CURSO EDUCAÇÃO, RELAÇÕES RACIAIS E DIREITOS HUMANOS
SHIRLEY ROBERTA
“Como pode a Geografia viver fora nessa fria”!
SÃO PAULO
2012
Costumo dizer que anos pares são os piores. Não gosto de 1° de janeiro desses anos.
2012 pensei logo, nada dará certo, será tudo complicado, darei um passo a frente e dez para
trás.
Vamos á fevereiro dia 1°, nesse dia os primeiros cinquenta minutos da manhã foram
infinitos, acabava de sair da sala do sexto ano A, minhas pernas tremiam, meu coração estava
acelerado, minha voz embargada. Fui até a cozinha bebi água, depois ao banheiro lavei o
rosto, molhei a nuca me olhei no espelho e segui em frente. Já tinha batido o sinal... Pensei...
Se sair agora nunca mais volto, mas se sair agora como vou saber se consigo fazer isso? Putz
me preparei tanto para esse momento, esperei tanto por ele e agora vou correr só porque tem
duzentas e cinquenta pessoas esperando para conhecer a Professora de Geografia. Enfiei as
mãos nos bolsos do avental florido, estufei o peito, respirei fundo e entrei novamente na sala
de aula, agora no sexto ano E. Ao final da manhã senti meu corpo todo dolorido, cada músculo
adormecido gritava dentro de mim. De repente, uma sensação de felicidade, um sorriso no
olhar e uma vontade enorme de explodir me invadiu. Nesse dia uma pergunta não saía de
minha cabeça, por que voltei? Por que voltei para escola, agora como professora e feliz?
A Geografia escolar entre outras funções pode contribuir para que meninos e meninas,
jovens e adultos construam saberes que lhes possibilitem interpretar o mundo e nele atuar. Já
temos a compreensão do papel da Lei 10.639 que torna obrigatório o ensino sobre História e
Cultura Afro-Brasileira e de acordo com Santos (2007) reposiciona o negro e as relações
raciais na educação brasileira. E o ensino de Geografia como fica?
A Geografia enquanto ciência humana “pesquisa o espaço produzido pelas sociedades
humanas, considerando-o como resultado do movimento de uma sociedade em suas
contradições e nas relações estabelecidas entre os grupos sociais e a natureza em diversos
tempos históricos"(PONTUSCHKA,2007), a partir de uma visão eurocêntrica. Os conceitos da
Geografia escolar como paisagem, região, território, natureza, sociedade também são
ensinados a partir de uma perspectiva eurocêntrica. Abordar temas relacionados ao Continente
Africano e a História do Negro no Brasil não é tarefa fácil, ainda mais em Geografia. É como se
fosse uma brincadeira de presença-ausência, ele existe como um dado da realidade, daí sua
presença, mas não existe enquanto conhecimento socialmente construído e validado por toda
a sociedade, daí sua ausência. Vejamos um exemplo: quando falamos de território, alguns
podem pensar em territórios indígenas, território palestino, territórios ocupados pelo
narcotráfico, mas poucas pessoas pensam em quilombos, por quê? E se afirmarmos que
existiram quilombos no Paraná, haverá alguma surpresa? Por quê?
Aprendemos nos livros de Geografia que o processo de colonização no estado do
Paraná foi maciçamente europeu, os livros não contaram quem ocupava e cultivava a terra
antes da chegada dos colonos, certo! Será necessário descolonizar também o ensino de
Geografia para que os alunos possam desenvolver suas capacidades de apreensão da
realidade e sua espacialidade, para que participem de seus bairros, das ações e decisões
políticas de forma crítica e consciente?
Costumo dizer anos pares são os piores, mas não posso reclamar de 2012. Nesse ano
descobri meu lugar no mundo.
Referências Bibliográficas
SANTOS, Renato Emerson dos. O ensino de Geografia do Brasil e as relações raciais:
reflexões a partir da Lei 10.639. In. __________(Org.). Diversidade, espaço e relações étnicoraciais: O negro na geografia do brasil. Belo Horizonte: Ed. Autêntica, 2007, pág. 27.
PONTUSCHKA, Nidia Nacib. PAGANELLI, Tomoko Iyda. CACETE, Núria Hanglei. Para
ensinar e aprender Geografia. 1ª ed. – São Paulo: Cortez, 2007, pág. 37.
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