Homero Pereira
O deputado federal Homero Pereira, parlamentar que lutou contra um câncer na região
do estômago, faleceu no dia 20 de outubro de 2013. Ele foi deputado estadual,
secretário de Estado de Agricultura, presidente da Federação da Agricultura e
Pecuária de Mato Grosso (Famato), superintendente da Companhia Nacional de
Abastecimento (Conab) e como deputado federal, presidente da Frente Parlamentar
da Agropecuária.
Poucos dias antes de falecer Homero Pereira deu diversas entrevistas à imprensa e
reproduzimos aqui, no Site da Nelore MT, como forma de homenagem ao grande
representante do agronegócio, uma entrevista feita pelo site de notícias Mídia News.
Boa leitura.
1. Como o senhor começou a vida política?
Homero Pereira – Eu comecei na vida pública em 1990, quando da eleição do Jaime
[Campos] para governador. De lá para cá, não parei. Na eleição de 1990, teve até uma
curiosidade, porque foi a primeira que participei e eu empatei com o José Riva: 3.103
votos para cada um. Como sou dois ou três anos mais velho que ele, eu assumi e ele
ficou como meu suplente.
2. E, obviamente, o senhor não gostaria de concluir esse ciclo dessa
maneira...
Homero – É claro que não. Talvez eu estivesse, agora, no meu melhor momento
político, presidindo a Frente Parlamentar de Agricultura, que é a mais importante do
Congresso Nacional e a que tem mais membros. Até esses últimos dias era
coordenador da bancada por Mato Grosso. Mas, infelizmente, tem coisas da biologia
que não dá para a gente solucionar. É algo maior do que as minhas pretensões
políticas. Essa decisão [de me afastar] não é política, é médica mesmo. Depois de
ouvir os médicos, nós resolvemos que eu tinha que concentrar minhas energias no
meu tratamento. Eu passei, de fevereiro para cá, por 15 sessões de quimioterapia,
duas cirurgias, e continuo fazendo quimioterapia. Agora, estou aguardando o resultado
de um exame de DNA que mandei para os Estados Unidos, porque os protocolos
tradicionais não estão dando o resultado que a gente espera. Então, nós temos que
estratificar isso via DNA para tentar encontrar a medicação correta para fazer o
tratamento.
3. Muitos, ainda mais na fase em que o senhor estava na política, não pensa
que vai ficar doente e, até mesmo se acha, um pouco “imortal”. E, de
repente, uma sequência de fatos delicados, muda completamente a sua
vida. Como é lidar com uma doença como essa?
Homero – Você é chamado a refletir sobre a limitação humana e percebe que tem
coisa muito maior que a gente. Nessas horas, só tem uma coisa que te ajuda a
superar isso, que é você se apegar, com muita fé, em um ser superior, se apegar em
Deus, na família, em outros valores que não são os valores da política. Porque a gente
fica nesse meio político e dá a impressão que o mundo só existe e só gravita em torno
da política. Daí, quando você se depara com uma situação como essa, você vê o
quanto você é pequeno, apenas uma partícula no meio desse universo e você tem que
se apegar a outras coisas. É preciso trabalhar muito a cabeça. Nesse período todo,
com o apoio da família, eu fiz um exercício muito grande para aceitar isso. Temos a
sensação de que todo político é imortal, porque fazemos projetos para daqui a quatro
anos, oito anos, pensamos em sair para senador, para deputado federal, enfim,
ficamos projetando coisas a longo prazo. Aí, você se depara com uma situação de
saúde como essa, e tem que passar a fazer projetos para um dia ou dois. Estou
encerrando esse ciclo porque meu projeto agora é exatamente de vida, não mais
político.
4. Quando o senhor começou o tratamento?
Homero – Em fevereiro deste ano.
5. O senhor estava sentido dores? Como foi o diagnóstico?
Homero – Foi tudo de repente. Eu fui para a votação na Câmara dos Deputados,
porque havia eleição para o presidente da Câmara no dia 4 de fevereiro. Lá [em
Brasília], no final de semana, eu já estava sentindo uma dorzinha no rim. Aí, passei a
sentir uma dor no estômago mais forte. Então, fiquei na Câmara e fazendo exames
nos dias 4, 5 e 6 de fevereiro. No dia 6 de fevereiro eu fiz uma endoscopia, onde foi
diagnosticado o tumor no estômago, embora ainda não houvesse saído o resultado da
biópsia. Nesse mesmo dia eu vim embora para Cuiabá. No dia 7 de fevereiro eu já
estava em São Paulo e no dia 9 eu passei por uma cirurgia. Foi quando começou essa
maratona. O exame mostrou que o tumor tinha tomado 70% do estômago e a linha de
tratamento que se optou foi a quimioterapia, para ver se reduzia. Mas, depois de
quatro sessões de quimioterapia, não reduziu. Trocamos o medicamento e fizemos
mais quatro sessões de quimioterapia, e o tumor também não reduziu. Foi quando se
optou por fazer a cirurgia de gastrectomia total.
6. Como foi a cirurgia?
Homero – Foi para retirada total do estômago. Daí ligou-se o duodeno direto ao
esôfago. Foi exatamente isso que me deixou mais magro, porque desde então eu
como porções pequenas. Depois dessa cirurgia, foi diagnosticado que havia tido uma
metástase (propagação do tumor) e eu comecei o tratamento dessa metástase.
Depois da cirurgia [para retirada do estômago], eu fiz mais sete sessões de
quimioterapia, que até agora não deu o resultado que a gente esperava. Foi quando
se optou por fazer esse exame de DNA, enviando o exame para os Estados Unidos.
7. Quantos quilos o senhor perdeu?
Homero – Eu emagreci 14 quilos.
8. A metástase foi encontrada um local específico?
Homero – Ela foi localizada na região do peritônio [membrana que reveste a parede
abdominal], próximo de onde foi retirado o estômago.
9. Como foi o processo de aceitação da doença?
Homero – Primeiro, eu tive que trabalhar muito a cabeça. Me apeguei à Deus porque
sou um homem de muita fé. Já passei por um câncer na garganta há 17 anos, quando
era deputado estadual. Era um linfoma, naquela época. Você tem que se apegar aos
médicos, fazer tudo aquilo que é recomendado e ter a cabeça tranquila para
administrar tudo isso. Eu fiz a política dos três "efes": família, foco e fé. Você tem que
focar no tratamento, se apegar na família, que é quem te dá força, e ter muita fé. E é
isso que eu tenho tentado exercitar.
10. Quando descobriu a doença, o senhor chegou a passar por algum
período de depressão ou se abateu?
Homero – Sim. Você tem períodos de altos e baixos. Tem semana que você está mais
animado, em outras, você está mais desanimado. Mas esses também são os efeitos
colaterais da quimioterapia.
11. Mas, o senhor precisou de algum acompanhamento psicológico?
Homero – Não, graças a Deus, não. Até agora, estou administrando tudo muito bem.
Minhas psicólogas são minha filha e minha esposa.
12. Agora, se afastando da política, como é a rotina do Homero como um
cidadão comum?
Homero – Agora, minha rotina é correr atrás de médicos, consultas e de reabilitar
minha força física. Estou focado nisso.
13. Foi difícil essa transição?
Homero – Completou uma semana essa minha nova condição, porque eu fiquei
sabendo na segunda-feira (23) que eles haviam publicado a minha aposentadoria. Aí
eu fui para Brasília, limpar as gavetas. Mas está tudo tranquilo. Eu trabalhei um pouco
a cabeça que é para o coração aceitar isso [afastamento]. Logicamente, que, em um
primeiro momento, você fica naquela angústia, porque você faz planos a longo prazo.
De repente, leva um baque desse e é obrigado a colocar os pés no chão. Hoje já estou
com a cabeça bem focada no seguinte: não adianta nada disso [política], se eu não
tiver saúde.
14. O senhor admite realizar algum tratamento fora do país?
Homero – Estou me tratando no Sírio-Libanês, que é uma referência nesses casos.
Os médicos de lá têm me dito que qualquer coisa que se esteja fazendo no mundo,
está se fazendo lá também. Eles chegaram a me recomendar para ir para Houston
(EUA), que é exatamente para onde foi o material que a gente enviou para exame.
Mas estou assim: onde falar que tem alguma coisa que possa ajudar, estou indo. Para
se ter uma noção, ontem [quarta-feira] estive em Abadiana (GO). Fui visitar o [médium]
João de Deus [da Casa Dom Inácio de Loyola].
15. E como foi?
Homero – Foi tudo ótimo. Essa é a segunda vez que fui lá e vou continuar indo. Ele
mesmo que me atendeu.
16. Fizeram uma cirurgia espiritual?
Homero – Ainda não. Nós estamos fazendo um processo de tratamento, por
enquanto. Eu fiquei lá por mais de três horas e senti uma áurea positiva. Você sai de
lá muito mais animado.
17. Como está a sua fé, sua expectativa para a cura, nesse momento?
Homero – Estou muito esperançoso. Logicamente que eu sei das dificuldades. Estou
enfrentando algo que não é uma doença típica. Esse tumor, aliás, é atípico, porque os
protocolos normais não têm sido eficazes. Tenho consciência de que estou travando
uma batalha muito grande. Mas tenho esperanças de que vou superar. Aliás, é isso
que nos mantém vivos. Tenho esperanças de que vai surgir algo novo que vai me
ajudar a superar. Sigo apegado em Deus e correndo atrás [da minha recuperação],
contando com a corrente de amigos, muitas vezes anônimos, que tentam me ajudar.
Recebo mensagens de evangélicos, católicos, espíritas. Há pessoas que me mandam
remédios caseiros, outras me mandam folhas para eu fazer um chá ou mudas de
alguma coisa que pode me ajudar, para eu plantar em casa.
18. Diante dessa nova visão que o senhor tem da vida, que crítica faria ao
estado das coisas atualmente, com todo mundo apegado à matéria,
consumo, bens, poder?
Homero – Quando você passa por uma situação de saúde como essa, é que você vê
o quanto somos limitados diante do universo e que temos que repensar os nossos
valores. Infelizmente, os valores que nós vemos expostos atualmente na mídia não
são muito republicanos ou recomendáveis para as gerações futuras. Eu já estava
convalescendo e assisti quase toda a visita do Papa quando esteve no Brasil. 100%
das vezes em que ele se pronunciou, minha mulher e eu assistimos e pegamos suas
palavras como lição. E ele falava muito sobre isso, de como estava preocupado
porque, no mundo atual, quem tem dinheiro é quem tem poder. E ele estava tentando
reintroduzir na igreja outros valores. E, claramente, isso vai se refletir nas próximas
eleições. Eu acho que vai haver uma renovação muito grande lá no Congresso
nacional, porque as pessoas estão passando a buscar novos valores e a criar novos
líderes.
19. Os políticos lidam diariamente com o poder. É um cidadão à parte, por
assim dizer. Isso, de alguma maneira, tornou mais difícil a aceitação da
doença?
Homero – Ao longo do meu mandato, todos já puderam notar o meu estilo. O poder
nunca subiu à minha cabeça. Fui o segundo deputado federal mais votado nas duas
eleições que participei, mas nunca tive essa sensação de ser o “todo-poderoso”. Sei
que há muito mais ex-políticos do que políticos. Sempre busquei nivelar meus
eleitores. Embora eu tenha começado ali como presidente da Famato, tenho
convicção que muitos agricultores familiares e trabalhadores dos assentamentos
votaram em mim. Então, isso significa que fiz ações sociais que alcançou esse tipo de
pessoas.
20. E como fica esse todo esse patrimônio político e eleitoral que o senhor
tem? Pretende se afastar da política total e definitivamente ou quer
trabalhar com isso de alguma forma?
Homero – A minha prioridade é a minha recuperação. Quero fazer o tratamento da
minha saúde. Se no momento da eleição eu estiver em condições de estar
transferindo, auxiliando de alguma forma, alguém que esteja identificado
principalmente com esse perfil de eleitorado que eu gravito [agronegócio], que é o meu
eleitorado, obviamente que eu pretendo ajudar. Mas, nesse momento, eu não tenho
essa pretensão. Vou ajudar o meu partido, o PSD, que foi um partido que me recebeu
bem. O que eu puder fazer, eu faço. Só que a minha prioridade é a minha
recuperação.
21. Com a sua saída do Congresso, o setor do agronegócio perde um
representante de peso. Como isso está sendo trabalhado politicamente?
Homero – Eu já comuniquei às entidades e acredito que eles têm que se reunir e ver
alguém para ocupar esse espaço. Porque o agronegócio é a atividade que move a
economia de Mato Grosso, porém, do ponto de vista político, esse segmento tem sido
meio desarticulado. Nós tivemos o nosso saudoso Jonas Pinheiro (DEM), que foi o
precursor disso tudo. Eu tentei, humildemente, naquilo que pude, pegar essa bandeira
[agronegócio] e carregá-la até aqui. Agora eu acho que alguém tem que pegá-la. Mas
líder você não fabrica, ele tem que nascer naturalmente. Eu vou estimular para que
possa surgir alguém com disposição e liderança suficiente para ocupar esse espaço.
22. Quem teria esse perfil? O atual presidente da Famato, Rui Prado, por
exemplo? Ou, quem sabe, o atual secretário de Política Agrícola do
Ministério da Agricultura, Neri Geller?
Homero – O Rui já manifestou que pretende focar na Federação da Agricultura,
apesar da especulação em torno do nome dele. O Neri já disputou duas eleições e,
quem sabe, com esse aprendizado, possa tentar colocar seu nome, porque está
ocupando um cargo importante e pode se projetar. Acredito que talvez algum
deputado estadual, que pudesse se identificar e estivesse com disposição para
ascender a deputado federal. Enfim, acho que o setor precisa se organizar para tentar
colocar alguém lá. Preferencialmente, até mais do que um.
23. Algum deputado estadual com esse perfil?
Homero – Olha, eu vou arriscar um nome. Gostaria muito que o deputado José
Domingos Fraga (PSD), que é engenheiro agrônomo e do mesmo partido que o meu,
pudesse assumir essa bandeira e tentar o cargo de deputado federal. Ele tem esse
perfil.
24. Com a sua saída, quem assume a vaga na Câmara Federal é o deputado
Ságuas Moraes (PT), que tem um perfil diferente do seu e já afirmou que
terá como bandeira a reforma agrária e a agricultura familiar. Como o
senhor avalia isso?
Homero – Cada um tem seu estilo e, a partir do momento que o Ságuas assumir, o
mandato será dele. Não conversei com ele sobre isso porque temos perfis diferentes.
Ele tem um foco diferente do meu. Me especializei no agronegócio, enquanto o foco
dele é educação.
25. Que mensagem o senhor gostaria de dar para os seus eleitores e
simpatizantes, nesse momento, que imagina-se que seja difícil, que é
encerrar uma carreira política que foi coroada?
Homero – A primeira mensagem que eu deixo é de agradecimento. Sou muito grato
aos votos de confiança que recebi. Procurei corresponder às expectativas que as
pessoas depositaram em mim e acho que consegui, porque vocês podem ver que de
uma eleição para outra o meu número de votos cresceu. Nesse momento, em que
estou me retirando da vida pública, eu só tenho a agradecer. Infelizmente, não por
vontade minha, mas por uma situação biológica, estou sendo obrigado a sair da
política. Porém, procurei deixar um legado de atitudes republicanas. Acho que não
envergonhei o Estado de Mato Grosso no tempo que passei lá [no Congresso]. Você
pode pesquisar em qualquer lugar que não vai encontrar um ato meu que tenha
envergonhado algum eleitor que votou em mim. Então, só tenho a agradecer, porque a
vida continua. Além de agradecer, acho que é um momento em que eu tenho que
pedir, né? Pedir por orações...
Fonte: MidiaNews / Jornalista Pedro Alves
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