UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE ARTES E COMUNICAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS
UMA ABORDAGEM DIACRÔNICO-COMPARATIVA DA ABREVIAÇÃO EM
DIFERENTES GÊNEROS, SUPORTES E TECNOLOGIAS
Tese apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Letras da UFPE
como requisito básico para obtenção
do grau de Doutor em Lingüística.
Aluna: Fabiana de Souza Silva
Orientador: Prof. Dr. Phil. Marlos de Barros Pessoa
Recife, maio de 2006.
Silva, Fabiana de Souza
Uma abordagem diacrônico-comparativa da
abreviação em diferentes gêneros, suportes e
tecnologias/ Fabiana de Souza Silva.– Recife: O
Autor, 2006.
253 folhas: iI., quadros, tab., graf.
Tese (doutorado) – Universidade Federal de
Pernambuco. CAC. Programa de Pós-Graduação em
Letras e Lingüística, 2006.
Inclui bibliografia.
1. Lingüística. 2. Diacronia. 3.Abreviação. 4.
Gênero textual. I. Título.
801
410
CDU (2.ed.)
CDD (22.ed.)
UFPE
CAC200611
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBCO
CENTRO DE ARTES E COMUNICAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS
UMA ABORDAGEM DIACRÔNICO-COMPARATIVA DA ABREVIAÇÃO EM
DIFERENTES GÊNEROS, SUPORTES E TECNOLOGIAS
BANCA EXAMINADORA:
__________________________________
Prof. Dr. Phil. Marlos de Barros Pessoa
Universidade Federal de Pernambuco
Prof. Dr. Phil. Dermeval da Hora Oliveira
Universidade Federal da Paraíba
______________________
Prof. Dr. Antonio Carlos dos Santos Xavier
Universidade Federal de Pernambuco
________________________________________
Prof.ª Dr.ª Stella Virgínia Telles de Araújo Pereira
Universidade Federal de Pernambuco
Prof.ª Dr.ª Virgínia Maria Almoêdo de Assis
Universidade Federal de Pernambuco
Tese apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Letras da UFPE
como requisito básico para obtenção
do grau de Doutor em Lingüística.
Ao Profº Luis Antônio Marcuschi,
exemplo de homem, profissional,
amigo, por ter-me incentivado a
prosseguir
com
transformando
realidade.
um
esse
sonho
tema,
em
AGRADECIMENTOS
“Há pessoas que nos falam e nem as escutamos; há
pessoas que nos ferem e nem cicatrizes deixam;
mas há pessoas que simplesmente aparecem em
nossa vida e nos marcam para sempre”. (Cecília
Meireles)
A Deus, único e suficiente Salvador de nossa alma, pelo perdão;
A meu pai, Nivaldo Rodrigues da Silva, pela paixão que despertou em
nós pelas letras;
A minha mãe, Maria Landelina de Souza Silva, pelo real exemplo da
autêntica mulher virtuosa;
A Landivaldo, Edvânia, David Lucas e Anna Karollinne, pelos inúmeros
e inesquecíveis favores prestados;
A Patrícia, pelo regresso ao lar;
A Jorgevaldo, pela paciência infinita com o meu constante mau humor;
A Marylane, por ser espontaneamente minha defensora extra judicial;
A Junior, pelas ricas lições bíblicas trocadas em nossas incontáveis
noites de insônia;
A Betânia, pela honra da sua companhia inefável em nossas viagens
em seu carro ao Recife;
A Fátima, amiga em todas as horas, por ser minha conselheira
sentimental;
A Medianeira, por tão carinhosamente ter-me acolhido em seu
apartamento no Cordeiro;
Ao casal Ravic e Regina Rolim, pelo sorriso que ostento;
A UFPB, por conceder-me o afastamento para a capacitação docente;
A UFPE, pelo trabalho sério e competente ali desempenhado;
A CAPES, pela oportunidade a mim outorgada de realizar minha
pesquisa;
Ao Prof. Dr. Marlos de Barros Pessoa, orientador incondicional, pelos
preciosos ensinamentos ao longo do curso;
Ao Prof. Dr. Phd. Dermeval da Hora, professor na graduação,
orientador no mestrado, examinador no doutorado, pelo currículo que tenho;
À Profª Drª Ângela Dionísio, pelo espaço aberto para mim em seu SPA;
Ao Prof. Dr. Luis Antônio Marcuschi, pelos sábios conselhos;
A Diva e Eraldo, profissionais e amigos em toda hora;
Aos colegas do DLCV, por levarem durante os quatro anos o fardo que
era meu;
A Drª Margarete Trigueiro, por ter abreviado o meu sofrimento,
agilizando o meu divórcio;
A Marcos Antonio Mendes de Araújo por, não mais que de repente, ter
transformado o meu pranto em riso;
Enfim, a todos quantos fizeram parte da minha longa e renhida história
rumo ao Doutorado.
“Apenas
preservando
inteligência
códex
da
cultura
podemos
“felicidade
gozar
a
do
a
extravagante”
prometida pela tela”.
Roger Chartier
RESUMO
O objetivo central deste trabalho é apresentar o uso da abreviação
numa perspectiva histórico-comparativa, a fim de provar que a ocorrência
desse fenômeno, ao contrário do que se pensa, não é uma criação do texto
eletrônico, mas teve início no século VI a.C. devido ao alto custo do
pergaminho, material utilizado para a escrita. À luz da teoria dos gêneros
textuais, testamos se há maior ou menor uso desse recurso, dependendo do
suporte e gênero utilizados, além de outras variáveis sociointerativas, entre
elas o propósito comunicativo e o estilo. Analisamos ainda quatro variáveis
estruturais, quais sejam: extensão do texto, extensão do vocábulo, classes de
palavras e tonicidade da sílaba. Por último, verificamos quatro variáveis, desta
vez sociais, a saber: faixa etária, grau de escolaridade, sexo e profissão. O
corpus analisado consta de cartas, diários, blogs, e-mails e SMSs. Os dois
primeiros gêneros situam-se entre os séculos XVIII e XIX, pertencentes a três
Estados da região nordeste: PB, PE e BA. O material correspondente aos
gêneros digitais foi coletado de seis provedores da Internet: UOL, IG, TERRA,
IBEST, YAHOO e HOTMAIL, além de três empresas de telefonia celular: OI,
TIM e CLARO. Observamos que o gênero textual, seguido do propósito
comunicativo, determina o estilo do texto, promovendo ou não a ocorrência da
abreviação.
PALAVRAS-CHAVE: abreviação, gênero, estilo, propósito comunicativo.
ABSTRACT
The central objective of this work is to present the use of the abbreviation
in a perspective comparative-historically, in order to prove that the incident was
giving phenomenon, on the contrary of what one thinks, it is not a creation of
the electronic text, but it had beginning in the century VI, due to the high cost of
the parchment, material used for the writing. By the light of the theory of the
textual types, we test a bigger or less use of this resource, depending on the
support and type when the communicative purpose and the style were used,
besides other variables sociointerativas, between them. We analyse still four
structural, what variables be: extension of the text, extension of the word,
classes of words and tonicity of the syllable. For last, we check four variables,
this time social, knowing: age group, degree of schooling, sex and profession.
The analysed corpus consists of letters, diaries, blogs, e-mails and SMSs. The
first two types are situated between the centuries XVIII and XIX pertaining to
three States of the northeast region: PB, PE and BA. The corresponding
material to the digital types was collected of six providers of the Internet: UOL,
IG, TERRA, IBEST, YAHOO and HOTMAIL, besides three enterprises of
cellular telephony: OI, TIM and CLARO. We notice that the textual type,
followed by the communicative purpose, determines the style of the text,
promoting or not the incident of the abbreviation.
KEY WORDS: abbreviation, type, style, communicative purpose.
RÉSUMÉ
L'objectif central de ce travail est présenter l'utilisation de l'abréviation
dans une perspective histórico-comparativa, afin de prouver que la présence de
ce phénomène, dont au contraire se pense, n'est pas une création du texte
électronique, mais a eu du début dans le siècle VI, dû au haut coût du
parchemin, du matériel utilisé pour l'écriture. À la lumière de la théorie des
types littéraux, nous expérimentons une plus grande ou moindre utilisation de
cette ressource, dépendant du support et du type utilisés, outre autres variables
sociointerativas, entre elles l'intention comunicativo et le style. Nous analysons
encore quatre variables structurelles, lequel soient : extension du texte,
extension du vocable, classes de mots et tonicité de la syllabe. Finalement,
nous vérifions quatre variables, cette fois sociales, à desavoir : bande étaire,
degré de scolarité, sexe et profession. Le corpus analysé consiste de lettres,
quotidiennes, blogs, e-mails et de SMSs. Les deux premiers types se placent
entre les siècles XVIII et XIX, appartenant à trois États de la région nord-est :
PB, PE et BA. Le matériel correspondant aux types digitaux a été rassemblé de
six fournisseurs de l'Internet : UOL, IG, TERRA, IBEST, YAHOO et HOTMAIL,
outre trois sociétés de téléphonie cellulaire : OI, TIM et CLARO. Nous
observons que le type littéral, suivant de l'intention comunicativo, détermine le
style du texte, promouvant ou non la présence de l'abréviation.
MOTS CLÉ: abréviation, type, style, intention comunicativo.
LISTA DE QUADROS, GRÁFICOS E TABELAS
QUADROS
PÁGINA
Quadro 1
Quadro 2
Quadro 3
Quadro 4
Quadro 5
Quadro 6
Quadro 7
GRÁFICOS
44
46
78
79
81
125
229
PÁGINA
Gráfico 1
Gráfico 2
Gráfico 3
Gráfico 4
Gráfico 5
Gráfico 6
Gráfico 7
Gráfico 8
Gráfico 9
Gráfico 10
Gráfico 11
Gráfico 12
TABELAS
47
162
168
174
180
188
192
198
203
207
212
218
PÁGINA
Tabela 1
Tabela 2
202
224
LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS
Sr.
Dr.
lh’
q’
Illmos
Exmos
verde.
kd
ligô
prosperide
VMgde.
Itamca.
Sta.
porq’
impreitro
pa.
da.
juramto.
Fazda.
cappnia.
de poimo.
do.
ne = / cessro.
pagamo.
mto.
deligca.
engenros.
Sargto.
gde.
Des.
fundamos.
ans.
ampo.
pr
mma
va
redo
pe
segdo
qm
Ant Frz
Perra da Sa
Doq
Offs
Segte
Pra
Re.
Pernco.
Dezro.
Bjs.
Ksa.
Tbm.
Senhor
Doutor
Lhe
Que
Ilustríssimos
Excelentíssimos
Verdade
Cadê
Ligou
Prosperidade
Vossa Magestade
Itamaracá
Santa
Porque
Empreiteiro
para
dita
Juramento
Fazenda
Capitania
depoimento
dito
necessário
pagamento
Muito
diligência
engenheiros
Sargento
guarde
Deus
fundamentos
anos
amparo
por
mesma
vila
reverendo
padre
segundo
quem
Antonio Ferraz
Pereira da Silva
do que
ofícios
seguinte
primeira
Recife
Pernambuco
Dezembro
Beijos
Casa
Também
Flo.
Hje.
Nu.
Xopi.
Fze.
Ñ.
Qdo.
Msg
Cmg
Vc
Fev
Tel
+tard
D
Credt
V
Cel
Sl
Cd
Bb
Mar
Cm
Spcial
Fliz
D+
Pq
Ds/
kda
fce
bok
t
findi
dpois
cviço
td
diz
ngm
krak
gral
msm
aki
ksa
depre
psor
mó
c
abs
ch
s.sul
Land
Ed1
Ed 2
+ ou Blxinha
Falou
Hoje
No
Shopping
Fazer
Não
Quando
Mensagens
comigo
você
fevereiro
telefone
mais tarde
de
crédito
ver
celular
sala
ser de
bebê
março
com
especial
feliz
demais
porque
de menos
sem
cada
face
boca
ter
fim de semana
depois
serviço
tudo
dizer
ninguém
caraca
geral
mesmo
aqui
casa
depressão
professor
maior
com
abraço
chamada
shopping sul
Landivaldo
Edvânia 1
Edvânia 2
mais ou menos
belezinha
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ______________________________________________________ 16
•
•
•
OBJETIVO ______________________________________________________________ 20
HIPÓTESES _____________________________________________________________ 22
METODOLOGIA __________________________________________________________ 22
A) A PESQUISA ____________________________________________________________ 23
B) A SELEÇÃO _____________________________________________________________ 23
b.1) O período _____________________________________________________________ 23
b.2) O local ________________________________________________________________ 24
b.3) O material _____________________________________________________________ 25
b.3.1) Tipologia ____________________________________________________________ 25
b.3.2) A autoria ____________________________________________________________ 29
b.3.3) A amostra (distribuição geográfica e temporal)____________________________ 29
b.3.4) A seleção dos informantes _____________________________________________ 29
C) VARIÁVEIS ANALISADAS ____________________________________________________ 31
c.1) Variáveis sociointerativas ________________________________________________ 32
• Gênero ________________________________________________________________ 32
• Estilo __________________________________________________________________ 32
• Instância de realização___________________________________________________ 33
• Participantes ___________________________________________________________ 33
• Propósito comunicativo __________________________________________________ 33
• Suporte ________________________________________________________________ 33
C.2) VARIÁVEIS ESTRUTURAIS _________________________________________________ 34
• Extensão do texto _______________________________________________________ 34
• Extensão do vocábulo ___________________________________________________ 34
• Classes de palavras _____________________________________________________ 34
• Tonicidade da sílaba_____________________________________________________ 35
C.3) VARIÁVEIS SOCIAIS:______________________________________________________ 35
• Faixa etária_____________________________________________________________ 35
• Grau de escolaridade ____________________________________________________ 35
• Sexo __________________________________________________________________ 35
• Profissão_______________________________________________________________ 36
CAPÍTULO 1 ________________________________________________________ 37
O CONTINUUM FALA/ESCRITA: VERSO E REVERSO DA MESMA MOEDA ____ 37
1.1 O CONCEITO DE LÍNGUA ___________________________________________________ 37
1.2 O CONCEITO DE TEXTO ____________________________________________________ 39
1.3 CONCEITO DE FALA E ESCRITA _____________________________________________ 40
1.4 PERSPECTIVAS DE ANÁLISE ________________________________________________ 43
1.5 O CONTINUUM ENTRE ALGUNS GÊNEROS TRADICIONAIS NA FALA E NA ESCRITA _____ 47
1.6 O CONTINUUM DE GÊNEROS NA COMUNICAÇÃO DIGITAL MEDIADA POR COMPUTADOR 49
CAPÍTULO 2 ________________________________________________________ 52
ABREVIAÇÃO: DA GÊNESE À DISSEMINAÇÃO___________________________ 52
2.1 CONCEITO DE ABREVIAÇÃO ________________________________________________ 54
2.1.1 ABREVIAÇÃO X ABREVIATURA ____________________________________________ 55
2.1.2 A TRADIÇÃO DAS ABREVIAÇÕES: UM POUCO DE HISTÓRIA ______________________ 57
2.1.3 ABREVIAÇÃO E OS SINAIS ABREVIATIVOS ____________________________________ 61
2.1.4 CLASSIFICAÇÃO DAS ABREVIAÇÕES ________________________________________ 62
2.1.5 A ABREVIAÇÃO E AS NOTAS TIRONIANAS OU TAQUIGRAFIA ______________________ 66
2.1.6 A ABREVIAÇÃO E A SIMPLIFICAÇÃO LINGÜÍSTICA ______________________________ 68
2.1.7 A ABREVIAÇÃO NAS GRAMÁTICAS E HOME PAGES _____________________________ 70
CAPÍTULO 3 ________________________________________________________ 85
A ABREVIAÇÃO E AS TECNOLOGIAS: DO MANUSCRITO AO TEXTO DIGITAL_ 85
3.1 O MANUSCRITO __________________________________________________________ 87
3.2 O IMPRESSO ____________________________________________________________ 91
3.3 O ELETRÔNICO __________________________________________________________ 96
CAPÍTULO 4 _______________________________________________________ 104
A ABREVIAÇÃO E OS GÊNEROS TEXTUAIS: DA CARTA AO E-MAIL ________ 104
4.1 ORIGEM DO TERMO ______________________________________________________ 104
4.1.2 TIPO TEXTUAL X GÊNERO TEXTUAL _______________________________________ 104
• Tipo textual____________________________________________________________ 104
• Gênero textual _________________________________________________________ 105
4.1.3 BREVÍSSIMO HISTÓRICO ________________________________________________ 105
4.2 GÊNEROS EMERGENTES X GÊNEROS PREEXISTENTES _________________________ 108
4.2.1 O GÊNERO CARTA _____________________________________________________ 109
4.2.1.1 Definição __________________________________________________________ 109
4.2.1.2 Classificação_______________________________________________________ 110
4.2.1.3 Visão panorâmica __________________________________________________ 114
4.2.1.4 Cartas pessoais X cartas oficiais______________________________________ 116
4.2.2 O GÊNERO DIÁRIO _____________________________________________________ 118
4.2.2.1 Origem ____________________________________________________________ 118
4.2.2.2 Definição __________________________________________________________ 118
4.2.2.3 A tradição dos diários _______________________________________________ 118
4.2.2.4 A classificação dos diários ___________________________________________ 120
4.2.3 O GÊNERO E-MAIL _____________________________________________________ 122
4.2.3.1 Origem ____________________________________________________________ 122
4.2.3.2 Definição __________________________________________________________ 123
4.2.3.3 Características _____________________________________________________ 124
4.2.3.4 A linguagem dos e-mails_____________________________________________ 127
4.2.3.5 E-mails pessoais X E-mails comerciais ________________________________ 129
4.2.4 O GÊNERO SMS ______________________________________________________ 131
4.2.4.1Origem ____________________________________________________________ 131
4.2.4.2 Definição __________________________________________________________ 132
4.2.4.3 Como funciona o SMS_______________________________________________ 133
4.2.4.4 SMS pessoal e empresarial __________________________________________ 134
4.2.4.5 Principais benefícios do SMS_________________________________________ 134
4.2.4.6 Aplicações do SMS Marketing ________________________________________ 135
4.2.5 O GÊNERO BLOG ______________________________________________________ 137
4.2.5.1 Origem ____________________________________________________________ 137
4.2.5.2 Definição __________________________________________________________ 137
4.2.5.3 Como funciona o blog _______________________________________________ 138
4.2.5.4 Blogs pessoais e empresariais _______________________________________ 139
4.2.5.5 A linguagem nos blogs: tá td blz!______________________________________ 139
4.3 A ABREVIAÇÃO E O SUPORTE DE GÊNEROS TEXTUAIS__________________________ 141
4.3.1 DEFINIÇÃO ___________________________________________________________ 142
4.3.2 CATEGORIAS DE SUPORTES TEXTUAIS _____________________________________ 142
4.3.3 SUPORTES CONVENCIONAIS _____________________________________________ 143
4.3.4 SUPORTES INCIDENTAIS ________________________________________________ 143
4.3.5 SERVIÇOS____________________________________________________________ 144
CAPÍTULO 5 _______________________________________________________ 146
ANÁLISE DOS DADOS ______________________________________________ 146
CONSIDERAÇÕES FINAIS ___________________________________________ 238
REFERÊNCIAS _____________________________________________________ 242
INTRODUÇÃO
Embora existam ainda em nossos dias opiniões formadas de que
estudar a história de uma língua é algo sem sentido, sabemos que é com um
olhar voltado para o passado que encontraremos explicações para os
processos de variação e mudança da língua. Sem abordagem diacrônica é
impossível desvendar as complexidades que cada período de uma língua
registra, e mencionar a importância que a documentação correspondente às
várias fases da língua representa para o conhecimento desta.
Não raras vezes, são os dados concretos de períodos passados que
fornecerão elementos para a compreensão de fenômenos que ocorrem no
presente. Para tanto, faz-se necessário conhecer não apenas o objeto de
estudo, a língua, mas aspectos da sociedade na qual aquela era utilizada como
meio de expressão. Afinal, por ser um instrumento de comunicação
imprescindível, a língua passa por constante mudança, ocasionando inovações
a todo instante em sua própria essência.
A rapidez ou a lentidão das mudanças da língua é determinada pela
estrutura da sociedade, ou seja, são as condições sociológicas que favorecem
o acúmulo e a integral realização da complexa evolução por que passam as
línguas no tempo e no espaço (SILVA NETO, 1970, p. 13).
Desta forma, diz-se que a evolução se deu no tempo, quando se imitam
os modelos do passado, reproduzindo-se os seus modos de dizer; no espaço,
quando indivíduos, que estão em estágios lingüísticos diferentes, se
interpenetram mutuamente.
Assim, a vida social encontra-se em constante oscilação entre a
imitação dos antigos e a difusão das inovações. Estas últimas podem ser lentas
e complexas, sujeitas a múltiplos e variadíssimos fatores. Entretanto, como
lembra Silva Neto (1970), só vingam as inovações que consultam o espírito da
evolução. Por isso é que muitas abortam, não passam dos primeiros
movimentos: afoga-as o ridículo ou a indiferença coletiva. Com isso, não
queremos dizer que inovar implica evoluir, tampouco afirmar que toda evolução
resulta em avanços, melhoras. Ou seja, tomando por base o sentido de
evolução enquanto processo de desenvolvimento e aperfeiçoamento de um
saber, de uma ciência etc (HOUAISS, 2001, p. 1278), podemos assegurar que
há inovações que não resultam em evoluções, restringindo-se ao seu sentido
de dicionário, ou seja, são apenas coisas novas, novidades, algo que não havia
antes e que, por isso mesmo, não indica evolução, uma vez que não houve
desenvolvimento ou aperfeiçoamento.
Serão as inovações e as imitações observáveis na língua que
nortearão nossa pesquisa, em especial aquelas relacionadas às abreviações
que, já comuns no século VI a.C., ganham destaque outra vez no século XX,
com o texto digital. Assim, buscaremos traçar uma comparação entre as
abreviações utilizadas em períodos anteriores e nos dias atuais, analisando as
regras utilizadas para abreviar, as siglas correspondentes a cada palavra, os
sinais
abreviativos,
entre
outros,
a
fim
de
classificarmos
em
inovações/imitações ou evoluções as abreviações existentes no passado e que
se mantiveram até hoje.
Como podemos ler em Martins (1996, p.174), as invenções são apenas
transformações ou aperfeiçoamentos de coisas anteriormente conhecidas, ou
de pedaços de invenções anteriormente tentadas. E acrescenta: os primeiros
aviões aspiram a ser monstruosas libélulas ou enormes gafanhotos; os
primeiros automóveis parecem muito mais com as carruagens de cavalos do
que com os automóveis atuais.
Para David Crystal (2001, p.2), é uma ilusão pensar que a cada nova
tecnologia o mundo todo se renova por completo. Segundo ele, “novidades
podem até acontecer, mas com o tempo percebe-se que não era tão novo
aquilo que foi tido como tal”. Ou seja, são novidades com algum gosto do
17
conhecido. Conforme lemos em Todorov (1980), os gêneros simplesmente vêm
de outros gêneros. Segundo esse autor, não há gênero novo, mas sim uma
transformação de um ou vários gêneros antigos. E essa transformação se dá
ou por inversão, ou por deslocamento ou por combinação. No dizer de Xavier
(2002, p.66),
Não há vácuos invencionistas em toda a história humana, isto
é, toda invenção é, via de regra, uma “reinvenção” de outras
invenções bem sucedidas; o nada não cria, tudo vai se
transformando sob a batuta inventiva da mente humana.
Com base nessas informações, faremos uma análise das abreviações
enquanto um “legado” do manuscrito ou uma “criação” da era digital, em
especial do texto eletrônico1, já que muitas vezes é a ele associada a
imputação pelo uso expressivo daquelas. Para tanto, observaremos o número
de ocorrência destas nas tecnologias: a manuscrita, a impressa e a digital;
testaremos se a ocorrência delas dá-se em todas as classes de palavras; se o
fator extensão do vocábulo é relevante para aplicação da regra; se a tonicidade
é ou não favorável à abreviação e, por fim, verificar se a economia lingüística é
o que rege o uso das abreviações, ou se há outro(s) fator(es) envolvido(s)
nesse processo.
Assim, a Introdução trará os objetivos, as hipóteses e a metodologia
utilizada ao longo do nosso trabalho, bem como as variáveis analisadas, a
saber: estruturais (classes de palavra – iremos verificar se o uso da
abreviação ocorre independente da classe de palavra: substantivo, adjetivo,
advérbio etc, ou se a incidência do fenômeno em estudo é maior em algumas
que em outras; extensão do vocábulo - nessa variável, o objetivo da análise
será fundamentado no princípio da economia lingüística, que registrará um
número de aplicação da regra mais freqüente em palavras polissílabas que em
monossílabas, caso seja esse o fator que rege o uso da abreviação;
tonicidade da sílaba – com base no princípio da saliência fônica, buscaremos
explicações para uma maior freqüência em sílabas tônicas que em átonas, fato
já observado em uma primeira análise dos dados; extensão do texto – numa
1
Aqui usamos indistintamente os termos eletrônico, digital ou virtual.
18
primeira observação dos dados, os textos que apresentavam um maior número
de linhas (escritas), conseqüentemente traziam um número maior de
abreviações que os textos com menos linhas escritas); sociointerativas (estilo
– essa variável permitiu-nos dividir os textos em formais e informais, a fim de
detectar se o grau de formalidade do texto inibe ou favorece a aplicação da
regra; instância de realização – esse fator classifica os textos em privadas
(pessoais) e públicas (empresariais). Com base nele, apresentaremos a
probabilidade maior de ocorrência da abreviação em um ou outro tipo de texto;
propósito comunicativo – ao que parece, os textos cujo objetivo era o de
divertir, ao contrário daqueles que objetivavam informar, são mais propensos a
usar abreviações dado o teor lúdico; gênero textual – tendo como premissa a
tese de que as palavras são selecionadas segundo as especificidades de um
gênero
(BAKHTIN,1992,
p.
312),
demonstraremos
qual
dos
gêneros
trabalhados apresenta um maior número de abreviações, independente do
período de uso; suporte textual – Xavier (2002, p.75) garante que “boa parte
da excelência intelectual alcançada pela escrita alfabética ao longo dos séculos
deve ser creditada também a evolução dos suportes nos quais ela se abrigou”.
A partir dessa informação, iremos verificar se os suportes exercem alguma
influência sobre os gêneros, no nosso caso, promovendo a existência de
abreviações no texto; e participantes – o fato de haver menos pessoas
envolvidas no processo de comunicação favorece o uso de abreviações ao
longo da produção textual); e sociais (faixa etária – no que tange aos gêneros
por nós analisados, a idade do “produtor do texto” destaca-se como relevante
quando o texto abordado é virtual. Buscaremos, pois, demonstrar se é
categórico esse resultado ou se também ocorre nos demais gêneros; grau de
escolaridade – com base numa primeira observação dos dados, vimos que
quanto mais escolarizado o ‘autor’, menos abreviações são notadas em seus
textos. Assim, veremos se o inverso também ocorre na utilização desse recurso
da língua, a abreviação; sexo – como a literatura aponta as mulheres como
mais conservadoras que os homens e mais inovadoras quando se trata de uma
variante de prestígio, utilizaremos essa variável a fim de comprovar ou não tais
afirmações; e profissão – embora seja considerada relevante na ocorrência de
determinados fatores, no uso de abreviações, a profissão, ao menos na
primeira observação dos dados, não foi considerada determinante, sendo
19
possível encontrar tal recurso em textos de autores de profissões as mais
variadas possíveis).
Dedicaremos o Capítulo I ao continuum fala/escrita, por entendermos o
processo de abreviação como um recurso da fala interferindo na escrita, visto
que muitas formas abreviadas buscam representar a palavra escrita da forma
como ela é pronunciada, o que resulta algumas vezes na alteração de
grafemas (ex: cadê por kd). Veremos a definição de cada termo, bem como as
várias perspectivas de análise, observando como contrapostos os contínuos
entre alguns gêneros tradicionais na fala e na escrita, e na comunicação digital
mediada por computador. No Capítulo II, iremos tratar da origem das
abreviações, o conceito que lhes é pertinente, a sistemática e tradição, sua
classificação, o tratamento dado àquelas pelas gramáticas e sites específicos.
A relação que há entre a abreviação e o meio (manuscrito, impresso, digital) no
qual ela é reproduzida será abordada no Capítulo III. O Capítulo IV trará a
abreviatção e os gêneros textuais (emergentes e preexistentes). Veremos o
conceito, origem e propagação destes, além da diferença entre gênero e tipo
textual. Para tanto, tomaremos como objeto de análise a carta, o e-mail, o
diário, o blog e o SMS. Traremos também as implicações do suporte textual e o
uso de abreviações, a fim de constatar se há ou não alguma relação entre
ambos. Para tanto, traremos a definição de suporte bem como exemplos de
suportes convencionais e incidentais. A análise e os resultados serão
expressos no Capítulo V. Nele, nossa tarefa será a de corroborar nossas
hipóteses testadas, a fim de, em seguida, apresentarmos as constatações da
nossa pesquisa que buscou oferecer uma contribuição, ainda que incipiente,
para estudiosos da área.
Objetivo
Este trabalho tem como objetivo analisar um dos aspectos da língua
portuguesa, a redução, aqui entendida como todo fenômeno de representação
parcial dos vocábulos, seja literal parcial (“p.” por “página”), literal-algarísmica
(“m2” por “metro(s) quadrado(s)”), pictográfica realista (“☼” por “sol”, picto-
20
ideográfico simbólica (“♥” por “amor”, “paixão”), numa perspectiva diacrônicocomparativa,
a
fim
de
comprovarmos
que
fenômenos
observáveis
sincronicamente têm origem e explicação em estados remotos da história da
língua; como também que são restritos a uma região ou, por tratar-se de
variação da língua, passíveis de observação em outras localidades. E, a partir
daí, afirmarmos em que aspectos se podem flagrar inovações e em que outros
perpetuam-se usos ou características das abreviações nos gêneros analisados.
O aspecto diacrônico diz respeito ao período compreendido entre o
século XVIII e o início dos estudos sincrônicos, enquanto o comparativo referese a três Estados da região Nordeste do Brasil, quais sejam Paraíba,
Pernambuco e Bahia. Escolhemos o século XVIII como o ponto de partida, por
ser a partir desse período que é possível levantar documentos ainda em
condições de manusear-se, ao contrário dos séculos anteriores. Atravessamos
o século XIX e nos estendemos até o XX pelo surgimento e propagação do
texto eletrônico, atual responsável por tamanha divulgação das abreviações
nos textos, em especial nos blogs, chats e e-mails2.
No que tange aos três Estados selecionados, Paraíba, Pernambuco e
Bahia, buscamos traçar um perfil da região Nordeste, a fim de sabermos se
havia uma regularidade quanto ao uso das abreviações contidas em cartas
produzidas naqueles Estados.
A abreviação é uma espécie de redução de uso geralmente
circunstancial, variável de obra para obra, de autor para autor, a qual, quando
de uso geral, passa à categoria das abreviaturas (HOUAISS, 1983, p.121-122).
Buscaremos mostrar onde e quando teve início esse recurso da língua; quais
as características que lhe são peculiares, ou seja, as regras e/ou princípios
utilizados para abreviar, os símbolos usados para representar a palavra
abreviada; quais as pessoas que fazem uso dele e, finalmente, descobrir se o
texto eletrônico, seu propagador atual, é responsável pelo surgimento e uso da
abreviação, ou se se trata apenas de uma retomada nos séculos XX e XXI de
um processo já existente anteriormente. Ainda, tentarmos responder à seguinte
questão: se o uso das abreviações tem interferido em diferentes gêneros, uma
2
Observando-se as variáveis formal X informal; público X privado, conforme vemos no capítulo
referente à análise.
21
vez que estes são determinados socio-historicamente (BAKHTIN, 1992,
p.285,302).
Hipóteses
Com base em autores como Spina (1977), Acioli (1994), Mendonça
(1987), Berwanger (1995) e Martins (1996) e, numa primeira observação do
corpus, levantamos para o nosso trabalho sobre as abreviações as seguintes
hipóteses:
1. Esse recurso da língua foi larga e amplamente difundido no
passado, permeando os mais variados gêneros; ou seja, seu uso, ao
que parece, não se restringiu a uma região específica, mas, ao
contrário, espraiou-se por diversos locais do país e do mundo;
2. Seus princípios de utilização, apesar de toda mudança lingüística
e social, são mantidos ainda hoje, com algumas alterações no que
concerne à representação de alguns itens lexicais;
3. O princípio da economia parece ter sido um fator determinante da
ocorrência de abreviações, não apenas nos séculos em que teve
início, mas também nos dias atuais;
4. O número de ocorrências das abreviações também está ligado ao
grau de formalidade do texto, ao gênero textual, ao suporte textual,
ao propósito comunicativo e à comunidade discursiva3;
5. Parece haver certa regularidade nas abreviações que permite
uma recuperação da palavra abreviada sem muito esforço por parte
do leitor, não apenas atualmente, mas em períodos anteriores.
Metodologia
3
Uma comunidade discursiva usa mecanismos de participação para uma série de propósitos:
para prover o incremento da informação e do feedback; para canalizar a inovação; para manter
os sistemas de crenças e de valores da comunidade; para aumentar seu espaço profissional
[...]
22
a) A pesquisa
A história primeira deste trabalho teve início em julho de 2002, quando
do recebimento, da nossa parte, de várias mensagens de texto, via web,
anunciadas no nosso celular. O fato de não conhecermos o (a) autor (a) era
instigante, contudo, o que nos deixou curiosos, no decorrer do envio dessas, foi
o nosso desconhecimento em relação a alguns vocábulos ali registrados: uma
das mensagens dizia: “+ TARD TC C VC. BJS”4. De imediato, começamos uma
busca por alguém que pudesse decodificar essa linguagem, até então,
misteriosa, para nós. No início, não sabíamos se se tratava de abreviação ou
sigla; começamos a associá-la a um novo tipo de linguagem dos jovens.
Após algumas aulas sobre as referidas mensagens, e já familiarizados
com as abreviações, passamos a atribuir a esse novo meio de comunicação –
web – o uso daquelas por parte de quem as utiliza. Entretanto, de volta ao
ambiente acadêmico, desta vez fazendo o levantamento do corpus com o qual
iríamos trabalhar em nossa tese, descobrimos nas leituras não apenas a
ocorrência de abreviações, mas também, até certo ponto, um uso acentuado
delas em cartas (documentos em geral) escritas no século XVIII. Nasce então a
curiosidade e o desejo de sabermos5 o quem, quando, onde, como e por que
da origem da abreviação, já que agora tínhamos a certeza de que esse
processo não é algo restrito a nossa época e, em particular, ao texto digital.
Demos início a nossa pesquisa, que sempre priorizou o feitio diacrônico
e também comparativo.
b) A seleção
b.1) O período
4
Por estarem em maiúsculas, pensamos tratar-se das iniciais do nome do remetente.
Segundo Pe. Antonio Vieira, quem não pergunta não quer saber; quem não quer saber quer
ignorar.
5
23
Quando do início propriamente dito da pesquisa, vimos que o desejo
pelo tema nascera com a incitante mensagem de texto recebida pelo celular e,
mais tarde, a constatação das abreviações já em manuscritos do século XVIII.
Restaram apenas os impressos. Foi quando optamos então por enveredar por
este caminho que nos leva dos textos manuscritos, atravessa os impressos, até
chegar aos textos digitais.
Sabedores da dificuldade em encontrar um considerável número de
textos anteriores ao século XVIII – que estivessem pelo menos em bom estado
de conservação6, portanto, passíveis de leitura, optamos por analisar
manuscritos do século XVIII, textos impressos do século XIX, e textos digitais
dos séculos XX e XXI.
b.2) O local
Restava o lugar. A escolha não foi difícil. Iríamos utilizar material da
Paraíba, cujo corpus pertence à tese defendida em 2003 pela Professora Maria
Cristina de Assis Pinto, intitulada Caracterização Lingüística de Cartas Oficiais
da Paraíba dos Séculos XVIII e XIX; do Recife, por aqui estarmos cursando o
doutorado, trabalhamos com o material do Projeto Ortografia e Pontuação em
manuscritos do século XVIII, coordenado pelo Prof. Marlos de Barros Pessoa;
e, por fim, o Estado da Bahia, para não só termos um perfil de Estados do
Nordeste, como também por sediar aquele Estado um bom banco de dados,
organizado pela Profª Tânia Lobo, a saber: Cartas baianas setecentistas, fruto
do “Projeto de Pesquisa das Fontes para o Estudo da História da Língua
Portuguesa no Brasil”.
Assim, preservaríamos a veia diacrônico-comparativa a que se propõe
a pesquisa.
Há de se ter claro que existem, embora raros, materiais pertencentes a períodos anteriores
passíveis de manuseio.
6
24
b.3) O material
A princípio, pensamos restringir o material a ser por nós analisado a
cartas. Porém, como faríamos um levantamento de textos digitais, vimos que
talvez nos desviássemos um pouco do nosso objetivo ao ter de provar, tratando
e-mails e outros textos digitais como cartas, que aqueles seriam uma versão
moderna dessas. Depois de observarmos que as abreviações não eram
específicas desse gênero, mas, ao contrário, estavam presentes nos mais
variados gêneros textuais, optamos então - já que é uma das nossas hipóteses
- por analisar diversos suportes textuais, a fim de comprovarmos o real uso das
abreviações em diferentes gêneros, dentre os quais estão o diário, o blog e o
SMS. Dessa forma, teríamos gêneros emergentes e suas contrapartes.
b.3.1) Tipologia
O material considerado importante para esta pesquisa é derivado de
duas instâncias: pública e privada, assim distribuídos:
privados
• manuscritos
públicos
privados
• impressos
públicos
privados
• digitais
públicos
Optamos por essas duas instâncias levando em consideração que o
estilo formal prima por uma linguagem mais “elaborada”, o que, se não elimina,
sem dúvida, inibe o uso das abreviações; enquanto que o estilo informal, mais
distenso, por isso menos “rebuscado”, favorece o uso daquelas. Essa divisão
25
engloba tanto as cartas quanto os demais gêneros trabalhados e anteriormente
citados, cuja seleção e respectiva distribuição deram-se da seguinte forma:
•
Buscamos coletar números aproximados de textos dos três
Estados, PB, PE, BA, no que diz respeito aos gêneros: diário,
blog, e-mail e SMS;
•
Primamos por manter a maior variedade possível no que
tange aos fatores sociais, quais sejam: sexo, faixa etária, grau de
escolaridade e profissão;
•
Preservamos o binômio pessoal (privado) X empresarial
(público) em todos os gêneros trabalhados aqui.
Dessa forma, o material coletado ficou assim distribuído:
profissão
jovens
escolarização
homens
profissão
adultos
escolarização
privadas
profissão
jovens
escolarização
mulheres
profissão
adultos
escolarização
profissão
cartas
jovens
escolarização
homens
profissão
adultos
escolarização
públicas
profissão
jovens
mulheres
escolarização
profissão
adultos
escolarização
26
profissão
jovens
escolarização
homens
profissão
adultos
escolarização
privadas
profissão
jovens
escolarização
mulheres
profissão
adultos
escolarização
profissão
diários
jovens
escolarização
homens
profissão
adultos
escolarização
públicas
profissão
jovens
escolarização
mulheres
profissão
adultos
escolarização
profissão
jovens
escolarização
homens
profissão
adultos
escolarização
privadas
profissão
jovens
escolarização
mulheres
profissão
adultos
escolarização
profissão
e-mails
jovens
escolarização
homens
profissão
adultos
escolarização
públicas
profissão
jovens
escolarização
mulheres
profissão
adultos
escolarização
27
profissão
jovens
escolarização
homens
profissão
adultos
escolarização
privadas
profissão
jovens
escolarização
mulheres
profissão
adultos
escolarização
profissão
blogs
jovens
escolarização
homens
profissão
adultos
escolarização
públicas
profissão
jovens
escolarização
mulheres
profissão
adultos
escolarização
profissão
jovens
escolarização
homens
profissão
adultos
escolarização
privadas
profissão
jovens
escolarização
mulheres
profissão
adultos
escolarização
profissão
SMS
jovens
escolarização
homens
profissão
adultos
escolarização
públicas
profissão
jovens
escolarização
mulheres
profissão
adultos
escolarização
28
b.3.2) A autoria
Quanto à autoria, o material foi classificado em textos autógrafos, isto
é, originais manuscritos do próprio punho do autor, e, apógrafos, escritos por
outrem, mas que valeriam por autógrafo (HOUAISS, 1983, p.65).
Dentre o material com o qual trabalhamos havia 170 autógrafos e 10
apógrafos.
b.3.3) A amostra (distribuição geográfica e temporal)
O corpus da nossa pesquisa é composto de cartas (dentro desse
gênero trabalhamos com subgêneros – carta pessoal, carta ao leitor etc),
diários, e-mails, mensagens de texto (SMS) e blogs. Os documentos são
pertencentes aos séculos XVIII, XIX, XX e XXI, assim distribuídos:
cartas: 30 (XVIII e XIX)
Manuscritos: 60
diários: 30 (XX e XXI)
cartas: 30 (XIX)
Impressos: 60
diários: 30 (XX e XXI)
e-mails: 30 (XX e XXI)
Eletrônicos: 60
blogs e SMS: 30 (XXI)
b.3.4) A seleção dos informantes
Sendo inviável, ao menos em alguns casos, apontar fatores sociais
como grau de escolaridade e faixa etária, decidimos por agrupar os informantes
29
pela profissão que exerciam, uma vez que este critério não só era possível de
identificação no material da BA quanto no da PB e PE, como nos ajudaria a
relacionar, de uma só vez, o tipo de cargo que o informante exercia com o grau
de formalidade presente (formal X informal) e a implicação desses fatores no
uso da abreviação.
No corpus da Bahia, segundo Lobo7 (2001), temos a seguinte
caracterização
sociolingüística
dos
informantes:
juízes
ordinários
provavelmente brasileiros e possivelmente não formados em leis e,
desembargadores, provavelmente portugueses e certamente formados em leis.
O material da Paraíba foi disposto por Pinto (2003, p.157-166) em
forma de anexo, no qual as informações relativas aos autores/destinatários das
cartas, no que tange à profissão, variam de militar escrivão a governador da
província, dos quais nós selecionamos8:
⇒Vigário da Vila:
02
⇒Chefes de polícia:
02
⇒Juiz Ordinário:
02
⇒Desembargadores:
02
⇒Ministro do Reino:
02
O terceiro Estado, Pernambuco, reúne em seu banco de dados
informantes cuja escala profissional vai desde Capitães engenheiros a
Governadores, Condes etc, assim distribuídos9:
⇒Servidor público: 02
⇒Major:
02
⇒Tenente:
02
⇒Tipógrafo:
02
⇒Governador:
02
A autora deixa claro que se trata de uma hipótese plausível.
Entendemos que quanto maior a variedade de profissão, melhor seria verificar a relação
desse fator com o fenômeno estudado.
9
Vale ressaltar que essas informações dizem respeito às cartas. Os demais gêneros têm outra
distribuição.
7
8
30
No que tange aos demais gêneros, diário, blog, e-mail e SMS, as
profissões dos informantes ocupam um leque que vai de professor a
empresário, passando por contadores e advogados (os pessoais). Quanto ao
gênero SMS, o caráter oficial/público diz respeito a 3 (três) empresas do ramo
da telefonia: TIM, OI , CLARO10. No gênero e-mail, outras 3 (três) empresas,
desta vez provedores da Internet, são analisadas: YAHOO, IBEST, UOL11. O
gênero blog terá suas amostras coletadas dos seguintes provedores:
HOTMAIL, IG, e TERRA12.
c) Variáveis analisadas
Tomando por base a assertiva que diz serem os gêneros textuais
fenômenos socio-históricos e culturalmente sensíveis (MARCUSCHI, 2002),
deve-se ter bem clara não só a questão da produção adequada desses como
também o uso adequado. Caso contrário, a inobservância das normas sociais
relativas aos gêneros pode acarretar problemas. Afinal, a apropriação dos
gêneros, como afirma Bronckart (1999), é um mecanismo fundamental de
socialização, de inserção prática nas atividades comunicativas humanas.
Dessa forma, na produção de cada gênero, há de se considerar a relação entre
os aspectos abaixo mencionados:
• Natureza da informação ou do conteúdo veiculado;
• Nível de linguagem (formal, informal, dialetal, culta etc.);
• Tipo de situação em que o gênero se situa (pública, privada, corriqueira,
solene etc.);
• Relação entre os participantes (conhecidos, desconhecidos, nível social,
formação etc.).
• Natureza dos objetivos das atividades desenvolvidas.
10
Essas foram as empresas selecionadas por serem as maiores representantes nessa área, ao
menos na região Nordeste.
11
A escolha dessas empresas também se deu por causa do elevado número de pessoas
(físicas e jurídicas) que as acessam diariamente.
12
A fim de utilizarmos uma amostra a mais variada possível, optamos por acrescentar esses
provedores na análise desse gênero digital.
31
Tais indicadores seriam uma espécie de identificação das condições de
adaptação comum na produção dos gêneros (MARCUSCHI, 2002). Sendo
assim, escolhemos um total de 14 (quatorze) variáveis consideradas
importantes para análise do nosso objeto de estudo, dentre as quais 6 (seis)
são de ordem sociointerativo, 4 (quatro) de ordem estrutural e 4 de natureza
social, respectivamente:
c.1) Variáveis sociointerativos
• Gênero: Dos gêneros textuais por nós aqui trabalhados – carta,
diário, blog, e-mail e SMS – iremos analisar qual deles comporta maior número
de abreviação, a fim de sabermos se há ou não uma relação entre o gênero e o
processo da abreviação. Assim, começaremos o levantamento dos dados com
os documentos do século XVIII, período em que ainda havia um largo uso
desse processo por parte de quem escrevia, e estenderemos nossa análise
aos dias atuais, quando há um retorno acentuado no que diz respeito ao
recurso da abreviação. Partindo do princípio de que os gêneros textuais são
fenômenos históricos, profundamente vinculados à vida cultural e social,
observaremos se a rapidez13 exigida na escrita dos gêneros digitais faz com
que haja ou não uma maior utilização desse fenômeno, já que era esse um dos
fatores responsáveis pela sua existência nos períodos anteriores.
•
Estilo14: Decidimos controlar essa variável, tomando como
premissa a existência do estilo em qualquer linguagem15 (POSSENTI 2001, p.
228). Dessa forma, foi possível dividir os textos em formais e informais16,
visando com isso à obtenção de um resultado que mostrasse alguma relação
da abreviação com o grau de formalidade do texto. Presumimos que, embora
não seja determinante, esse fator tem um peso considerável no que se refere
13
É importante lembrar que a rapidez imposta aos usuários é decorrente do “princípio da
economia”, que abrange tempo, esforço físico e pulso telefônico quando não é a cabo.
14
Aqui usamos o termo estilo, por entendermos como a escolha que faz o falante das formas
lingüísticas do seu discurso.
15
Segundo o autor, nenhuma liguagem é o que é por natureza, mas sim como resultado do
trabalho de seus construtores/usuários.
16
Entendemos como estilo informal aquele cujo grau de reflexão sobre as formas empregadas
é mínimo; ao passo que é máximo o grau de reflexão no estilo formal.
32
ao uso das abreviações, uma vez que o texto formal tende a seguir a norma
padrão, segundo a qual não se deve utilizar abreviações caso não haja
necessidade. E, ao fazer uso destas, seguir as regras existentes.
• Instância de realização: Dividimos os textos que compõem o
corpus, pelo menos os que se prestavam a tal divisão, em privados (pessoais)
e públicos (empresariais). Buscaremos verificar se há uma relação direta com
essa divisão e o número de ocorrência de abreviação nesses gêneros.
Acreditamos que em razão do texto público fazer uso de um vocabulário mais
conservador, em geral, já que se destina a pessoas variadas, talvez haja nele
um menor número de abreviações, ao contrário do texto pessoal, que se dirige
a um público seleto, muitas vezes o próprio autor, que reconhece toda e
qualquer abreviação por si utilizada.
• Participantes: Quando da correspondência equivalente: 1x1 ou
NxN17, no que diz respeito ao número de participantes, o fato de haver uma
maior restrição parece determinar o percentual de ocorrência de abreviações.
Em outras palavras, se remetente e destinatário são em número igual, há mais
chance de aplicar a regra, ou seja, usar abreviações, visto que, em princípio, o
autor conhece o léxico e sintaxe daquele para o qual está escrevendo.
• Propósito comunicativo: Paralelo ao estilo, este fator mostra-se
relevante quanto ao uso das abreviações. Ou seja, os textos que se propõem a
divertir o(s) destinatário(s) apresentam uma maior ocorrência de abreviação do
que aqueles cuja finalidade é informativa, educativa etc, comprovando a
plasticidade da linguagem, no que diz respeito aos usos que dela são feitos.
Como afirma Coscarelli (2005, p.121), para melhor atenderem aos seus
propósitos, os textos, sejam eles em formato hipertextual ou não, precisam ser
diferentes em cada situação de comunicação. Adotando a terminologia usada
por Zanotto (2005, p.131-133), classificaremos os propósitos comunicativos em
dominantes e secundários, seja o texto lúdico ou informativo.
• Suporte: Como veremos, foi com o manuscrito e o respectivo
preço elevado do material da escrita que surgiram as abreviações. Essa
economia, contudo, inexistente na era do impresso, não foi suficiente para
17
Estes símbolos significam, respectivamente, um para um e muitos para muitos.
33
extinguir o uso delas – as abreviações -, que ainda continuaram, em menor
número, por algum tempo. Com o texto virtual, cujo suporte é o computador, há
um retorno às abreviações que, embora ressurjam com alterações próprias das
novas tecnologias, em muito lembram as utilizadas já nas notas tironianas.
Partindo da assertiva de McLuhan, segundo a qual o meio é a mensagem,
iremos verificar se o canal é ou não um mero veículo de transmissão, se exerce
ou não influência no gênero que veicula.
c.2) Variáveis estruturais
• Extensão do texto: Iremos verificar o número de abreviações e
sua relação com a extensão do texto, a fim de sabermos se o processo é
diretamente proporcional, ou seja, quanto maior o texto, sua extensão, mais
abreviações se fazem notar. Pudemos ver, numa primeira leitura dos dados,
que tanto as cartas do século XVIII quanto os e-mails do século XX e dias
atuais fazem uso desse recurso da língua, quer se trate de um texto com mais
ou menos de vinte linhas.
• Extensão do vocábulo: Por tratar-se de um princípio de
economia, é de se esperar que a abreviação seja mais freqüente em vocábulos
com mais de uma sílaba. Ou seja, quanto maior a palavra, maior a
probabilidade de redução; o que não significa dizer que não haja palavra
dissílaba ou monossílaba (que, por exemplo) que não sofra abreviação. É bem
verdade também que algumas reduções não se justificavam, visto que apenas
uma letra era apagada, como no exemplo: pr (por), plos (pelos), conhecimetos
etc. Faremos uma análise do fenômeno, a fim de testarmos a existência ou não
de alguma relação que justifique esses resultados.
• Classes de palavras: Esta variável nos permitirá estabelecer
ligações entre as dez classes de palavras existentes e a ocorrência de
abreviações nessas. Dessa forma, será possível afirmar se se abreviam tanto
adjetivos, quanto verbos, pronomes, advérbios, substantivos e outros, não só
nas cartas e diários, mas também nos blogs, e-mails e SMSs.
34
• Tonicidade da sílaba: Não sabemos de fato se há uma relação de
causa estabelecida, mas, dos dados analisados, a incidência das reduções
recai, em sua maioria, nas silabas tônicas, quer seja a palavra monossílaba,
dissílaba, trissílaba ou polissílaba.
c.3) Variáveis sociais18:
• Faixa etária: Dentre os fatores sociais analisados, este parece se
destacar como mais relevante no processo de redução da palavra, a
abreviação. Contudo, não podemos esquecer que essa relação só é
determinante nos gêneros digitais. Ao que parece, esse fato se deve à razão
de serem os jovens aqueles que mais utilizam as novas tecnologias digitais e,
conseqüentemente, a linguagem peculiar. Nos demais gêneros, esse fator
parece ocorrer independente da idade do produtor do texto.
• Grau de escolaridade: Como não foi possível determinar com
precisão o grau de escolaridade dos informantes (remetentes e destinatários),
em se tratando dos autores de textos dos séculos anteriores, XVIII e XIX,
dividimos estes em mais alfabetizados e menos alfabetizados. Para tanto, não
adotamos o conceito de letramento, mas sim a definição de que alfabetizado é
aquele que escreve e lê, já que aqui era condição sine qua non19 do nosso
objeto de estudo.
• Sexo: Embora nas cartas só tenha havido um caso de remetente
do sexo feminino, já que não era permitido à mulher o direito de escrever,
ficando restrito ao homem essa tarefa, nos demais gêneros, onde foi possível
manter uma equivalência quanto ao sexo, vimos que esse fator não é relevante
para determinação das abreviações.
18
Dependendo da situação em que se encontrar, a variedade lingüística utilizada por um
falante será relativa à sua região de origem, classe social, idade, escolaridade, sexo etc.
(MUSSALIM, Fernanda, BENTES, Anna Christina (orgs.), 2005).
19
É verdade que alguns podiam exercer a função de “escritor” e “leitor” da carta para aqueles
que não dominavam tais capacidades. No século XVI, existiam os upografeis, pessoas que
escreviam por aqueles que não sabiam fazê-lo. Exemplos disso são as narrativas de vida
popular que, freqüentemente delegavam a uma pessoa próxima a atividade da escrita. Por
exemplo: Uma criança que escreve por seus pais e, no exército, um conscrito mais bem
alfabetizado que redige a correspondência de seus colegas (CHARTIER, 2002, p. 92-93).
35
• Profissão: Essa última variável permitirá a observação de como,
se é que é possível, a profissão interfere na relação do uso de abreviação, já
que há algumas profissões que se servem constantemente desse modo de
simplificar a língua, ao contrário de outras que impedem a utilização de
abreviações por parte de quem escreve (há proibição nos atos processuais e
inadmissibilidade em fichas de declaração e Carteiras de Trabalho e
Previdência Social, segundo nos informa o site DJi – índice Fundamental do
Direito).
36
CAPÍTULO 1
O CONTINUUM FALA/ESCRITA: Verso e reverso da mesma moeda
1.1 O conceito de língua
Tendo em vista que a fala e a escrita são modalidades da língua, há
que se ter a priori, antes de adentrarmos esta questão, uma exposição, ainda
que embrionária, do conceito de língua que norteia nosso estudo. Para tanto,
elegemos alguns autores em consonância com nossa postura teórica a fim de
dissipar quaisquer interpretações eivadas de crenças equivocadas sobre esse
lado social da linguagem.
É fato que a língua não deve ser tratada como uma abstração, extraída
de sua realidade socio-histórico-cultural, uma vez que aquela não existe senão
no falar dos indivíduos, e o falar é sempre falar uma língua (COSERIU, 1979,
p.33). Sob esse prisma, tanto o estruturalismo de Saussure quanto o
mentalismo de Chomsky são aqui rechaçados por deixarem de lado o
indivíduo, a sociedade, a história e a interação20, priorizando o sistema e
menosprezando o discurso21.
20
Marcuschi (2005b) deixa claro que, ainda que de formas diferentes e com conseqüências
diversas, hoje é possível ver essas conseqüências. (MARCUSCHI, L.A. Perplexidades e
perspectivas da lingüística na virada do milênio. In: LINGUA, LINGUÍSTICA E LITERATURA:
revista do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Universidade Federal da
Paraíba. João Pessoa/Santa Maria: Pallotti. VOL.1, n.3, Dez/2005, 214 p.).
21
A fim de não cometermos injustiça, trazemos à baila a distinção entre langue e parole, feita
por Saussure, e a que Chomsky fez entre competência e desempenho, ambas decisivas na
história da Lingüística. Vale ressaltar que Coseriu critica as noções de langue e parole, de
Saussure.
37
A concepção de língua não como obra acabada, mas como uma
atividade ininterrupta, mesmo quando fixada através da escrita, já era
defendida por Humboldt (1971) e corroborada por Coseriu (1979), para quem a
língua é uma matéria viva e evolutiva, inovada sem cessar pelo homem.
Segundo este autor, ao contrário de ser alteração ou deterioração22, a
mudança na língua é reconstrução, renovação do sistema, assegurando-lhe
continuidade e funcionamento.
Acerca das variações e mudanças da língua, destacamos o trecho a
seguir:
A cada dia aparecem, aos milhares, nos jornais, indicações de
todo tipo, aparecem nas ruas, em tabuletas, por toda parte.
Não se deve acreditar que se trata de uma forma inferior de
linguagem; essas indicações desempenham, na vida, um
grande papel e exercem uma sensível influência no
desenvolvimento da língua. Desde o século XIX, sobretudo,
elas contribuem fortemente para as mudanças do léxico, em
vista de suas necessidades peculiares. Não deixam de atuar
também sobre a sintaxe, mediante reduções23, obrigatórias, em
vista do lugar, do preço e das necessidades de serem lidas de
um só golpe de vista; trata-se de um estilo telegráfico de outro
gênero, que tem regras obscuras, das quais a principal é fazer
24
o máximo de efeito com o mínimo de palavras .
Seguidores dessa visão, consideramos a língua como um jogo de
atividades verbais, heterogêneas, interacionais, cognitivas, sociais e históricas
interdependentes e interrelacionadas. De acordo com essa perspectiva:
A língua apresenta uma organização interna sistemática que
pode ser estudada cientificamente, sem se reduzir a um
conjunto de regras de boa-formação que podem ser
determinadas de uma vez por todas como se fosse possível
fazer cálculos de previsão infalível; a língua tem aspectos
estáveis e instáveis, ou seja, ela é um sistema variável,
indeterminado e não fixo, apresentando sistematicidade e
variação a um só tempo; a língua se determina por valores
imanentes e transcendentes, de modo que não pode ser
estudada de forma autônoma, devendo-se recorrer ao entorno
22
Para Sócrates, a questão da mudança lingüística “é obra de pessoas que não se preocupam
com a verdade, mas apenas com a forma de suas bocas; assim, vão modificando as palavras
originais até que nenhum ser humano consiga entender o que a palavra significa (FERREIRA,
CARRILHO & LOBO et al. 1996, p. 564)”.
23
No capítulo referente à abreviação, nos deteremos com mais profundidade nesse aspecto.
24
BRUNOT, Ferdinand. (1926) La pensée et la langue.
38
e à situação nos mais variados contextos de uso; a língua
constrói-se com símbolos convencionais, parcialmente
motivados, não aleatórios mas arbitrários; a língua não pode
ser tida como um simples instrumento de representação do
mundo, como se dele fosse um espelho, pois ela é constitutiva
da realidade; a língua é uma atividade de natureza
sociocognitiva, histórica e situacionalmente desenvolvida para
promover a interação humana; a língua se dá e se manifesta
em textos orais e escritos ordenados e estabilizados em
gêneros textuais para uso em situações concretas; a língua
não é transparente, mas opaca, o que permite a variabilidade
de interpretação nos textos e faz da compreensão um
fenômeno especial na relação entre os seres humanos
(MARCUSCHI, 2000, p.32).
Na visão de Coseriu (1979, p. 52), “a língua é um saber falar, saber
como se fala numa determinada comunidade e segundo uma determinada
comunidade e segundo uma tradição”. Esta, pois, é a visão de língua da qual
compartilhamos plenamente. Ou seja, uma concepção de língua como uma
atividade social, cujas normas evoluem segundo os mecanismos de autoregulação dos indivíduos e dos grupos em sua dinâmica histórica de interação
entre si e com a realidade (BAGNO et al.2002, p. 32).
1.2 O conceito de texto
Uma vez que fazemos uso do termo texto em vários momentos da
nossa pesquisa, vimos como indispensável – ainda que de forma incipiente –
apresentarmos a definição que adotamos para o mesmo, a fim de deixar clara
a nossa postura em relação à concepção porque por ora optamos. Tendo como
âncora teórica o sociointeracionismo da linguagem, entendemos o texto como
uma atividade interacional na qual existe um sujeito social que, numa dada
situação, realiza uma atividade verbal com vistas a determinados efeitos.
Segundo Koch (1997, p.7):
Em sua inter-relação com outros sujeitos, o sujeito
planejador/organizador vai construir um texto, sob a influência
de uma complexa rede de fatores, entre os quais a
especificidade da situação, o jogo de imagens recíprocas, as
crenças, convicções, atitudes dos interactantes, os
conhecimentos (supostamente) partilhados, as expectativas
mútuas, as normas e convenções sócio-culturais.
39
Segundo Zanotto (2005, p. 36), os textos são as unidades de
comunicação empírica. São entidades concretas, orais ou escritas, com
começo e fim. Desta forma, fica clara a inconsistência do conceito de texto que
se restringe a defini-lo como sendo representação gráfica cercada de espaços
em branco, muito menos um que o reduza a mero conjunto de frases que
apresentam sentido. O texto precisa ser estudado enquanto objeto em
processo e não produto finalizado, visto que se trata de uma atividade
intencional que o falante, de conformidade com as condições sob as quais o
texto é produzido, empreende, tentando dar a entender seus propósitos ao
destinatário através da manifestação verbal (KOCH, 1997, p. 22).
1.3 Conceito de fala e escrita
Por entendermos a abreviação como um processo de estratégias da
língua falada na escrita, ou seja, ‘o falante tenta escrever como fala’(p.ex: kbça
por cabeça), vimos, como indispensável, antes de tratarmos do assunto
propriamente dito, apresentar algumas considerações acerca do binômio
oralidade e escrita já que, em certo sentido, gêneros emergentes (como os por
nós aqui estudados, o e-mail e o blog, por exemplo) possibilitam a redefinição
de alguns aspectos centrais na observação da linguagem em uso,
especificamente a relação entre a oralidade e a escrita.
É sabido que a natureza da comunicação escrita foi radicalmente
transformada pelo uso da tecnologia digital, ao inserir novos gêneros textuais.
Sendo assim, a visão dicotômica de fala/escrita torna-se hoje insustentável,
frente à variedade de formas e usos comunicativos em multimeios e suporte
eletrônico. Como afirma Marcuschi (2005, p.10), a natureza da escrita que se
desenvolve na Internet aflora certa primazia de estratégias orais sobrepondo-se
às estratégias da escrita. Ou ainda como salienta Vieira (2005, p. 29), é fato a
relavorização
da
escrita
com
a
introdução
da
tecnologia
eletrônica,
independente do que signifique falar/ler/escrever, dos limites oral/escrito e de
suas novas funções.
A fim de melhor discutirmos essa questão, reunimos neste capítulo
estudos com diferentes visões sobre o oral e o escrito. Nesse sentido, veremos
40
quais deles tratam a oralidade como algo informal, quais os que associam a
formalidade à escrita, proclamando sua supremacia; e por fim, aqueles que
vêem tanto em uma quanto em outra modalidade duas entidades que
constantemente se perpassam.
Embora tenha sido objeto de estudo de muitos trabalhos em
Lingüística, a discussão sobre as relações entre fala e escrita ainda está longe
de esgotar a questão, visto que a idéia de escrita como modalidade que requer
mais elaboração do que a fala ainda encontra espaços entre estudiosos
baseados na crença de que existem características intrínsecas aos textos orais
e aos textos escritos.
Um dos motivos para a propagação de axiomas desse tipo parece estar
relacionado ao realce dado à língua escrita em prejuízo da falada, antes do
século XX e, mais acentuadamente, antes do século XIX. Acreditava-se que,
ao escrever, no dizer de Sampson (1996, p.8), vestimos nossos trajes
lingüísticos de domingo, ponderando e censurando nossas expressões para
obter um produto final elaborado. Por outro lado, a língua falada era tida, até
meados da década de 60, como de estrutura simples ou desestruturada,
informal, concreta e dependente do contexto; em síntese, o lugar do “caos”
(FÁVERO, L. et al., 2003).
Mesmo
sendo
preterida
pela
escrita,
a
transmissão
oral
do
conhecimento foi por muito tempo privilegiada em detrimento da escrita devido
à relutância de alguns intelectuais da Antiga Grécia, como Platão, em aceitar a
escrita como uma criação apropriada, embora já se tivessem passado dois
séculos e meio do surgimento da “escrita fenícia” (MAN, 2004). Segundo Man,
acerca da apropriação do alfabeto, Platão teria afirmado o seguinte:
Se os homens o aprenderem, ele irá plantar o esquecimento
em seus corações. Para o verdadeiro conhecimento, é
necessária a interação, com bons professores. Uma vez que
suas palavras estão em um livro, o processo inteiro se rompe
(MAN, 2004, p. 251).
Olson (1997), citando Bloch (1989), diz que a escrita pode ter papéis
muito diferentes em diferentes culturas: “na cultura chinesa a palavra escrita é
41
tida como padrão e as formas orais são consideradas derivadas; na Índia, é
justamente o contrário: a forma oral é sagrada, a escrita não inspira confiança.”
Ou seja, na opinião de Bloch (1989), o papel da escrita só é entendido quando
observada a estrutura da cultura na qual ela foi introduzida.
R. Thomas (1989 APUD OLSON, 1997), por exemplo, diz que o
domínio da escrita contribuiu menos para as realizações dos gregos do que
geralmente se imagina. Afirma ainda que muitos filósofos dos antigos gregos,
entre eles Platão, não só preferiam as formas orais como também não
confiavam nas formas escritas.
Já Horcades (2004, p. 16) diz que a invenção da escrita foi uma das
maiores realizações do homem na Terra. Na opinião dele:
A escrita possibilitou o acúmulo de conhecimento humano.
Antes dela, tudo o que um homem aprendia durante sua vida
morria com ele. Depois da invenção da escrita, o conhecimento
passou a se acumular e a não se perder, assim, ao nascer, o
homem tem a seu dispor toda a experiência e as descobertas
de seus antecessores.
Convém lembrar que, durante muitos séculos, conforme lemos em Lévy
(1993), a escrita foi privilégio de poucos, ficando a alfabetização restrita a
grupos eclesiásticos e a nobres. Somente a alguns foram concedidos o acesso
e exercício da escrita, criando um ambiente de grande discriminação, onde os
muitos que a ignoravam eram controlados pelos poucos que a dominavam.
Sendo assim, durante muito tempo, e por que não dizer ainda hoje,
tratou-se a questão das relações entre oralidade e escrita como algo
dicotômico e estanque, a ponto de se considerar como dois sistemas
lingüísticos, duas línguas. Também o fato de, em muitas línguas, a escrita ser
relativamente conservadora em comparação com a falada, encaminhou a
atenção para a escrita como algo oposto à fala.
Entretanto, sabemos que tanto a língua falada quanto a escrita sofrem
influência das pressões sociais. E, embora sejamos cientes de que todas as
comunidades humanas possuem uma língua falada, e algumas não têm um
42
sistema de escrita, ainda assim, tal constatação não é suficiente para se
ignorar o estudo da língua escrita.
1.4 Perspectivas de análise
Conforme lemos em Marcuschi (2001, p.34), a partir dos anos 80,
porém, houve uma mudança de visão no que concerne ao tratamento da
oralidade e da escrita como opostas. Observou-se que as relações entre fala e
escrita não são óbvias nem lineares, não podendo postular-se polaridades
estritas e dicotomias estanques, já que elas refletem um constante dinamismo
fundado no continuum que se realiza entre essas duas modalidades de uso da
língua.
Devemos, sim, tratar a oralidade e a escrita como imprescindíveis ao
ser humano, não confundindo seus papéis e contextos de uso, e não
discriminar seus usuários, pois assim como a fala não apresenta propriedades
intrínsecas negativas, também a escrita não tem propriedades intrínsecas
privilegiadas, sendo um erro demandar preeminência de uma das duas
modalidades, já que não podemos assegurar que a fala é superior à escrita –
apesar da primazia cronológica indiscutível daquela em relação a esta – nem
tampouco que a escrita é superior à fala25 (MARCUSCHI, 2001, p. 22).
E, ainda que o homem seja definido como um ser que fala, tal assertiva
não implica a superioridade da fala sobre a escrita, nem tampouco sustenta a
tese de que a fala é primária e a escrita é derivada. Ambas, segundo Marcuschi
(2001, p.17), “são práticas e usos da língua com características próprias,
permitindo a construção de textos coesos e coerentes, variações estilísticas,
sociais, dialetais, ao contrário do que apregoam alguns lingüistas como
Bernstein (1971), Labov (1972) e Halliday (1985) 26”.
Segundo a perspectiva das dicotomias, uma das várias tendências de
análise da relação fala/escrita, a fala seria o lugar do erro e do caos gramatical
25
Do ponto de vista cronológico, a fala tem uma grande precedência sobre a escrita; do ponto
de vista do prestígio social, a escrita é vista como mais prestigiosa que a fala. Trata-se, como
salienta Marcuschi (2001, p. 36), de postura ideológica.
26
Para estes, a língua falada e a língua escrita estão divididas em dois blocos distintos,
apresentando, cada uma dessas modalidades, características intrínsecas.
43
(redundante, não-planejada, fragmentada, incompleta e pouco elaborada),
enquanto a escrita, o lugar da norma e do bom uso da língua (condensada,
planejada, não-fragmentada, completa e elaborada). Essa visão, divulgada nos
manuais escolares, postula menor complexidade para a fala e maior para a
escrita. Mas, como salienta Koch (2000, p.68), essas diferenças nem sempre
distinguem as duas modalidades, mesmo porque existe uma escrita informal
que se aproxima da fala e uma fala formal que se aproxima da escrita. Ainda:
essas características foram sempre estabelecidas tendo por parâmetro o ideal
da escrita, levando a uma visão preconceituosa da fala. Ou seja, costuma-se
olhar a língua falada “através das lentes de uma gramática projetada para a
escrita”, comparando-a a uma linguagem rústica, das sociedades primitivas e
das crianças em fase de aquisição (KOCH, 2002, p. 79). O que ocorre, na
verdade, é que a fala apresenta características próprias.
É necessário considerar as condições de produção27, para que não
haja distorção no estabelecimento das relações entre fala e escrita, pois essas
são distintas em cada modalidade, como podemos observar no Quadro 1,
abaixo:
Quadro 1
Fala
Interação face a face;
Planejamento simultâneo ou quase
simultâneo à produção;
Criação coletiva: administrada passo a
passo
Impossibilidade de apagamento;
Sem condições de consulta a outros
textos;
A reformulação pode ser promovida tanto
pelo falante como pelo interlocutor;
Acesso imediato às reações do
interlocutor;
O falante pode processar o texto,
redirecionando-o a partir das reações do
interlocutor;
O texto mostra todo o seu processo de
criação.
27
Escrita
Interação a distância (espaço-temporal);
Planejamento anterior à produção;
Criação individual;
Possibilidade de revisão;
Livre consulta;
A reformulação é promovida apenas pelo
escritor;
Sem possibilidade de acesso imediato;
O escritor pode processar o texto a partir
das possíveis reações do leitor;
O texto tende a esconder o seu processo
de criação, mostrando apenas o
resultado.
Fávero et al.(2003, p.74).
44
Sendo assim, podemos concluir que tanto a fala quanto a escrita
compreendem um continuum, que vai do mais informal ao mais formal,
passando por níveis intermediários. Dessa forma, a informalidade consistiria
em uma das possibilidades de realização tanto da fala como da escrita, e não
uma característica específica da modalidade oral (FÁVERO, 2003, p.75). Ou
seja, não podemos afirmar que a escrita seja mais complexa, mais bem
elaborada, mais explicita ou mais autônoma que a fala (BIBER, 1988, p.24).
A segunda tendência, a qual Marcuschi denomina visão culturalista,
observa muito mais a natureza das práticas de oralidade versus escrita, e vê
esta como um avanço na capacidade cognitiva dos indivíduos. Os seguidores
dessa visão, Walter Ong (1982), Jack Goody (1977) e David Olson (1977), se
voltam para as mudanças operadas nas sociedades onde o sistema da escrita
foi introduzido. O maior problema acarretado por essa perspectiva de análise
seria a idéia de que as culturas letradas são superiores, por apresentarem
raciocínio dedutivo e pensamento abstrato, possíveis graças à escrita, o que
sugeriria a supremacia da escrita sobre a fala.
Há ainda duas tendências de tratamento da questão da fala e escrita, a
da perspectiva variacionista e a sociointeracionista. A primeira, variacionista,
além de utilizar um maior rigor metodológico na análise da língua que as duas
propostas anteriores, não faz distinção dicotômica ou caracterização estanque,
mas, ao contrário, preocupa-se com regularidades e variações lingüísticas
distintas. Nessa perspectiva, as diferentes manifestações observadas nas
relações entre fala e escrita seriam casos de variação lingüística.
Na segunda, sociointeracionista, as relações entre fala e escrita são
tratadas dentro da perspectiva dialógica, dentro de um continuum textual sem
polaridades estritas, percebendo a língua como fenômeno interativo e dinâmico
(v. Quadro 2 abaixo). A preocupação dessa perspectiva está voltada para os
processos de produção de sentido, situando-os em contextos sociohistoricamente marcados por atividades de negociação ou por processos
inferenciais. Conforme lemos em Zanotto (2005, p. 31), o interacionismo
sociodiscursivo privilegia o estudo da língua como um instrumento de interação
social, não a língua como sistema ou construto teórico, mas a língua
transformada em discurso, viabilizado pelos gêneros de textos.
45
Quadro 2
Perspectiva sociointeracionista
Fala e escrita
Dialogicidade/Usos estratégicos
Funções interacionais/Envolvimento
Negociação/Situacionalidade
Coerência/Dinamicidade
Como se vê no quadro acima, este modelo percebe com mais clareza a
língua como fenômeno interativo e dinâmico, voltado para as atividades
dialógicas que marcam as características mais salientes da fala e da escrita.
Dessa forma, fala e escrita apresentam dialogicidade, negociação, funções
interacionais etc. Segundo a perspectiva sociointeracional, não existem
características intrínsecas às modalidades oral e escrita, mas decorrentes do
modo por que elas são atualizadas em textos.
Sendo assim, os estudos que se preocupam em descrever as
características da fala e da escrita como modalidades de traços próprios,
intrínsecos e inatos tornam-se pouco produtivos, haja vista os fatores externos
à língua que contornam, controlam e marcam os modos como ela se realiza.
Segundo Assis (2005, p. 219), esses fatores vão desde a tecnologia envolvida
– telefone, computador, tevê, lápis, papel, quadro-negro etc. – até os
elementos de ordem sociohistórica e subjetiva – o ambiente, os agentes
envolvidos, suas relações e papéis sociais, os propósitos comunicativos, entre
outros28.
Desta forma, o melhor enfoque sobre a relação fala/escrita, segundo a
autora, é aquele que se volta para as atividades comunicativas, que surgem
emparelhadas às necessidades advindas da vida cultural e social, bem como
às inovações tecnológicas que nos cercam.
28
No capítulo referente à análise, veremos o comportamento de cada um desses fatores.
46
1.5 O continuum entre alguns gêneros tradicionais na fala e na escrita
Em sua tese intitulada Formação de uma Variedade Urbana e Semioralidade: o caso do Recife, Brasil, Pessoa (2003) descreve em detalhes como
se dá o processo da passagem do oral para o escrito. Para ele, a distinção
entre oral e escrito se dá num continuum, sendo impossível precisar uma
separação rígida. Ainda segundo esse autor, para se compreender claramente
a natureza das duas modalidades, deve-se primeiramente compreender que
elas se concretizam num medium e numa concepção. O primeiro representa o
canal em que as modalidades se realizam; o segundo, a natureza cognitiva de
sua organização. Essa distinção já havia sido encontrada nos anos 70, por SÖll
(1974), afirma Pessoa. Vejamos a seguir a distribuição desses elementos e sua
relação nas passagens das modalidades:
Gráfico 1
m
A
(concepção) oral
B
fônico (medium = m)
o
escrito
gráfico (m)
C
D
No Gráfico 1 acima, o ponto 0 (zero) representa uma separação
teórica entre o oral e o escrito. Ao realizar seu percurso, essa linha deixa
separada a parte superior da inferior, onde se encontram o fônico e o gráfico,
respectivamente. A linha pontilhada m, representa o medium, e se movimenta
em concomitância com o eixo concepcional, mostrando as diversas
combinações possíveis e como medium e concepção se inter-relacionam nos
diversos tipos de textos produzidos; a linha m se encontra na altura do ponto 0
47
(zero) para indicar apenas sua posição de repouso, perpassando os dois
planos mediais, para indicar que serve para os representar. Sendo assim, m
pode se manifestar na parte superior ou inferior (fônico ou gráfico,
respectivamente) combinada com a concepção à esquerda ou à direita, se se
trata de concepção oral ou escrita respectivamente. Então, no quadrante
superior A se encontrariam os textos que se realizam como fônicos e são
concebidos como orais (uma conversa informal entre dois conhecidos); no
quadrante superior B se encontrariam os textos realizados fonicamente e
concebidos como escritos (uma conferência); no quadrante inferior esquerdo C
se encontrariam os textos realizados graficamente e concebidos como orais
(uma carta privada); finalmente, no quadrante D, os textos realizados
graficamente e concebidos como escritos (um artigo para publicação).
A proposta desse autor destaca a evidência, na perspectiva do
medium, da distinção entre oral e escrito, visto que os textos se realizam ou
pelo canal fônico ou pelo canal gráfico29. Já na perspectiva da concepção,
segundo ele, embora as formas de organização textual sejam diferentes podem
se perpassar, fazendo surgir a semi-oralidade, que implica a passagem do oral
para o escrito ou vice-versa. Na opinião de Pessoa (2003), devemos nos
orientar para a compreensão do que se quer representar através do medium, o
que não implica uma prevalência deste sobre a concepção. Nas palavras do
autor, oralidade e escrita não são duas entidades separadas, mas que
constantemente se perpassam.
Por trabalharmos na nossa pesquisa com textos digitais, vimos como
imprescindível
estender
a
representação
do
continuum
dos
gêneros
tradicionais para os gêneros virtuais. Dessa forma, apresentamos a seguir um
gráfico que exemplifica como se dá esse continuum no meio digital.
29
Pessoa salienta que o gráfico é filogeneticamente uma representação do fônico, mas essa
simetria deixa de existir, visto que há uma alteração na relação de um para um, já que a
representação gráfica insiste em um conservadorismo, que não acompanha a evolução dos
sistemas.
48
1.6 O continuum de gêneros na comunicação digital mediada por
computador
Assíncronos
Blogs
E-mail
Interação
multilateral
Interação
bilateral
Uso geral de rede
Vídeo-conferência
ICQ/ IRC/ MUD/ MOO
(chats em geral)
Síncronos
Fonte: Simeon J. YATES (2000) p.237
O Gráfico acima mostra o contínuo para os gêneros virtuais. Ele é
construído com base em dois eixos: (a) o eixo da comunicação síncrona
versus comunicação assíncrona, ou seja, comunicação que se dá no tempo
real (caso da comunicação face a face) e a comunicação escrita (em geral
defasada no tempo) e (b) o eixo da comunicação multilateral
30
(de um para
muitos, de muitos para um ou de muitos para muitos) e a comunicação
bilateral (de um para um). Nele podemos observar que os e-mails são uma
comunicação de fato assíncrona, mas podem ser tanto multilateral como
bilateral, tendo uma preferência por sua realização inter-individual. Já o uso da
rede (WWW), em todas as suas modalidades e gêneros abrigados, está num
entrecruzamento que permite enorme variedade de realizações em termos de
formalidade, informalidade, relações comunicativas e produção síncrona ou
não (MARCUSCHI, & XAVIER, 2004). Os Gráficos 1 e 2 mostram uma relação
que elimina a visão dicotômica e ao mesmo tempo mostra que há uma certa
diferença entre o ambiente sonoro/impresso e o meio digital.
30
É bem verdade que gêneros tradicionais, como o abaixo-assinado e outros similares,
também permitem a comunicação multilateral.
49
A propósito das relações entre a escrita nas novas tecnologias
computacionais e a escrita na forma tradicional, Marcuschi (2004, p.63) citando
Halliday afirma que, “sob o impacto das novas formas de tecnologia,
presenciamos uma nova situação que está desconstruindo toda a oposição
entre fala e escrita”. Para esse autor, semelhante ao surgimento dos tipos
móveis, com as novas tecnologias da produção escrita pelo computador com
os processadores de texto, está surgindo outro passo importante na história da
escrita. Segundo ele, em breve será eliminada a distância entre a fala e a
escrita. É certo, pois, que a escrita nos gêneros em ambientes virtuais se dá
numa certa combinação com a fala, manifestando um hibridismo ainda não
bem-conhecido e muitas vezes mal-compreendido.
Frente a essas divergências, achamos imprescindível desfazer alguns
mitos existentes relacionados à fala e à escrita:
1. A fala apresenta propriedades intrínsecas negativas;
2. A escrita apresenta propriedades intrínsecas privilegiadas;
3. A escrita é estruturalmente elaborada, complexa31, formal e abstrata; a
fala, concreta, contextual e estruturalmente simples;
4. A fala é dialogada; a escrita, monologada;
5. A fala varia; a escrita, não;
6. A fala é contextualizada; a escrita, descontextualizada;
7. A fala é implícita; a escrita, explícita.
O que ocorre, na verdade, é que, ao contrário do que acontece com o
texto escrito, no qual o produtor tem maior tempo de planejamento, sendo-lhe
concedida a prática de revisão e outras, o texto falado surge no próprio
momento da interação, sendo seu próprio rascunho, no dizer de Koch (2000, p.
69). Em tais situações o locutor muitas vezes sacrifica a sintaxe em favor das
31
No gênero chat é possível desfazer esse mito, a partir da observação dos períodos simples,
não tão elaborados e informais.
50
necessidades da interação (op.cit). Como dizem os Parâmetros Curriculares
Nacionais:
A questão não é falar certo ou errado e sim saber que forma de
fala utilizar, considerando as características do contexto de
comunicação, ou seja, saber adequar o registro às diferentes
situações comunicativas. É saber coordenar satisfatoriamente
o que falar e como fazê-lo, considerando a quem e por que se
diz determinada coisa.
Resumindo tudo o que vimos, temos que:
•
A fala é uma forma de produção textual-discursiva para fins
comunicativos na modalidade oral, sem a necessidade de uma tecnologia além
do aparato disponível pelo próprio ser humano;
•
A escrita é um modo de produção textual-discursiva para fins
comunicativos com certas especificidades materiais, e se caracteriza por sua
constituição gráfica, embora envolva também recursos de ordem pictórica e
outros (MARCUSCHI, 2001, p. 26).
Portanto, fica claro que, ao invés de se ter como preocupação maior
das pesquisas sobre oralidade e escrita mostrar as características de uma em
contraste e oposição à outra, realçando apenas a diferença, deve-se buscar
descrever as características comuns à oralidade e à escrita, ao contrário da
dicotomia que tenta separar o oral do escrito. Afinal, os achados mais notáveis
apontam mais semelhanças que diferenças entre essas duas modalidades de
uso da língua; as relações de semelhanças e diferenças não são estanques
nem dicotômicas, mas contínuas, e várias das características diferenciais
relacionadas a uma das modalidades são propriedades da língua. Ainda, as
diferenças entre fala e escrita podem ser vistas na perspectiva não do sistema,
mas do uso, ou seja, devem-se levar em consideração os usos do código e não
o código. Não esquecendo que as características da fala e escrita não são
categóricas nem tampouco exclusivas.
Será, pois, a tendência sociointeracionista, que considera as categorias
lingüísticas como construídas interativamente e sensíveis aos fatos culturais, a
bússola que norteará a nossa embarcação rumo ao caminho das abreviações.
51
CAPÍTULO 2
ABREVIAÇÃO: da gênese à disseminação
O fenômeno da abreviação no português brasileiro, apesar de
identificado há bastante tempo, foi ainda pouco estudado. Cientes dessa
lacuna, e ávidos por tentar reunir ao máximo informações válidas com base na
literatura pertinente, demos início a esse estudo, que nada mais é do que fruto
de um desejo pelo conhecimento, em especial nesse assunto que ressurge
com força visível paralelo ao domínio do mundo digital, o uso das reduções, em
específico a abreviação.
Neste capítulo, veremos um pouco da história das abreviações
existentes na língua portuguesa, sua conceituação, a sistemática do seu uso,
sua tradição até os nossos dias, e o tratamento dado pelas gramáticas a esse
fenômeno tão antigo, recorrente e notório nas mais variadas camadas sociais,
independentemente da faixa etária e do grau de escolaridade do usuário.
Antes de tudo, é importante distinguir o conceito de abreviação do
conceito de redução morfológica. Esta ocorre de preferência na fala (o que não
significa que seja exclusiva dela) e representa níveis diversos de informalidade
ou variação (ex: né, tá, pro, pra, cum etc.); aquela é algo que se dá de modo
particular na escrita (Sr., Excia., p.ex., cit), muito embora esteja se espraiando
na língua oral (tv, cdf, ci, ). Enquanto o processo da abreviação dá-se no nível
do fonema, o da redução morfológica ocorre no morfema. Entretanto, em
ambos os casos, da abreviação e da redução morfológica, temos exemplos de
redução. O que distingue a abreviação da redução é que na primeira a
52
supressão ocorre de forma aleatória, na maioria das vezes, enquanto na
redução tem-se geralmente o apagamento de seqüências consideradas afixos.
Na abreviação não há mudança de significação na palavra resultante, enquanto
que na redução a palavra derivante não mantém o mesmo significado.
Queremos salientar também que a nossa pesquisa restringe-se à análise de
textos escritos, a fim de ilustrarmos algumas das transformações pelas quais
vem passando a língua escrita, muito embora o processo de simplificação
lingüística seja algo observável não apenas na escrita, mas também na fala.
É comum deparar-nos com a presença quase categórica de algum tipo
de redução nos contextos mais inusitados possíveis. A ocorrência desse
recurso da língua é tão freqüente que muitas vezes chega a passar
despercebido aos nossos olhos. Seja em áreas públicas ou privadas, situações
formais ou informais, orais ou escritas, conscientemente ou não, lançamos mão
desse processo de simplificação, que visa tão somente à economia lingüística.
Basta um olhar mais acurado e logo veremos que o mundo em que
vivemos é circunscrito por algum tipo de redução que, ao contrário do que
possam pensar alguns, não se limita ao escrito, antes, parece ter origem no
oral, expandindo-se então para essa outra modalidade da língua. Exemplo
disso é o caso de palavras do tipo cine, mini, foto, entre outras, usadas em
lugar de cinema, minissaia, fotografia. Também nomes próprios como São
Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, que têm essas formas preteridas por
Sampa, Rio, B.H.
As reduções são práticas tão comuns e eficientes que personalidades
da história também tiveram seus nomes reduzidos a simples abreviações ou
siglas32: ACM, FHC, JK, PC, JA, JQ, entre outros. Também nas esferas
política, econômica e social são inúmeras as siglas utilizadas, entre elas: MP,
CPI, FARC, IR, CPMF, PIB, IPTU, TIP, TCR, GLS, TIM etc.
A fim de visualizarmos melhor a pluralidade de material que comporta
em seu texto um número significativo de abreviações, tomemos para análise
alguns gêneros, dos mais comuns aos mais específicos:
32
Não podemos esquecer também dos acrônimos, que consiste em uma palavra formada pela
inicial ou por mais de uma letra de cada um dos segmentos sucessivos de uma locução, ou
pela maioria destas partes (HOUAISS, 2001).
53
1. De natureza pessoal: agendas, diários, cartas, bilhetes, anotações, e-mails
e demais gêneros correlatos;
2. De natureza oficial: cartas, parecer, requerimentos, ofícios, atas, folder,
RG, CIC, e-mails e demais gêneros virtuais;
3. De natureza profissional: receituário médico, receita de culinária, bula,
caderneta, boletim de ocorrência, etiquetas, atestados, manual de
instrução etc.
Como pudemos observar, são inúmeras e variadas as possibilidades
de uso de redução na língua, em especial a abreviação. Cientes disso,
restringimos nossa pesquisa à análise desse recurso nos respectivos gêneros:
carta, diário, blog, SMS e e-mail.
2.1 Conceito de abreviação
A concepção do termo abreviação data, na língua portuguesa, de 1536,
como registra o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001). De origem
latina, teve suas formas históricas grafadas abreviaçõis (1536), abbreviação
(1576). Etimologicamente, abreviação significa diminuição, encurtamento. E
ainda (op.cit. p.26) :
Abreviação s.f.(1536 FOLG fº 9v) ato ou efeito de abreviar;
abreviatura 1 breve notícia; compêndio, síntese 2 FON.
FONOL. Fenômeno da passagem de um som, sílaba ou
fonema, de longo a breve 3 GRAM representação escrita de
uma palavra grafando-se apenas algumas de suas sílabas ou
letras; abreviatura 4 GRAM m.q. ABREVIATURA33 (‘redução
fixa’) 5 GRAM redução do corpo fônico de uma palavra
1Ato ou efeito de abreviar; abreviação 2 GRAM redução, fixa na língua escrita e de uso geral
de uma palavra ou locução (p. ex.: V., por você;) 3 GRAM redução de uma locução a uma sigla
(p.ex.:ONU, por Organização das Nações Unidas) 4 GRAM m.q. ABREVIAÇÃO
(‘representação’) 5 sinal ou cifra com que se representa uma palavra ou locução (p.ex.: o sinal
% representa a locução por cento) 6 EDIT sinal que indica a supressão de letra (s) numa
palavra 7 p.ext. qualquer coisa em ponto pequeno; miniatura {o bolo de aniversário era a a. de
um castelo} 8 p.ana.exposição sucinta; abreviação, resumo.
33
54
resultando em outra que passa a funcionar como sinônimo da
palavra
primitiva
(p.ex.,
microcomputador/micro,
videocasse/vídeo; cinematógrafo/cine etc.).
Segundo o Aurélio (1993), abreviatura s.f. 1 é a representação duma
palavra por alguma(s) de suas sílabas ou letras. 2 Sinal ou cifra com que se
representa uma palavra.
Em
Koogan/Houaiss
(1999),
encontramos
uma
definição
para
abreviação e outra para abreviatura, respectivamente:
1.
s.f. Ação de abreviar./ Redução literal, geralmente de uso
circunstancial e variável de obra para obra, de autor para autor,
sobretudo em anotações rápidas para uso próprio: q. (que),
apto. ou ap. (apartamento). À medida que se torna de uso
geral, entra na categoria das abreviaturas.
2.
s.f. Representação de uma palavra por meio de uma ou
algumas das suas letras.
A partir da peculiaridade ora sugerida por Koogan/Houaiss (1999),
faremos a diferença entre elas com base em dados de Houaiss (1983), que
engloba as abreviações e as abreviaturas dentro do quadro das reduções.
2.1.1 Abreviação X Abreviatura
Antes de apresentar a distinção entre abreviação e abreviatura,
Houaiss (Elementos de Bibliologia,1983) denomina de ‘reduções’ “todos os
fenômenos de representação literal parcial dos vocábulos – por exemplo, “p.”
por “página” - ; de representação literal-algarísmica - por exemplo, “cm3” por
“centímetro(s) cúbico(s)” - ; de representação pictográfica realista – por
exemplo + por “casa” - ; de representação picto-ideográfico-simbólica – por
exemplo “ ” por “morte”, “morto”, “falecido”, “falecida” - ; de representação
convencional científica – por exemplo, “♂”, que na técnica da zoologia indica
indivíduo do sexo masculino –.
55
A seguir, o autor (op. cit, 1983) representa em forma de gráfico a
sistemática das reduções:
1) abreviações
braquigrafias34
2) abreviaturas
3) siglas35
4) acrografias
reduções
5) símbolos36
ideografias
6) signos
7) sinais
8) ideogramas mistos
Finalmente, parte para a definição e distinção entre abreviação e
abreviatura, a saber:
•
abreviações são reduções literais, geralmente de uso
circunstancial, variáveis de obra para obra, de autor para autor.
Na medida em que se tornam de uso geral, entram na
categoria das abreviaturas.
•
abreviaturas são formas como que fossilizadas e de
emprego genérico tão tradicionalizado, que, embora possam
acarretar ao leitor ou autor desprevenido certas dificuldades
para a sua eventual compreensão, isso não se justifica entre os
que estejam, de certo modo, afeitos ao manuseio, uso e jogo
dos livros.
Do grego braqui = curto e grapheIn = escrever, braquigrafia significa escrever abreviado
(ACIOLI, 1994).
35
As siglas incorporaram-se de tal forma ao vocabulário do dia-a-dia, que passaram a sofrer
flexões e a produzir derivados (CPIs, peemedebistas etc).
36
O Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial) diferencia
símbolo de abreviatura: no caso de “quilograma” o “K” é o símbolo correspondente, uma vez
que essa letra sequer faz parte da palavra, não podendo, portanto, fazer parte da sua
abreviatura (www.inmetro.gov.br).
34
56
Feita a distinção sugerida pelo autor37, e por nós aqui adotada, a seguir
veremos um pouco da tradição das abreviações.
2.1.2 A tradição das abreviações: um pouco de história
Segundo Spina (1977), Berwanger (1995) e Martins (1996), as
abreviaturas são a chave da interpretação paleográfica dos documentos
medievais, devendo, portanto, o paleógrafo ter conhecimento não apenas do
vocabulário, grafia e terminologia, mas também das abreviaturas da época do
documento. Para Bueno (1963, p.108):
O conhecimento dos diversos usos da escrita, de que se
serviam os copistas medievais, tais como siglas, abreviaturas,
notações, valem muito na decifração dos textos, possibilitando
ao crítico o perfeito entendimento do assunto. Ainda: quem não
estiver preparado em tais estudos, nunca poderá produzir coisa
digna de nome científico.
Para Acioli (1994), duas correntes tentam explicar a origem do sistema
braquigráfico medieval: a tradicional e a encabeçada pelo paleógrafo alemão
Traube. A primeira admite a origem latina desse sistema que, segundo eles,
deriva das três diferentes maneiras usadas pelos romanos para abreviar as
palavras: as siglas, as notas tironianas e as “Notae Juris”. A segunda tenta
provar a origem bíblica das abreviaturas. Em Nomina Sacra, Traube expõe sua
teoria afirmando que era costume dos hebreus ocultar os nomes sagrados
como sinal de respeito. Assim, quando tinham de escrever um nome sagrado,
eles o substituíam por um tetragrama com o intuito de ocultar o nome38.
Araújo (1986) classifica as abreviaturas em dois tipos: circunstanciais e tradicionais. As
primeiras variam de obra para obra e conforme o conteúdo (são as encontradas em dicionários,
vocabulários e glossários); as segundas, segundo o autor, são aquelas de emprego genérico e
constante, via de regra se referindo a palavras ou expressões latinas, com raízes na prática
manuscritora medieval, independentemente dos vernáculos.
38
O sistema hebreu foi adotado quando da tradução da Bíblia para o grego já com o intuito de
abreviar as palavras (ACIOLI, 1994).
37
57
Conforme encontramos em Man (2004, p.175), o uso de abreviações e
múltiplas letras está ligado ao fato de os escribas copistas primarem por
encaixar os textos em seus espaços de Procusto39. Contudo, salienta o autor,
como não se podia prever onde a linha ia acabar, o ideal dos escribas
inevitavelmente estava fadado ao fracasso. Ou seja, bastava olhar para a
margem direita e via-se a derrota estética.
O uso das abreviaturas, por economia, vem desde a época do Império
Romano, conforme vemos em Spina (1977), Houaiss (1983), Berwanger (1995)
e Martins (1996). Segundo Bueno (1963):
Os calígrafos de todos os tempos, mas de modo especial, os
da Idade Média, quer por poupança de espaço porque os
pergaminhos escasseavam, quer por economia de tempo,
fizeram uso de um completo sistema de abreviaturas, de siglas
e de notas tironianas que torna sumamente difícil a leitura de
tais manuscritos ainda aos conhecedores de tais recursos
taquigráficos, quanto mais aos que só os conhecem por ouvir
dizer.
Foi a mesma necessidade de economizar pergaminho40, em razão da
raridade e conseqüente custo elevado desse material da escrita, que deu
nascimento ao sistema de abreviações da Idade Média. Segundo Bueno
(1963), antigamente, achava-se que as abreviações da Idade Média não
obedeciam à regra alguma, dependendo unicamente do arbítrio e da fantasia
de cada um. Contudo, alguns conseguiram estabelecer certa sistematização
nesse assunto, entre eles Chassant, cuja obra Paleografia Crítica aborda em
primeira mão as regras para uso das abreviaturas.
Outro autor, Paoli, discorda em alguns pontos de Chassant e reduz as
abreviaturas medievais a duas espécies:
• Abreviaturas de sinais gerais: indicam simplesmente a abreviação
de uma palavra sem indicar qual o elemento que falta;
Segundo o autor, trata-se de um mito grego que forçava os viajantes a caber perfeitamente
num leito, para isto esticando ou cortando seus membros.
40
A economia de pergaminho e de papel levou Gutenberg a reduzir o espacejamento,
comprimindo mais linhas e economizando espaço na produção da Bíblia de 42 linhas. Dessa
forma, ele cortou 5% dos gastos com o material de impressão, fazendo surgir a B42.
39
58
• Abreviaturas de sinais específicos: indicam quais os elementos
que faltam na palavra abreviada.
As da primeira espécie, de sinais gerais, subdividem-se em duas:
abreviaturas por suspensão ou apócope (AP = Apud), e por contração ou
síncope (Aia = Anima).
As abreviaturas da segunda espécie, de sinais especiais, subdividemse em: sinais de significado fixo (aquelas independentes do lugar onde
estiverem colocadas. Ex: o traço (-) colocado em cima da letra indica sempre
um M ou N); sinais de significado relativo (as que dependem da letra em que se
encontram ou da direção em que estão colocados. Ex: um ponto (.) colocado
ao lado e no alto do H: vale Hoc: mas se for colocado em cima do U já valerá
Ut); sinais com letras superpostas: D+ = Dicitur; Xc = Cristo.
Em Martins (1996), podemos ler que as abreviaturas já eram comuns
depois do VI século, aumentando no VII, ampliando ainda mais no IX e
proliferando no X. Segundo o autor, no século XI “não há linha sem oito ou dez
abreviações”, chegando ao excesso nos séculos XII, XIII, XIV e XV.
Um exemplo claro do que foi dito acima pode ser mais bem
compreendido a partir do modelo contido em um manuscrito conhecido sob o
nome de Virgile d’Asper41, onde o texto é escrito de tal maneira que é
necessário sabê-lo de cor para poder lê-lo (Martins, 1996, p.161):
Tityre, t.p.r.s.t.f.
por:
Tityre, tu patulF recubans sub tegmine fagi.
Assim, sob esta forma, é representado o primeiro verso das Bucólicas
no manuscrito supracitado. Segundo Martins (op.cit.), essas abreviações, onde
Esse manuscrito é considerado como do século XI, e está atualmente na Biblioteca Nacional
de Paris (MARTINS, Wilson. A Palavra Escrita. 2. ed. São Paulo: Editora Ática, 1996).
41
59
uma ou duas letras iniciais servem para exprimir toda a palavra, recebem o
nome de siglas42.
Berwanger (1995) revela que houve um modismo em abreviar palavras
após o século IX d.C., o que de certa forma vai de encontro ao princípio da
abreviatura, segundo vemos em Houaiss (1983), que é abreviar por economia
e não por amor da abreviação (op.cit, p. 122).
A fim de conceber melhor, ainda que de forma sucinta, a evolução das
abreviaturas, fiquemos com a narrativa registrada em Spina (1977) e aqui
transcrita em forma de citação:
Desde fins da república romana abreviação começou a tornarse complicada, chegando a suscitar – sem que tais medidas
surtissem efeito – a intervenção do senado e dos imperadores
proibindo o seu emprego. A partir do reinado carolíngio, cujas
reformas pedagógicas atingiram também os processos
caligráficos, o abuso das abreviaturas começou a saturar os
documentos, e a moda degenerou de tal forma que nos
séculos XII e XIII várias disposições foram baixadas com o
intuito de conter o mal. O abuso começou a diminuir à medida
que implantava a utilização da letra cursiva43, que não permitia
a profusão das abreviaturas.
Contudo, um novo surto no uso das abreviaturas é advindo com o
Renascimento, sendo inclusive elaboradas tabelas para leitura das siglas44,
conforme Spina (1977) e Berwanger (1995). Tal ressurgimento, segundo
Martins (1996), não mais se justifica, uma vez que o processo mecânico de
42
Segundo o autor, as siglas eram usadas não apenas nos manuscritos, mas também nas
inscrições lapidares, nas medalhas etc. (MARTINS, 1996).
43
É a escrita corrente. As letras começam a ligar-se umas às outras devido ao desejo de
escrever mais depressa e à preguiça de se levantar a mão.
Na Escrita Capital, por exemplo, a palavra que era abreviada: q .
A Escrita Gótica, por sua vez, era apertada, miúda, muito ligada e com poucas abreviaturas
(BERWANGER, Ana Regina. Noções de Paleografia e de Diplomática. 2. ed. Santa Maria:
Editora da UFSM. 1995).
44
O dicionário de Adriano Cappelli, Dizionario di abbreviature latine et italiane (3. ed. , Manuali
Hoepli), Milão, 1929, dá bem uma medida das dificuldades que a leitura de textos medievais
oferece, em razão da pletora das abreviaturas: Cappelli recenseou nada menos de catorze mil
sinais abreviativos (SPINA, Segismundo. Introdução à Edótica: crítica textual. São Paulo:
Cultrix, Ed. da Universidade de São Paulo, 1977).
60
reprodução e a utilização do papel pelos impressos do século XV estavam
resolvidos45.
Segundo Houaiss (1983), existem princípios constantes dentro de cada
sistema de abreviações, observáveis no passado histórico das existentes em
português, e das de base latina, no Ocidente, quais sejam:
1º) evitam-se abreviações iguais para vocábulos diferentes, pois, caso
contrário, haveria ambigüidade;
2º) abrevia-se economicamente e não por amor da abreviação; noutros
termos, usar da abreviação “pag.” por “pago” é algo sem sentido, pois
tipograficamente, ao menos, compor “pag.” é o mesmo que compor “pago”;
3º) abreviam-se palavras freqüentes no corpo da obra, pois de outra
forma a abreviação pode tornar-se obscura ou incompreensível, além de ser
quase nula a economia que decorre de uma abreviação muito episódica46.
2.1.3 Abreviação e os sinais abreviativos
Segundo Acioli (1994, p.46), sinais abreviativos são os traços que
indicam que uma palavra está abreviada. Para ela, o conhecimento desses
sinais é muito importante na leitura de um documento, embora muitas vezes
eles não tenham um valor fonológico especial. Essa autora distingue ainda
duas categorias de sinais abreviativos, a saber:
• Os gerais: não têm valor fonológico. São eles:
► ponto – o mais antigo sinal abreviativo. Quase sempre acompanha as
siglas;
► linha reta – usada nos documentos mais cuidados, sobretudo nos de
chancelaria. Vinha sempre sobreposta às letras;
Lecoy de la Marche deixa claro que multiplicação das abreviações nos manuscritos
medievais se deu, principalmente, por causa da necessidade de economizar pergaminho
(MARTINS, Wilson. A Palavra Escrita. 2. ed. São Paulo: Editora Ática, 1996).
46
Segundo o autor, as normas abreviantes, em português, podem ser depreendidas da prática
abreviante e de certas observações já com tendências sistemáticas (ACAD, XLVII, 53).
45
61
► linha curva – também foi utilizada como sinal abreviativo na escrita vulgar,
porque oferecia um traçado mais ligeiro;
► traço envolvente – a tendência de cursividade da escrita contribuiu para
que o escrivão, sem levantar o instrumento da escrita, envolvesse toda a
palavra abreviada. Podia partir da última letra da palavra ou da letra
sobreposta.
• Os especiais: são os que substituem uma letra ou um agrupamento delas.
Derivam-se das notas tironianas e têm valor fonológico. Foram usados na
escrita medieval, sendo importante conhecê-los para uma boa interpretação
documental. Vejamos:
►
2.1.4 Classificação das abreviaturas47
Conforme encontramos em Spina (1977), Houaiss (1983) e Berwanger
(1995), as abreviaturas podem classificar-se em:
1) Abreviatura por siglas→ consiste em representar a palavra pela sua letra
inicial: P = Petrus, sendo que o redobro da sigla pode apresentar dois valores:
o plural da palavra ou o seu superlativo: AA = Augusti; duas ou mais palavras,
Mais adiante veremos que nos gêneros digitais também há certos critérios nas reduções
realizadas.
47
62
que pelo sentido formam um todo, podem também reduzir-se às suas iniciais, e
nesse caso é utilizado o ponto em cada sigla: C.A. = Caesar Augustus48.
2) Abreviatura por suspensão ou apócope → em que se verifica a supressão
de elementos finais do vocábulo, ainda que os paleógrafos as qualifiquem de
siglas, remontam também aos gregos e romanos: drt =direito; Imp. =
imperator49.
3) Abreviatura por contração ou síncope→ forma-se mediante a supressão
de elementos gráficos do meio do vocábulo. A fixação apenas da letra inicial e
da final pode, contudo tornar difícil a identificação da palavra: Sr.=senhor; dr =
dicitur50.
4) Abreviatura por letras sobrepostas (sobrescritas)→ uma pequena letra é
inscrita por cima da abreviatura: rctor = rector; pior = prior; aqa = aqua51.
5) Abreviatura por sinais especiais→ são sinais que se colocam no início,
meio ou fim da palavra, significando uma sílaba ou ausência de uma letra: Ds =
Deus; ÷ ou % = est (é).
6) Abreviatura
por
letras
numerais→
constitui
as
abreviaturas
de
numerações, designativas de quantidades e de marcos cronológicos. Tais
abreviaturas, usadas ainda hoje, são de origem romana. Das sete letras
maiúsculas de seu alfabeto – I, V, X, L, C, D e M – serviram-se os romanos
para indicar respectivamente os números 1, 5, 10, 50, 100, 500 e 1.00052.
7) Letras inclusas→ consistem na inserção de uma letra na outra, ou seja,
quando um traço de uma letra serve comumente para outra. Estas letras são
chamadas de embebidas. Ex: AN
N I
= Antonio.
48
A sigla foi o processo mais antigo de abreviação por supressão ou apócope, e seu uso se
manteve durante toda a Idade Média; porém, logo no início verificou-se certa tendência para
tornar as siglas mais inteligíveis, acrescentando-se a elas outras letras do vocábulo: cl, cler,
cleric = clericus; ou ainda sobrepondo-lhes um signo abreviativo (a risca): qn = quando.
(SPINA, 1977).
49
Este sistema se desenvolveu consideravelmente a partir da divulgação da escritura
carolíngia na Europa (Idem, ibidem).
50
Para obviar a dificuldade, costumavam conservar letras intermediárias, chamadas mesmo
características, que favoreciam a intelecção do termo: dgm = dignem.
51
Muito rara entre os romanos, bem como nos documentos da Península Ibérica anteriores ao
século XII, generalizou-se a partir dessa época com a escritura visigótica (Op. cit, p. 46).
52
A sucessão das mesmas indicava soma (XXX = 30); mas a sobreposição de uma barra
horizontal à letra multiplicava mil vezes o seu valor (ö = 500.000). Daí que ù = M e 6M = um
milhão.
63
8) monogramas→ são letras ornamentais que substituem palavras,
geralmente nomes próprios, algumas vezes entrelaçadas. Ex: Æ.
Houaiss (1983) nos fornece ainda uma relação de abreviaturas de
curso corrente na língua portuguesa, excluindo, contudo, como diz o autor, uma
imensa galeria de valor restritamente paleográfico, ou seja, sem utilidade
corrente nos dias de hoje. As abreviaturas foram relacionadas segundo
afinidades temáticas mais ou menos marcadas. São elas:
1) abreviaturas axiológicas→ compreendendo as relacionadas com as
fórmulas de tratamento, os títulos nobiliárquicos, profissionais, eclesiásticos e
afins, e as ideologicamente associadas:
A.M. = Ave Maria (expressão e abreviatura ligadas à igreja católica);
V.S. = Vossa Santidade/ Vossa Senhoria;
2) abreviaturas
autorais→
de
palavras
latinas
exclusivamente,
que
antecedem os nomes de autores de obras de arte, na idade moderna, a partir
do momento em que o anonimato de regra desapareceu:
aet., aetat. → aetate, na idade de; inscrição com que os pintores, de
preferência, indicavam em que idade se achava o retratado.
3) abreviaturas bibliológicas→ que se relacionam com as técnicas de
remissão, indicação, seccionação, anáfora, dêixis, na estruturação de uma obra
escrita:
ib., ibid. = ibidem, isto é, no mesmo lugar, lugar como indicativo apenas da
obra;
op.cit.;opp.citt. = opus citatum; opera citata; obra citada; obras citadas; se
se tratar da mesma obra antes citada, reporta-se a op.cit.
4) abreviaturas comerciais, industriais e afins (e algumas esportivas):
c/c = conta corrente; p/ = por; p/, pª = para; pg. = pago, pagou.
64
5) abreviaturas crononímicas, relacionadas com a referenciação a tempo e
ao calendário:
a.C., A.C. = antes de Cristo (evite-se a segunda forma da abreviação, A.C.)
6) abreviaturas forenses, judiciárias, tabelioas, áulicas, cortesãs, eufêmicas
(e algumas institucionais):
a/c, A/C = aos cuidados; e.c.f. = é cópia fiel
7) abreviaturas médicas, farmacológicas e posológicas:
u.e. = uso externo, u.i. = uso interno.
8) abreviaturas musicais, na sua totalidade de origem italiana, mas de curso
praticamente geral nas línguas ocidentais:
accel. = acelerando;
cresc. = crescendo, em crescendo;
p. = piano, docemente.
9) abreviaturas náuticas mais correntes, pois que a terminologia própria
comportaria muito mais, de curso restrito:
BB, B.B = bombordo;
s.o.s., S.O.S. = inglês save our soul, quiçá também save our ship, salve
nossa alma, salve nosso navio, em apelo de socorro.
10) abreviaturas teatrais, tão-somente as relacionadas com a referência à
marcação do cenário:
D. = direita;
D.A. = direita alta;
E.B53. = esquerda baixa.
Como não é nossa pretensão apresentar todas as abreviaturas existentes, trazemos apenas
dois ou três exemplos de cada tipo, principalmente as mais conhecidas.
53
65
2.1.5 A abreviação e as notas tironianas54 ou taquigrafia
Spina (1977) e Berwanger (1995) afirmam que as notas tironianas
constituíram um sistema de abreviação, de índole muitíssimo complexa, usado
pelos romanos para cópias de livros inteiros ou transcrição de discursos
proferidos ao vivo; é um sistema estenográfico, e tido mesmo como a mais
antiga forma de taquigrafia na Europa. Martins (1996, p.161) diz que as notas
tironianas são simples letras, iniciais ou medianas, empregadas para figurar
palavras inteiras ou abreviar a escrita.
Inventado por um escravo liberto que pertencia a Cícero, de nome
Tiro55, daí a designação de tironiano, esse sistema foi desenvolvido
consecutivamente, atingindo o número de 5.000 abreviaturas56. Tiro se servia
de tal taquigrafia a fim de registrar, na íntegra, os discursos dos mais famosos
oradores de Roma (PAOLI apud BUENO, 1963).
Higounet (2003) afirma que o nascimento da estenografia ou taquigrafia
moderna se deve ao desejo, nascido na Alta Idade Média e ressurgido na
Renascença, de possuir uma escrita tão rápida quanto a fala. Segundo o autor,
a necessidade justificou a divulgação.
Conforme encontramos em Bueno (1963), as notas tironianas tiveram
largo uso e foram mais complicadas na Idade Média. Segundo esse autor, um
dos usuários desse sistema foi o papa Silvestre II que, por utilizar esse recurso,
ficou conhecido como feiticeiro e cabalista.
Durante muito tempo, as notas tironianas foram indecifráveis, mas, em
inícios do século XIX, Ulrico Federico Kopp instituiu as leis fundamentais nas
As Notae Juris derivaram-se das notas tironianas, entretanto não tiveram a mesma
popularidade e por isso tiveram seu uso restrito aos documentos jurídicos (ACIOLI, 1994).
55
Tiro anotava seus discursos através de sinais.
56
Segundo lê-se em Bueno (1963), alguns atribuem a invenção das notas tironianas a outros
que não Cícero Tullius Tiro. Suetônio, por exemplo, atribui a Ênio: Vulgares notas Enius primus
Mille et centum invenit. Outros, a Sêneca: Sêneca, contracto omnium digestoque et aucto
numero, opus effecit in quinque millia...Entretanto, como afirma Bueno (1963, p. 116), todos
são unânimes em aceitar Tiro como autor de tal taquigrafia. Para Plutarco: Romae primus
Tullius Tiro Ciceronis libertus commentatus est notas...
54
66
quais se baseava esse sistema gráfico57, lançando um “Lexicon tironianum”
(contido no II vol. de sua obra capital Palaeographia critica, Mannheim, 1817).
Outros estudiosos deram continuidade aos estudos, entre eles: Tardif, Sickel,
Schmitz, Traube, Zangomeister, De Vries, Havet e Cipolla (BUENO, 1963, p.
116).
Em razão de utilizarem as notas tironianas58 em suas minutas, antes de
receberem a designação de “tabeliães”, os oficiais públicos romanos59
chamavam-se notarius60. São exemplos de notas tironianas:
H* = Hoc (este);
Gi = igitur (por isso);
q. = quem;
tbem = também;
Gª = Erga (para/contra);
M’ = Mihi (para mim), etc.
Bueno (1963) afirma que as notas tironianas nada possuem de oculto;
antes, baseiam-se nas letras do alfabeto maiúsculo romano, cujos sinais são
usados em várias posições, representando significados independente em cada
uma delas: Signum principale e os Signa auxiliaria. Estes representam uma
terminação qualquer da palavra (- Ga = Erga); aquele, geralmente, inicial da
palavra (T’= tibi).
57
Esse sistema chegou a ser ensinado nas escolas, sobreviveu até o século X, mantendo
inúmeros sinais até bem depois.
58
Essas notas usualmente originavam-se do alfabeto maiúsculo romano, constituindo-se de um
“signo principal” (geralmente a letra inicial da palavra) e de “signos auxiliares”, que representam
a terminação do vocábulo. (SPINA, 1977).
59
O braquigrafismo era um aspecto importante da escrituralidade medieval e um aspecto
importante da competência escribal dos notários (Brocardo & Emiliano, no prelo).
60
N4t~r0ßs, 00, s. ap. m. QUINT. O que escreve por abreviaturas, estenographo ou
tachygrapho. § SOD. THEOD.
Escrivão, amanuense, escrevente, copista, secretario.
(SARAIVA, s/d).
67
2.1.6 A abreviação e a simplificação lingüística
Desde os tempos mais remotos, a função precípua da língua é
comunicar. Seja o meio sonoro ou impresso/digital, a mensagem deve primar
por adequar seu código ao público a que se destina. Assim, o vocabulário
utilizado tende a ser mais ou menos seleto; os períodos a variar entre simples e
compostos; a ordem oscila entre direta e indireta, e as frases a se estender de
curtas a longas, a depender do receptor/destinatátio, visando à brevidade e à
clareza.
Os procedimentos selecionados e ativados para tornar o texto
adequado a seu público são entendidos como processos de simplificação
lingüística. Em O século XVIII e a noção de simplificação lingüística, Pessoa
(2001) afirma que a
Simplificação lingüística é uma habilidade inata dos sujeitos
falantes de uma língua de adaptarem seus usos para
facilitarem a comunicação com aqueles que por razões
diversas teriam dificuldade de compreender certas
construções.
Mendonça (1987) diz que a simplificação pode ocorrer em dois níveis: a
simplificação do código da língua, cuja alteração mudará o texto de acordo com
regras lexicais e sintáticas61; e a simplificação da língua, cujo objetivo é o de
tornar a proposição o mais clara possível, com um estilo aproximado do
informal. No primeiro caso temos uma simplificação gramatical; no segundo,
semântica.
O século XVIII, conhecido como Século das Luzes, está intimamente
ligado à difusão do saber, da alfabetização e da simplificação. É nesse período
que um dos fatos relacionados com a simplificação lingüística surge, a proposta
61
Através da substituição de palavras polissílabas por outras menores; de palavras pouco
usuais por aquelas que sejam do léxico do leitor; da voz ativa em vez da passiva, e evitar
intercalações (MENDONÇA, 1987).
68
de Verney, que sugere uma gramática curta e clara para o estudante, com o
objetivo de difundir a língua portuguesa62.
Segundo Pessoa (2001), a noção de simplificação lingüística pode ser
aplicada em vários contextos. No nosso estudo, aplicá-la-emos aos autores de
textos manuscritos, impressos e digitais, cujo propósito é o de dar precisão e
objetividade ao texto produzido. Pessoa sugere ainda a inclusão de outros
tipos/gêneros textuais na análise do processo de simplificação lingüística.
Seguindo suas indicações, iremos tratar essa noção nos gêneros carta, e-mail,
diário, blog e SMS, observando os processos de redução que há na língua, em
especial a abreviação.
Vale destacar aqui a ressalva feita por Mendonça (op.cit.), segundo a
qual a sigla e a taquigrafia, embora tomem menos espaço e tempo para
escrever, devem ser evitadas, pois as mesmas impossibilitam a decodificação
da mensagem por aqueles que desconhecem o conteúdo transmitido de forma
abreviada. Segundo a autora, o abuso de siglas serve apenas para separar as
pessoas em dois grupos: o dos que dominam a informação e o das que não
possuem esse tipo de informação. Para ela, as siglas podem ser um entrave à
compreensão textual.
Na opinião de Brocado & Emiliano (no prelo), as abreviaturas não
devem ser desenvolvidas, respeitando o caráter logográfico que lhes é próprio,
e só desenvolvê-las se, e somente se, a sua expansão for absolutamente
inequívoca e não resultar de uma conjectura do editor, ainda que determinada
pelo contexto lingüístico. Para esses autores, essas são as únicas opções
editoriais paleográficas e filologicamente consistentes cujo propósito é o de
preservar a configuração estrutural específica da escrituralidade medieval.
Segundo eles, as abreviaturas, longe de serem um problema, são apenas um
tipo de escrita baseado em princípios diferentes dos das ortografias modernas.
Iremos, pois, verificar se os resultados da nossa pesquisa corroboram a
visão de Mendonça ou a de autores como Brocado e Emiliano. A fim de
atingirmos esse objetivo, iniciaremos uma viagem pelas gramáticas e sites de
Internet, observando o que dizem as mesmas quanto ao uso das abreviações.
É nesse período que a língua usada na burocracia começa a perder o seu caráter retórico
(MENDONÇA, 1987).
62
69
2.1.7 A abreviação nas gramáticas e home pages
Como o uso de abreviação está inserido no processo de produção
textual, vale investigar também como os gramáticos tratam esse recurso
gráfico. Para nossa surpresa, porém, constatamos que nem as gramáticas
descritivas63 tampouco as normativas trazem sequer uma linha acerca do
processo de abreviação.
Apesar de todas, ou quase todas, trazerem em seu sumário uma lista
de abreviaturas usadas, lista de abreviaturas de nomes dos autores e outros
utilizados, nenhum gramático dedicou em suas históricas páginas um espaço
reservado a esse tópico tão antigo e ainda presente em nossos dias. Restounos então partir para uma busca nos sites específicos, a fim de descobrirmos
se esses tinham o mesmo comportamento ou ao menos faziam menção do
assunto. A seguir, apresentamos o resultado da nossa pesquisa.
As abreviações utilizadas na língua revelam, conforme lemos em
PUCRS Manual de Redação, o ritmo acelerado da vida moderna, faz com que
se economizem palavras e tempo, mediante uma comunicação mais rápida,
reduzindo frases, expressões e palavras (pornográfico → pornô; professor →
profe; pneumático → pneu etc).
No
primeiro
site
que
acessamos,
www.nilc.icmc.usp.br/, foram
encontrados os seguintes critérios para utilização das abreviaturas:
•
Nos textos escritos, em especial formais, evite ao máximo o uso
de abreviaturas. Prefira escrever as palavras por extenso.
•
Lembre-se de que os acentos existentes nas palavras originais
são mantidos nas abreviaturas.
•
Nem todos os substantivos masculinos aceitam o "o" sobrescrito
em seu processo de abreviatura. O "o" sobrescrito deve ser utilizado:
1. Apenas para a redução dos numerais ordinais ("1º")
Excetuando-se a Gramática de Eduardo Carlos Pereira, que traz pouca informação sobre o
tema. Apenas apresenta uma lista, associando o largo uso das abreviaturas com a ortografia
(PEREIRA, 1938).
63
70
2. Opcionalmente, em alguns substantivos masculinos terminados em
"o", como: "engº" (engenheiro) ou "Colº" (colégio).
3. Substantivos masculinos terminados em consoante (professor, por
exemplo) devem ser reduzidos sem referência ao gênero ("prof.").
•
O "a" sobrescrito, por sua vez, deve ser obrigatoriamente utilizado
sempre que indicar gênero feminino, como em: "2ª" ou "prof.ª" (professora).
No que tange à sistemática das abreviaturas, foram encontradas as
seguintes normas:
1. Uso de Abreviaturas de Logradouros, Títulos Honoríficos e Nomes Próprios:
Recomenda-se que as abreviaturas de títulos honoríficos, profissões,
cargos e logradouros como: “Dr.", "Dra.", "Sr.", "Sra.", "D.", "prof.", "eng.",
"gen.", "cap.", "R.", "Av.", "Pç.", "Lgo." e "Trav." sejam utilizadas, somente se
necessário, diante dos substantivos próprios por elas modificados. Em outros
casos, é indicada a escrita da palavra por extenso.
Exemplos:
• A Dra. nos recomendou um bom remédio. [Inadequado]
A Dra. Henriqueta nos deu uma ótima notícia. [Adequado]
• O gen. viajou ontem. [Inadequado]
O general viajou ontem. [Adequado]
2.Uso de Abreviaturas de Tempo:
A maior parte das gramáticas do português recomenda que a
abreviatura de horários seja feita por referência explícita à unidade de tempo
("h" e "min").
71
A forma HH:MM, consagrada pelo uso, é considerada anglicismo, por
isso deve ser evitada.
A indicação das horas deve ser feita por meio da abreviatura invariável
"h" (15 h), e a unidade dos minutos pode ser omitida (14h48) ou expressa pelas
abreviaturas, também invariáveis, "m" (14h48m) ou "min" (14h48min).
A unidade das horas, sempre que não houver referência aos minutos,
deve vir separada do algarismo que a precede por um espaço em branco. Caso
contrário, as unidades devem vir imediatamente após os algarismos.
Exemplo:
• São 2h, estou atrasada. [Inadequado]
São 2 h, vamos! [Adequado]
• Faltam 5hs34m para o início da prova. [Inadequado]
Faltam 5h34min para o fim da viagem. [Adequado]
3.Uso de Abreviatura de Unidade de Medida:
• As abreviaturas das unidades de volume são:
"l" (litro), "ml" (mililitro), "cl" (centilitro) e "dl" (decilitro).
• As abreviaturas das unidades de massa são:
"g" (grama), "mg" (miligrama), "kg" (quilograma) e "dg" (decigrama).
Exemplo:
1. Comprou 3kgs de carne no mercado ontem. [Inadequado]
Comprou 3 kg de carne no mercado ontem. [Adequado]
2. Um galão americano tem 3,785 ls. [Inadequado]
Um galão americano tem 3,785 l. [Adequado]
72
Estas abreviaturas também são invariáveis, devem ser escritas com
letras minúsculas, e devem vir separadas do algarismo que as precede por um
espaço em branco.
4.Uso de abreviatura de distância:
As abreviaturas das unidades de distância são invariáveis e escritas da
seguinte forma: "m" (metro), "cm" (centímetro), "mm" (milímetro) e "km"
(quilômetro).
Exemplo:
• O carro rodou 243kms em apenas uma hora. [Inadequado]
O carro rodou 243 km em apenas uma hora. [Adequado]
5.Uso de abreviatura de nomes de santos:
A abreviatura recomendada para Santo e Santa é "S.", e não "Sto." ou
"Sta.".
Exemplos:
• Sou muito devota de Sta. Luzia. [Inadequado]
Sou muito devota de S. Luzia. [Adequado]
• Sto. Antônio é considerado casamenteiro. [Inadequado]
S. Antônio é considerado casamenteiro. [Adequado]
No segundo site, www.folhanet.com.br/, podemos resumir a idéia
central em estar o uso das abreviações associado à economia de tempo ou de
espaço. Daí o fato de a abreviação dever constar apenas da metade ou menos
da metade da palavra original, do contrário, é melhor escrevê-la por extenso, o
73
que está de acordo com o que diz Houaiss (1983): não convém abreviar
quando o princípio da economia é insignificante.
É ressaltado ainda o cuidado com o uso abusivo das abreviações, não
devendo estas constar em provas, trabalhos, artigos ou redações, mas apenas
em anotações de uso pessoal. Por último, é relacionado o uso constante, por
parte dos clientes, das abreviações no Caderno Classificados da Folha da
Região com o fato de aqueles visarem à economia de espaço, a fim de
pagarem menos (o que nos faz, de certa forma, regressar à época do
pergaminho, que, devido ao seu elevado preço, exigia o uso acentuado das
abreviações, a fim de economizar o material da escrita, cujo preço era
elevadíssimo).
Em seguida, são apresentadas regras de uso das abreviações.
A regra geral resume-se em: escrever a primeira sílaba e a primeira
letra da segunda sílaba, seguidas de ponto abreviativo64. Caso a primeira letra
da segunda sílaba seja vogal, escreve-se até a consoante. Exemplos: fut.
(futuro). Se a palavra tiver acento gráfico, este será conservado se cair na
primeira sílaba. Exemplos: núm. (número). Se a segunda sílaba iniciar por duas
consoantes, as duas farão parte da abreviatura. Exemplos: pess. (pessoa).
Entretanto, nem todas as palavras seguem a regra geral para
abreviatura. Exemplos: a.C. ou A.C. (antes de Cristo), ap. ou apto.
(apartamento), bel. (bacharel), btl. (batalhão), cel. (coronel), Cia. (Companhia),
cx. (caixa), D. ( digno, Dom, Dona), f. ou fl. ou fol. (folha), ib. ou ibid. (ilidem, da
mesma forma), id. (idem, o mesmo), i.e. (isto é), Ilmo. (Ilustríssimo), Ltda.
(Limitada), M.D. (Muito Digno), p. ou pág. (página), pp. págs. (páginas), pg.
(pago), p.p. (próximo passado), P.S. (pós-escrito = escrito depois), Q.G.
(Quartel General), rem. ou remte. (remetente), S.A. (Sociedade Anônima), sv.
(serviço), S.O.S. (Save Our Souls = salvai nossas almas), u.i. (uso interno),
U.S.A. (United States of America = Estados Unidos), vv. (versos, versículos).
É bom lembrar que na flexão de gênero não aparece a desinência “o”,
indicativa do masculino nas abreviaturas, como: prof. profª. Sendo, portanto,
Os gramáticos tradicionais não admitem flexão em abreviaturas, como: profª (professora),
págs. (páginas) (www.folhanet.com.br/).
64
74
errado grafar o masculino assim: profº. Nas abreviaturas de caráter
internacional, não se põe o ponto abreviativo: h, kg, km, kw. A última
observação: nunca corte a palavra numa vogal, sempre numa consoante.
Exemplo: departamento = dep., nunca depa.).
Dando seqüência ao assunto, é reservado um espaço para as siglas,
consideradas como um tipo especial de abreviatura, e definidas como redução
de locuções compostas por substantivos próprios.
As siglas/acronímias podem ser formadas:
•
pelas letras iniciais maiúsculas das palavras que formam o nome
como:
FGTS = Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.
•
pelas sílabas iniciais de cada uma das palavras que formam o
nome, como:
EMBRATEL = EMpresa BRAsileira de TELecomunicações.
As siglas devem trazer apenas a inicial em letra maiúscula, quando
possuírem mais de quatro letras e forem pronunciáveis; nos demais casos,
todas as letras devem ser grafadas com caracteres maiúsculos:
Exemplos:
1. Unicamp = Universidade de Campinas
2. Senac = Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
3. CNBB = Conselho Nacional dos Bispos do Brasil 65
Em uma entrevista especial para a Folha de São Paulo, Camargo66
(www.folhadesaopaulo) afirma que as palavras sofrem alterações de forma e
de significado no decorrer do tempo, existindo vários processos que dão
65
As abreviaturas ("Av.", por exemplo), mas não as siglas (“FMI”, por exemplo), devem ser
seguidas de ponto final. Unidades de medida ("km", "MHz",etc.), elementos químicos ("K"
(potássio),etc.) e pontos cardeais e colaterais ("E" (Leste), "NE" (Nordeste), etc.) também
dispensam o uso do ponto final.
66
Entrevista concedida em 2004.
75
origem a novos termos, sendo um dos mais comuns entre eles a abreviação ou
redução, que, para ela, é resultado da lei do menor esforço.
A autora trata a questão da abreviação não apenas como o
apagamento e/ou redução de uma ou mais letras, mas sim como um processo
de síntese (grifo nosso) do vocábulo. Desta forma, teríamos as seguintes
palavras que passaram por esse procedimento na língua portuguesa:
“pneu” em vez de “pneumático”;
"cinema" em lugar de "cinematógrafo";
"metrô", de origem francesa, é redução de "chemin de fer
métropolitain" (estrada de ferro metropolitana);
"Quilo" vem de "quilograma";
"Pólio", de "poliomielite";
"Pornô", de "pornográfico";
"Pinda", de "Pindamonhangaba";
"Kombi", de origem alemã, é redução de "Kombinationsfahrzeug"
(veículo combinado para carga e passageiros).
"Automóvel" convive com sua abreviação "auto", que deu origem à
palavra "auto-escola".
E continua: caso semelhante ocorre com "motoboy", também formado
a partir da abreviação de "motocicleta" ("moto"), à qual se prendeu a redução
do estrangeirismo "office boy" ("boy"), vigente entre nós há bastante tempo.
Concluindo, Camargo (op.cit.) diz que essas são provas do dinamismo da
língua, sempre pronta para incorporar o novo.
A abreviação vocabular é considerada um processo produtivo na
redução de palavras muito longas. Consiste, segundo informa o site Dudas
idiomáticas67, na eliminação de um segmento de uma palavra a fim de se obter
uma forma mais curta (otorrinolaringologista → otorrino). Ainda nesse site, a
forma abreviada é considerada de uso coloquial, embora em muitos casos
passe a fazer parte da língua escrita
67
www.dudasidiomáticas
76
Basílio (2003) diz ser importante fazer a distinção entre redução ou
abreviação de derivação regressiva. No primeiro caso, segundo a autora, temse uma palavra formada pela supressão de alguma parte da palavra derivante
(a palavra da qual outra deriva), sendo a parte suprimida muitas vezes
imprevisível. Para ela, a palavra formada é sinônimo da derivante, tendo
apenas seu uso em estilo mais coloquial. São exemplos de redução ou
abreviação: boteco por botequim, Sampa, por São Paulo, granfa por grã-fino,
delega por delegado. Basílio (op.cit.) apresenta ainda casos de redução em
formas compostas, nas quais o todo é representado por uma das partes da
composição, sem que haja prejuízo ou mudança da significação global: míni,
por minissaia, micro por microcomputador, vídeo, por videocassete, análise por
psicanálise. A diferença entre esses dois casos, formas simples e compostas, é
que no primeiro a redução é assistemática; no segundo, se faz pelos
constituintes da composição.
Já a derivação regressiva, segundo a autora, consiste em suprimir uma
seqüência fônica tomada como afixo. Nesses casos, afirma Basílio, a palavra
resultante não tem o mesmo significado ou uso da palavra derivante. Vejamos:
sarampão e sarampo. O ão foi interpretado como sufixo aumentativo formando
sarampo, bastando retirar a seqüência ão. Daí surgiu a oposição de significado
entre os dois vocábulos, significando sarampão um ataque forte de sarampo.
Em uma outra home-page, encontramos mais um esboço sobre nosso
objeto de estudo, a abreviação, o qual julgamos relevante para fins de
conhecimento da língua portuguesa. Desta vez, a análise é mais limitada,
restringindo-se ao vocábulo táxi e derivados.
Taxi: de taxímetro (despesa + medidor).
Talvez porque estejamos tão familiarizados com os termos taxímetro
(aparelho que mede a distância e calcula a quantia a ser paga) e táxi (veículo
de aluguel equipado com taxímetro), os detalhes abaixo se tornam
necessários:
1. No século XIX eram muito comuns pequenas carruagens de aluguel
chamadas cabriolés (duas rodas, um cavalo, conversível), que na França e na
Inglaterra se chamava CABRIOLET.
77
2. Na Inglaterra a palavra foi reduzida para CAB, com o mesmo uso. O
cocheiro era chamado de CABBY.
3. No fim do século passado inventou-se um aparelho mecânico para
possibilitar o pagamento do uso dos cabriolés em função da distância. O
aparelho foi chamado de TAXÍMETRO (taximeter). Os cabriolés assim
equipados foram chamados de TAXIMETER CAB, depois reduzido para
TAXICAB.
4. Continuando o processo de abreviação vocabular, chegamos ao
TÁXI.
5. Com o advento do automóvel, a mesma terminologia foi transferida
para as “carruagens sem cavalo”. Nos EUA até hoje os termos CAB, TAXICAB
e TAXI são usados indistintamente.
6. Como dissemos, o antigo cocheiro era conhecido como CABBY, mas
este termo não é mais utilizado, preferindo-se táxi driver. Já no Brasil, o antigo
cocheiro virou Chofer de Praça, Chofer de Táxi e hoje são chamados de
Motoristas de Táxi ou Taxistas.
Há
também
nas
home
pages
uma
série
de
abreviaturas68
características da Internet, representadas no Quadro 3, a seguir, que
significam respectivamente:
Quadro 3
Abreviaturas da Internet
BTW
GA
FYI
IMHO
ILY
LOL
MSG
OTOH
RTFM
TIA
By The Way
Go Ahead
For Your Information
In My Humble Opinion
I Love You
Laughing Out Loud
message
On The Other Hand
Read The fuck Manual
Thanks in Advance
A propósito
Vá em frente
Para a sua informação
Na minha humilde opinião
Eu te amo
Rindo em voz alta
Mensagem
Por outro lado
Leia o maldito do manual
Agradecendo antecipadamente
As letras maiúsculas são usadas para dar destaque. Se todas elas estiverem em
maiúsculas, significa que a pessoa está gritando. Portanto, evite escrever tudo em maiúsculas,
a menos que se queira enfatizar um ponto muito importante.
68
78
Algumas abreviações misturam letras e sinais gráficos69 para
representar a redução de palavras e expressões70. São exemplos:
Quadro 4
Abreviações com letras e sinais gráficos
K-Que
OBG-Obrigado
OK-Tudo bem
PQ-Porque
Q-Que
QQ-Qualquer
TB-Também
TKS-Obrigado(ing)
X-Vez
+-Mais
--Menos
BJS-Beijos
+ ou--Mais ou menos
C/O-Como
[ ]-Abraço
C/-Com
=-Igual
ILY-Amo-te
LOL-Rir alto(ing)
MSM-Mesmo
Segundo afirma Béguelin (2004, p.32), os internautas e os usuários do
SMS (Short Message Service) para os telefones móveis fazem uso de uma
quantidade de inovações gráficas basicamente por exigências externas do tipo:
rapidez e falta de espaço na tela. Para a autora, as abreviaturas também estão
presentes a fim de que os usuários atinjam o objetivo pragmático de serem
breves e rápidos em suas comunicações. Na opinião dela, alguns usuários
retomam o que caracteriza silabários micênicos e hititas, entre eles:
1. Utilização de letras ou ideogramas com valor fonético (rebus):
U2 = [you too]
Y A KELK1??? = [y a quelqu’un]
2. Uso de símbolos acrofônicos:
asv? = [age sexe ville?]
mdr!!! = [mort de rire]
Q = [quoi], [qui] ou [que], por exemplo em: CE Q JE PENSE
Para Saussure, só há dois sistemas de escrita: o ideográfico, cuja palavra é representada por
um sinal único e estranho aos sons que a compõem; e o fonético, que procura reproduzir a
sucessão de sons de uma palavra .
70
Na expressão de Vendryès, a linguagem é um sistema de sinais. Assim como o é a escrita,
na expressão de Martins (op.cit, p.24).
69
79
3. Reutilização de fonogramas com valor silábico:
CT = [ c´était]
4. Recurso à ideografia:
@+ = [a plus] (que se pronuncia “a plus”, forma truncada habitual,
em francês coloquial, para “à plus tard” 71).
5. Reciclagem de diversos signos para transformá-los em componentes de
ícones:
8-)):-p = signos não-lingüísticos os quais evocam uma pessoa que
usa óculos e sorri ou um personagem que mostra a língua,
tomados do repertório de smileys ou binettes. (“Emoticón” [algo
como “emotivadão” em português] é uma das denominações que
se usam em espanhol).
Podemos observar também na linguagem da Internet o crescente uso
da imagem, o que, de certa forma, nos leva aos códices medievais72, nos quais
predominavam as ilustrações, imagens e ornamentações (MIRANDA, 2004).
Vale ressaltar, porém, que nesses grande parte das ilustrações não tinha nada
a ver com o sentido do texto, servindo, via de regra, como mera decoração.
Naquela, as imagens e ícones em movimentos colaboram com a construção do
sentido. Ou seja, o hipertexto, modo de enunciação digital, converge VERBO +
IMAGEM + SOM = HT.
É bem verdade que a iconografia pode existir sem apoio do texto, como
este pode subsistir sem aquela, mas, associada ao texto, a imagem constitui
uma espécie de traço supra-segmental que marca leituras, suscita apelos, cria
modos de realidade que induzem significação no interior de comunidades
textuais suficientemente advertidas (NASCIMENTO, 1998, p. 21).
Se pudermos estabelecer ligações interessantes entre o texto digital e
os manuscritos, veremos que, no primeiro, a imagem possui uma relação
privilegiada com o elemento verbal, assumindo um valor primeiro que as
“iluminuras” não representavam nos códices, já que se limitavam à função
71
Béguelin (2004, p. 32) afirma que o recurso de abreviações fonográficas é freqüente na
língua francesa.
72
Com o advento da imprensa houve a separação do espaço verbal e imagético.
80
decorativa. Por outro lado, os ícones criados e amplamente difundidos no
espaço digital, que definem emoções e características de quem os escreve,
reconfiguram os sinais diacríticos. Vejamos alguns:
Quadro 5
Guia de emoticons73
:-)
Sorriso – Alegria
( :+( Assustado – :-x Um beijo
Aterrorizado
;-) ou ' -) Piscadinha - :[ ou :)= Vampiro
xxx Beijinhos
sarcasmo ou brincadeira
:-( Triste - Não gostei, |-I ou (- I Adormecido :-X Um beijo caloroso
estou triste ou chateado
e apaixonado
:-I Indiferença
|-O Bocejando
: - # De lábios
selados, guardar em
segredo
:*) Estou bêbado ou X)
Morto
|: - | Excessivamente
sendo incoerente
rígido
:-D Risada - Estou rindo
% -) Confuso
[]
abraços
:-DDD Estou rindo muito
: -e
Desapontado
0:) um anjo
Conforme lemos em Viana (2000), os emoticons foram desenvolvidos
pelo serviço secreto de um país do sudoeste europeu, em 1979, para que
apenas pessoas altamente treinadas na arte da decifragem pudessem
compreendê-los. Segundo essa autora, a técnica básica desse sistema
criptográfico baseava-se na rotação a 270 graus dos caracteres digitados, o
que os tornava praticamente impossível de serem lidos por pessoas que não
conheciam essa arte74. Atualmente, ressalta Viana, basta criatividade e um
pouco de paciência para entendê-los.
David Crystal (2005, p. 86), em seu livro intitulado A revolução da
linguagem, deixa claro que os smileys (emoticons) indicam a natureza sem fala
do veículo que os participantes utilizam, seja em interações por e-mail ou salas
de bate-papo. Na opinião dele,
73
74
Abreviaturas de emoções usadas na Internet.
Com o fim da Guerra Fria, o uso militar dos emoticons tornou-se obsoleto (VIANA, 2000).
81
Os smileys se expandiram como forma de evitar as
ambigüidades e as percepções errôneas que surgem quando
se faz a linguagem escrita carregar o peso da fala.
Ainda acerca dos emoticons, Oliveira e Paiva (op.cit.) citando Noblia diz
que:
Como a comunicação mediada por computador é uma
comunicação baseada em textos, ao contrário da comunicação
face a face, sofre a ausência de indicadores não-verbais
(gestos, expressões, olhares, entonação, acento etc.) que
normalmente ocorrem quando todos os participantes estão
presentes no mesmo ambiente físico. Um paliativo para essa
ausência é a “paralinguagem eletrônica” que oferece aos
interlocutores os chamados “emoticons” (que tentam reproduzir
sentimentos, emoções, risos etc. através de uma combinação
de símbolos).
Dentre os vários recursos utilizados na linguagem dos gêneros digitais,
em especial a redução das palavras, elegemos aqui os mais comuns, a saber:
1.
D+
T +++++
Sons das letras associados a símbolos matemáticos.
Escrita ideográfica:
Demais
Até mais
2.
Uso de consoantes que têm em sua pronúncia o som de uma
vogal:
Blz
Beleza
Kra
Cara
Msmo
Mesmo
Q
Que
Tc
Tecer = conversar on-line ou teclar
3.
Pq
Tb
Vc
Qdo
Uso das consoantes mais sonoras de palavras dissílabas:
Por que
Qto
Quanto
Também
Hj
Hoje
Você
Hrs
Horas
Quando
Mto
Muito
4. Expressões reduzidas a apenas uma palavra:
Kolé ou cole
Qual é
Dukarái
Procê
Para você
Xôtefalá
Cume
Como é
Né
Do caralho
Deixa eu te falar
Não é?
82
Ce
Te
Ta
Tava
5.
Interrupção da palavra em sua sílaba tônica, mantendo-se
por vezes, a pós-tônica:
Você
Tâmus
Estamos
Até
Fi
Filho
Está
Po
Pode
Estava
Nó
Nossa
Pegay
6. Uso de estrato sonoro da língua inglesa
Peguei
Naum
Intaum
Baum
Saum
Entaum
7. Modificação da representação convencional dos sons nasais:
Não
Vaum
Vão
Então
Daum
Dão
Bom
Estaum
Estão
São
Taum
Estão
Então
Jaum
João
Soh
Lah
Eh
8. Marcação das sílabas tônicas com o uso da letra h
Só
Moh
Mó
Lá
Neh
Né
É
Jah
Já
Aki
9. K substituindo o dígrafo QU
Aqui
Tikim
Tiquinho
Loko
Pra
10. Economia na escrita de letras mediais
Louco
Loca
Para
Veio
Louca
Velho
Todas as reduções acima apresentadas são motivadas pelos sons das
palavras e, mesmo que variem os contextos, o valor semântico é mantido.
Assim, mt é sempre muito, vc é você e aki é aqui e não há dificuldade na
compreensão por parte dos usuários.
No que tange à substituição do ditongo nasal ão pelo um (ex. não ⇒
naum), assim como o uso do h para representar as vogais tônicas (ex.é ⇒ eh),
ambos têm sua origem na linguagem telegráfica e permanecem até hoje.
Quanto ao uso do K em substituição à letra C e ao dígrafo QU (ex. aqui
⇒ aki), tem-se comprovada a tese da economia, que reduz duas letras a uma
só. Vale salientar, contudo, que há ocorrências do fonema /w/ em contextos
onde seu uso não implica redução: falou ⇒ falow. Nesse caso, o autor do texto
83
tem como finalidade apenas assinalar seu estilo, já que a marca principal das
interações on line é a utilização de um código próprio, que rompa com as
normas estabelecidas para a ortografia e a pontuação, fazendo surgir um
código irreverente e estiloso75. Convém lembrar que, a depender do gênero,
escrever conforme as normas gramaticais pode resultar em erro. Em outras
palavras, um ambiente que exige irreverência, velocidade e estilo requer uma
linguagem que se coadune com ele.
75
(SANTOS, 2005).
84
CAPÍTULO 3
A ABREVIAÇÃO E AS TECNOLOGIAS: do manuscrito ao texto digital
Após mostrarmos que a visão dicotômica da relação entre fala e escrita
não mais se sustenta, veremos se há ou não, no que diz respeito ao uso das
abreviações, certa diferença entre as tecnologias manuscrita, impressa e
digital. Para tanto, dedicaremos algumas linhas deste capítulo ao texto
manuscrito, seu significado, sua origem e tradição; ao impresso, seu
surgimento e contribuições e, por último, ao digital, sua introdução, importância
e impacto na linguagem e vida social, tomando como premissa um dos três
aspectos destacados por Crystal (2001), em seu livro “Linguagem e a
Internet76”:
Do ponto de vista dos usos da linguagem, temos uma
pontuação minimalista, uma ortografia um tanto bizarra,
abundância de siglas e abreviaturas (grifo nosso) nada
convencionais, estruturas frasais pouco ortodoxas e uma
escrita semi-alfabética. 77
76
Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, Internet s.f. (s XX) INF TEL rede de
computadores dispersos por todo planeta que trocam dados e mensagens utilizando um
protocolo comum, unindo usuários particulares, entidades de pesquisa, órgãos culturais,
institutos militares, bibliotecas e empresas de toda envergadura.
77
Não seria o caso aí, de escolha lingüística ou, como salienta Marcuschi (2002), temos, em
termos lingüísticos, uma língua escrita não-monitorada, não submetida a revisões, expurgo ou
correções. Em outras palavras: uma linguagem em seu estado natural de produção.
85
Quanto a este último, o texto digital, buscaremos identificar e
caracterizar alguns gêneros emergentes, em especial o e-mail78, o weblog, e o
SMS, a fim de mostrar o efeito dessas novas tecnologias na linguagem,
especificamente na escrita, visto que a comunicação em todos os gêneros da
mídia digital se dá por essa modalidade da língua.
Podemos adiantar, no entanto, que o fato de essa nova tecnologia
conseguir reunir várias formas de expressão (texto, som e imagem) em um só
meio é responsável por parte do sucesso que esse novo gênero ocupa ao lado
do papel e do som, nas atividades comunicativas.
A título de exemplo, destaquemos aqui a expressão do ano em 1998:
“e”: e-mail (correio eletrônico), e-book (livro eletrônico), e-therapy (terapia
virtual), e-business (negócios virtuais), entre outras, que passaram a fazer
parte do nosso vocabulário.
• A evolução da escrita: uma sinopse
As formas de comunicação utilizadas pelo homem ao longo de sua
evolução foram as mais variadas possíveis: o homem primitivo utilizava-se de
desenhos, hieróglifos, caracteres cuneiformes das civilizações da Mesopotâmia
ou, ainda, caracteres ideográficos sino-japoneses. Os materiais utilizados iam
de paus, pedras, fios, a tecidos, colares, entre outros, com os quais
compunham palavras, frases e expressavam idéias. No mundo ocidental, a
comunicação dá-se principalmente através de representação gráfica, cujo
principal veículo de transmissão do conhecimento humano é feito por meio do
alfabeto. Antes, porém, de chegarmos ao alfabeto, vivenciamos uma
verdadeira evolução da escrita, que pode ser assim resumida:
78
Visto que o termo já está sendo dicionarizado dessa maneira, ao menos no Dicionário
Houaiss da Língua Portuguesa não traduzimos, aqui, para “correio eletrônico”.
86
• Pictografia: do latim “pictus”, pintado; “grafe” (do grego), descrição. Essa
escrita era usada pelo homem primitivo para fixar nas paredes das cavernas
seus principais feitos;
• Ideografia: Fixação das idéias através dos símbolos. Signos convencionais
correspondentes a determinadas expressões e que sugerem idéias;
• Fonetismo: As figuras lidas evocavam seu sentido primitivo acrescido da
expressão sonora. Pássaro, ao invés de representar apenas rapidez, adquiria o
valor sonoro de ave. Ou seja, equivaliam ao som79.
• Silábica: O fonetismo sugeriu a decomposição da palavra em sílaba, ou seja,
conjunto de sons. Quando a escrita tinha dificuldades em encontrar uma
representação para determinada palavra, separava-a em duas, três ou mais
sílabas, com um desenho para cada uma.
• Alfabeto: Palavra composta com os nomes das principais letras gregas alfa e
beta. Sistema de sinais que exprimem os sons elementares da linguagem. De
origem fenícia, passou à Grécia e depois a Roma. No nosso caso, apenas no
século I a.C. surge o alfabeto latino completamente constituído com suas vinte
e três letras (HIGOUNET, 2003).
3.1 O manuscrito
Certamente não é uma novidade afirmar que as maiores obras
religiosas, literárias, artísticas e até mesmo cientificas da humanidade foram
redigidas de próprio punho pelos seus autores, foram obras “manu scriptæ”,
manuscritas. Todas que foram editadas antes do aparecimento da imprensa
79
Processo semelhante ocorre nas cartas enigmáticas, onde o símbolo do sol mais o do dado
representa a palavra soldado.
87
como a Bíblia, a Ilíada e a Odisséia, e mesmo depois que a imprensa já tinha
sido inventada por Gutenberg.
Queremos com isso dizer – aprofundando o assunto – que foram as
mãos a parte do corpo por excelência do homem através das quais ele revelou
o pensamento humano nas grandes obras do pensamento e da arte humana,
concebidos pelo cérebro e realizados através da escrita manual, da pintura, da
escultura, do desenho. Em seu “Elogio da mão”, Henri Focillon escrevia que
“l’esprit fait la main, la main fait l’esprit” e afirma a essencialidade da mão
humana, desde o gesto mais simples ao gesto oratório, que o torna mais
convincente, mais plausível, mais veemente. E afirma, a certa altura, que
aqueles que se expressam concomitantemente com a palavra e com os gestos
manuais “conservaram com vivacidade essa dupla poética... que traduz com
exatidão um estado antigo do homem, a recordação dos seus esforços para
inventar um mundo inédito” (HENRI FOCILLON, Vie des Formes, p.104 apud
WILSON MARTINS, A palavra escrita, p.18).
Durante séculos, como afirma Roman (2000), a comunicação escrita foi
feita por manuscritos ou processos artesanais de entalhe, gravação e
impressão de caracteres em pergaminhos preparados a partir do couro de
animais. Segundo o autor, durante a Idade Média, copiavam-se principalmente
documentos e textos religiosos. 80
A princípio, conforme encontramos em Martins (1996, p.93), manuscrito
é o texto escrito à mão, seja qual for o instrumento auxiliar, seja qual for a
matéria que o receba.
Nessas condições, seriam manuscritos todas as “inscrições” feitas em
papel ou em pedra, marfim, bronze ou mármore. Entretanto, esse nome é
reservado aos “manuscritos” em papel, papiro ou pergaminho; aos demais, o
nome de gravura ou de escultura. Dessa forma, a palavra “manuscrito” evoca
sem dubiedade a idéia da folha de papel, de papiro ou de pergaminho, escrita à
mão, e até, visto que nem sempre são sincrônicos os progressos técnicos e os
Um copista levava em média 100 dias para produzir um exemplar de uma obra (ROMAN,
Artur Roberto. Chega de papel! O correio eletrônico e a comunicação administrativa nas
empresas).
80
88
progressos vocabulares, a folha de papel datilografada, quando ela representa
o “original” vindo das mãos do escritor.
Também o Dictionnaire de Furetière refere dois sentidos à palavra
“manuscrit”: “livro ou obra escrita à mão” e “o original de um livro, o texto do
Autor sobre o qual ele foi impresso” (CHARTIER, 2002, p.96).
Assim considerado, o “manuscrito” visa ao texto escrito à mão,
qualquer que seja o instrumento auxiliar, seja qual for a matéria que o receba,
como foi dito acima. Estendemos, então, o conceito de manuscrito, também, ao
texto digital, visto que será aqui tomado apenas o original, vindo das mãos do
escritor81.
O primeiro mito que deve ser desfeito aqui é o da substituição simples
da cultura manuscrita pela impressa. Prova real de que tal afirmação não passa
de uma idéia errônea é o fato de ter aquela alcançado tamanha importância
quando da época da impressão. Segundo Chartier82 (2002, p.84), a
manutenção do manuscrito deu-se até o século XIX e mesmo no século XX.
A publicação manuscrita, afirma o autor, mantém a ambigüidade do
próprio termo “escritor”, compreendendo aquele que copiou o livro, bem como
aquele que compôs o texto. Este fato deve-se à constatação de um mesmo
livro conter textos de autores e, até mesmo, gêneros diversos.
Nos séculos XV e XVI a publicação manuscrita é reforçada a fim de
controlar a própria forma dada pelos autores às suas obras e, principalmente,
devido à consciência aguda e infeliz das corrupções introduzidas pela
imprensa, conforme podemos ler em Chartier (2002, p.85).
A partir do século XVI, os papéis manuscritos abundam em freqüência
e atingem um nível tal de importância que é raro um inventário após o
falecimento que não os contenha. Tamanha é a valia de um manuscrito que os
exemplares de apresentação oferecidos aos príncipes ou aos grandes tinham
suas cópias impressas preteridas (CHARTIER, 2002, p.83-86).
Será, portanto, nesses termos, com essa restrição e especificidade, que usaremos ao longo
do nosso trabalho a definição do tema.
82
O autor destaca a oposição radical entre print culture e scribal culture.
81
89
Havia, em plena época da impressão, uma “comunidade do
manuscrito”, no dizer do autor, cujo desejo era o de subtrair ao acesso público
um saber precioso, uma literatura escolhida, livrando-a dos riscos de corrupção
e profanação trazidas pela imprensa. Em sua obra A evolução da escrita,
Horcades (2004) afirma que os possuidores de livros manuscritos tinham
preconceito contra os livros impressos, chegando, em algumas cidades, a
proibirem a entrada dos impressores. Tal decisão era tomada por poderosos
escribas e calígrafos, que alcançavam facilmente seu objetivo, já que as
cidades eram cercadas por muros e guardadas por portões.
Os manuscritos abarcavam um número considerável de abreviaturas,
das quais uma parte das sílabas, e às vezes todas as letras da palavra, exceto
a primeira, eram suprimidas. Vejamos a quantidade das abreviações advindas
dos manuscritos:
• Um z pela conjunção e;
• uma espécie de 3 ou de 9 pela partícula cum ou a partícula francesa com, e
pelo final de certas palavras: te3 ou te9 = tecum; neq3 = neque;
• o q com a parte inferior cortada por um traço em forma de cruz para significar
quam ou quod;
• o sinal 4 correspondente ao latim rum: nostro4 = nostrorum; quo4 = quorum
etc;
• a freqüente supressão de certas letras, substituídas por um pequeno traço
horizontal, chamado til (em latim: titulus; em francês: titre; em espanhol: tilde),
colocado sobre a palavra assim abreviada: nre por notre; bos por bons; Dns por
Dominus, que até o século V só se aplica a Deus, mas no século VI começa a
ser aplicada a qualquer deus83 (MARTINS, 1996, p.161).
Nos manuscritos mais antigos, o m ou o n, no final das linhas, era
designado por um pequeno traço horizontal: C ou por um s deitado ( ), só ou
No século VI se deixa de abreviar o título dominus pela sigla D, passando a abreviatura DMS
ou DNS, que a princípio era designativa apenas do Senhor Deus (MAURICE PROU, Manuel de
palèographie, p.49).
83
90
acompanhado de dois pontos, um superior e outro inferior. A palavra est (do
verbo esse), representada por este sinal: ÷, indicava uma antiguidade de
setecentos a oitocentos anos. No século IX, o ille era abreviado para ill, e a
letra n servia de abreviação para os nomes de homens desconhecidos
(MABILLON APUD MARTINS, 1996).
As abreviações de per, de pro e de prœ eram distinguidas da seguinte
forma: per era representada por um p cuja perna era cortada por um traço; pro,
por um p com a cabeça cortada por um traço; e prœ por um traço superior que
não chega a tocar a letra.
Vimos, pois, que as abreviações tiveram origem nos manuscritos e se
estenderam até os nossos dias.
3.2 O impresso
Com o advento da imprensa, muito foi facilitada a transmissão de
textos e a produção de livros em série. O INCUNÁBULO é um termo técnico
que designa os livros impressos até 1500, embora, segundo Svend Dahl, nos
países do norte europeu, os incunábulos durassem até 1550. A maior parte dos
incunábulos que ascendeu a centenas de milhares foi impressa em
pergaminho. Dentre os principais caracteres que denunciavam a autenticidade
de um incunábulo, estava a quantidade de abreviações que esses continham.
Segundo John Man (2004: 219), esse nome latino incunabula - os “cueiros” - foi
adotado pelos historiadores em muitas das línguas mais faladas, significando
“infância” da revolução impressa. Algumas vezes, afirma o autor, essa
expressão adquiria uma singular forma espúria, incunabulum, ou um
equivalente local: “prensa do berço” (em alemão ”Wiegendruck”); e “livros do
período do berço” (em japonês“yoran-ki-bom” e “in-kyu-na-bu-ra”).
As edições PRINCEPS: Há um questionamento em torno do verdadeiro
significado do termo. Segundo Martins (1996, p. 164), abusa-se do emprego
dessa palavra para designar “indeterminadamente” as primeiras edições de
manuscritos e as primeiras edições em geral. Rouveyre, citado por Martins,
91
afirma que a palavra deve ser “reservada aos clássicos impressos no segundo
período do século XV”. Assim, todas as edições princeps são incunábulos.
Durante algum tempo, os impressos continuaram imitando os
manuscritos, gerando até certa dificuldade para distinguir se determinado livro
era impresso ou manuscrito, como no caso da Bíblia. A Bíblia de 42 linhas, de
Gutenberg, é um exemplo: nela, a técnica das rubricas impressas não permitia
distinguir as maiúsculas utilizadas das pintadas à mão (MAN, 2004, p.198). Era
costume que os impressores, ao imprimirem os livros, deixassem em branco o
lugar das primeiras letras e outros espaços onde os copistas iam desenhar e
ornamentar as letras e fazer outros desenhos.
O desenvolvimento da prensa mecânica por Gutenberg, em 1448,
revolucionou os processos de composição, possibilitando a impressão
mecânica de textos, bem como sua reprodutibilidade. Com esse avanço, o livro
deixa de ser o local onde se escondia o conhecimento e passa a ser o meio de
divulgá-lo84. É bem verdade que os preços dos livros impressos foram uma das
razões por que os manuscritos não foram substituídos prontamente (MAN,
2004, p.221).
Segundo Chartier (2002, p.85), a desconfiança diante do livro impresso
e a preferência pela publicação manuscrita está ligada ao fato de, nesta, ter-se
um maior controle do texto, bem como de sua circulação e interpretação.
Para muitos, na expressão do autor, a imprensa é vista como
triplamente corruptora:
deforma a letra dos textos, alterados pelos erros de tipógrafos
inábeis; destrói a ética desinteressada da República dos textos
entregando as composições dos humanistas, dos poetas ou
dos eruditos a livreiros cúpidos e desonestos; oblitera a
verdadeira significação das obras propondo-as a leitores
ignorantes, incapazes de compreendê-las corretamente.
Brocado & Emiliano (no prelo) acrescentam ainda que a edição de um
manuscrito medieval, por exemplo, faz sempre violência ao texto na sua
materialidade paleográfica e gráfica original, promovendo a substituição de
Os primeiros livros impressos por Gutenberg, entre 1442 e 1455, formam cerca de 100
exemplares da Bíblia.
84
92
caracteres
manuscritos
por
caracteres
impressos,
bem
como
o
desenvolvimento de abreviaturas e a normalização da capitalização que nada
mais são do que processos de transliteração, cujo resultado inevitável e efetivo
dá-se na transferência de um código de escrita para outro, segundo os autores,
baseado em regras e convenções distintas.
Conforme se lê em Man (2004, p.250), a imprensa foi vista inicialmente
pelo catolicismo como uma dádiva divina85, mas logo depois assumiu contornos
satânicos. Ainda: no Islã, cuja tradição védica acredita que “a verdade está
presa a palavras vivas de pessoas autênticas”, a imprensa foi satânica durante
quatrocentos anos, até que um perigo maior a relegou a uma posição inferior.
Para os muçulmanos, segundo Robinson (APUD MAN 2004, p.251) a
impressão “atacava aquilo que tornava o conhecimento algo digno de
confiança, o que dava a ele valor e autoridade. Desta forma, toda a autoridade
desaparece, e a vontade de Deus torna-se indeterminada, já que não há a
transmissão autorizada nem a memória. Na expressão de Lutero, a imprensa
era ”o mais alto e mais extremista ato da graça de Deus, por onde a tarefa do
Evangelho é levada adiante”. John Foxe (Livros dos Mártires, 1563) fez o
seguinte comentário acerca da escrita:
“Para dominar seu exaltado adversário, o Senhor começou a
trabalhar para Sua Igreja não com a espada e o escudo, mas
com a impressão, a escrita e a leitura. Se o papa não abolir o
conhecimento e a imprensa, a imprensa pode em curto tempo
expulsá-lo”.
Ao contrário do que se poderia imaginar, o impresso não surgiu com
sua personalidade própria. Martins (1996, p. 167) assegura que o “texto”
impresso procurou instintivamente continuar o manuscrito, em vez de substituílo. E acrescenta: a imprensa não só imita o mais fielmente possível o
manuscrito, como também tentou uma conciliação impossível com o copista
manual.
Segundo Horcades (2004), os grandes incentivadores da criação de livros foram os reis e a
Igreja. Esta, para que suas doutrinas e fundamentos ficassem impressos a fim de propagarem
a prática religiosa. Aqueles, para terem seus nomes registrados e documentados, dando
continuidade no poder aos seus descendentes.
85
93
Ainda segundo o autor (1996, p.168), o próprio tipo de impressão era
fundido em moldes que imitavam os caracteres manuscritos, embora
alcançassem uma regularidade natural que permitia distingui-los das letras
traçadas à mão.
Destacamos na cultura gráfica as escritas dos poderes – monárquico,
eclesiástico e municipal – cuja produção engloba registros ou recenseamentos,
e também cartazes colocados nas portas das igrejas; e os escritos do cotidiano
e do privado, contendo livros de contas, de razão, cartas, bilhetes etc (GOMEZ,
1998).
A história das relações entre manuscrito e impresso incluem também
as anotações marginais de textos manuscritos em obras impressas,
especificamente no século XVI. Tais anotações dizem respeito, principalmente,
às anotações de professores e estudantes, às dos eruditos e, também, dos
profissionais, dentre eles médicos e cirurgiões (CHARTIER, 2002, p.94-95).
Além dessas anotações marginais, no século XVIII, os objetos
impressos destinados a sujeitar e acolher a escrita manuscrita daqueles que a
utilizam têm multiplicadas as suas cópias pelas práticas editoriais. Exemplo
disso são os almanaques ingleses ou as agendas italianas, que traziam ambos
folhas em branco para que seus usuários ali pudessem expressar suas reações
e anotar seus afazeres (BRAIDA, 1998).
Vale ressaltar que a imitação dos manuscritos pelos impressos se
estende, segundo Svend Dahl (1933), a pormenores de ordem material ou
circunstancial que não mais se justificavam no momento em que a imprensa e
o papel vinham automaticamente resolver os problemas que os tinham
provocado.
Essa imitação, conforme encontramos em Martins (1996, p.174), é
explicável a partir de duas circunstâncias diferentes: a primeira, de ordem
psicológica, consiste no fato de que dificilmente o homem inventa qualquer
coisa de inteiramente novo. Ainda segundo o autor, as invenções são apenas
transformações ou aperfeiçoamento de coisas anteriormente conhecidas.
Essas influências são observadas nos primeiros impressos, onde a
permanência dos caracteres materiais do manuscrito é prolongada até que a
94
nova invenção se desse conta das enganadoras similitudes que a prendiam ao
manuscrito.
A segunda circunstância, desta vez de ordem econômica, é que os
manuscritos ganharam, nos primeiros tempos, um extraordinário prestígio,
passando a gozar da mesma consideração de que tinham usufruído os rolos de
papiro em face dos primeiros livros de pergaminho, ou, nos tempos modernos,
os livros feitos em prensa manual diante dos que são compostos à máquina. A
imitação resultou, então, em grande parte, do favor alcançado pelo manuscrito
na concorrência com os primeiros impressos.
Na verdade, temos hibridações das diferentes formas do escrito, como
observa Chartier (2002, p.83). Ou seja, havia manuscritos copiados a partir de
uma obra impressa como também impressos que continham formulários cujos
espaços em branco deviam ser preenchidos à mão. Segundo o autor,
exemplos desses objetos mistos eram, na Espanha de Felipe II, os
questionários enviados aos corregedores a fim de colher as informações
necessárias para as Relaciones Geográficas e, em várias dioceses do Sul da
França, as certidões de casamento utilizadas nos séculos XVI e XVII, conforme
ritual ali praticado.
Quanto às intervenções manuscritas no original, essas dizem respeito
às formas gráficas, às convenções ortográficas, à pontuação ou à própria
organização
do
texto,
buscando
normalizar
a
língua
impressa
e,
conseqüentemente, assegurar uma maior correção às edições (TROVATO,
1991 e 1998; RICHARDSON, 1994).
Exemplo disso, portanto das relações entre manuscrito e impresso,
pode ser visto em um exemplar da edição de 1676 de Hamlet, em 1740,
quando da substituição na pontuação impressa do texto, feita pelo ator que
desempenhava o papel de Hamlet, por uma pontuação manuscrita totalmente
diferente da primeira, considerada rudimentar. Segundo Chartier (2002, p.99100), tal substituição trouxe uma verdadeira interpretação do texto.
95
3.3 O eletrônico
Vimos até agora as mudanças causadas com a grande revolução do
livro, desde a passagem do papiro ao pergaminho até a invenção de
Gutenberg. Passemos, pois, às transformações/revoluções promovidas pela
informática. A primeira colocação a ser feita aqui é a distinção entre texto
eletrônico e hipertexto. Para tanto, adotamos a visão de Antonio Carlos Xavier
(2002), em sua tese de doutorado O Hipertexto na Sociedade da Informação: A
Constituição do Modo de Enunciação Digital, na qual ele afirma que:
Texto eletrônico não é necessariamente Hipertexto. Um texto
que exista originalmente em celulose, uma vez transportado
para superfície digital, não passa a ser automaticamente um
Hipertexto. Antes se transforma em um texto eletrônico, i.e., o
texto impresso disponível na Web por programas que o
codificam em linguagem html. Uma vez incluso na rede
mundial, dotado de hiperlinks e acrescido de outros modos
enunciativos (ícones, imagens, som) aquele texto inicialmente
impresso passa a ser, então, um Hipertexto.
Segundo Cavalcante (2004, p.164), o termo hipertexto surgiu em
meados dos anos 60 criado por Theodore Nelson para exprimir a idéia de
escrita/leitura não linear em um sistema de informática. Para a autora, a
história do hipertexto apresenta dois momentos: a primeira e a segunda
geração. O primeiro momento, situado em meados da década de cinqüenta,
visa ao acúmulo de informações; o segundo momento, compreendido em
meados da década de oitenta86, busca a incorporação de recursos
hipermidiáticos a estes sistemas e à popularização da informática e da Internet.
Em Leitura, texto e hipertexto, Antonio Carlos Xavier (2004, p.171)
define hipertexto como
Uma forma híbrida, dinâmica e flexível de linguagem que
dialoga com outras interfaces semióticas, adiciona e
acondiciona à sua superfície formas outras de textualidade.
86
A fim de sermos mais precisos, informamos que foi em 1991 que Tim Banmer Lee inventou o
navegador para web, tornando a relação PC X usuário mais amistosa.
96
Na opinião do autor, “o hipertexto exige do seu usuário muito mais que
mera decodificação das palavras que flutuam sobre a realidade imediata”. Na
visão dele, “o hipertexto reúne condições físicas de materializar a proposta
paulofreiriana até às últimas conseqüências”.
Em artigo intitulado A escrita e seus dispositivos, disposto no site
www.educ.fc.ul.pt, afirma-se que “a ruptura que o texto digital traz à escrita
apresenta-se como sendo a sua própria libertação relativamente descentrada e
heterogênea”. A autora desse artigo cita Pierre Lévy para afirmar que o novo
dispositivo determina uma escrita diferente, descentrada e heterogênea.
Contudo, diz Lévy, há um “inexistente impacto da tecnologia”, visto que uma
visão do hipertexto eletrônico já havia sido apresentada de forma embrionária
em ensaios anteriores.
Em entrevista concedida ao Jornal do Brasil87, Chartier afirma que as
coisas não mudaram muito depois de Gutemberg:
a idéia de um livro com páginas, numeração, índice, capa,
surgiu com a primeira revolução – da passagem do rolo ao
códex - , libertando o leitor para escrever ao mesmo tempo em
que lê, fato impossível quando se segurava o rolo com as duas
mãos.
Para este historiador francês, as principais mudanças trazidas pelo
computador se resumem a três, quais sejam:
a leitura descontínua, a leitura hipertextual e a leitura
tematizada. Na tela do computador se organiza geralmente a
partir de temas. Os textos eletrônicos são consultados mais
como banco de dados do que como obra. Com isso, há uma
tendência à fragmentação, porque perde-se a referência à obra
completa, como início, meio e fim. Outra coisa interessante
desse suporte é o hipertexto, que oferece a oportunidade para
o leitor de romper com a ordem seqüencial do texto impresso e
praticar uma leitura particular, que continuamente introduz
textos dentro de outros textos.
Acerca da leitura descontínua que o hipertexto apresenta, Xavier (2004,
p.174-175) faz o seguinte comentário: “a inovação trazida pelo texto eletrônico
87
www.jb.com.br (jbonline.terra.com.br/destaques/bienal/entrevista).
97
está em transformar a deslinearização88, a ausência de um foco dominante de
leitura, em princípio básico de sua construção”.
O hipertexto não é particularmente novo. A invenção do conceito é
atribuída a Vannevar Bush, que nos anos cinqüenta propôs uma máquina
Memex89, cujas informações científicas poderiam ser procuradas de forma
hipertextual. O hipertexto é uma espécie de texto multi-dimensional no qual
trechos de texto se intercalam com referências a outras páginas.
O texto digital desencarna o texto para promover uma escrita virtual,
liberta de todos os constrangimentos de clausura e sucessividade90, ao
contrário do que faz o livro. No site www.onlinebook.com afirma-se que o texto
eletrônico deu forma nova às histórias contadas, colocando nelas imagens,
cores, sons e até viagens paralelas através dos links. Ao contrário de muitos
que se mostram hostis aos meios eletrônicos, o site apresenta uma lista
contendo inúmeras vantagens que surgiram com o texto digital:
• O leitor tem condições de ampliar o tamanho da letra (utilizando a ferramenta
tamanho da fonte);
• Pode fazer anotações ao longo do texto;
• Aumenta a velocidade de circulação da informação;
• Dá retorno mais rápido (podendo ser enviado por e-mail, por exemplo) e
• Possui
maior
alcance,
chegando
aonde
não
existem
livrarias,
democratizando a informação.
Segundo o referido site, por ser distribuído em formato digital, o texto
eletrônico não tem custo de impressão, distribuição e, acima de tudo, o risco de
ficar mofando nas prateleiras das livrarias.
Segundo Xavier (op.cit.), dizer que o hipertexto é deslinearizado não equivale a dizer que ele
seja um conjunto de enunciados justapostos aleatoriamente, um mosaico de frases
randômicas. O que o hipertexto ou qualquer outro tipo de texto não pode é subverter os níveis
de organização das línguas naturais (sintaxe, semântica, pragmática).
89
Em 1598, Agostino Ramelli apresentou uma roda de livros, denominada nora, onde cada
calha contém um livro aberto. Desta forma, o leitor pode passar rapidamente de um texto a
outro com a ajuda de engrenagens descritas com detalhe por Ramelli.
90
www.educ.fc.ul.pt (Acessado em março de 2005).
88
98
Após cinco séculos de hegemonia, a onipotência do papel está em
xeque, segundo afirma Roman (2000). Para ele, o ano de 1976 marcou o início
da era dos bits com o surgimento da Internet, permitindo-nos vivenciar uma
nova revolução, na qual os átomos estão sendo substituídos pelos bits. Na
visão de Roman (op.cit.), a função precípua do papel e da palavra escrita foi a
de ampliar a capacidade de memorização. Atualmente, na era dos bits, essa
função é feita com muito mais eficiência pelos discos rígidos dos
computadores.
Conforme lemos em Chartier (1999), o texto eletrônico foi capaz de
realizar o sonho de universalidade dos saberes, das informações e dos
julgamentos expressos no ideal de Kant:
De que cada um fosse ao mesmo tempo leitor e autor, que
emitisse juízos sobre as instituições de seu tempo, quaisquer
que elas fossem e que ao mesmo tempo, pudesse refletir sobre
o juízo emitido pelos outros.
Chartier afirma também que algumas idéias pensadas pelo filósofo
francês Condorcet, no século XVIII, foram reintroduzidas com o surgimento do
texto eletrônico: uma língua de signos, de métodos que permitissem captar a
relação entre os objetos e as operações do conhecimento.
No dizer de Manguel (1997), no texto eletrônico91, temos apenas uma
transposição do livro para a tela onde, semelhantemente aos rolos de papiro,
precisamos rolar o texto, sugerindo uma leitura linear do texto. Segundo
Calvino (1988), os livros não vão desaparecer, mas a informação que contêm
começa a ter seu suporte alterado, o que requer um novo tipo de autor, leitor e
linguagem apropriados. Também Xavier (op.cit.) afirma que, embora o
hipertexto seja dotado da economia de escrita/leitura revolucionária, não tem
por usurpação o lugar e a relevância do livro impresso. Autores como
McLuham (1967), Eisentsein (1979), Landow (1992) afirmam que estamos
vivendo apenas não uma revolução mas uma evolução, que teve início com a
transição do manuscrito para o impresso e, atualmente, a passagem do
impresso para o digital.
91
Essa afirmação não pode ser aplicada ao hipertexto.
99
Segundo Levacov afirma em seu artigo Os novos paradigmas do texto
eletrônico92, o mundo de Gutenberg encontra-se em colapso. A tecnologia
industrial da impressão está cedendo lugar para as novas tecnologias e formas
de comunicação, afetando nossa relação com a informação e com o próprio
texto. Para a autora, todos os tipos de trabalhos – que lidam com dados
simbólicos, textuais, numéricos, visuais e auditivos – têm de adequar-se ao
texto digital.
Face a essas mudanças sociais e culturais trazidas com o
desenvolvimento mais amplo e rápido da comunicação a distância, propiciadas
pelas redes eletrônicas, Santaella (2001) propõe três tipos de leitor93:
• o contemplativo: leitor de livros. Aquele que se retira para o gabinete para o
ato da leitura, comumente representado nas pinturas do século XVII e XVIII;
• o movente: leitor do jornal, da revista, do folhetim...que lê na rua, no ônibus,
no metrô..., o típico leitor das metrópoles aceleradas;
• o imersivo: o leitor do nosso tempo, da sociedade da informação, assim
denominado por seus profundos mergulhos no mar dos hipertextos e
hipermídias presentes nas páginas da Web.
Chartier (2000) considera plenamente justificável a coexistência de
múltiplos leitores, afinal, novas tecnologias estão transformando o meio de
produção
dos
livros
e
de
reprodução
dos
textos,
modificando
conseqüentemente a relação dos leitores com a cultura escrita, desde a
Antiguidade até os textos eletrônicos deste século. Exemplo disso foi
poeticamente colocado por Xavier (op.cit.):
assim como no período das grandes navegações as naus e
esquadras tomavam, às vezes, destinos inesperados causados
por fenômenos climáticos nos oceanos durante a viagem, os
hiperlinks funcionam como fenômenos da natureza do
92
www.facom.ufba.br/
A definição do que seja um leitor eficiente, que pode circular com tranqüilidade no mundo da
escrita, muda necessariamente à medida que a presença da escrita é cada vez mais intensa na
sociedade (FERREIRO, 2001).
93
100
hipertexto que podem ser controlados- não acionados – pelos
hipernavegadores.
As mudanças ocorridas no meio social e nos suportes em que os textos
são dados exercem diretamente influências no ato da leitura, o que nos leva a
reformular alguns conceitos até então cristalizados, entre eles o de leitura e de
texto94. Assim, a leitura tem sua atuação ampliada do campo verbal para outros
campos: visual, sonoro, plástico; passando a ser um processo associativo que
promove a interação escrita e imagem (MACHADO, 1999).
Desta forma, os avanços das tecnologias midiáticas e hipermidiáticas
levam-nos à emergência de três olhares conflituosos em relação à revolução
do texto eletrônico, a saber:
•
O olhar dos apocalípticos: os quais profetizam a extinção do livro
e, conseqüentemente, das práticas leitoras do texto impresso;
•
O olhar dos otimistas: aqueles que acreditam na perpetuação do
livro apesar dos significativos avanços das tecnologias midiáticas e
hipermidiáticas;
•
O olhar daqueles que não acreditam nem na hegemonia dos livros
em relação às mídias e hipermídias, nem na extinção desses causada pela
supremacia dessas tecnologias.
Ao que nos parece, nos próximos decênios teremos a coexistência, nas
palavras de Chartier (1997), entre as duas formas do livro – o eletrônico e o
impresso – e os três modos de inscrição e de comunicação de textos: o
manuscrito, o impresso e o eletrônico.
Para o autor, o fato de cada forma de publicação de texto escrito
corresponder a expectativas e usos específicos assegura-nos, provavelmente,
as diferentes modalidades de transmissão da escrita. Assim sendo, salienta
94
Na era da informação tudo é texto. Um slogan político ou publicitário, um anúncio visual sem
nenhuma palavra, uma canção, um filme, um gráfico, um discurso oral que nunca foi escrito,
enfim, os mais variados arranjos organizados para informar, comunicar, veicular sentidos são
texto. O texto não é, pois, exclusividade da palavra (MACHADO, 1999).
101
ele, uma história de longa duração do livro só pode ser uma história da cultura
escrita em suas diferentes materialidades e usos.
Graças aos novos instrumentos eletrônicos, afirma Siano (1990), as
fronteiras entre realidade e interioridade são abatidas. Besen (2002), citando
Chartier, diz que este detecta três tipos de ruptura promovidas pelo texto
eletrônico:
1.
Livros, revistas, jornais, cada um destes suportes possui seu
caráter específico. Com o texto eletrônico, diversas classes de texto são lidas
em um mesmo suporte;
2.
Com o texto eletrônico, o leitor pode consultar não só textos, mas
também imagens e som. Além de ter acesso aos documentos utilizados pelos
pesquisadores;
3.
A questão do copyright, do direito autoral, é bastante afetada. O
texto passa a ser móvel, o leitor pode intervir, recortar etc.
Para Besen (2002), os textos tradicionais são obras singulares,
enquanto o texto eletrônico é instável. Na opinião de Chartier, a realidade
virtual é apenas mais um passo na história da escrita e não sinônimo do fim do
livro ou da literatura95. Dessa forma, o discurso desse autor caracteriza-se pela
cientificidade, sendo isento de visões catastróficas ou utópicas.
Bagno (2002, p.33-34) diz que “a comunicação eletrônica via Internet
vem tornando cada vez mais difícil a delimitação entre o que, tradicionalmente,
só era admitido na língua falada e o que era cobrado na língua escrita”. Na
visão do autor, há uma mescla cada vez maior entre os gêneros textuais, além
da proliferação de novos gêneros.
Para esse autor, o advento do processador de textos aboliu a relativa
estabilidade de um registro escrito tradicional, cedendo lugar a uma exibição
dinâmica na tela, na qual o texto escrito pode ser editado, revisado,
reformatado ou deletado, com grande facilidade, sem deixar nenhum vestígio
de qualquer alteração. No ponto de vista de Bagno:
95
MELLO, Eunnice Homem de. Navegar é preciso: Ler também é preciso. 2003.
102
O conceito de texto escrito se torna profundamente diferente:
ele é somente uma dentre uma série de transformações,
algumas das quais podem ser executadas automaticamente
por ferramentas de autocorreção ou por verificadores
ortográficos.
Esse autor diz ainda que é preciso estudar detalhadamente os efeitos
que essas mudanças tecnológicas trazem para os aprendizes, bem como as
transformações que incidem sobre as formas e usos dos textos escritos.
Em suma: embora não existam indícios suficientes que comprovem o
desaparecimento do papel (enquanto suporte) do meio da sociedade
contemporânea, é certo que a nossa relação com ele, muito em breve, terá
mudanças irreversíveis.
Vimos, pois, o surgimento das abreviações nos textos manuscritos, sua
conservação nos textos impressos e, finalmente, sua propagação nos textos
digitais, atuais divulgadores desse tipo de redução da língua.
103
CAPÍTULO 4
A ABREVIAÇÃO E OS GÊNEROS TEXTUAIS: da carta ao e-mail
4.1 Origem do termo
Etimologicamente, o termo gênero
vem
do
latim gnus, ris
‘nascimento, descendência, origem, raça, tronco; descendente, rebento, filho’.
Derivado do grego génos, eos ‘id.’; provavelmente esse vocábulo, em
português e em espanhol, como julga Corominas, terá como étimo o plural
genra, que, posteriormente, ao se tornar singular, é tomado como de 2ª
declinação *genrum (HOUAISS, 2002) .
4.1.2 Tipo Textual X Gênero Textual
Face à confusão entre uso e definição dos termos tipo textual e gênero
textual, vimos como relevante, antes de discorrermos sobre o tema
propriamente dito, apresentar uma definição concisa e clara, capaz de mostrar
as diferenças com nitidez. Para tanto, baseamo-nos em autores como Douglas
Biber (1988), John Swales (1990), Jean-Michel Adam (1990), Jean Paul
Bronckart (1999) e Marcuschi (2002), que defendem posição similar à por nós
adotada.
•
Tipo textual designa uma espécie de construção teórica definida pela
natureza lingüística de sua composição. Ou seja, abrange um conjunto limitado
104
de categorias teóricas determinadas por aspectos lexicais, sintáticos, relações
lógicas, tempo verbal. Em geral, abrangem categorias do tipo: narração,
argumentação, exposição, descrição e injunção.
•
Gênero textual refere os textos materializados que encontramos em
nossa vida diária e que apresentam características sócio-comunicativas
determinadas pelo canal, estilo, conteúdo, composição e função. Ao contrário
dos tipos textuais, os gêneros são praticamente ilimitados: carta comercial,
carta pessoal, carta eletrônica, bate-papo virtual, bilhete, telefonema, entre
outros.
4.1.3 Brevíssimo histórico
Partindo do princípio de que a comunicação verbal supõe a existência
de gêneros do discurso, e que estes são instrumentos para agir em situações
de linguagem, faz-se necessária a análise de suas características no processo
ensino/aprendizagem, servindo como instrumento para o leitor identificar e
reconhecer a diversidade de textos com os quais tem contato, ampliando,
assim, a capacidade de manejar toda a gama heterogênea dos gêneros do
discurso, tanto orais quanto escritos.
Desde Platão e Aristóteles, é possível observar um interesse pela
noção de gênero: primeiro, quando da distinção entre poesia e prosa; depois,
com a diferença entre lírico, épico e dramático; por último, com a oposição feita
entre tragédia e comédia (BRANDÃO, 2001, p. 257).
Segundo a autora, a classificação dos discursos também é um legado
da Retórica Antiga, que reconhecia nesses três tipos: o deliberativo, dirigido a
um auditório a quem se aconselha ou dissuade; o judiciário, no qual o orador
acusa ou se defende; e o epidítico, cujo discurso elogia ou repreende os atos
do cidadão.
Assim, o estudo dos gêneros, longe de ser algo novo e atual, surgiu
entre os antigos e vem sendo retomado com força total desde os anos 60, junto
com a Lingüística de Texto, a Análise Conversacional e a Análise do Discurso
105
(MARCUSCHI, 2002, p.3). A inovação, segundo Tomachevski (1965), é
substituir a classificação lógica por uma classificação pragmática e utilitária que
leve em conta unicamente a distribuição do material nos quadros definidos, já
que a distinção é sempre histórica, justificada para um dado tempo.
O critério de classificação nos é tão intrínseco e necessário que, sem
ele, nossa apreensão dos enunciados produzidos seria provavelmente
prejudicada, ficando submersos pela diversidade absoluta, frente à impressão
caótica que as regularidades sintáticas certamente não compensariam (ADAM,
1990).
Como afirma Bakhtin (1992, p.302), a comunicação verbal seria quase
impossível se não existissem os gêneros do discurso e se não os
dominássemos, ou se tivéssemos de criá-los pela primeira vez no processo da
fala; ou ainda se tivéssemos de construir cada um de nossos enunciados.
Entretanto, sabemos que cada esfera de utilização da língua elabora tipos
relativamente estáveis, sendo a adoção de um gênero de discurso uma escolha
determinada em função da especificidade de uma esfera dada da troca verbal,
como salienta o autor.
Para ele, desde o início somos sensíveis ao todo discursivo,
aprendendo a moldar nossa fala às formas do gênero e, ao ouvir a fala do
outro, sabendo de imediato, bem nas primeiras palavras, pressentir o gênero,
adivinhar o volume (a extensão aproximada do todo discursivo), a dada
estrutura composicional, prever o fim.
É com Bakhtin também que encontramos a distinção entre os gêneros
de discursos primários (simples) e gêneros de discursos secundários
(complexos). Os primeiros (conversa de salão, conversa sobre temas
cotidianos ou estéticos, carta, diário íntimo, bilhete etc.) constituídos pelos da
vida cotidiana, mantêm uma relação imediata com as situações nas quais são
produzidos; os segundos (romance, editorial, tese, palestra, anúncio, livro
didático etc.) presentes nas circunstâncias de uma troca cultural mais complexa
e relativamente mais evoluída, repousam sobre instituições sociais e tendem a
explorar e a recuperar os discursos primários. Para Schneuwly (1993), que
retoma os conceitos de gêneros primários e secundários formulados por
Bakhtin, aqueles são espontâneos, enquanto esses, não.
106
Em meio à heterogeneidade dos textos com os quais nos defrontamos
no campo da linguagem, afirma Brandão (2001), torna-se necessária sua
identificação, organização e ordenação visando a um melhor entendimento,
donde a adoção gêneros de discurso que correspondam às necessidades
peculiares das mais variadas situações de interação social. Para Charles
Bazerman (2005), a maioria dos gêneros tem características de fácil
reconhecimento que sinalizam a espécie de texto que são. Segundo ele, essas
características estão intimamente relacionadas com as funções principais ou
atividades realizadas pelo gênero.
Convém lembrar que um gênero não é uma forma fixa, cristalizada de
uma vez por todas e que, portanto, deve ser tratado como um bloco
homogêneo. Ao contrário, os gêneros do discurso, como afirma Bakhtin (1992),
se comparados às formas da língua, são muito mais mutáveis, flexíveis. Os
gêneros são marcados pela heterogeneidade e pela interdiscursividade, não
são
categorias
taxonômicas
para
identificar
realidades
estanques
(MARCUSCHI, 2002, p.3).
Para Bronckart (2000), qualquer espécie de texto pode atualmente ser
designada em termos de gênero e que, portanto, todo exemplar de texto
observável pode ser considerado como pertencente a um determinado gênero.
Segundo o autor, os gêneros são instrumentos de adaptação e participação na
vida social e comunicativa, o que torna interessante o trabalho com eles. Afinal,
como observa Bakhtin (1992), ao falarmos, servimo-nos sempre dos gêneros
do discurso.
Bazerman (2005) afirma que para chegarmos a uma compreensão
mais profunda de gêneros precisamos compreendê-los como fenômenos de
reconhecimento psicossocial que são parte de processos de atividades
socialmente organizadas. Segundo o autor, “gêneros são tão-somente os tipos
que as pessoas reconhecem como sendo usados por elas próprias e pelos
outros”. Mais: “gêneros são o que nós acreditamos que eles sejam, isto é, são
fatos sociais sobre os tipos de atos de fala que as pessoas podem realizar e
sobre os modos como elas os realizam”. Na opinião dele, “os gêneros
emergem nos processos sociais em que pessoas tentam compreender umas
107
às outras suficientemente bem para coordenar atividades e compartilhar
significados com vistas a seus propósitos práticos”.
Por fim, Oliveira e Paiva (op.cit) define gêneros como
sistemas discursivos complexos, socialmente construídos pela
linguagem, com padrões de organização facilmente
identificáveis, dentro de um continuum de oralidade e escrita,
configurados pelo contexto socio-histórico que engendra as
atividades comunicativas.
4.2 Gêneros emergentes x gêneros preexistentes
Neste tópico apresentaremos os gêneros em estudo, quais sejam,
carta, diário, blog, e-mail e SMS, suas respectivas definições, origens,
características, classificações e funções, a fim de melhor entendermos a
relação entre eles e o uso das abreviações.
São várias as polêmicas que giram em torno da originalidade, fascínio
e função dos gêneros emergentes no meio digital, dentre eles o e-mail e o blog.
Parte delas parece estar ligada ao fato de ser necessário rever conceitos
tradicionais, bem como repensar a relação com a oralidade e a escrita, já que,
ao que parece, pela importância dada à introdução da escrita eletrônica,
estamos caminhando em direção a uma cultura eletrônica.
Por depender totalmente da escrita, esta se torna aspecto central da
tecnologia digital, apesar da integração, nesse meio, de imagens e som. São
várias as formas textuais advindas da escrita eletrônica, que tendem a certa
informalidade e a uma menor monitoração e cobrança pela fluidez do meio e
pela rapidez do tempo (MARCUSCHI, 2002, p.12).
Alguns dos gêneros virtuais nos permitem observar, na expressão de
Crystal (2001, p.170), a linguagem em seu estado mais primitivo; como
também a notável versatilidade lingüística visível entre as pessoas comuns,
particularmente os jovens.
O que há são estratégias da língua falada nessas novas formas de
escrita, dentre elas a produção de enunciados mais curtos. Esse fato faz da
escrita digital uma escrita mais amigável e mais próxima da fala, o que permite
108
uma maior interação entre fala e escrita. Na visão de Crystal (2005, p.90), a
comunicação mediada por computador não é idêntica à fala ou à escrita, mas
exibe certas propriedades seletivas e adaptáveis presentes em ambas. Para
ele, temos não uma linguagem falada que foi escrita, mas uma linguagem
escrita que foi empurrada em direção à fala, conforme vimos no Capítulo 1.
No que tange às abreviações, a escrita em alguns gêneros faz largo
uso delas, sendo boa parte artificial, e por isso passageira. Outras, se firmam e
vão sendo reconhecidas como próprias do meio, segundo Marcuschi (2001, p.
35).
Na opinião de Halliday (1996, p. 354), o impacto das novas formas de
tecnologia está desconstruindo toda a oposição entre fala e escrita, visto que
nos gêneros do meio virtual a escrita se dá numa certa combinação com a fala,
manifestando, na expressão de Marcuschi (2001, p.36), um hibridismo ainda
não bem conhecido. Para esse autor, está se constituindo um novo formato de
escrita numa relação mais íntima com a oralidade do que a existente.
Conforme aludido anteriormente, faremos a exposição dos gêneros
aqui analisados, iniciando com a origem de cada um, sua definição,
classificação e breve histórico, a fim de nos familiarizarmos e melhor
entendermos a função deles na sociedade e na nossa vida.
4.2.1 O gênero carta
4.2.1.1 Definição96
Empréstimo antigo e latinizado do grego Khárt‘s, o termo carta
s.f.(1254 cf.IVPM), charta97, ae ou carta, ae, ‘folha de papiro preparada para
receber a escrita; folha de papel (feito antigamente da entrecasca do papiro)’,
significa mensagem, manuscrita ou impressa, a uma pessoa ou a uma
96
O gênero carta surgiu como carta comercial no início do século XVII e só após os meados
daquele século se tornou privado (MARCUSCHI, 2004).
97
Carta ou charta tinha o caráter de documento e ganhou difusão na Idade Média (PESSOA,
2002).
109
organização, para comunicar-lhe algo 2 p.ext. tal mensagem, fechada num
envelope, geralmente endereçado e freqüentemente selado 3 m.q. DIPLOMA
(‘documento oficial’) 4 JUR documento, título probatório ou aquisitivo de direitos
<c. de crédito> 5 documento (título, atestado, autorização) passado por
autoridades civis, militares etc. <c. de recomendação> 6 SP carteira de
motorista (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa).
4.2.1.2 Classificação
Ainda em Houaiss (op.cit.) são registradas várias locuções do vocábulo
carta, por nós aqui apresentadas em forma de classificação98, a saber:
• Carta aberta: carta que se dirige publicamente a alguém através dos órgãos
de imprensa;
• Carta avocatória: JUR ordem de juiz de instância superior para que o de
instância inferior lhe remeta os autos do processo;
• Carta batimétrica: CART mapa em que o fundo do mar é representado por
curvas contínuas de profundidade;
• Carta branca: 1 carta de baralho sem figura 2 autorização que se confere a
alguém para agir do modo que julgue melhor; plenos poderes;
• Carta celeste: ASTR representação, em superfície plana, de determinada
região da esfera celeste;
• Carta circular: a que é endereçada, simultaneamente, a vários destinatários;
• Carta citatória: JUR P mandado de citação;
• Carta comendatícia: ECLES ver COMENDATÍCIA;
• Carta constitucional: JUR m.q. CONSTITUIÇÃO;
• Carta credencial: DIPL carta de um governo soberano a outro que apresenta
um diplomata que o representará;
• Carta de á-bê-cê: m.q. CARTA DO ABC;
• Carta de abono: JUR 1 documento de garantia da solvabilidade de alguém
até certo limite 2 a que atesta a idoneidade de uma pessoa;
• Carta de adjudicação: JUR documento que assegura judicialmente a
transferência dos bens adjudicados ao adjudicatário;
98
Embora seja extensa a lista, a finalidade da mesma é tornar pública a variedade desse
gênero para todos quantos desejarem saber.
110
• Carta de aforamento: JUR escritura pela qual se constitui a enfiteuse; carta
de foro;
• Carta de afretamento: MAR m.q. CARTA PARTIDA;
• Carta de alforria: HIST documento que concedia liberdade ao escravo;
• Carta de arrematação: título de propriedade que recebe o rematante de bens
vendidos em leilão;
• Carta de condução: P carteira de motorista;
• Carta de correntes: CART mapa que delineia as direções, extensões e
velocidades das correntes oceânicas;
• Carta de corso: JUR MAR ant. m.q.CARTA DE MARCA;
• Carta de crédito: ECON JUR autorização de um banqueiro ou comerciante a
seu correspondente, para que ponha a disposição de um terceiro determinada
soma de dinheiro dentro de certo prazo;
• Carta de emancipação: JUR título de aquisição de capacidade civil plena
antes de completada a maioridade (21 anos);
• Carta de fiança: JUR documento no qual alguém se obriga solidariamente
pelo pagamento de dívida ou obrigação de outrem;
• Carta de foro: JUR m.q. CARTA DE AFORAMENTO;
• Carta de instrução: MAR documento especial do Estado Maior da Armada,
ou de comandante de teatro marítimo de operações, que fixa missão e garante
iniciativa a oficial subordinado;
• Carta de marca: JUR MAR ant.autorização escrita dada por Estado
beligerante para que particulares armem seus navios por sua conta e ataquem
o inimigo; carta de corso, licença de corso;
• Carta de marear: CART MAR ant.m.q. CARTA NÁUTICA;
• Carta de Mercator: CART m.q. CARTA REDUZIDA;
• Carta de navegação: CART MAR m.q. CARTA NÁUTICA;
• Carta de partilha: JUR carta ou título expedido aos herdeiros, para haveres
do casal ou herança jacente à parte que lhes pertence; formal de partilha;
• Carta de piloto: MAR documento que autoriza alguém a exercer as funções
de piloto do navio;
• Carta de prego: MAR carta fechada que, contendo determinações, é
entregue ao comandante de um navio e só deve ser aberta por ele em
momento determinado durante a viagem;
• Carta de privilégio: JUR documento que outorga um privilégio ou uma
concessão;
• Carta de reconhecimento: CART a que é elaborada a partir de
reconhecimentos topográficos, sem muita precisão;
• Carta de saúde: MAR ant.documento que, passado a um navio, declara o
estado sanitário do porto de partida;
111
• Carta de ventos: CART mapa no qual se indicam os ventos predominantes e
os dias em que sopram ou outros, com previsões que cobrem períodos que vão
de alguns meses a um ano;
• Carta de vinhos: relação dos vinhos disponíveis num restaurante ou bar;
• Carta dimissória: ECLES carta em que um prelado autoriza outro a conferir
ordens sacras a um seu diocesano; letra dimissória _tb. se diz apenas
dimissória;
• Carta do abc: livro em que se aprendem as primeiras noções de leitura; carta
de á-bê-cê, cartilha;
• Carta estratégica: MAR MIL mapa ou carta geográfica us. para estudo e
solução de problemas estratégicos;
• Carta fora do baralho: fig. pessoa que perdeu sua força, influência ou
prestígio;
• Carta geográfica: CART GEO representação plana da distribuição dos
fenômenos geográficos na superfície da Terra; mapa;
• Carta geológica: CART GEOL representação espacial de informações
geológicas, como rochas, estruturas, depósitos minerais e localidades
fossilíferas, feita nos cortes cartográficos do padrão internacional;
• Carta geral: MAR mapa que abrange grande extensão da superfície terrestre
(um continente, um oceano etc.);
• Carta hidrográfica: CART MAR representação de região hidrográfica,
indicando costas, ilhas, baixios, correntezas etc. importantes para a
navegação;
• Carta isófota: ASTR carta de uma região do céu com indicação das isófotas;
• Carta magna: JUR m.q. CONSTITUIÇÃO;
• Carta náutica: CART MAR mapa elaborado para navegação, contendo
geralmente maior parte de representação de trechos de mar do que de terra;
carta de navegação;
• Carta orobatimétrica: CART OCN mapa que representa o relevo submarino;
• carta partida: MAR documento de contrato de fretamento de navio mercante;
carta de afretamento [Antigamente rasgava-se o documento em duas metades,
cada uma ficando com uma das partes contratantes, unindo-se apenas no fim
da viagem.]
• Carta patente: 1 JUR carta representada pelo título de privilégio de invenção.
cf. carta de privilégio 2 JUR título oficial de uma concessão de privilégio para o
funcionamento de bancos, companhias de seguros, financeiras etc. 3 MIL
documento em que se define, para o oficial das forças armadas seu posto na
hierarquia e o quadro a que pertence.
• Carta plana: CART carta em que as medidas dos graus dos paralelos
extremos são iguais às do paralelo médio.
• Carta polar: CART carta em que o círculo máximo tangencia um dos pólos da
Terra.
112
• Carta precatória: JUR carta que um juiz dirige a outro, de circunscrição
diferente, para que este faça inquirição de testemunha, citação ou outros atos
jurídicos necessários para que o primeiro juiz tenha condições de julgar. tb. se
diz apenas precatória.
• Carta reduzida: CART carta semelhante à carta plana, mas onde os
paralelos se afastam à medida que a latitude aumenta; carta de Mercator.
• Carta régia: carta que, sem passar pela chancelaria (‘ministério’), um
monarca dirige diretamente a uma autoridade.
• Carta revocatória ou revogatória: DIPL JUR carta enviada de um governo a
outro, encerrando a missão do diplomata que o representava.
• Carta rogatória: 1 JUR carta em que se faz a requisição de atos processuais
que devem ser realizados em território estrangeiro 2 JUR carta enviada de um
país para outro (ger. por via diplomática), solicitando o cumprimento, no
território deste último, de determinado ato 3 ECLES carta em que paroquianos
de uma diocese pedem a sagração de um eclesiástico. tb. se diz apenas
rogatória.
• Carta rumada: MAR ant. carta em que os ventos são indicados a partir de um
ponto central, para operações de tirar o rumo.
• Carta sinóptica: MAR carta de previsão do tempo, em que se registram
direção e força dos ventos, estado do mar, temperatura, umidade etc.
• Carta testamentária: JUR instrumento que contém as disposições de última
vontade, feitas por testamento cerrado ou particular.
• Carta testemunhal: ECLES m.q. COMENDATÍCIA.
• Carta topográfica: CART m.q. PLANTA TOPOGRÁFICA.
Para Bazerman (2005), “à medida que mais temas e transações, de
forma reconhecível, inserem-se nas cartas, o gênero, em si, se expande e
especializa”. Segundo ele, dessa maneira é que tipos distintos de cartas se
tornaram reconhecíveis e passaram a ser tratados diferentemente.
Existem, também, vários subgêneros do gênero carta99: carta pedido,
carta resposta, carta pessoal, carta do leitor e carta de opinião (CANESTRARO
& OLIVEIRA, 2003). No nosso estudo, no entanto, restringiremos nossa análise
aos subgêneros carta do leitor e carta pessoal.
99
Para Bazerman (2005), as cartas desempenharam um papel no surgimento de gêneros
distintos: o primeiro artigo científico, a patente, o relatório dos acionistas, os relatórios internos
das empresas e as formas de registros regularizando correspondências internas das empresas.
113
4.2.1.3 Visão panorâmica
Em artigo intitulado Da carta a outros gêneros textuais, Pessoa (2002)
afirma que a carta é um dos gêneros textuais mais importantes para a história
das línguas. Segundo ele, as cartas eram utilizadas pelos letrados e estadistas,
desde a Antiguidade, com o objetivo de se manterem informados.
Bazerman (2005) afirma que as cartas precederam o aparecimento de
documentos públicos mais visíveis, tais como cartazes, manifestos e panfletos
sediciosos. Segundo esse autor,
as cartas não somente forneceram o meio para o
desenvolvimento de gêneros importantes do direito, do governo
e da política, mas também dos vários instrumentos de dinheiro e
crédito que medeiam os sistemas modernos bancários e
financeiros.
Para ele, o jornal, a revista científica e o romance, principais tipos de
escrita que surgiram na cultura impressa, parecem ter alguma conexão com a
carta.
O gênero carta procura estabelecer uma comunicação por escrito com
um destinatário ausente, identificado no texto por meio do cabeçalho100. A
estrutura da carta reflete-se claramente em sua organização espacial:
cabeçalho, que explicita local e data da produção, os dados do destinatário e a
forma de tratamento empregada para estabelecer o contato; corpo, onde a
mensagem e a despedida são desenvolvidas, incluindo saudação101 e
assinatura102, que introduz o autor no texto. Também a escolha do estilo de
escrita que será empregado nesse gênero é regida por alguns fatores como
grau de familiaridade e papel social hierárquico entre os interlocutores. Ou seja,
se o destinatário for um desconhecido ou uma pessoa que ocupa um nível
superior, chefe ou diretor, o texto apresenta-se no estilo formal.
100
Conforme lemos em Canestraro & Oliveira (2003).
A arte de escrever cartas enfatizou a saudação, identificando e conferindo respeito aos
papéis sociais e às posições de emissor e receptor, colocando ambos dentro de relações
sociais institucionalizadas (MURPHY APUD BAZERMAN, 2005).
102
Segundo Marcuschi (2002, p.30), um gênero pode não ter uma determinada propriedade e
ainda continuar sendo aquele gênero. O autor dá o exemplo da carta pessoal, que continua
sendo uma carta mesmo que a autora tenha esquecido de assinar o nome no final e só tenha
dito no início: “querida mamãe”.
101
114
Tais afirmações corroboram a tese de que diz ser ‘a sintaxe de quem
escreve sensível à proximidade psicológica do leitor103. Ou seja, um mesmo
gênero (uma carta) pode estar sendo escrito para dois destinatários e a
proximidade ou intimidade de quem vai receber a carta influi na forma
lingüística em geral usada pelo seu autor. Dessa forma, quanto mais distante
for o leitor pretendido, maior a complexidade sintática do texto escrito. Essa
tese também é partilhada por Marcuschi (2002, p.20). Para ele, a variação na
relação emissor-receptor, no caso de uma carta, pode interferir na seleção
lexical: uma carta pessoal a um amigo versus uma circular a toda uma
comunidade.
Para Bazerman (2005), a carta, com sua comunicação direta entre dois
indivíduos dentro de uma relação específica em circunstâncias específicas,
parece ser um meio flexível no qual muitas das funções, relações e práticas
institucionais podem se desenvolver. Segundo esse autor, a riqueza e a
multiplicidade das práticas antigas de escrever cartas conferiram a esse gênero
uma poderosa força comunicativa dentro da antiga Igreja cristã104.
Em se tratando da tipologia, as cartas podem ser constituídas por
diferentes tipos textuais: narração, argumentação, descrição, explicação e
injunção, cujas funções de linguagem são diversas: expressiva, apelativa e
informativa105. Bazerman (2005) afirma que até meados do século XX, nos
Estados Unidos, os principais documentos de patentes mantiveram o formato
de uma carta.
Esse gênero permite ainda a concretização de atos de fala diversos,
quais sejam: pedido, cobrança, intimação, prestação de contas, agradecimento,
notícias de familiares, propaganda e outros, se diferenciando em intenções e
formas de realização, circulando em diferentes áreas de atividades, com
funções comunicativas várias. Quanto à escolha da pessoa do discurso – 1ª
pessoa do singular, do plural ou 3ª pessoa -, esta varia de acordo com a
intenção do autor, resguardando a especificidade do texto106.
103
Watson (apud MARTLEW, 1983).
À medida que a Igreja se expandiu, unindo muitos povos, as cartas se tornaram importantes
para manter a burocracia e os laços da comunidade (CONSTABLE APUD BAZERMAN, 2005).
105
Canestraro & Oliveira, 2003.
106
Canestraro & Oliveira, 2003.
104
115
Mesmo diante de tantas variações funcionais que são associadas ao
gênero carta (carta de amor, carta comercial, carta de recomendação, cartas
pessoais, convites, solicitações, cartas de reclamação), ‘o espaço interno da
carta está aberto para os mais variados tipos de comunicação’107. Dessa forma,
uma carta de amor pode conter uma recomendação; uma carta pessoal, um
convite, e assim por diante. Conforme se lê em Paredes Silva (1996, p. 5), a
configuração típica desse gênero textual é dada pelo formato externo108, que
compreende cabeçalho, data, assinatura e algumas expressões formulaicas
freqüentes em suas seções iniciais e finais.
Uma carta pode ser escrita com vários propósitos e, também, alcançar
o mesmo propósito utilizando diferentes meios, a saber: escolhas lexicais,
variando de expressões formulaicas de polidez a modalizações, que abrangem
atenuadores ou acentuadores da força ilocucionária (PAREDES SILVA, 1996).
Tal visão está de acordo com o pensamento de Bakhtin (1992, p. 312),
segundo o qual ‘selecionamos as palavras segundo as especificidades de um
gênero’. Mais: ao escolher a palavra, partimos das intenções que presidem ao
todo do nosso enunciado, e esse todo intencional é sempre expressivo (idem,
ibidem).
É com base nessa assertiva que iremos analisar o gênero carta e seus
subgêneros carta de leitor e carta pessoal, bem como sua relação com o uso
acentuado ou não das abreviações, a fim de sabermos se, de acordo com o
estilo, informante e propósito comunicativo, o uso desse recurso de linguagem
decresce ou não no referido gênero.
4.2.1.4 Cartas pessoais X cartas oficiais
107
Wilson, 2000.
Para Bazerman (2005), mesmo um documento de significado legal geral como a Carta
Magna (1215) segue os princípios da escrita de cartas, a começar pela saudação que define
posições sociais e busca a boa vontade: “John, by the Grace of God, king of England, lord of
Ireland...”.
108
116
Inicialmente, faz-se necessária a distinção entre dois tipos básicos de
carta: a correspondência oficial e/ou comercial e a carta pessoal. Esta é por
nós utilizada a fim de estabelecermos contato com parentes, amigos,
namorados e outros. Nesse tipo de carta predomina o uso de uma linguagem
mais distensa, menos elaborada, mais coloquial, uma vez que a relação que
existe entre remetente e destinatário é de intimidade considerável. Outra marca
desse tipo de carta é que aquele que a escreve, o remetente, é também quem
a assina.
Pessoa (2002) diz que no século XVI as cartas pessoais eram poucas,
e guardavam um certo teor público. Segundo ele, na Antiguidade e na Idade
Média a carta enquanto escrito espontâneo e de natureza pessoal não tinha
essa denominação, havendo para esse fim o termo litterae, de tradição latina.
Entretanto, afirma ele, no século XVIII ela ganha um novo significado,
passando a se constituir numa espécie de telefone da época, revelando uma
língua mais natural e mais próxima do cotidiano, influência direta do movimento
romântico daquele período.
Quanto às oficiais/comerciais, estas geralmente nos são enviadas por
poderes políticos ou empresas privadas109. Ao contrário das pessoais, esse tipo
de carta apresenta uma língua padronizada110, via de regra, escrita num nível
formal, mais tenso, elaborado, visto que a relação remetente/destinatário não
apresenta grau algum de intimidade entre os participantes. Ainda que venham
assinadas por uma pessoa física, o emissor é uma pessoa jurídica111. Segundo
Stowers (apud BAZERMAN, 2005), as cartas evoluíram de usos formais e
oficiais para incluir expressões de preocupação pessoal e, posteriormente,
mensagens particulares112.
Segundo Bazerman (2005), a carta comercial no início deu conta da
comunicação necessária. Contudo, ressalta o autor:
a necessidade crescente de uma eficiente manutenção dos
registros e arquivos gerados pela correspondência em
109
Multas de trânsito, mudanças de endereço e telefone, propostas para aquisição de cartões,
entre outras.
110
Geralmente elas iniciam por “Vimos por meio desta...”.
111
Órgão público ou empresa privada
112
Na Inglaterra, algumas famílias registraram suas vidas e sua época em cartas que
projetaram as particularidades e personalidades dos correspondentes.
117
expansão levou ao desenvolvimento de formulários impressos,
memorandos, relatórios, circulares e outros gêneros.
4.2.2 O gênero diário
4.2.2.1 Origem
A palavra diário foi registrada pela primeira vez no Oxford English
Dictionary, durante o Renascimento113 (OLIVEIRA, 2004). Segundo o dicionário
Houaiss da língua portuguesa (2001), a entrada do termo diário na língua
portuguesa deu-se no ano de 1744.
Derivada do latim diarǐum, ii, o vocábulo diário significava “pagamento
de um dia, registro escrito de memória que se faz cada dia”.
4.2.2.2 Definição
Conforme podemos ver em Houaiss (2001), diário, substantivo
masculino114, significa 1 escrito em que se registram os acontecimentos de
cada dia 2 periódico que se publica todos os dias; jornal. Ainda: obra em que o
autor relata cronologicamente fatos ou acontecimentos do dia-a-dia, consigna
opiniões e impressões, registra confissões e/ou meditações etc.
4.2.2.3 A tradição dos diários
Oliveira (op.cit.) descreve o gênero diário como sendo “um fenômeno
cultural” que se estabelece desde tempos remotos e tem seus primeiros
113
114
Segundo Oliveira (2004), a tradição do diarismo remonta a muitos séculos antes.
Há também a forma de adjetivo registrada nos dicionários.
118
aparecimentos
vinculados
a
uma
natureza
pública
e
comunitária,
exemplificados, por exemplo, pelas tábuas de argila encontradas recentemente
na Suméria, datadas de 3000 a.C. aproximadamente.
Segundo essa autora, o conceito de diário tem sido erroneamente
associado à idéia de uma narrativa de cunho íntimo, escrita geralmente por
mulheres, embora a gênese e a prática diarística apontem para tipos e funções
variadas de diários.
Para Margo Culley (1985), a razão de ser dessa associação está ligada
ao fato de, no século XIX, com a divisão das esferas pública e privada, os
aspectos relacionados à vida privada terem se tornado do domínio de
mulheres. Culley afirma ainda que, no final desse mesmo século, nos Estados
Unidos, os diários faziam parte do conjunto de normas de etiqueta usado na
educação de garotas, sendo então associados “à gentileza e a regras de bom
comportamento das adolescentes da época115”.
Embora estejam estreitamente relacionados à noção de privado, os
diários surgiram primeiramente como documentos públicos, escritos para
preencher funções comunitárias, sendo de forma colaborativa compostos por
muitos autores (SHARYN LOWENSTEIN et all, 1994). Segundo Lowenstein
(1994), a tradição de diários era construída por e para comunidades, o que
representa a visão que diretamente contradiz a limitada noção de diário
enquanto “pessoal” em vez de “social”.
No que concerne ao caráter privado do diarismo, seu surgimento ocorre
no século X no oriente, precisamente no Japão, com as mulheres da corte de
Heian, cuja prática compreendia a manutenção de livros de cabeceira (pillow
books) privados. Mas é ao escritor inglês Samuel Pepys116 que é atribuído o
marco dos diários pessoais. Somente no final do século XIX é que se pôde
falar no diário como o “livro do eu”.
Em Era uma Vez o Tempo – Diário V, Fernando Aires (1999), afirma
que o diário é, de todos os gêneros, o que mais se aproxima do tempo
cronológico, visto que seu autor procura fixar instantes acontecidos,
115
Ainda hoje, século XXI, os diários íntimos pessoais estão associados a adolescentes do
sexo feminino.
116
Segundo Oliveira (2004), Pepys é considerado escritor modelo do gênero.
119
referenciando-os através de uma data, que contém o ano, o mês, o dia e às
vezes a hora. Para ele, as referências temporais explícitas são uma das
características fundamentais da escrita diarística. Segundo esse autor, ao
contrário das memórias, o diário não tem obrigação de continuidade, podendo
o diarista fazer interrupções e escrever o que quiser na ordem em que desejar.
Ou seja, não precisa se preocupar com a coerência de um enredo ou com a
lógica da narrativa.
Mikhail Bakhtin (1992), em Estética da Criação Verbal, considera o
diário como um gênero discursivo de tipo primário por este estar inserido num
contexto de comunicação verbal espontânea. Segundo ele, o diário enquanto
estilo íntimo revela uma fusão entre locutor e destinatário, sendo muitas vezes
o diarista o próprio destinatário.
Em Cadernos de Lanzarote II, José Saramago (1997) usa as seguintes
palavras para definir diário: Escrever um diário é como olhar-se num espelho
de confiança, adestrado a transformar em beleza a simples boa aparência ou,
no pior dos casos, a tornar suportável a máxima fealdade. Segundo o autor,
ninguém escreve um diário para dizer quem é. A título de exemplo, elegemos
um excerto de “O Amanuense Belmiro”, de Cyro dos Anjos, onde o
personagem Belmiro faz o seguinte resumo do diário: Venho da rua oprimido,
escrevo dez linhas, torno-me olímpico. Dessa forma, o autor revela o caráter
‘maqueador’ que o diário possui, ao conter em suas linhas apenas atos
heróicos.
4.2.2.4 A classificação dos diários
Há várias classificações que traçam o perfil da tradição do diarismo,
revelando as diversas funções desempenhadas pelos diários. Entre os
pesquisadores do assunto, destacamos três, a saber: Robert A. Fothergill,
conceituado pesquisador inglês, que propõe ter o modelo de diário íntimo
evoluído a partir de quatro formas de proto ou pré-diários: diários públicos,
diários de viagem, diários de registro pessoal - análogos aos livros
comunitários (commonplace books) – e diários de consciência ou espirituais;
120
Thomas Mallon, estudioso inglês, classifica os diários em sete tipos: diários de
cronistas,
viajantes,
peregrinos,
criadores,
apologistas
confessores
e
prisioneiros; por último, Ronald Blythe, autor inglês, cujo critério de
classificação utilizado se baseia no posição dos autores dos diários. Esse
pesquisador classifica os diários em 13 tipos: o diarista como testemunha, o
diarista apaixonado, o diarista e o casamento difícil, o diarista na vila, o diarista
como naturalista, o diarista doente, o diarista na loja, o diarista na guerra, o
diarista como artista, diários e realeza, o diarista em rota, o diarista em
desespero, o diarista e a morte.
Na nossa pesquisa, apenas destacaremos de forma sucinta, a
classificação de Fothergill, embora não seja a única sobre a gênese dos
diários, como vimos acima.
•
Diários públicos: esta categoria é considerada tão antiga quanto a própria
escrita. Essa noção está ligada à tradição de escrita comunitária117. Segundo
Lowenstein, livros e recordações de registros contábeis antigos, registros
domésticos romanos chamados Commentarii, crônicas chinesas do ano 56
d.C., entre outras, são exemplos da função de cronicar e manter um registro.
•
Diários de viagem: esta categoria agrupa relatos de experiências de
diaristas em torno de viagens. Não tão comuns nos séculos XV e XVIII, esses
diários refletiam as viagens de caráter exploratório ou não, informando sobre a
geografia específica, fauna e flora, terreno, curiosidades sobre os povos
nativos, bem como o sentimento associado a cada uma das experiências.
•
Diários de memória pessoal (commonplace books): esta terceira categoria
está relacionada com os diários de memória pessoal, análogos aos
commonplace books (livros de família). Esse tipo de diário é considerado um
ancestral dos diários de leitura, quotas, observações, notas e desenhos feitos
por pessoas letradas. Por ser rara e cara a publicação de livros, esse tipo de
diário foi muito útil no trabalho de estudantes. Dentre as pessoas de renome
que se utilizaram dessa prática encontra-se o pintor Leonardo da Vinci, que
117
Função que hoje é desempenhada pelos jornais.
121
manteve os cadernos de anotações por 40 anos, e Dostoievski, com três
cadernos enquanto escrevia Crime e Castigo.
•
Diários de consciência ou espirituais: esta é a última forma de pré-diários
classificados por Fothergill. Segundo Mallon, a prática desses diários começou
no século XVI entre o clero reformado de East Anglia118, que tinha como
preocupação minimizar o sentimento de culpa relacionado à fé em Deus. A
prática de escrever diários119, ressalta Mallon, tornou-se muito comum
enquanto meio de auto-examinação e auto-punição, tanto entre católicos,
Metodistas quanto entre os protestantes.
4.2.3 O gênero e-mail
Frente às tecnologias emergentes nos meios de comunicação, vemonos obrigados a, ao menos, ter noção do que vêm a ser gêneros como e-mail,
blog, Short Message Service (SMS) etc. Afinal, o homem é um “ser social”, e a
sociedade, por sua vez, está cada vez mais informatizada. Segundo Levacov
(1996), um número crescente de atividades sociais tem-nos feito sentir o
impacto da mídia digital. Para ela, todas essas tarefas precisam adequar-se a
esse novo referencial.
Vejamos, pois, a trajetória de alguns desses vários recursos utilizados
com o advento da informática, a começar pelo mais antigo de que dispõe a
Internet, o e-mail.
4.2.3.1 Origem
118
Grupo secreto que reunia dissidentes da Rainha Elizabeth (OLIVEIRA, 2004).
Schiwy (1996) preparou uma relação contendo as propostas mais comuns a todos quantos
mantêm um diário: alargar a autoconsciência; explorar a identidade pessoal; ter um confidente;
colocar sentimentos e emoções sobre o papel; criar senso de continuidade em nossas vidas;
preservar a memória de pessoas, eventos, de nós mesmos; lutar contra a descontinuidade,
mudança, perda e angústia; explorar impulsos criativos; capturar idéias para estórias, poemas
e outros projetos; recordar e explorar sonhos; celebrar graças e sucessos; engajar-se em um
diálogo com o mundo em torno de nós; descobrir o que é sagrado em nossas vidas; aprofundar
nossas jornadas espirituais; relembrar membros familiares e amigos queridos; arrumar
pensamentos e clarear idéias; esquadrinhar o desejo do inconsciente, entre outras.
119
122
Conforme lemos em Oliveira e Paiva (2004), o e-mail surgiu em 1971,
quando do envio da primeira mensagem de um computador para outro, feita
por Ray Tomlinson, utilizando o programa SNDMSG120 que acabara de
desenvolver. Segundo Tomlinson, o primeiro uso do correio em rede anunciou
sua própria existência. Ao contrário do que temos hoje, a extensão do e-mail
era relativamente curta – não ultrapassava algumas linhas – e sua recepção
era muito lenta.
Segundo Assis (2002, p.194), ler ou responder a e-mails na década de
70 demandava esforço e, sobretudo, paciência:
(...) o texto simplesmente era despejado na tela ou fora, na
impressora, e nada separava as mensagens. Além disso, para
se chegar à última mensagem, era preciso passar
obrigatoriamente por todas novamente. Para muitos
operadores, o único meio de ler o correio era ligar o teletipo e
imprimir metros e metros de texto (....) Também não havia
ainda a função Responder (Reply), o que obrigava o usuário a
começar uma nova mensagem sempre que o interesse fosse
responder a uma mensagem recebida.
4.2.3.2 Definição
Do inglês electronic mail, “correio eletrônico”, o e-mail é uma forma de
comunicação escrita, normalmente assíncrona121, que possibilita remessa/troca
de mensagens entre usuários do computador, suporte desse gênero. O termo
e-mail está sendo empregado, segundo Zanotto (2005, p.110), com três
sentidos. Para esse autor, dependendo do contexto, o e-mail pode significar
gênero de texto, endereço eletrônico ou sistema de transmissão da mensagem
eletrônica (ou canal).
Oliveira e Paiva (2004) assim define o e-mail:
Além do SNDMSG, Tomlinson também desenvolveu o READMAIL para sua leitura.
Em alguns casos a remessa de mensagens entre os interlocutores pode variar de um tempo
mínimo (quando ambos estão em conexão on-line) a defasagem de dias, semanas e meses, a
depender dos usuários. Há casos onde a resposta nunca chega, o que dá a impressão de o
destinatário não ter recebido ou não querer responder.
120
121
123
Um gênero eletrônico escrito, com características típicas de
memorando, bilhete, carta, conversa face a face e telefônica,
cuja representação adquire ora a forma de monólogo ora de
diálogo e que se distingue de outros tipos de mensagens
devido a características bastante peculiares de seu meio de
transmissão, em especial a velocidade e a assincronia na
comunicação entre usuários de computadores.
Por apresentar características semelhantes às das cartas, Yates (2000)
questiona se os e-mails não seriam novas versões de meios já estabelecidos
(como as cartas pessoais), no que tange ao formato textual bem como aos
diferentes níveis de linguagem. O e-mail foi considerado uma ameaça aos
correios tradicionais e às cartas escritas, visto que esse gênero não
acompanha as mudanças da sociedade moderna, na qual a filosofia que
impera é a de que “tempo é dinheiro”. Sendo assim, o e-mail seria uma forma
de comunicação rápida e eficiente, que evita desperdício de tempo e gastos
com servidor.
4.2.3.3 Características
A noção de e-mail está associada à idéia de endereço, daí conter
obrigatoriamente122 todas as informações necessárias para enviar uma
mensagem para alguém:
1. Endereço do remetente: automaticamente preenchido;
2. Endereço do receptor: deve ser inserido (quando não for uma resposta);
3. Possibilidade de cópias: a ser preenchido, visível ou não ao receptor;
4. Assunto: deve ser preenchido;
5. Data e hora: preenchimento automático;
6. Corpo da mensagem com uma saudação, texto e assinatura.
Os endereços utilizados no e-mail possuem duas partes separadas
pelo sinal @ (arroba): a identificação do usuário (user name) vem à esquerda
122
Ao contrário da carta, que pode deixar de conter algum dos dados do endereço e mesmo
assim chega ao destinatário, no e-mail a troca ou ausência de um caracter impossibilita o envio
da mensagem ou, caso exista algum outro semelhante, irá para outro interlocutor.
124
do símbolo; o que está à direita, denominado domínio, identifica o provedor ao
qual o usuário tem acesso. Ex: [email protected] .
QUADRO 6
e-mail como endereço eletrônico
fasousi
Nome
@
Arroba
Nome ou
abreviatura
do nome do
proprietário
da caixa de
correio
Símbolo com
o sentido de
“em” (lugar
em que);
designa o
endereço do
provedor
bol.
Nome do
servidor
Identificação
da máquina
encarregada
de receber e
enviar as
mensagens
com.
Organização
Br
País
Abreviatura que
indica o tipo de
organização à
qual pertence o
endereço
(comercial,
governamental,
organizacional).
Abreviatura
de duas
letras que
indica o país
a que
pertence o
endereço
Adaptado de ZANOTTO, Normelio. E-mail e carta comercial: estudo contrastivo de
gênero textual. Rio de Janeiro, RJ: Lucerna; Caxias do Sul, RS: Educs, 2005.
Os programas de e-mail apresentam alguns comandos básicos123:
Send – envia uma mensagem ou arquivo;
Reply – responde a uma mensagem usando as informações de
endereçamento contidas no cabeçalho da mensagem recebida;
Delete – apaga uma mensagem;
Forward – envia uma mensagem recebida para outro usuário124.
Ex: From: [email protected];
To: [email protected];
CC:[email protected],[email protected], [email protected];
Subject (assunto da mensagem): coisas de doutorando
Message (mensagem):
Olá, colegas!
A fim de que a mensagem seja enviada de forma correta, os campos devem ser preenchidos
corretamente. A ordem do cabeçalho, entretanto, pode variar de sistema para sistema.
124
Segundo Marcuschi (2002), uma característica interessante do e-mail é a de possibilitar, aos
interagentes, a troca entre: a) um emissor e um receptor; b) um emissor e vários receptores
simultaneamente, e c) vários remetentes e um receptor ou vários remetentes para vários
receptores (esta última é mais difícil e pouco usual).
123
125
Imaginem o que me aconteceu dessa vez! O CD no qual estavam
gravados todos os meus dados foi roubado, junto com minha bolsa, hoje pela
manhã, na hora em que eu vinha para a universidade. Pode?!
Fabiana
Vários autores destacam a informalidade, a inobservância de algumas
regras ortográficas – há uma escrita que procura representar a palavra como
ela é pronunciada, por exemplo: kd por cadê, blza por beleza; além da
objetividade – geralmente não há torneios para dizer o que se pretende,
tornando o texto curto e enxuto;
e a ausência de pré-seqüências como
algumas das características do e-mail - não há uma ordem a ser seguida: ao
mesmo tempo em que se responde à mensagem, já se fala de outros tópicos,
retoma algo dito, quebrando qualquer linearidade padrão.
Em tese, as mensagens enviadas por e-mail são invioláveis e
protegidas. Contudo, algumas precauções devem ser tomadas a fim de
dificultar o acesso a pessoas que tentam violar as correspondências alheias,
entrando em sua caixa postal, lendo seus e-mails etc:
• Evitar senhas não seguras: seu login ao contrário (ex: fasousi – login,
isuosaf – senha); formadas apenas por números (ex: 191281).
Para evitar tais constrangimentos:
•
Procure mesclar letras maiúsculas e minúsculas (ex: fAsOUsI);
•
Alterne letras e números (ex: fd110204);
•
Substitua O por 0 (zero), E por 3 e L por 1 (ex: car1os3duardo).
Além desses cuidados, Oliveira e Paiva (op.cit.) chama a atenção para
um vírus conhecido por Senil125 que, não podendo ser contido sequer pelo
Norton, afeta em maior grau os que nasceram antes de 1965:
Segundo a autora, o humor faz circular na Internet piadas desse tipo relacionadas aos
principais enganos na utilização do correio eletrônico (OLIVEIRA E PAIVA, 2004).
125
126
► O vírus senil faz com que você
1. Envie o mesmo e-mail duas vezes;
2. Envie e-mail em branco;
3. Envie para a pessoa errada;
4. Envie de volta para a mesma pessoa que o enviou a você;
5. Esqueça de atachar os textos;
6. Aperte o “ENVIAR” antes de terminar a mensagem.
4.2.3.4 A linguagem dos e-mails
Em artigo intitulado “A linguagem dos Chats Desafia os Newbies”,
Viana (2000) salienta que a rapidez da comunicação via chat ou e-mail permite
uma fluência maior da linguagem, quase com a mesma rapidez da fala.
Segundo a autora, nesses ambientes as palavras foram abreviadas até o ponto
de se converterem em uma, duas ou no máximo três letras (não=n, sim=s,
de=d, que=q, também=tb, cadê=kd, tc=teclar, porque=pq, aqui=aki, acho=axo,
qualquer=qq, mais ou mas=+). Além da “economia” lingüística que há, ressalta
ela, houve um extermínio da pontuação e da acentuação126, remetendo-nos
não à etimologia das palavras, mas à fonética delas (é=eh, não=naum). Na
visão de Viana (op.cit.), os internautas, ao contrário de estarem “escrevendo
errado”, parecem estabelecer um processo no qual as mensagens são
encurtadas a ponto de serem expressas com o menor número de caracteres
possível.
Autores há que consideram o e-mail, igual à carta, variando a
linguagem
a
depender
do
destinatário:
a
linguagem
empregada
na
comunicação entre dois amigos tende a ser menos criteriosa e mais despojada.
Já a comunicação entre pessoas cujo grau de intimidade entre elas é baixo ou
nulo tende a apresentar uma maior formalidade na linguagem. Tal pensamento
corrobora a idéia de Marcuschi (2002), segundo a qual as escolhas lingüísticas
A origem “imperialista” do não uso de acentos em mensagens eletrônicas está no fato de as
primeiras plataformas de computadores, chamadas UNIX, suportarem apenas os primeiros 127
caracteres, e os acentos e a cedilha começam a partir do número 128. Além disso, toda
economia era preciosa antigamente, já que os computadores tinham o disco rígido muito menor
e a transmissão era muito mais demorada (VIANA, 2000)
126
127
sofrem interferências dependendo dos interagentes. Para esse autor, uma
carta pessoal a um amigo difere de uma circular a toda uma comunidade.
A diferença entre a carta e o e-mail se dá, conforme lemos nos sites
www.ircmail.net,
www.tche.br/e-mail.html,
www.e-
dimensao.com.br/divulgacao/midiawe./correioeletronico em relação à distância:
no primeiro, o interlocutor está, via de regra, distante; no segundo, o
destinatário pode estar na mesma empresa na qual trabalha o remetente. Na
opinião desses autores, o fator rapidez é mais relevante que a distância na
transmissão das mensagens, o que ocasiona uma linguagem marcada por
abreviações que, para eles, são típicas desse novo gênero e não ocorrem no
seu correlato, a carta.
Oliveira e Paiva (op.cit.) destaca a possibilidade de transmissão de
vários tipos de dados (textos diversos, imagem, som e vídeo) como a grande
inovação do correio eletrônico.
Nesses sites vimos que o e-mail apresenta certo estreitamento de
fronteiras entre a oralidade e a escrita, o que propicia formas comunicativas
próprias, misturando signos verbais, sons, imagens e formas em movimento.
Ainda segundo informações contidas nesses sites, os e-mails apresentam a
forte presença da oralidade, espontaneidade e palavras abreviadas. Segundo
Jonsson (1997):
As mensagens eletrônicas podem partilhar as propriedades da
carta tradicional, mas podem partilhar as propriedades do
telefonema ou a comunicação face a face. Conseqüentemente,
os e-mails transgridem os limites entre as noções tradicionais
de comunicação oral e escrita.
Dentre as inúmeras vantagens oferecidas aos usuários pelo serviço de
e-mail, podemos destacar:
• Pode ser enviado a qualquer hora e lugar;
• Dispensa a ida aos correios para postar a correspondência;
• Além de poder ter qualquer extensão, o e-mail transmite mensagens,
imagens e programas, que podem ser copiados para o computador;
• Atualmente, existem vários sites que oferecem um endereço eletrônico
grátis: www.bol.com.br, www.ig.com.br etc.
128
Talvez uma das maiores especificidades do e-mail seja permitir o
imbricamento e encadeamento de mensagens anteriores, gerando a pronta
reconstrução e recuperação da correspondência completa. Para Assis (2002, p.
130), manisfesta-se, com o imbricamento e o encadeamento,
Um novo tipo de dialogicidade, na medida em que ali se flagra
uma dinâmica de alternância de turnos, garantida quer pela
inserção de partes da mensagem a que se responde no e-mail
- resposta, quer pela permanência, nesse e-mail (providenciada
pelo computador), da mensagem a que se responde, quer,
ainda, pela própria organização dada ao e-mail-resposta, que,
em termos de ordenação de informações, procura obedecer à
seqüência de demandas da mensagem a que se responde (...)
4.2.3.5 E-mails pessoais X E-mails comerciais
Vimos acima a origem do gênero e-mail, seu conceito, características e
finalidades. Agora, vejamos a dimensão desse recurso de que dispõe o usuário
da Internet e sua funcionalidade.
Entendemos, para fins de análise, como e-mail pessoal aquele que
funciona como correspondência entre pessoas físicas, podendo ser de uma
para várias simultaneamente ou, como se dá mais comumente, de uma só
pessoa para outra ou ainda de uma instituição para uma pessoa física.
Já o e-mail comercial é aquele utilizado apenas entre pessoas jurídicas,
ou empresas, melhor dizendo, não havendo a participação de uma pessoa
física apenas, quer se trate de remetente ou destinatário.
Na área empresarial, o e-mail tornou-se uma ferramenta de
comunicação indispensável e parece ter conseguido substituir e redimensionar
a diversidade de práticas comunicativas antes existentes, tais como a circular,
o ofício e o memorando.Uma pesquisa realizada pela Federação e Centro das
Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp/Ciesp) demonstrou que, de l.700
indústrias paulistas, 83% empregam o e-mail. A explicação para o sucesso
129
desse gênero está ligada ao fato de ele ser mais eficaz, diminuir o emprego de
papel e acelerar o trabalho.
Segundo dados da Veja (2000), a mensagem eletrônica é dinâmica e
informal, devendo ser concisa e sem enrolação. Entretanto, salienta, a
ausência de cerimônia não dispensa tratamentos de respeito e cortesia:
Ao iniciar um texto, por exemplo, é de bom-tom referir-se
sempre ao destinatário pelo nome, em vez de despejar direto
as informações. Para despedir-se, ao final da redação, usar um
“atenciosamente” ou “cordialmente”, tradicionais de cartas e
fax, é mais elegante. Deixe as abreviações127 e os “emoticons”
(aqueles desenhos feitos com sinais gráficos para demonstrar
emoções para os colegas mais chegados) e evite escrever em
letras maiúsculas, que soam como se você estivesse gritando
em vez de falar.
O correio eletrônico faz circular desde correntes e piadas de amigos até
solicitações do chefe, relatórios de subordinados, contratações, decisões de
compra e venda entre outras (Veja: 2000).
Com o objetivo de não desperdiçar tempo respondendo a tudo,
tampouco lendo todo tipo de “lixo eletrônico”, algumas empresas estão
adotando regras que monitoram o uso do correio128:
• Seja conciso e só envie mensagens que tenham utilidade. Não
ajude o colega a perder tempo com bobagem;
• Não mande arquivo muito “pesado” sem antes pedir permissão.
Muitos computadores acabam travando quando o recebem;
• Se você não sabe se o arquivo é “pesado”, peça ao suporte de
informática de sua empresa para avaliar o tamanho;
• Nunca espalhe piadas, correntes ou boatos. Além de entulhar lixo
na caixa postal alheia, você pode congestionar o sistema;
127
Mais uma vez vemos a relação feita entre o uso de abreviações e a informalidade do texto,
ou a intimidade entre os locutores, fatores decisivos para a freqüência baixa ou elevada desse
recurso da língua nos textos de e-mails.
128
Algumas empresas filtram o conteúdo das mensagens de seus funcionários, a fim de
bloquear conteúdos obscenos ou racistas, além de bloquear sites inadequados e endereços de
bate-papo (Veja: 2000).
130
• Só use o comando “responder a todos” quando sua réplica for
realmente do interesse geral;
• Confira o destinatário
correspondência à pessoa errada;
da
mensagem.
Isso
evita
enviar
• Não armazene mais que 150 e-mails. Seu terminal profissional
não é arquivo morto;
• O caminho mais curto da comunicação nem sempre é um e-mail.
Muitas vezes um telefonema resolve e é mais rápido;
• Evite mensagens com fofocas, intrigas ou bastidores sobre
colegas e chefias;
• Jamais envie mensagens com conteúdo pornográfico, machista,
racista ou discriminatório;
• Fuja de grosserias como dar cantadas pelo correio eletrônico;
• Só imprima mensagens realmente importantes. Para que
desperdiçar papel se você tem tudo eletrônico?
• Apesar de ser mais informal que uma carta ou fax, nada substitui
a educação e a cortesia. Mantenha certa formalidade no trato profissional;
• Responda às mensagens relevantes em até 24 horas. Se não der,
acuse o recebimento e prometa novo contato – e cumpra o prometido;
• Não remeta e-mail quando estiver nervoso. A agressão por escrito
é mais forte, duradoura e difícil de consertar;
• A segurança de privacidade de um e-mail é zero. Faça a você
mesmo a seguinte pergunta: e se uma cópia fosse parar no quadro de avisos?
Em caso de dúvida, não mande.
É fato, pois, que, ávidas em atender às necessidades de seus clientes,
ansiosas por um atendimento rápido, simples e confiável, as empresas
implementaram a informatização na comunicação administrativa. Com essa
tomada de decisão, houve um ganho considerável de agilidade no fluxo de
comunicação, como também um enxugamento no que diz respeito à
parafernália utilizada, pois o correio eletrônico dispensa papéis, carimbos,
vistos e assinaturas.
4.2.4 O gênero SMS
4.2.4.1Origem
131
Diferenciação é um fator significante para o sucesso no mundo
competitivo atual. Um dos potentes veículos que provê essa diferenciação é o
SMS, considerado pelo mercado como uma “revelação” dentre os provedores
de serviços. Segundo a Internet Sercomtel, o SMS proporciona conveniência
e flexibilidade, possibilitando a comunicação por dispositivo sem fio, como uma
extensão do computador, sem a necessidade de portar diversos aparelhos, já
que o serviço pode ser integrado em um só: o celular (terminal móvel, na
terminologia do site).
4.2.4.2 Definição
SMS é uma abreviação do inglês e quer dizer Short Message Service.
Ou seja, a sigla SMS significa: Serviço de Mensagens Curtas. Segundo o
freeSMSpt, esse é o nome da tecnologia que permite aos celulares digitais
enviar e receber mensagens de texto para outros celulares ou ambientes web.
De acordo com esse site, o SMS também é conhecido por outros nomes:
torpedo, sms, mensagem curta, mensagem de texto etc. A fim de evitar que os
usuários desse serviço se sentissem tentados a escrever mais do que é devido,
ficou estipulado que uma mensagem não poderia levar mais do que 160
caracteres129, o que traduzido significa não mais que 140 bytes, aos quais são
acrescidos mais 30 bytes do espaço ocupado pelo cabeçalho130.
Conforme lemos no site telemóveis.com, devido a essa medida de
economia nasceu a tão falada linguagem abreviada de SMS que, segundo
eles, tantas dores de cabeça tem dado aos professores de 2º grau por esse
mundo afora, visto que muitos alunos têm transferido essa linguagem usada no
celular para os textos produzidos em sala de aula, “infringindo” a linguagem
exigida pela escola, a padrão. O êxito das mensagens entre os jovens tem sido
tão grande que, segundo afirma Benedito (2003), essa geração já está sendo
chamada de geração das teclas ou a “geração do polegar”. Vale ressaltar que,
Podendo, inclusive, ser menor conforme o serviço da operadora. A VIVO, por exemplo,
permite a mensagem com no máximo 150 caracteres sem acentuação (freesmspt).
130
Se levarmos em conta os MMS, mensagens multimídia mais “pesadas” devido à integração
de som, imagens ou animações (cujo limite estabelecido é de 30Kb), o “peso” das SMS tornase leve para qualquer rede (Telemóveis.com).
129
132
segundo lemos em Crystal (2005, p.91), o fato de os mais jovens abreviarem
palavras nas suas mensagens, seja através das técnicas de rébus (b4 =
before), seja através de indicações fonéticas (thx = thanks), ou através de
abreviações (imho = in my humble opinion), não é novo ou fundamental.
Segundo ele, as pessoas vêm usando abreviações há gerações, e os jogos de
rébus há muito são encontrados em revistas de palavras cruzadas.
4.2.4.3 Como funciona o SMS
No site Sercomtel encontramos as instruções para se informar como
enviar mensagens de texto do celular. Segundo eles, trata-se de um serviço
simples, prático e fácil. Vejamos:
a. Verifique se o seu aparelho possui o serviço de mensagem de
texto;
b. Se o seu telefone está categorizado para enviar e receber
mensagens;
c. Se, no local em que você está, o seu celular está recebendo o
sinal digital;
d. Celulares pré-pago precisam possuir qualquer valor maior que
zero em crédito e estar dentro do prazo de validade de 90 dias da
última recarga;
e. Celulares pós-pago precisam estar com as faturas dentro do
prazo de vencimento sem corte.
Após certificar-se de que todos os passos estão corretos, você escreve
a mensagem no seu celular e envia para o número que deseja131.
O site www.sapo.pt informa que, se o celular estiver desligado, o(s)
SMS(s) que é destinado fica guardado pela operadora, mas, assim que o
celular for ligado, a mensagem será entregue. Contudo, se o celular
permanecer desligado por um período superior a 48 horas ou estiver numa
zona sem cobertura de rede, o SMS não será entregue.
As informações detalhadas para envio de mensagem de texto devem ser conhecidas no
manual do aparelho celular.
131
133
Quanto ao valor cobrado pelo serviço SMS, a cobrança ocorre somente
no celular que envia a mensagem. Clientes pós-pagos têm a cobrança em
conta, e clientes pré-pagos têm as mensagens descontadas dos seus créditos.
O custo por mensagem enviada é tarifado de acordo com as operadoras,
podendo variar de R$ 0,13 a R$ 0,19 centavos para clientes pós-pago132, e de
R$ 0,30 centavos para clientes pré-pago, independente do número de
mensagens enviadas. Esses valores estão livres de adicional de chamadas e
deslocamento, caso o cliente esteja fora de sua área de registro, ou seja, em
roaming digital.
4.2.4.4 SMS pessoal e empresarial
As necessidades de comunicação têm sido muitas e hoje, na Era da
comunicação e da Informação, comunica-se mais em menos tempo e por um
preço cada vez mais reduzido. A função das mensagens escritas foi um grande
avanço nos telemóveis. Dentre as muitas vantagens que esse serviço
apresenta, está a de não se perder tempo falando; mandar-se do lugar onde
estiver e à hora que se desejar. As SMS estão surgindo como uma nova mídia
para apoiar as ações de relacionamento das empresas com os clientes,
servindo como um canal de comunicação ágil para encaminhar informações
curtas para grupos de pessoas que não estão à frente do computador
(http:www.centroatl.pt/titulos/soluções/imagens/). Segundo informações contidas
nesse site, uma das grandes vantagens do SMS como canal de comunicação é
a sua abrangência, visto que atualmente são mais de 57 milhões de aparelhos
celulares, um número quase três vezes maior que o número de usuários que
têm acesso à Internet no Brasil.
4.2.4.5 Principais benefícios do SMS
132
Quanto maior o número de mensagens enviadas, menor o valor cobrado.
134
Partindo do princípio de que a economia, seja de tempo ou de dinheiro,
é a mola-mestra das tecnologias digitais, elencamos algumas vantagens ao se
utilizar esse gênero que, pela própria natureza, abriga uma escrita abreviada.
•
Comunicação em tempo real: a mensagem aparece na tela do
celular poucos instantes após o envio;
•
Novo
consumidores;
canal
de
comunicação
sinaliza
inovação
para
os
•
Agilidade: o canal de voz é ineficiente quando uma mesma
informação precisa ser transmitida para mais de uma pessoa;
•
pessoal;
Comunicação personalizada e segmentada: o celular é uma mídia
•
Menos intrusivo: não é necessário interromper uma reunião para
ler um SMS;
•
Economia: um SMS é mais barato que uma ligação para celular,
principalmente se for interurbana;
•
Interatividade: possibilidade
promoções, pesquisas de opinião etc;
de
resposta
do
cliente
para
4.2.4.6 Aplicações do SMS Marketing
A seguir, apresentamos um resumo de como o SMS pode ser utilizado
em diferentes áreas da empresa, a fim de estabelecer um contato direto com
clientes.
1. Para retornar o contato de um cliente ou para encaminhar o
pedido de um cliente para a equipe externa (vendas, manutenção etc.);
2. Pode substituir o canal de voz nos casos em que a informação a
ser transmitida precisa ser rápida e precisa;
3. Pode ser utilizado para divulgar lançamentos de produtos e
serviços, novas condições de pagamento e promoções que estimulem a
compra por impulso;
4. Perfeito para personalizar o relacionamento com os clientes e
enviar alertas sobre saldos de milhagens e prêmios conquistados com o
programa de fidelidade;
5. Pode ser utilizado, em um primeiro contato, para lembrar
vencimentos de pagamento.
As empresas que utilizam esse novo canal de comunicação têm obtido
bons resultados quando combinam de forma adequada com os canais de voz e
135
a Internet133. A seguir, apresentamos um quadro contendo as abreviaturas mais
triviais que o gênero SMS apresenta:
Quadro 8
Lista das abreviaturas mais utilizadas e seus significados no SMS
- Menos;
() abraços;
+ Mais;
+ - Mais ou menos;
= igual;
Bjs beijos;
c/ com
c/o como
icq falamos no icq
ily ou ilu I Iove you (amo-te)
k quê
lol a rir alto (laughing out loud em inglês)
msg mensagem
msm mesmo
ň não
obg obrigado
p/ para
pq porque
q que
+trd – mais tarde
=mente - igualmente
qq qualquer
Rotfl rolling on the floor laughing (rebolar
de riso no chão);
tb também;
tks ou thx thanks (obrigado);
x vez;
:-) sorrindo;
(-: também a sorrir;
:) sorrindo sem nariz;
:’) chorar a rir;
:-() rir de boca aberta;
8-) sorrindo com óculos;
[:-) a sorrir com walkman (a ouvir
música);
;-) piscar olhos;
:-* beijo
:-( triste;
:’-( a chorar;
:-{} espanto;
4E, 4ever – for ever
1mmt – um momento
Como pudemos observar, semelhante ao e-mail, a linguagem do SMS
é marcada pela presença de abreviações, sejam elas representadas por letras
ou ideogramas com valor fonético (ex: ILY = I LOVE YOU), através de símbolos
acrofônicos (ex: rotfl = rolar de rir no chão), de fonogramas com valor silábico
(ex: tb = também), com recursos à ideografia (ex: +- = mais ou menos), ou
ainda com a reciclagem de diversos signos para transformá-los em
componentes de ícones134 (ex: 8-) = sorrir com óculos).
Como salienta Béguelin (2004), a eficácia dessas tendências
ideográficas, silabográficas ou acronímicas serve tão somente para desmitificar
a idéia de que o único progresso possível na evolução dos sistemas de escrita
133
O Centro de Controle da Varig, o Centro de Integração Empresa Escola do RS (CIEE RS), A
Ipiranga, A Catho Online e a Cimpor são algumas das empresas que utilizam o SMS.
134
Os ícones mais comuns nos e-mails também são os mais utilizados nas mensagens de
texto. Em ambos há uma mescla de texto e imagem, onde muitas vezes apenas a imagem
compõe o texto: ☺ ou , significando respectivamente “estou alegre” e “estou triste”.
136
se daria através do princípio fonológico. Segundo a autora, devemos levar em
consideração os objetivos pragmáticos do sistema gráfico, a fim de tentarmos
avaliar a sua adequação.
4.2.5 O gênero blog135
4.2.5.1 Origem
O termo weblog foi inventado em dezembro de 1997 pelo teórico
americano Jorn Barger, e em agosto de 1999, com a utilização do software
Blogger da empresa do norte-americano Evan Willians, os blogs foram
concebidos como uma alternativa popular para a publicação de textos on-line
(KOMESU, 2004).
4.2.5.2 Definição
Blog é a simplificação de Web log ou Weblog, sendo log um diário de
bordo136. A definição de blog não é algo consensual, segundo o site sapo,
ouvindo-se muitas vezes a expressão “Diário virtual” para descrever o que seria
um blog. Há, contudo, variadíssimas definições de blog, dentre as quais
selecionamos algumas:
•
Um diário na web137;
• Um jornalzinho, ou diário, mantido on-line para que outras pessoas possam
ver também138;
135
Ao contrario do diário tradicional, é grande a presença de homens que escrevem nesse
gênero.
136
O interessante é que, segundo Evan Williams, um dos criadores da ferramenta Blogger, esta
não foi pensada para a criação de blogs ou diários digitais. Entretanto, foi nessa produção que
ela se tornou amplamente empregada (UOL, 2001).
137
(http//www.blog-se.)
138
Ta-Na.Net.- Redirecionador de Sites e Sistema de Blog.
137
• Uma página web atualizada freqüentemente, composta por pequenos
parágrafos apresentados de forma cronológica139;
• Um registro cronológico e freqüentemente atualizado de opiniões, emoções,
fatos, imagens ou qualquer outro tipo de conteúdo que o autor quiser
disponibilizar;
• Página pessoal da Internet que tem mecanismos de interação e permite
manter conversas entre grupos140.
4.2.5.3 Como funciona o blog
Em um ensaio sobre blog, Luis Antonio Giron141 salienta que ninguém
tem de saber linguagem ASP, PHP ou a já anciã HTML para que possa
publicar em um blog. Para o autor, a ferramenta revela-se tão fácil quanto um
programa de e-mail sediado na web.
O uso de um blog assemelha-se ao envio de uma mensagem
instantânea para toda a web: você escreve sempre que tiver vontade e todos
que visitarem seu blog terão acesso ao que você escrever (Ta-Na. Net –
Redirecionador de Sites e Sistema de Blog). O blog é definido ainda como um
espaço onde o usuário expressa o que quiser na atividade da (sua) escrita,
podendo escolher imagens e sons para compor o texto que será veiculado pela
Internet (KOMESU, 2004).
O conteúdo e tema dos blogs variam de assuntos que vão desde
piadas, diários, notícias, poesia, fotografias, até o que a imaginação do autor
permitir. Há pessoas que associam a idéia de blog a uma espécie de diário de
adolescente na Internet, e assim sequer chegam a conhecer o que é de fato
esse espaço de notícias, análises e debate. É bem verdade que existem alguns
onde predominam idéias e sentimentos do autor, são os blogs pessoais. Mas
há também aqueles que permitem a grupos de trabalho ou até empresas a
troca de comunicação mais simples e organizada, a fim de discutir projetos e
apresentar soluções. Ou seja, alguns blogs são essencialmente voltados para a
diversão; outros, para trabalho, e outros fazem uma mistura de ambos.
139
Blogger.com. br
observatorioultimosegundo.ig.com.br
141
www.digestivocultural.com/
140
138
4.2.5.4 Blogs pessoais e empresariais
No início eles não iam além de “diários on-line” publicados na web,
geralmente, criados por adolescentes. Entretanto, a idéia começou a atrair
pessoas em todo o mundo, o que gerou uma enorme diversidade de temas,
distribuídos em basicamente três tipos de blogs:
• Privado: somente o criador do blog pode colocar mensagem nele;
• Grupo: mais de uma pessoa pode postar mensagens. O criador do blog
controla quem participa;
• Público: qualquer pessoa pode postar mensagens. O blog é gerenciado pela
equipe do provedor142.
Frente à demanda inesperada, blogs com notícias jornalísticas,
científicas e informações úteis à sociedade foram oferecidos a cidadãos e
empresas, que têm já definidos os propósitos, ou seja, sabem o que pretendem
apresentar/aprender, e o que ou quem querem atrair. A própria imprensa viu-se
atraída pelo novo gênero, e resolveu incluir um blog em suas publicações
tradicionais. Há também blogs cuja finalidade é gerenciar o conhecimento em
instituições como escolas, jornais e empresas (http://www.blogger.com.br).
Sendo assim, o trabalho com esse novo gênero textual pode criar
oportunidades reais de ensino e aprendizagem entre os seus usuários.
4.2.5.5 A linguagem nos blogs: tá td blz!
142
No caso do IG, o serviço de blog é o Blig.
139
Geralmente a linguagem utilizada no blog está diretamente relacionada
com o seu propósito e/ou com o estilo lingüístico de seu criador. Ou seja, um
blog de cunho científico apresenta, via de regra, uma linguagem de acordo com
o tema abordado e o público leitor. Já um blog criado por um adolescente
retrata uma linguagem com um código bastante particular, caracterizado por
abreviações e pela utilização de novas formas de escrever velhos termos,
gerando senão uma imitação, pelo menos uma espécie de inovação nas
abreviações outrora existentes. No primeiro caso, temos vocábulos como
beleza, porque, tudo, você, também e não que sofreram drásticas reduções e
passaram a ser escritos, respectivamente, blz, pq, td, vc, tb e ň. No segundo
caso, temos palavras do tipo não, falou, então, até, é e né que, ao contrário das
citadas anteriormente, sofreram acréscimo de um elemento em sua forma
original e passaram a ser escritas naum, falow, entaum, ateh, eh, neh143.
Mas não parou aí. O uso de formas escritas apresentando marcas da
oralidade é outro aspecto observado na linguagem utilizada nesse novo
gênero, em especial pelos adolescentes. É bem verdade que há aqueles que
escrevem utilizando uma linguagem mais formal, fazendo uso de acentos e
pontuação, mas o que predomina é a presença de uma escrita abreviada,
aproximada da pronúncia, uma espécie de semi-oralidade.
Diante desse fato, surge um dilema de se corrigir ou não a grafia de
tais palavras. Segundo o site www.saladeaula, alguns professores de Língua
Portuguesa de colégios de São Paulo defendem que a formalidade deve ser
preservada, uma vez que o conteúdo é acessado pelos mais variados públicos.
Na opinião deles, quando se tratar de um texto de pesquisa, o estilo formal
deve ser preservado. Porém, quando o conteúdo for informal e restrito ao
grupo, a escrita utilizada pode ser a que apresenta as particularidades do texto
cibernético. Na visão do lingüista Bagno, os adolescentes devem expressar-se
livremente, já que não é nesse contexto que eles irão aprender ortografia e
gramática. Para Bagno, o blog nasceu com os jovens e o espaço desse gênero
deve ser reservado para os adolescentes (www.saladeaula.com.br). Na opinião
de Crystal (2005, p. 92), deve-se ensinar às crianças que as abreviações nas
O caso de falow foge à regra, uma vez que a palavra não sofreu nem redução nem
acréscimo de elemento em seu conjunto. Já o ateh, o eh e o neh passaram a representar o
sinal gráfico do acento com a letra h.
143
140
mensagens de texto, onde o espaço é pequeno e a rapidez um fator crítico,
desempenham uma função útil, mas não em outros lugares.
4.3 A abreviação e o suporte de gêneros textuais
Partindo do princípio de que todo gênero tem um suporte, e de que
este determina a distinção que o gênero recebe, achamos imprescindível
definir e analisar, ainda que em linhas gerais, os suportes textuais.
Convém destacar também que, segundo Chartier (1994, 1997), a
leitura que fazemos dos textos é afetada pelo suporte. Isto equivale a dizer que
não lidamos cognitivamente com os textos de igual modo em suportes
diversos. Ou seja, embora o conteúdo não seja afetado pelo suporte, contudo a
nossa relação com ele o é. Em outras palavras: a depender do suporte, um
mesmo texto pode ser identificado como um gênero diferente. Vejamos o
seguinte texto:
“Marcos, estou com saudades. Quando puder, me liga. Te amo. Meu novo
número é 81 3241 5678. Fabiana”
Se colocado em cima do bureau da referida pessoa (Marcos), o texto
pode ser lido como um bilhete; se recebido pela secretária eletrônica, passa a
ser um recado; entregue em formulário próprio pelos correios, é um telegrama;
já em um outdoor, pode ser interpretado como uma declaração de amor. Como
afirma Marcuschi (2003), o conteúdo não muda, mas o gênero é sempre
identificado na relação com o suporte.
Iremos pesquisar neste capítulo se os gêneros têm preferências, não
se manifestando na indiferença a suportes. Ou seja, se o gênero exige um
suporte especial. Assim, buscaremos responder se os suportes interferem ou
não na forma de interpretar, compreender os conteúdos expressos nos
gêneros.
141
4.3.1 Definição
Embora seja ainda embrionária a discussão acerca dos suportes
textuais, sabemos que a definição a ser adotada não deve ser aquela
registrada nos dicionários: DOC base física (de qualquer material, como papel,
plástico, madeira, tecido, filme, fita magnética etc) na qual se registram
informações impressas, manuscritas, fotografadas, gravadas etc (HOUAISS,
2001, p. 2643).
Marcuschi (2003) entende como suporte de um gênero textual “um
lócus físico ou virtual com formato específico que serve de base ou ambiente
de fixação do gênero materializado como texto”. Para ele, suporte de um
gênero é “uma superfície física em formato específico que suporta, fixa e
mostra um texto” 144
Segundo esse autor, o suporte não deve ser confundido com o
contexto nem com a situação, nem com o canal em si, nem com a natureza do
serviço prestado. Vejamos a seguir um exemplo que diferencia gênero de
suporte e outros. Escolhemos a carta pessoal para ilustrar a cadeia que é
estabelecida num contínuo nem sempre discreto:
Carta pessoal (GÊNERO)
papel-carta(SUPORTE)
tinta (MATERIAL DA ESCRITA)
correios (SERVIÇO DE TRANSPORTE)...
Marcuschi lembra ainda que o suporte não é neutro e que o gênero não
fica indiferente a ele. Por exemplo, não é qualquer gênero que aparece num
outdoor, pois esse é um suporte para certos gêneros, afirma ele. O suporte,
ressalta o autor, é imprescindível para que o gênero circule na sociedade e
deve ter alguma influência na natureza do gênero suportado.
4.3.2 Categorias de suportes textuais
144
Ao afirmar que um suporte é uma superfície fixa, estamos supondo que ele deve ser algo
real; dizer que ele tem um formato específico é admitir que os suportes não são informes nem
uniformes; por fim, assegurar que o suporte serve para fixar e mostrar o texto implica associar
a ele a função básica de fixar o texto, tornando-o acessível para fins comunicativos.
142
Em princípio, toda superfície física pode funcionar como suporte. Prova
disso é que na antiguidade a circulação de textos escritos nos chegava em
suportes textuais os mais variados: iniciaram nas paredes interiores de
cavernas, nos vasos de barro, túmulos, pedrinhas, tabuletas, no papiro,
pergaminho, papel145 e, modernamente, nos outdoors e ambiente virtual da
Internet.
4.3.3 Suportes convencionais
Entendam-se por suportes convencionais, típicos ou característicos
aqueles que foram desenhados com a função específica de serem suportes.
Com base nessa definição, passemos a alguns desses suportes e suas
características:
a) Livro: é um suporte maleável, com formatos definidos pela própria condição
em que se apresenta (capa, páginas, encadernação etc.). Comporta os mais
diversos gêneros que se queira, ou em outros casos um só gênero.
b) Jornal: todos concordamos que é um suporte com muitos gêneros (cartas
do leitor, anúncios fúnebres, previsões meteorológicas, horóscopo, notícias,
editoriais, charges etc).
c) Telefone: trata-se aqui de um suporte para gêneros orais (também escritos,
no caso do telefone celular, que comporta as mensagens de texto).
d) Tela do computador: suporte dos gêneros digitais (e-mail, blog, chat etc.),
tem sido preterida por uns, em geral amantes do livro, e preferida por outros,
marujos do oceano cibernético.
4.3.4 Suportes incidentais
145
A folha de papel é o suporte mais comum de todos e, no nosso caso, é o suporte utilizado
para as cartas manuscritas e diários.
143
Os suportes incidentais são assim denominados por serem meios
casuais e que emergem em situações especiais ou até mesmo corriqueiras.
Sendo assim, ao falarmos em suporte no sentido estrito, referimo-nos aos
convencionais (supracitados) e não aos incidentais. Vejamos alguns exemplos:
a) Pára-choques e pára-lamas de caminhão: é um suporte de gêneros
especiais como frases e provérbios;
b) Roupas: embora não traga de maneira sistemática textos, as camisetas são
suportes de gêneros vários como provérbios, poemas, canções, propagandas;
c) Corpo humano: apesar de não ser um suporte convencional, cada vez mais
vem aumentando o uso de textos curtos, tatuagens e slogans como formas de
protestos;
d) Paredes: aqui generalizamos todo tipo de parede (casas, edifícios,
universidades etc). Muitas vezes ocorre uma superposição, por abrigarem em
si outros tipos de suportes (um quadro de avisos, por exemplo);
e) Muros: ainda que não tenham sido convencionados para a finalidade de
suporte, os muros têm a cada dia registrado um crescente aumento no que diz
respeito ao número de gêneros nele ancorados (propagandas, inscrições,
publicidades e pichações).
Quanto à criação/utilização de novos suportes para a escrita, Xavier
(2002, p.92) afirma que estes
Operam, fundamentalmente, sob a égide da soma sinérgica e
não sob a lógica da substituição ou subtração absoluta de uma
pela outra. A existência concomitante por séculos do papiro e
do pergaminho, assim como do pergaminho com o livro
impresso ilustram muito bem isso. A tecnologia de
“escrituração” mais viável do ponto de vista técnico, econômico
e social tende a prevalecer como tecnologia mais eficaz para
um dado momento histórico.
4.3.5 Serviços
144
Os exemplos aqui arrolados não devem ser classificados em suportes
convencionais nem tampouco em suportes incidentais. Trata-se de casos de
serviços em função da atividade comunicativa:
• Correios: é mais um meio de transporte ou um serviço que um suporte;
• Mala-direta: no geral veicula gêneros diversos, tanto da publicidade quanto
da comunicação entre empresas e clientes destas;
• Software: tratado por uns como suporte, por outros como gênero, na função
de correio eletrônico o e-mail é um serviço que engloba os mais variados
gêneros (propagandas, ofícios, bilhetes, cartas comerciais, relatórios etc.).
Apresentada a distinção entre tipo e gênero textual, e feita a descrição
minuciosa de cada gênero aqui trabalhado, apresentaremos a seguir o capítulo
referente à análise dos dados.
145
CAPÍTULO 5
ANÁLISE DOS DADOS
Vimos, nos capítulos precedentes, a origem e a tradição das
abreviações, a sua relação com as tecnologias manuscrita, impressa e digital; o
suporte (o papel, o computador, o telefone celular) e os gêneros textuais, bem
como a influência de fatores sociointerativos, estruturais e sociais, quanto ao
maior ou menor uso delas por parte dos que as utilizam.
Resta-nos agora uma discussão acerca da atuação desses fatores em
conjunto, a fim de melhor compreendermos como se dá, nos dias atuais, a
ocorrência da abreviação nos gêneros por nós aqui estudados, quais sejam: email, SMS e blog, além dos tradicionais (diários e cartas), tentando traçar uma
ponte entre as abreviações do século em que estamos, XXI, com as de séculos
anteriores, XVIII, XIX, XX. Visando obter uma melhor compreensão do
fenômeno em estudo, a apreciação dos dados foi feita primeiro com as
variáveis sociointerativas, depois com as variáveis estruturais e, por último,
com as sociais. Contudo, essa ordem não é inalterável ou a mais indicada,
apenas uma forma de tornar menos extensa e intrincada a leitura. Passemos,
pois, à análise propriamente dita.
146
•
1.
Das variáveis sociointerativas
Gênero:
Dentre todas as variáveis aqui analisadas e por nós classificadas como
sociointerativas, essa foi a que demonstrou exercer maior influência quanto ao
uso acentuado ou não de abreviações. Conforme havíamos mencionado no
início deste trabalho, selecionamos 5 (cinco) gêneros para compor o material a
ser analisado, a saber: carta, e-mail, diário, blog e SMS. Quisemos com essa
escolha traçar um paralelo entre os gêneros emergentes e as suas
contrapartes. Dessa forma, pusemos o e-mail ao lado da carta tradicional, visto
que aquele compartilha semelhanças com essa, dentre elas: abertura,
saudação e fechamento146; o blog, como alguns afirmam e o próprio nome diz,
em muito lembra o diário tradicional: nele, o autor registra diariamente os fatos
que ocorrem em sua vida, ainda que alguns não mereçam destaque;
finalmente, o SMS, gênero da telefonia digital, que despertou interesse pelo
tema desta tese. Poderíamos abarcar outros tantos gêneros, mas devido ao
caráter da pesquisa, restringimo-nos aqui aos anteriormente citados,
considerando-os como uma amostra suficiente para nosso estudo. Afinal, como
afirma Bakhtin (1992), “à medida que a esfera da atividade humana se
desenvolve e fica mais complexa, o repertório de gêneros do discurso vai
diferenciando-se e ampliando-se”. Podemos adiantar, contudo, citando aqui as
palavras de Rodrigues (2005, p.166), que
Cada gênero tem seu campo predominante de existência (seu
cronotopos), onde é insubstituível, não suprimindo aqueles já
existentes. Por exemplo, o romance polifônico não acabou nem
limitou a existência de outras variantes de romance, o e-mail
pessoal não extinguiu a carta, o comentário e o artigo (artigo
assinado) não excluíram o editorial, o telefonema não acabou
com a existência da conversa. Cada novo gênero aumenta e
influencia os gêneros de determinada esfera e o seu
desaparecimento se dá pela ausência das condições
sociocomunicativas que o engendraram (por exemplo, a
conversa de salão).
146
Convém ressaltar que outros autores, a exemplo de Vera Lúcia Menezes de Oliveira e
Paiva, percebem no e-mail traços comuns a outros gêneros como o memorando, o bilhete, a
conversa face a face e a interação telefônica (MARCUSCHI, L. A. & XAVIER, A.C, p. 2004).
147
Os resultados obtidos para essa variável apontam a carta147 e o blog
como os dois maiores responsáveis pela produção de abreviações, seguidos
do SMS, e-mail e diário. Vale ressaltar, porém, que as cartas são as primeiras
colocadas por estarem situadas em um período em que a tradição das
abreviações ainda era muito forte, séculos XVIII e XIX148, embora a
necessidade precípua de economizar o material da escrita já tivesse sido em
muito reduzida com o surgimento do papel. Em segundo lugar, o blog é o
gênero que mais apresenta abreviação em seu texto. Convém lembrar que
esse número aumenta à medida que o autor é de uma faixa etária menor, ou
seja, mais jovem. O gênero SMS, terceiro na quantidade de abreviações, é
utilizado por falantes jovens e adultos, de ambos os sexos, e também por
empresas. O fator decisivo para a presença de abreviações nesse gênero é a
quantidade de caracteres permitida ao usuário por mensagem enviada. Embora
em menor número, os SMS’s empresariais também lançam mão de
abreviações nas mensagens endereçadas aos seus clientes. O último gênero
da lista, o diário tradicional, tem duas razões, a priori, para fazer uso de
abreviações: primeiro, manter em segredo alguns nomes e/ou fatos que não
devem ser de conhecimento público; a segunda, semelhante aos manuscritos
em pergaminho, está ligada ao espaço oferecido pelo papel no qual o autor faz
suas anotações. Vejamos a seguir o primeiro gênero analisado e seu
comportamento no processo de abreviação:
A CARTA
Conforme podemos observar na Carta 01, a seguir, o número de
abreviações utilizadas em cartas do século XVIII é bastante considerável,
chegando a apresentar abreviações desde a saudação (ex.: Snor’), ao longo de
toda a mensagem, se estendendo até o fechamento. Fato interessante e que
merece destaque é a presença, muitas vezes, da forma abreviada convivendo
147
De um total de 450 cartas, apenas 2 não apresentam abreviações em seu texto, o que
equivale a um percentual de 0,44% de cartas que não fazem uso de abreviações.
148
As cartas do século em que estamos, que foram por nós analisadas (pessoais e oficiais),
apresentam um número resumidíssimo de abreviações quando comparadas com as dos
séculos anteriores.
148
com a forma padrão (cf. linhas 7 e 29, respectivamente), ou seja, nãoabreviada, o que nos permite inferir que não era só a necessidade de abreviar
que levava o autor a escrever dessa forma, mas a tradição ou o puro prazer de
usar abreviações. Da abertura ao fechamento, usava-se abreviação. Em
algumas cartas, havia casos onde sequer uma linha escapava desse processo
de redução. Curioso é o fechamento quase categórico nessas cartas: Guarde
Deus a Vossa Majestade por muitos anos para amparo de seus vassalos que era escrito da seguinte forma: Gde. Ds a VMgde. Mtos. ans. pa. ampo. de
seus vassalos. Também o mês e o local eram escritos de forma abreviada: Re.
de Pernco. 18 de Dezro de 1703 (em lugar de Recife de Pernambuco, 18 de
dezembro de 1703). A Carta 02, uma carta ao leitor, traz um número bem
menor de abreviações se comparada à Carta 01. Naquela as abreviações se
resumem apenas aos pronomes e formas de tratamento. A Carta 03 pertence
ao subgênero carta pessoal e, semelhante à Carta 02, restringe as abreviações
às formas de tratamento e a uma forma no fechamento (P.S), além de um se
escrito s’. As Cartas 04 e 05, da Bahia e da Paraíba, respectivamente, ambas
do século XIX, são oficiais. Nelas a ocorrência de abreviações é visivelmente
maior, sendo possível observar exemplos desde a abertura até o fechamento.
A partir desses dados, percebemos uma estreita relação entre o gênero
trabalhado e sua situação sócio-histórica na sociedade, visto que a depender
do contexto, o mesmo gênero pode sofrer alterações de ordens várias.
149
Carta 01149(Oficial)
Corpus do Projeto Textos Brasileiros dos Séculos XVIII e XIX
1703
Pella carta junta veio a conta q’. / deraõ a VMgde. os oficeaes da camara / de Itamca.
das Ruinas do forte de Sta. Cruz da mesma Barra . e tendo eu / a mesma noticia,
asssim q’. chegueý a / este governo, fuý ver aquella Fortal = / leza, a qual acheý
acabada na altu = / ra do cordaõ, execpto o Portal, q’. esta = / va ainda por comessar.
Acheý o / Balluarte da parte da Barra . huã / face delle arruinada no chaõ, e a ou = /
tra, quazi na mesma forma; e porq’. / Se me dizia, q’. a Ruina poderia Ser / cauzada
por culpa do impreitro. le = / veý dous mestres pedreiros, pa. ex = / aminarem a da.
obra, e lhe mandeý / dar juramto., e ordeneý ao Provedor / da Fazda. Real desta
cappnia., lhe tomas = / se o Seu de poimo., oqual vaý incluzo / com esta, e mandeý
derribar o do. Ba / luarte, para Se tornar a levantar logo, e nelle Se anda trabalhando,
por / Ser o q’. tem esta fortalleza mais ne = / cessro. pa. a defença daquella Barra, /
pa. o por capaz de nelle poder labo = / rar a arthelharia. O pagamo. des = / ta
reedeficaçaõ, ordenará VMgde. Se / Se ha de fazer por conta da sua Real / fazda. Se
por conta do impreitro. / por q. assim o assenteý com elles, pa. com / brevidade Se
acabar esta obra, em q. / Se fica trabalhando com todo o cui = / o cuidado.
A
principal cauza da Ru = / ina desta fortalleza foý a incapacida = / de do Sitio, emq. Se
fundou e o pouco / fundmo. q’ Se lhe fez, sem grade nem / estacaria, principioandose
os alicerces / em huã area pouco Segura, e com pe = / dra, naõ mto. grande. E Sem
embargo de / q’. concidero alguã culpa ao impreitro. / por naõ fazer deligca. por
segurar melhor / a obra, maýor me parece a dos engenros. / q’. lhe concentiraõ; pois o
impreitro. po = / deria ignorar o como devia Segurala. / E os engenros. não devem
concentir em / Semelhantes erros.
Mostrando de / pois o tempo as Ruinas, q’.
ameaça- / vaõ esta Fortalleza, por cauza do mar / q’. lhe vinha chegando, mandaraõ
os / Engenros. fazer huã pequena ( ilegível ) / ou Arcen, por aquella parte / por onde /
o mar a cometia, e vendo eu q’. nem / isto era bastante, pa. a Segurança da / da.
Fortalleza, com o parecer do Sargto. / e os engenros., e de alguãs pessoas pra = /
ticas, mandeý fazer huã estacada / por fora da fortalleza alguã couza / distante della,
com quantidade de / pedra sequa; por ver Se por este / meýo arrimava o Mar a (
ilegível ) para / a parte da Fortalleza, e Livralla de / q’. o mar lhe naõ chegasse. e
conforme / as noticias q’. tenho, vaý Surtindo effei / to este Remedio; porq’. me dizem
vaý a = / reando, como queriamos. Com tudo isso / isso, naõ me parece ficar ainda
Segura, / por q’. assim, como o mar arruinou / huã fortalleza de pedra, e Cal, milhor /
arruinarâ esta pedra sequa q’. Se lhe / botou, em apodrecendo a estacada, e por
tempos tornarâ a arruinar a / Fortalleza, q’. he Sem duvida, q’. Se o / mar lhe chegar
com força, como fez / no Balluarte arruinado, a arruinarâ / toda; porq’. naõ conhecerlhe
a fir = / meza q’. devia ter. O Impreiteýro Se / me defende com os engenros. e eu Se
/ elles foraõ vivos, lhes tornâra ( ilegível ) culpa. / porq’. Se os fundamos. naó podiaõ
Ser / milhores, escuzàraõ de dar principio / a huã Fortalleza taõ grande q’. tem /
custado mais de oitenta mil cruzados / e naõ Seý Se Se acabarâ com trinta, Sen / do
bastante pa. aquelle Sitio qual / quer fortalleza de mto. menos custo. / Por Se atalhar â
Ruína da da. Fortal = / leza, tenho posto, e poreý todo o cuidado, / e nem a vista do
engenro., nem a mi = / nha lhe faltarâ, Se isto for bastante / pa. Se lhe remediar.
Mo. alta, e Real Pessoa de / VMgde. gde. Des. mtos. ans. pa. ampo. de / Seus
vassallos .
Re. de Pernco. 18 de / Dezro. de 1703
149
Os termos abreviados vêm destacados na cor verde.
150
Carta 02150 (Ao leitor)
Anno XXVII
Sabado 4 de Janeiro de 1851.
N.3
Correspondencia.
AO PUBLICO
Acabo de ser informado por pessoa de/minha intima e sincera amisade, que
Sr./Dr. Pedro Autran da Malta e Albuquerque/acha-se sentido e queixoso contra mim,
por/lhe haverem dito, que uma asquerosa e im-/moral correspondencia, que em avulso
espa-/lharam contra S. S. Fôra impressa na mi-/nha typographia.
Esta gratuita imputação, he tão inexacta/que me escusaria de responder; mas
para/que tire do Sr. Dr. Autran, que tão traçoei-/ra e vilmente foi offendido, qualquer
juizo/injusto, sem duvida, a meu respeito, des-/afio a esse ou esses calumniadores,
que pro-/vem a vil e baixa imputação. Sinto, que o/sr. Dr. Autran só menos por
momento acre-/ditasse, que um pai de familia consentiria/ que em sua typographia se
imprimisse em/avulso que não respeitou o mais sagrado da/familia; sem embrago
desculpo, e peço a S./S., que acreditando na minha sincera pala-/vra, atire para longe
imputação que só ini-/migos meus o fariam acreditar.
Eu vi esse asqueroso avulso – e mal pu-/de findar sua leitura, he impresso em
ty-/pographia 10, não sou eu só que tenho typographia;/e para mais convencer peço a
quem quer/que seja esse anonimo, que em honra a ver-/dade declare se foi em minha
typographia/impresso o dito avulso.
Tenho regeitado muitos impressos até/contra inimigos politicos, quando nelles
se/involvem a honra ou o sagrado das familias;/a pouco tempo regeitei um impresso
contra/o Sr. Dr. Francisco João Carneiro da Cunha,/e como consentia um contra o Sr.
Dr. Au-/tran, em que não se respeitava a honra nem/amisade?
Para tal não se presta a minha typogra-/phia; e sinto que haja ainda duvida a
res-/peito.
Sou pai de familia e sei avaliar o apreço/da honra, peço justiça porque tenho
direito a ella.
Recife, 3 de janeiro de 1851.
Ignacio Bento de Layola.
Carta 3 (Pessoal)
Meo caro Conselheiro.
São inexpressiveis os sentimentos de meo coração e eu não tenho expressões para
manifestar lhe os meos agrade cimentos. Aqui chegou meo marido que narrou me a
conferencia que teve com Vossa Excelencia e outra cousa eu não tinha á esperar de
sua antiga amizade, que nos lisongeamos de saber retribuir. No dia 31 seguiremos
para sua heroica provincia aonde espero receber e comprir fielmente suas ordens. Alli,
como em qualquer lugar, bencinho será sempre um dos seos mais de- dicados amigos
e leal soldado, eu só lhe peço que veja em mim a personificação da— gratidão. O
nosso amigo Doutor Guimarães lh’entregará um pequeno volume com charutinhos de
fumo que colhi no meo quintal: queria desculpar-me. Abraço lhe com muitas saudades
e amizade, á Sinhá e as meninas sua amiguinha sempre.
Maria Constança.
27 de Dezembro de 1888.
Bencinho não lhe escreve porque está fóra.
P.S.Não s’esqueça do Daltro.
150
Os termos abreviados nas cartas 2 e 3 vêm destacados em azul claro e verde escuro,
respectivamente.
151
Carta 4151 (Oficial)
151
Os termos abreviados na carta 4 vêm sublinhados, semelhantemente à carta 5 a seguir.
152
Carta 5 (Oficial)
Fato curioso, e que nos chamou a atenção, é a diferença visível quanto
ao número de abreviações existentes nas cinco cartas aqui exemplificadas. A
título de exemplo, destacamos as cartas 2 e 3 como aquelas que pouco ou
quase nenhum uso de abreviações fazem, embora sejam ambas do século
XIX, período em que estão situadas também as cartas 4 e 5. Ávidos por
descobrirmos o(s) fator(es) responsáveis por tal diferença, observamos que
aquelas, cartas 2 e 3, além de impressas, têm o jornal como suporte; enquanto
153
as cartas 1, 4 e 5 são manuscritas e utilizam o papel carta como suporte.
Assim, decidimos analisar, a seguir, a influência ou não desses suportes
utilizados (jornal, papel carta, tela do computador, entre outros), bem como a
tecnologia predominante (manuscrita, impressa etc), a fim de atribuirmos a
esses fatores o peso que lhes cabe no uso de abreviações.
O BLOG
Dentre os gêneros digitais aqui tratados, o blog foi o que mais uso fez
de abreviações ao longo do texto. Seja para ganhar habilidade na hora de
exercer a escrita eletrônica, seja para delimitar a linguagem de um grupo (a
exemplo das gírias), ou mesmo por qualquer outra razão, o fato é que, quando
pessoal e de autoria de jovens, principalmente, a abreviação é algo intrínseco
ao texto produzido pelos usuários desse gênero. Vale salientar que, pelo fato
de serem os de cunho pessoal, cujos autores são jovens, os que mais
abreviações apresentam, os demais (blogs oficiais/públicos) não estão
excluídos, tampouco aqueles cujos autores são adultos. Há apenas uma
redução no que diz respeito ao uso das abreviações, fato que parece estar
ligado a razões do tipo desconhecimento por parte do usuário, ou ainda, opção
por escrever sem abreviar, principalmente aqueles que primam por uma maior
clareza
do
texto.
Conforme
revela
o
Blog
01,
abaixo,
(Blog
–
www.sistersss.zip.net), a blogueira152, Ig utiliza abreviações em todo o seu
texto, não restando uma linha sequer sem registrar a ocorrência desse recurso
da língua.
No site www.comunidadebrasileira, encontramos um comentário a
respeito das abreviações utilizadas no gênero blog que afirma estarem os
jovens inaugurando uma nova Língua Portuguesa, bizarra, e só compreensível
entre os integrantes de galeras. Segundo esse site, os jovens tentam
reproduzir na escrita nuances possíveis apenas na fala. Dentre as abreviações
encontradas, algumas já estão cristalizadas e outras, como fze por fazer, aos
poucos vão se inserindo no léxico do blogueiro.
152
Esse termo refere-se ao autor de páginas de blog.
154
Segundo Marcuschi (2002), “quando dominamos um gênero textual,
não dominamos uma forma lingüística e sim uma forma de realizar
lingüisticamente objetivos específicos em situações sociais particulares”. É o
que fazem as autoras supracitadas quando adequam/moldam a sua linguagem
ao gênero por elas utilizado, a fim de se identificarem naquela comunidade (no
caso, a dos blogueiros).
BLOG 1
A típica frase do diário tradicional “Querido diário” está, não tão
lentamente, sendo substituída por registros os mais variados possíveis
155
encontrados no seu gênero correlato, o blog. Entretanto, algumas das
parafernálias que compunham o cenário do diário tradicional, entre elas
figurinhas, fotos e outros, mantêm seu lugar garantido nas páginas eletrônicas
dos blogs, como pode ser visto acima.
O SMS
Embora não tenhamos dados que comprovem a estreita relação que há
entre
esse
gênero e o telegrama,
vimos neste o
correlato do SMS, que
funciona como
as
mensagens
telegrafadas: curtas e
com
abreviações
representar
palavras e sinais. A
propósito,
primeiras
para
no
telegrama colocava-se
um “h” no lugar
do acento agudo (ex. é
⇒
escrevia-se
eh);
lugar
de
“vg”
em
vírgula; “pf” no lugar de
um ponto, e o
“vão”
visando
economia de palavras
à
que,
virava
“vaum”,
necessariamente,
implicava
economia
de
dinheiro153.
Conforme já aludido,
esse gênero impõe àquele que dele faz uso, um número restrito de caracteres
(letras e sinais) que varia de 150 a 160. Dessa forma, caso o conteúdo a ser
escrito
seja
longo,
restará
ao
que
escreve
a
opção
de
escrever
abreviadamente, ou enviar mais de uma mensagem, o que implicará gastar
mais tempo e pagar mais dinheiro pelo número de mensagens enviadas. Aqui
também não há, ainda, uma padronização quanto à forma abreviada, variando
esta de autor para autor e, às vezes, no próprio autor. É o caso de você,
também, que, beijo, que ora aparecem abreviadas ora escritas na forma
153
(SANTOS, 2005).
156
padrão. É bem verdade que já existem listas de abreviaturas mais utilizadas
pelos internautas (cf. Quadro 4) nesse e em outros gêneros afins. Resta-nos
tão-somente familiarizar-nos com elas e navegar no ciberespaço. A SMS acima
traz abreviadamente a seguinte mensagem: Kd vc q ñ ligô?Bjs., que escrita na
forma tradicional (melhor dizendo, em outro gênero) seria: Cadê você que não
ligou? Beijos. É visível a economia que o usuário desse gênero faz ao utilizarse de uma escrita que mostra traços próprios da oralidade, ao buscar escrever
da forma como se pronuncia, dispensando não raras vezes o uso de vogais,
semelhante à escrita semítica.
O E-MAIL
Este foi o quarto, dentre os gêneros aqui estudados, a apresentar
abreviação em seus textos. Por tratar-se de um gênero virtual, cuja escrita
apresenta um hibridismo entre o oral e a escrita, fica visível a presença de
abreviações ao longo de suas mensagens, principalmente aquelas que já estão
praticamente enraizadas no léxico dos internautas. De modo semelhante aos
demais gêneros virtuais, a possibilidade de se ter aqui uma escrita síncrona,
bastando que ambos estejam on-line, como nos chats, faz com que haja uma
maior rapidez no ato de escrever, a fim de manter uma aparente sintonia com o
destinatário, no que diz respeito ao tempo gasto para se responder a um email. É bom lembrar que, quanto mais tempo conectado à rede, maiores serão
os gastos com o serviço de telefonia, ao menos nos casos em que não se
dispõe do serviço de conexão a cabo. Esse fator pode ser decisivo na hora de
se usar abreviação, visando à economia de tempo. Vejamos o exemplo a
seguir:
157
E-mail 01
Data:
De:
Assunto:
Para:
Sun, 17 Apr 2005 21:18:20 -0300 (ART)
Ver detalhes do contato
fotos
"fabiana
souza
silva"
vixe!!! tomara mesmo q. vc. ou vcs. venham, vou adorar!!!!!!!!!!!!!! menina, mas
q. historia foi aquela c.fulano??!! estou besta!!vais continuar c. ele assim mesmo?? já
disse a Bet??bom, mas acho q. vc. conseguirá administar com sua ironia e seu humor
refinado.aH!! q. historia eh essa de sucesso meu aqui? quem te disse isso? fiquei
curiosa.teve um bom domingo??eu tive um otimo fim de semana, sozinha a minha
moda, cinema, praia, um dvd, papos c. a família154.
um beijão
O DIÁRIO155
154
Aqui, o informante reduz as formas que, você, vocês e com a, respectivamente, q, vc, vcs e
c.
155
Os termos abreviados vêm sublinhados em outra cor.
158
Como mencionado anteriormente, esse gênero, o último aqui
relacionado, faz uso das abreviações em dois momentos: quando da
necessidade de manter sob sigilo de outrem termos, nomes, expressões e
outros que só convêm ao autor saber de que se trata; ou ainda, quando o
espaço físico deixado pela página na qual serão registrados os fatos daquele
dia obriga o autor a resumir a narrativa como um todo, ou se optar pela
descrição minuciosa, ali escrever as palavras de forma abreviada (ver
18/09/05, acima). Esses são os principais fatores responsáveis pela existência
da abreviação nesse gênero. Pode-se registrar hoje um maior número de
abreviações no diário tradicional por influência, talvez, da escrita abreviada que
se usa no meio digital. Assim, o autor faria uma simples transferência de
código, utilizando o “internetês” no lugar do código comum, a língua “indicada”
pelos gramáticos.
A fim de melhor visualizarmos a ocorrência da abreviação em cada um
dos gêneros supracitados, apresentamos abaixo um gráfico que revela, em
termos de porcentagem, a relação entre o fenômeno em estudo e o gênero
tratado:
Gráfico 01
A abreviação e os gêneros
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Cartas
E-mail
Blog
Diário
SMS
159
O Gráfico 01 acima aponta a carta como o gênero responsável pelo
maior uso de abreviações em seu texto, 98,93%. Em segundo lugar, vem o
blog, com 70%; o SMS fica em terceiro com 65%; em quarto, o e-mail com 50%
e, por último, o diário, com 33% de aplicação de abreviações. Um dado crucial
que não pode ser esquecido é o período156 em que estão situados esses
textos. Esse fator é aqui determinante quanto ao maior uso de abreviações no
gênero. Ou seja, no gráfico exibido há um cruzamento de dados, no qual a
carta só obteve esse percentual por estar situada nos séculos XVIII e XIX157,
quando ainda predominava o uso de abreviações nesse gênero. Afinal, a
variação cultural, como diz Marcuschi (2002), deve trazer conseqüências
significativas para a variação de gêneros. Não podemos, pois, desconsiderar
esse dado, a fim de evitarmos um falseamento nos resultados.
2.O estilo
Para Bakhtin (1992), o estilo está indissoluvelmente ligado ao
enunciado e a formas típicas de enunciados, isto é, aos gêneros do discurso.
Segundo o autor, todo enunciado possui um estilo individual, mais perceptível
em uns gêneros (os literários, por exemplo) e menos em outros (documentos
oficiais), que requerem formas padronizadas. Na opinião dele, as palavras
evocam uma profissão, um gênero, uma época, um grupo social e um
“contexto” ou “contextos” onde vivem. Também Possenti (2001, p.245)
assegura que certas escolhas158 são condicionadas uniformemente pelas
circunstâncias. Assim, afirma o autor, o léxico utilizado por alguém que atinge
seu dedo com um martelo não é o mesmo quando esse tem anunciada a morte
de sua mãe.
Partindo dessa premissa, dividimos os textos em formais e informais, e
obtivemos os seguintes resultados: aqueles que utilizam um estilo mais
elaborado, rebuscado, apresentam menos abreviações em sua escrita; ao
156
Se desconsiderarmos esse fator, teremos um falseamento nos resultados.
Vale salientar que esses valores independem da porção textual.
158
Essas escolhas referem-se ao estilo adotado.
157
160
passo que os de estilo mais espontâneo, distenso, são detentores de mais
abreviações. Segundo Possenti (2001, p.244):
Mesmo sem nenhuma pretensão estética, a forma redobra o
conteúdo: isto é, para assuntos triviais, uma forma informal,
para assuntos mais “elevados”, uma forma socialmente mais
valorizada.
Aqui também cabe uma ressalva quanto aos números revelados: no
gênero carta, mesmo aquelas que primam por um estilo padrão, o uso das
abreviações independe desse fator. Como afirmou Bakhtin (op.cit.), as
mudanças históricas dos estilos da língua são indissociáveis das mudanças
que se efetuam nos gêneros do discurso.
Nos demais gêneros, a ocorrência da abreviação está diretamente
ligada ao estilo, ou seja, quanto mais informal, mais abreviação, e o inverso
também. Segundo Bakhtin, as variações estilísticas possuem natureza social e
não individual, refletindo as tendências sociais de uma época e de um grupo
social. Para o autor, o estilo é pelo menos duas pessoas ou, mais
precisamente, uma pessoa mais seu grupo social na forma de seu
representante autorizado, o ouvinte – o participante constante na fala interior e
exterior de uma pessoa (p.13). Também é Bakhtin quem afirma que
selecionamos as palavras em função da pessoa do interlocutor, e esta: variará
se se tratar de uma pessoa do mesmo grupo social ou não, se esta for inferior
ou superior na hierarquia social, se estiver ligada ao locutor por laços sociais
mais ou menos estreitos (pai, mãe, marido etc). Para o autor, selecionamos as
palavras segundo as especificidades de um gênero. Com base nessa assertiva,
inferimos que, a depender do gênero, tem-se um maior ou menor grau de
formalidade e, conseqüentemente, maior ou menor número de abreviações.
Vejamos como se dá o uso da abreviação quando cruzado com a variável
estilo:
161
Gráfico 2
Abreviação e Estilo
100
80
60
Formal
40
Informal
20
0
Diário
Blog
Carta
SMS
E-mail
Como demonstra o Gráfico 2, o processo de abreviação está ligado ao fator
estilo, sendo o informal favorável ao surgimento dele, enquanto o formal, de
certa maneira, inibe o uso de abreviações. A explicação parece estar ligada ao
valor que alguns termos lingüísticos recebem quando avaliados socialmente.
Possenti citando Gumperz (1968, p.220) diz que:
Uma escolha do indivíduo entre alternativas possíveis num
evento lingüístico particular pode revelar seu passado familiar e
sua pretensão social, pode identificá-lo... como polido,
grosseiro...e pode mesmo indicar se ele quer parecer amistoso
ou distante, familiar ou diferente, superiosr ou inferior.
Segundo afirma Possenti (2001, p.231), certas formas lingüísticas são
consideradas mais ou menos elegantes, mais ou menos chulas, mais ou
menos poéticas, mais ou menos exatas. No caso em estudo, a abreviação é
considerada deselegante em um texto formal.
Pelos resultados obtidos, os gêneros e-mail, blog, SMS e diário
apresentam um número maior de abreviações quando o estilo utilizado é o
informal. Aqui mais uma vez o gênero carta não apenas foge a essa regra, mas
vai de encontro a ela: aquelas cujo texto era escrito em um estilo formal
apresentam mais abreviações que as elaboradas em estilo informal. De novo o
fator época é decisivo no que tange à ocorrência ou não de abreviações.
162
Segundo Bakhtin, cada época e cada grupo social têm seu repertório de formas
de discurso na comunicação socioideológica. Aplicamos essa afirmação ao uso
acentuado de abreviações nos séculos XVIII e XIX. A seguir, apresentamos
exemplos de cada gênero trabalhado nos dois estilos, formal e informal.
Vejamos:
CARTA 6: Estilo Formal
Corpus do Projeto Textos Brasileiros dos Séculos XVIII e XIX
1731
Snr’.
Pella frota deste anno dei conta aVMgde. / dos excessos e demazias deq’
uzava D. Antonio / Domingos camaraõ Gouernador dos Indios pa. q’/ Sendo VMagde.
seruido mandasse deuaçar do Seu / proçedimento pello Ouuidor desta capitania.
Depois disso mepedio lça pa. hir acapitania do ce / ara q’ dista desta mais de
200 Legoas a onde foi fazer / nas Madeyras dos Indios as ( ilegível ) declaradas / na
cartajunta de Leonel deAbreu Lima capam. / mor da da. capitania nomeado por
VMagde. q’ proxi / mamte. hauia tomado posse daquelle Gouerno deq’ / me paresseu
ha de dar boa conta.
Fora da da. reprezentasaõ fes outras demazias / pellos caminhos emhuma
Aldeya tirou hũ Me / çionario e por outro, eporrezaõ dos referidos proçe / dimentos dei
orden ao do. capam. mor pa. oprender ca / zo q’ lâ o achasse.Pare siame q’ Sendo
VMagde. seruido deuia orde/ nar ao ouuidor da mesma capitania do cearâ de /
va saçe do procedimento do do. Camaraõ eq’a da. / deuassa sejunte aq’ ca se tirar
noq’VMagde. / mandarâ Rezoluer oq’for seruido.
Recife de / Pernambuco 2 deAbril de1731
CARTA 7: Estilo informal159
Papae,
O Doutor Tavares aqui esteve para dar-lhe o seguinte recado do Marinho: que não tem
podido ap- parecer-lhe pelas muitas occupações que tem tido e que nesta semana que
começa iria sem falta a sua casa.
Disse mais que o Martinneo vendeu a fazenda grande que possuía em São Paulo,
mas que não é a que se limita com a de Vossa Mercê.
Nada mais disse.
Do filho amigoPedro.
Rio, 22 de Dezembro de 1890.
159
As formas abreviadas na carta acima estão escritas em itálico.
163
Conforme dissemos anteriormente, era de se esperar que a Carta 6,
redigida em estilo formal, apresentasse menos abreviações que a carta 7,
elaborada em estilo menos formal. Entretanto, basta deter-nos na saudação da
1ª carta que logo percebemos a utilização de uma forma de tratamento –
Senhor – escrita de forma abreviada – Snr – a que segue todo o texto,
excetuando duas linhas – 3 e 5, as abreviações são encontradas com
freqüência em todo o corpo da carta, mesmo em se tratando de uma carta
oficial, cuja redação é feita em estilo formal. A segunda carta, uma carta
pessoal, cujo estilo é menos formal e, exatamente por isso traria mais formas
abreviadas, surpreende-nos ao apresentar da saudação ao fechamento apenas
duas formas abreviadas, das quais uma é um pronome - Vossa Mercê- e a
outra, uma forma de tratamento, amigo.
BLOG 3: Estilo formal
Vantagem: complementando o jornal
Qualquer matéria sempre fica bem maior do que o espaço disponível. Muita coisa que
seria interessante para os leitores acaba cortada. O blog atua como um complemento
à coluna. No blog, publico a versão original do artigo, sem cortes, com todas aquelas
informações mais detalhadas que não couberam no jornal, como sites das
organizações citadas ou declarações ipsis litteris dos entrevistados. Por isso, seria
impossível pensar minha coluna separadamente do blog. Para começar, fui convidado
para escrever a coluna por causa do trabalho no blog. É no blog que faço minha prépauta online e debato a futura coluna com os leitores. E, por fim, o blog acolhe tudo o
que não coube, ou não foi apropriado para publicação no jornal impresso.
(http://www.liberallibertariolibertino.blogspot.com/) Blig: Provedor da IG
BLOG 4: Estilo informal
quarta-feira, 14 de julho de 2004
ola pessoal passei hj so pra dar um oi pq amanha tem aula cedinhu !!!tenhu q
acordar as 6:30 pra me arrumar e ir estudar né... ne vou por imagem... bjao. ate o
findi!!!
http://farejador.ig.com.br/banner.cgi?url=http:%2F%2Fmaya_love.weblogger.com.br%2
F&returl Blig: Provedor da IG.
164
Como podemos ver, ao contrário do blog 3, redigido em estilo formal, e
por isso mesmo não traz em suas nove linhas sequer uma abreviação, o blog
4, cujo estilo é informal, em suas três linhas, comporta cinco abreviações, o
que representa uma média de quase duas formas abreviadas por linha, a
saber: bj, pq, q, bjão e findi, significando: beijo, porque, que, beijão e fim de
semana, respectivamente.
SMS 2: Estilo informal
Boa noite! Tudo bem com vc? Vc está melhor? Pq vc não responde?Saudades! Bjs!
(M, A, +E, auditor, RE)160
SMS 3: Estilo formal
Oi, seus creditos irao inspirar no dia 12/02 e voce nao podera originar mais chamadas.
Para poder continuar falando normalmente insira novos creditos (Oi, 07.02.05)
TIM INFORMA: cliente TIM TDMA pode enviar TIM Torpedos gratis para outro celular
TIM nos dias 22 e 23/01. Aproveite, envie quantos TIM Torpedos quiser. (TIM
18/01/05)
No mes de Maio, faça uma surpresa para sua mae ! Envie Torpedo do celular e mostre
que voce nao esquece quem sempre lembra de voce. Apenas R$ 0,33/msg. (CLARO
07/05/05)
Semelhante aos blogs 3 e 4, as SMSs 2 e 3, acima, também registram
a ocorrência de abreviações, e maior incidência destas, se o estilo utilizado for
o informal, ou menos formal. Das três SMSs formais, apenas uma traz um
vocábulo abreviado (msg por mensagem), enquanto que são constatadas cinco
abreviações em uma única SMS informal, o que corrobora nossa tese. São
elas: vc, pq, bjs, significando você, porque e beijos.
160
O M diz respeito ao sexo Masculino; o A corresponde à faixa etária Adulto, e o +E indica o
grau de escolaridade do autor, no nosso caso informa que a pessoa é formada. A profissão
vem escrita por extenso. A cidade do informante vem representada pela sigla correspondente,
nesse caso é Recife.
165
E-MAIL 2: Estilo formal
De:
Adicionar endereço
Para:
[email protected],
Assunto:
Plano de Desenvolvimento Institucional -
Data:
Wed, 25 May 2005 12:03:22 -0300
Caros Colegas,
Solicitamos que nos enviem, com a maior brevidade possível, informaçoes sobre a
revisão do tempo restantte para suas aposentadorias, cargo atual (Assistente I,
Adjunto IV...) e maior titulação. Tais informaçoes têm por objetivo traçar o perfil das
necessidades docentes do DLCV nos próximos anos, em especial no triênio 20052008.
Conto com sua colaboração, Prazo. Sexta-feira dias 27/05
Atenciosamente
W
E-MAIL 3: Estilo informal
Wed, 18 May 2005 14:29:27 -0300 (ART)
Data:
De:
Ver detalhes do contato
Assunto:
Re: vou sim
Para:
"fabiana souza silva" <[email protected]>
diga a junior q. se ele nao roncar darei a ele o prazer de compartilhar o quarto com ele
e terei o privilegio de dormir c. ele no meu quarto, sera portanto, uma troca de
privilegios. venham mesmo daremos muitas risadas.já marcou a qualificaçao? e fatima
tens noticias dela??
um abs
Eu
Mais uma vez, aqui, repete-se a regra que diz serem os textos
informais favoráveis à abreviação, e os formais não favoráveis. Nos e-mails
acima, apenas o 3, de estilo informal, traz em suas linhas a ocorrência de
166
formas abreviadas (q, c, abs, para que, com e abraços), ao contrário do 2, onde
forma alguma é escrita abreviadamente, salvo a sigla DLCV (Departamento de
Letras Clássicas e Vernáculas).
DIÁRIO 2: Estilo informal
DIÁRIO 3: Estilo formal161
Por último, o estilo informal utilizado no diário 2 vem ratificar o que
dissemos no início: gêneros cujo estilo é informal favorecem o uso de
abreviações, ao contrário dos formais, como nos mostra o diário 3. Aqui, é
possível observar no diário 3 a presença de abreviaturas (Art. para Artigo), ou
seja, formas cristalizadas, e não abreviações, que seriam variáveis de texto
para texto, de autor para autor.
161
É interessante observar que ao estilo formal estão associadas às abreviaturas, enquanto
que as abreviações ao estilo informal.
167
2. Instância de realização
Essa variável está intimamente ligada à anterior, mais parecendo uma
extensão daquela, visto que geralmente os textos de caráter pessoal, em tese,
fazem uso de um estilo informal, enquanto os de caráter oficial primam por um
estilo predominantemente formal. Levando-se em consideração que as
condições de intimidade entre remetente/destinatário levam a uma situação de
maior ou menor informalidade (PRETI, 2003), esperávamos que os textos
oficiais, via de regra dirigidos a mais de um destinatário, favorecessem menos
que os de cunho pessoal no que diz respeito ao uso de abreviações, uma vez
que naqueles é mantido um maior distanciamento entre os produtores do texto
que nos de natureza pessoal. Nossos resultados corroboraram essa tese,
apresentando um percentual maior de abreviações para os textos pessoais em
detrimento dos textos oficiais, excetuando-se aqui, mais uma vez, o gênero
carta
que,
ao
contrário
dos
e-mails,
blogs,
diários
e
SMS’s,
e
independentemente do volume de palavras, contém mais abreviações quando
são de caráter oficial, ao menos as dos séculos XVIII e XIX, é o que nos mostra
o Gráfico 3, abaixo:
Gráfico 3
Abreviação e Instância de realização
100
Pública
50
0
Privada
Diário
Blog
SMS
Carta
E-mail
Como é possível observar, excluindo o gênero carta, todos os demais – e-mail,
blog, diário e SMS -, são unânimes no uso predominante de abreviação quando
o texto é pessoal e não oficial. Esses resultados corroboram as nossas
hipóteses e estão de acordo com a literatura pertinente. Observemos alguns
dos trechos selecionados nos gêneros estudados:
168
CARTA 8: Instância pública
CARTA 9: Instância privada
Bahia 23 de Março de 1888
Excelentissimo amigo e Senhor Conselheiro João Alfredo Correia d’Oliveira
Esta será entregue a Vossa Excelência por meo particular amigo Doutor Joaquim
Simões (ilegível) e Silva, que vai a essa côrte pleitear uma justa causa. Peço-lhe que o
attenda, certo de que elle é um de meos melhores amigos. Refiro-me ao que já escrevi
a Vossa Excelencia em cartas pelo correio. Disponha do (ilegível) amigo affeiçoado
Inocencio Marques de Araújo Goes
Enquanto a carta pública se restringe a abreviar pronomes e formas de
tratamento (Dr., V. Sª), além do verbo guardar (Gde), a carta 9, tipo privada
(pessoal), abrevia nomes (amigo affeiçoado), pronomes (Vossa Excelência) e
conectores (que).
169
BLOG 4: Instância privada
[Segunda-feira, Fevereiro 28, 2005]
fala aih gentiiiiiiii... blxinha162?? esperu q xim... hihiih... cmg tah td certinhu.. keh diz...
td otiminhuuu... pow... mt tempu q ngm poxta aki neh?? krak meu... abandonu gral du
broguinhuuuu... bom... intaum to eu aki poxtandu neh... hehehhe... nem tenhu
nenhuma 9da10 naum... pra variah um pokinhu... hihihi... axu q eh ixu genti...bjuxxx da
Ra....
Por
As
Mina
Du
IG
às
[9:09
PM]
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=312ENO001
BLOG 5: Instância pública
at 11:19 PM 12/11/2005 Kkkkk......
162
O site comunidade brasileira diz que a troca de letras como o s, ss e ç pelo x busca
representar a ingenuidade de uma criança que está aprendendo a falar.
170
Nesta variável, que ora denominamos Instância de realização, fica
comprovada a influência exercida pelos gêneros do tipo privado (pessoal)
quanto ao uso de abreviações. Basta compararmos os blogs 4 e 5 e vemos que
no segundo, de tipo público, não há uma abreviação que seja em suas seis
linhas. Vale salientar que esse blog, de teor lúdico, é escrito por um informante
jovem, conseqüentemente menos escolarizado, estudante, ou seja, posssui
todos os pré-requisitos para se usarem com mais freqüência abreviações.
Basta lermos o início da mensagem, na qual são utilizadas letras para
representar uma gargalhada (KKKKK), mas logo em seguida, ao dar início ao
anúncio, classificado pelo blogueiro como sendo oficial, sequer uma abreviação
é registrada, a fim de que se dê maior credibilidade à notícia. Ao passo que no
primeiro, privado, com apenas quatro linhas, existem dezesseis abreviações, o
que corresponde a uma média de quatro por linha. Semelhantemente, os SMSs
privados apresentam uma média de duas abreviações por mensagem. Já os
públicos apresentam apenas uma abreviação em três mensagens analisadas,
qual seja: fev para fevereiro.
SMS 4: Instância pública
Oi, sua fatura no valor de 95,11 reais tem vencimento em 11/FEV/2005. Fique atento.
Com sua conta esteja em debito automatico, desconsidere este aviso. (Oi, 10/02/05)
TIM Informa: faça sua recarga atraves do seu proprio celular pelo * 244. Mais
informações acesse o site www.timnordeste.com.br ou atendimento TIM *144. (TIM,
07/03/05)
A partir de 22/02 sua Secretaria Claro tera mudanças. Para ouvir recados recebidos
ate 21/2, ligue * 1077. Para saber todas as mudanças ligue gratis * 2077 (CLARO,
21/02/05)
SMS 5: Instância privada
Ei ta com o tel desligado meu bem. Vou fazer uma prova + tard te ligo bjos (M, A, +E,
Empresário, BA).
Saudade d vc linda! (M, A, +E, Comerciante-PB).
Cheguei agora. Estou sem credt. Pode me v agora? Sim ou não? (M, A, +E, ContadorRE).
171
E-MAIL 4: Instância pública
De:
Y
Para:
Z
Assunto:
Re: confirmação de participação
Data:
Thu, 2 Dec 2004 09:07:45 -0200
Prezado(a) Professor(a)
Acusamos o recebimento da sua confirmação e estamos encaminhando sua
resposta
para o setor competente.
Atenciosamente,
Coperve
E-MAIL 5: Instância privada
Data:
Tue, 15 Mar 2005 09:50:51 -0300 (ART)
De:
X
Assunto:
olá
Para:
"fabiana souza silva" <[email protected]>
pois eh, c. ainda estou sem computador, tenho q. esperar as oportunidades e
assim vou dando noticias aos poucos.agora mesmo estou na UFSC na sl. de
minha orientadora e posso usar o computador, entao a cada dia agendo nomes
pra escrever ou responder.a mensagem q. vc. mandou deve ter sido vista p.
meninas o cel. ficou c. elas.e aí melhor da infecçao e mais disposta, tomara q.
sim.
Um abraço
172
DIÁRIO 4: Instância pública
DIÁRIO 5: Instância privada163
163
Nesse caso, a abreviatura P/ (para) foi registrada, além do sinal de + representando a
conjunção mas.
173
O comportamento observado nos gêneros anteriores não é diferente
com o diário e o e-mail, qual seja: quando se trata de um gênero tipo pessoal, a
probabilidade de haver abreviações é muito maior do que se o gênero for do
tipo oficial, conforme nos mostram os e-mails 5 e 4, respectivamente. O e-mail
4, oficial, não contém uma abreviação em todo o seu texto, ao passo que o email 5, pessoal, traz nove abreviações. Quanto aos diários, é possível afirmar
que, quando estes são oficiais, as palavras não são escritas de forma
abreviada, ao contrário do pessoal. Outro destaque que damos é à presença
de abreviaturas, ou seja, formas já cristalizadas e padronizadas, de uso geral,
em vez de abreviações, que seriam de ordem pessoal, e por isso variáveis.
4. Participantes
Esse terceiro fator, como veremos a seguir, demonstra que, como já
havíamos colocado em nossas hipóteses, os textos que apresentavam uma
correspondência entre o número de participantes favorecem o surgimento de
abreviações no corpo da mensagem. Essa relação é ainda mais estreita nos
gêneros digitais, e-mail, blog e SMS, onde membros de uma mesma
comunidade virtual, cujos interesses são comuns em um dado momento,
partilham um conjunto de valores, objetivos, normas e interesses, assim como
uma história, costumes e instrumentos (ERICKSON, 1997). Em nosso caso,
temos a ocorrência de abreviação como um costume comum e partilhado entre
os autores dos textos, que as utilizam com o interesse de ganhar tempo na
elaboração da mensagem escrita. Os resultados estão expressos no Gráfico 4
a seguir:
174
Gráfico 4
Abreviação e Participantes
100
1XN
50
0
1X1
Diário
Blog
SMS
Carta
E-mail
De acordo com o Gráfico 4, acima, tanto os gêneros tradicionais – carta
e diário – quanto os digitais – e-mail, blog e SMS – registram um número maior
de abreviação quando há uma correlação quanto ao número de participantes
envolvidos no processo. A fim de melhor entendermos a relação entre o uso de
abreviação e o número de participantes, selecionamos exemplos de cada um
dos gêneros aqui estudados. Vejamos:
175
CARTA 10: Participantes
1X1
CARTA 11: Participantes: 1XN
Anno de 1829
Diario de Pernambuco
Segunda Feira 5 de Janeiro.
Bem longe d’entreter opiniaõ contraria / áquella, que sempre entretive do
Thezou- /reiro, e mais agentes do Loteria Publica em / favor do Seminario de Olinda,
notto porem / que que se naõ tenha publicado huma Lista Ge- / ral, empreça, porque
em realidade quem ar- / riscou o seu dinheiro, e na melhor fé, quer / taõbem na
mesma boa fé, ter hum dezenga- / no em forma. Eu ví Srs. Redactores, quei- / xumes
contra o Thezoureiro, que precedeo / o actual, e naõ me atrevo a dizer, que fos- / sem
bem fundados, mas se assim he, elles / taõbem revertem agora sobre o Sr. Martino.
Sou Srs. Redactores.
176
A Carta 10, acima, inserida na categoria 1X1, quanto ao número de
participantes, traz abreviações desde a saudação até o fechamento. O mesmo
não ocorre na carta 11, cujo destinatário é em número maior que um e registra
apenas três ocorrências de abreviações, todas formas de tratamento,
especificamente Sr(s).
De igual modo, o blog 6, abaixo, cuja relação é 1XN, não traz uma
abreviação sequer. Já o blog 7, a seguir, endereçado a apenas um receptor,
tem suas dezoito linhas “recheadas” de abreviações.
BLOG 6: Participantes: 1XN
22/07/2004 11:42 http://fumado_cefeteq.blig.ig.com.br/
Atenção !!!
Por motivos de força maior, o blig não esta mais sendo atualizado todo "dia”
(madrugada). Seguem os motivos:
1º- o blig agora não permite mais de uma atualização por dia (ou madrugada).
2º- Estou sem telefone em casa(brigas constantes com a telemar).
3º- Por mais incrivél que possa parecer, eu estou trabalhando (aliás, estou postando
da agência onde trabalho.).
E por falar em trabalho, se vocês quiserem me visitar, ou se interessarem em se
inscrever na agência. Ai vai uma propagandazinha!!! (A logo abaixo fui eu que fiz.)
BLOG 7: Participantes: 1X1
http://www.mininas_tpm.blogger.com.br/ Terça-feira, Abril 26, 2005
to mó triste ultimamente e ainda sei bem o por quê...td começou com uma paixão q to
sentindo e não sei se queria ta assim......ele é um cara lindo, fofo, me agrada mto
msm, mas ta foda, pois ele ta afim de outra amiga minha e ela tbm ta mo afim dele só
q nenhum dos dois ta sabendo q to afim dele então isso não impede q eles se
aproximem, pois eles nem sabem disso......só q eu me peguei com mto ciúme deles no
domingo qdo fomos a casa dele e lá vi q to a fim msm........
Antes disso td eu tbm aprontei com uma amiga q não merecia o q fiz com ela....cara
amo mto aquela garota e ela sabe qto é importante na minha vida, mas eu fiz uma
cagada com ela sem querer e td por ter ouvido errado as palavras dela momentos q
ninguém consegue explicar mto menos eu........queria não ter feito o q fiz, mas não
posso voltar no tempo e concertar meus erros falei com ela, mas ela me ignora como
se eu fosse uma estranha......assim ta foda e ainda por cima ta chegando época de
prova e desavenças nunca são boas pra ninguém muito menos na época de
prova.......td por causa de um menino q eu nem tava ligando pra ele e ele muito menos
pra mim, mas acabou acontecendo e já não sei o q dizer........só queria pedir
desculpas outra vez.....só sei q queria ta com alguém pra me consolar e me acalmar
nesse momento triste q me encontro................
Bjos e até mais
Ju
177
Também nos SMSs (ver SMS 6 e 7) e e-mails (ver e-mails 6 e 7) a
relação é inversamente proporcional. Ou seja: quanto maior o número de
receptores, menor o número de abreviações. Sequer uma forma abreviada
aparece quando o SMS tem um número plural de receptores (cf.SMS 6). Já os
com um só destinatário possuem mais de uma abreviação por mensagem (cf.
SMS 7).
SMS 6: Participantes: 1XN
Chegaram os NOVOS papeis de paredes do incriveis! Exclusivos para clientes
CLARO. Acesse agora Portal Claro do navegador web do celular e escolha o seu!
(CLARO, 11/04/05)
TIM INFORMA: Megatim Torpedos. Aproveite a promoção ate 30/04 e compre 300
torpedos a R$ 9,90. Você paga menos de 4 centavos por torpedo enviado (TIM
18/01/05)
Coloque os eu Oi no ritmo da MTV, chegou o portal TONS MTV exclusivo para clientes
Oi, são mais de 500 tons para animar o toque do seu Oi (Oi, 03/04/05)
SMS 7: Participantes 1X1
Nao. Estou indo p Goiana c o coral. Amanha te ligo (F, J164, +E, Empresária-PB)
Se puder, ligue pra mim. O seu cel n~ atende. (F, A, +E, Professora - PB)
Essa placa deve c d outro Estado q no site do Detran daqui não consta nada. Tem q
saber qual o estado pra poder olhar o site (M, J, +E, Servidor Publico – PB)
Bom dia bb! (M, A, +E, Auditor - RE)
No caso dos e-mails, fizemos questão de pegar tanto aquele cujo
número de participantes era igual quanto o de número plural de receptores de
um mesmo informante, visando explicitar o fenômeno. Dessa forma, quando o
autor do e-mail dirige-se a mais de um destinatário (ver e-mail 6, a seguir), não
usa ou ao menos evita usar abreviação; enquanto que as utiliza quando o
receptor é uma só pessoa, conforme vemos no e-mail 7, abaixo.
Aqui, o F é o símbolo utilizado para o sexo Feminino, e o J diz que a pessoa está inserida na
classe dos Jovens.
164
178
E-MAIL 6: Participantes: 1XN
Data:
Thu, 24 Mar 2005 20:02:54 -0300 (ART)
De:
W
Assunto:
novo telefone
Para:
D
Olá amigos! já tenho telefone em Floripa. eh 48 232-1148, se precisarem de
alguma coisa eh só ligar. Feliz Páscoa
Um abraço,
Z
E-MAIL 7: Participantes: 1X1
Wed, 23 Mar 2005 20:21:17 -0300 (ART)
Data:
De:
Ver detalhes do contato
Assunto:
Re: Depoimento emocionado de Luiz Fernando Veríssimo
Para:
"fabiana souza silva" <[email protected]>
Adorei!!!!!!!!!!!!!!
já soube q. conversou bastante com nosso ídolo, me conta tudo, vai....
por aqui tudo ótimo
bjos
É interessante observar que, de acordo com os exemplos acima, emails 6 e 7, a depender do número de participantes, o autor do texto utiliza um
maior ou menor número de abreviação. No caso desse remetente, a mesma
pessoa nos dois e-mails, temos uma ocorrência explicitamente maior de
abreviações quando o número de participantes é igual, ou seja, 1X1, e menor
quando não há uma correlação entre eles, nesse caso um remetente para
vários destinatários.
179
DIÁRIO 6: Participantes: 1X1
No gênero diário, a regra permanece: quando escrito para uma só
pessoa, o número de abreviações é superior àquele cujo destinatário é em
número plural, como demonstra o diário 7, no qual a única forma abreviada é
nº, além da sigla FG-5 . No diário 6, as formas mais, para e Santa foram
reduzidas a +, p/ e Sta, respectivamente.
DIÁRIO 7: Participantes: 1XN
180
6. Propósito comunicativo
Seguindo a sugestão dada por Thomas Erickson (1997), quando da
observação do discurso on-line, escolhemos a variável Propósito Comunicativo
como sendo a quarta analisada em nosso trabalho, a fim de estabelecer a
relação existente, se é que há, entre o uso de abreviação e o propósito a que
se destina o texto. Estendemos aos gêneros carta e diário o cruzamento com
esse fator, uma vez que entendemos que não há texto ou discurso neutro, sem
objetivo, sem propósito. Em outras palavras, quando o locutor busca produzir
um efeito dentre os admissíveis, tem que escolher em meio aos disponíveis,
tem que “trabalhar” a língua a fim de impetrar o efeito desejado (POSSENTI,
2001, p.215).
Como já dito anteriormente, acreditamos que os textos cujo propósito é
informar apresentam menos abreviações do que os textos em cuja redação há
uma escrita com menor grau de informatividade e maior teor lúdico em seu
discurso. Denominamos como lúdicos aqueles textos que visam mais ao
divertimento que a qualquer outro objetivo. No Gráfico 5, abaixo, temos
demonstrado o comportamento da abreviação quando relacionada ao propósito
comunicativo do produtor do texto:
Gráfico 5
Abreviação e Propósito Comunicativo
100
Informar
50
0
Divertir
Diário
Blog
SMS
Carta
E-mail
181
Conforme observamos, há uma retenção praticamente categórica do
uso das abreviações quando o texto possui um propósito único ou primordial de
informar, o que não elimina a existência de abreviações em si. Em
contrapartida, aqueles cuja temática gira em torno de um discurso lúdico, com
caráter de diversão, apresentam mais abreviações em suas mensagens. Esses
dados ratificam o que diz Possenti (2001, p. 259) citando Gumperz (1982)
acerca da escolha da linguagem em detrimento da situação:
O falante é considerado capaz de variar não só segundo o
contexto, o que é relevante, mas segundo seus objetivos (grifo
nosso), embora não necessariamente esteja consciente desse
fato.
Dentre os gêneros selecionados aqui, todos os da esfera digital
corroboram essas afirmações. Daqueles ditos tradicionais, a carta foi o único
que não obedeceu à regra, utilizando abreviações independentemente do
propósito a que se prestava, informar ou divertir. Mais uma vez é mister
lembrarmos que estas estão situadas nos séculos XVIII e XIX, período em que
a tradição no uso de abreviações ainda era mantida. Os exemplos a seguir nos
dão uma noção clara de como o uso de formas abreviadas está ligado
diretamente com o propósito comunicativo do autor do texto:
Se observarmos as cartas a seguir, veremos uma maior ocorrência de
formas abreviadas na Carta 12, e um número bem menor na Carta 13, embora
se trate de um texto lúdico. A razão para tal acontecimento se deve ao fato de
ser essa impressa e não manuscrita, como aquela. Ou seja, a depender da
tecnologia utilizada (manuscrita, impressa ou digital), teremos um maior ou
menor uso de abreviações.
182
CARTA 12: Propósito informativo
Illmo e Exmo Sr General Prezide. emais Sres Deputados.
Passe do que constar. Re. em Iunta de 14 de Outubro de 1794
N 1o
(ilegível) LuRoy Coelho da Sa.
Dizem os admenistradores actuaes doContracto / dos Dizimos Reaes desta Capitania
quesendo publico que a / Real Iunta admenistrou estemesmoContracto alguns / annos
antes d’ arremataçaõ quefizeraõ seusConstituintes / e que parabem desua Iustiça lhes
heprecizo queesta Re= / al IuntadaFazenda lhemande dar porCertidaõ / se o
Engenho Uboca sito na FregueziadeSerinhaem per= / tencente aos Religiozos
Carmelitas dareforma Toroni= / eapagou Dizimo do açucar quefez, aquantidade
deCaixas, / earrobas querecebeo aReal Fazenda, easim mais a / copia
daprimeiraCondiçaõ do Termo dasua aremataçaõ.
P. aV. Excia. e Mces. Sejaõ ser= / vidos mandar aos Suppes. aCertidaõ
E. R. Mces.
CARTA 13: Propósito lúdico
Paris— 13 de Janeiro 79.
Presado João Alfredo,
Espero que esteja muito melhor; n’este caso e se puder sahir, venha jantar hoje
conosco ás 7 horas en famille. Os Penêdos são as unicas pessôas estranhas como
estão de passagem para o Sul, me fazem o obsequio de nos dar algumas horas para
estarmos juntos.
Sempre.
Primo e Amigo affeiçoado
Nioac.
Corroborando nossa hipótese, os demais gêneros seguem a mesma
regra: se o texto é escrito com um propósito lúdico, e não informativo, tem-se
um uso acentuado de abreviações, conforme nos mostram o blog, SMS e-mail
e diário, cujo propósito não é primordialmente informativo.
BLOG 8: Propósito informativo
Parâmetros novos
O professor Jay Rosen, da Escola de Jornalismo da Universidade de Nova York e um
dos participantes da reunião na Universidade de Harvard, publicou um rascunho de
sua apresentação no qual segue a mesma linha desenvolvida por este Observatório
"Blogs surfaram no tsumani", para afirmar que a cobertura da tragédia asiática
mostrou que os repórteres amadores podem ter um papel essencial na informação
pública, especialmente em situações de calamidade. Isto foi reconhecido até pela
183
grande imprensa e acabou contribuindo para tornar anacrônica a dicotomia entre blogs
e jornalismo. Começa a surgir um consenso de que o problema não é o diploma ou o
registro, mas sim a credibilidade. E é neste sentido que apareceram alguns dados
novos, como por exemplo, o depoimento do dublê de jornalista/blogueiro Christopher
Allbritton, que ficou famoso por ter ido por conta própria a Bagdá, em 2003, para cobrir
a invasão americana pelo seu blog Back to Bagdá. Em entrevista à revista Wired,
Allbritton admitiu que no começo do seu trabalho no Iraque a emoção pessoal falava
mais alto, mas, quando começou a ser lido por 25 mil visitantes diários em seu blog,
ele sentiu necessidade de ser muito mais preciso nas informações porque senão suas
reportagens deixariam de ser confiáveis. O blogueiro de Bagdá não é o único e nem o
primeiro jornalista que começa a descobrir que a busca de novos parâmetros de
credibilidade não está nas reuniões de diretoria dos jornais e televisões, mas entre os
leitores, ouvintes, navegadores e espectadores. São eles que detêm a chave do
enigma que jornalistas e o público devem decifrar.
BLOG 9: Propósito lúdico
[Segunda-feira, Outubro 18, 2004]
GALERINHA!!!
Por motivos de força maior!! Eu to pregui de postar o meu blog!!! Hehehe] só to aki
pra avisar vcs q eu postei fotos novas no meu flog!! Entrem lá!!!
Www.clauvillaca.fotoblog.uol.com.br por C v M de o * 10:41 pm
www.clauvillaca.zip.net
SMS 8: Propósito informativo
Oi, sua fatura no valor de R$ 80, 90 reais tem vencimento em 11/MAR/2005. Fique
atento. Com sua conta esteja em debito automático, descons (Oi, 07/03/05).
Promoção Natal e Claro. Cadastro confirmado. Você escolheu ganhar R$ 600 de
bônus em 24 parcelas. Insira créditos todo mês para ganhar. CLARO que você tem
mais (CLARO, 14/04/05).
SMS 9: Propósito lúdico
Karoll vc é 1 ds minhas melhores amigas continue sempre assim te adoro Kiss. (F,
J, -E, Estudante-PB)
Uma conclusão: gosto de vc; um desejo: estar com vc; um voto: suas felicidade;
uma ideia: ter vc perto d mim; um sonho: vc me querer; uma emoção: meu 1 beijo
c/ vc; um dia longo: te amando; um pedido: q vc me ame; um objetivo: conquistar
vc; um ciúme: so d vc; um medo: d te perder; um aviso: estou t esperando.(M, J, E, Estudante-PB)
184
E-MAIL 7: Propósito informativo
Data:
Sun, 6 Mar 2005 11:46:55 -0300
Assunto:
En: proposta dedução no IRPF - v amos lutar!
De:
Para:
Adicionar endereço
"fabianasouzasilva" <[email protected]>
Assunto: proposta dedução no IRPF - vamos lutar!
Caros colegas,
Considerando o arrocho a que vimos sendo submetidos historicamente e o
desgoverno na aplicação das verbas arrecadadas pelos tributos, venho
refletindo há muito sobre propor um projeto que nos dê um "pequeno refresco
no bolso”. Ganhamos pouco e ainda "pagamos para trabalhar", pois não temos
auxílio transporte, paletó, assessoria, etc etc etc como recebem os senhores
Deputados que elegemos para nos representar. Por isso, estou encaminhando
uma sugestão de texto abaixo que pode ser "bombardeada" sobre os
deputados em Brasília (IRPF é Federal), para que torçamos por um efeito
similar ao que houve com a sem-vergonha lei pretendida pelo Sr. Severino
Cavalcante. * Acesse o site da Câmara dos Deputados:
http://www.camara.gov.br/internet/faleconosco
* Em "Escolha o assunto", selecione "Participação Popular".
* Em "Participação Popular", selecione "Sua proposta pode virar Lei".
* Em "Sua proposta pode virar Lei", selecione "Ouvidoria Parlamentar".
* Em "Ouvidoria Parlamentar", selecione "Entre em contato".
* Em "Escolha o assunto", selecione "Deputados".
* Em "Escolha o assunto", selecione "Solicitar".
Em seguida preencha o formulário e encaminhe nossa proposta.
Texto sugerido:
Senhores Deputados,
Em função dos gastos operacionais do exercício da função de Professor do
Ensino Superior, que implica aquisição continuada de livros, equipamentos de
informática (incluindo upgrade), assinaturas de periódicos e de associações
acadêmicas, proponho a criação de dispositivo de abatimento mensal de 15%
sobre o valor dos vencimentos numa rubrica como "gastos operacionais da
docência superior" nas regras do IRPF, a partir do ajuste 2006.
185
E-MAIL 8: Propósito Lúdico
Data:
De:
Wed, 27 Apr 2005 10:35:35 -0300 (ART)
Adicionar endereço
Assunto:
Vida
Para:
"Fabiana Souza" <[email protected]>
Oi,
Recebi esta msg de uma amiga e achei tão linda e importnte q resolvi q vcs
precisavam conhecê-la.Karla, Josivan, Rachel e Wilavia, sinto muita saudade de
vcs !!Rafa recebi essa msg de Thereza!!Karenina, Kd vc??? Saudades!!Liana,
mostra p tua mãe!!E beijos a todos !!!
Mi
DIÁRIO 7: Propósito informativo
186
DIÁRIO 8: Propósito Lúdico165
7. Suporte
Como já havíamos mencionado no início do nosso trabalho, são três
as tecnologias aqui estudadas: a do manuscrito, a do impresso, e a do digital. À
primeira correspondiam como suporte da escrita os papiros e os pergaminhos,
até que chegasse o papel, material utilizado a partir da sua descoberta pelos
chineses, e que veio baratear a escrita, já que seu antecedente, o pergaminho,
apresentava um preço muito elevado. Na era do impresso, o papel já estava
difundido o bastante para que todos quanto dele faziam uso tivessem seus
escritos divulgados sem maiores despesas.
165
Neste caso, a palavra quarta é substituída pelo ordinal 4ª, a preposição para por P/, a
conjunção mas por +, a expressão mais ou menos, por + ou -, e a conjunção quando reduzida
a qdo.
187
A era digital surgiu anunciando o fim do papel, uma vez que tudo a
partir dela seria arquivado em memórias virtuais. Assim, a razão que fizera com
que surgissem as abreviações, qual seja, o elevado preço do material da
escrita, o pergaminho, na era do impresso e do digital, já não tem mais razão
de ser. Entretanto, mesmo com a propagação do papel e a alta tecnologia da
tela do computador e do telefone celular (suporte das mensagens de texto), as
abreviações não tiveram sua extinção decretada. Ao contrário, se pudemos
notar uma redução destas no impresso, o mesmo não ocorre no digital, que
parece fazer com que as abreviações ressurjam com tamanho destaque, a
ponto de provocar não só interesse e curiosidade, mas também polêmicas166.
O mais notável de tudo é que, dentre todos os sinais, símbolos e
siglas, sem esquecer os emoticons, muitos deles têm semelhanças com os
sinais abreviativos utilizados nos pergaminhos e inscrições latinas datadas do
século II a.C. A partir dessas informações, vimos como imprescindível a
inclusão da variável Suporte no processo em estudo, a fim de comprovarmos
ou não a relação dos meios utilizados e a ocorrência da abreviação. Após
analisarmos os dados, obtivemos os seguintes resultados: o material que
corresponde à tecnologia manuscrita, no nosso caso as cartas, cujo suporte é o
papel, apresenta mais abreviações que os da tecnologia impressa (embora
aqui também o suporte utilizado seja o papel) e da digital, havendo nesta última
uma retomada daquelas. De suma importância é ressaltar aqui o fato de ter
sido o volume de exemplos e a porção de textos analisados distribuídos de
forma igualitária o que descarta a hipótese de possível má distribuição da
amostra. No Gráfico 6, a seguir, temos expressos os valores correspondentes
ao processo da abreviação e sua relação com o suporte:
Visto que alguns pais associam o uso da escrita abreviada a algum tipo de desvio de
comportamento que necessariamente prejudica o desempenho do filho nas relações sociais,
principalmente na escola, professores há que defendem o uso da abreviação em seu “habitat”
natural, ou seja, na linguagem da tela; sendo porém preservada a forma padrão das palavras
em suas atividades acadêmicas.
166
188
Gráfico 6
Abreviação e Suporte
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Papel
Celular
Computador
É visível o papel que o suporte exerce quanto ao maior ou menor uso
de abreviações nos textos produzidos. Como já era esperado, o meio impresso,
mesmo tendo o papel como suporte, no caso das cartas e diários, é aquele que
menos favorece o surgimento de abreviação: de um total de 60 textos, apenas
os que contêm pronomes de tratamento registram abreviações, o que equivale
a um total de 10%, uma vez que das dez classes de palavras existentes,
apenas uma é abreviada. Em seguida vem o digital, que engloba o computador
e o celular, com 50% de ocorrências em 180 textos, contra 95% de abreviações
em 60 textos manuscritos, meio por natureza propiciador do surgimento de
abreviações. Vale ressaltar que, embora o suporte aqui seja o papel,
semelhante ao caso dos impressos, a tecnologia manuscrita prevalece,
fazendo surgir mais abreviações que no impresso. Ou seja, o fator
determinante para um maior uso de abreviações não é apenas o suporte, mas
também a tecnologia utilizada. Entendemos como tecnologia, processos,
métodos, meios e instrumentos utilizados em domínios da atividade humana
(cf. HOUAISS, 2001, p. 2683). No nosso caso, trata-se da escrita. De um total
de 300 textos, 153 apresentam abreviações. Esses resultados permitem-nos
inferir que, tanto na tecnologia manuscrita quanto na digital, onde há uma
relação direta da mão com o texto, ao contrário da tecnologia impressa, a
189
recorrência ao uso de formas abreviadas é visivelmente maior, já que a
necessidade de economizar tempo leva a uma simplificação lingüística.
Observemos os exemplos abaixo:
PAPEL – CARTA:
Corpus do Projeto Textos Brasileiros dos Séculos XVIII e XIX
1729
Sor.
He VMagde. Seruido por ordem de 14 de / Dezembropassado q’ eu mande
Logo dar premçi/pio a caza da camara, e cadeya desta vila do Re/çife, com o
dinheiro depozitado q’ Remanesseo do / Subçidio Lançadopa.hú molhe q’ aqui Se
fes, eo’q / faltaçe pa. ella Seempuzeçe por finta ou como me/lhor paresese, e mais
Suaue ao Pouo, e eu o con/cordasce com os offes. da camara.
Em execusaõ desta ordem fica esta obra posta / apregaõ pelos mesmos
offes. da camara, pa. Sea/ Rematar o qm. mais barato afizer, por opontamtos. / feitos
pelos offes. emginheiros, como Se costuma / praticar nas obras de VMagde.
pelaplanta q’oz mesmos emginheiros hauiaõ feito deq’ dei conta / a VMagde.
E pelo q’ tenho comferido /com os dtos. offes. da camara o dinheiro q’ faltar Se /
tirarâ por huma finta, aqual eide procurar Se / Safeita com igualdade poçiuel, eq’
emtudo Sefas/sa esta obra com a aRecadassaõ nessesa. e com abre/uidade
poçiuel pela neçeçide. q’ ha della, deq’ dou com/ta a VMagde. Recife
dePernambuco 21 de Mayo / de1729
DuarteSodre Pereira
O primeiro suporte que destacamos é o papel-carta que, como aludido
antes, substituiu o pergaminho, principal responsável pelo surgimento de
abreviações. Como podemos observar na carta acima, o uso de formas
abreviadas é tão corrente que apenas uma linha não registra alguma redução.
É mister, porém, lembrar que quando as cartas, fossem pessoais, oficiais, ou
ao leitor, eram impressas e não manuscritas, as formas abreviadas se
restringiam a abreviaturas, ou seja, formas padronizadas, de uso geral e que,
na maioria das vezes, eram pronomes e formas de tratamento.
Os
demais
gêneros,
blogs,
e-mails,
SMSs
e
diários
têm
comportamento similar, embora os suportes sejam a tela do computador, o
telefone celular e o papel, respectivamente. Contudo, há uma presença maior
de abreviações nos gêneros cujo suporte é o computador, visto que a própria
linguagem utilizada nesse suporte prima por uma redução. Se atentarmos para
o próprio nome dos gêneros que dele fazem uso, perceberemos que todos têm
190
seu nome abreviado ou associado a uma sigla – BLOG (de weblog), e-mail (de
electronic mail), CHAT (de chatter), WEB (de world wide web), entre outros. A
busca por economizar tempo (e dinheiro), a fim de se alcançar uma escrita
mais rápida, leva os usuários desses gêneros, e também do SMS, a
escreverem de forma abreviada, elevando o número de simplificações
lingüísticas nesses suportes.
TELA DO COMPUTADOR:
Data:
De:
Tue, 19 Apr 2005 11:55:18 -0300 (ART)
Adicionar endereço
Assunto:
Livro
Para:
"Fabiana Souza" <[email protected]>
Oi, Fabiana sei q vc é super ocupada + gostaria de te pedir um favor muito
grande, vc teria como me conseguir o seguinte livro: Princípios de Lingüistica
Geral, Ed. Vozes, Autor: Mattoso Câmara.Por que eu me comuniquei com outra
profª e ela me disse p começar a ler esse livro o mais breve possível, pois ela
me disse q poderia me orientar por onde eu devo ca,minhar p entrar no
mestrado.Se não for incomodo lhe poedir isso pq eu não tenho acesso a
nenhuma biblioteca e caso vc consiga eu tiro uma xerox eu leio logo e te
devolvo. Vc é quem diz, tá Ok?
Agradecendo antecipadamente,
M
TELEFONE CELULAR:
A) q deus cm a sua imensa sabdoria, trag-lhe paz,
alegria e principalmnt mta flicidad, pos vc merec, pq e
mto “spcial” fliz ano novo...! q em 2004 vc reali (sic) seus
sonhos (m, a, +e, balconista-pb).
B) Seu celular tem 1 ligacao perdida de 08388034663,
08/05, 18:20. CLARO
191
C)
,,,,
.*.
( , ”)
(“ ,)
(‘)==() () (‘)
,,,,
.*.
( , ”) (“ ,)
(‘)==() ((‘)
,,,
*.
( ‘X’ ,)
(‘)==()
(‘)
Um bjo p/ vc!
Assim como nos e-mails e nos blogs, a presença de uma escrita
abreviada, com sinais e símbolos, além da utilização de emoticons para
exprimir os sentimentos do autor do texto, nos SMSs também encontramos
uma escrita híbrida, que se utiliza de vários recursos, entre eles letras com
valor fonético, signos transformados em ícones, bem como o recurso à
ideografia numa tentativa de simplificar ao máximo os elementos da escrita.
Pudemos observar claramente esse fato, ao analisarmos os exemplos a, b e c
acima. No exemplo c, o usuário do SMS utiliza apenas sinais do teclado para
criar imagens que dispensam o uso de palavras que, quando são utilizadas,
sofrem abreviações (bjo por beijo; p/ por para; vc por você).
• Das variáveis estruturais
1. Extensão do texto
Nos gêneros tradicionais, a carta e o diário, foi possível observar que,
naquelas, tanto as que continham mais ou menos que dez linhas traziam em si
alguma abreviação, quer na abertura, saudação ou fechamento. E mais:
algumas tinham esse recurso de forma diretamente proporcional, ou seja,
quanto maior o tamanho do texto, maior o número de abreviações nele
contidas. Esse fator é comum às cartas de RE, PB e BA. Quanto ao gênero
192
diário, é visível a relação que há entre a extensão do texto e a probabilidade de
nele ocorrerem abreviações. Atribuímos a essa constatação o fato de ser
limitado, espacialmente falando, o local reservado para o autor fazer suas
anotações diárias, o que o leva a ou resumir os fatos, ou narrá-los sem cortes,
mas com palavras escritas de forma abreviada. No que concerne aos gêneros
digitais, o SMS é aquele que, por natureza, delimita ao usuário o número de
caracteres de que este pode dispor em seu texto – de 150 a 160, incluindo
acentuação e pontuação -. Assim sendo, o autor da mensagem de texto vê-se
obrigado a fazer uso de um maior número de abreviações, a fim de poder dizer,
em poucas linhas (caracteres), aquilo que certamente despenderia mais
palavras. Em seguida vêm os blogs e e-mails, ambos pessoais, já que estes,
quando oficiais, contêm bem menos abreviações em si. Convém lembrar
também que esses dois últimos gêneros citados, em geral, são menos
extensos quando apresentam um caráter privado, e não público, o que talvez
favoreça, em parte, o número reduzido de abreviações, uma vez que a
mensagem em si já é curta, abreviada. O fenômeno da abreviação fica mais
bem visualizado a partir dos números fornecidos pelo Gráfico 7:
Gráfico 7
Extensão do Texto
100
90
80
70
60
até dez linhas
mais de dez linhas
50
40
30
20
10
0
carta
diário
blog
sms
e-mail
193
Podemos concluir, pelos números expressos, que os autores dos
gêneros carta, blog e e-mail fazem uso de abreviações quer tenha o texto mais
de dez ou até dez linhas. Em outras palavras, independente da extensão do
texto, neles haverá abreviação. No que concerne aos dois outros gêneros,
quais sejam: diário e SMS, se o texto ultrapassa as dez linhas, a probabilidade
de usar abreviações tende a aumentar. Ou seja, quanto maior o texto do diário
ou do SMS, mais reduções as palavras sofrerão. Vejamos alguns exemplos:
CARTA 14
(até 10 linhas)
1745
Illmo e Exmo Snor
A planta que semeapresenta Com o despaxo de V. Exa Rubrica / da com asua
Rubrica, aqual planta pertense O Rdo pe Ga-‘briel de Malagrida Messionario
Apostolico por Em execução / nava de Igarassû naõ se Excedendo ao Risco
daplanta e perfil / aprezentado acho naõ ter forma de hospicio, nem Comvento/
p’q’ careça de Igreja e Claustro e só acho ser hum Edeficio / de Casas
Ordinárias ao uso do Pay, e he oq’ posso informar a V. Exª.
Re a 15 de Ag.to de 1745.
Fr: Estevão do Loretto
JorgEAntunes.
194
CARTA 15
(mais de 10 linhas)
1759
Illmo. e Exmo. Sn’r.
Aesta Igreja cathedral de Pernco. pertence o Espolio; q’ ficou, pr. / morte do
Exmo. Bispo da mesma D. Fr. Luiz de Sta. Thereza; como Bis- / po Regular, q’ era
Religiozo professo da Reforma descalsa carmelitana / q’he falecido, sem testamto: no
cazo q’. tivesse Indulto Apostolico para / testar em tal cazo hê herdeira àSua Igra. deq’
sou indigno SuceSsor. E / como tal, devo procurar o tal espolio, tal, equal elle seja,
mto., ou pouco. E por / iSso, quà nesta Provedoria, tenho procurado, a parte da sua
côngrua, / que tinha vencido em sua vida, enaõ tinha cobrado.
Agora àvizo ao meu Procurador; para q saiba de V.Exa. / o como sehade haver
na materia, pois me fez reparo, dizer-me na frota / pasada, q’ de ordem de V.Exa. fora
ver os Pontificaes do dito Exmo. Prelado, / para se comprarem por conta de Sua
Mage. qdo. elles, e tudo oq’ lhe / pertencia, por Dirto. hê da Sua Igra. como Sua
herdeira de q’. oBispo / actual tem a administraçaõ: E Se os Pontificaes deste Prelado,
e todo o / Seu espolio, qual elle seja; hê desta Igra. olindea, juntamte. reparei / em Se
me dizer, Se mandaraõ comprar, ou Se compraraõ para oBispo / de Angro, qdo. São
desta Igra: e como taes, devo solicitar todo o espolio / como pte legma. a quem
pertence.
O Exmo. Bsipo falesceo, na caza deD. Antonia Ma / riana Thereza Salgado,
veuva, de Anto. (ilegível) Sua parenta; q’ / terâ em arrecadaçam odito espolio; poes
bem terâ sabido; q’ naõ po / podia Ser herdeira de Seu Tio Bispo Religiozo proffesso
doCarmo descalço.
Os moveis q’ aqui consta, pelos familiares; q’ S.Exa. Le- / vou da qui para
Lisboa saõ os do rol junto; dos quaes, os q’ ficaram / por sua morte, enaõ constar
legitimamte q’ tivesse desposto em vida, / como podia fazer, ou Se despendessem
noseu funeral: tudo omais q’ / restar, pertence a esta Igra.
Tam bem hê certo, q’ Sua Exa. naõ tinha divida algúas / porq’ Supposto tiveSse
contas com a dita Sua parenta; hê certo tam / bem, q’ jâlhe naõ devia couza alguma;
porq’tudo tinha jâ Satisfei- / to com aSua chegada a Lisboa: Porem Seligitimamte.
constasse dealgúa / devida certa; citada apte naõ hâ duvida, q’ o espolio a devia
pagar.
Isto hê o q’ eu alcanço; porem poderâ haver outra couza / em contrario; por
iSso tudo Sugeito à acertada desposiçaõ de V.Exa. fiz / nesta àrrecadaçaõ por
entender, q’ aiSso sou obrigado em consciencia / em nome desta Igra. q’ taõ
indignamte. administro. V.Exa. rezolverâ / o q’ for Servido.
Deus gde. a V.Exa. ms
anns . Olinda 12 de Março de 1759
De VExa.
Illmo. Exmo. Sor. Thome Joachim da Costa
Se. Capelaõ mto. (ilegível)
Corte Real do Conso. de S. Mage. fidelíssimo Seu
Bispo de Olinda
Secretario de Estado do Ultramar.
SMS: (mais de 10 linhas)
Não te considero d+ pq tudo q é d+ sobra, e tudo q sobra é resto. Mas te
considero d - pq tudo o que falta é raro, assim como vc. Parabéns!(F, A,
auxiliar de enfermagem - PB).
(menos de 10 linhas)
Não vo ligar pq to s/credito, + to vivo!(M, A, servidor público – PB ·).
195
BLOG: (mais de 10 linhas)
15/11/2005 12:45...começando outro blog depois d mto tempo...primeiro post eh
sempre uma merda, eu nunca sei oq escrever, mas jah q a Poleti insistiu, aki
estou eu..alias,eu soh fiz outro blog pq vc praticamente mandou, vc gosta d
ficar fuçando na minha vida neh sua vaca uahuahauhauhauhauhauahbom, fim
d semana,pra variar, sai com a Mary e com a Li pra beber, mas dessa vez eu
naum fikei bebada, milagre! Hihihi ontem eu passei o dia td assistindo filmes q
eu jah tinha visto pelo menos umas 2 vezes e comendo pipoca... foi mto bom
hihih e hj eu naum fiz nada.. to tomando coragem pra fazer uns trabalhos da
escola, mas falta vontade........ aaahhhhhh eu qro férias!huuummmm num tem
mais nada pra escrever eu acho.. num to inspirada hj..bom, esse post eh pra
POleti linda....bjus miga, to com mta saudade viw, te adoro demais!bjusss pra
tds!e antes q alguem fale sobre o blog gótico, eu coloquei esse soh por causa
da cor tah Diego seu inutil! Uhauahauhauaha
BLOG: (menos de 10 linhas)
Postado
por
.:: Comentários (1)
<#Srta.K#>
às
13:53:26
nossa hoje eu to na maior depre, terminei com o rafa , aki em ksa tah um
merda
eu naum aguento +, eh muita pressao em cima de uma pessoa só.
preciso de ajuda, agora vamos ver quem sao meus verdadeiros amigos.
o jogo começo.....xau xau!!!!
E-MAIL: (menos de 10 linhas)
Data:
De:
Tue, 19 Apr 2005 11:55:18 -0300 (ART)
Adicionar endereço
Assunto:
Saúde
Para:
"Fabiana Souza" <[email protected]>
Oi!!! obrigada pelas mensagens. e vc. c. está? melhorou? espero que sim. em
recife vou ficar trocendo p. tudo dar certo em sua cirurgia. um abraçao
M
196
E-MAIL:(maisde10linhas)
Data:
Tue, 19 Apr 2005 11:55:18 -0300 (ART)
De:
M
Assunto:
Vídeo
Para:
"Fabiana Souza" <[email protected]>
Adicionar endereço
Oi gente,
Um video q meu irmão me mostrou e q eu achei MUITO
bom, por isso estou compartilhando com vcs, espero q vcs
gostem (espero, kkkkk)
Naum deixem de visitar meu gigafoto (aproveitando p
vender o meu Jabá, hehehe) www.mch.gigafoto.com.br
E p quem tem Orkut vejam essa comunidade qo meu
amigão Rafael (Obrigada Rafa) fez p mim, kkkkk,
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=6094676
Mi
DIÁRIO: (mais de 10 linhas)
197
(menos de 10 linhas)
2. Extensão do vocábulo
Para
nossa
surpresa,
melhor
dizendo,
contrariando
nossas
expectativas, a freqüência de abreviações em textos digitais ou tradicionais
está longe de apresentar uma relação direta com o tamanho da palavra. Os
dados nos revelaram que palavras polissílabas, trissílabas, dissílabas e
monossílabas são impiedosamente abreviadas, chegando algumas delas a
conter apenas uma de suas letras, como é o caso de que, não, de, escritas q,
ñ, d. Fato oposto a esse acontece nas cartas dos séculos XVIII e XIX, nos
Estados da PB, PE e BA, onde algumas palavras, em geral polissílabas
contendo mais de dez letras, apagam duas ou apenas uma delas, contrariando
o princípio da abreviação, que é abreviar por economia.
Um dado que achamos relevante nos nossos resultados diz respeito ao
apagamento de a palavra recair quase categoricamente sobre as vogais. A
esse respeito, no site www.duplipensarnet167 há um artigo intitulado O erro de
português entre a retórica e a dialética, publicado por Ana Flávia L. M.
167
Acessado em 10. 03. 2005.
198
Gerhardt, que trata exatamente dessa questão. Segundo Gerhardt, esse
fenômeno é particularmente interessante, visto que reflete a capacidade da
nossa mente de selecionar em figura as consoantes das palavras, restando ao
fundo as vogais, já que nas reduções estas são quase todas suprimidas,
ficando resguardadas apenas as consoantes. Para a autora, pouca atenção é
dada às vogais quando lemos uma palavra. Segundo ela, isso se deve ao fato
de ser o restante da palavra recuperável a partir do acervo léxico contido em
nossa memória. É exatamente isso que ocorre nas mensagens digitais de um
modo geral: nelas são resguardados apenas os caracteres fundamentais à
leitura. Na visão de Gerhardt
relacionado a isso está o fato de que, numa perspectiva
histórica acerca da evolução dos sistemas de escrita, a
compreensão da linguagem ser feita de sons acarretar a
invenção pelos sumérios, há cinco mil anos, da escrita silábica,
feita apenas de consoantes, que provavelmente foram os sons
que eles isolaram em princípio, sem dar conta ainda de que
elas formavam contínuos junto com as vogais.
Nossos dados corroboraram essa afirmação, tanto nos gêneros
digitais- e-mail, blog, SMS - quanto nos tradicionais – carta e diário. Vejamos o
Gráfico 8 a seguir:
Gráfico 8
Abreviação e extensão do vocábulo
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
monossilabo
dissilabo
trissilabo
polissilabo
199
Vale lembrar que os resultados exibidos no Gráfico 8 são específicos
de determinados vocábulos, ou seja, os monossílabos apresentam 80% de
abreviação se as palavras registradas forem de, que, não, com, por etc; os
dissílabos, com 70% de ocorrência, são em geral beijo, você, cadê, porque
etc; em seguida, os trissílabos, 50%, beleza, saudade; por último os
polissílabos felicidade, eternamente, realidade, entre outras, com 30% de
redução. Observemos alguns exemplos coletados:
BLOG:
Hotmail
Domingo, Julho 17, 2005
Parei de mexer com templates da trabalho d+.... To mexenu gora com meu
flogao. Como vcs deve ter percebido nem o template é feito por mim... É feito
por um de meus parceiros.
Bom vou ficano por aki mes.
orkut: http://www.orkut.com/Profile.aspx?uid=14476506332741090473
msn: [email protected]
flogao: www.flogao.com.br/wevertonvm
Postado por _WeVeRToN_
•Segunda-feira, Junho 20, 2005•
E-MAIL:
De:
"B M"
Para:
"Fabiana Souza" <[email protected]>
Assunto:
Recife
Data:
Tue, 18 Oct 2005 11:54:03 -0200
Ver detalhes do contato
Fa,
tudo bem c/ vc? E a saúde? Marquei com A para nos encontrarmos na próxima
quarta feira ( dia 26). às 9 horas. Vc vai querer ir tbém? É esse o dia da
abertura do seminário sobre Hipertexto? Qualquer coisa, me avise.
Bjos grandes,
B
200
SMS
Não tem pressa, mas vc q sabe...Se quiser fique a vontade (F, A,
+E;Enfermagem, PB).
Nunca conseguirei ser 100% mas sou o homem q te ama muito! (M, A,
+E, Auditor, RE)
Vejo vc a noite? Eta! (M, A, +E, Auditor, RE)
Já consegui p vc. Minha colega ficou de me entregar sábado qdo então
lhe passo. (F, A, +E; Enfermagem, PB).
DIÁRIO168:
Aqui os termos abreviados são para, com, mais, mas, escritos p/, c/, e +, respectivamente.
Este último representa tanto o advérbio quanto a conjunção.
168
201
3. Classes de palavras
A gramática registra em suas prescritivas páginas a existência de dez
classes de palavras na língua portuguesa, quais sejam: artigo, substantivo,
adjetivo, verbo, advérbio, conjunção, preposição, interjeição, numeral e
pronome. Nos nossos dados, dentre todos os gêneros aqui tratados, apenas
duas não apresentam abreviação: artigo e interjeição. Esta última praticamente
inexiste em nosso corpus; a primeira é categórica na manutenção da forma
original, não apresentando um caso sequer de abreviação. Atribuímos a esse
fato a razão de, em estando no singular, não haver possibilidade de ser
apagado o único elemento/letra que compõe essa classe; quando no plural,
não fazer sentido o registro apenas da marca de plural (s) sem o seu
antecedente o ou a, um ou uma. Das demais classes, os pronomes e/ou
formas de tratamento são os que apresentam um maior número de redução em
suas formas, quer seja o gênero uma carta do século XVIII ou um blog ou email dos dias atuais.
Em segundo lugar, vêm os advérbios terminados no sufixo mente, cuja
ocorrência de abreviação é de aproximadamente 95%. Vale ressaltar que
esses números correspondem ao gênero carta, situado nos séculos anteriores.
Os demais gêneros, compreendidos nos séculos XX e XXI, raramente fazem
uso de advérbios desse tipo e, quando o utilizam, ao menos nos blogs e SMSs,
aplicam o mesmo princípio utilizado nas cartas: escreve-se a palavra até o
início do sufixo e subtrai-se o en, colocando-se o te sobrescrito169 (ex:
atualmte).
Em terceiro lugar estão as preposições (de, para, com, escritas d, pra,
p, c) e conjunções (porque, para que, que, respectivamente, porq, pq, para q,
q) com mais de 90% de aplicação de abreviação. As outras classes restantes,
numeral, adjetivo, verbo e substantivos, apresentam exemplos vários, cujas
formas já possuem até siglas para as abreviações. Os numerais, no gênero
carta, são abreviados em sua maioria (ex: primro por primeiro). Nas cartas, o
único verbo abreviado era o guardar, praticamente categórico quando utilizado
169
Esse recurso é específico dos séculos XVIII e XIX.
202
no fechamento da carta (Deus guarde a Vossa Senhoria por muitos anos,
escrito, Ds gde a V Sª p mtos ans). Nos gêneros digitais, esse número é bem
maior, visto que quase todos os verbos têm ao menos uma de suas vogais
suprimida (bjar, brink, dxou, gstar por beijar, brincar, deixou, gostar). A última
classe, a dos substantivos, também registra um número elevado de
abreviações, tanto nas cartas quanto nos demais gêneros (ksa, bjo, blza, fds,
significando casa, beijo, beleza, fim de semana). É interessante observar que,
na grande maioria, as palavras que têm suas formas abreviadas, assim o
fazem levando em consideração o fato de consoante e vogal partilharem
semelhanças em seus sons, o que leva à assimilação de um deles,
prevalecendo a consoante. A Tabela 1 abaixo nos dá uma visão acerca do
fenômeno da abreviação e sua ocorrência nas classes de palavras.
203
TABELA 1170
ABREVIAÇÃO E CLASSES DE PALAVRAS
C
S
B
Verbo
Pronome
Substantivo171
Preposição
Conjunção
Advérbio
Gde;expda;
P.(peço);
a
T (tenha);R
da(registrada);
eg
ERM(esper
a receber
mercê);Ra(r
espondida);
Responda;
mde(mande
);
Reqr(requer
);
ta
(tenha);
Exmos;Illm
os; qm;
VExa;SExa;
Srias;Sr;
VMage;SM
age;Dmo;
VM(Vossa
Mercê);Vmc
es;Rmo;Rd
a
o;VS ;V.S;V
ia
.S ;Snr;VV
as
SS ;ql;q;da
qla;aqles;qt
o; nd(nada);
;diligas;conseqa;testas;novbro;corr(corregedor);novbro;C
orra(correia);preste;Oliva;Solddo;anns;Vigrro;V.(vila);Igno
;7bro;Desembgor;Glv(Gonçalves);Probide;tito(título);liv.;o
rd(ordens);regulamto;a(anos);Faze;Cide;Cavti;Albuq;Bam
;G.Na;comdo;offo;Intero;Bandra;escram;procedimto;ofl;N
ovbr;Ouv;Ignio;Cavte;testas;dizmo;verde;mamangpe;sub
dtos;nececide;JoaqmRibro;Go;XerTava; Carno Carvl;
Sza;Raimdo
Soas;Camra;
sentimtos;secretro;rivalide;verde;testos;circunstas;authori
de;Prezds;Anto;regmto;preze(presente);Alfes;Presid;Ord
enças;Corel;fama;Figrdo;Sz;Come Gal;Presça;
Offal;texto;Segda fra;
Respta;Frz(Ferraz);falecimo;Almda;Brto;Maxdo;Pera;Fort
a;Campa
Deq;plo;pr;pa;
p(para/por);p’;
d’;pla;p/;visto
q’
Pm;p’q’;por
q;pa
q;paraq’;em
qto;pr
tanto;os;p’t
anto;enqto;
p.isso;
Comodamte;tbem;mto; Baste; m; mta;
Inteiramte; Certamte; Somte; Pessoalmte;
Esteriormte;
Juntamte;
Atualmte;
Violentamte;
Igualmte;
Qdo;
Qto;
Finalmte; Dificultosamte; Interinamte;
Justamte;
Livremte;
Felizmte,
Energicamte; Especialmte; Principalmte;
Judiciosamte; Unicamte; Relativamte;
Imediatamte; Baste; Desgraçadamte;
Infelizmte; animosamte; involuntariamte;
ingenuamte;
respectivamte;
semanariamte;
igualmte;
unicamte;
manifestamte;
juntamte;
publicamte;
diariamte; anualmte; casualmte;
Adro;
v;
a;dv;to;vo;t
a;
eta;sj;
tava
Flo(falou);fz
e(fazer);diz
(dizer);to;
vo;axu;
Vc; vcs;eta;
q(que);toda
(toda);
MTV;PF;TDMA;msg;min;tel;Sms; bjsss; cviço; bjs;
bj;cel;bb;Credt;fut;fds;pe;fisio;saud;
hj;h;fev;mar;blza;
bb(bebê)
p/(para);p(por)
;c(com);s(sem
); (de);
D+ (demais); d- (de menos);tb;
Obg;
Cmg
(comigo);td
s
(todos);vcs;
q; td (tudo)
Vc; vcs; q;
Gent; ksa; xopi; bjss; bjao; findi; blzinha; 9da10
(novidades); bju
P (para);
(de); q;
Q(que);pq(p
orque);+(m
as);
(do
Dq
Q; pq; +;
Aki; tbm; hje; mt; pokinhu; qdo;;
Msm(mesm
o)
Sl (sala); cel (celular) bjos; msg (mensagem);
C
(com);p
(por); p (para)
Pq
(porque); +
(mas);
c
(como)
Kd
N
(nos);q
(que)
Msg (mensagem); art. (artigo);OAB; nº (número);
R.C.(Roberto Carlos);rem (remédio); comp (computador)
P (para);
(com)
E
D
V (vimos); t
(telefonamo
s)
d
c
Numeral
lPra;segd
a;primra;
po.;pa;se
gº;
Adjetivo
Obide;intro;
do;Sta;obro
;supe(auplic
ante);grde;o
rdinro;neria
s;ma(mesm
a);qlqr;
grde;pp.;obr
gdo;
verdadra;br
co;
Qdo (quando); ñ (não)
170
Como mencionado anteriormente, e por questão de economia de espaço, não exibimos na Tabela 1 acima as classes dos artigos e das interjeições, já
que não há registros das mesmas em nossos dados. As letras C, S, B, E e D, na coluna à esquerda, significam Carta, SMS, Blog, E-mail e Diário,
respectivamente.
171
Embora a classe dos substantivos seja a que maior número traz de formas abreviadas, contudo essa relação é menor quando comparada à proporção.
Ou seja, de 100 (cem) substantivos, 50 (cinqüenta) são abreviados; enquanto que esta proporção é bem maior com os pronomes, especificamente os de
tratamento. Neste caso, a probabilidade de a forma ser abreviada é de quase 99%.
204
4. Tonicidade da sílaba
Em uma primeira observação do corpus, os dados apontavam para maior
incidência de abreviações em cujas sílabas recaía a tonicidade. Essa constatação
era ainda maior no gênero carta. Analisados agora também os gêneros digitais, email, blog e SMS, vimos que há uma manutenção dessa regra, sendo as sílabas
tônicas as que mais abreviações contêm, o que não implica dizer que as pretônicas
ou postônicas não registrem casos de abreviação. Entretanto, percebemos uma
estreita ligação dessa variável com o fato de haver na sílaba tônica um partilhamento
de traços comuns à vogal e à consoante, o que, como já mencionado anteriormente,
levaria ao apagamento da vogal, em geral facilmente recuperável pelo leitor. Dessa
forma, podemos inferir que a responsável pela abreviação não é a tonicidade em si,
mas o princípio da economia que, nesse contexto, leva o autor a simplificar a escrita,
escrevendo apenas uma letra em vez de duas, quaisquer que sejam os gêneros
utilizados. Os resultados obtidos estão expressos no Gráfico 9 a seguir:
Gráfico 9
Abreviação e a Tonicidade das sílabas
Pré-tônica
Tônica
Pós-tônica
205
Segundo o princípio da saliência fônica, proposto por Naro e Lemle (1976),
a mudança lingüística primeiramente atinge as palavras nas quais o grau de
saliência fônica entre a forma antiga e a forma nova é menor, e só depois se instala
onde esta é maior. Segundo esses autores, a mudança segue uma escala de
saliência fônica que, no nosso caso, atinge primeiro as palavras cuja saliência entre
as formas existentes é menor. Por exemplo, palavras como porque → porq; beleza
→ blza; de → d - são mais facilmente abreviadas que outras do tipo mesmo → msm;
também → tbm; deve → dv; ser → c, comigo → cmg, mensagem → msg. Nessas
últimas formas, o leitor tem de fazer um maior esforço para recuperar qual palavra foi
abreviada, e para isto nem sempre apenas o contexto resolve, mas um domínio
amplo no vocabulário das abreviações. Aquelas permitem ao leitor uma
“decodificação” mais rápida e fácil, visto que o princípio que rege a abreviação leva
em conta uma escrita que se aproxime ao máximo da fala, daí abreviar as palavras
utilizando somente as letras que representam o som. Em outras palavras, quando o
falante diz ou pronuncia bebê, apenas ouvimos o som do fonema /b/, e por isso
abrevia-se a palavra escrevendo somente as consoantes bb, já que a vogal e tornase totalmente dispensável. Assim também acontece com porq, d, q, kd e outros,
onde praticamente todas as vogais são suprimidas e mantêm-se apenas as
consoantes que representam o som da pronúncia, como no caso de cadê, que tem
sua consoante original alterada de c para k, com o único propósito de reduzir,
abreviar a palavra, já que de duas letras ca, passa-se a escrever apenas uma, k, que
reproduz o mesmo som das duas outras. Vejamos os textos:
BLOG:
:: Enviado por Pam-Pam - 13:15:26 ::
Nossa, quanto tempu em gente, estou morrendu di saudadis di v6, eh ja entramos
de ferias, as minhas estao muito legais, estou me divertindu muito. Entaum eh issu
pessual logo logo estou de volta com td.
206
E-MAIL:
Mon, 14 Nov 2005 11:04:24 -0300 (ART)
Data:
"M C" Mais informações
De:
Assunto:
Foto
Para:
<[email protected]>,
Oi,
Olha o vicio gente, kkkk, nova foto do meu fotoblog, visitem...
Bjus p todos,
Mi
SMS
Eu queria c a lágrima q brota em c us ollhos, escorre em sua fac e chega até a sua
bok (F, J, -E, Estudante, PB).
Quando disserem q vc é uma droga ñ ligue pois em kda esquina vai t sempre alguém
viciado em vc! (F, J, -E, Estudante, PB).
207
DIÁRIO:
208
•
Das variáveis sociais
1. Faixa etária
Dos gêneros tradicionais, foi possível constatar um uso variável quanto à
aplicação de abreviação por parte de quem escreve. Como nas cartas analisadas,
quer fossem do século XVIII ou XIX e dos Estados da Paraíba, Pernambuco ou da
Bahia, só havia autores adultos, podemos afirmar que, nesse primeiro gênero, não
só jovens, se é que estes a utilizavam, mas também, e principalmente, os adultos
lançavam mão desse recurso sem restrição alguma. No segundo gênero trabalhado,
o diário, a prática da abreviação está, ao contrário da carta, diretamente relacionada
com a idade do autor. Ou seja, quanto mais jovem for a pessoa que escreve o diário,
maiores são as chances de nele aparecerem abreviações. Ao passo que as pessoas
mais adultas utilizam menos esse recurso da língua. Quando se trata de gênero
digital, é consenso – as pesquisas estão aí para corroborarem nossos resultados –
que o uso da abreviação é maior quando o autor (de e-mail, blog e SMS) se trata de
um jovem. É certo também que este fato não exclui os adultos da lista de “usuários
de abreviações”, apenas os coloca entre aqueles que menos as utilizam. Ao que nos
consta, segundo registra a literatura pertinente, semelhantemente às gírias, as
abreviações são utilizadas com o objetivo primeiro de ser ágil, economizando tempo
ao escrever (digitar) e, segundo, formar uma espécie de linguagem dos internautas,
já conhecida e denominada de internautês. Dessa forma, as pessoas que utilizam tal
estilo demonstram assim pertencerem à determinada comunidade discursiva, uma
vez que partilham objetivos em comum, entre eles, o tipo de escrita utilizada. Esse
fenômeno é facilmente observável em e-mails e, sobremaneira, nos SMSs, onde a
relação entre abreviação, idade dos usuários e grau de intimidade entre eles está
fortemente explicitada em quatro tipos:
1. Se se trata de uma pessoa mais velha que escreve para uma mais
nova, temos mais abreviações;
2. Se ocorrer o inverso, uma mais nova escrever para uma mais velha,
menos abreviações serão utilizadas;
209
3. Se ainda as pessoas envolvidas no texto/discurso são jovens,
certamente haverá uma maior ocorrência de formas abreviadas,
sendo constatado também o inverso;
4. Se dessa vez as pessoas forem mais velhas, automaticamente
recorre-se menos a esse recurso da língua.
Tal comprovação permite-nos inferir que no primeiro caso se dá uma busca
por demonstrar ser a pessoa mais velha conhecedora desse novo tipo de escrita,
largamente utilizada pelos mais jovens, o que a leva a usar abreviações em seu
texto; no segundo caso, por temer não ser compreendido em sua escrita, o jovem
evita usar a abreviação quando o destinatário é uma pessoa mais velha. Nos terceiro
e quarto casos, como ambos são da mesma faixa etária, tem-se um maior uso de
abreviações por jovens, já que estes “falam” a mesma língua, utilizam o mesmo
código, no caso em estudo, a forma abreviada, ou um decréscimo em sua
ocorrência, uma vez que não é prática comum entre os mais velhos escrever
utilizando abreviações ao longo de seus textos. A fim de melhor compreendermos o
que foi dito, ilustramos os resultados com o Gráfico 10, abaixo, que traz a relação
entre o uso de abreviações e a faixa etária do informante.
Gráfico 10
Abreviação e faixa etária
Adultos
100
80
60
40
20
0
Carta
E-mail
Jovens
Blog
SMS
Diário
Pelos dados apresentados, pode-se concluir que o gênero carta faz uso de
abreviações independentemente da faixa etária do autor. Quanto aos demais
gêneros, há uma unanimidade quanto aos resultados: em sendo o autor do diário,
210
blog, e-mail ou SMS pertencente à classe dos jovens, provavelmente sua mensagem
lançará mão de abreviações. Se, porém, este pertencer à classe dos adultos,
possivelmente serão encontradas menos formas reduzidas, menos abreviação.
Vejamos os exemplos abaixo:
CARTA 16
(autor adulto)
1765
Illmo. e Exmo Snr
Vou agradecer aV.Exa. a honra, q’ mefez naPro/curaçaõ, que me mandou patomar parte no
baptismo do filho, q’ nascesse / aos Illmos, e Exmos Snres Condes deVilla Flor.
Ecom effeito no dia 10 de Fevereiro de 1765 tive os credi-/tos delevar daSagrada
fonte do baptismo em Nome deVExea, / como seu verdadeiro Padrinho, no Oratorio do
SeuPalacio, ao Innocen- / te Menino, o Exmo. e Illmo. Snr’ D. Antonio de Populo, filho / dos
ditos Snres. Condes Copeiros Mores, funçaõ muito plauirvel / com assistencia da nobreza
da terra, que muito gostoza sabe obze-/quiar a o seu taõ benemerito Governador, eCapam
General, unica bo- / nança que o ceo mandou aPernambuco: e se nutre o afilhado
vigorosamte.
Bejo as maos AV.Exea por tanto me honrar / no seuServo com este, e com os mais
favores que espero das Liberaes / maõs de V.Exea; a quem Ds Gde ms anns pafelicide da
nossa / Monarchia.
Olinda 30 de Mco de1765
Illmo e Exmo. Snr Conde deOeyros
F. Bispo dePernambuco.
De VExa. Servo mto. obrigo. e fiel capelaõ e (ilegível)
211
CARTA 17
(autor jovem)
BLOG: (autor jovem)
Postado
por
<#Srta.K#>
às
20:43:41
.:: Comentários (1)
Eu amo o Inuyasha mais não é só desse anime q eu gosto aki vai a foto de mais um
personagem que eu acho perfeito ele é do Yu-Yu-Hakusho... Seu nome...Seu nome
é Shuchi Minamino no mundo dos homens no Makai ele é o Incrivel Kurama
Youko
BLOG: (autor adulto)
O que há de errado com a lã?
“A maioria das pessoas não sabe que as ovelhas criadas para produção de lã são
freqüentemente mutiladas sem nenhum tipo de anestésico, transportadas por milhares de
quilômetros suportando condições climáticas extremas, com pouco acesso à água e
alimentação, e abatidas enquanto totalmente conscientes.”
-- extraído do folheto “What's Wrong With Wool” da PETA - People for the Ethical Treatment
of Animals. Para saber mais, faça o download aqui. 11:19 PM 12/11/2005
212
E-MAIL: (autor adulto)
Data:
De:
Sat, 12 Nov 2005 18:40:14 +0000 (GMT)
"M"
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Assunto:
Raiva nada!
Para:
"fabiana souza silva" <[email protected]>
deve ter sido esquecimento, mesmo! espero q o eco já tenha se recuperado. qto as
orientaçoes acho q vc nao precisa delas, sinceramente.
eu essa semana escrevi um bocado, mas de ontem a tarde p. cá parei, esgotou.
qdo eh q vc aparece? hj vi valeira, ela perguntou por vc
um abraço
M
E-MAIL: (autor jovem)
Data:
De:
Mon, 17 Oct 2005 12:15:41 -0300 (ART)
"M C"
Ver detalhes do contato
Assunto:
Foto Nova
Para:
"Fabiana Souza" <[email protected]>,
Oi Gente,
Pra quem gosta de fotoblog uma foto nova nas paradas, advinha quem está comigo
Priscila ... é vc mesma !!! Hehehehe, e nem adianta reclamar viu???!!!! Kaká
realmente o vício tomou conta de mim, existe escapatória ????
Bjus a todos,
Mi
213
DIÁRIO: (autor jovem172)
172
As formas registradas vêm sublinhadas.
214
DIÁRIO: (autor adulto173)
173
O autor utiliza Cap. e + ou – para capítulo e mais ou menos.
215
2. Grau de escolaridade
Conforme mencionamos no capítulo da metodologia, essa variável dividiu os
informantes em mais escolarizados e menos escolarizados, já que as cartas que
compõem o material da Paraíba e do Recife não deixavam claro o nível de
escolarização dos autores, ao contrário das cartas da Bahia. Após uma detalhada
observação dos corpora da nossa pesquisa, foi possível concluir que, no gênero
carta, o uso de abreviações ocorre independentemente do grau de instrução do
autor desta, o que nos autoriza afirmar que esse fator não exerce influência alguma
quanto ao uso ou não de abreviações no referido gênero. Quanto ao diário, percebese uma discreta ligação no que diz respeito ao maior ou menor registro de formas
abreviadas quando o autor tem mais ou menos instrução. Ou seja, nossos
resultados apontam para menos abreviações quando se é mais escolarizado, e mais
abreviações nos textos cujos autores têm menos tempo de estudo. De certa forma, o
grau de escolaridade nesse gênero está diretamente relacionado com a idade do
autor, o que implica dizer que aqueles que mais uso fazem de abreviações nesse
gênero são os que menos idade têm. Essa mesma observação foi constatada nos
gêneros digitais, e-mails, blogs e SMS. Ou seja, as pessoas que apresentavam um
maior grau de escolaridade registravam menos abreviações em seus textos, e o
inverso também. Aqui mais uma vez a faixa etária está ligada ao tempo de estudo do
autor, apontando os mais jovens, no nosso caso menos escolarizados, como os que
usam mais abreviações nos referidos gêneros. A seguir, apresentamos os resultados
obtidos na nossa pesquisa, cruzando a variável grau de escolaridade com o
fenômeno em estudo, a abreviação. Confira o Gráfico 11 a seguir:
216
Gráfico 11
Abreviação e grau de escolaridade
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Mais Escolarizados
Menos Escolarizados
Conforme nos revelam os números do Gráfico 11, em todos os gêneros
aqui analisados – carta, diário, e-mail, blog e SMS -, os informantes que possuem
mais instrução, ou seja, são mais escolarizados, usam menos formas abreviadas em
suas mensagens, ao contrário daqueles que têm menos instrução, sendo menos
escolarizados. Estes não apenas as utilizam como as fazem com uma freqüência
bem maior, sendo praticamente categórico o uso de reduções em seus textos.
Confira os exemplos a seguir:
217
CARTA 18
(informante mais escolarizado174)
Como a própria carta revela, o autor da mesma é Desembargador e Ouvidor da Comarca, e
provavelmente formado em leis, segundo lemos em Tânia Lobo (2001, p.8).
174
218
CARTA 19
(informante menos escolarizado175)
175
O autor dessa carta é lavrador de algodão, o que provavelmente indica que tem pouca
escolarização.
219
E-MAIL: (mais escolarizado)
De:
"R C"
Para:
"Fabiana Souza" <[email protected]>
Assunto:
Relatório
Data:
Sat, 5 Nov 2005 06:05:13 -0800
Ver detalhes do contato
Oi, Fabiana
Adorei os e-mails. Você conseguiu abrir aquele de Gramado e Canela, e os outros?
também? A respeito do relatório para enviar ao orientador, é a partir de setembro de
2004? Porque nesse caso colocaríamos o do Gelne e o do CBLA, não é? Eu nem
sabia que ainda tinha de fazer isso!!! Ah! Depois me envia o teu endereço do MSN, e
a foto do Bronckart? (desculpe o abuso), mas é a curiosidade.
Abraços,
R
E-MAIL: (menos escolarizado)
De:
"j s"
Para:
Fabiana
Assunto:
Eu estou aqui.
Data:
Tue, 29 Nov 2005 00:51:29 +0000
Adicionar endereço
Oi, Fabiana.
Espero q vc nao passe mau novamente pois brevimente estarei ai vc tem q espera
por me. Quanto as eu enviei domingo depois q acabamos de conversa, mais algum
erro ouve q nao chegou ate o seu email.
Beijos e abracos,,,,,,,,,,,,,,,
J S.
220
SMS: (mais escolarizado)
Obrigado por ter plantado o amor em meu coração! Voltou a ser uma terra
fértil! Amo vc de verdade!!!(M, A, +E, Auditor – RE)
(menos escolarizado)
Quero lhe desejar mais um dia dos prof, e sei q vou voltar a lhe desejar isso
durante anos pois existem pessoas nesse ramo qualidade e competência mais
(sic) a sinhora e vovo não são assim, hoje vc pode estar cansada de estudar,
mas, amanha a sua gloria sera dada graças a sua perfeição de ensino e a sua
inteligencia d aprende o q ñ sabe com facilidade. Parabéns!(F, J, -E, estudante
– PB)
DIÁRIO: (informante mais escolarizado176)
176
A única abreviação diz respeito ao nome da pessoa, que tem escrito apenas a inicial P.
221
DIÁRIO (informante menos escolarizado177)
BLOG: (mais escolarizado)
12/11/2005 22:25E AGORA, DONA GLOBO?
Sem Brasil na Sul-Americana, emissora exibe filmes
Com a eliminação dos clubes brasileiros da Copa Sul-Americana de futebol, a Rede
Globo terá de rearranjar sua grade de programação. No vácuo deixado pela
competição, a emissora vai exibir filmes. Será esse o começo da já famosa
programação de fim-de-ano? Hoje a festa é sua, hoje a festa é nossa...
177
Aqui, as formas com, para, mais e demais são reduzidas a c/, p/, + e d+, respectivamente.
222
BLOG:(menos escolarizado)
sábado, 12 de novembro de 2005
Gente vou deixar uma perguntinha respondam nos coments oq primeiro pras
meninas se vocês tivessem andando na rua e derrepente vissem o Inuyasha, o
Mirok, Kouga, Narak e o eshomaru andando na rua oq vcs fariam?
A)Agarraria ele
B)Começaria a passar mal e desmaiaria
C)tiraria uma foto
D)sairia pulando e beijando ele
E)pediria um autografo
F)fingiria q não fiu
E ql deles seria?
A)Mirok
B)Inuyasha
C)Seshomaru
D)Kouga
E)Narak
Bom e agora pros meninos, se vocês tivessem andando na rua e derrepente vissem
a Sango, a in, a Ayame, a Kagome, e a Kagura na rua andando na rua oq vcs
fariam?
A)Ficaria sem reação
B)Tiraria uma foto
C)Daria um beijo nela
D)pediria um autografo
E)fingiria que não viu
F)Seguiria ela pelo resto do dia
E qual delas seria
A)Sango
B)Rin
C)Ayame
D)Kagura
Postado por <#Srta.K#> às 20:43:41
3. Sexo
De acordo com a literatura pertinente - Fisscher (1958), Labov (1966),
Trudgill (1974), Guy (1981), Oliveira (1982), Paiva (1986) e Silva (1997) - as
mulheres, em geral, são mais conservadoras quanto à utilização de formas ditas
padrão, enquanto os homens detêm a liderança do uso de formas não-padrão.
223
Contudo, afirmam as pesquisas que envolvem essa variável social, quando as
formas inovadoras são consideradas de prestígio, não-estigmatizadas, cabe às
mulheres uma maior representação no que tange ao uso daquelas. O fenômeno
abordado em nossa pesquisa aponta um maior número de abreviações por parte
dos homens, enquanto as mulheres fazem menos uso desse recurso. Esse resultado
parece estar ligado ao fato de ser a abreviação uma forma não-padrão, embora não
seja de todo estigmatizada, o que faz com que as mulheres sejam mais cautelosas
ao as utilizarem em seus textos. Esses dados, é verdade, referem-se aos gêneros
digitais – e-mail, blog, SMS – e não aos tradicionais – carta e diário. Nestes, temos
duas posições para a abreviação: se se trata de diário, predominantemente escrito
por mulheres, estas lideram o uso de formas abreviadas; se, porém, o gênero é
carta, os homens são os que mais abreviações utilizam. Vale lembrar que, das
quase quinhentas cartas estudadas aqui, tanto as de RE, as da PB quanto as da BA,
apenas uma é de autoria feminina, o que obviamente faz com que os homens
dominem a liderança. Dessa forma, fica clara a idéia de que nos gêneros tradicionais
a variável sexo é irrelevante no que se refere ao uso de abreviações, enquanto que,
nos gêneros digitais, ela é determinante, ao menos nos nossos dados. Observe o
Gráfico 12 a seguir:
Gráfico 12
Abreviação e Sexo
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
Carta
E-mail
Blog
Masculino
SMS
Diário
Feminino
224
De acordo com o Gráfico 12, o sexo feminino lidera o uso de abreviações
quando se trata dos gêneros diário (já que estas escrevem mais que os homens) e
blog; empatam se o e-mail for o gênero utilizado, e perdem por uma maioria
esmagadora, se a análise se restringe ao gênero carta, ao menos nas por nós aqui
analisadas. Resumindo, temos: duas vitórias para o sexo masculino – carta e SMS;
duas para o sexo feminino – diário e blog, e um empate no gênero e-mail.
Observemos os exemplos:
CARTA 20
(informante do sexo masculino)
1745
Illmo e Exmo Snor
A planta que semeapresenta Com o despaxo de V. Exa Rubrica / da com asua
Rubrica, aqual planta pertense O Rdo pe Ga-‘briel de Malagrida Messionario
Apostolico por Em execução / nava de Igarassû naõ se Excedendo ao Risco
daplanta e perfil / aprezentado acho naõ ter forma de hospicio, nem Comvento/ p’q’
careça de Igreja e Claustro e só acho ser hum Edeficio / de Casas Ordinárias ao uso
do Pay, e he oq’ posso informar a V. Exª Re a 15 de Ag.to de 1745.
Fr: Estevão do Loretto
JorgEAntunes.
CARTA 21
(informante do sexo feminino)
16 de Agosto de 1897 — Chamonix
Meu prezado Senhor João Alfredo
Sabendo do grande golpe porque acabão de passar não posso deixar de vir dizerlhes já toda a parte que o Principe e eu tomamos em sua tão grande dôr! Que Deus
lhes dê toda a resignação e coragem nes(?)cessarias e creião-me sempre sua
amiga muito(?) e muito de coração
Isabel Condessa d’Eu
225
DIÁRIO: (sexo feminino)
É possível observar uma forma abreviada para a preposição por (P/), e uma
substituição da palavra mil pelo numeral 1000, o que representa duas reduções
utilizadas pela informante em um dia de anotação. No diário masculino, as
anotações que o informante faz em dois dias registram apenas a substituição da
palavra mais, pelo respectivo símbolo: +, como podemos conferir abaixo:
226
DIÁRIO: (sexo masculino)
227
SMS: (sexo masculino)
Kd vc? Tudo q vejo lembro de vc! Eu te amo de verdade!(M, A, +E, Auditor – RE)
SMS: (sexo feminino)
Bom, tentei resistir, mas acabei beijando muuuuuuuuuuuuito. Foi legal, menos ter q
mentir em casa.(F, A, +E, Empresária – PB)
E-MAIL: (sexo feminino)
De:
"M"
Para:
"Fabiana Souza" <[email protected]>
Assunto:
Relatório
Data:
Sat, 5 Nov 2005 06:05:13 -0800
Ver detalhes do contato
E aí, garota? como estás??
quais sao as novidades pessoenses, tesianas, familiares, ecosportense, enfim...
como vai a vida.
estou bem e com muitos prazos p cumprir; depois de uma otima orientaçao c X,
acho q minha tese adquiriu a cara definitva, já nao era sem fim...
no mais p relaxar tenho ido ao cinema e olhado pro mar.
um grande abraço
M
E-MAIL: (sexo masculino)
Data:
De:
Mon, 10 Oct 2005 18:35:06 -0300 (ART)
"M A"
Ver detalhes do contato
Assunto:
O paraíso existe !!!!!!
Para:
[email protected]
Amor,
Depois que passei algumas horas no sítio com vc, fica difícil ir lá e não tê-la por
perto. Morro de saudades. Infelizmente hoje não vai dar para nos vermos, mas
amanhã tiraremos o atraso.
bjs
Teu gordinho!!!!
Segue a foto de um lugar que é um paraíso qdo vc está lá
228
BLOG:(sexo feminino)
Sexta-feira, Outubro 07, 2005
OIe galeraaaaaaaaa...como vaum meus queridos bjokeiros???? mta gente pedindo
atualizaum..aki estou... me desculpem galera.. sabe como eh.. nao eh mto facil
arrumar tempo.. mas pra voces eu arrumo.. claro... novamente.. obrigada pelos
emails... elogios..pedidos... e tudo mais Muitos e Muitos Beijos da Boquinha!!!
BaBaDo E ApRoVaDo PoR ».¥.LaRyBoQuInHa.¥.», em Sexta-feira, Outub
(sexo masculino)
Enviado: 22/set/05 19:48
Quote
único dia do ano q falto.. ai povo se rebela contra psor, mó zueira, num fizeram nada
claro q valeu a pena dormir até 11h inves de acordar as 6h, mah tinha q ser bom só
hoje, né? ai q f**a.. devolveram prova hoje tb.. q eu quero saber q eu tirei. me
estressei agora.
4. Profissão
Possenti (2001, p.219-220) diz que “cada locutor se apodera da língua
segundo sua situação social, os papéis que exerce etc”. Sendo assim, resolvemos
verificar a validade dessa afirmação cruzando a variável profissão com a ocorrência
da abreviação, a fim de ratificar as palavras do autor, pois, segundo ele:
A língua não se apresenta a todos da mesma maneira, a ordem da
aquisição, de certas estruturas não é idêntica em todos os falantes,
e a utilização da linguagem é freqüentemente capaz de distinguir um
locutor do outro.
No intuito de obtermos resultados satisfatórios, equivalemos o número de
textos por nós aqui coletados (cartas: 60, diários: 60;e-mails: 20, blogs:20,
SMSs:20), ao número de profissão exercida pelos informantes. No gênero carta, elas
variam de Vigário da Vila, Chefe de Polícia, Juiz ordinário a Ministro do Reino, nas
da Paraíba; desembargadores-ouvidores ou juízes ordinários, nas cartas da BA;
servidor público, major, tenente, tipógrafo, nas de RE. Os diários comportam
estudantes, professores e outros. Já os e-mails, blogs e SMSs incluem contadores,
advogados,
empresários,
doutores,
estudantes,
bibliotecários,
técnicos
de
enfermagem, gerente de venda e servidor do INSS. De acordo com os resultados,
essa variável não exerce qualquer influência que seja quanto ao uso ou não de
229
abreviações nos textos de seus autores. No banco de dados da Paraíba, de um total
de 203 cartas existentes, apenas uma, escrita por José Bonifácio de Andrada e
Silva, então Ministro do Reino e dos Negócios Estrangeiros, não registra sequer um
caso de abreviação em suas linhas178. As demais são categóricas em utilizarem
esse processo de redução, desde a abertura até o fechamento. É o que vamos ver
na Tabela 2 a seguir:
Tabela 2
Abreviação e as profissões
GÊNEROS
carta
e-mail
X (PB)
X (PB)
X
(PB,
BA)
X (PB)
PROFISSÕES
Vigário da Vila
Chefe de Polícia
Juiz ordinário
Ministro do Reino
Desembargadoresouvidores
Servidor público
Major
Tenente
Tipógrafo
Estudantes
Professores
Contadores
Empresários
Bibliotecário
Técnicos
enfermagem
Gerente de venda
Servidor do INSS
blog
diário
SMS
X (PB, BA)
X (PB)
X (PB)
X (PB)
X (PB)
X
X (PB)
X (PB)
X
X (PB)
X
X (PB)
X (PB)
X
X
X (BA)
X (RE)
X (RE)
X (RE)
X (RE)
de
X
X
X
X (RE)
X (BA)
X (PB)
X (PB)
X (PB)
X (PB)
X (PB)
Pelos dados exibidos na Tabela 2 acima, os autores de cartas, diários, emails, blogs e SMSs, dos Estados da Paraíba, Pernambuco e Bahia, quer se trate de
estudantes, contadores, Juizes, empresários ou qualquer uma outra profissão das
Ao que parece, a posição social ocupada pelo autor dessa carta, advinda da profissão que ele
exerce, faz com que não haja em seu texto a presença de abreviações, uma vez que o documento é
considerado uma Ordem Real.
178
230
acima mencionadas, utilizam em maior ou menor quantidade formas abreviadas nas
mensagens produzidas. Esses resultados nos autorizam a afirmar que o fenômeno
da abreviação ocorre independente da profissão que o autor do gênero analisado
exerça. Vejamos:
CARTA 21
(Rei de Portugal)
1747
Dom João porgraça de Deos Rey / de Portugal edos algarves daqm edalem mar em
/ Africa senhor de Guiné etc Faço Saber avos / governador ecapitaõ General da
capitania de / Pernambuco q’ vendosse a representaçaõ q’ me fize / raõ os ofeçiais
da camara da cidade deolinda na / carta deq’ com esta sevosremete copia emq’
pedem / seja servido mandar q’ os Padres da comp.ª en / sinem Teologia como o
fazem na B.ª emais / collegios assim naquella cidade como na villa do Recife
damesma maneira q’ praticaõ / ençinar Filosofia. Mepareceo ordenarvos / informeis
com vosso parecer Ouvindo o Reitor / da Companhia edeclarando senadita cidade /
deolinda ou Recife ha alguma escola deRe / legiaõ. ElRey nosso Snr.’ omandou por
Tome / Josachim da Costa corte Real epello P.e Antonio / Freire de Andrade
Henrriq. Comselheiros do Seo / cons.’ Vltramarino eSepassou por duas vias, Luis /
Manoel afiz emlisboa adesasseis deDezembro de / mil seteçentos quarenta e seis o
Secretario Ma / noelCaetano Lopes de Lavre afez escrever = Tome / Joachim
daCosta corte Real = Ant: Fr. DeAndrade
231
CARTA 22
(juiz ordinário)
232
CARTA 23
(governador)
SMS
Oi, Fa! Tudo bem? Liberou meu cel hoje. (F, A, -E, Promotora de vendas – PB)
Cheguei bem. Boa noite! Amo vc! Bjs! (M, A, +E, Auditor – PE)
Revelaste as fotos? Talvez eu vá aí amanhã, depende da quantidade de cviço q
aparecer! + se eu for eh dpois do almoço. (M, A, +E, Servidor Público – PB)
Vc foi? (F, A, +E, Professora – PB)
Desculpe a demora p responder sua msg, não esqueci de vc. Por enquanto não
tenho outras novidades, e vc?Estou sentindo falta das nossas saídas.Bj.(F, A, +E,
Empresária–PB)
233
E-MAIL: (PROFESSORA)
Data:
De:
Thu, 6 Oct 2005 00:03:33 +0000 (GMT)
"M"
Ver detalhes do contato
Assunto:
Correndo atrás das borboletas...
Para:
"fabiana souza silva" <[email protected]>
lindo, lindo, Fabiana!!
só podia mesmo ser a mágica simplicidade de Quintana.
e aí como vc está?? espero que bem.
bem, já aluguei o flat, uma maravilha: criei coragem e agora vou tb experimentar a
beleza de morar perto do mar.
um abraço
M
E-MAIL: (FONOAUDIÓLOGA)
Data:
De:
Tue, 4 Oct 2005 20:14:00 -0300 (ART)
"M C"
Ver detalhes do contato
Assunto:
Foto
Para:
[email protected],
Oi,
Gente nova foto no fotolog (tô viciada mesmo), atenção especial (Dri, Jailane e
Eunice) cês tão lá, qdo vcs puderem dêem uma passadinha lá...
Recadinho p Chelzinha, ei menina add o meu fotolog no teu...
Bjus a tds tô esperando os comentários,
Mi
BLOG: (estudante)
15/11/2005 12:58
Bom gente naum tenhu muito oq escrever...só q estou vivendo um amor
impossivel...ele gosta de mim e eu gosto dele mais naum podemos fikar
junto...espero q isso um dia melhore pois naum vou conseguir viver assim...beijokas
!!!
enviada por BIA
234
DIÁRIO: (estudante)
235
DIÁRIO: (Técnico de enfermagem)
Após tudo o que vimos neste capítulo, entendemos como necessário
apresentar um esquema geral, compreendendo todas as variáveis analisadas em
conjunto com o fenômeno da abreviação, visando um melhor entendimento por parte
do leitor. Em linhas gerais, pois, temos o seguinte quadro sinóptico:
236
QUADRO 7
A ABREVIAÇÃO X VARIÁVEIS ANALISADAS
Variáveis sociointerativas
Gênero:
Carta (0)
Diário (0)
E-mail(0)
Blog(0)
SMS(0)
Estilo:
Formal (-)
Informal (+)
Instância de realização:
Pública(-)
Privada(+)
Participantes:
1X1(+)
1XN(-)
Variáveis estruturais
Extensão do texto:
até 10 linhas(0)
+ de 10 linhas(0)
Variáveis sociais
Faixa etária:
Jovem(+)
Adulto(-)
Extensão do vocábulo:
Monossílabo(0)
Dissílabo(0)
Trissílabo(0)
Polissílabo(0)
Classes de palavras:
Artigo(-)
Substantivo(0)
Adjetivo(0)
Verbo(0)
Advérbio(0)
Pronome(0)
Numeral(0)
Preposição(0)
Conjunção(0)
Interjeição(-)
Tonicidade da sílaba:
Pré-tônica (0)
Tônica (0)
Pós-tônica (0)
Escolaridade:
- escolarizado(+)
+ escolarizado(-)
0
-
Sexo:
Masculino (0)
Feminino (0)
Profissão:
Estudante(0);
Professor(0);
Auditor(0);
Governador(0);
Aux. de enfermagem(0);
Servidor do INSS(0);
Fonoaudióloga(0);
Promotor de vendas(0);
Empresário(0);
Bibliotecário(0);
Desembargador(0);
Juiz ordinário(0);
Chefe de polícia(0),
Vigário da vila(0).
Propósito comunicativo:
Informativo(-)
Lúdico(+)
Suporte:
Papel (-)
Telefone celular (+)
Computador (+)
TOTAL
+
Legenda: sinais para a importância da variável no processo da abreviação: + (maior ocorrência), (menor ocorrência), 0 (irrelevância).
Pelo Quadro 7, acima, concluimos que, no cômputo geral, os fatores sóciointerativos são mais proeminentes no processo da abreviação; os fatores sociais são
menos salientes, e os estruturais, irrelevantes.
237
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo deste trabalho, levantamos algumas discussões no intuito de
demonstrar que:
1. a abreviação, aqui entendida como representação de uma palavra
por meio de uma ou algumas de suas letras, é um recurso da língua
que teve origem nos idos do século VI antes de Cristo, proliferou no
século X, estendendo-se até nossos dias, não sendo, pois, uma
criação da era digital, como pensam alguns e, ao contrário do que
muitos acreditam, sua utilização é muito menor hoje que em períodos
anteriores da história da língua;
2. embora seja um fenômeno da língua, e por isso não foge às
incessantes variações por que ela passa, a abreviação manteve
alguns princípios de uso (abreviar por necessidade), adaptando
outros;
3. o princípio da economia, seja de natureza lingüística ou financeira,
continua sendo fator determinante quando do uso da abreviação nos
dias hodiernos;
4. é evidente o fato de que os gêneros digitais aqui analisados guardam
muitas semelhanças com os gêneros orais conversacionais, dentre
elas: períodos simples e curtos, frases nominais, frases truncadas,
marcas de envolvimento, presença de marcadores conversacionais,
entre outras características da oralidade, o que, a nosso ver, favorece
o surgimento da abreviação;
238
5. dentre os fatores de ordem sociointerativa aqui analisados, o gênero
textual é aquele que atua como ‘carro-chefe’ na ocorrência da
abreviação, determinando um maior ou menor uso desse recurso da
língua. Atrelados a esse fator estão o estilo, a instância de realização,
os participantes, o propósito comunicativo e o suporte. Dos gêneros
tradicionais por nós trabalhados, a carta destacou-se como aquele
que registra maior número de abreviações, sendo fundamental
lembrar que tal fato se deve ao período no qual aquela foi escrita, ou
seja, séculos XVIII e XIX, época em que a abreviação era bastante
divulgada. Outra ressalva a ser feita diz respeito à tecnologia
utilizada, ou seja, se a carta era manuscrita ou impressa, já que na
primeira esse processo de redução chegou ao excesso. O inverso,
porém, ocorria se a tecnologia utilizada fosse a impressa, restando
apenas as abreviaturas correspondentes aos pronomes e às formas
de tratamento. O estilo, por sua vez, está diretamente ligado ao
propósito comunicativo, à instância de realização do texto e aos
participantes. Em outras palavras, se o autor do texto – seja uma
carta, um e-mail, um blog ou SMS – elabora um documento pessoal,
e não oficial, ou melhor, privado e não público, a tendência é fazer
uso de um maior número de abreviações ao longo de sua produção
textual, principalmente se o propósito primeiro da mensagem for
apenas divertir, o que não ocorre, ou se ocorre é em menor número,
em texto público e/ou de caráter oficial, que pela própria natureza
exige uma linguagem mais rebuscada. Dentro dessa ‘cadeia’ está o
participante que, em sendo alguém de maior proximidade ou
intimidade, mesmo que de posição social hierarquicamente mais
elevada, permitirá ou induzirá o autor do texto a escrever de maneira
mais distensa, menos formal. O último dos fatores sociointerativos, o
suporte, também altera a natureza da leitura, levando o autor do texto
a adequar sua produção às normas daquele locus, seja ele digital ou
não;
6. no que concerne aos fatores estruturais – extensão do texto,
extensão do vocábulo, classes de palavras e tonicidade da sílaba –
constatamos a não relevância dos mesmos no processo de redução
das palavras. Ou seja, a abreviação atinge tanto substantivos quanto
239
verbos, adjetivos e até mesmo preposições. É bem verdade que
algumas dessas classes detêm um maior número de reduções, o
que, porém, não elimina a ocorrência destas nas demais. De forma
semelhante, seja o texto curto ou longo, a palavra monossílaba ou
polissílaba, átona ou tônica, a abreviação atua de forma igualitária
nos mesmos;
7. em se tratando de fatores de ordem social, quais sejam: faixa etária,
grau de escolaridade, sexo e profissão, pudemos observar certa
ligação entre eles e o fenômeno em estudo: quando diz respeito aos
gêneros digitais – o e-mail, blog, e SMS – há um maior registro de
abreviações por parte de quem escreve se esse for jovem, e o
inverso também. O grau de escolaridade e a profissão do produtor do
texto, no entanto, não exercem influência no uso ou não da
abreviação. Ou seja, o fato de ser menos ou mais escolarizado não
inibe a utilização do recurso em pauta, bem como exercer a profissão
de estudante, auditor de contas, Professor Doutor ou outra ocupação
qualquer, indicando que a abreviação não é uma variável por
completo
estigmatizada,
sendo
por
essa
razão
usada
indiscriminadamente por homens e mulheres.
As reflexões feitas no decorrer deste trabalho tiveram como objetivo
primordial analisar, numa perspectiva diacrônico-comparativa, um dos aspectos da
língua portuguesa, a redução, especificamente a abreviação, a fim de constatarmos
a existência e origem desse fenômeno em períodos remotos da língua,
particularmente os séculos XVIII e XIX até os dias atuais. Para tanto, fizemos um
recorte de três Estados da região Nordeste, a saber: Paraíba, Pernambuco e Bahia,
no intuito de comparar o comportamento do fenômeno em estudo, a abreviação,
descrevendo suas aplicações e implicações na sociedade, tendo em vista que toda
alteração nesta provoca inevitavelmente alterações de ordem lingüística.
Embora de forma lacunosa, buscamos responder a algumas questões que
têm inquietado professores de língua portuguesa, particularmente, e pais de alunos,
de maneira especial, quanto às razões que levam alunos de séries variadas a
utilizarem, não apenas em seus espaços digitais, mas também nos textos
tradicionais, cujo suporte é a folha de papel, recursos de simplificação lingüística,
240
dentre eles a abreviação, fazendo-nos repensar aspectos centrais na relação entre a
oralidade e a escrita. Para tanto, elegemos a teoria sociointerativa como o construto
teórico capaz de explicar socio-historicamente processos de produção de sentido e
processos inferenciais. Assim, buscamos comprovar a relação entre os fatores
lingüísticos e sociais, considerando que aqueles são sensíveis aos fatores culturais,
não podendo ser estudados isoladamente.
Certamente a discussão por nós levantada não encerra aqui, mesmo porque
as línguas se encontram em constante processo de mudança, todavia, procuramos
reunir pontos de vista os mais diversos, visando atingir uma possível resposta para
as muitas indagações aqui levantadas. Resta-nos a perspectiva de termos
conseguido, de alguma forma, contribuir com dados reais da língua, instigando
pesquisadores da área a desenvolverem estudos adicionais.
241
REFERÊNCIAS:
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documentos manuscritos. Editora Universitária. Fundação Joaquim Nabuco. Editora
Massangana. Recife. 1994.
ADAM, J-M. Eléments de linguistique textuelle – théorie et pratique de l’analyse
textuelle. Liède: Mardaga. 1990.
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ARAUJO, Emanuel. A construção do livro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 1986
ASSIS, Juliana Alves. Ensino/aprendizagem da escrita e tecnologia digital: o e-mail
como objeto de estudo e de trabalho em sala de aula. In: Letramento digital:
aspectos sociais e possibilidades pedagógicas. Belo Horizonte: Ceale; Autêntica.
2005.
____. Explicitude/~Implicitude no E-mail e na Mensagem em Secretária Eletrônica:
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Doutorado, Faculdade de Letras, UFMG, mimeo. 2002.
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BAKHTIN, Michail [1979]. Os gêneros do discurso. In _______, M. Estética da
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BÉGUELIN, Marie-José. Unidades de Língua e Unidades de Escrita: Evolução e
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