COMUNICAÇÃO (Resumo)
1. Responsabilidade e Conhecimento
O Arquitecto, propósito e âmbitos de intervenção profissional, do
ponto de vista do “anónimo e genérico” cliente português.
Estela Catarino (Nº12044)
A palavra Arquitectura anda por todo o lado. Parece bem mais inteligível quando associada a redes
informáticas, sistemas computacionais ou a complexas redes neurolinguísticas; mais do que quando
associada à cidade, ao objecto, ao ambiente, à construção, enfim, ao espaço que habitamos. Informação,
aparentemente, não falta. Encontramos uma profusão de estabelecimentos comerciais que oferecem
serviços de apoio e desenho, projectos de interiores e exteriores, ambientes de banhos, cozinhas plenas de
design, soluções publicitadas em qualquer jornal regional, ou brochura. Encontramos lojas de decoração que
publicitam serviços de arquitectura de interiores que, na realidade não têm, porque não chamam arquitectos
para os realizar. Encontramos clientes com problemas reais para resolver com arquitectura, e que são
mascarados com artifícios decorativos, por pessoas com mais ou menos habilidade para vender decoração.
É tão bom incluir a palavra “arquitectura” nos discursos comerciais quando o objectivo é credibilizar soluções
e vendê-las.
Com a TV por cabo abre-se a possibilidade do nosso mundo doméstico ser transformado e “resolvido” pelo
familiar ou vizinho do lado em apenas 48 horas. Tropeçamos num manancial de publicações mais ou menos
comuns, mais ou menos económicas, mais ou menos técnicas, nas mais diversas línguas, devotas ao
grande e vasto tema dos “ambientes”. Vemos menções à arquitectura com design, ao belo, às tendências,
autênticos receituários compactos de soluções plenos de imagens sedutoras de paraísos originais do tipo
“tenha você mesmo”!
Quando me apresento como arquitecta para ajudar um cliente na loja onde trabalho, as observações são
diversas e vagueiam tantas vezes entre: “ah, que giro, o arquitecto também faz disso? Pensei que só fizesse
casas estranhas!”, ou “oh mas os arquitectos não fazem só museus?…” ou ainda “Oh arquitecta, mas eu
não quero fazer nada esquisito”, “…eu só quero pintar a parede da sala com uma cor diferente”; ou ainda “
oh arquitecta, para fazer obras na minha casa de banho, não é preciso complicar! Conheço um construtor
jeitosinho que até tem um amigo me faz isso sem projecto! ….”, “Projecto? Projecto para quê?”
Interrogo-me sempre sobre tudo o que o verbo “fazer” queira incluir no léxico deles e no meu.
Será que as pessoas entendem o que lêem e vêem? Será que sabem realmente o que faz (ou pode fazer)
um arquitecto? Sabem quando devem, ou não, solicitar o apoio de um arquitecto? Qual o verdadeiro
propósito da actividade do arquitecto? Qual o seu âmbito de intervenção? Será que sentem necessidade de
recorrer ao arquitecto para mudar o ambiente que as rodeia?
A resposta, quanto a mim, é não.
Porquê? Será que é tudo uma questão de dinheiro? Ou será antes, uma questão de formação académica do
cliente? Ou será ambas? Ou nenhuma delas?
Posso atestar em primeira pessoa o confronto com respostas destas que saem enfáticas quase diariamente
dos lábios de damas e cavalheiros das mais diversas idades, com bons, ou razoáveis atributos financeiros, e
das mais diversas profissões, como médicos, autarcas, professores, funcionários públicos, domésticas ou
outros. Nos casos mais extremos não sabem pura e simplesmente o que faz um arquitecto. Nos casos
menos dramáticos, acham que o arquitecto só faz desenhos, ou só sabe de paredes, cimento ou tijolo, e que
conforto é coisa de decoração e não arquitectura. Muitos há, que pensam que é caro solicitar um apoio
técnico de um arquitecto…Por outro lado, da parte de quem constrói, casos há, em que os construtores por
sua vez recomendam cuidado com os arquitectos, pois para eles, os arquitectos só atrasam as obras e só
complicam… A expressão “…já faço casas há vinte anos!” não deveria ser per si, justificação ou atestado de
qualidade do produto final para o cliente!
Com a experiência que tenho colhido e nos diversos casos para consultoria, projecto e obra com que me
tenho deparado nos últimos anos, sinto que, na maioria dos casos não é uma questão de custos, mas antes,
claramente, uma questão de estereótipo que afasta o cidadão português da figura do “Arquitecto”.
Recuso-me a aceitar que apesar de estarmos na linha da frente em tantos temas, continuamos a deixar que
intervenham sobre o meio que nos rodeia com a ligeireza, e às vezes, a leviandade do “jeitinho” tão
português.
Recuso-me a aceitar que um dos maiores investimentos da economia doméstica das famílias portuguesas,
onde há um endividamento para a vida, ou seja, a Casa, seja intervencionado, projectado, ou alterado por
pessoas com dúbias qualificações para tal.
Em conclusão
Apesar da abundância com que a palavra “Arquitectura” é e será escrita ou dita mesmo depois deste
congresso, na sua forma mais pura, ou em todas as derivações semânticas; apesar dos prémios, das
intervenções de autor, das festas de inauguração publicitadas por toda a parte, há ainda muita gente por
esse Portugal que não sabe o que é, para que serve, ou o que faz um arquitecto. Não venho aqui lançar
interrogações corrosivas ou pessimistas. Antes procuro expor a realidade com que me deparo diariamente.
A partir da frequência com que ouço estes sinais frequentes de desconhecimento, posso deduzir que um dos
problemas fundamentais associado ao desconhecimento das pessoas, relativamente à profissão, advém da
falta de divulgação do trabalho do arquitecto. Também considero que é muito importante trabalhar no sentido
da desmistificação da figura do arquitecto, demovendo-o de um patamar de aparente inacessibilidade, (de
alguém que faz coisas esquisitas, grandes estruturas museológicas, alguém que cobra caro, alguém
complicado e que ninguém entende o que diz). Por outro lado, penso sinceramente, que a obra de
arquitectura dita “anónima”, em diversidade e em quantidade poderá servir de contexto altamente
argumentativo de divulgação de ambientes territoriais de qualidade, aumentando as expectativas do cidadão
em relação ao que o rodeia, traduzindo-se por consequência, na procura crescente de trabalho de
arquitecto, em situações mais frequentes na vida dos cidadãos. Espero que esta comunicação possa servir
de apoio ao debate do que considero ser uma das raízes do problema dos “Novos Territórios” que, nós,
simultaneamente arquitectos e clientes, ansiamos ter e reclamamos não ver.
Às observações e interrogações mais ou menos inocentes ou preguiçosas de tantos clientes, eu respondo
quase diariamente “Sim, para transformar a sua casa-de-banho é melhor pensar antes de fazer e falar com
um arquitecto “, “Sim, o arquitecto pode fazer o projecto da ampliação da sua casa”, “Não, o arquitecto não
serve só para complicar a vida ao construtor”,” Não, o arquitecto não faz só projectos de museus e casas
estranhas”, “ Não, o arquitecto não é uma personagem que só inventa e desenha coisas no papel”, “Não,
não é preciso ter muito dinheiro para pedir ajuda a um arquitecto”….
Respondo resignada por fim, “Vou explicar-lhe o que um arquitecto que pode fazer por si.”
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