O PROCESSO CRIATIVO SOB O PONTO DE VISTA DA
CONFIGURAÇÃO E TRANSFORMAÇÃO DA
EXPRESSÃO GRÁFICA.
Luís Renato do Nascimento
[email protected]
Giselli Tsuchiya Neder
[email protected]
Resumo
Evoluir no processo criativo de forma eficiente, ou seja, sem retrabalho, é
um dos maiores desafios para o designer atualmente. Pesquisas recentes
apontam para problemas de gestão, de falta de conhecimento codificado e
também da interferência do computador nesse processo. No presente
trabalho é feita uma análise da produção de alguns gráficos para o jornal
Diário Catarinense, baseando-se em dois aspectos principais da evolução
da expressão gráfica: configuração e transformação. Como resultado
pode-se perceber que a aplicação de muitas transformações (refinamento)
geram maior retrabalho se a configuração não estiver bem resolvida. Além
disso, a necessidade de um projeto grafico é imprescindível, pois este
indica o nível de evolução que as transformações devem obedecer.
Palavras-chave: design gráfico, infografia, configuração, transformação.
Abstract
Today, one of the most important challenges for designers is to improve the
creative process efficiently, or in another words, with no rework. New
researches indicate management problems, lack of codified knowledge and
also the computer interference in the process. On this presentation, there is
a analysis about the production of some graphics on the Diario Catarinense
newspaper, based on two points: configuration and transformation. As a
result we can notice that the applications of many transformations
(refinement) generates more rework if the configuration was not well
defined. Furthermore the need of a graphic project is essential because it
shows the level of improvement that the transformations must follow.
Keywords: graphic design, infographic, configuration, transformation.
1
Introdução
A evolução no processo criativo passa por muitos estágios e fases que evidenciam
seu desenvolvimento. Conhecer, entender e definir esses estágios é fundamental para
seu adequado gerenciamento. Já é considerável o número de pesquisas que tratam
desse assunto com resultados bastante consistentes. Porém esse conhecimento ainda
não faz parte da cultura dos profissionais do design, onde é possível perceber
dificuldades de comunicação, gerenciamento, avaliação e consequente evolução do
processo.
O presente trabalho traz uma análise do processo criativo sob o ponto de vista da
evolução da configuração e das transformações ocorridas no processo de
desenvolvimento de um gráfico, englobando desde a concepção da ideia até sua
representação final. Toma como estudo de caso, o processo de elaboração de alguns
gráficos para o jornal Diário Catarinense, buscando salientar a evolução desses dois
aspectos, permitindo sua comparação e avaliação.
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Revisão bibliográfica
Um problema bastante recorrente, relatado por professores dos cursos superiores em
design gráfico, dos profissionais no mercado de trabalho e dos estudantes
universitários está em saber como evoluir no processo criativo de seus trabalhos.
Dondis (1997) nomeou como alfabetismo visual a necessidade de conhecimento
necessário à evolução da expressão gráfica. Atualmente existe um conteúdo
significativo de pesquisas que englobam essa problemática e da necessidade do
conhecimento codificado, que garante a melhoria da gestão e consequente evolução
do processo criativo. Destacam-se aqui as pesquisas realizadas por Gomes et. al.
(2010), Gomes et. al. (2009) e Medeiros (2004), as quais refletem essa busca pela
codificação do conhecimento para melhor gerenciamento do processo.
A inserção dos computadores possibilitou inúmeras intervenções no processo, muitas
vezes de forma não linear, aumentando a necessidade de se ter um conhecimento
claro do gerenciamento do processo. Ficou evidente essa necessidade, inclusive pelo
consistente número de pesquisas que surgiram comparando e discutindo as
ferramentas tradicionais de projetação com os meios informatizados, entre elas Nakata
(2003), Carvalho et. al. (2005) e Martino (2007).
No presente trabalho são apresentados dois aspectos da evolução da expressão
gráfica: configuração e transformação. O primeiro parâmetro refere-se à ordenação
espacial dos elementos visuais que compõem a obra. Já as transformações referemse às variações que ocorrem sobre a configuração e indicam o grau de refinamento
desses elementos, através de refinamento no traço, inclusão de cores, luzes e
sombras, etc.
Esse tipo de avaliação pode ser feito em qualquer obra visual que tenha o objetivo de
evoluir nesses dois aspectos. Essas evoluções são infinitas e o que define até onde a
obra deve evoluir muda de acordo com os dois parâmetros. Na transformação a
evolução deve ir de encontro à linguagem estabelecida no projeto gráfico. Já na
configuração a evolução vai de encontro à melhor ordenação espacial possível para
transmitir a mensagem. Esses dois parâmetros neste caso também podem ser
associados à funcionalidade, no caso da configuração, e à estética, no caso da
transformação.
3
Metodologia
A partir dos referenciais teóricos foram realizadas análises dos registros das imagens
da tela do computador, do processo de criação de um infográfico produzido para o
jornal Diário Catarinense.
Depois de finalizado o gráfico essas imagens foram analisadas sob o ponto de vista da
configuração e das transformações ocorridas no processo evolutivo da sua criação,
sob pontos de vista da configuração e transformação dos elementos visuais.
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Passo a passo da criação dos gráficos para o Diário Catarinense
Após terminada a apuração e definido o conteúdo que seria apresentado, o repórter
enviou as informações que comparam o ensino médio em Santa Catarina e Brasil. O
objetivo principal era mostrar o desempenho do Estado em relação ao nacional nos
ítens pesquisados. Com base nessas informações textuais utilizou-se o software
Adobe Illustrator para começar a organizar o conteúdo e ter uma visão mais geral de
todo o material. Nesta fase atribuiu-se um certo grau de transformação com a
utilização das tipografias definidas no projeto gráfico do jornal (Figura 1).
Figura 1: Primeiro registro – informações apresentadas em forma de texto seguindo o padrão
tipográfico do projeto gráfico do Diário Catarinense
Avaliando e interpretando os números percebeu-se que existia a comparação entre SC
e Brasil sob vários aspectos mas a grande maioria em valores de porcentagem, de 0 a
100%. Para análise do presente artigo foi feito o recorte somente sobre esses gráfico
em que o índice variava de 0 a 100%, as outras informações referentes à nota do
IDEB 2011 (notas de 0 a 10) não fazem parte da análise que está descrita no presente
artigo.
A partir daí produziu-se alguns gráficos com auxílio do software Adobe Illustrator e
desenhou-se os 22 gráficos de barra. A ideia era ter uma visão geral do conteúdo,
porém de forma gráfica e não mais textual (Figura 2).
Figura 2: Mudança na configuração – tradução dos textos em gráficos de barra.
Na figura 2 é possível perceber claramente uma evolução de configuração, onde as
informações textuais deram lugar aos gráficos de barra. É importante lembrar que toda
vez que há uma mudança de configuração, automaticamente também acontece a
mudança de transformação, já que esta sempre ocorre sobre a outra. Elas não estão
desvinculadas, a separação desses dois aspectos tem aqui o fim apenas de
comparação para avaliar a evolução.
Introduziu-se algumas mudanças de configuração, colocando-se caixas vazias
(contorno preto) correspondentes aos valores em 100% e, deu-se mais um nível de
transformação, com inclusão de cores. Uma outra mudança de configuração bastante
sutil se deu na disposição dos gráficos de “Taxa de aprovação” (gráficos mais
próximos de 100%) para a direita, além da inclusão dos subtítulos.
Figura 3: Mudanças na configuração – caixas indicando a porcentagem total que poderia ser
alcançada, deslocamento de alguns gráficos e inclusão de subtítulos – e transformação –
inclusão de cores
As transformações de cores obedeceram ao padrão visual estipulado previamente
(figura 4) para a apresentação das informações referentes à campanha “A educação
precisa de respostas”, do grupo RBS.
Figura 4: Parâmetros da evolução da transformação: identidade visual da campanha do grupo
RBS, adotados para a construção dos gráficos.
Uma outra proposta foi pensada utilizando-se uma cor para apresentar as informações
de SC, e o fio preto para apresentar as informações do Brasil. Este caso é um
exemplo claro de mudança sutil de configuração (inclusão do fio) e mudança de
transformação, com a inclusão de fundo cinza, ao inves de contorno nas caixas que
totalizam 100%. O grande diferencial desse nível de evolução para o anterior se deu
na grande redução de elementos visuais, tanto de barras (de 22 para 11) quanto de
cores (figura 5).
Figura 5: Mudança na configuração – inclusão do fio preto para indicar o índice nacional
comparando com as barras de índice estadual.
Como a proporção dos números era muito parecida fez-se novamente uma mudança
de configuração no tamanho dos gráficos, de forma a evidenciar melhor as diferenças
entre os número, o resultado foi o aumento proporcional dos gráficos verticalmente.
Outra mudança de configuração, que também pode ser entendida como uma
transformação da barra em forma de lápis, remetendo ao universo da educação.
Figura 6: Mudança na configuração – inclusão do fio preto para indicar o índice nacional
comparando com as barras de índice estadual.
Um outro problema que surgiu a partir dessa nova configuração foi o paralelismo das
barras que tornou a composição monótona, ocupando um grande espaço sem
informação. Outro problema a ser resolvido era ainda como colocar os números no
gráfico. Em alguns casos como no ítem “alunos fora da escola” o espaço para inclusão
Dessa forma partiu-se para uma nova configuração onde fosse possível apresentar
todos os itens num mesmo gráfico, separando de um lado do lápis (barra) as
informações de SC e do outro Brasil. Porém muitos dos valores eram próximos o que
faria que as informações ficassem sobrepostas.
Figura 7: Mudança drástica na configuração dos elementos, tentando apresentá-los num mesmo
elemento principal.
Esta ação (figura 7) modificou a ênfase e a comparação. Como o objetivo principal não
era a comparação entre os ítens, mas a comparação de um mesmo ítem entre SC e
Brasil, decidiu-se pesquisar um pouco mais em busca de uma solução para este tipo
de problema. Depois de algumas pesquisas encontrou-se a solução da figura 8 para
apresentação da variação de dois dados em porcentagem referentes a um mesmo
item/problema, utilizando-se pouquíssimos elementos e dando a maior ênfase aos
dados relevantes, com o uso de cores e uma caixa preta indicando o valor da variação
entre os dois dados (figura 8).
Figura 8: Referência adotada para a construção do gráfico. Fonte: Alberto Cairo, XXX.
Decidiu-se redesenhar os gráficos adotando a solução proposta na figura 8 para este
tipo de comparação. Com essa nova configuração, executou-se as transformações
necessárias para adequação à apresentação final de acorodo com o projeto gráfico do
jornal Diário Catarinense (Figura 9).
Figura 9: Apresentação final dos gráficos, veiculado na edição impressa do Diário Catarinense.
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Conclusão
Entender as mudanças que se dão num processo criativo é essencial para que haja
um adequado gerenciamento e consequente evolução no processo. Essas mudanças
evidenciam o grau de evolução em torno de um projeto, por isso se justifica a
importância desse conhecimento e dos registros dessa evolução, que contribuem para
a comparação, gestão e avaliação do processo, conduzindo o designer a resultados
eficientes e satisfatórios.
A inserção dos computadores no processo possibilitou inúmeras formas de
manipulação dos projetos e por isso mesmo, a falta de experiência pode levar o
designer a condições de refinamento ou acabamento do projeto sem que questões de
configuração tenham sido resolvidas. O resultado final pode ser muitas vezes de
trabalhos que não atendem às expectativas, tendo que ser refeitos. Wheeler (2008)
afirma que a eliminação de etapas ou reorganização do projeto pode apresentar uma
atraente forma de cortar custos e tempo, porém pode acarretar riscos substanciais e
impedir benefícios a longo prazo e que, quando feito corretamente, pode produzir
resultados extraordinários. Portanto a adequação ao processo amadurece a criação.
Ignorar a metodologia ou o conhecimento codificado é negligenciar o conhecimento
anterior desenvolvido para a melhoria do processo.
Muitas mudanças de transformação logo no início do trabalho mostraram uma certa
imaturidade na interpretação das informações (que foi corrigida ao encontrar a
referência da figura 8) e na condução do processo. O resultado foi de muitas
transformações desenvolvidas e que depois foram descartadas. Por outro lado, as
mudanças de configuração são importantes como busca pelo resultado mais
adequado. Esses resultados talvez pudessem ser melhor resolvidos utilizando-se um
mínimo de recursos de refinamento, como por exemplo o uso de esboços e desenhos
à mão livre como recurso de interpretação para a melhor configuração dos gráficos.
Em nenhum momento haveria a necessidade de se dar acabamento muito refinado a
uma configuração que ainda não estava bem resolvida. Isso só reforça a importância
da pesquisa de referências que possam contribuir para a interpretação dos dados.
A função de um projeto gráfico normalmente é a de definir as transformações que a
criação gráfica deve obedecer. É um instrumento que norteia a criação de forma clara
e objetiva, mostrando qual é o resultado esperado, em termos de transformações de
refinamento gráfico, no final do trabalho. Dar acabamento antes da configuração estar
bem resolvida pode refletir tanto a falta de experiência na gestão do projeto ou até a
falta de um projeto gráfico consistente. Se existe espaço para experimentação do
acabamento é porque esse aspecto não está resolvido dentro de um projeto gráfico.
Esse tipo de comparação se tornou muito útil como ferramenta para a evolução em
busca de um objetivo, além de tornar mais claro a importância de um projeto gráfico
bem definido. Quando o caminho das transformações que deve chegar está claro, o
trabalho concentra-se na interpretação dos dados e de qual seria a melhor
configuração dos elementos visuais, independente do acabamento.
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