VIII ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PESQUISADORES EM EDUCAÇÃO ESPECIAL
Londrina de 05 a 07 novembro de 2013 - ISSN 2175-960X
OBSERVATÓRIO
DE
EDUCAÇÃO
ESPECIAL:
A
ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DAS SALAS
MULTIFUNCIONAIS EM MARABÁ-PA
IMPLANTAÇÃO,
DE RECURSOS
LUCÉLIA CARDOSO CAVALCANTE RABELO1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ E
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
IVANILDE APOLUCENO OLIVEIRA2
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ
AVELINO SOUSA RODRIGUES3
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
NATALI EMANUELE BARROSO 4
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
MAYLA LUIZA DE ALMEIDA 5
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ/PROEX
AGÊNCIA FINANCIADORA
INTRODUÇÃO
No Brasil em 2005 é criado o Programa de Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais
(SRMs) nas escolas regulares, prioritariamente, com a oferta do atendimento educacional
especializado/AEE como apoio à inclusão escolar, constituindo-se como um dos componentes
fundamentais da atual Política de Educação Inclusiva.
Conforme dados oficiais do MEC, tem havido uma notória expansão dos serviços: de 2005 a
2011 foram criadas e financiadas 37.801 Salas de Recursos Multifuncionais, contemplando
37.281 das escolas públicas que informaram no censo a matrícula de alunos público alvo da
educação especial, abrangendo cerca de 83% dos municípios de 26 estados brasileiros e um
Distrito Federal.
Esses dados estatísticos têm sido divulgados pelo Ministério da Educação/MEC como
evidencias de “sucesso” do Programa. O questionamento a este “sucesso” anunciado tem
1
Técnica pedagógica do Campus de Marabá/UFPA, Mestre e doutoranda em Educação Especial pelo Programa
de Pós Graduação em Educação Especial da UFSCar e pesquisadora do Observatório Nacional de Educação
especial/ONEESP do Campus da UFPA/Marabá. e-mail: [email protected]
2
Professora Dra. da Universidade do Estado do Pará, coordenadora da pesquisa estadual no Pará vinculada ao
Observatório Nacional de Educação especial/ONEESP. e-mail: [email protected]
3
Estudante de graduação do Curso de Letras Língua Portuguesa da Universidade Federal do Pará/Campus de
Marabá, bolsista de extensão do Programa de Extensão O Infocentro como espaço de formação continuada de
professores do Atendimento Educacional Especializado para a inclusão escolar. E-mail:
[email protected]
4
Estudante de graduação do Curso de Geografia da Universidade Federal do Pará/Campus de Marabá, bolsista
de extensão do Programa de Extensão O Infocentro como espaço de formação continuada de professores do
Atendimento Educacional Especializado para a inclusão escolar. E-mail: [email protected]
5
Estudante de graduação do Curso de Pedagogia da Universidade Federal do Pará/Campus de Marabá, bolsista
de extensão do Programa de Extensão Formação de Recursos Humanos em Educação especial na perspectiva da
Educação Inclusiva/PROEX/PIBEX/UFPA. e-mail: [email protected]
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perpassado por análises críticas de pesquisadores da área, especificamente porque se
considera apenas dados quantitativos. A análise qualitativa sobre a oferta desses serviços é
uma necessidade que se impõe a pesquisadores comprometidos com a qualidade da educação
ofertada a grupos historicamente marginalizados, tal como as pessoas com deficiência,
transtornos e superdotação, que hoje figuram como público-alvo da educação especial
(BRASIL, 2011).
Nesta perspectiva são necessários estudos mais pontuais que revelem indicadores
significativos dos impactos desta política no desempenho acadêmico dos alunos; assim como
a ampliação e intensificação de pesquisas que descrevam e analisem os aspectos qualitativos
da política, ou seja, como efetivamente ela tem se concretizado na realidade das escolas
brasileiras.
A Política Nacional da Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL,
2008) prevê uma reorganização dos sistemas de ensino, para garantirem a escolarização dos
alunos público alvo da educação especial, focando na oferta do atendimento educacional
especializado e a garantia formação de professores para o ensino especial e comum nas
escolas regulares.
Mas como têm sido implantadas essas políticas que se pretendem inclusivas? Como as redes
de ensino têm desenvolvido suas ações para garantir a materialidade das políticas? Quais os
avanços e dificuldades nas mais diversas realidades do Brasil nesse formato hegemônico atual
– matrícula no ensino comum e atendimento educacional especializado prioritariamente nas
SRMs? E a formação de profissionais para atuarem no ensino comum e ensino especial como
tem ocorrido nos municípios brasileiros? Esse conjunto de questionamentos tem sido foco de
estudos de muitos pesquisadores da área de educação especial e inclusiva, entre os quais
Mendes (2010; 2011); Prieto (2003); Oliveira (2009); Milanesi (2012).
Esta pesquisa integra o conjunto de estudos desenvolvido pelo Observatório Nacional de
Educação Especial/ONEESP, com a finalidade de analisar a implantação e funcionamento das
salas de recursos multifuncionais/SRMs na rede municipal de ensino de Marabá-PA.
O objetivo do estudo foi verificar se esta política tem apoiado a escolarização de alunos com
deficiência, transtornos e altas habilidades/superdotação e quais os limites e potencialidades
do atendimento educacional especializado/AEE desenvolvido nas SRMs. Analisando a
implantação e funcionamento das salas de recursos multifuncionais na Rede Municipal de
Ensino de Marabá-PA a partir das falas das professoras, refletindo sobre seu processo seu
trabalho no AEE, formação e práticas de avaliação de seus alunos.
O trabalho se estrutura a partir de três eixos temáticos que fundamentam a pesquisa e que
serão discutidos a seguir.
Contextualizando a formação de professores do AEE para a inclusão escolar
Com a implantação da política de educação inclusiva assumida pelo governo brasileiro desde
a Constituição Federal do Brasil (BRASIL, 1988), quando se determina a oferta do AEE no
ensino regular, as políticas de formação de professores caminharam na direção de atender as
necessidades educacionais de todos os alunos.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/96 (BRASIL, 1996), endossa essa
necessidade de qualificação dos professores em seu Art. 59º: “III - professores com
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especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem
como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas
classes comuns” (BRASIL, 1996, p. 22).
A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL,
2008), aponta a necessidade de Formação de professores para o atendimento educacional
especializado como uma das condições fundamentais para a escolarização dos alunos.
Nas Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação
Básica, modalidade Educação Especial, atribui-se ao papel do professor do AEE:
I – identificar, elaborar, produzir e organizar serviços, recursos pedagógicos, de
acessibilidade e estratégias considerando as necessidades específicas dos alunos
público-alvo da Educação Especial;
II – elaborar e executar plano de Atendimento Educacional Especializado, avaliando
a funcionalidade e a aplicabilidade dos recursos pedagógicos e de acessibilidade;
III – organizar o tipo e o número de atendimentos aos alunos na sala de recursos
multifuncionais;
IV – acompanhar a funcionalidade e a aplicabilidade dos recursos pedagógicos e de
acessibilidade na sala de aula comum do ensino regular, bem como em outros
ambientes da escola;
V – estabelecer parcerias com as áreas intersetoriais na elaboração de estratégias e
na disponibilização de recursos de acessibilidade;
VI – orientar professores e famílias sobre os recursos pedagógicos e de
acessibilidade utilizados pelo aluno;
VII – ensinar e usar a tecnologia assistiva de forma a ampliar habilidades funcionais
dos alunos, promovendo autonomia e participação;
VIII – estabelecer articulação com os professores da sala de aula comum, visando à
disponibilização dos serviços, dos recursos pedagógicos e de acessibilidade e das
estratégias que promovem a participação dos alunos nas atividades escolares
(BRASIL, 2009, p.3).
Mendes (2010, p. 24) analisa que a este profissional é imputado uma sobrecarga de
responsabilidades, tais como saber lidar com todas as categorias de deficiência, transtornos e
superdotação, em todos os níveis e modalidades de ensino e em diversificados locus – escolas
especiais, salas de recursos, classes hospitalares, ensino domiciliar. Na atuação das salas de
recursos multifuncionais como tem se desenvolvido a prática pedagógica do professor
especialista? Que tipo de atendimento especializado é possível realizar? Como organiza sua
didática? Como avalia seus alunos. Essas são questões de base para refletirmos sobre a
política de educação especial na perspectiva da educação inclusiva.
O processo de avaliação de alunos público-alvo da Educação Especial no contexto da
política da educação inclusiva
O processo de avaliação de alunos considerados público-alvo da educação especial tem como
ponto de partida a definição clara de quem são esses alunos, suas demandas e potencialidades.
Atualmente são considerados da educação especial alunos com deficiências, transtorno global
do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação (BRASIL, 2011)
A questão da avaliação em educação especial conta com orientações oficiais, no documento:
“Saberes e práticas da inclusão: Avaliação para a identificação das necessidades educacionais
especiais” (BRASIL, 2006) que valoriza também “as habilidades básicas que permitem que o
aluno enfrente as demandas das diferentes etapas do fluxo da educação básica, quanto às
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características do ambiente no qual o sujeito se encontra” (BRASIL, 2006, p.62). A avaliação
precisa estar a serviço de melhorar as condições de aprendizagem e as repostas educacionais
precisam estar compatíveis com as necessidades educacionais especiais dos alunos.
Os professores que atuam com os alunos público-alvo da educação especial devem realizar
uma “[...] ação pedagógica processual e formativa que analisa o desempenho do aluno em
relação ao seu progresso individual, prevalecendo na avaliação os aspectos qualitativos que
indiquem intervenções pedagógicas do professor” (BRASIL, 2008, p. 11).
Depreende-se dessas orientações a preponderância de uma perspectiva pedagógica de
avaliação e não clínica, ou seja, identificam-se as necessidades educacionais especiais para a
tomada de decisões pedagógicas e produção de material de apoio a inclusão escolar dos
alunos.
O funcionamento das salas de recursos multifuncionais e o desenvolvimento do AEE
O Programa de implantação das salas de recursos multifuncionais foi criado com a
intencionalidade de apoiar os sistemas de ensino com materiais pedagógicos e de
acessibilidade, para a realização do AEE, complementar ou suplementar, que deveria
funcionar para identificar, elaborar e organizar:
[...] recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena
participação dos alunos, considerando as suas necessidades específicas. As
atividades desenvolvidas no atendimento educacional especializado diferenciam-se
daquelas realizadas na sala de aula comum, não sendo substitutivas à escolarização.
Esse atendimento complementa e/ou suplementa a formação dos alunos com vistas à
autonomia e independência na escola e fora [...] (BRASIL, 2008, p. 16).
O Decreto Nº 7.611 de novembro de 2011 (BRASIL, 2011) prevê como objetivo a seguridade
de condições para o acesso, participação e aprendizagem no ensino regular e a garantia de
serviços de apoio especializados de acordo com as necessidades individuais dos alunos
garantindo a transversalidade de educação especial em todos os níveis e modalidades de
ensino. Esse conjunto de orientações tem sido implantado nos municípios brasileiros com
vistas a atender as diretrizes da política nacional de educação inclusiva.
Método
A pesquisa foi desenvolvida com base na abordagem qualitativa, orientada pelos princípios da
pesquisa colaborativa.
Utilizou-se a técnica de grupo focal (GATTI, 2005) no levantamento de dados sobre como
ocorre o atendimento educacional especializado nas SRMs. A investigação colaborativa
envolveu a criação de um grupo atuando em conjunto na análise do objeto de estudo:
pesquisadoras e professoras (IBIAPINA; FERREIRA, 2005).
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A pesquisa foi desenvolvida no município de Marabá no Pará, de 2012 a 2013, com a
realização de oito encontros de grupos focais, articulando-se a um projeto de extensão 6
institucionalizado pela Universidade Federal do Pará.
Participaram do estudo, trinta e quatro (34) professoras que atuavam em dezesseis (16) salas
de recursos multifuncionais7, de dezesseis (16) escolas públicas – educação infantil e ensino
fundamental – e uma coordenadora do Departamento de Educação Especial do sistema
municipal de ensino. As participantes serão representadas neste artigo por nomes fictícios,
para não serem identificadas.
O estudo foi realizado com base na metodologia do ONEESP (MENDES, 2010), utilizando a
técnica de grupo focal em três eixos: 1 – Formação de professores para inclusão escolar; 2 Avaliação do estudante com necessidades educacionais especiais e 3 - organização do ensino
nas salas de recursos multifuncionais e classes comuns
As Etapas da pesquisa foram:
1
Procedimentos éticos da pesquisa: apresentação da pesquisa e assinatura do
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
2
Estudo do funcionamento das salas de recursos multifuncionais – Realização
de oito encontros de Grupos Focais.
3
Devolutiva dos dados, processos formativos e contribuições à política local.
Nos Grupos Focais participaram todas as 34 professoras do AEE do município, que foram
dividas em três grupos focais. Os encontros foram filmados e o conteúdo destas transcritas na
íntegra. Na sistematização e a análise dos dados foram utilizadas técnicas da análise de
conteúdo.
Resultados e discussões
Os dados coletados nos encontros de grupos focais com professoras que atuam no
atendimento educacional especializado em salas de recursos multifuncionais no sistema de
ensino municipal de Marabá foram organizados em três grandes eixos temáticos para análise
descritos a seguir.
1º eixo: Formação de professores para a inclusão escolar. As professoras afirmaram sobre
as suas formações iniciais e continuadas ao longo de suas trajetórias, que apesar de
contribuírem com sua qualificação, não atenderam, com qualidade, toda a diversidade das
demandas de seus alunos.
As professoras do AEE têm funções bastante ambiciosas (BRASIL, 2009) desde a
organização de serviços e produção de recursos pedagógicos acessíveis, atendimento a todas
as categorias de deficiências e transtornos, acompanhar o uso dos materiais produzidos no
ensino comum, orientar famílias, dar apoio ao professor do ensino comum, dominar
tecnologias assistivas. Diante destas exigências as professoras manifestam sua recusa ao
caráter multifuncional de seu trabalho, criticando a exigência de um professor “polivalente”.
6
Projeto Formação de Recursos Humanos na área da Educação Especial na perspectiva da Educação
Inclusiva/UFPA/PROEX/PIBEX, coordenado pela pesquisadora da UFPA e doutoranda da UFSCar no Programa
de Pós-Graduação em Educação Especial.
7
Uma característica da política educacional local consiste na lotação de duplas de professoras em cada SRMs.
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[...] o professor do AEE ele tem que ser assim polivalente [...] ele tem que conhecer
todas as deficiências eu acho assim [...] que [...] exige muito e não está oferecendo o
tempo e nenhuma condição para que o professor do AEE tenha todo esse
conhecimento, saiba trabalhar com todas as exigências que tem aí. Eu acredito assim
[...] por essas leis deveriam ser oferecido bem mais formação [...] (ADÉLIA).
Esta crítica dialoga com as análises de Mendes (2010) que indica uma sobrecarga de
responsabilidades imputadas a este profissional.
As professoras apontam a necessidade de mais formação e apresentam proposições
interessantes sobre como deveria ser pensada, organizada e desenvolvida as formações:
precisa haver participação das professoras na elaboração de propostas; as demandas reais da
prática precisam ser consideradas; os casos reais de ensino dos alunos precisam ser debatidos
nas formações. Segundo a professora Ivana, não precisa esperar sempre por um formador
externo, pretensamente, mais conhecedor e experiente na área.
Segundo a professora Cecília o cenário da atual política de educação inclusiva exige muito
dos professores do AEE, e os cursos e programas do governo federal, por exemplo, não tem
atendido suas necessidades formativas e indica que são necessários cursos:
[...] em todas as áreas [...] já que a gente tem que está preparado para todas elas [...]
eu não quero mais fazer aqueles cursos que a gente faz por aqui que fica assim... só
no blá... blá... blá... e parece que morre e não vai para lugar nenhum. Entrei para
fazer uma pós numa instituição dessa particular porque é uma necessidade a gente
ter esse certificado, mas aquilo que eu aprendi foi aquilo que eu busquei... que eu me
dediquei por que não tem aquele suporte... eu digo que quando os cursos vem do
Governo Federal que é um investimento de lá as cobranças são maiores porque eu já
fiz esses cursos [...] eu acho na minha opinião deveria ter cursos que atendessem
pelo menos o pessoal que já está na sala e que precisa desse conhecimento... é claro
que a gente sabe também que esse profissional deveria estar lá dentro sabendo de
tudo... por que isso diz na legislação que a gente para está lá dentro deveria estar
apto à tudo, inclusive eu já ouvi isso de colegas nossos e todas as vezes em que eu
escuto isso... eu levo um susto... sinceramente... aí da vontade de largar tudo que eu
já aprendi aqui e dizer... não vou dar conta dessa demanda desse jeito aqui [...]
Neste depoimento, fica claro o descontentamento de uma professora que ler criticamente a
política de educação inclusiva e seu processo de implantação. Mendes (2011) já apontava em
seus estudos que tem sido poucas as oportunidades de formação ofertadas, e sem a qualidade.
Eixo 2 - Avaliação do aluno público-alvo da educação especial. Identificamos que na fase
de diagnóstico são apontadas dificuldades, pois apesar de existir uma equipe multidisciplinar
– psicólogas, fonoaudiólogas, terapeuta ocupacional, pedagogas e psicopedagogas da
SEMED, o volume de demandas de alunos para triagem é elevado.
O diagnóstico é realizado por esta equipe multidisciplinar que atende toda a rede municipal de
ensino, conforme as solicitações das escolas. A crítica principal das professoras do AEE
refere-se à demora e falta de retorno às escolas, das avaliações e encaminhamentos a serem
realizados com os alunos.
O procedimento inicial de identificação dos alunos é feito pelo professor do ensino comum,
que sem estabelecer um diálogo com o professor do AEE, encaminha uma listagem com
nomes de alunos para a direção da escola, que enviará a SEMED, para que seja feita a triagem
na escola pela equipe multidisciplinar. Questiona-se porque as professoras do AEE não
participam deste processo de identificação na escola? Se uma de suas funções é apoiar o
professor do ensino comum?
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Sobre a avaliação de rendimento dos alunos, as professoras do AEE relataram que utilizam
instrumentos construídos pela SEMED: uma ficha diária de registros, por meio da qual fazem,
no final do ano, um relatório qualitativo, assim como preenchem um plano educacional de
atendimento, onde constam informações avaliativas sobre o desempenho do aluno.
3º eixo temático de análise dos dados Atendimento educacional especializado nas salas de
recursos multifuncionais, caracterizou-se como está organizado o AEE nas SRMs. Sobre a
função do AEE na escolarização dos alunos público-alvo da educação especial são realizadas
avaliações que indicam dificuldades e limites:
...Eu acho que a escola nossa oferece o mínimo né?! Muito pouco, o mínimo pelo
menos, é o menor lugar... o menor espaço... [...] eles sempre esquecem que a escola
tem o AEE, sempre esquecem que a escola (...) o AEE é da escola... Trabalham com
os alunos da escola [...] (FLORBELA)
[...] os alunos só participam de alguma coisa da escola quando a gente está no meio
brigando para eles participarem... (ALÍCIA)
[...] na nossa sala que eles têm um pouco mais de aproveitamento e são poucos os
dias né? três vezes na semana... e quando vem... e quando falta a semana toda... Cai
bastante o rendimento... (ROSA)
Esses relatos expressam a maneira como a sala de recurso multifuncional, o AEE e o trabalho
do professor especialista são considerados na escola, assim como se observa que o AEE da
forma como está organizado não atende às demandas do aluno.
A relação do trabalho do professor do AEE com o ensino comum é proposto nos documentos
oficiais do MEC (BRASIL, 1996; 2008; 2010; 2011), contudo, as condições de trabalho do
professor do AEE não permitem que esta articulação ocorra efetivamente. Existe uma relação
de tensão e cobrança entre os profissionais, tal como expresso nas falas a seguir:
[...] tem hora que eu vejo assim... Parece que eles cobram mais da gente do que a
gente deles... a gente acaba fazendo mais o papel dele... Eles só complementam e a
gente é a função principal... (NARA).
[...] acham que a gente está lá para dar o reforço (RUBIA).
[...] a função do professor também, do AEE... É também... não é só trabalhar com o
aluno né? Mas com os professores também... desse aluno da sala comum né?
(TELMA)
Sobre a organização e funcionamento das salas de recursos multifuncionais as professoras
seguem orientações do Departamento de Educação Especial:
[...] O atendimento acontece duas a três vezes por semana... depende da dificuldade
do aluno né...? [...] é em grupo porque é impossível atender individual por conta do
grande quantidade de alunos... Nós temos um autista lá... mas não tem como atendelo sozinho, porque temos muitos alunos... se for deixar um dia para ele os outros
vão ficar prejudicados... Então acontece dessa forma. (CORA CORALINA).
A respeito de como acontece o planejamento do AEE as professoras descreveram:
[...] o professor de português me procura e diz que está trabalhando verbo e aí eu
vou procurar fazer as atividades adaptadas sobre o verbo para C. que é surda [...]
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[...] a gente foca bem primeiro na deficiência né? E a gente vê os conhecimentos de
cada aluno... o que cada um necessita foca mesmo bem nas dificuldades para cada
um a gente tem um plano eu acho que o próprio Departamento dá uma fichinha lá na
nossa sala...A gente tem essa ficha de acompanhamento e aí agente faz nessa ficha
mesmo... (CORA CORALINA).
[...] Na nossa sala a gente planeja primeiro faz um plano individual no inicio do ano
né? ... A partir do diagnostico a gente observa nas primeiras semanas o aluno... e vê
né quais são as necessidades dele a gente traça o planejamento... os objetivos,
quais as áreas a serem trabalhadas a gente trabalha com ele... e sugestões também, e
a partir daí, no decorrer do ano letivo a gente vai desenvolvendo através das
observações o que ele avançou, o que precisa melhorar... e aí a gente vai traçando
estratégias para ir auxiliando ele através de atividades escritas e também jogos...
atividades de computador também que é uma coisa que eles gostam... estimula
também né?! Que é o computador... (TELMA).
O papel do professor do AEE foi foco de reflexão das professoras participantes, que
criticaram uma previsão na política, mas que na prática ainda não se efetiva:
[...] no papel eu acredito que sim, agora na nossa prática não... na escola os
professores do ensino regular do ensino comum eles acham que o professor do
atendimento educacional especializado... Aquele aluno é dele... Então ele vai
elaborar suas provas suas atividades e não é assim... às vezes querem cobrar da
gente um papel que não é nosso... Eu acho que os nossos colegas não estão sabendo
ou não querem entender qual é o nosso papel lá... Acham poxa! Tanto tempo que
esse aluno está lá e não consegue aprender a ler... (ADÉLIA).
[...] o Decreto de dois mil e oito ele era bem coeso no que ele falava, foi uma
mudança significativa e deixou todo mundo atribulado... O professor tem que dar
conta de toda essa demanda que tem aí... Agora esse último já começa a deixar
brecha e eu acredito que por essas brechas que ficam nas leis é que surgem essas
más interpretações até propositadas para que a gente fique de mãos atadas... Eu acho
que as pessoas devem olhar para essas brechas para deixar a gente nessa situação...
(CECÍLIA).
Considerando a forma como tem funcionado o trabalho de oferta do AEE nas SRMs, há
muitas dificuldades e desafios enfrentados não somente pelos alunos, como pelos professores
do AEE e do ensino comum, que indicam a necessidade de mudanças nos encaminhamentos
da política no município. Faltam melhores condições de funcionamento das SRMs que em
muitos casos é um espaço pequeno e em precárias condições, assim como há a falta de
materiais pedagógicos e equipamentos garantidos pelo Programa de Implantação das Salas de
Recursos Multifuncionais (BRASI, 2007) que demoram a chegar às escolas.
As professoras tem clareza do seu papel, dos limites do serviço do AEE, acreditam o trabalho
pedagógico poderia ser melhor se houvessem mudanças no processo de avaliação, no
planejamento, na assessoria do Departamento de Educação Especial, na promoção de
oportunidades para o trabalho conjunto entre professor do AEE e professor do ensino comum,
e principalmente, na construção de propostas de formação continuadas que atenda as reais
demandas das professoras. Estas são ações que de forma articuladas, constituem condições
ideais para qualificar o trabalho desenvolvido na área de Educação Especial no município
pesquisado.
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Conclusão
O estudo trouxe uma caracterização do trabalho pedagógico desenvolvido nas salas de
recursos multifuncionais, revelando os desafios, limites e conquistas obtidas a partir da
implantação da política de educação inclusiva apoiada pela oferta de serviços de atendimentos
educacionais especializados.
As participantes do estudo revelaram a existência de um hiato entre as exigências de suas
funções e a oferta de cursos e programas de formação que não dialogam.
O processo de avaliação tanto diagnóstica – clínica e pedagógica – tal como ocorre
atualmente no sistema de ensino pesquisado, tem originado problemáticas sérias, como
identificação questionável de alunos com deficiência intelectual, há muitos casos de
dificuldades de aprendizagem. A avaliação de rendimento acadêmico dos alunos é realizada
de forma isolada – professor do ensino comum e professor do AEE - isso precisa ser
superado.
A sala de recursos multifuncionais é um espaço que precisa ser reconhecido como parte da
escola, assim como a valorização do professor do AEE tem que acontecer considerando a
escola como todo.
A definição do público-alvo do AEE pode ser apontada como uma das principais urgências a
serem resolvidas já que atualmente as SRMs atendem um número elevado de casos com
dificuldades de aprendizagem que superlotam as SRMs o que prejudica a qualidade do
serviço educacional ofertado.
Atualmente esta pesquisa tem servido de base para a redefinição da política de educação
especial do município de Marabá. As práticas de avaliação têm sido revistas; a reorganização
das salas de recursos multifuncionais, assim como as matrículas dos alunos busca contemplar
efetivamente, os alunos que necessitam dos serviços do AEE; os instrumentos de
planejamento e avaliação estão sendo reconstruídos já em espaços de formação continuada,
que a pesquisa colaborativa aqui descrita tem propiciado, via ações de extensão.
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