RELATÓRIO CIENTÍFICO FINEP Laboratório de Estudos da Violência e Segurança. Criação de um centro interdisciplinar de Estudos da Violência, Segurança e Qualidade de Vida Coordenadora: Dra. Sueli Andruccioli Felix POLÍTICAS PÚBLICAS E VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM ARARAQUARA Processo nº: 01.06.0798.00 Período: novembro de 2006 / fevereiro de 2009 FCL-UNESP – Campus de Araraquara Março - 2009 SUBPROJETO: POLÍTICAS PÚBLICAS E VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM ARARAQUARA Equipe Unesp Araraquara: Profª Drª Maria Teresa Miceli Kerbauy (Coordenadora) Profª Drª Darlene Aparecida de Oliveira Ferreira Estagiários Rodrigo dos Santos (doutorando) Carla A. Barreto (doutoranda) Resumo O objetivo deste projeto foi diagnosticar através das ocorrências registradas no Conselho Tutelar, os casos de violência contra crianças e adolescentes, identificando os territórios que detém os maiores índices desse tipo de violência e suas causas no município de Araraquara. Araraquara está localizada na região central do estado de São Paulo e tem uma população aproximada de 200 mil habitantes. Apesar de ter um baixo índice de exclusão territorial, tem apresentado inúmeros casos de violência contra crianças e adolescentes. O período considerado para o levantamento das ocorrências foi de 2002 a 2006, o que nos permitiu construir um banco de dados que, somados aos dados já coletados para uma primeira etapa do projeto (1997 a 2001), financiado pela Fapesp, constituem uma série histórica de dez anos. A sistematização dos dados e o mapeamento em meio digital permitiu o diagnóstico dos territórios com elevados índices de violência contra crianças e adolescentes de forma a contribuir para formulação e implementação de políticas públicas mais efetivas pelas instâncias decisórias municipais. Relação de Mapas Mapa I. Malha Digital para Localização dos Eventos de violência .................. 23 Mapa II. Bairros com maior número de ocorrências de violência contra crianças e adolescentes ........................................................................24 Mapa III. Identificação das três áreas de influência ......................................... 29 Mapa IV. Primeira área de influência ................................................................. 31 Mapa V. Segunda área de influência ................................................................. 32 Mapa VI. Terceira área de influência .................................................................. 33 Mapa VII. Primeira área de não-influência (Região Nordeste) ......................... 34 Mapa VIII. Segunda área de não influência (Região Sudoeste) ....................... 35 Mapa IX. Terceira área de não-influência (Região Central).............................. 36 Mapa X. Localização das Instituições ............................................................... 42 Mapa XI. Mapa das Instituições de Políticas Públicas. Região Central (Centro, Jardim Brasil e Vila Xavier) ..................................................... 43 Mapa XII. Aparelho público em Araraquara ...................................................... 49 Relação de Tabelas Tabela I. Incidências para número de habitantes nos bairros de 2002 a 2006 ..................................................................................................... 25 Tabela II. Classificação segundo o número de habitantes e a classificação geográfica ........................................................................................... 27 Tabela III. Endereços das Instituições ............................................................... 50 SUMÁRIO Apresentação ............................................................................................... 7 1. Crianças e Adolescentes: as mudanças introduzidas pelo ECA..... 12 2. Os Conselhos Tutelares de Araraquara ............................................. 16 3. Atividades desenvolvidas e resultados obtidos ............................... 17 3.1. Coleta das informações e construção do banco de dados .......................................................................................... 17 3.2. Malha Digitalizada ......................................................................... 23 3.3. Áreas de influência da Violência contra Crianças e Adolescentes .............................................................................. 29 3.4. Características Sócio-Econômicas e acesso às Políticas Públicas ...................................................................................... 38 4. Considerações finais............................................................................ 51 5. Bibliografia ............................................................................................ 53 Anexos Anexo I – Lei de Criação do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente e do Conselho Tutelar Anexo II – Edital de Convocação do Processo Eleitoral do Conselho Tutelar Anexo III – Ficha de Coleta Anexo IV – Banco de Dados: formulários de Atendimento 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006 Anexo V – Violência contra Criança e Adolescentes nos bairros definidores de áreas de influência Anexo VI – Violência, características sócio-econômicas e acesso à Políticas Públicas Anexo VII – Mapa dos Aparelhos Públicos em Araraquara 7 Apresentação O objetivo deste projeto foi diagnosticar através das ocorrências registradas no Conselho Tutelar, os casos de violência contra crianças e adolescentes, identificando os territórios que detém os maiores índices desse tipo de violência e suas causas no município de Araraquara. Araraquara está localizada na região central do estado de São Paulo e tem uma população aproximada de 200 mil habitantes. Apesar de ter um baixo índice de exclusão territorial, tem apresentado inúmeros casos de violência contra crianças e adolescentes. O período considerado para o levantamento das ocorrências foi de 2002 a 2006, o que nos permitiu construir um banco de dados que, somados aos dados já coletados por uma primeira etapa do projeto (1997 a 2001), financiado pela Fapesp, constitui uma série histórica de dez anos. Através da coleta, da organização e da análise de 9.577 Fichas de Atendimento (FA’s) que possuíam endereço completo para identificação das quadras dentro das 15.000 FA’s arquivadas no Conselho Tutelar I e II do Município de Araraquara, foi possível mapear e qualificar as áreas com registros de casos de violência contra crianças e adolescentes. Para evitar a generalização que pode ocorrer quando se considera apenas os bairros como unidade de análise, optou-se, na pesquisa, por utilizar as quadras como as menores unidades de análise. O mapeamento das FA’s sendo realizado por quadras, permite uma maior exatidão na localização das ocorrências, indicando, especificamente, os locais mais problemáticos no interior dos bairros. Porém, manteve-se possível a sobreposição dos limites dos bairros sobre a malha de quadras, preservando desta forma a relação entre o evento mapeado e o bairro. 8 Para o levantamento e a análise das informações, foram utilizadas como parâmetro as diretrizes do Estatuto da Criança e do Adolescente. Foram definidas como criança as vítimas com idade entre 0 e 12 anos e como adolescente as vítimas entre 13 e 18 anos. Quanto ao indicador natureza do problema, foram considerados todos os casos que envolvessem a integridade física da criança e do adolescente e, também, casos relativos a questões educacionais, financeiras, psicológicas e de saúde, entre outras. Para a sistematização dos dados e a espacialização dos mesmos, foram elaborados categorias de análise e um conjunto de códigos que resultaram na agregação das informações. Destaca-se, na coleta dos FA’s, a mudança no padrão de preenchimento dos registros das ocorrências no Conselho Tutelar após o ano de 2002. Primeiramente, as FA’s substituíram os Boletins de Atendimento (BA’s) das gestões anteriores. A principal justificativa para esta troca foi o fato de muitos atendimentos não serem considerados mais graves e portanto não deveriam ser incorporados em um Boletim de Atendimento, ficando este apenas para os casos de reincidência. Dos 9.577 formulários de atendimento preenchidos, 4.288 foram considerados reincidentes e portanto transformados em Boletim de Atendimento. Algumas FA’s tornaram-se inválidas para o georeferenciamento das informações por não apresentarem o endereço das vítimas. Outra informação pouco registrada foi a da escolaridade das vítimas. De forma geral, apenas os seguintes dados foram registrados de forma isométrica: data da FA, natureza do problema, reincidência, sexo da vítima, idade da vítima, endereço, bairro, denunciante, escolaridade e indiciado. O padrão adotado com a implementação das FA’s redefiniu os critérios de classificação da natureza do problema, que passou a ser registrado através de categorias estabelecidas por tabelas de controle. As categorias da natureza dos problemas determinadas pelo Conselho Tutelar são: abandono, abandono intelectual, abuso/exploração sexual, 9 alcoolismo, assistência e programas sociais, atentado violento ao pudor, autorização de viagem, conflito familiar, desaparecimento, desvio de comportamento, discriminação, drogadição, exploração do trabalho/mendicância, fiscalização, gravidez precoce, indisciplina escolar, infrequência/evasão escolar, maus tratos, negligência, orientação de alimentos, orientação de guarda/adoção, orientação e reconhecimento da paternidade, programa de esporte, prostituição, recambiamento, requisição certidão de nascimento, requisição curso profissionalizante, requisição abrigo, requisição assistente judiciário, requisição serviços médicos, requisição transporte/passe escolar, requisição vaga em creche, requisição vaga em escola, termo de responsabilidade, outros. Ressalta-se que a categoria outros passou a ser utilizada como complemento das demais categorias, exemplificando-as. Cinco procedimentos compreenderam o trabalho de atualização da malha urbana para o diagnóstico georeferenciado da violência contra crianças e adolescentes em Araraquara: primeiro, a coleta e a digitalização dos dados disponíveis nos Conselhos Tutelares. Segundo, a codificação dos dados necessários e possíveis de mapeamento, no caso do período coletado, tem-se as quadras, os bairros, as naturezas dos problemas, as idades, os sexos, as reincidências e as escolaridades. Terceiro, o georeferenciamento e a geração dos mapas. Quarto, a adição da FA’s dos anos de 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006 junto ao banco de dados de 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001. Quinto, a geração e a formatação dos mapas em modelo de papel A4. Dentre as metas atingidas podemos destacar: 1) A constituição de um banco de dados de uma série histórica de dez anos (1997-2006) para consulta pública sobre violência contra crianças e adolescentes em Araraquara; 2) Georeferenciamento das informações coletadas, constituindo um referencial espacial para a análise de políticas públicas; 10 3) Geração e formatação de mapas do município e dos bairros; 4) Curso realizado por Rodrigo dos Santos, estagiário no projeto, para o uso do Terra View, no Centro de Estudos da Metrópole (CEM), Cebrap, agosto de 2008; 5) Participação nos eventos: - 3º Encontro de Segurança Pública e Cidadania – Unesp, Marília, Coordenadora de Mesa, 2007; - 4º Encontro de Segurança Pública e Cidadania, Unesp, Marília, 2009. 6) Apresentação de trabalhos: - Darlene Ap. de O. Ferreira. Procedimentos metodológicos em pesquisa: Políticas Públicas e violência contra crianças e adolescentes, 3º Encontro de Segurança Pública e Cidadania, Unesp, Marília, 2007; - Maria Teresa M. Kerbauy. Violência contra crianças e adolescentes. 4º Encontro de Segurança Pública e Cidadania, Unesp, Marília, 2009; 7) Artigos Publicados: - KERBAUY, M.T.M., FERREIRA, D.A.de O., SANTOS, R., BARRETO, C. Políticas Públicas e violência contra crianças e adolescentes: uma proposta metodológica, Revista Levs, v. 1, p. 61-74, 2008. - KERBAUY, M.T.M., SANTOS, R. Políticas Públicas para crianças e adolescentes: violência, conflito familiar e distúrbios escolares, Revista Levs, v. 2, p. 59-81, 2008. 8) Participação em Curso de Especialização sobre Segunraça Pública a ser oferecido pela Unesp/Campus de Marília. Maria Teresa Miceli Kerbauy, disciplina Políticas Públicas e Decisão de Governo em Segurança Pública; 9) Professora colaboradora do mestrado profissionalizante em Segurança Pública a ser oferecido pela Unesp. Disciplina Políticas Públicas e Decisão de Governo em Segurança Pública. Maria Teresa Miceli Kerbauy. 10) Orientação de pesquisas sobre o tema em Iniciação Científica, Mestrado e Doutorado; 11 11) O produto final deste relatório será a publicação de dois artigos em revistas indexadas para divulgação dos resultados alcançados. Este texto está dividido em três partes. No capítulo primeiro procuramos analisar as mudanças introduzidas pelo ECA em relação às políticas a serem efetivadas para crianças e adolescentes. No segundo capítulo tratamos especificamente da criação dos Conselhos Tutelares e em especial o de Araraquara e o seu papel no registro da violência contra crianças e adolescentes. No capítulo terceiro estão relatadas as atividades desenvolvidas durante a pesquisa, coleta de informações, construção do banco de dados, a construção da malha digitalizada e dos mapas temáticos e a metodologia utilizada para análise. Os resultados obtidos estão analisados nos itens: áreas de Influência da violência contra crianças e adolescentes e características sócio-econômicas e acesso às políticas públicas. Para esta análise optamos por colocar os dados em anexo para facilitar a leitura do texto. Nas considerações finais enfatizamos a importância da dimensão territorial no diagnóstico da violência contra crianças e adolescentes e na definição de políticas públicas municipais que garantam acesso universal e de qualidade das populações residentes na periferia dos municípios. 12 1. Crianças e Adolescentes: as mudanças introduzidas pelo ECA Crianças e adolescentes foram por décadas vítimas frequentes de violência urbana e doméstica. Um dos fatores que contribuíram para que isso ocorresse é a percepção, culturalmente difundida, de que este público não possuía direitos como cidadãos, ficando sempre sob a tutela da lei e da família. O Estatuto da Criança e do Adolescente enfrenta esta tradição cultural, trazendo profundas mudanças no direito infanto-juvenil, adotando a doutrina da proteção integral dos direitos da criança e do adolescente. Afirma em seu Artigo 3°: A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei, assegurandolhes por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. O ECA introduz significativas mudanças na gestão de políticas de atendimento à criança e o adolescente. Este atendimento deve-se realizar por meio de políticas sociais e assistenciais, significando acesso à educação, saúde, esporte, lazer, recreação, profissionalização, etc. Também ficam asseguradas as condições mínimas de bem-estar e dignidade àqueles que estão, de forma momentânea ou permanente, vulneráveis e, portanto, desassistidos em suas necessidades básicas. As Diretrizes da política de atendimento (Art. 88 do ECA) são: Municipalização do atendimento. Criação de conselhos municipais, estaduais e nacionais. Criação e manutenção de programas específicos, obedecendo os princípios da descentralização político-administrativa. 13 Manutenção dos fundos municipais, estaduais e nacionais vinculados aos respectivos conselhos. Integração operacional dos órgãos envolvidos no atendimento de adolescente a quem se atribui autoria de infração. Mobilização da opinião pública visando a participação no êxito desta política. As entidades e programas de atendimento estabelecidos pelo artigo 90º do ECA, devem atuar nas áreas de orientação e apoio sóciofamiliar, apoio sócio-educativo em meio aberto, colocação familiar, abrigo, liberdade assistida, semi-liberdade e internação. As entidades devem proceder à inscrição de seus programas, especificando os regimes de atendimento, na forma definida no art. 90, junto ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, que comunicará ao Conselho Tutelar e à autoridade judiciária. 1.1. O conceito de criança e adolescente O ECA define em seu artigo 20º como criança a pessoa até 12 anos de idade incompletos e como adolescente a pessoa de doze a dezoito anos. Se o agente infrator for criança será submetido às medidas de proteção (Artigo 105 e 101). Se for adolescente serão aplicadas as medidas sócioeducativas (Artigo 112) e eventualmente as medidas de proteção. As medidas de proteção às crianças e aos adolescentes serão aplicadas sempre que os direitos resguardados do ECA forem ameaçados ou violados por ação ou omissão do Estado e da sociedade, por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsáveis, ou ainda em razão da conduta do menor. 14 A aplicação dessas medidas estará vinculada às necessidades pedagógicas, considerando-se a situação peculiar da pessoa em desenvolvimento, visando o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários. Às crianças infratoras serão aplicadas medidas de proteção. Aos adolescentes serão aplicadas medidas sócio-educativas e eventualmente as de proteção. As medidas sócio-educativas são aquelas que visam à reeducação do infrator, sua reintegração na sociedade e principalmente na sua própria família. As medidas possíveis são: i) Advertência, obrigação de reparar o dano. ii) Prestação de serviços à comunidade. iii) Liberdade assistida. iv) Inserção em regime de semi-liberdade. v) Internação em estabelecimento educacional. A área de atenção aos autores da infração requer a integração e articulação entre o Poder Judiciário, a Segurança Pública, a Secretaria da Educação e o conjunto dos serviços e programas de atendimento direto. Existem diferentes interpretações quanto à responsabilidade institucional de execução das medidas de privação de liberdade: Estado ou município. A designação do Estado como responsável por “zelar pela integridade física e mental dos internos, cabendo-lhes adotar as medidas adequadas de contenção e segurança” estão no Artigo 125º do ECA. Alguns estudiosos e profissionais da área entendem, que são de competência do Estado apenas as questões relativas à segurança e à contenção. Para eles, o programa sócio-educativo, a ser desenvolvido junto ao adolescente, deve estar sob responsabilidade dos municípios. Os órgãos responsáveis atendimento, instituídos pelo ECA, são: - Conselhos de Direitos - Conselhos Tutelares pelas ações da política de 15 - Fundos Gestores De acordo com o ECA os três órgãos devem visar: i) a formulação de políticas e a fiscalização do poder público. ii) a mudança de mentalidade de suas comunidades. iii) garantia de políticas públicas específicas para as crianças e os adolescentes. O ECA propõe ainda um re-ordenamento de todas as instituições relacionadas com a infância: o Poder Judiciário, o Poder Executivo, as organizações não governamentais e a comunidade. A articulação destas instituições é necessária tendo em vista que muitos problemas das crianças e dos adolescentes decorrem da vulnerabilidade de suas famílias e do fracasso de políticas de educação, saúde, trabalho, moradia, saneamento e lazer. O Conselho de Direito da Criança e do Adolescente é um fórum de discussão e formulação da política social da criança e do adolescente com co-responsabilidade dos poderes públicos e da sociedade civil. È um órgão deliberativo de controle das ações em todos os níveis, assegurada a participação popular, paritária por meio de organizações representativas (Art. 88). Deve controlar as ações institucionais em todos os níveis. A averiguação sobre o cumprimento ou não das políticas públicas de atendimento à população infanto-juvenil no Município, de acordo com princípios constitucionais e legais contidos no Estatuto, é de responsabilidade do Conselho de Direito da Criança e do Adolescente Por este entendimento cabe aos municípios a coordenação local e execução direta das políticas e programas destinados à infância e à adolescência, preferencialmente em parceria com as entidades não governamentais. “O Conselho Tutelar é órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente”. Artigo 131 do ECA. 16 Cabe a ele receber denúncias de suspeitas e casos concretos de ameaça ou violação de seus direitos – não freqüentar a escola, não ter acesso à saúde, não viver em condições dignas - e garantir a proteção integral das crianças, quando estas (pessoas de até 12 anos) forem acusadas de prática de delitos. 2. Os Conselhos Tutelares de Araraquara Desde a década de noventa funciona em Araraquara o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente e um Conselho Tutelar. Em 2001 por determinação do governo municipal foi promulgada a Lei nº 5720, de 22 de novembro de 2001 que cria o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente – Comcriar, o Conselho Tutelar do Município e dá outras providências (Anexo I), procurando normatizar de forma mais adequada o atendimento de crianças e adolescentes, na perspectiva da política municipal de atendimento a estas categorias sociais. A lei considera como órgãos desta política o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente – Comcriar e o Conselho Tutelar. Foram criados dois Conselhos Tutelares cuja área de atuação está delimitada pela linha férrea que corta o município. Os conselhos são compostos por cinco membros, eleitos para mandato de 3 anos, permitida uma reeleição. A eleição se dará através do voto facultativo, direto e secreto, pelos cidadãos maiores de 16 anos, no uso e gozo de seus direitos civis e eleitorais, inscritos na Circunscrição eleitoral de Araraquara ( Anexo II). A criação de um segundo Conselho Tutelar introduziu diferenças na sistemática de preenchimento das fichas e boletins de 17 atendimento. Estas diferenças estão relacionadas à composição dos Conselhos. No Conselho Tutelar I membros antigos permaneceram, o que provocou muitos atritos, não só internamente, como também com membros do recém criado Conselho Tutelar II. Estas questões refletiram nas dificuldades que tivemos para a coleta dos dados. No Conselho Tutelar I o espaço é restrito e desorganizado, não sendo oferecido ao pesquisador um local adequado para a coleta. Era uma cadeira ou um sofá com o computador no colo. A troca do conselheiro responsável, como também a mudança do espaço físico, devido ao despejo, o ingresso de uma nova secretária foram fatores que colaboraram para a exaltação dos ânimos entre os conselheiros e dificuldades nas relações interpessoais. As discussões tornaram-se diárias culminando com a presença de policiais para registrar um BO entre os conselheiros e a secretária. No Conselho Tutelar II o espaço é bem mais organizado, tendo sido oferecido ao pesquisador condições adequadas de trabalho. O preenchimento das fichas é feito de maneira mais criteriosa. Existe também entre os membros dos dois conselhos uma discussão sobre o papel que devem exercer: se simples mediador das demandas para crianças e adolescentes, garantindo os seus direitos ou se agentes atuantes na formulação de políticas e na fiscalização do poder público. 3. Atividades desenvolvidas e resultados obtidos 3.1. A coleta das informações e a construção do banco de dados O levantamento das informações contidas nas FA’s (Fichas de Atendimento) e nos BA’s (Boletins de Atendimento) registradas nos Conselhos Tutelares I e II de Araraquara nos permitiram a montagem de 18 um banco de dados que contém uma série histórica de dez anos (A coleta dos dados foi iniciada em projeto anterior de Políticas públicas financiado pela FAPESP e compreendeu o período de 1997 a 2001), completada agora com os levantamentos para os anos de 2002, 2004, 2005, 2006. As fichas de atendimento (anexo III) substituíram os boletins de atendimento utilizados até 2001. A principal justificativa para essa troca foi o fato de muitos atendimentos não se configurarem enquanto categorias consideradas mais graves para serem incorporadas em um Boletim de Atendimento, mas vale ressaltar que conforme a criança ou adolescente seja encaminhada ao conselho com freqüência procede-se à abertura de Boletim de Atendimento. As fichas de atendimento compreendem principalmente as informações referentes à idade da criança e do adolescente: endereço do ocorrido, endereço dos pais ou do denunciante, se é o primeiro atendimento. Um grande número das fichas não contém o nome do denunciante. Quando a criança retorna para o atendimento é aberta nova ficha, que é anexada à ficha já existente. As categorias utilizadas nos dois conselhos são as mesmas, porém a forma de registro é diferenciada de conselho para conselho e de conselheiro para conselheiro. As categorias que compõem o quadro de atendimentos são subscritas abaixo. Abandono Abandono intelectual Abuso/ exploração sexual Alcoolismo Assistência e programas sociais Atentado violento ao pudor Autorização de viagem Conflito familiar Desaparecimento Desvio de Comportamento Discriminação Divulgação do ECA Drogadição Exploração do trabalho/ mendicância 19 Fiscalização Gravidez precoce Indisciplina escolar Infrequência / evasão escolar Maus tratos Negligencia Orientação alimentos Orientação de guarda/ adoção Orientação e reconhecimento da paternidade Programa de esporte Prostituição Recambiamento Requisição certidão de nascimento Requisição curso profissionalizante Requisição abrigo Requisição assistente judiciário Requisição serviços médicos Requisição transporte/ passe escolar Requisição vaga em creche Requisição vaga em escola Termo de responsabilidade Outros 20 Geralmente, a categoria Outros é utilizada para explicar ou completar uma das demais categorias, por exemplo, na requisição de transporte escolar a categoria outros significa demarcar também o pedido de material escolar. Esta demarcação na ficha de atendimento talvez seja o aspecto mais complicado, muitas vezes aparece mais de uma ficha de atendimento do mesmo menor, no mesmo dia com demarcação em categoria diferente, exemplo: ficha 1 maus tratos, ficha 2 desvio de comportamento, ficha 3 negligência. Em algumas situações as fichas referem-se a uma criança ou adolescente, mas como no exemplo anterior além de mudar a categoria de atendimento, também é incluída outra(s) criança (s) ou adolescente (s), vale ressaltar que no Conselho I esse problema é mais constante e se apresenta de forma incessante nas fichas de atendimento de 3 conselheiros. Para criarmos as nossas categorias de análise partimos dos tipos de violência, considerados pela literatura, contra criança e adolescente: - Violência física – aquelas que podem provocar, ou não, lesões externas, internas ou ambas. O castigo repetido não severo, também é considerado violência física. - Violência psicológica – aquelas consideradas como a interferência negativa sobre a criança e sua competência social. As formas mais comuns são: rejeitar, isolar, aterrorizar, ignorar, corromper e criar expectativas irreais ou extremadas sobre criança ou adolescente. - Violência sexual – aquelas entendidas como todo ato ou jogo sexual, relação heterossexual ou homossexual, , na qual o agressor está em estágio de desenvolvimento psico-social mais adiantado que a criança ou adolescente. - Negligência – omissão em prover as necessidades físicas e emocionais de uma criança ou adolescente. Quando os pais ou responsáveis 21 falham em alimentar, vestir adequadamente, medicar ou educar seus filhos. Acidentes também podem ser classificados como um tipo de negligência, quando passíveis de prevenção ou resultam do descuido dos responsáveis ou da falta de investimento público. As categorias utilizadas pelos Conselhos Tutelares para registro das fichas de atendimento foram consolidadas da seguinte forma: - conflitos familiares - atendimento de serviços educacionais - conflitos psicológicos / saúde / sexuais - dificuldades financeiras - atendimento de serviços de saúde - drogadição - outros Observa-se que há um grande número de registros nos conselhos tutelares referentes à ausência de atendimento em políticas públicas e de conflitos familiares. Do Banco de Dados constam 509 BA’s (1999-2001), 9577 ocorrências georefenciadas entre 2002 e 2006 e 4288 reincidências (BA’s) entre 2002 e 2006 e 842 em BO’s (O banco de dados contém informações obtidas para os anos de 1999, 2000 e 2001 em Boletins de Ocorrência da Delegacia da Mulher de Araraquara). Foram desconsiderados para o mapeamento da violência no perímetro urbano os registros que não continham informações sobre o endereço e o bairro da vítima, num total de 5423. Ressaltamos mais uma vez que para o levantamento e análise das informações foi utilizado como parâmetro as definições do Estatuto da Criança e do Adolescente: crianças com idade entre 0 e 12 anos e adolescentes entre 13 e 18 anos. 22 Quanto à natureza do problema considerou-se todos os casos que envolvessem a integridade física da criança e do adolescente e casos relativos a questões educacionais, financeiras, psicológica, saúde e outros. O Banco de Dados foi organizado na Planilha Access (Microsoft Office), onde constam as informações existentes na ficha de coleta . Para a sistematização dos dados e espacialização dos mesmos foram elaboradas categorias de análise e um conjunto de códigos que resultaram na agregação das informações. Desta forma procuramos racionalizar e tornar mais eficiente a administração do banco de dados agilizando não apenas a sua alimentação, como também o seu acesso, especialmente de nossos parceiros e instituições que atendam crianças e adolescentes. O banco também está disponibilizado para pesquisadores e interessados na área. O sistema de abastecimento está instalado no servidor central da Faculdade de Ciências e Letras, Unesp, Campus de Araraquara. Os dados armazenados e sistematizados durante a pesquisa (2002 a 2006) encontram-se no anexo IV. 23 PAREI DE COLOCAR AQUI 3.2. Malha Digitalizada A malha digitalizada da cidade de Araraquara permitiu a observação da localização dos eventos de eventos de maior violência contra crianças e adolescentes. O mapa a seguir permitiu a visualização da localização dos setores. Mapa I. Malha Digital para Localização dos Eventos de violência Fonte: IBGE - 2009 24 Os dezoito bairros com maior número de ocorrência de violência contra crianças e adolescentes podem se visualizados no mapa a seguir. Mapa II. Bairros com maior número de ocorrências de violência contra crianças e adolescentes Fonte: Censo 2000 IBGE/TerraView Política Social. Quando analisamos os dados na perspectiva da densidade populacional (dividindo-se o total das ocorrências por bairros e pelo número de habitantes, segundo os dados do IBGE, multiplicando-se por 1.000) a violência concentra-se em bairros da região periférica de Araraquara como se pode notar na Tabela I. 25 Tabela I. Incidências por número de habitantes nos bairros entre 2002 e 2006 Ranking 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 Bairros Ocorrências N° Habitantes Indice de Incidências Águas do Paiol 483 159 3.038 Jardim Paraíso 356 159 2.239 Santa Angelina 428 1.041 0.411 São José 377 992 0.380 Parque das Laranjeiras 397 1.408 0.282 Adalberto Roxo 426 2.563 0.166 Parque São Paulo 310 1.989 0.156 Jardim Maria Luiza 188 1.253 0.150 Vila Xavier 512 4.720 0.108 275 3.185 0.086 Jardim Hortências Santana 300 3.556 0.084 Vale do Sol 311 3.790 0.082 Selmi Dei 740 9.095 0.081 Jardim Dom Pedro 151 2016 0.075 Yolanda Ópice 323 4.746 0.068 Jardim América 227 3.780 0.060 Jardim Acapulco 207 3.890 0.053 Centro 696 14.776 0.047 Fonte: Pesquisa Violência contra crianças e adolescentes em Araraquara - UNESP/FUNDEPE/2008. Adotamos ainda uma classificação dos bairros pelo número de habitantes e pela posição geográfica no interior da cidade o que nos permitiu um diagnóstico mais adequado da situação de violência contra crianças e adolescentes em Araraquara na perspectiva espacial, constituindo-se assim um instrumento importante na definição de políticas públicas. Para a classificação proposta foram utilizados como referências os estudos realizados por Bógus (2007), Soares & Terron (2008) e PPGEO-UFPE; Fase (2005). Bógus (2007) estudando a segregação residencial na Região Metropolitana de São Paulo definiu uma tipologia na qual classifica e descreve categorias socioespaciais combinando informações censitárias sobre ocupação, renda e escolaridade. Ao final o resultado de sua análise permitiu a definição de 8 grandes categorias referentes á ocupação e localização geográfica no interior da Região Metropolitana. As categorias definidas pela autora foram: elite dirigente, elite intelectual, pequena burguesia, camadas medianas, proletariado secundário, proletariado terciário, baixo proletariado, trabalhadores agrícolas. A partir 26 da análise fatorial, a autora, pode agrupar as áreas homogêneas em conglomerados de áreas com predominância da mesma categoria sócioocupacional Estudando a repercussão das políticas públicas, em particular o Bolsa Família, na reeleição do presidente Lula (SOARES & TERRON, 2008) buscaram identificar o padrão da distribuição espacial dos votos do presidente. Para tanto, os autores definiram 6 categorias espaciais para os centros urbanos brasileiros: grande urbano centro sul, grande urbano norte e nordeste, médio urbano com rural próspero, médio urbano com rural misto, pequeno urbano com rural próspero e pequeno urbano com rural misto, agregadas a partir de 19 outras regiões, constituídas com base na situação socioeconômica e a da espacialização urbano/rural em que se localizam. Aqui a base socioeconômica e a localização da população foram as variáveis estudadas. O trabalho de PPGEO-UFPE e FASE (2005) foi realizado a pedido do Ministério das Cidades e procurou identificar a diversidade decorrente das situações e dinâmicas econômicas das regiões onde se situam os distintos centros urbanos brasileiros, classificando-os em espaços urbanos e rurais. Os textos citados nos forneceram parâmetros para que pudéssemos definir áreas na cidade de Araraquara a partir de características específicas. Em nosso caso optamos por regionalizar a cidade segundo a posição geográfica do bairro no interior da cidade e de acordo com um agregado de informações socioeconômicas que permitiram a classificação demonstrada na tabela II: 27 Tabela II. Classificação segundo o número de habitantes e a classificação geográfica Bairros Classificação por Classificação Habitantes Geográfica Águas do Paiol 159 Periférica Jardim Paraíso e Tropical 159 Periférica Santa Angelina 1041 Pequeno Porte Intermediária São José 922 Intermediária Parque das Laranjeiras 1408 Intermediária Adalberto Roxo 2.563 Periférica Parque São Paulo 1989 Periférica Jardim Maria Luiza 1253 Periférica Vila Xavier 4.720 Intermediária Jardim Hortências 3.185 Periférica Santana 3.556 Intermediária Vale do Sol 3.790 Médio Porte Periférica Jardim Dom Pedro 2016 Periférica Yolanda Ópice 4.746 Periférica Jardim América 3780 Periférica Jardim Acapulco 3890 Periférica Jardim Roberto Selmi Dei 9.095 Periférica Centro 14.776 Grande Porte Zona Central Fonte: Pesquisa Violência Urbana Contra Crianças e Adolescentes em Araraquara – UNESP/FUNDEP/2008. Zona Central – É o núcleo central e o seu entorno, onde predominam as atividades comerciais e de prestação de serviços, com a presença de equipamentos urbanos em sua totalidade. Trata-se de uma área com alta densidade ocupacional, com a predominância de padrões de ocupação, renda e escolaridade os mais elevados, com grande presença do poder público e dos grupos empresariais da cidade. Deve-se considerar ainda que estão presentes na área instituições de ensino médio, públicas e privadas. Bairros Intermediários – São aqueles menos distantes do núcleo central em que predominam o uso residencial e o comércio de interior de bairro, cujas atividades voltam-se à satisfação das necessidades cotidianas da população. Os equipamentos urbanos também estão presentes. A densidade populacional nessas áreas, em função da proximidade do centro e por serem bairros de origem antiga, é alta. Bairros Periféricos – São aqueles mais distantes do núcleo central em que predomina o uso residencial e cuja característica principal é a proximidade com as áreas rurais. Trata-se de áreas consideradas de 28 expansão do perímetro urbano nas quais os equipamentos urbanos também estão presentes. Nesta categoria temos duas situações distintas: ao sul da cidade, os bairros periféricos têm sua expansão limitada pela produção da cultura canavieira; na vizinhança destes bairros predominam esta atividade agroindustrial. Ao norte encontramos a pecuária como atividade marcante, o que indica tratar-se de uma área de especulação. São grandes propriedades rurais parceladas ao longo do tempo para a criação de novos bairros. Esta classificação aponta para a disseminação da violência pela cidade e a necessidade de readequar os investimentos públicos a esta realidade. A falta de equipamentos urbanos não é um indicador da presença de índices elevados de violência em Araraquara. A cidade é atendida por serviços e equipamentos públicos em sua totalidade; em distintos bairros encontram-se áreas para prática de esportes, escolas e creches infantis, assim como programas de atendimento á saúde (PSF). 29 3.3. Áreas de influência da Violência contra Crianças e Adolescentes A utilização do aplicativo Terra View permitiu delimitar três ares de influência espacial nos eventos de violência contra crianças e adolescentes1. O conceito de área de influência tem uma longa tradição e um renovado interesse em virtude das técnicas e metodologias do GIS. O grande desafio é desenvolver indicadores empíricos para descrever e operacionalizar o conceito de área de influência. Este nosso ensaio no uso desta metodologia procurou identificar os padrões de concentração e dispersão dos índices de violência em Araraquara, permitindo entender melhor o comportamento da distribuição espacial destes eventos. O mapa a seguir apresenta a identificação das três áreas de influência localizadas a partir dos dados coletados. Mapa III. Identificação das três áreas de influência Fonte: Censo 2000 IBGE/TerraView Política Social. 1 Rodrigo dos Santos, membro da equipe do projeto, realizou o curso Terra View no Centro de Estudos da Metrópole (CEM), sediado no Cebrap, em agosto de 2008. 30 As três áreas de influência sugerem que há uma dispersão do fenômeno da violência contra crianças e adolescentes em Araraquara em três áreas com características similares no interior da cidade. São locais distantes do centro da cidade, mas cujo acesso é dado por eixos de ligação bem definidos o que permite a inserção destes no contexto urbano. Desigualdade socioeconômica e segregação residencial são fatos marcantes da população destes locais que se encontram nos limites do perímetro urbano. Na busca por áreas de menor valor imobiliário instalaram-se nestas áreas e constituíram um conjunto populacional coeso no qual o não pertencimento à cidade é marcante. Desta forma, a pouca renda, o acesso restrito aos equipamentos urbanos e aos programas governamentais de atenção à criança e ao adolescente fazem destas áreas típicos locais onde o conflito familiar e escolar serão os principais responsáveis pela violência. É importante salientar que as áreas aqui definidas têm como peculiaridade estar nos limites do perímetro urbano. Como frisamos ao sul e à sudeste da cidade a presença da agroindustrial canavieira é marcante e assim, a expansão da cidade nesta direção será difícil de ocorrer. O sudoeste é marcado pela limitação da Rodovia Washington Luís e por grandes propriedades rurais. A expansão urbana nesta direção também é limitada. Na primeira região de influência (mapa IV) encontra-se localizada a Rua Armando Salles de Oliveira como o principal elo de ligação para o fluxo migratório interno. Na realidade trata-se de um eixo de mobilidade intra-urbana em Araraquara. Na segunda região de influência (mapa V) pode-se apontar a Av. Padre José de Anchieta, Av. Alberto Santos Dummont e a Rodovia Antonio Machado Santana como o segundo eixo de ligação centroperiferia. 31 Na terceira área de influência (mapa VI) tem-se a Av. José P. Bueno de Oliveira e a Rua Maurício Galli - como eixos de ligação centroperiferia. De forma geral, é possível haver verossimilhança na hipótese entre o fenômeno da violência e os deslocamentos humanos em Araraquara, possivelmente potencializados pela necessidade de trabalho, educação, saúde e consumo entre as regiões periféricas e centrais. Ao considerarmos a área de influência nossa hipótese é de que um bairro com altos índices de violência tende a “espraiar” estes índices e que portanto a violência não é um fato isolado e localizável, pois as variáveis que caracterizam a violência fazem parte de um contexto sócio espacial. Os dados sugerem que a violência contra crianças e adolescentes em Araraquara pode ser caracterizada espacialmente pela sua dinâmica no espaço, pela sua fluidez e também pela sua complexidade, que é reflexo da heterogeneidade sócio-espacial do interior da cidade. Mapa IV. Primeira área de influência Fonte: Censo 2000 IBGE/TerraView Política Social. 32 1ª Área de influência (Região Oeste): Parque Tropical e Jardim Residencial Paraíso. Locais influenciados: Jardim Águas do Paiol, Parque Residencial Vale do Sol, Jardim Acapulco, Jardim Nova Araraquara, Jardim Igaçaba, Jardim Tangará, Loteamento Santa Rita de Cássia, Bosque da Saúde, Vila Yamada, Loteamento Franciscato, Jardim Santa Angelina, Jardim Residencial Barbugli, Jardim Biagione, Jardim Dom Pedro, Jardim Cambuy, Jardim Botânico, Loteamento Cidade Jardim e Jardim Maria Luiza. Mapa V. Segunda área de influência Fonte: Censo 2000 IBGE/TerraView Política Social. 2ª Área de influência (Região Sudeste): Parque das Hotênsias. Locais influenciados: Vila Nossa Senhora Aparecida, Condomínio Satélite, Jardim Del Rei, Jardim Ieda, Jardim Arco Íris, Jardim Cruzeiro do Sul, Jardim Dumont, Jardim Eliana, Jardim Residencial Água Branca, Jardim das Paineiras, Jardim Araraquara, Jardim Residencial Itália, 33 Núcleo Rsidencial Yolanda Ópice, Jardim Florença, Jardim das Palmeiras, Jardim Palmares e Jardim Santa Júlia. Mapa VI. Terceira área de influência Fonte: Censo 2000 IBGE/TerraView Política Social. 3ª Área de Influência (Região Norte): Jardim Adalberto Roxo e Jardim Roberto Selmi-Dei. Locais influenciados: Jardim Veneza, Jardim São Rafael e Jardim Indaiá. É preciso salientar que mesmo estando espacialmente dispersa pela cidade, a violência contra crianças e adolescentes não ocorre em algumas áreas. A explicação para tal fato pode ser dada pelas características destes locais. São áreas sem grande adensamento populacional e cuja renda da população é mais elevada ou, no caso específico da zona central, o adensamento populacional e a renda são altos, mas os conflitos familiares em menor número. 34 Mapa VII. Primeira área de não-influência (Região Nordeste) Fonte: Censo 2000 IBGE/TerraView Política Social. 1ª Área de Não-influência periférica (Região Nordeste): Chácaras Velosa, Sítio São João, Jardim Zavanella, 3º Distrito Industrial, Jardim Aclimação, propriedades Bosque Fujimoto Sakamoto. rurais, terrenos desocupados Domicílios: 493 . Pessoas residentes: 2511. Região e constituída parque por industriais. 35 Mapa VIII. Segunda área de não influência (Região Sudoeste) Fonte: Censo 2000 IBGE/TerraView Política Social. 2ª Área de Não influência periférica (Região Sudoeste): Portal das Laranjeiras, Jardim Rosa, Jardim Bandeirantes, Loteamento Cociza, C.E.J Omar Maksoud. Região constituída por propriedades rurais, terrenos desocupados e parques industriais. Domicílios: 99. Pessoas residentes: 288 36 Mapa IX. Terceira área de não-influência (Região Central) Fonte: Censo 2000 IBGE/TerraView Política Social. 3ª Áreas dispersas de não-influência: região central, centro-leste, centro-oeste. Localidades comerciais, praças públicas. Região constituída por estabelecimentos comerciais, terrenos desocupados ou espaços públicos. Domicílios: 6836. Pessoas residentes: 21921. As áreas de não influência estão localizadas na região central do município e nas regiões periféricas onde se localizam chácaras, distritos industriais e terrenos desocupados, com uma baixa densidade populacional. Para estas áreas as políticas públicas municipais para crianças e adolescentes deveriam ser diferenciadas devido as suas especificidades, conforme descrição realizada nos parágrafos acima. Os bairros que possuem os maiores índices de violência contra crianças e adolescentes e que são definidores das áreas de influência são: - Jardim Paraíso e Parque Tropical localizados na primeira área de influência, considerado um bairro periférico de pequeno porte, de acordo com o tamanho de sua população. 37 - Jardim das Hortências localizado na segunda área de influência, também considerado um bairro periférico de porte médio, de acordo com o tamanho de sua população. - Jardim Adalberto Roxo e Selmi Dei localizado na terceira área de influência, também considerado um bairro periférico de porte médio, de acordo com o tamanho de sua população. Os dados apresentados no anexo V apontam os conflitos familiares como as ocorrências de maior número nos bairros analisados, seguidas pelo atendimento à educação. No Jardim Paraíso e Parque Tropical os conflitos familiares são uma constante ao longo do período analisado. Já o atendimento à educação apear de ser constante sofre variações no número de atendimentos. No Jardim das Hortências os conflitos familiares também são as maiores ocorrências registradas. O segundo problema é o atendimento à educação mais num número menor que o do bairro anterior. Apenas em 2004 este tipo de ocorrência ultrapassa os conflitos familiares. Deve-se ressaltar que os outros problemas no Jardim das Hortências têm poucos registros, talvez por ser este um bairro de melhor infra-estrutura para o atendimento da população. O Jardim Adalberto Roxo e Selmi Dei apresenta a mesma constância de conflitos familiares. Só que os conflitos psicológicos / saúde / sociais tem ocorrências muito próximas do atendimento à educação, em especial no Selmi Dei onde muitas vezes ultrapasse a questão educacional. Estes dados apontam para um diagnóstico importante no que se refere à violência contra criança e adolescente, e a importância de se considerar o componente espacial desta questão para a elaboração de políticas públicas. 38 A primeira questão a ser considerada diz respeito aos conflitos familiares que se manifestam em negligências, violência física, violência psicológica ou mesmo violência sexual. As causas destes conflitos poderão ser melhor identificadas quando no próximo item caracterizamos a situação sócio-demográfica destes bairros. Regiões com alta concentração de privação sócioeconômica, para além da renda têm efeitos sobre o acesso a políticas públicas. A segunda questão diz respeito ao atendimento educacional. Apesar dos indicadores de analfabetismo de crianças em idade escolar ter se reduzido no país e a educação em Araraquara ter acompanhado esta tendência, a rede de atendimento municipal e estadual não está distribuída de forma homogênea pelo município o que pode ocasionar as inúmeras demandas nos Conselhos Tutelares no que se refere especialmente à questão das vagas, evasão, qualidade do ensino etc. A rede de proteção à criança e ao adolescente deveria passar por políticas integradas pelas várias áreas sociais (educação, saúde, assistência social, direitos etc) que possibilitariam maior eficiência das políticas municipais. Infelizmente a construção desta rede encontra muitas dificuldades em sua implantação nos municípios, devido á visão fragmentada que os gestores públicos têm de políticas sociais. A construção de um cadastro único de atendimento de crianças e adolescentes nos municípios poderia garantir um melhor atendimento a esta população e uma maior eficiência da política municipal . 3.4. Características sócio-econômicas e acesso à Políticas Públicas A utilização das informações disponibilizadas pelo IBGE através do software Terra View possibilitou o levantamento dos dados sócio-demográficos do censo de 2000 para Araraquara e em especial 39 para os bairros apontados como os de maiores índices de violência contra crianças e adolescentes. A utilização do TerraView e da base de setores possibilitou agregar ao nosso estudo dados censitários que permitem a caracterização sócio-econômica das áreas de ocorrências de violência contra crianças e adolescentes e assim identificar as causas dos índices elevados das mesmas, na cidade de Araraquara. Usamos como variáveis alguns dados sócio-econômicos, instrução, residentes por sexo, relação com o responsável, renda, idade, número de moradores por domicílio, lixo coletado, abastecimento de água, tipo de banheiro e tipo de domicílio. Analisando este material pudemos caracterizar as especificidades dos bairros, os equipamentos públicos que possuem e as deficiências em termos de políticas públicas (anexo IV). A caracterização sócio-econômica diferenciada dos bairros de maior violência contra crianças e adolescentes aponta para a necessidade de uma redefinição da política para este setor levando-se em conta algumas especificidades. A caracterização geral do município aponta para que em alguns bairros (Centro, Vila Xavier, Jardim Brasil e Santana) o responsável pelo domicílio está concentrado na faixa dos 50/60 e 60/70 anos, e é uma família composta por filhos, enteados, sogro, sogra. Nos bairros mais periféricos (Yolanda Ópice, Jardim América, Selmi Dei, Parque São Paulo, Vale do Sol, Vila José Bonifácio, Residencial Iguatemi, Adalberto Roxo, Parque das Hortências, Jardim Del Rey) o responsável pelo domicílio está numa faixa mais jovem, 20/30, 30/40 e a família é composta basicamente por pais e filhos e em alguns destes bairros o número de desempregados e sem renda é alto. São famílias maiores, pois cada domicílio tem em média de 4 a 5 habitantes. 40 A renda dos moradores dos bairros centrais é de 3/5 e de 5/10 salários mínimos. Nos outros bairros de um a três salários mínimos, sendo que os de menor renda são Parque das Hortências, Jardim Del Rey (entre ½ e dois salários). A Vila José Bonifácio, talvez por se constituir numa região intermediária, tem um diferencial, pois o salário está na faixa de 5 a 10. A média de instrução do responsável pelo domicílio, em geral, é de 4 anos. Alguns bairros têm concentração em 11 anos ou 8 anos de instrução (Centro, Selmi Dei, Santana, Vila José Bonifácio, Vila Xavier, Jardim Santa Lúcia, Yolanda Ópice) apontando para franjas de camadas médias nas zonas intermediárias da cidade, e com contrastes sócioeconômicos significativos. O grau de analfabetismo das populações mais velhas, especialmente entre as mulheres, é uma constante exceto nos bairros mais centrais. Talvez por isto a prefeitura tenha implantado unidades do Mova e do EJA em todos estes bairros. É interessante observar ainda que em todos os bairros existem unidades de educação infantil e em alguns de educação integrada, complementar e interativa. Aparentemente a faixa da infância está coberta por uma infra-estrutura escolar. A demanda por questões escolares nos Conselhos Tutelares requer uma pesquisa específica para que se compreenda quais os motivos que levam pais e familiares a procurarem os Conselhos para atendimento destas. Existem alguns programas que não são específicos para jovens, mas que podem atender esta faixa etária, como Oficinas Culturais, Portal do Saber, Escolinha de Esporte, Cursinho, Escola Interativa. Os únicos programas que existem em quase todos os bairros são as Oficinas Culturais e as Escolinhas de Esporte, o que aponta para alguns programas de eficácia duvidosa e muitas vezes clientelistas. Não existe aparentemente nenhuma política pública para crianças e adolescentes, em especial para jovens. Os programas desenvolvidos 41 pelo município são basicamente programas de ressocialização, organizados através de oficinas ocupacionais, esporte e arte. A questão da saúde que é uma das origens dos problemas de violência contra crianças e adolescentes tem um atendimento pior que a educação. Não existe um foco definido, em alguns bairros foram implantados os PSF (Programa de Saúde da Família) que concorrem com as UBS (Unidades Básicas de Saúde) que contam com médicos especialistas. A questão do saneamento básico está razoavelmente resolvida com o serviço de abastecimento de água, banheiro com rede geral de esgoto, em quase todos os domicílios. Só a coleta de lixo tem um atendimento mais deficitário. Apesar de avanços significativos na municipalização do ensino, o sistema ainda não está completamente organizado e muitas escolas de 5ª a 8ª série ainda estão sob a responsabilidade do estado. Talvez esta duplicidade no atendimento, estado e município, deva ser levada em conta nas questões dos problemas com a escola. Comparando-se o mapa da violência e a localização das instituições de atendimento às crianças e adolescentes em Araraquara, podemos notar que o atendimento está concentrado na região central da cidade. As finalidades destas instituições estão definidas de acordo com o ECA e o LOAS, tendo como referência, em sua grande maioria, o apoio e a proteção familiar. No entanto os conflitos familiares foram apontados como um dos problemas de maior gravidade nas fichas e nos boletins de atendimento. 42 Mapa X. Localização das Instituições Fonte: Secretaria da Assistência Social de Araraquara – 2009. Como se pode observar pelo Mapa X há também uma grande concentração de equipamentos públicos na região central do município, deixando a periferia em situação de vulnerabilidade em relação a serviços e políticas públicas. 43 Mapa XI. Instituições de Políticas Públicas. Região Central (Centro, Jardim Brasil e Vila Xavier) Fonte: Plano Diretor de Araraquara – 2009. 44 Realizado este diagnóstico geral sócio-econômico e de políticas públicas do município, analisaremos em seguida mais especificamente os bairros que são definidores das regiões de influência da violência contra crianças e adolescentes: Jardim das Hortências, Jardim Roberto Selmi Dei e Adalberto Roxo e Jardim Paraíoso e Tropical (anexo IV). Retomamos os indicadores já apresentados pelas fichas de atendimento para que a comparação com os dados sócio-econômicos e de equipamentos públicos possam ser melhor visualizados. a) Jardim das Hortências No Jardim das Hortências na faixa de 35 a 39 anos, existe um maior número de mulheres alfabetizadas que homens. Depois desta faixa os homens têm maior escolarização que as mulheres, o que de alguma forma reflete uma questão geracional, quando as mulheres não tinham entrado efetivamente no mercado de trabalho e nem haviam incentivos para a sua educação formal. O grau de escolaridade do responsável é em média de 4 a 8 anos de estudo e são em sua maioria homens. O perfil dos homens e mulheres residentes aponta para casais jovens entre 19 e 39 anos, com filhos em sua maioria entre 0 e 14 anos. Este dado reflete a relação com a escolaridade das vítimas neste bairro, crianças de 0 a 11 anos e que estão matriculados na creche, pré-escola ou no ensino fundamental de 1ª a 5ª série. A renda do responsável familiar está entre um e cinco salários mínimos, com maior concentração de 1 a 2. A maioria dos responsáveis são homens. Quase a totalidade do lixo coletado no bairro é efetuada por serviço de limpeza; a maioria dos banheiros está ligado a rede geral de esgoto e o abastecimento de água é totalmente canalizado. 45 Por conta da forma como se deu a ocupação do bairro, 70% dos domicílios são permanentes, os outros são alugados ou cedidos. O mapa das instituições públicas apontam para uma certa concentração das mesmas numa região do bairro e para uma cobertura razoável em educação e precária em saúde e lazer. b) Jardim Adalberto Roxo O número de mulheres e homens alfabetizados neste bairro não tem grandes discrepâncias em todas as faixas etárias. A maioria dos responsáveis são homens e alfabetizados. O perfil da idade dos residentes aponta para casais na faixa dos 19 aos 39 anos com filhos na faixa etária de 0 a 14 anos. Coincidindo com o resultado encontrado do Jardim das Hortências o maior número de vítimas da violência são crianças entre 0 e 11 anos e que freqüentam a creche e a pré-escola de 1ª a 5ª série. A renda do responsável familiar está entre 1 a 5 salários mínimos,sendo a maior concentração entre 1 e 3 salários. O diferencial é que existe um número significativo de responsável com renda entre 5 e 10 salários. A grande maioria dos responsáveis são homens alfabetizados, com uma média entre 4 e 8 anos de escolaridade. O lixo é totalmente coletado pelo serviço de limpeza, os banheiros estão todos ligados à rede geral de esgoto, o abastecimento de água e todo feito por canalização. O Jardim Adalberto Roxo teve a sua ocupação ligada a um loteamento popular o que permitiu à população residente nesta região terem em sua quase totalidade domicílios particulares permanentes. O número de equipamentos em educação que atendem o bairro2 é significativo, assim como também existe serviços de atendimento de lazer. Mas a saúde deixa muito a desejar. 2 Os moradores do jardim Adalberto Roxo utilizam os equipamentos públicos do Jardim Selmi Dei. 46 c) Jardim Selmi Dei No Jardim Selmi Dei o número de mulheres e homens alfabetizados é equilibrado e sem grandes discrepâncias em todas as faixas etárias. A maioria dos responsáveis são homens alfabetizados. O número de mulheres responsáveis alfabetizadas está na faixa de 20%. Neste bairro o perfil dos residentes modifica-se um pouco. São casais na faixa dos 19 aos 49 anos, com filhos na faixa de zero a 14 anos, mas a quantidade de adolescentes entre 15 e 18 anos aumenta sensivelmente. A faixa etária das vítimas está entre 0 e 11 anos, com vítimas significativas na pré-escola, apontando para problemas com crianças em idade escolar. A renda do responsável familiar está entre 3 a 10 salários mínimos apontando para um bairro com famílias de rendimento mais elevado e com um número significativo de mulheres responsáveis com renda. O número de responsáveis sem renda é inferior a 10%. O lixo é quase todo coletado por serviço de limpeza, os banheiros estão quase todos ligados à rede de esgoto. O abastecimento de água é quase todo canalizado. O Jardim Selmi Dei assim como o Adalberto Roxo teve sua ocupação ligada a um loteamento popular, era uma antiga fazenda de café que foi loteada. A população residente neste bairro tem em sua totalidade domicílios particulares permanentes, provavelmente em decorrência da forma de ocupação. Como foi dito anteriormente os equipamentos públicos deste bairro atendem também o Jardim Adalberto Roxo. Tem serviços públicos em educação expressivos nas faixas de 0 a 14 anos. Também os equipamentos de lazer são significativos. Apenas a área de saúde tem atendimento precário. 47 d) Jardim Paraíso e Tropical Deve-se ressaltar que este bairro é de ocupação mais recente e foi considerado de acordo com nossa tipologia como intermediário de pequeno porte, enquanto os outros são intermediários de médio porte. Tanto a alfabetização de homens e melhores neste bairro é bastante irregular, não obedece um padrão como nos outros bairros. A maioria dos responsáveis são homens alfabetizados, o número de mulheres responsáveis alfabetizadas é muito baixo. O perfil da idade dos residentes para homens está na faixa dos 19 até os 59 anos e mulheres na faixa dos 19 aos 39 anos. A composição familiar deste bairro aparentemente é diferente dos outros estudados. O número de filhos na faixa etária de 0 a 14 anos é o mais significativo. Mais uma vez as vítimas em sua maioria estão entre 0 a 11 anos de idade e os problemas maiores estão em crianças que freqüentam a pré-escola e o ensino fundamental de 1ª a 5ª série. A renda do responsável familiar está entre meio e dois salários mínimos, com alguns responsáveis na faixa entre 3 e 10 salários. Existe um grande número de responsáveis homens sem renda o que também é um diferencial em relação aos outros bairros. Isto pode ser uma das fontes de conflito familiar; apesar dos casos de conflitos familiares nos outros bairros também serem os mais expressivos. O lixo é todo coletado por serviço de limpeza. Já os banheiros com fossa séptica estão presentes na maioria das residências. O número de banheiros ligados à rede geral de esgoto é muito pequena. O abastecimento de água é feito em geral por poço ou nascente. O abastecimento através de água canalizado é muito baixo. O fato do Jardim Tropical e Paraíso serem loteamentos recentes, voltados para a auto-construção, talvez explique o número significativo de domicílios cedidos e o baixo número de habitantes. 48 Quanto aos equipamentos urbanos o bairro tem pouco acesso a serviços de saúde. O bairro tem uma série de propostas de lazer, mas que atende uma série de outros bairros no entorno. De modo geral os bairros de maior violência contra crianças e adolescentes em Araraquara possuem uma população constituída por famílias jovens, baixa escolaridade e baixa renda (com exceção do Selmi Dei). Encontram-se na periferia do município e possui um histórico de ocupação mais ou menos parecido, loteamentos populares de grandes áreas rurais e que dependendo da legislação municipal são aprovados e implantados sem a mínima infra-estrutura e sem acesso aos serviços públicos. Os dados coletados permitem inferir que apesar do município ter universalizado o acesso à água, esgoto, luz nestes anos, exceto o Jardim Tropical e Paraíso, o acesso à políticas públicas é precário, expondo estas populações à violência. A provisão de serviços não garante a qualidade da oferta, o que coloca para os pesquisadores a necessidade de incluir indicadores de acesso que captem esta dimensão. A distribuição dos equipamentos públicos está concentrada na área central da cidade e nas áreas intermediárias. As áreas periféricas não contam com uma distribuição igualitária destes equipamentos conforme se pode observar ou mapa perceber pelo mapa XII. 49 Mapa XII. Aparelho público em Araraquara Fonte: Plano Diretor de Araraquara - 2009. Mapa estratégia de qualidade de vida urbana. Para maiores informações ver anexo VII3. As instituições que prestam atendimento à criança e ao adolescente também estão concentradas em determinadas regiões do município conforme mapa a seguir. Coincidentemente os bairros com os maiores índices de violência contra crianças e adolescentes não possuem instituições que prestam este atendimento, conforme Mapa X e Tabela III. 3 Para visualização completa do mapa é necessário o uso do software que segue juntamente com o arquivo do mapa. 50 Tabela III. Endereços das instituições Endereços das Instituições Razão Social Nome Fantasia Endereço Bairro CEP Telefone Fax Centro de Promoção Educacional e Social na Comunidade CEPROESC R. São Bento,2524 Centro 14802-290 (16)236-4547 (16)236-3367 Instituto dos Cegos Santa Luzia Não consta Av. Padre Antônio Cezarino, 870 Vila Xavier 14810-142 (16)222-2009 ( ) - 0 Associação Para Apoio e Integração do Deficiente Visual PARA - D.V. Av. Duque de Caixias, 364, 1° andar/sala 14 Centro 14801-120 (16)233-1212 ( ) - 0 Sociedade Beneficiente "Escola do Mestre Jesus" Não consta Av. Plínio de Carvalho, 357 Vila Santo Malara 14810-200 (16)222-0689 ( ) - 0 Lar Escola Redenção Não consta Av. Francisco Sampaio Peixoto, 372 Parque São José 14800-530 (16)222-6923 (16)222-4992 Associação dos Pais e Amigos Excepcionais de Araraquara APAE de Araraquara Av. Cientista Frederico de Marco, 750 Vila Xavier 14810-200 (16)237-3800 (16)237-3800 Nosso Ninho Therezinha Maria Auxiliadora Não consta Av. Manoel de Abreu, Km 02 Chácara Velosa 14801-970 (16)224-4546 (16)224-4546 Centro Comunitário Nossa Senhora do Carmo Creche do Carmo R. João Gurgel, 1871 Alexandre Bertoni 14801-970 (16)236-5586 ( ) - 0 Sociedade Amigos do Bairro Santa Angelina SABSA R. Voluntários da Pátria, 4331 Jardim Biagioni 14802-205 (16)235-2777 ( ) - 0 Casa da Criança Liga de Assistência Cristo Rei - Casa da Criança Cristo Rei R. Dom Pedro I, 1298 Vila Xavier 14810-108 (16)222-2076 ( ) - 0 Casa Betânia Não consta Av. Duque de Caixias, 967 Centro 14801-120 (16)232-1200 ( ) - 0 Associação Beneficiente e de Promoção Social São José Creche São José R. Expedicionários do Brasil, 556 Centro 14800-230 (16)232-1733 ( ) - 0 Sociedade Beneficiente Obreiros do Bem Creche Meimei Av. Barroso, 1238 Centro 14801-350 (16)236-5283 ( ) - 0 Lar Juvenil Araraquarense "Domingos Sávio" Não consta R. Armando Salles de Oliveira, 715 Centro 14801-335 (16)236-6995 ( ) - 0 Lar Escola "Maria Rita de Jesus" Não consta R. Cândido Portinari, 46 Vila Xavier 14810-255 (16)237-4760 ( ) - 0 Orfanato Renascer Não consta R. Paulo Elias Antônio, 919 Jardim Residencial Água Branca 14807-268 (16)232-4937 (16)222-7154 Associação Amigos da Vida - Araraquara AAVIDA Av. Feijó, 1383 Centro 14801-140 (16)236-0484 ( ) - 0 PRODAM de Araraquara - Projeto Diocesano de Atendimento ao Menor de Araraquara Pastoral do Menor R. Anunciato Rossi, 140 Jardim Imperador 14802-280 (16)224-2355 (16)236-8651 CedroMulher - Centro de Defesa dos Direitos da Mulher CedroMulher R. Voluntários da Pátria, 1759 Centro 14800-360 (16)232-9085 ( ) - 0 Associação de Atendimento Educacional Especializado AAEE R. Mondo Archimedes Luppi, 620 Jardim Aclimação 14806-121 (16)224-2879 ( ) - 0 Legião da Boa Vontade(Núcleo Municipal de Araraquara - Centro Comunitário Educacional) LBV Av. Poeta Carlos Drumond Andrade, 791 Jardim São Jorge 14807-086 (16)222-8994 (16)222-8994 51 Considerações Finais O diagnóstico da violência contra crianças e adolescentes em Araraquara, realizado pela pesquisa aponta para a importância da dimensão territorial na definição de políticas públicas municipais. A divisão da cidade em áreas centrais, intermediárias e periféricas e os diversos padrões de proximidade e distância em relação ao centro se constituem num importante indicador para a formulação de políticas públicas municipais. No entanto, as condições específicas dos bairros periféricos que tiveram uma ocupação irregular (Selmi Dei, Adalberto Roxo e Jardim das Hortências) ou ainda de situações de pobreza concentrada ou de precariedade de serviços públicos Jardim Tropical e Paraíso necessitam de políticas públicas que atendam estas condições especiais A análise das zonas de influência permitiu compreender melhor o efeito irradiador que os bairros com maior violência produzem em áreas contíguas, provavelmente com as mesmas características sócioeconômicas e de deficiência de equipamentos públicos e que exige políticas de integração urbana mais efetivas. Ao tratarmos da questão territorial como um indicador importante para políticas públicas contra a violência de crianças e adolescentes, procuramos entendê-la não como um simples rebatimento de fenômenos mais complexos que implicam na relação entre pobreza, desigualdade e segregação, mas como um ponto de partida importante para o reconhecimento do território como componente da sociedade e como um elemento importante para a definição de políticas públicas mais efetivas especialmente nas áreas urbanas periféricas susceptíveis de maiores indicadores de violência. Este tipo de análise é bastante incipiente no Brasil e exige um esforço de várias áreas do conhecimento no sentido de permitir uma melhor utilização dos vários modelos e programas de análise espacial 52 aplicados aos fenômenos sociais. Este avanço no conhecimento e sua aplicação no diagnóstico e definição de políticas públicas, nas várias esferas governamentais com certeza permitiriam um melhor uso do dinheiro público e maior eficácia das políticas públicas. 53 Bibliografia ALVES, H. P. da F. Desigualdade ambiental no município de São Paulo: análise da exposição diferenciada de grupos sociais e situações de risco embiental através do uso de metodologia de geoprocessamento. Revista Brasileira de Estudos da População, São Paulo, v. 24, n. 2, p. 301-316, jul/dez 2007. BOGUS, Lucia M. M. Región metropolitana de São Paulo: desiguldad y segregación socio-espacial. In: LAS PERIFERIAS URBANAS Y LA EXPANSIÓN DEL URBANISMO DISPERSO: JORNADAS DE DEBATE Y PERSPECTIVAS. Barcelona, 2007. (mimeo). BORJA, J. e CASTELLS, M. (1998), Local y Global. La gestion de las cuidades em la era de la informacion. Madrid: Taurus. BOURQUAT, A. e COHN, Amélia. (2003), A construção do mapa da juventude de São Paulo. 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MARIA TERESA MICELI KERBAUY Coordenadora