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Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande
Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande
ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 11 • Novembro 2013
A LEITURA COMO PRÁTICA PEDAGÓGICA PARA
OTIMIZAR A APRENDIZAGEM DAS CRIANÇAS DO 1°. E 2°.
ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL
Aldecina Costa Sousa (SEMEDSJR/UFMA)1
[email protected]
Jovina Maria Moura de Sousa (SMEAA)2
[email protected]
RESUMO: A leitura como prática pedagógica para estimular a aprendizagem das crianças do 1º e 2º ano
do Ensino Fundamental é uma pesquisa desenvolvida com o propósito de averiguar a leitura como recurso
do professor na promoção da aprendizagem em sala de aula. Para fundamentá-la as concepções de leitura
de Paulo Freire e Ezequiel Teodoro são basilares, ambos defendem que ler não se resume ao simples ato
de decodificar a palavra escrita, a leitura se alonga na interpretação e compreensão do mundo. Norteia-se
também essa investigação nas teorias da aprendizagem de L. S. Vygotsky e Piaget, os quais afirmam que
o desenvolvimento cognitivo da criança acontece a partir de sua adaptação e interação com o ambiente
social em que convive. Para delinear o objeto pesquisado, fez-se uso da observação não participativa e
entrevista com os professores das escolas pesquisadas, através destas obteve-se dados consistentes que
revelam a leitura como prática pedagógica que otimiza a aprendizagem do aluno. Além dessa
confirmação, constata-se que o ato de ler é uma prática que ainda não está, adequadamente, presente no
cotidiano do fazer docente, precisa ser vista como uma atividade capaz de promover a aquisição de
habilidades e competências que permitem à criança: analisar, refletir, interpretar e compreender as ações
que acontecem no seu dia a dia envolvendo sua vida familiar, escolar, ou seja, as suas rel(ações) sociais.
PALAVRAS-CHAVE: Leitura. Criança. Professor. Aprendizagem.
ABSTRACT: This research is titled: Reading as a teacher's pedagogic practice to stimulate children's
learning of the 1st and 2nd year of elementary school aims to ascertain the daily practice of reading as a
teacher in promoting learning. For such reasons, the present work on the conceptions of reading Paulo
Freire and Ezequiel Teodoro , both argue that the act of reading is not just the simple act of decoding the
written word, but extends to the interpretation and understanding of the world. Also guided the research
on learning theories of L. S. Vygotsky and Piaget, as the claim that cognitive development happens from
their adaptation and interaction with the social environment in which lives. To delineate the researched
object, perform non- participatory observation and interviewed the teachers of the
schools surveyed, where we obtained consistent data that reveal the reading as a pedagogical practice that
optimizes student learning, beyond this confirmation we found that the act of reading is a practice that is
not adequately do this in daily teaching, needing to be seen as an activity that can promote the acquisition
of skills and competence to the child, allowing you to analyze, reflect, interpret and understand the
actions that happen in your day to day life involving family, school, or their social relations.
KEYWORDS: Reading. Child. Teacher. Learning.
1
Mestra em Letras, Professora da Rede Pública Municipal de São José de Ribamar-MA.; Professora
UFMA/São Bernardo.
2
Pedagoga, Coordenadora na Secretaria Municipal de Educação do Município de Aldeias Altas-MA.;
Orientadora do PNAIC.
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1 Introdução
Nas últimas décadas, vários pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento
têm se interessado pela problemática da leitura, principalmente a que vivenciamos na
escola. O hábito de ler atrelado à dificuldade de aprendizagem, o papel do professor na
aprendizagem, as teorias de aprendizagem e a linguagem no desenvolvimento da
criança, têm desencadeado debates e discussões nas academias e congressos por todo o
país. Os diversos trabalhos já realizados sobre o tema apresentam pontos de
concordância quando se trata da aprendizagem da criança mediada pelo exercício da
leitura.
Diante dessas afirmações, o presente trabalho visa investigar a contribuição da
leitura na aprendizagem, em particular das crianças dos anos iniciais, por isso a temática
que contempla a pesquisa é: A leitura como prática pedagógica para otimizar a
aprendizagem das crianças no 1º e 2º ano do Ensino Fundamental. Nessa perspectiva, a
pesquisa pretende obter respostas fundamentadas nas várias concepções de leitura e nas
teorias existentes que explicam a relação entre a aprendizagem e a linguagem e suas
implicações no processo de construção do conhecimento. Mediante este delineamento,
surgiu o seguinte questionamento: Como a leitura pode otimizar a aprendizagem dos
alunos nos anos iniciais do Ensino Fundamental?
Partindo do tema e do problema delineados, formulou-se a seguinte hipótese: O
professor ao utilizar a leitura em sua prática pedagógica tornará a aprendizagem dos
alunos mais eficiente, pois estabelecerá interação entre o conhecimento que eles já
trazem do seu contexto cultural e o conhecimento formal a ser construído na e pela
escola. Além de instaurar, com esse procedimento, um vínculo efetivo/afetivo entre
escola-professor-aluno-conhecimento. Nessa perspectiva, quanto mais cedo o professor
envolver as crianças em práticas de leitura, maiores as chances delas obterem sucesso
no processo ensino-aprendizagem e de transformá-las em leitoras quando adultas.
Essa proposição torna-se verossímil quando se parte do princípio de que a
leitura é um meio fácil que o sujeito dispõe para adquirir informações e conhecimentos
que lhe permitem desenvolver capacidades e habilidades para compreender o mundo
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como um todo. Sendo assim, apresenta-se como recurso pedagógico acessível ao
professor, na promoção e otimização da aprendizagem no contexto escolar.
Dando prosseguimento à investigação, traçamos como Objetivo Geral: Analisar
a leitura como prática pedagógica na promoção e otimização da aprendizagem dos
alunos de 1°e 2° ano do Ensino Fundamental; E, como Objetivos Específicos:
Identificar as práticas de leitura trabalhadas pelo professor na sala de aula; Investigar a
formação do professor, enquanto mediador da leitura; Relacionar a aprendizagem dos
alunos com a prática de leitura utilizada pelo professor; Relacionar a prática efetiva da
leitura com a aprendizagem dos alunos.
Em decorrência da natureza do objeto pesquisado, esta investigação científica
apresenta um enfoque descritivo e analítico, por isso optou-se pela modalidade de
pesquisa qualitativa. Com o propósito de obter dados para subsidiar o problema
levantado, utilizou-se como técnica para esse fim a observação não participativa, tendo
em vista que esta possibilita maior aproximação com os sujeitos envolvidos na pesquisa,
assim como a entrevista semiestruturada, também empregada. Dessa forma, tornou-se
possível angariar subsídios para uma análise mais acurada do objeto em foco que
oportunizou, além de reflexões pertinentes, a apresentação de considerações relevantes e
abalizadas.
A leitura é uma das atividades mais complexas e, ao mesmo tempo prazerosa que
o ser humano pode realizar. Uma das características do homem é ser capaz, desde o
nascimento, de aprender continuamente. Nesse contexto, o ato de ler concebe-se como
modalidade de aprendizagem disponível ao sujeito. Esta, no contexto moderno, tornouse indispensável à sua sobrevivência. Mamar, falar, ler, são os primeiros e importantes
aprendizados do ser humano no início da vida. Alguns estudiosos defendem que
nascemos prontos para aprender, ao contrário do que ocorre com as outras espécies de
mamíferos. Essa teoria permite afirmar que a criança, quando vem para a escola, já traz
consigo uma bagagem cultural, adquirida em seu contexto familiar, que muito contribui
para a aquisição da leitura e, consequentemente, para seu aprendizado.
Diante da importância da leitura para o desenvolvimento da aprendizagem da
criança, faz-se necessário compreendermos que o ato de ler precisa efetivamente
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legitimar-se nas práticas docentes, pois é através da legitimação da leitura que o homem
torna-se capaz de realizar e transformar suas atividades, direcionar suas ações, apto a
refletir e construir seus passos em um universo que exige continuamente que o
indivíduo seja construtor de saberes necessários à sua sobrevivência na sociedade regida
pela palavra.
Considerando as discussões pertinentes sobre a prática da leitura na escola, visto
que é o lugar onde ela deve ser sistematizada, mediadas por práticas pedagógicas
emergidas da ação docente, o presente trabalho torna-se relevante na medida em que
desvenda como o ato de ler é mais complexo do que consideramos, tendo em vista que
envolve um conjunto de ações que englobam tanto a escola quanto o ambiente social em
que o aluno encontra-se inserido.
A investigação da presente produção científica fundamentou-se nas concepções
de leitura dos seguintes autores: Martins (1994); Freire (2001); Silva (2003); Maia
(2007) e dos PCNs de Língua Portuguesa (2001). Por serem estas oriundas da
concepção de leitura defendida por Freire (2001), para quem o ato de ler vai muito além
da decodificação pura da palavra escrita.
Para compreendermos como a leitura acontece na escola utilizamos, ainda, os
estudos de Geraldi (2002) que comunga da mesma concepção sobre o ato de ler.
Lançou-se mão dos estudos de: Rego (1995); Vygotsky (2001); Rangel (2005); Luria
(2001); Leontievt (2001); Bakhtin (2002) e Piaget (1993), para se compreender como
ocorre a aprendizagem e o desenvolvimento cognitivo da criança a partir da linguagem
adquirida no seu meio social, bem como o papel do docente na construção de novos
conhecimentos sem desconsiderar o que os pequenos trazem para a escola.
O caminho metodológico percorrido, no decorrer da realização da pesquisa
permitiu a análise e descrição dos dados coletados, bem como a discussão dos
resultados obtidos após confrontá-los com o referencial teórico que fundamentou a
pesquisa. Esse procedimento demonstrou que a prática pedagógica do professor
norteada pela leitura pode ser uma poderosa aliada para favorecer a aprendizagem das
crianças. Por outro lado, evidenciou-se que apesar disso, nem todos os docentes são
sujeitos leitores, fato que inviabiliza um trabalho efetivo e afetivo com grande parte dos
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alunos que se sentam todos os dias nos bancos escolares e revela o quanto a escola, no
contexto da cidade de Caxias, ainda precisa tomar a palavra do aluno (conhecimento de
mundo) e intermediá-la com a palavra contida nos livros (conhecimento formal) de
modo a permitir que haja um processo de interação em que o aprendiz sempre
redireciona seu conhecimento e, consequentemente, a realidade à sua volta.
2 Questões pertinentes ao ato de ler
A leitura deve ser um exercício diário, acontecendo dessa forma, possibilita ao
leitor inúmeras possibilidades de reflexão sobre a realidade vivenciada. O ato de ler é
intrínseco ao ser humano, é uma atividade característica do homem, que ao nascer traz
consigo a capacidade de aprender, e através desta, realiza sua adaptação ao meio em que
vive. Tal assertiva comprova-se em decorrência da leitura estar presente em todas as
suas atividades humanas, desde a mais corriqueira, como por exemplo, tomar um
ônibus, até a mais complexa como pilotar um avião.
Segundo Martins (1994, p.40) “a visão, o olfato e o gosto podem ser apontados
como os referencias mais elementares do ato de ler”. Essa leitura a que a autora referese são as ferramentas de sobrevivência que recebemos ao nascermos das quais nos
apropriamos para desenvolver habilidades de leituras que nos garantam a permanência
em um mundo de transformações constantes, que exige a adaptação ao meio, ou seja,
adapta-se às mudanças.
O ato de ler é um processo de compreensão e interpretação da realidade, que
implica em estratégias para o reconhecimento das habilidades inerentes à condição
humana. Também permite tanto o exercício da criticidade sobre a ação do próprio
sujeito, quanto lhe proporciona refletir sobre a ação humana coletiva. Nesse aspecto, a
leitura se torna importante em nossas relações sociais por ser o meio pelo qual
realizamos um diálogo direto ou indireto com a nossa própria história e com os sujeitos
que nos cercam. A partir da compreensão do nosso existir, efetuamos significados das
nossas práticas diárias. Como concorda Martins (1994, p. 17) ao afirmar que:
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Quando começamos a organizar os conhecimentos adquiridos, a partir da
situação que a realidade impõe, e de nossa atuação nela; quando começamos a
estabelecer relações entre as experiências e a tentar resolver os problemas que
nos apresentam – aí então estamos procedendo leituras, as quais nos habilitam
basicamente a ler tudo e qualquer coisa.
O ato de ler como acesso à cidadania, tem na leitura um papel indiscutível, pois
ela possibilita a ampliação da visão crítica em relação aos nossos atos e sobre as atitudes
das outras pessoas. Ler permite também ao leitor compreender. A leitura estimula a
criatividade, ao ler estimulamos o pensamento e a produção de novos conhecimentos. O
contato constante com gêneros literários diferentes permite ao leitor adquirir a
competência de produzir ou analisar criticamente qualquer assunto em questão ou até
mesmo formular uma hipótese para determinado problema. A construção da capacidade
de produzir e compreender as mais diversas linguagens está diretamente ligada às
condições propícias para ler, para dar sentidos ou atribuir significados a expressões
formais e simbólicas, representacionais ou não, quer sejam configuradas pela palavra,
quer pelo gesto, pelo som, pela imagem.
No que se refere ao papel social da leitura no sucesso profissional do cidadão, o
ato de ler é considerado uma ação propulsora do seu desenvolvimento em sentido
integral e humanístico, que habilita o ser humano a enfrentar uma situação ou
desempenhar qualquer atividade no mercado de trabalho. Ler desperta no sujeito um
sentimento de curiosidade que o motiva a pesquisar, a buscar os conhecimentos
necessários para compreender as transformações constantes que ocorrem em nossa
realidade, como a tecnologia que cotidianamente inova-se e, caso não seja
acompanhada, contribui mais ainda para exclusão social que afeta o país e que é,
também, reproduzida por meio da escola que não oferece às camadas populares uma
educação de boa qualidade (CARNEIRO, 1998).
É inegável que, nesse processo, a leitura assume a responsabilidade de preparar o
cidadão para o empreendedorismo, familiarizando-o com os sistemas modernos de
apropriação do conhecimento, a chave da legitimação de fato da qualificação do
profissional. Ratificando essas colocações Alliende & Condemarín (2005, p. 17)
defendem que:
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Ler amplia as capacidades mentais diversas, a relação que se estabelece entre
a leitura e a ampliação da memória humana permitem o crescimento
intelectual do ser humano. O ato de ler se apresenta não como um fenômeno
separado, mas interligado com outros contextos humanos e simbólicos, que
nos ajudam a compreender a interação complexa das dimensões cognitiva,
emocional e cultural característico (cic) da espécie humana. Os
conhecimentos que absorvemos durante as leituras que realizamos no nosso
cotidiano têm o poder de transfigurar as nossas ações, tornando-as mais
coerentes, criativas, autônomas e significativas. A leitura, também interfere
no nosso comportamento, uma vez que mexe com a nossa imaginação, com o
nosso afeto, pois permite nos refletir, avaliar as relações que se desenvolve
com as outras pessoas do nosso convívio social.
A leitura amplia o vocabulário e melhora a oralidade; o discurso da pessoa que
tem o hábito de ler é diferente de outra que não tem o mesmo hábito. Ao discursarmos
produzimos automaticamente uma sequência de ideias coerentes relacionadas ao
assunto discutido, isto é, se tivermos conhecimentos de causa do tema abordado, caso
contrário a nossa abordagem será quase impossível, uma vez que não podemos abordar
algo que não conhecemos. A leitura possibilita, também ao leitor, o uso de vários
sinônimos da mesma palavra, o que lhe permite empregá-la em situações diversas,
enriquecendo, dessa forma, a sua expressividade.
2.2 Concepções de leitura: visões divergentes sobre um mesmo tema
Sendo o ato de ler um tema bastante discutido, vários conceitos importantes
foram formulados por pesquisadores neste campo. Tanto a leitura que se dá na interação
com o mundo, quanto a que acontece a partir da decodificação das palavras vem, ao
longo do tempo, desencadeando divergências que resultaram em concepções diversas
entre os estudiosos. Apresentaremos algumas dessas concepções com o intuito de
delinear aquela que norteará esta pesquisa científica. Começaremos com o que afirma
Martins (1994, p. 15) sobre a leitura. Para a autora, “aprendemos a ler a partir do nosso
contexto pessoal. E temos que valorizá-lo para ir além dele. É preciso superar algumas
definições sobre o ato de ler”. A principal delas é que a leitura legitima-se através da
decodificação de letras e sons, sendo a compreensão consequência natural dessa ação.
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Nessa perspectiva, deixa-se bem explícito que o ato de ler vai além da pura e
simples decodificação das palavras, é um ato mais complexo e exige que o leitor seja
arguto e autônomo, e utilize os recursos disponíveis em seu meio social para a produção
de novos conhecimentos. Para Kleiman (1995, p. 10): “ao lermos um texto, qualquer
texto, colocamos em ação todo o nosso sistema de valores, crenças e atitudes que
refletem o grupo social em que se deu nossa sociabilização primária, isto é, o grupo
social em que fomos criados”.
“A leitura se realiza a partir do diálogo do leitor com o objeto lido – seja escrito,
sonoro, seja uma imagem, um acontecimento” (MARTINS, 1994, p. 33). Nessa
perspectiva, realizamos leitura a todo instante, ler é uma necessidade vital; Ao
desenvolvermos as nossas atividades do cotidiano, precisamos da leitura, ela é
indispensável ao planejamento de nossos afazeres, que vai do levantar pela manhã ao
deitar à noite, pois analisamos, avaliamos, decidimos e atribuímos significados às
nossas práticas diárias de compreensão do nosso ser e estar no mundo, ampliando, dessa
forma, o entendimento de nossas ações e o desempenho para torná-las mais coerentes
possíveis com o papel social que exercemos.
O ato de ler é a consequência da interação do sujeito com o ambiente cultural a
que pertence. Dominar a leitura e a escrita não é uma tarefa fácil, requer treinamento
sequencial do leitor, exigindo dele competências e habilidades para usar o conhecimento
adquirido no seu meio social para que faça a decodificação, a interpretação e a
compreensão da escrita. Sendo assim, é importante que o professor considere a ideia de
leitura que a criança tem para iniciar o processo de ensino-aprendizagem, ou seja, é
preciso que o professor faça uma avaliação diagnóstica no início do ano letivo, bem
como periodicamente, para avaliar o estágio em que a criança iniciou o ano, e sua
evolução durante o processo de construção do conhecimento.
A leitura é um dos meios mais apropriados que o ser humano dispõe para
ampliar sua visão planetária, considerando as constantes transformações que surgem a
cada minuto com as novas tecnologias, a mão invisível que move a vida social,
econômica e política da sociedade global. Precisamos, antes de tudo, compreender o ato
ler como parte do nosso ser, do nosso fazer, do nosso estar no mundo, situando os
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acontecimentos e interagindo com eles. Através dessa ação, frequentemente somos
capazes de interpretar e entender os fenômenos que ocorrem em nossa sociedade. Ao ler
adquirimos fundamentos e argumentos para interferir nas problemáticas existentes em
nosso contexto social, podendo, dessa forma, agir sensatamente para a solução desses
problemas sociais e contribuir, assim, para uma sociedade mais igualitária.
Freire (2001, p. 11) defende que o contexto em que vive a criança deve ser
considerado no processo de aquisição do ato de ler. Para ele “a leitura de mundo
precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da
continuidade da leitura daquele”. Não podemos compreender uma ação ou um texto sem
nos valer das experiências vivenciadas anteriormente, a compreensão se dá, de fato, a
partir do conhecimento prévio que adquirimos durante o contato com outras situações,
pois a nossa mente não é um quadro de giz que o professor apaga os enunciados escritos
ao término de cada aula. Registramos todas as nossas experiências em nossa memória
que ficam ali guardadas, prontas para serem selecionadas e utilizadas quando
necessário, inclusive, diante da palavra escrita.
A leitura nessa perspectiva propicia uma visão crítica do meio em que o leitor se
encontra inserido, contribuindo dessa forma, para que ele possa agir em prol de sua
modificação. Partidária da mesma posição, Martins (1994, p.30) afirma que:
É preciso considerar a leitura como um processo de compreensão de
expressões formais e simbólicas, não importando por meio de que linguagem.
Assim o ato de ler se refere tanto a algo escrito quanto a outros tipos de
expressões do fazer humano, caracterizando-se também como acontecimento
histórico e estabelecendo uma relação igualmente histórica entre o leitor e o
que é lido.
A leitura, ainda, permite ao leitor uma organização de ideias, um aguçamento do
raciocínio lógico, uma visão crítica da realidade vivenciada, permitindo a percepção e
atribuição de significados consistentes aos fatos reais (GERALDI, 2002). A necessidade
que temos de compreender que a leitura vai além do ler e escrever sistematizado na e
pela escola é a ponte que precisamos para alfabetizar de maneira responsável os nossos
alunos sem que, de primeira mão, sejam aprisionados a uma concepção de leitura ligada
somente ao decodificar das letras.
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Desconsiderar as aprendizagens que a criança recebe das relações desenvolvidas
dentro das instituições a que pertence como a família e a igreja, sem dúvida é um erro
do professor, e talvez seja esse o maior obstáculo encontrado pelo educando quando se
depara dentro de uma sala de aula em contato com um mundo diferente. O novo causa
insegurança, principalmente na criança; ao nos depararmos com situações incomuns, ou
seja, desconhecidas do nosso contexto, de imediato a sensação que temos é de medo. No
entanto, acreditamos que, quando a criança vai à escola pela primeira vez ou muda de
um ambiente escolar para outro, sente-se insegura. Nesse processo de transição, cabe ao
professor como mediador da aprendizagem e o responsável por um ambiente acolhedor
na sala de aula, criar situações de afetividade para conquistar a sua confiança,
contribuindo assim com a sua adaptação e sua integração ao meio, já que este
procedimento favorece o processo ensino aprendizagem do aluno.
Silva (2003, p. 46) “enfatiza que a íntima relação entre o conhecimento e o
mundo da escrita, ainda que várias outras linguagens sirvam para realizar e animar a
comunicação entre os homens é a escrita que serve como fonte principal e primeira para
transmissão do saber”. Nesse fato, reside a explicação para o homem necessitar da
escola, pois é através dela que nos apropriamos do conhecimento sistematizado,
necessário à nossa afirmação como seres detentores de capacidades e habilidades de
intervir socialmente na defesa dos nossos direitos, exercendo, dessa forma, uma
cidadania plena.
Em pesquisa realizada no contexto de Caxias, Maia (2007) apresenta em seu
trabalho que decodificar as letras é sinônimo de identificar, ou seja, descobrir o código
escrito que forma uma palavra. Nessa concepção “leitura significa o exercício da
decodificação e codificação mecânica, da repetição [...] metodologia essa que implica
uma consequência: a escola até consegue ensinar o povo a ler, porém não forma
leitores” (2007, p. 32).
É bastante pertinente a colocação da autora, uma vez que retrata de fato o
tratamento dado ao ato de ler em nossas escolas, e cristaliza a concepção de leitura que
seguem grande parte dos professores que nelas atuam, e são os responsáveis pelo seu
ensino às nossas crianças ao longo do processo escolar. É preciso dessa forma que o
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docente perceba que alfabetizar lentrando é a melhor maneira do aluno perceber que a
leitura faz parte das práticas sociais desenvolvida por ele. Por considerarem que ler não
é apenas decodificar, mas também envolve compreensão e reflexão, Sousa & Pereira
(2005, p. 76 - 77) afirmam que:
Quando o aluno ingressa na escola, todos (escola, pais, sociedade) esperam
que ele aprenda a ler. Muitas vezes, no entanto, aprender a ler, nas séries
iniciais é sinônimo de decodificar a palavra escrita. É preciso refletir sobre
essa noção de leitura como decodificação. Naturalmente, para que se leia a
palavra, é necessário que se tenha acesso a um conhecimento sobre a língua
escrita, o qual supõe a aprendizagem do sistema de escrita. [...] a leitura nem
começa e nem acaba com essa aprendizagem. Decodificar (reconhecer) as
letras, as sílabas que compõem a palavra é apenas um meio (necessário,
imprescindível) para se efetivar a leitura da palavra, que não se esgota nesse
gesto de identificação/ reconhecimento.
Segundo os PCN’s de Língua Portuguesa (2001, p. 53): “leitura é um processo
no qual o leitor realiza um trabalho ativo de construção do significado do texto, a partir
dos seus objetivos, do seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que
sabe sobre a língua: características do gênero, do portador, do sistema de escrita”. Sendo
assim, ao realizarmos a leitura de um determinado texto, construímos uma relação de
integração com os elementos que estão armazenados em nossa memória, elementos
esses que foram adquiridos através do contato permanente com a leitura. Esses
elementos básicos que usamos para a interpretação e compreensão do texto são
associados às aprendizagens do cotidiano que aplicamos ao escrito para, a partir dessa
interação, produzir sentidos.
Por acreditarmos que é a leitura que realmente promove a ascensão do cidadão,
preservando a sua identidade e o estimulando a uma atuação consciente dos seus
direitos e deveres, é que optamos guiar nossa pesquisa a partir da concepção de leitura
defendida por Freire (1984, p. 11) na qual: “O ato de ler não se esgota na decodificação
pura da palavra escrita, mas se antecipa e se alonga na inteligência do mundo”. Se
somos seres capazes de nos adaptar ao novo, devemos isso à capacidade que adquirimos
de ler tudo e qualquer coisa; em nenhum momento, após percebermos que temos vida,
ficamos sem realizar leituras, pois todas as nossas ações estão ligadas ao ato ler, lemos
para tudo.
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Partindo dessa perspectiva, é que nos propomos a averiguar se a leitura é
realmente um obstáculo à aprendizagem das crianças, pois sabemos que já nascemos
com instinto de leitores e durante toda a nossa vivência, ou seja, as nossas experiências
com o meio cultural realizamos leituras para desempenhar as atividades diárias.
Corroborando com a concepção de leitura defendida por Silva (1998, p. 43) pois
acrescenta que: “ler é antes de tudo compreender. Ao ler, o leitor executa um ato de
compreender o mundo”. Será, pois, as concepções de leitura, nessa perspectiva, que
nortearão o trabalho ora apresentado.
2.3 A leitura na escola: um desafio do Sistema Educacional
Segundo a LDB (Lei de Diretrizes de Bases 9394/96) o ensino “possui caráter
intencional, sistemático, planejado e continuado para crianças, adolescentes e jovens, a
escola deve propiciar a construção da cidadania”. Na prática, a escola pública vem
vivenciando muitos conflitos, tanto no que se refere à sua função social como em
relação aos recursos didáticos pedagógicos, a estrutura física e as condições de trabalho
e aprendizagem oferecidos aos professores e alunos. Mesmo considerando as mudanças
ocorridas nesse setor, percebe-se que ainda há carência de políticas públicas que
contemplem, de fato, todas as exigências e necessidades imprescindíveis ao bom
atendimento de sua clientela e ao cumprimento de sua função social que é de promover
o conhecimento sistematizado, preparar o aluno para o exercício da cidadania e para o
mercado de trabalho.
O surgimento da escola em nosso país veio acompanhado de grandes atropelos, e
quando se faz uma retrospectiva da leitura, constatamos que até dois séculos atrás não
existiam livros destinados à leitura. E quando o livro surgiu era em número escasso.
Talvez aí esteja a raiz do problema, pois podemos observar que as histórias do livro e da
leitura não surgiram de maneira que possibilitasse um enraizamento cultural de apreço
pelo objeto livro e, consequentemente, pelo hábito de ler. E, após o surgimento dos
livros, se vivenciou outra problemática em relação à impressão de alguns exemplares
que só era possível em outro Continente. Sobre essas questões os cadernos da TV
Escola (1990, p. 5-6) relatam que:
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Até meados do século 19, não existiam praticamente livros de leituras nas
escolas. Para prática da leitura eram usadas as mais distintas fontes. Relatos de
viajantes, autobiografias e romances indicam que a base para a leitura eram
textos manuscritos, tais como documentos de cartório e cartas. Em alguns
casos, a Constituição do Império (e a lei de 1827, a primeira lei brasileira que
trata especificamente de instrução pública), o Código Criminal e a Bíblia
serviam como manual de leituras nas escolas. Com a implantação da imprensa
Régia, 1808, começaram a impressão regular de livros no Brasil, mas tanto na
escola quanto nas demais instâncias sociais, eram raros os objetos disponíveis
para a leitura e, consequentemente, poucos os leitores. [...] a partir da segunda
metade do século 19, começaram a surgir livros de leituras destinados
especificamente às séries iniciais de escolarização, mas alguns ainda eram
impressos na Europa.
Em 1868, Abílio César Borges publicou uma série de livros produzidos
especialmente para o ensino de leitura e da escrita, substituindo as cartilhas grosseiras
ou os materiais manuscritos usados até então. [...] Ainda no século 19, apareceram
outras séries de livros de leitura, destacando-se a obra de Fesliberto de Carvalho,
utilizada em todo o país. [...] Incluindo às vezes ilustrações coloridas, os livros
apresentavam conteúdos das diversas áreas do conhecimento, seguidos em geral por
exercícios, além de ensinamentos morais. [grifo do autor].
Além da distorção em torno do surgimento do livro de leituras nos séculos
anteriores, o ensino vem sofrendo várias intervenções por conta de inúmeras práticas
pedagógicas, a explicação para esse fenômeno é uma busca incessante por um
paradigma que resolva as problemáticas em torno da aprendizagem dos alunos. O
método tradicional foi uma das práticas que criou raízes na educação brasileira, que
concebia o professor como detentor do conhecimento e o aluno como tabula rasa, ou
seja, ele era uma mente vazia de qualquer experiência, portanto, não podiam contribuir
para a produção de novos conhecimentos (BRANDÃO, 2004).
Essa metodologia permeou a prática pedagógica por longas décadas, porém
não podemos, de fato, afirmar que esse modelo tradicional de ensino já se extinguiu,
pois ainda existem várias instituições, tanto públicas quanto particulares, que utilizam o
método tradicional para educar e disciplinar as crianças. Fato que justifica os debates até
agora constantes sobre essa corrente metodológica entre os estudiosos da área. Dentre
esses, apresentamos o posicionamento de Brandão (2004, s.p.), que acredita que:
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Essa linha de ensino difundiu-se no século 18, a partir do iluminismo, e tinha
por objetivo universalizar o acesso do indivíduo ao conhecimento. Foi
considerada não-crítica e ultrapassada nas décadas de 60 e 70, mas ainda tem
prestígio. E seus defensores enfatizam que não há como formar um aluno
crítico e questionador sem uma sólida base de informação. Escolas que seguem
esse modelo tendem a ser rígidas em relação à disciplina.
Entretanto, podemos perceber que, mesmo com as visíveis mudanças ocorridas
nos paradigmas adotados pelo Sistema Educacional Brasileiro, o ensino necessita, ainda
e urgentemente, de práticas inovadoras e eficientes, capazes de diminuir o alto índice de
repetência e evasão escolar divulgados periodicamente pelos órgãos governamentais e
pela mídia. Carecemos de práticas que alfabetizem e promovam o letramento de mais
pessoas, reduzindo, dessa forma, o número considerável de analfabetos funcionais
existentes no país. É o que comprova o INAF de 2007(Indicador de Alfabetismo
Funcional), ao demonstrar que apenas 28% da população brasileira está na condição de
alfabetizados plenos. O indicador demonstra o quadro em que se encontra a educação
brasileira, o que nos leva a concluir que ainda estamos longe de construir uma sociedade
mais justa, pois, somente através da escolaridade, podemos nos tornar aptos a
questionar, a argumentar e, ao mesmo tempo, exigir os nossos direitos e exercer nossos
deveres para com a sociedade.
Atualmente, uma das linhas seguidas em algumas de nossas instituições
escolares é o Construtivismo, que nasceu a partir das ideias de Jean Piaget (2002) e
propõe a valorização das experiências vivenciadas pelo aluno e pelo professor. Essa
concepção defende que o educando deve ser estimulado a agir, criar e construir a partir
do contexto social em que se encontra. As escolas que adotam o modelo construtivista
trabalham na perspectiva do letramento, ou seja, da valorização dos saberes que a
criança traz consigo ao ingressar na escola. Cabe a ela sistematizá-los através de
práticas que respeitam o amadurecimento dos pequenos e os considerem ativos no
processo de construção do próprio conhecimento.
O papel do professor, nesse processo, não se resume apenas a repassar/transmitir
informações, e sim coordenar as situações de aprendizagens, ou seja, ele atua como
mediador, criando estratégias didáticas que possam motivar e promover a produção de
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novos conhecimentos. O docente, conforme o construtivismo, deve ter o cuidado de
respeitar o ritmo de aprendizagem dos alunos os quais participam ativamente na
construção do conhecimento em sala de aula. É por essa razão que optamos por utilizar
essa teoria educacional como referência na realização desta pesquisa, pois a leitura
quando trabalhada nessa perspectiva torna-se o caminho mais viável para que as
crianças além de serem alfabetizadas, sejam letradas. Condição sine qua non para que
tenham um bom desempenho na escola e na vida, visto que, em ambas, o ato de ler é a
competência básica para alcançar o sucesso (VIVAZ, 2009).
A escola deve ser um dos lugares mais favoráveis para a efetivação da leitura,
para isso deve haver espaços reservados para que ela aconteça de fato. No Censo
Escolar de 2005, cerca de 20% das escolas públicas do Ensino Fundamental declararam
ter biblioteca. Porém, na realidade elas têm outros espaços, como sala de leitura,
cantinho de leitura ou acervos itinerantes de livros. Em muitas, são espaços mal
pintados e com pouca iluminação, nada atrativos, que servem mais como depósito de
livros. Isso acaba reforçando a impossibilidade de escolha dos livros por parte do aluno,
devido à visualização do acervo e o acesso serem difíceis, outro problema é a primazia
dos livros didáticos e outras obras que não despertam o interesse dos pequenos.
Entretanto, é preciso que a escola disponibilize as crianças acervos
diversificados que despertem a curiosidade e a vontade do aluno para descobrir o
conteúdo de um determinado livro. Se ele tem o direito à livre escolha, se
desmistificará, dessa forma, a ideia de que a leitura só acontece para o cumprimento de
uma obrigação, e demonstrará à criança que ler pode se tornar um momento de prazer,
de lazer e de crescimento pessoal. Essa deve ser uma das principais preocupações da
escola, uma vez que se configura como o ambiente mais favorável ao estímulo da leitura
e a principal responsável por criar laços afetivos com os livros, portanto, com o
conhecimento. A leitura não deve ser apenas um exercício escolar, mas uma forma de
interação com o mundo pela construção de significados.
2.4 Como a criança aprende: algumas considerações necessárias
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A aprendizagem da criança tem início a partir dos primeiros contatos com seu
meio social. Ela aprende com as relações que naturalmente se desenvolvem com os
membros de sua família, com as pessoas dos lugares que frequenta e com seus vizinhos.
Na escola, aprende com seus colegas e, especialmente, com seu professor. A figura do
docente no processo ensino aprendizagem do aluno é de suma importância, uma vez que
exerce certo poder e deve ter um saber sobre as relações sociais que existem dentro da
sala de aula. Alguns autores afirmam que a criança tem um tempo marcado para a
aquisição do prazer pela leitura, ou seja, forma-se como leitor até os doze anos de idade.
Compreendemos que quando o indivíduo é estimulado a ler, não importa a idade, pois a
leitura tem a capacidade de ativar as habilidades mentais do ser humano, isso quando é
realizada diariamente. Essa afirmativa baseia-se na análise de que uma criança pode
descobrir o gosto pela leitura na fase adequada, mas se não estimulada até adquirir o
hábito de ler, tornar-se-á apenas um decodificador. Segundo Oliveira (apud REGO,
1995, p. 42):
O cérebro é entendido como um sistema aberto, de grande plasticidade, cuja
estrutura e modos de funcionamento são moldados ao longo da história da
espécie e do desenvolvimento individual [...] o cérebro pode servir a novas
funções, criadas na história do homem, sem que sejam necessárias
transformações no órgão físico.
Para Vygotksy (apud REGO, 1995, p. 57) “a mente da criança contém todos os
estágios do desenvolvimento intelectual, eles existem já na sua forma completa,
esperando o momento adequado para emergir”. Na concepção de Piaget (apud
REMOZZI-CHIAROTTINO, 2005, p. 19) distinguem-se quatro estágios de
desenvolvimento, que podem variar no que diz respeita à idade, ao contexto
socioeconômico ou de um grupo para outro, mas sua ordem de sucessão é fixa. O
processo de interação entre a criança e seu meio se dá, em cada um dos níveis de forma
diferente. Temos os seguintes estágios:
 O primeiro se concretiza através da ação, é o período sensorial motor (do
nascimento até 2 de idade, em média). Para o autor nesse período, “o dispositivo
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de que a criança possui para ordenar o mundo são os esquemas motores de
assimilação”;
 O segundo se efetiva através da representação que o meio oferece, ou seja, é o
período do pensamento intuitivo (o período pré-operatório que compreende dos
2 a 7 anos, em média). Segundo autora: “no final as ações sensório-motoras
começam a implicar representação, imagem mental, notando-se aqui a presença
de regulações semireversíveis”;
 O terceiro se manifesta através das operações formais, é o período das operações
concretas (de 7 a 12 anos). Afirma a autora que: “no curso do qual se alcança
uma determinada reversibilidade na formação das primeiras estruturas
operatórias e que comporta um aspecto implicativo”.
Ainda, segundo a autora, também existe o quarto estágio, que é “o período das
operações proposicionais (de 12 a 16 anos), alcança-se finalmente uma reversibilidade
completa e a distinção entre fenômenos atemporais e temporais, entre fenômenos
mecânicos e históricos, ou seja, fenômenos reversíveis e irreversíveis”. Dessa forma, a
criança se desenvolve de maneira integrada nos aspectos cognitivos, afetivos, físicosmotores, morais, linguísticos e sociais. E este processo acontece a partir da relação que
ela constrói com o meio físico e social a que pertence.
Vygotksy (apud REGO, 1995, p. 41) dedicou-se a estudar o desenvolvimento
infantil. Segundo suas conclusões: “as funções psicológicas especialmente humanas se
originam nas relações do indivíduo e seu contexto cultural e social”. Para o autor, a
interação da criança com o mundo possibilita o desenvolvimento das capacidades
mentais, e defende que essa ação acontece do exterior para o interior do indivíduo, ou
seja, a criança desenvolve-se de forma integrada nos aspectos cognitivos, afetivos,
morais, linguísticos e sociais. Apesar de haver afinidades entre as concepções de Piaget
e Vygotsky, nesse ponto eles divergem, pois o primeiro defende que essa interação do
homem com o meio se dá de dentro para fora, por e considera que a inteligência é algo
inato.
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Aprender a ler imagens, sons, objetos, situações do cotidiano amplia as
possibilidades de sentir, refletir, interpretar e agir diante de situações novas. A leitura
está totalmente ligada ao processo cognitivo da criança, é lendo que ela desenvolve
melhor a percepção, reflexão, memória, raciocínio, juízo crítico, imaginação e
representação do mundo, promovendo, assim, os recursos necessários para que possa
intervir, quando adulta, na modificação de sua realidade e, consequentemente, na
realidade daqueles que o cercam. Em relação à aprendizagem da criança, Vygotksy
(apud REGO, 1995, p.72), “identifica dois níveis de desenvolvimento: um se refere às
conquistas já efetivadas, chamado de nível de desenvolvimento real ou efetivo, o outro,
o nível de desenvolvimento potencial, que se relaciona às capacidades a serem
construídas”.
Segundo Rego (1995, p. 73), Vygotksy caracteriza as aprendizagens da criança
com o seu meio cultural em: “zona de desenvolvimento proximal”, ou seja, “a distância
entre aquilo que ela é capaz de fazer de forma autônoma (nível de desenvolvimento
real) e aquilo que ela realiza em colaboração com os outros elementos de seu grupo
social (nível de desenvolvimento potencial)”. Nessa perspectiva, a leitura torna-se um
recurso pedagógico muito importante no processo ensino-aprendizagem, uma vez que
possui elementos que permitem ao aluno realizar atividades utilizando o conhecimento
adquirido no seu meio cultural, e, ao mesmo, tempo o ato de ler, estimulado pelo
professor, possibilita à criança a capacidade de produzir novos conhecimentos.
2.5 O professor como mediador no ensino da leitura e na aprendizagem da criança
O papel do docente na escola contemporânea, frente às constantes
transformações da sociedade, não mais se resume a ensinar a ler e escrever nos moldes
tradicionais, pautados na decodificação e na cópia. A função do professor, na
atualidade, de articulador do processo ensino aprendizagem e mediador do
conhecimento exigem dele competências e habilidades para dirigir as situações de
aprendizagem. É papel também do educador planejar estratégias que trabalhem as
dificuldades do aluno. Para Perrenoud (2000, p. 20): “organizar e dirigir situações de
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aprendizagem” é a primeira competência do professor, pois desenvolver situações
didáticas que promovam a aprendizagem da criança, portanto, deve ser uma prioridade
no fazer docente, uma vez que é de inteira responsabilidade do professor criar meios
para que o aluno aprenda.
O professor, sendo o legítimo responsável, na sala de aula, pelas estratégias de
ensino que motivem a criança ao aprendizado, deve primar por um trabalho de
qualidade, mesmo diante das dificuldades encontradas, que sabemos serem muitas,
algumas já bem conhecidas. Nessa perspectiva, planejar as atividades diárias a partir dos
objetivos a serem alcançadas pelos alunos é uma atitude de responsabilidade e
compromisso com a criança e com a sociedade. Além disso, trabalhar a leitura como
recurso pedagógico em busca de um melhor aprendizado, requer do docente preparação
para que possa selecionar e levar para a escola textos presentes no cotidiano, como
revistas, livros, jornais, história em quadrinhos, de modo que, ao realizarem as
atividades de leitura, elas atendam aos objetivos propostos no processo de planejamento
(PERRENOUD, 2000).
Nas observações realizadas na pesquisa de campo, observou-se outro fator que
também interfere na aprendizagem: o ritmo e estágio de aprendizado de cada criança.
Fenômeno natural dentro e fora da sala de aula, que não é compreendido e respeitado
pelo professor, nem pela estrutura do ensino oferecido nas escolas brasileiras. Os alunos
que convivem em um ambiente rico em informações culturais estão em vantagem, pois
podem valer-se das experiências anteriores para resolver os problemas apresentados em
sala de aula. Tal fato é compreendido pelo professor como um comportamento inato, ao
fazer uma interpretação errônea dessas habilidades; Persistem na idéia de que as
crianças que têm menos sucesso nas atividades escolares apresentam dificuldades de
aprendizagem.
2.6 A linguagem na organização do pensamento infantil
Segundo Rangel (2005, p. 40), “o estudo da linguagem apoiado na análise do
discurso trata dos processos de constituição do fenômeno linguístico e da língua, como
um sistema abstrato, visto que considera o homem dimensionado no tempo e espaço”. O
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ser humano, como já comentado anteriormente, é constituído de várias dimensões que
intervém no seu desenvolvimento cognitivo, e a criança por ser o oco no processo de
ensino-aprendizagem exige do professor competências para lidar com a diversidade, no
que se refere ao contexto social e ao aprendizado que ela traz consigo para a escola.
A linguagem, nesse processo, tem a função de promover a interação entre o
indivíduo e as práticas sociais presentes em sua cultura. Através da linguagem, somos
capazes de compreender as manifestações existentes no comportamento humano em
relação a todos os aspectos que o dimensionam e o tornam único. Os PCN’s de Língua
Portuguesa (2001, p. 24) defendem que:
A linguagem verbal possibilita ao homem representar a realidade física e social
e, desde o momento que é aprendida, conserva um vínculo muito estreito com
o pensamento. Possibilita não só a representação e a regulamentação do
pensamento e da ação, próprios e alheios, mas, também, comunicar idéias,
pensamentos e intenções de diversas naturezas e, desse modo, influenciar o
outro e estabelecer relações interpessoais anteriormente inexistentes.
Nesse contexto, a escola assume um papel básico no ensino da linguagem. A
organização das ideias possibilita ao ser humano estabelecer uma comunicação
satisfatória com os outros seres da mesma espécie. Nesse processo, a linguagem tem um
papel fundamental. Para Bakthin (apud RANGEL, 2005, p. 49), “o indivíduo recebe da
comunidade linguística um sistema já constituído e qualquer mudança no interior deste
sistema ultrapassa os limites da sua consciência individual”. A criança quando começa a
falar utiliza-se dos signos linguísticos da comunidade em que está inserida, e, a partir
deles constitui os elementos de comunicação que lhe permite relacionar-se com os
demais membros de seu meio social.
A linguagem verbal, além de ser a ponte de comunicação entre os sujeitos, é
também responsável pela organização do pensamento, e é constituída individualmente,
ou seja, faz parte do processo de identidade pessoal e social de cada sujeito. Dessa
forma, o estudo da linguagem na escola é de suma importância tanto para a
aprendizagem dos conteúdos escolares, quanto para ampliar a participação cidadã do
indivíduo nas questões sociais. A leitura, nesse processo, contribui na sistematização do
conhecimento, ao proporcionar ao estudante um vocabulário amplo, mais segurança
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para expor e defender seu posicionamento em público e na construção de ideias
coerentes ao abordar um determinado tema.
Portanto, defendemos que cabe ao professor dos anos iniciais a tarefa de criar
um ambiente escolar voltado para a valorização da leitura no processo de ensino
aprendizagem das crianças, pois a passagem pela pré escola faz com que elas cheguem
ao Ensino Fundamental trazendo em sua bagagem experiências e informações
compatíveis com seu nível escolar. Nessa nova realidade, o docente precisa preparar um
espaço que possibilite trocas e aprendizagens significativas com e entre os alunos.
2.7 A linguagem no desenvolvimento da criança
Dominar a fala é uma característica exclusiva do ser humano, pois através dela o
indivíduo transmite as suas ideias e consegue compreender as das outras pessoas.
Vygotksy (apud REGO, 1995, p. 63-64), afirma que a conquista da linguagem
representa um marco no desenvolvimento do homem, pois considera que:
A capacitação especificamente humana para a linguagem habilita as crianças a
providenciarem instrumentos auxiliares na solução de tarefas difíceis, a
superarem a ação impulsiva, a planejarem a solução para um problema antes
de sua execução e a controlarem o seu próprio comportamento. Signos e
palavras constituem para as crianças, primeiro e acima de tudo, um meio de
contato social com outras pessoas. As funções cognitivas e comunicativas da
linguagem tornam-se, então, a base de uma forma nova superior de atividade
nas crianças, distinguindo-as dos animais.
A interação social ocupa um espaço de destaque no desenvolvimento humano,
pois é a partir dela que a criança tem acesso à cultura, aos valores e conhecimentos
acumulados ao longo da história. Através do contato social, o infante tem a
oportunidade de construir habilidades que lhe permitirá adaptar-se ao mundo e, nesse
processo, a linguagem atua como um canal de comunicação e expressão. Através da
fala, é possível desenvolver a memória, a imaginação e a criatividade, que possibilita a
passagem do pensamento concreto para o pensamento mais abstrato.
Leontiev (2001, p. 59) afirma que: “para esclarecer o problema teórico das
forças motivadoras do desenvolvimento da psique infantil, precisamos, primeiro,
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compreender o que determina o caráter psicológico da personalidade, em qualquer
estágio de seu desenvolvimento”. A criança vai conhecendo o mundo, a partir de sua
ação sobre ele. E a leitura é um veículo nessa interação, permitindo a assimilação das
informações recebidas, e, a partir dessa ação, ocorre o seu amadurecimento psicológico
atrelado às influências do contexto escolar mediado pelo professor.
Então as relações que a criança constrói com os adultos, principalmente com sua
família, é, determinante na formação de sua personalidade, pois o desenvolvimento de
sua personalidade não depende somente das condições biológicas e psicológicas, mas
também dos recursos oferecidos pelo seu meio, ou seja, a interação que realiza com as
pessoas com quem convive e o ambiente em que acontece essa interação é bastante
relevante para seu desenvolvimento completo.
[...] a língua é um sistema de signos histórico e social que possibilita ao
homem significar o mundo e a realidade. Assim, aprendê-la é aprender não só
as palavras, mas também os seus significados culturais e, com eles os modos
pelos quais as pessoas do seu meio social entendem e interpretam a realidade e
a si mesmas. [...] Produzir linguagem significa produzir discursos. (PCN’s,
2001, p. 24).
A partir da linguagem, os homens se relacionam uns com os outros, mas, para
que isso aconteça é preciso que utilizem os mesmos signos linguísticos. A interação
verbal permite a comunicação entre as pessoas, possibilita a compreensão da realidade e
as representações que compõem essa realidade. Isso significa dizer que a linguagem é
um recurso indispensável para a aprendizagem do ser humano.
Conclui-se que a leitura é uma prática pedagógica eficiente no processo ensino
aprendizagem da criança. O ato de ler estimulado pelo docente contribui na construção
de habilidades e competências necessárias para a produção de novos conhecimentos.
Nessa perspectiva, acreditamos que o trabalho do professor mediado pela leitura,
permite ao aluno analisar, refletir, interpretar e compreender as suas as ações diante da
sociedade.
3 A leitura como prática pedagógica para otimizar a aprendizagem das crianças do
1° e 2° ano do ensino fundamental
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3.1 O caminho metodológico percorrido: contextualizando o objeto da pesquisa
O presente trabalho apresenta um foco descritivo e analítico. Optou-se pela
pesquisa qualitativa com a utilização, primeiramente, da técnica de observação não
participativa que proporcionou maior proximidade com os sujeitos foco da pesquisa,
bem como analisar com maior acuidade os dados obtidos, posteriormente, com as
entrevistas semiestruturadas que efetuou-se com as professoras de duas escolas da Rede
Municipal de Ensino dos anos iniciais, e que se constituem como corpus desta
investigação científica.
A observação realizada na escola x, nas turmas do 1º ano A e B e 2º ano. Nela,
observamos o projeto didático com o tema: Lendo e aprendendo. Na escola z,
observamos as turmas do 1° ano A e B e 2º. A coleta de dados procedeu em torno dos
objetivos da pesquisa, por isso foi elaborado um roteiro de passos a serem seguidos e
que resultaram em um relatório para análise. A escolha das escolas-campo surgiu por
apresentarem as características ideais para a realização do presente trabalho, uma
trabalha com leitura diariamente, a outra ainda não tem o ato de ler como uma prática
pedagógica diária. As entrevistas, realizadas com o auxílio de um gravador, foram
norteadas por questões que objetivaram contemplar informações que subsidiassem a
temática em análise, uma vez que possibilitaram a análise e a interpretação de dados que
delinearam os resultados obtidos.
O universo dessa investigação é composto por 10 professores e seus respectivos
alunos. Como amostra para a efetivação da análise da pesquisa, extraiu-se cinco
docentes das escolas-campo x e z acima citados. A escolha da figura do professor se deu
por ser o mediador na construção do conhecimento em da sala de aula e o responsável
por utilizar práticas pedagógicas que promovam a aprendizagem das crianças sob sua
responsabilidade.
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3.2 Descrição e análise das observações e entrevistas
3.2.1 Professora Rosa
Professora Rosa está graduando-se em Pedagogia e trabalha há dez anos como
educadora no município de Caxias. Atualmente, leciona na escola x numa turma de 1º
ano com 16 alunos, um número considerado bom em se tratando da fase de
alfabetização.
Com
relação
à
leitura,
considera
uma
prática
que
auxilia,
significativamente, no trabalho pedagógico que desenvolve para promover a
aprendizagem das crianças. Segundo ela: “durante todo ano letivo desenvolvemos o
projeto: Lendo e a aprendendo, pois acreditamos que através do ato de ler, o aluno
desenvolve habilidades e competências para entender as ações que ocorrem no seu
cotidiano”.
Para a professora Rosa, “é importante que se conheça o que a criança já sabe e
trazer para a sala de aula; de início, assuntos relacionados à sua realidade”. Essa é uma
competência que o professor deve desenvolver durante as suas experiências como
educador, pois traçar estratégias de ensino para favorecer a aprendizagem é uma tarefa
exclusiva do docente. Cabe a ele, selecionar e organizar textos de gêneros diversificados
para estimular a aprendizagem de seus alunos (SOLÉ, 1998). Nessa perspectiva, é
importante que o professor por ser o mediador do processo ensino-aprendizagem,
promova atividades que envolvam essa diversidade textual e estimulem os educando a
produzir conhecimentos sobre as características dos gêneros textuais e sua utilidade de
acordo com objetivo e as situações exigidas na sociedade.
3.2.2 Professora Violeta
Professora Violeta é graduada em Letras pela Universidade do Estado do
Maranhão - UEMA, atualmente trabalha na escola x, na turma de 2º ano com 20 alunos.
Para ela, a leitura “é o principal, pois é lendo que se descobre o mundo”. Segundo a
entrevistada, não participa de cursos de formação continuada, no que demonstrou certa
dúvida ao declarar que participa de cursos voltados para práticas pedagógicas de leitura
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afirmando que “esses cursos deu novos rumos e me mostrou novas estratégias de
trabalho”.
Segundo Violeta, para recuperar os alunos que apresentam dificuldades de
aprendizagem, a escola x trabalha “reforço, atividades diferenciadas contemplando as
necessidades do aluno, acompanhamento individual com ajuda da coordenação e leitura
diária”. Acrescentou também que: “temos de explorar a inteligência particular de cada
criança, uns aprendem ler visualmente, outros com gestos, letras, palavras, enfim, cada
aluno tem seu universo e todas as concepções de leitura são válidas”.
3.2.3 Professora Margarida
Margarida é professora licenciada em Letras pela Universidade do Estado do
Maranhão – UEMA, atualmente leciona na escola x, na turma de 1º ano, há 18 alunos.
Segundo a professora, trabalhar com leitura para estimular aprendizagem das crianças é
uma ação criativa do professor, pois se percebe que, através do ato de ler, o aluno
desenvolve as suas habilidades cognitivas com mais rapidez. Para Margarida, a leitura é:
“o ponto de partida para o aluno evoluir o seu conhecimento”.
Para a professora, é de suma importância que os professores, principalmente, dos
anos iniciais participem de cursos de formação continuada voltados para práticas de
leitura. Segundo ela: “Esses cursos qualificam o nosso trabalho”. Qualificar cada vez
mais a sua prática docente é uma necessidade do educador e para Margarida: “Através
desses cursos, aprendemos novas estratégias para trabalhar a leitura dentro da sala de
aula”. E acrescenta afirmando: “A leitura é meio pelo qual adquiramos o conhecimento,
entretanto, é um recuso que favorece a aprendizagem do aluno, sendo necessária no
cotidiano escolar”.
Trabalhar a leitura na perspectiva de estimular a aprendizagem das crianças é
uma prática pedagógica que valoriza o trabalho do professor. E a concepção de leitura
da entrevistada segue a mesma linha de pensamento de Kleiman (1995, p. 70): “A
capacidade para perceber a função do contexto é de fundamental importância na
leitura”. Para Margarida, desenvolver atividades com textos pequenos e ilustrados
estimula a criança a interpretar o conteúdo a partir da leitura da imagem, e esse tipo de
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estratégias fornecem elementos essenciais para a aquisição da leitura, pois o aluno é um
ser curioso que estimulado responde ao processo ensino-aprendizagem.
3.2.4 Professora Jasmim
Professora Jasmim é graduada em Informática pelo NEAD (Núcleo de Educação
a Distância da Universidade do Estado do Maranhão – UEMA), e há 20 anos trabalha
no município de Caxias. Atualmente, leciona na escola z, na turma de 1º ano com 24
alunos.
Na concepção da professora, em relação ao papel da leitura no processo ensinoaprendizagem das crianças é: “a concepção globalizada hoje facilita o papel da leitura
despertando o raciocínio lógico das crianças no processo de aprendizagem”. Percebe-se
que Jasmim ou não compreendeu o questionamento ou não possui um conceito formado
de fato, sobre o ato de ler como prática pedagógica.
A leitura como prática pedagógica no processo ensino aprendizagem estimula a
criança a buscar mecanismos inseridos no seu contexto social que contribui com a
aquisição de habilidades e competências necessárias para a produção do conhecimento.
E relação a essa questão, a professora entrevistada declarou: “O professor deve
estimular aprendizagem dos alunos, com leituras infantis, pequenos textos orais e
escritos, interpretando junto com ele, a leitura facilita todo processo de ensinoaprendizagem do aluno e facilita na prática do professor”.
Observou-se que, apesar da professora mostrar compreender a leitura como
prática pedagógica que estimula no processo de alfabetização dos alunos, se percebe
que ela encontra certos obstáculos em entender os questionamentos. Evidenciando uma
problemática preocupante em relação à formação de nossos professores, a de que muitos
não têm o hábito da leitura e apresentam dificuldades de se expressar, analisar,
questionar, e interpretar um texto, uma ação ou uma determinada situação do seu
cotidiano.
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3.2.5 Professora Bromélia
Bromélia não possui formação acadêmica, ela tem apenas o magistério. Há 20
anos trabalha no município de Caxias, exercendo a função de professora, atualmente
leciona na escola z na turma de 2º ano composta por 25 alunos.
No que diz respeito à leitura como prática pedagógica para estimular a
aprendizagem das crianças, a professora afirma: “melhora os seus conhecimentos,
através da leitura com pequenos textos”. A professora entrevistada, também, mostrou
em alguns momentos não compreender as questões propostas da entrevista,
apresentando incoerências em suas respostas.
E ao ser questionado sobre sua
participação em cursos de formação continuada, a professora limitou-se a responder:
“Gosto de participar desses cursos”. Percebemos que algumas professoras ficaram em
dúvida ao responder o questionamento, pois mostravam insegurança.
Esse
comportamento das professoras entrevistadas pode ser provido de não saber de certo o
que significavam cursos de formação continuada.
Quando questionada em relação às práticas pedagógicas desenvolvidas pela
escola z para recuperar as crianças que apresentam dificuldades de aprendizagens, a
professora Bromélia respondeu: “trabalhamos com jornais, revistas e fichas”, e ao
estimularmos a detalhar as estratégias de ensino que utilizava com esses recursos
didáticos, a entrevistada declarou que considera de suma importância que os alunos
realizem leitura, manuseando recursos diferentes do livro didático, e não esclareceu os
objetivos de sua prática. É importante ressaltar o que afirma Perrenoud (2000, p. 30),
sobre a competência do professor em organizar e dirigir situações de aprendizagem:
[...] aprender não é primeiramente memorizar, estocar informações, mas
reestruturar seu sistema de compreensão de mundo. Tal reestruturação não
acontece sem um importante trabalho cognitivo. Engajando-se nela,
restabelece-se um equilíbrio rompido, dominando melhor a realidade de
maneira simbólica e prática.
As considerações da professora Bromélia sobre a temática leitura como prática
pedagógica para estimular a aprendizagem das crianças apresentam-se contraditórias, e
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esse fato se dá baseado na carência de conhecimentos relacionados ao ato de ler,
objetivando ao aluno a aquisição de habilidades e competências para compreender a
realidade em que envolve o seu meio sociocultural.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho proporcionou evidenciar que as práticas pedagógicas de
leitura desenvolvidas pelo professor na sala de aula estimulam o processo de ensinoaprendizagem, e que, sem dúvidas, a falta deste recurso torna difícil o trabalho dos
docentes na tarefa de alfabetizar as crianças dos anos iniciais.
Nesse sentido, cabe ao
professor a reflexão de sua prática docente, avaliando o seu trabalho pedagógico
regularmente como forma de acompanhar o processo ensino-aprendizagem das crianças,
dando ênfase para aqueles que apresentam dificuldades de aprendizagens, planejando
estratégias de ensino diversificadas que ajudem a superá-las. E nesse processo a leitura é
uma prática pedagógica que possibilita que o docente trabalhe esses obstáculos
encontrados pelos alunos na aquisição do conhecimento.
O papel da leitura na aprendizagem da criança proporciona ao professor realizar
um trabalho de qualidade, uma vez que o ato de ler desenvolve no aluno habilidades e
competências que o possibilita a questionar, analisar, interpretar e compreender as
situações presentes no seu cotidiano ampliando, dessa forma, a sua visão de mundo,
possibilitando-o a uma participação ativa no contexto social em que se encontra
inserido, podendo interferir em sua realidade e na realidade das pessoas de sua
comunidade.
Desenvolver este trabalho nos fez acreditar mais ainda que a leitura mediada pela
ação do professor estimula o processo de construção do conhecimento do aluno. Tal
confirmação foi possibilitada pela observação não participativa que realizamos na
escola x, onde crianças do 1º ano e 2º ano foram envolvidas num projeto de leitura, e na
ocasião podemos constatar alunos lendo contos, poesias, poemas, parlendas e travalínguas, atividades simples,
mas que podem enriquecer o processo ensino
aprendizagem.
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Ressalta-se ainda que, através dos estudos feitos e dos dados coletados por meio
da observação não participativa e das entrevistas com as professoras, algumas declaram
não gostarem de atuarem nos anos iniciais. E confessam não se identificar com a
alfabetização por considerarem uma tarefa árdua, e quando questionadas por que as
permanências relatam que, às vezes, é por imposição do diretor, atitude esta que
atrapalha no processo de construção do conhecimento da criança.
Conclui-se que a leitura é uma prática pedagógica do professor para estimular a
aprendizagem das crianças dos anos iniciais, mas que não está presente no cotidiano do
trabalho pedagógico de alguns docentes, precisando ainda, fazer parte das estratégias
didáticas do docente no processo ensino aprendizagem dos alunos do Ensino
Fundamental, principalmente aqueles que ingressam nos anos iniciais.
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Recebido Para Publicação em 30 de outubro de 2013.
Aprovado Para Publicação em 23 de novembro de 2013.
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