UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURPS
CURSO DE DIREITO
A EVOLUÇÃO DA REABILITAÇÃO CRIMINAL NO BRASIL
IAN ANDREZZO DUTRA
Biguaçu [SC], julho de 2008
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURPS
CURSO DE DIREITO
A EVOLUÇÃO DA REABILITAÇÃO CRIMINAL NO BRASIL
IAN ANDREZZO DUTRA
Monografia submetida à Universidade do
Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito
parcial para a obtenção de grau de Bacharel
em Direito.
Orientadora: Professora M.Sc. Eunice Anisete de Souza Trajano
Biguaçu [SC], julho de 2008
A Maury,
e às Luízas.
AGRADECIMENTOS
Às abnegadas Professoras Eunice Trajano
e Helena Pítsica, que tornaram este trabalho possível.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí –
UNIVALI, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e a Orientadora de toda
e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Biguaçu [SC], 1º de julho de 2008
Ian Andrezzo Dutra
Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente Monografia de Conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do
Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Ian Andrezzo Dutra, sob o título “A Evolução
da Reabilitação Criminal no Brasil”, foi submetida a 19 de junho de 2008 à Banca
Examinadora composta pelas Professoras Eunice Anisete de Souza Trajano, M.Sc.
(Presidenta), Helena Nastassya Paschoal Pítsica, M.Sc., e Marilene do Espírito Santo,
Especialista, e aprovada com a nota 10,0 (dez).
Biguaçu [SC], 1º de julho de 2008
Professora M.Sc. Eunice Anisete de Souza Trajano
Orientadora e Presidenta da Banca
Professora M.Sc. Helena Nastassya Paschoal Pítsica
Coordenadora do Núcleo de Prática Jurídica - NPJ
ELENCO DE REDUÇÕES
Amp.
Ampliada (diz-se de edição de obra)
Art (s).
Artigo (s)
Atual.
Atualizada (diz-se de edição de obra)
Aum.
Aumentada (diz-se de edição de obra)
CF
Constituição Federal
Cf.
Confronte ou Confira
CP
Código Penal
CPP
Código de Processo Penal
Dec.
Decreto
Ed.
Edição
LEP
Lei de Execução Penal
N.
Número
Reest.
Reestruturada (diz-se de edição de obra)
Rev.
Revista (diz-se de edição de obra)
P.
Página
Seç.
Seção
Tir.
Tiragem
Tít (s).
Título (s)
V.
Vide
SUMÁRIO
RESUMO
ABSTRACT
INTRODUÇÃO....................................................................................................1
1 PERÍODO COLONIAL – O DIREITO PENAL DAS ORDENAÇÕES
PORTUGUESAS E A REABILITAÇÃO CRIMINAL....................................3
1.1 DA LIDIMIDADE DA LEVANTADURA HISTÓRICA...... ...................................3
1.1.1 UMA HISTÓRIA DE REPARAÇÃO....................................................................4
1.2 DO DIREITO PENAL DO BRASIL COLONIAL.................. ................................6
1.2.1 O DIREITO PENAL DO DENOMINADO BRASIL HOLANDÊS...............................8
1.3 UM VELHO INSTITUTO....................................................................................9
1.3.1 DA REABILITAÇÃO CRIMINAL NAS ORDENAÇÕES.... .................................10
1.4 AS ORDENAÇÕES, SEU DIREITO PENAL, E REABILITAÇÃO...... ....... .........14
1.4.1 ORDENAÇÕES AFONSINAS.......... ................................................................16
1.4.1.1 DA REABILITAÇÃO CRIMINAL NAS ORDENAÇÕES AFONSINAS.. ............17
1.4.1.2 O DIREITO PENAL DAS AFONSINAS.............. .................. ..........................18
1.4.2 ORDENAÇÕES MANUELINAS.......... ...................... .......................................21
1.4.2.1 DA REABILITAÇÃO CRIMINAL NAS ORDENAÇÕES MANUELINAS.. .........22
1.4.2.2 O DIREITO PENAL DAS MANUELINAS............ ...........................................23
1.4.3 ORDENAÇÕES FILIPINAS.................... .........................................................26
1.4.3.1 DA REABILITAÇÃO CRIMINAL NAS ORDENAÇÕES FILIPINAS.... .............27
1.4.3.2 O DIREITO PENAL DAS FILIPINAS........... .......... ........................................29
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2 PERÍODO IMPERIAL – UM DIREITO PENAL BRASILEIRO, E A
REABILITAÇÃO CRIMINAL........................................................................32
2.1 O DEPERECIMENTO DO DIREITO PENAL DAS FILIPINAS..........................32
2.2 O PODER MODERADOR E A REABILITAÇÃO CRIMINAL............................37
2.3 O CÓDIGO CRIMINAL DO IMPÉRIO...................... .......................................41
2.3.1 DA REABILITAÇÃO NO CÓDIGO CRIMINAL DO IMPÉRIO............................44
2.4 O DIREITO PENAL CRIOULO COMPLETA SEIS DECÊNIOS... ............. ........46
.
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3 PERÍODO REPUBLICANO – DIREITOS E REABILITAÇÕES
CRIMINAIS.......................................................................................................50
3.1 O CÓDIGO PENAL DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL...............................50
3.1.1 A REABILITAÇÃO NO CÓDIGO PENAL DOS ESTADOS UNIDOS DO
BRASIL.................................................................................................................53
3.2 A CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS PENAIS.............. .......................... ..................59
3.2.1 A REABILITAÇÃO CRIMINAL NA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS PENAIS.........62
3.3 O CÓDIGO PENAL DE 1940................... .................. .......................................64
.
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3.3.1 A REABILITAÇÃO NO CÓDIGO PENAL DE 1940............................................67
3.3.1.1 A REABILITAÇÃO DO CÓDIGO PENAL DE 1940 EM SUA REDAÇÃO
PRIMITIVA......................... ......................... .........................................................68
3.3.1.2 A REFORMA DA REABILITAÇÃO CRIMINAL PELA LEI N. 5.467, DE 1968...76
3.3.1.3 A REFORMA PENAL DE 1984 E A REABILITAÇÃO....... .................. ............82
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CONCLUSÃO....................................................................................................93
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .....................................................95
RESUMO
Ideada pelo gênio romano, a Reabilitação Criminal, nascida restitutio in integrum, na
Antigüidade notabilizou-se entre as medidas de soberania, com que eram agraciados os
infratores, por motivos nem sempre os mesmos. Transportada para o Direito francês, que lhe
acelerou o desenvolvimento, daí espraiou-se para diversos sistemas jurídicos, afinal
alcançando o nacional, ressentido de semelhante medida. Por reunir os elementos que
caracterizaram as diferentes fases da Evolução da Reabilitação Criminal no Brasil, esta
monografia pretende situar seus efeitos em quantas foram as conjunturas jurídicas pátrias sob
as quais se fez o instituto mais ou menos presente. Para tanto, a divisão deste trabalho atendeu
a primeira de nossa história: Colônia, Império e República, correspondendo a cada período
um Capítulo. O inicial, desse modo, compreende os primeiros trezentos e tantos anos do
Brasil, em que subserviu sobretudo à metrópole portuguesa, diante de cuja contextura o
exame em busca da primeira fisionomia da Reabilitação fez-se rasteiro. Naturalmente menor,
o segundo Capítulo cobre os sessenta e sete anos de Império brasileiro, honrados por
admirável Código Criminal a ditar o primeiro sistema repressor da nação liberta dos travões
portugueses. O terceiro e último Capítulo insinua-se pelo atual período de nossa história, já
informado por mais de um século de fértil produção jurídica, quando pôde a Reabilitação
enfim prosperar. A peroração, mister é destacar, segue apartada, à maneira de Conclusão.
Finalmente, o produto dessa atividade equilibra-se sobre base lógico-indutiva, e resulta de
pesquisa na qual foi preferido o método indutivo.
Palavras-chave: Direito Penal. Reabilitação Criminal. Evolução do Direito no Brasil.
ABSTRACT
Designed by roman genius, the Criminal Rehabilitation, initially restitutio in integrum,
in the ancient times highlighted among the sovereign measures reserved for law breakers, for
various reasons. In the french law, was very well treated, for wich reason it was embraced by
many other legal systems, including the brazilian, who also needed a similar measure.
Collecting the basic elements that marked the different stages of evolution of the Criminal
Rehabilitation in Brazil, this monograph aims to situate the effects of this measure in the
accordance with the legal systems that have adopted it. For this purpose, the division of work
was made in agreement with the division of the great brazilian history: Cologne, Empire and
Republic period, deserving each one a Chapter. The first of them, because it includes more
than three hundred early years of Brazil, where it remained escravized by the portuguese
colonizers, brings a very carefully exam in search for the first Criminal Rehabilitation. The
second Chapter, smaller than the others, naturally, comprises the sixty-seven years of the
Empire of Brazil, when an excellent Criminal Code done the first repressive order of the
country, which then was free. The third and final Chapter walks by the current period of the
brazilian history, which already has more than one hundred years and many legal works,
when finally the Criminal Rehabilitation could thrive. The final part of this research is
separated from the others, and can be considered a conclusion of entire work. Finally, the
result obtained, founded in logical-inductive base, came from an study that was developed by
inductive method.
Keywords: Criminal Law. Criminal Rehabilitation. Evolution of law in Brazil.
INTRODUÇÃO
I – Concebidas a desoras, as linhas que aqui seguem sobre a Reabilitação decerto irão
desaprazer ao estudioso da Ciência Penal. Afeito à meditação serena e demorada em suas
incursões pelo terreno do delito, da punibilidade, da pena, da culpabilidade, e mais institutos
que a conformam, se lhe depara agora arrumadela das mais ordinárias dos registros e
elementos que dão notícia sobre a evolução de um daqueles, no Brasil.
Para tanto, a divisão desse trabalho atendeu a primeira de nossa história: Colônia,
Império e República, de seu sistema penal partindo a análise da Reabilitação. Situada,
pretendêramos que melhor pudesse justificar-se em meio ao canhoneio a que a doutrina sói
submeter-lhe.
A cada período correspondeu um Capítulo:
O inicial compreende os primeiros trezentos e tantos anos de nossa história, em que
subservimos à metrópole portuguesa das Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas, e,
ligeiramente, aos batavos, animados pela conquistação do nordeste brasileiro. O
esquadrinhamento da Reabilitação Criminal nessa tessitura fez-se rasteiro, em busca de
quaisquer laivos que compusessem sua primeira fisionomia. Friável, a forma conseguida não
espelha só a mediocridade do autor desprendado: não havia mesmo lugar para a Reabilitação
no Direito Penal das Ordenações portuguesas;
Naturalmente menor, o segundo Capítulo cobre os sessenta e sete anos de Império
brasileiro, dos quais quarenta e nove foram dedicados ao segundo reinado da nação
independente, então guarnecida de admirável Direito Penal. Com o deperecimento do sistema
das Ordenações Filipinas, danado pelo clarão da racionalidade que lhe esboroara além-mar,
afinal teve a cultura brasileira a ocasião de acudir à justiça e ao Direito com um Código
Criminal, em continuidade ao trabalho encetado pela liberal Constituição de 1824 – modelo
para a reorganização jurídica do velho Portugal, como aquele. Nesses primeiros seis decênios
de Direito Penal indígena, contudo, novos obstáculos sustiveram o evolver da Reabilitação
em terras brasileiras, que, à custa ainda de outras medidas, pouco avançou;
2
O terceiro e último Capítulo insinua-se pelo atual período de nossa história, informado
por mais de um século de fértil produção jurídica, no qual o câmbio da ordem penal constitui
retoque de quase todo movimento político que tomou a si as rédeas do país, de modo nem
sempre democrático. Os sistemas penais de 1890, 1940 e 1984 – todos republicanos, mas nem
todos pertencentes à mesma República –, o comprovam. E a Reabilitação Criminal, de mero
debuxo que fora até o advento dessa forma de governo, afinal granjeou a preocupação do
Brasil desasnado.
A peroração, mister é destacar, segue apartada do último Capítulo, à maneira de
Conclusão.
II – Tratando-se este trabalho de atividade acadêmica, reputam-se imprescindíveis as
seguintes observações:
O autor dele desincumbe-se com o objetivo institucional de obter grau de bacharel em
Direito perante a Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI; com o geral de desvelar os
sucessos que assinalaram a evolução da Reabilitação Criminal no Brasil; e com o específico
de justificar os caracteres do instituto ante os sistemas revogados e vigente de Direito Penal
pátrio.
O método indutivo foi empregado na fase de investigação do tema em apreço, e o
produto dessa atividade equilibra-se sobre base lógico-indutiva.
No curso de toda a pesquisa, foram levadas a efeito as técnicas do referente e da
pesquisa bibliográfica.
CAPÍTULO 1
PERÍODO COLONIAL – O DIREITO PENAL DAS
ORDENAÇÕES PORTUGUESAS E A REABILITAÇÃO CRIMINAL
1.1 DA LIDIMIDADE DA LEVANTADURA HISTÓRICA
O tempo, esse sobranceiro, que não condescende ou é dado a volteios, cedeu o passo
ao homem no instante em que este contemplou o que de rematado havia. E então seguiram
juntos.
Daí a História; daí a lida com o tempo, compreendido em horas, séculos, eras, épocas.
E o período, que bem serve ao volver, dista uns dos outros, sem o qual não seriam nem uns,
nem outros; tanto mais quanto serve ao presente, que passa a ser entendido, e ao porvir, que se
quer melhor.
Não se afigura possível – como se tem dito! – a real assimilação, a assimilação em sua
inteireza, de tal ou qual elemento ou instituto do saber humano, senão através do cotejo, da
acaroação de seus momentos. Ainda que um represente o mero instante anterior: é razão,
contudo, do que se lhe seguiu, sob seu influxo.
Que dizer, então, do Direito, que rebentara naturalmente muito dantes de ser
anunciado como dogma, de ser posto como tal?; do Direito, de fundas raízes, que tem nos
pendores humanos o alicerce de sua existência?; desses mesmos pendores, que alteram cursos,
que cunham sua marca no fluxo contínuo do tempo, separando-o em episódios?
Sobretudo o Direito, como expressão ingênita do convívio social, o Direito não pode
ser compulsado por mãos trôpegas, vacilantes – inevitáveis, entretanto, sob o luzir um só
archote, bruxuleante, tíbio, mesquinho, quase tragado pela escuridão.
4
Pode o Direito ser arrostado hoje, sem depor a bagagem que traz a tiracolo? Para
Miguel Reale,
a historiografia é o espelho no qual o homem temporalmente se contempla,
adquirindo plena consciência de seu existir, de seu atuar. Qualquer conhecimento do
homem, por conseguinte, desprovido da dimensão histórica, seria equívoco e
mutilado. O mesmo se diga do conhecimento do direito, que é uma expressão do
viver, do conviver do homem. 1
Posto que informada por outros recursos, não há compreensão verdadeira do Direito,
ou de instituto jurídico, sem levantadura histórica.
1.1.1 Uma História de Reparação
A dimensão histórica é poderoso recurso contra retrocessos sociais. À iminência de
seus pestíferos efeitos, ou sob seus sinais, adverte a História, ao mesmo tempo em que
descobre as medidas e soluções que os achanaram, ou, ao menos, que malograram na empresa
de os achanar.
Em relação ao Direito Penal, dada sua gravidade, esse atributo tresdobra em
importância. Como bem expende Aníbal Bruno,
o Direito Penal, como qualquer Direito, não é uma construção isolada no tempo. É
um produto histórico, que deriva de longa evolução de instituições penais e contém
em si mesmo, em potencial, elementos de transformações futuras. E como fenômeno
historicamente condicionado, incorporado a uma extensa tradição, a forma que
assume em um momento determinado só pode ser bem entendida, no seu sentido
geral e em cada uma das suas instituições, quando posta em referência com os seus
antecedentes históricos.
Daí a influência que pode ter sobre as construções do Direito Penal e o seu bom
entendimento a história dos vários institutos e sistemas penais. E essa visão da
continuidade histórica do fenômeno penal mantém viva aos olhos do criminalista a
realidade político-social em que o Direito assenta, o que pode ainda contribuir para
coibir a lógica jurídica nos seus extravios para o formalismo. 2
1
REALE, Miguel. Teoria tridimensional do direito: situação atual. 5. ed., rev., reest. e aum. São
Paulo: Saraiva, 1994. p. 80.
2
BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral: tomo 1º: introdução: norma penal: fato punível. 3. ed., 2.
tir. Rio de Janeiro: Forense, 1978. p. 45.
5
Fosse relevada essa perspectiva em certas épocas, precavendo-se à consolidação de
certos regimes, na idéia de certos povos, fosse a perspectiva histórica fiel da balança perante
quantos virgens páramos descortinaram-se às vistas dos governos, muitos direitos penais
nefários, inidôneos, ou atrasados e ilegítimos, porque inadequados à sua época, muitos
haveriam sido devidamente relegados.
Esse apenas um dos préstimos de se analisar a evolução do Direito Penal, ou de
instituto que o informa. Outro, de menor fôlego, conforma-se em coligir e anotar as várias
formas, os vários momentos, desse quadro irrompendo a exata posição, a adequação, ou falta
de, de que se examina.
A Reabilitação Criminal, aqui, recebe esse último.
Se a história do direito penal é a história da humanidade, como pretendeu Edgard
Magalhães Noronha, ditando a epígrafe de um sem número de ensaios sobre o tema, 3 a da
Reabilitação – entendido o instituto amplamente, como relocação do infrator por entre as
mais extremas margens do Direito – avista o empenho da humanidade em reparar o direito
penal.
É a situação que basta para se compreender por que não pode a Reabilitação, de
qualquer época, ser perscrutada senão engastada à contextura do sistema penal respetivo. Pela
mesma razão, esta justificará a imprevisão ou estreiteza da medida, quando assim houver se
dado; justificada está, porém, a revista do Direito Penal algures sem alusão direta à
Reabilitação Criminal.
Essa metanóia não seria mesmo revelada sem o arranjo de todas as suas construções,
sem o ir-se na esteira de sua evolução.
Entra o presente exame pelas Ordenações vigentes em Portugal ao tempo em que o
Brasil formava um Reino Unido, primeiros registros legais desse torrão americano, porque do
direito que cá se praticara até essa formação, do direito ensaiado pelos brasileiros adâmicos se
não tem retrato rigoroso que permita o garimpo em busca da Reabilitação Criminal.
3
NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal: volume 1: introdução e parte geral. 34. ed., atual. por
Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 20.
6
1.2 DO DIREITO PENAL DO BRASIL COLONIAL
O período colonial do Brasil, grosso modo, vai de seu descobrimento à sua
emancipação; de 1500 a 1822. Então se não podia falar em Direito brasileiro, considerada a
servidão do novo mundo à metrópole portuguesa. Esta, ao longo daquele intervalo, governou
segundo os ditames de três Ordenações, nesta ordem: Afonsinas, Manuelinas e Filipinas. As
primeiras foram baixadas em 1446, 4 e assistiram ao descobrimento do Brasil. Foram
substituídas em 1521 5 pelas Manuelinas, em cuja vigência os contornos da Nova Lusitânia
4
A datação de 1446 é praticamente unânime entre tantos quantos se dignaram a consigná-la. Zaffaroni e
Pierangeli, no entanto, com destaques nossos, concedem que “o trabalho só ficou concluído em 28.07.1446, na
vila da Arruda. Determinou-se, então, que uma junta revisasse o trabalho executado [...]. Algumas alterações
foram introduzidas e as Ordenações, com o nome de Afonsinas, vieram a público, provavelmente, no mesmo ano
de 1446, ou, no ano seguinte, por ordem do Infante D. Pedro, em nome de D. Afonso V” (PIERANGELI, José
Henrique; ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 5. ed. rev. e atual. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 192-3).
Em todas as edições (paginadas estas: 1. ed., 3. tir., p. 71; 3. ed., 2. tir., p. 68; 16. ed., p. 105; 19. ed., p.
104; 20. ed., p. 104; 21. ed., p. 107; 22. ed., p. 111; 23. ed., p. 111) de sua Teoria Geral do Processo, Antônio
Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco marcam o ano de 1456, no que
entendemos tratar-se de piolho (São Paulo: Malheiros, 1976, 1983, 2000, 2003, 2004, 2005, 2006 e 2007,
respetivamente).
Entre os muitos que não na questionaram: PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti.
Comentários ao código de processo civil: tomo VI: arts. 476-495. Rio de Janeiro: Forense, 1974 ou 1975. p.
191; BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa: volume XXIX: 1902: tomo III: réplica. Rio de
Janeiro: Ministério da Educação e Saúde, 1953. p. 220; TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo
penal: 1º volume. 29. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 180; PEREIRA, Caio Mário da Silva.
Instituições de direito civil: volume 1: introdução ao direito civil: teoria geral de direito civil. 21. ed. rev. e
atual. por Maria Celina Bodin de Moraes. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 81; DOTTI, René Ariel. Curso de
direito penal: parte geral. 2. ed. rev., atual. e amp., 2. tir. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 180.
5
A datação de 1521 é a que geralmente consta dos apanhados históricos que correm impressos; assinala
o texto definitivo das Manuelinas, a partir do qual seriam finalmente observadas, desde sua primeira aparição.
Aníbal Bruno (BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral: tomo 1º: introdução: norma penal: fato punível.
1978. p. 170, nota de rodapé 1) relata que, “concluída a obra, foi impressa em 1512, depois em edição mais
correta, em 1514, e, revista [...] por mais sete anos, foi finalmente publicada em 1521, recebendo o nome de
Ordenações Manuelinas.”
Zaffaroni e Pierangeli (PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de direito
penal brasileiro: parte geral. 2004. p. 194-5) inteiram o relato: “[...] a reforma legislativa, realizada às pressas,
não satisfez a expectativa de D. Manuel que, por tal razão, mandou inutilizar todos os exemplares, com exceção
daquele encontrável na Torre de Tombo [...]. Dessarte, quando se fala nas Ordenações Manuelinas, está-se
referindo às Ordenações publicadas a 11.03.1521, justamente aquelas que tiveram aplicação durante grande parte
do século e que foram impressas por Jacobo Cromberger, o Alemão.”
Não há verdadeiramente engano, pois, quando se refere um Magalhães Noronha (NORONHA, Edgard
Magalhães. Direito penal: volume 1: introdução e parte geral. 1999. p. 55) ao ano de 1512; um José Câmara, ao
ano de 1514 (in BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa: volume XVI: 1889: tomo I: queda do
império: diário de notícias. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde, 1947. p. 381, nota de rodapé 27,
parte final); um Mirabete, ao que tudo indica, também a 1512 (MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito
penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP: volume 1. 23. ed. rev. e atual. até 31 de dezembro de 2005 por Renato N.
Fabbrini. São Paulo: Atlas, 2006. p. 24) etc.
7
não foram além de ponteados. Em 1603, 6 no entanto, as Filipinas arrogariam a ordenação de
todas as quinas do Reino, inclusive ultramarinas.
Todas regularam o direito e o processo penal através de seu Livro V, já por força de
tradição, já porque entregavam às matérias praticamente os mesmos conteúdo e estruturação. 7
Do sistema penal das Ordenações Afonsinas não há nota tenha sido efetivamente
executado em terras brasileiras, sobretudo pela desorganização em que se encontrava a
Colônia durante os verdes anos que se seguiram à Descoberta. 8 Os mesmo motivos
conduziram a aplicação rarefeita do sistema das Manuelinas, 9 embora já se houvesse
consciência quando fosse desrespeitado, ou, pelo comum, acerado.
O Direito Penal do Brasil Colonial baralha com o sistema deitado pelo Livro V das
Ordenações Filipinas, 10 e copiosamente modificado até que fosse em definitivo supurado pela
6
A datação de 1603 não sofreu contradita, que saibamos: FARIA, Antonio Bento de. Codigo penal
brasileiro: volume I: noções gerais: interpretação da lei penal: extradição internacional e interestadual. Rio de
Janeiro: Livraria Jacintho, 1942. p. 72; NOGUEIRA, Ricardo Raymundo. Prelecções sobre a historia de
direito patrio: feitas pelo doutor Ricardo Raymundo Nogueira ao curso do quinto anno juridico da universidade
de Coimbra no anno de 1795 a 1796. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1866. p. 31; TOLEDO, Francisco de
Assis. Princípios básicos de direito penal. 5. ed., 13. tir. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 56; THEODORO
JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: volume I: teoria geral do direito processual civil e
processo de conhecimento. 47. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 15 etc.
7
Anotam Zaffaroni e Pierangeli, com nossos destaques, que “os autores são unânimes em exaltar a
importância das Ordenações Afonsinas, principalmente em razão de seu pioneirismo e da época em que ela
surgiu, constituindo-se no ponto de partida para a posterior evolução do direito português, inclusive para as
duas outras ordenações que a sucederam, as quais mantiveram, na essência, o plano das primitivas e se
limitaram a introduzir alterações em diferentes lugares” (PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio
Raúl. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 2004. p. 194).
8
Assis Toledo coloca que, “na verdade, em relação ao Brasil, as Afonsinas não chegaram a ter
aplicação, por ausência de uma organização estatal adequada” (TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios
básicos de direito penal. 2007. p. 56). “As Ordenações Afonsinas”, dizem Zaffaroni e Pierangeli, “nenhuma
aplicação tiveram no Brasil, pois, até 1521, quando de sua revogação, nenhum núcleo colonizador havia se
instalado aqui” (PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de direito penal
brasileiro: parte geral. 2004. p. 201). Ao passo que, para Aníbal Bruno, “as Ordenações Afonsinas podem
interessar apenas por aquilo com que influíram na elaboração das Manuelinas. Estas é que foram real e
efetivamente a legislação do início do regime colonial no Brasil” (BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral:
tomo 1º: introdução: norma penal: fato punível. 1978. p. 172).
9
Consoante Assis Toledo, “as Manuelinas, publicadas em 1521, tiveram, por sua vez, aplicação escassa,
até que foram substituídas pelas Filipinas [...]” (TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito
penal. 2007. p. 56).
10
Remata Magalhães Noronha que “foram, porém, as Filipinas nosso primeiro estatuto, pois os
anteriores muito pouca aplicação aqui poderiam ter, devido às condições próprias da terra que ia surgindo para o
mundo. Tudo estava por fazer e organizar” (NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal: volume 1:
introdução e parte geral. 1999. p. 55). Segundo Zaffaroni e Pierangeli, “pode-se, pois, fixar, com absoluta
8
só promulgação do Código Criminal do Império (Lei de 16 de dezembro de 1830). Este seu
termo final. Em verdade já não era escrupulosamente observado há tempos, culminando sua
desacomodação por aqui com a Independência e, logo, com a Carta de 1824, sequiosa por um
Código Criminal “fundado nas sólidas bases da Justiça, e Eqüidade” (art. 179, XVIII). 11
Desde a Revolução Francesa, porém, cujo ideário liberal espirrara para todos os cantos do
mundo, fora o sistema penal das Filipinas amofinado sem jamais restabelecer-se.
Essas Ordenações implantaram nos domínios portugueses o que a História de nossa
Ciência houve por bem qualificar como Direito Penal de terror, tamanha a fragosidade de
suas sanções. Eram sistemas de seu tempo, no entanto, próprios do afervorado Direito Penal
da Idade Média, verdadeiro lábaro das paixões religiosas.
Em terreno tão adverso não poderia grelar senão um átimo da Reabilitação Criminal,
como se verá oportunamente. Esta não medraria até que o Brasil se fizesse soberano.
1.2.1 O Direito Penal do denominado Brasil holandês
Houve época em que parte do Brasil esteve sob o domínio direto da Holanda, então
animada a conquistar colônias, devido a aperturas comerciais.
Américo Jacobina Lacombe reconstitui os acontecimentos:
O primeiro povo que disputou a Portugal a posse do Brasil foi o francês [...].
Quando os reis espanhóis assumiram o governo de Portugal, um outro povo passou a
ameaçar o Brasil: o holandês.
A Holanda era um dos domínios pertencentes à Casa d’Áustria sob o domínio de
Filipe II. Havia muito, porém, que estavam os holandeses revoltados contra a coroa
espanhola [...].
certeza, que dentre as três Ordenações do Reino, só as Filipinas tiveram efetiva aplicação no nosso país,
principalmente depois da criação da Relação da Bahia, ao tempo de Filipe II, em 07.03.1609, quando se
organizou, efetivamente, a administração da justiça. Embora suprimido em 1636, em 1652 foi esse Tribunal
restabelecido” (PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de direito penal
brasileiro: parte geral. 2004. p. 201).
11
BRASIL. Constituição politica do imperio do Brazil. Collecção das leis do imperio do Brazil de
1824: parte 1ª. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1886. p. 32-4.
9
Enquanto teve Portugal rei próprio, as transações entre os holandeses e os portos
portugueses se fizeram com grande vantagem para o comércio de ambas as nações
[...].
A Filipe II de Espanha, porém, que foi Filipe I de Portugal, o fechamento dos portos
portugueses pareceu excelente arma para combater seus súditos flamengos rebeldes.
Viram-se, assim, os holandeses levados a conquistar colônias, a fim de obter
diretamente os produtos com que comerciavam [...].
Os holandeses atingiram o período mais brilhante na conquista da chamada então
Nova Holanda com a chegada do governador João Maurício, conde de NassauSiegen (1637) [...]. Os conquistadores estenderam seu domínio por todo o Nordeste,
desde o Maranhão, onde ocuparam São Luís, até o Sergipe. 12
Natural é que pretendessem os holandeses implantar suas leis nessa região. Em 15
anos de dominação, porém, não poderiam fazer muito. São vagos os registros acerca da
organização jurídico-penal imposta pelos batavos ao povo do Nordeste; certo, contudo, que
bem não havia organização, mas regras de ocasião, necessariamente adaptadas às
circunstâncias tão diferentes da Colônia. Assim, se não indaga de eventual contribuição desse
sistema extraordinário à Reabilitação Criminal brasileira.
Desse asserto não destoa o magistério de Luiz Regis Prado:
A vigência das leis portuguesas foi interrompida na região do Nordeste do país pela
dominação holandesa (1630-1645). O Direito Penal do Brasil holandês – conjunto
de normas jurídicas aplicadas pelos flamengos nos territórios ocupados – foi um
acidente histórico prontamente esquecido, por força da reação de cunho nacionalista
dos brasileiros, em nada contribuindo para a formação de nosso Direito Penal. 13
1.3 UM VELHO INSTITUTO
Não é despropositado afirmar que a doutrina ainda se não resolveu quanto às origens
da Reabilitação Criminal no Brasil, arqueando-se a questão com as marcas de sensíveis
disparidades. Antes, contudo, de revelar terreno paludoso, de percurso impraticável, o exame
sobre a questão evidenciou desacertamento: há quem procure a Reabilitação rente às raízes da
restitutio in integrum, há quem o faça próximo às das lettres de réhabilitation, há quem
revolva o terreno da graça, e há, finalmente, quem as persiga todas, porque, a seu modo,
12
13
LACOMBE, Américo Jacobina. História do Brasil. São Paulo: Editora Nacional, 1979. p. 83 e 86.
PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: volume 1: parte geral: arts. 1º a 120. 6. ed.
rev., atual. e amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 115.
10
contribuíram para a evolução do instituto. Ao invés não teria cada sido identificada como a
Reabilitação de seu tempo, ou tipo de Reabilitação. 14
“É um velho instituto, que tem atravessado a história do Direito Penal, com
fisionomias diversas, relacionado ou não com o direito de graça”15 , professa Aníbal Bruno. E
logo se lobriga o desacerto aludido.
Temos, porém, que esta recolha deve ser tão abrangente quanto possível, acima de
tudo por abalançar-se a medir de perto evolução de instituto cujas transformações mais
refletem reação que fluidez. Então aqui integramos aquele último grupo, espécie de
contentadiços; então aqui seguramente se poderá falar em Reabilitação Criminal nas
Ordenações portuguesas, no Direito Penal do Brasil Colonial.
1.3.1 Da Reabilitação Criminal nas Ordenações
Alcançado o equívoco da Reabilitação Criminal, já esta se insinua em meio às
Ordenações Afonsinas, como perdão, ou graça, em sentido amplo. Cuida o Título LXXXVI
de seu Livro V “Do perdão, que el-rei fez aos que foram a Tânger, e estiveram no palanque
até o recolhimento do Infante Dom Henrique”; 16 o CI, “Do que for acusado por algum crime,
e livre por sentença de el-rei”, predicando “que não seja mais acusado por ele”. 17 Também os
14
Daí por que, ao que parece, perseguindo a restitutio in integrum, afiança Magalhães Noronha que a
reabilitação “não foi conhecida no direito português reinol” (NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal:
volume 1: introdução e parte geral. 1999. p. 309), e Heleno Fragoso, que “nosso Código Criminal, de 1830, era
inteiramente omisso a respeito” (FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: a nova parte geral. 13.
ed. rev. e atual. por Fernando Fragoso. Rio de Janeiro: Forense, 1991. p. 395), enquanto René Ariel Dotti, menos
exigente, reconhece que, “em nossos costumes, a reabilitação era também concedida como expressão de graça,
prevista no Livro V das Ordenações Filipinas. Segundo a Constituição imperial, o favor era deferido sob a forma
de perdão, outorgado pelo Poder Moderador exercido pelo Príncipe Regente (art. 101, §8º). Essa era também a
visão do instituto perante o Código Criminal do Império (art. 66)” (DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal:
parte geral. 2005. p. 613).
15
BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral: tomo 3º: pena e medida de segurança. 4. ed., 1. tir. Rio
de Janeiro: Forense, 1984. p. 220.
16
PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984. p. 321-4.
Faz referência à carga desautorizada de conscritos portugueses a essa cidade marroquina, tendente à sua
conquista, no ano de 1437. Como graça em sentido amplo, o caso mais parece ser de anistia, ou oblívio.
17
PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 359-60.
11
Ouvidores da Corte poderiam livrar o acusado neste caso, segundo o desenvolvimento do
Título. 18
A primeira previsão se não corresponde a qualquer outra constante das Ordenações
portuguesas. A do Título CI foi, aditada, decalcada às seguintes, pondo o perdão de par com a
sentença, a prol de livrança (Manuelinas, Livro V, Título LXXIII; 19 Filipinas, Livro V, Título
CXXX 20 ). 21
Resvala ainda na Reabilitação o Título LXX do Livro V das Afonsinas, que preside a
execução da pena de morte em seu sistema: 22 a certa altura garante ao condenado tempo para
razoavelmente confessar seus pecados. Afoita-se, contudo, quem desdenha a esmola, ou a
supõe modesta: para uma teocracia, não há mera Reabilitação espiritual; há redenção, há
salvação; para uma teocracia, a Reabilitação espiritual por meio de resipiscência podia
significar muito.
A matéria equivale à do Título LX do Livro V das Manuelinas, 23 e à do Título
CXXXVII do Livro V das Filipinas. 24 Àquelas já a confissão rematava sua rubrica. 25
18
Ao justapor a graça à sentença, o Título CI também amenta o perdão judicial, encistado ao sistema
penal vigente como causa extintiva de punibilidade (Código Penal, art. 107, IX) (cf. BRASIL. Decreto-Lei n.
2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Organização Luiz Flávio Gomes. 10. ed. rev., amp. e atual.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 273-4).
19
PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984. p. 225-9.
20
PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição feita
por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1985. p. 1304-6.
21
Mereceu o perdão posição topograficamente destacada ao Título CXXX, Livro V, das Filipinas (cf.
PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição feita por
Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1304-6). Talvez a razão de o ter reconhecido apenas
ali René Ariel Dotti (v. nota de rodapé 14, in fine).
22
A rubrica: “Quando for dada sentença de morte, seja perlongada a execução até vinte dias”
(PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real Imprensa da
Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 279-80).
23
PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 199-200.
24
PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição feita
por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.313-5.
25
“Dentro de quanto tempo se farão as execuções das penas corporais, e que os condenados sejam
primeiro confessados” (PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita
na Real Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 199).
12
As Ordenações Manuelinas ainda liaram-se inusitadamente à Reabilitação, por força
do Título V de seu Livro V, 26 onde coadjuva questão afeta à moderna temática do direito
penal de registro, 27 em pioneirismo que não foi ignorado pelas Ordenações seguintes. 28
Quanto à Reabilitação espiritual também inovaram as Manuelinas: agora poderiam os
condenados à morte testar (Livro V, Título XCIV), 29 o que lhes não era dado pelas
Ordenações anteriores (Livro V, Título LV). 30 Mas não no fariam desembaraçadamente:
legariam apenas em favor de causas sacras e pias enumeradas. Se a condenação, no entanto,
derivasse de traição, sodomia, ou heresia (Livro V, Título XCIV, in fine), estava o apenado
proibido de dispor de seus haveres; 31 por conseguinte, a alma se não desprofanaria; para a
época, um verdadeiro condenado de corpo e alma. 32
Durante largo tempo, nenhuns dos decretos, ou leis, ou alvarás, ou instruções, ou
estatutos baixados após o aparecimento das Manuelinas, considerável parte coligida por
Duarte Nunez do Lião, sob o escudo de Dom Sebastião, em publicação de 1569, 33 dirigiram
qualquer achega ao que hoje poderíamos admitir como tipo de Reabilitação, ou Reabilitação
26
A rubrica: “Como passará folha dos que forem presos por feito crime” (PORTUGAL. Ordenações
manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real Imprensa da Universidade de Coimbra, no
ano de 1797. 1984. p. 26-8).
27
O apelido é declarada crítica proveniente dos que consideram a antecedência, o rol dos culpados, ou
símil alocação marginalizante, verdadeiros estorvos à proposta, comungada por muitos países, de reinserção
social do infrator.
Zaffaroni e Pierangeli atestam que “as disposições que se referem ao direito penal de registro são
sumamente importantes, considerando que um dos objetivos da legislação contemporânea é de evitar a
estigmatização do condenado, até onde isso for possível” (PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI,
Eugenio Raúl. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 2004. p. 778).
28
Ordenações Filipinas, Livro V, Título CXXV: “Como se correrá a folha dos que forem presos por
feito crime” (PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição
feita por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.294-6).
29
PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 292-3.
30
PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 201.
31
PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 293.
32
33
A matéria foi ignorada pelas Filipinas.
PORTUGAL. Leis extravagantes e repertório das Ordenações de Duarte Nunes do Lião:
reprodução fac-símile da edição princeps das Leis Extravagantes impressa em 1569. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 1987.
13
histórica. Inclusive a notável Lei de Reformação da Justiça, saída à antevéspera das Filipinas,
em 1582, 34 quedou de mesma forma indiferente à Reabilitação. 35
As Ordenações Filipinas, além das disposições que recepcionaram, conforme já
anotado, dotaram o museu da Reabilitação com regulamento sobre “como se perdoará aos
malfeitores, que derem outros à prisão” (Título CXVI), 36 em cuja estrutura desponta singular
sistema de compensações.
Entre os aditamentos às Filipinas, dois, e apenas dois informam o ficheiro da
Reabilitação Criminal. Durante os lustros que medeiam o aparecimento das Ordenações de
1603 e a revogação de seu Livro V, em terras brasileiras, pelo advento de um Código
Criminal indígena, apenas a Reabilitação espiritual recebeu novas migalhas: o Decreto de 27
de maio de 1645, que dispôs “sobre embargos de condenados à morte”, 37 procurou garantir
dia para que pudessem tratar de suas almas (in fine), embora antes colimasse coibir o manejo
abusivo do recurso, conforme se verificara. E, afetando os mesmos embargos, porém mais
sinceramente elado à causa espiritual, o Decreto de 6 de julho de 1752, 38 após reconhecer que
os condenados à pena capital têm “menos tempo do que é preciso para se disporem a morrer
com a devida conformidade e paciência cristã”, em razão da esperança nutrida até a execução,
pela interposição de recurso, determinou sejam os embargos julgados “no mesmo tempo” de
eventual súplica deduzida ao rei. Em não sendo modificada a sentença, por qualquer das
medidas, “não será mais admitido requerimento algum, que se encaminhar a impedir a
execução da dita sentença; porque irremissivelmente se há de executar na manhã do dia
seguinte, ainda que seja feriado, não sendo domingo, ou dia santo dos que a Igreja manda
guardar, porque se for, se fará a execução no dia que se lhe seguir, em que não houver este
embaraço”.
34
Cf. PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume I: livro I: reprodução fac-símile da edição feita por
Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1985. p. 241-52.
35
Três décadas mais tarde, o alvará de 6 de dezembro de 1612 sairia com o mesmo título de Lei de
Reformação da Justiça (cf. PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução facsímile da edição feita por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.340-4).
36
PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição feita
por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.272.
37
PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição feita
por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.344.
38
PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição feita
por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.344-5.
14
Sistematicamente, esses aditamentos não deixavam de emprestar efetividade à garantia
de razoável tempo para confissão, tradicional nas Ordenações portuguesas (v. acima).
Ao aditamento de 1752 sobreveio o retumbante ensaio político de Beccaria, e, nele
inspirado, um novel Direito Penal. Indolentes, as Filipinas conformaram-se até seu ocaso com
as mostras de Reabilitação que respigamos. Feito hercúleo para uma legislação que resistiu ao
Setecentos e ao Oitocentos como a principal fonte de Direito de muitos povos.
1.4 AS ORDENAÇÕES, SEU DIREITO PENAL, E REABILITAÇÃO
As Ordenações desassombradamente timbraram a História do Direito. Obras
grandiosas, “se constituíram na mais importante codificação realizada até então”, 39
“sucederam à fase fragmentária dos forais e às abundantes leis gerais sem ordem nem
sistematização”, 40 alastraram suas regras através dos mais remotos pontos do planeta, e
asseguraram durante muito tempo o domínio português sobre eles.
Tão logo fulgiram as primeiras centelhas iluministas, o abominoso Direito Penal das
Ordenações
foi
asperamente
criticado
por
espíritos
inflamados
pelo
movimento
revolucionário.
Não seria jamais esquecido, porém. Para Bento de Faria, configurava como práticas
delituosas extravagâncias e despautérios. 41 Aníbal Bruno verbera que “as Ordenações
portuguesas são um exemplo dessa legislação, contra a qual se havia de levantar, com toda a
força de sua íntima simpatia humana, a voz de Beccaria.” 42 A Cezar Roberto Bitencourt o
Direito Penal das Ordenações “orientava-se no sentido de uma ampla e generalizada
39
PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de direito penal brasileiro:
parte geral. 2004. p. 191.
40
BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral: tomo 1º: introdução: norma penal: fato punível. 1978. p.
170.
41
Cf. FARIA, Antonio Bento de. Codigo penal brasileiro: volume I: noções gerais: interpretação da lei
penal: extradição internacional e interestadual. 1942. p. 72.
42
175.
BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral: tomo 1º: introdução: norma penal: fato punível. 1978. p.
15
criminalização, com severas punições.” 43 Heleno Fragoso anota que “caracterizava-se
também pela fantástica influência do clero.” 44 Por Mello Freire, expoente português do
Iluminismo, foi essa legislação penal reputada “inconseqüente, injusta, e cruel.” 45 No juízo de
Luiz Regis Prado, “o delito era confundido com pecado ou vício; a medida da pena vinculavase à preocupação de conter os maus pelo terror e a sua aplicação dependia da qualidade das
pessoas.” 46
Entre os estudiosos da História do Direito Penal, só logrou igual aceitação a idéia de
que eram as Ordenações coetâneas. 47 Nemine discrepante, bem ilustraram os dogmas,
sentimentos e métodos de sua época, tanto que durante séculos não foram expressivamente
contestadas, mesmo por quem nada devia à coroa portuguesa.
Com igual acerto o mesmo pode ser afirmado em relação à Reabilitação, ou seu
vislumbre. Era medida de que se serviam os condenados para não sucumbir por completo
perante o beatério. Conquanto pudesse, raro em raro, ser identificada com outro conteúdo, as
mais de suas aparições às Ordenações exprimiam licença real a purgatório. Daí o falar aqui,
muita vez, em Reabilitação espiritual (v. tópico 1.3.1 acima).
43
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral: volume 1. 10. ed. São Paulo:
Saraiva, 2006. p. 57.
Bitencourt, à feição da maior parte dos que se propuseram a extratar a história do Direito Penal lusobrasileiro, pinta os rigores das Ordenações apenas à vista das Filipinas. Vigorado por mais tempo que as
anteriores, e praticamente inaugurado a organização jurídica no Brasil, é compreensível sejam analisadas com
mais detença. Não menos compreensível, por lado outro, é que as censuras lançadas às Filipinas retrotraiam às
suas maiores, pois que não alteraram substancialmente a estrutura do Direito Penal que igualmente as
traspassara.
44
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: a nova parte geral. 1991. p. 56.
45
FREIRE, Pascoal José de Mello. Codigo criminal intentado pela rainha D. Maria I. 2. ed.
castigada dos erros - corrector o licenciado Francisco Freire de Mello, sobrinho do autor. Lisboa: Typographo
Simão Thaddeo Ferreira, 1823. p. II da Introdução.
46
PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: volume 1: parte geral: arts. 1º a 120. 2006.
p. 114.
47
Cf. FARIA, Antonio Bento de. Codigo penal brasileiro: volume I: noções gerais: interpretação da lei
penal: extradição internacional e interestadual. 1942. p. 72; BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral: tomo
1º: introdução: norma penal: fato punível. 1978. p. 174; PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio
Raúl. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 2004. p. 194; NORONHA, Edgard Magalhães. Direito
penal: volume 1: introdução e parte geral. 1999. p. 55-6; FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal:
a nova parte geral. 1991. p. 56 e 58; TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. 2007.
p. 56-7.
16
A proeminência das Ordenações na formação do Direito brasileiro nunca foi
contestada. Mas a marca indelével que imprimiram à História, o ardume de seu Direito Penal,
o caráter espiritual da embrionária Reabilitação, enfim, tudo que aqui se afirmou, não pode
ser adequadamente compreendido, quando menos, sem breve revisitação sistêmica e
abrangente ao cenário de cada um desses corpos de leis, através da qual tais fatores
efetivamente se engranzam e justificam.
Deflagremos essa benfazeja atividade.
1.4.1 Ordenações Afonsinas
Segundo ensinança de Fernando da Costa Tourinho Filho,
o primeiro Código português recebeu o nome de ‘Ordenações Afonsinas’, em
homenagem a D. Afonso V, em cujo reinado foi concluída a obra. Sua confecção,
desde o seu início, durou cerca de quarenta e cinco anos. Surgiu, exatamente, no ano
de 1446 e foi considerado um verdadeiro monumento de sabedoria. O Livro V, com
cento e vinte e um títulos, versava sobre os crimes, as penas e o Processo Penal. 48
As Afonsinas abeberaram nas grandes fontes jurídicas de seu tempo, mas não
rejeitaram as seminais águas do antigo filão romano. À ingente tarefa de sua geração se
atrelou durante cerca de quarenta anos a fina flor dos jurisconsultos portugueses, bem que se
não duvide tenham-na perfilhado talentos de outras partes. Baixadas em 1446, logo
espiritaram o ideal da Codificação às civilizações vizinhas. 49
Zaffaroni e Pierangeli expendem que
tiveram por padrão, ou modelo, a doutrina do Corpus Juris, e, quanto ao método e à
disposição das matérias, seguiram as Decretais do Papa Gregório IX. Assim,
apresentam um claro conteúdo do direito romano de Justiniano e do direito
canônico, como fontes principais: o direito civil de Justiniano, conhecido pelo nome
de Leis Imperiais; o canônico que se tornou célebre na Europa, logo após a primeira
48
49
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal: 1º volume. 2007. p. 180.
As Afonsinas constituíram o “primeiro código europeu completo”, de acordo com Regis Prado
(PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: volume 1: parte geral: arts. 1º a 120. 2006. p. 112).
Assim nas vêem Fragoso (FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: a nova parte geral. 1991. p.
56), Aníbal Bruno (BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral: tomo 1º: introdução: norma penal: fato punível.
1978. p. 170, nota de rodapé 1) e Zaffaroni e Pierangeli (PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio
Raúl. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 2004. p. 193).
17
metade do século XII; sob a denominação de direito comum, com as doutrinas dos
glosadores e intérpretes; o código visigótico, na versão do Fuero Juzgo; as leis das
Sete Partidas; as leis editadas a partir de Afonso II; as resoluções das cortes,
celebradas desde Afonso IV, as concordatas de D. Diniz, D. Pedro e D. João, além
de alguns costumes e forais. 50
Da ideologia racionalista que muito desabusaria a humanidade não havia sequer
olores. A cosedura não avançara metro senão apaixonada. Centúrias se demorariam até que
olhos mais cientes descessem à figura do desacomodado à lei. Considerações mais serenas,
exempli gratia, que arrostassem os fenômenos criminógenos a partir de fatores sociais, logo
eram obumbradas pela hirta religiosidade, para a qual a vontade divina e o pecado tudo
explicavam. 51
Dentro nesse quadro lucilava a Reabilitação, crivada pela mesma deificação.
1.4.1.1 Da Reabilitação Criminal nas Ordenações Afonsinas
A primeira das Ordenações diz com a Reabilitação através de três dos cento e vinte e
um Títulos que consubstanciam seu Livro V, consoante o apanhado deitado ao tópico 1.3.1
acima.
É o razoável tempo para confissão, garantido pelo Título LXX, 52 oásis em meio à
disciplina da execução da pena de morte. Seria recepcionado pelas Ordenações seguintes,
como se viu, e constitui a mais pura expressão da Reabilitação espiritual.
50
PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de direito penal brasileiro:
parte geral. 2004. p. 193
51
Silva Ferrão reflete sobre a influência direta da Igreja no Direito luso-brasileiro daqueles séculos: “As
disposições dos cânones da Igreja não podiam deixar de ter então, como tiveram por muito tempo, grande
influência e vigor nos fatos, denominados – crimes morais – ou – religiosos –, em que se considerava preciso
punir não só o crime, mas o pecado, como se a missão dos homens, no estado social fosse prestar auxílio à
onipotência divina, e justiça do Céu!” (FERRÃO, Francisco António Fernandes da Silva. Theoria do direito
penal applicada ao codigo penal portuguez: comparado com o codigo do Brazil, leis patrias, codigos e leis
criminaes dos povos antigos e modernos: offerecida a s. m. i. o sr. D. Pedro II: imperador do Brazil: volume 1.
Lisboa: Typographia Universal, 1856. p. XLVI).
52
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 279-80.
18
A anistia, concedida a quem participara da invasão a Tânger (Título LXXXVI), 53
rasteja a Reabilitação à medida que ambas, sob certo prisma, quadram à casta do perdão, ou
graça, em sentindo amplo.
Finalmente, admitia seu Título CI o livramento do acusado, mediante sentença do
próprio Monarca, ou de Ouvidor da Corte. 54 Assim jogava a hipótese com a graça lato sensu.
Dessa última construção ainda evolaram fumaças que se espreguiçariam até alcançar a
moderna estrutura do perdão judicial.
O acanhamento dessas medidas se conservaria durante muito tempo, e cedo tais não
encontrariam maiores aberturas. “A reforma completa da penalidade”, aponta Levy Maria
Jordão, “a reabilitação da humanidade aos olhos da consciência estava reservada para o século
XVIII.” 55
1.4.1.2 O Direito Penal das Afonsinas
Ao Direito Penal dedicaram as Ordenações Afonsinas todo o seu Livro V, o qual,
como que por tradição, seria também seu repositório às Ordenações seguintes.
Constituído por 121 Títulos, esse Livro albergou matérias de ordem material e
procedimental, dentre as quais destacam-se: Dos hereges (Título I); 56 Dos que dizem mal delrei (Título III); 57 Da mulher casada, que se saiu de casa de seu marido para fazer adultério
53
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 321-4.
54
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 359-60.
55
JORDÃO, Levy Maria. Commentario ao codigo penal portuguez: tomo I. Lisboa: Typographya de
José Baptista Morando, 1853. p. XVI.
56
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 2-5.
57
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 21-2.
19
(Título XII); 58 Dos que cometem pecado de sodomia (Título XVII); 59 Dos barregueiros
casados (Título XX); 60 Do que mata, ou fere alguém sem porquê (Título XXXII); 61 Do que
disse testemunho falso, e do que fez dizer (Título XXXVII); 62 Dos Feiticeiros (Título XLII); 63
Dos que arrancam os marcos sem consentimento das partes, nem autoridade da Justiça
(Título LX); 64 Quando for dada sentença de morte, seja perlongada a execução até vinte dias
(Título LXX); 65 Dos que entram em casa de alguém, por lhe fazer mal, e aí morrem, ou são
desonrados (Título LXXIII); 66 Do que se enforca, ou cai de árvore, e morre (Título
LXXIX); 67 Em que caso os cavaleiros, fidalgos, e semelhantes pessoas devem ser presos
(Título XCIV); 68 Que todas as apelações de feitos crimes de todo o reino venham aos
Ouvidores, que andam na corte com el-rei (Título XCVIII); 69 Dos que encobrem os
malfeitores (Título C); 70 Do que for acusado por algum crime, e livre por sentença del-rei,
58
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 44-5.
59
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 53-4.
60
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 72-85.
61
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 126-7.
62
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 142-4.
63
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 152-4.
64
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 237-8.
65
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 279-80.
66
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 284-5
67
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 294-5.
68
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 344-8.
69
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 352-3.
70
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 355-9.
20
que não seja mais acusado por ele (Título CI); 71 Que não prendam por dívida (Título
CVIII); 72 Do que é ferido, ou roubado de noite a desoras (Título CX); 73 Daqueles que
ajudam a fugir, ou a encobrir os cativos, que fogem (Título CXIII); 74 e Das cartas
difamatórias, que se lançam encobertamente por mal dizer (Título CXVII). 75
René Ariel Dotti observa que “muitas práticas punitivas já eram incompatíveis com
determinados progressos daqueles tempos.” 76 Prevaleceu, contudo, o conceito de que as
Afonsinas fielmente atenderam aos ideais de então. 77
Sobre o sistema de penas das Ordenações de D. Afonso V 78 excogita o mesmo autor
que,
no tocante às medidas que afetam a liberdade, a servidão penal raramente aparece
como pena no regime das Ordenações. Ela no entanto era admitida como, por
exemplo, no caso de um mouro ou um judeu que pretendia se fazer passar por
cristão. Em tal hipótese, o rei poderia determinar a sua entrega como escravo a
qualquer pessoa [...].
A prisão, embora prevista com freqüência, tinha em regra um caráter preventivo e
consistente em evitar a fuga do autor do crime até ser julgado.
Essa mesma e antiga característica da detenção física, como espécie da prisão
provisória dos dias presentes, era comum na Antigüidade e no Direito Romano [...].
Ao lado, porém, de uma função preventiva, a prisão também era aplicada no regime
das Ordenações Afonsinas como um meio de coerção para obrigar o autor ao
pagamento da pena pecuniária. Mas ela em raros casos surgia como típica reação de
natureza repressiva, imposta, por exemplo, por uma noite para aqueles que
71
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 359-60.
72
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 368-9.
73
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 372-3.
74
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 375-7.
75
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 384-6.
76
DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p. 180.
77
Cf. tópico 1.4, acima, no que é informado pela nota de rodapé 47.
78
Foi o monarca “amador de justiça e de ciência, e honrou muito os que a sabiam”, de acordo com o
cronista-mor Ruy de Pina (PINA, Ruy. Chronica de el-rei D. Afonso V: volume III: bibliotecha de classicos
portuguezes. Lisboa, 1902. p. 151).
21
presenciassem jogos (Tít. 41º, 8); por quinze dias para quem jogasse ou fizesse
tavolagem; por três dias para quem violasse, pela segunda vez, as leis sobre as coisas
de uso proibido (Tít. 43º, 4). 79
Magalhães Noronha asserta que “não se pode falar, nesse diploma, em técnica
legislativa. Seus títulos eram descritivos. Longas orações definiam os crimes. Imperava o
casuísmo etc.” 80
Demais, lamenta Alberto Carlos de Menezes, alguns dos forais de que se serviu o
Livro V “se conservavam escritos em linguagem latino-bárbara, e desacostumada.” 81
Mas o enleamento das definições, e a conseguinte insegurança, se não alterariam
perante as Ordenações seguintes. Subsistiriam por mais três séculos até o preconício de
Feuerbach.
1.4.2 Ordenações Manuelinas
Conforme o seguro relato de Zaffaroni e Pierangeli,
em 1505, portanto, 59 anos após a promulgação das Ordenações Afonsinas, D.
Manuel I, o Venturoso, mandou revisá-las. Para essa tarefa, o rei encarregou o
chanceler-mor, Rui Boto, o licenciado Rui da Grã, que era desembargador do Paço e
corregedor cível da corte, e João Cotrim, com a determinação de alterar, suprimir e
acrescentar, na compilação anterior, o que entendessem necessário [...].
Todavia, a reforma legislativa, realizada às pressas, não satisfez a expectativa de D.
Manuel que, por tal razão, mandou inutilizar todos os exemplares, com exceção
daquele encontrável na Torre de Tombo. Em seguida, o monarca nomeou nova
comissão, composta pelos desembargadores Cristóvão Esteves, João Cotrim e João
de Faria, sob a presidência do primeiro. Só o nome de Cristóvão Esteves não
encontra qualquer resistência entre os historiadores. 82
79
DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p. 180-1.
80
NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal: volume 1: introdução e parte geral. 1999. p. 56.
O comentário é deduzido perante as Ordenações Filipinas, de acordo com o que se disse à nota de
rodapé 43.
81
MENEZES, Alberto Carlos de. Plano de reforma de foraes, e direitos bannaes: fundado em hum
novo systema emphyteutico nos bens da coroa, de corporações, e de outros senhorios singulares: dividido em
nove partes: com hum novo arredondamento de comarcas para os foraes do patrimonio da coroa. Lisboa:
Impressão Regia, 1825. p. 26.
82
PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de direito penal brasileiro:
parte geral. 2004. p. 194-5.
22
Publicadas pela primeira vez em 1512, foram refundidas em edição de 1514, mas seu
texto definitivo custaria ainda um tanto; em 1521, porém, as Manuelinas estavam à altura do
reino português.
O Brasil as não podia receber, contudo. Os entraves à sua aplicação em terras tão
distantes e recém-descobertas são flagrantes: desorganização e desorganização. Já de início as
Manuelinas colidiriam com o sistema das donatarias a atalhar qualquer tentativa de respeito
absoluto a seus ditames, mesmo com a instalação que aqui se verificou de um Governo-Geral,
em meados do século XVI.
À guisa do que se dera, com motivos ainda maiores, em relação às Afonsinas, as
Manuelinas “não chegaram a ser eficazes, em razão das peculiaridades reinantes na imensa
colônia”, esclarece Cezar Roberto Bitencourt.
Na realidade, havia uma inflação de leis e decretos reais destinados a solucionar
casuísmos da nova colônia; acrescidos dos poderes que eram conferidos com as
cartas de doação, criavam uma realidade jurídica muito particular. O arbítrio dos
donatários, na prática, é que estatuía o Direito a ser aplicado, e, como cada um tinha
um critério próprio, era catastrófico o regime jurídico do Brasil Colônia. 83
Não tardaria até que as Ordenações fossem novamente substituídas.
1.4.2.1 Da Reabilitação Criminal nas Ordenações Manuelinas
As Ordenações de D. Manuel I avançaram a passo em direção à Reabilitação
Criminal. Das quatro hipóteses que se a ela avizinham, duas já antojavam às Afonsinas (v.
tópico 1.3.1 acima).
Nestas inspiradas, as Manuelinas encerraram no Título LXXIII de seu Livro V a
possibilidade de livramento 84 – se nos afigurando caso de graça lato sensu; ao Título LX
83
84
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral: volume 1. 2006. p. 57.
Cf. PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 225-9.
23
recepcionaram a confissão ao tratar da execução das penas corporais 85 – expressão de
Reabilitação espiritual (inclusive figurando alusão à medida já no cabeçalho).
Com essa última qualidade também aparece a Reabilitação diante do Título XCIV, o
qual autoriza o condenado à pena capital legar em favor de causas edificantes.86
Por derradeiro, o Título V do mesmo Livro fez soar os ecos do direito penal de
registro, hoje ensurdecedores. 87
Falasse embora Duarte Nunez do Lião em “perpétua mudança e variedade”, 88 exato é
que a Coleção de sua lavra as não revelaria ao pé da Reabilitação.
Até o advento das Ordenações Filipinas não haveria qualquer outra inovação no
particular. Mas esta também não dissiparia o bafio, senão levemente.
1.4.2.2 O Direito Penal das Manuelinas
Constituiu manifesto arremedo do Direito Penal das Ordenações anteriores, posto que
alterado em alguns pontos, como nota de evolução que, a medo, se revelava. Em seu Livro V
hospedou cento e treze Títulos, os quais compunham a fonte primária do Direito e do
Processo Penal.
Dentre as novas figuras penais, e outras disposições previstas, destacam-se – quer por
sua importância, quer por sua peculiaridade, ou ineditismo: Do homem que se veste em trajos
85
Cf. PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 199-200.
86
Cf. PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 292-3.
87
Cf. PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 26-8
88
PORTUGAL. Leis extravagantes e repertório das Ordenações de Duarte Nunes do Lião:
reprodução fac-símile da edição princeps das Leis Extravagantes impressa em 1569. 1987.
Os dizeres encontram-se nas linhas segunda e terceira do proêmio da obra, endereçado “ao Muito Alto e
Muito poderoso Rei Dom Sebastião nosso senhor”, com “perpétua felicidade”.
24
de mulher, ou mulher em trajos de homem, e dos que trazem máscaras (Título XXXI); 89 Dos
furtos, e que não tragam gazuas, nem outros artifícios pera abrir portas, nem as fechem de
fora (Título XXXVII); 90 Dos excomungados, e da pena que hão de pagar (Título XLVI); 91
Dos vadios (Título LXXII); 92 Em que casos o condenado à morte poderá fazer testamento
(Título XCIV); 93 Dos que compram colmeias pera matar as abelhas delas (Título XCVII); 94
e Dos que fazem música de noute (Título CIII). 95
Defronte ao sistema de penas do Livro V, René Ariel Dotti anota que
também ao tempo das Manuelinas a chamada servidão penal é rara como nas
hipóteses em que se submetia o infrator à situação de cativeiro (Títs. 77º e 82º). A
prisão é encontrada como medida de coerção pessoal até o julgamento e a
condenação (Tít. 42º), sendo menos freqüente a prisão por dívida, enquanto que a
privação da liberdade como sanção propriamente dita é pouco utilizada. Em alguns
casos, como pena, é fixada em quinze ou trinta dias, sem desconto; em outras vezes,
a sua duração é arbitrária (Títs. 14º, 1; 37º, 6 e 103º; 78º; 88º; 11; 10º, 9, 72º e
101º). 96
E diante da situação seguinte à publicação das Manuelinas, dispõe
foram divulgadas várias leis, decretos, alvarás, cartas-régias, resoluções, provisões,
assentos da Casa de Suplicação, regimentos, estatutos, instruções, avisos e portarias
que foram compilados por determinação de D. Henrique. Foi incumbido de tal
tarefa, Duarte Nunes de Leão a fim de se ordenar a multiplicidade dos éditos em
vigor. A coleção tratou na sua IV parte ‘dos delitos e do acessório a eles’. 97
89
Cf. PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 90.
90
Cf. PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 109-14.
91
Cf. PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 158.
92
Cf. PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 224-5.
93
Cf. PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 292-3.
94
Cf. PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 295-6.
95
Cf. PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 303-4.
96
DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p.181.
97
DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p.181.
25
Do que essa quarta parte da Coleção inovou ao sistema penal, merecem primeiramente
destaque, porque desagravaram a situação do acusado, a Lei IX de seu Título XX – que
impunha não aplicassem “os desembargadores as penas a seu arbítrio”, conquanto tornasse a
previsão às penas pecuniárias, somente 98 – e a Lei III de seu Título XXI – que autorizava aos
carcereiros darem de comer aos escravos presos, se os respetivos senhores o não fizessem. 99
Ausente, porém, qualquer vestígio de Reabilitação Criminal. Ao revés, estava a
Coleção envolta por severidades: a mesma parte IV prescrevia os delitos dos escravos (Título
V); 100 ocupava-se dos trajos dos estudantes (Título XVII, Lei XII); 101 das mulheres solteiras
que ganham por seus corpos (Título XIX); 102 das dívidas que impediam o retorno de degredo
(Título XXI, Lei IX). 103
E marcada também por desigualdades, como a franquia aos degredados assinalados ou
de qualidade de se retirarem sem cadeias aos pescoços (Título XXII, Lei I). 104
As desigualdades, o compadrio, e o privilégio nunca abandonariam as Ordenações.
“Mantém-se a mais injusta diferença de classes para o efeito da aplicação das penas, que
variavam segundo o réu era nobre ou plebeu, homem honrado, ou de estado, ou homem
vil.” 105
98
PORTUGAL. Leis extravagantes e repertório das Ordenações de Duarte Nunes do Lião:
reprodução fac-símile da edição princeps das Leis Extravagantes impressa em 1569. 1987. p. 172.
99
Cf. PORTUGAL. Leis extravagantes e repertório das Ordenações de Duarte Nunes do Lião:
reprodução fac-símile da edição princeps das Leis Extravagantes impressa em 1569. 1987. p. 173.
100
Cf. PORTUGAL. Leis extravagantes e repertório das Ordenações de Duarte Nunes do Lião:
reprodução fac-símile da edição princeps das Leis Extravagantes impressa em 1569. 1987. p. 121-2.
101
Cf. PORTUGAL. Leis extravagantes e repertório das Ordenações de Duarte Nunes do Lião:
reprodução fac-símile da edição princeps das Leis Extravagantes impressa em 1569. 1987. p. 165-6.
102
Cf. PORTUGAL. Leis extravagantes e repertório das Ordenações de Duarte Nunes do Lião:
reprodução fac-símile da edição princeps das Leis Extravagantes impressa em 1569. 1987. p. 170-1.
103
Cf. PORTUGAL. Leis extravagantes e repertório das Ordenações de Duarte Nunes do Lião:
reprodução fac-símile da edição princeps das Leis Extravagantes impressa em 1569. 1987. p. 174.
104
Cf. PORTUGAL. Leis extravagantes e repertório das Ordenações de Duarte Nunes do Lião:
reprodução fac-símile da edição princeps das Leis Extravagantes impressa em 1569. 1987. p. 175.
105
MATTA, José Caeiro da. Direito criminal português: volume 1. Coimbra: Typographya França
Amado, 1911. p. 264.
Trata-se, contudo, de outro caso de que à nota de rodapé 43 consignamos.
26
1.4.3 Ordenações Filipinas
As Ordenações Filipinas se depararam com um incipiente regime políticoadministrativo no Brasil, semeado sobretudo no litoral, no grande triângulo. Situação bem
diferente persistia no Oeste dos virgens pastiçais. Estruturalmente, todavia, nunca estivera o
Brasil mais apto a guardar a nova ordem jurídica.
Aníbal Bruno refere que
Felipe II, de Espanha, que passara a reinar sobre Portugal com o nome de Felipe I,
ordenou, ‘para emendar a confusão das leis e obter a estima dos portugueses’, nova
estruturação dos velhos Códigos, incumbindo de organizá-la os desembargadores do
Paço Paulo Afonso e Pedro Barbosa, com a colaboração de Damião de Aguiar e
Jorge Cabedo. Revistas, enfim, por outros juristas, são as Ordenações Filipinas
decretadas em 1603, já sob o reinado de Felipe II, e, restaurada a monarquia
portuguesa, revalidadas pela lei de 29 de janeiro de 1643, continuando em vigor por
mais de dois séculos ainda. 106
Das Filipinas quase nada restaria com a promulgação do Código Civil de 1916 (Lei n.
3.071, de 1º de janeiro de 1916), já pelo princípio da codificação, já por previsão expressa de
revogação (art. 1.807). 107 Após três séculos de vigência, desapareciam, praticamente; “de
regras sociais passavam à categoria de documentos históricos”. 108 A revogação do Livro V
das Ordenações, contudo, se dera com a entrada em vigor do Código Criminal do Império
(Lei de 16 de dezembro de 1830). 109
106
BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral: tomo 1º: introdução: norma penal: fato punível. 1978.
p. 170-1, nota de rodapé 1.
107
Cf. BRASIL. Lei n. 3.071, de 1º de janeiro de 1916 – Codigo Civil dos Estados Unidos do Brazil.
Collecção das Leis da Republica dos Estados Unidos do Brazil de 1916: volume 1: actos do poder legislativo.
Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1917. p. 242.
108
BEVILAQUA, Clóvis. Código civil dos estados unidos do Brasil comentado: volume II. ed.
histórica, 5. tir. Rio de Janeiro: Rio, 1980. p. 1.051-2.
109
A vigência, no Oitocentos adentro, do Direito Penal das Ordenações Filipinas, azou este desafogo de
Aníbal Bruno: “O insólito é que tal legislação tenha persistido entre nós até tão longo do tempo a que
correspondia. Estranha e absurda ela se apresenta é quando a vemos regendo ainda no clima do liberalismo
jurídico do primeiro quarto do século XIX, quando as suas abusões e rigores se chocavam com a consciência
jurídica da época. Humilhante para a cultura dos dois povos é que ela tenha podido prevalecer até então, com as
suas normas extravagantes do campo próprio do Direito Penal, na sua confusão de moral, religião e Direito,
como era corrente nas leis penais da Idade Média, injustas na distinção de tratamento entre fidalgos e plebeus,
desumanas e por vezs (sic) ridículas nas suas penas. Então é que ela merece ser julgada sob as negras cores com
que a vê, justamente, Baptista Pereira, que a define como ‘um misto de despotismo e de beatice, uma legislação
híbrida e feroz, inspirada em falsas idéias religiosas e políticas’” (BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral:
tomo 1º: introdução: norma penal: fato punível. 1978. p. 175-6).
27
A propósito, capitula Assis Toledo que “as Filipinas, em cujo Livro V se encontra a
codificação penal do Reino, é que foram aplicadas, com toda a sua dureza, durante o Brasil
colonial e, depois disso, até a edição e início de vigência do Código Criminal do Império, de
1830.” 110
Mas já em 1824, porém, o referido Livro V fora eclipsado pela Constituição do
Império do Brasil, ciosa por um Código Criminal “fundado nas sólidas bases da Justiça, e
Eqüidade” (art. 179, XVIII). 111
As Ordenações Filipinas foram profusamente aditadas, e submetidas a toda sorte de
modificações. Nenhuma, porém, notabilizou-se como a intentada por D. Maria I, através do
gênio de Mello Freire, catedrático da Universidade de Coimbra. 112 Seus Códigos de Direito
Público e de Direito Criminal, todavia, jamais entraram em vigor, “ou porque não resistiram
às críticas das comissões revisoras, ou porque só eram lembrados com receio, diante dos fatos
da Revolução Francesa.” 113
Esse Projeto de Código Criminal, que sensivelmente traduzia muitos dos protestos
revolucionários de seu tempo, serviu de modelo ao primeiro Código Penal brasileiro, cujo
artífice, cumpre destacar, bacharelara-se em Coimbra.
1.4.3.1 Da Reabilitação Criminal nas Ordenações Filipinas
Originariamente, quatro tímidas Reabilitações descerraram-se do texto do Livro V das
Filipinas. Aditadas estas, concorreriam aquelas com duas outras (v. tópico 1.3.1 acima).
110
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. 2007. p. 56.
111
Cf. BRASIL. Constituição politica do imperio do Brazil. Collecção das leis do imperio do Brazil
de 1824: parte 1ª. 1886. p. 32-4.
112
“Ele tinha apenas completado a idade de dezanove anos, quando foi graduado Doutor em Leis com
geral satisfação de toda a Universidade, que já desde então começava a entrever de quanta glória lhe seria algum
dia a associação deste novo Aluno” (STOCKLER, Francisco de Borja Garção. Elogio historico de Pascoal José
de Mello Freire dos Reis: pronunciado na assembléa publica da academia r. das sciencias de 17 de Janeiro de
1799, e dedicado a sua alteza real o principe D. Joao nosso senhor. Lisboa: Typographya da Academia R. das
Sciencias, 1799. p. 6).
113
NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal: volume 1: introdução e parte geral. 1999. p. 56.
28
Primeiramente cuidaram as Filipinas de “como se perdoará aos malfeitores, que derem
outros à prisão” (Título V), em cuja disciplina penetrou singular sistema de compensação. Era
caso de graça lato sensu, e a única hipótese inédita de Reabilitação. 114
Seguiram as Manuelinas ao tratar de “como se correrá a folha dos que forem presos
por feito crime” (Título CXXV), 115 questão fundamente entranhada à Reabilitação hodierna.
Não nas seguiram, porém, em relação à possibilidade de o condenado à morte testar
em benefício de causas elevadas, visando à expiação. 116 A esse respeito foram omissas as
Filipinas.
O Título CXXX suscitava outro caso de graça, em sentido amplo, expresso por meio
de livramento, mediante sentença, ou perdão. 117 A hipótese teve seu berço nas primeiras
Ordenações. 118
Também com ressaibo afonsino repousa o Título CXXXVII em meio ao Livro V das
Filipinas. Regulamentava a execução das penas corporais, e admitia a confissão. 119 Era a
conta para a Reabilitação espiritual.
Dentre os inúmeros aditamentos e modificações que sobrevieram às Filipinas,
aparecidas em 1603, dois Decretos disseram com essa mesma Reabilitação, ao cuidar do
114
PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição feita
por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.272.
115
PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição feita
por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.294-6.
116
Cf. PORTUGAL. Ordenações manuelinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1797. 1984. p. 292-3.
117
Cf. PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição
feita por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1304-6.
118
Cf. PORTUGAL. Ordenações afonsinas: livro V: reprodução fac-símile da edição feita na Real
Imprensa da Universidade de Coimbra, no ano de 1792. 1984. p. 359-60.
Cf., ainda, nota de rodapé 18.
119
Cf. PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição
feita por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.313-5.
29
recurso de embargos de condenado à morte. 120 Datando o segundo de 1752, logo se constata
que a pena capital sobreviveu aos primeiros luzeiros do movimento reformador. Em verdade
resistiria por mais algumas décadas, se bem que soslaiada.
Diria Francisco Freire de Mello que
em Portugal passa-se um ano e mais sem se executar a pena de morte. Quando se
executa sempre se dá primeiramente parte a El-Rei se está no distrito da execução.
Não permite a humanidade dos nossos Soberanos, que se execute esta terrível pena
sem eles a saberem, e a causa, porque morre um filho seu. 121
1.4.3.2 O Direito Penal das Filipinas
O Direito Penal das Ordenações Filipinas não foi menos terrível que o das anteriores.
Assistiria florescer, todavia, o descontentamento de alguns, ao passo que sumulava a vontade
geral das cortes. 122
Composto por 143 Títulos, seu Livro V mais se conformou em limar o Direito
Criminal conhecido, sem embargo de lhe achegar as infrações de parto suposto (Título
LV), 123 e dos que compram pão para revender (Título LXXVI); 124 o instituto do perdão,
120
Decretos de 27 de maio de 1645 (PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V:
reprodução fac-símile da edição feita por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.344), e
de 6 de julho de 1752 (PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da
edição feita por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.344-5).
121
MELLO, Francisco Freire de. Discurso sobre delictos e penas, e qual foi a sua proporção nas
differentes epocas da nossa jurisprudencia: principalmente nos tres seculos primeiros da monarchia
portugueza. Londres: T. C. Hansard, 1816. p. 50.
122
Poucos o veriam propriamente deslocado, ou despido da condição de rigoroso ícone de seu tempo,
como José Dias Ferreira, com grifos nossos: “[...] as ordenações compiladas por mandado de D. Filippe I, sendo,
com pequenas alterações, a reprodução das ordenações manuelinas, como estas já o eram das ordenações
afonsinas, nem representavam as necessidades da época, nem eram já acomodadas à civilização dos povos”
(FERREIRA, José Dias. Codigo civil portuguez annotado: volume 1. Lisboa: Imprensa Nacional, 1870. p. V).
Cf. o que se disse a respeito ao tópico 1.4 acima.
123
Cf. PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição
feita por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.204-5.
124
Cf. PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição
feita por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.222-4.
30
como recompensa à delação (Título CXVI); 125 a disciplina da punição para menores
infratores (Título CXXXV); 126 a vedação a arbitrariedade na aplicação das penas (Título
CXXXVI) 127 etc.
Ainda, a originalidade da relevância penal de uma impressão de livro sem a licença do
Rei (Título CII) 128 denunciava o intento – eclipsado, porém, por velhas e conhecidas
previsões – de gravar ao Direito Criminal filipino o sigilo de seu tempo. 129
Em último caso se não distinguiam substancialmente as Filipinas das Ordenações
anteriores. Os acrescentos referidos não teriam o condão de descobrir um novo Direito Penal.
E que se não indague das medievais distinções de classes, pois todas estavam lá, bem
aconchegadas.
A barbaria, esses excessos, todos se exibem no substrato a que Manuel Dias da Silva
reduziu o Direito Penal das Ordenações Filipinas:
[...] em 1603, no reinado de Filippe, foram promulgadas outras Ordenações que são,
em grande parte, cópia das antecedentes [...].
O carácter desta legislação penal é o ser bárbara e cruel [...].
125
Cf. PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição
feita por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.272.
126
Cf. PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição
feita por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.311.
127
Cf. PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição
feita por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.311-3.
Essa vedação, que primeiro aparecera na Coleção de 1569 (Quarta Parte, Título XX, Lei IX)
(PORTUGAL. Leis extravagantes e repertório das Ordenações de Duarte Nunes do Lião: reprodução facsímile da edição princeps das Leis Extravagantes impressa em 1569. 1987. p. 172), verdadeiramente foi
recepcionada pelas Filipinas.
Cf. ao tópico 1.4.2.2 o que se disse a respeito.
128
Cf. PORTUGAL. Ordenações filipinas: volume III: livros IV e V: reprodução fac-símile da edição
feita por Candido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. 1985. p. 1.249.
129
Concebido o processo de impressão em série por Gutenberg em meados do Século XV d.C., infração
ligada a seu uso não foi tardiamente assentada nas Ordenações Filipinas, como se poderia supor a princípio, haja
vista, primeiro, a distância entre os povos e a velocidade com que grassavam, à época, as descobertas; depois, o
tempo decorrido até que fosse aceita e consolidada a referida prática, tivessem as pessoas acesso aos
maquinários, fossem reputadas daninhas certas obras etc. Isso sem levar em conta o vulto de trabalho dispensado
a uma Ordenação reinol, a demora para sua conclusão, para a chancela real.
31
No livro V destas ordenações fizeram-se, é certo, algumas alterações, mas tão
insignificantes que não influíram no sistema nem mudaram a natureza da legislação
Manuelina e Afonsina [...].
Subsistem as distinções medievais de classes para o efeito de aplicação das penas
que variavam, consoante o réu era nobre ou plebeu, homem honrado, de estado, ou
homem vil. 130
130
SILVA, Manuel Dias da. Elementos de sociologia criminal e direito penal: lições do anno lectivo
de 1906-1907 na 14ª cadeira da faculdade de direito da universidade de Coimbra. Coimbra: Imprensa da
Universidade, 1906. p. 327-9.
CAPÍTULO 2
PERÍODO IMPERIAL – UM DIREITO PENAL
BRASILEIRO, E A REABILITAÇÃO CRIMINAL
2.1 O DEPERECIMENTO DO DIREITO PENAL DAS FILIPINAS
Muitos dissabores curtidos pelos súditos da portuguesa Coroa setecentista tinham um
gosto esquisito, e engendravam efeitos não menos invulgares em seus espíritos: o habitual
azedume do sistema penal filipino tornara-se mais que indigesto, era não raro também
ilegítimo e injustificável; a maça que desventrava o infrator, e o subjugava, agora estumava a
alguns, levando-os a engrossar a fileira dos descontentes.
Conquistas essas de filosofias e movimentos que não eram propriamente nascentes,
mas emergentes, longamente sedimentados a partir do conatural anelo liberal do indivíduo,
que recuperara da arca da Antigüidade um conceito mais exato de si.
Baixadas em 1603, as Ordenações Filipinas cessariam de ditar a matéria penal do
Brasil apenas em 1830, com o aparecimento do denominado Código Criminal do Império (Lei
de 16 de dezembro), marco do Direito Penal crioulo, e do ideal da codificação por aqui. Em
Portugal, semelhante sucesso verificar-se-ia apenas em 1852, ano de seu primeiro Código
Penal (Decreto de 10 de dezembro), 131 mas com proporções ainda maiores: era o fim do
131
Ideada antes, viu-se a reforma da legislação penal portuguesa na contingência de socorrer-se de sua
antiga colônia, tão longo foi o caminho percorrido até a edição do Código de 1852.
Outros sistemas também a inspiraram, decerto, e em acordo com o testemunho de Levy Maria Jordão:
“Em 1821 depois da revolução política que inaugurou o sistema liberal nomearam as Cortes uma comissão para
confeccionar o código criminal, a qual nada chegou a fazer. Em 1823 pela Carta de Lei de 14 de Fevereiro foi
votado pelo corpo legislativo um prêmio de quinze mil cruzados e uma medalha a quem o fizesse; e para o
mesmo fim foi votado em 1835 outro de vinte mil cruzados pela Carta de Lei de 25 de Abril. Apesar destes
estímulos não houve resultado algum; como porém o Sr. José Manoel da Veiga tivesse oferecido um projeto de
código, o Governo por Portaria de 19 de Dezembro de 1836 o mandou rever por uma comissão, que o aprovou,
sendo mandado observar por Dec. de 4 de janeiro de 1837, logo que fosse integralmente publicado; razões porém
que ignoramos fizeram que não tivesse lugar essa publicação oficial, o que é tanto mais para sentir quanto é certo
que muito merecimento tem esse trabalho do Sr. Veiga. Finalmente pelo Dec. de 10 de Dezembro de 1845 foi
nomeada de novo uma comissão, a qual concluiu o seu projeto em 30 de Setembro de 1852, sendo publicado e
adotado como lei do estado pelo Dec. de 10 de Dezembro do mesmo ano [...].
33
Direito Penal filipino. 132 Verdadeiramente decrepitara há algum tempo, e seu estertor serviu
de bálsamo a muitos.
Vários fatores concorreram em maior ou menor proporção para tal derrocada, e os
principais ficariam bem conhecidos pela posteridade.
O Iluminismo, que nascera ainda no século XVII como censura ao chamado Antigo
Regime, insurgiu-se ao longo da História especialmente contra o poder absoluto da realeza, de
que foi emblemático representante Luís XIV, de França. Em 1793, outro filho da Casa de
Bourbon seria destronado e decapitado em férvido episódio da Revolução Francesa, que
sacudiria os sanguinosos regimes da época, até de longes territórios. Poucas legislações penais
então sobreviveram sem considerar seus reclamos. Sortes como a de Tiradentes rarearam-se, e
as doutrinas que as pregavam sem rebuço escasseariam de forma acelerada.
A Nova Inglaterra independente se federalizaria em Estados Unidos, e, liberal,
adotaria em sua primeira e única Constituição (artigo IV, seção 4) 133 o regime que em terras
brasileiras se elevaria como espetro da branca túnica do mineiro desgraçado. Ainda no século
XVIII, correu mundo a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, proclamada pela
As suas fontes foram os códigos de França, de Espanha, do Brasil, da Áustria, e de Nápoles: é raro o
artigo que se não encontre em algum desses códigos, mais ou menos bem aplicado, e donde por vezes é quase
verbalmente extraído” (JORDÃO, Levy Maria. Commentario ao codigo penal portuguez: tomo I. 1853. p.
XVII e XVIII).
132
“Bárbara e desnaturada fora a nossa legislação penal antiga; bárbara e desnaturada, como os
costumes daquelas eras, eras, que, louvores a Deus e aos esforços dum povo por natureza livre, no presente são
contadas como triste memória do passado, e que há muito morreram para o futuro; porque um povo, que por
glorioso brasão, por lustroso timbre, tem a inata aspiração à liberdade, não poderia hoje suportar a crueldade e a
vingança, em vez da justiça; a severa inflexibilidade de uma lei vexatória e tirânica, em vez do bem entendido
rigor da pena, do sentimento moral e religioso, que o cristianismo viera implantar no meio dos homens, trazendo
do céu à terra esse meio divino, para nele temperar e purificar as leis da sociedade humana”
(D’ALBUQUERQUE, A. M. Seabra. in PINTO, Basilio Alberto de Sousa. Lições de direito criminal
portuguez: redigidas segundo as prelecções oraes do excelentíssimo senhor Basilio Alberto de Sousa Pinto:
impressas com sua permissão por A. M. Seabra D’Albuquerque. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1861. p.
IX-X).
133
Constituição dos Estados Unidos de 17 de setembro de 1787, art. IV, seç. 4ª: “Os Estados Unidos
assegurarão a todos os Estados da União a forma republicana de governo, e protegerão cada um deles, assim
contra a invasão, como contra violências intestinas, à requisição do corpo legislativo, ou do poder executivo,
quando o corpo legislativo não puder ser convocado – The United States shall guarantee to every State in this
Union a Republican Form of Government, shall protect each of them against invasion, and, on application of the
Legislature, or of the Executive (when the Legislature cannot be convened) against domestic violence”
(reprodução e vernaculização do dispositivo por Rui Barbosa, in BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui
Barbosa: volume XLVII: 1920: tomo III: o art. 6º da Constituição e a intervenção de 1920 na Bahia. Rio de
Janeiro: Ministério da Educação e Cultura, 1975. p. 26-7).
34
Assembléia Nacional Constituinte francesa. Transporte de férvido liberalismo, seus ideais
logo enfezaram o rigor do Direito Penal filipino.
Os maiores cavaleiros do humanismo, porém, brandiam pena, não espada. Nomes
como Beccaria, Montesquieu, Kant, Rousseau, Bentham, Hegel, Diderot e Voltaire
desgastaram a coluna central desse e de assemelhados sistemas penais, até que finalmente
fossem truncados pelos regimes que se consolidavam sob a estrela da liberdade.
Em 1789, o Projeto de Código Criminal do jurisconsulto Pascoal José de Mello Freire
muito se aproximou de arrebatar das Ordenações Filipinas a regulamentação do Direito Penal
de Portugal e de suas colônias. Mas não foi convertido em lei. Através das legislações que
inspirou, no entanto, se faria presente. 134
Em 1813, Feuerbach entregaria à Baviera o mais avançado Código Penal de seu
tempo, que, logo, constituir-se-ia na súmula dos predicados de que ressentia o Direito Penal
filipino. Vivamente sugestionado pelas idéias liberais que convulsionaram os últimos anos do
século anterior, a técnica e a cientificidade jurídicas pela primeira vez ombreavam-se com a
política criminal esposada. De mais a mais, rutilou em cenário a cuja testa apontava o Código
de Napoleão, de 1810. 135
O furriel não sabia, não podia saber, mas suas ambições o ligariam para sempre à
história do Brasil, para onde se dirigiu a família imperial portuguesa, fugida.
134
“A perspectiva de progresso no campo das relações humanas e sociais, tendo à frente as generosas
petitions of rights e o humanismo refletido na obra de Beccaria (1764), determinaram o movimento para
reformar a legislação portuguesa. Em 1778 foi constituída uma Comissão à qual se juntou Pascoal de Melo
Freire em 1783 e que foi encarregada de elaborar os projetos de Códigos de direito público e direito criminal. Os
trabalhos foram apresentados em 1789 e continham revolucionárias mudanças no sistema vigente.
Muito embora o Projeto Freire fosse abandonado, a história do direito penal luso-brasileiro consagrou
os esforços daquele jurisconsulto que tanto lutou contra a ‘carnífica tortura’ alimentada pelo Livro V das
horrendas Ordenações” (DOTTI, René Ariel. Reforma penal brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 1988. p. 141).
135
“O texto que, na legislação penal comparada, se contrapõe ao Code Napoleón, podendo ser a ele
equiparado tecnicamente – e até mesmo superando-o – posto que representa a autêntica linha liberal da
legislação penal, é o código da Baviera, de 1813, redigido por Johann Paul Anselm Ritter von Feuerbach. O
texto incorpora as idéias de seu autor, particularmente com relação à pena [...]. Trata-se de um texto com
linguagem extraordinariamente polida e técnica para a sua época, com conceitos bem construídos, que reduzem a
arbitrariedade judicial, altamente racional e demarcatório de uma linha político-penal em que o homem é
colocado em primeiro plano, o que se evidencia na própria classificação das infrações por bens jurídicos,
começando com os delitos contra as pessoas” (PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio Raúl.
Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 2004. p. 203).
35
Pouco depois, em 1821, a revolução constitucionalista havida em Portugal fez com
que Pedro I, que permanecera no Brasil como Príncipe Regente, jurasse as Bases da Carta que
pelo lavor das cortes portuguesas se fizesse. O ato constituiu outro duro golpe desfechado
contra o Direito Penal filipino, que passou então a viger em desengano.
René Ariel Dotti discrimina os direitos individuais do cidadão declarados pelas Bases,
todos confessadamente liberais:
a) liberdade individual, segurança pessoal, direito de propriedade, segredo epistolar
e direito de petição; b) liberdade de pensamento, com as seguintes especificações:
quando exercida através da imprensa, submetia-se ao controle de um Tribunal
especial destinado a coibir os abusos e quando envolvesse dogmas da religião
católica e aspectos morais, ficavam sob a censura dos bispos; c) igualdade de todos
perante a lei, salvo determinadas exceções que iriam confirmar a regra visando
eliminar privilégios; d) as penas somente poderiam ser estabelecidas nos casos de
absoluta necessidade e deveriam ser proporcionais à gravidade do delito; e) eram
abolidas todas e quaisquer penas infamantes e cruéis, tais como a declaração de
infâmia, a tortura, os açoites, o baraço e o pregão e a marca de ferro em brasa; f)
acesso aos empregos públicos, atendendo-se ao critério do merecimento em função
do talento e das virtudes do candidato. 136
No ano seguinte, a Independência do Brasil seria uma realidade. E, segundo o mesmo
autor:
As notáveis mudanças que se operaram nos diversos campos de existência da nossa
grande nação se projetariam também nas práticas do Direito Criminal.
Mas a revogação das Ordenações Filipinas não foi imediata. Uma lei promulgada
pela Assembléia Constituinte, em 20.10.1823, determinou que se observasse ainda a
legislação portuguesa, enquanto se aguardavam a elaboração do novo Código e a
revogação dos diplomas em vigor. No entanto, já se manifestavam os ideais de uma
Reforma a se colocar em harmonia com a nova sociedade brasileira que se
desenvolvia sob o manto da liberdade nacional. Alguns princípios fundamentais do
Direito Penal europeu do último quartel do século das luzes já ganhavam defensores
entre os juristas brasileiros como Fernandes Pinheiro, José Clemente Pereira e
Bernardo Pereira de Vasconcellos. A irretroatividade da lei penal, a igualdade de
todos perante a lei, a personalidade da pena e a utilidade pública da lei penal foram
alguns desses princípios que mais tarde iriam basear a legislação criminal
propriamente brasileira. 137
Já como Imperador e Defensor Perpétuo do Brasil, o Príncipe Regente de antanho
doaria a sua primeira Constituição, em 1824, após dissolver a Assembléia que fora
especialmente convocada para elaborá-la. Solenemente o Brasil aguardava uma nova ordem
136
DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p. 185.
137
DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p. 184.
36
penal. E o projeto que se lançou não poderia ser mais alvissareiro: “um Código [...] Criminal,
fundado nas sólidas bases da Justiça, e Eqüidade” (art. 179, XVIII). 138
A Carta não deixou, entretanto, de modificar desde logo o Direito Penal vigente, por
força de inúmeras disposições constantes, máxime, de seu art. 179, aporte dos “direitos civis,
e políticos dos cidadãos brasileiros”. 139
Ainda é René Ariel Dotti quem reaviva essa conjuntura:
Antes de reordenado o sistema positivo através da compilação de leis harmonizadas
com os novos tempos políticos e institucionais, a Carta de 25.3.1824 proclamara
importantes princípios que deveriam informar as novas leis penais e de processo
penal. O art. 179, §18, determinava que se organizasse o ‘quanto antes um código
civil e criminal, fundado nas sólidas bases da justiça e eqüidade’. Através de outros
parágrafos, o mesmo dispositivo proclamou a inviolabilidade dos direitos civis e
políticos dos cidadãos tendo por base a liberdade, a segurança individual e a
propriedade. Além das garantias gerais no campo das liberdades públicas e dos
direitos individuais, a Carta Política declarou, formalmente, a abolição dos açoites,
da tortura, da marca de ferro quente e todas as demais penas cruéis; proibiu o
confisco de bens e a declaração de infâmia aos parentes do réu em qualquer grau;
proclamou que nenhuma pena passaria da pessoa do delinqüente e que ‘as cadeias
serão seguras, limpas e bem arejadas, havendo diversas casas para a separação dos
réus, conforme suas circunstâncias e a natureza de seus crimes’ (§§19, 20 e 21).
Por outro lado, foram solenemente declarados: a) a proibição de perseguição por
motivo religioso (§5º); b) a inviolabilidade do domicílio (§7º); c) a proibição de se
prender e conservar na prisão alguém sem prévia culpa formada (§§8º, 9º e 10); d) o
princípio da personalidade da pena (§20).
De relevo acentuar que alguns dos princípios penais, consignados na Constituição,
foram expressamente desenvolvidos na legislação penal posterior, compreendendo o
Código Criminal e o Código de Processo. Vale destacar alguns deles pela sua
repercussão social e humana: a) o princípio da irretroatividade da lei penal declarado
juntamente com o da irretroatividade de qualquer outra espécie ou natureza de leis
(§3º). Tal detalhamento tornava-se indispensável para garantir o novo regime de
garantias. À nova ordem constitucional, repugnava a rotina da lei de ter eficácia
retroativa, de modo a sacrificar a liberdade e a segurança jurídica; b) o princípio da
igualdade de todos perante a lei (art. 179, §13). A legislação anterior desconhecia
inteiramente tal princípio, ficando ao arbítrio do juiz aplicar ou desconsiderar a lei
conforme a natureza e a condição das pessoas [...]; c) o princípio da individualização
da responsabilidade, em virtude do qual ‘nenhuma pena passará da pessoa do
delinqüente. Portanto, não haverá, em caso algum, confiscação de bens; nem a
infâmia do réu se transmitirá aos parentes em qualquer grau que seja’ (art. 179, §20).
Segundo a legislação anterior, a pena de infâmia pelo crime praticado pelos pais se
transmitia aos filhos e netos. Os descendentes dos réus do crime de lesa-majestade
eram declarados infames para sempre e submetidos a múltiplas perdas e restrições
de direitos. O Título VI do Livro V das Ordenações Filipinas tratava do referido
138
BRASIL. Constituição politica do imperio do Brazil. Collecção das leis do imperio do Brazil de
1824: parte 1ª. 1886. p. 32-4.
139
BRASIL. Constituição politica do imperio do Brazil. Collecção das leis do imperio do Brazil de
1824: parte 1ª. 1886. p. 32-5.
37
delito e impunha terríveis sanções: os filhos eram excluídos da herança paterna;
condenava-se o autor à pena de perpétua infâmia; proibia-se a honra da cavalaria e
outras dignidades [...]; d) o princípio da utilidade pública da pena (art. 179, §2º),
apesar da falta de uma compreensão homogênea em torno da expressão ‘utilidade
pública’.
Os historiadores admitem que a mudança no Brasil após 1821, e desenvolvida nos
anos seguintes, não se limitou a conduzir o país à Independência; ela proporcionou
as condições fundamentais para a aquisição de uma soberania nacional. Daí por que
falar-se de uma verdadeira ‘revolução liberal’. 140
O Direito Penal filipino ruiu na terceira década do século XIX, entre nós, por obra do
Código Criminal do Império do Brasil (Lei de 16 de dezembro de 1830). Daí a dois anos, o
Código do Processo Criminal de Primeira Instância com Disposição Provisória Acerca da
Administração da Justiça Civil (Lei de 29 de novembro de 1832) revogaria as disposições
processuais do Livro V das Filipinas, seu último sopro de vigência.
Estava acabado.
E, quem ouviria, nesse instante, ao fragor do exício, ao estalo do Direito Penal
crioulo?
Para um mundo novo, uma nova era.
2.2 O PODER MODERADOR E A REABILITAÇÃO CRIMINAL
Dispõe o art. 98 da Constituição Política do Império do Brasil, de 25 de março de
1824:
O Poder Moderador é a chave de toda a organização Política, e é delegado
privativamente ao Imperador, como Chefe Supremo da Nação, e seu Primeiro
Representante, para que incessantemente vele sobre a manutenção da Independência,
equilíbrio, e harmonia dos mais Poderes Políticos. 141
140
141
DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p. 185-7.
BRASIL. Constituição politica do imperio do Brazil. Collecção das leis do imperio do Brazil de
1824: parte 1ª. 1886. p. 20.
38
Por influência de Benjamin Constant, “tão importante na formação de D. Pedro [...],
com um prestígio inigualado entre os teóricos liberais da Europa”, 142 a Carta de 1824 abrigou
la clef de toute organisation politique, o Poder Moderador, que, naturalmente, não fora
admitido pelo Projeto de Constituição apresentado pela Assembléia Geral e Constituinte,
antes de sua dissolução, no ano passado. Tangida pela radical proposta libertadora, a grande
maioria dentre os que a compunham era infensa a participação desse alcance pelo rei, nos
negócios do Estado que nascia. Via-a como uma ingerência daninha, uma ameaça aos mais
caros interesses do novo século. 143
Sobre o Poder Moderador fez Pontes de Miranda este grave comentário:
No Império, que adotara o regime parlamentar, o monarca exercia o Poder
Moderador [...].
A fonte fora Benjamin Constant, no seu livro sobre política constitucional. Criara-se
na pessoa do rei aquele poder neutro, que o publicista francês aconselhava,
preservativo e reparador, sem ser hostil [...].
O Poder Moderador, depois de estabelecer-se no Brasil, penetrou na Carta
constitucional portuguesa, art. 71, e constituiu, doutrinariamente, inovação
memorável da história constitucional do Brasil. Os estadistas do Império tinham
plena consciência da originalidade, consistente na concentração dos poderes
marcados no art. 101 da Constituição imperial: nomear senador um dos três
candidatos eleitos pelo povo; convocar extraordinariamente a assembléia geral;
sancionar os decretos e soluções da assembléia geral, prorrogá-la ou adiá-la;
dissolver a Câmara dos Deputados; nomear e demitir os ministros; suspender o
magistrado que tinha de ser responsabilizado; perdoar as penas e conceder anistia.
Convenhamos em que se ia muito longe nos poderes de moderação. 144
Não faltou, no entanto, quem no aplaudisse, como expediente de que lança mão um
patriarca mavioso, em busca de congraçamento entre seus menores. Mas preponderariam,
entre os olhares despedidos à inovação, a desconfiança e o comedimento.
142
COSTA, Pedro Pereira da Silva. D. Pedro I: coleção A Vida dos Grandes Brasileiros: supervisão de
Afonso Arinos de Mello Franco e Américo Jacobina Lacombe: volume 9: supervisão de Afonso Arinos de Mello
Franco. São Paulo: Três, 1974. p. 173.
143
144
Cf. COSTA, Pedro Pereira da Silva. D. Pedro I. 1974. p. 149-150.
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967: com a
Emenda n. I, de 1969: tomo I: arts. 1º - 7º. 2. ed., rev., 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1973. p. 279-81.
Sobre esse Poder, cf., ainda: FIGUEIREDO, António Candido de. Rudimentos de direito publico
portuguez: accommodados ao programma official para uso dos alumnos de instrucção secundaria. Lisboa:
Livraria Ferreira, 1884. p. 32-5; BARBALHO, João. Constituição federal brazileira: commentarios. Rio de
Janeiro: Typographia da Companhia Lito-Typographia, 1902. p. 49; TAVARES, José. O poder governamental
no direito constitucional portuguez: lições para o curso do 2.º anno de direito no mez de maio de 1909.
Coimbra: Imprensa Academica, 1909. p. 5-9.
39
Agudamente anotava Alberto dos Reis, diante da Constituição portuguesa de 1838,
que se valera também da brasileira como peanha, mas sem admitir o Poder Moderador (art.
34): 145
Desde que há possibilidade de conflitos e antagonismos entre os três poderes, é
forçoso admitir, pondera-se, um órgão próprio para dirimir esses conflitos e remover
esses antagonismos: confiar tal atribuição a algum dos poderes interessados no
litígio seria atentar contra os mais rudimentares princípios de organização jurídica.
De resto, a necessidade do poder moderador resulta da própria unidade orgânica do
Estado. O Estado constitui um organismo, cuja unidade tem a sua expressão e
personificação no chefe supremo; este não pode ser mera figura decorativa e
ornamental; há de ter uma função própria correspondente à natureza e carácter da
sua representação: é a função moderadora ou unificadora.
A admissão do poder moderador obedece, a nosso ver, a um conceito vicioso de
organismo. Nos organismos vivos nada há que se compare ao que pretende ser o
poder moderador nos organismos sociais; nenhum órgão se eleva acima dos outros
para corrigir os desvios em que possam incorrer; a unidade orgânica resulta da ação
e reação dos vários órgãos uns sobre os outros; toda a vez que um aparelho se afasta
da sua função, as perturbações que o próprio desvio lhe causa e a reação dos outros
aparelhos com ele relacionados asseguram a restauração do equilíbrio orgânico. O
mesmo deve suceder nos organismos políticos. A única garantia eficaz contra os
conflitos e abusos está na reação duns órgãos sobre os outros e da consciência
coletiva do país sobre todos eles.
Tudo o mais são soluções artificiais que apenas dão em resultado o predomínio
violento dum dos poderes sobre os outros. Senão veja-se o que sucede entre nós. A
instituição do poder moderador tem como conseqüência imediata entregar-se de fato
ao poder executivo a resolução dum conflito em que ele pode ser interessado. Com
efeito, o ato do poder moderador só nominalmente tem uma origem diversa do ato
do poder executivo; na realidade das coisas os dois atos emanam das mesmas
entidades, revestem os mesmos caracteres e implicam a mesma responsabilidade.
Finalmente, a admissão do poder moderador deixa em aberto a lacuna que se
pretende preencher. Se um conflito surgir entre o próprio poder moderador e um dos
outros poderes do Estado, a que órgão há de confiar-se a solução do incidente?
Pelo que deixamos dito vê-se, pois, que a teoria tripartita das funções da soberania é
ainda a que melhor se adapta ao conceito orgânico do Estado. 146
145
Art. 34º Os poderes políticos são o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. §1º O Poder Legislativo
compete às Cortes com a Sanção do Rei. §2º O Executivo ao Rei, que o exerce pelos Ministros e Secretários de
Estado. §3º O Judiciário aos Juízes e Jurados na conformidade da lei (PORTUGAL. Constituição politica da
monarchia portugueza: edição official. Lisboa: Imprensa Nacional, 1838. p. 9).
146
REIS, Alberto dos. Sciencia politica e direito constitucional: lições feitas ao curso do 2º anno
juridico de 1906 - 1907. Coimbra: Imprensa Academica, 1907. p. 161-2.
Marnoco e Souza deparou-se com a mesma aporia: “E, se a possibilidade de conflitos entre os poderes
do Estado exige um poder especial para os resolver e afastar, então como se hão de resolver os conflitos e
divergências que venham a surgir entre o poder moderador e qualquer outro poder do Estado?”.
E concluía, severamente: “A admissão do poder moderador unicamente serve para tirar a independência
aos outros poderes do Estado [...].
O poder moderador é ainda um resto do antigo absolutismo dos príncipes, que as constituições liberais
precisam de eliminar. A ação que ele exerce sobre todos os outros é deletéria, e, sob a aparência enganadora de
uma função de coordenação, encobre aspirações de domínio e tirania” (SOUZA, António José Ferreira Marnoco
e. Direito político: poderes do Estado: sua organização segundo a sciencia politica e o direito constitucional
português. Coimbra: França Amado, 1910. p. 75).
40
A função moderadora manifestar-se-ia conforme o art. 101 da Carta brasileira de
1824, sempre através do Imperador; no caso do inc. VIII, “perdoando, e moderando as penas
impostas aos Réus condenados por sentença”. 147
Houve quem identificasse a hipótese como Reabilitação Criminal, “sob a forma de
perdão”. Forçosamente, faria o mesmo diante do Código Criminal do Império, quando aí se
deparasse com o art. 66, alusivo a esse poder imperial. 148
Como René Ariel Dotti:
Segundo a Constituição imperial, o favor era deferido sob a forma de perdão,
outorgado pelo Poder Moderador exercido pelo Príncipe Regente (art. 101, §8º).
Essa era também a visão do instituto perante o Código Criminal do Império (art.
66). 149
E Marco Antônio de Menezes:
“A Constituição de 1824, em seu artigo 101, §8º, trata a reabilitação como forma de
perdão e como faculdade do poder moderador exercido pelo monarca, transportando-se daí
para o Código Criminal do Império, no artigo 66 [...].” 150
Amparado embora pela equivocidade quanto às origens e às linhas reitoras do
instituto, 151 esse entendimento fatalmente faz-se alvo aos estudiosos que só admitem
Reabilitação com longes da restitutio in integrum, e que constituem a maioria.
147
BRASIL. Constituição politica do imperio do Brazil. Collecção das leis do imperio do Brazil de
1824: parte 1ª. 1886. p. 20-1.
148
Art. 66. O perdão, ou minoração das penas impostas aos réus, com que os agraciar o Poder
Moderador, não os eximirá da obrigação de satisfazer o mal causado em toda a sua plenitude (BRASIL. Lei de
16 de dezembro de 1830 – Manda executar o Codigo Criminal. Collecção das Leis do Imperio do Brazil de
1830: parte primeira. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1876. p. 153).
149
DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p. 613.
150
MENEZES, Marco Antônio. A reabilitação criminal no passado e no presente: uma visão
histórico-jurídica. Disponível em: <http://pepsic.bvs-psi.org.br>. Acesso em abril de 2008.
151
Equivocidade essa en passant salientada ao tópico 1.3 da presente monografia.
Aloysio de Carvalho Filho a não desperceberia: “De efeitos restritos à abolição das incapacidades civis,
oriundas da condenação penal, passa à própria condenação, fazendo-a desaparecer, como se fosse uma anistia; de
mero favor dos governantes, transfigura-se em ato judicial, fundamentado nos elementos e provas de processo
adequado; dos delinqüentes primários estende-se aos reincidentes, das penas criminais às correcionais, dos
condenados que cumpriram pena aos que, em conseqüência da graça ou prescrição, não a cumpriram; dessa
41
Conforme o bosquejo da Constituição de 1824, confunde-se o perdão com graça lato
sensu, bem estremada da restitutio na desinteligência em que se antepõem direito subjetivo e
favor, ato judicial e ato político-administrativo. 152
2.3 O CÓDIGO CRIMINAL DO IMPÉRIO
A 16 de dezembro de 1830, D. Pedro I sancionava o Código Criminal do Império do
Brasil. Nesse ano, protraíra as atividades da Assembléia Geral, conforme lhe autorizava a
Carta vigente (art. 101, V), 153 com o nítido objeto de que fosse o trabalho finalmente
concluído. Ao mesmo tempo, atendia parcialmente a ordem constitucional das mais
decantadas (art. 179, XVIII), 154 pondo fim a grande expectativa: há mais de três anos
Bernardo Pereira de Vasconcellos tivera seu Projeto preferido ao de José Clemente Pereira,
para servir de estrado à Codificação. 155
A obra sancionada, composta por 313 artigos, divide-se em quatro grandes Partes. A
primeira, que funciona como parte geral, tem Dos Crimes, e das Penas como mote (arts. 1º a
maneira, a reabilitação vence, através de várias leis, que os tribunais interpretam e esclarecem, sucessivas etapas,
mas, sempre presente, sob maiores ou menores limites, reservas, condições ou formalidades, ao ex-condenado,
estímulo para o bem, aceno de esperança em dias melhores, na plenitude de reputação social” (CARVALHO
FILHO, Aloysio de. Comentários ao código penal: volume IV: arts. 102 a 120. 5. ed., atual. por Jorge Alberto
Romeiro. Rio de Janeiro: Forense, 1979. p. 276-7).
152
“De qualquer forma, a ‘graça’, tal como a conhecemos, e muito menos nos seus primórdios, não é
direito subjetivo, senão prêmio, aqui sim, do Estado, que a concede quando, a seu juízo e critério, entende
necessário ou conveniente aos seus interesses. E, quando digo Estado, pretendo alcançar a classe governante tal
como nos é dado conhecer a estrutura que aí está: o Poder Executivo. Não se trata daquele delineado por
Montesquieu. Ao Poder Judiciário não é dada a liberdade de agir assim, pois ao juiz cabe analisar o fato e aplicar
o direito a ele inerente e não atender a interesses políticos. A ‘graça’, então, nunca foi ato judicial, mas ato
político-administrativo. Em síntese, os interesses que norteiam o instituto da ‘graça’ não são, e não eram técnicojurídicos, mas meramente políticos [...]” (FALCONI, Romeu. Reabilitação criminal: coleção Elementos de
Direito. São Paulo: Ícone, 1995. p. 59).
153
Cf. BRASIL. Constituição politica do imperio do Brazil. Collecção das leis do imperio do Brazil
de 1824: parte 1ª. 1886. p. 20-1.
154
Cf. BRASIL. Constituição politica do imperio do Brazil. Collecção das leis do imperio do Brazil
de 1824: parte 1ª. 1886. p. 32-4.
155
Cf. PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil: evolução histórica. 2. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2001. p. 65-8; DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p. 187-9;
BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral: tomo 1º: introdução: norma penal: fato punível. 1978. p. 177-8;
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: a nova parte geral. 1991. p. 58-9; PRADO, Luiz Regis.
Curso de direito penal brasileiro: volume 1: parte geral: arts. 1º a 120. 2006. p. 115.
42
67); 156 as demais, por sua vez, cuidam dos crimes em espécie: respetivamente, dos crimes
públicos (arts. 68 a 178), 157 dos crimes particulares (arts. 179 a 275) 158 e dos crimes policiais
(arts. 276 a 313) 159 – compreendida na Quarta as Disposições Gerais (v. esclarecimento
abaixo). Cada Parte subdivide-se em Títulos, e alguns destes em Capítulos, e Disposições
Comuns, desmanchando-se uns e outros dos primeiros em Seções.
Textualmente há duas Disposições Gerais: as primeiras, entretanto, previstas ao cabo
do Título II da Parte Primeira, estão relacionadas tão-somente com a disciplina sobre a pena
(inclusive declaram sua imprescritibilidade – art. 65); 160 as outras, que terminam a Parte
Quarta, e o Código, é que tratam de intertemporalidade, de vigência etc., e praticamente
constituem, ante seu destacamento no arcabouço do diploma, uma quinta parte. 161
A geração desse ingente trabalho, e as linhas que o transformaram em modelo para o
Direito Penal coetâneo, seriam consideradas por Candido Mendes de Almeida, um século
depois:
No ano de 1830, foi promulgado o Código Criminal, depois de brilhante e demorada
discussão no parlamento, começada em junho de 1826, prevalecendo, por pequena
maioria, a manutenção da pena de morte, abolida, porém, para os crimes políticos.
Apesar, de manter, também, a pena perpétua de galés, isto é, com correntes ligando
dous condenados, e não admitir a prescrição, o Código Criminal de 1830,
representou um grande progresso ao direito brasileiro, levando mesmo vantagens
aos códigos contemporâneos, considerado trabalho notável pela erudição jurídica,
156
Cf. BRASIL. Lei de 16 de dezembro de 1830 – Manda executar o Codigo Criminal. Collecção
das Leis do Imperio do Brazil de 1830: parte primeira. 1876. p. 142-53
157
Cf. BRASIL. Lei de 16 de dezembro de 1830 – Manda executar o Codigo Criminal. Collecção
das Leis do Imperio do Brazil de 1830: parte primeira. 1876. p. 154-77.
158
Cf. BRASIL. Lei de 16 de dezembro de 1830 – Manda executar o Codigo Criminal. Collecção
das Leis do Imperio do Brazil de 1830: parte primeira. 1876. p. 177-92.
159
Cf. BRASIL. Lei de 16 de dezembro de 1830 – Manda executar o Codigo Criminal. Collecção
das Leis do Imperio do Brazil de 1830: parte primeira. 1876. p. 193-99.
Muitos dos crimes policiais previstos na Parte Quarta encontram correspondência na vigente Lei das
Contravenções Penais (Decreto-Lei n. 3.688, de 3 de outubro de 1941), o que de certo modo não fugiu à
acuidade de Zaffaroni: “La ultima parte del código estaba dedicada a las contravenciones (crímenes policiales)”
(ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Tratado de derecho penal: parte general: tomo I. Buenos Aires: Ediar, 1998. p.
374-5).
160
Art. 65. As penas impostas aos réus não prescreverão em tempo algum (BRASIL. Lei de 16 de
dezembro de 1830 – Manda executar o Codigo Criminal. Collecção das Leis do Imperio do Brazil de 1830:
parte primeira. 1876. p. 153).
161
Cf. BRASIL. Lei de 16 de dezembro de 1830 – Manda executar o Codigo Criminal. Collecção
das Leis do Imperio do Brazil de 1830: parte primeira. 1876. p. 198-9.
43
pureza gramatical e ainda pelo tino prático das suas disposições, algumas das quais
constituíram inovações na ciência penal, como a relativa à responsabilidade
sucessiva nos crimes por abuso de liberdade de comunicação de pensamento, mais
tarde adotada no Código da Bélgica. Reconheceu o princípio das penas
relativamente determinadas; e com o processo de diferenciação quantitativa e
qualitativa, a que sujeitou a aplicação da pena, deu testemunho de certo respeito
pelo preceito da individualização. Elogiado pelos criminalistas mais eminentes da
época, entre os quais o belga Haus, que afirmou ser a melhor codificação que
conhecia, foi o Código brasileiro de 1830 traduzido em francês por Victor Foucher,
que assim o vulgarizou no mundo culto, tendo servido de modelo a vários códigos
na América e na Europa, especialmente o Código da Rússia. 162
Foi obediente à Constituição de 1824, de cujo art. 179 brotara seu gérmen,
auspicioso. 163 E deu muita forma e muito colorido a essa que foi a primeira a servir ao Direito
Penal brasileiro – que não nasceu bem cativo à Reabilitação, como se verá.
Mas nem o Código Criminal do Império, que encantou a tantos, se veria sem censores.
Logo à suma autoridade de Tobias Barreto tocaria indigitar-lhe os vícios e defeitos a que
certamente não estava alheio, e que, lento e lento, comprometiam o prestígio de nossa justiça
penal.
Diria:
Não estou muito de acordo que ele tenha sido bom para o tempo mesmo de sua
promulgação; mas dado que assim fosse, isto não é uma razão peremptória contra
quem quer que hoje lhe note imperfeições e despropósitos. Se é perdoável a um
escritor brasileiro de 1830, mesmo porque atualmente ninguém mais o lê, o
acanhado das suas idéias, a estreiteza de seu horizonte, outro tanto não pode dar-se
com o legislador daquela época. Postergada e esquecida a produção literária, não é
muito que se procure salvar do naufrágio, ao menos, o nome do autor, desculpando
a sua ignorância. Mas como esquecer a lei, fechar os olhos a todos os seus defeitos,
e atender somente para o meio social e o estado de cultura dos homens, que a
fizeram, se a lei é hoje tão viva, como nos primeiros dias da sua execução, se a
desculpa fundada no tempo, em que ela foi feita, não nos livra dos maus resultados
das suas lacunas? Limito-me a perguntar, e não me demoro em saber qual seja a
resposta, pois que nenhuma pode ser dada, merecedora de atenção. 164
162
ALMEIDA, Candido Mendes de. Relatorio do delegado oficial do Brasil na comissão
internacional penal e penitenciaria: decimo congresso penal e penitenciario internacional realisado em Praga
em agosto de 1930: sessões e resoluções: contribuição do Brasil: sessões e resoluções da conferencia penal e
penitenciaria brasileira realisada no Rio de Janeiro em junho de 1930: Ministerio da Justiça e Negocios
Interiores. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1933. p. 160-1.
163
Cf. BRASIL. Constituição politica do imperio do Brazil. Collecção das leis do imperio do Brazil
de 1824: parte 1ª. 1886. p. 32-5.
164
BARRETO, Tobias. Menores e loucos e fundamento do direito de punir: obras completas: tomo
V: direito. Aracaju: Edição do Estado de Sergipe, 1926. p. 43-4.
44
E José Henrique Pierangeli, dentre os penalistas modernos, sem prejuízo do panegírico
que rende à situação global da obra:
É evidente que essa legislação possuía defeitos, como, aliás, já vaticinara a
Comissão nomeada pela Câmara, ao ofertar o seu parecer [...]. Não definia a culpa,
mencionando apenas o dolo (arts. 2º e 3º), conquanto no art. 6º a ela se referisse,
capitulando logo mais adiante crimes culposos (arts. 125 e 153), olvidou o
homicídio e as lesões corporais culposas. Essa omissão só veio a ser suprida através
da Lei 2.033, de 1871. Contudo, é de se ressaltar que o silêncio do Código, na época
em que veio a lume, pouco ou nada significava, pois a importância dos crimes
culposos só surgiu com o advento das máquinas, com os meios de transporte e da
evolução da indústria, quando, então, situações perigosas passaram a se apresentar e
reclamar o que hoje denominamos de cumprimento do dever objetivo de cuidado.
Também estaria a merecer críticas por ter sucumbido às idéias predominantes na
época, em que se valorizava a pena de morte, principalmente como meio de
submissão do braço escravo, sobre o qual repousava, em grande parte, a nossa
incipiente economia. Com isso espalhou-se a desigualdade no tratamento entre
homens, mas, é bem verdade, o escravo era apenas rês que pertencia ao seu senhor.
Tudo isso, embora a Constituição consagrasse o princípio da igualdade de todos
perante a lei [...]. 165
2.3.1 Da Reabilitação no Código Criminal do Império
A ossatura do Direito Penal brasileiro fora descansada em 1824, pela Constituição
Política do Império do Brasil, de índole liberal. Os princípios que desta surdiam, direta ou
indiretamente atinentes à prisão e à pena, é que mantiveram a compostura da matéria até o
advento do Código Criminal. O cadente sistema filipino, por seu lado, já lhe não podia
embargar de adolescer. E o próspero horizonte que se distendia ao fundo dessa organização
bisonha, e que irmanava a todos os brasileiros, infundia em seus primeiros críticos um projeto
inaudito de Direito e de Justiça.
Essa ambiência mais sujeita a medidas como a Reabilitação, todavia, mesmo a não
traria logo perfeita e acabada, com toda a expressão da clássica restitutio in integrum – que a
desentranhara da idéia comum de graça, como exemplar especial. Afinal ainda eram severas
as sanções previstas pelo Código Criminal do Império, e o individualismo que logo ditaria a
reserva do Estado, o despojaria por muito tempo dos valores sob os quais precisa antes
amadurecer a idéia da Reabilitação.
165
PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil: evolução histórica. 2001. p. 71.
45
Na realidade, o Direito Penal do Império não refugaria prontamente a qualquer medida
que, sem atentar contra os princípios liberais dominantes, fizesse oposição ao cabalístico
sistema filipino. Mesmo assim, significativas contribuições no campo da Reabilitação
adviriam apenas com a República entrada em anos, chegando mesmo a não reconhecê-la no
âmbito do Código Criminal do Império a maioria de seus estudiosos. 166
Nomes como Romeu Falconi e René Ariel Dotti, contudo, vislumbraram o instituto
em nosso primeiro estatuto criminal.
O primeiro diante do art. 59, que trata da pena de perda do emprego: 167
[...] quero contestar a afirmação categórica de omissão sobre o instituto de
reabilitação.
[...] pretendo demonstrar, ou pelo menos chamar a atenção para o fato de que [...]
houve certo desprezo quanto à maneira de interpretar a norma jurídica, não a
adaptando ao seu tempo e ao conjunto intrínseco e extrínseco de valores cultuados
naquela quadra social.
Percebe-se, claramente, a existência da pena acessória no Código Criminal do
Império. Assim, aquele que viesse a ‘perder o emprego’, por força de sentença, não
teria direito ao reconhecimento dos serviços prestados. Ao que parece, havia até
mesmo efeito retroativo da lei, que tinha efeito ex tunc.
Entretanto, cumpre observar a real possibilidade de o condenado ser agraciado com
uma verdadeira restitutio in integrum no que diz respeito ao emprego que exercia. E
a lei vai mais longe ao dizer: ‘da mesma ou de diversa natureza’, o que ensejava ao
beneficiado reivindicar os benefícios da fungibilidade, em matéria funcional.
É precisamente na seqüência da locução, que se vislumbra de modo claro, o
reconhecimento da reabilitação. Lê-se no texto, em sua seqüência: ‘Salvo havendo
declaração de inhabilidade’. Ora, se houve o cuidado do legislador em afirmar a
decretação de inabilitação, há de se admitir, como fez o sistema normativo penal de
166
Heleno Cláudio Fragoso é incisivo: “Nosso Código Criminal, de 1830, era inteiramente omisso a
respeito” (FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: a nova parte geral. 1991. p. 395).
Outros simplesmente não fazem qualquer referência a Reabilitação existente antes do advento da
República, ao analisar a evolução do instituto no Direito brasileiro, como Luiz Regis Prado (PRADO, Luiz
Regis. Curso de direito penal brasileiro: volume 1: parte geral: arts. 1º a 120. 2006. p. 677-8), Aloysio de
Carvalho Filho (CARVALHO FILHO, Aloysio de. Comentários ao código penal: volume IV: arts. 102 a 120.
1979. p. 268 e s.), Magalhães Noronha (NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal: volume 1: introdução e
parte geral. 1999. p. 309) etc.
167
Art. 59. A pena de perda do emprego importará a perda de todos os serviços, que os réus houverem
prestado nele. Os réus, que tiverem perdido os empregos por sentença, poderão ser providos por nova nomeação
em outros da mesma, ou de diversa natureza, salvo, havendo expressa declaração de inabilidade (BRASIL. Lei
de 16 de dezembro de 1830 – Manda executar o Codigo Criminal. Collecção das Leis do Imperio do Brazil
de 1830: parte primeira. 1876. p. 152).
46
então, a reabilitação. De sorte que somente aqueles que fossem apenados com
sanção acessória da perda da função poderiam sempre pleitear a reabilitação. 168
Já o mestre curitibano vale-se do art. 66 da Codificação, 169 alusivo ao Poder
Moderador de perdoar as penas:
Segundo a Constituição imperial, o favor era deferido sob a forma de perdão,
outorgado pelo Poder Moderador exercido pelo Príncipe Regente (art. 101, §8º).
Essa era também a visão do instituto perante o Código Criminal do Império (art.
66). 170
De notar que, no primeiro caso, a hipótese mais se aproxima da restitutio in integrum,
sem as características da qual se não há falar em Reabilitação, segundo Falconi. 171
No segundo caso, a identidade do instituto com o perdão, que nada tem a ver com a
restitutio, calha à dominante concepção de que tem a Reabilitação a natureza de graça. 172
2.4 O DIREITO PENAL CRIOULO COMPLETA SEIS DECÊNIOS
O Direito Penal do Brasil nasceu com o Código Criminal do Império, em 1830.
Alvorecera pelos idos de 1824, com a Constituição, e até dantes, mas agora estava pronto.
Singular e valoroso, era do Brasil, era crioulo. 173
Esse Código vigorou durante 60 anos, os primeiros de nosso Direito Penal, quase toda
a Monarquia. Ao luzir a República, foi revogado por outro Código Penal (Decreto n. 847, de
168
FALCONI, Romeu. Reabilitação criminal. 1995. p. 81-2.
169
Art. 66. O perdão, ou minoração das penas impostas aos réus, com que os agraciar o Poder
Moderador, não os eximirá da obrigação de satisfazer o mal causado em toda a sua plenitude (BRASIL. Lei de
16 de dezembro de 1830 – Manda executar o Codigo Criminal. Collecção das Leis do Imperio do Brazil de
1830: parte primeira. 1876. p. 153).
170
DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p. 613.
171
Cf. FALCONI, Romeu. Reabilitação criminal. 1995. p. 48-50 e 57-71.
172
Cf. DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p. 614.
173
“O Código de 1830 constituiu a etapa inicial do direito penal brasileiro (pois, antes dele, mesmo após
a Independência, em 1822, vigorava no Brasil o líber terribilis das Ordenações Filipinas, tomadas de empréstimo
a Portugal). Foi, aliás, o primeiro Código autônomo da América Latina” (HUNGRIA, Nélson. Comentários ao
código penal: volume I: tomo I: arts. 1º a 10. 5. ed., atual. por Heleno Cláudio Fragoso. Rio de Janeiro: Forense,
1977. p. 47, nota 12, in limine).
47
11 de outubro de 1890), já bastante modificado.174 Mais do que a lei, porém, mudara o Direito
que esta pretendera dispor em artigos e incisos.
Nesses 60 anos, muito deveu a Ciência Criminal brasileira às Academias de Direito,
criadas por Lei de 11 de agosto de 1827. 175 E com a instrução acadêmica surgiram os
primeiros mestres; e o Brasil viu florescer a doutrina, 176 e os grandes jurisconsultos do
Império, de formação completa.
174
“Dentre as leis penais posteriores ao Código, até o advento do primeiro Código republicano, de
1890, foram promulgadas várias leis, dentre as quais merecem ser mencionadas as seguintes: 1) Lei de 4 de
setembro de 1850, que cuidou da repressão do crime de tráfico de africanos; 2) Lei de 18 de setembro de 1851,
sobre os crimes militares; 3) Lei de 20 de setembro de 1871, que define os crimes culposos e trata do estelionato,
(sic) 4) Lei de 4 de agosto de 1875, acerca do direito penal internacional; 5) Lei de 15 de outubro de 1886, que
refere-se a crimes de dano, incêndio e outros.
Com a abolição da escravidão, pela Lei Áurea, de 13 de maio de 1888, várias alterações atingiram o
Código Criminal. Em face da nova realidade social, em 4 de outubro desse mesmo ano, Joaquim Nabuco
apresentou projeto em que buscava a adaptação da lei penal à nova situação. O projeto sequer chegou a ser
discutido, mas o deputado João Vieira de Araújo apresentou ao Ministro da Justiça um ‘anteprojeto de nova
edição do Código Criminal’, tendo sido indicada para estudar o trabalho apresentado uma comissão [...]. Dita
comissão, através de ofício datado de 10 de outubro de 1889, opinou no sentido de que, em lugar de uma simples
revisão, se fizesse a reforma completa da legislação penal, posto que se impunha ‘a urgente necessidade de
reformar-se o atual regime de repressão’. Diante de tais considerações, o Conselheiro Cândido de Oliveira,
Ministro dos Negócios da Justiça, encarrega Batista Pereira de organizar o projeto reformista, missão que
aceitou. Contudo, em 15 de novembro de 1889, era proclamada a República, e com ela uma nova ordem
jurídico-política se instalou” (PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil: evolução histórica.
2001. p. 73-4).
Paula Ramos refletia, já em 1875: “Há mais de quarenta e quatro anos vivemos sob o regímen desse
monumento legislativo de penalidade que honra nossa pátria e seus autores.
Será porém chegado o tempo de rever a obra dos sábios de 1830?
Estaremos preparados para tão importante trabalho pelas lições da experiência, e reclamos instantes dos
costumes e da civilização que, segundo Bonneville, são as melhores e mais sábias conselheiras de quaisquer
modificações e reformas penais?
Não hesitamos diante da afirmativa.
A tendência irresistível para a revisão das leis criminais é um dos característicos do presente século,
como asseguram todos os modernos criminalistas [...].
É facto que a ninguém é lícito contestar; depois de 1830, época em que foi promulgado nosso Código,
quase todas as nações da Europa têm trabalhado na revisão completa de sua legislação criminal [...].
Se pois é manifesta a tendência da época que atravessamos; se nosso Código não é isento de
imperfeições e lacunas, que a experiência aliás tem de sobejo apontado, é de crer que os legisladores brasileiros
não deixarão, quanto antes, de atender a semelhante aspiração nacional” (RAMOS JÚNIOR, Antônio de Paula.
Commentario ao codigo criminal brasileiro. Rio de Janeiro: editora não informada, 1875. p. VII-IX).
175
BRASIL. Lei de 11 de agosto de 1827 – Crêa dous Cursos de sciencias jurídicas e sociaes, um na
cidade de S. Paulo e outro na de Olinda. Collecção das Leis do Imperio do Brazil de 1827: parte primeira. Rio
de Janeiro: Typographia Nacional, 1878. p. 5-7.
176
As grandes obras da fase inicial do Direito Penal crioulo viriam à tona somente a partir da segunda
metade desses 60 anos, a maioria em forma de comentários ao Código vigente.
Em escrito datado de 1858, Braz Florentino observa a escassez da doutrina brasileira sobre a sua
Ciência: “Há vinte e sete anos que o Código Criminal do Brasil foi promulgado, e a despeito do seu reconhecido
mérito e excelência, que o colocam a par das mais belas concepções legislativas dos tempos modernos, a
despeito mesmo do interesse vital que naturalmente devera inspirar o estudo de suas disposições em um país que
progride e aspira às honras da liberdade, nenhum trabalho tem aparecido sobre ele até o presente, além das
Observações do distinto magistrado o Sr. Dr. Mendes da Cunha; prova de que o gosto pelo estudo das ciências
jurídicas não tem tido entre nós a animação e o desenvolvimento que fora para desejar-se” (SOUZA, Braz
48
A liberdade de imprensa, dentre tantas conquistas liberais da humanidade por esses
tempos, no Brasil se deparou com regulamentação razoável, meditada. 177 O sistema de diamulta, que instituiu, afamar-se-ia através de outras legislações. 178 A individualização da pena,
tardiamente interessada, muito prosperou com a competente disposição sobre circunstâncias
atenuantes e agravantes (arts. 15 a 20). 179
Os ares, porém, não eram favoráveis à Reabilitação Criminal.
O bafejo individualista aflado pelo Iluminismo, que circunvolvia a Política
cosmopolita, e que naturalmente fora encanado para o primeiro Código Penal do Brasil, 180 se
Florentino Henriques de. Lições de direito criminal. 2. ed. augmentada com uma lição sobre o art. 1º do codigo
criminal. Paris: J. P. Aillaud Guillard e C., 1872. p. 329).
177
“É do mais alto interesse de atualidade qualquer questão, que se refira à liberdade da imprensa. Esta
belíssima instituição, que constitui uma das mais importantes conquistas da civilização moderna, tem chegado
em nosso país a uma desmoralização tal, que assusta os espíritos mais intrépidos. A imprensa é, como disse um
notável escritor, o sintoma quotidiano do estado do país; e quando descendo a mais torpe licenciosidade nas
mãos dos libelistas e difamadores, ela ataca com cínica audácia todas as reputações e todos os caracteres, é sinal,
de que a corrupção lavra pelo corpo social; e os pródromos das grandes anarquias se vão manifestando pela
desorganização e decomposição moral” (BARROSO, José Liberato. Questões praticas de direito criminal. Rio
de Janeiro: B. L. Garnier, 1866. p. 53).
178
O mundo conheceu-o como sistema nórdico, contudo, em razão do desenvolvimento que teve nas
legislações dessa região: “El origen del sistema del día-multa se halla [...] en el Código de Brasil de 1830,
siendo totalmente injusta la denominación de ‘sistema nórdico’, puesto que en los países nórdicos se lo
menciona más de setenta años después de su vigencia em los países de lengua portuguesa. Lo correcto sería
llamario sistema brasileño” (ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Tratado de derecho penal: parte general: tomo V.
Buenos Aires: Ediar, 1988. p. 215).
Cf., ainda: PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: volume 1: parte geral: arts. 1º a
120. 2006. p. 613; FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: a nova parte geral. 1991. p. 316;
PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil: evolução histórica. 2001. p. 72.
179
Cf. BRASIL. Lei de 16 de dezembro de 1830 – Manda executar o Codigo Criminal. Collecção
das Leis do Imperio do Brazil de 1830: parte primeira. 1876. p. 145-8.
180
Urgira a codificação do Direito nacional com a Independência, certo que não ignorava o governo a
representatividade desse lavor perante o consórcio internacional. A ordenação do Direito, todavia, em princípio
acorre à própria efetividade. Em relação ao Direito Penal, a idéia da codificação se consolidou com o princípio
da legalidade, creditado a Feuerbach.
“Foi com o Iluminismo, a partir do postulado nullum crimen sine lege, que se veio construindo a
Ciência do Direito Penal, pois do princípio da reserva legal deflui a exigência da lei prévia e também a de
sistematização racional da lei penal com vistas a garantir a segurança jurídica.
A ordenação sistemática da lei penal permite a sua cognoscibilidade, dando conformidade ao
aglomerado caótico, tornando apreensíveis os princípios comuns, em razão da estruturação das matérias,
estabelecendo de forma geral as condições de incidência das normas incriminadoras.
A lei penal ordenada de forma geral e abstrata fixa, também, as condições de eficácia das normas
incriminadoras, como por exemplo, no tempo, no espaço, a co-autoria como forma de realização da conduta,
bem como o modo de cumprimento das sanções penais, pena e medida de segurança, impedindo dessa forma o
arbítrio.
Surge, portanto, o processo de codificação como conseqüência do princípio da legalidade e da garantia
individual diante do Estado. E a codificação permite o desenvolvimento da Ciência do Direito Penal pela
49
não dispersaria suficientemente com o passar dos anos. Não obstante, houve quem ali bispasse
a Reabilitação, como restou mostrado.
E mesmo com o advento do regime republicano, a atmosfera individualista se
conservou por muito. A Reabilitação que consta de forma expressa do diploma de 1890 (art.
86) nada tem de social; designa a “reintegração do condenado em todos os direitos que houver
perdido pela condenação, quando for declarado inocente [...]”. 181 Não se preocupa com o
delinqüente, com a ressocialização. Esta, aliás, com a excepcionalidade da pena de morte
(Constituição de 1891, art. 72, §21) 182 assumiu a dianteira dos problemas nacionais.
O estrépito social, entretanto, se antecederia ao primeiro centenário do Direito Penal
brasileiro. 183
identificação dos princípios que se desumem do Código e pelo recorte da matéria disciplinada em institutos, cuja
natureza e implicações com outros institutos passam a ser examinados” (REALE JÚNIOR, Miguel. Instituições
de direito penal: parte geral: volume I. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 59-60).
181
BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1890. p. 2.676.
182
Cf. BRASIL. Constituição da Republica dos Estados Unidos do Brazil. Collecção das Leis da
Republica dos Estados Unidos do Brazil de 1891: partes I e II: de 24 de fevereiro a 30 de junho: volume I. Rio
de Janeiro: Imprensa Nacional, 1892. p. 17-9.
183
Rui Barbosa utilizou-se da campanha presidencial à sucessão de Rodrigues Alves para desasnar seus
compatrícios: “A concepção individualista dos direitos humanos tem evolvido rapidamente, com os tremendos
sucessos deste século, para uma transformação incomensurável nas noções jurídicas do individualismo
restringidas agora por uma extensão, cada vez maior, dos direitos sociais. Já se não vê na sociedade um mero
agregado, uma justaposição de unidades individuais, acasteladas cada qual no seu direito intratável, mas uma
entidade naturalmente orgânica, em que a esfera do indivíduo tem por limites inevitáveis, de todos os lados, a
coletividade. O direito vai cedendo à moral, o indivíduo à associação, o egoísmo à solidariedade humana”
(BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa: volume XLVI: 1919: tomo I: campanha presidencial. Rio
de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura, 1956. p. 81).
CAPÍTULO 3
PERÍODO REPUBLICANO –
DIREITOS E REABILITAÇÕES CRIMINAIS
3.1 O CÓDIGO PENAL DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL
O Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil, 184 “reconhecendo
a urgente necessidade de reformar o regímen penal”, entregou ao país, em 1890, por meio do
Decreto n. 847, de 11 de outubro, um novo Código Penal. 185
Vindo à luz antes mesmo que a República brasília completasse seu primeiro ano, antes
que tivesse sua primeira Constituição, esse estatuto, durante toda a sua vigência, e até mesmo
depois, exceleu nas páginas da doutrina como “o pior Código Penal de nossa história”. 186
184
Decreto n. 1, de 15 de novembro de 1889, art. 4º. Enquanto, pelos meios regulares, não se proceder à
eleição do Congresso Constituinte do Brasil, e bem assim à eleição das legislaturas de cada um dos Estados, será
regida a nação brasileira pelo Governo Provisório da República; e os novos Estados pelos governos que hajam
proclamado ou, na falta destes, por governadores delegados do Governo Provisório (BRASIL. Decreto n. 1, de
15 de novembro de 1889 – Proclama provisoriamente e decreta como a forma de governo da Nação
Brazileira a Republica Federativa, e estabelece as normas pelas quaes se devem reger os Estados Federaes.
Decretos do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: primeiro fasciculo: 15 de
novembro a 31 de dezembro de 1889. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1890. p. 1).
185
“O Governo Provisório aproveitou-se da excepcional autoridade que se atribuía em virtude das
funções extraordinárias que estava exercendo, para levar a efeito algumas reformas que eram desde muito
reclamadas pela opinião” (POMBO, José Francisco da Rocha. História do Brasil: volume V: a República. Rio
de Janeiro: W. M. Jackson Inc., 1959. p. 349).
186
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral: volume 1. 2006. p. 58.
Magalhães Noronha ajuíza: “Infelizmente o novo estatuto estava longe de seu antecessor e logo se viu
alvo de veementes e severas críticas. Carvalho Durão foi um dos que mais o criticaram. João Monteiro chegou a
chamá-lo ‘o pior de todos os códigos conhecidos’ [...].
As críticas que lhe foram feitas, sem dúvida, exageravam, mas, a par das qualidades apontadas, os
defeitos eram numerosos” (NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal: volume 1: introdução e parte geral.
1999. p. 59).
Segundo Aníbal Bruno, “o primeiro Código Penal da República foi menos feliz do que o seu antecessor.
A pressa com que foi concluído prejudicou-o em mais de um ponto, e nele a crítica pode assinalar,
fundadamente, graves defeitos, embora muitas vezes com excesso de severidade. Não tardou a impor-se a idéia
da sua reforma, e menos de três anos depois da sua entrada em vigor já aparecia o primeiro projeto de Código
para substituí-lo” (BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral: tomo 1º: introdução: norma penal: fato punível.
1978. p. 180).
“Não teve, porém, esse Código o mesmo sucesso do anterior”, justifica Assis Toledo, “provavelmente
pela pressa com que foi feito e promulgado ou, talvez, por não ter sido bem aceito e convenientemente aplicado.
51
Fora ainda a principal fonte da Consolidação das Leis Penais (baseada em obra
individual de Vicente Piragibe, convolada em lei pelo Decreto n. 22.213, de 14 de dezembro
de 1932), até que, carcomido em sua autoridade, se visse definitivamente revogado pelo
Código de 1940 (Decreto-lei n. 2.848, de 7 de dezembro). 187
As críticas que sobre ele desabaram foram numerosas e contundentes. E a tal ponto que mal entrara em vigor
teve início o movimento para reformá-lo [...]” (TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito
penal. 2007. p. 60).
Recebeu o estatuto penal de 1890, até mesmo, censura oficial. Logo ao primeiro item da Exposição de
Motivos do Código de 1940, assinada pelo Ministro Francisco Campos, assoma: “Com o atual Código Penal
nasceu a tendência de reformá-lo. A datar de sua entrada em vigor começou a cogitação de emendar-lhe os erros
e falhas. Retardado em relação à ciência penal do seu tempo, sentia-se que era necessário colocá-lo em dia com
as idéias dominantes no campo da criminologia e, ao mesmo tempo, ampliar-lhe os quadros de maneira a serem
contempladas novas figuras delituosas com que os progressos industriais e técnicos enriqueceram o elenco dos
fatos puníveis” (in FARIA, Antonio Bento de. Código penal brasileiro: volume II: primeira parte: parte geral:
arts. 1 a 41. Rio de Janeiro: Livraria Jacintho, 1942. p. 5).
Zaffaroni e Pierangeli, no entanto, redargúem de forma notável às críticas que se derramaram contra o
Código de 1890: “O Código de 1890 foi sumamente criticado, mas cremos que essas críticas não possuem tanto
fundamento como se tem apregoado. Freqüentemente refere-se a ele como possuidor de um texto arcaico e
defeituoso, e essa afirmação não tem sido objeto de uma revisão séria. Muitas dessas críticas exsurgem mais
como fruto da vaidade e da incompreensão [...].
É óbvio que a República nasceu sob o signo ideológico do positivismo, e o Código Baptista Pereira não
correspondia a essa ideologia. Isto explica as críticas de que foi alvo, particularmente quando chegaram ao Brasil
as influências de Ferri e de toda a escola criminológica italiana. Obviamente, as tendências elitistas e racistas não
poderiam ver no código de 1890, algo diferente do que a materialização do liberalismo que elas satanizavam.
Justifica-se, dessarte, a crítica sobre ser ‘o pior de todos os códigos conhecidos’ (João Monteiro)”
(PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de direito penal brasileiro: parte geral.
2004. p. 210-1).
Nélson Hungria, a quem se reconhece a impavidez de bater-se pelo ignoto valor desse Código,
testemunha que, “através do livro de Galdino” – faz referência ao primeiro tomo do Direito Penal Brasileiro
deste autor, tirado em 1921 –, “o Código de 90, que tão injustamente fora chamado ‘o pior Código Penal do
mundo’, aparecia-nos sob aspectos novos, reabilitado de muitas acusações que lhe faziam, explicado nos seus
pontos obscuros ou incompreendidos, reintegrado no verdadeiro sentido dos seus dispositivos, cientificamente
reajustado ao seu sistema orgânico e habilmente remoçado por uma exegese adaptativa. Ressurgiram, com o
excelente tratado, cuja publicação foi rematada em 1924, o estudo e o gosto em torno do direito penal. Viera ele
demonstrar que o nosso primeiro Código Penal republicano não era tão atrasado e defeituoso como se
assoalhava: os que com ele lidavam, na prática judiciária, é que revelavam, via de regra, um profundo descaso
pela cultura jurídico-penal, um quase total alheamento ao complexo estudo do direito penal como disciplina
jurídica, resultando daí que, ao invés de uma interpretação orientada no sentido de uma possível correção de
equívocos e falhas, o que se fazia era uma crítica intolerante e subversiva, tão do gosto dos que levam pouca
munição de ciência nos alforges” (HUNGRIA, Nélson. Comentários ao código penal: volume I: tomo I: arts. 1º
a 10. 1977. p. 57, nota 12 – cont.).
187
Não houve propriamente revogação do Código de 1890 com a entrada em vigor da Consolidação.
Este o teor do quinto considerando que encima o Decreto n. 22.213, de 1932 (os grifos são nossos):
“Considerando que, sem desarticular o sistema do Código atual nem alterar as disposições em vigor, é de todo
conveniente seja adotada uma consolidação das leis penais”; e o do parágrafo único de seu art. 1º: “A
Consolidação, assim aprovada e adotada, não revogará dispositivo algum da legislação penal em vigor, no caso
de incompatibilidade entre os textos respectivos” (BRASIL. Decreto n. 22.213, de 14 de dezembro de 1932 –
Aprova a Consolidação das Leis Penais, da autoria do Sr. desembargador Vicente Piragibe. Coleção das
Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1932: volume V: atos do govêrno provisorio: novembro e
dezembro. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1933. p. 371-2).
Zaffaroni e Pierangeli o atinaram, com nossos destaques: “Com o suceder dos anos, muitas leis
extravagantes foram editadas, com o que tornou-se difícil a aplicação do código. Isto levou o Desembargador
Vicente Piragibe a redigir uma consolidação das leis penais, para o seu próprio uso, e que veio a ser sancionada,
como texto oficial, através do Dec. 22.213, de 14.12.1932. Com esta estrutura, o código de 1890 teve vigência
52
A azáfama presente aos trabalhos dedicados à revalidação da ordem, e ao
assentamento da política imposta, naqueles primeiros tempos de República, em grande parte
foi responsável pelo insucesso do primeiro Código Penal desse regime. 188
Heleno Cláudio Fragoso, como a maioria, julgou-o um desserviço às letras jurídicas
nacionais, aclimadas que estavam à louvaminha até mesmo da crítica alienígena, que muito
agradara-se do Código de 1830:
Elaborado às pressas, antes do advento da primeira Constituição Federal
republicana, sem considerar os notáveis avanços doutrinários que então já se faziam
sentir, em conseqüência do movimento positivista, bem como o exemplo de códigos
estrangeiros mais recentes, especialmente o Código Zanardelli, o CP de 1890
apresentava graves defeitos de técnica, aparecendo atrasado em relação à ciência de
seu tempo. Foi, por isso mesmo, objeto de críticas demolidoras, que muito
contribuíram para abalar o seu prestígio e dificultar sua aplicação. 189
Informado por 412 artigos, o Código Penal dos Estados Unidos do Brasil divide-se
em quatro Livros: o primeiro, que compreende os arts. 1º a 86, cura Dos Crimes e das
Penas; 190 o segundo, e mais vasto, que termina com o art. 363, Dos Crimes em Espécie; 191 o
terço, Das Contravenções em Espécie, até o art. 404; 192 e, por último, hão lugar as
Disposições Gerais. 193
até 31.12.1941” (PIERANGELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de direito penal
brasileiro: parte geral. 2004. p. 210).
188
Sintomaticamente, o Livro II do Código, reservado aos crimes em espécie, tutela em primeiro lugar
os que atentam contra a forma de governo instituída (Títulos I e II) (Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de
outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do Governo Provisorio da Republica dos Estados
Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890. 1890. p. 2.676-84).
189
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: a nova parte geral. 1991. p. 60.
190
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.664-76.
191
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.676-728.
192
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.728-35.
193
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.735-7.
53
Ainda, seu Livro II foi desmiudado em Títulos, Capítulos e Seções, 194 o Livro I,
apenas em Títulos, 195 e o Livro III, em Capítulos. 196 O Livro IV, ao invés, se não fragmenta;
distingue-se dos anteriores por sua macicez. 197
O Código de 1890, enfim, foi assim resumido por Magalhães Noronha:
“Era ele de fundo clássico. Procurou suprir lacunas da legislação passada. Definiu
novas espécies delituosas. Aboliu a pena de morte e outras, substituindo-as por sanções mais
brandas, e criou o regime penitenciário de caráter correcional.” 198
3.1.1 A Reabilitação no Código Penal dos Estados Unidos do Brasil
O Código Penal dos Estados Unidos do Brasil (Decreto n. 847, de 11 de outubro de
1890) refere-se à Reabilitação, primeiro, em seu art. 72, 3º, como causa extintiva da
condenação: 199
Art. 72. A condenação extingue-se por estas mesmas causas, 200 e mais:
194
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.676-728.
195
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.664-76.
196
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.728-35.
197
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.735-7.
198
NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal: volume 1: introdução e parte geral. 1999. p. 59.
199
BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.674.
200
Remete o caput do art. 72 às causas arroladas pelo anterior, extintivas, precipuamente, conforme a
dicção do Código, da ação penal: Art. 71. A ação penal extingue-se: 1º Pela morte do criminoso; 2º Por anistia
do Congresso; 3º Pelo perdão do ofendido; 4º Pela prescrição (BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de
1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil:
decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890. 1890. p. 2.674).
54
1º Pelo cumprimento da sentença;
2º Por indulto do poder competente;
3º Pela reabilitação. 201
Defronte a essa previsão, Fernando Nery atentou que o instituto, no sistema penal da
primeira República, ao lado do Indulto, secunda o Cumprimento da Sentença, como causa
extintiva da condenação:
Assim como para a extinção da ação penal o modo regular e normal é a condenação
ou absolvição do réu, assim também para a extinção da condenação o modo regular
e normal é o cumprimento da sentença, a sua execução, e esta se dá quando finda o
tempo pelo qual o delinqüente foi privado de certos direitos [...].
Assim como existem para a extinção da ação penal circunstâncias especiais, que
fazem sustar o seu prosseguimento, assim também para a extinção da condenação
podem concorrer causas diversas, libertando o condenado antes do prazo legal,
exarado na sentença. Estas causas são as mesmas da extinção da ação, e mais o
indulto do poder competente e a reabilitação. 202
O art. 86 do Código, que põe termo à sua Parte Geral, assim disciplina a
Reabilitação: 203
Art. 86. A reabilitação consiste na reintegração do condenado em todos os direitos
que houver perdido pela condenação, quando for declarado inocente pelo Supremo
Tribunal Federal em conseqüência de revisão extraordinária da sentença
condenatória.
Fala esse diploma em extinção, sem considerar, ou admitir, a concepção da ação como direito
autônomo e abstrato, que nascera da testilha estabelecida pelos alemães Theodore Muther e Bernhard
Windscheid, sobre a natureza desse direito. Seria sobremodo desenvolvida pelos discípulos que houveram, em
todo o mundo. No Brasil, contudo, constata-se certa relutância em aceitá-la.
Não permite essa concepção, em seu estádio atual, a extinção da ação; ao revés, sustenta sua
imprescritibilidade. Ter-se-ia, então, extinção da punibilidade, quando da ocorrência de qualquer das hipóteses
do art. 71. Assim se posicionou o Código Penal de 1940, antes (art. 108) (Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de
7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940:
volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de outubro a dezembro. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,
1941. p. 209) e a partir da Reforma de 1984 (art. 107) (Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro
de 1940 – Código Penal. Organização Luiz Flávio Gomes. 2008. p. 273-4). Escusável, porém, considerado o
verdor desse modelo, a posição da lei brasileira à época – e até pouco depois (cf. Código Civil de 1916, art. 75)
(Cf. BRASIL. Lei n. 3.071, de 1º de janeiro de 1916 – Codigo Civil dos Estados Unidos do Brazil. Collecção
das Leis da Republica dos Estados Unidos do Brazil de 1916: volume 1: actos do poder legislativo. 1917. p. 16).
201
Nossos destaques.
202
NERY, Fernando. Lições de direito criminal: programa do Dr. Esmeraldino Bandeira: 2º volume. 2.
ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: A. J. de Castilho, 1923. p. 603-4.
203
BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.676.
55
§1º A Reabilitação resulta imediatamente da sentença de revisão passada em
julgado.
§2º A sentença de reabilitação reconhecerá o direito do reabilitado a uma justa
indenização, que será liquidada em execução, por todos os prejuízos sofridos com a
condenação.
A Nação, ou o Estado, são os responsáveis pela indenização.
Estabelece, como efeito primário da Reabilitação, a reintegração do condenado em
todos os direitos que houver perdido pela condenação (caput, 1ª parte). 204 Mas não há falar
em restitutio in integrum: apenas o inocente, assim declarado pelo Supremo Tribunal Federal,
em conseqüência de revisão extraordinária da sentença condenatória (caput, 2ª parte), 205 seria
reabilitado. O modelo romano, que logrou diferençar-se dos mais atos de indulgência
soberana, em razão mesmo de sua natureza, pressupõe a culpa do condenado. 206 Trasladado
para o sistema francês, em 1670, foi preferido por inúmeras legislações, notadamente, após
ser confirmado pelo Código Penal de 1791, 207 sempre a favor do infrator.
Galdino Siqueira o paragonou com o modelo do Código brasileiro de 1890:
O código não acolheu o instituto da reabilitação como foi organizado em legislações
estrangeiras, especialmente na francesa, onde assumiu feição própria, servindo de
modelo a outros países.
Se na legislação romana, durante a república, a reabilitação era uma aplicação
especial da restitutio in integrum, emanava do povo, como ato de soberania, e sob o
império, emanava do senado e depois do imperador, como ato de clemência, de
graça, carácter este que conserva no direito intermédio e em legislações modernas,
como a alemã, na França, após a revolução, a evolução do instituto foi para assumir
204
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.676.
205
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.676.
206
A Damásio de Jesus, porém, pareceu ser o caso de restitutio: “Em face do CP de 1890, o instituto da
reabilitação configurava espécie de restitutio in integrum, exigindo um processo que tinha por fim a reparação de
erro ou injustiça da sentença (art. 86)” (JESUS, Damásio E. de. Direito penal: parte geral: 1º volume. 28. ed.
rev., 3. tir. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 651).
207
Cf. SILVA, Antônio José da Costa e. Codigo penal dos Estados Unidos do Brasil commentado:
volume 2. Ed. fac-similar. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2004. p. 426; FÜHRER, Maximiliano
Roberto Ernesto; FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Código penal comentado. São Paulo: Malheiros,
2007. p. 161; DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p. 615.
Alguns autores, entretanto, identificaram o instituto com os moldes da restitutio in integrum somente a
partir do Código de 1791: ROSA, Antônio José Miguel Feu. Direito penal: parte geral. 1. ed., 2. tir. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1995. p. 525; COSTA JÚNIOR, Paulo José da. Código penal comentado. 9. ed. rev.,
amp. e atual. São Paulo: Perfil, 2007. p. 284.
56
a natureza de ato de justiça, e tornar-se função judiciária, assim amoldando-se aos
modernos princípios sobre a pena e as funções judiciárias [...].
Assim, em nosso direito, é o inocente que reabilita-se, pelo solene reconhecimento
da injustiça de que foi vítima; no direito francês, é o culpado que cumpriu a pena
justamente imposta que, na reabilitação social, vai encontrar um poderoso estímulo
para corrigir seus vícios e um prêmio de valor inestimável à regeneração de seus
costumes (Whitaker). 208
Quando entrou em vigor o primeiro Código republicano, a revisão extraordinária da
sentença condenatória, a que se refere o caput de seu art. 86, 209 achava-se regulada pelo
Decreto n. 848, também de 11 de outubro de 1890, que organizara a Justiça Federal (art. 9º,
III). 210 Promulgada a Constituição de 24 de fevereiro de 1891, a matéria não deixou de ser
expressamente recepcionada, com alterações (arts. 59, III, e 81). 211 Enquanto, por exemplo,
208
SIQUEIRA, Galdino. Direito penal brazileiro: segundo o codigo penal mandado executar pelo
decr. n. 847 de 11 de outubro, de 1890 e leis que o modificaram ou completaram, elucidados pela doutrina e
jurisprudencia: volume I: parte geral. 2. ed. correcta e augmentada. Rio de Janeiro: Livraria Jacintho, 1932. p.
762-3.
209
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.676.
210
Cf. BRASIL. Decreto n. 848, de 11 de outubro de 1890 – Organiza a Justiça Federal. Decretos
do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de
1890. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1890. p. 2.745-6.
O Código Penal dos Estados Unidos do Brasil tivera a vigência sincrônica inicialmente prevista para
“seis meses depois de sua publicação na Capital Federal” (art. 411) (BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro
de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do
Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890. 1890. p. 2.736), conforme se supunha, já sob a égide de
uma Constituição da República. Mas o Decreto n. 1.127, de 6 de dezembro do mesmo ano de 1890, “tendo em
consideração [...] que o código penal [...], além de haver consolidado e modificado, de acordo com os princípios
mais adiantados da ciência e progressos do país, as disposições esparsas da anterior legislação criminal e suprido
muitas lacunas do código promulgado em 1830, aboliu penas condenadas pela opinião geral da Nação,
estabeleceu outras mais brandas e proporcionadas à culpa, bem assim regímen penitenciário mais adaptado à
emenda e correção dos delinqüentes; que reconhecido haver a reforma penal bem consultado os interesses da
justiça social e os deveres de humanidade, manifesta-se o sentimento de que o longo prazo único, fixado no art.
411, para o começo da execução em todo o território da República, prive ainda por muitos meses os lugares mais
próximos, em que a nova lei já é assaz conhecida, dos benefícios dela resultantes”, adiantou a vigência do
Código – determinando então fosse progressiva –, em muitos Estados (art. 1º) (BRASIL. Decreto n. 1.127, de 6
de dezembro de 1890 – Marca prazo para terem execução o codigo penal brazileiro e o decreto n. 1030 de
14 do mez findo. Decretos do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brasil: decimo segundo
fasciculo: de 1 a 31 de dezembro de 1890. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1891. p. 3.991-2 ).
Até a Constituição, de fevereiro de 1891, que o modificaria, em alguns pontos, o Decreto n. 848, de
outubro de 1890, regulou, com exclusividade, a revisão (cf. BRASIL. Decreto n. 848, de 11 de outubro de
1890 – Organiza a Justiça Federal. Decretos do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do
Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890. 1890. p. 2.745-6).
211
Cf. BRASIL. Constituição da Republica dos Estados Unidos do Brazil. Collecção das Leis da
Republica dos Estados Unidos do Brazil de 1891: partes I e II: de 24 de fevereiro a 30 de junho: volume I. 1892.
p. 13-4; 20.
57
aquele estatuto excetua o expediente aos condenados por contravenção (art. 9º, III, §1º), 212 a
lei fundamental lho garante, ao prescrever a revisão dos processos findos, em matéria crime
(art. 81, caput) 213 – que se não opõe a matéria contravencional, mas a açambarca, na tradição
do Direito luso-brasileiro. 214 Mais tarde, a Lei n. 221, de 20 de novembro de 1894, que
completaria a organização da Justiça Federal da República, modificou aquele Decreto em
muitas questões, atingindo a própria revisão (arts. 54, VIII, 74 e 78). 215 Esta, ainda como
meio para a Reabilitação, seria mais uma vez recepcionada, pelo sistema da Constituição de
1934 (arts. 76, 3º, e 78, caput). 216 Três anos depois o Estado Novo desabava sobre o Brasil,
silente a respeito, e assim perduraria até o câmbio definitivo da ordem penal de 1890.
Revoltariam revisão e Reabilitação em 1940, desadunadas.
O §1º do art. 86 declara que “a reabilitação resulta imediatamente da sentença de
revisão passada em julgado.” 217 Da inocência, declarada em sentença de revisão, é que
dimanava a reintegração do condenado nos direitos que perdera. Não era a Reabilitação efeito
da revisão, “porque esta”, assevera Macedo Soares, “é o recurso, o meio, de que serve-se o
condenado para obter aquela.” 218
212
Cf. BRASIL. Decreto n. 848, de 11 de outubro de 1890 – Organiza a Justiça Federal. Decretos
do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de
1890. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1890. p. 2.745-6.
213
Cf. BRASIL. Constituição da Republica dos Estados Unidos do Brazil. Collecção das Leis da
Republica dos Estados Unidos do Brazil de 1891: partes I e II: de 24 de fevereiro a 30 de junho: volume I. 1892.
p. 20.
214
O Supremo Tribunal seguiu essa orientação, segundo o depoimento de Macedo Soares: “Parece [...]
que a maioria do Tribunal considera revogada aquela disposição do decreto n. 848, pela generalidade do art. 81
da Constituição, promulgada, aliás, em 1891, depois daquele decreto” (SOARES, Oscar de Macedo. Codigo
penal da Republica dos Estados Unidos do Brasil commentado. 4. ed. correcta e consideravelmente
augmentada, contendo em appendice a legislação criminal publicada até á presente data. Rio de Janeiro: H.
Garnier, 1908. p. 199).
215
Cf. BRASIL. Lei n. 221, de 20 de novembro de 1894 – Completa a organisação da Justiça
Federal da Republica. Collecção das Leis da Republica dos Estados Unidos do Brazil de 1894: partes I e II:
volume I. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1895. p. 33-4; 38-9; 40.
216
Cf. BRASIL. Constituição da Republica dos Estados Unidos do Brasil. Diario da Assembléa
Nacional: anno II: n. 159: 17 de julho de 1934. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1934. p. 5.171.
217
BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.676.
218
SOARES, Oscar de Macedo. Codigo penal da Republica dos Estados Unidos do Brasil
commentado. 1908. p. 198.
58
O direito a uma justa indenização, a que fazia jus o reabilitado, por força do §2º do
art. 86,
219
suscitou sérias controvérsias acerca da responsabilidade do Estado, obrigado pela
parte final do dispositivo. A mencionada Lei n. 221, de 1894, previu quando essa
responsabilidade seria afastada:
Art. 84. A indenização garantida pelo art. 86 do Código Penal não será devida pela
União ou pelo Estado:
1º Se o erro ou injustiça da condenação do réu reabilitado proceder de ato ou falta
imputável ao mesmo réu, como a confissão ou a ocultação da prova em seu poder;
2º Se o réu não houver esgotado todos os recursos legais;
3º Se a acusação houver sido meramente particular.
Parágrafo único. A União ou o Estado terá em todo o caso ação regressiva contra as
autoridades e as partes interessadas na condenação; que forem convencidas de culpa
ou dolo. 220
Em 1898, o Decreto n. 3.084, de 5 de novembro, consolidou as leis referentes à Justiça
Federal. 221 Acabou por reunir a disciplina da revisão, da indenização e de outras questões
adjacentes à Reabilitação, em definitivo incluída em nosso Direito, desde a edição do
primeiro Código Penal da República.
Afinal, este o compêndio que dela fez José Frederico Marques, ao volver ao antigo
sistema de 1890:
No sistema do Código Penal de 1890, a reabilitação era o resultado da revisão
criminal impetrada contra condenações constantes de processos findos. Reformada,
Fernando Nery aventa a mesma lição de Macedo Soares, para defender esse entendimento (NERY,
Fernando. Lições de direito criminal: programa do Dr. Esmeraldino Bandeira: 2º volume. 1923. p. 606). Já
Galdino Siqueira sustenta que a Reabilitação “é um efeito imediato de provimento do recurso de revisão [...].
Como efeito imediato da decisão deste recurso, a reabilitação se verifica quando o condenado for declarado
inocente, caso em que será reintegrado em todos os direitos de que foi despojado pela sentença” (SIQUEIRA,
Galdino. Direito penal brazileiro. p. 763).
219
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.676.
220
BRASIL. Lei n. 221, de 20 de novembro de 1894 – Completa a organisação da Justiça Federal
da Republica. Collecção das Leis da Republica dos Estados Unidos do Brazil de 1894: partes I e II: volume I.
1895. p. 40-1.
221
BRASIL. Decreto n. 3.084, de 5 de novembro de 1898 – Approva a Consolidação das Leis
referentes á Justiça Federal. Collecção das Leis da Republica dos Estados Unidos do Brazil de 1898: parte II:
volume II. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1900. p. 779-1.208.
59
por injusta ou errônea, a sentença de condenação, o réu era reabilitado com a
restauração plena de seu anterior status dignitatis. 222
3.2 A CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS PENAIS
A desarrumação da ordem penal, quarenta anos após a sanção do Código de 1890, ante
as centenas de leis a ela dirigidas, até esse período, impossibilitou o aferro aos seus preceitos,
e até mesmo sua aplicabilidade. 223 E como a implantação de um novo sistema penal, através
do Código que se preparava, se não daria para breve, o que fora vaticinado pelo próprio
governo, este resolveu sancionar uma Consolidação das Leis Penais. Para tanto se serviu,
diante de outras opções, 224 do trabalho de Vicente Piragibe, originalmente intitulado Código
Penal Brasileiro, completado com as leis modificadoras em vigor, que esse plasmara para
melhor desempenhar sua judicatura junto à Corte de Apelação do Distrito Federal, ao que
parece, sem com isso pretender a gravura de seu nome à história do Direito Penal brasileiro.
João José Leal é preciso em seu escorço:
Nascido velho, o Código Penal de 1890 foi sendo complementado e alterado por um
número expressivo e importante de leis especiais. Ao final de alguns anos, diante do
insucesso das diversas tentativas de se fazer aprovar um novo Código, criara-se uma
verdadeira balbúrdia legislativa, o que dificultava em muito a correta compreensão
do direito repressivo, então vigente no país.
Procurando ordenar adequadamente o sistema positivo repressivo, o desembargador
Vicente Piragibe compilou e organizou as diversas leis penais, incluindo o próprio
222
MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal: volume III. Campinas: Millennium, 2002. p.
516.
223
Guilherme de Souza Nucci imputa à “criação de inúmeras leis penais desconexas” a causa do
aparecimento da Consolidação (NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte
especial. 3. ed. rev., atual. e amp., 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 65).
Diz mais Vitorino Prata Castelo Branco: “Sofreu [...]” (o Código de 1890) “reformas, por leis
autônomas, ficando desatualizado de todas, porém, foi feita uma consolidação pelo Desembargador Piragibe, a
qual acabou sendo oficializada, em 1932” (BRANCO, Vitorino Prata Castelo. Direito penal: parte geral. São
Paulo: Sugestões Literárias, 1970. p. 41).
224
O trabalho de Piragibe não foi o único do gênero, como se infere da observação de Zaffaroni, Nilo
Batista, Alagia e Slokar: “O carrascal de leis penais extravagantes, com ou sem alteração no texto do código [...],
levou alguns autores – como Eugênio Cunha e Alvarenga Netto – a publicarem compilações para uso forense. O
mais completo desses trabalhos, um Código Penal Brasileiro, completado com as leis modificadoras em vigor,
de autoria do Des. Vicente Piragibe, que com paciência beneditina preservou a estrutura articulada do código,
enxertando-lhe os acréscimos e alterações, seria oficializado como Consolidação das Leis Penais, através do
dec. n. 22.213, de 14.dez.932” (ALAGIA, Alejandro; BATISTA, Nilo; SLOKAR, Alejandro; ZAFFARONI,
Eugenio Raúl. Direito penal brasileiro: primeiro volume: teoria geral do direito penal. 2. ed. Rio de Janeiro:
Revan, 2003. p. 456).
60
código, unificando-as [...]. O trabalho desse jurista, embora de natureza particular,
acabou sendo oficializado pelo decreto n. 22.213, de 14.12.1932, tendo contribuído
de forma significativa para uma melhor compreensão e para facilitar a aplicação do
direito repressivo então vigente. 225
O Decreto n. 22.213, de 14 de dezembro de 1932, que, na expressão de seu cabeçalho,
aprova a Consolidação das Leis Penais, da autoria do Sr. desembargador Vicente
Piragibe, 226 foi assinado por Getúlio Vargas, Presidente da República, e Francisco Antunes
Maciel, que assumira no mês anterior a pasta da Justiça. Os considerandos que encimam o
Decreto são eloqüentes, e despeitoram a grave situação da ordem penal à época, além de
instruírem a aplicação do trabalho que veicula: 227
Considerando que o Código Penal Brasileiro, promulgado pelo decreto n. 847, de 11
de outubro de 1890, tem sofrido inúmeras modificações, quer na classificação dos
delitos e intensidade das penas, quer com a adoção de institutos reclamados pela
moderna orientação da penalogia;
Considerando que essas modificações constam de grande número de leis esparsas,
algumas das quais já foram, por sua vez, profundamente alteradas, o que dificulta
não só o conhecimento como a aplicação da lei penal;
Considerando que, não sendo lícito invocar a ignorância do direito devem as leis
estar ao alcance de todos, já pela clareza, já pela divulgação, o que, com rigor maior,
cumpre seja observado em relação às leis penais, em virtude da particular incidência
destas sobre a liberdade individual;
Considerando que, malogradas as várias tentativas de reforma do Código Penal
Brasileiro, a que ora se empreende ainda tardará em ser convertida em lei, não
obstante a dedicação e competência da respectiva Subcomissão Legislativa;
Considerando que, sem desarticular o sistema do Código atual nem alterar as
disposições em vigor, é de todo conveniente seja adotada uma consoliadção (sic) das
leis penais;
Considerando que esse objetivo pode ser alcançado com o trabalho “Código Penal
Brasileiro, completado com as leis modificadoras em vigor”, da autoria do Sr.
225
LEAL, João José. Curso de direito penal. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris & Editora da Furb,
1991. p. 67-8.
Álvaro Mayrink da Costa indica o mesmo intuito de compatibilização da matéria penal em vigor: “Face
ao grande número de leis complementares e da verdadeira colcha de retalhos que se transformou a codificação de
90, sumiu a idéia de sua revogação [...]. Para compatibilizar a matéria penal em vigor, o Des. Vicente Piragibe
foi encarregado de reunir num só corpo o Código e as disposições complementares, surgindo a Consolidação das
Leis Penais, aprovada e adotada pelo Decreto n. 22.213, de 14 de dezembro de 1932” (COSTA, Álvaro Mayrink
da. Direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 1982. p. 64).
226
Cf. BRASIL. Decreto n. 22.213, de 14 de dezembro de 1932 – Aprova a Consolidação das Leis
Penais, da autoria do Sr. desembargador Vicente Piragibe. Coleção das Leis da República dos Estados
Unidos do Brasil de 1932: volume V: atos do govêrno provisorio: novembro e dezembro. 1933. p. 371.
227
BRASIL. Decreto n. 22.213, de 14 de dezembro de 1932 – Aprova a Consolidação das Leis
Penais, da autoria do Sr. desembargador Vicente Piragibe. Coleção das Leis da República dos Estados
Unidos do Brasil de 1932: volume V: atos do govêrno provisorio: novembro e dezembro. 1933. p. 371-2.
61
desembargador Vicente Piragibe, Juiz da Corte de Apelação do Distrito Federal,
com exercício em uma das câmaras criminais desse alto tribunal judiciário;
Considerando que a própria Subcomissão legislativa do Código Penal, em parecer
emitido sobre o mencionado trabalho, reconhece a sua utilidade prática e se
pronuncia pela sua aprovação oficial, pensando, do mesmo modo, o Instituto dos
Advogados, o Club dos Advogados e a unanimidade dos desembargadores das
Câmaras Criminais da Corte de Apelação do Distrito Federal;
Considerando que o autor da obra consente na sua adoção, independentemente de
qualquer indenização ou prêmio, ressalvados apenas os seus direitos autorais, quanto
à edição já publicada e as reedições futuras:
Decreta [...].
A Consolidação das Leis Penais, todavia, “não refreou o movimento reformista”,
como anota João Mestieri, 228 e, por sua própria condição, não pôde resolver de todo os
problemas da ordem penal vigente, para os quais antes se faziam necessárias medidas inéditas
entre nós, muitas delas já em curso no Direito estranho. Considerável parte das críticas
destinadas ao Código de 1890 enveredou para a Consolidação, tendo em vista como
praticamente manteve o texto daquele, porém vazado de modo que se aboletassem os
preceitos resultantes das matérias que dele extravasavam, ou mesmo constantes das leis que
inovaram a ordem penal por ele iniciada. 229
Somente com o advento do Código Penal de 1940 desaparecia o sistema à frente do
qual estavam o Código Penal de 1890, e a Consolidação das Leis Penais, 230 esta
sucessivamente atualizada por seu autor, que, “nas edições posteriores de sua obra, trazia em
apêndice os novos diplomas legislativos”, de acordo com José Frederico Marques. 231
228
MESTIERI, João. Manual de direito penal: parte geral: volume I. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p.
52.
229
“Surgindo em 14 de dezembro de 1932, a Consolidação de Vicente Piragibe, composta de quatro
livros e quatrocentos e dez artigos, passou a ser, de maneira precária, o estatuto penal brasileiro” (JORGE,
Wiliam Wanderley. Curso de direito penal: parte geral: volume I. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 98)
(nossos grifos).
230
Cf. GARCEZ, Walter de Abreu. Curso básico de direito penal: parte geral: com noções de
criminologia. São Paulo: José Bushatsky, 1972. p. 99.
Cf., demais, o que se disse à nota de rodapé 187.
231
MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal: volume I: propedêutica penal e norma penal.
1. ed. atual. Campinas: Bookseller, 1997. p. 124.
62
3.2.1 A Reabilitação Criminal na Consolidação das Leis Penais
A Consolidação, optando por manter a estrutura do Código de 1890, inscreveu a
Reabilitação em seu art. 86, completando-o com as principais disposições extravagantes sobre
revisão e indenização – modificadas consoante as exigências para sua coabitação, sob a
capitania da matéria já codificada: 232
Art. 86. A reabilitação consiste na reintegração do condenado em todos os direitos
que houver perdido pela condenação, quando for declarado inocente pelo Supremo
Tribunal Federal, em conseqüência de revisão extraordinária da sentença
condenatória.
§1º A reabilitação resulta imediatamente da sentença de revisão passada em julgado.
§2º A sentença de reabilitação reconhecerá o direito do reabilitado a uma justa
indenização, que será liquidada em execução, por todos os prejuízos sofridos com a
condenação. A Nação ou o Estado são responsáveis pela indenização.
§3º Tem lugar a revisão:
1º Quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal;
2º Quando no processo em que foi proferida a sentença condenatória não se
guardaram as formalidades substanciais estabelecidas em lei;
3º Quando a sentença condenatória tiver sido proferida por juiz incompetente,
suspeito, peitado ou subornado, ou quando se fundar em depoimento, instrumento ou
exame julgados falsos;
4º Quando a sentença condenatória estiver em formal contradição com outra, na qual
foram condenados, como autores do mesmo crime, outros réus;
5º Quando a sentença condenatória tiver sido proferida na suposição de homicídio,
que posteriormente se verificou não ser real, por estar viva a pessoa que se dizia
assassinada;
6º Quando a sentença condenatória for contrária à evidência dos autos;
7º Quando, depois da sentença condenatória, se descobrirem novas e irrecusáveis
provas da inocência do condenado.
§4º Na revisão não podem ser agravadas as penas da sentença revista.
§5º A indenização garantida pelo art. 86 não será devida pela União ou pelo Estado:
1º Se o erro ou injustiça da condenação do réu reabilitado proceder de ato ou falta
imputável ao mesmo réu, como a confissão ou a ocultação da prova em seu poder;
2º Se o réu não houver esgotado todos os recursos legais;
3º Se a acusação houver sido meramente particular.
232
In PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil: evolução histórica. 2001. p. 340-1.
63
§6º A União ou o Estado terá em todo o caso ação regressiva contra as autoridades e
as partes interessadas na condenação, que forem convencidas de culpa ou dolo.
O caput e os §§1º e 2º são os mesmos do Código. 233 O §3º corresponde ao §1º do art.
74 da Lei n. 221, de 20 de novembro de 1894, com ligeiras modificações. 234 O §4º obedece à
idéia insculpida no §7º desse artigo, até hoje respeitada. 235 E os §§5º e 6º reproduzem o art. 84
da mesma fonte. 236
Além do que anotamos ao tópico 3.1.1 do presente trabalho, vis-à-vis ao sistema penal
de 1890, a que se ligou o trabalho de Piragibe, sem maiores inovações, de se considerar a
crítica de Romeu Falconi ao seu posicionamento em relação à Reabilitação:
Do tema em si: Reabilitação Criminal, nada de novo em relação ao Código
suprimido. Apenas alguns novos parágrafos (do 3º ao 6º). Mas, inobstante sua
pretensão de norma revolucionária, havia o ranço da norma velha, tratando da
‘revisão’ e não da ‘reabilitação’.
Desses parágrafos, o terceiro trazia sete hipóteses para a revisão e, por via de
conseqüência, a concessão da restitutio in integrum. Dizia da revisão para os casos
de sentenças contrárias à lei, processos com nulidades formais, juízo incompetente,
antinomia normativa, crime de homicídio inexistente, sentença contrária à prova dos
autos e, finalmente, a prova nova.
O §4º vetava a reforma da sentença in malus. Já o §5º cuidava do que era regulado,
anteriormente, no §2º, a questão da indenização. Mas, aqui, corrigiu-se o equívoco
entre os vocábulos Estado e Nação, falando-se em União e Estado, em clara alusão
ao federalismo, parece-me. Agora, dá-se versão contrária, não indenizando os casos
233
Cf. BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890 – Promulga o Codigo Penal. Decretos do
Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil: decimo fasciculo: de 1 a 31 de outubro de 1890.
1890. p. 2.676.
234
Cf. BRASIL. Lei n. 221, de 20 de novembro de 1894 – Completa a organisação da Justiça
Federal da Republica. Collecção das Leis da Republica dos Estados Unidos do Brazil de 1894: partes I e II:
volume I. 1895. p. 38.
235
Cf. BRASIL. Lei n. 221, de 20 de novembro de 1894 – Completa a organisação da Justiça
Federal da Republica. Collecção das Leis da Republica dos Estados Unidos do Brazil de 1894: partes I e II:
volume I. 1895. p. 38-9.
Cf. arts. 617, 2ª parte, e 626, parágrafo único, do atual Código de Processo Penal (Cf. BRASIL.
Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção das Leis da República
dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis de outubro a
dezembro. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1942. p. 117-8).
236
Cf. BRASIL. Lei n. 221, de 20 de novembro de 1894 – Completa a organisação da Justiça
Federal da Republica. Collecção das Leis da Republica dos Estados Unidos do Brazil de 1894: partes I e II:
volume I. 1895. p. 40-1.
Magalhães Noronha observa, com nossos destaques, que a Reabilitação “entre nós surgiu com a
Consolidação das Leis Penais de Vicente Piragibe, tendo como finalidade corrigir possíveis injustiças cometidas
pela jurisdição penal” (NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal: volume 1: introdução e parte geral.
1999. p. 309), o que não deixa de causar certa estranheza, sobretudo porque segue o autor a comentar a situação
do instituto “no regime do Código de 1890”.
64
de ‘rehabilitação’ em que o ‘rehabilitado’ tenha dado azo ao erro judiciário, ou
mesmo quando a ‘rehabilitação’ chegar antes de o beneficiado haver esgotado todos
os recursos processuais de que dispunha. Finalmente, Piragibe tratou de garantir ao
Estado o direito de regressão.
Se critiquei o Código de 1890, pelo atraso em relação ao instituto questionado, o que
dizer da obra de Vicente Piragibe, que vem com 50 anos de vantagem em relação
àquele. Tivéssemos acompanhado a França (1885), a Inglaterra (1907), Espanha
(1915) etc., e poderíamos ter algo mais atual, pelo menos. Entretanto, ficou o
desembargador Piragibe parado no tempo. Perdeu a oportunidade de passar para a
história do Direito Penal como jurista moderno e inovador, preferindo ser um mero
escriba de tendência conservadora. 237
Era, ainda, causa extintiva da condenação (art. 72, 3º). 238
3.3 O CÓDIGO PENAL DE 1940
A Exposição de Motivos, que, assinada por Francisco Campos, 239 Ministro da Justiça e
Negócios Interiores, acompanhara o Projeto do Código Penal, encaminhado a Getúlio
Vargas, Presidente da República, em 1940, não traria outra consideração em seu preâmbulo:
Com o atual Código Penal nasceu a tendência de reformá-lo. A datar de sua entrada
em vigor começou a cogitação de emendar-lhe os erros e falhas. Retardado em
relação à ciência penal do seu tempo, sentia-se que era necessário colocá-lo em dia
com as idéias dominantes no campo da criminologia e, ao mesmo tempo, ampliarlhe os quadros de maneira a serem contempladas novas figuras delituosas com que
os progressos industriais e técnicos enriqueceram o elenco dos fatos puníveis. 240
A 31 de dezembro de 1940, o Diário Oficial da União publicou o Decreto-Lei n.
2.848, que fora baixado a 7 pelo mesmo Presidente, usando do Poder extraordinário previsto
no art. 180 da Constituição de 1937. 241
237
FALCONI, Romeu. Reabilitação criminal. 1995. p. 87.
238
Cf. PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil: evolução histórica. 2001. p. 338.
239
Foi redigida por Nélson Hungria, membro da Comissão Revisora do Anteprojeto Alcântara
Machado, conforme a revelação de Heleno Cláudio Fragoso, atualizador de sua obra (in HUNGRIA, Nélson.
Comentários ao código penal: volume I: tomo I: arts. 1º a 10. 1977. p. 11-2).
240
In FARIA, Antonio Bento de. Código penal brasileiro: volume II: primeira parte: parte geral: arts. 1
a 41. 1942. p. 5
241
Art. 180. Enquanto não se reunir o Parlamento nacional, o Presidente da República terá o poder de
expedir decretos-leis sobre todas as matérias da competência legislativa da União (in FARIA, Antonio Bento de.
Codigo penal brasileiro: volume I: noções gerais: interpretação da lei penal: extradição internacional e
interestadual. 1942. p. 332).
65
Esse Código “marca o advento do período científico”, 242 ainda em curso no Direito
Penal brasileiro.
Nasceu do anteprojeto de Alcântara Machado, Professor de Direito da Universidade de
São Paulo, que em poucos meses se desincumbiu do trabalho que, por meio de seu Ministro
da Justiça, lhe solicitara o Presidente. Entregou-lho pronto em agosto de 1938, com 390
artigos. Dois anos depois, apresentaria o Professor uma versão final de seu trabalho, quando
as discussões em torno ao projeto do Código, no qual se transformara seu anteprojeto, já se
encontravam em fase adiantada. 243
Uma Comissão, constituída pelo Ministro da Justiça, revisaria aquele primeiro
anteprojeto durante o biênio seguinte à sua apresentação. Vencida essa etapa, uma versão
definitiva do Código Penal caía às mãos do Presidente, a 4 de novembro de 1940:
Sem desmerecer no valor do trabalho de que se desincumbira o Professor Alcântara
Machado, julguei de bom aviso submeter o projeto a uma demorada revisão,
convocando para isso técnicos que se houvessem distinguido não somente na teoria
do direito criminal como também na prática de aplicação da lei penal.
Assim, constituí a Comissão revisora com os ilustres magistrados Vieira Braga,
Nelson Hungria e Narcélio de Queiroz e com um ilustre representante do Ministério
Público, o Dr. Roberto Lira.
Durante mais de um ano a Comissão dedicou-se quotidianamente ao trabalho de
revisão, cujos primeiros resultados comuniquei ao eminente Dr. Alcântara Machado
que, diante deles, remodelou o seu projeto, dando-lhe uma nova edição. Não se
achava, porém ainda acabado o trabalho de revisão. Prosseguiram com a minha
assistência e colaboração até que me parecesse o projeto em condições de ser
submetido à apreciação de Vossa Excelência. 244
242
LYRA, Roberto. Expressão mais simples do direito penal: introdução e parte geral: com o texto
atualizado da legislação: remissões às matérias especial, contravencional, processual, constitucional,
administrativa, trabalhista, civil, comercial e outras: índices cronológicos e remissivos: quadros sinóticos. Rio de
Janeiro: José Konfino, 1953. p. 33.
243
Cf. DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p. 199-201; MIRABETE, Julio
Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP: volume 1. 2006. p. 25; PIERANGELI, José
Henrique. Códigos penais do Brasil: evolução histórica. 2001. p. 77-9; TOLEDO, Francisco de Assis.
Princípios básicos de direito penal. 2007. p. 62-3; NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal: volume 1:
introdução e parte geral. 1999. p. 61-2; PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: volume 1: parte
geral: arts. 1º a 120. 2006. p. 118.
244
Exposição de Motivos, n. 1 (in FARIA, Antonio Bento de. Código penal brasileiro: volume II:
primeira parte: parte geral: arts. 1 a 41. 1942. p. 6).
Cf., ainda, sobre a elaboração do Código Penal de 1940: MACHADO, Luiz Alberto. Direito criminal:
parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987. p. 41-2; PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do
Brasil: evolução histórica. 2001. p. 77-80. BRANCO, Vitorino Prata Castelo. Aulas de direito penal: de acordo
com a nova parte geral do código penal brasileiro: para uso dos professores e alunos das faculdades de direito. 2.
66
O Código Penal de 1940, como se reconheceu, foi influenciado, sobretudo, pelo
Codice Rocco, o Código Penal itálico de 1930 (Régio Decreto n. 1.398, de 19 de outubro) –
ainda em vigor, mas consideravelmente alterado, como o nosso –, talhado sob o fascismo de
Benito Mussolini. 245 Elaborado em pleno Estado Novo, contudo, encarnou o Código
brasileiro muitos valores estranhos à ditadura desse regime, como apontado por Pinheiro
Torres:
[...] é de se ressaltar que o Código de 1940, oriundo de um projeto preparado durante
um período revolucionário, quando o Estado era a força maior, tenha dado maior
importância à figura humana, relegando os crimes contra o Estado ao último lugar
da lista, em ordem de importância. Saído de um Código que considerara de maior
relevância os crimes religiosos, teve o código de 1940, oriundo inicialmente do
projeto Alcântara de 1937, essa grandeza de reconhecer, como preponderantes, os
direitos individuais. 246
Ninguém melhor do que Roberto Lyra, membro da Comissão revisora do Anteprojeto
Alcântara Machado, para proceder à desfiadura do Código Penal de 1940, em sua
conformação primitiva:
O Código divide-se em duas partes – geral e especial. A parte geral divide-se em 8
títulos: I (sic) Da aplicação da lei penal; II – Do crime; III – Da responsabilidade; IV
– Da co-autoria; V – Das penas; VI – Das medidas de segurança; VII – Da ação
penal; VIII – Da extinção da punibilidade. A parte especial divide-se em 11 títulos: I
– Dos crimes contra a pessoa; II – Dos crimes contra o patrimônio; III – Dos crimes
contra a propriedade imaterial; IV – Dos crimes contra a organização do trabalho; V
– Dos crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos mortos; VI – Dos
crimes contra os costumes; VII – Dos crimes contra a família; VIII – Dos crimes
contra a incolumidade pública; IX – Dos crimes contra a paz pública; X – Dos
crimes contra a fé pública; XI – Dos crimes contra a administração pública.
ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1986. p. 47; BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral: tomo 1º: introdução:
norma penal: fato punível. 1978. p. 183.
245
O Código helvécio de 1937 foi outro estalão que avultou no conceito dos operários de 1940, como
reconheceriam, entre outros, Magalhães Noronha (NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal: volume 1:
introdução e parte geral. 1999. p. 62), Fragoso (FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: a nova
parte geral. 1991. p. 63), Luiz Alberto Machado (MACHADO, Luiz Alberto. Direito criminal: parte geral.
1987. p. 42) e José Salgado Martins. Este comentou, ao reconhecer que “nosso Direito positivo [...] tem no
Código italiano de 1930 e no Código helvético de 1937 as suas fontes mais próximas, no campo da legislação
estrangeira”: “O primeiro, apesar da influência fascista que repercutiu no setor dos crimes políticos, é um
magnífico código, do ponto de vista técnico. O Código suíço é outro diploma penal que realizou, com equilíbrio,
o dualismo do moderno Direito Penal, representado pela pena e pela medida de segurança” (MARTINS, José
Salgado. Direito penal: introdução e parte geral. São Paulo: Saraiva, 1974. p. X).
246
TORRES, Paulo R. Pinheiro. Noções de direito penal. Rio de Janeiro: Liber Juris, 1973. p. 40-1.
Igualmente, Magalhães Noronha: “É o Código de 1940 obra harmônica: soube valer-se das mais
modernas idéias doutrinárias e aproveitar o que de aconselhável indicavam as legislações dos últimos anos.
Mérito seu, que deve ser ressaltado, é que, não obstante o regime político em que veio à luz, é de orientação
liberal” (NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal: volume 1: introdução e parte geral. 1999. p. 62-3).
67
Os títulos subdividem-se em capítulos e o capítulo I do título V da parte geral, como
o capítulo VI do título I da parte especial, em seções. 247
Do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940, resta apenas a Parte Especial,
embora consideravelmente modificada. A Geral foi cabalmente substituída por força da Lei n.
7.209, de 11 de julho de 1984, após muitas alterações. 248
3.3.1 A Reabilitação no Código Penal de 1940
O instituto foi previsto pelo Código Penal de 1940 desde sua redação primitiva (arts.
108, VI, 119 e 120). 249 Alterado pela Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968, uma nova
Reabilitação despontou de seu texto (arts. 119 e 120), 250 conservando embora a mesma
247
LYRA, Roberto. Expressão mais simples do direito penal: introdução e parte geral: com o texto
atualizado da legislação: remissões às matérias especial, contravencional, processual, constitucional,
administrativa, trabalhista, civil, comercial e outras: índices cronológicos e remissivos: quadros sinóticos. 1953.
p. 38.
Rogério Greco adita: “O nosso atual Código Penal é composto por duas partes: geral (arts. 1º a 120) e
especial (arts. 121 a 361).
É a parte geral do Código destinada à edição das normas que vão orientar o intérprete quando da
verificação da ocorrência, em tese, de determinada infração penal. Ali encontramos normas destinadas à
aplicação da lei penal [...]; cuida de conceitos fundamentais à existência do delito [...]; elenca causas que
excluem o crime, afastando sua ilicitude ou isentando o agente de pena; dita regras que tocam diretamente à
execução da pena infligida ao condenado, bem como a aplicação de medida de segurança ao inimputável ou
semi-imputável; enumera causas de extinção da punibilidade; enfim, ocupa-se de regras que são aplicadas não só
aos crimes previstos no próprio Código Penal, como também a toda legislação extravagante [...].
A parte especial do Código, embora contenha normas de conteúdo explicativo [...], ou mesmo causas
que excluam o crime ou isentem o agente de pena, é destinada, precipuamente, a definir os delitos e a cominar as
penas.
No Código Penal ainda percebemos que sempre ao lado dos artigos, de forma destacada, encontramos
determinadas expressões que se destinam à sua maior inteligibilidade [...]. A indicação marginal ou rubrica
variará de acordo com cada infração penal ou instituto da parte geral ou especial do Código, podendo também
ser utilizada na legislação extravagante” (GRECO, Rogério. Curso de direito penal: volume I: parte geral: arts.
1º a 120 do CP. 7. ed. rev. e atual. até 8 de agosto de 2006. Niterói: Impetus, 2006. p. 8-9).
248
“Código Penal de 1940 – Ainda é o vigente, na parte especial” (MEHMERI, Adilson. Noções
básicas de direito penal: curso completo. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 22).
“Em 1984, a parte geral – que trata dos princípios básicos do Direito Penal – do Código é integralmente
reformada, por meio da Lei n. 7.209, de 11 de junho (sic) [...]” (TELES, Ney Moura. Direito penal: parte geral:
arts. 1º a 120: volume 1. São Paulo: Atlas, 2004. p. 66).
249
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis
da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de
outubro a dezembro. 1940. p. 209; 211-2.
250
Cf. BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do
Código Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil
de 1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro.
Brasília: Departamento de Imprensa Nacional, 1968. p. 15.
68
natureza da anterior – causa extintiva da punibilidade. Em menos de um vicênio, porém, o
Código seria profundamente reformado, e a Reabilitação com ele.
Analisemo-las.
3.3.1.1 A Reabilitação do Código Penal de 1940 em sua Redação Primitiva
Entre as causas extintivas da punibilidade, no sistema do Código Penal de 1940,
aparece a Reabilitação: 251
Art. 108. Extingue-se a punibilidade: [...] VI – pela reabilitação;
Mas essa previsão não poderia ser examinada senão em confronto com a do art. 119,
que, ao regular o instituto, se valendo para tanto de três rubricas, limita seu alcance a pena de
interdição de direito (caput, 1ª parte, e §2º): 252
Reabilitação
Art. 119. A reabilitação extingue a pena de interdição de direito, e somente pode ser
concedida após o decurso de quatro anos, contados do dia em que termina a
execução da pena principal ou da medida de segurança detentiva, desde que o
condenado:
I – tenha dado durante esse tempo provas efetivas de bom comportamento;
II – tenha ressarcido o dano causado pelo crime, se podia fazê-lo;
§1º Se o condenado é reincidente, o prazo mínimo para a reabilitação é de oito anos;
Penas que a reabilitação não extingue
§2º A reabilitação não pode ser concedida em relação à incapacidade para o
exercício de pátrio poder, tutela, curatela ou autoridade marital, se imposta por crime
contra os costumes, cometido pelo condenado em detrimento de filho, tutelado ou
curatelado, ou por crime de lenocínio contra a própria mulher.
Prazo para renovação do pedido
251
BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis da
República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de outubro
a dezembro. 1940. p. 209.
252
BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis da
República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de outubro
a dezembro. 1940. p. 211-2.
69
§3º Negada a reabilitação, não pode ser novamente requerida senão após o decurso
de dois anos.
Assim, a Reabilitação extinguia a punibilidade do agente, porém apenas no que
concernia à pena acessória de interdição de direito, da qual cuidava o art. 69 do Código; 253
bem diferente do tratamento que recebera no sistema de 1890, como observado por Reale
Júnior:
Visava efetivamente a cancelar a pena acessória, não se confundindo com a
restitutio in integrum cabível com referência à condenação injusta, uma vez
reconhecida a injustiça da condenação em revisão criminal provida pelo Supremo
Tribunal Federal, tal como dispunha o Código Penal de 1890 em seu art. 86. 254
Mas a sensível evolução do instituto, entretanto, foi obcecada por um pesar
experimentado por toda a comunidade jurídica: a curteza de seu alcance apontava à abertura
da idéia que o justificava, de sua ratio – afinal era o condenado seu destinatário, ele quem se
reabilitava; mas apenas em relação a pena de interdição de direito. E a resignação inicial dos
Tribunais, diante da letra da lei, causou à doutrina a resolução de estender-lhe o alcance.
Romeu Falconi é lancinante:
[...] cumpre salientar que o Código Penal do Estado Novo adotou modelos
experimentados na Suíça e na Itália. No início, somente as penas acessórias, as
restritivas de certos direitos, é que poderiam ser alcançadas pelo instituto da
reabilitação criminal. Bem de ver tratar-se de quase um arremedo do que precisa ser
um instituto de tal magnitude em matéria de Política Criminal. Por demais
precavido, o legislador de 1940 pouco ou nada fez em prol da verdadeira e real
Reabilitação Criminal; dando ao reabilitado um crédito minguado, acabou por criar
ao instituto ‘letra morta’, deixando-o como norma vigente, mas não eficaz.
Conforme a preleção de Hans Kelsen. O resultado foi o que se viu: acabou o
Código, neste particular, sendo atropelado pelos anseios de alterações tendo de se
curvar a uma lei especialmente elaborada para o fim pretendido. 255
253
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis
da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de
outubro a dezembro. 1940. p. 199-201.
254
REALE JÚNIOR, Miguel. Instituições de direito penal: parte geral: volume II. 2. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2004. p. 154.
255
FALCONI, Romeu. Reabilitação criminal. 1995. p. 96.
O silêncio do dispositivo em relação ao condenado beneficiário de sursis, ou de livramento condicional,
mereceu da doutrina críticas de mesmo tom, como assinala Regis Prado: “O Código Penal de 1940 – redação
pretérita – elencou a reabilitação entre as causas extintivas da punibilidade (art. 108, VI), mas circunscrevia seu
alcance unicamente às penas de interdição de direito (art. 69) [...]. O tratamento dispensado à reabilitação por
aquele diploma penal foi objeto de severas críticas doutrinárias, motivadas em grande parte pela limitação do
âmbito de atuação do referido instituto à pena acessória de interdição de direito e pela ausência de previsão da
70
E mesmo entre as interdições de direitos, escapavam aos efeitos da Reabilitação, de
acordo com o §2º do art. 119, 256 a incapacidade para o exercício de pátrio poder (art. 69, II),
tutela, curatela (art. 69, III), ou autoridade marital (art. 69, II), 257 se imposta por crime contra
os costumes (qualquer dos previstos no Título VI da Parte Especial do Código), 258 cometido
pelo condenado em detrimento de filho, tutelado ou curatelado, ou por crime de lenocínio
contra a própria mulher (mediação para servir a lascívia de outrem – art. 227, favorecimento
da prostituição – art. 228, ou rufianismo – art. 230 259 ). 260
Essa limitação recebeu a atenção de Salgado Martins:
A reabilitação não alcança a pena acessória que consistiu na imposição de
incapacidade para o exercício de pátrio poder, tutela, curatela ou autoridade marital,
quando o crime contra os costumes de que ela se originou, foi cometido pelo
condenado em detrimento de filho, tutelado ou curatelado, ou quando o crime de
lenocínio foi contra a própria mulher. 261
reabilitação dos beneficiários por sursis ou livramento condicional” (PRADO, Luiz Regis. Curso de direito
penal brasileiro: volume 1: parte geral: arts. 1º a 120. 2006. p. 678).
256
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis
da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de
outubro a dezembro. 1940. p. 211.
257
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis
da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de
outubro a dezembro. 1940. p. 199-200.
258
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis
da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de
outubro a dezembro. 1940. p. 235-9.
259
O crime de casa de prostituição (erradamente considerado de lenocínio pelo Código Penal – v. a
rubrica original e disposição do Capítulo V do Título VI da Parte Especial) não pode ser praticado contra a
própria mulher, porquanto, antes, atenta contra a moralidade pública. A manutenção de casa de prostituição, ou
sítio destinado a encontros para fim libidinoso, não exige a exploração sexual, ou sequer prejuízo, de alguém,
como se nota da descrição típica do art. 229 do Código Penal. Ocorrendo, constituirá mera circunstância desse
crime, ou outro delito, ou irrelevante penal. A sociedade é a vítima nesse caso, e não uma dada pessoa – senão
mediatamente. O inverso se dá no crime de rufianismo (art. 230), por exemplo, em que prepondera a tutela da
pessoa.
Mas dessa observação diverge um Damásio de Jesus: “Sujeitos passivos são as pessoas que praticam a
prostituição, ou, não a exercendo, entregam-se à lascívia alheia [...].
Também é sujeito passivo do crime de casa de prostituição a sociedade, uma vez que o delito ofende os
bons costumes” (JESUS, Damásio E. de. Direito penal: parte especial: 3º volume: dos crimes contra a
propriedade imaterial a dos crimes contra a paz pública. 15. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 173).
260
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis
da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de
outubro a dezembro. 1940. p. 237-8.
261
MARTINS, José Salgado. Sistema de direito penal brasileiro: introdução e parte geral. Rio de
Janeiro: José Konfino, 1957. p. 494.
71
O inc. I do art. 119 motivou as mais enérgicas discussões em derredor do bom
comportamento, que exige, como prova de regeneração do condenado. 262 O melindre e o
subjetivismo da questão, contudo, foram de certo modo mitigados pelo art. 744 do Código de
Processo Penal de 1941 (Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro), que instituiu meios
específicos de comprovação do bom comportamento (incisos I a IV): 263
Art. 744. O requerimento será instruído com:
I – certidões comprobatórias de não ter o requerente respondido, nem estar
respondendo a processo penal, em qualquer das comarcas em que houver residido
durante o prazo a que se refere o artigo anterior; 264
II – atestados de autoridades policiais ou outros documentos que comprovem ter
residido nas comarcas indicadas e mantido, efetivamente, bom comportamento;
III – atestados de bom comportamento fornecidos por pessoas a cujo serviço tenha
estado;
IV – quaisquer outros documentos que sirvam como prova de sua regeneração;
V – prova de haver ressarcido o dano causado pelo crime ou persistir a
impossibilidade de fazê-lo.
Agregou Bento de Faria seu conceito à construção doutrinária levantada ao bom
comportamento:
Bento de Faria, por seu lado, acrescenta: “A – reabilitação – tem cabimento em se tratando de –
qualquer delito, excluídos os referidos no §2º, pouco importando que se trate de uma ou mais condenações, ainda
quando alguma seja decorrente de sentença estrangeira que tenha sido aqui homologada.
Tem por objeto não só as penas acessórias previstas no Código Penal, mas também quaisquer outras da
mesma natureza estabelecidas em leis especiais.
Não se refere, porém, às medidas de segurança, simplesmente porque estas já devem ter cessado para
permitir a sua concessão [...].
Sendo a constatação da regeneração moral do condenado não poderia ser pedida com referência a uma
só das condenações, havendo mais de uma.
Há de, pois, abranger todas elas [...]” (FARIA, Antonio Bento de. Código penal brasileiro: volume II:
parte segunda: parte geral: arts. 42 a 120: expulsão de estrangeiros. Rio de Janeiro: Livraria Jacintho, 1942. p.
269).
262
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis
da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de
outubro a dezembro. 1940. p. 211.
263
BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
264
Art. 743. A reabilitação será requerida ao Juiz da condenação, após o decurso de 4 ou 8 anos, pelo
menos, conforme se trate de condenado ou reincidente, contados do dia em que houver terminado a execução da
pena principal ou da medida de segurança detentiva, devendo o requerente indicar as comarcas em que haja
residido durante aquele tempo (BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo
Penal. Coleção das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder
executivo: decretos-leis de outubro a dezembro. 1942. p. 134).
72
O – bom comportamento – não se infere de circunstâncias, mas há de ser provado
por forma a convencer do arrependimento e do propósito de continuar a vida honesta
e de trabalho, sem riscos para a coletividade, e sempre mantido, sem solução de
continuidade [...].
O comportamento, portanto, cumpre seja incensurável; não é dedutível de meras
presunções, mas, concludentemente, provador por – atestações de autoridades
policiais ou de pessoas, acima de qualquer suspeição, ou por atos que notoriamente
o revelem, ou por depoimentos de testemunhas ouvidas com a intervenção do
Ministério Público, ou por documentos dignos de fé, ou por serviços prestados à
sociedade – provas essas que ficarão sujeitas à livre apreciação do Juiz. 265
O ressarcimento do dano causado pelo crime (Código Penal, art. 119, II; 266 Código de
Processo Penal, art. 744, V 267 ) não foi requisito menos discutido. O legislador, contudo, ao
dispensá-lo a quem comprovadamente não tivesse condição, andou bem. Fora daí, mesmo que
a vítima não houvesse buscado a reparação, segundo as instruções dos arts. 63 e seguintes do
Código de Processo Penal, 268 até a data do requerimento da Reabilitação, não havia
justificativa para se dispensar o cumprimento do requisito, como resolvido pela doutrina –
aqui na expressão de Gomes Neto:
265
FARIA, Antonio Bento de. Código de processo penal: volume III: arts. 668 a 811: da execução: da
execução das penas em espécie: das relações jurisdicionais com autoridade estrangeira. 2 ed. atual. Rio de
Janeiro: Record, 1960. p. 94.
O comentário de Reale Júnior é atual, e irrespondível: “[...] não basta para a reabilitação a comprovação
da inexistência de não estar respondendo a processo penal, conforme exigência constante do art. 744, I, do
Código de Processo Penal. O bom comportamento exigido é mais do que a ausência de processo criminal, e sim
a efetiva demonstração de conduta social boa, de reconhecimento de ser na comunidade uma pessoa de
comportamento ilibado. Esta prova, cada vez mais difícil na grande cidade, na qual cada um vive isolado, muitas
vezes profissional autônomo, ignorando o próximo e ignorado, é de ser obtida por atestados das autoridades
policiais, bem como por declarações de pessoas as quais se presta serviço, como empregado ou empresário ou
profissional liberal. O inciso II do art. 744 do Código de Processo Penal indica toda a concepção de classe
preconceituosa ao exigir do condenado que apresente atestados de pessoas ‘a cujo serviço tenha estado’, como
se o crime fosse obra apenas de subalternos, a serem reconhecidos boas pessoas por seus superiores.
O inciso IV do art. 744 do Código de Processo Penal refere-se a qualquer documento comprobatório de
sua regeneração. A expressão é inadequada, pois o crime doloso e em especial o culposo muitas vezes se
constitui em fato isolado no conjunto de uma biografia correta, a não exigir regeneração. O bom
comportamento, no entanto, pode ser atestado por companheiros de trabalho, pelos clientes, pelos fornecedores,
pelos empregados, pelos patrões, em suma, por meio daqueles que convivem com o reabilitando ou têm com o
mesmo relações de emprego ou de negócio” (REALE JÚNIOR, Miguel. Instituições de direito penal: parte
geral: volume II. 2004. p. 157-8).
266
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis
da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de
outubro a dezembro. 1940. p. 211.
267
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
268
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 45-6.
73
Apenas é digna de observação a exigência do inciso V, de que o recorrente, além de
outras, faça também prova de haver ressarcido o dano causado pelo crime ou de não
poder fazê-lo. Neste caso, se não tiver havido ação civil para cobrança do dano,
material ou moral, nos termos do art. 63 e seguintes [...], o reabilitando, desde que
possa fazê-lo, é obrigado a pagar os danos decorrentes do crime, não obstante não
tenha havido ação própria para isto. E terá que juntar ao pedido de reabilitação o
respectivo comprovante. 269
O requerimento de Reabilitação somente poderia repetir-se depois de dois anos, na
hipótese de negativa (Código Penal, art. 119, §3º). 270 Porém, o art. 749 do Código de
Processo Penal ressalva a possibilidade de novo pedido, a qualquer tempo, “se o
indeferimento tiver resultado de falta ou insuficiência de documentos”, 271 defendendo a
doutrina por muito tempo que o mesmo se verificasse diante da insatisfação do requisito
temporal. 272 Decretada a revogação da Reabilitação, no entanto, de ofício pelo juiz, ou a
requerimento do Ministério Público (Código de Processo Penal, art. 750), 273 por motivo de
condenação irrecorrível à pena privativa de liberdade, não mais podia ser concedida (Código
Penal, art. 120). 274
O art. 745 do Código de Processo Penal prevê que “o juiz poderá ordenar as
diligências necessárias para apreciação do pedido, cercando-as do sigilo possível e, antes da
269
GOMES NETO, Francisco Antônio. Teoria e prática do código de processo penal com
formulários: volume 3: arts. 442 – 811. Rio de Janeiro: José Konfino, 1958. p. 284.
“O ressarcimento é indispensável”, robora José Rodrigues Pinheiro, “não havendo razão para decisões
em contrário, somente se aceitando como recusa a comprovada impossibilidade econômica” (PINHEIRO, José
Rodrigues. Comentários à nova parte geral do código penal. São Paulo: Saraiva, 1985. p. 116).
270
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis
da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de
outubro a dezembro. 1940. p. 211-2.
271
BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
272
Cf. TORNAGHI, Hélio Bastos. Curso de processo penal: volume 2. São Paulo: Saraiva, 1980. p.
454.
273
Art. 750. A revogação da reabilitação (Código Penal, art. 120) será decretada pelo juiz, de ofício ou a
requerimento do Ministério Público (BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de
Processo Penal. Coleção das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do
poder executivo: decretos-leis de outubro a dezembro. 1942. p. 134).
274
Art. 120. A reabilitação é revogada e não pode mais ser concedida, se o reabilitado sofre nova
condenação, por sentença irrecorrível, à pena privativa de liberdade (BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940:
volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de outubro a dezembro. 1940. p. 212).
74
decisão final, ouvirá o Ministério Público”.275 Como se constata, trata-se de uma faculdade do
magistrado responsável pelo feito – “poderá”. Ao órgão do Ministério Público resta opinar
pela concessão, ou denegação, da Reabilitação.
Câmara Leal é preciso:
Se o juiz entender que as provas oferecidas não são suficientes, ou suspeitando de
que sejam graciosas algumas delas, ou escrupulizando decidir o pedido sem uma
verificação da verdade dos fatos alegados, ordenará as diligências que entender
necessárias para a apreciação do pedido.
Essas diligências devem ser feitas em segredo, que o juiz recomendará às
autoridades ou serventuários a que se dirigir.
Depois de realizadas as diligências e juntos aos autos os documentos que as
autentiquem, o juiz mandará dar vista ao Ministério Público, para emitir o seu
parecer sobre o pedido.
O representante da justiça pública, à vista do requerimento e das provas oferecidas
ou coligidas por meio das diligências ordenadas, dará o seu parecer, opinando pela
concessão ou denegação da reabilitação, segundo achar de direito, fundamentando a
sua promoção. 276
Haverá recurso oficial na hipótese de concessão, de acordo com o art. 746 do Código
de Processo Penal. 277 Se o caso for de denegação, não há outro remédio para o condenado
fora apelar, pela via residual, ante o caráter decisivo dessa decisão (art. 593, II), 278 como
justifica ainda Câmara Leal:
O Código não estabelece nenhum recurso, expressamente declarado, contra a
decisão que denega a reabilitação. Será que dessa decisão não caberá recurso?
A nosso espírito liberal repugna que possa o juiz proferir uma sentença em matéria
de tal relevância, sem que as partes possam recorrer dessa sentença.
275
BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
276
LEAL, Antonio Luiz da Câmara. Comentários ao código de processo penal brasileiro: volume IV:
arts. 563 a 811. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1948. p. 367-8.
277
Art. 746. Da decisão que conceder a reabilitação haverá recurso de ofício (BRASIL. Decreto-Lei n.
3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção das Leis da República dos Estados
Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis de outubro a dezembro. 1942. p.
134).
278
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 114.
75
Denegada a reabilitação, desde que não seja por motivo de falta ou insuficiência de
documentos, o requerente não poderá renovar o pedido se não após o decurso de
dois anos (art. 749). Quer dizer que essa denegação tem um caráter definitivo, ou
com força de definitivo. Nesse pressuposto, não tendo o art. 581 incluído, entre os
casos de recurso em sentido estrito, o da decisão que denega a reabilitação, parece
caber a apelação com fundamento no art. 593, n. II, do Código de Processo Penal
[...].
Da decisão pela qual o juiz conceder a reabilitação deverá recorrer ex-officio para o
Tribunal de Apelação [...].
Esse recurso necessário não foi incluído pelo legislador no dispositivo do art. 574,
donde se vê que esse preceito não é completo, não compreendendo todos os casos de
recurso ex-officio. 279
O Instituto de Identificação e Estatística, ou órgão congênere, responsável pela
estatística judiciária criminal (art. 809), 280 será comunicado da Reabilitação (art. 747), 281
para que seja esta “averbada no registo geral, cancelando-se na folha de antecedentes a
condenação que fora imposta ao reabilitado.” 282
O art. 748 do Código de Processo fez parecer que a Reabilitação avançasse um tanto,
além do limite demarcado pelo art. 119 do Código Penal, dado que “a condenação ou
condenações anteriores não serão mencionadas na folha de antecedentes do reabilitado, nem
em certidão extraída dos livros do juízo, salvo quando requisitadas por juiz criminal”. 283
Outras autoridades, ou mesmo magistrado, que não exerça a judicatura criminal, não terão
acesso aos antecedentes do reabilitado. Essa restrição do enunciado milita em seu favor.
As principais fontes do Código Penal de 1940, os Códigos italiano de 1930 e suíço de
1937, tiveram sua Reabilitação sob as lâminas precisas de Roberto Lyra:
279
LEAL, Antonio Luiz da Câmara. Comentários ao código de processo penal brasileiro: volume IV:
arts. 563 a 811. 1948. p. 368.
280
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 143-4.
281
Art. 747. A reabilitação, depois de sentença irrecorrível, será comunicada ao Instituto de
Identificação e Estatística ou repartição congênere (BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 –
Código de Processo Penal. Coleção das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI:
atos do poder executivo: decretos-leis de outubro a dezembro. 1942. p. 134).
282
LEAL, Antonio Luiz da Câmara. Comentários ao código de processo penal brasileiro: volume IV:
arts. 563 a 811. 1948. p. 369.
283
BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
76
No Código suíço, são características da reabilitação: 1º, somente é aplicável a certas
penas acessórias; 2º, não se estende à totalidade da pena a que se aplica, pois se
exige o decurso de certo tempo da incapacidade; 3º, é preciso que o condenado, por
sua conduta, tenha merecido a reabilitação; 4º, a reabilitação é medida judiciária.
Na Itália, são pressupostos da reabilitação judicial: 1º, sentença de condenação
proferida por juiz comum ou especial; 2º, execução da pena principal ou sua
extinção; 3º, execução ou revogação da medida de segurança; 4º, provas efetivas e
constantes de boa conduta; 5º, vencimento de prazo, a partir do dia em que a pena
principal tenha sido extinta, por execução ou de outro modo. 284
E de Hélio Tornaghi:
No Código Penal italiano, que serviu de modelo ao nosso, a reabilitação atinge
também os efeitos da condenação (art. 178) e nisso a lei brasileira não seguiu a
italiana. O Código suíço, que também serviu de inspiração para o nosso, depois de
referir-se às penas acessórias (arts. 76 a 79), admite (no art. 80) o cancelamento, no
livro de registro, da respectiva sentença. 285
3.3.1.2 A Reforma da Reabilitação Criminal pela Lei n. 5.467, de 1968
A Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968, alterou sensivelmente a Reabilitação Criminal
do Código de 1940.
O art. 119, não mais dividido em rubricas, manteve-se como sede de suas diretrizes: 286
Art. 119. A reabilitação alcança quaisquer penas impostas por sentença definitiva.
§1º A reabilitação poderá ser requerida decorridos 5 anos do dia em que for extinta,
de qualquer modo, a pena principal ou terminar sua execução e do dia em que
terminar o prazo da suspensão condicional da pena ou do livramento condicional,
desde que o condenado:
a) tenha tido domicílio no País no prazo acima referido;
b) tenha dado, durante esse tempo, demonstração efetiva e constante de bom
comportamento público e privado;
284
LYRA, Roberto. Comentários ao código de processo penal: volume VI: arts. 668 a 811. Rio de
Janeiro: Forense, 1944. p. 379.
285
286
TORNAGHI, Hélio Bastos. Curso de processo penal: volume 2. 1980. p. 449-50.
BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do Código
Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil de
1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro. 1968.
p. 15.
77
c) tenha ressarcido o dano causado pelo crime ou demonstre a absoluta
impossibilidade de o fazer até o dia do pedido, ou exiba documento que comprove a
renúncia da vítima ou novação da dívida.
§2º A reabilitação não pode ser concedida:
a) em favor dos presumidamente perigosos pelos n. I, II, III e V do art. 78 deste
Código, salvo prova cabal em contrário;
b) em relação à incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela, curatela ou
autoridade marital se imposto por crime contra os costumes, cometidos pelo
condenado em detrimento de filho, tutelado ou curatelado, ou por crime de
lenocínio.
§3º Negada a reabilitação, não pode ser novamente requerida senão após o decurso
de 2 anos.
Então alcançaria a Reabilitação “quaisquer penas impostas por sentença definitiva”
(art. 119, caput), 287 ampliando-se sobremaneira os efeitos do instituto que ressurtia impotente
da redação intata do Código Penal de 1940. 288
Era um grande momento para a Reabilitação Criminal do Brasil, como relata Romeu
Falconi:
A data de 5 de julho de 1968 tem relevância para o instituto ora em discussão. Por
meio da Lei n. 5.467, vigente a partir de então, houve evidente vontade de alcançar
algo de positivo no campo da reinserção do ex-apenado no contexto social, a
principiar pela manifestação de respeito ao passado do cidadão [...].
Na edição do Código de 1940 [...], sequer a unanimidade das interdições de direitos
estava coberta pela norma jurídica, posto que, dos três incisos, apenas um era
amparado e, ainda, assim, parcialmente. Com a nova redação do artigo 119, o
instituto tomou foros de totalidade [...]. Quase tudo que não era permitido antes,
passou a sê-lo a partir de então. Abandonou-se o critério restritivo de servir o
instituto apenas para as penas acessórias, e, assim mesmo, umas poucas, para
ampliar os horizontes, visando alcançar também as penas principais, sem qualquer
restrição quanto ao tipo legal ofendido. 289
287
BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do Código
Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil de
1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro. 1968.
p. 15.
288
Cf. tópico 3.3.1.1, acima.
Em manifestação isolada, aduz Fragoso, com nossos grifos: “Em 1968, a Lei n. 5.467 alterou o art. 199,
CP, dispondo que a reabilitação alcança quaisquer penas, e manteve, basicamente, os efeitos que o direito até
então em vigor estabelecia” (FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: a nova parte geral. 1991. p.
395).
289
FALCONI, Romeu. Reabilitação criminal. 1995. p. 96-7.
Roberto Lyra Filho e Luiz Vicente Cernicchiaro partilharam da mesma satisfação diante do estiramento
dos efeitos da Reabilitação: “Advirta-se que a matéria sofreu grande alteração com a redação dada pela Lei n.
5.467, de 5 de julho de 1968 [...].
78
Para Damásio de Jesus, grande influência teve no espírito do legislador as críticas
formuladas pela doutrina e jurisprudência em face da Reabilitação do Código Penal de 1940
em sua redação primitiva:
Mostrou-se o legislador sensível às críticas formuladas pelos julgadores e
doutrinadores a respeito da restrição legal antiga. Inúmeros acórdãos, dando
interpretação elástica ao disposto no antigo art. 748 do CPP, estendiam os efeitos da
reabilitação além da extinção de algumas penas acessórias de interdições de direitos,
impondo silêncio sobre as condenações anteriores na folha de antecedentes do
reabilitado e em certidões extraídas dos livros do juízo, salvo se requisitadas por juiz
criminal. 290
O prazo para o requerimento, no entanto, foi aumentado: cinco anos do dia em que
fosse extinta, ou cumprida, a pena principal, ou terminasse o prazo do sursis, ou do
livramento condicional, conforme o caso (art. 119, §1º). 291 Já o reincidente teria de aguardar
dez anos para validamente requerer a sua Reabilitação, de acordo com art. 120 do Código
Penal, igualmente modificado pela Lei n. 5.467, de 1968: 292
Art. 120. A reabilitação será revogada de ofício, ou a requerimento do Ministério
Público, se a pessoa reabilitada for condenada, por decisão definitiva, ao
cumprimento de pena privativa de liberdade.
Hoje, o instituto é de maior amplitude. Alcança quaisquer penas impostas por sentença definitiva (art.
119) [...]. Vários acórdãos admitiam a reabilitação para o fim de não ser mencionada nenhuma pena na folha de
antecedentes do condenado. A boa exegese, todavia, estava com a interpretação restritiva.
A atual disposição ensejou tratamento menos parcimonioso de política criminal, e o fez bem. Em 1940,
restringia-se em liberar o condenado às interdições de direito impostas na sentença, com o acréscimo dessa
sanção não figurar na folha corrida” (CERNICCHIARO, Luiz Vicente; LYRA FILHO, Roberto. Compêndio de
direito penal. São Paulo: José Bushatsky, 1972. p. 280-1).
290
JESUS, Damásio E. de. Direito penal: parte geral: 1º volume. 28. ed. rev., 3. tir. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 651.
Observe-se, porém, que o art. 748 do Código de Processo é o mesmo desde 1941, ano em que este foi
baixado. O alcance de seu enunciado é que fora diminuído durante o período anterior à Lei n. 5.467, de 5 de
julho de 1968, de maneira a compatibilizá-lo com o sistema da Reabilitação ditado pelo primitivo art. 119 do
Código Penal.
291
Cf. BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do
Código Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil
de 1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro.
1968. p. 15.
292
BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do Código
Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil de
1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro. 1968.
p. 15.
“No sistema legal revogado”, dizem Sebastião Oscar Feltrin e Patricia Cristina Kuriki, sobre a
Reabilitação da Lei n. 5.467, de 1968, “o prazo para a reabilitação era de 5 anos para os condenados primários e
de 10 anos para os reincidentes” (FELTRIN, Sebastião Oscar; KURIKI, Patricia Cristina. Da Reabilitação. In
FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui. Código penal e sua interpretação: doutrina e jurisprudência. 8. ed.
rev., atual. e amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 469).
79
Parágrafo único. Os prazos para o pedido de reabilitação serão contados em dobro
no caso de reincidência.
O período de prova, da suspensão condicional da execução da pena privativa de
liberdade, ou do livramento condicional, não revogado, não seria considerado na contagem do
prazo para o requerimento da Reabilitação Criminal, como se constata do §1º do art. 119
modificado. 293
Exigiu-se do condenado tivesse domicílio no país até o requerimento (art. 119, §1º,
a), 294 bem como demonstração efetiva e constante de bom comportamento público e privado
(art. 119, §1º, b). 295 Agora, além de eximir-se da obrigação de reparar o dano engendrado pelo
crime, na hipótese de comprovada impossibilidade financeira, poderia juntar ao requerimento
documentação que comprovasse a renúncia da vítima, ou novação da dívida (art. 119, §1º,
c). 296
Os presumidamente perigosos, de que cuidavam os incisos I, II, III e V do art. 78 do
Código, 297 só poderiam reabilitar-se mediante prova que afastasse por completo essa
293
Cf. BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do
Código Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil
de 1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro.
1968. p. 15.
“Essa lei do Senador Guido Mondin não contemplou como período de prova para a concessão da
reabilitação o tempo decorrido na suspensão condicional da pena, por exemplo, o que não me parece ter sido
providência das mais justas” (FALCONI, Romeu. Reabilitação criminal. 1995. p. 98).
294
Cf. BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do
Código Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil
de 1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro.
1968. p. 15.
“A importância político-criminal da exigência de que o reabilitando tenha tido domicílio no País é de
difícil compreensão. E, a nosso juízo, representa uma limitação indevida e desnecessária no ius libertatis do
indivíduo, que, cumprida ou extinta a pena, tem o direito de locomover-se por onde, como e quando quiser.
Temos sérias dúvidas quanto à constitucionalidade dessa obrigatoriedade” (BITENCOURT, Cezar Roberto.
Tratado de direito penal: parte geral: volume 1. 2006. p. 833).
295
Cf. BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do
Código Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil
de 1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro.
1968. p. 15.
296
Cf. BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do
Código Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil
de 1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro.
1968. p. 15.
297
Art. 78. Presumem-se perigosos: I – aqueles que, nos termos do art. 22, são isentos de pena; II – os
referidos no parágrafo único do art. 22; III – os condenados por crime cometido em estado de embriaguez pelo
80
presunção (art. 119, §2º, a). 298 Os condenados por crime de lenocínio não seriam mais
beneficiários da Reabilitação, fosse ou não seu cônjuge a vítima (art. 119, §2, b). 299
A seleção de beneficiários, contudo, sempre atentou contra a própria razão de ser do
instituto, aqui belamente apresentada por Hélio Tornaghi:
A própria existência do instituto se deve à vontade de excitar nas pessoas de má vida
um desejo de emenda e recuperação e de estimulá-las, com a promessa de um
prêmio, a um esforço reconstrutivo, para o reingresso na comunhão social, livres de
qualquer prevenção dos outros e das próprias inibições. Mais do que o interesse
particular do condenado, sem dúvida relevante, existe aí um interesse de ordem
pública na restauração e cura de cédulas do tecido social. 300
A interposição de novo requerimento, antes do biênio seguinte a denegação do
benefício, continuou excepcionalmente possível, pelos motivos do art. 749 do Código de
Processo – indeferimento fundado em falta ou insuficiência de documentos –, 301 que não foi
derrogado pelo §3º do art. 119 do Código Penal, determinado pela Lei n. 5.467, de 1968, 302
álcool ou substância de efeitos análogos, se habitual a embriaguez; IV – os reincidentes em crime doloso; V – os
condenados por crime que hajam cometido como filiados a associação, bando ou quadrilha de malfeitores [...]
(BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis da República
dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de outubro a
dezembro. 1940. p. 202).
O art. 22, referido: Art. 22. É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento
mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter
criminoso do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Parágrafo único. A pena pode ser
reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação da saúde mental ou por desenvolvimento
mental incompleto ou retardado, não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o
caráter criminoso do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento (BRASIL. Decreto-Lei n.
2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil
de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de outubro a dezembro. 1940. p. 190).
298
Cf. BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do
Código Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil
de 1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro.
1968. p. 15.
299
Cf. BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do
Código Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil
de 1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro.
1968. p. 15.
300
TORNAGHI, Hélio Bastos. Curso de processo penal: volume 2. 1980. p. 451.
301
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
302
Cf. BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do
Código Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil
81
que apenas confirmou a redação primitiva do parágrafo, estabelecida originariamente para
vigorar em harmonia com o mencionado artigo da codificação processual, nos anos 40. 303
Pretendesse impedir novo requerimento antes de dois anos de eventual denegação, fundandose o condenado na ressalva do art. 749 do Código de Processo, 304 ou a reforma de 1968 o teria
modificado, ou faria a vedação constar do Código Penal.
A revogação do benefício não mais impediria nova concessão, desde que satisfeitos os
requisitos legais, pois desaparecida a vedação constante da primitiva redação do art. 120 do
Código Penal. 305 Tendo-a diante de si, o intuito do legislador foi claro ao optar por a não
repetir, ou seguir, nesse particular. 306
No âmbito do Código de Processo Penal, o art. 743 foi o mais atingido pela reforma da
Reabilitação ditada pela Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968, 307 principalmente em razão do
aumento dos prazos para o requerimento do benefício (Código Penal, novos arts. 119, §1º, e
120, parágrafo único). 308 O art. 744 passou a carecer de previsão que exigisse a prova de
de 1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro.
1968. p. 15.
303
Ainda, sobre o prazo de carência para a renovação do pedido, no sistema de 1968, René Ariel Dotti:
“O §3 do art. 119 do CP, com a redação determinada pela Lei n. 5.467/68, fixava o prazo de 2 (dois) anos para o
interessado renovar o pedido quando a reabilitação fosse negada. Tratava-se de exigência incompatível com a
generosa natureza do instituto, principalmente quando o indeferimento decorresse de inépcia da inicial e não dos
pressupostos de mérito” (DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2005. p. 617).
304
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
305
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis
da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de
outubro a dezembro. 1940. p. 212.
306
“A revogação da reabilitação [...] pode ser decretada a requerimento do Ministério Público ou de
ofício pelo juiz, não existindo restrição na lei a que o reabilitado que vem a ser condenado por novo crime e por
isso tem sua reabilitação revogada, possa obter segunda reabilitação, desde que preenchidos os requisitos legais.
O óbice só existiu no Código Penal até a Lei n. 5.467/68” (FELTRIN, Sebastião Oscar; KURIKI, Patricia
Cristina. Da Reabilitação. In FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui. Código penal e sua interpretação:
doutrina e jurisprudência. 2007. p. 470-1).
307
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
308
Cf. BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do
Código Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil
de 1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro.
1968. p. 15.
82
domicílio no país durante o cômputo para o requerimento, e outra que permitisse a exibição
de documento comprobatório da renúncia da vítima, ou novação da dívida, em relação à
indenização do prejuízo causado pelo crime, 309 conforme as exigências do §1º, a e c, do art.
119 do Código Penal. 310 A demonstração efetiva e constante de bom comportamento público
e privado, em último caso, sempre decorrera da satisfação dos incisos I a IV do art. 744 do
Código de Processo, 311 que continuaram, pois, a bem servir ao requisito do art. 119, §1º, b, do
Código Penal. 312
Mercê da Lei n. 5.467, de 1968, a previsão do art. 748 do Código de Processo Penal 313
afinal seria obedecida conforme seu primário e mais largo sentido, o qual fora amesquinhado
pela consideração que dele inafastavelmente se fazia em consonância com o primeiro art. 119
do Código Penal. 314
3.3.1.3 A Reforma Penal de 1984 e a Reabilitação
A Reforma Penal de 1984, responsável pelo Direito Penal em curso no Brasil, foi
efetivada pelas Leis n. 7.209 e 7.210, promulgadas a 11 de julho daquele ano, com vigência
309
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
310
Cf. BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do
Código Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil
de 1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro.
1968. p. 15.
311
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
312
Cf. BRASIL. Lei n. 5.467, de 5 de julho de 1968 – Dá nova redação aos artigos 119 e 120 do
Código Penal, que dispõem sobre a reabilitação criminal. Coleção das Leis da Republica Federativa do Brasil
de 1968: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro.
1968. p. 15.
313
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
314
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Coleção das Leis
da República dos Estados Unidos do Brasil de 1940: volume VII: atos do poder executivo: decretos-leis de
outubro a dezembro. 1940. p. 211-2.
83
para o seguinte (arts. 5º 315 e 204, 1ª parte, 316 respetivamente). A primeira, substituiu a Parte
Geral do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal (art. 1º); 317 a outra,
instituiu a Lei de Execução Penal, derribando a serôdia concepção de Direito
Penitenciário. 318
Ibrahim Abi-Ackel, Ministro da Justiça à época, apresenta, em sua Exposição de
Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal, a razão da Reforma, a par dos trabalhos que
se desenvolveram a fim de realizá-la:
A pressão dos índices de criminalidade e suas novas espécies, a constância da
medida repressiva como resposta básica ao delito, a rejeição social dos apenados e
seus reflexos no incremento da reincidência, a sofisticação tecnológica, que altera a
fisionomia da criminalidade contemporânea, são fatores que exigem o
aprimoramento dos instrumentos jurídicos de contenção do crime, ainda os mesmos
concebidos pelos juristas na primeira metade do século.
Essa, em síntese, a razão pela qual instituí, no Ministério da Justiça, comissões de
juristas incumbidas de estudar a legislação penal e de conceber as reformas
necessárias. Do longo e dedicado trabalho dos componentes dessas comissões
resultaram três anteprojetos: o da Parte Geral do Código Penal, o do Código de
Processo Penal e o da Lei de Execução Penal. Foram todos amplamente divulgados
e debatidos em simpósios e congressos. Para analisar as críticas e sugestões
oferecidas por especialistas e instituições, constituí as comissões revisoras, que
315
Art. 5º Esta lei entrará em vigor seis meses após a data de sua publicação (BRASIL. Lei n. 7.209, de
11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal,
e dá outras providências. Coleção das Leis da República Federativa do Brasil de 1984: volume V: atos do
poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a setembro. Brasília: Departamento de
Imprensa Nacional, 1984. p. 67).
316
Art. 204. Esta lei entrará em vigor concomitantemente com a lei de reforma da Parte Geral do
Código Penal, revogadas as disposições em contrário, especialmente a Lei n. 3.474, de 2 outubro de 1957
(BRASIL. Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984 – Institui a Lei de Execução Penal. Coleção das Leis da
República Federativa do Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder
executivo: leis de julho a setembro. Brasília: Departamento de Imprensa Nacional, 1984. p. 105).
317
Cf. BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República
Federativa do Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de
julho a setembro. 1984. p. 38.
318
Dos três Projetos de Lei que tramitaram no Congresso Nacional, de 1983 a 1984, com a matéria
originariamente pretendida para a Reforma, o de n. 1.655, com um novo Código de Processo Penal, não logrou
ser convertido em lei, como os outros dois (n. 1.656 e 1657). A 17 de novembro de 1989, quando já se
encontrava no Senado, era definitivamente retirado das pautas legislativas, por solicitação do Poder Executivo,
autor dos três Anteprojetos, depois Projetos de Lei (cf. MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal:
parte geral: arts. 1º a 120 do CP: volume 1. 2006. p. 26; NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito
processual penal. 28. ed., atual. por Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 11;
MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à lei n. 7.210, de 11-7-1984. 11. ed., rev. e atual. até
31 de março de 2004, 6. reimp. São Paulo: Atlas, 2007. p. 21-4; MEHMERI, Adilson. Noções básicas de direito
penal: curso completo. 2000. p. 22-3).
84
reexaminaram os referidos anteprojetos e neles introduziram as alterações julgadas
convenientes. 319
A Nova Parte Geral do Código Penal 320 regula, por meio de seus arts. 93 a 95, a nova
Reabilitação, não mais considerada causa extintiva da punibilidade: 321
Art. 93. A reabilitação alcança quaisquer penas aplicadas em sentença definitiva,
assegurando ao condenado o sigilo dos registros sobre o seu processo e condenação.
Parágrafo único. A reabilitação poderá, também, atingir os efeitos da condenação,
previstos no art. 92 deste Código, vedada reintegração na situação anterior, nos
casos dos incisos I e II do mesmo artigo.
Art. 94. A reabilitação poderá ser requerida, decorridos 2 anos do dia em que for
extinta, de qualquer modo, a pena ou terminar sua execução, computando-se o
período de prova da suspensão e o do livramento condicional, se não sobrevier
revogação, desde que o condenado:
I – tenha tido domicílio no País no prazo acima referido;
II – tenha dado, durante esse tempo, demonstração efetiva e constante de bom
comportamento público e privado;
319
BRASIL. Exposição de Motivos n. 211, de 9 de maio de 1983. Diário do Congresso Nacional:
seção I: ano XXXVIII: suplemento “a” ao n. 080: sexta-feira: 1º de julho de 1983. Brasília: Centro Gráfico do
Senado Federal, 1983. p. 15.
José Henrique Pierangeli ralha, sem rebuço: “A reforma operada, ainda quando não passava de um
anteprojeto já recebia críticas vindas de vários setores da sociedade. É incrível que até mesmo pessoas sem
qualquer formação jurídico-penal se atreviam a estabelecer críticas ao sistema de penas adotado. Essas vozes
vindas de todos os quadrantes do país não chegaram a nos causar qualquer surpresa, pois bem poucos atualmente
estão familiarizados com a evolução da ciência do direito penal, embora se atrevam até a escrever sobre o
assunto” (PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil: evolução histórica. 2001. p. 88).
320
Gérson Pereira dos Santos assim encarou-a: “Com todo o risco que possa representar para a unidade
do sistema adotado pelo Código, a renovação instaurada pela Lei n. 7.209, de 13 de julho de 1984, pretende
preservá-la, malgrado revisando inúmeras posições históricas e dogmáticas” (SANTOS, Gérson Pereira.
Inovações do código penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 1985. p. 12).
Luiz Alberto Machado, em contrapartida, denuncia: “O Ministro da Justiça Abi-Ackel, pela Portaria
1.043, de 27.11.80, constituiu comissão [...] para a elaboração do novo anteprojeto de Código Penal. Pronta, a
parte geral foi publicada para o recebimento de sugestões. Pouquíssimas foram aceitas. Remetido ao Congresso,
foi aprovado, na Câmara Federal, pelo inconstitucional ‘voto de liderança’ previsto no art. 176, parte final, do
Regimento Interno, transformando-se na Lei federal 7.209, de 11.6(sic).84, colocando em vigor a nova parte
geral do Código Penal a partir de 13.5(sic).85” (MACHADO, Luiz Alberto. Direito criminal: parte geral. 1987.
p. 42).
321
BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848, de 7
de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República Federativa do
Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a
setembro. 1984. p. 59-60.
Aduz a Exposição de Motivos, item 82: A reabilitação não é causa extintiva da punibilidade e, por isso,
ao invés de estar disciplinada naquele Título, como no Código vigente, ganhou Capítulo próprio, no Título V.
Trata-se de instituto que não extingue, mas tão-somente suspende alguns efeitos penais da sentença condenatória,
visto que a qualquer tempo, revogada a reabilitação, se restabelece o statu quo ante. Diferentemente, as causas
extintivas da punibilidade operam efeitos irrevogáveis, fazendo cessar definitivamente a pretensão punitiva ou a
executória (BRASIL. Exposição de Motivos n. 211, de 9 de maio de 1983. Diário do Congresso Nacional:
seção I: ano XXXVIII: suplemento “a” ao n. 080: sexta-feira: 1º de julho de 1983. 1983. p. 21).
85
III – tenha ressarcido o dano causado pelo crime ou demonstre a absoluta
impossibilidade de o fazer, até o dia do pedido, ou exiba documento que comprove a
renúncia da vítima ou novação da dívida.
Parágrafo único. Negada a reabilitação, poderá ser requerida, a qualquer tempo,
desde que o pedido seja instruído com novos elementos comprobatórios dos
requisitos necessários.
Art. 95. A reabilitação será revogada, de ofício ou a requerimento do Ministério
Público, se o reabilitado for condenado, como reincidente, por decisão definitiva, a
pena que não seja de multa.
O caput do art. 93 expressamente assegurou “ao condenado o sigilo dos registros
sobre o seu processo e condenação”, 322 que, até a Reforma, decorria do art. 748 do Código de
Processo Penal. 323 Atinge a Reabilitação, porém, apenas os efeitos extrapenais da condenação
listados pelo art. 92 do Código Penal, 324 “vedada reintegração na situação anterior, nos casos
dos incisos I e II do mesmo artigo” (art. 93, parágrafo único). 325
É Tomaz M. Shintati quem melhor esclarece a atuação da Reabilitação sobre esses
efeitos secundários da condenação penal:
322
BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848, de 7
de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República Federativa do
Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a
setembro. 1984. p. 59.
323
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
“Esse sigilo não que dizer propriamente um cancelamento definitivo dos registros forenses: é apenas a
não-comunicação dos mesmos registros, quando for pedida folha de antecedentes, ou uma certidão cartorária, ou
mesmo uma certidão das execuções criminais” (NOGUEIRA, Carlos Frederico Coelho. Efeitos da condenação,
reabilitação e medidas de segurança. In JESUS, Damásio E. de. Curso sobre a reforma penal: promoção
Procuradoria-Geral de Justiça: Associação Paulista do Ministério Público. São Paulo: Saraiva, 1985. p. 136)
324
Alerte-se que o inciso I foi alterado pela Lei n. 9.268, de 1º de abril de 1996: Art. 92. São também
efeitos da condenação: I – a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo: a) quando aplicada pena
privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou
violação de dever para com a Administração Pública; b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por
tempo superior a 4 anos nos demais casos; II – a incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou
curatela, nos crimes dolosos, sujeitos à pena de reclusão, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado; III – a
inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso. Parágrafo único. Os
efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença
(BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal. Organização Luiz Flávio Gomes.
2008. p. 270).
325
BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848, de 7
de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República Federativa do
Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a
setembro. 1984. p. 59-60.
86
Na nova Parte Geral do Código Penal, a reabilitação poderá, também, atingir os
efeitos da condenação, previstos no art. 92 – que, na lei anterior [...], constituíam
penas acessórias –, vedada, porém, a reintegração no cargo, função pública ou
mandato eletivo, no exercício do qual tenha o condenado praticado o crime, bem
como vedada a volta ao exercício do pátrio poder, da tutela ou curatela em relação
ao filho, tutelado ou curatelado contra o qual o crime tenha sido cometido (parágrafo
único do art. 93 do CP).
Assim, obtida a reabilitação:
a) o condenado estará habilitado para a investidura só em outro cargo, função
pública ou mandato eletivo, estando vedada ‘a reintegração no cargo, função
pública ou mandato eletivo, no exercício do qual o crime tenha ocorrido...
(parágrafo único do artigo 93)’ (Exposição de Motivos, n. 81);
b) o condenado estará habilitado a exercer o pátrio poder, tutela ou curatela só em
relação aos demais filhos, tutelados ou curatelados, ‘vedada ao (sic) volta ao
exercício do pátrio poder, da tutela ou da curatela em relação ao filho, tutelado ou
curatelado contra o qual o crime tenha sido cometido (parágrafo único do artigo
93)’ (Exposição de Motivos, n. 81), sendo, dessa forma, permanente a incapacidade
civil em relação à vítima;
c) o condenado estará habilitado a voltar a dirigir veículo, já que, nesse caso, o
parágrafo único do art. 93 do CP não veda a reintegração à situação anterior. 326
Alteração drástica se verificou quanto ao prazo para a Reabilitação: dois anos,
contados “do dia em que for extinta, de qualquer modo, a pena ou terminar sua execução”,
tanto para o primário, como para o reincidente. 327 Outra inovação: computar-se-á o período de
326
SHINTATI, Tomaz M. Curso de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 351.
Jair Leonardo Lopes completa, em franca crítica: “Bem se vê que o seu alcance é restrito aos casos dos
efeitos mencionados (art. 92 e seus incisos) e não reabilita coisa alguma, porque não reintegra na situação
anterior, salvo quanto à inabilitação para dirigir veículo, com o que continua sendo discriminatório e inútil”
(LOPES, Jair Leonardo. Nova parte geral do código penal: inovações comentadas. Belo Horizonte: Del Rey,
1985. p. 92).
E, na mesma linha, Guilherme de Souza Nucci: “[...] tal como foi idealizado e de acordo com o seu
alcance prático, trata-se, em verdade, de instituto de pouquíssima utilidade. [...] poder-se-ia argumentar com a
recuperação de direitos perdidos em virtude dos efeitos da condenação, mas o próprio Código reduz a aplicação
ao art. 92, III (‘inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso’)”
(NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 7. ed. rev., atual. e amp., 2. tir. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2007. p. 474).
327
BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848, de 7
de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República Federativa do
Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a
setembro. 1984. p. 60.
“[...] deparamos com mais uma das aberrações da nova legislação: o prazo passa a ser de apenas dois
anos (art. 94, caput), ao contrário dos cinco anos atuais [...]” (aguardava-se a vigência da Lei n. 7.209, de 1984).
“A Exposição de Motivos diz que esse prazo é mais do que suficiente para demonstrar que o condenado se
readaptou ao convívio social. Creio mendaz tal assertiva.
O prazo atual, como se sabe, é de cinco anos para o condenado primário, e de dez para o reincidente.
Pela nova Parte Geral, o prazo é o mesmo, para primários e reincidentes, tratando-se igualmente os desiguais, a
dano da sociedade, e incentivando-se a reincidência” (NOGUEIRA, Carlos Frederico Coelho. Efeitos da
condenação, reabilitação e medidas de segurança. In JESUS, Damásio E. de. Curso sobre a reforma penal:
promoção Procuradoria-Geral de Justiça: Associação Paulista do Ministério Público. 1985. p. 137).
87
prova da suspensão condicional da pena, ou do livramento condicional, desde que não tenha
havido revogação (art. 94, caput). 328
Não há mais seleção de beneficiários. Qualquer condenado, independentemente da
infração cometida, poderá ser reabilitado, desde que atenda às exigências legais. E, tendo o
pedido denegado, poderá renová-lo, a qualquer tempo, desde que “seja instruído com novos
elementos comprobatórios dos requisitos necessários” (art. 94, parágrafo único), 329 enquanto
no sistema anterior o condenado teria de aguardar, em regra, dois anos para renová-lo.
Orlando Soares não diverge:
Negada a reabilitação, poderá o pedido ser renovado a qualquer tempo, desde que
instruído com novos elementos comprobatórios dos requisitos necessários;
anteriormente, a renovação do pedido somente poderia ocorrer, decorridos dois
anos, como dispunha o §3º, do art. 119, do Código Penal. 330
A Reabilitação ainda será revogada de ofício, pelo juiz, ou a requerimento do
Ministério Público. Mas, para isso, exige agora o art. 95 do Código Penal que o reabilitado
seja condenado irrecorrivelmente a pena que não seja de multa – privativa de liberdade, ou
restritiva de direito –, como reincidente – antes de transcorrido o denominado período
328
Cf. BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República
Federativa do Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de
julho a setembro. 1984. p. 60.
Assinala, no entanto, Luiz Regis Prado: “Fixado para o sursis ou para o livramento condicional período
de prova superior a dois anos, não será possível a concessão da reabilitação antes do término do prazo
estipulado” (PRADO, Luiz Regis. Elementos de direito penal: volume 1: parte geral. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. p. 248).
Ainda, Guilherme de Souza Nucci: “[...] caso o sursis ou o livramento condicional tiverem prazos
maiores que 2 anos, é natural que o condenado tenha de esperar o final para requerer a condenação” (NUCCI,
Guilherme de Souza. Código penal comentado. 2007. p. 476).
329
BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848, de 7
de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República Federativa do
Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de julho a
setembro. 1984. p. 60.
330
SOARES. Orlando. Comentários ao código penal: parte geral. Rio de Janeiro: Edições
Trabalhistas, 1985. p. 199.
Romeu de Almeida Salles Junior, tampouco: “Se, eventualmente, a reabilitação for negada, a própria lei
(art. 94, parágrafo único) prevê a possibilidade de renovação, a qualquer tempo, com a devida instrução do
pedido” (SALLES JUNIOR, Romeu de Almeida. Curso completo de direito penal. 9. ed., rev. São Paulo:
Saraiva, 2002. p. 125).
88
depurador referido pelo inc. I do art. 64 do mesmo estatuto. 331 Ausente qualquer dessas
exigências, não será lícita a revogação do benefício.
Esse novo regramento derrogou o art. 743 do Código de Processo Penal: dele apenas
subsiste a regra da competência do juiz da condenação para conhecer do requerimento de
Reabilitação, 332 visto como esta “só se concede após o término da execução da pena [...]. Se a
condenação tiver sido proferida por tribunal, ainda assim a competência será do juízo de
primeira instância responsável pela condenação.” 333 Ao art. 744, afora os reparos já anotados
no tópico 3.3.1.2, acima, falta agora nota sobre o meio de comprovação de período de prova
não revogado, 334 em harmonia com o caput do art. 94 do Código Penal. 335
A subsistência do recurso de ofício previsto pelo art. 746 336 é assaz polêmica:
autorizados argumentos há no sentido da revogação do dispositivo, muitos amparados na atual
posição dogmática da Reabilitação, como foi reconhecida pela Reforma – tese referida por
Sebastião Oscar Feltrin e Patricia Cristina Kuriki:
331
Cf. BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República
Federativa do Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de
julho a setembro. 1984. p. 60.
“Prescrição da reincidência: não prevalece a condenação anterior se, entre a data do cumprimento ou
extinção da pena e a infração penal posterior, tiver decorrido período superior a 5 anos (período depurador),
computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não houver revogação (CP, art. 64,
I). Uma vez comprovado o benefício do art. 64 do CP, o agente readquire a sua condição de primário, pois se
operou a retirada da eficácia da decisão condenatória anterior” (CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal:
parte geral: volume 1. 8. ed., rev. e atual. de acordo com as Leis n. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso),
10.763/2003, 10.826/2003 e 10.886/2004. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 441-2).
332
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134
333
BONFIM, Edilson Mougenot; CAPEZ, Fernando. Direito penal: parte geral. São Paulo: Saraiva,
2004. p. 774.
334
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
335
Cf. BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República
Federativa do Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de
julho a setembro. 1984. p. 60.
336
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
89
Na vigência do Código Penal de 1940, em que a reabilitação era tratada como causa
de extinção da punibilidade, não havia dúvida quanto ao cabimento do recurso ex
officio das decisões que deferiam a reabilitação, ao lado do recurso voluntário em
sentido estrito, pelo interessado ou pelo Ministério Público (art. 581, VIII, do CPP).
Com a Reforma Penal introduzida pelas Leis n. 7.209 e 7.210/84, parte da
jurisprudência passou a entender que é dispensável o recurso necessário, só
remanescendo o voluntário. 337
Outros, tempos depois, passaram a sustentar que o art. 746 do Código de Processo
Penal 338 não foi recepcionado pela Constituição de 5 de outubro de 1988, que prevê a
titularidade exclusiva do Ministério Público sobre a ação penal pública (art. 129, I) 339 –
posição considerada por Carlos Vico Mañas, Sérgio Mazina Martins e Tatiana Viggiani
Bicudo:
Tema sempre polêmico é o que diz respeito ao recurso de ofício da decisão
concessiva da reabilitação, pois, pese a literalidade da lei processual penal, há quem
entenda, e com boas razões, que, na nossa atual sistemática, o recurso de ofício é
incompatível com a titularidade da ação penal pública incondicionada, que se
reserva, com exclusividade, ao Ministério Público (CF, art. 129, I). 340
Não tem a pujança das demais, contudo, a opinião de que foi o art. 746 do Código de
Processo 341 revogado pela Lei de Execução Penal, visto ter esta instituído o agravo em
execução penal (art. 197). 342 Como só há falar em Reabilitação após a extinção da pena, ou
337
FELTRIN, Sebastião Oscar; KURIKI, Patricia Cristina. Da Reabilitação. In FRANCO, Alberto
Silva; STOCO, Rui. Código penal e sua interpretação: doutrina e jurisprudência. 2007. p. 468.
338
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
339
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I – promover, privativamente, a ação
penal pública, na forma da lei [...] (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil – 1988. Diário
da Assembléia Nacional Constituinte: ano II: suplemento ao n. 308: quarta-feira, 5 de outubro de 1988. Brasília:
Centro Gráfico do Senado Federal, 1988. p. 20).
340
BICUDO, Tatiana Viggiani; MAÑAS, Carlos Vico; MARTINS, Sérgio Mazina. Reabilitação e
outros temas. In FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui. Código de processo penal e sua interpretação
jurisprudencial: doutrina e jurisprudência: volume 5: parte processual penal: arts. 668 a 811. 2. ed. rev., atual. e
amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 894.
341
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
342
Art. 197. Das decisões proferidas pelo juiz caberá recurso de agravo, sem efeito suspensivo
(BRASIL. Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984 – Institui a Lei de Execução Penal. Coleção das Leis da
República Federativa do Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder
executivo: leis de julho a setembro. 1984. p. 104).
90
término de sua execução (art. 94, caput), 343 a matéria é absolutamente estranha ao juízo da
execução, além de que não foi sequer mencionada pela Lei n. 7.210, de 1984. 344
Contudo, o art. 748 do Código de Processo Penal, 345 e mesmo todo o regulamento dos
arts. 93 a 95 do Código Penal, 346 foram reconsiderados diante do art. 202 dessa Lei: 347
Art. 202. Cumprida ou extinta a pena, não constarão da folha corrida, atestados ou
certidões fornecidas por autoridade policial ou por auxiliares da Justiça, qualquer
notícia ou referência à condenação, salvo para instruir processo pela prática de nova
infração penal ou outros casos expressos em lei.
Este dispositivo teria derrocado o instituto da Reabilitação Criminal, tal como está
posto, segundo muitas vozes. 348 Outras tantas, porém, cuidaram de diferençá-lo da medida
343
Cf. BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República
Federativa do Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de
julho a setembro. 1984. p. 60.
344
Cf. MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. 11. ed. São Paulo: Atlas,
2003. p. 1817-8; JESUS, Damásio E. de. Código de processo penal anotado. 22. ed. atual. São Paulo: Saraiva,
2005. p. 547.
345
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
346
Cf. BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República
Federativa do Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de
julho a setembro. 1984. p. 59-60.
347
BRASIL. Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984 – Institui a Lei de Execução Penal. Coleção das
Leis da República Federativa do Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder
executivo: leis de julho a setembro. 1984. p. 104.
348
Duas delas: “Os efeitos acrescidos à condenação, pelo art. 92, não merecem aplausos, nem a
reabilitação, tal como disciplinada no Código (arts. 92[sic]-95), tem qualquer alcance prático. Quanto a esta, o
seu mais importante efeito, que seria o de assegurar ao condenado o sigilo dos registros sobre seu processo e
condenação, é obtido, atualmente, de modo imediato e eficaz, por aplicação do art. 202, da Lei 7.210/84 (Lei de
Execução Penal – LEP), desde que tenha sido cumprida ou extinta a pena” (LOPES, Jair Leonardo. Curso de
direito penal: parte geral. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 248).
“Com a Reforma Penal, a reabilitação perdeu sua condição de causa de extinção da punibilidade para
ser tratada em capítulo próprio. Dispõe o art. 93 caput [...]” (transcreve o dispositivo). “Apesar dos termos deste
dispositivo, a verdade é que a reabilitação não é mais causa de extinção da punibilidade, mas simples causa
suspensiva de certos efeitos penais da condenação e, mesmo assim, de forma secundária e praticamente inócua.
Sua utilização tem sido mínima e até mesmo desnecessária, como no caso do ‘sigilo dos registros sobre
o processo e a condenação’, que já decorre automaticamente da extinção ou da execução da pena: [...]”
(transcreve o art. 202 da Lei de Execução Penal).
“Este dispositivo, de eficácia automática, revela-se muito mais favorável ao condenado e torna o
instituto da reabilitação completamente obsoleto, que exige a instauração de um processo judicial para cancelar
qualquer referência ao registro criminal do condenado” (LEAL, João José. Direito penal geral. 3. ed., rev. e
atual. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2004. p. 569-70).
91
prevista na Lei de Execução Penal, demonstrando ainda haver contribuição de sua parte ao
condenado.
Disse um dos responsáveis pela Reforma de 1984:
O primeiro efeito, lato sensu, da condenação é o do registro do réu no rol dos
culpados com a indicação da existência do processo nos distribuidores criminais e da
ocorrência da condenação no Juízo da Execução.
O art. 202 da Lei de Execução Penal estabelece que [...]. É esta uma automática
proteção do condenado, visando que o crime pelo qual já se pagou com o
cumprimento da condenação não venha a constar de certidões ou atestados, para
viabilizar a sua reintegração na sociedade.
Já com a reabilitação, objeto de apreciação judicial, assegura-se o sigilo dos
registros sobre seu processo e condenação, ou seja, apaga-se o fato delituoso e sua
conseqüência processual, para que o condenado seja tratado no meio social como se
o crime não tivesse ocorrido, pois do contrário não haveria a reabilitação pretendida
frente à sociedade [...].
Outra conseqüência da reabilitação consiste na supressão dos efeitos da condenação
mencionados nos incisos I e II do art. 92 do Código Penal, isto é, a perda de cargo,
função pública ou mandato eletivo, bem como a incapacidade para o exercício do
pátrio poder (poder familiar segundo o novo Código Civil), tutela ou curatela, sem,
no entanto, reintegração na situação anterior. 349
O art. 749 do Código de Processo Penal 350 encontra-se revogado, em razão do
parágrafo único do art. 94 do Código Penal, que permite a renovação do pedido de
Reabilitação a qualquer tempo, desde que “instruído com novos elementos comprobatórios
dos requisitos necessários”. 351
349
REALE JÚNIOR, Miguel. Instituições de direito penal: parte geral: volume II. 2004. p. 158-9.
Ainda nesse sentido: “O disposto no art. 202 da Lei de Execução Penal não substitui, porém, o instituto
da reabilitação. Em primeiro lugar, o sigilo não é tão amplo como o decorrente da reabilitação, já que não
prevalece quando se trata de instruir processo pela prática de nova infração penal ou em outros casos expressos
em lei. Isso significa que qualquer autoridade pública ou particular pode obter o registro da condenação, ainda
que cumprida ou extinta a pena, nessas hipóteses, enquanto, tendo ocorrido a reabilitação, só se excetua o sigilo
quando a folha de antecedentes, ou a certidão, ou o atestado for requisito por ‘juiz criminal’ (art. 748, do CPP).
Em segundo lugar, somente a reabilitação exclui, salvo hipótese de revogação, os efeitos da condenação
previstos no art. 92 do Código Penal” (MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à lei n. 7.210,
de 11-7-1984. 2007. p. 839).
350
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
351
Cf. BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República
Federativa do Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de
julho a setembro. 1984. p. 60.
92
Finalmente, a remissão constante do art. 750 daquela codificação 352 deve ser
desconsiderada, tendo em vista o atual posicionamento da Reabilitação no texto do Código
Penal (arts. 93 a 95). 353
352
Cf. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Coleção
das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil de 1941: volume VI: atos do poder executivo: decretos-leis
de outubro a dezembro. 1942. p. 134.
353
Cf. BRASIL. Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984 – Altera dispositivos do Decreto-lei n. 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Coleção das Leis da República
Federativa do Brasil de 1984: volume V: atos do poder legislativo: atos legislativos do poder executivo: leis de
julho a setembro. 1984. p. 59-60.
CONCLUSÃO
A Reabilitação Criminal fala à alma dos povos civilizados, que não incorrem na
temeridade de preferir a imperecível marginalização do infrator à proposta de emendar-lhe os
vícios e infrenes pendores para a delinqüência, tratado dos quais deveria regressar ao seio
social. Desde que proscrita a inumana satisfação do delito por meio da eliminação de seu
responsável, é falto de critério o sistema que descura da Reabilitação.
No Brasil, a evolução do instituto atesta sua tardia adesão a essa proposta, por razões
diversas, em dano próprio.
As Ordenações de Portugal, que também ditaram o primeiro Direito de suas colônias,
em verdade não previram a Reabilitação, senão mui distantemente. Mesmo com o advento do
Código Criminal do Império, editado sob o favônio da Independência, e da liberal
Constituição que a garantira, a situação pouco mudou. Fez-se concutir à nação soberana,
porém, a necessidade de se franquear ao condenado todos os meios para que não tornasse a
renitir em seu erro de outrora, ou em semelhante erro, visto como a inadaptabilidade social
dos egressos e a reincidência já delatavam à consciência brasileira certos problemas
insolúveis pela sanção penal. Mas esse juízo não foi capaz de demovê-la de sua quietação, e
em seis décadas quase nada se fez a respeito.
Em época na qual os sistemas estrangeiros já haviam-lhe dedicado boas construções,
foi a Reabilitação finalmente positivada no ordenamento brasileiro. O modelo português, por
exemplo, no-la alvitrara como medida própria para a reintegração do condenado nos direitos
perdidos por força da condenação; da justa condenação. Embalde: a Reabilitação Criminal
prevista pelo primeiro Código da República, cuja essência manteve-se íntegra até o câmbio
definitivo da ordem penal, cinqüenta anos depois, serviu durante todo esse período apenas aos
inocentes. Estes, porém, clamam por reparação, clamam por acerto, clamam sobretudo por
justiça, sequer duvidando da recuperação dos direitos perdidos, quando por erro são
condenados. E como não eram diversos os fins da medida no sistema de 1890, manteve-se o
Brasil sem Reabilitação.
94
Em 1937, a ditadura pôs cobro nas atividades que se arrastavam com a finalidade de
dotar o país de uma nova ordenação repressora. Estabelecendo-se mais desembaraçado plano,
porém menos democrático que o anterior, puderam os trabalhos iniciados sob o novo regime
ser entregues a nação ao dilúculo da década seguinte. Dessa vez, todavia, comporia a nova
ordem penal também um Código de Processo, que, como o de direito material, consagrou à
Reabilitação relevantes previsões (se afrontadas com as do sistema penal revogado). “Mas a
sensível evolução do instituto, entretanto, foi obcecada por um pesar experimentado por toda
a comunidade jurídica”, anotávamos há pouco: “a curteza de seu alcance apontava à abertura
da idéia que o justificava, de sua ratio – afinal era o condenado seu destinatário, ele quem se
reabilitava; mas apenas em relação a pena de interdição de direito”. Com o passar dos anos, os
deletérios efeitos da marginalização do condenado, de regresso à sociedade, espertaram a
resolução comum de estender-se o alcance da Reabilitação. Antes de completar três décadas,
no ano de 1968, alterava-se o regime codificado do instituto, em favor desse propósito. Ainda
assim fez-se pouco, sendo válido o mesmo juízo em relação à Reforma que se seguiria.
A tardança dessa consciência fez mal ao Brasil, como fez mal a todos os que
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A Evolução da Reabilitação Criminal no Brasil