ANAIS DO II ENCONTRO NACIONAL DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA
DO GRUPO INSTITUCIONAL DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS – GPDH
Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus/BA – 2011
ROMPENDO AS BARREIRAS DO DIREITO FUNDAMENTAL À
SAÚDE
QUEIROZ, Danilo Torres de
Discente do curso de Direito na Universidade Estadual de Santa Cruz. [email protected]
O artigo objetiva analisar a discussão doutrinária a respeito da eficácia dos direitos
sociais dando um especial enfoque sobre o direito à saúde. Para tanto foi realizado
uma pesquisa bibliográfica buscando os principais argumentos e teses em favor da
ampla eficácia dos direitos sociais. Foram enfrentadas temáticas como Princípio da
Separação dos Poderes, Discricionariedade Administrativa, Princípio da Isonomia, a
eficácia limitada das normas constitucionais definidoras de Direitos sociais e a
Reserva do Possível.
PALAVRAS CHAVE: Eficácia, Direitos Fundamentais, sociais, saúde.
1-Introdução
A discussão a respeito da efetividade dos direitos fundamentais sociais,
especialmente o direitos à saúde, suscita duas ordens de questões: uma de ordem
jurídica e outra de ordem fática. A primeira se circunscreve ao vácuo produzido nesta
seara em razão de omissões legislativas, atecnias e a enorme vagueza e abstração
dos preceitos normativos, que muitas vezes transformam leis em comandos
puramente morais. Os de ordem fática se referem à problemática encontrada na
imposição judicial, ao administrador público, para cumprir as obrigações tendentes a
efetivar direitos fundamentais sociais.
Assim, o presente artigo se prestará a propor soluções para que sejam
contornados os obstáculos à efetivação do direito a saúde, seja qual for a sua
natureza.
2–Óbices de Ordem Jurídica
No que concerne ao plano jurídico, os empecilhos vislumbrados pela
doutrina dizem respeito à imprecisão normativa de que se valeu o legislador, pois os
preceitos constitucionais que tutelam a saúde, assim como os que cuidam dos
direitos fundamentais sociais, são vagos, abstratos e não distinguem com precisão
as hipóteses que tutelam e muito menos prevêem as conseqüências para a não
observância das normas constitucionais. Esse fato usurpa a força normativa desses
1
ANAIS DO II ENCONTRO NACIONAL DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA
DO GRUPO INSTITUCIONAL DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS – GPDH
Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus/BA – 2011
preceitos e, por conseqüência deixam de ser cumpridos.
Inicialmente cumpre salientar que negar a aplicação de uma norma
devido a sua falta de delimitação fática é acima de tudo negar a força normativa dos
princípios, pois, estes não são normas descritivas, que regulam determinada
conduta, mas sim finalísticas, ou seja, estabelecem um estado de coisa que deve
ser promovido sem descrever, diretamente, qual o comportamento devido. A falta de
delineamentos fáticos ou concretos não pode servir de escusa à aplicação de uma
norma, seja ela uma regra ou princípio.
Outro argumento muito utilizado pela doutrina tem por base a famosa
classificação de José Afonso da Silva que, tomando como critério a eficácia das
normas constitucionais. Assim, há quem negue a eficácia dos arts. 6º e 196 da
Constituição por pertencerem à classe nas normas de eficácia limitada, ou seja,
seus efeitos ficam condicionados à regulamentação posterior do legislador.
Data maxima venia, esse entendimento não deve prevalecer ante a
existência da norma contida no art. 5º §1º da CF que estabelece: “As normas
definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”.
Ademais, afirmar que as normas constitucionais têm sua eficácia
dependente da edição de normas pelo legislador ordinário equivaleria a uma
“revogação de fato”, sempre que o legislador se omitisse no seu dever de
concretizar a norma constitucional. Em última análise, seria inverter a hierarquia do
ordenamento, na medida em que uma lei ordinária acabaria por se sobrepor a uma
norma constitucional, pois a primeira condiciona a produção de efeitos da segunda.
Feita essas considerações, notamos que legalmente não há óbices no
ordenamento brasileiro à direta e imediata efetivação dos direitos sociais,
especialmente o direito à saúde, haja vista a relação uterina que mantém com o
direito a vida e o princípio da dignidade da pessoa humana.
3–Óbices de Ordem Fática
Os óbices de ordem fática se referem, de forma geral, à problemática
encontrada na imposição judicial, ao administrador público, de obrigações tendentes
a efetivar direitos fundamentais sociais. Ou seja, superado o primeiro obstáculo de
garantir que às normas constitucionais constituam verdadeiros direitos subjetivos
2
ANAIS DO II ENCONTRO NACIONAL DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA
DO GRUPO INSTITUCIONAL DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS – GPDH
Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus/BA – 2011
públicos, passamos a analisar os problemas encontrados na concretização destes.
É precisamente neste último aspecto que se situa o objeto do presente
tópico, sobretudo, no que tange à questão relativa ao combate de omissões
administrativas que vulneram os diretos fundamentais sociais. Sabe-se que a
imposição ao Estado de prestações positivas tem encontrado obstáculos que podem
ser sintetizados em quatro subtópicos: (a) ferimento ao princípio da separação dos
poderes; (b) infração à discricionariedade administrativa; (c) atenta contra o princípio
da isonomia e (d) o limite da “reserva do possível”, representada pela escassez de
recursos.
3.1–Princípio da Separação dos Poderes
Um dos argumentos contrários à concretização dos direitos fundamentais
sociais se refere ao fato de que o princípio da separação dos poderes impediria a
atividade do Poder Judiciário nas funções reservadas ao Poder Executivo e
Legislativo. Assim, as decisões judiciais na seara dos direitos prestacionais maculam
o princípio democrático, vez que os juízes, por falta de legitimidade popular, não
poderiam decidir sobre as prioridades dos gastos orçamentais.
Em princípio, a partir da previsão constitucional deste controle (CF, arts.
97; 102,I, “a”, “q”; 103), poderia estar encerrada a discussão acerca da legitimidade
do Judiciário para intervir na atuação dos demais poderes constituídos sempre que
esta se desvirtuar dos fins constitucionais. A legitimidade do Judiciário estaria
assentada em uma previsão expressa do constituinte.
Por outro lado, é preciso indagar-se se a legitimidade democrática do
Legislativo e do Executivo permite que esses poderes negligenciem os direitos
Fundamentais, como usualmente ocorre. Ademais, vale lembrar que nem sempre os
representantes políticos correspondem às expectativas de seus eleitores, pois é
grande o número de normas emanadas pelo Legislativo e atos realizados de
Executivo que não possuem o apoio popular.
Um terceiro argumento que se pode sustentar é que a legitimidade
democrática do judiciário surge na medida em que suas decisões coadunam-se com
as idéias defendidas pelos parlamentares e presente nas leis do ordenamento, haja
vista toda decisão judicial deve possuir motivação legal, suficiente para convencer
3
ANAIS DO II ENCONTRO NACIONAL DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA
DO GRUPO INSTITUCIONAL DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS – GPDH
Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus/BA – 2011
seus destinatários. Ou seja, a legitimidade do judiciário reside no fato de que suas
decisões estarem em estreita consonância com o ordenamento jurídico.
Outro argumento que não pode ser olvidado é o do papel democrático
que o judiciário possui, pois possibilita aos grupos marginais e minorias, que não
possuem voz política, possam ser ouvidas através do processo judicial. De outra
forma, o livre acesso a justiça permite que uma população ou o cidadão,
individualmente considerado, possa participar do jogo democrático na medida em
que é facultado a este, requer perante o poder judicial, a realização de determinado
ato do Estado, como a construção de uma escola, um hospital, o fornecimento de
medicamentos e outros medidas que visem salvaguardar a dignidade humana.
Data máxima vênia, aventar o princípio da separação dos poderes para
obstar a atividade do Poder Judiciário na seara dos direitos prestacionais
existenciais é, em ultima instância, perpetuar a arbitrariedade do Poder Executivo,
tornando a função judicial co-responsável pela burla à Constituição e aniquilação do
interesse público.
3.2–Discricionariedade Administrativa
Freqüentemente, a implementação de direitos sociais esbarra na mera
alegação de ofensa à discricionariedade administrativa, aventada pela suposta
invasão do Judiciário na liberdade de escolha do administrador público. Todavia, a
discricionariedade não pode ser tomada como um obstáculo intransponível,
principalmente quando se trata da concretização dos direitos fundamentais.
No que tange ao controle judicial dos atos administrativos não há
dissenso na doutrina, todos admitem que o poder judiciário realize essa tarefa
visando corrigir a distorção do sistema e preservar seu equilíbrio. Neste sentido é o
art. 37, caput da CF/88: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”.
A questão que gera polêmica diz respeito ao que deve ser avalizado ou
controlado pelo Judiciário. É evidente que não se pode tolher por completo a
discricionariedade administrativa, pois ela é essencial para a desenvoltura da
máquina estatal, bem como para a realização dos objetivos constitucionais.
4
ANAIS DO II ENCONTRO NACIONAL DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA
DO GRUPO INSTITUCIONAL DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS – GPDH
Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus/BA – 2011
Assim, a doutrina fala em controle da legalidade do ato administrativo e
do abuso dessa discricionariedade. Nesses dois casos é pacífica a atuação do poder
Judiciário de invalidar o ato administrativo.
O que é importante deixar claro é que a discricionariedade deve ser
exercida dentro dos parâmetros estabelecidos pelo legislador. Portanto, a
discricionariedade não reside no âmbito do fazer ou não fazer, mas na forma como
deve ser feito. Significa dizer que entre uma medida que realiza o direito
fundamental, e outra que não o faz, não há discricionariedade possível: o Estado
deve escolher a medida que torna factível o direito fundamental em questão.
Todavia, há discricionariedade na escolha de qual medida a será tomada, dentre as
várias que concretizem o referido direito.
Todavia, há autores como Wálber Araújo Carneiro (apud OLSEN, 2010, p.
262) afirmando que “os critério de escolha para a administração da escassez pode
ser objeto de controle de legalidade, e estão sujeitos a um exame de
proporcionalidade”. Para esse autor mesmo a discricionariedade em relação à
escolha dos meios, esta sujeita ao crivo da proporcionalidade e razoabilidade.
Desta forma, percebe-se que quando se trata da realização dos direitos
fundamentais sociais, a própria noção de discricionariedade resta enfraquecida.
Afinal a presença dos direitos fundamentais na Constituição gera deveres estatais
correspondentes que merecem ser observado, especialmente, na questão da
definição, pelo administrador, das políticas públicas a serem realizadas, e das
dotações orçamentárias necessárias à sua realização.
3.3–Princípio da Isonomia
Outro ardiloso obstáculo à concretização do Direito à Saúde diz respeito
ao Princípio da Isonomia. Argumenta-se que o poder Judiciário, devido ao fato de
cuidar da justiça no caso concreto a partir do conflito da realidade que lhe é
apresentado para resolver, somente poderia determinar que o Estado cumprisse
uma prestação positiva, se esta puder atender a todos aqueles que, porventura,
deduzirem a mesma pretensão jurisdicional. Ou seja, estaria vedado ao Judiciário
fazer escolhas políticas, sob pena de violação do princípio da Igualdade, haja vista,
a justiça no caso concreto deve ser sempre aquela que possa ser assegurada a
5
ANAIS DO II ENCONTRO NACIONAL DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA
DO GRUPO INSTITUCIONAL DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS – GPDH
Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus/BA – 2011
todos que estão ou possam vir a estar em situação similar.
Outra conseqüência oriunda desse pensamento seria de que o Judiciário
ao atender a todas as pretensões de satisfação dos direitos sociais, estaria
causando uma injustiça àqueles que a ele não tiveram acesso. Ademais, uma
determinação judicial de emprego de recursos públicos na satisfação de um único
direito, em um determinado caso concreto, poderia comprometer a eficácia de
políticas públicas que eventualmente atenderiam a um número maior de pessoas.
Destarte, a congruência destes argumentos, a questão da Isonomia não
pode ser tomada em sentido absoluto, visto que este não é o único principio a ser
observado ante a tomada de uma decisão. Os estudiosos da Teoria dos Princípios
são
uníssonos
aos
afirma
que
não
existe
princípio
absoluto,
sendo
a
ponderabilidade uma característica de todos os princípios, inclusive o da Isonomia.
Outrossim, esse raciocínio, se levado ao extremo, poderá acarretar no
total esvaziamento dos direitos sociais, além de desfigurar a função jurisdicional do
Estado, pois o raciocínio isonômico pode levar o judiciário à tendência de se achar
incapaz de decidir, posto que este não é dotado de parâmetros ou instrumentos para
avaliar a extensão das conseqüências orçamentárias de sua decisão. Infringindo,
assim, o princípio do nom liquet.
3.4 – Reserva do Possível
Hodiernamente, a reserva do possível é a maior barreira encontrado
quando se trata da efetivação dos direitos fundamentais, haja vista não há como
desconsiderar a questão da escassez. É materialmente impossível ou faticamente
inviável concretizar todos os direitos fundamentais em níveis ótimos, há uma
impossibilidade fática, e conseqüentemente jurídica, nesta pretensão. Portanto, a
questão da escassez deve ser levada a sério. Afinal, o Direito não tem o mitológico
“toque de midas” para transforma tudo o que toca em ouro.
Nesta perspectiva, a reserva do possível corresponde a um dado da
realidade, um elemento do mundo dos fatos que influencia na aplicação do Direito.
Assim, o que, efetivamente, se pretende nesse tópico é afastar as falácias e abusos
que, usualmente, são alegados sobre o pretexto da reserva do possível.
6
ANAIS DO II ENCONTRO NACIONAL DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA
DO GRUPO INSTITUCIONAL DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS – GPDH
Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus/BA – 2011
3.4.1–Falácias sobre a reserva do possível
A primeira delas consiste na afirmação de que os direitos sociais seriam
direitos de segunda ordem, em contrapartida aos direitos civis e políticos que seriam
de primeira. Assim, haveria uma priorização na destinação de recursos a efetivação
dos direitos Civis e Políticos em detrimento dos direitos sociais. Segundo Noberto
Bobbio, os direitos são frutos de lutas e conquistas histórias, tendo sido consagrados
paulatinamente. Desta forma, muitos pensam que os direitos civis e políticos (1ª
geração), por terem sido consagrados antes dos sociais (2ª geração), seriam mais
importantes.
Todavia, em verdade, não há qualquer argumento que possibilite inferir
que os direitos de 1ª geração são mais importantes que os sociais. O que de fato
existe é uma relação de interação entre tais direitos, de sorte que não é viável
atribui-lhes gradação de importância.
A segunda falácia corresponde à concepção de que os direitos sociais
têm sua exigibilidade condicionada a uma economia forte. Porém, pensar dessa
forma é subverter a ordem das coisas, haja vista são, justamente, os países que
possuem uma fragilidade economia e grave desigualdade social, os que mais
precisão efetivar os direitos sociais.
Ademais, a existência dos recursos necessários a efetivação destes
direitos está muito mais condicionada a escolhas políticas, de definição da
destinação dos recursos existentes e das políticas públicas necessárias à efetivação
destes direitos, do que propriamente a existência de uma “economia forte”. Trata-se
muito mais de uma “vontade política” do que a existência de recursos propriamente
ditos.
3.4.2–Abusos quanto a reserva do possível
Os abusos sobre a reserva do possível costumam ser invocada em
relação a falta de recursos econômicos capazes de efetivar as prestações
consagradas nas normas de direitos fundamentais. Assim, a questão da escassez
surge no epicentro do debate.
Antes de examinarmos o referido abuso, cumpre reproduzir uma
7
ANAIS DO II ENCONTRO NACIONAL DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA
DO GRUPO INSTITUCIONAL DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS – GPDH
Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus/BA – 2011
interessante classificação da escassez feita por John Elster (apud AMARAL, 2001,p.
133 e 134):
Dizer que um bem é escasso significa que não há o suficiente para
satisfazer a todos. A escassez pode ser, em maior ou menor grau, natural,
quase-natural, ou artificial. A escassez natural severa aparece quando não
há nada que alguém possa fazer para aumentar a oferta. Pinturas de
Rembrandt são um exemplo. A escassez natural suave ocorre quando não
há nada que se possa fazer para aumentar a oferta a ponto de atender a
todos. As reservas de petróleo são um exemplo, a disponibilização de
órgãos de cadáveres para transplante é outra. A escassez quase-natural
ocorre quando a oferta pode ser aumentada, talvez a ponto da satisfação,
apenas por condutas não coativas dos cidadãos. A oferta de crianças para
adoção e de esperma para inseminação artificial são exemplos. A escassez
artificial surge nas hipóteses em que o governo pode, se assim decidir,
tornar o bem acessível a todos a ponto da satisfação. A dispensa do serviço
militar e a oferta de vagas em jardim de infância são exemplos.
Essa classificação ajuda-nos a elucidar dois aspectos bastante distintos
da reserva do possível: a total inexistência de recursos financeiros ou materiais
necessários a concretização da prestação demandada, e a inexistência deste
recurso porque os mesmos foram alocados pelos poderes públicos para outras
finalidades. É justamente neste último aspecto que reside os abusos pois é
perceptível uma má vontade dos poderes públicos em alocar recursos visando na
realização dos direitos sociais.
Desta forma, antes de se falar em inexistência de recursos para o
atendimento dos direitos fundamentais sociais, há que se investigar se a atividade
orçamentária do estado, no que tange a arrecadação e as despesas, está de acordo
com as normas constitucionais. A forma de alocar recursos, mesmo que
discricionária, deverá sempre respeitar os parâmetros fixados na Constituição, bem
como as prioridades por ela enumeradas.
Ademais, a escassez dos recursos econômicos destinados à realização
destes direitos não é natural ou quase-natural, mas artificial, fruto da escolha
realizada pelos poderes públicos. A prova desta assertiva está no fato de que
quando decisões judiciais determinam o fornecimento de certo medicamento ou
tratamento, o Estado acaba por se organizar para promover uma dotação
orçamentária capaz de suprir esta necessidade, ou até mesmo desenvolve políticas
públicas que viabilizem tais medicamentos e tratamentos de forma contínua a toda
população.
Portanto, ao se determinar que um dado direito fundamental não poderá
8
ANAIS DO II ENCONTRO NACIONAL DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA
DO GRUPO INSTITUCIONAL DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS – GPDH
Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus/BA – 2011
ser judicialmente exigido do Estado em virtude da reserva do possível, será
necessário observar se a alegada escassez, conforme a classificação de John
Elster, é natural ou artificial. Caberia ao estado investigar e demonstrar por que
motivo não há recursos, quando provocado a cumprir prestações de cunho social.
4-Conclusão
Vivemos em um Estado Social e Democrático de Direito que tem como
função garantir e dar eficácia a esses direitos conclamados aos cidadãos. Desta
forma, os direitos fundamentais revelam-se, já no próprio sentido da palavra, como
fundamental, ou seja, pressuposto para uma vida digna.
Assim, não podemos permitir que a saúde e os demais direitos sociais
padeçam de enfermidades profundas, fazendo com que este direito, enquanto direito
fundamental, não tenha sua total efetivação conforme os ditames constitucionais.
REFERÊNCIAS
AMARAL, Gustavo. Direito, escassez & escolha: em busca de critérios jurídicos
para lidar com a escassez de recursos e as decisões trágicas. Rio de Janeiro:
Renovar, 2001;
ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios
jurídicos. 11. ed., rev. São Paulo: Malheiros, 2010;
BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas
normas: limites e possibilidades da constituição brasileira. 5. ed. ampl. e atual. Rio
de Janeiro: Renovar, 2009;
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004;
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17. ed São
Paulo: Malheiros, 2004;
9
ANAIS DO II ENCONTRO NACIONAL DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA
DO GRUPO INSTITUCIONAL DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS – GPDH
Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus/BA – 2011
OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais sociais: efetividade frente à
reserva do possível. 1ª ed. (ano 2008), 2ª reimpr.Curitiba: Juruá, 2010;
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral
dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 10. ed. rev. Atual. e ampl.
Porto Alegre: Livraria dos Advogados, 2010;
SILVA, José Afonso da, Aplicabilidade das normas constitucionais, 6. ed. São
Paulo: Malheiros, 2004;
SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e
eficácia. 2.ed. São Paulo: Malheiros, 2010.
10
Download

rompendo as barreiras do direito fundamental à saúde