Fl. nº.__________
Proc. nº 734/2013
ESTADO DE RONDÔNIA
TRIBUNAL DE CONTAS
Gabinete do Conselheiro PAULO CURI NETO
Processo
Unidade
Assunto
Consulente
Relator
Revisor
Sessão
: 734/2013
: Departamento Estadual de Trânsito – Detran
: Consulta - Concessão de licença prêmio a servidores ocupantes
exclusivamente de cargo em comissão
: João Maria Sobral de Carvalho
: Conselheiro Edilson de Sousa Silva
: Conselheiro Paulo Curi Neto
: 11ª Sessão Ordinária, de 11 de julho de 2013
VOTO SUBSTITUTIVO
EMENTA:
Consulta. Departamento Estadual de Trânsito. Licença prêmio por
assiduidade. Servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão.
Não aplicabilidade. Estatuto dos Servidores Públicos do Estado.
Interpretação teleológica e sistemática.
- A licença prêmio por assiduidade prevista na cabeça do artigo 123 da Lei
Complementar estadual nº. 68, de 1992, é aplicável ao servidor titular de cargo
de provimento efetivo estadual.
- A licença prêmio, hipótese legal de afastamento remunerado das funções
públicas, caracteriza-se como típica sanção premial destinada a estimular e
promover a adoção de determinado comportamento desejado pela ordem
administrativa: a assiduidade dos servidores públicos. A sua aplicabilidade aos
servidores titulares, exclusivamente, de cargo em comissão não atende à
finalidade social da lei, porque esses agentes públicos podem ser exonerados ad
nutum, sempre que o desempenho não se revelar satisfatório.
- A interpretação sistemática da Lei Complementar nº. 68, de 1992 evidencia
que o diploma legislativo pecou, por falta de técnica jurídica, ao utilizar
indiscriminadamente os termos genéricos “servidor” e “cargo”, sem indicar a
natureza da investidura, inclusive para normatizar institutos típicos e exclusivos
de servidor ocupante de cargo de provimento efetivo – a exemplo dos artigos
22, 31, 45, 116, VI, 128, 120 e 231. A omissão do legislador em indicar a
natureza da investidura na cabeça do artigo 123 não pode autorizar uma
interpretação extensiva, porque essa solução exegética não vence o teste de
generalização. Não se pode pretender fazer interpretação sistemática aos
retalhos, colhendo-se apenas o que convém ao próprio intérprete.
- A análise topológica de dispositivos e dos institutos mencionados na Seção VI
do Capítulo IV do Título III demonstra, conclusivamente, que o destinatário da
norma concessiva da licença prêmio mencionado na cabeça do artigo 123 do
diploma legal complementar deve ser necessariamente o servidor titular de
cargo de provimento efetivo. Somente os ocupantes de cargo de provimento
efetivo podem acumular licitamente mais de um cargo público (artigo 124),
filiar-se ao regime próprio de previdência social (parágrafo único do artigo 123
e caput do artigo 127), bem como acumular um “cargo” público e uma
“função” gratificada (parte final do caput do artigo 123).
Impossibilidade de ampliação legislativa das hipóteses constitucionais de
estabilidade provisória do servidor exclusivamente comissionado.
- A instabilidade e temporariedade inerente à investidura dos ocupantes de
cargos de confiança e as atribuições constitucionalmente reservadas a esses
cargos – direção, chefia e assessoramento superior – constituem modelo
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constitucionalmente impositivo aos entes políticos (artigo 37, II, parte final, e
V, da CRFB/1988), não podendo ser excepcionada senão por outra norma de
estatura constitucional federal. A estabilidade provisória gestacional é a única
hipótese que excepciona o vínculo precário do servidor comissionado, por força
do artigo 10, II, “b”, do ADCT. Portanto, não se deve admitir que a legislação
infraconstitucional crie novas hipóteses de estabilidade financeira provisória ou
mecanismos compensatórios à exoneração imotivada dos
servidores
comissionados, o que contraria a competência discricionária inerente à
investidura dos cargos de confiança.
- A licença prêmio, prevista no artigo 123 da Lei Complementar nº. 68, de
1992, não pode ser concedida aos servidores ocupantes, exclusivamente, de
cargo em comissão, porque constitui hipótese legal de estabilidade financeira
provisória passível de ser gozada durante a investidura e mesmo após a
desconstituição do vínculo, mediante prestação pecuniária compensatória, o
que caracteriza ampliação legal das hipóteses constitucionais excepcionais de
estabilidade financeira provisória de servidores não titulares de cargo de
provimento efetivo. Aplicação, por analogia, das razões de decidir da ADI nº.
199-0 (Supremo Tribunal Federal, Relator: Ministro Maurício Corrêa).
Suposta Violação ao postulado da isonomia. Não ocorrência. Desigualação
constitucionalmente obrigatória. Princípio do livre provimento dos cargos
em comissão.
- A legislação estadual, quando restringe o direito à licença prêmio por
assiduidade aos titulares de cargos de provimento efetivo, ainda que
provisoriamente ocupantes de cargo ou função de confiança, não incorre em
ofensa ao postulado constitucional da isonomia. A desigualação feita pela
legislação infraconstitucional é constitucionalmente mandatória, a fim de
assegurar o princípio do livre provimento dos cargos em comissão,
considerando que a licença prêmio gera uma estabilidade financeira provisória,
situação jurídica incompatível com a precariedade da tênue investidura do
servidor comissionado com a Administração Pública.
- Em abstrato, não há se cogitar em desequilíbrio comutativo entre a prestação
laboral do servidor exclusivamente comissionado e a contraprestação estatal.
Os servidores exclusivamente comissionados usufruem todos os direitos
trabalhistas e previdenciários constitucionalmente assegurados, indistintamente,
a todos os trabalhadores da ordem econômica ou da Administração Pública.
Além disso, esses agentes públicos, por exercerem função de direção, chefia e
assessoramento superior, são remunerados pecuniariamente pelo incremento
extraordinário de atribuições e responsabilidades, de acordo com as condições
financeiras dos órgãos e entidades públicas.
Contagem do tempo de serviço público estadual prestado em exercício de
cargo em comissão anterior à investidura em cargo de provimento efetivo.
Estatuto dos Servidores Públicos do Estado. Ausência de norma que
autorize a retroação da lei à hipótese examinada.
- Na Lei Complementar nº. 68, de 1992, para fins de aperfeiçoamento do tempo
de serviço público estadual quinquenal da licença prêmio, não se deve admitir o
cômputo retroativo do tempo de serviço público estadual relativo a cargo de
confiança no âmbito da Administração direta, autárquica e fundacional do
Estado de Rondônia, acumulado anteriormente à investidura em cargo de
provimento efetivo.
- O servidor exclusivamente comissionado não possui, sequer, a expectativa de
direito à licença prêmio, enquanto perdurar a investidura precária, pois a Lei
Complementar nº. 68, de 1992, dispensou tal vantagem apenas ao servidor
titular de cargo de provimento efetivo. Por tal motivo, o tempo de serviço
prestado sob a égide dessa investidura precária permanecerá a ser juridicamente
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indiferente em relação à aquisição da licença prêmio, ainda que o servidor
venha a posteriormente ocupar cargo de provimento efetivo, por aprovação em
concurso público, salvo se o novo regime jurídico, excepcionalmente, autorizar
a sua retroação sobre os fatos e atos anteriores à investidura. Por regra, o fato
jurídico rege-se pela norma então vigente (“tempus regit actum”).
- A investidura em cargo de provimento efetivo, por aprovação em concurso
público, ainda que o servidor tenha ocupado cargo em comissão no mesmo
órgão ou entidade, caracteriza provimento originário, sujeito a novo regime
jurídico, o qual não poderá retroagir sobre fatos e atos pretéritos, salvo se,
excepcionalmente, houver expressa previsão em sentido contrário. O artigo 297
da Lei Complementar nº. 68, de 1992, como regra de transição, admitiu, em
caráter excepcional, para efeito de anuênio e licença prêmio, a contagem
retroativa do tempo de serviço prestado ao Estado pelos servidores, sujeitos ao
regime contratual-celetista, pertencentes ao quadro de pessoal quando da
promulgação do novo estatuto, ou seja, em 9 de novembro de 1992. Hipótese
normativa essa que não alcança os servidores titulares, exclusivamente, de
cargo de confiança e que não pode ser-lhes aplicada, ainda que por analogia,
porque a retroação da lei, norma de exceção que é, deve ser interpretada
restritivamente.
- O tempo de serviço quinquenal ininterrupto após a investidura é período de
prova definido pela lei para avaliar a assiduidade do servidor ocupante de cargo
efetivo, para fins de licença prêmio. Consequentemente, o cômputo do tempo
pretérito à investidura originária, sem autorização legal, contrariaria o aspecto
teleológico do instituto, qual seja, o incentivo ao cumprimento do dever
funcional de assiduidade do servidor efetivo dentro do período de prova,
evitando a atuação dos mecanismos repressivo-disciplinares.
- Além do mais, seria paradoxal admitir que o servidor efetivo, ao utilizar o
tempo de serviço pretérito à investidura, fizesse jus, logo após o provimento, à
licença prêmio, que pressupõe avaliação de sua assiduidade em período de
prova quinquenal, antes mesmo de adquirir a estabilidade funcional no cargo
efetivo, que pressupõe também a avaliação da assiduidade no cargo ocupado
em período de prova trienal (artigo 28, §1º, I). A interpretação da lei não deve
conduzir ao absurdo, desconsiderando a sistematicidade inerente à ordem
jurídica.
- A Lei Complementar nº. 68, de 1992, admite, para aquisição da licença
prêmio, a contagem do tempo de serviço prestado em cargo de confiança na
Administração estadual somente após a investidura em cargo de provimento
efetivo. Inteligência do artigo 138, IV.
Cuidam os autos de consulta suscitada pelo Departamento Estadual de
Trânsito acerca de dúvida quanto à interpretação do artigo 123 da Lei Complementar
estadual nº 68, de 1992.
2.
O consulente formulou os seguintes questionamentos:
a) o servidor ocupante de cargo exclusivamente comissionado, que
prestar no âmbito do Estado de Rondônia, por um período ininterrupto de 05
(cinco) anos, tem direito ao gozo da licença prêmio por assiduidade prevista no
art. 123 da LC n. 68/92?
b) O servidor que prestou serviços ao Estado de Rondônia como
ocupante de cargo exclusivamente comissionado e, posteriormente, por
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intermédio de concurso público, passou a ocupar cargo efetivo, tem direito a
computar o período anterior, para fins de licença prêmio?
O Ministério Público de Contas, por intermédio de Sua Excelência a
Procuradora-Geral de Contas Érika Patrícia Saldanha de Oliveira, opinou pelo
conhecimento da consulta e, no mérito, defendeu que a consulta fosse respondida no
sentido de que somente o servidor titular de cargo efetivo faz jus à licença prêmio por
assiduidade e que não é possível o cômputo do tempo de serviço pretérito exercido em
cargo em comissão exclusivamente, mesmo que o servidor venha a ocupar posteriormente
cargo efetivo, por aprovação em concurso público.
2.
O Conselheiro Relator Edilson de Sousa Silva, no mérito, divergiu do
opinativo ministerial, e apresentou a seguinte proposta de resposta à consulta:
3.
1) A Constituição Federal no art. 7º estabelece um rol de direitos
sociais mínimos aos trabalhadores privados, extensíveis, nos limites do §3º do
art. 39, aos servidores públicos efetivos ou comissionados, logo, é possível, a
garantia de outros direitos aos trabalhadores, desde que regulamentados por
meio de lei, no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios;
2) Havendo lei complementar estadual em vigor prevendo
expressamente o direito de licença prêmio por assiduidade aos servidores, sem
que haja qualquer restrição expressa aos servidores comissionados, será devida
sua fruição, e excepcionalmente, não havendo sido gozada, deverá ser
indenizada pela Administração;
3) Tendo o legislador garantido o direito de licença prêmio por
assiduidade a todos os servidores públicos – comissionados e efetivos – é
direito do servidor o cômputo do período em que exerceu cargo comissionado
com aquele que passou a exercer em caráter efetivo, desde que não haja
interrupção da prestação do serviço público junto ao Estado de Rondônia; e
4) A negativa do reconhecimento a um direito fundamental social
expressamente regulamentado por meio de lei complementar estadual importa
na violação do princípio da legalidade e dos princípios fundamentais
estabelecidos na Constituição Federal.
4.
Para fundar a sua posição, o Conselheiro Relator, em apertada síntese:
a)
Aduziu que a “ausência de previsão expressa da licença prêmio por
assiduidade no rol do art. 7º da Constituição da República e na parte que trata dos
servidores públicos não impede a ampliação por meio de lei complementar estadual ou
municipal”, pois o rol “dos direitos do trabalhador previsto no artigo 7º da Constituição
Federal é considerado exemplificativo e não exclui outros direitos que visam à melhoria
de sua condição social”. Esses direitos, por “gozarem do status de direitos fundamentais”,
“não podem ser objetos de retrocesso social” (pp. 4-13);
b)
Argumentou, ainda, que os servidores públicos e os trabalhadores
privados, cada vez mais, “se aproximam quanto a direitos e deveres, tanto que
comumente as normas de regulamentação destes são aproveitadas” e aplicadas aos
agentes públicos. Assim, sob esse fundamento, reafirmou que “nada impede que outros
direitos previstos no art. 7º e incisos da CF, quando compatíveis, sejam estendidos aos
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servidores públicos” e, por conseguintemente, não haveria impedimento “quanto à criação
por meio de lei, de outros direitos e garantias para os servidores públicos, como por
exemplo, a licença prêmio por assiduidade, as indenizações – auxílio moradia, transporte
–, gratificações, adicionais e os benefícios da seguridade social” (pp. 13-17);
c)
Sustentou que constituiria “violação ao princípio da isonomia fazer
qualquer diferenciação entre o servidor público ocupante de cargo efetivo e aquele
ocupante de cargo comissionado, quando não houver distinção expressamente prevista na
lei”, pois a “Constituição Federal tratou dos servidores públicos de maneira ampla e não
estabeleceu distinções entre servidores efetivos e comissionados, exceto nas situações
expressamente previstas no art. 37, II, V, e art. 40 da CF”, ou seja, na “forma de
provimento e desprovimento do cargo”, na “natureza da confiança que se impõe na
relação jurídica” e no “sistema de aposentadoria”. Destacou que todas “as vantagens,
frise-se, TODAS, assim como as obrigações inerentes aos servidores públicos devem ser
aplicadas em sentido amplo, porque o legislador, quando assim não quis, excepcionou por
meio de lei” (grifo original).
d)
A “aquisição do direito da licença prêmio por assiduidade em nada
influencia no poder da administração pública de exonerar ad nutum o servidor público em
comissão” e “precariedade do vínculo significa tão somente que quem exerce o cargo
comissionado não possui direito à continuidade na função”. Reputou “retrógrado o
pensamento de que a precariedade do vínculo e a dedicação exclusiva tornam o servidor
público comissionado ‘um escravo’ do serviço público e por isso não pode ser
beneficiado pelos direitos inerentes ao servidor efetivo”. (pp. 17-28);
e)
Constatou que, “tanto na Constituição Federal quanto na legislação
específica dos servidores públicos e ainda na doutrina, não existe qualquer distinção entre
[o conceito de] servidor efetivo e aquele ocupante de cargo comissionado, ambos
considerados igualmente servidores públicos” (pp. 28-31);
f)
Considerou que a “redação da LC nº. 68/1992 não traz qualquer
imprecisão ou dá margem à interpretação conflitante”. O “legislador quando se utilizou
do termo ‘a remuneração do cargo e função’ estendeu [a licença prêmio por assiduidade]
a todos os servidores públicos, efetivos ou comissionados, pois, segundo o art. 5º. da LC
n. 68/92, ‘os cargos públicos, acessíveis a todos os brasileiros, são criados por lei, com
denominação própria e vencimento pago pelos cofres públicos, para provimento em
caráter efetivo ou em comissão’”.
g)
Deduziu que, quando a Lei Complementar nº. 68, de 1992, “retirou o
termo ‘titular de cargo efetivo’ para utilizar ‘servidor’, o fez intencionalmente para
estender aos comissionados”, “caso contrário teria mantido a exclusão feita na” revogada
Lei Complementar nº. 39/1990.
h)
Pontuou, ainda, que a “apreciação da matéria sob comento deve estar
pautada numa interpretação literal e sistemática do texto legal, a qual obrigatoriamente
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induz à conclusão de que a licença prêmio por assiduidade deve ser usufruída por todos
aqueles considerados servidores públicos por lei, sob pena de se outorgar tratamento
desigual aos considerados iguais, violar o princípio da legalidade e a prevalência dos
direitos humanos no que se refere ao direito social fundamental” (pp. 31-37).
i)
Arguiu também que “a licença prêmio por assiduidade, assim como as
férias, destina-se tão-só a preservar a saúde física e mental do servidor, protegendo o
interesse da Administração apenas em caráter indireto, razão por que é defeso adotar-se
uma intepretação in malam partem da norma com o escopo de prejudicar a aquisição de
um direito fundamental social, quando a lei expressamente não proibiu” (pp. 58-59);
j)
Registrou que a “jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e dos
Tribunais estaduais, bem como dos Tribunais de Contas”, tem variado “a depender do
caso concreto”, pois o que “restringe o benefício” é a “previsão expressa em lei”.
Ressaltou, ainda, que este Tribunal de Contas, na apreciação da Consulta nº. 2.967/2010,
concluiu que a Lei Complementar nº. 68/1992 admite a concessão ao servidor
comissionado da licença por motivo de doença em pessoa da família, desde que não
remunerada (pp. 37-56);
k)
Asseverou que, “pelos argumentos dispendidos no parecer do Ministério
Público de Contas e também utilizados no voto condutor da Decisão nº. 28/2012”, “a
resistência do reconhecimento do direito de licença prêmio por assiduidade ao servidor
comissionado baseia-se unicamente no critério da conveniência e oportunidade, ou seja,
na reflexão do ônus orçamentário a ser suportado pelo Estado de Rondônia”. Assim,
ponderou que esse “fundamento nada mais é do que utilizar-se do princípio da reserva do
possível sem nominá-lo, para criar uma interpretação do texto legal desvinculado daquilo
que intencionou o legislador” (pp. 59-67); e
l)
Vislumbrou, por fim, que não “há controvérsia quanto ao direito de
cômputo do período em que o servidor público exerceu o cargo em comissão e
posteriormente passou a exercer cargo efetivo”, “desde que não haja interrupção da
prestação do serviço público junto ao Estado de Rondônia” (pp. 56-57).
Durante as discussões, esta Relatoria solicitou adiamento da discussão, para
melhor examinar a matéria e o laudatório voto apresentado.
5.
6.
É o breve relatório.
Vencida a admissibilidade, nos termos do parecer ministerial e do voto do
Conselheiro Relator, passa-se a examinar o mérito.
7.
No voto apresentado, o Conselheiro Relator reitera sua insatisfação em
relação ao entendimento recentemente firmado pelo Conselho de Administração desta
Corte (Decisão nº. 28/2012 – CSA – Processo nº. 1.202/2012, Conselheiro Relator: Paulo
Curi Neto – Julgado em: 27 de agosto de 2012), oportunidade em que sua proposta de
decisão foi vencida.
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Ao apreciar recurso hierárquico interposto por ex-servidor ocupante
exclusivamente de cargo em comissão, o Conselho Superior de Administração firmou
posição de que:
9.
… o servidor ocupante exclusivamente de cargo em comissão não faz jus ao
benefício (afastamento remunerado de três meses a cada quinquênio) da
licença-prêmio por assiduidade, previsto no artigo 123, da LC n. 68/92, em
decorrência da incompatibilidade do referido direito com a natureza (precária)
do provimento do aludido cargo público, à luz do comando constitucional
(CF/88, artigos 37, II, e 39, § 3º).
Nas razões de decidir dessa decisão administrativa, em síntese, considerou-se,
inicialmente, que o comando legal estadual invocado “não é taxativo em conferir ao
detentor exclusivo do cargo em comissão a licença prêmio por assiduidade”, mas sua
redação imprecisa “deu margem às interpretações conflitantes” e que a previsão de livre
exoneração do cargo em comissão, por possuir “residência constitucional”, somente pode
ser restringida por “outra norma de igual envergadura”, “o que retira tal material do
campo de atuação do legislador ordinário”.
10.
Em seguida, constatou-se que “a Constituição se encarregou de estabelecer
expressamente as ressalvas (ou exceções à precariedade do vínculo do servidor
comissionado), assegurando em alguns casos o direito ao afastamento remunerado, como
ocorre nas hipóteses da licença paternidade (CF, art. 7º, XIX), gestante (CF, art. 7º,
XVIII), para tratamento de saúde, bem como das férias (CF, art. 7º, XVII)”. Pontuou-se
que, nessas hipóteses, ainda que não possua direito subjetivo à permanência na
investidura precária, o servidor exclusivamente comissionado, ao ser exonerado, faria jus
à indenização compensatória. Assim, concluiu-se que “somente a própria Constituição
Federal pode coarctar, com ressalvas expressas, a livre exoneração do cargo em comissão,
não podendo a legislação ordinária ampliar o rol constitucional”.
11.
Salientou-se, ainda, que “as responsabilidades do cargo em comissão (de
direção, chefia e assessoramento) não comportam um período de afastamento longo,
tampouco viabilizam o ônus com o pagamento de eventual indenização”, pois “é a própria
essência do direito à licença prêmio que tem por tela assegurar o ócio remunerado por três
meses e não a indenização”.
12.
13.
Embora o discurso prático-jurídico deva estar sempre aberto à possibilidade
de vir a surgir novos e, eventualmente, melhores argumentos, ao examinar o voto
apresentado por Sua Excelência, verifica-se que os fundamentos fático-jurídicos já foram
discutidos e considerados pelo Conselho Superior de Administração desta Corte –
oportunidade em que, é importante frisar, estavam presentes todos os membros titulares e
a Procuradora-Geral de Contas, Érika Patrícia Saldanha de Oliveira. Com efeito, os
argumentos sintetizados no relatório do presente voto, embora mais analíticos, são
fundamentalmente os mesmos constantes do voto substitutivo subscrito por Sua
Excelência na ocasião em que esta Corte proferiu a Decisão nº. 28/2012 – CSA.
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Em que pese a falta de novos argumentos, deve-se colher esta oportunidade
para analisar minuciosamente as objeções arguidas por Sua Excelência e, dessa forma,
escoimar quaisquer dúvidas acerca da correção da solução exegética adotada por esta
Corte.
14.
Por certo, as razões de decidir da Decisão nº. 28/2012 – CSA não se fundam
em “preconceitos incompatíveis com a ordem constitucional vigente”, tal como sugere o
Relator. Vale ressaltar que, muito embora a rotatividade de servidores tenda a ser
extremamente nociva – fenômeno que, na ciência da Administração, é conhecida por
“turn over” –, ninguém ignora que, quando prevalecem os valores republicanos na
seleção, profissionais sem vínculo permanente com a Administração Pública podem
somar-se significativamente ao capital intelectual das instituições públicas, dinamizandoas com novas e melhores formas de conhecimento e práticas institucionais.
15.
16.
De qualquer modo, não se pode ignorar, particularmente a partir da Emenda
Constitucional nº. 19, de 1998, que o texto constitucional vigente defere expressa
preferência aos servidores de carreira para ocuparem os cargos de confiança (artigo 37, V,
da CFRB/1988). Certamente, não é o caso, todavia, de considerar que o Poder
Constituinte Reformador incorreu em intolerância ou discriminação odiosa, pois, o
objetivo, em última instância, do novel dispositivo é alcançar o ideal constitucional da
profissionalização do serviço público, minimizando a excessiva rotatividade nos cargos
em comissão e eventuais práticas patrimonialistas ainda persistentes na Administração
Pública.
De qualquer modo, é necessário frisar que essa discussão, a bem da verdade,
não convém aos questionamentos objeto da presente consulta, pois apenas embaçam,
anuviam o cerne da controvérsia jurídica.
17.
Equivoca-se, ainda, o Relator ao asseverar que a suposta “resistência” ao
“reconhecimento do direito de licença prêmio por assiduidade ao servidor comissionado”,
por parte do Ministério Público de Contas e do Conselho Superior de Administração,
“baseia-se unicamente no critério da conveniência e oportunidade, ou seja, na reflexão do
ônus orçamentário a ser suportado pelo Estado de Rondônia”.
18.
Tal afirmação está calcada em mera irresignação e incompreensão das razões
de decidir, pois, em nenhum momento, esta Corte, sequer, discutiu, muito menos reputou
relevantes, os eventuais impactos financeiros a serem suportados pela Administração
estadual. Na verdade, considerou-se que “as responsabilidades do cargo em comissão (de
direção, chefia e assessoramento) não comportam um período de afastamento longo,
tampouco viabilizam o ônus com o pagamento de eventual indenização”, o que
consubstancia proposição diversa da imaginada pelo relator.
19.
Tais considerações introdutórias mostram-se imprescindíveis para não deixar
de racionalizar a discussão e assegurar que os fundamentos da decisão da Corte, qualquer
que seja o resultado, estejam calcados em critérios jurídicos intersubjetivamente
20.
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controláveis. Nós, na condição de julgadores membros de um órgão imparcial de
aplicação do direito, não devemos perfilhar qualquer conceito particular e subjetivo de
“justiça”, mas simplesmente perseguir a aplicação das normas positivadas no
ordenamento jurídico, buscando uma solução hermenêutica a partir de uma análise
racional do direito, deixando de lado eventuais paixões que às vezes o tema pode suscitar.
Passa-se, doravante, a sopesar as objeções formuladas pelo douto Relator, a
fim de verificar se se justifica a mudança, total ou parcial, da orientação adotada
recentemente pelo Conselho Superior de Administração.
21.
22.
Pois bem.
23.
Sustentou o relator que a licença prêmio por assiduidade, “assim como as
férias, destina-se tão-só a preservar a saúde física e mental do servidor, protegendo o
interesse da Administração Pública apenas em caráter indireto, razão por que é defeso
adotar-se uma interpretação in malam partem com o escopo de prejudicar a aquisição de
direito fundamental social”.
Convém examinar, em brevíssimas linhas, a natureza jurídica da licença
prêmio por assiduidade, o que será feito, não por pedantismo, mas porque a inexata
apercepção do instituto, a nosso sentir, pode levar a um raciocínio equivocado. A
comparação da licença prêmio por assiduidade com as férias remuneradas é inapropriada,
pois os institutos possuem fins e fundamentos jurídicos distintos.
24.
25.
Inicialmente, repare-se que, na organização da Lei Complementar nº. 68, de
1992, as férias e as licenças em geral encontram-se formalmente segregadas em
segmentos distintos do diploma legal (Capítulos III e IV do Título III). As férias
destinam-se, de fato, a proporcionar um descanso anual remunerado a todo trabalhador,
por motivo de saúde e bem-estar, e possuem residência constitucional em normas
internacionalmente reconhecidas. A anualidade das férias é característica
internacionalmente reconhecida do seu conceito (Convenção nº. 132 da OIT, promulgada
internamente pelo Decreto federal nº. 3.197, de 1999). A licença prêmio por assiduidade,
por sua vez, é hipótese legal de afastamento remunerado trimestral das funções públicas,
prevista no artigo 123 da Lei Complementar nº. 68, de 1992. Ela é concedida a cada
quinquênio de serviços prestados ao Estado ininterruptamente e destinada precipuamente
a estimular e premiar a adoção de determinado comportamento desejado pela ordem
administrativa: a assiduidade funcional.
O instituto caracteriza-se, portanto, como evidente sanção premial (ou
positiva), na qual se asseguram benefícios aos destinatários da norma, ao invés de
reprimendas, a fim de promover um comportamento lícito e desejado pelo ordenamento
jurídico. Ao evitar o comportamento ilícito, a ausência injustificada do servidor público, a
licença prêmio previne também a necessidade da atuação dos mecanismos jurídicos
repressivos, como, no caso, a instauração de uma sindicância ou processo administrativo26.
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disciplinar, cuja instauração representa a mobilização de significativos recursos
organizacionais (humanos, financeiros e administrativos) da instituição pública.
Tal registro deve ser feito para evitar que a importância do instituto seja
superestimada, concedendo-lhe uma dimensão e valia maior do que realmente possui.
Não se trata, por certo, de um direito que salvaguarda uma necessidade vital do servidor –
afinal a Lei Complementar nº. 68, de 1992, já lhe assegura anualmente um descanso anual
remunerado. Essa inexata incompreensão pode influenciar erroneamente a convicção dos
julgadores na interpretação teleológica do texto legal. Na verdade, ele possui
fundamentalmente uma função promocional, estimulando comportamentos lícitos e
prevenindo a atuação do aparelho repressivo.
27.
Diante dessa premissa formulada, cabe indagar: qual a razão de a legislação
estadual instituir uma sanção premial para assegurar a assiduidade dos ocupantes
exclusivamente de cargos em comissão, prevenindo a atuação do aparelho repressivo,
quando o Estado goza da prerrogativa constitucional de ad nutum destitui-lo da
titularidade da função, sempre que a sua aptidão técnica ou ética não se mostrar
suficientemente satisfatória?
28.
Ora, se o cargo em comissão é de livre exoneração, então essa forma de
provimento deve ser suficientemente coercitiva para assegurar a observância da
assiduidade do agente público. A destituição do cargo em comissão, por prescindir de
processo administrativo formal, não gera mobilização relevante de recursos
organizacionais. Assim, tem-se que a concessão da licença prêmio aos servidores
exclusivamente comissionados é, rigorosamente, desnecessária para atender ao interesse
da Administração, objetivado pela norma. A interpretação pretendida pelo ilustre Relator,
portanto, não atenderá aos fins sociais do instituto jurídico.
29.
Talvez, alguns possam cogitar que a legislação supostamente concedeu esse
benefício a todos os servidores, indistintamente, por mera liberalidade ou política de
gestão de pessoas. Esse argumento não pode ser considerado juridicamente decisivo,
porque estaria a desprezar o fim social da norma jurídica, em favor de sua suposta
literalidade.
30.
Além do mais, muito embora o Conselheiro Relator não hesite em afirmar que
a “interpretação literal e sistemática do texto legal” “obrigatoriamente induz à conclusão
de que a licença prêmio por assiduidade deve ser usufruída por todos aqueles
considerados servidores públicos por lei”, é importante frisar que o texto legal não
especificou a natureza da investidura do cargo no texto do artigo 123 da Lei
Complementar nº. 68, de 1992, razão pela qual a suposta “vontade e intenção” do
legislador em alcançar todos os servidores não se sustenta na literalidade do dispositivo,
mas em mera presunção imprecisa do intérprete.
31.
Mesmo assim, a tese proposta pelo i. Relator considera que a “redação da LC
nº. 68/1992 não traz qualquer imprecisão ou dá margem à interpretação conflitante”,
32.
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porque o “legislador quando se utilizou do termo ‘a remuneração do cargo e função’
estendeu [a licença prêmio por assiduidade] a todos os servidores públicos, efetivos ou
comissionados”. Na verdade, o relator sustenta que o silêncio da lei é eloquente e
proposital, pois, se o quisesse, o legislador teria excluído expressamente os ocupantes de
cargo em comissão.
Nesse sentido, salientou que o legislador estadual, ao revogar a Lei
Complementar nº. 39, de 1990, “quando retirou o termo ‘titular de cargo efetivo’ para
utilizar ‘servidor’”, na redação do artigo 123 da Lei Complementar nº. 68, de 1992, o fez
“intencionalmente para estender” a licença prêmio “aos comissionados”, pois a própria
lei, ao conceituar servidor público, não distinguiu os que ocupam cargo efetivo ou cargo
em comissão. Assim, conclui que “as vantagens, frise-se, TODAS, assim como as
obrigações inerentes aos servidores públicos devem ser aplicadas em sentido amplo,
porque o legislador, quando assim quis, excepcionou por meio de lei”. Esses são,
basicamente, os argumentos que o i. Relator extrai do texto legal.
33.
É fácil perceber que a proposição de que o “legislador” intencionou
contemplar o servidor exclusivamente comissionado está no pano de fundo de todo o
raciocínio construído por Sua Excelência e, com o devido respeito, aqui mora a
imperfeição mais evidente da sua opinião.
34.
Repare-se que a “interpretação literal e sistemática” do texto legal proposta
causa-nos uma perplexidade: como é possível, ao interpretar o mesmo diploma
legislativo, concluir que ao servidor exclusivamente titular de cargo de confiança pode ser
concedida a licença por motivo de doença em pessoa da família, desde que não
remunerada (artigo 119), mas que, em se tratando de licença prêmio por assiduidade, deve
ser-lhe assegurado um ócio remunerado trimestral (artigo 123)? Como pode a
interpretação sistemática acarretar resultados aparentemente tão díspares, a evidenciar
uma inversão de valores constitucionais por parte da legislação infraconstitucional? O
aparente paradoxo denuncia algum tipo de erro metodológico na exegese legal proposta.
35.
36.
Embora o relator sustente que houve intenção manifesta do legislador em
“estender” a licença prêmio “aos comissionados”, por utilizar no texto legal os termos
“servidor” e “cargo”, a utilização de vocábulos genéricos no diploma legislativo estadual
deve ser creditada antes à falta de técnica jurídico-legislativa do que a um suposto
silêncio eloquente da lei.
Ora, uma leitura atenta e verdadeiramente sistemática do diploma legal
demonstra que, na Lei Complementar nº. 68/1992, os termos mencionados, sem quaisquer
adjetivos, foram utilizados indiscriminadamente, inclusive, para versar sobre institutos e
direitos exclusivos de servidor titular de cargo de provimento efetivo. A fim de
demonstrar cabalmente essa assertiva, podem ser citados especificamente os seguintes
institutos e direitos próprios de ocupantes de cargo efetivo, em relação aos quais o texto
legal não excluiu expressamente do âmbito subjetivo da norma os servidores ocupantes
exclusivamente de cargos de confiança:
37.
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a)
Progressão funcional na carreira:
“Art. 22 - A progressão não interrompe o tempo de exercício, que é
contado do novo posicionamento na carreira a partir da data da publicação do
ato que promover o servidor”.
Embora a lei tenha utilizado o termo genérico “servidor”, não excluindo os
ocupantes exclusivamente de cargos em comissão, essa forma de investidura é
incompatível com essa categoria de servidores públicos. Os cargos em comissão, mesmo
quando obrigatoriamente ocupados por titulares de cargo efetivo por força de lei, são
cargos isolados e destinam-se ao exercício de funções de direção, chefia e assessoramento
superior. Logo, por não estarem integrados em carreira, não podem ser providos por
promoção em sentido estrito 1 . Houve, portanto, falha técnico-legislativa na elaboração do
texto legal.
38.
b)
Readaptação funcional por motivo de limitação de capacidade física
ou mental:
“Art. 31 - Readaptação é a investidura do servidor em cargo de
atribuições e responsabilidades compatíveis com a limitação que tenha sofrido
em sua capacidade física ou mental verificada em inspeção médica”.
c)
Prestações previdenciárias do Plano de Seguridade Social Própria
do Estado:
“Art. 231 - Os benefícios do Plano de Seguridade Social do Estado
compreendem:
I - quanto ao servidor:
a) aposentadoria;
b) auxílio-natalidade;
c) salário-família;
d) licença para tratamento de saúde;
e) licença à gestante, à adotante e licença paternidade;
f) licença por acidente em serviço”.
Embora a lei não tenha excluído os ocupantes exclusivamente de cargos em
comissão, é certo que a readaptação em outro cargo e as prestações previdenciárias do
regime próprio de previdência social são institutos peculiares dos servidores que integram
o quadro permanente da Administração estadual.
39.
Mesmo que o texto da lei não tenha especificado a natureza da investidura,
não há se falar no direito à readaptação funcional do servidor exclusivamente
comissionado, assegurando-lhe a investidura em outro cargo de atribuições equivalentes,
40.
1
O diploma legal mencionado não diferencia conceitualmente progressão de promoção,
tratando-os indistintamente.
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pois o provimento dos cargos de confiança está sujeito à competência discricionária, ao
passo que o provimento em cargo efetivo, à aprovação em concurso público.
Acaso, por motivo de limitação da capacidade física ou mental, não seja
possível ao servidor desempenhar o cargo de confiança com a qualidade esperada pelo
Estado, o pressuposto da investidura – a confiança na sua aptição ético-profissional – foi
desconstituído. Tal não significa que essas pessoas fiquem socialmente desassistidas, pois
os ocupantes exclusivamente de cargo de livre provimento e nomeação, em eventos
relacionados à limitação da capacidade laboral habitual, bem como em outros riscos
sociais (doença, invalidez, idade avançada, maternidade, dente outros), sujeitam-se à
legislação da previdenciária geral (artigo 40, §3º, combinado com o artigo 201, I, §10, da
Constituição Federal de 1988 e Lei federal nº 8.213, 1992).
41.
Note-se, ainda, que, embora o estatuto dos servidores não indique a natureza
do cargo do “servidor” habilitado a receber prestações previdenciárias do Plano de
Seguridade Social do Estado, é inevitável concluir que esse agente público é titular de
cargo de provimento efetivo, pois a filiação ao regime próprio de previdência social lhe é
privativa (artigo 40, caput, da CRFB/1988). Novamente, houve falha técnica na
elaboração do texto, e não o intento legislativo de incluir indiscriminadamente todos os
servidores públicos no âmbito subjetivo da norma.
42.
d)
Direito à permanência no local de lotação, quando matriculado em
instituição de ensino superior:
“Art. 45 - É vedada a movimentação “ex-ofício” de servidor que
esteja regularmente matriculado em Instituição de Ensino Superior de
formação, aperfeiçoamento ou especialização profissional que guarde
correspondência com as atribuições do respectivo cargo”.
e)
Licença para Acompanhamento do cônjuge ou companheiro que
for deslocado para outro Estado da Federação, para o exterior ou para o exercício
eletivo:
“Art. 120 - O servidor terá direito à licença para acompanhar o
cônjuge ou companheiro que for deslocado para outro Estado da Federação,
para o exterior ou para o exercício eletivo” (artigo 120).
Sem maiores delongas, esses direitos subjetivos deferidos pelo texto da lei ao
43.
“servidor”, sem exclusão expressa dos ocupantes exclusivamente de cargo em comissão,
contradizem, todavia, a natureza essencialmente precária da livre nomeação e exoneração
dos ocupantes de cargos em comissão, cuja lotação está sujeita à competência
discricionária da Administração, por força da necessidade do serviço público.
f)
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Licença não remunerada para tratar de interesse particular:
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“Art. 116 - Conceder-se-á ao servidor licença: VI - para tratar de
interesse particular; Art. 128 - O servidor pode obter licença sem vencimento
para tratar de interesse particular”.
De acordo com a legislação atual, essa hipótese de afastamento não retribuído
das funções públicas pode ser exercido por até 6 (seis) anos, período após o qual os
servidores então licenciados não poderão ser demitidos durante 1 (um) ano (artigo 128,
§5º 2 ). Por evidente, em que pese o texto da lei não ter excluído expressamente os
ocupantes exclusivamente de cargo em comissão, a estabilidade pós-licença conferida
pela lei contraria a precariedade da investidura dos cargos comissionados. Além do mais,
há precedente desta Corte no sentido de que a concessão de licença a servidor
exclusivamente titular de cargo em comissão deve ser “sempre provisório e de curto
prazo” (Parecer Prévio nº. 01/2012 – Pleno – Processo nº 2.967/2010 – Conselheiro
Relator em substituição: Davi Dantas da Silva, unanimidade), razão por que o prazo de
afastamento da licença para tratar de interesse particular é incompatível com a necessária
continuidade dos exercícios das funções típicas de cargos em comissão.
44.
A exegese legal ampliativa proposta pelo i. Relator, quando submetida a um
teste de generalização, revela-se frágil. Ora, não se pode pretender fazer interpretação
sistemática aos retalhos, colhendo-se apenas os dispositivos legais que lhe convém. Se a
Lei Complementar estadual nº. 68, de 1992, ao disciplinar vários institutos típicos de
ocupantes de cargo de provimento efetivo, não excluiu expressamente os ocupantes
exclusivamente de cargo em comissão, utilizando indiscriminadamente termos genéricos,
como “servidor” ou “cargo”, inclusive na cabeça do artigo 123, então fê-lo simplesmente
por motivo de atecnia legislativa, e não por “vontade e intenção” do legislador estadual de
incluir todos os servidores, inclusive os não ocupantes de cargos de provimento efetivo,
no âmbito subjetivo da norma.
45.
Além do mais, sob o ponto de vista da interpretação histórica, que objetiva
alcançar a noção ou sentido originários de um conceito jurídico ou de uma norma, antes
de provar que o propósito da Lei Complementar nº. 68, de 1992, seria estender a licença
prêmio a todos os servidores, indica que, originariamente, o referido instituto,
anteriormente denominado de “licença especial”, era vantagem própria de “titular de
cargo de provimento efetivo” (artigo 122 da Lei Complementar nº. 39, de 1990 3 ) e de
“funcionário estável” (artigo 199 da Lei Complementar nº. 1, de 1984 4 ). Concluiu-se,
46.
2
3
4
“§5º - O servidor não poderá ser demitido, no período de 1 (um) ano, após o cumprimento da Licença
sem remuneração” (veto rejeitado pela ALE/RO).
“Art. 122 – A cada quinquênio de efetivo exercício prestado ao Estado na condição de titular de cargo
de provimento efetivo, o funcionário terá direito à licença especial de 03 (três) meses, com todos os
direitos e vantagens do cargo”.
“Artigo 199 – Ao funcionário estável que, durante o período de cinco (5) anos consecutivos, não se
afastar do exercício de suas funções, é assegurado o direito à licença especial de três (3) meses, por
quinquênio, com vencimento ou remuneração e demais vantagens, sendo-lhe assegurado a contagem em
dobro, para os efeitos legais” (sic).
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então, que a interpretação extensiva proposta pela relatoria também contraria o sentido
historicamente cristalizado da licença prêmio no âmbito da legislação estadual.
Portanto, a rigor, seria desnecessária exclusão expressa dos servidores
comissionados do artigo 123 da Lei Complementar nº. 68, de 1992, porque a tradição
legislativa local sinaliza que esse direito é próprio de titular de cargo de provimento
efetivo. Com efeito, a análise topológica dos dispositivos agrupados na Seção VI do
Capítulo IV do Título III (artigos 123 a 127) denota que, quando o texto do diploma legal
mencionou os termos “servidor” e “cargo”, pretendeu alcançar apenas o conceito
histórico da norma, ou seja, o servidor titular de cargo de provimento efetivo. É o que se
passará a demonstrar.
47.
O texto do artigo 124, ao utilizar o mesmo termo “cargos”, muito embora não
tenha especificado a natureza das investiduras, fê-lo para disciplinar a hipótese de
acumulação remunerada de cargos públicos efetivos 5 . Esta conclusão se impõe porque,
por óbvio, não há se cogitar, por força de imperativo constitucional, da acumulação lícita
de cargos em comissão, ainda mais quando o próprio estatuto dispõe que o servidor
“comissionado” atua em regime de dedicação integral (artigo 55, §2º 6 ).
48.
Além disso, o parágrafo único do artigo 123 prescreve que os “períodos de
licença prêmio já adquiridos e não gozados pelo servidor que vier a falecer, serão
convertidos em pecúnia, e revertidos em favor de seus beneficiários da pensão”. Por sua
vez, o caput do artigo 127 dispõe sobre a contagem em dobro, para efeito de
aposentadoria, do tempo de licença prêmio por assiduidade que o “servidor não houver
gozado”.
49.
Esses dispositivos topograficamente correlatos à cabeça do artigo 123
evidenciam que, ainda que o texto legal não tenha expressamente indicado a natureza da
investidura, o “servidor” acolhido pelo âmbito subjetivo da norma concessiva da licença
prêmio está vinculado ao regime próprio de previdência social, o que, por certo,
pressupõe a investidura em cargo de provimento efetivo na Administração estadual
(artigo 40, caput, da CRFB/1988). Afinal, não faria sentido que a Lei Complementar
estadual nº 68, de 1992, pretendesse legislar sobre o regime geral de previdência social,
ao qual se sujeitam os ocupantes exclusivamente de cargos de comissão, por se tratar de
competência privativa da União.
50.
Por fim, repare-se que a parte final do artigo 123, ao prescrever que o servidor
fará jus à “remuneração integral do cargo e função que exercia”, sugere-nos, ao contrário
do que conclui o relator, que o direito ao afastamento remunerado por assiduidade
51.
5
6
“Art. 124 - Em caso de acumulação legal de cargo, a licença será concedida em relação a cada
um. Parágrafo único - Será independente o cômputo do qüinqüênio em relação a cada um dos casos”.
“Art. 55 – […] § 2º - Além do cumprimento do estabelecido neste artigo, o exercício em
comissão e função gratificada exige dedicação integral ao serviço por parte do comissionado, que pode
ser convocado sempre que haja interesse da administração”.
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restringe-se aos titulares de cargos de provimento efetivo, pois as funções de confiança –
chamadas na lei complementar analisada de “funções gratificadas” 7 – devem ser
exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo (artigo 37, V, da
CFRB/1988). Dessa forma, o dispositivo legal assegura aos servidores ocupantes de
função gratificada o pagamento da remuneração do cargo efetivo e da designada
“gratificação pelo exercício de Função de Direção, Chefia, Assessoramento e
Assistência” (artigo 99, I, da Lei Complementar nº. 68, de 1992).
Ao lume do exposto, partindo de uma leitura apegada exclusivamente ao texto
do diploma legal, a sua interpretação sistemática permite concluir que a legislação, ao
disciplinar a licença prêmio, alcançou apenas o servidor titular de cargo efetivo.
52.
Mesmo aqueles que eventualmente não se convenceram, devem considerar
que, de qualquer modo, a licença prêmio é incompatível com a natureza jurídicoconstitucional dos cargos de confiança, de livre provimento e exoneração, razão porque
estaria esta Corte obrigada a conferir uma interpretação conforme à Constituição – afinal,
o Tribunal não poderia, em sede de consulta, proferir decisão normativa em contrariedade
à ordem constitucional.
53.
Frise-se, todavia, que essa intepretação conforme não é estritamente
necessária porque a exegese do texto legal é suficiente para avalizar a conclusão de que a
licença prêmio não é aplicável ao servidor titular, exclusivamente, de cargo em comissão.
De qualquer modo, é necessário também examinar a compatibilidade do resultado da
interpretação do texto legal com o sistema constitucional, pois, segundo a perspicaz lição
do jurista Juarez Freitas, não há verdadeiramente interpretação senão a sistemática, e toda
interpretação sistemática é necessariamente uma interpretação constitucional.
54.
Prosseguindo na análise do voto, observa-se que o Relator argumenta que a
“Constituição Federal consagra, nos diversos incisos de seu art. 7º, garantias mínimas
tanto para o trabalhador urbano quanto para o trabalhador rural”, razão pela qual nada
impediria que fosse “atribuído maior amplitude de proteção dos trabalhadores pela
legislação infraconstitucional”. Para abonar a sua afirmação cita precedente do Supremo
Tribunal Federal. Sustenta, ainda, “não haver limitação constitucional à ampliação dos
direitos dos trabalhadores previstos no rol do art. 7º da Constituição da República, pois a
própria norma expressamente permite a sua extensão, no intuito de promover a melhoria
da condição social do trabalhador”.
55.
E depois conclui que a “ausência de previsão expressa da licença prêmio por
assiduidade no rol do art. 7º da Constituição da República e na parte que trata dos
servidores públicos, não impede a ampliação por meio de lei complementar estadual ou
municipal”.
56.
7
“Art. 6º - É vedado atribuir ao servidor público outros serviços, além dos inerentes ao cargo de
que seja o titular, salvo quando designado para o exercício de cargo em comissão, função gratificada ou
para integrar comissões ou grupos de trabalhos”.
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De início, a ideia formulada genericamente quanto a suposta inexistência de
“limitação constitucional à ampliação de direitos dos trabalhadores” é bastante imprecisa,
pois toda competência legislativa adjudicada aos entes federativos autônomos está sujeita
a limites formais ou materiais, insculpidos na própria ordem constitucional. A
obscuridade da premissa, a nosso sentir, prejudica a validade do raciocínio, pois faz
ignorar que, a bem da verdade, a competência para legislar acerca de direito trabalhista é
privativa da União, nos termos do artigo 22, I, da CRFB/1988. Logo, a ampliação de
direitos trabalhistas, com fundamento na cabeça do artigo 7º, somente pode ser veiculada
por direito federal.
57.
Afinal, o comando constitucional suscitado pelo Relator está dirigido
precipuamente à regulamentação das relações de emprego firmadas sob a égide da ordem
econômica, sujeitas ao direito comum, e não às relações de trabalho entre os servidores
públicos e a Administração pública, submetidos a direitos especiais, a estatutos próprios.
O fato de “se aproximarem”, cada vez mais, os servidores públicos e os trabalhadores
privados, “quanto a direitos e deveres”, com a devida vênia, não é motivo bastante para
superar os limites federativos da competência dos Estados e para extrair da cabeça do
sétimo artigo da CRFB/1988 uma regra de competência legislativa estadual e
municipal, o que contraria uma visão sistemática da ordem constitucional. Na
verdade, a competência legislativa própria de cada ente político autônomo para fixar o
regime jurídico próprio dos seus servidores públicos, inclusive, daqueles que ocupam
exclusivamente cargo em comissão, encontra morada na autonomia federativa que lhes é
constitucionalmente assegurada nos artigos 18, 25, 29, 32 e, por simetria, no artigo 61,
§1º, II, “a” e “c”, da Constituição da República.
58.
59.
Nesse sentido, vide precedente do Supremo Tribunal Federal:
EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRABALHO. LICENCAPRÊMIO INSTITUIDA PELA LEI n. 4.819, de 26.08.58, do Estado de São
Paulo. I. - Licença-prêmio. Lei 4.819/58, do Estado de São Paulo. Vantagem
que não decorre do contrato de trabalho, mas de lei estadual, que não pode
impor as empresas mistas e publicas encargos trabalhistas, dado que o Estadomembro não tem competência para legislar sobre direito do trabalho (CF/67,
art. 8., XVII, "b"; art. 170, PAR. 2.). II. - No caso não se tem lide de natureza
trabalhista. Incompetência da Justiça do Trabalho. III. - R.E. conhecido e
provido. (RE 146155 – 2ª Turma – Relator: Min. Carlos Velloso – Julgado em:
26/09/1995, DJ 01-12-1995)
Entretanto, sustenta, ainda, o Relator que os direitos trabalhistas, por “fazerem
60.
parte dos direitos fundamentais sociais”, “são considerados direitos humanos
internacionais positivados na ordem interna do Estado, logo, possibilitam uma ampliação
de proteção e nunca de retrocesso em desfavor do indivíduo”. Por tal motivo, a supressão
da licença prêmio deveria ser considerada uma violação ao princípio da vedação do
retrocesso social. Com o devido respeito, houve um excesso de retórica na articulação
desse argumento.
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Em primeiro lugar, esse raciocínio parte da falsa premissa de que a legislação
estadual assegurou o direito à licença prêmio aos servidores ocupantes exclusivamente de
cargo de confiança, o que não é verdade, e que a resistência ao reconhecimento desse
direito supostamente baseia-se meramente no ônus orçamentário que sujeitaria o Estado,
o que também é falso.
61.
Em segundo lugar, ainda que se admitisse hipoteticamente que a legislação
infraconstitucional estadual tenha concedido a licença prêmio a servidores não ocupantes
de cargos de provimento efetivo – concessão que se faz por amor ao debate –, a eventual
supressão legislativa desse direito não acarretaria, sequer, violação ao princípio da
vedação do retrocesso. O raciocínio será formulado sob a forma de um simples argumento
dedutivo, porque, além disso, seria uma demonstração de eruditismo. Então, vejamos:
62.
(P1) A cláusula constitucional da proibição do retrocesso social (ou efeito
“cliquet”) destina-se a assegurar o núcleo-duro dos direitos sociais já realizados e
efetivados através de medidas legislativas. Em outras palavras, destina-se a assegurar o
chamado mínimo existencial, o conjunto de bens da vida e utilidades sociais necessários
para garantir e promover aos indivíduos igual respeito e consideração pelo Estado e pelos
demais sujeitos de direitos. A identificação e extensão desses bens da vida repousam
sobre um consenso social básico inserido na consciência jurídica geral da comunidade
política.
63.
64.
(P2) A licença prêmio não integra o núcleo-duro dos direitos
fundamentais, pois não é reconhecida pela consciência jurídica geral como uma
necessidade vital mínima para os trabalhadores em geral 8 . Na verdade, ela constitui,
como já visto, apenas uma espécie de sanção premial, um estímulo para induzir o
cumprimento de uma obrigação funcional inerente à investidura: a assiduidade.
(C) Logo, eventual supressão legislativa da licença prêmio – o que não
ocorreu – não constituiria violação ao princípio da vedação do retrocesso.
65.
Esse simples raciocínio dedutivo demonstra a impertinência da invocação do
princípio da vedação do retrocesso social, como recurso argumentativo para tentar
justificar o reconhecimento do direito à licença prêmio aos servidores ocupantes
exclusivamente de cargo em comissão, ainda mais porque, segundo pensamos, a licença
prêmio, de acordo com a legislação estadual examinada, é benefício próprio de agente
66.
8
Afirmar o contrário constituiria um evidente malabarismo retórico, pois, infelizmente, no
presente momento, ainda não se atingiu semelhante patamar de qualidade de vida, provavelmente nem
mesmo nos países escandinavos. A título de ilustração, vale observar que a licença prêmio por
assiduidade foi suprimida do estatuto dos servidores da União, pela Lei nº. 9.527, 1997, e, por certo, não
significou nenhum vilipêndio à dignidade existencial dos servidores federais – pelo contrário, é de
conhecimento geral que as carreiras federais ainda costumam ser as mais cobiçadas no mercado de
trabalho. Convém recordar, ainda, que mesmo a constitucionalidade das reformas constitucionais no
regime previdenciário dos servidores públicos, que resultaram em consideráveis ônus às presentes e
futuras gerações, foi acolhida pelo Supremo Tribunal Federal.
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público titular de cargo de provimento efetivo. É preciso tomar muito cuidado para não
banalizar o apelo à dignidade da pessoa humana como recurso argumentativo, pois o mau
uso poderá levá-lo a certo desgaste e desprestígio.
Ao analisar a compatibilidade do instituto legislativo da licença prêmio com o
regime constitucional dos cargos em comissão, opinou o Relator que a Constituição
Federal somente distinguiu os servidores públicos titulares de cargo em comissão,
“basicamente, [quanto] à forma de provimento e desprovimento, [à] natureza da
confiança que se impõe na relação jurídica” e ao “sistema de aposentadoria”. Então, ao
considerar que a Lei Complementar nº. 68, de 1992, “não fez distinção entre servidor
efetivo e comissionado” 9 , concluiu que a precariedade do vínculo não é razão suficiente
para excluir a licença prêmio aos servidores ocupantes exclusivamente de cargo em
comissão, pois essa condição implica apenas a ausência do direito subjetivo à
continuidade da investidura.
67.
Argumenta ainda que, se a precariedade do vínculo impedisse ao servidor
comissionado usufruir a licença prêmio, também ele “não poderia gozar da licença
maternidade, licença paternidade, licença para tratamento de saúde, férias anuais, 13º
salário, diárias, horas extras dentre outros benefícios”.
68.
De início, é fácil observar que o raciocínio acima indicado constitui uma falsa
generalização. Por certo, a concessão de diárias e horas extras não constituem hipóteses
de afastamento remunerado das funções (licença), razão pela qual o seu percebimento não
comprova a possibilidade de o servidor ocupante de cargo em comissão exclusivamente
gozar outro tipo de afastamento remunerado, porque não se pode fazer analogia entre
coisas dessemelhantes 10 .
69.
Especificamente em relação à licença para tratamento de saúde, também
comete igual equívoco o relator, pois, de acordo com o estatuto estadual, trata-se de
prestação previdenciária do regime próprio de previdência (artigo 231, I, “d”, da Lei
Complementar nº. 68, de 1992), ao passo que a licença prêmio é contraprestação de
natureza administrativa em sentido estrito. Logo, se a licença prêmio não possui natureza
de prestação previdenciária, não se pode estabelecer a pretendida analogia com a licença
para tratamento de saúde.
70.
9
10
Mais uma vez, vale frisar, o relator parte de uma premissa falsa, pois o diploma legal fez, sim,
distinção entre servidores ocupantes de cargos em comissão e os de provimento efetivo, ainda que, por
atecnia na redação do texto legal, caiba ao intérprete criticamente examinar a compatibilidade do
instituto com a espécie de vínculo funcional do agente.
Além do mais, é de conhecimento geral que a concessão de diárias constitui mero
ressarcimento por despesas desembolsadas pelo servidor no deslocamento eventual a serviço, razão pela
qual a natureza da investidura, neste caso, é indiferente. Já os serviços extraordinários (horas extras)
podem ou não serem pagos aos servidores titulares de cargo em comissão ou de função de confiança a
depender da jornada legal de trabalho e da organização interna dos serviços, o que também nada tem
que ver com a investidura.
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Além do mais, já foi dito que os servidores ocupantes exclusivamente de
cargos em comissão, quando acometidos por riscos sociais relacionados a doenças, estão
sujeitos às prestações e benefícios previdenciários do regime geral de previdência social,
orientado pelo princípio da universalidade (artigo 40, §13º, combinado com o artigo 201,
I, da Constituição Federal 11 , combinado com a Lei nº. 8.213, de 1992).
71.
72.
Por sua vez, sugere o i. Relator que o gozo de férias anuais, de licençamaternidade e de licença-paternidade provaria que a precariedade do provimento do
servidor comissionado não seria motivo bastante para impedir o gozo de outros tipos de
licenças. Ora, diferentemente da licença prêmio, esses direitos encontram-se
expressamente lastreados em normas constitucionais – artigo 39, §3º, combinado com o
artigo 7º da CRFB/88 – que, por possuírem igual hierarquia, excepcionam a precariedade
constitucional do provimento dos cargos em comissão (artigo 37, V, da CRFB/88). São
direitos concedidos indistintamente aos trabalhadores em geral, inclusive aos servidores
do Estado, pouco importando a natureza do vínculo, seja estatutário ou contratual, seja
efetivo ou temporário, seja civil ou militar.
O relator não leva em conta que a legislação infraconstitucional não pode
indiscriminadamente criar direitos que assegurem, ainda que indiretamente, estabilidade
ao servidor ocupante exclusivamente de cargo de confiança. Na jurisprudência, é pacífico
que a estabilidade financeira provisória somente tem sido admitida em relação à servidora
comissionada gestante, desde a confirmação da gravidez até 5 (cinco) meses após o parto,
por força de expressa previsão constitucional (artigo 10, II, “b”, do ADCT), que
excepciona a instabilidade ínsita aos cargos de confiança (artigo 37, V, da CRFB/1988).
Tal ocorre porque a Constituição Federal confere especial proteção social à maternidade
(artigos 7º, XVIII, 201, II, 203, I, da CRFB/1988) e ao mercado de trabalho da mulher
(artigo 7º, XX, da CRFB/1988).
73.
74.
Vale observar que o Supremo Tribunal Federal, em precedente de 1998,
declarou a inconstitucionalidade do inciso XII do §2º do artigo 98 da Constituição do
Estado de Pernambuco, considerando incompatível com a Constituição Federal o
“pagamento” a servidor destituído de cargo em comissão “de indenização”
equivalente ao valor da última remuneração mensal percebida, por cada ano de
serviço prestado em comissão. Entendeu-se que essa vantagem “restringe o princípio da
livre nomeação dos que foram nomeados para ocupá-los, e por isso, é incompatível com o
artigo 37, II, parte final, da Constituição Federal” (excerto do voto do Ministro Relator,
ADI nº. 199-0 – Plenário – Relator: Ministro Maurício Corrêa – Julgamento: 22 de abril
11
“Art. 40. […]. §13º. Ao servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão declarado
em lei de livre nomeação e exoneração bem como de outro cargo temporário ou de emprego público,
aplica-se o regime geral de previdência social. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de
15/12/98). Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade
avançada” (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998).
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de 1998, votação unânime). Pode-se intuir, pois, que a legislação infraconstitucional não
pode sequer criar mecanismos compensatórios à exoneração imotivada em favor dos
titulares de cargos de confiança, muito menos ampliar as excepcionais hipóteses
constitucionais de estabilidade financeira provisória dos servidores comissionados.
Ora, na prática, acaso a legislação estadual estendesse a licença prêmio por
assiduidade ao servidor exclusivamente comissionado, estaria a assegurar-lhe, após cada
quinquênio, o direito ao ócio remunerado trimestral ou, na hipótese de exoneração, a
prestação pecuniária compensatória equivalente, o que não é outra coisa senão a
concessão de estabilidade financeira provisória durante a investidura e após a
desconstituição do vínculo, o que é incompatível com a ordem constitucional vigente
(artigo 37, V, da CRB/1988).
75.
A nosso sentir, esse precedente advindo do intérprete último da Constituição
Federal deve ser preferido aos demais precedentes citados pelo Conselheiro Relator – os
quais, aliás, amparam-se em mera interpretação literal da legislação infraconstitucional do
respectivo ente federativo 12 .
76.
Registre-se que, ainda que esta Corte de Contas tenha reconhecido a
possibilidade de, havendo previsão legal, conceder ao servidor comissionado licença por
motivo de doença em pessoa da família, essa postura não se mostra incoerente com a ora
adotada. Diferentemente da licença prêmio, aqueloutra licença não assegura estabilidade
financeira ao servidor comissionado, o qual, na hipótese de exoneração por necessidade
do serviço, não fará jus a prestação pecuniária compensatória. Nesse sentido, a licença
por motivo de doença em pessoa da família assemelha-se, teleologicamente, mais às
hipóteses legais de ausências justificadas por motivo socialmente relevante.
77.
Por certo, a Lei Complementar nº. 68, de 1992, quando restringiu o direito à
licença prêmio aos titulares de cargos de provimento efetivo, ainda que provisoriamente
ocupantes de cargo ou função de confiança, não incorreu em ofensa ao postulado da
isonomia. Primeiramente, com amparo nas lições do ilustre Celso Antônio Bandeira de
Melo, verifica-se que o fator de discrímen – a temporariedade e instabilidade da
investidura (artigo 37, V, da CRFB/1988) – foi considerado relevante pelo próprio texto
expresso da Constituição Federal, quando sujeitou ao regime geral de previdência social o
“servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão declarado em lei de livre
nomeação e exoneração bem como de outro cargo temporário ou de emprego público”
(artigo 40, §13º, da CRFB/1988). Ou seja, a concessão de tratamento jurídico
78.
12
Mesmo sem examinar detidamente os precedentes citados pelo Conselheiro Relator, verifica-se
que algumas decisões colhidas foram proferidas ao examinar controvérsias que envolviam servidores
que ocupavam simultaneamente cargo efetivo e cargo em comissão, situação diversa da contida nos
questionamentos formulados pelo consulente, que restringiu a consulta aos servidores ocupantes
exclusivamente de cargo em comissão. Por esse motivo, nem sempre é possível estabelecer
corretamente a analogia, por falta de suficiente semelhança do contexto fático.
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diferenciado, por motivo da temporariedade do provimento, partiu da própria
Constituição Federal.
O critério de distinção é racionalmente condizente com a desigualação
realizada, porque a licença prêmio gera uma estabilidade financeira provisória, o que não
é compatível com a precariedade do provimento e a instabilidade do liame jurídico do
servidor com a Administração Pública. Repare-se que, a título de exemplo, o Tribunal
Superior Eleitoral pacificou o entendimento de que não “se aplica aos titulares de cargos
em comissão de livre exoneração o direito ao afastamento remunerado de seu exercício,
nos termos do artigo 1º, II, “l”, da Lei Complementar nº. 64/90, devendo exonerar-se do
cargo no prazo de 3 (três) meses antes do pleito” (Consulta nº. 597 – Resolução nº.
20.610 de 02/05/2000 – Relator: Min. Maurício José Corrêa – Revista de Jurisprudência
do TSE, Volume 12, Tomo 1, Página 382). Vale observar que, nesse caso, o texto da
norma federal também não excluiu os servidores exclusivamente comissionados 13 .
79.
Pelo exposto, pode-se concluir que, na hipótese examinada, a desigualação
feita pela legislação infraconstitucional ao restringir a licença prêmio aos servidores
titulares de cargo de provimento efetivo é constitucionalmente mandatória, e não
facultativa, a fim de assegurar o princípio do livre provimento dos cargos em comissão.
Solução outra não poderia ser admitida, sob pena de a legislação infraconstitucional dar
tratamento igual a agentes públicos considerados desiguais à luz da própria Constituição
Federal.
80.
A desigualação decorre, pois, de princípios e regras constitucionais
federais uniformizadores (Capítulo VII do Título II da CRFB/1988), ou seja, normas
constitucionais de observância obrigatória, as quais servem, inclusive, de guia para a
criação e interpretação da legislação infraconstitucional. Diante do exposto, não se pode
deixar de concluir que admitir que a concessão licença prêmio por assiduidade aos
servidores exclusivamente ocupantes de cargo em comissão constituiria privilégio não
racionalmente justificado à luz dos interesses jurídicos em jogo.
81.
Por certo, as limitações e condições lhe são próprias à sua condição não
significam que o servidor comissionado será reduzido à condição de “escravo”, como
sugere o relator. Eventualmente limitações não impedem, de outro lado, aos servidores
exclusivamente comissionados usufruírem os direitos trabalhistas e previdenciários
constitucionalmente assegurados, indistintamente, a todos os trabalhadores da
ordem econômica ou da Administração Pública, tais como o direito ao afastamento
remunerado nas hipóteses da licença paternidade, licença à gestante e férias anuais (CF,
82.
13
“Art. 1º São inelegíveis: II - para Presidente e Vice-Presidente da República: l) os que,
servidores públicos, estatutários ou não, dos órgãos ou entidades da Administração direta ou indireta da
União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e dos Territórios, inclusive das fundações
mantidas pelo Poder Público, não se afastarem até 3 (três) meses anteriores ao pleito, garantido o direito
à percepção dos seus vencimentos integrais”.
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arts. 39, §3º, e 7º, XVII a XIX), a irredutibilidade nominal da remuneração, revisão geral
anual dos vencimentos sem distinção de índices (CF, artigo 37, X e XV), além da
proteção do sistema de seguridade social em eventos relacionados à invalidez, doença,
acidente de trabalho, maternidade, desemprego voluntário, dentre outros (CF, artigos 40,
§3º, e 201).
Além do mais, por exercerem função de direção, chefia e assessoramento
superior, os órgãos e entidades públicas, de acordo com as suas condições financeiras,
costumam retribuir pecuniariamente o servidor comissionado em função do incremento
extraordinário de atribuições e responsabilidades. Assim, em abstrato, não há se cogitar
em desequilíbrio comutativo entre a prestação laboral do servidor exclusivamente
comissionado e a contraprestação estatal, muito menos em precarização ou “subhumanização” de suas condições laborais.
83.
Dessa forma, depois de examinar exaustivamente a questão, não foi
localizado um argumento decisivo que justifique a mudança do entendimento
consubstanciado na Decisão nº. 28/2012 – CSA. Pelo contrário, nesta oportunidade a
discussão foi bastante aprofundada e foram encontrados novos e melhores argumentos, o
que corrobora a ideia de que a divergência sincera é frutífera.
84.
À guisa de conclusão, convêm consolidar didaticamente os fundamentos
jurídicos que devem orientar a decisão normativa desta Corte em resposta aos
questionamentos formulados, o que, para evitar maior enfado, será feito em breves linhas.
85.
a)
A licença prêmio, hipótese legal de afastamento remunerado das
funções públicas, caracteriza-se como típica sanção premial destinada a estimular e
promover a adoção de determinado comportamento desejado pela ordem administrativa: a
assiduidade dos servidores públicos. A sua aplicabilidade aos servidores titulares,
exclusivamente, de cargo em comissão não atende à finalidade social da lei, porque esses
agentes públicos podem ser exonerados ad nutum, sempre que o desempenho não se
revelar satisfatório.
b)
A interpretação sistemática da Lei Complementar nº. 68, de 1992
evidencia que o diploma legislativo pecou, por falta de técnica jurídica, ao utilizar
indiscriminadamente os termos genéricos “servidor” e “cargo”, sem indicar a natureza da
investidura, inclusive para normatizar institutos típicos e exclusivos de servidor ocupante
de cargo de provimento efetivo – a exemplo dos artigos 22, 31, 45, 116, VI, 128, 120 e
231. A omissão do legislador em indicar a natureza da investidura na cabeça do artigo
123 não pode autorizar uma interpretação extensiva, porque essa solução exegética não
vence o teste de generalização. Não se pode pretender fazer interpretação sistemática aos
retalhos, colhendo-se apenas o que convém ao próprio intérprete.
c)
A análise topológica de dispositivos e dos institutos mencionados na
Seção VI do Capítulo IV do Título III demonstra, conclusivamente, que o destinatário da
norma concessiva da licença prêmio mencionado na cabeça do artigo 123 do diploma
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legal complementar deve ser necessariamente o servidor titular de cargo de provimento
efetivo. Somente os ocupantes de cargo de provimento efetivo podem acumular
licitamente mais de um cargo público (artigo 124), filiar-se ao regime próprio de
previdência social (parágrafo único do artigo 123 e caput do artigo 127), bem como
acumular um “cargo” público e uma “função” gratificada (parte final do caput do artigo
123).
d)
A instabilidade e temporariedade inerente à investidura dos ocupantes
de cargos de confiança e as atribuições constitucionalmente reservadas a esses cargos –
direção, chefia e assessoramento superior – constituem modelo constitucionalmente
impositivo aos entes políticos (artigo 37, II, parte final, e V, da CRFB/1988), não
podendo ser excepcionada senão por outra norma de estatura constitucional federal. A
estabilidade provisória gestacional é a única hipótese que excepciona o vínculo precário
do servidor comissionado, por força do artigo 10, II, “b”, do ADCT. Portanto, não se deve
admitir que a legislação infraconstitucional crie novas hipóteses de estabilidade financeira
provisória ou mecanismos compensatórios à exoneração imotivada dos servidores
comissionados, o que contraria a competência discricionária inerente à investidura dos
cargos de confiança.
e)
A licença prêmio, prevista no artigo 123 da Lei Complementar nº. 68,
de 1992, não pode ser concedida aos servidores ocupantes, exclusivamente, de cargo em
comissão, porque constitui hipótese legal de estabilidade financeira provisória passível de
ser gozada durante a investidura e mesmo após a desconstituição do vínculo, mediante
prestação pecuniária compensatória, o que caracteriza ampliação legal das hipóteses
constitucionais excepcionais de estabilidade financeira provisória de servidores não
titulares de cargo de provimento efetivo. Aplicação, por analogia, das razões de decidir da
ADI nº. 199-0 (Supremo Tribunal Federal, Relator: Ministro Maurício Corrêa).
f)
A legislação estadual, quando restringe o direito à licença prêmio por
assiduidade aos titulares de cargos de provimento efetivo, ainda que provisoriamente
ocupantes de cargo ou função de confiança, não incorre em ofensa ao postulado
constitucional da isonomia. A desigualação feita pela legislação infraconstitucional é
constitucionalmente mandatória, a fim de assegurar o princípio do livre provimento dos
cargos em comissão, já que a licença prêmio gera uma estabilidade financeira provisória,
o que não é compatível com a precariedade da investidura do servidor comissionado com
a Administração Pública.
g)
Em abstrato, não há se cogitar em desequilíbrio comutativo entre a
prestação laboral do servidor exclusivamente comissionado e a contraprestação estatal.
Os servidores exclusivamente comissionados usufruem todos os direitos trabalhistas e
previdenciários constitucionalmente assegurados, indistintamente, a todos os
trabalhadores da ordem econômica ou da Administração Pública. Além disso, esses
agentes públicos, por exercerem função de direção, chefia e assessoramento superior, são
remunerados pecuniariamente pelo incremento extraordinário de atribuições e
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responsabilidades, de acordo com as condições financeiras dos órgãos e entidades
públicas.
Portanto, em consonância com o Ministério Público de Contas, a consulta
deve ser respondida no sentido de que o direito à licença prêmio, prevista no artigo 123
da Lei Complementar nº. 68, de 1992, não é extensível ao servidor titular,
exclusivamente, de cargo em comissão.
86.
Especificamente em relação ao segundo questionamento, qual seja, a
contagem, para aquisição da licença prêmio, do tempo de serviço prestado no exercício de
cargo de comissão ocupado anteriormente a uma investidura em cargo de provimento
efetivo, a razão também está com o Ministério Público de Contas, que opinou pela
impossibilidade do cômputo, “tendo em vista não haver autorização legal expressa no
estatuto que rege os servidores públicos do Estado de Rondônia”. Convém, examinar
mais analiticamente esse questionamento, porque é comum haver muita confusão quando
se trata da mudança de cargos por provimento originário.
87.
A investidura em cargo efetivo, por aprovação em concurso público, ainda
que o servidor tenha ocupado cargo em comissão no mesmo órgão ou entidade,
caracteriza provimento originário, sujeito a novo regime jurídico. Somente há se falar em
direito adquirido, quando houver à época plena subsunção do fato à hipótese normativa da
lei vigente. Logo, somente há se reconhecer direito à licença prêmio do servidor ocupante
de cargo de provimento efetivo, quando inteiramente aperfeiçoados os requisitos legais,
notadamente, na hipótese examinada, o tempo de serviço público estadual quinquenal
ininterrupto. Antes disso, há mera expectativa de direito e a nova investidura originária
interrompe-a.
88.
Considerando especificamente a hipótese examinada, se a Lei Complementar
nº. 68, de 1992, não dispensou ao servidor exclusivamente comissionado o direito à
licença prêmio, enquanto perdurar a investidura precária não possui ele, sequer, a
expectativa de direito. E o respectivo tempo de serviço prestado sob a égide dessa
investidura precária permanecerá a ser juridicamente indiferente para a aquisição da
licença prêmio, ainda que o servidor venha a posteriormente ocupar cargo de provimento
efetivo, por aprovação em concurso público, salvo se o novo regime jurídico,
excepcionalmente, autorizar a sua retroação sobre os fatos anteriores à investidura. Ora,
por regra, os atos praticados durante a investidura anterior continuarão a ser ditados pelas
regras pertinentes àquele regime jurídico: o fato jurídico rege-se pela norma então vigente
(“tempus regit actum”).
89.
90.
Noutras palavras, em sendo a retroatividade das leis situação excepcional, a
eficácia jurídica do novo regime jurídico, decorrente de investidura originária em cargo
de provimento efetivo, não pode retroagir sobre fatos e atos pretéritos, salvo se,
excepcionalmente, houver previsão expressa em sentido contrário. Logo, por regra, a
contagem do tempo de serviço público estadual, para fins de aquisição de licença prêmio,
dar-se-á a partir de cada provimento originário em cargo efetivo estadual. Conclusão
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diversa poderá ser admitida se houver, em lei formal, previsão em sentido contrário, isto
é, quando houver norma jurídica que autorize expressamente a contagem de tempo de
serviço anterior ao provimento.
91.
Ora, como bem notou o Ministério Público de Contas, a Lei Complementar
estadual nº. 68, de 1992, de fato, autorizou expressamente a contagem “do tempo de
serviço prestado ao Estado de Rondônia, sob o regime celetista, dos atuais servidores
regidos por esta Lei Complementar”, “para efeito de anuênio e licença prêmio por
assiduidade” (artigo 297). Trata-se de norma de eficácia exaurível com o transcorrer do
tempo – inserida no Capítulo Único do Título VIII, intitulado Das Disposições Gerais e
Transitórias –, pois, é especificamente aplicável aos servidores que estavam vinculados à
Administração estadual no momento da promulgação da referida lei complementar. O
propósito histórico da norma, como regra de transição, era evitar solução de continuidade
na mudança do regime jurídico, pois, como é de conhecimento geral, muitos servidores
públicos estaduais, antes da Constituição Federal de 1988 e da obrigatoriedade do regime
jurídico único, sujeitavam-se ao regime contratual (celetista). Aliás, a Lei Complementar
nº. 39, de 1990, também possuía previsão semelhante (artigo 282).
92.
Consequentemente, ao disciplinar a licença prêmio, a legislação estadual
admitiu tão somente a contagem retroativa do tempo de serviço prestado ao Estado pelos
servidores sujeitos ao regime celetista e pertencentes ao quadro de pessoal, em 9 de
novembro de 1992, quando da promulgação do novo estatuto. Essa hipótese normativa
não alcança os servidores titulares, exclusivamente, de cargo de confiança que,
posteriormente, vieram a, por aprovação em concurso público, ocupar cargo de
provimento efetivo estadual. São situações substancialmente diversas.
A retroação da lei deve ser realizada apenas na medida e no aspecto em que
for expressamente determinado, pois as normas de exceção devem ser interpretadas
restritivamente. Portanto, é forçoso concluir que não há previsão legal para a contagem
retroativa do tempo de serviço público estadual do servidor exclusivamente comissionado
anterior ao provimento originário em cargo efetivo estadual.
93.
Além do mais, a considerar que o propósito da licença prêmio é incentivar e
promover o dever funcional de assiduidade do servidor e evitar a atuação dos mecanismos
repressivo-disciplinares, conforme já discorremos alhures (§§ 25 a 29 deste voto), cabe
ponderar: qual o sentido de a legislação assegurar ao servidor recém-investido em cargo
de provimento efetivo adquirir, logo após a nova investidura, o direito ao benefício,
utilizando tempo de serviço pretérito à investidura? Ora, o tempo de serviço quinquenal
ininterrupto é período de prova definido pela lei para avaliar a assiduidade do servidor
ocupante de cargo efetivo, para fins de licença prêmio, razão pela qual computar tempo
pretérito à investidura originária, sem autorização legal, contraria a aspecto teleológico do
instituto.
94.
95.
Aliás, admitir-se o cômputo indiscriminado de tempo de serviço anterior ao
provimento em cargo efetivo, caracteriza situação paradoxal: o servidor, ao utilizar tempo
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de serviço pretérito à investidura, poderia, logo após o provimento, fazer jus à licença
prêmio, que pressupõe avaliação de sua assiduidade em período de prova quinquenal,
antes mesmo de adquirir a estabilidade funcional no cargo efetivo, que pressupõe também
a avaliação da assiduidade no cargo ocupado em período de prova trienal (artigo 28, §1º,
I). A interpretação da lei não deve conduzir ao absurdo, desconsiderando a
sistematicidade inerente à ordem jurídica.
Outra é a situação do servidor titular de cargo efetivo estadual nomeado para
ocupar cargo de provimento em comissão ainda no âmbito da Administração Pública
estadual. Nesse caso, a própria Lei Complementar nº. 68, de 1992, expressamente,
considerou “como efetivo exercício” os afastamentos decorrentes do “exercício de cargo
de provimento em comissão na Administração Direta, Autárquica ou em Fundações
instituídas pelo Estado de Rondônia” (artigo 138, IV). Portanto, o exercício de cargo de
confiança estadual por servidor titular de cargo de provimento efetivo não caracteriza
interrupção do tempo de serviço público estadual quinquenal exigido pelo caput do artigo
123. Noutras, palavras, admite o estatuto, para aquisição da licença prêmio, a contagem
do tempo de serviço prestado em cargo de confiança na Administração estadual
posteriormente à investidura em cargo de provimento efetivo.
96.
Em face do exposto, em consonância com o Ministério Público de Contas,
submete-se ao Pleno a seguinte proposta de decisão:
I.
regimentais;
Conhecer a consulta, por preencher os requisitos legais e
II.
No mérito, em resposta aos questionamentos, proferir decisão
normativa conforme parecer prévio anexo; e
III.
Notificar a autarquia consulente, o Departamento Estadual de
Trânsito, encaminhando-lhe cópia da decisão e do parecer prévio, informando-lhe que os
votos poderão ser consultados nos próprios autos ou na consulta processual do sítio
eletrônico oficial do Tribunal (www.tce.ro.gov.br).
IV.
Autorizar o arquivamento dos presentes após o trânsito em julgado.
É como voto.
Sala das Sessões, 11 de julho de 2013.
PAULO CURI NETO
Conselheiro Revisor
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Processo
Unidade
Assunto
Consulente
Relator
Revisor
Sessão
: 734/2013
: Departamento Estadual de Trânsito – Detran
: Consulta - Concessão de licença prêmio a servidores ocupantes
exclusivamente de cargo em comissão
: João Maria Sobral de Carvalho
: Conselheiro Edilson de Sousa Silva
: Conselheiro Paulo Curi Neto
: 11 de julho de 2013
Proposta de Parecer Prévio
O TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE RONDÔNIA, em Sessão
Ordinária realizada em … de … de 2013, nos termos do artigo 1º, XVI, § 2º, da Lei
Complementar n. 154/96, combinado com os artigos 83 e 173 do Regimento Interno e
com os artigos 1° e 2° da Resolução Administrativa n° 016/TCER/04, conhecendo da
consulta formulada pelo Departamento de Trânsito Estadual, acerca da possibilidade de
concessão de licença prêmio por assiduidade aos servidores ocupantes, exclusivamente,
de cargos em comissão, bem como acerca da possibilidade de contagem do tempo de
serviço público estadual relativo a cargo de confiança exercido no âmbito da
Administração direta, autárquica e fundacional do Estado de Rondônia, antes da
investidura em cargo de provimento efetivo, em consonância com o voto do Conselheiro
Revisor Paulo Curi Neto, vencido o Conselheiro Relator Edilson de Sousa Silva,
Considerando que a licença prêmio, hipótese legal de afastamento
remunerado das funções públicas, caracteriza-se como típica sanção premial destinada a
estimular e promover a adoção de determinado comportamento desejado pela ordem
administrativa: a assiduidade dos servidores públicos, concluiu-se que a sua
aplicabilidade aos servidores titulares, exclusivamente, de cargo em comissão não atende
à finalidade social da lei, por esses agentes públicos não gozarem de estabilidade,
podendo ser exonerados ad nutum, sempre que o desempenho não se revelar satisfatório;
Considerando que a interpretação sistemática da Lei Complementar nº. 68,
de 1992 evidencia que o diploma legislativo pecou por falta de técnica ao utilizar
indiscriminadamente os termos genéricos “servidor” e “cargo”, sem indicar a natureza da
investidura, inclusive para normatizar institutos típicos e exclusivos de servidor ocupante
de cargo de provimento efetivo – a exemplo dos artigos 22, 31, 45, 116, VI, 128, 120 e
231), concluiu-se que a omissão do legislador em indicar a natureza da investidura não
pode autorizar uma interpretação extensiva, já que essa solução exegética não passa pelo
teste de generalização;
Considerando que somente os agentes públicos integrantes do quadro
permanente da Administração Pública podem acumular licitamente mais de um cargo
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público (artigo 124), filiarem-se ao regime próprio de previdência social (parágrafo único
do artigo 123 e caput do artigo 127) e acumular um cargo público e uma função
“gratificada” (parte final do caput do artigo 123), concluiu-se que a análise topológica de
dispositivos e dos institutos mencionados na Seção VI do Capítulo IV do Título III
demonstra que o destinatário da norma concessiva da licença prêmio mencionado na
cabeça do artigo 123 do diploma legal complementar deve ser necessariamente o servidor
titular de cargo de provimento efetivo;
Considerando que a instabilidade e temporariedade inerente à investidura
dos ocupantes de cargos de confiança e as atribuições constitucionalmente reservadas a
esses cargos – direção, chefia e assessoramento superior – constituem modelo
constitucionalmente impositivo aos entes políticos (artigo 37, II, parte final, e V, da
CRFB/1988), não podendo ser excepcionada senão por outra norma de estatura
constitucional federal, concluiu-se que não se deve admitir que a legislação
infraconstitucional crie novas hipóteses de estabilidade financeira provisória ou
mecanismos compensatórios à exoneração imotivada dos servidores comissionados, o que
contraria a competência discricionária inerente à investidura dos cargos de confiança;
Considerando que a licença prêmio, prevista no artigo 123 da Lei
Complementar nº. 68, de 1992, assegura o afastamento remunerado trimestral ou
pagamento de verba indenizatória de caráter compensatório, concluiu-se que a referida
licença constitui hipótese legal de estabilidade financeira provisória passível de ser
gozada durante a investidura e mesmo após a desconstituição do vínculo, mediante
prestação pecuniária compensatória;
Considerando que a estabilidade provisória gestacional é a única hipótese
reconhecida pela jurisprudência que excepciona o vínculo precário do servidor
comissionado, por força do artigo 10, II, “b”, do ADCT, concluiu-se que a licença
prêmio, prevista no artigo 123 da Lei Complementar nº. 68, de 1992, não pode ser
concedida aos servidores ocupantes, exclusivamente, de cargo em comissão, o que
caracterizaria ampliação legal das hipóteses constitucionais excepcionais de estabilidade
financeira provisória de servidores não titulares de cargo de provimento efetivo.
Aplicação, por analogia, das razões de decidir da ADI nº. 199-0 (Supremo Tribunal
Federal, Relator: Ministro Maurício Corrêa);
Considerando que a temporariedade e instabilidade da investidura do
servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão comissionado decorrem de
norma constitucional de observância obrigatória (artigo 37, V, da CF) e que a licença
prêmio gera uma estabilidade financeira provisória, concluiu-se que a desigualação
legislativa, que restringiu a licença prêmio aos servidores titulares de cargo de
provimento efetivo, é constitucionalmente mandatória, a fim de assegurar o princípio do
livre provimento dos cargos em comissão;
usufruem
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Considerando, ainda, que os servidores exclusivamente comissionados
todos os direitos trabalhistas e previdenciários constitucionalmente
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assegurados, indistintamente, a todos os trabalhadores da ordem econômica ou da
Administração Pública e que esses agentes públicos, por exercerem função de direção,
chefia e assessoramento superior, são remunerados pecuniariamente pelo incremento
extraordinário de atribuições e responsabilidades, de acordo com as condições financeiras
dos órgãos e entidades públicos, concluiu-se que, em abstrato, não há se cogitar em
desequilíbrio comutativo entre a prestação laboral do servidor exclusivamente
comissionado e a contraprestação estatal;
Considerando que a Lei Complementar nº. 68, de 1992 não dispensou o
direito à licença prêmio ao servidor titular de cargo de provimento efetivo, concluiu-se
que o servidor exclusivamente comissionado não possui, sequer, a expectativa de direito à
licença prêmio, enquanto perdurar a investidura precária;
Considerando que, por princípio geral do direito, o fato jurídico rege-se pela
norma então vigente (“tempus regit actu”), concluiu-se que os atos praticados e os fatos
ocorridos durante a investidura em, exclusivamente, cargo de confiança continuam a ser
ditados pelas regras pertinentes ao regime jurídico vigente na ocasião;
Considerando que a investidura em cargo efetivo, por aprovação em
concurso público, ainda que o servidor tenha ocupado cargo em comissão no mesmo
órgão ou entidade, caracteriza provimento originário, sujeito a regime jurídico próprio,
concluiu-se que o regime jurídico do cargo efetivo não poderá retroagir sobre fatos e atos
pretéritos;
Considerando que a retroatividade das leis depende de expressa previsão
legal, concluiu-se que, por força da investidura originária e da sujeição a novo regime
jurídico, a contagem do tempo de serviço público estadual, para fins de aquisição de
licença prêmio, somente poderá ser admitida se houver expressa previsão em lei formal;
Considerando que a Lei Complementar nº. 68, de 1992, admitiu em caráter
excepcional, como regra de transição, a contagem retroativa do tempo de serviço prestado
ao Estado pelos servidores sujeitos ao regime contratual-celetista e pertencentes ao
quadro de pessoal quando da promulgação do novo estatuto, ou seja, em 9 de novembro
de 1992 (artigo 297);
Considerando, ainda, que o exercício de cargo em comissão anteriormente ao
provimento originário em cargo efetivo estadual não se enquadra na hipótese excepcional
do artigo 297 da Lei Complementar nº. 68, de 1992, e considerando que a retroação da
lei, norma de exceção que é, deve ser interpretada restritivamente, concluiu-se a
legislação estadual não autorizou a contagem retroativa do tempo de serviço público
estadual decorrente da investidura, exclusivamente, de cargo de confiança anterior ao
provimento originário em cargo efetivo estadual;
Considerando que o tempo de serviço quinquenal ininterrupto é período de
prova definido pela lei para avaliar a assiduidade do servidor ocupante de cargo efetivo,
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para fins de licença prêmio, concluiu-se que o cômputo do tempo pretérito à investidura
originária, sem autorização legal, contrariaria a aspecto teleológico do instituto, qual seja,
o incentivo ao cumprimento do dever funcional de assiduidade do servidor efetivo dentro
do período de prova, evitando a atuação dos mecanismos repressivo-disciplinares;
Considerando que a estabilidade funcional no cargo efetivo pressupõe a
avaliação da assiduidade no cargo ocupado em período de prova trienal (artigo 28, §1º,
I,); considerando que a licença prêmio pressupõe avaliação de sua assiduidade em
período de prova quinquenal (artigo 123); e considerando que a contagem de tempo de
serviço pretérito à investidura poderia acarretar que o servidor, logo após o provimento,
fizesse jus à licença prêmio, concluiu-se que seria paradoxal a possibilidade de o servidor
fazer jus à licença prêmio antes mesmo de adquirir a estabilidade funcional no cargo
efetivo (artigo 28, §1º, I);
Considerando, por fim, que o estatuto legal admite, para aquisição da licença
prêmio, a contagem do tempo de serviço prestado em cargo de confiança na
Administração estadual somente após a investidura em cargo de provimento efetivo
(artigo 138, IV);
RESPONDEU a consulta formulada nos seguintes termos:
I.
A licença prêmio por assiduidade prevista na cabeça do artigo 123 da
Lei Complementar estadual nº. 68, de 1992, é aplicável exclusivamente ao servidor titular
de cargo de provimento efetivo estadual.
II. Nos termos da Lei Complementar nº. 68, de 1992, o tempo de serviço
prestado em exercício de cargo de confiança que anteceder à investidura originária em
cargo de provimento efetivo no âmbito da Administração Pública estadual não deve ser
computado no período de prova quinquenal da licença prêmio por assiduidade. Por força
do artigo 138, IV, da mencionada Lei Complementar, para o aperfeiçoamento do tempo
de serviço quinquenal da licença prêmio, o cômputo do tempo de serviço público estadual
relativo ao exercício de cargo de confiança no âmbito da Administração direta, autárquica
e fundacional do Estado de Rondônia, dar-se-á tão só posteriormente à investidura
originária em cargo de provimento efetivo estadual.
PAULO CURI NETO
Conselheiro Revisor
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