REVISTA ÂMBITO JURÍDICO ®
Ac?o: Horas extras. Regime compensat?.
ACÓRDÃO
0114200-03.2009.5.04.0411
EMENTA: HORAS EXTRAS. REGIME COMPENSATÓRIO.
Caso em que não restou demonstrada a observância dos critérios previstos em norma coletiva para realização do regime compensatório, não
havendo documento próprio de controle das horas creditadas e debitadas no chamado banco de horas.
VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da Vara do Trabalho de Viamão, sendo
recorrente BRF S.A. e recorrido ACNS.
Ajuizada a ação trabalhista em face do contrato apontado na petição inicial, no período de 03.10.05 a 15.04.08, foi proferida a Sentença às fls.
481-495.
A reclamada recorreu às fls. 507-509 postulando a absolvição do pagamento de adicional de insalubridade, horas extras e demais reflexos da
condenação.
Com contra-razões do autor às fls. 516-521, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
ISTO POSTO:
RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA.
1. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. REFLEXOS.
A reclamada alega que as atividades do autor, em aviário, não poderiam ter sido consideradas insalubres. Alega que o reclamante não mantinha
contato com agentes biológicos, ainda mais de forma permanente. Aduz que fornecia EPIs, de forma que os agentes insalubres restaram elididos.
Sustenta que os artigos 189, 190 e 195 da CLT preveem o pagamento de adicional de insalubridade apenas nos casos taxativamente descritos na
NR 15 da Portaria 3214/78. Entende que o trabalho em aviário não é análogo ao trabalho em estábulos e cavalariças. Invoca a Orientação
Jurisprudencial 04, inciso I da SDI-I do Tribunal Superior do Trabalho. Colaciona jurisprudência. Invoca violação ao artigo 5º, II da CRFB/88. Requer a
inversão do ônus pelo pagamento dos honorários periciais. Sucessivamente, requer a exclusão do pagamento de reflexos de adicional de
insalubridade em horas extras.
Examina-se.
A Sentença analisou minuciosamente o caso dos autos, devendo ser mencionados aqui os seguintes fundamentos, fls. 489-490:
“O perito técnico enquadrou as atividades do reclamante como insalubres em grau máximo, durante todo o período contratual, de acordo com o
Anexo 14 da NR-15 da Portaria 3.214/78 do Ministério do Trabalho, pelo trabalho como arrassoador, devido ao contato com agentes biológicos, ao
retirar as aves mortas e no final do dia colocá-las na composteira, onde havia aves em decomposição. Enquadrou, ainda, as atividades como
insalubres em grau médio, com base no mesmo Anexo, pelo contato com agentes biológicos em razão do contato com resíduos de animais
deteriorados.
A prova oral confirma o exercício das atividades relatadas ao perito.
A testemunha WZ refere que “o depoente era auxiliar do líder do grupo e o reclamante auxiliava no arraçoamento; quando ligava a máquina o
reclamanteficava dentro do galpão para retirar a sujeira que caía debaixo da calha, o que era feito com a mão; esta sujeira era maravalha e
esterco das aves; o reclamante também trabalhava com arado para revolver a terra, retirava as aves mortas, ajudava a descarregar ração,
varria o galpão e retirava o esterco com a enxada” (fl. 484).
Também a testemunha SSR, ouvida a convite da reclamada, informa que “na época o depoente e o reclamante exerciam as mesmas atividades:
arraçoavam as galinhas e ajudavam naseleção e tratamento das aves; como são grupos de recria não revolviam a serragem; a retirada da
maravalha é feita por empresa terceirizada; recebiam máscara, luvas, botas e uniforme; o uso dos EPIs é fiscalizado pelo técnico de segurança; o
reclamante não participou de lavagem de galpão; o chefe de grupo é quem faz o recolhimento das aves mortas; quando o reclamante ficava
fazendo arraçoamento poderia recolher alguma ave morta de dentro do galpão, colocando-a na parte externa; depois o chefe de grupo fazia o
recolhimento das aves depositadas na parte externa do galpão” (fls. 484v-485).
O Anexo 14 da NR 15 da Portaria 3.214/78 exige, para caracterização da atividade como insalubre em grau máximo, o contato permanente com
carnes, glândulas, vísceras, sangue, ossos, couros, pelos e defecções de animais portadores de doenças infecto-contagiosas (carbunculose,
brucelose, tuberculose), o que não se evidencia no caso presente, pois os animais existentes no aviário da reclamada não são portadores de
doenças infecto-contagiosas.
Também o recolhimento das aves mortas e a colocação destas na composteira não se equipara ao trabalho em contato permanente com esgotos e
lixo urbano.
Assim, as atividades não se enquadram como insalubres em grau máximo, pelo contato com agentes biológicos.
No entanto, o Anexo 14 da NR-15 da Portaria 3.214/78, estabelece ser insalubre em grau médio “trabalhos e operações em contato permanente com
pacientes, animais ou com material infecto-contagiante, em: (...) – hospitais, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados
ao atendimento e tratamento de animais (aplica-se apenas ao pessoal que tenha contato com tais animais) (...) – estábulos e cavalariças; e resíduos de animais deteriorados”.
Se dúvida há em considerar o trabalho em aviários, análogo aquele prestado em estábulos e cavalariças, não pode a mesma subsistir em relação a
serem os aviários estabelecimentos destinados ao atendimento e tratamento de animais, enquadrando-se na expressão “outros estabelecimentos
destinados ao atendimento e tratamento de animais” constante do anexo 14 da NR-15.
Ademais, como referido pelo perito e corroborado pela prova oral, havia o recolhimento de aves mortas dentro dos galpões. Assim, considerando que
o processo de deterioração tem início com a morte dos animais, esta atividade também se enquadra no Anexo 14 da NR-15, que classifica como
insalubre em grau médio o contato permanente com resíduos de animais mortos.
Diga-se que em se tratando de agente biológico, a insalubridade é inerente à atividade, não sendo neutralizado o agente nocivo pela utilização de
EPI’s. O equipamento de proteção individual apenas pode minimizar o risco, não eliminá-lo.
Resta, pois, afastada a aplicação da Orientação Jurisprudencial 04 da SDI-I do TST.
Desta forma, as atividades caracterizam-se como insalubres em grau médio.”
Por fim, diga-se que é irrelevante, neste caso, a utilização da luvas, visto que uma das formas de transmissão dos agentes insalubres é a via aérea.
Além disso, os agentes biológicos são seres vivos que se locomovem, entrando inclusive para o interior das luvas, percorrendo braços e outras
partes do corpo.
Por fim, tem-se que é qualitativa a avaliação da existência de insalubridade por contato com agentes biológicos, não dependendo a sua
caracterização do tempo de exposição do obreiro ao agente nocivo.
Tendo em vista que a reclamada permanece sucumbente na matéria objeto da perícia, deve responder pelos honorários periciais, nos moldes do art.
790-B da CLT.
Nesse sentido, recorde-se o Acórdão 0191200-66.2009.5.04.0771 da lavra da Desa. Flávia Lorena Pacheco, com a mesma reclamada e onde o
reclamante exercia função similar.
No que pertine aos reflexos em horas extras, diga-se que esta é paga considerando a remuneração do empregado, e não apenas seu salário-básico,
como suscita o reclamado. Assim sendo, e considerando que o adicional de insalubridade percebido pelo autor integra sua remuneração para todos
os fins, deve ser considerado, também, para o cálculo das horas extras prestadas.
Sentença mantida.
2. HORAS EXTRAS. REFLEXOS.
Rebela-se a reclamada contra o pagamento de horas extras e reflexos. Diz que foram juntados os registro nos cartões-ponto das horas extras
laboradas e os recibos com o respectivo pagamento. Sustenta que o autor não comprovou que trabalhava em horário extraordinário. Invoca a
validade do regime compensatório, previsto em normas coletivas. Sucessivamente, requer seja deferido o pagamento apenas do adicional , conforme
Súmula 85, III do Tribunal Superior do Trabalho.
Examina-se.
Os cartões-ponto foram considerados válidos como meio de prova da jornada de trabalho cumprida.
As normas coletivas autorizam a adoção de compensação das horas excedentes à jornada normal de trabalho pela correspondente diminuição em
outro dia, consoante critérios estabelecidos nos anexos dos acordos coletivos (fls. 222-290 e 362-432).
Como bem referido pelo julgador "a quo", “a reclamada não juntou relatório de controle do regime de compensação de horas, no qual conste o
número total de horas laboradas, compensadas e pagas, segundo os critérios fixados em norma coletiva.
O regime de compensação, embora previsto em norma coletiva, não foi efetuado de forma regular, porque não demonstrada a observância dos
critérios previstos em norma coletiva, não havendo documento próprio de controle das horas creditadas e debitadas no chamado banco de horas.
Inválido, pois, o regime de compensação chamado banco de horas, sendo devidas como extras todas as horas excedentes da 44ª semanal.
Ressalte-se que não podem ser consideradas como extras as horas excedentes da 8ª diária, diante do acordo de compensação de horas para
supressão do labor aos sábados da fl. 79, que é válido, na esteira da Sumula 85, I, do TST.
Na apuração das horas extras, deverá ser observado o critério previsto no art. 58, § 1º, da CLT.
Do exposto, evidencia-se a existência de diferenças de horas extras, assim consideradas as excedentes da 44ª semanal.”
Correta a Sentença que deferiu o pagamento de horas extras, assim consideradas as excedentes da 44ª semanal, com os adicionais de horas extras
previstos nas normas coletivas juntadas aos autos, nos respectivos períodos de vigência, com repercussões em repousos semanais (domingos e
feriados), autorizada a dedução dos valores comprovadamente pagos ao mesmo título, relativos ao mesmo mês, respeitado o período de apuração
das horas extras, de acordo com a data de fechamento da folha de pagamento.
Nesse sentido, o Acórdão 0192600-18.2009.5.04.0771 da lavra desse Relator com a mesma reclamada.
Sentença mantida.
3. REFLEXOS DA CONDENAÇÃO.
Mantida a condenação principal, remanescem diferenças de aviso-prévio, férias com 1/3 e 13º salários, decorrentes da integração das horas extras e
do adicional de insalubridade bem como incidência sobre o FGTS com multa de 40%. Nada a reformar.
Ante o exposto,
ACORDAM os Magistrados integrantes da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, negar provimento ao recurso
da reclamada.
Intimem-se.
Porto Alegre,
DESEMBARGADOR RICARDO CARVALHO FRAGA
Relator
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