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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
Luiza Marcela Balbinotti
REFLEXOS DAS POLÍTICAS NACIONAIS DE CULTURA SOBRE AS
POLÍTICAS LOCAIS DE CAMPO LARGO - PR
CURITIBA
2011
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REFLEXOS DAS POLÍTICAS NACIONAIS DE CULTURA SOBRE AS
POLÍTICAS LOCAIS DE CAMPO LARGO - PR
CURITIBA
2011
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Luiza Marcela Balbinotti
REFLEXOS DAS POLÍTICAS NACIONAIS DE CULTURA SOBRE AS
POLÍTICAS LOCAIS DE CAMPO LARGO - PR
Trabalho de conclusão do curso de Especialização
em Gestão, Produção e Promoção Cultural, da
Faculdade de Ciências Humanas, Letras e Artes,
da Universidade Tuiuti do Paraná, para obtenção
do título de especialista em Gestão Cultural.
Orientador Profº: Lindomar Wessler Boneti
CURITIBA
2011
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Agradeço a todos os funcionários do
Departamento de Cultura de Campo
Largo, em especial ao Sr. Juciê Parreira,
pela paciência e disponibilidade a todas
as solicitações que contribuíram
efetivamente para o desenvolvimento
deste trabalho de pesquisa.
Obrigada!
10
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO......................................................................................................... 6
2 POLÍTICAS PÚBLICAS: O PAPEL DO ESTADO E A CONCEPÇÃO DE
SOCIEDADE ............................................................................................................ 10
3 POLÍTICA CULTURAL E AÇÃO CULTURAL....................................................... 17
4 POLÍTICAS NACIONAIS DE CULTURA DO GOVERNO FHC AO GOVERNO
LULA......................................................................................................................... 23
5 POLÍTICAS E AÇÕES DE CULTURA EM CAMPO LARGO (1995 A 2010) E OS
REFLEXOS DAS POLÍTICAS NACIONAIS ............................................................ 33
5.1 Dados básicos e história de Campo Largo – Paraná.......................................... 33
5.2 Administração...................................................................................................... 33
5.3 Os primeiros anos da Casa da Cultura – 1993 a 1996....................................... 35
5.4 De 1997 a 2000: bibliotecas, livros e leitura, limitadas verbas públicas e
colaboração de empresas privadas........................................................................... 36
5.5 De 2001 a 2004 nada foi encontrado na Casa da Cultura.................................. 40
5.6 De 2005 a 2008: pensamento cultural, integração e rumo à política municipal de
cultura........................................................................................................................ 41
5.7 Em 2009 significativos avanços, mas as dificuldades continuam....................... 46
5.3 2010 – o desenvolvimento de uma política de cultura em Campo Largo........... 49
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 52
REFERÊNCIAS......................................................................................................... 55
ANEXOS................................................................................................................... 57
11
1. INTRODUÇÃO
Ao cursar a pós-graduação em Gestão Cultural na Universidade Tuiuti do
Paraná me interessei pelo tema Políticas Públicas de Cultura. Quando o assunto foi
abordado pelo Professor Lindomar Boneti apresentando a relação Estado e
sociedade civil, a trajetória do conceito de cultura e a história das políticas culturais
no Brasil, relembrei minha própria trajetória acadêmica e profissional.
No final dos anos 80 cursei Ciências Sociais na Pontifícia Universidade
Católica do Paraná e estagiei na Curadoria do Patrimônio Cultural (CPC) da
Secretaria de Estado da Cultura do Paraná. Na Universidade, em várias disciplinas
como Sociologia, Antropologia e Ciência Política, tive contato com textos e autores
que abordavam o papel do Estado, os movimentos sociais, o conceito de cultura, a
história política brasileira, assim como outros temas sociais.
No período de estágio no CPC tive a oportunidade de conhecer profissionais
ligados diretamente ao setor cultural do Estado do Paraná: os historiadores Aimoré
Índio do Brasil Arantes e Marcelo Polinari, o geógrafo e arqueólogo Almir Pontes, o
Curador do Patrimônio Natural Henrique Schimidilin (mais conhecido como
Vitamina), especialista em Direito Ambiental, a Curadora do Patrimônio Cultural
Rosina Alice Parchen e muitos outros profissionais como fotógrafos, arquitetos,
restauradores, artistas plásticos, que se tornaram meus professores e amigos.
Durante os anos de 1989, 1990 e 1991, através do setor do Patrimônio da
SEEC-PR, não só conheci pessoas da cultura como também diversos lugares
culturais: Lapa, Castro, Morretes, Antonina, Paranaguá, a Serra do Mar, o Cányon
do Guartelá, museus, arquivos e bibliotecas. Meu estágio consistia basicamente em
desenvolver levantamentos culturais, históricos, artísticos, arqueológicos, naturais
de múltiplas regiões do Paraná. Os levantamentos bibliográficos e documentais e os
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contatos pessoais serviam para auxiliar nos processos de tombamento de imóveis e
de centros históricos e artísticos. De certa forma, estava eu em contato com a
política cultural estabelecida pelo Estado do Paraná. Aprendi muito e foi uma
experiência inesquecível.
Estudar e pesquisar Políticas Públicas de Cultura faz lembrar um tempo de
aprendizagem e desafios, faz retornar aos temas e discussões da sociologia e esse
é um dos motivos para desenvolver a presente pesquisa.
Outro fator incentivador para estudar cultura é o fato de morar a nove anos
em Campo Largo, Região Metropolitana de Curitiba. Nasci, cresci e estudei em
Curitiba ao redor de cinemas, teatros e bibliotecas, feiras culturais, festivais e
espetáculos, e Campo Largo, uma cidade localizada a pouco mais de 30 quilômetros
desse “centro” de cultura, a meu ver, não apresenta características semelhantes. A
famosa Feira da Louça aproveita muito pouco da arte local, as exposições e
espetáculos que eventualmente acontecem não são devidamente divulgados, não
há livrarias na cidade, apenas uma biblioteca e um teatro, a Casa da Cultura e, há
poucos anos, temos duas salas de cinema. Como estudante de gestão cultural e
moradora da cidade gostaria de conhecer melhor os equipamentos culturais, os
artistas e suas artes, os planos e projetos de desenvolvimento da cultura local, as
pessoas que pensam e fazem arte/cultura em Campo Largo.
No nível nacional, pretendo pesquisar e conhecer a trajetória das Políticas
Públicas de Cultura, buscando características, semelhanças e diferenças de um
período específico, do Governo Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002) ao
Governo Luís Inácio Lula da Silva (2003 a 2010). No nível local, anseio investigar as
políticas e as ações de cultura em Campo Largo no mesmo período, abordando
quatro mandatos municipais: a gestão Newton Puppi (1997 a 2000), integralmente
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no período FHC; a gestão Afonso Guimarães Portugal (2001 a 2004), transição
FHC/Lula; o 1º mandato Edson Basso (2005 a 2008) e o 2º mandato Edson Basso
(2009 e 2010), integralmente no período Lula.
Poderia também investigar as políticas estaduais de cultura no mesmo
período e relacioná-las tanto com as políticas nacionais quanto às suas influências
nas políticas e as ações de cultura no município. Porém, o campo de pesquisa se
tornaria amplo e a quantidade de documentos, o tempo de análise e
desenvolvimento desse trabalho muito maior. Creio que essa sugestão fica para
pesquisadores que desejarem estender e aprofundar as relações das políticas
públicas de cultura verificando os reflexos nacionais sobre os estaduais e esses
sobre os municipais de Campo Largo.
O principal objetivo dessa pesquisa é verificar os possíveis reflexos das
políticas nacionais de cultura sobre as políticas locais de Campo Largo. Para
conhecer as políticas nacionais no período pretendido utilizamos a metodologia
histórica. Para investigar as ações e políticas culturais de Campo Largo utilizamos o
procedimento de campo, contatando profissionais envolvidos na área cultural e
analisando os documentos cedidos pelo Departamento de Cultura.
Os documentos consultados para o desenvolvimento desse trabalho foram
basicamente pastas de Ofícios Recebidos e Enviados de ano a ano armazenados na
Casa da Cultura, sede do Departamento de Cultura. O acesso aos materiais e às
pessoas responsáveis foi mediado pelo próprio Diretor - Sr. Juciê Parreira. Durante
os meses que percorreram a pesquisa de campo houve uma reorganização do setor
da cultura, inclusive nos materiais disponibilizados: as pastas foram armazenadas
em novas embalagens e arrumadas em ordem cronológica numa nova sala de
arquivos.
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As políticas nacionais podem servir como indicadores para as políticas locais
de cultura, elas tendem a nortear as ações estaduais e municipais. As ações
culturais locais, por sua vez, podem revelar as políticas públicas das estâncias
superiores. Desta forma, essa pesquisa utilizou procedimentos comparativos para
finalmente verificar a conexão entre o âmbito nacional e o municipal no que diz
respeito às políticas públicas de cultura.
Pesquisar e conhecer historicamente as políticas públicas de cultura no
Brasil e em Campo Largo revelou algumas características, conexões e reflexos. No
entanto, um estudo sobre Cultura é algo amplo, abrangente e longínquo. A
delimitação selecionada foi para tornar possível essa pesquisa e viabilizar um
material consistente sobre gestão pública de cultura.
2. POLÍTICAS PÚBLICAS: O PAPEL DO ESTADO E A CONCEPÇÃO DE
SOCIEDADE
No dicionário, Política Pública é a coisa pública; a arte ou ciência de
governar, de administrar, de organizar; em relação a um público. A expressão
política pública apresenta então uma redundância, pois, segundo Lindomar Boneti,
em seu texto Políticas Educacionais, Contrato Social e Cidadania na América Latina,
15
“... poderíamos interpretar políticas públicas como sendo a arte de lidar com um
público que é público.” (Boneti, 2006, p.93)
Políticas públicas são recursos públicos advindos do Estado, o Estado cuida
do que é público “... mas considera-se também que medidas de intervenção
meramente administrativas, por parte do Estado, sem mesmo envolver o orçamento
público, sejam consideradas políticas públicas pelo fato de envolver o público.”
(Boneti, 2006, p.93)
Envolvendo ou não dinheiro público, políticas públicas são ações sociais da
instituição: Estado. É necessário então aprofundarmos questões sobre Estado e
políticas públicas. A partir das abordagens do Professor Boneti, podemos considerar
três visões: a visão clássica do Estado como Contrato Social; a visão crítica do
Estado a serviço da classe dominante; a visão intermediária do Estado como uma
relação de forças sociais.
Na visão clássica de Estado definida por Hobbes e Locke no século XVII e
por Rousseau no século XVIII, o Estado é um pacto em que os homens concordam
livremente em formar a sociedade civil para garantir e preservar o direito de
propriedade. Os indivíduos entregam a sua liberdade individual para ser
administrada pelo Estado. O Contrato Social é um pacto legítimo, através do qual os
homens perdem sua liberdade natural e ganham em troca a liberdade civil.
Karl Marx defende uma visão crítica de Estado. Partindo do princípio que a
sociedade capitalista é dividida em classes sociais, onde coexistem os proprietários
dos meios de produção, os que mantêm a estrutura capitalista e os nãoproprietários, aqueles que vendem a sua mão-de-obra proporcionando a mais-valia.
Na visão de Marx o Estado está a serviço da classe dominante.
16
Ao observamos a nova configuração social, econômica e política advinda da
globalização da economia, podemos considerar uma visão intermediária de Estado,
defendida por Antonio Gramsci e Nicos Poulantzas. Nos dias atuais existe uma
dinâmica política, o Estado não depende unicamente das relações de produção e da
classe dominante e sim de uma relação de forças políticas entre os interesses das
classes sociais e a sociedade civil organizada.
Para entendermos a complexidade da elaboração e da operacionalização
das políticas públicas precisamos entender a relação que se dá entre o Estado, as
classes sociais e a sociedade civil revelando a típica dinâmica do contexto do mundo
globalizado. As políticas públicas são decididas pela força travada entre agentes do
poder global, nacional e local. E o Estado assume o papel de repassar à sociedade
civil essas decisões, delineando políticas públicas através de ações estatais de
intervenção administrativa na realidade social e através da apropriação de recursos
públicos. (Boneti, 2006, p.98)
É preciso também compreender as políticas públicas a partir de uma
concepção de sociedade. Para isso, vamos ampliar nosso campo de reflexão sobre
a sociedade e o papel do Estado utilizando a linha de raciocínio de Manuel Castells.
Em seu livro, em A Sociedade em Rede, Castells analisa vários acontecimentos
transformadores do o cenário social da vida humana: “Uma revolução tecnológica
concentrada nas tecnologias da informação está remodelando a base material da
sociedade em ritmo acelerado.” (Castells, 2000, p.21)
Nesse novo cenário tecnológico-informacional, Castells analisa a busca pela
identidade como a fonte básica de significado social:
“Essa tendência não é nova, uma vez que a identidade e, em especial, a
identidade religiosa e étnica tem sido a base do significado desde os
primórdios da sociedade humana. No entanto, a identidade está se tornando
a principal e, às vezes, única fonte de significado em um período histórico
caracterizado pela ampla desestruturação das organizações, deslegitimação
17
das instituições, enfraquecimento de importantes movimentos sociais e
expressões culturais efêmeras. Cada vez mais, as pessoas organizam seu
significado não em torno do que fazem, mas com base no que elas são ou
acreditam que são.” (2000, p.23)
Em O Poder da Identidade, Castells distingue identidade da definição
sociológica de papel social. Papéis sociais são funções que os indivíduos vão
adquirindo ao longo da sua vida em sociedade definidos pelas instituições sociais e
que dependem de negociações e acordos. Identidade é um processo de
autoconstrução, originados pelos próprios atores, construída no processo de
individualização. Ás vezes as identidades coincidem com os papéis sociais, mas
aquelas são mais importantes do que estes, pois são fontes de significado para o
ator social. (Castells, 1999)
Se a identidade é construída, quem constrói a identidade coletiva e para quê
é construída? Castells explica a dinâmica das identidades dentro do contexto
histórico da sociedade em rede a partir de três formas: Identidade legitimadora –
construída pelas instituições dominantes para expandir e racionalizar a dominação;
Identidade de resistência – construída por atores sociais desfavorecidos com
posições desvalorizadas com o objetivo de fazer resistência; Identidade de projeto –
construída por atores sociais que usam qualquer tipo de material cultural e esses
constroem uma nova identidade buscando redefinir a sua posição na sociedade e
desta forma, a transformação da estrutura social (1999, p.24). A primeira forma de
identidade dá origem a organizações e instituições. A segunda origina comunidades
de resistência e a identidade de projeto, produz sujeitos que buscam um projeto de
vida diferente.
E assim, Manuel Castells identifica o surgimento de novas formas de
transformação social a partir do novo contexto da sociedade em rede. Num mundo
onde tudo, e ao mesmo tempo, nada tem significado, os indivíduos, na busca da sua
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individualização, da sua identidade, criam novas formas de desenvolvimento que
podem transformar a sociedade. (Castells, 1999)
Lembrando que a busca da identidade é tão poderosa quanto a
transformação econômica e tecnológica nos dias de hoje, Castells parte para a
análise do processo de transformação tecnológica no contexto social. A revolução
tecnológica, permeada de tecnologias da informação, vai delineando uma nova
economia, sociedade e cultura: “A tecnologia não determina a sociedade. Nem a
sociedade escreve o curso da transformação tecnológica” “... a tecnologia é a
sociedade, e a sociedade não pode ser entendida ou representada sem suas
ferramentas tecnológicas.” (2000, p.25)
Manuel Castells acredita no papel do Estado como fator decisivo para o
entendimento da relação entre tecnologia e sociedade. Por intermédio do Estado a
sociedade pode sufocar o desenvolvimento tecnológico ou, também através da
intervenção estatal, a sociedade pode acelerar a modernização tecnológica. Assim,
sabemos que o Estado sempre foi ao longo da história a principal fonte de inovação
tecnológica ou, por outro lado, de estagnação da tecnologia. (2000, p. 26 e 29)
Explicando a relação entre tecnologia e sociedade, Castells reforça:
“o papel do Estado, seja interrompendo, seja promovendo, seja liderando a
inovação tecnológica, é um fator decisivo no processo geral, à medida que
expressa e organiza as forças sociais dominantes de um espaço e uma
época determinados. Em grande parte, a tecnologia expressa a habilidade
de uma sociedade para impulsionar seu domínio tecnológico por intermédio
das instituições sociais, inclusive o Estado. O processo histórico em que
esse desenvolvimento de forças produtivas ocorre assinala as
características da tecnologia e seus entrelaçamentos com as relações
sociais.” (2000, p.31)
Essa reflexão sobre o papel do Estado e a sociedade no contexto
globalizado vem auxiliar a compreensão sobre a luta política travada entre os
agentes determinantes das políticas públicas.
As elites globais, agentes externos, figuram interesses políticos e
econômicos do projeto do capitalismo global através de duas instâncias interligadas:
19
as relações econômicas e as relações políticas. Segundo o professor Lindomar
Boneti, em seu livro Políticas Públicas por Dentro, as questões econômicas se dão
no mercado global, na luta por definição de regras que favoreçam os mais ricos. Na
Organização Mundial do Comércio, por exemplo, são estabelecidas verdadeiras leis
facilitadoras dos processos de compra e venda dos maiores produtores industriais,
proporcionando a ampliação dos mercados consumidores. As questões políticas, por
sua vez, se dão no âmbito da diplomacia, pressões políticas atreladas às decisões
econômicas, com objetivos de interferência na organização estatal interna de
determinada nação. (Boneti, 2006)
Os agentes internos, representados pelas elites nacionais, defendem seus
interesses de classe, mas esses interesses estão vinculados ao projeto do
capitalismo global. Numa luta partidária, por exemplo, busca-se a apropriação dos
recursos públicos (interesses econômicos) e os resultados da intervenção estatal em
determinada realidade social (interesses políticos). Os detentores do poder político e
econômico fazem verdadeiras manobras políticas para manter o poder e seus
benefícios, mas também para corresponder aos compromissos com os interesses do
capitalismo global. (Boneti, 2006)
Ainda nesta linha podemos citar a classe dos burocratas, “técnicos
responsáveis por transformar as políticas públicas em projetos de intervenção na
realidade social com medidas administrativas ou com investimentos.” São
profissionais qualificados, servidores públicos, que formalmente cumprem a
obrigatoriedade da sua função pública e mantém o vínculo com o grupo dominante
através da obediência. Servidores, no sentido estreito da palavra, que obedecem às
determinações da classe dominante nacional. E essa, por sua vez, cumpre com os
interesses das elites do capitalismo global. (Boneti, 2006)
20
Temos também como agentes internos a sociedade civil organizada. Essas
organizações, na busca da defesa de seus interesses, podem pressionar os
burocratas em definições práticas que lhes favoreçam, e até mesmo confrontar os
projetos das elites nacionais ou globais. (Boneti, 2006)
É uma gama de correlação de forças de interesses que permeia a
elaboração e a operacionalização das políticas públicas. Uma rede de forças: a
sociedade civil organizada pressionando em benefício de seus interesses; os
servidores, nas instituições públicas, recebendo pressões da sociedade e
obedecendo as ordens estabelecidas pelo poder; as classes dominantes lutando
para manter o poder, ampliar benefícios, cumprir o débito com os acordos
internacionais; e as elites globais pressionando política e economicamente as
decisões internas de uma nação. A partir dessa luta surgem as políticas públicas.
(Boneti, 2006)
21
3. POLÍTICA CULTURAL E AÇÃO CULTURAL
Segundo Martin Cezar Feijó, no livro O que é política cultural (Coleção
Primeiros Passos), existem políticas culturais e políticas culturais. Pode existir
política para a proibição, para o cerceamento, direcionamento e imposição e pode
existir política para a organização, para o incentivo, criação, esclarecimento, para
superação da própria política. (Feijó, 1989)
Inicialmente Feijó faz algumas conclusões parciais sobre a relação política e
cultura. Trata de cultura como obras de inteligência ou de sensibilidade que têm por
objetivo interferir na realidade:
“Toda produção ou manifestação voluntária, individual ou coletiva, que vise
com sua comunicação à ampliação do conhecimento (racional e/ou
sensível) através de uma elaboração artística, de um pensamento ou de
uma pesquisa científica.” (1989, p.8)
Feijó considera que a política sempre se ocupou da cultura ao longo da
história da humanidade. Para ele, a cultura tem sido motivada a partir de interesses
políticos e econômicos dominantes e quando a cultura chegou a ultrapassar os
limites desses interesses foi duramente reprimida. Porém, quando a cultura é
organizada e consciente chega a produzir transformações históricas. (Feijó, 1989)
Martin Feijó comenta a época do Realismo Socialista Soviético como sendo
um período de política cultural rígida, dogmática e violenta, onde as organizações
culturais eram administradas e controladas pelo governo stalinista. A fábula a seguir
retrata bem a situação:
22
“Era uma vez um poderoso imperador chamado Tamerlão, o Grande.
Vaidoso, ele convocou todos os pintores do reino para pintar seu retrato.
Acontece que Tamerlão não tinha nem pernas nem olho direitos, perdidos
numa guerra patriótica. Temerosos, chegaram os pintores. O primeiro
retratou o imperador com os dois olhos e com as duas pernas. Foi
degolado. Aquilo era “idealismo”. O segundo apresentou o imperador como
realmente era: sem uma perna e sem um olho. Foi degolado. Aquilo era
“realismo burguês”. Aí chegou o terceiro. Era membro da União dos
Pintores Soviéticos. Este pintou Tamerlão de perfil, do lado em que só
aparecessem a perna e o olho esquerdo. Foi aclamado. Ele havia entendido
o que era “realismo soviético”. (1989, p.30)
Comenta também o período da Revolução Cultural da China, com muitas
reformas na educação, no ensino e na arte, no entanto, utilizando a cultura como
instrumento da política comunista. Essas realidades exemplificam a ligação entre
política e cultura e demonstra, ao mesmo tempo, uma política cultural direcionada
para determinados interesses.
Vários pensadores em suas teorias e experiências diversas demonstraram
também o estreitamento entre cultura e política. Lukács, por exemplo, ao
desenvolver o conceito de particularidade (uma obra de arte singular atinge muitas
pessoas em diferentes tempos e épocas e alcança a universalidade) mostra o valor
artístico indiscutível da obra, a sua contribuição cultural e confirma a importância
histórica decisiva da cultura. Bertolt Brecht, poeta, dramaturgo e teórico teatral da
Alemanha da primeira metade do século XX, acreditava que obras artísticas
deveriam promover compreensão, reflexão e transformação da realidade. Walter
Benjamin, analisando as técnicas modernas de produção artística, técnicas que
possibilitam atingir milhares de pessoas, demonstrou o inegável caráter político da
cultura. Demonstrou que o artista precisa ter consciência da sua posição no
processo de produção capitalista para evitar a manipulação dos interesses
dominantes. Antonio Gramsci clarificou a política cultural quando em suas teorias
revelou a importância dos intelectuais na organização da cultura. Preocupava-se não
apenas com a criação cultural, mas com a criação da reflexão e transformação da
realidade a partir de uma prática político-cultural, sem separar política da cultura ou
23
fazer da cultura um instrumento político. Todos esses pensadores contribuíram para
o surgimento de uma concepção diferente de política cultural, aquela política para o
desenvolvimento cultural, para a transformação social da realidade. (Feijó, 1989)
Ao investigarmos políticas públicas de cultura nem sempre nos deparamos
com um programa de cultura no qual o papel do Estado e a concepção de cultura e
de sociedade estão clarificados. Num primeiro momento não sabemos definir se a
cultura de determinada região está sendo utilizada como um instrumento político ou
há um incentivo à criação artística e cultural no âmbito da transformação social. Por
isso, as ações culturais devem ser averiguadas, pois elas podem revelar as
intenções e o tipo de política cultural.
O professor Teixeira Coelho, ao redigir o livro O que é ação cultural (Coleção
Primeiros Passos), explica que a ação cultural lida com a cultura e não com qualquer
coisa. E esclarece que a ação cultural é também uma ação social, uma área
específica de trabalho, ensino e pesquisa, um conjunto de conhecimentos e técnicas
para administrar o processo cultural. Este processo de ação cultural “resume-se na
criação ou organização das condições necessárias para que as pessoas inventem
seus próprios fins e se tornem assim sujeitos – sujeitos da cultura, não seus
objetos”. A ação cultural é a criação de condições para se fazer cultura. (Coelho,
1988)
Teixeira Coelho interpreta que nem tudo é ação cultural, a ação cultural tem
sua fonte, seu campo e seus instrumentos. Faz uma distinção entre cultura e
educação explicando que são dois projetos de natureza e objetivos bem diversos:
“A cultura, em suas manifestações radicais (como a arte), procura e viabiliza
o êxtase, o sair para fora de si, sair do contexto em que se está para ver
outra coisa, para ver melhor, para ver além, para enxergar sobre, acima, por
cima, para ver por dentro. A educação, embora pudesse ser outra coisa... é
o stase, o estar, quer dizer, partir daqui para voltar aqui mesmo,
permanecer, metaforicamente preparar-se para o que está, para o que
existe, integrar-se ao que existe.” (1988, p.28 e 29)
24
Ele critica o aparecimento dos chamados Centros de Cultura, meros
complementos dos sistemas educacionais existentes que optam por palestras,
cursos e oficinas, substituindo a verdadeira criação cultural. É um tipo de ação
incapaz de perceber a diferença entre o processo educativo e o processo cultural.
(Coelho, 1988)
O autor identifica ao longo da história três tendências da ação cultural. Num
primeiro momento ainda não se pode chamar de ação cultural, é o tempo da
instituição da cultura - o tempo do Museu. Nesse momento, por volta do século XIX,
busca-se preservar os “bens culturais da humanidade”, guardar as obras de arte,
tem-se uma visão patrimonialista e há uma supervalorização do produto cultural. No
segundo momento, as instituições passam a se preocupar com as pessoas que
entram em contato com a arte/cultura. Atinge-se uma abordagem social da questão
cultural, a ação cultural está mais voltada ao público, ao coletivo cultural. Na terceira
tendência, por volta da década de 1960, especificamente 1968, os espaços culturais
tendem a abrir caminhos para o desenvolvimento cultural do indivíduo e de sua
subjetividade. Ação cultural nem para a arte, nem para o coletivo, mas a
preocupação está na formação do indivíduo. (1988, p.35 a 39)
O professor Coelho expõe, a partir dessa tendência da formação cultural do
indivíduo, um sério questionamento sobre ações culturais. Qual o verdadeiro objetivo
da ação cultural? Construir um determinado tipo de sociedade? Atender os objetivos
das classes dominantes? Proporcionar lazer e entretenimentos para os menos
favorecidos? Utilizar recursos públicos para efetivar a “cultura de massa”? Financiar
práticas que contestem a própria sociedade?
Segundo o autor, nem ampliação
demasiada, nem simplificação exorbitante:
“Existe uma especificidade do processo cultural que não pode ser atendida
pelos mecanismos da prática política, e uma das conseqüências disso é que
o projeto cultural vai sempre e necessariamente além, muito além do projeto
25
político, de modo que insistir numa ação cultural quando se quer uma ação
política pode ser um equívoco... Se o âmbito da ação cultural não pode ser
assim ampliado, limitá-la a certas atividades é igualmente alterar sua
natureza. Nunca será demais alertar contra a tendência de fazer da ação
cultural, por exemplo, um instrumento de lazer para o tempo livre.” (1988,
p.45)
Existe também uma confusão sobre a ação cultural: o agente cultural pode
dirigir o processo cultural de uma determinada localidade? Ou deve deixar que o
processo ocorra espontaneamente? Seria uma hipocrisia, segundo o professor
Teixeira Coelho, achar que a comunidade possa sozinha administrar sua cultura,
assim como negar que o processo cultural por si só gera uma espontaneidade. O
agente cultural precisa assumir a posição de interventor, alguém de fora que vai
acionar um novo processo, não se trata de paternalismo e nem de dirigir o processo,
mas é sua responsabilidade criar as condições necessárias para que as pessoas
dirijam o seu próprio processo cultural.
“O agente cultural será um profissional capaz de entender os mecanismos
da atuação em grupo que possibilitem a esse grupo o exercício da
criatividade e capaz de conhecer a natureza e possibilidades das
linguagens e equipamentos culturais de que se servirá – equacionando sua
presença e intervenção, de modo a não perturbar exageradamente a
natureza/autenticidade do processo. Não pode, porém, deixar de
reconhecer a função muito especial que exerce.” (1988, p.57)
Segundo a UNESCO a profissão do agente cultural é peculiar, alguém que
se interessa por arte/cultura, mas não é necessariamente um artista, se envolve com
a administração do processo cultural, prepara o terreno para a criação. O agente
cultural lida com artes, artistas, comunidade e recursos financeiros, por isso, precisa
ter visão interdisciplinar (envolvendo arte, educação, psicologia, sociologia,
administração, marketing) e capacidade de coordenar uma equipe de técnicos.
O professor Teixeira Coelho questiona também a tão utilizada frase
“democratização da cultura”, considera que geralmente não se sabe “o que vai ser
democratizado” e nem “o que é democratizar”. Critica medidas isoladas, pois elas
não constituem uma política cultural ou uma política de ação cultural.
“Para que isto aconteça é imperioso que os fenômenos culturais sejam
vistos formando aquilo que são: um todo cujos componentes mantêm
26
relações determinadas entre si, e sujeitos,..., à lógica geral da sociedade
onde se localizam. A democratização cultural só poderá se dar, ... ,quando
todas as partes desse todo, e suas relações, forem igualmente tocadas
pelas iniciativas pertinentes.” (1988, p.74)
Para ele, a ação cultural pode intervir em todos os setores da dinâmica
cultural: na criação/produção do bem cultural, na sua distribuição (contato com o
público), na troca do bem por dinheiro (consumo) e no uso efetivo do bem cultural.
Por exemplo, um livro: na primeira fase o livro deve ser escrito e impresso (produção
do bem cultural); em seguida, distribuído para as livrarias (possibilidade de contato
com o público); nas livrarias deverá ser vendido e comprado (consumo do bem
cultural); e assim, o consumidor fará a leitura e a possível retenção de seu conteúdo
(apropriação plena). Se essa intervenção ocorrer nos vários setores da dinâmica
cultural poderá se transformar em política de ação cultural.
O que acontece tradicionalmente no Brasil, segundo o professor Teixeira
Coelho, é que a intervenção acontece geralmente na área da produção, para apenas
alguns artistas/produtores (sempre os mesmos), beneficiando determinada camada
social e ainda para certos produtos culturais. Ele critica os programas de ação
cultural que tratam apenas de uma ou de algumas fases do sistema cultural,
impedindo que o processo cultural se complete (1988, p.78). No Brasil a questão
cultural não é tratada como um todo, mas em partes. Devem-se romper monopólios,
colocar a ação cultural ao alcance efetivo do maior número de pessoas e assim
haverá a tão almejada democratização da cultura.
4. POLÍTICAS NACIONAIS DE CULTURA DO GOVERNO FHC AO GOVERNO
LULA
Antonio Albino Rubim (UFBA), ao analisar os caminhos das políticas culturais
brasileiras no texto: Políticas Culturais no Brasil: Trajetória e Contemporaneidade
27
(2008) sinaliza várias características: ausência, autoritarismo, instabilidade, elitismo
e erudição.
Rubim descreve os primeiros anos de existência do Ministério da Cultura
como um período marcado por instabilidades: foi criado no governo José Sarney em
1985, desmantelado e transformado em Secretaria no projeto neoliberal de Collor
(projeto esse que desmontou toda a área da cultura) e recriado por Itamar Franco
em 1993. “Além disso, foram dez dirigentes responsáveis pelos órgãos nacionais de
cultura em dez anos... uma considerável instabilidade institucional para um
organismo que está em processo de instalação.” (2008, p.10)
Explica Rubim que neste período de instabilidade, surgem também as leis de
incentivo à cultura: a Lei Sarney (Lei 7505/86), extinta e substituída pela Lei Roaunet
(Lei 8313/91) e a Lei do Audiovisual (Lei 8685/93). A criação dessas leis marcou a
introdução do neoliberalismo na cultura do país e fez com que:
“parcela considerável dos criadores e produtores culturais passasse a
identificar política de financiamento e, pior, políticas culturais tão somente
com as leis de incentivo. A profunda sedimentação e admirável persistência
deste imaginário de inspiração neoliberal em parcelas significativas do
campo cultural irão empobrecer a imaginação e as alternativas de políticas
culturais no Brasil... O Estado persistia em sua ausência no campo cultural
em tempos de democracia.” (2008, p.11)
Para
Antonio
Rubim:
“O
novo
governo
(FHC)
caracteriza-se
pela
implementação, de modo menos tosco e enfático, do projeto neoliberal no Brasil. A
retração do Estado acontece em praticamente todas as áreas, substituído pelo
mercado.” (2008, p.12)
Uma análise dos mandatos de Fernando Henrique Cardoso desenvolvida
pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos, publicada no site www.inesc.org.br em
2004, revela alguns pressupostos do contexto neoliberal que o Brasil esteve
submetido durante o período de 1995 a 2002.
28
Em 1996, Fernando Henrique Cardoso considerava a globalização como
fator primordial para a mudança do papel do Estado: “a ação governamental está
agora dirigida para a criação e sustentação de condições estruturais de
competitividade em escala global”, ou seja, o governo de FHC estava trocando o
desenvolvimento interno pela competitividade internacional. Para ele, a missão do
Estado era direcionar o desenvolvimento, propôs diminuir o papel do Estado na
economia para transformá-lo em agente do mercado internacional. O Plano Diretor
da Reforma do Aparelho do Estado rejeitava a idéia de um “Estado mínimo”, mas
não a orientação de dar mais espaço ao mercado: “um mercado forte precisa de um
Estado forte”. (Inesc, p.37 e 39)
No primeiro ano do governo FHC abriu-se espaço para o capital estrangeiro e
para as empresas privadas nos setores economicamente cruciais, como energia e
telecomunicação, preparando o terreno para a era das privatizações. Não foi o Brasil
que passou a competir mundialmente, mas o capital mundial que veio assumir
monopólios do Estado, transformando o país em um dos melhores negócios do
século XX. A privatização transferiu o patrimônio estatal para as empresas privadas,
do poder público para o mercado, atingindo o coração do país. (Inesc, p.41 e 42)
As decisões estratégicas e o controle da gestão estavam fora do território
nacional. A soberania nacional, a representatividade de seus cidadãos para a
escolha de seu próprio destino estava em segundo plano. O país ficou mais
vulnerável às instabilidades internacionais como às crises do câmbio em 1998 e em
2002. A solução, recorrer ao Fundo Monetário Internacional (FMI), resultou no
aumento da dívida líquida do setor público (de R$ 208 bilhões em 1995 para R$ 800
bilhões em 2002) e no aumento da dívida externa (US$ 159 bilhões para US$ 231
bilhões de 1995 a 2000). (Inesc, p.43)
29
O governo FHC reordenou o papel do Estado transformando-o em
complemento do mercado, instaurou um novo modelo de gestão pública gerencial e
transformou o cidadão em contribuinte-cliente. Todo o discurso oficial e a legislação
aprovada foram em defesa da competitividade, mas não houve concorrência no
país, o contribuinte pagou o aumento das tarifas do racionamento de energia em
2001 e não teve a prometida qualidade nos serviços básicos de saúde e educação.
Francisco Oliveira, na mesma análise desenvolvida pelo Inesc, considera: “é a isso
que o Estado, reformado desta maneira, estará condenado: a ser algoz de seu
próprio povo”. (Inesc, p.55)
Antonio Rubim explica que a ausência do Estado no campo cultural se amplia
nesse governo. A única publicação do Ministério da Cultura em oito anos - Cultura é
um bom negócio (1995) visava estimular a participação de empresas e a utilização
das leis de incentivo fiscal. Os recursos são públicos, mas o poder de decisão passa
a ser privatizado. (2008, p.11 e 12)
O Ministério da Cultura liderado por Francisco Weffort tem pouca expressão
e desenvolveu algumas ações nos setores de bibliotecas. O programa Uma
biblioteca em cada Município, desenvolvido pela Secretaria de Política Cultural,
visava o crescimento da rede de bibliotecas públicas, a fim de estimular a leitura e a
formação de leitores.
Para tal programa o Ministério contava com parceiros
importantes: a Fundação Biblioteca Nacional, os Sistemas Estaduais de Bibliotecas,
Prefeituras, Governos Estaduais e o Ministério da Educação e do Desporto.
(Ministério da Cultura, abril de 1997)
Em 1995, o Ministério da Cultura e o Banco Interamericano de
Desenvolvimento – BID dão início a entendimentos para viabilizar um programa de
preservação do patrimônio nacional. O IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e
30
Artístico Nacional elabora os fundamentos do programa em 1996 e determina os
locais de intervenção prioritária: Olinda, Recife, Salvador, Ouro Preto, Rio de Janeiro
e São Paulo. O Programa Monumenta inicia-se efetivamente no ano 2000.
(http://www.monumenta.gov.br, acesso em 17 de março de 2011)
Diante de grandes debates em torno de temas como mundialização e
neoliberalismo político e econômico, a gestão Weffort/FHC conseguiu criar um
programa de preservação baseado no modelo varguista, modelo que distanciou o
patrimônio do povo, caracterizado pela centralização e paternalismo, ressaltando a
cultura dos brancos, portugueses e católicos. (Revista CPC, São Paulo, nº 10, 2010)
Financiado pelo BID e com apoio técnico da Unesco o Programa
Momumenta demonstra, em seus anos iniciais, as características das políticas
culturais adotadas na década de 1990. A preservação do patrimônio cultural
brasileiro (esse determinado pelo IPHAN) contava com parceiros do setor privado
(esses atraídos pela Lei de Incentivo Fiscal) e diminuía a pressão sobre o orçamento
federal. Tentava-se incorporar a noção de patrimônio como recurso econômico, ou
seja, mais um bom negócio. (Revista CPC, São Paulo, nº 10, 2010)
Com exceção das ações do Ministério da Cultura no âmbito das bibliotecas e
do patrimônio cultural, imbuídas de erudição e elitismo, no geral não aconteceram
concursos e nem programas significativos, muito pouca atenção se deu ao
audiovisual, inclusive à televisão e à cultura digital, não houve a preocupação em
levantar dados estatísticos culturais, enfim, estabilidade, mas ausência de política
cultural efetiva. (Rubim, 2008, p.13 e 14)
Dado o contexto histórico, podemos constatar os desafios do governo
subsequente. O Mistério da Cultura procurou abrir espaço para outras culturas, além
da erudita/de elite, retomando a noção antropológica de cultura. Ao assumir o
31
Ministério em 2003, Gilberto Gil, no primeiro mandato de Lula, passou a enfatizar o
papel ativo do Estado, propondo formular e implementar políticas culturais,
chamando a sociedade para o diálogo cultural, criticando as leis de incentivo e
estabelecendo a sua reformulação. (Rubim, 2008, p.15)
A gestão Lula/Gil é marcada pela busca da democratização das políticas
culturais quando procura construir políticas públicas em debate com a sociedade,
através de inúmeros seminários, câmaras setoriais (música, dança, teatro, circo,
artes visuais) e conferências (I Conferência Nacional de Cultura, realizada em 2005
e II Conferência Nacional de Cultura, realizada em março de 2010). (Minc, 2010)
O próprio Ministro Gil enfatizou “a abrangência” como diretriz para as políticas
públicas de cultura, o que fundamentou a concepção de cultura em três dimensões:
simbólica, cidadã e econômica.
A dimensão simbólica considera cultura humana como o conjunto de modos
de viver: culturas, no plural. Política cultural “que enfatiza, além das artes
consagradas, toda a gama de expressões que caracterizam a diversidade cultural
brasileira”. Artes populares, eruditas e de massas, culturas populares, indígenas e
afro-brasileiras, todo o conjunto da produção simbólica da sociedade. (II CNC Textobase, Minc, 2010)
A dimensão cidadã parte do princípio que “os direitos culturais são parte
integrante dos direitos humanos”. Política cultural para “definir e colocar em prática
os direitos culturais”, “vital para o desenvolvimento humano e para a promoção da
paz”. (II CNC Texto-base, Minc, 2010)
A dimensão econômica compreende a cultura como um “dos segmentos mais
dinâmicos das economias de todos os países, gerando trabalho e riqueza”. (II CNC
Texto-base, Minc, 2010)
32
Todo o debate e investimento no setor geraram o Plano Nacional de Cultura
(Emenda Constitucional nº 48, de 10 de agosto de 2005, acrescenta o § 3º ao art.
215 da Constituição Federal, instituindo o Plano Nacional de Cultura) e o Sistema
Nacional de Cultura com o objetivo geral de:
“Formular e implantar políticas públicas de cultura, democráticas e
permanentes, pactuadas entre os entes da federação e a sociedade civil,
promovendo o desenvolvimento - humano, social e econômico - com pleno
exercício dos direitos culturais e acesso aos bens e serviços culturais.”
“Para a constituição de um sistema de cultura efetivamente nacional, tornase imprescindível a consolidação de sistemas próprios, ou seja, federal,
estaduais, e municipais ou intermunicipais.” (Minc, 2005).
O diferencial da atuação do Ministério da Cultura é a participação social.
Desde o início da elaboração do PNC houve incentivos à participação de todos os
setores da sociedade. “A viabilização dos sistemas de cultura depende da
participação da sociedade civil para a definição de prioridades e o controle e
acompanhamento das metas programadas.” (Minc, 2005)
Para Antonio Rubim, essa movimentação busca transcender governos e
viabilizar políticas nacionais mais permanentes. O Ministério inicia investimentos na
área da economia da cultura e já apresenta uma série de informações culturais
através do IBGE-2006. (2008, p.16) No entanto, a superação da instabilidade no
setor cultural depende plenamente da sintonia entre SNC e PNC:
“A construção que vem sendo realizada pelo ministério, em parceria com
estados, municípios e sociedade civil, de um SNC é vital para a
consolidação de estruturas e políticas, pactuadas e complementares, que
viabilizem a existência de programas culturais de médios e longos prazos,
não submetidos às intempéries conjunturais”. (Rubim, 2008, p. 16 e 17)
Rubim também coloca vários desafios para a plena atuação do Ministério da
Cultura e de suas intenções de política cultural: o conceito de cultura precisa ser
delimitado para a efetivação das políticas culturais; a participação da sociedade civil
precisa ser consolidada; os recursos humanos, materiais e financeiros precisam ser
descentralizados; a formação e qualificação de profissionais em cultura são
necessárias; é inevitável rediscutir e redefinir a questão do financiamento da cultura,
33
“as leis de incentivo parecem esgotar o tema das políticas de financiamento da
cultura. Elas agridem a democracia”. É preciso superar a lógica neoliberal, buscando
o papel ativo do estado na cultura, as verbas são públicas, mas o poder de decisão
ainda é do mercado. (Rubim, 2008, p.19)
O professor Paulo Miguez da UFBA, em palestra no dia 6 de maio de 2010,
no II Seminário Cultura, cidade e desenvolvimento (Curitiba – PR), apresentou um
panorama histórico do financiamento da Cultura:
Primeiramente, aparece o Estado com a lógica utilitarista e legitimadora da
cultura. Em seguida, a complexificação das relações entre cultura e poder.
No século XVIII, surge o mercado principalmente na esfera da circulação e
no século XIX, na esfera da produção, com a lógica da indústria cultural
(Adorno e Horkheimer).
Na contemporaneidade, surge uma tensão entre a lógica industrial-mercantil
e a lógica cultural. Com a ampliação do mercado mundial, ocorre a
extensão do campo cultural, a ampliação da criação, da produção, da
circulação, da divulgação e do acesso.
Durante os anos 1980 – 1990, na cena neoliberal, a tensão mercado e
sociedade é ampliada. Surgem novas modalidades: o marketing cultural, o
patrocínio, as Leis de Incentivo e também a relação desigual entre criadores
e patrocinadores. (Miguez, 2010)
Sobre o financiamento da cultura no Brasil, o professor Miguez continua:
Inicialmente o Estado era o principal agente financiador de cultura. No
ambiente neoliberal, surgem as Leis de Incentivo adotadas por estados e
municípios, leis que privilegiam o mercado utilizando dinheiro público.
O problema está quando as leis são os únicos mecanismos de
financiamento da cultura. E as principais críticas são: o poder de
deliberação passa do Estado para as empresas; uso de recursos públicos;
incapacidade de atrair novos recursos privados; ausência de contrapartidas;
concentração de recursos, concentração regional e utilização das mesmas
linguagens; apoio à cultura mercantil (exclusivamente comercial), etc.
Ora veja, se há concentração regional de recursos e de linguagens, não há
desenvolvimento cultural, serão sempre os mesmos, empresas, artistas e
segmentos culturais. O Estado deve cuidar disso, sem cair no exagero do
dirigismo cultural, mas precisa fiscalizar o mérito cultural dos produtos
financiados. (Miguez, 2010)
E finaliza, chamando os ouvintes para o debate atual:
É preciso primeiro definir políticas públicas de cultura, metas e objetivos e, a
partir disso, discutir mecanismos de financiamento da cultura. De um lado, o
Estado pode ser protagonista da cultura através de financiamentos diretos,
do outro, existem as leis de incentivo contando com a participação do
mercado.
O problema é que o tema financiamento interdita o debate sobre as políticas
públicas, o SNC, o PNC, a diversidade cultural, a relação da cultura com o
desenvolvimento, os estudos em cultura, a formação, etc.. O financiamento
é uma dimensão, uma ferramenta de política pública. É preciso pensar e
34
criar novas modalidades de política cultural: Estado, mercado, investimento
social privado (neo-mecenato, Sarcov), patrocínio, renúncia fiscal, agências
de fomento, mecanismos de crédito, legislação, etc.. (Miguez, 2010)
Na visão do professor Paulo Miguez, representante do posicionamento do
Ministério da Cultura, está claro a intenção e urgência na reformulação das leis de
incentivo e a retomada do papel do Estado. Porém, para ele, discutir apenas os
mecanismos de financiamentos obscurece a definição de políticas públicas de
cultura.
Bernardo da Mata Machado, do Minc DF e pesquisador em Minas Gerais, ao
proferir a palestra Reflexões sobre o financiamento público da cultura em 7 de maio
de 2010, no II Seminário Cultura, Cidade e Desenvolvimento (Curitiba-PR), cita
Isaura Botelho: “as políticas públicas determinam o financiamento e o que vemos no
Brasil hoje é ausência de discussões sobre os objetivos da política pública de
cultura.”
A tabela a seguir demonstra em súmula a abordagem do professor
Machado. Primeiramente apresentou uma tipologia de política cultural e o papel do
Estado e do mercado na cultura:
Modelo de política
cultural
Estado e Mercado
na cultura
Modelo Liberal
Democrático
(Inglaterra)
Intervenção mínima
do Estado
A cultura pertence à
sociedade, aos
indivíduos
Valor: liberdade
Foco: criação
à favor do mercado
Modelo Social
Democrático
(França)
O Estado deve
intervir para ampliar
o acesso
Valor: igualdade
Foco: distribuição e
consumo
à favor do Estado
Contra o mercado
O Estado deve
intervir para buscar
o interesse geral. O
ideal da República:
direitos iguais.
No século XX percebemos a
exaltação de interesses
particulares, a produção de
desigualdades e a dominação dos
mais fracos.
Modelo totalitário
(Nazismo)
O Estado intervém para propagar o regime e exaltar o chefe (política dirigista)
Valor: o poder do Estado
Foco: censura ao que é contrário ao regime, fomento às manifestações de
exaltação
No século XVIII
inicia-se um
processo de
independência dos
intelectuais e dos
artistas da Igreja.
Contra o Estado
No Estado capitalista os
interesses dominantes devem ser
os do mercado.
35
(Bernardo da Mata Machado, 2010)
Machado ainda analisa a diversidade cultural e financiamento da cultura da
seguinte forma:
Cada setor tem uma cadeia produtiva específica: criação – produção –
distribuição – difusão – consumo, e o financiamento deve ser pensado a
partir de cada setor e dos elos das cadeias produtivas.
O que temos hoje é um único tipo de financiamento cultural que privilegia
determinados setores e determinadas fases da cadeia produtiva cultural. As
Leis de Incentivo não abordam todos os tipos de manifestações culturais e
não compreendem todos os elos da produção cultural.
O financiamento cultural precisa de informações sobre cada setor e sobre
cada elo do respectivo setor, para identificar as carências e as
potencialidades. Isso porque os bens culturais são singulares e a aceitação
é algo imprevisível. Com informações sobre os diferentes processos
culturais pode-se pensar em diferentes mecanismos de financiamento.
(Machado, 2010)
Bernardo da Mata Machado, também esclarece a posição do Minc:
diversificar os mecanismos de financiamento para abordar a diversidade cultural
brasileira.
A atual política pública cultural tem retomado a intervenção do Estado na
cultura. Diferente de outros períodos históricos, onde a atuação do Estado servia
para controlar a cultura e a sociedade, hoje vemos uma vontade política inclinada
para a participação dos artistas, da sociedade civil e do meio empresarial. Vemos
uma discussão para a formulação de um plano nacional de cultura e necessidade de
sistemas regionalizados que possam tornar possíveis e realizáveis as diretrizes
culturais. Enfim, as limitações e os desafios são muitos, porém a atual política
pública de cultura está passando por um importante período de transição
democrática. (Rubim, 2008, p.19)
36
5. POLÍTICAS E AÇÕES DE CULTURA EM CAMPO LARGO (1995 A 2010) E
OS REFLEXOS DAS POLÍTICAS NACIONAIS
5.1.
Dados básicos e história de Campo Largo – Paraná:
O município de Campo Largo faz parte da Região Metropolitana de Curitiba.
Está localizado a 24,5 km da capital do estado do Paraná. Apresenta uma superfície
de 1.359.565 km2 e uma população estimada em 2009 de 112.548 habitantes. Sua
emancipação política ocorreu em 23 de fevereiro de 1871. Sua economia gira
principalmente em torno de atividades agropecuárias e industriais nas áreas de
cerâmica, moveleira e metal-mecânica. (http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso em
23 de outubro de 2010)
A história de Campo Largo faz parte do início da colonização do Paraná,
assim como outras regiões dos arredores de Curitiba, serviu como pouso de
tropeiros. “O desenvolvimento de Campo Largo foi mais intenso com a chegada dos
imigrantes,
principalmente
italianos
e
poloneses,
a
partir
de
1875.”
(http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso em 12 de março de 2011)
5.2.
Administração:
Desde 2005, o município de Campo Largo vendo sendo administrado pelo
prefeito Edson Basso. A Secretaria de Educação, Cultura e Esporte está sob a
responsabilidade do Professor Norton Nori Pooter (2009). O Departamento de
Cultura, formado pela Casa da Cultura Dr. José Antonio Puppi, pela Biblioteca
Central, pelo Museu Histórico de Campo Largo e pela Biblioteca Cidadã na Ferraria,
37
está sob a responsabilidade do Sr. Juciê Parreira, um jovem natural de Campo
Largo, graduado em pedagogia pela UFPR. (http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso
em 25 de julho de 2010)
A Casa da Cultura Dr. José Antonio Puppi foi inaugurada em setembro de
1992. Situada na Rua do Centenário, possui um auditório para 280 pessoas, salas
para cursos, salão de exposições e abriga o Departamento de cultura. O local tem
por finalidade promover eventos artísticos e culturais, cursos, concursos, pesquisas
e oficinas de arte.
A Biblioteca Central Dr. Francisco Ribeiro de Azevedo Macedo, localizada na
Rua do Centenário, está situada em um prédio histórico, sede da 1ª delegacia e da
2ª prefeitura, desde 1992. Conta com um acervo de aproximadamente 20 mil livros.
O acesso é livre e gratuito disponibilizando materiais para pesquisa, leitura, tele
centro e internet. Desenvolve também projetos de incentivo à produção literária e à
leitura.
O Museu histórico de Campo Largo, localizado na Praça Getúlio Vargas,
existe desde 2003. O prédio foi construído em 1911 para abrigar o grupo Escolar
Macedo Soares. Depois de algumas reformas, em 1942 passou a ser o Fórum
Municipal. De 1984 a 2001 abrigou alguns departamentos da prefeitura.
Hoje o Museu contém salas de exposições permanentes como a sala
histórica, com objetos antigos que contam a história da imigração em Campo Largo;
o corredor central, com fotos que contam a história política da cidade; a sala da
louça e a sala dos expedicionários. Além disso, contém salas de exposições
temporárias, uma oportunidade para artistas locais divulgarem seus trabalhos.
A Biblioteca Cidadã Odila Portugal Castagnoli foi inaugurada em setembro
de 2007 no bairro da Ferraria. Segundo Josiane Rogaleski, coordenadora da
38
biblioteca, a ideia foi desenvolvida a partir de um projeto do estado visando ampliar o
acesso à pesquisa e à leitura nos bairros periféricos. A biblioteca foi construída na
Rua Mato Grosso, próximo ao Parque do Passaúna, município cedeu o terreno e a
Secretaria de Estado da Cultura do Paraná construiu o prédio, promoveu o
treinamento, doou os equipamentos e um acervo de 2000 livros. Além de
empréstimos de livros e acesso à pesquisa, a Biblioteca Cidadã promove concursos,
palestras, oficinas, contação de histórias, reforço escolar em língua portuguesa,
atendendo pelo menos três escolas da comunidade.
5.3.
Os primeiros anos da Casa da Cultura - 1993 a 1996:
Durante o período de 1993 a 1996 a Secretaria de Educação, Cultura e
Esporte foi dirigida pelo Sr. Osvaldo Andrade Zotto e a Casa da Cultura foi
gerenciada pelo Sr. Antonio Braga Neto. As primeiras pastas consultadas revelaram
constantes solicitações para o uso do auditório e das salas de exposição da Casa da
Cultura Dr. José Antonio Puppi. Geralmente as solicitações vinham de outras
secretarias do município, de escolas, creches, sindicatos e associações da região
para reuniões, palestras, cerimônias, formaturas, apresentações de alunos,
apresentações de peças de teatro adulto e infantil, recitais e audições. Alguns
exemplos dessas solicitações: Festa Cultural de Dança e Formatura dos alunos da
pré-escola 1º Passo; Cantata de Natal; Lançamento da campanha “Cidade Limpa”;
Teatro Amador Incepa; Reuniões do Sindicato Rural; Peça infantil “Brincando de
Teatro” da Produções Artísticas Oriente; III Festival de Literatura, Música e Dança do
Colégio Sagrada Família.
Entre as tantas solicitações, encontramos a programação de um evento
denominado Culturas em Destaque, ocorrido em agosto de 1993. O evento consistiu
39
em apresentações folclóricas e exposições de artesanato local, rural e indígena na
Casa da Cultura. (Anexo 2)
Também encontramos a programação da comemoração dos 123 anos de
Campo Largo entre fevereiro e março de 1994. Entre as várias festividades estão:
Missa em Ação de Graças, hasteamento das Bandeiras, passeio ciclístico, torneio
de xadrez, exposição do acervo da Casa da Cultura, lançamento de um livro da
história de Campo Largo, atelier de artes, apresentação de teatro, show de bandas,
noite da seresta, apresentação de bailarinos do Teatro Guaíra e concerto da
Orquestra de Solistas do Paraná. Um evento sem dúvida destacável. (Anexo 3)
5.4 De 1997 a 2000: bibliotecas, livros e leitura, limitadas verbas públicas e
colaboração de empresas privadas:
Em 1997, na gestão do prefeito Newton Puppi, surgi a Secretaria de Cultura,
Esporte e Turismo coordenada pelo o Sr. Sérgio Souto. Permanecendo apenas um
ano, em 1998, a cultura torna-se novamente um departamento da Secretaria de
Educação, Cultura e Esporte dirigido pela Srª Neuzeli Sanson.
Nas pastas de 1997, além das conhecidas solicitações de uso dos espaços
da Casa da Cultura, localizamos um ofício com o regulamento de um concurso
municipal de redação, uma parceria entre Secretaria de Cultura e Caixa Econômica
Federal com o seguinte tema: “Caixa o Banco de uma vida melhor”. (Anexo 4)
Em julho de 1997, a Secretaria de Cultura, recebeu um Termo de
Cooperação Técnica e uma circular da Biblioteca Pública do Paraná/ Sistema
Estadual de Bibliotecas Públicas sugerindo a “mútua colaboração entre a Biblioteca
Pública do Paraná e o Município visando o desenvolvimento dos serviços públicos
de leitura e informação através da Biblioteca Pública Municipal”. (Anexo 5)
Juntamente com a circular foram encaminhados dois documentos: Propostas aos
40
Prefeitos Municipais do Sistema Nacional de Bibliotecas e Programa uma Biblioteca
em cada Município do Ministério da Cultura. (Anexo 6)
O convênio entre a Biblioteca Pública do Paraná e a Biblioteca Pública de
Campo Largo foi assinado e a Srª Therezinha Apparecida Mikos selecionada para
frequentar o assessoramento técnico oferecido pela Secretaria de Estado da Cultura
do Paraná. (Anexo 7)
Através desses documentos podemos perceber uma conexão entre o
programa nacional e o estadual e, consequentemente, um chamamento do Estado
sobre o município. Esse convênio pode ter representado um avanço para a cultura
de Campo Largo.
Além disso, encontramos uma organização das atividades do Departamento
de Cultura 1º semestre de 1997: há exposições, homenagem às mães, ateliers,
cursos de dança, violão, coral, work shop e teatro infantil, em parceria com a SEECPR, festa junina, em parceria com CEF e o 1º Encontro de Corais Curitiba e Região
Metropolitana (anexo 8). Para o 2º semestre do mesmo ano, há solicitações de
oficinas, cursos e palestras referentes ao Projeto Trilha da Cultura (SEEC-PR) e a
programação para a apresentação de grupos folclóricos na Vila Olímpica Antonio
Lacerda Braga.
Assim sendo, percebemos uma nova movimentação do Departamento de
Cultura de Campo Largo, a noção de ações culturais começa a se ampliar devido à
aproximação com a Secretaria de Estado.
Nesta passagem 1998/1999/2000 encontramos referências a Encontros dos
Secretários Municipais da Cultura do Estado do Paraná promovidos pela Secretaria
de Estado. Esses encontros tinham vários objetivos: levantar dados, mapear
serviços culturais, aglutinar linguagens e expressões artísticas, enfim, a aparente
41
intenção de organizar uma política cultural estadual. Não encontramos sinais da
participação do município de Campo Largo nos dois primeiros encontros. No
entanto, há uma solicitação de vagas para o 3º Encontro de Secretários previsto
para abril de 2000 em Faxinal do Céu. (Anexo 9)
Nos ofícios de 1999, encontramos diversos contatos entre a Diretora do
Departamento de Cultura Srª Neuseli Sanson e o Secretário de Educação, Cultura e
Esporte Sr. Sérgio Souto, entre eles, o calendário anual de eventos do
Departamento (Anexo 10); uma solicitação de materiais para os eventos e atividades
(Anexo 11), um documento para angariar livros junto às empresas da cidade e a lista
das empresas que contribuíram para o acervo da Biblioteca Central (Anexo 12).
Julgamos, pela análise dos documentos, modificações efetivas nas ações
culturais do Departamento de Cultura. Primeiramente, a partir de 1999, uma
simplificação dos eventos culturais, um esforço da diretora do Departamento de
Cultura para conseguir da Secretaria materiais básicos, ou seja, fazer cultura com
poucos recursos públicos: “já estamos trabalhando em parceria com empresas que
nos apóiam e patrocinam os eventos” (ver Ofício nº 016/99, anexo 11). Ainda
percebemos a participação de empresas privadas na campanha de doação de livros
para a melhoria da Biblioteca Municipal, pressão da Secretaria de Estado e dos
programas do Ministério da Cultura, e um enfoque educacional para a cultura
priorizando a “melhoria do ensino de nossa cidade... que nossas escolas municipais
e estaduais necessitam” (ver Ofício nº 027/99, anexo 12).
Nas pastas do ano 2000 encontramos uma notificação do Conselho Regional
de Biblioteconomia (29 de fevereiro) constatando a falta de um profissional
bibliotecário na Biblioteca Municipal de Campo Largo e a solicitação ao Prefeito
Newton Puppi (30 de março) para a contratação de bibliotecários. Em seguida, 11 de
42
abril, a Diretora Neuseli informa ao Conselho a presença da Srª. Rosilei Berto como
bibliotecária formada, antes atuante como estagiária (Anexo 13). Novamente a
pressão da Secretaria de Estado e do programa de Bibliotecas do Ministério da
Cultura.
Há um ofício, também de 2000, convidando todas as escolas do município a
participar das Exposições Itinerantes na Biblioteca Pública, promovidas pelo
Departamento de Cultura como parte do evento Brasil - 500 Anos. A lista de
exposições sugere uma programação bastante diversificada para o ano inteiro (ver
anexo 14).
Em maio de 2000, a Secretaria de Estado da Cultura – Coordenação de
Ação Cultural convida o Departamento de Cultura de Campo Largo a participar do
Projeto Comboio Cultural. Esse projeto visava proporcionar um rodízio de
espetáculos de música, dança e produção teatral entre os municípios do Estado. O
Departamento aceita o convite solicitando apresentações do Comboio Ópera e do
Comboio Teatro de Bonecos para agosto de 2000 (Anexo 15).
Na pasta dos Ofícios Recebidos do mesmo ano, encontramos algumas
solicitações para o uso do auditório da Casa da Cultura como nos anos anteriores,
no entanto, agora com a cobrança de uma taxa de R$ 300,00. Em 26 de outubro,
solicitação para uma palestra da Empresa Brasil Assessoria, Eventos e Informática;
em 25 de novembro, solicitação para apresentação de teatro da Companhia de
Marcio Miler e em 8 de dezembro, solicitação para apresentação de um espetáculo
de dança da Escola Anna Ballerina (modelo de solicitação e recibo ver anexo 16),
todos eventos obrigados a pagar aluguel pelo uso do único auditório da cidade.
Talvez uma alternativa para a falta de recursos públicos para a cultura.
43
Na pasta de Ofícios Expedidos de 2000, encontramos a programação de
alguns eventos culturais tais como: Homenagem ao dia das mães (em maio); IV
Junin Fest – Festival de Música Sertaneja (na Vila Olímpica, em junho); 1º Festival
de Teatro (de 1º a 8 de julho); III Encontro de Corais (em 29 de julho). Por conta
desses eventos, há também nessa pasta várias solicitações de verbas para a
Secretaria, assim como vários pedidos de patrocínio para empresas privadas: Global
Telecom, Tintas Suvinil, Dpascoal, Tim, Spida – Marketing e Comunicação e outras
para a Petrobrás, Caixa Econômica e Compagás.
Analisando as ações culturais do Departamento de Cultura de Campo Largo,
nos anos acima descritos, percebemos uma movimentação cultural, mas ainda uma
noção de cultura simplificada baseada em festividades anuais; uma preocupação
com biblioteca, livros e leitura e uma modificação nas ações culturais atreladas à
Secretaria de Estado da Cultura do Paraná. Percebemos dificuldades na realização
dos eventos: falta de materiais básicos, limitadas verbas públicas, necessidade de
cobrar taxa por um espaço de cultura e a constante com a colaboração de empresas
privadas. Reflexos do contexto cultural nacional.
5.5 De 2001 a 2004 nada foi encontrado na Casa da Cultura:
Curiosamente nada foi encontrado na Casa da Cultura referente aos anos
2001, 2002, 2003 e 2004, nenhuma pasta de ofícios recebidos ou expedidos ou
arquivo de computador, nenhum funcionário do Departamento sabe realmente o que
houve com os documentos desses anos. Sabemos apenas que durante a gestão do
Prefeito Afonso Portugal Guimarães, o Sr. Paulo Castagnolli foi Secretário da
Educação, Cultura e Esporte e o Sr. Alfredo Lopes diretor da Casa da Cultura.
5.6 De 2005 a 2008: pensamento cultural, integração e rumo à política municipal de
cultura:
44
A partir do ano de 2005, achamos outros documentos além das pastas de
Ofícios Recebidos e Expedidos: Lista dos Cursos e Relatório das Atividades
desenvolvidas na Casa da Cultura (Anexo 17 e 18); pasta de inscrição de alunos nos
cursos e nas oficinas e pasta de cadastro dos artistas da cidade. A Secretaria de
Educação, Cultura e Esporte passa a ser dirigida pela Srª Márcia de Mello e Silva, o
Departamento de Cultura é responsabilidade do Sr. Maurício Moraes e a Casa da
Cultura da Srª Luana Matter.
Nos Ofícios Recebidos de 2005, encontramos as já conhecidas solicitações
para o uso do Auditório da Casa da Cultura emitidas por escolas, empresas e
associações da região, mas não há indícios dos antigos pagamentos de aluguel.
Entre tantos documentos recebidos, destacamos uma circular da Secretaria
de Estado da Cultura convidando Campo Largo para o III Encontro de Secretários e
Dirigentes Municipais de Cultura, a ser realizado na cidade de Maringá em agosto do
mesmo ano (anexo 19): “Este evento, ..., contará com a presença de representantes
do Ministério da Cultura, ... serão debatidos temas relativos ao desenvolvimento da
cultura ...”. Na programação anexada, percebemos a intenção de discutir, Minc,
Estado e municípios, o Sistema Nacional de Cultura, os Pontos de Cultura, o
Financiamento e a Gestão da Cultura, a Cultura Brasileira e a questão do Patrimônio
e Inventário Cultural (ver anexo 20).
Em 2005, percebemos uma movimentação nas ações culturais do
Departamento de Cultura: criação de uma Feira de Artesanato Noturna (durante o 1º
final de semana de cada mês); Programa Paraná Fazendo Arte (em março);
Cadastramento de Artistas Locais (em abril); Cultura em Ação (em maio); Arte
Solidária para a 3ª Idade (em julho) e III Festival de Teatro (em outubro).
45
Encontramos solicitações de profissionais e de oficinas do Projeto
Paranização “Dada a necessidade de levar aos bairros atividades ligadas à cultura”,
com o objetivo de “descentralizar e deselitizar a cultura quebrando possíveis
barreiras que possam haver entre a população da periferia e a Casa da Cultura”
(anexo 21). Analisando essas solicitações, entendemos que esse projeto, do Centro
Cultural Teatro Guaíra (Direção de Nitis Jacon), faz parte de um programa plurianual
(2003 a 2006) de políticas públicas do Estado e que tem por objetivos a
democratização e a descentralização de toda a cultura produzida no Paraná, assim
como as ações culturais desenvolvidas pelo Governo e pelas prefeituras, com a
participação da iniciativa privada e da sociedade civil.
Achamos um ofício de setembro de 2005 endereçado ao Coordenador do
Programa Paraná Fazendo Arte, solicitando apoio ao III Festival de Teatro de
Campo Largo. Esse festival contou com grupos de Curitiba e Região Metropolitana
houve apresentações de peças teatrais (infantil e adulto) no ônibus/palco em uma
das praças centrais da cidade e em “regiões não centrais, a fim de incrementar e
difundir o teatro à população menos favorecida de nosso município” (anexo 22).
Ainda localizamos solicitações às empresas de Campo Largo pedindo apoio,
patrocínio e materiais para o desenvolvimento das ações culturais daquele ano.
Exemplos: em março, pedido de doação de refrigerantes para a Distribuidora de
Bebidas Beber e de salgados e doces para o Supermercado Mercantiba para a
abertura do Programa Paraná Fazendo Arte; em maio, solicitação de uma carro de
som para a Cocel - Companhia de Luz de Campo Largo e outra para a Empresa de
ônibus Nossa Senhora da Piedade para a divulgação do Cultura em Ação; em
agosto, solicitação de uma carro de som para Leve Calçados a fim de divulgar as
atrações da Feira Noturna e outra para as Lojas Central, pedindo doação de
46
materiais para a oficina de artes; em setembro, um pedido de policiamento intenso
para a Feira Noturna encaminhado ao Capitão Buzencko da 3ª Cia. de Campo
Largo; em outubro, um requerimento de patrocínio à Empresa Tritec Motors para as
feiras de culinária e artesanato e um pedido de apoio à Onda Livre FM para a
divulgação do III Festival de Teatro.
Aparentemente a aproximação da política cultural do Estado e do Ministério
da Cultura mobiliza as ações culturais de Campo Largo ampliando a noção de
cultura, mas ainda através daquilo que já vem sendo desenvolvido pelos projetos
culturais do Estado (Curitiba como centro irradiador de cultura) e ainda também
dependendo do apoio de empresas privadas.
Em 2006, a Diretoria da Casa da Cultura passa a ser responsabilidade da
Srª Gladis Chemin Miró e há também a participação da Srª Rejane Nóbrega como
coordenadora de projetos.
As conhecidas solicitações para o uso do Auditório da Casa da Cultura
continuam existindo em 2006, porém, dessa vez há um “Regulamento para
empréstimo e locação da Casa da Cultura Dr. José Antônio Puppi” (anexo 23).
A movimentação das ações culturais do Departamento de Cultura continua
em 2006, no relatório anual encontramos apresentações teatrais e musicais,
palestras, seminários, exposições, cursos e oficinas (ver anexo 24), indicações
sobre a I Semana de Culturas Tradicionais e Populares (em agosto) e sobre o I
Encontro Sul Brasileiro de Culturas Populares (em setembro, na Praça Getúlio
Vargas), encontramos também uma planilha detalhada sobre os projetos culturais
para todo o Departamento de Cultura, projetos de artes cênicas, musicais e visuais
para a Casa da Cultura, projetos para o Museu Histórico e para a Biblioteca Pública,
todos com objetivos, público alvo e custos. (Anexo 25)
47
Um
documento
semelhante
foi
encontrado
no
material
de
2007
apresentando projetos de espetáculos, oficinas e festivais. No entanto, com menos
detalhes e sem a exposição dos custos. Provavelmente, elaborado por outra pessoa.
(Anexo 26)
Nos documentos expedidos em 2008, encontramos diversas solicitações do
Departamento de Cultura: oficinas de dança e de violão; visita dos funcionários da
cultura ao MON – Museu Oscar Niemayer de Curitiba; acervo do Museu Paranaense
para a exposição de Culturas Indígenas; solicitação para Seminário sobre Fundação
Cultural; pedido de continuidade do evento Culturas Tradicionais e Populares com
envolvimento e projetos dos professores e das escolas da rede municipal; solicitação
de obras paranaenses para compor o acervo histórico de Campo Largo; participação
de grupos de fandango de Paranaguá; solicitação de verbas para os eventos:
Culturas Indígenas Brasileiras (em maio), Culturas Tradicionais e Populares (em
agosto) e Festival de Música de Raiz (em novembro).
Analisando essa sequência de solicitações observamos uma intenção de
continuidade das ações culturais de 2006 e 2007, de transformação e ligação maior
com as ações culturais de Curitiba, mas ao mesmo tempo uma dificuldade de
organização e efetivação.
O documento considerado mais importante desse período é uma cópia de email enviada pela Srª Rejane Nóbrega aos envolvidos com a cultura de Campo
Largo, contendo propostas de política cultural para o município. Nesse, encontramos
como pressuposto: “cultura e arte como agentes de transformação social, tão
necessários quanto educação, saúde, habitação, bem estar social”, diversas ações/
propostas e uma série de aspectos importantes do setor público de cultura a serem
discutidos e reordenados (ver anexo 27).
48
Outro documento igualmente importante é uma planilha com sugestões de
projetos culturais para 2009–2012 elaborado pelos funcionários da Biblioteca, da
Oficina de Literatura e do Centro de Letras de Campo Largo e assinado pela Srª
Rozeli Cosmo, coordenadora da Biblioteca. Nesse existe, entre os vários projetos, a
sugestão do desmembramento da cultura - a criação da Secretaria Municipal de
Cultura “visando mudanças... criando um plano de políticas culturais para o
município que atenda a classe artística e também a população de modo geral”.
Também aparece a necessidade de “integrar as ações culturais” da Casa da Cultura,
do Museu Histórico e da Biblioteca Pública “fortalecendo as atividades culturais do
município” (anexo 28).
Em todos os materiais consultados de ano a ano, encontramos pela primeira
vez, em 2008, documentos referentes à política municipal de cultura. Entendemos
que nesses anos houve movimentação nas ações culturais de Campo Largo, mas
não só isso, movimentação de qualidade cultural, pensando mais em arte/cultura do
que em educação, integrando Casa da Cultura, Museu Histórico e Bibliotecas,
fazendo projetos, eventos, buscando parcerias, tentando trazer para a cidade
projetos já existentes em Curitiba e no Estado, buscando um caminho de qualidade
no pensamento cultural. Talvez tenha faltado maturidade, legitimidade e apoio
institucional para o surgimento de uma política cultural em Campo Largo nesse
momento, porém, o rumo já estava delineado. Reflexos das discussões nacionais.
5.7 Em 2009 significativos avanços, mas as dificuldades continuam:
Após as eleições municipais, no segundo mandato do prefeito Edson Basso,
a Secretaria de Educação, Cultura e Esporte, passa a ser dirigida pelo Sr. Norton
Pooter e o Departamento de Cultura fica sob a responsabilidade do Sr. Osvaldo
Andrade Zotto, até maio de 2010.
49
Logo no início da gestão o diretor Osvaldo Zotto apresentou ao Prefeito e a
outros secretários responsáveis uma proposta de criação da Fundação Cultural de
Campo Largo “fruto de amplos estudos com representantes da classe cultural e
artística do município, ao longo dos três últimos anos” (anexo 29). O diretor, com
votos de estima e consideração, esperava a aprovação da proposta pelos
representantes municipais. Apenas encontramos o Ofício de encaminhamento de 31
de março de 2009, a proposta em si não foi encontrada nos arquivos pesquisados.
No entanto, tivemos acesso ao Projeto de Lei XX/2009 de outubro, no qual a
Câmara Municipal de Campo Largo aprovou e o Prefeito Municipal sancionou “a
criação do Conselho Municipal de Cultura, Conferência Municipal de Cultura, Fundo
Municipal de Cultura” (Anexo 30). Sabemos que ainda hoje (início de 2011) o
Departamento de Cultura continua fazendo parte da Secretaria de Educação,
Cultura e Esporte, no entanto, está previsto para o mês de abril a 1ª Conferência
Municipal e a escolha do Conselho de Cultura definitivo.
No Ofício nº 35/2009 o Diretor Osvaldo Zotto encaminha em 1º de junho
para vários vereadores e secretários um apelo à conscientização da necessidade de
“um orçamento maior para a área da cultura”. Em anexo a esse ofício estavam
vários outros documentos com “as propostas para a área cultural que estão sendo
debatidas a nível nacional”, tais como: propostas de emenda à Constituição de
destinação de recursos à cultura - PEC 150/03; Plano Nacional de Cultura, Sistema
Nacional de Cultura – 30 propostas prioritárias; Projetos para Cultura (Site do Minc,
maio/09): PEC 150 e Fundo Setorial do Livro e da Leitura; Documento de Criação da
Comissão de Educação e Cultura na Câmara dos Deputados liderada por Angelo
Vanhoni. Todos esses anexos mostram a intenção de sensibilizar os responsáveis
“para que possamos atingir os objetivos e desenvolver uma política cultural em
50
Campo Largo” e “desejamos poder contar com a sua colaboração no sentido de
apoiar a destinação de 1% do Orçamento de 2010 para a área cultural” (anexo 31).
Existe outro documento interessante de julho de 2009 onde o Diretor Zotto
solicita ao Prefeito apoio e colaboração para a viabilização de um projeto de
reconstrução de uma antiga casa existente na entrada do Parque Cambuí. O
levantamento histórico desvendou a relevância histórica e cultural dessa casa para
Campo Largo, “pertenceu à família do Desembargador Clotário Portugal” e depois
“abrigou a Escola Estadual Estação de Enologia” e ainda “mais tarde tornou-se a
Escola Municipal O Ateneu”. O diretor cobra “um compromisso do Município na sua
preservação”, mas ao mesmo tempo tem ciência “das dificuldades orçamentárias da
Prefeitura” e esclarece a pretensão de “elaborar um Projeto de Reconstrução que
seja
contemplado
com
os
recursos
de
outras
esferas
governamentais,
especialmente do Governo Federal.” (Anexo 32)
Achamos outras indicações relevantes: uma ficha de inscrição do Sr. Diretor
Osvaldo Zotto para participar do Seminário sobre o Sistema Nacional de Cultura em
Curitiba, nos dias 3 e 4 de setembro; uma lista de delegados para a Conferência
Intermunicipal de Cultura em Colombo, em 29 de outubro; e as inscrições do Sr.
Zotto e do Sr. Milton (funcionário da Ação Cultural da Casa da Cultura) para a 2ª
Conferência Estadual de Cultura em Campo Mourão, em 27 de novembro.
Analisando os documentos de 2009 descritos até aqui, podemos constatar
que o diretor do Departamento de Cultura é um profissional bem intencionado e
informado sobre os parâmetros e as diretrizes instituídos pelo Ministério da Cultura.
Projetos, propostas, compromissos com a preservação do patrimônio histórico e
cultural, pretensão a criação de uma Fundação Cultural, discussões sobre
51
orçamento para a área da cultura, são reflexos dos seminários, debates e
discussões nacionais referentes às políticas culturais no Brasil.
Ainda nos materiais pesquisados referentes a 2009, encontramos um
encaminhamento para os secretários responsáveis das prioridades da área cultural –
Plano/Propostas de trabalho 2009 a 2012 “atendendo solicitação feita na reunião do
Gabinete em 12 de agosto” e a relação dos compromissos de campanha do prefeito
para o setor da cultura (anexo 33).
Nas propostas do Museu Histórico, assinada pela coordenadora Srª
Margarete Boaron, encontramos diversas solicitações de materiais e equipamentos
necessários para a existência do Museu. Há metas, prazos, ações, atividades,
setores responsáveis e custos, tudo bem planejado, no entanto apenas dois projetos
envolvendo artistas e comunidade. Nas propostas da Biblioteca Cidadã, sem
assinatura, percebemos mais uma reclamação do que planos de ação: faltam
profissionais capacitados e materiais para o desenvolvimento de projetos, material
básico e de limpeza, assim como manutenção do próprio estabelecimento, tudo já
solicitado, segundo o documento, por ofícios e aguardando respostas (anexo 34).
Podemos concluir analisando o ano de 2009 diversos avanços para o setor
público cultural de Campo Largo, um caminho de discussões para a criação de uma
política cultural, uma forte ligação com as prerrogativas do Ministério da Cultura, mas
também persistindo as antigas dificuldades, faltam recursos, materiais básicos,
manutenção dos equipamentos culturais e profissionais qualificados. Aparentemente
existem pessoas, idéias e bons projetos de relevância cultural, porém, ainda há um
longo caminho a ser percorrido para o envolvimento dos artistas e da comunidade
campo larguense.
5.8 2010 – o desenvolvimento de uma política de cultura em Campo Largo:
52
Com o apoio da Prefeitura Municipal e dos funcionários, o atual diretor do
Departamento de Cultura, Sr. Juciê Parreira, vem promovendo diversos eventos
para o desenvolvimento de uma política cultural em Campo Largo.
Em julho de 2010 a população de Campo Largo foi convidada a participar da
1ª Audiência Pública sobre Cultura do Paraná. Nessa foram discutidas políticas
públicas e apresentadas as propostas do Departamento de Cultura. A Audiência,
realizada no Auditório da Casa da Cultura Dr. José Antonio Puppi, contou com a
presença do prefeito Edson Basso que ressaltou a importância da organização da
cultura em Campo Largo:
“Reconheço que precisamos de mais movimentos culturais. Campo Largo
tem que prestar mais atenção na cultura. A partir de agora teremos sempre
uma surpresa a mais e a cidade voltará a ocupar um lugar de destaque no
Paraná. A população precisa ajudar a decidir. Através da Audiência é que
haverá uma conscientização do povo sobre o poder público, e um
entendimento maior sobre a necessidade de investimentos em
determinadas
áreas,
como
é
o
caso
da
Cultura”.
(http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso em 22 de julho de 2010)
Depois da Audiência, em agosto de 2010, foi realizado em Campo Largo o
1º Fórum Municipal de Cultura (Anexo 1) para a construção de um Plano Municipal
de Cultura. A abertura contou com cerca de 100 representantes da sociedade e
várias autoridades: o vice-prefeito Dante Vanin, o Secretário da Educação e Cultura
Norton Pooter, a vereadora Lindamir Ivanowi, a antropóloga Gesline Braga e o
dramaturgo Abílio Machado de Lima. O Fórum apresentou propostas para definir o
futuro cultural do município e eixos para facilitar o planejamento: Cultura e Economia
Criativa; Diversidade Cultural; Patrimônio e Memória Cultural; Democratização e
Acesso à Cultura; Gestão e Institucionalidade da Cultura. “Cada novo fórum setorial
que for feito, seja sobre música, cinema, teatro, ou qualquer outro assunto, será
discutido como essas modalidades se enquadram dentro dos eixos definidos”,
explicou o diretor Juciê Parreira. (http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso em 15 de
setembro de 2010)
53
Também durante o Fórum foi definido o Conselho Provisório de Cultura que
ficará em exercício até abril de 2011, quando será realizada a 1ª Conferência
Municipal de Cultura, quando serão exibidos os resultados conquistados e será
eleito o Conselho definitivo. Os eleitos para fazer parte dessa gestão provisória
foram: Abílio Machado de Lima Filho (dramaturgo), Ana Paula Assis (cantora e
acadêmica de direito), Teodolino José de Souza (músico e maestro), Gesline Braga
(antropóloga)
e
Ramon
Voltolini
de
Assis
(músico
e
jornalista).
(http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso em 15 de setembro de 2010)
Por meio da parceria entre a Secretaria de Articulação Institucional do
Ministério da Cultura e o Departamento Municipal de Cultura de Campo Largo foi
realizado em setembro de 2010 o Seminário Gestão Pública e Sistema Nacional de
Cultura. O objetivo do evento foi promover debates no campo das ações políticas,
das reflexões históricas e teóricas. O representante do Minc, professor Bernardo da
Mata Machado, apresentou propostas de estruturação do SNC aos setores públicos
e sociedade civil. Gestores dos municípios vizinhos também acompanharam as
palestras e receberam orientações. O prefeito Edson Basso participou e salientou:
“Campo Largo está gratificada por receber um evento tão importante como este.
Neste novo modelo de política cultural temos que priorizar a organização e a
participação da população nas decisões”. (http://site.campolargo.pr.gov.br, acesso
em 6 de outubro de 2010)
Esses eventos realizados em Campo Largo no ano de 2010 movimentaram
o setor cultural da cidade, demonstraram apoio municipal e empenho no
desenvolvimento de uma política pública de cultura.
54
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nos primeiros anos de existência da Casa da Cultura (1993 a 1996) a noção
de cultura mostrava-se tímida valorizando simplesmente manifestações de folclore e
artesanato. Nos anos seguintes, de 1997 a 2000, a noção de cultura começa a se
ampliar devido à aproximação das ações e políticas da Secretaria de Estado da
Cultura do Paraná. O Departamento de Cultura de Campo Largo continua
valorizando comemorações anuais, mas já inicia cursos e oficinas de música, dança,
teatro e etc..
Nesses anos, período da gestão FHC/Weffort, começamos a perceber os
reflexos das políticas nacionais de cultura sobre as ações locais de Campo Largo.
Percebemos uma conexão nacional – estadual – municipal quando os programas do
Ministério da Cultura, relativos à biblioteca, livros e leitura, chegaram ao setor de
cultura de Campo Largo através das ações da Biblioteca Pública do Estado.
Constatamos também, a partir dos documentos consultados, um esforço para fazer
ações culturais com o mínimo de recursos públicos e com a participação de
empresas privadas, outro evidente reflexo do contexto nacional.
No período de 2001 a 2004 não encontramos registros sobre as ações
culturais do Departamento de Cultura de Campo Largo (ver capítulo 5.5). A partir de
55
2005, as novas ações do Departamento de Cultura demonstram iniciativa para
ampliar a noção de cultura no setor público do município. Nos anos seguintes, 2006,
2007 e 2008, novos projetos e propostas sugerem maior valorização do setor
cultural, necessidade de integração entre as atividades da Casa da Cultura, do
Museu Histórico e da Biblioteca Municipal, urgência de um plano de política pública
e busca de qualidade no pensamento cultural. Reflexos dos debates nacionais.
Sabemos que no contexto nacional, gestão Lula/Gil, o Ministério da Cultura passou a
enfatizar o papel ativo do Estado, propondo formular e implementar políticas
culturais, chamando a sociedade para o diálogo cultural.
Em 2009 vemos uma clara conexão com as prerrogativas do Ministério da
Cultura. O Departamento de Cultura de Campo Largo participa das discussões
nacionais, traz para o âmbito municipal planos, propostas e prioridades no setor
cultural culminando em debates e maior integração. No ano de 2010, acontecem
reuniões públicas para a concretização de uma política de cultura para Campo
Largo. Reflexos das políticas públicas de cultura do Brasil contemporâneo.
Constatamos reflexos das políticas nacionais de cultura nas ações locais de
Campo Largo. Mas gostaríamos de retomar o referencial teórico dessa pesquisa a
fim de ampliar as considerações finais.
Usando a concepção de sociedade de Manuel Castells onde tecnologia é a
sociedade e a sociedade é entendida a partir das suas ferramentas tecnológicas, e
essa relação tecnologia/sociedade se dá através do papel do Estado (Castells,
2000), podemos concluir que inicialmente o poder público de Campo Largo
contribuiu para a estagnação da tecnologia cultural e transitoriamente as novas
iniciativas do setor cultural estão acelerando a tecnologia e promovendo
transformação na sociedade.
56
Se analisarmos os tipos de políticas culturais comentadas por Martin Feijó,
política cultural para a proibição, para o cerceamento, direcionamento e imposição
ou para a organização, para o incentivo, criação, esclarecimento e transformação
social (Feijó, 1989), no período que coincide com a gestão FHC/Weffot, percebemos
inicialmente o direcionamento da cultura em Campo Largo, ações culturais
simplificadas, direcionadas pelo Estado para bibliotecas, livros e leitura, limitados
recursos públicos e patrocínios privados na cultura. No período seguinte, gestão
Lula/Gil/Ferreira, há uma gradativa transformação para a organização, incentivo e
criação cultural, as ações de cultura de Campo Largo buscam ampliação, propostas,
planos, debates, integração, maior orçamento e a criação de uma política municipal
de cultura.
Se tomarmos a visão de Teixeira Coelho na questão das ações culturais e
no papel dos agentes de cultura (Teixeira, 1988) os diversos diretores do
Departamento de Cultura de Campo Largo foram pessoas esforçadas, bem
intencionadas e desenvolveram seu trabalho dentro das possibilidades. Mas, muitas
vezes, sem a consciência necessária do processo cultural nacional. Quase sempre a
partir de uma visão específica e com a difícil tarefa de fazer cultura sem recursos,
sem pessoas, sem orientação e qualificação. Mesmo diante das dificuldades, os
agentes culturais administraram o processo cultural de Campo largo.
Concluímos com esse trabalho de pesquisa a relevância e a complexidade do
tema - políticas públicas de cultura. As considerações dessa pesquisa revelam a
necessidade de um estudo mais extenso sobre às ações culturais do Município de
Campo Largo, há ainda a necessidade de buscar outros registros oficiais e não
oficiais, de encontrar as pessoas envolvidas e ponderar os seus depoimentos sobre
as ações culturais dos anos descritos. No que diz respeito a uma análise do
57
desenvolvimento cultural de Campo Largo, se faz necessário também investigar o
envolvimento dos artistas locais e regionais, o desenvolvimento de suas obras, suas
ideias sobre cultura, assim como a opinião das pessoas da comunidade, para
visualizar com mais precisão a realidade dos acontecimentos culturais do Município
nos últimos 20 anos. Excelente oportunidade de investigação científica para o atual
contexto cultural brasileiro.
REFERÊNCIAS
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www.campolargo.pr.gov.br
www.inesc.org.br
www.monumenta.gov.br
BONETI, Lindomar. Políticas Públicas por dentro. Ijuí: Editora Unijuí, 2006.
CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
CASTELLS, Manuel. O poder da identidade. São Paulo: Paz e Terra, 1999.
COELHO, Teixeira. O que é ação cultural. São Paulo: Brasiliense, 1988.
(Primeiros Passos).
FEIJÓ, Martin Cezar. O que é política cultural. São Paulo: Brasiliense, 1989.
(Primeiros Passos).
MACHADO, Evelcy e MUELLER, Helena. Políticas Públicas Educacionais múltiplos olhares. Ijuí: Editora Unijuí, 2006.
MARTINELL, Alfons. Cultura e cidade: Uma aliança para o desenvolvimento – A
experiência da Espanha. In: Políticas Culturais para o Desenvolvimento. Brasília:
UNESCO Brasil, 2003. p. 93 a 104.
REIS, Paula Félix dos. Políticas Nacionais de Cultura: o documento de 1975 e a
proposta do governo Lula/Gil, Políticas Culturais em Revista, 2 (1), p.73-90,
58
2008. Disponível em: http://www.politicasculturaisemrevista.ufba.br. Acesso em:
16 jun. 2009.
Revista CPC, São Paulo, nº 10, 2010
RUBIM, Antonio Albino Canelas. Políticas Culturais no Brasil: Trajetória e
Contemporaneidade, Nossos Documentos, Fundação Municipal de Cultura
Garibaldi.
Disponível
em:
http//documentos-fgb.blogspot.com/2008/políticas-
culturais-no-brasil-trajetoria.html. Acesso em: 15 mai. 2009.
59
ANEXOS
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reflexos das politicas nacionais de cultura sobre as - TCC On-line