ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL MINISTÉRIO PÚBLICO EXMO(A). SR(A). DR(A). JUIZ(A) DE DIREITO DA ____ VARA CÍVEL DA COMARCA DE : COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, por seu Promotor de Justiça, no uso de suas atribuições legais, vem, com fundamento no artigos 129, incisos II, III, e IX, da Constituição Federal; no artigo 107 da Constituição Estadual; no artigo 25, inciso IV, a, da Lei n.º 8.625/93 e nos artigos 1º, inciso I, 3º, 5º, 11 e 12, da Lei n.º 7.347/85, com base no Inquérito Civil n.º, propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA contra o MUNICÍPIO DE , representado pelo Prefeito Municipal, Sr., a ser citado na Rua ..., pelas razões de fato e de direito a seguir aduzidas: I— DOS FATOS: A Promotoria de Justiça de ... instaurou o Inquérito Civil n.º ... para apurar irregularidades decorrentes da ausência de ligação predial das economias à rede pública de coleta e tratamento do esgoto doméstico em .... O IC ... teve início em virtude do Projeto Institucional Ressanear do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul que, entre outros objetivos, visa viabilizar a realização das ligações prediais de esgoto doméstico dos proprietários que ainda não aderiram ao sistema público implantado ou, na inexistência deste, que não implantaram sistema individual de tratamento de esgoto, fazendo permanecer, com tal postura, a destinação de esgoto cloacal “in natura” no meio ambiente. No curso das investigações, logrou-se apurar a subutilização das redes públicas de esgoto cloacal atualmente disponíveis no território do município, seja pela adoção de formas alternativas de esgotamento sanitário onde está disponível a rede coletora (imóveis com fossas e sumidouros), seja pela prática irregular de ligação do esgoto cloacal diretamente à rede de esgoto pluvial, ou, ainda, diretamente aos cursos d’água. Ocorre, contudo, que a população de ... não está sendo devidamente conscientizada e fiscalizada pelo Poder Público municipal, para proceder às ligações do esgoto de suas casas à rede pública construída, condição necessária para garantir o bom uso de todo o 2 investimento público feito para isso, bem como para implantar, nos casos necessários, sistema individual de tratamento de esgoto – no sentido de garantir o meio ambiente e a saúde dos munícipes. Na fl. ..., consta a indicação das Estações de Tratamento de Esgoto que servem ao Município de ... Veja-se que, em ...(data), a capacidade operacional da ETE ..., que seria de até ...l/s, correspondia a apenas ...l/s, o que denuncia a subutilização deste recurso. Na fl. , a CORSAN informa – em ...(data) – que... Em vista desse panorama, foi encaminhada Recomendação ao então Prefeito Municipal, Sr. ..., no sentido de proceder ao levantamento, mediante fiscalização administrativa, de todas as unidades consumidoras, com vista a orientar e exigir a ligação do esgoto doméstico ao sistema público de esgotamento sanitário, quando existente, e exigir a implantação de sistema individual de tratamento de esgoto nos locais onde não há rede (fls...do IC). O Município reconhece as irregularidades existentes. O Termo de Declarações da fl. ... do IC ..., dando conta de que cerca de ... famílias ribeirinhas do bairro ... jogam seu esgoto doméstico diretamente no ..., reforça a caracterização do problema e a necessidade de adoção de medidas eficazes por parte do Poder Público. 3 Verificou-se que, na rua ..., os moradores dos n°... ao ... despejam seu esgoto cloacal na rede pluvial há cerca de ...anos (conforme cópias acostadas às fls. ...do IC n° ...). Recentemente, em audiência realizada nos autos da Ação Civil Pública n° ...(aproveitar audiências de ACPs de regularização fundiária), foi possível verificar que vários moradores de um loteamento clandestino, localizado no ..., destinam de modo irregular o esgoto cloacal doméstico, conforme fls. ...do IC n° ...: Cumpre referir ainda que diversos outros Inquéritos tramitam/tramitaram nesta promotoria, tratando de questões relacionadas às irregularidades de saneamento neste Município, em diversas localidades. A Certidão aposta à fl. ... do IC n° ... é paradigmática nesse sentido: Certifico que verifiquei que tramitam, ou tramitou, nesta Promotoria de Justiça os IC’s ... (objeto: lançamento irregular de esgoto no Arroio ... – firmado TAC em ... – prazo: ...); ... (objeto: apurar irregularidades decorrentes da ausência de ligação predial das economias à rede pública de coleta e tratamento de esgoto doméstico); ... (Objeto: canalização irregular de esgoto pelo Condomínio ... – designada audiência para ...); ... (objeto: verificar possível lançamento de esgoto de moradias localizadas ao longo do Arroio ...) e ... (Objeto: poluição hídrica provocada pela Empresa ... no Rio ..., Bairro ..., ajuizada Ação de Execução em ...). Sendo que somente no IC ... (Local), ... de ... de ... 4 Em todos esses expedientes – bem como em tantos outros que não chegaram a ser ali referidos – o Ministério Público tem buscado soluções pontuais, para um problema que se mostra generalizado no Município de ... Não houve interesse do Município em firmar Termo de Ajustamento de Conduta junto ao Ministério Público, tendo sido recusado o acordo, após várias audiências e pedidos de prorrogação (fls. ..., todas do IC n° ...). O Município, portanto, não aceita se comprometer com os prazos e resultados que indica para suas ações administrativas. II – OS ESGOTOS DOMÉSTICOS E SEUS ASPECTOS TÉCNICOS: Buscando municiar o Juízo da compreensão dos aspectos técnicos que envolvem os esgotos domésticos, seu tratamento prévio e posterior canalização junto à rede pluvial, colaciona o Ministério Público excertos do Documento DAT-MA nº 0632/2010, da Divisão de Assessoramento Técnico do Ministério Público, produzido pela Engenheira Sanitarista Rosane Fátima Fedrigo, com a colaboração do Engenheiro Químico Paulo Ricardo dos Santos Silva e do Biólogo Fábio Vianna Mohr (cópia em anexo): 2.7. Tratamento de esgotos domésticos 5 A Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT (NBR 7229/1993) define esgoto sanitário como água residuária composta de esgoto doméstico, despejo industrial admissível a tratamento conjunto com esgoto doméstico e água de infiltração. Os esgotos domésticos são os despejos resultantes do uso da água para higiene e necessidades fisiológicas humanas. Nesse conceito se enquadram os despejos de bacias sanitárias (esgoto cloacal) e as águas cinza (águas de cozinha, de banho, de lavatórios, de tanque de lavar roupas, de pisos internos, etc.), produzidos nas residências e em estabelecimentos comerciais e institucionais como escolas, hospitais, prisões, repartições públicas, restaurantes, aeroportos, hotéis, postos de gasolina, etc. O tratamento e a disposição adequada dos esgotos sanitários possui relevante importância para a proteção da saúde pública devido as várias doenças que podem ser transmitidas de uma pessoa doente para uma pessoa sadia através da água, alimentos, mãos, solo e vetores (moscas, baratas, etc.) que tiveram contato com esgotos contaminados. Dentre estas doenças, pode-se citar: ancilostomíase, ascardíase, amebíase, cólera, cisticercose, diarréia infecciosa, disenteria bacilar, esquistossomose, febre tifóide, febre paratifóide, salmonelose e teníase. Além da possível contaminação microbiológica das fontes de água, a matéria orgânica existente nos esgotos sanitários ocasiona o consumo do oxigênio dissolvido presente nos corpos hídricos superficiais, podendo provocar a mortalidade de peixes e de outros organismos aquáticos, além de afetá-lo esteticamente com o escurecimento da água e aparecimento de odores desagradáveis. Existem basicamente dois tipos de sistemas como soluções para o esgotamento sanitário (coleta e tratamento) de uma determinada área: 6 Sistema coletivo (ou esgotamento dinâmico) – indicado para áreas urbanas com maior concentração demográfica. Sistema local (ou esgotamento estático) – indicado para edificações construídas em lotes amplos ou localizadas em vias públicas que não possuem de sistema coletivo. FONTE: VON SPERLING, 2005. Adaptado de VON SPERLING, 2005. O sistema local (individual) de tratamento de esgotos domésticos, geralmente é composto de tanque séptico, tratamento complementar e disposição final, os quais estão abaixo descritos. a) Tanque séptico Habitualmente chamado de fossa séptica, o tanque séptico é a instalação destinada ao 7 tratamento primário dos esgotos domésticos, constituído por um tanque estanque que retêm os esgotos por um tempo estabelecido, de modo a permitir a sedimentação dos sólidos e retenção do material graxo, transformando os esgotos afluentes em compostos mais simples. O tanque séptico deve receber todos os despejos produzidos na edificação, e não apenas os da bacia sanitária, mas também as águas de cozinha, de banho, de lavatórios, de tanque e máquina de lavar roupas. Os esgotos contendo sabões e detergentes nas concentrações geralmente utilizadas em habitações não são considerados prejudiciais ao funcionamento do tanque séptico. Não devem ser encaminhados ao tanque séptico despejos como águas de chuva, de piscinas, de pisos externos, e de lavagem de carros. O tanque séptico possui efluente escuro com odor característico. A eficiência da unidade é de cerca de 30% em termos de Demanda bioquímica de oxigênio – DBO, e não permite o atendimento do padrão de emissão de efluentes líquidos estabelecido na legislação vigente 1. O Tanque deve ser dimensionado, executado, e operado segundo critérios estabelecidos na ABNT - NBR 7229 – Projeto, construção e operação de sistemas de tanques sépticos. Vige a edição publicada em 1993. A figura abaixo mostra o esquema de um tanque séptico. Vem da edificação Vai para o tratamento complementar 1 Resolução CONSEMA n.º 128/2006 – Dispõe sobre a fixação de Padrões de Emissão de Efluentes Líquidos para fontes de emissão que lancem seus efluentes em águas superficiais no Estado do Rio Grande do Sul. 8 FONTE: VON SPERLING, 2005. b) Tratamento complementar O tratamento complementar tem a finalidade de melhorar a qualidade do efluente líquido do tanque séptico, que é potencialmente contaminado. Dentre as várias alternativas técnicas para o tratamento dos efluentes do tanque séptico estão o filtro anaeróbio, o filtro aeróbio, o filtro de areia e as valas de filtração, sendo que o primeiro é o mais utilizado. O filtro anaeróbio é um tanque estanque que possui em seu interior um leito de material filtrante, geralmente britas, na qual o efluente do tanque séptico escoa de forma ascendente. O material filtrante retêm em sua superfície as bactérias anaeróbias responsáveis pela redução da carga orgânica poluidora. A funcionalidade dessa unidade depende da eficiência do tanque séptico que o precede; o excesso de sólidos oriundos do tanque séptico pode proporcionar a obstrução do filtro anaeróbio. O sistema composto por tanque séptico e filtro anaeróbio pode atingir eficiência de até 75% em termos de DBO, quando devidamente projetado e executado, e em condições operacionais e de manutenção adequadas. Em termos de remoção de coliformes, o sistema não possui eficiência satisfatória, e como esse parâmetro representa potencialidade de transmissão de doenças, é recomendada a disposição final dos efluentes do filtro anaeróbio no solo, desde que observadas as limitações para esta prática, as quais são adiante descritas. A figura abaixo mostra o esquema de um filtro anaeróbio de fluxo ascendente. 9 Vai para o local de disposição final FONTE: CHERNICHARO, 2001. c) Disposição final Disposição no solo – Processo de disposição final Vem do Tanque séptico dos efluentes tratados que consiste na infiltração dos mesmos no solo, onde ocorre a depuração/tratamento da carga orgânica remanescente, devido a processos físicos (retenção de sólidos) e bioquímicos (oxidação). A disposição no solo pode ocorrer, entre outros, através do sumidouro, das valas de infiltração e da irrigação, porém essas duas últimas requerem grandes áreas. São limitações para a disposição de efluentes no solo: solo com baixa capacidade de infiltração, proximidade de corpos hídricos, e lençol freático elevado. Deve ser mantida distância vertical mínima de 1,50 m entre o fundo da unidade de disposição final e o nível máximo do lençol freático. Abaixo, figura de sumidouro com e sem enchimento. Entrada Entrada FONTE: CHERNICHARO, 2001. 10 Disposição final no corpo hídrico – Quando não é possível a disposição dos efluentes no solo, resta como alternativa o lançamento dos esgotos tratados em corpo hídrico, diretamente, ou indiretamente por meio da rede de águas pluviais, sendo que para a utilização de tal alternativa deve ser observado o artigo 1382 da Lei n.º 11520/2000 Código Estadual de Meio Ambiente. As unidades de tratamento complementar e disposição final devem ser dimensionadas, executadas, e operadas segundo critérios estabelecidos pela ABNT - NBR 13969 – Tanques sépticos – Unidades de tratamento complementar e disposição final dos efluentes líquidos – Projeto, construção e operação. Vige a edição publicada em 1997. A NBR 13969/1997 apresenta um fluxograma das possíveis combinações para composição do sistema local (individual) de tratamento, abaixo representado. Pós-tratamento Disposição final Filtro anaeróbio Vala de infiltração Filtro aeróbio submerso Canteiro de infiltração/ Lodo ativado por batelada evapotranspiração Vala de filtração Galeria de águas pluviais Esgoto Esgoto Tanque Filtro de areia Corpos de água efluente afluente séptico Desinfecção Sumidouro 2 Lei n.º 11520/2000. Art. 138 - A utilização da rede de esgotos pluviais para Reusoo transporte e afastamento de esgotos sanitários somente será permitida mediante licenciamento pelo órgão ambiental e cumpridas as seguintes exigências: I - será obrigatório o tratamento prévio ao lançamento dos esgotos na rede; II - o processo de tratamento deverá ser dimensionado, implantado, operado e Digestão anaeróbia pelos órgãos municipais e conservado conforme critérios e normas estabelecidas Campo Desidratação estaduais competentes ou, na inexistência destes, conforme as normas da Associação Lodo e Incineração Compostagem Brasileira de Normas Técnicas (ABNT); escuma Aterro sanitário III - qualquer que seja o processo deEstabilização tratamentoquímica adotado, deverão ser previamente definidos todos os critérios e procedimentos necessários ao seu correto funcionamento, em especial: localização, responsabilidade pelo projeto, operação, controle e definição do destino final dos resíduos sólidos gerados no processo; IV - as bocas de lobo e outras singularidades da rede condutora da mistura de esgotos deverão possuir dispositivos que minimizem o contato direto da população com o líquido transportado. 11 Como obra de engenharia, os sistemas de tratamento de esgotos domésticos devem ser projetados e executados por profissional habilitado 3 com registro no Conselho Regional de Engenharia – CREA, através da Anotação de responsabilidade técnica – ART. As unidades do sistema local de tratamento de esgotos domésticos devem possuir aberturas de inspeção, e localização passível de vistoria. Além do correto dimensionamento das unidades, a adequada funcionalidade e eficiência desse sistema está associada a limpeza periódica determinada no projeto, geralmente anual. As operações de limpeza (remoção do lodo) devem ser realizadas por empresa licenciada pelo órgão ambiental competente. II – DO DIREITO: A saúde e o meio ambiente de qualidade são direitos assegurados constitucionalmente a todos os cidadãos. Quanto à saúde da população, além da própria previsão do art. 6° da CF/88, há também que se invocar o art. 196 de nossa Lei Maior, que assevera ser a saúde “direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à 12 redução do risco de doenças e agravos [...]”. As ações e serviços de saúde são de relevância pública, conforme prevê o art. 197 da Constituição Federal. Com efeito, a promoção de obras de saneamento básico vem ao encontro desses comandos constitucionais, pois volta-se a garantir a saúde da população e a reduzir os riscos de doenças. O art. 23, inciso IX, da Constituição Federal é claro ao prever que é competência comum de todos os entes da federação “promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico”. O art. 24, inciso I, da Constituição Federal de 1988, determina ser de competência da União, Estado e Distrito Federal legislar sobre direito urbanístico, cabendo ao Município promover o adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano, nos termos do art. 30, inciso VIII, da CF. A política de desenvolvimento urbano executada pelo Poder Público Municipal deve ter por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais do Município e garantir o bem estar de seus habitantes, conforme o art. 182 da Constituição Federal. 3 Engenheiro Civil, Engenheiro Sanitarista, Arquiteto, por exemplo. 13 Ademais, a Lei Federal n° 11.445/07, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico, é clara ao prever a “universalização do acesso” dentre os seus princípios fundamentais (art. 2°, inciso I). E essa universalização há que ser compreendida como a “ampliação progressiva do acesso de todos os domicílios ocupados ao saneamento básico” (art. 3°, inciso III). Resta evidenciada, portanto, a legitimidade do ente municipal para figurar no pólo passivo da presente demanda, como consectário de sua responsabilidade direta, além da responsabilidade in vigilando, em zelar pelo uso do solo urbano e de seu poder-dever de adequá-lo aos ditames legais, inclusive no que se refere à execução de obras de infraestrutura. A Constituição Estadual do Rio Grande do Sul, na Seção II, trata do saneamento básico, dispondo em seu artigo 247 que “o saneamento básico é serviço público essencial e, como atividade preventiva das ações de saúde e meio ambiente, têm abrangência regional. § 1º - o saneamento básico compreende a captação, o tratamento e a distribuição de água potável; a coleta, o tratamento e a disposição final de esgotos cloacais e do lixo bem como a drenagem urbana. § 2º - é dever do Estado e dos Municípios a extensão progressiva do saneamento básico a toda população urbana e rural, como condição básica da qualidade de vida, da proteção ambiental e do desenvolvimento social”. 14 Já o Código Estadual do Meio Ambiente (Lei Estadual n° 11.520/00) dispõe: Art. 137 - Todos os esgotos deverão ser tratados previamente quando lançados no meio ambiente. Parágrafo único - Todos os prédios situados em logradouros que disponham de redes coletoras de esgotos sanitários deverão ser obrigatoriamente ligados a elas, às expensas dos proprietários, excetuando-se da obrigatoriedade prevista no "caput" apenas as situações de impossibilidade técnica, que deverão ser justificadas perante os órgãos competentes. Art. 138 - A utilização da rede de esgotos pluviais para o transporte e afastamento de esgotos sanitários somente será permitida mediante licenciamento pelo órgão ambiental e cumpridas as seguintes exigências: I - será obrigatório o tratamento prévio ao lançamento dos esgotos na rede; II - o processo de tratamento deverá ser dimensionado, implantado, operado e conservado conforme critérios e normas estabelecidas pelos órgãos municipais e estaduais competentes ou, na inexistência destes, conforme as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT); http://www.al.rs.gov.br/legiscomp 32; III - qualquer que seja o processo de tratamento adotado, deverão ser previamente definidos todos os critérios e procedimentos necessários ao seu correto funcionamento, em especial: localização, responsabilidade pelo projeto, operação, controle e definição do destino final dos resíduos sólidos gerados no processo; 15 IV - as bocas de lobo e outras singularidades da rede condutora da mistura de esgotos deverão possuir dispositivos que minimizem o contato direto da população com o líquido transportado [grifos nossos]. A Lei Orgânica Municipal dispõe, em seu art. ...: E não se poderia deixar de citar, ainda, o Código Municipal do Meio Ambiente (Lei Municipal n°...), que, ao tratar do saneamento básico, reza:... Portanto, não restam dúvidas de que o responsável pelo dano que está ocorrendo é o Município, pois cabe a ele providenciar os meios para que esteja ao alcance de todos os seus habitantes as mínimas condições de saneamento, e fiscalizar a sua correta utilização. O despejo de dejetos in natura nos cursos d’água, ou as ligações de esgoto cloacal na rede de drenagem pluvial acarretam uma situação de perigo para os moradores e para o meio ambiente. Tal prática traz aos moradores o perigo de inúmeras doenças, além do convívio com o odor insuportável que é emanado por este tipo de detrito. A omissão do demandado está se refletindo também na qualidade do meio ambiente, cuja defesa e preservação, para as presentes e futuras gerações, é atribuição do Poder Público (art. 225 da CF/88). A ligação do esgoto cloacal das residências diretamente na rede de esgoto pluvial, ou mesmo a sua disposição 16 diretamente nos cursos d’água que compõem a bacia hidrográfica do Rio... acarretam a poluição desses recursos hídricos, a alteração dos ecossistemas, a destruição da mata ciliar, o assoreamento dos leitos e, ao fim e ao cabo, a piora gradual da qualidade da água que abastece a população. O Município de ... não logra fiscalizar tais ligações irregulares, chegando-se ao extremo em que, no próprio centro da cidade, há moradias com esgoto ligado à rede pluvial, conforme foi possível verificar (fl.... do IC...). Além disso, há ainda outras tantas situações, a exemplo das acima relatadas, em que os imóveis seguem com seus esgotos cloacais destinados in natura diretamente em cursos d’água. Essa inoperância da Administração Municipal tem representado um alto custo para o meio ambiente em ... Consolidamse soluções inadequadas de escoamento de esgoto cloacal (como o caso da Rua ..., em que há ... anos o esgoto cloacal é depositado na rede de drenagem pluvial), sem que haja sequer uma conscientização da população. É altíssimo, portanto, o impacto que o meio ambiente vem sofrendo, por conta da omissão do Poder Público municipal. 17 III – DA TUTELA LIMINAR: Em se tratando de tutela coletiva, que conta com seu microssistema, a tutela de urgência deve ser concedida, s.m.j., diante dos pressupostos previstos no artigo 84 do CDC, nos termos do artigo 21 da Lei 7.347/85, ambos presentes nesta demanda. A relevância do fundamento da demanda é indubitável. Posto em causa o direito fundamental ao meio ambiente que vem sendo degradado diante da omissão do Município de ... Da mesma forma, o contexto, por si só, evidencia o receio de ineficácia do provimento final, na medida em que a situação ambiental que hoje se pode proteger, com a qual hoje ainda se pode contar, não mais estará presente desta forma se no curso da demanda a degradação se mantiver ou até evoluir diante da omissão da fiscalização municipal. A não concessão da tutela liminar implica manifesta projeção dos danos no tempo, durante o transcurso da presente demanda, permitindo a redução da qualidade de vida dos moradores e do ambiente natural devido à falta de fiscalização do Município, para que sejam feitas as obras que garantam a correta destinação do esgoto cloacal das moradias, extinguindo-se as ligações à rede pluvial ou diretamente nos cursos d’água, e isto se notabiliza por uma irreparabilidade dos danos causados ao meio ambiente, bem que integra o patrimônio de toda a coletividade. 18 Assim, torna-se imprescindível a correção desta grave situação, como também a concessão de tutela liminar para cessar o dano que vem ocorrendo ao meio ambiente e possibilitar uma vida mais digna à população de ... pela melhoria das condições de saúde e diminuição dos riscos. Em não sendo o entendimento de Vossa Excelência a aplicação do microssistema da tutela liminar coletiva prevista no artigo 84, §3º, do CDC, estariam presentes também os pressupostos para concessão da antecipação da tutela prevista no artigo 273, do CPC, que s.m.j, se presta à tutela liminar individual. Não há dúvida de que a falta de medidas fiscalizatórias no tocante ao saneamento básico, como demonstrado pela prova inequívoca das fls., violam o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e a uma vida saudável e digna dos moradores deste Município (artigo 225 da Constituição Federal) o que demonstra a verossimilhança da alegação. Há fundado receio da irreparabilidade do dano que decorre da degradação ambiental permanente ou até progressiva que será mantida no curso do processo, alterando a situação ambiental que ora se protege. Assim, indispensável, pois, para evitar-se o agravamento da situação constatada – lesividade à natureza e aos interesses ambientais e coletivos aqui defendidos, dentre eles a saúde pública –, seja concedida a tutela liminar, para o fim de determinar ao Município de ...: 19 (1) a realização – no prazo de 6 meses a partir da concessão da medida (ou outro que se entender mais adequado no curso da investigação da Promotoria de Justiça) – do levantamento que retrate a situação das edificações do Município, informando quais delas encontram-se com seus esgotos cloacais ligados à rede pluvial, ou diretamente em cursos d’água, e demonstrando ter procedido às devidas notificações desses moradores, para realização das obras de regularização, seja pela correta ligação do esgoto cloacal à rede pública para tal fim destinada, seja pela construção de sistemas alternativos de escoamento do esgoto doméstico das casas (fossas, filtro e sumidouros); (2) promover, no prazo de doze meses (ou outro que se entender mais adequado no curso da investigação da Promotoria de Justiça), também contados da concessão da liminar, a lacração do lançamento irregular de esgoto nos cursos d’água ou na rede de esgoto pluvial, no tocante àqueles imóveis que não atenderem à notificação da Prefeitura para regularização, encaminhando relatórios individualizados ao Ministério Público, para adoção das providências criminais cabíveis contra os infratores; (3) promover, de modo concomitante às medidas suprarreferidas, campanha de conscientização junto aos moradores das residências que não possuam sistema adequado de coleta, tratamento e destinação do esgoto cloacal, visando à despoluição dos Arroios, mediante a cessação dos lançamentos não autorizados. IV –DOS PEDIDOS: 20 Em face de todo o exposto, o Ministério Público requer: a) considerando a relevância dos fundamentos da presente demanda, seja concedida a tutela liminar, nos termos do acima exposto, sob pena de multa a ser aplicada ao Município de ..., no valor de R$ ... (estabelecer padrão conforme condições financeiras dos Município) por dia de atraso e por cada caso verificado de descumprimento, assim considerada cada ligação irregular não corrigida no tempo oportuno, e ao Agente Político Responsável pelo descumprimento da ordem judicial, com fulcro no artigo 14, parágrafo único, do CPC, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), sem prejuízo de outras sanções criminais, civis e processuais cabíveis; b) a procedência da ação, para condenar, modo definitivo, o Município de ... à obrigação de fazer consistente, (1) na realização – no prazo de 6 meses a partir da concessão da medida (ou outro que se entender mais adequado no curso da investigação da Promotoria de Justiça) – do levantamento que retrate a situação das moradias do Município, informando quais delas encontram-se com seus esgotos cloacais ligados à rede pluvial, ou diretamente em cursos d’água, e demonstrando ter procedido às devidas notificações desses moradores, para realização das obras de regularização, seja pela correta ligação do esgoto cloacal à rede pública para tal fim destinada, seja pela construção de sistemas alternativos de escoamento do esgoto doméstico das casas (fossas e sumidouros); (2) em promover, no prazo de doze meses (ou outro que se entender mais adequado no curso da investigação da 21 Promotoria de Justiça), também contados do deferimento da medida, a lacração do lançamento irregular de esgoto nos cursos d’água ou na rede de esgoto pluvial, no tocante àqueles imóveis que não atenderem à notificação da Prefeitura para regularização, encaminhando relatórios individualizados ao Ministério Público, para adoção das providências criminais cabíveis; (3) em promover, de modo concomitante às medidas suprarreferidas, campanha de conscientização junto aos moradores das residências que não possuam sistema adequado de coleta, tratamento e destinação do esgoto cloacal, visando à despoluição dos cursos d’água, mediante a cessação dos lançamentos não autorizados; tudo sob pena de multa a ser aplicada ao Município de ..., no valor de R$ ... (... reais) por dia de atraso e por cada caso verificado de descumprimento, assim considerada cada ligação irregular não corrigida no tempo oportuno, e ao Agente Político Responsável pelo descumprimento da ordem judicial, com fulcro no artigo 14, parágrafo único, do CPC, no valor de R$ ... (...reais), sem prejuízo de outras sanções criminais, civis e processuais cabíveis; c) a citação do requerido, para que, querendo, apresente resposta no prazo legal, sob pena de revelia; d) produção de todos os meios de provas em direito admitidos; e) a condenação do demandado ao pagamento das custas e demais despesas processuais decorrentes da sucumbência, exceto honorários advocatícios. Dá à causa valor de Alçada. 22 Nesses termos, Pede deferimento. (data). ..., Promotor de Justiça. 23