htm> Acesso: 21/05/2011
em:
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