FAZER COLEÇÃO É BOM!
Zuleide Maria Colognese Dal Monte**
Resumo
Este artigo é uma discussão sobre o ato de juntar objetos e formar coleções. Relata a discussão
que fez surgir o problema que originou o projeto, o desenvolvimento do mesmo e o resultado
da pesquisa de opinião diante dos questionamentos determinados pelo grupo de alunos
envolvidos no trabalho, estabelecendo o papel desta atividade na vida dos colecionadores,
bem como o perfil dos mesmos. Acrescenta ainda, como esta atividade propicia a construção
do conhecimento, fazendo parte no processo de aprendizagem e na socialização. Além da
preocupação com os produtos promocionais que de um lado incentivo o colecionismo e de
outro o consumismo.
Palavras-chave: coleção, aprendizagem, escola, objetos, trocas.
Nas turmas de quarta série da Escola Municipal de Ensino Fundamental Ângelo
Chiele, localizada no Bairro São Luís, do município gaúcho de Farroupilha, surgiram
questionamentos do tipo: “Fazer coleção é só coisa de crianças e adolescentes? Fazer coleção
é uma atividade educativa? Adultos também gostam de fazer coleção? Fazer coleção é um
esporte, uma brincadeira, um passatempo, um hobby ou uma mania? Todas as pessoas,
alguma vez na vida teriam feito alguma coleção? Que influência teria a mídia, através de
produtos promocionais no colecionismo, sabendo que esta atitude está diretamente ligada a
produtos preferidos pelo público infantil e juvenil? Tais questões tiveram origem depois de
inúmeras discussões geradas pelos meios de comunicação a respeito do excesso de peso que
as mochilas dos estudantes apresentavam comprometendo a coluna dos mesmos.
Ao organizar o horário escolar houve a preocupação de colocar as disciplinas de
modo a não coincidir, no mesmo dia, aquelas que necessitavam de maior quantidade de
material, para não ocorrer então o excesso de peso nas mochilas e comprometer a saúde da
coluna.
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Professora da Escola Municipal de Ensino Fundamental Ângelo Chiele, com formação no Curso de Pedagogia,
Educação Infantil e Séries iniciais da ULBRA, e leciona as aulas de Português e Matemática nas quartas séries
da citada escola.
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Porém, mesmo assim, as mochilas estavam pesadas, com em torno de quinze a vinte
por cento a mais do permitido para o índice estabelecido de acordo com a relação peso/altura
das crianças.
Foi feito então um levantamento sobre o que cada um estava trazendo em sua
mochila e o diagnóstico determinou que além do material escolar necessário, entre livros,
cadernos e estojos, estavam ali acomodados: álbuns, carrinhos, figurinhas, cartelas de
adesivos, bonecos e bonecas, cards entre outros.
Indagados do porquê destes objetos ali juntos dos materiais escolares, afirmaram que
eram objetos de coleção e a escola é o melhor local para mostrar a coleção, as novas
aquisições e fazer trocas.
Diante disto foi buscado material didático que viesse ao encontro a esse assunto. O
primeiro, dando inicio ao desenvolvimento do trabalho foi a obra de título “A Mochila da
Mariela” de Gláucia Lemos, que através de uma poesia rimada, relata o que a personagem
trazia em sua mochila amarela, que como os alunos, além do material escolar também trazia
uma série de outros objetos que pertenciam a coleções.
Surgiu então a proposta da construção de mochilas.
Em grupos, os alunos
receberam tecido, cada grupo de uma cor diferente. Além de confeccionar as mochilas,
deveriam também criar uma personagem que rimasse com a cor da mesma e uma poesia
também com rimas, descrevendo os objetos que estavam nas mochilas, além do material
escolar. Os alunos ainda deveriam fazer apresentação para a turma e exposição no saguão da
escola. O trabalho foi um sucesso!
Mas o questionamento, as discussões, sobre o assunto continuavam, sempre havia
um relato a ser contado sobre, a quantidade de objetos, o tipo de objeto colecionado, a coleção
de alguém conhecido, e assim o interesse ia tomando cada vez mais forma.
Ficavam surpresos quando descobriam que alguém da família, pai, mãe, tios, avós,
primos, tinham algum tipo de coleção, algumas ainda do tempo de criança.
Foi aproveitado então o assunto latente para desenvolver um projeto, como havia
uma série de questionamentos que necessitavam da opinião além da sala de aula, o assunto
encaixou-se no projeto de pesquisa de opinião do NEPSO.
Estava nascendo ali o projeto intitulado “FAZER COLEÇÂO É BOM!”.
Antes da pesquisa de campo, todo um trabalho envolvendo leituras, pesquisas no
GUINNESS, na web e inúmeras atividades foram realizadas, como forma de dominar melhor
o assunto.
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As aulas de Hora do Conto foram bastante proveitosas para o desenvolvimento do
projeto, pois ali, naqueles momentos foram apresentadas obras como: O Balaio do Caio e
Você Troca da escritora Eva Furnari, além de: Caio, o Colecionador e Uma Cortina Colorida
Que Não Sai do Lugar, reportagem que saiu no Jornal O Globo, descrevendo a mania de
colecionar adesivos nas vidraças das janelas. Com estas bibliografias foram realizadas
atividades de releitura que permitiram um contato maior com a atividade em questão, então
denominada colecionismo e fizeram parte de um portifólio. Cada aluno confeccionou o seu.
Uma exposição de coleções, destacando a quantidade, o tempo da coleção e
inclusive alguns objetos que tinham um destaque especial dentro da coleção, no salão da
escola, oportunizou a apresentação do projeto para a comunidade escolar. Ocorreram até
intercâmbio com colegas de outras séries, através de trocas de objetos repetidos.
Os resultados obtidos na pesquisa de opinião tiveram seu retorno apresentado à
comunidade escolar através de um teatro.
Diante da pesquisa determinou-se, que esta atividade de juntar objetos sob a forma
de coleção, denomina-se colecionismo e é antiga e universal, conforme diz o psiquiatra e
psicoterapeuta José Roberto Altenfelder Silva Wolff (ANO, pg.), quando afirma que:
Desenvolver uma coleção é um passatempo antigo e universal. Gente
dos mais diferentes lugares e perfis, de todas as idades, se dedica ao
hábito de juntar e organizar selos, moedas, cartões de telefone, vidros de
perfume, latas de cerveja, rótulos, carros e uma infinidade de outros
objetos, caros ou baratos, raros ou comuns. Se você pensa que isso é coisa
de quem não tem o que fazer ou de quem adora abarrotar a casa de
quinquilharias, considere a possibilidade de mudar de idéia e a mania de
colecionar é perfeitamente normal, denomina-se colecionismo, e esta
atividade é antiga e universal.
O terapeuta ainda lembra que: “Guardar coisas de que se gosta faz parte do
desenvolvimento do ser humano e é muito comum que as crianças passem um longo tempo
organizando e olhando seus brinquedos”. Acrescentando também que: “Na vida adulta,
algumas pessoas dão a esse hábito que vem da infância a forma de coleção e nos casos
extremos isso pode se transformar numa perversão, isso quando o apego aos objetos
colecionados passa a ter um sentimento de posse excessivo em relação a eles”.
Mas fazer coleção tem sua aplicação também na construção do conhecimento, de
acordo com Piaget, a construção do conhecimento lógico-matemático, passa inicialmente por
um processo igual ao de fazer coleções, quando as crianças juntam e organizam seus objetos
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determinando-os por espécie, então mais tarde, com a formação de subconjuntos, recebendo
pelo especialista a determinação de coleções figurais e não-figurais.
Como se sabe, para acontecer uma coleção, não basta apenas juntar coisas, mas é
preciso haver um significado, um sentimento. E é assim que o colecionador vê cada objeto de
sua coleção: com um significado, com uma história, com um sentimento, com uma
recordação.
Na pesquisa de opinião, envolvendo 100 pesquisados, dois por cada aluno, dos
bairros São Luís e São Francisco, que contribuem com o maior número de alunos da escola,
apresentou que 80% acreditam que a atividade de colecionar objetos é educativa.
Praticamente a mesma porcentagem, 82% vêem como uma atividade não somente para
crianças e adolescentes, mas de adultos também.
Na sua opinião, a atividade de colecionar é educativa?
90
Não
80
70
60
50
40
30
Sim
20
10
0
1
Na sua opinião, colecionar é só coisa de crianças e jovens?
90
Não
80
70
60
50
40
30
20
Sim
10
0
1
Quase a metade dos entrevistados, 47%pensam que o colecionismo acontece quando
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envolve recordações e lembranças.
No que conta a determinar uma modalidade para classificar a atividade, a grande
maioria, 48% classificam como hobby e 33% como um passatempo.
Quanto à influência da mídia no incentivo ao colecionismo, havia uma grande
preocupação dos alunos nesta questão que diz respeito aos produtos promocionais, que
premiam o consumidor com tazos, cartinhas, adesivos, figurinhas e outros objetos que
estimulam o ato de colecionar e até jogar e 42% acreditam nesta possibilidade, 34% vêem
nisso um favorecimento ao consumismo, pois crianças e adolescentes fazem parte do público
alvo dos produtos promocionais e 24% não concordam com nenhuma destas afirmações.
Na sua opinião, a mídia, com propagandas de produtos
promocionais (tazos, cartinhas, figurinhas), favorecem o quê?
45
colecionismo;
42
consumismo;
34
40
35
nenhuma das
afirmações; 24
30
25
20
15
10
5
0
1
A pesquisa apresentou ainda que 70% das pessoas, de uma forma ou de outra,
colecionam algum tipo de objeto.
O projeto de pesquisa determinou o perfil do colecionador, o papel do ato de
colecionar na vida do colecionador e o envolvimento social que esta atividade possibilita.
Considerações Finais
O tema do projeto inicialmente parecia inusitado para ser desenvolvido como projeto
de pesquisa, mas o interesse pelo assunto deu corpo ao projeto de maneira que permitiu um
envolvimento muito grande dos alunos com o assunto bem como os demais colegas de turma
e da escola e familiar, buscando informações, exemplos, relatos e até a troca de objetos, como
forma de aumentar ainda mais as coleções.
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Os resultados obtidos na pesquisa vieram de encontro às hipóteses inicialmente
levantadas nos questionamentos que deixavam dúvidas e criavam discussões a respeito de que
o colecionismo não seria apenas uma atividade de crianças e jovens, adultos também
poderiam estar envolvidos nisso. Além do mais, esta tarefa poderia ser considerada educativa.
Uma grande dúvida ficaria de como defini-la: brincadeira, esporte, hobby ou outra
modalidade.
Dividia as opiniões também, a questão dos produtos promocionais que apresentam
como premiação objetos colecionáveis e que se dirigem diretamente ao público infantil e
juvenil, seriam então as pessoas de opinião a favor disto como um ato de consumismo ou de
colecionismo.
As
atividades
desenvolvidas
durante
o
projeto
permitiram
uma
grande
interdisciplinaridade, com aprendizagem dentro de vários assuntos. Todas as disciplinas, bem
como os temas transversais, colaboraram com o projeto, foi apenas uma questão de
planejamento. Todo o trabalho se desenvolveu de maneira prazerosa e com um grande
envolvimento social.
A tarefa de pesquisar a opinião das pessoas foi esperada com grande ansiedade pelos
alunos, este contato permitiu aprender a respeitar e aceitar a opinião dos demais, mesmo não
concordando com ela.
No decorrer do trabalho se percebeu uma mudança na linguagem, na comunicação dos
alunos, em seus diálogos e colocações, de modo a usar elementos desenvolvidos durante o
projeto. Citando por exemplo, uma conversa dos alunos com um grupo de teatro que se
apresentou na escola, onde o questionamento feito aos artistas se apresentou com qualidade,
demonstrando traços de entrevistadores, deixando os próprios artistas admirados.
Todos os alunos afirmaram que gostaram muito do projeto e ficaram satisfeitos com os
resultados e gostariam de realizar outros.
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Referências Bibliográficas
SOARES, Magda. Português: uma proposta para o letramento: ensino fundamental/
Magda Soares, São Paulo: Moderna, 1999.
RIZZO, Sérgio. O Poder da Telinha. In: Nova Escola, São Paulo: Editora Abril, Ano XIII,
n.118, dez. 1998.
WOLFF, José Roberto A. Silva. O Prazer delas é Colecionar. In: Revista Cláudia, São
Paulo: Editora Abril, 1998.
KAMII, Constance. A criança e o número: implicação da teoria de Piaget para a atuação
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PERRENOUD, Philippe. Dez novas competências para ensinar. Porto Alegre: Artes
Médicas Sul, 2000.
RANGEL, Ana Cristina Souza. Educação matemática e a construção do número pela
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RANGEL, Ana Cristina Souza. Matemática da minha vida: educação infantil. Porto
Alegre: Arte final e Impressão, 2000.
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