Mey Rose Rink
Chefe da Fundacentro
do Paraná.
SAÚDE E SEGURANÇA DOS
TRABALHADORES: FATORES PARA A
RESPONSABILIDADE SOCIAL
PESQUISA EM INDÚSTRIAS MOVELEIRAS DO PARANÁ MOSTRA A
GRAVIDADE DO QUADRO DA SEGURANÇA NO TRABALHO
No Brasil, o movimento de valorização da responsabilidade social
empresarial recebeu impulso na década de 1990, fortalecido pela
ação de entidades não-governamentais, institutos de pesquisa e
empresas sensibilizadas com a questão.
A responsabilidade social, para muitos empresários, infelizmente
passa apenas pela questão da obtenção de certificados de padrão
de qualidade e de adequação ambiental como as normas ISO,
entendidas como símbolo de avanços técnicos e como a garantia
de concorrer dentro do mercado industrial internacional e de ainda
criar uma imagem de empresa que contribui para o
desenvolvimento do país por meio da melhoria da qualidade de
vida dos cidadãos brasileiros.
Defende-se neste artigo a necessidade de se considerarem
aspectos associados à saúde e segurança dos trabalhadores
como requisito básico e fundamental para a adoção da
responsabilidade social nas empresas. Esse requisito merece
ainda mais destaque quando são observados os índices
crescentes de acidentes de trabalho e de doenças ocupacionais,
em âmbito nacional e internacional.
MUITOS ACIDENTES
Os dados do Anuário Estatístico da Previdência Social mostram
que os acidentes de trabalho aumentam a cada dia, chegando a
custar cerca de R$ 300 milhões em 2002 à Previdência Social.
2 0 revista FAE BUSINESS
número 9
setembro 2004
No Brasil, foram registrados aproximadamente 388 mil acidentes
de trabalho em 2002, o que correspondeu a um aumento de 14%
em relação ao ano anterior (tabela 1). Os acidentes típicos
representaram 83% do total de acidentes; os de trajeto, 12%; as
doenças do trabalho, 5%. Na distribuição por sexo, a participação
dos homens foi de 78%; e das mulheres, 22%. A participação dos
grupos de idade com maior incidência de acidentes foi de 37%,
30% e 20%, para as faixas de 20 a 29 anos, 30 a 39 anos e 40 a
49 anos, respectivamente.
Os Códigos Internacionais de Doenças (CID) mais incidentes foram
os relacionados com ferimentos, fraturas e traumatismos nos punhos
ou nas mãos, representando 26% do total de acidentes. Partes do
corpo com maior incidência de acidentes típicos foram o dedo, mão
(exceto punho ou dedo) e pé (exceto artelhos), com, respectivamente,
27%, 11% e 8,5% do total de acidentes. Nas doenças do trabalho, as
partes do corpo mais atingidas foram o ouvido (externo, médio interno,
audição e equilíbrio), o braço (entre o punho e o ombro) e o ombro,
com 18%, 12% e 11%, respectivamente.
A maioria das máquinas encontradas
nas indústrias madeireira e moveleira
é muito antiga e sem proteção para o
trabalhador, muitas delas compradas
quando já se encontravam em desuso
nos países de primeiro mundo
CONDIÇÕES DE TRABALHO NAS INDÚSTRIAS
MOVELEIRAS
O setor das indústrias madeireira e moveleira é, atualmente, líder
em acidentes de trabalho no Paraná, registrando 2.515 acidentes
em 2000 (9,8% do total), 1.884 em 2001 (8,11% do total) e 2.315
em 2002 (8,4% do total). A causa principal tem sido atribuída ao
uso de máquinas inadequadas, sem manutenção e sem proteção
para os trabalhadores, de acordo com dados obtidos do Anuário
Estatístico da Previdência Social.
TRABALHANDO JUNTOS
Uma pesquisa de campo realizada em 2001 pela Fundacentro/PR
com as indústrias moveleiras do Parque Industrial de Arapongas/
PR, permitiu constatar que a situação das madeireiras é
emergencial¹. Apesar de ter sido timidamente formado, na década
de 1960, por pequenas indústrias de "fundo de quintal" e conduzido
principalmente por pessoas vindas da área rural da própria
comunidade local, esse parque é, atualmente, o segundo pólo
moveleiro do país, com 117 empresas do setor.
A análise dos dados coletados via questionários semi-estruturados
possibilitou concluir, de modo geral, que o ambiente de trabalho desse
segmento industrial está totalmente sem controle, expondo os
trabalhadores a ruído, poeira e produtos químicos para tratamento da
madeira. As máquinas e equipamentos encontram-se desprotegidos.
Para agravar a situação, as condições sanitárias e de conforto nos
locais de trabalho são totalmente adversas ao trabalhador.
Deve-se destacar que a maioria das máquinas encontradas nas
empresas é muito antiga, muitas delas compradas quando já se
encontravam em desuso nos países de primeiro mundo. Os
empresários se justificam afirmando não existirem, disponíveis no
mercado, unidades com proteção. Ocorre que as proteções para
essas máquinas devem ser projetadas por profissionais
especializados e desenvolvidas sob encomenda.
RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR
A instalação de proteção nas máquinas é de responsabilidade do
empregador. A eventual falta de proteção pode responsabilizar
esse empregador judicialmente em várias instâncias. Atualmente,
quando se compram máquinas do exterior, sabe-se que é possível
optar pela aquisição conjunta de suas respectivas proteções. A
maioria dos empresários, porém, prefere não adquiri-las em
decorrência do seu custo.
A solução para o problema seria a obrigatoriedade da compra das
máquinas e equipamentos com a devida proteção de segurança,
tanto para aquisição no mercado nacional quanto para sua
importação. A NR-12 da Portaria MTb n° 3.214, Máquinas e
Equipamentos, já contempla essas normas, sendo inclusive
bastante antigas.
Portanto, não há necessidade de legislação específica para esse
ramo de atividades, uma vez que cada risco encontrado, nas
várias indústrias da madeira, já está previsto nas Normas
Regulamentadoras existentes. A importância da criação de
Regulamentos Técnicos de Procedimentos (RTPs) ocorre apenas
nos casos de proteção em máquinas. Tais aspectos são similares
aos já existentes para a NR-18, Indústria da Construção. A principal
recomendação para esse setor produtivo é que se faça cumprir a
Portaria MTb n° 3.214 já existente.
Para possibilitar ações preventivas efetivas e a adoção de novas
metodologias de ação prevencionistas, faz-se necessário conhecer
as condições de vida dos trabalhadores, com enfoque nos aspectos
socioeconômicos e de segurança e saúde do trabalho.
Posteriormente, disponibilizam-se os dados obtidos para empresas
e outras entidades representativas ou interessadas.
Quando o ambiente de trabalho é detidamente observado, duvidase que os equipamentos de proteção coletiva sejam realmente
eficientes ou atendam à finalidade a que se destinam. Em geral, um
fato que chama a atenção é o desconhecimento do assunto
"segurança e saúde do trabalhador" pelos trabalhadores que
possuem alto grau de escolaridade e recebem altos salários. Esse
fator pode representar o descaso com a matéria por parte de todo
o sistema educacional brasileiro.
Responsabilidade social significa Estado e sociedade trabalhando
juntos, identificando o que cada um faz melhor para somar esforços
em prol de objetivos de interesse comum. Se as empresas realmente
querem cumprir esse papel, devem começar a questionar: o seu
relacionamento com os trabalhadores; que tipos de benefícios não
obrigatórios por lei ou acordo coletivo têm sido concedidos e em
que extensão; como a questão da diversidade e do respeito aos
trabalhadores se reflete em práticas diferenciadas de contratação/
demissão e de gestão do trabalho; e, ainda, se existe controle
efetivo do ambiente de trabalho.
Saúde e segurança dos trabalhadores como fatores para a
responsabilidade social significam na verdade o que sempre se
pretendeu como um todo: um ambiente de trabalho livre de todos
os riscos que sempre o acompanharam. Os efeitos da exposição
aos riscos sobre a saúde psicofísica dos trabalhadores não devem
superar o limite representado pela possibilidade de uma vida social
completa dentro e fora do trabalho. Somente uma real posição de
igualdade diante de todos os aspectos da nocividade por parte dos
empresários pode garantir as transformações necessárias que
devem determinar um ambiente de trabalho seguro e saudável. NOTA
1
A Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do
Trabalho (Fundacentro) tem por objetivo desenvolver estudos e pesquisas
na área de segurança e saúde dos trabalhadores, visando à melhoria da
qualidade de vida da força de trabalho do país e, conseqüentemente, de
suas famílias e da sociedade como um todo. Ela representa dentro do
setor público o compromisso contínuo de melhoria dos ambientes de
trabalho, promovendo integridade dos trabalhadores dentro do processo
produtivo das empresas, um fator tão importante para elas como a
qualidade do produto ou do serviço.
revista FAE BUSINESS
número 9
setembro 2004 2 1
Download

saúde e segurança dos trabalhadores: fatores para a