INFÂNCIA (1945)
Graciliano Ramos
ROMANCE AUTOBIOGRÁFICO
O primeiros anos de vida do autor no sertão de Alagoas e
Pernambuco durante o final do século XIX e o início do XX.
Livro de memórias repleto de lirismo e profundidade na forma de
retratar os anos iniciais de vida de Graciliano Ramos.
Nas lembranças do menino alagoano identificamos claramente a
arbitrariedade das instituições políticas, o coronelismo, o uso da
violência e da corrupção por motivação eleitoral, bem como a
crítica ao academicismo bacharelesco.
Mescla ficção e biografia (a biografia nutre-se de aspectos do
romance)
ESTRUTURA
Escrita em estilo seco e direto, aproximando-se das narrativas
realistas.
Há um vestígio naturalista na obra [apesar do autor rejeitar o
naturalismo], a zoomorfização de personagens que faz destacar
o lado grotesco delas. Em raras vezes há um humor nesse
procedimento.
CAPÍTULOS AUTÔNOMOS
isoladamente como contos.
Capítulos:
Nuvens
Manhã
Verão
Um cinturão
Uma bebedeira
Chega à vila
A vila
Vida nova
Padre João Inácio
O fim do mundo
O inferno
O moleque José
Um incêndio
José da Luz
Leitura
Escola
D. Maria
O barão de Macaúbas
–
podem
ser
apresentados
Meu avô
Cegueira
Chico Brabo
José Leonardo
Minha irmã natural
Antônio Vale
Mudança
Adelaide
Um enterro
Um novo professor
Um intervalo
Os astrônomos
Samuel Smiles
O menino da mata e o seu cão Piloto
Fernando
Jerônimo Barreto
Venta-Romba
Mário Venâncio
Seu Ramiro
A criança infeliz
Laura
Resumo
NUVENS
Primeiras memórias. O tom difuso e nebuloso da narrativa se faz
presente. A família, o vaqueiro Amaro, o sertanejo José Baía e sinhá
Leopoldina. Aos poucos lembranças se tonam mais nítidas e o medo
vai se insinuando na formação do personagem. Ponto importante: a
evocação da própria literatura, que aparece sob a forma de cantigas
populares. (há presença de metalinguagem)
MANHÃ
As figuras dos avôs, responsáveis pelas impressões sobre homens e
seus ofícios. Avô paterno, dado à música e proprietário falido (dele o
protagonista herda a “vocação absurda para as coisas inúteis”. O
materno, sujeito vigoroso e resistente, trabalhador obstinado. Evoca
os viajantes no arraial. A consciência do isolamento geográfico como
um fator angustiante e tentador do menino Graciliano.
VERÃO
As privações diante da seca. Memória do sofrimento se mistura à
observação calada e admirada do seu pai.
UM CINTURÃO
De acordo com o protagonista – o primeiro contato com a justiça. O
engano do pai na surra e sem pedir desculpas.
UMA BEBEDEIRA
Hábito de dar bebida para crianças nas reuniões sertanejas.
CHEGADA À VILA
Mudança do campo para a cidade. Sente-se oprimido pela agitação
das pessoas e pelo excesso de casas. Queria fugir dali e experimentar
a liberdade da fazenda.
A VILA
Vila Buíque descrita pela antropomorfização – casas e ruas vistas
como um corpo humano aleijado, feio e pobre, assim como seus
ocupantes. Entre os moradores chama a atenção Paulo Honório (que
seria protagonista da obra São Bernardo).
VIDA NOVA
Almas penadas também o amedrontam. As dificuldades da família
diante das chuvas de inverno. Busca de conforto nas cantigas de
roda.
PADRE JOÃO INÁCIO
Descrito como sujeito rude no trato com seus fieis, mas que ao
mesmo tempo demonstrava grande fraternidade e dedicação.
O FIM DO MUNDO
A mãe como leitora esforçada, ainda que confusa, de obras religiosas e
proféticas. O hábito chama a atenção do menino, que se preocupava
com a influência dos textos religiosos na vida da mãe.
O INFERNO
O menino questiona a mãe sobre o significado da palavra inferno (o
mesmo ocorre em vidas secas). O ato lhe rende uma surra.
O MOLEQUE JOSÉ
Afilhado do pai do narrador, é um negro órfão, experiente nas artes de
brincadeiras em andanças pela região. Ao descrevê-lo evoca as
fantasias de criança. O pai de Graciliano surra o moleque, ele também o
tenta fazer, o pai transfere a surra diante desta ação.
UM INCÊNDIO
José e Graciliano vão ver um incêndio, aventura que se torna um ato de
terror. A morte de uma das meninas da casa que tentara resgatar uma
imagem de Nossa Senhora. Inícios de pesadelos com a menina.
Sofrimento e recusa obstinada da fé.
JOSÉ DA LUZ
O policial José da Luz. Sujeito que desperta a curiosidade do menino.
Era amável. Encontrou um amigo e a possibilidade de haver bondade
entre os homens.
LEITURA
Início do processo de alfabetização. É oferecido pelo pai como se
fosse a aquisição de grande poder. Outro sofrimento, diante das
dificuldades em reconhecer as primeiras letras é castigado. Cena de
humor: não entende a sentença: “Fala pouco e bem: ter-te-ão por
alguém”; para ele Terteão é uma pessoa.
ESCOLA
É alvo de brincadeiras do pai, que repete de forma jocosa as falas
atrapalhadas do filho. Mais um pavor na instituição escola, que não
lhe esclarece que é o Terteão. Figura tranquila da professora se
contrapõe à da nervosa mãe.
DONA MARIA
A professora. Mais um adulto que ele aceita e admira. Aprendizado flui
em um ambiente mais acolhedor. Nesse capítulo conhece a menina
Cecília que o trata com desdém, o que lhe faz ver a rejeição também nas
crianças.
O BARÃO DE MACAÚBAS
O desafio de ler o livro. Aprende tabuada a partir da leitura dos
Lusíadas.
MEU AVÔ
Medicina e literatura. Registra a prática de ministrar aguardente aos
doentes. Na fazenda do avô resolver continuar sua fase de aprendizado.
Sutil iniciação sexual, foi apalpado por uma rapariga da fazenda.
CEGUEIRA
Moléstia grave nos olhos do menino. Traumas pelo escárnio da mãe
que o apelida de cabra-cega, bezerro-encourado. Diante da humilhação
revela sentir falta das palavras. (o lugar da literatura em sua vida)
CHICO BRABO
Além da doença, aguenta o vozeirão do inconveniente farmacêutico
Chico Brabo. Continua a análise da persona humana.
JOSÉ LEONARDO
Impressionou o narrador pela sua altivez e elegância.
generosidade humana.
Personifica a
MINHA IRMÃ NATURAL
Fuga da meia-irmã Mocinha. “hóspede permanente”. Episódio que
define negativamente o pai, que viu na fuga uma vantagem.
ANTÔNIO VALE
Homem que, embora criticado pelas más línguas da vila e com fama de
caloteiro, demonstrou ser uma pessoa de bem, tornando-se exemplo
positivo nas memórias. Ao partir da vila com dificuldades financeiras e
devendo na venda do pai do narrador, acharam que viraria calote, mas
ele voltou para surpresa de todos e quitou a dívida.
MUDANÇA
Ida para o município de Viçosa, AL. Novas pessoas e melhoria de vida
do pai. (capítulo de título homônimo de Vidas Secas)
ADELAIDE
Professora negra, Maria do O, que segundo o narrador descontava o
ódio da escravidão nas crianças, em especial em Adelaide, prima dele.
Fora do ambiente escolar, tal como Chico Brabo, as personagens são
amáveis.
UM ENTERRO
Falecimento de um colega da escola. A visão de um ossuário o
assombrou.
UM NOVO PROFESSOR
Professor difícil (na nova escola para a qual mudou) fruto de uma
vaidade incontrolável. O narrador o descreve como um tipo efeminado.
UM INTERVALO
Ingressa na vida eclesiástica, na condição de coroinha. Rituais da
eucaristia como fuga e menos como dogma. O narrador saltando para
um momento presente, afirma ter aprendido uma lição, a falsa
admiração.
OS ASTRÔNOMOS
Ao ler um romance para o pai, que lhe solicitou, ganha uma certa
aproximação dele. Ao solicitar ajuda da prima Emília, esta lhe diz que
ele deveria enfrentar as palavras sozinho. (metalinguagem)
SAMUEL SMILES
Nova escola e a profa. Agnelina, que parece incapaz de lhe ensinar
qualquer coisa. Ao ler um Livro de Samuel Smiles, encontra dificuldade
em pronunciar o nome estrangeiro. Guiado por um professor e pelas
leituras passa a confiar mais em si e sair das provocações sofrida por
rapazes na loja, devido a sua forma de falar.
O MEINO DA MATA E O SEU CÃO PILOTO
Título de um livro que alguém esquecera na loja. Foi censurado pela
prima Emília que dizia o livro ser pecaminoso, pois fora escrito por um
protestante. (fica sem livre arbítrio diante dos adultos)
FERNANDO
Personagens que lhe cercam são comparados aos dos livros.
Fernando, homem mal e apadrinhado por poderosos da região,
praticava barbaridades, como espancamento e estupros, sempre saindo
imune. Achava que ele superava Nero. Um dia admirou uma ação de
Fernando, ao entortar pregos afim de evitar que crianças se ferissem.
JERÔNIMO BARRETO
Leitor incurável, mas como adquirir livros naquele lugar? Jerônimo,
tabelião culto, lhe emprestou O Guarani e com o convite de que
voltasse sempre à biblioteca particular.
VENTA-ROMBA
Semelhança ao episódio do soldado amarelo (vidas secas). O pedinte
Venta-Romba ao entrar na casa dos Ramos é expulso pela mãe de
Graciliano de forma truculenta. O pai do menino, agora juiz, manda
chamar a polícia. Ao perceber o engano se recusa, como no caso do
cinturão, a reconhecer. Manda prender para afirmar sua autoridade.
MÁRIO VENÂNCIO
A formação do escritor. Relembra a mocidade ao entrar em um grupo
teatral, momento em que publicou seus primeiros textos em jornal.
Critica a prática letrada em voga, a do sec 19. Mário Venâncio fez de sua
vida um sacerdócio em nome da arte e literatura, entra para a galeria
dos que mais influenciaram o autor.
SEU RAMIRO
Pedantismo e arrogância personificados em Seu Ramiro. Queria se
associar ao pai de Ramos e fundar uma maçonaria. Deixa a cidade e
uma dívida com o pai de Graciliano, que agora abandona a maçonaria.
A CRIANÇA INFELIZ
A rejeição, sentimento que atravessa toda a narrativa, materializa-se,
agora, em outro personagem infantil, um menino que frequenta a
mesma escola do narrador e que é ridicularizado por todos. Percebe
que a infância naquele lugar é um período de crueldade e de privações.
LAURA
Primeira paixão de Graciliano. Encanta-se por ela, não pela beleza, mas
pela inteligência. O nascimento do desejo proporciona a primeira
experiência sexual, que fora realizado por Otília da Conceição, uma
mulher que tudo indica fazia as iniciações. Retoma o livro O cortiço,
antes guardado e amarrado no escondido da estante.
Primeiro núcleo:
O despertar do conhecimento da própria existência em face ao
ambiente circundante. Abrange os oito primeiros capítulos e
corresponde aos anos vividos em Quebrangulo e à mudança e
instalação em Buíque, em 1894.
Segundo núcleo:
O conhecimento dos outros, daqueles que mais o influenciaram
em menino, narrado desde “Padre João Inácio” até “Antônio
Vale” – 1894-1900, data em que mudou pra Viçosa-AL.
Terceiro núcleo: descoberta de sie das suas capacidades físicas
e intelectuais (pós 1900), que apressaram uma naturalidade.
Estilo metonímico de construção narrativa – (valoriza os aspectos
combinatórios e contextuais da linguagem – o autor parte de
retalhos, pedaços, frações, fragmentos e farrapos para conseguir
edificar o “sentido que tem do humano”)
Ex. Sinhá Leopoldina é identificada pela cara morena e pelos
brincos; Amaro Vaqueiro pelo gibão; José Baía pelos dentes alvos,
os pais, inicialmente, são vistos aos pedaços: rugas, olhos
raivosos, bocas irritadas e sem lábios, mãos grossas e calosas.
A metáfora tem um valor metonímico – “cipoais escritos” e
“veredas espinhosas” metaforizam o texto difícil do livro do Barão,
descrito como “barbas consideráveis e sisudez cabeluda”.
O ESPAÇO
Mesmo narrado em 1ª. Pessoa o texto não se restringe à dimensão
individualista (transmite a vida de qualquer criança no espaço hostil
do interior nordestino e que convive com famílias austeras, não
tendo lugar para a ternura e carinho.)
Várias referências à paisagem nordestina (caatingas, jitó, cacto,
Ouricuri, cajueiro, juazeiro, mandacaru, xiquexique...), poucas são
as palavras de origem regionalista.
INFÂNCIA – livro de aprendizagem, aprendizado de pessoas e
aprendizado da leitura. (o narrador relata as rupturas das barreiras
mentais e sociais para que um homem pudesse se construir como
pessoa).
Intertextualidades nas leituras. (os primeiros contatos dele com a
leitura não foram nada agradáveis)
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INFÂNCIA (1945)