JONAS NOSSO CONTEMPORÂNEO Igreja Batista Bíblica em Valparaíso www.ibbv.org.br JONAS NOSSO CONTEMPORÂNEO Este material é um resumo do livro: JONAS, NOSSO CONTEMPORÂNEO Autor: Isaltino Gomes Coelho Filho Editora Juerp Usado na Escola Bíblica Dominical, Classe de Jovens, da Igreja Batista Bíblica em Valparaíso, Santo André. Disponível para download no site: www.ibbv.org.br Santo André, janeiro de 2013 1 AULA A FIGURA DE JONAS Bastante criticado em nosso meio, onde é conhecido como ‘‘profeta fujão’’, ele é o quinto dos chamados profetas menores. O que tem para nos ensinar, hoje, a história de um homem que se recusou a pregar num lugar que nem mais existe, e que foi engolido e vomitado por um peixe? Pode ter alguma relevância para o nosso mundo hoje? Há nela alguma coisa de valor para nós? Sem dúvida alguma, Jonas é uma das mais intrigantes personalidades de toda a Bíblia. Afinal, aconteceu com Jonas aquilo que é o sonho de todo pregador: conversões em massa. Uma cidade inteira se converteu. E ele se sentiu irritado com isso. Aliás, mais do que irritado, ele se sentiu profundamente deprimido a ponto, a ponto de desejar morrer. Coisa raríssima: um homem frustrado porque alcançou sucesso. Sem dúvida, Jonas é um tanto desconcertante para os nossos esquemas mentais. Mas, curiosamente, muitos de nós agimos exatamente como ele. Na realidade, poucas personalidades são tão enriquecedoras como este profeta. E, no entanto, sabe-se pouco sobre ele. No Antigo Testamento, fora do livro que leva o seu nome, ele é citado apenas em 2Reis 14.25 e, mesmo assim, circunstancialmente. Quando se pensa em Jonas, pensa-se logo no peixe. Uma pena é que sua pessoa tenha passado para lugar inferior, em relação ao espaço que o grande peixe que o engoliu tem ocupado. Jonas é um contemporâneo nosso como poucos profetas o são. Nele vemos muitos dos nossos preconceitos contra aqueles que não são da nossa fé. Vemos muito da nossa maneira arraigada de entender as coisas e querer que Deus tenha um ponto de vista semelhante ao nosso. Mas a graça de Deus é muito grande e supriu as deficiências do profeta, como pode suprir as dos que querem servi-lo, mas tropeçaram. Jonas é um homem muito bem-intencionado para com a obra de Deus, mas bastante confuso e até mesmo atrapalhado. Pretende saber mais do que Deus e quer corrigi-lo. É um homem que tem teologia própria, que presumiu que sabia resolver os problemas de Deus melhor do que o próprio Deus, Por causa de seus preconceitos teológicos, recusou-se a ser um missionário, uma bênção para os outros. E, é com tristeza que o dizemos, que veremos como muitas vezes os gentios (no nosso contexto, os não-crentes) por vezes exibem padrões espirituais bem mais elevados que os do povo de Deus. Um esboço para compreender o livro Um esboço bem simples e literal é aquele que vê cada capítulo como sendo uma unidade completa. Teríamos, então: 1. Missão e fuga - capítulo 1 2. Punição e salvamento - capítulo 2 3. Pregação e conversão - capítulo 3 4. Queixa e repreensão - capítulo 4 Há ainda outra divisão, feita por Vincent Mora que nos ajudará na compreensão: Deus envia Jonas em missão aos pagãos: Deus e os pagãos: Deus e Jonas: Primeira parte 1.1 a 1.3 1.4 a 1.16 2.1 a 2.11 Segunda Parte 3.1 a 3.4 3.5 a 3.10 4.1 a 4.11 Ora, este esboço de Mora tem um alcance extraordinário, por sua simplicidade. Ele nos mostra que o sujeito do livro, além de não ser o grande peixe, não é nem mesmo Jonas. É Deus. O livro começa com ‘‘a palavra do Senhor’’ e conclui com o Senhor falando. A palavra do Senhor desencadeia o processo e também o encerra. Sim, é Deus quem dita o rumo dos eventos. Ele ordena a Jonas que pregue em Nínive (1.1). Quando o comissionado foge, ele o alcança no navio (1.4). Prepara um peixe que o engole (2.1). Manda ao peixe vomitá-lo (2.10). Ordena novamente ao teimoso profeta que cumpra a sua missão (3.1). Poupa Nínive (3.10). Chama o profeta à atenção pela primeira vez (4.4). Chama-o à atenção pela segunda vez (4.8). E conclui o livro apregoando o seu direito de ter misericórdia de quem quer ter (4.11). Termina falando a seu próprio respeito. E aqui está uma curiosidade: há dois livros do Antigo Testamento que terminam com uma pergunta: Jonas e Naum. Ambos tratam da mesma cidade, Nínive. Em ambos os casos, a pergunta é retórica, ou seja, dela não se espera resposta. Não foi formulada para ser respondida, mas para encerrar a questão. O livro de Jonas foi estruturado para se fechar com um clímax: Deus falando sobre Deus, deixando uma indagação que o homem questionador do seu plano não tem como responder. O término do livro é a reafirmação da Soberania de Deus. Para a próxima aula, leia: Jonas 1.1-3 Jonas, nosso contemporâneo www.ibbv.org.br 2 AULA Envolvendo-se em Problemas Texto Base: Jonas 1.1-16 ‘‘... veio a palavra do Senhor a Jonas’’: é assim que começa a nossa história. É assim que começam as histórias dos profetas, como lemos em Oséias, Joel, Amós e tantos outros. Esta deveria ser uma história igual à história de todos os outros profetas, mas, apesar do início comum, haverá nela duas diferenças bem marcantes. Pela primeira vez Deus está enviando um profeta a uma cidade pagã para uma missão de clamar a Palavra. A segunda diferença entre Jonas e os que antecederam é a sua atitude: ‘‘...levantou-se para fugir da presença do Senhor’’. Nínive, a capital da Assíria, tornou-se famosa por sua crueldade. Seus métodos de tratar os vencidos incluíam decepar as mãos, vazar os olhos, empalamento etc. Chegou a cobrar tributos de Israel, reino do Norte, o país de Jonas (2Reis 15.20) e, por fim, destruiu Israel (2Reis 17). Se Nínive fosse destruída, não iria destruir mais tarde a Israel. Há até certa lógica em Jonas. Ele tem bons planos, sabe observar o mundo ao seu redor, interpreta os fatos. Tudo que se espera de um bom líder. É um homem zeloso pela obra de Deus. Jonas conhece Nínive. Mas, como profeta que era, também conhece a Deus. Sabe que ele é misericordioso, longânimo e grande em benignidade (4.2) e que vai dar uma oportunidade a Nínive se houver conversão na cidade. Jonas tinha sua própria teologia. O problema com Jonas é que ele é radical em seus pontos de vista e faz de si mesmo a palavra final. Ele não deseja crescer na sua compreensão de Deus. Quando decide se movimentar, seu movimento é descendente: desce para Jope, desce para o porão do navio, desce para o profundo do mar. O caminho da desobediência é um caminho descendente. Na sua oração, registrada no capítulo 2, Jonas cita várias passagens do livro de Salmos. Parece que ele conhecia bem alguns deles. Mas, se os conhecia, ignorou o que diz Salmo 139.7,8. Aprendemos aqui que é possível uma pessoa saber verdades bíblicas e, no entanto, viver em desarmonia com elas. Conhecer não significa, necessariamente, praticar. Um homem insensível (1.4-10) Agora vai começar a enrascada de Jonas. Diga-se de passagem que ele procurou por ela. O Deus que avalia o comportamento dos homens é também o Deus da natureza. E isto vai ficar bem claro agora. Vai julgar o comportamento de Jonas, valendo-se da natureza para ministrar disciplina ao desobediente. Ele lança um forte vento sobre o mar e se forma uma grande tempestade. Experimentados e profundos conhecedores do mar, os marinheiros sabem avaliar o que tem diante de si. Compreendem que a situação é bastante feia. A sensação de medo os domina. A morte é iminente. ‘‘...clamavam cada um ao seu deus...’’. Lançam-se freneticamente ao trabalho: aliviam a carga do navio. Mas, enquanto a sua sensação é de terror, Jonas dorme. Dorme por ser insensível! É nesta altura que o mestre do navio, numa provável inspeção para ver como andavam as coisas, chega ao porão para onde Jonas descera e se espanta com o sono daquele passageiro. Como é que pode uma pessoa dormir assim? Desparta-o e manda-o clamar ao seu deus. No momento da dificuldade, qualquer ajuda serve, é o raciocínio. Mas logo a quem vai ele pedir oração! Se há uma coisa que Jonas não parece muito disposto a fazer, no momento, é orar. Ele não está interessado em buscar a Deus. Pelo contrário, está fugindo dele. Como orar? Que ironia! O homem, o único homem no navio, que podia fazer uma oração verdadeira ao Deus verdadeiro, não tem condições de orar. Quando os não crentes não podem contar com as orações dos crentes, a quem pedirão intercessão? Assim que questionado pelo mestre do navio, Jonas apresenta uma resposta totalmente incoerente. Ele é hebreu e declara temer a Deus. Acrescenta, ainda, a superioridade de Deus sobre as divindades invocadas pelos marinheiros: ele é quem fez o mar e a terra seca. Ou seja, quem fez tudo. Mas se Jonas o teme, por que o desobedece? Não se envergonha da sua fé, mas também não a vive. Jonas, nosso contemporâneo www.ibbv.org.br 2 AULA Envolvendo-se em Problemas Texto Base: Jonas 1.1-16 Conhecemos muitos iguais a ele. Às vezes, nós mesmos somos iguais a ele. Temos informação, mas não vivemos de acordo com elas. Surge agora um dos muitos contrastes do livro: o temor de Deus, que o homem de Deus deveria ter, mas não tem, os pagãos, que não deveriam ter, tem. Eles vão mostrar que são, na sua ignorância, um exemplo de espiritualidade, ainda que errada. E, depois, manifestarão um respeito pela vida humana que Jonas não manifestou. É realmente impressionante e, ao mesmo tempo, muito triste verificar que não são poucas as vezes que os incrédulos manifestam mais respeito por Deus do que os próprios cristãos. Descendo mais um pouco (1.11-16) Eles já sabiam que o problema não é com eles. É outro o culpado. Sabem que Deus, o Deus de Israel, está atrás de um dos seus adoradores. Isso ajuda um pouco porque tem um problema a menos: descobriram o motivo da tempestade. Mas tem um outro problema em suas mãos: eles estão em alto-mar e precisam se livrar de Jonas. Como poderão fazer isso? As pessoas que desobedecem a Deus não criam problemas apenas para si. Infelizmente, acabam por criar problemas também para os outros, envolvendo-os em suas enrascadas. Surge, agora, mais um contraste de caráter em nossa história. Jonas não manifestou nenhuma sensibilidade para com os gentios de Nínive, nem mesmo para com a vida dos marinheiros, a não ser quando confrontado por eles, após o lançamento de sortes que o deram como culpado. A solução é lançá-lo ao mar, mas os marinheiros relutam em proceder desta maneira. Tentam, com remos, alcançar a terra. Mais uma vez, nosso autor mostra como os gentios apresentam um padrão de conduta melhor do que o de Jonas. Os marinheiros estavam lidando com uma pessoa, Jonas, e estavam vendo uma pessoa, Jonas. Mas Jonas estava tratando com conceitos (ainda por cima, errados) e cometia o equívoco que tantos ainda cometem: colocar os conceitos acima das pessoas. No entanto, apesar de todo o esforço dos marinheiros, ‘‘o mar se ai embravecendo cada vez mais contra eles’’. O juízo de Deus sobre Jonas está em andamento. Só Jonas pode resolver o problema que, aliás, é ele. E lá vão os marinheiros se entregar à oração, mais uma vez. agora, não oram mais às suas divindades, mas ao Senhor. Enquanto isso, dos lábios de Jonas, o autor do livro não registra nem uma oração sequer. E Jonas é jogado para fora do navio. Mais uma vez os marinheiros dão um bom exemplo. Poderiam se contentar com o livramento e seguir na sua rotina, mas compreendem que devem algo a Deus. Fizeram-lhe um pedido. Obtiveram uma resposta. ‘‘ofereceram sacrifícios ao Senhor e fizeram votos’’. Ofereceram culto a Deus e empenharam sua palavra com ele. Se pudéssemos conhecer as mentes dos marinheiros depois do episódio, gostaríamos muito de saber o que pensavam a respeito daquele estranho homem que tinha um Deus tão poderoso e que não o respeitava. Na realidade, até mesmo o desafiara. E lá se vão eles, seguindo em sua viagem pelo mar. Deles nada mais saberemos. Saem de cena. Mas, pelo menos, podemos guardar boas lições de suas atitudes. Quanto ao nosso curioso profeta, ainda teremos mais algumas de suas incríveis peripécias. Ainda não tivemos tudo sobre ele. Por enquanto, o que dele se pode constatar é que, ao ser jogado ao mar, desceu mais um pouco. Jonas, nosso contemporâneo www.ibbv.org.br 3 AULA Das profundezas clamo a ti! Texto Base: Jonas 1.17 - 2.10 “o Senhor deparou um grande peixe”. Diferentemente do que se pensa, o peixe não foi um castigo, mas uma salvação para Jonas. Ele morreria afogado num mar tão bravo e ponto a trazer terror a marinheiros experimentados. Se o navio estava prestes a afundar, imagine, então, uma pessoa. Suas possibilidades de sobrevivência eram nulas. Jonas, então, é salvo pelo peixe. O bilhete de passagem que Jonas adquirira dava-lhe o direito de seguir até Társis, mas o Senhor modificou a sua viagem. Ela tomaria outra direção e Jonas faria conexão agora no meio do mar. Ali embarcaria numa outra condução: um peixe. Este é mais um passo descendente. Descera a Jope, ao navio, ao porão, ao fundo do mar e agora, ao ventre de um peixe. Poucas situações devem ter sido tão angustiosas quanto esta. Jonas estava perfeitamente consciente. Suas esperanças de sobrevivência, do ponto de vista da racionalidade, eram mínimas. Que lugar terrível para terminar a vida: no ventre de um peixe. Lugar escuro, malcheiroso e onde nunca o encontrariam. Nem mesmo uma sepultura viria a ter. Embora confuso e rabugento, Jonas é, no entanto, um homem que conhece a Deus. E faz a única coisa que se pode fazer em um momento de angústia: entrega-se à oração. A oração de Jonas é muito bonita. Ele descreve a sua situação e, ao fazê-lo, os termos que usa leva a crer numa estadia literal no ventre do peixe. Há uma grande preocupação na mente de Jonas: ele não veria mais o templo de Deus. “...como tornarei a olhar o teu santo templo?” (v.4). Este era o lugar em que Deus ouvia as orações e onde se encontrava com o seu povo, através do culto. Como hebreu, como respeitador do templo, Jonas sente que não o verá mais e lamenta. Até agora, com a sua obstinação e com as suas atitudes desastradas, tudo o que Jonas fez foi descer. Mas a partir de agora a situação vai mudar. “...mas tu, Senhor meu Deus, fizeste subir da cova a minha vida”. A palavra cova é o hebraico xeol. Designa o mundo dos mortos. Ele está orando e vai passar o controle da situação para Deus. Enquanto tentou controlar as coisas, tudo o que fez deu errado! Quando estava para morrer, Jonas se lembrou do Senhor (v.7). Como se parece com muitos de nós! Ou como muitos de nós nos parecemos com ele! Vamos fazendo conforme pensamos ser o método certo, até que, no momento de aflição, nos lembremos de Deus. Isso é suficiente para aborrecer qualquer pessoa, mas não a Deus. Jonas orou e “entrou a ti a minha oração, no teu santo templo”. Na dedicação do templo, o rei Salomão pediu isso a Deus: “...toda oração e toda súplica que qualquer homem ou todo o teu povo Israel fizer, conhecendo cada um a sua praga e a sua dor, e estendendo as suas mãos para esta casa, ouve então do céu, lugar da tua habitação, e perdoa...” (2 Crônicas 6.29,30). A oração de Jonas foi ouvida. Ele pode ser um crente fraco e bastante rebelde, mas sua confiança está em Deus e não em ídolos. Confiar em ídolos, diz ele, é afastar de si a misericórdia. O capítulo 1 terminou com louvor dos gentios, em resposta ao livramento dado por Deus. Agora, Jonas, o homem que conhece a Deus, ora e assume o compromisso de sacrifícios e votos. A oração de Jonas, além de muito bem construída, está baseada no livro de Salmos. Jonas conhecia bem o caráter de Deus. É um homem muito bem instruído espiritualmente. O capítulo 2 se encerra com mais uma ação divina. Deus fala com o peixe e este vomita Jonas na praia. Ele sabe que sua oração foi ouvida e que ele tem um compromisso com o Senhor. “O que votei pagarei”. Como profeta, tinha votado entregar a mensagem divina. Vai fazê-lo agora. Mas não pense que a experiência traumática o fez mudar. Ainda não. O homem é muito teimoso. Ainda poderemos nos reencontrar com ele – e nele. Jonas, nosso contemporâneo www.ibbv.org.br 4 AULA Uma segunda oportunidade Texto Base: Jonas 3.1-4 O livro põe diante de nossos olhos Deus e Jonas, mais uma vez. Pela segunda vez, Deus comissiona o profeta à sua missão de pregar aos ninivitas. Não recorda a Jonas a sua falha e tampouco lhe chama a atenção recordando o que lhe aconteceu. Não o ameaça dizendo o que fará. Simplesmente lhe dá uma nova oportunidade de cumprir a sua missão. Quem foi lançado no fundo do mar, desta vez, não foi Jonas. Foi a sua falha. ‘‘Tornará a apierdar-se de nós; pisará aos pés as nossas iniquidades. Tu lançarás todos os nossos pecados nas profundezas do mar’’ (Mq. 7.19). Como isso é confortador! Porque todos nós temos falhas, algumas menores, mas outras gritantes. Sentimo-nos indignos de fazer alguma coisa para Deus, de ser-lhe útil. A vergonha é até grande. Mas, ó graça, ele confia em gente que fracassa e dá uma Segunda oportunidade! Se assim não fosse, o que seria de nós? ‘‘Levanta-te, e vai à grande cidade de Nínive...’’. A ordem é a mesma da primeira vez. Ele não a muda pelo fato de não gostarmos dela. Aquilo que outros fariam alegremente, proclamar a palavra divina, Jonas precisava de ordem bem enfática para cumprir. Desta vez o destino de Jonas não é mais Társis. É Nínive. Sua atitude agora é ‘‘segundo a palavra do Senhor’’. Por que não procedeu assim anteriormente? Por que, da mesma maneira, muitos de nós também precisamos apanhar primeiro para obedecer depois? Nínive era, sem dúvida, um vasto campo missionário. Isso deveria soar como um desafio ao nosso profeta, mas parece que sua pregação reflete mais a atitude de um homem que carrega um incômodo fardo do que quem realiza algo pelo qual está apaixonado. Aliás, Jonas não parece muito apaixonado pela obra de Deus. Só se dói pelos seus conceitos, pela sua teologia própria. Só reclama quando perde benefícios. Jonas não teria completado a caminhada pela cidade, que era de três dias. Sua pregação teria durado apenas um dia. E ela mostraria mais ainda a má vontade de Jonas. Tipo ‘‘já falei o suficiente’’. Que situação curiosa! Este é o menor sermão pregado que as Escrituras registram. E o que maior impacto causou. ‘‘...interessante é que Jonas pregou uma mensagem que na sua presente forma em hebraico consiste somente de cinco palavras. Foi uma mensagem de condenação incondicional e irrevogável. Jonas sabia que Deus era um Deus compassivo, misericordioso, longânimo e grande em benignidade. Ele devia a sua própria vida à graça de Deus, porque havia sido salvo da morte do mar. Mas, embora ele entendesse acerca da graça de Deus, não há uma só palavra acerca desta graça em seu sermão. Jonas tinha um belo testemunho para compartilhar, mas os seus lábios estavam fechados. Ele não compartilhou o espírito do salmista quando disse: ‘‘Sim, grandes coisas fez o Senhor por nós, e por isso estamos alegres’’ (Sl. 126.3). Jonas aparentemente procurou fazer que fosse muito difícil para o povo de Nínive se arrepender e ser salvo. Ele não fez menção dos pecados que tinham de ser confessados. Ele não exigiu arrependimento. Ele não ofereceu nem mesmo esperança. Somente quarenta dias, e pronto! O fim viria sobre Nínive, assim como veio sobre Sodoma e Gomorra. Era uma mensagem sem compaixão, e, no entanto, foi pregada por uma pessoa que recentemente havia experimentado o milagre da graça e da compaixão de Deus na sua própria vida’’. Dr. Page Kelley Como temos gente que diz ter provado a graça de Deus, que proclama e recita que ‘‘Deus é amor’’, mas é desumano. Que, à semelhança dos fariseus que Jesus tão duramente combateu, ‘‘atam fardos pesados e difíceis de suportar, e os põem aos ombros dos homens; mas eles mesmos nem com o dedo querem movê-los’’ (Mt. 23.4). Se deveria haver uma comunidade misericordiosa neste mundo, tal comunidade deveria ser a Igreja de Jesus. A igreja conheceu a graça de Deus na pessoa de Jesus Cristo. Sabe o que é misericórdia porque a provou. Com que espírito se dirige ela ao mundo? Como quem recebeu a graça ou como quem recebeu um terrível castigo e deseja desforrar-se em outros? Jonas, nosso contemporâneo www.ibbv.org.br 5 AULA Uma conversão nacional Texto Base: Jonas 3.5-10 Nosso texto começa declarando exatamente aquilo que Jonas não gostaria que sucedesse: ‘‘E o homens de Nínive creram em Deus’’. O movimento é iniciado pelo próprio povo. Proclama-se um jejum. O povo veste-se de saco. São expressões de humilhação e de arrependimento. Quando Elias ameaçou Acabe, por ordem do Senhor, Acabe se humilhou, rasgando as suas roupas, vestindo-se de saco e entrando em jejum (1Rs 21.27). Nínive se converte com jejum, saco e em nível global: do menor ao maior. Partindo do povo, o movimento caminha até o rei. É uma comoção nacional ascendente, vindo da base para o trono. Mais uma vez, o padrão de espiritualidade não é povo de Deus, mas, sim, os incrédulos. O livro de Jonas insiste neste contraste e, comparando-o com Jeremias 36, esta verdade se aclara diante dos nossos olhos. O rei toma a sua parte no processo de conversão nacional. Primeiro ele se arrepende, depois exorta a cidade à conversão. Faz ele uma proclamação nacional tão intensa que até os animais devem ser incluídos, cobertos de sacos e submetidos ao jejum. Em Joel 2.16 até as crianças que mamavam deveriam submeter-se ao jejum. Aqui, a situação é ainda mais dramática porque envolve até os animais. É evidente que estes são irracionais. Deixar de dar comida a um boi não faz com que a fome do boi tenha um valor espiritual, porque, moralmente, o animal não está jejuando. Deixaram de lhe dar comida, o que é diferente. Não foi uma opção consciente do bicho. Mas mostra como o rei compreendeu a gravidade da situação. O rei reconhece e não mascara o pecado de sua nação: a ‘‘violência que há nas suas mãos’’. E violência, como já dito anteriormente, era o grande pecado em Nínive. Em Naum 3.1, ela é chamada de ‘‘cidade ensangüentada’’. A conversão verdadeira não procura justificar os pecados, mas declara-os. Um convertido não tenta ocultar os seus pecados, mas confessa-os. Um convertido não tenta ocultar os seus pecados, mas confessa-os e os deixa. Da mesma forma que, hoje, um coração autenticamente convertido não tenta se justificar. Deixa que Cristo o justifique. A justificação é obra divina. Além de reconhecer o pecado e confessá-lo, o rei reconhece também a iminência de um juízo. Uma ira ardente, reconhece ele, está para vir e expressa uma esperança: ‘‘Quem sabe se voltará Deus...?’’. Equivale a dizer: ‘‘Pode ser que Deus não faça assim’’ ou ‘‘Talvez não sejamos julgados’’. Seu arrependimento não é uma forma de barganha, mas uma contrição tão séria que reconhece que os pecados são grandes demais para aspirar ao perdão. Fica apenas uma esperança. A conversão do rei de Nínive mereceu o seguinte comentário de Page Kelley: ‘‘Nós pregamos o evangelho principalmente às pessoas pobres, porém, não devemos negligenciar pregar este mesmo evangelho também aos reis, presidentes, senadores, deputados, vereadores, prefeitos, vereadores, prefeitos, juízes e outras autoridades. Quando os líderes de um país se convertem, então não é tão difícil alcançar os cidadãos com a mensagem de salvação’’. Ou, ao menos, orar por eles como diz 1Tm.2.1-3. O rei de Nínive está sensibilizado. Sente o peso dos seus pecados, humilha-se e chama a nação ao arrependimento. E Deus viu... Este é o momento mais alto do livro. É onde encontramos a mensagem mais agradável e, ao mesmo tempo, a que nos permite entender toda a má disposição de Jonas. Além disso, é a notícia mais esperançosa que o homem pode ouvir: Deus perdoa o pecador arrependido. Jonas podia ser uma pessoa insensível, mas o seu Deus não! O verso 10 encerra com uma grande lição: ‘‘Com muita freqüência Deus responde ao arrependimento humano usando de misericórdia, cancelando a punição anunciada’’. Isso nos explica por que tantas vezes encontramos a expressão ‘‘Deus se arrependeu’’. A sua misericórdia vê o arrependimento e responde a ele com a suspensão do juízo. Esta é a boa mensagem: Existe esperança para os homens! Jonas, nosso contemporâneo www.ibbv.org.br 6 AULA Um conservador impiedoso Texto Base: Jonas 4.1-5 Novamente o foco de atenção de nossa história se desloca. Desloca-se também a qualidade de emoções em questão. De Deus passamos para Jonas. E de uma declaração de amor, passamos para a cena de inconformismo, ressentimento e ira. A pregação de Jonas foi um sucesso estrondoso. Conseguiu ele o que nem o próprio Jesus Cristo haverá de conseguir, séculos mais tarde: unanimidade na aceitação de sua mensagem. Este é o maior fenômeno na história da evangelização mundial. Em vez de manifestar alegria pelo sucesso do seu trabalho, Jonas explode em ressentimento e queixas. Sua reclamação é porque Deus manifestou sua graça a Nínive, que pelos seus padrões pessoais Jonas achava não merecer salvação. No entanto, por mais ridícula que seja tal mentalidade, ela não se tem restringido somente a Jonas. Os fariseus do tempo de Jesus também a possuíam. ‘‘Por que come o vosso Mestre com os publicanos e pecadores? (Mt. 9.11) foi a pergunta por eles dirigida aos discípulos, censurando Jesus por buscar a companhia de gente não elogiável aos olhos dos santos farisaicos. Mas também não se restringiu aos fariseus. Por ter batizado o gentio Cornélio, um homem extraordinário virtuoso, Pedro precisou se justificar diante da igreja cristã nascente, que também tinha dificuldade em entender que não-judeus pudessem ser salvos (At. 11). E, infelizmente, tal exclusivismo não morreu com o tempo. Continua muito vivo. Há, ainda hoje, denominações, seitas e igrejas que se colocam acima das outras, em vez de entender como propriedade de Deus, Israel viu Deus como sua propriedade. Hoje também há os donos de Deus. ‘‘Mas isso desagradou extremamente a Jonas’’. Este é o segundo passo que Jonas dá para uma depressão que o levará a querer a morte. O primeiro já fora dado há tempos: a recusa em agir de acordo com o querer de Deus. Uma vida em desacordo consciente com a vontade de Deus é uma vida frustrada. Não bastasse isso, Jonas se desgosta com a atitude divina. Ele insiste em continuar no seu ponto de vista: ele estava certo quando fugiu, e Deus, errado. Depois da ira de Jonas, vem a sua explosão contra Deus. Jonas ora mais uma vez. Na sua oração, novamente ele manifesta um bom conhecimento do Antigo Testamento. Mostrou que conhecia os Salmos quando orou da primeira vez. Agora mostra conhecer o livro de Êxodo. Os atributos de Deus que ele enaltece são registrados na citação de Moisés em Êxodo 34.6. Jonas estava familiarizado com a Escritura. Por ela, sabe que Deus é ‘‘compassivo, misericordioso, longânimo e grande em benignidade e que te arrependes do mal’’. está em consonância com Moisés. O curioso é que ele não se queixa de um possível mau caráter da sua divindade. Pelo contrário, sua queixa é que sua divindade, Deus, é totalmente perfeita. Jonas conhecia sua Bíblia, e podia citá-la. Mas o simples fato de alguém citar a Bíblia não garante que esteja agradando a Deus. O Diabo também pode citar a Bíblia. Jonas se queixa do caráter de Deus. Devia agradecer-lhe por isso. Foi por causa do caráter de Deus que Jonas teve a sua vida salva. Sua oração é um pretexto para lançar no rosto de Deus sua idéia de que ele estava certo. A oração não é para manter comunhão, mas para insistir em que sua conduta está correta. A oração é algo muito sério para se tratar com leviandade ou como mero pretexto para expor idéias pessoais. Agora Jonas quer morrer, seu desgosto é pela conversão de pessoas. Uma pessoa pode se cansar emocionalmente e fisicamente, e, diante de forte tensão, sentir-se enfraquecida, desanimada e entrega os pontos. No caso de Jonas, um estresse por causa de preconceitos quebrados. Nossos conceitos e esquemas teológicos não podem se firmar numa mentalidade de grupo, mas no que a Bíblia ensina. Deus responde a irritação de Jonas com uma pergunta: ‘‘É razoável essa tua ira?’’. Era tão irrazoável que Jonas nem responde e sai da cidade. Faz para si uma barraca e senta-se debaixo dela. Ali senta-se como espectador até ver o que aconteceria à cidade. Este é Jonas: um homem ortodoxo, cheio de idéias próprias, de convicções pessoais e se cansando num mundo de conceitos, mas indiferente ao destino de milhares de pessoas. Com um bom conhecimento teórico sobre Deus, mas com um coração vazio da graça divina. A mente está cheia, mas o coração está oco! Jonas, nosso contemporâneo www.ibbv.org.br 7 AULA Quem tem ouvidos ouça... Texto Base: Jonas 4.6-11 O livro de Jonas chega agora ao clímax da sua estrutura (o clímax teológico é 3.10). O sujeito é muito claro: ‘‘Deus enviou’’, ‘‘Deus mandou’’, ‘‘perguntou Deus’’, ‘‘disse Deus’’. O comando das ações é dele. Neste trecho final, Jonas aparece como figurante. E, como dito anteriormente, o livro termina com Deus fazendo uma pergunta sobre ele mesmo. A pergunta é formulada de maneira tal que não pode ser respondida, de modo que a argumentação chega a um impasse. Com a sua pergunta, Deus encerra tudo. Jonas fez uma barraca para ver o que aconteceria a Nínive. Talvez se não tivesse passado os quarenta dias ou talvez ele pensasse que convencera a Deus. Deus fez nascer uma aboboreira para dar sombra para Jonas. Jonas ficou contente. Como todo mundo, ele gostava de ser abençoado, de receber boas coisas das mãos de Deus. Ele gostava dos benefícios de Deus para si, mas não gostava de vê-los estendidos a outros. A alegria de malcriado dura pouco. No dia seguinte, Deus enviou um bicho, um verme, que feriu a planta que cobria a cabeça de Jonas e esta morreu. Mas não parou aí o que Deus desejava ensinar ao profeta. O dia teve seguimento com o sol forte e com a presença do terrível vento oriental. É o famoso siroco, vento seco e quente que vem do deserto, elevando a temperatura até 44 graus. É o vento que queima a vegetação e faz as flores morrerem (veja a ação do siroco em Isaías 40,7, onde ele é chamado de ‘‘hálito do Senhor’’). Sol forte, vento quente, tensão, irritação e, suponhamos, calvície. Some-se tudo isso. O resultado? ‘‘...e ele desmaiou’’. Ao voltar a si, disse: ‘‘Melhor me é morrer do que viver’’. Já dissera isso antes, quando Nínive foi poupada. Queria morrer porque sua vontade pessoal não se cumprira. Agora quer morrer porque se sente desconfortável. Deus responde: ‘‘É razoável essa tua ira por causa da aboboreira?’’. ‘‘É justo que eu me enfade a ponto de desejar a morte’’, disse Jonas. Como Jonas, há muita gente para quem as pessoas valem menos que aboboreiras. O que muito impressiona em Jesus foi ter ele valorizado mais o homem do que as grandes instituições do seu tempo. Para Jesus, o homem valia mais do que o Sábado, uma instituição intocável. ‘‘O sábado foi feito por causa do homem, e não o homem por causa do sábado’’ (Mc 2.27). A conversa chega a um impasse. Deus não tem mais nada para dizer. Já disse tudo. Jonas não tem como retrucar. O argumento divino é arrasador. Assim, parecendo incompleto, o livro se encerra. Nada mais se dirá de Jonas em qualquer livro bíblico. Mais tarde, nosso Senhor falará dele, mas em outro sentido. Mas, para sermos justos, encerremos com Deus. Quanta preocupação mostrada para com o pior pecador, Nínive. Quanta solicitude manifestada com pecadores desorientados como os marinheiros. Quanta misericórdia derramada para com a Nínive arrependida. E quanta paciência exibida para com Jonas. Temos que concluir pensando nele. Ele é magnífico! De Deus se pode dizer, usando as palavras do resmungão Jonas, que ele é ‘‘compassivo e misericordioso, longânimo e grande em benignidade, e que te arrependes do mal’’. Nisto Jonas acertou em cheio. Vimos através da experiência de Jonas, como Deus trata os gentios: com amor. Vimos como Deus trata os seus: com amor. ‘‘Deus é amor’’, diz a Bíblia. Que sempre ajamos para com ele em amor. Nunca em queixas ou insubmissão. Um Deus tão paciente e tão amoroso merece todo o nosso amor. Jonas, nosso contemporâneo www.ibbv.org.br