Livros Obrigatórios FUVEST/UNICAMP 2015
Viagens na Minha Terra – Almeida Garrett
AUTOR
João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett e mais tarde 1.º Visconde de Almeida Garrett, (Porto,
4 de fevereiro de 1799 - Lisboa, 9 de dezembro de 1854) foi um escritor e dramaturgo romântico, orador, par
do reino, ministro e secretário de estado honorário português.
Participou na revolução liberal de 1820 e, em seguida, foi para o exílio na Inglaterra em 1823, após a
Vilafrancada. Antes casou-se com uma muito jovem senhora Luísa Midosi, que tinha apenas 14 anos. Foi na
Inglaterra que tomou contato com o movimento romântico, descobrindo Shakespeare, Walter Scott e outros
autores e visitando castelos feudais e ruínas de igrejas e abadias góticas, vivências que se refletiriam na sua
obra posterior.
Em 1824, pode partir para França e, nessa viagem, escreveu Camões (1825) e Dona Branca (1826),
poemas geralmente considerados como as primeiras obras da literatura romântica em Portugal. No ano de 1826
foi chamado e regressou à pátria com os últimos emigrados dedicando-se ao jornalismo, fundando e dirigindo
o jornal diário O Português (1826-1827) e o semanário O Cronista (1827).
A vitória do Liberalismo permitiu-lhe instalar-se novamente em Portugal, após curta estadia em
Bruxelas como cônsul-geral e encarregado de negócios, onde lê Schiller, Goethe e Herder. Em Portugal
exerceu cargos políticos, distinguindo-se nos anos 30 e 40 como um dos maiores oradores nacionais. Foram
de sua iniciativa a criação do Conservatório de Arte Dramática, da Inspecção-Geral dos Teatros, do Panteão
Nacional e do Teatro Normal (atualmente Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa). Mais do que construir um
teatro, Garrett procurou sobretudo renovar a produção dramática nacional segundo os cânones já vigentes no
estrangeiro.
MOVIMENTO LITERÁRIO (Romantismo)
A literatura romântica em Portugal tem como marco simbólico a publicação do poema Camões, de
Almeida Garrett, em 1825. De fato, Camões exibe já algumas das tendências (a construção do herói romântico,
por exemplo) que marcam o Romantismo português. Contudo, só anos mais tarde este movimento literário se
enraizará em Portugal. Costuma-se dizer que o Romantismo durou cerca de 40 anos terminando por volta de
1865 com a Questão Coimbrã. No entanto, é de notar que, em 1865 e depois, muitos prosadores e poetas
românticos publicam ainda com grande sucesso muitas das suas obras.
Em inícios do século XIX, a literatura portuguesa experimentou uma revolução literária iniciada pelo
poeta Almeida Garrett, que tinha entrado em contato com o Romantismo inglês e francês durante o seu exílio
e que decidiu basear suas obras na tradição nacional portuguesa. No seu poema narrativo Camões (1825)
rompeu com as regras estabelecidas de composição; seguiram-no Flores sem Fruto e a coleção de poemas
amorosos Folhas Caídas. A sua elegante prosa está recolhida na obra miscelânea Viagens na minha terra.
Entre os primeiros seguidores de Almeida Garrett encontra-se Alexandre Herculano, cuja poesia está
cheia de motivos patrióticos e religiosos e de reminiscências de Lamennais. O movimento tornou-se
ultrarromântico em mãos de autores como Castilho, um mestre do verso escasso de ideias, ou nos versos de
João de Lemos ou do melancólico Soares de Passos. Tomás Ribeiro, autor do poema patriótico D. Jaime, é
sincero em seus conteúdos, mas segue os excessos desta escola no seu gosto pela forma e a melodia.
CARACTERÍSTICAS DA OBRA
Viagens na Minha Terra é um livro da autoria de Almeida Garrett, na qual se misturam o estilo
digressivo da viagem real (que o autor fez de Lisboa a Santarém) e a narração novelesca em torno de Carlos,
Frei Dinis e Joaninha.
O livro Viagens na Minha Terra, publicado em volume em 1846, é o ponto de arranque da moderna
prosa literária portuguesa: pela mistura de estilos e de gêneros, pelo cruzamento de uma linguagem ora clássica
ora popular, ora jornalística ora dramática, ressaltando a vivacidade de expressões e imagens, pelo tom
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oralizante do narrador, Garrett libertou o discurso da pesada tradição clássica, antecipando o melhor que a este
nível havia de realizar: Eça de Queirós.
Considera-se que Viagens na Minha Terra seja a obra em prosa mais ousada e mais bem realizada de
Almeida Garrett. Fazendo referência à obra de Xavier de Maistre, Viagem à Roda de Meu Quarto, que toma
por modelo, inicia uma viagem de Lisboa à Santarém a convite do amigo Passos Manuel, chefe da facção
setembrista do liberalismo português. A obra compõe-se de duas partes narrativas distintas. A primeira
compõe-se das impressões de viagem feito pelo autor/narrador, em que intercalando citações literárias e
históricas as mais diversas, vai compondo uma narrativa de viagem que nos é apresentada por um caráter muito
subjetivo e rico em intertextualidades e digressões. A segunda parte trata-se da interposição no meio da
narrativa de viagem de uma história amorosa e trágica que envolve as personagens Joaninha, Carlos, Georgina,
Francisca e Frei Dinis. Essa narração de um drama amoroso concebe um passado próximo que se desenvolvera
durante as lutas entre liberais e miguelistas, no período de 1830 a 1834. Os conflitos que envolvem essas
personagens têm causa ainda num passado mais distante que trata da vida do personagem Frei Dinis, quando
antes de se tornar religioso era um nobre e que em circunstâncias dramáticas resolvera esconder a paternidade
de Carlos.
Viagens na Minha Terra fornece por meio das personagens do drama amoroso uma visão simbólica de
Portugal em que se busca dialogar acerca das causas da decadência do império português. Assim, o instável
Carlos, que não consegue decidir-se acerca das suas relações amorosas, é o personagem que podemos ligar às
características biográficas do próprio autor. Georgina, a namorada inglesa de Carlos, apresenta-nos uma visão
de ingenuidade e altruísmo como caracteres de uma mulher estrangeira que acaba por não querer envolver-se
por questões sentimentais ao drama histórico de Portugal, fazendo de sua reclusão religiosa a justificativa para
não participar dos dilemas e conflitos históricos que motivaram sua decepção amorosa. É a fleugma britânica.
Joaninha, a amada de Carlos, singela e terna, nascida e vivendo no vale de Santarém, a “menina dos rouxinóis”
simboliza uma visão ingênua de Portugal, quase folclórica, que não se sustenta diante das condições históricas.
A velha cega Francisca, avó de Joaninha, mostra-nos a imprudência e a falta de planejamento com que Portugal
se colocava no governo dos liberalistas, levando a nação à decadência. Por fim, Frei Dinis é a própria tradição
calcada num passado histórico glorioso que, no entanto, não é mais capaz de justificar-se sem uma revisão de
valores e de perspectivas. O final do drama, que culmina na morte de Joaninha e na fuga de Carlos para tornarse barão, representa a própria crise de valores em que o apego à materialidade e ao imediatismo acaba por
fechar um ciclo de mutações de caráter duvidoso e instável.
PERSONAGENS
Carlos - é um homem instável que não consegue se decidir sobre suas relações amorosas, podendo ser
ligado às características biográficas do próprio Almeida Garrett.
Georgina - namorada inglesa de Carlos, é a estrangeira de visão ingênua, que escolhe a reclusão
religiosa como justificativa para não participar dos dilemas e conflitos históricos que motivaram sua decepção
amorosa.
Joaninha - prima e amada de Carlos. Meiga e singela, é a típica heroína campestre do Romantismo.
Simboliza uma visão ingênua de Portugal, que não se sustenta diante da realidade histórica.
D. Francisca - velha cega avó de Joaninha. Mostra-nos a imprudência e a falta de planejamento com
que Portugal se colocava no governo dos liberalistas, levando a nação à decadência.
Frei Dinis - é a própria tradição calcada num passado histórico glorioso que, no entanto, não é mais
capaz de justificar-se sem uma revisão de valores e de perspectivas.
RESUMO DA OBRA (por capítulo)
Capítulo I - Citação a Xavier de Maistre, Viagem à Roda do Meu Quarto: “O próprio Xavier de
Maistre que aqui escrevesse, ao menos ia até ao quintal”. Citações a Píndaro, Lord Byron. Início da viagem à
Santarém. 3.º parágrafo: Garrett apresenta o seu projeto de viagem especial a Santarém.
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Capítulo II - Garrett fala de uma escrita-viagem. Citação a Dom Quixote e Sancho Pança. Cita o
filósofo Jeremy Bentham: “A virtude é o galardão de si mesma, disse um filósofo antigo; e eu não creio no
famoso dito de Bentham, que sabedoria antiga seja um sofisma. O mais moderno é o mais velho” No 4.º
parágrafo: tentativa de definições de “progresso”, “espiritualismo” e “materialismo”.
Capítulo III - Citações a Vítor Hugo, Fausto de Goethe, Mistérios de Paris de Eugene Sue, Cervantes,
Shakespeare, Boileau e Moliére. Chegada a uma estalagem.
Capítulo IV - Reflexão sobre a modéstia. Cita Dêmades, Joseph Addison. Planos de seguir viagem a
Cartaxo passando por Pinhal do Azambuja, vilarejos próximos à Santarém.
Capítulo V - Chegada à vila de Pinhal do Azambuja. Descrição do lugar. Cita Benjamim Antier, Vitor
Hugo, El Cid. Segue o narrador para Cartaxo.
Capítulo VI - Cita Homero e Camões e fala da necessidade de se misturar o maravilhoso mitológico
ao Cristianismo. Fala o narrador da Divina Comédia. Chegada a Cartaxo.
Capítulo VII - Lembrança de Paris (Campos Elíseos, Bois de Boulogne) e fala da Suécia, que nada se
compara “ao prazer e consolação” que sentiu “à porta do grande café de Cartaxo”. Citação a Alfageme,
conversa no café, fala-se da revolução. Passeio pelo lugar, descrição do lugar. Citação a Bacon, Isaac Newton,
James Thomson, François Guizot.
Capítulo VIII - Saída de Cartaxo. Citações a Teócrito, Salomão Gessner, Rodrigues Lobo. Afirma o
narrador que não é romântico: “Eu não sou romanesco. Romântico, Deus me livre de o ser – ao menos, o que
na algaravia de hoje se entende por essa palavra.” Passa pelo lugar em que ocorreu a batalha de Almoster (18
de fevereiro de 1834) em que os liberais de D. Pedro e o Marechal Saldanha venceram os Miguelistas. Compara
essa batalha com a de Waterloo. Cita o filósofo Hobbes.
Capítulo IX - Cita Ênio Manuel de Figueiredo. Comenta cinco peças desse autor: O Casamento da
Cadeia, O Fidalgo de Sua Casa, O Cioso, O Avaro Dissipador e Poeta em Anos de Prosa. Destaca essa última:
“E há títulos que não deviam ter livro, porque nenhum livro é possível escrever que os desempenhe como eles
merecem.” Cita o Judeu Errante de Eugene Sue. Cita a Sílvio Pélico, Madame de Lafayette, René de
Chateaubriand, Madame de Abrantes. Fala de Bonaparte. Chega ao vale de Santarém: “pátria dos rouxinóis e
das madressilvas”.
Capítulo X - Transição da viagem para o drama. O narrador começa sua observação acerca de uma
janela; fala da inferioridade do homem que não é poeta. A “menina dos rouxinóis” é referida pela observação
da janela. Anuncia-se que se vai começar a contar a história da menina dos rouxinóis, de olhos verdes.
Capítulo XI - Apresenta Irmã Francisca (avó), velha cega, de setenta anos. Fala de Yorick,
personagem shakesperiana (bobo da corte da Dinamarca em Hamlet) que aparece em Tristam Shandy de
Lawrence Sterne. Cita Anacreonte, Aristóteles, Antônio Ferreira (pintor) e Rafael (Madonna della sedia).
Distinção entre os poetas e os romancistas, os primeiros estão sempre namorados. Pergunta-se: “Como hei de
eu então, eu que nesta grave odisseia das minhas viagens tenho de inserir o mais interessante e misterioso
episódio de amor que ainda foi contado ou cantado”? Referindo-se ao caso de Joaninha.
Capítulo XII - Joaninha (neta) surge para desembaraçar a meada da avó. O narrador anuncia que
professa a “religião dos olhos pretos”, mas “Joaninha, porém, tinha os olhos verdes”. Chegada de Frei Dinis
que interrompe a conversa entre a avó e a neta.
Capítulo XIII - Fala-se sobre o frade no aspecto moral, social e artístico. Da separação entre o frade
e o momento presente (“o nosso século” – séc. XIX). Outra referência à D. Quixote e Sancho Pança: “o frade
era até certo ponto o Dom Quixote da Sociedade velha”. Interpelação intertextual a Eugênio Sue e seu Judeu
Errante, “que precisa [ser] refeito.” Crítica do narrador ao “progresso” e à “liberdade” atuais de Portugal:
“antes queria a posição dos frades que a dos barões”. Metanarrativa: o autor comenta que não consegue
escrever uma história sem pôr nela um frade.
Capítulo XIV - Depois do capítulo XIII, que devia ser considerado uma “introdução ao capítulo
seguinte [XIV]”, inicia-se aqui a narrativa sobre Frei Dinis. Este se mostra inimigo de Carlos: “mas esse rapaz
é maldito, e entre nós e ele está o abismo de todo o inferno”.
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Capítulo XV - Descrição de Frei Dinis que critica o liberalismo em concordância com a opinião do
narrador. Frei Dinis é apresentado como um ferrenho defensor das instituições monásticas: “condição essencial
de existência para a sociedade civil”. Indaga o narrador sobre o passado de Frei Dinis, desconfiando de que no
passado havia alguma coisa que o prendia ainda a terra que “lhe faltava castrar ainda por amor do céu”.
Capítulo XVI - Conta-se como Dinis de Ataíde, nobre cavaleiro, de posses, resolveu abandonar tudo
e desaparecer, voltando dois anos depois à Santarém como Frei Dinis. Critica-se a ordem franciscana e as
outras ordens, de como tão rapidamente, às vezes sem vocação, alguém surgia ordenado frei. Diz o narrador
que um dia Frei Dinis contou um segredo à velha Francisca Joana e que também deixou para ela grande parte
de seus bens, depois que se tornou frei. Carlos fora estudar em Coimbra e em Lisboa e só nos finais de semana
voltava. Carlos e Frei Dinis se desentendem, Carlos não concorda com os mandos de Frei Dinis na casa e
resolve ir para a Inglaterra. Quando Carlos foi para a Inglaterra, Joaninha ainda “era uma criança”.
Capítulo XVII - Três anos depois, como era de costume, Frei Dinis vai visitar a velha Francisca. Frei
Dinis vem trazer a notícia de que Carlos estava bem na Inglaterra. Nesse capítulo de anuncia que o Frei Dinis
pode mentir, uma vez que finge alegria ao dar a notícia à velha. “O frade estava por fora, o homem por dentro”.
Frei Dinis tira uma carta da manga e entrega a Joaninha, a carta era de Carlos.
Capítulo XVIII - A carta era de Carlos para Joaninha e insinuava a saudade de Carlos para com a
prima: “não continha senão as ingênuas expressões de um amor fraterno nunca esquecido, longas saudades do
passado”. Frei Dinis, por essa época, andava preocupado com a guerra civil e com o avanço do exército realista
que já cercava Lisboa. Frei Dinis sugere que Carlos poderia voltar e lutar contra os realistas: “o seu Carlos,
vier expulsar as baionetas do pobre convento de São Francisco, o velho guardião”. A velha Francisca ameaça
contar toda a verdade a Carlos – o segredo dos dois – Frei Dinis ameaça-a com “a maldição eterna de Deus”.
Capítulo XIX - A guerra civil atinge Santarém: “Alguns feridos (...) ficavam na casa do vale entregues
à piedosa guarda e cuidado de Joaninha; dos outros tomou conta Frei Dinis e os acompanho a Santarém.” “E
pouco a pouco, os combates, as escaramuças, o som e a vista do fogo, o aspecto do sangue, os ais feridos, o
semblante desfigurado dos mortos.” Joaninha vai se acostumado com os horrores da guerra. Torna-se
conhecida dos solados: “A menina dos rouxinóis! Que cantiga é essa que tu cantas!”.
Capítulo XX - Joaninha, numa tarde, dorme ao campo, ao som do canto de um rouxinol, junto das
flores. Vem um oficial, “moço, talvez não tinha trinta anos” (...) “olhos pardos e não muito grandes, mas de
uma luz e viveza imensa (...) a mobilidade de espírito”. Quando Joaninha é acordada pelo soldado, reconheceo, é Carlos, seu primo. Joaninha e Carlos beijam-se como namorados.
Capítulo XXI - Carlos lutava pelo exército dos liberalistas, a casa de Joaninha estava sob o domínio
do outro exército, os realistas. Por isso Carlos não pode levá-la até a casa da avó Francisca.
Capítulo XXII - Carlos declara seu amor à Joaninha por meio de uma carta. Expõe a diferença que
Carlos percebe entre a menina que deixara e a moça que encontrara. Porém, Carlos havia deixado um amor na
Inglaterra, era Georgina “a mulher a quem prometera, a quem estava resolvido a guardar fé. E essa mulher era
bela, nobre, rica, admirada, ocupava uma alta posição no mundo”
Capítulo XXIII - Carlos atormenta-se na dúvida de contar ou não a verdade para Joaninha. Carlos
começa a refletir sobre a cor dos olhos das duas mulheres: “Olhos verdes!... Joaninha tem os olhos verdes. Não
se reflete neles a pura luz do céu, como nos olhos azuis. Nem o fogo e o fumo das paixões, como nos pretos.
Mas o viço do prado, a frescura e a animação do bosque, a flutuação e a transparência do mar... Tudo está
naqueles olhos verdes. Joaninha, por que tens tu os olhos verdes?” (...) “Oh! O céu é azul como os teus olhos,
Georgina...”
Capítulo XXIV - Explicação do mito de Adão, comparação de Adão a Carlos. Carlos conversa com
Joaninha e explica que não gosta do Frei Dinis e por isso deixou a casa e foi para a Inglaterra. A certa altura,
Joaninha diz que Carlos se parece com Frei Dinis quando se zanga e franze a testa.
Capítulo XXV - Joaninha declara seu amor a Carlos. Ela parece adivinhar que Carlos tem outra
mulher. Carlos e Joaninha se despedem tristemente. Os olhos verdes de Joaninha nunca mais brilharam como
dantes.
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Capítulo XXVI - O narrador fala dos autores antigos: Tito Lívio e Tácito (historiadores), Juvenal
(poeta), Horácio (retórico), Duarte Nunes (cronista português), cita-se o Anel dos Nibelungos (rapsódias
alemãs), Shakespeare e comenta-se de alguns de seus personagens (Banco, Macbeth, Falstaff). Fala-se de
Abelardo (filólogo e teólogo da idade média) e de Heloísa (sua paixão), de Bentham (filósofo inglês), Camões
e Os Lusíadas, de D. Afonso Henriques.
Capítulo XXVII - Chegada do narrador à Santarém. Descrição de locais de Santarém. Fala-se de São
Frei Gil: “que, é verdade, veio a ser grande santo, mas que primeiro foi grande bruxo”.
Capítulo XXVIII - A Igreja de Sta. Maria de Alcaçova, descrição. Comentário sobre o governo do
Marquês de Pombal e sobre os palácios de D. Afonso Henriques, a cruz de Santa Iria. Citação de trecho do
Fausto de Goethe.
Capítulo XXIX - O narrador faz a distinção entre poetas que morreram jovens (Byron, Schiller,
Camões e Tasso) e poetas que morreram velhos (Homero, Goethe, Sófocles e Voltaire). Comenta sobre a
imaginação e o sentimento dos poetas (categorias românticas). Compara Santarém com Nínive e Pompéia,
cidades destruídas. Inserção da trova sobre Santa Iria.
Capítulo XXX - Conta-se a história de Santa Iria: que a freira Iria namorou-se de Britaldo, filho do
cônsul Castinaldo. Santa Iria “consolou como mulher e ralhou como santa” e retirou do corpo a paixão de
Britaldo. A paixão – obra do demônio – foi se alojar no corpo do monge Remígio, este preparou uma bebida
diabólica que fez Iria parecer como grávida (“os sinais da mais aparente maternidade”). Britaldo indignado,
teve de volta a paixão e matou Iria, jogando o corpo no rio. O abade Célio descobriu toda a verdade sobre a
falsa maternidade de Iria e foi com outros padres procurar o corpo no rio e acharam um túmulo feito de
alabastro, por obra dos anjos. Este ficou encoberto pelas águas até que séculos mais tarde a Rainha Santa
Isabel, esposa do rei D. Dinis, orando, fez as águas se abrirem e contemplou o sepulcro.
Capítulo XXXI - Descrição de lugares de Santarém; o busto de D. Afonso Henriques e as muralhas
de Santarém.
Capítulo XXXII - Volta-se à história de Joaninha. Carlos, ferido e prisioneiro, é atendido no hospital
por uma enfermeira que é nada menos do que Georgina, a amada inglesa.
Capítulo XXXIII - Georgina explica a Carlos que o encontrou ferido e ajudado pelo Frei Dinis e que
já conhece tudo sobre Joaninha. Georgina explica que o amor que ela tinha por Carlos já se acabou.
Capítulo XXXIV - Continua a conversa no hospital. Frei Dinis implora o perdão de Carlos.
Capítulo XXXV - Citação a Laocoonte e Hércules. Carlos diz que não ama mais Joaninha, mas
Georgina, que não o quer. Frei Dinis explica o grande segredo: ele é o verdadeiro pai de Carlos, que a filha da
velha Francisca namorava Dinis, mas arrumou um amante e tencionava matar a Dinis numa emboscada, esse
sem reconhecer ninguém no escuro, mata os dois e joga os corpos no rio, que são tomados por afogados. Carlos
levanta-se da cama e vai embora para Évora lutar no exército Constitucional dos liberalistas.
Capítulo XXXVI - Fala sobre Santarém. Comenta o narrador que Carlos deixou de lado as paixões e
se meteu na política, mas promete contar os detalhes mais adiante.
Capítulo XXXVII - Fala-se do túmulo de Pedro Álvares Cabral, cita-se Os Lusíadas de Camões. A
história da igreja do Santo Milagre.
Capítulo XXXVIII - O narrador comenta sobre um jantar que fizera em Santarém, de como no jantar
se falou mal de Lisboa e de como se exaltou Paris, Londres, Pequim, Nanquim e Timboctu.
Capítulo XXXIX - O narrador comenta sobre seu ceticismo em relação ao tempo presente de Portugal.
Fala da diferença entre filósofos e poetas: “os filósofos são muito mais loucos do que os poetas”. Narração de
como Frei Dinis roubou os ossos de São Frei Gil.
Capítulo XL - Comenta-se do mosteiro das Claras. Frei Dinis traz os ossos de São Frei Gil para que
sejam guardados pelas freiras.
Capítulo XLI - Frei Dinis vai embora de Santarém, Georgina fora pra Lisboa, Carlos ainda estava em
Évora e Joaninha guardava uma última carta dele.
Capítulo XLII - O narrador quer ir embora de Santarém. Comenta sobre o túmulo de D. Fernando.
Fala de Jesus Cristo como modelo de paciência.
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Capítulo XLIII - Partida de Santarém. Antes de se ir, o narrador encontra Frei Dinis que lhe conta
que Joaninha morrera, de que Carlos sumira, de que a velha Francisca estava para ser enterrada e de que
“Santarém também morreu; e morreu Portugal”. Frei Dinis entrega ao narrador a última carta de Carlos escrita
para Joaninha.
Capítulo XLIV - Início da narração da carta de Carlos. Carlos comenta que mentia e que gostava de
mentir. Carlos comenta que conheceu uma família inglesa em que havia três filhas e ele flertava com as três.
Capítulo XLV - Fala de Laura: “olhos cor de avelã”. Descreve Júlia: “a mais carinhosa das três irmãs”.
Julia dizia a Aia: “Febe, estou só com Carlos; e quero estar só. Em casa para ninguém”.
Capítulo XLVII - Continuação da narração da carta de Carlos. Laura vai para o País de Gales, Júlia
fica como intermediária na correspondência indireta entre Carlos e Laura, até que Laura se casa. Carlos fica
só, sem Laura e sem Júlia.
Capítulo XLVIII - Carlos fala que a terceira irmã da casa era Georgina. Termina a carta dizendo
adeus à Joaninha.
Capítulo XLIX - Comenta-se que Carlos conseguiu o título de barão, Georgina virou abadessa. Frei
Dinis após a leitura da carta de Carlos pelo narrador fala sobre as virtudes e defeitos dos frades e dos barões.
TRECHOS DA OBRA
Trecho Capítulo I (início da obra)
De como o autor deste erudito livro se resolveu a viajar na sua terra,
depois de ter viajado no seu quarto; e como resolveu imortalizar-se escrevendo
estas suas viagens. — Parte para Santarém. — Chega ao Terreiro do Paço,
embarca no vapor de Vila Nova; e o que aí Ihe sucede. — A Dedução Cronológica
e a Baixa de Lisboa. — Lord Byron e um bom charuto. — Travam-se de razões os
Ílhavos e os Bordas-d’Água: os da calça larga levam a melhor.
QUE viaje à roda do seu quarto quem está à beira dos Alpes, de Inverno, em Turim, que é quase tão
frio como Sampetersburgo - entende-se. Mas com este clima, com este ar que Deus nos deu, onde a laranjeira
cresce na horta, e o mato é de murta, o próprio Xavier de Maistre, que aqui escrevesse, ao menos ia até o
quintal.
Eu muitas vezes, nestas sufocadas noites de Estio, viajo até à minha janela para ver uma nesguita de
Tejo que está no fim da rua, e me enganar com uns verdes de árvores que ali vegetam sua laboriosa infância
nos entulhos do Cais do Sodré. E nunca escrevi estas minhas viagens nem as suas impressões: pois tinham
muito que ver! Foi sempre ambiciosa a minha pena: pobre e soberba, quer assunto mais largo. Pois hei-de darlho. Vou nada menos que a Santarém: e protesto que de quanto vir e ouvir, de quanto eu pensar e sentir se háde fazer crónica.
Era uma ideia vaga, mais desejo que tenção, que eu tinha há muito de ir conhecer as ricas várzeas desse
Ribatejo, e saudar em seu alto cume a mais histórica e monumental das nossas vilas. Abalam-me as instâncias
de um amigo, decidem-me as tonterias de um jornal, que por mexeriquice quis encabeçarem desígnio político
determinado a minha visita .
Pois por isso mesmo vou: — pronunciei-me.
São 17 deste mês de Julho, ano de graça de 1843, uma segunda-feira, dia sem nota e de boa estreia.
Seis horas da manhã a dar em S. Paulo, e eu a caminhar para o Terreiro do Paço. Chego muito a horas,
envergonhei os mais madrugadores dos meus companheiros de viagem, que todos se prezam de mais matutinos
homens que eu. Já vou quase no fim da praça, quando oiço o rodar grave mas pressuroso de uma carroça
d’ancien régime: é o nosso chefe e comandante, o capitão da empresa, o Sr. C. da T. que chega em estado.
Também são chegados os outros companheiros: o sino dá o último rebate. Partimos.
Trecho Capítulo X
Vale de Santarém. — Namora-se o A. de uma janela que vê por entre umas
árvores. — Conjecturas várias a respeito da dita janela. — Semelhança do poeta com a
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mulher namorada, e inquestionável inferioridade do homem que não é poeta. — Os
rouxinóis. — Reminiscência de Bernardim Ribeiro e das suas saudades. — De como o A.
tinha quase completo o seu romance, menos um vestido branco e uns olhos pretos. —
Saem verdes os olhos com grande admiração e pasmo seu. — Verificam-se as conjecturas
sobre a misteriosa janela. — A menina dos rouxinóis. — Censura das damas muito para
temer, crítica dos elegantes muito para rir. — Começa o primeiro episódio desta
Odisseia.
— «Os olhos, os olhos...» disse eu pensando já alto, e todo no meu êxtase, «os olhos... pretos.»
— «Pois eram verdes!»
— «Verdes os olhos... dela, do vulto da janela?»
— «Verdes como duas esmeraldas orientais, transparentes, brilhantes, sem preço.»
— «Quê! pois realmente?... É gracejo isso, ou realmente há ali uma mulher, bonita, e?...»
— «Ali não há ninguém — ninguém que se nomeie hoje, mas houve... oh! houve um anjo, um anjo
que deve estar no céu.»
— «Bem dizia eu que aquela janela...»
— «É a janela dos rouxinóis.»
— «Que lá estão a cantar.»
— «Estão, esses lá estão ainda como há dez anos… os mesmos ou outros, mas a menina dos rouxinóis
foi-se e não voltou.»
— «A menina dos rouxinóis! que história é essa? Pois deveras tem uma história aquela janela?»
— «É um romance todo inteiro, todo feito como dizem os Franceses, e conta-se em duas palavras.»
— «Vamos a ele. A menina dos rouxinóis, menina com olhos verdes! Deve ser interessantíssimo.
Vamos à história já.»
— «Pois vamos. Apeemo-nos e descansemos um bocado.»
Já se vê que este diálogo passava entre mim e outro dos nossos companheiros de viagem. Apeámo-nos
com efeito; sentámo-nos; e eis aqui a história da menina dos rouxinóis como ela se contou.
É o primeiro episódio da minha Odisseia: estou com medo de entrar nele porque dizem as damas e os
elegantes da nossa terra que o português não é bom para isto, que em francês que há outro não sei quê...
Eu creio que as damas que estão mal informadas, e sei que os elegantes que são uns tolos; mas sempre
tenho meu receio, porque enfim, enfim, deles me rio eu, mas poesia ou romance, música ou drama de que as
mulheres não gostem, é porque não presta.
Ainda assim, belas e amáveis leitoras, entendamo-nos: o que eu vou contar não é um romance, não
tem aventuras enredadas, peripécias, situações e incidentes raros; é uma história simples e singela,
sinceramente contada e sem pretensão.
Acabemos aqui o capítulo em forma de prólogo, e a matéria do meu conto para o seguinte.
Trecho Capítulo XIX
Guerra de postos avançados. Joaninha no bivaque. — De como os rouxinóis
do vale se disciplinaram a ponto de tocar a alvorada e a retreta. — Quem era a «menina
dos rouxinóis», e porque Ihe puseram este nome. — A sentinela perdida e achada.
A velha disse aquelas últimas palavras com uma expressão de dor tão resignada, mas tão desconsolada,
que o frade olhou para ela comovido, e sentiu as lágrimas escurecerem-lhe a vista.
Neste momento Joaninha, que passeava a alguma distância da casa na direcção de Lisboa, acudiu
sobressaltada bradando: — «Avó, avó!... tanta gente que aí vem! soldados e povo... homens e
mulheres... tanta gente!»
Era a retirada de onze de Outubro.
— «Deus tenha compaixão de nós!» disse a velha. «O que será, padre?»
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— «O que há-de ser!» respondeu Fr. Dinis, «o pressentimento que se verifica; o combate foi decisivo,
os constitucionais vencem.»
Com efeito foram aparecendo as tropas que se retiravam, as gentes que fugiam, e todo aquele confuso
e doloroso espectáculo de uma retirada em guerra civil...
Alguns feridos, que não podiam mais, ficaram na casa do vale entregues à piedosa guarda e cuidado
de Joaninha; dos outros tomou conta Fr. Dinis e os acompanhou a Santarém.
As tropas constitucionais vinham em seguimento dos realistas, e dali a poucos dias tinham o seu
quartel-general no Cartaxo; D. Miguel fortificava-se em Santarém, e a casa da velha era o último posto militar
ocupado pelo seu exército.
Não tardou muito que a força toda, todo o interesse da guerra se não concentrasse naquele, já tão
pacífico e ameno, agora tão desolado e turbulento vale.
Eram os derradeiros dias do Outono, a natureza parecia tomar dó pelo homem — dar triste e lúgubre
decoração de cena ao sanguento drama de destruição e de miséria que ali se ia concluir. As últimas folhas das
árvores caíam, o céu nublado e negro vertia sobre a terra apaulada torrentes grossas de água, a cheia alagava
os baixos, e as terras altas cobriam-se de ervas maninhas, os trabalhos da lavoura cessavam, o gado e os
pastores fugiam, e os soldados de um e de outro campo cortavam as oliveiras seculares...
Trecho Capítulo XXXIII
Carlos e Georgina. Explicação. — Já te não amo! palavra terrível. — Que o
amor verdadeiro não é cego. — Frade no caso outra vez. Ecce iterum Crispinus; cá está
o nosso Fr. Dinis connosco.
— «TU já me não amas, Georgina, tu!» exclamou Carlos depois de uma longa e penosa luta consigo
mesmo: «Já me não amas tu, Georgina? Já não sou nada para ti neste mundo? Aquele amor cego, louco,
infinito, que derramavas em torrentes sobre a minha alma, em que transbordava o teu coração; aquele amor
que eu cheguei a persuadir-me que era o maior, o mais sincero, talvez o único verdadeiro amor de mulher que
ainda houve no mundo, esse amor acabou, Georgina? Secou-se no teu peito a fonte celeste donde manava?
Nem as recordações de nossa passada felicidade, nem as memórias dos cruéis lances que nos custou, dos
sacrifícios tremendos que por mim fizeste, nada, nada pode acordar na tua alma um eco, um eco
sumido que fosse, da antiga harmonia de nossas vidas — da nossa vida, Georgina, porque nós chegámos a
confundir num só os dois seres da nossa existência! — Oh! porque vivi eu até este dia? E tu, tu que refinada
crueldade te inspirou o salvar uma vida que tinhas condenado, que tinhas sacrificado quando a separaste da
tua?»
— «Carlos,» respondeu Georgina com a fria mas compassiva piedade que mais o desesperava: «Carlos,
não abuses da pouca saúde que ainda tens. O esforço de alma que estás fazendo pode-te ser prejudicial.
Sossega. Tu iludes-te, e sem querer, procuras iludir-me também a mim. Entra em ti, Carlos, e discorramos
pausadamente sobre a nossa situação, que não é agradável por certo nem para um nem para outro, mas que
pode suportar-se, se tivermos juízo para a encarar toda e sem medo, e para nos convencermos com lealdade e
franqueza do que ela realmente é. Ouve-me, Carlos: tu amaste-me muito...»
Trecho Capítulo XLIX
De como Carlos se fez barão. — Fim da história de Joaninha. — Georgina
abadessa. — Juízo de Fr. Dinis sobre a questão dos frades e dos barões. — Que não pode
tornar a ser o que foi, mas muito menos pode ser o que é. O que há-de ser, Deus o sabe
e proverá. — Vai o A. dormir ao Cartaxo. — Sonho que aí tem. — Volta a Lisboa. —
Caminhos-de-ferro e de papel. — Conclusão da viagem e deste livro.
Mas eu sonhei com o frade, com a velha — e com uma enorme constelação de barões que luzia num
céu de papel, donde choviam, como farrapos de neve, numa noite polar, notas azuis, verdes, brancas, amarelas,
de todas as cores e matizes possíveis. Eram milhões e milhões e milhões...
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Nunca vi tanto milhão, nem ouvi falar de tanta riqueza senão nas Mil e Uma Noites.
Acordei no outro dia e não vi nada... só uns pobres que pediam esmola à porta. Meti a mão na algibeira,
e não achei senão notas... papéis!
Parti para Lisboa cheio de agoiros, de enguiços e de tristes pressentimentos. O vapor vinha quase vazio,
mas nem por isso andou mais depressa. Eram boas cinco horas da tarde quando desembarcámos no Terreiro
do Paço.
Assim terminou a nossa viagem a Santarém: e assim termina este livro.
Tenho visto alguma coisa do mundo, e apontado alguma coisa do que vi. De todas quantas viagens
porém fiz, as que mais me interessaram sempre foram as viagens na minha terra.
Se assim o pensares, leitor benévolo, quem sabe? pode ser que eu tome outra vez o bordão de romeiro,
e vá peregrinando por esse Portugal fora, em busca de histórias para te contar.
Nos caminhos-de-ferro dos barões é que eu juro não andar.
Escusada é a jura porém. Se as estradas fossem de papel, fá-las-iam, não digo que não. Mas de metal!
Que tenha o Governo juízo, que as faça de pedra, que pode, e viajaremos com muito prazer e com
muita utilidade e proveito na nossa boa terra.
EXERCÍCIOS
1. (Fuvest 2013) Em Viagens na minha terra, assim como em
a) Memórias de um sargento de milícias, embora se situem ambas as obras no Romantismo, criticam-se os
exageros de idealização e de expressão que ocorrem nessa escola literária.
b) A cidade e as serras, a preferência pelo mundo rural português tem como contraponto a ojeriza às cidades
estrangeiras – Paris, em particular.
c) Vidas secas, os discursos dos intelectuais são vistos como “a prosa vil da nação”, ao passo que a sabedoria
popular “procede da síntese transcendente, superior e inspirada pelas grandes e eternas verdades”.
d) Memórias póstumas de Brás Cubas, a prática da divagação e da digressão exerce sobre todos os valores uma
ação dissolvente, que culmina, em ambos os casos, em puro niilismo.
e) O cortiço, manifestam-se, respectivamente, tanto o antibrasileirismo do escritor português quanto o
antilusitanismo do seu par brasileiro, assim como o absolutismo do primeiro e o liberalismo do segundo.
2. (Fuvest 2013) Os momentos históricos em que se desenvolvem os enredos de Viagens na minha terra,
Memórias de um sargento de milícias e Memórias póstumas de Brás Cubas (quanto a este último, em particular
no que se refere à primeira juventude do narrador) são, todos, determinados de modo decisivo por um
antecedente histórico comum – menos ou mais imediato, conforme o caso. Trata-se da
a) invasão de Portugal pelas tropas napoleônicas.
b) turbulência social causada pelas revoltas regenciais.
c) volta de D. Pedro I a Portugal.
d) proclamação da independência do Brasil.
e) antecipação da maioridade de D. Pedro II.
3. (Unicamp 2015) Muito me pesa, leitor amigo, se outra coisa esperavas das minhas Viagens, se te falto, sem
o querer, a promessas que julgaste ver nesse título, mas que eu não fiz decerto. Querias talvez que te contasse,
marco a marco, as léguas das estradas? GARRET, Almeida. Viagens na minha terra. São Paulo: Ateliê Editorial,
2012, p. 218.
No trecho acima, o narrador garrettiano admite que traiu as expectativas do leitor. Tal fato deveu-se
a) à descrição pormenorizada da natureza e dos monumentos históricos das cidades portuguesas.
b) ao caráter linear do relato ficcional, que se fixou nos detalhes do percurso realizado durante a viagem a
Santarém.
c) ao caráter digressivo do relato ficcional, que mesclou vários gêneros textuais.
d) às posições políticas assumidas pelo narrador, que propõe uma visão conservadora da história de Portugal.
4. (Fuvest 2013) Embora seja, com frequência, irônico a respeito do livro e de si mesmo, o narrador das
Viagens na minha terra não deixa de declarar ao leitor que essa obra é “primeiro que tudo”, “um símbolo” , na
medida em que, diz ele, “uma profunda ideia (...) está oculta debaixo desta ligeira aparência de uma viagenzita
que parece feita a brincar, e no fim de contas é uma coisa séria, grave, pensada (...)”.
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Tendo em vista essas declarações do narrador e considerando a obra em seu contexto histórico e
literário, responda ao que se pede.
a) Do ponto de vista da história social e política de Portugal, o que está simbolizado nessa viagem?
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b) Considerada, agora, do ponto de vista da história literária, o que essa obra de Garrett representa na evolução
da prosa portuguesa? Explique resumidamente.
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5. (Unicamp 2013) Leia os seguintes trechos de Viagens na minha terra e de Memórias Póstumas de Brás
Cubas:
Benévolo e paciente leitor, o que eu tenho decerto ainda é consciência, um resto de consciência:
acabemos com estas digressões e perenais divagações minhas.
(...) Neste despropositado e inclassificável livro das minhas Viagens, não é que se quebre, mas
enreda-se o fio das histórias e das observações por tal modo, que, bem o vejo e o sinto, só com muita
paciência se pode deslindar e seguir em tão embaraçada meada.
(Almeida Garrett, Viagens na minha terra.
São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1969, p.187 e 292)
Mas o livro é enfadonho, cheira a sepulcro, traz certa contração cadavérica; vício grave, e aliás
íntimo, por que o maior defeito deste livro és tu, leitor. Tens pressa de envelhecer, e o livro anda devagar;
tu amas a narração direita e nutrida, o estilo regular e fluente, e este livro e o meu estilo são como os ébrios,
guinam à direita e à esquerda, andam e param, resmungam, urram, gargalham, ameaçam o céu,
escorregam e caem... (Machado de Assis, Memórias Póstumas de Brás Cubas, em Romances, vol I. Rio de Janeiro: Garnier,
1993, p. 140.)
a) No que diz respeito à forma de narrar, que semelhanças entre os dois livros são evidenciadas pelos trechos?
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b) Que tipo de leitor esta forma de narrar procura frustrar, e de que maneira esse leitor é tratado por ambos os
narradores?
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6. (Unicamp 2014) O vale de Santarém é um destes lugares privilegiados pela natureza, sítios amenos e
deleitosos em que as plantas, o ar, a situação, tudo está numa harmonia suavíssima e perfeita: não há ali nada
de grandioso nem sublime, mas há uma como simetria de cores, de sons, de disposição em tudo quanto se vê
e sente, que não parece senão que a paz, a saúde, o sossego do espírito e o repouso do coração devem viver
ali, reina ali um reinado de amor e benevolência. As paixões más, os pensamentos mesquinhos, os pesares e
as vilezas da vida não podem senão fugir para longe. Imagina-se por aqui o Éden que o primeiro homem
habitou com a sua inocência e com a virgindade do seu coração.
(Almeida Garret, Viagens na minha terra.
São Paulo: Ateliê Editorial, 2012, p.114.)
Entramos a porta da antiga cidadela. – Que espantosa e desgraciosa confusão de entulhos, de pedras,
de montes de terra e caliça! Não há ruas, não há caminhos, é um labirinto de ruínas feias e torpes. O nosso
destino, a casa do nosso amigo é ao pé mesmo da famosa e histórica igreja de Santa Maria de Alcáçova. – Há
de custar a achar em tanta confusão. (Idem, p. 211.)
a) Os excertos transcritos contrastam dois espaços organizadores da narrativa. Caracterize e explique o
significado desses espaços para o conjunto do relato ficcional.
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b) A chegada à cidade de Santarém mostra-se decepcionante para o narrador viajante. Explique o motivo dessa
decepção, tendo em vista a expectativa do narrador no início do romance.
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7. (Fuvest 2015) Andai, ganha-pães, andai; reduzi tudo a cifras, todas as considerações deste mundo a
equações de interesse corporal, comprai, vendei, agiotai. No fim de tudo isto, o que lucrou a espécie humana?
Que há mais umas poucas de dúzias de homens ricos. E eu pergunto aos economistas políticos, aos moralistas,
se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, à
desmoralização, à infâmia, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir
um rico? – Que lho digam no Parlamento inglês, onde, depois de tantas comissões de inquérito, já deve de
andar orçado o número de almas que é preciso vender ao diabo, o número de corpos que se têm de entregar
antes do tempo ao cemitério para fazer um tecelão rico e fidalgo como Sir Roberto Peel, um mineiro, um
banqueiro, um granjeeiro – seja o que for: cada homem rico, abastado, custa centos de infelizes, de miseráveis.
Almeida Garrett, Viagens na minha terra.
a) Destas reflexões feitas pelo narrador de Viagens na minha terra, deduz-se que ele tinha em mente um
determinado ideal de sociedade. O que caracteriza esse ideal? Explique resumidamente.
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b) Identifique, em Viagens na minha terra, o tipo social sobre o qual, principalmente, irá recair a crítica presente
nas reflexões do narrador, no trecho aqui reproduzido. O que, de acordo com o livro, caracteriza esse tipo
social?
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GABARITO
1-A
2-A
3-C
No trecho, o narrador confirma que não cumpriu com o que o leitor esperava, questionando “Querias talvez que
te contasse, marco a marco, as léguas das estradas?”. Aborda, de modo indireto, à falta de minúcia de seu relato: inúmeras
vezes, os marcos das estradas servem como início de uma digressão. A viagem física passa a ser um amálgama de gêneros,
inclusive narrando um romance durante as páginas do diário de viagem.
4a) A viagem empreendida pelo narrador de Viagens Na Minha Terra simboliza um balanço, uma espécie de
"acerto de contas" com a história de Portugal. Assim, há um resgate histórico, seguido de uma comparação entre passado
e presente português. Este, representado politicamente pelos liberais; aqueles, pelos absolutistas. Socialmente, o que se
busca é a identidade nacional, bem ao gosto dos escritores do Romantismo, do qual Almeida Garrett faz parte.
b) Viagens na minha terra é considerada uma obra inovadora na linha evolutiva da prosa na história literária
portuguesa. Almeida Garrett utilizou-se de procedimentos inovadores para a época tais como as digressões, as referências
intertextuais, a inclusão do leitor e inferências metalinguísticas. A obra foi escrita “ao correr da pena” como fica claro no
prólogo. Resulta disto tudo uma obra de estilo livre.
5- Tendo em vista a forma de narrar nos dois livros, espera-se que o candidato identifique as seguintes semelhanças: o
caráter digressivo da narrativa, que não se preocupa em alinhavar toda a matéria exposta ao leitor (a embaraçada meada
em Garret e estilo ébrio em Machado de Assis); a reduzida importância da ação dramática, fenômeno causado em parte
pela quantidade expressiva de comentários irônicos do narrador e sua constante interpelação dos leitores (“Benévolo e
paciente leitor” em Garret, e “o maior defeito deste livro és tu, leitor”, em Machado de Assis).
Espera-se que o candidato observe que tal forma de narrar deseja frustrar o leitor impaciente e ingênuo,
acostumado às convenções do gênero narrativo, sendo que, nas duas obras, o leitor recebe um tratamento irônico por parte
do narrador.
6a) Inicialmente a exuberância e a paz que o Vale de Santarém proporcionava, contrasta com a miséria e o descaso
daquilo que se tornou o local. O que antes aproximava a descrição de um Éden, depois só refletia a desolação. Para a
obra, fica descrição do apogeu e da decadência do local e o questionamento sobre a identidade de uma nação que já
dominou os mares, mas tem de viver com seus próprios reveses.
b) Ao chegar a Santarém, o narrador viajante decepciona-se porque esperava encontrar uma cidade preservada,
a mesma que havia conhecido. Pelo contrário, encontra a destruição e o descaso dos governantes como também das
pessoas que sobreviviam às lutas internas e a sucessivas crises econômicas do país. O narrador fica entre a esperança de
se encontrar com um passado orgulhoso e a decepção com a realidade decadente que foi encontrada.
7a) O autor sonhava com a utopia iluminista de um mundo mais livre e socialmente mais justo. Teorias e
possibilidades sociais formuladas ao longo século XVIII com a Revolução Francesa e XIX com as teorias marxistas, que
pregavam uma vida mais justa e sem a exploração do próximo.
b) A crítica social recai sobre o burguês, sobre aquele que quer lucrar e ganhar custe o que custar, até mesmo
comprar um título nobiliárquico de barão, tudo conquistado à custa da exploração do próximo: – seja o que for: cada
homem rico, abastado, custa centos de infelizes, de miseráveis.
SITES UTILIZADOS
http://pt.wikipedia.org/wiki/Almeida_Garrett
http://pt.wikipedia.org/wiki/Literatura_rom%C3%A2ntica_em_Portugal
http://guiadoestudante.abril.com.br/estudar/literatura/viagens-minha-terra-resumo-obra-almeida-garret-701996.shtml
www.jayrus.art.br/Apostilas/LiteraturaPortuguesa/Romantismo/Almeida_Garrett_Viagens_na_Minha_Terra_analise_resumo.htm
http://www.estudenoanglo.com.br/correcao_online/correcao_online.php?codcorrecao=22
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