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Actualidad Jurídica Uría Menéndez / 17-2007
A CONSTITUIÇÃO E O DIREITO
INTERNACIONAL PRIVADO. ENSAIO
DE UMA PROPOSTA DE REGULAÇÃO
EM SEDE DE DIREITO
INTERNACIONAL PRIVADO
ANDRÉ VENTURA
JOÃO ANACORETA CORREIA
Advogados (*)
A relação entre a Constituição e o Direito Internacional Privado (DIP) é uma das mais fascinantes
questões debatidas pela doutrina mundial empenhada em estudar e aprofundar o DIP. E também
uma das mais importantes problemáticas remetidas
aos tribunais no mundo inteiro —aos mais altos
níveis hierárquicos dos respectivos ordenamentos
jurídicos— e que tem suscitado orientações prático-metodológicas muito diversas e distintas.
No presente artigo, e para a análise da referida relação
entre a Constituição e o DIP, usámos como texto base
a conferência proferida pelo Prof. FERRER CORREIA
na sessão inaugural dos Trabalhos Judiciais, no Supremo Tribunal de Justiça, em 18 de Janeiro de 1979 (cfr.
«A revisão do Código Civil e o Direito Internacional
Privado», António Ferrer Correia, in Estudos Vários de
Direito, Universidade de Coimbra (1982)).
De facto, é bom começar por notar a diversidade
incontornável que tem gerado a reflexão sobre as
(*) Advogados das Áreas de Fiscal e Comercial, respectivamente, de Uría Menéndez (Porto).
relações (abstractas e concretas, diga-se desde já)
entre a Constituição (qualquer que seja) e as normas de conflitos dos respectivos sistemas jurídicos.
É possível, assim, encontrar jurisprudência estrangeira com respostas diametralmente opostas e valorativamente inconciliáveis. Mesmo num campo
intra-sistemático (hoc sensu, de cada ordem jurídica
considerada) os tribunais não se têm entendido no
sentido de uma harmonização de soluções em
ordem a assegurar um mínimo de segurança jurídica
aos agentes destinatários. Tanto horizontalmente,
como num campo vertical-hierárquico (tribunais
superiores-tribunais inferiores) não se tem verificado harmonização de soluções ou sequer um aparente consenso entre os órgãos aplicadores do direito.
É necessário, antes de mais, situarmo-nos material e
conceptualmente no problema em causa: embora
seja um problema possível de equacionar sempre
(reduzindo, por exemplo, a referência à Constituição a uma referência à lex fundamentalis, no período
antecedente do moderno constitucionalismo), esta
tensão dialéctica surge e manifesta-se sobretudo a
partir do século XIX —com a expansão e consolidação do movimento de constitucionalização— e,
com acuidade, a partir da segunda metade do século XX, com a força superior e directa dos direitos
fundamentais (muito trabalhada pela jurisprudência alemã) e a definitivamente consensual superioridade da Constituição face aos outros instrumentos
normativos. No fundo, o esquecimento ocidental da
famosa consideração de FERDINAD LASSALE, das
«vãs folhas de papel», referindo-se ás constituições
escritas do liberalismo do século XIX.
Claro que algumas correntes jurídicas e políticas
nacionalistas, já em finais do século XIX e na primeira metade do século XX, enunciaram desde logo o
ARTÍCULOS
problema. Mas aqui a relação com a Constituição
era apenas marginal, incidental, sendo que a base
do problema era essencialmente política: aceitar a
aplicação de normas estrangeiras por tribunais do
foro, era não só reconhecer soberanias politicamente controvertidas (principalmente após a primeira
guerra mundial) como contrariava a ideia de superioridade do «espírito nacional» e da sua capacidade de produção jurídica e, no limite, a incongruência de um órgão de soberania se sujeitar a normas e
métodos estrangeiros. No fundo, raciocinava-se
para o DIP com base em conceitos, métodos e lógica de direito internacional público ou, pode dizerse com mais rigor, de relações internacionais. Não é
o problema por estas correntes enunciado, porém,
que estamos empenhados em estudar, na medida
em que o consideramos largamente ultrapassado.
O percurso histórico desta problemática, desde os
anos 50 do século passado, a abordagem que tem
sido feita a este propósito pela jurisprudência
estrangeira, principalmente alemã, norte americana
e francesa e as várias propostas políticas e sugestões
doutrinais que têm vindo à luz desde então configuram, para nós, tarefa de indescritível prazer e utilidade, mas que não poderemos aqui concretizar,
por óbvias razões de tempo. Limitar-nos-emos a
breves referências transversais e funcionalizadas ao
nosso objecto de eleição: o DIP e a Constituição
portuguesa, i.e., a aplicação de direito estrangeiro
resultante das normas de conflitos portuguesas e a
sua compatibilidade com as normas constitucionais
portuguesas e com o próprio «sistema constitucional», entendido aqui não apenas os princípios axiais
da ordem jurídico-constitucional mas também o
espírito subjacente ao nosso processo de controlo e
fiscalização da constitucionalidade. Adiante exporemos exactamente em que medida estes últimos considerandos são decisivos para a abordagem deste
problema.
Decidimos centrar o fulcro deste trabalho num
artigo/conferência do Prof. Ferrer Correia, de
1979, plenamente revelador das reais problemáticas aqui envolvidas. Uma vez mais, o Prof. Ferrer
Correia enuncia, com lucidez e rigor, as diversas
facetas do problema. Para além disso, a sistemática do texto permite uma abrangência material suficiente para tocar todos os pontos considerados
relevantes, inclusivamente os pontos anteriormente
mencionados.
Começa o Ilustre Professor por abordar o tema clássico da justiça material/justiça formal do Direito
Internacional Privado (DIP). Tal problemática tem,
nesta sede, todo o sentido. De facto, considerando
as normas de DIP como puramente formais ou
como «técnicas e axiologicamente neutras», ou, noutra perspectiva, como normas puramente metodológicas, dirigidas ao órgão aplicador do direito, dificilmente se problematiza a controvérsia valorativa
que possa existir entre a Constituição e as referidas
normas. Parece-nos que FERRER CORREIA constrói neste domínio um percurso interessante, começando por invocar a tese clássica (referindo-se à
célebre síntese de BEITZKE) das normas puramente formais, «que não têm o sentido de servir a justiça»,
para avançar desde logo que considera esta forma
de perspectivar o DIP «profundamente errónea».
Por um lado, porque, se é verdade que, em DIP
«não são os valores da justiça material que predominam», não se pode daí inferir que os seus preceitos
são «meros preceitos de ordem» pois «a ordem para
que tendem não é arbitrária, cega a valores, antes uma
regulamentação orientada para certos fins». Neste
sentido, pode concluir-se que «as normas de conflitos
não são, portanto, regras técnicas axiologicamente neutrais (à semelhança das que disciplinam o trânsito rodoviário), que não tenham o sentido de servir a justiça». O
que se pode dizer é, então «que a justiça que servem
é de cunho eminentemente formal, nela predominando
o ingrediente da certeza e da estabilidade jurídica».
Parece-nos que fazem todo o sentido estas considerações. Ao destacar as normas de conflitos face a
meras injunções de ordem, o Prof. FERRER
CORREIA afasta-se claramente de uma ideia segundo a qual as normas de conflito seriam juridicamente equivalentes a normas metodológicas. Ora,
não é assim, pois as normas de conflitos não determinam uma aplicação da lei «de olhos vendados». É
evidente que são diferentes as valorações subjacentes às normas materiais e às normas de conflitos,
mas tal não legitima a consideração bipolar de normas metodológicas como contraponto às normas
materiais, estas ultimas imbuídas de uma «teleologia
de justiça» e aquelas apenas preocupadas com uma
função orientadora e formal. Essa contraposição
não procede, na exacta medida em que não é verdadeiro afirmar-se que a norma de conflitos se desinteressa completamente do resultado alcançado pela
aplicação das suas regras. Mesmo os ordenamentos
jurídicos europeus —pode dizer-se em termos
genéricos— têm introduzido pequenas mas progressivas alterações nos seus principais códigos normativos no sentido de garantir determinados objectivos com a aplicação das normas de conflitos. Só
isso explica, efectivamente, a preferência e a progressiva relevância das normas de conexão alterna-
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tiva. Por outro, lado, nas modernas legislações,
nunca deixaram de estar presentes alguns princípios orientadores, com capacidade operativa quando a norma de conflitos esgotara já os seus efeitos
(como o Favor Negotii ou Favor Validitatis) ou algumas cláusulas de escape («escape clause» na terminologia inglesa) ou cláusulas de excepção, como a
cláusula de ordem pública.
Aliás, é muitas vezes apresentada a dimensão sobretudo material do direito conflitual norte americano
como contraponto ao direito conflitual «puramente
formal» europeu. Ora, parece-nos que não é efectivamente assim: nem o direito conflitual norte americano prescinde de um raciocínio metódico-formal
na aplicação das normas de conflitos (em nome da
certeza e da segurança jurídica, elementos decisivos
no tráfego jurídico internacional) nem o direito
europeu se apresenta absolutamente formalista,
como acabamos de enunciar. É verdade que até aos
anos 50 o direito conflitual europeu era considerado por vastos sectores da doutrina como exclusivamente formal e alheio às proposições jurídico-materiais e aos próprios valores axiais da ordem jurídica
na qual se inseria. Porém, pelas razões que já aduzimos, não nos parece cientificamente possível falar
de um direito conflitual exclusivamente formal,
nem quando reportados a períodos históricos concretos. Seguro é, porem, que tal ideia encontra-se
hoje completamente afastada não apenas por construções doutrinais e jurisprudenciais, mas sobretudo pelo próprio sistema de normas, explícito, na
maioria dos casos, quanto ao funcionamento de
determinadas proposições materiais, de determinadas excepções, de normas materiais imperativas ou
na enunciação de certos objectivos/interesses.
Assim, como bem conclui FERRER CORREIA, «se
no momento presente o direito internacional privado se
mostra assim aberto —ainda que em termos comedidos— a certos juízos de valor jurídico-materiais, como
admitir que lhe seja lícito ignorar princípios que, exactamente porque ancorados na Constituição, figuram
por certo no quadro dos valores axiais do ordenamento
jurídico do Estado?». Tal seria, certamente, insustentável! Conclui ainda, noutro lugar, FERRER
CORREIA: «Cada Estado tem naturalmente os seus
valores jurídicos fundamentais, que entende não dever
abdicar, e interesses de toda a ordem, que reputa essenciais e que em qualquer caso lhe incumbe proteger. A
preservação desses valores e a tutela desses interesses
exigem que a todo o acto de atribuição de competência a
um ordenamento jurídico estrangeiro vá anexa uma
ressalva: a lei definida por competente não será aplicada na medida em que essa aplicação venha a lesar
algum princípio ou valor básico do ordenamento nacional, tido por inderrogável, ou algum interesse de precípua grandeza da comunidade local».
Parece então não haver dúvida relevante quanto a
dois pontos de substancial interesse: por um lado,
as normas de DIP, mormente as normas de conflito
(para quem entende, como nós, que o DIP não se
esgota nas normas de conflitos), não são meras formas vazias (sendo desde logo criticável, do ponto
de vista filosófico-conceptual, a possibilidade desta
expressão) ou, para uma aproximação à linguagem
jurídica, simples ordens sem sentido de justiça; por
outro lado, a sua eventual reputação de normas predominantemente técnicas ou o seu enfoque numa
justiça predominantemente formal não podem ser
argumentos para uma exclusão de comparação e
confronto com determinados valores e proposições
jurídico-materiais, nomeadamente com direito
superior, como a Constituição ou, no caso da União
Europeia, o direito comunitário. E, assente este
ponto, passamos então a acompanhar o Prof.
FERRER CORREIA no tocante à determinação da
conexão relevante.
Começa FERRER CORREIA por anotar que «ao
princípio da most significant relationship foi dado largo
acolhimento no 2.º Restatement americano (Restatement of the Law —Second) e também no Projecto austríaco de 1971», para deixar claro desde logo que «é
sob a égide do referido principio que tais problemas
devem resolver-se— e não em conformidade com as
ideias da Better law approach ou qualquer doutrina que
preconize o repúdio do sistema tradicional de conexão».
Debruçando-se depois sobre o regime jurídico português, conclui FERRER CORREIA que «ao princípio da conexão mais significativa foi atribuída uma função subsidiária, mas num sentido diverso. Agora ela
intervirá sempre que os critérios conflituais consagrados
na lei em primeira linha não possam funcionar, isto é,
na ausência das circunstâncias a que a norma de conflitos atribui sucessivamente o papel de conexões determinantes. Assim, por exemplo, a regra de conflitos disporá
que na falta de nacionalidade comum e também de residência habitual comum dos sujeitos da relação, será
esta regulada pelo direito do país com o qual se ache
mais estreitamente conexa».
Depois de definido, o autor toma posição sobre o
mesmo regime, aventando desde logo que se tal sistema é «teoricamente defensável, suscita não obstante
alguns reparos». Por um lado, porque «trata-se de um
princípio geral a que podem reconduzir-se as várias
normas de conflitos do sistema, mas cuja mera enunciação não basta para a resolução de questões concretas».
ARTÍCULOS
Por outro, e sobretudo, porque intui o autor «que da
orientação perfilhada vai resultar a flutuação da jurisprudência, a imprevisibilidade das decisões judiciais —
ao fim e ao cabo, a incerteza jurídica. O sistema utilizado afectará também inevitavelmente a harmonia internacional de julgados, harmonia que constitui, no entanto, a meta para que o direito internacional privado
tende em última linha». E após a crítica, tomando
como exemplo a substituição, pela reforma do
Código Civil de 1977, do elemento de conexão
«nacionalidade do marido» (na norma referente à
determinação do regime de bens do matrimónio,
constante do art. 53.º CC), avisa que seria melhor
caminho o seguinte: «teria sido preferível que o nosso
legislador, ao ver-se enfrentado com o problema resultante da necessária erradicação da nacionalidade do
marido como elemento de conexão determinante na
âmbito das normas de conflitos concernentes às relações conjugais e à separação e divórcio, optasse por um
sistema semelhante ao que vem sendo preconizado na
RFA [então República Federal da Alemanha], quer a
nível oficial, quer por parte de eminentes tratadistas. O
sistema seria este: na falta de nacionalidade e residência habitual comum dos cônjuges, atender-se-ia aos
seguintes factores, por esta ordem:
(i) última nacionalidade comum, contanto que um
dos cônjuges mantenha essa nacionalidade
(ii) ultima residência habitual comum, se um dos
cônjuges conservar essa residência
(iii) residência de ambos os cônjuges no mesmo país
(iv) ultima residência comum de ambos os cônjuges
Como derradeiro recurso poderia funcionar ou o
sistema da competência cumulativa, ou o da aplicação, a cada um dos cônjuges, do seu estatuto pessoal, ou, preferivelmente, o da aplicação do direito
mais fraco, por tal se entendendo aquele segundo o
qual o matrimónio obriga menos os cônjuges».
Não cremos que este raciocínio deva proceder, ressalvado o respeito e a consideração que nos merece
o Ilustre Professor. A ideia de que o princípio da
conexão mais estreita, elevado a critério normativopositivo de decisão, pode gerar imprevisibilidade
decisória ou flutuação jurisprudencial de sentido,
sendo como tal desaconselhável, não está, em nossa
opinião, de acordo com o espírito do moderno
Direito Internacional Privado, sua estrutura e teleologia. Um sistema puramente formalizado e categorizado é susceptível de gerar, sem dúvida alguma,
maior segurança no tráfego, mas fá-lo à custa duma
«fixidez» e dum espírito «avalorativo» nítidos. Tal
como pode conduzir, como nota o Prof. FERRER
CORREIA, a uma superior harmonia de julgados do
ponto de vista internacional, principalmente se os
critérios positivados nas normas de conflitos do
foro tiverem paralelo ou reconhecimento nas normas dos restantes ordenamentos jurídicos da cadeia
de comunicação.
Acontece que estes não são, todavia, os únicos elementos a ter em conta, como se assinalou já, no
moderno direito internacional privado. Como ensina NEUHAUS, a justiça do DIP consuma-se essencialmente em dois momentos: num primeiro nível,
que consiste na eleição do elemento de conexão (a
«pontifex» de que falava RABEL), e num segundo,
que consiste exactamente na modelação do resultado material obtido através dessa mesma conexão.
Não é apenas a compatibilidade formal e/ou a harmonia de julgados a estar em causa: é também o
próprio título de legitimidade ou autoridade da
norma em intervir. Este aliás, com as inegáveis alterações que foi sofrendo, é um princípio conformador antigo em DIP: o princípio da maior legitimidade ou proximidade, por vezes positivado nas
diversas legislações como «quid mínimo», como um
princípio de mínimo de proximidade com a situação a regular. É o que ocorre, por exemplo, com o
art. 41.º, n.º 2 do Código Civil português.
JOSE MARIA ESPINAR VICENTE define com precisão, em nosso entender, as linhas de força do novo
paradigma do direito internacional privado: a crítica à mera utilização do tipo abstracto e a ideia chave da maior proximidade à situação material a regular. Vale a pena evocar aqui algumas palavras deste
autor:
«[...] a pesar del sustrato desconstrutivista de las
teorías contemporáneas, en todas ellas existe, cuanto menos, el germen de una alternativa al método
clásico.
Primero, el proceso de localización del paradigma
no debe basarse exclusivamente en el análisis del
tipo abstracto al que se reconducen las conductas y
hechos reales. La localización debe establecerse
mediante el examen directo de las propias conductas y hechos reales que hayan de regularse [...].
Segundo, las conexiones deben seleccionarse y formularse pensando, fundamentalmente, en el resultado sustancial que pretende lograrse. Este objetivo
comporta la utilización de una metodología flexible,
que se obtiene mediante la disposición de las conexiones en agrupaciones rigurosamente acumulativas, sucesivas, alternativas o mediante el uso de factores de localización meramente orientativos.
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Tercero, estos objetivos deben quedar garantizados,
hasta el punto de que si no se lograse su satisfacción
a través del empleo de estas nuevas técnicas, estas
deben ceder en aras de un resultado más adecuado
[...]. En esta línea podrían incluirse las normas
narrativas de JAYME, las cláusulas de excepción e
incluso ciertas actitudes judiciales basadas en la
Zweistufentheorie, en las que se toma en consideración la regulación establecida en un ordenamiento
no reclamado por la norma de atribución, pero si
estrechamente vinculado con el asunto [...].
Ora, a harmonia de julgados (ou de decisões internacionais) é, como sublinha o Prof. BAPTISTA
MACHADO, um princípio de «justiça formal», incapaz de se situar como fenómeno catalizador de toda
a justiça conflitual no seio do paradigma actual e
mesmo insuficiente para ser considerado o grande
princípio, a norma normarum do Direito Internacional Privado.
Antes de analisar pormenorizadamente as posições
do Prof. FERRER CORREIA a este respeito, importa
tecer algumas considerações, para que a nossa posição seja clara e sistematicamente integrada.
É hoje praticamente consensual que as regras de
DIP não são totalmente técnicas e formais, pelo que
não se exigem mais desenvolvimentos a este respeito. Aliás, sirva apenas como nota, com a globalização em curso (sobretudo a globalização humana),
tornou-se evidente que os propósitos desta nobre
ciência jurídica extravasam em muito os órgãos
aplicadores do direito ou os Estados. Pelo contrário,
torna-se um instrumento fundamental de regulação
privada internacional, quer em sede de garantia da
continuidade das relações jurídicas, quer no âmbito
da tutela das expectativas das partes envolvidas.
Mas, em todo o caso, não nos parece procedente a
ideia de que esta continuidade —manifesta no propósito de salvaguardar a harmonia de julgados—
possa erguer-se a escopo absoluto. Vejamos: a história do DIP tem conhecido consideráveis mutações
paradigmáticas, quer em termos metodológicos,
quer em termos de postulados axiológicos e finalidades. Neste sentido, pode afirmar-se o seguinte: a
grande questão para os Estatutários italianos era
qual dos estatutos se superiorizava de tal forma que
exigia a sua aplicação para lá do limite territorial
geralmente considerado como absoluto. As considerações políticas implicadas, com efeito, reclamavam que no seio de um território unificado sob um
domínio político-administrativo, se aplicassem as
leis em vigor no mesmo. A questão era determinar
as situações que justificavam um desvio a esta regra,
em função de elementos estritamente conexos com
a pessoa ou com a personalidade jurídica. Daí a
conhecida sistematização de BÁRTOLO DE SAXOFERRATO (não autoria, como muitas vezes se afirma), assente na distinção entre «estatutos pessoais» e
«estatutos reais». Mas a problemática não ficou automaticamente resolvida, desde logo porque a complexidade e a variedade quase inimaginável de tipologias em situações privadas internacionais não se
compadeciam com uma divisão estanque ou uma
integração meramente categorial de tipo aristotélico. Esta terá sido aliás, a razão determinante do surgimento duma categoria intermédia, os «estatutos
mistos», nos quais a escolástica da baixa Idade
Média já virá a trabalhar.
Não entrando agora na problemática de conhecer o
verdadeiro momento da superação da «concepção
estatutária», é necessário reconhecer a existência de
várias escolas estatutárias (a escola estatutária dos
conflitos de leis, a escola estatutária francesa ou a
escola estatutária holandesa) e os diferentes métodos de trabalho, pois verdadeiramente era disso que
se tratava, uma vez que todas as escolas (incluindo
os franceses D’ARGENTRÉ e DUMOULIN) tinham
como base as mesmas categorias e a sistematização
bartolista. Era aliás comum —até finais do século
XVII— o brocardo segundo o qual «quem não era
bartolista, não era jurista», expressão reveladora da
influência e do impacto do pensamento deste autor
na ciência jurídica.
Em qualquer caso, é comummente reconhecido
que é com o alemão SAVIGNY que o DIP conhece o
seu ponto de viragem. Mas, para este autor — como
aliás para a sua época — a grande questão já não era
apenas determinar os casos em que se justificava
um desvio à lei do território (a óptica do desvio, da
excepção), mas qual das várias leis envolvidas e
chamadas por diferentes elementos de conexão
(fácticos ou jurídicos) presentes, devia ser aplicada.
Pode parecer supérfluo mas tem, em nosso entender, implicações profundas: por um lado, tem-se
como aceite que não deve a territorialidade ser
tomada como regra geral e principal da regulação
das situações privadas de carácter internacional;
por outro, procura-se um critério de determinação
científico para a lei a aplicar, não partindo de noções simples (típicas do raciocínio e da método escolástico) como pessoa ou território. Tal perspectiva
abrirá as portas àquilo que consideramos ser a
«complexidade do Direito Internacional Privado».
No fundo procura-se já responder à questão de
saber qual a lei melhor colocada para intervir de
acordo com a relação jurídica em causa, mas tendo-
ARTÍCULOS
a em conta como um todo. Daí que SAVIGNY venha propor o conhecido critério da «sede» da relação, imbricado numa perspectiva tendencialmente
global (embora com excepções referidas pelo próprio autor e que não interessa agora mencionar) de
regulação da mesma.
os conceitos de maior proximidade, melhor resultado ou melhor estatuto pela noção de melhor legitimação. Parece-nos, pois, que deve ser o critério da
legitimidade a orientar o legislador de conflitos: que
lei tem legitimidade, ou superior legitimidade, para
se aplicar a uma determinada relação jurídica?
É porém em finais do século XIX —ou talvez mais
precisamente já no primeiro quarto do século XX—
que se começa a formular a perspectiva que configura o DIP contemporâneo (não obstante a grande
maioria da doutrina até aos anos 60 permanecer
adstrita a uma concepção tecnicista e formal, hoje
superada), nomeadamente com a denominada
«grande descoberta» do problema da qualificação
(por BARTIN e FRANZ KAHN) e com as críticas da
escola realista norte americana, muito especialmente as posições de DAVID CAVERS, B CURRIE e
EHRENZWEIG. A questão começa a configurar-se
já não apenas numa perspectiva metodológica, mas
também substancial, ou seja, começam a manifestar-se preocupações quanto ao resultado a alcançar
com o chamado «salto no desconhecido» (LEO RAAPE), e as próprias normas são predispostas para um
determinado resultado que se pretende alcançar. É
o interesse de política legislativa (os «policy interests» de que falava CURRIE), os objectivos do legislador positivo que começam a ganhar uma relevância até então desconhecida em sede de DIP. E é
também a ideia da «better law aproach» que ganha
algum terreno, embora com modelações e restrições variadas. Em qualquer caso, imperioso será notar
que a óptica da questão —que determinará a metodologia de prossecução da resposta— é já sensivelmente diferente: que lei interessa mais aplicar? Que
lei terá mais em conta os resultados pretendidos? E
que elemento, ou elementos, de conexão, facilitará
mais a obtenção desses mesmos resultados?
Seja-nos permitida a seguinte imagem, para expressar com intensidade o que pretendemos:
Claro que esta perspectiva (dita «substancialista»)
nunca foi acolhida em absoluto (não obstante
algum radicalismo da escola americana, sobretudo
de CAVERS, nos anos 30) e a sua exportação para a
mentalidade europeia obrigou a importantes restrições e adaptações. Pode dizer-se, assim, com L.
BRILMAYER, que não é fácil encontrar uma questão
em DIP à qual possamos reconduzir genericamente
a óptica do legislador, mas um misto de concepções
diversas organizadas segundo os interesses diversos
dos legisladores nacionais, na maior parte dos casos
de difícil apreendimento real.
É neste círculo que temos de nos mover para abordar as questões em análise. Quanto a nós, dentro
desde quadro, cabe dizer que preferimos substituir
Uma determinada equipa de futebol portuguesa é
convidada para um jogo amigável em Omã, contra
uma equipa local. Sendo, porém, um acontecimento notável naquele país, as autoridades nacionais
decidem premiar o vencedor com uma avultada
quantia em dinheiro, somando o mesmo que ganharia a equipa se vencesse a Liga dos Campeões.
Está portanto em causa uma quantia substancial.
Poucos minutos após o começo da segunda parte
surge o primeiro golo da equipa nacional e, após tal
facto, o árbitro (um nacional de Omã) põe termo ao
jogo. Indignada, a equipa portuguesa reage e solicita a intervenção de todos os órgãos responsáveis e
ameaça interpor recurso para os tribunais. É-lhe
dito, porém, que todos os jogos com bola segundo
as regras de Omã terminam após o primeiro golo,
seja em que sentido for, determinando imediatamente o vencedor da partida.
Mas a questão é: que regras devem ser aplicáveis: as
regras do Estado onde decorreu o jogo ou as regras
internacionais de futebol?
Na óptica estrita do princípio da territorialidade,
dir-se-ia: as regras do Estado de Omã, onde decorreu o jogo; numa perspectiva de «maior proximidade», somos igualmente obrigados a concluir pela
aplicabilidade das regras de Omã; numa posição
dita substancialista, i.e., do resultado pretendido,
não avançaríamos muito, pois tal dependeria da
óptica de análise: se dependesse do tribunal de
Omã, provavelmente o fundamental era a preservação das regras tradicionais dos jogos naquele país.
Mesmo o conceito de «sede da relação jurídica», de
SAVIGNY, seria aqui de muito difícil aplicação e,
em todo o caso, aproximar-se-ia das soluções anteriores: com efeito, toda a materialidade da situação
gira em torno do Estado de Omã. O jogo é neste
país, o árbitro é nacional deste país e uma das equipas é também nacional, sendo certo ainda que o
convite partiu desta mesma equipa e o prémio em
causa foi decidido e disponibilizado pelas autoridades deste país.
Com esta imagem simples, não queremos mais do
que por em relevo as fragilidades de concepções
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absolutas, com pretensão de totalizadoras, em
obediência a determinados princípios/finalidades
tidas por primordiais. De facto, todas as perspectivas apontadas parecem —segundo a sua lógica
interna— tender para esta resposta, e a verdade é
que ela nos parece, intuitivamente, injusta e
inapropriada para reger a situação. Ora, em nosso
entender, a questão teria de ser resolvida à luz do
critério da «legitimidade superior», que consiste
em definir qual a lei ou conjunto de regras ou instituto normativo se reveste de «legitimidade superior» para intervir e regular a situação. Tal juízo
implica, por um lado, analisar e dissecar cada pormenor relevante de uma relação jurídica concreta,
especialmente o fulcro dessa relação, propugnando-se por isso a uma elevada dose de casuísmo;
por outro lado, indagar se a relação em causa tinha, na sua origem, elementos de uma determinada
ordem jurídica ou de regras de direito internacional, isto é, averiguar se a relação constituída não
foi, desde início, conformada por uma qualquer
ordem normativa; finalmente, na densificação deste nosso critério, havia que saber se as partes
envolvidas tiveram alguma ordem normativa em
vista para regular a situação ou, ainda que o não
afirmando expressamente, todos os elementos da
relação indicam ou pressupõem essa mesma normação. Nestas situações, é a tutela das legítimas
expectativas das partes que está em causa e que
não deve ser defraudada, como corolário do respeito pela autonomia privada.
Aplicado agora o critério referido à hipótese descrita, poderíamos proceder ao seguinte raciocínio: tratando-se de um jogo de futebol —sendo este um
desporto indubitavelmente internacional, aliás dos
que maior movimento de massas e de capitais
implica— a legitimidade há-de pertencer às regras
ou conjuntos de normação mais intrinsecamente
conexas com o objecto, de acordo com a conformação e características típicas deste. Ora, é evidente
que o futebol é dos desportos com mais relevo e
implicações na vida internacional; é também evidente que existem regras claras e consolidadas ao
longo do tempo a propósito desta mesma regulação;
tratando-se dum jogo entre equipas de diferentes
países, e portanto uma situação de carácter transnacional, maior razão existe para presumir a aplicabilidade das regras de origem internacional, que
assim se apresentam com «superior legitimidade»
para regular o jogo em causa na hipótese. Só assim
não seria se as partes —ambas, por acordo— tivessem optado por outra regulação, o que seria considerada uma verdadeira convenção sobre as regras
aplicáveis e constituiria um desvio a este critério.
Mas repare-se o seguinte: seria um desvio só num
certo sentido. Se as partes acordam a regulação a
aplicar (tratando-se de um objecto disponível,
obviamente), fundar-se-ia aqui a própria legitimidade da regulação. Com efeito, nestes casos, a expectativa das partes funcionaria como um verdadeiro
critério de legitimidade.
Ora, em nosso entender, este critério, bem entendido, repudia veementemente toda e qualquer concepção formal das regras de conflitos e integra-as,
desde a sua configuração inicial, numa base material: fundadas num critério de legitimidade, elas [as
regras] perseguem necessariamente o valor da justiça, que deve assim sobrepor-se à prossecução da
harmonia internacional de decisões.
É nesta linha de raciocínio que surge a nossa diferença em relação às posições assumidas pelo Prof.
FERRER CORREIA. Atente-se sobretudo no art.
52.º, n.º2 CC, que manda aplicar, subsidiariamente, «a lei do país com o qual a vida familiar se ache mais
estreitamente conexa» e que o mesmo Prof., como já
referimos, entende ser lesiva da segurança jurídica e
potenciadora de flutuação decisória e de incerteza
jurídica, corolário de uma «renúncia do legislador a
resolver ele mesmo o problema». Como decorre do
acima exposto, a nossa posição é ligeiramente diferente.
A busca da lei imbuída de uma superior legitimidade para regular o caso deve constituir um imperativo de justiça das regras conflituais. Claro que isto
não impede a consagração de critérios positivados
pelo legislador, mas estes devem ser considerados
como concretização deste princípio e não eles próprios como princípios legitimadores. Ora, numa
determinada relação jurídica —dada a sua configuração, geralmente, em torno de um centro imputador, seja ele pessoal ou não (por exemplo, numa
relação de filiação será a pessoa do filho, mas numa
relação real será a «coisa»)— é sempre possível
aventar elementos que, em princípio, concretizam
uma superior legitimidade em intervir. Como o critério estatutário da lex rei sitae, no referente à regulação dos bens imóveis. Mas, no seio de uma relação, é possível determinar o elemento principal ou,
em alguns casos, dois elementos que podem ser
considerados essenciais. Não deve o legislador
impor uma hierarquia extensa e rígida de elementos
de conexão prevalecentes, sob pena de se afastar de
quaisquer critérios de legitimidade para se preocupar obstinadamente com a segurança jurídica, mesmo quando a lei designada seja manifestamente
ARTÍCULOS
estranha (concretamente, entenda-se) em relação à
lei em causa.
Analisemos, através de um exemplo concreto, a que
poderia levar uma solução do tipo proposto pelo
Prof. FERRER CORREIA. Diz o Ilustre Prof. que, a
propósito das relações entre os cônjuges (art. 52.º),
quando faltasse a nacionalidade e a residência habitual comuns, se deveria atender, primeiramente, à
«última nacionalidade comum, contanto que um dos
cônjuges mantenha essa nacionalidade». Imagine-se
um casal cuja nacionalidade comum é a nacionalidade belga. Porém, dois anos depois do casamento,
o marido, por passar longas temporadas em Espanha, decide adquirir nacionalidade espanhola e perde a nacionalidade belga. Com o tempo, ambos
começam a passar longas temporadas em Espanha,
sem que se altere a residência habitual: do marido
em Espanha, da mulher na Bélgica. O marido pretende agora vender à mulher um imóvel situado em
Espanha e que ele adquiriu a um amigo espanhol.
Neste caso, por faltar a nacionalidade comum ou a
residência habitual comum, o critério do Prof.
FERRER CORREIA levar-nos-ia a aplicar a lei belga
como reguladora da situação, sendo que esta nenhuma relação tem com a situação e é chamada apenas em função de um critério formal e abstracto.
Pelo contrário, um critério de «legitimidade superior», ainda que subsidiariamente, obrigar-nos-á a
indagar pelos três pontos acima referidos, e que
levarão à conclusão indubitável de que esta relação
jurídica entre os cônjuges deve ser regulada pela lei
espanhola.
Em nossa opinião, o legislador não pode estabelecer
regras obcecado com a segurança jurídica ou com a
harmonia de decisões, precludindo critérios de justiça material ou instrumentalizando-os. Nem pode,
por outro lado, pretender esgotar a regulação de
todas as situações da vida com normas positivas,
muito menos num terreno de tal forma complexo,
variado e disperso como é o das relações jurídicas
multinacionais.
Reconhecemos, no entanto, que a segurança jurídica e as expectativas dos interessados assentes na
regulação normativa ou apenas na situação material
da relação jurídica, são valores a ter em conta. A
solidez e a continuidade do tráfego jurídico são
objectivos salutares de uma ordem jurídica. Tem de
garantir-se a harmonia, quanto a nós, entre estes
dois pontos suspensos: a aplicabilidade de uma lei
superiormente legítima para regular a situação sub
judice e a segurança jurídica dos interessados. Por
isso consideramos a regulação do art. 52.º CC uma
boa fórmula de consenso: impõe-se primeiramente,
em nome exactamente da segurança jurídica, o
recurso a dois critérios, entendidos como concretizando, em princípio, a legitimidade superior;
porém, na falta destes, deixa-se funcionar o critério
per se, autonomamente, uma vez que, como se disse, está intimamente conexo com o valor de justiça
pretendido. E este obrigará, como se disse, a uma
abordagem casuística que, aqui, fará todo o sentido:
afastados os dois critérios que, à partida, determinam a melhor solução em abstracto, há que voltar à
materialidade concreta da situação e averiguar da lei
melhor colocada para a regular, do ponto de vista
da legitimidade. No fundo, trata-se, nos dois
momentos de aplicação do direito, do mesmo principio, embora concretizado numa actividade de
mediação legislativa num primeiro momento e funcionando em termos genéricos-principiológicos no
segundo.
A verdade é que, assim concretizado, o critério da
legitimidade superior harmoniza plenamente (pelo
menos tendencialmente) os vários valores a ter em
conta no moderno DIP. O critério proposto pelo
Prof. FERRER CORREIA pode levar a soluções «ilegítimas» (em nosso entender e dentro do juízo perspectivado à luz do critério da legitimidade superior,
entenda-se), como o exemplo atrás elaborado ilustra bem.
Da posição por nós subscrita há ainda que proceder
a alguns desenvolvimentos ou esclarecimentos.
Antes de mais a «questão hierárquica». Denominamos de questão hierárquica a reflexão em torno da
relação princípio-normas de conflitos, de forma a
saber se estas se apresentam como concretização
(ou tentativa) daquele (seja ele definido em qualquer perspectiva) ou se, pelo contrário, são elas [as
normas de conflito] a definir estruturalmente o regime vigente. Ou, noutras palavras, a fornecer o critério geral, sendo que algum princípio ou cláusula
geral apenas actuará a título subsidiário. Parece ser
esta última a posição do Prof. FERRER CORREIA,
quando se refere à norma do art. 52.º do Código
Civil português. Pois bem, não é essa a nossa perspectiva.
Antes de mais, entendemos que o DIP tem de ter
um princípio inspirador, um paradigma actuante
que lhe forneça, em cada época histórica, as suas
notas marcantes. Aliás, essa é uma decorrência lógica da concepção segundo a qual o DIP não é apenas
um articulado mais ou menos sistematizado de
regras técnicas e absolutamente neutrais, mas um
arsenal dogmático-científico e um conjunto norma-
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Actualidad Jurídica Uría Menéndez / 17-2007
tivo perseguidores, também, de uma determinada
justiça material ou valor de justiça, para recorrer a
uma expressão mais comum na doutrina internacional. Ora, se é assim, e tratando-se de domínio
jurídico claro, terão de (ao nível ontológico) existir
princípios estruturais e estruturantes e (ao nível
funcional-operativo) conformar as regras normativas especiais. Esses princípios têm sido entendidos
de forma volátil ao longo da história: como vimos
(ainda que de forma claramente superficial) as
ideias inspiradoras diferenciam-se claramente no
período estatutário, pós-savigniano e contemporâneo. Mas, em cada momento, distinguiram-se referências principiológicas conformadoras das regras
positivas.
Explicitámos já a nossa preferência nesta matéria,
enunciando o critério de princípio que deve reger as
situações privadas internacionais: o critério da legitimidade superior ou «superior legitimidade». Ora,
neste entendimento —que, sublinhamos mais uma
vez, parece ser o mais concordante com o moderno
paradigma de DIP— a legitimidade de um direito
(nos termos necessariamente provisórios que enunciámos) deve ser como que a «questão prévia» de
qualquer procedimento metodológico-legislativo e
também metodológico-aplicativo, i.e., no momento
de feitura das leis e no momento posterior da sua
aplicação. Neste sentido, e voltando ao art. 52.º CC,
os dois critérios legislativamente positivados (a
nacionalidade comum e a residência habitual
comum) seriam apenas instrumentos de mediação
ou concretização daquele princípio, consistindo o
último critério (a lei do estado com o qual a vida
familiar se ache mais estreitamente conexa) num
regresso racional, num «retrocesso às origens», que
seriam precisamente as notas estruturais do principio da superior legitimidade, mais do que o princípio da conexão mais significativa (the most significant relationship), que pelas razões atrás indicadas
não nos parece suficientemente abrangente e operativo. E, sendo um regresso racional, ele expressa
efectivamente a superioridade do verdadeiro critério condutor do órgão aplicador do direito e obriga
a uma decisão coerente com o mesmo. Coerência
que, note-se, nunca se perdeu, na medida exacta em
que os dois «primeiros» critérios legais mais não são
do que modelos ou instrumentos de concretização.
Perguntar-se-á: mas então, porque são necessários
sequer esses critérios iniciais, porque não deixar
logo à partida nas mãos do julgador a decisão sobre
qual a lei «superiormente legítima» para regular o
caso? Como se indicou já, resulta esta decisão da
necessária ponderação deste princípio com outros
elementos, sobretudo de ordem pragmática e funcional. Mais: trata-se de uma tentativa, um ensaio,
de, impondo o princípio —porque é ele a decidir
por esses mesmos elementos de conexão, mas como
que em termos de probabilidade, de prognose—
salvaguardar, se possível, a continuidade das relações jurídico-privadas e a harmonia de decisões.
Chegamos assim ao último considerando do nosso
primeiro tópico de análise, que parece ser um corolário lógico da nossa posição. Anunciá-lo-emos de
forma breve, visto ser relativamente marginal aos
propósitos que nos propomos atingir. Trata-se de
arguir a necessidade imperiosa de uma cláusula de
excepção (escape clause na linguagem anglo-saxónica) no direito português, por nos parecer essencial
uma norma deste tipo dentro do paradigma de DIP
contemporâneo a que fizemos referência. Advogando normas de conflitos (normas de DIP, em sentido
mais amplo) que perseguem efectivamente o valor
de justiça (pelo menos parcialmente) e a superioridade de certos princípios conformadores (onde
sobressai, pela densidade e pela posição hierárquica, o princípio da legitimidade superior), não pode
deixar de admitir-se a sua vigência para além das
próprias normas concretizadoras e a «avocação» da
situação a regular quando seja manifesto que determinada norma conflitual, não obstante ser positivamente consagrada e concretizadora, em abstracto,
do princípio, viola, no plano da análise concreta, o
princípio originário. Tal implica, como atrás defendemos, uma análise sempre casuística do problema,
embora só quando a contradição valorativa seja
manifesta se deva efectuar o referido «regresso
racional» ao princípio da legitimidade superior em
abstracto.
Em qualquer caso, é para nós evidente que a denominada cláusula de escape é expressão de um direito internacional privado em que valores substanciais se superiorizam (apesar de sempre se tentarem
conjugar), em termos operacionais, aos desígnios
formais. Expressão, no limite, de um DIP que hierarquiza devidamente as suas prioridades e objectivos. Isto implica dizer que, ainda que garanta a harmonia de julgados ou se destine a salvaguardar,
tendencialmente, as expectativas das partes, não
pode aceitar-se uma solução que se encontre em
manifesto desacerto com o paradigma vigente:
paradigma que, como já dissemos, deve assentar na
ideia de legitimidade de aplicação. Neste sentido, a
escape clause acaba por ser a pedra angular de todo
o sistema, a garantia da efectiva operacionalidade
do princípio conformador ou, numa linguagem kelseniana, a fonte de articulação de toda a pirâmide.
ARTÍCULOS
Debruçamo-nos de seguida sobre um dos problemas mais fascinantes do DIP contemporâneo: as
relações entre a Constituição e o DIP. Recordemos o
pensamento do Prof. FERRER CORREIA sobre a
matéria, expressa na referida conferência.
Começa o ilustre Prof. por avançar que «se não pode
pôr-se o problema de aquilatar a validade de normas
estrangeiras segundo os padrões ou a tábua de valores
jurídico-materiais da Constituição, já pode pôr-se o de
se lhes denegar toda a aplicação às relações privadas
internacionais, nos termos estabelecidos pelas regras de
conflitos nele vigentes, quando porventura infrinjam
aqueles valores», concluindo porém que «tal solução
não deve aceitar-se». E fundamental a mesma conclusão na base de que, também para as normas
constitucionais «não pode deixar de pôr-se aquele
mesmo problema que se levanta para as disposições das
leis ordinárias e que é o problema da sua esfera de aplicação temporal e espacial», pois «a regra de direito não
é segundo a sua natureza aplicável a condutas que lhe
sejam estranhas, que se situem fora da sua esfera de eficácia (quer em razão do tempo em que ocorreram, quer
em razão do que chamarei a sua localização espacial) e
cujos agentes nenhuma possibilidade ou razão tiveram
para por ela se deixarem determinar». Há que ter em
linha de conta, também na aplicação das normas
constitucionais, que «a aplicação de uma lei a uma
situação factual determinada pressupõe a existência
entre ambas de algum nexo, de algum ponto de contacto apreciável, ou seja em razão dos próprios factos, ou
da coisa, ou das pessoas».
Como pedra angular, e que podemos considerar
paradigmática, do seu raciocínio, estabelece:
«assim, à norma da lei estrangeira indicada como aplicável ao caso pela regra de conflitos da lex fori seria
dada, em principio, aplicação, independentemente de
ela porventura colidir com um preceito constitucional
sobre direitos fundamentais (como o que proíbe que os
filhos nascidos fora do casamento sejam alvo de discriminação; como o que formula a regra da igualdade
entre homem e mulher)». Ainda que já em conexão
com outro tema, o Prof. FERRER CORREIA parece
sintetizar bem o seu pensamento nesta matéria com
a seguinte reflexão: «não se trata tanto de estabelecer
—ou de excluir— a incompatibilidade abstracta da
norma estrangeira com as concepções fundamentais da
lex fori no mesmo domínio, como de apurar a possível
incompatibilidade de uma aplicação concreta da referida norma com o espírito do sistema. Daí que a melhor
doutrina exija que entre a situação em julgamento e a
ordem jurídica local exista algum nexo relevante: um
nexo suficientemente forte para justificar a não aplicação do direito estrangeiro. Na verdade, se for lícito dizer
que a situação em causa se apresenta como marginal
relativamente à vida jurídica que decorre no país do
foro, parece que fica excluída a possibilidade de a sua
decisão poder abalar nos seus mesmos alicerces jurídicos e morais a comunidade local. Não se esqueça, por
outra parte, que a justiça de uma lei é tão-somente uma
justiça relativa: relativa a um lugar e a um tempo determinado. Uma justiça espacio-temporalmente condicionada».
Deve começar por referir-se que é esta uma posição
com algum consenso na doutrina nacional e estrangeira e que tem sido denominada como a «exigência
do nexo relevante». Não é já a ideia, de certa forma
tradicional, do «espaço livre de constitucionalidade»,
fruto de uma particular concepção das normas de
conflitos, mas a de adaptar o tradicional entendimento da força normativa da Constituição ao domínio específico das relações privadas internacionais.
A doutrina norte americana tem sido particularmente insistente neste domínio, i.e., na exigência de
laços suficientemente fortes entre o caso sub iudice e
a ordem jurídica do foro e os tribunais norte americanos têm desenvolvido jurisprudência neste sentido. Na mesma linha, embora mais moderado, se
expressa o Prof. RUI MOURA RAMOS: «admitindose de forma mais ou menos clara a possibilidade de
intervenção dos comandos constitucionais nas relações
jurídicas cuja regulamentação é objecto do DIP, não é
possível sem mais, no entanto, dar por resolvido o problema do âmbito espacial destas normas, isto é, da
determinação de quais as relações jurídicas concretas
que não poderão ficar imunes aos valores nelas contidos. Com efeito, se a questão da determinação de um
âmbito espacial de aplicação se põe para todas as normas jurídicas, não se vê porque é que a Constituição se
veria dispensada de afrontar esta problemática. Importa, pois, segundo o consenso generalizado da doutrina,
delimitar os casos da vida jurídica internacional a que,
por assim dizer, a Constituição se vai aplicar».
E, nesta tarefa de delimitação começa por tocar
exactamente no essencial ponto do «nexo relevante».
Atente-se, pois, nas seguintes palavras: «Um primeiro ponto há desde logo que referir. E é ele o de que não
basta evidentemente que um determinado problema se
ponha em certo Estado para que se encontrem criadas
as condições necessárias à intervenção da lei fundamental deste. Não é, pois, de modo algum suficiente, para
que funcione o núcleo programático de uma Constituição, que se verifique o nexo tido por bastante para fundar a competência judiciária desse Estado. Há aqui,
com toda a evidência, que realizar uma interpretação
do texto constitucional que permita discernir quais as
hipóteses por ele contempladas, sem embargo de essa
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Actualidad Jurídica Uría Menéndez / 17-2007
interpretação não poder ser feita de fora, devendo pelo
contrário arrancar da própria Constituição. E não
parece que haja que ir além do simples bom senso para
justificar esta asserção. De resto, seria a situação contrária —a aplicação indiscriminada do texto constitucional a toda e qualquer fattispecie que um tribunal
deva analisar— que se poderia vir a revelar contrária a
outras exigências constitucionais (…). Por outro lado,
também parece que as normas constitucionais que
sejam eventualmente pertinentes para a apreciação de
uma questão prévia de pouco importarão quando esteja
em causa a resolução de uma questão principal».
Deste raciocínio denota-se uma certa concepção
das relações entre a Constituição e do DIP. Desde
logo, ainda que de forma mais atenuada e ponderada, mantém-se a exigência e a distinção —porque é
disto verdadeiramente que se trata— da aplicabilidade da Constituição face às normas nacionais e
face ás normas internacionais, quando estejam em
causa situações privadas internacionais. Em rigor,
mantém-se a exigência de um «nexo relevante»,
embora em termos algo diferenciados em relação
ao Prof. FERRER CORREIA. Também EUGENE
F. SCOLES, PETER HAY PATRICK J. BORCHERS e
SYMEON C. SYMEONIDES, em nome da melhor
doutrina anglo-saxónica, tecem considerações
similares:
«When the forum applies its law so that it imposes a
burden on a party that another law would not, it
may deprive the party of life, liberty or property. By
contrast, governmental interests of affected states in
multi-sate transactions result in the desire of the
forum to advance the policies of its law if it may do
so consistent and if this law differs from the law of
the situs of the events or the domicile of the parties,
the interests or policies of the other state or states
may be frustrated. If the interests of the affected
other state clearly outweigh the forum’s interest,
Full Faith and Credit may require that the forum
defer and not apply its law.»
Mais adiante, concluirão ainda os Autores, que «the
one test of constitutional limitations of choice of law is
whether the law to be applied has a sufficient relationship with the multi-state transaction in question to permit its application», o que, estamos convictos, enuncia uma vez mais a exigência do «nexo relevante»
na aplicação de comandos constitucionais excludentes de normas jurídicas estrangeiras. No fundo a
necessidade de uma conexão suficiente ou razoável
(sufficient relationship) para impor a operatividade
das normas constitucionais do foro, afastando assim
normas designadas pelas normas de conflitos, em
princípio as mais apropriadas para reger uma situação privada internacional da natureza em causa.
Conclui ainda, noutro lugar, FERRER CORREIA,
que «os preceitos da lei estrangeira designados pela
norma de conflitos que se não coadunem com os direitos fundamentais consagrados na legislação portuguesa são seguramente inaplicáveis (…). Só que, para
tanto, será indispensável que no caso de espécie se
encontrem realizados os pressupostos de relevância da
ordem pública. O primeiro desses pressupostos é naturalmente o facto de se tratar de valores de máxima
importância do ordenamento do foro. Outro consiste
na existência de uma conexão significativa da espécie
a julgar com aquele ordenamento. Assim, à norma da
lei estrangeira designada como aplicável ao caso pela
regra de conflitos da lex fori seria dada, em princípio,
aplicação, independentemente de ela porventura colidir com um preceito constitucional sobre direitos fundamentais (como o que proíbe que os filhos nascidos
fora do casamento sejam objecto de discriminação;
como o que formula a regra da igualdade entre o
homem e a mulher».
Vejamos em seguida que crítica se pode fazer a esta
concepção. Anotemos desde já que toda ela se
baseia numa exclusão da aplicação directa da Constituição (inclusive dos direitos fundamentais) e
numa aplicação condicionada, ou sujeita à verificação de determinados pressupostos, da mesma.
Excepto em casos absolutamente excepcionais
(aquilo a que a justiça internacional chama «imperativos de justiça»), as normas estrangeiras designadas pelas normas de conflitos do foro contrárias à
Constituição teriam igual aplicação, a menos que
uma conexão relevante à ordem jurídica do foro
justificasse o contrário. O que emerge do pensamento do Prof. FERRER CORREIA é necessariamente esta ideia: em princípio, a lei estrangeira furta-se ao controlo da constitucionalidade do foro,
excepto se uma conexão significativa (que terá de
ser analisada casuisticamente) justifique essa confrontação normativa.
Parece-nos, porém, que tal estrutura conceptual e
acervo metodológico se depara, no ordenamento
jurídico português, com não poucas dificuldades.
Enunciamos as três normas constitucionais que nos
parecem ter maior importância face ao problema
em debate:
«Art. 13.º - Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei»
«Art. 18.º - Os preceitos constitucionais respeitantes
aos direitos, liberdades e garantias são directamen-
ARTÍCULOS
te aplicáveis e vinculam entidades públicas e privadas»
«Art. 204.º - Nos feitos submetidos a julgamento
não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela
consignados»
É perceptível aos olhos de qualquer observador que
não podem as constituições nacionais impor constantemente e com base em todo o tipo de pretextos,
as respectivas valorações em sede de relações privadas internacionais. Nem tão pouco podem afastar
sucessivamente normas que, de outro modo, seriam
competentes para regular determinadas matérias,
sob pena de insuperável insegurança no tráfego e
frustração de expectativas legítimas. Mas, ao mesmo
tempo, é necessário toda a prudência na enunciação
de regras metodológicas gerais, cuja compatibilidade com o ordenamento jurídico (maxime, com o
ordenamento jurídico-constitucional) é, pelo
menos, duvidosa. A exigência de um nexo relevante entre o caso sub iudice e a ordem jurídica do foro
compreende-se. Pretende, em termos abstractos,
evitar intrusões indevidas na regulação privada
internacional. Não se pode furtar, porém, a um exigente exame crítico na óptica do nosso ordenamento jurídico.
Consagrou, como se sabe, a Constituição de 1976,
o sistema de fiscalização difusa da constitucionalidade das normas (ou um sistema de fronteira,
pedindo de empréstimo a expressão de RUI
MEDEIROS). Quer isto dizer, fundamentalmente,
que «os tribunais têm acesso directo à Constituição,
com competência plena para decidir, e não apenas para
apreciar e admitir o incidente. Neste sentido, se afirma
que, no actual sistema jurídico português, todos os tribunais, sem excepção, são órgãos de justiça constitucional», significando isto que «os actos legislativos e restantes actos normativos devem estar subordinados,
formal, procedimental e substancialmente, ao parâmetro constitucional». Não é nosso propósito proceder
agora a uma descrição do sistema [original, por
sinal] de fiscalização da constitucionalidade patente na CRP, por razões evidentes. Importa, em todo o
caso, compreender o verdadeiro paradigma estrutural e a sua materialidade, racionalidade e metanarratividade, de forma a apreender todo o seu impacto na questão em análise, isto é, as relações entre o
DIP e a Constituição.
Parece-nos evidente que, ao optar por um sistema
difuso (mas não um puro Judicial Review), o legislador procurou promover o acesso à Constituição
pelos tribunais, conceptualizando esta como crité-
rio de justiça racional. Neste sentido, a consagração
da eficácia directa dos direitos fundamentais (art.
18.º CRP) e de um sistema difuso erige-se numa
verdadeira «salvaguarda de justiça». O art. 204.º
CRP, porém, não introduz uma mera faculdade aos
tribunais, uma espécie de poder constitucional partilhado; pelo contrário, impõe esse acesso e a consideração do parâmetro constitucional em todos os
«feitos submetidos a julgamento», com a consequente desaplicação da norma [considerada]
inconstitucional. É, pois, uma verdadeira referência
jurídico-material última de todas as decisões jurisdicionais.
Claro que, em termos de metódica constitucional (e
metódica jurídica, em geral) pode e deve-se colocar
a questão de saber sob que pressupostos se desencadeia o funcionamento da norma. Isto porque,
como é reconhecido pela teoria geral do direito,
toda a norma têm um âmbito de actuação, de aplicação ou, para utilizar palavras de BAPISTA
MACHADO, um «âmbito de eficácia possível». A
demonstrá-lo está a sempre intensa polémica da
vinculação dos direitos fundamentais às entidades
privadas (tal como previsto no art. 18.º CRP) e a
clássica questão da eficácia real do princípio da
igualdade no domínio das relações jurídico-privadas.
Não é essa, porém, no nosso entendimento, o verdadeiro cerne da questão jurídica que agora nos
ocupa. Trata-se de saber, com efeito, se as normas
jurídicas estrangeiras com competência para actuar
na ordem jurídica portuguesa (através do reconhecimento dessa mesma competência por uma norma
de conflitos portuguesa) se podem furtar ao crivo
do «bloco de constitucionalidade», submetendo-se a
ele apenas quando tal seja justificado pela existência
de uma conexão significativa com a ordem jurídica.
Começamos por dizer que a referida conexão (ou
nexo relevante) releva mais em sede de determinação da ordem jurídica competente do que propriamente enquanto limite à aplicabilidade do direito
material. Se um caso a regular apresenta uma relação muito ténue com o ordenamento jurídico português, quer do ponto de vista material, quer formal, então o que faz sentido (mesmo numa pura
lógica jurídico-processual) é a ponderação da questão em sede de competência do foro e não a sua utilização enquanto justificação de um limite racional
à aplicação das normas do foro, principalmente
quando se trata das normas hierarquicamente superiores. Queremos com isto dizer que, regra geral, o
reconhecimento de uma ordem jurídica como com-
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petente para regular uma determinada matéria ou
caso complexo da vida privada internacional,
reflecte já um nexo de conexão com a referida
ordem jurídica e legitima, como nota LEWALD, a
aplicabilidade integral da mesma.
Como nota o Prof. RUI MOURA RAMOS, «tal solução não levanta problemas no caso das relações puramente nacionais —em que a aplicação da lex fori é de
preceito— nem tão pouco no das relativamente internacionais (afinal, o inverso do anterior) em que por força
se haverá de aplicar a lei do país em relação ao qual a
situação se poderá dizer puramente nacional. E a mesma lei deverá ainda ser aplicada a situações não totalmente nacionais em relação a um Estado estrangeiro
mas que tenham com este Estado os contactos que o foro
considera suficientes para, se o caso surgisse, com as
mesmas características, no seu âmbito fundarem a aplicação do seu próprio direito.»
Caso contrário, estamos a admitir a diferenciação
do nexo relevante em dois níveis: o nexo relevante
para legitimar a competência da ordem jurídica e o
nexo relevante para legitimar o próprio direito,
strictu sensu. Ou então afirmamos a importância do
nexo relevante para umas matérias e excluímos para
outras. Diríamos: está verificado o nexo que possibilita e reconhece competência à ordem jurídica do
foro para regular a questão em causa, mas já não o
que fundamentaria a aplicação da norma superior
dessa mesma ordem jurídica, sendo que a própria
Constituição proíbe expressamente a aplicabilidade
de normas (sem distinguir a sua origem ou natureza) contrárias na resolução dos casos concretos submetidos aos tribunais.
Chegamos com este tipo de considerações ao
momento conclusivo do nosso trabalho: propomos
a teoria da cláusula constitucional como grande critério de resolução da complexa questão das relações entre DIP e Constituição.
A teoria da cláusula constitucional propõe os
seguintes pontos distintivos:
(i) Toda a remissão para uma ordem jurídica
estrangeira conleva necessariamente o requisito
primordial da constitucionalidade das normas
finalmente aplicáveis face à Constituição da lex
fori.
(ii) A harmonia de julgados ou as expectativas
das partes não se podem sobrepor aos comandos constitucionais, pela simples razão de que
estão em causa valores axiais da ordem jurídica,
ou seja, valores de natureza material hierarquicamente superiores. No fundo, tal raciocínio
jurídico-metodológico também procede no
âmbito interno: não pode a uniformidade jurisprudencial impor-se a um juízo de inconstitucionalidade fundado, nem a expectativa das partes pela operacionalidade de uma norma julgada
inconstitucional pode prevalecer sobre este
mesmo juízo de racionalidade jurídica.
(iii) Para estarem reunidas as condições necessárias para o desencadear dos efeitos das normas
constitucionais basta a verificação do «nexo bastante», não de forma autónoma, mas atinente à
própria questão da competência da ordem jurídica portuguesa: caso se afigure competente,
então da conjugação da verificação do nexo exigido com o juízo de competência resulta a legitimidade de aplicação da Constituição, enquanto expressão dos valores superiores dessa
mesma ordem jurídica competente.
(iv) Apenas excepcionalmente pode determinado caso convocar normas jurídicas (através de
normas de conflitos da lege fori) que se furtem
ao crivo da constitucionalidade. Trata-se de uma
cláusula de «excepção de constitucionalidade»,
formulada nos seguintes termos: quando, apesar
de verificados os pressupostos da competência
de determinada ordem jurídica, seja manifesto
que a Constituição do foro não apresenta «vocação de aplicabilidade» ao caso concreto, seja
pela via interpretativa dos próprios preceitos
constitucionais, seja pela restante marginalidade
absoluta do caso material em análise (o termos
«restante» salvaguarda assim o ponto ou nexo
de conexão que legitimou a própria competência da ordem jurídica), então, a título excepcional, admitir-se-á uma «constitucionalidade atenuada».
(v) A «constitucionalidade atenuada» é a aplicação
de determinadas normas constitucionais dentro
de um escopo argumentativo determinado e circunscrito pela própria particularidade do caso
concreto. Repare-se que não se trata pura e simplesmente de arguir a não aplicabilidade do art.
204.º CRP (o que nos parece sempre, ainda que
a titulo excepcional, ferido de ilegitimidade por
carência de base normativa), mas de preconizar
uma interpretação particularmente restrita e atenuada (em termos de efeitos produzidos) dos
preceitos constitucionais, dentro, sublinhe-se,
da «intencionalidade problemática do caso concreto», recorrendo aqui a uma conhecida expressão
de CASTANHEIRA NEVES. De facto, afirmar
categoricamente que a norma estrangeira, (por-
ARTÍCULOS
que emanada de um órgão de poder exterior ao
«espaço constitucional» e porque destinada a
regular uma situação de cariz internacional)
pode inibir-se de um controlo constitucional
parece por em causa, para alem do principio da
constitucionalidade das lei, o próprio principio
da unidade do sistema jurídico, tal como no-lo
define MARIA LUCIA AMARAL: «O ordenamento de um Estado-constitucional, dotado desta estutura de fontes, é antes de mais um ordenamento
uno. A unidade da ordem jurídica não pode deixar
de ser a primeira característica distintiva da estrutura normativa típica deste tipo de Estado. Se, num
Estado como este, a Constituição é fonte superior do
ordenamento, e, portanto, a norma fundamental na
qual todo direito objectivo se sustenta, tal significa
que qualquer norma que componha a ordem jurídico-positiva pode ser, directa ou indirectamente,
reconduzida —na sua forma ou na sua substância;
pela autoridade que a emitiu ou pelo conteúdo da
regulação que prescreve— a essa norma fundamental única que é a Constituição».
(vi) A teoria da cláusula constitucional não
admite, em caso algum, a aplicação, no ordenamento jurídico nacional, de normas estrangeiras
claramente inconstitucionais (ressalvando, para
os referidos casos, o juízo de constitucionalidade atenuada), ao mesmo tempo que distingue
juridicamente (de forma estrutural e funcionaloperativa) a Constituição da cláusula de ordem
pública, prevista no art. 22.º do Código Civil
português.
Nestes breves tópicos sintetizamos a nossa teoria da
cláusula constitucional, sem espectaculares desenvolvimentos em função não apenas do objecto deste trabalho, previamente definido como uma recensão, mas também pelas óbvias limitações de tempo.
Em qualquer caso —e sem prejuízo de posteriores
reflexões e desenvolvimentos— parece-nos que se
integra harmoniosamente na interpretação que
fazemos da CRP, especialmente em sede de princípios fundamentais, regime jurídico dos direitos fundamentais e sistema de fiscalização e garantia da
Constituição.
O DIP é, como sublinhou KRONSTEIN, um instrumento de ordem social e não pode, por isso mesmo,
postular-se como supra normativo ou mesmo de
natureza constitucional, muito menos pode apelidar-se, como já esgotantemente vimos, de instrumento puramente técnico e neutral. Mas, sendo um
instrumento de regulação social —para além de
normativo-judicial— não pode impor soluções
materialmente inconstitucionais, pela evidência de
que não pode por em causa o projecto social imanente aos valores constitucionais.
Voltemos agora, exposto o essencial da nossa posição, ao texto do Prof. FERRER CORREIA, nomeadamente aos exemplos que fornece como expressão
do seu modo de pensar. Procedamos então a uma
análise comparativa dos resultados a que chegamos.
Tomemos o seguinte caso, apresentado pelo Insigne
Mestre, como exemplo de análise. Trata-se de um
italiano que pretende ser reconhecido em Portugal
como filho de um compatriota aqui domiciliado. O
Código Civil italiano só admite a investigação judicial da paternidade em casos limitados (convivência
notória, como marido e mulher, da mãe com o
suposto pai no período legal da concepção, escrito
do pai donde se deduza inequivocamente a paternidade, etc.). Suponhamos, acrescenta o Autor, que
não se alega qualquer destes elementos, pela simples
razão de eles se não verificarem. Pode ou não funcionar aqui a norma constante do art. 36.º, n.º4 CRP
que estatui que «os filhos nascidos fora do casamento
não podem, por esse motivo, ser objecto de qualquer discriminação [...]», de forma a afastar as normas italianas aplicáveis a fazer funcionar a legislação portuguesa nesta matéria, que não impõe restrições
significativas à investigação da paternidade, em conformidade com os artigos 1869.º e segs. CC?
Não entraremos aqui em considerações, muito
menos minuciosas análises, do direito português
em matéria de filiação. A questão centra-se no
momento prévio: pode a Constituição portuguesa
impor, normalmente, os seus comandos normativos
e conteúdos valorativos, de forma a afastar a lei
designada pela norma de conflitos? Responde o
ilustre Prof. que tal solução seria «extremamente
contestável». E estrutura a sua resposta em dois
pontos distintos, que cumpre verificar: por um lado
«nada autoriza a taxar de intoleravelmente iníqua a lei
que, reconhecendo aquele direito [de investigação da
paternidade], todavia estabelece certas restrições ao seu
exercício, em ordem a por cobro aos abusos, ás pressões,
às chantagens a que um regime liberal se presta inevitavelmente». Por outro lado, e será este o ponto relevante na nossa perspectiva, «o laço que une o caso
figurado ao ordenamento jurídico português, e que deriva unicamente do facto de o pretenso pai residir em Portugal, não se afigura bastante. É que o eixo em torno do
qual gira o nosso direito material da filiação não reside
na pessoa do pai, mas do filho».
Pelo nosso lado, chegaríamos a resultados diferentes de acordo com a metódica proposta anterior-
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Actualidad Jurídica Uría Menéndez / 17-2007
mente —segundo a teoria da cláusula de constitucionalidade. Nesta perspectiva, começaríamos por
ajuizar— e resolvida a questão da competência do
foro, que aqui não tratamos directamente e portanto presumimos —acerca da conformidade das normas em causa (designadas) com a CRP. Chegados à
conclusão, através do processo racional de averiguação comum— e esgotada a possibilidade de
uma «interpretação conforme à Constituição» - que
não estamos perante um fenómeno de inconstitucionalidade, então o processo não oferece nenhuma
novidade e todo o iter processual seguirá o seu curso normal, sem prejuízo do posterior funcionamento de institutos como a reserva de ordem pública,
prevista no art. 22.º do Código Civil português.
Rumo diferente toma o processo em caso de inconstitucionalidade das normas em causa. Ora, na hipótese em análise, verificaríamos isto mesmo: quaisquer restrições (excepto as previstas na lei) à livre
investigação da paternidade são materialmente
inconstitucionais. Logo, começaríamos por estatuir
que, em princípio, tais normas não teriam aplicação.
Cumpriria verificar ainda, na esteira da metodologia
proposta, se a interpretação do art. 36.º, n.º 4 CRP
segundo os melhores critérios hermenêuticos, repudiava a sua aplicação ao caso concreto ou o excluía
sem mais do seu campo material de previsão. Não
parece ser esse o caso, sendo que tal comando constitucional expressa, em nossa opinião, um valor
fundamental em termos de direito da família e
manifesta a sua vontade de aplicação a todos os
casos, exactamente como forma de evitar a discriminação entre filhos nascidos dentro e fora do casamento. O segundo crivo basear-se-ia em saber se
toda a materialidade do caso (para além daquela
que necessariamente legitimou a intervenção da
ordem jurídica do foro) parece esquivar-se ao contacto (jurídico, fáctico, axiológico, psicológico,
voluntarístico) com a ordem jurídica do foro. Neste
caso concreto, parecer-me-ia que não, pois para
além de o caso estar submetido à ordem jurídica do
foro (melhor, à unidade da ordem jurídica), o pretenso pai reside em Portugal, sendo que o elemento
de conexão «residência habitual» se assume cada
vez mais (e as recentes Convenções de Haia revelam
isso mesmo) como o elemento decisivo de conexão,
interligação, de pontifex.
Assim, em face do exposto, a teoria da cláusula de
constitucionalidade imporia precisamente a solução
inversa: a procedência da acção de investigação da
paternidade. É que, em último caso, não está em
causa a iniquidade da lei italiana ou a aceitação da
sua diferente valoração perante este domínio con-
troverso do direito da família. O que está em causa
é o respeito pelas normas constitucionais (neste
caso, os arts. 18.º, 36, n.º4 e 204.º CRP) do foro
num Estado Constitucional de Direito. É o próprio
princípio do Estado de Direito, tal como —nas
expressivas palavras de MARIA LUCIA AMARAL—
é entendido na contemporaneidade: «o poder do
Estado só pode ser exercido com fundamento na Constituição, e em leis que formal e materialmente sejam conformes com ela e com o fim de garantir a dignidade da
pessoa humana, a liberdade, a justiça e a segurança».
Mas, mesmo que se admitisse a verificação do último requisito exposto (a que poderíamos chamar de
«materialidade marginal») nem por isso, em nosso
entender, deveria a acção improceder. Vejamos:
funcionaria aqui aquilo a que chamámos de constitucionalidade atenuada, nos termos da interpretação restrita e circunscrita já avançados. Porém, a
materialidade do caso concreto não se afasta ou restringe do núcleo central da previsão normativa do
art. 36.º, n.º4, de forma a justificar a sua restrição
ou, pelo contrário, alargamento. O caso em análise
subsume-se plenamente no domínio visado do
comando constitucional em análise, no seu cerne
valorativo-regulador e não num dos aspectos
marginais que poderiam, eventualmente, ceder
nesta interpretação e aplicação atenuadas da norma constitucional. Como tal, uma vez mais, a
acção de investigação da paternidade procederia e
a ela teria de se submeter o pretenso pai residente
em Portugal.
Com este exemplo, esperamos ter tornado patente,
com vigor e claridade, as diferenças substanciais das
duas posições em presença, mas também as linhas
mestras da nossa teoria da cláusula de constitucionalidade [das normas de conflitos]. Pretendemos
assim fornecer um modesto contributo ao estudo da
questão essencial das relações entre a Constituição e
o direito internacional privado, ainda que em termos necessariamente restritos e carentes de amplos
desenvolvimentos, que esperamos sinceramente ter
oportunidade de realizar num futuro próximo.
Há que notar, todavia, como elemento conclusivo,
que os dois ensaios solutivos que aqui apresentámos, quer o critério da «superior legitimidade»,
quer a teoria da cláusula de constitucionalidade, se
inserem no que consideramos ser a progressiva
materialização do DIP enquanto paradigma emergente, como assinala a Prof.ª MARIA HELENA BRITO. Ao mesmo tempo, não poderemos deixar de
reconhecer a provisoriedade da sua estruturação
material e da sua configuração jurídica. Tal como é
ARTÍCULOS
forçoso reconhecer que ambos os critérios podem
apresentar-se como insuficientes e mesmo indesejáveis face a certos casos concretos ou meramente
hipotéticos. É tempo de recordar, como já assinalavam os antigos, que a vida supera sempre as regras
jurídicas, o que não poderá deixar de valer num
domínio tão complexo e variável como as situações
privadas internacionais.
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