CENTRO UNIVERSITÁRIO METODISTA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM REABILITAÇÃO E INCLUSÃO
MESTRADO PROFISSIONAL EM REABILITAÇÃO E INCLUSÃO
MARTHA FERRARI AGUSTONI
RECICLAGEM E A INCLUSÃO SOCIAL: A UNIDADE DE TRIAGEM DE “LIXO”
DO HOSPITAL SÃO PEDRO
PORTO ALEGRE
2012
MARTHA FERRARI AGUSTONI
RECICLAGEM E A INCLUSÃO SOCIAL: A UNIDADE DE TRIAGEM DE “LIXO”
DO HOSPITAL SÃO PEDRO
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Reabilitação e Inclusão do Centro
Universitário Metodista, do IPA, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre em
Reabilitação e Inclusão.
Orientador: Prof. Dr. Norberto da Cunha Garin
Co-orientador: Prof. Dr. Edgar Zanini Timm
PORTO ALEGRE
2012
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Agustoni, Martha Ferrari.
Reciclagem e a inclusão social [manuscrito] : a unidade de triagem de
“lixo” do Hospital São Pedro / Martha Ferrari Agustoni, 2012.
133 f.
Dissertação (mestrado) – Centro Universitário Metodista, do IPA. Programa
de Pós-Graduação. Mestrado em Reabilitação e Inclusão, Porto Alegre, 2012.
"Orientação: Prof. Dr. Norberto da Cunha Garin”
"Co-orientação: Prof. Dr. Edgar Zanini Timm”
1. Inclusão social. 2. Transtorno mental. 3. Reabilitação. 4.
Reciclagem. 5. ATUT. I. Garin, Norberto da Cunha. II. Timm,
Edgard Zanini. III. Título.
CDD 362.21
CDU 364.048.6
Bibliotecária Responsável
Patrícia Mentz CRB 10/2143
MARTHA FERRARI AGUSTONI
RECICLAGEM E A INCLUSÃO SOCIAL: A UNIDADE DE TRIAGEM DE “LIXO”
DO HOSPITAL SÃO PEDRO
Esta Dissertação foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Mestre em
Reabilitação e Inclusão, no Programa de Pós-Graduação em Reabilitação e
Inclusão, do Centro Universitário Metodista, do IPA.
Porto Alegre,
Apresentada à Banca Examinadora composta pelos (as) professores (as)
____________________________________________
Prof. Dr. Norberto da Cunha Garin– Orientador
PPG-RI
_____________________________________________
Profa. Dra.Luciane Carniel Wagner
PPG-RI
______________________________________________
Profa. Dra. Ilza Maria Tourinho Girardi
UFRGS
AGRADECIMENTOS
À Universidade Federal do Rio Grande do Sul pelo incentivo a capacitação de
seus Técnicos, na busca do conhecimento.
À Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação Social da UFRGS, ao Prof.
Ricardo Schneiders da Silva, que proporciona a capacitação de seus Técnicos,
através de Projetos, Mestrado e Doutorado.
Ao Mestrado Profissional em Reabilitação e Inclusão Social e ao Prof. Dr.
Jerri Luiz Ribeiro, pela grata satisfação de contar com sua compreensão e decisões.
Ao Prof. Dr. Norberto Garin, meu Orientador, a mais grata satisfação de ter
podido contar com sua orientação e compreensão e seus ensinamentos.
A minha família pelo incentivo e paciência no período de estudos, e da
certeza que iria vencer mais esta etapa da vida.
Ao meu pai, Carlos Augusto Ferrari (in memoriam), obrigado por ser meu pai
e transmissor de seu legado.
À natureza como um todo e as felinas Kitty e Nina que acompanharam a
trajetória e pelo seu amor incondicional.
Aos professores e colegas do curso de Mestrado a grata satisfação de
conhecê-los.
Estar na hora certa, poder viver e conviver é uma grata satisfação.
Gracias à la vida!
A escolha é nossa: formar uma aliança global
para cuidar da Terra e uns dos outros, ou arriscar
a nossa destruição e a da diversidade da vida.
(Carta da Terra)
RESUMO
O presente trabalho busca mostrar as relações que podem ocorrer entre a doença
mental e a reabilitação, as possibilidades que o trabalho pode oferecer a pessoas
historicamente excluídos da sociedade. Atualmente os doentes mentais possuem
um campo de atuação bem restrito e o Galpão de reciclagem Associação dos
Trabalhadores da Unidade de triagem do Hospital São Pedro (ATUT), que se
encontra nas dependências do Hospital São Pedro é uma oportunidade para que
essas pessoas e sua reabilitação. Na ATUT é oferecida capacitação com uma
atividade fácil de ser compreendida e de ser seguida, dentro de uma organização.
Neste Galpão é triado material reciclável vindo da coleta seletiva e doado por
Instituições Públicas, Bancos, escritórios e outros. É uma oportunidade de trabalho
para pacientes do Hospital e de outros locais que sejam receptores destas pessoas.
Sabemos que a sociedade não possui condições de recolocá-los na economia de
mercado, mas lá no Galpão eles têm esta oportunidade de trabalho, e de manter a
reabilitação psicossocial bem como obter um ganho mensal, lhes oportunizando a
independência. O cuidado com a natureza está contribuindo com o Projeto ATUT,
pois cada vez mais é importante a atividade de descarte correto dos resíduos que
produzimos, a fim de que a natureza possa regenerar-se, manter uma agradável
convivência com o homem. Assim, mostramos que a coleta seletiva de materiais
recicláveis e sua correta destinação ao Galpão de reciclagem é importante, pois vai
contribuir para a preservação do meio ambiente. Estuda-se o caso da Associação
ATUT, com o objetivo de propor um modelo para que outros galpões possam existir
e assim multiplicar a ideia original vinda do Projeto ATUT, que era uma oficina de
terapia de reciclagem.
Palavras-chave: Doença Mental. Associados da ATUT. Materiais Recicláveis.
Reciclagem. Reabilitação. Inclusão Social.
ABSTRACT
The present study attempts to show the relations that can occur between mental
illness and rehabilitation, the possibilities that the work can offer individuals
historically excluded from society. Currently they have a very restricted field of
operation and the recycling shed Workers' Association triage unit of Hospital São
Pedro (ATUT), which is at the premises of St. Peter's Hospital is an opportunity for
the mentally ill and their rehabilitation. There is a capacitating offered with an activity
easy to understand and to be followed within an organization. There is triaged
recyclable material coming from the selective collection and donation by public
institutions, banks, offices and others. It is an opportunity of work for the hospital
patient and other places which are receptors for these patients.
We
know
that
society does not have conditions of replacing them in the market economy, but there
in the shed they have this opportunity to work, and also to keep the psychosocial
rehabilitation and also get a monthly gain, their opportunity to the independence
Nature is contributing to the project ATUT because it is increasingly important activity
of properly discard the waste we produce, so that it can regenerate itself, maintain a
pleasant living with a man. Thus we have shown that the selective collection of
recyclable materials and their proper disposal to the recycling shed is important
today, will contribute to the preservation of the environment. It was a studied of the
case: ATUT Association, in order to propose a model which may create de origin of
other sheds and so multiply the original idea came from ATUT Project, which was a
workshop of therapy recycling.
Keywords: Mental Illness. Associates of ATUT. Recycled Materials. Recycling.
Rehabilitation. Social Inclusion.
LISTA DE SIGLAS
3Rs - Reduzir, reaproveitar e reciclar
A3P - Agenda Ambiental na Administração Pública
ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas
AJURIS - Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul
APAE - Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais
ATUT - Associação dos trabalhadores da Unidade de Triagem
CEPERS - Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul - Sindicato dos
Trabalhadores Em Educação
CGA - Coordenadoria de Gestão Ambiental
COREN - Conselho Regional de Odontologia
CREA - Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura, Agronomia
DMLU - Departamento Municipal de Limpeza Urbana
FABICO - Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação Social
FADERS - Fundação de Articulação e Desenvolvimento de Políticas Públicas para
Pessoas Portadoras de Deficiência e de Altas Habilidades no Rio Grande do Sul
GTs - Grupos de trabalho(s)
HPSP - Hospital Psiquiátrico São Pedro
IBAMA - Instituto Brasileiro de Meio Ambiente
IPA - Instituto Porto Alegre
IPF - Instituto Psiquiátrico Forense
LEVs - Locais de entrega voluntária de resíduos recicláveis
ONU - Organizações das Nações Unidas
PEVs - Postos de entrega voluntária
PNRS - Política Nacional de Resíduos Sólidos
PROCERGS - Companhia de Processamentos de Dados do Rio Grande do Sul
SICREDI - Cooperativa de Crédito
SUS - Sistema Único de Saúde
SUSEPE - Superintendência dos Serviços Penitenciários
TIM - Telefonia TIM
UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO..........................................................................................................9
1.1 PROBLEMA.........................................................................................................14
1.2 OBJETIVO GERAL..............................................................................................15
1.3 OBJETIVOS ESPECÍFICOS................................................................................16
1.4 A OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE NO GALPÃO...............................................17
2 REFERENCIAL TEÓRICO.....................................................................................19
2.1 WEBER E O TIPO IDEAL....................................................................................19
2.2 NATUREZA E CONHECIMENTO........................................................................23
2.3 DOENÇA MENTAL, HISTÓRIA E ORGANIZAÇÕES..........................................28
3 OS MATERIAIS RECICLÁVEIS.............................................................................32
4 PROJETO DE EXTENSÃO: ATUT- RECICLANDO VIDAS COM INCLUSÃO
SOCIAL...................................................................................................................43
4.1 CAMPANHAS DE DIVULGAÇÃO........................................................................46
4.2 APOIO E PARCERIAS.........................................................................................51
4.3 METODOLOGIA...................................................................................................51
5 O PERFIL DOS ASSOCIADOS E SEUS LOCAIS DE ORIGEM...........................55
5.1 O PERFIL.............................................................................................................55
5.2 LOCAIS DE ORIGEM..........................................................................................56
5.2.1 Hospital São Pedro.........................................................................................57
5.2.2 Instituições de Atendimento Psicossocial...................................................66
6 LOCAIS DE TRABALHO NO COTIDIANO DO GALPÃO.....................................73
7 ORGANOGRAMA DO GALPÃO...........................................................................85
8 PARCERIAS, SERVIÇOS E RECEITAS DA ATUT...............................................91
9 O CASO: O COTIDIANO DO GALPÃO DE RECICLAGEM.................................94
9.1 PERÍODO PRÉ-INSTITUCIONAL 2000: UMA OFICINA DE REABILITAÇÃO...94
9.2 NASCIMENTO E INSTITUCIONALIZAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO DOS
TRABALHADORES DA UNIDADE DE TRIAGEM DO HOSPITAL SÃO
PEDRO................................................................................................................98
10 CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................109
REFERÊNCIAS.......................................................................................................118
ANEXOS..................................................................................................................121
9
1 INTRODUÇÃO
Ao iniciar o caminho da pesquisa qualitativa do presente trabalho, foi
percorrido um longo tempo de espera, para que os trâmites legais fossem efetivados
no sentido de ser aprovada pelos Comitês de Ética do Centro Universitário Metodista
do IPA e do Hospital São Pedro, onde o Galpão de reciclagem está dentro dos seus
muros. Hoje, o Galpão é uma Associação que tem a sua independência
organizacional e estrutural, mas está lá dentro, do maior hospital que abriga doentes
mentais de Porto Alegre. Foram cinco meses de espera, com a aprovação dos
Comitês de Ética, liberando a pesquisa. Algumas ressalvas foram solicitadas,
através dos Comitês de Éticas do IPA e do Hospital São Pedro (Anexo 1) e (Anexo
2), e o Termo Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo 3), assim respeitados por
mim, durante a minha trajetória da pesquisa no trabalho de campo.
Sempre respeitei os limites impostos, em se tratando de pessoas portadoras
de doença mental ou com alguma deficiência mental, na sua maioria. A pesquisa
como um todo foi muito prazerosa, pela condição especial de ser muito bem
recebida pelos associados - Equipe Técnica do Galpão. Senti-me muito à vontade
para perguntar, aguçar minha curiosidade pelo cotidiano deles e do Galpão para que
o trabalho de pesquisa pudesse representar tudo àquilo que ele realmente é, em um
estudo de caso. Assim farei a proposição de uma possibilidade para as pessoas com
doença mental e que estejam no processo de reabilitação, em busca de sua inclusão
social.
Início pela história do Hospital Psiquiátrico São Pedro, que na atualidade não
é mais um hospital moradia, apenas um número pequeno de indivíduos ainda
moram nele, em torno de cento e cinquenta pessoas, em regime de internação
permanente na condição de morador. Nesta condição, de moradores do Hospital
encontramos pessoas abandonadas e sua condição emocional e de remissão total,
assim como não sabem sua origem, família, muitas vezes até o próprio nome,
também pela idade avançada. Os demais estão ou ficam internados por um período
máximo de um mês, ou em tratamento ambulatorial. O Hospital recebe atualmente
pessoas com sofrimento psiquiátrico que necessitam de tratamento ambulatorial,
com um curto período de internação, todos são encaminhados pelo Sistema Único
de Saúde (SUS) que atende à demanda da região Metropolitana de Porto Alegre.
10
Consigo traçar a história deste Hospital para doentes mentais e também não
só em relação à memória de seus atores, como o caminho longo da doença mental
e dos meandros que ela passou até chegar à atualidade. Assim vemos que para
estes indivíduos houve uma evolução em relação a sua situação de cidadania.
Existe uma reabilitação para o doente mental? Como se traduz? Ela acontece como
um estado permanente?
Fiz ao longo da pesquisa muitos questionamentos, no trabalho de campo e
durante a convivência com os associados do Galpão e mesmo em momentos de
reflexão do meu dia a dia, que me remetia às entrevistas. Observando o cotidiano
desses pacientes, as tarefas, os diálogos, os eventos como o lanche, palestras,
comportamentos nos diferentes momentos da pesquisa. Refletir sobre o mundo em
que vivemos e para onde iremos, foram perguntas que me fiz durante a pesquisa,
não só em relação à natureza, mas também quanto à existência destes indivíduos e
a sua inserção na sociedade.
Minha realidade pessoal permeou a doença mental, pois meu pai, já
falecido, Dr. Carlos Augusto Ferrari, foi Psiquiatra, mas de outro complexo hospitalar
- o Hospital Espírita, fundado e idealizado pelo meu avô paterno, Sr. Conrado
Ferrari.
Sem ter vocação para cursar a faculdade de Medicina, fui estudar Biologia, e
adepta ao ideal da preservação do meio ambiente, cursei especialização em
Educação Ambiental e, posteriormente, dentro da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS) fiz o curso de Capacitação para Agente Ambiental, com
ênfase na Gestão dos Processos Ambientais. Há nove anos participo da Ação de
Extensão que busca trabalhar o Galpão de reciclagem da Associação dos
trabalhadores da unidade de triagem do Hospital São Pedro (ATUT), promovendo
uma assessoria de comunicação interna e externa, realizada por acadêmicos do
Curso de Comunicação da UFRGS. Promovemos a educação ambiental para os
associados e para os integrantes da comunidade da Faculdade de Biblioteconomia e
Comunicação da referida Universidade. Nunca me imaginei dentro deste lugar, tão
pouco falado e de maneira velada, como um assunto proibido ou esquecido, pela
sociedade.
Hoje percebo a importância do Projeto de Extensão ATUT para o Galpão e
também da minha presença para os associados, como um elo de conhecimento e
integrador entre a Universidade e esta Associação.
11
Hoje os doentes mentais estão sendo descortinados pela necessidade da
sociedade ter que enxergar os que lá estiveram internados ou que foram ou são
moradores desse Complexo Hospitalar.
Assim a sociedade tem que propor uma saída para eles, para que eles
possam ter um convívio diário dentro de nossa sociedade, de participação efetiva de
forma inclusiva. Passando não só pela aceitação deste doente no seu retorno e
convívio familiar, mas também numa posição de mão de obra trabalhadora,
contribuindo para a sociedade e para si, de uma forma terapêutica. Pelos recursos
da medicina atual o doente mental nunca deixará de ser um doente mental, ele não
é um ex-doente mental, mas pode estar em reabilitação, sendo um processo
permanente.
Sobre a questão da reabilitação as pessoas têm uma ideia meio ortopédica
que os conceitos de reabilitação seria pegar o sujeito efetivo um processo de
reabilitação social propriamente dito e este sujeito passa ser incluso na
sociedade habitual, normal. A reabilitação não é isto. Não é um processo de
ortopedia. Ela é um processo continuo permanente um processo sem fim. Na
verdade a reabilitação significa criar formas efetivas de inclusão destas
pessoas na sociedade. Por exemplo, através do trabalho. Como é no nosso
caso. Demanda um atendimento permanente. (Membro da Equipe Técnica nº
1).
É um estado de vigília permanente em que o doente mental luta contra a sua
doença. Devemos entender que este doente é um somatório do complexo
tratamento psicoterápico e medicações. Assim ele encontra-se num estado que
poderá contribuir para sociedade, através de uma ocupação e tendo um ganho
digno, com um pensamento libertador da prisão mental que se encontra, através da
construção de um processo reabilitador.
O presente estudo, em torno do Galpão de Reciclagem Associação dos
trabalhadores da Unidade de Triagem do Hospital São Pedro (ATUT) pretende trazer
à Academia uma trajetória da Associação com seus integrantes dentro do seu
cotidiano de trabalho e de vivências. Este Galpão iniciou suas atividades em 2000,
como uma oficina terapêutica, com pacientes doentes mentais vindos do Clube da
Amizade, um grupo de socialização do Hospital. Esta oficina funcionava nas
dependências do Hospital, com apenas 3 a 4 indivíduos.
[...] Inicialmente o projeto começou com as pessoas do Clube da Amizade é
um serviço de convivência do próprio Hospital e depois progressivamente foi
12
se ampliando este perímetro então a gente tem pacientes que moram nos
abrigos da Prefeitura, nos Caps. São centros de atendimento psicossocial,
ambulatório do Hospital e alguns pacientes do Hospital, porque o projeto está
focado em atender o público que não mora no Hospital então esta é a
caracterização do grupo e têm algumas pessoas que moram na vila São
Pedro nas residências terapêuticas alguns pacientes do Hospital residem.
(Membro da Equipe Técnica nº 1)
As impressões na época da formação da oficina terapêutica foram positivas
sob o olhar de mais um membro da Equipe Técnica da Associação.
[...] Eu acho que este projeto geração de renda bem do início a gente
começou: achar o lugar para trabalhar, limpar este lugar, estruturar, divulgar o
trabalho, divulgar este trabalho no Hospital, depois foi desenvolvendo.
Começou com o [...] (Membro da Equipe Técnica nº 01) e, eu dois pacientes
[...] saiamos para divulgar e pegar material aqui pela Bento Gonçalves,
também divulgando o trabalho no comércio [...] Desde o ano de 2001, quando
iniciou mesmo acho que desenvolveu bastante, foi para lá de positivo [...] até
acho que não fosse crescer tanto. E a oportunidade de crescer mais [...] não
estancou aqui [...] acho que tem um mundo ainda. (Membro da Equipe
Técnica nº 2)
Atualmente a Associação é uma soma de tramas de ações bem peculiares
dentro do seu cotidiano. O interesse de levar à Academia este assunto e as
questões que envolvem o nosso lixo 1 é de grande importância, pois caminhamos na
grande teia da vida e deste planeta que vivemos e que algum dia deixaremos para
as futuras gerações de todas as espécies habitantes de nosso planeta Terra.
No pensamento de Capra (2001), que desenvolveu uma compreensão
sistêmica, unificada e que integra as dimensões biológica, cognitiva e social da vida
e demonstra que a vida em todos os seus níveis, é interligada por redes complexas.
Dentro desse estudo gostaria de contribuir com as atividades profissionais e
de educação ambiental realizadas nos galpões de reciclagem. Com a nova
legislação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), Lei nº 12.035 de 2 de
agosto de 2010 entrando em vigor, ainda faltando as leis complementares, os
galpões de reciclagem devem ser contemplados com ações inclusivas de alguma
forma, dentro das políticas públicas de inclusão social, trazendo assim um ganho a
todos os indivíduos participantes dos galpões (associação ou cooperativas).
1
Explicamos que a palavra lixo designa-se aos resíduos recicláveis, nomenclatura adequada para se
referir ao material que possa ser aproveitado no processo de reciclagem. O que não aproveitamos na
reciclagem é denominado dejeto e este vai para o aterro sanitário. Também denominamos como
resíduos sólidos secos que são aproveitados para fabricação de novos produtos, a partir de plástico,
metal, papel, vidro. (KRIEGER, 2006, p. 72).
13
Esta pesquisa poderá ser uma fonte de alternativas com a contribuição de
um modelo visando melhorar e constituir uma possibilidade de galpão de reciclagem
inclusivo.
Minayo (2007) discute a violência do campo na antropologia e na sociologia
urbana para diminuir a violência no apoio às crianças abandonadas e aos excluídos,
como população de rua, doentes
mentais, desfavorecidos,
a importância
fundamental é a família, religião e a escola. Sabe-se ainda que o problema
complexo e
é
de ordem econômica, político, social e histórico no Brasil que
contribuíram para a disseminação dos problemas na educação.
Minayo (2007) diz que a violência e a exclusão social no Brasil é secular,
vem desde os tempos da colônia, exemplificando a escravização dos índios,
posteriormente dos negros e neste contexto instaura as profundas desigualdades e
o desprezo das classes dominantes coloniais pelo povo pobre e escravo.
O interesse pelo tema deste trabalho, o Galpão de Reciclagem e sua
amplitude em promover uma melhoria de vida para seus associados, não só para a
reinserção econômica, mas também para a inclusão social, através de uma atividade
cotidiana como uma mão de obra trabalhadora na sociedade.
Meu envolvimento, pelos menos de dez anos nos assuntos ambientais,
como agente ambiental e gerente dos resíduos produzidos na unidade acadêmica
que trabalho, aliado ao Projeto de Extensão ATUT 2 em curso, com o Galpão da
Associação dos Trabalhadores da Unidade de Triagem de lixo do Hospital São
Pedro (ATUT) foi a escolha do objeto de estudo para a Dissertação de Mestrado, no
sentido de propor um trabalho acadêmico sobre esta Associação como estudo de
caso dando o surgimento de uma possibilidade, que poderá acolher outros grupos
de indivíduos excluídos, pelo estigma do sofrimento psiquiátrico, ou de alguma outra
deficiência e, por isso, estejam na situação de pouca inclusão não só social, como
econômica.
Minha trajetória nesta rede do Galpão de Reciclagem, educação ambiental,
coleta seletiva vem desde 2002, quando pude entrar no mundo da reciclagem
propondo trabalhos acadêmicos que pudessem melhorar a situação destes
associados.
2
O Projeto de Extensão ATUT é uma ação de extensão da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação da
UFRGS.
14
O Galpão de Reciclagem é um local de trabalho, com a sua diversidade de
tarefas e executadas pelo grupo, de forma individual, passando pela triagem de
material reciclável recebido, separação e classificação de tipos de materiais, limpeza
destes, material reciclável oriundo de documentos sigilosos (papeis); sendo
picotados, enfardados e a finalização para a venda. Obtém-se assim uma finalização
com fardos de material reciclável e a venda mediante um valor.
Em 2004, a Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação Social da
UFRGS, implantou a coleta seletiva nesta unidade acadêmica, com um programa de
motivação, informação e sensibilização sobre a atividade, sob minha orientação e
coordenação. Desde lá o Projeto de Extensão ATUT promove ações e atividades
que possam contribuir no meio acadêmico quanto à atividade de coleta seletiva e
sua importância no panorama mundial de falência ambiental.
Também colaboramos com uma assessoria de comunicação, de educação
ambiental e de vivências na Unidade de Triagem de Lixo do Hospital São Pedro
(ATUT). Na UFRGS temos um sistema de coleta seletiva e destinação, onde essa
unidade é de nossa parceira receptora dos materiais recicláveis, desde 2004. Ela
tem uma constituição diferente, pois é composta por pacientes, ex-pacientes do
Hospital e de outras instituições que albergam pessoas com doença mental,
denominada de galpão de reciclagem especial. Estas pessoas com pouca
possibilidade de reinserção econômica e social no mercado de trabalho iniciam
através da oficina terapêutica de reciclagem as atividades de triagem e separação
do material reciclável, assim surge esta Unidade de triagem ATUT. A capacitação
para a atividade foi sem grandes dificuldades, porque integra uma atividade simples
na triagem ou separação do material reciclável que possibilitou a estes indivíduos
que constituíssem uma força de trabalho. O Galpão fica nas dependências do
Hospital São Pedro, mas mantêm uma estrutura à parte deste, com certa
independência no seu cotidiano. Mantém uma Equipe Técnica, Coordenação da
Associação e associados, sendo estes pacientes com doença mental e moradores
da comunidade.
1.1 PROBLEMA
Os projetos sociais de reciclagem de materiais recicláveis, em geral
promovem inclusão, mas são tomados por práticas de gestões amadoras, com baixa
15
capacidade organizacional e de sustentabilidade de longo prazo. Dentro deste
contexto analiso se é possível construir metodologias que apontem alternativas de
inclusão social adequadas para projetos sociais de reciclagem com viabilidade
econômica, dentro do que já existe.
Esta pesquisa é um estudo de caso. Assim pergunto: é possível construir,
com uma metodologia adequada e a partir da análise das singularidades do estudo
de caso proposto no Galpão de reciclagem da Associação dos Trabalhadores da
Unidade de triagem (ATUT) propor um modelo sustentável de inclusão social, com
geração de renda e trabalho envolvendo a triagem de materiais recicláveis, que
possam ser reutilizados por outros grupos, também excluídos do processo trabalhoemprego-social? Com a pesquisa qualitativa analisei documentos, incluindo a
pesquisa de campo, em contato direto com as pessoas envolvidas nas tarefas
cotidianas que permeiam a Associação, buscando ai as experiências vividas, para
serem utilizadas na pesquisa. Nessa condução o trabalho tomou corpo e foi
delineado pelo trajeto metodológico através dos dados colhidos e das observações,
interpretações, questionamentos, anotações que foram feitas ao longo do período da
pesquisa de campo, transcrevendo a vivência do cotidiano dessa Associação e a
sua contribuição para um modelo tipo ideal (WEBER,1995).
Através da pesquisa busquei colher as informações que pudessem auxiliar
na construção do estudo de caso e de suas peculiaridades, com a compreensão dos
caminhos que formam a rede desta Associação no sentido da promoção, da
reabilitação e da inclusão social de seus associados.
1.2 OBJETIVO GERAL
O estudo de caso poderá contribuir para que as discussões da Academia
adentrem no cotidiano desse grupo, a fim de ajudar numa melhor interação e
organização das relações com a sociedade. Espero que esta pesquisa esclareça o
caminho tomado pela Associação e que esta possa contribuir com a qualidade de
vida e promoção da inclusão doentes mentais em reabilitação.
Compreendendo como o cotidiano dessa Associação se desenvolve no seu
dia a dia poderei construir uma linha de tempo e colocá-los como protagonistas
desta história que foi construída com a interação da conservação do meio ambiente,
16
com as questões do material reciclável, seu descarte, e sua valoração para o
mercado econômico e para a sociedade. Acreditamos que tudo faça parte de uma
rede, e que ela se entrelace construindo uma organização peculiar de trabalho,
como objetivo geral.
1.3 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
a) Apresentar o processo que produz a relação entre beneficiamento do resíduo
reciclável e geração da renda e sua distribuição junto aos associados na unidade
de triagem de resíduos estudada.
b) Propiciar projeto de geração de renda para atendimento de necessidades básicas
dos associados do Galpão de reciclagem.
c) Mostrar a constituição formal de uma Associação dos trabalhadores da unidade
de triagem de materiais recicláveis e analisar o seu Estatuto Social.
d) Verificar se os associados da Unidade de triagem (ATUT) estudada estão ou não
envolvidos num contexto de preservação e educação ambiental.
e) Descrever um caso de implantação da estrutura de equipamentos, operacional e
de estrutura física da unidade de triagem (ATUT) estudada.
f) Identificar o processo de qualificação e capacitação dos participantes do
Programa Coletivo de Trabalho da unidade de triagem de lixo estudada.
g) Descrever os processos de participação dos associados em fóruns, seminários,
palestras na unidade de triagem (ATUT) estudada.
h) Descrever as interfaces de parcerias e que tipo de serviços e receitas geram na
Unidade de triagem (ATUT) estudada.
17
1.4 A OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE NO GALPÃO
Estive no Galpão, em suas andanças e observações, num livre trânsito com
todos os envolvidos, perguntando sobre dúvidas, ou curiosidades no manejo dos
materiais recicláveis, nas diversas mesas e grupos de associados. Com a finalidade
de me contextualizar e poder levar a termo as entrevistas, procurei descobrir o
cotidiano dos associados, sempre respeitando o bom andamento do seu trabalho,
sem interferir diretamente, mas trocando ideias. Estas visitas foram anotadas e lidas
para que pudessem integrar ao trabalho. O momento permitiu um levantamento
exaustivo dos comportamentos, coletivos e individuais, reservados aos doentes
mentais, em sua estabilidade ou variação, segundo as diferentes condições de
contato como também dos moradores da comunidade.
Junto à observação participante foi utilizada a técnica de entrevista
semiestruturada. As entrevistas ocorreram de forma organizada e sistemática, após
a aprovação e liberação do Comitê de Ética do Hospital. Essas entrevistas serviram
para eu me guiar no momento que elas fossem aplicadas. Algumas perguntas foram
acrescidas ou feitas para facilitar o seu entendimento, já que muitos dos
entrevistados se mostraram receosos ao serem perguntados, antes de serem
entrevistados. Durante a entrevista eu procurei deixá-los confortáveis, utilizando uma
linguagem coloquial, para que pudessem se contextualizarem e responder
seguramente às questões, sem receio ou de se sentirem constrangidos, pois é muito
comum sentirem-se medrosos, diante de uma situação nova, receando um perigo
(FOUCAULT, 1972). Do grupo, somente um se negou a participar, afirmando que
não gostava de falar e misturou a situação da pessoa da pesquisadora com o
Projeto de Extensão da UFRGS. Eu disse que eram duas situações distintas, mas a
pessoa não aceitou. Futuramente esta pessoa me falou que gostaria ter participado
da entrevista. Conforme determinação do Comitê de Ética do IPA, os associados
que tinham algum impedimento legal, no caso Curatela legal, que é o encargo
deferido por lei a alguém capaz, para reger a pessoa e administrar os bens de quem,
em regra maior, não pode fazê-lo por si mesmo, não participariam das entrevistas.
Nas conversas no cotidiano do Galpão eles estavam presentes por vontade própria
na questão participação. Eu expliquei que, por razões especiais eles não seriam
entrevistados, mas fariam parte da pesquisa como associados do Galpão. No final
da pesquisa, percebi que primeiro observando, anotando e perguntando, e depois,
18
entrevistando, as técnicas aplicadas nas entrevistas se complementaram de forma
satisfatória, pois estas confirmaram muitas das minhas impressões no senso
comum.
Foram montados três tipos de entrevistas, pois o público alvo da pesquisa se
dividia em três grupos: Equipe Técnica, Terapeuta Ocupacional, Psicólogo e setor
Administrativo-financeiro; pacientes ou ex-pacientes do Hospital e de outras
instituições psiquiátricas e moradores da comunidade da Vila São Pedro. Para cada
um dos grupos as perguntas foram modificadas, conforme a pertinência da mesma.
Em todos os grupos foram colhidos dados pessoais, instrução escolar, idade,
endereço, origem em relação a internações, ser ou não um paciente com doença
mental. Isto possibilitou a obtenção de um perfil geral de todos os entrevistados
contribuindo no momento da efetivação da entrevista. A Equipe Técnica foi
denominada membro da Equipe Técnica nº 01, 02, 03, sem identificação pessoal
dos mesmos. Os pacientes foram denominados paciente nº 01, nº 02, nº 03 e assim
sucessivamente, sem identificar quem é nem pelo gênero. Os moradores da
comunidade da Vila São Pedro foram chamados na pesquisa de morador nº 01, nº
02, nº 03, assim por diante, sem identificação pessoal.
A entrevista semiestruturada deixa espaço para a entrevistadora e o
entrevistado se aprofundarem na resposta e fornece mais liberdade ao entrevistado.
Apesar deste fato na entrevista semiestruturada, a maioria dos entrevistados não o
fez, e responderam apenas às questões, sem incluir algum dado extra à pesquisa.
Assim eles se dispuseram apenas em responder sim ou não, com pouca explicação.
Analisei a dificuldade das pessoas, não só de entender as perguntas como também
o estado emocional dos entrevistados. Por outro lado, muitos falaram de suas
histórias de vida, o que não era pertinente à pesquisa. Alguns tiveram muita
dificuldade de se expressar, por causa do estado mental muito remissivo, de
confusão mental.
Segundo Bauer e Gaskel (2002), o entendimento da coletânea de dados
através do estatuto, livro de registro, fotografias e as entrevistas semiestruturadas
trazem respostas que possibilitam o entendimento do todo que envolve a pesquisa.
Ainda fazendo parte da pesquisa qualitativa as observações de campo e coletânea
de dados e as respectivas analises a pesquisa puderam ser vistos no estudo de
caso.
19
No decorrer do período das entrevistas, todos colaboraram e se
empenharam, pois sempre lhes foi dito que estariam contribuindo para uma
pesquisa, e que eles mesmos eram o objeto da mesma. Este fato lhes atribuiu uma
posição de destaque e de importância, tão necessárias às pessoas historicamente
excluídas de nosso convívio em sociedade.
A contextualização do trabalho permeia três áreas temáticas como a
sociologia e metodologia de Weber; intermediando a natureza e conhecimento e a
doença mental. Para tal, se faz necessário um referencial teórico que demonstre os
caminhos trilhados por mim durante o processo de estudo. Trata-se de um método
novo no lugar do método experimental objetivo que teria escassa aplicação nos
conhecimentos baseados na percepção sensorial que deveria lidar com fenômenos
subjetivos e da compreensão (método objetivo versus método compreensivo).
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 WEBER E O TIPO IDEAL
Foi o sociólogo alemão Max Weber (1864-1920) que sistematizou de modo
detalhado a metodologia da tipologia cunhada como método de construção do tipo
ideal ou tipo puro. Quanto à origem do termo: tipo ideal, Weber tomou emprestado
de Adolf Jellinek, mas alterou seu significado. Jellinek chama sua criação de um tipo
empírico. Para Weber, o modelo não é apenas empírico, mas um tipo ideal. Porém
para Weber citado por Vale (2007), o tipo ideal não é uma pura ficção subjetiva,
precisa ser confrontado com o desenrolar do real (procedimentos causais dos
acontecimentos) e sua relação com uma situação histórica que para Weber é
sempre parcial e estritamente delimitada.
Segundo Vale:
A elaboração de uma tipologia é de fundamental importância para os
estudiosos das organizações, pois permite entender quais as reais
consequências de escolhas teóricas prévias no âmbito de seus estudos e
pesquisas. Ao longo da apresentação da evolução das contribuições
teóricas, será possível observar como vai se ampliando o espaço e a
influência dos teóricos organizacionais. À medida que a teoria avança no
tempo, afastando-se do enfoque original, centrado em análises espaciais de
fundamentação neoclássica, passando por uma preocupação mais dirigida
às conformações produtivas e à organização industrial e chegando,
finalmente, nas abordagens de natureza mais institucionalista, o papel dos
20
analistas organizacionais vai tornando-se mais proeminente e relevante.
(VALE, 2007, p. 161).
O tipo ideal de modo sintético trata-se de uma reunião de atributos que
depende inteiramente da posição assumida pelo pesquisador, no sentido de que
isso provém da abstração dele uma influência dos ficcionistas e do filósofo alemão
Friedrich Nietzsche (FLEISCHMANN, 1977).
Segundo Lima:
Weber, diferentemente dos níveis de generalizações alcançados por
Durkheim, formulados dentro dos limites empíricos impostos pelos tipos
médios (quantitativos influenciados pelo filósofo Francis). Para Weber, o
objeto do conhecimento social não se impõe à análise, como já dado, como
coisa, como se esta realidade tivesse uma ordem interna e leis gerais
capazes de determinar a qualquer investigador simplesmente a busca de
fidelidade a ela. Weber tendeu para o modelo ideal do experimento na física
(influência de Galileu). (LIMA, 2008).
Para Weber citado por Fernandes (1967), era necessário descobrir um
método que permitisse estabelecer com referência aos fenômenos das atividades
humanas, o que o método experimental permitia realizar em relação aos fenômenos
da natureza. Em lugar do método experimental que teria escassa aplicação nos
conhecimentos baseados na percepção sensorial, que deveria lidar com fenômenos
subjetivos e da compreensão, Weber criou o método que permite lidar com
fenômenos de sentido - o método de compreensão, realizado através do tipo ideal
(FERNANDES, 1967, p. 84-85).
Segundo Fernandes (1967), o tipo ideal na concepção de Weber é um
instrumento de análise sociológica para o entendimento dos fenômenos sociais por
parte do cientista social com o objetivo de criar tipologias puras, destituídas de tom
avaliativo, de forma a oferecer um recurso analítico baseado em conceitos, como o
que é religião, burocracia, economia, capitalismo, entre outros. Max Weber é o
fundador da chamada Sociologia Compreensiva. Podemos dizer que ela só tem
acesso aos fenômenos socioculturais por meio de procedimentos metodológicos
diversos daqueles usados nas Ciências Físico-Naturais e na Matemática. Na cultura
o único meio de ingresso neste reino é através da compreensão desta.
Segundo Raymond Aron, (1977), um importante estudioso do pensamento
social clássico:
21
O termo compreensão no sentido de entendimento é a tradução clássica do
alemão Verstehen. A idéia de Weber é a seguinte: no domínio dos
fenômenos naturais só podemos aprender as regularidades observadas por
meio de proposições de formas e natureza matemáticas. Em outras
palavras, é preciso explicar os fenômenos por meio de proposições
conformadas pela experiência, para ter o sentimento de compreendê-las. A
compreensão é, por conseguinte mediata, passa por intermediários conceitos ou relações. (ARON, 1977, p. 468).
Podemos definir que compreensão é a captação interpretativa do sentido ou
conexão de sentido, dessas relações implicadas e implicantes entre o sujeito e o
objeto é um conhecimento de dentro para fora. Esse sentido pode estar concebido
na ação particular, no pensado de modo aproximado, ou no construído
cientificamente pelo método tipológico, quando se elabora um tipo ideal puro de um
fenômeno frequente. Weber constrói o método tipológico através de um arquétipo
de ação social, levando em conta as ações históricas que, em sua pureza, não
exista na realidade. Ou seja, é um modelo simplificado do real, elaborado com base
em traços considerado essências para determinação da causalidade, segundo os
critérios de quem pretende explicar o fenômeno a ser estudado. Ele é utilizado como
um instrumento para conduzir o autor à realidade complexa do problema.
A pretensão de Weber (1995) era fornecer com o tipo ideal um recurso
teórico-metodológico
que,
se
devidamente
aplicado,
permite
cumprir
um
autocontrole na investigação científica e certa conquista processual de uma
neutralidade axiológica contra a pretensão simplificada da neutralidade objetiva das
ciências observacionais. Para Weber, quanto mais se atribui forma conceitual aos
elementos que constituem o fundamento da significação cultural específica das
relações históricas complexas mais o conceito, ou o sistema de conceitos, adquire
um caráter de tipo ideal.
[...] Weber, assim criou o método de classificação e comparação dos fatos
sociais produzidos em uma sociedade ou em sociedades do mesmo tipo ou
em sociedades diferentes. A partir da metodologia do tipo ideal, podemos
descobrir seus traços comuns, de modo a estabelecer os modelos ideais
puros através de processos e fatos baseados em situações individuais e
coletivas que ocorrem na realidade social e ao mesmo tempo levarmos em
conta as características fundamentais e singulares dos fenômenos,
tornando-os típicos pela generalização modelada pelas ações sociais, com
suas regularidades, tendências, fatores e efeitos sociais. (WEBER, 1995,
p.420)
22
A construção do tipo ideal possibilita ao investigador a construção artificial
de um meio de controle dos dados e das interpretações dos mesmos. Weber (1995)
propõe a construção metodológica comportando duas posições onde o investigador
passa operar em duas séries: uma real, que é um dos fenômenos vistos durante a
observação e uma ideal que é como se o fenômeno fosse construído mediante a
uma racionalidade com referência a fins (FERNANDES, 1967, p. 98).
Os conceitos assim elaborados devem ser generalizadores, pois se deve
capturar e reter o que é essencial, mais relevante e não o acessório. Os conceitos
construídos pelo investigador possuem sempre um fim que busca soluções em
domínios que são difíceis, por isso parecem vazios diante da realidade histórica. .
Numa investigação social, caberia aos investigadores interpretar e construir
conceitos relativos à singularidade do acontecer. Estes conceitos devem servir como
instrumentos científicos de ordenação da realidade.
A metodologia dos modelos tipos ideais oferece também algumas
dificuldades que, segundo Florestan Fernandes (1967), são as dificuldades do tipo
ideal podem ser resumidas sinteticamente:
a) partir da abordagem compreensiva, formalmente, o conhecimento sociológico
não podia encontrar um paralelo exato nem com o conhecimento matemático,
nem com o conhecimento experimental puro;
b) a generalização não se encontrava no determinismo naturalista, como proceder a
generalizações compreensivas? Como operar concretamente as duas séries uma
ideal e a empírica e ao mesmo tempo, tendo que descrever tanto as
uniformidades no mundo de atividades humanas quanto as suas especificidades;
c) a interpretação das investigações depende quase totalmente da capacidade
individual do cientista em descobrir o sentido subjetivo das ações. É o método de
compreensão, seja de um sentido existente de fato historicamente dado, seja
construído como tipo ideal;
d) para Florestan Fernandes também, Weber não chegou a
elaborar, de forma
sistemática e completa a sua concepção de tipo ideal; isto nos deixa bastante
órfãos, fazendo com que possamos compreender seu método muito mais pelas
leituras de suas obras do que por uma sistematização específica do tipo ideal
(FERNANDES, 1967, p. 84-95).
Mesmo diante das reconhecidas dificuldades a metodologia do tipo ideal de
Weber trouxe um maior horizonte às ciências sociais para contribuir no
23
entendimento e na interpretação da ação social de modo a explicar os fenômenos
com generalidades respeitando suas singularidades.
Para Weber (1995), era necessário descobrir um método que permitisse
estabelecer com referência aos fenômenos das atividades humanas, o que o método
experimental permitia realizar em relação aos fenômenos da natureza. Em lugar do
método experimental que teria escassa aplicação nos conhecimentos baseados na
percepção sensorial,
que
deveria
lidar
com
fenômenos
subjetivos
e da
compreensão, ele criou o método que permite lidar com fenômenos de sentido - o
método de compreensão, realizado através do tipo ideal (FERNANDES, 1967, p. 8485).
O tipo ideal é um instrumento metódico que possibilita construir passo a
passo um esquema coerente que permita operar conceitos, pois os fenômenos
sociais não possuem estruturas dotadas de sentido. Um tipo ideal é formado pela
acentuação unilateral de um ou mais pontos de vista e pela síntese de um grande
número de fenômenos individuais, difusos, discretos, mais ou menos presentes e
ocasionalmente ausentes, os quais são arranjados de acordo com os pontos de vista
unilateralmente acentuados em uma construção analítica unificada. Em sua pureza
conceitual, essa construção mental não pode ser encontrada na realidade em
nenhuma parte. É uma utopia. (LIMA, 2008).
Na concepção de Weber (1995), é um instrumento de análise sociológica
para o entendimento dos fenômenos sociais por parte do cientista social com o
objetivo de criar tipologias puras, destituídas de tom avaliativo, de forma a oferecer
um recurso analítico baseado em conceitos, como o que é religião, burocracia,
economia, capitalismo, entre outros. Max Weber é o fundador da chamada
Sociologia Compreensiva. Podemos dizer que ela só tem acesso aos fenômenos
socioculturais por meio de procedimentos metodológicos diversos daqueles usados
nas Ciências Físico-Naturais e na Matemática. Na cultura o único meio de ingresso
neste reino é através da compreensão desta.
2.2 NATUREZA E CONHECIMENTO
Além da contextualização do tipo ideal de Weber esta pesquisa repassa por
autores que buscam fundamentar o pensamento em relação à preservação da
24
natureza, como por exemplo: Leonardo Boff, Bruno Latour, Fritjof Capra e Edgar
Morin.
Leonardo Boff (1993) é um detentor de ideias que o homem deve viver junto
à natureza. Ele diz que o universo está continuamente expandindo-se, organizandose e autocriando-se. Seu estado natural é a evolução e não a estabilidade, a
transformação e a adaptabilidade e não a imutabilidade e a permanência. O universo
relaciona-se em redes, ciclos e não existe nada fora desta relação. Por isso todos os
seres são interdependentes (natureza e o homem) colaborando entre si para
evoluírem juntos e garantir o equilíbrio de todos os fatores. Por trás de todos os
seres atua a energia de fundo que deu origem e anima o universo e faz surgir novas
criações.
A mais espetacular delas é descrita em Terra viva e nós (BOFF, 1993), onde
ele mostra que os seres humanos são como a porção consciente e inteligente dela,
com a missão de cuidá-la. Vivemos tempos de urgência. O conjunto das crises
atuais em relação ao meio ambiente está criando uma espiral de necessidades de
mudança que, se não forem implantadas, nos conduzirão fatalmente ao caos
coletivo, mas que se forem assumidas, poderão nos elevar a um estágio mais alto
de civilização desde o final do século XX. Para esse autor a humanidade está em
profunda crise existencial e de identidade com a natureza. Boff (1993) sai em busca
de novas ideologias, espiritualidade, de perspectiva humanística e financeira com
soluções rápidas e satisfatórias de superação dessas crises. O autor investe em
busca de soluções para os problemas que segundo ele próprio nós mesmos
criamos. Para ele a resposta para resolução de nossos problemas passa pela
mudança de comportamento e uma nova visão diferente de mundo onde a
humanidade precisará se redimir diante de tantas tragédias e modificar seu
comportamento, a tempo de consertar os estragos já feitos e acumulados. Isto
mostra que o ser humano está interligado a um contexto e a um sistema. Assim a
humanidade deve em primeiro lugar ter muito cuidado consigo mesmo e,
inseparavelmente, com o meio ambiente.
Para Boff (1999), o cuidado como processo sistêmico não representa
somente uma ação pontual e unilateral, mas envolve um sentimento de pertença e
de comunicação com o entorno social num todo integrado. Sob esse enfoque, o
cuidado
passa
a
ser
uma
atitude
de
ocupação,
de
preocupação,
de
responsabilização e de envolvimento efetivo e afetivo com o outro. Essa relação
25
dialoga e é inter-retro-relacional do cuidado com a natureza e com o universo como
um todo. Reflete que a natureza e o universo não constituem simplesmente o
conjunto dos objetos existentes como pensava a ciência moderna. Constitui uma teia
de relações, em constante interação, como vê a ciência contemporânea. Os seres
que interagem deixam de ser apenas objetos. Eles se fazem sujeitos, sempr e
relacionados e interconectados, formando um complexo sistema de inter-retrorelações. O universo é, portanto, o conjunto das relações dos sujeitos (BOFF, 1999).
Outro autor que julgamos relevante considerar é Bruno Latour, filósofo e
antropólogo francês. Esse autor ainda pouco conhecido no Brasil, mas que
proporciona uma audaciosa análise da ciência, demonstrando o quanto o contexto
social e o conteúdo técnico são essenciais para o próprio entendimento da atividade
científica. Latour (2004) apresenta o conceito de tecnociência para entender melhor
o impacto da integração da tecnologia com a ciência e com as implicações do saber
sobre a natureza.
Para esse autor, os problemas de hoje, seja o aquecimento da atmosfera, a
manipulação genética, a transformação da sociedade pela alta tecnologia, não
permitem mais separar ciência e política. Para Latour (2004), a alternativa é a
constituição de uma ecologia política com um caráter profundamente democrático
que pressuponha a participação de todas as partes interessadas no processo do
avanço do conhecimento sobre o mundo animal e natural, ou seja, a participação até
dos não humanos, dos animais, como as minhocas da floresta, representados assim
por cientistas e defensores dos animais, ao lado dos índios, dos garimpeiros, dos
economistas e dos artistas. Esta postura faz com que Latour (2004) desafie os
modernistas e pós-modernistas, em busca do bom senso e da civilidade. Ele
também afirma que a maior qualidade na política é a decência que se tornou um
insumo raro e está em falta no mundo atual. Para Latour (2004), as decisões são
importantes demais para serem deixadas somente para os políticos e cientistas.
A natureza e o conhecimento não podem ser apreendidos como um objeto
dualista, mas precisam ser compreendidos dentro de uma perspectiva dialógica de
cuidado. Essa relação implica repensar as bases de sustentação do planeta terra
que vão desde as práticas mais elementares e aparentemente ingênuas de jogar
papel no chão, de poluir águas, como também pelas práticas de consumo indo até a
elaboração e execução de políticas públicas e ambientais, pautadas no processo de
um viver saudável.
26
É importante, nessa direção, que as práticas educativas e de pesquisa
contribuam com atividades que tenham significado e que proporcionem um repensar
e um reorganizar dos modos de pensar e agir frente ao processo de viver saudável e
suas implicações e interações com as questões ambientais mais amplas. Em outras
palavras, é importante que o setor da saúde e enfermagem desenvolva práticas
educativas que possibilitem repensar o cuidado de si, do outro e das múltiplas
interações que estes abarcam, a fim de que o indivíduo se perceba no cuidado e
orientado pelo cuidado em suas diferentes dimensões.
Outro autor que julgamos importante considerar é Fritjot Capra (2001). Ele
apresenta a noção de conexões ocultas em busca de uma ciência para uma vida
sustentável. O autor mostra que as últimas descobertas científicas demonstram que
todas as formas de vida, desde as células mais primitivas até as sociedades
humanas mais complexas com suas empresas e estados nacionais e até mesmo
sua economia global, organizam-se segundo o mesmo padrão e os mesmos
princípios básicos promovendo um sistema em rede.
Capra (2001) desenvolveu uma compreensão sistêmica e unificada que
integra as dimensões biológica, cognitiva e social da vida e demonstra que a vida,
em todos os seus níveis, é interligada por redes complexas.
Por fim, outro autor que julgamos significativo considerar é Edgar Morin, que
é um pensador convicto, que acredita na necessidade de aperfeiçoar a existência do
homem sobre o planeta sabendo que este poderá nunca ser o melhor dos mundos.
No livro Terra-Pátria, que foi escrito em colaboração com a jornalista Anne
Brigitte Kern (1995), Morin, sociólogo francês, esboça um retrato do globo em que se
aloja o ser humano e questiona as formas e o conteúdo desta sobrevivência. Ele não
acredita em soluções definitivas, mas faz uma argumentação em favor do esforço
para criar respostas possíveis, mas sem concessões à hipocrisia pragmática.
Não se deve procurar em suas palavras um tom de pessimismo e nem de
uma mensagem apocalíptica, pois Morin (1995) enumera um conjunto de erros
cometidos que devemos superar com a aprendizagem da história e propõe
correções de rumo subordinadas a uma recuperada consciência humanística.
Morin (1995) quer que a vida de todos os seres humanos, deva ser
considerada mais do que um bem supremo. Assim ele defende o constante trabalho
para a eliminação das fronteiras que separam a humanidade de si mesmo.
27
Ele propõe a reformulação do pensamento para a compreensão da crise
planetária que se instalou na Terra. Nesse contexto observa que as civilizações
dispersas
do
planeta
estão
vivendo
um
momento
de
necessidade
de
interdependência em todos os aspectos e é preciso, então, que se consolide a
fraternidade, que surge com a conscientização da importância dessas inter-relações
entre a comunidade humana e o cosmo.
Este autor fala ainda da era planetária em que vivemos e a sua agonia, do
cartão de identidade terrena, dos objetivos terrestres e da responsabilidade do ser
humano na transformação da Terra-Pátria que deve iniciar-se pela transformação do
pensamento. Tendo-se a percepção em relação à preservação e conservação do
ambiente global. Dessa forma, deve-se constituir um processo contínuo, no qual os
indivíduos e comunidades envolvidas tomem consciência da possibilidade de um
colapso ecológico e adquiram conhecimentos, valores, habilidades, experiências e
determinação que os tornem aptos a agir, individualmente e coletivamente, tendo
como princípio básico o respeito a todas as espécies de vida.
Pensamos que Morin (1995) tem razão quando afirma que uma lógica da
complementaridade nos faz pensar para além das excludências e distinções. Essa
lógica supõe o intercâmbio entre diferentes áreas de conhecimentos, sobretudo
quando se trata do meio ambiente, tema que por si próprio demanda vários
enfoques e disciplinas. Desse modo, os cuidados com o planeta devem ser uma
preocupação de profissionais de todas as esferas, em especial de educadores, no
sentido de (re) educar ambientalmente os cidadãos terrestres.
Morin (1995) apontou para necessidade de um pensamento ecológico, que
leve em consideração a ligação vital de todos os sistemas vivos, ao seu ambiente.
Essas questões, entretanto, necessitam de atenção especial por parte dos órgãos
nacionais e internacionais responsáveis pela conservação da natureza, bem como
da população em geral, uma vez que para se alcançar sucesso na realização de
qualquer trabalho de nível de conscientização é preciso a participação ativa da
população.
Para fomentar uma conscientização ampla e efetiva segundo Morin (1995) é
preciso adentrar em novos referenciais capazes de satisfazer, pelo menos em parte,
às grandes indagações da sociedade contemporânea. Para o autor durante o século
XX sedimentou-se uma nova percepção de mundo, de sociedade, ou seja, uma
percepção sistêmica da realidade existencial: a complexidade como um pensamento
28
que distingue e une, ao invés de isolar, separar e reduzir o todo às suas partes
(MORIN, 1995). Este novo pensar tem como pano de fundo, a articulação dos
fragmentos dispersos pelo saber tradicional reducionista e a partir de uma nova
lógica, compreender as múltiplas relações, causalidades e interdependências entre
os processos naturais e sociais.
O pensamento complexo possibilita, numa percepção sistêmica, estudar o
meio ambiente, os seres vivos e os seres inertes de forma integral e inter relacionada, ou seja, na interação e na inter-relação entre eles e não mais de forma
isolada e fragmentada, regida pelo pensamento hegemônico tradicional.
A partir dos autores citados podemos ainda compartilhar das ideias de Odum
(1993), ele diz que devemos ter um cuidado ecológico, como atitude fundamental
dos tempos atuais que impulsiona a atenção de todas as ações do saber e do
conhecimento para a defesa do meio ambiente seja: no domicílio, no local de
trabalho, nas escolas e universidades, nos espaços públicos e privados, e em toda a
parte, permeando os processos e redes de relações, interações e associações entre
os seres humanos e demais seres junto à natureza. Trata-se de um compromisso
ético de responsabilidade consigo, com os outros e com o ecossistema de forma
ampla e integradora.
2.3 DOENÇA MENTAL, HISTÓRIA E ORGANIZAÇÕES
A ontologia de Michel Foucault (1972) é uma experiência de pesquisa e
estudos bem como um exercício sobre as paragens do nosso presente. Foucault
testa nossos limites, apresenta a noção do saber médico como um saber poder, o
não saber de um paciente como uma viabilização da impaciência pela liberdade e
uma constituição estabelecida do poder pelo conhecimento.
Foucault (1972) procurou, na grande maioria das suas obras, abordar os
problemas concretos como a insanidade, a prisão, a clínica em um contexto muito
específico geográfico e historicamente na França, mas também no restante da
Europa e no Ocidente como um todo; nas idades Clássicas, do século XVIII, ou na
Grécia antiga. No entanto, suas observações ajudam a identificar os conceitos
superiores a esses limites no tempo e no espaço. Elas conservam, assim, uma
grande abrangência, tanto intelectual, em uma variedade de áreas. Estuda a
transferência, por exemplo, das técnicas de punição penal no final do século XVIII,
29
sugerindo o surgimento de uma nova forma de subjetividade constituída pelo
governo.
Para Foucault (1972), não há relação de poder sem constituição correlativa
de um campo de conhecimento, ou que não pressupõe e constitui ao mesmo tempo
relações de poder. Estes relatórios de poder-saber não estão sendo analisados a
partir de um conhecimento sobre o que seria livre ou não do sistema de poder, mas
em vez disso, devemos considerar que o sujeito sabe, os objetos são como os
efeitos dessas implicações fundamentais do poder-saber.
A partir, principalmente dos estudos de Foucault, as pesquisas em Hospitais
Psiquiátricos passaram a ser realizadas considerando a contextualização da própria
doença mental ao longo da história de vida.
A compreensão da doença mental tem passado por diversas fases dentro da
história da humanidade. Na Antiguidade pré-clássica, as doenças eram explicadas
como resultantes da ação sobrenatural; a partir de 600 a.C, os filósofos gregos
trouxeram a ideia organicista da loucura e até o começo da Idade Média o
tratamento aplicado era de apoio e conforto aos doentes mentais.
Segundo FOUCAULT,
Nesta época estavam os pobres, vagabundos, presidiários e as cabeças
alienadas, que assumiram o lugar dos leprosos e vemos então que a
salvação se espera desta exclusão, para eles e para os que os excluem.
Dá-se então um novo sentido dentro de uma cultura diferente. Estas formas
estão partilhando o que é exclusão social, mas terão uma reintegração
espiritual (FOUCAULT, 1972, p. 6).
No final da Idade Média até a Idade Moderna houve uma mudança radical
desses conceitos. O doente mental passou a ser visto como um possuído pelo
demônio. Dessa forma, o tratamento antes humanitário, foi modificado para
espancamentos, privação de alimentos, tortura generalizada e indiscriminada,
aprisionamento dos doentes para que estes se livrassem dessa possessão.
No século XVII, já existiam hospitais para os excluídos socialmente, grupo
constituído pelos doentes mentais, criminosos, mendigos, inválidos, libertinos e
portadores de doenças venéreas. Embora a loucura tivesse passado do campo
mitológico para o âmbito médico, ainda a medicina não tinha elementos para definila. “Os medos seculares, que sucederam a lepra, vê-se bem que a loucura está
30
ligada a velhos ritos e a todas as experiências maiores ocorridas da Renascença”
(FOUCAULT, 1972, p. 8).
Surgiu no século XVIII, Phillippe Pinel, considerado o pai da Psiquiatria, que
teve o mérito de libertar os doentes mentais das correntes. Os asilos foram
substituídos, então, pelos manicômios, estes somente destinados aos doentes
mentais. Desenvolveram-se com isso várias experiências e formas de tratamento
nos hospitais La Bicêtre e Salpêtrière que se difundiram da França para o resto da
Europa. Para FOUCAULT (1972) a loucura esteve ligada à Terra de internamentos e
ao gesto que lhe designava esta com seu local natural. Ele diz ainda, que em
meados do Século XVIII, os internamentos dos loucos era estrutura visível na
experiência clássica da loucura e também um dado que será motivo de escândalo,
quando esta experiência vier a desaparecer da cultura europeia.
O tratamento no manicômio, de acordo com o que preconizava Pinel,
deveria ser de reeducação do doente mental, implicando respeito às normas e
desencorajamento das condutas inconvenientes. A função disciplinadora descrita
por Pinel, nos manicômios e do médico deveria ser exercida como um perfeito
equilíbrio entre firmeza e gentileza. Tendo a permanência demorada do médico em
contato com os doentes um melhor conhecimento sobre os sintomas e sobre a
evolução da loucura. FOUCAULT (1972) diz que a partir das terapias de Pinel os
loucos foram colocados durante um século e meio, sob o regime de internamento de
sistema rígido e confinamento como casas de força. Estes confinamentos eram
considerados como em seu local natural. Mais ainda, FOUCAULT (1972) descreveu
que os loucos eram cobertos de trapos, tendo apenas um pouco de palha para
abrigarem-se do frio e da umidade do chão, sobre o qual ficavam e dormiam. Os
loucos eram mal alimentados, com pouco ar para respirarem, sem água e sem
muitas outras coisas necessárias para viver. Com este tipo de tratamento ficavam
entregues e abandonados a uma vigilância de carcereiros e não cuidadores. Ele cita
estes lugares como verdadeiros antros, mantidos pelos governos através de grandes
despesas nas capitais.
Porém, com o passar do tempo houve uma leitura modificada do tratamento
moral de Pinel, segundo FOUCAULT (1972), sem os cuidados originais do método.
As ideias corretivas para o comportamento dos hábitos dos doentes passaram a ser
recursos de imposição da ordem e da disciplina institucional, recursos estes que
31
visavam, naquele momento, o bem da instituição. Tudo isto era justificado para
manter o doente mental em tratamento.
FOUCAULT (1972) ainda relata que no início do século XIX o tratamento do
doente era uma releitura distorcida do tratamento moral, preconizado por Pinel e que
utilizava medidas físicas e higiênicas como duchas, banhos frios, chicotadas,
máquinas giratórias e sangrias. FOUCAULT (1972) descreve que aos poucos, o que
era considerado como uma doença moral passou também a ter uma concepção
orgânica, de acordo com o pensamento de vários discípulos. Primeiro as técnicas de
tratamento usadas pelos que defendiam as teorias organicistas eram as mesmas
empregadas pelos adeptos do tratamento moral, e tinham como explicações e
justificativas fisiológicas para sua utilização. A partir daí prevalecem as teorias
organicistas da doença mental mediante as descobertas experimentais da
neurofisiologia e da anatomia patológica. Mesmo assim, entrando no século XX a
ideia de submissão do louco ainda persistia. FOUCAULT (1972) ainda relata que o
tema de um parentesco entre a medicina e a moral é, sem dúvida, tão velho quanto
à medicina grega. Mostrando que estas terapêuticas revelam surpreendentes
paisagens imaginárias e uma cumplicidade entre a medicina e a moral, que atribui
todo o sentido a essas práticas de purificação. Nela, a percepção médica é de longe
considerada ética, e por muitas vezes até é apagada, através do castigo, para
eliminar o contagio da doença mental.
Aqui na pesquisa trabalhei com uma população que de um modo ou de
outro, faz parte dessa história. Trata-se de uma população proveniente do Hospital
Psiquiátrico São Pedro 3. Nesse contexto, Edson M. Cheuiche (2004), historiador do
Serviço de Memória Cultural do Hospital Psiquiátrico São Pedro, apresenta uma
retrospectiva e resgate histórico sobre os cento e vinte anos do Hospital São Pedro,
que possibilitou mostrar o que foi ele no passado e o que é atualmente. Também
mostrou o porquê da existência do Galpão de reciclagem em suas dependências, a
sua significação e importância que nos ajudam a entender o caso do Galpão de
unidade de triagem de lixo do Hospital São Pedro, que é o objeto empírico principal
deste trabalho.
3
O Hospital Psiquiátrico São Pedro é uma instituição do Estado do Rio Grande do Sul, localizado em Porto
Alegre.
32
3 OS MATERIAIS RECICLÁVEIS
O atual Código de Limpeza Urbana (Código, 2011) com a Lei Complementar
nº 234, de 16 de outubro de 1990, surgiu para regulamentar o serviço de
gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos, cuja competência para a execução é
do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU, 2011) para a cidade de
Porto Alegre (RS). Pelo Código, são estabelecidas as normas de como devem ser o
acondicionamento, a coleta, a destinação e a disposição final dos resíduos de
qualquer natureza no âmbito do município de Porto Alegre, bem como prevê
penalidades aos que infringirem tais regras. Como destaque do Código está a
obrigatoriedade de o proprietário de terrenos mantê-los em condições perfeitas de
limpeza (artigo 38). Esse dispositivo tem como objetivo evitar que o mau uso da
propriedade particular cause prejuízos aos imóveis vizinhos como, por exemplo, os
donos de terrenos que os deixam abertos e cheios de mato e lixo, criando condições
para a proliferação de ratos, baratas, mosquitos e outros transmissores de doenças.
O modelo de sociedade em que vivemos com o desenvolvimento capitalista
implica numa geração de resíduos que produzimos. Mais do que ainda na maneira
que os descartamos e também na sua quantidade que cada vez mais é maior e
variada. Com esta constatação estamos sendo levados ao esgotamento dos
recursos naturais não renováveis. Morin (1995) descreve que devemos pensar cada
vez
mais
num
modelo
econômico
de
crescimento
compatível
desenvolvimento ambientalmente sustentável. Capra (2001)
com
mostra
que
um
a
humanidade deve então buscar novas maneiras de sensibilizar as pessoas para que
estas percebam seu poder de vida no presente e de suas ações para gerações
futuras.
A partir de 1989, novos conceitos foram introduzidos no modelo de gestão
do DMLU. A política de gerenciamento de resíduos sólidos adotados a partir de
1989 na cidade de Porto Alegre é uma referência e foi liderado pelo grupo de
Trabalho de Gestão Integrada e Sustentável dos Resíduos sólidos em cidades da
America Latina e Caribe, do Programa de Gestão Urbana da ONU. A proteção ao
meio ambiente e o apoio a segmentos excluídos da sociedade constituem as
diretrizes dessa política adotada pelo DMLU (2011) na cidade de Porto Alegre.
Assim é adotado o modelo de unidades de triagem (UT) de resíduos como sistema
33
de triagem e posterior encaminhamento para reciclagem. O lixo passa a ser
abordado sob o prisma dos princípios da educação ambiental, não mais sendo um
resto uma sobra. As bases do novo sistema de gerenciamento leva em conta a
redução de produção de resíduos; a reciclagem dos resíduos e mais ainda o
aproveitamento deste (3Rs). Preconizando as ideias de Odum (1993) o (DMLU,
2011) cria programas de educação ambiental para disseminar a ideia dos 3Rs,
disponibilizados pela prefeitura de Porto Alegre para escolas, universidades,
professores, síndicos de prédios, lideranças comunitárias, com Projetos Sociais de
Reaproveitamento e Reciclagem. O programa de educação ambiental não é só
disponibilizado na Capital, mas tem parcerias com outros municípios e outros
estados. Ele foi pioneiro na implantação de um sistema de
gerenciamento de
resíduos, bem como da coleta seletiva em Porto Alegre, que em 2011 comemorou
21 anos de existência, com uma implantação bem sólida e todos os bairros da
região metropolitana.
O sistema de gestão de gerenciamento de resíduos secos (material
reciclável) utilizado na coleta seletiva é de renome para todo o país, seu modelo é
uma realidade de sucesso. Existem dos tipos de coletas: a domiciliar e a coleta
seletiva.
A coleta domiciliar na cidade de Porto Alegre atinge 100% em toda a cidade.
A partir de 2011foi implantado um sistema de containers. Esta coleta é
automatizada, é um sistema consagrado em outras cidades do mundo, como Paris,
Roma, Milão, Barcelona, Santiago, Buenos Aires, Caracas, Montevidéu e Punta Del
Este. Porto Alegre recebe este novo tipo de coleta assim garantindo mais facilidade
e limpeza. Porto Alegre também é a primeira capital do Brasil com coleta
automatizada de lixo orgânico domiciliar. Este tipo a partir de uma área piloto da
cidade de Porto Alegre, a zona central e centro, o DMLU implantou o novo sistema
de containers. O sistema está sendo ajustado, diante de problemas decorrentes
como incêndio e destruição dos containers e mesmo uma demanda maior.
No
interior gaúcho, este sistema já foi implantado nas cidades de Caxias do Sul, Santa
Maria, Pelotas, Bagé, entre outras cidades. O sistema passa ainda pela instalação,
adaptação e aceitação da população nos bairros de Porto Alegre em que já foi
implantado. Mas ainda existe um campo bem grande nesta cidade de Porto Alegre
que conta com a coleta mecânica. Os tipos de resíduos que devem ser
encaminhados à coleta domiciliar são resíduos orgânicos como cascas e restos de
34
frutas e legumes, sobras de comida, papel higiênico, fraldas descartáveis usadas,
guardanapos e toalhas de papeis engordurados, plantas, restos de podas e varrição,
pó de café erva-mate, restos de vegetação acondicionados em sacos de lixo,
preferencialmente pretos, próprios para este tipo de descarte. É recomendável que
se forem descartados algum material cortante ou pontiagudo, deverão ser
embalados, para evitar lesão aos garis, no sistema manual de coleta.
Já a Coleta Seletiva em Porto Alegre está presente há vinte anos no
cotidiano da cidade. O sistema implantado atualmente atinge 100% dos bairros, com
a coleta duas vezes por semana. Esta coleta recolhe materiais recicláveis e
reaproveitáveis como papéis (sem gordura), papelão, latas de alumínio, isopor,
plásticos, metais, vidros e embalagens longa vida. Este material coletado é
encaminhado às unidades de triagem (UT) conveniadas com o DMLU. Estas
unidades de triagem geram emprego e renda para centenas de pessoas, além de
estar dando uma destinação correta ao material reciclável e beneficiando o nosso
meio ambiente. Atualmente, o DMLU realiza o recolhimento em torno de 100 t/dia de
materiais recicláveis, os quais são encaminhados às 18 Unidades de Triagens
cadastradas
no
Departamento,
onde
trabalham
cerca
de
800
pessoas
(VANZELLOTTI, 2011).
Os caminhões que fazem a coleta dos materiais recicláveis nos bairros
encaminham para as unidades de triagem,. Entretanto a Unidade de triagem do
Hospital São Pedro não recebe mais este material reciclável, porque encontra-se
dentro de um complexo hospitalar. Assim não é adequada a entrada de um material
reciclável em suas dependências. Nas unidades de triagem, os trabalhadores que
podem ser associados ou cooperados e fazem a separação mais específica por tipo
de material, prensam, agrupam em fardos e levam para a negociação para indústria
da reciclagem e ou aproveitamento. Se houver algum material reciclável
contaminado por gordura, líquidos eles são devolvidos para a coleta domiciliar.
Vanzellotti (2011) informa que a Prefeitura de Porto Alegre fornece a
infraestrutura para as unidades de triagem e também garante um custeio de
manutenção de valor R$ 2.500,00, que atualmente encontra-se defasado, mediante
as necessidades das unidades. O resultado bruto da comercialização do material
reciclável é dividido entre os integrantes das associações ou cooperativas de cada
unidade de triagem.
35
O sistema de gerenciamento deste tipo de material é reconhecido como uma
prática de gestão na reciclagem em todo o país (VANZELLOTTI, 2011) e já recebeu
prêmios como Prêmio Coleta Seletiva.
Ainda encontramos no sistema de gestão de resíduos, a Unidade de triagem
e compostagem (UTC) Francisco Engel Rodrigues, situada na estrada Alonso
Lourenço Mariante no Bairro da Lomba do Pinheiro. Ela tem aproximadamente uma
área de 10 hectares, iniciou suas atividades em 2000, é um local onde o DMLU faz o
reaproveitamento dos resíduos orgânicos usando o método da compostagem
(VANZELLOTTI, 2011).
A compostagem é um método de reaproveitar os resíduos orgânicos. É um
processo natural de decomposição da matéria orgânica, que gera o processo. A
base do composto é a parcela dos resíduos domiciliares composta por sobras de
alimentos, restos de jardins e outros. Ainda usam-se resíduos orgânicos
provenientes de estabelecimentos comerciais e industriais.
Cerca de 10 toneladas de resíduos domiciliares chegam nesta unidade, lá os
trabalhadores separam o rejeito, do seco do orgânico. Esta ação de separação é
feita em duas esteiras, com 30 m de comprimento cada uma. Dando prosseguimento
ao processo os resíduos orgânicos são colocados no pátio da unidade em montes,
também denominado leiras pelos profissionais que trabalham neste meio.
Periodicamente estas leiras são revolvidas para acelerar o processo. A temperatura
das leiras pode atingir até 70ºC e, em 100 dias após, reduz-se a uma temperatura
ambiente, devido à fermentação. Quando o composto atinge esta condição ele é
peneirado e já pode ser utilizado na jardinagem. O composto produzido por esta
Unidade é comercializado e o dinheiro gera renda para os integrantes da
associação.
No sistema de gerenciamento de resíduos sólidos temos ainda os Aterros
Sanitários para onde são encaminhados os resíduos sólidos orgânicos através de
uma obra de engenharia que tem como objetivo a redução de impacto ambiental no
descarte de lixo, através de uma área adequada, preparada com impermeabilização
e controle da entrada do resíduo. Segue-se ainda a compactação e cobertura
periódicas destes materiais, drenagem e tratamento de efluentes líquidos e gasosos,
com monitoramento ambiental. Atualmente os resíduos sólidos domiciliares de Porto
Alegre são enviados para a Central de Resíduo Recreio, aterro sanitário de
propriedade da empresa Soluções Ambiental Ltda., no município de Minas do Leão,
36
que fica a 113 km da cidade de Porto Alegre. Hoje, acredita-se que para os aterros
sanitários deva ir somente o lixo orgânico que não possa ser reciclado ou
reaproveitado, assim também garantindo menos aterros e futuramente algum
problema de impacto ambiental.
Atualmente o Brasil tem uma Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS),
contemplando um descarte para todos os tipos de resíduos, classificados com sua
periculosidade. Esta política foi aprovada após 21 anos de tramitação no Congresso
Nacional e foi sancionada como Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010 pelo Senhor
Presidente da República Sr. Luis Inácio Lula da Silva (Lei 12.305/2010).
A Lei 12.305/2010 encontra-se na situação de regulamentação do plano que
possa dar suporte a sua efetiva aplicação, uma vez que contamos com uma
diversidade muito grande de tipos de resíduos. Um dos pilares em que o Plano
Nacional de Resíduos Sólidos encontra-se apoiado é que todos nós devemos ter a
noção de nossas responsabilidades em relação aos resíduos gerados e no seu
descarte final. Isto gera também uma nova perspectiva cultural a ser seguida no
país.
Morin (1995) apontou a necessidade de um pensamento ecológico, que leve
em consideração a ligação vital de todos os sistemas vivos ao seu ambiente. Essas
ligações, entretanto, necessitam de atenção especial por parte dos órgãos nacionais
e internacionais responsáveis pela conservação da natureza, bem como da
população em geral e sua participação mais ativa, uma vez que para se alcançar
sucesso
na
realização
de
qualquer
trabalho
contará
com
uma
maior
conscientização.
Para fomentar uma conscientização ampla e efetiva é preciso compreender
que Morin (1995) trás novos referenciais capazes de satisfazer, pelo menos em
parte, as grandes indagações da sociedade contemporânea. O autor acrescenta que
durante o século XX sedimentou-se uma nova percepção de mundo, de sociedade,
ou seja, uma percepção sistêmica da realidade existente, a partir da complexidade
como um pensamento que distingue e une, ao invés de isolar, separar e reduzir o
todo às suas partes. Este novo pensar tem como pano de fundo, a articulação dos
fragmentos dispersos pelo saber tradicional reducionista e a partir de uma nova
lógica, compreender as múltiplas relações, causalidades e interdependências entre
os processos naturais e sociais.
37
A partir da lei (PNRS) os fabricantes, distribuidores, comerciantes,
consumidores, importadores e os titulares dos serviços de limpeza urbana devem
criar uma rede de coleta destes resíduos, que denominada Logística Reversa. A lei
traz ainda uma meta a ser vencida de implantação da logística reversa para o ano
de 2014, onde todos os tipos de resíduos tenham uma destinação corretamente
realizada (PATELLA, 2011).
Entende-se que a prática da logística depende de acordos setoriais, que
começaram a ser elaborados no início do ano de 2011 com a criação dos Comitês
Interministeriais do PNRS com a função de orientar a implantação do sistema de
logística reversa. Estes dois eixos juntos traduzem a implementação da nova
política. Nesse sentido, os consumidores também deverão atuar para que a nova lei
seja cumprida, uma vez que, entre as principais medidas estabelecidas pela PNRS,
está a definição do papel do consumidor no processo de emissão e coleta de
resíduos. Para exercer o princípio da responsabilidade compartilhada, a regulação
fixa o dever dos consumidores de acondicionarem adequadamente os resíduos
reutilizáveis e recicláveis sempre que houver o sistema de logística reversa ou coleta
seletiva implantada pelos municípios (PATELLA, 2011).
Com a sanção da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010), o
Brasil passa a ter um marco regulatório nesta área. Esta lei faz a distinção entre
resíduo (lixo que pode ser reaproveitado ou reciclado) e rejeito (o que não é passível
de reaproveitamento), além de se referir a todo tipo de resíduo: doméstico, industrial,
da
construção
civil,
eletroeletrônico,
lâmpadas
de
vapores
mercuriais,
agrosilvopastoril, da área de saúde e perigosos.
Resultante de ampla discussão com os órgãos de governo, instituições
privadas, organizações não governamentais e sociedade civil, a PNRS reúne
princípios, objetivos, instrumentos e diretrizes para a gestão dos resíduos sólidos.
Os objetivos principais da nova Lei de resíduos (Lei 12.305/2010) são:
• A não geração, redução, reutilização e tratamento de resíduos sólidos;
• Destinação final ambientalmente adequada dos rejeitos;
• Diminuição do uso dos recursos naturais (água e energia, por exemplo) no
processo de produção de novos produtos;
• Intensificação de ações de educação ambiental;
• Aumento da reciclagem no país;
38
• Promoção da inclusão social;
• Geração de emprego e renda para catadores de materiais recicláveis.
As propostas estão em torno de que a PNRS institui o princípio de
responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, o que abrange
fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, consumidores e titulares
dos serviços públicos de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos (PATELLA,
2011).
Um dos pontos fundamentais da nova Lei é a chamada Logística Reversa,
que se constitui em um conjunto de ações para facilitar o retorno dos resíduos aos
seus geradores para que sejam tratados ou reaproveitados em novos produtos. De
acordo com as novas regras, os envolvidos na cadeia de comercialização dos
produtos, desde a indústria até as lojas, deverão estabelecer um consenso sobre as
responsabilidades de cada parte.
Os grupos de trabalhos (GT) são compostos por representantes de
entidades nacionais das cinco cadeias produtivas em estudo, de prefeituras,
organizações estaduais e municipais, de prefeitos e de governo, e de sociedade
civil. Estão responsáveis para estudar e discutir alternativas socioeconômicas e
tecnicamente viáveis para formulação de proposta de modelos para Logística
Reversa e de subsídios de editais de chamamento para os ac ordos setoriais. Num
primeiro momento foram instalados cinco grupos técnicos, apesar da lei de resíduos
englobar todo de tipo resíduo. São eles: para descarte de medicamento;
embalagens em geral; embalagens de óleos lubrificantes e seus resíduos;
eletroeletrônicos; lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio de luz
mista.
À medida que vão surgindo soluções para a Logística Reversa destes,
outros tipos de resíduos serão incluídos. As empresas teriam até o final de 2011
para apresentar propostas de acordo, mas quem perder o prazo ficará sujeito à
regulamentação federal. Atualmente, a Logística Reversa já funciona com pilhas,
pneus e embalagens de agrotóxicos. Mas é pouco praticada pelo setor de
eletroeletrônicos, que foi um dos que mais contestaram tal ponto da Logística.
(PATELLA, 2011).
Quanto à Logística Reversa na coleta seletiva que já é uma realidade em
muitos municípios do país deverá ter um plano integrado de manejo com a
participação dos governos estaduais e municipais. O governo federal tem uma
39
estimativa para que a coleta seletiva no país atinja um patamar de 20% em 2015,
assim podendo contribuir na redução de pressão por recursos naturais e de
conservação da energia na produção industrial, pois o uso de plásticos, alumínio e
papel reciclado como insumos para produção reduz a necessidade de energia
também no processo produtivo (PATELLA, 2011).
A lei dos resíduos sólidos proíbe a existência de lixões e determina a
criação de aterros sanitários para lixo sem possibilidade de reaproveitamento ou de
decomposição (matéria orgânica). Nos aterros, que poderão ser formados até por
consórcios de municípios, será proibido catar lixo, morar ou criar animais. As
prefeituras poderão ter recursos para a criação de aterros, desde que seja aprovada,
nas câmaras de vereadores, uma lei municipal, também criando um sistema de
reciclagem dos materiais recicláveis.
A classificação de um resíduo é dada quanto à sua periculosidade, que vem
das suas propriedades físicas e químicas ou infectocontagiosas que possam
apresentar:
a) risco à saúde pública, provocando mortalidade, incidência de doenças ou
acentuando seus índices;
b) riscos ao meio ambiente, quando o resíduo for gerenciado de forma inadequada.
Ainda assim medimos o grau de toxidade que é a propriedade potencial que
o agente tóxico possui em maior ou menor grau. O agente tetragênico que é
qualquer substância, mistura, organismo, agente físico ou estado de deficiência que,
estando presente durante a vida embrionária ou fetal, produz uma alteração na
estrutura ou na função do individuo dela resultante. O agente mutagênico que é
qualquer substância, mistura, agente físico ou biológico cuja inalação, ingestão ou
absorção cutânea possa elevar as taxas espontâneas de danos ao material genético
e ainda provocar ou aumentar a frequência de defeitos genéticos; agentes
carcinogênicos; agentes eco tóxico e ainda outros medidores
específicos para
certos animais cobaias.
Segundo a ABNT NBR 10004, os resíduos são classificados em:
Classe 1 - Resíduos Perigosos: são aqueles que apresentam riscos à
saúde pública e ao meio ambiente, exigindo tratamento e disposição especiais em
40
função de suas características de inflamabilidade, corrosividade, e a atividade,
toxicidade e patogenicidade.
Classe 2 - Resíduos Não Inertes: são os resíduos que não apresentam
periculosidade, porém não são inertes; podem ter propriedades tais como:
combustibilidade, biodegradabilidade ou solubilidade em água. São basicamente os
resíduos com as características do lixo doméstico.
Classe 3 - Resíduos Inertes: são aqueles que, ao serem submetidos aos
testes de solubilização (ABNT NBR-10.007), não têm nenhum de seus constituintes
solubilizados em concentrações superiores aos padrões de potabilidade da água.
Isto significa que a água permanecerá potável quando em contato com o resíduo.
Muitos destes resíduos são recicláveis. Estes resíduos não se degradam ou não se
decompõem quando dispostos no solo (se degradam muito lentamente). Estão nesta
classificação, por exemplo, os entulhos de demolição, pedras e areias retirados de
escavações. (Norma 2011).
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010) estabelece pela
primeira vez novos princípios, objetivos e instrumentos para correta gestão dos
resíduos sólidos no Brasil.
O grande marco regulatório da nova legislação é o conceito de
responsabilidade compartilhada, pois os geradores de resíduos, tanto públicos como
privados, no quais nos incluímos os consumidores, temos responsabilidades
definidas dentro da PNRS. Devemos cooperar para a implementação desta e que os
objetivos dela sejam atingidos. Embora a PNRS (Lei 12.305/2010) refira-se muito
sobre a gestão de resíduos, principalmente pela disposição e destinação
adequadas. A lei também traz a responsabilidade dos resíduos gerados no processo
industrial como na fase de comercialização, consumo e pós-consumo, abrangendo
todas as etapas de sua vida útil. Esta política encontra-se em conformidade do
princípio dos 3Rs - reduzir, reutilizar e reciclar, o qual tem pautado os programas de
incentivo à reciclagem no Brasil e no mundo.
A responsabilidade compartilhada entre produção e consumo e apregoada
na PNRS deverá ser implementada, de forma individualizada e encadeada, fazendo
com que cada um dos atores assuma suas responsabilidades dentro de toda cadeia
(BOFF, 1999).
Morin (1995) relata que o maior problema é fazer com que cada um entenda
a importância de sua atuação dentro da cadeia, e assim o sistema se transformará,
41
modificando o panorama atual, mas isto deverá acontecer com a mudança de
comportamento e de entendimento que para fomentar uma conscientização ampla e
efetiva é preciso para o autor adentrar em novos referenciais capazes de satisfazer,
pelo menos em parte, as grandes indagações da sociedade contemporânea. Temos
que considerar ainda o importante papel dos consumidores na Logística Reversa,
porque como tais, deveremos acondicionar corretamente e, de forma diferenciada,
os diversos tipos de resíduos sólidos e também disponibilizá-los adequadamente
para fins de coleta seletiva e posterior destinação. Ainda contamos com o descarte
de equipamentos e materiais domésticos, como eletroeletrônicos, celulares, baterias,
lâmpadas, medicamentos vencidos ou não, óleo de cozinha e outros que deverão
ser entregues em locais de recepção voluntária de resíduos recicláveis (LEVs) ou
Postos de entrega voluntária (PEVs). Estes locais devem ser instalados pelos
responsáveis para acumulação temporária com vistas à realização da Logística
Reversa. Essa passa pela separação correta do lixo; pela prevenção e redução na
geração de resíduos sólidos.
A mudança de hábitos preconizada por Odum (1993) inicia-se dentro das
residências com a separação de materiais, além de fiscalizarmos se o poder público
está fazendo a sua parte com a implementação da coleta seletiva e da destinação
ambientalmente adequada. A PNRS (Lei 12.305/2010) conta com o auxilio de
controle de órgãos fiscalizadores, o Ministério Público, órgãos ambientais, Instituto
Brasileiro de Meio Ambiente (IBAMA), e o próprio cidadão que farão o
monitoramento das ações para a implantação e o cumprimento da Logística
Reversa.
Sabemos também que os próprios consumidores são os que mais demoram
a se acostumar com as novas responsabilidades. Atualmente, grande parte dos
consumidores ainda não tem hábito de separar os materiais e dispor de maneira
adequada para o descarte (PATELLA, 2011). Sendo importantes ações de
conscientização e mobilização a fim de envolver a população nesse processo.
O Ministério do Meio Ambiente, vendo esta necessidade, lançou a
Campanha “Separe o Lixo e Acerte na Lata”, e divulga nos meios de comunicação
disponíveis, para que atinja o maior número de pessoas. A administração pública
federal também implantou um programa denominado Programa Agenda Ambiental
da Administração Pública (A3P 2010), que visa implantar a responsabilidade
socioambiental nas suas atividades e operacionais da administração pública. Esta
42
agenda tem como princípios a inclusão de critérios socioambientais nas atividades
regimentais assim como mudanças nos investimentos, compras e outras ações de
serviços pelo governo federal com a proposta de promover uma gestão adequada
dos resíduos gerados e a diminuição da subtração dos recursos naturais utilizados
pelo homem, também promovendo a melhoria de qualidade de vida no ambiente de
trabalho. Esta agenda passa por momentos de implantação como a criação de
Comissões A3P dentro da Instituição, realização de um diagnóstico ambiental,
desenvolvimento de projetos e atividades relativas à agenda, promoção da
mobilização, sensibilização na preservação do meio ambiente. Ainda, ela prevê a
realização e avaliação e o monitoramento das ações implantadas. Também
recomenda algumas sugestões de ações para implantação como: o uso racional dos
recursos naturais com combate ao desperdício, como o consumo do papel,
englobando ações como levantamento e seu acompanhamento, usado para
impressão e cópias, o levantamento de número de impressora e situação em relação
à manutenção ou substituição, a realização de impressão de papel frente e verso. A
confecção de blocos de anotação com papel usado só de um lado, e ainda a
utilização de papel não clorado ou reciclado. O consumo de energia, com
diagnóstico das instalações elétricas, com proposição de alterações necessárias
para redução de consumo: implantação de sensores em banheiros e andares,
campanhas de conscientização, aproveitamento das condições naturais do ambiente
de trabalho como ventilação, luz solar. Ainda recomenda o uso racional da água,
coleta seletiva solidária, compras sustentáveis realizadas através de aquisições de
bens e matérias, contratações de serviços e projetos ambientalmente sustentáveis.
Morin (1995) manifesta que apesar de parecer que é um caminho longo e
muito difícil de ser percorrido, as nossas dificuldades atuais, problemas ambientais
que estão surgindo em relação a nossa convivência com a natureza, nos remete à
concordância deste novo padrão de pensamento. Como as evidências sobre os
problemas ambientais são irreversíveis e cada vez mais agudos, resta à
humanidade promover um novo pensamento com mudanças de hábitos em relação
à natureza.
Muito importante para este novo padrão, que tenham leis regulatórias em
relação a todos os tipos de resíduos que a sociedade produz e também de seu
descarte para que possamos vislumbrar um planeta mais limpo, sustentável no qual
o homem seja integrante da natureza.
43
4 PROJETO DE EXTENSÃO: ATUT- RECICLANDO VIDAS COM INCLUSÃO
SOCIAL
Minha trajetória nessa rede do Galpão de reciclagem, educação ambiental,
coleta seletiva vem desde 2002, quando pude entrar no mundo da reciclagem
propondo trabalhos acadêmicos que pudessem melhorar a situação destes, com a
participação da ação de extensão.
Em 2004, a Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação Social (FABICO)
da UFRGS, implantou a coleta seletiva na unidade, com um programa que visava à
motivação, informação e sensibilização dessa atividade, através do Projeto de
Extensão ATUT. Desde lá promovemos ações e atividades que possam contribuir no
meio acadêmico quanto à atividade de coleta seletiva e sua importância no
panorama mundial de falência ambiental.
Também colaborei com a assessoria de comunicação, de educação
ambiental e de vivências na Unidade de triagem de lixo do Hospital São Pedro
(ATUT), através do Projeto de Extensão ATUT: reciclando vidas com inclusão social.
É uma ação de extensão e dada à importância da temática para a nossa vivência, a
partir de 2007, passou a ter caráter permanente, com atividades no Galpão de
reciclagem e de assessoria interna e externa de comunicação e educação. Passou
então esta ação a ser vinculada à Direção da Faculdade de Biblioteconomia e
Comunicação em parceria com a Coordenadoria de Gestão Ambiental da UFRGS.
Na
Faculdade
se
promove
a
implementação
da
educação
ambiental,
conscientização do público envolvido e gestão ambiental, dentro do Projeto da
Reitoria da UFRGS. O nome definitivo da ação passou também pelo processo de
reciclagem ao longo dos nove anos que ela vem atuando. A ação de extensão fazia
parte da Agência Experimental de Relações Públicas dessa Faculdade. Era um
projeto dentro de um grupo que atendia às necessidades da Faculdade. Esta ação
trabalha o envolvimento do aluno de graduação com uma comunidade carente ou
com pessoas com necessidades especiais. Com a implantação da coleta seletiva na
Faculdade a partir do ano de 2004 e seu pleno sucesso com a adesão da
comunidade acadêmica desta.
Esta ação tem mostrado a ideia de reciclar, transformar e não engessar. Por
isso nasceu o nome final Projeto de Extensão ATUT: reciclando vidas com inclusão
social, se deu a partir das vivências do cotidiano do projeto, que se ampliou não só
44
no Galpão, mas também na comunidade da UFRGS, em especial da FABICO. É um
jogo de palavras-chave, que traduzem as ideias principais da ação durante esses
anos e que se solidificaram em suas atividades. Este nome agora é permanente,
pois dentro de tudo que pudemos pensar, objetivar e executar para o Galpão e para
a própria Faculdade, ele engloba, posto que é representativo na Universidade. Na
UFRGS temos um sistema de coleta seletiva e destinação, em que a Unidade de
triagem de lixo do Hospital São Pedro (ATUT) é nosso parceiro receptor dos
materiais recicláveis, desde 2004. Esta Unidade de triagem tem uma constituição
diferente, pois ela é composta por pacientes, ex-pacientes e por outras instituições
que albergam pessoas com doença mental. Os associados da ATUT, por serem na
sua maioria doentes mentais, tem pouca possibilidade de reinserção econômica e
social no mercado de trabalho. Daí a intenção de nomear a ação de extensão com
as palavras reciclando vidas e inclusão social, pois mostra o objetivo da Unidade de
Triagem (ATUT). A capacitação dos associados para a atividade acontece sem
grandes dificuldades na atividade de triagem do material. Isso possibilitou que essas
pessoas constituíssem uma força de trabalho. O Galpão fica nas dependências do
Hospital São Pedro, mas mantêm uma estrutura à parte deste, com certa
independência no seu cotidiano. Mantém uma Equipe Técnica, Coordenação da
Associação e associados.
A ATUT está associada ao Projeto São Pedro Cidadão, que preconiza a
reforma psiquiátrica e a reinserção dos doentes mentais à sociedade. Por esta razão
é composta principalmente de pacientes egressos do Hospital Psiquiátrico São
Pedro, moradores carentes da Vila São Pedro, que fica no entorno do complexo
hospitalar São Pedro e atualmente de outros locais como pensões, albergues, que
tenham um perfil psiquiátrico, em reabilitação totalizando de 36 pessoas, segundo
dados coletados referentes a 2002-2009, com a Equipe Técnica do Galpão. Esse
grupo conta com uma equipe de apoio técnico, formada por um Psicólogo e uma
Terapeuta Ocupacional.
A ATUT por ocasião de implantação da Associação recebeu o apoio do
Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU), da Fundação Solidariedade
de Formação e Capacitação de Trabalhadores e da Secretaria do Trabalho
Cidadania e Assistência Social. Desde 2003 esta Associação é uma Unidade de
triagem e trabalha com o sistema de parceiros doadores de materiais recicláveis.
Algumas empresas parceiras como o Banrisul, a PROCERGS, a Secretaria da
45
Fazenda, o Centro Administrativo do Estado e a Polícia Rodoviária Federal, doam
materiais recicláveis como plásticos, vidros, papéis e metais. Recebendo assim um
material reciclável mais limpo, sem contaminações e por estarem dentro das
dependências de um hospital, tiveram que abandonar o recebimento de material
vindo da coleta seletiva do nosso município. O material reciclável é triado
(beneficiado no Galpão) e vendido, garantindo uma fonte de renda aos
trabalhadores desta Associação.
Através dessa atividade, os alunos do Curso de Comunicação Social da
UFRGS têm uma experiência real de trabalho em comunidades carentes, adquirindo
conhecimentos úteis para serem transpostos na resolução de outras situações em
sua futura atuação profissional. Além disso, o Projeto encurta a distância entre a
vida acadêmica e as questões sociais, instrumentando a consciência crítica do futuro
profissional e preparando-o para o mercado de trabalho aliado a uma nova
consciência ambiental. O objetivo da assessoria é desenvolver e manter um
processo de comunicação e educação ambiental entre a ATUT e diversos
segmentos sociais, visando ao apoio de outras instituições à integração social do
grupo de recicladores. Além disso, pretende firmar convênios para a captação de
materiais recicláveis e de recursos financeiros a fim de proporcionar a melhoria de
suas condições de trabalho. Os instrumentos de comunicação interna, também,
serão aprimorados e estabelecidos em redes e fluxos de comunicação com a
comunidade,
através
da
divulgação
das
atividades
e
necessidades
dos
componentes da ATUT (KAUFMANN, 2010).
Kaufmann (2010) descreve que nas atividades do Projeto de Extensão a visão
da Comunicação Social, mostrando a importância do mesmo para o Galpão, como
um motivador na rede de associados, Equipe Técnica e também no aspecto
ambiental. Desde seu início a ação promove campanhas de comunicação, levando
em conta a potencialização da Associação, como um todo, internamente e com o
público externo.
46
4.1 CAMPANHAS DE DIVULGAÇÃO
Algumas campanhas e programas já desenvolvidos são de caráter
permanente, sempre levando em conta a necessidade da Associação.
a) Projeto de divulgação da ATUT: consiste na realização de uma campanha de
divulgação das ações da ATUT, através do encaminhamento de press-releases a
diversos suportes de comunicação de mídia impressa, televisiva e radiofônica.
São eles vídeo institucional, jornalístico, promocional, banner informativo,
campanha do agasalho, campanha de divulgação para captação de parcerias e
do projeto em empresas e Instituições, campanha nas Escolas Municipais de POA
de divulgação sobre o projeto oportunizando doações, campanha Kit de captação
de parceiros para a ATUT, atualização do KIT captação de parcerias para ATUT,
com a colaboração da Equipe Técnica da ATUT e execução da bolsista de
extensão sob a minha orientação. O Projeto de Extensão esteve presente,
juntamente
com
a
Coordenadoria
de
Gestão
ambiental,
em
parceria
apresentaram um vídeo mostrando a situação do projeto da coleta seletiva na
Universidade e da sua segregação a galpões de reciclagem, que são Associação
dos Trabalhadores da Unidade de Triagem de lixo do Hospital São Pedro e o da
Vila Pinto. Para estes dois galpões é que a UFRGS segrega seus materiais
recicláveis de acordo com a Legislação Federal. O vídeo mostrou de uma forma
geral, como se encontra o projeto, as atividades ligadas, e uma visão de cada
galpão em relação à importância da prática da coleta seletiva e da parceria com a
Universidade. O vídeo apresentado é o A separação que nos une. Este vídeo
encontra-se a disposição no acervo do Projeto de Extensão e na Coordenadora
de Gestão Ambiental da UFRGS. Esteve à frente desta atividade, a Direção da
Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação, a Coordenação do projeto, Martha
Ferrari Agustoni, Coordenadoria de Gestão Ambiental, Tereza Campezatto,
laboratório de vídeo/FABICO, Prof. André Prytoluck.
b) O projeto O mural da ATUT: como um veículo de comunicação não só entre os
associados, mas também com a Equipe técnica, parceiros e outros. O mural foi
revitalizado com a mudança de local, de estrutura visual e nova identificação
visual. A partir de então, ele está sendo realimentado e atualizado para que os
associados usufruam deste veículo de comunicação.
47
c) Projeto Museu da ATUT: a formulação de um folder para o Museu da reciclagem,
localizado no Galpão de reciclagem da ATUT. Em busca de valorização das
antiguidades e de objetos significativos do Museu, procuramos destacar os
aspectos interessantes em vista de atrair mais doações para o Galpão e
divulgação dele. Foi elaborado um folder sobre o Museu. O mesmo foi entregue à
Equipe Técnica do Galpão. O acervo do Museu é constituído, na sua maioria, de
material reciclável enviado para o Galpão. Com a implantação do Curso de
Museologia da FABICO/UFRGS, no ano de 2011, está sendo feito um estudo de
nomeação para todo acervo e também de catalogação. O local onde está sendo
guardado o acervo é um Gabinete de Curiosidade e deverá ser mantido assim,
pois tem uma variedade enorme de tipos de objetos.
d) Projeto de Identidade Visual: consistiu na criação de uma identidade visual para
ATUT.
e) Projeto Folder Institucional: foi confeccionado folder para divulgar e promover o
trabalho da ATUT. O folder está sempre em constante atualização.
f) Projeto Site da ATUT e utilização das redes sociais: em virtude da evolução que
se propaga a utilização das redes sociais como uma forma de comunicação. Foi
criado um endereço eletrônico para o Galpão: [email protected] e um linked it,
uma rede profissional. Também foi elaborado o novo site da Associação e como
se utiliza os links: www.wix.com/atutrs/atut. O site e o e-mail servem de meio de
comunicação com a sociedade, com outros galpões, com parceiros e traz
agilidade à Coordenação e Equipe Técnica da Associação em manter-se
atualizada.
g) Ciclo de Palestras: realizado sobre assuntos de interesse dos recicladores, como
contribuição previdenciária, segurança do trabalho, tabagismo, amizade e
solidariedade, drogas e terapias, ginástica laboral, meio ambiente, sobre doenças
sexualmente transmissíveis e suas implicações sociais, higiene pessoal e bucal, a
epidemia da dengue.
h) Programa Semana do Meio Ambiente na FABICO: na mesa expositora, no
saguão da FABICO ocorre exposição de brinquedos reciclados, absorvente
sustentável, cadernetas de papel, canetas, réguas, sacolas (ecobags), entre
outros materiais recicláveis que foram aproveitados para terem novamente uma
utilidade para a sociedade.
48
j) Programa datas comemorativas: foram organizados eventos de confraternização
em datas comemorativas, como no Natal, na Páscoa, no Dia das Crianças, para
os filhos dos associados.
l) Programa vivências: foram realizados passeios e outras atividades, como a
exibição de filmes, a fim de proporcionar experiências ao grupo fora do ambiente
de trabalho, são filmes didáticos e temáticos, visitas, oficinas de artesanato
recicláveis visitação a empresas recicladoras como a BETTANIN, apresentação
de vídeos, visitação no Planetário da UFRGS;
m) Programa de oficinas: foram realizadas diversas oficinas, de criação de um jornal
mural, de arte, teatro e de contação de histórias.
n) Programa Campanha do agasalho: no mês de maio lançamos, na Faculdade de
Comunicação da UFGRS, a Campanha do Agasalho para os Recicladores da
ATUT. Foram elaboradas peças, folder, cartazes informando sobre o objetivo
desta ação. Por esta ação obter um grande sucesso e grande adesão da
comunidade ela tornou-se de caráter definitivo, assim ocorrendo todos os anos.
o) Divulgações da Associação na Faculdade: aconteceu a participação da
Coordenadora no evento: Sinta-se em Casa, na FABICO, com apresentação do
Projeto ATUT: reciclando vidas com inclusão social e da coleta seletiva e seu
processo de informação e divulgando também a educação ambiental na
Faculdade. Este evento consistiu da apresentação, para os alunos calouros.
Foram em dois momentos, um no início do primeiro semestre e do segundo
semestre letivo, de 2009-2012.
p) Participação no Portas Abertas (recepção de alunos do ensino médio): aconteceu
com apresentação do Projeto através de banner e exposição de material gráfico,
visual, fotos do mesmo durante o dia do evento pela Coordenação e bolsista.
q) Participação no Salão de Extensão da UFRGS: com apresentação de trabalho e
pôster 2003-2011, ou outros eventos externos a Universidade que possam dar
visibilidade ao Projeto de Extensão.
A partir de 2004 a Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação implantou
o sistema de coleta seletiva e um amplo trabalho de motivação, conscientização e
motivação para sua comunidade. Esta ação é permanente e segue os princípios da
educação ambiental e a regra dos 3Rs: reduzir, reaproveitar e reciclar. Como este
processo está sempre se renovando e é uma prática que trabalha com um segmento
muito heterogêneo. Foram feitas capacitações para funcionarias da limpeza da
49
Faculdade e levando em conta o modelo de coleta seletiva adotada pela UFRGS e
os objetivos não só de melhoria ambiental como da doação dos resíduos para o
Galpão ATUT.
Nosso sistema baseava-se no que consumíamos e o que poderíamos
descartar de material reciclável como papel, plástico e metal. Para tal, foi elaborada
uma pesquisa, aplicada à comunidade da Faculdade e também um processo de
observação antes da implantação. Foi implantado um sistema com estes três tipos
de materiais recicláveis, observados nas lixeiras da Faculdade, com lixeiras
adequadas pela cor de recebimento. As funcionárias da limpeza desde então foram
ensinadas a fazer a coleta do material reciclável e encaminhá-lo para a Associação.
Então notamos que a Faculdade tem um valor em torno de 500 kg de material
reciclável, para doação para Associação. Este dado é coletado através da pesagem
do material reciclável da Faculdade ao chegar no Galpão. A qualidade do material
reciclável também é notada como de boa qualidade. A Faculdade se compromete a
descartar, através de envio, um material reciclável de boa qualidade, sem muita
contaminação. A contaminação está no caráter da aparência do material reciclável,
molhado, engordurado, com produto orgânico, amassado. Este tipo de material não
é passível de ser aproveitado para reciclagem, ele retorna ao lixo doméstico e sendo
reencaminhado ao aterro sanitário. Ao chegar no Galpão junto com um bom material
reciclável, ele pode contaminá-lo.
O Projeto de Extensão sempre se preocupou com o perfil dos associados,
sua origem, para poder contemplar ao máximo a maioria dos associados, com suas
atividades. Este Galpão é uma Associação com trabalhadores da Unidade de
triagem do Hospital São Pedro (ATUT), faz parte do Projeto São Pedro Cidadão e
busca a reinserção social (reabilitação) e econômica dos pacientes do Hospital São
Pedro e moradores da comunidade da vila São Pedro, exclusivamente até o ano de
2009. O Projeto São Pedro Cidadão visou reformular o atendimento psiquiátrico no
Rio Grande do Sul, reinserindo, gradativamente, o paciente na sociedade. Visou
modificar a abordagem dada a pessoas com doença mental, atendendo às diretrizes
da Lei da Reforma Psiquiátrica 9.715/92, que prevê a substituição gradativa dos
leitos psiquiátricos moradia, por leitos em hospitais gerais e o engajamento dos
usuários à sociedade. Mesmo tentando atender o número de associados em
quantidade de igualdade, o Galpão desde 2008 apresenta um novo perfil de
associados. Não mais mantendo a capacidade de trabalho com metade de
50
associados com doença mental e a outra parte com moradores da vila São Pedro.
Os associados oriundos da vila começam a se retirar do Galpão, por diversos
fatores entre os quais, motivos pessoais, como pouca integração com os pacientes,
novas oportunidades de trabalho, indisciplina e faltas ao trabalho.
[...] Este relacionamento com as pessoas consideradas ditas normais e com
os pacientes do hospital na prática que a gente viu que fora aquele discurso
que todo mundo alimenta de integração inclusão e de por ai vai a gente
observa que de tanto de uma parte do grupo como da outra existe uma
resistência. As pessoas tem uma tendência a se enxergar por exemplos as
pessoas de se enxergar como iguais. (Membro da Equipe Técnica nº 01)
Com a evasão dos associados, e dos moradores da comunidade, abrem-se
novos postos de trabalho. A Equipe Técnica que acompanha o Galpão abriu vagas
para outras instituições que acolhem pessoas com doença mental sendo do Estado,
ou de albergues. Estes locais apenas recebem as pessoas por um tempo restrito,
como uma casa de passagem. Com isto o perfil da Associação modificou-se e os
desafios mudaram em relação às necessidades do Galpão quanto à integração,
respeito e a efetivação das atividades, maior sentido terapêutico, remuneração e
inclusão social.
[...] Inicialmente o projeto começou com as pessoas do clube da amizade é
um serviço de convivência do próprio hospital e depois progressivamente foi
se ampliando este perímetro então a gente tem pacientes que moram nos
abrigos da prefeitura, nos caps. são centro de atendimento psicossocial,
ambulatório do hospital e alguns pacientes do hospital, porque o projeto está
focado em atender o publico que não mora no hospital então esta é a
caracterização do grupo e tem algumas pessoas que moram na vila São
Pedro nas residências terapêuticas e alguns pacientes do hospital residem.
(Membro da Equipe Técnica nº 1).
O Projeto tem o entendimento que durante estes nove anos de atividades,
convivência com este Galpão e seus associados, percebeu-se que eles conseguem
atingir um bom grau de superação de seus problemas psíquicos, uns mais, outros
menos, outros nenhum, chegando ao desligamento da Associação. Mas também
observamos que os associados diante de novos desafios em relação à condição da
doença mental vem demonstrando pleno conhecimento e discernimento quanto à
importância de sua atividade para sociedade e para a conservação do meio
ambiente na questão de triagem de material reciclável.
51
4.2 APOIO E PARCERIAS
Os parceiros e apoiadores são empresas públicas e privadas que
contribuem com resíduos, patrocínios, material gráfico, doações nas campanhas que
possa ser utilizadas na ação de extensão, com as quais a ATUT celebra convênios.
4.3 METODOLOGIA
Conjuntamente a Coordenação, Equipe Técnica da Associação do Galpão
da ATUT (Coordenadora, Psicólogo e Terapeuta Ocupacional) e o bolsista de
extensão traçam a metodologia para sedimentar a política de atuação e captação de
novas parcerias para a Associação. Essa metodologia pressupõe o processo de
abordagem da ação feita pelos alunos universitários envolvidos deve sempre ocorrer
através
de
uma
perspectiva
da
comunicação,
buscando
informações
e
fundamentando a prática na realidade dos principais envolvidos, os associados da
ATUT, como atuantes com estes e não para estes. Com isto os conhecimentos e o
aprendizado na área de comunicação e da educação ambiental são lhes oferecidos,
sendo que eles próprios estudam e resolvem pelo que deverão querer – “tomam
suas decisões” (KAUFMANN, 2010).
A política da ação de extensão busca o autoconhecimento e a emancipação
comunitária, definida na bibliografia consultada para o desenvolvimento do Projeto e
a seleção de métodos e técnicas de pesquisa, planejamento e execução das
atividades. São feitas, ainda, reuniões periodicamente com a Coordenação e com a
Equipe Técnica do Galpão.
O objetivo da assessoria é desenvolver e manter um processo de
comunicação entre a ATUT e os diversos segmentos sociais, visando implementar o
apoio de outras instituições à integração social ao grupo de trabalhadores da ATUT.
Além disso, o Projeto de Extensão pretende firmar convênios para a captação de
materiais recicláveis e de recursos financeiros a fim de proporcionar a melhoria de
suas condições de trabalho. Os instrumentos de comunicação interna e externa são
aprimorados com o estabelecimento de redes e fluxos de comunicação com a
comunidade, através da divulgação das atividades e das necessidades dos
componentes da ATUT (KAUFMANN, 2010).
52
Com o ingresso do Projeto de Extensão na Gestão Ambiental proposta pela
Universidade, através da Coordenadoria de Gestão Ambiental e com a Medida
Provisória da Presidência da República e adoção da Portaria Normativa de nº 345,
de setembro de 2008, relativas à necessidade de descarte dos materiais recicláveis
e adoção de uma cooperativa, associação ou catadores como receptores, são feitas
modificações no segundo semestre do ano de 2008. O padrão estabelecido pela
Gestão Ambiental para a Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação Social da
UFRGS, com a sinalização de
RECICLÁVEL = SACO PRETO.
RESÍDUO RECICLÁVEL = SACO AZUL E RESÍDUO NÃO
Foram aproveitadas as lixeiras coletoras já existentes na
Faculdade, mas adaptadas para o padrão. Foram agregadas as novas lixeiras. Fezse nova identificação visual para a comunidade através de folder e cartazes afixados
nos murais da Faculdade. Realizaram-se, reuniões motivadoras para as funcionárias
da limpeza da Faculdade explicando o novo padrão e ressaltando a importância do
trabalho delas junto ao Projeto.
Dentro das ações da Gestão Ambiental o Projeto promoveu capacitação
permanente para as funcionárias da limpeza da Faculdade quanto à mobilização e
conscientização em relação ao sistema de Gestão Ambiental da Universidade e,
especificamente, como proceder a respeito da coleta seletiva. Elas foram visitar o
Galpão de reciclagem e vivenciaram o trabalho dos associados da ATUT, para que
pudessem conhecer o caminho final dos materiais recicláveis por eles recolhidos e
acondicionados na Faculdade. O resultado foi excelente. Saíram da capacitação
motivadas e quando voltaram da visitação à ATUT, estavam visivelmente
sensibilizados por participarem da rede UFRGS/ATUT. Esta atividade é permanente,
através de telefonemas, contatos pessoais, sempre na busca de tirar dúvidas e
contribuir para a melhoria da coleta seletiva dentro do Campus da Saúde da
UFRGS, através da ação coletiva dos agentes ambientais. Com estas ações de
seminários, visitações e envolvimento, as funcionárias da limpeza com a Associação
ATUT puderam efetivar a parceria de doação dos materiais recicláveis do Campus
da Saúde para a ATUT (VANZELLOTTI, 2011).
Outra atividade que o Projeto mantém são as oficinas de coleta seletiva,
levando ao público interessado as formas de separação do material reciclável, d e
como podemos, já em nossas casas, enviar um material reciclável melhor, de
qualidade boa. O Projeto sempre contou com novidades em relação às novas
tecnologias que estão à disposição no mercado e também com a colaboração de
53
informações do Galpão de Reciclagem. Acrescente-se a isso a Campanha da
Compostagem na FABICO, como projeto piloto da Gestão Ambiental, lançada no
Campus da Saúde.
Finalizando, o Projeto de Extensão tem vasta participação na atuação do
Galpão de reciclagem. Kaufmann (2010) descreve, na sua Dissertação de Mestrado
que o Projeto de Extensão tornou-se de caráter permanente não só pela sua
característica de assessoria, mas pela importância do assunto reciclagem, galpões
de reciclagem, a possibilidade de inclusão social através da prática de triagem de
material reciclável para o nosso país e também para a preservação do meio
ambiente como um todo dando ênfase à educação ambiental. Constitui este Projeto
uma teia de relações, em constante interação, como vê as ciências naturais
contemporânea. Os seres vivos que interagem deixam de serem apenas objetos.
Eles se fazem sujeitos, sempre relacionados e interconectados, formando um
complexo sistema de inter-retro-relações. O universo é, portanto, o conjunto das
relações dos sujeitos (BOFF, 1999).
Latour (2004) apresenta o conceito de tecnociência para entendermos
melhor o impacto da integração da tecnologia com a ciência e as implicações do
saber poder sobre a natureza. Sabemos assim que atualmente o processo de
reciclagem é uma das saídas para os problemas ambientais, pois gera um produto
vindo do lixo (material reciclável) e ao mesmo tempo promove o saneamento de
nossas cidades, limpando e diminuindo a necessidade de novos aterros sanitários.
Segundo Krieger (2006), define-se a palavra lixo como restos das atividades
humanas, considerado como inúteis, indesejáveis ou descartáveis no estado sólido,
semissólido ou semilíquidos. Ainda Krieger (2006) define os resíduos comuns como
resíduos sólidos que podem ter sua disposição final sem precisar passar por
tratamento, manipulação e ou transportes especiais. Atualmente os resíduos sólidos
ainda são subdividimos em orgânicos e recicláveis. Nos resíduos sólidos orgânicos
encontramos restos de comida, frutas e verduras, que não poderão ser
reaproveitados
e
reciclados.
Os
resíduos
sólidos
recicláveis,
podem
ser
reaproveitados, separados, triados e encaminhados à indústria da reciclagem,
através das cooperativas e associações de unidades de triagem e catadores de lixo.
Ainda a palavra lixo nos remete a pensar que dele nada podemos retirar
para aproveitar ou reciclar. A reciclagem é um pensamento contemporâneo, pois
sempre fomos ensinados a descartar bem longe de nossas vistas aquilo que não
54
nos serve mais, sem utilidade, nas latas de lixo, sem nem pensar que muitos
materiais poderiam ser reutilizados, reciclados. Hoje temos infindáveis utilizações
para diversos materiais recicláveis, provocando a sociedade a separar seu lixo e
descartar corretamente, através da coleta seletiva.
55
5 O PERFIL DOS ASSOCIADOS E SEUS LOCAIS DE ORIGEM
5.1 O PERFIL
Trago um perfil dos associados, levando em conta a origem de
encaminhamento, escolaridade, sexo, idade, e o tipo de doença mental que os
associados apresentam ao ingressarem no Galpão para iniciar suas atividades. Na
sua maioria são do sexo masculino, integrando a força de trabalho, mas há também
um significativo número de mulheres, que fazem a separação minuciosa do tipo de
material reciclável. A idade dos associados está entre 30 a 50 anos, uma faixa etária
de bom desempenho nas atividades. A escolaridade é baixa, com o primeiro grau
incompleto, provando-se que no campo do mercado de trabalho eles têm muito
pouca probabilidade de conseguir um local fora do Galpão considerando o
complicador da doença mental. Há associados que possuem o ensino médio
incompleto, mas não se mostraram muito interessados em terminar os seus estudos
para terem uma perspectiva melhor de trabalho. Uma parte dos associados não se
sente confortável em trabalhar no Galpão de reciclagem.
[...] Eu não poderia dizer que gosto, mas também não poderia dizer que
gosto. [...] é um trabalho! Que me satisfaz [...] como vou te explicar eu não
tenho orgulho de trabalhar com o lixo [...] eu não tenho até acho que quase
ninguém aqui tem [...] Até quando me perguntam sobre o meu trabalho eu
tenho vergonha de falar [...] mas eu falo que trabalho com reciclagem, [...]
material reciclável, mas eu tenho orgulho. (Paciente nº 17)
Outro paciente dá seu testemunho sobre a atividade do Galpão.
[...] Só pelo trabalho, não acho bom trabalho com o lixo, mas (Paciente nº
06).
É compreensível
que
esses
recicladores
em
melhor condição de
escolaridade são os mais críticos em relação à condição do trabalho do reciclador,
mas não vislumbram uma mudança em suas vidas. Tomam o trabalho de reciclador
somente por um trabalho qualquer e seu ganho no final do mês. Ainda encontramos
associados com o segundo grau completo e com uma intenção de fazer um curso
superior, mas onde a doença mental o impossibilita.
56
O perfil do associado então é uma pessoa de jovem; tanto do sexo
masculino como do sexo feminino, com baixa escolaridade, mas que gosta do
trabalho que desenvolve, alguns orgulham-se de ser um associado reciclador.
[...] Eu to bem satisfeita com que eu faço aqui no galpão, adoro! Depois que
eu vim para cá eu melhorei bastante meus amigos disseram que eu fiquei
melhor e a minha família também acham que eu melhorei a minha mãe fala,
não imaginei que a [...] (Paciente nº 04) ia ter um futuro, ia ficar bem uma
menina trabalhadora ela tá indo por ela, faz as coisas valeu a pena. E eu
gosto mesmo quando está chovendo eu venho, não gosto de faltar eu vou o
compromisso é meu a gente pega o compromisso tem que cumprir. (Paciente
nº 04)
Apresenta-se também o testemunho de uma moradora da Comunidade:
[...] Eu só saio daqui quando não der mais, eu acho gratificante trabalhar aqui,
e também o que mudou a minha vida quase dez anos de trabalho, eu antes
trabalhava muito de faxina e faxina um dia tem outro está chovendo já não
tem mais é difícil então foi onde eu fui conquistando a maioria das minhas
coisas que eu tenho hoje foi o tempo de trabalho que eu tenho aqui na ATUT.
Abri conta em loja, no banco então eu tenho um bom nome no mercado, mas
graças ao meu trabalho na ATUT. A gente é cliente do Banrisul eu e outras
pessoas daqui vários anos eu não estou só aqui pelo dinheiro, mas pelas
portas que me abriram. (Moradora da Comunidade nº 03)
Esta é a força de trabalho dos associados atualmente, num percentual de
90% que são doentes mentais na busca da reabilitação e de uma inclusão social.
Buscam isso através de uma atividade permanente de triagem, que o Galpão
oferece, sem que o indivíduo deva ter a necessidade de uma melhor capacitação e
escolaridade.
5.2 LOCAIS DE ORIGEM
A procedência dos associados da ATUT é variada. Parte é constituída de
pacientes vindos do Hospital São Pedro, outros vem de instituições de atendimento
psicossocial em período de adaptação.
57
5.2.1 Hospital São Pedro
O Hospital São Pedro, inaugurado em 29 de junho de 1884, com o nome
Hospício São Pedro (homenagem ao santo do dia e padroeiro da Província) foi o
primeiro hospital psiquiátrico de Porto Alegre e da então Província de São Pedro.
(CHEUICHE, 2004). Sua construção, de expressão imperial, foi estimulada pela
filantropia, constituindo-se, no final do século XIX, no maior espaço de cunho social
da Província.
Os doentes mentais foram um dos segmentos sociais excluídos dos padrões
de comportamento eleitos pela sociedade, até a fundação do Hospício e eram
alojados em uma ala especial da Santa Casa de Porto Alegre. Como o número de
insanos, como eram chamados os doentes mentais na época provenientes das mais
diversas regiões da Província, crescia consideravelmente, foi necessário que os
recolhessem à Cadeia Civil. A conduta que apresentavam tranquilos ou agitados era
um dos critérios que definiam o local de internação.
Conta o historiador Cheuiche (2004) que uma circular imperial, em meados
do século XIX, definia os hospitais e as casas de caridade das províncias como as
instituições responsáveis pela administração da loucura, acabando com a
possibilidade de enviar os insanos para o Hospício D. Pedro II, no Rio de Janeiro.
Urgia um local ímpar para os alienados, outro termo empregado para definir os
doentes mentais nessa época. O projeto de construção do Hospício fez parte do
processo de saneamento social da cidade, deslocando para o subúrbio todos os que
apresentassem algum desvio de conduta. O procedimento indolente era impróprio às
exigências de produção da emergente sociedade moderna. A urbe, normatizadora,
vista como espaço de opulência, previsibilidade e disciplina, era destinado aos
grupos sociais judiciosos, que definiam os padrões racionais de comportamento. É
nesse meio de racionalidade que a loucura foi considerada uma ameaça, devendo
ser silenciada e isolada através do encarceramento físico, longe do espaço público.
Segundo Cheuiche (2004), os hospitais psiquiátricos no Brasil surgiram no
final do século XIX, profundamente influenciados pela psiquiatria francesa e pelo
tratamento moral. O primeiro foi o Asilo Pedro II, no Rio de Janeiro fundado em
1853. Cheuiche (2004) fala que as atividades de ensino neste Hospital tiveram início
em 1908, incentivadas por seu Diretor Dr. Deoclécio Pereira, para os alunos da
Faculdade de Medicina, que atualmente faz parte da UFRGS. Posteriormente, em
58
1926, inicia-se a grande fase de pesquisas no Hospital, instituída por seu Diretor Dr.
Jacyntho Godoy.
É nesse contexto histórico que se encontra o doente mental hospitalizado,
agora sujeito de estudo. Tratava-se de uma população específica, com perda da sua
autonomia e vulnerabilidade não só em decorrência da própria doença que os
afetava, mas também pela situação de abandono que muitas vezes se encontravam.
Existe uma dificuldade, muitas vezes de rechaço para tê-los dentro do meio familiar.
Dentro da perspectiva histórica, Cheuiche (2004) diz que esses indivíduos foram
institucionalizados, com famílias omissas, em situação de abandono. Esse quadro
colocava os doentes numa realidade diferente, permissiva para pesquisas diversas.
Muitas formas de tratamento e inovações foram introduzidas nessa época tais como
Insulinoterapia de Sakel, eletroconvulsoterapia de Ugo Cerletti, entre outros métodos
de tratamento. A fundamentação teórica para estes procedimentos caracterizava-se
por uma desmontagem da estrutura psíquica que proporcionaria uma reconstrução
sadia. Foram marcantes os trabalhos do Dr. J. Godoy no combate à paralisia geral
progressiva, de origem sifilítica, tratada pela aplicação de arsênico e bismuto.
Descoberta pelo austríaco, Professor Wagner Von Jaureg, a malarioterapia, foi
introduzida pela primeira vez no Brasil, no Hospital São Pedro, com grande sucesso.
O historiador relata que o local escolhido para a construção do prédio
destinado à loucura, na “Estrada do Mato Grosso” (atual Avenida Bento Gonçalves),
no Arraial do Partenon, arrabalde da cidade, invocava explicitamente a necessidade
de um ambiente próprio ao tratamento terapêutico e implicitamente a exclusão
social. A chácara adquirida para a edificação do Hospício tinha 38,5 hectares. A
Fazenda Provincial, autorizada pela Lei Provincial 1.220, de 16 de maio de 1879,
comprou o espaço da viúva Maria Clara Rabello por 25 contos de réis. A comissão
responsável pela administração da obra, nomeada pelo Presidente da Província,
Carlos Thompson Flores, em novembro de 1879, foi presidida pelo Provedor da
Santa Casa, Antonio Coelho Junior. Os recursos para custear o empreendimento
foram bancados, principalmente, por doações de filantropos e pelas rendas obtidas
com as extrações de Loterias da Província, conforme a Lei Provincial 944, de 13 de
maio de 1874 (CHEUICHE, 2004).
Com somente um dos pavilhões prontos, o ato de fundação do Hospício foi
comemorado com ostentação, na presença das autoridades e da imprensa de Porto
Alegre. O incremento das internações e o abandono dos pacientes por seus
59
responsáveis estimularam o término da construção do Hospício São Pedro, que só
veio acontecer em 1903. Insólito por sua magnitude à época, o prédio, idealizado em
planta por Álvaro Nunes Pereira, foi menção de cartão postal de Porto Alegre na
primeira década do século vinte (CHEUICHE, 2004).
Conforme o Regulamento do Hospício São Pedro de 1884, estabelecido pelo
Presidente da Província, José Júlio de Albuquerque Barros, a nova Instituição foi
gerida pela Mesa Administrativa da Santa Casa de Misericórdia, que teve no seu
Provedor, Joaquim José Salgado, a figura principal da estrutura organizacional do
Hospício. Com a República, por decisão de governo, o Hospício São Pedro separouse
da
Santa
Casa
e
ficou
subordinado
à
Secretaria
do
Interior
e
Exterior (CHEUICHE, 2004).
Com a intervenção estatal, os médicos, que atuaram no Hospício como Dr.
Carlos Lisboa, seu único representante na primeira administração da Instituição,
como Diretor do Serviço Sanitário do asilo de alienados, assumiram efetivamente a
Direção-Geral do Hospício São Pedro. Um novo Regulamento do Hospício foi
elaborado, desta vez sob a égide de um médico, o Dr. Francisco de Paula Dias de
Castro, nomeado Diretor do Hospício São Pedro pelo governo republicano do
Estado do Rio Grande do Sul.
Cerca de uma década após a inauguração, por sugestão de Júlio de
Castilhos e apoiado por uma campanha do jornal A Federação, a Companhia Carris
Urbanus, com bondes de tração animal, fixou seu terminal em frente ao Hospício
São Pedro. Esta circunstância, além de estreitar o elo do espaço urbano ao espaço
elegido à loucura, facilitou a aproximação dos sociáveis cordatos aos confinados
insanos. É nesse período que o discurso psiquiátrico e os novos recursos
terapêuticos, de avançada tecnologia à época, foram efetivamente instalados no
âmbito do Hospital São Pedro. Incluso no conjunto do Hospital Psiquiátrico São
Pedro, cuja área de 13,9 hectares. Inclui 43.710 m 2 de área edificada, o prédio
histórico do São Pedro está tombado pelos poderes públicos, estadual e municipal.
Com 12.324 m2 de área construída, o conjunto arquitetônico é composto por seis
pavilhões, com dois pavimentos, voltado para o sul. São ligados transversalmente
por um pavilhão na direção leste-oeste. Com linhas ecléticas, predomina a
arquitetura neoclássica (CHEUICHE, 2004).
60
Um fato relevante na década de 1960 aconteceu uma superlotação no
Hospital Psiquiátrico São Pedro, chegando ao número de 5.000 pacientes
internados. Certamente um vasto campo para os pesquisadores da época.
O grande problema para a realização de pesquisas em hospitais
psiquiátricos é a questão da autonomia do doente mental. O resgate desta
capacidade é uma das metas do tratamento de cada usuário, devendo o tratamento
instituído direcionar-se no sentido de buscá-la dentro das melhores possibilidades.
No caso de incapacidade do paciente, um familiar assumirá esta responsabilidade e
o representará defendendo os seus melhores interesses. Caso não haja um familiar
que assuma este papel, quem responde pelo paciente é um tutor legal ou ainda o
Diretor do Hospital (LOPES, 1983).
A doença mental, dentre todas as doenças, é a mais provável de afetar a
competência do paciente para tomada de decisões, sendo de particular interesse
para o psiquiatra e a pesquisa nesta área. Esses pacientes quando são internados
frequentemente se mostram incapazes de decidir sobre o consentimento, quadro
que pode ser revertido depois que melhoram (LOPES,1983).
O cenário contemporâneo dos processos de gestão no campo da saúde
mental, balizados pelas diretrizes da Lei da Reforma Psiquiátrica n. 9.715 de 1992,
apontou para ações multifacetadas no sentido da inclusão social do paciente doente
mental, ações que vão da substituição gradativa dos leitos psiquiátricos por leitos em
hospitais gerais até a efetiva constituição de uma Rede de Atenção Integral à Saúde
Mental, incluindo a implantação de projetos de geração de trabalho e renda que
permitam resgatar a credibilidade do usuário. A trajetória do Hospital sintetiza essa
disposição, porém inovando no sentido da inclusão conjunta deste público com
outro, moradores de uma comunidade vizinha ao hospital, que apresenta forte grau
de precarização e dificuldade de inserção no mercado (LOPES, 1983).
A desinstitucionalização, a partir da Reforma Psiquiátrica como processo
social complexo no Hospital São Pedro, implicou não somente na transformação de
técnicas e terapêuticas, mas sim dos atores sociais envolvidos incluídos os próprios
usuários, familiares e técnicos deste Hospital.
Ainda Lopes (1983) relata as diferenças no sentido de provocar as rupturas
do que estava instituído dentro das pessoas. Assim criou-se um processo de
transição em que nos espaços da cidade voltaram a circular livremente. Deste
evento surgiu o impacto da diferença, a desistitucionalização, que marcou a saída de
61
pessoas doentes mentais do lugar previsível como hospitais manicômios para o
cotidiano. Ela ainda afirma que houve reflexões e mais ainda a formulação de um
novo desafio.
Após o advento da Reforma Psiquiátrica adotada no Brasil, sabe-se que os
doentes mentais não moram mais nos hospitais, que outrora os recebia como
moradia e local de tratamento. Atualmente poucos estão na condição de morador no
Hospital São Pedro, em torno de 130 pacientes. Na sua maioria não possuem dados
que possam encaminhá-los às suas famílias, estão em situação de abandono, são
idosos e sem possibilidade de reabilitação mental pelos recursos da medicina atual.
Para tal o Estado hoje mantém locais onde os doentes mentais possam conviver, ter
uma ocupação, serem cuidados, uma vez fora do hospital moradia (LOPES, 1983).
A prefeitura de Porto Alegre dispõe um bom número de abrigos e pensões
públicas protegidas que recebem os doentes mentais em fase de reabilitação.
São muitas as doenças que trouxeram estes indivíduos para uma internação
no Hospital São Pedro, como esquizofrenia, bipolaridade, dependência química,
deficiência mental, associados a maus tratos, abandono, abuso sexual de familiares,
histórias de vida envolvendo muito sofrimento e dor que desencadeiam um processo
de sofrimento mental, denominado “doença mental”.
[...] A gente costuma fazer uma avaliação com três critérios: o emocional,
psiquiátrico, sujeito não pode estar agressivo, com alucinações nem delirante.
Nem com alucinação; o critério ocupacional que é as condições de trabalho
que a pessoa apresenta e o critério social, necessidades que a pessoa tem.
Todos estes critérios são entrecruzados e bem elásticos, estou falando de
uma tolerância bem elástica. (Membro da Equipe Técnica nº 1)
O doente já demonstrando uma estabilidade e uma possibilidade de produzir
através de uma atividade ou trabalho é encaminhando ao Galpão de reciclagem,
ATUT, tornando-se um reciclador(a). Existem locais especializados que encaminham
possíveis recicladores ao Galpão. Após o encaminhamento e entrevista com a
Equipe Técnica do Galpão e a existência de vaga, será um associado, em período
de experiência, antes de se tornar um associado reciclador.
No próprio Hospital São Pedro encontramos o Clube da Amizade que
encaminha indivíduos que possam fazer parte do Galpão.
1 - Clube da amizade: situa-se nas dependências do Hospital São Pedro.
Funciona nas segundas-feiras e nas quintas-feiras, sempre no turno da tarde. É um
62
espaço de ressocialização e reabilitação psicossocial. Este clube é o resultado da
intervenção da residente de Educação Artística (Programa de Residência Integrada
em Saúde Mental Coletiva/Escola de Saúde Pública/Hospital Psiquiátrico São
Pedro/RS). Neste espaço ocorre a reabilitação e reinserção social de pacientes
egressos de hospitais psiquiátricos e de outros serviços de saúde mental (MEYER,
2008).
Vem daí muitos sócios que trabalham na Associação dos Trabalhadores da
Unidade de Triagem (ATUT), Associação de reciclagem de materiais recicláveis
(papel, metal, plástico, vidro e sucatas), com a opção pela confecção de artesanato.
Através de materiais reaproveitáveis foi estimulado outro olhar para o que era
considerado lixo. Durante as atividades artísticas, a gradativa apropriação das
técnicas e materiais ofertados, resultou em soluções criativas e no interesse pela
comercialização dos produtos feitos, cuja renda reverteria para o próprio clube. O
resgate da autoestima e a ampliação dos vínculos foram consequências da proposta
desenvolvida. As atividades artísticas com pacientes doentes mentais e a Oficina de
Criatividade do Hospital é uma referência de espaço substitutivo existente a partir da
Reforma Psiquiátrica brasileira.
[...] Daí comecei a me tratar com o Dr. [...], ele me tratou, antes eu tomava
muito remédio, eu me tratava no CAps. Daí depois me tratar muito tempo o
Dr. [...] me mandou para o clube da amizade. É nas quintas feiras e na
segunda [...] tem a terapeuta ocupacional, doutor, outra T O [...] foi indo foi
indo [...] no inicio eu não queria ir [...] mas meus amigos me empurram para ir.
(Paciente nº 4)
[...] Vim do Clube da amizade. Quando era paciente e fui encaminhado para
trabalhar aqui. (Paciente nº 11)
O Clube da Amizade, segundo Membro da Equipe Técnica nº 02 (2011) é
uma Associação, sem fins lucrativos, fundada em 1975, antes da Reforma
Psiquiátrica (Lei n. 9.715/92), aliado ao processo de desinstitucionalização. Entre
seus principais objetivos estão: desenvolver no associado aspectos sadios da
personalidade; estimular a progressiva autonomia dos sócios; prevenir a ocorrência
de reincidências de novas internações; promover a integração grupal estimulando a
participação dos sócios nas diversas atividades; oportunizar padrões mais sadios de
relacionamento entre os associados, a família e a comunidade de acordo com suas
potencialidades; possibilitar ao associado o acesso aos recursos disponibilizados à
63
comunidade; proporcionar novas experiências positivas aos associados através da
execução de programas de qualificação profissional do trabalhador; incluir a pessoa
portadora de deficiência e/ou sofrimento psíquico no mercado de trabalho através da
educação, do resgate de conhecimentos tradicionais, do artesanato, do saber
científico, da democratização e acesso à tecnologia de informação; promover a
ética, a paz, a cidadania, os direitos humanos, a democracia e outros valores
universais; promover a amizade e através dela procurar meios saudáveis de
convivência social troca de experiências, apoio afetivo e técnico.
O Membro da Equipe Técnica nº 02 (2011) também diz que o Clube da
Amizade se caracteriza por ser um grupo operativo centrado em tarefas diversas
dirigidas pelos coordenadores. O grupo operativo é um grupo que tem por finalidade
aprender a pensar em termos da resolução das dificuldades criadas e manifestadas
no campo grupal, e não no campo individual de cada integrante, e não está somente
centrado no grupo, mas na tarefa que se opera em duas dimensões.
Em 2007 a equipe técnica do Clube era composta por uma Psicóloga, uma
estagiária de Psicologia, uma residente de Artes Plásticas, um Educador Físico e
uma voluntária de arte terapia. Esta equipe funcionou como suporte, estimulando a
participação dos sócios nas diversas atividades e assessorando a diretoria e demais
membros do Clube. Meyer (2008) explica que os encontros aconteciam todas as
segundas das 13h30 às 16h, na sua sede, que fica no piso inferior do prédio do
Ambulatório Melanie Klein e, nas quintas-feiras, no ginásio de esportes do Hospital,
o Gigantinho. Nas segundas-feiras compareciam ao Clube, em média, 20 sócios.
São pessoas com diagnósticos diferenciados, sendo predominante a esquizofrenia,
depois transtornos de ansiedade, bipolaridade e outros.
Alguns sócios já faziam parte do Clube há muitos anos, outros haviam
entrado para o Clube mais recentemente.
No período, além das atividades administrativas (reuniões da diretoria, do
conselho fiscal, assembleias ordinárias e eleições) eram desenvolvidas atividades
culturais (visitas a exposições, museus, feiras e outros), físicas (ginástica localizada
e alongamentos, jogos recreativos, caminhadas e oficina de autocuidado), sociais
(festas comemorativas, passeios na cidade e outros municípios e visitas domiciliares
aos sócios e familiares), oficinas (jardinagem, culinária, tricot e crochet, costura, arte,
artesanato e teatro). A prática de atividades artísticas, segundo relato dos sócios era
64
prática que dependia, para acontecer, da presença de um monitor qualificado
(MEYER, 2008).
O Clube da Amizade pode criar oportunidades de formação, capacitação e
inclusão social. Ele não foi pensado como um espaço de geração de renda, para
resolver problemas
econômicos dos sócios, até mesmo porque a renda
movimentada era insuficiente para ser considerada uma forma de subsistência. O
fator econômico foi apenas uma das vertentes, pois o que se buscou foi a inclusão
social, a descoberta de novas habilidades e reconhecimento. Meyer (2008) ainda
relata que foi feita proposta para que o paciente, fora do mercado produtivo, exilado
em suas relações sociais em função da sua doença, pudesse, em seu projeto de
tratamento, encontrar lugar cidadão, através do seu trabalho. As oficinas, lugar em
que arte e
artesanato se mesclaram
em trabalhos
diversos
envolvendo
processo/produtos, puderam, em alguma medida, modificar os sujeitos promovendo
reabilitação e cidadania. Ao facilitar o trânsito social, também facilitaram o convívio
familiar, bem como a inserção, como um trabalho produtivo possível. Neste sentido,
pensar em oficinas construtivas e inventivas, onde cada sujeito trabalha de acordo
com as suas possibilidades e potencialidades, favorece a reabilitação dos pacientes
(MEYER, 2008).
Membro da Equipe Técnica nº 02 (2011) relatou que muitos participantes do
Clube da Amizade foram ou são associados da ATUT. Tendo iniciado a socialização
lá no Clube, hoje são pertencentes de uma força de trabalho. Atualmente seis
integrantes na Associação fazem parte do Clube da Amizade. Quatro desses foram
entrevistados.
2 - Comunidade - Vila São Pedro: são os moradores da Vila São Pedro,
que se situa atrás do Hospital São Pedro. No início da Associação, em 2002, o
número de participantes moradores desta Vila era igual ao número de pacientes e
ex-pacientes do Hospital. Nascia assim uma possibilidade de experiência,
caracterizada como um elemento possível de construção e transformação social no
campo de saúde mental e como um dispositivo de sociabilidade, suporte mútuo e de
ação concreta no tecido social, na comunidade desta vila e do manicômio.
Caracterizou-se como uma alternativa de atenção e prevenção em saúde mental, de
possibilidade de desconstrução do manicômio junto à sociedade civil. A saída destes
associados, moradores da Vila, ocorreu por diversos motivos, como insatisfação,
trabalhar por conta (autônomo), gravidez, filhos pequenos, desavenças e brigas com
65
os pacientes, busca de uma alternativa de renda mensal. A Evasão maior ocorreu
nos últimos três anos.
Atualmente encontramos cinco moradores da Vila (comunidade), c omo
associados do Galpão. Três associados foram entrevistados, dos quais destacamos
dois:
[...] Eles estavam sem motorista e a minha filha vendeu a Kombi para eles. Eu
tava sem emprego e precisando de um serviço, eu vim trabalhar aqui.
(Morador nº 01)
[...] Eu desde o inicio o meu pensar é assim, tivemos algumas dificuldades no
inicio, né [...] como era o inicio da associação [...] dificuldade de material, eu
sou uma pessoa de pensamento bem positivo, porque não desisti [...] ampliar
o negocio, comprar uma prensa, ter uma picotadeira [...] com tempo ter uma
Kombi para associação, aumentar o número de associados [...] graças a Deus
deu certo [...] como é uma reciclagem especial, foi muito bem aproveitado
aquela ideia que eu tive. Eu me sinto muito bem. Eu não só estou aqui porque
eu recebo o meu dinheiro, eu estou aqui porque eu gosto de trabalhar eu
gosto do grupo ao todo. Eu não estou só aqui para coordenar mas também
para trabalhar,e numa harmonia, em paz do serviço. (Morador nº 03).
3 - A Morada São Pedro: Nos últimos anos, o Hospital São Pedro, vem
passando por um processo de desinstitucionalização e reabilitação psicossocial, que
contempla a reinserção psicológica e social dos doentes mentais. Muitas ações,
programas e serviços estão sendo realizados com este intuito, a destacar o Projeto
Morada São Pedro. Membro da Equipe Técnica nº 02 (2011) relata que O Projeto
Morada São Pedro propõe a construção de 36 Serviços Residenciais Terapêuticos
no território da Vila São Pedro, onde há cerca de 144 pessoas que se encontram
asiladas e em abandono familiar. Quanto aos espaços geográficos, aos territórios
habitáveis, a inserção destes novos moradores na comunidade da Vila está
garantida. O que não é visível e passa pela subjetividade é a interação social na
realidade da vida cotidiana. Membro da Equipe Técnica nº 01 (2011) afirma que o
processo de interação social entre os moradores da Vila São Pedro e dos doentes
mentais que são usuários do Hospital Psiquiátrico São Pedro a partir do
estabelecimento de uma intervenção junto a estes sujeitos, passa pela construção
da sua cidadania com os membros da comunidade da Vila que é o objetivo o Projeto
Morada São Pedro. Atualmente há dois associados nesta condição, sendo abrigados
pelo Projeto Morada, com sua integridade mantida, pela sua autogestão do seu
cotidiano, mas com a supervisão do Hospital.
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[...] Eu moro na morada São Pedro, moro sozinho. (Morador nº 14).
4 - Ambulatório Geral e Unidade Madre Matilde – É uma ala psiquiátrica
de moradores do Hospital. Ela fica nas dependências do Hospital São Pedro que
recebe pessoas procedentes de Viamão e de outras localidades fora da região
metropolitana. (MEMBRO DA EQUIPE TÉCNICA nº 02, 2011). Os pacientes que são
encaminhados pelos Técnicos do Hospital, são os que apresentam possibilidades de
manter um cotidiano e realizar tarefas dentro do Galpão. Há quatro associados
nessa situação:
[...] Lá na Morada eu morava com o [...] meu namorado [...] agora to aqui no
Madre Matilde (uma unidade do HSP) [...] sabe porque [...] eu botava o
remédio fora, eu escondia ele, botava atrás da cama, eu até fumava charuto
na morada, (risos) [...] Eu tenho vontade de ir para minha casa [...] botar uma
empregada. (Paciente nº 16).
5.2.2 Instituições de Atendimento Psicossocial
1 - CAPs e CAPs 8: são dois centros de atenção psicossocial que oferecem
atendimento à população para realizar o acompanhamento clínico e a reinserção
social dos usuários pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e
fortalecimento dos laços familiares e comunitários. Os centros entre todos os
dispositivos de atenção à saúde mental, têm valor estratégico para a Reforma
Psiquiátrica Brasileira. Com a criação desses centros, possibilita-se a organização
de uma rede substitutiva ao Hospital Psiquiátrico no país. Os CAPs são serviços de
saúde municipais, abertos, comunitários que oferecem atendimento diário. Estes
serviços devem ser substitutivos e não complementares ao Hospital Psiquiátrico. De
fato, o CAPs é o núcleo de uma nova clínica, produtora de autonomia, que convida o
usuário à responsabilização e ao protagonismo em toda a trajetória do seu
tratamento.
Os projetos desses serviços, muitas vezes, ultrapassam a própria estrutura
física, em busca da rede de suporte social, potencializadora de suas ações,
preocupando-se com o sujeito e a singularidade, sua história, sua cultura e sua vida
cotidiana.
O perfil populacional dos municípios é, sem dúvida, um dos principais
critérios para o planejamento da rede de atenção à saúde mental nas cidades, e
67
para a implantação de Centros. O critério populacional, no entanto, deve ser
compreendido apenas como um orientador para o planejamento das ações de
saúde. De fato, é o gestor local, articulado com as outras instâncias de gestão do
Sistema Único de Saúde, que terá as condições mais adequadas para definir os
equipamentos que melhor respondem às demandas de saúde mental de seu
município.
Segundo o Portal da Saúde (SUS), O CAPs dentre muitas das suas funções
estão: prestar atendimento clínico em regime de atenção diária, evitando as
internações em hospitais psiquiátricos; acolher e atender as pessoas com
transtornos mentais graves e persistentes, procurando preservar e fortalecer os
laços sociais do usuário em seu território; promover a inserção social das pessoas
com transtornos mentais por meio de ações intersetoriais; regular a porta de entrada
da rede de assistência em saúde mental na sua área de atuação; dar suporte à
atenção à saúde mental na rede básica; organizar a rede de atenção às pessoas
com transtornos mentais nos municípios; articular estrategicamente a rede e a
política de saúde mental num determinado território; promover a reinserção social do
indivíduo através do acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e
fortalecimento dos laços familiares e comunitários.
Muitos associados já foram encaminhados pelos CAPs, o Galpão conta com
seis associados, na atualidade.
[...] A gente se interna faz o tratamento aqui, e depois fui encaminhada para
cá [...] eu faço tratamento das drogas, sou dependente [...] eu vim do CAPs
Viamão e fiquei internada aqui. O meu irmão foi encaminhado, trabalhava
aqui, agora ele já não está mais daí, através dele eu conheci a Dona [...], e
ela me trouxe. (Paciente nº 07).
2 - Pensão Pública Protegida Nova Vida: é unidade da Secretaria
Municipal de Saúde (Prefeitura Municipal de Porto Alegre), que desde 1990 abriga e
dá tratamento gratuito às pessoas portadoras de distúrbios psíquicos. Recebe
pacientes de forma temporária, sem estabelecer tempo de permanência. O Portal da
Secretaria Municipal da Saúde de Porto Alegre informa que esse serviço é pioneiro
no Estado e no País no que se refere a residenciais terapêuticos, consolidando uma
proposta de atenção à saúde mental substitutiva ao modelo manicomial.
O Membro da Equipe Técnica nº 02 (2011) relata que entre muitas das
atividades de terapia ocupacional oferecidas pela Nova Vida estão oficinas: de
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culinária, atelier de arte, grupos de leitura e teatro. Trabalham na pensão três
psicólogos, terapeuta ocupacional, enfermeira, nutricionista, onze técnicos de
enfermagem, auxiliar de nutrição, duas cozinheiras, auxiliar de cozinha, três
auxiliares de limpeza, dois estagiários da secretaria, porteiros e estagiários de
psicologia.
Esta pensão iniciou suas atividades no ano de 1990, quando recebeu 53
usuários
provenientes
da Clínica Pinel,
de Porto Alegre,
que havia se
descredenciado do SUS. Com essa situação, os usuários não receberiam mais o
atendimento pelo sistema público de saúde. A partir de uma mobilização de
familiares, profissionais da saúde e políticos, foi possível encontrar um lugar para
abrigar essas pessoas. Firmou-se um convênio entre Estado e Município, onde a
administração ficou sob a responsabilidade da Secretaria de Saúde de Porto Alegre
e o prédio foi cedido pelo Estado. Desde essa data, a Pensão passou por
modificações tanto físicas como de funcionamento. O caráter de moradia tornou-se
temporário e iniciou-se um trabalho efetivo de reabilitação e reinserção social dessas
pessoas segundo Portal da Secretaria Municipal da Saúde de Porto Alegre (2011).
O referido o Portal, quando consultado em 2011, informou que conta com
três residenciais, com características específicas dividida em módulos. Um deles é a
Casa de Transição que já era um recurso existente desde 1995 onde ficam usuários
morando temporariamente com autonomia para autocuidado e cuidado com o
ambiente e vestimentas. Faz suas compras e administra seu benefício assistencial.
Recebe visitas da equipe itinerante uma vez por semana e sempre que necessita,
além deste horário, estipulado para a itinerância, vai até a Pensão Nova Vida. Outro
módulo é o Serviço Residencial Terapêutico Gomes Jardim, inaugurado em 2004,
para usuários com maior autonomia. Eles próprios cuidam do ambiente, do preparo
dos alimentos, das compras da semana, da lavagem de roupas, administram sua
medicação e circulam pela cidade de forma autônoma. Nesse residencial há uma
supervisão diária da equipe itinerante. O terceiro módulo é constituído de um
Residencial onde ficam os usuários com menor grau de autonomia, sendo
acompanhados
nas
atividades
da vida diária, como idas
ao banco,
ao
supermercado, à consultas médicas e odontológicas, de acordo com a demanda
específica de cada um. São estimulados a desenvolver autonomia, visando ao
processo de reabilitação e reinserção social. Em 2011 contava com 12 usuários e
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uma equipe multidisciplinar 24 horas, durante os sete dias da semana. O Galpão
está com sete associados encaminhados pela Pensão.
[...] Eu vim da pensão Nova Vida (Paciente nº 02).
3 - Abrigo Bom Jesus: albergue administrado pela Fundação de
Assistência Social e Cidadania (FASC), o Abrigo Municipal Bom Jesus promove
atendimento e auxílio aos moradores de rua para reorganização pessoal e social. Há
um associado procedente deste Abrigo.
4 - Oficina de Geração de Renda: são oficinas renda que ajudam na
reabilitação dos pacientes com doenças metais inserindo-os novamente no mundo
social. O Membro da Equipe Técnica nº 02 (2011) relata que a proposta atual de
oficinas sugere estratégias que buscam inserção dos pacientes, a partir de métodos
que capacitam os pacientes a criar, produzir e vender os produtos que desenvolvem.
Além disso, as oficinas são criadas para que os mesmos possam transformar suas
competências em fonte de renda. Tem um cunho social, sendo utilizada como
ferramenta de capacitação de pacientes com ou sem benefícios, para que eles
iniciem seu processo de crescimento e mobilidade social de forma prática e
autônoma O Galpão tem três integrantes desta Oficina como associados.
[...] Eu fui encaminhado pela geração de renda, e eles me enviaram aqui para
o São Pedro e para o Galpão. (Paciente nº03)
5 - Abrigo Marlene: O Abrigo Marlene está localizado na Av. Getúlio
Vargas, 40, em Porto Alegre, é o lar provisório de aproximadamente cem pessoas,
sendo oito famílias completas. É mantido pela Prefeitura, tem o objetivo de recuperar
e reintegrar os ex-moradores de rua, prepará-los para voltar à sociedade e a suas
famílias. Segundo o Membro da Equipe Técnica nº 02 (2011) esta entidade, que
existe desde 1995, oferece atendimento médico, serviço social e terapias
ocupacionais aos usuários, além de segurança e monitoramento. Trata-se não de
uma moradia permanente, mas de uma casa de passagem. Os moradores ficam no
abrigo por um tempo suficiente para se reerguer. No geral, entre 90 e 120
dias. Atualmente o Galpão tem um associado encaminhado pelo abrigo.
[...] encaminhou, do cais mental. Dra. [...]. E tava no abrigo Marlene [...]
(Paciente nº 12)
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6 - Cazon: é um Centro Abrigo Zona Norte, localizado na zona norte de
Porto Alegre. O Blog Voluntário do Rio Grande do Sul (2011) informa que ele é uma
das unidades da Fundação de Articulação e Desenvolvimento de Políticas para
pessoas com de deficiência e altas habilidades no RS (FADERS) que atende a
pessoas com deficiência mental e múltiplas deficiências. Recebe pessoas a partir de
18 anos oriundas de escolas especiais como a Associação dos Pais e Amigos dos
Excepcionais (APAE), Recanto da Alegria, Cristo Redentor, Escolas Municipais. O
Cazon tem uma equipe técnica formada por setores de supervisoras, pedagogas,
assistentes social, psicóloga. Possui diversas oficinas ocupacionais, bem como
oficinas de produção que em parceria com algumas empresas oportuniza estes
alunos desenvolver a importância do trabalho. O Galpão tem hoje um associado
encaminhado pelo CAZON. (MEMBRO DA EQUIPE TÉCNICA Nº 02, 2011).
7 - Abrigo Dias da Cruz: está nas dependências do Instituto Espírita Dias
da Cruz, na Avenida Azenha nº 366, esquina Avenida Ipiranga. A casa possui dois
pavilhões que integram o Albergue Noturno, com capacidade total para atender até
100 pessoas/noite, oferece banho, roupas, calçados, jantar e café da manhã aos
desabrigados. Alguns doentes mentais estão na condição de moradores de rua, por
impossibilidade de retorno familiar, ou história de vida, fuga, muitos motivos são
apresentados à Equipe Técnica do Galpão por ocasião da entrevista de
apresentação, para trabalhar no Galpão de reciclagem. O Galpão tinha um
associado encaminhado pelo Abrigo. (MEMBRO DA EQUIPE TÉCNICA Nº 01 E Nº
02, 2011).
[...] Eu fiquei sabendo quando eu sai lá da clínica e a minha família. O
albergue Dias da Cruz me encaminhou, lá na Farrapos [...] me informaram
que tinha trabalho, na reciclagem [...] (Paciente nº 14).
8 - Instituto Psiquiátrico Forense: O Instituto Psiquiátrico Forense
“Maurício Cardoso” (IPF) é um estabelecimento médico-penal da Rede Penitenciária
do Estado do Rio Grande do Sul, integrante da estrutura orgânica da
Superintendência dos Serviços Penitenciários (SUSEPE), da Secretaria de Justiça e
Segurança. O IPF cumpre funções periciais e assistenciais, além de atividades como
ensino e pesquisa. É o único local do Estado onde são realizados os laudos de
avaliação de Responsabilidade Penal, para avaliar se há ou não doença mental em
pessoas que tenham cometido delitos. Além disto, também é o órgão responsável
71
pela realização dos exames anuais de verificação da cessação de periculosidade,
pelos quais se registra se o interno apresentou melhora em suas condições mentais
que seja suficiente para permitir o retorno ao convívio social. É a Instituição na qual
são realizados todos os laudos de avaliação de dependência toxicológica do Estado.
Do ponto de vista assistencial, o Membro da Equipe Técnica nº 01 (2011)
relata que o IPF é o principal local para a internação, o tratamento e a
ressocialização das pessoas que praticaram delitos sob influência de doença mental,
e que receberam Medidas de Segurança, decretadas pela Justiça, através de
internações ou tratamento ambulatorial.
O IPF acolhe a todos os indivíduos sentenciados com Medidas de
Segurança de internação no Estado, bem como a maioria dos que recebem Medidas
de Segurança Ambulatoriais, presos com alta progressiva (AP) que podem fazer
alguma atividade fora do presídio. O Galpão está com três associados de origem do
IPF com Alta Progressiva. Esta parceria iniciou-se no ano de 2011. (Membro da
Equipe Técnica nº 01 (2011).
[...] Instituto Psiquiátrico Forense. Estou em alta progressiva. Eu sou paciente
ali do IPF, daí a TO, Dna. [...] do IPF falou com seu [...] (Membro da Equipe
Técnica nº 01) conseguiu. (Paciente nº 15. Alta Progressiva)
Com a descrição dos locais de origem de encaminhamento dos associados
do Galpão contata-se a sua diversidade, pois o Galpão atende um grupo mesclado
de pessoas com doenças mentais. O doente mental se encontra no processo de
reabilitação e de inclusão permanente. Existem inúmeras opções para os doentes
mentais, após um período de internação, estes locais servem de casa de passagem,
onde oferecem um acolhimento para quem não mais quer ou não tem uma família
responsável pelo doente mental. Na maioria, os entrevistados contam com sua
própria sorte e responsabilidade, não mais existindo o vínculo familiar. Por esta
razão, a existência desses locais é muito importante, pois se torna uma opção,
mesmo no momento da reabilitação, onde ocorre um evento psiquiátrico, de
acolhimento destas pessoas.
[...] Aquele ditado popular de que de louco todo mundo tem um pouco existe
um imaginário social de desqualificação das pessoas no momento que ela
tem algum transtorno psiquiátrico, tanto que eu pessoalmente não costumo
alterar a minha ação técnica pela questão zoonografica (sic.), que remete a
questão de equilíbrio por um manual técnico o diagnostico e tem pessoas que
72
até acham que eu não saberia dizer o que o sujeito tem [...] estão enganados,
eu tenho total compressão zoonografica (sic.) mas eu utilizo ela para
denominar as essas nem as situação senão a gente acaba reforçando esta
questão da desqualificação. Se fosse efetivamente uma analise das pessoas
normais que não passaram por uma avaliação psicológica ou psiquiátrica,
certamente a grande maiores das pessoas ditas normais teriam problemas
emocionais menores ou maiores então na pratica isto não tem uma diferença
e a gente acabou migrando estas vagas que eram do pessoal da comunidade
para as pessoas do hospital por uma necessidade mesmo estas pessoas
estão em fila de espera. A gente acha que é importante privilegiar no bom
sentido estas pessoas. É uma necessidade. (Membro da Equipe Técnica nº
01)
Seu tratamento passa por uma temporalidade mista, no sentido de conseguir
manter sua rotina de vida e de trabalho, mesmo que medicado. Muitas vezes isto
não acontece, e os episódios psiquiátricos retornam por motivos, até bem
corriqueiros. Podendo desencadear um surto ou um retorno à crise. Estas crises
muitas vezes podem provocar a saída do Galpão, como mostra o livro de
ocorrências diárias do mesmo. Ocorrendo então uma evasão e rodízio bem
significativo dos associados.
O panorama geral do Galpão no ano de 2011 era bem diferente do que foi
nos anos anteriores, porque hoje ele contava com cerca cinquenta associados. Com
dez associados interditados (Curatela) e cinco são moradores da comunidade,
sendo da Vila São Pedro, ainda trazendo o perfil original do Galpão.
[...] Este relacionamento com as pessoas consideradas ditas normais e com
os pacientes do hospital na prática que a gente viu que fora aquele discurso
que todo mundo alimenta de integração inclusão e de por ai vai a gente
observa que de tanto de uma parte do grupo como da outra existe uma
resistência. As pessoas têm uma tendência a se enxergar por exemplos, as
pessoas de se enxergar como iguais. (Membro da Equipe Técnica nº 01).
73
6 LOCAIS DE TRABALHO NO COTIDIANO DO GALPÃO
O Galpão de reciclagem abriga um mundo específico de tarefas diárias
dentro de um cotidiano e de peculiaridades bem variado pelos seus componentes. É
um grupo composto por associados, que no seu conjunto efetuam tarefas diárias
pertinentes à triagem desses materiais recicláveis.
A triagem desses passa pela transformação,
através
da limpeza,
organização e separação por tipos de materiais recicláveis já pré-selecionados na
Coleta Seletiva. Eles chegam à Associação dos Trabalhadores da Unidade de
Triagem do Hospital São Pedro onde são pré-selecionados e oriundos de parceiros
doadores que acolheram este Galpão como unidade de triagem para seus materiais
recicláveis. O tipo de material enviado pelos parceiros constituído principalmente de
papel, plásticos (garrafas), papelão, embalagens, chega ao Galpão em boa
qualidade.
[...] Então é uma unidade de triagem diferenciada e o aspecto do tipo de
material, é totalmente diferenciado das outras unidades tem que ser mais
limpo, não vou dizer que vem tudo separado o aspecto é de mais limpo vou
dizer o porquê esta dentro da área do Hospital, está lidando com pacientes o
Galpão tem que estar sempre limpo,com aspecto organizado bem
limpinho,quer ou não queira é uma reciclagem especial, ela é bem
diferenciada de todas as outras. (Morador nº 03)
Já que este material é pré-selecionado, limpo, quase sem contaminação, é
de fácil triagem para os associados. Existe o material sigiloso, que após ser picotado
ou fracionado, torna-se papel comum, podendo ir para reciclagem. Geralmente este
material sigiloso é oriundo de processos, ou documentos que não podem ser
publicados e nem lidos.
[...] O nosso material sigiloso é o nosso forte do Galpão, sendo uma
reciclagem especial a gente tem dois picotadores de material sigilosos duas
prensas. O material sigiloso é um material que consta dados pessoais, então
não pode ir direto para bombona, depois de separado, ele tem que ser
fragmentado e picotado para deixar de ser um material sigiloso. E depois ser
fardado. A gente assina uma responsabilidade, também em destinar este
material corretamente fragmentado. (Morador nº03)
O Galpão ATUT oferece este tipo de serviço, mas também se torna
responsável pelo fracionamento, junto ao emissor do material, através de um
74
convênio firmado entre as partes Galpão e parceiro. Como ele fica dentro das
instalações do Hospital São Pedro, e é de jurisdição estadual, muitos parceiros
doadores de materiais recicláveis são do próprio governo estadual como: Banrisul,
secretarias de estado, PROCERGS; órgãos federais como a UFRGS, Polícia
Rodoviária Federal e outros como Conselho Regional de Enfermagem (COREN),
Conselho Regional de Odontologia (CRO), Rainha das Noivas, Sindicato CEPERS,
AJURIS, SINDICAIXA, CGTEE, Maquimotor, Banco Santander, TIM, Saraiva, CREA,
e alguns escritórios de pessoas físicas.
Este Galpão trabalha com o sistema de parcerias doadoras de material
reciclável por estar dentro de um local destinado ao atendimento na área da saúde.
Não poderia estar recebendo um material oriundo da coleta seletiva do município,
como os demais galpões credenciados pelo Departamento Municipal de Limpeza
Urbana (DMLU, 2011). Esse recolhe todo o resíduo da coleta seletiva do município e
divide entre as dezoito unidades de triagem. Para lá também é enviado o material de
expurgo das unidades de triagem, que é algum material reciclável contaminado por
matéria orgânica, posteriormente enviada para a coleta domiciliar encaminhado ao
aterro sanitário. Além do credenciamento junto ao DMLU, o Galpão recebe uma
quantia mensal que agrega às suas despesas. Este valor mensal é de R$ 2.500,00.
Desde o início do credenciamento até os dias de hoje o valor não foi reajustado.
[...] Eu faço a parte administrativa do galpão. Ajudo eles a coordenar os
trabalhos, mas minha principal tarefa é a parte financeira. Tudo que tiver que
comprar, tudo que tiver que dividir de dinheiro. Tudo de dinheiro passa pelas
minhas mãos. (Membro da Equipe Técnica nº03)
Para dar continuidade ao sistema de doações de parceiros, o Galpão possui
transporte próprio constituído de uma Kombi, que busca no local de origem uma
quantidade mínima 100 litros em sacos de materiais recicláveis.
[...] Boas é todos os dias, a gente agradece a Deus que foi mais um dia de
trabalho, de ruim não tenho nada. Kombi nova para mim, porque se o carro
não anda, eu não posso fazer as coletas, e ou se ele tá arrumando também
esse novo [Kombi] gente sabe que não vai ter problema. E que cada vez que
estraga, sai dinheiro e sai o dinheiro daqui é bom para toda ATUT. (Morador
nº 01)
75
O tipo de material reciclável recebido também passa por um período de
avaliação no sentido de classificação em boas condições, sem muito contingente
orgânico, o que inviabilizaria sua venda como um reciclável.
[...] Na unidade de triagem especial temos várias parcerias, o material
tem que vir mais limpo, eu converso com os parceiros quando o
material não está muito bom, está sujo, contaminado. Eu tenho a
responsabilidade por telefone ou pessoalmente dou um prazo de 15
dias a um mês para melhorar o material. Uma vez, que quando se faz
o convênio eles já sabem para onde estão enviando o material. Mas
uns 80% melhora. (Morador nº 03)
O Galpão possui muitas formas de trabalho. Cada associado opera um tipo
de tarefa, sendo esta de acordo com sua capacidade de trabalho e condição mental.
Essa é uma variante, pois para um doente mental em reabilitação, um novo dia
passa a ser uma novidade, uma nova oportunidade, é sempre diferente.
[...] A gente nota com o passar do tempo eles vão se engajando no trabalho
eles também vão mudando a expressão do rosto, as roupas as atitudes.
Então eu acredito que isto venha melhorar a pessoa através do trabalho,
recicla a pessoa, melhora a vida deles, do associado. (Membro da Equipe
Técnica nº 02)
Assim, as tarefas são delegadas com o rodízio de trabalhadores: um dia na
mesa de triagem, outro nos plásticos, ou em outras atividades do cotidiano do grupo.
Mas o grupo aceita bem o rodízio e também a condição especial de algum colega
não estar muito bem, em relação ao estado de saúde mental.
[...] Meio dia pela manhã, eu limpo os banheiros masculino e depois o
feminino. Depois eu venho para mesa, oriento meus colegas que não sabem
muito, na mesa a gente organiza os papeis, branco, colorido, misto papelão.
Separação de papel. (Paciente nº 07)
O Galpão está nas dependências do Hospital São Pedro, dentro de um
pavilhão psiquiátrico em desuso. É um grande salão dividido em duas partes. Numa
dela está a estrutura logística do Galpão. Na outra metade funcionam as oficinas de
bordado, costura e fuxico. Esta estrutura física é pouco acolhedora e de pouco
conforto. No verão é muito quente, pois não possui um bom sistema de ventilação e
o teto é de telhas de zinco, muito avariadas. No inverno torna-se insalubre pela
condição de um piso frio e sem conforto. A iluminação está deficitária. Em
76
decorrência da quantidade de furos no telhado, a chuva avaria o sistema elétrico do
local (holofotes). Mesmo assim, durante as entrevistas percebeu-se que os
associados convivem bem dentro deste local pouco adequado, talvez porque já
tenham experimentado uma pior condição, de não ter outro local de trabalho, ou
mesmo uma simples oportunidade.
[...] É importante é o serviço que eu consegui, um emprego, importante que
eu conheci a minha esposa aqui dentro do Galpão. Eu trabalho de manhã e à
tarde. (Paciente nº 03)
Mesmo trabalhando na reciclagem, alguns associados têm um preconceito
em relação ao objeto material reciclável, que muitos ainda denominam como lixo.
[...] Eu gosto mais ou menos, só pelo trabalho, só pelo que eu ganho.
(Paciente nº 06)
Mas muitos dos associados não trazem, junto de si, o preconceito, até
esboçam uma situação de estarem ali prestando um serviço à sociedade e como
beneficiadores ou recicladores do meio ambiente.
[...] Eu me sinto muito bem em limpar o meio ambiente vamos separar o lixo,
a saúde, né todo mundo reclama que tem que separar, mas daí a natureza
fica suja o nosso lixo é bem bom não tem cheiro. Eu já fui em outros galpões
é um fedor, as pessoas não separam direito. Sua vida melhorou ou não desde
que você veio trabalhar no galpão? Sim muito. Qual o lugar que vai dar
comida para nós? (Paciente nº 04)
Eles traduzem uma pequena aula de educação ambiental quando fazem a
triagem dos materiais recicláveis e de quanto à sociedade deve melhorar sua coleta
seletiva. Não colocando estes materiais no Arroio Dilúvio, mostra assim uma
consciência ambiental. Para alguns associados o Galpão é apenas um local de
trabalho possível, diante da sua condição mental, nada mais. Assim o Galpão é uma
mescla de situações e de opções para essas pessoas apresentando-se como uma
possibilidade de reabilitação aliada a uma opção de geração de renda.
[...] Porque é uma reciclagem especial porque a maioria dos associados são
pessoas especiais, são pessoas que têm seus diagnósticos diferenciados,
são pessoas que vivem abaixo de medicação. São pessoas que fazem
terapia ali, e também tão fazendo uma terapia. E tem esta equipe técnica que
acompanha, muito querida desde o início. Então é uma unidade de triagem
77
diferenciada e o aspecto do tipo de material, é totalmente diferenciado das
outras unidades. (Morador nº 04)
Denominamos lixo a uma grande diversidade de resíduos sólidos de
diferentes procedências, dentre eles o resíduo sólido urbano gerado em nossas
residências. A taxa de geração de resíduos sólidos urbanos está relacionada aos
hábitos de consumo de cada cultura. Nota-se uma correlação estreita entre a
produção de lixo e o poder econômico de uma dada população. O lixo faz parte da
história do homem, já que a sua produção é inevitável. O lixo é definido de acordo
com a conveniência e preferência de cada um.
Na Idade Média o lixo acumulava-se pelas ruas e imediações das cidades,
provocando sérias epidemias e causando a morte de milhões de pessoas. A partir
da Revolução Industrial, 1698, iniciou-se o processo de urbanização provocando um
êxodo do homem, do campo para as cidades. Observou-se assim um vertiginoso
crescimento populacional, favorecido também pelo avanço da Medicina e
consequente aumento da expectativa de vida.
Assim observa-se os impactos ambientais, que passaram a ter um grau de
magnitude alto, devido aos mais diversos tipos de poluição, dentre eles a poluição
gerada pelo lixo. O fato é que o lixo passou a ser encarado como um problema, o
qual deveria ser combatido e escondido da população. Uma solução para o lixo,
naquele momento, não foi encarada como algo importante, pois bastava
simplesmente afastá-lo, jogando-o em áreas mais distantes dos centros urbanos,
assim denominados lixões (VANZELLOTTI, 2011).
Nos dias atuais, com a maioria das pessoas vivendo nas cidades, e com o
avanço mundial da indústria provocando mudanças nos hábitos de consumo da
população, vem-se gerando um lixo diferente em quantidade e diversidade. Até
mesmo nas zonas rurais encontram-se frascos e sacos plásticos acumulando-se,
devido às formas inadequadas de descarte. Há três décadas a produção de resíduos
era de algumas dezenas de quilos por habitante/ano; mas hoje, vemos países
altamente industrializados como os Estados Unidos produzirem mais de 700
kg/hab./ano. No Brasil, o valor médio verificado nas cidades mais populosas é da
ordem de 180 kg/hab./ano. A produção elevada de lixo norte americano deve-se ao
alto grau de industrialização e aos bens de consumo descartáveis produzidos e
amplamente utilizados pela maioria da população, como consumismo.
78
Mas no Brasil, a geração do lixo ainda é, em sua maioria, de procedência
orgânica. Porém, nos últimos anos vem se incorporando um novo modo de consumo
igual aos países ricos. Isso tem levado a uma intensificação do uso de produtos
descartáveis. Sem dúvida, associado ao crescimento populacional à intensa
urbanização e às mudanças de consumo que levam a um novo padrão do lixo
brasileiro. Essa modernidade não está sendo acompanhada das medidas
necessárias para dar ao lixo gerado, um saneamento adequado.
Vanzellotti (2011) diz que os resíduos gerados em áreas urbanas, em
estações de tratamento de esgoto são um grande problema, tanto pela quantidade
quanto pela toxicidade de tais rejeitos.
A solução para tal questão não depende apenas de atitudes governamentais
ou de decisões de empresas. Deve ser fruto também do empenho de cada cidadão.
Esse tem o poder de recusar produtos potencialmente impactantes, participar de
organizações não governamentais e segregar resíduos dentro de casa, facilitando
assim processos de reciclagem. O conhecimento da questão do lixo é uma maneira
de se iniciar um ciclo de decisões e atitudes que possam resultar em uma efetiva
melhoria de nossa qualidade ambiental e de vida, dando um destino adequado ao
lixo (VANZELLOTTI, 2011).
Na Associação o trabalho de triagem está ligado à atividade terapêutica, que
deu origem à formação desta.
Mesmo dentro de regras de horário, tarefas, atividades, postos de trabalho,
de revezamento nas mesas, ainda assim existe a possibilidade de flexibilização da
rotina, com momentos lúdicos, fumar um cigarro ou dar uma espairecida. Os
associados que necessitem sair para consultas médicas, são liberados. Todos na
ATUT sabem das necessidades e limitações de cada um e existe o respeito entre si.
Alguns dos associados, os mais remissivos, que têm dificuldades de concentração
ou que ainda necessitem de um olhar mais específico da Equipe Técnica, ficam em
pequenos grupos, atuando numa tarefa mais simples, também acompanhados por
outro associado.
Alguns só comparecem à Associação pelo turno da tarde, porque é o horário
em que conseguem efetivamente atuar nela. Como este público é muito variado em
relação às doenças que trazem como bagagem de vida assim quando um dia que
eles estão mais sonolentos, mas avoados, menos interessados, não são cobrados.
Aqueles que precisam faltar ou resolver problemas particulares, sejam usuários do
79
Hospital ou Moradores da Comunidade, podem fazê-lo, desde que tragam atestado
ou compensem a falta em outro momento. Essas questões são levadas a um
integrante da Equipe Técnica que toma a decisão em favor do associado solicitante.
[...] Sim, muito, mas eles me mandam andar na linha. (Paciente nº 05)
A composição do Galpão como espaço físico segue a um modelo proposto
às Unidades de triagem credenciadas pelo DMLU, com alguma adaptação
necessária ao espaço disponível. O Galpão está em funcionamento desde 2002 e
nunca foi ampliado ou mesmo sofreu alguma adaptação quanto a melhorias de
maquinários, ocorreram na infraestrutura poucas reformas.
Localizamos a entrada do Galpão pela porta e por onde entram os materiais
recicláveis. Na entrada encontra-se um pátio que abriga a kombi, os fardos já
prontos e acondicionados, cobertos por um plástico para proteção da chuva. O
caminhão de recolhimento leva os fardos e no mesmo local circulam os associados
no momento de lazer.
A pausa do café da manhã é às nove e meia, com duração de vinte minutos
e o café da tarde, às quinze horas, com a mesma duração. A ATUT oferece o café
preto, cada um traz o seu lanche e alguns trazem leite para misturar ao café.
O local foi mudado no ano de 2011. O cafezinho fica na parte onde
acontecem as oficinas terapêuticas de costura e bordados, no Galpão. Possui uma
pia, e um balcão. No momento do café acontecem conversas, rodinhas, mas o
hábito de fumar é fora do Galpão. No pátio circulam alguns moradores do próprio
Hospital, que ficam pedindo um cigarro, catando algum material pelo chão, mas não
entram dentro do Galpão. Também passam por ali visitantes que chegam para
conhecer a ATUT e parceiros que vêm entregar pessoalmente o material reciclável.
No lado direito fica a entrada que, atualmente abriga um depósito de material a ser
triado do tipo sigiloso, que necessita ter um controle de manejo. Antigamente esse
local abrigava a cozinha dos associados e área de convivência, mas foi
transformado em mais um local de depósito de material reciclável. Ao lado, da nova
cozinha existe um espaço que serve para encontros, reuniões, palestras dos
associados. Junto a este local há mais uma mesa de triagem.
Na sala onde é depositado o material reciclável sigiloso, fica localizado o
Relógio Ponto. Foi um pedido dos associados da Comunidade, a fim de evitar
80
discussões em função dos atrasos e faltas, minimizando as injustiças entre eles.
Todos associados têm a obrigação de bater o relógio-ponto e assim computar as
horas trabalhadas. A presença do relógio e a obrigatoriedade fazem parte do
sistema reabilitador, dando ao indivíduo uma responsabilidade no seu cotidiano.
O relógio é digital, adquirido a mais ou menos um ano. Ocupa lugar de
destaque e visibilidade na entrada da sala, onde encontra-se o mural de informações
da Associação.
Nesse mural encontram-se informações para os associados, de caráter
institucional do Hospital, da Equipe Técnica, informações sobre datas de
aniversários e alguma notificação de interesse deles.
Ao lado da ex-cozinha, fica o escritório da Coordenação, lugar ocupado
pelos seus integrantes, composta por dois associados, que auxiliam os demais e
orientam as atividades do dia-a-dia do Galpão. A coordenadora do Galpão cuida
mais dos processos administrativos, contato com os parceiros, venda de materiais,
lista de revezamento de trabalho aos sábados, lista de almoço, lista do pessoal que
fica para trabalhar no turno da tarde. Ela é escolhida por eleição a cada dois anos,
podendo ser reconduzida. Trata-se de uma moradora da Comunidade e já esteve
por diversas vezes neste cargo, demonstrando muito conhecimento sobre o
andamento do Galpão e de suas singularidades e peculiaridades. Conta ainda que
apesar das muitas dificuldades do cotidiano, ela gosta muito de estar ali e também
cumprir a tarefa de coordenar o Galpão. (WEBER, 1995).
A vice-coordenadora não foi eleita, mas escolhida pela Coordenadora em
exercício, para auxiliar na parte das atividades. A vice-coordenadora (extraoficial),
também chamada de delegada pelos demais associados, fica circulando entre eles
para cooperar, ajudar na tarefa dos mais remissivos e fazendo a atividade de
triagem, quando necessário.
No local do escritório da Coordenação ficava o pessoal da Equipe Técnica,
junto com ela. Mas a cerca de um ano e meio, foi reformado um novo espaço para
Equipe Técnica, localizado ao lado no Galpão, no prédio onde ficam as salas dos
outros especialistas, responsáveis pelas atividades terapêuticas da costura e da
lavagem dos carros. Neste mesmo espaço encontramos os banheiros de uso
exclusivo dos funcionários do Hospital, almoxarifado e a sala que abriga o Museu da
ATUT, que também é uma sala de recepção a pessoas convidadas. O Museu foi
organizado pelo Psicólogo e contém materiais raros e antigos encontrados em meio
81
aos resíduos que chegam ao Galpão. É um espaço que mostra a realidade da
sociedade, pois demonstra o olhar que essa tem para com seus objetos, no sentido
de descartar o que não serve, ignorando a etapa de reaproveitamento, ou de
doação. A sociedade tem uma enorme necessidade de descartar tudo que não quer
mais ou que está lhe incomodando, refletindo assim o pensamento capitalista e
consumista (MORIN, 1995).
Na parte da frente do Galpão encontram as gaiolas que recebem o material
enviado pelos parceiros doadores e que não tem caráter sigiloso. Esse material
chega de Kombi e é colocado pelos associados nas gaiolas. Estão acondicionados
em saco de lixo. À frente das gaiolas é para o lado do pátio, onde fica o trânsito de
pessoas, da Kombi, de entrada e saída do Galpão. Do lado de dentro das gaiolas,
vamos encontrar a mesa de triagem, onde os associados ficam de costas, abrindo
os sacos de lixo. Num primeiro momento iniciam a triagem dos materiais e
acondicionando em bombonas.
O acondicionamento é feito por tipo de material: papel branco; pardo; misto e
mistão; jornais; revistas; latinhas e o plástico. A separação continua no sentido de
verificar a condição do material recebido, que posteriormente terá um bom valor
agregado no momento da venda.
De frente para a mesa principal encontra-se mais uma mesa de triagem,
onde os associados separam outro material, mas de origem papel. O plástico já
separado na mesa de triagem vai para a parte de trás do Galpão. Nesse local ele
recebe um tratamento e limpeza, caso seja necessário e também é separado por
tipo e categoria de plásticos: em pet; embalagem de pote de manteiga; plástico
mole; plástico duro etc. São vários tipos, cada um com seu valor de mercado. As
tampinhas das garrafas também são separadas para venda. Ao lado da mesa do
plástico e à frente, ficam as gaiolas onde os plásticos que foram triados. Os que não
foram, ficam armazenados. À direita, dando um contorno de corredor, encontram-se
gaiolas com material de sucata, latinhas, alumínio, e outros do gênero. Os vidros
são armazenados ao lado da entrada principal. Esse tipo de material deverá passar
pelo fracionamento (quebrado). Por este motivo e pela origem dos associados, o
Galpão não tem muito interesse na recepção do material vidro e também pelo pouco
valor agregado no momento da venda para reciclagem.
Na parte central ficam outras grandes gaiolas, que acabam dividindo-o em
dois espaços. Nestas gaiolas ficam os papéis palha que passaram pela picotadeira,
82
maquina que faz a transformação do material sigiloso em material comum reciclável,
pois foi fracionado.
[...] Gosto, gosto mesmo. Mesmo com tudo que aconteceu comigo, me
acidentei ali na picotadeira. O [...] e o [...] (Membro da Equipe Técnica nº 02 e
Membro da Equipe Técnica nº 01) não queriam mais que eu ficasse ali, mas
como tá faltando gente eu fui, mesmo sabendo dos riscos. E do que
aconteceu comigo. Não fiquei com medo, nada. (Morador nº 02)
Atrás dessas gaiolas fica uma das prensas e a picotadeira que faz um
barulho ensurdecedor quando está ligada. Ela é uma máquina antiga, mas de
grande valor para o Galpão ATUT. Esse Galpão é a única Unidade de Triagem que
oferece, aos seus parceiros doadores, esse tipo de serviço, que é muito valorizado
pelas instituições públicas e mesmo nas privadas no sentido de descarte de
documentos sigilosos. O fracionamento do material sigiloso, muitas vezes, é
acompanhado pelo Órgão doador responsável pelo material, dado a importância do
documento.
Muitos
desses
são
materiais
do
Poder
Judiciário,
Fazenda,
dissertações, notas fiscais, fotografias, material que trás a origem como endereço e
que por esta razão deve ter o máximo rigor no descarte.
Ao lado da picotadeira ficam os banheiros, que foram reformados para o uso
dos associados (masculino e feminino), trazendo conforto aos seus usuários.
Na parte de trás do Galpão fica uma das prensas. Ao lado esquerdo das
gaiolas centrais fica a outra prensa. Ainda nesse mesmo local fica a gaiola onde são
armazenadas as caixas de papelão utilizadas para embalar os fardos de material.
Nas proximidades da saída secundária fica o elevador usado para os fardos de
material, que pesam em torno de trezentos quilos, até os caminhões que vêm buscálos no pátio. Há cerca de dois anos atrás, os fardos eram carregados manualmente,
exigindo a presença da maioria dos homens associados para fazê-lo, o que
representava uma dificuldade, pois podia acarretar acidente, ou mesmo causar
problemas de saúde para o trabalhador.
A balança também fica posicionada próximo da prensa, porque logo depois
de prensado o fardo é pesado. Esses fardos, depois de pesados, ficam esperando a
venda, armazenados junto à parede lateral do Galpão, atrás da prensa.
Normalmente os lugares (posição) dos associados dentro do Galpão são
fixos, mais por algum motivo de demanda acumulada de material para ser triado, as
posições são trocadas, para garantir o despacho rápido dos materiais. Os sábados
83
são utilizados para mutirão e ou plantão para diminuir a quantidade de material
reciclável cumulado dentro do Galpão ou nas gaiolas. É organizada uma escala de
trabalho, com a disponibilidade e vontade do associado.
Os turnos de trabalho são divididos entre manhã e tarde. A maioria dos
associados trabalha mais no turno da manhã. Os que têm condições físicas para
trabalhar nos dois turnos, assim o fazem. As pessoas que tem algum compromisso
em relação à terapêutica, como o clube da amizade, oficinas de criatividade, saem
sem prejuízo. Alguns associados que só fazem o turno da manhã, pois apresentam
um estado bem remissivo de saúde, demonstram a vontade de trabalhar os dois
turnos, com a intenção de terminar a tarefa proposta durante o turno da manhã.
[...] É importante. Olha, eu gosto de ficar quieta, fazendo meu trabalho quieta,
só prestando atenção para aquilo que eu to fazendo. Assim eu fico feliz. Eu
só trabalho de manhã, mas eu gostaria de trabalhar um pouco de tarde,
ajudar um pouco de tarde o que eu não consegui terminar de manhã eu faço
à tarde. (Paciente nº16)
Alguns associados, só conseguem ter condições de fazer tarefas pela parte
da tarde, pela quantidade de medicação e o grau de remissão. Todos que trabalham
os dois turnos e são pacientes e doentes mentais recebem o almoço ofertado pelo
Hospital, numa sala a parte do refeitório utilizado pelos funcionários do Hospital. Os
Moradores da Comunidade que são associados fazem os dois turnos de trabalho.
O valor da remuneração mensal é de acordo com as horas trabalhadas de
cada associado. É variável pela quantidade total de material enfardado para
reciclagem, o valor de cada tipo de material, em relação à bolsa de recicláveis sob o
binômio quantidade de material reciclável e bolsa de valores.
O valor para cada tipo de material reciclável é variável, dependendo da
oferta e demanda; cotação do dólar, relação com a bolsa de valores, através da
Comodittes. Atualmente o valor para tipos mais comuns que o Galpão oferece com a
triagem é:
Quadro nº 1 - Tipo de material reciclável - papel
TIPO
Branco (escrito)
Celulose AP Branco
Apara misto (papel colorido)
Mistão (capa de caderno)
PAPEL
VALOR /Kg
0,46/kg
0,85/kg
0,20/kg
0,15/kg
84
Jornal
Tetra Pak
Papelão 1 (marrom)
Papelão 2 (colorido)
Fonte: Coordenação do Galpão, outubro 2012
0,19/kg
0,15/kg
0,34/Kg
0,23/Kg
Quadro nº 2 - Tipo de material reciclável - plástico
TIPO
Pet branco (plástico transparente)
Pet verde:
Pad branco (materiais de limpeza)
PLÁSTICO
VALOR
1,20/kg
0,80/kg
0,80/kg
Pad colorido (embalagens coloridas em
geral)
Mole transparente (saco plástico
transparente)
Misto Mole (sacola de mercado):
0,80/kg
0,40/kG
Tampinha plástica:
PS (copinho de café):
PP (garrafas de água mineral):
0,50/kg
0,30/kg
1,15/kg
0,70/kg
Fonte: Coordenação do Galpão outubro 2012
Quadro nº 3 - Tipo de material reciclável alumínio – sucatas - isopor
ALUMÍNIO-SUCATAS-ISOPOR
TIPO
Latinhas de alumínio
Sucatas em geral
Isopor
Fonte: Coordenação do Galpão outubro 2012
VALOR
2,40/kg
0,13/kg
0,10/kg
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7 ORGANOGRAMA DO GALPÃO
Esse Galpão de reciclagem fica nas dependências do Hospital Psiquiátrico
São Pedro. Na sua formação há uma Equipe Técnica formada por um Psicólogo,
uma Terapeuta Ocupacional e uma Assessora Administrativo-financeira. A Equipe
Técnica se conecta com a Coordenação do Galpão, com todos os associados e com
parceiros doadores. Parte da Equipe Técnica, juntamente com a Coordenação,
supervisionam as atividades e o cotidiano do Galpão. Os associados mantêm uma
estreita comunicação com a Equipe Técnica em relação a atitudes e solicitações
pessoais. Todos seguem uma regra geral, indistintamente, mesmo sendo um
associado paciente ou um associado morador da comunidade, em relação às regras
de conduta ou de trabalho, conforme organograma a seguir.
Fonte: a Autora
A importância da Equipe Técnica para a existência do Projeto do Galpão é
um dos pilares da Associação. Ela dá a orientação técnica do ponto de vista
86
emocional e também da distribuição de tarefas ao grupo. Indica à Coordenação do
Galpão quais caminhos e soluções possíveis aos problemas que se apresentam no
cotidiano de trabalho. Os entrevistados foram unânimes em dizer, falar ou expressar
seus sentimentos de agradecimento a toda Equipe Técnica do Galpão. De uma
forma ou de outra, as expressões surgiram no sentido da Equipe Técnica ser um
guarda-chuva que ao mesmo tempo orienta o cotidiano dos trabalhos deles e dá o
apoio emocional necessário durante a reablitação. Nas palavras dos entrevistados
nota-se a dedicação da Equipe Técnica ao projeto de criação do Galpão.
[...] Claro, isso tem que ser às vezes a gente fica lentinha, daí ela chama e faz
tempo que eu não tenho as crises eu acho que melhorei. (Paciente nº 01)
[...] Falando com coração a [...] e [...] (membro da Equipe Técnica nº 02 e o
membro da Equipe Técnica nº 01) que fizeram o projeto, o [...] (membro da
Equipe Técnica nº 03) veio depois. Se mudar acho que não vai ser bom. São
profissionais ótimos, se um deles sair, vai sair um pedaço da reciclagem. São
muito, muito, muito importantes como profissionais, amigos, eles são amigos
da gente. (Morador nº 01)
[...] Eu vou ser bem sincera, a importância da equipe técnica não só no
trabalho como na minha vida foi muito interessante porque esta reciclagem
iniciou com esta Equipe técnica em 2000. Quando eu vim ela já existia, antes
era uma oficina terapêutica, quando eu vim em 2001, foram eles que
iniciaram com dois pacientes, eles buscavam material pelo hospital, lá fora,
perto na Bento, traziam de casa. Quando eu cheguei tinha 6 pacientes
trabalhando com a Equipe Técnica, no início o meu relato da dificuldade é um
relato muito importante não só para mim como para o grupo todo. Eles são os
nossos cuidadores e não fosse pela Equipe Técnica não existiria a reciclagem
que existe hoje eu estou muito emocionada. Hoje eu me deito todos os dias e
me levanto, tomo meu banho venho pro trabalho e tenho meu trabalho! Muito
importante. (Morador nº 03)
[...] Acho muito importante, mas às vezes nem a Equipe Técnica consegue
resolver, ainda tem muita coisa para melhorar aqui dentro da reciclagem. Por
exemplo: as pessoas cuidarem dos outros, ficarem xeretando a vida do outro,
já houve ocasiões de provocações de colegas, isto ai é uma coisa que tem
que mudar ainda, tem que melhorar um pouco. Pode ser melhor, só ter
vontade, que muitas vezes não tem. Já falei para [...] (membro da Equipe
Técnica nº 02) que tem muita pouca gente nas gaiolas e precisa mais. Tem
mais gente no sigiloso que nas gaiolas. Tem que alterando uma coisa, tirar do
sigiloso e botar nas gaiolas. Chega material toda hora. Uma coisa legal é
pegar todo mundo junto. Parar um pouco com a conversa. O Galpão tem seu
lado negativo, mas tem seu lado positivo. (Paciente nº 17)
[...] Eu acho muito importante. Eles dão muita força, se não estivessem, a
gente não saia. Eles são um porto firme entendeu? Vamos lá, vocês
conseguem para mim não são pacientes, vocês são pessoas normais isto
incentiva. Acho muito bom. (Paciente nº 04)
[...] Se não fosse a Equipe Técnica quem iria ser responsável pelo Galpão,
nem existiria. (Paciente nº 10)
87
[...] Sim, eles são. Sim sem eles este Galpão fica por conta, não anda para
frente. (Paciente nº13)
No Galpão encontramos alguns pacientes muito remissivos, com pouca
compreensão, mesmo assim conseguem executar as atividades propostas. Segue a
fala de um paciente remissivo, que encontrou nas atividades, sua razão de viver.
[...] É importante. Olha, eu gosto de ficar quieta, fazendo meu trabalho quieta,
só prestando atenção para aquilo que eu to fazendo. Assim eu fico feliz. Eu
só trabalho de manhã, mas eu gostaria de trabalhar um pouco de tarde,
ajudar um pouco de tarde o que eu não consegui terminar de manhã eu faço
à tarde. (Paciente nº 16)
Os relatos convergem, num só pensamento, sobre a existência da Equipe
Técnica para o Galpão quanto a importância dela para a própria organização e a sua
existência.
A Equipe Técnica da Associação, integrada pelo Psicólogo e Terapeuta
Ocupacional, foi a idealizadora e a fundadora da Associação em 2001. Antes disso,
coordenava a Oficina Terapêutica de reciclagem. Em 2002, a contadora juntou-se à
Equipe Técnica nas atividades administrativas e financeiras do Galpão. Esta Equipe
minimiza os conflitos interpessoais e se preocupa em mostrar aos associados, a
importância do crescimento da ATUT em termos de geração de renda e integração
dos mesmos.
Ao intervir nas reuniões, por exemplo, ela mostra as possibilidades de
entendimento entre os associados, diminuindo as fraquezas já existentes e as
ameaças, ressaltando as oportunidades e forças deste grupo. Os associados
esboçaram seus sentimentos de respeito, de gratidão e de afeto pelos membros
dessa Equipe. São especialistas que reforçam o potencial do coletivo de trabalho.
Se não acreditassem nisso, não teriam levado as atividades adiante, apesar dos
momentos turbulentos, que são relatados por eles mesmos e por alguns associados
mais antigos.
Sendo assim, apesar de ser uma organização em forma de Associação,
onde não existe um dono, um patrão, foi possível identificar as relações hierárquicas
no contexto organizacional.
88
A Equipe Técnica desempenha o papel de referência e de tomada de
decisões que dizem respeito à ATUT quando, por meio das reuniões, os associados
não chegam a uma decisão concreta e coerente, como demonstrado acima.
A Equipe exerce a função de poder maior, apesar de não haver decisões
individuais e isoladas. Os associados se dirigem a ela para pedir auxílio, resolver
determinados problemas. Além dela, há uma referência mais direta nesta hierarquia
constituído da Coordenação e da Vice-coordenação do Galpão. Por estarem mais
próximos dos associados, trabalhando diretamente com eles, servem de apoio às
questões mais ordinárias, relacionadas ao trabalho, às funções, ao apoio para
atividades extras. Isso porque nem sempre há um membro da Equipe Técnica à
disposição, como no período da tarde e aos sábados, por exemplo. É para isso que
existe a Coordenação da Associação que muitas vezes, atua como mediador entre
associados e a Equipe Técnica, representando os associados frente a ela.
Este formato hierárquico é comum às organizações, mesmo que sejam
associações ou cooperativas. É preciso que haja algum referencial, uma pessoa ou
grupo de pessoas a quem se remeter quando há necessidade, mesmo que esta
pessoa ou grupo não tome a decisão sozinha.
Na ATUT, quando há um problema individual, alguma insatisfação ou
problema pessoal, o associado se dirige à Coordenação ou à Equipe Técnica para
juntos tomarem a decisão, considerando as regras formalizadas pelo grupo.
Exemplificando, se algum associado precisa faltar, depois recupera as horas em
outro momento ou recebe apenas pelas horas trabalhadas. Quando o assunto é de
ordem coletiva, como uma discussão sobre trabalho extra, ou mesmo algum
comportamento desviante que altera ou atrapalha o rendimento do grupo, é feita
uma Assembleia com todos para que tomem a decisão. Neste sentido, quando não é
possível chegar a um acordo, um membro da Equipe Técnica intervém e decide a
partir da opinião da maioria. Quando não é possível estabelecer essa maioria, a
Equipe Técnica considera o que é mais conveniente para o grupo. (FREITAS;
MOSCAROLA, 2000).
O trabalho de triagem de materiais recicláveis é manual e minucioso, feito
em grupos: o do plástico, o do papel sigiloso, o das mesas da frente. Isso permite
que se estabeleçam conversas, troca de experiências e causos de vida. Muitos se
conhecem intimamente, sabem dos problemas uns dos outros e acompanham o
andar da vida dos colegas com interesse e preocupação. As amizades se fortalecem
89
diariamente na ATUT em meio aos montes de material, numa mistura de cooperação
e solidariedade que permite a aproximação do diferente, a compreensão do outro. É
uma forma de inserção que se dá pela construção de novas práticas. Essas
interações permitem que o convívio social se estenda para outras esferas, facilitado
pela experiência positiva recorrente na Associação (KAUFMANN, 2010).
O convívio com diversas pessoas na ATUT, desde a Equipe Técnica até os
diversos visitantes que a frequentam, permite o reconhecimento e familiaridade na
relação com os outros.
Pelas possibilidades de convívio que o Mundo ATUT, segundo mostra
Kaufmann (2010) nos seus relatos os doentes mentais e favelados não precisam
mais se esconder atrás dos muros do preconceito e do estigma, pois ao trabalharem
na Associação ocupam um espaço importante no mundo.
Alguns associados, principalmente os paciente e usuários do Hospital, estão
na ATUT desde sua criação, dizem não trocar esta experiência por nada,
principalmente, pelos efeitos positivos em seus processos de recuperação através
da reabilitação do convívio com os outros e de inclusão social.
Alguns associados aparecerem na ATUT mesmo durante as férias, porque
não conseguiam ficar longe da Associação e dos amigos que fizeram lá. Nesse
sentido a Associação se mostra como sinônimo de bem-estar.
[...] A minha vida financeira tá melhorando, aos poucos. A pessoal, aos
poucos. Eu moro aos fundos do terreno da minha irmã junto com a minha
namorada. (Paciente nº 03).
Além das características de sociabilidade que marcam os dias de trabalho
na ATUT, existe a simplicidade que marca o jeito de ser, a forma de vestir e de se
expressar dos associados, típicas do mundo modesto dessas pessoas. Suas vestes
são simples, muitas oriundas de doações. O Projeto de Extensão ATUT: Reciclando
Vidas com Inclusão Social da UFRGS, faz campanha do agasalho e as doações são
encaminhadas aos associados, que as recebem com muita gratidão.
A ATUT concentra múltiplos níveis de precarização, marcados na superfície
dos corpos, nos olhares e nos gestos, no vestir, no falar e também no modo de
trabalhar na triagem de materiais recicláveis.
90
Mesmo com o seu jeito próprio de viver, essas pessoas não deixam a
vaidade de lado, principalmente as mulheres, com suas unhas pintadas, suas
bijuterias, e objetos comprados com o salário recebido no Galpão.
[...] Eu adoro, aqui. Eu consegui bastante coisas, comprei uma cama de Box e
me deito e rolo pela cama e uma TV de tela plana. (Paciente nº 04)
Eles descrevem, com satisfação, o que conseguem adquirir ou fazer com o
ganho mensal.
[...] Sinto bem, gosto é daqui. Que eu vivo, pago minhas contas. (Morador nº
02)
Os associados, no seu cotidiano, mostram que a simplicidade não impede o
exercício da vaidade na medida em que as condições sociais o permitem. É uma
forma de fugir dos estigmas da pobreza, da doença mental, do lugar social, cultural e
econômico que determinam uma quase exclusão total.
Muitos dos associados
mudam seu paradigma de pensamento a partir do momento em que a reabilitação
se torna uma realidade, um novo caminho, mesmo que seja todos os dias. A
reabilitação não se dá como um processo definitivo, ela é conquistada a cada dia,
por novas atitudes que o doente mental apresenta em relação a sua terapêutica.
Assim tornam-se mais seguros, independentes, sentindo-se respeitados pelo grupo
e pela sociedade. O Galpão mantém uma disciplina, na qual os horários, as tarefas,
a convivência (mesmo que seja entre doentes mentais), colocado essas pessoas
numa nova realidade.
91
8 PARCERIAS, SERVIÇOS E RECEITAS DA ATUT
O Galpão ATUT, desde 2003, possui um sistema de parceiros doadores de
material reciclável. Nesse momento a Equipe Técnica, juntamente com o Projeto de
Extensão ATUT: reciclando vidas com inclusão social da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, constitui um sistema de captação de parceiros doadores de
resíduos
recicláveis.
Primeiramente
com
setores
do
governo
estadual
e
posteriormente pessoas físicas e com instituições públicas federais.
O tipo de serviço é oportunizar o descarte com garantia à instituição
solicitante e a responsabilidade sobre o material reciclável doado. O Galpão também
oportuniza a fragmentação de documentos sigilosos ao serem descartados. A
maioria dos materiais recicláveis doados é disponibilizada ao Galpão e este faz a
coleta do material através de um transporte próprio, pela Kombi da ATUT. Entre
2003 e 2006 a importância da captação de parceiros doadores era primordial para a
existência do Galpão. O Galpão tem atualmente um grande número de parceiros e
com um bom volume mensal de material reciclável doado por eles.
Como muitos dos associados são novos no Galpão (2009-2012) e entraram
num período onde as parcerias estavam consolidadas, notou -se durante as
entrevistas, que este fato em relação aos parceiros doadores não aparece como
muito importante.
Esses novos associados não passaram pelas expectativas do tempo de
formação do Galpão, onde as gaiolas que recebem material reciclável estavam
vazias. Apenas um ou dois lembraram-se dos parceiros doadores, sendo os mais
expressivos como a UFRGS (Campus da Saúde), Banrisul e algum outro que
enviava material sigiloso, o qual chama atenção pelo fato do responsável estar
presente no momento que é a documentação fragmentada. Esse é um dado de
grande relevância, mas a maioria dos associados não menciona e poucos
mencionam o fato da existência de parceiros doadores.
[...] Bom, eu saio todos os dias de manhã tipo às sete e trinta horas, às vezes
às seis e trinta horas e levo dois colegas, mas eu também tenho outras
atividades. Se estraga um maquinário, sou eu que levo para o conserto. Eu
que desmonto e monto. Coletas de papel reciclável, plástico, tudo que for
reciclável. Eu busco nos parceiros da Associação, lá na UFRGS eu pego num
92
monte de lugares. A ATUT e os parceiros e a gente tem responsabilidade de
buscar este material e agente vive disto ai. (Morador nº 01)
No momento de entrada como associado para Galpão é mencionado que o
material reciclável vem de parceiros doadores e isso é tomado como uma verdade
incontestável. Entretanto os associados não mencionaram a importância dessas
doações para a sobrevivência do Galpão. A causa pode ser pela perturbação
mental, que a maioria traz consigo, pouco dado de informação sobre a importância
para eles, ou que eles conseguem absorver.
Assim não levei
a pesquisa aos
parceiros, sendo apenas
esses
mencionados como parte do processo de institucionalização do Galpão. Sem dúvida
é uma peculiaridade bem importante do ponto de vista organizacional na existência
e na sobrevivência dele. A Coordenação possibilita aos doadores , informações e
palestras esclarecedoras, demonstrando a importância da separação adequada na
fonte geradora do material reciclável, pois esse poderá ter um bom aproveitamento
na indústria. Esclarece também, a respeito de como esse material deve ser enviado
para o Galpão. Esses momentos acontecem junto aos parceiros quando o reciclável
enviado por eles não está dentro dos padrões mínimos de recepção do Galpão. A
associação conta com um grande número de parceiros doadores e com uma boa
quantidade de material e de boa qualidade, facilitando a triagem pelos recicladores.
Pouco material contaminado com algum elemento orgânico é encontrado, ou mesmo
pérfuro cortantes, como agulhas e seringas contaminadas, ou mesmo por outro tipo
de contaminação biológica ou química.
[...] Na Unidade de triagem especial temos várias parcerias, o material tem
que vir mais limpo, eu converso com os parceiros quando o material não está
muito bom. Está sujo, contaminado, eu tenho a responsabilidade. Por telefone
ou pessoalmente dou um prazo de 15 dias a um mês para melhorar o
material. Uma vez que quando se faz o convênio eles já sabem para onde
estão enviando o material, mas uns 80% melhora. (Morador nº 03)
Os associados mais antigos tem a lembrança das dificuldades, do pouco
material nas gaiolas. Isso significava que, no final do mês, o salário também seria
prejudicado, de menor valor. Então fizeram alguma menção ao fato da existência
dos Parceiros Doadores enviarem o material reciclável para o Galpão, como um fato
importante.
93
A Equipe Técnica e a Coordenação do Galpão possuem controle do material
reciclável que os parceiros doadores enviam, mantendo, assim, uma via de dois
lados do convênio, Galpão e parceria.
94
9 O CASO: O COTIDIANO DO GALPÃO DE RECICLAGEM
De forma a construir um modelo ideal, a pesquisa permeou os fenômenos
que ocorreram no Galpão, na construção de sua história. Tais fenômenos se
repetiram ou não, mas de alguma forma levaram à estrutura atual do Galpão de
reciclagem ATUT. A história do Galpão dividiu-se em dois momentos, sendo o
Período Pré-institucional e o Institucional conforme Weber:
Obtém-se um tipo ideal mediante acentuação unilateral de um ou vários
pontos de vista, e mediante o encadeamento e de grande quantidade de
fenômenos isolados dados, difusos e discretos, que se pode dar em maior
ou menor número ou mesmo faltar por completo, e que se ordenam
segundo pontos de vista unilateralmente acentuados, a fim de se formar um
quadro homogêneo de pensamento. (WEBER, 1991, p.106)
Os períodos citados anteriormente são descritos da seguinte forma.
9.1 PERÍODO PRÉ-INSTITUCIONAL 2000: UMA OFICINA DE REABILITAÇÃO
A oficina terapêutica de reciclagem iniciou suas atividades para contemplar a
vinda da Reforma Psiquiátrica no Brasil, terminando com os hospitais moradia e
reabilitando seus doentes para o convívio da família em sociedade. As instituições
não recebiam mais pacientes moradores. Estavam de acordo com o pensamento
contemporâneo e atendendo às diretrizes da Reforma Psiquiátrica (Lei n. 9.715/92),
que regulamenta um novo modelo de assistência psiquiátrica deixando de ser
predominantemente hospitalar e passando à atenção psiquiátrica extra-hospitalar.
Essa nova metodologia permite apenas internações quando indispensáveis, pelo
menor prazo de tempo possível.
Atualmente o Hospital Psiquiátrico São Pedro
abriga em torno de 130 pessoas abandonadas, esquecidas, largadas no hospício há
30, 40 ou 50 anos. No processo de desinstitucionalização sobraram esses, sem
identidade, sem família, sem um lugar fora das moradas do Hospital. Muitos estão
sem condições físicas e psíquicas para reingressar na sociedade. Os que não
entraram como doentes mentais, ao longo do tempo, do abandono e da clausura,
assim tornaram-se. Esses excluídos perambulam pelos pátios da casa carregando
nas costas uma média de idade de mais de 60 anos, a maioria deles, vividos dentro
95
do Hospital. Trazem as marcas e feridas nos rostos, histórico de um penoso
tratamento psiquiátrico, que hoje é muito mais avançado, quase nulo de efeitos
colaterais.
O Hospital São Pedro passa por um processo de revitalização e restauração,
e desenvolvendo uma nova proposta no tratamento dos doentes mentais.
A paisagem da recepção do Hospital, ainda imponente, abriga uma
fisionomia das palmeiras imperiais na sua entrada com prédios do ambulatório,
prédio principal centralizado, parte burocrática e o Memorial acerca da sua história.
Este prédio foi tombado e está sendo revitalizado.
Ao seu redor ficam as alas que ainda abrigam cerca de cento e trinta
moradores do Hospital nos dias de hoje. Esses são de idade avançada e que não
apresentavam nenhuma possibilidade de reabilitação e sem qualquer algum contato
familiar (LOPES, 1983).
O Galpão se situa na parte baixa, dentro do grande terreno do Hospital São
Pedro, à esquerda de quem entra vindo pela Av. Bento Gonçalves, localizado após a
recepção, passando o Prédio Histórico que se reconhece logo à chegada e os
pavilhões dos pacientes. Esta microrregião é arborizada e, dado o relativo
distanciamento com as edificações circundantes, recebe sol durante boa parte do
dia.
A Lei n. 9.715 de 7 de agosto de 1992, dispõe sobre a Reforma Psiquiátrica
no Rio Grande do Sul. Essa determina a substituição progressiva dos leitos nos
hospitais psiquiátricos por rede de atenção integral em saúde mental. Determina
regras de proteção aos que padecem de doença mental, especialmente quanto às
internações psiquiátricas compulsórias, de acordo com o 2° artigo da Lei:
A reforma psiquiátrica consistirá na gradativa substituição do sistema
hospitalocêntrico de cuidados às pessoas que padecem de sofrimento
psíquico, por redes integradas e por variados serviços assistenciais de
atenção sanitária e social, tais como: ambulatórios, emergências
psiquiátricas em hospitais gerais, unidades de observação psiquiátrica em
hospitais gerais, hospitais-dia, hospitais-noite, centros de convivência,
centros comunitários, centros de atenção psicossocial, centros residenciais
de cuidados intensivos, lares abrigados, pensões públicas e comunitárias,
oficinas de atividades construtivas e similares. (Lei nº 9.715, 1992)
Segundo o Membro da Equipe Técnica nº 02 (2011), a oficina terapêutica de
reciclagem nasceu de modo contemplar os doentes em um estado mental que
possibilitassem uma possível reabilitação psicossocial. A implantação da ATUT foi
96
uma das ações, que faz parte do Projeto São Pedro Cidadão – criado em 1993, e
assumido como prioritário pelo Governo em 1999 – que, dentro das novas diretrizes
da Reforma Psiquiátrica, visava reinserir o portador de sofrimento psiquiátrico
gradativamente na sociedade. De acordo com o Membro da Equipe Técnica nº 02
(2011) e o Membro da Equipe Técnica nº 01 (2011), aprovados em Concurso
Público do Hospital São Pedro, a Direção do Hospital solicitou que fosse criada uma
atividade terapêutica contemplando a reabilitação de doentes mentais.
A ATUT surgiu em setembro de 2000 com este propósito da atividade
Terapêutica (oficina), somando-se aos trabalhos já desenvolvidos pela Supervisão
dos Serviços de Atividades Terapêuticas do Hospital como Horta Comunitária, Salão
de Beleza, Oficina de Criatividade e Reabilitação Profissional.
O objetivo era proporcionar aos pacientes, que não residiam mais nas
unidades do Hospital, um recurso ocupacional para evitar que a doença se
transformasse em um problema social. Ainda sim uma possibilidade financeira.
A ATUT, portanto, começou a ser vista como uma forma de sobrevivência
para os pacientes que sairiam das dependências do Hospital, dentro de um Galpão
que fora, no passado, uma ala psiquiátrica localizado num setor mais afastado do
prédio principal. É de fácil acesso tanto para o restante do Hospital, como para a Vila
São Pedro, a comunidade atrás do mesmo.
[...] A direção na época solicitou que a gente fizesse um projeto, e deram três
opções, a reciclagem, cantina ou brechó. Aí eu e o [...] (Membro da Equipe
Técnica nº 01), conversamos, aí veio dúvida do que trabalhar. Bom, então
vamos trabalhar com reciclagem. Vamos ver como é que é. Eu não sabia
nada, nada de reciclagem, nunca tinha entrado numa, nem o [...] ( Membro
da Equipe Técnica nº 01). Aí então a gente começou a visitar as reciclagens,
conversamos com o pessoal, começamos a receber as dicas, achamos
interessante, a [...] da Vila Pinto deu todas as dicas, assim como é que era,
como é que não era como é que eles desenvolviam o trabalho deles, aí a
gente viu que tava no caminho certo. Mas, aí veio aquela dúvida assim de
como é que vai ser trabalhar com pacientes psiquiátricos e lixo né.
Começamos a questionar essa coisa. Aí o [...] (Membro da Equipe Técnica nº
01), dizia, ah, mais o paciente psiquiátrico é uma sobra da sociedade e o lixo
também é uma sobra da sociedade. Será que isso vai dar certo? Eu disse não
sei, é meio complicado. (Membro da Equipe Técnica nº 02, 2011)
Estas foram às primeiras impressões do Membro da Equipe Técnica nº 02
(2011) a cerca da escolha do tipo de oficina. Mesmo assim pensava e tinha dúvidas
se haveria de dar certo. Pensava que os doentes mentais já eram excluídos da
97
sociedade, tinham o estigma da doença mental, pior ainda trabalhar com o lixo, que
a própria sociedade quer se livrar. Era um dilema de preconceito a cerca do tipo de
tarefa, mas também era de fácil entendimento, pois tratava-se de capacitá-los para
atividade de triagem.
Naquela época a oficina iniciou com três pacientes do Hospital que tinham
todos os pré-requisitos para integrarem a oficina, pois já participavam do Clube da
Amizade. Saiam com a Terapeuta Ocupacional em busca de material reciclável no
próprio Hospital, conta o Membro da Equipe Técnica nº 02 (2011).
Surgiu a ATUT como uma oficina terapêutica. Era um trabalho com uma
dimensão bem mais reduzida e com o objetivo, a princípio, de fazer um atendimento
pontual ao paciente. Desde o início, na verdade, já havia uma ideia de transformar
esse tipo de atividade num trabalho que visasse à geração de renda efetiva e que
criasse um recurso sem a necessidade do custeio do Hospital. O trabalho já tinha
surgido com essa ideia e foi a mola mestra do Projeto do Galpão. Houve um
crescimento natural com a participação e inclusão e diversas empresas públicas e
privadas no Projeto.
[...] Na verdade a gente nunca fez um planejamento estratégico, empresarial,
foi sempre se agregando valor a esse trabalho, tempo e ele foi tendo um
crescimento de certa forma natural. (Membro da Equipe técnica nº 01, 2011).
A Associação recebeu apoio da Secretaria do Trabalho e Ação Social do Rio
Grande do Sul, que realizou um treinamento gerencial ofertando algumas opções
para que a ideia do Projeto avançasse. Este programa era do Governo do Estado e
era chamado “Coletivos de Trabalho”, que contemplava uma bolsa auxílio às
pessoas. Em contrapartida, essas participavam de um curso de formação. Ao final
desse curso a ideia era que as pessoas pudesse se capacitar e formar uma
associação de trabalhadores. Sendo assim, foi isso que acabou ocorrendo com o
Galpão ATUT, pois já tinha o Projeto, mas precisava capacitar os futuros associados
para o trabalho de triagem. Neste momento em 2000, também houve a parceria com
o Departamento Municipal de Limpeza Urbana de Porto Alegre (DMLU), que realizou
um treinamento de capacitação de cerca de três meses para que os associados
aprendessem a separar corretamente todos os tipos de materiais recicláveis. Assim
nasceu, através dessa parceria, a ATUT,como a 9ª Unidade de Triagem da cidade
de Porto Alegre, passando a integrar o projeto de Coleta Seletiva e gerenciamento
98
de materiais recicláveis coordenado por esse Departamento. A associação atendeu
ao padrão de gerenciamento do DMLU, que fornecia os materiais recicláveis para o
Galpão, oriundos da coleta seletiva da cidade. Cumpriam a obrigatoriedade de
devolver algum material orgânico para ser encaminhado ao Aterro Sanitário, selando
assim, o convênio ATUT e DMLU.
Foram analisados ofícios, atas e correspondências para que este momento
pudesse ocorrer de forma oficial.
9.2 NASCIMENTO E INSTITUCIONALIZAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO DOS
TRABALHADORES DA UNIDADE DE TRIAGEM DO HOSPITAL SÃO PEDRO
Com o passar do tempo, a estrutura do Galpão já conveniada com o DMLU
a capacitação dos participantes na oficina terapêutica, surgiu a ideia da
institucionalização do Galpão ATUT.
A Sociologia significa uma ciência que pretende compreender
interpretativamente a ação social e assim explicá-la em seu curso e seus
efeitos. (WEBER, 1994, p. 3).
Apareceram as primeiras ideias de como institucionalizar o Galpão de forma
de cooperativa ou em associação. No início o pensamento original era a de ser
montada uma cooperativa. Os membros da equipe técnica analisaram muitos
empecilhos de ordem física e jurídica, pois o público alvo poderia ou não ter seu
pleno direito civil. Havia ainda a situação legal da Equipe Técnica, pois já eram
funcionários públicos do próprio Hospital. Desta forma, não poderiam ter outro
vínculo empregatício. Mais ainda, o Galpão estava localizado no Hospital, não
cabendo assim o perfil de cooperativa.
Surgiu a alternativa de associação, já que assim poderia funcionar nas
dependências do Hospital. Para se formar uma associação foi necessário que a
Equipe Técnica formulasse um Estatuto Social, a fim de constituir uma entidade
física. Dessa forma os recicladores teriam um vínculo oficial com o Galpão.
O objeto de análise sociológica não pode ser definido como a sociedade, ou
como o grupo social, ou mediante qualquer outro conceito de referência nos
coletivos, cuja existência não ocorreria a Weber negar. O que ele sustenta é
que o ponto de partida da analise sociológica só pode ser dado pela ação
99
de indivíduos e que ela é ‘individualista’ quanto ao método. (COHN, 1991, p.
126).
Em 18 de setembro de 2002 foi criado o Estatuto Social e lavrada a Ata de
fundação da ATUT em Porto Alegre, oficializando-a enquanto Associação. O
Estatuto trata da constituição, sua denominação, seus fins, sua sede, sua duração,
associados, Coordenação, declarando que a ATUT é uma sociedade civil sem fins
lucrativos, com o objetivo de promover a unidade de seus associados em torno da
defesa dos direitos sociais e econômicos, sem distinção de raça, credo, cor e partido
político. (Estatuto Social - Associação de catadores de materiais recicláveis União
Vila e Hospital Psiquiátrico São Pedro, registro 1293266).
Art. 1º - A associação de Catadores de Materiais Recicláveis União Vila e
Hospital Psiquiátrico São Pedro, fundada em POA, 12 de setembro de 2002
é uma sociedade civil sem fins lucrativos, que objetiva promover a unidade
dos associados em torno da defesa dos seus direitos sociais e econômicos,
sem distinção de raça, credo, cor e partido político, com sede à Av. Bento
Gonçalves, nº 2460, bairro Partenon, cidade de Porto Alegre e constitui-se
por prazo indeterminado. (Estatuto Social da Associação de Catadores de
Materiais Recicláveis União Vila e Hospital Psiquiátrico São Pedro, 12 de
setembro de 2002. Registro 1293266).
Art. 2º Na perseguição de seus fins, a Associação trabalhará pela defesa
dos interesses e da valorização profissional de seus associados, tanto no
que tange à assessoria que lhes prestará para seu aprimoramento técnico,
celebração de contratos, prestações de serviços, realização de cursos,
desenvolvimento do espírito comunitário, como no que se refere à
colaboração com entidades afins, inclusive públicas, com as quais celebrará
convênios, além de representação junto à Federação Estadual das
Associações dos Recicladores de Resíduos Sólidos do Rio Grande do Sul FARGS (Estatuto Social da Associação de Catadores de Materiais
Recicláveis União Vila e Hospital Psiquiátrico São Pedro, de 12 de setembro
de 2002. Registro 1293266)
Constitui ainda, como documentos na memória do Galpão, a ata da
assembleia da Coordenação Executiva e três atas de assembleias extraordinárias
com data, respectivamente, de 16 de agosto de 2005 com a pauta do dia de
desligamento de uma associada, a ata de 18 de setembro de 2008, com a pauta do
dia de escolha através de eleição da Coordenação e demais cargos e a ata de 21 de
outubro de 2010, com a pauta do dia de nova eleição da Coordenação e demais
cargos. Foram esses documentos oferecidos à mim e dois livros de anotações
durante a pesquisa.
Nesse momento, a Associação contava com membros oriundos do Clube da
amizade, Morada São Pedro e da comunidade da Vila São Pedro, mesclando um
100
público heterogêneo, atendendo aos objetivos de funcionamento da Associação.
Sendo assim, após a sanção da Associação, desde 2002, a ATUT tem como
proposta, além da inserção dos moradores e usuários do Hospital, a interação da
população residente na comunidade da Vila São Pedro, no mercado de trabalho. O
convívio dos moradores e usuários do Hospital com as pessoas de fora do ambiente
hospitalar, propicia resultados positivos para sua recuperação. A entrada do pessoal
da Vila no São Pedro, também está ligada ao fato do Projeto Morada, residenciais
terapêuticos para ex-moradores do Hospital, estar localizado dentro da Vila São
Pedro. Esse Projeto faz parte do processo de desinstitucionalização e reinserção
social dos doentes mentais, e localiza-se externamente, atrás do Hospital.
O tipo ideal (o modelo) não deve ser confundido com a história. Os
conceitos e juízos não constituem a realidade, nem a reproduz a realidade,
apenas a "ordena" de modo válido (científico). (LIMA, 2008)
O nascimento desse Projeto vem da compreensão e da necessidade da
reabilitação psicossocial do ex-morador do Hospital. Para isto o Hospital, amparado
na Reforma Psiquiátrica, oportuniza aos doentes mentais, em melhores condições,
de retornar ao convivo social. As moradas denominadas residenciais terapêuticos do
Hospital estariam em condições de abrigar esses internos. Entretanto, esses não
tinham outra opção familiar. Assim muitos que estavam trabalhando no Galpão
ATUT eram moradores dessas residências. Eles circulavam pelo Hospital, quer seja
no trabalho quer em alguma atividade terapêutica, sob a orientação do mesmo.
Como a Morada ficava na Vila São Pedro, atrás do Hospital, a alternativa
que esse encontrou foi motivar a integração entre os moradores da Vila e os exmoradores do Hospital. Assim foi feita uma justa troca, no sentido de os exmoradores do Hospital poderem habitar a Vila e os moradores da Vila terem um
local para trabalhar na Associação, oportunizando uma integração social entre as
duas populações bem distintas, mas longe de serem saudáveis.
[...] Aquele ditado popular de que de louco todo mundo tem um pouco; existe
um imaginário social de desqualificação das pessoas, no momento que ela
tem algum transtorno psiquiátrico. Tanto que eu pessoalmente não costumo
alterar a minha ação técnica pela questão zoonografica (sic.), que remete à
questão de equilíbrio por um manual técnico, o diagnóstico. E tem pessoas
que até acham que eu não saberia dizer o que o sujeito tem. Estão
enganados, eu tenho total compressão zoonografica (sic.), mas eu utilizo ela
para denominar as essas. Nem na situação. Senão a gente acaba reforçando
101
esta questão da desqualificação. Se fosse efetivamente uma análise das
pessoas normais, que não passaram por uma avaliação psicológica ou
psiquiátrica, certamente a grande maiorias das pessoas ditas normais teriam
problemas emocionais menores ou maiores. Então na prática, isto não tem
uma diferença e a gente acabou migrando estas vagas, que eram do pessoal
da comunidade, para as pessoas do Hospital, por uma necessidade. Mesmo
estas pessoas que estão em fila de espera. A gente acha que é importante
privilegiar, no bom sentido dessas pessoas. É uma necessidade. (Membro da
Equipe Técnica nº 01, 2011).
Estes residenciais terapêuticos possibilitam aos
autonomia
tanto
desejada como
cuidados
pessoais
doentes mentais
de limpeza,
a
higiene,
alimentação, cuidados com suas roupas, e até mesmo a administração da
medicação prescrita pelo médico do Hospital, saindo em liberdade e experimentando
o retorno ao convivo social.
A triagem de materiais recicláveis, enquanto tarefa de reabilitação
profissional, desempenha um papel terapêutico importante junto aos doentes
mentais, contribuindo, de forma decisiva para o resgate da sua credibilidade social.
Da mesma forma, representa uma possibilidade concreta de geração de trabalho e
de renda aos moradores da Vila São Pedro, uma população com histórica
dificuldade de acessar o mercado de trabalho. Nesse sentido, a Associação se
integra na perspectiva de uma nova força de trabalho, atendendo também ao doente
mental, como forma efetiva de inclusão social deles nos vários campos de
convivência sócio-comunitária, cultural e no mundo do trabalho.
Além da atividade terapêutica e de inclusão social, também existe a
reocupação, que alia a geração de postos de trabalho à construção de uma
consciência ecológica e cidadã. Essa atividade contribui na destinação dos materiais
recicláveis, produzidos em grandes quantidades, pela sociedade contemporânea.
No início, a Associação possuía quarenta e seis associados à ATUT, que se
mesclavam entre metade com doentes mentais em reabilitação e moradores da
comunidade. Essa mescla, entre públicos tão distintos, proporcionava o convívio
social e a integração.
[...] No início eu sempre dizia, a nossa unidade de triagem tinha dois grupos:
o grupo da comunidade e o grupo de pacientes.Queira ou não queira, acaba
sendo um grupo dividido. E pela quantidade que hoje nós temos de
associados, maioria são pacientes, nós da comunidade somos cinco pessoas.
Então, hoje acaba sendo um grupo só. Não há mais diferenças, e as
diferenças que há, é para melhorar o serviço. O pessoal da Comunidade lida
com a picotadeira. (Morador nº 03)
102
Na prática, o que se observa é um grande rodízio de entra e sai de pessoas
da comunidade no período 2003 a 2009, observando a análise documental do Livro
de Registros e Atas do Galpão. Esses registros, inicialmente são bem organizados e
detalhados, separados por assuntos. À medida que o Galpão foi crescendo, esses
tornam-se confusos, apenas são recados misturados em meio a atas de
assembleias, ocorrências de entradas e saídas de associados, algumas ocorrências
eventos clínicos como comportamentais, intervenções sobre a saúde, infraestrutura,
higiene e limpeza, organização e normas internas, atas de reuniões do Galpão,
reservas de vagas, entradas ou desligamentos. Estes eventos foram anotados de
forma desorganizada. Encontram-se anotados em dois livros, num período
compreendido entre 2003 a 2011. À medida que muitos eventos foram registrados,
percebe-se a falta de tempo para esta atividade. A precisão dos assuntos se
mistura, as caligrafias são diferentes, o que leva a crer que várias pessoas fizeram
suas anotações no livro, em duplicata, sobre o mesmo assunto. Verificou-se que, no
início da institucionalização do Galpão existia uma organização nos registros.Era um
livro de registros de atas de assembleias, mas depois tornou-se um livro de registro
de tudo que ocorria no Galpão, como um diário.
Os eventos clínicos foram anotados, desde o início, sempre por algum
integrante da Equipe Técnica, já que é de sua responsabilidade resolve-los. Esses
registros são descritos sucintamente pelo quadro do ocorrido ou pela medicação
indicada. Podiam ser de ordem comportamental ou de alguma intervenção relativa à
saúde. Eram, na maioria de eventos descritos de pacientes, mas alguns, de
moradores da comunidade. Isso me remete a constatar que os moradores da
comunidade acabam também adoecendo, necessitando de algum atendimento da
Equipe Técnica.
[...] Ai eu acho, assim como está, tá bom... são muito importantes, no dia que a gente
tá muito nervoso, triste a gente entra na sala deles, eles conversam com agente... eu
achava que nem tinha mais função... hoje sei que tenho... (Paciente nº 07).
As anotações relativas à infraestrutura não apresentam um crescimento ou
diminuição, são apenas dados soltos no livro de registro. Não apresentam
periodicidade nem organização ao longo dos anos. São eventos relativos à
consertos de máquinas, troca de lâmpadas, extintores de incêndio, conserto da
Kombi. Percebe-se que não há uma preocupação em ter uma manutenção
103
preventiva sobre a infraestrutura do Galpão. Caso aconteça um problema de ordem
da infraestrutura, ele é sanado de acordo com a disponibilidade de manutenção do
Hospital ou de outro serviço externo.
A higiene e a limpeza foram especialmente itens bem importantes, no ano de
2009. Nessa ocasião foram feitos dois banheiros para os associados, um masculino
e um feminino. Isso os motivou a utilizar estes espaços adequadamente, respeitando
a higiene e a limpeza. Decidiu-se que dois associados cuidassem da higiene e da
limpeza dos banheiros a cada dia, fazendo um rodízio de modo que todos
colaborassem com esta tarefa extra.
Atualmente, a limpeza dos banheiros é feita por pessoal terceirizado do
Hospital, mas ainda existe a observância do local se manter limpo e organizado no
cotidiano do Galpão. Essa postura é salientada nos momentos diversos do Ciclo de
Palestras, que muitas vezes são motivadoras e instigadoras promovidas pelo Projeto
de Extensão ATUT: reciclando vidas com inclusão social, da UFRGS. Para a maioria
das pessoas algumas atividades tornam-se corriqueiras, já para os doentes mentais,
existe dificuldade de manter a periodicidade destas atividades, como cuidar de seu
corpo, lavar as mãos diariamente. Eles necessitam de motivação e determinação
para praticar pequenas atitudes, e agregá-las ao seu dia-a-dia, ou seja, buscar a
lucidez, ao acordar, fazer a higiene, se arrumar para trabalhar, tomar café, sair para
o trabalho, pegar um coletivo, chegar ao trabalho, bater o ponto, ir para seu posto. A
rotina para os doentes mentais em reabilitação é importante, mas nem sempre é
cumprida. Para essas pessoas que buscam uma reabilitação e a lucidez perdida
com a doença mental é um trabalho difícil a cada dia que nasce.
Durante as entrevistas foi notado que a higiene e limpeza e rotina de
trabalho, para eles, tornou-se algo de vital importância. Eles procuravam fazer isso,
mas encontravam muita dificuldade para vencer as tarefas. Percebi que eles se
encontravam como se estivessem diante de um espelho e se vissem presos pelo
seu estado mental. À medida que buscam a realidade, fazem o tratamento de forma
correta, traduzindo a reabilitação através do cotidiano. Essas pessoas começam a
sair de dentro desse espelho e conseguem voltar à realidade, libertando-se da
prisão deles próprios. Foi assim que ao longo das entrevistas que refleti sobre as
falas dos pacientes, que na sua maioria relataram seus problemas de ordem
psíquica e emocional, mesmo sem serem instigados sobre este assunto. Serviu
104
como um momento reflexivo pessoal para mim e isso não foi utilizado como dados
de pesquisa.
[...] Ela voltou para o mundo, ela antes não queria tomar banho, ficava num
quarto escuro. A minha mãe me botava embaixo do chuveiro, me amarrava
para tomar banho. Não podia comer, estava enorme de gorda, um cabelão.
Agora eu tomo meu banho, minha higiene, quando eu estou bem, eu ajudo os
meus amigos. Agora eu sou gente. (Paciente nº 04).
Em relação às normas e à organização, durante o período descrito, vê-se
um acréscimo significativo em relação à quantidade de eventos anotados,
mostrando que a Associação deu um grande valor a este item. Houve cerca de 20
eventos anotados no Livro de Registro. Podem ser de caráter normativo envolvendo
o grupo, resolvidos em reunião, decididos pela Equipe Técnica, referentes à
organização geral do Galpão em relação às tarefas ou de informações para os
associados. Nos anos de 2007 e 2008 foram anotados cerca de 20 eventos com
esta temática, mostrando a necessidade de tomar decisões de caráter normativo e
de organização, visto que o número de associados era bem alto e havia muito
serviço dentro do Galpão. Nota-se que existe uma significativa preocupação com os
registros dos eventos, pois os mesmos aparecem todos os anos. Mostra também
uma ordenação crescente em relação ao assunto organização
Os registros encontrados nos livros, atas, assembleias ou reuniões, são de
ordem decrescente à medida que a Associação toma corpo. No seu início, para se
constituir a Associação foram necessárias muitas reuniões, nas quais todos
associados participavam. Um fato peculiar para o número elevado de reuniões nos
primeiros quatro anos do Galpão, foi o fator de integração dos grupos envolvidos, e
a pouca quantidade de material reciclável que chegava ao Galpão. O grupo tinha
tempo para reuniões, estruturando a sistemática da Associação.
Eram reuniões ordinárias, assembleias de todo grupo ou reuniões da
Coordenação da Associação com a Equipe Técnica. Na medida em que a
estruturação se estabilizou, a quantidade de reuniões foi diminuindo e chegou a cair
a zero em 2010. Essa diminuição deveu-se também ao fato de que a quantidade de
material reciclável a ser triado foi crescendo e as tarefas dentro do Galpão, se
avolumando. Assim o espaço para reuniões do grupo, para discussão sobre a
Associação, passou a segundo plano, somente em momentos importante para
resolução de problemas que envolvesse o grupo todo.
105
Outro fato importante, que contribuiu para diminuição das reuniões, foi que
a Associação, desde o final de 2008, passa por um novo momento com a saída da
maioria dos moradores da Comunidade. Hoje ela conta com apenas seis integrantes
da Comunidade.
A saída dos moradores se deu pelos mais variados fatores, tais como,
econômico, melhor condição de trabalho destes, gestações, dificuldade de
integração ou opção em trabalhar como autônomo. Uma justificativa marcante para
saída, foi de fato a dificuldade de trabalhar com os doentes mentais por achar que o
trabalho deles não rende e sobrecarrega o dos moradores da comunidade.
[...] Na realidade a gente sempre fez que não houvesse uma diferença, que
eles trabalhassem juntos, mas a gente sabe que existe. O pessoal da
comunidade trabalham mais, geralmente não é uma regra. Tem muitos
pacientes que trabalham muito bem, mas é que acontece de algum da
comunidade trabalhar muito além deles. E esse é objetivo, eles estão no
espaço dos pacientes trabalhando, para que eles também ganhem, é uma
troca. Eu acho isto muito bom, às vezes os pacientes esquecem que são
pacientes. De tão igual, que são integrados. (Membro da Equipe Técnica nº
03)
A saída deste grupo se deu aos poucos. Enquanto outros chegaram para
trabalhar, entretanto, nem todos se adaptaram, ou por outro motivo, não ficam na
Associação.
Segundo a Equipe Técnica, não existe um motivo maior para a saída desse
grupo. Os próprios pacientes também entram e saem, em grande número, mais pela
falta de condições de adaptação à tarefa e ao cotidiano de trabalho. Observou-se
que a partir de 2008 existiu um momento de transição e de formação de um novo
perfil do trabalhador do Galpão. Novas frentes de trabalhadores foram buscadas
pela Equipe Técnica que abriu vagas a outras instituições, que abrigam doentes
mentais em reabilitação com condições de manter uma rotina de trabalho.
Inicialmente de forma experimental e, se conseguir manter suas atividades,
efetivando-se na Associação.
[...] A gente costuma fazer uma avaliação com três critérios: o emocional,
psiquiátrico, sujeito não pode estar agressivo, com alucinações nem delirante.
Nem com alucinação. O critério ocupacional, que é as condições de trabalho,
que a pessoa apresenta e o critério social, necessidades que a pessoa tem.
Todos estes critérios são entrecruzados e bem elásticos, estou falando de
uma tolerância bem elástica. (Membro da Equipe Técnica nº 01)
106
Nota-se que em no final de 2009 o novo perfil começou a ser moldado e os
próprios associados começaram a se adaptar com um grupo maior de pacientes
doentes mentais. Parece que entre os associados moradores da comunidade e os
doentes mentais, a diferença é em relação à quantidade de conflitos. Esses
acontecem em maior número e aumenta a intervenção da Equipe Técnica no
cotidiano da Associação. Esse também é um motivo para que o número de reuniões
diminua, pois não há tanto espaço para elas, no cotidiano do Galpão.
As resoluções passam por pequenas reuniões entre da Coordenação com a
Equipe Técnica e posterior conhecimento do grupo todo.
Atualmente a Associação tem um número de 50 associados, podendo variar
para mais ou para menos, dependendo do número das saídas. Ela estabilizou neste
patamar em relação à condição dos associados a disponibilidade de material
reciclável para triagem por mês, bem como à condição de atendimento da Equipe
Técnica disponível. O número de associados com doença mental em reabilitação é
de aproximadamente 44 e dos moradores da comunidade é de 6 associados.
A pesquisa mostrou que, embora os números reduzidos de associados
moradores da comunidade, os mesmos, estão satisfeitos em dividir a força tarefa do
Galpão com este outro grupo bem peculiar formado de doentes mentais, não fazem
distinção e nem referência ao fato da existência da doença.
[...] Olha, no começo eu vim só para experimentar. Daí fiquei e adoro
trabalhar aqui, me dou bem com os meus colegas, somos todos iguais aqui
dentro. (Morador nº 01).
O registro de saídas, entradas, ou mesmo desligamentos, ficou a cargo da
mudança de panorama do Galpão nestes últimos quatro anos. Agora contempla o
novo perfil, retomando a importância da questão terapêutica e considerando a parte
financeira dos associados, como gerador de trabalho e fonte de renda.
O Membro da Equipe Técnica nº 02 (2011), sempre buscou e cobrou dos
associados, a lembrança do lado terapêutico da atividade de triagem de material
reciclável. O Membro demonstrou satisfação pelo retorno do lado terapêutico do
Projeto de reabilitação da ATUT, buscando um grupo maior de doentes mentais em
situação de exclusão social e econômica.
107
[...] Hoje em dia não me assusta mais doente, vai se apropriando com a
situação, pois a gente hoje em dia está abrindo para pacientes, da
comunidade e pacientes da grande Porto Alegre, isto é uma grande vitoria. A
vontade deles de ter alguma coisa diferente e com o dinheiro que eles
recebem, faz a diferença. A vontade de ter uma rede, isto tudo faz com que
eles voltem ao trabalho se motivem. São coisas simples, também ampliem a
amizade. Hoje é grupo grande, bem diferente, mas com subgrupos, que
tenham mais afinidade. Mas na grande maioria eles se acolhem, se aceitam,
é muito bom ver eles integrados, mas também tem muita confusão, muita
disputa, um tem mais que o outro, é o normal. É o que representa o mundo lá
fora. (Membro da Equipe Técnica nº 02).
Acentuado o número de registro nos livros, nos últimos anos, se deu pela
razão da abertura de novos postos de trabalho, e também desligamentos,
considerados normais pela Equipe Técnica.
Mesmo assim, nas entrevistas que fiz com os moradores da comunidade
busquei informações a cerca dos que saíram. Muitos desses ainda não conseguiram
uma nova colocação, estão fazendo bico na Vila e outros já estão em algum serviço.
Alguns se arrependeram de se retirar do Galpão.
[...] De lá para cá, quase dez anos de trabalho, já entrou e saíram pessoas,
alguns conseguiram serviço fixo, outros estão trabalhando individual. Outros
que saíram voltaram, mas saíram de novo, não dando certo. Mas outros, eu
sei, estão sem nada até hoje. (Morador nº 03).
Uma das principais queixas dos associados moradores da comunidade era
que o valor do salário mensal variava muito ou era baixo. Não tinham carteira de
trabalho assinada e nem décimo terceiro salário. Por essas razões, no momento da
entrada de algum novo membro é esclarecido como se ocorre a divisão dos recursos
obtidos com a venda do material reciclável, e ele que está fazendo parte de uma
Associação sem vínculo empregatício ou lucro. Ela sobrevive do material reciclável
triado, com um valor agregado de venda de acordo com a cotação na Bolsa de
Valores dos recicláveis e do comprador (revendedor) dividido por horas trabalhadas
por mês.
[...] Existe uma maturidade deles, saberem o porquê, existe esta diferença. E
tudo melhorou até pela situação financeira. E no inicio adquiriu muitas coisas,
pagava muitas despesas, agora dá mais para dividir o dinheiro. (Membro da
Equipe Técnica nº 03)
108
Mesmo exigindo uma demanda por maior trabalho terapêutico e psicológico
dos integrantes da Equipe Técnica, eles estão apostando muito no novo perfil da
Associação. As dificuldades são muitas, pois conciliar um grupo grande em
reabilitação, e também promover uma geração de renda, é uma tarefa complexa. A
Equipe Técnica optou por esta nova experiência e acha que está dando certo, pois
tem consciência de estarem dando uma oportunidades para estas pessoas,
estigmatizadas pela doença mental.
109
10 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Galpão de reciclagem ATUT apresenta singularidades em relação ao
comportamento dos associados e em relação à Associação com lugares bem
definidos e importantes. Alguns participam e interagem mais do que outros, mas se
complementam no cotidiano deles. Dentre os associados à posição da Coordenação
do Galpão é de orientar as tarefas diárias, agendando a busca de materiais
recicláveis com os parceiros; o motorista com a responsabilidade de cumprir a
agenda diária com os parceiros e entrega-los ao Galpão. Os associados, das mesas,
do
grupo
dos
plásticos,
picotadeira,
prensas,
enfardamento
tem
suas
responsabilidades. É uma engrenagem de pessoas e funciona como uma fábrica. O
horário a cumprir, a disciplina entre os associados com a Coordenação do Galpão
são vistas como peculiaridades importantes.
Nessa engrenagem diária agrega-se o fato de a maioria dos associados,
terem doença mental, mas encontram-se em reabilitação, em busca contínua de
uma reinserção social, emocional e econômica dentro da sociedade.
A Equipe Técnica tem um caráter importante de mediar e solucionar as
questões entre os associados e também contribuir com a Coordenação do Galpão
nos aspectos administrativo-financeiros. A baixa escolaridade e a doença mental
constituem o paradigma diário do funcionamento da ATUT. O dia-a-dia do Galpão
não segue uma rotina rígida, depende primeiro, do estado mental dos associados, e
do número que comparece ao trabalho ou mesmo de quem vai se ausentar para
alguma consulta médica. Ao observamos o Galpão parece uma grande bagunça,
existe desorganização, mas quando participamos do processo, pudemos observar e
entender esses entraves como normal. É o cotidiano do Galpão. Ele funciona dentro
destas realidades. Para o bom funcionamento, a atuação da Equipe Técnica, é como
um guarda chuva, ou mesmo cuidadores, orientando todas as questões disciplinares
emocionais e também administrativas.
A pesquisa mostrou que os entrevistados e mesmo os próprios membros da
Equipe Técnica concordam com a existência desta agindo diretamente no cotidiano
do Galpão. Ela orienta as questões jurídicas entre o Galpão e o Hospital e
providencia a manutenção dele. Nas questões de auxilio psicológico e terapêutico
observaram-se momentos de contenção com associados.
110
Aconteceram alguns episódios de ordem disciplinar, onde houve a
necessidade de intervenção da Equipe Técnica com o associado envolvido. No
projeto do Galpão é correto dizer que a existência deste grupo de profissionais
agindo diretamente no Galpão é relevante.
Também é importante ressaltar a relevância da existência do Galpão nas
dependências do Hospital São Pedro, trazendo melhores condições de retorno ao
tratamento à doença mental, no processo de reabilitação do paciente. É importante
destacar o fato de o Galpão fazer parte deste Hospital, mesmo com estrutura
administrativa e operacional independente dele.
A reabilitação não é um processo ortopédico: a cura é busc ada a cada dia e
se possível, dentro de um contexto de inclusão emocional, familiar, profissional e
econômica. O doente mental está num estado permanente de reabilitação, assim
como os viciados em alguma droga. Eles necessitam praticar todos os dias a
disciplina, o exercício da cura. Sabe-se que contribui excepcionalmente para com
estas pessoas o acolhimento familiar junto ao terapêutico (Membro da Equipe
Técnica nº 01, 2011).
Na pesquisa percebeu-se que os pacientes e associados do Galpão, mesmo
não morando mais no Hospital, preferem as casas de passagens, os abrigos, onde
encontram cuidadores e quando apresentam uma melhora e estabilização da saúde,
são encaminhados para uma atividade terapêutica ou trabalho.
Hoje o Galpão ATUT oferece esta oportunidade. Tornando-se uma
possibilidade da Reforma Psiquiátrica, que preconizou o retorno integral do doente
mental às suas residências, ao convívio familiar e social. Nas conversas com os
associados, eles relataram fatos pessoais que me levou a pensar e concluir que os
mesmos não retornam ao convívio da família. Várias vezes os ouvi dizerem: “moro
sozinho”; “estou na Pensão Nova Vida”, “no Abrigo Bom Jesus”, “moro com mais
dois colegas do Galpão”, “aluguei uma peça para morar”, “moro na Morada da Vila.”
Chamou-me a atenção este fato e, conversando com a Equipe Técnica pude
desvendar a mais cruel realidade de que, dentro da própria família, onde se
esperaria que zelassem por eles, é onde se dá o desencadeador da doença mental.
Assim o doente mental, mesmo após inúmeros atendimentos e internações, não
quer retornar à sua casa ou família. Prefere o acolhimento do Estado. Esta é a
realidade deles, é uma verdade.
111
A própria família muitas vezes é quem o exclui, colocando-o dentro do
manicômio, através de maus tratos, abusos sofridos que jamais foram esquecidos.
Muitos associados, nos momentos de conversas informais, relataram fatos
extremamente chocantes de suas histórias de vida. Mas o que me deixou menos
ansiosa ou triste é que eles conversam, e desabafam seus problemas passados e
estão felizes. Pareceu-me como se estivessem falando de outra pessoa, como se
fosse uma história alheia. A situação familiar foi elaborada, e com o auxilio de
medicações, eles conseguem sair do evento que gera o sofrimento. Assim, o
processo de reabilitação e de melhora emocional torna-se efetivo. Estes fatos não
foram mencionados neste trabalho, serviram somente de base de informação
histórica sobre a doença mental. Para os associados doentes mentais em
reabilitação todo dia é um novo dia: passando pela rotina de levantar; tomar banho;
o café da manhã; os remédios; higiene pessoal e bucal; a vestimenta; sair de casa
para o trabalho no Galpão. É uma rotina e também o motivador da reabilitação.
Nesses fatos encontramos a significação da existência do Galpão de
reciclagem ATUT. Esse local possibilita a integração de pessoas esquecidas pela
sociedade. A promoção da atividade de triagem é de caráter muito singelo e de fácil
compreensão para pessoas. Mesmo assim o entendimento simples torna-se
complicado e não sendo possível de ser realizado por eles.
Uma condição extremamente importante para a existência do Galpão é a
capacitação dos associados para uma atividade de caráter terapêutico. A Equipe
Técnica é unânime em dizer que o trabalho no Galpão é levado a sério pelos
associados doentes mentais e proporciona uma reabilitação mais eficaz, tirando a
pessoa de episódios contínuos de retorno ao Hospital e de internações.
O Galpão de reciclagem é um promotor da reabilitação e esta leva à inclusão
social e econômica do doente mental. A pesquisa mostrou que muitos associados,
os mais antigos, hoje encontram-se em melhores condições sociais. Os associados
mais novos estão almejando uma melhoria social e econômica com o trabalho no
Galpão. Essas são todas condições importantes para se dizer que a pessoa doente
mental esteja no processo de reabilitação e inclusão social. É um conjunto de fatos e
ações diárias que remete o associado a este estado.
A atividade de triagem de um material reciclável, antigamente denominado
como lixo da sociedade, que ela descarta, não torna o associado reciclador menos
nobre ou menos importante. Os associados dentro do grupo de recicladores são
112
como os saneadores do meio ambiente. Eles estão cooperando com a limpeza das
cidades, dando um destino correto a um contingente enorme de recicláveis, fazendo
com que estes retornem à cadeia produtiva através da indústria. Essa ação elimina a
necessidade da construção de número maior de aterros sanitários e também da
deposição de materiais recicláveis no solo, que demoram muito tempo até a sua
decomposição natural.
Os associados antigos, que participaram da fundação do Galpão, têm a
compreensão sobre a importância da atividade de triagem e gostam do que fazem.
Assim apresentam uma postura positiva em relação a trabalhar diretamente com
este material. Alguns não gostam de falar sobre o processo de triagem de material
reciclável, porque não se sentem confortáveis ao fazê-lo.
Os associados mais novos, que entraram nos últimos três anos quando o
número de associados doentes mentais aumentou substancialmente, sabem que
estão fazendo um bem à natureza. Concordam que é importante, ou nem sabiam
que este lugar existia, mas depois de vivenciar a rotina do Galpão, concordam com a
importância da existência dele.
Alguns poucos associados fazem menção de que trabalham no Galpão
porque foi o único local onde foram aceitos, o que não torna menos importante a
atividade de triagem e nem todo o processo organizacional do mesmo.
Fica claro na pesquisa que a baixa escolaridade e a doença mental fazem os
associados confundirem estas posições, mas em algum momento das entrevistas,
eles concordam que para eles é uma ferramenta de reabilitação e de inclusão social.
Assim entendemos a necessidade da Lei que obriga a todo local comercial a
acolher um deficiente, mas que se torna complicado no caso do doente mental, pois
o legislador não conhece os meandros da doença mental.
O doente mental não possui capacidade de exercer uma atividade sem a
orientação de profissionais especializados no seu cotidiano, como psicólogo, como
terapeuta ocupacional. O Galpão tem a condição necessária por encontrar-se dentro
de uma instituição hospitalar. Esse disponibiliza uma Equipe Técnica com
profissionais especializados para orientar o doente mental em reabilitação que
participa da Associação. Permite-lhe a liberdade de ação diária de atuação dentro do
processo organizacional e de tarefas do Galpão. O caso mostra bem esta situação
que beneficia essas pessoas em reabilitação na sua busca de reinserção.
113
O Hospital tem a preocupação de manter alguma parceria junto ao
associado, disponibilizando a alimentação, medicação e uma possível internação, se
necessária.
Ainda fazem parte da força de trabalho os moradores da comunidade que
não são menos importantes, são pessoas chaves dentro do sistema organizacional
do Galpão. Eles se ocupam das tarefas mais complexas, buscando o material
reciclável dos parceiros e contribuem com a organização diária do Galpão ou
operando as máquinas mais sofisticadas que necessitem de uma maior percepção e
cuidado no manejo. São atividades que os pacientes não podem desenvolver, mas
podem colaborar. A pesquisa mostrou que, com o aumento dos doentes mentais na
força de trabalho da Associação a responsabilidade da Equipe Técnica também
aumentou. São inúmeras solicitações de ordem emocional, de tarefas, saídas entre
outras.
Durante o período de observações foi visto que pelo menos uma vez, cada
componente da Equipe Técnica, esteve de licença saúde, acarretando sobrecarga
de trabalho terapêutico aos outros integrantes. Os motivos das licenças eram
doenças de ordem ocupacional, dores na coluna e estresse, mostrando bem a
origem delas. A Equipe Técnica se mostrou atenciosa e buscou resolver, da melhor
forma, a ordem de toda Associação. O bem-estar da maioria dos associados é o que
importa. As decisões são tomadas com ponderação e observações.
O Galpão representa uma nova oportunidade para pessoas drogadas que
estão cumprindo pena prisional no Instituto Forense, em fase de reabilitação, como
a pena progressiva. É um novo desafio ao Galpão acolher estas pessoas, pois são
vindos de outra camada da população também excluída, os drogados, e ainda
cumpridores de uma pena prisional. Assim eles necessitam de uma atividade
profissional como fonte de reabilitação das drogas. A integração destes associados
com os outros foi positiva, não foi percebido preconceitos ou brincadeiras em torno
da origem.
A pesquisa do estudo de caso do Galpão de reciclagem possibilitou a
construção, com uma metodologia adequada e a partir da análise de suas
singularidades do estudo, a criação de um modelo sustentável de inclusão social,
com geração de renda e trabalho envolvendo a triagem de materiais recicláveis, que
possa ser reutilizado por outros grupos de pessoas excluídos do processo trabalho e
emprego sociais.
114
Com a análise de documentos, a pesquisa de campo e com contato direto,
não só com as pessoas envolvidas nas tarefas cotidianas que se passam na
Associação, percebeu-se esta possibilidade a partir de experiências vividas.
Com o caso já estudado notamos que a Associação, ao longo do seu tempo
de existência, foi tomando novas dimensões em relação às questões que se
apresentavam e também encontrando soluções que pudessem torná-la realizável.
Mesmo assim observou-se no estudo de caso que muitas vezes não foi seguida uma
metodologia e nem uma continuidade nas ações apresentadas. A partir deste
diagnóstico existe a possibilidade da construção de um modelo para ressocialização
e promoção da inclusão social de doentes mentais, que são pessoas historicamente
excluídas. Tendo em vista o público alvo estar em crescimento, as instituições
psiquiátricas, mesmo dentro da Reforma Psiquiátrica, devem estar atentas a uma
necessidade maior de orientação e de recondução dos doentes mentais a luz da
sociedade.
Não somente devolvê-las à família, mas também proporcionar programas
permanentes de reabilitação. Sabe-se que o doente não só passa por um programa
de psicoterapias, tratamentos medicamentosos, mas também por uma possibilidade
de uma atividade, que possa leva-lo a uma rotina saudável. O trabalho é
significativamente um motivador, pois ele leva o doente mental em reabilitação a
estar atento à realidade e a manter sua rotina, seja terapêutica ou de atividade.
Dessa forma, uma instituição pública é capaz de oferecer a estrutura física e o corpo
técnico, para assim formar um galpão com a finalidade de tornar-se uma associação,
um grupo de possibilidades de caráter terapêutico e de atividade econômica,
gerando assim inclusão social. É recomendável uma equipe multidisciplinar, com
mais profissionais, além de Psicólogo, Terapeuta Ocupacional e funcionário
financeiro-administrativa. Seria recomendável agregar-se a este modelo, uma equipe
mais robusta, com mais profissionais para manter uma melhor condição em relação
à saúde dos trabalhadores, como profissionais de administração, psicopedagógica,
de relações públicas, para que pudessem auxiliar nas mais diversas ações que um
galpão tenha que se envolver e de caráter organizacional.
A capacitação da coordenação do galpão é importante, pois nela concentra
as atividades de relações interpessoais e de organização deste. Viu-se no estudo de
caso que falta uma melhor capacitação e maior independência para exercer suas
atividades.
115
Na maioria das vezes, a Equipe Técnica, tem que intervir nas situações
cotidianas do Galpão, além dos eventos de natureza psicoemocional. Acredito que
modernizando as relações organizacionais tanto da Equipe Técnica como da
Coordenação com os associados, deverá melhorar as atividades cotidianas do
Galpão. Essa modernização oportunizará uma melhor organização e um ambiente
de trabalho mais aprazível. Assim também a modernização de maquinários e a
disponibilidade de ampliação do local do Galpão lhe trarão benefícios. Os
associados se mostram motivados para novas mudanças desde que sejam
disponibilizadas através do diálogo com todo o grupo. Eles acreditam no grupo como
um todo. Atualmente o poder Público Federal, com suas práticas inclusivas e
algumas empresas privadas, estão disponibilizando editais que contemplam, aos
galpões de reciclagem, novas infraestruturas, possibilitando sua modernização.
Cabe à Equipe Técnica estar atenta e participar deles, pois é um meio dos galpões
se modernizarem.
A coordenação do galpão, podendo contar com mais conhecimento e
capacitação, possibilitará uma atuação mais efetiva sobre as atividades diárias no
mesmo, favorecendo a diminuição de intervenções da equipe técnica, por algum
motivo alheio à parte psicoemocional dos associados. Ela assim pode ampliar suas
atividades relativas à reabilitação do ponto de vista emocional, sem ter que estar
constantemente “apagando incêndios”, entre os associados.
Entendo que as necessidades são muitas e poucos são os investimentos na
área da saúde mental. Deve-se apostar neste projeto de geração de renda para
atendimento de necessidades básicas de associados do Galpão de reciclagem
ATUT. Ele tornou-se um modelo de possibilidade para muitas outras pessoas que
estão na mesma situação de vulnerabilidade, tanto social quanto econômica, um
Galpão de reciclagem inclusivo.
É um projeto que alia a facilidade de capacitação com o entendimento da
atividade de triagem, mas que leva o doente mental a uma rotina de trabalho e que
além de gerar bem-estar, possibilita reabilitação mais efetiva, com a geração da
inclusão social e econômica dessas pessoas.
O momento atual, com necessidades e perspectivas de preservação do meio
ambiente, a atividade de reciclador ou catador é uma opção e apresenta-se como
uma grande possibilidade para os doentes mentais em reabilitação.
116
Assim aliam-se áreas multidisciplinares de saber em busca do projeto de
reabilitação do doente mental que possa proporcionar a inclusão social e econômica.
É uma possibilidade que tem as condições de sucesso, pois o Galpão ATUT,
com todas as suas limitações, já está chegando aos 10 anos de vida, em condições
de expansão, ainda que necessite de reformas na área estrutural e organizacional.
Para quem iniciou como uma oficina de terapia de reciclagem, ele é plenamente um
sucesso e serve como paradigma para outras instituições que trabalhem com
doentes mentais em reabilitação.
A necessidade de cuidado com o meio ambiente, da existência da coleta
seletiva, é uma obrigação e representa uma mudança de hábito e de novas
maneiras de olhar e preservar a natureza. Certamente não faltará material reciclável
a novos galpões, mas também é certo que mais doentes mentais irão buscar
oportunidades de reinserção.
O trabalho que os associados fazem no Galpão de triagem de material
reciclável, não só beneficia a natureza, através da reciclagem, mas estão
constantemente reciclando vidas com inclusão social. A reabilitação ocorre de
maneira efetiva, dentro do cotidiano do doente mental.
Com a intenção de oferecer elementos para continuidade desta pesquisa,
elenco alguns indicadores, a partir do trabalho realizado.
1. Relevância da instalação do galpão estar nas dependências de uma
instituição que possa dar suporte aos associados com doença mental em
reabilitação, como fator suporte.
2. Um número maior de casas de passagem, com equipes necessárias para que
o doente mental possa administrar seu dia-a-dia, após a internação.
3. Outros galpões que possam receber as pessoas doentes mentais como
associados ou cooperativados.
4. Um número maior de pessoas da comunidade no galpão, como associados.
5. O processo de triagem de materiais recicláveis como forma de capacitação
fácil para pessoas de baixa escolaridade.
6. Maior capacitação para Coordenação do galpão, buscando um gerenciamento
mais qualificado.
7. A conscientização, a cerca do meio ambiente, entre os associados.
117
8. Uma equipe técnica maior, com outros profissionais da saúde dando suporte
terapêutico à associação.
9. Uma organização maior, possibilitando um local de trabalho mais aprazível
aos trabalhadores.
10. Maior informação em relação aos materiais recicláveis recebidos, como
documentos sigilosos e sua fragmentação, para fomentar as parcerias e
disponibilidade do serviço.
11. Prioridade na constituição de galpões de reciclagem para atender aos
dispositivos da Lei nº 12.035 de 2 de agosto de 2010 da Política Nacional de
Resíduos Sólidos (PNRS).
118
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121
ANEXOS
RELAÇÃO DE ANEXOS
1 – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA IPA ............................................................. 122
2 – TERMO LIVRE CONSENTIMENTO ESCLARECIDO E IPA ............................. 123
3 – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA DO HOSPITAL SÃO PEDRO E
DECLARAÇÃO ..................................................................................................... 126
4 – ESTATUTO SOCIAL DA ASSOCIAÇÃO ............................................................ 127
5 – ATA DA FUNDAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO ........................................................... 130
6 – ATA DA ASSEMBLEIA EXTRAORDINÁRIA ..................................................... 131
7 – ATA DA ELEIÇÃO DA COORDENAÇÃO EXECUTIVA ..................................... 132
8 – ATA DA ELEIÇÃO DA COORDENADORA EXECUTIVA .................................. 133
122
ANEXO 1 – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA IPA
123
ANEXO 2 - TERMO LIVRE CONSENTIMENTO ESCLARECIDODO E IPA
124
ANEXO 3 – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO E IPA
125
126
127
ANEXO 4 - ESTATUTO SOCIAL DA ASSOCIAÇÃO
128
129
130
ANEXO 5 – ATA DA FUNDAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO
131
ANEXO 6 – ATA DA ASSEMBLEIA EXTRAORDINÁRIA
132
ANEXO 7 – ATA DA ELEIÇÃO DA COORDENAÇÃO EXECUTIVA
ASSEMBLÉIA GERAL
Ata de Eleição da Coordenação Executiva
Aos onze dias do mês de novembro de dois mil e
quatro, reuniram-se em Assembléia Geral, na sede da associação dos
Trabalhadores da Unidade de Triagem do Hospital Psiquiátrico São
Pedro – ATUT, os associados abaixo assinados, a fim de eleger os
novos membros da coordenação da ATUT, que assim ficou
constituída:
Elaine Carvalho, coordenadora geral; João Rodrigues Bonfim, vicecoordenador; Antônio Everaldo Moreira, primeiro secretário; Juarez
Santos da Rosa, segundo secretário; Daniel Bicca Ribeiro, primeiro
tesoureiro; Almir da Silva Rodrigues, segundo tesoureiro. Os
membros da diretoria, permanecerão em seus cargos pelos próximos
dois anos, conforme prevê o Estatuto. Ata lida e assinada por mim,
Antônio Everaldo Moreira e pelos demais:
Almir da Silva Rodrigues
Amauri Ramos
Antônio Everaldo Moreira
Arcângelo Alves Antunes
Atanásio Teles dos Santos
Célia pereira Machado
Daniel Bicca Ribeiro
Dilce Roseli Rodrigues
Doracilda de Lima e Silva
Eduardo Brasil Pinto
Elaine Carvalho
Fernando Pereira
Geraldo Lobato
Joaquim Silveira
João Bonfim
Jorge da Silva Barbosa
José Silveira
Joventino José dos Santos
133
ANEXO 8 – ATA DA ELEIÇÃO DA COORDENADORA EXECUTIVA
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CENTRO UNIVERSITÁRIO METODISTA