PARTE III
APROVEITAMENTOS HIDRÁULICOS
1.
GENERALIDADES...........................................................................................................................3
2.
APROVEITAMENTOS HIDROELÉCTRICOS ...................................................................................3
2.1
CONSTITUIÇÃO ........................................................................................................................3
2.2
BARRAGENS ............................................................................................................................4
2.2.1
TIPOS DE BARRAGENS .......................................................................................................4
2.2.2
CONDICIONANTES DA SELECÇÃO DO TIPO DE BARRAGENS .........................................7
2.2.2.1
CONSIDERAÇOES GERAIS.........................................................................................7
2.2.2.2
TOPOGRAFIA...............................................................................................................7
2.2.2.3
CONDIÇÕES GEOLÓGICAS E GEOTÉCNICAS ...........................................................8
2.2.2.4
MATERIAIS DISPONÍVEIS NO LOCAL .........................................................................9
2.2.2.5
EVACUADOR DE CHEIAS. CAUDAL DE DIMENSIONAMENTO E LOCALIZAÇÃO ......9
2.2.3
2.2.3.1
INTRODUÇÃO ............................................................................................................10
2.2.3.2
SOLICITAÇOES..........................................................................................................11
2.2.3.3
ESTABILIDADE...........................................................................................................17
2.2.3.4
JUNTAS DE CONTRACÇÃO E DE BETONAGEM ......................................................20
2.2.4
BARRAGENS DE GRAVIDADE DE BETÃO COMPACTADO ..............................................20
2.2.5
BARRAGENS DE CONTRAFORTES ..................................................................................21
2.2.6
BARRAGENS-ABÓBADA....................................................................................................24
2.2.7
BARRAGENS DE ATERRO.................................................................................................28
2.2.7.1
CONDIÇÕES DA APLICAÇÃO - VANTAGENS E DESVANTAGENS ..........................28
2.2.7.2
TIPOS BÁSICOS DE BARRAGENS DE TERRA E DISPOSIÇÕES A ADOPTAR ........29
2.2.7.3
TIPOS DE BARRAGENS DE ENROCAMENTO DISPOSIÇÕES A ADOPTAR ............31
2.2.7.4
ESTABILIDADE DO ATERRO E DA FUNDAÇÃO DE BARRAGENS DE ATERRO......35
2.2.7.5
LIGAÇÃO DE BARRAGENS DE TERRA A ESTRUTURAS DE BETÃO.......................36
2.3
3.
BARRAGENS DE GRAVIDADE...........................................................................................10
DESCARREGADORES ...........................................................................................................38
2.3.1
CONSIDERAÇÕES GERAIS ...............................................................................................38
2.3.2
CONDICIONAMENTOS PRINCIPAIS ..................................................................................46
2.3.3
TIPOS DE EVACUADORES DE CHEIAS ............................................................................48
2.3.4
TIPOS DE EVACUADORES DE CHEIAS NAS PEQUENAS BARRAGENS .........................49
2.3.5
CANAL DE DESCARGA......................................................................................................51
2.4
DESCARGAS DE FUNDO E TOMADA DE ÁGUA ...................................................................53
2.5
CÂMARAS DE CARGA............................................................................................................56
2.6
BACIAS DE DISSIPAÇÃO .......................................................................................................57
APROVEITAMENTOS HIDROAGRÍCOLAS ...................................................................................58
2
1. GENERALIDADES
Aproveitamentos hidráulicos são todos os aproveitamentos cuja realização se baseia na utilização
da água. Podem referir-se:
- Aproveitamentos para abastecimento de água;
- Aproveitamentos hidroeléctricos;
- Aproveitamentos hidroagrícolas;
- Aproveitamentos de fins múltiplos.
Existem ainda armazenamentos para regularização de caudais, para fins recreativos, para controlo
climático, etc.
Os aproveitamentos para abastecimento de água, foram estudados com detalhe na disciplina de
Hidráulica Aplicada I.
Os aproveitamentos hidroeléctricos e os aproveitamentos hidroagrícolas são, em geral
aproveitamentos mais vultosos e desenvolvem-se nos pontos seguintes.
Os aproveitamentos de fins múltiplos têm, como o próprio nome indica, diversos fins tais como: o
abastecimento de água, a produção de energia eléctrica, a rega e actividades recreativas, podendo
ser cobertos todos os fins ou apenas alguns deles. Estas diferentes actividades devem ter tomadas
de água e derivações independentes. A gestão integrada dos recursos disponíveis deve conciliar os
diferentes interesses. Em geral dá-se prioridade aos abastecimentos de água e à rega.
2. APROVEITAMENTOS HIDROELÉCTRICOS
2.1 CONSTITUIÇÃO
Os aproveitamentos hidroeléctricos compreendem um conjunto de elementos que permitem
utilizar determinado caudal num curso de água, conduzindo-o a grupos turbo-alternadores onde a
energia hidráulica correspondente ao desnível entre a tomada de água e a restituição é
transformada em energia eléctrica.
Um aproveitamento hidroeléctrico é, geralmente, constituído pelas seguintes obras:
- Obra de retenção - barragem ou açude que dá origem a um reservatório a céu aberto – albufeira.
- Órgãos de segurança – descarregadores principais ou secundários
3
- Descargas de fundo – para esvaziar a albufeira, se necessário;
- Tomada de água – órgão de ligação entre a albufeira e o circuito hidráulico;
- Circuito hidráulico – constituído pelo canal de derivação, câmara de carga, conduta(s) forçada(s);
- Restituição – retorno ao curso de água;
- Central – constituída pelas turbinas (acopladas a alternadores), comandos e serviços auxiliares.
- PT, Subestação e parque de linhas para ligação à rede geral do País.
Constituem órgãos complementares:
•
Chaminé de equilíbrio – para protecção contra o choque hidráulico;
•
Eclusa de navegação;
•
Eclusa de peixes.
2.2 BARRAGENS
2.2.1
TIPOS DE BARRAGENS
Existem diferentes critérios para a classificação de barragens, sendo frequente os que se baseiam
na importância, na finalidade principal e nos materiais e tipos de estrutura.
No que respeita à sua importância, as barragens podem classificar-se em pequenas e grandes
barragens. A Comissão Internacional das Grandes Barragens classifica como grande barragem:
Ø - uma barragem com mais de 15 m de altura contada desde o ponto mais baixo da fundação
até ao coroamento;
Ø - uma barragem com altura entre 10 e 15 m, desde que se verifique uma das seguintes
condições:
•
- o desenvolvimento do coroamento é superior a 150 m;
•
- o volume armazenado é maior ou igual a um milhão de m 3;
•
- o caudal de ponta de cheia é superior a de 2000 m3/s;
•
- existem problemas especiais de fundação;
•
- a barragem é de projecto não convencional.
4
Poderão, assim, considerar-se pequenas barragens as que não cabem na classificação anterior.
Tendo em conta a finalidade principal para que foram previstas as barragens podem classificar-se
em:
•
barragens para criar albufeiras,
•
barragens de derivação,
•
barragens de detenção
•
barragens de fins múltiplos.
As barragens para criar albufeiras visam permitir o armazenamento da água afluente em excesso
em épocas húmidas, para ser utilizada em períodos secos.
As barragens de derivação destinam-se a criar condições para captar água para canais ou condutas
para usos muito diversos como o consumo público, a rega e a produção de energia eléctrica sem
criar albufeiras de regularização, são os chamados aproveitamentos a fio de água.
As barragens de detenção visam reter grande parte do material sólido afluente ou deter
temporariamente as cheias, evacuando um caudal máximo compatível com a capacidade de
transporte do leito existente a jusante, e evitando a inundação de determinadas zonas. Estas
barragens podem ainda ter estes dois objectivos em simultâneo.
Nas barragens de fins múltiplos verifica-se a coexistência de diferentes objectivos, sem que a
importância de qualquer deles se sobreponha.
Quanto aos materiais e estrutura, as barragens podem classificar-se nos seguintes tipos:
•
Barragens de betão (e menos frequentemente de alvenaria) que podem ser:
- de gravidade;
- abóbada;
- de contrafortes.
•
Barragens de aterro que podem ser:
- de terra;
- de enrocamento.
Algumas barragens têm trechos de betão e de aterro.
Nas Figura 1 e 2 dão-se exemplos de perfis transversais de barragens de betão e de aterro.
As barragens de gravidade, que são construídas de betão (e menos frequentemente de alvenaria),
têm a estabilidade assegurada pelo peso próprio. O seu perfil transversal é aproximadamente
triangular, com o paramento de montante vertical ou subvertical.
5
As barragens-abóbada apresentam curvatura para montante com a finalidade de transmitir o efeito
da pressão hidrostática à fundação e aos encontros, tirando partido da resistência dos arcos à
compressão e permitindo, assim, substancial redução do volume de betão em relação a barragens
de gravidade.
Barragem de gravidade
Barragem de abóbada
Barragem de contrafortes
Figura 1 – Barragens de betão
Figura 2 - Barragem de terra – perfil transversal
As barragens de arco-gravidade são barragens abóbada muito espessas com pequena contribuição
do efeito dos arcos.
As barragens de contrafortes apresentam uma estrutura contínua a montante, que assegura a
estanquidade, suportada a jusante por elementos descontínuos – os contrafortes.
6
As barragens de aterro são o tipo mais comum de barragem. A construção do corpo da barragem
faz-se utilizando unicamente materiais no estado natural, geralmente explorados próximo do local,
sem a adição de materiais aglutinantes e com um mínimo de intervenção humana.
As barragens de aterro requerem condições geo1ógicas e geotécnicas de fundação menos exigentes
que as das barragens de outros tipos.
É assim possível construir barragens de aterro em locais não propícios à construção de outras
barragens.
Uma barragem de aterro classifica-se como de terra se o seu corpo é constituído em mais de 50%
por solo compactado. As barragens de terra podem ser homogéneas ou zonadas.
As barragens de enrocamento são constituídas por maciços de materiais granulados (particulados
de dimensões variáveis e com permeabilidade global significativa), que asseguram a estabilidade,
e por uma zona impermeável. Esta última pode ser constituída por uma cortina sobre o paramento
de montante (de betão armado, betão asfáltico, chapa de aço ou outro material impermeável) ou
por um núcleo impermeável, mais frequentemente constituído por solo.
Uma barragem de aterro é classificada como de enrocamento se mais de 50% do volume do seu
corpo for constituído por enrocamento.
2.2.2 CONDICIONANTES DA SELECÇÃO DO TIPO DE BARRAGENS
2.2.2.1 CONSIDERAÇOES GERAIS
A escolha do tipo de barragem a implantar num determinado local baseia-se sobretudo em critérios
económicos e, em geral, é decidida após a definição preliminar de várias soluções de barragem e a
obtenção das respectivas estimativas de custo.
É evidente, que projectistas experientes poderão, em certos casos, apontar o tipo de barragem
aconselhável, sem se basear na definição de outras soluções.
Deve notar-se que a solução mais económica tem de considerar não só a barragem propriamente
dita, mas também as obras acessórias, como o evacuador de cheias, descarga de fundo, tomada de
água, centrais hidroeléctricas, se existirem, e as obras de desvio provisório durante a construção.
Os principais condicionamentos da escolha do tipo de barragem são analisados de seguida.
2.2.2.2 TOPOGRAFIA
A topografia do local é um dos factores mais importantes numa primeira escolha do tipo de
barragem.
7
Uma barragem alta a construir num vale estreito e rochoso, será provavelmente de betão, com o
evacuador de cheias, a descarga de fundo e a tomada de água (ou pelo menos alguns destes órgãos)
incorporados na barragem.
Uma barragem a construir num vale largo poderá ser de aterro, com o evacuador de cheias
independente do corpo da barragem, podendo, porém, ser mais favorável uma solução de barragem
de betão, de gravidade ou de contrafortes.
A localização do evacuador de cheias é um factor importante para a escolha do tipo de barragem,
fortemente condicionado pela topografia do local.
2.2.2.3 CONDIÇÕES GEOLÓGICAS E GEOTÉCNICAS
As condições de fundação dependem das características geológicas e geotécnicas das formações
ocorrentes. No caso de formações rochosas, terá de ter-se em conta o estado de alteração a
fracturação (altitude e espaçamento), a permeabilidade e a deformabilidade; no caso de solos, a
permeabilidade, a erodibilidade, a deformabilidade e a resistência mecânica.
Para uma dada altura de uma barragem, as condições geotécnicas poderão admitir qualquer tipo de
estrutura e, para alturas maiores, implicar a rejeição de alguns tipos.
As diferentes formações mais correntemente encontradas para a fundação apresentam os seguintes
condicionamentos (segundo o BUREAU OF RECLAMATION 1974):
Rocha sã - Devido à elevada resistência mecânica e à dificuldade de percolação e de erosão
interna, as fundações de rocha sã poucas limitações oferecem para qualquer tipo de barragem. No
entanto, é necessária a remoção da rocha decomposta, sendo frequente em grandes barragens
atingir-se uma profundidade de escavação de 10 m. Nas grandes barragens, é em geral necessário
injectar as fracturas da rocha.
Seixos – Fundações de seixos, se compactas, são adequadas para barragens de aterro (terra ou
enrocamento) e barragens de gravidade de pequena altura. Precauções têm de ser tomadas
relativamente à erosão interna.
Siltes e areias finas - Formações de siltes e areias finas podem ser usadas para barragens de
gravidade de pequena altura e barragens de terra, podendo pôr problemas nas de enrocamento. As
preocupações principais são os assentamentos, a percolação excessiva, a erosão interna da
fundação e, no caso de areias pouco compactas em zonas sísmicas, a liquefacção.
Argilas - Fundações de argila permitem a adopção de barragens de terra, mas requerem tratamento
especial. Dando lugar a consideráveis assentamentos, especialmente se a argila é não consolidada
8
e contém elevada percentagem de humidade, não são adequadas para suportar barragens de betão,
nem de enrocamento.
Para ilustrar como o tipo de barragem influi na tensão máxima transmitida à fundação THOMAS
(1979) indica os valores dessa tensão para barragens de100 m de altura:
- Barragem de gravidade: 3 a 4 MPa;
- Barragem de contrafortes: 5 a 7 MPa;
- Barragem-abóbada: 7 a 10 MPa.
2.2.2.4 MATERIAIS DISPONÍVEIS NO LOCAL
Os materiais necessários para a construção de barragens que deverão estar disponíveis no local ou
relativamente próximo são:
- Solos para aterros,
- Rocha para enrocamentos e protecções (riprap),
- Agregados para betão (areia, seixo e britas).
A distância de transporte de solos ou de enrocamentos para barragens de aterro pode ter
importância decisiva na escolha do tipo de barragem.
2.2.2.5 EVACUADOR DE CHEIAS. CAUDAL DE DIMENSIONAMENTO E LOCALIZAÇÃO
O evacuador de cheias pode representar uma parcela importante do custo da barragem e obras
acessórias.
Os condicionamentos impostos ao evacuador de cheias agravam-se com o aumento do caudal de
dimensionamento Esses condicionamentos respeitam à estrutura do evacuador e às condições
topográficas e geotécnicas para a sua implantação.
Não podem aceitar-se assentamentos diferenciais do evacuador de cheias que ponham em perigo a
obra.
Nalguns casos, a possibilidade de incorporar numa barragem de betão o evacuador de cheias (e
outras obras acessórias) pode aconselhar esse tipo de barragem.
Evacuadores de cheias com a estrutura sobre aterros de barragens de terra ou de enrocamento são
de evitar, sendo só admissíveis excepcionalmente em barragens de muito pequena altura.
Com efeito, são inevitáveis assentamentos diferenciais do aterro sobre o qual assentaria o
evacuador após a actuação da carga hidrostática correspondente à albufeira cheia.
9
Tais assentamentos teriam os seguintes inconvenientes: poderiam dar lugar ao arrastamento do
material do aterro por fugas de água através de fissuras e juntas do betão e ao levantamento de
lajes da estrutura em resultado da actuação de elevadas pressões hidrodinâmicas, quando o
escoamento sobre o evacuador encontrasse lajes desalinhadas.
As soluções de evacuadores de cheias compatíveis com barragens de aterro são as de canal a céu
aberto, nos encontros ou em portelas laterais, ou de evacuadores em poço, seguidos de galerias
escavadas na rocha ou construídas em betão a céu aberto e cobertas por aterro.
2.2.3
BARRAGENS DE GRAVIDADE
2.2.3.1 Introdução
As barragens de gravidade têm a estabilidade em relação ao derrubamento e ao deslizamento
assegurada pela acção do peso próprio.
Uma barragem de gravidade de betão com fundação adequada e convenientemente projectada e
construída é uma estrutura com baixos custos de manutenção e elevada fiabilidade
As barragens de gravidade de betão são particularmente adequadas para permitir a passagem de
cheias sobre elas, podendo os evacuadores de cheias, do tipo de superfície, ser integrados na
própria barragem, frequentemente nos troços correspondentes ao leito menor do rio. Também a
descarga de fundo e obras de desvio provisório podem ser facilmente integradas naquelas
barragens.
Quando o circuito hidráulico de derivação para a central hidroeléctrica assim o permite, é possível
construir centrais de pé de barragem, ou mesmo centrais no interior da barragem - Figura 3.
Existem exemplos de centrais de pé de barragem situadas por baixo do trampolim do evacuador de
cheias.
Figura 3 – Barragem de Idanha
10
O método de cálculo de estabilidade considera a fundação como rígida. No caso de grandes
barragens com fundação deformável podem justificar-se cálculos de análise de resistência da
barragem por métodos elaborados nomeadamente o dos elementos finitos. Este método
originalmente desenvolvido para análise a duas dimensões permite a análise tridimensional.
Sendo a construção de barragens de gravidade uma actividade multimilenária (exercida desde
1000 a 2000 a. C.), é natural que os critérios de construção e, posteriormente, de cálculo tenham
evoluído consideravelmente. Desta evolução importa salientar o critério de Maurice Levy,
apresentado em 1895 à Academia de Ciências de Paris: em qualquer ponto do paramento de
montante de uma barragem de gravidade a tensão de compressão (não entrando em conta com a
subpressão) deve ser superior à pressão hidrostática nesse ponto.
Esta condição é equivalente à de se não verificarem tracções em qualquer ponto do paramento de
montante, quando se tem em conta a subpressão como solicitação.
2.2.3.2
SOLICITAÇOES
CONSIDERAÇOES PRÉVIAS
As solicitações a que se pode encontrar submetida uma barragem de gravidade, Figura 4, dividemse em dois grupos:
Ø As que são directamente calculáveis pelas leis da hidrostática e hidrodinâmica e pelo
conhecimento dos pesos volúmicos dos materiais;
Ø As que dependem das disposições construtivas da barragem e da localização da barragem;
Em relação ao primeiro grupo, há a considerar;
•
Forças horizontais e verticais acima da fundação devidas à água;
•
Peso próprio do equipamento instalado;
•
Forças de reacção verticais e horizontais na fundação.
No segundo grupo incluem-se as seguintes forças:
•
Forças de subpressão na fundação;
•
Impulsos devidos aos sedimentos depositados na albufeira;
•
Forças devidas ao gelo;
•
Forças sísmicas;
•
Forças devidas a cheias catastróficas (eventualmente, galgamento de barragem).
11
Figura 4 - Solicitações em barragens de gravidade
As forças incluídas no primeiro grupo foram objecto de estudo em disciplinas anteriores, pelo que
a sua avaliação não será mencionada a seguir.
Em relação às forças que se incluem no segundo grupo, apenas as forças de subpressão, as forças
exercidas pelos sedimentos finos e as forças sísmicas serão objecto de desenvolvimento no
subcapítulo seguinte.
FORÇAS DE SUBPRESSÃO
A quantificação da subpressão é matéria de alguma controvérsia.
Medições efectuadas em barragens construídas confirmam a existência de subpressões não só na
base das barragens, como também em planos superiores ao longo dos quais a água penetrou ao
longo do tempo.
É habitual admitir, para efeitos de projecto, que a variação da subpressão entre as cargas
hidrostáticas a montante e a jusante é linear, ao longo de um perfil horizontal de fundação. Esta
hipótese corresponde a admitir uma fundação rochosa uniformemente fissurada ou um solo
permeável homogéneo, o que é difícil de conceber em zonas de extensão considerável, como o são
as de fundação de barragens de gravidade, ainda que de pequena altura.
No entanto, esta hipótese é correntemente aceite, pois qualquer outra formulação pode suscitar
objecções da mesma índole.
Quando o terreno de fundação for aproximadamente homogéneo o traçado da rede de percolação é
o método mais rigoroso para determinar o diagrama de subpressão.
12
Para diminuir o valor das subpressões, que como se verá subsequentemente conduzem a perfis
transversais de maiores espessuras, e, portanto, mais dispendiosos, é normal criar disposições para
a drenagem na fundação da barragem.
Em barragens de gravidade de betão tais disposições são constituídas por uma galeria de
drenagem, de onde partem drenos que penetram na fundação – Figura 5.
O diagrama da subpressão que passa a existir na fundação, quando forem executados drenos, é
estabelecido caso a caso, em função da barragem e das condições de drenagem. Considera-se
frequentemente um diagrama com dois trechos rectilíneos de acordo com a Figura 5, em que o
valor de K depende da eficiência da drenagem. O U.S. Corps of Engineers considera valores de K
compreendidos entre 0,25 e 0,50. Condições de fundação especiais podem exigir valores de K
superiores a 0,50.
Figura 5 - Diagrama da subpressão na fundação de uma barragem de gravidade com sistema de
drenagem
A água afluente à galeria é posteriormente bombada para jusante ou, se as cotas da galeria e do
nível de água a jusante o permitirem, escoa-se por gravidade.
O não funcionamento do sistema de drenagem conduz a situações de solicitação excepcionais às
quais a barragem deverá ainda resistir.
A fracturação da rocha de fundação pode dar origem a uma distribuição da subpressão bastante
mais desfavorável para a estabi1idade da barragem (ou do conjunto da barragem e de uma zona da
fundação) do que a variação linear. É o caso da existência de uma fractura preenchida por material
de elevada permeabilidade (ao longo da qual praticamente não diminui a carga hidráulica do
escoamento de percolação), ligada a outra de muito baixa permeabilidade (em que se dissipa a
13
totalidade da diferença entre as cargas hidrostáticas a montante e a jusante) -Figura 6. Por este
efeito, a barragem e a cunha de fundação subjacente poderão ter a estabilidade comprometida.
Figura 6 - Instabilidade do conjunto barragem e fundação com fracturas devido à subpressão
Assim, as injecções para tratamento da fundação e os furos de drenagem são quase sempre
praticados em grandes barragens de gravidade, com o que se evita o efeito anterior, ainda que as
fracturas não tenham sido detectadas no reconhecimento geotécnico. Em pequenas barragens, é
recomendável a realização de furos de drenagem.
FORÇAS DE SEDIMENTOS FINOS
Quando existe uma albufeira, os sedimentos transportados pelo curso de água vão-se depositando
ao longo da albufeira, por ordem decrescente das suas dimensões. Os sedimentos mais finos
podem acumular-se junto da barragem e exercer impulsões no paramento de montante.
As descargas de fundo de albufeiras profundas só, localmente, reduzem a acumulação de
sedimentos.
Muitas barragens têm sido, porém, dimensionadas sem ter em conta a carga dos sedimentos finos.
Em certos casos existe fundamento para desprezar essa carga: inicialmente o depósito de
sedimentos praticamente não existe e com o tempo, quando poderia passar a ter significado, os
sedimentos finos consolidam-se e deixam de se comportar como fluidos.
A acção dos sedimentos finos pode ser considerada, combinando a força resultante da pressão
hidrostática com a componente horizontal da carga de sedimentos determinada pela fórmula de
Rankine (desprezando a coesão):
14
γ s h 2  1 − senφ 

H=

2  1 + senφ 
γs. - Peso volúmico submerso do material dos sedimentos;
h - Altura dos sedimentos a montante sobre a base da barragem;
φ - Ângulo de atrito interno.
1.3.2.4 -FORÇAS SÍSMICAS
1.3.2.4.1 -Considerações gerais
Os sismos transmitem acelerações às barragens que diminuem a estabilidade das mesmas. Quer as
acelerações horizontais, quer as acelerações verticais, devem ser aplicadas segundo o sentido que
se mostrar mais desfavorável.
Na condição de a albufeira estar cheia, as situações mais desfavoráveis correspondem a
deslocações da fundação para montante e para baixo. O movimento para montante aumenta os
impulsos exercidos pela água e pelos sedimentos em contacto com a barragem e origina uma força
de inércia associada à massa da barragem, enquanto o movimento descendente diminui o peso da
barragem e da água situada sobre os paramentos inclinados. Qualquer destes efeitos é naturalmente
desfavorável do ponto de vista da estabilidade.
Os regulamentos do projecto de estruturas definem zonas com diferentes riscos sísmicos a que
estão associados valores das acelerações sísmicas, horizontais e verticais, no substrato rochoso. Os
coeficientes sísmicos dependem desses valores e das características das estruturas.
FORÇAS SÍSMICAS HORIZONTAIS
Na análise da estabilidade da secção transversal duma barragem, a força de inércia associada à
massa da barragem é aplicada ao centro de massa da referida secção independentemente da forma
desta.
O aumento de pressão da água no paramento de montante num ponto à distância y da superfície
livre é obtido por:
P=Cλγh em que,
C – coeficiente adimensional que traduz a distribuição e valor das pressões definido por:
C=
Cm  y 
y
 2 − +
2  h 
h
y
y 
 2 −   com,
h
h  
15
λ - quociente entre aceleração do sismo e a aceleração da gravidade;
γ - peso volúmico da água;
h – altura da água a montante sobre a base da barragem;
Cm – máximo valor de C, função do declive do paramento de montante – Figura 7.
Figura 7 - Coeficiente de pressão máxima e de pressão na base, para paramentos de declive
constante
Pode demonstrar-se analiticamente que a força horizontal total Hm acima de um ponto situado à
distância y da superfície livre e o respectivo momento derrubante, Mm, em relação ao mesmo
ponto são obtidos por:
Hm=0.726 Pm y
Mm=0.299 Pmy2
Para barragens com paramento de montante constituído por um troço inclinado e um troço vertical,
o procedimento a observar é o seguinte:
Ø Se a altura do troço vertical é superior ou igual a metade da altura total da barragem,
considera-se, para efeito de cálculo das pressões devidas a sismos, como se todo fosse
vertical;
Ø Caso contrário, considera-se um paramento imaginário resultante da união linear dos
pontos de intersecção do paramento com a superfície livre e com o leito.
FORÇAS SÍSMICAS VERTICAIS
Neste caso, quer o peso da barragem, quer o peso da água situada sobre os paramentos devem ser
modificados de acordo com a aceleração vertical adaptada.
16
2.2.3.3
ESTABILIDADE
DEFINIÇÃO DO PROBLEMA
Definidas as solicitações actuantes numa barragem de gravidade, para diferentes situações, tornase necessário determinar as tensões e os deslocamentos em qualquer ponto da estrutura e analisar a
estabilidade da barragem em relação ao deslizamento.
A análise de tensões e de deslocamentos, em barragens de grande altura, pode ser realizada pelo
método dos elementos finitos, que permite ter em conta a deformabilidade da fundação.
Em pequenas barragens sobre fundação que se possa considerar rígida, é suficiente calcular as
tensões verticais na secção da fundação e verificar a estabilidade ao deslizamento.
REACÇÃO DA FUNDAÇÃO
Em condições de estabilidade (solicitações não dinâmicas), a resultante das cargas verticais e
horizontais transmitidas pela barragem à fundação é equilibrada pela reacção desta.
O diagrama das tensões verticais de reacção da fundação - Figura 8(b) - é calculado excluindo-se a
subpressão das forças actuantes pelas fórmulas da compressão excêntrica.
A1 =
∑ V 1 − 6e 
B2 =
∑ V 1 + 6e 
L 
L 
L
L
Se a esse diagrama se subtrair o da subpressão definido no caso da Figura 8(c), pela variação linear
entre as cargas hidrostáticas nas extremidades da fundação, obtém-se o diagrama de tensões
efectivas verticais, de reacção.
Se, porém, a subpressão a montante exceder a tensão de reacção vertical, a tensão efectiva
correspondente é de tracção, a que a fundação é suposto, não resistir. Considera-se então que se
abre uma fenda na fundação, na zona em que as tensões efectivas seriam de tracção ao longo da
qual se instala uma subpressão constante e igual à carga hidrostática a montante - Figura 8(e).
O diagrama de tensões verticais de reacção apresenta neste caso um patamar, correspondente à
carga hidrostática a montante, e o valor B5 na extremidade de jusante. O valor B5 e o
comprimento do patamar são determinados pelas condições seguintes:
- a resultante do diagrama de tensões verticais de reacção iguala a resultante das solicitações
verticais, excluída a subpressão
17
∑V = A L + (B
3
5
− A3 )
L1
2
- o momento das tensões de reacção em relação ao centro de massa da fundação iguala o momento
das solicitações (excluída a subpressão)
(∑V − A L)e
3
1
=M
Figura 8 - Barragem de gravidade – Diagramas de subpressão e tensões na fundação
Obtido el -definido na Figura 8(a) - pode calcular-se Ll por considerações geométricas.
L

L1 = 3 − e1 
2

e, finalmente, B5, por recurso à primeira fórmula atrás apresentada
B5 =
2(∑ V − A3 xL )
L1
+ A3
É prática corrente não admitir tracções (em termos de tensões efectivas) em qualquer ponto do
paramento de montante, o que equivale a impor que a resultante das forças actuantes (incluída a
18
subpressão) acima de qualquer secção horizontal, tenha o ponto de aplicação dentro do núcleo
central dessa secção. Isto deve-se a que não sendo o betão um material com resistência apreciável
à tracção se poderiam produzir fendas devidas às tracções onde se instalariam subpressões que
contribuiriam para a instabilidade e para aumentar a progressão dessas mesmas fendas.
Igualmente se deve verificar que não sejam ultrapassadas na extremidade de jusante, as tensões de
compressão admissíveis para o betão utilizado, ou para a fundação.
DERRUBAMENTO
Devido às solicitações da pressão hidrostática e da subpressão, a barragem pode ter tendência para
rodar em torno da extremidade de jusante da fundação.
Para que a barragem não seja derrubada, o ponto de aplicação da resultante das forças actuantes
deverá situar-se a montante daquela extremidade.
A não admissibilidade de tracções a montante implica que a resultante das forças actuantes
(incluída a subpressão) passe pelo terço central da fundação, o que representa uma reserva de
segurança em relação à condição anteriormente mencionada. Assim, não é necessário verificar a
estabilidade de barragens de gravidade em relação ao derrubamento.
DESLIZAMENTO
A resultante das solicitações horizontais tende a deslocar a barragem para jusante, o que é
contrariado pelas forças tangenciais de atrito e de coesão no contacto betão-fundação.
Se a barragem for fundada em rocha, as forças de coesão não costumam ser consideradas. Sendo a
superfície de fundação sempre irregular, existem forças de corte que podem ser significativas, mas
de difícil quantificação. Assim, em barragens de gravidade de betão fundadas sobre rocha
considera-se que está assegurada a estabilidade em relação ao deslizamento desde que se verifique
a condição
( ∑ V − S ) tgφ > ∑ H
Em que φ é o ângulo de atrito entre o betão e a fundação e S é a força de subpressão na fundação,
sendo portanto as forças de coesão e de corte consideradas como reserva de segurança.
O coeficiente de atrito betão-rocha toma normalmente valores compreendidos entre 0,65 e 0,75.
19
2.2.3.4
JUNTAS DE CONTRACÇÃO E DE BETONAGEM
Se o desenvolvimento de uma barragem de gravidade de betão exceder significativamente 15 m (o
que será habitual), é necessário dividir a estrutura por juntas transversais para atender à retracção
do betão (juntas de contracção).
O espaçamento das juntas é determinado em função da capacidade da central de betonagem, das
características do betão utilizado e do equipamento utilizado na sua colocação.
Em barragens de pequena altura as juntas são seladas por perfis de estanquidade metálicos de
borracha ou de PVC, colocados durante a betonagem junto ao paramento de montante -Figura 9.
Figura 9 – Perfil de estanquidade numa junta de contracção
Nas grandes barragens, recorre-se à injecção das juntas com calda de cimento no final da
construção para o que, além de colocar perfis de estanquidade junto aos paramentos de montante e
jusante se deverá instalar, durante a betonagem os dispositivos necessários para fazer chegar a
calda de cimento a toda a junta.
Os blocos entre juntas de contracção são betonados por camadas de cerca de 1.5 a 2 m de
espessura, sendo necessário um intervalo de tempo entre a betonagem de duas camadas sucessivas
que permita a dissipação do calor de hidratação do cimento. Dadas as grandes massas de betão
envolvidas em certos casos, é arrefecida a água de amassadura ou os próprios inertes, ou são
previstos circuitos de refrigeração perdidos no betão.
2.2.4 BARRAGENS DE GRAVIDADE DE BETÃO COMPACTADO
O betão compactado é o material resultante de um processo de construção que combina as técnicas
económicas e rápidas, de colocação de aterros com as excelentes propriedades do betão,
nomeadamente a resistência e a durabilidade. É colocado nas barragens de gravidade em camadas
contínuas de grande área, sendo compactado por cilindros, vibradores ou não, em vez dos
vibradores clássicos imersos no betão.
Os teores de água e de cimento são mais baixos do que na construção clássica, o que reduz o calor
libertado pela hidratação do cimento e permite além de eliminar ou diminuir o número de juntas
20
transversais e dispensar instalações de refrigeração do betão, facilitar a colocação do betão e
progredir mais rapidamente em altura.
O betão compactado reduz o custo de barragens de gravidade em virtude de permitir diminuir a
mão de obra, o período necessário para construção (e consequentemente os correspondentes
encargos financeiros), a quantidade de cimento utilizado e, nalguns casos, eliminar os próprios
moldes dos paramentos de montante e de jusante.
A utilização do betão compactado em barragens de gravidade iniciou-se nos anos sessenta, tendo
depois dado lugar a muitas barragens, em vários países, a mais alta de 100 m, mas em especial nos
E.U.A. e no Japão, que utilizam técnicas e critérios diferentes.
2.2.5 BARRAGENS DE CONTRAFORTES
O perfil transversal de uma barragem de gravidade capaz de assegurar a estabilidade contra o
deslizamento e o derrubamento é determinado pelo respectivo peso próprio e, portanto, pelo
volume de material utilizado. O peso próprio terá de contrabalançar os efeitos destabilizadores da
impulsão hidrostática e da subpressão, que inevitavelmente actua numa área vasta. As tensões no
betão são muito inferiores às da capacidade de resistência respectiva.
As barragens de contrafortes, que consistem de elementos impermeáveis a montante e de
elementos descontínuos a jusante, os contrafortes, têm, como ilustra a Figura 10, as seguintes
vantagens sobre as barragens de gravidade maciças:
Ø Reduzem a subpressão;
Ø Mobilizam como força estabilizadora o peso da água acima do paramento de montante;
Ø Utilizam uma maior fracção da capacidade de resistência do betão.
Figura 10 - Barragens de contrafortes. Efeito da redução da subpressão e do peso da água acima do
paramento de montante.
21
Os principais tipos de barragens de contrafortes (Figura 11) são:
- Barragens de lajes e contrafortes -Figura 11 (a) - em que as lajes são de betão armado, inclinadas
de cerca de 45º e podem estar apoiadas ou encastradas nos contrafortes;
- Barragens de contrafortes de cabeça espessa - Figura 11(b), (c) e (d) - que pode ser em tê,
arredondada e em diamante; as formas arredondada e em diamante procuram transferir a pressão
hidrostática para forças axiais sobre os contrafortes, com eliminação ou redução da tracção nas
respectivas cabeças; as geratrizes do paramento de montante formam um ângulo com a horizontal
próximo de 60º.
- Barragens de contrafortes ocos ou barragens de gravidade celulares -Figura 11(e) - que são
essencialmente constituídas por contrafortes de cabeça espessa e de alma oca ou são barragens de
gravidade com um vazio interior; no caso de contrafortes, as geratrizes do paramento de montante
formam ângulos com a horizontal variando entre cerca de 65º e 90º.
- Barragens de abóbadas múltiplas -Figura 11(f) que, no caso de abóbadas cilíndricas, têm as
geratrizes formando ângulos de cerca de 45º com a horizontal; as abóbadas exercem forças axiais
nos contrafortes por se anularem as componentes transversais.
22
Figura 11 - Barragens de contrafortes: contrafortes e lajes (a), contrafortes de cabeça em tê (b), em
diamante (c) ou arredondada (d), contrafortes ocos (e) e arcos múltiplos (f).
As barragens de contrafortes permitem uma substancial redução do volume de betão em relação às
barragens de gravidade. No entanto, o custo da unidade de volume do betão é muito superior,
devido à muito maior incidência da cofragem. Esse custo unitário é ainda mais elevado no caso de
barragens de abóbadas múltiplas. Segundo THOMAS 1979, a percentagem do volume de
barragens de contrafortes em relação ao de barragens de gravidade varia consoante a configuração
do local de implantação. Para uma altura de cerca de 20 m, o volume de betão exigido por uma
barragem de contrafortes e lajes será da ordem de 40% do que requer uma barragem de gravidade;
para uma barragem de contrafortes de cabeça espessa, ter-se-á um valor de 60% a 75% e, para uma
barragem de abóbada múltiplas, um valor de 30% para alturas até 40 m, podendo atingir cerca de
70% para uma altura de 150 m.
As barragens de contrafortes têm ainda as seguintes vantagens:
23
Ø A colocação de menores volumes de betão e a maior área superficial, que favorece a
dissipação do calor de hidratação do cimento, possibilitam a execução mais rápida;
Ø A constituição da barragem por elementos independentes favorece a adaptação da estrutura
a assentamentos da fundação;
Ø Tal como as barragens de gravidade, as barragens de contrafortes permitem construir o
evacuador de cheias sobre a barragem (só na zona da alma dos contrafortes, no caso de
arcos múltiplos) e o galgamento durante a construção.
Para constituir o paramento do evacuador de cheias, as caudas das almas dos contrafortes são
alargadas de forma a dar lugar a um paramento contínuo - Figura 12.
Figura 12 – Barragem de contrafortes com evacuador de cheias sobre a barragem
O cálculo de estabilidade de barragens de contrafortes é análogo ao das barragens de gravidade,
devendo atender-se à modificação do diagrama de subpressões.
Parece desenvolver-se na actualidade a tendência para o emprego de barragens de gravidade de
betão compactado em detrimento das de contrafortes.
2.2.6 BARRAGENS-ABÓBADA
As barragens-abóbada transmitem a carga hidrostática às fundações e aos encontros por meio de
forças de compressão desenvolvidas nos arcos.
A consideração de uma barragem-abóbada como estrutura bidimensional constituída por um
conjunto de arcos muito raramente se aproxima da realidade: apenas quando construída em vales
excepcionalmente profundos e estreitos. É este o caso da célebre barragem de Vajont, Figura 13,
com cerca de 260 m de altura e 150 m de corda no coroamento.
24
Figura 13 - Barragem de Vajont (Itália) Perfil transversal e alçado de jusante
Na realidade o funcionamento estrutural de uma barragem-abóbada é tridimensional, podendo a
mesma ser entendida como constituída por arcos e consolas.
Aliás, o processo desenvolvido nos anos vinte, pelo U.S. Bureau of Reclamation e pelo engenheiro
suíço Stucky, para calcular as tensões nas barragens-abóbada, consistia em atribuir uma repartição
arbitrária das cargas por arcos e consolas e determinar os respectivos deslocamentos; o cálculo era
repetido com nova repartição de cargas até se obter compatibilidade entre os deslocamentos dos
arcos e das consolas (método designado por trial load). Na actualidade o cálculo das tensões é
frequentemente conduzido pelo método dos elementos finitos.
As barragens de arco são aplicáveis normalmente em vales em que o valor do quociente cordaaltura (L/H), ao nível do coroamento, é inferior a quatro ou mesmo seis. Como excepção cita-se a
barragem de Pieve di Cadore (Itália) em que é L/H=7.45.
Com o advento do cálculo automático e do desenho por meios automáticos, generalizou-se a
substituição de arcos circulares por arcos com outras curvaturas para definir a barragem, com o
que se conseguem formas estruturais melhor adaptadas ao vale e sujeitas a tensões mais
favoráveis.
Thomas, 1979, propõe a seguinte classificação quanto ao valor do quociente entre a espessura
máxima na base, e, e a altura máxima, h:
Ø - barragem-abóbada delgada
e
≤ 0.2
h
25
Ø - barragem-abóbada de espessura média 0.2 ≤
Ø - barragem-abóbada espessa 0.3 ≤
e
≤ 0.3
h
e
h
Ø - barragem de arco gravidade 0.5 ≤
e
h
Barragens cúpula são barragens em abóbada de dupla curvatura.
Nas barragens-cúpula, o perfil central apresenta, em geral, balanço no coroamento para jusante e
balanço para montante na parte inferior, com a finalidade de diminuir as tensões de tracção nas
consolas. Esta forma origina frequentemente tensões de tracção durante a construção, pois que
esta, em virtude dos problemas resultantes da dissipação do calor de hidratação do cimento e da
retracção do betão, é realizada por blocos, separados por juntas aproximadamente verticais e
normais aos paramentos.
O monolitismo da estrutura de barragens-abóbada é assegurado, na parte final da construção, por
injecção com calda de cimento das juntas entre blocos.
Nas barragens de arco-gravidade, a participação dos arcos não é preponderante sobre a das
consolas e, como tal, aquelas barragens apresentam uma espessura que é uma fracção elevada da
altura.
Convém sublinhar que as barragens-abóbada, para além de exigirem menores volumes de betão do
que as barragens de gravidade ou de contrafortes, oferecem maior segurança.
Com efeito, o factor de segurança das barragens de gravidade e de contrafortes baseia-se na tensão
de corte do betão ou da fundação, enquanto o das barragens-abóbada se baseia nas tensões de
compressão no betão e nas fundações das barragens.
Esta maior segurança é evidenciada nos ensaios de rotura de barragens efectuados em modelos
reduzidos.
Um dos mais lamentáveis desastres da história de barragens modernas é o da rotura da barragem
de Malpasset no sul de França, ocorrida em 1959. A barragem-cúpula, de 60 m de altura e 6,76 m
de espessura na base, ruiu repentinamente, quando o nível estava pela primeira vez, a 0,28 m do
nível máximo, originando quatro centenas de mortos e o arrasamento da cidade de Fréjus. A ruína
da barragem originou a sua divisão em blocos; como se se tratasse de uma explosão, o que se
explica por a barragem ter deixado de funcionar como estrutura tridimensional, em consequência
da rotura da fundação de xisto muito diaclasado.
26
Segundo uma equipa de engenheiros e geólogos a rotura deveu-se, Figura 14, a que:
- Existia ao longo do encontro esquerdo uma diaclase continua, paralela às camadas de xistos e
uma outra diaclase contínua que atingia a superfície da rocha, a jusante, isolando as duas diáclases
uma cunha de rocha.
- A actuação da carga sobre rochas fracturadas, como o xisto, originou grande decréscimo da
permeabilidade, o que tornou a zona tracejada praticamente impermeável.
- A subpressão aumentou lentamente devido à barragem subterrânea (constituída pela cunha
impermeável)
- Em determinado momento, a diaclase paralela à camadas abriu, a montante, criando uma ligação
à albufeira e o consequente estabelecimento da pressão hidrostática que, associada à impulsão da
barragem, fez deslizar a cunha de rocha e originou a rotura do arco sobrejacente.
Figura 14 – Barragem de Malpasset. Causa da rotura
Em face da complexidade da análise tridimensional das barragens arco, vários centros de
investigação, entre os quais o LNEC, especializaram-se em ensaios estruturais em modelos
reduzidos de barragens de betão. A carga hidrostática é simulada no modelo pela pressão exercida
por mercúrio ou pela aplicação de cargas por pequenos macacos hidráulicos. Inicialmente, só a
carga hidrostática era considerada, passando depois a incluir-se o peso da estrutura e, mais
recentemente, os efeitos da temperatura, da deformabilidade da fundação e dos sismos.
27
Os modelos reduzidos tendem a ser, em virtude do seu custo elevado e da sua pouca flexibilidade,
utilizados, principalmente, como controlo e calibração de modelos matemáticos.
Não obstante o desenvolvimento destes últimos, é ainda fortemente recomendada a realização de
ensaios em modelo reduzido de grandes barragens, que apresentem condições fora do comum.
2.2.7 BARRAGENS DE ATERRO
2.2.7.1 CONDIÇÕES DA APLICAÇÃO - VANTAGENS E DESVANTAGENS
As barragens de aterro, requerendo condições geotécnicas de fundação menos exigentes do que as
barragens de betão, estão particularmente indicadas para os locais onde estas últimas não sejam
possíveis, ou impliquem dispendiosas operações para remoção das formações de cobertura ou para
o tratamento do maciço rochoso.
As barragens de aterro têm-se tornado muito atraentes em virtude, quer dos avanços no
conhecimento das propriedades dos solos e dos enrocamentos, que permitem proceder a cálculos
para análise pormenorizada do comportamento dos aterros, quer do aumento significativo da
facilidade de escavar, transportar e compactar grandes volumes de aterro.
Estas barragens têm a vantagem de utilizar essencialmente materiais existentes na região e de não
necessitar de grandes quantidades de materiais com preparação industrial, nomeadamente betão,
aço, madeira, o que em zonas de difícil acesso representa uma vantagem importante.
As barragens de enrocamento, construídas essencialmente por materiais granulares (particulados)
colocados em camadas e compactados, podem ser técnico-economicamente preferíveis às de terra
quando se verifiquem algumas das seguintes condições:
Ø Estarem ou tornarem-se facilmente disponíveis grandes volumes de enrocamento
(nomeadamente quando estes provêm da escavação de túneis ou evacuadores de cheias ou
quando existem condições favoráveis à exploração de pedreiras);
Ø A obtenção de solos para aterro é difícil e as distâncias de transporte são grandes;
Ø O clima é particularmente chuvoso, impedindo a fácil colocação de grandes quantidades de
solos.
Deve, porém, notar-se que as barragens de enrocamento podem, em determinadas condições de
fundação, pôr problemas idênticos aos criados pelas barragens de terra, como já se referiu.
No caso de construção da barragem por fases é, em geral, mais adequada uma barragem de aterro,
pois não existe o problema da ligação entre as obras das diferentes fases.
28
Porém as barragens de aterro também apresentam desvantagens, nomeadamente, em caso de
galgamento, que, pelo processo de erosão do aterro (mais fácil no caso das barragens de terra no
que nas barragens de enrocamento), pode levar à rotura das barragens.
As barragens de aterro põem maiores condicionamentos durante a construção, pois, não permitem
a passagem do caudal no rio por aberturas no corpo da barragem. Além disso, exigem obras de
desvio provisório dimensionadas para caudais com maiores períodos de retorno do que as
barragens de betão, pois os prejuízos na parte já construída são muito mais elevados em caso de
insuficiência das obras de desvio provisório. A ensecadeira de montante destas obras é
frequentemente incorporada na barragem.
Em comparação com as barragens de betão, as barragens de aterro apresentam maiores
condicionamentos para a implantação de obras hidráulicas, como evacuadores de cheias, descargas
de fundo e centrais hidroeléctricas.
2.2.7.2 TIPOS BÁSICOS DE BARRAGENS DE TERRA E DISPOSIÇÕES A ADOPTAR
As barragens de aterro classificam-se: de terra ou de enrocamento, consoante os materiais
predominantemente utilizados, sejam solos ou enrocamentos.
As barragens de terra são basicamente das classes seguintes:
-Barragem de perfil homogéneo.
Uma barragem de terra de perfil homogéneo utiliza solos de um único tipo (com excepção dos
materiais para filtros e drenos e protecção de taludes). O material deve ser suficientemente
impermeável para que o caudal de percolação seja baixo.
Desde que a albufeira se mantenha o tempo suficiente à mesma cota, a água de percolação surgirá
no paramento de jusante a uma altura de cerca de 1/3 da a1tura da água a montante,
independentemente da inclinação do paramento e da permeabilidade do material. Este facto poderá
originar instabilidade do talude. Para o evitar, dispõe-se um dreno no pé a jusante ou um tapete
drenante - Figura 15(b) e (c). A solução de dreno vertical - Figura 15(d) -é menos frequente.
-Barragem de terra de perfil zonado
O tipo mais comum de barragem de terra de perfil zonado, é aquele em que existe, um núcleo
central muito pouco permeável, ladeado por maciços estabilizadores mais permeáveis. Esse núcleo
poderá ser muito pouco espesso, e então será obtido por meio de calda de argila (ou por parede
moldada) ou por um muro de betão armado, ou poderá ter espessura média a elevada e ser
29
constituído por solo argiloso com percentagem de finos (siltes e argilas) que garantam baixa
permeabilidade -Figura 16.
Figura 15 - Percolação em barragens de terra de perfil homogéneo (a) com dreno no pé de jusante
(b), com tapete drenante (c) e com dreno vertical (d).
Entre o núcleo e os maciços laterais terão de interpor-se filtros para evitar a erosão interna por
arrastamento de finos, quer para jusante por efeito do escoamento controlado pelo nível na
albufeira, quer para montante após esvaziamento da albufeira, devido à pressão intersticial.
Nas barragens de aterro hidráulico, os maciços laterais são obtidos por deposição de areias
transportados hidraulicamente, sendo os seus taludes pouco inclinados.
Figura 16 – Barragens de terra de perfil zonado com núcleo fino (a) ou espesso (b)
30
Quando uma barragem de terra é construída sobre uma formação permeável espessa, a diminuição
da percolação é conseguida por meio de uma trincheira que é preenchida com solo impermeável,
com uma parede de argila ou betão - ou parede moldada – ou por uma cortina de injecções (Figura
17). Nalguns casos, é usado um tapete impermeável, prolongado para montante da barragem. A
percolação através da fundação, se importante, deve ser controlada para evitar a erosão interna.
Procede-se à sua intercepção por poços de alívio, a jusante da barragem, equipados para medir o
caudal e dar alarme em caso de aumento anormal.
Os taludes exteriores de maciços de terra de barragens de aterro são protegidos contra a erosão
que, no talude de montante, resultaria da acção das vagas na albufeira e no talude de jusante, da
acção da chuva e do escoamento superficial.
Figura 17 - Barragens de terra sobre fundação permeável. Corta-águas por trincheira (a), parede
(b), cortina de injecções (c) ou tapete impermeável a montante (d).
A protecção do talude de montante é conferida por uma camada de enrocamento ou por lajetas de
betão, com filtros colocados entre a protecção e o solo do aterro. A protecção a jusante é
assegurada por enrocamento ou por cobertura vegetal adequada. A água do escoamento superficial
sobre o talude de jusante é recolhida em valetas, geralmente associadas a banquetas, nas barragens
altas.
2.2.7.3 TIPOS DE BARRAGENS DE ENROCAMENTO DISPOSIÇÕES A ADOPTAR
As barragens de enrocamento dividem-se essencialmente em duas classes, consoante a localização
do elemento que assegura a impermeabilidade da barragem: cortina, a montante (Figura 18); ou
núcleo, geralmente de solo muito pouco permeável, no interior do perfil (Figura 19).
31
Figura 18 - Muros corta-águas na base de cortinas de barragens de enrocamento. Cortinas de betão
armado (a), de material asfáltico (b) e metálicas (f) -BUREAU OF RECLAMATION 1974
Figura 19 – Barragem de enrocamento com núcleo de argila (Bureau of Reclamation, 1974)
32
A solução de cortina a montante tem a vantagem de mobilizar uma maior parte do perfil para a
estabilidade ao deslizamento, condição para a qual as barragens de enrocamento devem ser
verificadas.
As cortinas a montante podem ser de betão armado ou asfáltico ou metálicas. Em pequenas
barragens, a cortina pode ser conseguida à custa de membrana de plástico devidamente protegido.
Os núcleos exigem filtros adequados a montante e a jusante.
O assentamento de barragens de enrocamento é um aspecto crítico relativamente ao seu
comportamento e, em especial, ao das cortinas a montante.
Até cerca de 1970, o enrocamento utilizado era de grandes blocos, com uma granulometria pouco
extensa e sem finos. Era lançado de grande altura e exposto à acção de jactos de água, o que se
esperava conferir-lhe compacidade.
Exigia-se que a rocha a utilizar nas barragens de enrocamento fosse rija, durável e apta a suportar a
desintegração pela acção dos agentes atmosféricos e a resistir à quebra excessiva provocada pelas
operações de carga, descarga e colocação.
Para avaliar a adequação das rochas à obtenção de enrocamentos, desenvolveram-se ensaios
laboratoriais que medem a resistência à abrasão, a resistência ao gelo-degelo e a percentagem de
absorção de água. Verificaram-se assentamentos muito importantes nas barragens de enrocamento
assim construídas, o que se explica pela fracturação dos blocos de rocha provocada pelas tensões
muito elevadas desenvolvidas nos contactos. Estes contactos incidiam sobre áreas muito restritas
devido à estreita granulometria dos enrocamentos.
Actualmente, considera-se que a granulometria dos enrocamentos utilizados nas barragens deve
ser extensa e as exigências de qualidade da rocha diminuíram. Aceita-se a inclusão de finos
(elementos de diâmetro inferior a 0,074 mm), que não devem exceder uma percentagem da ordem
de 10%. a fim de que o material se possa considerar como um meio drenante (K > 10-3 cm/s) e
com comportamento diferente de um solo.
Procura-se reduzir a deformabilidade dos enrocamentos mediante a obtenção de um alto grau de
compacidade. Esse grau de compacidade é conseguido por meio de granulometria extensa, como
já se referiu, e pela compactação em camadas de espessura dependente da granulometria (0,60 a 2
m), utilizando cilindros vibradores.
As inclinações dos paramentos de barragens de enrocamento dependem da localização do
elemento de impermeabilização: a montante (cortina) ou no interior (núcleo).
33
As inclinações dos taludes das barragens de enrocamento com cortina a montante são de 1,3:1,0 a
1,7:1,0 a montante, e próximas das que correspondem ao talude natural, a jusante (1,3:1 a l,4:1).
As cortinas de betão asfáltico têm em geral inclinações de 1,6:1 a 1,7:1 para facilitar a construção;
as de betão armado ou metálicas de 1,3:1 a 1,4:1.
As inclinações dos taludes de barragens de enrocamento com núcleo central de solo argiloso
dependem das características deste solo, da espessura necessária dos filtros e da rapidez do
esvaziamento da albufeira. Em geral, essas inclinações variam entre 2:1 e 4:1, respectivamente, a
montante e a jusante.
É de importância crítica numa barragem de enrocamento com cortina a montante assegurar a
estanquidade não só através da cortina, mas também na zona da sua ligação à fundação. Para além
do problema da perda de água, a percolação excessiva pode originar arrastamento de materiais da
barragem e erosão da fundação.
A ligação da cortina à fundação pode ser assegurada por um muro corta-águas que impede a
passagem de água na parte superior da fundação, facilita a injecção e recebe o impulso da cortina Figura 18. O muro deve ter profundidade mínima de 0,90 m em rocha sã e ser mais profundo em
rocha alterada, ou muito diaclasada. A rocha de fundação é normalmente injectada através do
muro.
Nas grandes barragens, o muro corta-águas está muitas vezes associado a uma galeria de
drenagem, que tem a vantagem de facilitar a posterior injecção da fundação, sem esvaziar a
albufeira, de identificar os locais onde se verifica percolação mais intensa e de controlar o
respectivo caudal.
Quando a rocha é sã, a ligação da cortina, se for de betão armado, pode fazer-se por laje cortaáguas, ancorada (Figura 20). Tem esta solução a vantagem de evitar a escavação para o muro e
facilitar a injecção.
Figura 20 – Laje corta-águas e cortina de betão armado em barragens de enrocamento (Bureau of
Reclamation, 1974)
34
2.2.7.4 ESTABILIDADE DO ATERRO E DA FUNDAÇÃO DE BARRAGENS DE ATERRO
As causas de rotura de barragens de aterro podem ser:
Ø Galgamento durante ou após a construção devido a insuficiência do evacuador de cheias ou
das obras de desvio provisório. As barragens de terra são particularmente vulneráveis ao
galgamento, pelo que os respectivos evacuadores são dimensionados para cheias menos
prováveis.
Ø Instabilidade devida a erosão interna local (piping) do aterro ou da fundação
Ø Instabilidade conducente ao deslizamento dos taludes do aterro ou do conjunto do aterro e
fundação, nas seguintes condições:
o Durante a construção;
o Uma vez atingido o regime permanente de percolação com a albufeira cheia;
o Após o esvaziamento rápido da albufeira, devido à pressão instalada no aterro;
o Instabilidade dos paramentos por erosão (que se evita pelo recurso a protecção
adequada).
A estabilidade quanto ao deslizamento de taludes de aterros pode ser analisada de vários modos,
sendo o mais tradicional, o do deslizamento potencial ao longo de trajectórias, em geral circulares,
no interior do aterro ou deste e da fundação.
Deve notar-se que a análise de estabilidade entra em consideração com características (resistência
ao corte, erosão e atrito) que se não apresentam constantes no material de aterro e da fundação,
pelo que essa análise se não resume a um problema de cálculo numérico.
Os sismos podem ser considerados em cálculos pseudo-estáticos de análise de deslizamento. O
método dos elementos finitos apresenta maiores potencialidades e possibilita o cálculo dinâmico
que permite simular o comportamento de uma barragem durante um sismo de que se conheça o
respectivo espectro de acelerações, ou seja, determinar tensões e deslocamentos.
O U. S Bureau of Reclamation 1974 recomenda, para barragens homogéneas sobre fundações
estáveis, as inclinações dos taludes em função das características dos solos classificados em
grupos, com base em ensaios de identificação de solos bastante simples.
Dá-se no quadro da página seguinte uma ideia das inclinações recomendadas, utilizando uma
classificação qualitativa dos solos, que, como tal, não pode ser utilizada em projectos mesmo de
pequenas barragens.
35
Quadro 1 – Inclinações dos taludes de pequenas barragens de perfil homogéneo sobre fundação
estável* (Adaptado do Bureau of Reclamation, 1974)
*Trata-se de uma indicação qualitativa, não utilizável em projectos mesmo de pequenas barragens.
**(Se se admitir o esvaziamento rápido da albufeira, a inclinação do paramento de montante deve ser adicionada de
1/2.
2.2.7.5 LIGAÇÃO DE BARRAGENS DE TERRA A ESTRUTURAS DE BETÃO
A ligação de barragens de terra a estruturas de betão exige disposições especiais que contrariem o
estabelecimento de caminhos preferenciais de percolação ao longo do contacto solo-betão. Estes
caminhos poderiam originar erosão interna (piping) capaz de dar lugar a problemas graves,
incluindo a rotura.
Considere-se uma barragem com um troço de terra e outro de betão, de gravidade. A ligação que
obste aos inconvenientes mencionados pode conseguir-se por dois modos. Num deles, constrói-se
um muro de betão normal à directriz da barragem de gravidade para suporte do aterro e um outro
muro (muro corta-águas) no prolongamento da barragem de gravidade -Figura 21(a) -para
aumentar o caminho de percolação.
No outro modo, o aterro prolonga-se para o lado troço de betão, formando uma superfície troncocónica.
36
Se a barragem for zonada, a solução a adaptar é a de muro corta-águas que penetre no núcleo.
A solução de pequenas barragens com troços laterais de terra e a parte central de betão, de
gravidade, é recomendável quando a camada superficial de rocha meteorizada for espessa ao longo
de considerável desenvolvimento, nas margens do rio. Com efeito, a criação de condições de
fundação para a barragem de gravidade exigiria a remoção da rocha meteorizada e o dispêndio de
volume importante de betão abaixo da superfície do terreno; que seriam evitáveis na solução de
troços de aterro.
Por outro lado, o troço central de betão tem as vantagens de encontrar normalmente fundação
próximo da superfície e de permitir a evacuação das cheias.
Na ligação de uma barragem de aterro a um evacuador de cheias em canal, constrói-se um muro
corta-águas análogo ao da Figura 21(a).
O mesmo tipo de problemas na ligação solo-betão se põe quando o aterro cobre uma conduta de
derivação, de descarga de fundo ou de evacuador de cheias.
Para diminuir os riscos de erosão interna prevêem-se colares corta-águas ao longo da conduta.
As condutas em pressão cobertas por aterro apresentam também o risco de erosão interna do aterro
em consequência de fugas a partir do interior, através das juntas ou fissuras das condutas. Assim. a
construção das condutas deve ser extremamente cuidada para evitar as fugas. A fundação das
condutas deverá ser muito pouco deformável e deverão utilizar-se perfis de estanquidade nas
juntas de contracção.
O problema tem especial acuidade no troço a jusante do coroamento de barragens de perfil
homogéneo ou a jusante do núcleo de barragens zonadas, onde as diferenças de pressão entre o
exterior (devido à percolação no aterro) e o interior da conduta passam a ser importantes.
Por esta razão, em muitos casos, são evitadas as condutas em pressão ao longo de todo o aterro,
prevendo-se nas descargas de fundo um troço a montante em pressão, e um troço a jusante em
superfície livre.
37
Figura 21 - Barragens de troços de terra e de gravidade. Ligação com muro corta-águas (a) e
prolongamento do aterro (b).
2.3 DESCARREGADORES
2.3.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS
Os descarregadores são órgãos vitais em aproveitamentos hidroeléctricos. As insuficiências de
descarregadores são responsáveis por quase um quarto dos acidentes verificados em
aproveitamentos hidroeléctricos.
Um descarregador ou evacuador de cheias destina-se a dar passagem aos caudais de cheia na
secção de uma barragem, sem que esta obra ou as suas fundações corram o risco de ser derrubadas,
sofram submersão ou afogamento e se ultrapasse o nível de água excepcional previsto para
montante em período de cheia.
Podem classificar-se sob dois aspectos:
Ø Quanto à localização e ao controlo do caudal;
Ø Quanto ao guiamento da lâmina líquida e ao modo de dissipação de energia.
Os aspectos considerados na classificação anterior determinam a constituição geral dos
evacuadores de cheias e as suas condições principais de funcionamento.
38
Evacuadores sobre barragens podem empregar-se com barragens de betão de qualquer tipo,
podendo a descarga fazer-se livremente ou ser controlada por comportas. A lâmina líquida pode
atingir directamente o leito do rio, Figura 22, ou ser guiada por canal, que se apoia no total ou em
parte sobre a barragem, até um trampolim de saída (de onde é convenientemente orientada para o
rio), Figura 23, ou até uma estrutura de dissipação de energia.
No caso de barragens de pequena altura, do tipo móvel, em que grande parte da área de obstrução
e conseguida por comportas, a passagem do caudal de dimensionamento faz-se com pequena
sobrelevação do nível a montante e, portanto, com afogamento, Figura 24.
Evacuadores por orifícios através de barragens podem empregar-se com barragens de betão de
qualquer tipo e são controlados por comportas.
A lâmina líquida, para jusante do orifício, pode seguir livremente atingindo o leito do rio próximo
do pé da barragem (orifícios sob cargas pequenas), Figura 25, ou longe dela (orifícios sob cargas
elevadas), Figura 26, ou numa bacia de dissipação.
As soluções de queda livre junto do pé da barragem exigem rocha de boa qualidade na zona de
impacto, sendo necessário ainda o revestimento dessa zona por lajes de betão armado, ancoradas à
fundação e, por vezes, de açudes a jusante que aumentam a espessura do colchão de água em
relação às condições naturais.
Recorre-se, por vezes, a descarga, simultaneamente no mesmo perfil, sobre a barragem e através
de orifícios, com a finalidade de aproveitar as condições mais favoráveis de dissipação de energia
de jactos cruzados.
Nas barragens de aterro (de terra, de enrocamento ou mistas) recorre-se a evacuadores de cheias
em canal a céu aberto, com estrutura independente da barragem, Figura 28, e a evacuadores em
poço, em que o poço é seguido de galeria escavada em subterrâneo, na encosta, Figura 29, ou de
conduta construída a céu aberto na fundação da barragem, ficando depois recoberta, em parte do
percurso, por aterro. É evidente que estas soluções também podem ser adoptadas com barragens de
betão (Figura 30).
Os evacuadores em poço têm a vantagem de, em certos casos, permitir a utilização de parte das
galerias ou das condutas de desvio provisório como galerias ou condutas a jusante do poço –
Figura 29.
Os evacuadores em canal a céu aberto e em poço podem terminar por trampolim de saída ou por
estruturas de dissipação de energia.
39
Evacuadores de cheias de diques fusíveis podem ser adoptados para funcionar na emergência de
ser excedido o caudal de dimensionamento do evacuador principal. São constituídos, em geral, por
um perfil em aterro construído sobre soleira de betão. Quando se dá o galgamento do aterro, iniciase o processo de destruição do dique fusível; ao complementar-se esta, o evacuador entra em pleno
funcionamento. Normalmente, o evacuador do dique fusível dá passagem para uma linha de água
lateral, devendo o fundo da zona do dique fusível ser rochoso, para evitar o seu aprofundamento e
a vazão de um caudal incontrolado, Figura 31.
Figura 22 - Evacuador de cheias da barragem, abóbada, de Bouçã (Portugal),
40
Figura 23 – Evacuador de cheias da barragem, abóbada de Picote (Portugal)
Figura 24 - Evacuador de cheias da barragem, móvel, de Belver (Portugal)
41
Figura 25 – Evacuador de cheias da barragem de Caniçada (Portugal)
Figura 26 - Evacuador de cheias da barragem, abóbada de Cabora-Bassa (Moçambique)
42
Figura 27 – Evacuador de cheias da barragem de arco-gravidade de Castelo de Bode (Portugal)
1 -Barragem
2 -Evacuador de cheias
3 -Bacia de dissipação
4 -Descarga de fundo
5 -Circuito hidráulico
Figura 28 - Evacuador em canal da barragem de aterro Corumana (Moçambique).
43
Figura 29 – Evacuador de cheias da barragem, de enrocamento, de Paradela (Portugal)
44
Figura 30 - Evacuador de cheias em poço de barragem abóbada de Cabril (Portugal)
45
Figura 31 – Descarregador fusível (de emergência) da barragem da Corumana (Moçambique)
2.3.2 Condicionamentos principais
Os condicionamentos principais que influem na escolha do tipo e constituição de um evacuador de
cheias e no projecto dos seus órgãos são dos seguintes tipos:
o Condicionamentos de fiabilidade;
o Condicionamentos relativos à barragem e outros órgãos;
o Condicionamentos topográficos;
o Condicionamentos geotécnicos;
o Condicionamentos hidrológicos;
o Condicionamentos hidráulicos;
o Condicionamentos relativos a equipamentos hidromecânicos.
Um evacuador de cheias é um órgão que exige grande fiabilidade. O seu funcionamento em más
condições ou a sua insuficiência em relação aos caudais afluentes podem pôr em perigo a
46
barragem, cuja destruição, mesmo parcial, pode ter efeitos catastróficos, dependendo do volume da
albufeira e da ocupação do vale a jusante.
O tipo de barragem apresenta condicionamentos para a escolha do tipo de evacuador. Assim numa
barragem de aterro não se adoptam soluções de evacuadores com descarga sobre a barragem ou
através de orifícios ou condutas nela praticados. Com efeito, os inevitáveis assentamentos
poderiam dar lugar, durante o funcionamento do evacuador, a forças hidrodinâmicas capazes de
deslocar as lajes do canal de descarga. O efeito da erosão interna poderia levar também a essa
destruição.
Deve notar-se que existem barragens de aterro de pequena altura, sobre as quais têm sido
construídos evacuadores, por meio de revestimento de enrocamento (protegido ou não por malhas
metálicas), gabiões e gunite (sobre enrocamentos). Há ainda a assinalar o caso das barragens muito
baixas, de terra armada.
O próprio tipo de barragem condiciona o caudal de dimensionamento do evacuador; a sua altura
determina a velocidade máxima do escoamento e influi nas soluções a adoptar para a dissipação de
energia. Os restantes órgãos (descarregador de fundo, tomadas de água e desvio provisório) devem
ser considerados ao escolher o tipo do evacuador.
Os condicionamentos topográficos influem sobretudo na possibilidade de implantação do
evacuador de cheias.
Os condicionamentos hidrológicos não se limitam ao caudal de dimensionamento, pois a extensão
do período em que se verificam as cheias e a duração média anual destas poderão influenciar o
tipo e, mais frequentemente, a constituição do evacuador. Assim, quando as cheias são isoladas e
curtas as épocas em que são prováveis, podem, em certos casos, aceitar-se soluções que
eventualmente exijam conservação e reparações.
Os condicionamentos geotécnicos respeitam às condições de fundação do evacuador e às
exigências relativas à dispersão de energia, permitindo ou não dispensar bacia de dissipação ou
outra estrutura análoga e, em caso afirmativo, influindo nas dimensões da fossa de erosão e da
barra.
Os condicionamentos hidráulicos dizem respeito ao escoamento ao longo do evacuador e à
dissipação de energia.
As condições de escoamento ao longo do evacuador respeitam à capacidade de vazão, ao regime
de pressões junto das fronteiras sólidas, à ocorrência ou ausência de separação e cavitação e à
distribuição de alturas no escoamento com superfície livre.
47
A dissipação de energia pode confinar-se praticamente à bacia de dissipação ou órgão análogo,
dispensando protecções à saída, ou realizar-se completamente ou em parte no próprio leito do rio.
Os condicionamentos relativos a equipamentos hidromecânicos influem quer ao nível da
concepção geral do evacuador, pelas limitações a que estão sujeitos (dimensões do vão a obturar,
carga, tipo de accionamento e sua fiabilidade), quer ao nível das disposições de pormenor a
adoptar no projecto.
2.3.3 TIPOS DE EVACUADORES DE CHEIAS
1 - QUANTO A LOCALIZAÇÃO E CONTROLO
ü EVACUADOR SOBRE A BARRAGEM
o Barragem de betão.
o Descarga livre ou controlada por comportas (ou por sifão)
ü EVACUADOR POR ORIFÍCIOS ATRAVÉS DA BARRAGEM
o Barragem de betão.
o Descarga controlada por comportas.
ü EVACUADOR EM CANAL A CÉU ABERTO
o Independente da estrutura da barragem; barragem de qualquer tipo. Descarga livre
ou controlada por comportas.
ü EVACUADOR EM POÇO
o Poço vertical ou inclinado, seguido de galeria sob a barragem (barragem de aterro
ou de enrocamento) ou escavada em subterrâneo (barragem de qualquer tipo).
ü DESCARREGADOR FUSÍVEL
o De emergência, lateral à barragem.
2 -QUANTO AO GUIAMENTO DA LÂMINA LÍQUIDA E À DISSIPAÇÃO DE ENERGIA
ü QUEDA LIVRE E DISSIPAÇAO DE ENERGIA NO LEITO
o Protecção ou não, com ou sem sobreelevação do nível natural no rio.
o Localização e controlo
ü QUEDA GUIADA E TRAMPOLIM DE SAÍDA (SALTO DE ESQUI) COM
DISSIPAÇÃO NO LEITO (PROTEGIDO OU NÃO)
48
o Localização e controlo
ü QUEDA GUIADA E DISPOSITIVO DE ENERGIA DE DISSIPAÇÃO DE ENERGIA
o Bacia de dissipação ou equivalente.
o Localização e controlo
2.3.4 TIPOS DE EVACUADORES DE CHEIAS NAS PEQUENAS BARRAGENS
Nas pequenas barragens, os tipos de evacuadores de cheias apresentam-se menos diversificados do
que nas grandes barragens. Nas primeiras não se encontram, em geral, evacuadores por orifícios e
os evacuadores em poço são menos frequentes, além de exigirem conhecimentos mais
especializados para o projecto e só excepcionalmente dispensarem ensaios hidráulicos.
Trata-se, assim, neste curso, do projecto hidráulico de evacuadores sobre barragens de betão
(terminando em estruturas de dissipação de energia ou trampolins) e de evacuadores em canal.
Um evacuador de cheia de um destes dois tipos é constituído por:
o - estrutura descarregadora;
o - canal de descarga;
o - estrutura de dissipação ou trampolim de saída.
A estrutura descarregadora pode apresentar-se como:
v - descarregador rectilíneo, frontal, se se desenvolver em direcção do escoamento a
jusante.
v -descarregador para um canal, desenvolvendo-se ambos em direcções paralelas à do
escoamento a jusante;
v -descarregador em labirinto;
v -descarregador em leque.
O primeiro tipo de estrutura descarregadora pode aplicar-se a soluções de barragens de betão com
descarga superior ou de evacuadores de cheias em canal. A directriz do descarregador é rectilínea
ou com uma curvatura desprezável.
Os outros três tipos de descarregadores são utilizados em evacuadores de cheia em canal.
O descarregador para canal colector permite , em determinadas condições topográficas, reduzir o
volume de escavação para criar um canal para alimentação do descarregador – Figura 32.
49
Figura 32 – Descarregador rectilíneo frontal e descarregador por canal colector
Os descarregadores em labirinto ou em leque (Figura 33 e 34) aumentam o comprimento de
descarga. A sua utilização não dispensa, em geral, a realização de ensaios hidráulicos.
Figura 33 – Descarregador em labirinto
As estruturas com descarregador rectilíneo frontal, tanto sobre barragens, como nos evacuadores
em canal, e com descarregador para canal colector, podem ter descarga livre ou controlada por
comportas.
Para igual nível de pleno armazenamento e, portanto, igual volume disponível na albufeira para a
regularização dos caudais, a solução de estruturas descarregadoras com comportas permite que o
escoamento da barragem se situe a cota mais baixa.
50
Figura 34 - Descarregador em leque.
2.3.5 CANAL DE DESCARGA
Para o cálculo do regolfo no canal de descarga de um evacuador de cheias, admitem-se usualmente
as duas hipóteses seguintes:
o a perda de carga é nula entre a albufeira e a secção inicial do canal;
o a camada limite turbulenta está totalmente desenvolvida na secção inicial do canal (pelo
que a perda de carga unitária se pode calcular pelos métodos habituais).
O perfil do canal é definido tendo em conta as condições topográficas e geológicas do local. É
constituído por trechos rectilíneos ligados por curvas de transição.
As curvas convexas devem manter pressões positivas junto da parede, pelo que devem ser mais
graduais do que as trajectórias de jactos livres. A equação duma curva convexa de transição pode
ser definida por:
− y = x tgθ +
x2
 

V2 
 cos 2 θ 
k 4 −  D +
2g 
 

em que,
D -profundidade a montante;
V -velocidade a montante;
θ - ângulo com a horizontal do fundo do canal a montante da transição.
As curvas côncavas originam o aumento da pressão junto da parede
DV 2
∆p =
gR
sendo R o raio da curva circular.
Como indicação geral, deve ser R=10D, a não ser imediatamente a jusante da crista onde pode
aceitar-se R=5D.
51
As curvas de transição e os convergentes e divergentes em planta originam ondas transversais
obliquas que são inconvenientes por:
-exigirem maior altura dos muros laterais para evitar galgamento;
-provocarem uma não uniforme distribuição do caudal em largura, prejudicando o funcionamento
de órgãos de dissipação de energia.
O desvio angular de uma parede provoca no escoamento rápido uma onda como se ilustra na
Figura 1.
Admita-se que são uniformes as distribuições da altura líquida e da velocidade a montante da
frente de onda, com valores h l e U2 e a jusante dela, com valores h 2 e U2 -Figura 1.
Figura 1 -Desvio angular da parede num escoamento rápido (MANZANARES)
Considerando componentes da velocidade normais à frente de onda e uma largura unitária segundo
esta, a equação de continuidade toma a forma
h1U 1 senβ1 = h2U 2 sen( β1 − δ )
e o teorema de Euler (na hipótese de se anularem as componentes respeitantes ao peso do liquido e
à resistência do fundo) fornece:
y 2 y
y
y
h1 + h1U 12 sen 2 β1 = h22 + h2U 22 sen 2 (β 1 − δ )
2
g
2
g
Uma terceira equação exprime a igualdade das componentes das velocidades segundo a frente de
onda:
U 1 cos β1 = U 2 cos( β1 − δ )
O sistema das três equações anteriores permite, conhecidos h l, Ul e δ , determinar h 2, U2 e β 1
52
Das duas primeiras equações obtém-se:

1 h2  h2
 + 1
2 h1  h1

Em que o número Froude F1 é definido com as condições a montante da frente da onda.
senβ 1 =
1
F1
Esta última equação reduz-se à equação das pequenas perturbações, quando h2/hl tende para a
unidade.
Uma parede de directriz curva pode ser assimilada a uma parede de directriz poligonal,
provocando cada vértice uma frente de onda, que deixa a jusante a perturbação respectiva.
As ondas provocadas nas paredes opostas de canais combinam-se, assim como as ondas a jusante
de pilares.
O Bureau of Reclamation recomenda que, de acordo com resultados experimentais o ângulo α de
desvio de muros laterais (em convergentes ou divergentes) de canais de descarga de evacuadores
de pequenas barragens não exceda
tgα =
1
3F
onde F é o número de Froude.
Para ter em conta as irregularidades da superfície do escoamento rápido, e a emulsão do ar, as
paredes ou canais de descarga de evacuadores devem ter folga em relação aos valores calculados.
Assim o Bureau of Reclamation recomenda para pequenas barragens a folga em (m):
f = 0.61 + 0.0372 V 3 D
com a velocidade V e a profundidade D também em unidades métricas.
2.4 DESCARGAS DE FUNDO E TOMADA DE ÁGUA
As descargas de fundo, essencialmente são constituídas por um orifício protegido por uma grelha a
que se segue uma entrada hidrodinâmica. A jusante da boca existem a comporta, respectiva
conduta de ventilação, seguindo-se a conduta que pode ser estrangulada a jusante para evitar
cavitações. No extremo de jusante existe normalmente um dispositivo de dissipação.
As descargas de fundo podem desempenhar outras funções para além do esvaziamento da
albufeira, nomeadamente:
•
- Baixar o nível da albufeira para permitir a visita e a reparação da barragem e obras anexas
•
- Contribuir, em conjunto com o descarregador de superfície, para o amortecimento do
diagrama de cheias;
•
- Manter limpa de depósitos a zona das imediações da tomada de água para a central.
As obras da tomada de água, Figura 34, têm por fim captar de um curso de água ou de um
53
reservatório, o caudal necessário para alimentação das turbinas, eliminando na medida do possível,
as matérias sólidas transportadas pelo curso de água.
Figura 34 – Tomadas de água: numa albufeira e num rio
As matérias sólidas a eliminar são:
o Matérias transportadas por suspensão: limo, areia fina, etc;
o Materiais carreados: areia ou areão;
o Materiais flutuantes (árvores, folhas, etc.)
A eliminação das matérias sólidas é indispensável porque a sua presença na água pode causar
54
avarias nas turbinas.
Num rio a tomada de água deve comportar três elementos principais:
o Uma obra de entrada;
o Órgãos de regulação do caudal derivado;
o Obras de limpeza.
A obra de entrada é constituída por um elemento de canal cuja entrada é limitada por uma soleira e
que dirige o caudal derivado para o canal de adução. Deve ser estabelecido numa margem côncava
do rio. Se, devido à configuração do terreno, tiver que ser colocada num alinhamento recto, é
conveniente dispor espigões no rio para criar uma curva artificial na concavidade, na qual se
constrói a entrada da derivação.
As obras de eliminação do caudal sólido e corpos flutuantes têm como objectivo impedir o caudal
sólido de entrar na derivação.
Para eliminação das areias constroem-se câmaras de decantação (Figura 35), na qual a decantação
e a extracção das areias são duas operações sucessivas. As câmaras de decantação são constituídas
por bacias, cuja secção de escoamento é superior à do canal, de modo que a velocidade da água
seja suficientemente pequena (<0.2 m/s) e a turbulência de tal modo reduzida que os materiais em
suspensão se depositem no fundo. Compreende por isso um aprofundamento acompanhado de um
alargamento.
Figura 35 – Tomada de água (câmara de decantação e desarenador)
Os materiais depositados são devolvidos periodicamente ao rio através de uma galeria de limpeza,
pela abertura da comporta do canal de limpeza.
Os desarenadores, Figura 36, realizam uma eliminação contínua da areia por descarga de um certo
55
caudal líquido. Compreendem, em geral, uma câmara alongada no sentido do escoamento no
fundo do qual é realizada a descarga.
Figura 36 - Desarenador
As tomadas de água em albufeira devem ser estabelecidas tendo em consideração as condições de
sedimentação dos reservatórios.
Os materiais transportados por carreamento (godo, areia grossa), depositam-se na zona de
montante da albufeira, isto é, cerca da extremidade de montante da curva de regolfo. Este depósito
resulta da redução da força tractiva. Os materiais depositados formam um delta sub-lacustre
(regolfo sólido) que se desloca progressivamente de jusante para montante.
Os materiais transportados em suspensão (areia fina, limo, vasa) depositam-se no fundo da
albufeira, a jusante do regolfo sólido. O depósito tem lugar quer por deposição imediata, quer após
transporte na albufeira por correntes de densidade. Os materiais finos depositados constituem um
lago de vasa cuja superfície livre é sensivelmente horizontal, podem consolidar-se com o tempo e
adquirir uma coesão importante, e ocupam uma fatia importante do reservatório.
A tomada de água pode funcionar como derivação provisória durante a construção do troço
principal da barragem e em funcionamento definitivo como alimentação da central. A montante, é
protegida por grelhas e obturada por uma comporta ensecadeira.
2.5
CÂMARAS DE CARGA
Uma câmara de carga é um alargamento colocado no topo de montante das condutas forçadas, ou
56
seja na extremidade de jusante do canal ou da galeria de adução à derivação, Figura 37
Figura 37 – Câmara de carga
Desempenha um papel análogo ao das bacias de distribuição das quedas baixas. Tem as seguintes
funções:
o Distribuir a água das condutas forçadas (o que exige uma chegada em linha recta e uma
disposição simétrica em relação às condutas;
o Deter os últimos corpos flutuantes, se o canal é a céu aberto;
o Impedir a entrada de pedras e areia nas condutas forçadas;
o Impedir a entrada de ar nas condutas forçadas, o que produz vibrações nas turbinas. Esta
condição fixa a cota da soleira;
o Criar ondas de translação tão baixas quanto possível no caso de fecho das turbinas;
o Ter um volume suficiente para satisfazer os pedidos rápidos de potência da central, sem
ficar vazia – efeito regulador.
2.6
BACIAS DE DISSIPAÇÃO
O retorno da água ao rio pelos evacuadores de cheias ou pelas descargas de fundo, ou pelos
próprios circuitos de utilização da água, implica a perda de energia do escoamento correspondente
ao desnível verificado entre os planos de água a montante e a jusante.
Constroem-se, geralmente, para dissipação dessa energia estruturas hidráulicas que dispõem de
revestimentos de protecção, de forma a evitar a erosão das paredes pela turbulência associada à
dissipação. A jusante das estruturas de dissipação, o escoamento apresenta ainda, energia residual
em relação às condições naturais, mas vai diminuindo gradualmente à medida que o escoamento se
aproxima dessas condições.
57
Existem muitos tipos de estruturas de dissipação de energia, mencionando-se somente as que mais
correntemente interessam às pequenas barragens:
o Bacias de dissipação de energia por ressalto;
o Dissipadores em concha de rolo (roller buckets);
o Estruturas de dissipação por impacto;
o Estruturas de macro rugosidades;
o Estruturas de lançamento de jactos (em queda livre ou provenientes de orifícios ou
trampolins).
O Bureau of Reclamation definiu estruturas de dissipação de energia normalizadas,
correspondentes aos primeiros quatro tipos mencionados. A utilização destas estruturas em
pequenas barragens, quando as mesmas satisfazem plenamente as condições definidas, dispensa a
realização de ensaios hidráulicos.
3. APROVEITAMENTOS HIDROAGRÍCOLAS
Nos aproveitamentos hidroagrícolas os elementos barragens, dispositivos de segurança, tomadas
de água, derivação são idênticos aos descritos para os aproveitamentos hidroeléctricos.
A derivação é em geral por canal constituída por:
-tomada de água;
-comportas de regulação de níveis;
-rede primária de rega;
-uma ou mais redes secundárias.
O traçado da rede de rega deve atender ao tipo de rega utilizado: por gravidade., por aspersão, etc.
Frequentemente nestes aproveitamentos recorre-se a sistemas elevatórios para beneficiar parcelas
situadas a cotas superiores às da superfície da albufeira ou da rede primária.
58
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HA2-Parte 3-Aproveitamentos Hidraulicos