Notas de Aula de Física Aplicada aos Fenômenos Biológicos Curso de Licenciatura em Física do Instituto Federal de São Paulo Campus Itapetininga Prof. Dr. Vicente Pereira de Barros Itapetininga Fev/2014 1/98 Índice de conteúdos Conteúdo I............................................................................................................................................4 1- Biomecânica................................................................................................................................4 1.1– Um pouco de definição.......................................................................................................4 1.2 – Cinemática e cinesiologia..................................................................................................4 1.3 – Conceitos básicos de anatomia...........................................................................................5 1.4 – Uma revisão sobre alavancas.............................................................................................7 1.5– As leis de Newton...............................................................................................................8 1.5.1 – A força normal...............................................................................................................11 1.5.2 – A força de atrito.............................................................................................................12 1.6 - Exemplos..........................................................................................................................13 1.7- Exercícios..........................................................................................................................17 1.8 - Bibliografia.......................................................................................................................23 Conteúdo II.........................................................................................................................................24 2- Energia.......................................................................................................................................24 2.1– Definições.........................................................................................................................24 2.2- Energia Mecânica..............................................................................................................24 2.3 – Energia Térmica...............................................................................................................26 2.4 – Energia Química e Biológica...........................................................................................31 2.6 – A conservação de Energia em uma perspectiva Ecológica..............................................32 2.6.1 – Fermentação alcoólica e glicólise................................................................................33 2.6.2 – Respiração....................................................................................................................34 2.6.3 – Fotossíntese..................................................................................................................34 2.7 – Fluxo de energia na biosfera............................................................................................36 2.8 – Transferências de energia no corpo humano....................................................................37 2.9- Energia, força e tecido ósseo.............................................................................................41 2.10 – Modelos Físicos e Sistemas Ecológicos.........................................................................42 2.11 - Exercícios........................................................................................................................46 2.10 - Bibliografia.....................................................................................................................48 Conteúdo III........................................................................................................................................49 3- Física da Percepção...................................................................................................................49 3.1– Definições.........................................................................................................................49 3.2– O sistema nervoso.............................................................................................................49 3.3- Visão..................................................................................................................................52 3.3.1 – O olho composto...........................................................................................................52 3.3.2- O olho humano...............................................................................................................52 3.3.2.1 - Características do olho humano..................................................................................53 3.3- Audição..............................................................................................................................56 3.4- Fonação..............................................................................................................................58 3.5- Exercícios..........................................................................................................................60 3.6- Bibliografia........................................................................................................................60 Conteúdo 4 - Impulsos elétricos e fenômenos biológicos..................................................................61 4.1– Introdução..............................................................................................................................61 4.2 – Potencial elétrico...................................................................................................................61 4.3 - Potencial de repouso..............................................................................................................63 4.4 – Origem do potencial de repouso...........................................................................................64 4.5 - Concentrações iônica dentro e fora da célula........................................................................65 4.6 - Corrente elétrica....................................................................................................................66 4.7 - Difusão..................................................................................................................................67 2/98 4.8 - A bomba de sódio e potássio.................................................................................................69 4.9 - O Potencial de Ação..............................................................................................................70 4.10 - Exercícios............................................................................................................................73 Referências.....................................................................................................................................75 Conteúdo 5..........................................................................................................................................76 5.1– Conceitos básicos sobre radiação..........................................................................................76 5.1.1 – Radiação corpuscular....................................................................................................76 5.1.2 – Radiação eletromagnética.............................................................................................76 5.2– Tipos de radiação e suas características.................................................................................77 5.2.1 – Radiação alfa.................................................................................................................77 5.2.2 – Radiação beta................................................................................................................78 5.2.3 – Nêutrons........................................................................................................................78 5.2.4 – Radiação gama..............................................................................................................78 5.2.5 – Raios X..........................................................................................................................79 5.3 – Proteção Radiológica............................................................................................................82 5.3.1 – Unidades de Radiação...................................................................................................82 5.3.2 – Limites permissíveis.....................................................................................................83 5.4 – Desintegração Nuclear..........................................................................................................83 5.4.1 – Leis da desintegração radioativa...................................................................................84 5.5 – Radiação ionizantes e não-ionizantes e raios ultra-violeta........................................................87 5.5.1 – Como a radiação UV causa dano biológico?.....................................................................88 5.5.1 – A penetração da radiação UV.............................................................................................90 5.6 – Exercícios..............................................................................................................................92 Referências.....................................................................................................................................94 Apêndice A.........................................................................................................................................95 Referências.....................................................................................................................................98 3/98 Conteúdo I 1- Biomecânica 1.1– Um pouco de definição De maneira geral podemos entender que Biomecânica é o estudo anatomorfológico do movimento dos seres vivos e dos seus segmentos corporais. Mas, podemos imaginar a Biomecânica como uma ferramenta para se estudar o movimento dos membros do corpo humano e como eles respondem fisicamente a estímulos e ao próprio movimento. A importância do ensino da Biomecânica reside no fato da mesma ser imprescindível para diversos cursos e carreiras profissionais. Para citar: Educação Física, Medicina, Enfermagem e Fisioterapia(Corso, 2009). Em biologia e ciências da saúde como um todo há um grande poder nas palavras para a descrever os mecanismos da natureza. Podemos tratar melhor a própria expressão “estudo anatomorfológico do movimento”. A expressão é composta por duas palavras 1- ANATOAnatomia, 2- morfologia – estudo da forma. A definição clássica de anatomia é o ramo da biologia que estuda a estrutura e a organização dos ELEMENTOS dos seres vivos, tanto externa quanto internamente. A ênfase nos elementos surge pelo fato de que atualmente com o surgimento de mais ramos da biologia que estuda a organização dos seres vivos do ponto de vista de indivíduos (Ecologia) e dos tecidos que formam os seres vivos (Histologia) eu preferi a ênfase na palavra elementos. Existe a Anatomia humana, animal e vegetal. Uma das especificidades da anatomia é a anatomia comparada que procura encontrar relações entre os diferentes órgão de várias espécies animais na procura de padrões a serem usados para a melhor compreensão (Gordon, 1995). O estudo anatomorfológico se confunde no sentido de estudar como os órgãos estão estruturados nos seres vivos e quais as suas principais formas e o papel destas formas na promoção do movimento. Sendo assim a Biomecânica. Desta forma analisar qual a vantagem de se dobrar as pernas para levantar um dado objeto? Qual a melhor forma de se dispor as pernas enquanto você pedala em um bicicleta? Qual o dano ou o ganho na forma dos membros do gado que vive confinado em um terreno montanhoso ou plano? São questões que podem ser analisadas dentro do viés da Biomecânica. 1.2 – Cinemática e cinesiologia Tanto no espaço curricular “Introdução à Mecânica Clássica” quanto em “Gravitação e Leis de Conservação” estudamos a cinemática que é o estudo da descrição do movimento de um corpo sem a preocupação com a origem deste movimento. Na cinemática sabemos que a velocidade escalar de um ponto material v é a razão entre o espaço percorrido entre dois eventos ( S ) e o intervalo de tempo decorrido entre os dois eventos ( t ), ou seja: S v= (1) t Perceba que nesta abordagem não nos preocupamos com qual o ente físico que imprime esta velocidade no corpo, apenas queremos relacionar as três grandezas, velocidade, espaço percorrido e tempo. No mesmo sentido temos a cinesiologia que é o estudo do DESENVOLVIMENTO dos 4/98 movimentos realizados por um corpo. Na cinemática simplificamos ao máximo, começamos o seu estudo com a análise do ponto material, pois o mesmo não possui dimensões e é mais simples. Definimos o referencial inercial e tentamos desenvolver toda uma teoria para a explicação dos movimentos mais comuns do dia a dia. Em contrapartida na cinesiologia definimos o referencial no corpo do ser analisado, diferente da simplificação que tínhamos anteriormente na cinemática agora tratamos sempre de corpos extensos que são os membros dos corpos dos seres vivos (daí a importância de se estudar a Anatomia). Ao contrário da cinemática a cinesiologia sempre olhará para o elemento promotor do movimento e as forças que o promovem advindas dos músculos. Desta forma a cinesiologia terá paralelamente no seu desenvolvimento a presença da dinâmica. Como você deve se lembrar a dinâmica estuda a origem, a natureza da força, suas interações e suas relações com o movimento. As leis de Newton são a síntese mais completa das leis da dinâmica. Uma das aplicações da cinesiologia é a cinesioterapia que pode ser entendida como a terapia através dos movimento. Aqui o sentido da palavra terapia pode ser sintetizado como o conjunto de ações (tratamento) para sanar uma anomalia do corpo. Assim temos terapias químicas, genéticas, fitológicas e uma diversidade de outras, dentre elas a cinesioterapia. Esta rápida introdução presente neste dois itens são apenas para deixar o mais claro possível para você, prezado aluno, que será necessário lembrar de todos os conceitos de dinâmica para que seu caminho seja mais suave na compreensão da Biomecânica. Agora iremos para algumas novidades, aumentar o nosso conhecimento de anatomia humana. 1.3 – Conceitos básicos de anatomia Na visão mais inocente e simplista de anatomia poderíamos dividir os corpos dos animais em três partes, a saber: cabeça, tronco e membros. É evidente que para alguns organismos não necessitaríamos de todos os três (veja alguns peixes que possuem resumida quantidade de membros). Mas, podemos a princípio dividir desta forma o corpo dos seres vivos. Como somos seres finitos, precisamos definir um objeto de estudo mais preciso, então falaremos do corpo humano a princípio. O corpo humano se mantem graças ao sistema esquelético, que além de sustentar o corpo protege os órgãos internos e fornece pontos de flexão para os músculos. O esqueleto humano constitui-se de peças ósseas (ao todo 208 ossos no indivíduo adulto) e cartilaginosas articulações, que formam um sistema de alavancas movimentadas pelos músculos. A principio não iremos falar muito sobre o tecido ósseo deixaremos para uma próxima aula a discussão da natureza do tecido ósseo. Estudaremos agora como denominamos os diversos ossos no corpo humano e sua localização. Na figura da ilustração 1 temos uma representação do esqueleto humano e a nomenclatura da maioria de suas partes. Definisse uma divisão do esqueleto humano que usarei apenas a critérios ilustrativos. 1-Esqueleto axial: formado pela caixa craniana, coluna vertebral caixa torácica. 2-Esqueleto apendicular: compreende a cintura escapular, formada pelas escápulas e clavículas; cintura pélvica, formada pelos ossos ilíacos (da bacia) e o esqueleto dos membros (superiores ou anteriores e inferiores ou posteriores). Nesta aula apenas tomaremos conhecimento do nome destes que alguns ossos que são os mais importantes e seu papel na estrutura do corpo humano. Mas, junto com os ossos temos os músculos que são muito importantes no papel de sustentação e movimento do corpo, na figura da ilustração 2 temos uma imagem simplificada dos mais importantes músculos do corpo humano. 5/98 Ilustração 1: Figura ilustrativa do esqueleto humano (Avancini & Favaretto, 1997). Ilustração 2: Figura ilustrativa da musculatura do corpo humano. 6/98 Tecnicamente miologia é a parte da anatomia que estuda os músculos e os seus anexos. O músculo é definido como uma estrutura anatômica capaz de contrair quando devidamente estimulado. Posteriormente discutiremos como este estímulo ocorre. Assim como o esqueleto destacarei apenas alguns músculos mais importantes no corpo humano responsável para fixação de objetos (através dos braços) e do movimento (através das pernas). Nos braços temos o bíceps e o tríceps como os músculos que funcionam na flexão e tencionamento do braço. Outro músculo importante é o deltóide pelo revestimento feito na região do antebraço. Na perna eu destaco o glúteo, adutor e vasto medial. Não existe um consenso sobre a quantidade de músculos no corpo humano, mas devem ultrapassar 360 de acordo com alguns autores. Precisamos revisar alguns conceitos de estática que você já entro em contato anteriormente. Lembrando a definição clássica de alavancas e seu relacionamento com algumas leis de conservação 1.4 – Uma revisão sobre alavancas Normalmente quando lemos livros de Mecânica e de Biomecânica existe uma nomenclatura toda especial para tratar das alavancas, após descrever esta nomenclatura eu procurarei retornar ao que esta nomenclatura representa dentro de toda a teoria da Mecânica Clássica que estudamos em Gravitação no semestre passado. De maneira simplista alavanca é um objeto rígido que é usado com um ponto fixo apropriado para multiplicar a força mecânica que pode ser aplicada a um outro objeto (resistência). Ilustração 3: Princípio de funcionamento de uma alavanca. No caso da figura da ilustração 3 se desejarmos movimentar o peso da esquerda que exerce uma força F 1 deveremos aplicar uma força F 2 no peso da direita para que tenhamos equilíbrio. A expressão torna-se: F 2×D2 =F 1× D 1 (2) A distância D1 e D2 são denominadas respectivamente de braço resistente e braço potente, a força F 1 é a força resistente e F 2 é a força potente. Normalmente se faz uma classificação em função da posição do ponto fixo da alavanca e assim temos três classes: i- Alavanca inter-fixa ou de primeira classe onde o ponto fixo fica entre a força resistente ( F 1 ) e a força potente ( F 2 ). 7/98 Ilustração 4: Figura esquemática de uma alavanca inter-fixa. Note que na figura 4 a mão indica a força potente. No corpo humano um exemplo clássico deste tipo de alavanca é o tornozelo. ii- Alavanca inter-resistente ou de segunda classe onde a força resistente ( F 1 ) está entre a força potente ( F 2 ) e o ponto fixo. Ilustração 5: Figura esquemática de uma alavanca inter-resistente. Um exemplo no corpo humano deste tipo de alavanca é o pé. iii- Alavanca interpotente ou de terceira classe onde a força potente ( F 2 ) está entre a força resistente ( F 1 ) e o ponto fixo. Um exemplo no corpo humano é o cotovelo. Ilustração 6: Figura esquemática de uma alavanca interpotente. Como afirmei, esta nomenclatura é muito comum em livros de biomecânica, mas toda esta nomenclatura pode ser sintetizado dentro da teoria da dinâmica de Newton, então voltaremos às leis de Newton. 1.5– As leis de Newton Vamos usar novamente as definições das leis de Newton que usamos anteriormente. Em ordem começamos com a primeira lei que diz: “Todo o corpo persiste em seu estado de repouso, ou de movimento retilíneo uniforme, a menos que seja compelido a modificar esse estado pela ação de forças impressas sobre ele.” A primeira lei vale tanto para o caso do corpo em movimento (equilíbrio dinâmico) como no 8/98 caso da ausência de movimento (equilíbrio estático), no corpo humano temos o equilíbrio estático nos membros do corpo humano. Ou seja, a velocidade é nula. A segunda lei de Newton diz: “A força resultante sobre um corpo é igual ao produto da massa do corpo pela aceleração do corpo.” Podemos sintetizar esta lei através da seguinte expressão : ∑ F =m a (3) Perceba que a equação (3) possui uma somatória no lado esquerda que indica a resultante das forças. Se queremos um equilíbrio estático precisamos de duas imposições i-) aceleração nula, ii-) velocidade inicial nula. O que resultará em: ∑ F =0 (4) No entanto, como discutimos nas aulas de Gravitação, se temos um corpo extenso a segunda lei de Newton não é o suficiente para determinar o equilíbrio de um corpo, necessitamos também de que a rotação seja nula. E para tanto é necessário usarmos a mesma lei de Newton para as rotações Para tratarmos como a força atua em um corpo causando rotação devemos pensar em uma grandeza que dependa da força e dada distância entre o ponto de aplicação da força tratada e do ponto de rotação. Esta grandeza é denominada de torque e possui o símbolo . Logo, uma força aplicada em um ponto O localizada a uma distância r de um ponto de rotação, como mostra a figura da ilustração 7 terá um torque , que é um vetor, cuja a magnitude ou módulo é dado por ∣ ∣=r F sin (5) Ilustração 7: Figura ilustrativa do torque. Como afirmei no parágrafo anterior, o torque é um vetor e desta forma possui direção e sentido. A direção e o sentido do vetor torque é fornecido pela regra da mão direita. Mas, podemos convencionar que toda a fez que uma força aplicada à um corpo causa uma rotação no sentido antihorário este torque é positivo, no sentido horário o toque é negativo. Isto nos informa duas caraterísticas vetoriais do torque. Todo o vetor possui: módulo, direção e sentido. Podemos aprender se o torque é na vertical, horizontal ou em um plano inclinado pela posição do corpo onde é 9/98 aplicada a força. O sentido, pela regra que acabamos de enunciar e o módulo pela equação (5). A figura da ilustração 8 mostra mais claramente como o ângulo de aplicação influencia no torque. Ilustração 8: Representação tridimensional do torque causado por uma força F. Assim como temos a segunda lei de Newton das translações, também temos a segunda lei de Newton das rotação que é dada por: ∑ =I (6) Sendo que I é o momento de inércia do corpo e é a aceleração angular do corpo. O momento de inércia equivale a massa na lei de Newton da translação, equação (3), e equivale a aceleração. Usando a mesma condição de equilíbrio queremos que não ocorram rotações, então a aceleração deve ser nula e teremos: ∑ =0 (7) Se não há velocidade angular inicial teremos o completo equilíbrio estático se as condições 10/98 (4) e (7) serem atendidas. Uma coisa que é bom enfatizar é que o momento de inércia I é uma grandeza que depende da forma do corpo e não irei entrar em maiores detalhes pois este tema será mais explorado na componente curricular Mecânica Aplicada, mas recomendo a leitura de alguns bons livros textos para a melhor compreensão deste tema (NUSSENZVEIG, 1996; HALLIDAY, 2009). Quando este tema for cobrado nos exercícios será fornecido o valor do momento de inércia. Eu descreverei apenas as equações principais e algumas formas geométricas e seus respectivos momentos de inercia. Ilustração 9: Momento de inércia de algumas figuras geométricas conhecidas. É bom reenfatizar que a lei de Newton não define o que é força, mas ela diz como funciona a força com relação à aceleração e a massa (ou o momento de inércia) do corpo. Em função disto, devemos pensar em alguns tipos de força. Eu destacarei apenas duas a força normal e a força de atrito. 1.5.1 – A força normal A força normal é uma força de contato que ocorre em regiões de contato entre dois corpos. A força normal é sempre perpendicular à superfície. Na figura da ilustração 10a temos que a força normal entre a superfície e o bloco coincide na direção da força peso com sentido contrário. Na 10b temos uma força normal que também coincide com o peso, o mesmo não ocorre na figura 10c. 11/98 (a) (c) (b) Ilustração 10: Demonstração dos diversos tipos de força normal. 1.5.2 – A força de atrito Toda a superfície possui irregularidades e estas irregularidades causam o atrito que é a resistência ao movimento causada pelo contato entre duas superfícies. A força de atrito está relacionada a força normal através da seguinte expressão empírica (não existe uma dedução teórica fundamental). ∣Fatr∣=∣N∣ (7) Observe que a expressão (7) não apresenta a direção da força de atrita que é sempre contrária ao movimento que o corpo realiza, a figura da ilustração 11 mostra claramente esta relação. Desta forma a força de atrito dentro de um circuito fechado não realiza um trabalho nulo e logo a força de atrito não é conservativa. Pelo mesmo motivo não se pode escrever um potencial como o caso da força gravitacional que discutimos na disciplina de Gravitação. No corpo humano existe muito atrito entre os seus elementos como veremos mais adiante. Ilustração 11: Figura ilustrativa mostrando a força motora e a força de atrito. Note que elas possuem sentidos contrários. Outro fator interessante é que o atrito muda se o corpo está em movimento ou estático, assim temos dois tipos de coeficiente de atrito o estático e o dinâmico (ou cinético como afirmam alguns autores). Na figura da ilustração 12 temos o comportamento da força de atrito (representada pela letra f ) e a força aplicada (representada por F app ). Enquanto a força de aplica da é menor do que o valor máximo do coeficiente de atrito estático s a força de atrito permanece com o mesmo valor da força aplicada. Quando a força aplicada torna-se maior do que a força de atrito estático máximo f s ,max o atrito deixa de ser estático e torna-se cinético (ou dinâmico). Normalmente, k s . 12/98 Ilustração 12: Figura ilustrativa da força de atrito em função da força aplicada. 1.6 - Exemplos Nesta seção faremos alguns exemplos para fixar as ideias acima. Exemplo 1 - Considere 2 blocos sobre uma mesa (veja figura abaixo): o bloco A com peso igual a 2 N está sobre a mesa. O bloco B, pesando 4 N, está sobre o bloco A . Analise as forças que agem sobre cada um dos blocos separadamente. Finalmente, determine a força de contato total exercida sobre a mesa pelos 2 blocos. B A Mesa Ilustração 13: Figura do exemplo 1. Resolução: O primeiro passo é o de analisar separadamente cada bloco. No bloco B temos duas forças ocorrendo a força peso do bloco B e a força normal do contato entre B e A denotada por N AB . NAB B A PB Ilustração 14: Figura mostrando os blocos A e B isolados. 13/98 Para que haja equilíbrio, em módulo N AB= P B . Agora observando o bloco A e a mesa teremos o peso do bloco A atuando na mesa, a reação da Normal de A com B que denotaremos por N BA e a normal da mesa com A que denotaremos por N MesaA . Para que haja equilíbrio N MesaA= P A N BA= P A P B e assim finalmente, sobre a mesa teremos a sensação da reação da normal N MesaA que fará com que a mesa sinta o equivalente a soma dos pesos. Perceba que o “segredo” da abordagem de Newton é escrever as forças nos corpos separadamente. N MesaA N BA A PA Mesa Ilustração 15: Figura mostrando o bloco A e a mesa isoladamente. Exemplo 2 – Um bloco de massa 10 kg está sobre uma mesa plana e localizada na origem de um sistema de coordenadas tridimensional (conforme figura abaixo). Uma força F 1=20 N é aplicada ao longo do eixo y no sentido positivo do eixo. Uma força F 2=50 N é aplicada no sentido positivo de x fazendo um ângulo de 30° com o eixo x. O coeficiente de atrito estático entre a superfície e o bloco é s=0,2 e o coeficiente de atrito cinético é k =0,16 . a-) Qual o valor do módulo da força de atrito no eixo y e a sua natureza? b-) O bloco permanece imóvel nestas condições ? Explique. c-) Existe algum valor do ângulo para o qual o corpo se deslocará e em qual direção? c Ilustração 16: Figura do bloco citado no exemplo 2. 14/98 Resolução a-) Neste temos que começar calculando a força normal do bloco que está na direção z no sentido m positivo do eixo e possui módulo igual ao peso do bloco ( ∣N∣=mg=10 kg∗10 2 =100Newtons s ), a força aplicada no eixo y é igual a força de atrito estático f s =s N =0,2∗100 N =20 N , logo, neste eixo o bloco permanece imóvel pois o atrito é estático e de mesmo valor da força aplicada. b-) Como vimos no item anterior, no eixo y não há movimento. No eixo z a componente da força F 2 é F2z dada por ∣F2z∣=∣F2∣sin30 °=25 N esta força está na direção de z no sentido positivo do eixo, na notação dos versores unitários teremos F2z =25 N k esta força é menor do que a força peso do bloco, logo não há movimento no eixo z. No eixo x temos ° ∣F2x∣=∣ F 2∣cos 30 =43 N , este valor é maior do que o valor da força de atrito estático, logo há uma força de atrito cinético dada por f k =k N =0,15∗100 N =15 N . Como mostra a figura ≠0 , colocando as forças abaixo teremos uma somatória de forças não-nula nesta situação ∑ F teremos fk − F2x=m a sendo que m é a massa do bloco que é de 10 kg, a aceleração possui o mesmo sentido da força de maior valor (procure lembrar as aulas de Gravitação). Para o cálculo do valor da aceleração é somente isolar a aceleração na equação, então teremos: ∣ F2x∣−∣ f k∣ 43N−15N m ∣ a∣= = =2,8 2 m 10 kg s Ou seja, o bloco não ficará imóvel nesta situação e será deslocado para a direita com uma aceleração 2,8 m/ s 2 . c-) O ângulo deve ser aquele para qual tenhamos no mínimo a componente de F 2 igual à força de atrito estático ∣F2x∣− f s=0 ⇒∣ F 2∣cos − f s=0 Agora podemos isolar o ângulo nesta expressão e teremos: ∣ f ∣ 20N 2 2 cos = s = = ⇒ cos= ⇔≈66° 50N 5 5 ∣F 2∣ ° Isto quer dizer que para um ângulo menor do que 66 o bloco se deslocará para a direita e para ângulos maiores do que 66° ele permanecerá imóvel. a c fk F2x Ilustração 17: Distribuição das forças no bloco do exemplo 2. 15/98 Exemplo 3 – Um bloco de 6 kg de massa está sobre uma prancha que pesa 25 N como ilustra a figura. Quais serão as leituras nas duas balanças? Resolução Para resolvermos este problema a primeira coisa a fazer é distribuir as forças como mostra a figura da ilustração 19 . Nesta configuração iremos adotar o ponto 1 como o ponto de rotação, poderíamos adotar o ponto 2 apenas tomando o cuidado com o sinal das rotações. O peso da prancha está aplicado em seu centro de massa que no caso da prancha é o seu centro geométrico (o meio da prancha). Este peso causa uma rotação horária ao redor do ponto 1 que é o mesmo sentido da rotação causada pelo peso do bloco. No entanto, todo o conjunto está em repouso logo a condição de equilíbrio para o momento angular é que: ∑ =0 ⇒ F 1×025N×1,5 m60N×2,5 m−F 2×3 m=0 O módulo da força F 2 será o valor da leitura na balança. Ilustração 18: Figura ilustrativa do exemplo 3. F 2= 25N×1,5 m60N×2,5 m =62,5 N 3m Para o cálculo da força no ponto 1 devemos utilizar a outra condição de equilíbrio estático, que a somatória das forças seja nula. ∑ F =0 ⇒ F 1−25N−60N62,5=0 16/98 F 1 1,5 m F 2 60N 25N Ilustração 19: Distribuição das forças na figura do exemplo 3. É muito simples isolar F 1 e encontrar F 1=22,5 , este resultado vem ao encontro da leitura que aparece nas balanças. Note que simplesmente somente uma das condições jamais resultaria na resposta correta pois não teríamos certeza, ao “chutar” valores quais as infinitas combinações de pares de força que por exemplo atendessem a condição de igual a soma da duas forças aplicadas conhecidas (25N +60 N=85 N). Epígrafe (para quem gosta desta palavra) Evidentemente não terminamos com todos os tipos de problemas possíveis com os conceitos discutidos nos parágrafos anteriores. Não priorizei tanto a parte biológica, no entanto, nos exercícios a seguir haverá mais treino para a aplicação destes conceitos em sistemas biológicos. Procure resolvê-los. Qualquer dúvida procure o professor. O que poderíamos sintetizar como o mais importante em todos estes conceitos é a ideia de que o corpo humano pode ser pensado como uma máquina sujeita as condições de equilíbrio da Física. 1.7- Exercícios 1-) Considere 2 blocos sobre uma mesa: o bloco A com peso igual a 10 N está sobre a mesa. O bloco B, pesando 5N, está sobre o bloco A . Analise as forças que agem sobre cada um dos blocos separadamente. Finalmente, determine a força de contato total exercida sobre a mesa pelos 2 blocos. B A 17/98 2-) Considere um paciente submetido a um tratamento de tração como indica a figura abaixo. Qual a máxima massa a ser utilizada para produzir a força T sem que o paciente se desloque ao longo da cama? Sabe-se que a massa desse paciente é 60 kg, o coeficiente de atrito entre o mesmo e a cama é =0,20 . 3-) A fim de forçar um dos dentes incisivos para alinhamento com os outros dentes da arcada, um elástico foi amarrado a dois molares, um de cada lado, passando pelo dente incisivo, como mostra a figura abaixo. Se a tensão no elástico for 12 N, quais serão a intensidade e a direção da força F aplicada ao dente incisivo? Faça o desenho. 4-) O ventrículo esquerdo do coração acelera o sangue partindo do repouso até uma velocidade de + 26 cm/ s . a) Determine a sua aceleração (em cm / s 2 ), se o deslocamento do sangue durante a aceleração for de 2,0 cm (supondo a aceleração constante). b) Quanto tempo o sangue leva para atingir a sua velocidade final? c) Qual a força aplicada a um volume de 3 ml de sangue nesta situação? (Densidade do sangue é em média de 1,05 g /cm 3 ) 5-) Em uma rasteira de Judô, você tira o apoio do pé esquerdo do adversário ao mesmo tempo em que puxa o quimono para este lado sem apoio. Em consequência, seu adversário gira em torno do pé direito em direção ao tatame. A figura abaixo mostra um diagrama simplificado do seu adversário, com o pé esquerdo já fora do chão. O eixo de rotação passa pelo ponto O . A força gravitacional Fg age sobre o centro de massa do seu adversário, que está a uma distância horizontal d=28 cm do ponto O . Sua massa é de 70 kg e seu momento de inércia com relação à O é 65 kg.m 2. Qual é o módulo da aceleração inicial do seu adversário em relação ao ponto O se o puxão Fa que você aplica ao seu quimono (a) é desprezável e (b) é horizontal, com módulo de 300 N e aplicado a uma altura h=1,4 m? Faça g=9,8 m/s2. 18/98 6-) Uma centrífuga é um aparelho no qual um pequeno recipiente com material é posto para girar a alta velocidade em trajetória circular. Tal aparelho é usado em laboratórios médicos, por exemplo, para fazer com que as células vermelhas do sangue mais densas se depositem atravessando o soro do sangue menos denso e sejam coletadas no fundo do recipiente. Suponha que a aceleração centrípeta da amostra seja 6,25×103 vezes maior do que a aceleração gravitacional. a-) Quantas rotações por minuto a amostra estará completando, se ela estiver localizada em um raio de 5 cm do eixo de rotação? b-) Qual a força que estará submetida uma amostra de 5 ml de sangue? 7-) Para testes usando um balistocardiógrafo, um paciente fica deitado em cima de uma plataforma horizontal apoiada sobre jatos de ar, o atrito que impede o movimento horizontal da plataforma é desprezável. Cada vez que o coração bate, o sangue é empurrado para fora do coração em uma direção praticamente paralela à plataforma. Como a quantidade de movimento deve ser conservada (você lembra o porquê?), o corpo e a plataforma recuam, e este recuo pode ser detectado para fornecer informações a respeito do coração. Para cada batida, suponha que 0,050 kg de sangue seja empurrado para fora do coração com velocidade de +0,25 m/s e que a massa do paciente mais a plataforma seja de 85 kg. Supondo que o paciente não escorregue em relação à plataforma, e que o paciente e a plataforma partam do repouso, determine o vetor velocidade correspondente ao recuo. 8-) A figura abaixo mostra a representação do músculo bíceps, dos ossos do braço e do antebraço imóvel, na horizontal (perpendicular ao braço) e com um alter na mão. As forças que atuam no conjunto antebraço-mão estão representadas no esquema na parte inferior. Encontre a força muscular exercida pelo bíceps para equilibrar as forças (atenção!!!). São conhecidos: O módulo do peso P (objeto mais a mão)=20N, o peso A (antebraço) = 15N. O módulo da força R que é a força de reação do úmero contra a ulna vale 20N. 19/98 9-) Um carregador suporta na palma da mão um bloco de massa m=7,2 kg. Como a figura abaixo mostra, seu braço está em posição vertical, enquanto seu antebraço, apesar de levemente inclinado, podemos considerar como estando em posição horizontal. O ponto O é o ponto de contato do cotovelo com o antebraço. O centro de massa do antebraço encontra-se a 13 cm de distância do ponto O e a massa total do antebraço e da mão é de 1,8kg. a-) Qual o valor da força Fm exercida pelo bíceps? (agora não é apenas equilíbrio de forças) b-) Qual o valor da força exercida pela estrutura óssea do braço sobre o antebraço? c-) Discuta a magnitude destas forças. 10-) Na figura abaixo um bloco de 15 kg é mantido em repouso através de um sistema de polias. O braço da pessoa está na vertical; o antebraço faz um ângulo θ=30 \ com a horizontal. O antebraço e a mão têm uma massa conjunta de 2 kg, com um centro de massa a distância d 1=15cm à frente do ponto de contato dos ossos do antebraço com o osso do braço (úmero). Um músculo (o tríceps) puxa o antebraço verticalmente para cima com uma força cujo ponto de aplicação está a uma 20/98 distância d2=2,5 cm atrás desse ponto de contato. A distância d 3 é 35 cm. Quais são (a) o módulo e (b) o sentido (para cima ou para baixo) da força exercida pelo tríceps sobre o antebraço e ( c) o módulo e (d) o sentido (para cima ou para baixo) da força exercida pelo úmero sobre o antebraço? 11-) A distribuição de massa corporal de um homem de 70 kg é a seguinte : cabeça+pescoço = 5,0 kg; cada braço e antebraço-mão=3,5 kg;tronco=37kg; cada coxa=6,5kg; cada perna mais pé=4,0kg. Supondo que esta pessoa esteja em pé sobre os dois pés, calcule a intensidade da força normal (de contato): a-) total exercida por cada uma das junções dos quadris; b-) exercida por cada uma das junções do joelho. Supondo que agora ele fique em pé sobre um pé somente, calcule a intensidade da força de contato exercida: c-) pelo joelho da perna sobre a qual o homem está em pé; d) pelo joelho da perna que está suspensa. 12-) Considere uma criança de 20 kg em um escorregador que faz com a horizontal um ângulo de 45graus, e os coeficientes de atrito estático e cinético entre o corpo da criança e o escorregador são respectivamente de 0,8 e 0,6. a-) Decomponha o peso P da criança em componentes ortogonais em relação ao plano do escorregador e calcule os módulos dessas componentes; b-) calcule o valor da força normal exercida pelo plano do escorregador sobre a criança; c-) avalie se a criança ao soltar as mãos sai escorregando; d-) calcule a intensidade da força de atrito cinético; e-) determine a aceleração com que a criança desce o escorregador; f-) discuta o que acontece se o ângulo for maior do que 45 graus. 13-) Discuta o porquê da dificuldade em fazer abdominais, deitado: a-) com os braços esticados na direção do corpo apontando para os pés; b-) com os braços cruzados sobre o peito; c-) com os dedos das mãos entrelaçados e sob a cabeça. Respostas 1-) No bloco A estão aplicadas a força peso de 5 N e a força normal de 5 N. No bloco B estão aplicadas a força peso de 10 N, a força normal de 5 N exercida pelo bloco A e a força normal de 15 N. A força total na mesa devida aos pesos dos dois blocos é de 15 N. 21/98 2-) m=12 kg. =0,7 i −20,1 j N . 3-) F 4-) a) 169 cm / s2 ; b) 0,15s; c) 5,3×10−3 N 5-) a) 2,96 rad/s2; b) 9,42 rad/s2. 6-) a) 1.106 rotações por segundo; b) 321,6 N 7-) −1,4×10−4 m/ s 8-) 55 N considerando apenas a soma das forças que surgem. 9-) a) 690 N, b) 601 N, c) As forças são bem maiores do que o peso da caixa. 10-) a) 1,9 kN; b) para cima; c) 2,1 kN; (d) para baixo. 11-) a) 245 N; b) 310 N; c) 660 N; d) 40N. 12-) a) P x =P y =141,4 N ; b) N =141,4 N ;c) f s =113,1 N a criança deve escorregar; d) f k =84,8 N ; e) a=2,83 m/s 2 ; f) Se o ângulo aumentar a componente y diminui e consequentemente a força normal. Assim, a força de atrito estático diminui e a criança sairá escorregando com mais facilidade. 13-) A dificuldade progressiva se deve ao aumento do torque que resulta do aumento da distância de aplicação da força peso do conjunto em relação ao eixo de rotação que se situa no baixo lombar. 22/98 1.8 - Bibliografia AVANCINI & FAVARETTO. Biologia – Uma abordagem evolutiva e ecológica. Vol. 2. Ed. Moderna, São Paulo, (1997) CORSO, G. “Os conteúdos das disciplinas de biofísica e física” Revista Brasileira do Ensino de Física, v. 31, n. 2, 2703 (2009). GORDON, R. A assustadora História da Medicina. Ed. Diouro: São Paulo, (1995). HALLIDAY D., RESNICK R. & MERRIL, J. Fundamentos da Física. Vol.1, 8 ed., LTC, Rio de Janeiro, (2009) NUSSENZVEIG, H. M. Física Básica. Vol. 1, Edgard Blücher, São Paulo, (1996). OKUNO, E., FRATIN E., Desvendando a Física do Corpo Humano: Biomecânica. Manole: São Paulo, 2003 23/98 Conteúdo II 2- Energia 2.1– Definições Como discutimos em Gravitação, energia é um conceito um tanto quanto abstrato, definimos a energia sempre como uma quantidade relacionada à um dado fenômeno. Podemos usar a energia como uma medida para explicar certos efeitos na natureza. E esta quantidade possui uma propriedade muito interessante, se conserva. Discutiremos rapidamente dentro do que já foi abordado em Gravitação o primeiro tipo de energia que é a energia Mecânica e posteriormente discutiremos outros tipos de energia que são úteis na compreensão de fenômenos biológicos. 2.2- Energia Mecânica Para definirmos energia Mecânica, primeiramente pensamos em uma grandeza que relacione o deslocamento de um corpo causado pela ação de uma força. O chamado trabalho mecânico, como aprendemos em gravitação o trabalho mecânico é dado por: ⋅d (2.1) W =F Ilustração 20: Ilustração do trabalho realizado por uma força constante. W =∣ F∣∣ d∣cos (2.2) Outra coisa que podemos deduzir é a energia cinética T (um escalar como o trabalho) de uma partícula de massa m que se move com velocidade v dada por: T= m v2 2 (2.3) E temos uma relação interessante entre a variação da energia cinética W realizado por uma força conservativa que é T =W (2.4) o chamado teorema trabalho energia. 24/98 Ec e o trabalho Não entrarei em detalhes de como chegamos, mas se uma força dentro de um circuito fechado realiza um trabalho nulo esta força é chamada de força conservativa e podemos assim escrever uma função potencial U dada por: U x =−∫ F d x (2.5) A energia mecânica E m é definida como a soma das energia cinética e potencial de uma corpo ou de um sistema de partículas. E m =U T (2.6) Esta força que escreve o potencial pode ser também uma força como a força muscular, logo qualquer coisa no corpo humano capaz de realizar uma variação de velocidade também produz um trabalho (veja os exercícios). Uma aplicação importante destes conceitos de energia potencial estar associada à energia armazenada em uma dada condição temos a energia potencial de uma molécula diatômica por exemplo. Imagine dois átomos quaisquer P e Q separados por uma distância r, o gráfico da energia potencial é ilustrado na figura da ilustração 20. Neste caso hipotético a energia total da E da molécula é negativa. Ilustração 21: Ilustração da energia potencial de uma molécula diatômica hipotética. Anteriormente falamos de energia potencial associada à posição de uma partícula agora estamos falando de uma energia associada à distância entre duas partículas. Para entender melhor o gráfico da ilustração 20 devemos pensar que de forma geral os átomos se movem, existe uma distância ótima r 0 onde a força entre os dois átomos é nula. Quando a distância entre os átomos aumenta (por exemplo chegando a distância b) a força de atração interatômica atraem um ao outro. Se tentarmos aproximarmos em demasia os dois átomos a força deixa de ser atrativa e torna-se repulsiva. Este raciocínio será útil para entendermos o porque a mudança conformacional das molécula libera tanta energia das mais diferentes formas. Existe diversas técnicas para determinar a distância entre os átomos das moléculas, o ângulo entre estes átomos. Dentre elas a espectroscopia de força atômica, espectroscopia Raman e muitas outras em diversos comprimentos de onda. 25/98 2.3 – Energia Térmica Durante o fim do século XVI e início da século XVII uma nova discussão surgiu no mundo da Física para tentar explicar o que seria o calor, durante muitos anos o conceito mais aceito era de que o calor era uma substância, o chamado calórico. Esta ideia se passava também graças ao conceito de elementos tão presente na filosofia grega (Chassot, 1994). Um corpo “frio” recebia calórico de um corpo “quente”. Veja que eu coloco aspas nos termos “frio” e “quente” pois nesta época existia uma certa dificuldade de se entender o que seria isto. Mesmo o conceito de temperatura não era muito claro neste período. Com o trabalho de muitos filósofo das ciências naturais como Lavoisier e Dalton algumas definições começaram a ser feitas. Uma das mais importantes foi se começar a definir uma escala para marcar este “frio” e “quente” a temperatura. Com a invenção dos termômetros e das escalas tivemos muitos avanços. Temos normalmente dois tipos de escalas as relativas e as absolutas. As escalas relativas procuram uma dada propriedade física que varia com a temperatura (o “quente” e “frio” do parágrafo anterior). As escalas relativas foram as primeiras à surgir. Normalmente, se escolhe um fenômeno e estabelecemos um valor. Um escala relativa é a Celsius onde o zero é o ponto de congelamento da água e 100 é o ponto de ebulição da água. Da mesma forma temos outra escala que é a Fahrenheit onde o a água congela no ponto 32 e entra em ebulição no ponto 212. Ilustração 22: Relação entre as escalas Celsius e Fahrenheit. Na figura da ilustração 22 mostra a relação entre as escalas Celsius e Fahrenheit a relação entre as distâncias das origens aos pontos C e F 5 F −32 C−0 F −32 C F −32 = ⇔ = ⇔C= (2.7) 100−0 212−32 100 180 9 A última relação é a relação de conversão da escala Celsius para Fahrenheit e vise-versa. Este é o mesmo procedimento para qualquer outra escala. Para a construção de termômetros como eu falei podemos fazer um termômetro de um material que varie uma dada propriedade com a temperatura, a tabela mostra alguns tipos de 26/98 termômetros com suas respectivas propriedades usadas para medir a temperatura. Tipos de Termômetro Propriedade física que varia com a temperatura ou propriedade termométrica Termômetro de líquido (mercúrio ou álcool) Volume Termopar Diferença de potencial elétrico entre dois metais Termômetro de resistência Resistência elétrica de um metal Pirômetro Cor Cristal líquido Cor Falta ainda explicar como é definida a escala absoluta, esta definição esta relacionada a um conceito que cria que a temperatura entre dois corpos é a mesma quando há equilíbrio térmico (não há transferência de calor). Para pensarmos nela devemos olhar para outra propriedade para fazer a medida da temperatura. A propriedade termométrica pressão a volume constante nos fornece uma informação muito interessante. O termômetro de gás a volume constante está esquematizado na figura da ilustração 23. Ilustração 23: Esquema do termômetro de gás a volume constante. O gás, geralmente o hidrogênio, enche um bulbo e um tubo mais fino ligado à um manômetro de mercúrio de tubo aberto (um instrumento para medir pressão por diferença de coluna de um líquido). Através do tubo flexível é possível encontrar a pressão que o gás se encontra 27/98 quando o bulbo do gás é colocado em equilíbrio térmico com um corpo que desejamos medir a temperatura. Vários gases no bulbo geram diferentes leituras de pressão como mostra o gráfico da ilustração, mas que para o mesmo volume levam à mesma temperatura. Ilustração 24: Gráfico da pressão a volume constante com relação à temperatura mudando o gás. Isto indica uma propriedade absoluta que vale para todos os casos, a pergunta seguinte é : O que acontece com a temperatura se diminuirmos a pressão até um valor nulo? Bem, o resultado não se chega tão facilmente pois é praticamente dificílimos chegar à uma pressão nula onde não ocorra nenhuma partícula se movimentando. No entanto, uma extrapolação de medidas anteriores leva ao resultado do gráfico da ilustração 25. Ilustração 25: Gráfico da temperatura versus pressão na situação absoluta. O resultado leva à uma relação bem conhecida no ensino médio 28/98 t °C =T K −273,15 o zero Kelvin seria o valor onde a pressão seria nula. Com isto espero que estejam claras todas as relações de transformação de temperatura que serão importantes nas reações químicas que veremos nos seres vivos. Os estudos de calor e energia mecânica foram desenvolvidos independentemente, sabemos que a unidade de trabalho e energia é o joule, no entanto, a unidade de calor a princípio criada para medir o calórico era a caloria. Uma caloria é definida como a quantidade de calor necessária para aumentar a temperatura de 1 g de água de 14,5°C a 15,5°C. Outra unidade usada, principalmente quando se trata de alimentação é a Caloria ( Cal ) definida como 1Cal =103 cal =1 kcal (2.8) Continuando usando o princípio intuitivo de que o calor é transferido do corpo mais quente para o mais frio até a temperatura de ambos se igualarem. A quantidade de calor trocada Q , durante a variação de temperatura t de um corpo, depende de sua massa m , da própria t e do material de que o corpo é constituído. Assim, Q=m c t (2.9) onde as unidade de Q , m e t são respectivamente cal , kg e °C . A constante c é conhecida como calor específico e varia de uma material para outro. O calor específico também depende da temperatura, por esta razão sempre falamos o calor específico em uma dada temperatura. Por exemplo, o calor específico da água à temperatura ambiente é de 1 cal / g °C . Neste ponto é necessário recordar um pouco da natureza experimental do calor. O calor que obedece a equação (2.9) é denominado de calor sensível. O calor sensível é transferido durante a alteração de temperatura. Outro calor que existe é o necessário para que o estado da substância se altere, nesta situação não há variação da temperatura. É o chamado calor latente Q que é dado por: Q=mL (2.10) onde L é o coeficiente de calor latente. Ilustração 26: Gráfico de fase da água. A figura 34 mostra a relação da temperatura com o tempo para o aquecimento da água. Nas regiões A, C e E existe transferência de calor sensível para o aquecimento do gelo, da água e do vapor de água respectivamente. Nas regiões B, e D são regiões onde ocorre transição de fase, ocorre a fusão do gelo e a evaporação da água. Somente no século XIX Joule conseguiu estabelecer a relação entre calor e trabalho mecânico em uma clássica experiência exemplificada na figura da ilustração 27. 29/98 Ilustração 27: Esquema da experiência de Joule para a determinação da relação calor e trabalho mecânico. Ao caírem os pesos ilustrados na figura uma energia potencial gravitacional estará sendo transformada em energia cinética fazendo as pás se moverem. Joule isolou completamente o reservatório de água para ter a certeza de que qualquer aumento na temperatura (e logo transferência de calor) era originário da transferência de energia mecânica para calor. Ele obteve a relação: 1 cal=4,19 J (2.11) Exemplo: Em uma experiência realizada nos moldes da experiência de Joule, 5 litros de água são confinados em um reservatório, são suspensos pesos de 10 kg qual a altura que deve ser colocada os pesos para que a temperatura da água eleve 1 º C? Resolução: O primeiro passo a ser feito é calcular o calor necessária para elevar esta temperatura, ou seja, calcular o calor sensível. A massa de água é M =5 l×1 M é calculada por: kg =5 kg l O calor sensível Q necessário para elevar a temperatura a 1 º C é dado por: cal Q=Mc T =5.000 g 1 ° =5.000 cal=5 kcal Cg Transformando esta quantidade de calor em energia mecânica pela relação (2.11) obtemos Q= E=5.000×4,19 J =20.9000 J 30/98 Esta quantidade de energia deve vir da variação de energia cinética das pás que giram e esta energia cinética advém da variação da energia potencial gravitacional dos pesos suspensos, logo teremos: 2 E=mgh⇒ 20.900 J =10 kg 9,8 m/ s h⇒ h= 20.900 =213 m 98 N É evidente que esta altura é muito grande para causar uma variação tão pequena na temperatura e esta foi uma das razões de tanto problemas na obtenção destas análises da temperatura. Este resultado de Joule posteriormente levaria a conclusão de que o calor é um tipo de energia, que seria na verdade a energia cinética das minúsculas partículas chamadas de átomos que são composta a matéria. Ao ler desta forma toda este cadenciamento de ideias poderíamos pensar que foi um processo direto esta conclusão, mas a mesma teve vários avanços e retrocessos no decorrer dos séculos, mas atualmente é bem aceita pela comunidade científica que (de maneira grosseira) o calor é a energia cinética em nível subatômico. 2.4 – Energia Química e Biológica Como já falei no início deste conteúdo, cada molécula possui uma energia potencial que depende da posição dos átomos que a formam. Os mesmos átomos podem formar diferentes moléculas com diferentes energias potenciais, ou seja, diferentes energias químicas devido a absorção ou emissão de algum outro tipo de energia. Isso significa que uma forma de energia pode ser transformada em outra em uma reação química. E na verdade este deve ser o princípio da vida. Um exemplo é a queima do gás metano (CH4) neste fenômeno ocorre a reação de oxidação, representada por CH 42 O 2 C O 22 H 2 O E (2.11) Ou seja, metano ao entrar em combustão na presença de oxigênio gera dióxido de carbono, água e libera uma quantidade de energia térmica E que é de 55kJ/g, isto ocorre porque a energia potencial das moléculas de metano e oxigênio é maior do que as de água e dióxido de carbono. Ilustração 28: Ilustração da reação de (ADP) e (ATP). A manutenção de qualquer forma de vida depende da transformação moleculares. As plantas armazenam energia liberada em reações química produzidas pela absorção de energia solar. Essa energia pode posteriormente ser transferida aos animais na forma de alimento. Uma grande parte desses processos de transferência de energia é realizada através de algumas reações químicas básicas. Uma delas é a que envolve as moléculas de disfosfato de adenosina (ADP) e de trifosfato de adenosina (ATP). De maneira simplificada. A representação estrutural da adenosina é 31/98 Ilustração 29: Representação estrutural da adenosina. Esta representação pode variar de autor para autor, mas o mais importante é observar a cadeia de hidrocarbonetos. O grupo fosfato – P é constituído por onde existe uma ligação dupla do oxigênio e ligações simples com as hidroxilas. A ligação entre os grupos difosfato e trifosfato envolvem uma grande quantidade de energia potencial armazenada. Esta é a chamada energia biológica. Quando uma molécula de ATP perde um grupo fosfato, transforma-se numa molécula de ADP e uma grande quantidade de energia é fornecida ao organismo. A energia liberada nessa reação pelas moléculas de ATP é cerca de 67 J/g. Moléculas de ATP são encontradas na células vivas numa concentração de 0,001 mols a 0,01 mols por litro de solução aquosa, ou seja, 0,5 mg/ml a 5 mg/ml. Essas moléculas são formadas continuamente no interior das células durante os processos de fermentação, respiração e fotossíntese. 2.6 – A conservação de Energia em uma perspectiva Ecológica do um peso muito grande sobre a palavra Ecologia na atualidade. De maneira simplória em uma definição Wikipedia chegaríamos a definição que: “A Ecologia é a ciência que estuda as interações entre os organismos e seu ambiente, ou seja, é o estudo científico da distribuição e abundância dos seres vivos e das interações que determinam a sua distribuição.” (BEGON et al, 2007) Logo, as trocas de energia entre os elementos da natureza são imprescindíveis para entender os ecossistemas. E novamente precisamos definir que energia estamos observando, energia com relação ao quê? Por exemplo , se algum animal carnívoro digere um pedaço de carne, moléculas de proteína são desfeitas gerando outras moléculas de menor energia, como dióxido de carbono e água; nesse processo, parte da energia liberada é transformada em calor e parte é usada nos processos de manutenção da vida do animal. Saímos de um estado A para B e energia foi libera da A B E . Em contrapartida, na formação de glicose durante a fotossíntese, há absorção de energia C E D . Em células, as reações com liberação e absorção de energia estão ligadas pela conversão entre moléculas de ATP e ADP, conforme ilustra a figura 30. A energia liberada na conversão de A para B é utilizada para formar ATP a partir de ADP e P; a energia necessária à conversão de C em D é fornecida pela quebra de ATP. 32/98 Ilustração 30: Esquema da produção e utilização da molécula de ATP nas reações que liberam e que absorvem energia. Vamos falar de apenas três processos bioquímicos mais comuns na natureza para transformação de energia dentro das células. 2.6.1 – Fermentação alcoólica e glicólise A fermentação alcoólica e a glicólise são processos bioquímicos anaeróbicos (que ocorrem na ausência de oxigênio), pelos quais moléculas orgânicas são convertidas em outras com um conteúdo energético menor. Nesses processos, há, portanto, liberação de energia, parte da qual é usada na formação do ATP. A fermentação alcoólica e a glicólise podem ser divididas em duas etapas, sendo a primeira, na qual ocorre a formação de ATP, comum a ambas. Nela a glicose ( C 6 H 12 O6 ), por exemplo, é transformada, através de uma sequência de reações, em ácido pirúvico ( C 3 H 4 O 3 ) e hidrogênio. A segunda etapa, iniciada pelo ácido pirúvico e pelo hidrogênio, pode ser desenvolver de várias maneiras, levando a produtos finais diferentes. Na fermentação alcoólica os produtos finais, obtidos na presença de fermentos, são o etanol C H ( 2 5 OH ) e o dióxido de carbono ( CO 2 ). Na glicólise os produtos finais são diferentes, dependendo das células em que ela ocorre. Na célula muscular, por exemplo, é produzido ácido láctico ( C 3 H 6 O 3 ). A glicólise ocorre nas células musculares durante atividade física intensa quando o fornecimento de oxigênio se torna insuficiente. 33/98 Ilustração 31: Representação da fermentação alcoólica. 2.6.2 – Respiração Nos animais e na maioria dos micro-organismos, a produção de ATP se deve, principalmente, à respiração. Esse é um processo metabólico no qual há a liberação de energia e formação de ATP, a partir de uma série de reações entre elementos básicos da alimentação e oxigênio, produzindo dióxido de carbono e água. Para a glicose, esse processo pode ser representado por Este processo é energeticamente mais eficiente do que a fermentação. Na fermentação 1 molécula de glicose produz 2 moléculas de ATP enquanto que na respiração 1 molécula de glicose produz 38 moléculas de ATP. Isto ocorre pelo fato que na respiração há uma quebra mais completa da glicose. Das 38 moléculas de ATP formadas a partir de uma molécula de glicose, 2 provêm da produção de ácido pirúvico e as 36 restantes da sequência de reações denominada fosforilação. 2.6.3 – Fotossíntese Fotossíntese é o processo pelo qual plantas e certos micro-organismos convertem energia luminosa em energia biológica, produzindo carboidratos. Ela ocorre em cloroplastos, estruturas 34/98 celulares que contêm pigmentos de clorofila. Na produção da glicose, por exemplo, esse processo pode ser indicado por No processo de respiração essa reação ocorre no sentido contrário com liberação de energia. Comparando-se esses dois processos, pode-se concluir que, na formação de glicose pela fotossíntese, parte da energia luminosa é convertida em energia potencial dessa molécula. Além disso, há o armazenamento de energia em moléculas de ATP. Em uma planta, durante o dia temos o processo de fotossíntese claro e a noite o processo escuro como mostra a figura 32. Ilustração 32: Processo de fotossíntese: fase claro e fase escuro. Fonte SILVA & SASSON, 2011. Nas reações de claro água, ADP, fosforo e luz produzem oxigênio, ATP e o NADPH 2 . O NAD (nicotinamida-adenina-dinucleotídeo) é uma molécula formada por dois nucleotídeos, contendo a base nitrogenada adenina e uma molécula de nicotinamida. Trata-se de uma substância capaz de receber hidrogênio, isto é, funciona no metabolismo como um aceptor de hidrogênios, os quais são posteriormente transferidos a outras substâncias (dependendo da etapa do metabolismo envolvida), em reações que liberam energia. Quando o NAD se liga a dois Hidrogênios e um fósforo temos a produção de NADPH 2 que será utilizado na fase escuro para a cadeia respiratória. Note que em ambas as fases teremos produção de glicose. Note que em todos estes processos uma substância torna-se em outra indicando um processo semelhante à conservação de energia mecânica. Não importa que tipo de substância se forma, ela terá uma ligação com os elementos presentes na etapa anterior do processo. 35/98 2.7 – Fluxo de energia na biosfera A fonte de energia utilizada por qualquer animal provém de uma hierarquia de organismos relacionados numa cadeia alimentar (cadeia trófica). Essa cadeia pode se iniciar nas células fotossintetizadoras das plantas plantas. Essas plantas podem servir de alimentação para larvas e estas para pássaros, que estes por sua vez podem servir de alimento para outros animais. Em qualquer comunidade ecológica são encontrados inúmeros exemplos de ciclos alimentares, interligados no que se chama teia trófica. Os organismo que fazem parte de uma teia trófica podem ser classificados em produtores, consumidores e decompositores. Os primeiros são os únicos que conseguem utilizar compostos de carbono em forma simples, existentes no meio ambiente, como o dióxido de carbono. Os consumidores se alimentam de produtores e de outros consumidores. Encerrando a teia alimentar, existem os decompositores, como as bactérias e os fungos, que provocam a decomposição dos consumidores mortos e restituem ao solo e às atmosfera compostos simples de carbono. No entanto, esta classificação é apenas didática, pode ser mais simples entender desta forma, no entanto, um consumidor pode consumir outro consumidor e da mesma forma que um decompositor do ser entendido como um consumidor (de material em decomposição), adiante discutiremos mais aprofundadamente isto na seção de modelos físicos na biologia. Quanto à alimentação, os organismos vivos podem ser divididos em autotróficos e heterotróficos. Os autotróficos podem sintetizar seus compostos celulares – carboidratos, proteínas, lipídios – a partir de compostos simples de carbono, como o dióxido de carbono. Produtores, como algas superiores e outras plantas que contêm cloroplastos em suas células, fazem parte desse grupo. Ao contrário, organismos heterotróficos necessitam de compostos de carbono em forma mais complexa, ou seja, de moléculas orgânicas como carboidratos e proteínas. Os consumidores e os decompositores são heterotróficos. Na base de toda esta cadeia está na verdade a luz solar que os produtores utilizam como fonte de energia e produção de compostos mais complexos de carbono. Em cada etapa da cadeia trófica, a energia é utilizada para realizar trabalho biológico, como a síntese de compostos celulares, trabalho de contração celular, transporte, contra gradientes de concentração, nutrientes, sais minerais, íons etc. Em todos esses processos ocorrem perdas de energia, pois a conversão de energia de uma forma à outra nunca é completa. Essa energia perdida é absorvida pelo meio externo na forma de calor. Apenas parte da energia luminosa é efetivamente utilizada pelos produtores. A figura da ilustração 33 mostra que muito da energia é dispersa, através de calor e outra parte vai para os decompositores, perceba que na figura, além de transferência de energia há também transferência de matéria. Ilustração 33: Representação de uma cadeia trófica. 36/98 Existem vários ciclos de matéria na natureza o mais conhecido é o ciclo de carbono, principalmente após a polêmica dos últimos anos do aquecimento global causado por efeitos antrópicos (causados pelo homem). A figura da ilustração 31 mostra um pouco desta ideia. Em uma etapa do ciclo a presença humana é importante. Como falei no início o conceito de ecologia é, como tudo em Ciência, uma construção social. Entender que somos responsáveis pela produção de carbono no planeta é uma suposição humana e uma tomada de decisão. Durante muitos anos não foi entendido como que nós seres humanos fazíamos parte do sistema ecológico e com os mesmos méritos e obrigações. Com Darwin o homem ficou no mesmo patamar, teórico, que os animais. É interessante que as primeiras legislações sobre respeito aos animais foi feita na Alemanha nazista na década de 30 do século XX (Drake, 2012). Existem contestações sobre se o aquecimento global é causado determinantemente pela ação humana. Tudo isto vem apenas para indicar como que esta construção é contestável (FELÍCIO, 2012). Ilustração 34: Esquema do ciclo do carbono na natureza. Na próxima seção discutiremos mais sobre as semelhanças de modelos físicos e sistemas ecológicos 2.8 – Transferências de energia no corpo humano Fazendo um simples exercícios de conversão energética podemos ficar assustados com 37/98 alguns conhecimentos que temos até o momento sobre energia mecânica. Por exemplo, imagine um indivíduo de 80 kg que consumiu um copo de suco com 110 kcal que equivaleriam a aproximadamente 461 kJ, a variação de energia cinética, a partir do repouso, necessária para consumir toda esta energia seria de m v 2f mv 2i 80 kg v 2f E c =E cf −E ci = − ⇒ 461 kJ = −0 ⇒v f =107 m/ s 2 2 2 Note que este valor é inimaginável, então os valores serão tão altos mesmo para consumirmos pequenas quantidade de energia? A resposta é que não é bem isto. Pois existe um consumo natural de energia para o ser vivo se manter. Cada ser possui sua taxa específica. O corpo usa a energia extraída da alimentação, através dos processos discutidos anteriormente, para manter em funcionamento seus vários órgãos, manter sua temperatura constante e realizar trabalho externo (andar, por exemplo). Apenas uma pequena porcentagem (~5%) da energia armazenada na alimentação é eliminada pelo corpo na forma de fezes e urina, ficando qualquer excedente de energia armazenada na forma de gordura. A energia usada pelos órgãos é parcialmente transformada em calor, somos seres homotermas, desta forma temos que adiantar algumas ideias presentes na termodinâmica. A conservação da energia no corpo humano pode ser escrita na forma E= Q−W (2.12) onde E é a variação da energia interna ou armazenada pelo corpo, Q a quantidade de calor trocada com o ambiente e W o trabalho externo realizado pelo corpo. Por convenção, a quantidade de calor Q será sempre considerada negativa, enquanto que W será sempre o módulo do trabalho externo. Assim, uma perda de calor pelo corpo humano, ou um trabalho externo por ele realizado, resulta em uma diminuição de sua energia interna ( E0 ). Essas grandezas estão definidas num intervalo de tempo t , durante o qual a alimentação ou a excreção não ocorrem. Dividindo todos os membros da equação (2.12) por t , obtém-se E Q W = − (2.13) t t t sendo W = P (2.14) t a potência média com que o corpo realiza trabalho. Mesmo quando W =0 , há uma diminuição da energia armazenada no corpo, devida à perda de calor para o ambiente. Esse é o caso de uma pessoa, parada, que gasta energia para segurar uma barra de ferro sem realizar trabalho externo (levantar ou abaixar a barra). Essa energia, gasta na manutenção da força aplicada à barra, aquece e acaba sendo transferida ao meio externo na forma de calor. Mesmo que essa pessoa não estivesse segurando a barra, haveria ainda uma diminuição, embora menor, de sua energia armazenada. Como a energia utilizada pelo corpo humano é obtida a partir das reações de oxidação, podese calcular a variação de sua energia interna ( E ) medindo-se o seu consumo de oxigênio. Durante diferentes processos de oxidação, há liberação de uma quantidade de energia que depende da reação em particular . No exemplo que faremos em sala a seguir será considerada a oxidação da glicose. Exemplo – Na reação de oxidação 38/98 C 6 H 12 O 6 6 O 2 6 H 2 O6 CO 2 686 kcal são liberados 686 kcal por mol de glicose. Para essa reação, calcule a- a energia liberada por grama de glicose (valor calórico); • b- a energia liberada por litro de O2 consumido; • c- o número de litros de O2 consumidos por grama de glicose; • d- o número de litros de CO 2 produzidos por grama de glicose; • e- a razão entre o número de moléculas de CO 2 produzidas e o número de moléculas de O2 usadas (essa relação é definida como quociente respiratório). Como visto no exemplo acima, numa reação de oxidação há uma relação entre as energia liberadas por litro de O2 consumido ou por grama de substância oxidada. Cálculos análogos aos propostos nesse exemplo podem ser feitos para gorduras, proteínas e outros carboidratos. A tabela abaixo mostra, para algumas substâncias, as energias liberadas por mol de usado e por grama de substância oxidada (valor calórico). O2 Tabela 1: Energia libera em reações de oxidação (Okuno, 1982) Substância Energia liberada por litro de Valor calórico (kcal/g) O2 usado (kcal/l) Glicose 5,1 3,8 Carboidratos 5.,3 4,1 Proteínas 4,3 4,1 Gorduras 4,7 9,3 Gasolina - 11,4 A quantidade exata de energia liberada por liro de O2 consumido depende da proporção de substâncias como glicose, carboidratos, proteínas, gorduras etc na dieta de uma pessoa. Essa proporção pode ser determinada medindo-se o quociente respiratório. Os valores calóricos (energia liberada por grama de substância) da Tabela 1 correspondem ao máximo de energia que pode ser extraída dos alimentos. Contudo, nem toda essa energia é aproveitada pelo corpo. Parte dela é perdida devido a combustões inacabadas, sendo as correspondentes substâncias envolvidas eliminadas junto com fezes, urina e gases intestinais. O que sobre no corpo é a energia metabolizada Cada pessoa necessita de um nível minimo de energia para desempenhar as funções vitais no estado acordado. Essa demanda de energia, denominada taxa metabólica basal, ou simplesmente TMB., reflete a produção de calor pelo corpo. A mensuração do consumo de oxigênio do em condições rígidas permite a determinação direta da TMB. Os valores de consumo de oxigênio para a TMB variam habitualmente entre 160 e 290 ml/min (0,8 a 1,43 kcal/min), dependendo de fatores como sexo, idade, tamanho corporal global e peso corporal isento de gordura (PIG). Usualmente quando completamente em repouso, uma pessoa média consome cerca de 95 kcal/h, ou 110 W (quando corresponde em kcal/min?). 39/98 A figura 29 mostra uma ilustração entre diferentes animais e suas taxas metabólicas, note que animais pequenos possuem alta razão entre sua taxa metabólica e massa enquanto que animais maiores possuem taxas menores. Ilustração 35: Gráfico relacionando taxa metabólica em (watts) e massa corpórea para diferentes animais. A escala na vertical é logarítmica. Atualmente a organização mundial da saúde (OMS/WHO) define como valor calórico diário como sendo 2.000 kcal/dia para que um ser humano médio tenha todas as suas funções me perfeito funcionamento. No entanto, este ser humano médio deve consumir em média 95 kcal/hora. Tabela 2: Consumo de oxigênio e taxa de metabolismo basal (TBM) de um homem de 65 kg. (Okuno, 1982) Órgão Massa (kg) Fígado e baço - Cérebro Consumo O2 (ml/min) Consumo médio de energia (kcal/min) % da TMB 67 0,33 27% 1,4 47 0,23 19% Músculos 28 45 0,22 18% Rim 0,3 26 0,13 10% Coração 0,32 17 0,08 7% Existem várias equações para a determinação destas grandezas, no entanto, a maioria delas é feita totalmente empiricamente. Não há uma teoria muito bem definida, do ponto de vista matemático e heurístico para esta determinação. Um exemplo são as equações para a determinação do gasto calórico basal diário. Existe a equação de Harris Benedict (HARRIS, 1919). Que é uma equação onde a unidade para massa (M) é o quilograma, para altura (H) o centímetros e idade (A) em anos. Homens TMB=66013,7 M 5H – 6,8 A (2.15 Mulheres TMB=6659,6 M 1,8 H – 4,7 A (2.16) 40/98 Exemplo: Para um homem de 70 kg, 1,80 metros de altura, 30 anos, isso equivale a 1.452 calorias de metabolismo basal. Uma mulher de mesma idade, 55 kg e 1,60 metros de altura gasta em seu metabolismo basal 1.052 calorias. Observe que os fatores multiplicativos da massa do homem e da mulher variam entre si, este é um resultado do fato de que o metabolismo dos homens ser maior do que das mulheres e em função disto as mesmas sofrerem mais para o consumo de sua energia excedente. Todos estes valores diferem fortemente entre indivíduos, a figura da ilustração 21 mostra o resultado das medidas de taxa metabólica basal de profissionais de futebol em função da ingestão de diferentes alimentos (PRADO, et al, 2006). Ilustração 36: Relação entre taxa metabólica e alimentação para profissionais do futebol. fonte (PRADO, et al 2006) 2.9- Energia, força e tecido ósseo Nesta seção iremos introduzir algumas coisas relacionadas a resistência e a tensão nos ossos e iremos usar o texto básico do capítulo 7 de Okuno (OKUNO, 2003). Os ossos são compostos por uma matriz orgânica rígida fortalecida por depósitos de materiais inorgânicos que constituem o chamado tecido mineralizado. Em geral, em um osso compacto médio 40% é matriz óssea e 60% tecido mineralizado. O principal componente da matriz orgânica é o colágeno que diferencia de outros tipos de tecido colagenoso presentes em outras partes do corpo. Os cristais inorgânicos são principalmente a hidropatita. Um grupo de células conhecidas como osteoclastos que são células gigantes móveis são os principais responsáveis pela construção da matriz orgânica, o osteoclasto é uma célula multinucelada e sua ação é regulada entre vários outros elementos pela ação do estrógeno. Um grupo de células conhecidas como osteoblastos são os responsáveis pelo consumo da matriz orgânica e do próprio tecido mineralizado. Assim, o osso é um tecido conjuntivo, ou seja, um tecido vivo em contínua mudança. A cada 7 anos é como um novo esqueleto fosse produzido. A densidade média do osso é de 1,9 g /cm 3 e não muda com o passar do tempo. A partir dos 35-40 anos a massa do osso diminui lentamente a uma taxa de 1 a 2% ao ano. 41/98 Para estudar um pouco alguns fenômenos no corpo humano iremos lembrar alguns conceitos de mecânica dos sólidos. A tensão é definida como sendo a intensidade da força, F, que pode ser tanto de tração como compressão que causa uma deformação, dividida pela área A da secção transversal onde age. T= F (2.17) A A unidade de tensão é N /m 2 que é igual à unidade de pressão. Como existe a tensão de tração e compressão o significado se passei em uma força aplicada perpendicularmente à área. A deformação pode ser escrita como: = é definida como a variação relativa no comprimento de um corpo que L ∣L f −Li∣ = (2.18) Li Li onde Lf e Li são os comprimentos final e inicial respectivamente. O módulo de elasticidade Y é a razão entre a tração aplicada e a deformação desenvolvida, dado por: Y= T (2.19) O limite de ruptura é definido como a tensão máxima para a qual o material se rompe. A tabela abaixo mostra estes limites para alguns ossos. Tabela 3: Resumo de algumas propriedades mecânicas de ossos. Propriedade elástica de ossos sujeitos a tensão de tração Osso Y( 1010 Pa) Limite de ruptura ( 107 Pa) Máxima deformação Fêmur humano 1,6 12,1 0,0140 Fêmur de cavalo 2,3 11,8 0,0075 Vértebra 0,02 0,12 0,0058 Propriedade elástica de ossos e dos discos intervertebrais sujeitos a tensão de compressão Fêmur humano 0,94 16,7 0,0185 Fêmur de cavalo 0,83 14,2 0,0240 Vértebra 0,01 0,19 0,0025 Disco intervertebral 0,0011 1,10 0,3000 2.10 – Modelos Físicos e Sistemas Ecológicos Existe uma longa discussão sobre Ecologia e seu surgimento, uma rápida digressão sobre este tema se encontra no apêndice A . Mas, o que não podemos negar é a importância deste tema na sociedade moderna. Muitos mecanismos utilizados na Ecologia são analogias de sistemas físicos e veremos apenas um deles. Uma forma de determinar o comportamento de populações de seres vivos é imaginar que o 42/98 número de indivíduos pode ser representado por uma variável contínua e que a quantidade de indivíduos em um instante t é proporcional a quantidade de indivíduos em um instante t− t adicionada por uma taxa r , tomando o limite para que o intervalo de tempo t se aproxime de zero teremos: d N t =r N t (2.20) dt Este tipo de crescimento que se desenvolve desta forma é denominado de crescimento Malthusiano, em homenagem a Thomas Matlhus, o cientista social que primeiro chamou a atenção para o aumento desenfreado de uma população causaria o colapso dos recursos (Malthus, 1798). A função que é solução da equação (2.20) é N t =N 0 e rt que é uma exponencial e cresce infinitamente, no entanto, sabemos que sempre existem limites para o crescimento de indivíduos em qualquer população. A competição entre indivíduos da mesma espécie pode impor um limiar ao crescimento da população. Assim como o atrito impõe um limite a velocidade de um corpo que cai em um fluído (lembre-se da velocidade limite do tubo dinâmico usado em gravitação). Veja as duas equações abaixo [ d N t N t =r N t 1− dt K ] (2.21) d v t 2 =a−b v t (2.22) dt Assim como o fluído que possui coeficiente de atrito viscoso b impõe uma velocidade constante para o sistema a princípio acelerado descrito por (2.22) a equação (2.21) leva a uma quantidade de equilíbrio em K denominada de capacidade suporte. Este tipo de crescimento é chamado de crescimento logístico. A figura da ilustração 24 mostra o comportamento da solução da equação (2.21), note que mesmo que a população inicial esteja acima da capacidade suporte ou abaixo com o tempo ela tenderá à capacidade suporte. 43/98 Ilustração 37: Comportamento de uma população com crescimento logístico. Apesar de ser uma suposição bem simplista, algumas populações se comportam desta maneira aproximada. Na figura da ilustração 28 temos a curva de crescimento da populações dos Estados Unidos ajustada com os dados dos sensos conhecidos entre 1820 a 1908. Desde quando a população americana começou a ser monitorada até o início do século XX, o valor indicado na figura mostra que a população norte-americana se tornaria estável por volta do ano 2100 em 197 milhões de habitantes (MURRAY, 2005). Note que de acordo com dados do senso de 2010 a população americana está na ordem de 300 milhões de habitantes (WIKIPEDIA, 2012). Qual a razão da diferença? Acesso aos dados, a dinâmica da população americana mudou muito entre 1908 e os anos 40 por exemplo, até os anos 40 a poliomielite era uma doença mortal nos E.U.A, atualmente esta doença está totalmente controlada. 44/98 Ilustração 38: Evolução temporal da população americana. Agora podemos pensar na situação em que uma espécie interagem com outra, um consumidor com um produtor, por exemplo. Digamos que o número de indivíduos dos produtores é representado pela variável V t e que os produtores apresentam crescimento malthusiano (indefinido) a uma taxa a , um consumidor que denominaremos de predador, é representado por uma variável contínua P t que ao interagir com os produtores consomem os mesmos à uma taxa b (por esta razão temos o sinal negativo no sistema de equações (2.23)). Da mesma forma o número de consumidores, na ausência dos produtores, morrem à uma taxa d e aumentam com uma taxa c ao interagirem com os produtores. dV =aV −bPV =V a−bP dt dP =−dPcPV =P cV −d (2.23) dt Este exercício de raciocínio foi feito a primeira vez por um italiano chamado Vito Volterra no início do século XX (VOLTERRA, 1926) para explicar a variação de pescado no mar adriático. Este é o sistema conhecido como predador-presa. No que isto têm relação com a energia? As constantes b e d funcionam como parâmetros de trocas de energia no sistema. Assim como as moléculas que discutimos anteriormente. Vamos adimensionar este sistema para encontrarmos somente as variáveis significativas para cV bP o problema. Fazendo u = , v = , =at e =d /a que nos leva ao sistema: d a du =u 1−v d dv = v u−1 (2.24) d O parâmetro mostra totalmente como a população de consumidores e produtores se comporta. A exemplo do que ocorre com a velocidade podemos conseguir uma energia cinética 45/98 (veja os exercícios). Para concluir este conteúdo é muito recomendado a resolução dos exercícios abaixo. Bom trabalho. 2.11 - Exercícios 1-) Ao serem bombeados pelo coração, num regime de baixa atividade,200g de sangue adquirem uma velocidade de 30 cm/s. Com uma atividade mais intensa do coração, essa mesma quantidade de sangue atinge uma velocidade de 60 cm/s. Calcule em ambos os casos, a energia cinética que essa massa de sangue adquire e o trabalho realizado pelo coração. 2-) Um explorador no meio da antártica precisa determinar temperatura e cria um termômetro usando um líquido X. Neste termômetro a água congela a −10 X e ferve a 110 X . Uma leitura que indica 60 X corresponde a qual leitura na escala celsius? 3-) Qual a temperatura final atingida ao se misturar 50g de água a 70 °C com 200 g de água a 20°C? 4-) Na oxidação do etanol C 2 H 5 OH 3O 2 2CO 23H 2 O327 kcal são liberados 327 kcal por mol de etanol. Na oxidação de 1 g de etanol, calcule a -) A Energia Liberada; b-) A quantidade de O2 consumida; c-) A quantidade de CO2 produzida. 5-) Quais as origens da energia usada nos animais para a produção de moléculas de ATP? Como esta energia é processada. ATP ADP P são 6-) Uma colher pequena de açúcar contendo 7 g de glicose. Na reação −20 liberadas 1,6×10 cal por molécula de ATP. a-) Quantas moléculas de ATP são formadas na oxidação de uma molécula de glicose? b-) Quantas moléculas de ATP poderiam ser formadas a partir dessa quantidade de glicose? c-) Quantas calorias estariam armazenadas nessas moléculas de ATP? 7-) Calcule a razão entre as eficiências de armazenamento de energia, por produção de ATP, na fermentação e na oxidação de glicose. 8-) Na oxidação da gordura C 3 H 5 O3 OC 4 H 7 318,5O 2 15CO 2 13 H 2 O1941 kcal são liberadas 1.941 kcal por mol de gordura. Responda a- Quais as massas moleculares das quatro moléculas envolvidas na reação? b- o valor calórico; c- a energia liberada por litro por litro de O2 ; d- o número de litros de O2 produzidos por grama de gordura; d- o número de litros de CO 2 produzidos por grama de gordura; e- o quociente respiratório. 9-) Usando a figura da ilustração 35 considere uma galinha de 5 kg. a-) Determine a TMB em kcal/min. b-) Supondo que o valor calórico de sua dieta seja de 2 kcal/g, qual a quantidade mínima de alimento que ela necessita por dia. (Explique todos as suas suposições). 10-) Em um exercício de tração um homem adulto deixa um peso em seu tornozelo equivalente a 8 46/98 kg. Supondo que a tíbia tenha as mesmas propriedades elásticas que o fêmur, calcule a percentagem de alongamento quando tracionado por esta força. Considere a área da secção transversal da tíbia sendo 3,3 cm2 . 11-) Ao saltar na vertical, você pode ficar seriamente machucado se aterrissar com as pernas rígidas. Uma maneira de não se machucar é flexionar os seus joelhos na aterrissagem para reduzir o impacto. Um homem de 75 kg imediatamente antes do contato com o chão possui uma velocidades escalar de 6,4 cm/s. a-) Em uma aterrissagem com as pernas rígidas ele chega ao repouso em 2 ms. Determine a força média, devida a desaceleração, que atua sobre ele durante este tempo. b-) Quando flexiona as pernas ele chega ao repouso em 0,10 s, qual a força média devida a desaceleração?. c-) Durante a aterrissagem, a força do chão sobre o homem é para cima e da gravidade para baixo, qual a força resultante média em ambas as situações anteriores. d-) Nas pernas (tíbia e fíbula), há tração ou compressão em cada uma das situações? e-) Na tíbia com diâmetro de 2 cm gera quebra (suponha que a força se divide igualmente entre as duas pernas e atua apenas na tíbia)? f-) E na fíbula com diâmetro de 1 cm? Suponha que a tíbia e a fíbula tenham as mesmas propriedades elásticas que o fêmur 12-) Calcule a força de compressão máxima que o fêmur pode suportar antes de fraturar no caso de um adulto do sexo masculino e do sexo feminino, sabendo que a área efetiva da secção transversal da parte mais fina do fêmur de um homem é de 6,5 cm 2 e de uma mulher, 5,2 cm 2 . 13-) Em acidentes envolvendo motociclistas que corre sem capacete, a morte pode advir se a cabeça receber uma pancada com um impulso de 100 N.s. Para que não ocorra morte, nesses casos, qual deve ser a velocidade máxima do motociclista? Considere que a massa da cabeça do motociclista seja de 5,0 kg. 14-) Este exercício visa o aprimoramento da compreensão do modelo logístico e sua analogia com a Física. N 0 K e rt a-) Demonstre que a função N t = é solução para a equação (2.13). [ K N 0 e rt −1] b-) Argumente, usando princípios de dinâmica newtoniana, que a velocidade limite para ser solução a da (2.14) é dada por v l = . b K c-) Demostre que a função N t = também é solução da (2.13) sendo uma 1e−rt− constante positiva, discuta qual a imposição desta solução? Faça um rascunho desta solução. H 15-) O sistema (2.23) apresenta uma constante de interação (podemos pensar em uma tipo de energia) que determina a relação entre as soluções possíveis de predadores e presa dada por . Dica: procure encontrar uma equação combinada do sistema H = uv−ln u v (2.24) e substitua esta expressão, não se esqueça que 16-) Quais são os tipos de gráficos anterior? v×u H é uma constante no tempo. que resultam da expressão encontrada na questão Respostas 47/98 1-) 9x10-3 J; 3,6x10-3J; 2,7x10-3J 2-)58,3 °C 3-) 30 °C 4-) a-) 7,11 kcal, b-) 2,1 g, c-) 1,9 g 6-) a-) 38 moléculas de ATP. b-) 8,9×10 23 moléculas c-) 14,2 kcal. 7-) 1/19 10-) 0,000148% 11-) a) 2400 N; b-) 48 N; c-) Na situação em a-) a força é de aproximadamente 1.650 N, na situação de b-) a força é de aproximadamente 702 N; d-) Na situação a-) é tração sobre as pernas e compressão na situação b-); e-) a tensão de tração da tíbia é de 2,63×106 Pa e a de compressão é de 1,12×106 Pa em nenhuma das situações é ultrapassado o limite de ruptura ; f-) a tensão de tração da fíbula é de 1,05×107 Pa e a de compressão é de 4,5×106 Pa. 11-) No homem 1,08×105 N e nas mulheres 8,68×10 4 N . 12-) 72 km/h. 2.10 - Bibliografia BEGON, M.; TOWNSEND, C. 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Incluiremos também a fonação como sendo uma forma de interação com o meio externo. Para entender bem os sentidos é bom procurarmos entender o sistema que interpreta e transmite os sinais dos sentidos. 3.2– O sistema nervoso O sistema nervoso e o sistema endócrino (que realiza a secreção de hormônios) são os responsáveis pela maioria das funções de controle do organismo. O sistema nervoso controla as contrações musculares, o funcionamento das vísceras, os movimentos cardio-respiratórios e até mesmo os ritmos de secreção de hormônios de glândulas que constituem o sistema endócrino. Não discutiremos o sistema endócrino, mas existem vários mecanismos no funcionamento do mesmo que necessitam de um tratamento matemático que lembram o tratamento dado a fenômenos físicos. Ilustração 39: Representação do sistema nervoso central e dos nervos espinhais. O controle das atividades do organismo é possível não apenas porque o sistema nervoso comanda o funcionamento de diversos órgãos, mas também porque possui a capacidade de receber informações sensoriais de todas as partes do corpo e promover integração dessas informações antes de enviar uma “resposta”. O simples ato de reconhecer o rosto de alguém envolve um mecanismo nervoso bastante complexo, que envole células nervosas de diversas regiões do sistema. 49/98 O sistema nervoso humano, como o de outros vertebrados, é centralizado, apresenta uma reunião de células nervosas, em órgãos, que ficam em sua maioria localizados na região cefálica. O chamado sistema nervoso central (SNC) é formado pelo encéfalo, que está dentro da caixa craniana, e pela medula espinhal (ou medula raquidiana), que é envolvida pelas vértebras da coluna. Nos seres humanos, no entanto, o encéfalo apresenta um volume muito maior em relação ao tamanho do corpo do que nos outros vertebrados. Para fins pedagógicos o encéfalo pode ser dividido em regiões: • Cérebro – O cérebro em nós humanos é divido em dois hemisférios; cada um possui áreas especializadas em diversas funções, como memória,emoções, coordenação da fala, da visão entre outras. • Tálamo ou hipotálamo – O tálamo atua retransmitindo informações sensoriais para o cérebro; o hipotálamo está envolvido no controle da temperatura corpórea, no balanço hídrico e na produção e liberação de alguns hormônios, entre outras funções. Promove a harmonia de funções no organismo, estado conhecido como “homeostase”. • Cerebelo – é a parte do SNC correlacionada a funções de coordenação motora e percepção da localização no espaço e na postura (equilíbrio). • Tronco encefálico – região de comunicação entre cérebro e medula espinhal. Na ponte ocorre o cruzamento o cruzamento das vias motoras de modo que o lado direto do cérebro controla o lado esquerdo do corpo e vice-versa. O bulbo controla o movimentos respiratórios e cardíacos e está relacionado com alguns atos reflexos como a tosse deglutição e o vômito. Outra estrutura muito importante no sistema nervoso central é a medula espinhal que é um cordão formado por células nervosas que conduzem informações sensoriais para o encéfalo e deste para diversos órgãos do copro. Alguns movimentos da musculatura esquelética, conhecidos como atos reflexos, estão relacionados apenas coma medula, enquanto outros apenas com o bulbo. A medula espinhal e o encéfalo estão envolvidos por membranas resistentes chamadas meninges, que se localizam entre órgãos e ossos do crânio e das vértebras, oferecendo maior proteção ao SNC. Entre as meninges e os órgãos do SNC, existe o líquido cefalorraquidiano. Da medula espinhal partem 31 pares de nervos espinhais, que possuem fibras sensoriais (que conduzem informação do corpo para o SNC) e fibras motoras ( que conduzem a informação do SNC para o corpo). Também existem 12 pares de nervoso cranianos, que partem da região inferior do cérebro e do tronco encefálico. Discutiremos mais como este processo de transmissão ocorre no próximo conteúdo. 50/98 Os nervos espinhais e cranianos constituem o sistema nervoso periférico (SNP). Os nervos são constituídos por axônios, que são prolongamentos do neurônio que transmitem o impulsos nervosos. No SNP existem também gânglios nervosos, que correspondem a corpos celulares de neurônios localizados fora do SNC. Podemos dizer que existem três tipos básicos de “repostas” dadas pelos sistema nervoso. O ato reflexo – não envolvem diretamente áreas do cérebro (exemplo: tirar a mão quando o dedo é furado por uma agulha). O ato voluntário – envolvem diretamente áreas do cérebro e do cerebelo (exemplo: andar). O ato inconsciente -envolvem áreas do cérebro e não necessitam explicitamente do comando do cérebro para agir (exemplo: batimentos cardíacos). Em função desta diferenciação o SNP é dividido em somático (voluntário) e autônomo ou visceral (involuntário). A parte autônoma do sistema nervoso consiste em duas divisões formadas por nervos que, quando inervam o mesmo órgão, apresentam ação antagônica. Em uma dessas divisões, chamada simpática, os nervos partem da medula espinhal e formam-se gânglios nervosos paralelos à medula, distante dos órgão inervados por eles. Os nervos da divisão simpática geralmente liberam uma substância, a noradrenalina, que promove reações associadas a um estado de alerta: aceleração dos batimentos cardíacos e do ritmo respiratório, inibição do funcionamento do sistema digestivo, dentre outras. Ilustração 40: Representação da parte autônoma do sistema nervoso periférico. A divisão parassimpática, apresenta nervos que partem das extremidades da medula espinhal e os gânglios são formados próximos ou dentro dos órgãos inervados por eles. A substância 51/98 liberada pelos nervos desta divisão é a acetilcolina que provoca, dentre outras coisas, a contração das pupilas. Assim, o sistema nervoso é o responsável por receber e processar os estímulos externos, agora como este processamento ocorre e como é a interpretação do mesmo cabe a ciência da percepção definir isto. Note que cada animal poderia interpretar de uma maneira diferente os estimulas atribuídos do meio externo e processados pelos sistema nervoso. Por tal razão, veremos que em muitos mamíferos que possuem um sistema nervoso muito semelhante ao nosso muitos dos sentidos são processados de maneira diferente. 3.3- Visão Quando falamos do fenômeno da visão, devemos nos lembrar que não são apenas os humanos que veem. Animais também possuem visão, apesar de a mesma não ser expressa da mesma maneira que pelos humanos. Esta diferença ocorre por causa de características específicas do sistema nervoso central e por diferenças dos órgãos de processamento de estímulos luminosos. O órgão que melhor processa a luz é o olho e na natureza, em quantidade, o órgão mais comum é o olho composto e o estudaremos resumidamente. 3.3.1 – O olho composto Muitos animais, em especial insetos e peixes, possuem um olho composto, multifacetado, cada faceta é denominada de omatídio. O número depende da espécie. • Libélula – 28.000 omatídios • Mutuca – 7.000 omatídios • Mosca doméstica – 4.000 omatídios • Formiga - 6. O principal mecanismo físico encontrado na visão é o mecanismo de reflexão e refração da Luz. O parâmetro importante é o índice de refração. O rabdoma situa-se logo abaixo do cone do cristalino, ao longo do eixo do omatídio, mede de 100 a 600μm. Ele contém um pigmento fotossensível que absorve fótons. Um parâmetro importante no olho dos animais é o poder de resolução do mesmo que é também um parâmetro utilizado em instrumentos ópticos. A visão em cores também é uma característica que varia de espécie para espécie. 3.3.2- O olho humano O olho humano pode ser entendido como um conjunto de lentes e para podermos estudá-lo com maior precisão devemos lembrar de alguns conceitos de óptica que foram estudados durante o ensino médio. No entanto, antes disto iremos nos dedicar a entender as características do olho humano, sua forma e estruturas presentes no mesmo. 52/98 3.3.2.1 - Características do olho humano O olho humano é globular e podemos sintetizar as seguintes características presentes neste órgão. • Sistema automático de focalização. • Um diafragma conhecido como íris, controla entrada de luz no olho. • Eficiência de operação para ver tanto em ambiente claro, como escuro. Ilustração 41: Representação esquemática do olho humano. Os principais elementos presentes no olho são: Córnea - O Índice de refração da córnea 1,37 do ar 1,0 e da água 1,33. A córnea funciona como uma lente que recebe primeiramente a luz que chega do meio externo. Possui uma curvatura característica e envolve todo o globo ocular. Íris- Uma espécie de diafragma que controla a entrada da luz. Possui uma abertura chamada de pupila. Cristalino – Estrutura compacta localizada após a córnea coberto de fibras, o mesmo muda sua formatura, a chamada acomodação dos olhos, para focalizar os objetos, funciona como uma lente secundária na transmissão da imagem capturada pela pupila. O cristalino possui ligamentos conectados a nervos que alongam e comprimem o cristalino. Humor aquoso - Líquido incolor atrás da córnea produzido continuamente e o excesso é eliminado pelo canal de Schlemm, ele mantem a pressão do olho em 15 mmHg. A córnea e o cristalino não são vascularizados, logo os nutrientes chegam pelo humor aquoso. Humor vítreo é a última camada nos olhos antes da retina, preenche praticamente todo o globo ocular e é translúcido. Retina – cobre quase toda a superfície interna do olho e é altamente vascularizada. Aqui a luz é transformada em impulso elétrico. Na retina há dois tipos de fotorreceptores: os cones e os bastonetes. Nervo óptico – nervo conectado ao SNC e que transmite os impulsos luminosos para o processamento no cérebro. A imagem que vemos chega ao cérebro invertida e o mesmo a posiciona. Vamos revisar um pouco como é a formação de imagens em lentes 53/98 Ilustração 42: Ilustração da formação de imagens em uma lente. Qualquer elemento óptico que possui índice de refração próximo ao meio em que se encontra pode ser classificado como lente. Existem basicamente as lentes divergentes e convergentes e este comportamento depende de sua geometria. Não discutiremos com mais profundidade este tema pois ele será discutido posteriormente nas componentes curriculares de óptica e oficina de práticas de ensino. No entanto, apenas para lembrarmos como que uma imagem se forma em uma lente a partir das características da lente devemos relembrar a lei de Gauss. Ilustração 43: Figura ilustrativa de como se formam as imagens em lentes. A equação é dada por: 1 1 1 = (3.1) f p p' onde: f - distância focal, p – distância do objeto e p ' - distância da imagem. Assim como uma lente qualquer o olho também possui a sua distância focal. Definimos a convergência C como (OKUNO, 1982) C= 1 (3.2) f A unidade de C é a dioptria que popularmente denominamos de graus. A convergência do olho humano é variável graças ao cristalino. Se o cristalino está descontraído a imagem de um 54/98 objeto distante será focalizada na retina. Por outro lado se o cristalino tiver sua curvatura aumentado (cristalino engrossado), sua convergência será maior e poderá formar uma imagem nítida na retina, de um objeto colocado próximo ao olho. É definido que há uma distância mínima que um objeto pode ser colocado diante dos olhos de tal forma que a imagem formada na retina seja nítida. Isto varia de pessoa para pessoa, mas em média o valor é de 25 cm, isto não quer dizer que um objeto colocado a menos de 25 cm do olho não pode ser visto, mas na verdade que você precisa focalizar melhor o seu olho para ter uma imagem nítida. Assim como o ponto próximo, pode-se definir o ponto distante como sendo o mais distante que o olho ainda consegue focalizar na retina. Para olhos normais ele está no infinito. A convergência do olho humano pode ser calculada usando a equação (4.1) e considerando a distância da imagem p ' , que é a distância do cristalino à retina, igual a dois 2 cm. Para o caso de 1 0 ,e um objeto colocado a grande distância do olho, distância do objeto p ∞ , portanto p a convergência C d para o ponto distante é: Cd= 1 1 1 = = =50 di f p ' 0,02 m Para um objeto próximo ao olho, a distância do objeto p=25 cm e a convergência C p para o ponto próximo vale 1 1 1 C p= = =54 di f 0,02 m 0,25 m O poder de acomodação de um olho é definido como a diferença entre as convergências associadas aos extremos da visão nítida. No caso do olho humano normal vale 4 di . É interessante notarmos esta associação para entendermos os três mais conhecidos defeitos da visão. Miopia - Defeito causado pelo córnea ser muito acentuado ou globo ocular excessivamente alongado, com isto a imagem se forma antes da retina causando que as imagens de objetos distantes fiquem desfocadas (embaçadas). A correção da miopia pode ser feita usando-se lentes divergentes. Exemplo - Calcule a convergência da lente necessária para corrigir um olho míope com o ponto distante a 1 m do olho. Hipermetropia – Defeito causado pelo globo ocular excessivamente curto, com isto a imagem se forma após a retina gerando imagens de objetos próximos desfocadas. A correção da Hipermetropia pode ser feita usando lentes convergentes. Astigmatismo – Defeito causado pelo formato irregular da córnea ou do cristalino. As imagens dos objetos acabam se formando em diversos eixos. A correção do Astigmatismo pode ser feita com lentes cilíndricas. Presbiopia – À medida que as pessoas envelhecem, o cristalino se torna menos flexível e sua capacidade de acomodação se reduz. Esse fenômeno se chama presbiopia. Tanto o presbíope quanto o hipermétrope não enxergam bem a pequenas distâncias, isto é, seus pontos próximos estão a distâncias superiores a 25 cm. A mesma lente corretora da hipermetropia é usada na presbiopia. 55/98 3.3- Audição A audição é o sentido relacionado ao processamento dos sinais sonoros. O som é um onda mecânica transversal causada por rarefação e compressão do ar. As três propriedades básicas do som são: Intensidade – relacionada a quantidade de energia transmitida pela onda sonora que popularmente denominamos de volume. Frequência – relacionado ao número de oscilações da onda sonora em uma unidade de tempo. Normalmente a unidade da frequência sonora é dada em Hertz (Hz) que é oscilações por segundo. Timbre – que pode ser entendido como a forma da onda sonora que se propaga. Deixarei a maioria dos detalhes destas características para serem discutidos na disciplina de acústica. energia No entanto, citarei apenas o cálculo da intensidade do som. A intensidade de uma onda, é a E que atravessa uma área S num intervalo de tempo t . I= E S t (3.3) A intensidade I do som pode ser expressa em função da amplitude deslocamento horizontal dos elementos de volume do ar pela equação I= v 2 A 2 A do (3.4) sendo , v e , respectivamente, a densidade do meio, a velocidade de propagação da onda nesse meio e a frequência angular. Pode-se também deduzir a expressão que relaciona a intensidade amplitude P 0 I= P 20 2v I do som com a (3.5) onde e v possuem o mesmo significado da equação (3.4). A intensidade da onda sonora é proporcional ao quadrado da amplitude de pressão. O ouvido humano é capaz de detectar intensidades sonoras que vão de 10−12 W / m2 até 1W /m 2 . Devido a esse grande intervalo, uma escala logarítmica de base dez é usada para definir o nível de intensidade sonora %beta (decibel – dB): dB=10 log onde I é a intensidade sonora e I (3.6) I0 I 0 é a intensidade de referência de 10−12 W / m2 . Os limites da faixa de nível de intensidade sonora audível para o ser humano são 0 dB e 120 dB. Agora veremos como o ser humano detecta o som A estrutura que recebe os sons e onde estão os receptores sensoriais é conhecida como ouvido ou orelha. Até um passado recente os biólogos denominavam como ouvido e atualmente no ensino médio, têm-se utilizado a denominação de orelha. Mas, como sempre não se esqueça, definições foram feitas para facilitar e não confundir mais ainda. 56/98 Ilustração 44: Representação do ouvido humano Na parte mais externa temos o pavilhão auditivo conhecido popularmente como orelha. Esta região é denominada de ouvido externo. Nesta região também se encontram os pelos e as glândulas sebáceas responsáveis pela produção do cerume. Logo em seguida temos o canal auditivo que conduz o ar até a membrana do tímpano que é o nosso delimitador do ouvido externo Ilustração 45: Uma vista ampliada dos ossículos. O tímpano marca o início do ouvido médio. Nesta região as ondas sonoras fazem o tímpano vibrar, e essa vibração é transmitida aos três ossículos do ouvido médio: o martelo, a bigorna e o estribo, nessa ordem. A vibração é amplificada ao passar de um ossículo para outro, até atingir uma membrana chamada janela oval, que já é uma estrutura do ouvido interno. A janela oval comunica0se com um longo tubo enrolado, preenchido por líquido: a cóclea. As vibrações da janela oval são transmitidas para o líquido. Na superfície interna da cóclea, está o órgão espiral (órgão de Corti), onde se localizam os receptores. Eles detectam a vibração do líquido e estimulam o nervo coclear ou auditivo. A informação é transmitida ao cérebro, onde o som é interpretado. O órgão espiral é uma das estruturas mais delicadas do corpo humano. O ser humano detecta uma faixa de frequência de 20 Hz a 20 kHz que é uma faixa bem ampla de frequência. O ouvido também está relacionado com o equilíbrio. Existe uma estrutura ao lado da cóclea, que se comunica com a janela oval, formada por duas câmaras (utrículo e sáculo) e por três canais semicirculares. Essa estrutura é preenchida por líquido. Os canais semicirculares detectam alterações na posição da cabeça. Quando movimentamos 57/98 a cabeça, o líquido presente nas câmaras e nos canais semicirculares também se movimenta. Os receptores, que estão em contato com o líquido, são estimulados e enviam estímulos nervosos para o cérebro e cerebelo. Assim, temos consciência da posição de nosso copro no espaço – se estamos sentados, deitados, andando. Isto explica por que sentimos tontura quando giramos o corpo, parando bruscamente. O líquido contido nas câmaras e canais semicirculares adquire movimento com a rotação da cabeça. Quando paramos bruscamente, o líquido continua a se movimentar (conservação do momento linear). As células sensoriais do ouvido interno continuam sendo estimuladas e enviando ao encéfalo a informação de que a cabeça continua em movimento, embora os olhos detectem que o corpo está parado. 3.4- Fonação A fonação pode ser definida como a capacidade de produzir sons. Novamente, tanto humanos quanto animais apresentam esta capacidade em proporções diferentes. E os seres humanos são os que apresentam o sistema mais complexo de comunicação sonora: a fala. Muitos animais apresentam uma estrutura de códigos sonoros para se comunicarem. Os pássaros são os mais fáceis de percebermos esta estrutura. No entanto, o balido da ovelha, o mugido das vacas, os sons das baleias Jubarte também são resultados de um aparelho fonador biológico. Pensando em termos dos seres humanos, podemos imaginar que a voz é o meio de comunicação mais evoluído que o ser humano dispõe. Através dela o homem transmite mensagens, assim como sentimentos, emoções e pensamentos. Assim, a voz é um instrumento que permite ao homem comunicar-se e interagir com seus pares. Outros meios de comunicação como a escrita foram desenvolvidos posteriormente, mas a voz é tão primordial para nós que as vezes parece natural, sem a necessidade de aprendizado, o que é um ledo engando. Podemos dizer, de forma bem simplista, que o instrumento da voz é o trato vocal. Para compreendermos melhor a produção da fala, vejamos na Ilustração 46 a anatomia do aparelho fonador que são formados pelos seguintes órgãos: cavidades nasais, boca, faringe, laringe, pregas vocais, traquéia, brônquios, pulmões e diafragma. Não existe um órgão responsável pela fonação, a produção da voz humana é possível a partir da junção de vários órgãos. A laringe onde a voz se origina, e onde estão localizadas as cordas vocais, tem a função biológica de impedir a entrada de substâncias estranhas e a não biológica de produção de sons. No caso de aves, uma estrutura muito semelhante é a siringe que impedi a entrada de substâncias estranhas e também produz sons. Para a produção da voz, o ar inspirado pelos pulmões é expelido pelo diafragma. Este ar passa pela traqueia com grande pressão, e posteriormente pela laringe, onde se localizam as cordas vocais. As cordas ou pregas vocais possuem tiras de músculos muito pequenas, como mostra a imagem da Ilustração 47. Estas são controladas por fibras nervosas diferentes de forma separada. Essas pregas gêmeas atuam como vibradores durante a fonação, se fecham durante a fala pela ação das cartilagens aritenóides e se abrem durante a respiração. A passagem do fluxo de ar que vem dos pulmões impulsionado pelo diafragma faz com que as pregas se abram, no entanto, a própria velocidade faz com que ocorra uma queda de pressão que faz as pregas se fecharem. O abrir e fechar das cordas vocais rapidamente gera um trem de pulsos ou sinal glotal no trato 58/98 vocal. Ilustração 46: Representação do trato vocal. Ilustração 47: Imagem das pregas vocais. Para o estudo de diversos meios de produção sonora podemos utilizar toda a teoria aprendida no espaço curricular de Mecânica dos Sólidos e dos Fluídos. Mas, deixaremos para o espaço curricular de Acústica mais detalhes sobre este aparelho. 59/98 3.5- Exercícios Nesta seção as respostas dos exercícios encontram-se no texto, basta uma leitura atenta. Bom trabalho. 1-) Qual a relação entre o Omatídio e o Rabdoma? 2-) Qual a função do canal de Schlemm? 3-) Discuta sucintamente as seguintes estruturas do olho humano e suas funções a-) Humor Aquoso; b-) Pupila; c-) Retina; d-) Humor vítreo 4-) Explique o que vem a ser Miopia, Hipermetropia e Astigmatismo. 5-) A presbiopia é uma doença da visão ou pode ser classificada como outro fenômenos, discuta sucintamente dentro do que foi abordado em aula. 6-) Uma pessoa vê nitidamente só objetos colocados entre 25 cm e 4 m de seus olhos. Determine o poder de acomodação do olho desta pessoa. 7-) Qual deve ser a convergência das lentes corretoras para a pessoa do problema anterior? 8-) Qual a diferença funcional entre o ouvido interno e o externo? 9-) Resuma o papel do martelo, do estribo, da bigorna e do tímpano e suas diferenças. 10-) Qual a faixa de audição do ouvido humano? Compare-a com a de outros animais. 11-) Quando uma pessoa altera a frequência de sua voz, qual o mecanismo fisiológico que ela utiliza? E qual a explicação física? 12-) Normalmente em música as propriedades do som são classificadas como a-) intensidade, b-) altura, c-) timbre. Discuta como explicar estas propriedades dentro de uma visão da Física. Resposta 6- 3,75 di 3.6- Bibliografia OKUNO, E; CALDAS, I L; CHOW, E Física para Ciências Biológicas e Biomédicas, Ed. Harbra, São Paulo, 1982. LAURENCE, J. Biologia, Ed. Nova Geração, São Paulo, 2005. 60/98 Conteúdo 4 - Impulsos elétricos e fenômenos biológicos 4.1– Introdução Os seres vivos, em sua grande maioria, são compostos majoritariamente por água. A água é uma material que na presença de certos sais se comporta como condutora de eletricidade. A natureza, por alguma razão que não exploraremos aqui, acabou por usar a eletricidade e a transmissão de impulsos elétricos como a principal forma de transmissão de sinais em sistemas biológicos. Nos humanos praticamente toda a percepção discutida no conteúdo 3 abordado nas aulas anteriores termina com a transformação de sinais sonoros, luminosos, mecânicos ou químicos sendo transformados em sinais elétricos que são interpretados através do sistema nervoso e do cérebro. Um dos mais complexos fenômenos elétricos biológicos é o excesso de íons nos lados externo e interno da superfície celular, e às diferenças entre as concentrações iônicas no interior da célula e no meio extracelular. Nos seres humanos e nos animais, uma grande quantidade de energia metabólica (cerca de 20% da taxa metabólica basal) é constantemente despendida para manter esse processo, isto é um indicativo de sua importância. Uma das estruturas mais importantes na composição celular é a membrana citoplasmática que separa o interior da célula do seu meio externo. Graças a membrana citoplasmática, são mantidas as diferenças de composição entre soluções no interior e no exterior da célula. Vamos introduzir alguns conceitos básicos de potencial elétrico, capacitores elétricos, corrente elétrica e difusão iônica. Todos estes conceitos auxiliaram na explicação da ideia de potencial de repouso de uma célula. Posteriormente discutiremos o que vem a ser o potencial de ação de uma célula 4.2 – Potencial elétrico Alguns fenômenos na natureza possuem a característica chamadas elétricas. Historicamente este nome surgiu pelo fato de que no passado ao se atritar tecidos com um tipo de âmbar (em grego elktron) eles atraem outros materiais. Assim, se definiu que existiriam dois tipos de carga, a carga elétrica positiva e a negativa. Este são apenas nomes atribuídos pois alguns elementos tinham comportamento diferenciado de outros quanto esta atração. Não preciso relembrar que esta definição demorou anos para ser elaborada. As cargas positivas atraem as negativas. A unidade de medida de carga elétrica no sistema internacional é o Coulomb C. Uma carga elétrica cria em torno de si um campo elétrico E radial que possui estruturas imaginárias denominadas linhas de campo. A figura da ilustração 49 mostra como esta distribuição ocorreria. Assim, uma carga q de sinal contrário (chamada carga de prova) estaria sobre a ação de uma força causada pela carga Q como ilustra a figura da ilustração 48 . A relação entre a carga elétrica, o campo elétrico e a força é dada pela expressão: 61/98 Ilustração 48: Distribuição de linhas de campo em uma carga elétrica positiva. =q E (4.1) F , dependendo da carga O sentido da força é o mesmo ou oposto ao sentido do campo E q ser positiva ou negativa. Assim, a unidade de campo elétrico é Newton por Coulomb. A partir da equação (4.1) podemos definir o trabalho W realizado por essa força, quando a partícula se desloca uma distância x . . x (4.2) W =F Ilustração 49: Interação entra a carga de prova e o campo elétrico causado por uma carga Q. Como vimos anteriormente o trabalho é um escalar e podemos associá-lo a variação da energia cinética K . W = K (4.3) A energia mecânica E desta partícula é constante e dada por: E=U K (4.4) onde U é a energia potencial elétrica. Assim,havendo uma variação na energia cinética da partícula, haverá também uma variação em sua energia potencial. U =− K (4.5) A partícula carregada possui essa energia potencial devido a sua interação com o campo elétrico. O valor de U depende da posição da partícula. Quando a partícula se move, há uma variação de U devida ao trabalho realizado pela força elétrica: U =−W (4.6) Se a carga q da partícula for positiva, se essa partícula se deslocar no sentido das linhas 62/98 de força, o trabalho realizado será positivo e haverá uma diminuição da energia potencial. Neste sentido a variação de U é proporcional à carga elétrica. É interessante definir uma grandeza que relacione o trabalho necessário para deslocar uma carga elétrica q de um ponto x 1 para x 2 , esta grandeza é denominada de diferença de potencial elétrico V e pode ser expressa por duas relações U V= (4.7) q ou V =−E x (4.8) É fácil obter a expressão (4.8) a partir das expressões anteriores (é bom você fazer isto!!!). A 1J unidade do potencial elétrico é volt, assim 1V = . No mesmo sentido, a intensidade de um 1C campo elétrico uniforme em função da diferença de potencial é −V E= (4.9) x Existe a abordagem diferencial da equação (4.9) que deixaremos para o futuro quando tivermos o conceito de derivada direcional mais bem definido, mas para você entender a princípio, imagine que o vetor campo elétrico pode ser obtido pela derivada no espaço do potencial elétrico e o sinal da variação resultaria na direção do vetor. Todos estes conceitos estão sendo revistos, durante o ensino médio eles foram trabalhos no terceiro ano. Agora iremos falar de uma ideia mais aplicada aos sistemas biológicos, o potencial de repouso. 4.3 - Potencial de repouso Entre o líquido no interior de uma célula e o fluído extracelular há uma diferença de potencial elétrico denominada potencial de membrana. Esse potencial pode ser medido ligando por meio de microeletrodos, os polos de um medidor tensão (voltímetro) ao interior de uma célula (figura da Ilustração 50). Ilustração 50: Figura esquemática de uma célula. Na maioria das células, o potencial de membrana V permanece inalterado, desde que não 63/98 haja influência externas. Quando a célula se encontra nessa condição, dá-se ao potencial de membrana V , a designação de potencial de repouso representado por V 0 . Em uma célula nervosa ou muscular o potencial de repouso é sempre negativo, apresentando um valor constante e característico. Nas fibras nervosas e musculares dos animais de sangue quente, os potenciais de repouso se situam entre -55 mV e -100 mV. Nas fibras dos músculos lisos, os potenciais de repouso estão entre -30 mV e -55mV. Quando ambos os pontos do medidor de tensão (ou voltagem) estão no meio externo, a diferença de potencial medida é nula, indicando que o potencial elétrico é o mesmo em qualquer ponto desse meio. O mesmo aconteceria se os dois eletrodos pudessem ser colocados no interior da célula. O potencial elétrico do fluido extracelular, por convenção, é nulo e V é o potencial no interior da membrana. O potencial V, mostrado na ilustração 51, é constante dentro e fora da célula, devendo, portanto, variar no interior da membrana citoplasmática. Nessa figura, a variação linear V dentro da membrana é apenas hipotética, baseada em considerações físicas. O campo elétrico dentro e fora da celula é nulo pois não há variação de potencial elétrico. O campo elétrico na membrana citoplasmática pode ser calculado pela (4.9) e o seu valor em módulo é de 1,0×10 6 N /C , tente calcular este valor usando a equação (4.9) e os dados da ilustração 51 e lembre-se que −10 1 Å=10 m . Ilustração 51: Representação de um potencial celular. Outras informações relevantes neste momento é que a carga elétrica de um íon monovalente, como os existentes dentro e fora da célula, é q=1,6×10−19 C . 4.4 – Origem do potencial de repouso A célula animal, que será o foco de nossos estudos, pode ser entendida como um capacitor elétrico pois acumula carga elétrica através de uma distribuição específica de cargas elétricas. Para uma compreensão melhor do que vem a ser um capacitor sugiro a leitura do livro de Okuno (Okuno, 1982) que explica de uma forma mais aplicada à Biologia e a leitura do livro de Halliday (Hallyday, 2008) que apresenta uma descrição mais geral e Física do funcionamento do capacitor. De maneira geral podemos entender que o comportamento da célula se assemelha com um 64/98 capacitor por existir um acúmulo de cargas elétricas diferentes em partes específicas da célula. No geral a célula é neutra, tanto o interior da célula como o meio extracelular estão cheios de uma solução salina. Em soluções salinas muito diluídas, a maior para das moléculas se decompõem em íons. Esses íons movem-se livremente numa solução aquosa. Os fluídos dentro e fora da célula são sempre neutros, isto é, a concentração de ânions em qualquer local é sempre igual à de cátions, não podendo haver um acúmulo local de cargas elétricas nesses fluidos. Pode-se imaginar a membrana celular como um capacitor no qual duas soluções condutoras estão separadas por uma delgada camada isolante, a membrana citoplasmática. A figura da Ilustração 52 mostra um capacitor com cargas Q e −Q . Ilustração 52: Figura esquemática de um capacitor. As cargas elétricas em excesso, Q e −Q , que provocam a formação do potencial de repouso se localizam em torno da membrana celular. Esse potencial se origina também na membrana celular: a superfície interna da membrana é coberta pelo excesso de ânions ( −Q ), enquanto que, na superfície externa, há o mesmo excesso de cátions ( Q ). Por razões que ficarão mais claras no futuro, na célula animal a distribuição superficial de cargas elétricas no exterior da célula é positiva e no interior é negativa. Note que, no livro de Okuno não há a explicação da causa desta formação preferencial de cargas. A autor usa boa parte do texto discutindo as dimensões das células que são facilmente observadas pela experiência (pelo uso de microscópios) e das constantes elétricas universais como a permissividade elétrica e susceptibilidade magnética (termos que ficarão mais claros no futuro), a associação destes conceitos permite a obtenção do valor do potencial elétrico de repouso da célula com grande aproximação do que é observado experimentalmente através de experiências como a esquematizada na Ilustração 50. A explicação do porquê desta distribuição é uma tarefa para a teoria do equilíbrio celular que será discutida mais a frente quando falarmos sobre as diferentes concentrações iônicas dentro e fora da célula. 4.5 - Concentrações iônica dentro e fora da célula Vamos neste momento nos focalizar as diferenças de concentrações iônicas nos fluídos dentro e fora das células. Na parte interna a concentração de íons K + é bem maior que na parte externa. O oposto ocorre com os íons Cl- e Na+. A maior parte dos ânions intracelulares não são íons de Cl-, mas grandes ânions protéicos designados aqui por A-. Devido à mobilidade dos íons, o fluído permanece neutro. A tabela mostra as concentrações iônicas no exterior C(1) e interior C(2) de uma célula muscular de rã. Tabela 1 – Concentrações iônicas no exterior e interior de uma célula muscular de rã. Íon Concentração C(1) fora da Concentração C(2) no interior célula (10-3 mol/l) da célula (10-3 mol/l) 65/98 K+ 2,25 124 Na+ 109 10,4 Ca++ 2,1 4,9 Mg++ 1,25 14 - Cl 77,5 1,5 HCO3 26,6 12,4 Íons orgânicos 13 74 Para este tipo de célula, a concentração de potássio é 55 vezes maior dentro, enquanto que a C K 2 C Cl 1 ≃ concentração de cloro é quase 53 vezes maior no meio extracelular. Assim, . C K 1 C Cl 2 A concentração de sódio é quase 11 vezes maior do lado de fora da célula. No livro de Okuno, a autora gasta um certo tempo discorrendo sobre a diferença entre a quantidade de íons na superfície interna da membrana e o número de íons dentro da meio intracelular. Para este cálculo ela leva em conta a densidade superficial de carga elétrica obtida a partir da modelagem da membrana celular como sendo um capacitor de placas paralelas. A autora chega em uma razão entre o número de íons de Potássio no interior da célula N K e quantidade de íons de Potássio na N superfície da célula muito pequeno o que se repete para praticamente todas as células, ou NK seja, uma pequena quantidade dos íons no interior da célula encontram-se na membrana celular, no entanto, esta pequena quantidade é a responsável pelo potencial de repouso. 4.6 - Corrente elétrica Existem dois campos de estudos na eletricidade, um relacionado as cargas elétricas estáticas (a eletrostática), que são muito raras na natureza, mas são de grande valor para a compreensão de sistemas em equilíbrio (o tratamento do capacitor é uma situação uma aplicação da eletrostática) e para fins didáticos. O outro campo de estudos é o das cargas em movimento, a chamada eletrodinâmica. Um dos primeiros e mais fundamentais conceitos na eletrodinâmica é o conceito de corrente elétrica. Pode-se definir corrente elétrica como um fluxo de cargas elétricas. Para que seja mantida uma corrente elétrica num certo meio condutor é necessário que haja uma diferença de potencial, isto é, um campo elétrico neste meio. Num condutor ou numa solução eletrolítica, define-se a intensidade média de corrente elétrica i, através de uma área A, como sendo Q i= (4.10) t onde Q é a carga elétrica total que atravessa a área A durante o intervalo de tempo t . Se a Q dQ = corrente variar com o tempo, usas-se a definição diferencial i=lim t 0 . t dt 1C A unidade de corrente elétrica é o ampère (A) que é definido como 1 A= . 1s Se houver uma diferença de potencial V entre dois pontos de um condutor, haverá nele uma corrente elétrica i. Define-se resistência elétrica R como a razão 66/98 R= − V (4.11) i Ilustração 53: Figura ilustrando a corrente elétrica atravessando um condutor elétrico. A corrente i será positiva se cargas elétricas positivas se deslocarem no sentido das linhas de (ou cargas negativas no sentido contrário); nesse caso a diferença de forças do campo elétrico E potencial V será negativa. Assim, pela definição pode-se concluir que R>0. A unidade de resistência elétrica é ohm ( ). Quando R é constante, a corrente elétrica é proporcional à diferença de potencial. Nesse caso a equação (4.11) equivale a lei de Ohm. Em cada instante, pode-se definir a densidade de corrente elétrica por unidade de área como: i j= (4.11) A A unidade de densidade de corrente elétrica é A/ m 2 . A corrente elétrica num metal de deve ao deslocamento de elétrons e numa solução eletrolítica ao deslocamento dos íons. Além do movimento de agitação térmica, essas partículas possuem um movimento devido ao campo elétrico E que produz a corrente elétrica. Esse E movimento ordenado de cargas elétricas j é a intensidade do campo elétrico E é 1 j E = E (4.12) onde é a resistividade elétrica do meio considerado. Sua unidade é . m . Por exemplo, o líquido (axoplasma) no interior do axônio de uma célula nervosa de uma lula é um líquido condutor com resistividade elétrica ≈0,6 . m . Numa solução eletrolítica, a resistividade elétrica i é diferente para cada íon i. Pode-se verificar experimentalmente que i é inversamente proporcional ao quadrado da carga elétrica q i e à concentração C i (número de íons por unidade de volume) desse íon, ou seja, 1 =i q2i C i (4.13) i A constante i é denominada constante de mobilidade. A partir das equações (4.12) e (4.13) pode-se escrever E 2 j i =i q i C i E (4.14) 4.7 - Difusão Até o presente, todo o tratamento feito com relação a eletrodinâmica das soluções 67/98 eletrolítica foi realizado pensando-se em soluções iônicas homogêneas. Entretanto, raramente ocorrem concentrações iônicas são homogêneas na natureza em nível celular. Quanto não há uniformidade ocorre o fenômeno da difusão que é uma resposta termodinâmica do sistema na procura da homogeneidade da solução. O processo de difusão, numa solução a uma temperatura T (em K), está relacionado ao movimento de agitação térmica dos íons. Os íons colidem frequentemente com as moléculas do solvente, dando origem a um movimento aleatório sem nenhuma direção preferencial. A distribuição de um grande número de íons caracteriza-se por sua concentração C i , corresponde ao número de íons por unidade de volume (as concentrações são expressas, geralmente, em mol/l). Se essa concentração C i , não for uniforme, a agitação térmica dos íons fará a concentração se uniformizar. Isso corresponde a um fluxo de cargas elétricas, ou seja, a uma densidade de corrente elétrica. C i Se, para os íons i , o gradiente de concentração iônica for uniforme na direção x, x haverá uma densidade de corrente elétrica J Di , devida à difusão, proporcional a esse gradiente Ci (4.15) J Di =−qi Di x onde Di é a constante de difusão para os íons i. O sinal (-) indica que a densidade de corrente elétrica J i é no sentido da diminuição da concentração C i , . A equação (4.15) é conhecida como a lei de Fick e também é pensada no caso de indivíduos em processos migratórios em Biologia de populações. Se a concentração C i , não variar uniformemente em x a equação (4.15) será substituída pela equação dada por: lim x 0 C i d Ci (4.16) J i=−q i D i =−qi Di x dx A constante de mobilidade i , que aparece nas equações (4.13) e (4.14), e a constante de Difusão Di estão relacionadas por D i= i (4.17) kT −23 onde k =1,38×10 J / K é a constante de Boltzamnn. Essa relação expressa a influência da temperatura T da solução na difusão iônica. Assim, a densidade J Di devida a difusão iônica pode ser escrita como dC i (4.18) J Di =−qi i k T dx Para uma melhor compreensão da difusão de íons em soluções eletrolíticas existe a equação de Nernst-Planck e o potencial de Donnan que não gastaremos tanto tempo na matematização, mas direi em linhas gerais quais são os seus papeis para a melhor compreensão da dinâmica dos fluídos. Em linhas gerais a equação de Nernst-Planck expressa a densidade de corrente elétrica de um determinado íon com a variação espacial da concentração e do potencial de elétrico em uma dada região do espaço. Assim, em sua forma mais simples, a equação de Nernst-Planck é uma equação diferencial no espaço que relaciona duas grandezas distintas, a concentração de um dado íon e o potencial elétrico. Como nossos conhecimentos de equações diferenciais é limitado, nos limitaremos a entende-la nestes moldes. Para uma compreensão superficial expresso a equação de Nernst-Planck que é dada por: dC i dV (4.19) J i=q i i kT qi C i dx dx Um fato experimental que notamos na célula: há diferença de concentrações dos diversos íons na célula. Basta olhar a tabela 1 para verificar que a concentração de íons dentro e fora da 68/98 célula são muito diferentes para certos íons. Cada íon possui sua carga elétrica, seu tamanho (que pode ser expresso pelo seu raio hidrodinâmico ou seu diâmetro atômico), no entanto, íons com a mesma carga elétrica pode possuir diferentes concentrações. Podemos tentar explicar esta diferença, esta aparente permeabilidade seletiva, através de algum mecanismo. O equilíbrio de Donnan é uma explicação para a ocorrência de uma distribuição de íons desigual, gerando um gradiente elétrico, em função da presença de outro íon que a membrana é impermeável. Existem canais iônicos específicos em cada célula para a transmissão de íons característicos, estes canais iônicos são os caminhos físicos que permitem a caracterização do movimento de carga. Para a construção do equilíbrio de Donnan se considera que a equação de Nernst-Planck é nula, ou seja, há um balanço (equilíbrio) entre a variação da concentração e a variação espacial do potencial elétrico. Esta imposição leva a uma relação que explica para cada medida de potencial entre dois pontos na célula as variações de concentração de um dado íon. Note que na construção do equilíbrio de Donnan existe a suposição de um situação estática no espaço que não explica completamente a dinâmica do íons, pois a mesma não é estática no tempo. Para explicar estes fenômenos existe um outro mecanismo para a descrição da dinâmica do transporte de íons. 4.8 - A bomba de sódio e potássio. O que vimos até o momento foi um transporte de íons através de mecanismos termodinâmicos (difusão) e elétricos (potenciais elétricos em virtude das cargas elétricas). Mas, por si só estes mecanismos não são capazes de explicar todas as diferenças de concentração de íons. Este tipo de transporte descrito até o momento é chamado de transporte passivo pois o mesmo não consome energia. Isto quer dizer: usar energia de outra forma sendo transformada para gerar o transporte. Existe um mecanismos denominado de bomba de sódio e potássio que é o principal mecanismo de transporte ativo na célula animal. O transporte ativo caracteriza-se por ser o movimento de substâncias e íons contra o gradiente de concentração, ou seja, ocorre sempre de locais onde estão menos concentradas para os locais onde encontram-se mais concentradas. Esse processo é possível graças à presença de certas proteínas na membrana plasmática que, com o gasto de energia, são capazes de se combinar com a substância ou íon e transportá-lo para a região em que está mais concentrado. Para que isso ocorra, a proteína sofre uma mudança em sua forma para receber a substância ou o íon. A energia necessária a esta mudança é proveniente da quebra da molécula de ATP (adenosina trifosfato) em ADP (adenosina difosfato) e fosfato, que discutimos em aulas anteriores. A concentração do sódio é maior no meio extracelular enquanto a de potássio é maior no meio intercelular. A manutenção dessas concentrações é realizada pelas proteínas transportadoras descritas formadoras da bomba que capturam íons sódio (Na+) no citoplasma e bombeia-os para fora da célula. No meio extracelular, capturam os íons potássio (K +) e os bombeiam para o meio interno. Se não houvesse um transporte ativo eficiente, a concentração destes íons iria se igualar. Desse modo, a bomba de sódio e potássio é importante uma vez que estabelece a diferença de carga elétrica entre os dois lados da membrana que é fundamental para as células musculares e nervosas e promove a facilitação da penetração de aminoácidos e açúcares. Além disso, a manutenção de alta concentração de potássio dentro da célula é importante para síntese de proteína e respiração e o bombeamento de sódio para o meio extracelular permite a manutenção do 69/98 equilíbrio osmótico. Com isto explicamos praticamente a maioria dos mecanismos que são úteis na explicação dos potenciais elétricos de repouso na célula e das diferenças de concentração na célula. Agora, um dos mais importantes mecanismos na dinâmica celular é a variação deste potencial de repouso (ou potencial de membrana) da célula. Pois esta variação caracteriza a chamada transmissão de pulso elétrico que é tão importante nas células musculares e nervosas. Este é o chamado potencial de ação. 4.9 - O Potencial de Ação O valor numérico do potencial de ação na maioria das células animais é da ordem de V0=90 mV, no entanto, há para certas situações, variações da magnitude deste potencial V e esta variação se propaga pelo espaço da extensão da célula, matematicamente podemos representar isto por: V =V 0 V (4.20) Na figura da ilustração 54A temos uma representação do potencial de ação que é feita meramente por razões didáticas. Nesta situação o potencial de repouso tem o valor de -70 mV (o sinal negativo é apenas para indicar que dentro da célula há cargas negativas), este valor pode variar até um valor de -55 mV que é conhecido como limiar (isto quer dizer que uma perturbação abaixo do limiar não causa a transmissão do impulso elétrico), flutuações nestes valores denominamos de fase de repouso. Ilustração 54: Representação do potencial de ação. 70/98 Quando o potencial de ação começa a atuar temos a fase ascendente, caracterizada pela despolarização da célula (explicarei melhor a seguir), nesta fase o potencial da célula torna-se positivo, indicando uma inversão da distribuição de cargas dentro da célula. Quando o potencial se torna positivo temos o chamado “overshoot” que irá aumentar a sua magnitude até o valor pico (neste caso +40 mV), após o pico o potencial medido da célula começa a cair na fase conhecida como repolarização e assim a célula volta a sua configuração anterior de negativo no interior da célula e positivo no exterior, no entanto, o retorno é muito intenso superando mesmo o potencial de repouso esta fase é conhecida como hiperpolarização, depois o potencial da célula retorna ao repouso. Tudo que foi discutido no parágrafo anterior é uma idealização do que mediríamos durante um intervalo de 5 ms em um ponto de uma célula. Estas medidas podem ser realizadas em células específicas e as medidas são muito mais “sujas” como mostra a figura da ilustração 54B. Este pulso transmitido ao longo da extensão da célula é conhecido como impulso elétrico e células específica transmitem impulsos específicos. Assim, a dor que você sente na ponta do dedo ao sofrer uma martelada é sentida por que a alteração causada nas células do dedo são transmitidas através das células nervosas do seu braço até seu cérebro. Na figura da ilustração 55 mostra quais são os mecanismos para que ocorram estas variações de potencial da célula. Que são basicamente mudanças nos canais iônicos da célula. Ilustração 55: Ilustração do potencial de ação com a indicação de cada etapa no nível celular. Podemos ilustrar o comportamento dos canais iônicos para cada uma das etapas discutidas anteriormente e para facilitar a compreensão iremos adicionar às explicações ilustrações de uma célula nervosa que é a melhor célula que transmite impulsos elétricos (também chamados de impulsos nervoso) por causa de sua forma apropriada. A figura da ilustração 56 mostra a constituição de um neurônio. Neste tipo de célula o impulso é transmitido em apenas um sentido. 71/98 Ilustração 56: Estrutura esquemática de um neurônio. Vamos começar a explicar o potencial de ação dentro da representação dos canais iônicos e começando pela despolarização. A membrana celular possui vários canais iônicos, que são estruturas de proteínas que permitem a passagem de íons de sódio e potássio. Esses canais ficam normalmente fechadas em um neurônio em repouso, abrindo-se quando ele é estimulado. Quando um estímulo apropriado atinge o neurônio, os canais de sódio abrem-se imediatamente na área da membrana que foi estimulada: o íon sódio, por estar em maior concentração no meio celular externo, penetra rapidamente através dessas aberturas na membrana. O brusco influxo de cargas positivas faz com que potencial da membrana, que era da ordem de -70mV (potencial de repouso), passe a aproximadamente +35mV ou mais dependendo da célula. Essa transição abrupta de potencial elétrico que ocorre durante a despolarização, e cuja a amplitude é da ordem de 105 mV (de -70mV a +35 MV), é o potencial de ação propriamente dito. Na área afetada pelo estímulo, a membrana permanece despolarizada, apenas por um intervalo curto de tempo (da ordem de 1,5 ms). Logo os canais de potássio se abrem, permitindo a saída desse íon, que está em maior concentração no interior da célula. Com isso, ocorre a repolarização da membrana, que retorna a condição de repouso. No entanto, o afluxo de íons potássio é muito intenso e acabam por causar a hiperpolarização. Cada célula possui um valor de potencial de ação específico. As experiências que estudam o potencial de ação na maioria das vezes são feitos em moluscos que O potencial de ação que se estabelece na área da membrana estimulada perturba a área vizinha, levando à sua despolarização. O estímulo provoca, assim, uma onda de despolarizações e repolarizações que se propaga ao longo da membrana plasmática do neurônio. Essa onda de propagação é o impulso nervoso. 72/98 Ilustração 57: Representação de um neurônio e do deslocamento de um potencial de ação no mesmo, o chamado impulso nervoso. Como falei anteriormente o impulso nervoso se propaga em apenas um sentido na fibra nervosa. Assim, dendrito sempre conduzem o impulso em direção do corpo celular. O axônio por sua vez, conduz impulso em direção as extremidades, isto é para longe do corpo celular. Existe toda um matemática relacionada à descrição da propagação dos impulsos elétricos, a chamada redes neurais que são uma importante ferramenta para simular o pensamento humano. No entanto, uma discussão mais profunda deste desafio que é estabelecer como biologicamente surge a consciência está totalmente fora dos objetivos destas notas de aula. 4.10 - Exercícios 1-) Um câtion bivalente está em uma região do espaço onde atua um campo elétrico dado por 9 E=3,9×10 N /C i , ele sai de um meio intercelular e se difunde para dentro de uma célula cuja a membrana citoplasmática mede 60 Å . a-) Qual o trabalho realizado para o cátion transpor a membrana? b-) Qual a variação de energia potencial elétrica neste processo? c-) Se o potencial do lado de fora da célula é nulo, qual a diferença de potencial elétrico do exterior para o interior da célula? 2-) Qual o valor do campo elétrico dentro e fora da célula? Explique sua resposta. 3-) Qual a carga no interior da célula? Explique sua resposta. 73/98 4-) O potencial elétrico no interior de uma célula é da ordem de -70mV no lado de fora o potencial elétrico é nulo, a espessura da membrana é de 70 Å . a-) Qual o módulo e o sentido do campo elétrico? b-) Em 1 ms uma quantidade de 106 íons de Na+ entram dentro da célula, qual seria a resistência elétrica equivalente nesta região? 5-) Na mesma situação do exercício anterior uma quantidade de 106 íons de Na+ entram através de uma região de 6×10−10 m2 em um intervalo de 1 ms. Calcule a densidade de corrente elétrica nesta região? 6-) Mostre que, para os íons K+ Cl- , razão entre suas concentrações extracelular e no interior da qV C 1 célula é =e KT . Por que essa razão não é verificada exatamente? C 2 0 7-) Explique a diferença entre potencial de ação e potencial de membrana. 8-) Explique o funcionamento dos canais de sódio e potássio e da bomba de sódio e potássio. 9-) Explique detalhadamente os processos de polarização, despolarização e repolarização da célula. 10) O diagrama do potencial de ação no nervo é ilustrado abaixo. – Em qual dos pontos marcados no potencial de ação o K + está mais próximo do equilíbrio eletroquímico? a–1 b–2 c–3 d–4 e–5 Explique sua resposta. Respostas: 1-) a-) W =7,5×10−18 J , b-) U =−7,5×10−18 J , c-) V =23,4 V . 2-) É nulo, pois não há variação do potencial elétrico. 3-) No estado estacionário no interior da célula a carga é negativa. 7 4-) a-) O valor é ∣E∣=1,0×10 N /C o sentido é de fora para dentro. b-) R=4,4×108 . 5-) J =0,27 A/ m 2 . 6-) 10-) a-). 74/98 Referências OKUNO, E; CALDAS, I L; CHOW, E Física para Ciências Biológicas e Biomédicas, Ed. Harbra, São Paulo, 1982 75/98 Conteúdo 5 Física das Radiações e suas aplicações em Ciências da Vida 5.1– Conceitos básicos sobre radiação Como discutimos em sala de aula a radiação é um tipo de propagação de energia que não deve ser confundida com a irradiação que é um conceito aprendido no Ensino Médio que trata uma forma específica de transmissão de energia que é a energia térmica. Radiação pode ser entendida como a propagação de energia sob várias formas, sendo dividida geralmente em dois grupos: radiação corpuscular e eletromagnética. 5.1.1 – Radiação corpuscular É a transmissão da energia de partículas pelo processo de colisão de um grupo de partículas por meio de um feixe. Estas partículas podem ser elementares (elétrons, mésons, dêuterons, alfa) ou mesmo núcleos atômicos. Não discutiremos mais a fundo os principais processos de produção de radiação de radiação por efeito fotoelétrico, produção de pares e espalhamento Compton. Estes temas ficarão para a disciplina que tratam de Física de partículas e Física Moderna. Como você já sabe, a energia cinética K de uma partícula de massa m com velocidade v , sendo v ≪c é dada por 1 K = m v 2 (5.1) 2 5.1.2 – Radiação eletromagnética Ondas eletromagnéticas são constituídas de campos elétricos e magnéticos oscilanete e se propagam com velocidade constante c no vácuo, sendo c a velocidade da luz c=3×108 m/s. Ondas de rádio, ondas luminosas (luz), raios infravermelhos, raios ultravioleta, raios X e raios gama são exemplos de de radiação eletromagnética. As grandezas usadas para a caracterização de uma onda eletromagnética são o comprimento de onda e a frequência f . A relação entre estas grandezas e a velocidade da onda eletromagnética é c= f (5.2) Pois, em geral, a onda eletromagnética se propaga com a velocidade da luz, as unidades de medida que podem representar o comprimento de onda são submúltiplos do metro, abaixo alguns exemplos: 1 angstrom = 1 Å = 10−10 m . 1 nanometro = 1 nm = 10−9 m . 1 micrometro = 1 m = 10−6 m Como você já deve ter aprendido em ondulatória a energia associada à onda mecânica é 76/98 relacionada a amplitude de oscilação da onda, sua frequência e se comprimento de onda, no caso da onda eletromagnética este processo é mais complexo. Segundo a teoria quântica a radiação eletromagnética é emitida e se propaga descontinuamento, em pequenos pulsos de energia, chamados pacotes de energia, quanta ou fótons. Assim, a onda eletromagnética apresenta também um caráter corpuscular. Fótons são partículas sem carga elétrica e massa de repouso nula. A energia de um fóton está associada a sua frequência e é dada por E=h f (5.3) Na expressão (5.3) h é a chamada constante de Plack e possui o valor de 6,63×10−34 J.s . É fácil obter a energia em função do comprimento de onda de onde teremos hc E= (5.4) Da mesma maneira que a onda eletromagnética pode se comportar como uma partícula, poderíamos imaginar que a matéria poderia se comportar como uma onda, é a chamada dualidade onda-partícula. Louis de Broglie apresentou a proposição de que o momento linear p de uma partícula pode estar associado à um comprimento de onda de uma onda pela relação: h p=mv= (5.5) Normalmente as unidades de medida de energia de partículas subatômicas é o elétron-volt ( eV ) que pode ser associado à energia medida em sistemas macroscópicos, o joule J , pela seguinte relação: 1 eV =1,6×10−19 C 1 V =1, 6×10−19 J Podemos definir o elétron-volt como a energia adquirida por um elétron ao atravessar, no vácuo, uma diferença de potencial igual a 1 volt. Assim como qualquer outra grandeza em Física existem os múltiplos do elétron-volt que são o kilo elétron-volt (keV) correspondente a mil elétronvolt, o mega elétron-volt (MeV) correspondente a um milhão de elétron-volt. 5.2– Tipos de radiação e suas características As radiações de ambos os tipos,corpusculares e eletromagnéticas, quando possuem energia suficiente, atravessam a matéria, ionizando (removendo elétrons de ) átomos e moléculas, e assim modificando-lhes o comportamento químico. Essa ação destrutiva sobre as células pode ser utilizada no tratamento de tumores. Embora essas radiações produzam efeitos gerais semelhantes nos seres vivos, cada uma delas possui características próprias. 5.2.1 – Radiação alfa As partículas alfa são núcleos de hélio, constituídas de dois prótons e dois nêutrons. Uma partícula alfa é muito mais pesada do que um elétron. Na interação de uma partícula alfa com átomos de ar, a partícula alfa perde, em média, 33 eV por ionização. Então, por exemplo, uma partícula alfa com energia cinética inicial de 4,8 MeV, emitida pelo rádio-226, produz cerca de 145.000 ionizações antes de parar. A distância que a partícula percorre antes de parar é denominada de alcance. O alcance é diretamente proporcional à energia da partícula e inversamente proporcional a densidade do meio. A partícula alfa em virtude de suas dimensões e massa é pouco penetrante As partículas alfa são produzidas principalmente pelo decaimento (que veremos mais a 77/98 frente o que significa) de elementos pesados como urânio, tório, plutônio e rádio. Usualmente a radiação alfa é acompanhada de radiação beta e gama. 5.2.2 – Radiação beta Partículas beta são elétrons ou pósitrons (partícula de mesma massa do elétron mas de carga positiva) que são muito mais penetrantes. 5.2.3 – Nêutrons Os nêutrons são partículas sem carga elétrica e não produzem ionização diretamente, mas o fazem indiretamente, transferindo energia para outras partículas carregadas que por sua vez, podem produzir ionização. Os nêutrons percorrem grandes distâncias através da matéria, antes de interagir com o núcleo dos átomos que compõem o meio. São muito penetrantes, e podem ser blindados por materiais ricos em hidrogênio, como, por exemplo, parafina ou água. Desenho 1: Representação comparativa do alcance e penetração de alguns tipos de radiação. 5.2.4 – Radiação gama Os raios gama são ondas eletromagnéticas extremamente penetrantes. Eles interagem com a matéria pelo efeito fotoelétrico, pelo efeito Compton ou pela produção de pares, nesses efeitos são emitidos elétrons ou pares elétron-pósitron que, por sua vez ionizam a matéria. Um fóton de radiação gama pode perder toda ou quase toda a energia numa única interação, e a distância que ele percorre antes de interagir não pode ser prevista. Tudo que se pode prever é a 78/98 distância em que ele tem 50% de chance de interagir. Esta distância se chamada camada semiredutora. Tabela 1 – Camada semi-redutora no tecido humano e no chumbo para os raios X ou gama Energia (MeV) Camada semi-redutora (cm) Raios X ou gama Tecido humano Chumbo 0,01 0,13 4,5×10−4 0,1 4,15 1,1×10−2 1,0 9,91 0,86 5,0 23,1 1,44 5.2.5 – Raios X Os raios X são também ondas eletromagnéticas, exatamente como os raios gama, diferindo apenas quanto à origem, pois os raios fama se originam dentro do núcleo atômico, enquanto que os raios X têm origem fora do núcleo, na desexcitação dos elétrons. Os raios X como falamos anteriormente são produzidos primordialmente dentro dos chamados tubos de raios catódicos com algumas características específicas. Existe a chamada radiação de freamento (Bremsstrahlung) e a radiação característica do material. A radiação de Bremsstrahlung é a radiação produzida quando cargas elétricas sofrem aceleração. Ilustração 58: Figura ilustrativa do mecanismo de obtenção de raio -X por Bremsstralung. Quando partículas carregadas, principalmente elétrons, interagem com o campo elétrico de núcleos de número atômico elevado ou com a eletrosfera, elas reduzem a energia cinética, mudam de direção e emitem a diferença de energia sob a forma de ondas eletromagnéticas esta é a origem 79/98 da chamada radiação de freamento ou Bremsstrahlung. A energia dos raios X de freamento depende fundamentalmente da energia da partícula incidente. Os raios X gerados para uso médico e industrial não passam dos 500 keV, embora possam ser obtidos em laboratório raios X até com centenas de MeV. Como o processo depende da energia e da intensidade de interação da partícula incidente com o núcleo e de seu ângulo de "saída", a energia da radiação produzida pode variar de zero a um valor máximo, sendo contínuo seu espectro em energia. Ilustração 59: Representação da radiação emitida pelo elétron retroespalhado. Na produção de raios X de freamento são produzidos também raios X característicos referentes ao material com o qual a radiação está interagindo. Esses raios X característicos somamse ao espectro de raios X de freamento e aparecem com picos destacados nesse espectro. Quando ocorre a captura eletrônica ou outro processo que retire elétrons da eletrosfera do átomo, a vacância originada pelo elétron é imediatamente preenchida por algum elétron de orbitais superiores. Ao passar de um estado menos ligado para outro mais ligado (por estar mais interno na estrutura eletrônica),o excesso de energia do elétron é liberado por meio de uma radiação eletromagnética, cuja energia é igual à diferença de energia entre o estado inicial e o final. Vai ocorrer instabilidade do átomo do ânodo, com "saltos" quânticos e libertação de radiação electromagnética característica do respectivo material, até que o estado energético do átomo seja mínimo. A denominação "característico" se deve ao fato dos fótons emitidos, por transição, serem monoenergéticos e revelarem detalhes da estrutura eletrônica do elemento químico e, assim, sua energia e intensidade relativa permitem a identificação do elemento de origem. A produção de Rx só ocorre por materiais de número atómico elevado (como o caso do tungsténio). Os raios X característicos são portanto dependentes dos níveis de energia da eletrosfera e, dessa forma, seu espectro de distribuição em energia é discreto. Como a emissão de raios X característicos é um fenômeno que ocorre com energia da ordem da energia de ligação dos diversos níveis da eletrosfera, as energias de emissão dos raios X característicos variam de alguns eV a dezenas de keV. Agora, baseados no modelo de Bohr podemos entender como são gerados os raios X característicos, e por quê o espectro obtido com o tungstênio apresenta apenas linhas discretas. Quando o elétron proveniente do catodo incide no anodo, ele pode expulsar um elétron orbital. A órbita de onde o elétron será expulso, depende da energia do elétron incidente e dos níveis de energia do átomo do anodo. A lacuna deixada por este elétron será preenchida por um elétron mais externo. Neste processo, a radiação X será emitida, com frequência dada pela equação: 80/98 Ilustração 60: Espectro de emissão de radiação X. E f − Ei f= h (5.6) A equação (5.6) apesar de ser muito simples do ponto de vista matemático apresenta uma grande conceituação física. Pois a mesma leva em conta como que a radiação eletromagnética transfere energia em pacotes bem definidos, os chamados quantas. (b) (a) Tabela 4: Figura ilustrativas. a- Aparelho de raio-X médico. b- Ilustração de um eletrodo emissor de raios-x. 81/98 5.3 – Proteção Radiológica Para compreender um pouco mais sobre como a radiação atua sobre o ser humano é necessário definirmos algumas grandezas para medir o efeito da radiação nos seres vivos. Cada país determina as regras para o uso da radioativo, no Brasil temos a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). Existe um documento denominado “Normas Básicas de Proteção Radiológica” que rege o uso da radiação no País. Internacionalmente temos a “International Commission on Radiological Protection” (ICRP) e a “International Commission on Radiation Units and Measurements” (ICRU) que definem grandezas de medida da radiação. 5.3.1 – Unidades de Radiação Existem três grandezas física para medir radiação 5.3.1.1 - Exposição Os raios X ou gama, ao interagir com os átomos de um meio, produzem elétrons ou pares elétron-pósitron. A exposição X é uma grandeza física definida como a razão entre a soma das cargas ( Q ) de todos os íons de um mesmo sinal, produzidos no ar, quando todos os elétrons e pósitrons liberados pelos fótons da radiação X ou gama são freados e a massa de ar ( m ) encerrada em um volume. Q X= (5.7) m −4 A unidade de exposição é o roentgen R expressa por 1 R = 2,58×10 C kg 5.3.1.2 – Dose absorvida (D) A exposição é definida para medir o número de ionizações no ar, define uma boa medida de radiação no ambiente, mas precisamos de outra medida para verificar o efeito da radiação no tecido biológico. Assim, definimos outra grandeza que calcula a razão da energia depositada pela radiação e a massa de tecido biológico exposta a esta radiação. Esta é a chamada dose absorvida (D) definida matematicamente como: E (5.8) m A princípio a unidade de dose absorvida era o rad (radiation absorbed dose), definido como 1 rad= 10−2 J/kg. Por razões de definição nos anos 70 foi definida uma nova unidade denominada de gray (Gy) definida como 1 Gy =1 J/kg. D= 5.3.1.2 – Dose equivalente (H) Uma dada dose equivalente aplicada a diferentes tipos de tecidos biológicos podem ter diferentes efeitos. Por esta razão foi definida uma nova grandeza para medir o efeito da radiação, o nome desta grandeza é a dose equivalente(H), definida como: H =D Q N (5.9) 82/98 onde D- dose equivalente, Q – fator de qualidade, N- fator de ambiente. Note que Q e N não são funções ou medidas, mas parâmetros da localização do tecido e das condições ambientais onde é feita a exposição. Os parâmetros Q e N não possuem dimensão, mas para diferenciar uma medida de dose absorvida e dose equivalente, a unidade de dose equivalente é o sievert (Sv), com 1 Sv= 1 Gy 5.3.2 – Limites permissíveis Agora que já conhecemos as medidas de dose absorvida e dose equivalente podemos pensar sobre os limites permissíveis. Estes limites são determinados a partir das necessidades e atividades de um grupo de pessoas. A ICRP define os seguintes limites: • Trabalhadores em radiação 50 mSv/ano • Público em geral 5 mSv/ano Estes limites foram determinados a partir da medida do número de ocorrência de danos em indivíduos dentro de uma população amostral. Seria interessante discutirmos que os efeitos da radiação não são totalmente diretos, existem os chamados efeitos estocásticos, determinísticos e somáticos. Os efeitos estocástico são aqueles em que a probabilidade de ocorrência de um dado dano é proporcional à dose de radiação recebida, não existe um limiar para estes efeitos. Doses pequenas abaixo dos limites podem induzir tais efeitos. O mais conhecido é o câncer. Os efeitos determinísticos são causados por irradiação total ou localizada de um tecido, causando um grau de morte celular não compensado pela reposição ou reparo, com prejuízos detectáveis no funcionamento do tecido ou órgão. Existe um limiar de dose, abaixo do qual a perda de células é insuficiente para prejudicar o tecido ou órgão de um modo detectável. Os efeito somáticos como o próprio nome diz é uma somatória de vários fatores, como dose nível de dose recebida, frequência da dose e pré disposição do organismo que recebeu a dose. Estes efeitos são os mais difíceis de serem mensurados. Todo os limites estabelecidos pelos órgãos oficiais são limites preventivos e estatísticos, nosso comportamento diante do uso de fontes radioativas devem levar sempre em conta todas estas variáveis. 5.4 – Desintegração Nuclear A teoria mais simples para tentar explicar a constituição do núcleo atômico temos o modelo onde o núcleo é composto por partículas denominadas de prótons e nêutrons. Sendo que os prótons possuem carga elétrica positiva e os nêutrons não possuem carga elétrica. Cada elemento químico tem um número específico de prótons no núcleo; por exemplo: o carbono tem 6 prótons, o nitrogênio 7 prótons e o oxigênio 8 prótons. Entretanto, o número de nêutrons dentro do núcelo pode variar para cada elemento. Os núcleos de um dado elemento com número diferente de nêutrons, mas o mesmo número de prótons são chamados de isótopos do elemento. Estes podem ser estáveis ou instáveis. Normalmente os átomos com o mesmo número de prótons e nêutrons são estáveis, podemos fazer um gráfico de número de prótons versus o número de nêutrons e indicar quais seriam os átomos estáveis, a figura da ilustração 61 mostra a chamada ilha de estabilidade dos átomos, como os átomos radioativos são em sua maioria átomos com grande número atômico este gráfico mostra somente a região mais pesada da ilha. 83/98 Ilustração 61: Uma representação da ilha de estabilidade dos átomos mais pesados. Os núcleos dos isótopos instáveis estão em níveis energéticos excitados e eventualmente podem dar origem à emissão espontânea de uma “partícula” do núcleo, passando, então de um núcleo (pai) para outro (filho) em nível energético menos excitado ou fundamental. Essa “partícula” pode ser alfa, elétron, pósitron ou fóton da radiação gama. A esse fenômeno dá-se o nome de desintegração ou decaimento nucelar, ou desintegração ou decaimento radioativo. Os isótopos instáveis são portanto radioativos e também conhecidos por radioisótopos. Os isótopos estáveis não sofrem desintegração radioativa e portanto não são radioativos. O carbono por exemplo tem dois isótopos estáveis ( 126C e 136C ) e diversos radioisótopos ( 116C , 146C , 156C e etc). O índice superior indica a soma do número de prótons e nêutrons no núcleo, o chamado número de massa (A). O índice inferior, muitas vezes omitido (inclusive quando nos referimos ao isotopo só falamos o número de massa, por exemplo: “carbono 14”, “Estrôncio 87” e assim por diante), representa o número de prótons no núcleo e é chamado de número atômico (Z). Os elementos com número atômico de 1 (hidrogênio) a 92 (urânio) são encontrados na natureza, enquanto aqueles com Z entre 93 a 113 são produzidos artificialmente. Todos os elementos com Z superior a 82 (chumbo) são, entretanto, radioativos e se desintegram, passando de um núcleo para a outro,através da série principal da ilha de estabilidade, até o átomo se tornar num isótopo estável de chumbo. 5.4.1 – Leis da desintegração radioativa Numa desintegração radioativa, o núcleo emite espontaneamente uma partícula alfa (um núcleo de hélio), uma partícula beta (um elétron ou pósitron) ou um raio gama (um fóton), se tornando mais estável. 5.4.1.1 – Meia-vida ( T 1 /2 ) Uma fonte radioativa contém muitos átomos e não há modo de dizer quando um dado núcleo irá se desintegrar. Entretanto, em média, pode-se predizer que após um dado intervalo de tempo, chamado meia-vida ( T 1 /2 ), metade dos núcleos se desintegram neste período. Na próxima meiavida metade dos núcleos que não decaíram na meia-vida anterior decairão na segunda meia-vida. Cada radioisótopo com uma meia-vida longa decai mais lentamente que aquele com uma meia-vida curta. As meias vidas T 1 /2 dos radioisótopos variam de frações de segundos a muitos milhões de 84/98 anos. Entretanto, a meia-vida dos radioisótopos para aplicações biológicas devem estar dentro de um certo intervalo de tempo limitado. Na tabela 2 temos alguns radioisótopo, suas meia-vidas e suas aplicações mais comuns. Tabela 2 – Meia-vidas e aplicações de alguns elementos. T 1 /2 Elemento 131 53 I 15 8 O 14 6 C 40 19 K Aplicações 8 dias Estudo do funcionamento da tireóide. 2,1 minutos Estudo do funcionamento do sistema respiratório. 5.760 anos Análise do comportamento metabólico de proteínas, açúcares e gorduras. 1,4×10 9 Anos Datação de rochas vulcânicas e fósseis. Podemos imaginar que a quantidade núcleos ativos em um tempo t N t é proporcional a quantidade de núcleos ativos em um um tempo t t , no entanto, após o intervalo t a quantidade de íons será menor a uma razão , assim: N t =N t− T − N t− t t (5.10) é simples chegarmos a expressão: dN t =− N t (5.11) dt Com solução − t (5.12) N t =N 0 e Na expressão (5.11) o parâmetro é conhecido como constante de decaimento e é característico de cada elemento químico e N 0 é a quantidade, no tempo nulo, dos íons ativos. A unidade de é desintegrações por unidade de tempo (no SI por segundos). Para encontrarmos a relação entre a constante de decaimento e a meia-vida do elemento é uma simples manipulação algébrica que resulta na expressão: ln 2 = (5.13) T 1/ 2 Utilizando as expressões (5.11) e (5.12) é simples chegarmos na expressão: N N t = t / T0 (5.14) 2 A expressão (5.14) é muito útil para tempos t que sejam múltiplos da meia-vida, no entanto, para valores não múltiplos é mais interessante a expressão (5.12). 1/ 2 5.4.1.2 – Atividade radioativa A atividade radioativa é definida como o número de desintegrações que ocorrem em um intervalo. Assim a atividade de uma amostra de material radioativo é proporcional a quantidade de átomos N que emitem no instante dado. Assim temos a seguinte expressão para a atividade radioativa A. A= N (5.15) Usando a equação (5.11) é fácil chegarmos na expressão: A= A0 e− t (5.16) 85/98 onde A0 é a atividade no tempo nulo, os demais parâmetros são os mesmos indicados nas expressões anteriores. Os equipamentos utilizados para a medida da atividade de uma fonte de radioativa é o contador Geiger. A unidade de atividade depende do comitê gestor, a unidade mais utilizada é o curie (Ci), igual a 3,7×10 10 desintegrações por segundo, sendo seus submúltiplos o milicurie e o microcurie. Em 1975 a ICRU recomendou o uso do becquerel (Bq) como unidade de atividade no Sistema Internacional. Assim, 1 becquerel (Bq) é definido como 1 desintegração por segundo. Portanto, 1Ci =3,7×10 10 Bq . Desta forma podemos dizer também que a unidade de é s−1 e automaticamente 1 mCi=3,7×107 s−1 e assim sucessivamente. 5.4.1.3 – Vida Média Vida média é uma grandeza definida da seguinte maneira. Imagine que um material radioativo com atividade inicial A0 tenderá a ter sua atividade nula em um tempo muito grande (digamos, “infinito” ∞ ), no entanto, podemos imaginar um tempo T onde a grande maioria da atividade desapareceria. Façamos isto matematicamente: denominamos de I a somatória da atividade da amostra em todo o tempo então: ∞ I =∫0 At dt (5.17) Agora iremos calcular a área do retângulo figura da ilustração 62 que possui valor que é igual ao valor de I então: ∞ ∞ ∞ I =∫0 At dt=∫0 N t dt=∫0 N 0 e−t dt=−∣ N 0 − t ∞ e ∣ =N 0 0 Sendo assim chegaremos na seguinte conclusão: 1 T A0= N 0 ⇒ T N 0= N 0 ⇒ T = e finalmente teremos a expressão da vida média ( T ): 1 T = (5.18) Assim, neste instante praticamente a atividade da amostra seria anulada. 86/98 T A0 Ilustração 62: Gráfico da atividade de um material radioativo qualquer. 5.5 – Radiação ionizantes e não-ionizantes e raios ultra-violeta A radiação pode possuir energia suficiente para causar a ionização de moléculas de organismos vivos, este tipo de radiação é denominada de ionizante. Radiações de maior energia são normalmente ionizantes. E as mesmas possuem limites de dose. Enquanto que radiações que não possuem tanta energia são as chamadas não-ionizantes. Os efeitos deste tipo de radiação são mais somáticos. Uma das mais conhecidas radiações não-ionizantes é a radiação ultra-violeta. A radiação ultravioleta (UV) é a radiação eletromagnética com um comprimento de onda menor que a da luz visível e maior que a dos raios X, de 380 nm a 1 nm. O nome significa mais alta que (além do) violeta (do latim ultra), pelo fato de que o violeta é a cor visível com comprimento de onda mais curto e maior frequência. A radiação UV é de grande importância para a saúde humana pois temos uma grande fonte de radiação UV que é o Sol e o corpo humano, por razões que veremos a seguir, é muito sensível a este tipo de radiação. Ilustração 63: Representação da radiação UV no espectro eletromagnético. 87/98 A radiação UV pode ser subdividida em UV próximo (comprimento de onda de 380 até 200 nm - mais próximo da luz visível), UV distante (de 200 até 10 nm) e UV extremo (de 1 a 31 nm). Internacionalmente existe uma divisão diferenciada utilizada em produtos de proteção contra este tipo de radiação. 1- UVA (400 – 320 nm, também chamada de "luz negra" ou onda longa). 2- UVB (320–280 nm, também chamada de onda média). 3- UVC (280 - 100 nm, também chamada de UV curta ou "germicida"). A maior parte da radiação UV emitida pelo sol é absorvida pela atmosfera terrestre. A quase totalidade (99%) dos raios ultravioleta que efetivamente chegam a superfície da Terra são do tipo UV-A. A radiação UV-B é parcialmente absorvida pelo ozônio da atmosfera e sua parcela que chega à Terra é responsável por danos à pele. Já a radiação UV-C é totalmente absorvida pelo oxigênio e o ozônio da atmosfera. A ilustração 64 mostra simplificadamente este processo. Ilustração 64: Representação da parcela da radiação dissipada na atmosfera. Muitas substâncias, quando expostas à radiação UV, se comportam de modo diferente de quando expostas à luz visível, tornando-se fluorescentes. Este fenômeno se dá pela excitação dos elétrons nos átomos e moléculas dessa substância ao absorver a energia da luz invisível. Ao retornar a seus níveis normais (níveis de energia), o excesso de energia é reemitido sob a forma de luz visível. Como a luz UV não é visível podemos estar no escuro e observando certos objetos como se eles apresentassem luz própria. Assim funciona a “luz negra”, o UVA. Note que existe todo uma ideia de interação de luz dentro da dualidade onda-partícula, por esta razão que no ensino médio podemos utilizar esta aplicação como uma ilustração da utilidade da Física Moderna e Contemporânea no cotidiano. Uma aplicação da radiação UVB, bem mais técnica, é a aceleração da polimerização de certos compostos. A mesma radiação também é utilizada para apagar dados escritos em uma memória eletrônica EPROM. A radiação UVC possui comprimento de onda pequeno, logo alta frequência e imediatamente, alta energia. A radiação UVC é prejudicial a organismos vivos e por esta razão é utilizada como germicida em filtros de água e outros sistemas de esterilização. Para entendermos como é a interação da radiação UV interage com a matéria biológica, criaremos uma nova seção. 5.5.1 – Como a radiação UV causa dano biológico? O que ocorre é que a luz UV pode causar danos ao DNA, ou ácido desoxirribonucleico, a molécula que guarda todas as nossas informações genéticas. Mas antes de explicar exatamente o que ocorre com o DNA primeiro precisamos lembrar como é a sua estrutura. 88/98 O DNA presente em nossas células é composto por uma dupla fita em forma de hélice. Essa fita é um polímero de nucleotídeos, compostos por um açúcar (desoxirribose, da onde vem parte do nome DNA), um fosfato e uma base nitrogenada, que pode ser de 4 tipos, A – adenina, C – citosina, G – guanina ou T – timina. Para compreender melhor vejamos a figura da ilustração 65. Ilustração 65: Representação do DNA. Como já mencionado, o DNA é uma dupla fita, e cada fita interage com a outra por meio de ligações de hidrogênio entre bases complementares, sendo A complementar a T e C complementar a G. A luz UV tem a capacidade de gerar “dímeros de timina” (ver figura). Quando duas bases timina estão posicionadas lado a lado na fita de DNA, a irradiação com luz ultravioleta pode formar ligações covalentes entre essas bases, interferindo no pareamento normal de bases dessa fita, que pode levar a mutações e até mesmo câncer. Ilustração 66: Representação do dano causado pela radiação UV no DNA. O intrigante é que um dos mecanismos que os seres vivos utilizam para reparar essa lesão é por meio da enzima DNA fotoliase, que utiliza energia derivada da luz para agir, regenerando as duas timinas que estavam ligadas. Por isso é tão importante utilizar protetor solar e evitar exposição 89/98 solar excessiva!! Em virtude deste interessante mecanismos foi definido um princípio denominado de efeito Hormesis, que é muito utilizado em toxicologia, o mesmo defini que existem limites de benesse e malefício de uma dada substância. Este princípio também é utilizado em radiação UV, em baixas doses a radiação UV favorece a produção de vitamina D e é extremamente benéfica. Em altas doses a radiação UV pode causar muitos danos como já verificamos. 5.5.1 – A penetração da radiação UV A lei de Lambert-Beer determina o grau de penetração de uma dada radiação eletromagnética. Assim, um raio de intensidade Io atinge um corpo de comprimento x com fator de absorção λ e transmite uma intensidade I que obedece a seguinte lei. I =I o e− x (5.19) O grau de penetração da radiação UV depende do seu comprimento de onda e do grau de pigmentação da pele (nas peles mais pigmentadas a penetração é menor, o fator absorção e maior, pelo que o risco diminui). Os efeitos das radiações UV limitam-se praticamente à pele e aos olhos. A maior parte das UV são absorvidas pela córnea e o cristalino. A retina só fica exposta em circunstâncias especiais com UV-A próximas da luz visível. As radiações UV-B e C penetram unicamente a epiderme. As UV-A penetram a derme, podendo chegar a produzir lesões nas terminações nervosas. Efeitos agudos não estocásticos Sobre a pele Escurecimento (bronzeado) Eritema Pigmentação retardada Interferências com o crescimento celular Sobre os olhos Fotoqueratite e fotoqueratoconjuntivite (2 a 24 horas depois da exposição, dolorosas, dura de 1 a 5 dias e o prognóstico é benigno) Lesões no cristalino (dados ainda pouco significativos) Lesões na retina (dados ainda pouco significativos) Efeitos crônicos não estocásticos Sobre a pele Perda da elasticidade da pele (alterações do desenvolvimento normal da derme, com alterações histológicas) Pele rugosa (típica dos marinheiros e agricultores)(UV-A) Queratite actínica (epiderme) Interferências com o crescimento celular Sobre os olhos Opacidades no cristalino Cataratas Efeitos crônicos estocásticos (maior probabilidade em função da dose) Carcinoma basocelular Carcinoma de células escamosas (espinocelular) Melanoma (Casos descritos em marinheiros, pescadores, agricultores e trabalhadores expostos à intempérie). As figuras das ilustracões 67 e 68 mostram alguns efeitos das radiações. Existem parâmetros análogos aos utilizados para a energia sonora para descrever a energia luminosa transmitida pela radiação UV. A irradiância é definida como a potência irradiada por unidade de área. Este parâmetro é interessante para se medir o dano que uma dada taxa de radiação causa em indivíduos e a dose absorvida que é medida em unidades de energia por área. 90/98 Ilustração 67: Efeito comparativo das divisões do espectro eletromagnético focado na radiação UV. Ilustração 68: Efeito na pele de uma pessoa. 91/98 5.6 – Exercícios 1 - A frequência da luz verde é de 5,5 x 1014Hz. Qual é a energia dessa radiação, isto é, a energia de cada fóton? 2 – Calcule o comprimento de onda e a frequência de um fóton de 100 eV? 3 – Imagine que Antônio Carlos chuta uma bola de futebol de massa 1,5Kg e imprime uma velocidade de 120 Km/h. Calcule qual seria o comprimento de onda associado à bola? 4 – Num tubo de raios X, um elétron acelerado pode ceder toda a sua energia cinética emitindo um único fóton, correspondente à radiação X. Suponha que esse seja o caso de um elétron com energia cinética de 34,3 keV. Determine: A-) O comprimento de onda associado ao elétron; B-) A velocidade do elétron; C-) O comprimento de onda do raio X produzido; D-) A velocidade do fóton; E-) A energia do fóton em J. Dados: massa do elétron 9,11x10 -31 kg 5-Davisson e Gerner confirmaram a hipótese de de Broglie, realizando uma experiência de difração de elétrons, que é um fenômeno puramente ondulatório. Eles usaram um feixe de elétrons com energia cinética igual a 54 eV. Calcule o comprimento de onda de de Broglie desses elétrons? 6- Quantas ionizações são feitas no ar por uma partícula alfa de energia de 9,9 MeV ? 7- Uma lâmpada azul de 100 W emite luz de comprimento de onda de 450 nm. Se 12% da energia surge sob forma de luz, quantos fótons são emitidos por segundos? 8 – Um cirurgião tenta colar uma retina descolada usando pulsos de raio laser com duração de 20 ms, com uma potência de 0,6 W. Quanta energia e quantos fótons são emitidos em cada pulso se o comprimento de onda do raio laser é de 643 nm? 9 – Durante um exame com raios X, são absorvidas uniformemente pelo útero 5 rads. Determine a energia absorvida por grama pelo útero. 10 – O rádioisótopo fósforo -32 é administrado à um paciente com 67 kg. Cada átomo desse rádioisótopo emite uma partícula beta com energia de 0,698 MeV numa desintegração. Se a dose absorvida não deve superar 1 rad, calcule a quantidade em gramas de fósforo-32 que pode ser ingerida pelo paciente. 11-) A meia-vida de um isótopo radioativo é de 140 dias. Quantos dias seriam necessários para que a atividade A de uma amostra deste isótopo caísse a um quarto de sua taxa inicial de decaimento? 12-) Calcule a atividade de uma amostra de 1 g de 90 38 Sr , cuja a meia-vida é 28 anos. 15 13-) O oxigênio radioativo 8O tem uma meia vida de 2,1 minutos. A -) Quanto vale a constante de decaimento radioativo λ? B-) Quantos átomos radioativos existem numa amostra com uma atividade de 4 mCi? C-) Qual o tempo necessário para que a atividade seja reduzida por um fator 8? 14-) Demonstre que a atividade de uma amostra qualquer pode ser dada por A= A0 2t /T 1/ 2 . 15-) Calcular a taxa de desintegração num organismo vivo, por grama de carbono, admitindo que a razão 14C/12C seja 1,3 x 10-12. Dado: meia vida do carbono 14 é de 5730 anos. 16-) Um osso, contendo 200 g de carbono, tem uma atividade beta de 400 desintegrações por minuto. Qual a idade do osso? 92/98 17-) Um certo elemento radioativo tem uma meia-vida de 20 dias. A-) Qual é o tempo necessário para que ¾ dos átomos inicialmente presentes se desintegrem? B-) Quanto vale a constante de desintegração e a vida média deste elemento? 18-) Na desintegração do 226Ra é emitida uma partícula alfa. Se essa partícula se chocar com uma tela de sulfeto de zinco, produzir-se-á uma cintilação. Desse modo é possível contar diretamente o número de partículas alfa emitidas por segundo por um grama de 226Ra, tendo sido determinado este número por Hess e Lawson como sendo 3,72 x 10 10. Use esses dados e o número de Avogadro para calcular a meia-vida do Radio. 19-) A atividade de um certo fóssil diminui de 1530 desintegrações por minuto (fóssil recém fossilizado) para 190 desintegrações por minuto já com correção da radiação de fundo. Sendo a meia-vida do isótopo radioativo do 14C de 5730 anos, determine a idade do fóssil. 20-) O carvão do fogo de um antigo acampamento indígena apresenta uma atividade devido ao 14C de 3,83 desintegrações por minuto por grama de carbono da amostra. A atividade do 14 C nas árvores vivas independe da espécie vegetal e vale 15,3 desintegrações por minuto por grama de carbono da amostra. Determine a idade do carvão. 21-) Qual a faixa de comprimento de onda é entendida como Ultra-violeta? 22-) Ao meio dia de um dia do mês de outubro de 1996 a irradiância era de 55 W/m2 qual o tempo máximo de permanência ao Sol para que não seja atingida a dose de eritematosa mínima do pescoço (220 J/m2 )? Respostas 1-3,64x10-19J 2-1,24x10-8 m e 2,4 x 1016 Hz 3- 1,33x10-35m 4- a- 6,63x10-12 m, b- 1,09x108 m/s; c- 3,61x10-11m; d- 3x108 m/s; e- 5,5x10-15 J 5- 1,67 Å 6- 3×105 ionizações 7- 2,7×1019 8-1,2x10-2J; 4x1016 fótons 9-5x10-5 J/g 10- Aproximadamente 3,2x10-10 g 11- 280 dias. 12- 5,25×10 12 s−1 13- A- 5,5 x 10-3s-1, B- 2,69 x 1010 desintegrações (átomos), C-378,08 s. 15- 15 desintegrações /minuto. 16- 16700 anos. 17- A- 40 dias; B- 0,0347 dias-1 28,86 dias. 18- 1600 anos. 19-17246 anos. 20-11513 anos. 22-4 s. 93/98 Referências OKUNO, E; CALDAS, I L; CHOW, E Física para Ciências Biológicas e Biomédicas, Ed. Harbra, São Paulo, 1982. OKUNO, E; VILELA, M. A C.; Radiação Ultravioleta: Características e Efeitos, Ed: Livraria da Física, São Paulo, 2005. 94/98 Apêndice A A Ecologia e a Energia em suas diversas interpretações Observando apenas a etimologia da palavra Ecologia chegaremos em algumas conclusões. O termo “Oikos” do grego significa “casa”, logo a Ecologia seria o estudo do ambiente em que os seres se encontram e sua interação com o mesmo. No entanto, tal como todos os aspectos do conhecimento humano, a ciência da Ecologia teve, ao longo da história, um desenvolvimento gradual, e muitas vezes não contínuo. As obras de Hipócrates, Aristóteles e outros filósofos da cultura grega contêm material de natureza claramente ecológica (ODUM, 1999). A palavra Ecologia é utilizada muito recentemente e foi proposta pela primeira vez pelo biólogo alemão Ernest Haeckel, em 1869 (ODUM, 1999). Vamos fazer alguns paralelos entre o conceito de energia para a Física e a energia pensada em sistemas ecológicos. Antes de qualquer aventura em fazer paralelos devemos recordar alguns conceitos importantes em Ecologia, já que no conteúdo II já discutimos questões básicas sobre energia na perspectiva da Mecânica Clássica e da Termologia. No entanto, precisamos ver quais são os conceitos básicos em Biologia e Ecologia sobre alguns termos importantes como Ecossistema, Biota e Bioma. Para fazer tal definição usaremos boa parte do material apresentado por Odum (2009) em seu livro que faz um interessante levantamento histórico-etimológico do termo. O Ecossistema é definido como o conjunto de comunidades que se relacionam entre si e cuja a existência depende do bom funcionamento de cada elemento. Do ponto de vista trófico (relacionado à comida) o ecossistema apresenta dois elementos o autotrófico, no qual predomina e a fixação da energia da luz, a utilização de substâncias inorgânicas simples e a elaboração de substâncias complexas. E o elemento heterotrófico que é alimentado, normalmente funcionando na dependência do outro elemento. Veja que esta é uma definição um tanto quando mais elaborada do que a definição utilizada no ensino médio para produtores e consumidores, no entanto, ambas estão dentro da contextualização da problemática do alimento na Biologia. Uma lagoa, uma cultura de bactérias dentro de um laboratório, todos são exemplos de Ecossistema. O Bioma está mais relacionado a visão geral das estruturas “vivas”, onde temos fauna e flora. Biota está mais relacionado a toda a biosfera e inclui algumas relações entre geosfera. Apesar de aparentemente não ser tão aplicados estes estudos existem vários projetos grandes para a caracterização do Biota e Bioma como o Biota-FAPESP1. Assim, dentro das estruturas organizacionais biológicas (Ecossistemas, Bioma e Biota) dois elementos desempenham papéis muito importantes, a matéria e a energia. Em certo sentido estas são facetas de uma mesma entidade, mas que para a nossa construção teórica de momento manteremos separadas. Ainda você não possui todo o conhecimento de fundo necessário para a compreensão de alguns conceitos relacionados à energia. Mas, de forma bem simplificada evocaremos os conceitos da termodinâmica que procura relacionar os processos térmicos e mecânicos dentro de uma mesma teoria Física. De maneira bem simplória, define-se energia como a capacidade de realizar trabalho. O comportamento da energia é definido por duas leis: a primeira e a segunda lei da termodinâmica. Vejamos seus enunciado por diferentes enfoques. A primeira lei da termodinâmica que podemos entender que explica que a energia pode transformar-se de um tipo em outro, embora nunca seja criada ou destruída (ODUM, 1999). A definição acima é uma definição típica de biólogos e ecologista, normalmente em física se utiliza de uma definição um pouco mais baseada em função e princípios. Vejamos esta outra 1 Mais informações ´podem ser obtidas em http://www.biota.org.br/ 95/98 definição. “Existe uma função de estado de um sistema termodinâmico, que chamaremos de sua energia interna U , cuja variação U f −U i entre estado inicial i e o estado final f é igual ao trabalho necessário para levar o sistema de i até f “ (NUSSENZVEIG, 1981, pg. 290). Para nós, estudantes de ciências exatas, é mais complexo entender que estas definições acima se equivalem, no entanto, é a mais pura verdade. O estado termodinâmico é definido como o conjunto de variáveis de pressão, temperatura e volume que descrevem uma dado sistema em um instante específico. De maneira geral podemos entender que esta função de estado possui algumas particularidades. A luz pode ser encarada como uma forma de energia, dado o poder de transformar-se em trabalho mecânico, calor ou energia potencial de alimentos, conforme a situação, embora nenhuma porção dela possa ser destruída. Agora vejamos a segunda lei da termodinâmica em dois diferentes enfoques, começaremos pelo enfoque mais ecológico. “Nenhum processo envolvendo uma transformação de energia ocorrerá a menos que haja uma degradação de energia de uma forma concentrada para uma forma dispersa”(ODUM, 1999, pg. 55). As ciências exatas enunciam esta mesma lei dentro de dois princípios equivalentes (Clausius e Kelvin): “É impossível realizar um processo cujo único efeito seja remover calor de um reservatório térmico e produzir uma quantidade equivalente de trabalho” (NUSSENZVEIG, 1981, pag. 334). O resultado deste enunciado é a criação da função entropia que consegue medir o grau de desordem causado pelas transferências térmicas e que de forma mais geral estabelece a chamada seta do tempo (NUSSENZVEIG, 1981). Os organismos, os ecossistemas e toda a biosfera possuem a característica termodinâmica essencial de serem capazes de criar e manter um elevado grau de ordem interior, ou uma condição de baixa entropia. Alcança-se uma entropia baixa mediante a dissipação contínua de energia de alta utilidade (luz, ou alimento, por exemplo) em energia de baixa utilidade (calor, por exemplo). No ecossistema, a "ordem" é, em termos de uma estrutura complexa de biomassa, mantida pela respiração total da comunidade que continuamente "elimina a desordem por bombeamento". Como citamos na aula sobre os diversos níveis alimentícios. Podemos denominar de teia trófica as relações de transferência de matéria através de alimentos e energia. Esta definição é um pouco mais abrangente do que o termo usado no ensino médio em virtude de que esta transferência de energia em que há alteração de complexidade de uma energia acaba por causar uma dependência mais aguda dos membros da teia. Quando uma quantidade de matéria, por exemplo, algas são digeridas por algum mamífero marinho, no próximo nível trófico (o nível dos consumidores) a energia é menor para cada grama de alga, no entanto, a complexidade da energia processada é maior e grande parte é dissipada em calor. Voltando a discutir a questão da energia podemos pensar que a segunda lei da termodinâmica trata da transferência de energia para um estado cada vez menos disponível e mais disperso. No que diz respeito ao sistema solar, o estado disperso relativamente à energia é aquele em que toda a energia se encontra em forma de energia térmica igualmente distribuída. Isto é, quando entregue a si mesma, toda a energia tenderá finalmente a se transformar em energia térmica distribuída a temperatura uniforme. Alguns pesquisadores crêem nesta tendência no sistema solar a chamada "degradação dos sistema solar". Não se sabe se esta tendência para o nivelamento da energia se aplica a todo o universo. A segunda lei da termodinâmica, que trata da dispersão da energia, está relacionada com o princípio da estabilidade. De acordo com este conceito, qualquer sistema natural isolado, com energia a atravessá-lo, trate-se da própria Terra ou de uma entidade menor, como por exemplo, um lago, tende a alterar-se até que se desenvolva um ajustamento estável com mecanismo de auto96/98 regulação. Quando se alcança um ajustamento estável, as transferências de energia tendem a processar-se pelo padrão de um só sentido e a ritmo característicos. Note que o parágrafo anterior pode sucitar uma discussão se não é uma contradição com o crescimento da entropia. Tal contradição está longe de ser totalmente resolvida, mas é um tema muito estudado em uma área nascente e crescente que é a termodinâmica fora do equilíbrio. H. T. Odum (1996), baseando-se nos conceitos de A. J. Lotka (1922) e do Fìsico E. Schrödinger (1944), colocou os princípios termodinâmicos no contexto ecológico da forma que eu sintetizo aqui. A manutenção de um estado antitérmico constitui a prioridade número um em qualquer sistema complexo no mundo real. Segundo demonstrou Schrödinger, o trabalho contínuo de esgotar a "desordem" pelo bombeamento térmico é imprescindível, caso se pretenda manter "ordem" interior em presença de vibrações térmicas, em qualquer sistema de temperatura superior ao zero absoluto. No ecossistema a razão entre a respiração da comunidade e a biomassa da comunidade total (R/B) pode considerar-se como a razão entre a manutenção e a estrutura, ou como uma função termodinâmica de ordem. Se R e B forem expressos em calorias e divididos pela temperatura absoluta, a proporção R/B converte-se na razão entre o aumento da entropia de conservação (e trabalho relacionado) e a entropia da estrutura ordenada.Quanto maior for a biomassa, maior é o custo da manutenção; porém, se o tamanho das unidade de biomassa (os organismos individuais, por exemplo) é grande (tal como a vegetação de uma floresta), a manutenção antitérmica por unidade de biomassa diminui. Uma das questões teóricas presentemente em debate consiste em saber se a natureza maximiza a proporção entre a estrutura e o metabolismo de manutenção ou se é a própria corrente de energia que é maximizada. O enunciado acima mostra diversos problemas de ordem prática (medir os observáveis em unidade de energia) e teórica, qual das "manutenções" a natureza prioriza. Além de todo este desafio do ponto de vista da construção do conhecimento sobre o uso da energia, esta discussão pode levantar a hipótese prática da solução de graves problemas como a utilização mais equilibrada dos recursos. Ainda existe o grande debate sobre se nossas atitudes podem ser modeladas a partir de um sistema previsível de maximização do conforto que é uma questão que deixamos para a Filosofia. 97/98 Referências LOTKA, A. J. Contributions to energetics of evolution. Proc. Natl. Acad. Sci. USA 8. vol. 6, 151154, 1922. NUSSENZVEIG, H. M. “Um curso de Física Básica- volume 2”, Edgar Blüchar: São Paulo, 1981. ODUM, E. P. & Barret, G. W. "Fundamentos de Ecologia", Cengage Learning: São Paulo, 2011. ODUM, H. T. "Environmental Accounting: Emergy and Environmental Decision Making". John Wiley:New York, 1996. SCHRÖDINGER, E. "What is life? The physical aspect of living cell", University Press: Cambridge, 1944. 98/98