5 O Estado do Maranhão - São Luís, 22 de janeiro de 2014 - quarta-feira Raffaele Petrini - diretor artístico “O que mais me empolga é ver as longas filas no cinema” Proprietário da Petrini Filmes, Raffaele Petrini assumiu recentemente a direção artística do Cine Praia Grande e prevê algumas mudanças na programação e estruturais; espaço se mantém com recurso da bilheteria André Lisboa Andressa Valadares Da equipe de O Estado F alar em cinema de arte em São Luís é imediatamente lembrar-se daquele que sempre foi pioneiro neste segmento na capital, o Cine Praia Grande, localizado no Centro de Criatividade Odylo Costa, filho, no Centro Histórico. Considerado o templo das produções audiovisuais artísticas e independentes, que raras vezes entram no circuito comercial de distribuição cinematográfica, o Cine Praia Grande entrará em uma nova fase. Uma fase de renovação, mas sem perder a essência para a qual se propõe. Dono da distribuidora Petrini Filmes, Raffaele Petrini é agora o novo diretor artístico do Cine Praia Grande, antes administrado pelo cineasta Frederico Machado. Apaixonado por cinema, o novo diretor contou, em entrevista a O Estado, as novidades que estão por vir e avaliou o atual cenário tanto da produção cinematográfica, quanto do público interessado em cinema de arte em São Luís. O Estado – O Cine Praia Grande entrará agora em uma nova fase. Quais serão as principais mudanças pelas quais o cinema irá passar? Raffaele Petrini - Vamos reformular um pouco o equipamento do cinema - projeção e poltronas, basicamente. Também vamos ter uma variação no tipo de programação. A gente vai exibir sempre filmes de arte, mas, também, vamos integrar mostras de cinema. Já estamos preparando uma programação para o Dia da Mulher, 8 de março, com uma mostra do cinema feminino, com filmes dirigido por mulheres. Vamos fazer cineclubes com filmes clássicos ou pouco conhecidos, por um preço baixo. O Estado – E em relação à programação,continuará a mesma proposta ou teremos também novidades no que toca a essa parte? Raffaele Petrini - Agora ele vai ter uma programação bem independente. Nós e o Cine Lume continuaremos em parceria, mas a programação será diferente. Não vai mudar o tipo de filme, mas vai ter uma programação mais rica em número de filmes exibidos. E também vai ter um diferencial de preço. Nas últimas duas semanas nós fizemos um teste, onde na segunda-feira colocamos meiaentrada para todos, a um preço único de R$ 6,00. Nesta segunda-feira, esgotaram todas as sessões de Ninfomaníaca. Uma vez por mês vai ter uma mostra temática, ou por diretor, ou por gênero, por tema, por ator. Também estamos querendo exibir alguns filmes comerciais, na sessão das 16h, que é uma sessão em que o público é muito pequeno. Então, se o filme sai de cartaz nos grandes cinemas e é um filme bom, de qualidade, a gente pode exibir. O Estado – No engatinhar dessa nova fase,quais serão as primeiras mudanças que o público poderá sentir? Raffaele Petrini – Na realidade, esses primeiros meses vão ser de estudo. Ver qual é a tendência do público, ouvir o que esse público quer ver e tentar experimentar, exibindo filmes de todos os tipos. Estamos programando agora o filme Azul é a Cor Mais Quente, que é um filme francês e que todo mundo está pedindo, mas vamos colocar também uns filmes mais experimentais, como Quando Eu Era Vivo, do Marco Dutra, com Antônio Fagundes e Sandy, que é um filme entre suspense e terror. E também iremos investir nas mostras, para ver qual a tendência do público, o que eles querem. Às vezes a gente acha que um filme não pode funcionar, mas na hora “ O Cine Praia Grande tem, mais que qualquer outro cinema daqui, um papel de formador de público” Raffaele Petrini, diretor artístico do Cine Praia Grande um ou dois meses, dependendo do tipo de filme que estivesse passando. Raffaele Petrini assumiu a direção artística do Cine Praia Grande; produtor quer movimentar a programação com filmes de qualidade de arte Divulgação O filme francês Azul é a Cor Mais Quente é uma das produções previstas para estrear no próximo mês no Cine Praia Grande funciona, e isso mostra o quanto é necessário ouvir o público. É para eles que o cinema existe. O que a gente espera é que a ida ao cinema seja uma experiência formadora, puxando cada vez mais o público para essa, que é uma grande paixão. O Estado – Manter um cinema exige custos e mudar a cara de um cinema também. Essa reformulação será financiada? Como o Cine Praia Grande se mantém hoje? Raffaele Petrini – Só bilheteria. O cinema é do Estado e como foi arrendado ele se mantém apenas com a bilheteria, não tem nenhum recurso, infelizmente. A gente vai modificar o cinema com o que temos e com o que podemos ter. Por enquanto vamos realizar essas mudanças só com a bilheteria. Se a gente está projetando tanta coisa sem orçamento, imagina se tivesse. Iríamos ficar abertos 24h [risos]. Já tentamos ir atrás de parcerias algumas vezes, mas não conseguimos, embora, gostaríamos muito de ter um leve apoio. O Estado - E há quanto tempo você trabalha com cinema? Raffaele Petrini - Eu sempre gostei de cinema desde criança. Mas, trabalhar mesmo com cinema eu comecei em 2010, que foi quando abri uma distribuidora aqui, a Petrini Filmes, que já lançou uns 10 filmes para os cinemas nacionais. Eu estou produzindo o novo filme do Marcos Ponts, que fez o Ei, você conhece Alexander Guaracy? e que agora está fazendo o Cine Vitória. Fui coprodutor do novo filme do Frederico Machado, Signo das Tetas, e vou começar a trabalhar esse ano com produção cinematográfica, no qual vou dirigir um curta-metragem. O Estado - Como você avalia o crescimento da produção cinematográfica em São Luís? Raffaele Petrini – É visível que está crescendo o número de cineastas aqui e, consequentemente, o número de produções. Por exemplo, nós tivemos O Exercício do Caos, do Frederico Machado, que foi lançado nacionalmente nos cinemas, vai passar na Europa e foi comprado por vários países. Teve também No Interior da Minha Mãe, de Lucas Sá, lançado ano passado e é um documentário que foi premiadíssimo em circuitos brasileiros e está começando a carreira em festivais internacionais. Ele também fez outro, que foi O Membro Decaído, lançado em 2011, e que ainda está tendo carreira em festivais e é um filme feito sem recurso nenhum, na luta mesmo. Tem também o Acalanto, do Arturo Saboia, que foi para Cannes, venceu em Gramado e que está caminhando em festivais no mundo inteiro. Ter três filmes assim em um ano, do nada, em São Luís, que sempre teve produções esporádicas, e ver esses filmes fazendo uma carreira boa em festivais é a demonstração de que alguma coisa está funcionando e que existem pessoas que sabem fazendo cinema aqui. Eu espero que nos próximos anos isso só venha a se multiplicar. O Estado – E em relação ao público, como você percebe o interesse destes,São Luís,pelo cinema de arte. É algo que tem crescido? Raffaele Petrini – Eu estou vendo nos últimos meses um grande crescimento. E eu acho que isso se deve em razão da abertura de dois espaços, o Cine Praia Grande e o Cine Lume, porque realmente o cinema de arte estava todo concentrado naquela área da Praia Grande, que algumas pessoas não gostam de frequentar. Já o Renascença fica em uma área mais “nobre”, e ajudou muito. A coisa que mais me empolga é ver as filas, por exemplo, nas sessões de Ninfomaníaca, e ver só jovens, pessoas que nunca tinham vindo para o cinema. Isso é um sintoma de que a gente está realmente conseguindo conquistar um certo público, que é o que nos interessa. Ninfomaníaca fica em cartaz até hoje e, se continuarmos com esse público, fecharemos a semana com 1.500 telespectadores, o que pro Cine Praia Grande seria o público de O Estado – Para você,qual o papel do Cine Praia Grande para a construção do cenário cultural em São Luís? Raffaele Petrini – Na minha avaliação, o Cine Praia Grande tem, mais que qualquer outro cinema daqui, um papel de formador de público. Por isso é que vêm as mostras, as exibições especiais tanto de clássicos, quanto de filmes para crianças. Eu acho que tudo começa da formação do espectador. Nós estamos preparando uns programas de formação de público, que acho que podem servir muito para o futuro. O Estado – E qual vai ser a principal característica dessa nova fase do Cine Praia Grande? Raffaele Petrini - O cinema não vai ser só um lugar para ver filme e sair. Vai ser um lugar para promover discussão, debates. Nós fizemos com Ninfomaníaca um debate muito legal logo no primeiro dia de exibição. Veio um pessoal do grupo Geni, da Universidade Federal do Maranhão, que fizeram uma discussão sobre a sexualidade e foi bem interessante. Vamos também fazer shows na primeira semana de fevereiro, mas ainda vai ser oficializado, não sei quais bandas irão tocar. A ideia é fazer um show por mês, vendendo ingresso de filme e show juntos, a um preço simbólico justamente para incentivar as pessoas a conhecerem e passarem a freqüentar o cinema. O Estado – E qual é a sua expectativa em relação à identificação do público com a nova fase do Cine Praia Grande? Raffaele Petrini – Eu espero que o público realmente compareça. É óbvio que vamos fazer de tudo para o público comparecer, então a casa está aberta, aceitamos sugestões tanto de filmes para exibir, mostras para fazer, quanto quem tiver a ideia de fazer alguma exibição especial, a gente pode sentar para conversar. Nosso objetivo é nos alinharmos, até o final do ano, ao mesmo patamar dos cinemas de arte das grandes capitais, que é uma coisa bem possível de acontecer. Mais que um cinema formal, o Cine Praia Grande é uma casa de cinema. É um ponto de referência para todas as pessoas que querem fazer ou que gostam de cinema no Maranhão, que querem ver um filme diferente, um filme que deixa alguma coisa a mais. Veja a entrevista de Raffaele Petrini na versão online de O Estado