TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
Registro: 2014.0000782971
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº
0046886-43.2013.8.26.0506, da Comarca de Ribeirão Preto, em que é apelante
TRANSERP EMPRESA DE TRÂNSITO E TRANSPORTE URBANO DE RIBEIRÃO
PRETO S.A., é apelado WILLIAN SILVA DE OLIVEIRA (JUSTIÇA GRATUITA).
ACORDAM, em 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de
São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de
conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores LUÍS
FRANCISCO AGUILAR CORTEZ (Presidente), ALIENDE RIBEIRO E VICENTE DE
ABREU AMADEI.
São Paulo, 2 de dezembro de 2014
LUÍS FRANCISCO AGUILAR CORTEZ
RELATOR
Assinatura Eletrônica
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VOTO Nº : 16715
APEL. Nº : 0046886-43.2013.8.26.0506
APTE.: Transerp Empresa de Trânsito e Transporte Urbano de Ribeirão Preto S.A.
APDO.: Willian Silva de Oliveira
COMARCA: RIBEIRÃO PRETO
Juiz: Júlio Cesar Spoladore Dominguez
MULTAS DE TRANSITO Ação anulatória de auto de infração
de trânsito Exercício do poder de polícia praticado por sociedade
de economia mista Questão controvertida na jurisprudência
Repercussão geral reconhecida pelo STF Atos sancionatórios
derivam do poder de coerção do Poder Público e não podem ser
delegados Precedentes desta 1ª Câmara de Direito Público e do
STJ Sentença mantida Recurso não provido.
Recurso de apelação contra r. sentença de fls. 243/248 que julgou
procedente ação anulatória de auto de infração movida por Willian Silva de Oliveira em
face da TRANSERP
Empresa de Trânsito e Transporte Urbano de Ribeirão Preto S/A,
para declarar a nulidade do auto de infração nº F 26168130, cancelando todas as
penalidades dele provenientes, inclusive a pontuação no prontuário do autor, além de
condenar ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em R$ 800,00.
Apela a TRANSERP alegando cerceamento de defesa, com a
limitação à produção de prova acarretada pelo julgamento antecipado da lide, apontando
violação aos princípios constitucionais. No mérito sustenta existir fundamento legal e
constitucional para o exercício de suas atribuições na qualidade de entidade executiva de
trânsito, bem como ser possível a delegação de poder de polícia a sociedade de economia
mista integrante da administração indireta, sendo ela prestadora de serviços públicos,
conforme vem sendo reconhecido pela jurisprudência em relação a outras entidades como
EMDEC (Campinas), CET e CETESB (São Paulo), URBES (Sorocaba) e outras. Pede
provimento ao recurso, prequestionando toda a matéria debatida (fls. 250/273).
Recurso tempestivo, com preparo (fls. 274/275); contrarrazões
apresentadas às fls. 280/298.
É o relatório.
De início afasto a alegação de cerceamento de defesa, uma vez que
as questões relevantes para o deslinde da causa estão devidamente amparadas pelos
documentos constantes dos autos e o julgamento antecipado da lide decorreu da natureza
da matéria controvertida e do contexto probatório dos autos.
Apelação nº 0046886-43.2013.8.26.0506 - Ribeirão Preto - VOTO Nº 2/5
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Nesse sentido: “...o magistrado tem o poder-dever de julgar
antecipadamente a lide, desprezando a realização de audiência para produção de provas,
ao constatar que o acervo documental é suficiente para nortear e instruir seu
entendimento. É do seu livre convencimento o deferimento de pedido para a produção de
quaisquer provas que entender pertinentes ao julgamento da lide." (STJ - AgRg no Ag
693.982 - SC 4ª Turma Rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 17/10/2006).
Quanto ao mérito, alegou o autor (fls. 01/23) ter sido contra ele
irregularmente lavrado, pela ré, o auto de infração nº F26168130 .
Apontou que a Empresa de Trânsito e Transporte Urbano de
Ribeirão Preto S/A
TRANSERP possui natureza jurídica de sociedade de economia
mista, assim, não possui legitimidade para exercer o poder de polícia, mais
especificamente no que se refere à imposição de sanção por infração de trânsito, atributo
conferido pelo ordenamento jurídico à Administração Pública, uma vez que a
descentralização das funções administrativas não pode implicar transferência/delegação
das atividades de legislar e sancionar.
Por entender que a requerida é incompetente para lavrar os auto de
infração impugnado, ingressou em juízo pleiteando a anulação da infração anteriormente
mencionada, pretensão acolhida pela r. sentença de fls. 243/248, o que ensejou a
interposição do recurso ora em análise.
A possibilidade, ou não, de empresa de economia mista receber
delegação do Poder Público para aplicar multas de trânsito é controvertida, tanto que foi
reconhecida a existência de repercussão geral sobre o tema pelo Colendo Supremo
Tribunal
Federal:
“DIREITO
CONSTITUCIONAL
E
ADMINISTRATIVO.
APLICAÇÃO DE MULTA DE TRÂNSITO POR SOCIEDADE DE ECONOMIA
MISTA. PODER DE POLÍCIA. DELEGAÇÃO DOS ATOS DE FISCALIZAÇÃO E
SANÇÃO A PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO” (RepercGeral no RExtr
com Ag nº 662.186-MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, j. 22.3.2012).
Entende esta 1ª Câmara de Direito Público que “a competência
legislativa suplementar do município decorre da cláusula genérica do interesse local;
todavia, essa liberdade de regulamentação fica limitada pelo sistema maior, que rege o
trânsito de qualquer natureza nas vias terrestres do território nacional, abertas à
circulação”. No caso do disposto pelos artigos 24, inciso VI e 25 do Código de Trânsito
Apelação nº 0046886-43.2013.8.26.0506 - Ribeirão Preto - VOTO Nº 3/5
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Brasileiro ('possibilidade de celebração de convênio delegando as atividades previstas
neste Código, com vistas à maior eficiência e à segurança para os usuários da via'), essa
delegação “não pode ser irrestrita, notadamente quando é conferida a pessoas jurídicas de
direito privado, demandando, em qualquer caso, autorização legislativa específica” (AP
0044264-88.2013.8.26.0506, rel. Vicente de Abreu Amadei, j. 27/05/2014.
Conforme anotado em referido julgado “não há lei, em sentido
formal, que atribua à Transerp competência para o exercício do poder de polícia em
relação ao trânsito na Comarca de Ribeirão Preto, permitindo tão-somente gerenciar o
sistema de trânsito municipal.
Ora, a aplicação de sanção por infração de trânsito constitui ato
típico de poder de polícia, próprio da Administração Pública, por implicar limitação do
exercício do direito de propriedade e da liberdade em favor do interesse público.
Assim sendo, o poder de polícia não pode ser delegado a
particulares ou pessoas jurídicas de direito privado, à exceção de atos materiais que
precedem o ato de polícia”.
No mesmo sentido: Apelação nº0956024-43.2012.8.26.0506, rel.
Isabel Cogan, 12ª Câmara de Direito Público, j. 30/04/2014; Apelação nº
0033788-88.2013.8.26.0506, rel. Eduardo Gouvêa, 7ª Câmara de Direito Público, j.
05/05/2014, entre outros.
A questão já foi igualmente apreciada pelo Colendo Superior
Tribunal de Justiça, ocasião em que ficou decidido que “ (...) 3. As atividades que
envolvem a consecução do poder de polícia podem ser sumariamente divididas em quatro
grupo, a saber: (i) legislação, (ii) consentimento, (iii) fiscalização e (iv) sanção. 4. No
âmbito da limitação do exercício da propriedade e da liberdade no trânsito, esses grupos
ficam bem definidos: o CTB estabelece normas genéricas e abstratas para a obtenção da
Carteira Nacional de Habilitação (legislação); a emissão da carteira corporifica a
vontade o Poder Público(consentimento); a Administração instala equipamentos
eletrônicos para verificar se há respeito à velocidade estabelecida em lei (fiscalização); e
também a Administração sanciona aquele que não guarda observância ao CTB (sanção).
5. Somente os atos relativos ao consentimento e à fiscalização são delegáveis, pois aqueles
referentes à legislação e à sanção derivam do poder de coerção do Poder Público. 6. No
que tange aos atos de sanção, o bom desenvolvimento por particulares estaria, inclusive,
Apelação nº 0046886-43.2013.8.26.0506 - Ribeirão Preto - VOTO Nº 4/5
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comprometido pela busca do lucro aplicação de multas para aumentar a arrecadação”
(REsp nº 817.534/MG, rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, j. 10/11/2009).”
(grifei).
Assim sendo, não merece reforma a r. sentença proferida pelo juízo
a quo.
Para efeito de prequestionamento anoto que não houve violação ou
negativa de vigência a qualquer dispositivo de Lei ou da Constituição, especialmente às
normas invocadas pelos recorrentes às fls. 272, destacada a desnecessidade de indicação
explícita aos artigos mencionados (nesse sentido: RSTJ 15/233, 30/341, 64/183).
Ante o exposto, meu voto é pelo não provimento do recurso.
Luís Francisco Aguilar Cortez
Relator
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Sentença 03 - Advogado - Anderson Rogério Mioto