Água na Visão do Direito – 1 A ÁGUA NA VISÃO DO DIREITO Des. Wellington Pacheco Barros Porto Alegre – Julho de 2005 Coordenador: Desembargador Wellington Pacheco Barros Colaboradores: Angela Maria Braga Knorr – Secretaria Administrativa/Revisora Ana Paula Russomano Braun – Pesquisadora Daniela Bermudez Hruby – Revisora Sandro Pacheco da Silva – Voluntário/Capa Editoração e Impressão: Departamento de Artes Gráfica do TJRS B277a Barros, Wellington Pacheco A água na visão do direito / Wellington Pacheco Barros – Porto Alegre : Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Departamento de Artes Gráficas, 2005. 231 p. Responsabilidade editorial : Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Centro de Estudos. 1. Águas – Bem Público 2. Águas – Direito 3. Águas – Brasil 4. Águas – Jurisprudência 5. Águas – Legislação 6. Constituição – Brasil – 1988 7. Recursos Hídricos I. Título. CDU 347.247 Catalogação na fonte elaborada pela Biblioteca do TJRS SUMÁRIO APRESENTAÇÃO .......................................................................................... 7 CAPÍTULO 1 - GENERALIDADES ................................................................... 9 1.1 INTRODUÇÃO ................................................................................... 9 1.2 A IMPORTÂNCIA DAS ÁGUAS .......................................................... 11 1.2.1 ABASTECIMENTOS DOMÉSTICO E PÚBLICO ............................ 12 1.2.2 USOS AGRÍCOLA E INDÚSTRIAL ............................................. 13 1.2.3 PRODUÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA ........................................ 15 1.3 DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO PLANETA ........................................... 15 1.3.1 O CICLO DA ÁGUA ................................................................. 17 1.4 DISTRIBUIÇÃO DE ÁGUA NO BRASIL .............................................. 19 1.4.1 BACIA DO RIO AMAZONAS ..................................................... 20 1.4.2 BACIA DO TOCANTINS-ARAGUAIA .......................................... 21 1.4.3 BACIA DO ATLÂNTICO TRECHOS NORTE/NORDESTE ............... 21 1.4.4 BACIA DO SÃO FRANCISCO .................................................... 21 1.4.5 BACIA DOS RIOS DA REGIÃO DO ATLÂNTICO SUL TRECHO LESTE ................................................................................ 22 1.4.6 BACIA DO RIO PARANÁ .......................................................... 22 1.4.7 BACIA DO RIO URUGUAI ........................................................ 22 1.4.8 BACIA DOS RIOS DO ATLÂNTICO SUL - TRECHO SUDESTE ..... 23 1.5 CLASSIFICAÇÃO DAS ÁGUAS ......................................................... 23 1.5.1 CLASSIFICAÇÃO DAS ÁGUAS QUANTO AO USO PREDOMINANTE. ............................................................................. 24 1.5.2 CLASSIFICAÇÃO DAS ÁGUAS QUANTO À SUA LOCALIZAÇÃO COM RELAÇÃO AO SOLO. .......................................... 26 1.6 ÁGUAS SUBTERRÂNEAS .................................................................. 27 1.7 O AQÜÍFERO GUARANI ................................................................... 29 1.7.1 POLUIÇÃO DO AQÜÍFERO GUARANI ........................................ 32 1.7.2 DIMINUIÇÃO NO REABASTECIMENTO DO AQÜÍFERO GUARANI ....................................................................... 34 1.7.3 PROJETO DE PROTEÇÃO AMBIENTAL E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO SISTEMA AQÜÍFERO GUARANI ............................ 37 1.8 A CRISE DA ÁGUA .......................................................................... 38 1.8.1 POLUIÇÃO .............................................................................. 38 1.8.2 ESCASSEZ ............................................................................. 40 CAPÍTULO 2 - A ÁGUA COMO BEM PÚBLICO ............................................... 45 2.1 A ÁGUA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ............................................. 45 2.1.1 HISTÓRICO ............................................................................ 45 2.1.2 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ......................................... 47 4 – Água na Visão do Direito 2.1.2.1 DOMINIALIDADE DAS ÁGUAS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. ..................................................................... 47 2.1.2.2 COMPETÊNCIAS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ... 50 2.1.2.2.1 COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS ............................... 51 2.1.2.2.2 COMPETÊNCIAS MATERIAIS OU EXECUTIVAS .......... 53 2.2 A ÁGUA NAS CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS ..................................... 54 2.2.1 A ÁGUA NA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL ...................................................................... 55 2.3 A ÁGUA NA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL .......................... 58 2.3.1 HISTÓRICO ............................................................................ 58 2.3.2 A LEI FEDERAL N.º 9.433/97 .................................................. 62 2.3.3 A LEI ESTADUAL N.º 10.350/94 ............................................. 63 CAPÍTULO 3 - O GERENCIAMENTO DOS RECURSOS HÍDRICOS .................. 65 3.1 POLÍTICA NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS .............................. 65 3.1.1 OBJETIVOS ............................................................................ 65 3.1.2 FUNDAMENTOS LEGAIS .......................................................... 67 3.1.2.1 A ÁGUA COMO BEM PÚBLICO .......................................... 67 3.1.2.2 A ÁGUA COMO UM RECURSO NATURAL LIMITADO E DOTADO DE VALOR ECONÔMICO ................................................ 70 3.1.2.3 USO MÚLTIPLO E USO PRIORITÁRIO DOS RECURSOS HÍDRICOS ................................................................ 73 3.1.2.4 BACIAS HIDROGRÁFICAS COMO UNIDADE TERRITORIAL .. 75 3.1.2.5 GESTÃO DESCENTRALIZADA E PARTICIPATIVA ............... 76 3.1.3 DIRETRIZES DE AÇÃO ............................................................ 78 3.1.4 INSTRUMENTOS ..................................................................... 80 3.1.4.1 PLANOS DE RECURSOS HÍDRICOS .................................. 80 3.1.4.2 ENQUADRAMENTO DOS CORPOS DE ÁGUA EM CLASSES SEGUNDO OS USOS PREPONDERANTES ....................... 83 3.1.4.3 OUTORGA DE USO DOS RECURSOS HÍDRICOS ............... 85 3.1.4.3.1 A ÁGUA COMO OBJETO DE DIREITO DE USO ONEROSO .............................................................................. 85 3.1.4.3.2 GENERALIDADES E OBJETIVOS DA OUTORGA ......... 87 3.1.4.3.3 A OUTORGA ENTRE ADMINISTRAÇÕES. .................. 87 3.1.4.3.4 A OUTORGA A PARTICULARES COMO CONTRATO ADMINISTRATIVO “SUI GENERIS” ........................ 88 3.1.4.3.5 QUANDO É NECESSÁRIA A PRÉVIA LICITAÇÃO PARA OUTORGA DO DIREITO DE USO .................................... 89 3.1.4.3.6 QUANDO É INEXIGÍVEL A LICITAÇÃO .................... 89 3.1.4.3.7 A DELEGAÇÃO DA OUTORGA ................................... 90 3.1.4.3.8 AS MODALIDADES DE OUTORGAS ......................... 90 3.1.4.3.9 O USO DA ÁGUA QUE INDEPENDEM DE OUTORGA ..... 92 3.1.4.3.10 OS CASOS DE SUSPENSÃO DA OUTORGA ............. 93 3.1.4.3.11 PRAZO DE DURAÇÃO DA OUTORGA ....................... 96 3.1.4.4 COBRANÇA PELO USO DOS RECURSOS HÍDRICOS .......... 96 3.1.4.5 SISTEMA DE INFORMAÇÕES SOBRE RECURSOS HÍDRICOS ................................................................................ 100 Água na Visão do Direito – 5 3.2. O SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS ........................................................................ 102 3.2.1. CONSELHO NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS - CNRH .... 102 3.2.1.1.COMPETÊNCIA DO CNRH .............................................. 103 3.2.1.2. COMPOSIÇÃO DO CNRH .............................................. 104 3.2.1.3 CÂMARAS TÉCNICAS .................................................... 105 3.2.1.4 DELIBERAÇÃO .............................................................. 105 3.2.2. CONSELHOS DE RECURSOS HÍDRICOS DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL .............................................................. 106 3.2.2.1.COMPETÊNCIAS DOS CONSELHOS ESTADUAIS ............. 106 3.2.2.2.COMPOSIÇÃO DOS CONSELHOS ESTADUAIS ................. 107 3.2.3. COMITÊS DE BACIAS HIDROGRÁFICAS ................................ 107 3.2.3.1. COMPETÊNCIA ............................................................. 108 3.2.3.2. COMPOSIÇÃO .............................................................. 108 3.2.4. AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS ........................................... 109 3.2.5. AGÊNCIAS DE ÁGUA ............................................................ 109 3.3 O SISTEMA ESTADUAL DOS RECURSOS HÍDRICOS RIO GRANDE DO SUL ......................................................................... 111 3.3.1 COMPOSIÇÃO ....................................................................... 111 3.3.1.1 O DEPARTAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS – DRH ..... 112 3.3.1.2 COMITÊS DE BACIAS .................................................... 115 3.3.1.3 AS AGÊNCIAS DE REGIÕES HIDROGRÁFICAS ............... 116 3.3.1.4 FEPAM – FUNDAÇÃO ESTADUAL DE PROTEÇÃO AMBIENTAL .............................................................................. 117 CAPÍTULO 4 – LEGISLAÇÃO ..................................................................... 119 4.1 LEI Nº 9.433, DE 8 DE JANEIRO DE 1997. ................................... 119 4.2 LEI Nº 10.350, DE 30 DE DEZEMBRO DE 1994. ............................ 136 CAPÍTULO 5 - GLOSSÁRIO ...................................................................... 151 CAPÍTULO 6 - JURISPRUDÊNCIA .............................................................. 185 6.1 TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL .................................................... 185 6.2 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ........................................... 188 6.3 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL ... 193 6.4 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ................. 197 6.5 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA ........ 197 6.6 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ ......................................... 198 CAPÍTULO 7 – BIBLIOGRAFIA .................................................................. 201 7.1 DOUTRINA ................................................................................... 201 7.2 SITES VISITADOS ........................................................................ 205 APRESENTAÇÃO “A água é, hoje, um fator de preocupação agudo e tem suscitado debates acalorados em vários estratos sociais, religiosos e organismos estatais, inclusive na ONU, apesar de cobrir 2/3 da superfície da Terra e com isso aparentar ser infinita para a vida humana, animal e vegetal”. É com esta afirmação que início o livro A ÁGUA NA VISÃO DO DIREITO e que agora apresento aos prezados leitores. Na esteira das publicações anteriores editadas pelo CENTRO DE ESTUDOS DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Estudos Tópicos sobre Organismos Geneticamente Modificados e o Servidor Público na Visão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul) o livro aborda tema de importância social com vinculação no direito procurando demonstrar que o poder Judiciário, como parte do poder social geral outorgado pela sociedade por meio da Constituição Federal, tem preocupações superiores que transbordam as resoluções de conflitos via processo. E água é um desses temas que, dia a dia, ganha importância na concepção jurídica pelo simples reconhecimento de sua finitude decorrente do aumento da população, da poluição provocada pelas atividades humanas, pelo consumo excessivo e pelo alto grau de desperdício. O livro está dimensionado em seis capítulos principais. O primeiro capítulo trata da generalidade sobre a água procurando introduzir o leitor a informações propedêuticas sobre o tema. Assim, o leitor tem uma visão sobre a importância da água, sua distribuição no planeta, seu ciclo, sua distribuição no Brasil através das várias bacias hidrográficas, como a água é classificada e, como temas relevantes, estudo sobre o Aqüífero Guarani e sobre a crise da água. O segundo capítulo trata da água como bem público oferecendo ao leitor uma visão histórica da evolução da água no direito brasileiro, que passou de uma desimportância inicial, uma importância meramente privada até chegar ao reconhecimento de se constituir num bem público de uso comum. 8 – Água na Visão do Direito O terceiro capítulo trata do gerenciamento dos recursos hídricos, nomenclatura que a legislação infraconstitucional outorgou à água. Aqui o livro aborda temas como a prioridade no uso da água, a bacia como mediada territorial, a gestão descentralizada e participativa, a outorga de seu uso a terceiros, o sistema nacional de gerenciamento, entre tantos temas importantes. O quarto capítulo apresenta ao leitor a legislação infraconstitucional envolvendo a água. O quinto capítulo oferece ao leitor um glossário dos conceitos mais usados sobre a água. E o sexto capítulo é uma coletânea de jurisprudência daquilo que já foi julgado pelos tribunais pátrios sobre a água. O livro que agora apresento não teria sido viabilizado se não contasse com o denodo de pesquisadora da estagiária ANA PAULA RUSSOMANO BRAUN, dos conhecimento de informática e gráficos do Bel. SANDRO PACHECO DA SILVA, da revisão e orientação da Belª DANIELA BERMUDEZ HRUBY e da servidora pública responsável pela administração do CENTRO DE ESTUDOS Bela ÂNGELA MARIA BRAGA KNORR. A todos eles meu reconhecimento e agradecimento público. Porto Alegre, julho de 2005. Des. WELLINGTON PACHECO BARROS Coordenador-Geral do Centro de Estudos do Tribunal de Justiça CAPÍTULO 1 - GENERALIDADES 1.1 INTRODUÇÃO A água é, hoje, um fator de preocupação agudo e tem suscitado debates acalorados em vários estratos sociais, religiosos e organismos estatais, inclusive na ONU, apesar de cobrir 2/3 da superfície da Terra e com isso aparentar ser infinita para a vida humana, animal e vegetal. Essa preocupação não decorreu de estudos sobre seu poder de causar acidentes como o tsunami que atingiu vários países e causou a morte de algumas centenas de milhares de vidas e danos patrimoniais imensos, nem na busca de entender seu funcionamento e importância no contexto biológico, como a descoberta recente de que ela tem “memória” e que por 50 femtosegundos (um femtosegundo é equivalente a um bilionésimo de milionésimo de um segundo) armazena as lembranças das propriedades de substâncias que já estiveram nela diluídas, conforme publicação da revista científica “Nature”1 , de 10 de março de 2005, noticiado pelo jornal Folha de São Paulo, no seu caderno FolhaCiência, página A 16, da mesma data ou mesmo das secas periódicas que nos assolam. A preocupação com a água é mais direta e mais profunda e decorre da conscientização de que, apesar de cobrir quase a totalidade da Terra o volume 1 Water has many unique features that distinguish it from other liquids. A key to these properties is the dynamic network of hydrogen bonds linking the highly polar water molecules. Infrared spectroscopy of the hydroxyl (OH) stretching vibration is ideal for probing the dynamics and structure of this network, but technical limitations have meant that it has been necessary to use mixtures of isotopically substituted water and observe, for example, the deuteroxyl (OD) bond in normal water (H 2O). Now by using an ultrathin sample cell, the behaviour of the hydrogen bond network structure has been studied in pure H 2O. The results are surprising: water loses its ‘memory’ of structural correlations within 50 femtoseconds, an order of magnitude faster than seen previously. This favours rapid relaxation of elementary excitations, which may contribute to the stability of biological systems that strongly interact with surrounding water. Disponível na página da Internet: http://www.nature.com/nature/links/ 050310/050310-5.html, visitada em 31.03.05. 10 – Água na Visão do Direito de água doce aqui disponível é insignificante, pois essa quantidade abarca em sua maior parte as geleiras e neves eternas, as águas subterrâneas, que são encontradas na umidade do solo, nos pântanos e nas geada, restando um percentual muito baixo do volume da água doce existente, algo em torno de 0,1% a 0,3%, os quais estão em rios e lagos e que, portanto, com o aumento da população mundial, a poluição provocada pelas atividades humanas, o consumo excessivo e o alto grau de desperdício, ela se tornou um bem finito em curto prazo a preocupar toda vida existente na Terra. O gráfico abaixo demonstra claramente a diminuição da disponibilidade da água ao passar dos anos: Disponibilidade de água por Habitante/Região (1000m3): Retirado da página de Internet: http://www.uniagua.org.br/ default.asp?tp=3&pag=aguaplaneta.htm, visitada em 31.03.05 Essa conscientização, embora já venha de algum tempo em outros países, chegou ao Brasil de forma tênue e com uma certa desimportância talvez pelo fato do País abrigar 13,8% das reservas mundiais de água doce para uma população de apenas 2,8% da mundial e aqui se encontrar 71% dos 1,2 milhões de quilômetros quadrados (cerca de 840 mil quilômetros quadrados) do Aqüífero Guarani, o maior reservatório subterrâneo de água doce das Américas e um dos maiores do mundo, envolvendo os estados de Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Portanto, o presente estudo, a par desses elementos, analisará a importância dos mananciais para a humanidade. No primeiro capítulo, trata do uso da água pelo abastecimento, distribuição e escassez. Num segundo momento, aborda a água como bem público e seu trato legal no ordenamento jurídico brasileiro, seguindo para o gerenciamento dos recursos hídricos, no terceiro capítulo. A quarta parte do trabalho reproduz a legislação referente ao tema, quer no âmbito federal, com a lei nº 9.433/97, quanto no estadual, Água na Visão do Direito – 11 com a nº 10.350/94. Agregando, por fim, no quinto e último capítulo, para facilitar o acesso à pesquisa, um glossário concernente ao tema. 1.2 A IMPORTÂNCIA DAS ÁGUAS A água, como já dito, é um elemento indispensável a toda e qualquer forma de vida. Com propriedade, Edis Milaré, definiu a água como um valiosíssimo recurso diretamente associado à vida. Observou, ainda que: “(...), ela participa com elevado potencial na composição dos organismos e dos seres vivos em geral, e suas funções biológicas e bioquímicas são essenciais, pelo que se diz simbolicamente que a água é elemento constitutivo da vida. Dentro do ecossistema planetário, seu papel junto aos biomas é múltiplo, seja como integrante da cadeia alimentar e de processos biológicos, seja como condicionantes dos diferentes habitats”.2 Em 22 de março de 1992 a Organização das Nações Unidas proclamou a “Declaração Universal dos Direitos da Água” na qual expôs: “a água é a seiva de nosso planeta. Ela é condição essencial de vida de todo vegetal, animal ou ser humano. Sem ela não poderíamos conceber como são a atmosfera, o clima, a vege3 tação, a cultura ou a agricultura”. Por outro lado, a água está presente em múltiplas atividades do homem e, como tal, é utilizada para finalidades muito diversificadas, entre as quais assumem maior importância o abastecimento doméstico e público, os usos agrícola e industrial e a produção de energia elétrica.4 Assim, fica claro que: MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: doutrina – prática – jurisprudência – glossário. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 126. 2 3 Disponível em http://:www.aguasdelimeira.com.br/aimportanciadaagua.htm. Acesso em 01 nov. 2004. Dísponível em http://www.geocites.com/Athens/Forum/5265/mundoatu.htm.Acesso em 17 mar. 2004. 4 12 – Água na Visão do Direito “a água é um recurso natural essencial, seja como componente bioquímico de seres vivos, como meio de vida de várias espécies vegetais e animais, como elemento representativo de valores sociais e culturais e, até, como fator de produção de 5 vários bens de consumo final e intermediário”. 1.2.1 ABASTECIMENTOS DOMÉSTICO E PÚBLICO O abastecimento doméstico compreende aqueles atos em que a água é utilizada “como fonte de vida, bebida, no preparo de alimentos, higiene pessoal, limpeza na habitação, irrigação de jardins e pequenas hortas particulares, criação de animais domésticos, entre outros”.6 Já o abastecimento público, por sua vez, é aquele no qual utiliza-se água nas “moradias, escolas, hospitais e demais estabelecimentos públicos, irrigação de parques e jardins, limpeza de ruas e logradouros, paisagismo, combate a incêndios, navegação, etc.” 7 Entretanto, sabe-se que uma série de doenças pode ser associada à água, entre elas podemos citar a cólera, a amebíase e a hepatite, ..., por isso, o abastecimento de água com qualidade própria para a ingestão, preparo de alimentos e higiene pessoal passou a constar como prioridade entre os direitos de todos os cidadãos. De acordo com isso, Luiz Antonio Timm Grassi afirma que: “Por todos esses motivos, o acesso universal à água potabilizada e distribuída em todos os domicílios deve fazer parte, prioritariamente, da pauta de todas as políticas públicas, seja de saúde, ambiental, de bem estar social e de desenvolvimento urbano e regional. O uso da água para o abastecimento humano, sob a forma de sistemas de distribuição urbanos é o mais importante e o mais nobre entre os usos da água e de suas fontes naturais (...)".8 Disponível em http://www.brasildasaguas.com.br/conteudo/importancia_agua.html. Acesso em 08 mar. 2004. 5 6 Disponível em http://www.sosmatatlântica.org.br/. Acesso em 19 mar. 2004. 7 Idem. GRASSI, Luiz Antonio Timm. Direito à água. Porto Alegre. Seção Câmara Técnica de Recursos Hídricos. Disponível em www.abes-rs.org.br/rechid/direito-a-agua.htm. Acesso em 17 fev. 2005. 8 Água na Visão do Direito – 13 A legislação brasileira garante o acesso de água potável em quantidade suficiente para usos pessoais e domésticos. O objetivo 15 da Agenda 21 brasileira, publicada em 16 de julho de 2002, também assegura que se deve “facilitar o acesso à água, que dá prioridade máxima para a água de beber e à dessedentação dos animais”.9 Dado importante quanto ao consumo doméstico de água por atividade:10 ATIVIDADE Descarga no vaso sanitário tradicional Minuto no chuveiro Lavar roupa em tanque Lavar as mãos Lavar roupa com máquina de lavar Escovar os dentes com água correndo Lavagem do automóvel com mangueira Lavar louça em lava-louça QUANTIDADE (EM LITROS) 10 a 16 15 150 3a5 150 11 100 20 a 25 1.2.2 USOS AGRÍCOLA E INDÚSTRIAL Em relação à produção agrícola, a água pode representar até 90% da composição física das plantas. A falta de água em períodos de crescimento dos vegetais pode destruir lavouras e até ecossistemas devidamente implantados.11 Por isso que, em sua maior parte, a água é utilizada para irrigação. Ainda é, adicionalmente, “utilizada para tratamento de animais, lavagem de instalações, máquinas e utensílios, entre outros”.12 Tem-se que a agricultura é a atividade que mais consome água.13 9 Disponível em http://www.mma.gov.br/. Acesso em 15 fev. 2004. Ministério do Meio Ambiente – Secretaria de Recursos Hídricos. Documento de Introdução do Plano Nacional de Recursos Hídricos. Brasília – DF, 2004. p. 10. 10 Disponível em http://www.brasildaságuas.com.br/conteudo/importancia_agua.html Acesso em 08 mar. 2004. 11 12 Disponível em http://www.sosmatatlântica.org.br/. Acesso em 19 mar. 2004. 13 Disponível em http://www.geocities.com. Acesso em 22 abr. 2004. 14 – Água na Visão do Direito Na indústria a água também tem diversas utilidades, dentre as quais: “Como matéria-prima, na produção de alimentos e produtos farmacêuticos, gelo, etc.; em atividades industriais onde a água é utilizada para refrigeração, como na metalurgia, para lavagem nas áreas de produção de papel, tecido, em abatedouros e matadouros, etc.; e em atividades em que é utilizada para fabricação de vapor, como na caldeiraria, entre outros”.14 A irrigação corresponde a 73% do consumo de água, 21% vai para a indústria, enquanto que apenas 6% destina-se ao consumo doméstico.15 Devido à grande demanda, a Agenda 21 brasileira afirma que: “Sendo a água um recurso escasso e estratégico e um bem econômico de grande valor, seu uso para atividades agrícolas ou industriais, especialmente as de grande porte, como a irrigação, deve ser contabilizado como custo para estimular o tratamento dos resíduos ou para permitir a reposição”.16 Para se ter uma idéia, observe-se a quantidade de água necessária para produzir alguns bens:17 PARA OBTER 1 kg de arroz 1 kg de trigo 1 kg de aço 1 kg de papel 1 kg de pão 1 kg de batata 1 kg de cereal 1 kg de carne de vaca 1 kg de verdura QUANTIDADE DE ÁGUA NECESSÁRIA 4.500 1.500 300 250 150 150 1.500 20.000 1.000 14 Disponível em http://www.geocities.com. Acesso em 22 abr. 2004. 15 Disponível em http://www.sosmatatlantica.org.br/. Acesso em 03 maio 2004. 16 Disponível em http://www.mma.gov.br/. Acesso em 15 fev. 2005 Ministério do Meio Ambiente – Secretaria de Recursos Hídricos. Documento de Introdução do Plano Nacional de Recursos Hídricos. Brasília – DF, 2004. p. 10. 17 Água na Visão do Direito – 15 1.2.3 PRODUÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA A energia elétrica pode ser obtida através de diversas formas, dentre as mais comuns estão: As usinas atômicas, as termelétricas e as hidrelétricas. A energia decorrente das usinas atômicas, como o próprio nome sugere, são aquelas derivadas dos átomos, em que pequenas quantidades de matéria são transformadas em grandes quantidades de energia. Entretanto, geram resíduos indestrutíveis e expõem a população a riscos mortais.18 As usinas termelétricas “utilizam-se de combustíveis para queimar, produzir vapor e acionar, com esse vapor, turbinas geradoras de energia elétrica. Para essa queima utilizam-se a biomassa, o petróleo ou o gás dele e os carvões”.19 As usinas hidrelétricas são aquelas em que se utiliza a força da água para gerar energia elétrica exigindo este tema maior profundidade. A energia elétrica, como já foi dito, é aquela proveniente do movimento das águas. “Ela é produzida por meio do aproveitamento do potencial hidráulico existente num rio, utilizando desníveis naturais, com quedas d’água, ou artificiais, produzidos pelo desvio do curso original do rio”.20 As características físicas e geográficas do Brasil foram determinantes para implantação de um parque gerador de energia elétrica de base predominantemente hídrica.21 Por ser privilegiado em recursos hídricos, cerca de 95% da energia elétrica brasileira provém de rios.22 1.3 DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO PLANETA A superfície da Terra tem cerca de 71% de sua superfície coberta por água, correspondentes a um volume total de aproximadamente 1.380.000 km3.23 De toda essa quantidade de água existente no planeta, cerca de 97,3% é água salgada e apenas 2,7% é água doce (37.000 km3). No entanto, conforme José Álvaro de Vasconcelos Weissheimer, “a busca de dados entre os 18 Disponível em http://www.gpca.com.br/gil/art88.htm/. Acesso em 03 nov. 2004. 19 Idem. 20 Disponível em http://www.ambientebrasil.com.br/. Acesso em 03 nov. 2004. 21 Idem. 22 Idem. Disponível em http://www.aguadechuva.com/index.aguaplaneta.htm. Acesso em 19 mar. 2004. 23 16 – Água na Visão do Direito mais diversos autores e materiais mostrou que é relativamente imprecisa a determinação dos números referentes à água, por ser um elemento de difícil mensuração em função da quantidade”.24 Distribuição de água na Terra 2,7 Água Salgada Água Doce 97,3 Deste total de água doce disponível na Terra, 77,2% encontra-se em forma de gelo, nas calotas polares (25.564 km3), 22,4% se trata de água subterrânea (8.288 km3), 0,35% se encontra nos lagos e pântanos (128 km3), 0,04% se encontra na atmosfera (16 km3) e apenas 0,01% da água doce está nos rios (4 km3).25 Distribuição de água doce no mundo 80 Calotas 60 Subterrâneas Lagos e Pântanos 40 Atmosfera 20 0 Rios 77,2 22,4 0,35 0,04 0,01 WEISSHEIMER, José Álvaro de Vasconcelos. A constituição e o regime das águas. In Revista Justiça do Direito, Passo Fundo, n. 16, p. 146, 2002. 24 Disponível em http://www.daees.p.gov.br/cultura/distribuição.htm. Acesso em 05 mar. 2004. 25 Água na Visão do Direito – 17 Contudo, a distribuição da água no Mundo é muito desigual e, uma grande parte do planeta, está situada em regiões com carência de água.26 Atualmente estima-se que mais de 1,1 bilhão de pessoas no mundo sofrem com falta d’água.27 A disponibilidade renovável de água doce nos continentes pode ser estimada em porcentagens conforme segue:28 CONTINENTE ÁFRICA AMÉRICA DO NORTE AMÉRICA DO SUL ÁSIA EUROPA OCEANIA ANTÁRTIDA ÁGUA DOCE 10,00% 18,00% 23,10% 31,60% 7,00% 5,30% 5,00% Em relação a esta disponibilidade de água no mundo pode-se observar quanto é privilegiada a situação do Brasil, uma vez que dispõe ele de 12% de toda a água doce do planeta.29 1.3.1 O CICLO DA ÁGUA A quantidade de água na Terra é praticamente invariável há centenas de milhões de anos. Ou seja, a quantidade de água permanece a mesma, o que muda é a sua distribuição e seu estado.30 Isto se deve a um processo chamado Ciclo Hidrológico. O ciclo hidrológico é um movimento contínuo, um processo natural de reciclagem de moléculas de água da terra ao ar e de regresso à terra, é o caminho que ela percorre, é o constante processo de mudança de estado da água.31 26 Disponível em http://www.geologo.com.br. Acesso em 04 nov. 2004. Disponível em http://www.sosmatlantica.org.br/?id_pasta1=0&id_pasta2=112. Acesso em 27 fev. 2004. 27 Disponível em http://www.daee.sp.gov.br/cultura/distribuicao.htm. Acesso em 05 mar. 2004. 28 29 Idem. 30 Disponível em http://www.geologo.com.br. Acesso em 04 nov. 2004. 31 Disponível em http://www.ecolnews.com.br/água/conteudo.htm. Acesso em 30 nov. 2004. 18 – Água na Visão do Direito Os processos do Ciclo Hidrológico são: evaporação, transpiração, precipitação e infiltração, além da respiração e combustão. Para Luiz Antonio Timm Grassi,32 é a existência da água, sob seus três estados físicos, que tornou possível a vida no Planeta Terra. O calor vindo da radiação solar provoca sua evaporação, formando-se as nuvens. A água se separa da atmosfera como precipitação, termo que a identifica, nos seus estados líquido e sólido. Existem quatro tipos principais de precipitação: chuva, garoa, neve e granizo.33 A chuva, basicamente, é o resultado da água que evapora dos lagos, rios e oceanos, e forma as nuvens. Quando as nuvens estão carregadas, soltam a água na terra, trazendo gás carbônico, nitrogênio e outras substâncias fundamentais à vida dos seres vivos.34 Ao atingir o solo, parte dela promove a recarga de reservas freáticas e sua reidratação, alimentando as nascentes dos rios e os reservatórios subterrâneos, que são as atividades terrestres e biológicas, e a outra parte escoa para os rios, lagos e oceanos. Se cair nos oceanos, mistura-se às águas salgadas e volta a evaporar, chove e cai na terra novamente.35 A água acumulada por infiltração, em parte, retorna na forma de nascentes e o restante reinicia a evaporação e transpiração. A vegetação tem a importante função de acelerar o processo da evaporação, através da transpiração na superfície das folhas, repondo o vapor d’água na atmosfera.36 Estima-se que nos rios o volume aproximado de água seja de 1700 quilômetros cúbicos e o tempo de permanência no seu leito de duas semanas. No que diz respeito às geleiras e à neve, elas possuem 30 milhões de quilômetros cúbicos e a água deve ficar congelada por milhares de anos. A água atmosférica tem o volume de 113 mil quilômetros cúbicos e permanece por 8 a 10 dias no ar.37 GRASSI, Luiz Antonio Timm. Direito à água. Porto Alegre. Seção Câmara Técnica de Recursos Hídricos. Disponível em www.abes-rs.org.br/rechid/direito-a-agua.htm. Acesso em 17 fev. 2005. 32 Disponível em http://www.soaresoliveira.br/projetoagua/agua.html. Acesso em 15 maio 2004. 33 34 Disponível em http://www.casa-al.com.br/ciclo.htm. Acesso em 09 dez. 2004. 35 Idem. 36 Disponível em http://www.ecolnews.com.br/agua/conteudo.htm. Acesso em 30 nov. 2004. 37 Idem. Água na Visão do Direito – 19 1.4 DISTRIBUIÇÃO DE ÁGUA NO BRASIL Dadas suas características geográficas, “o Brasil é o país com maior disponibilidade de recursos hídricos de superfície e subterrâneos, gerados por precipitações atmosféricas sobre seu próprio território”.38 Detendo cerca de 12% (169.000 m3/s) do total de água doce de superfície no mundo. Mas, apesar da situação muito favorável, sua distribuição não é uniforme em todo o território nacional. Assim, por exemplo, a Amazônia detém a maior bacia fluvial do mundo, em contrapartida esta região é uma das menos habitadas do país. Por outro lado as maiores concentrações populacionais encontram-se nas capitais distantes dos grandes rios brasileiros. E há, ainda, o Nordeste que tem a menor quantidade de água do país, o que faz com que tenham secas freqüentes.39 A disponibilidade de água doce nas regiões brasileiras pode ser estimada em porcentagens conforme segue: “A região Norte detém 68,5% dos recursos hídricos de superfície brasileiros, a Centro-Oeste 15,7%, a Sul 6,5%, a Sudeste 6,0 e a Nordeste 3,3%”.40 Distribuição de água nas regiões brasileiras 6,5 6 3,3 Norte Centro-Oeste 15,7 Sul 68,5 Sudeste Nordeste Em termos gerais, como mostra o mapa abaixo, pode-se dividir a rede hidrogáfica brasileira em 8 principais bacias, a saber: Bacia do Rio Amazonas, Bacia do Tocantins, Bacia do Tocantins-Araguaia, Bacia do Atlântico trecho Norte, Bacia do São Francisco, Bacias dos Rios da Região do Atlântico, Bacia do Rio Paraná, Bacia do Rio Uruguai e Bacia dos Rios do Atlântico Sul trecho Sudeste. PEREIRA JR., José de Sena. Processo Legislativo e Organização Institucional da Gestão de Recursos Hídricos no Brasil. Câmara dos Deputados: Brasília, 2004. p. 3. Disponível em http://www2.camara.gov.br/publicacoes/estnottec/tema14. Acesso em 20 nov. 2004. 38 Disponível em http://brasildasaguas.com.br/conteudo/importancia_agua.html. Acesso em 08 mar. 2004 39 PEREIRA JR., José de Sena. Processo Legislativo e Organização Institucional da Gestão de Recursos Hídricos no Brasil. Câmara dos Deputados: Brasília, 2004. p. 3. Disponível em http://www2.camara.gov.br/publicacoes/estnottec/tema14. Acesso em 20 nov. 2004. 40 20 – Água na Visão do Direito Mapa das principais bacias brasileiras 41 1.4.1 BACIA DO RIO AMAZONAS Conforme informação disponibilizada através do site da Agência Nacional de Energia Elétrica, “seu principal curso de água é o Rio Amazonas, que com extensão de 6.570 km, nasce em território peruano, no Riacho Lauricocha, originário da Lagoa do Ninõ, nas geleiras da cordilheira de Santa Anna, cerca de 5.000m acima do nível do mar. O percurso inicial, da ordem de 45 Km, é realizado em quedas, no sentido norte, formando as Lagoas Santa Anna, Cablocacha, Nieveurco, Tinquincocha, Yanacocha e Patarcocha. Após escoar no Lago Lauricocha, toma a denominação de Marañon, ainda nos Andes, onde recebe pequenas contribuições, e, após atravessar o Pongo de Manseriché, segue aproximadamente a direção leste até a foz, no Atlântico. Entra no Brasil na confluência com o Rio Javari, somente a partir dessa confluência, próximo à Tabatinga, onde, então, é chamado de Solimões e, somente apartir da confluência com o Rio Negro, passa a ser denominado de Amazonas. Próximo a Manaus, bifurca-se com o Paraná do Careiro, estimando-se aí uma largura da ordem de 1.500m e profundidade em torno de 35 m. 41 Disponível em http://www.aneel.gov.br. Acesso em 04 nov. 2004. Água na Visão do Direito – 21 Entre a confluência do Rio Negro e a região das ilhas, próximo à desembocadura, é conhecido por Baixo Amazonas”.42 1.4.2 BACIA DO TOCANTINS-ARAGUAIA A bacia do Rio Tocantins possui uma área de drenagem de 767.000 Km2, que representa 7,5% do território nacional; onde 83% da área da bacia distribue-se nos Estados de Tocantins e Goiás (58%), Mato Grosso (24%); Pará (13%) e Maranhão (4%), além do Distrito Federal (1%). Grande parte de sua área está na região Centro Oeste, desde as nascentes dos Rios Araguaia e Tocantins até sua confluência, na divisa dos Estados de Goiás, Maranhão e Pará. Desse ponto para jusante a bacia hidrográfica entra na Região Norte e se restringe a apenas um corredor formado pelas áreas marginais do Rio Tocantins.43 1.4.3 BACIA DO ATLÂNTICO TRECHOS NORTE/NORDESTE A Bacia do Atlântico - trecho Norte/Nordeste banha extensas áreas dos Estados do Amapá, Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, parte do Estado da Paraíba, Pernambuco, Pará e Alagoas. A Bacia do Atlântico, trecho Norte/Nordeste, possui uma área de drenagem de 996.000 km² composta por dois trechos: Norte e Nordeste. O trecho Norte corresponde à área de drenagem dos rios que deságuam ao norte da Bacia Amazônica, incluindo a Bacia do Rio Oiapoque. A drenagem da bacia é representada por rios principais, caudalosos e perenes, que permanecem durante o ano com razoável vazão, se comparados aos da região semi-árida nordestina. O segundo trecho - Nordeste, corresponde à área de drenagem dos rios que deságuam no Atlântico, entre a foz do Rio Tocantins e a do Rio São Francisco.44 1.4.4 BACIA DO SÃO FRANCISCO O Rio São Francisco é o mais importante da bacia, com uma extensão de 2.700 Km, tem suas nascentes na Serra da Canastra, em Minas Gerais. 42 Disponível em http://www.aneel.gov.br. Acesso em 04 nov. 2004. 43 Disponível em http://www.aneel.gov.br. Acesso em 04 nov. 2004. 44 Idem. 22 – Água na Visão do Direito Atravessando a longa depressão encravada entre o Planalto Atlântico e as Chapadas do Brasil Central, segue a orientação Sul-Norte até aproximadamente a Cidade de Barra, dirigindo-se então para Nordeste até atingir a Cidade de Cabrobó, quando inflete para Sudeste para desembocar no Oceano Atlântico. A sua importância se deve não só pelo volume de água transportada numa região semi-árida mas, principalmente, pela sua contribuição histórica e econômica na fixação das populações ribeirinhas e na criação das cidades hoje plantadas ao longo do vale, bem como pelo potencial hídrico passível de aproveitamento em futuros planos de irrigação dos excelentes solos situados à sua margem.45 1.4.5 BACIA DOS RIOS DA REGIÃO DO ATLÂNTICO SUL TRECHO LESTE A área da Bacia do Atlântico abrange parte dos territórios dos seguintes Estados: São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Sergipe e os territórios dos Estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo. A bacia compreende a área de drenagem dos rios que deságuam no Atlântico, entre a foz do Rio São Francisco, ao Norte, e a divisa entre os Estados do Rio de Janeiro e São Paulo, ao Sul.46 1.4.6 BACIA DO RIO PARANÁ A área da bacia do Rio Paraná, abrange os territórios dos Estados de Mato Grosso, Paraná, São Paulo e partes dos territórios dos Estados de Minas Gerais e Goiás. Geograficamente limita-se com as seguintes bacias hidrográficas brasileiras: a Bacia Amazônica, ao Norte; Bacia do TocantinsAraguaia e Bacia do Rio São Francisco, a Noroeste; Bacia do Atlântico Trecho Leste, a Sudeste; com a Bacia do Uruguai, ao Sul. Grande parte de sua área está na região Sudeste do Brasil.47 1.4.7 BACIA DO RIO URUGUAI A bacia do Rio Uruguai abrange uma área de aproximadamente 384.000 km2, dos quais 176.000 km2 situam-se em território nacional, compreen45 Disponível em http://www.aneel.gov.br. Acesso em 04 nov. 2004. 46 Idem. 47 Disponível em http://www.aneel.gov.br. Acesso em 04 nov. 2004. Água na Visão do Direito – 23 dendo 46.000 km2 do Estado de Santa Catarina e 130.000 Km2 no Estado do Rio Grande do Sul. Possui uma vazão média anual de 3.600 m3/s, volume médio anual de 114 Km3. Para efeito de estudos, a bacia do Uruguai foi dividida em sub-bacias: Canoas, Pelotas, Forquilha, Ligeiro, Peixe, Irani, Passo Fundo, Chapecó, da Várzea, Antas, Guarita, Itajaí, Piratini, Ibicuí, Alto Uruguai e Médio Uruguai. 1.4.8 BACIA DOS RIOS DO ATLÂNTICO SUL - TRECHO SUDESTE Fazem parte desta bacia, os Rios Ribeira do Iguape, Itajaí, Mampituba, Jacuí, Taquari, Jaguarão (e seus respectivos afluentes), Lagoa dos Patos e Lagoa Mirim. Para efeito de estudo e do gerenciamento dos recursos hídricos, esta bacia foi dividida em um conjunto de 10 sub-bacias enumeradas de 0 a 9. Sendo, que a sub-bacia 89 localiza-se fora do Território Nacional. A referida divisão facilita não só o armazenamento e recuperação das informações hidrometeorológicas, mas também o gerenciamento da operação de coleta de tais dados e a própria referência geográfica dos cursos d’água nacionais.48 1.5 CLASSIFICAÇÃO DAS ÁGUAS Classificar significa “distribuir em classes e/ou grupos, segundo sistema ou método de classificação”.49 Para Maria Luiza Machado Granziera: “Em matéria de águas, classificar significa estabelecer níveis de qualidade para as águas – doce, salobras e salinas -, em face dos quais priorizam-se determinados tipos de uso, mais ou menos exigentes”.50 Diante disso, é possível classificar as águas, conforme preleciona Celso Antonio Pacheco Fiorillo: a) quanto à sua localização com relação ao solo e, b) quanto ao seu uso predominante. 48 Disponível em http://www.aneel.gov.br. Acesso em 04 nov. 2004. HOLANDA FERREIRA, Aurélio Buarque de. Novo dicionário da língua portuguesa. 2 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. p.416. 49 GRANZEIRA, Maria Luiza Machado. Direito de águas: disciplina jurídica das águas doces. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 146. 50 24 – Água na Visão do Direito 1.5.1 CLASSIFICAÇÃO DAS ÁGUAS QUANTO AO USO PREDOMINANTE. A classificação dos recursos hídricos quanto ao uso predominante era regida pela Resolução nº 20/86, que foi revogada pela Resolução nº 357/05 do CONAMA. A nova classificação resultou da Lei nº 9.433/97 e dos novos conhecimentos na área da qualidade de águas, resultando na instalação de um Grupo de Trabalho para revisão da Resolução nº 20/86.51 O texto base foi aprovado em reunião plenária do CONAMA, trazendo como destaques, as inovações referentes à inclusão de novos parâmetros para a classificação de qualidade dos corpos de água, assim como harmonização das competências do CONAMA e do Conselho Nacional dos Recursos Hídricos (CNRH).52 Isto resultou na publicação da Resolução nº 357, de 17 de março de 2005. Segundo esta resolução (Resolução nº 12/2000, do CNRH53), classificar é a “qualificação das águas doces, salobras e salinas com base nos usos preponderantes (sistema de classes de qualidade)”. O critério que se utiliza para distinguir as águas doces, salobras e salinas é a quantidade de sal dissolvido nelas. Assim: • • • água salobra é aquela que possui salinidade inferior à oceânica 54, ou seja, de acordo com o art. 2º, II, da Resolução nº 357/05 do CONAMA, são aquelas com salinidade igual ou inferior a 0,5‰ e 30‰; água salina é aquela com salinidade oceânica 55, isto é, conforme o art. 2º, III, da Resolução nº 357/05 do CONAMA, são aquelas com salinidade igual ou superior a 30‰; água doce é aquela desprovida de salinidade. 56 De acordo com o art. 2º, I, é aquela que possui salinidade igual ou inferior a 0,5‰. 51 Disponível em http://www.ana.gov.br/. Acesso em 26 nov. 2004. 52 Disponível em http://www.mma.gov.br/port/conama/. Acesso em 27 dez. 2004. HENKES, Silviania Lúcia. Histórico legal e institucional dos recursos hídricos no Brasil. Jus Navigande. Teresina, a.7, n. 66, jun. 2003. Disponível em http://www.jus.com.br/. Acesso em 21 dez. 2004. 53 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 100. 54 55 Idem. 56 Idem. Água na Visão do Direito – 25 Diante disso, as águas doces, conforme o art. 4º da Resolução nº 357/05, se dividem em 4 classes, segundo seus usos preponderantes, a saber: CLASSE USOS A QUE SE DESTINAM Classe Especial a) ao abastecimento para consumo humano, com desinfecção; b) à preservação do equilíbrio natural das comunidades aquáticas; c) à preservação dos ambientes aquáticos em unidades de conservação de proteção integral. Classe 1 a) ao abastecimento para consumo humano, após tratamento simplificado; b) à proteção das comunidades aquáticas; c) à recreação de contato primário (natação, esqui aquático e mergulho)57 ; d) à irrigação de hortaliças que são consumidas cruas e de frutas que se desenvolvam rente ao solo e que sejam ingeridas cruas e sem remoção de película; e) à proteção das comunidades aquáticas em Terras Indígenas. Classe 2 a) ao abastecimento para consumo humano, após tratamento convencional; b) à proteção das comunidades aquáticas; c) à recreação de contato primário (esqui aquático, natação e mergulho)58 ; d) à irrigação de hortaliças e plantas frutíferas e de parques, jardins, campos de esporte e lazer, com os quais o público possa a vir a ter contato direto; e) à aqüicultura e à atividade de pesca. 57 Conforme Resolução CONAMA n.º 274/2000 58 Conforme Resolução CONAMA n.º 274/2000 26 – Água na Visão do Direito Classe 3 a) ao abastecimento para consumo humano, após tratamento convencional ou avançado; b) à irrigação de culturas arbóreas, cerealífera e forrageiras; c) à pesca amadora; d) à recreação de contato secundário; e) à dessedentação de animais. Classe 4 a) à navegação; b) à harmonia paisagística. É preciso lembrar que a Lei nº 9.433/97 trouxe o enquadramento dos corpos de água em classes, segundo seus usos preponderantes como um de seus instrumentos. Por essa razão será tratado no tópico Instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos (item 3.1.4.2). 1.5.2 CLASSIFICAÇÃO DAS ÁGUAS QUANTO À SUA LOCALIZAÇÃO COM RELAÇÃO AO SOLO. As águas, quanto à sua localização ao solo dividem-se em: águas superficiais e águas subterrâneas. As águas superficiais são, conforme Fiorillo (2001), “As que se mostram na superfície da Terra. Dividindose em internas (rios, lagos e mares interiores) e externas (mar territorial, alto mar, águas contíguas)”.59 As águas subterrâneas correspondem à água que infiltra no subsolo, preenchendo os espaços formados entre os grânulos minerais e fissuras das rochas. Essas águas tendem a migrar continuamente, abastecendo nascentes, leitos de rios, lagos e oceanos.60 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 100. 59 60 Ministério do Meio Ambiente – Secretaria de Recursos Hídricos. Documento de Introdução do Plano Nacional de Recursos Hídricos. Brasília – DF, 2004. p. 17. Água na Visão do Direito – 27 Muitos autores apontam as águas subterrâneas como a solução para o problema da escassez deste recurso tão importante, razão pela qual merece um maior aprofundamento. Neste sentido, Milaré (2004) sustenta que: “As reservas subterrâneas, com 0,6% da água doce total, aparecem como alternativa para satisfação da demanda em escala ampliada. Felizmente as águas subterrâneas são abundantes no Brasil. Bastaria recorrer a apenas 10% do volume atualmente explorável para se ter um uso sustentado daquelas reservas”.61 1.6 ÁGUAS SUBTERRÂNEAS O art. 2º, II, da Instrução Normativa MMA nº 4/2000 determina que águas subterrâneas são aquelas que transitam no subsolo infiltradas através do solo ou de suas camada subjacentes, armazenadas na zona de saturação e suscetíveis de extração e utilização. E na Resolução nº 15/2001, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos, no art. 1º, III, conceitua que aqüífero é o “corpo hidrológico com capacidade de acumular e transmitir água através dos seus poros, fissuras ou espaços resultantes da dissolução e carreamento de materiais rochosos”. Para ser classificada como aqüífero, uma formação geológica deve conter poros ou espaços abertos repletos de água e permitir que a água mova-se através deles.62 Ou seja, conforme Solange Teles da Silva (2003), “enquanto as águas subterrâneas correspondem ao conteúdo, os aqüíferos constituem o suporte onde elas correm no subsolo”.63 Como citado, as águas subterrâneas, num primeiro momento, podem significar a grande salvação para o problema de escassez e da poluição, uma vez que geralmente são de melhor qualidade do que as águas de superfície. Todavia, como diz Vladimir Passos de Freitas, apesar de estarem mais protegidas da poluição, as águas subterrâneas levam muito mais tempo para MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: doutrina – prática – jurisprudência – glossário. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 177. 61 62 Disponível em http://www.geocities.com. Acesso em 28 dez. 2004. SILVA, Solange Teles da. Aspectos Jurídicos da Proteção de Águas Subterrâneas. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, a.8, n. 32, p. 159-182, dez. 2003, p. 1.62 apud VIEGAS, Eduardo Coral. Visão Jurídica da Água. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 66 63 28 – Água na Visão do Direito retornarem ao status quo ante, enquanto que os rios em 15 ou 20 dias já se renovaram, e os custos para despoluírem são muito caros e praticamente ineficazes.64 Além disso, há os problemas da grande perfuração de poços artesianos sem o conhecimento técnico suficiente, o que, fatalmente, deverá diminuir a quantidade de águas subterrâneas. A esse respeito, preleciona Eduardo Coral Viegas, “Ademais, também nos deparamos com a diminuição no reabastecimento dos aqüíferos, seja pela super exploração; pela crescente ocupação humana próxima das áreas de recarga, por onde o aqüífero se realimenta com água da chuva; pelo fenômeno da impermeabilização do solo decorrente das pavimentações, que impedem a absorção, pela terra, da água que precipita como parte do ciclo hidrológico; etc”.65 O fato é que as informações sobre águas subterrâneas no Brasil ainda são escassas e, quando existentes, atomizadas e dispersas66 . De forma a preencher parte da lacuna existente, a CPRM desenvolveu o Sistema de Informações de Águas Subterrâneas para o país e alguns estados especificamente.67 O Governo do Rio Grande do Sul juntamente com o governo federal através da CPRM – Serviço Geológico do Brasil estão realizando o levantamento das águas subterrâneas do Rio Grande do Sul e pretendem concluí-lo até agosto de 2005. Esta medida visa possibilitar um melhor 64 FREITAS, Vladimir Passos de. Sistema Jurídico brasileiro de controle da poluição das águas subterrâneas. In Revista de Direito Ambiental, São Paulo, a.6, n. 23, jul-set.2001, p. 56. VIEGAS, Eduardo Coral. Visão Jurídica da Água. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005, p. 67 65 “De forma a reunir, divulgar e atualizar o acervo de dados e informações sobre os recursos hídricos no país foi instituído o Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos - SNIRH, em 1988. A Agência Nacional de Águas - ANA, que é o organismo responsável pela implementação do SNIRH, desenvolveu a interface <http://hidroweb.ana.gov.br>, de forma a tornar o Sistema amplamente acessível aos usuários. Os Sistemas Estaduais de Informações de Recursos Hídricos deverão estar conectados ao HidroWeb dentro de uma filosofia de descentralização e integração”. Disponível em http://www.ana.gov.br. Acesso em 28 dez. 2004 66 67 Disponível em http://www.ana.gov.br. Acesso em 28 dez. 2004 Água na Visão do Direito – 29 planejamento dos recursos hídricos e será integrada ao Sistema de Informação de Águas Subterrâneas já que se trata de um banco de dados que realiza o mapeamento no Brasil.68 1.7 O AQÜÍFERO GUARANI Como já se disse, as águas subterrâneas correspondem a 22,4% do total de água doce disponível no mundo, sendo o Aqüífero Guarani a principal reserva subterrânea de água doce da América do Sul e um dos maiores sistemas aqüíferos do mundo. O Aqüífero Guarani recebeu esta denominação pelo geólogo uruguaio Danilo Anton, em memória do povo indígena que habitava a região. Inicialmente, foi denominado de Aqüífero Gigante do Mercosul, por ocorrer nos quatro países participantes do acordo comercial.69 No Brasil, anteriormente, este aqüífero era conhecido pelo nome de Botucatu, pelo fato de que a principal camada de rocha que o compõe ser um arenito de origem eólica, reconhecido e descrito pela primeira vez no Município de Botucatu, Estado de São Paulo.70 O aqüífero ocupa uma área total de 1,2 milhões de km2 na Bacia do Paraná e parte da bacia do Chaco-Paraná. Estendendo-se pelo Brasil, Paraguai, Uruguai e Argentina.71 Sua maior ocorrência se dá em território brasileiro, correspondendo a 2/3 de sua área total, abrangendo os Estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul e a população atual do domínio de ocorrência do aqüífero é estimada em 15 milhões de habitantes. Estado quer planejamento de Recursos Hídricos. Jornal do Comércio, Porto Alegre, Terça-feira – 16 de novembro de 2004, Economia, p. 7. 68 69 Disponível em http://www.ana.gov.br/guarani. Acesso em 08 nov. 2004. 70 Disponível em http://www.meioambiente.pro.br. Acesso em 08 nov. 2004. 71 Disponível em http://www.jornalexpress.com.br. Acesso em 07 jul. 2004. 30 – Água na Visão do Direito 72 Abrangência do Aqüífero Guarani Pesquisadores do Paraná realizam diversos estudos para tentar explicar como se formou esse grande reservatório de água subterrânea. Conforme o pesquisador Ernani da Rosa Filho existem diversas hipóteses que estão sendo discutidas. Assim: “Há mais ou menos 180 milhões de anos, ainda no tempo dos dinossauros, a região era um imenso deserto. Em um período entre 200 e 132 milhões de anos, o deserto – com área equivalente aos territórios da Inglaterra, França e Espanha juntos – sofreu uma grande transformação. O mar de areia virou um dos maiores reservatórios de água doce do mundo: o Aqüífero Guarani”.73 Dessa forma, o aqüífero se constitui pelo preenchimento de espaços nas rochas (poros e fissuras), convencionalmente denominado Guarani. Por isso é errado imaginar o aqüífero como um imenso lago debaixo da Terra. O geólogo Eduardo Hindi explica que lá embaixo, seria encontrado apenas pedras, pois – como já foi dito – a água ocupa o espaço entre os grãos de areia.74 Portanto, o aqüífero nada mais é do que uma rocha porosa com capacidade de absorver água. 72 Disponível em http://www.cienciaefe.org.br/. Acesso em 08 jun. 2005. O Aqüífero Guarani, apresentado no Programa Globo Repórter da Rede Globo de Televisão, exibido dia 18.02.05. 73 74 Idem. Água na Visão do Direito – 31 E estas rochas se constituem de um pacote de camadas arenosas depositadas, cujas espessuras variam de 50 a 800 metros, estando situadas em profundidades que podem atingir até 1800 metros. Em decorrência do gradiente geotérmico, as águas do aqüífero atingem temperaturas relativamente elevadas, em geral entre 50° C e 85º C.75 As águas advindas do Aqüífero Guarani têm uma vantagem sobre as águas de superfícies em decorrência de suas características próprias, “a proteção contra os agentes de poluição que comumente afetam os mananciais de água na superfície, que decorre de mecanismos naturais de filtração e autodepuração biogeoquímica que ocorrem no subsolo, resulta numa água de excelente qualidade. A qualidade da água e a possibilidade de captação nos próprios locais, onde ocorrem as demandas, fazem com que o aproveitamento das águas do Aqüífero Guarani assuma características econômicas, sociais e políticas destacadas para abastecimento da população”.76 No Rio Grande do Sul, a Cidade de Estrela é integralmente abastecida por água potável oriunda do Aqüífero Guarani. E a cidade de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, com 545 mil habitantes, é a maior cidade brasileira abastecida 100% por águas subterrâneas do Aqüífero Guarani. Este fato decorre de uma sorte geográfica, visto que a cidade está em uma das pontas onde o aqüífero chega mais perto da superfície. Em uma planície, inclusive, ele aflora e a água forma uma lagoa. Apesar do Rio Pardo, um dos principais rios do estado de São Paulo passar a um quilômetro da cidade nem é tocado. Pois a captação para a rede pública é feita por 97 poços que, juntos, fornecem 13 milhões de litros de água por hora. O custo da produção é 50 vezes mais baixo que se a água fosse retirada do rio. A composição do cloro é baixíssima, só o que a lei estipula, mas os responsáveis dizem que nem isso seria necessário, como ela sai da terra já poderia ser consumida, podendo ser enquadrada, inclusive, como água mineral.77 75 Disponível em http://www.ana.gov.br/guarani. Acesso em 08 nov. 2004. 76 Idem. O Aqüífero Guarani. Programa Globo Repórter da Rede Globo de Televisão, exibido dia 18.02.05. 77 32 – Água na Visão do Direito O curioso é que a natureza fez uma muralha para proteger o Aqüífero Guarani, pois 90% do reservatório é coberto por uma camada de basalto, uma rocha praticamente impermeável. Entretanto, o basalto não é tão intransponível assim, pois existem rachaduras naturais por onde a água da superfície escorre. Este é o chamado caminho da recarga. Considerando uma espessura média aqüífera de 250 metros e porosidade efetiva de 15%, estima-se que as reservas permanentes do aqüífero (água acumulada ao longo do tempo) sejam da ordem de 45.000 Km³.78 Deduz-se que, por ano, o Aqüífero Guarani receba 160 Km³ de água adicional vindas da superfície, sendo que desta, 40 Km³ constitui o potencial explorável sem riscos para o sistema aqüífero.79 De acordo com a Empresa Brasileira de Pesquisa Ambiental e Agropecuária, a EMBRAPA, a água contida no Aqüífero Guarani é de excelente qualidade e suficiente para abastecer a atual população brasileira por 2,5 mil anos.80 E, diante da escassez que ameaça o mundo, a Organização das Nações Unidas propôs que o Aqüífero Guarani fosse transformado em Patrimônio da Humanidade e que suas águas fossem consideradas reservas estratégicas, intocadas, para que no futuro fossem usadas por toda a população do planeta, mas isso por enquanto é apenas uma proposta. 1.7.1 POLUIÇÃO DO AQÜÍFERO GUARANI Como se viu, as rachaduras naturais no basalto são o caminho através do qual a água retorna ao aqüífero, garantindo a sua recarga. Por outro lado, este também é o caminho de uma possível contaminação. De acordo com o geólogo Luiz Marlan, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, “se tiver uma atividade poluidora em cima, essa poluição vai escorrer para o aqüífero”.81 Segundo nos ensina Eduardo Coral Viegas, 78 O Aqüífero Guarani. Programa Globo Repórter da Rede Globo de Televisão, exibido dia 18.02.05. Disponível em http://www.uniagua.org.br/default.asp?tp=3&pag-aquifero.htm. Acesso em 16 mar. 2004. 79 80 Estado quer planejamento de Recursos Hídricos. Jornal do Comércio, Porto Alegre, terça-feira, 16 de novembro de 2004, Economia, p. 7. 81 O Aqüífero Guarani. Programa Globo Repórter da Rede Globo de Televisão, exibido dia 18.02.05. Água na Visão do Direito – 33 “os focos de contaminação são vários, destacando-se a infiltração da matéria líquida oriunda de ‘lixões’ irregulares e de cemitérios; os vazamentos sanitários, de combustíveis, fertilizantes, agrotóxicos, resíduos de mineração, produtos oriundos de indústrias; a poluição das águas superficiais, que, por vezes, contamina os lençóis freáticos, atingindo as águas subterrâneas; dentre outros”.82 Entretanto, o maior risco de contaminação do Aqüífero Guarani está nas regiões onde a rocha que armazena a água aparece, nas chamadas regiões de afloramento do Aqüífero. Isto é, se fosse cortada a terra, a imagem do aqüífero seria como uma bacia, a rocha que armazena a água chega a mais de um quilômetro de profundidade e por cima está o basalto. Nas bordas não tem proteção, e a pedra chega até a superfície.83 Nesses locais se forma a terra roxa, que nada mais é do que uma parte do aqüífero. Segundo o geólogo Luiz Marlan, “Em cima desse conjunto toda a rocha é alterada, formando as camadas de terra roxa que cobrem praticamente toda a região da bacia, principalmente as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. A terra roxa é altamente cultivável em razão da fertilidade do solo que essa rocha produz”.84 No entanto, o maior problema que se encontra junto com a produtividade das grandes lavouras é o uso de agrotóxicos. “O Guarani pode ser atingido por fontes poluidoras, principalmente por agrotóxicos, dos quais o atrazine é um dos mais prováveis”, afirma o geólogo da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Eurico Zimbres.85 Além disso, é sabido que onde tem criações e lavouras, tem matéria orgânica que produz o nitrato. O biólogo Alcides Faria afirma que “o nitrato está no metabolismo das bactérias. É fundamental para o desenvolvimento 82 VIEGAS, Eduardo Coral. Visão Jurídica da Água. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 67. 83 Idem. 84 Idem. 85 Disponível em http://www.radiobras.gov.br/ct/2000/materia_221200_7htm. Acesso em 20 dez. 2004. 34 – Água na Visão do Direito das plantas, mas em altas concentrações pode levar à contaminação”.86 Por exemplo, na suinocultura, o nitrato presente nos dejetos é altamente poluente. Por outro lado, deve-se estudar quais são as áreas mais vulneráveis e menos vulneráveis e a partir disso determinar que as áreas menos suscetíveis são as mais indicadas para a disposição de resíduos sólidos e locação de parques industrias, por exemplo. Isso não só no Aqüífero Guarani, como em todos os demais aqüíferos em área brasileira. Assim a vulnerabilidade dos aqüíferos pode ser usada para o planejamento territorial. Isso é possível na medida em que a ocupação possa ser incentivada ou desincentivada a partir do estabelecimento de maiores e mais caras exigências ambientais em áreas mais vulneráveis à contaminação.87 No mesmo sentido tem-se os ensinamentos do biólogo Alcides Faria: “Nós precisaríamos partir de um zoneamento para dizer que tipo de uso pode ter o Aqüífero em cada região, o mais adequado, aquilo que é apropriado, o quanto de água pode-se retirar, o tipo de atividade econômica que se pode desenvolver em cada uma das regiões que estão sobre o aqüífero, de maneira que ele não seja contaminado. Porque se você contamina o aqüífero como é que você limpa? Não limpa. Se você contamina um curso de água superficial você até pode fazer um trabalho de recuperação, agora o aqüífero não há como limpar”.88 1.7.2 DIMINUIÇÃO NO REABASTECIMENTO DO AQÜÍFERO GUARANI A diminuição no reabastecimento do aqüífero pode se dar de várias maneiras: pela super exploração, pela crescente ocupação humana perto das áreas de recarga; pela impermeabilização do solo, decorrente das O Aqüífero Guarani. Programa Globo Repórter da Rede Globo de Televisão, exibido dia 18.02.05. 86 Hirata, Ricardo. Reflexões sobre a contaminação e descontaminação de aqüíferos no Brasil. XIII Congresso Brasileiro de Águas Subterrâneas. Cuiabá MT – 19 a 22 out. 2004. ABAS. P. 03. 87 88 O Aqüífero Guarani. Programa Globo Repórter da Rede Globo de Televisão, exibido dia 18.02.05. Água na Visão do Direito – 35 pavimentações, que impedem a absorção, pela terra, da água que precipita como parte do ciclo hidrológico, dentre outros.89 Relativamente à super exploração do aqüífero, ela está intimamente ligada à grande quantidade de perfurações de poços. Os poços, por sua vez, podem ser artesianos, quando a própria pressão natural da água é capaz de levá-la até a superfície; semi-artesianos, quando é necessária a instalação de aparelhos para a captação da água, visto que não há pressão natural suficiente e há, ainda, o chamado poço caipira, que obtém água dos lençóis freáticos90 , mais rasos. Nos últimos 25 anos foram perfurados por volta de 12 milhões de poços no mundo. No Brasil, observou-se nas últimas duas décadas um aumento da utilização da água subterrânea para o abastecimento público.91 Tanto em nível mundial como nacional, o aumento crescente da utilização das reservas hídricas subterrâneas se deve ao fato de que, geralmente, elas apresentam uma excelente qualidade e um custo menor. Porém a própria natureza começa a dar sinais de que se deve preservar esse recurso natural. Como se viu, Ribeirão Preto é uma das poucas cidades brasileiras abastecida totalmente por águas subterrâneas do Aqüífero Guarani, entretanto, “há 50 anos, para se conseguir água em um dos poços mais antigos, no centro da cidade, era preciso cavar 35 metros. Hoje, a água não aparece antes dos 75 metros – mais que o dobro de profundidade. Para os especialistas, o recado é claro: o nível do aqüífero está baixando”.92 O Diretor de Água e Energia de Ribeirão Preto, Celso Antonio Perticarrari, diz que o problema é o excesso de poços perfurados: mais de VIEGAS, Eduardo Coral. Visão Jurídica da Água. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 67 89 “(...) lençóis freáticos – rios subterrâneos originados em profundidades pequenas. Devido ao fato de serem rasos, os poços caipiras estão mais sujeitos a contaminações por água da chuva e até mesmo por infiltrações de esgoto.” Disponível em http://www.sabesp.com.br. Acesso em 24 fev. 2005. 90 91 Disponível em http://www.sabesp.com.br. Acesso em 24 fev. 2005. O Aqüífero Guarani. Programa Globo Repórter da Rede Globo de Televisão, exibido dia 18.02.05. 92 36 – Água na Visão do Direito 400 na cidade inteira, autorizados ou não.93 Isto é, com a perfuração de muitos poços há um rebaixamento do lençol freático, diminuindo o nível de água no subsolo, sendo necessário, assim, o aprofundamento da perfuração para que se alcance água.94 A principal causa dessa ocorrência é o consumo superior aos limites de recarga do aqüífero. Osmar Sinelli, geólogo que estuda o Aqüífero Guarani há 49 anos, alerta “a natureza sozinha demora quase 30 anos para recompor as camadas do lençol d’água. É preciso evitar a qualquer custo a superexploração do aqüífero”.95 No Rio Grande do Sul, o Decreto nº 42.047/2002 determina que para ser perfurado o solo a fim de captar e operar águas subterrâneas depende de autorização prévia do Departamento de Recursos Hídricos. E depois de concluída a obra um responsável técnico deverá apresentar relatório pormenorizado contendo os elementos necessários à exploração da água subterrânea de forma a possibilitar a expedição da outorga, nos termos do Decreto Estadual nº 37.033/96. Deve-se atentar ao fato de que perfurar poços artesianos sem a outorga da autoridade administrativa também traz conseqüências perigosas como nos lembra Vladimir Passos de Freitas, “sabidamente, há um limite para que se adote tal proceder. Quando ele não é observado, podem ocorrer conseqüências iguais às da Cidade do México, onde o solo está afundando e o metrô, rodovias, edifícios, sofrem rachaduras decorrentes da instabilidade”.96 Aliás, isso já vem acontecendo no interior do Paraná, em Almirante Tamandaré, Região Metropolitana de Curitiba, onde o subsolo “mais parece um queijo suíço, com grutas de rocha calcária, pouco resistente. Nelas se 93 O Aqüífero Guarani. Programa Globo Repórter da Rede Globo de Televisão, exibido dia 18.02.05. 94 VIEGAS, Eduardo Coral. Visão Jurídica da Água. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 67 95 O Aqüífero Guarani. Programa Globo Repórter da Rede Globo de Televisão, exibido dia 18.02.05. FREITAS, Vladimir Passos de. Água – Considerações Gerais. Responsabilidade Civil. Cuiabá. Seção Judice. Disponível em http://www.mt.trf1.gov.br/judice/jud5/ águas.htm. Acesso em 24 fev. 2005 96 Água na Visão do Direito – 37 formaram os reservatórios de água. Com o bombeamento dos poços, ocorrem os afundamentos no solo”.97 Em decorrência disso muitas famílias constatam, em suas próprias casas, as conseqüências, onde começam a surgir rachaduras, as calçadas cedem, surgem enormes buracos no chão, etc.98 1.7.3 PROJETO DE PROTEÇÃO AMBIENTAL E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO SISTEMA AQÜÍFERO GUARANI Um dos principais problemas existentes é o risco de deterioração do aqüífero em decorrência do aumento dos volumes explotados e do crescimento das fontes de poluição pontuais e difusas. Esta situação demonstra a necessidade de gerenciamento relativo às condições de aproveitamento dos recursos do aqüífero.99 Assim, segundo informação da ANA, agência implementadora do projeto nacionalmente, “o Projeto Aqüífero Guarani visa contribuir para a superação da situação atual, por meio da formulação de um modelo técnico-legal e institucional, para a gestão dos recursos do aqüífero de forma coordenada pelo conjunto dos países e organismos envolvidos”.100 O projeto tem como principal objetivo apoiar a Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai na elaboração de um modelo para preservação e gerenciamento do Sistema Aqüífero Guarani para as gerações futuras e 101 atuais. O marco inicial foi uma reunião organizada pela Secretaria de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente, que ocorreu em janeiro de 97 O Aqüífero Guarani. Programa Globo Repórter da Rede Globo de Televisão, exibido dia 18.02.05. 98 Idem. Estado quer planejamento de Recursos Hídricos. Jornal do Comércio, Porto Alegre, terça-feira – 16 de novembro de 2004, Economia, p. 7. 99 100 Idem. 101 Idem. 38 – Água na Visão do Direito 2000, em Foz do Iguaçu, no qual os Governos da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai aprovaram o documento conceitual do Projeto. O resultado final a que o projeto pretende alcançar, como já foi dito, é possibilitar que os quatro países disponham de um modelo de gestão para o Sistema Aqüífero Guarani, por meio de um Programa de Ações Estratégicas – PAE, incluindo aspectos técnicos, científicos, institucionais, financeiros e legais para a sua proteção e uso sustentável. Assim, “O desenvolvimento conjunto e a instrumentalização de um marco de gestão para o SAG constitui o núcleo do projeto”.102 Para isso estão previstas diversas análises, a fim de propiciar maior conhecimento técnico-científico, incluindo modelos quantitativos e qualitativos para fortalecimento das decisões tomadas a respeito do uso sustentável do aqüífero, além de firmação de acordos jurídicos, que definam direitos e responsabilidades pela utilização e proteção do aqüífero, tudo concatenados ao conhecimento alcançado. 1.8 A CRISE DA ÁGUA Como foi visto anteriormente (item 1.3, apenas 0,01% de água doce no mundo está disponível em ecossistemas aquáticos continentais. O Brasil, apesar de sua relativa abundância de recursos hídricos, possui uma distribuição regional muito desigual (item 1.4), fato que também ocorre em nível mundial. Estes fatores naturais, aliados ao aumento da população mundial, a poluição provocada pelas atividades humanas, o consumo excessivo e o alto grau de desperdício de água prejudicam ainda mais a disponibilidade de água para o uso humano.103 Diante dessa perspectiva torna-se inevitável a discussão do que se chama de “crise da água doce”. 1.8.1 POLUIÇÃO Como foi visto, o estado físico e a qualidade da água são fatores determinantes da possibilidade de aproveitamento para cada uso (item 1.5). Em decorrência disso, em muitos casos, como, por exemplo, para o abasteEstado quer planejamento de Recursos Hídricos. Jornal do Comércio, Porto Alegre, terça-feira – 16 de novembro de 2004, Economia, p. 7. 102 Ministério do Meio Ambiente – Secretaria de Recursos Hídricos. Documento de Introdução do Plano Nacional de Recursos Hídricos. Brasília – DF, 2004. p. 14. 103 Água na Visão do Direito – 39 cimento humano, a condição qualitativa é restritiva. Isto é, não basta ter uma grande quantidade de água disponível em determinado lugar, é necessário que se tenha a qualidade compatível com os usos que se quer.104 Assim, a crise da água doce pode se dar em decorrência da falta de qualidade da água para determinados usos ocasionados pela crescente poluição. O impacto causado aos recursos hídricos pela atividade humana tem provocado índices de poluição alarmantes. Situação essa que se torna mais grave nos países pobres, onde as condições ambientais são precárias. De acordo com os dados constantes do Relatório Mundial sobre o Desenvolvimento de Recursos Hídricos da Unesco, discutido durante o “Terceiro Fórum Mundial sobre a Água”, que ocorreu no ano de 2003 em Kioto, Japão, “mais de um bilhão de pessoas em todo o mundo não têm acesso à água potável. Mais de o dobro desse número não conta com saneamento adequado. As doenças transmitidas pela água matam pelo menos seis mil crianças diariamente nos países em desenvolvimento. Cerca de dois bilhões de toneladas de lixo são jogados em rios e lagos todos os dias. Um litro de água residual polui em média oito litros de água doce”.105 Na cidade, a água é contaminada por esgoto, monóxido de carbono, produtos derivados de petróleo e bactérias. O cloro utilizado para proteger a água pode contaminá-la quando em contato com as substâncias orgânicas da água. A agricultura contamina a água com fertilizantes, inseticidas, fungicidas, herbicidas e nitratos que são carregados pela chuva ou infiltrados no solo, contaminando os mananciais subterrâneos e os lençóis freáticos. A água da chuva se contamina com a poluição constante do ar, como, por exemplo, o arsênico, chumbo, entre outros. A industria, por sua vez, contamina a água através do despejo nos rios e lagos, de desinfetantes, detergentes, metais pesados, derivados do petróleo entre outros.106 GRASSI, Luiz Antonio Timm. Direito à água. Porto Alegre. Seção Câmara Técnica de Recursos Hídricos. Disponível em www.abes-rs.org.br/rechid/direito-a-agua.htm. Acesso em 17 fev. 2005. 104 105 Disponível em http://www.faperj.br/interna.phtml?obj_id=602. Acesso em 03 maio 2004. Disponível em http://www.5elementos.org.br/2003/acoes/guia.htm. Acesso em 04 mar. 2004. 106 40 – Água na Visão do Direito No Brasil, um dos maiores problemas ambientais é a poluição por esgotos. O censo do INGE revela que cerca de um quarto das residências do país não conta com serviço de água potável e quase metade não tem serviço de esgoto. A ausência deste saneamento básico é a causa de 80% das doenças e de 65% das internações hospitalares, e, segundo dados do Sistema Único de Saúde, a cada R$ 1,00 investido em saneamento, as cidades economizariam R$ 5,00 em medicina curativa da rede de hospitais e ambulatórios públicos.107 Além disso, as diferenças regionais relativas a domicílios com coleta de esgoto são drásticas: enquanto que na Região Sudeste 71% dos domicílios têm coleta de esgoto, na Região Norte apenas 2% dos domicílios têm esse serviço, na Região Centro-Oeste esse número sobe para 33%, na Região Sul 18% dos domicílios têm coleta de esgoto e a Região Nordeste 13% dos domicílios são atendidos por esses serviços, de acordo com o Ministério do Meio Ambiente.108 1.8.2 ESCASSEZ A situação de escassez de água no mundo é resultado do uso desordenado desse recurso durante várias gerações. Esse desordenamento passou desapercebido enquanto a população do planeta era relativamente pequena e distribuída em diversas áreas. Entretanto, “ocorreram profundas transformações no planeta, ocasionando o aumento da população e sua concentração em cidades e o desenvolvimento da indústria, dando início ao modelo de desenvolvimento urbano-industrial”.109 Em artigo publicado na Revista de Direito da Universidade de Passo Fundo, José Álvaro de Vasconcelos Weissheimer, observou em relação ao assunto o seguinte: Disponível em http://www.5elementos.org.br/2003/acoes/guia.htm. Acesso em 04 mar. 2004. 107 108 Idem. Disponível em http://www.ana.gov.br/semanadaagua/navegador.asp. Acesso em 04 mar. 2004. 109 Água na Visão do Direito – 41 “Demarca-se a Revolução Industrial como ponto de partida da crise ambiental. Ocorrida nos fins do Século XVIII, proporcionou a criação de sistemas econômicos gerados em bases nitidamente antiecológicas, quando a natureza passou a ser vista apenas como fonte geradora de recursos”.110 Além disso, na maior parte do planeta o próprio dinamismo do ciclo hidrológico acarreta também a ocorrência de faltas ou excessos ao longo do tempo. Em outras palavras, não há segurança que se tenha água na quantidade adequada onde e quando ela é necessária.111 Há, portanto, uma tendência de escassez – quantitativa – global, devido ao uso desordenado de diversas gerações, agravado pelo aumento da população e conseqüente aumento dos usos, combinado com a ocorrência de escassez localizadas em algumas regiões. Em trabalho realizado pela organização não-governamental Population Action International, Robert Engelman, prevê que haverá crise de abastecimento, e estima que no ano 2000 -, 3% dos habitantes da terra (6 bilhões) já se ressentiam da falta d’água potável, e, ainda, em projeção feita para 2025, com uma população de 7,82 bilhões, a escassez da água atingirá o percentual de 7%, com 62% de risco.112 Também um dos grandes responsáveis pela escassez da água, dentro do contexto atual, é o desperdício. De acordo com a Associação Nacional dos Serviços de Saneamento, 49% da água captada para o abastecimento é jogada fora, entre outros fatores, por perdas do próprio sistema de captação113 , mas, principalmente, pela má utilização por parte dos consumidores. No Brasil, existe uma “cultura de desperdício”114 , uma vez que as tarifas de água são baratas, pois a conta mínima de um consumo de até 10 mil 110 WEISSHEIMER, José Álvaro de Vasconcelos. A constituição e o regime das águas. In Revista Justiça do Direito, Passo Fundo, n. 16, p. 146, 2002. GRASSI, Luiz Antonio Timm. Direito à água. Porto Alegre. Seção Câmara Técnica de Recursos Hídricos. Disponível em www.abes-rs.org.br/rechid/direito-a-agua.htm. Acesso em 17 fev. 2005. 111 EVANGELISTA, Eva. A proteção jurídica das águas. In Revista Centro de Estudos Jurídicos. Brasília, n. 12, p. 41, set/dez. 2000. 112 Disponível em http://www.akatu.net/conheca/visualizarConteudo.asp?InfoID=921. Acesso em 24 mar. 2004. 113 114 Disponível em http://www.jornaldomeioambiente.com.br. Acesso em 29 mar. 2004. 42 – Água na Visão do Direito litros é de R$ 9,60.115 Além disso, como se pode observar (item 1.4), o Brasil é um país relativamente privilegiado no tocante à quantidade de água disponível ao uso. Este fato, fez com que muitas campanhas fossem lançadas no País, com o intuito de alertar para a necessidade de um uso mais racional dos recursos hídricos. O Estado de São Paulo, por exemplo, lançou o PURA (Programa Estadual de Uso Racional de Água Potável), que tem como objetivo estabelecer uma cultura de uso racional.116 Assim como o Dia 22 de março foi celebrado o Dia Mundial da Água, com uma parada de consciência global, objetivando a luta contra o mau uso deste recurso117, no Estado do Rio Grande do Sul, na mesma data e com o mesmo objetivo, o Governo instituiu, através do Decreto nº 42.958, o ano de 2004 como sendo o “Ano Estadual das Águas”. Inclusive a atualidade do tema levou a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) a adotá-lo na Campanha da Fraternidade de 2004, que trouxe como lema: “Água, Fonte de Vida”. Esta Campanha, independente da ideologia religiosa, pôde agregar parceiros e, assim, atingir várias classes sociais.118 Com toda essa divulgação há uma última pretensão: que chegue até o consumidor uma idéia de como se obter um uso racional da água na irrigação, uso racional da água na indústria, uso racional da água nas residências, etc.119 Portanto, conforme ensina Luiz Antonio Timm Grassi, a crise da água doce pode ser compreendida pelos seguintes fatores: "a) agravamento da escassez quantitativa da água devido à competição com a demanda de outros usos, como a irrigação; b) aumento da escassez da água de boa qualidade, devido à degradação dos mananciais, pela poluição resultante de todas as atividades; c) deterioração dos próprios corpos de água pelas intervenções intencionais ou não (barragens, retificações, desmatamento, mineração nos leitos, erosão, perfuração descontrolada de poços); Disponível em http://www.akatu.net/conheca/visualizarConteudo.asp?InfoID=921. Acesso em 24 mar. 2004. 115 116 Disponível em http://www.recursoshidricos.sp.gov.br. Acesso em 05 mar. 2004. 117 Disponível em http://www.jornaldomeioambiente.com.br. Acesso em 29 mar. 2004. 118 Idem. 119 Disponível em http://www.recursoshidricos.sp.gov.br. Acesso em 05 mar. 2004. Água na Visão do Direito – 43 d) desequilibro natural na distribuição das águas, seja especial (regiões áridas, regiões úmidas), seja no tempo (períodos de seca, épocas de enchentes), que agrava, sob diferentes aspectos, a escassez localizada; e) magnitude da demanda e os infindáveis recursos financeiros, daí decorrentes, são cada vez maiores, devido à piora da qualidade dos mananciais ou da distância, além daqueles recursos que são apropriados, como os investimentos que são indispensáveis para a instalação de equipamentos e para sua operação; f) desperdício em níveis preocupantes, seja por falhas operacionais dos sistemas de abastecimento, seja pelo uso descontrolado por 120 parte dos usuários". GRASSI, Luiz Antonio Timm. Direito à água. Porto Alegre. Seção Câmara Técnica de Recursos Hídricos. Disponível em www.abes-rs.org.br/rechid/direito-a-agua.htm. Acesso em 17 fev. 2005. 120 CAPÍTULO 2 - A ÁGUA COMO BEM PÚBLICO 2.1 A ÁGUA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL 2.1.1 HISTÓRICO A Constituição do Império de 1824 não fez referência expressa quanto às águas de superfície. Entretanto, seu art. 179, XXII, assegurava o direito de propriedade em toda a sua plenitude, assim, na propriedade de solo estava implícita a de subsolo. Portanto, se nas terras privadas existissem mananciais de águas subterrâneas esses pertenciam ao proprietário da terra. Esta Carta trazia, ainda, a figura da desapropriação pelo poder público, o 121 que incluía os mananciais hídricos existentes em propriedades privadas. A Carta Política seguinte, de 1891, não disciplinou o domínio hídrico, mas definiu as competências para legislar sobre a navegação, sendo do Congresso Nacional, quanto à navegação dos rios que banhassem mais de um Estado, ou se estendessem a territórios estrangeiros (art. 34, 6º) e dos 122 Estados ou da União, quanto à navegação interior (art. 13, “caput”). A primeira Constituição a conter algum dispositivo ambientalista foi a de 1934. Estabelecia em seu art. 5º, XIX, “j”, a competência privativa da 123 União para legislar, dentre outros assuntos, sobre água. E, no art. 20, II, considerava como sendo de domínio da União: POMPEU, C.T. Direito das Águas no Brasil. São Paulo. 2001. p. 121 Apud HENKES, Silviania Lúcia. Histórico legal e institucional dos recursos hídricos no Brasil. Jus Navegandi, Teresina, a. 7, n. 66, jun. 2003. Disponível em http://www.jus.com.br/doutrina/ texto.asp?id=4146. Acesso em 21 dez. 2004 121 HENKES, Silviania Lúcia. Histórico legal e institucional dos recursos hídricos no Brasil. Jus Navegandi. Teresina, a.7, n. 66, jun. 2003. Disponível em http://www.jus.com.br/. Acesso em 21 dez. 2004. 122 123 ALMEIDA, Caroline Corrêa de. Evolução histórica da proteção jurídica das águas no Brasil . Jus Navegandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: http:// www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3421. Acesso em 20 dez. 2004 46 – Água na Visão do Direito “[...] II - os lagos e quaisquer correntes em terrenos do seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países ou se estendam a território estrangeiro III – as ilhas fluviais e lacustres nas zonas fronteiriças”. Essa Constituição determinava que aos Estados pertenceriam “as margens dos rios e lagos navegáveis, destinadas ao uso público, se por algum título não forem do domínio federal, municipal ou particular” (art. 21, II). Entretanto, ficava claro, ao se observar o art. 119, da citada Constituição, que a maior preocupação relativa à água estava no fato de ser ela 124 fonte de energia elétrica , estabelecendo que o aproveitamento industrial das águas e da energia hidráulica, ainda que de propriedade privada, dependiam de autorização ou concessão federal. Ainda, estabeleceu no art. 118 que “as minas e demais riquezas do subsolo, bem como as quedas d’água, constituiam propriedade distinta da do solo para o efeito de exploração ou aproveitamento industrial”. O constituinte de 1937 manteve o mesmo tratamento dado pela Constituição anterior. Já o de 1946, incluiu entre os bens de domínio dos Estados, os lagos e rios, em terrenos do seu domínio, e os que tivessem nascente e foz no território estadual. Ainda, conforme ensina Silvania Lúcia Henkes, “manteve-se nesta Carta, o título voltado para o disciplinamento da ordem econômica e social, no qual o constituinte tratava das águas nos arts. 152 e 153. No art. 152, mantevese as quedas d’água sob o regime de propriedade distinta da do solo para efeito de aproveitamento industrial ou de exploração. Enquanto que, o art. 153, determinava que o aproveitamento dos recursos minerais e de energia hidráulica dependiam de autorização e concessão. O aproveitamento de energia hidráulica de potência reduzida, não dependia de autorização ou concessão”.125 124 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 6ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002. p. 575. HENKES, Silviania Lúcia. Histórico legal e institucional dos recursos hídricos no Brasil. Jus Navegandi. Teresina, a.7, n. 66, jun. 2003. Disponível em http://www.jus.com.br/. Acesso em 21 dez. 2004. 125 Água na Visão do Direito – 47 126 As Constituições Federais de 1967 e 1969 , não trouxeram modificações relevantes no tratamento das águas em relação às Cartas anterio127 res. 2.1.2 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 A partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, foi delimitado o sistema jurídico ambiental. Isto é, por disposição do art. 225 da Constituição Federal todos os cidadãos têm direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e, com isso, conforme Weissheimer, “a Constituição disciplina o meio ambiente como um todo a que se atribui a natureza 128 jurídica de bem público”. Em decorrência disso, as águas também receberam uma nova regulamentação legal, a fim de serem preservadas e conservadas para as gerações futuras. A Constituição é inovadora ao caracterizar a água como recurso econômico, e os rios foram compreendidos com base no conceito de bacia hidrográfica e não como um elemento isolado. 2.1.2.1 DOMINIALIDADE DAS ÁGUAS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. Como se pode notar, principalmente nos arts. 20, III e 26, I da CF, a Constituição passou a considerar as águas como bens do Estado, inexistindo, com o novo ordenamento jurídico, águas particulares ou até mesmo águas 129 municipais. Dessa forma, a Constituição Federal de 1988 considera de domínio público todas as águas, preceituando que: “Teórica e tecnicamente, não se tratou de emenda, mas de nova constituição. A emenda só serviu como mecanismo de outorga, uma vez que verdadeiramente se promulgou texto integralmente reformulado”. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 10ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 1995, p. 88. 126 127 ALMEIDA, Caroline Corrêa de. Evolução histórica da proteção jurídica das águas no Brasil . Jus Navegandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: http:// www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3421. Acesso em 20 dez. 2004 WEISSHEIMER, José Álvaro de Vasconcelos. A constituição e o regime das águas. In Revista Justiça do Direito, Passo Fundo, n. 16, p. 167, 2002 128 Paulo Affonso Leme Machado defende que, não obstante a redação do texto constitucional, é possível a existência de águas municipais, na hipótese de uma corrente de água nascer em 129 48 – Água na Visão do Direito “a) ‘são bens da União os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais’ (art. 20, ‘caput’ combinado com o inciso III); b) ‘incluem-se entre os bens dos Estados as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União’ (art. 26, ‘caput’ combinado com o inciso I); c) ‘são bens da União os potenciais de energia hidráulica’ (art. 20, ‘caput’ combinado com o inciso VIII; e ‘...os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração e aproveitamento, e pertencem à União...’ (art. 176, 130 ‘caput’)”. Como se pode notar, a Carta Política de 1988 ampliou o domínio estadual concedendo-lhe o domínio das águas subterrâneas que anteriormente não tinham titular definido. Assim, as águas subterrâneas serão sempre estaduais, ou até mesmo com gestão compartilhada por outro ou outros Estados-membros. Pode servir de exemplo, o Aqüífero Guarani que, como já foi visto (item 1.7), abrange oito estados brasileiros. Todavia, como lembra Eduardo Coral Viegas, há divergência doutrinária acerca do tema e, há aqueles que defendem a dominialidade da União nos casos em que banhem mais de um Estado: “Jorge Calasans e outros, de um lado, sustentam:’Ora, mesmo que existam interpretações divergentes quanto à dominialidade sobre as águas subterrâneas, a Constituição não deixa dúvidas quanto à dominialidade de águas que banham o território de mais de um estado. Estas são, sempre, de domíum município e ter a sua foz, junto ao mar, no território do próprio município. (MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 329.) 130 PEREIRA JR., José de Sena. Processo Legislativo e Organização Institucional da Gestão de Recursos Hídricos no Brasil. Câmara dos Deputados: Brasília, 2004. p. 3. Disponível em http://www2.camara.gov.br/publicacoes/estnottec/tema14. Acesso em 20 nov. 2004. Água na Visão do Direito – 49 nio da União’ (CALASANS, Jorge Thierry et al. A Política Nacional de Recursos Hídricos: uma avaliação crítica. In: CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO AMBIENTAL, 7., 2003, São Paulo. Direito, Água e Vida. São Paulo: Imprensa Oficial, 2003, v.1, p. 595)”.131 Contudo, Maria Luiza Machado Granziera preconiza que, “não há base constitucional para o entendimento de que as águas subterrâneas, 132 subjacentes a mais de um Estado, sejam de domínio da União”. Com isso, a autora deixa claro a nova situação pós Constituição Federal de 1988, isto é de que não existem mais águas privadas e de que não há qualquer indício de que o poder público deve indenizar aqueles particulares que tinham águas incorporadas ao seu patrimônio. Fernando de Quadros da Silva situa que: “Em suma, não mais subsiste o direito de propriedade relativamente aos recursos hídricos. Os antigos proprietários de poços, lagos ou qualquer outro corpo de água devem se adequar ao novo regramento constitucional e legislativo passando à condição de meros detentores de direitos de uso dos recursos hídricos, assim mesmo, desde que obtenham a necessária outorga prevista na lei citada”.133 Porém, esta idéia não é pacífica. Há os que defendem que o direito adquirido, expresso no art. 5º, XXXVI, da CF, socorre esses proprietários no sentido de obterem indenizações dos Estados quando estes pretenderem o domínio das águas que, de acordo com o art. 8º, do Código das Águas, 134 seriam de sua propriedade. Neste sentido, está posicionado Paulo Affonso Leme Machado que defende que: 131 VIEGAS, Eduardo Coral. Visão Jurídica da Água. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 79. 132 GRANZEIRA, Maria Luiza Machado. Direito de águas: disciplina jurídica das águas do- ces. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 82 SILVA, Fernando Quadros da. A Gestão dos Recursos Hídricos após a Lei nº 9.433, de 08 de janeiro de 1997. In FREITAS, Vladimir Passos de. Direito Ambiental em Evolução. Curitiba: Juruá, 1998. p. 83 133 Art. 8º do Decreto n.º 24.643, Código de Águas: “São particulares as nascentes e todas as águas situadas em terrenos que também o sejam, quando as mesmas não tiverem classificadas entre as águas comuns de todos, as águas públicas ou as águas comuns”. 134 50 – Água na Visão do Direito “Não se pode simplesmente tentar introduzir o regime jurídico das nascentes privadas, o sistema de outorga e da cobrança do uso desse recurso específico pelo viés da ‘função social’ da propriedade (art. 5º, XXIII, da CF/88). Houve um inegável esvaziamento do direito de propriedade (art. 5º, XXII da CF/ 88), que acarreta a obrigação de indenizar”.135 Por outro lado, lembra José Ribeiro que: “o entendimento predominante, conforme se colhe em Ferreira (1989, pp. 148 e 149), citando doutrina e jurisprudência, é o de que somente a lei ordinária não pode retroagir em prejuízo do direito adquirido, da coisa julgada ou do ato jurídico perfeito, mas a Constituição e a Emenda Constitucional podem e têm eficácia revocatória completa desses atos”.136 2.1.2.2 COMPETÊNCIAS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 O Brasil é um Estado Federado, assim a unidade da Federação se mantém em virtude da existência de um ordenamento jurídico federal válido em todo território nacional; da repartição de competências; de um poder capaz de solucionar conflitos e da possibilidade da União intervir nos estados quando houver ameaça à Federação.137 Nesses termos, a distribuição das competências constitui, como foi dito, um dos alicerces do sistema federativo e divide-se em competências legislativas e administrativas ou materiais. E quanto à forma que nossa Constituição divide essas competências, conforme Márcia Dieguez Leuzinger, “O sistema de divisão de competências adotado pela CF/88, que engloba três níveis diferentes de estatalidade (União, Estados e Municípios), consubstancia-se na enumeração taxativa 135 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 423. 136 RIBEIRO, José. Propriedade das águas e o Registro de Imóveis. In FREITAS, Vladimir Passos de. Águas: Aspectos Jurídicos e Ambientais. Curitiba: Juruá, 2000, p. 41. LEUZINGER, Márcia Dieguez. Competências Constitucionais e Domínio Hídrico. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p.2. 137 Água na Visão do Direito – 51 das competências da União, competências residual ou remanescente dos Estados-Membros e competência para dispor sobre tudo o que for de interesse local aos Municípios”.138 2.1.2.2.1 COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS Conforme Maria Luiza Machado Granziera, “A competência legislativa pode ser privativa da União (art. 22), concorrente entre União, Estados e Distrito Federal (art. 24), dos Estados (art. 25, §1º), dos Municípios (art. 30, I e II) e do Distrito Federal (art. 32, § 1º)”.139 Em se tratando das questões afetas ao meio ambiente a competência legislativa vem delimitada basicamente no art. 24 da Constituição Federal, sendo, portanto, concorrente, “cabendo à União a edição de normas gerais, principiológicas, e aos Estados-Membros a de normas específicas, suplementando a legislação federal”.140 Em relação aos recursos hídricos, entretanto, a competência para legislar sobre águas é privativa da União. Assim, vem delimitado no art. 22, IV, da CF/88, “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (...) IV - águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão”. (grifos nossos) Entretanto, como bem lembra Maria Luiza Machado Granziera, essa competência privativa fixada no art. 22 não implica ser indelegável, pois de acordo com o que dispõe o parágrafo único do citado artigo, lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas. LEUZINGER, Márcia Dieguez. Competências Constitucionais e Domínio Hídrico. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p.5. 138 GRANZEIRA, Maria Luiza Machado. Direito de águas: disciplina jurídica das águas doces. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 67. 139 140 LEUZINGER, Márcia Dieguez. Competências Constitucionais e Domínio Hídrico. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p.5. 52 – Água na Visão do Direito Não obstante, surge uma contradição aparente: ao mesmo tempo em que o constituinte especifica a competência privativa da União, para legislar sobre a matéria de águas (conforme o art. 22, IV, da CF/88), no seu art. 24, IV, atribui competência concorrente à União e os Estados e Distrito-Federal quando se refere a legislar sobre o meio ambiente e sendo a água um recurso natural, inclui-se – também - neste inciso. Conforme Márcia Dieguez Leuzinger, esta contradição está no fato de que a competência privativa da União vai de encontro à competência dos Estados de estabelecer regras administrativas sobre os bens de seu domínio.141 Sobre essa questão José Afonso da Silva delimita: “não é muito coerente atribuir aos Estados o domínio de águas superficiais e subterrâneas, (...), sem lhes reconhecer a competência para legislar, ainda que fosse suplementarmente, sobre águas”.142 A maneira encontrada para solucionar esse impasse, conforme Maria Luiza Machado Granziera: “foi o entendimento de que a competência para legislar sobre águas, em sentido genérico é que pertence à União, não deve ser confundida com a capacidade de cada ente político brasileiro – União, Estados, Distrito Federal e Municípios – para estabelecer regras administrativas sobre os bens que se encontram sob seu respectivo domínio, entendido esse termo como guarda e administração”.143 Assim o que está vedado é criar o direito sobre águas, este sim, de competência privativa da União. No entendimento de Celso Antônio Pacheco Fiorillo, a melhor interpretação é aquela extraída com base no art. 24, de modo que a competência 141 LEUZINGER, Márcia Dieguez. Competências Constitucionais e Domínio Hídrico. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p.5. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 6 ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1990, pp. 86-87 apud GRAF, Ana Cláudia Bento. Água, bem mais precioso do milênio: o papel dos Estados. In Revista Centro de Estudos Jurídicos. Brasília, n. 12, p. 34, set/dez. 2000. 142 GRANZEIRA, Maria Luiza Machado. Direito de águas: disciplina jurídica das águas doces. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 68. 143 Água na Visão do Direito – 53 para legislar sobre normas gerais é atribuída à União – entre outros, podendo servir de exemplo, como já foi visto (item 1.5), a classificação e denominação dos corpos de água e a prioridade no uso dos recursos hídricos -, cabendo aos Estados e ao Distrito Federal legislar complementarmente e ao município suplementarmente, com base no art. 30, II, da Constituição Federal.144 Quanto aos municípios, porém, Maria Luiza Machado Granziera afirma que não sendo eles detentores de domínio hídrico, não há que se falar em fixação de regras sobre a gestão de águas. Mas, a Constituição dispõe que a eles cabe legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, I) assim como suplementar a legislação federal e a estadual no que couber145 (inciso II). Portanto, a sua competência está restrita ao interesse local, relativo aos recursos naturais e à proteção do meio ambiente.146 2.1.2.2.2 COMPETÊNCIAS MATERIAIS OU EXECUTIVAS Competência material, pela definição de Fernanda Dias Menezes de Almeida, é o poder para desempenho de diversas tarefas e serviços, de cunho político, administrativo, econômico e social.147 Divide-se em exclusiva e comum148 . No art. 23, VI, a Constituição Federal elenca as matérias cuja competência material (ou executiva) é comum a todos os entes federados, o 144 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 101. 145 “A expressão ‘no que couber’ deve ser entendida como o conjunto de matérias relativas ao predominante interesse local, desde que não se trate de tema de competência de outro ente político nem fira o ordenamento jurídico posto”. GRANZEIRA, Maria Luiza Machado. Direito de águas: disciplina jurídica das águas doces. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 73. GRANZEIRA, Maria Luiza Machado. Direito de águas: disciplina jurídica das águas doces. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p.72. 146 147 ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competência na Constituição de 1998. São Paulo: Atlas, 1991, p. 90. “(...) conferindo à União competência exclusiva para atuar em relação às matérias enumeradas no art. 21; aos municípios competência exclusiva quanto aos temas previstos nos incs. III a IX, do art. 30, bem como competência para atuar quando houver interesse local predominante; e, aos Estados-membros, competência exclusiva para agir sobre tudo o que não for de competência exclusiva da União ou dos municípios; em outras palavras, competência remanescente”. LEUZINGER, Márcia Dieguez. Competências Constitucionais e Domínio Hídrico. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p. 6. 148 54 – Água na Visão do Direito que, como se sabe, não envolve poder de legislar, mas somente de execução. Conforme, Ana Cláudia Bento Graf, “Nesse dispositivo estão insertas as competências para proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas (inc. VI), promover programas de construção de moradias e melhoramento das condições habitacionais e de saneamento básico (inc. IX) e registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seu território”. 149 Entretanto, embora a competência para proteger o meio ambiente, de modo geral, seja comum a todas as entidades estatais (art. 23, VI, da CF/88), a competência para instituir um sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direito de uso é exclusiva da União, conforme o art. 21, XIX, da CF/88, e foi a consubstanciação desse dispositivo que gerou a Lei n.º 9.433/97 2.2 A ÁGUA NAS CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS Como foi visto no item anterior, as águas são de domínio dos Estados e da União, não existindo, após a Constituição Federal de 88, águas particulares ou pertencentes aos Municípios. Também foi discutida a competência material ou executiva, que pode ser comum a todos os entes federados no tocante a alguns temas referentes às águas, e à competência legislativa que, mesmo gerando discussões acerca do tema, é privativa da União. No entanto, apesar da Constituição Federal atribuir privativamente à União a competência para legislar sobre águas, várias constituições estaduais apresentam dispositivos sobre recursos hídricos. Segundo José Afonso da Silva, “[...] As Constituições dos Estados, contudo, não se omitiram na consideração da matéria. Ao contrário, fundados na competência comum dos Estados para proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer das suas formas (art. 23, VI), assim como na sua competência para legislar 149 GRAF, Ana Cláudia Bento. Água, bem mais precioso do milênio: o papel dos Estados. In Revista Centro de Estudos Jurídicos. Brasília, n. 12, p. 33, set/dez. 2000. Água na Visão do Direito – 55 concorrentemente sobre a proteção do meio ambiente e controle da poluição (art. 24, VI) e ainda sobre a responsabilidade sobre dano ao meio ambiente (art. 24, VIII), os constituintes estaduais inseriram nas respectivas constituições capítulos desenvolvidos sobre a matéria, reservando espaço para a proteção dos recursos hídricos”.150 Assim, as Constituições dos Estados do Amapá, Amazonas, Sergipe, Espírito Santo, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e a do Distrito Federal prevêem a criação de sistemas estaduais de gerenciamento de recursos hídricos. Já as de Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, São Paulo, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul determinam a elaboração de planos estaduais de recursos hídricos. As de Alagoas, Bahia, Sergipe, São Paulo, Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul contêm dispositivos sobre a cobrança do uso do recurso e do Rio Grande do Sul sobre critérios de outorga. E as Constituições do Acre, Rondônia, Roraima, Maranhão e Santa Catarina são as que menos se estendem sobre a matéria.151 2.2.1 A ÁGUA NA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL Assim como a Constituição Federal, a Carta gaúcha também é rica em dispositivos atinentes às questões ambientais. Para a questão das águas, entretanto, o art. 171 da Constituição Estadual é o principal, dispondo assim: “Art. 171 - Fica instituído o sistema estadual de recursos hídricos, integrado ao sistema nacional de gerenciamento desses recursos, adotando as bacias hidrográficas como unidades básicas de planejamento e gestão, observados os aspectos de uso e ocupação do solo, com vista a promover: I - a melhoria de qualidade dos recursos hídricos do Estado; II - o regular abastecimento de água às populações urbanas e rurais, às indústrias e aos estabelecimentos agrícolas. SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 5ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2004, p.128. 150 PEREIRA JR., José de Sena. Processo Legislativo e Organização Institucional da Gestão de Recursos Hídricos no Brasil. Câmara dos Deputados: Brasília, 2004. p. 3. Disponível em http://www2.camara.gov.br/publicacoes/estnottec/tema14. Acesso em 20 nov. 2004. 151 56 – Água na Visão do Direito § 1º - O sistema de que trata este artigo compreende critérios de outorga de uso, o respectivo acompanhamento, fiscalização e tarifação, de modo a proteger e controlar as águas superficiais e subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, assim como racionalizar e compatibilizar os usos, inclusive quanto à construção de reservatórios, barragens e usinas hidrelétricas. § 2º - No aproveitamento das águas superficiais e subterrâneas será considerado de absoluta prioridade o abastecimento das populações. § 3º - Os recursos arrecadados para utilização da água deverão ser destinados a obras e à gestão dos recursos hídricos na própria bacia, garantindo sua conservação e a dos recursos ambientais, com prioridade para as ações preventivas”. Com a leitura desse dispositivo exurge quatro grandes princípios na gestão das águas estaduais que a Constituição quis assegurar. Conforme Eugênio Miguel Cánepa, Isidoro Zorzi, Luiz Antonio Timm Grassi e Percy B. Soares Neto, são eles: “1º) Gestão das águas através de um Sistema Estadual de Recursos Hídricos – e não através de um órgão específico e centralizado – reconhecendo-se assim, a complexidade técnica, política e institucional da questão; 2º) Adoção da bacia hidrográfica como unidade básica de planejamento e intervenção; aqui vai-se ao encontro de princípio bem estabelecido na doutrina internacional da gestão de recursos hídricos; 3º) Estabelecimento da outorga e tarifação dos recursos hídricos – cobrança pela retirada e pelo despejo de efluentes – estabelecendo-se em nível constitucional, pás as águas de domínio estadual o Princípio Usuário Pagador (PUP), um moderno instrumento econômico utilizado amplamente em países do mundo desenvolvimento – especialmente nos países da União Européia; 4º) Reversão, para a respectiva bacia de arrecadação, da receita acima, devendo os recursos financeiros ser aplicados Água na Visão do Direito – 57 na própria gestão das águas da bacia; este dispositivo torna a aplicação do PUP uma operação “casada”: o produto de sua arrecadação fica na bacia para a sua gestão isto é, financiando o planejamento e a execução das intervenções, sejam estruturais ou não”.152 Sobre os dois últimos princípios cabe tecer alguns comentários mais específicos por seu caráter revolucionário no Brasil, isto é, o Princípio de Usurário Pagador (PUP) e o Princípio da Reversão, bem como da sua aplicação conjunta, uma vez que o produto de arrecadação fica na própria bacia arrecadadora para a sua gestão. O Princípio do Usuário Pagador (PUP) surge com a necessidade dos Estados de racionarem e, principalmente, racionalizarem o uso das águas em decorrência da atual situação dos recursos hídricos, tema abordado no Capítulo 1 deste livro. Consiste em agregar dois preços ao uso da água: o primeiro correspondente à retirada, no sentido de frear o consumo e o segundo correspondente ao despejo de esgotos e que acompanhará a tarifa de esgoto, no sentido de refrear seu lançamento – aqui consubstanciado o Princípio do Poluidor Pagador.153 No Rio Grande do Sul esse valor cobrado pelo uso das águas é classificado constitucionalmente como tarifa, de acordo com o art. 171, § 1º. Entretanto a nível federal e de outros estados há uma grande discussão acerca do fato de o pagamento pelo uso da água ser tributo ou preço. De acordo com Eugenio Miguel Cánepa e Luiz Antonio Timm Grassi: “(...) o PUP dá origem a um preço. De fato, não estamos diante de um tributo (imposto, taxa ou contribuição de melhoria), destinado a financiar serviços públicos. Estamos, isto sim, diante de um preço – um preço público mais precisamente – destinado a remunerar o Estado pelo uso de um patrimônio de propriedade estatal que se tornou escasso relativamente às CANEPA, Eugênio Miguel;ZORZI, Isidoro; GRASSI, Luiz Antonio Timm e NETO, Percy B. Soares. Os comitês de bacia no Rio Grande do Sul: Formação, dinâmica de funcionamento e perspectivas. Porto Alegre. Seção Câmara Técnica de Recursos Hídricos. Disponível em www.abes-rs.org.br/rechid/direito-a-agua.htm. Acesso em 17 fev. 2005. 152 153 CÁNEPA, Eugênio Miguel e GRASSI, Luiz Antonio Timm. A lei das águas do RS: No caminho do desenvolvimento sustentável. Porto Alegre. Seção Câmara Técnica de Recursos Hídricos. Disponível em www.abes-rs.org.br/rechid/direito-a-agua.htm. Acesso em 17 fev. 2005. 58 – Água na Visão do Direito necessidades (...) e que não cabe mais o ‘livre acesso’, sob pena de degradação do recurso”.154 Quanto ao último princípio exposto na nossa Constituição Estadual, tratou-se de um grande avanço, uma vez que dispôs sobre a necessidade dos recursos arrecadados pela utilização da água devessem ser reaplicados na própria bacia, conforme o art. 171, § 3º. Este fato faz com que o Princípio do Usuário Pagador seja mais eficaz, porquanto o produto da arrecadação será utilizado para planejamento e intervenções, estruturais ou não, na bacia da qual provieram. 2.3 A ÁGUA NA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL 2.3.1 HISTÓRICO A proteção e a preocupação com os recursos hídricos no Brasil vêm de longa data – desde as Ordenações do Reino -, entretanto essa normatização evoluiu de acordo com as características próprias de cada época, buscando concatenação com as necessidades e, principalmente, com os interesses respectivos. Assim, o Código Civil de 1916 (Lei n.º 3.071, de 01/01/1916) dedicou uma das suas seções à água. Nos arts. 563 a 568 dispôs basicamente sobre o direito de utilização das águas, mas não se referiu diretamente ao seu domínio. Limitava-se a uma regulamentação sob o fundamento básico do direito de vizinhança e da utilização da água como bem essencialmente privado e de valor econômico limitado,155 possibilitando ao usuário utilizar as águas da forma que melhor o aprouvesse, desde que fossem respeitados os direitos de vizinhança. 156 154 CÁNEPA, Eugênio Miguel e GRASSI, Luiz Antonio Timm. A lei das águas do RS: No caminho do desenvolvimento sustentável. Porto Alegre. Seção Câmara Técnica de Recursos Hídricos. Disponível em www.abes-rs.org.br/rechid/direito-a-agua.htm. Acesso em 17 fev. 2005. 155 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 6ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002. p. 582. ALMEIDA, Caroline Corrêa de. Evolução histórica da proteção jurídica das águas no Brasil . Jus Navegandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: http:// www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3421. Acesso em 20 dez. 2004 156 Água na Visão do Direito – 59 Em seu art. 568, disciplinou ”as águas”; no art. 564 cuidou dos conflitos entre vizinhos; já em seu art. 565 regulou a forma de consumo, dispondo que o proprietário da fonte não captada, satisfeitas as necessidades, não poderia impedir o curso natural das águas; no art. 566, procurou disciplinar o problema das águas pluviais, estabelecendo que as águas pluviais que corressem por locais públicos, assim como os rios, poderiam ser utilizadas por qualquer dos proprietários por onde passassem; no art. 567, previu indenização sobre determinados direitos de proprietários prejudicados e, finalmente, em seu art. 658 estabeleceu normas procedimentais, afirmando que seriam pleiteadas em ações sumárias à servidão de águas e às indenizações correspondentes.157 Em 1934, o Governo Provisório - decorrente da Revolução de 30 – promulgou o Decreto nº 24.643, chamado de Código das Águas. As disposições do Código Civil foram recepcionadas quase na sua totalidade por este diploma, completando-as, embora muitas vezes os temas fossem repetidos. O Código das Águas foi editado com a preocupação de se regulamentar a apropriação das águas para fins de geração de energia elétrica. Isso se deu porque o Brasil deixava de ser um país essencialmente agrícola. A indústria expandia-se e as águas foram tratadas como um dos elementos básicos do desenvolvimento por ser matéria-prima para a geração de eletricidade, subproduto essencial da industrialização.158 Didaticamente, Edis Milaré dividiu o Código em duas partes: “Divide-se o Código em duas partes. A primeira trata das águas em geral e de seu domínio, estabelecendo as normas fundamentais do que podemos chamar de Direito das Águas. A segunda trata do aproveitamento dos potenciais hidráulicos e estabelece uma disciplina para geração, transmissão e distribuição de energia elétrica. Esta parte é mais extensa do que a primeira, dado que foi o motivo determinante da decretação do Código”.159 157 WEISSHEIMER, José Álvaro de Vasconcelos. A Constituição e o Regime das águas. In Revista Justiça do Direito, Passo Fundo, n. 16, p. 171, 2002. ALMEIDA, Caroline Corrêa de. Evolução histórica da proteção jurídica das águas no Brasil . Jus Navegandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: http:// www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3421. Acesso em 20 dez. 2004 158 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: doutrina – prática – jurisprudência – glossário. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 383. 159 60 – Água na Visão do Direito O Código estabeleceu uma política hídrica bastante moderna e complexa para a época, abrangendo vários aspectos, tais como: aplicação de penalidades, propriedade, domínio, aproveitamento das águas, navegação, regras sob águas nocivas, força hidráulica e seu aproveitamento, concessões e autorizações, fiscalização, relações com o solo e sua propriedade, desapropriação, derivações e desobstrução.160 A maioria dessas medidas de conservação, proteção e recuperação necessitavam, por sua vez, de normas reguladoras que não foram criadas, não sendo, portanto, implementadas, ao contrário das destinadas à exploração energética. Entretanto, muitos desses instrumentos foram adotados décadas mais tarde, por outras legislações brasileiras. Esse é o caso da responsabilidade penal, civil e administrativa, aplicada conjunta e independentemente ao mesmo crime, presente nos arts. 109 e 110 do Código de Águas. Os princípios de poluidor-pagador - disposto nos arts. 111 e 112 do referido diploma legal - e do usuário-pagador – previsto implicitamente no art. 36, §2º. Porém, a principal diferença entre o Código Civil e o Código de Águas é que este enfoca as águas como recursos dotados de valor econômico para a coletividade e, por isso mesmo, seriam merecedores de atenção especial do Estado, enquanto aquele não reconhecia o real valor econômico deste recurso e a sua regulamentação fundava-se principalmente no direito de vizinhança. O Código das Águas embora seja um texto antigo, têm partes ainda vigente, embora muito modificado por leis posteriores. Neste sentido Eva Evangelista, sustentou “O Código de Águas (...), não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, permanecendo em vigor a parte que disciplina as proibições de construções capazes de poluir ou inutilizar a água dos poços e nascentes e a que trata da poluição das águas e da responsabilidade dos poluidores, notadamente dos agricultores e industriais”.161 GRANZIERA, 2001 apud HENKES, Silviania Lúcia. Histórico legal e institucional dos recursos hídricos no Brasil. Jus Navegandi. Teresina, a.7, n. 66, jun. 2003. Disponível em http://www.jus.com.br/. Acesso em 21 dez. 2004. 160 EVANGELISTA, Eva. A proteção jurídica das águas. In Revista Centro de Estudos Jurídicos. Brasília, n. 12, p. 42, set/dez. 2000. 161 Água na Visão do Direito – 61 O Código Florestal, instituído pela Lei n.º 4.771/65, tratou do assunto “águas” ao determinar a preservação das florestas e demais formas de vegetação situada ao longo dos rios, cursos d’águas, nascentes, lagos, lagoas ou reservatórios, protegendo de forma reflexa a vazão e a qualidade da água.162 O Código de Pesca (Decreto-Lei nº 221/67): “estabelece, em seu art. 37, que os efluentes das redes de esgotos e os resíduos líquidos ou sólidos das indústrias somente poderão ser lançados às águas quando não as tornarem poluídas. Este diploma diz ainda que cabe aos governos estaduais a verificação da poluição e a tomada de providências para coibi-la. De resto, vale lembrar que o Código de Pesca, aplica-se às águas interiores e ao mar territoriais, nos termos do art. 4º”.163 A Política Nacional de Saneamento, Lei n.º 5.138/67, ao normatizar o saneamento básico, tratando especificamente sobre o sistema de esgoto e de drenagem de águas pluviais, contribui de modo formal para a gestão qualitativa dos recursos hídricos. A Política Nacional de Irrigação, Lei n.º 6.662/79, tinha por objetivo controlar a utilização da água usada na irrigação, dentre outros.164 Em 1981, a Lei n.º 6.938, institui a Política Nacional do Meio Ambiente, posteriormente alterada pela Lei n.º 7.804. Esta lei, tida como uma das regulamentações ambientais brasileiras mais importantes, trouxe consigo o início do pensamento holístico165 em relação à proteção ambiental no Brasil, MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: doutrina – prática – jurisprudência – glossário. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 148. 162 163 Idem. HENKES, Silviania Lúcia. Histórico legal e institucional dos recursos hídricos no Brasil. Jus Navigande. Teresina, a.7, n. 66, jun. 2003. Disponível em http://www.jus.com.br/. Acesso em 21 dez. 2004. 164 HOLÍSTICO v. do latim – holismo - 1.Filos. Tendência, que se supõe seja própria do Universo, a sintetizar unidades em totalidades organizadas; 2.Teoria segundo a qual o homem é um todo indivisível, e que não pode ser explicado pelos seus distintos componentes (físico, psicológico ou psíquico), considerados separadamente; holística. HOLANDA FERREIRA, Aurélio Buarque de. Novo dicionário da língua portuguesa. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. 165 62 – Água na Visão do Direito indo o legislador além da tutela dispersa dos diferentes bens (...) e tratando o ambiente como um todo.166 Esta Lei instituiu o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SINAMA, cujo órgão superior é o Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA, ao qual compete, entre outras atribuições “estabelecer normas e critérios e padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do meio ambiente com vistas ao uso racional dos recursos ambientais, principalmente os hídricos”. A esse respeito,Edis Milaré afirma, “Note-se a ênfase dada aos recursos hídricos entre os demais recursos ambientais. Aliás, a mesma Lei também enfatiza as águas ao definir os recursos ambientais como sendo: ‘a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora’”.167 A Lei n.º 7.347/85, criou o instrumento processual adequado para reprimir ou impedir danos ao meio ambiente, além de outros interesses difusos e coletivos da sociedade: Ação Civil Pública. 2.3.2 A LEI FEDERAL N.º 9.433/97 O art. 21, inc. XIX, da Constituição Federal estabelece: “Art. 21. Compete à União: (...) XIX - instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso; (...)” Assim em 08 de janeiro de 1997 entrou em vigor a Lei Federal n.º 9.433/97, conhecida como a “Lei das Águas”. Cabia, portanto, a ela instituir a Política Nacional de Recursos Hídricos e criar o Sistema Nacional de 166 ALMEIDA, Caroline Corrêa de. Evolução histórica da proteção jurídica das águas no Brasil . Jus Navegandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: http:// www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3421. Acesso em 20 dez. 2004 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: doutrina – prática – jurisprudência – glossário. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 387. 167 Água na Visão do Direito – 63 Gerenciamento de Recursos Hídricos, dando cumprimento ao mandamento constitucional supra citado. A lei é composta de 57 artigos que traçam a Política Nacional de Recursos Hídricos, seus fundamentos, objetivos, diretrizes de ação e instrumentos, dando principal ênfase à outorga e à possível cobrança pelo uso desse recurso. Além de especificar quais são os órgãos que irão compor o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Por ter a Lei das Águas trazido transformações no tratamento legislativo da água, concatenado com a nova realidade de que esse recurso natural não é infinito, será tratada especificamente no capítulo seguinte deste livro. 2.3.3 A LEI ESTADUAL N.º 10.350/94 Ao mesmo tempo em que a Constituição Federal previa em seu art. 21, XIX, a instituição de uma Política Nacional de Recursos Hídricos, a Constituição Estadual do Rio Grande do Sul, em seu art. 171, previa a instituição do Sistema Estadual de Recursos Hídricos. Assim, a Lei Estadual n.º 10.350/94 veio regulamentar este artigo da Constituição Estadual. Como se pode perceber a lei estadual é anterior à lei federal que data de 1997, este fato, porém não ocorreu apenas em nosso estado. Conforme Silviana Lúcia Henkes citando Maria Luiza Machado Granziera, “(...) a mora da União em instituir a Política Nacional de Recursos Hídricos e criar o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e, tendo em vista a competência outorgada pela CF/88 aos estados para legislar sobre os bens de seu domínio, vários estados começaram a elaborar suas políticas estaduais de recursos”.168 E continua: “O Estado de São Paulo foi o primeiro estado brasileiro a editar uma política estadual de recursos hídricos, fê-lo através da Lei 7.663, de 30/12/1991. Paulatinamente, outros estados GRANZIERA, 2001 apud HENKES, Silviania Lúcia. Histórico legal e institucional dos recursos hídricos no Brasil. Jus Navegandi. Teresina, a.7, n. 66, jun. 2003. Disponível em http://www.jus.com.br/. Acesso em 21 dez. 2004. 168 64 – Água na Visão do Direito editaram suas políticas estaduais. O Estado do Ceará foi o segundo estado a editar, fê-lo cem 24/07/1992, através da Lei 11.996, seguido pelos estados de Minas Gerais, através da Lei 11.504, de 20/06/1994; Santa Catarina através da Lei 9.748, de 30/11/1994; e o Rio Grande do Sul, através da Lei 10.350, de 30/12/1994”.169 Entretanto, o Rio Grande do Sul já vinha apresentado uma maior mobilização no sentido de gerenciamento dos recursos hídricos desde a segunda metade da década de 80. Diversos fatores fizeram com que o Estado tivesse os dois primeiros comitês de bacia: o do Sinos e o do Gravataí. Em 17 de março de 1988, a partir de um decreto governamental de criação, o Comitê Sinos torna-se o primeiro comitê de gerenciamento de bacia de um rio estadual implantado no país. E em 15 de fevereiro de 1989 instalava-se oficialmente o Comitê Gravataí, o segundo a ser instalado. Em meados de 1988, um grupo inter institucional, por iniciativa e com liderança da Assessoria de Recursos Hídricos da CORSAN, foi criada para discutir a respeito do gerenciamento.170 Após a Constituição Federal de 88 e a Constituição Estadual de 1989, começaram os esforços para tentar “modelar um sistema de gestão que aliasse as melhores contribuições da experiência internacional, a experiência até aqui adquirida nas iniciativas voluntaristas locais e nos princípios de grande alcance estabelecidos pelo legislador constitucional”.171 Para finalmente, em 30 de dezembro de 1994, o projeto ser aprovado por unanimidade pela Casa Legislativa e sancionado pelo então Governador do Estado do Rio Grande do Sul.172 GRANZIERA, 2001 apud HENKES, Silviania Lúcia. Histórico legal e institucional dos recursos hídricos no Brasil. Jus Navegandi. Teresina, a.7, n. 66, jun. 2003. Disponível em http://www.jus.com.br/. Acesso em 21 dez. 2004. 169 CANEPA, Eugênio Miguel;ZORZI, Isidoro; GRASSI, Luiz Antonio Timm e NETO, Percy B. Soares. Os comitês de bacia no Rio Grande do Sul: Formação, dinâmica de funcionamento e perspectivas. Porto Alegre. Seção Câmara Técnica de Recursos Hídricos. Disponível em www.abes-rs.org.br/rechid/direito-a-agua.htm. Acesso em 17 fev. 2005. 170 171 Idem. 172 Idem. CAPÍTULO 3 - O GERENCIAMENTO DOS RECURSOS HÍDRICOS 3.1 POLÍTICA NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS 3.1.1 OBJETIVOS A Lei nº 9.433/97 em seu artigo 2º determina quais os principais objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos, estabelecendo: “Art. 2º São objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos: I - assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos; II - a utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o transporte aquaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável; III - a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos recursos naturais”. Com a leitura atenta destes dispositivos se extrai que a Lei nº 9.433/ 97 tem por fim maior a manutenção do desenvolvimento sustentável dos recursos hídricos, já que a própria Constituição brasileira, em seu art. 225, caput, assegura a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo ao Poder Público a obrigação de instaurar o desenvolvimento sustentável. Sobre desenvolvimento sustentável, diz Mieko Ando Ussami: “A definição mais conhecida é a da Comissão ‘Brundtland’, em 1987, que segundo a mesma, conceitua o desenvolvimento sustentado como aquele que satisfaz às necessidades do pre- 66 – Água na Visão do Direito sente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras satisfazerem as suas”.173 Assim a Lei das Águas: “demarca concretamente a sustentabilidade dos recursos hídricos em três aspectos: disponibilidade de água, utilização racional e utilização integrada”, conforme ensina Paulo Affonso Leme Machado.174 Para Luís Paulo Sirvinskas: “Busca-se, além disso, dar uma qualidade de vida igual ou melhor para as futuras gerações, evitando que esses recursos venham a faltar no futuro”.175 Outro objetivo da Política Nacional de Recursos Hídricos é a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos recursos naturais”(art. 2º, III). Isto é, evitar as enchentes ou inundações que, normalmente, são decorrentes da ação humana. Situando com clareza os objetivo da Lei nº 9.433/97, observa Juliana Santilli, que: “A nova lei está em sintonia com outros instrumentos legais nacionais e internacionais que pretendem assegurar a integridade e a sustentabilidade a longo prazo dos recursos naturais, estabelecendo limitações e restrições ao seu uso e exploração. Afasta-se, portanto, da concepção legal anterior de viabilizar apenas o seu aproveitamento com fins econômicos e USSAMI, Mieko Ando. Gestão dos Recursos Hídricos para o Desenvolvimento Sustentável. In Revista de Direito Difusos: Desenvolvimento Sustentável, São Paulo, vol. 6, p. 807, abril 2001. 173 174 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 433. 175 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental. p.136. São Paulo: Saraiva, 2002, Água na Visão do Direito – 67 de priorizar as demandas do setor elétrico em detrimento dos demais usos da água (...)”.176 3.1.2 FUNDAMENTOS LEGAIS A Política Nacional de Recursos Hídricos tem como fundamentos, a teor do art. 1º da Lei nº 9.433/97: I - a água é um bem de domínio público; II - a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico; III em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais; IV - a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas; V - a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos; VI - a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades. 3.1.2.1 A ÁGUA COMO BEM PÚBLICO A Constituição Federal de 1988 já havia promovido a publicização das águas, inexistindo a partir de então quaisquer águas privadas no âmbito do direito brasileiro, como já foi visto. Neste sentido, a Lei nº 9.433/97 não só reafirmou o disposto na Lei Maior, como estabeleceu um de seus fundamentos básicos. Maria Luiza Machado Granziera explica a origem da tendência mundial a publicização dos recursos hídricos, ao definir: “Quanto maior a importância de um bem à sociedade, maior a tendência a sua publicização, com vista na obtenção da tutela do Estado e da garantia de que todos poderão a ele ter acesso, de acordo com os regulamentos estabelecidos. No que se refere às águas, as coisas não passam de forma diferente”.177 As águas são bens públicos e se classificam entre aqueles de uso comum do povo, entretanto há divergência acerca desta classificação. Cesar Antonio Pacheco Fiorillo chega a afirmar que o inc. I, do art. 1º, da referida SANTILLI, Juliana. Aspectos Jurídicos da Política Nacional de Recursos Hídricos. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p.2. – verificar página 176 GRANZEIRA, Maria Luiza Machado. Direito de águas: disciplina jurídica das águas doces. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 88. 177 68 – Água na Visão do Direito lei, é inconstitucional face ao art. 225 caput da Constituição Federal, enquadrando o autor, a água como bem ambiental de natureza jurídica difusa, nestes termos: “(...) preceituou-se que a água é um bem de domínio público. Tal assertiva padece de inconstitucionalidade, porquanto, conforme foi demonstrado, a água é um bem tipicamente ambiental, sendo portanto, de uso comum do povo, e, em conformidade com a Lei nº 8.078/90 (art. 81, parágrafo único, I), bem difuso”.178 Não obstante esta parcela da doutrina que considera a água como bem ambiental difuso, a outra corrente defende que os recursos hídricos, por serem elementos constitutivos do meio ambiente, se enquadram no art. 225 da Constituição Federal, quando afirma: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo (...)”. Ora, se o Legislador Constituinte procedeu à classificação de meio ambiente, e sendo a água um de seus elementos constitutivos, a ela se aplica a mesma classificação, sendo, portanto, bem público de uso comum do povo. Neste sentido, Paulo Affonso Leme Machado dispõe, “A água como um dos elementos do meio ambiente. Isso faz com que se aplique à água o enunciado do caput do art. 225 da CF”.179 João Hélio Pes mantém essa posição: “A nossa Constituição Federal, no capítulo do meio ambiente, ao definir todos os bens ambientais como de uso comum do povo, não exclui desse rol a água – bem fundamental para preservação da vida no planeta”.180 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 104. 178 179 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 421. 180 PES, João Hélio. Água para todos. Zero Hora, Porto Alegre, 14 fev. 2005. Caderno, p. 17 Água na Visão do Direito – 69 Posição essa compartilhada também por Eduardo Coral Viegas, dentre outros: “(...) fácil é perceber que a norma, ao mencionar que o meio ambiente, é um bem de uso comum do povo, estava procedendo a sua classificação e, logicamente, à da água (...)”.181 Há de se salientar que esse conceito de bem público não importa em propriedade do bem pela administração pública. Não se pode confundir bem de uso comum do povo, do qual a água faz parte, com bem de uso dominical. Maria Sylvia Zanella di Pietro ressalta como bens públicos: “àqueles que, por determinação legal ou sua própria natureza, podem ser utilizados por todos em igualdade de condições, sem necessidade de consentimento individualizado por parte da Administração”.182 Já quanto aos bens públicos dominicais define como sendo àqueles que: “constituem o patrimônio da União, dos Estados ou Municípios, como objeto de direito pessoal ou real de cada uma dessas entidades, caracterizando por serem alienáveis”.183 Para Paulo Affonso Leme Machado a característica de bem público dos recursos hídricos é: “(...) não transforma o Poder Público federal e estadual em proprietário da água, mas torna-o gestor desse bem, no interesse de todos”.184 181 VIEGAS, Eduardo Coral. Visão Jurídica da Água. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 89. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 14ª 2002. p. 560. 182 183 ed. São Paulo: Atlas, Idem MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 421. 184 70 – Água na Visão do Direito E continua, deixando claro que não se trata de bem dominical, neste termos: “Indique-se o art. 18 da Lei 9.433/97 para atestar que a água não faz parte do patrimônio privado do Poder Público, ao dizer: ‘A outorga não implica alienação parcial das águas que são inalienáveis, mas o simples direito de uso’. A inalienabilidade das águas marca uma de suas características como bem de domínio público”.185 No mesmo sentido João Hélio Pes, discorre que: “esse é um bem ao qual as pessoas não se atrelam por meio do instituto da propriedade. A propriedade é baseada na idéia de usar, gozar, fruir e fazer o que se bem entende, idéia essa que não é possível aplicar ao ‘bem ambiental”, tanto pelo agente público como pelo particular”.186 3.1.2.2 A ÁGUA COMO UM RECURSO NATURAL LIMITADO E DOTADO DE VALOR ECONÔMICO O inciso II, do art. 1º, da Lei nº 9.433/97 traz em seu bojo a conscientização de que a água vem se tornando um bem escasso. Embora pareça abundante é sabido que apenas 2,8% são águas doces, das quais 2,15% são geleiras e calotas polares, 0,31% constituem águas subterrâneas e somente 0,34% da água total existente estão disponíveis para o consumo humano imediato, sob forma de rios, riachos, lagos e reservatórios acessíveis.187 Até pouco tempo sustentava-se que a água era um recurso natural inesgotável devido à sua condição cíclica. Entretanto, embora seja um recurso natural renovável, a água é um recurso natural finito, uma vez que vários fatores interferem na sua disponibilidade. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 423 185 186 PES, João Hélio. Água para todos. Zero Hora, Porto Alegre, 14 fev. 2005. Caderno, p. 17 187 CABRAL, Bernardo. O ouro do século XXI. In Cidadania e Justiça, Brasília: Diretoria da Associação Magistrados Brasileiros, n.º 12, p. 89, 2º semestre de 2002. Água na Visão do Direito – 71 Luiz Antônio Timm Grassi analisa estes fatores que interferem na questão da limitação dos recursos hídricos, nos seguintes termos: “Hoje com o crescimento demográfico e econômico, multiplicam-se os usos das águas e crescem rapidamente suas demandas, embora a quantidade global disponível seja sempre a mesma. Abastecimento humano, dessedentação de animais, indústria, agricultura, navegação, geração de energia elétrica, pesca, esportes, diluição e biodegradação de esgotos urbanos e industrias, e outros mais, são os usos que estão se intensificando cada vez mais tanto global quanto localizadamente”.188 Além da questão relativa à quantidade da água, existe também o problema da poluição dos mananciais. O que leva a crer que a situação da escassez das águas pode ser tanto quantitativa como qualitativa, ou, em alguns casos, incidindo estas duas formas. Configurada a situação de escassez não se pode mais considerar a água como um bem inesgotável, mas sim limitado na confrontação de sua disponibilidade com suas demandas. Roberto Luis Troste e Francisco Mochon ao conceituarem bem econômico expõem, “os bens econômicos caracterizam-se pela utilidade e pela escassez [...]. Os bens livres – [...] são àqueles cuja quantidade é suficiente para satisfazer a todo o mundo”.189 Portanto, torna-se clara a classificação de água como bem econômico, uma vez que ela não está disponível nas mesmas condições, tornando-o um recurso “raro”, seja ela relativa à quantidade ou qualidade. Nesse diapasão, Eldis Camargo Neves da Cunha ensina: “(...) o legislador pátrio dotou a água de valor econômico. É necessário lembrar que este propósito está embasado nas considerações constitucionais do art. 170, inc. VI, ou seja, entre os princípios econômicos está a defesa do meio ambiente. Nesse sentido as verificações das metodologias de valoração GRASSI, Luiz Antonio Timm. Direito à água. Porto Alegre. Seção Câmara Técnica de Recursos Hídricos. Disponível em www.abes-rs.org.br/rechid/direito-a-agua.htm. Acesso em 17 fev. 2005. 188 189 TROSTER, Roberto Luis e MOCHON, Francisco. Introdução à Economia. São Paulo: Makron Books, 1999. p.7. 72 – Água na Visão do Direito do bem ambiental devem estar referenciadas nas teorias econômicas que abraçam as externalidades”.190 Concatenado a essa nova realidade o legislador dispôs em seu art. 19, I da Lei nº 9.433/97, a obrigatoriedade da cobrança pelo uso dos recursos hídricos. É bom deixar claro que, hoje, o que se paga é o serviço de captação de água e seu tratamento, e que, quando começar a ser posto em prática o instrumento imposto pela Lei das Águas se estará cobrando a utilização em si do recurso. Sobre isto Vladimir Passos de Freitas alerta “é evidente que o termo é polêmico e que acarreta sérias conseqüências econômicas” e diz mais “imagine-se a título de exemplo, uma indústria que venha utilizando há anos as águas de um rio e que se veja obrigada, agora, a pagar pelo uso. É óbvio que isso representará um custo maior e exigirá da empresa um realinhamento de suas contas”.191 O objetivo principal que se busca com o emprego da cobrança de uso dos recursos hídricos é “reconhecer a água como um bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor” (art. 19, I, da Lei nº 9.433/97). Nas palavras de Luis Paulo Sirvinskas: “(...) fazer com que o usuário não a desperdice, utilizando-a de forma racional. É uma forma de o Poder Público obter os recursos financeiros necessários para o financiamento dos programas e intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos (art. 19, II e III, da Lei n. 9.433/97)”. 192 CUNHA, Eldis Camargo Neves da. Desafios Jurídicos na Gestão dos Recursos Hídricos m face dos Instrumentos da Política Nacional: Papel da Agência Nacional das Águas. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p.2. 190 FREITAS, Vladimir Passos de. Águas – Considerações Gerais. In _____. Águas: Aspectos Jurídicos e Ambientais. Curitiba: Juruá, 2000. p.22. 191 192 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 134. Água na Visão do Direito – 73 Entretanto, como alerta Paulo Affonso Leme Machado: “isso não pode e nem deve levar a condutas que permitam que alguém, através do pagamento de um preço, possa usar a água a seu bel-prazer. A valorização econômica da água deve levar em conta o preço da conservação, da recuperação e da melhor distribuição desse bem”.193 A água como bem econômico, portanto, está intimamente relacionada com a cobrança pelo uso dos recursos hídricos. Busca-se através deste instrumento uma maior conscientização por parte dos consumidores, utilizando-a de forma racional a fim de que seja preservada para as gerações futuras. Razão pela qual, pequenos usos, para satisfazer as necessidades pessoais, não estarão sujeitos à cobrança. 3.1.2.3 USO MÚLTIPLO E USO PRIORITÁRIO DOS RECURSOS HÍDRICOS A Política Nacional de Recursos tem como regra geral de uso o disposto no inc. IV, do art. 1º, a saber, “a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas”, em detrimento dos privilégios que eram dados ao setor hidroenergético. Isto se dá, porquanto, é sabido que a água não somente é essencial à sobrevivência do ser vivo, especialmente o homem, como também à toda e qualquer atividade por ele exercida, seja ela comercial, agrícola, recreativa, esportiva, industrial, etc. Raymundo José Santos Garrido explica o surgimento do princípio dos usos múltiplos nos seguintes termos: “Ora, o crescimento da população urbana, com o conseqüente aumento da demanda por produtos, em especial por alimentos, deu lugar ao florescimento do princípio dos usos múltiplos, porque alguns setores – e o carro-chefe desse processo foi a agricultura irrigada – passaram a apresentar seus reclamos contra a assimetria de tratamento que era conferida pelo Poder central aos diversos usuários da água, privilegiando de todas as formas o setor hidroenergético”.194 193 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 427. GARRIDO, Raymundo José Santos. Água, uma preocupação mundial. In Revista Centro de Estudos Jurídicos, Brasília, n.12, p. 08, set/dez. 2000 p.11. 194 74 – Água na Visão do Direito Torna-se notório que a gestão dos recursos hídricos se dê no sentido de garantir os usos múltiplos, ou seja, uso urbano, industrial, geração de energia elétrica, navegação, lazer, irrigação, etc. Assim, conforme ensina Silviania Lúcia Henkes, “o Poder Público responsável pela concessão de outorgas está proibido de conceder outorgas que favoreçam um uso em detrimento dos demais”.195 Nas situações de escassez, porém, deve ser observado o estipulado no inciso III do dispositivo legal, ou seja, garantir o uso prioritário dos recursos hídricos, qual sejam: o consumo humano e a dessedentação dos animais. Sobre isto, Juliana Santilli expõe: “Os dois fundamentos estão intimamente ligados e dizem respeito, basicamente, à tendência moderna de legislações nacionais e tratados internacionais de buscar um equilíbrio entre os diversos usos de águas, estabelecendo-se as prioridades a partir das necessidades sociais vigentes”.196 No entanto, tem-se que observar qual a amplitude dos termos “consumo humano” e “dessedentação animal”. Consumo humano compreende somente o uso para as necessidades mínimas de cada pessoa, isto é, água para beber, para comer e para higiene, enquanto que dessedentação animal é estrita, não incluindo-se utilização de água para o abate e o processo de comercialização de animais, conforme Paulo Affonso Leme Machado.197 As conseqüências jurídicas da escassez deverão ser a suspensão imediata da outorga por parte do Poder Público concedente, conforme permissivo do art. 15, inc. V ou, ainda, inc. III da Lei nº 9.433/97. Fernando Quadros da Silva afirma que o Poder Público, com a Lei das Águas, têm instrumentos para combater uma atividade muito comum em épocas de seca, qual seja, a atividade ilegal de venda de água.198 Seja ela HENKES, Silviana Lúcia. Política nacional de recursos hídricos e sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos . Jus Navegandi, Teresina, a. 7, n. 64, abr. 2003. Disponível em http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3970. Acesso em: 06 abr. 2005. 195 SANTILLI, Juliana. Aspectos Jurídicos da Política Nacional de Recursos Hídricos. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p. 4 196 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 428 197 198 SILVA, Fernando Quadros da. A gestão dos recursos hídricos após a Lei 9.433, de 08 de Janeiro de 1997. In FREITAS, Vladimir Passos de. Direito Ambiental em Evolução. Curitiba: Juruá, 1998. p. 87. Água na Visão do Direito – 75 pelo vendedor não ter a respectiva outorga ou tendo, por não ter observado o uso prioritário, podendo e devendo ser suspensa sua outorga de pronto, como medida cautelar administrativa, e instauração de processo administrativo. 3.1.2.4 BACIAS HIDROGRÁFICAS COMO UNIDADE TERRITORIAL O legislador adotou a bacia hidrográfica como a unidade territorial para a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Ao fazer isso o Brasil seguiu uma tendência já consolidada em vários países, principalmente o modelo adotado pela França. A partir da Lei nº 9.433/97 a gestão passa a ser por bacia hidrográfica em detrimento de uma abordagem pontual das águas, não mais se baseando em fronteiras administrativas e políticas dos entes federados. O princípio de que a bacia hidrográfica é a unidade físico-territorial de planejamento e gerenciamento das águas, já havia sido adotado por alguma das leis estaduais que antecederam à lei federal, dentre elas a Lei das Águas gaúcha. Rodrigo Andreotti Mussetti alerta que: “A bacia hidrográfica deve ser entendida como sendo a unidade ecossistêmica e morfológica que permite a análise e entendimento dos problemas ambientais. Ela também é perfeitamente adequada para um planejamento e manejo, buscando otimizar a utilização dos recursos humano e natural, para estabelecer um ambiente sadio e um desenvolvimento sustentado”.199 Não obstante a Lei nº 9.433/97 não ter estabelecido um conceito para bacia hidrográfica ela deve ser entendida como a “área de captação natural da água da precipitação que faz convergir os escoamentos para um único ponto de saída, seu exutório”.200 Ao que Paulo Affonso Leme Machado completa “a ‘bacia hidrográfica, ao abranger os cursos de água, não MUSETTI, Rodrigo Andreotti. Bacias Hidrográficas no Brasil: Aspectos JurídicoAmbientais. Seção Doutrina, Disponível em http://www.universojuridico. com.br . Acesso em 20 jan. 2005. 199 SILVEIRA, André L.L. da. Ciclo hidrológica e Bacia Hidrográfica. In TUCCI, Carlos E. M. (org.). Hidrologia: ciência e aplicação.2 ed. Porto Alegre:Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul: ABRH, 2001. p. 40. 200 76 – Água na Visão do Direito está necessariamente abrangendo os aqüíferos, ou seja, a ‘bacia hidrogeológica’”.201 Entretanto, quanto a este assunto, Raymundo José Santos Garrido, assim se manifesta: “O principio da bacia hidrográfica como unidade de planejamento foi muito questionado, no início, em razão de não abranger as águas subterrâneas, mas veio a ter as dúvidas dissipadas, quando optou-se, harmonicamente, pela eleição de conceito de ‘bacia holística’, ou seja, àquela que congrega todo o conjunto, toda a universalidade dos problemas que estejam em bacias colidentes e em camadas subjacentes do solo”.202 A aplicação prática do princípio se dará com os Comitês de Bacias Hidrográficas, também criados por Lei, que serão compostos por representantes da União, Estados, DF, Municípios, dos usuários de águas e das entidades civis dedicadas à bacia hidrográfica. Tendo como principais objetivos estabelecer metas a serem atingidas pela execução dos Planos de Bacia. Portanto, a adoção da bacia hidrográfica como unidade de planejamento foi um grande avanço alcançado pelo nosso legislador, mas para ser posto em prática dependerá da efetiva articulação entre os representantes que comporão os Comitês de Bacia. Neste sentido, conforme Luiz Antônio Timm Grassi203 , a do Rio Grande do Sul está com praticamente todos os seus comitês instalados ou em fase de instalação, assim como os Estados de São Paulo e Ceará. 3.1.2.5 GESTÃO DESCENTRALIZADA E PARTICIPATIVA O último dos fundamentos da Lei nº 9.433/97 afirma que a gestão dos recursos hídricos deverá ser descentralizada e participativa. Isto é, para o 201 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 430 GARRIDO, Raymundo José Santos. Água, uma preocupação mundial. In Revista Centro de Estudos Jurídicos, Brasília, n.12, p. 11, set/dez. 2000. 202 GRASSI, Luiz Antônio Timm. Os comitês de bacia. Porto Alegre. Seção Câmara Técnica de Recursos Hídricos. Disponível em www.abes-rs.org.br/rechid/direito-a-agua.htm. Acesso em 17 fev. 2005. 203 Água na Visão do Direito – 77 sucesso de uma mentalidade voltada ao uso racional das águas, como de qualquer política ambiental, é fundamental a participação popular. A descentralização se dará no âmbito da gestão dos recursos hídricos, isto na medida em que a Lei das Águas previu a criação dos Comitês de Bacias Hidrográficas e das Agências de Águas. Mas, Julio Thadeu Silva Kettelhut, alerta que: “o princípio da descentralização [...], não se prende somente aos aspectos de natureza administrativa, mas também aos de ordem técnica. Estes dizem respeito aos estudos realizados sem participação e envolvimento dos setores objeto dos mesmos”.204 Então, como nos ensina Paulo Affonso Leme Machado205 , transferiram-se as atribuições tradicionais da União e dos Estados para estes órgãos hídricos. Ao que Raymundo José dos Santos Garrido completa entendendo que o legislador ao consagrar a gestão descentralizada como um dos fundamentos da Política Nacional de Recursos Hídricos, baseou-se na seguinte filosofia: “o gerenciamento de recursos hídricos deve ser feito nos níveis hierárquicos do governo mais baixos e apropriados. Em outras palavras, o que pode ser resolvido na área da bacia hidrográfica não deve ser decidido na capital do Estado ou do país por órgãos mais elevados na hierarquia do serviço público”.206 Esta descentralização já havia sido discutida na Agenda 21, além disso encontra mais respaldo no Brasil. Decorrente das grandes dimensões do país, da sua grande variedade de culturas e principalmente de suas desigualdades no que diz respeito à quantidade e qualidade de água disponível, KETTELHUT, Julio Thadeu Silva. Importância da comunicação na implementação dos recursos hídricos no Brasil. In Revista Centro de Estudos Jurídicos. Brasília, n. 12, p. 22, set/dez. 2000. 204 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 432 205 GARRIDO, Raymundo José Santos. Água, uma preocupação mundial. In Revista Centro de Estudos Jurídicos, Brasília, n.12, p. 08-12, set/dez. 2000 p.11. 206 78 – Água na Visão do Direito o que torna praticamente impossível executar um gerenciamento de forma centralizada, tanto em nível federal quanto estadual207 . No que diz respeito à participação, a lei procurou garantir que as decisões sobre gerenciamento se dêem no âmbito do Comitê de Bacia Hidrográfica e, portanto, com a participação dos diversos segmentos interessados. Uma vez que são compostas, nos termos do art. 39 da Lei nº 9.433/97 de representantes “I – da União; II – dos Estados e do Distrito Federal cujos territórios se situem, ainda que parcialmente, em suas respectivas áreas de atuação; III – dos Municípios situados, no todo ou em parte, em sua áreas de atuação; IV – dos usuários das águas de sua área de atuação e V – das entidades civis dos recursos hídricos com atuação comprovada na bacia”. Para garantir uma igualdade entre esses participantes, evitando que o Poder Público se torne o verdadeiro gestor sob um manto de democratização, o legislador ainda previu que a somatória dos representantes dos três níveis do Poder Executivo (Federal, Estadual e Municipal) seja de no máximo 50% do total de membros. Entretanto, o Conselho Nacional dos Recursos Hídricos, através da Resolução nº 05/00 redimensionou, estabelecendo que os comitês serão formados com 40% de representantes do Poder Executivo, 20% de representantes de entidades civis e 40% de representantes dos usuários.208 Entretanto, a doutrina é unânime ao afirmar que o êxito da democratização na gestão de recursos hídricos depende de um processo transparente, o que se dará com o acesso dos participantes a constantes e organizadas informações, o que será posto em prática com a criação do Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos. Neste sentido encontram-se Paulo Affonso Leme Machado, Julio Thadeu Silva Kettelhuut, Juliana Santilli, Gilberto Valente Canali, dentre outros. 3.1.3 DIRETRIZES DE AÇÃO As principais diretrizes de ação, que deverão ser observadas por aqueles que irão gerir os recursos hídricos são: I – a gestão sistemática dos recursos CANALI, Gilberto Vicente. Descentralização e Subsidiariedade na gestão de recursos hídricos – uma avaliação da sua recente evolução em face da Lei 9.433/97.In FREITAS, Vladimir Passos de. Direito Ambiental em Evolução. Curitiba: Juruá, 1998. p. 126 207 HENKES, Silviana Lúcia. Política nacional de recursos hídricos e sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos . Jus Navegandi, Teresina, a. 7, n. 64, abr. 2003. Disponível em http://www1.jus.com.br/doutrina/texto. asp?id=3970. Acesso em: 06 abr. 2005. 208 Água na Visão do Direito – 79 hídricos, sem dissociação dos aspectos de quantidade e qualidade; II - a adequação da gestão de recursos hídricos às diversidades físicas, bióticas, demográficas, econômicas, sociais e culturais das diversas regiões do País; III - a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental; IV - a articulação do planejamento de recursos hídricos com o dos setores usuários e com os planejamentos regional, estadual e nacional; V - a articulação da gestão de recursos hídricos com a do uso do solo; VI - a integração da gestão das bacias hidrográficas com a dos sistemas estuarinos e zonas costeiras (art. 3º da Lei nº 9.433/97). Em vista disso, percebe-se que as diretrizes gerais de ação estão de acordo com os objetivos e fundamentos da Política Nacional de Recursos, bem como, com a Constituição Federal que determina o desenvolvimento sustentável. Juliana Santilli explica que: “a premissa básica é de que a água é necessária em todos os aspectos da vida, e que a escassez generalizada, a destruição gradual e o agravamento da poluição dos recursos hídricos exigem o planejamento e a gestão integrada desses recursos, o que a Lei nº 9.433/97 procura consolidar”.209 Estabelecem as diretrizes que a gestão hídrica deve ser concatenada com a gestão ambiental, como não poderia deixar de ser, uma vez que a água é um recurso natural e como tal depende de outros recursos para sua existência sadia. Como exemplifica Paulo Affonso Leme Machado: “o planejamento ambiental concernente à fauna (aquática e terrestre), as florestas, o uso do solo e de agrotóxicos, a instalação de indústrias, a renovação de antigas indústrias e o zoneamento ambiental das bacias hidrográficas são algumas das matérias que devem ser levadas em conta na gestão das águas".210 A gestão não dissociará os aspectos da quantidade e da qualidade, com isso, conforme Juliana Santilli, está se entendendo a água a partir do binômio quantidade/qualidade. Fica claro que estas nuances não podem ser SANTILLI, Juliana. Aspectos Jurídicos da Política Nacional de Recursos Hídricos. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p. 8. 209 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p.435. 210 80 – Água na Visão do Direito dissociadas, uma vez que o uso dos recursos hídricos afeta, inegavelmente, ambos padrões. Édis Milare, por outro lado, observa que estas diretrizes de ação: “[...] visam à superação da dicotomia entre a gestão da qualidade e da quantidade, hoje ainda existente e, de certo modo, persistente na mentalidade de vários setores da Administração Pública, que não acompanharam a evolução da política ambiental”.211 A gestão ainda deve levar em conta as diferenças físicas, bióticas, demográficas, econômicas, sociais e culturais das diversas regiões do País, bem como atentar para as diferenças que existem entre bacias hidrográficas, tendo em vista que a gestão dos recursos hídricos depende dessas observações para que se obtenha sucesso. E ainda estabelecem que há a inserção do dever para a União articular-se com o Estado para o gerenciamento dos recursos hídricos de interesse comum, ao que Paulo Affonso Leme Machado afirma ser de grande relevância, “pois a União não poderá deixar de participar dos organismos que vão implementar a política dos recursos hídricos, sejam as águas de seu domínio ou não”. 212 3.1.4 INSTRUMENTOS A Lei nº 9.433/97 estabelece os instrumentos para possibilitar a implementação da Política Nacional dos Recursos Hídricos, quais sejam: I – Planos de Recursos Hídricos; II – Enquadramentos dos corpos d’água; III – Outorga de Uso dos Recursos Hídricos; IV – Cobrança pelo Uso da Água e V – Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos. 3.1.4.1 PLANOS DE RECURSOS HÍDRICOS Os Planos de Recursos Hídricos são planos diretores que visam fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e seu gerenciamento (art. 6º). Isto é, a formulação dos planos de recursos MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: doutrina – prática – jurisprudência – glossário. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 395. 211 212 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 436. Água na Visão do Direito – 81 hídricos tem como fundamento orientar a administração dos recursos hídricos, segundo José Raymundo dos Santos Garrido, e são documentos 213 programáticos do setor na área do planejamento. Edis Milaré explica a necessidade dos Planos de Recursos Hídricos, nos seguintes termos: “a gestão hídrica depende do planejamento institucionalizado, não podendo o uso das águas ser condicionado apenas a planos setoriais e, o que é pior, à decisão de cada caso concreto, sem vinculação com o planejamento de uso dos recursos hídricos da bacia. O Plano visa, entre outras coisas, a evitar ou coibir casuísmo”.214 A confecção dos Planos de Bacia é atribuição das Agencias da Água e deve ser aprovado pelos Comitês de Bacia, conforme os arts. 44, X e 38, III da Lei nº 9.433/97. Ressalta-se a importância desse procedimento, pois, conforme Ana Graf, essas são “as instâncias de maior participação social do sistema de gerenciamento de recursos hídricos”.215 Maria Luiza Machado Granziera, quanto à atribuição dos Comitês de Bacia para aprovar o Plano, diz: “como garantia de efetividade do processo de elaboração do plano, está diretamente relacionada com o sistema de decisão que tiver sido adotado por parte de cada comitê, em sua instalação. Em outras palavras, é necessário que o sistema decisório do Comitê seja de tal forma estabelecido que necessariamente seja exarada uma decisão, por maioria, ou por outro critério que possa representar o desejo predominante de seus integrantes”.216 GARRIDO, Raymundo José Santos. Água, uma preocupação mundial. In Revista Centro de Estudos Jurídicos, Brasília, n.12, p. 08-12, set/dez. 2000 p.11. 213 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: doutrina – prática – jurisprudência – glossário. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 396. 214 GRAF, Ana. Enquadramento de corpos d’água de domínio dos Estados e os Planos de Recursos Hídricos. In Revista de Direitos Difusos. São Paulo:ADCOAS, 2002, v.16, p.2111-21115, p 2115. 215 GRANZEIRA, Maria Luiza Machado. Direito de águas: disciplina jurídica das águas doces. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 136. 216 82 – Água na Visão do Direito Entretanto, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos, precavendo-se do fato dos locais em que ainda não tenham Agência da Água ou Comitês de Bacia, editou a Resolução nº 17, estabelecendo as diretrizes para os Planos de Bacias. Em seu art. 3º, a Resolução reza que: “enquanto não for criada a Agência de Bacia e não houver delegação para consórcios ou associações para exercer esse papel, os Planos podem ser elaborados pelas entidades ou órgãos gestores de recursos hídricos, conforme a dominialidade do corpo hídrico”.217 E continua afirmando que: “caso não esteja formado o Comitê de Bacia, também as entidades gestoras, com a participação dos usuários e da serão responsáveis pela proposta do Plano”.218 Estes planos serão elaborados por bacia hidrográfica, por Estado e para o País e devem ser devidamente integrados, surgindo, primeiramente, nas bacias hidrográficas, demonstrando sincronia com o restante da lei, uma vez que estas são a unidade de planejamento da Política Nacional de Recursos Hídricos, para depois serem elaborados nos Estados levando-se em consideração as prioridades apontadas nos planos de bacia e, enfim, o Plano Nacional de Recursos Hídricos, que agregara as prioridades estaduais.219 Entretanto, os Planos estaduais não serão um simples somatório dos Planos de bacia existentes no Estados, assim como o Plano Nacional, dos Planos estaduais. Deverão ser levados em conta os dados e prioridades apontadas fazendo uma interação, de forma a ficarem em consonância. Entretanto, esse alcance dos Planos de Recursos Hídricos é alvo de muitas críticas, uma vez que, sua elaboração com áreas ou unidades 217 CUNHA, Eldis Camargo Neves da. Desafios Jurídicos na Gestão dos Recursos Hídricos m face dos Instrumentos da Política Nacional: Papel da Agência Nacional das Águas. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p.. 9. 218 Idem. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 437. 219 Água na Visão do Direito – 83 territoriais diversas, fatalmente acarretará conflitos.220 Quanto a isto Paulo Affonso Leme Machado afirma que tríplice pode ser a abrangência territorial do plano e continua: “O Plano de Recursos Hídricos estadual não ira planejar somente para os limites políticos do Estado, mas para a realidade de todas as bacias e sub-bacias hidrográficas, levando em conta suas relações hídricas com os outros Estados brasileiros e até com países vizinhos. Daí caminha-se naturalmente para o Plano Nacional de Recursos Hídricos”.221 O art. 7º dispõe sobre o conteúdo mínimo que deverá conter todos os planos de recursos hídricos. Conforme salienta Paulo Affonso Leme Machado, “o conteúdo do Plano dos Recursos Hídricos é de ordem pública. Quando a lei diz que há um conteúdo mínimo, ela está indicando a sua indispensabilidade”.222 Assim, são obrigatórios em todos os Planos de recursos hídricos: I – diagnóstico da situação atual dos recursos hídricos; II – análise de alternativas de crescimento demográfico, de evolução de atividades produtivas e de modificações dos padrões de ocupação do solo; III – balanço entre disponibilidades e demandas futuras dos recursos hídricos, em quantidade e qualidade, com identificações de conflitos potenciais; IV – metas de racionalização de uso, aumento da quantidade e melhoria da qualidade dos recursos hídricos disponíveis; V – medidas a serem tomadas, programas a serem desenvolvidos e projetos a serem implantados, para o atendimento das metas previstas; VI – (VETADO); VII – (VETADO); VIII – prioridade para outorga de direitos de uso dos recursos hídricos, IX – diretrizes e critérios para a cobrança pelo uso dos recursos hídricos e X – propostas para a criação de áreas sujeitas à restrição de uso, com vistas à proteção dos recursos hídricos. 3.1.4.2 ENQUADRAMENTO DOS CORPOS DE ÁGUA EM CLASSES SEGUNDO OS USOS PREPONDERANTES Outro instrumento da Política Nacional de Recursos Hídricos é o enquadramento dos corpos de água em classes segundo os usos preponderantes. SANTILLI, Juliana. Aspectos Jurídicos da Política Nacional de Recursos Hídricos. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p.10. 220 221 Idem, p. 439. 222 Idem, p. 440. 84 – Água na Visão do Direito Isso visa assegurar às águas qualidade compatível com os usos mais exigentes a que forem destinadas e diminuir os custos de combate à poluição mediante ações preventivas permanentes. A classificação das águas é regida pela Resolução CONAMA nº 357/ 05, conforme já foi visto. Em seu art. 2º, essa Resolução traz as distinções entre águas doces, salobras e salinas, de acordo com a qualidade de sal dissolvido que cada uma contém. Assim cada um desses tipos de água é dividido em classes de qualidade requerida para seus usos preponderantes. Entretanto, poderão ser aproveitadas em usos menos exigentes, desde que não prejudique a qualidade da água. Maria Luiza Granziera salienta que: ”Essa classificação possui um sentido de proteção, não da água propriamente, mas da saúde pública, pois é evidente a preocupação em segregar a água que pode ser utilizada para, por exemplo, irrigar hortaliças que se consomem cruas. Ou, ainda, a água que serve para abastecimento sem prévia desinfecção, sem, é claro, expor a população a riscos de contaminação por vetores hídricos. Mais que isso, nota-se uma preocupação com o fator econômico, em relação aos custos de desinfecção da água para abastecimento público”.223 Assim como nos consideranda a Resolução estabelece que a saúde e o bem-estar humano, bem como o equilíbrio ecológico aquático, não devem ser afetados pela deterioração para a qualidade das águas, salienta também que esse enquadramento deve estar baseado não necessariamente no seu estado atual, mas nos níveis de qualidade que deveriam possuir para atender às necessidades da comunidade. A importância deste enquadramento, segundo ensinamentos de Maria Luiza Machado Granziera, consiste no fato de que indiretamente acaba transformando-se num mecanismo de controle de uso e ocupação do solo. Ao passo que se determinado curso de água doce está enquadrado no nível especial, seu trecho fica restrito a empreendimentos que sejam compatíveis com os tipos de usos. A competência para propor o enquadramento aos comitês de bacia é das Agências de Água, conforme art. 44, XI, “a”. Após a aprovação pelos GRANZEIRA, Maria Luiza Machado. Direito de águas: disciplina jurídica das águas doces. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 141 223 Água na Visão do Direito – 85 Comitês de Bacia, estes encaminharão a proposta para aprovação do Conselho Estadual ou Federal de Recursos Hídricos, conforme o domínio do respectivo curso de água. Os referidos Conselhos, conforme Paulo Affonso Leme Machado: “poderão concordar com a atual classificação das águas ou concordar com as proposições do estabelecimento de novos níveis de qualidade a serem alcançados. A lei comentada, em seu art. 35, não concedeu, contudo, competência a este conselho para efetuar uma nova classificação”.224 Após a aprovação e adoção do enquadramento, compete aos órgãos públicos, gestores dos recursos hídricos, fiscalizar, monitorar e controlar para verificar se as metas estão sendo cumpridas. Trata-se de típico exercício de poder de polícia administrativo do poder público sobre o bem público “água”. 3.1.4.3 OUTORGA DE USO DOS RECURSOS HÍDRICOS 3.1.4.3.1 A ÁGUA COMO OBJETO DE DIREITO DE USO ONEROSO CONCEITO DE DIREITO DE USO Direito de uso é o instituto jurídico de direito administrativo pelo qual o poder público, União, Estados ou o Distrito Federal, atribui a outrem, ente público ou privado, o direito de uso do bem público água de forma onerosa. O uso da água pelo terceiro impõe a obrigação de que este a destine para sua própria finalidade que, no entanto, pode ser limitada pela Administração Pública, porém nunca desvirtuada de seu fim natural. Portanto, no âmbito de exação da outorga não está o direito de disposição, circunscrevendo-se apenas ao simples direito de uso, conforme preconiza o art. 18, da Lei nº 9.433/97. No direito de uso de bem público o usuário sequer pode não usar o bem porque, por sua natureza pública, o bem público precisa cumprir a sua finalidade de produzir benefícios para o povo. Se o faz no tempo de três anos sofre a sanção de ver suspensa a outorga de forma definitiva (art. 15 inc. I da Lei nº 9.433/97), situação típica de rescisão contratual. O direito de uso, como já mencionado, é instituto típico de direito administrativo, o que o coloca no rol temático de direito público e, dessa 224 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 445. 86 – Água na Visão do Direito forma, não se confunde com os contratos de locação, arrendamento, comodato ou até mesmo o direito real de uso que são contratos tipicamente privados. O direito de uso da água por terceiros surge da conveniência e da oportunidade administrativa de delegar a outrem a gestão de um bem que por força de lei é considerado de domínio público e que, por isso mesmo, deve aquele que detém a sua titularidade destinar este bem à sua finalidade natural. Não pode o terceiro exigir da Administração Pública a outorga do direito de uso da água porque outorgar é função precipuamente administrativa e inserida no seu poder discricionário. Mesmo nos casos de outorga individualizada a Administração Pública deve analisar a conveniência e a oportunidade de outorgar o uso tendo sempre presente o primado do interesse público sobre o privado. A água, como um bem de domínio público, deve, como princípio fundamental, ser administrada pelo próprio ente público a quem a Constituição Federal legitimou competência para administrá-la. A outorga é a faculdade de repassar esta administração a terceiros. A Lei nº 9.433, de 08 de janeiro de 1997, quando trata da outorga do direito de uso da água, apenas formaliza o modus faciende de como deve ser operacionalizada a delegação de uso desse bem público ao terceiro. É o poder legislativo legitimando a Administração Pública a repassar a gestão de um bem público, que em princípio seria da própria administração, a outrem. A autorização legislativa não elegeu a forma de como a Administração Pública deva proceder perante o terceiro. Apenas “autorizou” a delegação através do instituto jurídico que chamou de “outorga”. A União, o Estado ou o Distrito Federal, nas águas que lhes compete administrar, é quem, no exercício do típico poder discricionário, decidirá se essa ou aquela água será objeto de direito de uso. Outorgado o uso, contudo, não perde a Administração Pública concedente o controle da delegação. Em outras palavras, a água será apenas usada pelo outorgado, mas, se este não cumprir os termos da outorga, não usá-la por três anos consecutivos, houve necessidade premente para atender situações de calamidade, de prevenção ou reversão de degradação ambiental, houve necessidade para atender usos prioritários de interesse coletivo ou navegabilidade do corpo de água a outorga de direito de uso poderá ser suspensa parcial ou totalmente, em definitivo ou por prazo determinado. As causas suspensivas da outorga, no entanto, decorrerão de processo administrativo em que seja garantido o contraditório, a ampla defesa, a motivação e a possibilidade de recurso, princípios garantistas estabelecidos pela Constituição Federal através do art. 5º, inc. LIV e LV. Água na Visão do Direito – 87 No Rio Grande do Sul é motivo de grande polêmica definir-se se as águas administradas pelo Estado devem ou não integrar o projeto de lei que estabelece que os serviços de captação, distribuição e tratamento de água podem ser objeto de parceria público-privada, isso porque o art. 2º, § 2º, do Projeto de Lei nº 027/2004, que vedava essa possibilidade, foi vetado pelo Senhor Governador do Estado e que agora se encontra em análise na Assembléia Legislativa. Parece-me que, pelo princípio da simetria, se a Lei das Águas estabeleceu como norma geral à possibilidade de outorga do direito de uso, não poderia o Poder Legislativo Estadual retirar da Administração Estadual a possibilidade da outorga. 3.1.4.3.2 GENERALIDADES E OBJETIVOS DA OUTORGA Outorgar, no conceito jurídico tem o significado de conceder. Portanto, quando a Lei nº 9.433/97, na seção III, do Capítulo IV, do Título I, trata da Outorga de Direitos de Uso dos Recursos Hídricos, em disposição sumária, especifica como e de que forma jurídica o direito de uso da água pode ser concedido, não olvidando que esse ato tenha por objetivo assegurar os controles qualitativo e quantitativo do uso da água e permitir o efetivo exercício do acesso à água. Em outras palavras, o regramento do legislador disciplina o procedimento administrativo de como a Administração Pública deverá agir para validamente concretizar a delegação de outorga de uso da água a terceiros. A outorga pode se operar entre administrações ou entre administração e particular. 3.1.4.3.3 A OUTORGA ENTRE ADMINISTRAÇÕES. A Administração Pública detentora da competência para administrar o uso da água pode entender de outorgar essa competência à outra administração. Neste caso, o direito de outorga será instrumentalizado por acordos, ajustes ou convênios, sempre de natureza onerosa. Embora estes acordos, ajustes ou convênios tenham a estrutura de verdadeiros contratos já que criam direitos e obrigações entre as administrações envolvidas, eles dispensam a prévia licitação porque são contratos entre administrações e não contratos administrativos cujos participantes são, de um lado, uma Administração Pública, e, de outro, particulares, consoante o disposto no art. 2º, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93, que institui normas para as licitações e contratos administrativos. 88 – Água na Visão do Direito 3.1.4.3.4 A OUTORGA A PARTICULARES COMO CONTRATO ADMINISTRATIVO “SUI GENERIS” A Lei nº 9.433/97, diferentemente do Código das Águas de 1934, não prevê a natureza jurídica da outorga do direito de uso da água. Naquele, há a previsão expressa de concessão administrativa, no caso de utilidade pública, e de autorização, para outras finalidades, sendo que, no primeiro caso, haveria um contrato e, no segundo, um ato administrativo. Ato administrativo é manifestação de vontade da Administração Pública tendente a produzir efeitos jurídicos. Sendo uma manifestação de estado, o ato administrativo tem estrutura formal própria e atributos que o torna diferente dos demais atos jurídicos. Um destes atributos é o de poder ser revogado por puro critério de conveniência ou oportunidade da Administração, sem que sobre isso possa haver controle externo. Querer e não querer é vontade administrativa insuscetível de revisão, mesmo judicial, que se limita tão-somente às ilegalidades. Já o contrato é um acordo de vontades que cria direitos e obrigações entre os contratantes e assume a denominação de contrato administrativo se uma das partes é a Administração Pública. Diferentemente dos contratos privados, o contrato administrativo tem particularidades próprias e inerentes da tipicidade administrativa onde há predomínio das cláusulas exorbitantes pró-administração. Sendo um contrato extremamente formal, como regra, somente se instrumentaliza se, antes, ocorrer licitação ou houver incidência das exceções de dispensa ou inexigibilidade, tendo sempre presentes os princípios da moralidade e impessoalidade. A Lei nº 8.666/93, que institui normas para licitação e contratos administrativos, no art. 2º, parágrafo único, assim definiu: “Para os fins desta lei, considera-se contrato todo e qualquer ajuste ente órgãos ou entidades da Administração Pública e particulares, em que haja um acordo de vontades para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, seja qual for à denominação utilizada”. No caso da outorga de direito de uso da água o legislador da Lei das Águas estabeleceu que: a) a água tem um valor econômico (art. 1º inc. II); b) é possível ser concedido o direito de uso a alguém em casos expressos (art. 12); Água na Visão do Direito – 89 c) a outorga deve ser concedida por prazo certo nunca superior a 35 anos, passível de renovação (art. 16); d) para que seja outorgada, é necessária uma contraprestação resultante no pagamento de um valor cobrado por quem a usa (art. 19 a 22). 3.1.4.3.5 QUANDO É NECESSÁRIA A PRÉVIA LICITAÇÃO PARA OUTORGA DO DIREITO DE USO. Como já se viu, a outorga do direito de uso da água é faculdade de quem tem a competência para administrá-la o seu uso que, com este ato, repassa esta atribuição à terceiro, já que se trata de um bem de domínio público também chamado de bem de uso comum do povo (art 99, inciso I, do Código Civil) onde, de regra, a competência para administrar é do poder público. No elenco de outorgas do art 12, da Lei nº 9.433/97, direitos de uso existem que pressupõem a licitação prévia obrigatória para respeitar os princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa esculpidos no art. 37, caput, da Constituição Federal. Assim, exigem licitação prévia nos casos de: a) derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de água para consumo final de abastecimento público; b) aproveitamento dos potenciais hidrelétricos; c) outros usos que tenham utilidade pública que a Administração Pública pretenda dar à água e que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de água. Pode servir de exemplo a outorga para instalação de um parque náutico. 3.1.4.3.6 QUANDO É INEXIGÍVEL A LICITAÇÃO Sendo a outorga do direito de uso da água instrumentalizável através de contrato administrativo sui generis, a licitação é a regra, como já referido. Caracterizam casos de inexigibilidade licitatória: a) a derivação ou captação da água existe em um corpo de água que envolva consumo final restrito ou sirva para insumo do processo produtivo de pessoa ou pessoas determinadas; Opera-se a exceção da inexigibilidade licitatória por aplicação analógica do art. 25, da 90 – Água na Visão do Direito Lei nº 8.666/93, já que a participação no processo licitatório de outros interessados é impossível. Pode servir de exemplo a captação de água de um rio para irrigação de uma lavoura de arroz; b) extração de água de aqüífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo. Pode servir de exemplo a perfuração de um poço para uso de um proprietário.; c) lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final; A ato de lançamento é individualizado. Daí porque é inexigível a licitação; d) outros usos que alterem o regime, a quantidade ou qualidade da água existente em um corpo de água que seja, mas que não se destine ao uso do público; Caracterizando-se a alteração de regime, quantidade ou qualidade da água ato individual inexigível à licitação. 3.1.4.3.7 A DELEGAÇÃO DA OUTORGA A outorga pode ser concedida de uma Administração Pública a outra, como já foi mencionado. Nesta hipótese, a administração outorgada é mero terceiro e por isso se submete ao pagamento pela outorga recebida. Na delegação ocorre a transferência do poder de delegar a outorga da órbita federal aos Estados e ao Distrito Federal. O Poder Executivo Federal, por força do art. 14, § 1º, da Lei nº 9.433/97, pode delegar a qualquer Estado ou ao Distrito Federal a competência de outorgar o direito de uso de águas de sua competência. O Estado ou o Distrito Federal age em nome do delegante. Em termos de controle judicial da delegação, o delegado responderá pelos atos abusivos a que deu causa. 3.1.4.3.8 AS MODALIDADES DE OUTORGAS A Lei nº 9.433/97, no seu art. 12, estabelece quais as modalidades de direito de uso de água que necessitam de outorga. São elas: a) na derivação ou captação de parcela de água existente em um corpo de água para consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo. Água na Visão do Direito – 91 Derivação significa desvio e captação significa aproveitamento. Corpo de água é qualquer rio, córrego, riacho, lago, lagoa ou brejo. Portanto, o desvio ou aproveitamento de água existe em um rio, córrego, riacho, lago, lagoa ou brejo que se destine ao consumo da população ou mesmo que se destine como elemento no processo de produção de bens exige outorga de direito de uso por parte da Administração Pública competente. A sua inexistência gera abusividade passível de controle pelo poder de polícia da administração ou até mesmo por ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público ou de ação popular por qualquer do povo; b) na extração de água de aqüífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo. Aqüífero é uma formação geológica capaz de armazenar e fornecer quantidades significativas de água, representando um reservatório de água subterrânea. Assim, extrair essa água para consumo final ou mesmo para uso no processo produtivo necessita de outorga de direito de uso. O uso da água sem a outorga administrativa constitui prática abusiva a ser controlada e impedida pelo poder público, pelo Ministério Público ou por qualquer do povo em defesa do bem público; c) no lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final. Lançamento é o ato de lançar, jogar, atirar. Esgotos são escoadouros de dejetos ou águas servidas das casas. Resíduos significa restos. Dessa forma, jogar no rio, córrego, riacho, lago, lagoa ou brejo dejetos, águas servidas ou restos, tratados ou não, com a finalidade de misturá-los com a água, utilizar-se dela como meio de transporte ou escoadouro final necessita de outorga do direito de uso. A inobservância resulta na prática de ilícito administrativo, penal e ambiental todos passíveis dos respectivos controles. d) no aproveitamento dos potenciais hidrelétricos; O aproveitamento da água para a geração de energia exige outorga do direito de uso pela Administração Pública competente que, todavia, deve atender ao que ficar estabelecido no Plano Nacional de Recurso Hídricos e ao que exigir a legislação setorial competente; 92 – Água na Visão do Direito e) em outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de água. Como requisito final a demonstrar que os outros usos são meramente exemplificativos para ocorra outorga do direito de uso da água estão aqueles usos que alteram a estrutura, a quantidade ou a qualidade da água de um rio, córrego, riacho, lago, lagoa ou brejo. 3.1.4.3.9 O USO DA ÁGUA QUE INDEPENDEM DE OUTORGA Sempre que a Administração Pública competente pretender outorgar o direito de uso da água a um terceiro, ente público ou não, somente poderá fazê-lo através de um contrato administrativo sui generis, com prévia licitação, ou não, dependendo neste caso de que o terceiro seja outra administração pública ou incida a inexigibilidade licitatória para o outorgado privado por impossibilidade de concorrência. A outorga do direito de uso, dessa forma, é a regra geral. A Lei nº 9.433/97, no § 1º, do art. 12, no entanto, fixou os casos em que o uso da água independe de outorga administrativa enunciando-os de forma abrangente, mas fixando que eles deveriam ser definidos em regulamento. O legislador vinculou a Administração Pública competente para a outorga a necessidade de prévia regulamentação. Portanto, não pode a Administração Pública por ato exclusivo seu, inexigir a outorga do direito de uso da água. Se o faz, pratica ato abusivo passível de controle administrativo ou judicial, este através das ações de controle como o mandado de segurança, a ação civil pública ou a ação popular. A lei enumera as seguintes situações que independem de outorga: a) Uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural. Os pequenos núcleos populacionais rurais não necessitam de outorga de direito de uso da água, desde que use esse bem público para suas necessidades. A dimensão desses núcleos rurais e o que sejam satisfação das necessidades deverão ser regrados pelo regulamento. Penso, no entanto, que no conceito de necessidade deve ser incluída a econômica; b) Derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes. O desvio e o aproveitamento da água, bem como o lançamento de resíduos ou dejetos em quantidades insignificantes sobre um rio, córrego, riacho, lago, lagoa brejo ou mesmo um aqüífero não ne- Água na Visão do Direito – 93 cessita de outorga. No entanto, a inexigência de outorga não afasta a Administração Pública do dever de fiscalizar a sua desnecessidade; c) Acumulações de volumes de água consideradas insignificantes. As barragens e os açudes de volumes insignificantes, assim considerados nos termos do regulamento, independem de outorga do direito de uso. A fiscalização de isenção, todavia, é imposição a que deve a Administração Pública competente exercer. 3.1.4.3.10 OS CASOS DE SUSPENSÃO DA OUTORGA Concedida a outorga nos termos da lei, passa o outorgado a exercer o direito dela resultante com plenitude, sem que com isso deixe a Administração Pública titular da outorga de exercer vigilância sobre o objeto contratado. Próprio de um contrato administrativo sui generis deve, tanto a Administração Pública outorgante como o terceiro outorgado, primarem pela execução do contratado, por aplicação do princípio contratual clássico do pacta sunt servanda. Suspensa a outorga deve a Administração Pública outorgante analisar, caso a caso, sobre a suspensão da contraprestação. A Lei nº 9.433/97 enumera os casos de suspensão da outorga, nestes termos: a) Não cumprimento pelo outorgado dos termos da outorga. A outorga do direito de uso da água tem a natureza jurídica de um contrato administrativo. Embora seja uma especialidade na teoria geral dos contratos, o contrato administrativo de outorga impõe deveres aos contratantes como qualquer outro contrato. Assim, não cumprindo o outorgado qualquer das cláusulas, torna-se inadimplente e, como sanção, pode ver o objeto contratado, que é a própria outorga, suspensa pela Administração Pública outorgante. A suspensão administrativa da outorga não é ato administrativo puro e imotivado. Para ser declarada ela necessita de processo administrativo prévio em que se garanta ao outorgado o direito ao contraditório, à ampla defesa e ao recurso administrativo, como princípios constitucionais garantistas mínimos. A decisão administrativa que concluir pela suspensão da outorga do direito de uso da água necessita de motivação, sopesando através dos critérios de razoabilidade e proporcionalidade se a suspensão deve ser parcial ou total, temporária ou definitiva. 94 – Água na Visão do Direito A suspensão irregular pode ser controlada pelo Poder Judiciário por meio de ações de controle, como é o mandado de segurança e ensejar indenização; b) Ausência de uso por três anos consecutivos. A água é um bem público de uso comum do povo. Dessa forma, a água tem a natureza de se destinar ao uso público, de forma direta, através de consumo, ou indireta, através de insumo de produção. O seu não-uso pelo outorgado de forma contínua por três anos atenta contra a própria destinação natural desse bem. Portanto, não destinar o outorgado a água que recebeu através de outorga pública pratica infração material e formal do contrato cuja sanção é a suspensão do contrato, total ou parcialmente, temporária ou definitivamente. Na aplicação da sanção deve a Administração Pública agir com razoabilidade e proporcionalidade. A suspensão por ausência de uso também necessita de processo administrativo prévio com asseguramento ao contraditório, ampla defesa e recurso. A suspensão irregular pode ser controlada pelo Poder Judiciário e ensejar a responsabilização civil da Administração Pública concedente; c) Necessidade premente de água para atender a situações de calamidade, inclusive as decorrentes de condições climáticas adversas. A água é um bem de uso comum do povo. Assim, havendo necessidade premente para atender a situações de calamidade decorrentes de condições climáticas adversas, situação mais comum criada pela seca, surge uma cláusula suspensiva natural do contrato. O interesse público evidenciado não pode ser impedido pelo interesse privado do outorgado. Penso que o dispositivo legal é a transformação em norma positiva da teoria da imprevisão. A calamidade ou a situação climática adversa deve ser declarada pela Administração Pública outorgante com toda amplitude e diante de fatos notórios. Neste caso, a suspensão da outorga deve durar enquanto persistir a calamidade podendo abranger parcial ou integralmente o objeto da outorga. Água na Visão do Direito – 95 Ante a urgência da medida, a suspensão será sempre acautelatória, preventiva ou remediadora, mas exige processo administrativo em que sejam assegurados o contraditório, a ampla defesa, a decisão motiva e possibilidade recursal. A abusividade da suspensão implica na possibilidade de controle jurisdicional e pode ensejar responsabilidade civil; d) Necessidade de se prevenir ou reverter grave degradação ambiental. Meio ambiente é o conjunto de condições naturais e de influências que atuam sobre os organismos vivos e os seres humanos. Como a água, o meio ambiente é um bem de uso comum do povo. Portanto, mantê-lo em perfeitas condições é dever do Estado e direito de todos. Degradação é deterioração. Por conseguinte, havendo justo receio de grave deterioração ao meio ambiente ou tendo este já ocorrido em decorrência do exercício da outorga do direito de uso da água tem a Administração Pública outorgante o dever de suspender a delegação pelo prazo necessário para afastar a potencialidade do perigo ou reversão da gravidade já ocorrida. A suspensão da outorga exige prova da potencialidade do perigo de dano ambiental ou que ele tenha ocorrido e necessite ser revertido. Dessa forma não se trata de ato administrativo simples e imotivado. Em quaisquer das situações, a suspensão da outorga pode ser determinada cautelarmente, mas exige processo administrativo em que se garanta ao outorgado oportunidade de contraditório, ampla defesa, decisão final motivada com possibilidade de recurso. A suspensão poderá ser total ou parcial, temporária ou definitiva dependendo da gravidade da degradação ou do tempo necessário para afastar a possibilidade do dano ambiental. A suspensão abusiva pode ensejar o controle jurisdicional e a responsabilização civil da Administração Pública concedente; e) Necessidade de se atender a usos prioritários, de interesse coletivo, para os quais não se disponha de fontes alternativas. A outorga também será suspensa quando houver necessidade de se atender a usos prioritários, de interesse coletivo, para os quais não se disponha de fontes alternativas. A suspensão da outorga, portanto, é decorrência da inexistência de fontes alternativas, circunstância a ser demonstrada pela Administração Pública outorgante. 96 – Água na Visão do Direito O ato administrativo de suspensão, portanto, é decorrência da préexistência de processo administrativo com todos os consectários constitucionais de contraditório, ampla defesa, decisão motivada e recurso à segunda instância administrativa. Em decorrência da urgência, pode a Administração Pública determinar a suspensão da outorga cautelarmente. A suspensão abusiva pode ser controlada pelo Poder Judiciário e ensejar indenização; e f) Necessidade de serem mantidas as características de navegabilidade de corpo de água. Consistindo o corpo de água em um rio, lago ou lagoa onde a navegabilidade é permitida deve a Administração Pública outorgante suspender a outorga do direito de uso até ser possível o retorno a este uso. Pela própria natureza da suspensão, observa-se que ela é temporal. Pode ser determinada cautelarmente, mas exige a instauração de processo administrativo para que o outorgado possa contraditar e oferecer provas, devendo a Administração Pública decidir motivadamente determinando a suspensão e permitindo o recurso do que foi decido. A suspensão viciada pode ser controlada, inclusive pelo Poder Judiciário e ensejar responsabilidade civil da Administração Pública. 3.1.4.3.11 PRAZO DE DURAÇÃO DA OUTORGA A outorga do direito de uso da água tem prazo limite de até 35 anos, renovável. É o que diz o art. 16 da Lei nº 9.433/97. A fixação de duração da outorga está limitada apenas ao seu limite máximo. Pode o regulamento estabelecer prazos para cada tipo de outorga ou deixar isso para a discrição administrativa. 3.1.4.4 COBRANÇA PELO USO DOS RECURSOS HÍDRICOS Outro instrumento da Política Nacional de Recursos Hídricos, considerado como um dos mais importantes juntamente com a outorga, é a cobrança pelo uso dos Recursos Hídricos. Deve-se esclarecer que o preço que se paga atualmente sob a rubrica de “água” refere-se ao serviço de tratamento e captação de água e não o pagamento pelo uso desta. O pagamento de uso não implica na criação de qualquer tipo de direi- Água na Visão do Direito – 97 to sobre a água, como já foi visto, por tratar-se de bem público ela é inalienável. Entretanto o direito brasileiro já previa a cobrança pela utilização de bens públicos de uso comum dispondo que eles podem ser gratuitos ou retribuídos, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração pertencerem, assim disposto no art. 103 do Código Civil e, nos mesmo termos, no art. 36 do Código das Águas.225 Os objetivos deste instrumento são definidos no art. 19 da Lei 9.433/ 97, nos seguintes termos: I – reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor; II – incentivar a racionalização do uso da água e, III – obter recursos para o financiamento de programas previstos nos planos de recursos hídricos. Maria Luiza Machado Granziera226 afirma que há três finalidade básicas, a primeira é didática, a segunda é lógica, uma vez que ao ter de pagar, gasta-se menos e a terceira está relacionada com o financiamento de recuperação ambiental dos recursos hídricos. A cobrança dos recursos hídricos veio a consagrar os princípios, já contidos na Lei nº 6.938/81, art. 4º VII, a saber: o Princípio do PoluidorPagador e do Usuário Pagador, ou seja, conforme Edis Camargo Neves da Cunha, “em termos de verificação dos usos múltiplos e vazões disponíveis, quanto cada usuário capta e/ou quanto lança no corpo de água”.227 A aplicação deste instrumento foi a forma adotada pelo legislador pátrio para colocar em prática a internalização dos custos da proteção ao meio ambiente em detrimento da externalização. Conforme Ronaldo Seroa da Matto: “A teoria econômica diz: se o uso do recurso (bem público) não causa dano a ninguém, não se cobra por isso; causando dano a alguém, gerando essa externalidade, um impacto a terceiro, temos de cobrar”.228 GRANZIERA, Maria Luiza Machado. Direito das águas. Apud. HENKES, Silviana Lúcia. Política Nacional de Recursos Hídricos e Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos . Jus Navegandi, Teresina, a. 7, n. 64, abr. 2003. Disponível em http:// www1.jus.com.br/doutrina/texto. asp?id=3970. Acesso em 06 abr. 2005. 225 226 GRANZIERA, Maria Luiza Machado. A cobrança pelo uso da água. In Revista Centro de Estudos Jurídicos. Brasília, n. 12, set/dez. 2000. CUNHA, Eldis Camargo Neves da. Desafios Jurídicos na Gestão dos Recursos Hídricos m face dos Instrumentos da Política Nacional: Papel da Agência Nacional das Águas. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p. 12. 227 MOTTA, Ronaldo Seroa de. Privatização pelo uso da água. In Revista Centro de Estudos Jurídicos. Brasília, n. 12, p. 27, set/dez. 2000. 228 98 – Água na Visão do Direito Em outras palavras, Maria Luiza Machado Granziera explica essa realidade, nos seguintes termos: “Hoje vigora no Brasil, o princípio do ônus social, que é antítese do poluidor-pagador. Toda a comunidade paga pela despoluição dos rios, pela sua preservação. O Poder Público quando aplica parte de seu orçamento para cumprir um determinado plano, ou para realizar um certo programa, está onerando a comunidade como um todo”.229 A fixação deste instituto levará em conta, consoante o art. 20 da Lei nº 9.433/97, a outorga de uso dos recursos hídricos, na medida em que só serão cobrados àqueles usos que dependem de autorização pelo Poder Público. Assim sendo, usos insignificantes, estabelecidos pela Lei das Águas, Resolução n.º 16 do CNRH, além do Decreto Estadual do Rio Grande do Sul n.º 37.033/96, que independem de outorga, não serão objeto de cobrança. A esse respeito, Eldis Camargo Neves da Cunha estabelece que, “As normas arroladas preconizam o mesmo enunciado, listando os usos que independem de outorga: o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural; as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes”.230 Decidindo a Administração Pública competente que lhe é conveniente ou oportuno outorgar que determinado corpo de água seja administrado por terceiros em benefício próprio ou mesmo em benefício da comunidade, essa delegação do uso do bem público pressupõe uma contraprestação. Mesmo que os terceiros sejam outros órgãos administrativos, já que a lei não estabelece distinção, quanto mais os particulares, pessoas físicas ou jurídicas, consoante previsão legislativa da Lei nº 9.433/93, que chama esta contraprestação de cobrança pelo uso, nos precisos termos do art. 20 da mencionada lei. 229 GRANZIERA, Maria Luiza Macahado. A cobrança pelo uso da água. In Revista Centro de Estudos Jurídicos. Brasília, n. 12, p. 73, set/dez. 2000. CUNHA, Eldis Camargo Neves da. Desafios Jurídicos na Gestão dos Recursos Hídricos m face dos Instrumentos da Política Nacional: Papel da Agência Nacional das Águas. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p.5. 230 Água na Visão do Direito – 99 A água, se usada pela própria Administração Pública gestora do corpo de água, por evidente, não gera contraprestação. Esta somente decorre da outorga do direito de uso a terceiros. Além disso, ao serem fixados os valores deve ser observado o estabelecido no art. 21 da Lei das Águas, a saber: I – nas derivações, captações e extrações de água, o volume retirado e seu regime de variação e II – nos lançamentos de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, o volume lançado e seu regime de variação e as características físico-químicas, biológicas e de toxidade do afluente231 . Quanto à natureza jurídica dessa cobrança é pacífico na melhor doutrina que trata-se de preço público, pago pelo uso de um bem público. O percentual embora uno para as águas de competência da União e do Distrito Federal, poderá variar de estado para estado. O que não pode é o Estado dispensar a sua cobrança. Portanto, será contínua e variável enquanto durar o prazo da outorga. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos, através da Resolução n.º 48, de 2001, estabeleceu os critérios gerais para a cobrança de uso dos recursos hídricos. Estabeleceu os fatores a que estará condicionada a cobrança e os mecanismos para a definição dos valores de cobrança. Quanto à aplicação dos valores arrecadados, estabelece o art. 22, que deverá ser feita prioritariamente na bacia hidrográfica em que foram geradas e deverão ser utilizadas no financiamento de estudos, programas, projetos e obras incluídos nas Planos de Recursos Hídricos, bem como no pagamento de despesas de implantação e custeio administrativo dos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, porém, neste segundo caso, essa aplicação está limitada a 7,5% do total arrecadado (§1º). O termo “prioritariamente” deixa claro que não se exclui a aplicação fora da bacia hidrográfica. Porém, como ressalta Paulo Affonso Leme Machado, a aplicação não cai no campo da discricionariedade, visto que “se houver necessidade do emprego dos recursos na bacia hidrográfica em que os valores foram gerados, o termo ‘prioridade’ determina que é nessa bacia, e não noutra, que os valores devem ser aplicados”.232 “os lançamentos analisados na sua recepção no corpo de água são afluentes, e os analisados no ponto de sua emissão são efluentes”. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p 464. 231 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 466. 232 100 – Água na Visão do Direito Estabelece ainda o §2º, do referido dispositivo legal que os valores arrecadados poderão ser aplicados a “fundo perdido”. Quanto a isto, Edis Milare sustenta, “os valores arrecadados destinam-se, ordinariamente, a empréstimo, portanto, com retorno acrescido de juros. Todavia, podem ser aplicados a fundo perdido em projetos benéficos à coletividade”.233 Por sua vez, a Resolução nº 49, do Conselho Nacional de Recursos Hídricos estabeleceu as prioridades para a aplicação dos recursos proveniente da cobrança pelo uso dos Recursos Hídricos, referente ao exercício do ano de 2006. A regulamentação implementada pelo CNRH traçou apenas as linhas gerais para a cobrança pelo uso da água, cabendo aos Comitês de Bacia sobre os valores e a sua forma de aplicação. Segundo o próprio CNRH a cobrança representará um aumento de 2% na conta de cada consumidor final ou R$ 0,02 (dois centavos) por metro cúbico de água. É bom deixar claro que a cobrança diz respeito à outorga do direito de uso da água, podendo esta cobrança ser ou não repassada para o usuário final no caso de abastecimento. A competência está relacionada ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos, aos Comitês de Bacia, as Agências da Água e à ANA. Ao CNRH cabe estabelecer os critérios gerais para a outorga de direito de uso dos recursos hídricos e para a cobrança de seu uso (art. 35, X). Aos Comitês de Bacia compete estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir valores a serem cobrados (art. 37, VI). Às Agências da Água cabe efetuar, mediante delegação do outorgante, a cobrança pelo uso de recursos hídricos, bem como acompanhar de uma maneira geral a aplicação dos recursos provenientes da cobrança (art. 41 incs. III, IV e V). 3.1.4.5 SISTEMA DE INFORMAÇÕES SOBRE RECURSOS HÍDRICOS O Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos está disciplinado nos arts. 25 a 27 da Lei das Águas. Trata-se de um sistema de coleta, tratamento, armazenamento e recuperação de informações sobre recursos hídricos e quaisquer fatores que interfiram na gestão. Paulo Affonso Leme Machado salienta a importância deste instrumento afirmando que sem informação não se poderia implementar a Política de Recursos Hídricos e continua: 233 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: doutrina – prática – jurisprudência – glossário. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 403. Água na Visão do Direito – 101 “Ao criar um ‘Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos’ a lei está procurando articular as informações, para que não fiquem dispersas e isoladas. Os organismos integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos terão obrigações de fornecer os dados ao Sistema de Informação sobre Recursos Hídricos (art. 25, parágrafo único, da Lei 9.433/97). Não haverá, portanto, informações privilegiadas e secretas nos órgãos de recursos hídricos, nem que os mesmos estejam submetidos a regime de Direito Privado”.234 O art. 26 da Lei nº 9.433/97 estabelece os princípios básicos para o funcionamento do Sistema, quais sejam: I – descentralização da obtenção e produção de dados e informações; II – coordenação unificada do sistema e III – acesso aos dados e informações garantidos à toda a sociedade. Enquanto que o art. 27 estabelece os objetivos do Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos, sendo eles: reunir, dar consistência e divulgar os dados e informações sobre a situação qualitativa e quantitativa de recursos hídricos no Brasil; atualizar permanentemente as informações sobre disponibilidade e demanda de recursos hídricos em todo território nacional e fornecer subsídios para a elaboração dos Planos de Recursos Hídricos. Note-se que este artigo trata especificamente do Sistema Nacional de Informações enquanto que os outros (arts. 25 e 26) tratam de Sistema de Informações, tendo como destinatários em âmbito nacional como também estadual e do Distrito Federal.235 Compete à Agência Nacional de Águas – ANA – organizar, implantar e gerir o Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos, de acordo com o art. 4º, XIV da Lei nº 9.984/2000). Com propriedade Juliana Santilli pontua: “trata-se de instrumento que visa incorporar definitivamente à lei o princípio da transparência e publicidade na gestão dos recursos hídricos, indispensável a uma efetiva gestão compartilhada entre usuários, sociedade civil e Poder Público Federal, Estadual e Municipal”.236 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2000. p. 470. 234 235 Idem. SANTILLI, Juliana. Aspectos Jurídicos da Política Nacional de Recursos Hídricos. In Meio Ambiente, Grandes Eventos. Brasília: ESMPU, v. 1, 2004, p. 13. 236 102 – Água na Visão do Direito 3.2. O SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS Os sistemas, tanto nacionais quanto estaduais, de gerenciamento de recursos hídricos são os instrumentos de efetivação da Política Nacional, consoante dicção da Lei nº 9.433/97. Ou seja, através desses mecanismos jurídico-administrativos é que se tornará possível a gestão legítima, válida e eficaz dos recursos hídricos. O gerenciamento dos recursos hídricos é realizado em três planos e é formado pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos - CNRH; pelo Conselho de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal; pelos Comitês de Bacia Hidrográficas; e pelas Agências de Água, e foi constituído calcado nos seguintes objetivos: a) coordenar a gestão integrada das águas; b) implementar a política nacional de recursos hídricos; c) arbitrar administrativamente os conflitos relacionados com os recursos hídricos; d) planejar, regular e controlar o uso, a preservação e a recuperação dos recursos hídricos; e) promover a cobrança pela utilização dos recursos hídricos. 3.2.1. CONSELHO NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS - CNRH O CONSELHO NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS - CNRH - é um organismo colegiado, consultivo, normativo e deliberativo composto por representantes dos setores usuários de água, governo e sociedade civil organizada. Tem como competências, dentre outras: promover a articulação do planejamento de recursos hídricos com os planejamentos nacional, regionais, estaduais e dos setores usuários; arbitrar os conflitos existentes entre Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos; estabelecer critérios gerais para a outorga de direito de uso de recursos hídricos; analisar propostas de alteração de legislação pertinente a recursos hídricos, e estabelecer diretrizes complementares para a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos.237 O Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) é o órgão mais expressivo da hierarquia do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (o SINGREH, criado pela Lei nº 9.433/97, estabeleceu um arranjo institucional claro e baseado em novos princípios de organização para Ministério do Meio Ambiente – Secretaria de Recursos Hídricos. Documento de Introdução do Plano Nacional de Recursos Hídricos.Brasília – DF, 2004. p. 23. 237 Água na Visão do Direito – 103 a gestão compartilhada do uso da água). É de sua competência decidir sobre as grandes questões do setor, além de dirimir as contendas de maior vulto. Caber-lhe-á também decidir sobre a criação de Comitês de Bacias Hidrográficas em rios de domínio da União, baseado em uma análise detalhada da bacia e de suas sub-bacias, de tal forma que haja uma otimização no estabelecimento dessas entidades. Para tanto, estabeleceu, através da Resolução nº 05 de 10 de abril de 2000, regras mínimas que permitem demonstrar a aceitação, pela sociedade, da real necessidade da criação de Comitês.238 O CNRH pode ser também considerado “um colegiado que desenvolve regras de mediação entre os diversos usuários da água sendo, assim, um dos grandes responsáveis pela implementação da gestão dos recursos hídricos no País. Por articular a integração das políticas públicas no Brasil é reconhecido pela sociedade como orientador para um diálogo transparente no processo de decisões no campo da legislação de recursos hídricos”.239 O CNRH é o principal fórum de discussão nacional sobre gestão de recursos hídricos, exercendo o papel de agente integrador e articulador das respectivas políticas públicas, particularmente quanto à harmonização do gerenciamento de águas de diferentes domínios.240 3.2.1.1.COMPETÊNCIA DO CNRH O CNRH possui como competências, dentre outras: • • • Analisar propostas de alteração da legislação pertinente a recursos hídricos; Estabelecer diretrizes complementares para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos; Promover a articulação do planejamento de recursos hídricos com os planejamentos nacional, regionais, estaduais e dos setores usuários; Arbitrar conflitos sobre recursos hídricos; 238 Disponível em http://www:cnnrh-srh.gov.br. Acesso em 26 abr. 2005. 239 Idem. 240 Idem. 104 – Água na Visão do Direito • • • • Deliberar sobre os projetos de aproveitamento de recursos hídricos cujas repercussões extrapolem o âmbito dos estados em que serão implantados; Aprovar propostas de instituição de comitês de bacia hidrográfica; Estabelecer critérios gerais para a outorga de direito de uso de recursos hídricos e para a cobrança por seu uso; Aprovar o Plano Nacional de Recursos Hídricos e acompanhar sua execução. 3.2.1.2. COMPOSIÇÃO DO CNRH O CNRH é composto, conforme estabelecido por lei, por representantes de Ministérios e Secretarias (Especiais) da Presidência da República com atuação no gerenciamento ou no uso de recursos hídricos; representantes indicados pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos; representantes dos usuários dos recursos hídricos (irrigantes; indústrias; concessionárias e autorizadas de geração de energia hidrelétrica; pescadores e usuários da água para lazer e turismo; prestadoras de serviço público de abastecimento de água e esgotamento sanitário; e hidroviários), e, representantes das organizações civis de recursos hídricos (consórcios e associações intermunicipais de bacias hidrográficas; organizações técnicas e de ensino e pesquisa, com interesse na área de recursos hídricos; e organizações nãogovernamentais). É presidido pelo Ministro do Meio Ambiente 241 , e, atualmente, são 57 conselheiros com mandato de três anos. O número de representantes do Poder Executivo Federal não pode exceder à metade mais um do total de membros”.242 A representação dos usuários ficou definida para os setores de irrigantes, indústrias, concessionárias e autorizadas de geração hidrelétrica, pescadores e lazer e turismo, prestadores de serviço público de abastecimento de água e esgotamento sanitário, e hidroviários. Dentre as organizações civis de recursos hídricos foram definidas: comitês de bacias hidrográficas, consórcios e associações intermunicipais de bacias hidrográficas; organizações técnicas e de ensino e pesquisa com interesse na área de recursos hídricos e, organizações não-governamentais com objetivos de defesa de interesses difusos e coletivos da sociedade. 241 Disponível em http://www:cnnrh-srh.gov.br. Acesso em 26 abr. 2005. 242 Idem. Água na Visão do Direito – 105 3.2.1.3 CÂMARAS TÉCNICAS O CNRH possui nove Câmaras Técnicas243 e cada uma realiza, em média, uma reunião mensal para tratar de assuntos pertinentes às suas atribuições com o objetivo de subsidiar os conselheiros nas decisões em plenário. São compostas por sete a dezessete participantes (sendo um deles o presidente) com mandatos de dois anos. As CTs são constituídas pelos próprios conselheiros ou seus representantes devidamente credenciados. Essa possibilidade torna-se importante já que permite, a cada reunião, a indicação para participação de técnicos especializados de diferentes organizações, enriquecendo os debates. As reuniões são públicas e mesmo os convidados têm direito à voz. Grupos de Trabalho e reuniões conjuntas entre CTs agilizam os pareceres e promovem a eficácia das deliberações. Para que tudo isso funcione bem, existem regras claras como prazos de encaminhamentos, condutas em reuniões e até penalidades para ausências. 3.2.1.4 DELIBERAÇÃO As reuniões do Conselho acontecem em sessões ordinárias e extraordinárias, onde Moção e Resolução são as formas de manifestação. Será moção, quando se tratar de recomendação dirigida ao Poder Público ou à sociedade civil em caráter de alerta, de comunicação honrosa ou pesarosa. E resolução, quando se tratar de deliberação de matéria vinculada à sua competência ou instituição e extinção de Câmaras Técnicas – CTs ou Grupos de Trabalho. Ambas, antes de serem submetidas ao colegiado, são analisadas e validadas pelas competentes CTs, bem como verificada a compatibilização com a legislação pertinente. Após aprovação, por maioria simples no plenário, seguem para publicação no Diário Oficial da União, sendo assinadas pelo Presidente e Secretário Executivo do CNRH. As Resoluções do Conselho têm amplitude nacional e servem para balizar as ações nos Estados, Municípios e nas bacias hidrográficas, sendo passíveis de adequação às realidades locais. Portanto, as resoluções permitem o estabelecimento de um denominador comum que confere unidade à regulação de recursos hídricos no País e, ao mesmo tempo, sua adaptação à variedade de situações regionais. Algumas Resoluções aprovadas referem-se à estrutura de funcionamento do Conselho. Outras se referem às suas atribuições, entre elas: 243 Disponível em http://www:cnnrh-srh.gov.br. Acesso em 26 abr. 2005. 106 – Água na Visão do Direito • • • • • • • Resolução n.º 5: estabelece diretrizes para a formação e funcionamento dos Comitês de Bacias Hidrográficas; Resolução n.º 14: define o processo de indicação de representantes dos Conselhos Estaduais, dos usuários e das Organizações Civis de Recursos Hídricos no CNRH; Resolução n.º 15: determina normas para o disciplinamento da gestão integrada de águas subterrâneas; Resolução n.º 16: estabelece critérios gerais para a outorga de direito de uso de recursos hídricos; Resolução n.º 19: aprova o valor da cobrança pelo uso de recursos hídricos na bacia hidrográfica do Rio Paraíba do Sul; Resolução n.º 32: institui a Divisão Hidrográfica Nacional; Resolução n.º 35: estabelece as prioridades para aplicação dos recursos oriundos da cobrança pelo uso de recursos hídricos, para o exercício de 2005; Resolução n.º 37: estabelece diretrizes para a outorga de recursos hídricos para a implantação de barragens em corpos de água de domínio dos estados, do Distrito Federal ou da União. 3.2.2. CONSELHOS DE RECURSOS HÍDRICOS DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL Os CONSELHOS DE RECURSOS HÍDRICOS DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL: da mesma forma que o CNRH, são organismos colegiados consultivos, normativos e deliberativos, compostos por representantes dos setores usuários de água, governo e sociedade civil organizada. As competências dos conselhos estaduais, com alguma variação de Estado para Estado, acompanham as do CNRH, só que no âmbito estadual.244 3.2.2.1.COMPETÊNCIAS DOS CONSELHOS ESTADUAIS Os Conselhos Estaduais têm as seguintes competências: • Propor alterações na Política Estadual de Recursos Hídricos; • Opinar sobre qualquer proposta de alteração na Política Estadual de Recursos Hídricos; 244 Ministério do Meio Ambiente – Secretaria de Recursos Hídricos. Documento de Introdução do Plano Nacional de Recursos Hídricos.Brasília – DF, 2004. p. 23. Água na Visão do Direito – 107 • • • • • • • Apreciar o anteprojeto de Lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos; Aprovar relatórios anuais sobre a situação dos recursos hídricos; Aprovar critérios de outorga do uso da água; Aprovar os regimentos internos dos Comitês de Bacias; Decidir os conflitos de uso da água em última instância; Representar o Governo Estadual, através do seu Presidente, junto a órgãos federais e internacionais, em questões relativas a recursos hídricos; Elaborar o seu Regimento Interno. 3.2.2.2. COMPOSIÇÃO DOS CONSELHOS ESTADUAIS O Conselho de Recursos Hídricos Estadual é um órgão colegiado constituído por Secretários de Estado e representantes de Comitês de Bacias e dos Sistemas Nacionais de Recursos Hídricos e do Meio Ambiente, que tem o papel de instância deliberativa superior do Sistema. É atualmente presidido pelo Secretário Estadual do Meio Ambiente.245 Os demais órgãos estatais que integram o sistema são: Obras Públicas e Saneamento, com a vice-presidência do CRH; Agricultura e Abastecimento; Coordenação e Planejamento; Saúde; Energia, Minas e Comunicações; Ciência e Tecnologia; Transportes; Casa Civil; e Secretaria do Desenvolvimento e dos Assuntos Internacionais.246 3.2.3. COMITÊS DE BACIAS HIDROGRÁFICAS O Comitê de Bacias Hidrográficas é um órgão colegiado, inteiramente novo na realidade institucional brasileira, contando com a participação dos usuários, da sociedade civil organizada, de representantes de governos municipais, estaduais e federal. Esse ente é destinado a atuar como “parlamento das águas”, posto que é o fórum de decisão no âmbito de cada bacia hidrográfica. Os comitês constituem a base do Sistema nacional de gerenciamento de Recursos Hídricos. 245 Art.1º, Lei nº 11.560, de 22 de dezembro de 2000, que alterou o artigo 7º da Lei 10.350, de 30 de dezembro de 1994. Art. 1º, Decreto nº 40.505 de 08 de dezembro de 2000, que alterou o art. 1º do Decreto nº 36.055 de 04 de julho de 1995. 246 108 – Água na Visão do Direito 3.2.3.1. COMPETÊNCIA Também conhecidos como “parlamentos das águas”, os comitês podem ser de rios federais ou de rios estaduais, conforme a dominialidade de suas águas. Dentre as atribuições dos Comitês, é importante destacar que elas devem: promover o debate sobre questões relacionadas aos recursos hídricos e articular a atuação das entidades intervenientes; arbitrar conflitos relacionados aos recursos hídricos; aprovar o Plano de Recursos Hídricos da Bacia e acompanhar sua execução; estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir os valores a serem cobrados; entre outras.247 3.2.3.2. COMPOSIÇÃO Os comitês são compostos por representantes dos governos da União, Estados, Distrito Federal, Municípios, entidades civis de recursos hídricos e dos diversos setores de usuários das águas da bacia hidrográfica. Integrarão os Comitês em rios de domínio da União representantes públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e representantes da sociedade, tais como, usuários das águas de sua área de atuação, e das entidades civis de recursos hídricos com atuação comprovada na bacia. A proporcionalidade entre esses segmentos foi definida pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos, através da Resolução nº 05, de 10 abril de 2000. Esta norma estabelece diretrizes para formação e funcionamento dos Comitês de Bacias Hidrográficas, representando um avanço na participação da sociedade civil nos Comitês. A resolução prevê que os representantes dos usuários sejam 40% do número total de representantes do Comitê. A somatória dos representantes dos governos municipais, estaduais e federal não poderá ultrapassar a 40% e, os da sociedade civil organizada ser mínimo de 20%. Nos Comitês de Bacias de rios fronteiriços e transfronteiriços, a representação da União deverá incluir o Ministério das Relações Exteriores e, naqueles cujos territórios abranjam terras indígenas, representantes da Fundação Nacional do Índio – FUNAI e das respectivas comunidades indígenas. Cada Estado deverá fazer a respectiva regulamentação referente aos Comitês de rios de seu domínio. Alguns Estados, a exemplo de São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Espírito Santo já estão em estágio bem avançado no processo de regulamentação, com diversos Comitês criados.248 247 Ministério do Meio Ambiente – Secretaria de Recursos Hídricos. Documento de Introdução do Plano Nacional de Recursos Hídricos.Brasília – DF, 2004. p. 23. Água na Visão do Direito – 109 3.2.4. AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS A Agência Nacional de Águas (ANA) está vinculada ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), cuja função principal é a de implementar os instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos, outorgar, fiscalizar e cobrar o uso dos recursos hídricos de domínio da União.249 A ANA tem como missão regular o uso da água dos rios e lagos de domínio da União, assegurando quantidade e qualidade para usos múltiplos, e implementar o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, um conjunto de mecanismos, jurídicos e administrativos, que visam o planejamento racional da água com a participação de governos municipais, estaduais e sociedade civil. Além de criar condições técnicas para implantar a Lei nº 9.433/97, conhecida como Lei das Águas, a ANA contribui na busca de solução para dois graves problemas do país: as secas prolongadas, especialmente no Nordeste e a poluição dos rios. A lei institui o princípio dos usos múltiplos como uma das bases da Política Nacional de Recursos Hídricos para que os diferentes setores usuários (abastecimento humano, geração de energia elétrica, irrigação, navegação, abastecimento industrial e lazer, entre outros) tenham acesso à água.250 É uma autarquia sob regime especial com autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, sendo responsável pela implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos. O projeto de criação da ANA foi aprovado pelo Congresso no dia 7 de junho de 2000, transformando-se na Lei nº 9.984, sancionada pelo Presidente da República em exercício, Marco Maciel, no dia 17 de julho do mesmo ano. Além de responsável pela execução da Política Nacional de Recursos Hídricos, a ANA deve implementar a Lei das Águas, de 1997, que disciplina o uso dos recursos hídricos no Brasil. 3.2.5. AGÊNCIAS DE ÁGUA As Agências de Água têm por função o desempenho das atividades técnicas necessárias para que os Comitês de Bacias Hidrográfica possam ver 248 Disponível em http://www:cnnrh-srh.gov.br. Acesso em 26 abr. 2005. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 6ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002. p. 604. 249 250 Disponível em http://www.ana.gov.br. Acesso em 26 abr. 2005. 110 – Água na Visão do Direito aplicadas as suas deliberações. Deverão ter sua constituição autorizada pelos Comitês ou pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos. São condições legais necessárias para sua constituição a prévia existência do Comitê ou Comitês de Bacias que as tenham instituído e a viabilidade financeira assegurada pela cobrança do uso dos recursos hídricos em sua áreas de atuação. Podem prestar serviços para mais de um Comitê. 251 As Agências de Águas em rios de domínio da União previstas na Lei nº 9.433, de 1997, atuarão como secretarias executivas do respectivo Comitê de Bacia Hidrográfica. A criação das Agências está condicionada, em cada bacia, à prévia existência do respectivo Comitê de Bacia Hidrográfica e à sua viabilidade financeira. As principais competências da Agência de Água, previstas na Lei das Águas, são: • manter balanço hídrico da bacia atualizado; • manter o cadastro de usuários e efetuar, mediante delegação do outorgante, a cobrança pelo uso de recursos hídricos; • analisar e emitir pareceres sobre os projetos e as obras a serem financiados com recursos gerados pela cobrança pelo uso dos recursos hídricos e encaminhá-los à instituição financeira responsável pela administração desses recursos; • acompanhar a administração financeira dos recursos arrecadados com a cobrança pelo uso dos recursos hídricos em sua área de atuação; • gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos em sua área de atuação; • celebrar convênios e contratar financiamentos e serviços para a execução de suas competências; • promover os estudos necessários para a gestão de recursos hídricos em sua área de atuação; • elaborar o Plano de Recursos Hídricos para apreciação do respectivo Comitê de Bacia Hidrográfica; • propor ao respectivo Comitê de Bacia Hidrográfica o enquadramento dos corpos de água nas classes de uso, os valores a serem cobrados pelo uso dos recursos hídricos, o plano de aplicação de recursos e o rateio de custos das obras de uso múltiplo. 251 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 6ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002. p. 604. Água na Visão do Direito – 111 A figura jurídica das Agências de Água em rios de domínio da União deverá ser estabelecida por uma lei específica. A criação desses entes dependerá da autorização do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, ou dos respectivos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, mediante solicitação de um ou mais Comitê de Bacia Hidrográfica. A área de atuação das Agências de Água, em rios de domínio federal, deverá ser a bacia hidrográfica do Comitê solicitante. Essa área de atuação poderá se estender a mais de uma bacia hidrográfica, se os Comitês dessas bacias assim desejarem. Cada Estado brasileiro poderá estabelecer, segundo as especificidades locais, a figura jurídica que melhor provier, para a Agência de Água (ou de Bacia). O Estado de São Paulo, por exemplo, criou através da Lei nº 10.020/ 98, a figura de Agências de Bacia como Fundação de Direito Privado.252 3.3 O SISTEMA ESTADUAL DOS RECURSOS HÍDRICOS RIO GRANDE DO SUL A busca de soluções para a crise da água253 , instituiu o Sistema Estadual de Recursos Hídricos, no Rio Grande do Sul. Este Sistema se fundamenta num modelo de gerenciamento caracterizado pela descentralização das decisões e pela ampla participação da sociedade organizada em Comitês de Bacias. Assim, mesmo que o Estado seja o detentor do domínio das águas (superficiais e subterrâneas) de seu território, conforme determina a Constituição Federal, ele compartilha a sua gestão com a população envolvida. 3.3.1 COMPOSIÇÃO O Sistema Estadual dos Recursos Hídricos é composto pelo Departamento de Recursos Hídricos, os Comitês de Bacias, Agências de Regiões Hidrográficas e a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM). 252 Disponível em http://www:cnnrh-srh.gov.br. Acesso em 26 abr. 2005. A crescente escassez da água foi definida pela UNESCO como o problema ambiental mais grave deste século. A drenagem indiscriminada e a poluição dos recursos hídricos têm acentuado os conflitos pelos diversos usos deste bem, tais como: abastecimento de populações e irrigação de lavouras; diluição de esgoto doméstico e industrial e pesca; geração de energia e lazer; entre outros. 253 112 – Água na Visão do Direito 3.3.1.1 O DEPARTAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS – DRH O DRH é órgão da administração direta, responsável pela integração do Sistema Estadual de Recursos Hídricos, que concede a outorga do uso da água e subsidia tecnicamente o CRH, notadamente no que tange à coordenação, ao acompanhamento da execução e à elaboração do anteprojeto de Lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos. São atribuições do DRH: elaborar o anteprojeto de lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos; coordenar e acompanhar a execução do Plano Estadual de Recursos Hídricos; propor ao Conselho de Recursos Humanos critérios para a outorga do uso da água e expedir as respectivas autorizações de uso; regulamentar a operação e uso dos equipamentos e mecanismos de gestão dos recursos hídricos; elaborar Relatório Anual sobre a situação dos recursos hídricos no Estado; assistir tecnicamente o CRH. É importante considerar que a Lei nº 10.350, de 30 de dezembro de 1994, em seu art. 10, estabeleceu a criação do DRH na então Secretaria Estadual de Planejamento Territorial e Obras, atual Secretaria Estadual das Obras Públicas e Saneamento (SOPS). Todavia, na época, não foi efetivada a criação do DRH nos moldes definidos pela legislação. Em verdade, foi criado o Departamento de Recursos Hídricos e Saneamento (DRHS), no qual havia a Divisão de Recursos Hídricos. Essa Divisão ficou com as atribuições do Departamento preconizado pela Lei das Águas. A Lei n.º 11.362, de 29 de junho de 1999, introduziu modificações na estrutura organizacional do Estado, e criou a Secretaria Estadual do Meio Ambiente - SEMA. No que tange ao Sistema, a referida lei determinou importantes alterações, quais sejam: • a SEMA passa a atuar como órgão de integração do Sistema Estadual de Recursos Hídricos e na coordenação de programas de desenvolvimento sustentável em bacias hidrográficas; • são transferidos para a SEMA a Divisão de Recursos Hídricos pertencente à SOPS, com seus recursos humanos, financeiros, patrimoniais e atribuições. Assim, somente na SEMA, a Divisão de Recursos Hídricos adquiriu o status de Departamento, atendendo, afinal, o estabelecido pela Lei n.º 10.350/94. No entanto, a Lei nº 11.362/99 não contemplou o FRH e a Presidência do CRH. Isso, de uma certa forma, dificultou o processo de implementação do Sistema, uma vez que as atividades inerentes ao Fundo e a Presidência do CRH foram mantidas na SOPS. Água na Visão do Direito – 113 A Lei nº 11.560/2000 veio corrigir as lacunas anteriormente deixadas. Introduzindo modificações na Lei nº 10.350/94, a lei em questão estabeleceu: • Secretário Estadual do Meio Ambiente como Presidente do CRH e o das Obras Públicas e Saneamento como Vice-Presidente; • a vinculação do FRH à SEMA. A estrutura do DRH foi estabelecida pelo Regimento Interno da Secretaria Estadual do Meio Ambiente, aprovado pelo Decreto nº 10.931, de 02 de agosto de 2001. Assim, na Seção III, que trata dos Órgãos de Execução da Secretaria, tem-se o seguinte: Art. 8º - Ao Departamento de Recursos Hídricos compete: • elaborar o anteprojeto de lei do Plano Estadual dos Recursos Hídricos através da compatibilização das propostas encaminhadas pelos Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica com os planos e diretrizes setoriais do Estado, relativos às atividades que interferem nos recursos hídricos; • coordenar e acompanhar a execução do Plano Estadual de Recursos Hídricos; • propor ao Conselho de Recursos Hídricos critérios para a outorga do uso da água dos corpos de água sob o domínio estadual e expedir as respectivas autorizações; • regulamentar a operação e uso dos equipamentos e mecanismos de gestão dos recursos hídricos, tais como redes hidrometeorológicas, banco de dados hidrometeorológicos, cadastros de usuários das águas; • elaborar o relatório anual sobre a situação dos recursos hídricos no Estado para apreciação pelos comitês, na forma do art. 19, IV, com vista à sua divulgação pública; • assistir tecnicamente ao Conselho de Recursos Hídricos. Art. 9º - À Divisão de Outorga e Fiscalização do uso dos Recursos Hídricos compete: • implementar ações referentes ao gerenciamento e fiscalização do uso dos recursos hídricos; • conceder a outorga de uso das águas de domínio do Estado; • conceder licença para a execução de obras hidráulicas, a que se refere a Lei nº 2434/54; 114 – Água na Visão do Direito • • • • promover a articulação do sistema de outorga com o processo de licenciamento ambiental. Art. 10 - À Seção de Controle e Autorização do uso das Águas compete: instruir processos de outorga do uso das águas; elaborar e manter atualizado o cadastro de usuários das águas; executar outras atividades correlatas. Art. 11 - À Seção Fiscalização e controle de obras em recursos hídricos compete: • promover e supervisionar as ações de fiscalização e controle do uso das águas de domínio do Estado; • instruir os processos de licenciamento para obras a que se refere a Lei nº 2434/54; • executar outras atividades correlatas. Art. 12 - À Divisão de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos compete: • planejar e coordenar planos, estudos, programas e projetos que envolvam os recursos hídricos de domínio do Estado; • coordenar a elaboração de planos estaduais de recursos hídricos; • planejar e coordenar a rede de monitoramento quantitativo dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos no âmbito do estado do RS; • regulamentar a operação e uso dos equipamentos e mecanismos de gestão dos recursos hídricos, tais como redes hidrometeorológicas e o banco de dados hidrometeorológicos ; • implantar e gerenciar o sistema de informações em recursos hídricos. Art. 13 - À Seção de Apoio Técnico Operacional compete: • prestar apoio técnico ao Sistema Estadual de Recursos Hídricos; • regulamentar, garantir a operação e a manutenção do banco de dados hidrometeorológicos; • regulamentar, garantir a operação e a manutenção da rede de monitoramento quantitativo; • implantar e gerenciar o sistema de informações em recursos hídricos; • executar outras atividades correlatas. Água na Visão do Direito – 115 Art.14 - À Seção de Planejamento do Uso das Águas compete: • planejar e coordenar planos, estudos, programas e projetos que envolvam os recursos hídricos de domínio do Estado; • planejar e implantar o Sistema de Alerta e Controle de Cheias e Estiagens; • coordenar a elaboração de planos estaduais de recursos hídricos; • executar outras atividades correlatas. 3.3.1.2 COMITÊS DE BACIAS OS COMITÊS DE GERENCIAMENTO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS – CGBH Os Comitês de Gerenciamento de Bacias Hidrográficas – CGBH- representam a instância básica de participação da sociedade no Sistema. Trata-se de colegiados instituídos oficialmente pelo Governo do Estado. Exercem poder deliberativo, uma vez que é no seu âmbito que são estabelecidas as prioridades de uso e as intervenções necessárias à gestão das águas de uma bacia hidrográfica, bem como devem ser dirimidos, em primeira instância, os eventuais conflitos. Conforme Grassi (1999), a composição qualitativa dos comitês deve considerar as funções e os interesses dos usuários, públicos e privados, e da população da bacia, com referência ao bem público água. Neste particular, os usuários se distinguem pelos “interesses utilitários - econômicos e sociais”; a população, pelos “interesses difusos vinculados ao desenvolvimento sócio-econômico local ou regional, a aspectos culturais ou políticos, à proteção ambiental”, entre outros; e o poder público, como detentor do domínio das águas. A Lei n.º 10.350/94, estabelece a proporção de representatividade nos comitê, na qual 40% será destinado aos representantes dos usuários da água, 40% aos representantes da população e 20% aos representantes de órgãos públicos da administração direta estadual e federal. Dentre as atribuições dos CGBH estão: encaminhar ao DRH proposta relativa à própria bacia para ser incluída no anteprojeto de lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos; conhecer e manifestar-se sobre o anteprojeto de lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos; aprovar o Plano da respectiva bacia e acompanhar a sua implementação; apreciar o relatório anual sobre a situação dos recursos hídricos, no Estado; propor ao órgão competente o enquadramento dos corpos de água da bacia; aprovar os valores a serem cobrados pelo uso da água; realizar o rateio do custo das obras a serem 116 – Água na Visão do Direito executadas na bacia; aprovar os programas anuais e plurianuais de investimentos em serviços e obras da bacia; compatibilizar os interesses dos diferentes usuários e resolver eventuais conflitos em primeira instância. 3.3.1.3 AS AGÊNCIAS DE REGIÕES HIDROGRÁFICAS Para implementar a Política de Recursos Hídricos, que representa um dos principais objetivos deste Sistema, o Estado foi dividido em três Regiões Hidrográficas, a do Guaíba, a do Uruguai e a das Bacias Litorâneas, e em 23 bacias hidrográficas. Para cada bacia está destinado um comitê, garantindo, desta forma, que os seus respectivos cidadãos participem de um processo contínuo e solidário, ou seja, do gerenciamento de suas águas. A Lei das Águas prevê a criação de três Agências de Região Hidrográfica, uma para cada região hidrográfica: a da Bacia do Uruguai, a da Bacia do Guaíba e a das Bacias Litorâneas. Estas serão instituídas por lei e estarão integradas à Administração Indireta do Estado. Sua função principal é a de prestar apoio técnico ao Sistema Estadual de Recursos Hídricos. Entre as atribuições estão: assessorar tecnicamente os comitês de bacias na elaboração de propostas relativas ao Plano Estadual de Recursos Hídricos, no preparo dos Planos de Bacia e na tomada de decisões que demandem estudos técnicos; subsidiar os comitês na proposição do enquadramento dos corpos de água; manter e operar equipamentos e mecanismos de gestão; arrecadar e aplicar os valores correspondentes à cobrança pelo uso da água. Mapa das Regiões Hidrográficas do Rio Grande do Sul254 254 Disponível em http://www.sema.rs.gov.br. Acesso em 27 abr 2005. Água na Visão do Direito – 117 3.3.1.4 FEPAM – FUNDAÇÃO ESTADUAL DE PROTEÇÃO AMBIENTAL Órgão ambiental do Estado que integra o Sistema com atribuições específicas, relativas às interfaces com o Sistema Estadual de Meio Ambiente. Assim, caberá à FEPAM a concessão de outorga quando se referir a usos que afetem as condições qualitativas dos recursos hídricos (art. 29, §2º). Além disso, é atribuição do órgão ambiental a aprovação do enquadramento dos corpos de água, de acordo com os objetivos de qualidade, com base na proposta elaborada pelos comitês de bacias. CAPÍTULO 4 – LEGISLAÇÃO 4.1 LEI Nº 9.433, DE 8 DE JANEIRO DE 1997. 255 Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, regulamenta o inciso XIX do art. 21 da Constituição Federal, e altera o art. 1º da Lei nº 8.001, de 13 de março de 1990, que modificou a Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: TÍTULO I Da Política Nacional de Recursos Hídricos CAPÍTULO I Dos Fundamentos Art. 1 - A Política Nacional de Recursos Hídricos baseia-se nos seguintes fundamentos: I - a água é um bem de domínio público; II - a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico; III - em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais; IV - a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas; 255 Atualizada até 29.04.2005. 120 – Água na Visão do Direito V - a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos; VI - a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades. CAPÍTULO II Dos Objetivos Art. 2 - São objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos: I - assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos; II - a utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o transporte aquaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável; III - a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos recursos naturais. CAPÍTULO III Das Diretrizes Gerais de Ação Art. 3 - Constituem diretrizes gerais de ação para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos: I - a gestão sistemática dos recursos hídricos, sem dissociação dos aspectos de quantidade e qualidade; II - a adequação da gestão de recursos hídricos às diversidades físicas, bióticas, demográficas, econômicas, sociais e culturais das diversas regiões do País; III - a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental; IV - a articulação do planejamento de recursos hídricos com o dos setores usuários e com os planejamentos regional, estadual e nacional; V - a articulação da gestão de recursos hídricos com a do uso do solo; VI - a integração da gestão das bacias hidrográficas com a dos sistemas estuarinos e zonas costeiras. Art. 4 - A União articular-se-á com os Estados tendo em vista o gerenciamento dos recursos hídricos de interesse comum. Água na Visão do Direito – 121 CAPÍTULO IV Dos Instrumentos Art. 5 - São instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos: I - os Planos de Recursos Hídricos; II - o enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os usos preponderantes da água; III - a outorga dos direitos de uso de recursos hídricos; IV - a cobrança pelo uso de recursos hídricos; V - a compensação a municípios; VI - o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos. SEÇÃO I Dos Planos de Recursos Hídricos Art. 6 - Os Planos de Recursos Hídricos são planos diretores que visam a fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e o gerenciamento dos recursos hídricos. Art. 7 - Os Planos de Recursos Hídricos são planos de longo prazo, com horizonte de planejamento compatível com o período de implantação de seus programas e projetos e terão o seguinte conteúdo mínimo: I - diagnóstico da situação atual dos recursos hídricos; II - análise de alternativas de crescimento demográfico, de evolução de atividades produtivas e de modificações dos padrões de ocupação do solo; III - balanço entre disponibilidades e demandas futuras dos recursos hídricos, em quantidade e qualidade, com identificação de conflitos potenciais; IV - metas de racionalização de uso, aumento da quantidade e melhoria da qualidade dos recursos hídricos disponíveis; V - medidas a serem tomadas, programas a serem desenvolvidos e projetos a serem implantados, para o atendimento das metas previstas; VI - (VETADO) VII - (VETADO) VIII - prioridades para outorga de direitos de uso de recursos hídricos; IX - diretrizes e critérios para a cobrança pelo uso dos recursos hídricos; X - propostas para a criação de áreas sujeitas a restrição de uso, com vistas à proteção dos recursos hídricos. 122 – Água na Visão do Direito Art. 8 - Os Planos de Recursos Hídricos serão elaborados por bacia hidrográfica, por Estado e para o País. SEÇÃO II Do Enquadramento dos Corpos de Água em Classes, Segundo os Usos Preponderantes da Água Art. 9 - O enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os usos preponderantes da água, visa a: I - assegurar às águas qualidade compatível com os usos mais exigentes a que forem destinadas; II - diminuir os custos de combate à poluição das águas, mediante ações preventivas permanentes. Art. 10 - As classes de corpos de água serão estabelecidas pela legislação ambiental. SEÇÃO III Da Outorga de Direitos de Uso de Recursos Hídricos Art. 11 - O regime de outorga de direitos de uso de recursos hídricos tem como objetivos assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos direitos de acesso à água. Art. 12 - Estão sujeitos a outorga pelo Poder Público os direitos dos seguintes usos de recursos hídricos: I - derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de água para consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo; II - extração de água de aqüífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo; III - lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final; IV - aproveitamento dos potenciais hidrelétricos; V - outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de água. Água na Visão do Direito – 123 § 1º Independem de outorga pelo Poder Público, conforme definido em regulamento: I - o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural; II - as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes; III - as acumulações de volumes de água consideradas insignificantes. § 2º A outorga e a utilização de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica estará subordinada ao Plano Nacional de Recursos Hídricos, aprovado na forma do disposto no inciso VIII do art. 35 desta Lei, obedecida a disciplina da legislação setorial específica. Art. 13 - Toda outorga estará condicionada às prioridades de uso estabelecidas nos Planos de Recursos Hídricos e deverá respeitar a classe em que o corpo de água estiver enquadrado e a manutenção de condições adequadas ao transporte aquaviário, quando for o caso. Parágrafo único. A outorga de uso dos recursos hídricos deverá preservar o uso múltiplo destes. Art. 14 - A outorga efetivar-se-á por ato da autoridade competente do Poder Executivo Federal, dos Estados ou do Distrito Federal. § 1º O Poder Executivo Federal poderá delegar aos Estados e ao Distrito Federal competência para conceder outorga de direito de uso de recurso hídrico de domínio da União. § 2º (VETADO) Art. 15 - A outorga de direito de uso de recursos hídricos poderá ser suspensa parcial ou totalmente, em definitivo ou por prazo determinado, nas seguintes circunstâncias: I - não cumprimento pelo outorgado dos termos da outorga; II - ausência de uso por três anos consecutivos; III - necessidade premente de água para atender a situações de calamidade, inclusive as decorrentes de condições climáticas adversas; IV - necessidade de se prevenir ou reverter grave degradação ambiental; V - necessidade de se atender a usos prioritários, de interesse coletivo, para os quais não se disponha de fontes alternativas; VI - necessidade de serem mantidas as características de navegabilidade do corpo de água. Art. 16 - Toda outorga de direitos de uso de recursos hídricos far-se-á por prazo não excedente a trinta e cinco anos, renovável. 124 – Água na Visão do Direito Art. 17 - (VETADO) Art. 18 – A outorga não implica a alienação parcial das águas, que são inalienáveis, mas o simples direito de seu uso. SEÇÃO IV Da Cobrança do Uso de Recursos Hídricos Art. 19 - A cobrança pelo uso de recursos hídricos objetiva: I - reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor; II - incentivar a racionalização do uso da água; III - obter recursos financeiros para o financiamento dos programas e intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos. Art. 20 - Serão cobrados os usos de recursos hídricos sujeitos a outorga, nos termos do art. 12 desta Lei. Parágrafo único. (VETADO) Art. 21 - Na fixação dos valores a serem cobrados pelo uso dos recursos hídricos devem ser observados, dentre outros: I - nas derivações, captações e extrações de água, o volume retirado e seu regime de variação; II - nos lançamentos de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, o volume lançado e seu regime de variação e as características físico-químicas, biológicas e de toxidade do afluente. Art. 22 - Os valores arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos hídricos serão aplicados prioritariamente na bacia hidrográfica em que foram gerados e serão utilizados: I - no financiamento de estudos, programas, projetos e obras incluídos nos Planos de Recursos Hídricos; II - no pagamento de despesas de implantação e custeio administrativo dos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. § 1º A aplicação nas despesas previstas no inciso II deste artigo é limitada a sete e meio por cento do total arrecadado. Água na Visão do Direito – 125 § 2º Os valores previstos no caput deste artigo poderão ser aplicados a fundo perdido em projetos e obras que alterem, de modo considerado benéfico à coletividade, a qualidade, a quantidade e o regime de vazão de um corpo de água. § 3º (VETADO) Art. 23 - (VETADO) SEÇÃO V Da Compensação a Municípios Art. 24 - (VETADO) SEÇÃO VI Do Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos Art. 25 - O Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos é um sistema de coleta, tratamento, armazenamento e recuperação de informações sobre recursos hídricos e fatores intervenientes em sua gestão. Parágrafo único. Os dados gerados pelos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos serão incorporados ao Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos. Art. 26 - São princípios básicos para o funcionamento do Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos: I - descentralização da obtenção e produção de dados e informações; II - coordenação unificada do sistema; III - acesso aos dados e informações garantido à toda a sociedade. Art. 27 - São objetivos do Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos: I - reunir, dar consistência e divulgar os dados e informações sobre a situação qualitativa e quantitativa dos recursos hídricos no Brasil; II - atualizar permanentemente as informações sobre disponibilidade e demanda de recursos hídricos em todo o território nacional; III - fornecer subsídios para a elaboração dos Planos de Recursos Hídricos. 126 – Água na Visão do Direito CAPÍTULO V Do Rateio de Custos das Obras de Uso Múltiplo, de Interesse Comum ou Coletivo Art. 28 - (VETADO) CAPÍTULO VI Da Ação do Poder Público Art. 29 - Na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, compete ao Poder Executivo Federal: I - tomar as providências necessárias à implementação e ao funcionamento do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos; II - outorgar os direitos de uso de recursos hídricos, e regulamentar e fiscalizar os usos, na sua esfera de competência; III - implantar e gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, em âmbito nacional; IV - promover a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental. Parágrafo único. O Poder Executivo Federal indicará, por decreto, a autoridade responsável pela efetivação de outorgas de direito de uso dos recursos hídricos sob domínio da União. Art. 30 - Na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, cabe aos Poderes Executivos Estaduais e do Distrito Federal, na sua esfera de competência: I - outorgar os direitos de uso de recursos hídricos e regulamentar e fiscalizar os seus usos; II - realizar o controle técnico das obras de oferta hídrica; III - implantar e gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, em âmbito estadual e do Distrito Federal; IV - promover a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental. Art. 31 - Na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, os Poderes Executivos do Distrito Federal e dos municípios promoverão a integração das políticas locais de saneamento básico, de uso, ocupação e conservação do solo e de meio ambiente com as políticas federal e estaduais de recursos hídricos. Água na Visão do Direito – 127 TÍTULO II Do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos CAPÍTULO I Dos Objetivos e da Composição Art. 32 - Fica criado o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, com os seguintes objetivos: I - coordenar a gestão integrada das águas; II - arbitrar administrativamente os conflitos relacionados com os recursos hídricos; III - implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos; IV - planejar, regular e controlar o uso, a preservação e a recuperação dos recursos hídricos; V - promover a cobrança pelo uso de recursos hídricos. Art. 33 - Integram o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos: I – o Conselho Nacional de Recursos Hídricos; (Redação dada pela Lei 9.984, de 2000) I-A. – a Agência Nacional de Águas; II – os Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal;III – os Comitês de Bacia Hidrográfica; IV – os órgãos dos poderes públicos federal, estaduais, do Distrito Federal e municipais cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos; V – as Agências de Água. (caput e incisos com redação alterada pela Lei 9.984, de 2000) CAPÍTULO II Do Conselho Nacional de Recursos Hídricos Art. 34 - O Conselho Nacional de Recursos Hídricos é composto por: I - representantes dos Ministérios e Secretarias da Presidência da República com atuação no gerenciamento ou no uso de recursos hídricos; II - representantes indicados pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos; III - representantes dos usuários dos recursos hídricos; 128 – Água na Visão do Direito IV - representantes das organizações civis de recursos hídricos. Parágrafo único. O número de representantes do Poder Executivo Federal não poderá exceder à metade mais um do total dos membros do Conselho Nacional de Recursos Hídricos. Art. 35 - Compete ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos: I - promover a articulação do planejamento de recursos hídricos com os planejamentos nacional, regional, estaduais e dos setores usuários; II - arbitrar, em última instância administrativa, os conflitos existentes entre Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos; III - deliberar sobre os projetos de aproveitamento de recursos hídricos cujas repercussões extrapolem o âmbito dos Estados em que serão implantados; IV - deliberar sobre as questões que lhe tenham sido encaminhadas pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos ou pelos Comitês de Bacia Hidrográfica; V - analisar propostas de alteração da legislação pertinente a recursos hídricos e à Política Nacional de Recursos Hídricos; VI - estabelecer diretrizes complementares para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, aplicação de seus instrumentos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos; VII - aprovar propostas de instituição dos Comitês de Bacia Hidrográfica e estabelecer critérios gerais para a elaboração de seus regimentos; VIII - (VETADO) IX - acompanhar a execução do Plano Nacional de Recursos Hídricos e determinar as providências necessárias ao cumprimento de suas metas; IX – acompanhar a execução e aprovar o Plano Nacional de Recursos Hídricos e determinar as providências necessárias ao cumprimento de suas metas; X - estabelecer critérios gerais para a outorga de direitos de uso de recursos hídricos e para a cobrança por seu uso. (redação do inciso IX alterado pela Lei 9.984, de 2000) Art. 36 - O Conselho Nacional de Recursos Hídricos será gerido por: I - um Presidente, que será o Ministro titular do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal; II - um Secretário Executivo, que será o titular do órgão integrante da estrutura do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, responsável pela gestão dos recursos hídricos. Água na Visão do Direito – 129 CAPÍTULO III Dos Comitês de Bacia Hidrográfica Art. 37 - Os Comitês de Bacia Hidrográfica terão como área de atuação: I - a totalidade de uma bacia hidrográfica; II - sub-bacia hidrográfica de tributário do curso de água principal da bacia, ou de tributário desse tributário; ou III - grupo de bacias ou sub-bacias hidrográficas contíguas. Parágrafo único. A instituição de Comitês de Bacia Hidrográfica em rios de domínio da União será efetivada por ato do Presidente da República. Art. 38 - Compete aos Comitês de Bacia Hidrográfica, no âmbito de sua área de atuação: I - promover o debate das questões relacionadas a recursos hídricos e articular a atuação das entidades intervenientes; II - arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados aos recursos hídricos; III - aprovar o Plano de Recursos Hídricos da bacia; IV - acompanhar a execução do Plano de Recursos Hídricos da bacia e sugerir as providências necessárias ao cumprimento de suas metas; V - propor ao Conselho Nacional e aos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos as acumulações, derivações, captações e lançamentos de pouca expressão, para efeito de isenção da obrigatoriedade de outorga de direitos de uso de recursos hídricos, de acordo com os domínios destes; VI - estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir os valores a serem cobrados; VII - (VETADO) VIII - (VETADO) IX - estabelecer critérios e promover o rateio de custo das obras de uso múltiplo, de interesse comum ou coletivo. Parágrafo único. Das decisões dos Comitês de Bacia Hidrográfica caberá recurso ao Conselho Nacional ou aos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, de acordo com sua esfera de competência. Art. 39 - Os Comitês de Bacia Hidrográfica são compostos por representantes: I - da União; 130 – Água na Visão do Direito II - dos Estados e do Distrito Federal cujos territórios se situem, ainda que parcialmente, em suas respectivas áreas de atuação; III - dos Municípios situados, no todo ou em parte, em sua área de atuação; IV - dos usuários das águas de sua área de atuação; V - das entidades civis de recursos hídricos com atuação comprovada na bacia. § 1º O número de representantes de cada setor mencionado neste artigo, bem como os critérios para sua indicação, serão estabelecidos nos regimentos dos comitês, limitada a representação dos poderes executivos da União, Estados, Distrito Federal e Municípios à metade do total de membros. § 2º Nos Comitês de Bacia Hidrográfica de bacias de rios fronteiriços e transfronteiriços de gestão compartilhada, a representação da União deverá incluir um representante do Ministério das Relações Exteriores. § 3º Nos Comitês de Bacia Hidrográfica de bacias cujos territórios abranjam terras indígenas devem ser incluídos representantes: I - da Fundação Nacional do Índio - FUNAI, como parte da representação da União; II - das comunidades indígenas ali residentes ou com interesses na bacia. § 4º A participação da União nos Comitês de Bacia Hidrográfica com área de atuação restrita a bacias de rios sob domínio estadual, dar-se-á na forma estabelecida nos respectivos regimentos. Art. 40 - Os Comitês de Bacia Hidrográfica serão dirigidos por um Presidente e um Secretário, eleitos dentre seus membros. CAPÍTULO IV Das Agências de Água Art. 41 - As Agências de Água exercerão a função de secretaria executiva do respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica. Art. 42 - As Agências de Água terão a mesma área de atuação de um ou mais Comitês de Bacia Hidrográfica. Parágrafo único. A criação das Agências de Água será autorizada pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos ou pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos mediante solicitação de um ou mais Comitês de Bacia Hidrográfica. Água na Visão do Direito – 131 Art. 43 - A criação de uma Agência de Água é condicionada ao atendimento dos seguintes requisitos: I - prévia existência do respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica; II - viabilidade financeira assegurada pela cobrança do uso dos recursos hídricos em sua área de atuação. Art. 44 - Compete às Agências de Água, no âmbito de sua área de atuação: I - manter balanço atualizado da disponibilidade de recursos hídricos em sua área de atuação; II - manter o cadastro de usuários de recursos hídricos; III - efetuar, mediante delegação do outorgante, a cobrança pelo uso de recursos hídricos; IV - analisar e emitir pareceres sobre os projetos e obras a serem financiados com recursos gerados pela cobrança pelo uso de Recursos Hídricos e encaminhá-los à instituição financeira responsável pela administração desses recursos; V - acompanhar a administração financeira dos recursos arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos hídricos em sua área de atuação; VI - gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos em sua área de atuação; VII - celebrar convênios e contratar financiamentos e serviços para a execução de suas competências; VIII - elaborar a sua proposta orçamentária e submetê-la à apreciação do respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica; IX - promover os estudos necessários para a gestão dos recursos hídricos em sua área de atuação; X - elaborar o Plano de Recursos Hídricos para apreciação do respectivo Comitê de Bacia Hidrográfica; XI - propor ao respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica: a) o enquadramento dos corpos de água nas classes de uso, para encaminhamento ao respectivo Conselho Nacional ou Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, de acordo com o domínio destes; b) os valores a serem cobrados pelo uso de recursos hídricos; c) o plano de aplicação dos recursos arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos hídricos; d) o rateio de custo das obras de uso múltiplo, de interesse comum ou coletivo. 132 – Água na Visão do Direito CAPÍTULO V Da Secretaria Executiva do Conselho Nacional de Recursos Hídricos Art. 45 - A Secretaria Executiva do Conselho Nacional de Recursos Hídricos será exercida pelo órgão integrante da estrutura do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, responsável pela gestão dos recursos hídricos. Art. 46 - Compete à Secretaria Executiva do Conselho Nacional de Recursos Hídricos: I – prestar apoio administrativo, técnico e financeiro ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos; II – REVOGADO; III – instruir os expedientes provenientes dos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos e dos Comitês de Bacia Hidrográfica; IV – REVOGADO; V – elaborar seu programa de trabalho e respectiva proposta orçamentária anual e submetê-los à aprovação do Conselho Nacional de Recursos Hídricos. (redação do caput e incisos alterada pela Lei 9.984, de 2000) CAPÍTULO VI Das Organizações Civis de Recursos Hídricos Art. 47 - São consideradas, para os efeitos desta Lei, organizações civis de recursos hídricos: I - consórcios e associações intermunicipais de bacias hidrográficas; II - associações regionais, locais ou setoriais de usuários de recursos hídricos; III - organizações técnicas e de ensino e pesquisa com interesse na área de recursos hídricos; IV - organizações não-governamentais com objetivos de defesa de interesses difusos e coletivos da sociedade; V - outras organizações reconhecidas pelo Conselho Nacional ou pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos. Art. 48 - Para integrar o Sistema Nacional de Recursos Hídricos, as organizações civis de recursos hídricos devem ser legalmente constituídas. Água na Visão do Direito – 133 TÍTULO III Das Infrações e Penalidades Art. 49 - Constitui infração das normas de utilização de recursos hídricos superficiais ou subterrâneos: I - derivar ou utilizar recursos hídricos para qualquer finalidade, sem a respectiva outorga de direito de uso; II - iniciar a implantação ou implantar empreendimento relacionado com a derivação ou a utilização de recursos hídricos, superficiais ou subterrâneos, que implique alterações no regime, quantidade ou qualidade dos mesmos, sem autorização dos órgãos ou entidades competentes; III - (VETADO) IV - utilizar-se dos recursos hídricos ou executar obras ou serviços relacionados com os mesmos em desacordo com as condições estabelecidas na outorga; V - perfurar poços para extração de água subterrânea ou operá-los sem a devida autorização; VI - fraudar as medições dos volumes de água utilizados ou declarar valores diferentes dos medidos; VII - infringir normas estabelecidas no regulamento desta Lei e nos regulamentos administrativos, compreendendo instruções e procedimentos fixados pelos órgãos ou entidades competentes; VIII - obstar ou dificultar a ação fiscalizadora das autoridades competentes no exercício de suas funções. Art. 50 - Por infração de qualquer disposição legal ou regulamentar referentes à execução de obras e serviços hidráulicos, derivação ou utilização de recursos hídricos de domínio ou administração da União, ou pelo não atendimento das solicitações feitas, o infrator, a critério da autoridade competente, ficará sujeito às seguintes penalidades, independentemente de sua ordem de enumeração: I - advertência por escrito, na qual serão estabelecidos prazos para correção das irregularidades; II - multa, simples ou diária, proporcional à gravidade da infração, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 10.000,00 (dez mil reais); III - embargo provisório, por prazo determinado, para execução de serviços e obras necessárias ao efetivo cumprimento das condições de outorga ou para o cumprimento de normas referentes ao uso, controle, conservação e 134 – Água na Visão do Direito proteção dos recursos hídricos; IV - embargo definitivo, com revogação da outorga, se for o caso, para repor incontinenti, no seu antigo estado, os recursos hídricos, leitos e margens, nos termos dos arts. 58 e 59 do Código de Águas ou tamponar os poços de extração de água subterrânea. § 1º Sempre que da infração cometida resultar prejuízo a serviço público de abastecimento de água, riscos à saúde ou à vida, perecimento de bens ou animais, ou prejuízos de qualquer natureza a terceiros, a multa a ser aplicada nunca será inferior à metade do valor máximo cominado em abstrato. § 2º No caso dos incisos III e IV, independentemente da pena de multa, serão cobradas do infrator as despesas em que incorrer a Administração para tornar efetivas as medidas previstas nos citados incisos, na forma dos arts. 36, 53, 56 e 58 do Código de Águas, sem prejuízo de responder pela indenização dos danos a que der causa. § 3º Da aplicação das sanções previstas neste título caberá recurso à autoridade administrativa competente, nos termos do regulamento. § 4º Em caso de reincidência, a multa será aplicada em dobro. TÍTULO IV Das Disposições Gerais e Transitórias Art. 51 - O Conselho Nacional de Recursos Hídricos e os Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos poderão delegar a organizações sem fins lucrativos relacionadas no art. 47 desta Lei, por prazo determinado, o exercício de funções de competência das Agências de Água, enquanto esses organismos não estiverem constituídos. (artigo com redação alterada pela Lei nº 10.881, de 2004) Art. 52 - Enquanto não estiver aprovado e regulamentado o Plano Nacional de Recursos Hídricos, a utilização dos potenciais hidráulicos para fins de geração de energia elétrica continuará subordinada à disciplina da legislação setorial específica. Art. 53 - O Poder Executivo, no prazo de cento e vinte dias a partir da publicação desta Lei, encaminhará ao Congresso Nacional projeto de lei dispondo sobre a criação das Agências de Água. Art. 54 - O art. 1º da Lei nº 8.001, de 13 de março de 1990, passa a vigorar com a seguinte redação: Água na Visão do Direito – 135 “Art. 1º ............................................................................. ........................................................................................ III - quatro inteiros e quatro décimos por cento à Secretaria de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal; IV - três inteiros e seis décimos por cento ao Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica - DNAEE, do Ministério de Minas e Energia; V - dois por cento ao Ministério da Ciência e Tecnologia. ................................................................................... § 4º A cota destinada à Secretaria de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal será empregada na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e na gestão da rede hidrometeorológica nacional. § 5º A cota destinada ao DNAEE será empregada na operação e expansão de sua rede hidrometeorológica, no estudo dos recursos hídricos e em serviços relacionados ao aproveitamento da energia hidráulica.” Parágrafo único. Os novos percentuais definidos no caput deste artigo entrarão em vigor no prazo de cento e oitenta dias contados a partir da data de publicação desta Lei. Art. 55 - O Poder Executivo Federal regulamentará esta Lei no prazo de cento e oitenta dias, contados da data de sua publicação. Art. 56 - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 57 - Revogam-se as disposições em contrário. FERNANDO HENRIQUE CARDOSO 136 – Água na Visão do Direito 4.2 LEI Nº 10.350, DE 30 DE DEZEMBRO DE 1994. 256 Institui o Sistema Estadual de Recursos Hídricos, regulamentando o artigo 171 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul. O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Faço saber, em cumprimento ao disposto no artigo 82, inciso IV da Constituição do Estado, que a Assembléia Legislativa aprovou e eu sanciono e promulgo a Lei seguinte: CAPÍTULO I Da Política Estadual de Recursos Hídricos SEÇÃO I Dos Objetivos e Princípios Art. 1 - A água é um recurso natural de disponibilidade limitada e dotado de valor econômico que, enquanto bem público de domínio do Estado, terá sua gestão definida através de uma Política de Recursos Hídricos, nos termos desta Lei. Parágrafo único - Para os efeitos desta Lei, os recursos hídricos são considerados na unidade do ciclo hidrológico, compreendendo as fases aérea, superficial e subterrânea, e tendo a bacia hidrográfica como unidade básica de intervenção. Art. 2 - A Política Estadual de Recursos Hídricos tem por objetivo promover a harmonização entre os múltiplos e competitivos usos dos recursos hídricos e sua limitada e aleatória disponibilidade temporal e espacial, de modo a: I - assegurar o prioritário abastecimento da população humana e permitir a continuidade e desenvolvimento das atividades econômicas; II - combater os efeitos adversos das enchentes e estiagens, e da erosão do solo; III - impedir a degradação e promover a melhoria de qualidade e o aumento da capacidade de suprimento dos corpos de água, superficiais e subterrâne256 Atualizado até 29.04.2005. Água na Visão do Direito – 137 os, a fim de que as atividades humanas se processem em um contexto de desenvolvimento sócio-econômico que assegure a disponibilidade dos recursos hídricos aos seus usuários atuais e às gerações futuras, em padrões quantitativa e qualitativamente adequados. Art. 3 - A Política Estadual de Recursos Hídricos reger-se-á pelos seguintes princípios: I - Todas as utilizações dos recursos hídricos que afetam sua disponibilidade qualitativa ou quantitativa, ressalvadas aquelas de caráter individual, para satisfação de necessidades básicas da vida, ficam sujeitas à prévia aprovação pelo Estado; II - a gestão dos recursos hídricos pelo Estado processar-se-á no quadro do ordenamento territorial, visando à compatibilização do desenvolvimento econômico e social com a proteção do meio ambiente; III - os benefícios e os custos da utilização da água devem ser equitativamente repartidas através de uma gestão estatal que reflita a complexidade de interesses e as possibilidades regionais, mediante o estabelecimento de instâncias de participação dos indivíduos e das comunidades afetadas; IV - as diversas utilizações da água serão cobradas, com a finalidade de gerar recursos para financiar a realização das intervenções necessárias à utilização e à proteção dos recursos hídricos, e para incentivar a correta utilização da água; V - é dever primordial do Estado oferecer à sociedade, periodicamente, para conhecimento, exame e debate, relatórios sobre o estado quantitativo e qualitativo dos recursos hídricos. SEÇÃO II Das Diretrizes Art. 4º - São diretrizes específicas da Política Estadual de Recursos Hídricos: I - descentralização da ação do Estado por regiões e bacias hidrográficas; II - participação comunitária através da criação de Comitês de Gerenciamento de Bacias Hidrográficas congregando usuários de água, representantes políticos e de entidades atuantes na respectiva bacia; III - compromisso de apoio técnico por parte do Estado através da criação de Agências de Região Hidrográfica incumbidas de subsidiar com alternativas bem definidas do ponto de vista técnico, econômico e ambiental, os Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica que compõe a respectiva região; 138 – Água na Visão do Direito IV - integração do gerenciamento dos recursos hídricos e do gerenciamento ambiental através da realização de Estudos de Impacto Ambiental e respectivos Relatórios de Impacto Ambiental, com abrangência regional, já na fase de planejamento das intervenções nas bacias; V - articulação do Sistema Estadual de Recursos Hídricos com o Sistema Nacional destes recursos e com Sistemas Estaduais ou atividades afins, tais como de planejamento territorial, meio ambiente, saneamento básico, agricultura e energia; VI - compensação financeira, através de programas de desenvolvimento promovidos pelo Estado, aos municípios que sofram prejuízos decorrentes da inundação de áreas por reservatórios ou restrições decorrentes de leis de proteção aos mananciais; VII - incentivo financeiro aos municípios afetados por áreas de proteção ambiental de especial interesse para os recursos hídricos, com recursos provenientes do produto da participação, ou da compensação financeira do Estado no resultado da exploração de potenciais hidroenergéticos em seu território, respeitada a Legislação Federal. CAPÍTULO II Do Sistema de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul Art. 5 - Integram o Sistema de Recursos Hídricos, o Conselho de Recursos Hídricos, o Departamento de Recursos Hídricos, os Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica e as Agências de Região Hidrográfica. Parágrafo único - Para os efeitos desta Lei, integrará ainda o Sistema o órgão ambiental do Estado. SEÇÃO 1 Dos Objetivos Art. 6 - São objetivos do Sistema de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul: I - a execução e atualização da Política Estadual de Recursos Hídricos; II - a proposição, execução e atualização do Plano Estadual; III - a proposição, execução e atualização dos Planos de Bacias Hidrográficas; IV - a instituição de mecanismos de coordenação e integração do planejamento e da execução das atividades públicas e privadas no setor hídrico; Água na Visão do Direito – 139 V - a compatibilização da Política Estadual com a Política Federal sobre a utilização e proteção dos recursos hídricos no Estado. SEÇÃO 2 Do Conselho de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul Art. 7 - Fica instituído o Conselho de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul como instância deliberativa superior do Sistema de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul, a ser presidido pelo Secretário de Estado do Planejamento Territorial e Obras, e integrado por: I - Secretários de Estado cujas atividades se relacionem com a gestão dos recursos hídricos, o planejamento estratégico e a gestão financeira do Estado; II - três representantes dos Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica, um para cada região hidrográfica em que se divide o Estado. Parágrafo único - Integrarão, ainda, o Conselho, mediante convite do Governador do Estado, um representante, respectivamente, do Sistema Nacional do Meio Ambiente e do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Art. 8 - Compete ao Conselho de Recursos Hídricos: I - propor alterações na Política Estadual de Recursos Hídricos a serem encaminhadas na forma de proposta de projeto de lei ao Governador do Estado; II - opinar sobre qualquer proposta de alteração da Política Estadual de Recursos Hídricos; III - apreciar o anteprojeto de lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos previamente ao seu encaminhamento ao Governador do Estado e acompanhar sua implementação; IV - aprovar os relatórios anuais sobre a situação dos recursos hídricos do Rio Grande do Sul; V - aprovar critérios de outorga do uso da água; VI - aprovar os regimentos dos Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica; VII - decidir os conflitos de uso de água em última instância no âmbito do Sistema de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul; VIII - representar o Governo do Estado do Rio Grande do Sul, através de seu presidente, junto aos órgãos federais e entidades internacionais que tenham interesses relacionados aos recursos hídricos do Estado; IX - elaborar seu Regimento Interno. 140 – Água na Visão do Direito Parágrafo único - As deliberações do Conselho serão tomadas pela maioria de seus membros. Art. 9 - O Conselho será assistido em suas funções administrativas por uma Secretaria Executiva e em suas funções técnicas pelo Departamento de Recursos Hídricos da Secretaria do Planejamento Territorial e Obras. SEÇÃO 3 Do Departamento de Recursos Hídricos Art. 10 - Fica criado na Secretaria Estadual do Planejamento Territorial e Obras, o Departamento de Recursos Hídricos, como órgão de integração do Sistema de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul. Art. 11 - Compete ao Departamento de Recursos Hídricos: I - elaborar o anteprojeto de lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos através da compatibilização das propostas encaminhadas pelos Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica com os planos e diretrizes setoriais do Estado, relativos às atividades que interferem nos recursos hídricos; II - coordenar e acompanhar a execução do Plano Estadual de Recursos Hídricos, cabendo-lhe, em especial: a) propor ao Conselho de Recursos Hídricos critérios para a outorga do uso da água dos corpos de água sob domínio estadual e expedir as respectivas autorizações de uso; b) regulamentar a operação e uso dos equipamentos e mecanismos de gestão dos recursos hídricos, tais como redes hidrometeorológicas, banco de dados hidrometeorológicos, cadastros de usuários das águas; c) elaborar o relatório anual sobre a situação dos recursos hídricos no Estado para apreciação pelos Comitês, na forma do Artigo 19, IV, com vista à sua divulgação pública. III - assistir tecnicamente o Conselho de Recursos Hídricos. SEÇÃO 4 Dos Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica Art. 12 - Em cada bacia hidrográfica será instituído um Comitê de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica, ao qual caberá a coordenação Água na Visão do Direito – 141 programática das atividades dos agentes públicos e privados, relacionados aos recursos hídricos, compatibilizando, no âmbito espacial da sua respectiva bacia, as metas do Plano Estadual de Recursos Hídricos com a crescente melhoria da qualidade dos corpos de água. Art. 13 - Cada comitê será constituído por: I - representantes dos usuários da água, cujo peso de representação deve refletir, tanto quanto possível, sua importância econômica na região e o seu impacto sobre os corpos de água; II - representantes da população da bacia, seja diretamente provenientes dos poderes legislativos municipais ou estaduais, seja por indicação de organizações e entidades da sociedade civil; III - representantes dos diversos órgãos da administração direta federal e estadual, atuantes na região e que estejam relacionados com os recursos hídricos, excetuados aqueles que detém competências relacionadas à outorga do uso da água ou licenciamento de atividades potencialmente poluidoras. Parágrafo único - Entende-se como usuários da água indivíduos, grupos, entidades públicas e privadas e coletividades que, em nome próprio ou no de terceiros, utilizam os recursos hídricos como: a) insumo em processo produtivo ou para consumo final; b) receptor de resíduos; c) meio de suporte de atividades de produção ou consumo. Art. 14 - Na composição dos grupos a que se refere o artigo anterior deverá ser observada a distribuição de 40% de votos para representantes do grupo definido no inciso I, 40% de votos para representantes do grupo definido no inciso II e 20% para os representantes do grupo definido no inciso III. Art. 15 - Os órgãos e entidades federais, estaduais ou municipais que, na bacia hidrográfica, exerçam atribuições relacionadas à outorga do uso da água ou licenciamento de atividades potencialmente poluidoras terão assento nos Comitês e participarão nas suas deliberações, sem direito de voto. Art. 16 - Os comitês serão presididos por um de seus integrantes pertencente aos grupos definidos nos incisos I ou II do artigo 13, eleito por seus pares, para um mandato de 2 anos, permitida a recondução. Art. 17 - Todos os integrantes de um comitê deverão ter plenos poderes de representação dos órgãos ou entidades de origem. 142 – Água na Visão do Direito Art. 18 - A indicação da composição dos membros de cada comitê, bem como as normas básicas de orientação e de elaboração do respectivo regimento interno, serão estabelecidas por decreto do Poder Executivo do Estado. Art. 19 - Os comitês têm como atribuições: I - encaminhar ao Departamento de Recursos Hídricos a proposta relativa à bacia hidrográfica, contemplando, inclusive, objetivos de qualidade, para ser incluída no anteprojeto de lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos; II - conhecer e manifestar-se sobre o anteprojeto de lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos previamente ao seu encaminhamento ao Governador do Estado; III - aprovar o Plano da respectiva bacia hidrográfica e acompanhar sua implementação; IV - apreciar o relatório anual sobre a situação dos recursos hídricos do Rio Grande do Sul; V - propor ao órgão competente o enquadramento dos corpos de água da bacia hidrográfica em classes de uso e conservação; VI - aprovar os valores a serem cobrados pelo uso da água da bacia hidrográfica; VII - realizar o rateio dos custos de obras de interesse comum a serem executados na bacia hidrográfica; VIII - aprovar os programas anuais e plurianuais de investimentos em serviços e obras de interesse da bacia hidrográfica tendo por base o Plano da respectiva bacia hidrográfica; IX - compatibilizar os interesses dos diferentes usuários da água, dirimindo, em primeira instância, os eventuais conflitos. SEÇÃO 5 Das Agências de Região Hidrográfica Art. 20 - Às agências de Região Hidrográfica, a serem instituídas por Lei como integrantes da Administração Indireta do Estado, caberá prestar o apoio técnico ao Sistema Estadual de Recursos Hídricos, incluindo, entre suas atribuições, as de: I - assessorar tecnicamente os Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica na elaboração de proposições relativas ao Plano Estadual de Recursos Hídricos, no preparo dos Planos de Bacia Hidrográfica, bem como na tomada de decisões políticas que demandem estudos técnicos; Água na Visão do Direito – 143 II - subsidiar os comitês com estudos técnicos, econômicos e financeiros necessários à fixação dos valores de cobrança pelo uso da água e rateio de custos de obras de interesse comum da bacia hidrográfica; III - subsidiar os Comitês na proposição de enquadramento dos corpos de água da bacia em classes de uso e conservação; IV - subsidiar o Departamento de Recursos Hídricos na elaboração do relatório anual sobre a situação dos recursos hídricos do Estado e do Plano Estadual de Recursos Hídricos; V - manter e operar os equipamentos e mecanismos de gestão dos recursos hídricos mencionados no artigo 11, II, b). VI - arrecadar e aplicar os valores correspondentes à cobrança pelo uso da água de acordo com o Plano de cada bacia hidrográfica. CAPÍTULO III Do Planejamento dos Recursos Hídricos Art. 21 - Os objetivos, princípios e diretrizes da Política Estadual de Recursos Hídricos, definidos nesta Lei, serão discriminados no Plano Estadual de Recursos Hídricos e nos planos de Bacias Hidrográficas. SEÇÃO I Do Plano Estadual de Recursos Hídricos Art. 22 - O Plano Estadual de Recursos Hídricos, a ser instituído por lei, com horizonte de planejamento não inferior a 12 anos e atualizações periódicas, aprovadas até o final do segundo ano de mandato do Governador do Estado, terá abrangência estadual, com detalhamento por bacia hidrográfica. Art. 23 - Serão elementos constitutivos do Plano Estadual de Recursos Hídricos: I - a tradução dos objetivos da Política Estadual de Recursos Hídricos em metas a serem alcançadas em prazos definidos; II - a ênfase nos aspectos quantitativos, de forma compatível com os objetivos de qualidade de água, estabelecidos a partir das propostas dos Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica; III - o inventário das disponibilidades hídricas presentes e das estruturas de reservação existentes; 144 – Água na Visão do Direito IV - o inventário dos usos presentes e dos conflitos resultantes; V - a projeção dos usos e das disponibilidades de recursos hídricos e os conflitos potenciais; VI - a definição e as análises pormenorizadas das áreas críticas, atuais e potenciais; VII - as diretrizes para a outorga do uso da água, que considerem a aleatoriedade das projeções dos usos e das disponibilidades de água; VIII - as diretrizes para a cobrança pelo uso da água; IX - o limite mínimo para a fixação dos valores a serem cobrados pelo uso da água. Parágrafo único - O Plano Estadual de Recursos Hídricos contemplará também os programas de desenvolvimento nos municípios a que se referem os incisos VI e VII do artigo 4º. Art. 24 - O Plano Estadual de Recursos Hídricos será elaborado com base nas propostas encaminhadas pelos Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica, e levará em conta, ainda: I - propostas apresentadas individual ou coletivamente por usuários da água; II - planos regionais e setoriais de desenvolvimento; III - tratados internacionais; IV - estudos, pesquisas e outros documentos públicos que possam contribuir para a compatibilização e consolidação das propostas a que se refere o “caput”. Parágrafo único - O Plano Estadual de Recursos Hídricos considerará, obrigatoriamente, a variável ambiental através da incorporação, ao nível do planejamento de cada bacia hidrográfica, de Estudos de Impacto Ambiental e respectivos Relatórios de Impacto Ambiental, de modo a conter um juízo prévio de viabilidade do licenciamento ambiental global, sem prejuízo do licenciamento nos termos da legislação vigente. Art. 25 - Com a finalidade de permitir a avaliação permanente da execução do Plano Estadual de Recursos Hídricos, o Poder Executivo, através do Departamento Estadual de Recursos Hídricos, publicará, até 30 de abril de cada ano, o relatório sobre a situação dos recursos hídricos no Estado. SEÇÃO 2 Dos Planos de Bacia Hidrográfica Art. 26 - Os planos de Bacia Hidrográfica têm por finalidade operacionalizar, no âmbito de cada bacia hidrográfica, por um período de 4 anos, com atua- Água na Visão do Direito – 145 lizações periódicas a cada 2 anos, as disposições do Plano Estadual de Recursos Hídricos, compatibilizando os aspectos quantitativos e qualitativos, de modo a assegurar que as metas e usos previstos pelo Plano Estadual de Recursos Hídricos sejam alcançados simultaneamente com melhorias sensíveis e contínuas dos aspectos qualitativos dos corpos de água. Art. 27 - Serão elementos constitutivos dos Planos de Bacia Hidrográfica: I - objetivos de qualidade a serem alcançados em horizontes de planejamento não inferiores ao estabelecido no Plano Estadual de Recursos Hídricos, nos termos do artigo 22. II - programas das intervenções estruturais e não-estruturais e sua especialização; III - esquemas de financiamento dos programas a que se refere o inciso anterior, através de: a) determinação dos valores cobrados pelo uso da água; b) rateio dos investimentos de interesse comum; c) previsão dos recursos complementares alocados pelos orçamentos públicos e privados na bacia. Art. 28 - Os planos de Bacia Hidrográfica serão elaborados pelas Agências de Região Hidrográfica e aprovados pelos respectivos Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica. CAPÍTULO IV Dos Instrumentos de Gestão dos Recursos Hídricos SEÇÃO I Da Outorga do Uso dos Recursos Hídricos Art. 29 - Dependerá da outorga do uso da água qualquer empreendimento ou atividade que altere as condições quantitativas e qualitativas, ou ambas, das águas superficiais ou subterrâneas, observado o Plano Estadual de Recursos Hídricos e os planos de Bacia Hidrográfica. § 1º - A outorga será emitida pelo Departamento de Recursos Hídricos mediante autorização ou licença de uso, quando referida a usos que alterem as condições quantitativas das águas. § 2º - O órgão ambiental do Estado emitirá a outorga quando referida a usos que afetem as condições qualitativas das águas. 146 – Água na Visão do Direito Art. 30 - A outorga de que trata o artigo anterior será condicionada às prioridades de uso estabelecidas no Plano Estadual de Recursos Hídricos e no Plano de Bacia Hidrográfica. Art. 31 - São dispensados da outorga os usos de caráter individual para satisfação das necessidades básicas da vida. SEÇÃO 2 Da Cobrança Pelo Uso dos Recursos Hídricos Art. 32 - Os valores arrecadados na cobrança pelo uso da água serão destinados a aplicações exclusivas e não transferíveis na gestão dos recursos hídricos da bacia hidrográfica de origem: I - a cobrança de valores está vinculada à existência de intervenções estruturais e não estruturais aprovados para a respectiva bacia, sendo vedada a formação de fundos sem que sua aplicação esteja assegurada e destinada no Plano de Bacia Hidrográfica; II - até 8% (oito por cento) dos recursos arrecadados em cada bacia poderão ser destinados ao custeio dos respectivos Comitê e Agência de Região Hidrográfica; III - até 2% (dois por cento) dos recursos arrecadados em cada bacia poderão ser destinados ao custeio das atividades de monitoramento e fiscalização do órgão ambiental do Estado desenvolvidas na respectiva bacia. Art. 33 - O valor da cobrança será estabelecido nos planos de Bacia Hidrográfica, obedecidas as seguintes diretrizes gerais: I - na cobrança pela derivação da água serão considerados: a) o uso a que a derivação se destina; b) o volume captado e seu regime de variação; c) o consumo efetivo; d) a classe de uso preponderante em que estiver enquadrado o corpo de água onde se localiza a captação; II - na cobrança pelo lançamento de efluentes de qualquer espécie serão considerados: a) a natureza da atividade geradora do efluente; b) a carga lançada e seu regime de variação, sendo ponderados na sua caracterização, parâmetros físicos, químicos, biológicos e toxicidade dos efluentes; c) a classe de uso preponderante em que estiver enquadrado o corpo de água receptor; Água na Visão do Direito – 147 d) o regime de variação quantitativa e qualitativa do corpo de água receptor. Parágrafo único - No caso do inciso II, os responsáveis pelos lançamentos não ficam desobrigados do cumprimento das normas e padrões ambientais. SEÇÃO 3 Do Rateio de Custo de Obras de Uso e Proteção dos Recursos Hídricos Art. 34 - As obras de uso múltiplo, ou de interesse comum ou coletivo, terão seus custos rateados, direta ou indiretamente, segundo critérios e normas a serem estabelecidos pelo regulamento desta Lei, atendidos os seguintes procedimentos: I - prévia negociação, realizada no âmbito do Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica pertinente, para fins de avaliação do seu potencial de aproveitamento múltiplo e conseqüente rateio de custos entre os possíveis beneficiários; II - previsão de formas de retorno dos investimentos públicos ou justificada circunstanciadamente a destinação de recursos a fundo perdido; III - concessão de subsídios somente no caso de interesse público relevante e na impossibilidade prática de identificação de beneficiados para o conseqüente rateio de custos. CAPÍTULO V Das Infrações e Penalidades Art. 35 - Constituem infrações para os efeitos desta Lei e de seu Regulamento: I - utilizar os recursos hídricos para qualquer finalidade, com ou sem derivação, sem a respectiva outorga do uso ou em desacordo com as condições nela estabelecidas; II - iniciar a implantação ou implantar empreendimento ou exercer atividade relacionada com a utilização de recursos hídricos, superficiais ou subterrâneos, que implique alterações no regime, quantidade ou qualidade das águas, sem aprovação dos órgãos ou entidades competentes; III - executar a perfuração de poços ou a captação de água subterrânea sem a devida aprovação; IV - fraudar as medições dos volumes de água utilizados ou declarar valores diferentes dos medidos; 148 – Água na Visão do Direito V - descumprir determinações normativas ou atos emanados das autoridades competentes visando a aplicação desta Lei e de seu regulamento; VI - obstar ou dificultar a ação fiscalizadora das autoridades competentes no exercício de suas funções. Art. 36 - Sem prejuízo das sanções civis e penais cabíveis, as infrações acarretarão a aplicação das seguintes penalidades: I - advertência por escrito, na qual poderão ser estabelecidos prazos para correção das irregularidades, sob pena de multa; II - multa, simples ou diária, de 100 (cem) a 1000 (mil) vezes o valor da UPF/RS, ou outro índice que a substituir, mediante conservação de valores; III - intervenção administrativa, por prazo determinado para execução de obras necessárias ao efetivo cumprimento das condições de outorga ou para cumprimento de normas referentes ao uso, controle e proteção dos recursos hídricos; IV - embargo definitivo, com revogação ou cassação da outorga, se for o caso, para repor incontinenti, no seu antigo estado, os recursos hídricos, leitos e margens, nos termos dos artigos 58 e 59 do Código de Águas ou tamponar os poços de água subterrânea. § 1º - No caso dos incisos III e IV, independentemente da pena de multa, serão cobradas ao infrator as despesas em que incorrer a Administração para tornar efetivas as medidas previstas nos citados incisos, na forma dos artigos 36, 53, 56 e 58 do Código de Águas, sem prejuízo de responder pela indenização dos danos a que der causa. § 2º - Na aplicação da penalidade de multa, a autoridade levará em consideração a capacidade econômico-financeira do infrator, bem como sua escolaridade. § 3º - Sempre que da infração cometida resultar prejuízo a serviço público de abastecimento de água, riscos à saúde ou à vida, perecimento de bens ou animais, ou prejuízo de qualquer natureza a terceiros, independentemente da revogação ou cassação da outorga, a multa a ser aplicada nunca será inferior à metade do valor máximo previsto no inciso II. § 4º - Em caso de reincidência, a multa será aplicada pelo valor correspondente ao dobro da anteriormente imposta. Art. 37 - Da imposição de multa caberá recurso ao Secretário de Planejamento Territorial e Obras e, em última instância, ao Conselho de Recursos Hídricos. Água na Visão do Direito – 149 CAPÍTULO VI Das Disposições Finais e Transitórias Art. 38 - Para fins de gestão dos recursos hídricos o Estado do Rio Grande do Sul fica dividido nas seguintes regiões hidrográficas: I - Região Hidrográfica da Bacia do Rio Uruguai, compreendendo as áreas de drenagem do Rio Uruguai e do Rio Negro; II - Região Hidrográfica da Bacia do Guaíba, compreendendo as áreas de drenagem do Guaíba; III - Região Hidrográfica das Bacias Litorâneas, compreendendo as áreas de drenagem dos corpos de água não incluídos nas Regiões Hidrográficas definidas nos incisos anteriores. Parágrafo único - A subdivisão das regiões de que trata este artigo em Bacias Hidrográficas será estabelecida por decreto do Governador. Art. 39 - Os Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica serão criados por Decreto no prazo de 1 (um) ano contados da promulgação desta Lei. Parágrafo único - O comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos, criado pelo Decreto n.º 32.774, de 17 de março de 1988, o Comitê de Gerenciamento da Bacia do Rio Gravataí, criado pelo Decreto n.º 33.125, de 15 de fevereiro de 1989 e o Comitê de Gerenciamento da Bacia do Rio Santa Maria, criado pelo Decreto n.º 35.103, de 1º de fevereiro de 1994, deverão adaptar-se ao disposto nesta Lei, no prazo de 90 dias, a contar da publicação do Decreto a que se refere o artigo 18. Art. 40 - A implantação da cobrança pelo uso da água será feita de forma gradativa, atendidas as seguintes providências: I - desenvolvimento de programa de comunicação social sobre a necessidade econômica, social, cultural e ambiental da utilização racional e proteção da água, com ênfase para a educação ambiental; II - implantação de um sistema de informações hidrometeorológicas e de cadastro dos usuários de água; III - implantação do sistema integrado de outorga do uso da água, devidamente compatibilizado com sistemas correlacionados de licenciamento ambiental e metropolitano. Parágrafo único - O sistema integrado de outorga do uso da água, previsto no inciso III, abrangerá os usos existentes, os quais deverão adequar-se ao disposto nesta Lei, mediante a expedição das respectivas outorgas. 150 – Água na Visão do Direito Art. 41 - O primeiro Plano Estadual de Recursos Hídricos será elaborado até 1 (um) ano após a aprovação desta Lei, observando os seguintes critérios: I - nas bacias hidrográficas onde existam comitês em operação será observado o disposto no “caput” do artigo 24; II - nas bacias hidrográficas onde não estejam ainda em operação Comitês, caberá ao DRH (Departamento de Recursos Hídricos) a coordenação da elaboração das propostas relacionadas a estas bacias; III - atendimento, no mínimo, do disposto nos incisos III a VI do artigo 23, sem prejuízo do cumprimento integral dos demais dispositivos pertinentes ao Plano Estadual de recursos Hídricos, desde que seja viável no prazo a que se refere o “caput” deste artigo.(Retif. DOE de 31.05.95) Art. 42 - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 43 - Ficam revogadas a Lei n.º 8.735, de 4 de novembro de 1988 e as demais disposições em contrário. PALÁCIO PIRATINI, em Porto Alegre, 30 de dezembro de 1994. CAPÍTULO 5 - GLOSSÁRIO A Abstração inicial - Soma da interceptação e do armazenamento de água nas depressões do solo. Acidez da água - Quantidade de base forte que deve ser utilizada para neutralizar uma amostra no valor de pH7, expressa em milieqüivalentes por litro de água. Açude - Conjunto constituído por barragem ou barramento de um curso d’água e o respectivo reservatório ou lago formado. Acumulação - Processo de armazenamento de produtos procedentes da erosão ou abrasão, ou da água, tais como: sais, sedimentos, etc., em massas de água naturais ou artificiais ou a quantidade de neve, ou qualquer outra forma de água no estado sólido, que é adicionada a um glaciar, gelo flutuante ou a um coberto de neve. Aditivos do solo – Substâncias químicas que, quando adicionadas ao solo, modificam as suas características físicas e a capacidade de infiltração da água no mesmo (ABID, 1978). Administração de Água - É o planejamento da distribuição e utilização de recursos hídricos. Adutora - São os condutos destinados a ligar as fontes de abastecimento de água bruta às estações de tratamento de água, situadas além das imediações dessas fontes, ou os condutos ligando estações de tratamento, situadas nas proximidades dessas fontes, a reservatórios distantes que alimentam as redes de distribuição. Aeração - Reoxigenação da água com ajuda do ar. A taxa de oxigênio dissolvido, expressa em % de saturação, é uma característica representativa de certa massa de água e de seu grau de poluição. Para restituir, a uma água poluída, a taxa de oxigênio dissolvido, ou para alimentar o processo de biodegradação das matérias orgânicas consumidoras de oxigênio, é preciso favorecer o contato da água e do ar. A aeração pode também ter 152 – Água na Visão do Direito por fim a eliminação de um gás dissolvido na água: ácido carbônico, hidrogênio sulfurado. Afluência local - Água que entra numa linha de água entre duas estações hidrométricas. Afluente ou Tributário - Qualquer curso d’água que deságua em outro maior, lago ou lagoa. Agência de Água - É o organismo que exerce a função de secretaria executiva (técnico-administrativa) do Comitê de Bacia Hidrográfica. Água - Fisicamente, é um líquido transparente, incolor, com um matiz azulado quando visto em grande massa. Quando em sua forma pura não tem sabor. Apresentam-se nos três estados físicos: sólido, líquido e gasoso. Passando do estado líquido para o sólido a 0º C, e, após a ebulição a 100º C, a água vaporiza-se. Quimicamente, a água é um composto formado por dois elementos gasosos, em estado livre, o hidrogênio e o oxigênio (H2O). A água é indispensável para a vida. Água agressiva - Água com propriedades de dissolver determinados minerais por contato. Água alcalina - Água com pH superior a 7. Água bruta - É aquela encontrada naturalmente nos rios, riachos, lagos, lagoas, açudes ou aqüíferos. Água capilar - Água retida no solo acima do nível freático, devido à ação da capilaridade, acima da umidade higroscópica e abaixo da capacidade de campo ou, também, trata-se de umidade líquida, presa entre grãos de solo, seja por atração eletrostática entre as moléculas minerais e da água ou por forças osmóticas. Água conata - Água que foi captada nos espaços porosos de rochas sedimentares desde à época em que os sedimentos originais foram depositados. Água contaminada - É a que contém substâncias tóxicas, vermes ou micróbios, capazes de produzir doenças. A contaminação pode ser invisível aos nossos olhos ou imperceptível ao paladar. Considerada imprópria até para o lazer, por fazer mal à saúde. Água de captação - Qualquer rio, lago ou oceano em que a água servida tratada, ou não, é finalmente descarregada. Água de esgoto - Corrente de água servida que é drenada de um pátio de fazenda, de um monte de escória ou de uma rua. Água de reposição - Água requerida para substituir a usada num sistema ou perdida por ele. A água de reposição inclui a usada para substituir a água que escoa de um sistema de irrigação e, mais comumente, àquela perdida numa torre de refrigeração usada na geração de energia. Água de superfície - Ocorrência de água na superfície da terra. Água na Visão do Direito – 153 Água disponível no solo - Água no solo disponível para as plantas. Obtida, freqüentemente, pela diferença entre a capacidade de campo e o coeficiente de emurchecimento. Assim, a água disponível no solo é igual à capacidade útil de armazenamento. Água doce - Água que contém muito pouco sal (menos de 0,05 por cento), em comparação com a água salobra (que tem entre 0,05 e 3 por cento), como a dos rios, lagos e lagoas. Água doméstica - Fonte de água disponível para uso doméstico e, geralmente, distribuída por um sistema de tubulações. Água dura - Água subterrânea com sais minerais dissolvidos, geralmente carbonato de cálcio (ou uma combinação de cálcio e magnésio). A água dura não espuma bem com sabão, forma depósitos (escama, CaC03 ou MgCO) em chaleiras e tanques de água quente, e, em casos mais extremos, pode entupir as tubulações, formando depósitos de cálcio nos canos de água, sendo que o tratamento com amaciantes de água remove grande parte do cálcio e do magnésio por meio da troca de íons, comumente é misturada com cloreto de sódio (sal de mesa). Água freática - Água que ocupa os vãos dentro de uma rocha ou solo num nível abaixo do lençol de água. Água gravitacional - Água que se move através do solo sob a influência da gravidade. Um solo não pode se tornar saturado até que a água gravitacional tenha assentado. Água intersticial - Água contida nos interstícios das rochas. Água mineral - Segundo o Código das Águas Minerais (DNPM, Decreto-Lei nº 7.841, de 08/08/1945), águas minerais naturais “são aquelas provenientes de fontes naturais ou de fontes artificialmente captadas que possuam composição química ou propriedades físicas ou físico-químicas distintas das águas comuns, com características que lhes confiram uma ação medicamentosa”. São classificadas segundo suas características permanentes (composição química) e segundo as características inerentes às fontes (gases presentes e temperatura). Água poluída - É a que contém elementos químicos não naturais das águas, resíduos industriais, tóxicos, detergentes, plásticos e/ou matéria orgânica, que provêm dos esgotos e dejetos humanos. Esses elementos vão se acumulando nos rios, açudes e lagos, diminuindo a capacidade de oxigênio das águas, prejudicando a vida dos peixes e do homem. A água se torna turva ou tem alterada sua cor, odor ou sabor, tornando-a desagradável. Água potável – É aquela apropriada para consumo humano. Água precipitável - Quantidade de água, expressa em altura ou em massa, que poderia ser obtida se todo o valor de água, contido numa coluna de 154 – Água na Visão do Direito atmosfera, de seção transversal-horizontal unitária, se condensasse e se precipitasse. Água salgada - Água que contém concentrações significativas de sal (acima de 3 por cento), como a encontrada nos oceanos. Água salobra - Água que contém sal numa proporção significativamente menor que a água do mar. A concentração do total de sais dissolvidos está normalmente compreendida entre 1000-10 000 mgl-1. Água servida - Águas de abastecimento de uma comunidade, rejeitadas depois de variadas utilizações. Em geral, são os esgotos e podem resultar também da mistura de resíduos ou despejos domésticos com águas superficiais ou subterrâneas. Água superficial - Toda a água que se escoa ou é armazenada na superfície terrestre. Águas - Termo usado quando se trata das águas em geral, incluindo àquelas que não devem ser usadas por questões ambientais. Águas de domínio estadual - São águas estaduais os rios, riachos, lagos e lagoas pertencentes às bacias dos rios e afluentes dos rios federais, além das águas acumuladas nos aqüíferos em todo o território. Águas de domínio federal - São águas de domínio da União para os rios (portanto, águas superficiais) quando atravessam mais de um Estado e/ou são fronteiras com outros Estados ou países, ou águas acumuladas em açudes decorrentes de obras da União, tais como: os rios, além das águas acumuladas nos açudes construídos pelo DNOCS – Departamento Nacional de Obras Contra as Secas. Águas de esgoto - Águas de consumo de uma comunidade, rejeitadas após terem sido contaminadas por diversos usos, como, por exemplo, as águas com resíduos urbanos do tipo doméstico, municipal e industrial, juntamente com as águas subterrâneas, superficiais e pluviais. Águas estagnadas - Água imóvel em determinadas zonas de um rio, lago, reservatório ou aqüífero. Águas interestaduais - Termo aplicado a rios e vertentes ou bacias de captação que se situam dentro de dois ou mais limites políticos estaduais. Águas residuais - Água que contêm resíduos, ou seja, materiais sólidos ou líquidos, que são rejeitados após serem utilizados, num processo industrial. Águas subterrâneas - São as águas que se infiltraram no solo e que penetraram, por gravidade, em camadas profundas do subsolo atingindo o nível da zona de saturação, constituindo-se em um reservatório de águas subterrâneas (aqüíferos), suscetíveis de extração e utilização. A zona saturada pode ser considerada como sendo um único reservatório, ou um sistema de reservatórios naturais, cuja capacidade e volume total dos poros, ou Água na Visão do Direito – 155 interstícios, estão repletos de água. Alcalinidade da água - Qualidade da água em neutralizar compostos ácidos, em virtude da presença de bicarbonatos, hidróxidos, boratos, silicatos e fosfatos. Esgotos são alcalinos, por receberem materiais de uso doméstico com estas características. Alimentação de um aqüífero - Processo pelo qual a zona saturada de um aqüífero recebe água diretamente do exterior, ou, indiretamente, através de outra formação. Altura de água doce - Nível da água em determinado ponto de um aqüífero, que seria medida por um piezômetro ligado àquele ponto, se contivesse apenas água doce. Altura de queda de neve - Espessura de uma camada de neve recentemente depositada. Altura de precipitação – É a quantidade de água líquida procedente da atmosfera, expressa em altura de água sobre uma superfície horizontal. Altura piezométrica - Altura de uma coluna de água que pode ser sustentada pela pressão hidrostática num determinado ponto. Aluvião - Argila, silte, areia, cascalho ou outro material detrítico, depositado pela água. Álveo - Superfície que as águas cobrem sem extravasar para as margens ou terreno natural, ordinariamente, enxuto. Amostra de água composta - Combinação, em proporções adequadas, de várias amostras para obter o valor médio de uma característica pretendida, podendo ser colhidas, de forma discreta ou contínua, calculada, normalmente, em função do tempo ou do caudal. Aqüífero - Formação porosa (camada ou estrato) de rocha permeável, areia ou cascalho, capaz de armazenar e fornecer quantidades significativas de água. Aqüítardo - Formação geológica de natureza algo impermeável e semiconfinada que transmite água em proporções muito pequenas por comparação com um aqüífero. Área ativa da bacia - Área da bacia excluindo as zonas não drenadas. Área contaminada - Área onde há comprovadamente poluição causada por quaisquer substâncias ou resíduos que nela tenham sido depositados, acumulados, armazenados, enterrados ou infiltrados, e que determina impactos negativos sobre os bens a proteger. Área de drenagem - Refere-se a uma bacia hidrográfica onde é a área plana (projeção horizontal) inclusa entre seus divisores topográficos. Usualmente é expressa em km² ou em hectares. Área de influência - Área que rodeia um furo de bombagem ou de recarga, 156 – Água na Visão do Direito no qual o nível freático (em aqüíferos livres) ou a superfície piezométrica (em aqüíferos confinados) aumenta ou diminui significativamente. Área de proteção ambiental (APA) - É uma categoria de unidade de conservação cujo objetivo é conservar a diversidade de ambientes, de espécies, de processos naturais e do patrimônio natural, visando a melhoria da qualidade de vida, através da manutenção das atividades sócio-econômicas da região. Esta proposta deve envolver, necessariamente, um trabalho de gestão integrada, com participação do Poder Público e dos diversos setores da comunidade pública ou privada. É determinada por decreto federal, estadual ou municipal, para que nela sejam discriminados o uso do solo e evitada a degradação dos ecossistemas, sob interferência humana. Área molhada - Área da seção transversal de um curso de água limitada pelas paredes do canal e pela superfície da água. Armazenamento - Retenção de água, em reservatórios de superfície ou subterrâneos, para posterior utilização. Arroio – Denominação dada aos pequenos rios no Sul do Brasil. Corresponde aos igarapés da região amazônica. Ascensão capilar - Movimento ascendente de um líquido num tubo capilar nele submergido, medido a partir da superfície do líquido em seu exterior. Aspersão - Sistema de rega no qual a água é distribuída sob a forma de chuva. Aterro controlado - Aterro para lixo residencial urbano, onde os resíduos são depositados recebendo depois uma camada de terra por cima. Na impossibilidade de se proceder à reciclagem do lixo, pela compostagem acelerada ou pela compostagem a céu aberto, as normas sanitárias e ambientais recomendam a adoção de aterro sanitário ao invés do controlado. Aterro sanitário - Aterro para lixo residencial urbano, com pré-requisitos de ordem sanitária e ambiental. Deve ser construído de acordo com técnicas definidas, como: impermeabilização do solo para que o chorume não atinja os lençóis freáticos, contaminando as águas; sistema de drenagem para chorume, que deve ser retirado do aterro sanitário e depositado em lagoa próxima, que tenha essa finalidade específica, vedada ao público; sistema de drenagem de tubos para os gases, principalmente os gases carbônico, metano e o sulfídrico, pois, se isso não for feito, o terreno fica sujeito a explosões e deslizamentos. Atualização da previsão - Revisão da previsão relativa à determinada grandeza utilizando a informação adquirida ‘a posteriori’. Autodepuração da água - Processo natural de purificação da água, que reduz a poluição orgânica. Por exemplo, há espécies de plantas aquáticas que absorvem poluentes. Água na Visão do Direito – 157 Avaliação de recursos hídricos - Determinação das nascentes, extensão, fiabilidade e qualidade dos recursos hídricos, com vista à sua utilização e controle. Aviso de cheia - Difusão de um aviso, face à possibilidade de ocorrência de uma cheia, em curto prazo, em determinada área de um curso de água ou bacia hidrográfica. B Bacia de Captação - Mais do que o rio, lago ou reservatório de onde se retira a água para consumo. Compreende também toda a região onde ocorre o escoamento e a captação dessas águas na natureza. (Fonte: Rede AIPA) Bacia hidrográfica - Conjunto de terras drenadas por um rio principal e seus afluentes. A noção de bacias hidrográficas inclui naturalmente a existência de cabeceiras, ou nascentes, divisores de águas, cursos de águas, principais afluentes e subafluentes, etc. Em todas as bacias hidrográficas deve existir uma hierarquização na rede hídrica e a água se escoa normalmente, dos pontos mais altos para os mais baixos. O conceito de bacia hidrográfica deve incluir também noção de dinamismo, por causa das modificações que ocorrem nas linhas divisórias de água sob o efeito dos agentes erosivos, alargando ou diminuindo a área da bacia. Baixa mar - É o refluxo da maré. Balanço hídrico - Balanço da água baseado no princípio de que durante um certo intervalo de tempo as afluências totais a uma bacia ou formação aquática deve ser igual ao total das saídas mais a variação, positiva ou negativa, do volume de água armazenado nessa bacia ou massa de água. Banhado - Setor de uma planície de inundação em que habitualmente acontece o transbordamento de águas pluviais e fluviais, durante a estação chuvosa; várzea, vazante. Barra - Banco de sedimentos, por exemplo areia ou cascalho, depositado no leito do rio ou na foz, que limita o fluxo ou a navegação. Barragem - Construção para regular o curso de rios, usada para prevenir enchentes, aproveitar a força das águas como fonte de energia ou para fins turísticos. Sua construção pode trazer problemas ambientais, como no caso de grandes hidrelétricas, por submergir terras férteis, muitas vezes cobertas por importantes florestas, por desalojar populações que vivem na área. Barreira de gelo - Acumulação de gelo que, sendo num rio, obstrui o escoamento da água. Biomassa - Massa total de organismos vivos em determinada massa de água. 158 – Água na Visão do Direito Biota - Conjunto de fauna e flora, de água ou de terra, de qualquer área ou região, que não considera os elementos do meio ambiente. C Cabeceira - Local onde nasce o rio, ou curso d’água. Nem sempre é um ponto bem definido, constituindo às vezes toda uma área. Isso se nota, por exemplo, na dificuldade em determinar onde nasce o rio principal, como é o caso da definição das cabeceiras do Rio Amazonas. Calha - Vales ou sulcos por onde correm as águas de um rio. Canal - Curso de água natural ou artificial, claramente diferenciado, que, permanente ou periodicamente, contém água em movimento ou que forma uma ligação entre duas linhas de água. Capacidade de infiltração - Velocidade máxima a que a água pode ser absorvida por um solo em determinadas condições, por unidade de superfície. Capacidade hidráulica - Característica física de um canal superficial, que tem em conta a superfície da seção transversal e sua rugosidade, e que multiplicada pela raiz quadrada do declive, corresponde ao caudal no canal. Capacidade máxima do rio - Caudal que pode passar num curso de água sem transpor as margens. Capilaridade - Fenômeno associado à tensão superficial de um líquido, particularmente em tubos capilares e meios porosos, onde existem as interfaces gás, líquido e sólido. Carga poluidora - Quando se fala de recursos hídricos, é a quantidade de poluentes que atingem os corpos d’água, prejudicando seu uso. Medida em DBO e DBQ. Cascata - Pequena queda de água natural ou artificial. Catarata - Grande queda de água. Caudal – Volume de água numa seção transversal de um rio ou de um canal, por unidade de tempo. Celeridade - Velocidade de propagação de uma onda. Charco - Acumulação de água resultante da fusão do gelo, devido principalmente à neve fundida e, em fases mais avançadas, devido também à fusão do gelo. A fase inicial consiste em flocos de neve derretida. Cheia - Pequena cheia causada por precipitação intensa ou degelo. Cheia anual - Caudal que é igualado ou excedido em média uma vez por ano . Água na Visão do Direito – 159 Cheia catastrófica – É àquela devido a condições meteorológicas excepcionais. Chuva - Precipitação de partículas de água líquida, quer sob a forma de gotas com mais de 0.5 mm de diâmetro, quer sob a forma de gotas menores e dispersas. Ciclo do nível freático - Período durante o qual é observado um aumento seguido de uma diminuição do nível freático ou da superfície piezométrica. Ciclo hidrológico - É o comportamento natural da água quanto às suas ocorrências, transformações e relações com a vida humana. Inicia com a evaporação da água dos oceanos. O vapor resultante é transportado pelo movimento das massas de ar, sob determinadas condições, o vapor é condensado, formando as nuvens que por sua vez podem resultar em precipitação (chuva, neve, etc.). A precipitação que ocorre sobre a terra é dispersa de várias formas, ficando a maior parte temporariamente retida no solo próximo de onde caiu e, finalmente, retorna à atmosfera por evaporação e transpiração das plantas. Parte da água restante escoa sobre a superfície do solo, ou através do solo para os rios, enquanto que a outra parte, penetrando profundamente no solo, vai suprir o lençol d’água subterrâneo. Dos rios as águas são descarregadas no oceano. Ciclone tropical - Ciclone de origem tropical de pequeno diâmetro (algumas centenas de quilômetros), com uma pressão de superfície mínima, em alguns casos inferior a 900 hPa, ventos muito violentos e chuvas torrenciais, por vezes, acompanhados de trovoadas. Clima - Conjunto de condições meteorológicas predominantes em determinada região que se caracteriza por estatísticas em longo prazo dos elementos meteorológicos nessa região (valores médios, probabilidades de ocorrência de valores extremos, etc.), influenciado pela latitude, altitude, etc. Cobrança pelo uso dos recursos hídricos - É um dos instrumentos de gestão de recursos hídricos, essencial para criar as condições de equilíbrio entre as forças da oferta (disponibilidade de água) e da demanda, promovendo, em conseqüência, a harmonia entre os usuários competidores, ao mesmo tempo em que também promove a redistribuição dos custos sociais, a melhoria da qualidade dos efluentes lançados, além de ensejar a formação de fundos financeiros para as obras, programas e intervenções do setor. Código das águas – Conjunto de legislação fundamentada em Decreto Federal de 10 de julho de 1934, para todo o território nacional. Coeficiente de escoamento - Relação entre o escoamento (expresso em coluna de água) e a precipitação expressa pela altura da água. Comitê de Bacia Hidrográfica - É um órgão colegiado com atribuições 160 – Água na Visão do Direito normativas, consultivas e deliberativas e o foro principal para o conhecimento, debate de problemas, planejamento e a tomada de decisão sobre os usos múltiplos dos recursos hídricos no âmbito da bacia hidrográfica de sua jurisdição. Concentração limite - Elemento de planejamento e controle de bacia hidrográfica configurada pela concentração de agente poluente especificada no correspondente plano de recursos hídricos, para cada ano do horizonte de planejamento, podendo apresentar variação anual partindo das condições atuais para atingir, ao final do horizonte previsto, a concentração meta definida na Resolução CONAMA nº 20/86 para a classe em que tenha sido enquadrado o corpo hídrico. Condensação - Passagem da fase de vapor para a fase líquida. Condutividade hidráulica – Propriedade de um meio poroso combinada à do fluído escoando-se nesse meio saturado e que determina a relação, chamada Lei de Darcy, entre a descarga específica e o gradiente hidráulico que a origina. Conduto aberto – Qualquer conduto no qual o escoamento da água se processa com superfície livre (em contato com o ar). Confluência - União ou ponto de união de dois ou mais cursos de água. Congelação - Formação de uma capa de gelo na superfície da água devido ao arrefecimento sazonal. Conservação dos recursos hídricos - Medidas tomadas para economizar a quantidade de água utilizada para um determinado fim e/ou para protegêla contra a poluição. Consumo - Água extraída de um reservatório superficial. Consumo de água - Quantidade de água, superficial e subterrânea, absorvida, transpirada ou utilizada pelas plantas durante a formação do seu tecido vegetal, assim como pela evaporação do solo cultivado, expressa em unidades de volume por unidade de superfície. Inclui também todas as afetividades que implicam uma diminuição dos recursos hídricos disponíveis, por exemplo os consumos urbanos e industriais. Contaminação - Termo geral que significa a introdução na água de qualquer substância indesejável não presente nela normalmente, como por exemplo, microorganismos, produtos químicos, detritos ou esgoto, que tornam a água imprópria para a sua utilidade prevista ou uso pretendido. Controle hidráulico - Propriedades físicas de um canal que determinam a relação entre a altura e o caudal em determinado ponto. Corpo d’água - Denominação genérica para qualquer manancial hídrico; curso d’água, trecho de rio, reservatório artificial ou natural, lago, lagoa ou aqüífero subterrâneo. Água na Visão do Direito – 161 Correição - Alteração que se deve introduzir no resultado observado para ter em conta os erros conhecidos de modo a obter-se uma melhor aproximação do valor real. Córrego - Pequeno riacho, ou afluente de um rio maior. Corrente contínua - Curso de água cujo fluxo é ininterrupto no espaço e no tempo. Corrente de maré – Trata-se de um movimento horizontal das águas do mar registrado durante cada fluxo ou refluxo da maré (ABID, 1978). Crista - Parte superior de uma barragem, dique ou descarregador acima do qual a água deve elevar-se antes de passar sobre a estrutura. Curso d’água - Denominação para fluxos de água em canal natural para drenagem de uma bacia, tais como: boqueirão, rio, riacho, ribeirão ou córrego. Curso de água - Canal natural ou artificial através do qual a água pode fluir. Curso superior - Parte de um curso de água situado na zona superior da bacia de drenagem. Curva de armazenamento - Curva que representa o volume de água armazenado em função do nível ou do tempo. D Datação das águas subterrâneas - Determinação do tempo decorrido entre a alimentação da formação aqüífera e a recolha de amostras de água. DBO - Demanda Bioquímica de Oxigênio. A DBO de uma amostra de água é a quantidade de oxigênio necessária para oxidar a matéria orgânica por decomposição microbiana aeróbia para uma forma inorgânica estável. A DBO é normalmente considerada como a quantidade de oxigênio consumido durante um determinado período de tempo, numa temperatura de incubação específica. Um período de tempo de 5 dias numa temperatura de incubação de 20oC é freqüentemente usado e referido como DBO5 , 20 . É a forma mais utilizada para se medir a quantidade de matéria orgânica presente num corpo d’água, ou seja, mede-se a quantidade de oxigênio necessário para estabilizar a matéria orgânica com a cooperação de bactérias aeróbias. Quanto maior o grau de poluição orgânica maior será a DBO. A presença de um alto teor de matéria orgânica pode induzir à completa extinção do oxigênio na água, provocando o desaparecimento de peixes e outras formas de vida aquática. Um elevado valor da DBO pode indicar um incremento da microflora presente e interferir no equilíbrio da vida aquática, além de produzir sabores e odores desagradáveis e ainda, pode obstruir os filtros de areia 162 – Água na Visão do Direito utilizadas nas estações de tratamento de água. Declive da superfície da água - Inclinação da superfície da água expressa como a diferença de cota entre dois pontos dividida pela distância entre eles. Deflúvio - Escoamento superficial da água. Aproximadamente um sexto da precipitação numa determinada área escoa como deflúvio. O restante evapora ou penetra no solo. Os deflúvios agrícolas, das estradas e de outras atividades humanas podem ser uma importante fonte de poluição da água. Degradação hidrográfica - Degeneração de uma rede hidrográfica nas áreas planas de uma bacia, tanto mais marcada quanto mais árido é o clima. Delta - Depósito aluvial na foz de um rio; entidade geográfica e geomorfológica daí resultante. Demanda de água – Quantidade de água necessária para o abastecimento, baseada em elementos de tempo e de quantidade, e relacionada com um ponto específico ao longo do sistema. Requisição ou ordem das necessidades totais ou quantidades especificadas de água, em qualquer lugar. Derivação de água - É toda a retirada de água, proveniente de qualquer corpo hídrico, ou seja, é toda água desviada do seu curso natural destinada a um uso como o abastecimento doméstico, irrigação, industrial, etc. Descida do nível da água - Diminuição local do nível da água num canal de aproximação devido à aceleração do escoamento que passa sobre um obstáculo ou através de uma secção de controlo. Desenvolvimento sustentável - Termo caracterizado como: “desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações de satisfazer as suas próprias necessidades”. Desfiladeiro - Vale encaixado, de vertentes abruptas, onde geralmente corre um curso de água. Despejos domésticos - Despejos decorrentes do uso de água para fins higiênicos. Desperdício - É o desconhecimento ou a falta de orientação das pessoas em suas casas quanto à quantidade de água perdida pelo mau uso dos seus aparelhos e equipamentos hidráulicos, bem como vazamentos nas instalações, tais como: deixar a torneira aberta enquanto se escova os dentes ou faz a barba; enquanto se usa o sabonete, no banho; enquanto se ensaboa a louça, ao lavá-la; lavar carro ou calçadas com mangueira; aguar o jardim quando o sol já está alto; torneiras pingando ou vasos sanitários vazando, etc. Dessalinização - Processo de transformação a partir do qual o conteúdo de sal da água é reduzido suficientemente para a sua utilização para o consumo humano e animal, usos industriais e outros. Água na Visão do Direito – 163 Desvio - Derivação das camadas superficiais de um curso de água ou de um canal, mediante a utilização de um descarregador superficial. Difusividade de um aqüífero - Coeficiente de transmissibilidade de um aqüífero dividido pelo seu coeficiente de armazenamento. Dique natural - Pequeno banco aluvial, contíguo ao canal de um curso de água, composto por sedimentos depositados por eventos de cheia que transbordaram as margens do canal. Direito de uso de Recursos Hídricos - Direito que a lei assegura aos titulares de outorga de serem satisfeitos o aproveitamento da água conforme seu destino. Divisor de águas - Linha que separa a direção para onde correm as águas pluviais, ou bacias de drenagem. Um exemplo de divisor de água é a montante. Doenças de veiculação hídrica - São as doenças causadas por substâncias que não fazem parte da composição da água, encontrando-se aí, acidentalmente, como por exemplo, a contaminação por chumbo, cianetos, mercúrio, defensivos agrícolas, etc., ou então pelos micróbios patogênicos como os vírus, bactérias, protozoários, fungos e helmintos, que são alheios à fauna e flora naturais da água e que causam sérias doenças. Drenagem do solo - Movimento de água livre contida no solo que se escoa pelo efeito da gravidade. Dureza da água - Propriedade da água originada principalmente pela presença de bicarbonatos, cloretos e sulfatos de cálcio e magnésio, limitando a formação de espuma por ação dos sabões. E Ecosonda - Equipamento que utiliza a reflexão de um sinal acústico do fundo para determinar a profundidade da água. Educação ambiental - Entende-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à qualidade de vida e sua sustentabilidade. Para uma sustentabilidade eqüitativa, a educação ambiental é um processo de aprendizagem permanente, baseado no respeito a todas as formas de vida. Efeito de sifão - Fluxo ascendente de água que se produz numa formação arenosa devido a um desequilíbrio da pressão hidrostática que resulta na subida do nível de um curso de água próximo ou da diminuição da sobrecarga através de trabalhos de escavação. 164 – Água na Visão do Direito Efluente - Água residual que flui de um reservatório ou de uma estação de tratamento para a derivação de um curso de água principal ou de um reservatório. Eixo do curso de água - Linha que une os sucessivos centros das secções transversais de um curso de água. Enchente - É o fenômeno da ocorrência de vazões relativamente grandes (de escoamento superficial) e que, normalmente, causam inundações. Engenharia hidrológica - Ramo da hidrologia relativo ao desenvolvimento e à gestão dos recursos hídricos. Enquadramento de corpos d’água em classes, segundo os usos preponderantes da água - É um dos instrumentos de gestão de recursos hídricos que visa o estabelecimento do nível de qualidade (classe) a ser alcançado e/ou mantido em um segmento de corpo d’água ao longo do tempo, ou seja, objetiva assegurar às águas qualidade compatível com os usos mais exigentes a que forem destinadas, bem como diminuir os custos de combate à poluição das águas mediante ações preventivas permanentes. Equação de continuidade - Equação que descreve a conservação da massa no escomanto (por exemplo de água). Erosão fluvial - Ação erosiva - em particular, erosão localizada e intensa da água num curso de água, por escavação e remoção de materiais do leito e das margens. Escassez de água - É o resultado do consumo cada vez maior da água, do seu mau uso, do desmatamento, da poluição e do desperdício. Escoamento - É o modo como flui uma corrente de água (sua vazão, sua velocidade, etc.). Escoamento subsuperficial - Parte da precipitação que não atingiu o reservatório subterrâneo, mas que tem um percurso no solo para atingir o curso de água, conhecido também como um fluxo de água proveniente de zonas de saturação temporárias, que circula nos extratos superiores a uma velocidade superior à velocidade do escoamento subterrâneo. Escoamento subterrâneo - Qualquer escoamento que ocorre abaixo da superfície do solo e que pode contribuir para o escoamento em profundidade, escoamento de base ou percolação profunda. Escoamento uniforme - Escoamento onde o vetor velocidade é constante ao longo de cada uma das linhas de corrente. Escoamento variável - Escoamento em cursos de água com seção transversal e/ou declive do leito variáveis. Escorrência específica - Fluxo médio do escoamento subterrâneo por unidade de superfície de um aqüífero ou de uma bacia hidrogeológica. Água na Visão do Direito – 165 Esgoto doméstico - É aquele que provém principalmente de residências, estabelecimentos comerciais, instituições ou quaisquer edificações que dispõe de instalações de banheiros, lavanderias e cozinhas. Compõem-se essencialmente de água de banho, excretas (fezes humanas e urina), papel higiênico, restos de comida, sabão, detergentes e águas de lavagem. Espelho D’água - É a superfície contínua de águas, exposta à atmosfera e visíveis de uma determinada altitude, relacionadas com lagos, lagoas, rios e reservatórios de barragens e açudes. Estação hidrométrica - Estação na qual se obtêm dados relativos à água dos rios, lagos ou reservatórios, nomeadamente o nível, caudal, transporte e depósito de sedimentos, temperatura e outras propriedades físicas, químicas e biológicas da água. Estação pluviométrica - Estação onde se realizam apenas medições da precipitação observada. Estuário - Parte de um curso de água, geralmente ampla, que fica próxima da desembocadura. Eutrofização - Aumento de nutrientes (como fosfatos) nos corpos d’água, resultando na proliferação de algas podendo levar a um desequilíbrio ambiental a ponto de provocar à morte lenta do meio aquático. A eutrofização acelerada é problemática, porque resulta na retirada de oxigênio da água, matando os peixes ou outras formas de vida aquática não-vegetais. Evaporação - É a emissão de vapor de água de uma superfície livre, a uma temperatura inferior à do ponto de ebulição. Excedente de água - Diferença (positiva) entre os valores totais da precipitação e da evapotranspiração potencial durante um período de tempo, também conhecida como quantidade de água que excede a procura e que pode permanecer armazenada num reservatório ou sistema de abastecimento. Extração de água - Extração de água de reservatórios superficiais ou subterrâneos. F Filtração - Processo no qual se faz passar um líquido através de um meio filtrante, com o fim de eliminar as matérias em suspensão ou as substâncias coloidais. Floração das águas - Fenômeno em que um grande número de algas, num corpo d’água, interfere em outras formas de vida, devido, principalmente, 166 – Água na Visão do Direito ao consumo do O2 dissolvido na água. Esse fenômeno pode ser causado pela eutrofização. Flotação - Processo de elevação de partículas existentes na água, por meio de aeração, insuflação, produtos químicos, eletrólise, calor ou decomposição bacteriana, e respectiva remoção. Fluxo de água subterrânea - Massa de água que se escoa numa conduta aberta ou fechada, ou, um jato de água que emana de um orifício, ou ainda, uma massa de água subterrânea em movimento. Fonte – Lugar onde brotam ou nascem águas. A fonte é um manancial de água, que resulta da infiltração das águas nas camadas permeáveis, havendo diversos tipos como: artesianas, termais etc... Formação de uma lagoa - Formação natural de uma lagoa, com água estagnada, num curso de água. Fossa séptica – Refere-se à fossa subterrânea projetada para receber, manter e decompor os conteúdos de água residual doméstica. Foz - Ponto mais baixo no limite de um sistema de drenagem (desembocadura). Extremidade onde o rio descarrega suas águas no mar. Freqüência de cheia ou Probabilidade de cheia - Número de vezes, em determinado número de anos, no qual se pode produzir uma cheia cujo caudal ou altura supera um dado nível. Fundo - Parte inferior da secção transversal de um canal ou de outra estrutura hidráulica. Furo de controle - Furo de observação utilizado para detectar a chegada de uma condição prevista, geralmente indesejável, como o avanço de uma frente de água salgada na área costeira onde ocorra a invasão de água salgada, ou o movimento de um poluente introduzido num aqüífero. G Galeria - Conduta fechada que permite a drenagem de água sob uma estrada, via férrea ou outra estrutura. Geada - Depósito de gelo composto por grânulos mais ou menos separados por bolsas de ar e constituído, por vezes, por ramificações cristalinas. Gelo - Água em estado sólido. GEMS/Água - Projeto do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) que diz respeito ao controle mundial da qualidade da água. Gestão de bacias hidrográficas - Utilização controlada de bacias hidrográficas de acordo com objetivos definidos previamente. Gestão participativa - Constitui-se num método que enseja aos usuários, Água na Visão do Direito – 167 à sociedade civil organizada, às ONG’s e outros agentes interessados a possibilidade de influenciar no processo da tomada de decisão, de participar democraticamente, de defender seus pontos de vista sobre investimentos e outras formas de intervenção na bacia hidrográfica e na administração dos recursos hídricos locais. Granizo - Precipitação de glóbulos ou partículas de gelo (granizo), com diâmetro entre 5 e 50 mm, por vezes maior, que caem isolados ou aglomerados em fragmentos maiores e irregulares. Grau-dia - Diferença algébrica, expressa em graus centígrados, entre a temperatura média num determinado dia e uma temperatura de referência (geralmente 0 °C). Para um período determinado (meses, anos), é a soma algébrica dos graus-dia dos diferentes dias desse período. H Hidráulica - Ramo da mecânica dos fluidos que estuda o fluxo da água (ou de outros líquidos) em condutas e canais abertos. Hidrologia - É a ciência que estuda as águas superficiais e subterrâneas da terra, sua formação, circulação e distribuição, no tempo e espaço, suas propriedades biológicas, físicas e químicas e interações com o ambiente e com os seres vivos. Hidrologia cársica - Ramo da hidrologia que estuda a hidrologia os fenômenos hidrológicos nas passagens subterrâneas ou fissuras, as quais permitem o movimento subterrâneo de grandes quantidades de água. Hidrologia de superfície ou Potamologia - Ramo da hidrologia que estuda os fenômenos e processos hidrológicos observados na superfície terrestre, em especial os escoamentos e fluxos que ocorrem na rede hidrográfica. Hidrologia determinística, analítica ou paramétrica - Método de análise dos processos hidrológicos, utilizando uma aproximação determinística para analisar a resposta dos sistemas hidrológicos, em função e diversos parâmetros. Hidrologia estocástica - Processos e fenômenos hidrológicos que são descritos e analisados pelos métodos da teoria das probabilidades. Hidrologia urbana - Ramo da hidrologia que estuda as zonas urbanas e metropolitanas, onde predomina as superfícies quase impermeáveis e um relevo artificial do solo, analisando em particular o efeito do desenvolvimento urbano. Hidrômetro - Partículas de água no estado sólido ou líquido em queda ou suspensão na atmosfera. 168 – Água na Visão do Direito Hidrometria - Ciência que se ocupa da medição e análise da água, compreendendo os métodos, técnicas e instrumentação utilizados em hidrologia. Hidrômetro - É o aparelho destinado a medir e indicar o volume de água que o atravessa, ou seja, o consumo de água, popularmente conhecido como contador de água em ligações domiciliares ou prediais. Hidrosfera - À parte da terra coberta de água e de gelo. Higrômetro - Sonda utilizada para medir a umidade do solo. Homotermia - Estado de uma massa de água na qual a temperatura não varia com a profundidade. I Icebergue - Massa de gelo de grandes dimensões, destacada de um glaciar ou de uma plataforma de gelo, flutuante ou à deriva, que emerge mais de 5 metros sobre o nível da água. Ilha - Porções relativamente pequenas de terra emersa circundada de água doce ou salgada. Impacto ambiental - É qualquer alteração, provocada ou induzida pelo homem, das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, que, direta ou indiretamente, afetam: a saúde, a segurança e o bem-estar da população; as atividades sociais e econômicas; a biota; as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; e a qualidade dos recursos ambientais. Índice de infiltração - Taxa média de infiltração obtida a partir de um hietograma de modo a que o volume da precipitação correspondente à parte superior da ordenada definida pela taxa de infiltração corresponda ao volume de escorrência Índice de precipitação antecedente ou Umidade antecedente de solo - Soma ponderada da precipitação diária que se utiliza como índice de umidade do solo. O peso atribuído à precipitação diária representa-se através de uma função exponencial ou inversa no tempo, por forma a que a precipitação mais recente tenha maior peso. Índice de seca - Valor que quantifica um déficit de água prolongado e generalizado. Em hidrologia um índice de seca considera níveis em rios, lagos, albufeiras e/ou reservatórios subterrâneos por comparação com valores de referência. Um índice de seca agrícola refere-se a efeitos de um déficit excepcional de evapotranspiração. Índice de vazios - Relação entre o volume de interstícios e o volume de partículas sólidas numa dada amostra de um solo poroso. Água na Visão do Direito – 169 Infiltração - Movimento da água da superfície para um meio poroso. Infiltração ou percolação profunda - Água que se infiltra em profundidade, abaixo da zona radicular, com possibilidade de alcançar o nível freático. Injeção de água Walter bleeding - Água que é injetada através de uma fissura numa camada de gelo. Interface água doce/água salgada - Superfície que separa uma massa de água doce de uma outra de água salgada ou salobra e que se situa na zona de transição entre os dois fluídos. Interferência nos recursos hídricos - Toda e qualquer atividade, obra ou empreendimento que altere as condições de escoamento das águas, criando obstáculo, produzindo modificações ou perturbando o fluxo dessas águas. Interstício ou poro capilar - Interstício suficientemente pequeno para manter a água contra a ação da gravidade, acima do nível freático. Intervalo ou banda de confiança - Zona compreendida entre os limites de confiança superior e inferior. Inundação - É o fenômeno em que o volume de água de uma enchente (em geral, por excesso de chuvas) transborda do canal natural do rio. Podem ter duas causas: o excesso de chuvas, de tal forma que o canal do rio não suporta a vazão da enchente ou existe, a jusante da área inundada, qualquer obstrução que impede a passagem da vazão de enchente, como por exemplo, um bueiro mal dimensionado ou entupido. Irrigação - Basicamente, é uma operação agrícola que tem como objetivo suprir artificialmente a necessidade de água da planta. Isoalina - Linha (ou superfície) que une os pontos de igual salinidade das águas subterrâneas ou das águas superficiais. J Jusante - Uma área ou um ponto que fica abaixo de outro ao se considerar uma corrente fluvial ou tubulação na direção da foz, do final. O contrário de montante. K Kanat - Galeria subterrânea para o fornecimento de água, que se inicia sob o nível freático e se dirige para a superfície do solo, com um declive menor que o declive do nível freático e o declive da superfície. 170 – Água na Visão do Direito L Lago - Massa de água continental de tamanho considerável. Denominação genérica para qualquer porção de águas represadas circundada por terras de ocorrência natural ou resultante da execução de obras, como barragens em curso de água ou escavação do terreno. Depressões do solo produzidas por causas diversas e cheias de águas confinadas, mais ou menos tranqüilas, pois dependem da área ocupada pelas mesmas. As formas, as profundidades e as extensões dos lagos são muito variáveis. Geralmente, são alimentados por um ou mais ‘rios afluentes’. Possuem também ‘rios emissários’, o que evita seu transbordamento. Lagoa - Depressão de formas variadas, principalmente tendentes a circulares, de profundidades pequenas e cheias de água salgada ou doce. As lagoas podem ser definidas como lagos de pequena extensão e profundidade (...) Muito comum é reservarmos a denominação ‘lagoa’ para as lagunas situadas nas bordas litorâneas que possuem ligação com o oceano. Laguna - Depressão contendo água salobra ou salgada, localizada na borda litorânea. A separação das águas da laguna das do mar pode se fazer por um obstáculo mais ou menos efetivo, mas não é rara a existência de canais, pondo em comunicação as duas águas. Lavagem da atmosfera pela chuva - Eliminação de substâncias da atmosfera, como poeiras, aerossóis e gases, por ação da precipitação líquida ou sólida. Leito do rio - Parte inferior de um vale fluvial, moldado pelo escoamento, e ao longo do qual se deriva a maior parte do caudal e dos sedimentos transportados pelo escoamento em períodos entre cheias. Licenciamento ambiental - É um dos mais eficazes instrumentos da política ambiental para a viabilização do desenvolvimento sustentado. É um ato administrativo pelo qual o órgão ambiental competente estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas para a liberação da: LP (Licença Prévia), LEU (Licença de Instalação) e LO (Licença de Operação). Lixiviação - Processo que sofrem as rochas e solos, ao serem lavados pela água das chuvas (...) Nas regiões intertropicais de clima úmido os solos tornam-se estéreis com poucos anos de uso, devido, em grande parte, aos efeitos da lixiviação. A lixiviação também ocorre em vazadouros e aterros de resíduos, quando são dissolvidos e carreados certos poluentes ali presentes para os corpos d’água superficiais e subterrâneos. Água na Visão do Direito – 171 Lodo - Mistura de água, terra e materiais sólidos acumulados, separados por diversos tipos de águas, que resultam de processos naturais ou artificiais. Lodo ativado ou ativo - Lodo que foi aerado e sujeito à ação de bactérias, usado para remover matéria orgânica do esgoto. Lodo bruto - Lodo depositado e removido dos tanques de sedimentação, antes que a decomposição esteja avançada. Freqüentemente chamado lodo não digerido. M Manancial - Qualquer corpo d’água, superficial ou subterrâneo, utilizado para abastecimento humano, industrial, animal ou irrigação. Manguezal - Ecossistema costeiro de transição entre os ambientes terrestre e aquático sujeito a regime das marés. Marcas de cheia - Marcas naturais numa estrutura ou outro suporte, que indicam o nível máximo alcançado pela cheia. Maré - Elevação e diminuição periódicas da água do mar e de grandes lagos devido à atração gravitacional da Lua e do Sol. Maré baixa - Nível mais baixo atingido pela maré descendente em determinado ciclo de marés. Maré morta - Maré de pequena amplitude que ocorre duas vezes por mês, aproximadamente durante o período correspondente à quadratura da Lua. Margem - Orla de um curso de água; margem localizada à esquerda do rio quando nos colocamos no sentido de jusante. É a margem esquerda. Massa de água - Massa de água distinta de outras massas de água. Meandro - Porção curva de um curso de água sinuoso, consistindo em duas voltas consecutivas, uma na direção dos ponteiros do relógio e a outra no sentido inverso. Meio ambiente - É o conjunto dos elementos e fatores (condições, leis, influências e interações) físicos, químicos e biológicos, naturais e artificiais, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas e necessários à sobrevivência das espécies. O meio ambiente é formado pelos elementos produzidos pela própria natureza (água, solo, vegetação, rios, relevo, clima, etc.), e pelos elementos produzidos pelo homem (habitações, fábricas, campos cultivados, etc.). Método racional - Fórmula que exprime o valor máximo do caudal de ponta do escoamento superficial como o produto da superfície da bacia, um 172 – Água na Visão do Direito valor máximo da intensidade de precipitação e um coeficiente de escoamento. Molinete - Instrumento para medir a velocidade da água num ponto, normalmente pela rotação de copos ou hélices. Montante - Um lugar situado acima de outro, tomando-se em consideração a corrente fluvial que passa na região. O relevo de montante é, por conseguinte, aquele que está mais próximo das cabeceiras de um curso d’água, enquanto o de jusante está mais próximo da foz. N Nascente artesiana - Nascente cuja água provém de um aqüífero artesiano, geralmente através de uma fissura ou outro tipo de abertura da formação impermeável que delimita o aqüífero. Navegação - Uso de recurso hídrico para o transporte fluvial, demandando a manutenção de vazões mínimas nos cursos d’água. Necessidade de água de rega - Quantidade de água que é necessário adicionar à precipitação para uma produção agrícola ótima. Neve - Precipitação de cristais de gelo, em geral aglomerados em flocos, freqüentemente em forma de estrela. Nível da água - Altura da superfície livre de uma massa de água em relação a um plano de referência. Nível da água subterrânea - Cota do nível freático ou superfície piezométrica de um aqüífero num determinado local e momento. Nível freático - Superfície na zona de saturação de um aqüífero livre submetida à pressão atmosférica. NMP - Número Mais Provável de coliformes por 100 ml de amostra de água. A densidade de coliformes na água bruta é usada como um critério para julgar as necessidades de tratamento da água. A determinação da qualidade da água “in natura” e da eficiência do tratamento deve ser condicionada aos padrões de potabilidade que fixam os limites de tolerância das impurezas. A contaminação bacteriológica é medida em NMP. Número de Froude - Número adimensional que exprime a relação entre as forças de inércia e as forças de gravidade. Num canal o escoamento é rápido, crítico ou lento se o número de Froude for inferior, igual ou superior à unidade, respectivamente. Número de Reynolds - Parâmetro adimensional que exprime a relação entre as forças de inércia e as forças de viscosidade. Água na Visão do Direito – 173 Número de Weber - Parâmetro adimensional que exprime a relação entre forças de inércia e as forças de tensão superficial. Nutriente - Substância simples ou composta necessária ao crescimento e desenvolvimento das plantas e animais. O Obra - Construção ou execução de empreendimento que interfira sobre o regime, a quantidade ou a qualidade dos recursos hídricos superficiais ou subterrâneos, consumindo recursos materiais e assumindo a forma de um bem material. Obra hidráulica - Qualquer obra permanente ou temporária, capaz de alterar o regime natural das águas superficiais ou subterrâneas, incluídas as condições qualitativas e quantitativas. Observação hidrológica - Medição ou avaliação direta de uma ou mais variáveis hidrológicas, como o nível, o caudal, a temperatura da água, entre outras. OD – Oxigênio dissolvido. Os níveis de oxigênio dissolvido têm papel determinante na capacidade de um corpo d’água natural manter a vida aquática. Uma adequada provisão de oxigênio dissolvido é essencial para a manutenção dos processos naturais de autodepuração em sistemas aquáticos e estações de tratamento de esgotos. Através de medição do teor de oxigênio dissolvido, podem ser avaliados os efeitos dos resíduos oxidáveis sobre as águas receptoras e sobre a eficiência do tratamento dos esgotos, durante o processo de oxidação bioquímica. Olho d’água, nascente - Local onde se verifica o aparecimento de água por afloramento do lençol freático (Resolução nº 04, de 18.09.85, do CONAMA). Onda - Oscilação da superfície de um lago ou de uma massa de água similar, causada por terremotos, ventos ou variações da pressão atmosférica. Onda cheia - Elevação do nível das águas de um rio até o pico e subseqüente recessão, causada por um período de precipitação, fusão das neves, ruptura da barragem ou liberação de água por central elétrica. Órgão gestor - É a instituição integrante do Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos que tem como competência realizar a implementação da Política Estadual de Recursos Hídricos. Orvalho - Depósito de gotas de água nos objetos próximos do solo, provenientes da condensação do vapor de água contido no ar. 174 – Água na Visão do Direito Osmose - Fenômeno produzido quando duas substâncias líquidas, ou dissolvidas com concentrações desiguais e separadas por membrana semipermeável, a atravessam e se misturam. Outorga - É um dos instrumentos de gestão de recursos hídricos, no qual o usuário recebe uma autorização para fazer uso da água. É um documento que garante a tomada d’água, de determinada vazão, de certa fonte hídrica, em local definido, para um determinado uso, durante um período de tempo, podendo-lhe ser assegurado o direito de uso desta água. P Parâmetro - Coeficiente de um modelo hidrológico, fórmula ou outro tipo de relação, que pode ser ajustado para aplicar um modelo geral, etc. a casos particulares. Por exemplo, para ajustar o modelo precipitação-caudal a uma determinada bacia é necessário afetar os parâmetros do modelo de valores apropriados para essa bacia. Paredão - Muro construído para confinar cursos de água, como medida de prevenção contra inundações. Percentagem de lagos - Percentagem da superfície de uma bacia hidrográfica coberta de lagos. Perdas de água - Num balanço hídrico, quantidade de água perdida numa dada região, durante um certo período de tempo, pela transpiração das culturas ou da vegetação natural e formação do tecido vegetal, por evaporação da superfície de água, da umidade do solo e da neve, e por intercepção. Piscicultura - É a atividade com o uso de recurso hídrico para a criação, engorda e comércio de peixes, utilizando-se de tanques, viveiros ou açudes. Plâncton - Conjunto dos seres vivos que flutuam sem atividades nas massas de água de lagos ou de oceanos. A parte vegetal é chamada fitoplâncton e ocorre até onde chegam os raios de sol (cerca de 100 metros de profundidade, dependendo da altitude). A parte da fauna é chamada zooplâncton e é formada basicamente de minúsculos crustáceos. O plâncton é a principal reserva alimentar dos ecossistemas marinhos. Planejamento - É a atividade destinada a resolver os problemas de uma comunidade, através de considerações ordenadas, que envolvem, desde uma concepção inicial, um Plano de recursos hídricos - Estudo prospectivo que busca adequar o uso, controle e grau de proteção dos recursos hídricos às aspirações sociais e/ou governamentais expressas formal ou informalmente em uma política de recursos hídricos, através da coordenação, compatibilização, articulação Água na Visão do Direito – 175 e/ou projetos de intervenção. Segundo a lei, os Planos de Recursos Hídricos são planos diretores das bacias hidrográficas que visam fundamentar e orientar a implementação da Política Estadual de Recursos Hídricos e o gerenciamento dos recursos hídricos. São planos de longo prazo, com horizonte de planejamento comparável com o período de implantação de seus programas e projetos. Plano de referência - Superfície horizontal de referência à medição da cota. Plano de trabalho - É a descrição detalhada das etapas ou fases de um serviço ou obra, segundo determinada metodologia, elaborado tendo em vista o(s) objetivo(s) a atingir. Plano estadual de recursos hídricos - É um dos instrumentos da Política Estadual de Recursos Hídricos que visa fundamentar, planejar e orientar a sua implementação e o gerenciamento dos recursos hídricos. Pluviômetro - Instrumento para medir a altura da água da precipitação num ponto. Poço - Obra de perfuração efetuada com o objetivo de extrair água subterrânea. Se efetuada em profundidade e com maior diâmetro denomina-se furo. Poço artesiano - Poço que se comunica com o aqüífero artesiano, no qual o nível da água se eleva acima da superfície do solo. Política da água - Conjunto de normas legislativas e legais, decisões governamentais, políticas de gestão e respostas culturais para a conservação quantitativa e qualitativa dos recursos hídricos de uma região, bacia hidrográfica ou país. Política Estadual de recursos hídricos - É o conjunto consistente de princípios doutrinários que conformam as aspirações sociais e/ou governamentais no que concerne à regulamentação ou modificação nos usos, controle e proteção de recursos hídricos, garantindo sua utilização para gerações futuras. Poluente - Substância, meio ou agente que provoque, direta ou indiretamente qualquer forma de poluição. Poluição - É a contaminação ou qualquer interferência danosa nos processos de transmissão e/ou alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente e das águas, pelo lançamento de quaisquer substâncias sólidas, líquidas ou gasosas, que se tornem efetiva ou potencialmente nocivas à saúde, à segurança e ao bem-estar públicos, comprometendo seu emprego para uso doméstico, agrícola, pastoril, recreativo e industrial, ou para outros fins justificados e úteis, bem como cause danos ou prejuízos à flora e fauna. 176 – Água na Visão do Direito Potamologia - Ramo da hidrologia que estuda os cursos de água superficiais e o tipo de regime a eles associado. Inclui a hidráulica fluvial e todos os fenômenos relacionados com a erosão e a sedimentação no leito dos cursos de água. Precipitação - Produtos, sob a forma líquida ou sólida, resultantes da condensação do vapor de água, que caem das nuvens ou que são depositados pelo ar úmido sobre o solo. Precipitação útil - Parte da precipitação que contribui para o escoamento direto num curso de água. Precisão ou Erro - Qualidade associada ao grau de concordância entre os resultados repetidos de vários cálculos, estimativas ou medições, independentemente, de o seu valor médio se aproximar ou não do valor real. Preservação - É tornar intocáveis os recursos naturais e o meio ambiente, preservando-os para o deleite das futuras gerações. Não se deve confundir com “proteção” e “conservação” que permitem o uso e aproveitamento racional. Pressão capilar - Diferença de pressão ao longo da interface curva água/ ar. Pressão dinâmica - Pressão devida à energia cinética de um fluido. Previsão de cheias - Previsão do nível, caudal, tempo de ocorrência e duração de uma cheia, especialmente do seu caudal máximo em determinado ponto do curso de água, resultante da ocorrência de precipitação e/ou degelo. Previsão do abastecimento de água - Previsão do volume de água disponível numa área e período de tempo determinado, incluindo, se possível, sua distribuição temporal e as probabilidades correspondentes. Prisma de maré - Volume de água que entra com o movimento da maré para um canal de maré e que dele volta a sair durante um ciclo completo da maré, excluindo os caudais continentais. Processo de ‘Markov’ - Processo estocástico em que a distribuição da probabilidade condicional do estado do sistema para qualquer instante futuro, dado o estado presente do sistema, é independente do conhecimento suplementar da história anterior. Propagação da onda de cheia - Técnicas utilizadas para calcular o movimento e as alterações na forma de uma onda de cheia, que se move através de um troço ou de um reservatório. Purificação - Tratamento de águas naturais ou residuais de modo a modificar as propriedades físicas e eliminar as substâncias químicas e organismos vivos considerados nocivos e indesejáveis. Água na Visão do Direito – 177 Q Qualidade da água - Características químicas, físicas e biológicas, relacionadas com o seu uso para um determinado fim. A mesma água pode ser de boa qualidade para um determinado fim e de má qualidade para outro, dependendo de suas características e das exigências requeridas pelo uso específico. Queda de água - Queda de água vertical ou descida com grande declive de um curso de água. R Racionamento - Limitação do consumo dos recursos hídricos, a fim de garantir a distribuição eqüitativa para todos os usuários outorgados de uma bacia hidrográfica, bem como para os usos considerados insignificantes, em razão de situação hidrológica crítica, principalmente as secas prolongadas. Raio hidráulico - Relação entre a área da secção líquida e o perímetro molhado de um curso de água, canal ou conduta fechada. Ravina - Canal profundamente erodido pela ação da água de escorrência durante períodos de fortes chuvaradas ou degelo. Recarga - Introdução artificial de águas num aqüífero, após tratamento adequado. Recarga artificial - Processo de aumentar o fornecimento natural de água a um aqüífero bombeando água para dentro dele através de perfurações ou para dentro de bacias de captação que drenam a água para dentro do aqüífero. Reciclar - Coletar e processar um recurso de modo que ele possa ser transformado em novos produtos, como recuperar garrafas ou latas de alumínio para processá-las em novas garrafas ou latas. A reciclagem difere da reutilização por envolver processamento; reutilizar significa usar um recurso novamente em sua forma original, como na lavagem e reutilização de um container. Recife - Proeminência ou massa de rochas ou de coral (ou de um banco de areia estendido) junto à superfície do oceano. Recife artificial - Estrutura construída pelos homens que se ergue acima do fundo do oceano. Ele cria um habitat artificial para atrair organismos marinhos e bentônicos. Recursos Hídricos - Numa determinada região ou bacia, é qualquer coleção 178 – Água na Visão do Direito d’água superficial ou subterrânea que pode ser obtida e está disponível para o uso humano. Segundo a ONU, não passa de um por cento das águas totais do planeta. Recursos Naturais - São o conjunto de riquezas atuais e potenciais existentes na natureza, à disposição do homem. Rede de abastecimento de água ou sistema de abastecimento de água - Conjunto dos reservatórios, bombas e condutas que são necessários para assegurar aos diversos utilizadores um fornecimento de água com a quantidade e a qualidade exigidas. Rede de esgoto - Termo coletivo para o sistema de coleta e usina de tratamento de esgoto num determinado bairro ou região. Rede hidrográfica - Conjunto de rios e outros cursos de água, permanentes ou temporários, incluindo lagos e reservatórios em determinada região. Rede hidrométrica - Conjunto de estações hidrométricas e pontos de observação situados em determinada zona (bacia hidrográfica, região administrativa), que proporcionam informação para o estudo do regime hidrológico. Redução - Processo químico que leva a uma perda de oxigênio ou a um aumento de eletrões num composto; é o processo contrário à de oxidação. Rega - Aplicação artificial de água com fins agrícolas. Reservatório de água - É toda massa de água, natural ou artificial, usada para armazenar, regular e controlar os recursos hídricos. A partir da seção imediatamente a montante de um barramento, é todo volume disponível, constituído de alturas atingidas pelas águas e respectiva área superficial abrangida (espelho d’água), descritos por curvas cota-volume e cota-área. Resíduo - Quando se ajusta um modelo aos dados, um resíduo é a diferença entre um dos dados e o valor correspondente calculado pelo modelo. Por exemplo, numa regressão linear é a diferença entre um valor observado e o valor determinado pela equação. Resistência hidráulica - Inverso da condutividade hidráulica. Ressurgência - Reaparecimento ao ar livre, após percurso subterrâneo, de um curso de água superficial que tinha desaparecido a montante. Retenção - Parte da precipitação que cai na área de drenagem de uma bacia e que não é parte integrante do escoamento superficial, durante um determinado período de tempo. Reuso - Trata-se de uma alternativa mais plausível para satisfazer as demandas menos restritivas como, por exemplo, utilizar as águas domésticas servidas mais de uma vez, após tratada, realizar o reuso urbano não potável, o reuso industrial ou o reuso agrícola, liberando as águas de melhor qualidade para usos mais nobres, como o abastecimento e consumo humano. Água na Visão do Direito – 179 Rio - Canal natural de drenagem de superfície que tem uma descarga anual relativamente grande. Um rio geralmente termina oceano. S Salinidade - Medida da concentração de sais dissolvidos, principalmente cloreto de sódio, em água salina ou água do mar. Salinização - Degradação de terras férteis causada pelo sal. A salinização das terras agrícolas é comum em áreas que dependem de irrigação: a evaporação superficial retira sais do solo e das pedras do subsolo, sendo que a redução das águas subterrâneas aumenta o percentual de minerais e sais na água armazenada. Saneamento ambiental - É a parte do saneamento que se encarrega da proteção do ar, do solo e das águas contra a poluição e a contaminação. Seca hidrológica ou Seca - Período de tempo excepcionalmente seco, suficientemente prolongado para provocar uma considerável diminuição das reservas hídricas, como a redução significativa do caudal dos rios, do nível dos reservatórios e/ou a descida dos níveis de água no solo e nos aqüíferos. Conseqüência de ausência prolongada ou marcada escassez de precipitação. Sedimentação - Acúmulo de solo e/ou partículas minerais no leito de um corpo d’água. Em geral, esse acúmulo é causado pela erosão de solos próximos, ou pelo movimento vagaroso de um corpo d’água, como ocorre quando um rio é representado para formar um reservatório. Sifão - Conduta fechada uma parte da qual está acima da linha piezométrica. Pelo que neste tramo se verifica uma pressão inferior à atmosférica o que obriga à realização de uma descarga parcial para amortecer o escoamento. O sifão utiliza a pressão atmosférica para produzir ou aumentar o escoamento de água que o atravessa. Pode aparecer naturalmente em regiões cársicas. Sistema de abastecimento público de água - É o conjunto de obras, instalações e serviços, destinados a produzir e distribuir água potável a uma comunidade, em quantidade e qualidade compatíveis com as necessidades da população, para fins de consumo doméstico, serviços públicos, consumo industrial e outros usos. Destina-se a melhorar as condições de Saúde Pública, tanto do ponto de vista físico, pela eliminação das doenças de veiculação hídrica, como pela social, pela melhoria das condições de comodidade na obtenção e uso da água. 180 – Água na Visão do Direito Solo - Parte superficial da terra formada pelo acúmulo de material inconsolidado originado do intemperismo das rochas. Para os geólogos, o solo (melhor definido como regolito) compreende tanto o material superficial como o subsolo formado por rocha em decomposição. Para os pedólogos (agronomia), observa-se um horizonte A, superficial, que contém muita matéria orgânica, um horizonte B, mais profundo, onde ocorre o acúmulo dos sais lixiviados da superfície e de partículas minerais e, mais abaixo, o subsolo considerado horizonte C. Para a gestão de recursos hídricos e do meio ambiente, assim como para a engenharia, a acepção usada pelos geólogos é mais adequada. Sonda - Instrumento desenhado para recolher amostras de solo, argila ou outros materiais relativamente pouco consolidados a profundidade reduzida. Submersão - Condição de um descarregador quando o nível de água a jusante é igual ou superior à cota da crista do descarregador. Sumidouro - Em hidrologia, significa uma cavidade, em forma de funil, na superfície do solo, que se comunica com o sistema de drenagem subterrânea, em regiões calcárias, causada pela dissolução da rocha. Já, na engenharia sanitária, significa um poço destinado a receber o efluente da fossa séptica e permitir sua infiltração subterrânea. T Talvegue - Linha que percorre a parte mais funda do leito de um curso de água ou de um vale. Tanque - Reservatório escavado com trator em terreno com declive, fora do álveo de curso d’água, formando uma área côncava com uma coroa do material escavado para armazenamento das águas de chuva. Tempestade - Queda de precipitação muito intensa em forma de chuva, neve ou granizo, acompanhada ou não por vento que está associada a outro fenômeno meteorológico diferenciado. Teor de água na neve - Fração, expressa em peso de água líquida, contida nos interstícios existentes entre os grãos de neve, mas que a eles não adere fortemente, e que se move livremente por capilaridade ou por gravidade. Teor de umidade do solo - Percentagem de água no solo, expressa em relação ao peso do solo seco ou ao volume. Termoclina - Camada de uma massa de água termicamente estratificada onde o gradiente de temperatura atinge o valor máximo. Água na Visão do Direito – 181 Tina flutuante - Tina evaporimétrica que flutua numa massa de água. Tomada d’água - É uma estrutura construída em concreto, alvenaria ou outro material num corpo hídrico ou estrutura hidráulica para a captação ou derivação de água para determinada finalidade. Torrente - Curso de água de grande declive que se escoa geralmente a uma grande velocidade e de forma turbulenta. Traçador - Substância facilmente detectável que pode ser introduzida em pequenas quantidades na água corrente, de superfície ou subterrânea, para materializar as trajetórias das partículas ou medição das características do escoamento, como por exemplo a velocidade do escoamento, tempo de percurso, diluição, etc. Transposição - Transferência de água e/ou efluentes entre mananciais hídricos pertencentes a bacias hidrográficas distintas. Tratamento - Processo artificial de depuração e remoção das impurezas, substâncias e compostos químicos de água captada dos cursos naturais, de modo a torná-la própria ao consumo humano, ou de qualquer tipo de efluente liquido, de modo a adequar sua qualidade para a disposição final. Tratamento primário - Operações unitárias, com vistas principalmente à remoção e estabilização de sólidos em suspensão, tais como sedimentação, digestão de lodo, remoção da umidade do lodo. Tratamento químico - Qualquer processo envolvendo a adição de reagentes químicos para a obtenção de um determinado resultado. Tratamento secundário - Operações unitárias de tratamento, visando principalmente à redução de carga orgânica dissolvida, geralmente por processos biológicos de tratamento. Tratamento terciário - Operações unitárias que se desenvolvem após o tratamento secundário, visando ao aprimoramento da qualidade do efluente, por exemplo à desinfecção, à remoção de fosfatos e outras substâncias. Trecho de corpo hídrico - Segmento de um corpo d’água onde as características são consideradas uniformes. Troço - Tramo de um canal aberto compreendido entre duas secções transversais. Tsunami - Onda marítima de grande amplitude provocada por um terremoto no mar (maremoto) ou por uma erupção vulcânica. Tubo de Pitot - Tubo em ângulo reto cujo ramo inferior tem uma abertura orientada para montante e que se mantém perpendicular às linhas de corrente do escoamento. Dispositivo utilizado para medir a velocidade de um líquido a qual pode ser determinada pela diferença entre a pressão dinâmica e a pressão estática. Turbidez - Medida da transparência de uma amostra ou corpo d’água, em 182 – Água na Visão do Direito termos da redução de penetração da luz, devido à presença de matéria em suspensão ou substâncias coloidais. Mede a não propagação da luz na água. Turbulência atmosférica - Fenômeno atmosférico caracterizado por uma variação importante da velocidade do vento que começa bruscamente, dura alguns minutos e diminui rapidamente. É muitas vezes acompanhado de aguaceiro ou trovoada. U Umidade - Medida da quantidade de vapor d’água contido no ar atmosférico. Umidade relativa - A uma pressão e temperaturas dadas, é a relação percentual entre a fração molar do vapor de água e a fração molar que o ar teria se estivesse saturado de água à mesma pressão e temperatura. Unidade de trítio - Unidade utilizada para exprimir a concentração de trítio. Uma unidade de trítio corresponde a uma concentração de um átomo de trítio em 1018 átomos de hidrogênio. Uso dos recursos hídricos - Toda e qualquer atividade humana que, de qualquer modo, altere as condições naturais das águas. Uso industrial da água - Constitui o uso dos recursos hídricos como matéria prima de produção e também de insumo para o processo produtivo industrial, tais como: fonte de energia (vapor), caldeiras, sistemas de refrigeração, combate a incêndios, fins sanitários e outros. Uso rural da água - É o uso do recurso hídrico para as atividades na zona rural como irrigação, insumo na criação de animais em sistema intensivo de confinamento ou extensiva ou ainda para a simples dessedentação animal. Usos benéficos da água - São os que promovem benefícios econômicos e o bem-estar à saúde da população. Os usos benéficos permitidos para um determinado corpo d’água são chamados usos legítimos de corpos d’água: abastecimento público - “uso da água para um sistema que sirva há, pelo menos, 15 ligações domiciliares ou há, pelo menos, 25 pessoas, em condições regulares”; uso estético - “uso da água que contribui de modo agradável e harmonioso para compor as paisagens naturais ou resultantes da criação humana”; recreação - “uso da água que representa uma atividade física exercida pelo homem na água, como diversão”; preservação da flora e fauna - “uso da água destinado a manter a biota natural nos ecossistemas aquáticos”; atividades agropastoris - uso da água para irrigação de culturas e dessedentação e criação de animais”; abastecimento industrial - uso da água para fins industriais, inclusive geração de energia. Água na Visão do Direito – 183 Usos múltiplos da água - Coloca todas as categorias usuárias em igualdade de condições em termos de acesso aos recursos hídricos, sem privilégios. V Vala - Canal artificial de pequena dimensão escavado na terra, utilizado para conduzir a água. Vazante - O refluxo da maré da preia-mar para a baixa-mar, ou o período durante o qual tal se dá. Vazão - É o volume de água que passa por uma determinada seção de um conduto por uma unidade de tempo. Usualmente é dado em litros por segundo (l/s), em metros cúbicos por segundo (m3/s) ou em metros cúbicos por hora (m3/h). Voçoroca - Processo erosivo subterrâneo. causado por infiltração de águas pluviais, através de desmoronamento e que se manifesta por grandes fendas na superfície do terreno afetado, especialmente quando este é de encosta e carece de cobertura vegetal. Volume aleatório - Volume disponível sazonalmente em um corpo hídrico, sob a forma de variável aleatória que assume valor diferente a cada período de tempo, em função da natural variabilidade hidrológica e do manejo dos corpos hídricos. Volume outorgado - Volume indisponível para novas outorgas em função de outorgas já efetuadas no próprio corpo hídrico, ou em outros localizados à montante, devendo ser sempre igual ou inferior ao volume outorgável. Volume outorgável - Máximo volume que pode ser outorgado em um corpo hídrico e cujo montante é composto pela soma do volume já outorgado com o volume ainda disponível para outorga. Vórtice - Turbilhão de grande diâmetro numa massa de água. Z Zona árida - Zona onde a precipitação é de tal modo insuficiente que é necessário regar para manter as culturas. Zooplâncton – 1) Refere-se a microorganismos que se alimentam dos fitoplânctons que vivem na água e que por sua vez são alimentos para os vários tipos de peixes; 2) Animais, geralmente microscópicos, que se mantém flutuando ou nadando na coluna de água (microcrustáceos e larvas de peixes e camarões) CAPÍTULO 6 - JURISPRUDÊNCIA 6.1 TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DIREITO AMBIENTAL – HIDROVIA – ANÁLISE INTEGRADA – ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL – PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO Ementa: Direito Ambiental. Hidrovia Paraguai-Paraná. Análise integrada. Necessidade do Estudo do Impacto Ambiental em toda extensão do rio, e não por partes. Aplicação do princípio da precaução. 1. O Projeto da Hidrovia Paraguai-Paraná, envolvendo realização de obras de engenharia pesada, construção de novos portos e terminais, ampliação dos atuais, construção de estradas de acesso aos portos e terminais, retificações das curvas dos rios, ampliação dos raios de curvatura, remoção dos afloramentos rochosos, dragagens profundas ao longo de quase 3.500 Km do sistema fluvial, construção de canais, a fim de possibilitar uma navegação comercial mais intensa, com o transporte de soja, minério de ferro, madeira etc, poderá causar grave dano à região pantaneira, com percussões maléficas ao meio ambiente e à economia da região. É necessário, pois, que se faça um estudo desse choque ambiental em toda a extensão do Rio Paraguai até a foz do Rio Apa. 2. Aplicação do princípio que o intelectual chama de precaução, que foi elevado à categoria de regra do direito internacional ao ser incluído na Declaração do Rio, como resultado da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento - Rio/92. “Mas vale prevenir do que remediar”, diz sabiamente o povo. 3. Os serviços rotineiros de manutenção, como, por exemplo, as dragagens que não exijam grandes obras de engenharia, devem continuar. A navegação atual, a navegação de comboios de chatas no Rio Paraguai, permanece da maneira como vem sendo feita há anos, obedecendo-se às normas baixadas pela Capitania Fluvial do Pantanal e às orientações do IBAMA. 4. Havendo, como há, ordem judicial no sentido de os atuais portos e terminais continuarem operando, o funcionamento dos mesmos não constitui crime, não podendo, assim, haver abertura de inquérito policial para apurar 186 – Água na Visão do Direito possível ocorrência de dano ambiental, tão só pelo funcionamento. O não atendimento da decisão judicial implica prática do crime de desobediência. (Agravo Regimental na Petição n.º 200101000015170. Corte Especial. TRF – Primeira Região. Relator Juiz-Presidente Tourinho Neto . Julgado em 12/02/2001). AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DANO AMBIENTAL – LANÇAMENTO DE EFLUENTES QUÍMICOS - INDENIZAÇÃO Ementa: Administrativo. Ação Civil Pública. Dano Ambiental. Procedência da ação. Sentença confirmada. Improvimento do recurso e da remessa oficial. 1. (a) do Dano Ambiental Os autos trazem uma seqüência de fatos que comprovam inequivocamente o dano causado pela apelante ao rio Jaguarão, bem como ao seu entorno. A apelante demonstrou desinteresse tamanho em cumprir as exigências determinadas pelo Juízo que foi determinada a paralisação de suas atividades, bem como a instauração de ação penal em face da apelante e de seu sócio Ésio Adilton Lavínia. Em junho de 2001, após fiscalização do órgão ambiental, o Juízo de 1º Grau assinalou prazo de 45 dias para que a empresa-ré apresentasse Plano Global de Adequação, sob pena de interdição de suas atividades, ante a constatação de que a ré teria lançado efluentes químicos in natura no rio Jaguarão, por problemas técnicos em seus equipamentos de tratamento. Conforme narrado pelo Ministério Público Federal no 1º Grau, em inspeção judicial nas instalações da apelante (fl. 563/566), a Juíza designou nova data para inspeção judicial (15.03.2002) face às péssimas condições do local e da estação de tratamento de efluentes (ETE). Nessa ocasião, foram determinadas diversas providências à apelante, dentre elas a instalação de bomba com maior potência para alimentar o tanque de equalização; instalação de raspador automático do tanque de flotação; limpeza geral do ambiente próximo a ETE, dentre outras. Em Relatório de Vistoria e Viagem confeccionado pela FATMA em 20.02.2002 (fl. 590), foi anotado: ... foi realizada uma vistoria para a verificação de alguma benfeitoria necessária, conforme inspeção realizada em conjunto com o Ministério Público. A empresa ainda não implantou qualquer benfeitoria e o efluente lançado foi registrado por foto (anexo). Em março de 2003, em nova inspeção judicial, constatou-se, ainda, diversas irregularidades na atividade fabril da empresa, malgrado todas as determinações judiciais e medidas dos órgãos ambientais. Tal fato provocou a Água na Visão do Direito – 187 decretação de paralisação das atividades da empresa por medida judicial constante nas fls. 613/615. A alegação de que não há prova do dano ambiental causado diretamente pela atividade da apelante, portanto, não tem nenhum fundamento. Conforme já demonstrado em diversas oportunidades nos autos, através de sucessivas vistorias no local pela FATMA e algumas inspeções judiciais realizadas comprovaram o lançamento, por parte da apelante, de efluentes químicos no rio Jaguarão. (b) Valor da indenização Determina o art. 30 da Lei 7347/85 que disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente: Art. 3º. A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer. Por sua vez, o art. 14, § 1º da Lei 6938/81 : § 1º. Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente. Verificada a possibilidade da cominação de prestação pecuniária a título de reparação de danos ao meio ambiente em ação civil pública, deve-se analisar a razoabilidade dos critérios adotados pelo Juízo de 1º Grau para a fixação do valor dos danos causados (fl. 1092-1093): a) custo de 1 ano para o tratamento do lodo decantado e tratado na ETE - R$ 16.800,00; b) gastos mensais com a empresa de consultoria ambiental CAF, até 08.2003 - R$ 12.960,00; c) gasto anual com a destinação do lodo à aterro industrial licenciado - R$ 2.160,00; d) substituição da tubulação de PVC por tubo de concreto - R$ 1.900,00; e) instalação de temporizador no tanque de flotação R$ 172,50; f) modificação do sistema automatizado do tanque de flotação R$ 1.853,00; g) aquisição de tambor e bomba dosadora de descolorante R$ 3.062,00. Total: R$ 38.907,50. Portanto, é visível a adequação do valor cominado pelo Juízo, pois observou critérios razoáveis para a fixação do valor da indenização, de acordo com a capacidade financeira do ofensor e, em vista das medidas que deverão ser necessariamente tomadas, para que cesse a atividade danosa ao meio ambiente. 2. Improvimento da apelação e da remessa oficial. (Apelação Cível Nº 2000.72.01.004473-0/SC. Terceira Turma. Relator Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz. Acórdão Publicado em 03.11.2004) 188 – Água na Visão do Direito 6.2 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA CRIME AMBIENTAL – PESSOA JURÍDICA – RESPONSABILIDADE SOCIAL – CO-RESPONSABILIDADE Ementa: Criminal. Crime ambiental praticado por pessoa jurídica. Responsabilização penal do ente coletivo. Possibilidade. Previsão Constitucional regulamentada por lei federal. Opção política do Legislador. Forma de prevenção de danos ao meio-ambiente. Capacidade de ação. Existência jurídica. Atuação dos administradores em nome e proveito da pessoa jurídica. Culpabilidade como responsabilidade social. Co-responsabilidade. Penas adaptadas à natureza jurídica do ente coletivo. Recurso provido. I. Hipótese em que pessoa jurídica de direito privado, juntamente com dois administradores, foi denunciada por crime ambiental, consubstanciado em causar poluição em leito de um rio, através de lançamento de resíduos, tais como, graxas, óleo, lodo, areia e produtos químicos, resultantes da atividade do estabelecimento comercial. II. A Lei ambiental, regulamentando preceito constitucional, passou a prever, de forma inequívoca, a possibilidade de penalização criminal das pessoas jurídicas por danos ao meio-ambiente. III. A responsabilização penal da pessoa jurídica pela prática de delitos ambientais advém de uma escolha política, como forma não apenas de punição das condutas lesivas ao meio-ambiente, mas como forma mesmo de prevenção geral e especial. IV. A imputação penal às pessoas jurídicas encontra barreiras na suposta incapacidade de praticarem uma ação de relevância penal, de serem culpáveis e de sofrerem penalidades. V. Se a pessoa jurídica tem existência própria no ordenamento jurídico e pratica atos no meio social através da atuação de seus administradores, poderá vir a praticar condutas típicas e, portanto, ser passível de responsabilização penal. VI. A culpabilidade, no conceito moderno, é a responsabilidade social, e a culpabilidade da pessoa jurídica, neste contexto, limita-se à vontade do seu administrador ao agir em seu nome e proveito. VII. A pessoa jurídica só pode ser responsabilizada quando houver intervenção de uma pessoa física, que atua em nome e em benefício do ente moral. VIII. “De qualquer modo, a pessoa jurídica deve ser beneficiária direta ou indiretamente pela conduta praticada por decisão do seu representante legal ou contratual ou de seu órgão colegiado.” IX. A atuação do colegiado em nome e proveito da pessoa jurídica é a pró- Água na Visão do Direito – 189 pria vontade da empresa. A co-participação prevê que todos os envolvidos no evento delituoso serão responsabilizados na medida se sua culpabilidade. X. A Lei Ambiental previu para as pessoas jurídicas penas autônomas de multas, de prestação de serviços à comunidade, restritivas de direitos, liquidação forçada e desconsideração da pessoa jurídica, todas adaptadas à sua natureza jurídica. XI. Não há ofensa ao princípio constitucional de que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado...”, pois é incontroversa a existência de duas pessoas distintas: uma física - que de qualquer forma contribui para a prática do delito - e uma jurídica, cada qual recebendo a punição de forma individualizada, decorrente de sua atividade lesiva. XII. A denúncia oferecida contra a pessoa jurídica de direito privado deve ser acolhida, diante de sua legitimidade para figurar no pólo passivo da relação processual-penal. XIII. Recurso provido, nos termos do voto do Relator. Recurso Especial n.º 564960/SC. Quinta Turma. Superior Tribunal de Justiça. Relator Ministro Gilson Dipp. Julgado em 02/06/2005). DESAPROPRIAÇÃO – TERRENOS MARGINAIS - INDENIZABILIDADE Ementa: Administrativo. Desapropriação. Terrenos marginais. Inindenizabilidade. 1. Os terrenos reservados nas margens das correntes públicas, como o caso dos rios navegáveis, são, na forma do art. 11 do Código de Águas, bens públicos dominiais, salvo se por algum título legítimo não pertencerem ao domínio particular. 2. Em se tratando de bens públicos às margens dos rios navegáveis, o título que legitima a propriedade particular deve provir do poder competente, no caso, o Poder Público. Isto significa que os terrenos marginais presumem-se de domínio público, podendo, excepcionalmente, integrar o domínio de particulares, desde que objeto de concessão legítima, expressamente emanada de autoridade competente. 3. Por força da Constituição Federal, art. 20, III, os rios que banham mais de um Estado, como é o caso do Rio Paraná, são bens da União, assim como o são os terrenos marginais e as praias fluviais, por isso que afigura-se incabível a indenização pretendida. 4. Aplicação da Súmula 479/STF, verbis: “As margens dos rios navegáveis são domínio público, insuscetíveis de expropriação e, por isso mesmo, excluídas de indenização.” 190 – Água na Visão do Direito 5. “São de propriedade da União quando marginais de águas doces sitas em terras de domínio federal ou das que banhem mais de um Estado, sirvam de limite com outros países ou, ainda, se estendam a território estrangeiro ou dele provenham” (art. 20, III, da Constituição). Por seguirem o destino dos rios, são de propriedade dos Estados quando não forem marginais de rios federais. Em tempos houve quem, erroneamente, sustentasse que sobre eles não havia propriedade pública, mas apensa servidão pública. Hoje a matéria é pacificada, havendo súmula do STF (nº 479) reconhecendo o caráter público de tais bens, ao confirmar acórdão do TJSP no qual a matéria fora exaustivamente aclarada pelo relator, Des. O. A. Bandeira de Mello, o qual, em trabalhos teóricos anteriores, já havia examinado ex professo o assunto. De resto, hoje, no art. 20, VII, da Constituição, a questão está expressamente resolvida. Os terrenos reservados são bens públicos dominicais (art. 11 do Código de Águas).” (Celso Antonio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo, 14ª edição, Malheiros, 2002, p. 778). 6. Recurso Especial provido. (Resp n.º 617822/SP. Primeira Turma. Superior Tribunal de Justiça. Relator Ministro Luiz Fux. Julgado em 03/03/2005). DANO ECOLÓGICO – REPARAÇÃO – ROMPIMENTO DE DUTO – POLUIÇÃO - INDENIZAÇÃO Ementa: Dano Ecológico. Reparação. Rompimento de duto. Poluição ambiental. Artigo 14, parágrafo 1. Da Lei n. 6.938/81. Cobrança das despesas feitas pela companhia de saneamento. Procedência. É o poluidor obrigado, independentemente de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. Tendo a companhia de saneamento, encarregada de zelar pelo meio ambiente e guardiã de um interesse difuso da comunidade, tomado as medidas necessárias para o combate a poluição ocasionada pelo rompimento de um duto, deve ser ressarcida, como terceira, das despesas correspondentes. (Recurso Especial n.º 20401. Segunda Turma. Superior Tribunal de Justiça. Relator Ministro Hélio Mosimann, julgado em 10/12/93). DESAPROPRIAÇÃO – PROPRIEDADE – SOLO E SUBSOLO – ÁGUAS SUBTERRÂNEAS – TITULARIDADE – BEM PÚBLICO Ementa: Administrativo. Desapropriação. Indenização. Obra realizada por terceira pessoa em área desapropriada. Benfeitoria. Não caracterização. Água na Visão do Direito – 191 Propriedade. Solo e subsolo. Distinção. Águas subterrâneas. Titularidade. Evolução legislativa. Bem público de uso comum de titularidade dos Estados-Membros. Código de Águas. Lei n.º 9.433/97. Constituição Federal, arts. 176, 176 e 26, I. 1. Benfeitorias são as obras ou despesas realizadas no bem, para o fim de conservá-lo, melhorá-lo ou embelezá-lo, engendradas, necessariamente, pelo proprietário ou legítimo possuidor, não se caracterizando como tal a interferência alheia. 2. A propriedade do solo não se confunde com a do subsolo (art. 526, do Código Civil de 1916), motivo pelo qual o fato de serem encontradas jazidas ou recursos hídricos em propriedade particular não torna o proprietário titular do domínio de referidos recursos (arts. 176, da Constituição Federal) 3. Somente os bens públicos dominiais são passíveis de alienação e, portanto, de desapropriação. 4. A água é bem público de uso comum (art. 1º da Lei n.º 9.433/97), motivo pelo qual é insuscetível de apropriação pelo particular 5. O particular tem, apenas, o direito à exploração das águas subterrâneas mediante autorização do Poder Público cobrada a devida contraprestação (arts. 12, II e 20, da Lei n.º 9.433/97) 6. Ausente a autorização para exploração a que o alude o art.12, da Lei n.º 9.443/97, atentando-se para o princípio da justa indenização, revela-se ausente o direito à indenização pelo desapossamento de aqüífero. 7. A ratio deste entendimento deve-se ao fato de a indenização por desapropriação estar condicionada à inutilidade ou aos prejuízos causados ao bem expropriado, por isso que, em não tendo o proprietário o direito de exploração de lavra ou dos recursos hídricos, afasta-se o direito à indenização respectiva. 8. Recurso especial provido para afastar da condenação imposta ao INCRA o quantum indenizatório fixado a título de benfeitoria. (Resp n.º 518744/RN. Primeira Turma. Superior Tribunal de Justiça. Relator Ministro Luiz Fux. Julgado em 03/02/2004). DANO AMBIENTAL – SANÇÃO ADMINISTRATIVA – COMPETÊNCIA DERRAMAMENTO DE ÓLEO Ementa: Administrativo. Dano ambiental. Sanção administrativa. Imposição de multa. Ação anulatória de débito fiscal. Derramamento de óleo de embarcação estrangeira contratada pela Petrobrás. Competência dos órgãos estaduais de proteção ao meio ambiente para impor sanções. Respon- 192 – Água na Visão do Direito sabilidade objetiva. Legitimidade da exação. 1.”(...)O meio ambiente, ecologicamente equilibrado, é direito de todos, protegido pela própria Constituição Federal, cujo art. 225 o considera “bem de uso comum do provo e essencial à sadia qualidade de vida”. (...) Além das medidas protetivas e preservativas previstas no § 1º, incs. I-VII do art. 225 da Constituição Federal, em seu § 3º ela trata da responsabilidade penal, administrativa e civil dos causadores de dano ao meio ambiente, ao dispor: “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. Neste ponto a Constituição recepcionou o já citado art. 14, § 1º da Lei n. 6.938/81, que estabeleceu responsabilidade objetiva para os causadores de dano ao meio ambiente, nos seguintes termos: “sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.” “ [grifos nossos] (Sergio Cavalieri Filho, in “Programa de Responsabilidade Civil”) 2. As penalidades da Lei n.° 6.938/81 incidem sem prejuízo de outras previstas na legislação federal, estadual ou municipal (art. 14, caput) e somente podem ser aplicadas por órgão federal de proteção ao meio ambiente quando omissa a autoridade estadual ou municipal (art. 14, § 2°). A ratio do dispositivo está em que a ofensa ao meio ambiente pode ser bifronte atingindo as diversas unidades da federação 3. À Capitania dos Portos, consoante o disposto no § 4°, do art. 14, da Lei n.° 6.938/81, então vigente à época do evento, competia aplicar outras penalidades, previstas na Lei n.° 5.357/67, às embarcações estrangeiras ou nacionais que ocasionassem derramamento de óleo em águas brasileiras. 4. A competência da Capitania dos Portos não exclui, mas complementa, a legitimidade fiscalizatória e sancionadora dos órgãos estaduais de proteção ao meio ambiente. 5. Para fins da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, art 3º, qualifica-se como poluidor a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental. 6.Sob essa ótica, o fretador de embarcação que causa dano objetivo ao meio ambiente é responsável pelo mesmo, sem prejuízo de preservar o seu direito regressivo e em demanda infensa à administração, interpartes, discutir a culpa e o regresso pelo evento. 7. O poluidor (responsável direto ou indireto), por seu turno, com base na mesma legislação, art. 14 - “sem obstar a aplicação das penalidades admi- Água na Visão do Direito – 193 nistrativas” é obrigado, “independentemente da existência de culpa”, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, “afetados por sua atividade”. 8. Merecem tratamento diverso os danos ambientais provocados por embarcação de bandeira estrangeira contratada por empresa nacional cuja atividade, ainda que de forma indireta, seja a causadora do derramamento de óleo, daqueles danos perpetrados por navio estrangeiro a serviço de empresa estrangeira, quando então resta irretorquível a aplicação do art. 2°, do Decreto n.° 83.540/799.De toda sorte, em ambos os casos há garantia de regresso, porquanto, mesmo na responsabilidade objetiva, o imputado, após suportar o impacto indenizatório não está inibido de regredir contra o culpado. 10. In casu, discute-se tão-somente a aplicação da multa, vedada a incursão na questão da responsabilidade fática por força da Súmula 07/STJ. 11. Recurso especial improvido. (Resp n.º 467212/RJ. Primeira Turma. Superior Tribunal de Justiça. Relator Ministro Luiz Fux. Julgado em 28/10/2003). 6.3 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL AUTORIZAÇÃO – USO DE ÁGUA SUBTERRÂNEA – COMPETÊNCIA Ementa: Apelação Cível. Município de Lajeado. Autorização para uso de água subterrânea para fins potáveis em estabelecimento comercial. Competência. A outorga do uso de águas subterrâneas pode ser concedida através de licença de uso, autorização ou concessão. Compete ao Departamento de Recursos Hídricos - DRH - e à Fundação Estadual de Proteção Ambiental FEPAM - a autorização para uso de águas subterrâneas, e não aos Municípios. Inteligência do artigo 18 do Decreto Estadual n. 42.047/02 e artigo 1º do Decreto Estadual 37.033/96. Competência municipal apenas para fiscalizar a qualidade da água utilizada. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. (Apelação Cível Nº 70008861767, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Julgado em 14/10/2004) AÇÃO CIVIL PÚBLICA – RESPONSABILIDADE – DANO AMBIENTAL – SOLIDARIEDADE – “CITZEN ACTION” Ementa: Direito Público. Ação Civil Pública - Responsabilidade por dano ambiental - Solidariedade dos demandados: Empresa Privada, Estado e 194 – Água na Visão do Direito Município. “Citizen Action”. 1 - A Ação Civil Pública pode ser proposta contra o responsável direto, o responsável indireto ou contra ambos, pelos danos causados ao meio ambiente, por se tratar de responsabilidade solidária, a ensejar o litisconsórcio facultativo. “Citizen Action” proposta na forma da lei. 2 - a omissão do Poder Público no tocante ao dever constitucional de assegurar proteção ao meio ambiente não exclui a responsabilidade dos particulares por suas condutas lesivas, bastando, para tanto, a existência do dano e nexo com a fonte poluidora ou degradadora. Ausência de medidas concretas por parte do Estado do Rio Grande do Sul e do Município de Porto Alegre tendentes, por seus agentes, a evitar a danosidade ambiental. Responsabilidades reconhecidas. Responsabilidade objetiva e responsabilidade “in ommitendo”. Culpa. Embargos acolhidos. (33FLS.) (Embargos Infringentes Nº 70001620772, Primeiro Grupo de Câmaras Cíveis, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Roberto Lofego Canibal, Julgado em 01/06/2001) AÇÃO DEMOLITÓRIA – EDIFICAÇÃO – ÁREA DE PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE – CAPTAÇÃO DE RECURSOS HÍDRICOS Ementa: Ação Demolitória. Edificação em área de proteção ao Meio Ambiente. Realizada a edificação em área de preservação ambiental, em atentado ao disposto em legislação local que proíbe a construção em faixa próxima à bacia de captação de recursos hídricos, deve ser mantida a sentença. Aplicação do disposto na Lei nº 2.452/79 do município de Caxias do Sul. Apelação improvida. (Apelação Cível nº 70005315379, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Heleno Tregnago Saraiva, julgado em 22/10/2004). SERVIDÃO DE ÁGUA – CONSTRUÇÃO DE BARRAGEM – INTERRUPÇÃO - CURSO DO ARROIO Ementa: Agravo de Instrumento. Servidão de água. Reconsideração de liminar pelo juízo “a quo”. Construção de barragem para a formação de açude, interrompendo o curso de arroio. Prova fotográfica produzida com a contestação, a demonstrar sua manutenção por meio da instalação de tubulação na saída do reservatório. Agravantes que, por outro lado, não demonstraram sofrer de escassez de recursos hídricos em sua propriedade, a justificar a demolição de barragem de alto custo. Decisão mantida. Agravo improvido. Unânime. (Agravo de Instrumento nº 70001065580, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cláudio Augusto Rosa Lopes Nunes, julgado em 07/06/2001). Água na Visão do Direito – 195 AÇÃO DEMOLITÓRIA – AUTARQUIA – EXERCICIO DO PODER DE POLÍCIA – ÁGUAS - COMPETÊNCIA Ementa: Apelação Cível. Processual Civil. Ação demolitória ajuizada por autarquia, no exercício do poder de polícia das águas. Área de conservação de recursos hídricos pertencentes ao município de Caxias do Sul. Direito público não-especificado. Competência absoluta e indeclinável das Câmaras integrantes dos 1º, 2º e 11º Grupos Cíveis. Exegese do artigo 11, §1º, da Resolução n.º 01/98 da e. Presidência desta Corte. Competência declinada. (Apelação Cível nº 70008174880, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Celso Dal Pra, julgado em 27/05/2004). COMPETÊNCIA LEGISLATIVA – ÁGUA MINERAL – PADRÕES SANITÁRIOS Ementa: Constitucional. Competência legislativa. Água mineral. Padrões sanitários. 1. Comporta tutela através do Mandado de Segurança, preventivamente, o direito líquido e certo alegado, ou seja, aquele direito que prescinde de prova diversa da documental. É da competência exclusiva da União legislar sobre águas (CF, art. 22, IV), incumbindo o poder de policia ao Município. Porem, também cabe ao Município, na competência material concorrente do art. 23 da CF/88, quer no tocante a saúde (inc. II), quer no acompanhamento e fiscalização da exploração de “recursos hídricos e minerais” (inc. XI), suplementar as lacunas da legislação federal, inclusive naqueles casos de competência exclusiva. É compatível a Lei 8.640/01, do município de Porto Alegre, com regulamento da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, no controle da comercialização de água com dosagem de fluoreto acima de 2 mg/l, porque, segundo tal norma, ela é imprópria para o consumo diário. Falta de prova da advertência ao consumidor quanto à nocividade do produto. Legítimo exercício do poder de polícia para impor o cumprimento de padrões sanitários. 2. Apelação provida. (Apelação e Reexame Necessário nº 70003186863, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Araken de Assis, julgado em 05/12/2001). DANO MORAL E MATERIAL – CONTAMINAÇÃO DO LENÇOL FREÁTICO – INTERDIÇÃO – ESTABELECIMENTO COMERCIAL Ementa: Processual Civil. Ação de danos morais e materiais. Contaminação de lençol freático. Pedido de interdição do estabelecimento comercial e produção antecipada de prova pericial. Indeferimento de ambos. Concessão de efeito 196 – Água na Visão do Direito ativo para propiciar a produção antecipada da prova. 1. Existindo fundado receio de contaminação de água e relatando os autores a existência de perigo de morte em razão da utilização de metais pesados pela empresa, possibilita-se a produção antecipada da prova pericial e indefere-se o pedido de interdição da central de resíduos da demandada, ao menos até o resultado do laudo pericial, quando, então, existirão melhores elementos de prova que ensejem uma decisão amparada em laudo técnico. 2. Agravo provido em parte. (Agravo de Instrumento Nº 70005701453, Segunda Câmara Especial Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu José Giacomolli, julgado em 29/08/2003). LOTEAMENTO – LICENCIAMENTO AMBIENTAL - COMPETÊNCIA Ementa: Apelação Cível. Loteamento urbano. Questão ambiental e atos administrativos que o licenciaram. Competência. Reexame ex officio. Exclusão da FEPAM e manutenção da Metroplan. Mata atlântica e vegetação secundária. Princípios da prevalência do conteúdo sobre a localização geográfica e da densidade mínima das espécies típicas. Área de preservação ambiental permanente e de preservação ambiental. Arroio e sua nascente. Canalização e endutamento. Extensão das margens. EIA-RIMA. Validade dos procedimentos administrativos. 1. Competência. Se o problema do loteamento urbano tem como questão principal o meio ambiente e os atos administrativos das autoridades que o licenciaram, e como acessória o parcelamento do solo (Lei 6.766/79), a competência plena é das Câmaras de Direito Público por vis atractiva. 2. Reexame ex officio. Se a sentença, na parte que acolheu o pedido, contrariou interesse do Município, e não há as excludentes dos §§ 2.º e 3.º do art. 475, do CPC, merece conhecido ex officio o reexame não apresentado pelo juízo de primeiro grau. 3. Exclusão da FEPAM. Se o juízo de primeiro grau, em decisão interlocutória, excluiu a Fundação de Proteção Ambiental - FEPAM, entidade tutora do meio ambiente no Estado, e não houve recurso, conclui-se que, relativamente ao fato que lhe imputava, independente dos imputados aos demais co-réus, o que afasta o litisconsórcio, o demandante se conformou. (Apelação Cível e Reexame Necessário n.º 7008763955. Primeiro Câmara Cível. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Relator Nereu José Gacomolli, julgado em 03/03/2004). AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DANO AMBIENTAL – DEFEITO – SITEMA DE ESGOTO SANITÁRIO - COMPETÊNCIA Ementa: Ação Civil Publica. Dano ao Meio Ambiente. Defeitos no sistema de esgoto sanitário. Ação intentada contra a CORSAN e a COHAB julgada Água na Visão do Direito – 197 procedente. Improvido o recurso da cohab, como responsável pela edificação das moradias e pelo esgoto a nível domestico. Provido o recurso da CORSAN, a quem não incumbia a manutenção do sistema de esgoto, a que se limitou a elaboração e execução dos projetos de abastecimento de água e dos coletores públicos do esgoto, e sua ligação ao emissário. (Apelação Cível Nº 592016885, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Élvio Schuch Pinto, julgado em 15/04/1992). 6.4 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO CRIME AMBIENTAL – POLUIÇÃO DE RIO – CURTUME – LANÇAMENTO DE SUBSTÂNCIAS TÓXICAS Ementa: Penal. Processo penal. Nova definição juridica. CPP, art. 383. Defesa. Meio ambiente. Poluição. O rio Parnaíba. Lei n. 6.938, de 981, art. 15. Lei n. 7.804, de 1989. I - Não é da classificação do crime que o réu se defende, e sim da imputação contida na denúncia (CPP, art. 383). II - Comete o crime previsto no art. 15 da Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, alterado pela Lei n. 7.804, de 18 de julho de 1989, o proprietário de curtume que lança no rio matérias orgânicas putrefactas, matérias não biodegradáveis, substâncias tóxicas, poluindo-o, criando assim, uma situação de perigo para a vida, humana, animal e vegetal. (Apelação Criminal n.º 95.01.11586-0. Terceira Turma. Relator Juiz Fernando Gonçalves. Julgado em 25.03.1996) 6.5 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA CRIME AMBIENTAL – POLUIÇÃO – RIO – ABATE DE ANIMAIS – LANÇAMENTO DE SUBSTÂNCIAS TÓXICAS Ementa: Processo Penal. Revisão Criminal. Crime contra o Meio Ambiente (art. 15, § 1º, II, da Lei 6.938/81). Demonstrada a atividade industrial poluidora. Lançamentos, nas águas de rio, de dejetos oriundos de abate de animais em frigorífico. Sentença condenatória transitada em julgado (requisito do art. 625, § 1º, CPP). “Emendatio libelli” em consonância com a norma do art. 383 do CPP. Apenas definição jurídica diversa da constante na 198 – Água na Visão do Direito denúncia. Mantidos os mesmos fatos nela descritos. Negada pretensão de revisão em substituição a recurso de apelação intempestivo. Inviabilidade de pretendido reexame das provas e de questões formuladas no apelo intempestivo. Afastada a alegação de contrariedade à evidência dos autos (art. 621, I, CPP). Sentença condenatória baseada em laudos conclusivos justificados pelo instituto ambiental do Paraná IAP e em prova testemunhal idônea. Demonstrada a saciedade à degradação de água potável do rio atingido pela atividade industrial do frigorífico. Correta a dosimetria da pena. Pena-base fixada à vista da intensidade do dolo do réu revelada por sua persistente atividade poluidora. Desconsideração de cobranças administrativas condutoras do caso à proposição de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público. Majoração da resposta penal diante de condição especial de aumento de pena. Extensão do lapso temporal de poluição industrial com graves danos a bens e interesses da coletividade. Julgado improcedente o pedido revisional. Mantida incólume a sentença objeto da revisão. (Revisão Criminal n.º 148465-7, de Cianorte Vara Criminal. Relator Juiz Convocado Luiz Mateus de Lima. Julgado em 14.10.2004). 6.6 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DANO AMBIENTAL – EXTRAÇÃO DE AREIA – MARGEM DE RIO Ementa: Ação Civil Pública. Extração de Areia. Dano Causado ao Meio Ambiente. Fato incontroverso. Procedência. Impugnação: Decisão Ultra Petita. Inocorrência. 1. Sendo o fato incontroverso que, ao extrair areia da margem do rio Iguaçu, produzindo um buraco de grande proporção, a empresa-ré causou danos ao meio ambiente, julga-se procedente a ação civil pública proposto pelo Ministério Público, condenando a ré a repor a área florestal danificada, restaurando a mata ciliar. 2. A decisão que se restringe a acolher os pedidos formulados na inicial não é ultra petita. (Apelação Cível n.º 20.2777. Primeira Câmara Cível. Tribunal de Justiça do Paraná. Relator Juiz Acácio Cambi, julgado em 01/03/94). DANO AMBIENTAL – POLUIÇÃO HÍDRICA – LANÇAMENTO DE RESÍDUOS – AUSÊNCIA DE PRÉVIO TRATAMENTO Ementa: Embargos à execução fiscal. Danos ao meio ambiente. Poluição hídrica. Lançamento de resíduos líquidos e sólidos em córrego sem prévio Água na Visão do Direito – 199 tratamento. Presunção (relativa) de certeza e liquidez da divida ativa não ilidida pela prova inequívoca do executado. Improcedência. Decisão confirmada. 1. Constatado no auto de infração e multa, pelo IAP (Instituto Ambiental do Paraná), sucessor da SUREHMA (Superintendência dos Recursos Hídricos e Meio Ambiente), que a embargante estava lançando resíduos líquidos e sólidos em córrego, sem prévio tratamento, pela presunção de certeza e liquidez da divida ativa (art. 3. Da lei 6.830/80), inverte-se o ônus da prova, cabendo a executada a prova inequívoca da inexistência do dano ambiental imputado. 2. A mera alegação da inexistência da poluição hídrica, desacompanhada da prova inequívoca, implica na confirmação da sentença, que julgou improcedentes os embargos a execução fiscal, possibilitando a aplicação da multa. (apelação n.º 75912-6. Sexta câmara cível. Tribunal de justiça do Paraná. Relator Des. Accacio Cambi, julgado em 26/05/1999). CAPÍTULO 7 – BIBLIOGRAFIA 7.1 DOUTRINA ALMEIDA, Caroline Corrêa de. Evolução histórica da proteção jurídica das águas no Brasil . Jus Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3421. Acesso em 20 dez. 2004. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 6ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002. p. 575. O Aqüífero Guarani. Programa Globo Repórter da Rede Globo de Televisão, exibido dia 18.02.05. BRASIL. 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