ASPECTOS JURÍDICOS RELEVANTES NO ATRASO DA OBRA Silvio Dutra 1 1. Introdução Na mesma proporção que cresce a quantidade dos lançamentos de empreendimentos imobiliários, também, surgem as demandas propostas pelos consumidores contra as construtoras, tendo como causa de pedir, na maioria das vezes, o defeito e o atraso da obra, daí a razão da necessidade de se propor algumas premissas para a solução destas espécies de ação, especialmente, porque se verifica com relação à extensão da responsabilidade civil das construtoras decisões antagônicas sobre o mesmo tema. A questão torna-se ainda mais emblemática, porque, nos contratos celebrados entre os consumidores e as construtoras o poder de negociação das cláusulas contratuais é totalmente suprimido, o que faz destes contratos uma espécie de contrato de adesão, por vincularem todos os consumidores / compradores dos imóveis de um específico empreendimento imobiliário a uma mesma minuta contratual. Em linhas gerais e sem querer ser simplista, entre os pontos mais debatidos nas ações propostas pelos consumidores podemos citar: (i) os danos materiais indiretos, notadamente, conhecidos como “lucros cessantes”; (ii) a legalidade do prazo de carência fixado pelas construtoras, em torno de 180 (cento e oitenta) dias; (iii) a fixação do quantum debeatur; e (iv) a existência, ou não, dos danos morais em razão da inexecução da obrigação da construtora. 2. O Direito de Indenização dos Danos Materiais pelo Atraso da Obra 2 O argumento utilizado pelas construtoras para o indeferimento do pedido de danos patrimoniais negativo, conhecidos como “lucros cessantes”, está atrelado à destinação dada ao imóvel, uma vez que, se o imóvel for utilizado para a moradia, em tese, não haveria um lucro que o consumidor teria deixado de auferir, portanto, seria indevido o pagamento de lucros cessantes, pois, nesta hipótese, o consumidor não sofreu um dano negativo que consiste, na perda do lucro decorrente de um ato ilícito. 1 SILVIO DUTRA. Advogado. Mestrando em Direito pela PUC/SP. Especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. E-mail: [email protected]. Área de Concentração de Pesquisa na PUC/SP: Direito Empresarial. 2 Em coerência com o desenvolvimento do presente trabalho, considera-se atraso da obra apenas o período excedente após o término do prazo contratual estabelecido pelo construtora, incluindo, neste prazo contratual, o período de carência de 180 dias usualmente fixado. O outro fundamento para tentar eximir a responsabilidade das construtoras é a alegação de que a inexecução da obrigação (atraso da obra) ocorreu, por caso fortuito ou força maior que “impediram a entrega das chaves dentro do prazo pactuado”, porém, s.m.j, este argumento é inadmissível, diante da previsibilidade inescusável dos acontecimentos alegados como força maior ou caso fortuito (períodos de chuvas, falta de mão de obra, etc). Os argumentos supracitados em nada deverão influir no dever de indenizar das construtoras pelo atraso da obra, porque, a inexecução da obrigação da construtora de entregar o imóvel, dentro do prazo previamente pactuado, caracteriza um ilícito que privou o direito do consumidor de ter o bem adquirido, junto à construtora, dentro daquele prazo contratual; diante disto, independentemente, da destinação do imóvel – para moradia ou locação a terceiros – a construtora deverá ressarcir o consumidor. A pessoa, que contrata com a construtora a aquisição deste tipo de imóvel, espera usufruí-lo em sua plenitude e acima de tudo dentro do prazo estabelecido pela própria construtora no ato da venda o imóvel, acaba-se criando uma expectativa, por parte do consumidor de que a empresa irá honrar com o cumprimento de sua obrigação. O professor Tércio Sampaio Ferraz Júnior, em sua magnífica obra Introdução ao Estudo do Direito – Técnica, Decisão e Dominação, ensina que a expectativa cognitiva diz respeito ao que se espera de um determinado agente, em uma determinada situação, cuja durabilidade é garantida pela generalização de possibilidades, por meio de observação – a regra cognitiva se adapta aos fatos – que descrevem a normalidade do comportamento e nos permitem a controlar a contingência dos sistemas sociais (a ciência como instrumento de previsão). Os princípios da equidade e do equilíbrio contratual, juntamente, com outros princípios consagrados pelo ordenamento jurídico pátrio, vêm exatamente garantir que a expectativa cognitiva esperada de um determinado agente, em uma determinada situação seja cumprida, considerando os usos e costumes e, principalmente, o pacto celebrado entre as partes. Dessa forma, ainda que não houver cláusula expressa estabelecendo multa pecuniária pela inadimplência da construtora, mesmo assim a indenização será devida, pois, a inexistência desta espécie de cláusula implica indiretamente em um desequilíbrio contratual em desfavor dos consumidores, tornando o contrato iníquo, isto é, trata-se de uma cláusula implícita violadora dos princípios protegidos pelo Código do Consumidor, especificamente, o equilíbrio contratual e a equidade. Na interpretação dos princípios da Equidade e Equilíbrio Contratual, deve-se ater ao disposto no art. 51 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis: Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: I- impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis; IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; XV- estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor; 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vontade que: Iofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence; II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual; Nessa esteira, a ausência de cláusula expressa consignando multa pecuniária pela inexecução da obrigação da construtora constitui cláusula implícita que exonera a responsabilidade da construtora, o que é vedado pela norma jurídica, assim como também, pelas mesmas razões, a destinação do imóvel não é capaz elidir o dever de indenização pelo atraso da obra. Quanto a inadimplência contratual da Ré e o seu dever de recompor as perdas dos Autores, oportuno citar os ensinamento do jurista Arnoldo Wald 3 para quem: “O inadimplemento obriga o contratante ou aquele que não executou as suas obrigações a indenizar a outra parte, repondo-a na situação econômica que se encontraria se a prestação tivesse sido tempestivamente cumprida.” Na jurisprudência tem prevalecido que, tanto a destinação a ser dada ao bem imóvel, quanto à inexistência de cláusula de multa pecuniária, ou ainda, a alegação de caso fortuito ou força maior, não são fatores impeditivos para a responsabilidade civil das construtoras, segue abaixo alguns julgados: Apelação nº 0119638- 38.2011.8.26.0100 – 6ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Alexandre Lazzarini – data de Julgamento: 09.02.2012 (....) 2- A previsão de sanção por inadimplemento dos contratantes, sem fixação de qualquer penalidade pela mora da contratada resulta em cláusula implícita de não indenizar, e evidencia a onerosidade excessiva a ser suportada pelos consumidores, o que é inadmissível (CDC, art. 51, I). – grifo nosso. (...) quando analisada a quebra contratual, verifica-se que, para a aquisição do imóvel a ser construído, foram delineadas obrigações a serem cumpridas por ambas as partes. Quanto à obrigação dos adquirentes, o atraso no pagamento de qualquer das parcelas avençadas implica em sanção pecuniária, possível perda do bem, ou mesmo rescisão contratual (fls. 45/46). Resguarda-se a pessoa jurídica através de mecanismos legais e contratuais para recomposição do valor monetário perdas decorrentes das frustrações no recebimento das parcelas pactuadas, necessários à continuidade da atividade empresarial. Contudo, o contrato de compra e venda não prevê qualquer sanção em caso de mora da contratada, o que evidencia desequilíbrio contratual e onerosidade excessiva dos compradores que passam a suportar graciosamente o inadimplemento. O risco do negócio é conferido aos adquirentes, o que deve ser repudiado, sob pena de acobertar-se verdadeira cláusula de não indenizar. 3 WALD, Arnaldo. Direito Civil: Obrigações e Teoria Geral dos Contratos, Vol 2. 18ª Ed. Editora Saraiva. São Paulo.SP. Pág. 155. Voto nº: 18.921 Apelação Cível nº: 0025826-11.2011.8.26.0562 Comarca: Santos - 11ª Vara 1ª Instância: Processo nº 562.01.2011.025826-0 Aptes: Kaiapó Empreendimentos Imobiliários Ltda e Outro Apdos.: Silvia Duarte Reitermann e Outro VOTO DO RELATOR EMENTA INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS Parcial procedência, acolhido o pedido de indenização por danos materiais - Atraso na entrega do imóvel por parte da construtora Inocorrência de caso fortuito ou força maior Fato alegados previsíveis que não justificam o atraso da obra, inseridos no risco da atividade desempenhada pelas rés - Cabível a condenação das rés no pagamento de penalidade prevista em caso de privação do uso da unidade - Tratamento recíproco das partes em caso de inadimplemento - Contrato redigido pelas próprias. (GRIFO NOSSO) 0034060-79.2011.8.26.0562 Apelação Relator(a): Francisco Loureiro Comarca: Santos Órgão julgador: 6ª Câmara de Direito Privado Data do julgamento: 19/04/2012 Ementa: COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. Autor que, face ao prolongado atraso na entrega das chaves de apartamento objeto de compromisso de compra e venda, ingressou com ação indenizatória em face das rés, promitentes vendedoras. Atraso inequívoco. Inexistência de justificativas razoáveis para o inadimplemento. Fatos apontados pelas rés que não afastam sua responsabilidade em indenizar pelo atraso prolongado. Fortuito interno. Silêncio do contrato quanto às perdas e danos que não elidem aquelas previstas em lei. Dever da ré de indenizar bem reconhecido. Desnecessidade de comprovação de que imóvel seria alugado para que autor faça jus à indenização, face à natureza frutífera do bem imóvel, de cujo proveito econômico o autor foi privado em virtude da desídia das rés. Termo final do pagamento de indenização e termo inicial da incidência de correção monetária bem fixados em sentença. Ação parcialmente procedente. Recurso não provido (GRIFO NOSSO) O prazo de entrega das obras era certo, portanto, a mora da Oliveira Campos pode ser caracterizada como "ex re". Ou seja, descumprido o prazo de entrega, incorreu de pleno direito em mora. Vale o princípio "dies interpelai pro homine". 33. Nesse sentido, a partir da data fixada no contrato para a entrega do imóvel até a data da sua efetiva entrega, o autor deve ser ressarcido pelos lucros cessantes que obviamente experimentou, seja porque teve de procurar outro imóvel para residir ou simplesmente porque poderia ter colocado o imóvel à locação e não pode fazê-lo. (...) 35. No caso dos autos, nada foi dito até o momento se o imóvel já foi efetivamente entregue, razão pela qual a indenização correspondente aos aluguéis deverá ser apurada por arbitramento em sede de liquidação de sentença, considerando a data da entrega do bem, limitada ao valor do imóvel, tanto no caso em que já tenha sido entregue, como na hipótese de a entrega ainda não ter ocorrido" (grifos nossos) (Apelação Cível n°. 994.02.068378-6 - Guarulhos, Rel. Des. José Carlos Ferreira Alves, 2a Câmara de Direito Privado, j . 16.03.2010). APELAÇÃO n° 0001296-28.2011.8.26.0566 – 10ª Câmara de Direito Privado COMARCA DE SÃO CARLOS (2ª. Vara Cível Processo nº 151/2011) APELANTES: ROSSI RESIDENCIAL S/A, GMELINA EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA E CORDIFOLIA EMPREENDIMENTOS S/A APELADO: NARA GARDINI Responsabilidade civil. Atraso injustificável na entrega de imóvel. Dever de indenizar reconhecido. Sentença mantida. Apelo improvido. Apelação nº: 0023088-92.2008.8.26.0000 Comarca: Guarujá Apelante: CONSTRUTORA, INCORPORADORA E IMOBILIÁRIA IVAN MONTEBELO LTDA E OUTROS Apelado: OS MESMOS INDENIZAÇÃO. ATRASO NA ENTREGA DAS OBRAS FORÇA MAIOR NÃO CARACTERIZADA – DANOS MATERIAS E MORAIS INDENIZAÇÃO DEVIDA CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CARACTERIZADO DESPROVIDO O RECURSO DA RÉ; PARCIALMENTE PROVIDO O DOS AUTORES. A factie specie é a inadimplência contratual por não ter cumprido com o seu dever jurídico de honrar com a entrega do imóvel, dentro do prazo estabelecido no contrato – prazo este que inclui eventuais períodos de carência previstos contratualmente; este ato ilícito é fruto da inexecução de uma obrigação, por este motivo, inadmissível a falta de reparação de danos pela privação do direito de fruição de um bem frutífero, inclusive, porque, a inexistência de uma cláusula expressa imputando multa pecuniária pelo atraso da obra é cláusula implícita que exonera a construtora de sua responsabilidade, o que viola os princípios da equidade e do equilíbrio contratual, bem como, o disposto no art. 51 do CDC. 3. A Legalidade do Prazo de Carência de 180 (Cento e Oitenta) Dias. A interpretação de um determinado dispositivo contratual deve levar em consideração todos os aspectos sociais e jurídicos em torno da relação jurídica a qual está sendo disciplinada pelo referido dispositivo contratual. Este raciocínio deve ser o mesmo, no caso da análise da legalidade do período de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias, usualmente, estabelecido pelas construtoras nos contratos de promessa de compra e venda de bem imóvel a ser construído; se diz: usualmente, porque, tornou-se praxe no mercado imobiliário a fixação do período de 180 (cento e oitenta) dias, inclusive, os próprios consumidores em geral já estão acostumados com a fixação deste período. Cabe, aqui, adiantar que não há nenhuma legislação estabelecendo expressamente que o período de tolerância deve ser de 180 (cento e oitenta) dias, ao invés de 120 (cento e vinte) dias ou 210 (duzentos e dez) dias; fato este que requer um cuidado ainda maior do intérprete e do julgador. O prazo de carência para a entrega do imóvel existe para cobrir eventuais imprevistos comuns em toda obra civil e, não há como negar, que toda obra civil seja de pequeno, médio ou grande porte, ocorrem imprevistos que fogem a qualquer normalidade; desta feita, a afirmação de que é possível prever todos os infortúnios existentes, no decorrer da construção de um empreendimento, é fechar os olhos para a realidade, daí a razão pela qual a fixação do prazo de carência de 180 (cento e oitenta) dias é perfeitamente válida e legal. Há algumas teses jurídicas que defendem a nulidade da fixação do prazo de carência estabelecido pelas construtoras, por não ser outorgado o mesmo direito de carência aos consumidores, no pagamento do imóvel, motivo este que levaria a nulidade desta espécie de cláusula, diante da violação dos princípios norteadores do Código de Defesa do Consumidor, notadamente, o equilíbrio contratual e a equidade. Todavia, apesar da referida tese ser bastante plausível, não se pode deixar de ponderar 02 (dois) fatores extremamente relevantes a favor da validade e legalidade do período de carência, quais sejam: 1º) A fixação de um prazo certo e determinado para a conclusão de uma obra civil não pode ser rigoroso a ponto de ser intolerável pequenos atrasos, especialmente, diante das peculiaridades desta espécie de empreendimento; 2º) Os consumidores já se habituaram, com o prazo de carência, logo, não se pode afirmar que houve uma expectativa cognitiva violada, ou então, qualquer outro tipo de artifício para ludibriar o consumidor que, previamente, tem conhecimento do prazo de carência. Por outro lado, também, deve ser esclarecido que qualquer atraso da obra, além do prazo de 180 (cento e oitenta) dias, é passível de indenização, conforme defendido no item anterior, por uma razão simples, o prazo de tolerância existe exatamente para cobrir todo e qualquer imprevisto ocorrido no decorrer da obra. O raciocínio é o mesmo para repelir de imediato os argumentos trazidos pela construtora de caso fortuito ou força maior para se isentar da responsabilidade pelo atraso da obra, além do período de carência. Nesse sentido, os tribunais vêm se posicionando para afastar a alegação de nulidade da cláusula de carência de 180 (cento e oitenta) dias para entrega das chaves, apenas uma ou outra decisão isolada declararam a nulidade do referido dispositivo, veja adiante alguns julgados do tribunal de justiça de São Paulo: Enfim, o prazo de carência de 180 (cento e oitenta) dias não deve ser declarado nulo, pois, o consumidor já está ciente da necessidade do período de carência para a conclusão de uma determinada obra, de maneira inversa, deve-se afastar o uso abusivo desta cláusula, com a fixação de um prazo extremamente elástico, entendendo-se como prazo extenso, todo aquele prazo que superar o período geralmente utilizado de 180 (cento e oitenta) dias, nesta última hipótese, o ato ilícito é decorrente da aplicação do art. 187 do Código Civil que veda o exercício abusivo do direito. 4. Os Danos Morais no Atraso da Entrega das Chaves A moradia e a propriedade gozam de proteção constitucional tamanha a importância destes institutos na vida das pessoas (art. 5º, Inc. II, e Art. 6º, ambos da CF), sob esta ótica deve ser analisado o direito a danos morais decorrentes do atraso na entrega das chaves do imóvel, pois, por mais que se defenda ser inadmissível o direito a danos morais por simples violação contratual, não se pode perder de vista que a inexecução da obrigação da construtora impediu o acesso a um bem jurídico protegido constitucionalmente (a moradia e o exercício da propriedade). O Dano Moral pelo atraso na demora da construção é devido não apenas porque houve um descumprimento de uma cláusula contratual, mas, também, em função de ter ocorrido a obstrução do exercício do direito de moradia e de propriedade, sendo este último fundamento mais relevante do que o primeiro. Ademais, não é nenhuma novidade o fato de que a pessoa adquirente de um imóvel na planta cria emoções e faz um planejamento familiar fruto até mesmo da nova moradia, tudo isto com a esperança que o imóvel seja entregue dentro do prazo, ou então, extrapolando até o término do período de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias; daí a razão pela qual a inadimplemento da construtora não é um mero aborrecimento, mas, sim, uma efetiva frustração de uma emoção real e concreta, bem como, a aniquilação de todo o planejamento familiar. Nesse sentido, segue algumas posições do Tribunal de Justiça de São Paulo sobre o mesmo tema: Apelação nº: 9282538-23.2008.8.26.0000 Comarca: Campinas Relator: Moreira Viegas Apelante: Alexandre Luis Lima (AJ) Apelado: Construtora Plaza Ltda e outro. RESCISÃO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA ATRASO NA OBRA CARACTERIZAÇÃO DA CULPA CORRETA A ESTIPULAÇÃO DE DEVOLUÇÃO DO VALOR PAGO DANOS MORAIS CONFIGURADOS COMPORTAMENTO IRREGULAR DAS APELADAS QUE FRUSTROU O APELANTE, PROLONGANDO O MARTÍRIO E TRAZENDO AFLIÇÃO PSICOLÓGICA - VERBA REPARATÓRIA COMPATÍVEL COM AS PECULIARIDADES DA DEMANDA - RECURSO PROVIDO. “COMINATÓRIA CUMULADA COM INDENIZATÓRIA - ATRASO PARA ENTREGA DE BEM IMÓVEL – EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO QUE DEMANDA CUIDADOSO PLANEJAMENTO TÉCNICO E FINANCEIRO - JUSTIFICATIVAS APRESENTADAS PELA CONSTRUTORA QUE NÃO A EXIMEM DE CULPA - INDENIZAÇÃO MATERIAL DEVIDA, EMBASADA EM PARÂMETROS DE LOCAÇÃO - DANOS MORAIS CONFIGURADOS FRUSTRAÇÃO DE PLANOS FAMILIARES NO SENTIDO DE DESFRUTAR DO IMÓVEL DE VERANEIO - PRIVAÇÃO DO BEM NA PASSAGEM DO ANO, FÉRIAS E FERIADOS - VERBA INDENIZATÓRIA FIXADA EM R$ 8.000,00 E MANTIDA NESTA INSTÂNCIA - RECURSO NÃO PROVIDO” (Apelação nº 9129858-92.2004.8.26.0000, Rel. Des. Erickson Gavazza Marques, j. 23.11.2011) “Compromisso de venda e compra. Indicação referente ao prazo para entrega do bem. Vinculação evidente em face, inclusive, da legislação consumerista. Pagamento, pela compradora, do valor integral. Recusa na entrega da escritura do imóvel. Atraso na entrega da obra. Danos materiais e morais sofridos face à conduta da ré. Danos materiais. Concretizada a venda do apartamento onde residia a autora. Entendimento firmado com comprador no sentido de estender a ocupação do imóvel por período além do acordado. Valores despendidos a título de aluguel. Restituição devida. Danos morais. Cabimento. Descumprimento injustificado para entrega da unidade. Constrangimento, dor e frustração caracterizadas a ensejar a indenização. (...) Recurso não provido.” (Apelação n.º 9.209.76543.2009.8.26.0000, rel. Des. Élcio Trujillo, julgado em 04/05/2011). Apelação nº: 9134690-32.2008.8.26.0000 Comarca: Jacareí Relator: Moreira Viegas Apelantes: Humberto Alexandre Ferrara e outra Apelada: Colunatta Construção Civil Ltda. Compromisso de venda e compra- Pedido de indenização por danos morais e materiais decorrentes de atraso na entrega do imóvel- Sentença de improcedência- Indicação referente ao prazo para entrega do bem- Vinculação evidente- Atraso na entrega da obra- Indenização devida pelos danos materiais e morais sofridos face à conduta da ré- Apelação provida. Portanto, diante do fato da construtora não ter honrado com o compromisso de entregar as chaves, dentro do prazo contratual, entendemos que são devidos os danos morais decorrentes da violação do planejamento familiar e frustração das expectativas criadas pelo consumidor, agregado a isto o ato de ter obstruído de forma ilícita, por um determinado período, o direito de moradia e propriedade. 5. Conclusão Com fulcro nas normas jurídicas postas, buscou-se traçar alguns parâmetros concretos que possam auferir a extensão da responsabilidade civil das construtoras em função da inexecução da obrigação de entregar a obra dentro do prazo contratual, o valor da indenização irá depender de caso a caso, pois, cada situação irá ter as suas peculiaridades, porém, uma coisa é certa, os danos materiais ou morais são devidos, somente, após o término do prazo de tolerância, geralmente, fixado em 180 (cento e oitenta) dias, antes do vencimento desse prazo, a indenização não tem amparo legal. Por fim, no tocante aos lucros cessantes ou perdas e danos, o razoável seria fixar o critério indenizatório, com base nos valores de mercado do aluguel do imóvel objeto da controvérsia, esta talvez seja a forma mais coerente de ressarcir os danos materiais, contudo, como dito acima, sempre quando se está diante de uma ação de caráter indenizatório, somente, a análise do caso concreto irá poder auferir qual seria a justa reparação. 6. Bibliografia - ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. Vol. 1. 9ª Edição. Editora Forense. 1998. - BARROS MONTEIRO, Washington de. Curso de Direito Civil. São Paulo, Saraiva, 1983, v.1, 2, 3 e 5. - BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Direitos da Personalidade e Autonomia Privada. 2ª Edição Revisada – Editora Saraiva. São Paulo. - DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro, Vol. 7: responsabilidade civil – 19ª Edição – São Paulo: Saraiva, 2005. - DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos, v. 3. 6. ed., rev., ampl. e atual. de acordo com o novo código civil (lei n. 10.406, de 10-1-2002), o projeto de lei n. 6.960/2002 e a lei n. 11.101/2005. São Paulo: Saraiva, 2006. - FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio, Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, denominação – 6ª Edição – São Paulo: Atlas, 2008. - SILVA PEREIRA, Caio M. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro, Forense, 1979, v. 1, 3 e 5. - WALD, Arnoldo, Direito Civil: Direito das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos, Vol 2 – 18ª Edição – São Paulo: Saraiva, 2009.