6 UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Luiza Marcela Balbinotti REFLEXOS DAS POLÍTICAS NACIONAIS DE CULTURA SOBRE AS POLÍTICAS LOCAIS DE CAMPO LARGO - PR CURITIBA 2011 7 REFLEXOS DAS POLÍTICAS NACIONAIS DE CULTURA SOBRE AS POLÍTICAS LOCAIS DE CAMPO LARGO - PR CURITIBA 2011 8 Luiza Marcela Balbinotti REFLEXOS DAS POLÍTICAS NACIONAIS DE CULTURA SOBRE AS POLÍTICAS LOCAIS DE CAMPO LARGO - PR Trabalho de conclusão do curso de Especialização em Gestão, Produção e Promoção Cultural, da Faculdade de Ciências Humanas, Letras e Artes, da Universidade Tuiuti do Paraná, para obtenção do título de especialista em Gestão Cultural. Orientador Profº: Lindomar Wessler Boneti CURITIBA 2011 9 Agradeço a todos os funcionários do Departamento de Cultura de Campo Largo, em especial ao Sr. Juciê Parreira, pela paciência e disponibilidade a todas as solicitações que contribuíram efetivamente para o desenvolvimento deste trabalho de pesquisa. Obrigada! 10 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO......................................................................................................... 6 2 POLÍTICAS PÚBLICAS: O PAPEL DO ESTADO E A CONCEPÇÃO DE SOCIEDADE ............................................................................................................ 10 3 POLÍTICA CULTURAL E AÇÃO CULTURAL....................................................... 17 4 POLÍTICAS NACIONAIS DE CULTURA DO GOVERNO FHC AO GOVERNO LULA......................................................................................................................... 23 5 POLÍTICAS E AÇÕES DE CULTURA EM CAMPO LARGO (1995 A 2010) E OS REFLEXOS DAS POLÍTICAS NACIONAIS ............................................................ 33 5.1 Dados básicos e história de Campo Largo – Paraná.......................................... 33 5.2 Administração...................................................................................................... 33 5.3 Os primeiros anos da Casa da Cultura – 1993 a 1996....................................... 35 5.4 De 1997 a 2000: bibliotecas, livros e leitura, limitadas verbas públicas e colaboração de empresas privadas........................................................................... 36 5.5 De 2001 a 2004 nada foi encontrado na Casa da Cultura.................................. 40 5.6 De 2005 a 2008: pensamento cultural, integração e rumo à política municipal de cultura........................................................................................................................ 41 5.7 Em 2009 significativos avanços, mas as dificuldades continuam....................... 46 5.3 2010 – o desenvolvimento de uma política de cultura em Campo Largo........... 49 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 52 REFERÊNCIAS......................................................................................................... 55 ANEXOS................................................................................................................... 57 11 1. INTRODUÇÃO Ao cursar a pós-graduação em Gestão Cultural na Universidade Tuiuti do Paraná me interessei pelo tema Políticas Públicas de Cultura. Quando o assunto foi abordado pelo Professor Lindomar Boneti apresentando a relação Estado e sociedade civil, a trajetória do conceito de cultura e a história das políticas culturais no Brasil, relembrei minha própria trajetória acadêmica e profissional. No final dos anos 80 cursei Ciências Sociais na Pontifícia Universidade Católica do Paraná e estagiei na Curadoria do Patrimônio Cultural (CPC) da Secretaria de Estado da Cultura do Paraná. Na Universidade, em várias disciplinas como Sociologia, Antropologia e Ciência Política, tive contato com textos e autores que abordavam o papel do Estado, os movimentos sociais, o conceito de cultura, a história política brasileira, assim como outros temas sociais. No período de estágio no CPC tive a oportunidade de conhecer profissionais ligados diretamente ao setor cultural do Estado do Paraná: os historiadores Aimoré Índio do Brasil Arantes e Marcelo Polinari, o geógrafo e arqueólogo Almir Pontes, o Curador do Patrimônio Natural Henrique Schimidilin (mais conhecido como Vitamina), especialista em Direito Ambiental, a Curadora do Patrimônio Cultural Rosina Alice Parchen e muitos outros profissionais como fotógrafos, arquitetos, restauradores, artistas plásticos, que se tornaram meus professores e amigos. Durante os anos de 1989, 1990 e 1991, através do setor do Patrimônio da SEEC-PR, não só conheci pessoas da cultura como também diversos lugares culturais: Lapa, Castro, Morretes, Antonina, Paranaguá, a Serra do Mar, o Cányon do Guartelá, museus, arquivos e bibliotecas. Meu estágio consistia basicamente em desenvolver levantamentos culturais, históricos, artísticos, arqueológicos, naturais de múltiplas regiões do Paraná. Os levantamentos bibliográficos e documentais e os 12 contatos pessoais serviam para auxiliar nos processos de tombamento de imóveis e de centros históricos e artísticos. De certa forma, estava eu em contato com a política cultural estabelecida pelo Estado do Paraná. Aprendi muito e foi uma experiência inesquecível. Estudar e pesquisar Políticas Públicas de Cultura faz lembrar um tempo de aprendizagem e desafios, faz retornar aos temas e discussões da sociologia e esse é um dos motivos para desenvolver a presente pesquisa. Outro fator incentivador para estudar cultura é o fato de morar a nove anos em Campo Largo, Região Metropolitana de Curitiba. Nasci, cresci e estudei em Curitiba ao redor de cinemas, teatros e bibliotecas, feiras culturais, festivais e espetáculos, e Campo Largo, uma cidade localizada a pouco mais de 30 quilômetros desse “centro” de cultura, a meu ver, não apresenta características semelhantes. A famosa Feira da Louça aproveita muito pouco da arte local, as exposições e espetáculos que eventualmente acontecem não são devidamente divulgados, não há livrarias na cidade, apenas uma biblioteca e um teatro, a Casa da Cultura e, há poucos anos, temos duas salas de cinema. Como estudante de gestão cultural e moradora da cidade gostaria de conhecer melhor os equipamentos culturais, os artistas e suas artes, os planos e projetos de desenvolvimento da cultura local, as pessoas que pensam e fazem arte/cultura em Campo Largo. No nível nacional, pretendo pesquisar e conhecer a trajetória das Políticas Públicas de Cultura, buscando características, semelhanças e diferenças de um período específico, do Governo Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002) ao Governo Luís Inácio Lula da Silva (2003 a 2010). No nível local, anseio investigar as políticas e as ações de cultura em Campo Largo no mesmo período, abordando quatro mandatos municipais: a gestão Newton Puppi (1997 a 2000), integralmente 13 no período FHC; a gestão Afonso Guimarães Portugal (2001 a 2004), transição FHC/Lula; o 1º mandato Edson Basso (2005 a 2008) e o 2º mandato Edson Basso (2009 e 2010), integralmente no período Lula. Poderia também investigar as políticas estaduais de cultura no mesmo período e relacioná-las tanto com as políticas nacionais quanto às suas influências nas políticas e as ações de cultura no município. Porém, o campo de pesquisa se tornaria amplo e a quantidade de documentos, o tempo de análise e desenvolvimento desse trabalho muito maior. Creio que essa sugestão fica para pesquisadores que desejarem estender e aprofundar as relações das políticas públicas de cultura verificando os reflexos nacionais sobre os estaduais e esses sobre os municipais de Campo Largo. O principal objetivo dessa pesquisa é verificar os possíveis reflexos das políticas nacionais de cultura sobre as políticas locais de Campo Largo. Para conhecer as políticas nacionais no período pretendido utilizamos a metodologia histórica. Para investigar as ações e políticas culturais de Campo Largo utilizamos o procedimento de campo, contatando profissionais envolvidos na área cultural e analisando os documentos cedidos pelo Departamento de Cultura. Os documentos consultados para o desenvolvimento desse trabalho foram basicamente pastas de Ofícios Recebidos e Enviados de ano a ano armazenados na Casa da Cultura, sede do Departamento de Cultura. O acesso aos materiais e às pessoas responsáveis foi mediado pelo próprio Diretor - Sr. Juciê Parreira. Durante os meses que percorreram a pesquisa de campo houve uma reorganização do setor da cultura, inclusive nos materiais disponibilizados: as pastas foram armazenadas em novas embalagens e arrumadas em ordem cronológica numa nova sala de arquivos. 14 As políticas nacionais podem servir como indicadores para as políticas locais de cultura, elas tendem a nortear as ações estaduais e municipais. As ações culturais locais, por sua vez, podem revelar as políticas públicas das estâncias superiores. Desta forma, essa pesquisa utilizou procedimentos comparativos para finalmente verificar a conexão entre o âmbito nacional e o municipal no que diz respeito às políticas públicas de cultura. Pesquisar e conhecer historicamente as políticas públicas de cultura no Brasil e em Campo Largo revelou algumas características, conexões e reflexos. No entanto, um estudo sobre Cultura é algo amplo, abrangente e longínquo. A delimitação selecionada foi para tornar possível essa pesquisa e viabilizar um material consistente sobre gestão pública de cultura. 2. POLÍTICAS PÚBLICAS: O PAPEL DO ESTADO E A CONCEPÇÃO DE SOCIEDADE No dicionário, Política Pública é a coisa pública; a arte ou ciência de governar, de administrar, de organizar; em relação a um público. A expressão política pública apresenta então uma redundância, pois, segundo Lindomar Boneti, em seu texto Políticas Educacionais, Contrato Social e Cidadania na América Latina, 15 “... poderíamos interpretar políticas públicas como sendo a arte de lidar com um público que é público.” (Boneti, 2006, p.93) Políticas públicas são recursos públicos advindos do Estado, o Estado cuida do que é público “... mas considera-se também que medidas de intervenção meramente administrativas, por parte do Estado, sem mesmo envolver o orçamento público, sejam consideradas políticas públicas pelo fato de envolver o público.” (Boneti, 2006, p.93) Envolvendo ou não dinheiro público, políticas públicas são ações sociais da instituição: Estado. É necessário então aprofundarmos questões sobre Estado e políticas públicas. A partir das abordagens do Professor Boneti, podemos considerar três visões: a visão clássica do Estado como Contrato Social; a visão crítica do Estado a serviço da classe dominante; a visão intermediária do Estado como uma relação de forças sociais. Na visão clássica de Estado definida por Hobbes e Locke no século XVII e por Rousseau no século XVIII, o Estado é um pacto em que os homens concordam livremente em formar a sociedade civil para garantir e preservar o direito de propriedade. Os indivíduos entregam a sua liberdade individual para ser administrada pelo Estado. O Contrato Social é um pacto legítimo, através do qual os homens perdem sua liberdade natural e ganham em troca a liberdade civil. Karl Marx defende uma visão crítica de Estado. Partindo do princípio que a sociedade capitalista é dividida em classes sociais, onde coexistem os proprietários dos meios de produção, os que mantêm a estrutura capitalista e os nãoproprietários, aqueles que vendem a sua mão-de-obra proporcionando a mais-valia. Na visão de Marx o Estado está a serviço da classe dominante. 16 Ao observamos a nova configuração social, econômica e política advinda da globalização da economia, podemos considerar uma visão intermediária de Estado, defendida por Antonio Gramsci e Nicos Poulantzas. Nos dias atuais existe uma dinâmica política, o Estado não depende unicamente das relações de produção e da classe dominante e sim de uma relação de forças políticas entre os interesses das classes sociais e a sociedade civil organizada. Para entendermos a complexidade da elaboração e da operacionalização das políticas públicas precisamos entender a relação que se dá entre o Estado, as classes sociais e a sociedade civil revelando a típica dinâmica do contexto do mundo globalizado. As políticas públicas são decididas pela força travada entre agentes do poder global, nacional e local. E o Estado assume o papel de repassar à sociedade civil essas decisões, delineando políticas públicas através de ações estatais de intervenção administrativa na realidade social e através da apropriação de recursos públicos. (Boneti, 2006, p.98) É preciso também compreender as políticas públicas a partir de uma concepção de sociedade. Para isso, vamos ampliar nosso campo de reflexão sobre a sociedade e o papel do Estado utilizando a linha de raciocínio de Manuel Castells. Em seu livro, em A Sociedade em Rede, Castells analisa vários acontecimentos transformadores do o cenário social da vida humana: “Uma revolução tecnológica concentrada nas tecnologias da informação está remodelando a base material da sociedade em ritmo acelerado.” (Castells, 2000, p.21) Nesse novo cenário tecnológico-informacional, Castells analisa a busca pela identidade como a fonte básica de significado social: “Essa tendência não é nova, uma vez que a identidade e, em especial, a identidade religiosa e étnica tem sido a base do significado desde os primórdios da sociedade humana. No entanto, a identidade está se tornando a principal e, às vezes, única fonte de significado em um período histórico caracterizado pela ampla desestruturação das organizações, deslegitimação 17 das instituições, enfraquecimento de importantes movimentos sociais e expressões culturais efêmeras. Cada vez mais, as pessoas organizam seu significado não em torno do que fazem, mas com base no que elas são ou acreditam que são.” (2000, p.23) Em O Poder da Identidade, Castells distingue identidade da definição sociológica de papel social. Papéis sociais são funções que os indivíduos vão adquirindo ao longo da sua vida em sociedade definidos pelas instituições sociais e que dependem de negociações e acordos. Identidade é um processo de autoconstrução, originados pelos próprios atores, construída no processo de individualização. Ás vezes as identidades coincidem com os papéis sociais, mas aquelas são mais importantes do que estes, pois são fontes de significado para o ator social. (Castells, 1999) Se a identidade é construída, quem constrói a identidade coletiva e para quê é construída? Castells explica a dinâmica das identidades dentro do contexto histórico da sociedade em rede a partir de três formas: Identidade legitimadora – construída pelas instituições dominantes para expandir e racionalizar a dominação; Identidade de resistência – construída por atores sociais desfavorecidos com posições desvalorizadas com o objetivo de fazer resistência; Identidade de projeto – construída por atores sociais que usam qualquer tipo de material cultural e esses constroem uma nova identidade buscando redefinir a sua posição na sociedade e desta forma, a transformação da estrutura social (1999, p.24). A primeira forma de identidade dá origem a organizações e instituições. A segunda origina comunidades de resistência e a identidade de projeto, produz sujeitos que buscam um projeto de vida diferente. E assim, Manuel Castells identifica o surgimento de novas formas de transformação social a partir do novo contexto da sociedade em rede. Num mundo onde tudo, e ao mesmo tempo, nada tem significado, os indivíduos, na busca da sua 18 individualização, da sua identidade, criam novas formas de desenvolvimento que podem transformar a sociedade. (Castells, 1999) Lembrando que a busca da identidade é tão poderosa quanto a transformação econômica e tecnológica nos dias de hoje, Castells parte para a análise do processo de transformação tecnológica no contexto social. A revolução tecnológica, permeada de tecnologias da informação, vai delineando uma nova economia, sociedade e cultura: “A tecnologia não determina a sociedade. Nem a sociedade escreve o curso da transformação tecnológica” “... a tecnologia é a sociedade, e a sociedade não pode ser entendida ou representada sem suas ferramentas tecnológicas.” (2000, p.25) Manuel Castells acredita no papel do Estado como fator decisivo para o entendimento da relação entre tecnologia e sociedade. Por intermédio do Estado a sociedade pode sufocar o desenvolvimento tecnológico ou, também através da intervenção estatal, a sociedade pode acelerar a modernização tecnológica. Assim, sabemos que o Estado sempre foi ao longo da história a principal fonte de inovação tecnológica ou, por outro lado, de estagnação da tecnologia. (2000, p. 26 e 29) Explicando a relação entre tecnologia e sociedade, Castells reforça: “o papel do Estado, seja interrompendo, seja promovendo, seja liderando a inovação tecnológica, é um fator decisivo no processo geral, à medida que expressa e organiza as forças sociais dominantes de um espaço e uma época determinados. Em grande parte, a tecnologia expressa a habilidade de uma sociedade para impulsionar seu domínio tecnológico por intermédio das instituições sociais, inclusive o Estado. O processo histórico em que esse desenvolvimento de forças produtivas ocorre assinala as características da tecnologia e seus entrelaçamentos com as relações sociais.” (2000, p.31) Essa reflexão sobre o papel do Estado e a sociedade no contexto globalizado vem auxiliar a compreensão sobre a luta política travada entre os agentes determinantes das políticas públicas. As elites globais, agentes externos, figuram interesses políticos e econômicos do projeto do capitalismo global através de duas instâncias interligadas: 19 as relações econômicas e as relações políticas. Segundo o professor Lindomar Boneti, em seu livro Políticas Públicas por Dentro, as questões econômicas se dão no mercado global, na luta por definição de regras que favoreçam os mais ricos. Na Organização Mundial do Comércio, por exemplo, são estabelecidas verdadeiras leis facilitadoras dos processos de compra e venda dos maiores produtores industriais, proporcionando a ampliação dos mercados consumidores. As questões políticas, por sua vez, se dão no âmbito da diplomacia, pressões políticas atreladas às decisões econômicas, com objetivos de interferência na organização estatal interna de determinada nação. (Boneti, 2006) Os agentes internos, representados pelas elites nacionais, defendem seus interesses de classe, mas esses interesses estão vinculados ao projeto do capitalismo global. Numa luta partidária, por exemplo, busca-se a apropriação dos recursos públicos (interesses econômicos) e os resultados da intervenção estatal em determinada realidade social (interesses políticos). Os detentores do poder político e econômico fazem verdadeiras manobras políticas para manter o poder e seus benefícios, mas também para corresponder aos compromissos com os interesses do capitalismo global. (Boneti, 2006) Ainda nesta linha podemos citar a classe dos burocratas, “técnicos responsáveis por transformar as políticas públicas em projetos de intervenção na realidade social com medidas administrativas ou com investimentos.” São profissionais qualificados, servidores públicos, que formalmente cumprem a obrigatoriedade da sua função pública e mantém o vínculo com o grupo dominante através da obediência. Servidores, no sentido estreito da palavra, que obedecem às determinações da classe dominante nacional. E essa, por sua vez, cumpre com os interesses das elites do capitalismo global. (Boneti, 2006) 20 Temos também como agentes internos a sociedade civil organizada. Essas organizações, na busca da defesa de seus interesses, podem pressionar os burocratas em definições práticas que lhes favoreçam, e até mesmo confrontar os projetos das elites nacionais ou globais. (Boneti, 2006) É uma gama de correlação de forças de interesses que permeia a elaboração e a operacionalização das políticas públicas. Uma rede de forças: a sociedade civil organizada pressionando em benefício de seus interesses; os servidores, nas instituições públicas, recebendo pressões da sociedade e obedecendo as ordens estabelecidas pelo poder; as classes dominantes lutando para manter o poder, ampliar benefícios, cumprir o débito com os acordos internacionais; e as elites globais pressionando política e economicamente as decisões internas de uma nação. A partir dessa luta surgem as políticas públicas. (Boneti, 2006) 21 3. POLÍTICA CULTURAL E AÇÃO CULTURAL Segundo Martin Cezar Feijó, no livro O que é política cultural (Coleção Primeiros Passos), existem políticas culturais e políticas culturais. Pode existir política para a proibição, para o cerceamento, direcionamento e imposição e pode existir política para a organização, para o incentivo, criação, esclarecimento, para superação da própria política. (Feijó, 1989) Inicialmente Feijó faz algumas conclusões parciais sobre a relação política e cultura. Trata de cultura como obras de inteligência ou de sensibilidade que têm por objetivo interferir na realidade: “Toda produção ou manifestação voluntária, individual ou coletiva, que vise com sua comunicação à ampliação do conhecimento (racional e/ou sensível) através de uma elaboração artística, de um pensamento ou de uma pesquisa científica.” (1989, p.8) Feijó considera que a política sempre se ocupou da cultura ao longo da história da humanidade. Para ele, a cultura tem sido motivada a partir de interesses políticos e econômicos dominantes e quando a cultura chegou a ultrapassar os limites desses interesses foi duramente reprimida. Porém, quando a cultura é organizada e consciente chega a produzir transformações históricas. (Feijó, 1989) Martin Feijó comenta a época do Realismo Socialista Soviético como sendo um período de política cultural rígida, dogmática e violenta, onde as organizações culturais eram administradas e controladas pelo governo stalinista. A fábula a seguir retrata bem a situação: 22 “Era uma vez um poderoso imperador chamado Tamerlão, o Grande. Vaidoso, ele convocou todos os pintores do reino para pintar seu retrato. Acontece que Tamerlão não tinha nem pernas nem olho direitos, perdidos numa guerra patriótica. Temerosos, chegaram os pintores. O primeiro retratou o imperador com os dois olhos e com as duas pernas. Foi degolado. Aquilo era “idealismo”. O segundo apresentou o imperador como realmente era: sem uma perna e sem um olho. Foi degolado. Aquilo era “realismo burguês”. Aí chegou o terceiro. Era membro da União dos Pintores Soviéticos. Este pintou Tamerlão de perfil, do lado em que só aparecessem a perna e o olho esquerdo. Foi aclamado. Ele havia entendido o que era “realismo soviético”. (1989, p.30) Comenta também o período da Revolução Cultural da China, com muitas reformas na educação, no ensino e na arte, no entanto, utilizando a cultura como instrumento da política comunista. Essas realidades exemplificam a ligação entre política e cultura e demonstra, ao mesmo tempo, uma política cultural direcionada para determinados interesses. Vários pensadores em suas teorias e experiências diversas demonstraram também o estreitamento entre cultura e política. Lukács, por exemplo, ao desenvolver o conceito de particularidade (uma obra de arte singular atinge muitas pessoas em diferentes tempos e épocas e alcança a universalidade) mostra o valor artístico indiscutível da obra, a sua contribuição cultural e confirma a importância histórica decisiva da cultura. Bertolt Brecht, poeta, dramaturgo e teórico teatral da Alemanha da primeira metade do século XX, acreditava que obras artísticas deveriam promover compreensão, reflexão e transformação da realidade. Walter Benjamin, analisando as técnicas modernas de produção artística, técnicas que possibilitam atingir milhares de pessoas, demonstrou o inegável caráter político da cultura. Demonstrou que o artista precisa ter consciência da sua posição no processo de produção capitalista para evitar a manipulação dos interesses dominantes. Antonio Gramsci clarificou a política cultural quando em suas teorias revelou a importância dos intelectuais na organização da cultura. Preocupava-se não apenas com a criação cultural, mas com a criação da reflexão e transformação da realidade a partir de uma prática político-cultural, sem separar política da cultura ou 23 fazer da cultura um instrumento político. Todos esses pensadores contribuíram para o surgimento de uma concepção diferente de política cultural, aquela política para o desenvolvimento cultural, para a transformação social da realidade. (Feijó, 1989) Ao investigarmos políticas públicas de cultura nem sempre nos deparamos com um programa de cultura no qual o papel do Estado e a concepção de cultura e de sociedade estão clarificados. Num primeiro momento não sabemos definir se a cultura de determinada região está sendo utilizada como um instrumento político ou há um incentivo à criação artística e cultural no âmbito da transformação social. Por isso, as ações culturais devem ser averiguadas, pois elas podem revelar as intenções e o tipo de política cultural. O professor Teixeira Coelho, ao redigir o livro O que é ação cultural (Coleção Primeiros Passos), explica que a ação cultural lida com a cultura e não com qualquer coisa. E esclarece que a ação cultural é também uma ação social, uma área específica de trabalho, ensino e pesquisa, um conjunto de conhecimentos e técnicas para administrar o processo cultural. Este processo de ação cultural “resume-se na criação ou organização das condições necessárias para que as pessoas inventem seus próprios fins e se tornem assim sujeitos – sujeitos da cultura, não seus objetos”. A ação cultural é a criação de condições para se fazer cultura. (Coelho, 1988) Teixeira Coelho interpreta que nem tudo é ação cultural, a ação cultural tem sua fonte, seu campo e seus instrumentos. Faz uma distinção entre cultura e educação explicando que são dois projetos de natureza e objetivos bem diversos: “A cultura, em suas manifestações radicais (como a arte), procura e viabiliza o êxtase, o sair para fora de si, sair do contexto em que se está para ver outra coisa, para ver melhor, para ver além, para enxergar sobre, acima, por cima, para ver por dentro. A educação, embora pudesse ser outra coisa... é o stase, o estar, quer dizer, partir daqui para voltar aqui mesmo, permanecer, metaforicamente preparar-se para o que está, para o que existe, integrar-se ao que existe.” (1988, p.28 e 29) 24 Ele critica o aparecimento dos chamados Centros de Cultura, meros complementos dos sistemas educacionais existentes que optam por palestras, cursos e oficinas, substituindo a verdadeira criação cultural. É um tipo de ação incapaz de perceber a diferença entre o processo educativo e o processo cultural. (Coelho, 1988) O autor identifica ao longo da história três tendências da ação cultural. Num primeiro momento ainda não se pode chamar de ação cultural, é o tempo da instituição da cultura - o tempo do Museu. Nesse momento, por volta do século XIX, busca-se preservar os “bens culturais da humanidade”, guardar as obras de arte, tem-se uma visão patrimonialista e há uma supervalorização do produto cultural. No segundo momento, as instituições passam a se preocupar com as pessoas que entram em contato com a arte/cultura. Atinge-se uma abordagem social da questão cultural, a ação cultural está mais voltada ao público, ao coletivo cultural. Na terceira tendência, por volta da década de 1960, especificamente 1968, os espaços culturais tendem a abrir caminhos para o desenvolvimento cultural do indivíduo e de sua subjetividade. Ação cultural nem para a arte, nem para o coletivo, mas a preocupação está na formação do indivíduo. (1988, p.35 a 39) O professor Coelho expõe, a partir dessa tendência da formação cultural do indivíduo, um sério questionamento sobre ações culturais. Qual o verdadeiro objetivo da ação cultural? Construir um determinado tipo de sociedade? Atender os objetivos das classes dominantes? Proporcionar lazer e entretenimentos para os menos favorecidos? Utilizar recursos públicos para efetivar a “cultura de massa”? Financiar práticas que contestem a própria sociedade? Segundo o autor, nem ampliação demasiada, nem simplificação exorbitante: “Existe uma especificidade do processo cultural que não pode ser atendida pelos mecanismos da prática política, e uma das conseqüências disso é que o projeto cultural vai sempre e necessariamente além, muito além do projeto 25 político, de modo que insistir numa ação cultural quando se quer uma ação política pode ser um equívoco... Se o âmbito da ação cultural não pode ser assim ampliado, limitá-la a certas atividades é igualmente alterar sua natureza. Nunca será demais alertar contra a tendência de fazer da ação cultural, por exemplo, um instrumento de lazer para o tempo livre.” (1988, p.45) Existe também uma confusão sobre a ação cultural: o agente cultural pode dirigir o processo cultural de uma determinada localidade? Ou deve deixar que o processo ocorra espontaneamente? Seria uma hipocrisia, segundo o professor Teixeira Coelho, achar que a comunidade possa sozinha administrar sua cultura, assim como negar que o processo cultural por si só gera uma espontaneidade. O agente cultural precisa assumir a posição de interventor, alguém de fora que vai acionar um novo processo, não se trata de paternalismo e nem de dirigir o processo, mas é sua responsabilidade criar as condições necessárias para que as pessoas dirijam o seu próprio processo cultural. “O agente cultural será um profissional capaz de entender os mecanismos da atuação em grupo que possibilitem a esse grupo o exercício da criatividade e capaz de conhecer a natureza e possibilidades das linguagens e equipamentos culturais de que se servirá – equacionando sua presença e intervenção, de modo a não perturbar exageradamente a natureza/autenticidade do processo. Não pode, porém, deixar de reconhecer a função muito especial que exerce.” (1988, p.57) Segundo a UNESCO a profissão do agente cultural é peculiar, alguém que se interessa por arte/cultura, mas não é necessariamente um artista, se envolve com a administração do processo cultural, prepara o terreno para a criação. O agente cultural lida com artes, artistas, comunidade e recursos financeiros, por isso, precisa ter visão interdisciplinar (envolvendo arte, educação, psicologia, sociologia, administração, marketing) e capacidade de coordenar uma equipe de técnicos. O professor Teixeira Coelho questiona também a tão utilizada frase “democratização da cultura”, considera que geralmente não se sabe “o que vai ser democratizado” e nem “o que é democratizar”. Critica medidas isoladas, pois elas não constituem uma política cultural ou uma política de ação cultural. “Para que isto aconteça é imperioso que os fenômenos culturais sejam vistos formando aquilo que são: um todo cujos componentes mantêm 26 relações determinadas entre si, e sujeitos,..., à lógica geral da sociedade onde se localizam. A democratização cultural só poderá se dar, ... ,quando todas as partes desse todo, e suas relações, forem igualmente tocadas pelas iniciativas pertinentes.” (1988, p.74) Para ele, a ação cultural pode intervir em todos os setores da dinâmica cultural: na criação/produção do bem cultural, na sua distribuição (contato com o público), na troca do bem por dinheiro (consumo) e no uso efetivo do bem cultural. Por exemplo, um livro: na primeira fase o livro deve ser escrito e impresso (produção do bem cultural); em seguida, distribuído para as livrarias (possibilidade de contato com o público); nas livrarias deverá ser vendido e comprado (consumo do bem cultural); e assim, o consumidor fará a leitura e a possível retenção de seu conteúdo (apropriação plena). Se essa intervenção ocorrer nos vários setores da dinâmica cultural poderá se transformar em política de ação cultural. O que acontece tradicionalmente no Brasil, segundo o professor Teixeira Coelho, é que a intervenção acontece geralmente na área da produção, para apenas alguns artistas/produtores (sempre os mesmos), beneficiando determinada camada social e ainda para certos produtos culturais. Ele critica os programas de ação cultural que tratam apenas de uma ou de algumas fases do sistema cultural, impedindo que o processo cultural se complete (1988, p.78). No Brasil a questão cultural não é tratada como um todo, mas em partes. Devem-se romper monopólios, colocar a ação cultural ao alcance efetivo do maior número de pessoas e assim haverá a tão almejada democratização da cultura. 4. POLÍTICAS NACIONAIS DE CULTURA DO GOVERNO FHC AO GOVERNO LULA Antonio Albino Rubim (UFBA), ao analisar os caminhos das políticas culturais brasileiras no texto: Políticas Culturais no Brasil: Trajetória e Contemporaneidade 27 (2008) sinaliza várias características: ausência, autoritarismo, instabilidade, elitismo e erudição. Rubim descreve os primeiros anos de existência do Ministério da Cultura como um período marcado por instabilidades: foi criado no governo José Sarney em 1985, desmantelado e transformado em Secretaria no projeto neoliberal de Collor (projeto esse que desmontou toda a área da cultura) e recriado por Itamar Franco em 1993. “Além disso, foram dez dirigentes responsáveis pelos órgãos nacionais de cultura em dez anos... uma considerável instabilidade institucional para um organismo que está em processo de instalação.” (2008, p.10) Explica Rubim que neste período de instabilidade, surgem também as leis de incentivo à cultura: a Lei Sarney (Lei 7505/86), extinta e substituída pela Lei Roaunet (Lei 8313/91) e a Lei do Audiovisual (Lei 8685/93). A criação dessas leis marcou a introdução do neoliberalismo na cultura do país e fez com que: “parcela considerável dos criadores e produtores culturais passasse a identificar política de financiamento e, pior, políticas culturais tão somente com as leis de incentivo. A profunda sedimentação e admirável persistência deste imaginário de inspiração neoliberal em parcelas significativas do campo cultural irão empobrecer a imaginação e as alternativas de políticas culturais no Brasil... O Estado persistia em sua ausência no campo cultural em tempos de democracia.” (2008, p.11) Para Antonio Rubim: “O novo governo (FHC) caracteriza-se pela implementação, de modo menos tosco e enfático, do projeto neoliberal no Brasil. A retração do Estado acontece em praticamente todas as áreas, substituído pelo mercado.” (2008, p.12) Uma análise dos mandatos de Fernando Henrique Cardoso desenvolvida pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos, publicada no site www.inesc.org.br em 2004, revela alguns pressupostos do contexto neoliberal que o Brasil esteve submetido durante o período de 1995 a 2002. 28 Em 1996, Fernando Henrique Cardoso considerava a globalização como fator primordial para a mudança do papel do Estado: “a ação governamental está agora dirigida para a criação e sustentação de condições estruturais de competitividade em escala global”, ou seja, o governo de FHC estava trocando o desenvolvimento interno pela competitividade internacional. Para ele, a missão do Estado era direcionar o desenvolvimento, propôs diminuir o papel do Estado na economia para transformá-lo em agente do mercado internacional. O Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado rejeitava a idéia de um “Estado mínimo”, mas não a orientação de dar mais espaço ao mercado: “um mercado forte precisa de um Estado forte”. (Inesc, p.37 e 39) No primeiro ano do governo FHC abriu-se espaço para o capital estrangeiro e para as empresas privadas nos setores economicamente cruciais, como energia e telecomunicação, preparando o terreno para a era das privatizações. Não foi o Brasil que passou a competir mundialmente, mas o capital mundial que veio assumir monopólios do Estado, transformando o país em um dos melhores negócios do século XX. A privatização transferiu o patrimônio estatal para as empresas privadas, do poder público para o mercado, atingindo o coração do país. (Inesc, p.41 e 42) As decisões estratégicas e o controle da gestão estavam fora do território nacional. A soberania nacional, a representatividade de seus cidadãos para a escolha de seu próprio destino estava em segundo plano. O país ficou mais vulnerável às instabilidades internacionais como às crises do câmbio em 1998 e em 2002. A solução, recorrer ao Fundo Monetário Internacional (FMI), resultou no aumento da dívida líquida do setor público (de R$ 208 bilhões em 1995 para R$ 800 bilhões em 2002) e no aumento da dívida externa (US$ 159 bilhões para US$ 231 bilhões de 1995 a 2000). (Inesc, p.43) 29 O governo FHC reordenou o papel do Estado transformando-o em complemento do mercado, instaurou um novo modelo de gestão pública gerencial e transformou o cidadão em contribuinte-cliente. Todo o discurso oficial e a legislação aprovada foram em defesa da competitividade, mas não houve concorrência no país, o contribuinte pagou o aumento das tarifas do racionamento de energia em 2001 e não teve a prometida qualidade nos serviços básicos de saúde e educação. Francisco Oliveira, na mesma análise desenvolvida pelo Inesc, considera: “é a isso que o Estado, reformado desta maneira, estará condenado: a ser algoz de seu próprio povo”. (Inesc, p.55) Antonio Rubim explica que a ausência do Estado no campo cultural se amplia nesse governo. A única publicação do Ministério da Cultura em oito anos - Cultura é um bom negócio (1995) visava estimular a participação de empresas e a utilização das leis de incentivo fiscal. Os recursos são públicos, mas o poder de decisão passa a ser privatizado. (2008, p.11 e 12) O Ministério da Cultura liderado por Francisco Weffort tem pouca expressão e desenvolveu algumas ações nos setores de bibliotecas. O programa Uma biblioteca em cada Município, desenvolvido pela Secretaria de Política Cultural, visava o crescimento da rede de bibliotecas públicas, a fim de estimular a leitura e a formação de leitores. Para tal programa o Ministério contava com parceiros importantes: a Fundação Biblioteca Nacional, os Sistemas Estaduais de Bibliotecas, Prefeituras, Governos Estaduais e o Ministério da Educação e do Desporto. (Ministério da Cultura, abril de 1997) Em 1995, o Ministério da Cultura e o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID dão início a entendimentos para viabilizar um programa de preservação do patrimônio nacional. O IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e 30 Artístico Nacional elabora os fundamentos do programa em 1996 e determina os locais de intervenção prioritária: Olinda, Recife, Salvador, Ouro Preto, Rio de Janeiro e São Paulo. O Programa Monumenta inicia-se efetivamente no ano 2000. (http://www.monumenta.gov.br, acesso em 17 de março de 2011) Diante de grandes debates em torno de temas como mundialização e neoliberalismo político e econômico, a gestão Weffort/FHC conseguiu criar um programa de preservação baseado no modelo varguista, modelo que distanciou o patrimônio do povo, caracterizado pela centralização e paternalismo, ressaltando a cultura dos brancos, portugueses e católicos. (Revista CPC, São Paulo, nº 10, 2010) Financiado pelo BID e com apoio técnico da Unesco o Programa Momumenta demonstra, em seus anos iniciais, as características das políticas culturais adotadas na década de 1990. A preservação do patrimônio cultural brasileiro (esse determinado pelo IPHAN) contava com parceiros do setor privado (esses atraídos pela Lei de Incentivo Fiscal) e diminuía a pressão sobre o orçamento federal. Tentava-se incorporar a noção de patrimônio como recurso econômico, ou seja, mais um bom negócio. (Revista CPC, São Paulo, nº 10, 2010) Com exceção das ações do Ministério da Cultura no âmbito das bibliotecas e do patrimônio cultural, imbuídas de erudição e elitismo, no geral não aconteceram concursos e nem programas significativos, muito pouca atenção se deu ao audiovisual, inclusive à televisão e à cultura digital, não houve a preocupação em levantar dados estatísticos culturais, enfim, estabilidade, mas ausência de política cultural efetiva. (Rubim, 2008, p.13 e 14) Dado o contexto histórico, podemos constatar os desafios do governo subsequente. O Mistério da Cultura procurou abrir espaço para outras culturas, além da erudita/de elite, retomando a noção antropológica de cultura. Ao assumir o 31 Ministério em 2003, Gilberto Gil, no primeiro mandato de Lula, passou a enfatizar o papel ativo do Estado, propondo formular e implementar políticas culturais, chamando a sociedade para o diálogo cultural, criticando as leis de incentivo e estabelecendo a sua reformulação. (Rubim, 2008, p.15) A gestão Lula/Gil é marcada pela busca da democratização das políticas culturais quando procura construir políticas públicas em debate com a sociedade, através de inúmeros seminários, câmaras setoriais (música, dança, teatro, circo, artes visuais) e conferências (I Conferência Nacional de Cultura, realizada em 2005 e II Conferência Nacional de Cultura, realizada em março de 2010). (Minc, 2010) O próprio Ministro Gil enfatizou “a abrangência” como diretriz para as políticas públicas de cultura, o que fundamentou a concepção de cultura em três dimensões: simbólica, cidadã e econômica. A dimensão simbólica considera cultura humana como o conjunto de modos de viver: culturas, no plural. Política cultural “que enfatiza, além das artes consagradas, toda a gama de expressões que caracterizam a diversidade cultural brasileira”. Artes populares, eruditas e de massas, culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, todo o conjunto da produção simbólica da sociedade. (II CNC Textobase, Minc, 2010) A dimensão cidadã parte do princípio que “os direitos culturais são parte integrante dos direitos humanos”. Política cultural para “definir e colocar em prática os direitos culturais”, “vital para o desenvolvimento humano e para a promoção da paz”. (II CNC Texto-base, Minc, 2010) A dimensão econômica compreende a cultura como um “dos segmentos mais dinâmicos das economias de todos os países, gerando trabalho e riqueza”. (II CNC Texto-base, Minc, 2010) 32 Todo o debate e investimento no setor geraram o Plano Nacional de Cultura (Emenda Constitucional nº 48, de 10 de agosto de 2005, acrescenta o § 3º ao art. 215 da Constituição Federal, instituindo o Plano Nacional de Cultura) e o Sistema Nacional de Cultura com o objetivo geral de: “Formular e implantar políticas públicas de cultura, democráticas e permanentes, pactuadas entre os entes da federação e a sociedade civil, promovendo o desenvolvimento - humano, social e econômico - com pleno exercício dos direitos culturais e acesso aos bens e serviços culturais.” “Para a constituição de um sistema de cultura efetivamente nacional, tornase imprescindível a consolidação de sistemas próprios, ou seja, federal, estaduais, e municipais ou intermunicipais.” (Minc, 2005). O diferencial da atuação do Ministério da Cultura é a participação social. Desde o início da elaboração do PNC houve incentivos à participação de todos os setores da sociedade. “A viabilização dos sistemas de cultura depende da participação da sociedade civil para a definição de prioridades e o controle e acompanhamento das metas programadas.” (Minc, 2005) Para Antonio Rubim, essa movimentação busca transcender governos e viabilizar políticas nacionais mais permanentes. O Ministério inicia investimentos na área da economia da cultura e já apresenta uma série de informações culturais através do IBGE-2006. (2008, p.16) No entanto, a superação da instabilidade no setor cultural depende plenamente da sintonia entre SNC e PNC: “A construção que vem sendo realizada pelo ministério, em parceria com estados, municípios e sociedade civil, de um SNC é vital para a consolidação de estruturas e políticas, pactuadas e complementares, que viabilizem a existência de programas culturais de médios e longos prazos, não submetidos às intempéries conjunturais”. (Rubim, 2008, p. 16 e 17) Rubim também coloca vários desafios para a plena atuação do Ministério da Cultura e de suas intenções de política cultural: o conceito de cultura precisa ser delimitado para a efetivação das políticas culturais; a participação da sociedade civil precisa ser consolidada; os recursos humanos, materiais e financeiros precisam ser descentralizados; a formação e qualificação de profissionais em cultura são necessárias; é inevitável rediscutir e redefinir a questão do financiamento da cultura, 33 “as leis de incentivo parecem esgotar o tema das políticas de financiamento da cultura. Elas agridem a democracia”. É preciso superar a lógica neoliberal, buscando o papel ativo do estado na cultura, as verbas são públicas, mas o poder de decisão ainda é do mercado. (Rubim, 2008, p.19) O professor Paulo Miguez da UFBA, em palestra no dia 6 de maio de 2010, no II Seminário Cultura, cidade e desenvolvimento (Curitiba – PR), apresentou um panorama histórico do financiamento da Cultura: Primeiramente, aparece o Estado com a lógica utilitarista e legitimadora da cultura. Em seguida, a complexificação das relações entre cultura e poder. No século XVIII, surge o mercado principalmente na esfera da circulação e no século XIX, na esfera da produção, com a lógica da indústria cultural (Adorno e Horkheimer). Na contemporaneidade, surge uma tensão entre a lógica industrial-mercantil e a lógica cultural. Com a ampliação do mercado mundial, ocorre a extensão do campo cultural, a ampliação da criação, da produção, da circulação, da divulgação e do acesso. Durante os anos 1980 – 1990, na cena neoliberal, a tensão mercado e sociedade é ampliada. Surgem novas modalidades: o marketing cultural, o patrocínio, as Leis de Incentivo e também a relação desigual entre criadores e patrocinadores. (Miguez, 2010) Sobre o financiamento da cultura no Brasil, o professor Miguez continua: Inicialmente o Estado era o principal agente financiador de cultura. No ambiente neoliberal, surgem as Leis de Incentivo adotadas por estados e municípios, leis que privilegiam o mercado utilizando dinheiro público. O problema está quando as leis são os únicos mecanismos de financiamento da cultura. E as principais críticas são: o poder de deliberação passa do Estado para as empresas; uso de recursos públicos; incapacidade de atrair novos recursos privados; ausência de contrapartidas; concentração de recursos, concentração regional e utilização das mesmas linguagens; apoio à cultura mercantil (exclusivamente comercial), etc. Ora veja, se há concentração regional de recursos e de linguagens, não há desenvolvimento cultural, serão sempre os mesmos, empresas, artistas e segmentos culturais. O Estado deve cuidar disso, sem cair no exagero do dirigismo cultural, mas precisa fiscalizar o mérito cultural dos produtos financiados. (Miguez, 2010) E finaliza, chamando os ouvintes para o debate atual: É preciso primeiro definir políticas públicas de cultura, metas e objetivos e, a partir disso, discutir mecanismos de financiamento da cultura. De um lado, o Estado pode ser protagonista da cultura através de financiamentos diretos, do outro, existem as leis de incentivo contando com a participação do mercado. O problema é que o tema financiamento interdita o debate sobre as políticas públicas, o SNC, o PNC, a diversidade cultural, a relação da cultura com o desenvolvimento, os estudos em cultura, a formação, etc.. O financiamento é uma dimensão, uma ferramenta de política pública. É preciso pensar e 34 criar novas modalidades de política cultural: Estado, mercado, investimento social privado (neo-mecenato, Sarcov), patrocínio, renúncia fiscal, agências de fomento, mecanismos de crédito, legislação, etc.. (Miguez, 2010) Na visão do professor Paulo Miguez, representante do posicionamento do Ministério da Cultura, está claro a intenção e urgência na reformulação das leis de incentivo e a retomada do papel do Estado. Porém, para ele, discutir apenas os mecanismos de financiamentos obscurece a definição de políticas públicas de cultura. Bernardo da Mata Machado, do Minc DF e pesquisador em Minas Gerais, ao proferir a palestra Reflexões sobre o financiamento público da cultura em 7 de maio de 2010, no II Seminário Cultura, Cidade e Desenvolvimento (Curitiba-PR), cita Isaura Botelho: “as políticas públicas determinam o financiamento e o que vemos no Brasil hoje é ausência de discussões sobre os objetivos da política pública de cultura.” A tabela a seguir demonstra em súmula a abordagem do professor Machado. Primeiramente apresentou uma tipologia de política cultural e o papel do Estado e do mercado na cultura: Modelo de política cultural Estado e Mercado na cultura Modelo Liberal Democrático (Inglaterra) Intervenção mínima do Estado A cultura pertence à sociedade, aos indivíduos Valor: liberdade Foco: criação à favor do mercado Modelo Social Democrático (França) O Estado deve intervir para ampliar o acesso Valor: igualdade Foco: distribuição e consumo à favor do Estado Contra o mercado O Estado deve intervir para buscar o interesse geral. O ideal da República: direitos iguais. No século XX percebemos a exaltação de interesses particulares, a produção de desigualdades e a dominação dos mais fracos. Modelo totalitário (Nazismo) O Estado intervém para propagar o regime e exaltar o chefe (política dirigista) Valor: o poder do Estado Foco: censura ao que é contrário ao regime, fomento às manifestações de exaltação No século XVIII inicia-se um processo de independência dos intelectuais e dos artistas da Igreja. Contra o Estado No Estado capitalista os interesses dominantes devem ser os do mercado. 35 (Bernardo da Mata Machado, 2010) Machado ainda analisa a diversidade cultural e financiamento da cultura da seguinte forma: Cada setor tem uma cadeia produtiva específica: criação – produção – distribuição – difusão – consumo, e o financiamento deve ser pensado a partir de cada setor e dos elos das cadeias produtivas. O que temos hoje é um único tipo de financiamento cultural que privilegia determinados setores e determinadas fases da cadeia produtiva cultural. As Leis de Incentivo não abordam todos os tipos de manifestações culturais e não compreendem todos os elos da produção cultural. O financiamento cultural precisa de informações sobre cada setor e sobre cada elo do respectivo setor, para identificar as carências e as potencialidades. Isso porque os bens culturais são singulares e a aceitação é algo imprevisível. Com informações sobre os diferentes processos culturais pode-se pensar em diferentes mecanismos de financiamento. (Machado, 2010) Bernardo da Mata Machado, também esclarece a posição do Minc: diversificar os mecanismos de financiamento para abordar a diversidade cultural brasileira. A atual política pública cultural tem retomado a intervenção do Estado na cultura. Diferente de outros períodos históricos, onde a atuação do Estado servia para controlar a cultura e a sociedade, hoje vemos uma vontade política inclinada para a participação dos artistas, da sociedade civil e do meio empresarial. Vemos uma discussão para a formulação de um plano nacional de cultura e necessidade de sistemas regionalizados que possam tornar possíveis e realizáveis as diretrizes culturais. Enfim, as limitações e os desafios são muitos, porém a atual política pública de cultura está passando por um importante período de transição democrática. (Rubim, 2008, p.19) 36 5. POLÍTICAS E AÇÕES DE CULTURA EM CAMPO LARGO (1995 A 2010) E OS REFLEXOS DAS POLÍTICAS NACIONAIS 5.1. Dados básicos e história de Campo Largo – Paraná: O município de Campo Largo faz parte da Região Metropolitana de Curitiba. Está localizado a 24,5 km da capital do estado do Paraná. Apresenta uma superfície de 1.359.565 km2 e uma população estimada em 2009 de 112.548 habitantes. Sua emancipação política ocorreu em 23 de fevereiro de 1871. Sua economia gira principalmente em torno de atividades agropecuárias e industriais nas áreas de cerâmica, moveleira e metal-mecânica. (http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso em 23 de outubro de 2010) A história de Campo Largo faz parte do início da colonização do Paraná, assim como outras regiões dos arredores de Curitiba, serviu como pouso de tropeiros. “O desenvolvimento de Campo Largo foi mais intenso com a chegada dos imigrantes, principalmente italianos e poloneses, a partir de 1875.” (http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso em 12 de março de 2011) 5.2. Administração: Desde 2005, o município de Campo Largo vendo sendo administrado pelo prefeito Edson Basso. A Secretaria de Educação, Cultura e Esporte está sob a responsabilidade do Professor Norton Nori Pooter (2009). O Departamento de Cultura, formado pela Casa da Cultura Dr. José Antonio Puppi, pela Biblioteca Central, pelo Museu Histórico de Campo Largo e pela Biblioteca Cidadã na Ferraria, 37 está sob a responsabilidade do Sr. Juciê Parreira, um jovem natural de Campo Largo, graduado em pedagogia pela UFPR. (http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso em 25 de julho de 2010) A Casa da Cultura Dr. José Antonio Puppi foi inaugurada em setembro de 1992. Situada na Rua do Centenário, possui um auditório para 280 pessoas, salas para cursos, salão de exposições e abriga o Departamento de cultura. O local tem por finalidade promover eventos artísticos e culturais, cursos, concursos, pesquisas e oficinas de arte. A Biblioteca Central Dr. Francisco Ribeiro de Azevedo Macedo, localizada na Rua do Centenário, está situada em um prédio histórico, sede da 1ª delegacia e da 2ª prefeitura, desde 1992. Conta com um acervo de aproximadamente 20 mil livros. O acesso é livre e gratuito disponibilizando materiais para pesquisa, leitura, tele centro e internet. Desenvolve também projetos de incentivo à produção literária e à leitura. O Museu histórico de Campo Largo, localizado na Praça Getúlio Vargas, existe desde 2003. O prédio foi construído em 1911 para abrigar o grupo Escolar Macedo Soares. Depois de algumas reformas, em 1942 passou a ser o Fórum Municipal. De 1984 a 2001 abrigou alguns departamentos da prefeitura. Hoje o Museu contém salas de exposições permanentes como a sala histórica, com objetos antigos que contam a história da imigração em Campo Largo; o corredor central, com fotos que contam a história política da cidade; a sala da louça e a sala dos expedicionários. Além disso, contém salas de exposições temporárias, uma oportunidade para artistas locais divulgarem seus trabalhos. A Biblioteca Cidadã Odila Portugal Castagnoli foi inaugurada em setembro de 2007 no bairro da Ferraria. Segundo Josiane Rogaleski, coordenadora da 38 biblioteca, a ideia foi desenvolvida a partir de um projeto do estado visando ampliar o acesso à pesquisa e à leitura nos bairros periféricos. A biblioteca foi construída na Rua Mato Grosso, próximo ao Parque do Passaúna, município cedeu o terreno e a Secretaria de Estado da Cultura do Paraná construiu o prédio, promoveu o treinamento, doou os equipamentos e um acervo de 2000 livros. Além de empréstimos de livros e acesso à pesquisa, a Biblioteca Cidadã promove concursos, palestras, oficinas, contação de histórias, reforço escolar em língua portuguesa, atendendo pelo menos três escolas da comunidade. 5.3. Os primeiros anos da Casa da Cultura - 1993 a 1996: Durante o período de 1993 a 1996 a Secretaria de Educação, Cultura e Esporte foi dirigida pelo Sr. Osvaldo Andrade Zotto e a Casa da Cultura foi gerenciada pelo Sr. Antonio Braga Neto. As primeiras pastas consultadas revelaram constantes solicitações para o uso do auditório e das salas de exposição da Casa da Cultura Dr. José Antonio Puppi. Geralmente as solicitações vinham de outras secretarias do município, de escolas, creches, sindicatos e associações da região para reuniões, palestras, cerimônias, formaturas, apresentações de alunos, apresentações de peças de teatro adulto e infantil, recitais e audições. Alguns exemplos dessas solicitações: Festa Cultural de Dança e Formatura dos alunos da pré-escola 1º Passo; Cantata de Natal; Lançamento da campanha “Cidade Limpa”; Teatro Amador Incepa; Reuniões do Sindicato Rural; Peça infantil “Brincando de Teatro” da Produções Artísticas Oriente; III Festival de Literatura, Música e Dança do Colégio Sagrada Família. Entre as tantas solicitações, encontramos a programação de um evento denominado Culturas em Destaque, ocorrido em agosto de 1993. O evento consistiu 39 em apresentações folclóricas e exposições de artesanato local, rural e indígena na Casa da Cultura. (Anexo 2) Também encontramos a programação da comemoração dos 123 anos de Campo Largo entre fevereiro e março de 1994. Entre as várias festividades estão: Missa em Ação de Graças, hasteamento das Bandeiras, passeio ciclístico, torneio de xadrez, exposição do acervo da Casa da Cultura, lançamento de um livro da história de Campo Largo, atelier de artes, apresentação de teatro, show de bandas, noite da seresta, apresentação de bailarinos do Teatro Guaíra e concerto da Orquestra de Solistas do Paraná. Um evento sem dúvida destacável. (Anexo 3) 5.4 De 1997 a 2000: bibliotecas, livros e leitura, limitadas verbas públicas e colaboração de empresas privadas: Em 1997, na gestão do prefeito Newton Puppi, surgi a Secretaria de Cultura, Esporte e Turismo coordenada pelo o Sr. Sérgio Souto. Permanecendo apenas um ano, em 1998, a cultura torna-se novamente um departamento da Secretaria de Educação, Cultura e Esporte dirigido pela Srª Neuzeli Sanson. Nas pastas de 1997, além das conhecidas solicitações de uso dos espaços da Casa da Cultura, localizamos um ofício com o regulamento de um concurso municipal de redação, uma parceria entre Secretaria de Cultura e Caixa Econômica Federal com o seguinte tema: “Caixa o Banco de uma vida melhor”. (Anexo 4) Em julho de 1997, a Secretaria de Cultura, recebeu um Termo de Cooperação Técnica e uma circular da Biblioteca Pública do Paraná/ Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas sugerindo a “mútua colaboração entre a Biblioteca Pública do Paraná e o Município visando o desenvolvimento dos serviços públicos de leitura e informação através da Biblioteca Pública Municipal”. (Anexo 5) Juntamente com a circular foram encaminhados dois documentos: Propostas aos 40 Prefeitos Municipais do Sistema Nacional de Bibliotecas e Programa uma Biblioteca em cada Município do Ministério da Cultura. (Anexo 6) O convênio entre a Biblioteca Pública do Paraná e a Biblioteca Pública de Campo Largo foi assinado e a Srª Therezinha Apparecida Mikos selecionada para frequentar o assessoramento técnico oferecido pela Secretaria de Estado da Cultura do Paraná. (Anexo 7) Através desses documentos podemos perceber uma conexão entre o programa nacional e o estadual e, consequentemente, um chamamento do Estado sobre o município. Esse convênio pode ter representado um avanço para a cultura de Campo Largo. Além disso, encontramos uma organização das atividades do Departamento de Cultura 1º semestre de 1997: há exposições, homenagem às mães, ateliers, cursos de dança, violão, coral, work shop e teatro infantil, em parceria com a SEECPR, festa junina, em parceria com CEF e o 1º Encontro de Corais Curitiba e Região Metropolitana (anexo 8). Para o 2º semestre do mesmo ano, há solicitações de oficinas, cursos e palestras referentes ao Projeto Trilha da Cultura (SEEC-PR) e a programação para a apresentação de grupos folclóricos na Vila Olímpica Antonio Lacerda Braga. Assim sendo, percebemos uma nova movimentação do Departamento de Cultura de Campo Largo, a noção de ações culturais começa a se ampliar devido à aproximação com a Secretaria de Estado. Nesta passagem 1998/1999/2000 encontramos referências a Encontros dos Secretários Municipais da Cultura do Estado do Paraná promovidos pela Secretaria de Estado. Esses encontros tinham vários objetivos: levantar dados, mapear serviços culturais, aglutinar linguagens e expressões artísticas, enfim, a aparente 41 intenção de organizar uma política cultural estadual. Não encontramos sinais da participação do município de Campo Largo nos dois primeiros encontros. No entanto, há uma solicitação de vagas para o 3º Encontro de Secretários previsto para abril de 2000 em Faxinal do Céu. (Anexo 9) Nos ofícios de 1999, encontramos diversos contatos entre a Diretora do Departamento de Cultura Srª Neuseli Sanson e o Secretário de Educação, Cultura e Esporte Sr. Sérgio Souto, entre eles, o calendário anual de eventos do Departamento (Anexo 10); uma solicitação de materiais para os eventos e atividades (Anexo 11), um documento para angariar livros junto às empresas da cidade e a lista das empresas que contribuíram para o acervo da Biblioteca Central (Anexo 12). Julgamos, pela análise dos documentos, modificações efetivas nas ações culturais do Departamento de Cultura. Primeiramente, a partir de 1999, uma simplificação dos eventos culturais, um esforço da diretora do Departamento de Cultura para conseguir da Secretaria materiais básicos, ou seja, fazer cultura com poucos recursos públicos: “já estamos trabalhando em parceria com empresas que nos apóiam e patrocinam os eventos” (ver Ofício nº 016/99, anexo 11). Ainda percebemos a participação de empresas privadas na campanha de doação de livros para a melhoria da Biblioteca Municipal, pressão da Secretaria de Estado e dos programas do Ministério da Cultura, e um enfoque educacional para a cultura priorizando a “melhoria do ensino de nossa cidade... que nossas escolas municipais e estaduais necessitam” (ver Ofício nº 027/99, anexo 12). Nas pastas do ano 2000 encontramos uma notificação do Conselho Regional de Biblioteconomia (29 de fevereiro) constatando a falta de um profissional bibliotecário na Biblioteca Municipal de Campo Largo e a solicitação ao Prefeito Newton Puppi (30 de março) para a contratação de bibliotecários. Em seguida, 11 de 42 abril, a Diretora Neuseli informa ao Conselho a presença da Srª. Rosilei Berto como bibliotecária formada, antes atuante como estagiária (Anexo 13). Novamente a pressão da Secretaria de Estado e do programa de Bibliotecas do Ministério da Cultura. Há um ofício, também de 2000, convidando todas as escolas do município a participar das Exposições Itinerantes na Biblioteca Pública, promovidas pelo Departamento de Cultura como parte do evento Brasil - 500 Anos. A lista de exposições sugere uma programação bastante diversificada para o ano inteiro (ver anexo 14). Em maio de 2000, a Secretaria de Estado da Cultura – Coordenação de Ação Cultural convida o Departamento de Cultura de Campo Largo a participar do Projeto Comboio Cultural. Esse projeto visava proporcionar um rodízio de espetáculos de música, dança e produção teatral entre os municípios do Estado. O Departamento aceita o convite solicitando apresentações do Comboio Ópera e do Comboio Teatro de Bonecos para agosto de 2000 (Anexo 15). Na pasta dos Ofícios Recebidos do mesmo ano, encontramos algumas solicitações para o uso do auditório da Casa da Cultura como nos anos anteriores, no entanto, agora com a cobrança de uma taxa de R$ 300,00. Em 26 de outubro, solicitação para uma palestra da Empresa Brasil Assessoria, Eventos e Informática; em 25 de novembro, solicitação para apresentação de teatro da Companhia de Marcio Miler e em 8 de dezembro, solicitação para apresentação de um espetáculo de dança da Escola Anna Ballerina (modelo de solicitação e recibo ver anexo 16), todos eventos obrigados a pagar aluguel pelo uso do único auditório da cidade. Talvez uma alternativa para a falta de recursos públicos para a cultura. 43 Na pasta de Ofícios Expedidos de 2000, encontramos a programação de alguns eventos culturais tais como: Homenagem ao dia das mães (em maio); IV Junin Fest – Festival de Música Sertaneja (na Vila Olímpica, em junho); 1º Festival de Teatro (de 1º a 8 de julho); III Encontro de Corais (em 29 de julho). Por conta desses eventos, há também nessa pasta várias solicitações de verbas para a Secretaria, assim como vários pedidos de patrocínio para empresas privadas: Global Telecom, Tintas Suvinil, Dpascoal, Tim, Spida – Marketing e Comunicação e outras para a Petrobrás, Caixa Econômica e Compagás. Analisando as ações culturais do Departamento de Cultura de Campo Largo, nos anos acima descritos, percebemos uma movimentação cultural, mas ainda uma noção de cultura simplificada baseada em festividades anuais; uma preocupação com biblioteca, livros e leitura e uma modificação nas ações culturais atreladas à Secretaria de Estado da Cultura do Paraná. Percebemos dificuldades na realização dos eventos: falta de materiais básicos, limitadas verbas públicas, necessidade de cobrar taxa por um espaço de cultura e a constante com a colaboração de empresas privadas. Reflexos do contexto cultural nacional. 5.5 De 2001 a 2004 nada foi encontrado na Casa da Cultura: Curiosamente nada foi encontrado na Casa da Cultura referente aos anos 2001, 2002, 2003 e 2004, nenhuma pasta de ofícios recebidos ou expedidos ou arquivo de computador, nenhum funcionário do Departamento sabe realmente o que houve com os documentos desses anos. Sabemos apenas que durante a gestão do Prefeito Afonso Portugal Guimarães, o Sr. Paulo Castagnolli foi Secretário da Educação, Cultura e Esporte e o Sr. Alfredo Lopes diretor da Casa da Cultura. 5.6 De 2005 a 2008: pensamento cultural, integração e rumo à política municipal de cultura: 44 A partir do ano de 2005, achamos outros documentos além das pastas de Ofícios Recebidos e Expedidos: Lista dos Cursos e Relatório das Atividades desenvolvidas na Casa da Cultura (Anexo 17 e 18); pasta de inscrição de alunos nos cursos e nas oficinas e pasta de cadastro dos artistas da cidade. A Secretaria de Educação, Cultura e Esporte passa a ser dirigida pela Srª Márcia de Mello e Silva, o Departamento de Cultura é responsabilidade do Sr. Maurício Moraes e a Casa da Cultura da Srª Luana Matter. Nos Ofícios Recebidos de 2005, encontramos as já conhecidas solicitações para o uso do Auditório da Casa da Cultura emitidas por escolas, empresas e associações da região, mas não há indícios dos antigos pagamentos de aluguel. Entre tantos documentos recebidos, destacamos uma circular da Secretaria de Estado da Cultura convidando Campo Largo para o III Encontro de Secretários e Dirigentes Municipais de Cultura, a ser realizado na cidade de Maringá em agosto do mesmo ano (anexo 19): “Este evento, ..., contará com a presença de representantes do Ministério da Cultura, ... serão debatidos temas relativos ao desenvolvimento da cultura ...”. Na programação anexada, percebemos a intenção de discutir, Minc, Estado e municípios, o Sistema Nacional de Cultura, os Pontos de Cultura, o Financiamento e a Gestão da Cultura, a Cultura Brasileira e a questão do Patrimônio e Inventário Cultural (ver anexo 20). Em 2005, percebemos uma movimentação nas ações culturais do Departamento de Cultura: criação de uma Feira de Artesanato Noturna (durante o 1º final de semana de cada mês); Programa Paraná Fazendo Arte (em março); Cadastramento de Artistas Locais (em abril); Cultura em Ação (em maio); Arte Solidária para a 3ª Idade (em julho) e III Festival de Teatro (em outubro). 45 Encontramos solicitações de profissionais e de oficinas do Projeto Paranização “Dada a necessidade de levar aos bairros atividades ligadas à cultura”, com o objetivo de “descentralizar e deselitizar a cultura quebrando possíveis barreiras que possam haver entre a população da periferia e a Casa da Cultura” (anexo 21). Analisando essas solicitações, entendemos que esse projeto, do Centro Cultural Teatro Guaíra (Direção de Nitis Jacon), faz parte de um programa plurianual (2003 a 2006) de políticas públicas do Estado e que tem por objetivos a democratização e a descentralização de toda a cultura produzida no Paraná, assim como as ações culturais desenvolvidas pelo Governo e pelas prefeituras, com a participação da iniciativa privada e da sociedade civil. Achamos um ofício de setembro de 2005 endereçado ao Coordenador do Programa Paraná Fazendo Arte, solicitando apoio ao III Festival de Teatro de Campo Largo. Esse festival contou com grupos de Curitiba e Região Metropolitana houve apresentações de peças teatrais (infantil e adulto) no ônibus/palco em uma das praças centrais da cidade e em “regiões não centrais, a fim de incrementar e difundir o teatro à população menos favorecida de nosso município” (anexo 22). Ainda localizamos solicitações às empresas de Campo Largo pedindo apoio, patrocínio e materiais para o desenvolvimento das ações culturais daquele ano. Exemplos: em março, pedido de doação de refrigerantes para a Distribuidora de Bebidas Beber e de salgados e doces para o Supermercado Mercantiba para a abertura do Programa Paraná Fazendo Arte; em maio, solicitação de uma carro de som para a Cocel - Companhia de Luz de Campo Largo e outra para a Empresa de ônibus Nossa Senhora da Piedade para a divulgação do Cultura em Ação; em agosto, solicitação de uma carro de som para Leve Calçados a fim de divulgar as atrações da Feira Noturna e outra para as Lojas Central, pedindo doação de 46 materiais para a oficina de artes; em setembro, um pedido de policiamento intenso para a Feira Noturna encaminhado ao Capitão Buzencko da 3ª Cia. de Campo Largo; em outubro, um requerimento de patrocínio à Empresa Tritec Motors para as feiras de culinária e artesanato e um pedido de apoio à Onda Livre FM para a divulgação do III Festival de Teatro. Aparentemente a aproximação da política cultural do Estado e do Ministério da Cultura mobiliza as ações culturais de Campo Largo ampliando a noção de cultura, mas ainda através daquilo que já vem sendo desenvolvido pelos projetos culturais do Estado (Curitiba como centro irradiador de cultura) e ainda também dependendo do apoio de empresas privadas. Em 2006, a Diretoria da Casa da Cultura passa a ser responsabilidade da Srª Gladis Chemin Miró e há também a participação da Srª Rejane Nóbrega como coordenadora de projetos. As conhecidas solicitações para o uso do Auditório da Casa da Cultura continuam existindo em 2006, porém, dessa vez há um “Regulamento para empréstimo e locação da Casa da Cultura Dr. José Antônio Puppi” (anexo 23). A movimentação das ações culturais do Departamento de Cultura continua em 2006, no relatório anual encontramos apresentações teatrais e musicais, palestras, seminários, exposições, cursos e oficinas (ver anexo 24), indicações sobre a I Semana de Culturas Tradicionais e Populares (em agosto) e sobre o I Encontro Sul Brasileiro de Culturas Populares (em setembro, na Praça Getúlio Vargas), encontramos também uma planilha detalhada sobre os projetos culturais para todo o Departamento de Cultura, projetos de artes cênicas, musicais e visuais para a Casa da Cultura, projetos para o Museu Histórico e para a Biblioteca Pública, todos com objetivos, público alvo e custos. (Anexo 25) 47 Um documento semelhante foi encontrado no material de 2007 apresentando projetos de espetáculos, oficinas e festivais. No entanto, com menos detalhes e sem a exposição dos custos. Provavelmente, elaborado por outra pessoa. (Anexo 26) Nos documentos expedidos em 2008, encontramos diversas solicitações do Departamento de Cultura: oficinas de dança e de violão; visita dos funcionários da cultura ao MON – Museu Oscar Niemayer de Curitiba; acervo do Museu Paranaense para a exposição de Culturas Indígenas; solicitação para Seminário sobre Fundação Cultural; pedido de continuidade do evento Culturas Tradicionais e Populares com envolvimento e projetos dos professores e das escolas da rede municipal; solicitação de obras paranaenses para compor o acervo histórico de Campo Largo; participação de grupos de fandango de Paranaguá; solicitação de verbas para os eventos: Culturas Indígenas Brasileiras (em maio), Culturas Tradicionais e Populares (em agosto) e Festival de Música de Raiz (em novembro). Analisando essa sequência de solicitações observamos uma intenção de continuidade das ações culturais de 2006 e 2007, de transformação e ligação maior com as ações culturais de Curitiba, mas ao mesmo tempo uma dificuldade de organização e efetivação. O documento considerado mais importante desse período é uma cópia de email enviada pela Srª Rejane Nóbrega aos envolvidos com a cultura de Campo Largo, contendo propostas de política cultural para o município. Nesse, encontramos como pressuposto: “cultura e arte como agentes de transformação social, tão necessários quanto educação, saúde, habitação, bem estar social”, diversas ações/ propostas e uma série de aspectos importantes do setor público de cultura a serem discutidos e reordenados (ver anexo 27). 48 Outro documento igualmente importante é uma planilha com sugestões de projetos culturais para 2009–2012 elaborado pelos funcionários da Biblioteca, da Oficina de Literatura e do Centro de Letras de Campo Largo e assinado pela Srª Rozeli Cosmo, coordenadora da Biblioteca. Nesse existe, entre os vários projetos, a sugestão do desmembramento da cultura - a criação da Secretaria Municipal de Cultura “visando mudanças... criando um plano de políticas culturais para o município que atenda a classe artística e também a população de modo geral”. Também aparece a necessidade de “integrar as ações culturais” da Casa da Cultura, do Museu Histórico e da Biblioteca Pública “fortalecendo as atividades culturais do município” (anexo 28). Em todos os materiais consultados de ano a ano, encontramos pela primeira vez, em 2008, documentos referentes à política municipal de cultura. Entendemos que nesses anos houve movimentação nas ações culturais de Campo Largo, mas não só isso, movimentação de qualidade cultural, pensando mais em arte/cultura do que em educação, integrando Casa da Cultura, Museu Histórico e Bibliotecas, fazendo projetos, eventos, buscando parcerias, tentando trazer para a cidade projetos já existentes em Curitiba e no Estado, buscando um caminho de qualidade no pensamento cultural. Talvez tenha faltado maturidade, legitimidade e apoio institucional para o surgimento de uma política cultural em Campo Largo nesse momento, porém, o rumo já estava delineado. Reflexos das discussões nacionais. 5.7 Em 2009 significativos avanços, mas as dificuldades continuam: Após as eleições municipais, no segundo mandato do prefeito Edson Basso, a Secretaria de Educação, Cultura e Esporte, passa a ser dirigida pelo Sr. Norton Pooter e o Departamento de Cultura fica sob a responsabilidade do Sr. Osvaldo Andrade Zotto, até maio de 2010. 49 Logo no início da gestão o diretor Osvaldo Zotto apresentou ao Prefeito e a outros secretários responsáveis uma proposta de criação da Fundação Cultural de Campo Largo “fruto de amplos estudos com representantes da classe cultural e artística do município, ao longo dos três últimos anos” (anexo 29). O diretor, com votos de estima e consideração, esperava a aprovação da proposta pelos representantes municipais. Apenas encontramos o Ofício de encaminhamento de 31 de março de 2009, a proposta em si não foi encontrada nos arquivos pesquisados. No entanto, tivemos acesso ao Projeto de Lei XX/2009 de outubro, no qual a Câmara Municipal de Campo Largo aprovou e o Prefeito Municipal sancionou “a criação do Conselho Municipal de Cultura, Conferência Municipal de Cultura, Fundo Municipal de Cultura” (Anexo 30). Sabemos que ainda hoje (início de 2011) o Departamento de Cultura continua fazendo parte da Secretaria de Educação, Cultura e Esporte, no entanto, está previsto para o mês de abril a 1ª Conferência Municipal e a escolha do Conselho de Cultura definitivo. No Ofício nº 35/2009 o Diretor Osvaldo Zotto encaminha em 1º de junho para vários vereadores e secretários um apelo à conscientização da necessidade de “um orçamento maior para a área da cultura”. Em anexo a esse ofício estavam vários outros documentos com “as propostas para a área cultural que estão sendo debatidas a nível nacional”, tais como: propostas de emenda à Constituição de destinação de recursos à cultura - PEC 150/03; Plano Nacional de Cultura, Sistema Nacional de Cultura – 30 propostas prioritárias; Projetos para Cultura (Site do Minc, maio/09): PEC 150 e Fundo Setorial do Livro e da Leitura; Documento de Criação da Comissão de Educação e Cultura na Câmara dos Deputados liderada por Angelo Vanhoni. Todos esses anexos mostram a intenção de sensibilizar os responsáveis “para que possamos atingir os objetivos e desenvolver uma política cultural em 50 Campo Largo” e “desejamos poder contar com a sua colaboração no sentido de apoiar a destinação de 1% do Orçamento de 2010 para a área cultural” (anexo 31). Existe outro documento interessante de julho de 2009 onde o Diretor Zotto solicita ao Prefeito apoio e colaboração para a viabilização de um projeto de reconstrução de uma antiga casa existente na entrada do Parque Cambuí. O levantamento histórico desvendou a relevância histórica e cultural dessa casa para Campo Largo, “pertenceu à família do Desembargador Clotário Portugal” e depois “abrigou a Escola Estadual Estação de Enologia” e ainda “mais tarde tornou-se a Escola Municipal O Ateneu”. O diretor cobra “um compromisso do Município na sua preservação”, mas ao mesmo tempo tem ciência “das dificuldades orçamentárias da Prefeitura” e esclarece a pretensão de “elaborar um Projeto de Reconstrução que seja contemplado com os recursos de outras esferas governamentais, especialmente do Governo Federal.” (Anexo 32) Achamos outras indicações relevantes: uma ficha de inscrição do Sr. Diretor Osvaldo Zotto para participar do Seminário sobre o Sistema Nacional de Cultura em Curitiba, nos dias 3 e 4 de setembro; uma lista de delegados para a Conferência Intermunicipal de Cultura em Colombo, em 29 de outubro; e as inscrições do Sr. Zotto e do Sr. Milton (funcionário da Ação Cultural da Casa da Cultura) para a 2ª Conferência Estadual de Cultura em Campo Mourão, em 27 de novembro. Analisando os documentos de 2009 descritos até aqui, podemos constatar que o diretor do Departamento de Cultura é um profissional bem intencionado e informado sobre os parâmetros e as diretrizes instituídos pelo Ministério da Cultura. Projetos, propostas, compromissos com a preservação do patrimônio histórico e cultural, pretensão a criação de uma Fundação Cultural, discussões sobre 51 orçamento para a área da cultura, são reflexos dos seminários, debates e discussões nacionais referentes às políticas culturais no Brasil. Ainda nos materiais pesquisados referentes a 2009, encontramos um encaminhamento para os secretários responsáveis das prioridades da área cultural – Plano/Propostas de trabalho 2009 a 2012 “atendendo solicitação feita na reunião do Gabinete em 12 de agosto” e a relação dos compromissos de campanha do prefeito para o setor da cultura (anexo 33). Nas propostas do Museu Histórico, assinada pela coordenadora Srª Margarete Boaron, encontramos diversas solicitações de materiais e equipamentos necessários para a existência do Museu. Há metas, prazos, ações, atividades, setores responsáveis e custos, tudo bem planejado, no entanto apenas dois projetos envolvendo artistas e comunidade. Nas propostas da Biblioteca Cidadã, sem assinatura, percebemos mais uma reclamação do que planos de ação: faltam profissionais capacitados e materiais para o desenvolvimento de projetos, material básico e de limpeza, assim como manutenção do próprio estabelecimento, tudo já solicitado, segundo o documento, por ofícios e aguardando respostas (anexo 34). Podemos concluir analisando o ano de 2009 diversos avanços para o setor público cultural de Campo Largo, um caminho de discussões para a criação de uma política cultural, uma forte ligação com as prerrogativas do Ministério da Cultura, mas também persistindo as antigas dificuldades, faltam recursos, materiais básicos, manutenção dos equipamentos culturais e profissionais qualificados. Aparentemente existem pessoas, idéias e bons projetos de relevância cultural, porém, ainda há um longo caminho a ser percorrido para o envolvimento dos artistas e da comunidade campo larguense. 5.8 2010 – o desenvolvimento de uma política de cultura em Campo Largo: 52 Com o apoio da Prefeitura Municipal e dos funcionários, o atual diretor do Departamento de Cultura, Sr. Juciê Parreira, vem promovendo diversos eventos para o desenvolvimento de uma política cultural em Campo Largo. Em julho de 2010 a população de Campo Largo foi convidada a participar da 1ª Audiência Pública sobre Cultura do Paraná. Nessa foram discutidas políticas públicas e apresentadas as propostas do Departamento de Cultura. A Audiência, realizada no Auditório da Casa da Cultura Dr. José Antonio Puppi, contou com a presença do prefeito Edson Basso que ressaltou a importância da organização da cultura em Campo Largo: “Reconheço que precisamos de mais movimentos culturais. Campo Largo tem que prestar mais atenção na cultura. A partir de agora teremos sempre uma surpresa a mais e a cidade voltará a ocupar um lugar de destaque no Paraná. A população precisa ajudar a decidir. Através da Audiência é que haverá uma conscientização do povo sobre o poder público, e um entendimento maior sobre a necessidade de investimentos em determinadas áreas, como é o caso da Cultura”. (http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso em 22 de julho de 2010) Depois da Audiência, em agosto de 2010, foi realizado em Campo Largo o 1º Fórum Municipal de Cultura (Anexo 1) para a construção de um Plano Municipal de Cultura. A abertura contou com cerca de 100 representantes da sociedade e várias autoridades: o vice-prefeito Dante Vanin, o Secretário da Educação e Cultura Norton Pooter, a vereadora Lindamir Ivanowi, a antropóloga Gesline Braga e o dramaturgo Abílio Machado de Lima. O Fórum apresentou propostas para definir o futuro cultural do município e eixos para facilitar o planejamento: Cultura e Economia Criativa; Diversidade Cultural; Patrimônio e Memória Cultural; Democratização e Acesso à Cultura; Gestão e Institucionalidade da Cultura. “Cada novo fórum setorial que for feito, seja sobre música, cinema, teatro, ou qualquer outro assunto, será discutido como essas modalidades se enquadram dentro dos eixos definidos”, explicou o diretor Juciê Parreira. (http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso em 15 de setembro de 2010) 53 Também durante o Fórum foi definido o Conselho Provisório de Cultura que ficará em exercício até abril de 2011, quando será realizada a 1ª Conferência Municipal de Cultura, quando serão exibidos os resultados conquistados e será eleito o Conselho definitivo. Os eleitos para fazer parte dessa gestão provisória foram: Abílio Machado de Lima Filho (dramaturgo), Ana Paula Assis (cantora e acadêmica de direito), Teodolino José de Souza (músico e maestro), Gesline Braga (antropóloga) e Ramon Voltolini de Assis (músico e jornalista). (http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso em 15 de setembro de 2010) Por meio da parceria entre a Secretaria de Articulação Institucional do Ministério da Cultura e o Departamento Municipal de Cultura de Campo Largo foi realizado em setembro de 2010 o Seminário Gestão Pública e Sistema Nacional de Cultura. O objetivo do evento foi promover debates no campo das ações políticas, das reflexões históricas e teóricas. O representante do Minc, professor Bernardo da Mata Machado, apresentou propostas de estruturação do SNC aos setores públicos e sociedade civil. Gestores dos municípios vizinhos também acompanharam as palestras e receberam orientações. O prefeito Edson Basso participou e salientou: “Campo Largo está gratificada por receber um evento tão importante como este. Neste novo modelo de política cultural temos que priorizar a organização e a participação da população nas decisões”. (http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso em 6 de outubro de 2010) Esses eventos realizados em Campo Largo no ano de 2010 movimentaram o setor cultural da cidade, demonstraram apoio municipal e empenho no desenvolvimento de uma política pública de cultura. 54 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Nos primeiros anos de existência da Casa da Cultura (1993 a 1996) a noção de cultura mostrava-se tímida valorizando simplesmente manifestações de folclore e artesanato. Nos anos seguintes, de 1997 a 2000, a noção de cultura começa a se ampliar devido à aproximação das ações e políticas da Secretaria de Estado da Cultura do Paraná. O Departamento de Cultura de Campo Largo continua valorizando comemorações anuais, mas já inicia cursos e oficinas de música, dança, teatro e etc.. Nesses anos, período da gestão FHC/Weffort, começamos a perceber os reflexos das políticas nacionais de cultura sobre as ações locais de Campo Largo. Percebemos uma conexão nacional – estadual – municipal quando os programas do Ministério da Cultura, relativos à biblioteca, livros e leitura, chegaram ao setor de cultura de Campo Largo através das ações da Biblioteca Pública do Estado. Constatamos também, a partir dos documentos consultados, um esforço para fazer ações culturais com o mínimo de recursos públicos e com a participação de empresas privadas, outro evidente reflexo do contexto nacional. No período de 2001 a 2004 não encontramos registros sobre as ações culturais do Departamento de Cultura de Campo Largo (ver capítulo 5.5). A partir de 55 2005, as novas ações do Departamento de Cultura demonstram iniciativa para ampliar a noção de cultura no setor público do município. Nos anos seguintes, 2006, 2007 e 2008, novos projetos e propostas sugerem maior valorização do setor cultural, necessidade de integração entre as atividades da Casa da Cultura, do Museu Histórico e da Biblioteca Municipal, urgência de um plano de política pública e busca de qualidade no pensamento cultural. Reflexos dos debates nacionais. Sabemos que no contexto nacional, gestão Lula/Gil, o Ministério da Cultura passou a enfatizar o papel ativo do Estado, propondo formular e implementar políticas culturais, chamando a sociedade para o diálogo cultural. Em 2009 vemos uma clara conexão com as prerrogativas do Ministério da Cultura. O Departamento de Cultura de Campo Largo participa das discussões nacionais, traz para o âmbito municipal planos, propostas e prioridades no setor cultural culminando em debates e maior integração. No ano de 2010, acontecem reuniões públicas para a concretização de uma política de cultura para Campo Largo. Reflexos das políticas públicas de cultura do Brasil contemporâneo. Constatamos reflexos das políticas nacionais de cultura nas ações locais de Campo Largo. Mas gostaríamos de retomar o referencial teórico dessa pesquisa a fim de ampliar as considerações finais. Usando a concepção de sociedade de Manuel Castells onde tecnologia é a sociedade e a sociedade é entendida a partir das suas ferramentas tecnológicas, e essa relação tecnologia/sociedade se dá através do papel do Estado (Castells, 2000), podemos concluir que inicialmente o poder público de Campo Largo contribuiu para a estagnação da tecnologia cultural e transitoriamente as novas iniciativas do setor cultural estão acelerando a tecnologia e promovendo transformação na sociedade. 56 Se analisarmos os tipos de políticas culturais comentadas por Martin Feijó, política cultural para a proibição, para o cerceamento, direcionamento e imposição ou para a organização, para o incentivo, criação, esclarecimento e transformação social (Feijó, 1989), no período que coincide com a gestão FHC/Weffot, percebemos inicialmente o direcionamento da cultura em Campo Largo, ações culturais simplificadas, direcionadas pelo Estado para bibliotecas, livros e leitura, limitados recursos públicos e patrocínios privados na cultura. No período seguinte, gestão Lula/Gil/Ferreira, há uma gradativa transformação para a organização, incentivo e criação cultural, as ações de cultura de Campo Largo buscam ampliação, propostas, planos, debates, integração, maior orçamento e a criação de uma política municipal de cultura. Se tomarmos a visão de Teixeira Coelho na questão das ações culturais e no papel dos agentes de cultura (Teixeira, 1988) os diversos diretores do Departamento de Cultura de Campo Largo foram pessoas esforçadas, bem intencionadas e desenvolveram seu trabalho dentro das possibilidades. Mas, muitas vezes, sem a consciência necessária do processo cultural nacional. Quase sempre a partir de uma visão específica e com a difícil tarefa de fazer cultura sem recursos, sem pessoas, sem orientação e qualificação. Mesmo diante das dificuldades, os agentes culturais administraram o processo cultural de Campo largo. Concluímos com esse trabalho de pesquisa a relevância e a complexidade do tema - políticas públicas de cultura. As considerações dessa pesquisa revelam a necessidade de um estudo mais extenso sobre às ações culturais do Município de Campo Largo, há ainda a necessidade de buscar outros registros oficiais e não oficiais, de encontrar as pessoas envolvidas e ponderar os seus depoimentos sobre as ações culturais dos anos descritos. No que diz respeito a uma análise do 57 desenvolvimento cultural de Campo Largo, se faz necessário também investigar o envolvimento dos artistas locais e regionais, o desenvolvimento de suas obras, suas ideias sobre cultura, assim como a opinião das pessoas da comunidade, para visualizar com mais precisão a realidade dos acontecimentos culturais do Município nos últimos 20 anos. Excelente oportunidade de investigação científica para o atual contexto cultural brasileiro. 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