INSTITUTO DE INVESTIGAÇÃO AGRÁRIA DE MOÇAMBIQUE DIRECÇÃO DE FORMAÇÃO, DOCUMENTAÇÃO E TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIAS RELATÓRIO DE PESQUISA LIBERALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO DE SEMENTES EM MOÇAMBIQUE Por: Tomás A. Sitoe1 1 IIAM/Direcção de Formação, Documentação e Transferência de Tecnologias – Investigador do CESE. Email: [email protected] i Resumo O presente estudo de natureza qualitativa procurou diagnosticar o sub-sector de semente básica, tendo em vista analisar as implicações da liberalização do mercado de sementes no país. As principais constatações são as seguintes:- a entrada de novas empresas de sementes veio dinamizar o processo de produção de semente no país. A produção de semente passou de 3,500 toneladas em 2002 para cerca de 6,000 toneladas/ano em 2010. No entanto, a quantidade de semente produzida ainda não satisfaz as necessidades de semente no país. O Estado é o maior cliente das empresas de semente; no entanto, a intervenção do Estado no mercado de sementes não estimula o desenvolvimento do mercado e da percepção dos produtores em relação ao valor da semente. Existe um interesse das empresas partirem para a produção de semente básica como forma de contribuir para falta de semente básica de qualidade no país. Recomenda-se: (i) a melhoria da capacidade técnica e de gestão do IIAM/USEBA por forma a que este cumpra com eficácia a sua missão; (ii) o alinhamento dos investimentos em curso para aquisição de equipamentos, reabilitação dos sistemas de rega e de armazenamento e modernização das estações de acordo com as prioridades de desenvolvimento do sector agrário; (iii) o desenvolvimento de parceiras entre o IIAM/USEBA e as empresas comerciais de sementes. A subcontratação de empresas comercias para a produção não deve ser um fim, mas um meio para resolver a falta de semente de qualidade no país. Maior protagonismo das empresas iria permitir maior competitividade entre as empresas e o desenvolvimento de estratégias que incentivam a procura. Palavras chave: Semente. USEBA. Empresas Comerciais. Produtor. ii I. Introdução A semente constitui o elemento básico e indispensável na cadeia de produção e de alimentos. Ela constitui o elo primário da cadeia de produção por isso representa um precursor da segurança alimentar. A semente constitui também uma ferramenta essencial para a transferência de tecnologia na produção agrícola; contudo sem a sua disponibilidade regular, um bom clima e solos têm pouco impacto sobre a produção e produtividade. A habilidade dos produtores de obterem a semente depende da capacidade destes de a produzirem ou adquirirem. A questão de disponibilidade remete-nos à segurança de sementes que significa o acesso físico e económico, em quantidade e qualidade, por todos os produtores à semente durante todo o tempo. Isso significa que para que haja segurança de sementes é necessário que haja suficiência, estabilidade e continuidade na sua disponibilidade. Por outro lado, significa também que a segurança em sementes incorpora diversos aspectos: a disponibilidade, o acesso, a informação e a qualidade de semente2. O anterior é particularmente importante em Moçambique, onde 90% da semente provêm do setor informal, - são produzidas pelos próprios camponês (Dominguez, 2001) e apenas 5 - 10% de toda a semente usada pelos pequenos agricultores são de variedades melhoradas (Libombo & Uaeine, 1999). As prioridades do governo na área de sementes são: (i) a promoção da produção local de sementes no sector familiar como uma medida alternativa e uma componente de fornecimento de semente de qualidade aos agricultores; (ii) a difusão de metodologias adequadas sobre tecnologias de produção, manutenção da qualidade física e genética das variedades durante os ciclos de multiplicação, assim como conservação de semente após a colheita, e (iii) a criação de mecanismos de circulação de semente dentro das comunidades e entre comunidades favorecendo as renovações periódicas. 2 Existe uma relação entre a segurança de sementes e a segurança alimentar; a segurança em semente é percussor da segurança alimentar; no entanto, a direção causal entre os dois é complexa. 1 Ao nível do Ministério da Agricultura, a Direção Nacional de Serviços Agrários (DNSA), através do seu Departamento de Sementes3 tem a responsabilidade de garantir a “melhoria da disponibilidade de sementes (qualidade e quantidade), através de projetos de produção local e comercial de sementes melhoradas, reactivação e melhoria da coordenação da cadeia de sementes e a reactivação dos laboratórios regionais de sementes”. Por seu turno o INIA tem a responsabilidade de produzir as primeiras gerações de semente e proceder às ações de purificação genética e manutenção varietal. Até 1999, a DNSA previa rever a legislação de sementes por forma o aumentar o seu impacto na “criação de um ambiente atrativo e catalisador para a intervenção do setor privado, em toda a cadeia de sementes, incluindo a importação, exportação e distribuição”. A entrada do setor privado na cadeia de sementes está em linha com a política neoliberal prosseguida pelo governo, que desde 1987 liberalizou a economia e por via disso, diminuir a intervenção do Estado no mercado. Contudo, a prática mostra que apesar dessa decisão, o Estado, quer através da organização e realização de feiras de insumos, ou distribuições gratuitas às populações vulneráveis, continua a intervir no mercado de insumos. Tradicionalmente se atribui às “falhas de mercado” o argumento para a intervenção pública no mercado, mesmo que a prior não essa intervenção não garanta maior eficiência4. Um maior protagonismo do setor privado no mercado de insumos ganha mais força na atualidade porque se considera que o Estado é um competidor, que reduz o poder de barganha das empresas comerciais. No que se refere à semente básica aventa-se a hipótese de que um maior protagonismo do setor privado na produção poderia contribuir para o desenvolvimento do mercado de 3 O Departamento de Sementes é uma entidade autônoma na prestação de serviços aos institutos de investigação, às empresas produtoras de sementes, aos projetos de desenvolvimento, ONGs e aos agricultores. Os seus principais serviços incluem: recolha de amostras para análises de qualidade, inspeção dos campos de produção de semente, inspeção às fábricas e armazéns de semente, análises especializadas de pureza, germinação e humidade de semente, etc. 4 “Falhas de mercado” ocorrem quando os mecanismos de mercado, não regulado pelo Estado e deixados livrememente ao seu próprio funcionamento originam resultados econômicos não eficientes ou indesejáveis do ponto de vista social. Tais falhas são geralmente provocadas por pelas imperfeições deo mercado, tais como a informação incompleta dos agentes, elevados custos de transação, existência de externalidades e ou ocorrência de estruturas de mercado de tipo concorrência imperfeita. 2 sementes5. No entanto, esta hipótese é apenas baseada no senso comum; há poucas evidências que sustentam tal hipótese. Por isso, o presente estudo inserido no âmbito das pesquisas do CESE, que está preocupado em entender as ligações entre a produção de tecnologias e os aspectos que afetam a sua transferência, se propõe a analisar as implicações da liberalização do mercado, traduzida pela entrada de novas empresas comerciais na produção de semente básica. As principais questões que norteiam o estudo são as seguintes: • Haverá interesse do sector comercial de sementes em envolverse na produção de semente básica? Quais as razões subjacentes à tal potencial interesse; • Será que a intervenção do sector comercial na produção de semente básica pode contribuir para o desenvolvimento do mercado de sementes no país? • Qual a percepção do setor privado em relação ao negócio de sementes no país?- Quem seria o maior comprador das sementes produzidas pelo setor privado- o Estado ou os camponeses? • Em que variedades o setor privado terá maior capacidade de melhorar a oferta de sementes? • Qual é a experiência doutros institutos de investigação, como o IITA em relação à produção de semente e sua colocação aos produtores a baixo custo. Será que essas experiências poderiam ser replicadas no país, e em que culturas? Após este capítulo introdutório, segue a descrição da metodologia. O capítulo II refere-se ao quadro conceptual a partir do qual o capítulo III analisa o sistema o sistema de sementes no país, incluindo a produção de semente básica. O capítulo IV sistematiza as conclusões e recomendações. 5 Em si este aspecto mostra o conflito até contradição dialética que representa o debate Estado versus mercado no contexto da economia capitalista. As implicações desse debate para uma política econômica requerem a articulação estratégica e ofensiva das dinâmicas econômicas e sociais por parte do Estado. 3 1.1 Metodologia Para a persecução dos objectivos propostos, usou-se uma abordagem qualitativa de investigação, consubstanciada pela aplicação de entrevistas semiestruturas a intervenientes-chave (key informants) na cadeia de sementes, para captar percepção deles em relação às questões de pesquisa. As entrevistas semi-estruturadas foram de natureza aberta iniciando com um tópico guia que cobre as questões centrais de pesquisa (Gaskell, 2009), o que permite aflorar as interpretações na fala dos entrevistados. A análise de conteúdo foi empregue para interpretar a fala dos entrevistados (Bauer & Gaskel, 2002; Bicudo & Espósito, 1997). II. O quadro conceptual para análise do sistema de sementes O “sistema de sementes” refere-se a todo complexo de organizações, indivíduos e instituições ligadas ao desenvolvimento, multiplicação, processamento, armazenagem, distribuição e comercialização de sementes (Howard et al., 2001). Quatro objectivos estruturam as prioridades da cadeia de sementes: (i) Fornecer o sistema agrícola com boas variedades de sementes; (ii) Estimular a produção suficiente quantidade de semente: isto é, satisfazer a procura; (iii) Garantir a qualidade do produto; (iv) Dar informação técnica sobre como produzir e como alcançar o máximo potencial das variedades; e a retroalimentação; isto é o feed back dos produtores. O sistema de sementes inclui o sistema tradicional (ou informal) no qual os agregados individuais encarregam-se de todas as funções de sementes, incluindo o desenvolvimento, multiplicação, processamento e comercialização de sementes, e os sistemas formais ou comerciais que compreendem organizações especializadas com papéis distintos no fornecimento de sementes de novas variedades. 4 Os sistemas de semente combinam elementos da teoria micro e macroeconómica; combinam relações de procura e oferta e envolvem o ambiente institucional (regras, leis e tradições) e ambiente organizacional (a estrutura e a conduta dos intervenientes). O quadro institucional determina em última instância, a segurança em sementes. As instituições6 constituem um dos quatro elementos fundamentais que influenciam a adopção e transferencia de tecnologia e a comercialização. As instituições, os incentivos de mercado, os investiemntos e as infraestruturas em interação com as políticas micro e macroeconomicas conformam os elementos fundamentais para a criação do ambiente favorável para adopção de tecnologia que sustentem a produção agrícola e o mercado. A partir da economia neoclássica a demanda individual é determinada pela renda e variação de preço. No entanto, esta análise se dissociada do contexto institucional é inadequada para explicar porque governos intervém no mercado através de subsídios ou apoiar os mais vulneráveis. As instituições determinam, por exemplo, a forma como o mercado funciona na prática, incluindo o nível de confiança (ou ausência desta), e os mecanismos que se adoptam para ultrapassar essa falta de confiança. A racionalidade para intervenção do governo em geral está associada a efeitos redistributivos e compensações, assimetria de informação, informação incompleta e presença de externalidades. Um sistema de sementes será “funcional” quando usa uma combinação apropriada do sistema formal, informal, mercados e canais não mercantis para estimular e satisfazer eficientemente as necessidades e procura de sementes de qualidade pelos agricultores (Howard et al., 2001). Um sistema de sementes em transformação passa através de diversas fases evoluindo do sistema tradicional, para um sistema mais complexo onde muitas e diferentes organizações (por exemplo as companhias de sementes, produtores de sementes, programas de certificação) jogam papéis especializados na cadeia da semente (Douglas, 1980). No entanto, o processo 6 Elas podem tomar a forma, por exemplo, de normas locais que regem o acesso dos recursos, direitos de propriedade e acesso à terra, políticas públicas, etc.( Ellis, 2000, p. 10). No caso de sementes podem ser a Lei de importação de sementes, libertação de variedades, procedimentos para protecção das variedades, propriedade intelectual, etc. 5 de transformação do sistema de semente não deve ser interpretado como uma simples progressão linear de um programa nacional de semente, em que o sistema informal é transformado em sistema formal. Em cada fase do processo de transformação é necessário reconhecer-se a complexidade e a diversidade do sector de semente, e os papéis dinâmicos de uma série de organizações formais e informais de semente na promoção do processo de transformação (Tripp, 1995). Dois aspectos se apresentam importantes no processo de transformação dos sistemas de semente (i) a mudança (que não significa necessariamente o declinio) do papel do sector público, à medida que o envolvimento do sector privado cresce nos diferentes estágios da cadeia de semente; e (ii) a importância decrescente do sistema informal à medida que o sistema de semente se desenvolve. O anterior é importante porque no passado as estratégias dos doadores e governos eram baseados numa interpretação estreita do processo de transformação, focalizando apenas no desenvolvimento de empresas de semente comerciais públicas ou privadas de grande escala e agências de regulamentação que promoviam o uso de sementes certificadas e de híbridos (Howard et al., 2001). Para a SADC os problemas de sementes serão melhor compreendidos se analisados numa perspectiva que articula as dimensões de segurança em sementes (disponibilidade, acesso e utilização), com a duração dos impactos (aguda ou crónica)7. Nessa perspectiva as evidências empíricas na região mostram duas tendências: (i) Que ao invés de um presumível objetivo geral de recuperação, há uma tendência crescente de transição de situação de insegurança aguda para crônica, e que isso está relacionado com o fato de que as várias formas de alivio, como a distribuição de variedades melhoradas, podem comprometer o funcionamento normal dos sistemas locais de sementes, alterar o desempenho de culturas mais robustas, e criar dependência pelo mercado; 7 A SADC criou em 2001 a rede de segurança em sementes na região- cuja função é providenciar liderança e coordenação na abordagem dos problemas de sementes 6 (ii) Em muitos casos as formas de ajuda aguda exibem aspectos de situação crónica; neste caso, as medidas de emergência aguda são implementadas numa perspectiva de solução de longo termo. Por exemplo, na Zâmbia e Zimbabwe, desde os anos 1950-60 houve um trabalho significativo no desenvolvimento de variedades modernas, entretanto, a adoção dessas “variedades modernas” nos anos 1980-1990 estava ligado a subsídios e/ou programas de distribuição gratuita (Domiguez, 2001; Muliokela, 1997). A Figura seguinte sistematiza as funções e organizações no fornecimento de sementes. A esquerda da figura se apresenta um conjunto de instrumentos que conformam o quadro institucional que determina a quantidade e qualidade de semente que chega às etapas da cadeia (produção de semente básica, multiplicação, processamento e distribuição). As leis e regulamentos de sementes podem ser relativos à propriedade intelectual, programas de certificação, padrão e qualidade de semente, contratos e fiscalização. 7 Leis e Regulamentos Lei de importação de semente; libertação de variedades; procedimentos para protecção de variedades e propriedade intelectual Pesquisa e Desenvolvimento Canal formal canal informal Agregados Familiares (AF) na Agricultura Empresas Privadas NARs LARs Variedade nova variedade local Multiplicação de Semente Programa de certificação, certificados e propriedade intelectual Canal formal canal informal Empresas público Estações de Explorações de Produtores Privado Pesquisa Sementes Contratados Associações/cooperativas Variedade nova AF na agricultura variedade local Processamento e Armazenamento de semente Canal formal Regulamentos para controlo de qualidade; direitos de propriedade, classificação e padrões canal informal Empresas público/privado, Processadores, Associações/cooperativas Privado, Empresas de sementes AF na agricultura Variedade nova variedade local Comercialização e distribuição de semente Informação sobre mercados, etiquetas dos produtos, marcas comerciais e preço de sementes Canal formal canal informal Empresas publico/privado, comerciantes, Empresa de semente, agentes de extensão, associações de agricultores Programas se ONGs/governo AF na agricultura variedade local Variedade nova Retido/Trocada Mercados Não trocado Figura 1. Quadro organizacional e institucional do sistema de sementes Fonte: (Adaptado de Howard et al., 2001). 8 III. A Produção de Sementes no País, Mercado e Organização do Sistema de Semente No país, o sector de sementes vem passando por profundas transformações; vários factores têm contribuído para descrever as mudanças que ocorrem na área de sementes. As mudanças na economia e a entrada em vigor do novo regulamento de sementes são factores decisivos para as mudanças que actualmente caracterizam este sector. Até 1999, a “Sementes de Moçambique”- a SEMOC era a única empresa produtora de semente no país, tanto nos seus campos como sob contrato com agricultores (Bay 1997). 90% da semente produzida pela SEMOC era destinada aos programas de emergência; apenas 10% da semente era distribuida através da Boror Comercial ou vendida em quantidades pequenas na Loja de Maputo (Howard et al., 2001). Em 2000, a com o estabelecimento da PANNAR no país se imprimiu alguma concorrência no sector comercial de sementes e aumentou o leque de escolhas de variedades para os produtores. Contudo, a quantidade de semente vendida através de agentes e retalhistas continuou baixa nos anos 2001 e 2002, sendo estimada em apenas 20% da quantidade total vendida pelas companhias de sementes, continuando a maior parte a ser colocada no mercado via emergência (Massingue & Alberto, 2004). Com o término dos programas de emergência generalizada (entre 19761992), o mercado do sistema formal de sementes diminuiu significativamente no país. Por exemplo, as vendas da SEMOC caíram mais de 14,000 toneladas por ano no início dos anos 1990 para 3,000 toneladas em 1997/98 (Howard et al., 2001). Como parte da re-estruturação uma parte significativa das acções da SEMOC foram adquiridas pela SeedCo Zimbabweana8. Até 2001, o principal constrangimento para a disponibilidade e acesso de semente certificada estava ligado ao fraco desenvolvimento do mercado. Em 2001 foi aprovado o novo regulamento de sementes que criou as condições 8 Actualmente a SEMOC está sendo re-estruturada tendo o Estado adquirido as acções que tinham sido compradas pela SeedCo, e sua administração tutelada pelo Instituto de Gestão das Participações do Estado-IGEPE. 9 para a dinamização do sistema de sementes no país, enfatizando maior intervenção do sector comercial e a produção local de sementes no país9. Em 2002, a produção total de semente pela SEMOC e a PANAR foi de 3,500 toneladas. Actualmente estima se que a produção total de semente seja 6,000 toneladas/ano; 82% dessa quantidade é milho de polinização aberta (OPV); 14% é semente de feijão nhemba, amendoim e mapira (Ribeiro, 2010). A produção total de semente da SEMOC em 2010 foi de 4,000 toneladas, sendo 2,000 toneladas de milho e 2,000 toneladas de arroz. No entanto, a procura real de sementes de grão não ultrapassa 2,000 toneladas. A quantidade de semente comercializadas pelos circuitos formais em 2010 é estima-se entre 8 e 8,5 mil toneladas. 80% dessa quantidade foi distribuição subsidiada principalmente pelo MINAG e ou pouco pelas ONGs10. A percepção das empresas comerciais sob a comercialização de sementes é de que o Estado é o maior comprador das sementes, pois, maior parte das ONGs que trabalhavam nos programas de desenvolvimento, como a Save the Children, FDC, FHI, etc., actualmente estão a reduzir as compras de sementes. Segundo Ribeiro (2010), as vendas através das empresas comerciais e pequenos vendedores de sementes nas zonas rurais (agro-dealers) representam apenas 20% do volume total comercializado11. Em 2010, o MINAG/DNSA lançou-se três concursos: (i) Para um lote de 3,000 toneladas de semente de milho; (ii) Para uma lote 3,000 toneladas de semente de batata; e (iii) Para um lote de 500 toneladas de semente de feijão nhemba e hortícolas diversas. Em 2011, os concursos lançados este ano (2011) pelo MINAG no âmbito do Plano de Acção para a Produção de Alimentos são para aquisição das seguintes quantidades de semente para 1ª e 2ª época 2011/12: 9 As maiores críticas à legislação de sementes têm haver com a falta de capacidade para implementação e fraca harmonização com a região. 10 Ibid. 11 Presume-se são as vendas fora das compras do Estado. 10 Tabela 1 Quantidade de semente procurada pelo MINAG para implementação do Plano de Acção para Produção de Alimentos, no período 2011/12 Tipo de semente Variedade Quantidade em Toneladas Milho (OPV) Milho híbrido Matuba/ Tsangano/Djanza PAN 67 Soja 2,000 1200 800 Trigo Nduna 1,400 Arroz ITA-312 2,000 Mapira Macia 500 Manteiga/Enselin 200 BP1 3,000 Feijão vulgar Batata reno Hortícolas diversas 4 Fonte: MINAG/DNSA Às quantidades acima se somam as referentes aos concursos lançados nas províncias cujos dados não se fez o levantamento. A falta de dados não permite estimar o valor actual do mercado total de semente12. No entanto, a existência de emergência joga um grande papel na quantidade de semente que é vendida no país. Quando há emergência as quantidades podem disparar e quando não há emergência as vendas caem abruptamente. Mas a grande preocupação das empresas é a insuficiência da produção e incapacidade de manutenção de stocks para fazer face à situações em que a procura é maior; tendo as empresas de recorrer às importações. Parte da semente adquirida por via dos concursos pelo MINAG é posteriormente entregue a crédito aos retalhistas rurais que se encarregam depois de revender aos pequenos produtores. A falta de armazéns convencionais para o armazenamento e conservação de semente nos distritos constitui um constrangimento sério para a manutenção da qualidade das sementes distribuídas. As direcções distritais de agricultura ensaiaram várias 12 Precisaríamos do valor das vendas dos dois sistemas formal e o informal. A maior dificuldade tem haver com a dificuldade de acesso à informação, ou mesmo não se sabe qual a quantidade de semente que o país precisa por ano. As informações sobre a produção interna de semente, quantidades de semente vendida, importada continuam em banco de dados isolados e algumas vezes de difícil acesso (Massingue & Alberto, 2004). 11 formas de gerir a distribuição de sementes e gerir os riscos associados ao processo. Uma modalidade consistia na entrega da semente aos produtores via contratos com comerciantes. Este processo mostrou baixos níveis de cobertura devido ao menor numero de comerciantes com capacidade financeira nos postos administrativos. O segundo sistema (das senhas de insumos) é implementado no âmbito do programa de insumos de emergência apoiado pela FAO; este programa é relativamente vantajoso porque se envolvem os agro-dealers espalhados pelos distritos, o que aumenta a cobertura e reduz o risco de que a semente se deteriore nos armazéns distritais. Em 2010, o produtor recebia uma senha que lhe permitia comprar um kit de insumos composto por 2 sacos de adubo mais 12,5 kg de milho pagando pela senha 813,00 Meticais. O valor total do kit era 2,300.00 Meticais, sendo que a FAO cobria a diferença. No entanto, este sistema tem limitações uma vez que depende de apoio externo. Presume-se que o sistema tenha já terminado, e não sabe qual vai ser o futuro. A Figura seguinte reproduz o sistema de fornecimento de sementes pela DNSA no âmbito da implementação do Plano de Acção para a Produção de Alimentos. Figura 2 Sistema de Fornecimento de Semente no âmbito do PAPA Fonte: Adaptado de Ribeiro, 2010 12 As feiras de sementes são consideradas mecanismo importante para provisão de insumos aos pequenos produtores. As feiras de insumos em geral são levadas a cabo pelo governo e ONGs para dar resposta à demanda temporária de sementes decorrente do déficit estrutural de sementes causado pelas fracas colheitas. Para apoiar as famílias afectadas pela estiagem na campanha 2009/10, o MINAG e parceiros realizaram feiras de insumos nas províncias de Gaza, Sofala, Manica e Zambézia, beneficiando um total de 20.000 famílias. Contudo, muitas vezes as medidas de resposta partem da presunção de que quando há uma emergência deve haver sempre uma resposta em sementes, sem, contudo ter-se em conta os sistemas locais de semente. O sector informal contribui para a cadeia de sementes como produtor e joga um papel crucial no fornecimento de semente de culturas básicas e como o principal consumidor da semente. Por outro lado, muitas vezes essas intervenções têm pouco impacto se tomar-se em conta o custo de sua implementação (Jones et al., 2001; Longley et al., 2001). Para aumentar o impacto das respostas se deveria ter conta a compreensão de todos os sistemas de semente que os produtores utilizam e do papel que esses sistemas têm no apoio aos modos de vida. Por outro lado, as respostas para que sejam efectivas devem ter o objectivo imediato de facilitar o acesso a material apropriado enquanto ao mesmo tempo procuram no longo prazo contribuir para a melhoria dos sistemas agrários locais. A opinião das empresas comerciais é favorável à realização das feiras de insumos, provavelmente pela oportunidade que representam as feiras para as empresas que não logram aprovação nos concursos públicos para a provisão de sementes ao MINAG. No entanto, considera-se que o impacto das feiras poderia ser maior se a qualidade do material disponível fosse boa. 13 3.1 Produção de Semente Básica A única instituição pública que produz semente pré-básica e básica no país é o IIAM através da sua “Unidade de Semente Básica” (USEBA)13. No exercício de suas atribuições compete ao IIAM organizar e manter o sistema de produção de sementes do melhorador, pré-básicas, básicas e certificadas. A USEBA produz a semente básica quase integralmente nos Centros Zonais do IIAM. Apesar de ter sido criada em 2003, apenas em 2007 é que a produção de semente básica começou a ganhar notoriedade. A Tabela seguinte se refere à produção de semente básica pela USEBA no período 2008- 11. Em geral há uma tendência de crescimento da produção. As evidências, no entanto sugerem que essas quantidades não são suficientes para a satisfação das necessidades de sementes no país. Tabela 2 Produção de semente básica em Moçambique no período 2008-11 Culturas Quantidade em Toneladas 2008/09 Milho 2009/10 2010/11* 112,5 120,4 365 Mexoeira 48 4,6 3 Arroz 94 123 366 Mapira - 20,3 68 Trigo - - 0 4,32 18,1 40 - 13,40 55 7,5 15 53 - 6 5 8,4 15 25 0,435 36 28 Batata reno 20 50 Mandioca 3,000,000** 840,000 Amendoim Feijão vulgar Feijão nhemba Feijão boer Soja Algodão 5,200,000** Fonte: MINAG/2011. Notas: * Projecção; ** estacas de mandioca. 13 A USEBA foi criada em 2003, na sequência do Memoradum de Entendimento entre o governo de Moçambique e o ICRISAT visando à implementação de programas de fortalecimento da investigação agrária nas regiões semi-áridas 14 Uma avaliação recente da USEBA indica que das 17 estações experimentais nas áreas de investigação e ensaios todas em geral precisavam de equipamentos por forma a continuar as suas actividades. Actualmente estão sendo feitos investimentos nas estações, dando mais atenção àqueles que pela sua importância podem gerar maiores retornos no médio e curto prazo. Os principais problemas que afectam o desenvolvimento da USEBA são: (i) A transferência atempada dos fundos para assegurar o pagamento de salários aos trabalhadores inventuais, que constituem a maior parte da mão-de-obra intensiva sazonal que assegurar a produção de sementes nas estações experimentais; (ii) Inadequada coordenação entre as estações e o nível central; por exemplo, há pouco controlo do material que é entregue às empresas comerciais para multiplicação, facto que compromete a possibilidade de que o material produzido possa ser certificado como semente pelo Departamento de Sementes,- entidade responsável pela aprovação da libertação das variedades: (iii) A falta de transparência e comunicação entre as estações e o nível central, principalmente no que diz respeito à troca de informações sobre quantidades produzidas, planos de produção, valores arrecadados, destinos da semente, etc. (iv) Equipamentos de rega obsoletos e em más condições, (v) Falta de condições/capacidade de armazenagem de sementes de melhorador, pré-básica e básica; e (vi) Insuficiente experiência dos técnicos de campo. Por outro lado, embora de júri o IIAM tenha atribuição para “organizar e manter o sistema de produção e comercialização da semente do melhorador, pré-básicas, básicas e certificadas, de mudas”; a USEBA não é ainda suportada por um quadro legal que oriente as suas actividades. É urgente a conclusão e aprovação do regulamento para assegurar o correcto funcionamento da USEBA. Desde cedo, a SEMOC reconheceu a fraca capacidade do Instituto de Investigação Agrária (INIA) em termos de geração de novas variedades por 15 isso, iniciou nos seus campos testes de variedades e actividades de investigação em colaboração com o INIA e a Universidade Eduardo Mondlane (UEM). A SEMOC concentrou-se na avaliação de material indígena e material introduzido, produção de semente pré-básica e básica e a utilização de variedades de polinização aberta (OPV) em vez de híbridos, devido ao baixo nível de gestão dos campos de semente e a limitada capacidade dos agricultores moçambicanos para a compra de híbridos anualmente (Howard et al., 2001). O Quadro seguinte se refere à estrutura do sistema produtivo de semente no país antes da liberalização do mercado. Quadro 1 Tipo de semente e formas de sua obtenção Tipo de semente Como obtê-la Material parietal Obtida através da selecção e cruzamentos feitos ao longo de vários (semente do anos (geralmente 8 anos) melhorador) É parte da semente do melhorador que as empresas de produção Semente Pré-básica recebem do melhorador (INIA); geralmente são poucos kilos que as empresas recebem do melhorador Produzida geralmente nas unidades de produção de semente básica; Semente básica por exemplo, a Estação da SEMOC no Umbelúzi é que no passado fazia a produção de semente básica Refere-se à primeira geração. Para plantas de polinização aberta, Semente certificada I Semente certificada II normalmente se interrompe aqui as multiplicações Refere-se à semente de segunda geração Nota: semente certificada I e II é a semente que maior parte das vezes se comercializa; isto é a semente que chega às lojas para venda aos produtores Actualmente apenas a PANNAR tem programas de investigação na área de sementes com ajuda de parceiros regionais. A PANNAR é única empresa 16 produtora de híbridos sob contrato com a MozFoods e outros produtores comerciais. A SEMOC continua a multiplicação de semente subcontratando produtores médios (com mais de 30 hectares) ou em associações. A grande preocupação dos produtores subcontratados gira em torno do preço que as empresas a SEMOC oferece (10,00Mt/Kg de semente de milho), que consideram ser baixo. Além da SEMOC e PANNAR entraram no mercado novas empresas de sementes, como a MozFoods, a Lazane Farms e a IKURU14. A MozFoods neste momento é a principal empresa produtora de semente básica de arroz na zona sul e tem prevista a libertação de sete (7) novas variedades de arroz. A IKURU é uma empresa fundada em 2003, com investimento inicial das associações de produtores no norte do país15. Desde 2006 com assistências de seus parceiros internacionais produz sementes de milho (OPV e híbridos), amendoim, gergelim, soja e feijão nhemba usando contratos com produtores. A IKURU também tem parceria com o IIAM para aquisição de semente básica. Através do Programa de leguminosas de grão apoiado pelo IITA, o IIAM fornece semente básica aos multiplicadores da IKURU. A IKURU por sua vez garante benefícios aos produtores na aquisição de semente e fertilizantes e providencia assistência técnica. Assim a integralização do pacote tecnológico tem suporte da IKURU. Os grandes desafios da IKURU são a garantia de quantidades suficientes e regulares de grão para exportação, a oscilação dos preços de compra ao produtor e a degeneração de variedades, especialmente em relação à variedade nametil de amendoim, que se considera estar a perder as suas características. À pergunta se as empresas comerciais estariam interessadas de produzir semente básica e qual a motivação subjacente se percebeu que as empresas precisam de produzir semente básica para si mesmas para assegurar a 14 De referir que antes da liberalização do mercado e aprovação do regulamento de sementes em 2001, a participação do sector privado no desenvolvimento duma indústria de sementes no país era incipiente. A lista de novas empresas não se restringe apenas às empresas acima apresentadas; existem muitas pequenas empresas espalhadas pelas províncias; no entanto, devido à sua maior escala de produção e talvez a qualidade do trabalho que realizam, as empresas acima listadas têm maior significado. Esta distinção é especialmente importante para orientar as estratégias de desenvolvimento do sector de sementes no país. 15 20% das acções da IKURU são detidas pelos produtores: 40 pela GAPI e os restantes 40% pela Novib. 17 regularidade e qualidade de semente nas suas empresas. As dificuldades que a USEBA tem de garantir semente estão na razão da pretensão das empresas produzirem semente básica, conforme atestam as afirmações seguintes: “A USEBA não tem condições de produzir e armazenar a semente em boas condições; o ano passado devolvemos 9 toneladas de semente produzida em Nante, na Zambézia. A produção do IIAM depende da chuva o que provoca atrasos nas entregas” (entrevista em Chimoio, 20/6/2011). Quanto à falta de semente a SEMOC, por exemplo, indicou que este ano teve falta de semente básica de mapira, feijão vulgar, milho e arroz. Tendo em conta os custos adicionais que representa a condução de programas de investigação, seria uma vantagem para as empresas apenas multiplicar a semente e em seguida colocar no mercado. No entanto, por causa dos problemas acima indicados preferem embarcar na produção de semente básica, pois têm a confidência de que o material produzido será de melhor qualidade, reduzindo o risco de enfrentar problemas com os clientes, conforme se indica no trecho seguinte: “[...] fizemos contratos de royality com IIAM/USEBA para multiplicação de milho matuba, amendoin namitil, feijão nhemba IT18 e mapira de várias variedades, tivemos problemas com os camponeses com os quais tínhamos contratos porque a semente tinha baixo poder de germinação... o IIAM perdeu a capacidade de manutenção de variedades e disponibilização de materiais” (entrevistas com o sector comercial, 17/06/2011). A produção de semente básica é um processo caro e custoso pelas exigências técnicas que envolvem o processo produtivo, no entanto, actualmente o custo de oportunidade associado à questão de qualidade ultrapassa as vantagens de que a produção de semente básica seja conduzida pelo sector público. A desconfiança da qualidade de semente não se circunscreve apenas à semente básica, mas também à semente pré-básica; é dizer “se a qualidade física da semente básica não é boa é plausível desconfiar a qualidade fisiológica da semente progenitora”. As empresas defendem limitar acção do IIAM/USEBA à produção de semente do melhorador e produção de semente pré-básica. A produção de 18 semente básica através das empresas iria contribuir para a melhoria da qualidade da semente e mudança de mentalidade dos produtores em relação ao valor da semente. Mas a mudança de percepção dos produtores é um processo gradual, que exige ações concertadas em várias áreas. A diminuição da intervenção do Estado no mercado pode abrir espaço para que as empresas definam estratégias empresarias que incentivam a demanda. As empresas seriam cada vez obrigadas a ir ao encontro dos produtores para vender os seus produtos, e por via disso garantir a comercialização da produção, através da aquisição da semente produzida pelos produtores. Portanto, a intervenção das empresas pode contribuir para o fortalecimento do binómio produção-comercialização, através das demonstrações e garantia de mercado para os produtores. A hipótese de que o interesse das empresas comerciais pela produção de semente básica pudesse estar relacionado com a possibilidade de ganhar “muito dinheiro” através da subcontração das empresas pelo IIAM não foi confirmada. A limitada capacidade do IIAM/USEBA em proporcionar semente em quantidade e qualidade justifica a pretensão das empresas se envolver na produção de semente básica. Até porque a produção de semente básica é custosa e menos lucrativa. O orçamento anual de USEBA é de cerca de 5 mil contos. A subcontratação de empresas para a produção de semente básica não deve ser um fim, mas um meio para se atingir a qualidade e suficiência de sementes no país. Neste momento é errônea a ideia de que no curto prazo o IIAM/USEBA vai poder produzir semente suficiente para cobrir as necessidades de semente no país. Por isso, desde um ponto de vista estratégico a segurança de sementes no país passa pelo estabelecimento de parcerias entre o sector público e o privado. A USEBA considera ser possível num horizonte de 3-4 anos atingir-se a auto-suficiência de semente de algumas culturas básicas (principalmente milho e arroz). Aumenta esta convicção o facto de que já houve excedentes de semente de mapira que não tiveram colocação. No entanto, para as empresas os excedentes não têm mercado por falta de qualidade. A falta de colocação dos excedentes reforça a ideia de que as políticas e programas do governo na área de insumos são dominados por uma abordagem que enfatiza a oferta de tecnologias, dando pouco enfoque ao fortalecimento de 19 estratégias de procura dessas tecnologias (Howard et al., 2001). As empresas reconhecem o esforço do governo na criação de condições para melhorar o acesso à semente. No entanto, consideram que esse esforço poderia ser significativo se os investimentos fossem traduzidos em semente de qualidade. A percepção dominante é de que em geral a qualidade de semente disponível é de baixa, e as intervenções do governo não criam incentivos para o fortalecimento das ligações entre os fornecedores de insumos, produtores e o mercado de produtos, razão porque a procura real de sementes é menor. 20 IV. Considerações finais A partir do presente estudo quisemos contribuir uma base de conhecimento que suporte a tomada de decisão. Aprendemos que a entrada de novas empresas de sementes veio dinamizar o processo de produção de semente no país. A produção de semente passou de 3,500 toneladas em 2002 para cerca de 6,000 toneladas/ano em 2010. No entanto, a quantidade de semente produzida ainda não satisfaz as necessidades de semente no país. O Estado é o maior cliente no sector de sementes. No entanto, a intervenção do Estado no mercado de sementes não estimula o desenvolvimento do mercado e da percepção dos produtores em relação ao valor da semente. Existe um interesse das empresas partirem para a produção de semente básica como forma de contribuir para falta de semente básica de qualidade no país. Assim, sugerimos (i) a melhoria da capacidade técnica e de gestão do IIAM/USEBA por forma a que este cumpra com eficácia a sua missão; (ii) o alinhamento dos investimentos em curso para aquisição de equipamentos, reabilitação dos sistemas de rega e de armazenamento e modernização das estações de acordo com as prioridades de desenvolvimento do sector agrário; (iii) o estabelecimento de parceiras entre o IIAM/USEBA e o sector comercial. A subcontratação de empresas comercias para a produção de semente não deve ser um fim, mas um meio para resolver a falta de semente de qualidade no país. Maior protagonismo das empresas pode permitir maior competitividade entre as empresas e o desenvolvimento de estratégias que incentivam a procura. A mudança do papel do Estado (que não significa necessariamente o declínio) do papel do sector público, à medida que o envolvimento do sector privado cresce está em linha com a teoria da economia política do Estado segundo a qual para que a acção do Estado seja efectiva no processo de desenvolvimento é necessário que o Estado inicie o processo adoptando sequências “mais compulsivas”, mas na sequência a segunda função do Estado deve ser o de desenvolver acções reguladoras que catalizem o processo de desenvolvimento. Não parece conveniente que o IIAM integralize os pacotes tecnológicos, isto é, que entregue a semente e outros inputs como estratégia para assegurar 21 que os resultados da investigação sejam maiores, mas sugere-se que estreite as ligações entre a investigação e a extensão, bem como com outros sectores da cadeia de sementes. As experiências da Tanzânia e Gana são ilustrativas da importância de políticas favoráveis à adopção e transferência de tecnologia e a necessidade de uma abordagem de cadeia de sementes para o sucesso dos resultados da investigação. O Gana beneficiou do Projecto SG2000 logo em 1984 após começar as reformas de sua economia; o programa tinha o objectivo central a transferência de tecnologias que garantissem o aumento da produção das culturas alimentares. A transferência de tecnologias, crédito e a disponibilização de outros inputs constituíam o foco das actividades do programa. Houve um grande esforço da extensão para transferir as tecnologias de produção usando a abordagem de “aprender por fazer” permitindo que os produtores ponderassem os riscos, custos e benefícios de adoptar uma nova tecnologia. O crédito estava directamente ligado à produção através dos inputs; no entanto, o processamento e a comercialização não constituíam componentes chave do programa, o que reduziu o impacto dos resultados programa. A Tanzânia beneficiou nos anos 1990 do Projecto Sasakawa Foundation & Carter Center cujo objectivo era induzir a modernização da agricultura através do uso de fertilizantes e variedades melhoradas de milho e práticas agronômicas melhoradas de produção. Embora o projecto tenha criado incentivos em termos de conhecimentos, germoplasma e outros inputs e crédito, os resultados não foram satisfatórios por causa das políticas que tinham pouco impacto nas instituições, incentivos, e infraestruturas. Por isso pensamos que o IIAM pode aumentar o impacto da transferência de tecnologias (i) advogando para criação de um ambiente favorável à transferência de tecnologias, enquanto por outro lado, (ii) reforça as ligações com outros sectores da cadeia de sementes. Por exemplo, a parceria com o sector privado pode permitir maior competitividade entre as empresas e o desenvolvimento de estratégias empresariais orientadas pela demanda; as empresas poderiam fazer o marketing e extensão, - através da demonstração das sementes por elas produzidas, criando condições para que os produtores comecem a comprar a semente e os inputs necessários à produção e comercialização. 22 No período de crise da SEMOC,- quando a emergência terminou, a SEMOC desenvolveu estratégias adaptativas de impacto em termos de demonstração de tecnologias. Técnicos que assistiram no desenvolvimento da da SEMOC e que continuaram a trabalhar para a empresa transportavam nas suas viaturas embalagens pequenas de sementes para as áreas remotas e junto dos produtores montavam ensaios de demonstração de variedades, permitindo que os camponeses pudessem aprender vendo e por via disso comprar as sementes melhoradas. As mudanças reais da liberalização no sector de sementes podem ser captadas em um horizonte temporal relativamente razoável. Por isso, sugere-se que no futuro seja feita uma avaliação quantitativa ou “inquérito de sementes” visando analisar o comportamento dos produtores em relação ao consumo/utilização das sementes, principalmente a análise do consumo de semente por categorias de renda e outras variáveis. 23 V. Referências Bauer, M.; Gaskell, G. (orgs.). Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som. Um manual prático. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002. Bicudo, M.; Espósito, V. Pesquisa qualitativa em educação. Piracicaba: Editora Unimep, 1997. Brannen, J. (Ed). Mixing methods: qualitative and quantitative research. England: Avebury, 1992. Douglas, J. (ed.) 1980. Successful Seed Programs: A Planning Guide. Westview Press, Boulder, Colorado. Dominguez, C. Sistema Informal de Sementes. Causas, consequências e alternativas. Maputo: Associação do Centro Cultural de Matalane. 2001. Ellis, F. 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