SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
REVISTA
TRIMESTRAL
DE
JURISPRUDÊNCIA
ORGANIZADA PELO
SERVIÇO DE DIVULGAÇÃO
Volume 100*
(Páginas 1 a 466)
Abril de 1982
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
PODER JUDICIÁRIO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Ministro Francisco Manoel XAVIER DE ALBUQUERQUE
(19-4-72), Presidente
Ministro João Baptista CORDEIRO GUERRA (26-9-74),
Vice-Presidente
Ministro DJACI Alves FALCÃO (22-2-67)
Ministro José Carlos MOREIRA ALVES (20-6-75)
Ministro Pedro SOARES MUNOZ (8-8-77)
Ministro DECIO Meirelles de MIRANDA (27-6-78)
Ministro Luiz RAFAEL MAYER (15-12-78)
Ministro FIRMINO Ferreira PAZ (24-6-81)
Ministro José NERI DA SILVEIRA (1-9-81)
Ministro ALFREDO BUZAID (30-3-82)
Ministro OSCAR Dias CORRÊA (26-4-82)
COMISSÃO DE REGIMENTO
Ministro DJACI FALCÃO
Ministro SOARES MUNOZ
Ministro OSCAR CORRÊA
Ministro NERI DA SILVEIRA — Suplente
COMISSÃO DE JURISPRUDENCIA
Ministro MOREIRA ALVES
Ministro DECIO MIRANDA
Ministro RAFAEL MAYER
COMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO
Ministro MOREIRA ALVES
Ministro RAFAEL MAYER
Ministro NERI DA SILVEIRA
COMISSÃO DE COORDENAÇÃO
Ministro CORDEIRO GUERRA
Ministro SOARES MUNOZ
Ministro DECIO MIRANDA
PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
Doutor INOCÊNCIO Martires COELHO
REVISTA
TRIMESTRAL
DE
JURISPRUDÊNCIA
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
PETIÇÃO N? 66 — DF
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto.
Interessado: Samuel Monteiro.
Petição objetivando a declaração de inconstitucionalidade de dispositivos de decreto federal, por haver o Procurador-Geral da República determinado o arquivamento de representação com o mesmo
objetivo.
Sendo o Procurador-Geral da República o dominas Iltis da ação
direta para declaração, em tese, de inconstitucionalidade de lel ou ato
normativo federal ou estadual, é inadmissível a propositura direta
dessa ação pelo interessado eventual nessa inconstitucionalidade.
Petição indeferida.
ACORDA()
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão
plenária, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em
indeferir a petição e determinar o
seu arquivamento, nos termos do voto do Ministro Relator.
Brasília, 12 de dezembro de 1979.
— Antonio Neder, Presidente —
Cunha Peixoto, Relator.
RELATORIO
Sr. Ministro Cunha Peixoto: Samuel Monteiro ingressou com a presente Petição, na qual esclarece,
verbis:
«1. Em 09/02/1979, o Supte. encaminhou longa exposição — fartamente corroborada em documentação sólida e idônea — ao Exmo. Sr.
Dr. Procurador-Geral da República, para provocação de Declaração
de Inconstitucionalidade dos artigos 3? e 4?, ambos do Decreto Federal n? 31.794, de 17/11/1952 (Anexo n? I e documentos juntos).
Em 14/02/1979, a Procuradoria
Geral da República, recebeu o expediente, conforme se comprova
com o Anexo n? II (A.R.).
Todavia, já no dia 09/03/1979,
sem qualquer justificação, sem
qualquer fundamentado jurídica e
sem motivação não atentando para
a gravidade e a relevância jurídica
da matéria — S. Exa., o Doutor
Procurador-Geral da República,
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Indeferiu a petição do Supte., mandando arquivá-la. Tal despacho foi
publicado no Diário da Justiça de
21/03/1979, que circulou em São
Paulo no dia 23/03/1979 (Anexo n?
III).
4. Diante da alta relevância da
matéria que está contida na cópia
autêntica constante do Anexo I e
documentos juntos e mesmo porque, no Sistema Constitucional
Brasileiro, somente as decisões dos
magistrados fazem coisa julgada,
retirando — através do Plenário do
S.T.F. — a norma Irrita, do campo
jurídico, estamos encaminhando
esta Petição a Vossa Excelência,
uma vez que inócua seria própria
Constituição Federal vigente, se a
Declaração de Inconstitucionalidade de ato normativo federal, lel ou
regulamento, dependesse única e
exclusivamente da vontade do Exmo. Sr. Dr. Procurador-Geral da
República.
E mesmo porque, somente o Plenário do Supremo Tribunal Federal, com quorum especifico, poderá declará-la ou não»
E após argumentar no sentido da
inconstitucionalidade dos dispositivos regulamentares referidos, conclui o peticionário:
«9. Diante das relevantes razões
de Direito consubstanciadas na cópia autêntica e documentos juntos,
da exposição dirigida ao Exmo. Sr.
Dr. Procurador-Geral da República — Processo P.G.R. n? 37.896-79
— o Supte. requer a Vossa Excelência:
Que seja encaminhado ao Plenário do Supremo Tribunal Federal,
o expediente constante da Petição
e dos seus anexos, já protocolizados na Procuradoria-Geral da República, sob n? 37.896-79, — agora
reproduzidos por cópia autêntica —
para que se decida da Inconstitucionalidade dos artigos 3? e 4?, do
Decreto Federal n? 31.794, de
17.11.1952, por violarem frontalmente o artigo 153, ff 2? e 23 da
Magna Carta.»
A Petição, que foi dirigida ao
eminente Presidente deste colendo
Supremo Tribunal e a mim distribuida, encaminhada com vistas à
Procuradoria-Geral da República, recebeu o parecer de fls. 125/128, subscrito pelo nobre Procurador-Geral,
Professor Firmino Ferreira Paz, que
se manifestou pelo indeferimento do
pedido, pois cabe exclusivamente ao
Procurador-Geral da República, conforme reiterada jurisprudência deste
Pretório Excelso, a iniciativa de encaminhar a representação para que
se declare genericamente a inconstitucionalidade de lei, ato normativo
ou ato governamental.
E acrescenta não caber no caso,
também, a avocatória, já que não se
trata de causa, na acepção técnica
do termo mas, sim, de decisão do
Procurador-Geral tomada em processo administrativo referente a representação que lhe foi encaminhada
pelo peticionário, conforme já ficou
decidido na Reclamação n? 95-8-SP
(Ementário do STF n? 1.125-1).
Juntou ainda o peticionário os
documentos de fls. 139/142, tendo o
nobre Procurador-Geral se manifestado novamente pelo indeferimento
do pedido (fls. 144/45), nos seguintes
termos, verbis:
«Entretanto, a Petição está predestinada a arquivamento porque
seu único objetivo é provocar a
avocação, pelo Colendo Supremo
Tribunal Federal, de processo administrativo cuja decisão é de
competência, constitucionalmente
definida, do Procurador-Geral da
República. Não se trata, aqui, de
causa processada perante outros
juizos ou Tribunais, mas sim de
procedimento administrativo de
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argüição de inconstitucionalidade
de Lei em tese em que apenas o
Procurador-Geral da República é o
senhor do exame do cabimento de
pedir a prestação jurisdicional. E
submetida a argüição de inconstitucionalidade a sua decisão, entendeu de não propor a ação direta
por não vislumbrar a inconstitucionalidade argüida. Em conseqüência, determinou o arquivamento do
pedido.
Não tendo remédio recursal, o
interessado usou do direito de petição, mas fé-lo impropriamente, objetivando avocatória não prevista
na Constituição Federal.»
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto, (Relator): 1. O peticionário encaminhou
representação à Procuradoria:Geral
da República objetivando a propositura, por esse Orgão, de ação direta
para que fosse declarada a inconstitucionalidade dos arts. 3? e 4? do Decreto Federal n? 31.794, de 17.11.1952.
O Sr. Procurador-Geral da República, entretanto, por não vislumbrar
a pretendida inconstitucionalidade,
determinou, mediante despacho exarado no expediente, o arquivamento
do pedido.
Irresignado, ingressou o requerente com a presente Petição, postulando diretamente perante este Pretório Excelso o exame da matéria,
com a conseqüente declaração da inconstitucionalidade dos dispositivos
regulamentares já referidos.
2. Nos termos dos dois pareceres
subscritos pelo nobre ProcuradorGeral, Professor Firmino Ferreira
Paz, é totalmente insubsistente o pedido.
Já se firmou a jurisprudência deste Pretório Excelso no sentido de
que, sendo o Procurador-Geral da
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República constitucionalmente o
dominus litis da ação direta para que
seja declarada em tese a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo
federal ou estadual ( art. 119, I, letra
L da EC n? 1/69 — Redação dada pela
Emenda n? 7/77), cabe-lhe decidir da
conveniência ou não do atendimento
das representações que lhe forem dirigidas com esse objetivo.
Pelo mesmo motivo, não pode o representante, ao ver indeferida a sua
pretensão pelo Procurador-Geral, vir
diretamente ao Colendo Supremo
Tribunal pleitear a declaração dessa
inconstitucionalidade, já que lhe falta legitimidade para propor diretamente esse tipo de ação.
De igual modo, como bem esclareceu a Procuradoria-Geral, amparada
em precedente deste Colendo Supremo Tribunal, não é caso de avocatória, pois inexiste, na acepcão
técnico-processual, causa proposta
perante qualquer juízo ou tribunal,
já que a representação feita junto à
Procuradoria-Geral e a decisão nela
exarada são meros atos administrativos, estranhos à esfera do Poder
Judiciário.
Indefiro o pedido e determino o arquivamento do processo.
EXTRATO DA ATA
Pet. 66 — DF — Rel.: Min. Cunha
Peixoto. Interessado: Samuel Monteiro.
Decisão: Indeferiu-se a petição e
determinou-se o seu arquivamento,
nos termos do voto do Ministro Relator. Decisão uniforme.
Presidência do Senhor Ministro
Antonio Neder. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Djaci Falcão,
Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Cordeiro Guerra, Moreira
Alves, Cunha Peixoto, Soares Muiloz,
Decio Miranda e Rafael Mayer. Ausente, licenciado, o Sr. Ministro Lei-
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Brasília, 12 de dezembro de 1979 —
tão de Abreu. Procurador-Geral da República, Dr. Firmino Ferreira Dr. Alberto Veronese Aguiar, SecreUri°.
Paz.
AÇÃO CIVEL ORIGINÁRIA N? 142 — Si'
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Soares Mufioz.
Autor: Instituto Nacional de Previdência Social — Réu: Estado de São
Paulo.
Ação Cível Originária. Incompetência.
— Verificada a incompetência absoluta do Supremo Tribunal Federal para processar originariamente ação civel, deverá ela ser declarada, ainda que a competência tenha sido reconhecida em decisão
anterior. E que as decisões, que rejeitam preliminar de incompetência absoluta no curso do processo, são sempre de cognição incompleta, no sentido de que, até o julgamento final da causa podem ser modificadas.
ACORDÃo
Vistos,
Acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em sessão plenária, à unanimidade de votos, e na
conformidade das notas taquigráficas; acolher a exceção de incompetência e determinar a remessa dos
autos à Justiça Federal do Estado de
São Paulo.
Brasília, 13 de novembro de 1980 —
Antonio Neder, Presidente — Soares
Muiloz, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Soares Mufloz: O
Instituto de Aposentadoria e Pensões
dos Ferroviários e Empregados em
Serviços Públicos propôs, em 1965,
ação ordinária de cobrança contra o
Estado de São Paulo, para haver
deste as contribuições que lhe cabem
como empregador, referentes aos
meses de julho a dezembro de 1959,
no montante de Cr$ 26.418.393,00,
além dos juros moratórios vencidos
após 30-04-60, na taxa de 7% ao ano
até 04-09-60, e dai em diante à taxa
de 1% ao mês.
Contestada a ação, o Dr. Juiz de
Direito da 1! Vara da Fazenda Nacional, ao ensejo do despacho saneador, deu-se por incompetente para
conhecer da causa e determinou a
remessa dos autos ao Supremo Tribunal Federal ( fls. 25).
A Corte, em acórdão de 07-10-1970,
relatado pelo eminente Ministro Di aci Falcão, reconheceu a sua própria
competência, recebendo embargos
deciaratórios à decisão anterior que
determinara a devolução do processo ao juizo de origem.
O acórdão, proferido nos embargos
declaratórios, está encimado pela seguinte ementa:
«Ementa: Embargos de declaração. Seu recebimento, em face
da existência de ponto contraditório (art. 862 do Código de Pro-
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cesso Civil), Reconhecimento da
competência do Supremo Tribunal Federal, para processar a
ação.» ( fls. 48).
A fls. 49 dei por saneado o processo, salientando que as preliminares
suscitadas na contestação se acham
vinculadas com o mérito, e determinei, depois de julgar legitimas as
partes, se abrisse vista, sucessivamente, ao autor, ao réu e ao Dr.
Procurador-Geral da República, para arrazoarem os dois primeiros e
apresentar parecer o terceiro, todos
no prazo de cinco dias.
O Instituto alegou que, em face do
decurso do tempo, os valores em cobrança são outros e que a correção
monetária, pedida na inicial, deverá
ser aplicada a partir da vigência da
Lei n? 4.357, de 16-07-1964.
O Estado de São Paulo, de seu turno, sustentou, em síntese, que é ilegal o pedido do autor, porquanto a
empregadora nada deve pagar a
C.A.P. pelas jóias e aumentos de
vencimentos dos empregados. Pede,
por fim, que, se não declarada prescrita, seja a ação a final julgada improcedente e condenado o autor nas
custas e em honorários advocaticios.
A Proclaradoria-Geral da República, em parecer aprovado pelo seu
eminente titular e elaborado pelo
ilustre Procurador Walter José de
Medeiros, argüiu a incompetência
absoluta do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar originariamente a causa e postulou a devolução dos autos à Justiça Federal de
1? Instância de São Paulo, verbis:
«Pelo acórdão cuja ementa se lê
às fls. 48, conclui-se ter o Supremo
Tribunal reconhecido sua competência para processar ação ajuizada nos idos de 1965, pelo então Instituto de Aposentadoria e Pensões
dos Ferroviários e Empregados
em Serviços Públicos, contra a Fa-
zenda Pública do Estado de São
Paulo, para cobrança de contribuições referentes aos meses de julho
a dezembro de 1959, de que a Ré se
tornou devedora, em face de disposições regulamentares que sujeitaram os servidores da Estrada de
Ferro Sorocabana, de propriedade
do Governo paulista, ao regime de
previdência social do Autor.
Essa decisão plenária da Excelsa Corte, tomada, em 15 de abril
de 1970, por composição inteiramente diversa da atual, já que de
seus integrantes só remanescem os
eminentes Ministros Djaci Falcão
e Thompson Flores (fl. 36), reflete
a orientação então dominante no
Tribunal acerca da exegese do art.
119, I, d, da Constituição Federal,
com redação que, dada pela Emenda n? 1, de 17 de outubro de 1969,
daquela data até esta parte não
'mais alterou.
Modificou-se, porém, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que, hoje, a respeito da norma
constitucional aludida, tem como
pacifico o entendimento sobre sua
incompetência para processar e
julgar causa entre, de um lado, autarquia federal — como é o caso do
autor, hoje substituído pelo INPS
— e, de outro, Estado Federado onde aquela esteja situada ou tenha
representação. Desse teor, por
exemplo, é o acórdão proferido na
Ação Cível Originária n? 238, relator o Exmo. Sr. Ministro Latão de
Abreu, que fé-lo encimar com ementa assim redigida:
«Ação Civel Originária intentada pelo Instituto Nacional de
Previdência Social contra o Estado de Santa Catarina. Embora
se trate de entidade autárquica
com sede fora do Estado nele
possui superintendência e Procuradoria. Diante disso, a competência para processar e julgar
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não é do Supremo Tribunal Federal, mas da Justiça Federal Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto à interpretação do artigo 119. I, d, da Constituição Federal» (DJ de 13-6-77,
pág. 3.899).
Nessa mesma trilha poderiam
ainda ser invocadas as decisões
proferidas nas ações cíveis originárias n?s 169, 201, 230, 282, 283, 285 e
289.
Não cabe, por outro lado, objetar
com a existência do venerando
acórdão de f. 44, porquanto a incompetência absoluta, como preleciona a doutrina, não se prorroga,
devendo, nos termos do art. 113 do
CPC, ser declarada de oficio e podendo ser alegada em qualquer
tempo e grau da jurisdição.
Dal a nulidade que se impõe declarada, até mesmo ex officio, daquele v. decisório, pois, em matéria de competência absoluta, de ordem eminentemente pública, não
há falar em preclusão.
Não é outro, a propósito, o ensinamento de Hélio Tornaghi, em escólio ao artigo 245 do Código de
Processo Civil, quando afirma que,
«no plano processual as nulidades
absolutas são declaráveis de oficio
e a qualquer tempo ficando a salvo
da preclusividade».
Nestas condições, quer o Ministério Público Federal, por este seu
representante, argüir, em face da
jurisprudência invocada, a incompetência absoluta do Supremo Tribunal Federal para processar e
julgar originariamente a demapda,
declarada, em conseqüência, a nulidade do v. acórdão de f. 44 e seguintes. Requer-se, ainda, com
apoio no art. 113, § 2? do CPC, a remessa dos autos à Justiça Federal
de São Paulo, a competente para o
processo e julgamento da
(fls. 63 a 65).
E o relatório.
-ação.»
VOTO
O Sr. Ministro Soares Mutloz (Relator): O acórdão de fls. 48 deste Plenário não impede que seja reexaminada a questão atinente à incompetência absoluta do Supremo Tribunal
Federal para processar e julgar a
causa. E que as decisões, que rejeitam preliminar de Incompetência
absoluta no curso do processo, são
sempre de cognição incompleta, no
sentido de que, até o julgamento final, podem ser modificadas.
O Prof. Galeno Lacerda, na sua tese de concurso O Despacho Saneador,
salienta:
«O problema da preclusão de decisões no curso do processo é substancialmente diverso do problema
da preclusão das decisões terminativas. Enquanto nestas o magistrado esgota a jurisdição extinguindo
a relação processual, naquelas ele
conserva a função jurisdicional,
continua preso à relação do processo.
Em face desta premissa, a pergunta se impõe: Pode o magistrado, que conserva a jurisdição, fugir ao mandamento de norma imperativa, que o obriga a agir de
oficio, sob pretexto de que a decisão interlocutória precluiu? Reconhecido o próprio erro, poderá a
falta de impugnação da parte
impedi-lo de retratar-se? Terá esta, com sua anuência, tal poder de
disposição sobre a atividade ulterior do Juiz?
A resposta, evidentemente, no
caso, deve ser negativa. Se o juiz
conserva a jurisdição, para ele não
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preclui a faculdade de reexaminar
a questão julgada, desde que ela
escape à disposição da parte, por
emanar de norma processual imperativa.
Dai se conclui que a preclusão no
curso de processo depende, em última análise, da disponibilidade da
parte em relação à matéria decidida. Se indisponível a questão, a ausência de recurso não impede o
reexame pelo juiz. Se disponível, a
falta de impugnação importa concordância tácita à decisão. Firmase o efeito preclusivo não só para
as partes, mas também para o
juiz, no sentido de que vedada se
torna a retratação.
Comprovemos, porém, a exatidão da tese, mediante o exame de
casos concretos.
Inicialmente, consideremos questões relativas à nulidade absoluta
do ato processual.
Poderá precluir a decisão que repele nulidade dessa ordem? Evidentemente, não. Verificado o erro, a qualquer tempo deverá o juiz
retratar-se, a fim de cumprir a
norma imperativa ditada pelo interesse público. Assim, embora haja
pronúncia judicial no sentido da
validade do ato, poderão ser sempre reexaminadas questões relativas à incompetência absoluta,
à suspeição, à litispendência, à ausência de juízo prejudicial necessário, à falta de personalidade da
parte, à prática de ato do oficio
por não-serventuário, à fraude do
processo. Tais vidos tornam absolutamente nulo o ato processual, e
a decisão interlocutória que errôneamente o considerasse válido nenhuma eficácia teria» (fls. 160/162).
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Se assim é no tocante ao Juiz de
primeiro grau, assim também deve
ser em relação aos Tribunais nas
ações de sua competência originária.
Verificada a incompetência absoluta, deverá ela ser declarada, ainda
que a competência tenha sido reconhecida em decisão anterior, que,
como já disse, não tem efeito preclusivo.
Ante o exposto e pelo aduzido no
parecer, acolho a preliminar de incompetência e determino a devolução dos autos á Justiça Federal de 1?
grau em São Paulo.
EXTRATO DA ATA
ACOr. 142 — SP — Rel.: Min. Soares Mufioz. Autor: Instituto Nacional
de Previdência Social. (Advs.: Olavo
de Castro e outros). Réu: Estado de
São Paulo. (Advs.: Luiz Rangel de
Freitas e outro).
Decisão: Acolheu-se a exceção de
incompetência e determinou-se a remessa dos autos à Justiça Federal
do Estado de São Paulo. Decisão uniforme.
Presidência do Senhor Ministro
Antonio Neder. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Djaci Falcão.
Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Leitão de Abreu, Moreira
Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufloz,
Decio Miranda e Rafael Mayer. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Cordeiro Guerra. ProcuradorGeral da República, Dr. Firmino
Ferreira Paz.
Brasília, 13 de novembro de 1980 —
Alberto Veronese Aguiar, Secretário.
— 100
REPRESENTAÇÃO N? 955 — PR
(Tribunal Pleno)
Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Rafael Mayer.
Representante: Procurador-Geral da República — Representada: Assembléia Legislativa do Estado do Paraná.
Funcionalismo. Adicional por tempo de serviço. Lei estadual
(constiturionalidade). Constituição Federal, art. 13, V (interpretação). Limites máximos de remuneração. Os Estados estarão adstritos, em obervtincia ao art. 13, V, In fine, da Constituição, aos limites
máximos de remuneração estabelecidos em lel federal, entendida como lei com essa matéria especifica, e com expressa destinaçâo ao
plano das entidades federadas. Não tem correspondência com a previsão constitucional a lei federal, que, simplesmente voltada para a circunscrição administrativa da União, limita-se a estabelecer remuneração dos servidores federais. Representação julgada improcedente.
ACOFtDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, na Sessão
Plena, na conformidade da ata de
julgamentos e notas taquigráficas,
por maioria de votos, julgar improcedente a Representação.
Brasília, 20 de maio de 1981 —
Xavier de Albuquerque, Presidente
— Rafael Mayer, Relator para o
Acórdão.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I. O eminente Sr. ProcuradorGeral da República representa no
sentido de o Supremo Tribunal declarar a inconstitucionalidade do inciso II, do art. 70, da Constituição do
Paraná com a Emenda n? 3/71.
Leio na f. 8 o texto integral do sobredito art. 70:
«Art. 70 — O funcionário terá
acréscimo aos vencimentos:
I — de cinco em cinco anos de
exercício, cinco por cento, até
completar vinte e cinco por cento;
II — ao completar trinta anos de
exercício, cinco por cento por ano
excedente, até o máximo de vinte e
cinco por cento.
— A incorporação dos acréscimos será imediata, inclusive para efeito de aposentadoria, e será
computada igualmente sobre as alterações dos vencimentos.
— São reconhecidas as mesmas vantagens aos integrantes das
corporações militares».
Informando a respeito do assunto,
fé-lo assim o nobre Presidente de Assembléia Legislativa do Paraná (folhas 19 a 22):
«2. A aludida representação pretende seja declarada a «inconstltucionalidade do inciso II, f10 art. 70,
da Emenda n? 3/71 à Constituição
do Estado do Paraná, que, permitindo ao funcionário estadual, ao
completar 35 anos de servico, perceber 50% de acréscimo aos vencimentos, considerando que já o inciso I do mesmo artigo assegura 25%
de adicionais nos primeiros 25 anos
de serviço, viola a regra imperativa do art. 13, inciso V, da Emenda
Constitucional n? 1/69, tendo em
R.T.J. — 100
vista que a lei federal reguladora
da concessão de adicionais ao servidor público federal (Lei 4.345, de
26-6-64) estabelece um máximo de
35% concedidos, parceladamente,
à razão de 5% por qüinqüênio de
efetivo exercício (art. 10 da Lel n?
4.345)».
«3. Se a norma federal apontada
devesse ser aplicada ao funcionário público estadual, por força do
art. 13, inciso V, da Constituição
Federal, como sustenta a representação, ela deveria representar, não
um máximo, mas um mínimo de
garantia para o funcionário estadual, de acordo com a doutrina e o
entendimento da nossa Corte Suprema.
«3.1. Ao comentar o dispositivo
constitucional em apreço, o prof.
Manoel Gonçalves Ferreira Filho,
titular da cadeira de Direito Constitucional da Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo, sustenta que
«As normas referentes aos funcionários públicos (Vide infra
arts. 97 e seguintes) são estendidas pela Constituicão aos funcionários estaduais e municipais.
Gozarão estes, pois, no mínimo,
dos direitos e vantagens constitucionalmente atribuídos aos funcionários federais. Seus direitos e
vantagens não poderão, Jamais,
ser menores, conquanto possam
ser maiores». (Os gritos são nossos). (Comentários á Constituição Brasileira, vol. 1?, pág.
135)».
«3.2. Esse entendimento está de
acordo com a orientação do Supremo Tribunal Federal, no sentido de
que as garantias e direitos estabelecidos nas normas federais constituem um mínimo para o funcionário estadual ou municipal.
9
«No Recurso Extraordinário n?
77.993, de Mato Grosso, o seu ilustre relator, Ministro Thompson
Flores, declarou que
«Óbice não existe na Carta em
questão (Constituição Federal)
que permite a contagem do referido tempo para o fim mencionado (recebimento de adicional).
bastante que o Estado o admita.
A expressão constitucional é um
mínimo». (in Rev. Trimestral de
Jurisprudência, vol. 74/157).
«3.3. Nesse mesmo Julgamento, o
Min. Xavier de Albuquerque assim
se pronunciou:
também entendo que o art.
102, 3?, da Constituição, assegura a contagem recíproca e integral do tempo de serviço federal,
estadual e municipal, para os
efeitos de aposentadoria e disponibilidade, mas não exclui nem
proíbe que a legislação da União,
do Estado ou do Município possa
mandar computá-lo para efeitos
que não os da inativação». (In
Rev. Trimestral de Jusrisprudénela, vol. 74/158).
«3.4. O Recurso Extraordinário
n? 80.078, de que foi relator o Min.
Leitão de Abreu, tem a ementa seguinte:
«Funcionário público. Tempo
de Serviço. O art. 102, 3?, da
Emenda Constitucional n? 1/69,
não é limite máximo, no sentido
do art. 13, V, dessa Carta Politica, mas garantia mínima do funcionário. A pessoa de Direito Público não pode restringir essa garantia, mas não está impedida de
computar o tempo de serviço para outros efeitos». (In Rev. Trimestral de Jurisprudência, vol.
73/963).
«3.5. De acordo com esse entendimento, o fato de a norma federal
10
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conceder, aos funcionários federais, 35% de adicionais por tempo
de serviço, não impede que o legislador estadual conceda maior percentagem de adicionais ao funcionário estadual. O que ela não poderia fazer é dar menos do que foi
atribuído ao funcionário federal.
«4. Ressalte-se, neste passo, que
a autorga de adicionais por tempo
de serviço em percentagem superior à estabelecido na Lei n? 4.345,
Para o funcionalismo federal, não
constitui uma peculiaridade paranaense adotada em suas constituições desde a de 1947. Outros Estados pela sua legislacão ordinária,
também assim têm procedido. Outros, ainda, o asseguram em suas
constituições, como a do Acre, art.
91, VIII; a de Mato Grosso, art.
121, XII; e a de São Paulo, art. 92,
VIII. Também o Senado Federal,
pela sua Resolução n? 58, de 1972,
em seu artigo 392, garante, aos
seus servidores, adicionais por
tempo de serviço bem superiores
aos estabelecidos na Lei 4.345 citada.
«4.1. Todos os Estados, que assim procedem, estão agindo regularmente, dentro da sua esfera de
competência. A gratificação adicional por tempo de serviço constitui matéria integrante do regime
jurídico do funcionário estadual e
este é da competência residual dos
Estados. Excluídas as restrições
de natureza constitucional e aquelas decorrentes de leis ordinárias
expressamente referidas na Constituição, o que sobra é da competência residual dos Estados e Municípios. Estabelece a Constituição
(art. 109) que lei federal definirá o
regime jurídico dos servidores públicos da União, do Distrito Federal e dos Territórios, o que significa que, aos Estados e Municípios,
deferiu a competência para legislar sobre o regime jurídico de seus
servidores, no qual se inclui, como
já foi dito, o adicional por tempo
de serviço.
«4.2. Por isso mesmo, o Estatuto
dos Funcionários Públicos da
União, embora seja norma federal,
não substitui os estatutos dos funcionários públicos estaduais ou
municipais, que continuam em plena vigência. Também a recente
norma federal, que instituiu a contagem recíproca de tempo de serviço na atividade pública e particular para efeito de aposentadoria,
não se estende ao funcionalismo
estadual e municipal. Igualmente,
pelos mesmos fundamentos, não se
pode admitir a aplicação, ao funcionalismo estadual e municipal,
da norma do art. 10, da Lei n?
4.345.
«4.3. Não é outro o entendimento
do Prof. Celso Antonio Bandeira de
Mello. Em simpósio realizado em
São Paulo, em 1970, sobre o regime
dos servidores públicos municipais
ante a Emenda Constitucional n?
1/69, teve ele a oportunidade de
examinar a disposicão do art. 13,
V. E afirmou:
«Entendo eu que o art. 13, V, só
pode ser bem interpretado, se
conjugadamente com os arts. 108
e 109, da Carta Constitucional de
1967, com a redação que lhe deu
a Emenda n? 1, de 69. Diz o art.
O disposto nesta seção
aplica-se aos funcionários dos
três Poderes da União e aos funcionários, em geral, dos Estados,
do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios. E diz o art.
Lei Federal, de iniciativa exclusiva do Presidente da República, respeitado o art. 97 e seus
1? e no 2? do art. 108, definirá: I.
o regime jurídico dos servidores
públicos da União, do Distrito
Federal e dos Territórios; II. a
forma e as condições de provi-
R.T.J.— 100
mento dos cargos públicos; e III.
as condicões para aquisição de
estabilidade. São portanto três
artigos que devem ser interpretados em conjunto. Não vejo nenhuma espécie de razão para o
art. 108, que manda aplicar a Estados e Municípios o disposto
nesta seção; não vejo nenhuma
outra razão para esse dispositivo,
senão a aceitação que tomo eu,
mais como expressa do que como
implícita, de que os Estados e
Municípios organizam o regime
de seus servidores do modo que
lhes aprouver, desde que respeitados os princípios consagrados
nesta seção.
E mais me fortaleço neste entendimento, ao considerar que o
art. 109 estabelece que, através
de lei federal, se estabelecerá o
regime jurídico, o estatuto dos
funcionários da União, o que torna claro que não é lei federal que
o estabelecerá para os Estados e
Municípios, se necessário fosse
ainda aduzir este último argumento». «... se for preciso acrescentar ainda alguma coisa, eu referiria aquele principio interpretativo do texto constitucional,
que aceitamos funcionasse como
critério hermenêutico, qual seja
o de que a autonomia municipal
é princípio prestigiado pela nossa
lei maior e, em conseqüência, em
casos onde dúvida de interpretação pudesse existir, no concernente à matéria em principio incidente no âmbito do Município,
repito, quando dúvida pudesse
haver, prevaleceria a inteligência que prestiglasse o principio
da autonomia municipal». (In
Revista de Direito Público, vol.
14, págs. 317/18). (Os grilos são
nossos).
E prossegue mais adiante:
«Eu entendo por regime jurídico a disciplina feita pelo direito
11
das relações entre funcionário e
Estado; entendo toda e qualquer
disciplina e não apenas a constitucional. Há um regime jurídico
constitucional e há um regime
jurídico, que, por certo, há de se
afinar ao regime constitucional,
mas que é mais amplo». (Revista
de Direito Público, vol. 14, pág.
321). Como entendo que regime
jurídico do servidor público é
uma expressão bastante ampla e
que se refere a toda e qualquer
disciplina das relações entre funcionário e Estado, não se restringe evidentemente ao regime
jurídico constitucional, quer dizer, as normas constitucionais
que disciplinam as relações entre
funcionário e Estado. Havendo,
pois, um conceito de regime
jurídico constitucional do funcionário, entendo que o regime
jurídico do funcionário público da
União não se aplica obrigatoriamente a Estados e Municípios.
Entendo que o regime jurídico
constitucional, como é absolutamente óbvio, se aplica aos Estados e Municípios e não me pareceria necessário sequer que se tivesse dito que se aplicaria a Estado e Municípios. De maneira
que, sendo o cerne da nossa discussão, o problema do conceito
de regime jurídico, coloco agora,
inclusive para demonstrar que
não se esgota de modo nenhum a
delimitação de direitos e deveres
de servidores naquilo que está no
texto constitucional. Darei exemplos absolutamente normais: o
problema da licença prêmio, o
problema da conversibilidade ou
não da licença prêmio, o problema do gozo ou não de férias no
mesmo ano ou o da necessidade
de já haver completado um ano
para poder gozar férias, o adicional por tempo de serviço, há uma
série de direitos e deveres e pode
haver uma série de proibições,
12
R.T.J. — 100
de limitações ao exercício de atividades por parte do funcionário,
estabelecidas no Estado, no Município, à luz da conveniência, à
luz até das peculiaridades locais.
E tudo isso, no meu modo de entender, são direitos e deveres fixados na via constitucional. Sendo assim, colocar-se-ia a questão
de se saber se o regime jurídico,
isto é, o conjunto de direitos e deveres de funcionários estaduais e
municipais será o mesmo que o
estabelecido pela União para
seus servidores, para seus funcionários, ou pelo contrário. Estados e Municípios têm se restringido unicamente, como é óbvio, em obediência àqueles
princípios na Constituição consagrados. Opto pela inteligência de
que Estados e Municípios têm
plena liberdade na determinação
de seus direitos, do regime
juridko de seus funcionários,
respeitados os princípios constitucionais, por esse acervo de
razões, que já enuncie e considero que seria ocioso repetir.
(Os grifos são nossos). (Revista
de Direito Público, vol. 14, pág.
322).
«4.4. Nesse simpósio compareceu
o Ministro Seabra Fagundes, que,
a respeito da matéria focalizada,
emitiu os seguintes conceitos:
«... tudo gira em torno de saber
se o regime jurídico dos servidores estaduais e municipais é apenas regido pela Constituição e
por leis federais ou pela Constituição e leis locais. Eu tenho a
impressão que o regime jurídico
dos servidores dos Estados e dos
Municípios sofre uma dupla regência. Ele é regido pela Constituicão nos seus princípios básicos
fundamentais e eventualmente
pela lei federal, quando prevista
aqui na própria Constituição, explicitamente na Constituição.
Mas há um resíduo para esse regime, que fica à lei local, dentro
daquela exemplificação do Bandeira de Mello. Quer dizer: há
coisas que não têm cabimento na
lei federal, porque a Constituição
não deferiu à lei federal esta matéria. Então esse resíduo fica para a lei local. Então em relação à
licença-prêmio, adicional, a lei
local é que vai dispor a respeito.
Isso é regime do funcionário, é
relação do funcionário com o empregador, que, no caso, é o Estado ou o Município». (In Revista
de Direito Público, vol. 14. págs.
323/24).
«4.5. Desse modo, tendo em vista
que a disposicão do artigo 10, da
Lei Federal n? 4.345, não está expressamente prevista na Constituição Federal e, ainda, que a gratificação adicional por tempo de serviço, constituindo matéria componente do regime jurídico dos funcionários estaduais, pertence à
competência residual dos Estados,
— é indiscutível que ela não se
aplica aos servidores estaduais,
devendo a representação ajuizada,
por isso mesmo, ser julgada improcedente».
Em seu parecer de folhas 24 a 28,
sustentou o nobre Procurador-Geral
da República:
Reservando-se para uma análise ulterior do mérito, esta Procuradoria-Geral argüiu a inconstitucionalidade do artigo 70, inciso
da Constituição do Estado do Paraná, que concede ao servidor público local, a partir do trigésimo ano
de serviço, adicionais à razão de
5% ao ano, fazendo destarte com
que o montante da vantagem alcance o índice ao cabo de trinta e
cinco anos de trabalho.
A peça inicial ponderou que,
na esfera da União, por força da
Lei n? 4.345/64 esse adicional ia-
R.T.J. — 100
mais ultrapassa a ordem dos 35%,
limite que seria aplicável ao serviço público dos Estados federados á
luz do art. 13, Inciso V, da Constituição da República.
Prestando informações, a
Presidência da Assembléia Legislativa do Estado do Paraná ilustra
seu texto com jurisprudência dessa
alta Corte e com selecionada doutrina. A primeira não trata especificamente do tema em debate. A
segunda, porém, aborda-o com percuclência, mas não logra convencer da legitimidade do dispositivo
impugnado.
O problema da extensão das
normas da Constituição Federal,
em matéria de funcionalismo, aos
Estados e Municípios, tem sofrido
entendimento variável, quer na
doutrina, quer na jurisprudência,
inclusive na deste colendo Supremo Tribunal Federal.
Comprova-o a afirmação do
eminente Ministro Luiz Gallotti,
nestes termos, verbis:
«A doutrina de que as Constituições Estaduais não podem restringir, mas podem ampliar os
direitos outorgados aos funcionários públicos pela Constituição
Federal existiu realmente e teve
apoio do Supremo Tribunal, mas
foi derrogada por textos legais
supervenientes». (RTJ vol. 58,
pág 306).
E também a lição de Hely
Lopes Meirelies, quando adverte,
verbis:
«Se até a Constituição de 1967
os dispositivos constitucionais
pertinentes ao funcionalismo
eram vistos apenas como mínimos de garantia dos servidores
públicos e só se impunham integralmente por recomendação da
boa doutrina e pela moralizadora
13
orientação jurisprudencial, a
partir de então passaram a ser
normas de observância obrigatória em todas as esferas administrativas, situação mantida pela
Emenda de 1969 (Constituição da
República, arts. 13, V, e 108).
Com isso, fica prejudicada qualquer discussão sobre a possibilidade de sua restrição ou ampliação, uma vez que, atualmente,
constituem mesmo «um código
de direitos e obrigações fundamentais que devem ser respeitados pelos Estados e Municípios
(e, também, pela União, acrescentamos) em suas leis ordinárias», como ensina Themistocles
Cavalcanti. » (Direito Administrativo Brasileiro, 4, ed., pág.
393).
Não significa esse entendimento que os Estados tenham perdido sua autonomia para regular
suas relações com seus servidores,
mas, tão-somente que, ao d1scipliná-las estão obrigados a respeitar os princípios constitucionais especificados na Constituição
Federal.
Daí, a liberalização do entendimento deste colendo Supremo
Tribunal, de que nos dão conta os
julgados citados e parcialmente
transcritos nas Informações da
egrégia Assembléia Legislativa,
quando admitiram a legitimidade
de leis estaduais que prescreveram
a contagem recíproca do tempo de
serviço para efeito de percepção
de adicionais, e não só para aposentação ou disponibilidade.
a. E o retorno declarado ao
principio de que a Constituição Federal estabelece apenas os limites
mínimos quanto a direitos e vantagens dos funcionários, podendo as
Constituições de leis estaduais
ultrapassá-los, em beneficio de
seus servidores.
14
R.T.J. — 100
Data venta, entendemos que,
se é certo que o art. 109 da Constituição, referindo-se apenas aos servidores públicos da União, do Distrito Federal e dos Territórios, assegurou a autonomia dos Estados
para regular o regime jurídico de
seus servidores, não menos certo é
que os artigos 13, V, e 108, tornam
obrigatório o respeito pelo Estado
dos princípios constitucionais referentes aos funcionários públicos.
Entre esses princípios, de
obediência obrigatória, não apenas
como um mínimo, mas, expressamente, como um máximo, está o
previsto no art. 13, V, parte final,
quando preceitua, verbis:
«V — as normas relativas aos
funcionários públicos, inclusive a
aplicação, aos servidores estaduais e municipais, dos limites
máximos de remuneração estabelecidos em lei federal».
não há que falar, aí, em garantia minima, pois expressamente
proibiu a Constituição Federal que
fosse atribuída aos funcionários estaduais e municipais remuneração
superior aos limites máximos estabelecidos em lei federal.
Não se cuida, aqui, sequer
do limite de remuneração que vigorou até época recente, mas já
desaparecido, que fixara em 90%
dos vencimentos de Ministro de
Estado a remuneracão dos servidores públicos federais.
«14. Determina o transcrito inciso V, do art. 13 da Constituição, a
observância dos limites máximos
estabelecidos ( tudo no plural) na
lei federal, ou seja, os diversos limites fixados para cargos ou funções idênticas. Assim, não podem
um Promotor, um Juiz de Direito,
um Delegado de Polícia, um Fiscal
de Tributos, etc. estaduais perce-
ber remuneração superior à fixada
em lei federal para os mesmos
cargos ou seus equivalentes.
Essa matéria, ou seja, remuneração de servidores, é a única em que os Estados são obrigados a respeitar, não apenas os
princípios constitucionais referentes aos funcionários, mas o limite
estabelecido em lei federal, nos
termos do inciso V, do art. 13, da
Constituição.
No que diz respeito à gratificação adicional por tempo de serviço, os chamados qüinqüênios,
portanto, previstos e fixados em lei
federal pode a lei estadual instituíla para os servidores do Estado,
mas observado o limite máximo
estabelecido naquela lei.
Assim se a Lei n? 4.345/64,
que a disciplina, estabelece gratificação de 5% por qüinqüênio de serviço, até o máximo de 7 (sete)
qüinqüênios, representando o total
de 35% sobre os vencimentos, inconstitucional, em face da Constituição Federal é a Constituição do
Estado do Paraná (art. 70, II),
quando os concede de forma a que,
com o mesmo tempo de serviço —
35 anos — os adicionais atinjam a
50% dos vencimentos, pois ultrapassa o limite máximo fixado
pela lei federal correspondente.
Assim, pelas razões expostas, opinamos no sentido de que se
julgue procedente a Representação, para, declarar a inconstitucionalidade no art. 70, II, da Constituição do Estado do Paraná».
II —
o relatório a ser copiado
pela Secretaria para cumprir a segunda parte do art. 177 do Regimento Interno.
VOTO
O Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I. O art. 13, caput, da Constituição de 1967 com a Emenda n? 1 de
R.T.J. — 100
1969, expressa que o Estado-membro
deverá organizar-se e reger-se pela
Carta Política e leis que adotar, desde, porém, que respeite os princípios
estabelecidos naquela Constituição,
e, ainda, os que se acham indicados
na referida norma.
Dentre os princípios a que se reporta o mencionado preceito está incluído, no seu inciso V, o de o
Estado-membro aplicar, ao servidor
estadual e ao municipal, os limites
máximos de remuneração estabelecidos em lei federal.
Sucede, porém, que a Constituição
do Paraná de 8 de maio de 1967 com
a Emenda Constitucional n? 3 de
29.5.1971 veio a dispor, no seu art. 70,
II, que ao completar trinta anos de
exercício, o funcionário terá direito
a uma gratificação de cinco por cento ao fim de um ano excedente, até o
máximo de vinte e cinco por cento.
Ora, do que dispõe a citada regra
da Constituição paranaense bem se
vê que o seu texto concede uma gratificação adicional por tempo de serviço que é maior do que a prevista
no art. 10, caput, da Lei Federal n?
4.345, de 26.6.1964, para os funcionários da União, visto que esta última
é clara no exprimir que a gratificação adicional por tempo de serviço
prevista no art. 146 da Lei n? 1.711,
de 28.10.52 tem o limite de cinco por
cento ao fim de cada qüinqüênio, isto
é, até , trinta e cinco por cento no máximo, quando é certo que a discutida
regra paranaense concede, ao funcionário que completar trinta anos
de serviço, um adicional de cinco
por cento ao ano, donde a conclusão
de que, aos trinta e cinco anos de
serviço, receberá o funcionário do
Paraná o adicional de cinqüenta por
cento calculado sobre o quanto de
seus vencimentos.
Deve reconhecer-se, pois, que o
questionado preceito da Constituição
do Paraná é contrário ao padrão federal e, por isto, não pode subsistir.
15
Note-se que o art. 13, V, da Constituição Federal de 1967 com a Emenda n? 1, de 1969, expressa que os
Estados-membros devem respeitar
os limites máximos de remuneração
estabalecidos em lei federal.
Por conseguinte, não se tem como
sustentar o entendimento da eg. Assembléia Legislativa do Paraná, segundo o qual a limitação imposta no
art. 13, V, da Constituição Federal
de 1967, com a Emenda Constitucional n? 1, de 1969, diz respeito com o
mínimo da remuneração estabelecida em Lei Federal, e não com o
máximo dessa remuneração.
O referido entendimento Importa
no extirpar do texto federal agora
discutido a locução limites máximos,
e uma tal extirpação não pode ser
feita pelo Intérprete
Os precedentes a que se reporta,
em suas informações, a eg. Assembléia Legislativa do Paraná, versaram temas diferentes do agora questionado, e, por isto, não lhe são aplicáveis.
Com efeito, no RE n? 77.993, de
Mato Grosso, pelo que se lê na RTJ,
74/154 a 158, o STF discutiu e Julgou
a questão de ser admissivel, para o
efeito de se aumentar o quanto da
gratificação adicional, a contagem
do tempo de serviço que certo Juiz
prestou a outro Estado.
Julgou-se nesse acórdão que se pode computar, nos termos da legislação mato-grossense, o tempo do serviço federal e municipal que um Juiz
de Mato Grosso prestou em antes do
seu ingresso na Magistratura desse
Estado, isso para o efeito de se lhe
conceder a gratificação correspondente a esse tempo, visto que o 0 3?,
do art. 102, da Constituição Federal
de 1967 com a Emenda n? 1 de 1969,
não proíbe o seu cômputo para outros efeitos.
16
R.T.J. — 100
Vê-se que o referido precedente
desta Corte não questionou o tema
de ser proibido ao Estado-membro
ultrapassar os limites máximos de
remuneração estabelecidos em lei
federal.
E de se dizer o mesmo no tocante
ao segundo precedente indicado pela
eg. Assembléia Legislativa do Paraná, qual seja o acórdão que o STF
proferiu no julgamento do RE n?
80.078, também de Mato Grosso,
acórdão esse que discutiu a mesma
questão versada no anterior, e a Julgou afirmando que o Estadomembro pode admitir a contagem do
tempo de serviço público federal ou
municipal para outros efeitos que
não os previstos no art. 102, § 3?, da
Constituição Federal de 1967 com a
Emenda n? 1 de 1969, e que uma tal
contagem não é contrariante do art.
13, V, da referida Carta Política.
A matéria proposta nesta representação é a que diz respeito com o
limite máximo da remuneração estabelecias em lei federal, limite que o
Estado-membro deve observar, e
não, claro isto, aos efeitos que produz o cômputo do serviço público federal, estadual ou municipal.
Quaisquer que sejam tais efeitos,
eles devem corresponder a uma certa quantia, e essa quantia não pode
ultrapassar o limite fixado em lei federal.
Pelo que se lê no art. 13, V e VI,
da Constituição de 1967 com a Emenda n? 1 de 1969, o constituinte adotou
o critério de proibir que os funcionários estaduais e municipais percebam remuneração que seja superior
à dos funcionários federais, e, também, o de vedar que os deputados
estaduais recebam subsídios e ajuda
de custo em quantia maior do que a
prevista em lel para os deputados federais.
Trata-se de critério político. para
obstar que, no ponto, o Estado-fnembro possa conferir a seus funcionários e a seus deputados um tratamento mais vantajoso do que o previsto pela União para seus funcionários e deputados.
Relevante, no caso, não é a espécie de remuneração, mas, isto sim, o
seu quanto.
Ao funcionário da União é vedado
receber de gratificação adicional por
tempo de serviço uma quantia superior a cinco por cento de seus vencimentos em cada qüinqüênio até o
máximo de sete qüinqüênios, e tal
proibição é extensiva também ao
funcionário estadual, e, obviamente,
ao municipal.
Dir-se-á que o discutido preceito
do art. 13, V, da Consituição de 1967
com a Emenda n? 1 de 1969, não pode ser aplicado sem que haja uma
lel federal especifica, e de alcance
nacional, que expresse quais os limites máximos de remuneração que
devam ser observados.
Estou em que um tal entendimento
não poderá prevalecer porque a lei
de natureza específica e alcance nacional (isto é, uma lei federal que
disponha sobre a matéria de serviço
estadual e municipal) já se acha expressamente prevista no art. 109 da
Constituição Federal de 1967 com a
Emenda n? 1 de 1969, e essa regra
não se refere a limite máximo de remuneração do servidor estadual e
municipal.
Se o constituinte não incluiu, no citado art. 109, a matéria da remuneração máxima do servidor estadual
e municipal, e somente o fez no referido art. 13, V, é porque ele se orientou no sentido, que logo se percebe,
de adotar, como limite máximo de
remuneração, o estabelecido em
qualquer lei federal.
R.T.J. — 100
17
Note-se que o mencionado art. 109
se refere: a) ao regime jurídico dos
servidores públicos da União, do Distrito Federal e dos Territórios; b) ã
forma e ás condições de provimento
dos cargos públicos (obviamente federais, estaduais e municipais); c)
às condições para o fim de aquisição
da estabilidade (pelo servidor federal, estadual e municipal).
ção do servidor federal, pode ser
aplicada, desde logo, como limitadora do máximo da remuneração do
servidor estadual e municipal.
II — Julgo procedente a representação para declarar a inconstituclonalidade, que me parece manifesta,
do art. 70, II, da Constituição do Paraná de 8.5.67 com a Emenda Constitucional n? 3 de 29.5.71.
Nenhum preceito expressa o art.
109 sobre o limite máximo de remuneração do servidor estadual e municipal.
VOTO
Por conseguinte, os limites máximos a que se reporta o supracitado
inciso V, do art. 13, são evidentemente os fixados por lel federal comum, e não especifica.
Atente-se para o fato de que as regras do art. 13, I a IX, da Constituição Federal de 1967 com a Emenda
n? 1 de 1969, afirmam o princípio de
que, no tocante às respectivas matérias, deve o Estado-membro
subordinar-se ao que dispõe o texto
constitucional, visto que os mencionados preceitos impõem a supremacia da União Federal sobre os
Estados-membros, donde a certeza
de que são auto-aplicáveis.
Não importa que algumas de tais
matérias estejam previstas na Constituição e outras estejam inscritas
em leis.
Relevante no pormenor é que as
normas constitucionalte legais re guladoras do assunto sejam imperativas, caráter este que o art. 13, I a
IX, lhes confere.
Parece-me, pois, que não é necessária uma lel federal especificamente reguladora do art. 13, V, da
Constituição de 1967 com a Emenda
n? 1 de 1969, para se aplicar o citado
preceito constitucional.
Qualquer norma que, baixada pela
União, disponha sobre a remunera-
O Sr. Ministro Rafael Mayer: Sr.
Presidente, antes de entrar nesta nobre Casa, o que multo me honra, tive
oportunidade de, exercendo função
administrativa, apreciar proposições
sobre a preocupação de certos órgãos do Poder Executivo relativamente à aplicação aos funcionários
estaduais dos limites de remuneração estabelecidos na lei federal, como decorrentes da aplicação deste
art. 13, inciso V, da Emenda Constitucional n? 1/69. Verifiquei, então,
que essa lei federal, que ai se reclama, não é aquela voltada para o plano federal, com eficácia para a circunscrição administrativa da União,
mas, dentro daquela distinção estabelecida ultimamente pela doutrina,
com muita razão de ser, entre lei federal e lei nacional, esta é que se reclama, com destinação e eficácia para o plano das entidades federadas.
O que se exigiria, no caso, não era a
lei federal existente para o âmbito
da União, a estender-se, automaticamente, aos Estados, sem mesmo
dizê-lo, mas uma lei que tivesse como objetivo específico estabelecer limites para os funcionários estaduais. A própria diversidade de estruturação funcional não poderia recomendar que se aplicasse automaticamente limites de remuneração de
servidores federais a servidores estaduais, sendo de anotar que o dispositivo constitucional não se refere a
simples teto, mas a limites, no plu-
18
R.T.J. — 100
ral, o que supõe a consideração de
situações e categorias funcionais diversas. Como se aplicariam os limites sem as especificações funcionais?
Qual o critério de verificação da paridade das situações sem a explicitação e correlação das funções? Eu
me perguntaria ainda: será que teria
limites superiores de remuneração e
modesto funcionário do Estado do
Paraná, que, em virtude desses
qüinqüênios, percebe ínfima importância, relativamente ao funcionário
federal?
Assim, minha concepção a respeito disso é que, não existindo lei federal específica estabelecendo quais os
limites dessa remuneração — porque
importaria ela até em desconsiderar
as diversas situações do Estado —,
não se verifica a integração da norma constitucional para sua observância, sendo esta a interpretação
mais favorável à autonomia remanescente do Estado, que somente padece restrição de modo expresso e
excepcional.
Desse modo, pedindo vênia ao eminente Relator, julgo improcedente a
representação.
VOTO
O Sr. Ministro Dedo Miranda: Sr.
Presidente, peço vênia ao eminente
Ministro Relator para acompanhar o
voto do eminente Ministro Rafael
Mayer. Também a mim me parece
que a referência do inciso V do art.
13 da Constituição apenas se relaciona com a lei específica federal cujo
alvo seja estabelecer limites máximos de remuneração de servidores
públicos, e não com os próprios limites superiores, in concreto, das remunerações ordinárias comuns dos
funcionários federais.
Consideração diversa levaria a
que, na operação de comparação do
máximo se somassem os vencimen-
tos básicos com as vantagens a eles
adjacentes, para então verificar se o
funcionário de categoria idêntica,
com o mesmo tempo de serviço, com
as mesmas promoções, estaria igualado ou superando o funcionário de
Idênticas características, do âmbito
federal. Nem isso me parece
possível. Mas, aqui, quer-se ir mais
longe. Procura-se isolar um componente da remuneração do funcionário para Comparar, exclusivamente,
este componente.
Acentuo este aspecto como reforço
de meu ponto de vista, porque me
parece que a comparação só poderia
decorrer de uma lei federal especifica, que visasse a fixar parâmetros
às remunerações dos funcionários
estaduais: ou um parâmetro localizado em determinada parte do estipêndio ou o parâmetro global.
Com essas considerações, Sr. Presidente, e com a vênia devida ao
eminente Relator julgo improcedente a representação.
EXTRATO DA ATA
Rp. 955-PR — Rel.: Min. Antonio
Neder. Repte.: Procurador-Geral da
República. Repda.: Assembléia Legislativa do Estado do Paraná.
Decisão: Pediu vista o Ministro
Soares Murloz, após o voto do Ministro Relator julgando procedente a representação, e dos votos dos Ministros Rafael Mayer e Decio Miranda,
julgando-a improcedente. Impedido
o Senhor Ministro Leitão de Abreu.
Presidência do Senhor Ministro
Xavier de Albuquerque. Presentes à
Sessão os Senhores Ministros Djaci
Falcão, Antonio Neder, Leitão de
Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mtarloz,
Decio Miranda e Rafael Mayer.
Procurador-Geral da República, Dr.
Firmino Ferreira Paz.
Brasília, 12 de março de 1981 —
Alberto Veronese Aguiar, Secretário.
R.T.J. — 100
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Soares Mufloz: O
Dr. Procurador-Geral da República
argüiu, na presente representação, a
inconstitucionalidade do inciso II do
art. 70 da Emenda n? 3/71 á Constituição do Estado do Paraná, sob o
fundamento de que ele, permitindo
ao funcionário estadual, ao completar 35 anos de serviço, perceber 50%
de acréscimo dos vencimentos, considerando que já o inciso I do mesmo
artigo assegura 25% de adicionais
relativos aos primeiros 25 anos de
serviço, viola flagrantemente a regra imperativa do art. 13, inciso V,
da Emenda Constitucional n? 1/69,
tendo em vista que a lei federal reguladora da concessão de adicionais
ao servidor público federal (Lei n?
4.345, de 26.6.64) estabelece um máximo de 35% concedidos, parceladamente, a razão de 5% por qüinqüênio
de efetivo exercício (art. 10 da Lei n?
4.345).
Dispõe o art. 13, inciso V, da Constituição da República:
«Os Estados organizar-se-ão e
reger-se-ão pelas Constituições e
leis que adotarem, respeitados,
dentre outros princípios estabelecidos nesta Constituição... as normas
relativas aos funcionários públicos,
inclusive a apficação, aos servidores estaduais e municipais, dos limites máximos de remuneração
estabelecidadas em lei federal.»
Discute-se qual seja a lei federal a
que se reporta o preceito constitucional, insta dizer, se á lei que regula a
remuneração dos servidores federais
ou se a uma lei destinada, especificamente, a fixar os limites máximos
de remuneração dos funcionários estaduais e municipais.
Em prol da exigência de uma lei
federal especifica militam dois argumentos.
19
O primeiro reside na verificação
de que a norma constitucional suscita, realmente, dúvida em sua interpretação, devendo prevalecer a que
assegura a autonomia dos Estados,
que é a regra, porquanto as restrições constituem exceções que, como
tal, devem ser entendidas.
O segundo argumento anima-se
no confronto do inciso V com o inciso
VI do mesmo artigo 13, pois se aquele houvesse erigido as vantagens
percebidas pelos funcionários da
União em teto intransponivel para os
Estados e Municípios na remuneração de seus funcionários, teria assim
disposto, Inequívoca e expressamente, como o fez o inciso VI, proibindo
aos Estados pagar, a qualquer título,
aos deputados estaduais mais de
dois terços dos subsídios e da ajuda
de custo atribuídos em lei aos deputados federais.
Ou, então, teria estabelecido, como
o fez no f 4?, do mesmo art. 13, no
qual prescreveu que os postos ou
graduações das policias militares estaduais não podem ter remuneração
superior à fixada para os postos e
graduações correspondentes no Exército.
O estabelecimento de tetos de remuneração para os servidores estaduais constitui providência complexa,
em face da diversidade dos Estados
da Federação, que conta ao lado de
Unidades superdesenvolvidas outras
subdesenvolvidas e algumas em fase
de desenvolvimento. Ademais, para
verificar-se o teto federal, não é
possível confrontar-se apenas uma
de suas parcelas, no caso os adicionais por tempo de serviço, mas a remuneração total.
A exigência de uma lei especial,
enfrentando tais peculiaridades, se
me afigura indispensável à aplicação do inciso V do art. 13 da Constituição da República. A lei federal,
R.T.J. — 100
20
exigida por esse dispositivo, não é,
pois, a que regula os vencimentos e
vantagens dos servidores da União,
mas aquela que for editada com esse
tini específico.
Objeta-se que o art. 109 da Constituição Federal não incluiu, entre as
hipóteses em que exige lei federal de
iniciativa do Presidente da República, a matéria de remuneração máxima dos servidores estaduais e municipais. Á lei no entanto, a que se refere o art. 13, inciso V, não se confunde com a prevista no art. 109,
nem esta exclui a viabilidade daquela, pois ambas emanam de preceitos
constitucionais da mesma hierarquia, que não se excluem `expressamente, nem se contradizem em sua
substância.
Ademais, a objeção se anima em
argumento a contrário, o qual, acentua Carlos Maximiliano, «embora
muito prestigioso outrora, é mal visto hoje pela doutrina e pouco usado
pela jurisprudência» (Hermenêutica
e Aplicação do Direito, pág. 291, 3?
ed.). Do fato de se mencionar uma
hipótese, ou algumas hipóteses, não
se deduz a exclusão de todas as outras, a menos que aquelas tenham
sido enunciadas de maneira taxativa.
Com vênia do eminente Ministro
Antonio Neder, julgo improcedente a
reclamação, acompanhando os nobres Ministros Rafael Mayer e Decio
Miranda.
VOTO
tados têm liberdade em sua organização, excetuados os casos previtos
na Constituição.
Ora, o art. 13, inciso V, dispõe que
lel federal estabelecerá o teto máximo de remuneração dos funcionários
estaduais, que não pode ser superior
à dos funcionários federais. Evidentemente que se trata de uma lei geral, e não especial, destinada a regular adicionais dos funcionários federais, que estabelece, para esses, o
máximo de sete qüinqüênios. A questão de adicional de vencimentos é de
competência de cada Estado. Tanto
isso é verdade que, para se limitar
os adicionais da magistratura a sete
qüinqüênios, foi necessário que a lel
orgânica assim estabelecesse expressamente:
«A gratificação adicional de 5%,
por tempo de serviço, até o máximo de sete».
Foi a Lei Geral da Magistratura
que estabeleceu, com relação à magistratura, o teto que, antes, apesar
de vigorar a Constituição variava de
Estado a Estado e, em alguns, não
tinha limite.
O mesmo ocorre com relação ao
funcionário público, razão por que
estou inteiramente de acordo com os
votos que me antecederam, julgando
Improcedente a representação.
EXTRATO DA ATA
Rp. 955 — PR — Rel.: Min. Antonio Neder. Rpte.: Procurador-Geral
da República. Rpda.: Assembléia Legislativa do Estado do Paraná.
O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Senhor presidente, de início, tenho a dizer que estou inteiramente de acordo
Decisão: Pediu vista o Ministro
com os argumentos expendidos pelos Cordeiro Guerra, após o voto do Mieminentes Ministros Soares Muiloz, nistro Relator, julgando procedente
Rafael Mayer e Decio Miranda, a representação, e dos votos dos Miacrescentando ainda estarmos em nistros Rafael Mayer, Decio Miranuma República Federativa, e, nes- da, Soares Mufioz e Cunha Peixoto
ta, no tocante a funcionários, os Es- julgando-a Improcedente.
R.T.J. — 100
Presidência do Senhor Ministro
Xavier de Albuquerque. Presentes à
Sessão os Senhores Ministros Djaci
Falcão, Antonio Neder, Cordeiro
Guerra, Cunha Peixoto, Soares Mufoz, Dedo Miranda e Rafael Mayer.
Ausentes, justificadamente, os Srs.
Ministros Moreira Alves e Leitão de
Abreu. Procurador-Geral da República, Dr. Firmino Ferreira Paz.
Brasília, 26 de março de 1981 —
Alberto Veronese Aguiar, Secretário.
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra:
Pergunta-se, nesta Representação,
se é licito ao Estado regular as gratificações adicionais por tempo de
serviço de modo diverso, ou mais liberal, que o previsto na lel federal
pertinente à mesma gratificação outorgada aos funcionários da União,
em face do inciso V do art. 13 da
Constituição Federal.
O eminente Ministro Antonio
Neder, relator, entende que não é necessária uma lei especifica para estabelecer o teto da remuneração máxima do servidor estadual ou municipal, pois essa limitação deflui do
próprio texto do inciso V do art. 13
da Constituição Federal, que se refere a limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal, e
não exige que essa lel seja especifica
ou complementar.
Os eminentes Ministros Decio Miranda, Rafael Mayer, Soares Muboz
e Cunha Peixoto divergem do eminente relator, sustentando que não
basta uma lei federal disciplinadora
da matéria, necessária é que haja
uma lel específica estabelecendo um
limite máximo aos vencimentos dos
funcionários estaduais ou municipais, tal como ocorre com a Lei Orgânica da Magistratura, art. 65,
VIII, que restringe o número de
qüinqüênios a sete.
21
Não me impressiona esse argumento, porque, sendo o Poder Judiciário Nacional, a própria Constituição previu a submissão das Justiças
Estaduais à Lei Orgânica da Magistratura Nacional, compleméntar e
especial, art. 194, e o art. 112, parágrafo único, da própria Constituição
estabelece:
*Lei complementar, denominada
Lei Orgânica da Magistratura Nacional, estabelecerá normas relativas à organização, ao funcionamento, à disciplina, às vantagens,
aos direitos e deveres da Magistratura, respeitadas as garantias e
proibições previstas nesta Constituição ou dela decorrentes.»
Em relação aos funcionários públicos o art. 109 da Constituição Federal não exigiu uma lel complementar
para estabelecer o regime juddico
dos servidores da União, do Distrito
Federal e dos Territórios, e multo
menos, em relação aos servidores
estaduais e municipais.
Basta, na matéria, a existência de
lei federal ordinária.
O art. 13 da Constituição Federal
estabeleceu a observância, entre outros, dos princípios que enumera, o
do inciso V.:
«As normas relativas aos funcionários públicos, inclusive a aplicação, aos servidores estaduais e
municipais, dos limites máximos
de remuneração estabelecidos em
lei federal.»
Ora, na espécie, o regime de gratificação adicional por tempo de serviço, norma relativa aos servidores
públicos, está disciplinado em lei federal, que limita o número de qüinqüênios ao máximo de 35%.
Não pode, a meu ver, data venta,
essa norma relativa a funcionários
públicos, estabelecida em lei federal,
ser negada ou ultrapassada por lei
local, porque, neste particular, os
22
R.T.J. — 100
Estados não têm autonomia, já que
a Constituição impõe a sua submissão às normas federais.
Restringir-se o preceito a uma norma especifica de caráter geral, não
imposta pelo art. 109 da Constituição
Federal, seria criar uma condição
onde ela não é imposta, ou seja,
exigir-se na lei complementar fora
dos casos previstos na Constituição.
A meu ver, o art. 13 da Constituição Federal visa à uniformidade de
critérios legislativos em matéria de
funcionários públicos e seus vencimentos, estabelecendo um teto, quer
quanto aos vencimentos base, quer
quanto às vantagens acrescidas a
ele.
O critério estabelecido na Constituição Estadual impugnada, a meu
ver, extrapola o limite da lei federal,
e assim, data venia, não pode subsistir, do mesmo modo, que não poderiam ter os funcionários estaduais ou
municipais vencimentos base superiores aos servidores federais.
Por outro lado, em relação aos
funcionários públicos, o limite de remuneração foi estabelecido em lei
federal para os funcionários da
União, não entendeu necessário a
Constituição dispor expressamente
como o fez em relação aos deputados
e militares.
Se se admitisse, a ultrapassagem
dos tetos estabelecidos quanto aos
adicionais, nada impediria a inobservância dos limites dos vencimentos
base federais, por normas estaduais.
Os critérios de remuneração dos
funcionários públicos, em todo pais,
devem ser uniformes, isto é, os estabelecidos em lei federal mesmo ordinária.
Em conseqüência, não obstante o
peso dos argumentos em contrário,
acompanho o eminente relator.
EXTRATO DA ATA
Rp. 955 — PR — Rel.: Min. Antonio Neder. Repte.: Procurador-Geral
da República. Reptda.: Assembléia
Legislativa do Estado do Paraná.
Decisão: Pediu vista o Ministro
Moreira Alves, após os votos dos
Ministros relator e Cordeiro Guerra,
Julgando procedente a representação, e os votos dos Ministros Rafael
Mayer, Decio Miranda, Soares Mufoz e Cunha Peixoto, julgando-a improcedente. Impedido o Sr. Ministro
Leitão de Abreu.
Presidência do Senhor Ministro
Xavier de Albuquerque. Presentes à
Sessão os Senhores Ministros Djaci
Falcão, Antonio Neder, Leitão de
Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Soares Mufloz, Dedo Miranda e
Rafael Mayer. Ausente, Justificadamente, o Senhor Ministro Cunha Peixoto. Procurador-Geral da República, Dr. Frimino Ferreira Paz.
Brasília, 02 de abril de 1981 —
Alberto Veronese Aguiar, Secretário.
VOTO ( VISTA)
O Sr. Ministro Moreira Alves: 1. —
A divergência entre os votos já proferidos se adstringe a saber se a lel
federal, a que alude o inciso V do artigo 13 da Constituição — «as normas relativas aos funcionários públicos, inclusive a aplicação, aos servidores estaduais e municipais, dos limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal» — é lei
federal que estabeleça limites máximos de remuneração aos funcionários federais (e esses limites deverão ser observados pelas Constituições e leis estaduais) ou se é lei federal apenas na sua origem, mas
não quanto aos seus destinatários, já
que integrada somente por normas
em que a União determina, diretamente, os limites máximos de remuneração dos servidores estaduais e
municipais.
R.T.J. — 100
2. — A meu ver, quer pela interpretação literal, quer pela interpretação lógica, correta é a primeira
dessas duas correntes.
Com efeito, sempre que a Constituição Federal determina que a
Constituição e as Leis Estaduais observem a aplicação de normas federais, estas são as que se dirigem diretamente aos agentes políticos ou
servidores federais, como se vê dos
incisos VIII e IX desse mesmo artigo
13, e isso até porque se se tratasse
de lei nacional, ela incidiria diretamente sobreps servidores estaduais
e municipais, não sendo necessário
que os Estados-membros, em sua
Constituição ou em suas, leis, aplicassem principio cuia incidência independeria da atuação legislativa
deles. Por isso mesmo, esse artigo 13
não determina que os Estadosmembros apliquem, nas suas Constituições e Leis, os princípios de leis
inequivocamente nacionais, como a
lei ordinária nacional relativa a
«normas gerais sobre orçamento,
despesa e gestão patrimonial e financeira de natureza pública; taxa
judiciária, custas e emolumentos remuneratórios dos serviços forenses,
de registros públicos e notariais; de
direito financeiro; de seguro e previdência social; de defesa e proteção
da saúde; de regime penitenciário»
(art. 8?, XVII, c), ou como a lei complementar nacional relativa a normas gerais de direito tributário (art.
18, § 1?), ou como a lei complementar nacional referente a regime
jurídico de servidores, a forma e
condições de provimento dos cargos
públicos, bem como a condições para aquisição de estabilidade (art.
109), ou com a lei complementar nacional de limites de despesas de pessoal (art. 64: «Lei Complementar estabelecerá os limites para as despesas de pessoal da União, dos Estados
e dos Municípios»). Em nossa liguagem técnica constitucional, a expressão «aplica-se» (ou similares, como
23
ocorre com «aplicação») não se usa
quando se quer aludir a incidência
direta (como sucede com a incidência de leis nacionais nos Estados e
Municípios), mas quando se quer estender norma legal que tem um destinatário específico a outros destinatários, como se vê, inequivocamente,
no próprio art. 13, incisos VIII e IX,
no art. 108 e em seu § 1?, e no artigo
158, § 5?.
Por outro lado, quando a Constituição se refere a leis nacionais, ela
usa da expressão alei complementar
ou lei federal» mas explicita que se
trata de lei federal que regula determinada matéria diretamente para a
União, os Estados e os Municípios.
Assim, no artigo 64 («Lei complementar estabelecerá os limites para
as despesas de pessoal da União, dos
,Estados e dos Municípios») e no artigo 109, I («Lei federal, de iniciativa
exclusiva do Presidente da República, respeitado o disposto no artigo 97
e seu § 1? e no § 2? do artigo 108, definirá: I — o regime jurídico dos servidores públicos da União, do Distrito Federal e dos Territórios»). Ora,
no inciso V, parte final do artigo 13
(«inclusive a aplicação, aos servidores estaduais e municipais, dos limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal») não se
alude aos servidores federais, como
se faria se se tratasse de lei nacional. Dal, urna de duas:
ou se admite que essa lei federal tenha por destinatários exclusivos os servidores estaduais e municipais, e, nesse caso, se permitiria
que a União, por lei ordinária, pudesse estabelecer que os limites
máximos de remuneração dos servidores estaduais e municipais fossem até inferiores aos que ela admite para os servidores federais;
ou se dá à parte final do inciso V do artigo 13 a interpretação
que se coaduna com a sua letra e
24
R.T.J. — 100
com o sistema adotado pela Constituição em questões similares, como as atinentes aos limites de remuneração de policias militares e
de magistrados estaduais, que se
fazem com a observância da paridade de limites de vencimentos de
niveis equivalentes nos âmbitos federal e estadual (art. 13, § 4?, e
art. 144, § 4?).
Não tenho dúvida em acolher essa
segunda interpretação.
Ela se compatibiliza melhor com a
autonomia dos Estados, não permitindo que lei ordinária federal possa
estabelecer limites máximos de remuneração para os servidores estaduais e municipais que sejam inferiores aos dos servidores federais;
quando a Constituição quer estabelecer tal disparidade o faz expressamente, como se vê do disposto no inciso VI do seu artigo 13 («a proibição
de pagar, a qualquer título, a deputados estaduais mais de dois terços
dos subsídios e da ajuda de custo
atribuídos em lei aos deputados federais, bem como de remunerar mais
de oito sessões extraordinárias mensais»). Ela se harmoniza com os demais dispositivos que tratam de remuneração, e que visam, sempre, a
estabelecer como limites máximos
os que a União paga a seus servidores, e isso porque, se os servidores
da União podem ser lotados no território de qualquer dos Estadosmembros, a remuneração máxima a
eles atribuída pode ser observada
como limite máximo (os limites
mínimos é que podem variar em função do custo de vida nos Estados)
para os servidores de qualquer desses Estados-membros.
Por fim, não vejo qualquer problema em se aplicar aos Estados-membros os limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal
para os servidores federais.
A parte final do inciso V do artigo
13 da Constituição Federal não diz
respeito à paridade de níveis de vencimento de categorias semelhantes
na União, nos Estados-membros e
nos Municípios. Alude ele a «limites
máximos de remuneração», expressão que, por ser mais genérica do
que «vencimento», abrange quaisquer vantagens pecuniárias, além do
vencimento atribuído a cada categoria funcional. O uso do plural «limites máximos de remuneração», uma
vez que não se trata de paridade de
níveis de vencimentos para categorias funcionais, se fez exatamente
para significar que a limitação a que
os servidores estaduais e municipais
estão sujeitos não é o máximo que,
concretamente, algum servidor federal possa perceber da União computados os vencimentos e todas as vantagens outras, inclusive de ordem
pessoal (nesse caso, não teria sentido o plural «limites máximos», pois
o limite seria um só: o desse total),
mas sim, os limites máximos de cada uma das parcelas integrantes da
remuneração do servidor, à semelhança, aliás, do que explicitou a Lei
Orgânica da Magistratura. Por isso
mesmo, o inciso V do artigo 13 da
Constituição Federal se refere a limites máximos de remuneração
estabelecidos em lei, ou seja, de modo abstrato.
Por tudo isso, em meu entender,
pelo dispositivo constitucional em
causa, nenhum servidor estadual ou
municipal poderá perceber vencimento-padrão superior ao mais
alto pago pela União, nem ter vantagens, em número e em quantia, superiores às máximas admitidas pela
legislação federal aos seus servidores.
No caso, um desses limites máximos — o relativo a adicionais — não
foi respeitado, razão por que, com a
devida vênia dos que pensam em
contrário, acompanho o eminente relator.
R.T.J. — 100
VOTO
Sr. Ministro Djaci Falcão: Sr.
Presidente, peço vênia ao eminente
Relator para acompanhar os votos
dos eminentes Ministros que entendem, na espécie, não ocorrer a inconstitucionalidade, porque, nos termos do inciso V do art. 13, não posso
chegar a uma conclusão de inobservância, no que diz respeito à locução
«limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal», pois não
existe a lei federal ai prevista.
Julgo improcedente a representação.
VOTO
Sr. Ministro Xavier de
Albuquerque (Presidente): Prescindo do exame da questão, que foi suscitada em votos de alguns eminentes
Colegas, de se referir a Constituição,
a lei de caráter nacional, ou não,
mas lei especial que se destine, precipuamente, a reger a remuneração
de funcionários estaduais, ou a leis
regedoras de remuneração de funcionários federais. Prescindo do exame destas questões.
Para mim, a disposição constitucional federal, com a qual é confrontada a norma constitucional estadual
impugnada, quer-se referir a eventuais tetos de remuneração dos servidores federais. Para que a norma
estadual colidisse com essa regra,
seria mister demonstrar-se que a remuneração total, auferida por funcionário favorecido com o percentual
de 50% aos 35 anos de serviço, alcança valor absoluto superior ao teto
acaso fixado na lei federal. E assim
que entendo a disposição, e não como foi declinado nos votos do Relator e dos colegas que o acompanham.
não pode ser ela, a meu ver, diferentemente entendida. Não há nor-
25
ma alguma da Constituição que obrigue os Estados a pagarem adicionais
por tempo de serviço a seus funcionários. E se eles entenderam de
pagá-los, não há norma alguma que
lhes imponha o critério do qüinqüênio. Porém, pagar triênios, como podem pagar decênios. E onde haverá
de ficar o limite de 5 qüinqüênios, ou
35 anos, se esse número não é múltiplo, nem de 3, nem de 10?
Está-se a ver, a meu sentir, que a
norma constitucional do inciso V, do
art. 13, diz respeito aos chamados tetos de remuneração, que foram muito usados nos anos 50 a 70 e que, de
certo modo, caíram em desuso no estágio atual do nosso Direito Administrativo.
Em relação aos magistrados, não,
porque a Lei Orgânica é expressa
em dizer que nenhuma vantagem se
lhes atribuirá, fora das que ela prevê, nem em bases ou limites superiores aos nela fixados. Mas, em relação ao funcionalismo comum, não
me parece que a legislação estadual
esteja coarctada pela norma constitucional trazida a debate.
Desse modo, acompanho o voto do
eminente Ministro Rafael Mayer,
data venta dos que se pronunciaram
em sentido contrário.
EXTRATO DA ATA
Rp. 955 — PR — Rel.: Min. Antonio Neder. Rpte.: Procurador-Geral
da República. Rpda.: Assembléia Legislativa do Estado do Paraná.
Decisão: Julgou-se improcedente a
Representação, vencidos os Ministros Relator, Cordeiro Guerra e Momira Alves. Votou o Presidente.
Presidência do Senhor Ministro
Xavier de Albuquerque. Presentes à
Sessão os Senhores Ministros Djacl
26
R.T.J. - 100
Falcão, Antonio Neder, Leitão de
Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufioz,
Decio Miranda, Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. Procurador-Geral da
República, Dr. Firmino Ferreira
Paz.
Brasília, 20 de maio de 1981. —
Jonas Célio Monteiro Coelho, Secretário.
REPRESENTAÇÃO N? 1.026 — RJ
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves.
Representante: Procurador-Geral da República — Representados: Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro e O Governador do Estado
do Rio de Janeiro.
Representação de inconstitucionalidade.
Poder do Estado-membro, em face da estrutura das Câmaras
Municipais, de adaptação das normas constitucionais federais relativas ao processo legislativo. Limites.
Não viola os artigos 13, ILI, e 51, § 2?, da Constituição Federal o
§ 2? do art. 188 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, que fixa
o prazo de vinte dias para que a Câmara Municipal aprecie projeto de
lei de iniciativa do Prefeito, se este, por entender urgente a medida, o
solicitar.
Representação de inconstitucionalidade que se julga improcedente.
o poder de solicitar à Câmara a
ACORDA°
Vistos, relatados e discutidos estes apreciação de projetos de lei no prazo
autos, acordam os Ministros do Su- de vinte dias, em oposição ao que
premo Tribunal Federal, em Sessão prescreve o art. 13, inciso III, combiPlenária, na conformidade da ata do nado com o art. 51, § 2?, da Constituijulgamento e das notas taquigráfi- ção da República.
cas, por maioria de votos, julgar imSolicitadas informações, foram
procedente a Representação.
elas prestadas pelo Exmo. Sr. GoBrasília, 26 de novembro de 1980. vernador do Estado, a fls. 56/61, e
— Xavier de Albuquerque, Presiden- pela Assembléia Legislativa Estadual, a fls. 63/74.
te — Moreira Alves, Relator
A fls. 77/83, assim se manifesta a
RELATÓRIO
Procuradoria-Geral da República,
do Dr. Moacir Antonio
O Sr. Ministro Moreira Alves: em parecerda
Silva, devidamente
Atendendo à solicitação da Câmara Machado
aprovado
pelo
Municipal de volta Redonda (RJ), o da República: Dr. Procurador-Geral
Exmo. Sr. Dr. Procurador-Geral da
República argüi a inconstitucionall«Por solicitação da Câmara Mudade do 2? do artigo 188 da Constinicipal de Volta Redonda, a presente representação argüi a intuição do Estado do Rio de Janeiro,
que versando o processo legislativo
constitucionalidade do 2?, do art.
no âmbito municipal, dá ao Prefeito
188, da Constituição do Estado do
R.T.J. — 100
Rio de Janeiro, na parte em que fixa o prazo de vinte dias para que a
Câmara aprecie projeto de lei de
iniciativa do Chefe do Executivo,
se este, julgando urgente a medida, assim o solicitar.
E este o teor do dispositivo em
referência:
«Art. 188. O Prefeito pode enviar à Câmara Municipal projetos de lei sobre qualquer matéria, que serão apreciados no prazo de quarenta e cinco dias, a
contar de seu recebimento, se assim o solicitar.
2° Caso julgue urgente a medida, o Prefeito pode solicitar a
apreciação do projeto em vinte
dias».
Entende a Câmara Municipal
que a regra transcrita, ao estabelecer o prazo de vinte dias, contraria
os arts. 13, III, e 51, 20, da Lei
Fundamental, pois, no âmbito federal, o Congresso Nacional dispõe
de quarenta dias para a apreciação
de projetos de lei, em regime de
urgência, em caso de solicitação
do Presidente da República.
Em suas informações de fls. 5661, sustenta o Exmo. Sr. Governador do Estado, em suma, que a Câmara de Vereadores não se integra
no Poder Legislativo, de maneira
que o constituinte estadual tinha liberdade ampla para disciplinar o
assunto, por força do que dispõe o
art. 13, ff 1?, da Constituição Federal.
A Egrégia Assembléia Legislativa do Estado, por seu turno, entende que compete ao Estado-membro
dispor sobre o processo legislativo
municipal, mas não está obrigado
a seguir literalmente as regras estabelecidas na Constituição da República. Considera invocando observação de Hely Lopes Meirelles,
que o prazo de urgência pode ser
27
reduzido a um tempo razoável para deliberação, sem ofensa à Carta
Magna .
art. 13, III, da Constituição, estende aos Estados-membros o
principio pertinente ao processo legislativo. Como assinala José Afonso da Silva, trata-se de regra que
se inclui entre as de controle federal sobre a organização das unidades federativas (Estado-membro
da Constituição Federal in RDP 16,
p. 17). O principio estende-se, assim, obrigatoriamente também para os Municípios, mesmo porque a
sua criação e organização constituem matérias da competência dos
Estados, embora sua autonomia
venha definida na própria Constituição Federal.
art. 200, por seu turno, prescreve que as disposições da Constituição Federal ficam incorporadas,
no que couber, ao direito constitucional legislado dos Estados. O dispositivo apresenta inovação em relação ao art. 188, na redação de
1967, pois este previa uma fase
preliminar de adaptação das Cartas Estaduais ás normas da Constituição Federal. A incorporação sobreviria apenas no caso de omissão dos Estados em reformarem
suas Constituições no prazo de sessenta dias.
De qualquer forma, mesmo em
face do texto atual, a incorporação
não elimina a adaptação. A propósito, observa-se,' em primeiro lugar, que a incorporação tem precisamente o sentido de prevenir
eventuais omissões dos Estados na
reforma de suas Constituições em
face do novo texto da Constituição
Federal ou mesmo desvios dos
mandamentos de cumprimento
obrigatório (Raymundo Faoro,
Excesso de Adaptação das Cartas
Estaduais ã Constituição de 1967,
RDP n? 7, p. 208), mas não paralisa o poder constituinte estadual,
28
R.T.J. — 100
que poderá proceder à aludida reforma de suas normas básicas,
adaptando-as aos princípios obrigatórios da Carta Magna.
A autonomia dos Estados, com
efeito, consiste basicamente na capacidade de auto-organização, no
poder de elaborar a sua própria
Constituição, de estabelecer seus
princípios e normas básicas, pois a
autonomia implica sempre em
competência legislativa (Pinto
Ferreira, Curso de Dir. Constitucional, 3. ed., 1974, v. 1, p. 95). A incorporação não ilide o poder de revisão, de reforma ou de modificação da Constituição do Estado. E
certo que a autonomia dos
Estados-membros encontra limites
nos princípios a que devem obrigatória observância, estatuídos na
Constituição Federal, mas também
estão livres para dispor o que lhes
aprouver em âmbito material diverso.
Não pode subsistir dúvida, portanto, de que a incorporação de
maneira alguma impede que o poder constituinte estadual elabore,
reforme sua Constituição ou a
adapte ao paradigma federal. Pelo
contrário, o próprio art. 13 da
Constituição Federal dispõe que os
Estados devem organizar-se e
reger-se pelas Constituições e leis
que adotarem, respeitados os
princípios da Lei Fundamental.
Por outro lado, é inerente ao poder de elaboração ou de reforma
da Constituição Estadual, em face
de nova ordem constitucional no
âmbito federal, um processo de
adaptação. A expressão «no que
couber», contida no art. 200 da
Constituição Federal, já denota a
necessidade de ajustamento aos
princípios contemplados na Lei Suprema da Nação.
A organização estadual e a municipal têm aspectos peculiares, ca-
racteristicas próprias, que as tornam inconfundíveis entre si, ou
com o organismo federal. Essas diferenças impõem a adaptação dos
princípios constitucionais federais,
na medida das discrepâncias estruturais entre essas três entidades
políticas.
Segundo o testemunho de Caio
Tácito, Relator Geral da Comissão
de Juristas do antigo Estado da
Guanabara, encarregada de adaptar a Constituição local ao texto da
Constituição Federal de 1967, não é
tão simples o ajustamento das
Constituições dos Estados ao paradigma federal (As Constituições
Estaduais e sua Adptação à Carta
Federal In RDA 89, pág. 431). As
dificuldades maiores situam-se
precisamente nas regras pertinentes aos chamados princípios constitucionais extensíveis (Constituição,
art. 13, II a IX), entre os quais se
inclui o relativo ao processo legislativo.
Nesse processo de adaptação, há
regras indesviáveis, consideradas
fundamentais ao controle federal,
entre as quais se inserem, por
exemplo, em matéria de processo
legislativo, as relativas à iniciativa
reservada, ao poder de ementa do
órgão legiferante e mesmo as referentes ao quorum requerido para a
aprovação dos atos legislativos.
Outras, porém, não podem ser
seguidas inteiramente à risca, em
face das diferenças entre a organização federal e a estadual ou municipal. No que se refere ao processo legislativo, a nota distintiva básica entre a União e os Estados e
Municípios esta em que o Congresso Nacional é bicameral, ao passo
que as Assembléias Legislativas e
Câmaras de Vereadores têm composição unicameral. Por essa razão, impossível, por exemplo, falar
em incorporação de regras de processo legislativo que definem a tra-
R.T.J. - 100
imitação de projetos pelas duas Casas do Congresso Nacional.
O mesmo se observa com relação aos prazos para apreciação de
projetos em regime de urgência solicitada pelo Chefe do Executivo.
Ora, se o prazo de quarenta dias
foi fixado na Constituição Federal
( art. 51, § 2?) tendo em vista que a
apreciação se faz em sessão conjunta do Congresso Nacional, a necessidade de constituição de Comissão
Especial para proferir parecer sobre o projeto, e ainda o número de
parlamentares, é evidente que o legislador constituinte estadual, considerando a constituição unicameral das Câmaras de Vereadores ou
mesmo o número de seus membros, pode estabelecer prazo menor, para a apreciação dos projetos, em caso de urgência solicitada
pelo Chefe do Executivo local.
A fixação de prazos diversos do
previsto no art. 51, § 2?, da Carta
Magna, para deliberação das Assembléias ou das Câmaras em nada ofende o princípio do processo
legislativo, correspondendo, antes,
a uma medida legitima e razoável
de ajustamento da Carta Estadual
ao paradigma federal, em atenção
às peculiaridades das organizações
estadual e municipal.
Os vários Estados têm, por isso
mesmo, estabelecido prazos menores do que o fixado no aludido art.
51, § 2?, da Constituição Federal,
para a apreciação de projetos em
regime de urgência pelas Assembléias Legislativas. Assim é, por
exemplo, que a constituição de
Pernambuco (EC. n? 2, de 25.3.70,
art. 32, § 1?), do Piauí (EC n? 1, de
31.1.71, art. 17, § 5?), do Rio Grande do Norte (EC n? 4, de 5.6.74, art.
26, § 3?), de Santa Catarina (EC n?
1, de 20.1.70, art. 60), da Paraíba
(EC nt 1, de 16.6.70, art. 31, § 2?),
do Pará (EC nt 1, de de 29.10.69,
art. 61, § 2?), de Magoas (EC n? de
29
15.12.69, art. 33, § 2?), e do Maranhão (EC n? 1, de 28.2.70, art. 26, §
2?) fixam o prazo de trinta dias para a apreciação em caráter de urgência , se os respectivos Governadores ó solicitarem. A EC n? 1, de
30.9.70, do Estado do Amazonas
prevê o prazo de quinze dias (art.
27, § 2?):
E certo que a liberdade do legislador constituinte estadual na fixação desse prazo é limitada, não podendo chegar ao ponto de restringir a apreciação dos projetos pela
Câmara de Vereadores. O prazo de
vinte dias previstos no art. 188, §
2?, da Constituição do Estado do
Rio de Janeiro, porém, não implica, por si só, uma limitação dessa
prerrogativa, não tornam materialmente impossível a apreciação
dos projetos. Se o prazo fosse tal
que impedisse a deliberação, a inconstitucionalidade deveria ser reconhecida porque a regra pertinente Importaria em suprimir as atribuições legiferantes das Câmaras
Municipais.
Correta, por isso, esta ponderação de Hely Lopes Meirelles,
referindo-se ao prazo de urgéncia»... o de urgência pode ser reduzido a um tempo razoável para deliberação, geralmente a metade do
prazo comum, como se observa na
generalidade das disposições constitucionais pertinentes» (Dir. Municipal Brasileiro 3. ed., 1977, p. 761).
Em face do exposto, parece-nos
de todo improcedente a presente
representação.»
E o relatório, do qual a Secretaria
deverá remeter cópia a todos os Srs.
Ministros.
Brasília, 28 de agosto de 1980.
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): Nada tenho que acrescentar
ao bem lançado parecer da Procuradoria-Geral da República, cuja fun-
30
R.T.J. — 100
damentação acolho para julgar improcedente a presente representação.
EXTRATO DA ATA
Rp. 1.026 — RJ — Rel.: Min. Moreira Alves. Repte.: ProcuradorGeral da República. Repdos.: Assembléia Legislativa do Estado do
Rio de Janeiro e o Governador do
Estado do Rio de Janeiro.
Decisão: Pediu vista o Min. Leitão de Abreu, após q voto do Ministro Relator que julgou improcedente
a representação. Falou pela Assembléia Legislativa do Estado do Rio
de Janeiro o Advogado Américo Gonçalves Valério Filho.
Presidência do Sr. Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão os Srs.
Ministros Djaci Falcão, Thompson
Flores, Xavier de Albuquerque, Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares
Mulloz, Decio Miranda e Rafael Mayer.
Procurador-Geral da República,
Dr. Firmino Ferreira Paz.
Brasília, 17 de setembro de 1980 —
Dr. Alberto Veronese Aguiar, Secretário.
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Leitão de Abreu:
No conceito de federação se contêm
certas notas que são essenciais a essa forma de governo. Não quer isso
dizer, contudo, que essa instituição
política, no seu desenho prático, haja
de corresponder a uma noção lógica,
rigidamente definida. Resguardados
elementos, que lhe são impreteríveis, é comum denotar a federação, na ordem positiva, feições peculiares, plasmadas pelo embate das
idéias políticas. De modo que a fisionomia do sistema federativo, ao
Invés de ser traçada, exclusivamente, a golpes de lógica, é delineada,
também por imposições históricas.
Variam, pois, entre si, os sistemas
federativos, notadamente quanto à
maior autonomia das entidades federadas e a maior ou menor soma de
autoridade do poder central. Além
disso flutuam, no tempo, as opiniões
ou teorias quanto à idoneidade que
revestiria a federação, como fórmula política e administrativa, para
acudir às exigências do desenvolvimento econômico e social da nossa
época. Ora se preconiza, como acontece, especialmente, nos Estados
Unidos, um novo federalismo, que
volte as costas a princípios já envelhecidos, inerentes à antiga idéia federalista, ora se anuncia, gravemente, que a federação está em declínio,
não só no ocidente, como em outros
horizontes. Esse o diagnóstico, por
exemplo, do Professor Karl Loewestein, de quem se afirma haver pronunciado oração fúnebre sobre o corpo do federalismo, por se achar este
divorciado da filosofia política da
época, na qual predomina o imperativo do planejamento econômico, incompatível com as concepções liberais, em que se funda a idéia federalista.
O nosso federalismo, sem as antecedências históricas do federalismo
norte-americano, nele tem as suas
raízes. A concepção de um federalismo dualista, que marcava, até bem
pouco, quando irrompeu vitoriosamente a idéia de um novo federalismo, de um federalismo cooperativo,
o sistema dos Estados Unidos, não
podia ser estranha à nossa ordem
Institucional. Ainda que aos Estados
jamais se houvesse reconhecido a
amplitude de poderes, no que toca à
sua capacidade legislativa, de que
gozavam essas pessoas políticas, na
União Americana, a autonomia que
se arrogaram entre nós alguns
Estados-membros, com a implantação da República, assumiu proporções, por vezes, certamente inesperadas.
R.T.J. — 100
Relembre-se, por ser o mais si gnificativo, o caso do Rio Grande do
Sul, que, usando largamente da franquia de que se reputava investido, já
no preâmbulo da Constituição, que
editou aos 14 de julho de 1891, declarava que a promulgação desse estatuto político se fazia «em nome da
Família, da Pátria e da Humanidade». Menos afoito, o Estado de Minas Gerais, fiel a velha concepção
quanto à fonte de todo o poder, deixava consignado que a sua Constituição se decretava e promulgava «em
nome de Deus Todo Poderoso». Os
representantes do povo paulista, por
sua vez, como que num rapto divinatório, no preâmbulo, onde adotavam,
decretavam e promulgavam sua
Constituição, declaravam «de ora
em diante autônomo e soberano o
Estado de São Paulo, como parte integrante dos Estados Unidos do Brasil».
Mais de um Estado terá introduzido, no corpo de suas Cartas Políticas, prescrições que não quadravam, se estritamente interpretadas,,
com a Carta Política da União. Nenhum, porém, terá excedido mais,
na ilberalidade com que interpretaram a sua competência autoorganizatória, do que o Rio Grande do Sul.
Decidiu a Carta Política sulista, simplesmente, reduzir a competência da
Assembléia Legislativa, acerca da
elaboração das leis, ás de natureza
financeira, quais as de fixação anual
da despesa e receita do Estado, assim como a de impor alguns tributos, isto é, impostos e taxas, enumerados no instrumento constitucional.
Quanto ao restante, provia o Presidente do Estado, mediante processo
que, na verdade, não tolhia o caráter
discricionário com que lhe era dado
legislar. Sejam quais forem as razões, umas de ordem filosófica, outras de índole política, que contribuiram para essa exacerbação da autoridade presidencial, a verdade é que
está implícita, na adoção desse siste-
31
ma, a idéia de que o órgão legislativo tem coisas mais importantes a fazer do que legislar. Por mais paradoxal que possa parecer essa concepção, que alguns, menos sóbrios,
chamariam de absurda, tal doutrina
não tem o mérito da orginalidade.
Em livro clássico, cuja primeira edição ocorreu em 1867 — quase um
quarto de século antes da promulgação da Constituição Rio-grandense —
Walter Bagehot, enumerando as funções da Câmara dos Comuns, não começa com a função legislativa. Indica, em primeiro lugar, a função eletiva, função mediante a qual escolhe
o Primeiro Ministro e os demais
componentes do Gabinete, ou seja, o
Poder Executivo. Essa — diz Bagehot — a mais importante função da
Câmara dos Comuns. A segunda função é a expressiva, aquela pela qual
se manifesta a opinião do povo inglês sobre todas as matérias. A terceira função é a pedagógica. Uma
grande assembléia, cujas sessões sejam públicas, integradas por homens
notáveis, não se situa no meio de
uma sociedade sem que altera essa
sociedade. Deve alterá-la para melhor, ensinando á nação aquilo que
ela não sabe. Se a grande assembléia, cujo papel assim se encarece,
cumpre essa missão, ou até que ponto o faz, é coisa que o célebre constitucionalista transfere para ulterior
exame. Vem, em quarto lugar, a
função informativa, pela qual se colocam peránie a nação, por via dos debates parlamentares, as grandes
questões que podem interessá-la.
Qualquer idéia, qualquer credo, qualquer sentimento ou reivindicação —
observa o grande publicista — em
cuja defesa se levante certo número
de respeitáveis deputados ingleses
pode parecer á maior parte dos ingleses uma opinião falsa e perniciosa. Entretanto, é uma opinião com a
qual, na esfera intelectual, se há de
contar. Inclino-me a considerar essa
função — frisa Bagehot — como a
32
R.T.J. — 100
segunda função do Parlamento, na
ordem de importância, porquanto
nos proporciona ouvir aquilo que,
aliás, não ouviríamos. Por fim —
prossegue o insigne analista político
«existe a função legislativa, cuja
grande importância seria grotesco
negar, importância que eu só nego
ser igual à da gestão executiva de
todo o Estado ou à educação política
dada pelo Parlamento a toda a Nação». Admite Bagehbt, entretanto,
existirem fases em que a legislação
é mais importante do que as que acima se mencionam, indicando os casos em que isso acontece.
Escrita em face do sistema britânico, essa página deve ser interpretada, no que entende com a posição
que aí se confere ao legislativo,
tendo-se em conta as peculiaridades
do ordenamento jurídico inglês, onde
a criação do direito se faz — ou se
fazia, predominantemente, mediante
a common law», não mediante a lei
proprie dieta. A crescente importância desta, no entanto, faz com que
hoje o juiz trate a lei — the statute
não mais como a exceção, mas
como a base do direito afrouxando,
assim, com a consternação dos seus
fiéis, a rigidez ao velho e venerável
dogma do stare dedais.
Voltando ao presidencialismo da
primeira Constituição sulriograndense — espécie de neo-presidencialismo precoce, que faria
inveja, talvez, ao consagrado, hoje,
em outros estatutos constitucionais
a redução que, em benefício do
Poder Executivo, se impôs à atividade legislativa não ocasionou perturbação maior à ordem pública, embora se murmurasse, permanentemente, dentro e fora das fronteiras gaúchas, contra esse regime constitucional, que se argüia de desacatar a
Carta Politica da União. Se, pelo não
exercício de atribuições que, pela
Constituição Federal lhe competiam,
isto é, pelo não exercício da plenitu-
de da função legislativa, não- sofreu
detrimento a ordem pública, já isso
não ocorreu, quando se desempenhou, em certo momento, de uma
das atribuições, que a Constituição
Estadual lhe dava: a de fazer a apuração da eleição do Presidente do
Estado (art. 56, n? 8?).
A acusação de que o resultado, que
deu por obtido, não refletia a vontade das urnas desencadeou a chamada Revolução de 23, a que pôs termo, depois de muito derramamento
de sangue, a «Paz de Pedras Altas»
que viria marcar o começo do fim,
da primeira Constituição do Rio
Grande do Sul, cujo fim mesmo
ocorreu com a Revolução de 1930.
Embora tenha estabelecido continuarem em vigor as Constituições Federais e Estaduais, estas a bem pouco
ficaram reduzidas porque, pelo Decreto que instituiu o governo Provisório, ficou «confirmada, para todos
os efeitos, a dissolução do Congresso
Nacional, das atuais Assembléias Legislativas dos Estados (quaisquer
que sejam as suas denominações).
Câmaras ou Assembléias Municipais
e quaisquer outros órgãos legislativos ou deliberativos existentes nos
Estados, nos municípios, no Distrito
Federal ou Território do Acre e dissolvidos os que ainda não tenham sido de fato». Suspenderam-se, ao
mesmo tempo, as garantias constitucionais e autorizou-se o Governo
Provisório a nomear um interventor
federal para cada Estado, interventor ao qual se deferiram, na sua órbita de ação, as largas atribuições
que se autoconferia o Governo Provisório.
O reingresso no Estado de Direito
ocorreu com a promulgação da
Constituição Federal de 1934. Conquanto esse instrumento constitucional haja introduzido, em nossa ordem Política e social, inovações do
mais alto relevo — inovações recebidas pelas constituições posteriores,
R.T.J. — 100
dela, sob o ângulo que aqui interessa, pouco há dizer-se, dado seu curto
periodo de vigência. Em compensação, nada é possível dizer da Constituição de 1937, a não ser que, à imitação do Decreto que, em 1930, instituiu o Governo Provisório, dissolveu,
em Disposição Transitória, que se
tornou permanente, a Câmara dos
Deputados, o Senado Federal, as Assembléias Legislativas e as Câmaras
Municipais, ficando o Presidente da
República, enquanto não se reunisse
o Parlamento Nacional, com o poder
de expedir decretos-leis sobre todas
as matérias da competência legislativa da União, competência que, na
órbita dos Estados, estendeu-se aos
Interventores Federais.
Promulgada a Constituição de
1946, os constituintes gaúchos, ao
elaborar a Constituição Estadual,
dando razão, novamente, a Montesquieu, para quem todo órgão tende a hipertrofiar a sua competência,
tentaram repetir a façanha dos constituintes locais de 1891. Desta feita,
porém, ao invés de insistirem na hipertrofia do Executivo, ensaiaram
confiscar-lhe atribuições, inerentes à
forma presidencialista de Governo,
mediante a instituição de Governo
Parlamentar, caracterizado pela instituição de Gabinete, constituído
por um Secretariado, cujos integrantes, indicados pela Assembléia, eram
da confiança desta, devendo demitirse, quando vitoriosa moção de desconfiança. Os autores dessa Carta
Estadual não tiveram, porém, a fortuna dos constituintes de 1891, cuja
soberba autonomista praticamente
não foi quebrada, pois a ilegitimidade do presidencialismo, que implantaram, resistiu a todas as peripécias
ou increpações, até que a Constituição que o consagrava foi levada, depois de quase quarenta anos, para o
grande cemitério a que a Revolução
de 1930 fez recolher, não se sabe se
piedosa ou impiedosamente, todas as
Constituições, sem faltar a Consti-
33
tuição Federal. Não cabe dizer que
não contavam os instituidores do
parlamentarismo, na órbita do Estado gaúcho, com a função areopagitica do Supremo Tribunal. Políticos
experientes, alguns de largo saber
jurídico, os caudilhos da idéia parlamentarista tinham consciência de
que, desde a Constituição Federal de
1934, se dera ao Supremo Tribunal,
então Suprema Corte, competência
para ingerir-se no processo de intervenção federal, somente realizável,
para assegurar a observância dos
chamados princípios sensíveis ou
explícitos, quando, mediante provocação da Procuradoria-Geral da República, o mesmo Tribunal, tomando
conhecimento da lei que houvesse
decretado a intervenção, lhe declarasse a constitucionalidade. Sabiam,
também, aqueles condutores políticos que a Constituição Federal de
1946, em presença de cuja catadura
inflexivelmente presidencialista ousavam enxertar, na Constituição local, a idéia parlamentarista, desenvolvera o instituto da representação,
para autorizar se provocasse, por
seu intermédio, a censura do Supremo Tribunal sobre ato estadual, que
infringisse principio constitucional
sensível.
Acolhida a representação, isto é,
declarada a inconstitucionalidade da
lei, autorizada ficava, então, a decretação da intervenção federal. A
representação passou, destarte, a vir
antes da lei federal; em lugar de
provocar a apreciação da constitucionalidade desta, dava lugar à censura
da constitucionalidade do ato estadual havido por incompatível com a
Carta Política da União.
A argüição de inconstitucionalidade do parlamentarismo que se embutiu na Constituição Rio-Grandense não
tardou. Nem demorou o pronuncià:
mento do Supremo Tribunal Federal
que, em memorável julgamento —
memorável pelo brilho dos votos pro-
34
R.T.J. — 100
feridos, entre os quais se destacou,
particularmente, o do Relator, Ministro Castro Nunes, concluiu não
ser compatível a forma de Governo,
que na Carta Rio-Grandense se adotara, com os princípios rigidamente
presidencialistas da Carta Política
da União.
A querela de inconstitucionalidade,
por via da qual se cortou esse sonho
autonomista, não foi a primeira que
se trouxe ao Supremo Tribunal. Outras, posto que menos expressivas,
já haviam sido articuladas. Essa forma de controle em tese da constitucionalidade de lel ou ato normativo
estadual — também aplicável à lei
federal — não nos é certamente peculiar, pois tem similar, por exemplo, na República Federal da Alemanha. O controle aí dos atos normativos estaduais não se exerce, contudo, de modo tão frequente como entre nós, visto que, na federação germânica, maior é o grau de autonomia reservada às entidades federadas. Além de muito mais restrita a
competência legislativa que aqui se
reconhece aos Estados, estes se
acham sujeitos, em mais alto grau,
quanto à sua organização, à observância do modelo estabelecido na lei
fundamental. Seja, no entanto, porque se considere que a competência
dos Estados se deve interpretar ampliativamente, diante da regra de
que lhe pertencem os poderes não
enumerados, seja porque os interesses políticos trabalhem no sentido do
fortalecimento das unidades federadas, o certo é que, na estrutura
jurídico-organizacional dos Estadosmembros, se registram freqüentes
desvios da moldura federal, naquilo
que dentro dela se deve conter imperativamente. Donde a multiplicação
de representações, mediante as
quais se intenta extirpar do ordenamento jurídico dos Estados disposições normativas havidas como inconstitucionais.
Entre as representações de inconstitucionalidade encaminhadas à
apreciação do Supremo Tribunal se
encontra a de n? 1.026, oriunda de
expediente, no qual a Câmara Municipal de Volta Redonda solicitou ao
Procurador-Geral da República que
submetesse ao exame desta Corte a
argüição de inconstitucionalidade do
§ 2? do art. 188, da Constituição do
Estado do Rio de Janeiro, e conseqüentemente do # 2? do art. 84, da
Lei Complementar n? 1 (Lei Orgânica dos Municípios), de 17.12.75, que
«fixam um prazo de vinte dias para a
votação em regime de urgência, contrário aos quarenta dias fixados pelos §§ 2? dos artigos 51 e 41, respectivamente, das Constituições da República e do Estado, ex vi do mandamento do art. 13, Inc. III, da Constituição Federal».
O § 2? do art. 51, da Constituição
Federal, estatui que «se o Presidente da República julgar urgente o projeto poderá solicitar que a sua apreciação seja feita em sessão conjunta
do Congresso Nacional, dentro do
prazo de quarenta dias». Por sua vez,
dispõe a Constituição do Estado do
Rio de Janeiro, no § 2?, do art. 41,
que «se o Governador julgar urgente
o projeto, poderá solicitar que a sua
apreciação seja feita dentro do prazo
de quarenta dias». Nos dois casos, na
falta de deliberação dentro desse
prazo, consideram-se aprovados os
projetos. Assevera-se que a regra
posta no § 2° do art. 51 da Constituição Federal integra o processo legislativo, disciplinado na Carta Politica
da União. Como, no art. 13, III, desse estatuto político, se determina
cumprir aos Estados respeitar, nas
Constituições e Leis que adotarem,
os princípios concernentes ao processo legislativo, conclui-se que contraria a Constituição Federal a prescrição exarada no art. 188, § 2?, da
Constituição do Rio de Janeiro, prescrição segundo a qual «caso julgue
urgente a medida, o Prefeito pode
R.T.J.
solicitar a apreciação do projeto (pela Câmara Municipal) em vinte
dias».
Responde-se que a Constituição
Federal, no artigo 200, manda incorporar as disposições dela constantes,
no que couber, ao direito constitucional legislado dos Estados. Logo, haveria, no tocante ao processo legislativo, possibilidade de adaptação das
regras constitucionais, no que coubesse, aos Estados. Não é essa, todavia, a
conseqüência que cumpre extrair do
que se estabelece no mencionado
art. 200. O que nele se diz é que as
disposições constantes da Constituição Federal ficam incorporadas, no
que couber, ao direito constitucional
legislado dos Estados. Pergunta-se:
não terá ficado incorporada, por força
dessa cláusula constitucional, ao direito constitucional legislado dos Estados, a regra do I 2? do art. 51, da
Constituição Federal? A resposta
afirmativa se me afigura impor-se,
nesse particular, pois cabe aplicar,
na órbita estadual, quanto ao Governador e à Assembléia Legislativa, o
que se preceitua, na esfera fede
ral, no tocante ao Presidente da República e ao Congresso Nacional,
quando funcione em sessão conjunta.
Só há falar-se em adaptação desse
principio constitucional, na sua incorporação ao direito legislado dos
Estados, no concernente à mudança
das expressões pelas quais se designam, no plano estadual, o Chefe do
Poder Executivo e o órgão legislativo. Nenhuma alteração comporta,
entretanto, o prazo dentro no qual,
por ser urgente o projeto, solicite o
Chefe do Poder Executivo a sua
apreciação. De quarenta dias é o
prazo fixado, em tal caso, para a
apreciação do projeto em sessão
conjunta do Congresso Nacional; de
quarenta dias há de ser, também,
por aplicação do disposto no art. 200
da Constituição Federal o prazo para a apreciação do projeto, pela Assembléia Legislativa.
— 100
35
Pela incorporação, com a cláusula
no que couber, posta no art. 200 da
CF, das disposições desta ao direito
constitucional dos Estados, o prazo
para a aprovação dos projetos ditos
de urgência é, como se viu, de quarenta dias. Sustenta-se, no entanto,
que a clásula no que couber governa
também a adaptação das Cartas Estaduais aos princípios constitucionais da União. Assevera-se que essa
adaptação há de recair, também,
não obstante a regra do art. 13, III,
da Lel fundamental, onde se manda
respeitar o processo legislativo, sobre o que a seu respeito al se estabelece; se assim não fora, os Estados
teriam de adotar, forçosamente, o
sistema bicameral, nos moldes previstos na Constituição Federal. E sabido que alguns Estados, cerca de
dez, incorporaram às suas Cartas
Políticas, no regime da Constituição
de 1891, o sistema bicameral. E excusado apurar se, debaixo da Constituição de 1934, algum Estado persistiu nessa orientação ou se a ela se finou. Basta assinalar-se que, sob a
Constituição de 1946, nenhum Estado
adotou o sistema bicameral. E isso
suficiente para que não se possa
atribuir às regras constitucionais
pbsteriores, que impuseram expressamente aos Estados a observância
do processo legislativo da União, o
intento de incluir nesse processo a
parte que diz com a participação nele de duas casas legislativas à maneira do que se verifica na órbita federal. Aliás, como ninguém se lembrou, até agora, desde a Constituição
de 1891, de argüir a inconstitucionalidade da não implantação, na ordem
estadual, do sistema bicameral, não
seria, pelo menos, curial que, nesta
altura, mesmo ante o postulado
que manda os Estados observarem o
processo legislativo da União, se
viesse aventar querela de inconstitucionalidade, em relação ás Cartas
Políticas dO Estado que deixaram,
sem nenhuma discrepância entre
36
R.T.J. — 100
de inserir, no seu ordenamento constitucional, ao lado das Assembléias
Legislativas, órgão correspondente
ao Senado.
Da possibilidade de não inclusão
de órgão dessa natureza no corpo
das Constituições Estaduais não se
tira, entretanto, o reconhecimento de
que os Estados, no tocante ao delineamento do processo legislativo,
possuam o arbítrio de modificar
princípios essenciais a esse processo. Entre esses princípios se conta o
estabelecido no 2? do art. 51, da
Constituição Federar, onde se assina
o prazo de quarenta dias para a
apreciação de projeto considerado
urgente pelo Chefe do Executivo.
Preceito de índole especial, pois dele
pode resultar, no caso de não apreciação do projeto dentro do prazo,
ter-se o mesmo como aprovado, não
pode esse prazo, dada a sua natureza, ser diminuído ao alvedrio dos
Estados-membros. Que essa regra,
pela qual se faz possível obter a
aprovação de lel até pela intencional
negativa de quorum para a votação do projeto possui qUid especial mostra a própria Constituição,
primeiro quando determina a sua
não aplicação aos projetos de codificação, segundo quando, no tocante
às emendas constitucionais, exige,
para a sua aprovação, votação expressa e efetiva, com maioria qualificada.
Admitir, aliás, que a título de
adaptação, com base na cláusula —
no que couber — o constituinte estadual possa reduzir, a seu talante, o
prazo de quarenta dias, a que se refere o 2?, do art. 51, da Constituição Federal não se coaduna, aliás,
nem com os termos do art. 13, item
III, dessa Carta Política, nem com o
modo estrito com que o Supremo
Tribunal tem intepretado os imperativos estatuídos nesse artigo. Marca,
nesse particular, a orientação desta
Corte a decisão que tomou acerca da
argüição de inconstitucionalidade de
preceito da Constituição paulista, onde se regulava matéria concernente
à fiscalização financeira, exercida
pela Assembléia Legislativa, com o
auxílio do Tribunal de Contas.
Estipulava-se nesse preceito que se o
Tribunal de Contas solicitasse que a
Assembléia Legislativa se pronunciasse sobre contrato impugnado pelo mesmo Tribunal e, se o não fizesse a Assembléia, dentro do prazo de
trinta dias, a impugnação se reputaria subsistente. Entendeu, porém, o
Supremo Tribunal, aplicando ao caso
o item IV, do art. 13. da Constituição
Federal, que esta dispunha a respeito do assunto e que, ao fazê-lo, estabelecia que, se o Congresso Nacional, no. prazo de trinta dias, não se
pronunciasse sobre a impugnação,
esta se considerava insubsistente.
Concluiu, portanto, que, dando a
Constituição paulista como subsistente a impugnação, no silêncio da
Assembléia, quando a Constituição
Federal, no silêncio do Poder Legislativo, reputava insubsistente a impugnação, o mandamento constitucional do Estado era ilegítimo, porque estava adstrito à observância do
Item IV, do art. 13, da Constituição
Federal, que impõe aos Estados a
observância dos princípios constitucionais da União acerca da fiscalização orçamentária e financeira.
Lembra-me — relator que fui do processo — ter defendido a compatibilidade da cláusula estadual com o sistema constitucional, uma vez que,
sobre se não haver desviado do
princípio concernente à fiscalização
financeira, imposto à observância
dos Estados-membros, a Constituição paulista, na aplicação desse
princípio, usava até de maior rigor
do que a Carta Federal, pois, enquanto esta reputa insubsistente a
Impugnação, quando sobre ela não
se manifesta, no prazo de trinta
dias, o Poder Legislativo, a Constituição paulista considerava que o de-
R.T.J. — 100
curso do prazo, sem manifestação da
Assembléia Legislativa, importava
haver-se como subsistente a impugnação. Maior razão milita, no caso
vertente, para que se haja como intocável o modelo federal, quanto ao
prazo para a apreciação do projeto
de lei, que o Chefe do Executivo declare urgente. Lá se cuida, simplesmente, da apreciação, no prazo de
trinta dias, de contrato, que tenha
sofrido impugnação do Tribunal de
Contas, apreciação cuja falta, dentro
do prazo, redunda em manter-se o
contrato. Aqui, no entanto,se trata
de prazo estabelecido na Constituição Federal para que se aprecie projeto de lei, sob pena de se ter o projeto como aprovado, se a votação não
se verificar até o final desse prazo. Dispõe-se, nesta hipótese, ~tinto, quanto a uma das formas pelas
quais se pode dar a aprovação de
projeto de lei, independente de votação. Vale dizer: disciplina-se um dos
processos de criação do ato legislativo; regula-se, pois, a feitura da própria lei.
Ora, se a Constituição Federal ao
prover acerca do caso em que a
aprovação do projeto de lei pode
verificar-se independente de votação, estipula que isso só ocorrerá se
o projeto não for apreciado dentro de
quarenta dias, não é licito aos Estados reduzir esse prazo, porque, se o
fizerem, estarão restringindo o
período dentro do qual os membros
do corpo legislativo podem, segundo
a Carta Federal, apreciar o projeto,
mediante votação, seja para
emendá-lo, ou negar-lhe aprovação,
seja para aprová-lo. Diminuir o prazo para o exercício dessa faculdade,
natural ao órgão legislativo, redunda, pois, em por embaraços, não autorizados na Carta Federal, ao uso
da autonomia, a que, fora dos limites traçados na Lei fundamental, o
corpo legllativo está intitulado.
Não se argumente que menos importantes são as leis estaduais e mu-
37
nicipais, porquanto, no que toca aos
interesses estaduais ou municipais,
os projetos de lei pedem ser havidos
como de suma importância. Ademais, se fosse menor a sua importância, não haveria razão, também,
para que a sua apreciação fosse julgada mais urgente do que a dos projetos de lei federal, de modo que, ao
Invés dos largos quarenta dias, estabelecidos pela Constituição Federal,
para a sua apreciação, se deveriam
estipular prazos menores, redutíveis
a não se sabe quanto tempo. Não colhe, de outra parte, a alegação de
que, por ser menor a composição dos
corpos legislativos estaduais e municipais, lhes será mais fácil deliberar
em menos tempo: Quanto aos Estados, estes, em geral, assim não pensam, porque são raros os que encurtaram os prazos para a apreciação
dos projetos, sujeitos a aprovação
pelo decurso do tempo. Ademais, e
maior ou menor dificuldade em deliberar, acerca da aprovação ou não,
de projeto de lei, não constitui o elemento que figura como decisivo para
a fixação de prazo destinado a deliberação, uma vez que esse elemento
reside na urgência do projeto, urgência que não será maior para os Estados e Municípios do que para a
União, onde o prazo, para a apreciação do projeto, por ser este urgente,
é de quarenta dias.
A anomalia constitucional, consistente na redução do prazo para a
apreciação de projetos de lei, reputados urgentes, cresce de ponto no que
toca à regra estatuída na Constituição do Estado do Rio de Janeiro,
art. 188, f 2?, onde se prescreve: «Caso julgue urgente a medida, o Prefeito pode solicitar a apreciação do projeto em vinte dias». Com a assinação
desse prazo — vinte dias para a
apreciação do projeto — estima-se,
certamente, que os profetos, pronunciados como urgentes, não são apenas urgentes, mas urgentíssimos.
Mas se o são, porque não estabelecer
38
R.T.J. - 100
prazo menor para a sua apreciação,
por exemplo, quinze dias, dez dias,
cinco dias? Replica-se que não seria
razoável. Pergunta-se, no entanto, a
partir de que limite o prazo deixaria
de ser razoável, para tornar-se, por
não revestir esse característico, inconstitucional a sua estipulação?
Ainda! Se razoável, para alguns mu.licipios, de menor porte, seria o prazo razoável para outros, onde os projetos de lei lidem com problemas de
maior complexidade? A .Constituição do Estado do Rio de Janeiro cortou a questão, porque, no seu entender, o prazo que é razoável para o
menor dos seus municípios é razoável, também, exempli gratia, para o
Município do Rio de Janeiro, onde se
situa, com todos os seus problemas,
uma das megalópolls, com que a idade contemporânea atemoriza ou aflige os gestores da coisa pública. Essa
Carta Constitucional, tratando igualmente, no que concerne ao processo
de formação da lei, cujo projeto se
tenha definido como urgente, municípios entre os quais reina, quanto
à composição dos corpos legislativos, flagrante desigualdade, municípios entre os quais impera, no
que toca aos problemas que lhes são
peculiares, indiscutível disparidade,
trata igualmente — § 2? do art. 188 —
entidades desiguais, rompendo, assim, com o princípio de igualdade.
Tudo isso concorre para demonstrar
que o contribuinte estadual, no caso,
procedeu de modo arbitrário. Sobre
esses argumentos se alteia, contudo,
decisivamente, o que concerne à intocabilidade, no que tange à apreciação dos projetos, que o Chefe do Poder Executivo pronuncie como urgentes, da regra estabelecido no §
2?, do art. 51, da Constituição Federal.
Por estes fundamentos, julgo procedente, data venta, a presente representação para declarar inconstitucional o § 2?, do art. 188, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro.
EXTRATO DA ATA
Rp. 1.026 — RJ — Rel.: Min. Moreira Alves. Repte.: ProcuradorGeral da República. Repdos.: Assembléia Legislativa do Estado do
Rio de Janeiro e o Governador do
Estado do Rio de Janeiro.
Decisão: Pediu vista o Ministro
Rafael Mayer, após o voto do Ministro Relator, que julgou improcedente
a representação: e do voto do Minisro Leitão de Abreu, que julgou procedente a representação, para declarar a inconstitucionalidade do § 2?,
do art. 188, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro.
Presidência do Senhor Ministro
Antonio Neder. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Djaci Falcão,
Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Leitão de Abreu, Cordeiro
Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufloz, Decio Miranda
e Rafael Mayer. Procurador-Geral
da República, Dr. Firmino Ferreira
Paz.
Brasília, 15 de outubro de 1980 —
Alberto Veronese Aguiar, Secretário.
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Rafael Mayer: Ao
dispor sobre o processo legislativo,
no capitulo do Poder Legislativo Estadual, a Constituição do Estado do
Rio de Janeiro, em confronto com o
modelo federal, regulou o procedimento abreviado, no artigo 41,
pelo qual são apreciados pela Assembléia Legislativa, projetos de lei
sobre qualquer matéria, enviados pelo
Governador, no prazo de sessenta
dias, enquanto no modelo federal esse prazo é de quarenta e cinco dias,
sucessiva e distintamente, para cada
uma das casas do Congresso (art.
51). E o procedimento urgente, pelo
qual a apreciação será no prazo de
quarenta dias (art. 40, § 2?), coincidente com o disposto no art. 51, § 2?,
para a reunião conjunta do Congresso Nacional. Em um e outro ca-
— 100
so se tem a aprovação tácita do projeto, como enviado, se decorrido o
prazo, dentro nele não se deliberar.
Entretanto, na parte sobre Organização Municipal, no capitulo relativo
ao processo legislativo das Câmaras
Municipais, conceituadas como órgãos legislativos do Município,
determina-lhes a observância do
principio da aprovação tácita dos
projetos enviados pelo Prefeito, pelo
decurso do tempo sem deliberação,
mediante o procedimento abreviado,
em quarenta e cinco dias ( art. 188) e
em procedimento urgente, vinte dias
(art. 188, § 2?).
Somente com relação à ultima hipótese é irrogada a mácula de inconstitucionalidade. Desde logo, data
venta, não me parece que ele ocorra
Decerto, o art. 200, da Constituição
Federal, na redação da Emenda n?
1, reza que as disposições constitucionais federais ficam incorporadas,
no que couber, ao direito constitucional legislado dos Estados. Não se admita, porém, que essa incorporação
seja capilar e milimétrica, pois a
própria cláusula modal, concede a
flexibilidade indispensável para o
atendimento das realidades circunstanciais destinatárias da incorporação.
A interpretação desse dispositivo
não se faz isoladamente mas, como
em boa hermenêutica, sistematicamente com o art. 13 da Constituição,
onde enumerados os chamados
princípios extensíveis, dentre os
quais o processo legislativo, sem
desprezar o critério político do regime. No regime federativo, a autonomia pode ser reduzida ao máximo,
conquanto não ao ponto de ser anulada de todo a capacidade de autoorganização, o que comporta uma
margem de variações e módulos alternativos, desde que não desbordem
do quadro dos princípios, que são
39
princípios, estes a serem indeclinavelmente observados na organização
estadual.
Cuido, portanto, não esteja afastado o poder estadual de realizar a
adaptação de suas Constituições, e,
pela própria natureza da adaptação,
acomodar os princípios federais ás
realidades estruturais peculiares do
Estado.
A circunstância de que não se tenha reiterado no atual art. 200 a primeira parte do art. 188 da redação
original da Constituição de 1967 não
retira obviamente o poder de emenda constitucional, de âmbito estadual, no sentido aqui proposto. pois a
norma primitiva visava facultar tãosomente um procedimento excepcional de reforma constitucional, sem
que a sua inexistência implique em
desfazer-se o procedimento ordinário
de revisão.
Não é despiciendo que diversas
Constituições Estaduais tenham adotado a redução ora de um ora de outro prazo, o que reflete uma consideração comum sobre diferenças indisfarçáveis a desaconselhar a aplicação rígida e formal de um paradigma que tem outros pressupostos institucionais. Basta ver a mais saliente que é a característica unicameral
das Assembléias Legislativas para
que não se tenha al o perfeito reflexo
de uma condição temporal imposta,
no plano federal, a duas câmaras,
ou à reunião das duas, com bem
mais numerosa composição e complexa organização e funcionamento.
Ai o poder autonómico se exerce
legitimamente. Guarda-se o principio do processo legislativo, pelo qual se assegura ao Executivo,
com a primazia que modernamente
se lhe tem reconhecido, a realização
do interesse de ter prontamente
apreciado, livre de obstruções, o projeto que julgue merecedor de urgência. Não ofende o principio que o de-
40
R.T.J. - 100
curso do prazo se faça em tempo
menor, atendendo às peculiaridades
locais e a critério do constituinte estadual, desde que não se infirme a
possibilidade da pertinente manifestação parlamentar, enfim desde que
seja razoável, usual expressão de notória conotação jurídica.
VOTO
O Sr. Ministro Xavier de
Albuquerque (Presidente): Peço licença à maioria qualificada, que já se
formou, para acompanhar o voto do
eminente Ministro Leitão de Abreu.
Procurei, na jurisprudência da CaSe a colocação me soa válida fren- sa, algum precedente a respeito do
te à organização dos poderes do Es- tema, porque me parecia difícil que,
tado, maior significação assumirá se tantos anos depois da inovação, não
o equacionamento se fizer diante da se houvesse cuidado dele. Na verdaorganização municipal, à qual as de, nada encontrei que representasse
exame frontal, pelo Tribunal, do
Constituições estaduais e leis orgâni- o
que está fazendo objeto da
cas municipais transferem os mol- problema
des federais com maior índice de representação.
discrição e critério mais amplo de
Mas, em certa representação da
adaptabilidade. E o ponto sob exame Guanabara,
a Rp 823, de que foi Rediz precisamente sobre organização lator o eminente
Ministro Adalício
municipal. As difrações que ai sofre Nogueira, cujo acórdão
está publicaa aplicição dos princípios extensivos do na RTJ 56/601, examinou-se
a arsão ainda mais patentes, pois a si- güição de inconstitucionalidade
de
tuação institucional não apresenta preceito constitucional estadual que,
uma réplica para o recebimento do a propósito do prazo para a apreciamodelo, já que nem o esforço dos ção do projeto, fixava-o em tempo
municipalistas convence de que o maior do que o estabelecido na ConsMunicípio tenha autonomia política, tituição Federal. Alegava-se que esIntegre a federação ou se organize
norma era inconstitucional, porpela divisão de poderes. A Câmara sa
discrepava do modelo federal. O
Municipal, — que não representa um que
voto
eminente Relator, acompapoder legislativo como o da União ou nhadodosem
acréscimos pelo Tribudo Estado, — justifica, se não recla- nal, foi repelindo
a argüição e se remada, por sua estrutura, pelo seu di- portando, repetindo-a
à observação
mensionamento e por sua competên- feita no parecer da Procuradoria-Gecia, um tratamento compatível com ral, no sentido de que inconstituclosua escala institucional e peculiari- nalidade haveria se o prazo fosse
dade organizacional. Para a obser- menor, mas, não, maior, porque em
vância do princípio do processo le- nada coartava a atuação do Poder
gislativo, e para o procedimento de Legislativo. Todavia, não se enfrenurgência vigente para o Congresso tou, na verdade, a questão. Esta foi
Nacional, bem consentâneo com a a única referência que encontrei nos
sua realidade é a estipulação do pra- precedentes.
zo de vinte dias, mais talvez do que
os quarenta daqueloutro, acomodada
De todo modo, parece-me que a
a uma situação complexa que aqui questão
da limitação do prazo para
se apresenta bem simples.
apreciação dos projetos do Executivo entesta com o princípio, que a tuPelo exposto, data venha, acompa- do preside, das relações entre os Ponho o voto do eminente Relator, jul- deres, que hão de ser harmônicas e
gando improcedente a representa- em termos que permitam o pleno
exercício da atuação de cada qual.
ção.
41
R.T.J. — 100
Não creio, por isso, que os limites
temporais traçados na Constituição
Federal para que as Casas Legislativas apreciem projetos do Executivo,
possam ser reduzidos ainda mais
nas áreas estadual e municipal. Penso que eles já são o mínimo suportável para poderem conviver com o
principio constitucional da harmonia
e independência dos Poderes. O prazo de vinte dias, que se marca na
Constituição do Estado do Rio de Janeiro para que as Câmaras Municipais — por exemplo, a Câmara Municipal do município do Rio de Janeiro — apreciem projetos mandados
pelos Prefeitos, é uma irrisão.
O sistema constitucional federal, a
meu ver, pode ser decalcado, mas
sem maior aflição para as Casas Legislativas. No máximo, o que se pode fazer no âmbito estadual e municipal é repetir os prazos dados na
Constituição Federal; diminui-los
ainda mais, a meu ver, agride o postulado da harmonia entre os Poderes.
Por isso, acompanho o voto do
eminente Ministro Leitão de Abreu e
Julgo procedente a representação.
EXTRATO DA ATA
Rp. 1.026 — RJ — Rel.: Min. Moreira Alves. Repte.: ProcuradorGeral da República. Repdos.: Assembléia Legislativa do Estado do
Rio de Janeiro e o Governador do
Estado do Rio de Janeiro.
Decisão: Julgou-se improcedente a
representação, vencidos os Srs. Ministros Leitão de Abreu e Xavier de
Albuquerque, (Presidente).
Presidência do Senhor Ministro
Xavier de Albuquerque. Presentes à
Sessão os Senhores Ministros Djaci
Falcão, Thompson Flores, Leitão de
Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Soares Mufioz, Decio Miranda e
Rafael Mayer. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Antonio Neder e Cunha Peixoto. ProcuradorGeral da República, Dr. Firmino
Ferreira Paz.
Brasília, 26 de novembro de 1980 —
Alberto Veronese Aguiar Secretário.
REPRESENTAÇÃO N? 1.062 — MS
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Decio Miranda.
Representante: Procurador-Geral da República — Representado: Assembléia Legislativa e Governador do Estado.
Constitucional. Organização Judiciária Estadual. Vedadas emendas que determinem aumento de despesa, ou estranhas ao objeto da
proposta do Tribunal de Justiça, nessas duas proibições incidiu a
emenda de que resultou o art. 341 da Lei n? 39, de 18.12.1979, do Estado de Mato Grosso do Sul, segundo o qual a partir de 1? de janeiro de
1982 a Comarca de Dourados passaria a Entrância Especial. A uma,
porque a emenda determina aumento de despesa, ainda que em
exercido subseqüente ao imediatamente seguinte à votação da proposta. A duas, porque a atribuição de status de Comarca Especial, a
outra sede que não a da Capital, envolve definição implícita de requisitos dessa qualificação, o que não fora objeto da proposta do Tribunal de Justiça.
42
R.T.J. - 100
ACORDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão
Plenária, na conformidade da ata de
julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, julgar
procedente a Representação e declarar inconstitucionalidade do artigo
341, da Lei o? 39, de 18 de dezembro
de 1979, do Estado de Mato Grosso
do Sul.
Brasilia, 7 de outubro de 1981 —
Xavier de Albuquerque, Presidente
— Dedo Miranda, Relator.
RELATOR 10
O Sr. Ministro Decio Miranda:
Atendendo a solicitação do Colando
Tribunal de Justiça do Estado de
Mato Grosso do Sul, o ProcuradorGeral da República oferece representação ao Supremo Tribunal Federal, para que declare a inconstitucionalidade do art. 341 da Lei n? 39, de
18 de dezembro de 1979, Código de
Organização Judiciária do referido
Estado, que teria sido votado com
desatenção ao art. 144, § 5?, da Constituição Federal.
Na proposta enviada pelo referido
Tribunal à Assembléia Legislativa,
para modificação de dispositivos da
Lei• de Organização Judiciária do Estado, e isso em cumprimento ao preceito do art. 139 da Lel Complementar n? 35, de 14.3.79, Lei Orgânica da
Magistratura Nacional, houve por
bem aquela Assembléia acrescentar
o art. 341, que veio a figurar no texto
da nova Lei, o? 39, de 18.12.79, a dizer que «a partir de primeiro de janeiro de 1982, a Comarca de Dourados passará a Entráncia Especial».
(Fls. 14).
Solicitadas informações, vieram as
da douta Assembléia Legislativa
(fls. 22-35) e as do Senhor Governa-
dor do Estado, estas acompanhadas
de parecer do Procurador-Geral do
Estado (fls. 43-9) as primeiras defendendo a subsistência do preceito impugnado, as segundas apoiando a argüição de inconstitucionalidade.
As informações da Assembléia Legislativa, prestadas por seu Presidente, Deputado Londres Machado,
contestam que a disposição impugnada importe em aumento de despesa, aferida tal circunstância em relação a despesa prevista no projeto,
ou que haja resultado de emenda estranha ao objeto da proposta.
E assim concluem:
«Ao argumento que a elevação
da Comarca a Entrância Especial
acarretará um aumento de cinco
cargos de juizes de entrância especial em 1982 e, conseqüentemente,
o aumento de despesas, pode-se
contra argumentar dizendo-se que
poderá — até 1982 — ocorrer a diminuição de Comarcas no Estado,
que compensarão aquele aumento
ou então que o número de vagas
previstas para a segunda entrância
não estará totalmente preenchido,
havendo dessa forma uma compensação dentro do orçamento anual;
afastando, assim, a hipótese da
ocorrência do aumento de despesas.
Ai, então, seria discutir o futuro,
o que está por acontecer, o que pode ou não ocorrer daqui a algum
tempo.
Vale a pena observar que só encontramos alguma referência de
caráter financeiro, no Projeto, em
seu artigo 329, que diz:
«Artigo 329 — As dotações orçamentárias consignadas ao Poder
Judiciário, ser-lhes-ão creditadas,
em duodécimo, até o quinto dia do
mês seguinte ao vencido, ressalvadas aquelas destinadas a atender
despesas cujo montante exija
maiores recursos.»
R.T.J. — 100
Se
aceitássemos
—
ad
argumentandum — cornc válida a
alegação do ilustre Presidente do
T.J. de M.S., diriamos, uma vez
ainda, que não houve aumento de
despesas, els que o próprio T.J., na
proposta original, remete todas as
despesas à «lei orçamentária»,
conforme se depreende, claramente, da simples leitura do artigo 329.
O que houve, então, foi a manifestação popular, através de seus
legítimos representantes, no sentido de elevação da Comarca. Essa
elevação, terá o respaldo suficiente
na previsão orçamentária a ser votada no ano de 1981, para entrar
em vigor a 1? de janeiro de 1982, e
onde, o Tribunal deverá solicitar a
cobertura necessária ao cumprimento da lei ora votada, sancionada e promulgada.
A não aceitação da emenda, seria o mesmo que se passar, ao Poder Legislativo, o diploma de simples chancelador da vontade do Judiciário e do Executivo e a quem
caberia, tão só e unicamente, aprovar In totum ou In totum rejeitar o
que fosse encaminhado à sua consideração. Nesse caso, então, indagaríamos: e onde fica a manifestação de vontade popular? e como fica o artigo 6? da Constituição Federal, que reconhece três poderes
do Estado? e como se explicaria a
Independência dos poderes do Estado?
São indagações que, evidentemente, permanecerão acaso seja
cerceado o legitimo direito do parlamentar de emendar projeto de
iniciativa reservada, mesmo «sem
aumentar a despesa prevista no
projeto», como diz Manoel Gonçalves Ferreira Filho e como é o caso
em exame.» (Fls. 33-5).
Já o parecer adotado pelo Senhor
Governador considera, em conclu-
43
são, ser «inquestionável que o art.
341, do Código de Organização e Divisão Judiciárias do Estado, que eleva á categoria de entrância especial
a Comarca de Dourados, a partir de
1982, resultando de emenda aditiva
da proposta de modificação daquele
diploma legal apresentado pelo Tribunal de Justiça à Assembléia Legislativa, constitui grave e flagrante
afronta ao principio de exclusividade
da iniciativa do Poder Judiciário,
consagrado pelo 5? do art. 144 da
Constituição Federal». (Fls. 49).
A Procuradoria-Geral da República, em parecer do Procurador Walter José de Medeiros, aprovado pelo
Procurador-Geral, Doutor Inocênclo
Mártires Coelho, oficia pela procedência da argüição de inconstituclonalidade, salientanto, na parte
precípua, o que se segue:
«Sustenta-se em resumo que, ao
elevar a comarca de Dourados á
entrância especial, teria o Legislativo local, a um só tempo, oferecido emenda estranha ao objeto da
proposta inicial e ainda determinante do aumento da despesa pública, porquanto tal elevação implicaria aumento de mais cinco
cargos de juizes, com ofensa ao
dispositivo constitucional mencionado.
A matéria em exame, ainda que
sob outros ângulos, já foi enfrentada pelo Supremo Tribunal, como,
por exemplo, na Representação n?
1.009, de Mato Grosso, em que se
reputou inconstitucional dispositivo
de lei estadual onde se previa aumento do número de comarcas não
indicadas pelo Tribunal, a quem,
privativamente, compete a iniciativa do processo legislativo para
tanto. Desse precedente foi relator
o eminente Ministro Rafael Mayer
que, em brilhante voto, pôs em
destaque a solução de equilíbrio
encontrada pela redação do atual
44
R.T.J. - 100
art. 144, 5?. da Constituição, onpesa pública, pela necessidade
de, segundo S. Exa., «remanesce
conseqüente da ampliação do núa dominância da experiência e do
mero de juízes, importou também
interesse maior do Tribunal de
em aprovação de emenda estranha
Justiça no imprimir as linhas e os
ao objeto da proposta.
elementos da organização judiciáNestas condições, opina a Procuria dos Estados», acrescentando
radoria-Geral pela procedência da
em seguida:
representação a fim de que seja
declarado inconstitucional o art.
«Assim é que, na redação dada
341 da Lei n? 39, de 18 de dezembro
pela Emenda 7 ao â 5? do art. 144
de 1979, do Estado de Mato Grosso
da Constituição, a proposta de aldo
Sul (Código de Organização e
teração da divisão e organização
Divisão Judiciárias).» (Fls. 52-3).
judiciária, do Tribunal de Justiça
2 o relatório.
à Assembléia Legislativa, tem a
sua substância sob o resguardo
da formal vedação de emendas
VOTO
estranhas ao objeto da mesma
proposta ou que sejam determiO Sr. Ministro Decio Miranda (Renantes de aumento de despesa,
para assegurar o evitamento de lator): As informações do Senhor
critérios ou de soluções não con- Presidente da Assembléia Legislatidizentes com a conveniência do va põem ênfase, como se viu, na asserviço judiciário de que o Tribu- sertiva de que a proibição de emenda que aumente a despesa somente
nal se faz intérprete».
se relaciona com a «despesa previsMais recentemente, na Repre- ta», como está dito no art. 57, parásentação n? 1.043, do Maranhão, de grafo único, da Constituição, o que
que saiu vencedor o voto do emi- significaria «despesa prevista no
nente Ministro Soares Minioz, pre- projeto».
valeceu na Suprema Corte a tese
Ora, aduz o nobre informante, o
da inconstitucionalidade do disposi- projeto em causa não continha dispotivo de lei local que cria comarca sição sobre a quanto montaria a desou vara em locais diferentes dos pesa com a execução da lei dele reIndicados na proposta, não por sultante.
ofensa ao requisito relativo ao auDal, entender improcedente a armento da despesa, mas por importar em aprovação de emenda estra- güição.
Sem necessidade de conferir o arnha ao objeto da. proposta (DJ de
gumento com as disposições genéri7.8.81).
cas da Constituição relativas ao proNa hipótese em comento, embo- cesso legislativo (Seção V do Capítura não se trate da criação de co- lo VI do Título I), é bem de ver que,
marca, a verdade é que a elevação no atinente à elaboração das leis de
de Dourados, em Mato Grosso do organização judiciária dos Estados,
Sul, de segunda entrância, para en- a regra pertinente situa-se na vedatrância especial, por, obra de ção de emendas «estranhas ao objeto
emenda parlamentar, fora da pro- da proposta ou que determinem auposta originária do Tribunal, cons- mento de despesa», consoante o art.
titui sem dúvida, ofensa ao 144, 5?, da mesma Carta, disposiprincípio Inscrito no 5? do art. 144 ção especifica sobre o processo legisda Constituição Federal, pois, lativo das leis de Organização Judialém de implicar aumento da des- ciária dos Estados.
95
R.T.J. — 100
Aqui, desenganadamente, não é
necessário que se trate de despesa
quantitativamente prevista no projeto, nem mesmo é indispensável que
o projeto a preveja, se aprovado anteriormente à confecção do orçamento que haja de inclui-la.
Basta, à proibição, que a emenda
tenha como efeito, objetivamente,
aumento na despesa global do Estado.
Suficiente este aspecto para
configurar-se a argüida inconstitucionalidade.
Mas também prospera a argüição
pela eiva da estraneidade em relação ao objeto da proposta.
O Estado de Mato Grosso do Sul
tem apenas uma Comarca de Entrãncia Especial: a que compreende
o Município da Capital e alguns Municípios circunvizinhos.
Erigir em Comarca Especial a que
tenha sede em Município outro, que
não o da própria Capital, envolve asserto implícito, mas relevante, sobre
aspecto que não fora objeto da proposta, a saber, a definição de requisitos que, a par do já consagrado pela simples circunstância da sede na
Capital do Estado, determinariam
ou autorizariam a transformação de
Comarca do interior do Estado em
Comarca de Entrancia Especial.
Dessa especial e imprescindível
definição não cuidou a proposta do
Tribunal de Justiça.
A atribuição de status de Entranda Especial a Comarca do Interior
do Estado exige proposta prévia de
definir qualificações suficientes para
essa elevação, tema submetido á iniciativa de outro Poder, dos que formam o sistema tripartite.
Não poderia ter resultado, como
no caso resultou, de deliberação autónoma do Poder Legislativo, a cuja
independência no elaborar normas
de organização judiciária o atual ordenamento constitucional não confere tal amplitude.
A definição de princípios básicos
sobre classificação das Comarcas,
matéria de singular relevo na Organização Judiciária Estadual, depende da conjugação harmoniosa da iniciativa do Poder Judiciário com deliberação do Poder Legislativo.
Isto posto, acolho, por seus dois fundamentos, a argüição de inconstitucionalidade do art. 341 da Lei n? 39,
de 18 de dezembro de 1979, que institui o Código de Organização e Divisão Judiciária do Estado de Mato
Grosso do Sul e dá outras providências.
o meu voto.
VOTO
O Sr. Ministro Néri da Silveira: A
elevação da comarca de Dourados,
de 2! entrância, para entrância especial, equiparando-a, dessarte, á comarca da Capital, Campo Grande,
ofende, sem dúvida, o art. 144, 5?,
da Constituição, verbis:
«fi 5? — Cabe privativamente ao
Tribunal de Justiça propor ao Poder Legislativo a alteração da organização e da divisão judiciárias,
vedadas emendas estranhas ao objeto da proposta ou que determinem aumento de despesa».
A elevação de grau de comarca é
matéria de organização judiciária,
não sendo admissivel emenda a proposta do Poder Judiciário sobre dita
matéria, tal como a de que provei o
o art. 341, da Lei n? 39/1979, Código
de Organização Judiciária do Estado
de Mato Grosso do Sul.
Estou, assim, de acordo com o
eminente Ministro Relator, no que
concerne à infringência do art. 144, â
5?, da Constituição.
46
R.T.J. — 100
Em verdade, comarca de entrâneia especial possui status superior,
em confronto com comarca de segunda ou terceira entrâncias, correspondendo, atualmente, à situação da
comarca da Capital. A elevação cogitada importa em aumento de despesa e não é objeto de proposta do
Tribunal de Justiça, que não pretendeu comarca do interior na condição
de entrância especial.
lar se exerce de acordo com a Constituição e as leis: se a Constituição
condiciona a manifestação da Assembléia à iniciativa do aumento de
despesa, não há restrição injustificável à soberania popular.
Gostaria de aduzir com referência
às informações do Presidente da Assembléia, de que a soberania popu-
Brasília, 7 de outubro de 1981 —
Jonas Célio Monteiro Coelho,. Secretário.
Por outro lado, quando a lei defere
à Assembléia aprovar ou não a proposta do Poder Judiciário, evidentemente lhe reserva não só altíssima
atribuição, como põe em suas mãos
Pelos dois fundamentos apontados rejeitar a proposta do Judiciário.
no brilhante voto do Sr. Ministro ReNão vejo apoucamento da Assemlator, acompanho, pois, S. Exa., para julgar procedente a Representa- bléia Legislativa, e assim não creio
ção e declarar inconstitucional o art. que esteja restaurando, pura e sim341, da Lei n? 39/1979, que dispõe so- plesmente, o preceito que existia na
bre o Código de Organização Judi- Constituição de 1969, com a devida
ciária do Estado de Mato Grosso do vénia do Ministro Cunha Peixoto.
Sul.
EXTRATO DA ATA
VOTO
Rp-1.062 — MS — Rel.: Min. Decio
O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Se- Miranda. Repte.: Procurador-Geral
nhor Presidente, estou de acordo da República. Repda.: Assembléia
com o eminente Relator apenas na Legislativa e o Governador do Estasegunda parte do seu voto, isto é, do.
por ter havido aumento de despesa.
Admitida a impossibilidade de emenDecisão: Julgou-se procedente a
das nos projetos de organização judi- Representação
inconsciária, voltaríamos à primitiva reda- titucionalidade edodeclarou-se
artigo 341, da Lei
ção da Constituição de 1969, em que n? 39, de 18 de dezembro
1979, do
a organização era exclusiva compe- Estado de Mato Grosso dodeSul.
Impetência dos Tribunais, nas suas resoluções. Se, mandado um projeto de dido o Ministro Firmino Paz.
organização, não se pode modificaPresidência do Senhor Ministro
lo, o projeto representa a própria lei
Xavier de Albuquerque. Presentes à
de organização judiciária.
Sessão os Senhores Ministros Djaci
Falcão, Cordeiro Guerra, Moreira
Alves, Cunha Peixoto, Decio MiranVOTO
da, Rafael Mayer, Clovis Ramalhete, Firmino Paz e Néri da Silveira.
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: Ausente, justificadamente, o MinisSr. Presidente, estou de acordo com tro Soares Mufloz. Procurador-Geral
o eminente Relator, data venta do da República, Dr. Inocêncio Mártires Coelho.
eminente Ministro Cunha Peixoto.
R.T.J. — 100
47
AÇÃO REscisORIA N? 1.097 — PR
" (Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Cordeiro Guerra.
Autores: Sylvia Tellini Lopes — Ré: União Federal.
— Ação Rescisória. Legitimidade dos sucessores do autor para
propó-la. Precedente: AR n? 887, SP — RTJ 86/748.
Inocorrência dos fundamentos invocados.
Aplicação da Súmula 371.
Improcedência.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão
Plenária, na conformidade da ata de
julgamentos e das notas taquigráficas, á unanimidade de votos em julgar improcedente a ação rescisório.
Brasília, 15 de outubro de 1981. —
Xavier de Albuquerque, Presidente
— Cordeiro Guerra, Relator
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: A
presente ação é proposta, pela viúva
de Clotário de Macedo Lopes, visando rescindir o V. Acórdão da Egrégia 1, Turma, prolatado no Re 85.185
- Paraná, em 21.2.1978, assim ementado:
«1. Lel n? 4.746-42, que transformou a Rede de Viação Paraná —
S. Catarina em autarquia da União.
Lei n? 2.752-56, art. 1? Direito a
dupla aposentadoria.
Súmula do STF, verbete 371.
Ferroviário admitido como
servidor autárquico não tem direito à dupla aposentadoria.
Precedente do STF.
6. RE conhecido e provido. ( fls
108).
Fundamentou-o o voto do eminente
Ministro Antonio Neder, relator, concebido nestes termos:
«O Eg. Tribunal a quo decidiu
que o recorrido Clotário de Macedo
Lopes era funcionário público ao
ensejo da transformação da Rede
de Viação Paraná - S. Catarina em
autarquia, e que, por isso ele conservou esse status depois da mencionada transformação, donde a
procedência do que postula nesta
demanda, que foi ajuizada em
1969.
Sucede que, ao julgar, em 1966 o
Mandado de Segurança 15.046 impetrado pelo mencionado Clotário
de Macedo Lopes e por outros, o
Plenário do STF, apreciando a
mesma questão agora discutida,
julgou em votação uniforme,que os
então Impetrantes, inclusive o recorrido Clotário sempre foram considerados servidores autárquicos,
isto é, nunca foram funcionários
Públicos.
E o que se lê no acórdão copiado
nas fls. 89-93 do qual foi Relator o
nobre Ministro A.M.Vilas Boas.
Esse acórdão veio para os autos
com a petição do RE, e sua existência não Mi sequer mencionada
pelo recorrido Clotário ao redigir
a petição inicial desta demanda,
falta que impediu fosse considerado nas instâncias ordinárias o contendo material desse julgado.
48
R.T.J. — 100
De qualquer forma, é indiscutível que o acórdão impugnado
está em divergência com esse paradigma, cuja cópia se lê nos autos
( fls. 89-93).
Doutro lado, se o referido Clotário e outros foram sempre considerados servidores autárquicos, qual
o diz sobredito aresto do STF, não
se tem como defini-los de outro
modo, isto é , não se pode julgar
que o mencionado Clotário tinha a
qualidade que afirma, de funcionário público federal, quando, por
força de Dec-lei 4.746-42, foi a Rede
de Viação Paraná-S. Catarina transformada em autarquia da União.
Vê-se do exposto,que o acórdão
impugnado emprestou errónea de
finição jurídica ao fato da causa,
visto que definiu como funcionário
público federal quem, por decisão
do STF não tem essa qualidade.
E assim julgando a controvérsia,
o eg. Tribunal a quo impediu a incidência no caso, da regra indicada pela União no seu recurso, o
art. 1? da lei 2.752-56, ou, mais precisamente o seu 1 único, norma
que concede o direito a dupla aposentadoria aos que eram funcionários ao ser instalado o regime autárquico daquela Rede e, ainda
mais, julgou em termos claramente contrário à jurisprudência indicada pela Recorrente, afinal condensada no verbete 371 da Súmula, verbis:
«Ferroviário,que foi admitido
como servidor autárquico, não
tem direito a dupla aposentadoria.»
Assim, embora o valor da causa
seja menor do que o fixado no art.
308. IV, do Regimento Interno do
STF (redação anterior à da Emerda n? 3-75), combinado com o Decreto número 64.442-69, conheço do
recurso porque se configura, na espécie, a segunda exceção a que se
refere o caput daquela regra regimental.
E do recurso conhecendo, julgo a
causa como expressa o art. 307, in
fine do Reg. Int.
Quanto ao mérito, estou em que
prevalece a fundamentação deduzida no RE, pela qual a Recorrente
se reportou ao voto que o nobre Ministro Decio Miranda proferiu no
Tribunal .Federal de Recursos ao
julgar a Apelação Civel n? 30.057
A essência desse voto está transcrita no relatório.
Na verdade, o Recorrido não era
funcionário público antes de se
transformar em autarquia a Rede
de Viação Paraná-S. Catarina (como,aliás, decidiu o STF no MS
15.046, fls. 89-93), e, por isto, ao
proceder-se à referida transformação, passou ele a funcionário autárquico (lel 2.284-54).
Se o Recorrido não teve jamais a
qualidade de funcionário público
da União, não pode aceitar-se o entendimento de que faz jus a duas
aposentadorias, uma pelo Tesouro
Nacional, outra de natureza previdenciária.
Dou provimento ao recurso para
julgar a ação improcedente e condenar o vencido a que pague as
custas e os honorários advocaticlos, estes na quantia de cinco
mil cruzeiros, pois, no caso, não
houve condenação em dinheiro e a
Procuradoria da República demonstrou zelo na defesa da União
e trabalhou nas duas instâncias ordinárias e na do STF (CPC, art, 20
1 4?).
Recolher-se-á ao Tesouro Nacioral a quantia dos honorários advocaticios a serem pagos à vencedora porque seus procuradores recebem vencimentos pelo exercido
dos respectivos cargos.
— too
Alento a que se configura na espécie o caso previsto no art. 16
combinado conto o art. 17, III, do
CPC, visto que o Reeorrldo omitiu
intenclettaiMente o tato de que fera
vencido, antes, cento impetrante
do MS 15.046, essencial pata o julgamento desta califa, deve responder pelos prejultos que produziu na
fleeotrente, os queda, no cate, «estão indenizados pela verba de honorários. (fls. 1047).»
Alicerça a ação a invocado do
que Clotário de Macedo Lopes era
funcionário público antes de ser
tramite:nada em autarquia a Rede
Viação Paraná-S. Catarina, e, como
tal. continuou a servi-Ia, após a
transfOrmação, e ainda, "peia de
sua incorporação à Rede frerroviária
Federal S.A., e, etn conseqüência,
assistia-lhe o direito liquido e certo
de se aposentar pelo Tesouro Nacional sem prejulto da aposentadoria
pelo Instituto de Previdência a que
estava compulttoriamente vinculado,
nos termos do Dee-lei 2.004, de 7.3.
art. 485, V e IX do CPC, sustentando
1940; DeeretMel 8.821, de 24.1.1946,
Lei 2.752, de 10.4.1956.
Sustenta a autora que o julgado
impugnado desatendeu ao tato de ser
o seu marido funcionário público, o
q ue foi certificado a fl. 11 dos autos
em apenso. Invoca. ainda, desataiçaa às Mantem 279, 454. 294 e 400.
Contestando a ação, a União Fedeal alega pite o autor não era funcionário público antes da autorização da fleflé, e, cenneeitententente,
não teria direito ft MS aparderette
ria (Lei 2.752, de 10.4.198e, 1 ~Co de)
art. lt), conforme nunterems julgados e a Súmula 371.
Que a condição jurídica do autor
não é matéria de fato, mas de direito
e, quando multo.seria é de aplicar-se
a Súmula 343.
49
Concitando:
«Finalmente, a espancar qualquer dúvida quanto à correção do
acórdão rescindendo, temos que o
falecido:, marido da Autora era Procurador de 2! categoria, fls, 33,
conforme sua ficha funcional e referido na sentença inicial f. 44.
Ora, a Ré União Federal nunca
possuiu em seu quadro da Administração Direta Procuradores Autárquicos, mas, sim, Procuradores
da República. Tal fato, relevante e
fundamental mesmo, passou desapercebido ao exame procedido pelas Meilen proferidas neste caso.
Aliás, no referente a tal aspecto da
situação fática, podemos invocar
os Mandados de Segurança 15.150,
Relatar Ministro Luiz Gallotti e
15.281, Relator Victor Nunes, cujos
acórdãos anexamos, relativos a pedidos de dupla aposentadoria de
procuradores da Estrada de Perro
Central do Brasil. Realmente, pretender que procurador autárquico
tem direito a dupla aposentadoria
é demais, é pretender juntar legislação distintas para casos distintos
no que melhor aprouver. Ou bem o
servidor é autárquico, por ser procurador, ou não o é. Ser e não ser,
ao mesmo temo°, parece-nos que a
legislação não permite. Também
nesse ponto invocável é, no mínimo, a Súmula 343 em face dos precedentes retro aludidos» (fls. 134135) .
Arrazoaram as partes impugnando
os seus pontos de vista, e a douta
Procuradoria-Geral da República,
afinal assim se manifesta:
«Com fundamento no art. 485,
itens V e IX, do CPC, propõe
Sylvia Tellinl Lopes, na qualidade
de pensionista de Clotário de Macedo Lopes, et-ferroviário falecido,
ação rescisória contra a União Federal, para desconstituir acórdão
R.'r J. - 100
da Egrégia Primeira Turma do
STF, proferido no RE. 85.185 ( fls.
128-143), que traz a seguinte ementa:
I.Lei n? 4.746-42, que transformou a Rede de Viação Paraná-S.
Catarina em autarquia da União.
2. Lei n? 2.752-56, art. 1?. Direito à dupla aposentadoria.
3.Sümula do STF, verbete 371.
Ferroviário admitido como
servidor autárquico não tem direito à dupla aposentadoria.
Precedentes do STF.
6. Recurso extraordinário conhecido e provido.
Alega a autora, em resumo, que
o acórdão embargado dissentiu
das súmulas 279,454,291 e 400, e de
julgados que a elas deram aplicação, bem como ofendeu a legislação federal anterior e posterior à
transformação da Rede em Autarquia, que atribuiu e reconheceu a
condição de funcionário público ao
ex-servidor, contrariando as provas do processo.
Contestou a União Federal, sustentando que os antigos funcionários da Rede de Viação Paraná-S.
Catarina só passaram à condição
de servidores autárquicos com o
advento do Dec-Lei 4.746, de
25.9.1942, de modo que se impunha
mesmo a aplicação da Súmula 371
ao caso Acrescentou que a jurisprudência do STF, em relação aos
servidores da antiga Rede de Viação Paraná-S.Catarina,sempre foi
orientada nesse sentido.
Observa-se preliminarmente, que
há obstáculo no próprio julgamento
do mérito da presente rescisório.
Há, com efeito, coisa julgada material representada pela decisão
proferida pelo STF no MS 15.046DF, em 17.2.1966 (Eis. 89 e 93 do
apenso), requerido por Clotario de
Macedo Lopes e outros contra ato
do Presidente da República, que
indeferira seus pedidos de aposentadoria pelo Tesouro Nacional.
Considerou o Egrégio Plenário que
os então impetrantes só passaram
à condição de servidores autárquicos com o advento do Decreto n?
4.746,do 25.9.1942, e assim aplicou a
Súmula 371, que tem o seguinte
teor:
«Funcionário que foi admitido
como servidor autárquico não
tem direito à dupla aposentadoria.»
O venerando acórdão rescindendo aludiu a essa decisão precedente do Pretório Excelso, limitandose, porém, a considera-1a para configuração da divergência, pois tendo sido trazido para os autos apenas com a interposição do recurso
extraordinário, não fora possível
às instâncias ordinárias considerar
o conteúdo material desse juizado.
Apenas a ausência de prequestionamento, portanto, impediu o reconhecimento da coisa julgada no
acórdão rescindendo. Entretanto, a
decisão prolatada no MS 15.046 surge como óbice intransponível à
pretenção da autora. Se a rescisório pode ter por fundamento a
ofensa à coisa julgada (CPC, art.
485, IV), também a ré na ação pode argüi-la como exceção ou como
matéria de defesa.
A União argüiu a coisa julgada
nas razões de fls. 180-1, inexistindo,
portanto, obstáculo ao seu reconhecimento. A coisa julgada, com efeito, poder ser argüida como exceçãO ou em qualquer fase do processo sendo questão suscetível de ser
reconhecida até mesmo de oficio
Lopes da Costa, Dir. Proc. Civil,
1947, v. 2, p.170, n? 214, e José Frederico Marques, Inst. de Dir. Proc.
Civil v. 5, p. 1. 03).
R.T.J.
No MS 15.046, Clotário de Macedo Lopes e outros servidores da
Viação Paraná-S. Catarina requereram também a aposentadoria
pelo Tesouro Nacional, com fundamento na mesma lei 2.752, de 1956,
invocando a condição de funcionários Públicos, antes da transformação da ferrovia em entidade
autárquica operada pelo Dec.
4.746, de 25.09.42.
O reconhecimento da existência
da coisa julgada implica em extinção do processo, sem julgamento do
mérito, nos termos do art. 267, V,
do CPC.
No mérito, nota-se que a jurisprudência do STF está orientada
no sentido de que, antes do Dec-lei
4.746, de 1942, os servidores da Rede não tinham a condição de servidores públicos (MS 15.046, 15.047,
15.062, 15.066, 15.172, 15.173, 15.174 e
15.175, fls. 102).
Durante a emancipação, surgida
com o Dec-lei n? 2.073, de 1940, a
Rede Viação Paraná-S. Catarina
manteve a personalidade Jurídica
de direito privado e seus empregados continuaram submetidos à legislação trabalhista. Somente com
advento do Dec-lei 4.746, de 1942,
passaram á condição de servidores
autárquicos (MS 15.066, relatado
pelo Exmo. Sr. Ministro Luiz
Gallotti.
Em face do exposto, o parecer é
pela declaração de extinção do
processo ou pela improcedência da
ação.
Brasília, 28 de maio de 1961.
— Moacir Antônio Machado da
Silva. Procurador da República»
(fls. 184-187).
É o relatório que submeto à consideração do eminente Ministro
Moreira Alves, Revisor.
Brasília, 2 de setembro de
1981.— Cordeiro Guerra, Ministro
Relator.
—
100
51
VOTO
Sr. Ministro Cordeiro Guerra
(Relator): Tem-se admitido nesta
Corte, e não é contestado nos autos,
a legitimidade dos sucessores das
partes para a propositura de ação
rescisória (AR 887-SP, Relator Ministro Antonio Neder- RTJ 86-748),
assim, está a viúva legitimada a pedir a rescisão do julgado em que foi
vencido o marido.
v. acórdão rescindendo, para negar a dupla aposentadoria pretendida pelo autor, partiu do pressuposto
de que ele sempre foi considerado
servidor autárquico, e isto com base
no julgado no Mandado de Segurança n? 15.046, relatado pelo eminente
Ministro Vilas Boas, ris. 89-93, do
apenso, e em que era impetrante,
entre outros, o autor da ação.
Leio o acordão mencionado:
«Sr. Presidente, o caso é assim
exposto no parecer do eminente
Ministro Oswaldo Trigueiro, quando servia como Procurador-Geral
da República, a fl. 163:
«Clotário de Macedo Lopes e outros impetraram mandado de segurança por haver a autoridade impetrada indeferido os seus pedidos
de aposentadoria pelo Tesouro Nacional (dupla aposentadoria de que
trata a lei n? 2.752, de 1956).
2 . Alegam que, sendo servidores
da Viação ,Paraná-S. Catarina, são
funcionários públicos federais, amparados pela Lei 3.115-57.
3. O Senhor Presidente da República remeteu as informações de
fls. 118-121, firmadas pelo consultor
Jurídico do Ministério da Viação e
Obras Públicas,que esclarecem
não terem os impetrantes o direito
que se arrogam, uma vez que são
servidores autárquicos, de Quadro
extinto do Ministério da Viação, e
52
R.T.J. — 100
os autárquicos estão expressamente excluídos do benefício da dupla
aposentadoria, pelo parágrafo único do art. 1? da lei n? 2.752, de
1956.
Opinamos pelo indeferimento
do pedido, uma vez que a pretensão dos impetrantes não encontra
guarida na lei e é contrariada por
jurisprudência pacífica.
Realmente, a Rede Viação
Paraná-Santa Catarina era empresa particular. Não importa que em
1930 tenha estado sob intervenção
militar. O seu pedido não teve, por
isso, mudado o stattis jurídico,
continuando como empregado de
empresa particular.
O Decreto 4.746, de 25 de setembro de 1942, transformou a ferrovia em entidade autárquica, passando seus empregados a servidores autárquicos. São autárquicos
até hoje, de Quadro extinto do
M.V.O.P. sendo que no caso, vários dos impetrantes estão aposentados pelo IAPFESP
Argumentam, ainda, com um
parecer da Comissão de Classificação de Cargos e a lei n? 3.115, de
1957. O recente parecer do atual
Consultor-Geral da República, n?
055-11, D.O. de 6.8.64, que.confirma
entendimento antigo, inclusive o
parecer 259-2, D.O. de 17.5.59, do
então Consultor-Geral Dr. Gonçalves de Oliveira, fulmina o citado
parecer d0 C.C.C., e reafirma que
a lei 3.115, de 1957, conservou o
status jurídico dos servidores autárquicos das ferrovias.
8. A jurisprudência dessa Colando Corte está consubstanciado na
Súmula 371, Ferroviário autárquico não tem direito a dupla aposentadoria, excluído que foi pelo disposto no parágrafo único do art. 1?
da lel n? 2.752-56.»
É o relatório.»
VOTO
O Sr. Ministro Vilas Boas (Relator): De acordo com a Súmula 371,
indefiro o pedido. Diz ela: «Ferroviário que foi admitido como servidor autárquico não tem direito a
dupla aposentadoria.»
Esses funcionários da Rede Viacão Paraná-S. Catarina sempre foram considerados serviddres autárquicos. O D. 4.746, de 1942, assim os declarou.» (Fls. 90-92 do
apenso).
Estabelecido, por sentença transitada em julgado, a condição de funcionário autárquico do marido da autora, no julgamento do Mandado de
Segurança n? 15.046—DF, não haveria como rever, em ação ordinária,
não ressalvada, essa conclusão.
Errónea, portanto,era a qualificação jurídica dada no acórdão recorrido aos fatos da causa, e inaplicáveis à espécie as Súmulas 279, 454,
291 e 400, impunha-se o provimento
do recurso extraordinário, nos termos da Súmula 371, que dispõe:
«Ferroviário,que foi admitido como servidor autárquico, não tem
direito a dupla aposentadoria.»
Por conseqüente, não foi negada
vigência ao parágrafo único do art.
1? da lei 2.752, de 1956, pois ao ser
instalado o regime autárquico, não
era o autor servidor ou funcionário
público.
Sustenta a autora, que o julgado
revisando se alicerçou em erro de
fato, resultante de atos e documentos da causa, por força do documento de fls. 11 do apenso - certidão passada pelo Departamento de Pessoal
da Rede Ferroviária Federal S.A —
fls. 11 a 14).
Entretanto, se a certidão em referência é válida sobre os fatos e atos
que especifica, não pode ser aceita
R.T.J. — 100
como decisiva para definir, no campo do direito, a situação Jurídica do
servidor, Já que a qualificação
Jurídica da natureza do vinculo empregaticio é deferida á Justiça, em
havendo controvérsia sobre a mesma.
Na espécie, o v. acórdão revisando
não admitiu um fato inexistente,
curvou-se à coisa Julgada. Não considerou inexistente um fato efetivamente ocorrido, pelo contrário, decidiu em decorrência lógica, de julgado definitivo anterior,que naõ foi rescindido.
53
Por isso, a rescisória se arrima
nos incisos V e IX do artigo 485 do
Código de Processo Civil.
2. — Improcedem, porém, ambas
as alegações.
Com efeito, para Julgar como julgou, o acórdão rescindendo não se
fundou em erro de fato, mas partiu
da premissa — que é verdadeira —
de que esta Corte, anteriormente, ao
indeferir o mandado de segurança
15.046, de que um dos impetrantes
era Clotário de Macedo Lopes, decidira que não tinha sido funcionário
~tico, mas sempre autárquico, racflo por que se lhe aplicava a Súmula
371 deste Tribunal.
Não vejo, assim, configuradas as
hipóteses dos incisos V e IX do art.
485 do CPC e, por via de consequênEm rigor, o acórdão rescindendo,
cia, Julgo improcedente a ação, con- ao Julgar a causa, poderia ter entendenada a autora nos ónus da sucum- d$o que a questão então em debate
bência, fixados os honorários em Já havia sido decidida, com trânsito
20% sobre o valor dado à causa.
em Julgado naquele mandado de segurança, de que participara como um
dos impetrantes Clotário de Macedo
VOTO
Lopes e' um que, Julgando-se o mérito da impetração (os impetrantes
O Sr. Ministro Moreira Alves — 1. atacavam o ato que lhes negara a
Dois são os ',Lindar/tentos da presente dupla aposentadoria), se indeferira a
rescisória:
segurança sob o fundamento de que
« ferroviário que foi admitido como
— que o acórdão rescinderido, servidor autárquico, não tem direito
ao negar a dupla aposentadoria, a dupla aposentadoria (Súmula 371)»
violou várias disposições legais (Os. 89 dos autos em apenso). Prefe(art. 1? dó Decreto-lel 2.004/40; riu no entanto, reafirmar a mesma
art. 3? do Decreto-lei 8.821/46; art. decisão, partindo da premissa ante1? da Lei 2.752/56, todos relativos à riormente firmada pela Corte. De
dupla aposentadoria; e arts. 14 e 16 qualquer sorte, não poderia o acórda lei 163/50; art. 15 e il§ 2? e 4? da dão rescindendo ter decidido o mériLei 3.115/57; art. 1? da Lei 2.284/54; to de maneira diversa, sob pena de
art. 1? do Decreto 42.380/57; art. 2? ofender coisa Julgada.
do Decreto 52.084/63; e art. 19 e seu
parágrafo (mito da Lel 3.780/60; e
Por cedro lado, essa mesma circunstância afasta a violação dos vá— que o acórdão rescindendo rios dispositivos legais invocados na
se fundou em 'erro de fato, resul- rescisória: o acórdão rescindendo estante de atos ou de documentos da tava Jungido à coisa Julgada antecausa, os quais atestavam que Clo- rior, razão por que, ainda que quisestário de Mácedo Lopes era funcio se, não poderia reexaminar a maténário federal já antes da transfor- ria que Já havia sido decidida antes,
mação da Rede em autarquia.
havendo trânsito em Julgado.
54
R.T.J. — 100
3. — Em face do exposto. Julgo improcedente a presente ação, condenando a autora nas custas e em honorários de advogado que fixo em 20% do
valor atribuído à causa, bem como
determinando, se unânime a decisão,
a reversão, em favor da ré,do depósito.
EXTRATO DA ATA
AR 1.097 — PR — Rel.: Min. Cordeiro Guerra. Rev. Min. Moreira Alves. Autora: Sylvia Tellini Lopes
( Advs.: Luiz Gastão L. I3ório e Aquiles R. de Oliveira). Ré: União Federal.
Decisão: Julgou-se improcedente a
Ação, unanimemente. Impedido o
Ministro Firmino Paz.
Presidência do Senhor Ministro
Xavier de Albuquerque. Presentes à
Sessão os Senhores Ministros Djact
Falcão, Cordeiro Guerra, Moreira
Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufioz,
Decio Miranda, Rafael Mayer, Clovis Ramalhete, Firmino Paz e Néri
da Silveira. Procurador-Geral da República, Dr. Inocêncio Mártires Coelho.
Brasília, 15 de outubro de 1981. —
Jonas Célio Monteiro Coelho, Secretario.
AÇÃO RESCISORIA N? 1.120 (AgRg) —
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Rafael Mayer.
Agravante: Superintendência Nacional da Marinha Mercante — SUNAMAM — Agravada: Imesa Veículos Ltda..
Ação rescisória. (Agravo Regimental). Depósito prévio. Autarquia. CPC, art. 488, único (exegese). Despacho de indeferimento da
inicial (art. 490, II, CPC). — Os entes públicos isentos do depósito prévio para a ação rescisória, a que se refere o parágrafo único do art.
488 do CPC, compreendem tão somente a União, os Estados e os Municípios, não se estendendo o benefício aos órgãos de administração
indireta dessas entidades públicas, inclusive as respectivas autarquias. Indeferimento da inicial ( art. 490, II do CPC). Agravo Regimental improvido.
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão
Plenária, em conformidade com a
ata de julgamentos e notas taquigráficas, à unanimidade, em negar provimento ao agravo.
Brasília, 29 de outubro de 1981. —
Moreira Alves, Presidente — Rafael
Mayer, Relator.
O Sr. Ministro Rafael Mayer: A
Superintendência Nacional da Marinha Mercante, autarquia federal, intenta ação rescisória contra a Imesa
Veículos Ltda., visando a rescindir,
com fundamento no art. 485, V, do
CPC e art. 259 do RI/STF, o acórdão
proferido pelo Plenário desta Corte,
no ERE 89.413-RJ. Requereu a citação da Ré, e dando à causa o valor
55
R.T.J. — 100
de Cr$ 100.000,00, declarou não dever
o recolhimento do depósito previsto
no art. 488, II, do CPC, à luz do que
dispõe o seu parágrafo único.
Em face da Inicial, o Relator despachou nesses termos:
«Intime-se a Autora para a efetivação, no prazo de dez dias, para a
efetivação do depósito a que alude
o art. 488, II do CPC».
o despache; em
Publicado
18.08.1982, a Autora apresentou petição reafirmando a sua isenção do
depósito, visto gozar como autarquia, das mesmas prerrogativas concedidas ã União.
Em despacho datado de 06.10.1981,
publicado em 14.10.1981, foi indeferida a inicial, nos termos do art. 490,
II, do CPC, in verbis:
«Trata-se de ação rescisória intentada por autarquia atribuído o
valor de Cri 100.000,00. Verificando
que a inicial não foi acompanhada
do depósito a que alude o art. 488,
II do CPC, intirnelparaque o efetivasse, em despacho publicado a
18.08.1981.
Veio
a
Autora,
escusando-se de fazê-lo, por entender estar revestida das prerrogativas concedidas por lei à União (fls.
55). Entretanto, a exegese correta
do parág. único do art. 488 do CPC
não permite se estenda o privilégio
além das entidades nele mencionadas, isto é, a União, o Estado, o
Município e o Ministério Público,
pois o preceito reclama uma interpretação de sentido estrito. Indefiro, portanto, a inicial, nos termos
do art. 490, II do Código de Processo Civil».
Dai a interposição do presente
agravo regimental, argumentando,
em resumo, que é inaplicável à Autora o art. 488, II, pois as multas se
equiparam às custas e destas estão
isentas as autarquias, como se vê do
art. 2?, VI, c/c o art. 9? da Lei n?
6.032/74.
Mantido o despacho agravado por
seus fundamentos vai o recurso a
Julgamento do Egrégio Plenário.
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Rafael Mayer (Relator): Cuido válido o entendimento
de que a norma do parágrafo único
do art. 488 do CPC que excepciona
da exigência do depósito de 5% sobre
o valor da causa, como requisito
extrínseco da propositura da ação
rescisória, a União, o Estado, o Município e o Ministério Público, não é
extensiva aos órgãos, de administração indireta das mencionadas entidades públicas, inclusive as autarquias respectivas.
Dèsde logo, a espécie é inconfundível, por sua natureza, função e
destinação, do conceito de custas,
pois enquanto estas são «aquela parte das despesas relativas à expedição e movimentação dos feitos, taxadas por lei», a multa, em que se pode transformar o depósito, no caso
de improcedência da rescisória por
unanimidade, tem o caráter de penalidade ou sanção, funcionando, no
caso, como medida preventiva contra o impensado exercido de ataque
à coisa Julgada (Cfr. Amaral Santos,
Primeiras Linhas, 11/261 e segs.:
Pontes de Miranda Tratado da Ação
Rescisória, 497). Não colhe, portanto, argumento da Agravante no invocar, na hipótese, a legislação especifica, Inclusive isencional, sobre
custas.
Em se tratando de norma excepcional, porquanto institutiva de um
privilégio, pede a hermenêutica que
se lhe dê interpretação estrita, a excluir de sua abrangência o, —ates
que nela não estão nomeadamente
contemplados.
56
R.T.J. - 100
Do ponto de vista sistemático,
sempre que a lei processual, como
qualquer outro ordenamento, quer
privilegiar de maneira ampla as entidades de direito público de administração direta e indireta, emprega
o conceito global da Fazenda Pública, como por exemplo nos arts. 27,
188, 197, 240, 475, III, 511, 730 e outros, enquanto dispõe, distinta e especificamente, com relação às entidades político-administrativas centralizadas, isto é, a União, o Estado'
e o Município, em preceitos outros,
por exemplo, os arts. 12, I, 475, I,
816, (1173 do CPC.
O entendimento jurisprudencial
desta Corte se tem pautado pela observância dessa distinção conceituai
posta na lei, assim é que, a exemplo,
não considera as autarquias contempladas pelo principio do duplo grau
de jurisdição, nos termos do art. 475,
II, que somente o prevê nas decisões
contra a União, o Estado e o Município, e no entanto, tem-nas como
beneficiárias do prazo em quádruplo
para contestar e em dobro para recorrer, conferidos à Fazenda Pública pelo art. 188 do CPC.
2 conseqüente, nessa linha a interpretação do parágrafo único do art.
488 do (PC, em sua estrita catalogação dos entes públicos isentos do depósito prévio para a ação rescisório,
compreendidos tão-somente a União,
os Estados e os Municípios.
Não contemplada, portanto, a Autora como beneficiária da isenção, e
por ela descumprida a satisfação
desse requisito, no prazo que se lhe
deu, de acordo com o art. 284 do
CPC, não haveria fugir à norma imperativa do art. 490, II, da lei processual, no sentido do indeferimento da
inicial.
Pelo exposto, nego provimento ao
agravo.
VOTO
O Sr. Ministro Next da Silveira: Sr.
Presidente. Estou de acordo com o
eminente Relator, pelos fundamentos do seu voto.
Em verdade, tem sido essa a
orientação exegética dos dispostivos
do Código de Processo Civil, ao se
estabelecer a distinção entre Fazenda Pública e pessoas administrativas matrizes. Assim, corrente o entendimento, no que concerne ao art.
475, incisos II e III, do Código de
Processo Civil. O referido inciso II
respeita à sujeição obrigatória ao
duplo grau de jurisdição da sentença
desfavorável apenas às pessoas matrizes, Isto é, à União, aos Estados e
aos Municípios. Já outra tem sido a
compreensão do inciso III do art.
475, cio CPC, ao se referir a Fazenda
Pública, entendendo-se, então, aí,
compreendidas, também, as respectivas autarquias.
Por igual, o art. 188, do Código de
Processo Civil estabelece:
«Computar-se-á em quádruplo o
prazo para contestar e em dobro
para recorrer quando a parte for a
Fazenda Pública ou o Ministério
Público».
Por isso, dito prazo especial do
art. 198, do CPC, beneficia não só as
pessoas matrizes, mas também suas
autarquias.
Ora, o art. 488 do código de Processo Civil, ao tratar da ação rescisório, estabelece, no seu inciso II:
— depositar a importância de
5% (cinco por cento) sobre o valor
da causa, a titulo de multa, caso a
ação seja, por unanimidade de votos, declarada inadmissível, ou improcedente.
Parágrafo único. Não se aplica o
disposto no número II à União, ao
Estado, ao Município e ao Ministério Público».
R.T.J. — 100
57
dessa
Dentro
compreensão,
parece-me, assim, inequívoco que as
autarquias não estão contempladas
na exceção do parágrafo único do
art. 438, do Código de Processo Civil,
devendo, dessa maneira, efetuar o
depósito a que se refere o inciso II,
do mencionado dispositivo.
Nego provimento ao agravo regimental.
Decisão: Negou-se provimento ao
Agravo Regimental, unanimemente.
Impedidos os Ministros Xavier de
AlbUqUerque, Presidente, e Cordeiro
Guerra. Presidiu o Julgamento o Ministro Moreira Alves.
Presidência do Senhor Ministro
Moreira Alves, no impedimento do
Ministro Xavier de Albuquerque
(Presidente). Presentes á Sessão os
Senhores Ministros Cunha Peixoto,
Soares Mudos, Dedo Miranda, RaEXTRATO DA ATA
fael Mayer, Firmino Paz. e Néri da
AR. 1.120 — (AgRg) — RJ — Rel.: Silveira. Ausentes, justificadamente,
Min. Rafael Mayer. Agte.: Superin- os Ministros Djaci Falcão, Cordeiro
tendência Nacional da Marinha Mer- Guerra e Clovis Ramalhete.
cante (SUNAMAM). (Advs.: José Procurador-Geral da República, Dr.
Roberto C. Boilmann e Márcio Luiz Inoeêneio Mártires Coelho..
Brasília, 29 de outubro de 1981 —
Borges). Agda.: IMESA — Veículos
Ltda. ( Advs.: João Dodsworth Cor- Jeitos Célio Monteiro Coelho, Secredeiro Guerra e outros).
tário.
RECURSO CRIMINAL N? . 1.391 — MT
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto.
Recorrentes: Rubens Gonçalves Martins e outros —Recorrido. Ministério Público Militar.
Assalto a estabelecimento de crédito — Processo Instaurado e julgado na vigência do Decreto-lei 896/49 (art. 27), com recurso para o
Supremo Tribunal Federal — Advento da nova lei de segurança nacional (Lei n? 6.620/78), que deixou de tipificar o delito quando praticado
sem motivação político-subversiva.
Preliminares rejeitadas.
Autoria comprovada.
Inocorrência de abolltio crimina. Aplicação da lei mais favorável, com a adequação das penas á mesma figura delituosa prevista no
Código Penal, art. 157, g 2?, I e II, observados os critérios de sua fixação constantes da decisão condenatória. Recurso Criminal parcialmente provido.
cas, por unanimidade de votos, em
ACÓRDÃO
dar provimento em parte do recurso
Vistos, relatados e discutidos estes criminal nos termos do voto do Miautos, acordam os Ministros da Pri- nistro Relator.
meira Turma do Supremo Tribunal
Brasília, 27 de novembro de 1979 —
Federal, na conformidade da ata do Thompeon Flores, Presidente —
Julgamento e das notas taquigráfi- Cunha Peixoto, Relator.
— 100
38
RELATORIO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto: O
minucioso parecer da ProcuradoriaGeral da República, subscrito pelo
Dr. Aristides Junqueira Alvarenga,
regularmente aprovado pelo ilustre Sub-procurador Geral, Doutor
Francisco de Assis Toledo, relata
com propriedade a espécie, verbis:
1 — Rubens Gonçalves Martins,
Jorge Nunes Barcelos e Anizio Alberto da Silva, juntamente com outro, foram denunciados perante a
Auditoria da 9? C.J.M., como incursos no artigo 27 do D.L. 898/69,
porque no dia 7 de agosto de 1973,
em Cuiabá, Mato Grosso, participaram do roubo a bancários que
transportavam numerário do Banco do Estado de São Paulo S.A. a
ser depositado no Banco do Brasil
S A., subtraindo-se de um deles a
importância de Cr$ 90.000,00 (denúncia de fls. 2/3).
2 — Finda a instrução criminal,
o Conselho Permanente de Justiça,
para a Aeronáutica, condenou cada
um a dez anos de reclusão, além
da pena acessória de suspensão
dos direitos políticos, por igual
prazo (Sentença de fls. 330/341).
3 — Inconformados, os três apelaram para o Egrégio Superior Tribunal Militar, que entretanto, à
unanimidade, negou provimento
aos apelos, em Acórdão datado de
8 de agosto de 1977 e assim ementado:
«Assalto — Confissões coerentes, colhidas no inquérito, em
corroboração com outros elementos dentro dos autos. Assaltantes
contumazes, portadores de longa
folha penal. Deixa-se de corrigir
a pena, à falta de recurso do
M.P. Desprovidas as apelações.»
(fls. 466/476).
4 — Novamente irresignados, interpurseram recurso ordinário, em
5 julho de 1978 (fls. 525), alegando,
como preliminar, a incompetência
da Justiça Militar e, no mérito, insuficiência de prova para a condenação (razões de fls. 526/530).
5 — A argüição de incompetência
da Justiça Castrense há de ser repelida.
Objeto do roubo descrito na denúncia foi dinheiro pertencente a
estabelecimento de crédito. O fato
ocorreu e foi julgado na vigência
do D.L. 898/69, que, em seu artigo
27, dizia constituir crime contra a
segurança nacional qualquer assalto a estabelecimentos de crédito e
financiamento, independentemente
da natureza de sua motivação.
E tem sede constitucional a competência da Justiça Militar, relativamente aos crimes contra a segurança nacional.
Não descaracterizava o delito definido no artigo 27 do D.L. 898169 o
fato de ter sido o assalto perpetrado fora do estabelecimento de crédito. Por diversas vezes, essa Suprema Corte entendeu tipificado
tal crime, quando se tratava de assalto a carro transportador de numerário pertencente a estabelecimentos bancários. Não seria a natureza do transporte que teria o
condão de notificar a capitulação
do delito, tanto mais que, o transporte humano haveria de merecer
maior proteção do que o mecânico.
Saliente-se, ainda, que a descrição da denúncia não deixa dúvidas
de que os autores do roubo, postados na proximidade da agência do
Banco do Brasil S.A., sabiam que
uma das vitimas transportava numerários, porque estava ela escoltada por um guarda.
R.T.J. — 100
Afastada fica, pois, a pretensa
incompetência da Justiça Militar,
subsistindo, assim, a decisão do Superior Tribunal Militar, que rejeitou a argüição feita pelo Ministério
Público, antes do inicio da ação penal (V. Acórdão de fls. 93/95).
6 — Outra questão preliminar a
ser enfrentada, com reflexos na admissibilidade do recurso ordinário,
é a da novatio legis.
Com a superveniência da Lei n?
6.620, de 17 de dezembro de 1978,
surgiu, com relação à figura do
art. 27 do D.L. 898/69, revogado pela nova lei, problema de direito intertemporal, já que o tipo penal nele descrito («assaltar, roubar ou
depredar estabelecimento de crédito ou financiamento, qualquer que
seja a sua motivação») não foi reproduzido na nova lei de segurança
nacional.
De acordo com esta, só é crime
contra a segurança do Estado o assalto, o roubo, ou a depredação
com finalidade atentatória à segurança nacional, (art. 26), não se fazendo mais distinção entre estabelecimentos de crédito ou financiamento e quaisquer outros.
Em suma, os assaltos a banco,
sem motivação político-subversiva,
como o retratado nestes autos, deixaram de ser crime contra a segurança nacional, pelo que torna-se
impossível a adequação da pena
imposta ao recorrente a qualquer
cominação prevista na nova lei de
segurança nacional.
Mas, tal fato é e sempre foi delituoso, com previsão no artigo 157
do Código Penal comum, não se
podendo, pois, cogitar em abolitio
criminis, que conduziria no absurdo de se colocar em liberdade todos os assaltantes e ladrões comuns de alta periculosidade, condenados durante a vigência da revogada lei.
59
7 — Surge, assim, o problema da
alteração de competência, eis que
o crime de assalto a estabelecimento crediticio, antes crimes contra a segurança nacional, com processo e julgamento afetos à Justiça
Militar Federal, passou a ser crime comum, cujo processo e julgamento compete à Justiça comum.
8 — Embora, com a edição da
Lei n? 6.620/78, não caiba mais recurso ordinário contra decisão condenatória relativa a crime de roubo a bancos, no caso em exame,
parece-nos se deva prosseguir no
julgamento do recurso ordinário
interposto na vigência da lei 1-evogada, de acordo com o principio de
direito intertemporal, pelo qual «a
competência recursal se fixa pela
lei vigente na data da sentença»
(CJ 6.123-RS Rel. Min. Leitão de
Abreu, D.J.U. 29/9/78).
Qualquer outra solução contrária
viria em detrimento do réu, ferindo o princípio constitucional da
«ampla defesa, com os recursos a
ela inerentes».
9 — Superada a preliminar de
conhecimento e afastada a ocorrência da abolltio criminis, analisemos as provas dos autos.
10 -- A prova material do crime
é induvidosa e está estampada no
Boletim de Ocorrência de Ri 23,
bem como hos autos de exames de
corpo de delito de fls. 24/25, além
da prova testemunhal.
11 — Quanto à autoria, Rubens
Gonçalves Martins (fls. 128v. e
4/10 do apenso) e Anizio Alberto da
Silva (fls. 131v) confessaram, extrajudicialmente a prática do assalto, embora, em Juizo, tenham
negado validade à confissão anterior (fls. 175/176 e 179/180).
Já o recorrente Jorge Nunes
Barcelos negou sua participação,
so
R.T.J. — 100
tanto no interrogatório policial (fls.
129v.), como no judicial (fls.
177/178).
12 — Embora retradas em Juízo,
às confissões de Rubens e Anízio
não se pode negar valor, dada a
impossibilidade de serem fruto de
imaginação policial. Basta a leitura das declarações de Rubens Gonçalves Martins, nos autos em apenso, para se firmar o convencimento de que as alegadas sevícias,
mesmo que existentes, não foram
a ponto de impedi-lo, inclusive, de
se identificar falsamente perante a
autoridade policial, usando o nome
de Valdomiro Veiga.
13 — Quanto a Jorge Nunes Barcelos, a chamada dos co-réus anula
a negativa de sua participação no
crime.
Saliente-se, ainda, que a confissão extrajudicial do outro participe, Jorge dos Santos, é harmônica
com as dos dois recorrentes e relata a at tação de Jorge Nunes Barcelos, no assalto ( fls. 132/133).
14 — Apesar de se declararem,
perante o Conselho de Justiça, como conhecidos entre si, «na esfera
do estelionato, achaque», (fls. 176)
e ladrões de automóveis (fls.
177/180), querem fazer crer que
não foram os autores do roubo narrado na denúncia.
15 — Estando, pois, conjunto probatório a autorizar a condenação
dos recorrentes, há de ser improvido o recurso ordinário quanto ao
mérito.
16 — Entretanto, há de se adequar a pena privativa de liberdade
a eles imposta à cominação prevista no artigo 157, $ 2?, I e II, do Código Penal, por se tratar de lei
mais benigna.
17 — Ao roubo ou assalto a estabelecimento de crédito, sem resultado morte ou lesão corporal grave, era cominada a pena de reclusão de 10 a 24 anos pelo artigo 57,
caput, do D.L. 898/69, vigente à
época, quer da prolação da sentença, quer do V. Acórdão recorrido.
Pelo Código Penal comum o
mesmo fato é apenado abstratamente com reclusão de 4 a 10 anos,
e multa, de três cruzeiros a quinze
cruzeiros, com aumento de um terço até metade, em face do emprego de armas e concurso de agentes.
18 — A pena de 10 anos de reclusão aplicada aos recorrentes foi a
mínima prevista no artigo 27 do diploma legal revogado, embora não
houvesse neste previsão de causas
especiais• de aumento, como no Código Penal comum.
19 — Reduzida a pena mínima
para 4 anos, consoante a legislação
penal comum, e acrescida a esta
mais um terço, em virtude das
causas especiais contempladas no
I) 2? do artigo 157, do C.P., tem-se a
pena de 5 anos e 4 meses de reclusão.
20 — Adotando-se o mesmo critério para a pena de multa, não hão
de ser apenados os recorrentes em
Cr$ 4,00 (valor anterior à vigência
da Lei n? 6.416/77).
21 — Por todo o exposto, somos
pelo provimento parcial do recurso
ordinário, tão-só para que sejam
aplicadas a cada recorrente as penas de 5 anos e 4 meses de reclusão e Cr$ 4,00 de multa, como 1w
cursos no artigo 157, $ 2?, I e II, do
Código Penal, desprezando-se a pena acessória de suspensão dos direitos políticos a todos aplicadas.
22 — Relativamente à adequação
da pena de Jorge dos Santos, já de-
R.T.J. — 100
finitivamente condenado, somos
pela restituição do expediente de
fls. 627/647 ao Juiz Auditor solicitante (solicitação contida no expediente juntado por linha).
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): 1 — Nos termos do jurídico
parecer da douta ProcuradoriaGeral da República, que integra o
relatório e cujos fundamentos incorporo a este voto, como razões de decidir, é de se dar provimento apenas
parcial ao recurso, tão-somente para
adequação da pena à vista da superveniência da Lei n? 6.620/78, que deixou de tipificar como crimes contra
a segurança nacional roubos praticados contra estabelecimentos de crédito por criminosos comuns, em motivação subversiva, como é o caso
sob exame.
2 — A preliminar de incompetência da Justiça Militar, sob o fundamento de que o roubo fora perpetrado na rua, contra dois funcionários,
do Banco, foi suficientemente refutada no acórdão recorrido.
A prova dos autos demonstra que o
crime foi praticado já às portas da
agência local do Banco do Brasil,
contra dois funcionários do Banco do
Estado de São Paulo, um deles facilmente indentificável, pois era um
guarda de vigilância, os quais transportavam numerário pertencente ao
último Banco, para depósito no primeiro, sendo Certo que os recorrentes chegaram a manter forte tiroteio
com os funcionários assaltados, que
saíram feridos, como, ainda, dispararam vários tiros na direção da entrada da agência do Banco do Brasil.
Assim, sendo vitima a agência local de um estabelecimento de crédito, pouco importa, para a caracteri-
61
zação da competência, na vigência
do Decreto-lei n? 808/89, o melo de
transporte empregado pela agência
bancária, vez que os réus tinha conhecimento de que se tratava de funcionários a serviço do Banco.
Como salientou o Dr. Arbaides
Junqueira Alvarenga, a hipótese se
assemelha ao assalto a carro
transportador, sendo pacífica a jurisprudência neste Pretório Excelso
a respeito da matéria.
3 — Por outro lado, também já se
pacificou neste colendo Tribunal o
entendimento de que o fato de a nova Lei de Segurança Nacional não
mais tipificar o crime de assalto a
Banco sem motivação políticosubversiva, não acarreta a abolição
da figura penal, vez que está ela expressamente prevista no Código Penal, em seu art. 157 e parágrafos.
4 — No mérito, limitam-se os recorrentes à negativa de autoria.
As declarações extrajudicias dos
recorrentes Rubens Gonçalves Martins — codinome Valdomiro Veiga —
e Jorge dos Santos — codinome Nelson R. ou Nelson Pereira dos Santos —
(não recorrente, este último), em
confronto com o contexto probatório,
não deixam, entretanto, dúvida sobre a participação de todos os recorrentes no assalto.
O primeiro deles — Rubens — declarou que, formaram — ele e os demais sentenciados — uma quadrilha
com o objetivo de praticarem crimes
nos Estados de Goiás e Mato Grosso.
A seguir, com riqueza de detalhes,
descreve o assalto objeto deste processo, para, em conclusão, esclarecer que,
(c... quem efetivamente participou do assalto, além do declarante,
o que também agora faz constar,
foram seus conhecidos Nelson Ro-
62
R.T.J. - 100
drigues, Anízio Alberto da Silva e
não Anizio Matos da Silva, e Fernando de Tal, cujo nome verdadeiro o declarante não sabe se é o
mesmo».
E certo que o recorrente Jorge Nunes Barcelos — coginome George
Bauer Neto ou Domingos Moura —
negou sua participação, mas o coreu Rubens já havia declarado que,
«... Jorge, neste momento (o da
partilha do fruto do roubo) trocava
o pneu do Opala nada lhe sendo
entregue, pois o mesmo receberia
sua parcela quandô houvesse passado o perigo...»
O co-sentenciado Jorge dos Santos,
por sua vez, declarou que,
«... em data de sete daquele mesmo mês, postaram-se de manhã
bem cedo, nas proximidades da
agência do Banco do Brasil, em
Cuiabá, Mato Grosso, sendo que
Rubens dirigia a C-10, em cuja carroceria se encontrava o declarante
e Anizio, enquanto que Jorge dirigia o Opala».
Finalmente, um dos réus — Rubens Gonçalves Martins, — foi preso
na região após intensa perseguição
policial, tendo apontado, conforme
transcrição retro, os demais comparsas
Todos os participes do crime eram
já criminosos de elevada periculosidade, conforme eles próprios confessam.
Ficou, pois indubitavelmente provada a autoria do crime, ao contrário do que afirmam os recorrentes,
os quais sequer tentaram provar a
sua permanência em outro local
quando da prática do delito, o que
seria extremamente fácil caso fossem verídicas suas alegações.
5
Isto pacto, seria de se negar
provimento ; recurso.
Ocorre, porém, que o crime imputado aos recorrentes, e pelo qual foram condenados com base no
Decreto-lei n? 898/69, não mais se encontra tipificado na Lei de Segurança Nacional vigente, o que, leva à
necessidade da adequação das penas
com base no crime de roubo, figura
penal idêntica, previsto no art. 157 e
seus parágrafos do Código Penal.
Todos os recorrentes foram condenados à pena mínima prevista no
art. 27 do Decreto-lei n? 898.
Essa pena corresponde, na lei penal comum — art. 157 do CP — a
quatro anos de reclusão, a qual deverá ser acrescida de um terço, em
vista das causas especiais de aumento previstas no § 2? do referido artigo.
Isto posto, nos termos do parecer
da douta Procuradoria-Geral, dou
provimento parcial ao recurso, tão-somente para, fazendo a adequação
das penas, fixar para cada recorrente a pena de cinco (05) anos e quatro
(04) meses de reclusão e multa de
Cr$ 4,00, por incursos no art. 157, §
2?, 1 e II, do Código Penal,
desprezando-se a pena acessória de
suspensão de direitos políticos a todos aplicada.
A adequação da pena do cosentenciado Jorge dos Santos, que
não recorreu, estando já definitivamente condenado, deverá processarse perante o Juízo competente, pelo
que determino desentranhamento do
expediente de fls. 627/647 e sua conseqüente remessa ao Juiz Auditor da
C.J.M., que o fez remeter a este
colendo Supremo Tribunal.
VOTO
O Sr. Ministro Soares Mufloz: Sr.
Presidente, no voto que proferi no
R.Cr. 1.387, ressalvei hipótese idêntica à espécie sub Judice, motivo pelo
qual a esse pronunciamento me reporto:
R.T.J. — 106
«Não tenho dúvida em aderir a
essa orientação, quando a punição
aplicada pela lel antiga foi objeto
de individualização, no respectivo
quantum, variável entre os extremos obstratamente cominados. Assim, se o crime, pela lel revoltada,
era punido com a pena de dez a
quinze anos de reclusão, e a nova
lei passou a puni-lo com a pena de
reclusão, de oito a dez anos, a retroatividade benigna restringe-se a
corrigir o quantum da pena para
oito anos» ( fls. 1/2).
Ante o exposto, concordo com o
eminente Ministro Cunha Peixoto,
conhecendo do recurso e lhe dando
provimento parcial.
63
EXTRATO DA ATA
RCr 1.391 — MT — Rel.: Min.
Cunha Peixoto. Rectes.: Rubens Gonçalves Martins e outros( Adv.: Riga
Nabukatsu). Recdo.: Ministério Público Militar.
Decisão: Deram provimento em
parte nos termos do voto do Ministro
Relator, decisão unânime.
Presidência do Sr. Ministit Thompson Flores. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Xavier de Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mufi oz e Rafael Mayer, Subprocurador-Geral da República, o Dr. Francisco de Assis Toledo.
Brasília, 27 de novembro de 1979 —
Antonio Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
SENTENÇA ESTRANGEIRA 14? 2.816
República Federal da Alemanha
Presidente: O Sr. Ministro Xavier de Albuquerque.
Requerentes: Chrlstoph Bauer e Peter Ralf Bauer, representados pela
Procuradoria-Geral da República — Requerido: Rolf Albert Bauer.
Sentenças estrangeiras. Alimentos. Homologação concedida.
Vistos.
A Procuradoria-Geral da República, na qualidade de instituição intermediária e em nome dos menores
Christof e Peter Ralf Bauer, requereu a homologação de duas sentenças da Justiça alemã, pelas quais ficou Rolf Albert Bauer, alemão, ora
residente e domiciliado no Brasil,
condenado a prestar alimentos aos
seus referidos filhos.
Citado por carta de ordem, o requerido contestou às fls. 71/73, Juntando documentos às fls. 75/78.
Os requerentes replicaram, sempre representados pela Procuradoria
Geral da República, às fls. 82/83.
Em virtude de a referida Procuradoria-Geral, atuar, no caso, como
instituição intermediária, nos termos da Convenção de Nova Iorque sobre a prestação de alimentos no estrangeiro e do art. 26 da Lei n? 5.478,
de 25.7.68, e de conseqüentemente
patrocinar os interesses dos requerentes, estando, por isso, impedida
de oficiar como Órgão do Ministério
Público, nomeei Procurador-Geral
da República ad hoc o advogado
Professor Josaphat Marinho.
Com vista dos autos, S. Exa. neles
exarou o seguinte parecer ( fls.
88/93):
«Os requerentes, filhos menores
do requerido, são representandos
69
R.T.J. — 100
pela Procuradoria-Geral da República, como «instituição intermediária», nos termos do art. 26 da
Lei n? 5.748, de 25-7-68, e da Convenção sobre prestação de alimentos no estrangeiro, promulgada
com o Dec. 56.826, de 2.9.965.
Pedem, na forma da inicial, que
«Sejam homologadas a sentença do Tribunal Regional de Kiel,
de 21 de setembro de 1971, e a decisão do Tribunal da Comarca de
Munique, de 10 de abril de 1974,
para que as mesmas em se tornando executórias no Brasil possibilitem a exigência das prestações alimentares devidas» (fl. 2).
Em verdade, a sentença do Tribunal Regional de Kiel (Fls. 6-12),
devidamente traduzida (fls. 13-18),
revela que, ao ser decretado o divórcio do requerido e de Lore
Bauer (fls. 13 e 17), foi assegurada
«contribuição ao sustento» dos requerentes, filhos menores do casal
(fl. 14).
A par disso, a decisão do Tribunal de Munique, na «Vara para
ações de aluguel, sustento, descendência de filhos, partilhas heranças ou pensões e da assistência
jurídica» (fl. 21), concedeu aos requerentes «o Direito de Pobre» para a primeira instância, incluindo
a execução forçosa», como garantia ao recebimento do «sustento
mensal de 175-DM» para cada qual
deles (fl. 21) — correspondente à
pensão estipulada na sentença de
divórcio do Tribunal de Kiel (fl.
14) —, além de «pensão adicional
mensal de 50-DM», em beneficio
igualmente de um e do outro (fl.
21).
De outro lado, por provocação da
autoridade judiciária da Comarca
de Esslinger e «mediante o Tribunal de Comarca de Ntirtingen», foi
solicitado à Procuradoria-Geral da
República junto ao Supremo Tribunal Federal», com documentação
informativa (fls. 26e 29-34), «realizar e executar os direitos ao
subsídio (alimentos) dos dois filhos
menores (fls. 26-27). Expressamente é pedido.
«... o obséquio de aplicar todas
as possíveis medidas adequadas,
em harmonia com o Convênio
das Nações Unidas, para levar a
efeito a contribuição ao sustento
e de impor e procurar executar a
cobrança junto ao pai ...» (g. 28).
O pedido resultou da circunstância de o requerido encontrar-se residindo no Brasil (fl. 27, in fine),
com endereço no Estado do Rio
Grande do Sul (fl. 3), onde recebeu
intimação regular (fl. 69 e v.).
Ora, a Lei n? 5.478, de 25-7-968,
que «dispõe sobre ação de alimentos», atribui competência ao
Procurador-Geral da República no
sentido de agir como «instituição
intermediária» (art. 26). No mesmo passo, a «Convenção sobre
prestação de alimentos no estrangeiro», promulgada com o Dec. n?
56.826, de 2-9-965, estabelece que «a
Autoridade remetente transmitirá
os documentos à instituição intermediária designada pelo Estado do
demandado» (art. IV). Demais, a
Convenção mencionada prescreve,
ainda, que «a instituição intermediária, atuando dentro dos limites
dos poderes conferidos pelo demandante, tomará, em nome deste, quaisquer medidas apropriadas
para assegurar a prestação de alimentos» (art. VI).
Confrontando o pedido da justiça
alemã com essas disposições normativas, ressalta a titularidade da
Procuradoria-Geral da República,
como instituição intermediária, para agir, bem assim a legitimidade
R.T.J. — 100
do procedimento usado preliminarmente — homologação das sentenças (Reg. Int. art. 215).
E certo que o requerido argüi, do
ponto de vista formal:
a falta de autenticação, pelo
Consulado brasileiro, das peças remetidas da Alemanha (fl. 72);
a inexistência de prova do
trânsito em julgado da sentença do
Tribunal de Munique (fl. 72);
c) «em nenhum momento, no
processo de execução de alimento
que tramitou pelo Tribunal de Munique, há alusão sobre a citação do
contestante como Réu» (fl. 73).
Sem dúvida, o Regimento Interno da alta Corte enumera como
«requisitos indispensáveis à homologação da sentença estrangeira» a
satisfação das duas formalidades
reclamadas (art. 217, III e IV).
Mas, quanto à primeira delas,
como observou a douta Procuradoria, cabe notar que as peças originárias «tiveram trânsito direto entre as Autoridades definidas pela
Convenção de Nova Iorque, prescindindo, portanto, da chancela consular» (fl. 82).
A propósito da outra exigência,
atente-se em que a decisão do Tribunal de Ele!, que dissolveu o casamento e fixou originariamente a
«contribuição de sustento», resultou de conciliação (fl. 14), e há declaração de que transitou em julgado em 21 de setembro de 1971
(fl. 18).
No processo de execução, no Tribunal de Munique, não há, realmente, atestação de trânsito em
julgado, como salientou o requerido, e de igual modo não se vê referência a citação do requerido.
65
Ocorre, porém, em contrariedade a todas as alegações do requerido, o disposto no art. VI, n? 2, da
Convenção promulgada:
«Antes de transmitir os documentos, a Autoridade remetente
certificar-se-á de que estes últimos se encontram, pela lei do
Estado demandante, em boa e
perfeita forma».
Há de presumir-se, pois, normalmente, a regularidade da documentação e, em conseqüência, a
correção dos atos nela retratados.
Somente motivo ponderoso deve
afastar essa presunção. Tal motivação inexiste no caso, até porque
requerido, tentando discutir logo
montante da pensão, declara ter
feito remessa à ex-esposa, à conta
dessa obrigação, de certa importância — o que significa reconhecimento de divida, mesmo com a
ressalva de que o «valor» reclamado *é incorreto» (fl. 73).
Não havendo, como não há, negativa da divida, nem alegação
de prejuízo, qualquer problema ou
dificuldade sobre o valor dos alimentos deverá ser objeto de discussão e decisão posteriormente,
após a homologação das sentenças,
como decorre, aliás, da inicial (fl.
2).
Acresce, em apoio dessa orientação, que a justiça alemã, no pedido
formulado, solicitou à Procuradoria-Geral da República «o obséquio de aplicar todas as possíveis
medidas adequadas» contra o requerido.
«... para que este seja obrigado
a pagar os alimentos correspondentes às necessidades mínimas,
ou então na devida proporção em
relação à situação em que se encontra, se não for conforme ao
acima exposto» (fl. 58).
66
R.T.J. — 100
A alternativa explicitamente
aberta confere à «instituição intermediária» margem de prudente
arbítrio, bastante para apreciação
de problema que não haja sido posto, porventura, na execução, pela
alegada falta de ciência do processo.
E o que poderá ocorrer, com a
ressalva de que o preceituado no
art. VI, n? 2, citado, recobre os
atos documentados da presunção
de regularidade.
As regras gerais do Regimento
Interno (art. 217) não constituem,
a nosso ver, obstáculo ao entendimento exposto. n de boa hermenêutica que as normas genéricas
não devem ser interpretadas durante ou como dogmas, antes com a
indispensável
a
flexibilidade
ajustá-las as diferentes situações.
Quanto maior o sentido social da
solução pleiteada, como no caso,
em que se cuida de prestações alimentares devidas a filhos menores, tanto mais se há de assegurar
a finalidade superior da lei.
E de ver, também, que, no concernente à soberania nacional, à
ordem pública e aos bons costumes, a que se refere o Regimento
(art. 216), o resguardo deles emerge das próprias cláusulas da Convenção invocada, a que aderiu o
Brasil.
Por fim, afigura-se-nos improcedentes a alegação do requerido,
não desdobrada nem esclarecida,
de que o pedido de homologação
«não atendeu também aos Itens 3 e
letra c do item 4, do artigo III do
Decreto-lei 56.826, de 2 de setembro de 1965» ((l. 73).
Além do lapso na referência a
Decreto-lei, •ao passo que se trata
de decreto executivo, os preceitos
referidos são, rigorosamente, da
Convenção promulgada.
O art. III, em seu item 3, prescreve que «o pedido deverá ser
acompanhado de todos os documentos pertinentes, inclusive, se
necessário, de uma procuração que
autorize a instituição intermediária a agir». O item 4, c, do mesmo
art. III, acentua que «a autoridade
remetente tomará todas as medidas que estiverem a seu alcance»,
compreendendo «uma exposição
pormenorizada dos motivos nos
quais for baseado o pedido, o objeto deste e qualquer outras informações pertinentes, inclusive as relativas à situação econômica do demandante e do demandado».
Na solicitação que faz a justiça
alemã, foram anexadas cópias dos
elementos essenciais do processo
de divórcio e da fixação de alimentos ((ls. 36 e 59-62), daí se inferindo, claramente, entre outras particularidades, a dissolução do casamento, a individuação das partes,
a condição de menores dos filhos
beneficiários, o valor da pensão estimada. A ausência do requerido
da Alemanha, apontada no pedido
de providência à instituição intermediária (fl. 57, In fine), resulta
indubitável pelo recebimento da citação, por ele, em nosso país, no
Rio Grande do Sul (fl. 69 e v.).
Quanto à situação econômica dos
interessados: os requerentes são
menores, e o requerido estando
aqui, perante a justiça brasileira
deverá definir, no tempo próprio,
suas disponibilidades. Prudentemente, a Autoridade remetente reservou ampla esfera de apreciação
oportuna desse aspecto pela
Procuradoria-Geral da República.
Esse órgão, por sua vez, juntou a
documentação recebida ao pedido
inicial, como demonstrado, consolidando a pretensão que lhe fora endereçada.
R.T.J. — 100
Diante dessas razões, e considerando que todas as peças apresentadas estão regularmente traduzidas, somos de parecer que as sentenças analisadas podem ser homologadas, nos termos do pedido,
salvo melhor entendimento do eminente Presidente do Supremo Tribunal Federal».
67
Isto posto, nos termos do parecer
transcrito, cujos judiciosos fundamentos acolho e adoto como razões
de decidir, homologo as sentenças de
que se trata.
Brasília, 20 de maio de 1981 — Ministro Xavier de Albuquerque, Presidente.
SENTENÇA ESTRANGEIRA N? 2.907
República do Paraguai
Presidente: O Sr. Ministro Xavier de Albuquerque.
Requerente: Manfred Krauss — Requeridos: Viktor Krauss e Sofia
Krauss ou seus sucessores.
Sentença estrangeira de aprovação de informação sumária de testemunhas sobre estado de filiação. Homologação denegada.
Vistos.
Manfred Krauss, alemão, residente no Paraguai, requereu a homologação da sentença de 6 de junho de
1978, pela qual o Juiz de Primeira
Instància em matéria civil do Segundo Turno, em Assunção, aprovou a
informação sumária de testemunhas
ali promovida pelo requerente com o
fito de comprovar ser filho de Viktor
Krauss e Sofia Krauss.
Intimado para indicar os nomes e
endereços dos requeridos, para lhes
serem feitas as citações, o requerente escusou-se nos termos da petição
de fls. 16.
Com vista dos autos, assim opinou
a Procuradoria-Geral da República,
em parecer exarado pelo Subprocurador-Geral José Francisco Rezek e
aprovado pelo Procurador-Geral Inocêncio Mártires Coelho ( fls. 19/20):
«O texto da decisão judiciária
que ora se pretende homologar
(trad. ás fls. 8, do original de fls.
10) não permite saber qual o fundamento da competência da Justi-
ça paraguaia para conhecer da espécie (Reg. Int. do S.T.F., art. 217,
inciso I), nem tampouco menciona
o transito em julgado (idem, inciso
III).
A peça fundamental deixa claro,
ademais, que não houve citação de
quem quer que seja. Nem mesmo
algo do gênero de um chamamento
edital de interessados incertos (idem, inciso II).
Tudo isso, porém, não são mais
que reflexos incidentes do extraordinário fato principal: a pretensa
prova de filiação com a singeleza
de uma justificação judicial comum, e sem cautelas primárias
como a exata identificação do postulante e de seus indigitados pais.
Destes, não disse o juizo paraguaio
nem mesmo se vivos ou mortos, e,
na primeira hipótese, onde econtráveis.
Convergem, no caso, a ordem
pública (art. 216) e três dos valores formais do art. 217 do Regimento Interno, para inviabilizar o
êxito do pedido de homologação».
Pelo indeferimento».
R.T.J. — 100
68
Isto posto, nos termos do pare-
cer transcrito, indefiro o pedido de homologação.
Brasília, 1? de julho de 1981 — Ministro Xavier de Albuquerque, Presidente.
CONFLITO DE JURISDIÇÃO N? 6.215 — MS
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto.
Suscitante: Tribunal Federal de Recursos — Suscitado: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso.
— Conflito de Jurisdição — Tráfico Interno de drogas. Competêneia.
Tendo o réu sido processado e absolvido na 1! Instância, com base no art. 12 da Lei n? 6.386/76, a competência para o julgamento do
recurso é do Tribunal de Justiça do Estado.
Conflito conhecido, para declarar-se competente o Tribunal de
Justiça, suscitado.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal em sessão
plenária, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos em
conhecer do conflito e julgar competente o Tribunal suscitado.
Brasília, 14 de novembro de 1979 —
Antonio Neder Presidente — Cunha
Peixoto, Relator.
RELATÓRIO
Corumbá-Bauru, encontraram uma
sacola de couro, cor escura dentro
da qual continha dois pacotes de
uma erva verde, denominada vulgarmente maconha; procedidas as
diligências ficou provado que os
pacotes contendo as substâncias
entorpecentes pertenciam ao denunciado e ao menor, que pretendiam após usarem, vendê-la, sendo
que tais pacotes foram adquiridos
no Paraguai».
O Juiz, entendendo ser a maconha
do menor, absolveu o réu Sebastião
da Paz, com o que não concordou o
representante local do Ministério Público, que interpôs recurso de apelação.
O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Na
comarca de Três Lagoas, o Representante do Ministério Público denunciou a Sebastião da Paz, dando-o
Tribunal de Justiça do Estado
como incurso nas sanções do art. 12 deOMato
Grosso do Sul não conheceu
da Lei n? 6.368, de 21 de outubro de do recurso,
entendendo que se trata1976, porque:
va de tráfico com o Exterior.
«Na madrugada do dia 16 de feOs autos foram remetidos ao Trivereiro do corrente ano (1977), os
Agentes Federais, que faziam fis- bunal Federal de Recursos, que suscalização de rotina no trem da citou o presente conflito negativo de
N.C.B. que fazia o percurso de jurisdição.
R.T.J.
A Procuradoria-Geral da República assim se manifestou, verbis:
«1. Por maioria, deliberou a 4!
Turma do Tribunal Federal de Recursos declarar-se incompetente à
apreciação da controvérsia, que alcança o nível recursal, fazendo-o
com suporte no entendimento do
ilustre Min. Guelros Leite; assim
relevado, verbis;
«Não encontro provada, todavia, a modalidade de tráfico,
levando-se em conta o local da
apreensão da mercadoria, as circunstâncias do fato e a pequena
quantidade encontrada». (Vide:
fls. 133).
2 — Foi, conseqüetemente, suscitado o incidente, negativo de competência, ante prévia manifestação
do coleglado estadual, igualmente.
declinando do exercitar a Jurisdição, no caso.
3 — Data maxima venta, há o
tráfico internacional de entorpecentes.
4 — Fiquemos com as declarações do acusado, e do menor, que o
acompanhava, como prestadas perante o magistrado a que, verbis:
«Que o menor que foi em companhia do denunciado chegando em
Ponta Porã foi para o Paraguai
lá ficando 5 dias e de vez em
quando vinha a Ponta Porá e se
avistava com o denunciado; que o
referido menor disse ao denunciado que tinha amigos no Paraguai». (Vide' fls 35-v, grifamos).
«Que quando o depoente saiu
do Paraguai Já saiu com a bolsa
de sua propriedade e com a maconha dentro, tendo adquirido a
maconha no Paraguai; que o depoente e v-nprou a maconha para
fazer usu LLei >. (Vide: fls. 76 v,
grifamos).
69
— 100
5 — Ora, assim bem caracterizado o trafico internacional, da maconha, à espécie incide a primeira
parte da Súmula n? 522, verbis:
Súmula n? 522: «Salvo ocorrência de tráfico para o Exterior,
quando então a competência será
da Justiça Federal, compete à
Justiça dos Estados o processo e
Julgamento dos crimes relativos
a entorpecentes».
6 — E de se conhecer do conflito;
mas para fixar a competência na
4! Turma do Tribwjal Federal de
Recursos»..
o relatório.
VOTO
O Sr. Ministre* CUnha PebtOto (Relator): 1 — O réu foi denunciado apenas pela posse de substância tóxica,
nos termos do art. 12 da Lei 6.368, de
21 de outubro de 1976, não fazendo a
denúncia referência ao art. 18 da
mesma Lel, que trata de tráfico com
outros países.
E foi com base nessa denúncia que
o acusado foi processado e absolvido
na 1! Instância. Não se cogitou, tanto na denúncia quanto na sentença,
de tráfico com o Exterior.
Assim, nos termos da denúncia e
da sentença, a competência é da
Justiça Estadual, e não da Federal,
vez que o processo trata de posse para venda de tóxico apreendido em
território nacional.
Não nos parece possível e jurídica
a pretensão da Procuradoria-Geral
da República de examinar elementos
probatórios, num conflito de Jurisdição, para decidir sobre qual a justiça competente.
Este colendo Supremo Tribunal
Federal, no Conflito de Jurisdição n?
6.183, relatado pelo eminente Ministro Thompson Flores, decidiu:
70
R.T.J. — 100
«Verificando-se da denúncia, a
qual não sofreu aditamento, que o
delito atribuído ao réu foi o do art.
12, 1, sem qualquer referência ao
art. 18, I, ambos da Lei 6.386/76, e,
assim, resultou apreciada pelo juiz
de direito, evidencia-se que sentenciou ele no exercício de sua competência ordinária, jamais, com a delegada a que se refere o art. 27 do
citado Diploma.
EXTRATO DA ATA
CJ. 6.215 — MS — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Suste.: Tribunal Federal de Recursos. Susdo.: Tribunal de
Justiça do Estado de Mato Grosso do
Sul. Interessados: Sebastião da Paz,
(Adv.: Lúcio Queiroz Moreira) e o
Ministério Público Estadual.
Decisão: Conheceu-se do conflito e
julgou-se competente o Tribunal suscitado. Decisão uniforme.
Presidência do Senhor Ministro
Cabe, pois, ao Tribunal de Justiça, e não ao Tribunal Federal de Antonio Neder. Presentes à Sessão
Recursos, julgar a apelação inter- os Senhores Ministros Djaci Falcão,
Thompson Flores, Xavier de Albuposta daquele veredicto»."
querque, Cordeiro Guerra, Cunha
Peixoto, Soares Murioz, Dedo MiranNo caso em apreço, também a de- da e Rafael Mayer. Ausente, licennúncia não mereceu qualquer adita- ciado, o Sr. Ministro Leitão de
mento para o envolvimento de tráfi- Abreu. Ausente, justificadamente, o
co com outro país.
Sr. Min. Moreira Alves. ProcuradorGeral da República, o Dr. Finnino
2 — Por estes motivos, conheço do Ferreira Paz.
Brasília, 14 de novembro de 1979 —
conflito e declaro competente o Tribunal de Justiça de Mato Grosso, Alberto Veronese Aguiar, Secretásuscitado.
rio.
CONFLITO DE JURISDIÇÃO N? 6.252 — SP
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu.
Suscitante: Tribunal Federal de Recursos — Suscitado: Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região.
Empresa sob o regime de intervenção federai. Reclamação trabalhista contra ela ajuizada. Caso de competência da Justiça do Trabalho, por não estarem em causa os objetivos do confisco e da intervenção (A.C. n? 99173, artigos 1? e 2?). Simples assistência ad adjuvandum não desloca competência. Conflito conhecido, competente o suscitado, Tribunal de Trabalho da 2! Região.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão
plenária, na conformidade com a ata
de julgamentos e notas taquigráficas,
em conhecer do conflito, dando pela competência do suscitado, o Colendo Tribunal Regional do Trabalho
da 2! Região. Decisão unânime.
Brasília, 06 de agosto de 1980. —
Antonio Neder, Presidente — Leitão
de Abreu, Relator
R.T.J. — 100
RELATORIO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu: A
Primeira Turma do Tribunal Federal de Recursos suscitou conflito negativo de jurisdição em acórdão assim ementado:
«Reclamação trabalhista. Benedito Cardoso Pinto e outros contra
Companhia Brasileira de Cimento
Portland Perus. Despedida em
fraude à Lel, obstativa da estabilidade (CLT., art. 499, § 3?). Decisão
Unânime da Décima Sétima Junta
de Conciliação e Julgamento.
«Recurso ordinário. Intervenção
da União Federal, na segunda instância, pedindo a remessa dos autos ao Tribunal Federal de Recursos, em face de seu interesse superveniente, pois o acervo ou patrimônio líquido da reclamada fora
confiscado e incorporado ao Patrimônio Nacional, nos termos do Decreto n? 74.728, de 18 de outubro de
1974 ».
«Não conhecimento do recurso.
Incompetência da Justiça do Trabalho. Remessa dos autos ao Tribunal Federal de Recursos ».
«Não conhecimento do recurso,
contra o voto do Ministro Relator,
em razão da Incompetência do Tribunal».
«Conflito negativo de jurisdição
suscitado para o Supremo Tribunal
Federal» ( f. 143).
Pela Procuradoria-Geral da República, o Procurador Moacir Antônio
Machado da Silva emitiu o seguinte
parecer•
«Em reclamação trabalhista
ajuizada contra a Cia. Brasileira
de Cimento Portland Perus, empresa sob intervenção federal, a
União declarou, inicialmente, a
inexistência de interesse na causa
71
(f.79). Prosseguindo o feito, a MM.
17! Junta de Conciliação e julgamento de São Paulo julgou procedente a ação, assegurando aos reclamantes indenização em dobro,
por entender caracterizada a dispensa tendente a obstar a aquisição da estabilidade.
«Após a interposição de recurso,
a União Federal interveio no feito,
para afirmar seu interesse a requerer a remessa dos autos ao
egrégio Tribunal Federal de Recursos, tendo em vista que, por
força do Decreto n? 74.228, de 18-1074, superveniente à decisão, o patrimônio liquido da reclamada fora
confiscado e incorporado ao Patrimônio Nacional, passando a constituir entidade pública federal.
«O egrégio Tribunal Regional do
Trabalho declinou de sua competência, entendendo caracterizada a
hipótese prevista no artigo 125,
2?, da Constituição ».
«Por seu turno, o egrégio Tribunal Federal de Recursos também
se julgou incompetente e suscitou
conflito perante o Supremo Tribunal Federal, sob o fundamento de
que a União fora chamada a
pronunciar-se e o fez declarando
seu desinteresse no feito».
«Np Conflito de Jurisdição n?
6.157 (DJ de 06-06-80, pág. 4.134), decidiu o Supremo Tribunal Federal
que compete à Justiça do Trabalho
processar e julgar reclamação trabalhista ajuizada contra empresa
sob regime de intervenção federal
e que a simples assistência ad
adjuvandum da União não desloca
a competência para a Justiça Federal».
«E, com efeito, o confisco e a incorporação do patrimônio liquido
da empresa não têm o efeito de
extingüi-la, de forma que a União
R.T.J. — 100
72
Reclamação trabalhista contra ela
ajuizada. Caso de competência da
Justiça do Trabalho, por não estarem em causa os objetivos do confise da intervenção (A.C. n? 99/73,
«O Ato Complementar n? 99, de co
1? e 2?). Simples assistência
04-10-73, aliás, deixa clara essa artigos
ad
adjuvandum
desloca compeconclusão ao prescrever que, nos tência. Conflito não
compefeitos em andamento, as empresas tente o suscitado,conhecido,
sob intervenção continuarão repre- lho da 2? Região.» Tribunal do Trabasentadas pelos procuradores por
elas constituídos ( art. 2?).»
De acordo com esse precedente, e
«Não se verifica, portanto, a hi- reportando-me ao voto que então
pótese do artigo 110 da Constitui- proferi, conheço do conflito e dou peção que constitui a regra específi- la competência do suscitado, o Coca sobre a competência da Justiça lendo Tribunal Regional do Trabalho
Federal em matéria trabalhista. A da 2? Região.
intervenção da União, como assistente, em nada altera a questão,
EXTRATO DA ATA
sendo inaplicável o artigo 125, I, da
Constiuição, no que concerne à jurisdição trabalhista. E, aliás, o que
resulta da parte final da ementa
CJ 6.252 — SP — Rel.: Min. Leitão
da decisão proferida pelo Supremo de Abreu. Suste.: Tribunal Federal
Tribunal no C.J. 6.157».
de Recursos. Susdo.: Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região.
«A reclamação trabalhista, por Interessados: Benedito Cardoso Pinsua própria índole, não envolve to e outros ( Advs.: Francisco Ary
matéria relativa ao confisco ou à Montenegro Castelo e outros) e Cia.
intervenção, em si, razão por que a Brasileira de Cimento Portland Pecompetência não passa à Justiça rus (Advs.: Nylva Alves Nogueira e
outros).
Federal».
não substituiu a reclamada na relação de direito substancial deduzida em juizo».
«Pelo conhecimento do conflito,
declarada a competência do eg.
Tribunal suscitado» (fls. 149-151).
o relatório.
VOTO
Sr. ~listro Leitão Le Abreu
(Relator): Em apoio do parecer, a
Procuradoria-Geral da República invocou decisãO do Supremo Tribunal
Federal, tomada no julgamento do
C.J. n? 6.157, publicado no D.J. de 0606-80. Traz o acórdão, do qual fui relator, a seguinte ementa: «Empresa
sob o regime de intervenção federal.
Decisão: Conheceu-se do conflito e
deu-se pela competência do Tribunal
Regional do Trabalho da Segunda
Região. Decisão uniforme.
Presidência do Senhor Ministro
Antonio Neder. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Djaci Falcão,
Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Leitão de Abreu, Cordeiro
Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufloz, Decio Miranda
Rafael Mayer. Procurador-Geral
da República, o Dr. Firmino Ferreira Paz.
Brasília, 6 de agosto de 1980 —
Alberto Veronese Aguiar, Secretário.
R.T.J. — 100
73
CONFLITO DE JURISDIÇÃO N? 6.286 —
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu.
Suscitante: Junta de Conciliação e Julgamento de Maceió — Suscitado:
Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas.
Ação ajuizada por trabalhadores avulsos contra o Sindicato dos
Estivadores, reclamando participação nos valores entregues pelo Instituto do Açúcar e do Álcool. Caso que não se enquadra na competência da Justiça do Trabalho. Conflito conhecido, declarando-se a competência da Justiça comum do Estado.
ACORDAO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros. do Supremo Tribunal Federal, em sessão
plenária, na conformidade com a ata
de julgamentos e notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em
conhecer do conflito e declarar competente a Justiça comum do Estado.
Brasília, 21 de maio de 1981 —
Xavier de Albuquerque, Presidente
— Leitão de Abreu, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu:
Apresento como relatório o parecer
do Procurador Moacir Antônio Machado da Silva, aprovado pelo
Procurador-Geral da República Firmino Ferreira Paz:
«1 — Trabalhadores avulsos vinculados ao Sindicato dos Estivadores do Estado de Alagoas ajuizaram ação contra este, perante o
Juízo da Vara de Maceió, reclamando participação nos valores
entregues pelo Instituto do Açúcar
e do Álcool ao Sindicato, para distribuição entre os associados, a
titulo de compensação pelo decréscimo de trabalho resultante do funcionamento do Terminal Açucareiro de Maceió.
2 — A ação foi julgada procedente em primeira instância, mas a
eg. 2? Câmara do Tribunal de Justiça do Estado, entendendo que a
controvérsia é oriunda de relação
de emprego, julgou incompetente a
Justiça comum dó Estado e determinou a remessa dos autos ao eg.
Tribunal Regional do Trabalho da
6! Região.
3 — O MM. Juiz Presidente da
Junta de Conciliação e Julgamento
de Maceió, entretanto, suscitou
conflito negativo perante o Supremo Tribunal, considerando que não
há litígio decorrente de relação de
emprego, pois o Sindicato opera
como simples intermediário na, distribuição dos recursos, não se configurando a hipótese do art. 142 da
Constituição Federal.
4 — Tem razão ó Juizo suscitante. Não se trata de litígio entre empregado e empregador, nem existe
lei atributiva de competência à
Justiça do Trabalho, a autorizar a
subsunção da causa à regra do artigo 142 da Constituição. O litígio
envolve, de um lado, trabalhadores
avulsos e, de outro, o Sindicato respectivo, que, por força de convênio, recebe recurso do Instituto do
Açúcar e do Álcool e os aplica em
complemento da remuneração dos
associados e em obrigações sociais
vinculadas a essas complementações, como compensação de natureza social e de caráter transitório
74
R.T.J. — 100
pela diminuição do trabalho, decorrente do funcionamento do Terminal Açucareiro.
5 — Não se caracteriza a relação
de emprego entre os associados e
qualquer das partes do convênio.
Sob esse aspecto, acrescente-se
que a simples existência do convênio não atribui à Autarquia a qualidade de litisconsorte do Sindicato,
afastando assim qualquer possibilidade de cogitar-se de competência
da Justiça Federal (CJ 6.029, RTJ
84-78).
6 — Nos casos em que o Sindicato opera como intermediário entre
os tomadores do serviço e os trabalhadores avulsos para pagamento
destes e satisfação dos encargos
sociais, correspondentes, a Jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal está firmada no sentido de
que a competência para o processo
e Julgamento dos litígios entre os
associados e o Sindicato é da Justiça Comum (CJ 5.029, RTJ 84-78; CJ
6.039; 1)J de 9-8-77; CJ 6.090, DJ de
31-10-7i; C.J 6.108; DJ de 30-6-78; CJ
6.241, DJ de 16-5-80; e RE 88.287;
DJ de 30-5-80).
7 — Essa orientação também
prevalece evidentemente nos casos
em que os associados reclamam a
participação de recursos provenientes do Instituto do Açúcar e do
Alcool. No Julgamento do CJ 6.029PE, por exemplo, em que os associados pleiteavam do Sindicato respectivo tanto os recursos provenientes dos tomadores de seus serviços quanto os a da Autarquia, a
conclusão foi pela competência da
Justiça Comum.
8 — Pelo conhecimento do conflito, declarada a competência da
Justiça Comum do Estado de Magoas. ( fs. 27 a 29).
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu
(Relator): Como se trata de conflito
entre Tribunal e o órgão judicante
de primeiro grau, isto é, Junta de
Conciliação e Julgamento, àquele
não subordinado, conheço do conflito
e, nos termos do parecer da Procuradoria-Geral da República, que
se reporta a precedentes do Supremo Tribunal, aplicáveis ao caso,
declaro competente a Justiça Comum do Estado. Determino, em conseqüência, a remessa dos autos da
ação ordinária ao. suscitado. Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas,
para que aprecie a apelação, como
for de direito.
EXTRATO DA ATA
CJ. 6.286 — AL — Rel.: Min. Leitão
de Abreu. Suste.: Junta de Conciliação e Julgamento de Maceió. Susdo.:
Tribunal de Justiça do Estado de
Alagoas. Interessados: Genivaldo José de Oliveira e outros. (Advs.: Ezir
Colaço Rodrigues Costa e outra) e
Sindicato dos Estivadores do Estado
de Alagoas. ( Adv.: Antônio Aleixo
Paes de Albuquerque).
Decisão: Conheceu-se do conflito e
deu-se pela competência do Tribunal
suscitado. Decisão unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Xavier de Albuquerque. Presentes à
Sessão os Senhores Ministros Djaci
Falcão, Antonio Neder, Leitão de
Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mtuloz,
Decio Miranda, Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. Procurador-Geral da
República, Dr. Firmino Ferreira
Paz.
Brasília, 21 de maio de 1981 —
Jonas Céllo Monteiro Coelho, Secretário.
R.T.J.
— 100
75
MANDADO DE SEGURANÇA N? 20.201 — DF
(Tribunal Pleno)
Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Cunha Peixoto.
Requerente: Silvio Meyer Fontenelle — Requerido: Senhor Presidente da
República.
Mandado de segurança — Ato de demissão por acumulação ilegal
de cargos — Nulidade — Funcionário do extinto DCT, declarado em
remanejamento por não ter sido integrado ao quadro de servidores da
ECT, quando da transformação daquele departamento, e que passou
a exercer, concomitaiitemente, relação de emprego com a Aço Minas
Gerais S/A — Açominas — Sua demissão, sob o fundamento de acumulação ilegal de cargos, após indeferimento de pedido de exoneração.
— Não sendo pacifica a caracterização da Açominas, anteriormente á aquisição de seu controle acionário pela SIDERBRAS, como
entidade de economia mista, e sendo razoável, dado o aspecto negociai da transformação, que fosse facultado aos servidores, após a encampação, o direito de opção, coexistiu, por parte do impetrante, a
má-fé em que se fundou o ato demissório.
Segurança concedida, com votos vencidos em parte.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão
plenária, na conformidade da ata de
julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em conceder a segurança nos termos do pedido, vencidos, quanto a extensão do
deferimento os Ministros Relator,
Rafael Mayer, Decio Miranda e
Thompson Flores.
Brasília, 19 de setembro de 1979 —
Antonio Neder, Presidente — Cunha
Peixoto, Relator para o acórdão.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu:
Cuida-se de pedido de segurança
contra ato do Senhor Presidente da
República. Estes, segundo a narração do impetrante, os fatos que culminaram com a decisão presidencial, contra a qual se insurge:
«Em 7 de junho de 1974, através
da Portaria n? 840, do Diretor Regional da Empresa Brasileira de
Correios e Telégrafos (ECT) no
Ceará, o impetrante foi declarado
em remanejamento, por não ter sido integrado ao quadro de servidores da referida empresa pública,
ficando outrossim afastado da função que até então exercera no extinto Departamento de Correios e
Telégrafos, como oficial de administração, nível 16, e sendo colocado á disposição do Dasp e do Ministério das Comunicações, para
efeito de um futuro aproveitamento.
«Em 23 de fevereiro de 1976, já
perdurando, portanto, por quase
dois anos, a situação de inatividade acima mencionada, o impetrante foi admitido como empregado
da Aço Minas Gerais S.A. (Açominas), sediada em Belo Horizonte,
Estado de Minas Gerais, passando
a exercer a função de Chefe do Ga-
76
R.T.J. — 100
binete da Presidência da referida
empresa.
«Em 23 de setembro do mesmo
ano, tendo decidido fixar definitivamente sua residência naquela cidade, o impetrante foi ao Ceará
para apresentar seu pedido de exoneração do cargo público do qual
estava afastado (doc. 2), não tendo
tido posteriormente qualquer
notícia a respeito do andamento do
mesmo pedido, ressalvada a suspensão do pagamento de seus
vencimentos, ocorrida a partir de
Janeiro de 1977.
«Em fins de maio de 1977 o impetrante veio a ter conhecimento do
indeferimento de seu pedido de
exoneração através do expediente
Cl/SID 1.507/77, originário de Fortaleza e datado de 23.05.77, nos seguintes termos:
Assunto: Pedido de exoneração
1 — Vimos solicitar seu pronunciamento urgente sobre o assunto
tratado nos expedientes de referência. Casc tenha assumido novo emprego, deverá V. Sa. remeter imediatamente requerimento de exoneração, através desta regional.
2 — Esclarecemos que seu pagamento está suspenso desde janeiro/77 em virtude do pedido feito
em outubro/76 e que não pôde ser
encaminhado em face da anterioridade com que requeria a exoneração.
«Tendo em vista o não encaminhamento do pedido anterior, o impetrante apresentou novo pedido
de exoneração, em junho de 1977,
acompanhado de declaração do
Chefe da Seção de Pessoal da Açominas, quanto a seu emprego na
mesma empresa (doc. 3). Surpreendentemente, entretanto, o novo pedido tampouco teve encaminhamento, sob a alegação de ter sido instaurado inquérito adminis-
trativo para apurar uma eventual
acumulação de cargos pelo impetrante (doc. 4). Na verdade apenas
em 02 de setembro de 1977, através
da Portaria n? 810 do Diretor Regional da ECT, è que veio a ser designada a comissão incumbida de
apurar aquela acumulação (doc.
5).
«A aludida Comissão de Inquérito, embora concluindo pela acumulação dos dois cargos pelo impetrante, entendeu que a mesma não
decorrera de má fé (doc. 6) e opinou pelo encerramento do processo, com o encaminhamento regular
do primeiro pedido de exoneração
que fora formulado pelo impetrante.
«No mesmo sentido manifestaram-se o Assessor Jurídico e
diversas chefias da Diretoria
Regional da ECT, todos opinando
pelo encaminhamento do primeiro
pedido de exoneração do impetrante, com sua desvinculação a partir
de 22.02.76, e a conseqüente restituição das importâncias que lhe
haviam sido pagas entre 23 de fevereiro e 31 de dezembro de 1976
(docs. 7 a 10).
«A decisão administrativa final,
entretanto, tomada com base em
pronunciamento da Consultoria
Jurídica da ECT (docs. 11, 12 e 13)
e da Assessoria e da Diretoria Geral do Departamento de Pessoal do
Ministério das Comunicações
(docs. 14, 15 e 16), foi no sentido de
que estava caracterizada a má fé
na acumulação de cargos que incorrera o impetrante (doc. 17).
«Dai a pena de demissão que foi
imposta ao impetrante por decreto
de 04.01.79, do Exmo. Sr. Presidente da República, publicado no
Diário da União de 05.01.79 (doc.
18).
R.T.J. — 100
«E contra o ato de demissão em
apreço que ora se insurge o impetrante, não só por inexistir, no caso, qualquer acumulação de cargos
públicos, como porque, ainda quando houvesse, efetivamente, tal acumulação, não teria havido, absolutamente, a imputada má fé e, em
qualquer circunstância, teriam sido nulos, de qualquer forma, os
processos administrativos que precederam e pretensamente justificaram aquela demissão, uma vez
que os mesmos não observaram as
normas legais aplicáveis, tudo conforme se demonstrará a seguir»
(fl. 2/4).
Sustenta-se, inicialmente, não ser
a Aço Minas Gerais S.A. empresa de
economia mista, não se configurando, assim, a acumulação vedada pelo artigo 99, 2? da Constituição Federal. Alega-se, ainda, que a Aço Minas Gerais S.A. sempre agiu, em relação ao impetrante, como empresa
essencialmente privada, quer porque
não exigiu dele, à época da admissão, a declaração de que ele não
exercia cargo de natureza pública,
quer porque o registrou no Programa de Integração Social (PIS).
Argumenta-se, a seguir, ter sido
ilícita a recusa da exoneração, que
foi pleiteada por duas vezes.
Assevera-se, ainda, não se haver assegurado ao impetrante o direito de
opção, antes da abertura do processo
administrativo. Por fim, argúi-se
não ter havido prova da má fé do
impetrante no tocante à alegada
acumulação de cargos. Diante disso,
pede:
«Com fundamento no que ficou
exposto, o impetrante vem pedir se
digne esse egrégio Tribunal
conceder-lhe a segurança para o
fim de declarar nulo e de nenhum
efeito o ato de sua demissão, dada
a sua flagrante ilegalidade, com a
conseqüente sustação de todo e
77
qualquer ato dele decorrente, direta ou indiretamente, notadamente
a rescisão do contrato de trabalho
celebrado entre a Açominas e o
impetrante e a restituição das importâncias por ele recebidas na vigência do mesmo contrato» (fls.
24).
As informações, encaminhadas a
esta Corte pelo Senhor Presidente da
República, foram prestadas pelo
Diretor-Geral do Dasp, nos seguintes
termos:
«Preliminarmente, improcede a
segurança impetrada, pois a matéria tratada escapa ao âmbito restrito do mandado de segurança,
por envolver exame de fatos e de
provas, somente deslindáveis através de ação ordinária, de acordo
com jurisprudência mansa e
pacifica não só do Colendo Supremo Tribunal Federal como de todos os demais Tribunais do Pais.
«Quanto ao mérito o pedido é totalmente desprovido de qualquer
respaldo jurídico, como ficará demonstrado a seguir.
«Não resta a menor dúvida de
que a Aço Minas Gerais S.A. —
Açominas, subsidiária da Siderbrás, que dela detém a maioria do capital, é uma Sociedade de
Economia Mista, estando, inclusive, dessa forma, catalogada no Cadastro de Administração Federal,
publicação da Secretaria de Planejamento da Presidência da República (2! edição, seção 46, pág. 9).
Assim, sobre os seus servidores incide a proibição existente no f 2?
do artigo 99 da Constituição Federal.
«Sociedade de Economia Mista
não é somente aquela criada pela
União, em virtude de lei específica, mas, também, a que for instituída por entidade da Administração Indireta, em decorrência de
78
R.T.J. — 100
autorização legal pertinente, constante da lei institucional da entidade principal ou de lei casuística.
Este é o entendimento da Administração Pública, expresso, inclusive, em parecer da Consultoria Geral da República, de n? L-154/77,
publicado no Diário Oficial de
26.07.1977, in verbis:
'De acordo com essa conceituação, sociedade de economia mista
será não somente aquela criada
pela União, em virtude de lei especial com a detenção do controle
acionário; sê-lo-á, igualmente, *a
que vier a ser instituída, por entidade da Administração Indireta
(autarquia, empresa pública ou sociedade de economia mista), em
face de autorização legislativa pertinente, que poderá constar da própria lei institucional e não, necessariamente, de lel casuística, assegurado sempre o controle acionário por parte da entidade instituidora. Logo, as sociedades filiais,
satélites ou subsidiárias, criadas,
em tais pressupostos, pelas sociedades de economia mista matrizes,
são iniludivelmente, sociedades de
economia mista, ditas de segundo
grau, material e formalmente integrantes da Administração Indireta.'
«conforme se vê do artigo 3? da
Lei n? 5.919, de 17.09.1973, que autorizou a sua constituição, na redação dada pelo artigo 2? da Lei n?,
6.159, de 06.12.1974, a Siderbrás poderá criar subsidiárias:
Artigo 3? — A Siderbrás exercerá o controle acionário das empresas siderúrgicas, cuias ações com
direito a voto pertençam em sua
maioria à União ou a entidade de
Administração Federal Indireta,
as quais passarão à condição de
suas subsidiárias, podendo ainda
criar outras subsidiárias e
associar-se minoritariamente a
empresas privadas que exerçam
atividades siderúrgicas e afins.
«Desse modo, sendo a Açominas
uma sociedade de economia mista,
o impetrante, ao ingressar no seu
quadro de pessoal, incidiu em acumulação proibida, já que detinha,
de há muito, o cargo de Oficial de
Administração nos Correios e Telégrafos.
«Quanto aos argumentos desenvolvidos pelo ex-servidor de que a
pena de demissão que lhe foi aplicada é ilegal porque ilícita foi a recusa dos seus dois pedidos de exoneração e não ficou provada a sua
má fé na acumulção, também, não
têm consistência Jurídica. Os pedidos de exoneração além de apresentados muito depois da ocorrência da acumulação ilícita, foram
feitos sob termos condicionais, que
a Administração, após examiná-los
todos, achou por bem não aceitalos, antes de instaurar o processo
administrativo para apuração minuciosa dos fatos. Tendo em vista
o nível cultural do impetrante e sobretudo o fato de ser bacharel em
direito, entendeu-se caracterizada
a acumulação ilícita, com má fé,
que desenganadamente houve, e
decidiu-se, recusando os pedidos de
exoneração, demitir o servidor do
cargo que ocupava na área federal.
«Finalmente, vale ressaltar que
o argumento de que a não concessão do prazo de opção pode levar à
nulidade do ato de demissão, não
tem qualquer base legal, visto como o parágrafo único do artigo 53
da Lei n? 4.242, de 17.07.1963, não
revogou as disposições do argigo
193 da Lei n? 1.711, de 28.10.1952,
pois o que o legislador teve em mira, apenas, foi criar mais uma
forma de fiscalização das acumulações, a ser realizada depois de
publicado o resultado do censo periódico dos servidores públicos da
União, das Autarquias e entidades
R.T.J. — 100
paraestatais, que deveria ser efetivado pelo Instituto Brasileiro de
Georgraf ia e Estatística» ( fls.
92/96).
Do parecer da Procuradoria-Geral
da República transcrevo a parte final, verbis:
«Como se nota, pretende-se não
apenas exame de matéria de fato,
mas, principalmente, exame de
critério seguido pela Administração Federal de respeito à lei.
*Em conclusão, o ato impugnado
obedeceu à legislação pertinente e
não foi praticado com abuso de poder e o seu desfecho, se de se lamentar, não é de ser imputado à
autoridade requerida mas, sim, ao
próprio impetrante.
«Somos pelo indeferimento do
mandado de segurança» (fls. 102).
E o relatório.
79
cargos ( artigo 193, parágrafo único,
da Lei n? 1.711, de 28.10.52), está revoltada pela Lei n? 4.242, de 17 de julho de 1963, na qual se determinou:
«Artigo p3 — O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística realizará censo periódico dos servidores públicos da União, das Autarquias e entidades paraestatais.
«Parágrafo único — Publicado o
resultado do censo, com os elementos precisos de identificação, tempo de serviço, cargo ou função do
servidor, vencimentos e vantagens
ou proventos percebidos, o servidor que acumular cargos, funções
ou proventos com violação dos preceitos legais terá o prazo de 30 dias
para manifestar opção por um deles,sob pena de instauração de processo administrativo pelo Departamento Administrativo do Serviço
Público».
Afirma-se que, em caso absolutamente idêntico, o Supremo Tribunal,
VOTO
por sua antiga Terceira Turma, tade ilegal demissão de funcionáO Sr. Ministro Leitão de Abreu chou
rio, por lhe não haver sido assegura(Relator): Deixando de lado a ordem do
o direito de opção, previsto na Lei
pela qual são articulados os funda- 4.242/63.
Transcreve-se, para commentos em que o impetrante apóia a
da assertiva, parte conclusua pretensão, começo pelo exame provação
siva do voto do relator, assim concedaquele em que se sustenta ter sido bida:
ferido dispositivo legal, que asseguraria ao servidor que acumular car«O artigo 53, parágrafo único, da
gos, funções ou proventos, com vioLei n? 4.242, de 17.07.63, silencia solação dos preceitos legais, o prazo de
bre a prova da boa fé, exigida no
trinta dias para manifestar opção
artigo 193 da Lel n? 1.711, para a
por um deles, sob pena de instauraopção por um dos cargos. Prevê
ção de processo administrativo. Enaquele dispositivo outro meio de
frento, desde logo, essa argüição,
verificação da acumulação proibiporquanto, se procedente, seria ela
da e assegura o direito de opção,
bastante para a concessão do manantes da instauração do processo
dado, independente do exame das
administrativo, sem fazer distinoutras alegações, formuladas pelo
ção entre as hipóteses de boa ou
requerente.
má fé do funcionário. Na espécie,
não foi assegurado ao impetrante o
Assevera-se, a tal propósito, que a
direito de opção.
regra estatutária, onde se preceitua
que, provada, em processo, a má fé,
«Dou provimento ao recurso, pao funcionário, que incorrer em acura restabelecer, na conclusão, a
mulação proibida, perderá ambos os
sentença de primeira instância.»
ao
— 100
Esse voto é extremamente sintéti- em prol da tese que defende, entenco, de modo que precisa ser inter- deu, na verdade, que a regra do artipretado em face do relatório. Neste, go 193 da Lei 1.711, quanto à prova
entretanto, não se diz, explicitamen- da boa fé no tocante à acumulação
te, se a acumulação foi acusada pelo de cargos, fora modificada pelo articenso, a que se refere a Lei 4.242, go 53 da Lei n? 4.242, o qual assegura
nem se a instauração do processo ao servidor, que acumular cargos inadministrativo se deu sem que hou- devidamente, o prazo de trinta dias
vesse corrido o prazo de 30 dias, den- para optar por um deles.
tro no qual se deveria manifestar a
Apesar da reverência de que é creopção por um dos cargos. Está dito,
contudo, no citado relatório, que o dor, por todos os títulos, o precedenimpetrante fora nomeado para o car- te a que se arrima o impetrante, não
go, que configuraria a acumulação me parece que a Lei n? 4.242 haja esproibida, em 24.03.60, antes, portan- tabelecido, acerca da acumulação de
to, da Lei 4.242, que é de 17 de julho cargos, regra geral, aplicável a tode 1963. Ora, não Havia, ainda, decorri- dos os casos em que se verifique o
do o prazo de 30 dias, assinado por exercício indevido de cargos públiesse diploma legal para a opção, cos. Como se depreende do que está
quando, em 3 de agosto seguinte se dito, não implícita, mas explicitarepresentava contra ele perante a mente no artigo 53 desse ato legislaAdministração Central, para que au- tivo, o direito nele assegurado diz
torizasse o processo administrativo. respeito à acumulação de cargos reEste foi determinado mediante Por- velada pelo censo periódico, cuja
taria de 31.12.63. De resto nem pode- realização se determinou. Aliás nem
ria tratar-se, nessa hipótese, de caso mesmo se afirma, nos autos, ter esse
a saber, o concernente ao
de incidência do artigo 53, parágrafo trabalho,
único, como resultado de ofensa ao censo, sido efetuado, ou, se o foi, esdireito de opção, ai previsto, uma tar ele sendo levado a efeito, periodivez que a Lei n? 4.242, que é de 17 de camente, como prescreve a lei. De
julho de 1963, cuida, no artigo 53, de qualquer maneira, realizado ou não
censo periódico, que manda realizar', o censo periódico dos servidores púdos servidores públicos da União, blicos, o certo é que a regra da opdas autarquias e entidades paraesta- ção, nos termos constantes do artigo
tais De todo improvável é que o pri- 53, parágrafo único, da Lei 4.242, vameiro censo, que se determinou fos- lia e valerá unicamente no tocante
se periódico, se tenha realizado com aos achados em acumulação pelo
rapidez tal que haja antecedido, seja censo. Quanto aos demais casos, em
a representação da autoridade admi- que for surpreendida, pela adminisnistrativa, a quem estava subordina- tração, acumulação indevida de cardo o funcionário em causa, seja o ato gos públicos, aplicável é o artigo 193
da Administração Central que man- e seu parágrafo único, do Estatuto
dou instaurar o inquérito, uma vez dos Funcionários Públicos da União,
que o primeiro desses atos, como já preceito em que não se garante ao
se observou, é de 3 de agosto de 1963, actunulante, submetido a processo, o
cerca de uma quinzena após a expe- prazo de trinta dias para optar por
dição da Lei n? 4.242, e o segundo é um dos cargos acumulados. Desacode 31.12.63, isto é, somente alguns lho, diante disso, o argumento, suscimeses após a edição do mesmo di- tado pelo impetrante, de que, por
não se lhe dar oportunidade para opploma legislativo.
tar por um dos cargos, ilegítimo é o
Parece exato, assim que o acór- ato que o demitiu do serviço público
dão, invocado pelo ora impetrante federal.
R.T.J. 100
Queixa-se o impetrante, também,
de que lhe foi negada, injustamente,
a exoneração que pediu. Regular,
isento de vicio, fora, no seu entender, o pedido que fizera; não obstante, a pretexto de que o requerimento,
que apresentara, denotava defeito, a
administração lhe negou o desligamento do cargo que ocupava,
ferindo-lhe, com isso, direito irrecusável.
O impetrante que, desde junho de
1974, era funcionário em remanejamento, pois, não tendo sido integrado no quadro da Empresa Brasileira
de Correios e Telégrafos, a que pertencia, fora posto à disposição do
DASP para futuro aproveitamento,
foi admitido, em 23 de fevereiro 1976,
como se viu do relatório, como empregado da Aço Minas Gerais S.A.
(Açominas),com sede em Belo Horizonte. Corridos sete meses, ou seja,
a 23 de setembro do mesmo ano, entrou com pedido de exoneração do
cargo de cujo exercício estava afastado, cargo que se achava lotado no
Estado do Ceará
Nessa petição, protocolada a 27 de
setembro, solicitou o requerente, que
era Oficial de Administração, fosse a
exoneração, que pleiteava, concedida a partir de 1? de janeiro de 1977,
isto é, cerca de três meses após,
dispensado-se-lhe a permanência em
exercício dos 40 dias da lei. O pedido
de exoneração, no entanto, foi indeferido, em 15.10.76, sob o fundamento
de que era fora de propósito solicitar
dispensa dos 40 dias e pedir exoneração a partir de data indicada no requerimento.
Posto não seja usual pedir exoneração e fixar a data em que esta, no
futuro, deva vigorar, não incorre esse pedido em ilegalidade. O funcionário, não estando sujeito a processo
administrativo, tem direito a exoneração, se o pedir (Lei 1.711, artigo
75, I). Nem poderia deixar de ser as-
81
sim, uma vez que o serviço público
profissional não é prestado de modo
compulsório. Em face disso, pode a
administração, quando muito, estabelecer, para assegurar a continuidade do serviço, prazo razoável de
permanência do funcionário no
exercido do cargo, a pós o Pedido de
exoneração. Foi isso que se fez,
aliás, com a regulamentação da exoneração a pedido pelo. Decreto n?
45.807, de 15.04.59. no qual se estatui:
«Artigo 1? — O pedido de exoneração
do funcionário, previsto no artigo 75,
item I, da Lei 1.711, de 28 de outubro
de 1952, deverá ser dirigido ao Presidente da República e apresentado ao
chefe imediato do requerente, com
firma reconhecida.» «Artigo 2? —
Após a apresentação do pedido a que
se refere o artigo 1", ,o funcionário
deverá conservar-se em exercício
durante quarenta dias.» «Artigo 3? —
A permanência em exercício, durante quarenta dias, a que se refere o
artigo 2?, poderá ser dispensada, se
não houver prejuízo para o serviço
público, a critério do chefe da repartição ou serviço, em que estiver lotado o funcionário.»
Como ao funcionário assiste o direito de desligar-se do serviço público, mediante pedido de exoneração,
quando o entender, nada impede, em
princípio, que, apresentando o requerimento pelo qual pleiteia a desvinculação do cargo, estipule a data a
partir da qual queira que o pedido
vigore. Não incorreu o impetrante,
por conseguinte, em ilegalidade,
quando, ao produzir o seu pedido de
exoneração, requereu que este produzisse efeito a partir de 1? de janeiro de 1977, cerca de três meses depois de protocolado o requerimento.
Não havia motivo juridico, destarte,
para que, por essa razão, se trancasse o encaminhamento do pedido de
exoneração ao Presidente da República. Pareceu, contudo, por outro
lado, ao autor do despacho indeferitório que era fora de propósito, tam-
82
R.T.J. - 100
bém, o pedido de dispensa dos quarenta dias. Porém, ainda aqui, não
se fez justiça ao impetrante, porquanto o prazo de quarenta dias de
permanência no cargo se exige para
que a administração, perante o pedido de exoneração do funcionário,
possa prover no sentido de que o serviço desempenhado pelo requerente
não sofra interrupção. Ora, no caso
vertente, tendo o impetrante solicitado que o pedido de exoneração somente vigorasse cerca de três meses
depois de protocolado, notificada estava a administração, com antecedência maior de quarenta dias, que
não mais poderia, a partir de 1? de
janeiro de 1977, contar com o serviço
do requerente. Quando isso não bastasse, cumpriria, ainda, ter em conta que o requerente não se achava
no exercido de suas funções, uma
vez que delas estava afastado havia
cerca de dois anos, por haver passado ao que, na gíria administrativa,
se chama funcionário em remanejamento.
Contraditoriamente, porém, tirando conseqüências práticas do pedido
de exoneração, a autoridade administrativa, suspendeu, a partir de 1?
de janeiro de 1977, data a contar da
qual o requerente pediu vigorasse o
seu requerimento de exoneração, o
pagamento dos vencimentos concernentes ao cargo que ocupava. Segundo documento transcrito, pelo impetrante, a fls. 3, documento cujos termos não são contestados, antes, de
certa forma, corroborados, a administração comunicou, em fins de
maio de 1977, que o pagamento fora
suspenso desde janeiro em virtude
do pedido feito em outubro de 1976,
pedido que não pôde vir a ser encaminhado em face da anterioridade
com que a exoneração fora requerida. Logo, não obstante se afirmar
que o pedido de exoneração não havia sido encaminhado em face da anterioridade com que se formulava o
pedido, afirmava-se que, por força
dessa petição, se havia suspenso o
pagamento da retribuição pecuniária
ligada à titularidade do cargo.
A fls. 39, consta informação, datada de 17 de fevereiro de 1978, onde se
diz que o DR do Ceará fizera expediente ao interessado aconselhando-o
a pedir exoneração, caso tivesse assumido novo emprego. Não se esclarece, contudo, o momento em que a
sugestão, em tal sentido, se efetuou.
Mas o certo é que o impetrante reiterou o pedido em requerimento ao
qual anexa declaração da Açominas,
onde se diz ser ele empregado dessa
entidade, desde 23.2.76, na qual exercia a função de Chefe do Gabinete da
Presidência (fls. 31). Meses mais
tarde, isto é, a 4 de outubro de 1977,
a Diretoria Regional do Ceará informava ao requerente, em resposta à
carta que este lhe enviara, que o seu
pedido de exoneração (agora já o segundo pedido), não tivera encaminhamento, em virtude de haver sido
instaurado inquérito administrativo
para apurar acumulação de cargos
em que possivelmente incorrera, como funcionário de Sociedade de Economia Mista (fls. 32).
A recusa de encaminhamento do
segundo pedido de exoneração se
apóia, no entanto, em fato diferentes, consistente, como se viu, na
possível acumulação do cargo de
Oficial de Administração com emprego em Sociedade de Economia
Mista. Essa sociedade, Açominas
S.A., todavia, então já não era estadual, uma vez que passara para a
Órbita federal, em virtude da obtenção do seu controle acionário pela Siderbrás, da qual se tornara subsidiária. Em faceS dessa transposição da
Açominas S.A. de uma para outra
pessoa política, sem a existência de
lei, que houvesse atribuído, diretamente, a essa entidade, no âmbito
da União, o status de sociedade de
economia mista, entende o impetrante que tal condição não lhe é reco-
R.T.J. — 100
nhecivel, não havendo falar-se, destarte, em acumulação de cargos públicos, quando um deles como tal
não se pode considerar.
Encontra-se nos autos brilhante
parecer oferecido, quando Consultor
Geral da República, pelo hoje Ministro Rafael Mayer, onde Sua Excelência examina, com agudeza e profundidade, inclusive perante a nova Lei
das Sociedades Anônimas, a condição jurídica das sociedades de economia mista, para distingui-las em
sociedade de economia mista de primeiro grau (matriz) e sociedade de
economia mista de segundo grau
(subsidiária). Da ementa desse parecer o nobre Subprocurador da República, que oficiou no presente caso, Dr. Mauro Leite Soares, cita a
seguinte passagem: «O conceito de
sociedade de economia mista, como
integrante da Administração Indireta, supõe, sob o aspecto formal, a
concorrência de dois requisitos essenciais, ou seja, a criação em virtude de lei autorizativa e a participação majoritária da entidade mater,
de modo permanente e indeclinável»
(fls. 100). No corpo do parecer frisava o então Consultor Geral da República: «... sociedade de economia
mista será não somente aquela criada pela União, em virtude de lei especial, com a detenção do controle
acionário; sê-lo-á, igualmente, a que
vier a ser instituída, por entidade da
Administração Indireta ( autarquia,
empresa pública ou sociedade de
economia mista), em face de autorização legislativa pertinente, que poderá constar da própria lei institucional e não, necessariamente, de lei
casuística, assegurado sempre o controle acionário por parte da entidade
instituidora. Logo, as sociedades filiais, satélites ou subsidiárias, criadas, em tais pressupostos, pelas sociedades de economia mista matrizes, são, iniludivelmente, sociedades
83
de economia mista, ditas de segundo
grau, material e formalmente integrantes da Administração Indireta».
Dito isto, anotava, em seguida, «Ainda em conseqüência da mesma conceituação, não obstante composto, o
respectivo capital, de recursos públicos e privados, não são, formalmente, sociedades de economia mista
aquelas em que ocorra participação
minoritária do capital público, salvo
se a lei, excepcionando, expressamente, ao arrepio dos princípios,
conceituá-las como de economia mista...» ( fls. 105).
Não se discute, no caso, que a
participação da Siderbrás na Açominas é majoritária, de sorte que a primeira, ao assumir o controle acionário da segunda, lhe teria comunicado
status, que formalmente possui,
de sociedade de economia mista.
Desta sorte, cumpriria concluir quê
impetrante, como empregado da
Açominas S.A., depois que a Siderbrás assumiu o controle acionário
desta, teria incorrido em acumulação proibida de cargos públicos. Sucede, no entanto, que esse não é o
ângulo sob o qual deve a questão ser
examinada. O que importa saber, na
hipótese, não é se a Açominas, como
subsidiária da Siderbrás, passou a
constituir sociedade de economia
mista, tornando aplicável aos titulares de seus cargos ou empregos a
proibição de acumular, mas se a
Açominas S.A., antes de passar ao
controle acionário da Siderbrás, detinha a condição de sociedade de economia mista. Importa que essa questão se coloque porque o impetrante
pediu exoneração do cargo, de que
era titular no serviço público federal
(cargo de Oficial de Administração)
antes da assunção, pela Siderbrás,
do controle acionário da Açominas.
O seu primeiro requerimento de exoneração como se verifica a fls. 28,
foi protocolado, como já foi dito, a 27
de setembro de 1976, ao passo que é
de outubro seguinte, a decisão da Dl-
84
— too
retorta da ~minas de transformar
os créditos da Siderbrás em capital
social, decisão pela qual esta entidade veio assumir o controle acionário
da Açominas (fls. 60/61). Em conseqüência dessa decisão, a Siderbrás,
como se verifica do documento de
fls. 63, é arrolada como detentora,
em 8 de novembro de 1976, de 58,83%
das ações da Açominas S.A.
Ostentaria, no entanto, a ~minas, quando sob o controle de capitais mineiros, a condição de sociedade de economia mista estadual? O
exame dos elementos constantes dos
autos induzem à conclusão de que o
Estado de Minas Gerais não teve o
intuito de atribuir-lhe esse caráter
pois, aliás, teria procedido como fez
em relação à Metamig, à qual conferiu, explicitamente, no ato constitutivo, a condição de sociedade de economia mista. Está dito, realmente,
na Lei n? 2.462, de 13 de outubro de
1961: «Artigo 1? — Fica o Governo
autorizado o organizar e incorporar,
no Estado, uma sociedade de economia mista, denominada «Metais de
Minas Gerais S.A. — Metamig» e
destinada à exploração, industrialização, transporte, exportação e qualquer outra forma de aproveitamento
econômico de minérios, e que se
regerá pela Lei das Sociedades Anônimas». Além disso, no artigo 4?, estabeleceu o mesmo diploma legal
que seria de 51% a participação do
Estado na formação do capital social, dispondo, ainda, no artigo 5?,
que as ações correspondentes a essa
participação mínima seriam inalienáveis.
Assim não se procedeu, no entanto, quando se cuidou da instituição
da Açominas, porquanto no artigo 1?
da Lei n? 2.865, de 12.09.63, que autoriza a constituição dessa entidade, se
prescreveu, simplesmente: «Fica o
Governo fio Estado autorizado a participar, majoritária ou minoritariamente, através da Metais de Minas
Gerais, S.A. — Metamig, da Constitui-
cão de uma sociedade que se denominará Açominas S.A., destinada a
industrializar os minérios da região
do Vale do Paraopeba».
Acareando-se uma lei com outra,
verifica-se que a primeira é categórica ao caracterizar a Metamig como sociedade de economia mista, indo ao ponto de prescrever a inalienabilidade das ações que asseguravam
ao Estado o controle acionário da entidade, enquanto a segunda, além de
não definir a sociedade como de economia mista admite que a participação do Estado seja najoritaria ou
minoritária, deixando claro, desse
modo, que não tinha por indispensável o controle acionário da entidade
criada, a qual poderia, assim, passar a outras mãos. Nada admira,
pois, que o Estado, durante determinado período, haja perdido a sua posição majoritária na aludida sociedade, como se colhe do quadro de
fls. 63, onde se acusa, em 31.12.73, a
detenção da maioria do capital por
entidades privadas.
Desse modo, se com base em outros critérios, seja possível sustentar
que a Açominas, desde a sua criação, exibia o perfil de sociedade de
economia mista, é inegável ser justificável manter-se dúvida razoável
quando à sua caracterização conto
tal, enquanto esteve sob o domfuno
de capitais do Estado de Minas Gerais. Afirma-se, certamente, que essa entidade, em 26 de setembro de
1977, se declarou sociedade de economia mista (fls. 35). Mas é preciso
ter em conta que essa declaração se
enunciou quando o seu controle acionário já estava em poder da &derbrás, da qual passara ser subsidiária
ou entidade satélite. Tudo isso explica, por outro lado, haver a administração da Açominas, enquanto subordinada ao Estado, dispensado ao
impetrante tratamento que era privativo dos trabalhadores em empresa privada.
R.T.J. — 100
Por tudo isso, não caberia alegar
— coisa que, no momento, aliás, não
se fez — para obstar o encaminhamento do primeiro pedido de exoneração, formulado pelo impetrante,
estar ele incurso em acumulação
proibida. Poderá dizer-se que, entre
o pedido de exoneração, 27 de setembro, e a data que o requerente indicou para a vigência da ruptura do
vinculo de emprego, 1? de janeiro, a
Açominas passou à condição de subsidiária da Siderbrás, adquirindo,
destarte, o status de sociedade de
economia mista. Nesse período, portanto, teria havido, de qualquer modo, acumulação proibida, capaz de
justificar a demissão, dada a má fé
com que teria procedido o impetrante.
Contra esse argumento milita, P o
-rém,epiolugad
formal, ou melhor, negociai, que
presidiu á aquisição, pela Siderbrás,
do controle acionário da Açominas.
Admitindo-se, para efeito de raciocínio, que essa entidade haja, por tal
caminho, sido atraída para a órbita
das sociedades de economia da
União, não se deu isso de maneira
solene, traduzida na declaração imediata e expressa de que adquirira,
na esfera federal, essa feição jurídica. Enfraquece, depois disso o vigor
do aludido argumento a circunstância
de que, em tais casos, a saber, no de
transformação de uma entidade privada em entidade pública, é natural
facultar-se prazo para que os servidores da entidade transformada, que
ocupem outro cargo público, manifestem opção por um dos cargos de
que sejam titulares.
Não havia razão Jurídica, por conseguinte, para que se negasse ao Impetrante o encaminhamento do seu
primeiro pedido de exoneração, já
porque, embora formulado de modo
não usual, comportava interpretação
que o tornava isento de qualquer
vicio, já porque não se alegou, para
85
isso, estar o requerente incurso em
acumulação proibida, já porque essa
alegação, se tivesse sido levantada,
não teria consistência, no que toca
ao período em que a Açominas permaneceu sob o controle acionário de
capitais do Estado, já, enfim, porque, no curto período que vai de 27
de setembro de 1° de janeiro, era
licito, pelo menos, manter dúvida
quanto à aquisição, pela Açominas,
da qualidade de sociedade de economia mista da União e, quando assim
não fosse, era mister que se tivesse
facultado, logo após o trânsito dessa
entidade da órbita estadual para a
federal, prazo para que os servidores, que ocupassem cargos na entidade encampada, realizassem opção, se ocupassem outro cargo público, insuscetível de acumulação.
Como o impetrante tinha direito,
pois, a que se lhe deferisse a exoneração solicitada, 'legitimo se fez o
ato de demissão que depois se lhe
impôs, a pretexto de má-fé relativamente à acumulação de que era acusado.
A invalldade da demissão não requer, porém, no caso, se anule o ato
demissório, porquanto, se este não
pode subsistir como tal, pode valer,
não obstante, como ato de exoneração. Viável se torna, assim, na espécie, converter, por interpretação, o
ato de ruptura do vínculo do emprego, mediante a imposição de pena
disciplinar, em ato de desfazimento
da relação de emprego, a pedido do
próprio funcionário.
A figura da conversão não encontra, por certo, fundamento explícito,
ao menos entre nós, no direito positivo, contrariamente ao que sucede no
tocante ao direito alemão, onde esse
instituto se acha consagrado dogmaticamente. Mas aí mesmo talvez isso
ocorra somente no campo do direito
privado, ou seja, no artigo 140 do
BGB, onde se estatui que, correspon-
as
R.T.J. — 100
dendo um ato jurídico nulo às exigências de outro ato Jurídico, valerá
este último, se admissivel ter este sido querido, caso houvesse conhecimento da nulidade (Entspricht emn
nichtiges Rechtsgeschilaft den Erfordernissen eines anderen Rechts- •
geschilafts, so gilt das letztere,
wenn anzunehmen ist, dass dessen Geltung bei Kenntnis der Nichtigkeit gewollt sem würde».
Apesar de editada essa regra
quanto ao direito privado, o certo é,
no pentanto, que a sua aplicação
transcendeu a órbita privatistica,
pois se tem entendido que nela se exprime um principio geral de direito,
qual o da conservação do próprio direito. É certo que, no direito administrativo germânico, se faz invocável, também para justificar a incidência desse postulado, a analogia
legis. Mas em outros países, em que
se não pode recorrer à analogia, por
não haver texto legal, que lhe sirva
de apoio, tem bastado, para firmar a
legitimidade da conversão, a própria
evidência da sua juridicidade. Não
se deixa embaraçar, assim, pela falta de lei, que autorize a conversão,
uma das vezes oraculares do direito
público peninsular, Sana Romano,
quando escreve: «Questa (la
conversione) si ha quando un atto
che è invalido come atto di un dato
tipo, puó considerarsi come atto di
un altro tipo, del quale continne tutti gli elementi necessari, formali e
sostanziali, come quando, p. es., una
concessione amministrativa relativa
a beni non demaniali pilei valere como locazione. La conversione puó essere stabllita dalla legge (ma di
questa sua specie non pare che si abbiano esempi nel diritto amminisCativo) o dalla volontà, expressa, o
meno, dell'autorità, con la quale
debe concorrere anche la volonta di
colui o di coloro ai quale l'atto si rivolge, se si tratta dl um atto per cul
questa é un presupposto indispensablle alia sua et:lenda» (Corso dl Dirit-
to Amministrativo, 2? ed., 1932, p.
285).
Mais fácil é operar-se, aliás, a conversão no direito público, e particularmente no direito administrativo,
do que no direito privado, uma vez
que aqui predomina a autonomia de
vontade, prevalecem geralmente os
móveis subjetivos das partes, a sua
utilidade particular, entretanto que
ali impera o interesse público, a cuja
promoção se subordina a vontade do
agente, vontade que, por estar vinculada a um fim, pode e deve ser interpretada em face de critérios objetivos. Além disso, como os atos administrativos gozam da presunção de
validade, impõe-se aplicar, em relação a eles, com mais rigor, a regra
hermenêutica, onde se diz que a rainha das interpretações é a que salva
o ato e não a que o nulifica.
No caso vertente, não é possível
salvar, simpliciter, o ato impugnado.
E viável, contudo, salvá-lo, em parte, mediante a sua conversão em outro, já que para isso concorrem todos os requisitos. Não pode haver
dúvida de que a autoridade, que praticou o ato de demissão, se houvesse
tido conhecimento da nulidade desse
ato, haveria concedido a exoneração
requerida pelo ora impetrante. Indubitável, também, que satisfeitas estão as demais exigências para a conversão, ou seja, a competência do
agente, a forma do ato, a sua causa,
a vontade daquele a quem diz respeito o ato resultante da conversão.
Nessas condições, concedo, em
parte, a segurança para converter o
ato de demissão, cuja nulidade se argúi, em ato de exoneração do impetrante, do cargo de Oficial de Administração a partir de 1? de janeiro de
1977, deixando de pronunciar-me
quanto à parte do pedido, que diz
respeito à sustação da rescisão do
contrato de trabalho entre o impetrante e a Açominas, uma vez que
esta não Integra a lide.
R.T.J. — 100
VOTO
O Sr.Ministro Cunha Peixoto: Sr.
Presidente, dentro da linha de raciocínio do eminente Relator, ponhome inteiramente de acordo com as
premissas do magnifico voto de S.
Ex? . Apenas discordo de S. Ext na
conclusão.
Concedo a segurança integral, para anular o ato de demissão.
VOTO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra:
Sr. Presidente, defiro a segurança,
para anular o ato, porque a Lei do
IBGE faculta o direito de opção a
quem for apanhado em fraude, acumulando.
Esse funcionário foi levado por
uma contingência. Depreende-se, facilmente, que o Departamento ia ser
extinto e ir-se-ia criar a Empresa de
Correios e Telégrafos. Ele ficou em
remanejamento e procurou fixar um
destino na vida. Logo que se fixou,
pediu exoneração, que lhe foi negada, por duas vezes embora a partir
da primeira vez lhe tenham retirado
os vencimentos.
Não creio que ele estivesse de má-i
fé. Mas, mesmo que estivesse, o IBGE é exatamente num órgão adequado a descobrir aqueles que fraudam a lei de acumulação. A lei, nesses casos de fraude manifesta, dá direito de opção ao funcionário. E ele
não teve esse direito.
Concedo a segurança, integraimente, de acordo com o eminente
Ministro Cunha Peixoto.
VOTO
O Sr. Ministro Xavier de
Albuquerque: Sr. Presidente, não tenho dúvida em acompanhar o eminente Relator, quanto à fundamentação que desfecha, em seu douto voto
na ilegitimidade do ato demissório.
87
Estou embaraçado, porém, para me
situar no dissenso que se instalou
com relação á sua conclusão.
Percebo que o eminente Relator,
além da excelente fundamentação
teórica que utilizou, funda-se na consideração pragmática de dar desfecho final ao problema, evitando que
aquele primitivo pedido de exoneração, de setembro de 1976, ainda vá
retomar, agora, o seu curso, depois
que houve até processo administrativo por acumulação.
O Sr. Ministro Leitão de Abreu
(Relator): Eminente Ministro, aqui
há uma consideração.
Se o Presidente da Repúlica houvesse indeferido o pedido de exoneração, não poderia fazer-se, no caso,
a • conversão, a que se refere o meu
voto. Sucede, porém, que o ato teve
o seu encaminhamento trancado, de
modo que sobre o pedido de exoneração não chegou a manifestar-se o
Chefe do Governo. 2 possível supor,
assim, que se tivesse este tomado,
no tempo próprio, conhecimento do
pedido de exoneração, deferiria a solicitação, porquanto o requerente
possuía direito ao que pedia.
possível supor, ainda, que, se ao lhe
ser submetido o ato de demissão,
houvesse sabido que esse ato não podia ser praticado, por ilegal, teria,
então, deferido o pedido de exoneração. Ora, cabe a conversão de um
ato jurídico nulo em outro ato
jurídico, quando se tenha como admissivel que este outro ato haveria
sido querido, se se houvesse conhecido a nulidade do primeiro. Por me
parecer admissivel, em primeiro lugar, que o Chefe do Governo, diante
do conhecimento da nulidade do ato
de demissão, teria querido o ato de
exoneração, tal qual lhe fora requerido. e por ser inegável, de outra
parte, que o funcionário, que sofreu a
denüssão, queria a exoneração, a
R.T.J. - 100
88
conversão da primeira na segunda
se acha, a meu ver, plenamente autorizada.
O Sr. Ministro Xavier de
Albuquerque: Talvez não seja muito
ortodoxa, ou, pelo menos, não sela
costumeira, a solução do deferimento parcial da segurança para operar
a conversão do ato impugnado. Mas
ela se ajusta, como a justifica o eminente Relator, às condições do caso
que Siamos examinando. E do ponto de vista da sua compatibilidade
com o direito público, parece-me indiscutível que o principio tem adequação. Creio que a pova mais evidente de que ele a tem, na área do
direito público, ainda que nascido
nos domínios do direito privado, é o
principio da fungibllidade dos recursos no direito processual, que constitui desdobramento do principio da
conversão do ato jurídico.
Acompanho o eminente Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Thompson Flores:
Senhor Presidente.
Também estou de acordo com o
eminente Relator, inclusive, no pertinente à forma pela qual defere o
pedido.
Dois aspetos impressionaram-me
desde a primeira hora. É que o requerente formulou dois pedidos de
exoneração. Um, ao tempo em que
era ainda servidor da Sociedade de
Economia Mista, forma atingida por
via transacional. O outro, posterior,
insistindo na primeira súplica, a
qual fora trancada e não chegara ao
seu destino concessionário.
Neise interim ocorreu sua demissão, a qual ensejou o mandamuns.
Em tais termos, quando ocorresse
a acumulação proibida, ainda assim,
não poderia o pedido de exoneração
ser interceptado.
A rigor, ortodoxamente, o mandado caberia ser concedido, para anular o ato impugnado, de exoneraçRo,
e determinar o destrancamento do
pedido de exoneração.
Propõe, todavia, o eminente Relator, a conversão da demissão em
exoneração. Ou seja, pragmaticamente, por mais breve caminho atingir o mesmo resultado.
Desvinculado já o requerente da
Administração, converte apenas o
modus.
A tal resultado chegou S. Exa. o
eminente Relator, invocando o direito estrangeiro, vezes várias, fruto de
inspiração de nossas decisões.
Posto que ousada a tese, mas criadora do direito, alimenta-se, todavia,
em fontes salutares. E o papel construtivo que predominantemente
exerce o S.T.F., como o tem feito,
especialmente, a Suprema Corte
Americana.
Folheava os autos para ver os termos do pedido formulado pelo peticionário.
Leio a fls. 24. Diz:
«Com fundamento no que ficou
exposto, o Impetrante vem pedir
se digne esse Egrégio Tribunal
conceder-lhe a segurança para
o fim de declarar nulo e de nenhum efeito o ato de sua demissão,
dada a sua flagrante ilegalidade,
com a conseqüente sustação de todo e qualquer ato dele decorrente,
direta ou indiretamente, notadamente a rescisão do contrato de
trabalho celebrado entre a Açorninas e o Impetrante e a restituição
das importâncias por ele recebidas
na vigência do mesmo contrato.»
Creio que a conversão não é extra
ou ultra pedia. Antes nela se contém, posto que de forma mais pragmática, fugindo à ortodoxia.
R.T.J. — 100
Nestes termos, também defiro o
pedido.
como voto.
VOTO
Sr. Ministro Djaci Falcão: Sr.
Presidente, nada tenho a acrescentar às brilhantes considerações aduzidas pelo eminente Relator. Todavia, tratando-se, como se trata, de
mandado de segurança, com pedido,
determinado e não alternativo, divirjo, na conclusão, de S. Exa.
Afigura-se-me inviável a operação
adotada no voto do eminente relator.
Prefiro acompanhar o entendimento esposado pelos eminentes Ministros Cunha Peixoto e Cordeiro Guerra, concedendo a segurança, dada a
ilegalidade do ato demissório. Concedo o writ integralmente.
E o meu voto.
RETIFICAÇÃO DE VOTO
Sr. Ministro Soares Muãoz: Sr.
Presidente, peço a palavra.
Estou deveras impressionado, Sr.
Presidente com o brilhante voto que
acaba de proferir o eminente Ministro Leitão de Abreu e um tanto perplexo com a sua conclusão.
Parece-me que a conversão proposta por S. Exa., do ato administrativo demissionário em exoneração,
poderá surpreender o impetrante,
que, nesta altura, já não terá mais
interesse talvez, em reiterar o pedi-1
do de exoneração que fez há muito
tempo, e que foi indeferido. As considerações que acabam de ser feitas
pelo eminente Relator demonstram
que não havia acumulação , proibida
em relação àquela sociedade, que
não era sociedade de economia mista, e o cargo público que o Impetrante desempenhava.
A pretensão exonerativa não está
no pedido e, em se tratando de man-
89
dado de segurança, parece-me que
ela não poderá ser feita, por isso resolvi retificar o meu voto, para
acompanhar os pronunciamentos dos
eminentes Ministros Cunha Peixoto,
Cordeiro Guerra, e Djaci Falcão.
Concedo, pura e simplesmente, o
mandado de segurança, para anular
o ato demissário tal como foi pedido,
em face de sua nulidade.
RETIFICAÇÃO DE VOTO
O Sr. Ministro Xavier de
Albuquerque: Sr. Presidente, o debate deixa-me intranqüilo, porque o fato de eu acompanhar o eminente Relator não significa — como não me
parece que importe nisso o voto de
S. Exa. — que eu dê ao impetrante
menor sorna de razão do que ele possU ter. Todavia, se o meu voto,
acompanhando o eminente Ministro
Relator, pode ser tomado como restritivo do direito do impetrante, não
desejarei mantê-lo.
A minha intranqüilidade leva-me a
buscar outro caminho, com a devida
vênia do eminente Relator. Considero que o decreto do Presidente da
República, que demitiu o impetrante
com a nota infamante da má-fé, é
ilegal e não pode subsistir. Estaria
de acordo, pela consideração pragmática de dar solução definitiva à
quizila, em acompanhar, como comecei por fazê-lo, o eminente Relator, para dar a esse decreto o conteúdo de ato de exoneração desde
1/1/77. Mas isso me aflige, porque
pode ser menos do que o impetrante
pede; e não tenho razão para lhe reduzir o deferimento do mandado de
segurança. Prefiro, pedindo licença
ao eminente Relator, reconsiderar,
também, o meu voto.
Concedo a segurança, pura e simplesmente, para anular o decreto impugnado.
90
R.T.J. — 100
Maria de Oliveira Paredes e pelo
Reqdo. o Procurador-Geral da República Dr. Firmino Ferreira Paz.
Presidência do Senhor Ministro
Antonio Neder. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Djaci Falcão,
Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Leitão de Abreu, Cordeiro
Decisão: Concedeu-se a segurança Guerra, Moreira Alves, Cunha Peinos termos do pedido, vencidos, xoto, Soares Mufloz, Dedo Miranda
quanto a extensão do deferimento os e Rafael Mayer. Procurador-Geral
Ministros Relator, Rafael Mayer, da República, substituto, o Dr. Gildo
Dedo Miranda e Thompson Flores. Correa Ferraz.
Impedido o Sr. Min. Moreira Alves.
Brasília, 19 de Setembro de 1979 —
Falaram.: Pelo Reqte. a Dra. Santa Alberto Veronese Aguiar, Secretário.
EXTRATO DA ATA
MS. 20.201 — DF — Rel.:Min. Leitão de Abreu. Reqte.: Silvio Meyer
Fontenelle. ( Advs.: Roberta Maria
Caruso, Paulo Seabra de Noronha e
outros). Reqdo.: Senhor Presidente
da República.
MANDADO DE SEGURANÇA N?
(Tribunal Pleno)
20.298
— DF
Relator: O Sr. Ministro Firmino Paz.
Impetrante: Leopoldo Konte — Autoridade coatora. Mesa do Senado Federal.
— E jurisprudência tranqüila do Supremo Tribunal Federal (Súmula 270) que não cabe ação de mandado de segurança; para se discutir matéria relativa a enquadramento de funcionário público, face
ao Plano de Classificação de Cargos, se há envolvimento de exame de
provas ou de situação funcional complexa.
— Ação de mandado de segurança não conhecida.
ACOFtDA0
Vistos e relatados estes autos de
Mandado de Segurança n? 20.298-0,
do Distrito Federal, em que é impetrante Leopoldo Konte e autoridade
coatora a Mesa do Senado Federal,
decide o Supremo Tribunal Federal,
em sessão plena, por maioria de votos, não conhecer do pedido, de acordo com as notas juntas.
Brasília, 12 de novembro de 1981 —
Xavier de Albuquerque, Presidente
— Firmino Paz, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Firmino Paz (Relator): Leopoldo Konte propôs a pre-
sente ação de pedir mandado de segurança à Mesa do Senado Federal,
ao fundamento, no essencial de que
lhe fora negado o «direito líquido e
certo ao enquadramento como Técnico em Comunicação Social» (grifos
do original).
2 — Alegou o autor desta ação de
segurança, ao longo da inicial, serlhe legitima a postulação de
enquadramento no cargo de Técnico
em Comunicação Social, que lhe proclamou o douto Consultor Geral do
Senado Federal (fl. 2). Fora habilitado em provas de desempenho profissional de Técnico em Comunicação
Social (fl. 7). Demais disso, na prova
de classificação, diz ele, fora o se-
R.T.J. — 100
gundo na ordem classificativa (fl.
10). Outros, porém, lhe passaram à
frente ( fl. 14).
Ai, em resumo, e no essencial, o
que se contém na petição inicial.
3 — Informações, prestou-as o
eminente Senador Jarbas Passarinho, Presidente do Senado Federal, ao encaminhar ao eminente
Ministro Xavier de Albuquerque,
honrado Presidente desta Suprema
Corte, informações prestadas pelo
douto Consultor Geral do Senado Federal, de que destaco as seguintes
passagens, verbis:
«Vindo, então, ao nosso exame,
emitimos, sobre o pedido, o Parecer 90/77 ( doc. n? 2). Dissemos, em
suma, o seguinte:
que o ponto nuclear da questão estava em esclarecer se a prova de desempenho funcional, prestada pelo Requerente, a fim de
habilitar-se ao enquadramento na
Categoria de Técnico em Comunicação Social, teria sua validade limitada no tempo ou não;
que, se a validade daquela
prova persistisse, então a sua habilitação ao que pleiteia não poderia
ser contestada;
que, dentro do critério fixado
pela Comissão Diretora, à proporção que houvesse vaga, poderia ser
chamado, para ocupá-la, pela ordem, o servidor habilitado de mais
tempo no Senado;
que o fato de o Requerente haver prestado, no Senado, outro exame interno, e aprovado, ter sido
enquadrado como Assistente Legislativo, não significava anulação da
prova de desempenho a que fora
anteriormente sujeito e em que logrou, também, aprovação, nem
tampouco, em renúncia à expectativa de seu aproveitamento como
Técnico em Comunicação Social;
91
e) sujeitando-se à seleção e enquadramento para Assistente Legislativo, isso queria dizer, somente, que, embora nessa nova posição
nela ficaria apenas aguardando a
oportunidade de ser posicionado na
Categoria de Técnico em Comunicação Social, para a qual fora legalmente habilitado;
f ) que o prazo de validade da
prova de desempenho funcional
(concurso interno), era de quatro
anos, de acordo com o disposto na
Emenda Constitucional n? 8, de 14
de abril de 1977, estando o recurso
do Suplicante dentro do prazo;
que, já tendo sido habilitado,
em prova de desempenho, para
Técnico em Comunicação Social,
não caberia ao Peticionário fazê-lo
novamente perante a Corege, pois
a primeira prova de seleção não
fora anulada, nem poderia a
Corege invalidá-la, pois só a Comissão Diretora teria competência para tanto;
que a tarefa da Corege não co- lidiu com a da Comissão instituída
pelo Ato n? 26/1974, da Presidência
do Senado;
que, se o Requerente já estava
habilitado, inclusive por ter sido
aprovado na prova de desempenho
funcional, porque e para submetêlo a outra prova de seleção; e
que, dentro das normas legais
aplicáveis à espécie, era legitima a
postulação de Leopoldo Konte, de
ser aproveitado como Técnico em
Comunicação Social.
Foi pedido, pelo Diretor Geral, o
exame da matéria também pelo
Conselho de Administração, mas
não consta, do processo, o pronunciamento desse órgão, presumindose não tinha ele falado a respeito.
92
R.T.J. — 100
judicial e mandamental a «direito
liquido e certo ao enquadramento como Técnico em Comunicação Social»
do quadro de funcionários do Senado
Federal. Enquadramento funcional
previsto na Lei n? 5.645, de 10 de dezembro de 1970, em que se estabelecem diretrizes para a classificação
de cargos do serviço civil da União e
autarquias federais.
2 — Há decidido, iterativamente,
este Colendo Supremo Tribunal
Federal, o que se lê da Súmula, n?
270, verbis:
«Não cabe mandado de segurança para impugnar enquadramento
da Lei n? 3.780, de 12-7-60, que envolva exame de prova ou de situação funcional complexa.»
Na Lei n? 3.780, de 1960, a que se
alude na Súmula, •n? n 270, o
enquadramento funcional ré previsto
nos artigos 19 e seguintes.
Ao advento da Lel n? 5.645, de 10
de dezembro de 1970, criou-se novo
Plano de Classificação, extinto, às
expressas (artigo 14), o Plano de
Classificação de Cargos, regulado,
anteriormente, na Lei n? 3.780, de
1960.
3 — Seguindo a orientação jurídica
da Súmula 270, após o advento da
Lei n? 5.645, de 1970, decidiu-se no
Supremo Tribunal Federal, sendo
Relator o eminente Ministro Xavier
de Albuquerque, verbis:
«Não cabe mandado de segurança para impugnar atos individuais
de implantação, mediante transposição ou transformação de cargos,
do novo Plano de Classificação de
Cargos (Lei 5.645, de 10-12-70),
quando envolva exame de prova ou
de situação funcional complexa.
Mandado de segurança não conhecido» (Rev. Trim. de Jurisp. do
VOTO
STF, 77/399).
No mesmíssimo sentido, há outros
O Sr. Ministro Firmino Paz (Relator): Leopoldo Konte, o autor desta pronunciamentos desta Suprema
ação de segurança, pleiteou proteção Corte, a exemplo, proferido no Man-
Finalmente, indo, com outros
processos, à Comissão Diretora,
esta, pelo Parecer n? /81 (doc. n?
3), sob o fundamento de que
«tais pedidos, contudo, contrariam frontalmente as normas
que regem a aplicação, nesta Casa, dos Institutos da Progressão
e Ascenção Funcionais», e
«que o exame de cada um desses pedidos por parte da Comissão Diretora, em separado, é desaconselhado, pois além de desprovidos de amparo legal, o atendimento de qualquer um desses,
converter-se-ia em gritante injustiça para com os demais servidores da Casa», decidiu arquivar o
pedido.
São estas Senhor Presidente, as
Informações que, dentro dos elementos disponíveis, julgamos por
bem prestar a Vossa Excelência,
para efeito de se instruir o Mandado de Segurança n? 20.298-0, conforme solicitação do Excelentíssimo Senhor Presidente do Supremo
Tribunal Federal» (fls. 164/166).
Consta das informações, ao cabo
de contas, que o deferimento do pleiteado pelo autor desta ação de segurança, sobre desprovido de «amparo
legal,» «converter-se-ia em gritante
injustiça para com os demais servidores da Casa», donde o arquivamento do pedido.
4 — Ouvida, a douta Procuradoria-Geral da República se manifestou
pela improcedência da ação de segurança, especialmente, à consideração do previsto na Súmula n? 270,
deste Colendo Supremo Tribunal
Federal (fls. 185/187).
E o relatório.
R.T.J. — 100
dado de Segurança n? 20.063, do Distrito Federal, de que fora Relator o
eminente Ministro Antonio Neder
(Rev. Trim. de Jurisp., 78/89).
4 — No caso dos autos, que se lê
na petição inicial, pretende o autor
da impetração que, por via de mandado de segurança, se lhe «reconheça de imediato, o direito à designação» ao enquadramento seu na categoria funcional de Técnico em Comunicação Social.
5 — Q autor, em suma, impugna o
enquadramento funcional de outros
funcionários. Julga ter sido bem
classificado em concurso. Reclama
de critério de enquadramento funcional adotado pelo Senado Federal
Discute, em suma, matéria de facto,
para concluir por violação de direito
subjectivo certo e liquido.
6 — Diante do exposto, não conheço da ação de segurança.
E o meu voto.
93
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Néri da, Silveira:
Leopoldo Konte submeteu-se a prova
de desempenho funcional, realizada
em 19-9-1974, para enquadramento
na Categoria Funcional de Técnico
em Comunicação Social, do Grupo
Outras Atividades de Nível Superior,
do Quadro Permanente do Senado
Federal, de conformidade com a Resolução n? 45, de 1973, da referida
Casa Legislativa, editada com vistas
à implantação da Lei n? 5.645, de 1012-1970, dispondo o art. 5? da Resolução, verbis:
«Art. 5?. Os cargos ocupados serão transformados ou transpostos
mediante inclusão dos respectivos
ocupantes nas correspondentes Categorias Funcionais, do maior para
o menor nível, nos limites da lotação estabelecido para cada área de
especialidade por ordem rigorosa
de classificação dos habilitados no
processo seletivo a que se refere o
EXTRATO DA ATA
art. 7? desta Resolução.»
Alega o impetrante que, não obsMS-20.298 — DF — Rel.: Min. Firmino Paz. Impte.: Leopoldo Konte. tante obter o 2t lugar no processo se(Advs.: Alberto Francisco Torres e letivo para inclusão na Categoria
outro). Autoridade Coatora.: Mesa Funcional de Técnico em Comunicação Social, velo a ser preterido por
do Senado Federal
servidores, para uma das
Decisão: Pediu vista o Ministro outros
trinta
e
vagas que constiNéri da Silveira, após o voto do Re- tuíram a cinco
lotação
ideal da mencionalator, não conhecendo do pedido. Fa- da Categoria Funcional,
lou pelo Impte. o Dr. Alberto Fran- cinqüenta e dois candidatoshavendo
aprovacisco Torres.
dos na seleção.
Presidência do Senhor Ministro
Consoante esclarece o requerente,
Xavier de Albuquerque. Presentes
sessão os Senhores Ministros Djaci na inicial, foi admitido, no Senado
Falcão, Cordeiro Guerra, Moreira Federal, como Redator, CLT, em 13Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufloz, 8-1974 (fls. 15), o que está conformaDecio Miranda, Rafael Mayer, Cló- do às fls. 77.
vis Ramalhete, Firmino Paz e Néri
Relativamente à alegado preterida Silveira. Procurador-Geral da Re- ção, fato que me fez ter dúvida a
pública, Dr. Inocêncio Mártires Coe- propósito da impetração e do voto inlho.
deferitório do eminente Relator é de
Brasília, 11 de novembro de 1981 — registrar que nenhuma prova enconJonas Célio Monteiro Coelho, Secre- trei no exame dos autos, abonatória
da assertiva vestibular. O que se
tário.
94
R.T.J. — 100
afirma nos autos, nos diversos pronunciamentos da Secretaria do Senado Federal, é ter sido adotada como
critério seletivo a antiguidade dos
concorrentes, o que vedado não se
fazia, segundo a sistemática do Plano de Classificação de Cargos. Nesse
sentido, de resto, o parecer do Dr.
Consultor-Geral do Senado Federal
invocado pelo impetrante, conclui,
verbis ((is. 120):
«Não se cuida, é bom salientar,
de um direito a que a Comissão Diretora tenha de curvar-se. Mesmo
se se tratasse de concurso público,
o Senado não estaria obrigado a
nomear o servidor para o cargo
pretendido. O que a Alta Direção
da Casa não poderia fazer seria enquadrar como Técnico em Comunicação Social outro servidor, que tivesse feito a mesma prova do Requerente, desde que esse fosse
mais antigo da Casa.»
Foi admitido, nos autos, que o impetrante poderia ser atendido em
sua súplica, se assim houvesse por
bem a Comissão Diretora, desde que
existisse vaga, uma vez respeitados
os critérios fixados no Ato n? 26/74
((is. 120). Não se trata, portanto, de
direito líquido e certo a ser garantido, na via eleita.
Ademais disso, não encontrei prova de o requerente, de fato, mesmo
na prova de habilitação, haver excedido aos demais enquadrados com
prioridade.
Superado, assim, este aspecto fundamental do pedido, penso que a situação real do peticionário no Quadro Permanente do Senado Federal
está corretamente descrita, na Informação de fls. 132, verbis:
«Dos assentamentos funcionais
do requerente consta que sua admissão nesta Casa se deu no dia 13
de agosto de 1974, para exercer o
emprego de Redator, sujeito, as-
sim, ao regime jurídico da Consolidação das Leis do Trabalho, conforme autorização da Presidência
do Senado Federal Em 1? da junho
de 1976, com a aprovação do Quadro de Pessoal CLT desta Casa, verificada com a publicação do Ato
n? 8, de 1976, da Comissão Diretora, no DCN II de 1? de julho de
1976, teve o seu emprego de Redator incluído no Plano de Classificação de Cargos instituído pela Lei
n? 5.645, de 1970, na Categoria
Funcional de Assistente Legislativo, Classe «A». Por último, de conformidade com o Ato n? 33, de 1976,
da Comissão Diretora, publicado
no DCN II de 06 de dezembro de
1976, teve o seu emprego transformado em cargo do Quadro Permanente, na mesma Classe e Categoria Funcional que já pertencia.»
Dessa maneira, havendo o emprego de Redator do impetrante sido
transformado em emprego e, depois,
em cargo do Quadro Permanente,
sua movimentação, de uma Categoria a outra, ou de um grupo a outro,
dependerá do atendimento às regras
do concurso público ou da ascensão
ou progressão funcionais. Essa será
a solução possível, segundo o sistema em vigor, aplicável no Senado
Federal, com base nas Diretrizes da
Lei n? 5.645, de 1970.
Verifica-se, de outra parte, que,
não havendo sido de caráter classificatório a prova de desempenho funcional, mas apenas de verificação de
requisitos básicos para o exercício
do cargo de Técnico em Comunicação Social, ou de habilitação às funções, a 1! Secretaria da Mesa Diretora, tendo em conta que 52 eram os
candidatos habilitados e apenas 35
as vagas, segundo a lotação ideal estabelecida previamente, conforme o
art. 6?, I, da Lei n? 5.645/1970, decidiu fixar, como critério de classificação, a data de admissão dos contratados, no Senado Federal. Assim, te-
R.T.J. — 100
95
riam preferência para o enquadraVOTO
mento aqueles que possuíssem o
Sr.
Ministro
Clovis Ramalhete:
maior tempo de serviço nessa Casa Senhor Presidente,
não acompanho
Legislativa. No particular, em reali- os votos dos eminentes Ministros Redade, nenhum dos enquadrados pos- lator e Néri da Silveira. Concedo a
suía menor antiguidade no Senado ordem.
Federal que o impetrante ( fls. 141).
Foi pela Mesa do Senado mandado
Penso que esse critério, se even- realizar um concurso arrematado
tualmente não seria de considerar-se por concurso de seleção. A Resoluo melhor, não infringiu a Lel n? ção n? 45, do Senado Federal é clara.
5.645/1970, que deixou á Administra- Determinou a criação de uma Banca
ção fixar os critérios de seleção.
Examinadora. Incumbiu-a de ministrar as aulas e de proceder ao critéEm 1976, o impetrante veio a ser rio seletivo para habilitação, em proaprovado no concurso interno para vas de desempenho funcional. E
Assistente Legislativo, integrando- mais, estatuiu que os cargos transse, assim no Plano de Classificação formados ou transpostos deverão ser
de Cargos, na Categoria Funcional ocupados mediante ordem rigorosa
de Assistente Legislativo, Classe «A» de classificação dos habilitados no
(fls. 91/93 e 98).
processo seletivo. Nem era necessário dizê-lo, porque concurso é feito
No exame do pedido inicial, cum- para estabelecer a ordem de colocapre observar, desde logo, que as pro- ção e de habilitação para fins de novas de desempenho funcional, com- meação.
petitório interno, para a aplicação do
Plano de Classificação de Cargos, ut
Não há direito liquido e certo de
Lei n? 5.645 de 1970, têm, em concursado,
a ser nomeado, é certo.
principio, validade restrita por sua A administração, quando abre conprópria natureza, até o primeiro curso, não se vincula à obrigação de
preenchimento dos cargos que com- nomear. Vincula-se, porém, a nopõem a lotação ideal da Categoria mear guardando a ordem da classifiFuncional correspondente. Após, os cação. Não pode preterir ninguém. O
claros surgidos preenchem-se por Senado passou, no entanto, a noconcurso _público, ascensão ou proDentre os 52 habilitados para
gressão funcionais, conforme discipli- mear.
as
35
vagas,
continua o impetrante
na estabelecida' Essa a dinãmica do sem estar nomeado,
não obstante
sistema implantado pela Lei n? sua colocação em segundo
lugar,
5.645/1970.
conforme consta da petição inicial e
Na hipótese, mesmo se se admitis- constar o fato em vários documentos
se a aplicação dos princípios gerais, no processo.
quanto a concursos públicos, não poSr. Ministro Néri da Silveira:
deria a validade da prova de desempenho funcional prestada pelo impe- Não há prova disso nos autos.
trante ultrapassar o prazo de quatro
Sr. Ministro Clovis Ramalhete:
anos, de acordo com o disposto no
art. 97, 3?, da Constituição, na re- Tem razão, talvez, V. Exa. em dizer
dação introduzida pela Emenda que não há prova. Mas, qual a prova
que falta? Seria o caso de vir, na inConstitucional n? 8, de 14-4-1977.
formação, a listagem com a classifiDo exposto, não conheço do pedi- cação. Mas a informação silencia e
do.
nem nega.
96
R.T.J. — 100
O Sr. Ministro Néri da Silveira:
Não houve classificação. A prova é
Meramente de habilitação. Dentre
todos os que estão classificados, na
área de recrutamento, verificam-se
os que têm condições para o
exercício do cargo. Depois, dentre
todos os que têm condições para o
exercício do cargo, é feita a classificação, de acordo com critério adotado. Este, no caso, foi o da antigüidade no Senado Federal.
Dentre os que tinham habilitação,
foram aproveitados os primeiros
contratados. Realmente, conforme
verifiquei, isso ocorreu. O impetrante entrou para o Senado Federal no
dia 14 de agosto de 1974 e não há nenhum, dentre os constantes da relação, que tenha entrado depois dessa
data em que o impetrante ingressou.
Se tivesse verificado o contrário,
reconheceria a preterição, porque teria sido quebrado o critério que á
Administração é licito estabelecer. A
implantação do Plano de .Classificação de Cargos deferiu à administração estabelecer critério de classificação do pessoal, particularmente
do pessoal CLT. Assim, essa prova
não é classificatória. É meramente
de habilitação, de verificação de
condições básicas.
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete:
Ouvi o voto de V. Exa. com proveito,
para meu enriquecimento pessoal,
mas não para elucidação do voto que
profiro. Porque o que leio nos autos
é que ficou estabelecido, no art. n? 7
da Resolução, que haveria uma ordem rigorosa de classificação dos
habilitados no processo seletivo. Portanto, houve classificação.
Habilitado foi o impetrante, mas
lhe está sendo negado o direito de
verificar, em que posição ficou nesta
classificação. E como lhe está sendo
negado? Com certo desconforto e espanto, encontro, às fls. 43 e 48, a informação da Diretora da Subsecreta-
ria do Pessoal. Nela, está asseverado que esta servidora não possui elementos quanto à realização do concurso. Isto é de espantar, depois de
haver uma resolução do Senado, no
sentido de que se fizesse um curso
de formação, para poder haver
transposições ou transformações de
cargos, e outra Resolução estabelecendo que, ao cabo disso, seria feita
rigorosa classificação dos concursados. Parece-me que a informação,
que declara não possuir elementos,
quanto à realização desse concurso,
está acrescentando algo à negativa
de direito ao impetrante. Fundado
numa Resolução que determinou esse curso, no qual foi classificado em
segundo lugar, o Impetrante alega
preterição de seu direito à nomeação
A informação está comunicando os
fatos, para conhecimento deste Supremo Tribunal Federal. O que me
causa espanto, dado os termos da
própria Resolução, é que não haja
apontamentos a respeito de curso e
do concurso.
Encontro por isso lesado o direito
liquido e certo do impetrante. Ele
não terá o direito de ser nomeado, se
ninguém o foi. A administração,
quando abre concurso, não se vincula à obrigação de nomear. Mas, se
passou a nomear, como provado, e
se no caso trata-se de transformação
de cargo ou transposição, que o concurso dava oportunidade...
O Sr. Ministro Néri da Silveira:
Foi um mero teste de capacidade.
Adotou-se o critério de aproveitar
nas vagas os habilitados nesse teste
de capacidade, por ordem de ingresso no Senado Federal Todos ingressaram no Senado, por aprovação da
Presidência. Então, foi adotado esse
critério, levando em conta a antiguidade de todos os que estão dentro
dessa área de recrutamento e tenham feito teste com resultado satis-
R.T.J. — 100
fatório. O número atingiu a 52. Foi o
que aconteceu em todas as repartições, também nos tribunais, com a
implantação do Plano de Classificação de Cargos.
Sr. Ministro Clovis Ramalhete:
A intervenção do eminente Ministro
Néri da Silveira, como sempre, honra o meu voto. Entendo, entretanto,
em contrário, que houve classificação, porque a resolução estabeleceu
que deveria haver rigorosa ordem de
classificação dos habilitados.
Por este motivo, concedo a ordem.
VOTO
Sr. Ministro Rafael Mayer: Sr.
Presidente, seguindo a orientação da
Jurisprudência desta Corte, que se
firmou, inclusive, numa súmula, em
relação ao enquadramento, multo
mais simples e sumário do que estes
que se fazem mediante implantação
e transposição no Plano de Classificação de Cargos ora em vigor, e á
vista da Lei n? 3.780, acompanho o
voto do eminente Ministro Relator,
indeferindo a ordem
97
que temos sob exame, o critério, que
se instituiu, fora o da antiguidade
daqueles que viessem a ser habilitados. Se o impetrante não logrou ser
enquadrado, isto se verificou porque,
embora primariamente habilitado,
seu grau de antiguidade não o favorecia.
Não conheço do mandado.
VOTO (PRELIMINAR)
Sr. Ministro Soares Mulloz: Sr.
Presidente, data venha do voto do
eminente Ministro Clovis Ramalhete, acompanho o eminente Relator
para negar apenas o direito líquido e
certo do impetrante, visto que falta,
nos autos, a comprovação da alegada preterição que ele teria sofrido no
concurso a que se submeteu. Não conheço do mandado, mas ressalvo ao
impetrante a via ordinária.
EXPLICAÇÃO
Sr. Ministro Firmino Paz (Relator): Sr Presidente, como Relator,
não conheci do mandado de seguranVOTO (PRELIMINAR)
ça, exatamente porque não encontrei
Sr. Ministro Decio Miranda: Sr. demonstrada, nos autos, a prova da
Presidente, também acompanho o existência do alegado direito líquido
voto do Sr. Ministro Néri da Silveira, e certo. Também, tive de levar em
com a vênia devida ao Sr. Ministro consideração a jurisprudência pacifica, sumulada, do Supremo Tribunal
Clovis Ramalhete.
Federal — Súmula 270 —, segundo a
O que se alega tratar-se de concur- qual:
so foi, na verdade, apenas — como
«Não cabe mandado de seguranse deu de modo geral na implantaça para impugnar enquadramento
ção do último Plano de Classificação
da Lei n? 3.780, de 12-07-60, que ende Cargos — uma prova de habilitavolva exame de prova ou de situação, quer dizer, verificou-se quem tição funcional complexa.»
nha a habilitação mínima para ingressar num determinado nível funApós essa sumulação, em outros
cional. E habilitação básica, não um acórdãos, o Supremo Tribunal, —
concurso. Realizada esta fase de ha- em que V. Exa., Sr. Presidente foi
bilitação, o segundo passo era a ob- dos maiores propugnadores — entenservância de critérios, que os diri- deu que, em se tratando de enquagentes das repartições ficaram auto- dramento funcional, tudo é matéria
rizados a estabelecer em atos nor- complexa que depende da existência
mativos, para a segunda fase da de prova da produção de provas, e
operação classificatória. No caso essa matéria só pode ser discutida
98
R.T.J. — 100
4
pelas leis ordinárias. O facto de uma
EXTRATO DA ATA
Resolução declarar que a classificaMS-20.298
— DF — Rel.: Min. Flrção deve ser rigorosamente obedecida, feita a classificação rigorosa, dal mino Paz. Impte.: Leopoldo Konte.
não nasce direito subjetivo de nin- (Advs.: Alberto Francisco Torres e
guém. Todos sabemos que o direito outro). Autoridade Coatora: Mesa do
subjetivo, efeito jurídico, nasce de Senado Federal.
facto jurídico previsto em lei; não,
Decisão: Não se conheçeu da impeem Resolução administrativa. A Re- tração, vencidos os Ministros Clovis
solução não tem força de Incidir, pa- Ramalhete e Cunha Peixoto, que dera produzir efeito jurídico. Emanada la conheceram e deferiram a segude autoridade inferior, na ordem rança. Ausente, ocasionalmente, o
constitucional, não pode, absoluta- Ministro Moreira Alves.
mente, estabelecer regra que inciPresidência do Senhor Ministro
dindo, dê lugar ao nascimento de di- Xavier de Albuquerque. Presentes à
reito subjetivo. O nascimento de di- Sessão os Senhores Ministros Djaci
reito subjetivo, público ou privado, é Falcão, Moreira Alves, Cunha Peixode ser previsto em lei federal. Data to Soares Mufloz, Decio Miranda,
venha, a Resolução não incide, para Rafael Mayer, Firmino Paz, Clovis
gerar direito subjetivo de ninguém.
Ramalhete e Néri da Silveira. AuAssim, não vejo, absolutamente, sente, justificadamente, o Ministro
no caso, a prova evidente da existên- Cordeiro Guerra. Procurador-Geral
cia de direito subjetivo. E não conhe- da República, Dr. Inocêncio Mártici da ação de mandado de seguran- res Coelho.
ça, por Inexistência de direito subjeBrasília, 12 de novembro de 1981 —
tivo certo e líquido.
Jonas Célio Monteiro Coelho, Secretário.
Obrigado.
HABEAS COFtPUS N? 57.409 — FtJ
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto.
Paciente: Antônio Marcelo Braga Coelho — Coator: Tribunal de Justiça
do Estado.
Habeas Corpus — Citação-edital — Erro de data na convocação
do citando para se ver processar e interrogar, constante da publicação do edital — Inexistência de retificação — Nulidade da citação editalicia.
Pedido de habeas corpus deferido.
ACÓRDÃO
Brasília, 27 de novembro de 1979 —
Thompson Flores — Presidente —
Cunha Peixoto — Relator.
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal RELATÓRIO
Federal, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taquigráfI-
O Sr. Ministro Cunha Peixoto: — O
cas, por unanimidade de votos, em parecer da Procuradoria-Geral da
deferir o pedido de habeas corpus.
República, subscrito pelo Dr. Aristi-
R.T.J. — 100
99
des Junqueira Alvarenga (fls. 28-29), julho de 1973, às 13 horas, para o ato
que esclarece a matéria sub judice, de interrogatório.
é do seguinte teor:
Entretanto, esse edital, que foi pu«1. Antônio Marcelo Braga Coe- blicado no Diário Oficial do Estado
lho, em seu próprio favor, impetra de 5-7-73 (fl. 4), convocou o paciente
ordem de habeas corpus, contra o para comparecer no Forum, para
Tribunal de Justiça do Estado do ciência da acusação é se ver interroRio de Janeiro, que, por sua 3? Câ- gar, no dia 24 de julho de 1972.
mara Criminal, condenou-o a cinco
Por outro lado, conforme informa
anos e quatro meses de reclusão e o nobre
Presidente do Tribunal indimulta de Cri 15,00, além de um gitado coator, às fls. 10-11, não foi
ano de medida de segurança deten- feita a retificação da data publicada
tiva, ao dar provimento ao apelo com erro, seja quanto ao dia, quer
do Ministério Público, contra a quanto ao ano designados para comsentença absolutória, do MM. Juiz parecimento do citando.
da 22? Vara Criminal da Comarca
Este fato, aliado ainda à não fixado Rio de Janeiro.
ção do edital no local, de costume,
Nulidade da citação por edital é no Forum, invalida a citação edio único fundamento do pedido for- talícia.
mulado pelo réu revel (fls. 2).
Neste sentido já decidiu esta egré2 — As informações de fls. 10-11, gia Primeira Turma, no julgamento
do ilustre Desembargador Carlos do HC n? 56.895-DF, de que foi relaLuiz Bandeira Stampa, bem como tor o eminente Ministro Rafael Maos documentos que as instruem, re- yer (Sessão de 24-4-79).
velam que o edital de citação do
Por estes motivos, de acordo com
paciente fixava a data de 25 de julho de 1973 para o interrogatório o parecer da douta Procuradoria(fls. 17). Contudo, na publicação no Geral, defiro o writ para decretar,
Diário Oficial constou, erronea- em relação ao paciente-impetrante,
mente, a data de 24 de julho de a nulidade do processo, a partir da
1972 (fls. 18) sem que houvesse citação por edital, inclusive.
correção posterior.
EXTRATO DA ATA
Se não bastasse a imprecisão da
data estampada na publicação,
1:1C — 57.409 — RJ — Rel.: Min.
inexistiu certidão de afixação do Cunha
Peixoto. Pte. e Impte.: Antôedital na porta do edificio, onde nio Marcelo
Braga Coelho. Coator:
funciona o Juízo, tornando inválida Tribunal de Justiça
do Estado.
a citação, consoante reiterada juDecisão:
Deferiram
o pedido, nos
risprudência desse Excelso Tributermos do voto do Ministro-Relator,
nal.
3 — Pelo exposto, somos pelo de- decisão unânime.
Presidência do Sr. Ministro
ferimento do writ.
Thompson
Flores. Presentes à SesE o relatório.
são, os Senhores Ministros Xavier de
Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares
VOTO
Mufioz e Rafael Mayer. Subprocurador-Geral da República, o Dr. FranO Sr. Ministro Cunha Peixoto (Re- cisco de Assis Toledo.
lator): — O edital de citação do
Brasília, 27 de novembro de 1979 —
paciente-impetrante, cuja cópia se Antônio Carlos de Azevedo Braga —
encontra à fl. 17, fixava o dia 25 de Secretário.
R.T.J. — 100
RECURSO DE HABEAS COFtPUS N? 57.502 —
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto.
Recorrente: José Bonifácio Libânio Mathias — Recorrido: I Tribunal de
Alçada do Estado.
Habeas Corpus — Lei Orgânica da Magistratura Nacional —
Competência dos Tribunais de Justiça e de Alçada.
Não tendo ainda o Estado-membro procedido à adaptação de sua
organização judiciária, no período de seis meses referido no art. 139
da Lel Orgânica da Magistratura Nacional permanece a competência
residual dos Tribunals'cle Alçada, conforme precedente do S.T.F..
Recurso de habeas corpus provido para determinar que o habeas
corpus seja julgado,pelo Tribunal de Alçada.
ACORDA°
2 — O I Tribunal de Alçada, entretanto, por sua Segunda Câmara CriVistos, relatados e discutidos estes minal, não conheceu do writ por enautos, acordam os Ministros da Pri- tender que,
meira Turma do Supremo Tribunal
«... trata-se, na hipótese, de criFederal, na conformidade da ata do
me
punido com reclusão, cuja
julgamento e das notas taquigráficompetência, em face do disposto
cas, por unanimidade de votos, em
nos arts. 108 n? III, 139 2? e 146 da
dar provimento ao recurso de
Lei 035-79, passou a ser do Egrégio
habeas corpus.
Tribunal de Justiça, competência
Brasília, 16 de novembro de 1979 —
esta ratione materiae, a que não
ThomPson Flores — Presidente —
pode, por isso, furtar-se de aplicar
Cunha Peixoto — Relator.
o Juizo» (Acórdão de fl. 17).
3 — Recorre o paciente, postulando
RELATOR IO
seja determinado ao Tribunal a quo,
O Sr. Ministro Cunha Peixoto — 1 que conheça e julgue o pedido de
— A favor de José Bonifácio Libânio habeas corpus, já que «deu-se, no caMathias, condenado a dois anos de so presente, a exclusão de apreciareclusão como incurso nas penas do ção judicial de uma lesão de direito
art. 155, 4?, II. do Código Penal, individual (§ 4?, art. 153 da Constituiimpetrou-se perante o Tribunal de ção Federal), sendo certo ainda de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro que não se estabelece conflito de jurisdição entre Tribunais de Justiça e
ordem de habeas corpus.
Alçada do mesmo Estado, face à
O Vice-Presidente do referido Tri- de
hierarquia
que o relaciona» ( fl. 21).
bunal, entretanto, determinou a remessa dos autos ao Primeiro Tribu4 — A Procuradoria-Geral da Renal de Alçada, «nos termos do art. pública, em parecer subscrito pelo
250, do 1? c/c o art. 67, do Código Dr. Aristides Junqueira Alvarenga
de Organização e Divisão Judiciá- ( fls. 27-28), manifesta-se pelo conherias (Resolução n? 1 de 21 de março cimento e provimento do recurso, a
de 1975) e Provimento n? 5/79 do fim de que o I Tribunal de Alçada do
Conselho da Magistratura de 16 de Estado do Rio de Janeiro conheça do
pedido de habeas corpus, vez que esmaio de 1979».
R.T.J. — 100
se colendo Supremo Tribunal, em
Sessão Plenária de 10-10-79, decidiu
uniformemente pela competência residual do Tribunal de Alçada ao julgar, em caso idêntico, o HC 57.377
(D.J.U. de 17-10-79, p. 7.729).
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator) — O acórdão proferido no precedente citado no parecer da Procuradoria-Geral da República, relatado
pelo eminente Ministro Soares Muhoz, está assim ementado:
«Ementa: Lei Orgânica da Magistratura. A competência, por ela
estabelecida, para os Tribunais de
Justiça e de Alçada, somente entrará em vigor urna vez findo o'
prazo de seis meses fixado no art.
139, se antes o Estado não houver
procedido á adaptação de sua organização judiciária.
Habeas
Corpus concedido para determinar
que os anteriores habeas corpus
sejam julgados pelo Primeiro Tribunal de Alçada.»
101
Tratando-se de matéria idêntica,
dou provimento ao recurso para determinar que o I Tribunal de Alçada
do Estado conheça do pedido de
habeas corpus e o julgue como entender de direito.
EXTRATO DA ATA
RHC — 57.502 — RJ — Rel.: Min.
Cunha Peixoto. Recte.: José Bonifácio Libânio Mathias. (Adv.: Nilo Batista). Recdo.: Tribunal de Alçada do
Estado.
Decisão: Deu-se provimento ao recurso de Habeas Corpus, decisão
unânime.
Presidência do Sr. Ministro
Thompson Flores. Presentes á Sessão os Senhores Ministros )(avier de
Albuquerque, Cunha Peixoto Soares
Muiloz e Rafael Mayer. Subprocurador-Geral da República,
o Dr. Francisco de Assis Toledo.
Brasília, 16 de novembro de 1979 —
António Carlos de Azevedo Braga —
Secretário.
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 58.090 — RS
(Primeira Turma)
Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Soares Mufioz.
Recorrente: Laurindo Fortuna — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.
Prisão do devedor de alimentos. Verba fixada provisoriamente
nos autos de ação revisional. Admissibilidade dessa fixação e legalidade da prisão exarada por motivo do não pagamento dos alimentos
provisórios. Habeas Corpus indeferido. Recurso desprovido.
ACORDAO
Vistos,
Acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Primeira Turma, por maioria de votos, e na conformidade das notas taquigráficas,
negar provimento ao recurso.
Brasília, 02 de setembro de 1980 —
Thompson Flores, Presidente —
Soares Mufloz, Relator para o acórdão.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Adoto como relatório, por esclarecer
102
R.T.J. — 100
com propriedade a espécie, o parecer da Procuradoria-Geral da República, subscrito pelo Dr. Alvaro Augusto Ribeiro Costa e aprovado pelo
Professor Francisco de Assis Toledo,
Subprocurador-Geral, Ui-verbis:
«1 — Cuida-se de pedido de
habeas corpus — ora em grau de
recurso — formulado contra ordem
de prisão exarada por motivo de
inadimplência concernente ao pagamento de alimentos — fixados
de plano e em caráter provisório —
nos autos de ação revisional.
2 — Alega o impetrante ser ilegal o constrangimento, porque, a
seu ver, a ação revisória de alimentos não comporta a elevação,
de plano, da verba alimentar anteriormente em vigor.
3 — O writ foi indeferido pelo
aresto de fls. 46-50, cujos fundamentos o voto do relator assim
enunciou:
«A Lei 6.014 de 1973, adaptando
a Lei 5.478 ao Código de Processo
emprestou ao art. 773 maior elastério, incluindo a prisão civil nele
cominada quer se cuide de pagamentos de alimentos provisórios,
quer de verba fixada 'definitivamente. Parecem óbvios os motivos: a perda da liberdade tem cabimento tendo em linha de conta
a natureza da obrigação e a necessidade social de cobrar o devedor recalcitrante.
Certo o caso é de revisão. Mas
o art. 13 da Lel n? 5.478-68 que
manda aplicar o diploma no que
couber às ações ordinárias de separação, nulidade, relação de casamento, revisão de pedidos alimentares e respectivas execuções ampara o ato do juiz é claro.
No caso dos autos o juiz restabeleceu pensão• em dois salários
mínimos regionais por mês de
acordo com fixação condizente e
com as necessidades de sustento
e criação das filhas.
A requerente reclamou falta de
condições para prover o próprio
sustento e de filhas estudantes
com Cr$ 450,00 mensais.
Como se lê a fls. 31 ao devedor
impendia saldar as pensões em
débito ou comprovar a impossibilidade. Em vez disso passou a
impugnar a carta precatória. Como se vê, tática protelatória e
com ela vem prejudicando a mulher e a prole.
Assim sendo revogo a liminar e
denego a ordem pois reputo
legítima, fundada e legal a prisão do paciente.
Lembro o despacho do juiz:
«Cumpre ao devedor pagar as
prestações alimentícias em débito, ao em vez de pretender impugnar a carta precatória ou alegar e provar a sua impossibilidade. Em conseqüência do pedido
pelo credor, bem como do solicitado pelo Ministério Público, decreto a prisão do réu por 45
dias.»
O devedor, portanto, não aduziu razões demonstrativas da impossibilidade do pagamento, nem
toca nele. Alega questões de
índole meramente processual relacionadas com a precatória. E
técnica utilizada erroneamente.
Trata-se de alimentos desatendidos. A prisão é permitida e inteiramente legal.»
4 — Daí, o apelo de fls. 52-53, que
reitera as alegações inicialmente
deduzidas pelo impetrante.
5 — Não merece acolhimento, todavia, a irresignação em causa.
6 — O art. 4? da Lei n? 5.478, de
25/07/68 dispõe que, ao despachar
R.T.J. — 100
o pedido inicial na ação de alimentos, o Juiz fixará desde logo alimentos provisórios a serem pagos
pelo devedor, salvo se o credor expressamente declarar que deles
não necessita.
7 — O art. 13 da mencionada lei,
por seu turno, estabelece que o nela disposto se aplica, no que couber, à revisão de sentenças proferidas em pedidos de alimentos.
8 — Cabível, dessarte, em face
do aludido diploma legal, a fixação
de alimentos provisórios em ação
de revisão.
9 — E certo que o impetrante, invocando a restrição contida em lei
— «no que couber» — sustenta que
existe incompatibilidade entre a fixação de alimentos provisionais e
a decisão objeto do pedido de revisão.
10 — Tal incompatibilidade, entretanto, a nosso ver inexiste. A revisão dos alimentos tem como fato
gerador a alteração das condições
financeiras das partes; e a finalidade dela é ajustar à situação nova o quantitativo anteriormente fixado. Ora, se ao pleitear a revisão
o devedor o faz porque já se. encontra modificada a situação financeira das partes, não há motivo para
que persista até a decisão final,
que ajustará a verba alimentícia
às modificações verificadas, a
cláusula de alimentos fixados anteriormente. Seria, aliás, contrário
ao espirito da lei — a Exposição de
Motivos lembra que «a fome não
espera» — e ao objetivo dos alimentos, a pretendida inadmissibilidade do reajuste provisório dos
mesmos.
11 — Sobre o tema em debate,
Nelson Carneiro teve ocasião de
afirmar (in «A Nova Ação de Alimentos,» 1° ed., páginas 118-119, R.
de Janeiro Freitas Bastos, 1969),
in verbis:
103
«A Lei n? 5.478 autoriza que seu
rito seja observado, no que couber, pelas ações de revisão, que
agravam, reduzem e até extinguem o encargo. Se os alimentos
que se querem modificar forem
tão desatualizados que reclamem
correção imediata, nada obsta a
que o juiz, ao despachar a inicial
da ação de majoração, ou no curso dela, fixe outros, em caráter
provisório.»
12 — Sem razão, portanto, o impetrante, quando afirma ser inadmissível a fixação de alimentos
provisórios em ação de revisão.
Pelo improvimento do recurso,
face ao exposto é o parecer.»
É o relatório.
VOTO
Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): 1 — O problema cinge-se em
saber se é possível a fixação de alimentos provisionais em ação revistonal de alimentos.
Juiz, apoiado pelo acórdão recorrido, é pela afirmativa, tendo fixado alimentos provisionais em ação
revisional e, como o recorrente não
efetuou o pagamento, decretou-lhe a
prisão por quarenta e cinco dias.
2 — Os alimentos provisionais são
cabíveis quando a parte que os procura não tem meios de subsistência.
objetivo da lei, concedendo alimentos provisionais, antes de iniciar
a lide, ou durante a sua pendência, é
assegurar ao autor a subsistência.
Assim, destinam-se eles à subsistência do alimentando durante a lide, bem como às despesas que tiver
de fazer com esta.
3 — A hipótese não se ajusta à revisão das sentenças proferidas em
pedidos de alimentos, pois aqui a
subsistência do requerente já está
assegurada com os alimentos fixados na ação.
104
R.T.J. - 100
E nem se diga que prevalece o
espírito da lei, quando, ponderadas
as circunstâncias do caso concreto o
juiz se convencer de que o valor revidendo é írrito, dada a defasagem
provocada pela inflação, e quando as
condições econômicas do alimentante permitem desde logo a correção,
porque ninguém melhor do que o alimentando para saber se a quantia
recebida é ou não suficiente para
sua subsistência, e se demorou a solicitar o revisionamento, é de presumir que até aquele momento a quantia recebida lhe estava sendo bastante.
Dai estar expresso, no art. 13, que
a lei disciplinadora dos alimentos se
aplica também «à revisão de sentenças proferidas em pedidos de alimentos» no que couber.
Ora, a índole do pedido provisional
não se coaduna com o da revisão. A
essência de um e outro são diferentes e, como a concessão de alimentos
provisionais constitui uma exceção,
pois independe de qualquer prova,
ou melhor, fica ao arbítrio do juiz,
não se pode aplicar aquele no caso
deste, sem dispositivo expresso de
lei.
Se, já foi estabelecido de maneira
definitiva o alimento, não se pode falar em fixação provisória
Esta, aliás, é a orientação do egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. O eminente Desembargador Niro Teixeira de Souza, no despacho concessivo de liminar do
habeas corpus, assinalou:
«Segundo a jurisprudência prevalente neste Tribunal, tem-se entendido que descabe prisão civil
em decorrência de majoração provisional, els que esta também é
inadmitida.» (fls. 36).
4 — Estes autos mostram o acerto
da conclusão.
O processo de revisionamento dos
alimentos, com pedido de fixação
provisória de novos, deu entrada
em juizo no dia 01 de outubro de
1977, tendo o Juiz fixado os alimentos provisórios em 24-11-77 (fls. 12).
Entretanto, a audiência para conciliação e prova só foi marcada para
15 de maio de 1978, tendo se realizado, nesse dia, sem a presença da autora (fls. 19).
A revisão depende de prova e a autora, não se sabe o motivo,
desinteressou-se do próprio andamento do processo.
Ora, se não cabe a fixação de alimentos provisionais em ação de revisão, ilegal é a prisão pela falta de
pagamento dos alimentos ali fixados,
merecendo, pois, provimento o recurso.
Dou provimento ao recurso.
EXTRATO DA ATA
RHC. 58.090 — RS — Rel.: Min:
.Cunha Peixoto. Recte.: Laurindo
Fortuna (Adv.: Eghlio Barros Costa). Recdo.: Tribunal de Justiça do
Estado do Rio Grande do Sul.
Decisão: Adiado o julgamento por
haver pedido vista o Ministro Soares
Mufloz, após o voto do Min. Relator,
que dá provimento ao recurso.
Presidência do Sr. Ministro
Thompson Flores. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mufoz e Rafael Mayer. SubprocuradorGeral da República, Dr. José Resek.
Brasília, 26 de agosto de 1980 —
Antônio Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Soares Muiloz: Sr.
Presidente, o eminente Ministro
Cunha Peixoto, Relator, conclui o
seu brilhante voto, dizendo:
R.T.J. — 100
«Ora, se não cabe a fixação de
alimentos provisionais em ação de
revisão, ilegal é a prisão pela falta
dos alimentos ali fixados, merecendo, pois, provimento o recurso.»
Em sentido contrário, manifestara-se a Procuradoria-Geral da República, em parecer da lavra do ilustre
Procurador Dr. Alvaro Augusto Ribeiro Costa, In verbis:
«O art. 4? da Lei n? 5.478, de 257-68 dispõe que, ao despachar o pedido inicial na ação de alimentos, o
Juiz fixará desde logo alimentos
provisórios a serem pagos pelo devedor, salvo se o credor expressamente declarar que deles não necessita.
O art. 13 da mencionada lei, por
seu turno, estabelece que o nela
disposto se aplica, no que couber, à
revisão de sentenças proferidas em
pedidos de alimentos.
Cabível, dessarte, em face do
aludido diploma legal, a fixação de
alimentos provisórios em ação de
revisão.
E certo que o impetrante, invocando a restrição contida em lei —
«no que couber» — sustenta que
existe incompatibilidade entre a fixação de alimentos provisionais e
a decisão objeto do pedido de revisão.
Tal incompatibilidade, entretanto, a nosso ver, inexiste. A revisão
dos alimentos tem como fato gerador a alteração das condições financeiras das partes; e a finalidade dela é ajustar á situação nova o
quantitativo anteriormente fixado.
Ora, se ao pleitear a revisão o devedor o faz porque já se encontra
modificada a situação financeira
das partes, não há motivo para que
persista até a decisão final, que
ajustará a verba alimentícia às
modificações verificadas, a cláusula
de alimentos fixados anteriormen-
105
te. Seria, aliás, contrário ao espirito da lei — a Exposição de Motivos
lembra que «a fome não espera» —
e ao objetivo dos alimentos, a pretendida inadmissibilidade do reajuste provisório dos mesmos.
Sobre o tema em dabate, Nelson
Carneiro teve ocasião de afirmar
(in «A Nova Ação de Alimentos»,
1! ed., páginas 118-119, R. de Janeiro, Freitas Bastos, 1969), in
verbis:
«A Lei n? 5.478 autoriza que seu
rito seja observado, no que couber, pelas ações de revisão, que
agravam, reduzem e até extinguem o encargo. Se os alimentos
que se querem modificar forem
tão desatualizados que reclamem
correção imediata, nada obsta a
que o juiz, ao despachar a inicial
da ação de majoração, no curso
dela, fixe outros, em caráter provisório.»
Sem razão, portanto, o impetrante, quando afirma ser inadmissível a fixação de alimentos
provisórios em ação de revisão.
Pelo improvimento do recurso,
face ao exposto» (fls. 66-68).
Com a vênia do eminente Ministro
Cunha Peixoto, penso que é possível
a fixação de alimentos provisórios
na ação revisional a que a pensão,
assim estabelecida, deve ser paga
pelo réu, sob pena de prisão.
O art. 13 da Lei n? 5.478/68 determina que «o disposto nesta Lei
aplica-se igualmente, no que couber,
às ações ordinárias de separação,
nulidade e anulação de casamento, à
revisão de sentenças proferidas em
pedidos de alimentos e respectivas
execuções.»
A ressalva «no que couber» pressupõe a existência de incompatibilidade entre alguns dos dispositivos da
lei e as ações enunciadas no art. 13.
106
R.T.J. - 100
Existiria incompatibilidade entre a
concessão de alimentos provisórios e
a ação revisional se a sentença, nesta proferida, tivesse eficácia ex
num, vale dizer, a partir dela.
Entretanto, expresso é o art. 13, §
2?, no sentido de que «em qualquer
caso, os alimentos fixados retroagem à data da citação.» E esta Primeira Turma, no RE 86.064, Relator
Ministro Rafael Mayer, decidiu «nas
ações de revisão, os alimentos retroagem à data da citação» (Jurisprudência Brasileira, v. 31, p. 69).
Ora, se nas ações de revisão, os
alimentos retroagem à data da citação inicial, tudo está a recomendar
que sejam fixados provisoriamente
no início da demanda, para que atendam, desde logo, às necessidades
atuais e inadiáveis do alimentando.
Não consulta à natureza jurídica da
pensão alimentar procrastinar o pagamento das prestações, vencidas no
curso da lide, para a execução.
Ademais, em prol da legalidade da
concessão de alimentos provisórios
nas ações de revisão, milita o § 1? do
art. 13, verbis:
«Os alimentos provisórios fixados na inicial poderão ser revistos
a qualquer tempo, se houver modificação na situação financeira das
partes...».
Ora, se os próprios alimentos provisórios poderão ser revistos, a fim
de mantê-los atualizados às necessidades do alimentando e aos recursos
da pessoa obrigada, razão não há para negar-se essa atualização provisória no limiar da ação revisional, fundada na modificação da situação financeira das partes.
Ante o exposto, nego provimento
ao recurso, «data venia» dos votos
dos eminentes Ministros Cunha Peixoto e Rafael Mayer.
RECONSIDERAÇÃO DE VOTO
Sr. Ministro Rafael Mayer: Sr.
Presidente, estou convencido dos argumentos trazidos pelo eminente Ministro Soares Mufioz, porque me parece que a função dos alimentos provisionais em relação às ações primitivas de alimentos se repete ou se
reitera no problema das ações revisionais, porque são as necessidades
imediatas que ditam os alimentos
provisionais. Pode haver uma defasagem tal nos alimentos que tenham
sido anteriormente deferidos que a
lei possa ser interpretada no seu sentido teológico de conceder provisoriamente aquele aumento, para atender a tais necessidades.
Assim, data venta do eminente Relator, reconsidero o meu voto, para
ficar de acordo com o Ministro Soares Mufioz, negando provimento.
VOTO
Sr. Ministro Xavier de
Albuquerque: Também entendo ser
compatível com a ação de revisão de
alimentos a fixação, nela, de alimentos provisionais; sendo compatível,
não há constrangimento ilegal a ser
reparado na hipótese.
Data vénia do eminente Relator,
acompanho o voto do Sr. Ministro
Soares Mufioz, negando provimento
ao recurso.
VOTO
Sr. Ministro Thompson Flores
(Presidente): Peço vênia ao eminente Relator para -acompanhar
o voto do eminente Ministro Soares
Mtuloz, harmônico com o parecer da
douta Procuradoria-Geral da República.
Nego, assim, provimento ao recurso.
R.T.J. — 100
EXTRATO DA ATA
RHC. 58.090 — RS — Rel.: Min.
Cunha Peixoto. Recte.: Laurindo
Fortuna (Adv.: Egídio Barros Costa). Recdo.: Tribunal de Justiça do
Estado do Rio Grande do Sul.
Decisão: Negado provimento, vencido o Ministro Cunha Peixoto (Relator).
107
Presidência do Sr. Ministro
Thompson Flores. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mufoz e Rafael Mayer. SubprocuradorGeral da República, Dr. José Resek.
Brasília, 02 de setembro de 1980 —
António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
HABEAS CORPUS N? 58.134 — PR
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão.
Paciente e Impetrante: Hélio Queiroz Barboza ou Hélio Queiroz Barbosa
— Coator: Tribunal de Alçada do Estado do Paraná.
Inidoneidade da revisão criminal para apreciar, no caso, aleijano de extinção da punibilidade, pela prescrição. Indeferimento do pedido de habeas corpus.
Envio dos autos ao Tribunal dà Alçada, para que aprecie, pelo
mérito, a alegação de prescrição, desde que o S.T.F. não tem competência originária para o seu julgamento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal à unanimidade
de votos e na conformidade da ata
do julgamento e das notas taquigráficas, indeferir o pedido, remetendose os autos ao Tribunal do Paraná.
Brasília, 05 de setembro de 1980. —
Djaci Falcão, Presidente e Relator
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Djaci Falcão: Hélio
Queiroz Barboza impetra habeas
corpus em seu próprio benefício, alegando, em resumo, que foi condenado ao cumprimento da pena de quatro (4) anos de reclusão, como incurso no art. 171, caput, c/c o art. 51, §
2?, do Código Penal; que a pena foi
reduzida para dois (2) anos; que
pleiteou em revisão criminal a extinção da punibilidade, pela prescrição
da pretensão executória, deixando
de ser conhecido o pedido por ser inviável mediante revisão.
Espera, em conclusão, que seja
deferida a ordem com a decretação
da extinção da punibilidade.
O pedido vem instruído com os documentos de fls. 9 a 48.
Após as informações de fls. 51, a
Procuradoria-Geral da República
emitiu o seguinte parecer:
«1 — Hélio Queiroz Barbosa, em
benefício próprio, ajuíza pedido de
habeas corpus, inconformado com
a decisão do Grupo de Câmaras
Criminais do Tribunal de Alçada
do Paraná, que não conheceu de
pedido revisional, por ele manifestado, com o intuito de ver reconhecida a prescrição da pretensão
executória de pena recebida.
108
R.T.J. — 100
2 — Disse, a propósito, o ilustre
Juiz Mattos Guedes, relator da matéria, verbis:
Não se pode conhecer do pedido.
Como se vê dos itens do artigo
621, do Código de Processo Penal, o pretendido reconhecimento
da prescrição não se encaixa em
nenhum deles, e não é possível
que se alargue tanto o instituto
de revisão criminal, para permitir a discussão a respeito da extinção da punibilidade, matéria
privativa, nesta altura do processo, do habeas corpus, como demonstra o artigo 647, item VII,
do mesmo livro penal.
Não ocorre qualquer dúvida a
este respeito.
A se admitir tal, data venta,
seria desvirtuar a revisão criminal'. (vide: fls. 57).
3 — Incensurável esta colocação.
4 — Não está normativamente
autorizada, a discussão em sede de
revisão criminal sobre o tema
prescricional.
5 — E foi unicamente isso o declarado no julgado analisado, dai
porque improcedente é o inconformismo do impetrante, nesta perspectiva, e incabível é o conhecimento, pela Suprema Corte, da
alegaria realidade prescricional,
que não foi debatida na instância
colegiada, para onde devem tornar
os presentes autos à apreciação do
tópico.
6 — Concluímos, pois, o parecer
no sentido do indeferimento do argumento que quer validar o pedido
revisional ao reconhecimento da
prescrição, com a devolução dos
autos à instância colegiada a quo à
apreciação da alegada prescrição,
porque sobre isto não enunciara
Juizo de Mérito.
Brasília, 29 de agosto de 1980 —
Cláudio Lemos Fonteies, Procurador da República
Aprovo: José Francisco Rezek,
Subprocurador-Geral da República» ( fls. 61 a 63).
VOTO
O Sr. Ministro Djaci Falcão (Relator): Parece-me correto o entendimento sufragado no acórdão que
apreciando o pedido de revisão criminal, dele não conheceu, por não se
enquadrar em nenhum dos incisos do
art. 621 do C.P. Penal. Com efeito,
não se cogita de «sentença condenatória contrária ao texto expresso da
lei penal ou à evidência dos autos;"
nem de sentença baseada «em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos.» e nem tampouco, de novas provas conducentes
à inocência do condenado, ou «de
circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.»
Nas circustâncias do caso é inidôneo o pedido de revisão criminal.
Vale ponderar que não se aponta
uma decisão condenatória que se
contraponha, de modo evidente, a
preceito legal.
O remédio adequado ao caso, por
sinal mais célere, é o habeas corpus.
Aliás, conforme dispõe o art. 648:
«A coação considerar-se-á ilegal:
VII — quando extinta a punkt:intdade.»
Finalmente, considerando que o
Tribunal de Alçada não teve ensejo
de apreciar o tema da prescrição, no
seu mérito, resta o indeferimento do
writ, com a remessa dos autos ao
mencionado Tribunal para que sobre
ele se manifeste.
E o meu voto.
R.T.J. — 100
EXTRATO DA ATA
HC. 58.134 — PR — Rel.: Min. Djaci Falcão. Pacte.: Hélio Queiroz Barboza ou Hélio Queiroz Barbosa. Impte.: Hélio Queiroz Barboza ou Hélio
Queiroz Barbosa. Coator.: Tribunal
de Alçada do Estado do Paraná.
Decisão: Indeferido o pedido,
remetendo-se os autos ao Tribunal
do Paraná. Unânime.
109
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mauro
Leite Soares.
Brasília, 05 de setembro de 1980 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 58.259 — RJ
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão.
Recorrente: Hilkias Marinho Nunes — Recorrido . Tribunal de Justiça do
Estado do Rio de Janeiro.
Re-ratificação de denúncia. O recebimento da mesma não está
submetido às condições previstas no art. 384 do C.P.P. Recurso ordinário improvido.
ACORDA()
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros componente da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade
de votos e na conformidade da ata
do julgamento e das notas taquigráficas, negar provimento ao recurso.
Brasília, 26 de setembro de 1980 —
Djaci Falcão — Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Djaci Falcão — O
aresto objeto deste recurso tem o seguinte teor:
«— A modificação da denúncia
antes de consumada a prescrição
com base em capitulação do delito
rejeitada, interrompe o curso da
mesma prescrição.
— Não cabe habeas corpus,
quando a prescrição não se consumou.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de habeas corpus, n?
5.526 da Comarca de Nilópolls, em
que é impetrante Dr. Paulo FrÓes
Machado e paciente Hilkias Marinho Nunes, acordam em Primeira
Câmara Criminal do Tribunal de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro denegar a ordem, por unanimidade, de votos.
Assim decidem pelos fundamentos do douto parecer da Procuradoria-Geral da Justiça que
a este se incorpora na forma regimental.
Rio de Janeiro, 30 de junho de
1980 — Pedro Bandeira Steele —
Presidente — Osny Duarte Pereira
— Relator» ( fls. 32).
O parecer em que se baseou a decisão tem o seguinte teor
«A hipótese dos autos reveste-se
da maior simplicidade:
110
R.T.J. — 100
O paciente foi denunciado, como
Incurso nas penas do art. 129 § 1?,
n? I do Código Penal, por ter produzido disparos de arma de togo
contra sua companheira Odranice
de Aragão Macedo.
No curso do processo, na fase
de diligência, o patrono do paciente intimado a requerimento da
querendo,
para,
Promotoria
manifestar-se (fls. 18), requereu
fosse julgada extinta a punibilidade pela prescrição, com fundamento no art. 108, n? IV do Código Penal (fls. 19).
O mencionado pedido não chegou
a ser decidido pelo ilustre Juiz a
quo.
Contudo, ao ter vista dos autos
para manifestar-se sobre a pretensão do acusado, a Promotoria, por
ter entendido que a mencionada
denúncia descreve conduta que
'embora caiba na descrição do
art. 121, § 2?, inciso II, c/c art. 12
n? II, ambos do Código Penal, foi
erroneamente, d.v., capitulada
no art. 129 § 1?, n? I do mesmo
Código' (fls. 20).
requereu a re-ratificação da peça vestibular
'haja visto que, com a definição
jurídica, correta, agora dada ao
fato narrado a prescrição não
operou' (fls. 21).
A pleiteada re-ratificação foi recebida, tendo sido determinada a
abertura de vista à defesa (fls. 23),
que peticionou na mesma data,
pretendendo a reforma do despacho (v. Item IV das informações de
fls.).
Antes de mais nada, cumpre salientar que, na melhor das hipóteses, não pode ficar sem qualquer
crítica a morosidade com que vem
se arrastando a ação penal de que
tratam os autos sendo data venia,
a nosso ver, inaceitáveis as explicações contidas no Item 9? das informacões.
Além disso, é de se ressaltar,
que, como a denúncia foi recebida
em 25-4-68 (item 1? das informações), a primeira capitulação dada
ao delito, antes da re-ratificação,
não havia ainda sido atingida pela
prescrição.
Por último, a re-ratificar a capitulação da peça inicial, o ilustre
representante do Ministério Público usou da faculdade concedida pelo art. 569 do C.P.P., isto é, supriu
omissão da denúncia, o que importou na alteração da capitulação do
Assim sendo e, como a hipótese
não é a do art. 384, § único do
C.P.P., como corretamente sustenta o Juiz informante, a Procuradoria da Justiça opina no sentido de
ser denegada a ordem.
Rio de Janeiro, 30 de junho de
1980 — Antonio Cláudio Bocaiúva
Cunha — Procurador da Justiça
em exercício» (fls. 28 a 30).
Em tempo hábil foi interposto o recurso ordinário, como se vê da petição de fls. 34 a 38, que leio.
A Procuradoria da República emitiu o seguinte parecer
«1 — O paciente foi denunciado
como incurso no art 129, § 1?, I, do
Código Penal (v. fls. 8-8verso), tendo sido a denúncia recebida a 25-468 (v. fls. 9 verso).
2 — A defesa requereu, através
da petição de fls. 19, que fosse julgada extinta a punibilidade, em
virtude de prescrição.
3 — O representante do Ministério Público, todavia, re-ratificou a
denúncia, a 5-2-80, dando o paciente como autor do crime previsto no
art. 121, § 2?, II, c/c o art. 12, II, do
Código Penal (v. fls. 20-21).
R.T.J. — 100
111
4 — A re-ratificação foi objeto do
em que o Juiz, encerrada a instrudespacho de 26-2-80, que a recebeu
ção, vislumbra — em face de pro(v. fls. 23).
va de circunstância elementar não
contida explícita ou implicitamente
5 — Dai, a impetração de fls. 2-7,
na denúncia ou na queixa — a posargüindo a inadmissibilidade da alsibilidade de nOva definição juríditeração havida na denúncia, bem
ca do fato.
como sustentando que a narrativa
12 — No caso, entretanto, cuidanela contida não autorizava a impuse de iniciativa do órgão causador,
tação, ao paciente, de autoria de
propondo imputação parcialmente
tentativa de homicídio. O despacho
diversa da contida na primitiva deque recebeu a re-ratificação tradunúncia. Cogita-se, em parte, de noziria, em conseqüência, ilegal consva ação penal, cuja instauração é
trangimento.
condicionada ao Juízo de admissi6 — Com base em tais alegações,
bilidade externado no despacho
o impetrante assim deduziu os obque recebe a re-ratificação.
jetivos do pedido:
13 — Não há como se confundir,
ser dada como extinta, por
dessarte, a hipótese da remotivo de prescrição, a punibiliratificação da denúncia com a codade ou, em caso contrário,
gitada pelo art. 384 do C.P.P. A incidência
deste dispositivo pressuser tornada sem efeito a repõe a iniciativa do próprio juiz, no
ratificação da denúncia, admititocante á nova imputação, e disda pelo MM. Juiz, por via do qual
pensa
a renovação do sumário.
o Paciente, denunciado por crimes de lesões corporais, passou
14 — Não são aplicáveis à reratificação da denúncia, portanto,
a responder, sem forma nem fias exigências legalmente previstas
gura de direito, por delito de tenpara a desclassificação de que tratativa de homicídio.
ta o art. 384 do C.P.P.
7 — O writ, foi denegado pelo
15 — Dessarte, a circunstância
aresto de fls. 32, que adotou os funde não terem sido satisfeitas no cadamentos do parecer de fls. 28so, aquelas exigências, não consti30.
tui motivo-de nulidade do despacho
que delas prescindiu.
8 — Recorreu, então, o impetrante, insistindo nas alegações que IniPelo improvimento do recurso,
cialmente formulara.
em face do exposto, é o parecer.
Brasília, 17 de setembro de 1980
9 — Toda a argumentação do re— Alvaro Augusto Ribeiro Costa —
corrente se propõe a demonstrar
Procurador da República.
que não é permitido ao juiz alterar
a classificação dada ao fato na deAprovo: Francisco de Assis
núncia sem fazê-lo na ocasião próToledo — Subprocurador-Geral da
pria — a da emissão da sentença
República (fls. 43 a 45).
— e sem observar o que estabelece
o art. 384 do C.P.P.
VOTO
10 — Equivocada, porém, afigura-se-nos a tese suscitada no apelo.
O Sr. Ministro Djaci Falcão — O
11 — Não tem aplicação à espé- recurso não merece acolhida. Seguncie o art. 384 do CPP, vez que esse do ficou esclarecido no juizo de oridispositivo diz respeito à hipótese gem, antes de se operar a extinção
112
R.T.J. - 100
da punibilidade, pela prescrição da
pretensão punitiva, o representante
do Ministério Público 1'e-ratificou a
capitulacâo expressa na denúncia,
usando da faculdade prevista no art.
569 do Código de Processo Penal.
Não se cogita, no caso, da incidência
do art. 384, do citado diploma, que
pressupõe a iniciativa do próprio
juiz.
Dai, o acerto do acórdão recorrido
negando a concessão da ordem.
EXTRATO DA ATA
RHC — 58.259 — RJ — Rel.: Min.
Djaci Falcão. Recte.: Hilkias Mari-
nho Nunes. (Adv.: Paulo Fróes Machado). Recdo.: Tribunal de Justiça
do Estado do Rio de Janeiro.
Decisão: Negado provimento. Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djacl Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
Decio Miranda. SubprociwadorGeral da República, o Dr. Mauro
Leite Soares.
Brasília, 26 de setembro de 1980 —
Hélio Francisco Marques — Secretário.
HABEAS CORPUS N? 58.377— DF
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão.
Paciente: Almindo Lopes da Silva — Coator: Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios.
Júri. Legítima defesa putativa. Necessidade do desdobramento
dos quesitos, à semelhança do que se dá na legítima defesa real. No
caso, negado o quesito sobre a injustiça da agressão, deixou de se
configurar a excludente da legítima defesa. Habeas corpus indeferido.
ACORDA()
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade
de votos e na conformidade da ata
do julgamento e das notas taquigráficas, indeferir o pedido.
do em favor de Almindo Lopes da
Silva, em que se alega:
«O paciente foi pronunciado, pelo
Presidente do Tribunal do Júri do
Distrito Federal, em 22 de novembro de 1977, conforme sentença em
anexo, doc. n? 1.
RELATORIO
2 — Libelado em 09 de dezembro
de 1977, conforme doc. n? 2, anexo,
foi dito libelo retificado em 2 de outubro de 1978, consoante doc. n? 3,
junto.
O Sr. Ministro Djaci Falcão:
Trata-se de habeas corpus impetra-
3 — Em 07 de novembro de 1978,
o paciente foi submetido a julgamento pelo Tribunal Popular, con-
Brasilia, 04 de novembro de 1980 —
Djaci Falcão, Presidente e Relator
R.T.J. — 100
forme termo de interrogatório e
Ata anexos, docs. Wh; 4 e 5.
4 — Ao Júri foram formuladas 4
séries de quesitos, conforme cópias
anexas, docs. Ws 6, 7, 8 e 9.
5 — Proferida a sentença em
anexo, doc. nt 10, houve Apelação
da Defesa e da Acusação, consoante termos anexos, docs. Ws 11 e 12.
6 — Para melhor entendimento
de questão jurídica que se tratará
adiante, junta-se também as razões de Apelação da Defesa, doc.
n? 13.
7 — Por Acórdão de 24 de outubro de 1978, o Egrégio Tribunal de
Justiça do Distrito Federal, em
manifesta contradição, deu provimento a Apelação da Defesa, parcialmente, e deu também provimento ao apelo do M P , consoante
ementa a seguir transcrita:
(.(A legítima defesa não se perfaz sem o concurso de todas as
circunstâncias previstas na lei,
as quais quando se cuidar de defesa putativa, deverão ser desdobradas em igual número de quesitos para deliberação do Júri.
Mantém-se o veredito condenatório bem alicerçado na prova dos
autos, provando-se parcialmente
o recurso do réu-apelante somente para reduzir a pena imposta,
face à inexistência de agravantes.
Cassa-se a decisão do Júri
quando em manifesto divórcio
com a prova dos autos, provendose o apelo do Ministério Público
para submeter os outros réus a
novo julgamento.» (junta-se cópia integral do retendo Acórdão,
doc. n? 14).
8 — Ocorre Doutos Ministros,
que o processo é manifestamente
nulo, a partir do julgamento levado
113
efeito pelo Tribunal Popular e. o
Egrégio Tribunal de Justiça do
Distrito Federal, tornou-se autoridade coatora, porquanto, não acatou os reclamados do paciente, embora a Jurisprudência dessa Suprema Corte lhe seja inteiramente favorável, consoante Acórdão proferido no RE n? 61.479. cuja cópia segue anexa, doc. n? 15.
a
9 — Com efeito, a contradição do
julgamento proferido pelo Tribunal
de Justiça do Distrito Federal é
tão gritante, que a própria ementa
manda submeter outros réus a Júri, no caso, olvidando-se de que no
processo a que o paciente responde
não existe co-réus.
10 — A nulidade é absoluta, porque a formulação de outros quesitos, em caso de erro de fato, consoante bem esclarece o Acórdão da
Suprema Corte, tomado como paradigma, provoca nas respostas
dos Senhores Jurados, tremenda
contradição, como ocorreu no presente caso.
11 — No julgamento do RE n?
61.479, trazido St colação, ficou bem
demonstrado que o erro de fato
não se confunde com a leéptima defesa. No caso tratado pelo presente
habeas corpus, o 3? quesito formulado na primeira série, englobava
a tese do erro de fato e sua resposta afirmativa, prejudicava os demais quesitos, como bem já reconheceu o Supremo Tribunal Federal no recurso citado.
12 — Como se vé, o julgamento
do Júri mantido pelo Tribunal
apontado como coator, vulnerou os
artigos 484 e 489, do Código de Processo Penal.
13 — A nulidade apontada é abconsoante o parágrafo único
do artigo 564, do Código de Processo Penal.
soluta
114
R.T.J. — 100
14 — Nulo também é o processo,
em decorrência de haver o Tribunal a pio, cindido o julgamento de
competência do Tribunal Popular.
Não é possível admitir que o mesmo Corpo de Sentença haja acertado e errado ao mesmo tempo. A
decisão não pode ser manifestamente contrária à prova dos autos,
somente parcialmente, como entendeu o Tribunal coator. Ora, a
dar valia ao Acórdão impugnado
pelo presente writ, estaria retirando do Júri a sua soberania Constitucional porque estatia-lhe reconhecendo legitimidade só quando
satisfeitos fossem os interesses do
Ministério Público.
15 — E impossível juridicamente, no caso, cindir o julgamento,
não só porque o libelo é único, mas
sobretudo porque, somente são
cassadas as decisões do Júri manifestamente contrárias à prova dos
autos. Como então ser manifesta
só parcialmente? Como decidiu o
Egrégio Tribunal de Justiça do
Distrito Federal.
16 — A única solução para o caso
é anular o processo a partir do julgamento do Júri, não há outra forma, salvo melhor juízo. Por se tratar de nulidade absoluta é perfeitamente sanável pelo habeas corpus,
dai a impetração» (fls. 2 a 5).
O pedido vem instruído com os documentos de fls. 6 a 43.
Prestadas as informações de fls.
48 a 49, manifestou-se o Ministério
Público pelo indeferimento do pedido
(fls. 51 a 58).
VOTO
O Sr. Ministro Djact Falcão (Relator): Acertado é a meu ver, o entendimento exposto no parecer do Dr.
Alvaro Augusto Ribeiro Costa, In
verbis:
«6 — Não se configurou, em verdade, o argüido erro de questionário, nem ocorreu contradição nas
respostas dadas aos quesitos.
7 — O questionário obedeceu aos
ditames do art. 484, IV e VI do
C.P.P. e, no tocante à circunstância de haver o juiz desdobrado o
quesito relativo à tese do erro de
fato, nenhuma censura lhe deve
ser feita; antes, evidencia o uso de
boa técnica, obstativa de quesitação complexa.
8 — Doutra parte, ao afirmar
que o réu, em conseqüência de erro plenamente justificado, resultante do fato de ter a vítima feito
gesto de que iria apanhar ou pegar
alguma coisa, supôs achar-se diante de uma agressão à sua pessoa
(sic), o júri não emitiu assertiva
incompatível com a resposta ao
quesito seguinte, segundo a qual a
suposta agressão não era injusta.
9 — Outrossim, há que ser feita
distinção entre a hipótese cogitada
nos presentes autos e a subjacente
ao julgamento, na Suprema Corte,
do RE n? 61.479. Na hipótese paradigma, cuidava-se de formulação de quesito concernente à atualidade ou iminência da agressão,
depois de já haver sido respondida
afirmativamente a indagação acerca da ocorrência de erro de fato.
Supõe-se, pela leitura do aresto
modelo (v. fls. 39-43), que o quesito
pertinente ao erro de fato fora redigido de modo a englobar todos os
requisitos necessários à caracterização da tese que lhe dera origem.
Diversa, entretanto, como já se
viu, foi a técnica usada no questionário impugnado pelo impetrante.
R.T.J. — 100
10 — No que diz respeito à alegada incindibilidade do julgamento
pelo júri, igualmente não assiste
razão ao impetrante.
11 — Nesse particular, o voto do
relator da apelação observou:
— «O Egrégio Tribunal de Justiça, em recente sessão plenária,
decidiu, contra meu voto entre
outros, pela cindibllidade do julgamento do Júri. O caso então
versado não guarda nenhuma
analogia com este. Aqui, cogitase do exame de mérito de três
(03) decisões absolutórias e de
uma condenatória, todas distintas entre si.
Por mais forte razão, aqui, o
exame isolado de cada uma daquelas decisões imporá solução
autônoma para cada uma delas.
Assim como o Conselho de jurados julgou separadamente cada
uma das imputações do libelo,
assim também à Turma cumpre
julgar os recursos isolando o mérito de cada um dos crimes.»
12 — E verdade que o art. 79 do
C.P.P. impõe a unidade de processo e julgamento quando houver conexão; e que, ao enumerar as exceções a essa regra, não cogita da hipótese de que ora se cuida.
13 — No entanto, sendo diversos
os pontos da acusação e havendo
autonomia entre as condutas respectivas, nada impede que subsista
julgamento na parte que não foi
objeto da irresignação do Ministério Público, porquanto a unidade
de julgamento dos crimes conexos
não é absoluta (v. HC n? 53.108-GB,
2! T., Rel.: Min. Xavier de
Albuquerque, aud. de publicação
de 05-03-75).
115
Pelo indeferimento do writ, em
face do exposto, é o parecer» (fls.
56 a 58).
Realmente, «o questionário da
legitima defesa putativa deve ser
desdobrado em tantos quesitos quantos são os da legitima defesa real».
E o que sustenta o Prof. José Frederico Marques, invocando a jurisprudência (ver «O Júri no Direito Brasileiro», 2! edição, pág. 269).
Na mesma diretriz coloca-se o
Prof. Hermino Alberto Marques Porto, ao versar o tema no livro «Júri»,
pág. 266, no qual observa que a decisão tomada no RE 61.479, relatada
pelo saudoso e eminente Ministro
Hermes Lima (RTJ 45/ 4fY7), é de todo isolada.
Ante o exposto, indefiro o pedido.
EXTRATO DA ATA
HC-58.377 — DF — Rel.: Min.
Djaci Falcão. Pacte.: Almindo Lopes
da Silva. Impte.: Jason Barbosa de
Faria. Coator: Tribunal de Justiça
do Distrito Federal e dos Territórios.
Decisão: Indeferido o pedido, à
unanimidade de votos.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República, Dr. Mauro Leitão Soares.
Brasília, 04 de novembro de 1980 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
R.T.J. — 100
116
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 58.423 — GO
(Primeira Turma)
Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Soares Mufioz.
Recorrente: Rubens Antonio Ferreira Rosa — Recorrido: Tribunal de
Justiça do Estado de Goiás.
Denúncia. Co-autoria.
Não há dúvida de que a denúncia deve conter a exposição do fato
criminoso com todas as suas circunstâncias (art. 41 do C.P.P.) e que,
em se tratando de autoria coletiva, é indispensável que a peça inicial
da ação penal descreva, ainda que resumidamente, a conduta delituosa de cada um dos participantes (RE 75.401-SP, relatar Mln. Bilac
Pinto).
Todavia, o cumprimento dessas exigências formais pressupõe que
as indagações policiais forneçam ao órgão do Ministério Público as
mencionadas circunstâncias e particularidades. Omisso ou falho que
seja o inquérito a respeito das circunstâncias do fato criminoso ou da
participação individual dos seus co-autores, nem por isso o órgão do
Ministério Público estará impedido de oferecer a denúncia, visto que,
para a instauração da ação penal, basta a prova da existência do crime e indícios da autoria.
Recurso de habeas corpus desprovido.
ACORDACr
Vistos,
Acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Primeira Turma, por maioria de votos, e na conformidade das notas taquigráficas,
negar provimento ao recurso.
Brasília, 18 de novembro de 1980 —
Thorapson Flores, Presidente —
Soares Munas, Relatar pio acórdão
RELATORIO
O Sr. Ministro Cunha pacato: O
parecer da Procuradoria-Geral da
República, subscrito pelo Dr. Alvaro
Augusto Ribeiro Costa e aprovado
pelo Professor Francisco de Assis
Toledo, ilustrado Subprocurador-Geral, retrata com fidelidade a espécie
sub judice, In verbis:
1 — «O paciente responde a processo em que lhe é imputada a coautoria no crime de roubo qualificado (art. 157, § 2?, 1 e II do C.P.).
2 — Em seu favor, foi impetrado
habeas corpus, mediante alegativa
de nulidade da denúncia, que,
asem descrever o modo como o paciente teria concorrido para a prática do delito» (sie), seria «omissa
no tocante a requisito essencial e,
por conseguinte, inepta, confusa,
polêmica e sem técnica» (sic, (ls.
03).
3 — Tendo sido denegado o writ
pelo are-sto de fls. 29-31, o impetrante reiterou as alegações inicialmente deduzidas, o que fez
através do apelo de fls. 32-35.
4 — Improcede, todavia, a irrasignação em causa.
5 — Ao prestar as informações
de fls. 20-21, a autoridade inicialmente apontada como coatora assinalou:
— «Realmente, o paciente foi
preso e autuado em flagrante delito, à 01 hora da madrugada, do
dia 14 do mês de agosto p.p., pelo
R.T.J. — 100
Dr. Delegado de Policia do Primeiro Distrito Policial desta Comarca, acusado de ter, juntamente com Antonio da Silva Lima Filho e dos menores: Ronaldo
Ferreira Rosa e Aloysio Ferreira
Silva, assaltado a Milton Rodrigues da Silva e Elcio de Assis, na
Praça Tamandaré, nesta Capital.
Também é verdadeiro que o representante do Ministério Público, em exercido legal, neste
Juizo, ofereceu denúncia contra o
paciente e Antonio da Silva Lima
Filho, incursando-os nas penas
do artigo 157, g 2?, incisos I e II
do Código Penal Brasileiro, e a
denúncia está redigida, exatamente conforme o exposto pelo
Dr. Advogado impetrante.
A denúncia foi, sim, por mim
recebida e, ao recebê-la, estive
atento às diretrizes dos artigos 41
e 42 do Código de Processo Penal, não encontrando nenhuma
justificativa legal para rejeltá-la.
Veja Vossa Excelência que o
paciente praticou o delito, segundo ele próprio narra, nas declarações que prestou em Polícia,
em companhia de mais três elementos, num trabalho conjunto,
praticando, todos eles, atos indistintos de execução do crime.
Entendo, pois, que, em casos
como tais, não exige a lei que a
denúncia descreva com minúcias, a participação de cada
agente na prática do assalto, sobretudo, quando, nem os próprios
assaltantes fazem esta distinção.
6 — Diante das considerações
acima enunciadas, afigura-se incensurável o aresto recorrido,
quando pondera:
«Bem examinada a peça atacada, vê-se que, embora de forma
resumida, descreve os fatos e
circunstâncias que levaram à
classificação final do delito.
117
Induvidosamente qualificado o
paciente, atribui-lhe haver, com
outro comparsa, igualmente qualificado, ambos armados, assaltado as duas vítimas, de quem
subtraíram importâncias em dinheiro, além do carro, abandonando-as, posteriormente, em um
dos setores desta Capital.
Suficientemente descritos o
roubo e as circunstâncias autorizadoras do aumento da pena,
consistentes no uso de arma e
concurso de duas pessoas, pelo
menos.
Suscinta a peça vestibular no
processo, mas precisa a acusação.
Nulidade, na hipótese, haveria
se embaraço intransponivel ou
cerceamento resultasse para a
defesa, de tal modo que impossível lhe fosse exercitar-se de
maneira objetiva e eficiente.
A denúncia, porém, além de
narrar os fatos com clareza, conquanto sumariamente, ainda se
reporta ao inquérito que a instrui, e onde poderão ser supridos
pequenos defeitos que porventura
encerre.
Cumpre, ademais, notar que,
em se tratando de ação conjunta,
nem sempre é possível precisar,
já na fase inaugural da ação penal, a conduta delitiva de cada
um, o que será buscado na instrução criminal, quando não desnecessária a particularização,
por haverem todos, de igual forma, concorrido para o evento delituoso.
Não é inepta a denúncia que,
embora suscintamente, narra o
fato delituoso e suas circunstâncias, possibilitando à defesa
exercitar-se de maneira objetiva
e incircunscritas».
R.T.J. — 100
118
7 — E certo que a jurisprudência
tem considerado indispensável a
individualização, na denúncia, das
condutas dos participes do delito
em hipóteses de autoria coletiva.
8 — Não há de ser entendida, porém, de modo absoluto essa orientação, porquanto hipóteses há —
como a dos autos — em que a conduta dos co-autores se dá de maneira indistinta, sendo impossível
individualizá-la. Em tais casos, se
a descrição da maneira como ocorreram os fatos propicia à defesa
amplo exercício de contraditório,
não há motivo para decretação de
nulidade.
O parecer, em face do exposto,
sugere o inlprovimento do recurso».
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): 1 — A denúncia, cuja inépcia
formal é alegada pelo recorrente
(cópia «xerox» de fl. 22), está vazada nos seguintes termos:
«O infra-assinado, 13? Promotor
de Justiça em Goiânia, por suas
atribuições legais, vem com base
no inquérito policial junto, denunciar Antonio da Silva Lima Filho,
brasileiro, solteiro, mecânico, com
22 anos de idade, natural de Belo
Horizonte — M.G. residente no
«Hotel do Silvio» próximo a Estação Rodoviária do Dergo e Rubens
António Ferreira Rosa, brasileiro,
solteiro, sem profissão, com 18
anos de idade, residente na Rua U80A, Quadra 54, Lote 14, Vila
União, pelo fato delituoso que abaixo expõe.
As últimas horas do dia 13 do
mês fluente, Milton Rodrigues da
Silva e Elcio de Assis, aqui vítimas, se encontravam na Praça Tamandai-é, quando conversavam no
interior de um carro FIAT de propriedade de Elcio. De repente surge 2 dois elementos armados de f aca e uma mauser Beretta, obrigando-os a passarem para o banco trazeiro do veículo onde estavam. Daí, deslocaram o carro, e,
adiante, pegaram dois outros marginais e foram para o Setor Sul,
onde deixaram as vítimas, depois
de roubarem da primeira uma bolsa de couro contendo documentos
pessoais e a quantia de Cr$ 500,00,
roubando da segunda vitima o carro FIAT e a quantia de Cr$ 1140,00
em dinheiro.
Face ao exposto pede-se a instauração do processo-crime,
citando-se o indiciado para todos
os seus termos, pena de revelia,
com intimação das testemunhas
abaixo arroladas, por ter o referido indiciado incorrido nas sanções do artigo 157, § 2?, incs. I e
II do Código Penal».
2 — Embora lamentável que urna
ação penal não possa prosperar pelo
descuido na feitura de uma peça
simples como é a denúncia, a leitura
da peça cuja invalidade se pretende,
e que acabo de fazer em todo o seu
teor, demonstra, «hl ictu oculi», que
não foram atendidos os requisitos legais indispensáveis à formulação de
uma acusação.
Em primeiro lugar, o denunciante
sequer esclareceu se os «dois elementos» referidos na denúncia seriam os denunciados parecendo, à
primeira vista, que estes respondem
por atos praticados por terceiros não
identificados.
Pode-se alegar estar implícito na
denúncia tratar-se dos acusados, entre eles o paciente. Mas, examinando-se a denúncia imparcialmen-
R.T.J. — 100
te, pode-se chegar também à conclusão oposta, ou seja, que a acusação
foi formulada contra quem não cometera o delito.
Em segundo lugar, refere-se expressamente a peça vestibular acusatória a quatro agentes do crime,
deixando de esclarecer porque omitira na acusação dois deles.
119
tos» nela mencionados seriam efetivamente os acusados, bem como ao
motivo pelo qual deixou de incluir na
acusação dos dois participes, conduz
à perplexidade, dificultando a defesa.
Nem se alegue, como fez o egrégio
Tribunal a quo que os autos de inquérito, por referidos na vestibular
acusatória, supririam tais lacunas,
pois a ação penal se instaura com a
denúncia, cujos requisitos de validade estão taxativamente expressos no
art. 41 do Estatuto Processual.
É certo que o auto de prisão em
flagrante, juntado aos autos com a
informação do Juiz indigitado coator, esclarece que dois assaltantes
seriam menores de dezoito (18) anos
e, portanto, inimputáveis. Mas tal
Entendo, com a jurisprudência reifato não consta da denúncia, e forço- terada e pacífica desta Excelsa Corsamente dela teria de constar, mes- te, que a denúncia não deve conter
mo porque a exclusão sem justifica- obrigatoriamente elementos secuntiva ofenderia o princípio da indivisi- dários, facilmente identittcáveis nas
bilidade da ação penal, além de omi- peças do inquérito.
tir agravante expressamente previsAmpliar-se essa jurisprudência,
ta no art. 45, III, do Código Penal,
caso a participação dos menores não entretanto, ao ponto de se pretender
pudesse tipificar o crime previsto no que o inquérito policial substitua a
denúncia, naquilo de essencial que
art. 1? da Lei n? 2.252, de 01-7-54.
ela deve conter, seria estabelecer o
Por outro lado, o já mencionado caos no processo penal, não podendo
auto de prisão em flagrante, no qual as partes, sequer, apreender os limiforam ouvidos, além das testemu- tes em que foi posta a lide. E é evinhas sacramentais, as vitimas e os dente que essa subversão da ordem
indiciados, fornece, conforme já di- processual provoca objetivamente
to, todos os elementos necessários à um cerceamento de defesa incomformulação de uma acusação eficaz, patível até mesmo com preceito
que atenda as exigências legais, fato constitucional.
este que invalida o argumento do
3 — Pode-se argumentar que a
acórdão recorrido, endossado pela
douta Procuradoria-Geral, sobre a inépcia da denúncia, se reconhecida,
impossibilidade de se descrever o fa- implicará na soltura dos réus, com
to delituoso com todas as suas cir- possível prejuízo para a ordem púcunstâncias elementares, conforme blica.
exigido no art. 41, do Código de ProContraponho a este argumento, encesso Penal.
tretanto, o de que maior prejuízo, inE certo que algumas dessas falhas clusive para a ordem pública, é a inpoderiam ser supridas oportunamen- segurança do cidadão provocada pelo
te, nos termos da lei. Não é menos desrespeito às normas legais, sejam
certo, entretanto, que uma denúncia elas do direito material ou formal,
lacunosa, omissa inclusive quanto à mesmo porque o afastamento comreal participação dos denunciados no pulsório do convívio da sociedade só
evento criminoso, vez que sequer in- encontra amparo no principio consaforma com clareza se os «elemen- grado da paz e segurança social.
120
R.T.J. — 100
4 — Convicto de que a denúncia,
no caso sub indica não contém descrição de elementos essenciais
passíveis de proporcionar uma defesa eficaz, dou provimento ao recurso, para, reconhecendo a inépcia formal dessa peca preambular acusatória, anular o processo, reinstaurando-se a ação penal com obediência aos ditames legais.
E nos termos do art. 580 do Código
de Processo Penal, estendo os efeitos
dessa decisão ao co-réu António da
Silva Lima Filho.
Determino, em conseqüência, a expedição de alvaPás de soltura a favor de ambos os denunciados, ultrapassados que estão os prazos para
conclusão da instrução criminal.
denúncia deve conter a exposição do
fato criminoso com todas as suas
circunstâncias (art. 41 do C.P.P.) e
que, em se tratando de autoria coletiva, é indispensável que a peça inicial da ação penal descreva, ainda
que resumidamente, a conduta delituosa de cada um dos participantes
(RE 75.401-SP, relator Min. Bilac
Pinto).
O cumprimento dessas exigências
formais pressupõe que as indagações
policiais forneçam ao órgão do Ministério Público as mencionadas circunstâncias e particularidades.
Omisso ou falho que seja o inquérito
a respeito das circunstâncias do fato
criminoso ou da participação individual dos seus co-autores, nem por isso o órgão do Ministério Público estará impedido de oferecer a denúncia, visto que, para a instauração da
EXTRATO DA ATA
ação penal, basta a prova da existência do crime e indícios da autoRHC 58.423 — GO -- Rel.: Min. Cu- ria.
nha Peixoto. Recte.: Rubens Antonio
No caso sub judice, o paciente, inFerreira Rosa (Adv.: Paulo Nasser).
Recdo.: Tribunal de Justiça do Esta- terrogado no auto de prisão em flagrante, confessou ter praticado o asdo de Goiás.
salto dizendo, textualmente:
Decisão: Adiado o julgamento por
*que na data de ontem, por volta
haver pedido vista o Ministro Soares
das 23,00 horas, mais ou menos, o
Mialloz, após os votos dos Ministros
declarante juntamente com AntoRelator e Rafael Mayer, que davam
nio da Silva Lima Filho e dos meprovimento ao recurso.
nores Ronaldo Ferreira Rosa e
Aloysio Pereira da Silva, ambos de
Presidência do Senhor Ministro
16 anos de idade, resolveram assalThompson Flores. Presentes à Sestar e roubar um veículo FIAT que
são os Senhores Ministros Xavier de
se achava estacionado na Praça
Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares
Tamandaré desta capital, bem coMufioz e Rafael Mayer. Subpromo os ocupantes do mesmo: que,
curador-Geral da República, Dr.
depois de coagirem as vitimas,
Francisco de Assis Toledo.
determinando-as para que passassem para o banco trazeiro, levaBrasília, 11 de novembro de 1980 —
António Carlos de Azevedo Braga,
ram as mesmas até o Setor Sul,
Secretário.
para logo em seguida abandonáIas; que, de posse do veículo e dos
VOTO (VISTA)
pertences das vitimas, o declarante e seus colegas se dirigiram até a
O Sr. Ministro Soares Mufioz: Sr.
Praça Cívica, a fim de comprarem
Presidente, não há dúvida de que a
gasolina, local onde foram detidos
R.T.J. — 100
pelos policiais da R.P. 011, que os
conduziram a este Distrital; que o
declarante já foi preso várias vezes; que esclarece mais o declarante que, quanto a arma, tipo «Beretta» usada no crime, eles a jogaram
debaixo de um «táxi» estacionado
na Praça Bandeirantes, enquanto
que a faca, tipo punhal, foi apreendida em poder do declarante e seus
companheiros» ( fls. 16).
Idênticas são as declarações do outro acusado (fls. 15 e v.).
De seu turno, as duas vítimas, depondo no auto de prisão em flagrante, declararam, cada uma a sua vez:
«que no momento em que o declarante se achava conversando
com Elcio de Assis (nome da outra
vitima) no interior do veiculo
FIAT eis que se aproximam do
veículo dois indivíduos , um de cada lado do carro, estando ambos
armados com faca e «Beretta»;
que, logo em seguida ditos individuos coagiram o depoente e
seu amigo no sentido de passarem
para o banco trazeiro do carro e
assim feito, os citados indivíduos
colocaram o FIAT em movimento
e após andarem por alguns metros
pararam o veículo, momento em
que mais dois indivíduos adentraram no mesmo carro; que, nova
-ment,oviculfpsmvimento, tendo aqueles indivíduos
abandonado o depoente e seu amigo Elcio de Assis no Setor Sul,
que, dai o depoente e seu amigo
Elcio pegaram uma carona, voltando para a Praça Tamandaré,
local onde se deu o fato e, quando
procuravam os policiais, tomaram
conhecimento de que os acusados
já haviam sido agarrados» (fls. 13,
14 e 15).
Razão assiste ao parecer da
Procuradoria-Geral da República,
121
quando, após salientar que a jurisprudência tem considerado indispensável a individualização, na denúncia, das condutas dos participantes
do delito em hipótese de co-autoria,
acentua que «não há de ser entendida, porém, de modo absoluto essa
orientação, porquanto hipóteses há,
— como a dos autos — em que a conduta dos co-autores se dá de maneira indistinta, sendo impossível
individualizá-la. Em tais casos, se a
descrição da maneira como ocorreram os fatos propicia à defesa amplo
exercício do contraditório, não há
motivo para a decretação da nulidade» (fls. 49).
Realmente, confrontados os elementos constantes do auto de prisão
em flagrante, única peça probatória
juntada aos autos do writ, e os termos da denúncia, verifica-se que esta contém, ainda que resumidamente, o fato criminoso e as suas circunstâncias essenciais. A participação dos dois assaltantes se fez conjuntamente, sem atos distintos. A
falta, na denúncia, de alusão aos menores, referidos no auto de prisão
em flagrante, não constitui causa de
nulidade absoluta, mesmo porque as
vítimas não incluiram, como participantes do assalto, os dois outros individuos que, depois deles, segundo
elas, entraram no automóvel, e nenhuma alusão fizeram a menores.
Se a instrução vier a esclarecer
qual tenha sido a participação de cada um dos acusados no assalto, e,
bem assim, o concurso de outras
pessoas, nada impedirá que tais particularidades sejam apreciadas na
sentença final, observadas pelo juiz
as regras estabelecidas no artigo 383
e 384 do Código de Processo Penal,
inclusive providenciando em que o
Ministério Público adite a denúncia, se houver possibilidade de nova
definição jurídica que importe na
R.T.J. — 100
122
aplicação de pena mais grave ou na
de serem incluídos outros acusados
na ação.
Reconheço a existência dos outros
defeitos apontados no douto voto do
eminente Ministro Cunha Peixoto;
penso, entretanto, que eles não bastam para qualificar a denúncia de
inepta.
Ante o exposto, nego provimento
ao recurso, com a máxima vênia dos
respeitáveis votos dos eminentes Ministros Cunha Peixoto e Rafael Mayer.
VOTO
O Sr. Ministro Xavier de
Albuquerque: Sr. Presidente, nego
provimento ao recurso, com a
máxima vênia do eminente Ministro
Cunha Peixoto.
Estou de acordo, em princípio,
com as linhas gerais e doutrinárias
do voto do eminente Relator, mas temo que S. Exa. se haja excedido em
rigor, quando, ao fazer a critica da
denúncia, concluiu por sua inépcia e
inteira desvalia. Parece-me que, dados os necessários descontos, diante
da realidade cotidiana da nossa Justiça Criminal, é possível contemporizar com os defeitos que, se existentes na denúncia, não me parece que
levem à sua imprestabilidade.
Acompanhando o voto do eminente
Ministro Soares Mufioz, também nego provimento ao recurso.
VOTO
O Sr. Ministro Thompson Flores:
(Presidente) — Peço vênia para
acompanhar os votos dos eminentes
Ministros Soares Miuloz e Xavier de
Albuquerque.
Como eles, admito que inepta não
é a denúncia; atende ela, a meu ver,
quanto satis, para levar ao conhecimento do recorrente, qual a acusação que lhe faz o Ministério Público,
de molde a que se possa, com amplitude, dela, acusação, ge 'defender.
Além disso, aliada aos elementos
do flagrante e demais subsídios decorrentes do inquérito que instruem
a respectiva denúncia, mais nitidamente se pode capacitar da amplitude do crime que se lhe imputa, bem
como as circunstâncias em que teria
sido praticado.
Por fim, quaisquer omissões ou retificações outras podem ser feitas no
decurso da instrução, até à sentença,
como é expresso o C.P.P.
Assim, também nego provimento
ao recurso, data venia.
EXTRATO DA ATA
RHC 58.423 — GO — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Recte.: Rubens Antonio
Ferreira Rosa (Adv.: Paulo Nasser) .
Recdo.: Tribunal de Justiça do Estado de Goiás.
Decisão: Negado provimento ao recurso, vencidos os Mins. Relator e
Rafael Mayer.
Presidência do Sr. Ministro
Thompson Flores. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mufoz e Rafael Mayer. SubprocuradorGeral da República, Dr. José Francisco Resek.
Brasília, 18 de novembro de 1980 —
António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
R.T.J. — 100
123
HABEAS CORPOS N? 58.464 — DF
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves.
Paciente: Márcio Barbosa Lima — Aut. Coatora: Tribunal de Justiça do
Distrito Federal e dos Territórios.
Habeas corpus. Júri. Quesitos. Excesso culposo em legitima defesa. Utile per Mutilem non vitiatur.
Alegada a legitima defesa, ainda quando os jurados respondam
negativamente ao quesito relativo ao uso de meios necessários, mister se faz, sob pena de nulidade do Julgamento, se manifestem sobre
aquele que lhe é complementar, e que diz respeito á ocorrência, ou
não, do excesso culposo.
Tratando-se, porém, de condenação por dois crimes distintos,
com penas aplicadas especificamente com relação a cada um deles
(e, no caso, são diversas, dada a diferença de circunstâncias), é de
aplicar-se o principio segundo o qual utile per Mutilem nom vitiatur,
uma vez que, com referência à série de quesitos relativa a um deles,
não se verificou o vício acima aludido.
Habeas corpus deferido em parte.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, deferir, em parte, o pedido de habeas
corpus.
Brasília, 14 de novembro de 1980 —
Djaci Falcão, Presidente — Moreira
Alves, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Moreira Alves: São
estas as informações prestadas pelo
Exmo. Sr. Presidente do Tribunal de
Justiça do Distrito Federal (fls.
18/19):
«a) O paciente foi denunciado,
processado e pronunciado nas penalidades do artigo 121, duas vezes, combinado com os artigos 12,
II e 51, todos do Código Penal.
Libelado e submetido a julgamento pelo Tribunal Popular, em
sessão realizada em 8 de fevereiro do ano fluente, o Júri reconheceu que o paciente tentou contra a
vida de Paulo Roberto Martins e
Durval Cândido Martins, filho e
pai, respectivamente.
Todavia, quanto à primeira
série de quesito, negou-se a escludente de criminalidade prevista no
artigo 19, II, do Código Penal legitima defesa.
Entretanto, na segunda série, o
Júri reconheceu que o fato foi praticado em defesa da pessoa do paciente, caindo a excludente no quesito da moderação dos meios usados, por cinco votos contra dois.
Efetivamente, não foi questionado ao Júri o excesso.
d) Em decorrência, o ilustre
Presidente do Tribunal julgou prejudicados os quesitos restantes,
com exceção ao relativo à existên-
124
R.T.J. - 100
eia de circunstância atenuante,
prolatando, em seguida, a sentença. Condenou o paciente a cumprir
a pena de sete anos de reclusão pelas duas tentativas.
e) Inconformado, o condenado
apelou da decisão. Processado regularmente o recurso, o Representante do Ministério Público opinou,
preliminarmente, pelo provimento,
por entender que o Egrégio Supremo Tribunal Federal eté totalmente
favorável à tese do apelante».
Entretanto, a douta Câmara Criminal houve por bem negar provimento ao recurso, à unanimidade,
em sessão realizada em 23-10-80.
Para melhores esclarecimentos,
junto seguem fotocópias dos quesitos, termos de votação, sentença e
parecer do M.P.»
A fls. 30/31, assim se manifesta a
Procuradoria-Geral da República,
em parecer do Dr. Cláudio Lemos
Fonteles:
«A pretensão liberatória requerida pelo Dr. Raul Livino Ventim de
Azevedo em favor de Márcio Barbosa Lima proclama a nulidade do
julgamento pelo Conselho de sentença porque, uma vez negada a
necessidade dos meios usados na
repulsa à agressão injusta e iminente, reconhecida previamente,
não poderia o MM. Juiz Presidente
dar por prejudicado, como fez, as
demais indagações atinentes à moderação na utilização destes meios
e ao excesso, se doloso, ou culposo
(vide: fls. 8).
Procede a pretensão, porque embasada em vasta manifestação jurisprudencial, inclusive desta Suprema Corte, como mencionado a
fls. 3/6, e o seu conhecimento originário é autorizado, porque se bem
que inexistente nos autos o teor
completo do julgado colegiado, cer-
tidão há assentando terem sido rejeitadas as preliminares suscitadas
pela defesa — fls. 28 —, no recurso
de apelação, e o parecer da
Subprocuradoria-Geral da Justiça,
no apelo, alude ao tema,
emprestando-lhe a adesão, não
acolhida judicialmente (vide: fls.
26/27).
Pelo deferimento do solicitado
para que, anulado in totum o julgamento, pois se duas (2) séries de
quesitos foram propostas ao Conselho de Sentença, e só em uma delas reconheceu-se o vício insanável
— fls. 20/21 e 22/23 —, nem por isso examinar-se-á a realidade do
ato único de decidir, ainda que sob
forma complexa, seja Márcio Barbosa Lima submetido a novo Júri
pelos eventos perpetrados.),
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator). No caso, como duas eram as
vítimas, houve duas séries de quesitos. Na primeira, relativa à vítima
Paulo Roberto Martins, não houve
qualquer vicio, uma vez que os jurados negaram o quesito da legítima
defesa. Na segunda, referente à vitima Durval Cândido Martins, a legitima defesa foi admitida, negado, Porém, o quesito de serem os meios necessários, razão por que os demais
quesitos foram tidos como prejudicados.
Ora, esta Corte já firmou o entendimento de que — como ainda recentemente julgou esta Segunda Turma,
no HC 57 625 — « alegada a legítima
defesa, ainda quando os jurados respondam negativamente ao quesito
relativo ao uso dos meios necessários, mister se faz, sob pena de nulidade do julgamento, se manifestem
sobre aquele que lhe é complementar, e que diz respeito à ocorrência,
ou não, do excesso culposo».
R.T.J. — 100
Sucede, porém, que o vício em
causa só ocorreu com relação á vitima Durval Cândido Marfins, tendo a
sentença condenado o paciente por
concurso material de crimes, estabelecendo penas distintas para cada
um deles, como se lê, a fls. 10:
«Vistos, etc.
Na conformidade da decisão do
Júri, reconhecendo haver o réu
Márcio Barbosa de Lima praticado, por duas vezes, o crime previsto no artigo 121 c/c o art. 12 item
II, todos do Código Penal, condenoo: a) em relação à vitima Paulo
Roberto Martins, à pena base de 7
anos de reclusão, diminuindo-a de
4 anos e 6 meses, tornando-a definitiva em 2 anos e 6 meses de reclusão; b) em relação à vitima
Durval Cândido Martins, à pena
base de 7 anos de reclusão,
diminuindo-a de 2 anos e 6 meses,
tornando-a definitiva em 4 anos e 6
meses de reclusão, penas estas
aplicadas cumulativamente por
força do artigo 51 caput do Código
Penal, totalizando, 7 anos de reclusão.
Na fixação da pena, considerei
as diretrizes previstas no artigo 42
do Código Penal, especialmente os
antecedentes do réu, anteriormente condenado por tentativa de furto; á menor e maior intensidade
das lesões sofridas pelas vitimas,
bem como ao reconhecimento, por
parte do Júri, de militar circunstância atenuante especifica ( artigos 48, III do Código Penal) a favor do réu. O réu não possui as
condições previstas na Lei 5.941/73,
razão pela qual deve ser o mesmo
recomendado na prisão em que se
encontra.
Custas, pelo condenado cujo nome será lançado no rol dos culpados.
Publique-se e intime-se.».
125
Assim sendo, e tendo em vista o
princípio jurídico segundo o qual
utile per mutilem non vitiatur, não
há razão, já que se trata de dois crimes distintos, com vítimas diversas,
e praticados — como reconheceu o
próprio júri — em circunstâncias diferentes (daí, a diversidade de penas), para que se anule a decisão
com relação àquele dos dóis com relação ao qual não houve qualquer
nulidade.
Em face do exposto, defiro, em
parte, o presente habeas corpus, para, declarando a nulidade do julgamento apenas no tocante à vitima
Durval Cândido Martins (mantida,
portanto, a condenação no concer:
nente à vitima Márcio Barbosa de
Lima), determinar que seja o paciente submetido a outro julgamento
pelo Júri quanto à primeira das duas
mencionadas vitimas.
EXTRATO DA ATA
HC. 58.464 — DF — Rel.: Min. Moreira Alves. Pacte.: Márcio Barbosa
Lima (Impte.: Raul Livino Ventim
de Azevedo). Coator: Tribunal de
Justiça do Distrito Federal e dos
Territórios.
Decisão: Concedido em parte nos
termos do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Moreira Alves e Decio Miranda. Ausente, justificadamente, o Senhor
Ministro
Cordeiro
Guerra.
Subprocurador-Geral da República,
o Dr. Mauro Leite Soares.
Brasília, 14 de novembro de 1980 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
R.T.J. - 100
126
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 58.527 — PR
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves.
Recorrente: João Maria de Oliveira — Recorrido: Tribunal de Justiça do
Estado do Paraná.
Habeas carpes. Excesso de prazo. Competência. Justiça Militar
Estadual.
Excesso de prazo superado.
Civil que comete crime militar em co-autoria com policial militar estadual. Impossibilidade de cisão do fato. Continência Precedentes do STF: RHC 57.540 e FtHC 57.624.
Recurso ordinário a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taquigráfIcas, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso ordinário.
Brasília, 18 de dezembro de 1980 —
Djaci Falcão, Presidente — Moreira
Alves, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Moreira Alves: É
este o teor do acórdão recorrido (fls.
38/39):
«Acordam, em Grupo de Câmaras Criminais, à unanimidade de
votos, denegar a ordem.
Assim decidem, porque improcedente a alegação da inicial de
encontrar-se o paciente preso em
virtude de prisão preventiva decretada pelo Dr. Juiz de Direito da
Comarca de Cornai° Procópio, incompetente ratione materiae, por
ter este egrégio Grupo de Câmaras
Criminais, ao julgar o conflito de
jurisdição n? 4/80, firmado a competência da Justiça Militar do Estado para o respectivo processo
(fls. 17 a 20).
Com efeito, revelam os autos que
o acusado teve a sua prisão cautelar decretada pelo ilustre juiz Auditor da Justiça Militar Estadual,
em 27 de agosto próximo findo, seguindo o processo os seus trâmites
regulares, no juízo competente, fls.
29 a 30 e 31 a 32.
Diante disso, torna-se obviamente sem objeto o segundo argumento
da impetração, ligado ao excesso
de prazo.
Não há, pois, constrangimento a
sanar através do presente writ.
Custas na forma da lei.»
Interposto recurso ordinário, sobre
ele assim se manifesta a Procuradoria-Geral da República, em parecer do Dr. Francisco de Assis Toledo
(fls. 56/59):
«Argüindo excesso de prazo de
custódia provisória e ilegalidade
do decreto cautelar — vez que exarado por juiz Incompetente — pleiteou o paciente o wrft, colimando
soltura.
O pedido foi denegado pelo aresto de fls. 38/39.
Dai, o apelo de fls. 41/43, mediante o qual o paciente, além de
reiterar as alegações inicialmente
deduzidas, sustenta que não poderia, na qualidade de civil — e em
R.T.J. — 100
face do art. 144, § 1?, d, da vigente
Lei Maior — ser julgado perante a
Justiça Militar estadual.
As informações de fls. 26 — prestadas a 6/10/80 — noticiam, In
verbis:
«Foi decretada a prisão preventiva do réu pelo MM. Juiz de
Cornélio Procópio, em data de 17
de janeiro do corrente ano.
O conflito de Jurisdição n? 4-80
tornou nulo o decreto de prisão
preventiva (Acórdão 9.314).
Por este Juiz Auditor foi decretada a prisão preventiva do réu
João Maria de Oliveira e outros,
em data de 27 de agosto do ano
corrente.
O acusado foi interrogado em
data de 19 de setembro passado.
(Anexo fotocópias)».
Pelo que se vê do documento de
fls. 45, a denúncia contra o paciente foi recebida a 26/8/80, pelo Juiz
Auditor. Superada, portanto, ficara
a demora ocorrida antes dessa data, noticiada pelo requerente a
11.8.80 (fls. 03).
No que diz respeito à argüida incompetência do Juizo castrense,
deve ser notado, em primeiro lugar, que o processo tem curso no
foro militar em virtude de acórdão
proferido no julgamento do Conflito de Jurisdição n? 04/80 — pelo
Grupo de Câmaras Criminais do
Tribunal de Justiça do Estado do
Paraná — assentado nas considerações assim deduzidas:
«De acordo com o relato dos
acusados que invadiram a cadeia
pública para libertar os presos,
vários policiais estão envolvidos
no evento, além de estarem acusados de receberem vultosa soma em dinheiro para levarem a
termo o assalto, que culminou
com a libertação de todos os presos recolhidos naquele presidio.
127
Os marginais que invadiram a
cadeia pública, por ocasião da invasão furtaram quatro revólveres, sendo três deles pertencentes a Policia Militar, e um outro
a um civil.
Após várias investigações, a
policia conseguiu prender três
dos marginais liberados da cadeia pública.
O plano estava adredemente
preparado com auxilio principalmente do soldado Silvestre, que
invadiram a Delegacia e libertaram os presos.
Os marginais presos posteriormente, confessaram a participação dos milicianos, que receberam certa importância em dinheiro para facilitar a invasão à
Delegacia.
A doutra Promotoria de Justiça, também entende que os indiciados pertencem só aos quadros
da vida civil, como militar filiados a Policia Militar do Estado.
O parecer da ProcuradoriaGeral da Justiça, opinando fosse
julgado improcedente o conflito
negativo de jurisdição, está
apoiado em recente acórdão do
Excelso Pretório que assim decidiu: «A separação do processo,
para submeter os civis ao Juizo
da Justiça comum e os militares
ao Juízo da Justiça Militar, importaria em cindir um só e mesmo fato delituoso para transferir
a apreciação e julgamento de
Juízes diversos, arriscando comprometer o prestigio da Justiça.
Um mesmo fato, praticado nas
mesmas circunstâncias de tempo, lugar e resultado, não pode
sofrer valoração diversificada».
O Capítulo V, que trata da
competência por conexão ou continência, em seu artigo 78, inciso
IV, do C.P.P. define com acerto
a competência da Justiça Mili-
128
R.T.J. — 100
tar, quando especifica que: no
concurso entre a jurisdição comum e a especial, prevalecerá
esta, considerando-se mesmo que
é impossível cindir a ação dos coautores».
Não vemos, data venta, o que reparar nessa decisão, pois também
já sustentamos ponto de vista idêntico no RHC 57.624 e no RHC
57.540.
Pelo improvimento é o parecer.»
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): Acolho integralmente o parecer da Procuradoria-Geral da República que bem demonstra, não só que
está superado o excesso de prazo
alegado, mas também que, no caso,
não há a pretendida incompetência
da Justiça Militar Estadual, uma
vez que se configura hipótese já examinada por esta Corte nos RHC
57.540 e 57.624, 2! Turma, relator o
Sr. Ministro Decio Miranda, e em
cujas ementas se lê:
«Competência. Justiça Militar.
Civis que, em co-autoria com OfI-
dal da Força Pública Militar estadual, cometem crime militar. Impossibilidade de cisão do fato. Continência que acarreta a fixação da
competência da Justiça Militar,
nos termos do art. 78, IV, do CPP,
e 9?, III, a, do CPM».
Nego, pois, provimento ao presente recurso.
EXTRATO DA ATA
RHC 58.527 — PR — Rel.: MM.
Moreira Alves. Recte.: João Maria
de Oliveira (Adv.: Dirceu Fernandes). Ftecdo.: Tribunal de Justiça do
Estado do Paraná.
Decisão: Negado provimento. Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Cordeiro Guerra,
Moreira Alves e Dedo Miranda. Ausente, justificadamente, o Senhor
Ministro Leitão de Abreu, Suprocurador-Geral da República, o Dr. Mauro
Leite Soares.
Brasília, 18 de novembro de 1980 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
HABEAS COFtPUS N? 58.809 — MG
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Antonio Neder
Paciente: João Francisco de Macêdo — Coator: Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais.
Os bons antecedentes a que se refere o 2?, do art. 408. do C.
Pr. Penal, com a redação do art. 1? da Lei n? 5.941 de 22.11.973,
abrangem não só os penais, mas, também, os que se referem ao comportamento do réu como tal, isto é, o seu comportamento em face do
processo a que responde. Se o réu se acha foragido, não merece havido como pessoa de bons antecedentes. Doutro lado, se o réu deixa de
atender ao pessoal chamamento judiciário para o julgamento, não
merece definido como pessoa de bons antecedentes.
Caso em se decretou a prisão do réu pelo fato de não comparecer ao Júri para ser julgado. É legal a medida.
3. Petição de habeas carpas indeferida.
R.T.J. — 100
ACÓRDÃO
129
II — Em vez de informar acerca
da petição de habeas corpos, o nobre
Vistos e relatados estes autos de Presidente do eg. Tribunal de JustiPetição de Habeas Corpus n? 58.809, ça de Minas Gerais houve por bem
do Estado de Minas Gerais, em que remeter-me os três volumes dos aupaciente João Francisco de Macê- tos do processo criminal a que resdo e coator o Tribunal de Justiça do ponde o Paciente, autos esses que li
referido Estado, decide o Supremo para me inteirar da questão suscitaTribunal Federal, por sua Primeira da pelo Paciente.
Turma, unanimemente, indeferir o
III — A eg. Procuradoria-Geral da
pedido, de acordo com as notas jun- República oficiou emitindo este patas.
recer do nobre Procurador Alvaro
Augusto Ribeiro Costa, fls. 48 e 49:
Brasília, 19 de maio de 1981 —
«1 — Através da impetração sob
Antonio Neder, Presidente e Relator.
exame, o paciente almeja permanecer em liberdade até o novo julRELATORIO
gamento, pelo Júri, a que deverá
se submeter, por força de acórdão
O Sr. Ministro Antonio Neder (Reque, para esse fim, deu provimento
lator): I — O Tribunal do Júri da Coa recurso da acusação, oposto à
marca de Itulutaba, Minas Gerais,
sentença que anteriormente o ababsolveu o réu João Francisco de
solvera (v. fls. 35/38).
Macêdo.
«2 — Não se verifica no caso, todavia, constrangimento ilegal ou
Ao apelo do Ministério Público deu
abusivo.
provimento o eg. Tribunal de Justiça
do Estado.
— Embora primário e sem antecedentes desabonadores, sua cusPelo acórdão que proferiu no caso,
tódia fora decretada através da dedeterminou aquela Casa egrégia se
liberação de fls. 21, porque, deirecolhesse o Réu à prisão.
xando de comparecer ao julgamenPor não se conformar com essa orto para o qual fora intimado, desdem, João Francisco de Macêdo velo
cumprira uma das condições estater ao Supremo Tribunal Federal
belecidas no despacho de fls.
com a petição de habeas corpus de
18v./19 para o beneficio da liberdafls. 2 a 7 para impugná-la.
de provisória.
Sustenta: a) que é primário e tem
«4 — Sendo assim, impunha-se a
bons antecedentes, e que, por isso, é
prisão do mesmo, como conseqüênde se lhe reconhecer o direito de percia necessária do provimento do
manecer em liberdade, como expresapelo do Ministério Público, porsa o 2?, do art. 408, do C. Pr. Penal,
que restabelecida a situação antede novo redigido pelo art. 1?, da Lel
rior ao julgamento anulado.
nt 5.941, de 22.11.1973; b) que foi ab«Pelo indeferimento do writ, dessolvido pelo Tribunal do Júri, donde
sarte,
o parecer.»
o seu direito à liberdade, como disIV. É o relatório.
põe o art. 596 daquele Código com a
redação da citada Lel; c) que, mesmo fosse condenado, o seu recurso
VOTO
de apelação dar-lhe-ia o direito à liberdade, como se lê no art. 594 do
referido Código com a redação da
O Sr. Ministro Antonio Neder (Remencionada lei.
lator): I — O acórdão pelo qual o eg.
130
R.T.J. — 100
Tribunal de Justiça de Minas Gerais
ordenou a prisão do Paciente foi proferido em 11.12.80, 1. 35.
Pois bem, aos 18.6.80, ao ensejo da
Terceira Reunião da Terceira Sessão
do Tribunal do Júri da Comarca de
Itulutaba, o Paciente foi apregoado
para se submeter ao julgamento,
mas não compareceu.
Verificando a ausência do agora
Postulante, o MM. Juiz Presidente
daquele Tribunal do Júri proferiu a
seguinte decisão, f. 21:
«Conforme consta da certidão do
Sr. Oficial de Justiça, o acusado tivera regular intimação de seu julgamento. Acontece que o mesmo
acusado estava sob o benefício da
liberdade provisória, condicionada
a comparecer a todos os atos do
processo. Assim, deliberadamente,
não comparecendo o réu a esse ato
solene de seu julgamento, não
mais faz jus ao benefício que lhe
fora concedido. Por essas razões,
revogo o benefício já referido, concedido ao réu João Francisco de
Macedo, determinando que contra
o mesmo seja expedido mandado
para que se recolha o acusado á
cadeia pública, onde o mesmo
aguardará a inclusão do seu processo na próxima pauta de julgamento.»
Vê-se do exposto que o eg. Tribunal de Justiça de Minas Gerais tinha
fundada razão para ordenar fosse o
Paciente recolhido à prisão.
E que, deixando ele de comparecer ao Júri que deveria julgá-lo, e o
fazendo sem justificar sua ausência,
o Paciente perdeu a qualidade que
até então podia alegar, de ter bons
antecedentes.
E que os bons antecedentes a que
se refere o 2?, do art. 408, do C. Pr.
Penal, com a redação do art. 1? da
Lei n? 5.941 de 22.11.1973, abrangem
• não só os penais, mas, também, os
que se referem ao comportamento
do réu como tal, isto é, o seu comportamento em face do processo a
que responde.
Se o réu se acha foragido, não merece havido como pessoa de bons antecedentes.
Doutro lado, se o réu deixa de
atender ao pessoal chamamento judiciário para o julgamento, não merece definido como pessoa de bons
antecedentes.
Deve o réu demonstrar, por sua
primariedade e por seus bons antecedentes, que se comporta, normalmente, em sua vida individual, familiar, profissional e social, como indivíduo sempre atento à regra moral
de conduta, e que o fato criminoso
que lhe é imputado constitui um acidente que lhe não compromete a normalidade psíquica e também ética.
No caso agora discutido, o Paciente foi acusado pelo MP de ser coautor de homicídio qualificado pela
circunstância de o haver cometido
na emboscada (entocaiado).
Apesar disso, a Justiça permitiu
que respondesse em liberdade ao
processo.
Deu-se, porém, que deixou de comparecer ao Júri para ser Julgado,
embora recebesse intimação pessoal.
Perdeu, é claro, a qualidade por
força da qual se defendeu livre.
II — Nego o habeas corpus e mando se devolvam imediatamente os
autos apensados (Apenso n? 58.809).
VOTO
O Sr. Ministro Soares Muiloz: Sr.
Presidente, estou de acordo com o voto de V. Exa. Apenas, entendo que a
circunstância de o réu ser foragido
não induz maus antecedentes. Entretanto, a circunstância de o réu estar
sendo processado em liberdade e de
131
R.T.J. — 100
Decisão: Indeferiu-se o pedido. Votação uniforme.
Presidência do Senhor Ministro
Antonio Neder. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Mufioz, Rafael Mayer e
Clovis Ramalhete. SubprocuradorEXTRATO DA ATA
Geral da República, o Dr. Francisco
HC 58.809 — MG — Rel.: Min. An- de Assis Toledo.
tonio Neder. Me.: João Francisco de
Macêdo. Impte.: Lincoin Avila BorBrasília, 19 de maio de 1981 —
ges. Coator: Tribunal de Justiça do António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
Estado de Minas Gerais.
não ter comparecido ao Tribunal do
Júri autoriza a sua prisão, porque,
com esse procedimento, está impedindo a aplicação da lei penal.
Assim, acompanho o voto de V.
Exa., indeferindo o pedido.
HABEAS CORPUS N? 58.839 — MT
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete.
Paciente: Agnaldo Coelho Júnior — Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso.
Criminal. — Denúncia fundada em auto de prisão em flagrante, por porte de pequena quantidade de maconha para uso do indiciado, mas desacompanhados, o auto de flagrante e a denúncia, do laudo
de constatação da natureza do material apreendido com o detido. —
Ilegalidade da denúncia por contrariar o 1? do art. 22 da L. 6.368/76.
O auto de apreensão, nem por estar assinado por policiais, pode suprir o exame que a lei quer que Peritos Oficiais, para a prova da
materialidade do delito.
Deparada com Ilegalidade em processo, pode o relator, no Supremo Tribunal Federal, votar pela concessão exofficio de habeas
comas.
— Habeas corpos que se concede ez-offIclo para anular o processo
desde a denúncia.
ACORDA()
RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, não conhecer do pedido e conceder a ordem ex-officio.
Brasília, 15 de setembro de 1981 —
Cunha Peixoto, Presidente — Clovis
Ramalhete, Relator.
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete:
1. Agnaldo Coelho Júnior impetrou
habeas corpus ao Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, contra
o Juiz de Direito da Comarca de
Rondonópolis, perante o qual responde à ação penal como incurso no art.
16 da Lel 6.368/76, por porte de certa
quantidade de maconha para uso
próprio, tendo sido preso em flagrante.
132
R.T.J. - 100
Viu ser-lhe indeferida a ordem, pelo Tribunal, com base em que o pedido envolvia apreciação da prova.
2 — Reitera o pedido, agora dirigido por petição a este Supremo Tribunal. — Queixa-se do constrangimento de estar respondendo à ação
penal, por uso de entorpecente, ação
ilegalmente iniciada. É que a denúncia está desacompanhada do laudo
de constatação da natureza tóxica da
substância, que se alega ter sido
com ele apreendida. No•entanto esse
laudo de constatação da natureza do
produto apreendido é exigido pelo
1? do art. 22 da Lei, «para efeito da
lavratura do auto de flagrante e do
oferecimento da denúncia, no que
tange à materialidade do delito»;
mas que não foi produzido, diz a petição.
3 — De fato, pela denúncia de fls.
14/15, o paciente responde à ação penal, pois trazia consigo certa quantidade de maconha, tida como para
seu uso. Preso em flagrante, o auto
do flagrante delito e a denúncia não
se fizeram acompanhar do Laudo de
Constatação da natureza do corpo de
delito apreendido, para prova da
materialidade do delito.
4 — Solicitadas as informações, o
Presidente do Tribunal de Justiça do
Estado do Mato Grosso remeteu,
adotando-as, aquelas que lhe prestara o Juiz coator. Na peça o magistrado de 1? grau havia informado ao
Tribunal:
«Ressalto ainda que a digna Autoridade policial não teve as cautelas devidas, quando da lavratura
do Auto de Prisão em Flagrante,
bem como não teve também o Promotor Público quando do oferecimento da denúncia, já que esta
velo a juízo sem a prova material
da infração noticiada, fato esse
que contraria, sobremaneira, o já
citado SI 1? do art. 22 da lei que nega a matéria.
Da mesma forma, o nobre colega
que respondia por esta Vara Criminal em 09-10-79, não observou a ausência da prova material do crime.
Agora, este informante, no sentido de ordenar o feito, determinou a
elaboração do respectivo laudo de
constatação. Entretanto, tal tarefa
está se tornando difícil, posto que
com a mudança de Delegado de
Polícia ocorrida em janeiro do corrente ano, o novo Bacharel não está conseguindo encontrar a referida substância. O certo é que em
Juízo ela não se encontra».
5 — A Procuradoria-Geral da República opina, a fls. 79-82, e sugere
uma alternativa: ou não se conheça
do pedido, em face do art. 119, II da
Constituição, pois que, por esse pedido diretamente ao Supremo Tribunal
Federal, o paciente substitui o recurso ordinário, que devera ter oposto
ao acórdão do Tribunal. ou caso se
conheça, que se conceda parcialmente o habeas corpus, — «para anulação do processo ab initio sem prejuízo de sua renovação».
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete
(Relator): 1 — O paciente impetrara, setembro de 1980, recurso de
habeas corpus ao Tribunal do Estado, contra o Juiz da Comarca. Foilhe indeferido.
Reitera agora o pedido, mas apresentado diretamente ao Supremo
Tribunal Federal, ao qual o pedido
não chega sob a forma de recurso
ordinário.
2 — Há óbice a reconhecê-lo como
recurso no pedido inicial, convertendo o presente habeas corpus, que recurso é, naquele recurso ordinário, e
assim se estaria usando a fungibilidade dos recursos penais autorizada
pelo Cód. de Processo Penal, no art.
579.
R.T.J. —
No caso porém, dada a perda de
prazo, não é possível ao julgador
transmudar um recurso em outro.
3 — Entretanto, no curso do processo verifico que o paciente sofre
violência por ilegalidade. (Regimento Interno, art. 188, II).
De fato, preceitua o 1? do art. 22
da Lei 6.368/76:
«Para efeito da lavratura do auto de prisão em flagrante e do oferecimento da denúncia, no que tange à materialidade do delito, bastará laudo de constatação da natureza da substância, firmado por Perito Oficial ou, na falta deste, por
pessoa idónea escolhida de preferência entre as que tiverem habilitação técnica».
4 — Esta exigência reitera e exige
forma especial à perícia, geralmente
exigida, para denúncia, nos crimes
que deixam vestígio, materialidade
chamada de corpo de delito.
De fato, Cód. Proc. Penal, art. 158:
«Quando a infração deixar
vestígio, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.»
5 — Ora, verifico a juntada do «Inquérito Policial» (fls. 16-38), incluído
o Relatório do Delegado (fls. 37-38).
E leio a Denúncia, a fls. 14/15.
100
133
6 — Não há que se pensar em suprir a nulidade, agora. Porque a informação do Tribunal a este Supremo Tribunal, dá notíciè da sua impossibilidade, à vista do extravio do
que foi apreendido, «pequena quantidade de erva conhecida por maconha» (Auto de Apreensão, fls. 23).
Este Auto de Apreensão não se
confunde, substancialmente, com
aquele outro, o Auto de Constatação
da natureza da substância apreendida; (1?) — porque foi apenas apreendida sem melhor exame e pelo policial condutor com as testemunhas
leigas, do flagrante; (2?) — porque a
lei exige Auto de Constatação por
Perito oficial, e investigador de Policia não é Perito.
7 — Pelo exposto, entendo que deparo no processo, que o paciente está sofrendo o constrangimento ilegal
de responder à ação penal, iniciada
por denúncia que não apresenta a
materialidade da existência do delito
sob a forma prescrita em lei. E nula,
a denúncia.
8 — Acolho o Parecer da
Procuradoria-Geral da República.
Concedo a ordem, para anular o Processo.
E o meu voto.
VOTO (PRELIMINAR)
O Sr. Ministro Rafael Mayer: Sr.
Presidente, estaria possivelmente,
Desacompanhados do indispensá- de acordo, no mérito, com a apreciavel «Auto de Constatação» da natu• ção feita pelo eminente Ministro Rereza da substância, o auto de fla- lator, quanto á invalidade da prisão
grante e a denúncia não bastam pa- em flagrante e quanto à conseqüente
ra comprovar a materialidade do de- nulidade do processo
lito, como o exige o 1? do art. 22 da
O que questiono é se a concessão
Lei 6.368/76.
de habeas corpus, de ofício, em tais
Deparo pois com a ilegalidade do condições, não importaria em conconstrangimento da ação penal, ini- tornar, de múltiplas maneiras, as
ciada pela denúncia, mas com con- proibições e as normas constituciotrariedade da lel.
nais, porque decorre da Constituição
134
R.T.J. — 100
que o Supremo Tribunal Federal não
poderá apreciar pedido de habeas
corpus, quando seja ele sucedâneo
de recurso.
EXTRATO DA ATA
HC 58.839 — MT — Rel.: Min. Clovis Ramalhete. Pte.: Agnaldo Coelho
Júnior. Imptes.: Manoel José Araújo
Se, num caso como este, o Supre- Azevedo Neto, Rafael Eugênio de
mo Tribunal Federal apreciasse e Azeredo Coutinho, José de Magaconcedesse, de ofício, ordem de lhães Barroso e outros. Coator: Trihabeas corpus, em pedidos feitos ori- bunal de Justiça do Estado de Mato
ginariamente, sem a intermediação Grosso.
de recurso, estaria amplamente liberado o caminho para que as impetraDecisão: Adiado o julgamento por
ções fossem feitas sucessivamente, haver pedido vista o Ministro Soares
infringindo uma clara disposição so- Murloz, após o voto do Ministro Relabre competência constitucional, des- tor que concedia ex-officio do
conhecendo a missão fundamental Habeas Corpus e Ministro Rafael
da Carta Magna, que é a competên- Mayer que dele não conhecia. Falou
cia das competências.
como Impte.: O Dr. José Magalhães
Barroso.
Em segundo lugar, isso também
importaria em que o Supremo TribuPresidência do Senhor Ministro
nal Federal estaria conhecendo de Cunha
Peixoto. Presentes à Sessão
pedido de habeas corpus no qual a os Senhores
Ministros Soares Mufloz,
autoridade coatora é um juiz de pri- Rafael Mayer
e Clovis Ramalhete.
meiro grau, desbordando, igualmen- Subprocurador-Geral
da República,
te, ai dos limites de sua competên- o Dr. Francisco de Assis Toledo.
cia.
Brasília, 01 de setembro de 1981 —
Quando o Código de Processo Penal — que é repetido pelo nosso Re- Antônio Carlos de Azevedo Braga,
gimento — fala em concessão de Secretário.
ofício, de ordem de habeas corpus,
VOTO (VISTA)
tem em mira conhecimento que tem
o juiz de um constrangimento ilegal
O Sr. Ministro Soares Multoz: Pedi
no curso de um processo, outro, por
exemplo, no recurso extraordinário. vista para conferir a possibilidade
Não se trata do conhecimento limi- de, no caso, conceder-se de ofício o
nar em uma petição de habeas habeas corpus, tal como votou o Recorptas, que teria até de não ser co- lator, eminente Ministro Clovis Ranhecida, por incompetência, e que, malhete. Concordo com S. Exa. O
tendo por objeto, exclusivamente, o auto de prisão em flagrante e a deconstrangimento ilegal, redundaria núncia se acham desacompanhados
no total aniquilamento da ordem do laudo de constatação da natureza
processual e da ordem de competên- tóxica da substância, que se alega
cias em matéria de habeas corpus. A apreendida em poder do paciente. E
principal norma é a norma de com- esse exame, consoante as informapetência, e a interpretação da norma ções, dificilmente poderá ser feito,
regimental não deve conduzir a seu porque a pequena quantidade da
substância apreendida se acha exdesconhecimento.
traviada. Acompanho, pois, o voto do
Por isso, peço vênia ao eminente eminente Ministro Clóvis RamalheRelator para não conhecer do recur- te, concedendo, de oficio, o wrft para
anular o processo ab initio.
so.
R.T.J. — 100
135
VOTO
EXTRATO DA ATA
O Sr. Ministro Rafael Mayer: Sr.
Presidente, não concedo a ordem,
porque entendo que o nosso Regimento e o Código de Processo Penal,
ao falarem na concessão de oficio
quando o Juiz conhecer no curso de
processo de ilegal constrangimento,
não estão a referir-se ao processo de
habeas comas, quando não tenha de
ser conhecido liminarmente, porque,
senão, seria a própria subversão da
competência constitucional estabelecido em cláusula negativa, qual o do
pedido originário como sucedâneo do
recurso ordinário não interposto. No
recurso extarodinário criminal, ou
em qualquer recurso que o Supremo
venha a conhecer, tem lugar a concessão de oficio. Mas no habeas
corpus que o Supremo Tribunal não
pode conhecer — para o qual não é
competente, se dele conhece e o Concede, está se sobrepondo a uma norma de competência constitucional,
fazendo tabula rasa das ordens de
competência indicadas no texto
maior com relação ao remédio heróico.
HC 58.839 — MT — Rel.: Min. Clovis Ramalhete. Poete • Agnaldo Coelho Júnior. Imptes.: Manoel José
Araújo Azevedo Neto, Rafael Eu gênio de Azeredo Cadinho, José de
Magalhães Barroso e outros. Coator:
Tribunal de Justiça do Estado de
Mato Grosso.
Decisão: Não conheceram do pedido de Habeas Corpus e o concederam
ex-officio por maioria de votos. Vencido o Ministro Rafael Mayer.
Presidência do Senhor Ministro
Cunha Peixoto. Presentes à Sessão
os-Senhores Ministros Soares Miuloz,
Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e
Néri da Silveira. SubprocuradorGeral da República o Dr. Francisco
de Assis Toledo.
Brasília, 15 de setembro de 1981 —
António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 58.943 — MG
(Segunda Turma)
Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Decio Miranda.
Recorrente: José Reis de Miranda — Recorrido: Tribunal de Alçada do
Estado de Minas Gerais.
Penal. Perito. Funcionário público. No conceito de funcionário público, segundo o art. 327 do Código Penal, insere-se o perito judicial.
Calúnia contra ele irrogada, em razão de seu oficio, é punível com o
aumento do art. 141, II, e mediante a representação a que alude o art.
145, parágrafo único, do Código Penal.
de julgamentos e das notas taquigráACÓRDÃO
ficas, por maioria de votos, negar
Vistos, relatados e discutidos estes provimento ao recurso.
autos, acordam os Ministros do SuBrasília, 4 de setembro de 1981 —
premo Tribunal Federal, em Segun- Djaci Falcão, Presidente — Decio
da Turma, na conformidade da ata Miranda, Relator para o Acórdão.
R.T.J. — 100
136
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Firmino Paz (Relator) — O Dr. José Reis de Miranda,
propôs, em causa própria, ação de
habeas corpus, porque, denunciado
pelo competente órgão do Ministério
Público, à base do previsto nos artigos 138; 141, II; 67, II; 69, IV, todos
do Código Penal, não cometera o crime de calúnia contra a pessoa do perito Walter de Freitas, que não é
funcionário público, e, portanto, não
podia o impetrante ser denunciado
(fls. 2-8).
2 — Nos autos de execução cambiaria proposta a Maria de Fátima
Cançado, diz-se, na denúncia, o autor da ação de habeas corpus, por
via de memorial apresentado ao
Juízo, advogado da executada, disse,
do perito Walter de Freitas, o seguinte, verbis:
«(...) o advogado que esta subscreve, apesar de infelizmente não
poder provar, tomou conhecimento
através de informações, de que o
marido da devedora estaria pagando, ao Sr. Perito nomeado por este
Juizo, a importância de Cr$
3.000,00 ( três mil cruzeiros) mensais. Por quê? ... Para quê?...»
(Denúncia, fls. 10. Destaque do original).
E continua a denúncia, verbis:
«Depois de incriminar, severamente, o perito-vitima, alega o mesmo advogado que
«não fazemos tais afirmações
aleivosamente...» depois de asseverar que
«colhendo informes sobre o
comportamento daquele Sr. Perito, não conseguimos obtê-los muito elogiosos e recomendáveis,
deixando perceber que as informações sobre ele eram autênticas» (Denúncia, fls. 10).
Aí, pois, os fundamentos da denúncia.
3 — Processada a ação proposta, a
Egrégia Primeira Câmara Criminal
do Tribunal de Alçada do Estado de
Minas Gerais julgou improcedente a
ação de habeas corpus, e denegou a
ordem (fls. 50), ao fundamento, resumido, de que perito exerce função
pública, e, assim, é funcionário
público, para os efeitos penais (fls.
52); logo, cabia a denúncia, em vez
de queixa-crime.
4 — Irresignado, o advogado José
Reis de Miranda interpôs o presente
recurso ordinário, em que arguiu: a)
que, não sendo o perito funcionário
público, não podia o Dr. Promotor
Público denunciá-lo; e b) não cometera o crime de calúnia, que lhe fora
Imputado.
E o relatório.
. VOTO
O Sr. Ministro Firmino Paz (Relator): — Constitui fundamento principal da douta decisão recorrida, para
denegar o pedido de habeas corpus, a
consideração preliminar de que
perito é funcionário público, para
efeito penal.
E o que examinarei, em primeiro
lugar.
2 — Declarou-se, no Código Penal,
que, verbis:
«Art. 327. Considera-se funcionário público, para os efeitos penais,
quem, embora transitoriamente ou
sem remuneração, exerce cargo,
emprego ou função pública».
Funcionário Público, ainda que para efeitos penais, é de ser, necessariamente, a pessoa que exerça ou seja titular de poderes jurídicos inerentes à função pública do Estado.
137
R.T.J. — 100
Há de ser órgão do Estado. E pessoa
que representa o Estado. E o próprio
Estado, agindo, praticando actos essencialmente estatais.
Funcão pública é função do Estado, posta na relação Estado Sociedade.
A remuneracão e a duração da
função pública não participa, a rigor, do conceito de funcionário
público. São elementos secundários.
De igual, a relação jurídica empregaticia, sendo termo relacional o Estado.
Em suma e ao cabo de contas, fundamental, essencial, nuclear, ao
conceito de funcionário público, para
efeitos penais, é o ser a pessoa órgão
presentativo do Estado, ao exercício
de poderes jurídicos estatais. E o
que penso.
3 — A meu ver, data venta, perito,
em Juizo, indicado ou não pelo Juiz,
não é funcionário público.
O pronunciamento pericial, laudo,
seja o que for, é acto de ciência especializada. Acto de saber dirigido à
orientação do Juiz. E acto informativo. Nada mais do que isso. Não é
acto do Estado, ou inerente às
funções estatais.
4 — Partindo-se dessa fundamentação, é parte ilegítima de denunciar
o Ministério Público, autor da
denúncia.
5 — Diante do exposto, dou provimento ao recurso de habeas corpus,
para anular o processo, a partir da
denúncia, inclusive, por ser o Ministério Público parte ilegítima de oferecer a denúncia, tudo na forma da
lei.
E o meu voto.
VOTO
O Sr. Ministro Decio Miranda —
Sr. Presidente, não estou longe de
concordar com o eminente Relator,
porque, realmente, o perito não é
funcionário público, como não o são
outras figuras que, apesar de despidas dessa qualidade, podem, no
exercício de uma função pública, como é o caso do perito, praticar atos
que para fins penais se equiparam
aos atos do funcionário público. O
importante não é a titularidade permanente do agente, mas a sua titularidade ocasional ou transitória. Há
uma como que investidura num serviço público transitório; tanto isto é
verdadeiro que o perito presta compromisso, no sentido de exercer, sob
as pepas da lei, a dignidade do
munas.
Assim, Sr. Presidente, o meu voto,
neste passo, diverge do que acaba de
pronunciar o eminente Relator, o
que enuncio com o respeito devido à
lição proferida por S. Exa.
Nego provimento ao recurso.
EXTRATO DA ATA
RHC 58.943 — MG — Rel.: Min.
Firmino Paz. Recte.: José Reis de
Miranda. (Advs.: Helvécio de Jesus
Resende Chaves e outro). Recdo.:
Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais.
Decisão: Adiado o julgamento por
haver pedido vista o Ministro Moreira Alves, depois dos votos do Relator
que dava provimento ao recurso e do
Ministro Decio Miranda que negava
provimento.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão, os
Senhores Ministros Cordeiro Guerra,
Moreira Alves, Decio Miranda e Fir-
R.T.J. - 100
138
mino Paz. Subprocurador-Geral da
República, Dr. Mauro Leite Soares.
Brasília, 1 de setembro de 1981 —
Hélio Francisco Marques, — Secretário.
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Moreira Alves : 1
— Correta se me afigura a posição
dos que entendem que o conceito de
funcionário público estabelecido no
artigo 327 do Código Penal se aplica
não apenas aos crimes praticados
por funcionários contra a administração em geral, mas também a todos os demais crimes previstos no
referido Código e na legislação extravagante aos quais seja ele pertinente. Nesse sentido, Inclina-se a
doutrina pátria (além de Frederico
Marques e de Magalhães Noronha,
citados no parecer da ProcuradoriaGeral da República, veja-se também, Heleno Fragoso, Lições de Direito Penal, Parte Especial, 3! edicão, págs. 390-391).
Por outro lado, na amplitude da
abrangência dada pelo Código Penal
ao conceito de funcionário público
para os efeitos penais se enquadra o
perito judicial. Esse problema tem
sido aprofundado pelos penalistas
italianos, que se defrontam com
mais dificuldades do que as existentes em face do nosso artigo 327, uma
vez que este adotou conceito unitário
de funcionário público, ao passo que
a codificação penal italiana faz distinção entre funcionário público, encarregado de serviço público e pessoa que exerce serviço de necessidade pública. Mas, também na Itália
se entende que as pessoas, que colaboram com o órgão judicante com
declarações que atestam fatos, são
consideradas, para efeitos penais,
funcionários públicos. É o que acentua, entre outros Antolisei (Manuale
di Diritto Penale, Parte Speciale,
vol. II, 3? ed., n? 176, págs. 600-601),
ao prelecionar que também se consideram funcionários públicos, no campo penal, «le persone che nel processo, collaborando con gli organi giudicanil, fanno attestazioni che sono
destinate alia prova: testimoni, periti, interpreti, ecc.»
E Heleno Fragoso (ob. cit., ri?
1051, pág. 392), após citar Maggiore
— que salienta que se a função «é tal
que o sujeito forme ou concorra para
que se forme a vontade do Estado
para a obtenção de fins públicos,
quem nela está investido se transforma em órgão da administração pública, e, somente por isso, torna-se
funcionário público» —, reconhece
que são «funcionários públicos o jurado (exerce função jurisdicional) e
a testemunha em processo judicial.»
2 — Em face do exposto, e com a
devida vênia do eminente relator,
acompanho o voto do Sr. Ministro
Decio Miranda, que nega provimento
ao presente recurso.
EXTRATO DA ATA
RHC — 58.943 — MG — Rel.: Min.
Firmino Paz. Ftecte.: José Reis de
Miranda. (Advs.: Helvécio de Jesus
Resende Chaves e outro). Recdo.:
Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais.
Decisão: Negado provimento ao recurso, vencido o Relator.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Moreira Alves,
Decio Miranda e Firmino Paz. Ausente, justificadamente, o Ministro
Cordeiro Guerra. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mauro
Leite Soares.
Brasília, 4 de setembro de 1981 —
Hélio Francisco Marques — Secretário.
R.T.J. — 100
139
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.047 — RJ
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Cordeiro Guerra.
Recorrente: Anazilto Paiva da Silva — Recorrido: Tribunal de Justiça do
Estado do Rio de Janeiro.
Curador. Menor. 'Inquérito policial. Não constitui nulidade a falta
de nomeação de curador ao réu menor no inquérito policial que investiga crime que enseja processo de rito ordinário, mormente quando
na instrução foram dadas todas as garantias à defesa.
Precedente: HC 57.189 — 1 — SP.
RHC improvido.
2 — Sobre não se constituir em
ACORDA()
nulidade a ausência de curador a
Vistos, relatados e discutidos estes
indiciado menor, no rito processual
autos, acordam os Ministros da Secomum, como proclama o Supregunda Turma do Supremo Tribunal
mo Tribunal Federal (vide: emenFederal, na conformidade da ata de
ta do ilustrado Min. Rafael Mayer
julgamento e das notas taquigráfino HC 57 189 — RTJ 91/476 DJ 10-9cas, á unanimidade de votos, em ne79 — 6.677), no debatido é inócua a
gar provimento ao recurso.
proclamação de qualquer irregulaBrasília, 21 de agosto de 1981 —
ridade formal no auto de prisão em
Djaci Falcão, Presidente — Cordeiro
flagrante, posto que a instância de
Guerra, Relator.
conhecimento já se concluiu com
a condenação de Anazilto (vide: f.
RELATORIO
6).
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra:
3 — Somos pelo improvimento.
Trata-se de réu condenado por crime
Brasília, 13 de agosto de 1981 —
de estupro com violência real, que
Cláudio Lemos Fonteles, Procuraimpetrou diversos habeas corpus; o
dor da República». ( fls. 55/56).
primeiro de n? 58.963, não conhecido,
pelo 'Plenário, e por mim relatado, f.
É o relatório.
63, na consideração de que o constrangimento seria de juiz de primeiVOTO
ro grau, ou poderia ser interposto
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra
para suprir a falta de recursos ordi(Relator): De conformidade com
nário, f. 67.
jurisprudência desta Corte, HC
Neste recurso postula o recorrente a57.189
— RTJ 91/476, e nos termos do
a nulidade do processo, pelos motivos bem apreciados no parecer da parecer acima transcrito, nego prodouta Procuradoria-Geral da Repú- vimento ao recurso.
blica, assim concebido:
EXTRATO DA ATA
«I — O presente recurso, também da lavra do Dr. Jayme Boa
RHC. 59.047 — RJ — Rel.: Min.
Vista, e elaborado em favor de
Anazilto Paiva da Silva, almeja a Cordeiro Guerra. Recte.: Anazilto
soltura do recorrente porque não Paiva da Silva (Adv.: Jayme Boa
se lhe teria dado curador ao ato de Vista). Recdo.: Tribunal de Justiça
do Estado do Rio de Janeiro
prisão em flagrante.
140
R.T.J. - 100
Decisão: Negado provimento. Unâ- mino Paz. Subprocurador-Geral da
nime.
República, Dr. Mauro Leite Soares.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Brasília, 21 de agosto de 1981 —
Senhores Ministros Cordeiro Guerra, Hélio Francisco Marques, SecretáMoreira Alves, Decio Miranda e Fir- rio.
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.052 — CE
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete.
1? Recorrente: Fernando Ballalai Alves Júnior — 2? Recorrente: João
Holanda de Castro e outros — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do
Ceará.
Crime. Peculato por desvio em proveito alheio. — Necessário o
convencimento da irregularidade ou ilegalidade da aplicação dos dinheiros públicos, feita pelo servidor, para a caracterização da figura
penal.
É também imputável como réu de peculato, quem não seja servidor público, desde que haja contribuído ou participado da ação em
tese criminosa, de quem o seja; será tido então e em tese como coautor.
Se o Contrato com a Administração foi concluído quando vigentes condições conhecidas do Imposto de Importação de um bem indispensável à execução de contrato, mas sobreveio nova regulamentação
tributária, onerosa e imprevisível, ocorreu (dato do Príncipe», o qual
legitima a revisão da economia do contrato, quanto às condições primitivas.
Averiguação de nulidade ou anulabllidade de Contrato Administrativo não encontra via própria na ação penal por peculato.
Recurso de habeas empes que se provê, em parte, para conceder a ordem por inépcia da denúncia.
ACORDA°
RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos estes
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete:
autos, acordam os Ministros da Pri- 1 — Os Advogados Raul Chaves e
meira Turma do Supremo Tribunal Luiz Cruz de Vasconcelos recorrem
Federal, na conformidade da ata do do Acórdão do Tribunal de Justiça
julgamento e das notas taquigráfi- do Ceará, que lhes negou ordem de
cas, por empate de votos, dar provi- habeas corptis impetrada em favor
mento aos recursos parcialmente, de Fernando Ballalai Alves Júnior e
nos termos do art. 150, III, do Regi- outros, denunciados por crime de pemento Interno, para considerar inep- culado ao Juiz Criminal de Fortaleta a denúncia.
za. — O acórdão recorrido igualmente negou habeas corpus aos demais
Brasília, 8 de setembro de 1981 — co-réus, servidores públicos, que o
Cunha Pebcoto, Presidente — Clovis haviam solicitado pelos mesmos fundamentos.
Ramalhete, Relator
R.T.J. — 100
Os impetrantes alegam falta de
justa causa e inépcia da denúncia.
2 — O 1? Recorrente é o diretor e
representante legal do Consórcio de
empresas, vencedor de concorrência pública aberta pela Companhia
de Agua e Esgotos do Ceará —
CAGECE, e por isso, o contratante
da obra da construção do denominado «terminal oceânico», de Fortaleza.
Os demais recorrentes exerciam
funções de direção da empresa pública estadual, a contratante desta
obra com o consórcio de empresas
dirigido pelo 1? Recorrente, e são
eles — Octavio Soares Falcão, João
Holanda de Castro e Antonio Carlos
Godinho.
3 — A empresa pública tendo aberto concorrência adjudicou a obra ao
Consórcio vencedor, firmando o respectivo contrato, em 12.V.77.
4 — Os fatos que são tidos como
peculado e que se imputam, em coaUtoria, ao Presidente do Consórcio
e a esse grupo de Diretores da empresa pública, constam da longa peça de denúncia, passível de ser resumida.
5 — Em síntese, ocorreu o seguinte, entre as partes contratantes da
obra:
— O Consórcio Concic-Bouygues
Offshore, em 12.V.77, firmou com a
CAGECE, contrato de construção do
terminal oceânico de Fortaleza. —
Detalhe relevante no caso consiste
em que, no Parágrafo Segundo da
Cláusula XV do Contrato, o consórcio se obrigou a importar por compra ou a arrendar, a plataforma
auto-elevatória «Mer d'Ivoire», especificado na proposta vencedora da
concorrência, por intermédio da consorciada francêsa Boygues Offshore,
que então se achava fundeada no
Havre.
141
6 — Prossegue a denúncia, agora
descrevendo qual o fato criminoso
que imputa aos pacientes:
— O consórcio, por seu Presidente
Ballalai Alves Júnior, 1? Recorrente,
em carta de 30.V.78 aos diretores da
empresa pública contratante da empreitada, pleiteou um Aditivo ao
Contrato, a fim de lhe ser ressarcido
aquilo que denominou de «custos não
orçados» (denúncia, fls 15).
Justificou-se, o Presidente do consórcio e 1? Recorrente, com o que
denominou de «imprevisão nos contratos», pois que suscedera, às condições aceitas pelas partes no contrato, quanto à importação da plataforma, do Havre, a superveniência
da Resolução CACEX 590, que dispôs
sobre depósito compulsório de 100%
do valor da impOrtação, que era no
caso orçada em 2.500.000 dólares. —
Assim, informou o Consórcio e narra
a denúncia —, que se tornara «impossível importar a Plataforma Submarina, a que se comprometera utilizar na sua proposta como equipamento indispensável à execução da
obra». — Descreve ainda a denúncia: — o fato impusera ao Consórcio,
a locação de certa Plataforma, à
ECEX (denúncia, fls. 15).
7 — A seguir a denúncia historia a
tramitação desta proposta de revisão contratual, pelos órgãos
da empresa pública contratante, ar
CAGECE. Este Aditivo velo a ser
aprovado e pago, em menor valor do
que o pretendido pelo consórcio empreiteiro, por decisão de algum modo envolvendo os co-réus, que à época eram dirigentes da empresa pública.
8 — Este é o fato criminoso narrado pela denúncia, como consistindo
em peculato, praticado em coautoria pelo representante legal do
consórcio empreiteiro, o 1? Recorrente, e pelos dirigentes da empresa
pública, envolvida neste adicional de
142
R.T.J. — 100
contrato autOrIzativo de pagamento
— Otomar Soares Falcão, Presisuplementar da empreitada, sob o dente da CAGECE, que não obstante
título de «custos não orçados».
o Parecer favorável, dado pelo serviço jurídico da empresa, para sua
9 — E de ser no entanto registrada maior certeza antes de autorizar a
neste Relatório, a posição dos co- lavratura do Aditivo e o pagamento,
réus, quer a do Diretor do Consórcio entendeu, conforme narra a denúncontratante, e quer a da administra- cia, de solicitar Parecer ao jurista
ção da CAGECE, a empresa pública Milton Tavares, de Salvador, Bahia,
o qual opinou pela legalidade do pacontratante da empreitada:
gamento suplementar ern ressarci— Fernando Ballalai Alves Júnior, mento.
diretor do consórcio Internacional viRegistro que a cifra afinal paga ao
torioso na concorrência pública que, Consórcio montou á quantia menor
em razão disso, contratou construir do que a pretendida.
a obra; dele é a carta de 30.5.78 (fl.
10 — Estes os fatos narrados na
23), em que o Consórcio solicitou o
a qual a todos dá como inressarcimento de prejuízos, invocan- denúncia,
cursos
no
312 do código Penal,
do o fator imprevisível da Resolução c/c o art. 25,art.
dada a co-autoria.
CACEX 590, que desequilibrou inter11 — impetradas ordens de habeas
namente o Contrato, e especificou,
na carta, que o pagamento solicitado corpus por falta de justa causa e
se destinava a custos não orçados inépcia da denúncia, os pedidos fooriginariamente na proposta à con- ram julgados em conjunto; mas recorrência, os quais era provenientes cusada a ordem, pela Camara Crido arrendamento de uma Platafor- minal do Tribunal de Justiça do Ceama Submarina, à empresa ECEX, e rá.
obras de reparos nela, tudo como
Os Impetrantes recorrem agora ao
narra a denúncia a fls. 13/15.
Supremo Tribunal Federal contra esse acórdão que lhes recusou o
— Antonio Carlos Santos Godinho, habeas corpus, e cuja ementa é a segerente da GEFOR, órgão de plane- guinte:
jamento e controle técnico dos pro«Habeas corpus, pacientes integramas de abastecimento d'água e
grantes do mesmo processo.
esgoto de Fortaleza e de seus aspectos financeiros, — como informa ainAlegações sobre inepcia da deda a denúncia, a fls. 17, e quem opinúncia e falta de justa causa.
nou favoravelmente ao pagamento
Crime em tese, que envolve mados chamados custos não orçados,
téria de próvas, nos estreitos limirequerido pelo Consórcio empreiteites do writ. Inadmissibilidade.
ro sob fundamento de imprevisão do
contrato, e disso é acusado na deAmpla defesa terão os pacientes
núncia;
no decorrer da ação criminal.
Ordem denegada».
— Dr. João Hollanda de Castro, da
12— A Procuradoria-Geral da Reassessoria jurídica da empresa pública que, em Parecer jurídico, opi- pública opina a fls. 190, por seu ilusnou pelo deferimento do Aditivo em tre Subprocurador Francisco de Asressarcimento, «visto lhe ser aplicá- sis Toledo, o qual resume o alegado
vel, como escreveu, a teoria da im- fato criminoso, como consistente em
previsão», sendo incluido entre os Pleitear e receber com má fé, um
reajuste de preço de empreitada.
réus na denúncia;
R.T.J. — 100
pronunciamento do Subprocurador dá noticia do Parecer fornecido
para este caso, por Pontes de Miranda, quanto ao reajuste; e transcreve
trecho do saudoso jurisconsulto nestes termos:
«Não há qualquer elemento que
se possa invocar contra a validade
eficácia do contrato de empreitada e do que a ele se acrescentou,
para que as circunstâncias não
prejudicassem os contratantes. —
Este é o meu Parecer. ( a )—
Pontes de Miranda.»
13 — Após transcrever o Parecer
de Pontes, sobre a legalidade e a eficácia do Aditivo do Contrato, o douto
Subprocurador da República passa a
opinar quanto ao aspecto penal do
caso:
«Colocada a questão nestes precisos termos, não vemos como capitular na figura de peculato, o fato imputado a Fernando Ballalai
Não era funcionário público, não se
apropriou de bem público de que
tinha a posse em razão do cargo,
não subtraiu bem nas mesmas circunstâncias, nem poderia tê-lo desviado, se não o detinha».
acrescenta, o ilustre Subprocurador:
«Ficamos no entanto na inépcia
da denúncia, sem avançar o sinal
sobre a alegada falta de justa causa. No habeas corpus, examina-se
aspecto formal da peça acusatória», — diz o Parecer (fls. 195).
14 — Quanto aos demais impetrantes, opina o Subprocurador que, a
ser verdade que cometeram o ato
para satisfação de interesse ou sentimento pessoal, «cometeram pelo mênos o crime de prevaricação — art.
319, CP».
Na conclusão, o Parecer da Subprocuradoria inclina-se pela concessão do habeas corpus, por inépcia da
denúncia, quanto ao 1? Paciente.
o relatório.
143
VOTO
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete:
(Relator) 1 — No fato narrado na denúncia, vê-se que dirigentes de uma
empresa pública do Estado do Ceará, portanto servidores públicos, decidiram a revisão para maior, do
preço da obra, objeto de Contrato
Administrativo adjudicada em concorrência pública. Autorizaram esse
pagamento à parte privada contratante, fundados em fato que dizem
ter sido imprevisível, que é atribuído
à Administração Federal, o qual teria causado dano á parte contratante
particular.
Foram por isso denunciados por
peculato, art. 312 CP, os dirigentes
da Empresa Pública cearense que
de algum modo participaram da decisão e da ordem do pagamento,
bem como encontra-se denunciado o
representante legal da pessoa jurídica privada contratante da obra pública, este por haver solicitado o suplemento de pagamento e, assim,
propriciado a despesa extra-contratual, autorizada pelos funcionários denunciados por peculato.
2 — Como peculato, entende-se o
mesmo crime de apropriação indébita, mas tendo servidor público por
agente e, por sujeito passivo, a Administração, lesada pela apropriação ou pelo desvio, em proveito próprio ou alheio, de dinheiro ou outro
bem ( art. 312 CP).
A denúncia, narrando que o acréscimo ao pagamento foi deferido à
empresa contratante, exclui a espécie do peculato com furto. A modalidade do crime imputado, portanto,
será a do peculato por desvio em
proveito alheio. — Desvio importa
em irregularidade.
3 — O parecer do Subprocurador
da República adverte: — «O fato do
aditivo contratual ser ou não nulo ou
anulável não descaracteriza por si só
144
B.T.J. — loo
a destinação do dinheiro empregado
no pagamento do preço da obra. De
resto esta matéria, extremamente
complexa, não pode ser deslindada
em ação penal, o que parece ter sido
objetivo da denúncia, que mais se
assemelha a uma petição inicial de
ação civil do que a uma formal acusação penal».
Alinho-me com esse entendimento.
4 — Mas neste caso, o douto Subprocurador da República descarta
do crime, o 1? Recorrente, o Presidente do Consórcio, por não ser funcionário, nem ter tido a posse do
bem.
Não me impressiona o suficiente,
esta ponderação. Há na denúncia,
como co-réus, servidores públicos
que tinham a disponibilidade juriclica dos dinheiros; e figuram denunciados como co-autores do peculato.
Estou em que o particular também
pode figurar em denúncia de crime
de peculato, se ocorra concurso de
agentes, aplicáveis então os arts. 25
e 26 do Código Penal. — Neste sentido, Hungria, em Comentários, v.
IX, p. 339, e Magalhães Noronha, em
Código Penal, v. IV, p. 223.
Por outro lado não me parece configurado que tenham os funcionários
praticado crime de prevaricação
(Código Penal, art. 315); pois não
omitiram nem retardaram ato de
ofício, nem praticaram ato contra
disposição expressa de lei.
5— O deslinde do presente Recurso de habeas corpus restringe-se a
verificar se estão presentes, ou não,
os elementos constitutivos da figura
do peculato, por desvio em proveito
alheio, como decorre dos fatos narrados pela denúncia.
Tratando-se de habeas corpus por
falta de justa causa, há que se ver,
na estrutura lógica da construção da
denúncia, se os fatos narrados conduzem à conclusão da imputação do
crime.
6 — Saio da leitura atenta da denúncia e do acórdão, que negou o
habeas comias, com os fatos narrados, que embasam a ação penal iniciada.
Veja-se:
Fato relevante, declarado pela denúncia, é a data do contrato de construção da obra do terminal submarino, como resultado da concorrência
pública. — Este contrato foi datado
em 12.V.77, — leio-o na denúncia, a
fls. 13.
Outro fato relevante, também declarado pela denúncia, consiste no
conteúdo da Cláusula XV deste contrato, transcrita na integra a fls. 14,
pela denúncia, e na qual o Consórcio
se obrigou à importação de uma certa Plataforma submarina, tal como
«especificada em sua proposta técnica e outros equipamentos», — diz a
denúncia.
7 — Por conseguinte, se o Contrato
abrigou a obrigação, contida na proposta técnica e apresentada no curso
da concorrência, referente à esta Importação da plataforma submarina,
como diz a denúncia —, é então manifesto que tal proposta foi formulada pelo Cotiaórcio, na vigência da
Resolução CACEX 534 de 8.XII.77,
que na época não dispunha sobre depósito compulsório de 100% do valor
da importação. Esta exigência só
surgiu depois da adjudicação da empreitada ao Consórcio, pois foi posta
em vigor, pela publicação, no DO de
22.IV.77, da Resolução CACEX 590,
após o processo da Concorrência,
portanto.
8 — Vê-se que a empreitada, para
a qual fora aberta concorrência pública — diz a denúncia, fls. 13, e nela
venceu o Consórcio Concic-Bouygues
Offshore (fls. 13), correu toda ela.
como ato administrativo formalizado
sob a vigência da Resolução CACEX
534, de 8.XII.77, que não exigia o depósito prévio para importações.
R.T.J. — 100
Assim, na verdade, a exigência
contida na Resolução 590' é fato posterior e imprevisível. Causou ao contratante particular, o comportamento que vem' narrado pela denúncia
(fls. 15) e que diz conter co-autoria
em peculato. O diretor do Consórcio
dirigiu carta a CAGECE, dizendo
que se tornara a obra «bem mais
onerosa» e «pretendeu da CAGECE
a emissão de um Aditivo ao Contrato, aduzindo em P rime iro litigar —
diz a denúncia, fls. 14 — ter sido impossível importar a Plataforma Submarina, a que se cemprometera utilizar, na sua proposta, como equipamento indispensável à execução da
obra, face às instruções constantes
do. Comunicado CACEX 590, que dizia respeito ao chamado depósito
compulsório».
9 — Este o comportamento do Consórcio, por seu representante, e que
é descrito na denúncia como sua
participação pessoal no peculato.
10 — Registro que a denúncia se
contradiz e colide, com os fatos que
narrou, quando assevera o dolo da
empreiteira no seguinte trecho de
fls. 15:
«Descabida e de manifesta má-fé, a pretensão, visto que a empreiteira, ao entrar na concorrência,
não desconhecia a existência de
uma exigência legal de depósito
compulsório, para as importaerma».
Se tais tivessem sido os fatos, se a
concorrência tivesse tido editais já
sob a vigência do Comunicado CACEX 590, — que é bem posterior —,
então sim, poder-se-ia por de pé, esta denúncia.
Mas se a denúncia declara que
houve concorrência, que foi julgada,
que a obra foi adjudicada ao Consórcio e o contrato, — ato formal final
— só veio a ser assinado em 12.V.77
(de
núncia, fls. 13), tenho como con-
145
seqüente qUe os licitantes, -- o Consórcio entre eles — participararn de
concorrência na vigência do ComCACEX 534, de 8;XII.77; — o qual
não exigia o depósito compulsório.
11 — De tudo concluo que não há
Weito penal a ser apurado em contraditório da ação criminal. Trata-se
no caso, de uni incidente intprevistvel, na execução do Contrato Administrativo.
A empreiteira solicitou a aplicação
da cláusula rebtis sie stantibuas ao
Contrato Administrativo de empreitada, que tinha firmado com a empresa pública do Estado do Ceará,_eis tudo.
conhecido que esta cláusula
rebus ate stantibus foi resposta no
mundo jurídico, durante a PI Gtterra,
pelo Conselho de Estado da França,
na decisão famosa do caso da Cia.
de Gás de Bordeau. — Deu lugar à
teoria da imprevisão, que fez fortuna
em toda parte.
A denúncia fala na aplicação pelos
denunciados, da teoria imprevisão,
ao Contrato. Eles próprios a invocam, na petição de habeas corpus, afim de demonstrar a legitimidade do
aditivo ao contrato e a legalidade da
revisão do preço da empreitada.
certo é que, evoluindo na doutrina, a teoria da imprevisão apartouse. Distingue-se hoje, a álea extraordinária decorrente de fato imprevisivel, de uma outra álea extraordinária, a decorrente de fato da própria Administração. Esta, restaura a
velha expressão do factUfn principias,
«fato do Príncipe». Ambas geram
efeito de indenizar, aquela mais
que esta última..
— No caso presente, vê-se nos termos da denúncia, que ocorreu aos
contratantes, na área estadual; um
factum principia decorrente de decisão normativa tomada na área federal, no CACEX, quando passou a im-
146
R.T.J. — 100
Federal; em saber da competência
funcional dos dirigentes da Empresa
Pública estadual: em indagar da correta tomada de decisão da despesa.
Contém, todo o complexo quadro,
matéria apropriada para a Justiça
Civil, mas não para a criminal, desde logo impulsionada por denúncia
de peculato.
14 — Nem vejo os fatos, tal como
narrados pela denúncia, o crime de
peculato de desvio, antes afigurandose-me tratar de um incidente na execução de Contrato Administrativo,
com decisões tomadas por seus Diretores,
no exercício de sua função.
O ato de uma entidade pública, se
produz efeitos de imprevisível dano,
Se a revisão do contrato foi nula —
em obrigação contraida por outra por ilegalidade, ou anulável — por
entidade pública, se agravam Con- erro ou dolo, não é a ação penal, a
tratos desta outra, constitui igual- via própria para a apuração.
mente «fato do príncipe». — A hipóCom tais fundamentos, conheço
tese é versada por Os-waldo Aranha
Bandeira de Mello («Principio de Di- dos recursos e dou provimento para
reito Administrativo», v. I, p. 603). extinguir a ação penal por falta de
— No caso, o Com.-CACEX 590, ato justa causa.
normativo federal, de efeitos lesivos
EXTRATO DA ATA
sobre a obrigação de importar assumida pelo Consórcio, em Contrato
RHC. 59.052 — CE — Rel.: Min.
com entidade estadual, ainda que
sendo ato normativo federal consti- Clovis Ramalhete. 1? Ftecte.: Fertuiu «ato do príncipe», sobre esse Con- nando Balialai Alves Júnior (Adv.:
trato Administrativo estadual, — da- Raul Chaves). 2? Recte.: João Holanda a matéria que disciplinou e a da de Castro e outros (Adv.: Luiz
competência da Administração Fe- Cruz de Vasconcelos). Ftecdo.: Tribuderal, hábeis legalmente para eficá- nal de Justiça do Estado do Ceará.
cia sobre o Contrato, na esfera estaDecisão: Adiado o julgamento por
dual.
haver pedido vista o Ministro Rafael
após o voto do Ministro Rela13 — Entendo, com a Subprocura- Mayer,
tor
que
deu provimento ao recurso.
doria da República, tratar-se de Falou pelo
Recte.: o Dr. Raul ChaqueStfio de responsabilidade, para ves.
cuia apuração a via penal é imprópria.
Presidência do Senhor Ministro
Cunha Peixoto. Presentes à Sessão
Saber se o aditivo e o pagamento os Senhores Ministros Soares Mufioz,
conseqüente, fundados na cláusula Rafael Mayer e Clovis Ramalhete.
rebus Mc stantibus, revestiram-se de Subprocurador-Geral da República o
legalidade, ou não, envolve questões Dr. Francisco de Assis Toledo.
jurídicas referentes à execução do
Contrato Administrativo, surpreendiBrasília, 25 de agosto de 1931 —
do por alteração de fato lesiva, im- António Carlos de Azevedo Braga,
posta no caso pela Administração Secretário.
por condição imprevisível, ruinosa à
execução do contrato, e inexistente
ao tempo da conclusão deste no Ceará, pelo Consórcio, com a empresa
estatal co-contratante.
12 — Ato normativo é substancialmente um ato legislativo; e constituise em facttim principis. Nada o impede. Em regra gera direito indentzatório amplo, ao contratante lesado.
Laubadère é incisivo: — *La loi formelle constitue de maniere Typique
un «fait du prince» (*Tralté des
Cont. Admm), v. III, p. 27, nota 5).
R.T.J. — 100
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Rafael Mayer: A
proposta acusatória descreve crime
de autoria coletiva, consistente em
comportamentos de funcionários públicos em tomo da realização de um
aditivo a contrato de construção de
um interceptor oceânico, envolvendo
onerosa remuneração adicional, motivada pela locação de uma plataforma, em contrário ao estipulado originariamente, pois o contrato primitivo previa a compra da plataforma,
pela empreiteira, o que se não fez, o
pagamento se fez, por meio do aditivo, fora da previsão do contrato originário, a titulo de «custos não orçados», num montante aproximado de
cinqüenta milhões de cruzeiros.
Diz a denúncia que, com essa operação, ilegítima face aos termos do
contrato, a realizada com má-fé, tendo em mira o proveito ilícito da empreiteira, efetivamente alcançado, o
Estado sofreu considerável prejuízo
de ordem patrimonial.
Detém-se, ainda, a descrever a
participação dos diversos figurantes
na consumação do crime que é qualificado como peculato (art. 312 do
CP).
Referindo-se aos segundos Recorrentes, denunciados, como dirigentes
ou categorizados funcionários do órgão público, incumbido da administração do contrato, a denúncia diz
que «concorreram para desviar, em
proveito alheio, vultosa verba com
prejuízo patrimonial do Estado» (fls.
21), descrevendo a conduta de cada
qual, na linha do que chama uma
«trama bem urdida, que ia se desenvolvendo passo a passo», em torno
da aprovação, assinatura e final pagamento do aditivo, mediante a autorização daquele dos denunciados
que tinha a disponibilidade do dinheiro público.
147
E a súmula do que está na peça
acusatória, em matéria de narrativa, se lhe extraem as demasias e
impropriedades ou o estilo farfalhante.
E diante dessa substância factual,
cuido inviável o trancamento da
ação penal, por falta de justa causa,
do mesmo modo como pareceu ao
eminente Subprocurador-Geral, embora lhe houvesse sugerido tipificação diversa da que consta da denúncia.
Com efeito a descrição dos fatos
da proposta acusatória tem correspondência com figuras criminais tipificadas, esta ou aquela, mas
parecendo-me razoável seja aquela
mesma da incriminação. Em todo
caso, a eventualidade de nova definição jurídica até a sentença, facultada na lei processual, afasta a argüição da impossibilidade jurídica da
proposição inicial, como está.
Os aspectos civis que o negócio
jurídico implica não excluem nem
prejudicam os aspeCtos criminais
que podem envolver o comportamento dos figurantes. A circunstância de
que se trate de um termo aditivo formalizado e cumprido, segundo os padrões administrativos, não impede a
indagação de responsabilidade criminal subjacente. Não fosse assim,
digo em tese, o aspecto formal a que
necessariamente se sujeitam os atos
e contratos da Administração. Importaria, per se, num 13111 of
indemnity de probidade administrativa, o que não é jurídico nem ético.
Pelo mesmo princípio é que a jurisprudência é referia de casos em que
não se tem por inepta a denúncia por
peculato, ainda que o funcionário tenha as contas aprovadas.
Eliminar a eventual criminalidade
dos fatos da denúncia, extremamente complexos e apurados em inquérito policial, processo administrativo e
inquérito parlamentar, não encontra
148
R.T.J. — 100
âmbito adequado nos lindes deste remédio processual. Mesmo o argumento dos segundos Recorrentes,
quanto à Portaria CACEX 590, está
sujeito à controvérsia, quanto à correlação de datas com a feitura do
contrato, além de que não é razão
explicativa cabal para o que vem
narrado na denúncia.
Carecendo de evidências, devo
afastar, data venta, o fundamento de
falta de justa causa para a propositura da ação penal, pondo-me de
acordo no ponto, com o douto parecer.
Entretanto, no tocante ao primeiro
Recorrente, o pronunciamento do
eminente Subprocurador tem a denúncia como inepta com relação a
ele, opinando que se dê provimento
parcial para que assim fique declarado.
Cuido, no entanto, data venia, que
•a denúncia não é omissa no descrever a sua participação no fato, não
se cingindo esta à apresentação da
proposta de um anódino aditivo,
pois, de acordo com a denúncia, aí
reside o núcleo em torno do qual se
desenvolveu toda a operação delitiva
que teria resultado em proveito do
Recorrente. Essa atuação, dada como vinculada ao contexto da autoria
coletiva, tem indicação bastante, na
denúncia, inclusive para fazer saber
da acusação de que se deve defender, como se vê deste tópico: (fls.
19).
«De maneira insofismável, esta
comprovado que o Estado sofreu
considerável prejuízo de ordem patrimonial em todo esse lastimável
acontecimento. O Consórcio a sua
vez, sob a Presidência do Dr.
Fernando Ballalai Alves Júnior,
participou decisivamente de toda
essa ilicitude, sendo o principal interessado em auferir a vantagem
econômica de que resultou para o
Estado do Ceará, a escandalosa
operação. Contando com a conivente atuação de Otomar, Godlnho e
João Holanda, obteve para a sua
empresa, proveito econômico ilícito, e não entregou ao pública a
obra que se comprometeu a realizar em condições técnicas de utilização adequada, conforme o parecer da Sub-Comissão da C.P.I., em
seu Relatório e suas Conclusões (anexos)».
Ora, a atribuição de co-responsabilidade a estranho ao serviço
público, por crime de peculato, sobretudo quando se trata de quem
seria o beneficiário do desvio, é fato
que em tese se acomoda com a lei
penal. Por isso, data venta, descrevendo uma atuação que a isso corresponde, a denúncia não me parece
Inepta.
Finalmente, o trato do mesmo assunto, sob o prisma civil, em várias
questões propostas no juízo competente, não é de molde a inibir o curso
da ação penal, ainda que certos pontos possam ter ai deslinde adequado.
E que a suspensão obrigatória do
processo penal somente se dá quando a existência da infração dependa
da solução de controvérsia sobre o
estado civil da pessoa, a ser dirimida no juizo próprio, como está no
art. 92 do CPP. Mas se o reconhecimento do crime depender da solução
civil de questão complexa e difícil,
em ações já propostas, a suspensão
do processo-crime é facultativa, Pela
aplicável é o art. 93.
Pelo exposto, data venha, nego provimento.
VOTO
O Sr. Ministro Soares Mufloz: Sr.
Presidente, a denúncia, segundo
compreendi, imputa aos pacientes o
fato de ter um deles, na qualidade de
empreiteiro, recebido a importância
maior do que a ajustada no respecti-
R.T.J. — 100
vo contrato, e os demais, por terem,
na qualidade de funcionários, contribuído para que se vulnerasse o contrato, atribuindo importância maior
ao empreiteiro em detrimento do
erário público. Estou em que esse fato constitui, em tese, crime e que autoriza o recebimento da denúncia tal
como foi recebida.
Dr. Francisco de Assis Toledo,
Subprocurador-Geral da República:
V. Exa. me permite um esclarecimento sobre matéria de fato?
A denúncia atribui aos acusados
não terem pago ou terem recebido
importância maior do que a estipulada no contrato, mas sim terem pago
e recebido importância em função de
um aditivo contratual que a denúncia reputa nulo. O pagamento foi feito tal qual consta do contrato. O problema todo reside em saber se o aditivo é nulo ou não é nulo. Não houve
um tostão acima do preço ajustado
no contrato.
Sr. Ministro Soares Mufioz: Reitero o que acabo de dizer. Os acusados, dois deles como funcionários e o
outro como empreiteiro, participaram de uma operação em virtude da
qual foi paga a um deles, com conivência das demais, importância superior à ajustada no contrato.
Dr. Subprocurador-Geral da República pondera que esse pagamento
foi feito de acordo com o aditivo que
a denúncia reputa nulo. Ora, Sr. Presidente, o nulo é como se não existisse: o nulo não tem eficácia jurídica,
não entra no mundo válido das relações jurídicas. De sorte que, se a denúncia diz que o aditivo é nulo, só a
instrução irá apurar se realmente o
é e se efetivamente houve essa operação que a denúncia cónsidera ilegal e criminosa e que, em tese, se
apresenta como tal.
Acompanho o voto do eminente Ministro Rafael Mayer, negando provi-
149
mento aos recursos data venta do
eminente Ministro ClOvis Ramalhete.
VOTO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto
(Presidente): Neste caso, a importância do meu voto é decisiva, porque se trata de Recurso de Rabeas
Corpus, e, empatando, há concessão.
Já havia firmado meu ponto de Vista, quando dos debates e do voto do
Ministro Clovis Ramalhete. Ouvi
com atencão o brilhante pronunciamento de S. Exa., o eminente Ministro Rafael Mayer, agora acompanhado pelo eminente Ministro Soares
Muiloz. O caso em apreço cinge-se, a
meu ver, a um pedido de reajustamento em contrato de serviço público. Os diretores da companhia estatal que autorizaram o pagarnento o
fizeram com base em pareceres de
juristas ilustres. Podem ser civilmente responsáveis; mas, dizer-se
que desviaram bens públicos ou co-meteram ilícito penal, há uma grande direfença. O problema é, pois, saber se, neste caso, há peculato ou
prevaricação e estes crimes não se
configuram na espécie. Poderia o
ilícito penal de apropriação indébita.
Mas, para que seja válida a denúncia quanto a apropriação indébita, é
indispensável que se identifique
aquele que ficou com a coisa, o que
não ocorreu neste processo. Data
venta dos eminentes Ministros Rafael Mayer e Soares Muiloz, dou provimento aos recursos para considerar inépta a denúncia.
RETIFICAÇÃO DE VOTO
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete
(Relator): Senhor Presidente, ouvindo as ponderações de V. Exa. e a leitura do voto do Ministro Rafael Mayer, animo-me a retificar a conclusão do voto que proferi como Relator, afirmando a falta de justa cau-
150
R.T.J. — 100
Entendo que devemos retirar a
sa, para entender que a denúncia foi
Inepta, tanto mais que, lembrado pe- projeção prestigiosa de uma decisão
lo eminente Ministro Rafael Mayer, do Supremo Tribunal Federal sobre
existem ações, paralelamente e no a formação de convicção do juiz Ciâmbito civil, sobre as mesmas ques- vil. Donde a razoabilidade de, neste
tões que o Ministério Público, preci- momento, aproveitar para estar na
pitadamente, tentou, em denúncia honrosa companhia de V. Exa., retiinepta, colocar na ação penal. Evi- ficando a conclusão do meu voto. —
dente é que, se o Supremo Tribunal Dou provimento aos recursos, parFederal se antecipar, dizendo que cialmente, por inépcia da denúncia.
não haver justa causa, estará, de alE o voto.
gum modo, interferindo no desenvolvimento das ações cíveis paralelas.
ADITAMENTO AO VOTO
Há certa razoabilidade no fundamento, que enuncio, da retificação do
meu voto, com o fito de deixar o juiz
O Sr. Ministro Cunha Peixoto
civil, que está verificando a legalida- (Presidente): Em virtude da retifide ou não, desse aditivo de paga- cação do voto, feita pelo eminente
mento, livre do peso de uma decisão Ministro Clovis Ramalhete, concordo Supremo Tribunal Federal, que do com S. Exa., no tocante à inépcia
dê por falta de justa causa; pois isso, da denúncia.
de modo oblíquo, significaria dizer
da licitude desse aditivo contratual.
Com este fundamento, que acho raEXTRATO DA ATA
zoável, retifico o meu voto de Relator, na conclusão, e julgo inepta a
Min.
RHC. 59.052 — CE —
denúncia.
Clovis Ramalhete. 1? Recte.: FerBallalai Alves Júnior (Adv.:
Há uma ação declaratória, propos- nando
Raul
Chaves).
Recte.: João Holanta pelo consórcio, para que o juiz de- da de Castro e2?outros
(Adv.: Luiz
clare se foi, ou não, lícito, o aditivo Cruz de Vasconcelos). Recdo.:
Tribuao contrato administrativo a ele ad- nal de Justiça do Estado do Ceará.
judicado, com majoração de preço,
dada a superveniência do fato do
Decisão: Deram provimento parpríncipe. E que durante o desenvolvimento da concorrência não era cialmente ao recurso de Habeas
previsto o depósito de 100% do valor Corpus, nos termos do art. 150 III
de uma importação, orçada, na pró- do RI, para considerar inépta a depria denúncia, em dois milhões e Meneia. Vencidos os Ministros Rafael
Mayer e Soares IVIufloz.
quinhentos mil dólares.
Feita a adjudicação, sobreveio a
Resolução da CACEX, estabelecendo
o depósito compulsório de 100% do
valor da importação. Ela introduziu
tamanho desequilíbrio no interior do
contrato administrativo, que fez com
que os licitantes, vencedores da concorrência, viessem a propor esse
aditivo. Se esse aditivo foi, ou não,
eivado de ilegalidade é matéria já
entregue ao juiz civil.
Presidência do Senhor Ministro
Cunha Peixoto. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Soares Mufloz,
Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e
Néri da Silveira. SubprocuradorGeral da República o Dr. Francisco
de Assis Toledo.
Brasília, 8 de setembro de 1981 —
Antônio Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
R.T.J. — 100
151
RECURSO DE BARBAS CORPUS Nt 59.116 — RJ
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete.
Recorrente: Reginaldo Batista — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Prisão preventiva. Entre seus requisitos encontra-se o da proteção ft paz pública mediante recolher-se preso o réu.
Hipótese em que o delito de homicidio gerou odiosidade e clima
de vinganças entre familiares, coincide com os fins da prisão preventiva em proteção da paz pública. •
Recurso de habeas arpes a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata do
Julgamento e das notas taquigrátlcas, por maioria de votos, negar provimento ao recurso.
Brasília, 15 de setembro de 1981 —
Cunha Peixoto, Presidente — Clovis
Ramalhete, Relator
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete: 1
— Reginaldo Batista, comerciário
que até foi caixa na Chebade Transportes S/A, em desavença com seu
Primo Washington, recebeu um tiro
na perna. Tempos depois, em Campos onde reside, novo encontro; desta feita Reginaldo, pressentindo que
Washington ia atirar, foi quem atirou; e Washington morreu. — Este
fato criminoso incumbe ao Júri da cidade de Campos apreciar e decidir.
2 — Reginaldo encontra-se preso,
preventivamente. O Juiz fundamentou a prisão no inicio do inquérito:
necessidade da garantia da ordem
pública e assegurar a aplicação de
lei penal.
Requerido, depois de tempos, o relaxamento da prisão, o Juiz não
apreciou o pedido. Sobreveio toda a
Instrução e depois, a pronúncia. Na
sentença, o Juiz narra o fato (fls.
13/14), mas decidiu que compete ao
Júri decidir o caso. E acrescenta:
«Os motivos determinantes da custódia legal permanecemo ( fls. 16).
3 — O defensor do Impetrante instrui o pedido com documentação tendente a demonstrar a personalidade
do acusado.
Declaração abonadora, da empresa em que esteve ultimamente empregado, em que era caixa, e «nada
existindo que possa desabonar a conduta.» Um outro, da empresa Equipo, no mesmo sentido. Certificado da
Secretaria de Educação e Cultura da
conclusão de curso na. Escola Supletiva Saldanha da Gama. Curso de
«motivação pessoal,» no Instituto
Brasileiro de Desenvolvimento Pessoal. «Diploma de Honra», passado
pela Escola Supletiva, da Secretaria
de Educação e Cultura, — «como
prémio pela sua irrepreensível conduta». — Diploma de curso de datilografia — Titulo de Técnico em Contabilidade, pela escola oficial Já referida (fls. 17/22).
4 — Impetrada ordem de habeas
corpus o Tribunal de Justiça do Rio
de Janeiro negou-a, após ouvido o
Juiz, que informou que a desavença
entre os primos, dos quais um morreu, está ampliada para a familia,
152
R.T.J. — 100
tudo devido a questões de imóvel. Na
informação, escudado no Promotor
que servira em ambas as Comarcãs,
Juiz fala em «confronto entre
membros da família Batista» que
«está tomando foros de vindita» (fls.
34), com fatos ulteriores envolvendo
Irmãos das partes do drama do lio-
lo já causado pelo homicídio e prejudicar o processo. O Juiz e o Promotor da Comarca deduzo que são neste caso os melhores censores. Ambos
dão notícia do perigo à paz pública,
decorrente de livrar-se solto o réu,
enquanto perdura a odiosidade e desejos de vingança, entre membros
da família.
A contragosto, nego provimento ao
recurso
E o meu voto.
Conclui por dizer que os motivos
da custódia permanecem e não aplica o facultativo do §2? do art. 408 do
Código Penal.
5 — Como relatado, o Tribunal de
VOTO
Justiça negou a ordem, donde o recurso, no qual a Procuradoria-Geral
O Sr. Ministro Cunha Peixoto
da República opina pelo não provi- (Presidente): Data venta do eminente Relator, vou discordar de seu vomento.
to. Não é possivel negar a liberdade
E o relatório.
ao paciente, só porque a família da
vítima ameaçou vingar. Acabaríamos com a liberdade provisória; basVOTO
taria que a familia da vitima dissesse que, solto o réu, o mataria. Data
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete venta, acho que isso não é-argumen(Relator): Nego prOvimento. Não há to para se negar a liberdade provisóilegalidade na prisão decretada. O ria. Nunca se deu prisãO preventiva
Acórdão manteve a decisão do Juiz, para garantir o réu. À conclusão
o qual revela conhecimento imediato contrária acabaria com o objetivo da
dos fatos na localidade da personali- Lei Fleury. A ordem pública, neste
dade do réu, fundada a prisão, no ca- caso, pão justificaria a negativa de
so, na tutela à paz pública.
pedido de liberdade provisória, que é
Entendo insuficientes, como requi- um direito, hoje, do acusado no Brasito determinante de prisão preventi- sil.
va, a estrita presença da mataria/1Dou provimento ao recurso.
dade do delito e a exclusiva prova da
autoria que são pressupostos da proCONFIRMAÇÃO DO VOTO
cedibilidade, assim Isolados. Fundado apenas neles Seria autorizar a anO Sr. Ministro Clovis Ramalhete
tecipada condenação, e pospor a ela, (Relator):
Senhor Presidente, eu me
o desenvolvimento da defesa.
penitencio da insuficiência do meu
Prisão preventiva é necessidade relatório. Da leitura do processo, reda polítka penal, mas constitui me- sulta que a odiosidade também está
dida eitcepcional.
animando o paciente. Uma vez solto,
Há que formarem o quadro, outros em confrontação com seus parentes,
elementos, de lei, como a proteção à na pequena cidade de Campos, ele
paz pública e o resguardo da ação próprio poderá repetir o delito.
penal.
Mantenho o meu voto, em proteção
No caso presente, entretanto, mal- à paz pública, que poderia vir a ser
grado o bom passado do paciente, a perturbada. Tomo conhecimento da
atual odlosidade pode ampliar o aba- situação trazida ao processo pelo
153
R.T.J. — 100
Promotor, que serviu numa Comarca e na outra, e acompanhou o desenvolvimento da quizilla entre as
famílias, até mesmo a questão possessória referente a terras. Por isso
nego provimento ao recurso, apesar
da minha notória inclinação liberal
em matéria de habeas corpus. Essa
gente poderá ser vitima do próprio
Ódio, do próprio sentimento de indignação. E melhor deixar serenar os
ânimos, até que o Júri decida.
EXTRATO DA ATA
RHC 59.116 — RJ — Rel.: Min.
Clovis Ramalhete. Recte.: Reginaldo
Batista (Advs.: Sebastião Tavires
Campista e outro). Recdo.: Tribunal
de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Decisão: Negaram provimento ao
recurso de Habeas Corpus. Vencido
o Ministro Presidente.
Presidência do Senhor Ministro
Cunha Peixoto. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Soares Mufloz,
Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e
Néri da Silveira. SubprocuradorGeral da República o Dr. Francisco
de Assis Toledo.
Brasília, 15 de setembro de 1981 —
António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.175 — RJ
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete.
Recorrente: Eduardo Alberto Arvid Johnston — Recorrido: Tribunal de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Cr minai. — Habeas Corpus contra ordem de prisão preventiva.
Cabe ás instâncias superiores, o controle da presença, em cada
caso, dos requisitos autorizativos do decreto de prisão preventiva pelo
Juiz.
Se resulta de laudo psiquiátrico a convicção da permanência de
periculosidade do réu, à paz pública, com iminente perigo, deve ser
mantida a ordem de prisão cautelar.
— Recurso de habeas corpus a que se nega provimento.
ACORDA()
RELATORIO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata do
Julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, conhecer do recurso e lhe negar provimento.
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete:
Em favor de Eduardo Alberto Arvid
Johnston, os ilustres Advogados Nélio Roberto Seidl Machado e Gerardo
de Majela Melo Fortes, impetraram
habeas corpus ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, fundados em
falta de justa causa para mantê-lo
em prisão preventiva, à disposição
do Juiz da 4! Vara Criminal, no Rio
de Janeiro.
2 — A custódia preventiva decorre
de decisão do Juiz que preside o su-
Brasília, 01 de setembro de 1981 —
Cunha Peixoto, Presidente — Clovis
Ramalhete, Relator
154
R.T.J. — 100
mário por crime de homicídio, de
que é acusado o Paciente de haver
cometido contra a sua ex-esposa,
Christel Arvid Johnston, em 09 de
março deste ano.
3 — O Paciente, consta dos autos,
após o crime viajou para São Paulo,
mas passada a pertubação inicial,
regressou ao Rio e apresentou-se ao
Delegado que presidia o Inquérito.
Este já havia realizado buscas do
Réu e, por não bem sucedidas, requereu ao Juiz da 4! Vara Criminal
a prisão preventiva. O mandado não
chegou a ser cumprido, dada a apresentação espontânea do acusado.
4 — Os Advogados impetrantes solicitaram a revogação da prisão preventiva. O juiz manteve-a por entender que persistiam as condições que
lhe haviam ditado a decisão.
5 — Argumentam os impetrantes,
que a prisão foi decretada no inicio
do Inquérito Policial, que constituira, aos olhos do julgador, uma dada
versão dos fatos. Mas que o contraditório é de lei, na ação penal e, ademais, a fase do Inquérito Policial é
aquecida pelo estrépito e sensação
da eclosão do crime. Passada a situação e encerrado o sumário de culpa, entendem não subsistirem as razões do decreto de clausura preventiva.
Aduzem que a presunção de inocência dos acusados até a sentença,
que os convença, torna mais odiosa
a prisão preventiva, sendo que, no
caso, o direito a defender-se solto é
pleiteado por indivíduo primãrlo, comerciante, estabelecido com negócio
de comissaria aduaneira e assessoria de importação e exportação. Foi
juntada documentação comprovante.
6 — Os sucessivos pedidos de reconsideração de custódia preventiva,
o Juiz Presidente do 4? Tribunal do
Juri indeferiu, tendo os patronos reiterado o entendimento da desnecessidade da custódia de réu que se
apresentara espontaneamente.
7 — No recurso, não foram os impetrantes melhor sucedidos, quando
o Tribunal decidiu:
«HC — Prisão preventiva: ninguém melhor que o Juiz do Processo para aquilatar da necessidade
ou conveniência da medida. Decreto fundamentado. Descabimento de
sua revogação. Denegação da ordem». (as. 102).
8 — Deste acórdão, recorrem. A
Procuradoria-Geral da República
oficiou a fls. 120, opinando pelo não
provimento do recurso, já que o
Juiz, no decreto da prisão, fundamentou tê-lo feito em garantia da ordem pública e por conveniência da
instrução criminal.
9 — Peça fundamentada, a ser
apreciada, é o despacho de prisão,
pois contra ele é que se impetrou a
ordem de habeas corpus e, agora,
recorre-se.
A fls. 42, diz o Magistrado que se
acham presentes os dois requisitos
da faculdade da lei, ao Juiz, constantes do art. 312 do Código de Processo
Penal para a prisão preventiva, a
saber, a prova da materialidade do
crime — o homicídio, e os indícios
da autoria atribuível ao ora Paciente, Eduardo Alberto Arvid Johnston.
E fundamenta a decisão. Quanto à
garantia da ordem pública,
convenceu-se de que a prisão preventiva do- então indiciado se impunha, pelos fatos antecedentes já apurados no Inquérito, da violenta passionalidade do acusado, voltada não
somente contra a esposa, a qual matou, mas também contra a pessoa do
pai desta, seu ex-sogro, envolvido
também na tragédia da família. E
registra o despacho (fls. 42) que diz
a testemunha «Carlos» a fls. 11 do
Inquérito, que o Paciente «no dia seguinte ao crime tal testemunha via o
indiciado na porta do prédio onde
trabalha o pai da vitima». Acrescen-
R.T.J. — 100
ta o despacho que a vitima havia solicitado proteção policial, dizendo-se
ameaçada de morte pelo ora paciente, mas desatendida veio a sucumbir
a seus disparas.
Aduz o Magistrado: ao ato praticado pelo indiciado é revelador de que
sua presença, em liberdade
constitui-se em uma efetiva ameaça». Decidiu a prisão preventiva,
diz, que «não somente para garantia
da ordem pública, como ainda para
conveniência da instrução criminal.»
Este o resumo da longa inicial dos
impetrantes e suas razões de recurso, o do acórdão e do despacho decisório da prisão.
A Procuradoria-Geral da República é contrária ao deferimento do pedido.
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete
(Relator): 1. Decretação e revogação de prisão preventiva constituem
faculdade do Juiz do Júri, a ele atribuída pelo art. 408 e § 2? do Código
de Processo Penal, ao sentenciar a
pronúncia, podendo não prender o
pronunciado se for primário e de
bons antecedentes, ou revogar sua
prisão, neste caso, se já se encontrar
sob custódia.
E faculdade atribuída ao Juiz, por
lei.
2 — Entretanto, tratando-se no caso da prisão preventiva de violenta
inversão dos fatos, o do encarceramento preceder ao julgamento, estou
em que, às instâncias Superiores, cabe a verificação da legalidade da decisão de cada caso, buscando a adequação do despacho decisório, à presença dos requisitos legais desta prisão antecipada, que, sem dúvida, deve constituir ato excepcional numa
sociedade juridicamente organizada.
155
3 — «Ninguém será preso senão
em flagrante delito ou por ordem de
autoridade competente», — garante
a Constituição (153, § 12); e o juiz «a
relaxará se não for legal» — insisteme ainda a Constituição — A instrução criminal será contraditória, assegura ela, a todos (153, § 16).
Tal regime de garantias, é pelmeiro constitucional, e só depois, legal.
Está a indicar, às instâncias superiores, que a faculdade atribuída ao
Juiz, de decretar prisão preventiva,
não assegura o pleno arbítrio dele,
nesta decisão extrema. Donde, a verificação controladora, pelas instâncias hierárquicas acima do Juiz, dos
pressupostos de lei para seu despacho ordenatório de encarceramento
cautelar.
4 — No caso de homicídio presente, a decisão de prender antecedeu a
sentença de pronúncia. Não é pois
senão o caso dos arts. 312 e seguintes
do CPP, que se tem sob as vistas.
Aqui não se trata então, como
pressupostos que conduzem a faculdade do Juiz, o acusado ser primário
e ter bons antecedentes, como o quer
o § 2? do art. 408 do CPP, no ato da
pronúncia.
Narram os Impetrantes que estava
ainda em curso, o Inquérito. E logo o
Juiz decretou a prisão preventiva.
Convencera-se de que era o caso de
garantir a ordem pública e a conveniência da instrução do processo, à
vista de depoimentos já colhidos no
Inquérito Policial.
5 — Terminado o Inquérito, concluída a prova acusatória os patronos requereram a reconsideração do
despacho, a fim de que se livre solto,
o acusado.
6 — Cabe indagar se proceda, a
convicção do Juiz, da permanência
dos motivos que o convenceram,
apoiado pelo acórdão recorrido.
156
R.T.J. — 100
10 — Ora, é a defesa quem autenti7 — Tratando-se de efeito legal de
prova simples, não sendo operado ca, com esta prova cientifica, a suexame de prova complexa e contra- posição do Juiz sobre a permanência
ditória, entendo que, sempre que ale- da periculosidade do acusado à orgada falta de justa causa em habeas dem pública, com ressaibo vingativo
comias, é admissivel o exame da agora contra o sogro, com sentimento auto-destrutivo voltado em despeiprova direta.
to pela rejeição do próprio filho.
8 — No caso sob julgamento,
convenci-me da razão que teve o
11 — Saio do exame dos fatos, a
Juiz, mantida pelo acórdão recorri- que minha função judicante me comdo, ante a leitura do despacho e de peliu, tomado pela acabrunhante
documentos com ele condizentes.
convicção de que, se é certo que em
geral os passionais não reincidem e
Homicida passional, o acusado, esvaziam-se, exangues, em remorso
lembra-me o caso dele, a lição dos e auto-acusação, após eliminarem o
maiores em criminologia, de que a objeto de seu. amor — lição que me
descarga emocional do homicídio do dão os clássicos de psicologia judiente amado, em regra esvazia a pe- ciária, no tema, e aos quais os penariculosidade do delinqüente, que se listas excessivamente abstratos, depõe sem mais dispor do objeto de masiadamente legistas repressivos
sua contraditória pressão emocional, contradizem, — se tudo me parece
que o fez matar a quem ama. — Um certo, quanto aos passionais em gepassional não reincide.
ral, quanto a este Paciente, no entanto, a ele me volto, cheio da soli9 — Não obstante, foi no caso tra- dariedade que os desgraçados me
zido aos autos pela defesa, um Lau- inspiram; e nego-lhe a ordem a fim
do Psiquiátrico sobre o estado do Pa- de que, tal como teme o Juiz e teme
ciente, após a tragédia em que ma- o acórdão recorrido, não vá ele
tou sua ex-esposa, à qual se vincula- acrescentar mais fatos, a seu inforva por um envolvimento emocional, túnio.
obsessivo e violento.
homem precisa de tratamenAssina esse laudo, o renomado Do- to.Esse
Não
o que fazer, por ora,
cente de Psiquiatria Rawlison Pres- com seu tem
direito
de ir livremente, petes Lemos.
las ruas da cidade.
Descreve o estado depressivo, viziConheço do recurso e nego provinho de idéias de auto-extermínio, que
no momento corroem' o Paciente. Co- mento, por haver constado a presenmo etiologia da síndrome depressi- ça dos requisitos de lei, para a priva, o Psiquiatra adianta estar pre- são preventiva, nos termos do art.
sente — «a decorrência de antigas e 312 do Código de Processo Penal: a
graves desavenças com a ex-esposa garantia da ordem pública e a cone com os sogros — que culminaram veniência da instrução criminal.
com a trágica morte de D. Christel».
E o voto.
Que o filho do acusado «se recusa a
sequer ouvi-lo no telefone, depois de
EXTRATO DA ATA
se ter constituído no objeto do extremado amor do seu pai». Conclui o
FtHC 59.175 — RJ — Rel.: MM. Cloconhecido clinico, que o acusado
apresenta «quadro depressivo — an- vis Ramalhete. Ftecte.: Eduardo Alberto Arvid Johnston ( Advs.: Nélio
sioso».
R.T.J. — 100
157
Roberto Seldl Machado e Gerardo de
Presidência do Senhor Ministro
Majela Melo Fortes). Recdo.: Tribu- Cunha Peixoto. Presentes à Sessão
nal de Justiça do Estado do Rio de os Senhores Ministros Soares Mulloz,
Janeiro).
Rafael Mayer, e Clovis Ramalhete.
Subprocurador-Geral da República,
Decisão: Conheceram do recurso o Dr. Francisco de Assis Toledo.
mas lhe negaram provimento. DeciBrasília, 1 de setembro de 1981 —
são unânime. Falou pelo Impte. o António Carlos de Azevedo Braga,
Dr. Nélio Roberto Seidl Machado.
Secretário.
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.191 — PB
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete.
Recorrente: José Guilherme, vulgo «Dedé» — Recorrido: Tribunal de
Justiça do Estado da Paraíba.
Criminal. Crime de dano. — Sendo o dano de pequena valia e estando ressarcido pelo responsável, antes da denúncia, é de ser julgada extinta a punibllidade.
— Decidir-se como tendo força de extinguir a purabilidade, o ressarcimento do dano de pequena monta, é entendimento de estimulo ao
encerramento de controvérsias e cabe no poder criativo dos juizes na
aplicação da lei penal.
— Recurso de habeas torpes que se conhece e provê.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, conhecer do recurso, e dar-lhe provimento.
Brasília, 15 de setembro de 1981 —
Cunha Peixoto — Presidente —
Clovis Ramalhete — Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Clóvis Ramalhete —
O caso é cómico.
Numa pequena cidade, o Juiz, dizem que implica com o Prefeito e o
Delegado. Então surge o popular De-
dé, que corta folhas da palmeira
do pátio da Prefeitura. Dai, se arma
a disputa judicial.
Não fosse a austeridade desta Corte, no relatório eu tomaria de empréstimo ou a pena do cronista Stanislaw Ponte Preta ou uma câmera
de cinema de diretor de comédia italiana.
Passo a relatar.
José Guilherme viu ser indeferido
pelo Tribunal de Justiça da Paraíba
o pedido de habeas corpus contra a
denúncia por crime de dano, que o
Promotor da Comarca ofereceu contra ele, ao Juiz, por haver cortado
palmas da copa de uma pequena palmeira, que cresce no pátio externo
do prédio da Prefeitura de Magoa
Grande. — Por isso agora, recorre,
no prazo de lei.
158
R.T.J. — 100
2 — A poda na copa da pequena
palmeira ocorreu em 16 de setembro
do ano passado. O Prefeito logo chamou o autor do dano à responsabilidade. Por isso, José Guilherme em
carta pediu desculpas pelo ato ao
Prefeito e dispôs-se a reparar o prejuízo.
Prefeito, João Basco Carneiro,
mandou que peritos avaliassem o
prejuízo. Estes concluíram pela
quantia de Cri 200,00. E foi paga pelo recorrente, e recolhida aos cofres
da Municipalidade.
Prefeito enviou então ao Delegado um ofício tudo relatando, — as
desculpas, a avaliação, o ressarcimento; — e declarou que não mais
pretendia que se procedesse contra
José Guilherme. Deu então por encerrado o caso da palmeira. (doc. 1,
fls. 8).
3 — Mas sucedeu que o Juiz então
baixou Portaria. E determinou ao
mesmo Delegado que abrisse Inquérito. Este ato do Juiz surgiu três meses depois de reparado o dano, conforme oficio em que o Prefeito se
deu por satisfeito (Portaria do Juiz,
fls. 9). -- O Delegado, só devido à
Portaria do Juiz, determinou a formal instauração do Inquérito (doc.
do Delegado, fls. 7).
4 — O advogado Renato Galdino
da Silva impetrou então uma ordem
de habeas corpus ao Tribunal de
Justiça, ao ver o Paciente incriminado em denúncia por crime de dano,
que foi recebida. Alegou estar o Paciente prejulgado por esse Juiz. Assevera que esse Magistrado vive «às
turras» com o Delegado e o Prefeito
do lugar. Fundamenta o habeas
corpus em inépcia da denúncia, à
vista de que não existe a queixa do
Prefeito; multo pelo contrário.
Tribunal de Justiça da Paraíba,
negou a ordem de habeas corpus,
pois que se trata de crime de dano
contra bem do Município — que tal é
a pequena palmeira, com suas folhas
decepadas. — Diz o acórdão que o
habeas corpus não é remédio próprio
para dirimir a questão de direito
suscitada pelo despojamento da copa
da pequena palmeira do pátio da
Prefeitura.
5 — Tendo o Impetrante recorrido
ao Supremo Tribunal Federal, a
Procuradoria-Geral da República
em certo e preciso Parecer do Dr.
Cláudio Lemos Fonteles, opina pelo
provimento do recurso para a concessão do habeas corpus à vista do
oficio do Prefeito e considerado o
comportamento do Paciente com o
ressarcimento do dano e seu pedido
de desculpas, pela falta.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete —
(Relatar) — 1 — A denúncia deu
inicio à ação penal, mas após o ressarcimento do dano. O prejuízo às
folhas da pequena palmeira montou
em Cr$ 200,00, segundo a avaliação
na Prefeitura. E a Administração
declara-se integralmente indenizada
pelo autor da danificação.
O caso dos autos dá noticia do ato
inconsiderado que praticou o Paciente e ora Recorrente, ao cortar folhas
da copa da pequena palmeira, que
viceja no pátio da Prefeitura. O dano, que é de pouca monta, foi avaliado e reparado pelo Paciente, até
mesmo antes da abertura do Inquérito.
2 — Tudo visto e considerado, e tal
como na Súmula 554, e na jurisprudência do STF sobre cheque sem
provisão e ainda, como na lei, quanto a peculato culposo, se o dano ao
patrimônio público é reparado antes
da denúncia, também no caso de crime de dano de pequena valia, sou do
entendimento de que, caso seja ressarcido o prejuízo antes da denúncia,
se tenha por extinta a punibilidade.
R.T.J. — 100
159
E sábia a criação da jurisprudên3 — Na questão trazida pelo precia desta Corte quanto à extinção da sente recurso, sou da opinião que,
punibilldade por emissão de cheque tratando-se do apoucado valor da cosem provisão, no caso de o paga- pa podada da pequena palmeira que
mento anteceder à denúncia. Nesse integra o patrimônio municipal, sensentido RHC 49.104, 51.231, 53.160, do o réu primário e havendo ele re53.604 e 82.663 (RTJ 60-654, 66-402, 73- parado o dano mediante avaliação
115, 75-732 e 77-648, corresponden- pela autoridade —, deve ser considetes).
rada extinta a punibilidade, já que a
Igualmente manda a Lei penal que indenização foi anterior ao início da
ao Estado faleça a sua pretensão pu- ação penal pela denúncia.
E o voto.
nitiva, no caso de peculato culposo,
se o ressarcimento ocorrer até a senEXTRATO DA ATA
tença irrecorrivel (Código Penal, 3?,
do art. 312). A reparação do dano dá
causa à extinção da punibilidade.
RHC 59.191 — PB — Rel.: Min.
Clovis Ramalhete. Recte.: José GuiTais incentivos à reparação produ- lherme, vulgo «Dedé». (Adv.: Renato
zem estímulo que é socialmente útil. Galdino da Silva). Recdo.: Tribunal
O mesmo, criação da jurisprudên- de Justiça do Estado da Paraíba.
cia, deve ser aplicado aos casos de
Decisão: Conheceram do recurso e
crime de dano, mormente aos de pe- lhe deram provimento. Decisão unâquena valia. Nem se diga que a im- nime.
precisão do que se entenda por *pePresidência do Senhor Ministro
quena valia» impede a prévia defini- Cunha Peixoto. Presentes à Sessão
ção do crime.
os Senhores Ministros Soares Mufloz,
Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e
A Lei penal, ela própria, refere-se Nérl
da Silveira. Subprocuradora estelionato de «pequeno valor» no
prejuízo (11 1?, art. 171). Igualmente Geral da República o Dr. Francisco
na lei penal, o furto de pequena valia de Assis Toledo.
Brasília, 15 de setembro de 1981 —
merece trato benevolente que não
abre portas de prisão a culpado (Có- Antônio Carlos de Azevedo Braga —
Secretário.
digo Penal, art. 155, I 2?).
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.199 — MG
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Decio Miranda.
Recorrente: Isalas Cipriano da Silva — Recorrido: Tribunal de Justiça
do Estado de Minas Gerais.
Penal. Menor inimputável. Anulado o processo pela menoridade
do agente ao tempo do crime, depois de cumprida cerca de metade da
pena e atestando o estabelecimento penai a plena recuperação do paciente para a sociedade. Concessão de «habeas comuto), para que a
soltura do paciente não fique condicionada à sua apresentação ao Juiz
de Direito de Comarca distante, para eventual consideração de medidas que, na situação atual, não teriam sentido.
160
R.T.J. — 100
ACÓRDÃO
tTistos, relatados e discutidos estes
autos, ao:ordem os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata
de julgamentos, e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos,
prover o recurso para lhe conceder a
ordem nos termos do voto do relator.
portador da carteira rosa de 1! Classe, conferida, ao mesmo pela Comissão de Classificação e Tratamento
do Estabelecimento», e, mais, «que o
referido sentenciado presta serviços
na Secretaria do Estado do Interior,
no Almoxarifado, com zêlo e dedicação.» (fls. 4).
No primeiro Recurso de habeas
corpus (n? 58.968, de que também fui
Brasília, 18 de setembro de 1981 — relator, julgado em 16 de junho do
Djaci Falcão — Presidente — Decio corrente ano), meu voto, com apoio
Miranda — Relator.
da Turma, negou a ordem, pela consideração de que «o art. 99 da Lel n?
RELATORIO
6.697, de 10-10-79 (Código de Menores)
autoriza o encaminhamento à autoriO Sr. Ministro Decio Miranda — dade judiciária — o Juiz de Menores
Pela segunda vez, o Dr. Adalberto — do menor de dezoito anos a quem
Ferraz, advogado judiciário da Peni- se atribua a autoria de infração petenciária de Neves, dirige:se ao Su- nal, para fins de apuração da mespremo Tribunal em favor do preso ma (art. 100) — sendo certo que, paIsalas Cipriano da Silva.
ra os efeitos da referida lei, deve ser
considerada a idade do menor à data
Trata-se de paciente que, co-autor do fato — cabendo àquela autoridade
de bárbaro latrocínio, veio a ser con- determinar as providências, quanto
denado a pena de 21 anos de reclu- à sua liberdade, que melhor atensão
dam a seus Interesses»
No curso da execução penal, e
Desta vez, o parecer da Procuraquando cerca de nove anos de cum- doria-Geral
República, da lavra
primento da pena já haviam decorri- do Dr. AlvarodaAugusto
Ribeiro Costa
do, foi o processo anulado, por se ve- e aprovação do Dr. Francisco
de Asrificar que o paciente era menor, sis Toledo, oficia pelo provimento
do
inimputável, ao tempo do fato.
recurso, para que, deferido o writ, se
imediato alvará de soltura
Anulando o processo, o Tribunal expeça
favor do paciente, a ser cumprilocal determinou fosse o paciente em
do se por al não estiver preso e sem
conduzido, da Penitenciária das Ne- prejuízo
medidas que o Juiz de
ves, em que se encontra, à presença Menoresdas
de Caratinga venha a endo Dr. Juiz de Direito da Comarca tender cabíveis.»
(fls. 37-42).
de Caratinga, goro da ação penal e
É o relatório.
da execução.
Essa providência se perde, todavia, em desencontros burocráticos e
o paciente continua preso, já com
nove anos de cumprimento da pena
anulada, tendo se casado no curso da
execução penal, e atestando o estabelecimento penal que «vem mantendo nesta Penitenciária ótimo
comportamento carcerário, sendo
VOTO
O Sr. Ministro Dedo Miranda (Relator) — Dou provimento ao recurso,
para que a soltura do recorrente independa de sua prévia apresentação
ao Dr. Juiz de Direito da Comarca
de Caratinga.
R.T.J. — 100
A ressalva de eventuais providências a cargo do Juiz de Direito de
Caratinga diria respeito a medidas
de segurança que, no quadro descrito no relatório, não mais teriam propósito, podendo, até, representar detrimento à plena reincorporação do
paciente à sociedade.
Ele está radicado, pelo casamento,
pelo cumprimento da pena, e pelo
trabalho, na região de Belo Horizonte, no centro do Estado, e fazê-lo
trasladar para apresentação ao respectivo Juiz de Direito, à Comarca
de Caratinga, na região leste, palco
de seu antigo crime, para eventuais
medidas de segurança, que, de resto,
nosso aparelhamento assistencial
não tem condições de executar, seria
providência totalmente inútil, além
de altamente prejudicial à situação
de aparente recuperação, em que se
encontra o recorrente.
Dou provimento ao recurso para
conceder a ordem, determinando se
161 ,
expeça alvará de soltura ao paciente, se por al não estiver preso.
E o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RHC 59.199 — MG — Rel.: Min.
Dedo Miranda. Recte.: Isaias Cipriano da Silva. (Adv.: Adalberto
Ferraz. Recrio.: Tribunal de Justiça
do Estado de Minas Gerais,
Decisão: Provido o recurso para
conceder a ordem nos termos do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Cordeiro Guerra,
Decio Miranda e Firmino Paz. Ausente, justificadamente, o Senhor
Ministro Moreira Alves. Subprocurador-Geral da República, Dr. Mauro
Leite Soares.
Brasília, 18 de setembro de 1981 —
Hélio Francisco Marques — Secretário.
HABEAS CORPUS N? 59.219 — DF
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Decio Miranda.
Paciente: Odilon Ferreira da Cunha — Coator: Tribunal de Justiça do
Distrito Federal.
Processual Penal. 1) Prazo judicial. Publicação do acórdão embargável no órgão oficial com a só indicação «Defensoria Pública* e
omissão do nome ou número do Defensor Público encarregado do caso. Nulidade da intimação. 2) Condenado em decisão não-unânime,
proferida na apelação do Ministério Público, permanece o réu em liberdade enquanto oferece embargos infringentes.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata
de julgamentos e das notas taquigrãficas, à unanimidade de votos, conceder a ordem.
Brasília, 18 de setembro de 1981 —
Djaci Falcão, Presidente — Dedo
Miranda, Relator.
RELATORIO
O Sr. Ministro Decio Miranda: Condenado o paciente em apelação, por
maioria de votos, à pena de quatro
•
162
R.T.J. — 100
anos de reclusão pela prática de lesão corporal seguida de morte (art.
129 3?), a noticia da publicação do
respectivo acórdão foi inserida no
«Diário da Justiça» com a menção
«Adv.: Defensoria Pública», relativamente ao órgão encarregado da defesa.
Dai o presente habeas corpus, originalmente apresentado ao Colendo
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e por este encaminhado ao Supremo Tribunal Federal, após dèbater e afastar a competência do Plenário daquele Colegiado.
A Procuradoria-Geral da República, em parecer do Procurador Claudio Lemos Fonteles, com aprovação
do Subprocurador-Geral Francisco
de Assis Toledo, oficia pela concessão da ordem verbis:
4 — Quanto ao mérito, procede a
pretensão.
5 — Caracterizado fica que a intimação do julgado colegiado fezse sem a individuação do Dr. Defensor Público — vide: (fls. 6), e
assim tal realidade caracteriza
cerceamento de defesa porque é da
lavra do ilustrado Min. Dedo Miranda orientação jurisprudencial,
que assim se põe. verbis:
«Processual Penal. Prazo judicial. Publicação do acórdão no
órgão oficial com a só indicação
Defensoria Pública e omissão do
nome do defensor dativo ou número do Defensor Público. Nulidade da intimação do acórdão».
(H.C. n? 57.828 D.J. 23.5.80,
3.733).
6 — Pelo deferimento do pedido
para que se proceda à intimação
nominada, pela publicação, ou pessoal do Dr. Defensor Público, sendo irrelevante a ponderação do
ilustre Des. Waldir Meuren, como
está à fls. 33 de que o Dr. Defensor
Público teve vista dos autos, porque ali mesmo se diz que a Defensoria Pública assim foi convocada
a examinar a conta, em execução
e, de qualquer forma, não se tem a
plena certeza de que o Defensor
Público em exercido na Vara das
Execuções Criminais fora o mesmo que desempenhara o patrocínio
do réu, na Instância recursal.
7 — Reitera-se o deferimento do
pedido». (fls. 42-4).
E o relatório.
«1 — Em favor de Odilon Ferreira Cunha, o Dr. Biron Cardoso Leite ajuizou pedido de habeas corpus, relevando cerceamento de defesa porque não intimado pessoalmente o Dr. Defensor Público da
decisão condenatória, lavrada na
instância recursal.
2 — Declarada a incompetência
da Turma, os autos foram remetidos à composição plenária do Tribunal de Justiça do D.F. — fls. 24
— que, por maioria, não conheceu
da anpetração, remetendo-a a exame da Suprema Corte (vide: fls.
27).
3 — Efetivamente, quer a Turma, quer o Colegiado em sua exVOTO
pressão total, jamais poderiam
apreciar o writ, porque a Turma
Criminal do sodallcio, a nivel de
O Sr. Ministro Decio Miranda (Rerecurso de apelação, esgotara a lator): Merece atendimento a súplica
instância recursal — fls. 7 —, e as- do paciente, nos termos do parecer,
sim, a ilícita coação, de tal emer- que invoca o precedente desta Turgente, haveria mesmo de ser trata- ma, de que fui relator, no HC 57.828,
da originariamente perante a Su- a dizer que, para a intimação da deprema Corte.
fesa por publicação no «Diário da
R.T.J. — 100
Justiça», não basta constar a vaga
designação «Defensoria Pública», senão que é necessário indicar pelo nome o defensor dativo, ou pelo número ou nome o Defensor Público.
No caso dos autos, a ordem de
habeas corpus, ora concedida para
que se refaça a publicação com força de intimação, envolve também a
soltura do réu. Foi ele preso em execução do acórdão condenatório, que
se teve por transitado em julgado
mediante a defeituosa intimação.
E este o entendimento do Supremo
Tribunal Federal (H.C. 53.555, 2?
Turma em 5.8.75, RTJ 75/102; HC
55.547, 2? Turma em 8.11.77, RTJ
83/760). .
Defiro a ordem para mandar que
seja posto em liberdade o paciente,
se por al não estiver preso, e para
determinar seja o acórdão condenatório republicado com indicação precisa do nome ou número do Defensor
163
Público encarregado da defesa do
paciente.
E o meu voto.
EXTRATO DA ATA
HC 59.219 — DF — Rel.: Min. Decio Miranda. Pacte.: Odilon Ferreira
da Cunha. Impte.: Biron Cardoso
Leite. Coator: Tribunal de Justiça do
Distrito Federal.
Decisão: Concedida a ordem nos
termos do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Cordeiro Guerra,
Decio Miranda e Firmino Paz. Ausente, justificadamente, o Senhor
Ministro Moreira Alves, Subprocurador-Geral da República, Dr. Mauro
Leite Soares.
Brasília, 18 de setembro de 1981 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.396 — DF
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Firmino Paz.
Recorrente: Flávio Tomaz Pereira Lopes — Recorrido: Tribunal de Justiça do Distrito Federal.
«A identificação criminal não constitui constrangimento ilegal,
ainda que o indiciado já tenha sido identificado civilmente» (Súmula
n.° 568, do STF).
Recurso a que se nega provimento.
ACORDA()
Brasília, 27 de novembro de 1981 —
Djaci Falcão, Presidente — Firmino
Vistos e relatados estes autos de Paz, Relator.
Recurso de Habeas Corpus n? 59.3968, do Distrito Federal, em que é reRELATORIO
corrente Flávio Tomaz Pereira LoO Senhor Ministro Firmino Paz
pes e recorrido Tribunal de Justiça
do referido Estado, decide o Supre- (Relator): Flávio Tomaz Pereira
mo Tribunal Federal por sua Segun- Lopes, por seu advogado, propôs
da Turma, unanimemente, negar ação de habeas corpus, ao fundaprovimento ao recurso de acordo mento de que, indiciado em inquérito
com as notas juntas.
policial e se julgando inocente, sofre
164
— ioo
o ideal constrangimento de ser identificado criminalmente, sendo, Já,
Identificado civilmente, no distrito
da culpa.
A ação de habeas corpus fora
julgada improcedente (fls. 30). Houve recurso (fls. 34/35).
A douta Procuradoria-Geral da
República, ouvida, opinou, à vista da
Súmula n? 568, desta Suprema Corte,
pelo improvimento do recurso (fls.
46).
2 o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Firmino Paz (Relator): Dispõe-se na Súmula n? 568,
deste Supremo Tribunal Federal,
verbis:
«A identificação criminal não
constitui constrangimento ilegal,
ainda que o indiciado já tenha sido
identificado civilmente».
Esse, o entendimento predominante, sumulado, do Supremo Tribunal
Federal.
2. Posto se cogite de medida desnecessária e, para pessoa inocente,
humilhante, nego provimento ao recurso, em obséquio à copiosa jurisprudência da Corte Suprema.
2 o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RHC 59.396 — DF — Rel.: Min.
Firmino Paz. Recte.: Flávio Tomaz
Pereira Lopes (Adv.: Ari Soares
Ferreira). Recdo.: Tribunal de Justiça do Distrito Federal.
Decisão: Negado provimento. Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Cordeiro Guerra,
Moreira Alves, Decio Miranda e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da
República, Dr. Mauro Leite Soares.
Brasília, 27 de novembro de 1981 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.424 — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira.
Recorrente: Roberto Correia Ribeiro — Recorrido: Tribunal de Alçada
Criminal do Estado de São Paulo.
Habeas Corpus. Aditamento à denúncia, no curso da instrução criminal, em face de prova testemunhal, em Juízo, que veio esclarecer
aspectos importantes sobre a participação do paciente no evento tido
como delituoso. Não se aplica, ao caso, o art. 18 do Código de Processo Penal. Aditamento á denúncia e o disposto no art. 569 do mesmo
Código. Se a prova, que serviu de base ao aditamento à denúncia, Procede, ou não, dirá a sentença. Não cabe, entretanto, ao paciente pretender opor-se à apuração de sua responsabilidade criminal, como coreu, na espécie. Recurso desprovido.
julgamentos e notas taquigráficas, à
ACÓRDÃO
unanimidade, negar provimento ao
recurso.
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Pri-
Brasília, 10 de novembro de 1981.
meira Turma do Supremo Tribunal — Cunha Peixoto, Presidente — Néri
Federal, na conformidade da ata de da Silveira, Relator.
R.T.J. — 100
RELATORIO
165
gou, unanimemente, a ordem, por intermédio de sua Sexta Câmara, com
os seguintes fundamentos (fls.
38/39):
«Sem ferir a fundo o mérito da
questão o cotejo da prova colhida
no inquérito policial com a que se
produziu em Juízo revela diferença
qualitativa na última, que inova
por precisar e esclarecer a participação do paciente nos fatos denunciados. Se essa participação, nos limites do primitivo inquérito policial, apresentava nebulosas ou até
mesmo omissões que recomendariam o non liquet requerido e aceito, a verdade é que, em Juizo, sobre a mesma base testemunhal, essa prova divergiu quantitativa e
qualitativamente da anterior, no
tocante ao paciente, fato que se
realça pela só observação de o depoimento judicial da testemunha
Quitéria Maria da Conceição ,suprir omissão que se lhe atribuiu na
polícia com apontar o paciente a
socar a vitima por trás.
Ante o exposto, denegam a ordem por não se vislumbrar nenhum constrangimento ilegal que
sofra o paciente pelo processo contra ele instaurado».
Recorre, ordinariamente, Roberto
Correia Ribeiro, reiterando que nenhum elemento probatório novo houve a justificar o aditamento da denúncio em exame (fls. 41/45).
A douta Procuradoria-Geral da
República opina no sentido do desprovimento do recurso.
E o relatório.
O Sr. Ministro Néri da Silveira
(Relator): Roberto Correia Ribeiro,
policial, militar, residente em Piracaia, SP, teve impetrado, em seu favor, habeas corpus, com o objetivo
de obter a exclusão da ação penal,
que lhe é movida, juntamente com
Edson Martins dos Santos, na 2? Vara Criminal da comarca de Guarulhos, em razão de lesões sofridas por
Luiz Gonzaga Correia de Oliveira, a
8.4.1977.
Alega-se que, concluído o inquérito
policial, o M.P., a 5.8.1980, denunciou, apenas, Edson Martins dos Santos, pelo evento aludido, requerendo
o arquivamento do procedimento criminal, quanto ao paciente, o que foi
deferido pelo Dr. Juiz.
Sucede, porém, que, a 16.3.1981, foi
a denúncia aditado, para incluir-se,
na ação penal, o impetrante, como
co-autor das lesões corporais sofridas por Luiz Gonzaga Correia de Oliveira, embora não se houvesse colhido outra prova, «a não ser a repetição daquilo que já fora dito no inquérito policial, não considerado o bastante pelo Dr. Promotor Público»,
«que, assim, pediu o arquivamento
referido.»
Sustenta que o aditamento da denúncia, recebido pelo magistrado,
tendo-o como incurso no art. 129,
caput, do Código Penal; violou o art.
.18, do CPP, o contrapondo-se ao que
dispõe a Súmula n? 524, pois não servem, no caso, à denúncia posterior,
repetidos argumentos, onde a vitima
e sua sogra apenas renovaram anteriores acusações ao paciente, quando
as demais testemunhas, ouvidas naVOTO
da disseram contra dito policial,
«quer na fase policial, quer na insO Sr. Ministro Néri da Silveira
trutória».
(Relator): O fundamento do pedido
O Tribunal de Alçada Criminal do de habeas corpus foi inexistência de
Estado de São Paulo, perante o qual novas provas a autorizarem o desarfoi impetrado o habeas corpus, dene- quivamento do inquérito policial, de
166
R.T.J. — 100
referência ao paciente, imputandose-lhe, em co-autoria, o delito de lesões corporais, em face da agressão
sofrida por Luiz Gonzaga Correia de
Oliveira, a 8.4.1977.
Considerou a decisão recorrida,
para indeferir o writ, que o cotejo
das declarações da testemunha Quiteria Maria da Conceição, sogra da
vítima, no inquérito policiai (fls. 14)
e em Juízo -( fls. 22v) constituia o
elemento de prova suficiente a autorizar o aditamento à denúncia, como
ocorrido, envolvendo o ora paciente.
Analisou a matéria a douta
Procuradoria-Geral da República, às
Xis. 55, nestes termos:
«Se, perante a autoridade policial, a declarante afirmou que o
recorrente investiu também contra
a vítima, embora não soubesse
precisar a forma de agressão, é
certo que, em Juizo, suas declarações ofereceram prova nova, ao
afirmar, de forma categórica, que
o recorrente «agredindo traiçoeiramente por detrás (sic)» a vítima,
«deu-lhe um murro, que fez com
que Luiz Gonzaga caísse».
O acórdão considerou que a prova,
em Juizo, precisou e esclareceu a
participação do paciente nos fatos
denunciados, o que restara nebuloso
no inquérito policial, divergindo, assim, quantitativa e qualitativamente, da anterior, no que concerne ao
paciente.
Em realidade, o art. 18, do C.P.P.,
estabelece que, depois de ordenado o
arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base
para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder as novas pesquisas, se de outras provas tiver
notícias. Na espécie, os aspectos probatórios novos incriminadores do paciente surgiram, na instrução criminal, não sendo, pois, de invocar-se,
na in casu, o art. 18, para afastar o
aditamento da denúncia, como pretende a inicial. O aditamento da denimcia, de outra parte, podia ocorrer, ao longo da instrução, com
apoio no art. 569, do CPP, surgindo,
como pareceu ao órgão do M.P., prova nova a indicar a participação do
paciente no evento delituoso.
Se essa prova procede, ou não, será matéria a decidir-se na sentença.
Não pode, entretanto, o paciente
opor-se à apuração de sua responsabilidade, em Juizo, incluído como coréu, na ação penal com asseguração
de ampla defesa.
Quanto aos fatos, a vitima, Luiz
Gonzaga Correia de Oliveira, em
Juizo, ao depor, esclareceu (fls.
21v.): «O declarante tem certeza que
seu rosto foi golpeado pelo indivíduo
chamado Roberto, que é integrante
da Policia Militar. O acusado Edson
estava em companhia do supra mencionado Roberto, mas o declarante
não notou se o acusado também o
agrediu. O declarante tem a impressão que Roberto não foi indiciado como autor da agressão, por ser integrante da Polícia Militar».
Quitaria Maria da Conceição, sogra da vítima, em Juízo (fls. 22v.),
declarou: «Que nesse instante também interveio a rua um policial militar conhecido na rua por «Roberto».
Que mencionado Militar agredindo
traiçoeiramente por detrás a Luiz
~zaga, deu-lhe um murro, que fez
com que Luiz Gonzaga caísse. Que
depois deste murro, Luiz Gonzaga
levantou-se ensangüentado. Que depois disso todos correram. Que aí
sua filha prestou socorro ao marido
Luiz Gonzaga».
No aditamento à denúncia, o órgão
do M.P. assim descreveu a conduta
do paciente (fls. 29):
«Segundo se apurou no procedimento processual sumário, através
da fase instrutória acusatória, o indiciado Roberto Correia Ribeiro,
agrediu traiçoeiramente a vítima
R.T.J. — 100
167
desferindo-lhe um murro, que fez
Do exposto, nego provimento ao
com que a vitima caísse ao chão. recurso.
Consta ainda que o indiciado Roberto, golpeou a vitima no rosto.
EXTRATO DA ATA
Face ao exposto, denuncio a V.
Exa. Roberto Correia Ribeiro, co59.424 — SP — Rel.: Min. Némo incurso nas penas do artigo 129 ri RHC.
da Silveira. Recte.: Roberto Corcaput do C. Penal, c.c. art. 25 do reia Ribeiro (Adv.: Paulo Francismesmo Códex, o requeiro que após co). Recdo.: Tribunal de Alçada Crirecebida esta, se façam as devidas minal do Estado de São Paulo.
anotações e que seja instaurado o
Decisão: Negaram provimento ao
procedimento penal, com a citação
e o interrogatório do indiciado, recurso. Decisão Unanime.
prosseguindo-se até final sentenPresidência do Senhor Ministro
ça».
Cunha Peixoto. Presentes à Sessão
Não há, assim, ver falta de justa os Senhores Ministros Soares Mufioz,
causa para a acusação ao paciente, Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e
que já foi interrogado, a 8.9.1981, Néri da Silveira. Subprocuradortendo, dessa maneira, oportunidade Geral da Rebúlica o Dr. Mauro Leite
de também se defender, juntamente Soares.
Brasília, 10 de novembro de 1981. —
com o co-réu Edson Martins dos Santos, na forma de direito, no curso do António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
processo.
RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.520 — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Cordeiro Guerra.
Recorrentes: Elena Laura de Medeiros e outra — Recorrido: Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo.
A recusa de salvo conduto a prostitutas para a prática de trottolt,
não constitui negação de direito constitucionalmente assegurado.
No ordenamento jurídico vigente, que coíbe certos atos contra a
moral e os bons costumes, não pode o habeas corpus erigir-se em
*alvará» para a prática da prostituição ostensiva.
Precedente: RHC 58.179 — O — SP, RTJ 96/1.075.
RHC improvido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata de
julgamento e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso de habeas
corpus.
Brasília, 11 de dezembro de 1981.—
Djaci Falcão, Presidente.— Cordeiro
Guerra, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: O
v. acórdão recorrido é do seguinte
teor:
168
R.T.J. — loo
«Em nova sentença, proferkla
por exemplo, se locomove na via
em virtude de anulação do procespública sem o objetivo de angariar
so pelo acórdão de fis. 86/88, foi
fregueses.
concedida em favor das pacientes,
No julgamento do recurso de
ora recorridas, a reclamada ordem
habeas
corpus, acima referido, a
de habeas corpus, com o respectiColenda
Segunda Turma do Eg.
vo salvo conduto, tendo o MM. Juiz
Supremo Tribunal Federal conrecorrido de oficio ( fls. 112/113).
cluiu que:
Pelo não provimento do recurso
«a recusa de salvo conduto a
é o parecer da douta Procuradoriaprostitutas
para a prática do
Geral da Justiça.
trottoir não constitui negação de
direito constitucionalmente asseguMantida, porém, não pode ser a
rado.»
decisão recorrida, pois não se há
de permitir a expedição de salvo
e que o trottoir configura:
conduto para o fim do trottoir, ain«ato contrário aos bons costuda que discreto, sem maiores esmes, ofensivo da moralidade públicândalos na via pública.
ca e fonte de constrangimento para
No julgamento do Recurso de
transeuntes e residentes.»
Habeas Corpus n? 58.179, de São
Isto posto:
Paulo, o eminente Ministro
Acórdam, em sessão da ~ara
Cordeiro Guerra aduziu que:
Especial
do Tribunal de Justiça de
«O trottoir é uma atividade ofenSão
Paulo,
por maioria de votos,
siva à moral pública que pode ser
dar provimento ao recurso, para
reprimida pela Polícia, dentro dos
cassar a ordem concedida.
seus poderes naturais de mantenedora da ordem pública, na preserCustas na forma da lei.
vação dos bons costumes. Não é
O julgamento teve a participação
necessário que a Polícia aguarde
dos Desembargadores Batalha de
que a prostituta, no trottoir, imporCamargo, com voto vencido, e
tune alguém de modo ofensivo ao
Halo Galli, com voto vencedor.
pudor ou mesmo pratique um atentado ao pudor público, para que enSão Paulo, 29 de julho de 1981 —
tão atue. Basta que a prostituta,
Henrique Machado, Presidente e
pela sua atitude, revele o propósito
Relator.» (fls. 128/129).
da prática da contravenção ou do
Fundamentou seu voto o ilustre
crime, porque a conduta da prostituta no trottoir já é um fato indica- Desembargador Italo Galli nestes
tivo dessa intenção. Assim, não me termos:
parece possível que se obrigue a
«Trata-se, inegavelmente, de
autoridade policial a aguardar a
habeas corpus preventivo, para a
consumação do ilícito penal para
livre prática do trottolr. Como tal
então agir.»
foi considerado na inicial, In
Aliás, a policia desempenha funverbis: «E pacífico o entendimento
ção também preventiva, não apejurisprudencial de que a lei não punas repressiva, além de que não é
ne o troittoir, item 6, f. 4; bem coo habeas corpus a via própria para
mo pela sentença, que concedeu o
que a prostituta possa praticar o
salvo conduto: «é sabido que o
trottoir. E claro que essa mesma
trottoir, em si mesmo, não configura infração penal, desde que o
via excepcional não lhe pode ser necomportamento da prostituta não
gada, fora dessa hipótese, quando,
R.T.J. — 100
169
ofenda os bons costumes e a morae não uma injustiça, tem por finalilidade pública, e se exercido de
dade defender uma existência moforma discreta e sem escândalo,»
ral,» na expressão de Tradelemf. 113.
burg (Revista dos Tribunais
543/308; Revista de Jurisprudência
Em abono de tal entendimento,
do Tribunal de Justiça de São
invoca o impetrante jurisprudência
Paulo 65-308).
já superada por recente julgado do
Pretório Excelso, em que a quesOra, admitir a prática do
tão foi colocada em seus devidos
trottoir, em que está insita a imotermos (RHC n? 58.179-0 — SP).
ralidade do comportamento — porCom efeito, conforme encareceu
que, de outro modo não seria
esse aresto, está insita, na prática
trottoir, conforme judiciosamente
do trottoir a ofensa aos bons costuobservou o Ministro Decio Miranda
mes e à moralidade pública, envolseria agasalhar a imoralidade que
vendo, nesta simples designação «o
a lel tem o dever de proteger, pois,
reconhecimento da malícia contuem última análise, o direito sanciomeliosa da atitude,» pois, «do conna os preceitos morais indispensátrário não seria qualificada como
veis á convivência dos indivíduos
trottoir.»
na sociedade.
«Este — prossegue o voto do MiNèsse sentido, recente acórdão
nistro Dedo Miranda — além da
da
Eg. Terceira Câmara Criminal
malícia e da provocação, configura
deste Tribunal, relatado pelo emiafronta a outras pessoas que na
nente Desembargador Andrade
via pública se encontrem e guarJunqueira, que salientou a incondem posição de moralidade e resgruência de condicionar a proibipeito aos costumes.»
cão da prática do trottoir à ressalE arremata:
va de ofenderem as meretrizes o
pudor público, uma vez que o
«Sr. Presidente, não me parece
trottoir já é ofensivo às normas soque o caso seja de concessão de
ciais:
habeas corpus, porque, a ser admitido o habeas corpus preventivo,
«Battre le trottoir — acrescenta
estaríamos reconhecendo que a
o aresto — exploiter le trottoir —
prática é perfeitamente normal,
ensinam os mestres — nada mais é
não é anti-social, e que com ela se
do que chercher des clientes sur le
têm de conformar as demais pestrottoir, en parlant des femmes de
soas de moralidade normal que
mauvaise vie. Telle actrice, que fit
transitam pelas vias públicas. O
courir tout Paris, est redulte a faire
habeas corpus preventivo seria cotrottoir. (Revista de Jurisprudênmo que uma carteira profissional,
cia do Tribunal de Justiça do Estaem lugar da que o Ministério do
do de São Paulo 68-355).» ( fls. 130Trabalho não outorga.»
132).
No mesmo diapasão, afinaram
Dissentiu o ilustre 'Desembargador
os votos dos Ministros Moreira Alves, Cordeiro Guerra e Djaci Batalha de Camargo desse modo:
Falcão.
«Neguei provimento ao recurso
Esse acórdão confirmou decisão
oficial, único interposto.
da Primeira Câmara Criminal deste Tribunal, em que ficou acentuaPunível há de ser o trottoir esdo o fundamento teleológico do dicandaloso e que atente contra a
reito: «todo direito enquanto direito
moralidade pública.
170
R.T.J. — 100
Teria sido este o trottoir que as
pacientes vinham praticando?
A conclusão negativa está na
própria conduta da autoridade policial, que, conduzindo, reiteradamente, as pacientes à prisão, dois
ou três dias depois, as põem em liberdade — sem qualquer providência de ordem legal a justificar a
detenção.
A ilegalidade maior, conseqüentemente, não está no pretendido
trottoir praticado pelas pacientes,
mas na prisão arbitrária feita pela
autoridade — arbitrária porque
desvestida de qualquer forma legal, sem qualquer conseqüência legal, a se repetir ilegalmente em
prática habitual, senão suspeita,
pelo menos condenável.
Se a policia, levando as pacientes à prisão, iniciasse o processo
de vadiagem ou de atentado ao pudor — tudo bem, de pleno acordo
com os excelentes votos vencedores, firmes na boa teoria.
Condenar, porém, o trottoir por
si mesmo e fazer vistas grossas à
forma ilegal e arbitrária como reprimido, não constitui, a meu ver,
data venha, solução legal ou outra
qualquer que ponha a termo o indesejável espetáculo.
O fato, porém, é que o indigitado trottoir permite a autoridades
policiais de baixo escalão praticar,
continuadamente, arbitrariedade
muito maior, a consubstanciar não
apenas conduta ilegal de autoridade pública, maS a reiteração de delito previsto em lei.
Concedido que fosse, em termos,
o habeas corpus, estaria a autoridade policial compelida, ao prender as pacientes, a cumprir o dever de oficio de iniciar o procedimento penal próprio.
Não concedida tout court a ordem, outorgou-se à Policia carta
branca para continuar a agir como
vem agindo, de forma ilegal, sem
proveito algum à moralidade pública e, talvez, com proveito indevido
que prisões ilegais e solturas imotivadas podem proporcionar a autoridades que agem ao arrepio da lei
— senhores do arbítrio de prender
e soltar seu alvedrio.
Em suma: a autoridade coatora
não atribuiu às pacientes a prática
de qualquer crime, já que, a respeito, providência alguma, de ordem legal, foi tomada.
Não concedida a ordem, a situação permanecerá a mesma: nem o
trottoir deixará de existir, nem a
Polícia de cometer a arbitrariedade da prisão sem forma legal.
A concessão da ordem, pelo menos, haveria de compelir a autoridade policial de proceder de acordo com a lei, efetivando a prisão
das pacientes que, na prática do
trottoir, estivessem a infringir algum dispositivo penal ou contravencional.
Esta, a meu ver, a realidade da
situação e a razão pela qual neguei
provimento ao recurso.» ( fls. 133135).
Insurgem-se as recorrentes sustentando que prostituição não é crime,
que fazer trattolr não é crime, e que
todos são iguais perante a lei, invocando voto do eminente Ministro
Clovis Ramalhete.
A douta Procuradoria-Geral da
República, em parecer da lavra do
ilustre Subprocurador-Geral, Professor Francisco de Assis Toledo, assim
opina:
01 — De novo chega-se ao Excelso Pretório — com o pedido de concessão de habeas corpus para a
prática do trottoir.
R.T.J. - 100
Quer-se a reforma do acórdão do
Eg. Tribunal de Justiça de São
Paulo que, invocando precedente
do Supremo Tribunal, cassou ordem concedida pelo Juiz de primeira instância.
2 — Já emitimos parecer em caso anterior (RHC. 58.938 — SP)
que se aplica por inteiro ao presente (xerox anexa).
3 — Reportando-nos, pois, ás razões desse parecer, somos pelo improvimento.» (HC 58.938 — SP).
«Em favor de Susana Rogéria
Batista e outra, impetra-se habeas
corpus preventivo, com o declarado objetivo de se permitir às pacientes a prática do trottoir, sem
que venham a ser importunadas
pela Policia.
2 — A ordem foi denegada em
acórdão de que extraímos o seguinte tópico essencial:
Não se nega a possibilidade da
ocorrência de abusos por parte de
policiais mal selecionados para a
função, inclusive com o intuito de
explorar infelizes moças que se dedicam à prostituição.
Isso teria acontecido em épocas
passadas e, com tal escândalo que
a jurisprudência se inclinou, na
impossibilidade de outros meios
para coibir a corrupção e a violência, a conceder, quase como norma
geral, habeas corpos preventivo,
em casos semelhantes.
Este aspecto foi apreciado no habeas corpus 4.149 — 3 — SP, em
acórdão que se fa-z integrante deste.
A situação, entretanto, parece diferente, acreditando-se que os objetivos das autoridades policiais,
dentro do âmbito de sua finalidade
é evitar abusos e excessos.
171
Se houver excesso na ação policial, nada impede a intervenção
dos órgãos superiores da própria
policia, para não acobertar maus
policiais e dos próprios órgãos judiciais, preservando-se entretanto
do risco de transformar-se, embora movidos pelas melhores intenções, em instrumento de advocacia
especializada na proteção da prostituição ambulante.» (fls. 81-82).
3 — Dai o recurso no qual se reiteram as alegações da inicial.
4 — Somos pelo improvimento.
No ordenamento jurídico vigente,
que coíbe certos atos contra a moral e os bons costumes, não pode o
Poder Judiciário conceder verdadeiro «alvará» para a prática ostensiva da prostituição.
5 — E certo que, hoje em dia,
certas publicações perlodicas e a
própria televisão incumbem-se de
levar a dúvida ao espirito daqueles
que ainda acreditam na possibilidade de sobrevivência de uma ética social, de feitio tradicional.
Não obstante sem pretender apresentarmo-nos qual paladino
quixotesco de uma cultura em decadência embora correndo esse
risco — pensamos que as normas
legais, sempre que possível, devem
ser interpretadas de modo a não
estabelecer conflito com o aquilo
que desde Bentham e Jellinek, convencionou chamar de «o mínimo
ético.»
6 — Saliente-se, por derradeiro,
que, se negado o salvo conduto pretendido, nada obstará às pacientes
de recorrerem ao remédio do babeas corpus, na hipótese de virem a sofrer, de fato, alguma ilícita coação
por parte das autoridades policiais,
o que, segundo se informa, ainda
não ocorreu.
172
R.T.J. — 100
O parecer, repita-se, é pelo improvimento.» (FtHC 58.938 — SP)
(fls. 151/155).
2 o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra
(Relator): Não é nova a espécie em
debate. Esta Turma no Ri-1Ç 58.179,
SP, assim decidiu, em ementa da lavra do eminente Ministro Dedo
Miranda:
«Constitucional. Poder de policia. A recusa de salvo conduto a
prostitutas para a prática de
trottoir não constitui negação de
direito constitucionalmente assegurado. Configuração de ato contrário aos bons costumes, ofensivo da
moralidade pública e fonte de
constrangimento para transeuntes
e residentes.» (RTJ 96/1.067).
Dei, na oportunidade, de improviso
longo voto (RTJ 96/1.075 a 1.076) a
que, data venia, me reporto.
Não obstante o valioso dissenso
trazido à colação pelas recorrentes,
mantenho o entendimento de que «no
ordenamento jurídico vigente, que
coíbe certos atos contra a moral e os
bons costumes, não pode o habeas
corpus erigir-se em «alvará» para a
prática da prostituição ostensiva.»
De fato, a prostituição é o comércio sexual da mulher com fim de lucro e sem que ela escolha o parceiro do prazer, na definição do professor Arturo Santoro, da Universidade
de Pisa, que relembra ser ela estigmatizada no livro dos Profetas e no
Pentateuco.
Não é, pois, uma atividade romântica, digna de estimulo e facilitação:
«A prostituição, além de constituir um fato de patente imoralidade e fonte de degradante corrupção, constitui sob diversos aspectos
um perigo para a sociedade.»
diz o mesmo autor que ressalta:
«Amplas são as ligações do meretrício com a criminalidade, e «lo
stato nom puó chiudere gli occhl dinanzi alia realtà dei tristo fenomeno, anche perche, come si é accennato, esso é fomite e causa dl gravi
nocumenti sociali.
E quindi, praticamente inammissibili un sistema legislativo de plena liberta, 11 quali lascerebbe la
prostituzione sottoposta esclusivamente alie comuni dispozioni valevolt per ogni forma de atività.»
Digesto
Italiano,
(Novissimo
Prostituzione).
Dal o regime regulamentar da
prostituição adotado em todos os povos cultos, pela Grã-Bretanha, nas
cidades portuárias, em 1964; na Itália, em 1871; na França, desde o século XVI, e, finalmente, na União
Soviética, que por um ukas de
4.5.1961, prevê medidas de ingerência social em relação àqueles que,
furtando-se ao trabalho, se dedicam
a vida anti-social e parasitária na
qual se incluem as mulheres que
exercitam a prostituição, segundo
refere Tomaso Napolitano (II Nuovo
Codice Penale Sovietico Milano,
1963, pág. 366).
O trottoir, como salienta o ilustre
— Desembargador lido Galli, «nada
mais é que procurar clientes nas calçadas», e como disse, é uma atividade ofensiva à moral pública que pode ser reprimida pela Polícia, dentro
de seus poderes normais de mantenedora da ordem pública, na preservação dos bons costumes. Não é necessário que a Polícia aguarde que a
prostituta, no trottoir, importune alguém de modo ofensivo ao pudor ou
mesmo pratique um atentado ao pudor público, para que então atue.
Basta que a prostituta, pela sua atitude, revele o propósito da prática
da contravenção ou do crime, para
que seja, obstada em sua intenção
manifestada pela própria conduta.
R.T.J. — 100
173
Assim, estou em que não é incons- do.: Tribunal de Justiça do Estado
titucional evitar que os direitos Indi- de São Paulo.
viduais sejam utilizados em contráDecisão: Negado provimento. Unârio à sua própria finalidade que é a
nime.
de assegurar a tranqüilidade de todos os cidadãos.
Presidência do Senhor Ministro
Por esses motivos, nego provimen- Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Cordeiro Guerra,
to ao recurso.
Moreira Alves, Decio Miranda e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da
EXTRATO DA ATA
RHC. 59.520 — SP — Rel.: Min. República, Dr. Mauro Leite Soares.
Cordeiro Guerra. Rectes.: Elena
Brasília, 11 de dezembro de 1981 —
Laura de Medeiros e outra (Adv.: Hélio Francisco Marques, SecretáFrancisco Lobo da Costa Ruiz). Rec- rio.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 63.769 — RJ
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu.
Recorrente: União Federal — Recorrido: Carlos Octávio Michelet de Oliveira.
Militar. Anistia prevista no Decreto legislativo n? 18, de 1961. Reversão ao serviço ativo. Procedência, nas instâncias ordinárias, da
ação. Demanda, porém, sem objeto, diante da decisão proferida no
mandado de segurança. Recurso extraordinário da União, por isso,
conhecido e provido, julgando-se improcedente a ação ordinária.
ACORDA°
ajuizou ação de mandado de seguranca, apontando como autoridade
Vistos, relatados e discutidos estes coatora o então Ministro da Guerra.
autos, acordam os Ministros da Se- Paralelamente, no ano de 1963, mês
gunda Turma do Supremo Tribunal de janeiro, agora com apoio também
Federal, na conformidade com a ata no Decreto-lei n? 8.159, de 3-11-45,
de julgamentos e notas taquigráfi- que dispôs sobre o aproveitamento
cas, em conhecer do recurso e no serviço ativo do Exército de ofiprovê-lo nos termos do voto do Mi- ciais subalternos da reserva convonistro Relator, unanimemente.
cados e de praças, ajuizou ação ordiBrasília, 7 de outubro de 1980 — nária. Em ambos os feitos, o autor,
Djac.1 Falcão — Presidente — Leitão oficial da reserva da 2? classe, que
fora convocado por ocasião da 2!
de Abreu — Relator.
guerra mundial, pretendia, em suma, reverter ao serviço ativo.
RELATORIO
Ao julgar o pedido de segurança, o
O Sr. Ministro Leitão de Abreu — Tribunal Federal de Recursos o inCom fundamento no Decreto legisla- deferiu, sob o fundamento de inconstivo n? 18, de 1961, que concedeu a- titucionalidade do art. 1?, letra e, do
nistia, Carlos Octávio Michelet de Oli- Dlg n? 18-61. Entretanto, o Supremo
veira, no ano de 1962, mês de agosto, Tribunal, apreciando recurso ordlná.
179
R.T
— 100
tras situações, inclusive atrasados.
rio, de que foi relator o Min. HahneA ação se prejudicaria se o mandamann Guimarães, reconheceu a inconstitucionalidade do texto em caudo fosse negado, ou pelo menos,
para aqueles que sustentam que,
sa e determinou se julgasse o pedido
nos termos em que fora postulado.
em matéria de direito, sua decisão
faz coisa julgada. Acompanho o voVoltando os autos à origem, a seguto do Sr. Relator» (f. 146, do RE
rança foi concedida, à unanimidade
de votos. Frisou o Ministro Henrique
69.229).
D'Avlla, relator:
O acórdão, de 17-11-64, ficou assim
«Face ao pronunciamento do ementado:
Egrégio Supremo Tribunal Fede«Decreto legislativo n? 18. Anisral, não nos resta senão deferir o
tia
relativamente a faltas verificapedido.
das no Curso de Oficiais da Reserva. Constitucionandade do consig«Reputado, como o foi, constitunado nas letras c e e do referido
cional, o disposto nas letras c e e
decreto» (f. 151 do RE 69.229).
do Decreto Legislativo n? 18-61, e
não havendo residualmente qualPor decreto presidencial de 6-7-65,
quer outra matéria a considerar a publicado
um dia após, o ex-1? Teesta altura, a solução que se impõe nente R2 da
Arma de Cavalaria —
é o deferimento do writ, para que o Carlos Octávio
de Oliveira
impetrante, ou' retorne ao serviço foi reformado, Michelet
em
cumprimento
de
ativo do Exército, ou passe à inati- sentença judicial (f. 14 dos documenvidade com as vantagens a que fi- tos por linha).
zer jus, nos precisos termos do art.
1?, § 2?, do aludido Decreto LegisAcontece, porém, que, por sentenlativo n? 18» (f. 142 do RE 69.229).
ça de 10-5-63, o juiz julgou procedente a ação ordinária, determinando a
Outros Ministros motivaram o seu
do autor ao serviço ativo do
voto, reportando-se, ao acompanha- reversão
Exército.
os recursos —
rem o voto do relator, à decisão des- o oficial e Apreciando
o
voluntário
—, o Tribunal
te Tribunal. Eis o voto do Ministro Federal de Recursos, em
acórdão de
Oscar Saraiva:
30-11-66 — posterior ao proferido na
«Também, Sr. Presidente, é este ação de mandado de segurança, bem
o meu voto. Ia fazer apenas uma como ao seu cumprimento — deciobservação breve, que é do Direito diu, nos termos do voto do Min. Escanônico: Roma locuta est causa dras Gueiros, relator:
finita. Não temos mais o que argu«A despeito de todas as alegamentar. O Supremo Tribunal Fedeções
trazidas aos autos pela União
ral repeliu a argüição de inconstiFederal,
desde a Contestação até
tucionalidade e esse era o único aràs
suas
razões de apelação,
gumento. Por outro lado, não creio
verifica-se
que estava certo o Dr.
que a ação ordinária, que veio exJuiz
a
quo não só quando rejeitou a
temporânea, prejudique o mandaargüição preliminar de prescrição,
do de segurança; ao contrário, o
da ação, mas também no tocante
mandado é que prejudicaria a ação
ao mérito do pedido, conforme é
ordinária, e não teria efeito algum
fácil de demonstrar.
se o Supremo Tribunal mantivesse
a nossa decisão; apenas, ela veio
«No tocante à preliminar de
ex abundancia — não em prejuízo
prescrição, já a matéria tornou-se
pacífica nos tribunais, inclusive o
— porque é concorrente. Na ação
ordinária o autor pode pleitear ounosso e o Supremo Tribunal Fede-
R.T.J. - 100
ral. Está na Revista Forense, vol.
178, fls. 157, Ementa, de decisão
deste Tribunal, assim concebida:
Prescrição — Não atinge o fundo
do direito, mas tão-somente os
efeitos patrimoniais, vencidos nos
cinco anos anteriores.»
«E a respeitável sentença apelada bem apreciou esse aspecto, ao
afirmar:
«Por outro lado, é evidente que a
prescrição qüinqüenal não atinge
aos direitos pessoais daqueles que
tenham algo a reclamar do Estado. Este entendimento constitui hoje matéria pacífica dos Tribunais,
alcançando a prescrição, nos casos
de servidores do Estado, civis ou
militares, apenas as vantagens ou
prestações que, vencidas periodicamente, tiverem tido tal vencimento anterior ao qüinqüênio que
precedeu a propositura da ação.
Rejeito, portanto, a preliminar de
prescrição nos termos amplos em
que foi formulada, para só admitila no tocante ás prestações antecedentes ao qüinqüênio referido.» (V.
fls. 75 dos autos).
«Quanto ao mérito, igualmente
andou acertada a sentença apelada, proferida em 10-05-63, quando
admitiu em benefício do autor a
anistia de que trata o Decreto Legislativo n? 18, de 15-12-61, cuja
constitucionalidade foi declarada,
em favor do mesmo autor, em recurso seu, de mandado de segurança, Alagado pelo Supremo Tribunal
Federal, do qual foi Relator o eminente Ministro Hahnemann Guimarães, conforme se vê da publicação
inserta no D. da Justiça de 11-81964, junto pelo autor com sua petição de fls. 100-104. Nessa decisão
determinou-se ao Tribunal Federal
de Recursos que julgasse o pedido
nos termos do art. 1?, letras c e e
do Decreto Legislativo n? 18, de 15-
175
12-1961, considerando-o, nessa parte, constitucional.» A decisão foi
unânime.
«Verifica-se, assim, que a douta
sentença apelada estava inteiramente certa, ao aplicar em favor
do autor, ora apelado, o Decreto
Legislativo n? 18.
«Acontece que, já agora, segundo se lê do D Oficial de 7-7-1965,
parte II, pág. 6351, que o apelado
fez juntar, por linha, a estes autos,
com sua petição de fls., foi ele
reformado, por ato do Sr. Presidente da República de 6-7-65, em
cumprimento a decisão judicial
proferida por este Tribunal no
Mandado de Segurança já antes referido, com a aplicação da anistia
prevista no Decreto Legislativo n?
18, «com direito aos proventos a
que fizer jus, a partir da vigência
do referido Decreto Legislativo,
observados os artigos 137, 139 e 140
da Lei n? 4.328, de 30 de abril de
1964.»
«Observe-se que na petição do
apelado, junta por linha, declara
ele que «abre mão de receber os
atrasados, mesmo porque o Exmo.
Sr. Presidente da República, no
ato de sua reforma, mandou que
lhe fossem pagos os atrasados a
partir de 1961.»
«Com estas considerações, entendo que se deve negar provimento
aos recursos de «oficio» e à apelação da União Federal, em parte,
isto é, para que prevaleça a sentença apelada exceto naquilo em
que não discorde do agora pretendido pelo autor quanto aos atrasados, eis que declarou expressamente, no documento junto por linha a
estes autos, que aceita o recebimento de atrasados apenas *a partir de 1961», conforme ficou previsto no ato presidencial de sua reforma. No mais, prevalecerá a sentença, dado que o objetivo primor-
176
R.T.J. — 100
dial do autor na demanda baseouse nos arta 1?, letra b, e 10?, letra
b, do Decreto lei n? 8.159, de 1945.»
(fls. 111 a 113 do RE 63.769).
Na ação de segurança, a União entrou com recurso extraordinário,
com amparo na alínea a do permissivo constitucional, recurso que subiu porque provido o agravo, Ag. n?
43.407, em apenso. O recurso tomou,
nesta Corte, o n? RE 69.229. Na ação
ordinária, a União também entrou
com recurso extraordinário, com
apoio nas alíneas a e d, que foi admitido. O recurso recebeu, nesta Corte,
o n? RE 63.769.
A Procuradoria-Geral da República, opinando quanto a ambos os recursos, pede que:
«a E. Segunda Turma conheça
dos recursos e lhes dê provimento,
no mérito, para cassar a segurança e, por via de conseqüência, Julgar prescrita ou improcedente a
ação ordinária, condenando o autor, ora recorrido, nas custas e em
honorários de advogado, de acordo
com o art. 64 do Código de Processo Civil, com a nova redação dada
pela Lei n? 4.632, de 18 de maio de
1965.» (fls. 182).
Impedido o Min. Antonio Neder, os
autos passaram ao Min. Bilac Pinto,
e, depois, em face da aposentadoria
deste, ao Min. Decio Miranda, que
também se deu por impedido.
E o relatório dos dois recursos extraordinários.
teve presente o Subprocurador-Geral
da República; b) ofensa ao Decreto
Legislativo ti? 18-61, e ao art. 141, ã
24, da Constituição de 1946. Os fundamentos do recurso foram repelidos
pelo despacho do então Presidente
do Tribunal a quo, Ministro Godoy
Ilha, que assim remata a sua decisão:
«O apelo excepcional é nitidamente descabido, pois a recorrente
reedita matéria vencida, Já que o
Egrégio Supremo Tribunal Federal
no recurso interposto pelo ora recorrido da primitiva decisão proferida por este Tribunal que lhe negou a aplicação do mencionado Decreto Legislativo n? 18, por
considerá-lo, em parte, inconstitucional, repeliu a argüição, e, provendo o recurso, determinou fosse
apreciado o mérito do pedido (acórdão de (ls. 136, no Recurso em
Mandado de Segurança n? 12.539).
VOTO
«E o Julgado, ora impugnado,
limitou-se a considerar o impetrante enquadrado no benefício da anistia, eis que, 1? Tenente da Reserva
da 2? Classe da Arma de Cavalaria, convocado para o serviço ativo
e cursando o 2? ano da Escola Militar, para a permanência definitiva
nas fileiras, fora dispensado do
serviço por ter trancado a sua
matrícula pelas faltas às aulas em
que incorreu, aliás por motivos de
saúde, extensivos que lhes são os
incisos c e e do art. 1? do Decreto
Legislativo, como o reconheceu a
egrégia suprema instância.
O Sr. Ministro Leitão de Abreu
(Relator) — No recurso extraordinário, que tomou o n? 69.229, recurso
Interposto contra decisão proferida
no Julgamento do mandado de segurança, a União, estribada unicamente na alínea a, alega: a) nulidade do
Julgamento, visto que, por ocasião
do Julgamento dos recursos, não es-
«O acórdão recorrido, aplicando
o invocado diploma legislativo,
condicionou a reversão do impetrante ao pronunciamento favorável da autoridade militar, assegurado o direito à reforma em caso
negativo, tudo como dispõem os
parágrafos 1? e 2? do art. 2? do decreto de anistia.
R.T.J. — 100
«A preliminar de nulidade do julgamento, por não estar a ele presente o titular da SubprocuradoriaGeral da República, não tem qualquer fomento de direito. Além de
não se tratar de questão prequestionada, cuida-se, na espécie, de
mera repetição do julgamento,
salientando-se que já havia o representante da União falado nos
autos, com o longo parecer de fls.
43-48.
«A presença do órgão do Ministério Público Federal nos julgamentos dos Tribunais em que servem
não é obrigatória e, na generalidade dos casos, são ausentes e, quando presentes, só excepcionalmente
fazem a sustentação oral dos seus
pareceres O que é indispensável é
a sua audiência e o Tribunal jamais decidiu sem a prévia manifestação da Subprocuradoria-Geral
da República.» (fls. 159-160).
Procedem os fundamentos do despacho que negou seguimento ao recurso. No tocante à preliminar, além
do que se afirma no aludido despacho, trata-se de questão não ventilada no acórdão recorrido, incidindo,
pois, as Súmulas 282 e 356. Quanto ao
mérito, a questão, que lhe diz respeito, já se encontrava, na verdade superada, diante do acórdão proferido
pelo Supremo Tribunal no RMS ri?
12.539, que se encontra às fls. 125135.
Não conheço, assim, do RE n?
69.229.
Quanto ao recurso extraordinário,
a que se após, nesta Corte, o n? RE
63.769, a União Federal ao deduzi-lo,
argumentou:
«Como se depreende da inicial,
da contestação e das demais peças
dos autos, inclusive do documento
junto por linha, o A., sendo Oficial
da Reserva de 2? classe (isto é,
não remunerada) do Exército, foi
177
convocado por ocasião da 2? guerra mundial, sendo depois matriculado no Curso de Oficiais da
Reserva como condição para
permanência na, ativa, nos termos
do Decreto-lei n? 8.159, de 1945. já
que não participara da FEB (fls.
36-40).
«Desligado desse curso, por falta
de freqüência ( fls. 37), retornou,
como corolário, à situação de oficial da reserva da 2? classe.
«Decorridos mais de quinze
anos, ajuizou, contra esse ato, duas
ações:
uma de mandado de
segurança, pleiteando a anistia do
Decreto Legislativo n? 18-61, para
aquelas faltas que motivaram sua
exclusão do Curso; e
a ação ordinária de que aqui
se trata, pretendendo a anulação
do ato pelo qual foi devolvido à reserva, por considerá-lo contrário
ao citado Decreto-lei 8.159, de 1945.
«Com o pedido de Anistia, afinal
julgado procedente e já até executado pela Administração (v. doc.
junto por linha), conseguiu o A.,
nos exatos termos do Decreto Legislativo 18-61, sua reforma no posto de 1? Tenente.
«Com a ação ordinária, afinal
julgada procedente na lt instância
e agora confirmada pelo acórdão
recorrido, pediu:
«... seja o Autor revertido ao servi° ativo... e seja incluído no
Q.O.A., seja o mesmo tempo condenada a Ré aos reparos dos
Danos Materiais e Morais... (Inicial, fls. 9; os grifos são do A.).
«Ora, cremos não ser necessário
maior esforço para se ver que essas pretensões se repelem, por
contradição gritante, tanto no campo do direito como no plano da lógica das coisas.
178
R.T.J. - 100
ção e não apenas as prestações pa«Com efeito, se não há falta (em
trimoniais vencidas há mais de
sentido criminal ou disciplinar),
cinco anos da propositura da decomo pode haver anistia?
manda.»
«Inversamente, se há anistia, como decidiu esse E. Tribunal no
«No mesmo sentido, este outro,
mandado de segurança, já estando
proferido no Rec. Ext. n? 59.122, In
o A. no gozo dela, é porque houve
DJ de 17-11-66, pág. 4.003:
faltas. Como, pois, tachar de «ilegal», «injusto», e outros apelidos o
«Prescrição. Quando é um direiato que as puniu, e contra o qual
to
reconhecido, sobre o qual não se
vem esta ação?
questiona, ai, são as prestações
que vão prescrevendo, mas, se o
«E tem mais. Como poderá o A.
direito às prestações decorre do diestar reformado por força do
reito à anulação do ato, é claro
Mandado de Segurança e, agora,
que, prescrita a ação em relação a
por força do acórdão recorrido, ser
este, não é possível julgar prescrirevertido.., e incluído no Q.O.A. e
tas apenas as prestações, porque
ficar na ativa?
prescreveu a ação para reconheci«Vê-se que o v. acórdão recorrimento do direito, do qual decorredo, ao tomar por um de seus funria o direito às prestações. Do condamentos, o fato de ter o A. obtido
trário, seria admitir o efeito sem a
o vnit, não atentou para essa concausa. Recurso extraordinário, cotradição e decidiu contra a coisa
nhecido, mas não provido.»
julgada.
«Houve, assim, negativa de apli«Mas se isto não bastasse, é incação ou vigência aos arts. 223, 877
discutível que a presente ação
e 878 do CPC, 1? do Decreto n?
ordinária estava mesmo prescrita.
20.910-32 e 150, 3?, da ConstituiCuida ela de anular um ato baixação. Estando, por outro lado, dedo em 1947, para restabelecer uma
monstrado o dissídio, espera a
situação jurídica que ele extinguiu.
União
Federal que V. Exa. haja
E caso do art. 1? do Decreto númepor bem admitir o presente recurro 20.910-32, que cuida da prescriso, como de direito.» (fls. 119-122).
ção de todo e qualquer direito, e,
não do art. 3?, referente a simples
O Ministro Godoy Ilha determinou
prestações, como entendeu o acór- o processamento
do recurso, por este
dão.
despacho:
«Diz a ementa de recente acór«2 de acolher-se o recurso. A
dão proferido, em 30-7-64, pela
ação estava, realmente, prescrita,
Egrégia 1! Turma da mais alta
ajuizada que foi quinze anos após o
corte, ao julgar o Rec. Ext. n?
ato que o desligou do Curso de Ofi55.201, e publicado na integra no
ciais da Reserva, por falta de freDJ de 22-10-64, pág. 834:
qüência regular (fls. 37). Assim, a
toda a evidência, o direito à ação
«Prescrição qüinqüenal contra a
para nulificar o ato estava prescriFazenda Pública. Em matéria de
to, não vingando a assertiva do
equiparação funcional, o lapso
prescricional começa a fluir da daacórdão de que a prescrição não
ta do ato ou fato que origina a preatinge o fundo de direito, mas tãotensão básica, e a prescrição, uma
só os efeitos patrimoniais, ou mevez consumada, atinge o direito de
lhor, sobre as prestações acessóobter judicialmente tal equipararias.
R.T.J. — ipo
«Vingou, em algum tempo, o entendimento de que, tratando-se de
prestação de trato sucessivo, a
prescrição só alcança as prestações vencidas no qüinqüênio anterior, deixando Integro o fundo do
direito, afirmação menos jurídica,
ainda que proclamada em alguns
julgados.
179
mérito, sendo, então,
concedida a segurança, nos termos
do mencionado Decreto Legislativo
n? 18, sendo o recorrido reformado
por Decreto publicado no Diário
Oficial, de 7 de julho de 1965, como
se vê do apenso.
apreciasse o
«O que o recorrido pleiteou na
ação foi a sua reversão ao, serviço
ativo, agora já impossível pelo ato
que o reformou.» (fls. 128-129).
«A regra contida no art. 167 do
Código Civil é a de que, com o
principal, prescrevem os direitos
acessórios, desde que a prescrição
Tendo em conta, como observa o
atinge o fundo do direito, o próprio despacho
presidencial supratranscriconteúdo da causa, como observa to,
que
a
ação
ordinária, a que se reCarvalho Santos.
fere o recurso, perdeu o objeto, diante da decisão proferida no mandado
«O entendimento sustentado pelo de segurança, decisão que, além de
acórdão está superado na jurispru- ter transitado em julgado, já foi
dência hoje remansada do Egrégio cumprida pela União, conheço do
Tribunal ad quem, como consagra aludido recurso — o de n? 63.769 — e
a Súmula 443; «A prescrição das lhe dou provimento, para julgar imprestações acessórias só não ocor- procedente a aludida ação, invertire quando não tiver sido negado o dos os õnus da sucumbência.
próprio direito reclamado ou a situação jurídica de que ele resulEXTRATO DA ATA
ta.»
o Decreto Legislativo n?
18-61 teve o efeito de interromper a
prescrição, como sustentou o recorrido.
RE 63.769 — RJ — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Recte.: União Federal
Recdo.: Carlos Octávio Michelet de
Oliveira (Adv.: Antão Araújo da Silva).
«Todavia, a ação já não tinha
mais objeto.
Decisão: Conhecido e provido nos
termos do voto do Ministro Relator.
Unânime. Impedido o Senhor Ministro Décio Miranda.
«E nem
«O recorrido, concomitantemente, postulou a concessão da anistia
daquele diploma legislativo. NegaPresidência do Senhor Ministro
da pela autoridade administrativa,
com assento em parecer do então Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Consultor da República, denegou- Senhores Ministros Leitão de Abreu,
lhe este Tribunal a segurança, por Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
entender inaplicável o citado De- Decio Miranda. Subprocuradorcreto, mas o Egrégio Supremo Geral da República, o Dr. Mauro
Tribunal Federal proveu-lhe em Leite Soares.
parte o recurso, para considerar
constitucional o disposto nas letras
Brasília, 7 de outubro de 1980 —
c e e do art. 1? e, em conseqüência, Hélio Francisco Marques — Secretádeterminar que o Tribunal a quo, rio.
180
R.T.J. — 100
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 74.011 — MG
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Antonio Neder.
Recorrente: Tarcides Pereira Fernandes — Recorrido: Espólio de Cândido Ribeiro.
Decreto n? 24.150 de 1934, art. 31. Ação revisória do aluguel. Caso
em que o acórdão impugnado por meio de recurso extraordinário considerou certa peculiaridade para julgar que o novo aluguel deve ser
pago a partir da citação. Inadmissibilidade, na espécie, de confronto
com o verbete 180 da Súmula para caracterizar a divergência pretoriana.
2. Recurso extraordinário que, fundado em discordância jurisprudencial, não é conhecido.
ACORDA°
Vistos e relatados estes autos de
Recurso Extraordinário n? 74.011, do
Estado de Minas Gerais, em que é
recorrente Tarcides Pereira Fernandes e recorrido o Espólio de Cândido
Ribeiro, decide o Supremo Tribunal
Federal, por sua Primeira Turma,
unanimemente, não conhecer do recurso, de acordo com as notas juntas.
Brasília, 05 de maio de 1981 —
Antonio Neder, Presidente e Relator.
2? Apelante, que é o Espólio do
locador, pleiteou aumento do aluguei
fixado na sentença.
Eg. Tribunal de Alçada mineiro
negou provimento aos dois recursos,
e o fez acompanhando o voto do Relator, assim deduzido na f. 95:
«Considero incensurável a r. decisão de fls. 60 a 63 dos autos, e,
por isso mesmo, nego provimento
às apelações registradas às folhas
66 e 70 do processo, para confirmar, por todos os seus termos e
jurídicos fundamentos, a referida
RELATÓRIO
decisão.
Sr. Ministro Antonio Neder (Re«Bem lançada a sentença, desalator): 1. Na Comarca de Belo Horifia ela, no seu desate, qualquer rezonte, MG, Cândido Ribeiro ajuizou
forma, ou qualquer modificação,
contra Tarcides Pereira Fernandes
tendo o seu ilustre prolatar feito a
a ação revisória de aluguel prevista
sustentação da mesma no bom dino art. 31, do Decreto n? 24.150, de
reito e de acordo com as provas e
1934.
a lei reguladora do assunto. Vê-se
Julgou-a procedente o juiz de prique
o 2? (segundo) recorrente, apemeiro grau, que fixou o dia da citalou pelo sentido de conseguir «um
ção para começo de vigência do nopouco mais» no ajuste do valor lovo aluguel.
caticio, mas o seu pedido inicial foi
A sentença que assim julgou o cadeclarado procedente, no principal,
so, cada uma das partes interpôs reinclusive na fixação da data de
curso de apelação.
início de solicitação revisional. Já
o 1? (primeiro) apelante ingressou
1? Apelante, que é o locatário,
com a sua insurreição à sentença
pediu que o novo aluguel tenha inicio
recorrida, na intenção de obter a
a partir do laudo, como previsto no
reforma, na parte do inicio do paverbete 180 da Súmula desta Corte.
R.T.J. — 100
gamento do valor revisional, que
reclama deva ser a data da
perícia, e não a da citação inicial.
E suplica a improcedência da ação
«nos termos em que foi proposta»
(fls. 68), com a condenação do autor nas cominações legais. Examinados os recursos , vê-se que os
apelantes, usaram do direito de
apelar, como um meio de «alcançar um pouco» mais do que conseguiram obter nos autos. Porém, essa insatisfação não convence e, por
isso, entendo bem lançada a sentença apelada e incensurável no
seu desate, pelo que eu a confirmo,
por seus próprios e jurídicos fundamentos.»
II — Pelo recurso extraordinário
que ajuizou nas fls. 98 a 99, sustenta
locatário Tarcides Pereira Fernandes que o acórdão local diverge
da jurisprudência que o STF resu-,
miu no verbete 180 da Súmula, redigido nestes termos:
«Na ação revisional do art. 31 do
D. 24.150, de 20.4.34, o aluguel arbitrado vigora a partir do laudo pericial.»
O recurso foi impugnado, fls. 101 a
105, admitido, f. 107, razoado, fls. 109
110, e contra-arrazoado, fls. 112 a
119, tudo nestes termos: ... (lê).
III — E o relatório.
VOTO
Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I. A sentença julgou que o novo aluguel deve ser pago a partir da
citação, f. 62.
acórdão confirmou a sentença
pelos fundamentos em que ela se baseou, f. 95, isto é, confirmou que o
novo aluguel deve ser pago a partir
da citação.
Recorrente sustenta que, julgando assim o pormenor, o acórdão local se acha em divergência com o
verbete 180 da Súmula, que registra
o entendimento de que o novo alu-
181
guel deve ser pago a partir do laudo
pericial.
Sucede, porém, que o Supremo
vem adotando, em vários julgamentos, a orientação que abranda a rigidez do citado verbete.
E o que se verifica nos acórdãos
preferidos nestes casos: RE 71.578,
RE 72.093, RE 63.385, RE 42.318, RE
62 624 RE 69.064, todos publicados
na
Revista
Trimestral
de
Jurisprudência.
Por conseguinte, ao confirmar a
sentença, o acórdão impugnado se
harmoniza, quanto ao assunto, com
a citada jurisprudência da Corte.
Ocorre, ainda, que, na espécie, o
juiz ressaltou uma peculiaridade,
qual seja a de que a perícia foi realizada muito tempo depois, f. 63.
Trata-se de fundamento decisório
que tem o apoio da eqüidade.
Considerando tal peculiaridade,
não se tem como fazer a comparação do acórdão local com o verbete
180 da Súmula.
II — Não conheço do recurso.
EXTRATO DA ATA
RE 74.011 — MG — Rel.: Min. Antonio Neder. Recte.: Tarcides Pereira Fernandes (Advs.: Humberto
Anastásia e outros). Recdo.: Cândido
Ribeiro (Espólio de) Advs.: Severo
José Lopes da Silva e outros).
Decisão: Não se conheceu do recurso, votação uniforme.
Presidência do Senhor Ministro
Antonio Neder. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Mufioz e Rafael Mayer.
Ausente, justificadamente o Ministro
Clovis Ramalhete. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Francisco
de Assis Toledo.
Brasília, 5 de maio de 1981 —
António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
R.T.J. — 100
182
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 74.506 — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu.
Recorrente: Jockey Club São Vicente — Recorrido: Município de São Vicente.
Imposto sobre serviços. Sociedade turfística. Movimento geral de
apostas. Ilegitimidade na incidência do tributo, pois legítima apenas a
cobrança sobre os ingressos vendidos aos freqüentadores. Precedente: RE 74.849. Recurso extraordinário conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal na conformidade com a ata
de julgamentos e notas taquigráficas, em conhecer do recurso e
provê-lo parcialmente, nos termos
do voto do Ministro Relator, por
maioria de votos.
Brasília, 31 de outubro de 1980 —
Djaci Falcão, Presidente — Leitão
de Abreu, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu: O
acórdão recorrido assim expõe o caso:
«O Jockey Club de São Vicente
impetrou mandado de segurança
para eximir-se do pagamento do
imposto sobre serviços de qualquer
natureza, que a Prefeitura Municipal está lhe exigindo através dos
avisos de fls. 153/157 da Diretoria
de Serviços Jurídicos, com base na
Lei •n? 1.321, de 3.2.1967, regulamentada pelo Decreto n? 1.386, do
mesmo ano, sendo o tributo reclamado na base de 10% sobre o percentual de 31? que o impetrante retira do movimento geral de apostas.
Alegou que a pretensão da Fazenda Municipal é ilegal por inúmeras razões, a saber: por impos-
sibilidade econômico-financeira,
dada a pesada carga que o tributo
representa para o orçamento já deficitário do impetrante; que não se
trata de serviço municipal o tributado, mas de serviço federal, dado
que a atividade turfistica importou
em verdadeira derrogação da lei
penal e somente pode ser exercida
mediante autorização federal, daí
se seguindo que não é lícito ao Município instituir imposto sobre serviços da União, conforme determina a Carta Magna; que por se tratar de serviço federal a União já
instituiu tributos sobre a poule que
tendo a chamada «lei do turfe»
(Lel n? 4.096, de 18-7-62) disposto
que para todos os efeitos a exploração de apostas e o espetáculo ou
diversão pública se consideram
atividades distintas, isto significa
que a fiscalização municipal só pode se restringir ao espetáculo ou à
diversão pública, nunca às apostas, que à União cabe fiscalizar,
daí se seguindo que o Município só
poderia tributar o ingresso no hipódromo; não a poule. Aduziu ainda
que a venda de poules ou as apostas em hipódromo não consta da
lista de serviços apresentada pelo
decreto-lei n? 406, de 31-12-68, nem
do Decreto-lei n? 834-69 e que não
sendo uma «empresa» no sentido
Jurídico do termo, mas uma sociedade civil de fins não lucrativos,
falta esse requisito para a integração do fato gerador, que requer a
R.T.J. — 100
prestação de serviços por empresa
ou
profissional
autônomo.
Tratando-se de caso de não incidência, prossegue, a exigência fiscal consubstanciada nos mencionados avisos importa em ilegalidade
e para justificar a renovação do
writ aduziu que a decisão denegatória anterior não lhe apreciou o
mérito, fundada apenas na decadência do pedido, agora afastada
pela remessa de novos avisos da
impetrada, exigindo o pagamento
do imposto em questão. A segurança foi concedida em primeira instância por haver entendido o MM.
Juiz que as apostas sobre corridas
de cavalos não se confundiam com
a diversão pública, segundo a «Lei
do turfe», ainda não modificada. E
não estando incluídas em qualquer
dos 66 itens da nova lista de serviços instituída pelo Decreto-lei n?
834/69, sobre as mesmas não pode
incidir o tributo. Como razão de
decidir considerou também o magistrado que o impetrante não é
empresa e não visa finalidades lucrativas na prestação de serviços,
inexistindo portanto elementos subjetivos do fato gerador do tributo
em causa» (fls. 345/347).
Na parte decisória, reza o aresto:
É preciso registrar inicialmente
que ao contrário do alegado o impetrante não é órgão do Governo
Federal, mas apenas desenvolve
uma atividade regulada por lei federal. E como já decidiu o Egrégio
Tribunal de Justiça, em sessão plenária, estando sujeita essa atividade ao poder de polícia estadual e
municipal, «no desempenho de serviços públicos que lhes são afetos
pode ser tributada pelas três unidades da Federação» (cfr. «Revista dos Tribunais», 300/326. Idem:
rev. citada, vol. 330/648, Tribunal
de Alçada).
183
E precisamente por isso que a
chamada «lei do turfe» (Lei n?
4.096, de 18.7.1962) dispõe no parágrafo 2? do artigo 7?, que «a fiscalização federal será limitada às atribuições especificas da alçada da
União, ressalvado ao Município o
direito de fiscalizar a observáncia
de sua própria legislação, no âmbito de sua competência constitucional.»
Depois de editado o Decreto-leir
n? 717, de 30.7.1969, que dispõe sobre a cota de previdência devida
pelas entidades turfisticas, velb o
decreto-lei n? 1.129, de 13.10.1970,
regulamentado pelo Decreto n?
67.644, de 23.11.1970, dispondo sobre
o conceito de renda liquida para
fins da incidência daquela cota de
previdência.
Assim é que ao dispor sobre os
tributos dedutiveis para a apuração da renda liquida o citado decreto federal menciona as obrigações de qualquer natureza, "federal, estadual e muncipal que incidem ou venham a incidir sobre os
hipódromos, suas dependências e
serviços...», numa demonstração
de que, ao contrário do alegado, a
par dos tributos federais e encargos previdenciários os hipódromos
estão sujeitos à tributação municipal em razão dos serviços prestados
Embora se trate de legislação
posterior ao ato impugnado não se
pode deixar de aceitá-la pelo menos como normas de interpretação
a respeito do assunto.
Não foi por outra razão, aliás,
que a Egrégia Sexta Câmara deste
Tribunal ao julgar recurso interposto em executivo fiscal movido
contra o impetrante deixou expresso que «a atividade da executada
depende de licença federal pois
que objetiva autorização para realizar e aceitar apostas em corridas
184
R.T.J. — 100
de cavalo, mas pelas reuniões que
faz, no município, está ela sujeita
às tributações devidas por divertimentos e jogos. Assim, não se confundem a licença federal e o imposto cobrado» (fls. 297).
Sustentou o impetrante, ainda
com apoio na Lei n? 4.096/62 (((lei do
turfe»), que segundo estabelece o
seu artigo 7?, parágrafo 2?, já citado, a exploração de apostas e o espetáculo ou diversão pública se
consideram atividades distintas,
«para todos os efeitos», pretendendo com isso extrair a ilação de que
sendo a exploração de apostas derrogação da lei penal, só a União
poderia tributar essa atividade, como vem fazendo. Assim sendo restaria ao município fiscalizar e cobrar impostos sobre a diversão pública, fazendo-os incidir unicamente sobre o preço dos ingressos, e
não sobre as «poules». Se as considerações expendidas anteriormente não bastassem para repelir o argumento, é importante ressaltar,
neste passo, que a distinção feita
pela citada lei acerca de apostas e
diversões públicas não pode alcançar efeitos fiscais, segundo proibição contida no artigo 109 do Código
Tributário Nacional, In verbis: «os
princípios gerais de direito privado
utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do 'alcance de
seus institutos, conceitos e formas,
mas não para definição dos respectivos efeitos tributários».
Dai se pode deduzir que as atividades turfísticas, no respeitante
aos serviços prestados aos freqüentadores de hipódromos podem ser
tributadas também pelos municípios, no âmbito de sua competência, não havendo na Constituição vigente ou em qualquer lei que
constitua fonte de Direito Tributário limitação alguma.
Se assim é, deve-se convir que
sendo o Imposto sobre serviços ins-
tituído pelo município, cabe-lhe
traçar os contornos da tipicidade
fiscal, desde que não contrarie as
disposições gerais da Constituição
e das leis fiscais.
Estas disposições estabelecem
que a essência do fato gerador do
referido imposto está contida nestas duas regras: a) deve ser uma
atividade praticada por empresa
ou profissional autónomo; b) deve
ser uma atividade que represente
serviço constante da lista geral.
Ora, tanto o decreto-lei ri? 406, de
31 de dezembro de 1968, como o de
n? 834, de 8 de setembro de 1969,
incluíram na lista de serviços tributáveis, no item reservado às diversões públicas, «bilhares, boliches e outros jogos permitidos,»
encontrando-se as apostas em corridas de cavalo subsumidas nesses
jogos permitidos, como o próprio
impetrante se empenhou em demonstrar com a alusão que fez à
derrogação da lei penal, em face
da lei do turfe, permitindo as apostas nos hipódromos.
Tem-se, resumindo, que sendo as
apostas em hipódromos jogo permitido, autorizado, pelos serviços
que são prestados aos apostadores
estão as entidades turfisticas sujeitas ao pagamento do imposto municipal respectivo, sendo licito aos
municípios dispor a respeito das
bases de cálculo, que na espécie «é
o preço do serviço» ( artigo 9? do
Decreto-lei n? 406).
Da mesma forma a lei municipal
que instituiu o tributo em questão
(Lei n? 1.321, de 14.2.1967) podia,
para efeitos fiscais somente, equiparar os hipódromos às empresas
de diversões (artigo 7?), buscando
com isso caracterizar o elemento
subjetivo do fato gerador.
Muito se discutiu o propósito do
conceito de empresa nestes autos,
R.T.J.
com o objetivo de demonstrar que
não sendo o Jockey Club de São Vicente uma empresa civil ou comercial, não está sujeito ao imposto
sobre serviços, que necessariamente pressupõe no fato gerador uma
atividade praticada por empresa
ou profissional autônomo. Para
tanto vieram para os autos eruditas citações sobre esse conceito,
assinalando-se que o impetrante é
uma sociedade civil de fins não lucrativos, como seus próprios atos
constitutivos indicam, não percebendo seus dirigentes qualquer remuneração e destinando-se suas
rendas ao aprimoramento do puro
sangue de carreira no pais e a
obras de benemerência.
Entretanto já se observou que
em matéria fiscal os institutos,
conceitos e formas de direito privado não podem ser utilizados para definição dos efeitos tributários
(artigo 109 do C.T.N. citado), o
mesmo sucedendo com o Direito do
Trabalho, por exemplo, no qual a
expressão «empresa» tem significado diverso, confundindo-se com o
simples empregador, ainda que individual.
E por isso que segundo a lição de
Ruy Barbosa Nogueira, «ao desejar tributar determinados eventos
da vida, o legislador tributário
constata que já estão eles disciplinados pelo Direito Privado, mas
verifica que a configuração jurídica que lhe dá o Direito Privado
não se coaduna integralmente com
os objetivos da tributação. Dai introduz certas modificações para os
fins tributários» (cfr. «Da Interpretação e da Aplicação das Leis
Tributárias», São Paulo, 1965, pág.
58).
Reconhecendo-se embora que a
natureza do contribuinte é também
elemento do fato gerador, não se
pode deixar de reconhecer igual-
100
185
mente, com apoio em trabalho de
autoria do Prof. Nlldo Serpa Cruz,
publicado na «Revista de Direito
Público» (vol. 11, pág. 182/4), que
«muitas vezes, entidades sem finalidade lucrativa, para desonerar
seus membros componentes ou a
fim de angariar fundos para a realização de obras ou empreendimentos de vulto, ou mesmo por uma
questão de sobrevivência, lançam
mãos de atividades lucrativas,
equiparando-se ás empresas e, esses serviços, que prestam a terceiros, a pessoas estranhas ao seu
quadro associativo, a nosso ver,
entram na faixa de incidência e devem ser tributados.»
Admitindo-se caracterizado o fato gerador do imposto sobre serviços de qualquer natureza no caso,
diante das considerações feitas,
cumpre registrar que em relação à
base de cálculo do tributo o decreto n? 1.386, que regulamentou a Lei
n? 1.321/67, não contém qualquer
excesso dispondo que a cobrança
far-se-á na base de 10% sobre o
preço das poules (artigo 37), uma
vez que reside precisamente nas
poules o preço dos serviços que o
impetrante vem prestando aos
apostadores.
Objetou a ilustrada Procuradoria-Geral da Justiça, que o citado
decreto exorbitou da função regulamentar porque o jogo não se enquadra na hipótese em que a lei
prevê a porcentagem fixada, não
se podendo confundir o «serviço»
com o «jogo» em si (fls. 328).
Data venta a objeção apontada
extravasou dos limites que a postulação inicial traçou e sobre a qual
versaram as informações do impetrado, inclusive as considerações e
fundamentos da sentença recorrida. Trata-se de argüição serôdia, e
improcedente também, uma vez
que não indicou a douta Procuradoria limite algum que teria sido
ultrapassado na base de cálculo
em foco, devendo-se registrar,
aliás, que o imposto vem sendo
exigido em bases inferiores às estabelecidas pelo decreto tido como
exorbitante. E o que informou a
Diretoria da Receita de São Vicente à fls. 175, notando-se por essa informação que o imposto sobre serviços de qualquer natureza tem sido cobrado do Jockey Club vicentino na base de 10% calculados sobre os 31% que essa entidade retira do movimento geral de apostas.
Afastadas todas as impugnações
levantadas contra o ato acoimado
de ilegal, resta considerar que a
alegada «impossibilidade económico-financeira» do impetrante no
atinente ao pagamento dos impostos em referência constitui matéria
da alta indagação e não pode por
isso ser apreciada neste processo,
que não pode depender de comprovação de matéria de fato, não preconstituída.
Concluindo tem-se que a cobrança do imposto comentado não revela ilegalidade alguma, ou abuso de
poder a ser coartada por mandado
de segurança.
Nestes termos os recursos de
ofício e voluntário são providos,
denegando-se a segurança requerida e cassando-se a que foi concedida, pagas as custas pelo impetrante» (fls. 350/356).
Houve recurso extraordinário, a
que o nobre Presidente do Colendo
Tribunal a quo, deu seguimento, com
este despacho:
«Inconformado, o impetrante pede recurso extraordinário com fundamento no artigo 119, III, letra a,
da Constituição Federal sustentando, com as razões que informaram
a sentença de primeira instância
que houve, no julgado denegatório
do Writ, incursão de veto a lel federal.
E argumenta: o fato gerador de
diversões públicas é o espetáculo
público em si mesmo (daí admitir
imposto sobre o ingresso no hipódromo) e não a atividade do empresário; ora, a emissão e venda
de poules é a atividade fundamental do impetrante, através da qual,
em realizando uma atividade meio,
atinge as finalidades que lhe são
determinadas pela lel federal
4.096/62 (Lei do Turfe); e se esta
diz que «Para todos os efeitos, a
exploração de apostas e o espetáculo ou diversões públicas se consideram atividades distintas» (art.
7?, 2?), não se encontrando nos
decretos leis federais 406/68 e
834/69, que instituíram a lista de
serviços sobre os quais o município
pode tributar, nenhuma referência
a poules ou apostas em hipódromos, forçoso será concluir que não
é lícito o tributo requestado, mormente de entidade, como a recorrente, que não é empresa e se cria
ex vi lege (art. 2), inciso 1?, item
3?, letra a da lei federal 4.096/62)
como sociedade sem fins lucrativos.
Numa consideração singela do
problema parece que a proclamação da incidência do imposto resultou de uma interpretação razoável
da lel questionada (4.096/62, iterativamente focalizada no r. aresto
recorrido, bem como das normas
de contato com o tema — decretos
leis n?s 406/68 e 834/69), o que vedaria o apelo extremo Súmula 400.
Todavia, a questão é, a meu ver,
de maior profundidade, justificando um reexame pelo Colendo Supremo Tribunal Federal.
A atividade dos Jockey Clubs no
pais tem um estatuto peculiar; a licença para apostas é empreitada
R.T.J. — 100
excepcional e dependente de prévia licença ministerial, timbrando
a lei federal 4.096/62, ao limitar a
área da fiscalização federal e conceder «ao município o direito de
fiscalizar a observância de sua
própria legislação, no âmbito da
sua competência constitucional»,
em enfatizar que — «Para todos os
efeitos, a exploração de apostas e o
espetáculo ou diversão pública se
consideram atividades distintas»
(art. 7?, § 2?). E a separação obedece a um esquema coerente, pois
a União cobra uma taxa das entidades que explorem apostas sobre
competições hípicas (art. 8?), de
forma que a intervenção do município nas apostas, que não se
confundem com o «espetáculo ou
diversão pública» leva á persuação
de que há, realmente indevida tributação municipal, não obstante o
esforço de argumentação esposado,
no r. acórdão recorrido. A matéria
ainda sub Judice, portanto, envolve, sem dúvida, hipótese que encontra vestibular pertinência processual para o interposto recurso
extraordinário. De outro turno, a
questão de não ser o impetrante
empresa no sentido das normas tributárias pertinentes, oferece também relevância, desde que não parece de todo procedente a distinção
ensaida no acórdão para impor a
obrigação fiscal. Por isso, fica o
recurso interposto ás fls. 358 deferido para que se permita a sua tramitação procedimental até o acesso ao Egrégio Supremo Tribunal
Federal» (fls. 373/375).
A douta Procuradoria-Geral da
Repúbica é pelo não conhecimento
do recurso.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu
(Relator): No julgamento do RE n?
74.849, em que as partes são as mes-
187
mas e mesmas as questões sobre as
quais versa o presente recurso, o
eminente Ministro Decio Miranda,
na qualidade de relator, assim votou:
«Fundado o recurso na letra a,
todavia o recorrente não chega a
indicar precisamente a que disposição legal teria negado vigência o
acórdão recorrido.»
Afirma, é certo, que «o venerando acórdão de fls. 114/115 vulnerou
dispositivos da Carta Magna e de
leis federais que, terminantemente, Impedem à Prefeitura Municipal de São Vicente tributar a emissão e venda de palies que o recorrente coloca Junto ao público apostador, a titulo de imposto de serviços de qualquer natureza, considerando que tal fato constitui fato gerador de diversões públicas.»
Quais dispositivos da Carta Magna e de leis federais?
Não consegue dizê-lo de modo direto e incisivo o recorrente.
Acompanhemos, porém, seu raciocínio.
Começa por afirmar que «o fato
gerador de diversões públicas é a
venda do ingresso nos portões,
que o eventual apostador paga para entrar no hipódromo.»
E lembra que o legislador federal, no art. 7?, § 2?, da Lei n? 4.096,
de 18.7.62, deixou escrito o seguinte:
§ 2?. A fiscalização federal será
limitada às atribuições específicas
da alçada da União, ressalvado ao
Município o direito de fiscalizar a
observância de sua própria legisla=
çào, no âmbito de sua competência
constitucional. Para todos os efeitos, a exploração de apostas e o espetáculo ou diversão pública se
consideram atividades distintas.»
188
R.T.J. — 100
Segue-se, dai, que tributado o ingresso ao espetáculo, o bilhete de
entrada, seja impossível tributar a
exploração de apostas?
Pareçe que não. O mínimo, que
se pode tirar do dispositivo, para
efeito tributário, é que a tributação
de uma das fontes da economia do
estabelecimento não impede a da
outra.
Ou, talvez, que uma e outra fonte
devem ser tributadas diferentemente, segundo sua própria natureza.
Ora, pelo que se vê dos autos, o
Município deu tratamente consentâneo, sob o ponto de vista tributário, a uma e outra espécie.
Tributou o bilhete de ingresso pelo seu valor. E tributou a poule,
não pelo seu valor, do qual a maior
parte volta para os freqüentadores
que hajam apostado com acerto
mas pelo valor residual deixado no
estabelecimento. Ou seja, o Município cobra o imposto, na taxa legal de 10% sobre 31% do valor das
apostas, percentual que remanesce
com a entidade, depois de pagos os
prêmios e as apostas vitoriosas.
Inviável, pois, concluir que, admitindo a cobrança do ISS sobre o
resultado liquido das apostas, esteja o legislador municipal negando
vigência ao dispositivo legal que
manda distinguir ingressos no prado e participação nas apostas.
Alega, por outro lado, o recorrente, que nos Decretos-leis n? 406,
de 31-12.1968, e n? 834, de 8.9.69, o
legislador federal de modo algum
contemplou as atividades turfisticas.
Num e noutro desses diplomas
federais, alusivos ao Imposto sobre
Serviços, consta a alínea referente
a «bilhares, boliches e outros jogos
permitidos.»
Na Lista de Serviços do Decretolei n? 406:
«X — serviços de diversões públicas:
bilhares, boliches e outros
jogos permitidos, exceto o fornecimento, no recinto, de bebidas,
alimentos e outras mercadorias,
que fica sujeito ao Imposto de
circulação da mercadorias;
Na lista de Serviços do Decretolei n? 834:
«28 — Diversões públicas
bilhares, boliches e outros
jogos permitidos;
Por outro lado, nada prova em
favor da exclusão das apostas
turísticas o fato de haver a Lista
de Serviços contemplado expressamente a «distribuição e venda de
bilhetes de loteria.»
Constituirá uma explicitação
cautelar, da qual não se pode deduzir que a venda de participação
nas apostas de corridas de cavalos,
por não explicitada, deixa de
compreender-se na rubrica genérica, concernente a «outros jogos
permitidos. »
Por último, mostra-se inaceitável o argumento de que as sociedades autorizadas á prática de apostas em corridas de cavalos não se
enquadram no conceito de «empresa» para o efeito de sujeição à
obrigação tributária do Imposto sobre Serviços (art. 71 do código Tributário Nacional; art. 8?, caput, do
Decreto-lei n? 406, de 31.12.68).
No voto que proferi, com acolhimento desta Turma, no RE 87.890,
referente a Imposto sobre Serviços
pretendido pelo Município de São
R.T.J. - 100
Paulo ao Jockey Clube daquela Capital sobre o preço de estacionamento de veículos em sua sede,
afastei a legitimidade da cobrança,
por se tratar de serviço prestado
sem intuito económico, já que restrito aos sócios da entidade.
Nas apostas, ao contrário, em
cuja participação não é levada em
conta a qualidade de sócio da entidade, o intuito econômico é visível.
2 uma fonte de rendimento, não
necessariamente relacionada á
conveniência pessoal dos sócios,
mas, ao contrário, derivada, em
regra, da afluência de pessoas estranhas ao convívio associativo.
Quando admite a participação,
nas apostas, de estranhos á sociedade, o Jockey Clube atua como
empresa, e, assim, não se afasta
do campo de incidência do Imposto
sobre Serviços.
No acórdão que assim decide,
nenhuma negativa de vigência de
lei federal, multo menos as apontadas pelo recurso extraordinário
ora examinado, do qual não conheço.»
Depois de pedir vista dos autos, o
Senhor Ministro Cordeiro Guerra,
em voto divergente, conheceu do recurso e lhe deu parcial provimento,
deduzindo, nestes termos, a sua opinião
«Solicitei vista dos autos para
melhor exame da legislação pertinente às sociedades turfisticas e
para conferir os ônus tributários
que comportam.
Não tenho dúvida em aceitar que
as sociedades turfisticas se enquadram, num sentido amplo tributário — no conceito de empresa, e
que, conseqüentemente, se subsumem ao imposto de serviços especificado na lista de serviços anexa
ao Dec-lei 406, de 1966, na redação
do art. 3?, VII, do Dec-lei n? 834, de
3 de setembro de 1969, a saber:
189
«28 — Diversões públicas:
c) bilhares, boliches e outros jogos permitidos;»
Mas, distingo nos espetáculos
surfísticos a diversão, que é o ingresso no hipódromo, do joga ou a
aposta. Há diversão quando se paga o ingresso e se assiste ao espetáculo.
Há jogo, quando se participa da
aposta, isto é, quando o freqüentador compra a poule.
No primeiro caso, a venda de ingressos, incide o imposto sobre
serviços, no segundo caso, participação no jogo, pelo turfista, não incide o tributo, muito menos como
pretende o recorrido em 10% sobre
o provento líquido de 31% da sociedade mantenedora do hipódromo.
E, isto porque, como esclarece
Bernardo Ribeiro de Morais:
«Conforme se verifica, a diversão pública alcançaria pelo ISS é
aquela que representa a venda
(circulação) do bem material (direito de adentrar no local onde se
realiza a diversão). Ao direito tributário interessa apenas a atividade que tem por objeto recrear ou
divertir o público, com acesso ao
local através de pagamento.»
Carlos de Alvarenga Sentardes
considera elemento indispensável
para a configuração da diversão
pública e para efeitos tributários
«a cobrança de entrada ou pagamento do ingresso ou do direito a
participar de divertimento.»
A hipótese de incidência tributária não é encontrada na simples
realização do divertimento, mas na
venda do direito de ingresso ao locai onde tal divertimento é realiza-
do. Quando qualquer interessado
se dirige à bilheteria e adquire um
«bilhete de ingresso,» estará ele
190
R.T.J. - 100
adquirindo o direito de entrar (ingressar no local). A empresa de diversões públicas vende ao interessado este direito. Eis ai a hipótese
de incidência do ISS, para o caso
de diversões públicas.
E acrescenta com autoridade:
«Fatos posteriores ao da ocorrência do fato imponível (venda do
direito de ingresso no local da diversão pública) não ficam nas cogitações do Fisco. O poder tributante
não irá verificar se o interessado
na diversão divertiu-se ou não Não
irá ver se o interessado dormiu ou
apreciou todo espetáculo.
O que é fato essencial para a tributação é a venda do ingresso, isto
é, a venda do direito de ingresso no
local da diversão pública (Doutrina e Prática do Imposto sobre Serviços — RT 1975— p. 292/293).»
No caso, é o ingresso no hipódromo mediante bilhete pago.
Ao pretender cobrar da empresa,
não o serviço, não é a produção de
diversão, mas uma participação no
produto das apostas, a Municipalidade incursiona na esfera de competência federal, pois à União compete instituir imposto sobre renda
de produtos de qualquer natureza
— art. 21, IV da CF, ou ainda no
campo de incidência das contribuições previstas no § 2? do art. 21 da
DV, criada com a finalidade de intervir no domínio econômico, de
atender ao interesse de categorias
profissionais e para atender diretamente a parte da União no custeio
dos encargos da previdência social.
Ora, com essa finalidade, a Lei
4.096, de 18 de julho de 1962 excluiu
da incidência penal as apostas em
corridas de cavalo, para promover
a criação eqüina e estimular os
criadores nacionais, isto é, uma finalidade econômica, disciplinando
os prêmios, e a participação neles
dos criadores e proprietários e sujeitando as sociedades mantenedoras dos hipódromos à fiscalização
federal, dispondo expressamente:
«art. 7°
§ 2? A fiscalização federal será
limitada às atribuições específicas
da alçada da União, ressalvado ao
Município o direito de fiscalizar a
observância de sua própria legislação, no âmbito de sua competência
constitucional. Para todos os efeitos, a exploração de apostas e o espetáculo ou diversão pública se
consideram atividades distintas»
(dispositivo dado como violado na
petição de recurso extraordinário).
E, no art. 8?, a União sujeita as
entidades turfisticas ao pagamento
de uma taxa equivalente a 10% do
valor dos prêmios atribuídos aos
proprietários dos animais classificados em todos os páreos das reuniões de cada mês. Essas taxas
são cobradas em benefício da Comissão Coordenadora da Criação
do Cavalo Nacional, que a aplica
na execução da política do governo
no particular.
Sobre a renda líquida das apostas incide a contribuição de previdência social, desde a Lel n? 3.807,
de 26 de agosto de 1960 — art. 74, e
§ 1?, alterado pelo Dec-lei 1.129, de
13 de outubro de 1973, regulamentado pelo Decreto 67.646, de 23 de
novembro de 1970, no qual se lê:
art. 8? Considera-se renda líquida auferida pela entidade turfística
o saldo da importância por ela retirada das apostas, depois de feitas
as seguintes deduções:
a) o valor dos prêmios pagos aos
proprietários, criadores e profissionais;
R.T.J. — 100
o valor dos tributos a serem
recolhidos.»
O Decreto-lei n? 717, de 30 de julho de 1969, deu nova redação ao
Dec-lei 204, de 27 de fevereiro de
1967, art. 4?, e estabeleceu o critério de cobrança da contribuição da
Previdência Social, sobre a renda
liquida auferida pelas entidades
turfisticas em cada reunião hípica
— art. 2? — que altera o art. 74 da
Lel 3.807, de 26 de agosto de 1960 —
e na letra b se dispõe que a entidade pagará 5% sobre a renda liquida até NCrt-150.000,00; 10% de
NCrt-150.000,00 a 250.000,00 e 30%
acima de NCr$-250.000,00.
Em conseqüência, tenho por
legitima a cobrança do ISS, sobre
os ingressos vendidos aos freqüentadores dos hipódromos, porém,
como ilegítima a pretensão do município de tributar — a renda das
apostas ou proventos das sociedades mantenedoras de hipódromos,
por ser tal da competência tributária da União.
Pelo exposto, conheço do recurso
e lhe dou provimento, em parte,
para excluir a pretensão do autor
de haver 10% sobre a renda liquida
da sociedade mantenedora do Jóquei Clube de S. Vicente.
E o meu voto, data venia, do
eminente relator.»
Solicitando, também, vista dos autos, terminei por acompanhar o voto
do Ministro Cordeiro Guerra, dizendo:
«Peço vênia ao eminente Relator, Ministro Dedo Miranda, para
acompanhar o voto dissidente,
emitido pelo Ministro Cordeiro
Guerra, cuja opinião coincide, ponto por ponto, com aquela a que
cheguei, depois de minucioso exame da questão. Diante disso, conheço do recurso e lhe dou provi-
mento, em parte, para limitar a incidência do ISS ao preço dos bilhetes de ingresso no hipódromo.»
Subscrevendo, agora, novamente,
as razões em que se estribou o Ministro Cordeiro Guerra para a conclusão a que chegou, conheço do presente recurso e lhe dou provimento,
em parte, para limitar a incidência
do ISS ao preço dos bilhetes de ingresso no hipódromo.
VOTO
O Sr. Ministro Dedo Miranda: Sr.
Presidente, com a vênia devida ao
eminente relator, mantenho, sobre a
espécie, o voto que proferi no RE
74.849, a dizer:
«Fundado o recurso na letra a,
todavia o recorrente não chega a
indicar precisamente a que disposição legal teria negado vigência o
acórdão recorrido.
Afirma, é certo, que «o venerando acórdão de fls. 114/115 vulnerou dispositivos da Carta Magna
e de leis federais que, terminantemente, impedem à Prefeitura Municipal de São Vicente tributar a
emissão e venda de poules que o
recorrente coloca junto ao público
apostador, a titulo de imposto de
serviços de qualquer natureza,
considerando que tal fato constitui
fato
gerador
de
diversões
públicas.»
Quais dispositivos da Carta Magna e de leis federais?
Não consegue dizê-lo de modo direto e incisivo o recorrente
Acompanhemos, porém seu raciocínio.
Começa por afirmar que «o fato
gerador de diversões públicas é a
venda do ingresso nos portões, que
o eventual apostador paga para entrar no hipódromo.»
192
R.T.J. — 100
E lembra que o legislador federal, no art. 7?, § 2?, da Lei ri? 4.096,
de 18.7.62, deixou escrito o seguinte:
a§ 2?. A fiscalização federal será limitada às atribuições específicas da alçada da União,
ressalvado ao Município o direito
de fiscalizar a observância de
sua própria legislação, no âmbito
de sua competência constitucional. Para todos os efeitos, a exploração de apostas e o espetáculo ou diversão pública se consideram atividades distintas.»
Segue-se, daí, que tributado o ingresso ao espetáculo, o bilhete de
entrada, seja impossível tributar a
exploração de apostas?
Parece que não. O mínimo, que
se pode tirar do dispositivo, para
efeito tributário, é que a tributação
de uma das fontes da economia do
estabelecimento não impede a da
outra.
Ou, talvez, que uma e outra fonte
devem ser tributadas diferentemente, segundo sua própria natureza.
Ora, pelo que se vê dos autos, o
Município deu tratamento consentâneo, sob o ponto de vista tributário, a uma e outra espécie.
Tributou o bilhete de ingresso pelo ingresso nos portões, que o eventual apostador paga para entrar no
hipódromo.»
E lembra que o legislador federal, no art. 7?, § 2?, da Lel n? 4.096,
de 18.7.62, deixou escrito o seguinte:
2?. A fiscalização federal será
limitada às atribuições específicas da alçada da União, ressalvado ao Município o direito de
fiscalizar a observância de sua
própria legislação, no âmbito de
sua competência constitucional.
Para todos os efeitos, a exploração de apostas e o espetáculo ou
diversão Pública se consideram
atividades distintas.»
Segue-se, daí, que tributado o ingresso ao espetáculo, o bilhete de
entrada, seja impossível tributar a
exploração de apostas?
Parece que não. O mínimo, que
se pode tirar do dispositivo, para
efeito tributário, é que a tributação
de uma das fontes da economia do
estabelecimento não impede a da
outra.
Ou, talvez, que uma e outra fonte
devem ser tributadas diferentemente, segundo sua própria natureza.
Ora, pelo que se vê dos autos, o
Município deu tratamento consentâneo, sob o ponto de vista tributário, a uma e outra espécie.
Tributou o bilhete de ingresso pelo seu valor. E tributou a poule,
não pelo seu valor, do qual a maior
parte volta para os freqüentadores
que hajam apostado com acerto,
mas pelo valor residual deixado no
estabelecimento. Ou seja, o Município cobra o imposto, na taxa legal de 10%, sobre 31% do valor das
apostas, percentual que remanesce
com a entidade, depois de pagos os
prêmios e as apostas vitoriosas.
Inviável, pois, concluir que, admitindo a cobrança do ISS sobre o
resultado líquido das apostas, esteja o legislador municipal negando
vigência ao dispositivo legal que
manda distinguir ingresso no prado e participação nas apostas.
Alega, por outro lado, o recorrente, que nos Decretos-leis n? 406,
de 31.12.1968, e n? 834, de 8.9.69, o
legislador federal de modo algum
contemplou as atividades turfisticas.
R.T.J. — 100
Num e noutro desses diplomas
federais, alusivos ao Imposto sobre
Serviços, consta a alínea referente
a «bilhares, boliches e outros jogos
permitidos.»
Na Lista de Serviços do Decretolei n? 406:
«X — serviços de diversões públicas:
bilhares, boliches e outros
jogos permitidos, exceto o fornecimento, no recinto, de bebidas,
alimentos e outras mercadorias,
que fica sujeito ao imposto de
circulação de mercadorias;
Na lista de Serviços do Decretolei n? 834:
«28 — Diversões públicas.
bilhares, boliches e outros
jogos permitidos:
Por outro lado, nada prova em
favor da exclusão das aPostas
turfístkas o fato de haver a Lista
de Serviços contemplado expressamente a «distribuição e venda de
bilhetes de loteria». Constituirá
uma explicitação cautelar, da qual
não se pode deduzir que a venda de
participação nas apostas de corridas de cavalos, por não explicitada, deixa de compreender-se na rubrica genérica, concernente a «outros jogos permitidos.»
Por último, mostra-se inaceitável o argumento de que as sociedades autorizadas à prática de apostas em corridas de cavalos não se
enquadram no conceito de «empresa» para o efeito de sujeição à
obrigação tributária do Imposto sobre Serviços (art. 71 do Código Tributário Nacional; art. g?, caput, do
Decreto-lei n? 406, de 31.12.68).
193
No voto que proferi, como acolhimento desta Turma, no RE 87.090,
referente a Imposto sobre Serviços
pretendido pelo Município de São
Paulo ao Jockey Clube daquela Capital sobre O preço de estacionamento de veículos em sua sede,
afastei a legitimidade da cobrança,
por se tratar de serviço prestado
sem intuito económico, já que restrito aos sócios da entidade.
Nas apostas, ao contrário, em
cuja participação não é levada em
conta a qualidade de Sócio da entidade, o intuito económico é visível.
E uma tente de rendimento, não
necessariamente relacionada à
conveniência ~Soai dos sócios,
mas, ao contrário, derivada, em
regra, da afluência de pessoas estranhas ao convívio associativo.
Quando admite a participação,
nas apostas, de estranhos à sociedade, o Jockey Club atua come
empresa, e, assim, não se afasta
do campo de incidência do Imposto
sobre Serviços.
No acórdão que assim decide,
nenhuma negativa de vigência de
lei federal; muito menos as apontadas pelo recurso extraordinário
ora examinado, dó qual não conheCo.»
o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RE. 74.506 — SP — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Recte.: Jockey Club
São Vicente (Adv.: Domingos Pacifi
-coNet).Rda:PrfiuMncipal de São Vicente (Adv.: Reynaldo P. Ayrosa).
Decisão: Conhecido e provido parcialmente nos termos do voto do Relator, vencido o Ministro Decio Miranda.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes á Sessão os
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
194
R.T.J. — 100
Decio Miranda. Subprocurador-
Brasília, 31 de outubro de 1980 —
Geral da República, Dr. Mauro Leite Hélio Francisco Marques, Secretario.
Soares.
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 77.604 — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Antonio Neder.
Recorrente: Malek Cury — Comercial, Importadora e Exportadora Limitada — Recorrida: União Federal.
O fato gerador do imposto de Importação é a entrada, no território nacional, da mercadoria importada.
Discussão a respeito de o importador haver adquirido o direito
de pagar tal imposto mediante aplicação de alíquota mais favorável.
Improcedência do argumento.
Divergência pretoriana que não se acha demonstrada.
Recurso extraordinário a que o STF nega conhecimento.
Acta:ai/to
II. Ao referido acórdão interpôs recurso extraordinário a vencida, MaVistos e relatados estes autos de lek Cury — Comercial, Importadora
Recurso Extraordinário n? 77.604, do e Exportadora Ltda., que se baseou
Estado de São Paulo, em que é re- no art. 119, III, a) e d), da Constituicorrente Malek Cury — Comercial, ção.
Importadora e Exportadora LimitaQuanto ao primeiro fundamento,
da e recorrida a União Federal, de- alega
o acórdão impugnado concide o Supremo Tribunal Federal por trariouque
o
art.
3?, da Constituisua Primeira Turma, unanimemen- ção, no ponto 153,
referente
à garantia do
te, não conhecer do recurso, de acor- direito adquirido.
do com as notas juntas.
No tocante ao segundo fundamenBrasília, 19 de maio de 1981 —
Antonio Neder — Presidente e Rela- to, sustenta que o mencionado acórdão contém divergência com o do
tor.
RE n? 62.248, copiado nas fls. 92-97.
RELATÓRIO
O recurso não foi admitido, mas o
O Sr. Ministro Antonio Neder (Re- provimento de agravo fê-lo subir a
lator) — I. A matéria julgada pelo esta Corte para melhor exame do caacórdão recorrido acha-se resumida so.
com exatidão na sua ementa, f. 85:
As partes razoaram-no e a eg. Pro«Imposto de Importação. O fato curadoria-Geral da República emitiu
gerador é a entrada da mercadoria o seguinte parecer, fls. 119 a 119:
estrangeira no território nacional.
«1 — Nada temos a acrescentar,
Nova alíquota do Decreto-lei n?
data venta, aos pronunciamentos
398, de 30-12-68, aplicada a mercada douta 9! Subprocuradoria-Geral
doria que não se provou oportunada República (fls. 100 e 113), os
mente, tenha sido entregue nos arquais demonstram o não cabimenmazéns do porto de origem antes
to do presente recurso extraordináda data de publicação daquele
Decreto-lei.»
rio.
R.T.J. — 100
«2 — Cabível, que fosse, o recurso extraordinário a questão se
apresenta inteiramente desfavorável à ora recorrente, conforme se
vê dos precedentes Jurisprudenciais:
«Importação de mercadoria.
Data do câmbio é aquela do despacho aduaneiro.
Entendimento do art. 165 da
Nova Consolidação das Leis da
Alfândega e do art. 60, da Lei n?
3.244, de 1957» (Rec. Extr. n?
52.191, in DJ de 31-5-68 — pág.
1.987);
Os direitos a cobrar são os vigentes na época do desembaraço
em território nacional, para despacho» (Rec. Extr. n? 55.474,
«Rev Trim. de Jur.» — vol. 37 —
pág. 101 -- Rel. Min. Aliomar Baleeiro).
«3 — Com efeito, nenhuma dúvida existe sobre ser devido o imposto de importação calculado com
base na aliquota vigente à data da
entrada da mercadoria no Pais,
vez que, conforme definido no art.
E', do Dec-lei n? 37-66, o imposto de
importação incidente sobre mercadoria estrangeira »... tem como fato gerador sua entrada no território nacional.» No mesmo sentido
dispõe a Lei n? 5.172-66 (Código.
Tributário Nacional) artigo 19,
verbis:
«O imposto de competência da
União, sobre importação de produtos estrangeiros tem como fato
gerador a entrada destes no território nacional.»
4 — Somos, pelo exposto, pelo
não conhecimento do presente recurso extraordinário.»
III — E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Antonio Neder (Relator) — I. A fundamentação do
195
acórdão recorrido é a que se lê neste
voto do seu Relator no TFR, f. 83:
*Segundo o art. 1? do Decreto-lei
n? 37, de 18-11-66 o imposto de importação tem como fato gerador a
entrada da mercadoria estrangeira
no território nacional.
a() Decreto-lei n? 398, citado, no
art. 4? garantiu o despacho aduaneiro pela aliquota anterior nã
mercadoria embarcada até a data
de sua publicação.»
*Na inicial, a firma impetrante
admitiu que a mercadoria «foi embarcaria alguns dias após a entrada em vigor» Decreto-lei 398.
«O atestado, Juntado ao fãto de
provar fato equivalente ao embarque — a entrega da mercadoria
nos armazéns do porto de origem
— só veio agora aos autos, com o
recurso, desvalorizado pela ausência de contraditório oportuno a seu
respeito.
«Por isso, mantenho a sentença,
não podendo dar valor ao atestado
sobre o qual a autoridade apontada
como coatora não teve ocasião de
se manifestar.
«Nego provimento ao recurso.»
Pelo que se contém na transcrita
fundamentação, bem se vê que o
acórdão impugnado, não contraria o
princípio constitucional do direito
adquirido, nem diverge do acórdãopadrão, pois este Julgou o caso na
consideração de certa peculiaridade,
como se vê de sua ementa, f. 92:
«Importação. Acórdão que, à vista de circunstâncias peculiares do
caso, dá como caracterizado o direito adquirido da impetrante de
proceder ao desembaraço da mercadoria segundo a lei vigente ã data da emissão da licença e cobertura cambial conseqüente. Recurso
extraordinário não conhecido.»
II — Não conheço do recurso, é o
meu voto.
R.T.J. — 100
196
Presidência do Senhor Ministro
Antonio Neder. Presentes à Sessão
RE 77.604 — Si' — Rel.: Min. Anto- os Senhores Ministros Cunha Peixonio Neder. Recte.: Malek Cury — Co- to, Soares Mulloz, Rafael Mayer e
mercial, Importadora e Exportadora Clovis Ramalhete. SubprocuradorLtda. (Advs.: Rubens de Barros Bri- Geral da República, o Dr. Francisco
solla e outros), Recda.: União Fede- de Assis Toledo.
ral.
Brasília, 19 de maio de 1981 —
Decisão: Não se conheceu do re- Antônio Carlos de Azevedo Braga —
curso. Votação uniforme.
Secretário.
EXTRATO DA ATA
AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 79.866 (AgRg) — SE'
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Soares Mufioz.
Agravante: Sérgio Sérvulo da Cunha — Agravado: Banco Itaú S/A.
A apresentação de contas, extrajudicialmente, não impede que sejam exigidas em juízo, se não houve acertamento amigável a respeito
daquelas. Agravo regimental desprovido.
ACORDA0
Vistos.
Acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Primeira Turma, à unanimidade de votos na conformidade das notas taquigráficas,
negar provimento ao agravo regimental.
Brasília, 19 de agosto de 1980 —
Thompson Flores, Presidente —
Soares Mulloz, Relator,
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Soares Mufloz: Eis o
teor do despacho impugnado no presente agravo regimental:
«Nego seguimento ao agravo de
instrumento, mantendo o despacho
denegatório do recurso extraordinário, por seus fundamentos,
verbis: «Quanto à letra d do permissivo constitucional, além do recorrente não cumprir o disposto no
art. 305 do RISTF, já que não indicou repositório de jurisprudência e
nem juntou cópia autenticada dos
julgados apresentados como contatentes, tal decisão é desta Corte,
não servindo para fundamentar o
recurso Súmula 369, quanto à letra a, não se percebe em que teria
o r. julgado recorrido vulnerado o
ãrt. 3? do Código de Processo Civil.
Já na sentença de primeiro grau,
confirmada nessa parte, colocavase que «várias tentativas de acertamento de contas foram realizadas, todas sem êxito. É que o que
se infere da prova literal que
acompanha a resistência. Não havendo o acertamento amigável e,
não sendo aceita a prestação feita
em caráter extrajudicial, necessário se faz a prestação judicial de
contas que deve ser elaborada em
conformidade com os requisitos legais» (fls. 226). A Turma
Julgadora aduz que, «realmente, a
demonstração do interesse para
agir ficou feita pelos autores, que,
insatisfeitos com a forma e a exposição das contas apresentadas em
caráter particular, querem a prestação segundo o que preceitua a
lei, com o pronunciamento judicial
sobre elas» (fls. 256). Tenho, aliás,
como evidente que, se não satisfazem as contas extra judicialmente
R.T.J. — 100
prestadas por quem está obrigado
a fazê-lo, poderá a outra parte reclamar a prestação judicial. Houve, portanto, interpretação razoável à lei, o que obsta o recurso extremo Súmula n? 400.. Finalmente,
quanto ao art. 508 do Código de
Processo Civil, o recorrente não
apresentou qualquer argüição de
intempestividade do recurso adesivo dos autores, quer nas contrarazões de fls. 246/247 e quer por
via de embargos declaratórios. A
falta de prequestionamento veda o
recurso Súmulas 282 e 356» (fls. 43
a 44) (fls. 80).
No agravo regimental o recorrente
alega, em síntese, que é errônea a
tese firmada pelo despacho impugnado, consoante a qual se não satisfazem as contas prestadas extrajudicialmente, poderá a outra parte
reclamá-las judicialmente, pois, se
as contas já foram prestadas em caráter particular, sem qualquer ressalva, objeção ou pedido de esclarecimento por parte do destinatário,
não tem este ação para exigi-las em
juizo.
E o relatório.
197
dão, não abonam a versão apresentada no agravo, visto que consta do
acórdão que, «realmente, a demonstração do interesse «para agir ficou
feita pelos autores, que, insatisfeitos
com a forma e a exposição das contas apresentadas em caráter particular, querem a prestação segundo o
que preceitua a lei, com o pronunciamento judicial sobre elas» (fls. 35).
Ante o exposto, nego provimento
ao agravo regimental.
EXTRATO DA ATA
Ag. 79.866 — (AgRg) — SP — Rel.:
Min. Soares Muitoz. Age.: Sérgio
Servido da Cunha (Adv.: Sérgio Roberto Alonso). Agdo.: Banco Baú S.A
(Advs.: Sebastião Silveira Dutra e
outros).
Decisão: Negaram provimento ao
Agravo Regimental. Decisão: unânime.
Presidência do Sr. Ministro
Thompson Flores. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cunha
Peixoto, Soares Mudez e Rafael Mayer. Ausente, Justiricadanierne, o Sr.
Ministro Xavier de Albuquerque.
Subprocurador-Gerai da República,
Dr. Francisco de Assis Toledo.
VOTO
Brasília, 19 de agosto de 1980, —
O Sr. Ministro Soares Mufloz (Re- Antônio Carlos de Azevedo Braga,
lator 1: Os fatos, discutidos no acór- Secretário.
RECURSO. EXTRAORDINÁRIO N? 82.493 — RJ
(Primeira Turma)
Relator O Sr. Ministro Antonio Neder.
Recorrente: Estado do Rio de Janeiro — Recorrida: Mama Augusta Ferreira Cardoso Ponce de Leão.
Enfiteuse. E matéria de Direito Civil, da competência legisititiva da União. O Estado-membro não pode legislar sobre o assunto. Inconstituclonalidade manifesta de normas locais editadas sobre o referido instituto.
Precedentes do S upremo Tribunal.
3. Recurso extraordinário a que a Corte nega conhecimento.
— 100
198
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos de
Recurso Extraordinário n? 82.493, do
Estado do Rio de Janeiro, em que é
recorrente o referido Estado e recorrida Maria Augusta Ferreira Cardoso Ponce de Leão, decide o Supremo
Tribunal Federal, por sua Primeira
Turma, unanimemente, não conhecer do recurso, de acordo com as notas juntas.
Brasília, 05 de mato de 1981 —
Antonio Neder, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
«1 — Cuida-se de resgate de aforamento, matéria de direito civil,
sobre a qual o Estado-recorrente
legislou, indevidamente, na pretensão de atualizar o valor da «pensão
anual».
«O caso é idêntico ao de que tratou o RE 81.930, relatado, no Pleno,
pelo eminente Ministro Thompson
Flores, com a decisão de seu não
conhecimento (Sessão de 29-9-75).
«2 — Dispensamo-nos, pois, de
maior consideração sobre também
não ser conhecido o presente recurso.»
IV - E o relatório.
Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I. O acórdão impugnado neste
VOTO
recurso extraordinário foi proferido
pelo eg. Tribunal de Justiça do Rio
O Sr. Ministro Antonio Neder. (Rede Janeiro, e se acha redigido com lator): I. O acórdão impugnado não
ventilou as matérias das normas que
esta ementa, 1. 68:
Estado recorrente considera ofen«Enfiteuse. Resgate de afora- didas.
mento de bem estadual. InconstituNão as questionou em seu brevíssicionalidade do Dec.-lei n? 317/970.
mo texto.
• «Procede-se ao resgate do aforaSe o referido acórdão não discutiu
mento de bem estadual mediante as mencionadas normas, a óbvia
aplicação da lei federal, mormente conclusão é a de que não as contrase o decreto-lei estadual, em que riou.
se funda a exigência da autoridade
Incide, pois, no caso, a jurispruadministrativa, já foi declarado in- dência
que o STF resumiu nos verbeconstitucional.»
tes 282 e 356 da Súmula.
II — A esse acórdão interpôs reComo quer que seja, o acórdão imcurso extraordinário o Estado venci- pugnado se harmoniza com a jurisdo, que se fundou no art. 119, III, a), prudência desta Corte sobre o tema.
da Constituição.
Com efeito, ao julgar o RE 81.930,
Plenário do Supremo Tribunal firAlegou que o referido acórdão con- mou
o entendimento de que o
trariou os artigos 13 e 116 da Consti- Estado-membro
não tem competêntuição e vulnerou os artigos 66 e 67 cia para legislar sobre
o instituto da
do Código Civil.
enfiteuse, ainda que o imóvel enfirecurso foi admitido, f. 78, ra- têutico seja um bem público, porque
zoado, fls. 81 a 84, e contra- se trata de matéria pertinente ao diarrazoado, fls. 87 a 90, tudo nestes reito civil, da competência legislativa da União, como se lê no art. 8?,
termos: ... (lê).
XVII, b), da Carta Política, e, por isIII — A eg. Procuradoria-Geral da so, julgou Inconstitucionais as norRepública emitiu o seguinte parecer, mas que o Estado do Rio de Janeiro
f. 109:
editou sobre o assunto.
199
R.T.J. —100
E o que se lê na ementa do acórdão acima referido (RTJ, 77/323):
«Enfiteuse. Bens do Estado. Resgate.
«Regula-se pelo art. 693 do C.
Civ. (Redação da Lei 5.827/72).
«Nem supletivamente pode o Estado legislar a respeito do instituto, tanto mais diferentemente do C.
Civil.
«Inconstitucionalidade dos arts.
13 do Dec.-lei Complementar 3/69,
e 17 do Dec.-lei 317/70, do extinto
Estado da Guanabara.
«II — Recurso extraordinário
não conhecido.»
Noutros acórdãos foi o tema julgado no mesmo sentido: RE 80.342
(RTJ, 76/605), RE 83.874 (RTJ,
76/665), RE 84.509 (RTJ, 80/228), RE
84.974 (RTJ, 81/913), RE 86.600
(RTJ, 82/315).
II — Voto pelo não-conhecimento
do recurso.
EXTRATO DA ATA
RE-82.493 — RJ — Rel.: Min. Antonio Neder. Recte.: Estado do Rio de
Janeiro (Adv.: Sebastião Luiz de Andrade Figueira). Ftecda.: Maria Augusta Ferreira Cardoso Ponce de
Leão (Adv.: Luiz Alfredo .de Moraes).
Decisão: Não se conheceu do recurso. Votação uniforme.
Presidência do Senhor Ministro
Antonio Neder. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Muãoz, Rafael Mayer e
Clovis Ramalhete. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Francisco
de Assis Toledo.
Brasília, 05 de maio de 1981 —
António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 82.983 — (AgRg) — PE
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete.
Agravante: Estado de Pernambuco — Agravado: Cotonificio Moreno
S/A.
Recurso Extraordinário, requisitos. — Se os Embargos de Declaração provocaram o exame de outras questões de direito entre as
quais não se incluem estas, que vieram a ser agitadas em Recurso
Extraordinário, elas por LM não se entendem como decididas em última Instância na causa em apreço (Constituição Federal, art. 119.
III): não cabe Recurso Extraordinário que as encaminhe ao Supremo
Tribunal Federal.
— Agravo Regimental a que não se dá provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na Conformidade da ata de
julgamento e das notas taquigráfi-
cas, por unanimidade, de votos, ne-
gar provimento ao agravo.
Brasília, 14 de agosto de 1981
Cunha Peixoto — Presidente
Clovis Ramalhete — Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro ClOvis Ramalhete —
1 — A questão do acórdão versa o seguinte:
200
R.T.J. — 100
Cotonificio Moreno S/A, Sociedade estabelecida na cidade do
Moreno, neste Estado, promoveu,
perante o Juízo da Vara Privativa dos Feitos da Fazenda Estadual, uma Ação ordinária contra o
Estado de Pernambuco, o Departamento de Agua e Energia (DAE)
e a Companhia de Eletricidade
de Pernambuco (CELPE). 2 —
Com a ação, visou, o autor, a
execução e cumprimento, pelos
réus, de cláusulas de contrato de
Promessa de Troca firmado entre
as partes, especialmente para que:
a) o Estado de Pernambuco proceda à avaliação e á autorização dos
bens objeto do contrato: b) faça a
entrega, ao autor do número de
ações da CELPE correspondente
ao valor dos bens, devidamente
atualizado: c) e em relação a CELPE, lhe fosse reduzida a tarifa de
energia fornecida ao autor. 3. A
ação foi julgada improcedente, na
primeira instância, sentença que
foi reformada, em parte, pela
Egrégia Primeira Câmara Cível,
fixando-se o valor, em ações da
Companhia de Eletricidade do Estado de Pernambuco (CELPE) a
ser pago ao autor, com juros e correção monetária, além dos honorários advocaticlos.»
2 — O Estado requereu Recurso
Extraordinário fundado na letra A
do art. 119. III, da Constituição, dando por negada a vigência do art. 1.061
e 906 do Código Civil, que foi indeferido por despacho fundamentado.
3 — Tirado o Agravo de Instrumento, pelo Estado, contra o indeferimento do seu Recurso Extraordinário, neguei seguimento pelos mesmos fundamentos do despacho, que,
examinados os autos, correspondia
ao caso. O fundamento consistiu em
que a questão de direito da regra do
art. 1.061 do Código Civil bem como
a do 960 não foi versada no acórdão
recorrido.
Houve sim, Embargos de Declaração opostos pelo Estado mas versando ponto omisso diverso das questões que veio a agitar no Recurso
Extraordinário.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete
(Relatar) — 1 — E de ser negado seguimento ao Recurso Extraordinário, se as questões de direito contidas nos arts. 1.061 e 960 do Código
Civil não foram versadas no acórdão
recorrido nem objeto de Embargos
de Declaração que forçassem a
apreciação delas.
2 — O caso versa promessa de troca, objeto de Escritura Pública, o
Cotonificio tendo cedido uso e posse
dhe bens referidos no contrato e prometido a transferência da propriedade dos mesmos quando recebesse
ações de certa S/A, a ser constituída.
3 — E manifesto que não se tratou
no caso de perdas e danos por descumprimento de obrigações em dinheiro, e pois, não ensejaria a aplicação do art. 1.061 do Código Civil.
4 — Mas, no juízo de admissibilidade do Recurso Extraordinário,
fica-se no requisito do prequestionamento, que não houve, e na verificação de que o acórdão decidiu fazendo
mera interpretação de contrato.
5— A vista de que sou do entendimento de manter o despacho com
que indeferi o Agravo de Instrumento, que teve estes fundamentos, rejeito o presente Agravo Regimental.
E o voto.
EXTRATO DA ATA
Ag. 82.983 — (AgRg) — PE —
Rel.: Min. Clovis Ramalhete. Agte.:
Estado de Pernambuco. (Advs.: Joaquim Correia de Carvalho Júnior e
R.T.J. — 100
José Guilherme Vllella). Agdo.: Cotonifício Moreno S/A. (Adv.: Walter
Mala Santiago).
Decisão: Negaram provimento ao
Agravo Regimental. Decisão unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Cunha Peixoto. Presentes à Sessão
201
os Senhores Ministros Soares Mufioz,
Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e
Firmino Paz. Subprocurador-Geral
da República, o Dr. Francisco de
Asssis Toledo.
Brasília, 14 de agosto de 1981 —
António Carlos de Azevedo Braga —
Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 83.351 (AgRg) — RJ
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Cordeiro Guerra.
Agravantes: Albert Alcouloumbre e outros — Agravado: Estado do Rio
de Janeiro.
Desapropriação. Direitos pessoa s« por ela não atingidos. Inocor~eia de ofensa ao art. 153, f 22, da CF. AgRg improvido, — art. 308,
VI do RI.
ACOltDA0
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata de
julgamento e das notas taquigráficas,
por unanimidade de votos, em negar
provimento ao agravo regimental.
Brasília, 18 de setembro de 1981 —
Djaci Falcão, Presidente — Cordeiro
Guerra, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: O
recurso extraordinário foi indeferido
pelo seguinte despacho:
«Indefiro o recurso, salvo quanto
à argüição de relevância da questão federal, cuja apreciação é da
competência privativa do Excelso
Pretórios Nesse sentido, forme-se o
necessário instrumento.
A Egrégia Oitava Câmara Civel,
ao confirmar a sentença de primeiro grau ( fls. 620-32), sintetizou seu
entendimento na seguinte ementa:
«Ação ordinária, por parte dos
adquirentes de cadeiras cativas a
serem construídas em autódromo, contra o Estado do Rio de
Janeiro, poder expropriante de
lotes, onde as mesmas iriam ser
construídas: improcedência.
A decisão exeqüenda (Embargos Infringentes), fixando a legitimidade passiva do Estado para
ser acionado, não impede o reconhecimento da improcedência da
ação. Afirmações ali contidas em
votos não fazem coisa julgada
(Inciso Ido art. 469 do CPC), pois
constituem os meros obiter
dictum do direito angio-americano.
«Bem destacou a sentença apelada, ora unanimemente mantida, que na ação de-desapropriação foi fixada indenização abrangente dos lotes de terreno e das
benfeitorias então existentes: um
barracão de madeira e uma pista
mal conservada, sendo que as
mencionadas cadeiras perpétuas
jamais existiram. Em tais condi-
202
R.T.J. — 100
ções sobreveio a concordata da
firma construtora e proprietária
dos ditos lotes, posteriormente
desapropriados.
Ausência de prévia publicidade
de contratos particulares por ela
firmados com os AA.
Legem habemus regendo a matéria, o art. 31 da Lei de Desapropriações (I11. n? 3.365, de 216-41 ), no sentido de que:
«Ficam subrogádos no preço
quaisquer ônus que recaiam sobre o bem expropriado».
Inconformados com esse decisório, que se acha a fls. 680-5, os autores interpuseram o recurso extraordinário de fls. 687-95, invocando a alínea a do permissivo constitucional.
Incidindo, na hipótese, o vedativo previsto no art. 308, VI, do RI
do STF, os recorrentes procuraram contorná-lo, alegando ofensa
a dispositivo da Constituição e argüindo a relevância da questão federal, esta última de apreciação
privativa do Excelso Pretório.
Inexiste a apontada infringência
do art. 153, 22, da Constituição,
eis que nada mais fez a Egrégia
Câmara que dar ao aludido texto
razoável interpretação à luz das
provas produzidas — (Súmula 400
e 279).
Rio de Janeiro, 19-8-1980 — Des.
Antonio Marins Peixoto, 2? VicePresidente. (fls. 41-43).
A argüição de relevância intentada
foi rejeitada.
Neguei seguimento ao recurso pelo
seguinte despacho:
«O recurso extraordinário foi indeferido com fundamento no art.
308, VI, do RI — fls. 41-43. Rejeitada a Argüição de Relevância 9.742
— verifico, por igual, que o V.
Acórdão impugnado não negou vigência ao art. 153, 22 da CF, pois
se limitou a reconhecer que não
poderia ser indenizado o que não
chegou a existir, e que o contrato
existente entre os agravantes e expropriada era inoponível ao exPropriante, e, em conseqüência, aplicável à espécie, o art. 31 da Lei
das Desapropriações. Inocorrentes
as exceções regimentais, nego seguimento ao recurso. Acrescento,
que o V. Acórdão impugnado, bem
fundamentado, também mereceria
confirmação por força das
Súmulas 279, 454 e 400. Brasília, 198-1981» (fls. 140 e v).
Contra esse despacho insurgem-se,
na forma regimental, .os agravantes,
sustentando negativa de vigência do
art. 153, 22 da CF, pois aos direitos
dos agravantes são valores patrimoniais à parte, não tendo qualquer
vinculaçâo real com a propriedade
expropriada, embora hajam sido levados de roldão com ela», e que inaplicável à espécie é o art. 31 da Lei
das Desapropriações.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra
(Relator): Realmente, os direitos
dos agravantes eram pessoais contra
a expropriada. Não se materializou,
não chegou a constituir bem, ou objeto da desapropriação, que só atingiu a propriedade da expropriada.
Assim, se a expropriada não cumpriu o contrato com os agravantes,
por isso deve responder, eventualmente, não o expropriante.
Portanto, não só houve violação do
art. 153, 22 da CF, como bem invocado foi o art. 31 da Lei das Desapropriações.
Nego provimento ao agravo regimental.
É o meu voto.
R.T.J. — 100
EXTRATO DA ATA
Ag.83.351 — (AgRg) — RJ — Rei.:
Min. Cordeiro Guerra. Agtes.: Albert
Alcouloumbre e outros (Advs.: Márcio Luiz Malta, Alcino Guedes da Silva e outro). Agdo.: Estado do Rio de
Janeiro. (Adv.: Francisco S. Moniz
de Aragão).
Decisão: Negado provimento ao
Agravo Regimental. Unânime.
203
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Cordeiro Guerra,
Decio Miranda e Firmino Paz. Ausente, justificadamente, o Senhor
Ministro Moreira Alves. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Mauro
Leite Soares.
Brasília, 18 de setembro de 1981 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 83.353 — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu.
Recorrentes: João Agripino Mala Sobrinho e outros — Recorrido: Instituto do Açúcar e do Alcool.
Intervenção no domínio econômico. Instituto do Açúcar e do Alcool. Fornecedores de cana. Pagamento quinzenal. Não cabe quando
instituído regime de comercialização da safra mediante retenção dos
estoques (RE 83.328). Recurso extraordinário não conhecido.
ACOFIDA0
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade com a ata
de julgamentos e notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em
não conhecer do recurso.
Brasília, 07 de agosto de 1981. —
Djaci Falcão, Presidente — Leitão
de Abreu, Relator.
RELATORIO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu:
Trago à apreciação da Turma, para
julgamento conjunto, os RR.EE n?s
83.328 e 83.353, primeiro concernente
ao AMS 67.376, o segundo ao AMS67.548, ambos julgados pelo Tribunal
Federal de Recursos, e atinentes à
aplicação da Resolução n? 2.034, de
1969, do Instituto do Açúcar e do Álcool.
Perante a Segunda Turma do Tribunal Federal de Recursos, o Ministro Decio Miranda, relatando o AMS
67.376, assim apresentou o caso:
«A Usina Santo Antônio S.A. —
Açúcar e Alcool, fls. 2, logo seguida de numerosas outras empresas
açucareiras do Estado de São Paulo, fls. 69, impetraram o presente
mandado de segurança, ajuizado
em 26-1-70, para livrar-se dos efeitos da Resolução n° 2 034, de 6-1269, do Conselho Deliberativo do
Instituto do Açúcar e do Álcool na
parte em que, modificando a sistemática anteriormente estabelecida
para a mesma safra regulou o pagamento aos fornecedores de cana,
o qual, segundo aquela Resolução,
passaria a ser efetuado no período
de 1? de julho a 31 de dezembro como adiantamento mensal do preçobase e no período de 1? de janeiro
a 31 de março de 1970 como saldo
desse preço.
204
R.T.J. — 100
No reduzir para três meses o
período dessa segunda fase dos pagamentos, reside a principal inconformidade das impetrantes. (Ler
fls. 2-19).
Em informações, o Delegado Regional do Instituto refutou a pretensão, alegando: a) incompetência
do Juízo, por caber a impetração
na sede da autarquia; b) inidoneidade da medida, por estar em causa a discrição própria dos atos administrativos, e não a sua legalidade; c) no mérito, a Improcedência
do pedido, visto que o IAA considerou o verdadeiro sentido da lei, que
é o estabelecimento da proporção
da participação do fornecedor nos
ônus da retenção em razão do volume do fornecimento feito, e não em
razão do tempo de comercialização
da safra total, resultante de canas
dos fornecedores e de canas próprias das usinas. (Ler fls. 174-175).
Em petição de 23-2-70, apresentaram-se nos autos Domingos
José Aldrovandi e numerosos outros fornecedores de canas do
Estado de São Paulo, como litisconsortes da autoridade impetrado, apoiando as razões desta. (Ler
fls. 200-220).
Ao mesmo tempo, em 24-2-70, a
douta Subprocuradoria-Geral da
República requereu ao Presidente
do Tribunal a suspensão da medida
liminar concedida às usinas impetrantes, mas o pedido foi indeferido, esclarecendo todavia o respectivo despacho que os pagamentos
aos fornecedores continuariam
sendo feitos na conformidade do
Ato n? 24, de 8-7-69, anterior á Resolução 2.034 incriminado. (Fls. 51
dos autos em apenso).
Simultaneamente, os mesmos
fornecedores, desta vez encabeçados por João Agripino Mata Sobrinho e outros, por petição apresentada em Juízo a 27-2-70, impe-
traram mandado de segurança
contra a mesma Resolução número
2.034, de 06-12-69, objetivando a sua
desconstituição para o efeito de se
forrarem a qualquer disciplina no
pagamento das canas fornecidas,
cujos entregas deveriam ser pagas
quinzenalmente, compreendendo
os fornecimentos feitos na quinzena anterior, como dispunha o art.
3? da Lei o? 4.071, de 15-6-62.
Após suscitado conflito de jurisdição entre os dois Juízes que processavam, respectivamente, o presente mandado de segurança e o
que a que acabo de aludir, ficou o
segundo mandado, o dos fornecedores, submetido à decisão do mesmo Dr. Juiz Federal da eit Vara,
dando-se por prejudicado o conflito
que se suscitara (CJ 337).
Este segundo mandado de segurança constitui hoje o AMS 67.548,
a mim distribuído, neste Tribunal,
por dependência com o de que ora
me ocupo.
Após outras manifestações de
que se ocupa o 3? volume destes
autos, veio a sentença, do Juiz Federal Dr. José Américo de Souza.
Após admitir os litisconsortes
passivos, repeliu a sentença o pedido de revogação da medida liminar, sustentou a competência do
Juízo, visto que as sanções decorrentes do ato administrativo impugnado seriam aplicadas pelo Delegado Regional da autarquia no
Estado, refutou a alegação de inidoneldade da medida, porque a
discussão girava sobre a legalidade do ato, e, por fim, no mérito,
concedeu a segurança, para declarar ilegal a Resolução número
2.034, de 6-11-69, do IAA, na parte
em que alterou o esquema de pagamento das canas instituído pelo
Ato n? 24, de 8-7-69, e, como conseqüência, declarou sem efeito os
atos de coação já praticados can-
R.T.J. — 100
tra os impetrantes que ficariam livres das cominações impostas com
base na aludida Resolução.
Considerou a sentença, no mérito:
A atividade agro-açucareira,
sob intervenção estatal absoluta,
em regime de economia dirigida,
está subordinada ao Instituto do
Açúcar e do Alcool (I.A.A.), autarquia federal, especificadamente criada para disciplinar o
setor, desde a produção da matéria prima (plantio da cana e trato da lavoura, corte e beneficiamento) até à fabricação, comércio, distribuição, consumo e exportação do produto acabado.
Cabe-lhe ainda, disciplinar as relações entre usineiros e fornecedores de cana, e entre estes e
seus trabalhadores rurais, quanto ao tempo, modo e forma de
pagamento da cana, sempre dentro dos limites legais.
Houve época em que a autarquia Controlava a produção, atraves dos planos de safra, mas não
diSpunha de instrumento legal
para disciplinar a comercialização do produto acabado. De sorte
que, o produtor tinha a faculdade
de vender o seu produto de acordo com as suas conveniências
econômicas ou financeiras. Então, quando havia escassez do
açúcar, o usineiro podia retê-lo
em seus armazéns para forçar a
alta dos preços; e quando havia
excesso, lançava-o no mercado a
qualquer preço , arrazando a economia setorial, com todos os reflexos danosos sobre a comunidade interessada.
Para evitar situação dessa ordem que, aliás, ocorreu em 1965,
com a crise que pós em risco todo o sistema agro-açucareiro no
Estado de São Paulo, o IAA preparou o projeto do qual resultou
a Lei n? 4.870, de 1-12-1965, pre-
205
vendo medidas de recuperação
do setor, entre elas o recalque da
produção, retardamento do inicio
da safra, maior elasticidade de
financiamento e o estabelecimento de cotas mensais de comerciaI lz ação.
Nos termos do art. 51 e 3) 1?
dessa lei, a faculdade de adotar o
plano de comercialização e de
modifica-to foi delegada à autarquia nos seguintes termos:
«art. 51. A fim de disciplinar
o ritmo do escoamento da produção e complementar as medidas de estabilização do preço
do acúcar no mercado interno,
poderá o IAA estabelecer cotas
mensais de comercialização de
açúcar, a serem atribuídas às
cooperativas de produtores e
às usinas não cooperadas, onde as houver.»
n/ 1? — As cotas mensais de
comercialização de açúcar poderão ser reduzidas ou ampliadas, de acordo com a posição
estatística e o comportamento
dos mercados.»
Como se nota, a adoção do plano de comercialização é uma faculdade delegada ao IAA quando
houver necessidade de estabilizar
os preços de mercado e disciplinar o escoamento da safra. Desde que posto em prática o sistema, o produtor perderá a liberdade de vender o seu produto
quando quiser, ou ã medida em
que o fabrica, como se fazia antes da vigência da Lei n?
4.870/65. Ficará sujeito à liberação de cotas de mercado e à retenção dos estoques com todas as
implicações decorrentes das despesas de armazenagem, juros e
pagamento de canas.
Para acudir a essa situação, o
IAA fica obrigado a proporcionar
206
R.T.J. — 100
os meios necessários, junto às
autoridades monetárias, a fim de
que os fabricantes possam obter
os recursos financeiros com os
quais possam, também, suportar
o Ônus da retenção. Entretanto,
esse financiamento, geralmente
na base de 60% do preço de parte
do estoque, não é suficiente para
cobrir o custo de todo o estoque
retido. Então, a lei oferece o caminho para a solução desse aspecto do problema, mandando
convocar os fornecedores para
tomarem parte no ônus da retenção, nos termos do § 5?, do mesmo artigo 51, que assim dispõe:
«§ 5? — Os fornecedores de
cana participarão da retenção
dos estoques conseqüentes de
fixação das cotas mensais de
comercialização e receberão,
sob a forma de adiantamento,
por tonelada de cana, parcela
proporcional aos fornecimentos
realizados e ao financiamento
que for deferido.»
De sorte que, estabelecida a retenção dos estoques conseqüente
de fixação das cotas mensais de
comercialização, a participação
do fornecedor é efetiva, material
e obrigatória, no sentido de esperar o pagamento da cana, em escala progressiva, até à liquidação total dos estoques. Não é um
concurso facultativo porque o §
5? emprega o termo participarão
no sentido imperativo.
Sendo efetiva, a participação
do fornecedor na retenção do estoque durará enquanto este existir, porque a lei não limita o concurso material do fornecedor no
tempo. Enquanto restar um saco
de açúcar, o fornecedor participará do ônus da retenção. Se esta
for determinada por cotas mensais, enquanto não for liberada a
última, o fornecedor também não
se liberta do Ônus decorrente de
sua participação que consiste em
esperar a total liquidação dos estoques. É como se entende a primeira parte da norma legal
transcrita, assim redigida: Os
fornecedores participarão da retenção dos estoques conseqüentes
da fixação das cotas mensais de
comercialização.
A segunda parte do g 5? indica
o Ônus da participação, dispondo
que os fornecedores receberão,
sob a forma de adiantamento,
por tonelada de cana, parcela
proporcional aos fornecimentos
realizados e ao financiamento
que for deferido.
Aqui a participação efetiva e
material na conjugação de esforços para o suporte da retenção é
uma decorrência da primeira
parte do mesmo § 5?. O recebimento do preço da cana, por parte do fornecedor, está ligado à liberação da cota mensal correspondente. Tanto assim que, ele
não recebe, por saldo, o preço da
cana fornecida, tomando-se por
base o preço oficial da tonelada.
Não. Ele recebe, como adiantamento, parcela proporcional ao
fornecimento realizado e ao financiamento que o produtor obteve.
A circunstância de a lel estabelecer o adiantamento, ao invés de
pagamento, não foi á toa. Este
não se confunde com aquele.
Pagamento extingue a obrigação.
Consiste na entrega definitiva da
prestação devida para saldar a
obrigação. O pagamento quita
a divida. Ao passo que, adiantamento significa ir adiante,
entregar uma parcela da obrigação antes da sua exigibilidade
integral. De forma que o fornecedor, recebendo uma parte do preço, adiantadamente, não pode
R.T.J. — 100
207
pretender a antecipação total da
obrigação, ou seja, o pagamento
do saldo do preço, seja qual for a
superveniência dos fatos que possam influir na pretensão, salvo o
estado de insolvência.
O fornecedor também espera essa liberação para receber uma
parcela de adiantamento do preço da cana contribuída em proporção, para o contingente fabricado.
Não importa, por exemplo, que
fabricante de açúcar disponha
de recursos próprios ou obtenha
financiamento suficiente para antecipar o pagamento da cana. A
isso não está obrigado porque
ninguém pode ser coagido a antecipar o cumprimento da prestação antes do vencimento do prazo marcado na lei ou no contrato.
Se o fizer, como já fizeram vários usineiros, será por mera liberalidade ou por conveniência
própria.
A lei não pode ser casuística,
via de regra, principalmente
quando disciplina setor económico, propiciando a intervenção do
Estado nas suas relações. A Lei
n? 4.870/65 é uma delas que resultou de violenta crise que pôs em
risco todo o sistema agroaçucareiro no Estado de São
Paulo. Foi preciso tomar medidas para evitar desordens
económico-financeiras
conseqüentes da liberdade de comércio
do produto acabado. Entre elas,
controle do mercado, através
de liberação de cotas mensais,
com a finalidade de estabilizar o
Preço do açúcar. Para isso, usineiro e fornecedor suportam o
ônus da retenção, de modo geral,
sem distinguir situações discriminatórias para favorecer a uns
e prejudicar a outros.
As regras de incidência obrigatória quanto aos encargos atribuídos a usineiros e fornecedores, no que diz respeito a retenção dos estoques, são as mesmas
quanto à espera. O produtor espera liberar cota para vendê-la.
O prazo estabelecido para o
ano-safra 69/70, foi de 12 (doze)
meses para a liquidação do estoque em cotas mensais. Essa espera atinge o fornecedor, igualmente, porque ele, participando
da retenção sem limite de tempo,
terá que aguardar a liberação de
todas as cotas de mercado. Como
o estoque é liberado mês a mês,
em cotas preestabelecidas, o fornecedor recebe também, de mês
a mês, não o preço da cana, mas
uma parcela por conta, um
adiantamento que será levado à
conta final de liquidação do preço.
Esse raciocínio é fácil de confirmar, verificando-se o art. 16 e
seus ff 1?, 2? e 3?, da Resolução
n? 2.028 (fls. 51/52). Dispõe a cabeça do artigo 16, que os fornecedores participarão da retenção
dos estoques, na forma do 1$ 5?,
art. 51 da Lel n? 4.870/65. O g 1?
preceitua que os fornecedores
não participarão das despesas de
retenção e comercialização do
açúcar. O 2? prevê a regulamentação do sistema de pagamento de canas, com base no
mesmo f 5? art. 51, Lei n?
4.870/65. O 3? estabelece que os
fornecedores participarão dos
eventuais aumentos verificados
nos estoques.
Vale dizer que, aos forneçedores, não estando obrigados às
despesas mas participando dos
eventuais aumentos verificados
nos estoques, a única forma de
participação efetiva e material
na retenção é a espera da liqui-
— 100
dação do preço das canas até à
liquidação do estoque de açúcar.
Se não fosse assim, a sua participação seria nenhuma. Absurdo
evidente que o raciocínio repugna.
Dentro desse espirito, o IAA
passou a fixar as cotas mensais
de comercialização do açúcar,
em cada ano-safra, a partir da
vigência da Lei n? 4.870, de 1-121965, estabelecendo simultaneamente o esquema de pagamento
das canas de fornecedores, de
modo a que o último pagamento
coincidisse com a liberação da
última cota de mercado. Em relação à safra 68/69, o esquema
foi assim deliberado pelo próprio
Presidente do IAA quando, dirimindo divergência entre usineiros e fornecedores, proferiu o
despacho de fls. 34/36, manifestando que o critério adotado «se
ajusta ao espírito e ao sentido da
norma regulamentar» (fls. 36).
Seguindo a mesma orientação,
o Presidente do IAA baixou o Ato
n? 24, em 8-7-1969 (fls. 21), estabelecendo para o Estado de São
Paulo, na safra 1969/1970, as cotas de comercialização em dois
períodos, sendo o primeiro, de
cinco meses, compreendido entre
1? de julho a 30 de novembro de
1969; e o segundo, de sete meses,
estendendo-se dei? de dezembro de
1969 até 30 de junho de 1970 (art.
2?). No mesmo Ato n? 24 ficou estabelecido que, na forma do art.
16 da Resolução n? 2.028, de 27-61969; e o do § 5? do art. 51 da Lei
n? 4.870, de 1-12-1965, o pagamento das canas fornecidas às usinas
do Estado de São Paulo, na safra
69/70, é feito em duas parcelas,
sendo uma, como adiantamento
do preço-base, no período de 1?
de julho a 31 de dezembro de
1969, e outra, por saldo desse preço, nos meses compreendidos no
período de 1? de janeiro a 30 de
junho de 1970 (art. 7?— fls. 22).
Em plena vigência o esquema
de comercialização de açúcar e
pagamento das canas, em relação à safra 69/70, cujo primeiro
período foi totalmente cumprido,
velo a Resolução n? 2.034, de 6-1169, estabelecendo que o pagamento das canas seria feito em
duas parcelas, sendo uma, como
adiantamento do preço-bage, no
período de 1? de julho a 31 de dezembro; e outra, por saldo desse
preço, nos meses compreendidos
de 1? de janeiro a 31 de março de
1970. Além disso, dispôs sobre a
revisão dos cálculos para os fins
de reajustamento da parcela de
adiantamento do preço-base, correspondente ao primeiro período
(arts. 2? e 6?— fls. 40 e 41).
Do confronto entre a Resolução
n? 2.034 e o Ato n? 24, observa-se
que ambos os atos se reportam
ao art. 16, da Resolução n?
2.028/69, e ao § 5?, art. 51 da Lei
n? 4.870/65, como fundamento da
participação dos fornecedores de
cana na retenção dos estoques de
açúcar. E, ambos os atos mantém o plano de comercialização
em doze cotas mensais referentes à mesma safra 69/70. Apenas
foi modificado o esquema de pagamento das canas em ambos os
períodos. Quanto ao primeiro, já
vencido e pago, pelo reajustamento da parcela de adiantamento. Quanto ao segundo, pelo seu
encurtamento para três meses
(janeiro a março de 1970).
Explicando a alteração introduzida, no particular referente
ao pagamento das canas, o «Fluxograma» de fis. 43 e os «esclarecimentos» de fls. 44, anexos à Resolução n? 2.034/69, indicam que
o volume de açúcar a ser comercializado, no período de janeiro a
R.T.J. — 100
junho de 1970, é de 15.085.715 sacos, cuja cota mensal é de
2.514.285 sacos.
Considerando que, na industrialização do açúcar, as canas
de fornecedores foram utilizadas
na proporção de 45% do total esmagado, a mesma proporção deve ser destacada do produto acabado, equivalente a 6.788.571 sacos de açúcar que teriam sido
usinados com canas exclusivas
dos fornecedores. Nessas condições, a fração do estoque que teria sido fabricada com canas somente dos fornecedores poderia
ser liberada em três meses, isto
é, de janeiro a março de 1970. O
resto é açúcar que teria sido usinado com canas próprias dos fabricantes, na proporção de 55%.
Entretanto, o ,raclocinio constante do Fluxograma é absolutamente divorciado da realidade
porque não é possível rotular o
produto acabado com essa ou
aquela cana. O estoque de açúcar
é um contingente industrializado
com canas de usineiros e canas
de fornecedores. Se a proporção
de 45% corresponde a canas dos
fornecedores, essa mesma proporção há de estar contida em todo o estoque, saco por saco, até o
fim da comercialização. Se o escoamento das cotas mensais está
programado para doze meses sucessivos, em dois períodos, de julho a novembro de 1969 e de dezembro de 1969 a 30 de junho de
1970, os fornecedores participam
da retenção dos estoques durante
o mesmo tempo, até à liberação
da última cota.
Foi justamente isso que o art.
7?, do Ato n? 24 (fls. 21) deixou
assentado, criando o ónus da retenção para os fornecedores durante o mesmo prazo estipulado
para os produtores, em face do
209
sistema de escoamento duodecimal de comercialização previsto
no art. 2?, do mesmo Ato n? 24, o
que está conforme a lei.
Mas, a Resolução n? 2.034/69
(fls. 40), adotando o mesmo sistema duodecimal de escoamento
das cotas de comercialização,
previsto no Ato n? 24 (fls. 21),
restringiu, no entanto, o prazo do
segundo período, dentro do qual o
saldo do preço das canas deveria
ser pago. Aquela associação de
esforços prevista no { 5?, artigo
51, Lel n? 4.870/65, para disciplinar a retenção dos estoques, em
benefício da estabilização de preços dp mercado interno, foi totalmente desprezada.
Se as cotas de comercialização
estabelecidos na forma da cabeça do art. 51 da Lei n? 4.870/65,
acarretam como conseqüência, a
retenção dos estoques; se os fornecedores, ainda como conseqüência, participam obrigatoriamente da retenção, eles só poderão receber integralmente todas
as parcelas do preço, quando estiverem liberadas todas as cotas
de mercado. E isso que dispõe o
fk 5? do art. 51 da Lei n? 4.870/65.
Dizendo que o fornecedor participa da retenção do estoque sem
demarcar o limite da partipação,
é evidente que ela é obrigatória
até o fim da retenção.
Aliás, esse ponto de vista tem o
apoio integral do próprio
PrOCurador-Geral do IAA., Dr.
Holló Cavalcante Pina, que, a
respeito do assunto em causa,
emitiu o parecer de fls. 55/60.
Analisando detidamente a matéria, o ilustrado jurista acentua
que a participação dos fornecedores se estende ao pagamento que
se procede sob a forma de adiantamento, Si parcela proporcional ao fornecimento realizado. O
210
R.T.J. — 100
exame do 5?, art. 51, já referido, não leva a outra conclusão
que não a de subordinar a parcela não paga às contingências ditadas pela comercialização.
Vale dizer que, a parcela não
paga, estando subordinada às
contingências ditadas pela comercialização, acarreta para o
fornecedor a obrigação de esperar o escoamento das cotas de
mercado para receber integralmente o preço da cana. É a opinião do Procurador-Geral do
IAA.
O que não é possível é estabelecer o prazo de seis meses para o
escoamento do remanescente do
estoque, no segundo período, e
encurtar, para três meses, o prazo dentro do qual as canas deverão ser liquidadas. Além da discriminação ilegal, em face do
5?, art. 51, Lei n? 4.870/65, a distinção outorgada aos fornecedores pela Resolução n? 2.034,
quanto ao pagamento das canas,
é injurídica nessa altura da safra
69/70.
Assim é porque, se o Ato n? 24,
a folhas 21, estabeleceu um plano
de escoamento da safra e o mesmo foi executado durante o primeiro período, esse plano não poderia mais ser alterado por motivo algum, até o fim da comercialização, salvo acordo geral das
classes interessadas. O ato administrativo pode ser revogado pela própria administração, desde
que não contrarie a lei e não
ofenda situação jurídica subjetiva do particular. No caso, usineiros e fornecedores tinham um
ato a observar e o observaram
durante o primeiro período da safra O segundo período teria que
percorrer o mesmo caminho previsto pelo mesmo ato porque, em
face dele, todas as classes inte-
ressadas Já tinham tomado posição, principalmente os usineiros,
sobre os quais pesam os encargos financeiros. Os produtores já
tinham a seu favor uma situação
jurídica definitiva no sentido de
pagar os fornecedores, de acordo
com a liberação das cotas de
mercado, nos termos do Ato n?
24. Já conheciam a sua obrigação
de pagar as canas em prazo certo, ditado pela administração.
Criou-se em favor deles, o direito
ao prazo para pagar as canas.
De sorte que, esse prazo não pode, unilateralmente, em caráter
potestativo, ser encurtado.
Dir-se-á que o IAA tem o poder
discricionário de estabelecer cotas de mercado, de reduzi-las ou
dilatá-las, de acordo com as necessidades de estabilização de
preço, posição estatlstica e comportamento do mercado. E verdade que tem essa faculdade.
Mas, desde que o sistema seja
adotado, a retenção conseqüente
acarreta ónus que os produtores
e fornecedores deverão suportar
obrigatoriamente, conjugando esforços, até o fim da comercialização.
A cabeça do art. 51, Lei n?
4.870/65, autoriza o IAA a disciplinar o escoamento da safra,
complementar medidas de estabilização de preço e estabelecer
cotas mensais de comercialização. Mas, não obriga. Tudo depende da posição estatística e do
comportamento do mercado. Se,
porém, a autarquia resolve estabelecer cotas mensais de mercado, o 5? passa a atuar obrigatoriamente para exigir a participação do fornecedor de cana na retenção do estoque conseqüente.
Participação efetiva e material
no sentido de tomar parte, de
cooperar para que alguma coisa
se taça, segundo a Interpretação
R.T.J. — 100
211
do Procurador-Geral do IAA, Dr.
do órgão e destinada a aplicar exaHelio Cavalcante Pina ( fls. 58).
tamente a lei que se declara vioE, na espécie, a participação
lentada. (ler fls. 649-665).
consiste em o fornecedor receber
o preço oficial da cana, sob a forRecorreram, de sua vez, os forma de adiantamento, em parcela
necedores de cana, já agora encaproporcional ao fornecimento
beçados por João Agripino Mala
realizado e ao financiamento deSobrinho, sustentando que devia
ferido aos produtores. Mas, até
ter sido proferida uma só sentença
quando? Até ao escoamento das
nos dois mandados de segurança,
cotas de mercado; enquanto due, no mérito, sustentando que a
rar a retenção, porque o 5? não
verdadeira e legal solução é a do
limita a sua incidência no tempo.
pagamento das canas na quinzena
Apenas diz que os fornecedores
subseqüente, compreendendo os
participarão da retenção dos esfornecimentos da anterior. (ler fls.
toques. Vale dizer, participarão
669-679).
até o fim da retenção.
Falaram, por fim, os impetranNo entanto, a Resolução n?
tes agravados, apoiando a senten2.034/69, alterando o esquema de
ça, e aduzindo que a questão está
pagamento das canas de fornecesuperada, sendo certo, por outro
dores, quando o ano-safra já tilado, que o IAA retomou o procedinha percorrido o primeiro períomento normal adotado anteriordo, estabeleceu uma distinção
mente ã impugnada Resolução n?
que o jf 5?, art. 51, Lei n? 4.870/65,
2.034, tendo baixado, para a safra
não permite. Reduziu o prazo da
1970/71, a Resolução n? 2.041, de 25participação na retenção dos es6-70, que consagra aquele proceditoques, em detrimento dos usineimento anterior. ( fls. 871-883).
ros, quando a lei exige a associação de esforços de produtores e
Nesta Instância, a douta
fornecedores para suportarem o
Subprocuradoria-Geral da Repúbliônus conseqüente daquela retenca após haver oficiado pela sujeição. Encurtou o prazo de seis
ção dos dois agravos de mandados
meses conferido aos usineiros pade segurança (este, de n? 67.376, e
ra o pagamento das canas, quano outro, de n? 67.548) a um só relado esse prazo se erigira em direitor, no que foi atendida, opina, no
to constituído e integrante do seu
mérito, pela reforma da sentença,
patrimônio. Estabeleceu revisão
porque a questão envolve matéria
dos cálculos para efeito de reade fato, e porque a proporção do
justamento da parcela de adianpagamento aos fornecedores se faz
tamento do preço-base corresem razão do adiantamento e finanpondente ao primeiro período,
ciamento por tonelada de cana, naquando je havia se escoado no
da tendo a ver com as vendas de
tempo, fazendo incidir o ato reaçúcar feitas pelos usineiros. (fls.
troativamente, ao arrepio do nos89-901).» (fls. 910/923).
so sistema jurídico.» ( fls. 633641 ).
Este o voto do eminente Relator,
acolhido
de modo unânime:
u o Instituto do Açúcar e
do ÁÁllcool, sustentando que a deci«Dispunha a Lel n? 4,071, de 15-6são foi preferida por Juiz incompe62, a propósito do pagamento de
tente e declarou ilegal uma Resolucanas pelas usinas aos fornecedoção baixada dentro das atribuições
res:
212
R.T.J. — 100
«Art. 3? O pagamento será feito
quinzenalmente e compreenderá
os fornecimentos de cada quinzena anterior, admitidas as seguintes deduções:
Mais tarde, porém, a Lei n?
4.870, de 1-12-65, visando a disciplinar o escoamento da produção de
açúcar mediante sua comercialização gradual, estabeleceu a possibilidade de retenção da safra e conseqüente retenção e liberação parcelada do preço devido aos fornecedores de cana.
No ponto que interessa à controvérsia posta nestes autos, reza a
última lei:
«Art. 51. A fim de disciplinar o
ritmo do escoamento da produção e complementar as medidas
de estabilização do preço do açúcar no mercado interno, poderá o
IAA estabelecer cotas mensais
de comercialização de açúcar, a
serem atribuídas às cooperativas
de produtores e às usinas não
cooperadas, onde as houver.
5?. Os fornecedores de cana
participarão da retenção dos estoques conseqüentes de fixação
das cotas mensais de comercialização e receberão, sob a forma
de adiantamento, por tonelada de
cana, parcela proporcional aos
fornecimentos realizados e ao financiamento que for deferido.»
yê-se, pois, que o antigo pagamento quinzenal desapareceu, ficando restrito àquelas safras em
que o IAA não usar da faculdade
de estabelecer cotas mensais de
comercialização.
Instituído o regime de contingenciamento, de escoamento gradual
da safra, os fornecedores de cana
participam das retenções do produto final e, conseqüentemente, do
ônus da gradualização das vendas.
Em que proporção?
Não apenas na proporção óbvia,
declarada na lei, dos fornecimentos feitos e do financiamento da safra.
O financiamento, que as Usinas
obtém para suportar a retenção
dos estoques, para não vender o
açúcar logo que produzido, não
corresponde ao valor total da safra, mas apenas a certa parte do
valor.
Logo, não permite pagar aos fornecedores, de pronto, o valor total
do que forneceram.
Mas, ainda que a lei não mencionasse o financiamento (e pode ele
ser dispensado pela Usina que com
recursos próprios suporta a retenção) a disposição principal do parágrafo 5?, submetendo os fornecedores à participação na retenção
dos estoques, torna claro que essa
participação é por todo o tempo da
retenção.
Dispondo de modo a reduzir o
tempo dessa participação dos fornecedores, deixando-a nos últimos
meses somente a cargo das usinas,
a Resolução impugnada se pós em
flagrante desrespeito ao teor literal e ao espírito do mencionado parágrafo 5?.
A sentença examinou com profundidade e lucidez os vários argumentos suscitados e deu ã controvérsia a solução claramente imposta pelo 5? do art. 51 da Lei n?
4.870, de 1-12-65.
Confirmo-a, pelos seus próprios
fundamentos, que adoto, seja quanto às preliminares, seja quanto ao
mérito.
Nego provimento aos recursos,
voluntário e de ofício.» (fls. 923/5)
R.T.J. — 100
Apresentados, pelos litisconsortes
passivos, embargos de declaração, estes não foram conhecidos, por
intempestivos (fls. 941/2 — RE
83.328)
No que diz respeito ao mandado de
segurança impetrado pelos fornecedores, mandamus que a sentença denegara (AMS 67.548 — RE 83.353),
proferiu o Ministro Decio Miranda
este voto, também acolhido sem voz
discrepante:
«Este mandado de segurança
surgiu como uma espécie de retorsão ao mandado de segurança ajuizado pelas Usinas (AMS 67.376)
Ambos visam à ilegalidade da
Resolução n? 2.034, de 6-12-69, mas
para resultados diferentes. Os usineiros para não sujeitar-se sozinhos aos ónus da retenção dos estoques, nos últimos três meses dela.
Os fornecedores para não participar de forma alguma no ónus dessa retenção.
Acabamos de mostrar, no voto
proferido no AMS 67.376, que os
usineiros tinham razão.
Logo, prejudicada está a pretensão dos fornecedores, veiculada
neste mandado que ora temos sob
exame, a qual, de resto, esbarra
na clara disposição do 5? do artigo 51 da Lei nt 4.870, de 1-12-65.
A sentença, tanto das preliminares quanto no mérito, merece confirmação, pelos seus próprios fundamentos.
Nego provimento ao recurso.»
(fs. 234 — RE 83.353)
Houve embargos de declaração,
não conhecidos porque opostos a destempo.
Da decisão proferida no mandado
de segurança requerido pelas Usinas, AMS 67.376 (RE 83.328), recorreram, extraordinariamente, os Misconsertes passivos. Com apoio na
213
alínea d, sustentam que a questão
em exame envolve matéria complexa, inapreciável, como tal, na ação
de mandado de segurança; que houve invasão do judiciário na esfera
administrativa, já que a decisão impugnada examinou o mérito do ato
administrativo consubstanciado na
Resolução número 2.034/69; que não
foram citados outros litisconsortes
passivos. Pela alínea a, alegam
negativa de vigência ao artigo 2?,
3?, da Lel de Introdução, por entenderem aplicável a Lei n? 4.071, de
1962. Argúem ainda, ofensa ao artigo
7?, da Resolução nt 2.034/69.
Com os mesmos fundamentos, os
impetrantes — fornecedores recorreram, extraordinariamente, da decisão que lhes foi desfavorável no outro mandado de segurança, AMS
67.348 (RE 83.353).
Inadmitidos os recursos, fi-los subir para melhor exame.
No recurso relativo ao mandado de
segurança requerido pelas Usinas
(RE 83.328), a Procuradoria-Geral
da República é pelo provimento do
recurso, para cassar-se a segurança
concedida. O parecer, quanto ao RE
83.353, é no entanto, pelo não conhecimento do recurso
E o relatório de ambos os feitos.
VOTO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu
(Relator): A Resolução n? 2.034, de
06-11-69, baixada pelo Conselho Deliberativo do Instituto do Açúcar e do
Álcool, na qual se dispõe sobre o pagamento da cana fornecida às usinas
do Estado de São Paulo durante a
safra de 1969/70, deu margem a dois
mandados de segurança, donde resultaram os presentes recursos extraordinários: o impetrado pelos usineiros, que não se conformaram com
a redução do prazo de seis para três
meses; e o impetrado pelos fornece-
214
R.T.J. — 100
dores, que vindicavam o pagamento sas censuras: a primeira, porque o
da cana na forma da Lei n? 4.071, de acórdão impugnado limitou-se a examinar a Resolução n? 2.034/69, sob o
1962, isto é, quinzenalmente.
ponto de vista da estrita legalidade,
afastando a sua aplicação por confliNo RE 83.328, cuida-se do manda- tar
com outras normas, que deviam
do de segurança impetrado pelos ora prevalecer;
a segunda porque, ao asrecorridos, Usina Santo Antônio S.A. sim proceder,
o acórdão a
Açúcar e Mcool e outros, contra o apreciar, sob cingiu-se
o ponto de vista forDelegado Regional do Instituto do mal, o ato administrativo
tachado de
Açúcar e do Álcool do Estado de São ilegal, não havendo falar-se,
conPaulo, mandado no qual intervieram seguinte, em invasão, peio por
judiciácomo litisconsortes passivos João rio, de esfera privativa da adminisAg,ripino Mala Sobrinho e outros, ora tração; a terceira, porque, quando
recorrentes. Argüiu-se, no mandado, outra razão não houvesse, cuida-se
a ilegalidade da Resolução n? 2.034,
matéria não ventilada no acórdão
de 06-11-69, do Conselho Deliberativo de
recorrido.
do Instituto do Açúcar e do Álcool,
pela qual se reduziu de seis para
Descabe, também, o recurso pela
três meses o pagamento do saldo do
preço relativo ao fornecimento de alínea a, porque ao considerar inacana. Segundo o regime anterior, o sal- plicável à espécie o art. 3? da Lei n?
do do preço, devido aos fornecedo- 4.071/62, onde se determina que o pares, devia satisfazer-se em seis me- gamento será feito quinzenalmente e
ses, isto é, de 1? de janeiro á 31 de compreenderá os fornecimentos de
julho. Pela Resolução n? 2.034, essa cada quinzena anterior, o acórdão
prestação final passou a ser devida recorrido limitou-se a suscitar que
no período de 1? de janeiro a 31 de essa norma não incidia em face de
março de 1970. A sentença concedeu outras regras legais, aplicáveis à eso mandado, assegurando aos Impe- pécie, não se configurando, destarte,
trantes, Usina Santo Antônio S.A. e a alegada ofensa ao 2?, do art. 2?,
outros, a faculdade de prestar o sal- da Lei de Introdução ao Código Civil.
do do preço dentro dos seis meses. «O que fizeram a sentença e o acórJulgando agravo, o Tribunal Federal dão que a confirmou» — afirma o
de Recursos, pela sua Segunda Tur- despacho presidencial que negou sema, manteve a decisão de primeiro guimento ao recurso — «em última
grau. Dessa decisão não recorreu o análise, ao considerar que a particiInstituto do Açúcar e do Álcool, pação dos fornecedores de canas nos
fazendo-o, todavia, os litisconsortes ônus de retenção dos estoques de
passivos, João Agripino Maia Sobri- açúcar deverá obrigatoriamente
estender-se até ó fim da comercialinho e outros.
zação do produto, foi interpretar disda Lei n? 4.870/65, de forma
Argúem estes, pela alínea 0, como posições
escorreita,
E bastaria que fosestá no relatório, que o acórdão re- se razoávelaliás.
essa
interpretação,
corrido entrou no exame de matéria vedar a estreita via recursalpara
excomplexa, insuscetível de aprecia- traordinária
400»
Súmula
(f.
981).
ção em mandado de segurança; que
o aresto invadiu a esfera administraAnte o exposto, não conheço, prelitiva, porque pronunciou-se quanto ao
mérito do ato administrativo con- minarmente, do RE — 83.328, porsubstanciado na Resolução n? quanto inconsistentes as razões pelas
2.034/69; que não foram citados ou- quais se increpa ao acórdão ter netros litisconsortes. Improcedem es- gado, indevidamente, aplicação à
215
R.T.J. — 100
Resolução n? 2.034/69. Concluiu o
acórdão, como se viu, que, em vez
dos três meses para o pagamento do
saldo, prazo estatuído na aludida Resolução, esse prazo, de acordo com o
sistema então vigente, era de seis
meses. Ora, se ficou ai entendido,
corretamente que prevalecia, para o
pagamento do saldo, o prazo de seis
meses, descabe, também, o RE
83.353, porquanto, aqui, os mesmos
recorrentes, João Agripino Mala Sobrinho e outros, sustentam, sob fundamentos iguais aos defendidos no
RE — 83.328, que, em vez do prazo
de seis meses, para o pagamento do
saldo relativo ao fornecimento de cana, esse pagamento devia fazer-se,
quinzenalmente, segundo o artigo 3?
da Lei n? 4.071, cuja incidência se
havia afastado. Ora, assentado, no
RE 83.328, que o prazo para o pagamento era de seis meses, não de três
meses, conto se estabelecia na Resolução n? 2.034/69. esse entendimento,
isto é, de que o dito prazo era de seis
meses, prevalece quanto ao RE —
83.353, do qual, portanto, também
nãO conheço. Em suma, não conheço
dos recursos extraordinários 83.328 e
83.353.
EXTRATO DA ATA
RE 83.353 — SP — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Rectes.: João Agripino
Mala Sobrinho e outros (Adv.: José
Moura Rocha). Recdo.: Instituto do
Açúcar e do Alcool (Adv.: Antonio
Carlos Sigmaringa Seixas).
Decisão: Não conhecido. Unânime.
Impedido o Senhor Ministro Decio
Miranda.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República, Dr. Mauro Leite
Soares.
Brasília, 07 de agosto de 1981 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 84.064 (AgRg) — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira.
Agravante: Banco Bamerindus de Investimento S.A. — Agravados: Mauro Roberto Nava e sua mulher.
Embargos de terceiro. Promitente comprador. Execução contra o
promitente vendedor. Fraude ã execução não comprovada. Negativa
de vigência dos arts. 592, III, e 593, II, ambos do Código de Processo
Civil, que não se verifica, não cabendo, em recurso extraordinário, o
simples reexame de provas (Súmula nt 279). Inaplicabilidade à espécie do art. 530, I, do Código Civil, o qual, de resto, não foi prequestionado no acórdão recorrido (Súmula nP 282). Agravo regimental a que
se nega provimento.
ACORDA°
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata de
julgamentos e notas taquigráficas, à
unanimidade, negar provimento ao
Agravo Regimental.
Brasília, 10 de novembro de 1981 —
Cunha Peixoto, Presidente — Néri
da Silveira, Relator.
216
R.T.J. — 100
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Néri da Silveira
(Relator): Banco Bamerindus de Investimentos S/A agrava, regimentalmente, do seguinte despacho (fls.
44/45):
«O Banco Bamerindus de Investimentos S.A. agrava do despacho
do ilustre Presidente do Primeiro
Tribunal de Alçada Civil de São
Paulo, que inadmitiu recurso extraordinário, interposto com apoio
no art. 119, inciso III, letra a, da
Constituição, contra aresto unânime, de 05.11:1980, da sua colenda
Quinta Câmara Civil, alegando negativa de vigência dos arts. 530,
do CCB, 592, III, e 593, II, ambos
do CPC.
2. — O Banco recorrente moveu
execução contra Carlos Vaz Macia
e outro, sendo penhorado imóvel
que Mauro Roberto Nava e sua
mulher haviam prometido comprar aos executados. Nos embargos de terceiro interpostos pelo casal de Mauro Roberto Nava,
questionou-se a ocorrência de fraude à execução.
O acórdão recorrido extraordinariamente, ao dar provimento ao
apelo dos embargantes e julgar
procedentes os embargos de terceiro, após exame da prova dos autos,
firmou:
«Vale dizer, por ocasião do negócio imobiliário, cuja origem deita
raízes no compromisso de compra
e venda assinado em 18 de agosto
de 1977, não corria contra o vendedor executado demanda capaz de
reduzi-lo à insolvência, não se justificando a alegação de ocorrência
de fraude à execução, na conceltuação do legislador processual
(art. 9.593, inciso II, CPC), como
sustentou, sem razão, o Banco embargado)S. Assentou o aresto, outrossim, com base no complexo
probatório: «O valor da execução,
objetivamente, não é de molde a
justificar a conclusão de que o devedor está insolvente, ou será reduzido tal estado, o que mais fortalece a convicção contrária à definição judicial impugnada, por sinal
traduzida em termos simplistas.»
Noutro passo, ainda, assere o julgado da colenda Câmara: «Acresce
notar que o embargado apenas invocou a ocorrência de fraude à
execução, na defesa oposta, passando a cogitar da alegação de
fraude contra credores por ocasião
da audiência de instrução e julgamento. E sabido ipie os elementos
da culpa mi da má-fé são indiferentes para a configuração da fraude
à execução, que não cogita do
«consilium fraudis», embora sejam
essenciais na aferição da fraude•
contra credores, cuja discussão se
admite, é verdade, na esfera dos
embargos de terceiro, mas a matéria não foi questionada a esse título. De qualquer modo, os elementos probatórios coligidos nos autos,
sob esse aspecto, não autorizam
outra conclusão» ( fls. 12/13).
3 — Está correto o despacho
agravado, dessarte, ao afirmar
inocorrer a alagada negativa de vigência dos arts. 592, III, e 593, II,
ambos do CPC, em face dos termos do acórdão, não cabendo, em
recurso extraordinário, o simples
reexame das provas (Súmula n?
270).
No que concerne à invocação do
art. 530, I, do CCB, não houve efetivo prequestionamento no acórdão
recorrido (Súmula n? 282).
4 — Do exposto, nego seguimento
ao agravo».
As fls. 47/48, insiste o agravante
no sentido de haver ocorrido prequestionamento da matéria relativa
ao art. 530 do Código Civil Brasilei-
R.T.J. — 100
ro, considerando que o acórdão, na
sua fundamentação, «teve necessidade de transpor-se à data da lavratura do instrumento da promessa».
Dal, o agravante assevera que o
acórdão recorrido «disse que a
transferência do imóvel se perfaz pelo simples contrato, pouco importando não tenha sido registrado». Aduz:
«E isto, sem dúvida, ofende o artigo
530 do Código Civil». Embora reconheça que o aresto não faz referência ao art. 530 do Código Civil Brasileiro, entende o agravante que tal fato não exclui o prequestionamento,
«que reside em sede da discussão do
tema, da matéria, do assunto, da essência do direito». E acrescenta que,
«se o acórdão houvesse citado o art.
530, talvez não tivesse cometido a
heresia de dizer que o imóvel se
transferiu pelo simples contrato sem
registro». E conclui: «6. E se já havia em andamento ação executiva
aparelhada, ao tempo do registro da
propalada promessa, o v acórdão
violentou o artigo 593, item II, do
CPC, sem sombra de dúvida, negando a ocorrência da fraude à execução».
E o relatório.
217
alegação de ocorrência de fraude à
execução, na conceituação do legislador processual (art. 593, inciso II,
do CPC), como sustentou sem razão, o Banco embargado».
Destacou, de outra parte, o despacho agravado que não cabe o recurso
extraordinário a simples reexame de
provas (Súmulas n? 279), tendo em
conta as conclusões do aresto recorrido, acerca de não verificação de
fraude à execução, no compromisso
de compra e venda, então, celebrado
pelo devedor, porque, à época, não
corria contra ele demanda capaz de
reduzi-lo à insolvência. Além disso, o
acórdão baseou-se, também, na circunstância de o ora agravante apenas haver invocado a ocorrência de
fraude à execução, na defesa oposta,
passando a cogitar da alegação de
fraude contra credores, por ocasião
da audiência de instrução e julgamento, ressaltando o aresto que, «de
qualquer modo, os elementos probatórios coligidos nos autos, sob esse
aspecto, não autorizam outra conclusão».
Do exposto, nego provimento ao
agravo.
EXTRATO DA ATA
VOTO
Ag. 84.064 — ( Aglig) — SP — Rel.:
O Sr. Ministro Nazi da Silveira Min. Néri da Silveira. Agte.: Banco
(Relator): Não tem razão o agravan- Bamerindus de Investimento SIA
te. O Art. 530, do Código Civil Bra- (Adv.: Orlando Antonaglia). Agdos.:
sileiro, não foi referido no acórdão,. Mauro Roberto Nava e sua mulher
porque, em realidade, não tem apli- (Advs.: Orestes Bacchetti e outros).
cação à hipótese de promessa de
Decisão: Negaram provimento ao
compra e venda de imóvel. Disso é Agravo
Regimental. Decisão unânique cuidou o aresto recorrido, não me.
havendo, assim, afirmado que a
Presidência do Senhor Ministro
transferência do imóvel se perfaz pelo simples contrato, pouco importan- Cunha Peixoto. Presentes à Sessão
do o registro. Dessa questão não co- os Senhores Ministros Soares Mtuloz,
gitou o julgado, que se referiu ao Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e
compromisso de compra e venda do Néri da Silveira. Subprocuradorimóvel, assinado a 18.8.1977, para ob- Geral da República o Dr. Mauro Leiservar que, a essa data, não corria te Soares.
Brasília, 10 de novembro de 1981 —
contra o executado, promitente vendedor, demanda capaz de reduzi-lo à António Carlos de Azevedo Braga,
insolvência, «não se justificando a Secretário.
218
R.T.J. — 100
AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 84.274 (AgRg) — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Rafael Mayer.
Agravante: Renato Pires Imobiliária e Construtora Ltda. — Agravada:
Prefeitura Municipal da Estância Balnearia de Perulbe.
Município. Competência. Construção (embargo). — E competente
o Município para editar regulamentos administrativos que limitem o
exercício das faculdades inerentes ao direito de propriedade, e usar
das medidas tendentes à sua observação, inclusive o embargo de
obra. Agravo regimental improvido.
ACÓRDÃO
dissídio invocado. Invocando os
fundamentos de despacho impugnado, nego seguimento. Arquivese».
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, em conformidade com a
Insiste a Agravante em que o desata de julgamentos e notas taquigrá- pacho lhe causa prejuízo, pois sofre
ficas, à unanimidade, em negar pro- a iniquidade de ser a única incorvimento ao agravo.
poradora brasileira que não consegue
construir um hotel em condomínio
Brasília, 10 de novembro de 1981 — (ou apart-hotel ou Rat-service), apeCunha Peixoto, Presidente — Rafael sar de cumprindo todas as exigênMayer, Relator.
cias da legislação especifica, ter efetuado o registro da incorporação no
cartório competente. Não existe, na
RELATOR 10
verdade, desvirtuamento da finalidaO Sr. Ministro Rafael Mayer: As- de da construção, pois continua a ser
sim está o despacho que negou pro- hotel, só que em condomínio. E o ato
vimento ao agravo de instrumento municipal violou o direito de proprieinterposto da denegação do recurso dade do Agravante.
extraordinário:
Mantido o despacho, por seus fun«São insubsistentes as alegações damentos, vai o• agravo regimental a
de ofensa à Constituição e demais julgamento da Egrégia Turma.
dispositivos legais, nem mesmo raE o relatório.
zoável a argüição de inconstitucionalidade do ato da administração
municipal, como bem demonstra o
VOTO
douto despacho agravado. Verificado o desvirtuamento da finalidade
da construção, tinha legitimidade a
O Sr. Ministro Rafael Mayer: (Reautoridade para cancelar o respec- lator): Para demonstrar a inconsistivo alvará, já que irrecusável a tência da pretensão da Agravante.
competência do Município de edi- invoco o douto voto vencedor, no
tar normas edllícias e fazer acórdão recorrido, proferido pelo
cumpri-las. Por outro lado, consi- ilustre Desembargador Batalha de
dero, também, não comprovado o Camargo, in verbis:
R.T.J. — 100
219
«A questão jurldica em que a
gar administrativamente a obra,
apelante, apegando-se a definições,
cuja finalidade passou a ser outra
pretende equiparar hotel em conda declarada como condição da
domínio, com hotel tout court —
aprovação.
não esconde ter sido o alvará obtiSustentar por outro lado, que não
do sob falsa declaração e objetivo.
compete ao Município editar norA impetrante assumiu o expresso
mas adiadas, relativas à construcompromisso de que a planta subção de edifícios, é sustentar o que,
metida à aprovação da autoridade
primacialmente, constitui a prómunicipal estava destinada á conspria razão de ser da autoridade
trução de um hotel, proibida a venmunicipal.
da de unidade autônomas, sob peTenho que se não feriu a direito
na de cassação do alvará.
liquido e certo da impetrante no
A impetrante, por seu represenembargo administrativo da obra —
tante legal, responsabilizou-se pela
partindo, mesmo, exclusivamente,
manutenção da finalidade prevista
do fato de que o alvará foi obtido
na planta, salvo ulterior decisão da
mediante fraude, ou, pelo menos,
Prefeitura Municipal, sob pena de
com objetivo enganoso.
cassação do alvará.
A construção do edifício com a
Como agiu, entretanto, a impedestinação
agora relevada pela imtrante?
petrante, havia de ser assegurado,
no mínimo, o direito da autoridade
Inscteveu no Registro de Imómunicipal de reexaminar a planta.
veis a incorporação de um edifício
destinado à venda de unidades autôA impetrante é que não competinomas e passou a anunciar a venria, no. caso, o direito liquido e cerda de cômodos em unidades autôto de faltar ao compromisso assunomas.
mido».
ociosa a dialética, inculcada
Diante desse fato incontroverso,
na Lei de Condomínios, no Código núcleo de toda a demanda, não haveCivil, e até na Constituição: a plan- ria mesmo como prosperar as invecta, simplesmente, não teria sido tivas do recurso extraordinário. O
aprovada pela autoridade munici- exercício das faculdades inerentes
pal se a destinação fosse para a ao direito de propriedade tem limivenda de quartos com banheiro co- - tes nos regulamentos administratimo unidades autônomas.
vos, em cujo ãmbito se insere a norma descumprida pela Agravante.
Não foi por outro motivo que se Competente
Município para edita
exigiu o expresso compromisso da la, nem fariaosentido
a sua existênimpetrante.
cia como norma legal não estivesse
A impetrante é que fraudou, à dotada de coercibilidade e dos meios
evidência, a administração munici- adequados ao desfazimento de sua
pal; e a falsa intenção não se ocul- infringência. Por isso é legitimo o
ta, agora, na alegação de não com- ato impugnado.
petir à autoridade municipal emNego provimento ao recurso.
bargar a obra.
Se a obra, para inicio da construEXTRATO DA ATA
ção, dependia de aprovação da
planta e de alvará, é evidente que
Ag 84.274 — (AgRg) — SP — Rel.:
a mesma autoridade podia embar- Min. Rafael Mayer. Agte.: Renato
R.T.J. — 100
Pires Imobiliária e Construtora
Ltda. (Adv.: Tarcisio Augusto de Andrade). Agdo.: Prefeitura Municipal
da Estância Balnearia de Partilhe
(Adv.: Henrique de Brito Viana).
Decisão: Negaram provimento ao
Agravo Regimental. Decisão unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Cunha Peixoto. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Soares Mufloz,
Rafael Mayer, Clóvis Ramalhete e
Néri da Silveira. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mauro
Leite Soares.
Brasília, 10 de novembro de 1981 —
António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 84.699 (AgRg) — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Decio Miranda.
Agravante: ASA — Agentes de Serviços Aeroviárlos Ltda. — Agravados:
Juiz de Direito da 3? Vara dos Feitos da Fazenda do Estado de São Paulo e
Viação Aérea São Paulo S/A — VASP.
Processual Regimental. Ação popular. Suspensão liminar do ato
impugnado. Mandado de segurança contra esta medida. A medida
cautelar não deixa de estar excluída dos casos de cabimento do recurso extraordinário, pelo fato de ter sido concedida ou negada em ação
popular, prevista na Constituição.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata
de julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, negar
provimento ao Agravo Regimental.
Brasília, 10 de novembro de 1981 —
'Mei Falcão, Presidente — Decio
Miranda, Relator.
RELATOR 10
O Sr. Ministro Decio Miranda: Neguei seguimento ao agravo, com despacho em que se lê:
«O acórdão recorrido não se atrita com o art. 153, 31, da Constituição, quando entende que a medida cautelar, pela sua finalidade
preventiva, não está jungida à antecipada apreciação de mérito, ou
mesmo ao deslinde de dúvida processual, quando a discussão de
uma ou outra matéria poderia prejudicar os efeitos visados pela medida.
Não se ultrapassou, no ponto focalizado, a interpretação do instituto, tendo em vista sua finalidade,
sem elevar-se a matéria à questão
constitucional levantada.
Afastada esta, bem aplicou o
despacho a restrição contida no
art. 308, V, do Regimento Interno
de 18-6-70, ainda em vigor para o
caso (RISTF, art. 368, parágrafo
único).
Mantenho o despacho, por seus
fundamentos.» (Fls. 170).
R.T.J. — 100
Vem a ASA — Agentes de Serviços
Aerovlários Ltda. com agravo regimental.
Sustenta que a colisão com o parágrafo 31, do art. 153, da Constituição
da República ocorre, na espécie, não
em função das circunstâncias apontadas no despacho, atinentes às relações que podem existir entre a ação
principal e a ação cautelar, mas
quando, no julgamento de um mandado de segurança, a pretexto daquele relacionamento, se entendeu
inviável a apuração de ilegalidade
manifesta, consubstanciada, precisamente, no fato de ter sido admitida a
processamento ação popular sem
que se verificassem os pressupostos
dessa tutela jurídico-processual especialissima.
221
VOTO
O Sr. Ministro Decio Miranda (Relator): A douta petição de agravo regimental, pelas elocubrações que
suscita, bem deixa à mostra o tema
das dificuldades e perplexidades do
mandado de segurança contra decisão judicial.
No caso dos autos, porém, o tema
se acha reduzido, em última análise,
à invocação do parágrafo 31 do art.
153 da Constituição, a dizer que
«qualquer cidadão será parte legitima para propor ação popular que
vise a anular atos lesivos ao patrimônio de entidades públicas».
A contrario sensu, raciocina a
agravante, quando está em causa
uma empresa que, como a seu ver
acontece com a Vasp, não é entidade
E discorre, longa e eruditamente, pública, e, por isso, não poderia ter
no propósito de demonstrar a ilegali- secundado o pedido dos autores, a
dade do ato cautelar produzido na ação popular não merecia andamenação popular, ilegalidade que se des- to.
dobra em duas faces.
Dá-se, porém, que, no recurso extraordinário, está em causa apenas
Ilegal em si mesmo teria sido a a medida cautelar.
medida cautelar, porque no plano da
E esta, salvo invocação de ordem
asseguração da pretensão da ação
popular as ações cautelares são constitucional (que a ela especificainadmissíveis, só sendo possível mente não se aplica), ou de argüição
concebe-las no plano da asseguração de relevância (que não foi apresenda prova, do que, na espécie, não se tada), está incluída no rol das ações
e procedimentos de cuja decisão não
trata.
cabe recurso extraordinário (art.
308, V, do Regimento Interno vigente
E ilegal, ainda, a medida, pelo óbi- até 30-11-80, aplicável a este caso).
ce de não ser a Vasp pessoa jurídica
de direito público, nem autarquia
A medida cautelar tem mero
nem sociedade de economia mista, status legal e nem por aplicar-se em
caracterizando-se como sociedade processo que tenha por objeto instianónima, pessoa jurídica de direito tuto de direito adjetivo previsto na
privado, de natureza comercial, in- Constituição transmuda-se em matésusceUvel de ter seus atos tutelados ria constitucional superadora do óbipela via excepcional da ação popu- ce regimental.
lar, prevista no f 31, do art. 153, da
Constituição da República. (Fls. 172Isto posto, nego provimento ao
18.3 )
agravo regimental.
o relatório.
o meu voto.
222
R.T.J. — 100
EXTRATO DA ATA
Ag. 84.699— (AgRg) — SP — Rel.:
Min. Dedo Miranda. Agte.: Asa —
Agentes de Serviços Aeroviários
Ltda. (Advs.: Celso Neves e outro).
Agdos.: Juiz de Direito da 3? Vara
dos Feitos da Fazenda do Estado de
São Paulo, Viação Aérea São Paulo
S.A. — Vasp (Advs.: Luiz Carlos Bettiol, José Sado Pereira Ramos e outros).
Decisão: Negado provimento ao
Agravo Regimental. Unánime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Cordeiro Guerra,
Moreira Alves, Decio Miranda e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da
República, Dr. Mauro Leite Soares.
Brasília 10 de novembro de 1981 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 84.983 (Ag,Rg) — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira.
Agravante: Freios Gots Auto Partes S/A. — Agravada: União Federal.
Agravo. Despacho do Presidente do Tribunal a quo dando pela Intempestividade do recurso extraordinário. Ao agravante incumbe providenciar o traslado das peças essenciais à compreensão da controvérsia. Súmula n? 288. Agravo regimental desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata de
julgamentos e notas taquigráficas, à
unanimidade, negar provimento ao
Agravo Regimental.
Brasília, 10 de novembro de 1981 —
Cunha Peixoto, Presidente — Néri
da Silveira, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Néri da Silveira
(Relator): Trata-se de agravo regimental interposto por Freios Gots
Auto Partes S.A. do seguinte despacho, às fls. 38:
«Vistos, publicado o acórdão recorrido a 16.4.1980, foram interpostos embargos de declaração, em
22 do mesmo mês, sendo recebidos,
segundo o despacho agravado, a
6.8.1980. Há referência à interposição de novos embargos de declaração, no dia 12.8.1980, não conhecidos. O recurso extraordinário deu
entrada no TER a 5.2.1981, consoante está anotado, às fls. 17.
2 — Sucede, entretanto, que não
providenciou a agravante o traslado de peças essenciais à compreensão da controvérsia, nos termos
postos no despacho que teve por intempestivo o apelo extremo. Não
só não estão trasladados os acórdãos nos embargos de declaração,
como não se tem elemento documental a identificar, sequer, a data da publicação do aresto nos embargos de declaração, por último,
Interpostos. O despacho apenas
afirma a data da interposição a
12.8.1980. Não há prova da data da
publicação do acórdão que deles
não teria conhecido, nem de seu inteiro teor, a possibilitar o exame
do conteúdo da decisão, em lace
R.T.J. — 100
também do que sustenta a agravante (fls. 1/3).
223
de novo, embargado a 12.8.1980, então não conhecido, o recurso O apelo extremo é de 5.2.1981. Quando
ocorreu, entretanto, a publicação do
3 — Do exposto, nego seguimento acórdão dos segundos embargos de
ao agravo (Súmula n? 288)».
declaração? Como referi no despacho ora agravado, disso não há
noticia nos autos, o que se faria misSustenta a agravante, às fls. 42/43, ter,
o cômputo do tempo recurque não há falar em falta de peças sal, para
por
duas
vezes suspenso. Certo
essenciais à compreensão da contro- é que o recurso
extraordinário sovérsia, no traslado, porque o despa- mente deu entrada
na Corte a quo, a
cho presidencial, ao dar pela intem- 5.2.1981.
pestividade do recurso, entendeu que
aos segundos embargos declaratóDessa maneira, não providenciou
rios não têm o mérito de suspender o a agravante o traslado de peças esprazo para o recurso, por não terem senciais à compreensão da controsido conhecidos», não sendo esse o vérsia, em torno da intempestividaentendimento do Supremo Tribunal de do apelo. Sequer o inteiro teor do
Federal, em abono do que refere o acórdão, que dos segundos embargos
despacho no Ag. 75.493.
de declaração não conheceu, compõe
o traslado. Incide, dessarte, aqui, a
E o relatório.
Súmula n? 288.
Nego assim, provimento ao agravo
VOTO
regimental.
O Sr. Ministro Néri da Silveira
(Relator): O agravo não traz eleEXTRATO DA ATA
mentos novos, que possibilitem modificar o despacho, de fls. 38, ora imAg. 84.983 — (AgRg) — SP — Rel.:
pugnado.
Min. Néri da Silveira. Agte.: Freios
Gots Auto Partes S.A. (Advs.: José
Como nele se registrou, não há ele- Eduardo Rangel de Alckmin e oumento documental a identificar, se- tros, e Antonio Carlos de Almeida
quer, a data da publicação do aresto Castro). Agdo.: União Federal.
nos embargos de declaração, por último, interpostos. O despacho do
Decisão: Negaram provimento ao
ilustre Presidente do Colendo Tribu- Agravo
Regimental. Decisão unâninal a quo afirma a data da interposi- me.
ção desses segundos embargos declaratórios, como sendo 12.8.1980.
Presidência do Senhor Ministro
Não há, porém, prova da data da publicação do aresto que, deles, a se- Cunha Peixoto. Presentes à Sessão
guir, não tomou conhecimento. Se, os Senhores Ministros Soares Mtuloz,
pelo art. 538, do CPU, os embargos Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e
de declaração supendem o prazo pa- Néri da Silveira. Subprocuradorra a interposição de outros recursos, Geral da República o Dr. Mauro Leina espécie, sucedeu que, publicado o te Soares.
acórdão recorrido a 16.4.1980,
interpuseram-se embargos de declaBrasília, 10 de novembro de 1981 —
ração a 22 do mesmo mês. O aresto Antônio Carlos de Azevedo Braga,
nestes embargos declaratórios foi, Secretário.
224
R.T.J. - 100
AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 85.067 (AgRg) — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Cordeiro Guerra.
Agravante: Terraplanagem Globo S/C — Ltda. — Agravada: Companhia
Docas do Estado de São Paulo, sucessora da Companhia Docas de Santos.
— Taxa de armazenagem. Se o importador não usa da faculdade
de liberar, mediante garantia, as mercadorias retidas em instalações
portuárias alfandegadas, exclusivamente em virtude de litígio entre o
Interessado e a autoridade fiscal responderá pela armazenagem e
despesas de remoção, ainda que a decisão final do litígio lhe seja favorável. (Dl 517/69, art. 1? e 5?).
AgRg improvido.
ACORDAI)
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam• os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata de
julgamento e das notas taquigráficas, ti unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental.
Brasília, 09 de outubro de 1981 —
Djaci Falcão, Presidente — Cordeiro
Guerra, Relator.
RELATORIO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: O
v. acórdão impugnado está assim
ementado:
«Taxa de armazenagem. Importada a mercadoria sob o regime do
Decreto-lei 517/69, não deve o importador ou interessado aguardar
a solução do litígio fiscal, para só
depois liberar os efeitos armazenados, sob pena de arcar com a responsabilidade do pagamento das
taxas de armazenagem e remoção
(arts. 1? e 5?). O Decreto-Lei 5/66,
art. 28, de vigência anterior e
atualmente
revigorado
pelo
Decreto-lei 1.455/76 (art. 41), não
beneficia os casos intercorrentes.»
(f. 20).
Indeferido foi o apelo extraordinário nestes termos:
«Recorre extraordinariamente a
impetrante sustentando amparo
nas letras a e cl cio permissivo
constitucional ao argumento de
que o aresto recorrido negou vigência ao art. 29, inciso I, ff 1? e 2?, do
Decreto-lei n? 5, de 1966, e divergiu
do enunciado na Súmula 127 do
STF.
Entendo que razão desassiste à
recorrente.
Neste sentido adoto os fundamentos do voto condutor do acórdão ao proclamar:
«... á época vigia o Decreto-lei n?
517/69, segundo o qual cabia ao interessado diligenciar a liberação
da mercadoria retida em virtude
de litígio com a autoridade fiscal,
mediante a garantia da instância e
antes da decisão final (art. 1?).
Assim, não diligenciando, no sentido da lei, pouco importaria a sorte do litígio fiscal, mesmo que contrária à Fazenda, porque assim está dito no art. 5? da mesma lei,
verbis:
«Art. 5? Mesmo que a decisão final do litígio seja favorável ao interessado, este será responsável
pelo pagamento da armazenagem
R.T.J. — 100
225
e das despesas de remoção, se não
houver providenciado a liberação
da mercadoria, na forma estipulada no artigo 1?.»
«O v acórdão impugnado está
conforme à jurisprudência do STF
— RE 77.436 — SP, 1! Turma, relator Ministro Rodrigues Alcitmln,
13.9.74, assim ementado:
O critério diverso, anteriormente
instituído pelo Decreto-lei n? 5/66,
art. 29, e que atribula à União Federal o pagamento daquelas despesas, quando a questão fiscal fosse
decidida em favor do interessado
foi superado pela lei nova, o
Decreto-lei 517/69, com vigência
até a edição do Decreto-lei 1.455,
de 7 de abril de 1976, expressamente o revogou, no seu art. 41, restabelecendo a partir daí o sistema
anterior.
«Taxa de armazenagem. Se o
importador não usa a faculdade de
liberar, mediante garantia, as
mercadorias retidas em instalações portuárias alfandegadas exclusivamente em virtude de litígio
entre o interessado e a autoridade
fiscal, responderá pela armazenagem e despesas de remoção ainda
que a decisão final do litígio lhe seja favorável (Dl 517/69, art. 1?
e 5?).
Não vejo como descaracterizarse, na hipótese, o litígio ou a questão fiscal surgida quanto à isenção
da mercadoria importada, se a
mesma foi. levada a uma composição final, dentro dos cânones de indiscutível conflito de interesse, que
tanto poderiam ser resolvida em
procedimento formal ou pela autocomposição.»
Se a decisão impugnada não deixou de aplicar a regra incidente
sobre a espécie, e o fez com conotação de razoabilidade, não há que
falar em negativa de vigência (Súmula 400).
Quanto à Súmula indicada para
confronto (125) trata ela de tema
diverso do discutido nos presentes
autos (SúmUla 291).
Do exposto, nego seguimento ao
recurso.
Publique-se.
Brasília, 24 de novembro de 1980
— Ministro Jarbas Nobre, VicePresidente.» (fls. 28/30).
Ao agravo neguei seguimento nestes termos:
RE não conhecido.»
Assim, bem aplicada a Súmula
400 pelo despacho agravado, nego
seguimento ao recurso.» (f. 42t).
Insurge-se a agravante na inaplicabilidade à espécie dos arts. 1? e 5?
do Decreto-lei 517/69, pois não houve
litígio, mas simples questão levantada pela Receita Federal.
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra
(Relator): Realmente, na vigência
do art. 10, n? 02, do Decreto-lei
8.439/45 nenhuma armazenagem era
devida em caso de ser julgada improcedente a questão fiscal suscitada pela alfândega, Súmula 127, RE
76.836, São Paulo.
Mas, como adverte o professor Roberto Rosas (Direito Sumular, 2!
Edição, pág. 867): «O art. 5? do
Decreto-lei 517/1969, altera em parte
a Súmula.»
Ora, na espécie, incidia o Decretolei 517/69 e assim, bem invocado foi
o precedente do RE 77.436-SP.
226
— loo
Por outro lado, questão e litígio
são sinônimos, e negada a sinonimia,
a questão encontraria o óbice da
Súmula 279.
de São Paulo, Sucessora da Companhia Docas de Santos (Advs.: Aicino
Guedes da Silva e outros):
Decisão: Negado provimento ao
Agravo Regimental. Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Cordeiro Guerra,
Moreira Alves, Decio Miranda e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da
República, Dr. Mauro Leite Soares.
Brasília, 09 de outubro de 1981 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
Nego provimento ao agravo.
EXTRATO DA ATA
Ag. 85.067 — (AgRg) — SP —Rei:
Min. Cordeiro Guerra. Agte.: Terraplanagem Globo S/C — Ltda. (Advs.:
Paulo Seabra de Noronha e outro).
Agda.: Companhia Docas do Estado
EMBARGOS NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 85.391 — RJ
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto.
Embargante: Daisy Fernandes — Embargado: Luiz Carlos Segala de
Menezes.
— Concubinato — Sociedade de fato — Embargos de divergência.
Dissídio não caracterizado nos termos do art. 305, c/c. art. 309,
1?, ambos do RISTF.
Embargos de divergência não conhecidos.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão
plenária, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em
não conhecer do recurso de embargos de divergência.
Brasília, 08 de novembro de 1979 —
Xavier de Albuquerque, Presidente
— Cunha Peixoto, Relator.
existência de sociedade de fato, capaz de, a seu termo, ensejar a partilha dos bens dos concubinos, salvo
prova de que tenham sido conseguidos pelo esforço comum, seja em
forma de capital, quer por melo de
serviços prestados.
No caso concreto, após examinar
profundamente as provas coligadas,
concluiu o Tribunal local que, a despeito da vida em comum more
uxorio, não havia a concubina concorrido com seu esforço para a aquisição do bem imóvel questionado,
RELATÓRIO
pertencente unicamente ao amásio,
sozinho, arcara com o pagaO Sr. Ministro Cunha Peixoto: O que,
mento
do preço.
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro firmou entendimento de que o
A egrégia Segunda Turma deste
concubinato não implica só por si a colendo Supremo Tribunal Federal
R.T.J. — 100
conheceu do recurso extraordinário
interposto, mas lhe negam!! provimento, em acórdão que porta a ementa
seguinte:
*Concubinato. Sociedade de fato.
II — Para a existência da
sociedade de fato não se faz bastante o concubinato, ainda que
more uxorio. E mister comprovar
que o patrimônio adquirido proveio
do trabalho conjugado de ambos
(Precedentes do S.T.F.).
III — Ausente tal tipo de prova,
é Inviável o reconhecimento social
propugnado».
Contra este decisório, insurge-se
Dona Daisy Fernandes, sustentanto
não se harmonizar a tese acolhida
pelo venerando acórdão com a fixada em vários outros desta Suprema
Corte, dentre os quais indicou os
RREE. n?s 52.541, 37.491, 41.821,
52.217, 50.150, 70.271, 68.952, 65.243 e
43.903.
As decisões confinantes, segundo a
embargante, teriam firmado o entendimento de que basta o concubinato para, desde logo, haver a sociedade de fato entre os concubinos, capaz de obrigar à partilha do patrimônio, no caso de separação.
A Procuradoria-Geral da República manifesta-se pelo não conhecimento dos embargos, em parecer do
teor seguinte:
«1 — Ao julgar o RE n? 85.391-0,
proferiu a Egrégia Segunda Turma
acórdão assim ementado:
*Concubinato. Sociedade de fato.
II — Para a existência da
sociedade de fato não se faz bastante o concubinato, ainda que
more uxorio. E mister comprovar que o patrimônio adquirido
proveio do trabalho conjugado de
ambos (precedentes do S.T.F.).
227
III — Ausente tal tipo de prova, é inviável o reconhecimento
social propugnado.
IV — Recurso conhecido pelo
dissídio pretoriano, mas Improvido.
Voto vencido» (fls. 392).
2 — Irresignada, Daisy Fernandes opôs embargos de divergência
asserindo que a tese acolhida pelo
r. acórdão embargado não se harmoniza com a fixada em vários outros desta Suprema Corte, dentre
os quais indicou os RE n?s 52.541,
37.491, 41.821, 52.217, 50.150, 70.271,
68.952, 65.243 e 53.903.
3 — Os embargos foram impugnados ( fls. 416/9), e o impugnante
pediu o seu não conhecimento ou,
se conhecido, o seu improvimento.
4 — Parece-nos que o v. acórdão
embargado não discrepa da orientação da Súmula n? 380 e amoldase à que fixou o Plenário deste Excelso Pretório a quando do julgamento do ERE n? 81.012 — RJ.
5 — Com efeito, o v. acórdão não
conflito com aqueles que a embargante trouxe à colação no que se
refere à possibilidade de partilha
dos bens quando provada a formação do património pelo esforço
comum. 6 — Se, pois, provada fosse a sociedade de fato e a formação do
património pela colaboração de
ambos, haveria de ser feita a partilha: como, porém, apreciando soberanamente as provas, decidiu o
Colendo Tribunal de Justiça que
tal sociedade não resultou provada, e que o patrimônio não foi formado pelo esforço comum, parecenos que o v. acórdão embargado
não se atrito com os trazfdos à colação pela embargante, nem com a
Súmula 380.
228
R.T.J. — 100
7 — Diante do exposto, evidenciada está a inexistência de divergência, razão por que opinamos no
sentido de que não sejam conhecidos os embargos».
E o relatório.
A companheira ou concubina que
prestou serviço por largos anos ao
de cujus, ajudando-o no granjeio
dos meios de subsistência e contribuindo para a formação de seu patrimônio, faz jus a uma remuneração, porque tais serviços não se
presumem gratuitos».
VOTO
RE. n? 52.217:
O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Re«Tendo vivido vários anos com o
lator): 1 — Ao julgar o RE n? 85.391,
amásio, já viúvo, com ele coabiproferiu a Egrégia Segunda Turma
tando, ajudando-o no trabalho diáacórdão assim ementado:
rio, tem direito a concubina de ser
indenizada, se o companheiro, ao
«Concubinato. Sociedade de fato.
morrer, sem herdeiros necessários, nada lhe deixa».
II — Para a existência da
sociedade de fato não se faz basRE. ri? 70.271:
tante o concubinato, ainda que
«Companheira. Serviços doméstimore =orlo. 2 mister comprovar
cos. Faz jus à remuneração por
que o patrimônio adquirido proveio
serviços domésticos ou outros lícido trabalho conjugado de ambos
tos e de natureza econômica, a mu(Precedentes do S.T.F.).
lher solteira que viveu sob o mesII — Ausente tal tipo de prova, é
mo teto, durante anos com homem
inviável o reconhecimento social
solteiro, de quem engravidou, em
propugnado».
união livre e honesta».
A embargante interpôs embargos
O RE. n? 68.952, a' seu turno,
de divergência, apontando como dis- assina-la:
sidentes nove acórdãos, todos trazi«Concubinato. Já esta superada
dos à colação através de suas emena divergência jurisprudencial sotas. Destes, seis mostram, à primeibre os efeitos do concubinato,
ra leitura, que se amoldam ao deciquando há efetiva prestação de
dido no acórdão embargado, pois
serviços da companheira ao concuacentuam haver prestado a concubibinário ou sociedade de fato entre
na serviços. Com efeito, no acórdão
ambos. O Pleno e as Turmas do
proferido no RE n? 37.491, está escriSupremo Tribunal Federal, em suto:
cessivos e tranqüilos pronunciamentos, reconheceram direito,
«São indenizáveis os serviços doem ambos os casos, à mulher que
mésticos prestados pela compavive em união livre e estável com
nheira concubina durante largos
o homem, prestando-lhe serviços
anos de vida em comum.
rurais, domésticos ou econômicos».
Tal entendimento filia-se à meComo se verifica, todos ressaltam
lhor doutrina e ajusta-se com ade- a prestação
de serviços por parte da
quação à lei».
concubina, elemento ausente no caso
objeto do RE. n? 85.391, ora embarTambém o RE. n? 41.821:
«Concubina. Serviços prestados gado.
ao companheiro. Direito à remuneA ementa do acórdão proferido no
ração.
RE. n? 60.657, em que foi relator o
R.T.J. — 100
eminente Ministro Adalício Nogueira, discrepa da decisão embargada.
Acontece, porém, que a leitura de todo o voto do eminente Ministro
Adiando Nogueira, que traduziu a
decisão, mostra que também este se
ajusta à tese do acórdão embargado.
Com efeito, além do relator haver
mencionado a Súmula n? 318, que
também se refere ao «património
adquirido com o esforço comum»,
declarou, expressamente, no voto:
«A tese central deste é se a concubina deve ser indenizada pelo
seu companheiro, em razão dos
serviços que lhe prestou, durante
muitos anos, compondo ambos
uma verdadeira sociedade de fato».
Por sua vez, o acórdão proferido
no RE n? 52.541, na ementa trazido à
colação, é vago e não diverge também da decisão embargada, verbis:
«Concubina. Legitimidade de
parte para pleitear alimentos por
morte do amásio, que provia à sua
manutenção e do qual tivera dois
filhos ainda menores.
O concubinato, embora à margem da família constituída, nasce
de circunstâncias imperiosas da vivência social, e gera interesses que
a moral não repele e só não se concilia como fato gerador de direito
se, em suas conseqüências, entra
em choque com situações jurídicas
Já constituídas à sombra da lei».
Por último, vem o RE. n? 43.903.
Este, embora pareça divergir do
acórdão embargado, não se presta
ao confronto, já que foi trazido aos
autos apenas pela sua ementa e sem
possibilidade de ser conferido com a
decisão embargado, uma vez que a
embargante não indicou o repertório
em que foi publicado e, por mais esforço que fizéssemos, não conseguimos localizá-lo.
229
Ora, adverte o art. 309, § 1?, combinado com o art. 305, ser dever do
embargante apresentar os acórdãos
divergentes por certidão ou cópia autenticada, ou mediante citação do repositório de jurisprudência oficial ou
autorizado, com transcrição dos trechos que configurem o dissídio, mencionando as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os julgados
confrontados.
Relegando a advertência regimental, a embargante, sobre não ter
mencionado o repositório de jurisprudência no qual se encontra inserida a decisão proferida no RE. n?
43.903, limitou-se a reproduzir uma
passagem do voto do eminente Ministro Vilas Boas, onde estaria a divergência pretendida.
Não satisfez ela, pois, os pressupostos regimentais, sendo imprestável ao fim pretendido.
de notar que a própria embargente, posto tenha, no capítulo
«Princípios dominantes do STF», declorado: dê em trecho do douto voto» (do eminente Ministro Vilas
Boas), não o compila no Capítulo
«Dissídio de Julgados», entre as decisões indicadas como divergentes
do acórdão embargado.
Assim, como assinala o parecer
da douta Procuradoria-Geral da República, «o V. acórdão não conflito
com aqueles que o embargante trouxe à colação no que se refere à possibilidade de partilha dos bens
quando provada a formação do patrimônio pelo esforço comum.»
Acresce que o acórdão do Tribunal
de Justiça do Rio de Janeiro, integrado no voto do relator, eminente
Ministro Thompson Flores, ressalta
uma circunstância inexistente nas
decisões apontadas como divergentes, pois, enquanto estas salientam a contribuição de serviços da
230
R.T.J. — 100
concubina, aquele assinala que ela
auferia dos ganhos de seu amante
com a manutenção de suas duas filhas.
Diz o acórdão:
«... a presunção que se tem é a
de que a apelada, com suas agregadas, constltuia pesado ânus no
orçamento do apelante; presumivelmente, custava bem caro ao
apelante aquele concubinato».
Por estes motivos, não conheço
dos embargos.
Dutra e outro). (Dec. Embda.: 2!
Turma, em 05.12.1978).
Decisão: Não se conheceu do recurso de embargos de divergência.
Decisão unânime. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Min. Antonio Neder.
Presidência do Senhor Min. Xavier
de Albuquerque.
Presidência do Senhor Ministro
Antonio Neder. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Djaci Falcão,
Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Cordeiro Guerra, Moreira
Alves, Cunha Peixoto, Soares Mtuloz,
Dedo Miranda e Rafael Mayer. AuEXTRATO DA ATA
licenciado, o Sr. Ministro LeiERE: 85.391 — RJ — Rel.: Min. sente,
tão
de
Abreu. Procurador-Geral da
Cunha Peixoto. Embte.: Daisy Fer- República,
Dr. Firmino Ferreira
nandes. (Adv.: José Guilherme Ville- Paz.
la). Embdo.: Luiz Carlos Segala de
Brasília, 08 de novembro de 1979 —
Menezes. (Advs.: Mauro Calderaro
da Silva Travassos, Sérgio Gonzaga Alberto Veronese Aguiar, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 86.781 — BA
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto.
Recorrente: Noêmia Martins do Sacramento Vencimento (Espólio de) —
Recorrido: Maurício José Raynal.
Inventário — Honorários advocatícios. Arbitramento judicial independentemente de citação dos herdeiros e sem audiência do Ministério Público, apesar da existência de menores interessados. Nulidade.
Recurso Extraordinário conhecido e provido.
ACORDA°
RELATORIO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto —
Vistos, relatados e discutidos estes Mauricio José Raynal, funcionou,
autos, acordam os Ministros da Pri- em quase todo o processo, como admeira Turma do Supremo Tribunal vogado do inventário de Noêmia
Federal, na conformidade da ata do Martins do Sacramento Vencimento,
julgamento e das notas taquigráfi- e, revogado seu mandato, requereu
cas, por unanimidade, de votos, em arbitramento de honorários, os quais
conhecer e prover o recurso.
foram fixados em 6% sobre o valor
do monte, tomando-se por base o
Brasília, 4 de dezembro de 1979 — preço da venda do terreno.
Interposta apelação por parte do
Thompson Flores — Presidente —
espólio, o Tribunal de Justiça da BaCunha Peixoto — Relator.
R.T.J. — 100
hia deu provimento parcial ao recurso para arbitrar os honorários em
4% sobre o valor da venda do terreno e mais 2% sobre o valor que coube a cada um dos herdeiros.
Irresignados, os herdeiros de Noêmia Martins do Sacramento Vencimento interpuseram recurso extraordinário com fundamento na letra a do permissivo constitucional,
alegando como violados os arts. 113,
(1 2? e 275, II, letra m do Código de
Processo Civil, que prevê o procedimento sumarissimo como meio hábil
à cobrança dos honorários profissionais. Argumentam, ainda, que o Ministério Público não foi ouvido, havendo, portanto, violação dos arts.
82, I e 83, I do Código de Processo
Civil, já que há menores no inventário, que não haviam outorgado procuração ao recorrido.
A Procuradoria-Geral da República manifesta-se pelo conhecimento e
provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto
(Relator): — O Tribunal de Justiça
da Bahla, sem dúvida, negou vigência aos dispositivos invocados pelos
recorrentes, quando, sem forma e figura de juizo, arbitrou os honorários
do advogado no inventário de Noémia Martins do Sacramento Vencimento.
Demonstra-se lucidamente o parecer da Procuradoria-Geral da República, cuja fundamentação se me afigura irrepreensível. Ei-la:
«Não pode, a nosso ver, prevalecer o arbitramento dos honorários
advocaticlos, fixados pelo MM.
Juiz singular, sem forma nem figura de juizo, em 6% sobre o valor do
monte, percentual alterado pelo
eg. Tribunal baiano, que o estipu-
231
lou em 4% sobre o valor da venda
do terreno e mais 2% sobre o quinhão de cada herdeiro. (f. 155).
Ocorre que, entre estes, existiam
dois menores, conforme fazem prova inconcussa as certidões acostadas às fls. 53 e 54 dos autos, menores estes, entretanto, que não se fizeram representar por ocasião do
arbitramento que o MM. Juiz mandou preceder de laudo pericial oficial, sem facultar aos incapazes a
designação ao menos de assistentes técnicos.
Ademais, não funcionou, ao ensejo de tal fixação, o representante
do Ministério Público, como recomenda a lei, no art. 82 do CPC, que
determina a intervenção do
Pitrquet nas causas onde haja, como no caso, interesses de incapazes.
Como não havia contrato escrito
de honorários, não nos parece
possível fossem estes arbitrados no
processo de inventário, a não ser
com anuência expressa de todos os
interessados, o que na espécie não
ocorreu.
Impunha-se, a nosso ver, fossem
eles postulados em ação própria,
perante o Juizo competente, após
regular citação das partes e a interveniência oportuna do Ministério Público.
O que não se concebe, data
venta, ,é que, a pretexto de abreviar o curso do processo, se omita
o cumprimento de formalidades essenciais, pondo em risco os direitos
impostergáveis de menores absolutamente incapazes.
Nestas condições, o Ministério
Público Federal, atento aos deveres do seu cargo, pede o provimento do recurso extraordinário, a fim
232
R.T.J. — 100
de que se casse o arbitramento dos
honorários advocaticios feito nestes autos, ressalvado, evidentemente, ao interessado perseguir o
seu direito pelas vias judiciais próprias.»
EXTRATO DA ATA
RE 86.781 — BA — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Recte.: Noêmia Martins
do Sacramento Vencimento (espólio
de). (Adv.: Marta Maria Mónaco Silva Meireles). Recdo.: Mauricio José
Não há dúvida de que a falta de Raynal. (Adv.: em causa própria).
Decisão: Conhecido e provido, deaudiência do Ministério Público, em
processo no qual figuram menores, e cisão unânime.
a ausência de citação dos herdeiros
Presidência do Sr. Ministro Thomppara participarem do arbitramento, son Flores. Presentes à Sessão
violam os dispositivos processuais os Senhores Ministros Xavier de
invocados pelos recorrentes.
Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares
Mtuloz e Rafael Mayer. SubprocuraPor estes motivos, conheço do re- dor-Geral da República, o Dr. Francurso e lhe dou provimento para cisco de Assis Toledo.
anular o arbitramento em questão,
Brasília, 4 de dezembro de 1979 —
nos termos do parecer da Procura- Antônio Carlos de Azevedo Braga —
doria-Geral da República.
Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 87.255 — RJ
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto.
Recorrente: Banco Nacional Brasileiro de Investimentos S/A — Recorrido: Juizo de Direito da 17? Vara Civel.
Falência — Arrecadação, pelo síndico, de bens apreendidos em
benefício de credor da firma que velo a falir. Mandado de segurança
objetivando tornar sem efeito a arrecadação. Meio processual impróprio, nos termos do art. 79 da lei de falências, que prevê expressamente a via de embargos de terceiro para o fim collmado pelo impetrante.
Recurso extraordinário não conhecido.
ACOFtak0
Vistos, relatados e discutidos estes
autos acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade -da ata do
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em
não conhecer do recurso
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto:
Banco Nacional Brasileiro de InveStimentos S/A, credor fiduciário da
«Cia Metropolitana de Construções»,
obteve do Juizo da 4? Vara Civel a
busca e apreensão das máquinas
alienadas.
Brasília, 05 de fevereiro de 1980 —
Sobrevindo a falência da devedora
Xavier de Albuquerque, Presidente . fiduciante, foi o processo referente à
— Cunha Peixoto, Relator.
busca e apreensão remetido ao Juízo
233
R.T.J. — 100
da Falência e, em seguida, arrecadar
dos pelo síndico os bens que haviiiin
sido apreendidos por ordem do Juiz
do Cível.
O credor, então, impetrou mandado de segurança, objetivando tornar
sem efeito a arrecadação procedida
pelo síndico e, conseqüentemente,
reaver os referidos bens.
O Tribunal de Justiça do Estado
do Rio de Janeiro denegou a segurança, eiti decisão do teor seguinte:
a••• denego a medida. É matéria
assentada na jurisprudência pátria
a de que não se dará mandado de
segurança de decisão judicial
quando dela caiba recurso com
efeito suspensivo.
Neste sentido é a Súmula 267.
«Não cabe Mandado de Segurança contra ato judicial passível
de recurso ou correção».
Por sua vez o art. 79 da Lel de
Falências é expresso no assentar
que:
«Art. 79 — Aquele que sofrer
turbação ou esbulho na sua posse
ou direito, por efeito de arrecadação ou de seqüestro, poderá, se
nió preferir usar do pedido de
restituição, defender os seus bens
por via de embargos de terceiTO».
No caso dos autos, foram arrecados pelo Dr. Juiz da Falência, em
poder do Impetrante, entregues que
foram pelo Juízo original, as bens
gravados com alienação fiduciária.
Cabia, assim, ao impetrante, o remédio normal dos embargos de
terceiro, que, malgrado não sejam
um recurso, são instrumento legal
específico, já que não quis usar da
faculdade de pedir a restituição,
inobstante tenha aceitado, o juízo
falimentar, deixando de recorrer
das decisões que, com base no art.
7? da Lel n? 7.661/45, determina-
ram a remessa dos autos de busca
e apreensão ao Dr. Juiz da Falência.
Observe-se que a arrecadação foi
feita quando os bens já se encontravam em poder do impetrante
em virtude de simples mandados
de busca e apreensão, sem julgamento final e antes mesmo de delimitada a angularidade procedimental — art. 264 do Cód. de Processo Civil.
Os embargos seriam, assim, a
maneira de corrigir o ato da arrecadação, comportando discussão
ampla com cuidadoso exame da
matéria entre as próprias partes,
diretamente, o que inocorre no
Mandado de Segurança, onde os interessados apenas intervêm, sem
possibilidade de produção de provas em audiência e outras garantias processuais que, na falência,
por sua complexidade, repercussão
e interesses de outros credores, devem ser preservados». (fls.
218/219).
Irresignada, a vencida inter" recurso extraordinário com fundamento na letra d do permissivo constitucional, alegando haver o Tribunal de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro
divergido da Súmula nt 267.
A Procuradoria-Geral da República
manifesta-se no sentido do não conhecimento do recurso.
E o relatório.*
VOTO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): Não conheço do recurso extraordinário. A decisão recorrida
não dissentiu da Súmula 267, que
declara não caber mandado de segurança contra ato judicial passível de
recurso ou correção.
A decisão não teve apenas este
fundamento. Ao contrário: o acórdão, na verdade, se referiu à men-
234
R.T.J. — 100
cionada Súmula, mas, em seguida,
afirmou aplicar à espécie o art. 79
da Lei de Falências, que prevê, expressamente, a via de embargos de
terceiro àquele que sofrer turbação
ou esbulho na sua posse ou direito,
em caso de arrecadação ou seqüestro de bens em processo falimentar.
Ora, fixando a Lel de Falências o
remédio próprio para o objetivo colimado pelo terceiro que se diz prejudicado com a arrecadação de bens pelo síndico, certamente não lhe cabe
abandonar esta medida para optar
pelo mandado de segurança.
Não conheço do recurso.
Brasileiro de Investimentos S/A
(Adv.: Nelson Ribeiro Alves Filho).
Recdo.: Juízo de Direito da 17! Vara
Cível.
Decisão: Não conhecido, unanimemente.
EXTRATO DA ATA
RE 87.255 — RJ — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Reate.: Banco Nacional
Brasília, 5 de fevereiro de 1980 —
António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
Presidência do Sr. Ministro Xavier
de Albuquerque, na ausência justificada do Sr. Ministro Thompson Flores — Presidente. Presentes á Sessão os Senhores Ministros Cunha
Peixoto, Soares Mufioz e Rafael Mayer. Subprocurador-Gerai da República, Dr. Francisco de Assis Toledo.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 88.960 — RJ
(Tribunal Pleno)
Relatar: O Sr. Ministro Leitão de Abreu.
Recorrentes: 1?) Maria Helena Barreto de Carvalho — 2?) Estado do Rio
de Janeiro — Recorridos: Os mesmos.
Desapropriação. 1 — Correção monetária. Incide sobre a parcela
de 20% mantida em depósito. Recurso extraordinário do Estado não
conhecido. 2 -- Juros moratórios e compensatórios. Incidem cumulativamente, sendo que estes á taxa de 12% ao ano. Precedente: RE n?
90.656, Pleno de 26-9-1980. 3 — Honorários de advogado. Para seu cálculo, incluem-se, na indenização, ambas as partes dos juros. Não cabe, porém, a elevação do seu percentual. Recurso extraordinário da
desapropriada conhecido e parcialmente provido.
ACORDAO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, reunidos
em sessão plenária, na conformidade com a ata de julgamentos e notas
taquigráficas, em conhecer do recurso da 1! Recorrente, e dar-lhe provimento nos termos do voto do Relator. Não conhecer do recurso do Estado do Rio de Janeiro, unanimemente.
Brasília, 24 de setembro de 1980 —
Antonio Neder, Presidente — Leitão
de Abreu, Relator.
RELATORIO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu:
Em desapropriação, fixado o preço,
a sentença ainda concedeu: a) correção monetária do saldo não levantado; b) juros compensatórios, 6% ao
ano, a partir da data da imissão de
posse até o efetivo pagamento; c) ju-
— 100
ros moratórios, 6% ao ano, a partir
do trânsito em julgado e sobre o saldo não levantado e devidamente corrigido; d) 5% de honorários sobre a
diferença entre a oferta e a indenização, mas sem os juros (v. fs. 180/183
e fls. 190/191). O acórdão excluiu da
condenação apenas os juros moratórios (fls. 243). Subiram os autos,
com recurso extraordinário de ambas as partes. A Procuradoria-Geral
da República, em parecer do Procurador Moacir Antonio Machado da
Silva, assim se manifestou:
*... Insurge-se o Estado contra a
incidência de correção sobre o saldo de vinte por cento não levantado pelo expropriado, alegando
ofensa ao art. 33 do Decreto-lei n?
3.365, de 1941, e divergência com
julgados de outros Tribunais do
Pais.
«Por seu turno, pede a expropriada a inclusão de juros moreiarios, a elevação da taxa de juros
compensatórios de 6% para 12% ao
ano, a elevação do percentual de
honorários de advogado e a inclusão dos juros na indenização, para
efeito de cálculo da diferença sobre que haverá de incidir a mesma
verba de honorários. Sustenta violação dos arts. 1.062, 1.064 e 1.536,
2?, do Código Civil, e 20 do Código
de Processo Civil, além de divergência jurisprudencial (Ap. Cíveis
33.888 e 32.365, RE 69.798, RE
85.209 e RE n? 77.614, cujos cópias
constam de fls. 252 a 289 dos autos).
«Não merece prosperar o recurso do Estado, embora esteja demonstrada a divergência. A jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal é no sentido de que a atualização deve ser feita até à data do
efetivo pagamento do preço, não
podendo ser considerado como tal
a retenção necessária de uma parcela da quantia depositada no inte-
235
resse do expropriante (RE 82.122,
DJ de 22.10.76, p. 9.228; RE 73.564,
RTJ 61/288, etc )
«Merece provimento parcial o
recurso da expropriada. A jurisprudência dominante no Supremo
Tribunal Federal é no sentido de
que os juros compensatórios e os
moratórios, porque resultantes de
fundamentos distintos, podem incidir cumulativamente (RE 89.211,
DJ de 11.10.78; RE 80.718, DJ de
31.12.76, p. 11.238).
«Por igual, os honorários de advogado devem ser calculados sobre
a diferença entre a oferta e a indenização, ambas corrigidas monetariamente. O conceito de indenização abrange não só o valor do bem
expropriado, como também os juros e demais parcelas mandadas
pagar (RE 79.855, RE 77.937 e RE
78.196, ai de 06.05.74, p. 2.896; RE
88.223, etc.).
«Não cabe, porém, elevação do
percentual para o cálculo dos mesmos honorários de advogado. O arbitramento dessa verba nas desapropriações tem regulamentação
específica (Decreto-lei 3.365/41,
art. 27, 1?), não se aplicando o
art. 20 do Código de Processo Civil
(RE 82.909, RTJ 76/659).
«Quanto aos juros compensatórios, é certo que o Supremo Tribunal Federal tem, em alguns casos,
elevado o percentual de seis para
doze por cento. Parece-nos, porém,
que a fixação da taxa de juros
compensatórios é matéria ligada it
maior ou menor rentabilidade do
bem expropriado, existindo julgados em ambos os sentidos. E razoável, assim, a conclusão do acórdão, fixando-os em seis por cento.
«Pelo conhecimento, mas pelo
desprovimento do recurso do Estado e pelo conhecimento e provimento parcial do apelo da expro-
236
R.T.J. — 100
priada, para inclusão dos juros
moratórios e para que ambas as
parcelas de juros integrem a indenização, para efeito de cálculo dos
honorários de advogado.» (fls.
329/330)
Não procede todavia, como entende
o parecer, a pretensão da recorrente no sentido de obter elevação do
percentual dos honorários.
Em resumo: não conheço do segundo recurso, que é do Estado do
Rio de Janeiro; conheço, entretanto,
do primeiro recurso, que é da desapropriada, e lhe dou parcial proviVOTO
mento para: a) restabelecer a sentença quanto aos juros moratórios;
O Sr. Ministro Leitão de Abreu b) determinar que se incluam ambas
(Relator): Recorre o Estado- as partes dos juros na indenização,
desapropriante contra a incidência para o cálculo dos honorários de adda correção monetária «sobre a par- vogado; e c) elevar a taxa dos juros
te do preço depositado e não levanta- compensatórios para 12% ao ano.
do». De acordo com a jurisprudência
do Supremo Tribunal, a correção
monetária, sobre essa parte do preEXTRATO DA ATA
ço, é cabível, razão pela qual não conheço do recurso do Estado, segundo
recorrente.
RE 88.960 — RJ — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Rectes.: 1?) Maria HeDas pretensões da expropriada, lena Barreto de Carvalho (Adv.:
em número de quatro, o parecer Adolpho José Fernandes); 2?) Estafavorável ao conhecimento do recur- do do Rio de Janeiro (Adv.: Luiz
so por ela interposto, manifesta-se Carlos de Azevedo Barros). Recdos.:
pelo deferimento de duas: inclusão Os mesmos.
na indenização dos juros moratórios
e adição de ambas as parcelas de juDecisão: Conheceu-se do recurso
ros — moratórios e compensatórios
— á indenização, para que sobre elas da it Recorrente, e se lhe deu provirecaiam honorários. Ainda de acordo mento nos termos do voto do Relacom a orientação desta Corte, são tor. Não se conheceu do recurso do
imputáveis na indenização juros mo- Estado do Rio de Janeiro. Decisão
ratórios e compensatórios, aqueles a uniforme.
partir do trânsito em julgado da sentença e estes a contar da imissão de
Presidência do Senhor Ministro
posse, ambos até o pagamento. co- - Antonio
Neder. Presentes à Sessão
mo os juros compensatórios, nesses os Senhores
Ministros Djaci Falcão,
termos, foram concedidos pela deci- Thompson Flores,
de Albusão recorrida, porém não os morató- querque, Leitão de Xavier
Abreu,
Cordeiro
rios, cumpre reformar o acórdão, Guerra, Moreira Alves, Cunha
Peineste ponto, para reconhecer-se á xoto, Soares Muhoz, Decio Miranda
desapropriada, consoante o critério e Rafael Mayer. Procurador-Geral
já exposto, direito aos juros morató- da República, substituto, o Dr. Franrios. Assiste razão á expropriada, cisco de Assis Toledo.
ainda, no concernente á elevação dos
juros compensatórios de 6% para
12%, pois nesse sentido se firmou a
Brasília, 24 de setembro de 1980 —
jurisprudência do Supremo Tribunal. Alberto Veronese Aguiar, Secretário.
E o relatório.
R.T.J. — 100
237
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 89.700 — RJ
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão.
Recorrente: Horácio Moreira Rega — Recorrido: Estado do Rio de Janeiro.
Serventuário da Justiça. Tratando-se, como se trata de cumulação sucessiva de pedidos, o acolhimento de um depende, sem dúvida,
do acolhimento do outro de conteúdo básico. Na espécie, transitou em
julgado a decisão que declarou válida a aposentadoria do recorrente.
Ainda que possível transpor o óbice da coisa julgada, tnocorre ofensa
aos princípios do direito adquirido ou da isonomia. Recurso extraordinário não conhecido.
ACORDA°
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade
de votos e na conformidade da ata
do julgamento e das notas taquigráficas, não conhecer do recurso.
Brasília. 30 de setembro de 1980. —
Djaci Falcão, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Djaci Falcão: Diz o
despacho que admitiu o recurso:
«Com base na alínea a do permissivo, Horácio Moreira Rega interpôs recurso extraordinário (fis.
167/174) contra o acórdão de fls.
161/5, cuja ementa é a seguinte:
«Escrevente juramentado que
exercia, interinamente, em substituição ao respectivo titular, o
cargo de Oficial do Registro de
Distribuição, extinto pela Lei 11?
5.010/966, que organizou a Justiça
Federal da 1! Instancia.
Não faz jus à disponibilidade,
nem ao aproveitamento em serventia equivalente não oficializada.
Validade da sua aposentadoria
voluntária estreme do alegado
vicio de coação.
Inaplicabilidade do principio
da isonomia.»
Alega o recorrente violação do
artigo 100, único da Constituição,
por lhe ter sido denegada a disponibilidade, de aplicação imperativa; transgressão do artigo 153, 3?,
também da lel maior, pois o aresto
lhe negou o direito adquirido ser
investido em cargo equivalente, na
forma do artigo 46, da Lel 89/64;
violação do artigo 153,
1?, da
Constituição, que consagra o
principio da isonomia, pois o acórdão recorrido distinguiu entre situações que guardam entre si
vínculos de identidade, repelindo a
aplicação ao autor da citada lei
489, quando aos outros assemelhados foi aplicado esse diploma legal.
A matéria, tal como foi exposta,
unicamente de direito impondose a admissão do apelo em atendimento à recomendação do Supremo Tribunal Federal, constante do
acórdão proferido no Agravo de
Instrumento n? 34.028 e publicado
na 'Revista Trimestral de Jurisprudência, volume 38, pg. 574, tendo em vista que aquela Corte ainda
firmou jurisprudência em torno do
tema.
238
R.T.J. — 100
São estas as razões que me levam a admitir o recurso pela
alínea a.
Prossiga-se.
Rio de Janeiro, 4 de abril de 1978
— Des. Marcelo Santiago Costa,
Presidente» (fls. 189 a 190).
Com as razões de fls. 193 a 204 e
contra-razões de fls. 207 a 210 subiu o
processo a esta Corte.
A Procuradoria-Geral da República emitiu o seguinte parecer•
«1. — Escrevente juramentado
que exercia, interinamente, o cargo de Oficial de Registro de Distribuição, em substituição ao respectivo titular, ajuizou ação contra o
Estado do Rio de Janeiro, visando
à decretação de nulidade do ato de
sua aposentadoria e ao seu aproveitamento como titular em outra
serventia ou à concessão de disponibilidade remunerada em relação
a esse cargo.
— Alegou o autor, em suma,
que, extinto o cargo exercido em
substituição, com a aposentadoria
compulsória de seu titular (Lei n?
5.010, de 1966, art. 86, ji 1?), requereu seu aproveitamento em outra
serventia, com base no art. 46 da
Lei estadual n? 489, de 1964, mas
sua pretensão foi indeferida ante à
inexistência de vaga, de forma
que, sem nenhuma remuneração
desde 2.6.73, foi compelido a pedir
aposentadoria. Acrescentou, por
fim, que tinha direito à disponibilidade remunerada, por força do
art. 100, parágrafo único, da Constituição Federal.
— A decisão de primeiro grau
declarou a nulidade do ato de aposentadoria e determinou o aproveitamento ou a colocação do autor
em disponibilidade remunerada. O
Eg. Tribunal de Justiça do Estado,
porém, concluiu pela validade da
aposentadoria voluntária, além de
que o servidor não sendo titular do
cargo extinto, não fazia jus à disponibilidade.
— Funda-se o recurso extraordinário na letra a do permissivo
constitucional, por ofensa aos artigos 100, parágrafo único, .e 153,
1?, da Carta Magna. Sustenta o recorrente que era funcionário estável nomeado em caráter efetivd
desde 1940, razão por que, em face
do que dispõe o art. 46 da Lei estadual n? 489, de 1964, tem direito de
obter cargo equivalente em outra
serventia ou ser posto em disponibilidade, tanto mais quando outros
servidores, em idêntica situação,
foram aproveitados.
— Não merece prosperar o
apelo. De inicio, como bem observa a Procuradoria-Geral do Estado, invocando lição de José Carlos
Barbosa Moreira (O Novo..., 2!
ed., v. 1, p. 26), trata-se de cumulação sucessiva de pedidos, em que
o acolhimento da pretensão final —
aproveitamento ou disponibilidade
remunerada — depende da decretação de nulidade da aposentadoria. Ora, havendo o acórdão recorrido concluído pela validade do ato
de inativação e dirigindo-se o recurso apenas contra a parte da decisão que indeferiu o pedido de
aproveitamento ou disponibilidade,
a questão da legitimidade da aposentadoria passou pelo crivo da
coisa julgada, prejudicando a análise da questão jurídica suscitada
no recurso.
6. — Ademais, inadmissível a alegação de vício no ato de aposentadoria. A extinção do Cartório se
deu em 2 de junho e já em 9 de julho o recorrente requeria sua aposentadoria. Se seu direito ao aproveitamento decorria do art. 46 da
Lei est. n? 489, de 1964, por que não
pediu a disponibilidade remunera-
R.T.J. — 100
da, em lugar da aposentadoria, em
face do indeferimento por inexistência de vaga?
— Acresce que o direito à disponibilidade só existe para o extitular do cargo extinto, não para
aquele que o exerce em caráter interino. O recorrente tinha efetividade no cargo de Escrevente Juramentado e apenas exercia, em
substituição, o cargo de Oficial do
Registro de Distribuição.
— Inadmissível a invocação do
princípio da isonomia, que pressupõe a existência de direitos em face da lel. No caso, a nomeação de
outros serventuários, como concluiu o acórdão, se fez ao arrepio
da Lei n? 489, de 1964.
— Por fim, abstraída a questão da validade da aposentadoria
do recorrente, toda a matéria residual prende-se à interpretação do
artigo 48 da Lei estadual n? 489, de
1964, que não autoriza a abertura
da instância extraordinária (Súmula 280).
— Pelo não conhecimento.
Brasília, 20 de novembro de 1979.
— Moacir Antonio Machado da
Silva, Procurador da República
Aprovo: Mauro Leite Soares,
Subprocurador-Geral da República» (fls. 216 a 218)
VOTO
O Sr. Ministro Djaci Falcão (Relator): A decisão atacada pelo recorrente tem o seguinte teor:
«Relatório
Adio Ordinária intentada pelo
primeiro apelante com duplo objetivo — anular o ato de sua aposentadoria voluntária e obter investidura em outro cargo equivalente e
correspondente ao que ocupava, ou
seja, uma serventia não oficializada, em caráter efetivo.
239
Exercia ele, interinamente, em
substituição ao respectivo titular, o
cargo de Oficial do 9? Ofício de Registro de Distribuição, para o qual
foi nomeado a 15.6;1951, quando sobreveio a Lei n? 5.010, de 30.5.1966
(que organizou a Justiça Federal
de I? instância), cujo art. 86 determinou a extinção dos cargos de
distribuidores das extintas Varas
da Fazenda Pública Federal no antigo Estado da Guanabara, à medida que se vagassem. Com a aposentadoria compulsória do seu titular, ocorrida em 2-6-1973, ficou extinto o cargo interinamente ocupado pelo autor.
Antevendo essa extinção, requereu o autor seu aproveitamento ao
Sr. Desembargador Corregedor da
Justiça, com base no art. 46 da Lei
n? 489/64, por contar mais de 25
anos de exercido como Oficial Interino do 9? Ofício de Registro de
Distribuição, pretensão indeferida
por despacho de 23.1.1973, ante a
inexistência de vaga. Inconformado, renovou mais duas vezes sua
pretensão a ser aproveitado em
cargo equivalente ao que fora extinto, uma vez que, funcionário estadual a serviço das Varas da Fazenda Federal, nada recebia dos
cofres estaduais. Aduz que em 4-71973, foi surpreendido com o indeferimento definitivo de seu requerimento, sob fundamento de que não
fora atendido um dos requisitos legais e de ser transitória a aplicação do art. 46, da citada Lel n?
489/64.
Ao desamparo ilegal e inconstitucional a que foi lançado, viu acrescer a pressão econômica, Pois deixou de receber qualquer remuneração desde 2-6-1973, pressão que
se tornou psicologicamente avassaladora por estar ciente do propósito negativista da administração
em relação à sua situação singular.
240
— 100
Premido por essas circunstâncias tão desfavoráveis foi obrigado
a requerer a sua aposentadoria em
9-7-1073, concedida em 1974.
Esse o resumo dos fatos referidos na inicial.
A 1? postulação relativa á anulação da aposentadoria tem duplo
fundamento — a coação moral e a
ilegalidade ou inconstitucionalidade, que viciam o ato.
A coação moral teria consistido,
principalmente, na privação de
qualquer remuneração durante
seis meses, para o sustento próprio
o da família, privação que teria
se prolongado por mais tempo se
tivesse demorado mais a requerer
a sua aposentadoria.
A ilegalidade e inconstitucionalidade resultariam da violação do
art. 100, único, da Constituição
Federal de 1969, segundo o qual,
extinto o cargo, o funcionário estável ficará em disponibilidade remunerada, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço,
preceito não observado pela administração pública, que se omitiu,
não colocando o autor em disponibilidade; bem como do art. 76, letra j, da Constituição Estadual de
1970, do então Estado da Guanabara, e do art. 100, § 1?, do DL n? 100,
de 8-8-1969 (Estatuto dos Funcionários da Guanabara) vigente á época do fato.
A 2! pretensão, relativa à investidura em outro cargo equivalente
correspondente ao que ocupava,
ou seja, serventia não oficializada,
vem fundada no art. 46, da citada
Lei 489/64, segundo a qual, os serventuários com mais de 25 anos de
serviço serão efetivados nos cargos, que estejam ocupando em
substituição. Sustenta o autor que
esse dispositivo não é de caráter
transitório e sua exegese autoriza
seu aproveitamento em outra
serventia, como ocorreu com nove
colegas seus em condições idênticas às suas, justificando-se, assim,
a aplicação do principio da isonomia.
A sentença de fls. 106/112 julgou
procedente, em parte, a ação, para
anular a aposentadoria do autor e
determinar ao réu que, no caso de
não o aproveitar em caráter interino, em cargo equivalente ao que
ocupava, cartório desoficializado,
a pó-lo em disponibilidade, com
vencimentos proporcionais ao tempo de serviço e equivalentes ao aludido cargo, cuja base dos proventos não será inferior ao valor atual
percebido como inativo.
Apelou primeiro o autor com as
razões de fls. 115/119, pretendendo
a reforma parcial da sentença a
fim de ser efetivado em outra serventia equivalente, invocando o citado art. 46, da Lei 489/64 e o
princípio da isonomia.
Apelou, também, o Estado do
Rio de Janeiro com as razões de
fls. 126/130, pleiteando a reforma
da sentença na parte em que anulou a aposentadoria do autor.
Aduz o Estado que a sentença
para anular a aposentadoria do autor, considerou inconstitucional o §
I?, do art. 86, da Lei Federal n?
5010/966, por entendê-lo conflitante
com o único do art. 100, da Constituição Federal, donde surgir o
problema de que o órgão julgador
da apelação, a seguir a decisão recorrida, terá de sustar o julgamento e enviar o processo ao Tribunal
Pleno, único órgão competente, no
2? grau de jurisdição, para declarar a inconstitucionalidade da lel.
No mais, sustenta o caráter especial do regime de aposentadoria
dos serventuários não oficializados, e a não caracterização da alegada coação.
R.T.J. — 100
O Dr. Curador da Fazenda Pública, a fls. 145/146, a e Ilustre Dr.
Procurador da Justiça, em seu parecer de fls. 149/152, manifestaram-se pelo desprovimento de ambos
os recursos.
Ao Exmo. Sr. Desembargador
Revisor.
Rio de Janeiro, 22 de julho de
1977. — Rubens Rodrigues Silva,
(fls. 155 a 157).
«Ementa: Escrevente juramentado que exercia interinamente,
em substituição ao respectivo titular, o cargo de Oficial do Registro de Distribuição, extinto pela Lei n? 5.010/966, que organizou
a Justiça Federal de 1! instância.
Não faz jus à disponibilidade,
nem ao aproveitamento em serventia equivalente não oficializada.
Validade da sua aposentadoria
voluntária estreme do alegado
vício de coação.
Inaplicabilidade do princípio
da isonomia.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível n?
4.419, sendo primeiro apelante
Horácio Moreira Rega segundo, o
Estado do Rio de Janeiro, e apelados, os mesmos:
Acordam os Juizes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça
do Estado do Rio de Janeiro, integrado neste o relatório de fls.
155/157, em indeferir o pedido do 1?
apelante de conversão do julgamento em diligência e, rejeitada a
alegação de inconstitucionalldade,
em negar provimento à primeira
apelação e dar provimento à segunda apelação, condenado o autor
nas custas e honorários advocaticlos de 2% (dois por cento) sobre o valor dado à causa.
241
Indeferiu-se o pedido do 1? apelante no sentido de ser ouvida a
parte contrária sobre os documentos juntos por linha, o que Importava na conversão do julgamento em
diligência, porque os aludidos documentos têm o mesmo conteúdo e
o mesmo sentido de outros já existentes nos autos, com os quais objetiva o primeiro apelante provar o
aproveitamento de diversos serventuários em situação semelhante
A sua.
Quanto à questão suscitada pelo
Estado, de se levar ao Tribunal
Pleno a apreciação da inconstitucionalidade do art. 86 e seus parágrafos da Lei 5.010/966, entendeu a
Câmara ser desnecessária tal medida para o julgamento do caso
vertepte, tanto mais que a sentença recorrida não considerou, explicitamente, ser O citado dispositivo
inconstitucional.
No mérito, a sentença, como já
ficou assinalado, anulou o ato de
aposentadoria do autor, e determinou que o réu, caso não o aproveite, em caráter interino, num cartório desoficializado, ponha-o em disponibilidade remunerada.
São três disposições distintas:
uma, anulatória da aposentadoria,
outra, relativa ao aproveitamento
do autor em uma serventia de
justiça, em caràter interino; e a Última, concessiva da disponibilidade remunerada, caso ocorra o
aproveitamento em caráter interino.
Entendeu a respeitável sentença,
In verbis: sendo o autor funcionário
estável, extinto o cargo que ocupava, embora Interinamente e não
tendo sido aproveitado em outra da
mesma natureza, teria que ser poste em disponibilidade remunerada,
conforme o preceito do if único, do
art. 100, da Constituição Federal.
242
R.T.J. — 100
Esse fundamento, data venta,
não prima por sua correção jurídica. O ocupante de cargo extinto,
para fazer jus à disponibilidade remunerada, tem que ser seu titular,
e não substituto interino, embora
essa interinidade possa ser exercida por um funcionário estável.
Como esclarece Hely Lopes Meirefles, in verbis: A disponibilidade
importa no afastamento temporário e compulsório do titular do
cargo, e, por isso mesmo, não o pode prejudicar em qualquer direito
decorrente da função' (Dir. Ad.
Bras. — pg. 383 — 2! edição —
1966).
No caso, o autor não era o titular
do 9? Oficio de Reg. de Distribuição, mas substituto interino do respectivo titular.
Assim, extinto o cargo com a
aposentadoria compulsória do título, o substituto interino não tinha
direito à disponibilidade, embora
fosse escrevente juramentado estável.
E certo que a estabilidade, como
atributo pessoal do servidor público, acompanha-o em todas as suas
nomeações de caráter efetivo;
mas, naqueles de caráter interino
ou em comissão, ela não influi para a permanência do servidor no
cargo ou função, nem lhe confere a
vantagem da disponibilidade no
cargo extinto.
Eis, no particular, o conceito do
autorizado Hely Lopes Meirelles,
in verbis: A estabilidade, sendo um
atributo pessoal do servidor público, acompanho-o em todas as suas
nomeações efetivas, para o serviço
público» (ob. cit. pg. 374).
Assim é porque a vinculação do
funcionário interino ou comissionado ao cargo é transitória, instável,
podendo ser rompido a qualquer
tempo, a juizo exclusivo e discricionário da administração.
A Súmula n? 24 encerra esse sentido ao dispor que o funcionário interino substituto é demissivel, mesmo antes de cessar a causa da
substituição.
Se podia o autor ser demitido antes mesmo da extinção do cargo,
que vinha ocupando como substituto interino, não há como estenderlhe o benefício da disponibilidade,
conferida exclusivamente ao titular efetivo do cargo.
Professa o mesmo Hely Lopes
Meirelles: Pela própria natureza
de sua nomeação se vê que a investidura interina não confere ao
nomeado qualquer direito á permanência no cargo ou função (ob.
cit. pg. 376).
desvalioso o argumento, a que
se apega o autor, de que, a disposição do art. 86, da Lei 5.010 atinge
apenas aos funcionários federais
então lotados no 9? Ofício -do Cartório de Distribuição e não a ele, por
não poder a legislação federal regular a situação dos funcionários
estaduais. A Resolução n? 1, de 212-1970, do Tribunal de Justiça do
antigo Estado da Guanabara, que
aprovou o Código de Org. e Div.
Judiciárias do Estado, Já dispunha,
em seu art. 358, que a situação dos
titulares dos 9? e 11? ofícios do Registro de Distribuição era regulada
pelo art. 86 e seus parágrafos, da
Lei 5.010, disposição reproduzida no
art. 91, da Lei Estadual n? 2.085-A,
de 5.9.72, que estabeleceu o regime
jurídico dos serviços da Justiça.
Assim, o regime dos servidores
lotados naquelas serventias de distribuição foi adotado integralmente
pela legislação estadual, antes de
ocorrer a extinção de qualquer delas.
Não se vislumbra, pois, nenhuma
inconstitucionalidade ou ilegalidade no ato de aposentadoria do autor.
R.T.J. — 100
Essa manifesta legalidade, de
que se reveste o ato administrativo, torna-o senão imune, pelo menos de difícil contaminação pelos
vícios da vontade, tanto mais que
foi a pedido a aposentadoria.
Queixa-se o autor de «um desamparo ilegal e inconstitucional», por
parte da administração pública,
quanto à sua situação funcional,
agravado pela circunstância de ter
ficado sem receber qualquer remuneração cerca de seis meses, circunstâncias que o coagiram a pedir a aposentadoria.
Não se nega que a situação do
autor devia ser das mais aflitivas
vendo-se privado do cargo que ocupava interinamente, em conseqüência de sua extinção, para a
qual, diga-se de passagem, não
concorrera a administração estadual.
Mas, do estado aflitivo, em que
se encontrou o autor, ao reconhecimento da coação, que o teria levado a pedir aposentadoria, vai uma
distância multo grande.
De certo modo, se é que houve
omissão da autoridade no solucionar a situação funcional do autor,
adveio ela da impossibilidade
jtuidica de atender a sua pretensão de ser aproveitado no cargo
em vias de ser extinto, como velo
de reconhecer a própria sentença
recorrida, que lhe foi parcialmente
favorável.
Quanto ao período em que ficou
sem remuneração, resultou da contingência, a que estão sujeitos os
funcionários que, na atividade não
recebem diretamente dos cofres
estaduais, como ocorre com os servidores dos cartórios não oficializados.
Essa situação se prolongou, não
por culpa da administração pübli-
243
ca, mas porque o autor buscava
uma vantagem juridicamente Inviável — o seu aproveitamento como titular de outra serventia.
Ao denegar o segundo pedido do
autor, o do aproveitamento em serventia não oficializada em caráter
efetivo, por entender inaplicável à
hipótese dos autos o art. 46, da Lei
489/64, a sentença decidiu de acordo com o entendimento manifestado pelo Tribunal de Justiça do antigo Estado da Guanabara, em dois
casos semelhantes (Acórdão na
Revista de Jurisprudência n? 23 —
pág. 118).
Não havia como aproveitar o autor em cargo que foi extinto, e não
podia ele ser efetivado em outro
equivalente, como decidiu acertadamente a sentença recorrida.
Houve, é certo, nomeações de
serventuários ao arrepio desse entendimento jurídico, ao que se apega o autor para invocar o princípio
da isonomla; mas, como bem assinalou o saudoso relator do acórdão
acima aludido, non exemplls sed
legibus judicandum.
Não cabe ao judiciário, abusando
do princípio da bonomia, de aplicação muito restrita, estender a
outros os favores concedidos pela
administração pública e alguns
privilegiados.
Rio de Janeiro, 27 de outubro de
1977. Des. Ebert Chamotm, Presidente s/voto — Des. Rubem Rodrigues Silva, Relator.» (fls. 161 a
165).
Tratando-se, como se trata de cumulação sucessiva de pedidos, o acolhimento de um depende sem dúvida, do acolhimento do outro, de conteúdo básico.
No caso, o acórdão recorrido repeliu a existência de nulidade do ato de
aposentadoria voluntária do ora recorrente. Acontece que o recurso ex-
244
R.T.J. — 100
traordinário não traz qualquer fundamento contrário à decisão, neste
particular. Dirige-se, sim, contra a
parte que indeferiu o pedido de aproveitamento ou disponibilidade do
serventuário. Dessarte, transitou em
julgado a decisão que declarou a validade da aposentadoria do recorrente.
Ora, o segundo pedido depende necessariamente do primeiro, eis que
não se pode falar em obrigatória disponibilidade ou aproveitamento de
servidor que se encontra voluntária
e regularmente aposentado. Descabe
discutir eventual direito que somente
seria viável se o recorrente fosse um
servidor em atividade.
A rigor, essa é a situação do presente recurso.
Ainda que se pudesse transpor o
óbice acima, inadmissível seria o recurso, pois, como resulta claro, jamais houve ofensa aos princípios do
direito adquirido ou da isonomia. O
recorrente era titular efetivo e estável do cargo de Escrevente Juramentado, e apenas exercia, em substituição, o cargo de Oficial de Registro de Distribuição. Em conseqüência, como bem decidiu o acórdão recorrido, não tinha direito à disponibilidade neste último cargo, extinto
por força de lei, por não ser o seu titular, mas, tão-somente, substituto
Interino. Dada essa situação funcional podia ser exonerado mesmo antes da extinção da aludida serventia.
Se a administração aquinhoou outros serventuários, em situação semelhante, mas de modo ilegal, como
sói acontecer neste «Brasil grande...», isso não justifica a invocação
do elevado principio da isonomia
(art. 153, 1?, da Constituição Federal).
Ante o exposto e de acordo com o
parecer da douta Procuradoria-Geral da República, não conheço do recurso.
EXTRATO DA ATA
FtE 89.700 — RJ — Rei.: Min. Djaci Falcão. Recte.: Horácio Moreira
Rega (Adv.: José de Aguiar Dias).
Recdo.: Estado do Rio de Janeiro
(Adv.: Antonio Carlos Cavalcanti
Mala).
Decisão: Não conhecido. Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
Dedo Miranda. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mauro
Leite Soares.
Brasília, 30 de setembro de 1980 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 90.913 — (EDc1) — MG
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Dedo Miranda.
Embargante: Fausto Salomão Trezzi — Espólio de, Representado por
sua inventariante Anna Elmira Scagliarini Salomão. — Embargado: CIPO
— Comércio e Indústria Pedro Salomão Ltda.
Processual Civil. Apuração de haveres. Embargos de declaração.
Correção de valores. 1) Se a sentença deixou de conceder certa verba
na apuração de haveres, e dela somente apelou a parte a quem essa
disposição beneficiava, ao acórdão na apelação não era dado volver
ao tema. 2) A correção monetária da Lei n? 6.899, de 8.4.81, se não cogitada na instância ordinária, é de consideração Inviável no superveniente recurso extraordinário.
R.T.J. — 100
ACORDA()
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata
de julgamentos e das notas taqulgráficas, à unanimidade de votos, rejeitar os Embargos de Declaração.
Brasília, 27 de outubro de 1981 —
Djaci Falcão, Presidente — Dedo
Miranda, Relator.
FtELATORIO
O Sr. Ministro Dedo Miranda:
Trata-se de embargos de declaração
opostos pelo segundo recorrente, Espólio de Fausto Salomão Trezzi, ao
acórdão desta Turma, de que foi rer
lator o eminente Ministro Leitão de
Abreu, na parte que a ementa assim
compedia:
«Apuração de haveres. (...) 3 —
Correção de valores. Determinação, pelo acórdão, em embargos de
declaração. Caso, entretanto, em
que não houve, da parte interessada, recurso de apelação da sentença, que negara a correção. Impossibiliade da concessão em segundo
grau.» (fils. 626).
Expõe o ora embargante que o
acórdão recorrido, do Tribunal de
Justiça de Minas Gerais, quisera dizer é que a apuração de haveres deveria ser feita pelo real valor; que o
acórdão ora embargado, embora
considerando justa essa solução, não
a admitiu por não ter havido apelação do ora embargante, que ensejasse aquela determinação.
Pondera, a seguir, que o Tribunal
de Minas concedera a atualização de
valores, não como penalidades, mas
como decorrência inafastável da de-
245
preciação da moeda e da valorização
dos bens imóveis constantes do acervo, os quais, se balanceados agora
na base dos preços vigentes ao tempo do óbito do ez-sócio (junho de
1973), viriam a figurar por valores
irrisórios, com grave prejuízo dos
herdeiros e enriquecimento ilícito da
firma: que, de qualquer sorte, concedendo avaliação atual, e não correção monetária, o acórdão na apelação não terá alterado o dispositivo
da sentença que negou a incidência
desta última, mas, ainda que o tivesse alterado, isso se justificava, porque o então embargante infringente
ora embargante de declaração
houvera apelado da sentença, por
meio de recurso adesivo, este, porém, sonegado ao conhecimento do
Tribunal de segunda instancia por
um descuido do cartório da Comarca, que indevidamente o entranhou
no bojo dos autos suplementares, e
não nos autos principais, quando naqueles deveria ter juntado apenas a
respectiva cópia.
Acrescenta o embargante que, de
qualquer forma, a atualização hoje se
impõe, por uma circunstância capital: quando proferida a decisão ora
embargada de declaração, já se
achava em vigor a 'Lei n? 6.899, de
8.4.1981, que determina a aplicação
de correção monetária sobre qualquer débito resultante de decisão judicial. (fls. 637 princ).
Por fim, sustenta o embargante
explicitaçâo do julgado na apelação feita pelo acórdão em embargos infringentes, era perfeitamente
admissivel, e, mesmo que se tratasse de parcial alteração do julgado,
não seria de censurar-se, ante a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal sobre o tema (FtREE 85.039.
73.192, 87.092, 75.170), entendimento
hoje consagrado no art. 338 do Regimento Interno desta Corte.
que a
R.T.J. — 100
246
Conclui o embargante requerendo terem seu recurso adesivo, é provise requisitem os autores de apura- dência obviamente irrealizável, e até
ção de haveres, existentes no Cartó- inócua, na instância extraordinária.
rio da Primeira Vara da Comarca
de Uberaba, para verificar-se que lá
último, também não cabe, em
se encontra a petição do recurso talPor
instância,
consideração do efeiadesivo, e, se considerada desneces- to que possa ater,
na presente lide, a
sária a diligência, sejam desde logo Lei n? 6.899, de 8.4.1981,
que determirecebidos os presentes embargos de na a aplicação da correção
declaração, nos termos do art. 338, ria nos débitos oriundos demonetádecisão
tine, do Regimento Interno. (fls. 628- judicial, lei essa não cogitada
no
639).
acórdão local recorrido, a cujos termos unicamente se dirige o recurso
extraordinário.
o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Decio Miranda (Relator): Os embargados de declaração, como se viu do relatório que
acabo de fazer, visam a afastar irresistivel raciocínio estampado no
acórdão embargado: se a sentença
de primeiro grau deixara de conceder a correção monetária, e dela somente apelou, por outros temas, a
parte a quem a referida correção
prejudicaria, não era dado à instância de apelação conceder atualização
de valores, providência de efeito
idêntico à da negada correção monetária.
Não se negou a possibilidade da
correção monetária, em caso que a
poderia comportar, nem a atualização de valores dos imóveis componentes do acervo, o que, segundo o
acórdão ora embargado, «seria Justo
que (...) ocorresse», sendo todavia
necessário, «para adotar-se essa solução, que a tivesse solicitado, mediante recurso ( ...) a parte a quem
aproveitaria». ( fls. 623 medio).
Isto posto, rejeito os embargos de
declaração.
E o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RE 90.913 — (EDc1) — MG — Rel.:
Min. Decio Miranda. Embtes.: Fausto Salomão Trezzi — Espólio de, representado por sua inventariante
Anna Elmira Scagliarini Salomão
(Advs.: Sebastião Oscar de Castro e
outros). Embdo.: Cipo — Comércio e
Indústria Pedro Salomão Ltda.
(Advs.: Aristoteles Atheniense e outros).
Decisão: Rejeitaram os Embargos
de Declaração. Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes á Sessão os
Senhores Ministros Moreira Alves,
Decio Miranda e Firmino Paz. Ausente, justificadamente, o Ministro
Cordeiro Guerra. SubprocuradorGeral da República, Dr. Mauro Leite
Soares.
Brasília, 27 de outubro de 1981 —
A requisição dos autos suplemen- Hélio Francisco Marques, Secretátares, que a ora embargante diz con- rio.
R.T.J. — 100
247
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 90.928 —
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto.
Recorrentes: Luiz Severiano Ribeiro S.A. e outros — Recorrido: Instituto
Nacional do Cinema.
Instituto Nacional do Cinema — Venda de bobinas de ingressos.
Não foram objeto de exame na decisão recorrida os arts. 19, I e 153, §
29 da Constituição Federal, não havendo, assim, o devido prequestionamento necessário ao conhecimento do apelo extremo.
O acórdão trazido à colação como paradigma é do próprio Tribunal recorrido, o que o torna imprestável à comprovação do dissídio.
Recurso extraordinário não conhecido.
ACORDA°
Vistos, relatados e discutidos estes
autos acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em
não conhecer do recurso.
Brasília, 09 de outubro de 1979 —
Thompson Flores, Presidente —
Cunha Peixoto, Relator.
RELATOR 10
O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Luiz
Severiano Ribeiro SÃ. e outros linpetram mandado de segurança contra o Conselho Deliberativo e o Secretário de Planejamento, ambos do
Instituto Nacional do Cinema, para
se absterem de exigir a aquisição de
máquinas registradoras, venda compulsória de ingressos padronizados e
de Impor sanções pela inobservância
das referidas determinações.
Alegam haver o primeiro coator
baixado a Resolução INC ri? 94/74,
tornando obrigatório o uso de máquinas registradoras, controladoras e
de roletas para a venda de ingressos
padronizados, a partir de 24 de junho
do mesmo ano, estabelecida a obrigatoriedade de aquisição, por preço
previamente estipulado, dos borderõs e bobinas desses ingressos; e ter
o segundo baixado instruções reguladoras de responsabilidade dos exibiddres, no sistema mecanizado de
venda de ingressos padronizados,
através do Ofício Circular Sec. Planei. 001/74.
Esses atos — acrescentam — extravasam da competência das autoridades apontadas como coatoras,
em face do art. 35 do Dec.-lei n?
43/66, porque pretende o INC, além
da utilização obrigatória das máquinas e do igual uso dos borderôs e ingressos, que as primeiras sejam fornecidas por firma da sua escolha e
preço previamente fixado, e os segundos para pagamento á vista.
Nas informações prestadas, o INC
sustenta poder estabelecer a obrigatoriedade do borderb-padrão, emitir
e vender, para aplicação compulsória pelas salas exibidoras nacionais, ingressos padronizados, ou
obrigar o uso de máquinas registradoras, na conformidade do art. 35 do
Dec.-lei n? 43/66 e de sua Regulamentação, baixada com o Decreto n?
62.005, de 29-12-1967.
A segurança foi denegada em primeira e segunda instâncias, portando o acórdão recorrido a ementa seguinte:
248
R.T.J. — 100
«Ao baixar a Resolução n? 94, de
20 de março de 1974, tornando obrigatório o uso de «máquinas registradoras controladoras e de roletas» nos cinemas do Pais, o INC
não desbordou de suas atribuições,
nem ofendeu a qualquer principio
legal ou a direito das empresas interessadas.
De fato, a Resolução n? 94 nada
tem a ver com Resolução n? 23, já
examinada judicialmente, e, no
seu próprio texto, não impõe privilégio de compra das máquinas adotadas a um só fornecedor, nem regula a remuneração pelo seu uso.
Aliás, tais aparelhos são comprados pelo INC e cedidos gratuitamente às empresas.
Quanto ao art. 12, há apenas disposição sobre o acréscimo de
direitos autorais aos custos dos
borderós e bobinas de ingressos
padronizados.
As bases de cálculo adotadas
servem, é certo, ao estabelecimento do preço definitivo, mas não
ofendem a direito dos distribuidores ou exibidores. Refletem-se afinal no público, podendo a escala
admitida até constituir um estimulo à maior divulgação. Além disso,
sob tal aspecto, a impet
ração não
disfarça o propósito de reexaminar,
embora inadequadamente, matéria
vencida. Merece, pois, confirmação a sentença denegatória do
writ, cujos fundamentos desnudam
a improcedência do pedido.» (fl.
133).
Irresignadas, as vencidas interpuseram recurso extraordinário com
fundamento nas letras a e d do permissivo constitucional, alegando haver a decisão recorrida violado os
arts. 19, I e 153, 29 da Constituição,
bem como dissídio jurisprudencial.
A Procuradoria-Geral da República manifesta-se pelo não conhecimento do recurso.
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): 1 — Cuida-se na controvérsia
sobre a legitimidade dos valores estabelecidos pela Recorrida na cobrança das bobinas de ingressos que
fornece aos cinemas, para máquinas
registradoras de utilização obrigatória.
Sustentam os recorrentes que a
exigência de preço supetior ao custo
configuraria instituição de tributo
sem que a lei o estabeleça,
ofendendo-se, assim, os arts. 19, I e
29 da Constituição Federal,
153,
bem como dissídio jurisprudencial.
2 — Como se verifica pela ementa
do acórdão, transcrita no relatório e
que espelha com fidelidade o decidido, a matéria compendiado no recurso extraordinário não foi objeto de
decisão, razão por que inviável, nesta parte, o recurso extraordinário.
3 — Improcede, também, o apelo
com fundamento na letra d, visto co-mo o acórdão apontado como paradigma é do próprio Tribunal Federal
de Recursos
4 — Desta maneira, não conheço
do recurso.
EXTRATO DA ATA
RE 90.928 — RJ — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Rectes.: Luiz Severiano
Ribeiro S.A. e outros (Advs.: Paulo
César Gontijo e outros) Recdo.: Instituto Nacional do Cinema. Decisão:
Não conhecido, decisão unánime.
Presidência do Sr. Ministro
Thompson Flores. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Cunha Peixoto,
Soares Mufloz e Rafael Mayer. Ausente justificadamente o Sr. Min.
Xavier de Albuquerque. Subprocurador-Geral da República, o Dr.
Francisco de Assis Toledo.
Brasília, 09 de outubro de 1979 —
António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
R.T.J. — 100
249
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 91.259 — SP
(Tribunal Pleno)
Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete.
Recorrente: Companhia Municipal de Transportes Coletivos — Recorrido: Luerezia Carrier! Colaciocco.
Trabalhista, competência. — Complemento da pensão previdenetária da viúva de empregado, devido pelo empregador que o institua.
— Competência da Justiça do Trabalho para as questões pertinentes.
O ato unilateral do Empregador de instituir, como norma interna da empresa, um suplemento financeiro aos proventos da aposentadoria previdenciária aos seus empregados, exigível quando se aposentarem, e também à pensão previdenciária da viúva de empregado
que venha a falecer, tem natureza de Regulamento de Empresa e
com eficácia de norma estatutária, sendo exigível pelo sujeito ativo
da obrigação patronal, — aposentado ou viúva, — quando presentes
suas condições, e competente a Justiça do Trabalho para a causa.
Compete às Juntas de Conciliação e Julgamento processar e
decidir as controvérsias sobre o suplemento financeiro instituído pelo
Empregador, ao provento de aposentado ou à pensão de viuvez, não
obstante extinta a relação de emprego originária, pela aposentadoria
ou pela morte.
A Constituição da República, é certo que estabelece a competência da Justiça do Trabalho para dissidlos entre Empregado e Empregador; mas estende-a também a outras controvérsias oriundas da
relação de emprego, desde que a lei disponha sobre essa competência
extraordinária; e esta norma de lei, exigida para o caso de coMplemento a aposentados e viúvas, encontra-se na regra de competência
das JCJ no art. 852, a, a? IV, que a estabelece para os «demais
disaldlos» concernentes ao Contrato Individual de Trabalho, como é o
caso destes suprimentos financeiros pelo Empregador, oriundos de
norma estatutária da Empresa, com eficácia residual após extinta a
relação de emprego.
— Recurso não conhecido.
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão
Plenária, na conformidade da ata do
Julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, não conhecer do recurso.
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: O
despacho que admitiu o apelo extremo está assim redigido:
«Discute-se, neste processo, a
competência da justiça do Trabalho para decidir litígio decorrente
de norma regulamentar da recorrente e versante sobre complementacão de pensão.
O recurso extraordinário é interposto com a afirmação de atentado
Brasília, 10 de setembro de 1981 —
Xavier de Albuquerque, Presidente
— Clovis Ramainete, Relator para o
Acórdão.
250
R.T.J. — 100
A douta Procuradoria-Geral da
ao artigo 142 da Constituição FedeRepública assim opina:
ral.
Tratatsé flagrantemente, de lide
«Lucrezia Carrieri Colacicco, itasurgida de interpretação de cláusuliana, do lar, viúva de empregado
la residual do contrato de trabalho.
aposentado da Cia. Municipal de
Decorre, dal, a competência desta
Transportes Coletivos (CMTC),
Justiça Especializada.
moveu contra esta reclamação traO Supremo Tribunal Federal tem
balhista em que postulou a compleresolvido, reiteradamente, caber à
mentação de sua pensão com funJustiça do Trabalho a decisão dos
damento em cláusula do contrato
litígios sobre complementação de
de trabalho que assegurava aos beaposentadoria, quando conseqüenneficiários do empregado falecido
tes de cláusulas residuais do conperceber da empresa 80% do salátrato laborai.
rio a que aquele fazia jus à data de
seu falecimento, com os reajustaNão posso deixar de reconhecer,
mentos posteriores por ocasião do
todavia, que a Suprema Corte tem
aumento geral dos salários. Requeordenado a subida dos apelos exreu ainda a complementação dos
tremos, para melhor exame, quanproventos de seu falecido marido,
do o debate sobre competência se
referentemente aos últimos meses
trava em pleitos pertinentes a penque precederam a sua morte, tudo
sões, nos casos em que não existiu
com base no contrato de trabalho
vinculo de trabalho direto entre os
já extinto.
litigantes, ou seja, entre dependentes de antigos empregados e a ReFoi a ação julgada procedente
de.
em todos os graus da jurisdição
Em vista disso, inócuo seria
trabalhista que, por sua vez, repeliu
trancar-se o apelo extremo por
a argüição de sua incompetência
simples convencimento pessoal,
que, desde os albores da lide, vem
sabendo-se que os autos acabarão
sendo sustentada pela reclamada,
subindo à apreciação do Pretório
como agora o faz em grau de reExcelso.
curso extraordinário (f. 291).
Sendo assim, atento ao princípio
Sustenta-se, em síntese, não hada economia processual, mas resver
no caso litígio entre empregasalvando meu ponto de vista, addo
e
empregador, e mais: ainda
mito o recurso.
que oriunda da relação de trabaPublique-se e prossiga-se.
lho, a controvérsia só poderia ser
dirimida pela Justiça EspecializaBrasília, 02 de março de 1979 —
da se existente lei ordinária lhe deMinistro Raymundo de Souza
ferindo competência para tanto, o
Moura,
Vice-Presidente
no
que inocorre na hipótese em coexercício da Presidência». ( fls.
mento.
296-297).
Sustenta a recorrente, por seu ilusNão pode, contudo, prosperar a
tre patrono, a competência da Justiirresignação derradeira, pois o te
ça Comum, na consideração de que
ma já foi enfrentado pelo Supremo
foi violado o art. 142 da Constituição
Tribunal, em sua composição pieFederal, porque nenhuma lei defere
nária, tendo-se fixado, depois de
à Justiça Especializada competência
acesos debates, a orientação de ser
para julgar o pedido de reajustapara o caso competente a Justiça
mento de pensão à viúva dos empredo Trabalho, em acórdão de que
gados da empresa.
saiu vencedor o voto do eminente
251
R.T.J. - 100
Ministro Dedo Miranda no RE
89.546, cuja ementa ficou por S.
Exa. assim redigida:
«Trabalho. Pensão. Complementação. Atribuída pela autora à empresa a responsabilidade pela complementação, em virtude de cláusula do contrato de trabalho. Nesse
caso, competente é a Justiça do
Trabalho para a ação da beneficiária da pensão.» (RTJ 89-646).
No julgamento deste precedente,
o eminente Ministro Cunha
Peixoto, depois de refutar a adequação dos mesmos julgados então
lembrados e agora arrolados pela
recorrente em suas razões (RR EE
89.201, 89.154, 89.199, 89.200 e
89.203), teve ocasião de afirmar,
com propriedade, que a pensão
agora postulada pela reclamante
«não passa de um reflexo jurídico
do contrato de trabalho, efeito residual da claúsula que deu embasamento à pretensão» (RTJ 89-648).
Acrescentando ao aludido precedente o RE 90.120, in DJ de 14-1279, relator o Exmo. Sr. Ministro
Decio Miranda, opina-se, em face
da Jurisprudência assente, pelo
não conhecimento do recurso extraordinário.
Brasília, 23 de fevereiro de 1981
— Walter José de Medeiros, Procurador da República:» (fls. 304-305).
E o relatório.
ANTECIPAÇÃO AO VOTO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra:
(Relator): Sr. Presidente, as brilhantes exposições feitas pelos eminentes
Advogados, da tribuna, creio que me
justificam de ter trazido este caso a
julgamento, na forma regimental,
pelo Plenário. Há acórdãos referentes à Companhia Municipal de
Transportes Coletivos divergentes, e
o último, de que fui Relator, o RE
91.759, dá razão à recorrente.
Mas, no momento, peço a benevolência e a atenção do Egrégio Tribunal para ler o voto que trouxe escrito: (Lê).
VOTO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra:
(Relator): O v. acórdão recorrido
afirmou a competência da Justiça do
Trabalho para conhecer da reclamação de viúva de empregado visando
à complementação de pensão e, ainda, complementação dos proventos
de seu falecido marido referentes
aos últimos meses que precederam a
sua morte, tudo com base no contrato de trabalho já extinto.
Sustenta a recorrente que não há,
no caso, litígio entre o empregado e
o empregador e, mais ainda, que
embora oriunda de relação de trabalho, a controvérsia só poderia ser dirimida pela Justiça Trabalhista se
existisse lei ordinária deferindo-lhe
tal competência, pois o artigo 142 da
Constituição Federal é expresso em
condicionar a extensão da competência da Justiça Trabalhista« a outras
controvérsias oriundas de relação de
trabalho», a existência de Lei, que
inexiste na espécie.
A questão é realmente controvertida.
Em relação às viúvas de empregados da FEPASA, tem-se decidido pela competência da Justiça Comum,
na consideração de que o pedido tem
base estatutária e de natureza previdenciária do beneficio concedido pela Lel Estadual n? 4.819-58 (RE
89.203 — SP — RTJ 88-682) relator
Sr. Ministro Soares Mufloz contra o
meu voto, I. 684, RE n? 89.201, SP,
rel. Sr. Ministro Djacl Falcão, que
indica os seguintes precedentes: RE
89.154, 89.199, 89.200, além do RE
89.203, já mencionado — RTJ 91-285,
assim ementado:
252
R.T.J. — 100
«Reclamação de viúvas, postulando complementação de pensões
em decorrência de cláusula de contrato de trabalho de seus falecidos
maridos.
Incompetência da Justiça do
Trabalho. Precedentes do Supremo
Tribunal Federal (RE 89.154,
89.199, 89.200 e 89.203).
RE provido».
No mesmo sentido o RE 89.199, relatado pelo Sr. Ministro Cunha
Peixoto, RTJ 94-1.211.
Na espécie, porém, invoca o ilustre Procurador' Walter José de
Medeiros, o julgado no RE 89.546,
SP, de que foi relator o Sr. Ministro
Decio Miranda, assim ementado:
«Trabalho. Pensão. Complementaçâo. Atribuída pela autora à empresa a responsabilidade pela complementação, em virtude de cláusula do contrato de trabalho.
Nesse caso, competente é a Justiça do Trabalho para a ação da
beneficiária da pensão. » RTJ 89646.
Nesse julgamento, como relator,
fiquei vencido, pois aplicava à espécie a norma implícita nos julgados
referentes às pensionistas da FEPASA.
O Sr. Ministro Decio Miranda, relator designado, chegou a sua conclusão por entender «que a Companhia Municipal de Transportes Coletivos resolveu, voluntariamente —
embora em coincidência com uma
lei estadual que assim dispunha para
outra empresa do Estado, inseriu no
contrato de trabalho de seus empregados uma cláusula segundo a qual
se obriga a empresa a pagar aos empregados aposentados uma complementaçâo de aposentadoria, e aos
beneficiários familiares de seus empregados uma complementação da
pensão previdenciária.
Trata-se, portanto, como salientou
o eminente Ministro Moreira Alves,
de aditamento voluntário ao contrato
de trabalho. Sendo assim, inclui-se
na competência da Justiça do Trabalho a demanda pelo respectivo pagamento.» (RTJ 89-647).
O Sr. Ministro Soares Mufloz concordou com o voto do Sr. Ministro
Decio Miranda, bem como os Srs.
Ministros Moreira Alves, Thompson
Flores, expressamente vencidos os
Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Antonio Neder e Djaci Falcão,
que me acompanhavam.
Creio que prevaleceu o entendimento expresso na síntese final do
Sr. Ministro Moreira Alves:
«Não há quem sustente que existe dissídio de trabalho entre aposentado e ex-empregador, porque o
aposentado deixa de ser empregado.
Esta Corte é que interpretou
extensivamente o texto constitucional, e entendeu que, nesses casos,
por ultra-atividade, de contrato de
trabalho, se admita a competência
da Justiça Trabalhista. E daí, extraio, também, esta conseqüência:
todas as vantagens que eram dadas pelo contrato de trabalho, ao
empregado, ainda que para beneficiar terceiro, devem ser examinadas pela Justiça Trabalhista, com
base no art. 142 da Constituição
Federal.»
Entretanto, creio que procede o
presente recurso extraordinário, pois
a Constituição Federal é expressa:
«Art. 142 — Compete à Justiça
do Trabalho conciliar e julgar os
dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores,
e, mediante lel outras controvérsias oriundas de relação de trabalho.»
R.T.J. — 100
Não há dúvida que se trata de uma
controvérsia oriunda de relação de
trabalho, mas lei nenhuma defere
competência à Justiça do Trabalho
Para Julgar a reclamação de viúvas
contra a recorrente, em matéria previdenciária, ainda que decorrente do
contrato de trabalho de seu falecido
marido empregado da empresa.
253
mediante lel outras controvérsias
oriundas de relação de Trabalho (o
que é o caso dos autos).
Ora, inexistindo lel que defira a
competência à Justiça Trabalhista,
Para julgar reivindicações de pensionistas, quaisquer que sejam,
parece-me competente a Justiça
Comum.»
Não creio possível, por interpretaconformidade, tendo em visção extensiva, dar-se competência à taNessa
a
relevância
do tema, art. 22, paJustiça de Trabalho, quando tal só
único, b, 1? parte, submeto à
Pode ocorrer mediante lei, e esta rágrafo
douta consideração do Plenário, o
inexiste na espécie.
meu voto no sentido de conhecer do
e lhe dar provimento para
Observou, com acuidade, o Sr. Mi- recurso
deferir à Justiça comum competênnistro Xavier de Albuquerque:
cia para julgar a presente reclama*0 litígio não se fere entre em- ção.
pregado e empregador, a lei podeEXTRATO DA ATA
rá atribui-lo à Justiça do Trabalho.
E o que diz a Constituição. Essa lel
RE. 91.259 — SP — Rel.: Min. Cornão existe. Então a Justiça do Trabalho não é competente.» RTJ 89- deiro Guerra. Recte.: Companhia
Municipal de Transportes Coletivos
659.
(Adv.: Célio Silva). Recdo.: Lucrezia
De fato, como bem observa o ilus- Carrieri Colaciocco. (Adv.: Sid H.
tre patrono da recorrente, a solução Riedel de Figueiredo e Sérgio Roberconsagrada no RE 89.546, de São to Alonso, Ulisses Riedel de Resende
Paulo, acima exposta, estaria certa e outros). •
na vigência da Constituição Federal
Decisão: Pediu vista o Ministro
de 1946, que dispunha:
Clovis Ramalhete, após o voto do Ministro Relator que conheceu e deu
«Art. 123 — Compete à Justiça provimento ao recurso. Falaram :
do Trabalho conciliar e julgar os pela Recte.: o Dr. Célio Silva, e, pela
dissídios individuais e coletivos en- Ftecda.: o Dr. Sid H. Riedel de Fitre empregados e empregadores, e gueiredo.
as demais controvérsias oriundas
de relações de trabalho regidas pePresidência do Senhor Ministro
la legislação especial».
Xavier de Albuquerque. Presentes à
Sessão os Senhores Ministros Djaci
Entretanto, a Constituição de 1967, Falcão, Antonio Neder, Leitão de
tanto na redação original como na Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alque foi introduzida pela EC 01-69, ves, Cunha Peixoto, Soares Muiloz,
não seguiu as Constituições anterio- Dedo Miranda, Rafael Mayer e Clores e estabeleceu regra nova:
vis Ramalhete. Procurador-Geral da
República, Dr. Firmino Ferreira
«Art. 142 — Compete à Justiça Paz.
do Trabalho conciliar e julgar os
Brasília, 22 de abril de 1981 —
dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores (o Alberto VeroneSe de Aguiar, Secreque não é o caso dos autos) e, tário.
R.T.J. — 100
254
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete:
O Recurso Extraordinário versa a
questão de se saber da competência
para decidir litígio, entre a Recorrente Cia. Municipal de Transportes
Coletivos e a viúva de um seu empregado. Esta viúva é a recorrida.
Ela pleiteia condenação da Recorrente, empregadora do seu falecido marido, ao pagamento de complementação da aposentadoria do antigo empregado, como se trabalhando
até o dia da morte estivesse estado,
e, ainda, a condenação a complementar sua pensão, nos termos dos
Avisos 64 e 85 que foram expedidos
pela empresa Recorrente para estipular estas condições regulamentares nas relações de emprego com
seu pessoal.
2 — Não há controvérsia, ao menos trazida em Recurso Extraordinário, sobre a existência do vinculo
obrigacional do mérito, seja quanto
ao complemento da aposentadoria ou
seja quanto ao da pensão da viúva,
como devidos pela Recorrente.
Estes créditos surgiram de ato
unilateral da empregadora. Ganharam natureza de norma regulamentar. Como tal, incorporaram-se às
condições da relação de emprego na
Recorrente.
3 — E certo que a regra do art. 444
assegura, nas relações contratuais
de trabalho, a livre estipulação das
partes, no que não contravenha disposições tutelares do empregado ou
contratos coletivos. Tal norma vem
invocada nas razões da Recorrida.
Não provém dela, no entanto, a
exigibilidade dessa obrigação da Recorrente. Antes estará na qualidade
de norma de Regulamento de Empresa, que possuem os Avisos 64 e
85, contendo tais estipulações unila-
terais da parte empregadora. Tais
condições agregam-se à relação de
emprego, em definitivo. Não podem
ser alteradas, devido à vedação de
modificação unilateral das condições
de trabalho e à nulidade das que,
ajustadas, resultem em prejuízo direto ou indireto ao empregado (CTL,
468).
4 — Norma regulamentar da empresa e incorporada, como tal, ao
contrato de trabalho, questiona-se
neste Recurso Extraordinário a
competência para dirimir dissídio
nascido dela.
5 — A Recorrente assevera a ofensa à Constituição Federal, art. 142,
pelo acórdão do Tribunal Superior do
Trabalho, que aceitou a competência
para a questão.
As suas razões no Recurso Extraordinário advertem que a nova
redação dada à norma constitucional
do art. 142 afastou-se do que dispunha a Constituição Federal de 1946,
art. 123.
Se naquela Constituição, à Justiça
do Trabalho incumbia julgar questões
«entre empregados e empregadores e as demais controvérsias
oriundas das relações de trabalho
regidas pela legislação especial».
— contudo agora é outra a norma,
quando não mais acolhe quaisquer
«controvérsias oriundas das relações
de trabalho» — no entender da Recorrente. E observa que o art. 142 da
Constituição Federal de 69 estabelece a exigência de lei, para levar a
competência trabalhista até tais
questões, nas quais não se defrontam as próprias partes originárias
da relação de emprego.
6 — Em abono da tese, a Recorrente cita acórdão do plenário
deste Supremo Tribunal Federal, no
RE 89.201-0-SP, relator Ministro Diaci Falcão, em 16-03-69 com a ementa:
R.T.J. — 100
«Reclamação de viúvas, postulando complementação de pensões,
em decorrência de cláusula de contrato de trabalho de seus falecidos
maridos — Incompetência da Justiça do Trabalho. Precedentes do
STF (RE 89.154, 89.199, 89.200,
89.203).
7 — O eminente Ministro Cordeiro
Guerra, relator deste Recurso Extraordinário, em sessão de 22-04-81,
votou pelo conhecimento e provimento deste Recurso Extraordinário. Deferiu à Justiça comum, o julgamento
da reclamação. S. Exa. invoca o art.
142 da Constituição Federal e a opinião do Ministro Xavier de Albuquerque, votando sobre a matéria o
qual observou em questão idêntica:
«O litígio não se fere entre empregado e empregador, a lei poderá atribuí-lo à Justiça do Trabalho.
E o que diz a Constituição. Essa lei
não existe, então a Justiça do Trabalho não é competente.»
Pedi vista —Ese antes não trouxe
esse voto, foi por deferência à solicitação de adiamentos, do ilustre advogado da Recorrente.
8 — Atentei a alteração havida na
Constituição no trato da competência
da Justiça do Trabalho.
O art. 142 exige em questões nas
quais não se confrontem empregado
e empregador, que esteja em lei, a
competência da Justiça do Trabalho
para dirimir dissidlos que sejam no
entanto oriundos da relação de emprego.
9 — Ao que me parece, o texto
constitucional inspirou-se com delicada atenção ao que dispunha a legislação trabalhista, sobre competência. A Constituição podia, é óbvio,
radicalmente, inovar na matéria. —
O certo porém é que não o fez.
A redação, que então deu ao art.
142, manteve a amplitude das com-
255
petências, que a legislação trabalhista já atribula, no art. 652, às juntas
de conciliação e julgamento.
A Consolidação nele já previa,
com largueza posta em lei, — na lei
que neste Recurso Extraordinário se
exige, para a competência especial
— que a competência da Justiça do
Trabalho poderá ir além das questões travadas entre empregado e
empregador, competência esta que
ela disciplina em razão do lugar, nos
arts. 650 e 651, e em razão da matéria, no art. 652.
Neste porém, no art. 652, a CLT
estende a competência da Justiça do
Trabalho. Leva-a também a outros
vínculos que não consistem em relação de emprego, — pois torna-a competente, no art. 652, III, para aquelas
questões oriundas do serviço de autónomo, desde que esse empreiteiro
seja operário ou artífice. Nestes casos, não se defrontam empregado e
empregador, dada a eventualidade
do trabalho. É questão de competência constante de lei, esta, do item
III, art. 652 da CTL. A lei não fica aí,
porém.
No item IV, do art. 652 generalizadamente a CLT estabelece a competência das Juntas Trabalhistas para
«os demais dissIdlos concernentes ao contrato individual de trabalho».
Consta, portanto, de lei, como o exige a Constituição, a distensão da
competência trabalhista, pira as
chamadas «demais questões», que
pertinem com o contrato individual
de trabalho. E se estas questões fossem a relação processual em ação
entre empregado e empregador, a
lei não se haveria de referir a demais questões concernentes ao contrato individual de trabalho. Só o faz
por prever dissIdlos pertinentes com
relação de emprego, mas com outras
partes, como o caso presente. —
de lei.
256
R.T.J. — 100
Verifico que o ponto de referência
Sou pois do entendimento, que a
competência trabalhista para diri- na jurisprudência desta Corte, no tomir a questão de que trata este Re- cante á questão de competência sob
curso Extraordinário, — (comple- exame, reside no julgamento pelo
mentação de aposentadoria de em- Pleno, do RE 89.546, datado de 5-10prego, e complementação de pensão 1978, quando eu ainda não participaà viúva deste) — assenta em lel a va desta Casa. AI foram enunciadas
debatidas todas as posições, vindo
saber, no art. 652 n. IV da CLT, pois
eminente Relator para o acórdão,
a matéria versada é condição do
contrato de trabalho estipulado no Ministro Dedo Miranda, à formulação da seguinte ementa:
regulamento da empresa.
Por conseguinte, não ocorre afron«Trabalho. Pensão. Complementa à Constituição, art. 142, pelo acórtação. Atribuída pela autora á emdão recorrido.
presa a responsabilidade pela comNão conheço do recurso.
plementação, em virtude de cláusula do contrato de trabalho. Nesse
EXTRATO DA ATA
caso, competente é a Justiça do
Trabalho para a ação da beneficiáRE. 91.259 — SP — Rel.: Min. Corria da pensão.»
deiro Guerra. Recte.: Companhia
Foram vencidos os Ministros CorMunicipal de Transportes Coletivos.
(Adv.: Célio Silva). Recdo.: Lucrezia deiro Guerra, Relator, Xavier de AlCarrieri Colaclocco. (Adv.: Sid H. buquerque, Antonio Neder e Djaci
Riedel de Figueiredo, Sérgio Roberto Falcão.
Alonso, Ulisses Riedel de Resende e
No entanto, a posição não era
outros).
inaugural, pois na mesma assentaDecisão: Pediu vista o Ministro da, o eminente Ministro Thompson
Rafael Mayer, após o voto do Minis- Flores se reporta a precedentes de
tro Relator que conheceu do recurso igual entendimento, que conferi: Ag.
e lhe deu provimento, e o voto do Mi- Inst. (AgRg) n? 61.886, julgado pelo
nistro Clovis Ramalhete, não conhe- Pleno, em 05-12-1974, versando suplecendo do recurso.
mentação do sistema previdenciário
Presidência do Senhor Ministro através de cláusulas contratuais priXavier de Albuquerque. Presentes à vadas, reclamada pela viúva do emSessão os Senhores Ministros, Djaci pregado (RTJ — 76-754). Assim tamFalcão, Leitão de Abreu, Cordeiro bém, no julgado no RE 77.535, de 22Guerra, Moreira Alves, Cunha Pei- 5-74, pertinente a reclamação trabaxoto, Soares Mufioz, Dedo Miranda, lhista visando complementação de
Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. aposentadoria ou pensão (RTJ — 73Procurador-Geral da República. Dr. 514).
Firmino Ferreira Paz.
Entretanto, a partir da referência
Brasília, 10 de junho de 1981 — que destaquei, a jurisprudência se
Jonas Célio Monteiro Coelho, Secre- tem cristalizado, no sentido de firtário.
mar a competência da Justiça do
Trabalho para o deslinde da relação
VOTO (VISTA)
juridico-previdenciária, de ordem
privada', sob a forma de pensão,
O Sr. Ministro Rafael Mayer: Pedi quando tenha fonte no contrato de
vista para repassar os precedentes trabalho. E o que se vê, por exemdesta Corte, dados como conflitantes plo, do RE 90.120, Relator o eminenem relação ao ponto controvertido.
te Ministro Decio Miranda, e RE
R.T.J. — 100
257
91.257, Relator o eminente Ministro de trabalho. Tanto a aposentadoria
Soares Mufroz, reiterativos da orien- como a pensão complementares, em
tação, ambos da mesma data de 22- tais casos, seriam um *reflexo
11-1979.
jurídico do contrato, efeito residual
da cláusula que deu embasamento à
Entretanto, como aliás demonstra- pretensão». Distinta é a hipótese em
do no voto do eminente Relator, ou- que o benefício previdendário é de
tra vertente da jurisprudência exclui ordem estatutária e não contratual,
da competência da Justiça do Traba- sem que a prestação se origine de
lho, deferindo-a à Justiça Comum, uma estipulação emergente de relaas espécies previdenciárias decor- ção jurídico-trabalhista.
rentes de norma estatutária e não
contratual, no que se dá conseqüênCom reverência à douta argumencia e coerência às proposições tação do eminente Relator, que não
implícitas nos precedentes.
desconhece essa constante da jurisprudência, senão que propõe, com
Assim, o julgamento no RE 89.203, inteligência e brilho, o seu reexame,
Relator a eminente Ministro Soares cuido permanecer conforme à orienMufloz (RTJ — 88-862), RE 89.199, tação que à razoabilidade acresce a
Relator o eminente Ministro Cunha constância. Acompanho, portanto, o
Peixoto (RTJ-94-1211) e RE 89.201, voto do eminente Ministro Clovis RaRelator o eminente Ministro Djaci malhete, não conhecendo do recurso.
Falcão, que se reporta entre outros
ao precedente supracitado, em que
VOTO (PRELIMINAR)
Relator o eminente Ministro Soares
Mufloz (RTJ 285).
Sr. Ministro Dedo Miranda: Sr.
Presidente, na certeza de se tratar
Este último julgado é que foi invo- de pensão instituída pela própria
cado, pelo eminente Ministro Cordei- empresa, competente é a Justiça do
ro Guerra, no julgamento do RE n? Trabalho.
91.759, no qual era a mesma a Recorrente do caso sub judice, e em
De acordo com o eminente Minisque viúva de servidor postulava
complemento de pensão, para dar tro Rafael Mayer, não conheço do
pela incompetência da Justiça do recurso.
Trabalho, e que obteve a adesão
VOTO (PRELIMINAR)
unânime do Plenário. Cuido, entretanto, que essa remissão a precedenSr. Ministro Soares Muiloz: Sr.
tes que se põem na linha da compePresidente,
acompanho o voto do
tência da Justiça Comum para os casos de previdência de natureza esta- eminente Ministro Clovis Ramalhete
tutária, esmaece a significação que com as especificações do eminente
se pretende de se ter ai uma tomada Ministro Rafael Mayer. Não conheço
de posição do Plenário ao arrepio de do recurso.
entendimento consolidado.
A constante da jurisprudência se
VOTO (PRELIMINAR)
faz, portanto, no sentido da competência da jurisdição especializada
Sr. Ministro Moreira Alves: Sr.
para as questões pertinentes à com- Presidente, já por diversas vezes teplementação de aposentadoria ou nho votado no mesmo sentido em
pensões, ou quando emergentes de que se pronunciou o Sr. Ministro Clocláusulas estabelecidas no contrato vis Ramalhete.
258
R.T.J. — 100
Acompanho, pois, o voto de S. (Adv.: Célio Silva). Recdo.: Lucrezia
Exa. e dos que o seguem, no sentido Carrier' Colaciocco. (Adv.: Sid H.
de não conhecer do recurso.
Riedel de Figueiredo, Sérgio Roberto
Alonso, Ulisses Riedel de Resende e
outros).
VOTO (PRELIMINAR)
Decisão: Não se conheceu do reO Sr. Ministro Xavier de Albuquer- curso, vencido o Relator. Votou o
que (Presidente): Também sigo a ju- Presidente.
risprudência estabelecida há vários
Presidência do Senhor Ministro
anos, ainda que contra meu voto.
Xavier de Albuquerque. Presentes à
Com ressalva do meu ponto de vis- Sessão os Senhores Ministros Djaci
ta, peço licença ao eminente Relator Falcão, Cordeiro Guerra, Moreira
para também não conhecer do recur- Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufioz,
so.
Decio Miranda, Rafael Mayer e Néri
da Silveira. Ausentes, justificadamente, os Ministros Clovis RamalheEXTRATO DA ATA
•
te e Firmino Paz.
RE. 91.259 — SP — Rel.: Min. CorBrasília, 10 de setembro de 1981 —
deiro Guerra. Recte.: Companhia Jonas Célio Monteiro Coelho, SecreMunicipal de Transportes Coletivos tário do Tribunal Pleno.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 91.262 — GO
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão.
Recorrente: Terezinha Ferreira Gouveia — Recorrido: Celestino Gouveia.
Recurso de apelação. Intimação ao advogado das partes, pelo escrivão. Colhido o «ciente», se o escrivão aceita a data consignada pelo
advogado, no momento em que apõe sua assinatura, não havendo
qualquer impugnação, prevalece a data do «ciente» sobre a certificada pelo próprio escrivão (art. 239 do CPC). Recurso extraordinário
conhecido, em virtude do dissídio jurisprudenclal, e provido.
ACORDA°
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade
de votos e na conformidade da ata
do julgamento e das notas taquigráficas, conhecer do recurso e dar-lhe
provimento, nos termos do voto do
Ministro Relator.
Brasília, 26 de setembro de 1980 —
Djaci Falcão, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Djaci Falcão: Adoto
como relatório o despacho que admitiu o recurso:
«Vistos, etc.
Terezinha Ferreira Gouveia, irresignada com o acórdão unânime
de fls. 124-5, da Segunda Câmara
ave', nos autos da apelação eive'
n? 11.330, da Comarca de Itapuranga, sendo 1° apelante a ora recorrente e 2? apelante Celestino Gou-
R.T.J. — 100
veia e apelados os mesmos, recorre, extraordinariamente, para o
Egrégio Supremo Tribunal Federal, com fundamento no art. 119,
inc. III, letra d, da Constituição
Federal.
Houve impugnação.
Versa a espécie sobre a ação de
desquite (hoje separação judicial),
julgada procedente no Juízo de primeiro grau, com o reconhecimento
de culpabilidade de ambos os cônjuges.
Estes interpuseram recursos
apelatórios, que não foram conhecidos pelo v. aresto recorrido, assim ementado:
EMENTA: Apelação. Intempestividade. E intempestivo o
apelatório manifestado após o decurso de 30 dias da intimação do
advogado da parte, atestada pelo
serventuário oficiante no processo.
Recursos apelatórios não conhecidos.
Embora tenha indicado apenas a
alínea d do permissivo constitucional a recorrente fundamenta o extraordinário na alegação de ocorrência de dissídio jurisprudencial e
negativa de vigência do dispositivo
da lei processual civil.
Tendo em vista as reiteradas decisões do Excelso Pretório no sentido de que a errônea indicação ou
omissão da alínea do preceito constitucional não impede o conhecimento do apelo extremo, passamos
a examinar, na devida ordem, as
questões propostas pela recorrente.
Contra o fundamento da intempestividade do recurso apelatório,
a recorrente sustenta que o escrivão exarou certidões de intimação
dos apelantes, datando-as como se
eles tivessem sito intimados da
259
sentença no dia 20 de maio de 1978,
ao passo que, na realidade, só foram intimados no dia 05 de junho
do mesmo ano, como se vê dos
'cientes' de seus patronos, no verso
de fls. 80 dos autos.
Quer dizer a recorrente que o patrono do segundo apelante não teria nenhum interesse de colaborar
com o advogado da primeira apelante, no sentido de este recuperar
o prazo perdido, como não o teria,
também, o julgador de primeiro
grau de colaborar com uma das
partes em detrimento da outra,
quando despachou recebendo os recursos de ambas as partes.
Assim, como ponto central da argüição — contrariedade ao disposto no art. 239, parágrafo único, inciso III do Código de Processo Civil —, afirma a recorrente que o
serventuário da justiça tinha o dever legal de exigir o ciente dos advogados de uma e outro dos apelantes, e, no caso de recusa, incluir
na certidão, os nomes das pessoas
que assistiram à recusa.
A espécie dos autos tem semelhança com a que foi objeto do Recurso Extraordinário interposto
nos autos da apelação cível n?
11.128, da Comarca de Rumblara,
sendo recorrente João Quirino Borges e outros e recorridos Oswaldo
Galdino de Oliveira e outros (despacho presidencial datado de 02-0279), em que, igualmente, entre a
certidão do escrivão e a cota do
ciente do advogado datada com data posterior, o Coleglado Julgador
optou pela primeira, para efeito de
contagem do prazo do recurso formulado.
No caso presente, no mesmo sentido, o acórdão sob exame, a nosso
ver, deu razoável interpretação à
lei.
260
R.T.J. — 100
Reportamo-nos às razões expostas no mencionado despacho, por
aplicáveis à espécie.
Com efeito, a lei confere à declaração oficial do serventuário o caráter de autenticidade, revestindoa de fé pública, que só cede diante
de cabal prova em contrário.
Na hipótese dos autos, o advogado da ré não se recusou a apor a
nota de ciente. Portanto, não era
caso de se colher na certidão os nomes de testemunhas que assistiram ao ato.
O processualista E. D. Moniz de
Aragão, em Comentários ao Código
de Processo Civil, Ed. Forense, II
Vol., pág. 250, ao estudar o art. 239
e seu parágrafo único, concluiu
que as regras do texto não se dirigem aos advogados, e sim, unicamente, às outras pessoas, após salientar:
«1:caríssimas são as intimações
procedidas pelos escrivães que não
se dirijam aos advogados que comparecem ao cartório, e são geralmente conhecidos. Torna-se, assim, supérfluo exigir-lhes identidade, descrevê-los, oferecer-lhes
contra-fé e convidá-los a apor a nota de ciente, providenciando testemunhas para o caso de recusa
Também os oficiais de justiça,
quando intimam advogados ficam
dispensados de tais formalidades».
Assim, com base em negativa de
vigência à lei federal, não vemos
viabilidade no apelo extremo.
Quanto à divergência pretoriana,
a recorrente traz à colação aresto
publicado, na integra, no conhecido
Repertório de Jurisprudência do
Código de Processo Civil, de Edson
Prata, Ed. Universo de Direito —
1977, 4? vol. págs. 1.246-125, e juntado a fls. destes autos, por fotocópia
autenticada.
Verifica-se tratar-se de acórdão
de 16-06-76, do T.A. Civil do Tribu-
nal de Justiça de Minas Gerais, na
apelação civel n? 8.075, em caso
que guarda identidade com o dos
presentes autos, do qual apenas se
distingue pelo fato de que, nestes,
os recursos apelatórios de ambas
as partes foram julgados intempestivos sob o mesmo fundamento,
quando a intimação dos respectivos advogados se deu em idênticas
circunstâncias e, possivelmente,
na mesma data.
O acórdão-padrão decidiu diferentemente, como se lê de seu contexto, do qual nos permitimos extrair os seguintes excertos:
No caso presente, após lavrar
sua certidão de intimação da sentença às partes, às fls. 59 v?, co-lheu o serventuário, os cientes dos
respectivos advogados, ao pé da
certidão.
Pois bem: embora a certidão esteja datada de 12 de maio de 1975,
o ciente do advogado dos vencedores do pleito está datado de 13 de
maio, enquanto que o do advogado
da vencida traz a data de 16 de
maio.
Ora, se se tratasse tão-somente
da data lançada por quem perdeu
a demanda, por dilatar o prazo recursai, a circunstância teria pouco
relevo. Mas, no instante em que
também o advogado do vitorioso
corrige a data da certidão por via
oblíqua, a presunção que militava
em favor dela perdeu toda significação. Que interesse teria o patrono de quem ganhou o pleito em infirmar a data de sua intimação, se
não sucumbiu sob nenhum aspecto?
Aliás, essa circunstância não
passara despercebida no voto do
Eminente Juiz Ottogamiz de
Oliveira, que lhe emprestou a devida significação.
Não há dúvida que o ciente não é
indispensável. Todavia, no instante
em que o escrivão o colhe, e aceita
R.T.J. — 100
a restrição, ela enfraqueceu definitivamente o valor probante da certidão.
Temos, pois, como ocorrente a
semelhança dos casos confrontais,
sendo de ressaltar, porém, que na
hipótese destes autos, após a certidão de sua intimação, datada de 20
de maio de 1978, um tanto à margem, o patrono do 2? apelante apôs
ciente com a data de 05-06-78, e,
seguidamente, após a certidão de
intimação, também datada de 20
de maio de 1978, e à margem apôs
seu ciente o advogado da 1! apelante com a data de 05-6-78; e que
ambos se consideraram parcialmente vencidos, tanto que manifestaram o apelo, a final, julgado intempestivo.
Damos como demonstrada a divergência de interpretação.
Pelo exposto, com apoio na letra
do permissivo constitucional, admitimos o recurso, no efeito devolutivo, e determinamos que se abra
vista dos autos aos recorrentes e
aos recorridos, sucessivamente,
para, no prazo legal, apresentarem
suas razões.
Publique-se.
Goiânia, 03 de maio de 1979 —
Desembargador Paulo de Amorim,
Presidente» (fls. 144 a 147).
Com as razões de fls. 150 a 152 e
contra-razões de fls. 156, subiu o processo a esta Corte, onde recebeu o
seguinte parecer:
«1 — Contrariamente ao decidido
pelo acórdão de fls. 124 não nos parece que a questão da intempestividade dos recursos de apelação
apresentados pelos desquitandos
encontre solução na afirmação de
que os atos dos serventuários da
Justiça merecem fé pública e somente prova inconcussa pode
destruí-los. Não se trata, no caso
dos autos, de tal situação. E certo
que em todas as certidões de fls.
261
80v. consta a data de 20-5-78. Também é certo que os patronos dos
desquitandos colocaram seus respectivos cientes com a data de 5-678, ao lado das intimações. Na instância inicial não surgiu controvérsia a respeito da tempestividade
dos recursos apresentados, nem
por parte do Juiz, nem por parte
do Escrivão, isto é, este poderia
esclarecer se fosse o caso, que
procedera à intimação na data
constante do carimbo. Aliás, se
desnecessário fosse o ciente das
partes, certamente ele não contraria dos autos, é óbvio. Se constou o
ciente, sem a impugnação do Escrivão, o que temos, então, é justamente o contrário do declarado pelo acórdão recorrido, isto é, o Escrivão atestou a data da intimação
como sendo de 05-6-78. Portanto,
não se trata de contradição entre
atos de serventuário e atos de partes.
2 — Conforme se declarou no
acórdão trazido ao dissídio do Tribunal de Alçada de Minas Gerais,
verbis, não há dúvida que o ciente
não é indispensável. Todavia, no
instante em que o Escrivão o colhe, e aceita a restrição, ela enfraqueceu definitivamente o valor
probante da certidão.
3 — Tratando-se de ação de desquite e comprovado o alegado dissídio, nos termos do despacho admissivo de fls. 144 do Des. Presidente Paulo Amorim, somos pelo conhecimento e provimento do recurso extraordinário a fim de determinado ser ao Tribunal a quo o examè do recurso de apelação apresentado pela ora recorrente, afastada a preliminar de intempestividade, conforme o direito.
Brasília, 03 de setembro de 1980
Soares,
Leite
Mauro
Subprocurador-Geral da República
( fls. 160 a 161).
262
R.T.J. - 100
VOTO
O Sr. Ministro Djaci Falcão: O
acórdão objeto do recurso tem o seguinte teor:
«EMENTA: Apelação. Intempestividade. E intempestivo o apelatório manifestado após o decurso de
30 dias da intimação ao advogado
da parte, atestada pelo serventuário oficiante no processo.
Recursos apelatórios não conhecidos.
E certo que os aludidos advogados lançaram cientes nos autos com
data de 05 de junho de 1978. Tais
ocorrências, no entanto, não podem destruir a fé pública que desfrutam os atos dos serventuários
da justiça. Essa fé pública, somente poderá resultar desfeita através
prova inconcussa em ordem a
contraditá-la. Isso não aconteceu
na hipótese em apreço.
Sendo assim, acolhido o parecer
ministerial, não conheço dos apelatórios porque, desenganadamente,
ACORDÃO
manifestados fora da atempação
legal.
Vistos, relatados e discutidos esPreliminarmente, é o que voto»
tes autos de apelação cível n?
(fls.
124).
11.330, da Comarca de Itapurunga,
Não padece dúvida de que o enten1? apelante Terezinha Ferreira
Gouveia, 2? apelante Celestino dimento sufragado no aresto recorrido destoa do que serviu de suporte
Gouveia e apelados os mesmos.
ao acórdão paradigma, do Egrégio
Acorda o Tribunal de Justiça, Tribunal
de Justiça de Minas Gerais,
por sua segunda Câmara Cível à
unanimidade, não conhecer dos re- in verbis:
«No caso presente, após lavrar
cursos apelatórios, nos termos do
sua certidão de intimação da senvoto do Relator.
tença às partes, às fls. 59v, colheu
Custas, pelos apelantes.
o serventuário os cientes dos resPresidência do Senhor Desempectivos advogados, ao pé da certibargador Leôncio Pinheiro de Ledão. Pois bem: embora a certidão
mos Com o Relator votaram os seesteja datada de 12 de maio de
nhores Desembargadores Mauro
1975, o ciente do advogado dos venCampos e Celso Fieury.
cedores do pleito está datado de 13
Goiânia, 06 de fevereiro de 1979
de maio, enquanto que o do advo— Ilegível, Presidente — Ilegível,
gado da parte vencida traz a data
Relator» (fls. 125).
de 16 de maio.
Ora, se se tratasse tão-somente
Voto
da data lançada por quem perdeu
a demanda, para dilatar o prazo
Senhor Presidente, os advogados
recursal, a circunstância teria poudas partes foram intimados da senco relevo. Mas, no instante em que
tença proferida no primeiro grau
também o advogado do vitorioso
de jurisdição no dia 20 de maio de
corrige a data de certidão, por via
1978, consoante atestam as certioblíqua, a presunção que militava
dões exaradas pelo serventuário às
em favor dela perdeu a significafls. 80v. dos presentes autos. Tamção. Que interesse teria o patrono
bém o representante do Ministério
de quem ganhou o pleito em infirPúblico foi intimado nessa mesmar a data de sua intimação, se
ma data. Os recursos apelatórios,
não sucumbira sob nenhum aspecporém, somente foram manifestato?
dos, respectivamente, nos dias 19 e
20 de junho.
R.T.J. — 100
Não ha dúvida que o ciente não é
indispensável. Todavia, no instante
em que o escrivão o colhe, e aceita
a restrição, ela enfraqueceu definitivamente o valor probante da certidão» (fls. 129 a 130).
Impõe-se, em conseqüência, o conhecimento do recurso
Em caso de intimação, não há regra exigindo o «ciente» (art. 239 do
C.P. Civil). Segundo pondera Hélio
Tornaghl:
«Seja como for uma coisa é certa: o execlitor da intimação deve
pedir o ciente do intimado. Se esse
o recusa, deve aquele incluir na
certidão os nomes das pessoas que
assistiram à recusa» (Comentários
ao Cód. de Proc. Civil, Vol. II, pág.
212).
No caso dos autos, não houve recusa na aposição do ciente. O problema envolve a data em que se deu a
intimação. Não obstante datada de
20-5-1978 a certidão de intimação
passada pelo escrivão, os «cientes»
apostos pelos advogados das partes
integrantes da causa, têm a data de
05-06-1978. Vale ponderar que, no
juízo de origem, não houve qualquer
dúvida à cerca da tempestividade do
recurso, quer de parte do escrivão,
seja por parte do juiz.
263
Ora, se colhido o «ciente» nos autos o escrivão aceitou a restrição
quanto a data em que se deu a intimação, ai não há que se invocar a
credibilidade decorrente da fé pública (art. 239 do C.P.C.).
Ex posais, conheço do recurso e
dou-lhe provimento, a fim de que,
afastada a preliminar de intempestividade, prossiga a Egrégia Câmara
Chiei no julgamento da apelação, como de direito.
EXTRATO DA ATA
RE. 91.262— GO — Rel.: Min. Djaci Falcão. Recte.: Terezinha Ferreira Gouveia (Advs.: Armando Carneiro Vaz e Jucy Gaivão Costa). Recdo.: Celestino Gouveia (Advs.: Ilza
Ferreira da Silva e outro).
Decisão: Conhecido e provido nos
termos do voto do Ministro-Relator.
Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República o Dr. Mauro Leite Soares.
Brasília, 26 de setembro de 1980 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 91.338 — MG
(Primeira Turma)
de.
Relator: O Sr. Ministro Soares Mufioz.
Recorrente: Estado de Minas Gerais — Recorrido: José Alípio de RezenEstabilidade. Art. 177, 2?, da Carta de 1967.
Funcionário público federal licenciado para tratar de interesses
particulares e no exercício de cargo público estadual, à data da promulgação da Constituição de 1967. Exoneração, a pedido, do primeiro
cargo pouco depois. Soma dos dois tempos de serviço. Acumulação
enquadrável na permissão prevista no art. 185 da Constituição de
1946. Acórdão que fez justiça sem afrontar os dispositivos constitucionais questionados, naquilo que têm de substancial. Recurso extraordinário não conhecido.
264
R.T.J. — 100
ACÓRDÃO
vencidos dos Desembargadores
Gonçalves de Rezende (julgamento
da apelação), Jair Leonardo e LinVistos,
coln Rocha (julgamento dos embarAcordam os Ministros do Supremo
gos). São afrontas que autorizam o
Tribunal Federal, em Primeira Turrecurso com amparo na alínea a,
ma, por maioria de votos e na condo inciso III, do art. 119, da Constiformidade das notas taquigráficas,
tuição Federal ora vigente.
não conhecer do recurso.
8 — Na verdade, desde 1966, o
Brasília, 11 de novembro de 1980 —
Recorrido acumulava ilicitamente
Thompson Flores, Presidente —
o exercício de dois (2) cargos, porSoares Mufloz, Relator.
quanto a Constituição de 1946, vigente à época, vedava expressaRELATORIO
mente tal acumulação.
9 — A acumulação não remuneO Sr. Ministro Soares Mufloz: José
rada
só veio a ser admitida com o
Alípio de Rezende, funcionário públiadvento da Constituição de 1967.
co federal em licença para tratar de
10 — Portanto, não será razoável
interesses particulares, passou, em
aceitar-se que uma infringência de
março de 1966, mediante contrato, a
disposição constitucional possa serexercer as funções de professor do
vir de base para o reconhecimento
Ensino Médio no Instituto de Educado um direito. O que é proibido peção de Minas Gerais, em cujo
la Constituição não pode gerar
exercício se encontrava quando adefeito jurídico». (fls. 132).
veio a Constituição de 1967.
Pelo Presidente do Tribunal de
Requereu ao Estado de Minas Gerais a declaração de sua estabilida- Justiça foi inadmitido o recurso, sob
de, nos termos do art. 177, § 2?, da o fundamento de que:
Constituição de 1967, nas funções de
«O recurso é baldo de sustentaProfessor de Ensino Médio do Instição.
tuto de Educação de Minas Gerais,
«De ver-se, para quem tenha olhos
acrescendo-se ao tempo em que
exerceu essas funções o período ande ver, que o impetrante não afirterior de efetividade no serviço púma ter havido violação da Constituiblico da União.
ção vigente; usa do subterfúgio de dizer que o acórdão desatendeu às
Desatendido na via administratiexigências do § 2?, art. 177. Ora, o
va, propôs ação ordinária contra o
que se pode ter por certo é que o
Estado e obteve êxito em grau de
decisum cuidou de dar exato cumapelação, através de decisão tomada
primento ao preceito constituciopor maioria de votos e mantida nos
nal, o que fez com o exame da proembargos infringentes.
va de satisfação dos requisitos exiO Estado Interpôs recurso extragidos (contagem de tempo de serordinário, pela letra a do permisviço público). O que leva a esta
sivo constitucional, alegando que:
proposição fundamental: para de«1 — O v. acórdão não só desaferir a pretensão posta em juízo, o
tendeu às exigências contidas no §
acórdão examinou a prova docu2?, do art. 177, da Carta de 1967, co-- mental produzida e afirmou estar
mo ainda atribui eficácia jurídica
ela de acordo com a exigência do
a atos ofensivos ao art. 185, da
texto constitucional. O que mostra
Constituição de 1946, que os regia,
escrúpulo e cuidado na aplicação
como reconheceram os rr. votos
nunca vulneração da lei maior.
R.T.J. — 100
Depois, para se aferir se é certa
ou errada a conclusão do acórdão,
o Pretório Excelso deveria descer
ao reexame de prova, matéria que
não merece as honras do apelo extremo (Súmula 279).» (fls. 139 a
190).
Determinei a subida do apelo derradeiro, para melhor exame, provendo o agravo de instrumento em
apenso.
A Procuradoria-Geral da República, em parecer elaborado pelo ilustre Procurador João Boabald de Oliveira Itapary, opinou pelo conhecimento e provimento do recurso,
verbis:
«Trata-se de recurso extraordinário interposto pelo Estado de Minas Gerais contra o v acórdão de
fls. 126-129.
O apelo é tomado com fulcro nas
disposições do artigo 119. III, a, da
Constituição Federal, segundo o recorrente, o v. acórdão atacado teria vulnerado a regra do artigo
177, • 2?, da Constituição Federal
de 1967.
A vulneração decorreria da adição do tempo de serviço prestado à
União Federal ao que fora prestado ao Estado-membro, a fim de
que completados os cinco anos de
serviço público, exigidos no mencionado dispositivo constitucional.
Do exame dos autos, verifica-se
que o voto vencedor, proferido pelo
eminente Desembargador Melo
Junior, destaca:
«De inteira aplicação à espécie
sob julgamento e julgado referido no voto • do Desembargador
Gouthier de Vilhena, segundo o
qual «o servidor contratado, como o Apelante, que à data da
Constituição de 69 já havia completado cinco anos de serviço
público mesmo que prestados a
265
entidades diversas de direito público interno, adquiriu o direito à
estabilidade» (Revista Trimestral de Jurisprudência, Vol. 59,
pág. 531). (fls. 128-9).
Tem-se, pois, a impresssão de
que o r. acórdão atacado estaria
em consonância com orientação já
fixada pela Augusta Corte.
Ocorre, porém, que o RE 71.043
— Si' — referido no voto suso
transcrito — não versou sobre estabilidade adquirida mediante adiÇãO: de tempos de serviço prestados
a diferentes pessoas jurídicas de
direito público. Assim, inviável é,
data venta, que aquela mencionada
decisão seja trazida à colação como precedente fixado pelo Pretório
Excelso.
Quanto à estabilidade conferida
pelo artigo 177, 2?, da Constituição Federal de 1967, parece-nos indiscutível que o tempo de serviço
exigido — cinco anos de exercício
— deve ter sido prestado à mesma
pessoa jurídica de direito público,
à qual servia no dia 15 de março
de 1967.
Para Pontes de Miranda, são
pressupostos do
«... direito subjetivo resultante
da incidência do art. 177, 2?: a)
Haver cargo público, que não fosse de comissão, isto é, que pudesse estar provido definitivamente
(não de funcionários vitalícios).
b) Estar em exercício funcionário interino, vale dizer-se — pessoa que foi nomeada interinamente para exercê-lo (não, se nomeada ad interim, para cargo de
comissão). c) Ter essa pessoa
cinco anos de exercício, pelo menos, o que não é a mesma coisa
que estar há cinco anos no
exercício do cargo, «ininterruptamente». («Comentários à Constituição de 1967». Tomo VI, págs.
423/4).
266
R.T.J. — 100
Ora, se o próprio v. acórdão re- serviço público. Não exige que o
corrido proclama que o autor da mencionado tempo seja no mesmo
ação ordinária não se encontrava, cargo, nem proíbe sejam somados
no cargo, com cinco anos de tempos de serviços prestados a entiexercício, tanto que, para comple- dades distintas (Pontes de Miranda,
mentar esse tempo, adicionou tem- in Comentários, Tomo VI, pág. 424;
po de serviço prestado a outra pes- RE 79.399, Rel.: Ministro Rodrigues
soa jurídica de direito público, co- Alckimin, RE 71.284, rel.: Ministro
mo ocupante de outro cargo, Aliomar Baleeiro).
parece-nos inarredável que o v.
A dificuldade está em que o recoracórdão atacado contrariou as disposições do artigo 177,
2?, da rido se exonerou do cargo público federal em 29.5.67 (fls. 10). Ocorre, no
Constituição Federal de 1967.
que ele deixara o seu
Diante do exposto, opinamos no entanto,
exercício,
como já disse, em 1965,
sentido de que seja conhecido e
para tratar de interesprovido o recurso, para o fim de licenciando-se
reformar a r. decisão recorrida e ses particulares.
restabelecer a de primeira instânForam essas duas singularidades
cia, que julgou improcedente a que
levaram o acórdão recorrido a
ação». (tis. 160 a 162).
julgar procedente a ação, tal como
se vê do voto vencedor proferido peE o relatório.
lo ilustre Desembargador José Arthur, verbis:
VOTO
«a 24 de janeiro de 1967, data da
promulgação da Carta Magna, o
apelante era servidor do Estado,
O Sr. Ministro Soares Muiloz (Reexercendo as funções de Professor
lator ): Mandei que fosse processado
Auxiliar de Ensino Médio, onde reo recurso extraordinário porque ele
gia aulas extranumerárias e contacontém nuances que me suscitaram
va mais de cinco anos de serviço
fundadas dúvidas.
público,
se computado o tempo de
Na data da promulgação da Carta
serviço que anteriormente prestade 1967, o recorrido era funcionário
ra à União.
do Serviço Federal de Promoção
Agropecuária em Minas Gerais, liNa realidade não estava ele acucenciado para tratar de interesses
mulando
cargos, pois, desde abril
particulares, e, mediante contrato
de
1965
esteve
licenciado do servicom o Estado de Minas Gerais, exerço
público
federal
— licença sem
cia as funções de Professor Auxiliar
remuneração — para lecionar no
de Ensino Médio do Instituto de EduInstituto de Educação. Tenho que a
cação de Minas Gerais. Seu tempo
lei veda a acumulação remunerada
de serviço público federal remontae que, in casu, não houve e nem
va ao ano de 1952, e a licença já refeserviços paralelos eram prestados
rida se iniciara a 19.5.65. O contrato
à União e ao Estado.
com o Estado de Minas Gerais, de
seu turno, é de 1966.
Estou em que correto é o pareA adição desses dois períodos é
cer da douta Procuradoria-Geral
possível. O art. 177, 2?, da Constida Justiça da lavra do eminente
tuição de 1967 contenta-se que o serProcurador Marcos Elias, que acolho como fundamento do presente
vidor, à data de sua promulgação,
possuísse, pelo menos, cinco anos de
voto». (fls. 108).
R.T.J. — 100
acórdão, assim decidindo, não
ofendeu o art. 177, 2?, da Constituição de 1967. De outro lado, a acumulação de um cargo em licença não
remunerada com outro remunerado
obrigaria o funcionário a optar por
um deles ( art. 14 do Decreto n?
35.956, de 1954), e essa opção foi feita
pelo recorrido, exonerando-se do serviço público federal. Ademais, a acumulação em referência era enquadrável na permissão prevista no art.
185 da Constituição de 1946, vigente à
época.
A decisão recorrida foi justa, sem
afrontar os dispositivos constitucionais questionados, naquilo que têm
de substancial.
Ante o exposto, não conheço do recurso extraordinário.
267
VOTO
Sr. Ministro Cunha Peixoto: Senhor Presidente, quanto ao problema
da acumulação, data venta, do eminente Ministro Rafael Mayer, colocome de acordo com o eminente Ministro Soares Mufloz, principalmente
porque não podemos examinar o problema em face de duas Constituições.
que me leva a divergir de S.
Exa., é o entendimento de ser o art.
177 um dispositivo de exceção, e,
conseqüentemente, não se pode dar
a um funcionário nova estabilidade.
Ora, se ele era estável no Governo
Federal, não poderia adquirir essa
estabilidade por um dispositivo excepcional, somando, para nova estabilidade, o tempo de Serviço Federal
ao tempo...
VOTO
Sr. Ministro Soares Mufloz (ReSr. Ministro Rafael Mayer: Sr. Mor): Poderia conseguir estabilidaPresidente, data venia do voto do de, mas ele só a requereu no serviço
eminente Relator, tenho ponto de estadual, e não no federal.
vista firmado e antigo quanto à
O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Mas
abrangência da proibição de acumujá era funcionário antigo, tanto
lar mesmo quando, em um dos car- ele
tinha direito a licença para tragos acumulados, o funcionário se que
tar
de
interesses particulares. Por
ache em licença não remunerada. O este motivo,
acho que ele não é
fato de estar em licença não remu- abrangido pelo art.
177.
nerada não lhe retira a titulariedade
Assim,
conheço
do recurso e lhe
de um cargo. Isso é o que a Constituição tem em mira, inclusive para evi- dou provimento.
tar, no tempo mesmo em que se
VOTO PRELIMINAR
proibiu a acumulação, o empreguismo, os chamados «cabides», que
Sr. Ministro Xavier de
existiam naquela época. Desde Rui Albuquerque:
Sr. Presidente, consiBarbosa se entende que não é preci- deradas as circunstâncias
do caso,
so que a acumulação seja, necessa- acompanho o eminente Relator,
data
riamente, remunerada — como, venta, dos colegas que disssentem.
aliás, a Constituição de 46 mantinha
recorrido, quando sobreveio a
o qualificativo — para que essa proiConstituição de 1967, tinha quinze
bição se configure.
de serviço público federal, conPor isso, data venta, entendo que anos
tados desde 1952. Aos primeiros cinestá ofendido o dispositivo constitu- co
anos teria adquirido, na esfera fecional que proibia a acumulação, co- deral,
a estabilidade, ainda que não
mo ainda na Constituição vigente es- fosse concursado;
se o fosse, tê-la-ia
tá proibido.
adquirido com dois anos. De sorte
Conheço do recurso e lhe dou pro- que podia prescindir, folgadamente,
vimento.
do tempo federal que lhe assegurou
268
R.T.J. - 100
Todavia são elas, as peculiaridaa estabilidade ordinária, para usar o
remanescente desse tempo federal e des, que me levam a admitir não ter
adquiri-la, a estabilidade excepcio- havido desatenção ao disposto no
nal, no âmbito estadual. Ademais, o art. 177, 2?, da Constituição de 1967.
caso é muito caprichoso e admito
Assim, com a vênia devida, tamque haja sido julgado, diante de suas bém não conheço do recurso.
conotaçôes, pela Justiça local, conforme o direito.
EXTRATO DA ATA
Quanto à utilização de tempo de
serviço prestado à entidade diversa,
RE 91.338— MG — Rel.: MM Soatambém a admito e lembro, além
dos precedentes já mencionados pelo res Muftoz. Recte.: Estado de Minas
eminente Relator, o RE 86.205, que Gerais (Adv.: Newton N. Campos,
relatei na Segunda Turma a 12 de Francisco Deiró Couto Borges e
novembro de 1976, no mesmo senti- Wanderley Gregoriano de Castro).
Recdo.: José Alipio de Rezende
do.
( Adv.: Erasmo Barros de Figueiredo
Assim, não conheço do recurso.
Silva, Rafael Eugêncio de Azeredo
Coutinho e outros).
VOTO (PRELIMINAR)
Decisão: Não conheceram do recurso, vencidos os Ministros Rafael
O Sr. Ministro Thompson Flores: Mayer e Cunha Peixoto. Falou pelo
(Presidente) — Peço vênia para Recte. o Dr. Francisco Deiró Couto
acompanhar o voto do eminente Re- Borges
lator.
Presidência do Senhor Ministro
Faço-o ante as peculiaridades re- Thompson Flores. Presentes á Sesveladas na espécie e salientadas nos são os Senhores Ministros Xavier de
votos dos eminentes Ministros Rela- Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares
Mtuloz e Rafael Mayer. Subprocurator e Xavier de Albuquerque.
da República, Dr. FrancisNão fossem elas, as peculiaridades dor-Geral
que dão à controvérsia colorido di- co de Assis Toledo.
Brasília, 11 de novembro de 1980.
verso, é possível que viesse a aderir
aos votos que estão provendo o re- — Antônio Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
curso.
EMBARGOS NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 91:405 (AgRg) — RJ
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Antonio Neder.
Agravante: Fenix Comercial e Construtora Limitada.
Embargos de divergência. É recurso que tem cabimento no caso do acórdão embargado e o acórdão-padrão versarem o mesmo tema jurídico em termos discordantes. Se os dois acórdãos julgaram a
mesma questão federal em termos que se harmonizam, dito recurso
não tem cabimento.
Decisão liminar que negou seguimento aos referidos embargos.
3. Agravo regimental a que o STF nega provimento.
R.T.J. — 100
ACORDAO
Vistos e relatados estes autos de
Agravo Regimental nos Embargos
em Recurso Extraordinário n?
91.405-6, do Estado do Rio de Janeiro, em que é agravante Fenix Comercial e Construtora Limitada, decide o Supremo Tribunal Federal,
em Sessão Plenária, unanimemente,
negar provimento ao agravo regimental, de acordo com as notas juntas.
Brasília, 06 de maio de 1981 —
Xavier de Albuquerque, Presidente
— Antonio Neder, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Antonio Neder, (Relator): I. Leio nas fls. 273 a 275 a decisão agravada:
«Vistos, etc.
«2 — O acórdão embargado
acha-se redigido com esta ementa,
f. 200:
Mandado de Segurança. Litisconsórcio passivo necessário.
Impossibilidade de prequestionamento, uma vez que os recorrentes só ingressaram nos autos
depois de prolatado o acórdão, e
o fizeram para Insurgir-se contra
a ausência de sua citação como
litisconsortes necessários. Ocorrência, no caso, de litisconsórcio,
passivo necessário.
Recursos extraordinários conhecidos e providos em parte».
«Pelo que se lê na fundamentação desse acórdão, julgou a Eg. Segunda Turma que, na ação de segurança, deve citar-se o litisconsorte necessário, e considerando
que, no caso, não foram citados os
litisconsortes necessários, julgou,
ainda, o referido acórdão, anular o
acórdão local concessivo da segurança e ordenar sejam citados tais
269
1lUsconsortes para se prosseguir,
como de direito, no procedimento
da ação de segurança.
o que se lê nos votos dos eminentes Ministros Moreira Alves,
Leitão de Abreu e Djaci Falcão,
votos esses que fundamentam o
acórdão embargado, fls. 195 a 197.
«Alega o 1? Embargante que, ao
julgar a questão nos temos em que
a julgou, o referido acórdão embargado se acha em divergência
com o que o STF proferiu em sua
Primeira Turma no RE 71.992,
acórdão-padrão esse publicado na
RTJ, 59/596 a 599, e copiado nos
autos, fls. 205 e 206.
«Doutro lado sustenta a 2! Embargante que o acórdão embargado contém divergência com o mesmo paradigma citado.
«O 1? Embargante pretende que
os embargos venham a ser conhecidos e recebidos para o fim de se
negar conhecimento ao recurso extraordinário.
«A 2! Embargante pretende que
o recurso extraordinário da Predial K.S. Ltda. não seja conhecido,
ou, se conhecido, que a ele não se
dê provimento.
« 3— O acórdão embargado questionou a matéria do art. 19, da Lei
n? 1.533/51, em combinação com a
do art. 47 do C. Pr. Civil, e julgou
que o litisconsorte necessário deve
ser citado em ação de segurança.
«O acórdão-paradigma questionou a matéria do art. 19, da Lei n?
1.533/51, em combinação com o artigo 88 do C. Pr. Civil de 1939, e julgou que o litisconsorte necessário
deve ser citado em ação de segurança.
«Vê-se que os dois acórdãos, o
embargado e o paradigma, questionaram a mesma tese jurídica e
270
R.T.J. — 100
a julgaram em termos que se harmonizam, e não em termos divergentes.
«Portanto, não se tem como cogitar dos embargos opostos pelos
dois Embargantes, visto que nenhuma discordância pode ser apontada entre os dois mencionados
acórdãos.
«Os embargos de divergência
têm cabimento no caso em que o
acórdão proferido por uma Turma
do STF em recurso extraordinário
ou em agravo de instrumento diverge de acórdão prolatado por outra Turma da Corte, ou por seu
Plenário, na interpretação do mesmo direito federal.
«E, pois, um recurso pelo qual o
embargante questiona tão-só a divergência entre duas ou mais teses
jurídicas fixadas na consideração
da mesma norma federal.
«No caso agora discutido, é certo
que, o acórdão embargado julgou
que se deve citar o litisconsorte necessário em ação de segurança, e é
também certo que o acórdãoparadigma julgou que se deve citar o litisconsorte necessário em
ação de segurança.
«Não há, pois, divergência de teses jurídicas no caso, mas, isto
sim, concordância de teses jurídicas, ou, melhor dizendo, a fixação,
nos dois juglamentos, da mesma
tese jurídico-federal.
«4 — Pelas razões deduzidas, nego seguimento aos dois embargos
(Reg. Int., art. 21, § 1?).n
A sociedade agravante Fenix Comercial e Construtora Limitada sustenta, em seu agravo, que a divergência que alegou em seus embargos
está demonstrada.
E o que se lê nestas razões do seu
agravo regimental, fls. 280 a 281:
«9 — A divergência jurisprudenciai assinalada nos Embargos se,
reconheça-se, não resulta evidente
da simples comparação de ementas, apresenta-se contudo patente e
clara ao se examinar o fundamento mesmo das decisões cotejadas.
A mera circunstância de que, no
acórdão recorrido, se chega exatamente ao resultado oposto àquele
que a jurisprudência consagrada
da Corte Suprema visou quando
impôs a imprescindibilidade da
cientificação de terceiros prejudicados em Mandado de Segurança,
já é uma evidência de que a decisão embargadi contrasta com
aquela jurisprudência. Pois, se o
Supremo Tribunal Federal visou,
afastando-se do caminho do rigor
exclusivamente técnico, a salvaguardar a posição dos terceiros interessados em Mandado de Segurança, assegurando-lhes a possibilidade de defesa, como consagrar,
tal qual se faz neste processo, situação em que quem se pôde defender obtém a anulação do feito,
em detrimento de quem jamais teve possibilidade de defesa.
«10 — A divergência jurisprudencial que enseja o cabimento dos
embargos está, data venia, evidenciada também no item III (n?s 9 a
18) do Recurso indeferido. A eles
se permite reportar a Agravante,
respeitosamente.
«11 — Senhor Ministro Relator: A
Embargada, Predial K. S. Ltda.,
não visa, neste processo, a rigor, a
uma decisão favorável que ela sabe impossível. Objetiva, única e
exclusivamente, a persistência da
demanda, e não a sua solução final. Este objetivo, malicioso e injurídico, contrasta certamente com
todo o arcabouço ético que reveste
a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que assegura, ao
terceiro prejudicado, o direito de
R.T.J. — 100
defesa em Mandado de Segurança.
No presente processo, terceiros
prejudicados são a ora Agravante
e os demais adquirentes legítimos
do bem cujo domínio é posto sob
suspeita pela simples circunstância de se processar ainda o Mandado de Segurança. E com base nessa divergência essencial de objetivos, de fundamentos, de alcance e
de significado entre os acórdãos
apontados como divergentes na petição de Embargos e o decisório
embargado, que se espera que Vossa Excelência, em juizo de retratação, ou o E. Plenário, provejam o
Agravo, para que se prossiga na
tramitação dos Embargos.»
II — E o relatório.
271
to, uma vez que os recorrentes entraram na causa, como salientou o
eminente Ministro Moreira Alves,
somente depois de ter sido prolatado o acórdão recorrido. De maneira que afasto, nesse ponto, também, a exigência de prequestionamento.
«Quanto ao mérito, como o eminente Ministro Moreira Alves, também anulo o acórdão, a fim de que
sejam citados o arrematante e o
leiloeiro.»
Finalmente, o Sr. Ministro Djaci
Falcão votou nestes termos, f. 197:
«Peço vênia ao eminente Relator, para acompanhar o eminente
Ministro Moreira Alves.
«No que toca ao prequestionamento, não é de se exigir, na hipóVOTO
tese, uma vez que os ora recorrentes não integravam a relação processual.
O Sr. Ministro Antonio Neder (Re«Por outro lado, provejo o recurlator): I — Não é difícil demonstrar
so com base no primeiro fundaa sem-razão da Agravante.
mento, da existência de litisconsorUma rápida leitura dos dois acórtes necessários, não chamados a
dãos, o embargado e paradigma, deintegrar a causa.
monstra que um e outro versaram o
«Via de conseqüência, dou provimesmo tema jurídico e o decidiram
mento aos recursos, para anular o
em termos que se harmonizam.
acórdão recorrido.»
A fundamentação decisória do
Vê-se que, julgando a matéria de
acórdão embargado é a que se acha
inscrita nos votos dos nobres Minis- ser indispensável a citação do litistros Moreira Alves, Leitão de Abreu consorte necessário em ação de segurança, o acórdão embargado fixou
e Djaci Falcão.
o entendimento afirmativo.
Disse o primeiro, f. 195:
Pois bem, o acórdão-paradigma,
«Por isso, Sr. Presidente, tam- copiado
nas fls. 205 e 206, julgou que
bém afasto a preliminar de pre- é indispensável
citação do litisconquestionamento, e conheço do re- sorte necessárioana
ação de segurancurso, para lhe dar provimento, a ça.
fim de anular o acórdão recorrido,
E o que se verifica na sua fundapara que sejam citados os ora recorrentes, como litisconsortes ne- mentação deduzida no voto do Sr.
cessários, prosseguindo o feito co- Ministro Luiz Gallotti, f. 206:
mo de direito.»
«Conheço do recurso, em face do
De seu lado, assim votou o Sr. Midissídio jurisprudencial.
nistro Leitão de Abreu, f. 196:
«E dou-lhe provimento, para de«Sr. Presidente, na hipótese, não
cretar a nulidade argüida pela rese podia exigir o prequestionamencorrente.
272
R.T.J. — 100
«O art. 19 da L. 1.533, de 1951,
manda aplicar ao processo do
mandado de segurança os arts. 88
a 94 do C. Pr. Civil.
«E o art. 88 do C. Pr. dispõe que,
quando fundado o litisconsórcio,
ativo ou passivo, na comunhão de
interesses, não poderão as partes
dispensá-lo.
«No caso é patente a comunhão
de interesses, pois a segurança,
embora requerida contra o Prefeito, visava a anular a concessão feita à recorrente.
«Impunha-se, assim, a citação
da recorrrente como litisconsorte
necessário.»
A única diferença que se registra
entre os dois acórdãos é irrelevante.
Sim, porque o acórdão embargado
Julgou o caso mediante questionamento do art. 19 da Lei n? 1.533/51
combinado com o art. 47 do C. Pr.
Civil de 1973, e o acórdão-padrão
questionou o art. 19 da Lei n?
1.533/51 combinado com os arts. 88 a
94 do C. Pr. Civil de 1939.
•
Não há, pois, nenhuma discordância entre os acórdãos confrontados.
II — Nego provimento ao agravo
regimental.
EXTRATO DA ATA
EFtE 91.405 (AgRg) — FtJ — Rel.:
Min. Antonio Neder, Agte.: Fenix Comercial e Construtora Limitada.
(Advs.: Pedro Paulo Cristófaro e
João Carlos Muller Chaves). Agdo.:
Sebastião Brigido de Lemos e outro.
(Advs.: Silvio Goldgewicht e outro).
Decisão: Negado provimento ao
agravo regimental, unanimemente.
Presidência do Senhor Ministro
Xavier de Albuquerque. Presentes à
Sessão os Senhores Ministros Djaci
Falcão, Antonio Neder, Leitão de
Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Muhoz,
Dedo Miranda, Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. Procurador-Geral da
República, Dr. Firmino Ferreira
Paz.
Brasília 06 de maio de 1981 —
Jonas Célio Monteiro Coelho, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 91.408 — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Firmino Paz.
Recorrentes: Sandro Pantani e sua mulher — Recorrida: Empresa de
Engenharia Ferroviária S/A — ENGEFER.
A contestação, em processo Judicial de desapropriar, só podendo versar sobre vicio processual e impugnação do preço oferecido pelo expropriante, não constitui obstáculo Jurídico ao acto de desistência
da ação proposta.
Recurso extraordinário não conhecido.
ACORDA°
Vistos e relatados estes autos de
Recurso Extraordinário n? 91.408-1,
do Estado de São Paulo, em que são
recorrentes Sandro Pantani e sua
mulher e recorrida a Empresa de
Engenharia Ferroviária S.A. —
Engefer, decide o supremo Tribunal
Federal, por sua Segunda -Turma,
unanimemente, não conhecer do recurso, de acordo com as notas Juntas.
Brasília, 24 de novembro de 1981 —
Djaci Falcão, Presidente — Firmino
Paz, Relator.
R.T.J. — 100
RELATORIO
O Sr. Ministro Firmino Faz (Belator) Empresa de Engenharia Ferroviária S.A. — Engefer, propôs ação
de desapropriação a Sandro Pantani
e sua mulher, que recaiu em terrenos e benfeitorias de propriedade
dos réus, declarados de utilidade pública, necessários ao projeto final de
engenharia do anel ferroviário de
São Paulo.
Em contestação, insurgiram-se os
expropriados, contra o preço oferecido, e pleitearam justo preço (fls.
18/24).
Após saneado o feito (fls. 114), requereu a expropriante a desistência
da ação, «face aos elevados custos
que seriam alcançados com a presente desapropriação, tendo em vista a atual conjuntura financeira por
que atravessa o País» (fls. 121/123).
2 — O Dr. Juiz de Direito
homologou a desistência formulada
pela autora. Determinou, ainda, fossem pagas por ela as despesas decorrentes da expropriação (fls.
125v.).
3 — Apelaram ambas as partes
(fls. 164/168 e 170/171).
4 — A Egrégia Terceira Câmara
do Segundo Tribunal de Alçada Civil
de São Paulo, por votação unânime,
deu provimento, em parte, ao recurso da exproprlante, e julgou prejudicado o apelo dos apropriados, com
a seguinte fundamentação (fls.
194/196), verbis:
«1 — Homologada desistência em
ação expropriatória, apelaram as
partes. O expropriado inconformase com a desistência, alegando-a
impossível na fase em que se encontrava o processo e à mingua da
revogação do decreto expropriatório; irresigna-se, ainda, com a verba honorária, cuja elevação pleiteia. A expropriante, de seu lado,
pretende a redução dos honorários
273
advocaticios e dos salários periciais.
Processamento regular, vendo-se
contra-razões.
2 — Incontroversa a possibilidade de desistência da desapropriação, sem audiência da parte Contrária, pelo menos até a efetivação
do pagamento (Hely Lopes
Meirelles, «Direito Administrativo
Brasileiro», pág. 559; Seabra
Fagundes, «Da desapropriação no
Direito Brasileiro», pág. 282; F.
Whitaker «Desapropriação», págs.
56/57).
Inadmissível, portanto, o indeferimento do pedido de desistência,
mesmo que não haja ocorrido a revogação do decreto expropriatório.
3 — A condenação em honorários,
nas desapropriações, tem por base
dar ao desapropriado a justa indenização, que não pode ser desfalcada do quantum a ser pago ao advogado (RTJ 76/659). Inaplicável,
pois, às demandas dessa natureza,
o art. 20 do C.P.C.
Assim, se não vige o principio da
sucumbência, o arbitramento deve
basear-se em critério que traduza,
numa expressão monetária correta, o valor do trabalho desenvolvido pelo advogado.
Aplicável, em principio, a regra
do art. 27, â 1?, da Lei de Desapropriações, que determina o estabelecimento num percentual sobre a
diferença entre a oferta e.a indenização. Mas, na hipótese de desistência antes da sentença, o critério
deve ser outro, pois ainda não há
indenização fixada.
No caso especial dos autos, o advogado da apelante ofereceu contestação e juntou documentos, mas
sequer chegou a manifestar-se sobre o laudo, diante da desistência
da expropriante. Vê-se, assim, que
o trabalho não se revestiu de
maior complexidade.
274
R.T.J. — 100
Sendo assim, os honorários advocaticios devem ser arbitrados em
quantia fixa, ora estabelecida
em Cri 60.000,00. Tal importância
remunera, condignamente, o advogado, considerando-se que o processo não chegou à conclusão de
sua primeira fase.
Também são reduzidos os salários periciais, fixados os do perito
do juízo em Cr$ 12.000,00 e o dos
assistentes em Cri 8.000,00.
4 — Diante do exposto, fica provido em parte o apelo da expropriante, prejudicado o do expropriado.».
5 — Dai o recurso extraordinário
interposto por Sandro Pantni e sua
mulher (fls. 198/201), à base das
alíneas a e d do permissivo constitucional. Atribuiu contrariedade ao
disposto nos artigos 33, § 2?, e 15, §
1?, a; e d, do Decreto-lei 3.365, de 21
de junho de 1941, e artigo 267, § 4?,
do Código de Processo Civil, e divergência jurisprudencial com arestos
desta Corte: RE n? 73.594, in RTJ
63/510; e RE 81.095, in RTJ 77/5691».
6 — O despacho do ilustre Presidente, Juiz Agripino Vieira de Souza,
inadmitiu o recurso (fls. 204/207), o
qual teve processamento, todavia,
ante o provimento do Ag 75.730-9, segundo autos em apenso.
Razões, apenas, dos recorrentes,
deduzidas a fls. 219/223.
7— Neste Colendo Supremo Tribunal Federal, pronunciou-se a douta
Procuradoria-Geral da República
(fls. 229/230), em parecer da lavra
do ilustre Subprocurador-Geral da
República Mauro Leite Soares, pelo
não conhecimento do recurso ou pelo
seu não provimento, nestes termos:
— O acórdão impugnado manteve, em parte, decisão de primeira instância, f. 194/5, admitindo como válida a desistência formulada
pela recorrida, em ação de desapropriação por ela intentada, antes
da sentença final.
2 — Dal o recurso extraordinário
dos expropriados, com apoio nas
letras a e d, alegando negativa de
vigência dos arts. 33, § 2?, e 15, §
1?, a e d, do Decreto-lei 3.365/41;
art. 267, § 4?, do C.P.C., e divergência com julgados do Supremo Tribunal.
3 — Não procede, a nosso ver, o
apelo por quaisquer dos fundamentos em que veio lastreado. Não cabe a invocação dos preceitos legais
apontados como violados pelos recorrentes, que pretendem apenas
tirar conclusões que levariam à
construção de uma definida situação jurídica impeditiva da desistência.
4 — Ora, o Poder expropriante
formalizou o necessário pedido de
desistência, f. 121, tornando sem
efeito a desapropriação objeto da
presente ação. Não se pode conferir supremacia às pretensões privadas sobre o interesse público,
desconhecendo-se que a expropriação é uma prerrogativa da Administração, podendo o Poder Público, em regra, revogar unilateralmente os atos por ele praticados,
quando não convenha ao interesse
público. Portanto, descabe a impugnação porque o acórdão recorrido se limitou à aplicação da lei
de maneira correta ou, pelo menos, razoável, ao lado de os invocados dispositivos legais referidos na
petição extraordinária não terem
sido debatidos pelo Tribunal a quo,
conforme afirmam os próprios recorrentes às f. 199, verbis «Tal alegação não foi considerada pela Eg.
Câmara Julgadora, sequer a ela se
referindo, donde a completa negativa de sua vigência». Além disso,
para legitimar a solução adotada,
é tranqüila a orientação do Supremo Tribunal nos RFtEE. 26.117,
RTJ 5/57; 70.078, RTJ 56/806 e
73.048, RTJ 77/569.
5 — Finalmente, ao invés de divergir da jurisprudência indicada
R.T.J. — 100
pelo recorrente, a decisão recorrida com ela se harmoniza. Senão,
vejamos o entendimento do Supremo Tribunal no RE 73.594 — MG,
Relator Ministro Thompson Flores,
RTJ 63/510, trazido a confronto pelos próprios recorrentes, verbis:
«Desapropriação. Desistência,
antes de findo o processo. Viabilidade. Efeitos. II — E um direito
da desapropriante desistir de sua
pretensão antes de findo o processo com recebimento do preço.
III — Se algumas obras realizou,
com prejuízo do desapropriado,
ressalvado fica o direito à reparação, em procedimento próprio.
Recurso provido.»
6 — Isto posto, somos pelo não
conhecimento ou, acaso conhecido,
pelo não provimento do recurso extraordinário.»
o relatório.
VOTO
Sr. Ministro Firmino Paz (Relator): Empresa de Engenharia Ferroviária S.A. — Engefer —, devidamente autorizada, propôs ação de
desapropriar terrenos, acessões e
benfeitorias a Sandro Pantani e sua
mulher, por utilidade pública (Inicial, fls. 2/4).
2 — Declara-se, no apelo extremo,
que o venerando acórdão recorrido
ofendera, primeiro, o artigo 33, § 2?,
do Decreto-lei n? 3.365, de 21 de junho de 1941 (Lei de Desapropriação),
em que se declara que o expropriado, ainda que discorde do preço oferecido, poderá levantar até 80% do
depósito feito.
Essa, a tese que se contém no precitado dispositivo legal.
Note-se. A leitura do venerando
aresto extraordinariamente recorrido, não se vislumbra a adoção de
tese contrária á enunciada na norma
legal. O respeitável aresto recorrido,
sequer, aludiu ao artigo 33 da Lei de
Expropriar.
275
3 — Não se disse, outrossim, no
acórdão recorrido, nada em contrariedade ao previsto no artigo 15, § 1?,
a a d, da Lei de Expropriar, em que
se prescreve sobre o cálculo do valor
do prévio depósito, para efeito de
imissão provisória na posse.
Não há, portanto, violação ou, até,
negação de vigência dessas normas
federais.
4 — Enquanto ao previsto no artigo 267, § 9?, do Código de Processo
Civil, não se disse, também, no aresto recorrido, que, decorrido o prazo
para resposta, o autor poderia, sem
o consentimento do réu, desistir da
ação.
Ficara assentado e declarado, no
acórdão recorrido, ser, verbis: «Incontroversa a possibilidade de desistência da desapropriação, sem audiência da parte contrária, pelo menos até a efetivação do pagamento
(Hely Lopes Meireiles, Direito Administrativo Brasileiro, pág. 559;
Seabra Fagundes, Da Desapropriação no Direito Brasileiro, pág. 282;
F. VVhitaker, Desapropriação, págs.
56/57)» (Acórdão, fls. 195).
Esse, por sinal, o entendimento da
doutrina.
5 — Demais disso, considere-se o
que previsto fora no Decreto-lei n?
3.365, de 1941 (Lei de Desapropriar),
verbis:
«Art. 20. A contestação só poderá
versar sobre vicio do processo judicial ou impugnação do preço;
qualquer outra questão deverá ser
decidida por ação direta.»
Assim, pois, se o expropriado, ao
contestar, atribui vício ao processo
judicial, não está a se opor á
desistência da ação de • expropriar,
que, por si mesma, ineficaciza um
ou todos os actos processuais já praticados. Há convergência de fins, entre desistir e argüir vício do
processo judicial.
276
R.T.J. — 100
Por outro lado, impugnar o preço
oferecido pelo expropriante é
preferir não perder a propriedade da
coisa desapropriada. Não é, portanto, logicamente, acto obstativo da
delistência da ação.
Diante disso, num e noutro caso,
se não se cria situação jurídica
incompatível com o acto de desistir
da ação proposta, não há por que se
invocar o previsto no artigo 267, g 4?,
do Código de Processo Civil, que, por
todo o exposto, não incide em tema
de expropriação.
6 — Demais, disso, é exemplar da
jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal, acórdão de que fora Relator o eminente Ministro Moreira
Alves, de cuja ementa destaco,
verbis:
«No curso da ação de desapropriação, é cabível sua desistência
pelo Poder Público, independentemente do assentimento do expropriado, ressalvada, porém, em favor deste, a via ordinária para o
ressarcimento dos prejuizos acaso
sofridos. Precedentes do STF.
Recurso extraordinário conhecido e provido, para julgar-se extinto
o processo» (Ac. de 18.4.1980. 2!
Turma. RE 92.440. Minas Gerais).
Esse entendimento tem, ainda, o
apoio da melhor doutrina.
7 — Diante do exposto, não conheço do recurso. Assim, voto.
VOTO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra:
Sr. Presidente, acompanho o eminente Relator. Não discuto que o poder expropriante possa desistir da
ação de expropriação. Mas pode o
expropriado reaver os prejuízos que
tiver sofrido com a renúncia à desapropriação por ação própria.
EXTRATO DA ATA
RE 91.408 — SP — Rel.: Min. Firmino Paz. Rectes.: Sandro Pantani e
sua mulher (Advs.: Fendo Simão e
outros). Recda.: Empresa de Engenharia Ferroviária S.A. — Engefer
(Advs.: Alexandre Gaze e outros).
Decisão: Não conhecido. Unânime.
Presidência do Senhor.
Djaci Falcão. Presentes àsão
es os
Senhores Ministros Cordeiro Guerra,
Moreira Alves, Decio Miranda e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da
República, Dr. Mauro Leite Soares.
Brasília, 24 de novembro de 1981 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO CRIMINAL N? 91.519 — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Soares Mutloz.
Recorrente: Ministério Público Estadual — Recorridos: Vicente Osório
Giordano e Dimas Moro.
Falso testemunho. Retratação:
A retratação, em virtude da qual o fato deixa de ser punível, é a
verificada, antes de proferida a sentença, no processo em que foram
prestadas as falsas declarações e não a manifestada, posteriormente,
no processo pelo delito de perjúrio; caso contrário, a punição deste fica ao alvedrio do respectivo réu, em hipótese de ação pública, indisponível tanto para a acusação quanto para a defesa. Recurso extraordinário conhecido e provido.
R.T.J. — 100
ACORDA°
Vistos.
Acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Primeira Turma, à unanimidade de votos, e na
conformidade das notas taquigráficas, conhecer do recurso e dar-lhe
provimento.
Brasília, 21 de outubro de 1980. —
'rhompson Flores, Presidente. —
Soares Muiloz, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Soares Muiloz: Vicente Osório Giordano e Dimas Moro, condenados pelo crime de falso
testemunho, a dois anos de reclusão,
obtiveram, em grau de apelação, o
julgamento da extinção de suas punibilidades, sob o fundamento, acolhido pela maioria da Segunda Câmara
Criminal do Tribunal de Justiça de
São Paulo, de que a retratação prevista no § 3? do art. 342 do Código
Penal não necessita verificar-se no
processo em que foi prestado o falso
testemunho, podendo dar-se no processo pelo delito de perjúrio.
Dai o recurso extraordinário do
Ministério Público Estadual, pela letras a e d do permissivo constitucional, alegando negativa de vigência
do § 3? do art. 342, do Código Penal e
divergência com os acórdãos indicados como paradigmas.
O Recurso foi admitido em razão
dos dois fundamentos pelo eminente
2? Vice-Presidente do Tribunal de
Justiça de São Paulo.
A Procuradoria-Geral da República, em parecer da lavra do ilustre
Prof. Francisco de Assis Toledo, opinou pelo conhecimento e provimento
do recurso extraordinário, verbis:
277
«Vicente Osório Giordano e Dimas Noro foram denunciados por
terem feito afirmações falsas, em
depoimentos prestados, como testemunhas compromissadas, perante
o Juiz criminal de Campinas. Condenados,no processo que se seguiu,
a dois anos de reclusão, com
sursis, pelo crime do art. 342, § 1? ,
do CP, ingressaram com recurso
de apelação, provido, por maioria
de votos, pelo E. Tribunal de Justiça de São Paulo. No acórdão, que
concluiu pela absolvição dos acusados, considerou-se que a retratação, na ausência de uma precisa
definição legal, pode ser feita, validamente, até a sentença a ser
proferida no segundo processo, isto
é, naquele em que se persegue a
condenação do agente do falso testemunho. Considerou-se ainda, a
circunstância de, no caso, não te•rem os depoimentos falsos, ao ver
do acórdão, potencialidade para influir no desfecho do primeiro processo, onde foram prestados.
Desse julgado, Interpôs o Ministério Público estadual recurso extraordinário, pelas letras a e d, regularmente admitido, no qual sustenta, com apoio na doutrina, que
a regra do § 3? do art. 342 do CP
não tem a extensão que lhe deu o
tribunal a quo, visto que a expressão «antes da sentença», constante
dessa norma, se refere indubitavelmente à sentença do primeiro
processo, ou seja, daquele em que
se produziu o falso testemunho,
não á do segundo, conforme se decidiu.
Pensamos, preliminarmente, que
o dissídio jurisprudencial não está
devidamente demonstrado. Os dois
acórdãos citados, um do Tribunal
de Alçada Criminal do mesmo Estado, outro do Tribunal de Justiça
do Rio de Janeiro, versaram hipó-
278
R.T.J. — 100
teses diversas da que foi decidida
nestes autos, não se prestando,
pois, para confronto.
Não obstante, a negativa de vigência do § 3? do Art. 342, por se ter
dado a esse preceito uma extensão
que ele evidentemente não tem,
parece-nos evidenciados.
Com efeito; salienta a sentença
de primeiro grau (fls. 126) que as
retratações dos recorridos só ocorreram neste processo - o segundoquando já nenhuma influência poderiam ter no julgamento da causa
em que foram produzidos os falsos
testemunhos. Eram retratações
inócuas. Por outro lado, afirma
igualmente o ilustre juiz, de maneira irrespondível, que os depoimentos falsos, se não tivessem sido
descobertos a tempo, pelo juiz do
primeiro processo, teriam certamente levado a uma sentença diferente da proferida, diante da conhecida jurisprudência que não
considera crime a emissão de cheque sem fundos, com o conhecimento do favorecido, para apresentação ao Banco em data futura
(fls.128).
Aplica-se, pois, como luva, ao caso a seguinte lição de Nelson Hungria, nos comentários que faz ao
mencionado § 3? do art. 342, In
verbis:
«A retratação, como já se disse, deve preceder à sentença no
processo em que foi o crime cometido. Se feita posteriormente,
mesmo que a decisão ainda seja
passível de recurso, só terá efeito
atenuante (art. 47. IV, letra b).
Trata-se de circunstância de
caráter pessoal e, como tal, incomunicável (art. 26)» (Comentários, IX, pág. 489).
Nem se diga, para invocação da
Súmula 400, que se está diante de
uma «interpretação razoável». A
prevalecer a tese do acórdão recorrido, toda e qualquer testemunha poderá prestar depoimentos
falsos, na certeza de que, se por isso vier a ser eventualmente denunciada em outro processo (só podera ser em outro processo), bastará
retratar-se, neste último, para alcançar a impunidade.
Esse entendimento não pode,
data venia, ser razoável por instilar total descrédito sobre a já frágil prova testemunhal, como bem
salienta, neste tópico, que adotamos, o voto vencido do eminente
Desembargador Cunha Bueno.
«O 3?, do art. 342 do Código
Penal, dispondo que «o fato deixa
de ser punível, se, antes da sentença, o agente se retrata ou declara a verdade», à evidência se
refere ao processo onde foi prestado o falso testemunho, e não a
ação penal dele resultante.
A prevalecer o entendimento
respeitável da Douta Maioria, e
não haveria mais segurança alguma na prova testemunhal, sendo, até mesmo dispensável o
compromisso. Se em decorrência
do perjúrio sobreviesse processo
criminal, bastaria que, antes de
sentenciado esse feito, o autor do
perjúrio crime esse que já produzira todos seus efeitos - se retratasse.
Não foi esse o espírito que norteou o legislador.
A retratação, segundo meu modesto entendimento, é admissivel
apenas antes da sentença a ser
proferida nos autos onde ocorreu
o fato.
279
R.T.J. — 100
In casu o que ocorreu não foi
uma retratação, porém uma confissão do crime.» (fls. 167/168).
O parecer, em conclusão, é pelo
conhecimento e provimento do recurso para o fim de restabelecer-se
a sentença de primeiro grau.» (fls.
206/209).
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Soares Mtuloz (Relator): Adoto inteiramente os fundamentos do parecer A retratação válida é a manifestada, antes de proferida a sentença, no processo em que
foram prestadas as falsas declarações. E o que dispõe o art. 342 § 3?,
do Código Penal, consoante a interpretação de Nelson Hungria (Comentários ao Código Penal, 1958,
v. IX, págs. 486/487), Magalhães Noronha (Direito Penal, ed. Saraiva,
4? vol., pág. 393), José Frederico
Marques (Curso de Direito Penal,
ed. Saraiva, vol. III, pág. 427), Bento
de Faria (Código Penal Brasileiro,
ed. Distribuidora Record, vol. VII,
pág. 181), entre outros. O dispositivo
em referência não comporta o entendimento que lhe deu o acórdão recorrido, porque ele importa em tornar a
punição do falso testemunho ao alvedrio daquele que, como tal, foi denunciado em ação pública, indisponível tanto para a acusação quanto para a defesa.
Outrossim, não configura fundamento suficiente em si a observação
final do acórdão recorrido de que a
circunstância de os ora recorridos
estarem, presentes, ou não, ao ato
da entrega dos cheques era irrelevante, não podendo, a não ser por rigorismo Kantiano, dar motivo ao
movimento da máquina penal. E que
esse argumento, se houvesse influído
na decisão da causa, teria conduzido
à absolvição dos réus, por não configurado o crime do art. 342 do Código
Penal, e não, como ocorreu, à extinção do processo com fundamento no
§ 3?.
Ademais, como bem acentua o parecer, as declarações falsas somente
não influiram no desfecho do processo, onde foram prestadas, porque foram descobertas a tempo pelo Juiz
do primeiro processo Se assim não
houvesse ocorrido, elas teriam dado
causa a absolvição da emitente dos
cheques sem provisão de fundos,
diante da conhecida Jurisprudência
que não considera crime a emissão
de cheques sem fundos, com o conhecimento do favorecido, ' para
apresentação ao Banco em data futura (fls. 308).
Ante o exposto, conheço do recurso
pela letra a e lhe dou provimento,
para restabelecer a sentença de primeiro grau.
EXTRATO DA ATA
FtECr.- 91.519 — SP — ReI.: Min.
Soares Mufloz. Recte.: Ministério Público Estadual. Recdo.: Vicente Osório Glordano e Dimas Moro (Adv.:
Ozeni Maria Moro).
Decisão: Conhecido e provido, decisão unânime.
Presidência do Sr. Ministro
Thompson Flores. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mufoz e Rafael Mayer. SubprocuradorGeral da República, Dr. José Resek.
Brasília 21 de outubro de 1980. —
António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
R.T.J. — 100
280
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 91.627 — RS
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão.
Recorrente: Ana Maria Klein de Castro — Recorrida: Esther Vieira de
Castro.
Recurso extraordinário baseado unicamente na letra d, do Inc.
III, do art. 119, da Constituição Federal. Não cabe ao Presidente do
Tribunal, no despacho em que aprecia a sua admissão, aditar a fundamentação constitucional, fugindo á sistemática do próprio recurso.
Precedente do S.T.F.. Dissídio jtuisprudencial inviável, consoante a
Súmula 369. Recurso extraordinário não conhecido.
ACORDA()
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade
de votos, e na conformidade da ata
do julgamento e das notas taquigráficas, não conhecer do recurso
Brasília, 26 de setembro de 1980 —
Djaci Falcão, Presidente e Relator.
RELATORIO
O Sr. Ministro Djaci Falcão: Decidiu, em apelação, o Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
«Relatório
Esther Vieira de Castro ajuizou,
nesta Capital, ação de anulação de
casamento contra Ana Maria
Klein, alegando o seguinte: diz
que casou com Olmiro Deniz de
Castro, em 11.7.36, não tendo ambos qualquer impedimento, na época, para o matrimônio, que foi objeto de trasladação. Falecendo o
marido em 8-9-75, tomou a autora
conhecimento de que ele havia contraído novas núpcias, em 27-12-50,
com a requerida. Sustenta que sendo este casamento posterior ao seu
e, estando, por isso, seu marido
impedido de consociar-se nova-
mente, aquele ato é nulo. Pleiteia,
assim, sua decretação. Acrescenta,
por fim, que de seu casamento
com Olmiro, possui uma filha.
Juntou os documentos de fls. 4/7.
Citada, a requerida contestou.
Sustenta que o casamento de Esther com Olmiro foi realizado em
Rivera, Uruguai, não em presença
de autoridades consulares brasileiras, e só foi objeto de trasladação
em 17.5.76 (quarenta anos depois),
em descumprimento, pois, ao disposto no art. 83 da. Lei 4.857/39. Assim, quando a contestante casouse, não havia nenhum impedimento, sendo, por isso, válido seu casamento. Esclarece que o primeiro
casamento de Olmiro foi realizado
fora das fronteiras brasileiras, numa tentativa de ludibriar o Regulamento Interno do Exército Nacional, que proíbe casamento de
praça-de-pré, posto que ele ocupava na época. Não seria válida a assertiva da autora de que não havia
impedimento para o seu casamento. Prossegue dizendo caracterizada a má-fé da autora que só depois
da morte do pretenso marido, velo
a reclamar e tentar legalizar direito que não tem, visando apenas
usufruir vantagem financeira. Por
outro lado, sustenta que sempre viveu na ignorância da existência de
matrimônio anterior de seu marido. Em reconvenção pretende a
R.T.J. — 100
anulação da averbação do casamento da autora com Olmiro, els
que realizado quando, no Brasil,
havia impedimentos (ele militar e
ela menor de idade) e por não ter
sido averbado no prazo legal . Além
disso, não poderiam ter casado perante autoridade estrangeira quando não eram lá domiciliados.
Nomeado, pronunciou-se o Curador ao Vínculo assim como o representante do Ministério Público.
Saneado o feito, realizou-se a audiência de instrução e julgamento.
A fls. 43/44, o Dr. Juiz a quo,
proferiu sentença para julgar procedente a ação e improcedente a
reconvenção, declarando nulo o casamento de Olmiro Deniz de Castro e Ana Maria Klein. Condenou a
ré ao pagamento das custas e honorários advocaticos em trés salários mínimos. Recorreu de oficio
ao Tribunal.
Irresignada, apelou a ré. Preliminarmente, reporta-se às prefaciais argüidas na contestação. No
mérito, propugna a improcedência
da ação e a procedência da reconvenção.
O recurso foi respondido pela
apelada.
Manifestaram-se o Dr. Curador e
o representante do Ministério Público.
Preparados, subiram os autos.
Em 2? grau, o parecer do Dr.
Procurador da Justiça é pelo provimento integral da apelação.
É o relatório.
A douta revisão.
Porto Alegre, 7 de junho de 1978
— Paulo Boecicel Velloso, Relator»
(fls. 73 a 74).
«Casamento. Nulidade por bigamia. Casamento (o precedente) realizado no Uruguai, sendo
281
os cônjuges brasileiros e em presença da autoridade local, no ano
de 1936. Código Civil, art. 204.
Validade do ato, provado com
certidão do Registro Civil.
Registro Civil. Ausência de
trasladação desse casamento no
Registro Civil do domicílio brasileiro dos nubentes, o que só feito
após o falecimento do cônjuge
varão. A exigência de publicidade em território nacional provinha já da Lel 181, de 24 de janeiro de 1890, art. 47, { 1? e constou
do Decreto 18.542 de 24 de dezembro de 1928, art. 8? vigente na
época. Tal registro, porém, é feito apenas para a eficácia do casamento em território nacional,
não lhe retirando a validade e
existência. Assim, o segundo casamento, realizado no Brasil, entre o mesmo cônjuge varão e outra mulher, é nulo. Ele não ignorava já ser casado. A omissão da
trasladação decorreu de culpa
exclusiva do cônjuge varão, que
com isso, não se haveria de beneficiar. O cônjuge mulher do segundo casamento, realizado no
Brasil, declarado nulo nesta
ação, eventualmente poderá pleitear em seu favor o reconhecimento da putatividade, resguardando-se os seus efeitos civis em
favor dela e dos filhos até o dia
da sentença anulatória. Código
Civil, art. 221, único.
Apelação Clvel — Terceira Câmara Civel — N? 30.293 — Porto
Alegre.Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da
5! Vara de Familia e Sucessões,
Apresentante:
Ana Maria Klein de Castro, Apelante;
Esther Vieira de Castro,
Apelada.
282
R.T.J. — 100
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os
autos,
Acordam, em Terceira Câmara
Civil, à unanimidade, negar provimento à apelação e confirmar a
sentença em reexame, de conformidade com as notas taquigráficas
Inclusas e que integram o presente
acórdão.
Custas, na forma da lei.
Participou do julgamento, além
dos signatários, o Exmo. Sr. Pio
Flori de AzeveclO.
Porto Alegre, 22 de junho de 1978
— Paulo Boeckel Venoso, Presidente e Relator — Ney da Gama
Ahrends, Relator: Des. Paulo
Boeckel Venoso, (Leu o relatório
de fls. 73/74)
Voto
O Presidente Des. Paulo Boeckel
Velloso, Relator — A autora apelada, Esther Vieira de Castro, tendo
casado com Olmiro Deniz de Castro no ano de 1936 na cidade de Riverá, República Oriental do Uruguai, perante a autoridade local
competente, ato esse trasladado
para o Oficio da 1? Zona desta CaPitai em 27-5-76 (fls. 4), ajuizou esta ação de anulação de casamento
contra Ana Maria Klein, por ter esta se casado com o mesmo Olmiro
Deniz de Castro, a 27 de dezembro
de 1950, nesta Capital, dizendo-se
ele solteiro. Ele faleceu no ano de
1975.
A ré contestou, sustentando ter
sido legalmente casada com o falecido Olmiro perante as leis brasileiras, tanto que nunca houve o indispensável registro, na Comarca
de Santana do Livramento, no prazo de três meses, do referido casa-
mento celebrado no Uruguai (Decreto 4.857/39, art. 82) e só depois
de falecido Olmiro é que a autora
promoveu a trasladação do ato para um Ofcilo desta Capital. Em reconvenção, sustentou a nulidade do
casamento da autora, porque estavam impossibilitados de casar no
Brasil, sendo ela menor e ele militar, praça-de-pré; além disso, não
ocorreu a averbação no Registro
Civil, no prazo legal.
A sentença recorrida partiu da
consideração de que, à época do
primeiro casamento não estavam
em vigor o Decreto 4.857 e nem a
(Nova) Lei de Introdução ao Código
Civil e muito menos, a Lei 6.015. O
Código Civil, em seu art. 204, dispondo sobre o casamento celebrado no estrangeiro não impunha requisitos formais para a convalidação do ato no Brasil, remetendo à
lei estrangeira apenas no tocante à
prova do casamento. Declarou a
nulidade do segundo casamento e
submeteu a espécie a reexame.
Dai o recurso da ré e reconvinte.
Não tem nehuma consistência o
argumento de que, sendo menor a
nubente ( tinha 18 anos), não seria
válido o casamento realizado no
Uruguai no ano de 1936. Seria necessário, antes de mais nada, demonstrar o teor da vigência do direito estrangeiro, em termos de
comprovar a existência e gravidade do vicio inquinado, o o que não
foi feito; pois tal casamento se prova de acordo com a lei do pais onde foi celebrado (art. 204 do C. Civil). Além de que, se a argüição tiver pertinência com a falta de consentimento do pai ou tutor (nem
mesmo se demonstrou não ter havido), não seria a reconvinte a parte competente para tanto (Código
Civil, art. 178, § 4?, II). Também
sem qualquer relevo a alegação de
ser Olmiro praça-de-pré, impedido
de casar no Brasil. Tal impedimen-
R.T.J. — 100
to, na verdade, jamais existiu na
lei civil, tratando-se apenas de
prescrição regulamentar, que, infringida, poderia acarretar-lhe determinadas sanções, mas sem reflexo algum na validade e eficácia
do ato civil praticado.
O Código Civil, em seu art. 204,
contém regra de prova, relativamente ao casamento celebrado fora do Brasil, estabelecendo que ele
se prova de acordo com a lei do
país onde se celebrou. E em seu
Parágrafo único prevê a hipótese
de ter sido contraído o casamento
perante agente consular (o que não
é o caso dos autos). Em seu caput,
pois, aplicou a regra locas legit
actum, podendo a prova consistir
em certidão do Registro Civil (como no presente caso), assim como
por quaisquer outros modos admitidos no pais em que o casamento
foi celebrado (J.M. de Carvalho
Santos, Código Civil Interpretado,
Comentários ao art. 204).
No que concerne ao registro desse casamento no Brasil, a legislação respectiva é bastante antiga e
contemporânea, de certo modo, à
implantação do Registro Civil, conseqüência da secularização do instituto, uma das importantes conquistas republicanas. Assim, já a
Lei n? 181, de 24-1-1890, em seu art.
47, 1? dispunha que se ambos ou
um só dos contraentes é brasileiro
(em casamento celebrado no estrangeiro) o casamento pode ser
feito na forma usada no pais, onde
foi celebrado; 4?. Os mesmos casamentos devem ser registrados no
Brasil, á vista dos documentos de
que trata o art. 11, três meses depois de celebrados ou Um mês depois que os cônjuges, ou ao menos
um deles, voltar ao país.
Assim, embora não vigorasse o
Decreto n? 4.857 (que teve vigor de
lei), nem a nova Lei de Introdução
283
ao Código Civil ou a recentissima
Lei 6.015 (Registros Públicos), já
existia norma legal e que, dizendo
respeito apenas a uma formalidade
registraria, não se poderia considerar revoltada com o advento do Código Civil, que nada dispôs em contrário, nem regulou a respeito (Código Civil, art. 1.807). Além disso,
o Decreto 18.542, de 24-12-1928, Regulamento dos Registros Públicos,
vigente na época do primeiro casamento, dispunha no art. 8? o seguinte: *0 casamento de brasileiros, feito no estrangeiro, perante
as respectivas autoridades ou por
cônsules brasileiros, deverá ser registrado quando um ou os dois cônjuges vierem ao Brasil, dentro do
prazo de três meses, no Cartório
do respetivo domicilio, e, em sua
falta no 1° Oficio do Distrito Federalo. No seu ã único define que tal
registro constará de um termo assinado pelo oficial e pelo cônjuge
apresentante ou procurador especial, no qual se incluirá a transcrição do documento ou, quando for o
caso, de sua tradução, devidamente autenticada*.
Impõe-se determinar qual a finalidade e o alcance dessa norma,
bem como as conseqüências do seu
descumprimento, o que constitui o
fulcro da demanda.
Tal registro, sem dúvida, deve
ser efetuado no interesse da publicidade do casamento, mesmo que
não observado o prazo do art. 82 do
T. I do Decreto 4.857-39 (ou da Legislação anterior), como bem decidiu a 6? Câmara Civel do Tribunal
de Justiça de São Paulo, In Revista
dos Tribunais 384/136.
Examinando a questão da publicidade no Código Civil Brasileiro,
Pontes de Miranda observa que esta se concretiza através da formalização registraria, distinguindo-se
a celebração, que é ato jurídico do
289
R.T.J. — 100
casamento (Tratado de Direito
Privado, $ 794)- aik data do registro é que estabelece a irradiação
dos seus efeitos civis, de modo que,
tendo havido duas celebrações, é
eficaz a que primeiro se registrou». Mais adiante, faz considerações sobre o casamento de brasileiros feito no estrangeiro, perante as
respectivas autoridades ou os cônsules brasileiros e que deve ser registrado quando um ou os dois cônjuges vierem ao Brasil, dentro
do prazo de três meses, no cartório do respectivo domicílio e, em
sua falta, no do 1? ofício do Distrito
Federal, e observa que a regra do
único do art. 82 do Decreto
4.857/39 («Esse registro constará
de um termo assinado pelo oficial
pelo cônjuge apresentante ou
procurador especial, no qual se incluirá a transcrição do documento,
ou, quando for o caso, da sua tradução devidamente autenticados»)
é apenas para a eficácia, pois, «a
despeito da fixação de prazo, não
se tira existência, ou validade» e
«faz-se eficaz no Brasil totalmente,
ainda que se registre depois dos
três meses» (ob. cit., 794, n? 4).
Ora, dentro dessa linha de raciocínio, tal casamento, o celebrado no Uruguai, não poderia ser
considerado nulo por não ter sido
registrado no devido tempo e nem
mesmo se jamais houvesse sido registrado. No plano da existência e
validade, ele sempre existiu e foi
válido. A discussão só pode se circunscrever ao plano da eficácia.
De outra banda, o segundo casamento, realizado no Brasil, por
sem dúvida é nulo. Olmiro somente
logrou contrai-to fraudando a presumível boa-fé do outro cônjuge e
dos funcionários do Juízo de Casamentos, dizendo-se solteiro e desimpedido. Relativamente a ele,
em nada importava fosse ainda o
precedente casamento ineficaz no
Brasil, por defeito de formalidade
a que, por sinal, deu causa,
omitindo-se na trasladação do ato
para o registro local. Casado estava, validamente casado e não poderia tornar a casar.
A apelante, assim, somente socorre o disposto no art. 221, único
do Código Civil, na presunção de
que estivesse de boa-fé ao celebrar
o casamento, resguardando-se os
seus efeitos civis em favor dela e
dos filhos até o dia da sentença
anulatória, pois ao que tudo leva a
crer, relativamente a ela, ocorreu
casamento putativo.
Nessas condições, nego provimento ao recurso voluntário e confirmo a sentença recorrida.
Dr. Pio Flori de Azevedo —
Também confirmo a sentença,
pelo fundamentos trazidos agora
por V. Exa.. O impedimento para o
novo casamento existia, diante da
validade do anterior casamento do
varão. Nessas condições, apenas
pode resguardar-se a posição da
ré, se tiver contraído o casamento
de boa-fé, como V.Exa. ressaltou.
Nego provimento à apelação, e,
em reexame necessário, confirmo
a conclusão da sentença.
Des. Ney da Gama Ahrends —
Acompanho o brilhante voto de S.
Exa.,» (fls. 76 a 84).
Irresignada, Ana Maria Klein de
Castro interpôs recurso extraordinário com base no art. 119, inc. III. letra d, da Constituição Federal, invocando a apelação cível n? 24.004, de
Quarai, julgada pela 4? Câmara
Cível do Tribunal de Justiça dá Rio
Grande do Sul (ver fls. 87 a 94).
Após a manifestação do Ministério
Público local pelo descabimento do
recurso ( fls. 97 a 98), foi este admitido pelos Des. Jorge Ribas Santos,
como se vê do seguinte despacho:
R.T.J. — 100
«Vistos, etc
1. A ora recorrida, «Esther Vieira de Castro, tendo casado com 01miro Deniz de Castro no ano de
1936, na cidade de }tivera, República Oriental do Uruguai, perante
autoridade local competente, ato
esse traslado para o Oficio da le
Zona desta Capital em 27-6-76 ( fls.
4), ajuizou esta ação de anulação
de casamento contra Ana Maria
Klein, por ter esta se casado com o
mesmo Olmiro Deniz de Castro, a
27 de dezembro de 1950, nesta Capital, dizendo-se ele solteiro. Ele
faleceu no ano de 1975» ( fls. 79).
A ora recorrente, Ana Maria
Klein, contestou a ação «sustentando ter sido legalmente casada com
falecido Olmiro perante as leis
brasileiras, tanto que nunca houve
indispensável registro, na Comarca de Santana do Livramento,
no prazo de três meses, do referido
casamento celebrado no Uruguai
(Decreto 4.857/39, art. 82), e, só depois de falecido Olmiro, é que a autora promoveu a trasladação do
ato para um Oficio desta Capital»
(fls. 79).
Em reconvenção, Ana Maria
pleiteou a «anulação do registro»,
de casamento, «junto ao Cartório
de Registro Civil da 1! Zona de
Porto Alegre» (fls. 18), argumentando, em suma. que Olmiro e Esther estavam impossibilitados de
casar no Brasil, sendo ela menor e
ele militar, praça-de-pré; além disso, não ocorreu a «averbação» no
Registro Civil, no prazo legal. Diz
que esse casamento inexiste.
A sentença julgou procedente a
ação e improcedente a reconvenção (fls. 43 e 44).
Houve apelação, interposta pela
ré, à qual a Egrégia Terceira Câmara Cível negou provimento. Esta a ementa do acórdão:
285
Casamento. Nulidade por bigamia.
Casamento (o precedente) realizado no Uruguai, sendo os cônjuges brasileiros e em presença
de autoridade local, no ano de
1936, Código Civil, art. 204. Validade do ato, provado com certidão do Registro Civil.
Registro Civil. Ausência de
trasladação desse casamento no
Registro Civil do domicilio brasileiro dos nubentes, o que só feito
após o falecimento do cônjuge
varão. A exigência de publicidade em território nacional provinha já da lei de 24 de janeiro de
1890, art. 47, 1? e constou do Decreto 18.542, de 24-12-1928, art. 8?
vigente na época. Tal registro,
• porém, é feito apenas para a eficácia do casamento em território
nacional, não lhe retirando a validade e existência. Assim, o segundo casamento, realizado no
Brasil, entre o mesmo cônjuge
varão e outra mulher, é nulo. Ele
não ignorava já ser casado. A
omissão de trasladação decorreu
de culpa exclusiva do cônjuge varão, que com isso, não se haveria
de beneficiar. O cônjuge mulher
do segundo casamento, realizado
no Brasil, declarado nulo nesta
ação, eventualmente poderá pleitear em seu favor o reconhecimento da putatividade, resguardando-se os seus efeitos civis em
favor dela e dos filhos até o dia
da sentença anulatória.
Código Civil, art. 221, único»
( fls. 76).
Inconformada, Ana Maria Klein
interpôs o presente recurso extraordinário, «com supedfineo no
art. 119, III, d da Constituição Federal» (fls. 87).
Preliminarmente, argüi sua ilegitimidade passiva, uma vez que a
286
R.T.J. — 100
ação deveria ser dirigida contra
Olmiro, enquanto vivia. Tendo falecido, não havia mais casamento,
extinto o vinculo matrimonial. Cita
o art. 315, § único, do Código Civil.
Critica o aresto recorrido, reproduzindo um acórdão da Egrégia
Quarta Câmara Civel que, segundo
a recorrente, esposara tese diversa.
Argüi a decadência do direito de
promover a «averbação» do casamento celebrado no estrangeiro,
«perante autoridades locais, logo
incompetentes, segundo a lei brasileira, 40 anos depois de realizado...
pois, o prazo que a lei lhe dava era
de três meses, e não de 40 anos
(fls. 90).
Repete, após, ter sido infringido
o art. 315, § único, do Código Civil.
Argumenta que a «averbação»,
no registro público, do casamento
celebrado no exterior, não é mera
formalidade registrária, como pretende o acórdão, acrescentando
que esse «é até contraditório»,
quando *traz á colação lição do
douto Pontes de Miranda, assim: A
data do registro é que estabelece a
irradiação dos seus efeitos civis,
de modo que, tendo havido duas
celebrações, é eficaz a que primeiro se registrou». Prossegue a recorrente: «Então, cabe uma pergunta: Qual foi o primeiro registro
realizado no Brasil? Certamente
em resposta, podemos afirmar,
sem sombra de dúvida, que não foi
o celebrado no Uruguai. Perante
a Lei brasileira inexistia o matrimônio celebrado no estrangeiro,
pela ausência de registro no prazo
legal. Aqui, no Brasil, Olmiro era
solteiro quando casou com a Recorrente; válido, portanto, seu casamento (fls. 91).
Reporta-se, após, transcrevendoos, aos pronunciamentos do Dr.
Curador ao Vínculo e dos órgãos do
Ministério Público, de fls. respectivamente, 31, 33 e 71.
O Parecer do Dr. ProcuradorGeral da Justiça é no sentido de
não admissão do recurso (fls. 97 a
98).
Suscita, o Parecer da Douta
Procuradoria-Geral da Justiça, a
preliminar de não cabimento deste
recurso, nos termos do art. 308,
VIII, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, por não
atingir o valor atribuído á causa a
alçada regimental.
Trata-se, porém, na espécie, de
ação que visa à anulação de casamento, ação, portanto, de valor
inestimável, como o são, em geral,
as ações de estado.
A não incidência, no caso daquela
norma regimental, é recdnhecida
pelo Supremo Tribunal, como se
infere do voto do Eminente Ministro João Leitão de Abreu no RE n?
85-328-MG, in verbis: a regra do
art. 308, VIII, do Regimento Interno aplica-se sempre que, não incindindo, para tornar inadmissível o
recurso extraordinário, nenhuma
das outras regras previstas nesse
preceito regimental, se tratar de
causa cujo valor não seja inestimável. Ora, na hipótese, nem se acha
afastada a admissibilidade do recurso extraordinário pelo art. 308, IV,
d, nem é inestimável o valor da
causa, que, pelo contrário, possui
declarado conteúdo econômico
(RTJ, vol. 83, págs. 929 e 930).
Resulta, claramente, do voto do
Eminente Ministro, que a regra regimental, sobre a alçada, não alcança as causas de valor inestimável, como é a presente.
Afasto, por isso, a preliminar ora
apreciada.
A recorrente, no preâmbulo da
petição do recurso, fundou-o na le-
R.T.J. — 100
tra d do permissivo constitucional,
e, adiante, aponta acórdão da
Egrégia Quarta Câmara Clvel deste Tribunal de Justiça, como paradigma. Aliás, esse acórdão é o único por ela mencionado. Sendo do
mesmo Tribunal, não se presta para cotejo, conforme a Súmula 369.
Além disso, o aresto trazido como
paradigma não tratou da mesma
espécie, pois, o casamento nele em
foco, embora celebrado no estrangeiro, o fora em data bem mais
próxima, pelo que as questões pertinentes foram julgadas às luz de
outras normas, que não aquelas vigorantes em 1936.
4. Embora sem aludir, na petição do recurso ao permissivo
constitucional da letra a, a recorrente, ao longo de sua argumentação, sustentou haver o aresto recorrido violado dispositivos legais,
como consta do relatório. Impõese, por isso, apreciar tais alegações.
A primeira, diz com a negativa
de vigência do art- 315, único (hoje revogado pela Lel n? 6.515, de
26.12.77), do Código Civil, porque,
dissolvida a sociedade conjugal,
que nascera do casamento realizado no Brasil, pela morte do cônjuge varão, carecia a recorrida de
ação para anulá-la.
Registro, desde logo, que a matéria não foi ventilada no acórdão recorrido, de sorte que incide a
Súmula 282.
Alega, depois, que o acórdão recorrido negou vigência aos dispositivos legais que determinam o registro no Brasil, no prazo de três
Ineses, a contar do regresso de um
dos cônjuges, do casamento celebrado no estrangeiro, uma vez que
admitiu registro feito cerca de 29
anos após.
287
O v. acórdão enfrentou esta
questão, do prazo para o registro
do casamento, à luz do disposto no
art. 47, g 1?, da Lel n? 181, de 24-11890 e, também, porque vigente à
época do que é discutido nesta
ação, do Decreto n? 18.542, de 2412-1928, art. 8?. E entendeu que
«Tal registro, sem dúvida, deve
ser efetuado no interesse da publicidade do casamento, mesmo que
não observado o prazo do art. 82...
do Decreto 4.787/39 (ou da legislação anterior), como bem decidiu a
6! Câmara Civel do Tribunal de
Justiça de São Paulo, in Revista
dos Tribunais, 384/136» (fls. 82).
Em outro aresto, do mesmo Tribunal, igual entendimento foi acolhido, como se vê deste trecho: «A
finalidade do registro, que é a publicidade do ato, além de se tornar, no caso, um meio de prova e
de conservação de documento estrangeiro que afeta a situação de
brasileiro, envolve interesse de ordem pública bastante para evidenciar que o lapso de tempo estatuído
em lei para a providência não é
prazo de decadência ou de prescrição, mas, antes, forma de ativar a
diligência das partes.
O registro, dado o seu alcance
social, far-se-á sempre, dentro ou
fora daqueleS prazo, cuja inobservância só poderá acarretar a sanção pecuniária prevista no art. 55,
da Lel de Registros Públicos».
(R.T., vol. 279/278).
O acórdão recorrido apóia-se,
ademais, em Pontes de Miranda,
que chancela o registro mesmo
após o prazo de três meses (cf. fls.
83).
Assim, a interpretação dada à
norma legal pelo aresto recorrido,
quanto à natureza do prazo nela fixado, é de ser tida, ao menos como
razoável, invocando-se, em conseqüência, a Súmula 400.
288
R.T.J. — 100
Mas, afora o ponto relativo ao
prazo para o registro do casamento de brasileiro celebrado no exterior, a recorrente aflora, ainda, a
questão do efeito desse registro,
argumentando que o v. acórdão 'é
até contraditório', quando 'traz à
colação lição do douto Pontes de
Miranda, assim: A data do registro
é que estabelece a irradiação dos
seus efeitos civis, de modo que tenho havido duas celebrações, é eficaz a que primeira se 'registrou'.
Aduz, então, que o primeiro registro feito no Brasil não foi o do casamento celebrado no Uruguai (fls.
91). Sustenta, ainda, através dos
pareceres, que transcreve na petição do recurso, dos órgãos do Ministério Público,
que o referido
registro somente poderia gerar
efeitos jurídicos caso traslado antes do casamento impugnado: efetivado 'a posteriori' é inteiramente
ineficaz' ( fls. 93).
O que o venerendo acórdão entendeu, em suma, foi que o registro de
casamento no Brasil exigido nos
dispositivos mencionados, tinha
efeitos apenas no plano de eficácia
não atingindo sua existência, nem
sua validade. Por isso, disse:
fosse ainda o precedente casamento ineficaz no Brasil', não importava a Olmiro, que 'casado estava,
validamente casado e não poderia
tornar a casar.
Estou em que, assim decidindo,
o v. aresto negou vigência aos dispositivos citados da legislação dos
Registros Públicos.
O Código Civil, ao dispor sobre o
casamento celebrado no Brasil,
distingue o ato da celebração e o
ato do registro. No art. 194, disciplina aquela e, no artigo 195, reza:
'Do matrimônio, logo depois de ciebrado, se lavrará o assento no livro de registro'. Pontes de Miranda, no Tratado de Direito Privado,
vol. 7, pág. 344, discorre sobre a
função do Registro Civil para o casamento, apontando o 'erro' dos
que entendem que o registro não é
preciso para que ele exista. E. antes, dissera que a data do registro
'é que estabelece a irradiação dos
seus efeitos civis', acrescentando:
'... tendo havido duas celebrações,
é eficaz a que primeiro se registrou'. (ob. cit., pág. 343).
Chama a atenção para a Lei n?
1.110, reguladora do casamento religioso, quanto aos efeitos civis, frisando que nela 'mais patente ficou
a função do registro civil: ... e a
convocação de novo casamento, civil ou religioso, depois de outro que
se não registrou, não importa nulidade, mas, tão-só, possível incidência da lei penal, se essa o estatuir' (ob. cit., pág. 343).
As normas da legislação de Registros Públicos — art. 8?, do Decreto n? 18.542, de 24-12-1928, vigente ha Coca, repetida no art. 82, do
Decreto n? 4.857/3% sobre o registro, no Brasil, do casamento, celebrado no exterior, sendo os cônjuges brasileiros insere-se, portanto,
no sistema da publicidade do casamento adotado pelo Código Civil.
Entretanto, o v. aresto, entendendo
que o cônjuge varão, que se casara
no Uruguai, mas cujo casamento
não fora registrado, não podia
casar-se civilmente aqui, retirou
qualquer efeito à norma legal determinadora do registro.
Em nível de despacho da admissão do apelo extremo, tenho por
demonstrado a negativa de vigência do dispositivo em causa de lei
federal, admitindo, nesse ponto, o
recurso pela letra a, do art. 119, III
da Constituição Federal.
Vista às partes pelos prazos e
para os fins legais» (fls. 99 a 108).
R.T.J. — 100
Oferecidas as razões de fls. 113 a
115 e contra-razões de ris. 118 a 122,
opinou a Procuradoria-Geral da Justiça pelo não conhecimento do recurso (fls. 124 a 128).
Perante esta Corte foi oferecido o
seguinte parecer:
«1. Conforme bem salientou o
Ministério Público local em seu
pronunciamento, fls. 126, o recurso
extraordinário foi interposto com
apoio na letra d, somente, trazendo
ao dissídio acórdão do mesmo Tribunal, encontrando, portanto, o
obstáculo da Súmula 369. Sem dúvida, de acordo, ainda, com tal parecer, aplicável ao caso é o acórdão proferido no RE 81.905. Relator Ministro Rodrigues Alckmin;
RTJ 79/962, no sentido • de, verbis,
`não competir, aos Presidentes de
Tribunais, postularem pelos litigantes. Assim, posto o recurso pela
letra d descabido é que se pretenda
que também seria ele admissivel
pela letra a, fundamento que o recorrente não invocou.
2. — Somos, nos termos da
Súmula 369, pelo não conhecimento
do recurso extraordinário.
Brasília, 02 de setembro de 1980
— Mauro Leite Soares, Subprocurador-Geral
da
República
(fl. 132).
VOTO
O Sr. Ministro Djaci Falcão (Relator: Ficou esclarecido no relatório
que o recurso extraordinário se baseou apenas na divergência jurisprudencial (letra d, do inc III, do art.
119, da Constituição Federal). Acontece que o único acórdão trazido à
colação e do mesmo Tribunal de Justiça. A toda evidência não enseja a
sua admissão, segundo a Súmula
369, in verbis:
«Julgados do mesmo tribunal
não servem para fundamentar o
289
recurso extraordinário por divergência jurisprudencial».
E verdade que o ilustre Desembargador Vice-Presidente teve a iniciativa de admitir o recurso pela letra a
do permissivo constitucional, apesar
da recorrente haver invocado, tãosomente, a letra d. Conforme afirmou, com precisão, o admirável e
saudoso Ministro Rodrigues Alckmin:
«Interposto o recurso extraordinário com fundamento unicamente
em uma das alíneas do permissivo
constitucional, não toca ao Presidente do Tribunal, ao admiti-lo,
aditar-lhe fundamentação em outra alínea» (RE 81.905, in RTJ
79/962).
Ao recorrente é que cabe indicar
um ou mais dos fundamentos constitucionais imprescindíveis ao cabimento do recurso (art. 304 do Regimento Interno do S.T.F.).
Sem dúvida, no particular, o despacho fugiu à sistemática do recurso
extraordinário.
Diante do exposto, não conheço,
preliminarmente, do recurso.
EXTRATO DA ATA
RE-91.627 — RS — Rel.: Min. Djaci
Falcão. Recte.: Ana Maria Klein de
Castro (Advs.: José Claudino Alves
de Oliveira e outros). Recda.: Esther
Vieira de Castro (Adv.: Mário Kruse).
Decisão: Não conhecido. Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreirá Alves e
Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mauro
Leite Soares.
Brasília, 26 de setembro de 1980 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
R.T.J. — 100
290
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 91.633 — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão.
Recorrente: Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social — IAPAS p/INPS — Recorrida: Tecelagem Fimetex Ltda
Massa falida de, p/seu Síndico.
Falência. Pedido de restituição de contribuições previdenciárias
retidas e não recolhidas pelo empregador aos cofres da Previdência.
Sua restituição pelo falido, eis que não se enquadra como crédito de
natureza fiscal. Precedente do STF.
Recurso extraordinário provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade
de votos e na conformidade da ata
do julgamento e das notas taquigráficas, em conhecer do recurso e darlhe provimento nos termos do voto
do Ministro Relator.
Brasília, 7 de outubro de 1980 —
Djaci Falcão — Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Djaci Falcão —
Apreciando a interposição do recurso disse o Presidente Young da Costa Manso:
«I — Trata-se de pedido de restituição de dinheiro, em falência
previdenciárias),
(contribuições
que a sentença, confirmada em segunda instância, repeliu, sob fundamento de carência de ação (aresto unânime de fls. 25).
2 — O vencido não se conforma e
interpõe recurso extraordinário
(fls. 28), com base no art. 119, III,
letras a e d, da Constituição argüindo relevância da questão federal.
A Procuradoria-Geral da Justiça
opinou pelo indeferimento (fls. 45).
3 — O valor da causa (Cri
22 047,27) não atinge o limite da alçada, que, na hipótese, é de Cr$
110.640,00 (cem vezes o saláriomínimo de Cri 1.106,40, estabelecido no Dec. 79.610, de 28-4-77, quando se apresentou o pedido em Juízo
— fls. 05), à vista da uniformidade,
dos julgamentos das instâncias ordinárias (Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, art. 308,
VIII).
O recurso, pois, é inadmissível.
4 — Não me competindo, todavia, examinar a argüição de relevância (Regimento cit., art. 308,
3?), mando que se forme o respectivo instrumento» (fls. 48 a 49).
O recurso veio a ser processado
por força da Argüição de Relevância
4.253-5 (ver (ls. 67 a 71 e 77 a 78).
Perante esta Corte a Procuradoria-Geral da República manifestou-se pelo provimento do recurso
(fls. 82).
VOTO
O Sr. Ministro Djaci Falcão (Relator) — E o seguinte o acórdão recorrido:
R.T.J. — 100
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Ove! 268.707,
da Comarca de Inaaiatuba, em que
é apelante Instituto Nacional de
Previdência Social, sendo apelada
M. F de Tecelagem Fimetex Ltda.:
Acordam, em 1? Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo,
por votação unânime, negar provimento ao recurso.
O art. 157, da Lei 3.807, de 26-860, mantendo a tradição do direito
anterior, assegurava ao INPS o direito à restituição das quantias
descontadas dos salários dos empregados em favor da autarquia,
nos processos falimentares, assim
dispondo: São privilegiados nos
processos de falência, concordata
ou concurso de credores, os créditos das instituições de previdência
social relativos às contribuições
devidas pela empresa, cabendo às
mesmas instituições, o direito à
restituição de quaisquer importâncias arrecadadas pelas empresas,
a titulo de cota de previdência.
O dispositivo, em questão, todavia, foi alterado pelo art. 25, do
Decreto-lei 66, de 21-11-66, passando a viger com a seguinte redação:
Os créditos da previdência social
relativos a contribuições e seus
adicionais ou acréscimos de qualquer natureza, por ela arrecadados, inclusive a cota de previdência, a correção monetária e os juros de mora correspondentes, nos
processos de falência, concordata e
concurso de credores, estão sujeitos às disposições atinentes aos
créditos da União, aos quais estão
equiparados, seguindo-se a estes
na ordem de prioridade (art. 157,
da Lei 3.807, de 26-8-60, publicada
em cumprimento ao art. 31, da Lei
5.890, de 8-6-73, através da Portaria
3.219, de 4-7-73, do Gabinete do Ministro do Trabalho e Previdência
Social, In DOU de 12 de julho de
1973, Suplemento).
291
A equiparação aos créditos da
União retirou, portanto, das instituições de previdência social a restituição, autêntico privilégio especial, nos processos falimentares.
A questão, atualmente, se resolve pelos arts. 186 e 188 da Lei 5.172,
de 25-10-66 (CTN), cabendo ao apelante prioridade para o recebimento dos seus créditos logo após os da
União, situando-se, assim, em terceiro lugar na ordem geral, uma
vez que aos da União, preferem os
de natureza trabalhista (art. 186).
Por conseguinte, à falta de amparo legal, desde o advento do
Decreto-lei 66, de 12-11-66, aos créditos do Instituto Nacional de Previdência Social, não se aplica o direito à restituição, previsto no art.
76, da Lei de Falências.
Ante o exposto, negam provimento ao apelo.
São Paulo, 18 de abril de 1978 —
Cardoso Rolim — Presidente com
voto — Mendes Pereira — Relator»
(fls. 25 a 26).
Como se vê, trata-se de pedido de
restituição formulado pelo então
INPS, referentes a descontos procedidos pela falida de seus empregados e sócios, e não recolhidos ao órgão arrecadador competente. O recurso merece conhecimento, sobretudo diante da divergência com precedentes desta Corte. Assim, no RE
86.069, relatado pelo eminente Ministro Soares Mufioz, ficou assentado:
«Falência — O falido exerce função de Coletoria referentemente às
contribuições previdenciárias que
incidem sobre os salários dos empregados. Legitimo é o pedido de
reivindicação formulado pelo
INPS. Recurso extraordinário co-nhecido e provido, para deferir a
restituição requerida.
292
R.T.J. — 100
n
Acórdão
Vistos, etc.
Acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em 1! Turma, à unanimidade de votos e na
conformidade das notas taquigráficas conhecer e dar provimento ao
recurso.
Brasília, 1? de setembro de 1978
— Antonio Neder — Presidente —
Soares Muhoz — Relator.
Relatório
O Sr. Ministro Soares Munoz —
O despacho do ilustre Presidente
Mello Júnior, do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, expõe a espécie:
«O Instituto Nacional de Previdência Social interpõe recurso
extraordinário, com fundamento
nas letras a e d do texto constitucional por negar o acórdão deste
Tribunal vigência à Lei 3.807, de
26-8-60 com alterações posteriores e seu Regulamento, e quanto
ao segundo fundamento por divergir da interpretação do STF
consubstanciado na Súmula 417 e
outras que aponta.
Trata-se de acórdão que negou
restituição de crédito de Previdência Social em processo de falência, ao fundamento de que inexiste texto legal que o autorize.
Apenas o Regulamento, desbordando da lei, instituiu a restituição. Além do mais, não se provou recolhimento de parcelas dos
empregados.
Verifica-se, pois, que ao contrário de afrontar a Lei 3.807, de
28-6-60, o acórdão deu-lhe exato
entendimento, impedindo uma
extensão do Regulamento ao que
dispõe a própria lei.
E no que concerne ao fundamento da letra d, a matéria versada pelo acórdão é de prova,
que não enseja o recurso extraordinário (Súmula 279).
Assim, inadmito-o.
Subiu, no entanto, o apelo derradeiro, para melhor exame, pelo
provimento do agravo de instrumento em apenso.
Em parecer da Dra. Cecília de
Cerqueira Leite Zarur, manifestouse a 2! Subprocuradoria-Geral da
República pelo conhecimento e
provimento do recurso extraordinário, sob o fundamento de que nas
razões de fls. 48 logrou o recorrente provar negativa de vigência à
Lel n? 2.807-60 (com alterações
subseqüentes), ao seu regulamento, bem como a existência do
dissídio alegado.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Soares Muiloz
(Relator) — O recurso se anima
nas letras a e d do permissivo
constitucional.
Sustenta que o acórdão impugnado, recusando ao Instituto o direito
à restituição das contribuições referentes aos empregados, que o
empregador estava obrigado a descontar dos salários para esse fim,
negou vigência.
«... à Lei 3.807, de 16-8-60, com
as alterações do Decreto-lei 86,
de 22-11-66, e o seu Regulamento,
Decreto 60.501, de 14-3-67, que revogou não aprovou como diz o
malsinado parecer, o Decreto
48.958-A, de 19-6-60; aliás o mesmo parecer faz afirmações sem a
mínima consistência de que não
houve dinheiro arrecadado, que
as contribuicões diziam respeito
R.T.J. — 100
a período de estagnação e não
produtividade da fábrica, sem sequer ter noção do que rezam os
arts. 69 e 79 da Lei 3.807 sobre o
sistema de custeio e arrecadação
das contribuições, chegando mesmo a fazer confusão destas com
a quota de previdência, a que
alude a Lei 5.172, de 25-10-66,
CTN, coisa completamente diversa.
O pedido reivindicante teve o
seu valor apurado por levantamentos fiscais oportunos, já inscritos como divida ativa e objetos de executivos fiscais, que foram suspensos pela decretação
da falência. Nada têm que ver
com o período de estagnação,
tanto que a falida não impugnou
o pedido concordando com seu
valor, nem podia fazê-lo porque
era legitimo, procurando apenas,
quando foi interposto o agravo de
petição, negar o direito de restituição... que decorre da natureza
da contribuição imposta pela
Constituição Federal, art. 165,
item XVI e parágrafo único...»
«... manda a Lei 3.807, em seu
art. 157, que os créditos da previdência social relativos a contribuições e seus adicionais ou
acréscimos de qualquer natureza
por ela arrecadados, inclusive a
cota de previdência, a correção
monetária e os juros de mora
correspondentes, nos processos
de falência, concordata ou concurso de credores, estão sujeitos
às disposições da União, aos
quais são equiparados, seguindose a estes na ordem de prioridade.»
O que é repetido no art. 188 do
Regulamento, Decreto n? 60.501.
«Os créditos da previdência social relativos a contribuições e
293
seus adicionais ou acréscimos de
qualquer natureza por ela arrecadados, inclusive a cota de previdência, a correção monetária e
os juros de mora, correspondentes, nos processos de falência,
concordata ou concurso de credores, estão sujeitos às disposições
atinentes aos créditos da União
aos quais são equiparados,
seguindo-se a estes na ordem de
prioridade, cabendo, outrossim, à
previdência social o direito de
restituição, de quaisquer importâncias arrecadadas pelas empresas, tanto dos segurados,
quanto, a título de cota de previdência do público. (art. 176,
itens, I, II, IV, V e 1?).»
E a Lei 3.807, em seu art. 79,
item V, é expressa.
«Os descontos das contribuições e os das consignações legalmente autorizadas sempre se
presumirão feitos, oportuna e regularmente, pelas empresas a isso obrigadas, não lhes sendo licito
alegar nenhuma omissão que hajam praticado, a fim de se eximirem ao devido recolhimento, ficando pessoal e diretamente responsáveis pelas importâncias que
deixarem de receber ou que tiverem arrecadado em desacordo
com a disposição desta Lei.»
Basta portanto, atentar para
tal dispositivo legal e não regulamentar, para verificar-se o engano
ledo e cego do v. aresto, que se deixou empolgar pelo parecer que,
data venta, não examinou, a questão detida e devidamente, adotando o sofisma, de que «a indústria
não arrecadou parcelas para o
INPS»... (fls. 34), o que a agravada não nega, cingindo-se em alegar
«que os débitos previdenciários da
falida foram objetos de composição com a Agravante, antes do decreto da falência...» (fls. 12) e sus-
294
R.T.J. - 100
tentar que «o regulamento não pode
modificar a lei »... o que, por ser
trivial, no caso não é verdadeiro.
O confronto dos artigos transcritos integral e textualmente linhas
atrás, mostra claramente que o regulamento tão só interpretou o direito pré-existente na lei da restituição, uma vez que o empregador,
sendo obrigatoriamente o arrecadador das contribuições, mediante
desconto da remuneração dos empregados ( art. 79, item I da Lei
3.807), transforma-se em mero depositário dessas quantias, enquanto não as recolhe aos cofres do
INPS, não desaparecendo essa responsabilidade mesmo no caso de
sua omissão, como dispõe a Lel ( item V).»
Aceito a argumentação deduzida
pelo recorrente, no sentido de que
o art. 188 do Regulamento, Decreto
60.501 de 14-3-67, nada mais fez do
que explicitar o que se contém, por
força de compreensão, nos arts. 79
e 157 da lei 3.807, dos quais emana,
para o empregador, a situação de
simples depositário das contribuições concernentes aos salários de
seus empregados.
Aliás, esse entendimento consoa
com o acórdão unânime desta 1!
Turma, no RE 52.249, relator o
eminente Ministro Luiz Gallotti,
que acentuou:
«O art. 9? do Decreto-lei 65, de
14-12-37, distingue nitidamente
entre as quantias de que os Institutos são apenas credores privilegiados e os outros de que são reivindicantes, porquanto estas lhes
pertencem, pois o empregador,
no exercício de uma função de
coletoria que a lei lhe confiou, as
descontou dos salários de seus
empregados, e, em vez de
recolhê-las como devia, as reteve.
Por outro lado, existe copiosa
jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal, no sentido de
que as contribuições do empregado, assim retida pelo patrão, é
reivindicável da massa falida
deste como bem do terceiro em
poder de mero depositário.
Nem há dizer, como objeta o
acórdão recorrido, que não foi
feita a discriminação das parcelas, pois, como bem observa o
despacho de fls. 47 verso, sendo o
quantum fixado em lei, aquela
discriminação se obtém por simples cálculo aritmético. Acresce
que são iguais a contribuição do
empregador e a dos empregados.»
Não foi esse aresto indicado pelo
recorrente, circunstância que não
me impede de referi-lo para demonstrar a negativa de vigência
das leis invocadas no recurso Por
igual, não aplicou ele os dispositivos legais questionados na presente trresignação, mas a objeção carece de relevo, em face da consideração de que, no ponto, não houve
mudança de orientação quanto à
nítida diferença entre as contribuições previdenciárlas que incidem
sobre o empregador com aquelas
que incidem sobre os salários dos
empregados e em relação às quais
a lei confia ao patrão as funções de
coletoria.
Sustenta ainda o recorrente que
o acórdão recorrido deu à lei federal interpretação divergente da
que lhe deram outros Tribunais do
país.
Indica, como decisões paradigmas, a Súmula 417, segundo a
qual:
«Pode ser objeto de restituição,
na falência, dinheiro em poder do
falido, recebido em nome de outrem, ou do qual, por lei ou con-
R.T.J. — 100
trato, não tivesse a disponibilidade.»
e os seguintes acórdãos:
a) do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo:
«Instituto de Aposentadoria —
Contribuições dos empregados e
do empregador — falta de recolhimento pelo comerciante falido
— Direito de reivindicação quanto às primeiras e crédito privilegiado quanto às segundas — Aplicação do art. 9? do Decreto-lei 65,
de 1937.
... Justa e legal a distinção entre as contribuições devidas pelos falidos aos Institutos e as devidas pelos empregados, que aos
empregadores incumbe descontar e recolher aos membros Institutos. Destas últimas os empregadores são como que verdadeiros depositários. Essa naturalmente a razão pela qual o
Decreto-lei 65, dispõe em seu art.
10:
«São reputados privilegiados,
nos processos de falência, concordata ou concurso de credores
os créditos dos Institutos ou Caixas de Aposentadorias e Pensões,
incluídos, como reivindicantes
em relação às quantias recebidas
pelos empregadores de seus empregados.»
«Força a essa interpretação o
próprio dispositivo do art. 102, da
atual Lei de Falência que, contrariamente ao que sustenta o agravante, não revogou, nem mesmo
implicitamente o preceito da lei
trabalhista citada.
Atente-se para o que dispõe o citado art. 102, I 3?, da Lei de Falências:
295
«Têm privilégio geral: I ... II —
os créditos dos Institutos ou Caixas de Aposentadoria e Pensões
pelas contribuições que o falido
dever.»
Referiu-se o inciso, explicitamente, às contribuições devidas pelo
falido, ou sejam aquelas a que se
refere à primeira parte do art. 10
da Lei 65, porque relativamente às
contribuições recebidas pelo empregador de seus empregados, e é
o caso dos autos, os Institutos serão incluídos como reivindicantes.
Isto se afigura tão claro, lógico e
de boa hermenêutica, que não se
vê como justificarem-se as dúvidas
do agravante.
Igualmente improcedente é a
alegação de que as importâncias
reclamadas pelo agravado não foram arrecadadas pelo síndico, exigência que não está na lei, e nem
poderia estar, pena de invalidar-se
o preceito porque as contribuições
são feitas em dinheiro, coisa
fungivel, jamais se poderia
individuá-las, distinguindo-as das
outras acaso encontradas em poder do falido, e arrecadadas pelo
representante da massa. Certa e
rigorosamente jurídica foi, portanto, a decisão agravada que fica
mantida.»
b) do Tribunal da Guanabara:
«As contribuições que os patrões descontam dos ordenados de seus empregados, para
recolhê-las aos Institutos de Aposentadoria e Pensões, tem natureza de depósito. Os empregadores exercem, nesse caso, munus
de depositário e, por essa razão,
cabe às autarquias, as quais são
filiados patrões e empregados, o
pedido de restituição. (RT 172825, idem 168-136, 178-310, 201,
pág. 336).»
296
R.T.J. — 100
Quanto a essa jurisprudência,
cabe a observação que fiz relativamente ao acórdão desta Primeira
Turma, relatado pelo eminente Ministro Luiz Gallotti, de que, embora tenha aplicado lei pretérita, é
válida para o confronto, visto que
se esteja nos mesmos princípios
que informaram a Súmula 417.
Ante o exposto, conheço do recurso extraordinário pelas letras a
e d e lhe dou provimento, para deferir a restituição requerida.»
(RTJ 89-206 a 209).
No mesmo sentido a decisão tomada no RE 89.345, relatado pelo eminente Ministro Moreira Alves, perante esta Turma, e que ficou assim
ementado:
Finalmente, com idêntica diretriz
se decidiu no RE 92.519, de que fui
relator e, invocado no parecer da
douta Procuradoria-Geral da República.
Sem dúvida, em relação aos créditos referentes ás contribuições dos
empregados, retidas e não recolhidas pelo empregador aos cofres da
Previdência, impõe-se a sua restituição pelo falido.
O empregador torna-se depositário
das respectivas quantias, sujeitandose, conforme o caso, a responder pelo crime de apropriação indébita.
Desse modo, não é possível o seu
enquadramento como crédito de natureza fiscal
«Concordata. Pedido de restituição de contribuições previdenciárias não recolhidas ao INPS pelo
empregador. Honorários de advogado.
Ante o exposto, conheço e provejo
o recurso.
A Súmula 417 «Pode ser objeto
de restituição, em falência, dinheiro em poder do falido, recebido em
nome de outrem, ou do qual por lei
ou contrato, não tivesse ele disponibilidade» se aplica ás contribuições previdenciárias dos empregados arrecadadas pelo empregador,
que, pela falta de recolhimento na
época oportuna, fica sujeito às penas do crime de apropriação indébita.
Mesmo em face do atual CPC, a
expressão «despesas da reclamação», do art. 77, § 2?, da Lei de Falências, sem nenhuma ressalva,
abrange honorários advocaticios,
que são devidos em pedido de restituição ou em embargos de terceiros, regulados no Titulo V daquela
lel. Precedentes do STF.
Recurso extraordinário não conhecido.» (RTJ 93-363).
RE 91.633 — SP — Rel.: Min. Djaci
Falcão. Recte.: Instituto de Administração Financeira da Previdência e
Assistência Social — IAPAS
p/INPS. (Adv.: Santo Battistuzzo).
Recda.: Tecelagem Fimetex Ltda.,
massa falida, de p/seu Síndico.
(Adv. Moacyr Pires).
EXTRATO DA ATA
Decisão: Conhecido e provido nos
termos do voto do Ministro Relator.
Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mauro
Leite Soares.
Brasília, 7 de outubro de 1980 —
Hélio Francisco Marques — Secretário.
R.T.J. — 100
297
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 91.694 — RJ
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu.
Recorrente: Rede Ferroviária Federal S/A — Recorrido: Francisca da
Silva Teixeira.
Responsabilidade civil extracontratual. Honorários de advogado.
Incidência imediata da Lel n? 6.745, de 05.12.79, e aplicação do â 5?,
por ela acrescentado ao art. 20 do CPC, quando a indenização decorre
de responsabilidade extracontratual (ato ilícito contra a pessoa). Recurso extraordinário parcialmente conhecido, porém não provido.
ACORDA0
dano moral, no valor de 10 salários
mínimos, vencida a Juíza Áurea
pimentel Pereira, que não concedia a verba do dano moral, e, dar
provimento em parte à 2? Apelação, para determinar que os juros
de mora se contem a partir da citação inicial, vencida a Juíza Relatora, que ainda reconhecia a prescrição canquenal». (fs. 53/54).
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade com a ata
de julgamentos e notas taquigráficas, em conhecer parcialmente do
recurso mas negar-lhe provimento,
unanimemente.
Brasília, 03 de outubro de 1980 —
Leitão de Abreu, Presidente e RelaPara manter a sentença quanto ao
tor.
reconhecimento da procedência da
ação, frisou o acórdão:
RELATORIO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu:
«A procedência da ação é indisPorque o seu marido foi atropelado
cutível uma vez demonstrado,
por um trem, falecendo em conseatravés da prova testemunhal coqüência do acidente, a recorrida
lhida, que o acidente se deu em
ajuizou ação para haver indenização
passagem de pedestre onde inexisda Rede Ferroviária Federal S.A.
tia sinal e onde a cancela existente
Julgada, pela sentença, parcialmenno momento não funcionava (fs.
te procedente a ação, assim o acór16).
dão decidiu ambas as apelações interpostas:
«Negligente, portanto, a Rede
Ferroviária na observância do Re«... dar provimento à primeira
gulamento de Segurança e Polícia
apelação, para: elevar a pensão a
das Estradas de Ferro (DL
2/3 do salário mínimo sobre o que
a vítima efetivamente percebia (fl.
2.089/63), a obrigação de indenizar
8), concecida a atualização da pené indescutível, estando a responsabilidade em questão em tudo e por
são ã época da execução; incluir o
tudo assemelhada à culpa contra13? salário; elevar os honorários
tual, como tal incompensável com
advocatícios a 15%, observada a
a eventual culpa da vítima». (fl.
Súmula n? 1 deste Tribunal e conceder verba para indenização do
54).
298
R.T.J. - 100
Extraordinariamente recorreu a
Rede, pelas letras a e d, e o seu recurso subiu porque acolhida, em parte, a argüição de relevância (fl. 88 e
ARv. n? 4.196, em apenso).
E o relatório.
te a honorários advocaticios, conheço, parcialmente, do recurso e, nessa parte, de acordo, agora, com os
precedentes desta Turma, lhe nego
provimento.
VOTO
RE-91.694 — RJ — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Recte.: Rede Ferroviária Federal S.A. (Advs.: Oswaldo
Campos e outros). Recda.: Francisca da Silva Teixeira (Advs.: Marco
Aurélio Monteiro de Barros e outros).
O Sr. Ministro Leitão de Abreu
(Relator): A argüição de relevância
foi acolhida somente no que toca à
questão concernente a honorários de
advogados, de sorte que tão-só essa
questão é agora suscetível de exame
pelo Supremo Tribunal.
EXTRATO DA ATA
Decisão: Conhecido em parte, mas
negado
provimento. Unânime. AuEm 5 12 79 foi editada a Lei n? sente, ocasionalmente,
o Senhor Mi6.745, que aos parágrafos do art. 20 nistro Djaci Falcão. Ausente, justifido Cód. de Proc. Civil acrescentou o
o Senhor Ministro Morei§ 5?, onde se complementam as dis- cadamente,
ra
Alves.
posições quanto a honorários advocatícios. Essa norma legal, segundo
Presidência do Senhor Ministro
entende esta Turma, é de incidência Leitão de Abreu. Presentes à Sessão
imediata, porém o novo parágrafo só os Senhores Ministros Cordeiro
se aplica nos casos de responsabili- Guerra e Decio Miranda. Ausente,
dade extracontratual (ato ilícito con- ocasionalmente, o Senhor Ministro
tra a pessoa) — RE's 92.259, 92.457, Djaci Falcão. Ausente, justificada92.934, etc.
mente, o Senhor Ministro Moreira
Alves. Subprocurador-Geral da ReNo caso vertente, cuida-se, exata- pública, o Dr. Mauro Leite Soares.
mente, de indenização fundada em
responsabilidade
extracontratual.
Brasília, 03 de outubro de 1980 —
Diante disso, caracterizado o Hélio Francisco Marques, Secretádissídio quanto à questão concernen- rio.
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 91.755 — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Rafael Mayer.
Recorrente: Centrais Elétricas de São Paulo S/A — CESP — Recorridos:
Antonio Delgado Filho e outros.
Competência. Empregado de sociedade de economia mista
(CESP). Licença-prêmio. Lei estadual 4.819/58-SP. Justiça corhum. —
Vantagem que não decorre de contrato de trabalho, porém, de beneficio legal do Estado, não podendo, por isso, inserir-se no contexto
da relação empregaticia, única que suscitaria a competência especializada. Recurso Extraordinário conhecido e provido.
R.T.J. — 100
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos,acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata de
julgamentos e notas taquigráficas, à
unanimidade, conhecer do recurso e
dar-lhe provimento.
Brasília, 22 de setembro de 1981. —
Cunha Peixoto, Presidente. — Rafael
Mayer, Relator.
RELATORIO
299
nador com a Assembléia, não da
empresa com os empregados, que
adquiriram o direito à vantagem
outorgada.»
Interposto recurso extraordinário,
em que são dados como violados os
arts. 8?, VIII, b, 142, 153 ff 2? e 3? e
170 2? da CF, não foi admitido,
mas, ao agravo, fi-lo subir para melhor exame.
Nesta instância, a douta Procuradoria-Geral opina pelo não conhecimento.
k o relatório.
O Sr. Ministro Rafael Mayer: Em
reclamação trabalhista intentada
VOTO
contra as Centrais Elétricas de São
Paulo e contra o Estado de São PauO Sr. Ministro Rafael Mayer (Relo, os reclamantes pleitearam o recebimento, em pecúnia, de licença- lator): Em caso idêntico, julgado a
prêmio de três meses a cada perío- 21.XI. 1979, o Pleno conheceu e deu
do de cinco anos de exercido funcio- provimento por unanimidade ao renal, com fulcro na lei Estadual nt curso extraordinário para dar pela
incompetência da Justiça do Traba4.819/58.
lho para processar o feito, por não
A JCJ excluiu do processo o Esta- ser ele de natureza trabalhista (RTJ
do de São Paulo e julgou a reclama- - 96/857).
ção procedente contra a Recorrente,
Com efeito, conforme se salienta
condenando-a ao pagamento pleiteado. Essa decisão foi reformada pelo nesse julgado, não se trata de uma
TRT que julgou os reclamantes care- vantagem decorrente do contrato de
cedores de ação. Recurso de revista trabalho, senão de benefício de orque dai se interpôs não foi conhecido dem legal do Estado que não veio a
ser incorporada aos regulamentos da
pela 2! Turma do TST.
empresa, pelos canais competentes,
Entretanto, em recurso de embar- e inserir-se, desse modo, no contexto
gos, o Pleno do TST julgou proceden- das relações empregaticias.
te a reclamação, nos termos da seguinte ementa:
A autonomia privada que resguarda mesmo as empresas mistas, face
«Embargos recebidos para jul- ao art. 170 2? da CF, resultou ofengar procedente a reclamação. A lei dida, pois somente pelos seus órgãos
em questão estabeleceu um co- de manifestação de vontade, regumando, por ser o Estado majoritá- larmente exercitados, é que se poderio no capital da empresa. A norma ria assumir a obrigação contratual
passou a ser auto-aplicável, para com os empregados.
inserindo-se como cláusula no contrato de trabalho. O governador do
Sem que a obrigação que se atriEstado desobedeceu à Assembléia, bui à Recorrente tenha sido posta
deixando de cumprir o que a lei de- nesse plano, é impossível cuidar-se
terminou. O problema é do gover- de uma relação juridico-trabalhista,
300
R.T.J. - 100
que somente ela suscitaria a competência especializada. Assim, com base no precedente, conheço e dou provimento para declarar a incompetência da Justiça do Trabalho.
EXTRATO DA ATA
RE. 91.755 — SP — Rel.: Min. Rafael Mayer. Recte.: Centrais Elétricas de São Paulo S/A — CESP
(Advs.: Maria Cristina Paixão Cortes, Luiz Carlos Pujol e outros). Recdos.: Antonio Delgado Filho e outros
(Advs.: Ulisses Riedel de Resende,
Solange Vieira de Souza e outros).
Decisão: Conhecido e provido Decisão unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Cunha Peixoto. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Soares Muftoz,
Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e
Néri da Silveira. SubprocuradorGeral da República o Dr. Francisco
de Assis Toledo.
Brasília, 22 de setembro de 1981. —
Antônio Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 92.070 — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Cordeiro Guerra.
Recorrente: Alvaro Paupério Filho, s/mulher e outros — Recorridos: Júlio Paupério e sua mulher — Antônio Abel Plerre; sua mulher e outra —
Juan Castro Conde e sua mulher.
— A venda de ascendente a descendente sem o consentimento dos
demais, e nula quer seja feita direta ou indiretamente, art. 1.132 do Código Civil.
Não discrepa dessa orientação jurisprudencial, acórdão que, em
base das provas dos autos e circunstâncias do processo, tem como
inocorrente a fraus lege, porque real a alienação feita a uma pessoa
Jurídica integrada pelo ascendente e descendentes, e legitima a retirada do ascendente da sociedade, pago e satisfeito dos seus haveres.
Precedentes: RE 92.810 — 3 — MG.
Dissídio jtuisprudencial não comprovado, Súmula 291.
RE não conhecido, Súmula 279 e 400.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal na conformidade da ata de
julgamento e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em não
conhecer do recurso.
Brasília, 16 de outubro de 1981 —
Djaci Falcão, Presidente — Cordeiro
Guerra, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra, O
acórdão recorrido é do seguinte teor:
«Os autores, ora embargantes,
com fundamento no art. 1.132 do
Código Civil, moveram aos ora
embargados a presente ação de nulidade cumulado com a de petição
de herança, na qualidade de herdeiros necessários de Alvaro Pauperlo, pai, avô e sogro de ambas as
R.T.J. - 100
301
partes, a fim de obter a devolução
Não se contesta que a venda diao respectivo Espólio, para ultereta, de ascendente a descendente
rior partilha na forma legal, dos
sem o consentimento expresso dos
dois imóveis, silos á Rua Castro
demais descendentes, seja nula,
Alves n?s 321 e 323, nesta Capital,
conforme adverte Clóvis (Comenque o de cujus transferiu para a
tários ao art. 1.132), independentesociedade «A. Paupério & Cia.
mente, portanto, de prova da simuLtda.», constituída em 1942 por allação. A respeito, exaustivo é o esteração da firma individual «A.
tudo do Desembargador Dimas de
Paupério», com a inclusão de seus
Almeida, na sua monografia «Venfilhos Júlio Paupério e Abel Suda de Ascendente a Descendente»
plicy Paupério, pai de Antônio
reproduzida a fls. 449/459.
Abel Pierre Paupério, e da qual se
Todavia, conforme acentua o
retirou em 1951, vendendo-lhe sua
mesmo Clóvis, não haverá o vicio
quota-parte, os quais, ao dissovêcondenado por esse artigo (1.132)
la, em 1956, dividiram entre si os
quando o descendente comprar de
imóveis em apreço sem anuência
terceiro o que este adquiriu do asdos demais herdeiros, em qualcendente»,
uma vez demonstrada a
quer dessas transações.
legitimidade da venda. Em tal hipótese a anulação do ato dependeO Juiz, invocando o magistério
de Clóvis Bevilacqua e Carvalho s rá de prova da simulação, como é
intuitivo.
Santos — que não consideram —
nula a venda feita realmente por
Na espécie em exame, exaustiascendente a terceiro e deste a um
vamente demonstrou a sentença,
descendente do seu vendedor —
pelas circunstâncias envolventes a
julgou Improcedente a ação por
ausência de qualquer simulação.
não vislumbrar simulação na transCom efeito, admitiram os autoferência feita por Alvaro Paupério
res, por seu — ilustre procurador,
dos dois imóveis em questão para
que «as duas primeiras escrituras
a sociedade, e na subseqüente vende compra e venda — do ascendenda a esta de sua quota-parte, que
te comum para a Pessoa Jurídica
afinal foi partilhada entre os dois
—
são inatacáveis», fls. 296. E no
sócios remanescentes, envolvendo
tocante à retirada de Alvaro Paupéaqueles dois prédios.
rio da sociedade, recebendo o justo
Inconformados, apelaram os aupreço de sua quota-parte —
tores, mas a Egrégia Quinta CâCr$600.000,00 também não foi susmara Civil, integrada pelos emicetível de qualquer suspeita.» fls.
nentes Desembargadores Afonso
489/491).
André, Relator, Coelho de Paulo,
O recurso extraordinário foi admiRevisor e Macedo Bittencourt, ne- tido
pelo seguinte despacho:
gou provimento ao recurso, contra
«
— Trata-se de ação , fundao voto do Revisor, que o provia,
mentada no art. 1.132 do Código Cipara julgar procedente a demanda,
vil, para invalidar a transferência
tendo sido repelida a preliminar de
de dominio sobre imóveis, que, por
prescrição, contra o voto do Relaconseguinte, deverão ser levados
tor.
ao inventário do alienante para soInconformados, interpuseram os
brepartilha entre os seus herdeiautores os presentes embargos,
ros.
com apoio no douto voto vencido,
A Sentença repeliu a preliminar
colimando a procedência da ação,
de prescrição e julgou improcedenNão merece guarida o recurso.
te o pedido, sendo confirmada em
302
R.T.J. — 100
apelação e embargos infrigentes cam o julgado, por simples ementa,
assim resumido:
(fls. 418 e 489).
«A nulidade imposta pelo art.
2 — Não se conformando, os ven1.132 do Código Civil, as vendas cecidos interpõem recurso extraordilebradas por ascendentes a alguns
nário ((is. 493), com embasamento
no art. 119, III, Letra a e d, da
descendentes, seus herdeiros potenciais, sem anuência dos demais,
Constituição.
é extensiva a cessão de quotas do
Argumentam com a negativa
capital de sociedade comercial,
de vigência do mencionado disposiainda que os compradores dela já
tivo do Código Civil, a respeito de
sejam sócios.» (STF, 1, Turma,
fraude à lei que acarreta a nulidaRE 76.054 — MG, rel. Min. Aliomar
de do ato de alienação independenBaleeiro. DJU 28.9.73, pág 7 215
temente da prova da simulação,
doc. fls. 73).
que o julgado não aceitou, contraA douta Procuradoria-Geral da
dando, igualmente, a jurisprudência da Suprema Corte (indicada a República, por seu ilustre Subprocurador-Geral, assim opina:(ls. 506/507).
«1 — A instância ordinária, uniO apelo extremo sofreu impugnaforme e sucessivamente, f. 331, 418
ção ((ls. 509 e 517).
e 489, quais sejam em sentença iniprocuradoria-Geral da Juscial, apelação e embargos infrintiça opina pelo deferimento.
gentes, respectivamente, declarou
3 — Reportando-me a excelente
a improcedência de ação ordináfundamentação de fls. 493/507, adria, fundada no art. 1.132 do Código
mito o processamento do recurso
Civil e visando a nulidade de venda
pelas razões, expostas em síntese,
de imóveis por ascendente a despelo douto Procurador Benedito
cendente mediante interposta pesNestor Penteado ((Is. 518):
soa, pois que, verbis, f. 490:
«O elemento subjetivo enfatizado
— «... conforme acentua o mesno acórdão já não encontra agasamo Clóvis, «não haverá o vicio conlho na jurisprudência do S.T.F.,
denado por esse artigo (1.132)
que revogou a Súmula 152. A frauquando o descendente comprar de
de demonstrável para a anulação
terceiro o que este adquiriu do asdo ato jurídico não é reclamada
cendente», uma vez demonstrada a
onde o resultado objetivo confina
legitimidade da venda. Em tal hicom o dispositivo (art. 1.132 e Súpótese, a anulação do ato dependemula 494). Se o pai alienou aos firá de prova da simulação, como é
lhos sem o consentimento dos deintuitivo.
mais, o desrespeito á norma é paNa espécie em exame, exaustitente, dispensável a prova de frauvamente
demonstrou a sentença,
de no emprego de interposta pespelas circunstâncias envolventes, a
soa.»
ausência de qualquer simulação.
São Paulo, 29 de dezembro de
Com efeito, admitiram os auto1978 — Young da Costa Manso,
res, por seu ilustre procurador,
Vice-Presidente do Tribunal de
que «as duas primeiras escrituras
Justiça, no impedimento ocasional
de compra e venda — do ascendendo Presidente.» ((is. 522/524).
te comum para a Pessoa Jurídica
— são inatacáveis», fls. 296, e no
Sustentam os recorrentes que houve negativa de vigência do art. 1.132
tocante à retirada de Alvaro Paudo Código Civil, pois é nula a venda
pério da sociedade, recebendo o
feita por interposta pessoa, e invojusto preço de sua quota-parte —
R.T.J. — 100
Cr$600.000,00 — também não foi
suscetível de qualquer suspeita».
2 — Alegam os recorrentes, com
apoio nas letras a e d, que a pretendida nulidade independe da prova de simulação em face do art.
1.132 do Código Civil, incidente sendo com a simples presença do terceiro.
3 — Ora, a jurisprudência do
Egrégio Supremo Tribunal não
abona tal tese e ainda recentemente, no RE 92.810, Ftelator Ministro
Cordeiro Guerra, sessão de 21.8.81,
a Egrégia Segunda Turma a unanimidade, acentuou que é necessária
a comprovação da simulação do ato
translativo através de interposta
pessoa.
4 — Reportando-nos aos fundamentos do acórdão referido, somos
pelo não conhecimento ou, acaso
conhecido, pelo não provimento do
recurso extraordinário.
Brasília, 25 de setembro de 1981
— Mauro Leite Soares, Subprocurador-Geral da República.»
(fls. 569/570).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra
(Relator): O v. acórdão recorrido,
frente ao exame dos fatos e circunstâncias da causa, reconheceu que as
vendas dos imóveis feitas à pessoa
jurídica foram reais e inatacáveis,
vendas essas; para integralizar os
aumentos de capital, da sociedade,
realizados em 1945 e 1949, já constituída a sociedade em 1942.
Em 1951, o pai se retirou da sociedade cedendo suas quotas aos filhos,
mediante pagamento do valor das
mexias.
Concluiu que, em face dessas circunstâncias não houve fraude ao
mandamento do art. 1.132 do Código
Civil, ou seja, simulação destinada a
303
prejudicar a igualdade das legitimas.
O acórdão trazido à colação por
simples ementa, e sem que sejam
especificadas as circunstâncias táticas do julgado, não confina com o
acórdão recorrido, pois, a cessão de
quotas foi feita sem fraude, como foi
assinalado:
Diz o acórdão com acerto.
«...Não se contesta que a venda
direta, de ascendente a descendente, sem o consentimento expresso
dos demais descendentes, seja nula, conforme adverte Clóvis (Comentários ao art. 1.132), independentemente, portanto, de prova da
simulação. A respeito, exaustivo é
o estudo do Desembargador Dimas
de Almeida, na sua monografia
«Venda de Ascendente a Descendente», reproduzida a fls. 449/459).
Todavia, conforme acentua o
mesmo Clóvis, «não haverá o vício
condenado por esse artigo (1.132)
quando o descendente compra de
terceiro o que este adquiriu do ascendente», uma vez demonstrada a
legitimidade da venda. Em tal hipótese, a anulação do ato dependerá de prova da simulação, como é
intuitivo.
Na espécie em exame, exaustivamente demonstrou a sentença,
pelas circunstâncias envolventes, a
ausência de qualquer simulação.
Com efeito, admitiram os autores,
por seu ilustre procurador, que «as
duas primeiras escrituras de compra e venda — do ascendente co-mum para a Pessoa Jurídica —
são inatacáveis», fls. 296. E no tocante à retirada de Alvaro Paupério da sociedade, recebendo o justo
preço de sua quota-parte —
Cr$600.000,00 — também não foi
suscetível de qualquer suspeita.»
(fls. 490/491).
Realmente, assim julgou esta Turma no RE 92.810-3 — Minas Gerais,
em acórdão por mim relatado, e re-
304
R.T.J. — 100
ferido no parecer do ProcuradorGeral da República:
«A venda de ascendente a descendente, sem o consentimento dos
demais, é nula quer seja feita direta ou indiretamente, art 1 132 do
CC.
Não discrepa dessa orientação
jurisprudencial, acórdão, que, em
face das provas dos autos e circunstâncias do processo, tem como
inocorrente a fraus legis, porque,
real a venda a terceiro feita pelo
ascendente.
Não é vedado aos descendentes
readquirir patrimônio familiar
alienado validamente a terceiros,
se não ocorre fraude ao mandamento do art. n? 1.132 do Código
Civil.
RE não conhecido. Súmula 279,
291, 282, 356 e 400.»
De fato, reconhecida a realidade
dos aumentos do capital 'social e da
retirada do sócio-quotista, com o pagamento dos seus haveres- pelo real
valor, não se pode ter como violado
o art. 1.132 do código Civil.
Afastado o dissídio jurisprudencial, por força da Súmula 291, não
conheço do recurso com base nas
Súmulas 279 e 400.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RE. 92.070 — SP — Rel.: Min. Cordeiro Guerra. Ftectes.: Alvaro Paupério Filho, s/mulher e outros
(Advs.: Antônio de Arruda Sampaio
e outros). Recdos.: Júlio Paupério e
sua mulher. (Advs.: Ivanildo Anacleto Porto e outros). Antônio Abel
Pierre, sua mulher e outra (Advs.:
Waldo Ferraz Costa Júnior e outros). Juan Castro Conde e sua mulher (Advs.: Marcelo Guimarães da
Rocha e Silva e outro).
Decisão: Não conhecido. Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Cordeiro Guerra,
Moreira Alves, Dedo Miranda e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da
República, Dr. Mauro Leite Soares.
Brasília, 16 de outubro de 1981 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 92.200 — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete.
Recorrente: LIGHT — Serviços de Eletricidade S/A — Recorrido: Estado de São Paulo.
Tributário e Processual. — Não fundamenta Recurso Extraordinário a mera transcrição de ementa de acórdão, sem demonstrar a
adequação do precedente de jurisprudência ao caso decidido mas recorrido.
Recurso que se não conhece pela letra d do art. 119, III, da
C.F.
Repetição de indébito tributário. Juros de mora, pela Fazenda
Pública.
Devem ser contados como determinado no Código Civil, pois
assim o estabelece a Lei 4.414/64, autorizada pelo { 1? do art. 161 do
Código Tributário Nacional («Se a lei não dispuser de outro modo»...)
Recurso não conhecido.
R.T.J. — 100
ACORDA0
305
VOTO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos não
conhecer do recurso.
Brasília, 05 de junho de 1981 —
Antonio Neder, Presidente — Clovis
Ramalhete, Relator.
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete
(Relator): Não conheço do Recurso.
Pela leão d, é certo que a Companhia Recorrente invoca por paradigma, o RE 88.516-SP, cuja ementa
transcreve; mas nem demonstra a
adequação desse precedente, ao caso, nem cita o repertório de jurisprudência, em que o colheu (Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, art. 322). Pela letra a, porque
não houve recusa de vigência do art.
RELATOR
161, Si 1? do CTN. Esta norma ressalva a eficácia de outras leis que disO Sr. Ministro Clovis Ramalhete: ponham em contrário: «Se a lei não
Ação de repetição de indébito de re- dispuser de modo diverso», adverte
colhimento do imposto de transmis- o art. 161, ora está em vigência, no
são inter vivos de imóveis adquiri- entanto, a Lel 4.414-64, não revogados, proposta pela Recorrente, Light da, que regula o pagamento de Juros
— Serviços de Eletricidade S.A., moratórios pela Fazenda Pública, e
contra a Fazenda Estadual de São estabelece (art. 1?) que serão eles
Paulo.
calculados «na forma do direito civil».
2 — A 4! Câmara Cível, ao julgar
procedente a ação, determinou, no
2 — Não conheço do recurso
entanto, que os juros moratórios seÉ o meu voto.
jam pagos sobre 6% ao ano.
EXTRATO DA ATA
3 — Recurso Extraordinário da
Empresa apelada, com fundamento
RE. 92.200 — SP — Rel.: Min. Clonas letras a e d, — por negativa de
vigência do 1? do art. 161 c.c. o art. vis Ramalhete. Recte.: Light — Ser167 do Código Tributário Nacional, e viços de Eletricidade S.A (Advs.:
por divergência com os acórdãos Renato Ribeiro e outros). Recdo.:
Estado de São Paulo (Adv.: Eugênio
dos RREE n?s. 85.791 e 82.851.
Semi).
Despacho deferindo seguimento do
recurso (fls. 2.119). — Parecer da
Decisão: Não se conheceu do redouta Procuradoria-Geral da Repú- curso. Votação uniforme.
blica (fls. 2.137), que constata o
dissídio mas pretende seja negado
Presidência do Senhor Ministro
provimento, com base no decidido no Antonio Neder. Presentes à Sessão
RE 82.219 — SP, Primeira Turma, os Senhores Ministros Cunha PeixoRelator Ministro Rodrigues Alckmin, to, Soares Mulloz, Rafael Mayer e
que entendeu que os juros de mora Clovis Ramalhete. Subprocuradorem repetição tributária e sobre Geral da República, o Dr. Francisco
quantia restituída pela Fazenda, de Assis Toledo.
contam-se como determina a Lei
4.414-64, que os faz reger pelo Código
Brasília 05 de junho de 1981 —
Civil.
António Carlos de Azevedo Braga,
É o relatório.
Secretário.
306
R.T.J. - 100
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 92.327 — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu.
Recorrente: Estado de São Paulo — Recorrido: Jordelino Olímpio de
Paulo.
Serventuário da Justiça. Extinção do cartório de que era titular e
aproveitamento com base na legislação local. A proibição de nomeação não abrange o caso de aproveitamento. Inocorrência de ofensa ao
disposto No (i 2? do art. 206 da Constituição Federal. Recurso extraordinário não conhecido.
ACORDA()
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade com a ata
de julgamentos e notas taquigráficas, em não conhecer do recurso,
unanimemente.
Brasília, 21 de outubro de 1980 —
Leitão de Abreu, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu:
Este o teor da decisão recorrida:
«Acordam, em Terceira Câmara
Civil do Tribunal de Justiça de São
Paulo, por votação unânime conceder a segurança.
«Jordelino Olímpio de Paula impetra a concessão de mandado de
segurança contra o ato do Exmo.
Sr. Secretário da Justiça, que lhe
negou pedido de nomeação para o
cargo de Escrivão do Cartório de
Registro Civil e Anexos do Município de Três Fronteiras, em caráter definitivo.
«Alega o impetrante que era titular do cargo de Escrivão do Cartório de Registro Civil e Anexos do
Distrito de Aparecida do Bonito, da
Comarca de Santa Fé do Sul, quando esta serventia foi extinta pela
Resolução n? 2, estabelecida pelo
Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo em 15 de dezembro de
1976, e que começou a vigorar em
1? de janeiro de 1977. Passando
à situação de servidor em disponibilidade não remunerada, dirigiuse o postulante da segurança à autoridade impetrada e pediu-lhe a
nomeação, por remoção, para o
Cartório do 2? Ofício e Anexos de
Santa Fé do Sul, mas não obteve
êxito em sua pretensão, indeferida
por ato de 2 de junho de 1977, em
virtude de não ter sido indicado o
fundamento legal do pedido e por
estarem vedadas as nomeações definitivas para serventias não oficializadas. Diante disto, o impetrante solicitou do impetrado a sua
nomeação, em caráter provisório,
para o Cartório de Registro Civil e
Anexos de Três Fronteiras, de
Igual natureza e classe do cartório
extinto, deixando de ser atendido,
PU falta de amparo legal, através
de ato datado de 16 de agosto de
1977. Inconformado, voltou à carga
o impetrante, pleiteando agora a
sua remoção para o Cartório de
Registro Civil das Pessoas Naturais e Anexos do Município de Três
Fronteiras, em caráter definitivo,
fundado em que a serventia, de
que era titular, foi extinta antes de
promulgada a Emenda Constitucional n? 7, de 13 de abril de 1977,
mas, ainda desta vez, sua solicita-
R.T.J. — 100
ção foi desatendida pelo impetrado, através de ato praticado em 30
de novembro de 1977. Verberando
este pronunciamento, por considera-10 lesivo ao seu direito
liquido e certo de desempenhar as
funções do cargo de Escrivão, de
que está impedido de exercer há
mais de um ano, o postulante do
writ propugna pela concessão de
segurança, a fim de que lhe seja
deferida a nomeação para o cargo
de Escrivão do Cartório de Registro Civil e Anexos do Município de
Três Fronteiras. Entende o impetrante, que a proibição constitucional diz respeito à nomeação de novos serventuários, mas não daqueles que já eram escrivães e calas
serventias foram extintas antes do
advento da Emenda Constitucional
n? 7/77, até porque o que esta torna
defesa são as nomeações em caráter definitivo para as serventias e
não as remoções de quem, como o
impetrante, já era escrivão e que,
por isso, tem o direito adquirido de
ser aproveitado no cargo, que ora
pleiteava.
«Denegada a suspensão liminar
do ato censurado, vieram para os
autos as informações enviadas pela ilustre autoridade impetrada,
em que esta preliminarmente, qualifica de inepta a inicial, seja porque desacompanhada dos documentos, que deveriam instruí-la,
seja porque não especifica o ato,
de que teria sobrevindo a lesão ao
direito invocado pelo impetrante. A
seguir, ferindo a questão de fundo,
o impetrado defende o ato impugnado, justificando-o á luz do art.
206, 2?; da Constituição da República, acrescentado pela Emenda
Constitucional n? 7, de 13 de abril
de 1977, pelo qual 'Fica vedada, até
a entrada em vigor da lei complementar a que alude o parágrafo
anterior, qualquer nomeação em
307
caráter efetivo, para as serventias
não remuneradas pelos cofres públicos'. Sustenta, então, a autoridade impetrada, que o preceito proibitivo estende-se a todas as formas
e modalidades, de que se revista o
provimento em caráter efetivo de
serventias vagas, pois, com este
propósito o preceito da Lei Maior
foi promulgado, mantendo, assim,
'as serventias vagas desvinculadas
de qualquer titularidade irremediável' para não aumentar as dificuldades inerentes à implantação
do regime de oficialização dos cartórios, que será disciplinada através de lei complementar a ser editada. Nega, outrossim, a invocação
de direito adquirido como suporte
à impetração, baseando-se o impetrado em que essa argüição não é
suscetível de opor-se á incidência e
aplicação de preceitos da Carta
Magna. «Considerando correta a
posição assumida pela autoridade
impetrada, pronunciou-se a douta
Procuradoria-Geral da Justiça pela denegação da segurança.
«2 o relatório.
«1 — A prejudicial articulada pelo impetrado não procede. Primeiro, porque os documentos fundamentais à impetração, comprovando a realidade dos fatos nela descritos, estão presentes nos autos,
exibidos, em fls. 8, o titulo de nomeação do impetrante para o cargo de Escrivão do Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e
Anexos do Distrito de Aparecida do
Bonito (1? classe), em fls. 8 verso
e 9, certidões de compromissos
prestados pelo impetrante e sua
posse no cargo, seguindo-se, em
fls. 10, comunicação à Corregedoria Permanente da entrega dos livros e acervo da serventia extinta
e, em fls. 11, o termo de recebimento respectivo, Segundo, porque
o ato contra o qual se insurge o
postulante do writ se acha perfeitamente identificado na impetração,
308
R.T.J. — 100
pela qual é atacado, especificamente, o indeferimento, em 30 de
novembro de 1.977, da solicitação
dirigida ao impetrado, para que removesse o impetrante para o Cartório de Registro Civil das Pessoas
Naturais e Anexos do Município de
Três Fronteiras, em caráter definitivo.
«2. — Passando-se ao mérito da
causa, verifica-se que as posições
assumidas pelo impetrante e impetrado, em torno da questão debatida, estão suficientemente bem delineadas a ensejar, pois, adequado
tratamento com vistas à sua solução. «Enquanto o subscritor da impetração sustenta que o preceito
constitucional do art. 206, g 2? Introduzido na Carta Magna Pela
Emenda Constitucional n? 7, de 13
de abril de 1977, proíbe, exclusivamente, a nomeação de novos serventuários, mas não a nomeação
dos antigos, já investidos na condição de titulares de serventia, que
veio a ser extinta antes de promulgada aquela Emenda, o impetrado,
por seu turno, assevera que a sobredita proibição abrange qualquer tipo de provimento em caráter efetivo, seja ele decorrente de
nomeação, remoção ou promoção,
posto que, em matéria cartorária,
o vocábulo 'nomeação', aplicado no
texto constitucional, não tem o sentido estrito, que lhe atribuem os
Estatutos dos Funcionários Públicos do Estado.
«Bem de ver-se, no entanto, que
razão nenhuma assiste à autoridade impetrada.
«Com o estabelecer o principio
da gradual oficialização das serventias extrajudiciais, cuidou o
mandamento constitucional de
proibir, desde logo, as nomeações
originárias ou de primeira investidura, em caráter efetivo, para as
serventias não remuneradas pelos
cofres públicos, a fim de não serem criados maiores embaraços no
processamento da implantação do
novo regime.
«Objetivou-se com a proibição
constitucional, evitar a nomeação
de novos serventuários, mas não
impedir nomeação derivadas daqueles titulares de serventias, que
já ostentavam essa posição antes
de promulgada a Emenda Constitucional n? 7/77.
«Tanto isso é certo que no caput
do art. 206, da Lei Maior, ficou expressamente ressalvada a situação
dos atuais titulares, vitalícios ou
nomeados em caráter efetivo.
«No caso do impetrante, especificamente, que já era titular de serventia, e que se achava em disponibilidade, por ter sido extinto o
cartório, quando sobreveio a
Emenda n? 7/77, seu aproveitamento noutra serventia não irá
agravar as dificuldades inerantes
à transformação para o novo sistema, porque ele já integrava os
quadros de servidores cartorários,
quando veio de ser instituído o novo regime.
«Vale, pois, dizer-se, que, com
vistas à reforma programada, a
ocupação pelo impetrante de uma
serventia não acarretará, em substância, nenhuma dificuldade a
mais, dentre as que já existem, para ser cumprida a oficialização,
que se desenvolverá progressivamente, na medida em que forem se
vagando os cargos dos titulares de
cartórios.
«Nesse sentido, por sinal, em hipótese semelhante, já se pronunciou este Egrégio Tribunal no julgamento do Mandado de Segurança número 260.416, em sessão da St
Câmara Civil, figurando como Relator o eminente Desembargador
Dias Filho.
R.T.J. — 100
«3 — Em tais condições fica concedida a segurança, para que, na
forma da legislação vigente, cumpridas as formalidades legais, a
autoridade impetrada expeça título, nomeando o impetrante, em caráter efetivo, para assumir as funções do cargo de Escrivão do Cartório de Registro Civil das Pessoas
Naturais e Anexos do Município de
Três Fronteiras.» (fls. 36/40).
A Fazenda do Estado de São Paulo
interpôs recurso extraordinário contra esse acórdão, com fundamento
na alínea a, do art. 119, III, da Constituição Federal alegando negativa
de vigência do § 2? do art. 206, dessa
Carta Política.
O Vice-Presidente do Tribunal a
quo, o nobre Desembargador Adriano Marrey, admitiu o recurso com
este despacho:
«Segundo consta, o Serventuário
Jordelino Olímpio de Paula requereu ao Sr.. Secretário da Justiça, do
Estado, sua nomeação para o cargo de Escrivão do Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais e
Anexos, do município de Três
Fronteiras, neste Estado, porquanto, a antiga e idêntica serventia, de
que fora titular, no distrito de Aparecida do Bonito, município de
Santa Rita D'Oeste, havia sido extinta pela Resolução Judiciária n?
2, de 1976, art. 95, letra a.
«Indeferida a pretensão, impeirou ele mandado de segurança, o
qual lhe foi concedido, pelo resp.
acórdão a fls. 36 e seguintes.
a... para que, na forma da legislação vigente, cumpridas ai formalidades legais, a autoridade impetrada expeça titulo, nomeando o
impetrante, em caráter efetivo, para assumir as funções do cargo de
Escrivão do Cartório de Registro
Civil das Pessoas Naturais e Anexos do Município de Três Fronteiras (textual, do resp acórdão, fls.
40).
309
«Contra esse resp. aresto é que
interpõe a Fazenda do Estado o
presente recurso extraordinário,
com fundamento no art. 119, III, letra a da Constituição Federal, a dizer que, com a decisão proferida,
verificou-se a vulneração do preceito constitucional contido no art.
206, § 2? da Lei Magna, com a redação da Emenda Constitucional
n? 7/77.
«Conforme se diz, oficializou esse dispositivo as serventias do foro
judicial e extrajudicial sendo norma de eficária plena e de aplicabilidade imediata, ao vedar `... até a
entrada em vigor da lei complementar a que alude o parágrafo
anterior, qualquer nomeação em
caráter efetivo para as serventias
não remuneradas pelo cofres públicos'.
Entende a recorrente que `...a
expressão nomeação é evidente, foi
utilizada no sentido genérico de
provimento para as serventias não
remuneradas pelos cofres públicos,
conforme se verifica da meus
legis consubstanciada na Mensagem n? 347/76, encaminhada ao
Congresso Nacional em 16 de novembro de 1976, pelo Exmo. Senhor Presidente da República mensagem essa que acompanhou o projeto de emenda constitucional e
que resultou na edição do. art. 206 e
§§ da Constituição Federal...' ( textual, fls. 48).
«O recurso foi impugnado, a fls.
52 e seguintes. E a d. ProcuradoriaGeral da Justiça foi de parecer que
se defira o seguimento do presente
recurso (fls. 56/57).
«Ao meu ver, desmereceria seguimento ao apelo excepcional em
apreço. A vedação constitucional
do art. 206, § 2? (redação da EC
7/77), de qualquer nomeação em
caráter efetivo, para as serventias
não remuneradas pelos cofres pú-
310
R.T.J. - 100
blicos até a entrada em vigor da
lei complementar prevista em seu
§ 1?, afigura-se-me inaplicável à situação de Jordelino Olímpio de
Paula.
«Este é serventuário efetivo, de
serventia extinta pela Resolução
Judiciária n? 2/76, em data anterior à da vigência do preceito constitucional discutido.
«Claro é que não poderiam esse,
e outros serventuários nas mesmas
condições, permanecer em disponibilidade não remunerada, por tempo indefinido.
«Dal o pedido de aproveitamento
em serventia da mesma classe da
que ficara extinta, sendo a pretensão acolhida pelo v. acórdão, por
fundamentos que bem demonstram
não se haver infringido o texto
constitucional, dado que não se tratava de provimento originário,
nem de primeira nomeação, mas,
de ato equivalente à mera
remoção.
«Conforme se diz no v. acórdão,
'...objetivou-se com a proibição
constitucional, evitar a nomeação
de novos serventuários, mas não
impedir nomeação derivadas daqueles titulares de serventias, que
já ostentavam essa posição antes
de promulgada a Emenda Constitucional n? 7/77.
«Tanto isso é certo que no caput
do artigo 206, da Lel Maior, ficou
expressamente ressalvada a situação dos atuais titulares, vitalícios
ou nomeados em caráter efetivo.
«No caso de impetrante, especificamente, que já era titular de serventia, e que se achava em disponibilidade, por ter sido extinto o
cartório, quando sobreveio a
Emenda n? 7/77, seu aproveitamento noutra serventia não irá
agravar as dificuldades inerentes
transformação para o novo siste-
ma, porque ele já integrava os
quadros de servidores cartorários,
quando veio de ser instituído o novo regime (textual, fls. 39/40).
«Não se irá, com isto, 'aumentar
as dificuldades inerentes à transformação das serventias não oficializadas', em outras oficializadas, único motivo pelo qual se proibem novas nomeações, em caráter
efetivo.
«O ora recorrido já era serventuário efetivo e por concurso — e
não se está criando cargo para ele.
«Pondera, todavia, o ilustre Ministério Público desta instância seja conveniente a subida do recurso,
para conhecimento do Egrégio Supremo Tribunal Federal, porquanto, ali já se encontra, pendendo de
julgamento, outro recurso extraordinário, em caso idêntico.
«Em vista disso, e tão-somente
por tal circunstância, permito-me
deferir o processamento do presente recurso, pois, segundo o meu entendimento, é de todo improcedente a argumentação do resp. parecer a fls. 56/57.
«O
serventuário
Jordelino
Olímpio de Paula foi provido, por
concurso, no cargo de Escrivão do
Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Anexos do Distrito
de Aparecida do Bonito (1t classe),
no município de Santa Rita D'Oeste, comarca de Santa Fé do Sul,
conforme o título em cópia a fls. 8.
«E não esta sendo investido, por
força do resp. acórdão recorrido,
em serventia oficializada, mas,
noutra não oficializada, e de categoria idêntica à daquela de que fora titular, agora extinta.
Não se trata, portanto, de nomeação para tal serventia, senão,
em verdade, de ato equivalente à
sua remoção, da serventia extinta,
R.T.J. — 100
para essa, que se acha vaga. Inexiste, segundo penso, razão para a
incidência do preceito constitucional questionado.
«Em suma, defiro o processamento do recurso extraordinário
de fls. 45 e seguintes. » (fls. 74/130).
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu,
(Relator): A Procuradoria-Geral da
República pronúncia-se pelo não conhecimento do recurso. Diz o parecer, que é de lavra do procurador
Moacir Antonio Machado da Silva.
«Parece-nos que a palavra nomeação, contida no art. 206, § 2?,
da Constituição Federal, não
abrange a hipótese de aproveitamento. A expressão em si, no rigor
técnico, já comporta uma acepção
estrita, equivalente à primeira investidura em cargo público.
«Nesse sentido, a expressão não
abrange os casos de provimento
derivado, como observa Hely Lopes Meirelles: O provimento, pode
ser originário ou inicial, e derivado. Provimento inicial é o que se
faz através de nomeação, que pressupõe a inexistência de vinculação
entre a situação funcional anterior
do nomeado e o preenchimento do
cargo. E, logo adiante, completa o
autor: Já o provimento derivado,
que se faz por transferência, promoção, acesso, reintegração, readmissão, aproveitamento, ou reversão, é sempre uma alteração na situação funcional do provido.
«E positivamente razoável a conclusão no sentido de que o provimento mediante aproveitamento
não se insere na vedação constitucional. Essa forma de provimento,
aliás, em nada afeta a ratio legis
do preceito, como bem ressaltou o
acórdão, nestes termos:
311
«Como estabelecer o principio da
gradual oficialização das serventias extrajudiciais, cuidou o mandamento constitucional de proibir,
desde Jogo, as nomeações originárias ou de primeira investidura,
em caráter efetivo para as serventias não remuneradas pelos cofres
públicos, a fim de não serem criados maiores embaraços no processamento da implantação do novo
regime.»
«Ademais, a extinção de serventia não oficializada corresponde a
uma disponibilidade sem vencimentos, figura estranha à Constituição Federal. O aproveitamento,
em conseqüência, é direito inerente à extinção, tanto mais em face
do art. 206, caput, da Carta Magna,
que ressalvou a situação dos titulares vitalícios então existentes, co- mo é o caso do recorrido.
«Não houve, portanto, ofensa ao
art. 206, § 2? da Constituição. Em
caso rigorosamente idêntico (RE
92.350, DJ de 13.06.80, p. 4.463), Helator o Exmo. Sr. Ministro Thompson
Flores, decidiu a Egrégia Primeira Turma no mesmo sentido,
Trazendo o acórdão a seguinte
ementa:
«Serventuário da Justiça no gozo
de vitaliciedade. Extinção do seu
cartório. Aproveitamento com base
na legislação local, estão, imperaste. Concessão via mandado de segurança. Exegese do art. 206, § 2?,
da Constituição.
«II. Recurso extraordinário que
se não conhece; eis que o acórdão
recorrido não contrariou o art. 206,
§ 2? da Carta Maior, o qual obstou
o provimento, apenas, para as nomeações que não compreendem o
aproveltamento.n (fls. 123/124).
Não existe, no caso, a meu ver, a
pretendida ofensa ao *2? do art. 206, da
Constituição Federal. Ao oficializar
312
R.T.J. - 100
as serventias do foro judicial e extrajudicial, mediante remuneração
de seus servidores exclusivamente
pelos cofres públicos, o art. 206,
caput, ressaltou a situação dos que
então eram seus titulares, vitalícios
ou nomeados em caráter efetivo. Ao
invés de impor a imediata oficialização de todas as serventias do foro judicial e extrajudicial, essa regra
constitucional,
transitoriamente,
após à margem da oficialização as
serventias que tivessem ocupantes
vitalícios ou nomeados em caráter
efetivo. Logo, se garantiu o direito
de continuarem nos seus cargos, sob
o regime da não oficialização, aos titulares vitalícios e efetivos de tais
serventias, nada impede que titulares efetivos e vitalícios dos ofícios de
justiça, cujos cargos tenham sido extintos, possam, mediante aproveitamento, ser providos em tais cargos.
Não se cuida, em tal caso, de nomeação para cargos dessa natureza,
mas de provimento, por outra forma, ou seja, mediante aproveitamento, de serventuário posto em disponibilidade, em razão da extinção
do cargo, que ocupava.
Como não vejo, na eipecie, a alegada ofensa ao § 2?, do art. 206, da
Constituição Federal não conheço
do recurso.
EXTRATO DA ATA
RE.92.327 — SP — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Recte.: Estado de São
Paulo (Adv.: Sérgio João França).
Recdo.: Jordelino Olímpio de Paulo
(Adv.: Elba Montovanelli):
Decisão: Adiado o julgamento por
haver pedido vista o Ministro Cordeiro Guerra, depois dos votos do Relator e do Ministro Decio Miranda que
não conheciam do recurso. Ausente,
ocasionalmente, o Senhor Ministro
Djaci Falcão. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Moreira
Alves.
Presidência do Senhor Ministro
Leitão de Abreu. Presentes a Sessão
os Senhores Ministros Cordeiro
Guerra e Decio Miranda. Ausente,
Ocasionalmente, o Senhor Ministro
Djaci Falcão. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Moreira
Alves. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Mauro Leite Soares.
Brasília, 03 de outubro de 1980 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: O
eminente relator não vê, na alegada
ofensa ao § 2? do art. 206 da Constituição Federal, e, em conseqüência,
não conhece do recurso.
Em caso idêntico — RE. n? 92.350
— DJ de 13.6.80, pág. 4.463 — sendo
relator o eminente Ministro
Thompson Flores, assim decidiu a
Egrégia Turma.
«Serventuário da Justiça no gozo
da vitaliciedade. Extinção do seu
cartório. Aproveitamento com base
na legislação local, então, imperente. Concessão via mandado de
segurança. Exegese do art. 206,
§ 2?, da Constituição.
II — Recurso Extraordinário que
se não conhece, eis que o acórdão
recorrido não contrariou o art. 206,
§ 2?, da Carta Maior, o qual obstou
o provimento, apenas, para as nomeações que não compreendem o
aproveitamento.» ( fls. 123/124).
Nessa conformidade, não conheço
do recurso.
EXTRATO DA ATA
RE 92.327 — SP — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Recte.: Estado de São
Paulo (Adv.: Sérgio João França).
Recdo.: Jordelino Olímpio de Paulo
( Adv.: Elba Montovane111).
R.T.J. - 100
Decisão: Não conhecido. Unânime.
Não participaram do julgamento os
Senhores Ministros Djaci Falcão e
Moreira Alves por não terem assistido ao Relatório.
Presidência do Senhor Ministro
ssão os
Djaci Falcão. Presentes à Se
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
313
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República, Dr. Mauro Leite
Soares.
Brasília, 21 de outubro de 1980 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 92.605 — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves.
Recorrente: Itaú Seguradora S/A — Recorrido: Walter de Oliveira.
Recurso.
Se a questão objeto do recurso extraordinário só foi apreciada
pelo acórdão recorrido (inadequação de recurso), aplica-se a parte final do inciso VIII do artigo 308 do Regimento Interno desta Corte,
caindo o limite da alçada para 50 vezes o valor do maior saláriomínimo vigente no pais quando do ajuizamento da ação.
Se o despacho saneador não pês termo ao processo, com julgamento do mérito, ou sem ele, mas considerou insubsistente a preliminar de prescrição, contra ele, nessa parte, cabia a interposição — como se fez — de agravo de instrumento, e não — como decidiu o acórdão recorrido — de apelação. Aplicação dos artigos 162, i 1?, e 513 do
C.P.C.
— Ademais, no caso, seria admissivel, em qualquer hipótese (e isso porque não se poderia pretender a existência de erro grosseiro) a
conversão do recurso, como tem sido admitido por esta Corte mesmo em face do atual Código de Processo Civil (RE 91.157, RTJ
90/1.106).
Recurso extraordinário conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, conhecer do recurso e dar-lhe provimento.
Brasília, 07 de novembro de 1980 —
Djaci Falcão, Presidente — Moreira
Alves, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Moreira Alves: É este o teor do acórdão recorrido (fls.
99/95):
«Cuida-se de agravo de instrumento interposto contra sentença
certificada a fls. 22 que julgou não
ocorrer a prescrição alegada pela
ré-seguradora.
Movida ação para haver o prêmio referente ao contrato de seguro de acidentes em grupo, por invalidez permanente, a seguradora
314
R.T.J. — 100
arguiu, na contestação, a ocorrência da prescrição (art. 178, § 6?, II,
do Cód. Civil). Funda-se no laudo
pericial que declara que o autor sofreu acidente em 12-6-72. E, pois,
insubsistente a afirmação da sentença de que «a incapacidade que
legitimará o A. pleitear o seguro
ainda está por ser apurada». «Tendo fluido o prazo prescricional,
sem qualquer interrupção, impõese o reconhecimento da prescrição,
com o conseqüente decreto da improcedência da ação».
O recurso foi respondido e preparado e a sentença mantida.
art. 269. IV, do CPC dispõe:
«Extingue-se o processo com julgamento do mérito quando o juiz pronunciar a decadência ou a prescrição».
art. 162, § 1?, do CPC define a
sentença:«é o ato pelo qual o juiz
põe termo ao processo, decidindo
ou não o mérito da causa».
o art. 513 do CPC estabelece
que cabe apelação da sentença.
Em conseqüência, a sentença de
fls. 22, pronunciando-se sobre a
prescrição, declarando não ocorrer
a mesma, é apelável. O agravo de
instrumento é recurso inadequado
para impugnar sentença, cabendo
apenas para atacar decisão interlocutória, prevista no art. 162, § 2?,
do CPC (cf. art. 522 do CPC). Reduzindo o elenco de recursos, o Código vigente não incluiu, em suas
normas, disposição semelhante ao
art. 810 do CPC/39 que permitia o
recebimento de um recurso por outro.
Acordam, em Segunda Câmara do Primeiro Tribunal de Alçada
Civil, por votação unânime, não conhecer do agravo de instrumento,
por ser inadequado.
Custas na forma da lei».
Interposto recurso extraordinário,
foi ele admitido pelo seguinte despacho (fls. 70/71):
«Em ação ordinária, movida para haver prêmio referente a contrato de seguro de acidentes em
grupo por invalidez permanente,
contestou a seguradora, argüindo a
ocorrência de prescrição.
O r. despacho saneador de fls: 22
afastou aquela preliminar, concluindo In verbis «a incapacidade
que legitimará o A. pleitear o seguro ainda está por ser apurada».
Contra essa decisão agravou de
instrumento a ré e a Egrégia Segunda Câmara, por votação unânime, não conheceu do pedido, sustentando ser tal decisão atacavel
somente por meio de apelação.
Irresignada, recorre extraordinariamente a vencida, com fundamento nas alíneas a e d do permissivo constitucional, sob alegação
de negativa de vigência aos artigos
162, § 1?, posto que a decisão impugnada não pôs termo ao processo e 269, IV, 513 e 522 do Código de
Processo Civil.
Não teria aplicado ainda, o v.
aresto o principio da fungibilidade.
Argúi também relevância da
questão federal nos termos do artigo 308 do Regimento Interno do
Colendo Supremo Tribunal Federal.
Acusa ainda o v. acórdão recorrido de divergir de outro que junta
por xerocópia a fls. 54.
Houve impugnação a fls. 65/68.
A questão, pelo seu alcance e
conseqüências, merece apreciação
pela Colendh Suprema Corte de
Justiça.
Defiro, portanto, o recurso.
R.T.J. — 100
315
Por outro lado, dispõe o artigo 413
do mesmo código:
«Art. 513. Da sentença caberá
apelação ( arts. 267 a 269)».
Portanto, pelo sistema do Código
atual, para que haja sentença é mister que se trate de ato do juiz que
ponha termo ao processo com ou
sem julgamento do mérito.
2 o relatório.
Se se tratar de ato decisório que
VOTO
não ponha termo ao processo, ainda
O Sr. Ministro Moreira Alves (Re- que decida sobre parte do mérito,
lator): 1— No caso, não há o óbice do enquadrar-se-á ele entre as decisões
inciso VIII do artigo 308 do Regimen- interlocutórias, certo como é que o
to Interno, porquanto a questão pro- Código de Processo Civil atual tocessual em causa — inadequação do mou a expressão decisão interrecurso — só foi decidida por uma locutória em sentido muito amplo,
instância, razão por que se aplica pois, como acentua PONTES DE
analogicamente a parte final desse MIRANDA (Comentários ao Código
dispositivo, que reduz a alçada a 50 de Processo Civil, VII, pág. 186), ao
vezes o maior salário-mínimo vigen- comentar o artigo 513:
te no pais na data de seu ajuizamen«Se a decisão não põe fim ao proto, ou seja, Cri 55.320,00, inferior ao
cesso, com ou sem julgamento do
valor atribuído à causa (Cr$
mérito, é interlocutória ( cf. art.
60.000,00).
162, § 2?).
2 — Ultrapassada essa preliminar,
Em vez de definitividade, há inconheço do recurso e lhe dou proviterlocutoriedade».
mento, para que retornem os autos
do Tribunal de origem, a fim de que
No caso, a decisão atacada foi o
este, afastada a preliminar de não despacho que, declarando saneado o
conhecimento por inadequação do processo, decidiu pela insubsistência
agravo de instrumento, prossiga no da preliminar de prescrição. Por
julgamento como entender de direi- conseguinte, não pôs esse despacho
to.
termo ao processo, não ocorrendo,
pois, qualquer das hipóteses previsReza o artigo 162, §§ 1? e 2?, do Có- tas nos artigos 267 e 269 do C.P.C, a
digo de Processo Civil:
que se reporta o artigo 513 do mesmo Código. E, em assim sendo,
«Art. 162. Os atos do juiz consis- cabível seria — como, aliás, foi o retirão em sentença, decisões interlo- curso interposto — o agravo de inscutórias e despachos.
trumento.
Sentença é o ato pelo qual o
O acórdão recorrido violou, porjuiz põe termo ao processo, deci- tanto, os artigos 162, § 1?, e 513 do
dindo ou não o mérito da causa.
Código de Processo Civil.
Decisão interlocutória é o
Observo, finalmente, que, ainda
ato pelo qual o juiz, no curso do quando assim não fosse, o presente
processo resolve questão incidente. recurso deveria ser conhecido pelo
dissídio de jurisprudência — que foi
Manifeste-se o recorrente, se
tem ainda interesse na formação
do instrumento para a argüição de
relevância.
Int.»
Houve argüição de relevância da
questão federal, que foi rejeitada.
316
R.T.J. — 100
demonstrado — no tocante à possibilidade (que o acórdão recorrido negou) de conversão de um recurso em
outro. E, nesse caso, a ele seria dado
provimento, uma vez que esta Corte
tem admitido a conversão de recurso, desde que não haja erro grosseiro, o que, na hipótese, evidentemente não ocorreria. Assim julgou a Primeira Turma, ao apreciar o RE
91.157, relator o Sr. Ministro Xavier
de Albuquerque, tendo o acórdão a
seguinte ementa:
«Recurso. O princípio da fungibilidade subsiste no sistema do Código de Processo Civil de 1973, a despeito de não haver este reproduzido norma semelhante à do art. 810
do estatuto processual de 1939. Recurso extraordinário conhecido e
provido» (RTJ 90/1.106 e segs. ) .
E, em seu voto, acentuou o Sr. Ministro Xavier de Albuquerque:
«Assim também decidiu a Segunda Turma, embora tal entendimen-
to não pudesse ser aproveitado para a conclusão do julgado, no RE
86.179, apontado como dissidente»
(ibidem, fls. 1.108).
EXTRATO DA ATA
RE 92.605 — SP — Rel.: Min. Moreira Alves. Recte.: Itaú Seguradora
S/A (Advs.: Sebastião Silveira Dutra
e outros). Recdo.. Walter de Oliveira
(Adv • Erasto Pinheiro Wiezel).
Decisão: Conhecido e provido nos
termos do voto do Ministro Relatar.
unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes á Sessão os
senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
Dedo Miranda. SubprocuradorGeral da República, Dr. Mauro Leite
Soares.
Brasília, 07 de novembro de 1980 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 92.876 — RJ
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu.
Recorrentes: José Maria da Silva Pimenta e Maria Vieira Pimenta (Espólios de) — Recorridos: José Veríssimo Santos Baldez e outros.
Promessa de compra e venda. Figurando, na promessa, somente
o marido, desnecessária, para a constituição em mora, da notificação
da mulher, bem como não inscrita a promessa no registro imobiliário,
lnexlgível a interpelação a que se refere o art. I? do DL n? 745/69.
Dissídio demonstrado em relação a ambas as teses. Recurso extraordinário conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Brasília, 12 de dezembro de 1980.
— Djaci Falcão, Presidente —
Vistos, relatados e discutdos estes Leitão de Abreu, Relator.
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
RELATORIO
Federal, na conformidade com a ata
de julgamentos e notas taquigráfiO Sr. Ministro Leitão de Abreu —
cas, em conhecer do recurso e lhe
dar provimento, nos termos voto do Este o teor da sentença, que julgou
procedente a ação:
Ministro Relator, unanimemente.
R.T.J. — 100
«Os espólios de José Maria da
Silva Pimenta e Maria Vieira Pimenta aforaram a presente ação
de rescisão de contrato de compra
e venda com reintegração na posse
contra José Veríssimo Santos Baldez, Vera Santos Baldez, Mauricio
Santos Baldez, Veríssimo Costa
Baldez, Galdino Luiz Santos Baldez, Luiz Carlos Santos Baldez e
Sandra Rachel Santos Baldez.
«Na inicial de fl. 2/4, alegam os
AA., em síntese, que:
que, os RR. adquiriram dos
AA., através de escritura pública
de promessa de compra e venda,
os imóveis situados na Alameda
São Boaventura n? 454 e 456, casas
1 e 2, desta cidade;
que, o preço ajustado foi de
Cri 150.000,00, recebendo no ato a
quantia de Cri 30.000,00 e o saldo
devedor de Cri 120.000,00 seria pago em 16 prestações mensais e sucessivas de Cri 5.000,00 (Cri
80.000,00), vencível a primeira em
06-10-73, mais 4 prestações trimestrais de Cri 10.000,00 (Cri
40.000,00), vencendo-se a primeira
em 06-12-74;
que, os RR pagaram três (3)
prestações de Cri 5.000,00 e duas
(2) de Cri 10.000,00;
que, descumprindo os RR
suas obrigações contratuals, foram
devidamente interpelados, ficando,
assim, constituídos em mora;
e) que, ficou ajustado na cláusula 6? do contrato que o não pagamento de duas (2) prestações mensais e sucessivas autorizaria os
vendedores a rescindir a presente
promessa de compra e venda (fl. 8
v.);
Pelo que, não atendendo á interpelação judicial, pediam a citação
dos RR. para responderem aos termos da presente ação, cumulada
317
com reintegração na posse, sendo
afinal, julgadas procedentes com
as cominações de estilo.
«Com a inicial, vieram os docs.
de fl. 7-32.
«Os RR. foram regularmente citados (fl. 38/42).
«Em contestação, que fez acompanhar do doc. de fs. 47, alega o R.
— José Veríssimo Santos Baldez,
em linhas gerais, o seguinte:
que, não foi interpelado como
determina o DL 745/69:
que, a sua interpelação foi ardilosamente feita por hora certa;
C) que, os AA. se negavam ao recebimento das prestações;
Pelo que requer a improcedência
do pedido com as conseqüentes
condenações.
«Réplica às fls. 49/52.
«Os demais RR. deixaram fluir
em branco o prazo para a resposta.
«Tratando-se de ação real imobiliária foram os cônjuges do RR.,
também, citados (fl. 69/73). E não
acudiram á citação (fl. 74).
«Este é o relatório.
«Decido, tendo em vista o disposto no art. 330, I do CPC.
«Todo contrato de efeito bilateral
traz Insita a cláusula resolutiva expressa ou tácita.
«Com efeito, por força dessa
cláusula abre-se para o vendedor a
seguinte alternativa: pedir o preço,
ou considerar desfeita a venda.
«A rigor, tal direito já competia
ao vendedor, mesmo sem a lex
comissoria expressa. Apenas através dessa cláusula, ficava o vendedor dispensado de obter sentença
constitutiva de rescisão, posto que
sua manifestação de vontade, nesse sentido, tem eficácia suficiente
para romper a compra e venda.
318
R.T.J. — 100
«Ora, a promessa de compra e
venda é expressa* deixando os outorgados de pagar nas épocas próprias duas (2) prestações mensais
e consecutivas, podem os vendedores optar pela rescisão da presente
promessa (cl. 6? — fi. 15 v.).
«Ainda mais:
«Revela a prova de fl. 53/54 que
as notas promissórias representativas do saldo do preço foram encaminhadas a Banco desta praça, de
acordo com a cl. 2? do contrato (fl.
15). E. junto ao Banco Itaú América S/A os títulos não foram pagos
(fl. 55 e 56).
«Interpelados, judicialmente (fl.
8/32), foram os RR. constituídos
em mora.
«Por outro lado, a contestação
não teve eficácia suficiente para
ilidir a pretensão dos AA., porque
a interpelação (Dl 745/69) foi regularmente efetivada, conforme certificam os docs, de fs. 25, 26 e telegrama de f. 29; dispuseram os RR.
de meios para se libertarem da
obrigação e nem mesmo perante o
Cartório de Protestos (fl. 56/57) se
dispuseram a efetuar o pagamento
devido.
«Isto posto, e considerando o
mais que dos autos consta, Julgo,
com fundamento no art. 119 e 1.092
do Código Civil e demais dispositivos legais pertinentes e aplicáveis
à espécie, procedente o presente
pedido, para declarar anulada e
sem efeito a escritura pública de 69-73, liv. 32, fs. 9v., passada em notas do Cartório da 4? Zona Judiciária desta Comarca de Niterói (RJ).
«Condeno, ainda, os RR. no pagamento de custas e honorários advocatícios, que fixo em 20% sobre
o valor da causa.
«Expeça-se, incontinentemente,
mandado de reintegração na posse
dos imóveis situados na Alameda
São Boaventura n? 454 e 456, casas
1 e 2, desta cidade, pelo que reintegro os AA.» (fs.92/94)
Apelou José Veríssimo dos Santos
Baldez, reeditando os argumentos da
contestação, e o seu apelo foi provido, nos termos do seguinte voto do
Relator:
«Pretendem os Autores a rescisão da promessa de compra e venda que ajustaram com os réus porque estes deixaram de pagar as
prestações avençadas.
«Defende-se o Réu José Veríssimo Baldez, alegando que não foi
regularmente notificado conforme
determina o Decreto-lei 745, de
1969.
«Realmente, a notificação foi feita com hora certa, no endereço dos
demais Réus, quando era conhecido o do contestante que residia à
rua Monnerat, 19, ap. 202, enquanto que a diligência impugnada foi
completada na Alameda S. Boaventura n? 456, casa 2.
«E verdade que o Oficial de Justiça certificou que procurou o Réu
no Palácio Nilo Peçanha, onde o
mesmo trabalhava e não o encontrou, assim como a Galdino Luiz
Santos Baldez, achando que eles se
ocultavam para fugir à notificação. Em razão disso, marcou com
o pai dos Réus dia e hora para a
diligência.
«A notificação é, entretanto, irregular ressaltando-se que o telegrama foi enviado à Alameda São
Boaventura, 456, casa 2.
«Reputa-se, no entanto, como
ineficaz a interpelação mesmo porque, na contestação, o Apelante a
319
R.T.J. - 100
impugnou, não se podendo dizer,
por isso, que a citação para a ação
teria o condão de substituir a notificação.
«Além disso, as esposas dos
Réus casados não foram incluídas
na aludida interpelação.
«Nessas condições, dá-se provimento ao recurso para julgar-se o
Autor carecedor da ação proposta.» (fs. 131/132)
Ficou vencido o Juiz Marques Morado, que anulava o processo a partir da notificação.
Recorreram extraordinariamente
os autores: pela alínea a, alegam
que o acórdão recorrido negou vigência aos arts. 37 e parágrafo único,
227, 228, ff 1? e 2?, e 229 do Cód. de
Proc. Civil, e 119 e seu parágrafo e
1.092 do Código Civil pela alínea d,
apontam dissídio com arestos deste
Tribunal, segundo os quais a citação
para a causa supre a interpelação,
ou a interpelação do marido dispensa a da mulher, se somente aquele
figurou na promessa, ou, no caso de
situação constituída anteriormente,
não se aplica o Dl 745/69.
O Juiz João Francisco admitiu o
recurso pela alínea d, verbis:
«No que se relaciona com a falta
de mandato do Advogado que firmou a apelação de fs. 97/99, embora os Recorrentes hajam aflorado
o assunto quando da réplica, não o
reiteraram na, resposta de fs.
102/103, silenciando-se o acórdão
recorrido a respeito.
«Não há, pois, que falar-se em
violação do artigo 37, 2?, do Cód.
de Proc. Civil, capaz de ensejar o
recurso extremo, porquanto prevalece o principio [tisno na Súmula —
verbete 282.
«Dos artigos 119, parágrafo único, e 1.092, do Código Civil, não adversoú o acórdão recorrido.
«Quanto ao primeiro, a norma a
observar é a do Decreto-lei 745/69
e, com o segundo, não tem pertinência o julgado.
Inadmissível, portanto, o Recurso com fulcro na letra a.
«Com pertinência à alínea d, o
Aresto alinhado a fl. 144 e publicado na Revista Trimestral de Jurisprudência, vol. 73/948, em face do
entendimento do acórdão recorrido, que proclamou necessária a interpelação, no caso, das esposas
dos réus, prova o dissídio jurisprudencial.» (fl. 171)
6 o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu
(Relator) — Trata-se de ação de rescisão de promessa de compra e venda ajuizada pelos Espólios de José
Maria da Silva e de Maria Vieira Pimenta contra os compromitentescompradores, ora recorrentes, ação
cumulada com a de reintegração de
posse. Consta do contrato que alguns
dos promitentes compradores são
casados, sem que, entretanto, suas
mulheres houvessem participado
desse negócio jurídico. Entendeu,
contudo, o acórdão recorrido ser necessária a notificação delas, para a
constituição em mora. Está em conflito a decisão local, nesse ponto, como argúem os recorrentes, com o
acórdão desta Corte, publicado na
RTJ 73/948. Cuida-se, por outro lado,
de promessa de compra e venda não
inscrita no registro imobiliário, nem
dela consta obrigação de se proceder
ao dito registro. Desse modo, ao dar
pela carência da ação, o aresto impugnado destoa, também, dos padrões, onde se entende que a citação
para a causa supre a interpelação.
320
R.T.J. — 100
Conheço, do recurso, pelo dissídio
jurisprudencial, passando, pois, ao
julgamento da causa. Firme é a jurisprudência do Supremo Tribunal
no sentido de que, figurando somente
o marido no compromisso de compra
e venda, não há necessidade, para a
constituição em mora, da notificação
da mulher. Firmou-se, ainda, a
orientação desta Corte no sentido de
que não se achando inscrita a promessa no registro imobiliário, não se
faz exigível a interpelação a que se
refere o art. 1? do Dl n? 745/69. Nesse sentido, exemplificativamente, os
RFtEE 89.459 e 89.699, o primeiro relatado pelo Ministro Moreira Alves e
o segundo, pelo Ministro Djaci Falcão
EXTRATO DA ATA
RE 92.876 — RJ — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Rectes.: José Maria da
Silva Pimenta e Maria Vieira Pimenta (espólios de) (Advs.: José Danir Siqueira do Nascimento e Outro).
Recdos.: José Veríssimo Santos Baldez e outros (Adv.: Fernando Ribeiro
Capella).
Decisão: Conhecido e provido nos
termos do voto do Ministro Relator.
Unânime. Falou, pelo Rede. Dr. A.
C. SigmarInga Seixos. Falou, pelo
Recdo.: Dr. Edmundo de Noronha.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
Ante o exposto, dou provimento ao Decio Miranda. Subprocuradorrecurso para determinar que o Co- Geral da República, Dr. Mauro Leite
lendo Tribunal a quo, afastada a ca- Soares.
rência da ação, prossiga no julgaBrasília, 12 de dezembro de 1980 —
mento da apelação, como for de di- Hélio Francisco Marques, Secretário.
reito.
RECURSO EXTFtAORDINARIO N? 92.878 — SP
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão.
Recorrente: Violin Transportes Ltda — Recorridos: Panamericana de
Seguros S/A e Instituto de Resseguros do Brasil.
Ajuizada a ação no prazo fixado para o seu exercício, o retardamento na sua distribuição e na citação do réu, por obstáculo decorrente do mecanismo da justiça, jamais por inércia da autora, não justifica a acolhida da argüição de prescrição. Precedentes do S.T.F. Recurso extraordinário provido, para que, afastada a preliminar de
prescrição, o Tribunal local prossiga no julgamento do recurso, como
for de direito.
ACORDA°
provimento, nos termos do voto do
Ministro Relator.
Vistos, relatados e discutidos estes
Brasília, 23 de setembro de 1980 —
autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supre- •Djaci Falcão, Presidente e Relator.
mo Tribunal Federal, à unanimidade
RELATO RIO
de votos e na conformidade da ata
do julgamento e das notas taquigráO Sr. Ministro Djaci Falcão: Adoto
ficas, conhecer do recurso e dar-lhe como relatório o despacho que admi-
R.T.J. — 100
tiu o recurso, lançado nos seguintes
termos:
“Violin Transportes Ltda, na
qualidade de segurada, moveu
ação ordinária contra a seguradora, visando o recebimento de indenização por sinistro ocorrido com
um dos veículos de sua frota, visto
que a ré se recusava a efetuar o
pagamento em razão de ter o prémio sido pago após a ocorrência.
Em sua contestação a ré Panamericana de Seguros S/A, suscitou
preliminar de prescrição da ação,
por decorridos mais de ano entre a
data do evento e a do despacho que
determinou a citação.
Em segundo grau, a E. Primeira
Câmara Civil deu provimento a
`agravo retido para acolher a prellMinar de prescrição da ação, condenada a autora nas custas e honorários advocaticios de 10% sobre o
valor da causa'.
Inconformada, a autora, após
embargos de declaração rejeitados, interpôs extraordinários (CF119, III, a, d) alegando ofensa do
julgado ao art. 263 do Código de
Processo Civil e discrepância com
a jurisprudência do Excelso Pretório (RTJ 45-66, 50-449, 52-23, 73-243,
78-631, 81-287 e 81-990).
Houve impugnação.
Ao reconhecer a prescrição disse
o acórdão recorrido:
`Dispõe o artigo 178, 6?, inciso
II, do Código Civil que prescreve
em um ano a ação do segurado
contra o segurador e vice-versa,
se o fato que a autoriza se verificar no pais; contado o prazo do
dia em que o interessado tiver
conhecimento do mesmo fato'.
O fato que autoriza a presente
ação, por sem dúvida, é o acidente ocorrido com o veiculo da autora, que, segundo ela, estaria
321
acobertado pela apólice de seguro. E, à falta de prova em contrário, é de se presumir que a autora tomou ciência do fato — o
acidente — no dia em que o mesmo ocorreu.
Pois bem. O sinistro teve lugar
no dia 17 de outubro de 1976, de
sorte que o prazo para o
exercício do direito de ação
encerrou-se em 17 de outubro de
1977.
A autora distribuiu a inicial em
14 de outubro de 1977, mas só obteve o despacho determinador da
citação no dia 18 seguinte.
Ora , estabelece o artigo 219, Si
1?, do Código de Processo Civil,
que verbis:' A prescrição considerar-se-á
interrompida
na
data do despacho que ordenar a
citação'. Por conseguinte, não é
a distribuição da ação, como pretende a agravada, que interrompe a prescrição, mas apenas o
despacho que determina a citação. Tanto assim que, mesmo
após esse despacho, se a citação
não se consuma, no prazo, para
fato imputável ao autor, tem-se
por não interrompida a prescrição (artigo 219, 4?).
Em suma, pois, no presente caso, quando foi exarado no resto
da inicial o despacho mandando
citar a ré, já havia fluido o prazo
prescricional de um ano' ( fls.
223-4). Impugnando-o alega a recorrente que,
`a decisão recorrida confina
com iterativa, uniforme e torrencial jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que, sem
discrepância, declara que a distribuição da ação tem o condão
de interromper a prescrição, pois
o credor não ficou inerte e fez,
em tempo hábil, antes da consumação do prazo prescricional, o
que lhe cumpria fazer.
322
R.T.J. — 100
Realmente, é do Código de ProA decisão recorrida, acolhendo a
cesso Civil, que 'considera-se preliminar de decadência destoou,
proposta a ação, tanto que a peti- sem dúvida, dos acórdãos trazidos a
ção inicial seja despachada pelo confronto, dentre os quais figuram:
juiz, ou simplesmente distri«Ajuizada a ação no prazo fixado
buída, onde houver mais de uma
para
o seu exercício, o retardamenvara' (art. 263), e também que:
to na sua distribuição e na citação
do réu, por obstáculo decorrente do
'O processo começa por iniciamecanismo da Justiça, jamais por
tiva da parte mas se desenvolve
inércia da autora, não justifica a
por impulso oficial' (art. 262)'.
acolhida da argüição de decadência» (RE 63.770, relator o Senhor
A citação, pelo artigo 219, caput,
Ministro Djaci Falcão, in FtTJ 48interrrompe a prescrição na data
220, fls. 242 dos autos).
do despacho que a ordenar (§ 1?).
«Petição apresentada no último
Mas, é mister considerar que os
dia
do prazo à distribuição neces§§ 2? e 3? prevêem prazo para a
sária,
embora despachada no dia
promoção da citação e que somenseguinte.
Prescrição que se consite quando não observados é que
dera
interrompida
na data em que
'haver-se-á por não interrompida a
apresentada
a
juízo
a petição (1?
prescrição' (§ 4?).
Turma — un. — RTJ 73-243).
A hipótese, quer pela letra a,
«Apresentada, em juízo, a petiquer pela d, em face do teor dos
ção inicial, antes de transcorrido o
acórdãos paradigmas transcritos,
tempo da prescrição, não importa
autoriza o encaminhamento do
que, por causa pertinente ao serviapelo extremo.
ço judiciário, o despacho que ordenou a citação haja sido proferido
Pelo exposto, defiro o recurso.
depois de tal prazo, pois é sabido
que a parte postulante não responSão Paulo, 31 de março de 1980
de pela demora da invencível buro— Gentil do Carmo Pinto, 3? Vicecracia forense» (1? Turma — un.
Presidente do Tribunal de Justiça
— RTJ 7&/631)» (fls. 243).
em exercício» (fls. 260 a 264).
E oportuno acrescentar que foi
Oferecidas as razões de fls. 269 a
essa jurisprudência em face
271 e contra-razões de fls. 273 a 276 e mantida
do
C.P.C.
que passou a vigorar em
279 a 281, subiu o recurso a esta Cor- 1974 (RE 87.178,
relatado pelo emite.
nente Ministro Xavier de Albuquerque, in RTJ 81/990). No caso dos auVOTO
tos a citação se deu nos dez dias seguintes à prolação do despacho do
O Sr. Ministro Djaci Falcão (Rela- Juiz
(§ 2? do art. 219 do CPC). Esse
tor): Como se viu do relatório, o si- despacho é que foi retardado, mas
nistro ocorreu a 17.10.1976. Portanto, sem culpa imputável a autora da
o prazo para o exercício do direito ação.
de ação haveria de expirar a
Ante o exposto, conheço do recurso
17.10.1977. A 14.10.1977 a autora distribuiu a petição inicial Todavia, o e dou-lhe provimento, para que afasjuiz somente proferiu despacho orde- tada a prejudicial de prescrição, o
nando a citação no dia 18.10.1977, Tribunal a quo prossiga no julgaoperando-se esta a 27.10.1977 (fls. 2 e mento do recurso, como entender de
33).
direito.
R.T.J. — 100
323
EXTRATO DA ATA
Presidência do Senhor Ministro
RE 92.878 — SP — Relator: Minis- Djaci Falcão. Presentes á Sessão os
tro Djaci Falcão. Recte.: Violin Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Transportes Ltda. (Advs.: Jayme Moreira Alves e Decio Miranda. AuQueiroz Lopes e outros). Recdos.: sente, justificadamente, o Senhor
Ministro Cordeiro Guerra. SubprocuPanamericana de Seguros S/A rador-Geral
da República, o Dr.
( Advs.: Gilberto Lupo e outros) e Mauro Leite Soares.
Instituto de Resseguros do Brasil
(Advs.: Adolpho Martinelli e outros).
Decisão: Conhecido e provido nos
Brasília, 23 de setembro de 1980 —
termos do voto do Ministro Relator. Hélio Francisco Marques, SecretáUnânime.
rio.
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 92.900 — PR
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão.
Recorrente: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária — INCRA — Recorridos: Altino Reis Junqueira e outros.
Ação reivindicatória, entre particulares, em torno de terras situadas na faixa de fronteira. Intervenção do INCRA. Competência da
Justiça Federal de primeira instância, Seção do Estado do Paraná,
para processar e julgar a causa (art. 125, inc. I, da C.F.). Recurso extraordinário provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade
de votos e na conformidade da ata
do julgamento e das notas taquigráficas, conhecer do recurso e dar-lhe
provimento, nos termos do voto do
Ministro Relator.
Brasília, 14 de outubro de 1980 —
Djaci Falcão, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Djaci Falcão:
Cuida-se de recurso extraordinário
que foi processado por força do
agravo de instrumento sob n? 77.9787, processo em apenso.
Lê-se no despacho do Presidente
Ariel Ferreira do Amaral e Silva:
«Da decisão que julgou improcedente exceção de incompetência
absoluta suscitada pelo Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária — Incra (xerox de f.
17/18), agravou o vencido e ao recurso, regularmente processado
nas jurisdições de primeiro e segundo graus, a Egrégia 4? Câmara
do Tribunal de Justiça do Estado
do Paraná negou provimento, pelo
v. Ac. n? 50/51 do feito, assim
ementado, verbis
«Ações possessórias entre particulares, relativas a imóveis localizados em faixa de fronteira».
Irresignado, manifestou o agravante, tempestivamente, com
apoio no artigo 119, III, letras a e d
da Constituição Federal, o RE de f.
53/59, ao pressuposto de negativa
324
R.T.J. — 100
de vigência, pelo julgado recorrido, ao artigo 10, inciso I, da Lei n?
5.010, de 30-05-1966, de ofensa à
Constituição, assim como de dlssenso interpretativo, que refere no
item VII do procedimento recursório.
Não houve impugnação do recorrido e do M.P (certidões de fl. 60 e
62), respectivamente.
Improcede o RE. Com efeito e
bem sustentado no aresto recorrido
(fl. 50/51).
Não se trata de exame do
domínio, à luz de normas legais e
constitucionais, ou, de titulação
por parte de estado-membro.
Os problemas e as conseqüências dessa ação dizem respeito,
apenas, aos litigantes. A questão
dominai é completamente independente; não interessa à causa.
Tampouco, cabe discutir sobre a
legitimidade do titulo expedido
pelo Estado do Paraná. A respeito poderá a União valer-se das
prerrogativas que lhe são inerentes.
A decisão a ser proferida ficará restrita aos direitos e obrigações entre os litigantes, sem afetar as preocupações do agravante.
Pelo exposto, acordam os
Juizes da Quarta Câmara Cível
do Tribunal de Justiça do Paraná, por maioria, em negar provimento ao recurso.
Custas ex vi legis.
E a decisão que o acórdão recorrido manteve, bem esclarece, a
seu turno, a hipótese da causa (fls.
17/18):
Pretende o Instituto Nacional
de Colonização e Reforma Agrária — Incra, através seus patronos, pronunciamento judicial que
acolhe a exceção de incompetência absoluta argüida e que os
presentes autos sejam encaminhados à Justiça Federal em virtude da lide versar sobre porção
de terras situada na faixa de
fronteiras.
No entanto, os exceptos comprovaram que a área em referência foi desmembrada legitimamente do patrimônio público, por
titulo idôneo, sendo que o título
de propriedade expedido pelo Estado do Paraná deu-se em 1? de
outubro de 1920, tendo sido devidamente transcrito no Registro
de Imóveis desta Comarca em 13
de março de 1946, ambas as datas, portanto, anteriores à vigência do Decreto-lei n? 9.760, de 5
de setembro de 1946, que em seu
artigo 5? conceitua as terras devolutas na faixa de fronteira, excluindo expressamente, as particulares.
Comentando tal artigo, assim
ensina F.C. de Santiago Dantas
Problemas de Direito Positivo
fls. 121:
«Por ai se vê que a União não
considera devolutas, e por conseguinte não chama ao seu patrimônio, as terras situadas na
faixa de fronteira, que se tenham incorporado ao domínio
privado, em virtude de alienação, concessão ou reconhecimento por parte da União ou
dos Estados».
Julgo improcedente a exceção
de incompetência absoluta argüida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária —
Incra.
Custas e demais encargos ao final.
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
R.T.J. — 100
Não há, como se vê, qualquer infração a normas de leis federais e
da Constituição Federal, a que se
apega o recorrente, nem o dissídio
jurisprudencial intentado se reveste de necessária adequação à hipótese restrita dos autos.
Em face do exposto, indefiro o
RE pela dupla motivação constitucional» (fls. 63 a 64).
Acrescento que, após as razões de
fls. 74 a 79 e 83 a 86, subiu o processo
a esta Corte, onde recebeu o seguinte parecer
«Trata-se de recurso extraordinário Interposto de r. acórdão prolatado pelo Egrégio Tribunal de
Justiça do Estado do Paraná, arrimado nas letras a e d do permissivo constitucional, sob alegação de
negativa de vigência do disposto no
art. 10, inciso I, da Lei n? 5.010, de
30-05-66, com ofensa do estatuído
no • art. 125, I, da Lei Maior, bem
assim de dissídio pretoriano.
2 — Indeferido na Egrégia Corte
a quo, sobre o apelo, para melhor
exame; mercê do r. despacho exarado as fls. 70 dos autos do agravo
em apenso.
3 — O recorrente, citado para
manifestar-se em ação reivindicatória ajuizada pelo 1? recorrido e
sua mulher contra Angelo Capeletti
e outros, argüiu a incompetência
absoluta da Justiça comum estadual para conhecer do pedido, ao
fundamento de girar a lide em torno de um trato de terras inserido
na denominada 'faixa de fronteira', de domínio da União, a impor
fosse o processo deslocado para a
Justiça Federal, consoante prevê o
art. 125, I, da Constituição vigente
e dispõe o art. 10, I, da Lei nt 5.010,
de 30-05-66.
4 — A invocada incompetência
foi repelida pelas doutas instâncias
ordinárias, que recusaram-se a ver
325
o interesse do recorrente, a primeira, por ter os autores da ação como titulares de domínio legítimo
da área reivindicanda, em razão
de título de propriedade idôneo expedido pelo Estado do Paraná á
Companhia Estrada de Ferro São
Paulo — Rio Grande, em 1? de outubro de 1920, e a segunda, por
considerar restritos aos litigantes
os problemas e as conseqüências
da ação, aos quais seria alheio o
recorrente.
5 — A espécie presente diz com
pleito envolvendo uma área de 300
(trezentos) alqueires paulistas,
equivalentes a 7.260.000 m2 (sete
milhões e duzentos e sessenta mil
metros quadrados), situada no Município de Foz do Iguaçu, distando
de sua sede 25 (vinte e cinco) quilômetros e exibindo como uma de
suas divisas o Rio Paraná (c. doc.
copiado ás fls. 22), donde se conclui, in limine, encontrar-se o imóvel em foco dentro da chamada
'faixa de fronteira', na vetusta zona de dez léguas contíguas aos limites do território nacional com
paises estrangeiros, fixada desde a
Lei n? 601, de 18 de setembro de
1850, que dispunha sobre as terras
devolutas no Império, e do regulamento que a mandou executar, o
Decreto n? 1.318, de 30 de janeiro
de 1854, onde dita zona foi reservada ao estabelecimento de colônias
militares e outros fins (arts. 82 a
85).
6 — Esse Excelso Pretório, no
pertinente ao espaço em tela, tendo por predominante e firme sua
jurisprudência, editou a súmula
477, cujo enunciado põe a cavaleiro
da mais mínima dúvida o domínio
da União sobre as prefaladas terras localizadas na 'faixa de fronteira'.
7 — Do só aduzido resulta inconteste a imcompetência absoluta da
Justiça comum estadual para
326
R.T.J. - 100
apreciar ação reivindicatória como
a ora noticiada, envolvendo área
integrante de 'faixa de fronteira,
máxime tendo em conta a intervenção da autarquia federal, recorrente, que, no exercício seu
legítimo mister, ingressou no feito
visando a excluir os pretensos direitos das partes em litígio.
8 — Se para ação de manutenção
de posse, entre particulares, a respeito da área encravada em 'faixa
de fronteira', já definiu essa Suprema Corte a competência da Justiça
Federal ao teor do v. acórdão proferido na Ação Cível Originária n?
95, do Paraná (In R. T. J. 52-620 a
627), curial será o mesmo reconhecer no tocante à ação reivindicatória aqui ventilada, fulcro primeiro
do extraordinário apelo formulado.
9 — A ofensa ao ditame do art.
125, I, da Constituição, bem assim
a negativa de vigência ao disposto
no art. 10, I, da Lei n? 5.010, de 3005-66, revelam-se presentes, de forma inarredável, perpetradas, que
o foram, pelo r. aresto recorrido.
10 — Isto posto, o parecer é pelo
conhecimento e provimento do recurso, para o fim de, declarada a
incompetência da douta Justiça a
quo, e, ipso facto, a nulidade dos
atos decisórios nela havidos, ser
determinada a remessa dos autos
principais à Justiça Federal da Seção Judiciária do Estado de origem, competente para processar e
julgar a ação relvindicataria ajuizada por Altino Reis Junqueira e
sua mulher contra Angelo Capeletti e outros.
Brasília, 24 de setembro de 1980
— José Antonio Leal Chaves, Procurador da República.
Aprovo: Mauro Leite Soares
Subprocurador-Geral da República» (fls. 90 a 93).
VOTO
O Sr. Ministro Djaci Falcão (Relator): Consoante observa, com acerto,
o parecer do Dr. José Antonio Leal
Chaves:
«Se para ação de manutenção de
posse, entre particulares, a respeito da área encravada em 'faixa de
fronteira', já definiu essa Suprema
Corte a competência da Justiça
Federal, ao teor do v. acórdão proferido na Ação Civel Originária n?
95, do Paraná (in RTJ 52-620 a
627), curial será o mesmo reconhecer no tocante à ação reivindicatória aqui ventilada, fulcro primeiro
do extraordinário apelo formulado
(fls. 92).
Aliás, esclareço que fui o relatar
da decisão proferida na mencionada
ação.
Ante o disposto no art. 125, Inc. I,
da Constituição Federal e de acordo
com o parecer, conheço e dou provimento ao recurso, para, declarando
a incompetência da Justiça estadual
e a nulidade dos atos decisórios, determinar a remessa dos autos da
ação à Justiça Federal, Seção do Estado do Paraná a quem compete
processar e julgar a causa.
EXTRATO DA ATA
RE 92.900 — PR — Rel. Min. Djaci
Falcão. Recte.: Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária —
Incra (Advs.: Geraldo Castellano
Biscaia e outros). Recdos.: Altino
Reis Junqueira e outros (Adv • Salazar Barreiras).
Decisão: Conhecido e provido nos
termos do voto do Ministro Relatar.
Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
R.T.J. — 100
327
Decio Miranda. SubprocuradorBrasília, 14 de outubro de 1980 —
Geral da República, o Dr. Mauro Hélio Francisco Marques, Secretário.
Leite Soares.
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 92.914 — SP
(Segunda Turma)
Relatar: O Sr. Ministro Djaci Falcão.
Recorrente: Ademar Trentini — Recorrido: Instituto Nacional de Previdência Social — INPS.
Duplo grau de jurisdição. As decisões contra autarquias não ficam sujeitas ao duplo grau de jurisdição, a menos que lei especial
disponha em contrário. Inteligência do art. 475, Inc. II, do C. P. Civil.
Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Recurso extraordinário
provido, com restabelecimento da decisão de primeiro grau.
ACÓRDÃO
Vistos relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade
de votos e na conformidade da ata
do julgamento e das notas taquigráficas conhecer do recurso e dar-lhe
provimento, nos termos do voto do
Ministro Relator.
Brasília, 26 de agosto de 1980. —
Djaci Falcão, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Djaci Falcão:
Trata-se de recurso extrhordinário,
processado por força da Argüição de
Relevância n? 6.008-8 (proc. em
apenso), contra a seguinte decisão:
«Vistos, relatados e discutidos
Apelaçãoautos
de
estes
Sumarissimo n? 93.893, da comarca
de São Bernardo do Campo, em
que é recorrente o Juizo de Oficio,
sendo apelante Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social — IAPAS
(INPS) e apelado Ademar Trentini:
Acordam, em Quinta Câmara do
Segundo Tribunal de Alçada Civil,
por votação unânime, adotado o relatório de fls. 78, não conhecer do
recurso voluntário e dar provimento ao de oficio.
Do recurso do IAPAS não tomam
conhecimento pelas razões expostas no parecer da Procuradoria da
Justiça.
Mas dão provimento ao recurso
de ofício.
O autor era ajudante de fábrica
de parafusos. Não se queixou das
condições excepcionais do trabalho, mas tão-só de acidente ocorrido em 26 de fevereiro de 1971,
quando ao erguer uma barra de
ferro sentiu um estalido na coluna.
Foi encaminhado ao INPS, onde
recebeu tratamento, mas a alta foi
dada embora não tenha ficado
completamente curado.
Tem espondiloartrose lombar. E
moléstia de caráter degenerativo.
O resultado da radiografia diz: «espondilose lombar» «anomalia transicional».
328
R.T.J. — 100
Não há afirmação de lesão na coVOTO
luna causada pelo acidente. Por isso mesmo, o perito, que deixou de
O Sr. Ministro Djaci Falcão (Relafazer vistoria no local de trabalho, tor): Como se viu da leitura do acór«pois trata-se de acidente-típico,
dão recorrido, foi admitido o duplo
perfeitamente caracterizado (At. grau de jurisdição por se tratar de
número 4.035-71)», acabou por rela- autarquia, julgando-se improcedente
cionar o mal com o trabalho diário a ação. Entende o recorrente que
do autor, que «desempenhava fun- descabe a remessa ex officio, na cações que exigiam dispêndio de es- so de sentença contra autarquia,
forço fisico,com repetidos movi- consoante o disposto no art. 475 do
mentos de nexo-extensão do tron- Código de Processo Civil.
co, e foi vítima de um acidente,
com lesão direta da coluna». ( fls.
O Recurso merece provimento. Na
39).
qualidade de relatar do RE 90.424 tive oportunidade de afirmar, interMas tanto o exame físico como a pretando o art. 475, Inc. II, do CPC,
radiografia foram realizados entre que as decisões contra autarquias
14 de outubro a 18 de novembro de não estão sujeitas a duplo grau de
1977, porque o autor não se interes- jurisdição, a menos que lei especial
sou pelo processo e demorou para venha a dispor em contrário. A recomparecer para os exames. Logi- gra do citado inciso refere-se, de
camente, decorridos mais de 6 anos modo expresso, às entidades de die meio da data do acidente, não po- reito público União, Estado-Membro
deria o perito a ele ligar a molésMunicípio. E não se deve perder
tia. Aliás, classifica o autor na le- de vista, que o princípio do duplo
tra c da Portaria n? 2/68, sem grau de jurisdição, dado a seu caráter excepcional, em relação a outro
mínima fundamentação (fls. 39).
princípio — o da igualdade das parA conclusão é que o autor rece- tes no plano processual, há de merebeu o tratamento devido, teve alta cer interpretação strictu sensu.
e o que apresenta agora não é relacionado com o acidente.
Finalmente, na linha desse entendimento merecem invocação os sepelo exposto, dão provimento ao guintes julgados: RR.EE . 87.216, rerecurso de ofício para julgar latado pelo eminente Min. Soares•
improcedente a ação, reconhecido Muniu', 87.723, relatado pelo emiao autor os benefícios da assistên- nente MM. Cordeiro Guerra e 91.529,
cia judiciária gratuita.
de que foi 'relato': o nobre Min. Rafael Mayer.
Participaram do julgamento os
Juízes Costa Carvalho e Silveira
Ante o exposto, conheço e provejo
Netto.
presente recurso para, cassando o
São Paulo, 19 de setembro de acórdão recorrido, restabelecer a de1979. — Edgard de Souza. Presi- cisão de primeiro grau.
dente e Relator» (fls. 80 a 81.v).
EXTRATO DA ATA
Acrescento que, oferecidas as razões de fls. 99 a 102 e 120,
manifestou-se o Ministério Público
RE 92.914— SP — Rel.: MM Mac(
pelo improvimento do recurso (fls. Falcão. Ftecte • Ademar Trentini
121 a 124).
(Advs.: João Paulo 1V1affel e outros).
R.T.J. — 100
Recdo.: Instituto Nacional de Previdência Social — INPS (Adv.: Iraci S.
Pereira).
Decisão: Conhecido e provido nos
termos do voto do Ministro Relator.
Unânime.
Presidência do Senhor Ministro
Djaci Falcão. Presentes à Sessão os
329
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República,o Dr. Mauro Leite Soares.
Brasília, 26 de agosto de 1980. —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO CRIMINAL N? 92.916 — PR
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Antonio Neder.
Recorrente: Ministério Público Estadual, no interesse de Angélica Avila
Capela — Recorrido: Tribunal de Alçada do Estado do Paraná.
Suspensão condicional da pena. Suas condições. Caso em que se
proibiu o beneficiário de freqüentar, auxiliar ou desenvolver cultos religiosos que forem celebrados em residências ou em locais que não sejam especificamente destinados ao culto. Trata-se de condição que é
contrária ao principio inscrito no 5?, do art. 153, da Constituição, sobre a liberdade religiosa. A Justiça deve estimular no criminoso, notadamente o primário e recuperável, a prática da religião, por causa
do seu conteúdo pedagógico, nada importando o local.
Suspensão condicional da pena. Caso em que se impõe á beneficiária, a obrigação de pessoalmente carregar, para o edifício da Cadeia Pública do local, umas tantas latas d'água. g obrigação que não
se harmoniza com a finalidade que a doutrina confere ao sursls, visto
que, por ser humilhante, pode humilhar e indignar a beneficiária.
Recurso extraordinário do Ministério Público local interposto
ao acórdão que aprovou as descritas condições.
Seu provimento para cancelar, no caso, uma obrigação e outra.
ACORDA()
Vistos e relatados estes autos de
Recurso Extraordinário n? 92.916, do
Estado do Paraná, em que é recorrente o Ministério Público Estadual,
no interesse de Angélica Avila Capela e recorrido o Tribunal de Alçada
do referido Estado, decide o Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, unanimemente, conhecer do recurso para lhe dar provimento, de acordo com as notas
juntas.
Brasília. 19 de maio de 1981 —
Antonio Neder, Presidente e Relator.
RELATORIO
O Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I. O Ministério Público Federal expõe e aprecia o caso no seguinte parecer do nobre SubprocuradorGeral da República, Dr. Francisco
de Assis Toledo, fls. 90 a 93:
— Angélica Avila Capela foi
condenada a sete meses de detenção por crime de maus tratos em
seus próprios filhos menores.
Aplicou-lhe, ainda, a sentença a
pena acessória de incapacidade
temporária para o exercício do pátrio poder e, ao conceder a suspen-
— 100
330
são condicional da pena, estabeleceu as seguintes condições:
«1 — Não ficar mais de uma
semana por mês sem trabalhar;
2 — Não se embriagar;
3 — Não freqüentar, nem auxiliar ou desenvolver cultos feitos
em residências ou locais não destinados especificamente a esse
fim;
4 — Apresentar-se uma vez cada dois meses a este juízo;
5 — Não se dedicar ao meretrício;
6 — Carregar, para a Cadeia
Pública local seis latas de água
um domingo em cada mês, trazendo água da mesma mina de
onde seus filhos a carregavam»
(fls. 38).
«2— Houve apelação da ré na
qual se fala sobre as condições humilhantes do sursis, e se pede a
absolvição por Insuficiência de prova (fls. 46/47).
«3 — Improvido o recurso, conparecer
favorável
da
tra
Procuradoria-Geral da Justiça (fls.
59), houve embargos de declaração
do Ministério Público para corrigir
omissão quanto às condições do
sursis, reputadas humilhantes.
«Rejeitados esses embargos,
vem o apelo extremo com apoio
nas letras a e d do permissivo
constitucional, admitido pela letra
a por ter sido invocada negativa de
vigência de preceito constitucional
(art. 153, § 5?, da Constituição).
«4 — Afastado, assim, o obstáculo do art. 308 do Regimento Interno
(redação anterior a 30-11-80, examinemos o pedido).
«5 — Parece-nos, preliminarmente, que o Ministério Público,
como custos legis tem legitimidade para recorrer em favor do réu,
sobretudo quando, como no caso
se trata de pessoa pobre, defendida
pela Assistência Judiciária.
«Assim decidiu o Excelso Pretório em acórdão que leva a seguinte
ementa:
Ementa: Ministério Público.
Recurso em favor do réu. Tem o
Ministério Público interesse para
recorrer (CPP, artigo 577, parágrafo único), em favor do réu, de
sentença penal condenatória.
Aplicação dos princípios contidos
nos artigos 257, 385 e 654 do CPP
e no artigo 247 do Regimento Interno do STF. Recurso extraordinário conhecido, pela letra d, e
provido» (RECr 86.088-RJ, Rel.:
Min. Rilac Pinto, DJ de 1212-77,
pág. 9.037).
«Por outro lado, a matéria prequestionada nos embargos, para
cumprimento dos requisitos exigidos pelas Súmulas 282 e 356, espelha de modo evidente um caso de
malferimento do preceito do art.
153, § 5?, da Carta Magna, visto como, ao fixar as condições do sursis, não se deteve o juiz perante a
liberdade de culto da condenada,
vedando-lhe a freqüência ou a participação em «cultos feitos em residências ou locais não destinados
especificamenté a esse fim».
«6— As demais condições do
sursis encontram amparo, a nosso
ver, nos §§ 1? e 3? do art. 698 do
CPP, parecendo-nos que a de n? 6
(obrigação de levar seis latas d'água, uma vez por mês à cadeia pública), embora inusitada, equivale
a uma forma de prestação de serviço à comunidade, que nada tem
de humilhante em confronto com a
situação social e a personalidade
da condenada.
R.T.J. — 100
«7 — Diante do exposto, somos
pelo conhecimento e provimento
parcial do recurso para cancelarse apenas a condição de n? 3 do
sursis em exame».
II — é o relatório
331
garante a liberdade religiosa, direito
que abrange o do exercício de cultos,
desde, é claro, que não sejam ofensivos da ordem pública e dos bons costumes.
A estranha imposição agora discutida é proibitiva, inclusive, de a beVOTO
neficiária do sursis freqüentar cultos
O Sr. Ministro Antonio Neder (Re- religiosos que se realizem em casas
lator ): I. Esclareço que incide no residenciais.
presente caso a regra do art. 308, I,
Trata-se de algo aberrante, pois a
do Regimento Interno desta Corte (o Justiça,
para corrigir o criminoso,
de 1970 com a redação da Emenda n. notadamente
o criminoso primário e
3/75).
recuperável, deve animar ou estimuEsclareço, também, que a Ar- lar nele a prática da religião, por
güição de Relevância n? 7.440-2, do causa do seu conteúdo pedagógico,
Paraná, foi rejeitada na sessão de qualquer que seja o local do culto re18-02-81.
ligioso, pois este pode realizar-se nuigreja, numa outra casa e até
Por conseguinte, deve a Turma ma praça
pública (missa campal,
julgar, nesta oportunidade, tão- em
somente a matéria constitucional por exemplo).
discutida no recurso extraordinário,
O sempre lembrado mestre Pontes
tal como dispõe o caput da supraci- de Miranda foi previdente ao escretada norma do Regimento Interno do ver este aviso: Compreendem-se na
STF.
liberdade de culto a de orar e a de
os atos próprios das maniEssa matéria é a que diz respeito praticar
festações exteriores em casa ou em
com a ofensa, pelo acórdão local, da público
(Com. à Const. de 1967, V, p.
garantia constante do § 5?, do art. 121, n? 3).
153, da Constituição.
Note-se que o direito garantido na
Na verdade, o acórdão proferido discutida
regra não pode ser desfeito
nos embargos declaratórios; fls. 66 a nem sequer
pelo Poder Legislativo.
67, expressa que, ao confirmar a Como se pode
que o Judisentença, o acórdão prolatado no ciário imponhapermitir
limitação
esse diapelo ratificou as condições do sursis reito quando é certo que,ano
caso
impostas na sentença, fis.38.
não se trata de contrariedade à orPortanto, as condições do sursis, dem pública, nem aos bons costuinclusive a que diz respeito com a mes?
restrição à liberdade religiosa, foII — Registro que merece reparo
ram prequestionadas.
também a condição de n? 6, f. 38,
seja a que impõe à beneficiária
Estou em que, ao proibir que a be- qual
sursis a obrigação de pessoalmenneficiária do sursis freqüente, auxi- do
carregar, para o edifício da Calie ou desenvolva cultos em residên- te
deia
Pública local, umas tantas latas
cias ou locais não destinados especi- dágua.
ficamente a esse fim, na verdade a
sentença de primeiro grau, aprovada
Essa obrigação não se harmoniza
pelo acórdão recorrido, contrariou o com a finalidade que a doutrina conprincípio inscrito no § 5?, art. 153, da fere ao sursis, visto que, por ser huConstituição, visto que essa norma milhante, pode revoltar e indignar a
332
R.T.J. — 100
beneficiária, que, ao invés de refrear
seus impulsos ou tendências criminais, poderá exarcebá-los ao ser
compelida a cumprir obrigação de
tal natureza em público. E, na verdade, uma pena que a lei não prevê.
Por ser instituto de politica criminal concebido para estimular a beneficiária a conduzir-se, no futuro, de
acordo com a lei e as normas de moralidade, suas condições devem ser
fixadas com certa cautela para que
não produzam resultado negativo.
Disse com acerto o exímio professor Stoos que o sursis repousa na
idéia de que o autor, com a suspensão da pena, deixará presumivelmente de praticar outros crimes
(apud Costa e Silva, Cód. Pen., I,
1943, p. 322).
No caso presente, as duas condições agora discutidas poderão conduzir a beneficiária, não a deixar o
crime, e, sim, a continuar nele.
III — Conheço do recurso e lhe dou
provimento para o fim de excluir,
das condições relacionadas na f. 38,
as de números 3 e 6, por serem claramente inadequadas ao salutar objetivo perseguido pelo sursis.
deixar de fazer, senão em virtude
de lei. Não havendo lei, é inconstitucional o item 6, dessa estranha sentença de sursis, que impõe à Ré a
obrigação de transportar latas d'água à cadeia pública. Além de inconstitucional essa condição de sursis
apresenta-se com a natureza de uma
pena, mas sursis é a suspensão da
pena de prisão, a qual é de lei, e não
pode ser substituída por outra, no regime vigente.
Dou provimento ao recurso.
EXTRATO DA ATA
RECr. 92.916 — PR — Rel.: Min.
Antonio Neder. Recte: Ministério Público Estadual no interesse de Angélica Avila Capela. Recdo: Tribunal
de Alçada do Estado do Paraná.
Decisão: Conheceu-se do recurso e
a ele se deu provimento. Votação
uniforme. Falou pelo Ministério Público Federal o Dr. Francisco de Assis Toledo, Subprocurador-Geral da
República.
Presidência do Senhor Ministro
Antonio Neder. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Muftoz, Rafael Mayer e
Clovis Ramalhete. SubprocuradorVOTO
Geral da República, o Dr. Francisco
O Senhor Ministro Clovis Rama- de Assis Toledo.
lhete: Senhor Presidente, estou de
Brasília 19 de maio de 1981 —
acordo com V Exa., ainda mais por- Antônio Carlos de Azevedo Braga,
que ninguém é obrigado a fazer ou Secretário.
•
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 92.936 — RJ
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu.
Recorrentes: Niomar Moniz Sodré e outra — Recorridos: Estado do Rio
de Janeiro e outro.
Enfiteuse. Resgate. Imutabilidade do foro estabelecido no ato
constitutivo. Cláusula contratual estabelecendo, porém, valor diferente para o resgate. Afronta aos arts. 678 e 693 do Código Civil. Recurso
extraordinário conhecido e provido.
R.T.J. — 100
ACORDAO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade com a ata
de julgamentos e notas taquigráficas, em conhecer do recurso e
provê-lo nos termos do voto do Ministro Relator, unanimemente.
Brasília, 03 de outubro de 1980 —
Leitão de Abreu, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu: O
Procurador Moacir Antonio Machado da Silva assim expõe e examina o
caso:
«Em ação ordinária proposta
contra a Municipalidade do Rio de
Janeiro, pleitearam os recorrentes
a restituição parcial do pagamento
efetivado por ocasião do resgate
do aforamento de terrenos diversos, relativo ao reajustamento do
valor e ao número de foros, sob o
fundamento de que esses acréscimos resultavam de lei do Estado
declarada inconstitucional.
«Obtiveram êxito em primeira
Instância, mas o v. acórdão de fls.,
admitindo o excesso relativo ao número de foros (Cód. Civil, art.
693), negou a devolução da importância correspondente à elevação
de seu valor, entendendo que a
concordância dos adquirentes, na
carta de trespasse do aforamento,
constituía novação, admitida pelo
Código Civil, que transformara em
letra morta a enfiteuse anterior.
«Recorrem as autoras, pelas letras a e d do permissivo constitucional, sustentando violação dos
arts. 678 e 693 do Código Civil e divergência com julgados que teriam
considerado inalterável o foro,
mesmo por acordo.
333
«Merece, a nosso ver, prosperar
recurso. O contrato de enfiteuse é disciplinado no Código Civil,
inserindo-se a matéria, portanto,
na competência legislativa exclusiva da União (Constituição, art. 8?,
XVII, b). Sob esse fundamento, o
Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art.
13 do Decreto-lei Complementar n?
317, de 1970, do extinto Estado da
Guanabara, que previa atualização
do foro fixado nos contratos de enfiteuse.»
«Dispõe o art. 678, parte final, do
Código Civil, que o foro ou pensão
deve ser certo e invariável. Esta
determinação do quantum pressupõe necessariamente sua fixação
no contrato (Carvalho Santos, Cód.
Civil Bras. Interpretado, 1963, 11!
ed., v. 10, p. 44), ou seja, no ato
constitutivo da enfiteuse. Trata-se
de disposição imperativa, restrita
da liberdade de contratar, de modo
que as partes estão impedidas de
pactuar de modo diverso, sob pena
de invalidade.
«Ora, dizendo a lei civil que o foro é certo e invariável e não tendo
contrato de enfiteuse limitação
no tempo (Cód. Civil, art. 679),
torna-se evidente que o consenso
das partes em sentido contrário,
em qualquer época, é nulo, porque
importa em burla àquela disposição imperativa.
«Dessa forma, a estipulação de
valor para o foro, diverso do previsto no ato constitutivo da enfiteuse, por ocasião do resgate, implica
em violação dos arts. 678 e 693 do
Cód. Civil.»
«Está, por igual, demonstrada a
divergência com decisão do eg.
Tribunal de Alçada da Guanabara
( fls. 202/3), que considerou nula
cláusula contratual estabelecendo
forma de pagamento do resgate diferente da prevista no Código Civil.
334
B.T.J. — leo
Os demais julgados são do mesmo
Tribunal Súmula 369, sendo que o
proferido no RE 80.342 refere-se à
legislação local que prevê atualização do foro, não de alteração decorrente de acordo. Pelo conhecimento e provimento.»
(fls.
247/249).
2 o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Leitão de Abreu
(Relator): Foram declarados inconstitucionais, por decisão do Supremo
Tribunal, o art. 13 do Decreto-lei
Complementar n? 3/69, e 17, do
Decreto-lei n? 317/70, ambos expedidos pelo extinto Estado da Guanabara. Possuiam esses artigos o seguinte teor:
em parte, pagos com base no foro
atualizado. Quanto a essa parte, pretendem as recorrentes restituição do
indébito, uma vez que a exigência se
estribara em preceitos legais, cuja
inconstitucionalidade foi declarada
pela Suprema Corte. De acordo com
a jurisprudência desta Corte e nos
termos do parecer da ProcuradoriaGeral da República, que se ajusta a
essa orientação, conheço do recurso
e lhe dou provimento para reformar,
em parte, o acórdão recorido,a fim
de determinar que a quantia relativa
à repetição do indébito, relativa aos
dez foros anuais pagos a mais, seja
calculada sobre a diferença entre os
foros anuais cobrados com atualização e os foros que aos recorridos era
lícito arrecadar com base no
princípio da invariabilidade do foro
(Cód. Civil, art. 678).
«Art. 13. O valor mínimo do foro
EXTRATO DA ATA
já estabelecido será atualizado de
acordo com a regulamentação a
RE 92.936 — TU — Rel.: Min. Leiser baixada pelo Poder Executitão de Abreu. Rectes.: Niomar Moniz
vo.»
Sodré e outra (Advs.: Frederico José
«Art. 17. Em cada transmissão do Leite Gueiros e outros). Recdos.: Esdomínio útil, inter vivos ou causa tado do Rio de Janeiro e outro (Adv.:
rnortis, será atualizado o foro a ser João José Assad).
pago pelo novo foreiro.
Decisão: Conhecido e provido nos
Parágrafo 1? — O foro atualizado termos do voto do Ministro Relator.
será calculado em 0,6% (seis déci- Unânime. Ausente, ocasionalmente,
mos por cento) do valor do o Senhor Ministro Djaci Falcão. Audomínio pleno do terreno arbitrado sente, justificadamente, o Senhor
pelo Departamento do Patrimônio. Ministro Moreira Alves.
Parágrafo 2? — O foro atualizado
sera devido a partir do ano em que
for transcrito o imóvel em nome do
novo foreiro no Registro Geral de
Imóveis, nas Transmissões inter
vivos, e a partir do ano da expedição do foro de partilha, nas transmissões causa monis».
No caso, houve transmissão do
domínio útil, monis causa. Exigiu o
Estado, contudo, para remissão dos
aforamentos, fossem os foros anuais,
Presidência do Senhor Ministro
Leitão de Abreu. Presentes à Sessão
os Senhores Ministros Cordeiro
Guerra e Decio Miranda. Ausente,
ocasionalmente, o Senhor Ministro
Djaci Falcão. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Moreira
Alves. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Mauro Leite Soares.
Brasília, 03 de outubro de 1980 —
Hélio Francisco Marques, Secretário.
R.T.J. — 100
335
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 92.940 — PR
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves.
Recorrente: João Miguel Caram — Recorrido: Luiz Dias Bastos.
Negócio jurídico tido como simulado para fraudar lei de ordem
pública. Pacto comissório. Prova.
Inexistência, em face das circunstâncias da causa, de negativa
de vigência dos dispositivos do Código Civil e do Código de Processo
Civil invocados no recurso extraordinário.
Dissídio de jurisprudência não demonstrado.
Recurso extraordinário não conhecido.
ACORDA()
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taqulgráficas, por unanimidade de votos, não
conhecer do recurso.
Brasília, 07 de novembro de 1980 —
Djaci Falcão, Presidente — Moreira
Alves, Relator.
RELATORIO
O Sr. Ministro Moreira Alves:
este o teor do acórdão recorrido ( fls.
162/166):
«Acordam os Juizes da Segunda
Câmara Civel do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, adotada a
exposição de fls. e sem discrepância, negar provimento ao recurso
para confirmar, em todos os seus
termos, a respeitável e jurídica decisão do primeiro grau, que bem
apreciou a espécie debatida.
Os autos guardam chamada ação
de prestação de contas, promovida
pelo Apelante contra o Apelado, na
condição de co-proprietário de um
imóvel rural, em face de alienação
de produtos colhidos sem entrega
da parte correspondente ao primeiro.
Na peça defensiva, o Apelado negou qualquer direito ao Apelante,
denunciando que a primitiva promessa de venda ou cessão de direitos que entre ambos havia sido
celebrada encobria empréstimo
com cláusula comissária, vale dizer com a garantia da metade do
imóvel, mas que mesmo empréstimo fora quitado, conforme documentos.
O MM. Juiz acolheu a contestação e, inobstante asseverasse a
inexistência de prova escrita do
contrato de mútuo, considerou-o
comprovado por depoimentos orais
e canhotos de cheques, alusivos à
sua quitação, invocando o artigo
404, I, do estatuto processual, a
respeito, para reconhecer e proclamar a existênéia de simulaçãõ,
que ensejava a nulidade do ,ato
jurídico e, pois, a carência da lide,
com extinção processual tudo consoante artigos 765, 145, V e 146 parágro único do Código Civil, combinado com o artigo 267, VI, do Código de Processo Civil.
O apelo endereçado á este Areópago, evidentemente, persegue a
reforma de tal sentença, reiterando argumentos aduzidos no curso
do processo.
Mas, não enseja prosperar.
336
O ilustre Juiz a quo, com acuidade, bem examinou o contido no bojo dos autos e seu decisório, muito
bem fundamentado e pleno de elementos extraídos do conjunto probatório, só enseja plena e cabal
confirmação.
Na verdade, a Escritura Pública
de Cessão de Transferência de Direito de Compromisso de Compra e
Venda, celebrada entre as partes
(fls. 14/16) mascara verdadeiro negócio de mútuo, configurando
pacto comissório.
Basta perfunctório exame dos
autos para se chegar a tal conclusão.
Nosso De Plácido e Silva ('/ocabulário Jurídico, Forense vol. III,
pág. 1.109) ensina: «No sentido
técnico-jurídico, comissório, do latim commissorius, de commitere,
quer significar comissão ou
atribuição conferida a alguém para que possa, por iniciativa sua, fazer alguma coisa. E o poder conferido a outrem para que proceda,
conforme está estipulado ou convencionado. Nesta razão, em sentido geral, pacto comissório (Pacttun commissoritun) entende toda
convenção inserta num contrato bilateral, em virtude da qual se atribui o poder ou direito a uma das
partes, para que proceda
unilateralmente, em certas circunstâncias, quando a outra parte
não cumpre as obrigações assumidas ou a seu cargo.»
De seu turno, Caio Mário da Silva Pereira (Instituições de Direito
Civil, Forense, vol. IV, n. 348)
lembra que a cláusula comissória
«consiste em pactuar, no ato constitutivo da garantia real, a faculdade de apropriar-se o credor do seu
objeto em caso de não cumprida a
obrigação,» afirmando que «é uma
técnica opressiva do economica-
— 160
mente mais fraco» e «proibida a
cláusula hi continenti (no próprio
instrumento), como também ex
intervalo (em apartado)».
Ora, o magistrado considerou
que a Cessão de Direitos «se • deu
em razão das dificuldades enfrentadas pelo réu para saldar tuna
prestação de Cr$ 200.000,00 alusiva
aquisição da fazenda, como deixou claro a própria testemunha do
autor, Anésia Cavalcanti Lopes»;
que «o autor é «useiro e veleiro»
em realizar negócios fiduciários
como o dos autos,» segundo relato
da testemunha Dr. Diaoli Lopes
Busse, advogado e professor universitário, e cuja idoneidade está a
salvo de qualquer suspeita»; que «o
autor nunca se interessou pela fazenda, embora se declara sócio
deste 1971, e lá somente esteve em
1971 ou 1972, e assim mesmo a passeio, conforme depôs a testemunha
Manoel da Silva»; que, «o autor
não negou o recebimento dos cheques cujos canhotos foram anexados à contestação os quais o réu insiste em afirmar que lhe foram entregues em pagamento de empréstimo» (fls. 133/134).
Demais disso, o julgador apontou
o depoimento de Edmo Elidi° de
Medeiros, que ouvira do Apelante e
do Apelado a assertiva de que parte do imóvel fora transferido ao
primeiro em garantia de empréstimo e, ainda, do próprio Dr. Diaoll
Lopes Busse, renomado causídico
de Londrina, como importantíssimos para o completo esclarecimento da causa, concluindo,
verbis: «Na verdade, a « cessão de
direito» (fls. 14/16) é simulada, e
foi celebrada «para encobrir um
empréstimo garantido com metade
da propriedade que o réu havia adquirido sozinho. E esse empréstieno,
conquanto não existia prova escrita de sua ocorrência, ficou suficientemente demonstrado pela pro-
R.T.J. — 100
va testemunhal já referida, e, também, pelos canhotos de cheques
que foram anexados á contestação,
alusivos à sua quitação. E negócios
realizados nessas circunstâncias,
são nulos, porque burlam a norma
cogente estatuida no art. 765 do C.
Civil segundo reiterados pronunciamentos de nossos tribunais...»
(fls. 135).
De sorte que, bem apreciado tudo que contém o caderno processual, não há elementos que propiciem a reforma de tão jurídica
sentença.
Nem mesmo a circunstância do
Apelado haver participado, com o
Apelante, da Escritura Pública de
Compra e Venda outorga Mn 19 de
julho de 1972 (seis meses apôs a da
Cessão de Direitos) pela antiga
proprietária do imóvel, pode ser
invocadas em beneficio do Apelante, pois tal ocorreu quando ainda
não se achava quitada a divida,
garantida com malsinada cláusula.
Por derradeiro, não há de se alegar a inércia do Apelado em pról
do Apelante, dado o relacionamento e confiança que existia entre
ambos, robustecidos com o fató do
último ter sido padrinho de casamehto de uma filha do primeiro
(115. 40 in fine) e nem se invocar a
necessidade de qualquer interpelação judicial «que ponha o pactuante inadimplente em mora, a
fim de que 5e cumpra a condição,»
o que mesmo De Plácido e Silva
entende necessário, data venial,
sem qualquer respaldo em
principio legal.
Pelo exposto e adotando, integralmente os fundamentos do decisório impugnado, o Colegiado nega
provimento ao recurso.»
Interposto recurso extraordinário,
foi ele admitido pelo seguinte despacho (fls. 263/265):
337
«João Miguel Caram propôs contra Luiz Dias Bastos ação de prestação de contas porque, tendo ambos adquirido em comum um imóvel rural e efetuado, também em
conjunto, empréstimos destinados
ao Custeio de seu cultivo, teria ele
direito à meação dos resultados
agrícolas, o que nunca recebeu.
A ação foi julgada improcedente,
sem apreciação do mérito, pela
sentença de fls. 128/136, confirmada pelo acórdão nt 18.549, ora Impugnado.
Assim decidiu a primeira instância (fls. 135), porque a prova testemunhal comprovada que
«... a «cessão de direitos» (fls.
14/16) é simulada e foi « celebrada», para encobrir um empréstimo garantido com metade da
propriedade que o réu havia adquirido sozinho. E negócio realizados nessas circunstâncias são
nulos, porque burlam a norma
cogente estatuida no art. 765 do
C. Civil, segundo reiterados pronunciamentos de nossos Tribunais (Rev. Tribs. 503/74, 482/61,
468/75).»
A decisão de segundo grau (fls.
162), ao confirmar a sentença, fez
constar de sua ementa:
«De conseqüência, encobrindo,
negócio jurídico celebrado entre Apelante e Apelado, verdadeiro pacto comissório, tal como reconhecido na decisão de primeiro
grau, a ação não poderia vingar.»
E incluiu em seu corpo:
*De sorte que, bem apreciado
tudo que contém o caderno processual, não há elementos que
propiciem a reforma de tão
jurídica sentença.
Nem mesmo a circunstância do
Apelado haver participado, com
Apelante, da Escritura Pública
338
R.T.J. — 100
de Compra e Venda outorgada
e) a de que o negócio jurídico
em 19 de julho de 1972 (seis meera anulável e, portando, sujeito à
retificação, o que ocorreu com a
ses após a da cessão de direitos)
efetivação da escritura pública de
pela antiga proprietária do imóvel), pode ser invocada em becompra e venda em cumprimento
ao ato anterior (artigos 147-11, 148
nefício do Apelante, pois tal ocorreu quando ainda não se achava
e 151 do Código Civil).
quitada a dívida, garantida com
O dissídio pretoriano suscitado
malsinada cláusula.
pelo recorrente restou demonstrado, principalmente no que tange
Inconformado, o recorrente inaos julgados prolatadoS pelo Pretóterpôs tempestivo recurso extraorrio Excelso (RE n? 82.447 , publidinário, fundamentado nas letras a
cado na R. T. J. 82/869, e RE n?
e d do inciso III do artigo 119 da
85.156-9, publicado no D.J.U. de
Constituição Federal, invocando
10.09.79, página 6.679).
violação dos artigos 103, 104, 141,
148, 151, 178 (b, V, § 9?), 765 e 1.126
Pelos motivos acima expostos,
do Código Civil e 402 e 404 (I) do
admito
o apelo extremo.
Código de Processo Civil, mais
dissídio pretoriano, e argüindo, inQuanto à argüição de relevância
clusive, relevância da questão feda questão federal, proceda-se de
deral.
acordo com o que determina a legislação vigente.
As teses propugnadas no recurso
extraordinário e parecer que o
Publique-se e prossiga-se.»
acompanha (fls. 169/199 e 219/254)
2
o relatório.
parecem-me eivadas de juridicidade. Entre elas destacam-se:
VOTO
a de que a nulidade atinge a
O Sr. Ministro Moreira Alves (Recláusula instituidora do pacto co- lator):
1 — No caso, quanto ao pacto
missório e não o negócio jurídico comissório,
não se configura o
que a contém, sendo requisito es- dissídio de jurisprudência,
vez
sencial a existência da cláusula que o acórdão recorrido, uma
ou
(artigo 756 do Código Civil), o que mal, entendeu que o negóciobem
jurídico
inocorre nos autos:
entre as partes era simulado, pora de que o artigo 765 do Códi- quanto dissimulava mútuo com gago Civil incide somente nas hipóte- rantia subordinada a pacto comissóses por ele mencionadas (penhor, rio, ao passo que os acórdãos trazidos a confronto dizem respeito a neanticrese e hipoteca):
gócios qualificados com fiduciários,
c) a de que a simulação não pode que não se confundem com os simuser alegada pelos contraentes em lados, e aos quais. não se aplica o
litígio de um contra o outro, ou pacto comissório.
contra terceiros (artigo 104 do CóA diversidade de qualificações
digo Civil);
jurídicas e elas, na hipótese, são red)a de que a alegação do recorri- levantes — afasta a alegada diverdo, que argüiu em sua defesa a gência.
simulação do negócio recorrido, esObservo, ademais, que, no caso
taria prescrita desde 17/03/75 (artigo 178, letra d do inciso V do § sob julgamento, não há o elemento
obrigacional expresso (pacto de re9?);
R.T.J. — 100
339
transmissão da coisa) que é indis- cia, porquanto, o primeiro dos acórpensável para a caracterização do dãos trazidos a confronto ( fls. 190)
negócio fiduciário.
não trata, nos trechos transcritos,
desse aspecto da questão, e o segun2 — Por outro lado, no tocante à do (fls. 190) é citado por meio de recircunstância de a simulação não po- positório que não atende ás exigênder ser alegada pelas partes que ce- cias do artigo 305 do Regimento Inlebram o negócio Jurídico, sustentou terno desta Corte.
a sentença de primeiro grau (confir3 — Quanto à pretendida ofensa ao
mada por seus fundamentos pelo artigo
756 do Código Civil, ela não se
acórdão recorrido) que, na espécie, verifica,
pOrquanto o acórdão recora simulação encobria ato nulo (vio- rido entendeu
que o débito dissimulação do artigo 765 do Código Civil, o lado estava quitado
considerou nuqual é principio de ordem pública), lo, apenas, o pacto ecomissório
que
razão por que não se aplicavam os também Julgou dissimulado, em face
preceitos dos artigos 103 e 104 do Có- da prova produzida nos autos.
digo Civil.
4 — No que diz respeito ao artigo
Esse entendimento é sustentado 141 do Código Civil, foi ele afastado
por autores do porte de Serpa Lopes pelo acórdão recorrido pela existên(Curso de Direito Civil, I, n? 301,pág. cia de canhotos de cheques anexados
451) que acentua:
(o que não é prova testemunhal, mas
indiciária). Essa circunstância afas«Conseqüentemente, toda vez ta igualmente, a negativa de vigênque a simulação atue como um cia do disposto no artigo 404, I, do
meio fraudatório à lei, visando a C.P.C. E, no concernente, ao artigo
vulneração de uma norma cogente, 402, I, do mesmo C.P.C., não foi ele
deve desaparecer para dar lugar à examinado pela sentença de primeipreponderância da fraude à lei, pe- ro grau, nem pelo acórdão recorrido,
la violação da norma de ordem pú- não tendo sido, também, interpostos
blica. Por outro lado, quando não embargos de declaração, motivo por
ocorrer essa hipótese, quando o ato que lhe falta o indispensável predissimulado não atender contra questionamento Súmula 282 e 356.
uma norma de ordem pública, de- Ademais, é de notar-se que não se
vem preponderar os princípios ine- trata, exclusivamente, de canhotos
rentes à simulação.»
de cheques, pois, com relação a um
há fotocópia de cheque nomiE isso ocorre porque, segundo ain- deles,
nativo
em favor do recorrido, com o
da Serpa Lopes (Idem, ibidem):
devido carimbo de liquidação, o que
«Apresenta-se, então, um ato ei- serve de recibo de pagamento.
vado de nulidade absoluta, fraude
5 — Também não foram prequesà lei, negócio fiduciário contrário à tionados
os artigos 148, 151, 178, f 9?,
ordem pública, figuras que absor- V, b, e 1.126 do Código Civil Súmulas
vem e dominam a da simulação, 282 e 356. Esses artigos, aliás, em faque não passa de um meio para ce da tese, adotada nas instâncias
atingir um fim principal.»
ordinárias, de simulação como melo
fraude a lei de ordem pública,
Tal interpretação não é, evidente- de
não
poderiam ser aplicados por inmente, desarrazoado, o que afasta a conciliáveis
com ela.
alegada negativa de vigência do artigo 104 do Código Civil. Ademais,
6 — Em face do exposto, não co-também nessa parte não está de- nheço, preliminarmente, do presente
monstrado o dissídio de Jurisprudên- 'recurso.
340
R.T.J. — 100
outros e José Paulo Sepúlveda Pertence).
O Sr. Ministro Cordeiro Guerra:
Decisão: Não conhecido. Unãnlme.
Sr. Presidente, também estou de Falou, pelo Recte.: O Dr. Potiguar
acordo, porque resultou claro, dos Alvim Resende. Falou, pelo Recdo.:
debates e do voto do eminente Rela- Dr. José Paulo Sepúlveda Pertence.
tor, que, bem ou mal, as instâncias
Presidência do Senhor Ministro
ordinárias consideraram que o ato
Djaci
Falcão Presentes à Sessão os
era simulado.
Senhores Ministros Leitão de Abreu,
Cordeiro Guerra, Moreira Alves e
EXTRATO DA ATA
Dedo Miranda. SubprocuradorRE 92.940 — PR — Rel.: Min. Mo- Geral da República, Dr. Mauro Leite
reira Alves. Recte.: João Miguel Ca- Soares.
ran (Advs.: Newton José de Sisti e
Brasília, 07 de novembro de 1980 —
outros) Recdo.: Luiz Dias Bastos Hélio Francisco Marques, Secretá( Advs.: Eduardo Rocha Virmond e rio.
VOTO (PRELIMINAR)
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 93.002 — SP
(Primeira Turma)
Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Soares Mulloz.
Recorrente: União Federal — Recorrido: Bratonal S/A — Indústria e Comércio
I.P.I. Maquinaria importada de pais signatário do GATT. Crédito.
Inadmissibilidade.
anteriormente pago, asseguraO direito de creditar-se pelo
do ao comprador de maquinaria nacional, destinada ao ativo fixo do
adquirente, constitui subsidio que a União concede à indústria nadonal, não se estendendo, por isso, à importação de produtos estrangeiros. Recurso extraordinário conhecido e provido.
ACORDA()
Vistos.
Acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Primeira Turma, por maioria de votos, e na conformidade das notas taquigráficas,
conhecer do recurso e dar-lhe provimento.
Brasília, 23 de setembro de 1980 —
Thompson Flores, Presidente —
Soares Muiloz, Relator p/ o acórdão.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Cunha Peixoto:
«BRATONAL S/A — Indústria e Comércio» impetrou, em 02 de dezem-
bro de 1975, mandado de segurança
contra ato do Delegado da Receita
Federal de São Paulo, alegando: a)
haver importado teares que especifica, e peças necessárias à sua atividade produtora, procedentes da República Federal Alemã e Estados
Unidos, países participantes do
GATT, de que é signatário o Brasil;
b) esse Tratado afirma o principio
segundo o qual os produtos originários de qualquer parte contratante
devem obter tratamento fiscal não
menos favorável que o concedido a
produtos similares de origem nacional; c) que o Dec.-lei n? 1.136/70, em
seu art. 36, permite aos estabelecimentos industriais adquirentes de
R.T.J. — 100
391
to de se creditar no valor do imposto
sobre Produtos Industrializados pago
na importação de mercadorias originárias de pais signatário do GATT.
Alega permitir o art. 36 do Decreto
n? 70.612/72, que regulamentou o art.
26, f 2?, da Lel n? 4.502/64, na redação dada pelo art. 1? do Dec.-lei n?
1.136/70, aos estabelecimentos industriais adquirentes de máquinas nacionais destinadas a integrar seu ativo fixo, creditar-se da importância
paga a título de IPI e, portanto, estando ela nas mesmas condições, já
que importara, para o mesmo fim,
produtos originários da Alemanha e
Estados Unidos, e pagou o IPI por
ocasião do desembaraço da mercadoria, tem direito também a
creditar-se do tributo pago.
Q Tribunal Federal de Recursos,
atendeu-lhe a pretensão, em parte.
2 — Na verdade, o Acordo Geral
de Tarifas — GATT — do qual Brasil, Alemanha e Estados Unidos são
signatários, dispõe que os produtos
originários de uma das partes contratántes gozarão, no território de
outra, de tratamento não menos favorável ao dispensado ao similar nacional.
Também é certo que o art. 36 do
Decreto n? 70-612/72 permite aos estabelecimentos industriais adquirentes de máquina nacional destinada a
seu ativo fixo creditar-se do imposto
pago pelo seu vendedor. Diz este dispositivo:
«Os estabelecimentos industriais
poderão creditar-se do imposto relativo a máquinas, aparelhos e
equipamentos, de produção nacional, inclusive quando adquiridos de
VOTO
comerciantes não contribuintes do
imposto, destinados a sua instalação, ampliação ou modernização e
O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Reque integrarem o seu ativo fixo, e
lator): 1 — A impetrante, ora recorrelacionados nas instruções baixarida, objetiva, com o mandado de sedas pelo Ministro da Fazenda».
gurança, o reconhecimento do direi-
máquinas nacionais destinadas a integrar seu ativo fixo, creditarem-se
da importância paga a titulo de IPI;
d) pretende, assim, que às máquinas
que importou, originárias daqueles
países signatárlos,seja assegurado o
mesmo tratamento.
A segurança foi denegada em primeira instância, mas o Tribunal Federal de Recursos, em decisão datada de 28 de novembro de 1977, publicada em 07 de fevereiro de 1979, reformou a sentença de 1? grau, estando o acórdão assim ementado:
«Importação.
Equipamentos industriais procedentes de países signatários do
GMT.
Pretensão a creditar-se pelo valor a título de I.P.I., no seu desembaraço aduaneiro:
Apelação parcialmente provida,
para conceder, parte, a segurança,
apenas, com relação às importações efetuadas após a entrada em
vigor da Portaria GB-665, de
10.12.1974, mantida, porém a decisão denegatória quanto às anteriores ao citado ato administrativo».
Irresignada, a União interpôs recurso extraordinário com fundamento nas letras a e d do permissivo
constitucional, sustentando negativa
de vigência do art. 36 do Dec. n?
70.612/72, que regulamentou a nova
redação dada pelo art. 1? do Dec.-lei
n? 1.136/70 ao art. 26, 2? da Lei n?
4.502, de 30.11.64, bem como dissídio
jurisprudencial.
O processo me foi distribuído em
22.08.1980.
E o relatório.
342
R.T.J. — 100
De acordo com o código Tributário
Nacional, o fato gerador do IPI é o
desembaraço aduaneiro do produto,
quando de procedência estrangeira,
a sua saída do estabelecimento
industrial ou do comerciante brasileiro que o forneça à indústria, ou
arrematação em leilão, quando
apreendido ou abandonado.
Equivale, portanto, o pagamento
do IPI sobre a mercadoria estrangeira, ao recolhimento do mesmo tributo pelo industrial sobre o produto
que fabrica.
Admitindo, no art. 36 do Regulamento, que o industrial comprador
se credite no IPI, quando adquire determinadas máquinas destinadas a
integrar o seu ativo fixo, a lei, na
verdade, está concedendo uma isenção ao industrial alienante, pois é
evidente que ele venderá a mercadoria pelo preço real, descontado o imposto.
Ora, a finalidade da cláusula de
nação mais favorecida é estabelecer
e manter em todo tempo, entre os
Países interessados, uma igualdade
fundamental e sem discriminação.
Nem se diga que se trata de um
subsídio à indústria nacional, e que o
próprio Tratado permite a concessão
do incentivo, verbis:
«As disposições deste artigo não
Impedirão o pagamento de
subsídios exclusivamente a produtos nacionais compreendidos os pagamentos a produtos nacionais
com recursos provenientes da arrecadação dos impostos ou tributos
internos aplicados de conformidade com os dispositivos deste Artigo
e de subsídios concedidos sob a forma de compra de produtos nacionais pelos poderes públicos».
O Tratado só permite a concessão
de subsídio, e nunca isenção direta
ou indireta; e a hipótese do art. 36 é
típica de isenção.
No caso, se o produto importado
de país signatário do GATT não tiver
tratamento idêntico ao previsto no
art. 36 do Regulamento do IPI, resultará que o material ao que o mesmo
se refere ficará mais onerado tributariamente que o nacional da mesma
natureza e adquirido para o mesmo
fim, contrariando, assim, o Tratado.
Assim, o acórdão recorrido não se
limitou a dar razoável interpretação
ao art. 36 do Regulamento do IPI;
Imprimiu-lhe, a nosso ver, sua verdadeira inteligência.
3 — Os acórdãos trazidos à colação
não têm nenhuma semelhança com a
hipótese dirimida pelo egrégio Tribunal Federal de Recursos, o que seria
bastante para não se conhecer do recurso com fundamento na letra d.
Acontece, ainda, que o recorrente
não satisfez os requisitos do art. 305
do Regimento Interno do Supremo
Tribunal Federal, limitando-se a
transcrever ementas de acórdãos
que resolveram matéria inteiramente diversa da que é objeto da decisão
recorrida.
4 — Por estes motivos, não conheço do recurso.
EXTRATO DA ATA
RE 93.002 — SP — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Recte.: União Federal.
Recda.: BRATONAL S/A — Indústria e Comércio (Advs.: Joseval Sirqueira e outros).
Decisão: Adiado o julgamento por
haver pedido vista o Min. Soares
Mufioz, após os votos dos Ministros
Relator e Rafael Mayer, que não conheciam do recurso.
Presidência do Senhor Ministro
Thompson Flores. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Xavier de
Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares
Mayer.
Mufloz
e
Rafael
R.T.J. — 100
343
Subprocurador-Geral da República,
Dr. Francisco de Assis Toledo.
Brasília, 09 de setembro de 1980 —
Antônio Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
cimento do industrial ou do comerciante brasileiro que os forneça à
indústria, ou a arrematação em
leilão, quando apreendido ou abandonado.
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Soares Muãoz: Pedi
vista para refletir sobre a espécie e
apresento, agora, o processo em mesa, para que prossiga o julgamento.
O acórdão recorrido arrima-se no
voto vencedor proferido pelo eminente Ministro José Néry da Silveira,
que obteve a adesão do eminente Ministro Armando Rollemberg. Ficou
vencido o eminente Ministro José
Dantas (fls. 138).
Entretanto, os dois ilustres magistados responsáveis pela decisão, ora
recorrida, apreciando outros recursos, que versaram a mesma tese,
mudaram de orientação.
O eminente Ministro Armando Rollemberg, na AMS n? 81.479, assim
fundamentou seu atual posicionamento:
«A questão é muito conhecida do
Tribunal cujos integrantes não têm
no propósito ponto de vista uniforme, o que se explica pelo fato de se
tratar de interpretação de texto
de acordo internacional não muito
claro, em confronto com a legislação pátria.
Essa dificuldade enfrentei pessoalmente, desde que, depois de
me haver manifestado no sentido
da tese defendida pela Impetrante,
quando do julgamento do AMS
77.362, reexaminando depois a matéria, reconsiderei-me pelas razões
que passo a expor.
De acordo com o Código Tributário Nacional, o fato gerador do IPI
é o desembaraço aduaneiro do produto quando de procedência estrangeira, a sua saída do estabele-
Equivale, portanto, o pagamento
do IPI sobre a mercadoria estrangeira ao recolhimento do mesmo
tributo pelo industrial sobre o produto que fabrica, com o que, ao admitir, no art. 36, do RIP!, que os
estabelecimentos industriais que
adquiriram máquinas, aparelhos e
equipamentos de produção nacional, destinados a sua instalação,
ampliação ou modernização e que
integram o seu ativo fixo, de acordo com relação constante de instrução do Ministro da Fazenda, P o
-derãocitasmpel
relativo, o legislador está provendo
sobre hipótese diversa, pois a faculdade ai concedida decorre de
haver sido pago, pelo produtor, o
IPI do qual se creditará o adquirente do bem, quando, no caso do
produto importado, tal pagamento
não ocorreu.
O que há na hipótese do art. 36
referido, como bem acentuaram as
informações, é o subsidio por parte
da União, por via do crédito do IPI
arrecadado do produtor, ao adquirente da mercadoria nacional,
subsidio previsto nos arts. III, 5 e
XVI do. Acordo Geral de Tarifas e
Comércio, ao disporem:
*Se uma Parte Contratante
concede ou mantém uma subvenção qualquer, inclusive qualquer
forma de proteção das rendas ou
sustentação dos preços que tenha
diretamente ou indiretamente,
por efeito elevar as exportações
de que um produto qualquer do
território da referida Parte Contratante ou de reduzir as importações no seu território, dárá conhecimento por escrito às Partes
Contratantes, da importância e
344
R.T.J. — 100
da natureza dessa subvenção,
dos resultados que possam ser
esperados sobre as quantidades
do ou dos produtos em questão
por ela importados ou exportados
e as circunstâncias que tornam
a subvenção necessária. E, todos
os casos em que fique estabelecido que uma tal subvenção causa
ou ameaça causar um prejuizo
sério aos interesses de outra Parte Contratante a Parte Contratante que a concedeu examinará,
quando solicitada, com a ou com
as Partes Contratantes interessadas ou com as Partes Contratantes, a possibilidade de limitar a
subvenção».
«Art. III. 5. As disposições deste Artigo não se aplicarão à compra pelos órgãos governamentais
ou por sua conta de produtos destinados ao seu uso, e não à revenda ou ao uso na produção de
mercadorias destinadas à venda.
Também não impedirão o pagamento, somente a produtoras nacionais, dos subsídios previstos
no Art. XVI, incluindo os
subsídios provenientes de arrecadação de taxas e imposições interiores, e os subsídios efetuados
através das compras de produtos
nacionais pelos órgãos governamentais ou por sua conta».
Essa permissão de subsídio se
tornou mais clara com a aprovação de Protocolo modificando a
Parte II e o artigo XXVI do Acordo
Geral de Tarifas e Comércio, ratificado pelo Brasil por via do Decreto Legislativo 43, de 1950, que
alterou o Art. III do Acordo referido, dando aos ns. 2 e 8 b a seguinte
redação:
«Art. II. 2. Os produtos do território de qualquer parte contratante, importados por outra parte
contratante, não estão sujeitos,
direta ou indiretamente, a impos-
tos ou outros tributos internos de
qualquer espécie, superiores aos
que incidem, direta ou indiretamente, sobre produtos nacionais.
Além disso, nenhuma parte contratante aplicará, de outro modo,
impostos, ou outros encargos internos a produtos importados nacionais contrariamente às principais estabelecidas no parágrafo
1.
8 (b) — As disposições deste
artigo não impedirão o pagamento de subsídios exclusivamente a
produtores nacionais compreendidos os pagamentos a produtores nacionais com recursos provenientes da arrecadação dos impostos ou tributos internos aplicados de conformidade com os
dispositivos deste Artigo e de
subsídios concedidos sob a forma
de compra de produtos nacionais
pelos poderes públicos».
A última disposição lida deixa
claro que qualquer das partes contratantes poderá subsidiar os produtores nacionais com recursos
provenientes da arrecadação dos
impostos ou tributos internos, faculdade que foi utilizada pelo Brasil quando, no Dec.-lei n? 1.136, de
1970, previu o subsídio referido no
art. 36 do RIPI, isto é, a possibilidade de os estabelecimentos industriais poderem creditar-se do imposto relativo a máquinas, aparelhos e equipamentos de produção
nacional, relacionados em instruções baixadas pelo Ministro da Fazenda, quando se tratar de instalação, ampliação ou modernização
de indústria que interesse ao desenvolvimento do País, subsídio
que, como autorizado no Acordo
Geral de Tarifas e Comércio, é feito por via de tributo arrecadado
pela União, pois, ao se creditar do
IPI pago pelo industrial bràsileiro
fabricante de máquinas, aparelhos
R.T.J. — 100
e equipamentos, o estabelecimento
industrial adquirente realmente está recebendo o imposto pago pelo
vendedor.
A hipótese, assim, não tem similitude com a obrigação do pagamento do IPI pelo adquirente de
produto estrangeiro importado, e
seria mesmo de todo inconcebível
que o Brasil, que se esforça para
ingressar no grupo das nações desenvolvidas, fosse usar dinheiro
público para subsidiar produtos estrangeiros, incentivando a sua
aquisição pelos estabelecimentos
industriais nacionais.
Meu voto, assim, é dando provimento ao recurso para reformar a
sentença, e cassar a segurança.'
(fls. 144/146).
Concordo com esse pronunciamento, pois a União, relativamente a
máquinas, aparelhos e equipamentos, de produção nacional, adquiridos por estabelecimentos industriais
para integrar o seu ativo fixo, autoriza (art. 36 do RIPI) a esses adquirentes a se creditarem do IPI, anteriormente pago, com o que, na verdade, lhes está fornecendo um incentivo. No caso de importação, a hipótese seria de não pagamento do IPI,
que somente poderia ser autorizado mediante isenção.
Aliás, o eminente. Ministro Cordeiro Guerra, no Atavo de Instrumento n? 78.440, prolatou o seguinte despacho:
«Ao apreciar o despacho indeferltório do apelo extraordinário, assim se manifesta o Procurador-Geral da República: «Não merece reparos o despacho vestibular. A
agravante não demonstrou o
dissídio jurisprudencial, como o
exige a Súmula 291, nem qualquer
afronta ao art. 98 do CTN. Ao afirmar que os estímulos e Incentivos
fiscais não se caracterizam como
345
isenção, o acórdão impugnado fez
aplicação correta do GATT, que
ressalvou a hipótese no I 5? do art.
III e no art. XVIII. Assim, opinamos seja arquivado o Agravo».
Realmente, já se manifestou a 2?
Turma no mesmo sentido, em 25-480, sendo relator o eminente Ministro Moreira Alves:
«Ementa: IPI. GATT. Leis n?s
313/48 e 4.138/62. Lei 4.502/64, art.
25, 4 2?, com a redação do art. 1?,
Decreto 70.162/72, art. 36. Portaria
665/74 do Ministro da Fazenda.
Aplicação da Súmula 400. Dissídio
de jurisprudência não demonstrado. Agravo regimental a que se nega provimento» (DJ de 17-6-80,
pág. 4.540)».
Ante o exposto, conheço do recurso
extraordinário, para, cassado o acórdão recorrido, restabelecer a sentença de primeiro grau, data venta do
brilhante voto cio eminente Ministro
Cunha Peixoto, ao qual aderiu o eminente Ministro Rafael Mayer.
CONFIRMAÇÃO DE VOTO
(Preliminar)
O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): Senhor Presidente, neste recurso, de que sou Relatar, mantenho
o meu voto, não conhecendo do recurso.
A meu ver, o cerne da questão é
saber se a dispensa de pagamento do
tributo é subsidio ou é isenção, porque o que ocorre é que, indiretamente, o produtor da máquina deixa de
pagar o tributo, uma vez que o comprador se credita do que não pagou.
Então, o que acontece? Evidente,
que o vendedor, nessa hora, deixou
de cobrar-lhe o imposto; vendeu com
a dedução do imposto. Subsidio seria, se a União fizesse o pagamento
extra, tora do dinheiro que ele havia
arrecadado, ou fornecesse dinheiro a
preço baixo. Do contrário, seria fácil
descumprir o tratado do GATT; bas-
346
— 100
teria que o produtor, quando tivesse
— como no caso de São Paulo e não
pagar o imposto — o ICM — fizesse
o pagamento e recebesse de volta o
imposto, através do comprador. De
fato, tem ele isenção do tributo.
Como o ilustre Advogado afirmou,
da tribuna, o pagamento do IPI, na
importação, se faz na chegada da
mercadoria no porto brasileiro. Paga, neste momento, mas quer se creditar. Pagou, da mesma maneira
que o fez o comprador do produto
nacional. Este pagOt e, depois, lá
adiante, se creditou. Aqui, também,
ele pagou e imediatamente se creditou. O problema de dizer que há diferença entre um e outro é mero jogo
de palavras, pois a situação é absolutamente idêntica.
Se o GATT é prejudicial ao Brasil,
isto não nos compete verificar. As
autoridades que denunciem o Tratado. Mas, enquanto este estiver .em
vigor, a meu ver, deve ser cumprido. Data venia, não há aí subsídio,
mas verdadeira isenção.
VOTO
O Sr. Ministro Xavier de
Albuquerque: Admito que seja
possível — em termos matemáticos,
como fez o nobre Advogado, ou no
plano da contabilidade financeira,
como parece haver feito o eminente
Ministro Cunha Peixoto — sustentar
a equivalência entre a desoneração
tributária direta e ostensiva, sob a
forma de isenção, e a desoneração
oblíqua, que aqui se daria sob a forma de crédito do imposto pago por
outrem, em relação aos produtos nacionais. Admito até que seja possível
acusar os que distinguem uma coisa
de outra, de fazer jogo de palavras:
mas o fato é que o tratado GATT
também contempla essa distinção,
admitindo os subsídios e as subvenções, e não confundindo uma coisa e
outra com o tratamento tributário
benéfico que tome a forma de isenção, de redução de allquota, etc.
Parece-me que está no espírito do
acordo a permissão de hipóteses como estas, que estamos examinando,
pelo que o acórdão do Tribunal Federal de Recursos, no caso de que é
Relator o eminente Ministro Soares
Mtuloz, não negou vigência ao dito
acordo, e, conseqüentemente, não
maltratou o art. 98 do código Tributário Nacional.
Convenço-me, data venia do eminente Ministro Cunha Peixoto, de
que a solução dada, no maior número de seus acórdãos, pelo Tribunal
Federal de Recursos, interpreta corretamente o documento internacional e a lei brasileira, e, por isso, peço licença a S. Exa. para acompanhar o voto do eminente Ministro
Soares Mufloz, conhecendo do recurso e lhe dando provimento.
VOTO
O Sr. Ministro Thompson Flores
(Presidente): Peço vênia ao eminente
Ministro Cunha Peixoto (Relator)
para acompanhar o voto do eminente Ministro Soares Mtuloz.
Creio que a distinção que acaba de
fazer S. Exa. encontra amparo na
lei. Não se trata de crédito, porém,
de incentivo em favor do produtor
nacional. Correta, pois, a orientação
atual do Tribunal Federal de Recursos, superando a anterior, sob cuja
égide foi julgada a espécie dos autos.
Assim, conheço do recurso que é
da União Federal e lhe dou provimento.
E como voto.
EXTRATO DA ATA
RE 93.002 — SP — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Recte.: União Federal.
Recda.:BRATONAL S/A — Indústria
R.T.J. — 100
e Comércio ( Advs.: Joseval Sirqueira e outros).
Decisão: Conhecido e provido, vencidos os Ministros Relator e Rafael
Mayer.
Presidência do Sr. Ministro
Thompson Flores. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Xavier de Afim-
347
querque, Cunha .Peixoto e Soares
Manos. Ausente, justificadamente, o
Ministro Rafael Mayer. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco de Assis Toledo.
Brasília, 23 de setembro de 1980 —
Antônio Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 93.053 — MG
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Antonio Neder.
Recorrente: Estado de Minas Gerais — Recorridos: Libergráfica Editora
Ltda. e outras e Gráfica Itacolomi Ltda.
Ao redigir o 1?, do art. 8?, do Decreto-Lei n? 406/68, teve o seu
autor o capricho de salientar que é tributável pelo ISS o serviço que,
incluído na lista, seja prestado com o fornecimento de mercadorias, e
que, ao redigir o § 2?, do mesmo artigo, ele teve o cuidado visível de
tributar pelo ICM o fornecimento de mercadorias com a prestação de
serviços não especificados na lista (o 2? foi de novo redigido pelo DL.
n? 834/89). A comparação dessas duas normas permite se vislumbre
que o legislador fixou, para o assunto, o critério da utilidade preponderante: no f 1?, o serviço prepondera sobre a mercadoria e incide o
ISS; no f 2?, a mercadoria prepondera sobre o serviço e incide o ICM.
Composição gráfica. E prestação de serviço que abrange o fornecimento de mercadorias (papel, tinta, etc.), mercadorias que, todavia, não constituem, no caso, a utilidade preponderante. Incide nela o
ISS e não o ICM.
O i 1?, do art. 8?, do Decreto-Lei n? 406 de 1968, não é inconstitucional.
Precedentes do STF sobre a matéria.
5. Recurso extraordinário do Fisco de Minas Gerais a que a Corte
nega conhecimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes- autos de
Recurso Extraordinário n? 93.053-1,
do Estado de Minas Gerais, em que
é recorrente o referido Estado e recorridos Libergráfica Editora Ltda.
e outras e Gráfica Itacolomi Ltda.,
decide o Supremo Tribunal Federal,
por sua Primeira Turma, unanimemente, não conhecer do recurso, de
acordo com as notas juntas.
Brasília, 19 de maio de 1981 —
Antonio Neder, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I — Libergráfica Editora Limitada e outras Impetraram segurança ao eg. Tribunal de Justiça de
Minas Gerais contra certo ato do Sr.
Secretário das Finanças daquele Estado.
398
Alegaram: que prestam o serviço
de composição gráfica previsto no n.
53 da Lista de Serviços referida no
art. 8?, do Decreto-lei n? 406, de 1968,
de novo redigido pelo art. 3?, VI, do
Decreto-lei n?. 834, de 8.9.69; que,
portanto, são contribuintes do Imposto Sobre Serviço; que, todavia, o
Secretário da Fazenda de Minas Gerais exige que paguem, no caso ao
Estado, o Imposto Sobre Circulação
de Mercadorias.
O eg. Tribunal de Justiça mineiro
concedeu a segurança.
Fundou-se em precedente desta
Corte, o acórdão proferido no RE
84.387 (RTJ, 84/570 a 573).
Destacou do texto desse acórdão
este fundamento decisório, f. 186:
(...) «nos casos de tipografias,
posto que empreguem em seus serviços tinta, papel e ingredientes
outros, ficam eles absorvidos com
a impressão realizada; perdem o
seu valor comercial, não são eles
vendidos como bens corpóreos, merecendo, pois, ser tributado o serviço prestado, o qual, como é expresso em lel, afasta a incidência
de outros».
II — Ao acórdão que assim julgou
a matéria, interpôs recurso extraordinário o Estado de Minas Gerais.
Baseou-se no art. 119, III, a), da
Constituição.
Quanto ao primeiro fundamento, o
Impugnante sustenta que o acórdão
recorrido contrariou o art. 23, II, e
seu § 6?, da Constituição, como também negou vigência ao § 2?, do art
8?, do Decreto-lei n? 406, de 31.12.68,
e ao art. 46 do Código Tributário Nacional.
No tocante ao segundo fundamento, afirma o Recorrente que o acórdão local diverge do que foi proferi-.
do pelo eg. Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo na Apelação
n? 252.387, copiado nas fls. 206 a 215.
— 100
O recurso foi impugnado, fls. 217 a
220, mereceu parecer favorável do
Ministério Público de Minas Gerais,
fls. 222 a 223, foi admitido, fls. 231 a
233, razoado, fls. 235 a 244, contraarrazoado por uma litisconsorte, fls.
247 a 251, tudo nestes termos: ... (lê).
III — A eg. Procuradoria-Geral da
República emitiu sobre o caso este
parecer da lavra do nobre Procurador Moacir Antonio Machado da Silva, fls. 258 a 259:
«1. O eg. Tribunal de Justiça de
Minas Gerais concedeu segurança
a empresas gráficas estabelecidas
em Belo Horizonte, concluindo que
o ICM não incide sobre os serviços
de composição gráfica contratados
com clientes e consumidores finais.
«2 — Recorre o Estado, sustentando ofensa aos arta. 23, II, e § 6?,
da Constituição, 8?, § 2?, do Dec.-lei
n? 406/68 e 46 do CTN, além de divergência com julgado do Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São
Paulo (fls. 206-15).
«3 — Não merece prosperar o recurso. Além da decisão preferida
no RE 84.387 (DJ de 10/9/76, p.
7.836), há outros precedentes do
Supremo Tribunal Federal que firmaram orientação no sentido de
que os serviços de composição gráfica ( feitura e impressão de notas
fiscais, fichas; talões, cartões,
etc.) estão exclusivamente sujeitos
ao ISS (RE 92.927, DJ de 7/11/80;
RE 92.762, DJ, de 19/9/80; RE
92.761, DJ de 7/11/80; RE 92.161,
DJ de 18/4/80; RE 93.032, 111 de
3/10/80, etc.).
«4 — Se a atividade se compreende no item 53 da Lista anexa
ao Dec.-lei n? 834, de 1969, está sujeita unicamente ao ISS, por força
do que dispõe o § 1? do art. 8? do
Dec.-lei n? 406, de 1968.
R.T.J. — 100
— De acordo com os precedentes, o parecer é pelo nãoconhecimento de recurso.»
IV — E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I. A tese do Estado recorrente é a de que a composição gráfica
exige aplicação de matéria primas
(papel, tintas e outros ingredientes),
e que, por isso, é produto industrializado que, circulando, está sujeito ao
ICM.
Na verdade, a composição gráfica
é prestação de serviço que abrange
aplicação de alguns produtos (papel,
tinta, etc.).
Sucede que o I?, do art. 8?, do
Decreto-lei n? 406, de 31.12.68, expressa que o serviço incluído na lista
referida no seu texto (de novo redigida pelo art. 3?, VII, do Decreto-lei nt
834 de 8.9.69) fica sujeito apenas ao
Imposto previsto no mencionado art.
8?, o ISS, ainda que sua prestação
envolva fornecimento de mercadorias.
Vale dizer que o legislador afastou
a tributação das mercadorias com
que se presta qualquer serviço incluído na lista, e qtie o fez porque,
na presta tão de tal serviço, o fornecimento de mercadorias não constitui o fato econômico preponderante.
O legislador adotou o critério, que
lhe foi indicado pela politica fiscal,
de preponderância da utilidade fornecida pelo contribuinte, critério esse definido pelo Prof. Antonio Roberto Sampaio Daria nestes termos
(Revista dos Tribunais, SP, volume
392, p. 53):
«Ora, sendo de observação elementar o fato de que toda mercadoria fornecida pressupõe, em seu
custo, fatores representados por
349
serviços e materiais, havendo o legislador constituinte instituído impostos diferençados incidentes sobre mercadorias e sobre serviços e
não se permitindo a exigência de
dois tributos diversos sobre o mesmo substractum econômico, é de
se concluir que, implicitamente, foi
adotado, entre nós, o critério da
preponderância funcional da utilidade fornecida. Se, num dado fornecimento, a utilidade preponderantemente transferiria pelo fornecedor for o material, cabível será
a cobrança do ICM. Se a utilidade
preponderante for o serviço, competirá ao mtmicipio exigir o imposto correspondente. Tal critério parece repousar no bom senso, permitir uma repartição equitativa da
matéria impositiva e assegurar o
eficiente funcionamento da máquina arrecadadora, exonerando o
contribuinte da obrigação de decompor o custo do bem fornecido
em materiais, serviços e outros
itens, para o que, na imensa maioria dos casos, ele não possui aparelhagem contábil adequada.»
Não importa, pois, que, na prestação de qualquer serviço previsto na
supracitada lista, o prestador aplique mercadoria, pois esta constitui
sempre a utilidade que não
prepondera na que é fornecida pelo
contribuinte.
Note-se que, ao formar a lista, o
legislador teve o cuidado, que logo
se percebe, de selecionar serviços
em que o fornecimento de mercadorias constitui algo que não prepondera na utilidade final.
Tanto que, ao redigir o I 1?, do art.
8?, do Decreto-lei n? 406/68, teve o
seu autor o capricho de salientar que
é tributável pelo ISS o serviço que,
incluído na lista, seja prestado com
o fornecimento de mercadorias, e
que, ao redigir o 4 2?, do mesmo arti-
350
R.T.J. — 100
go, ele teve o cuidado visivel de tributar pelo ICM o fornecimento de
mercadorias com a prestação de serviços não especificados na lista (o
2? foi de novo redigido pelo Dl. n?
834/69).
A comparação dessas duas normas
permite se vislumbre que o legislador fixou, para o assunto, o critério
da utilidade preponderante: no 1?,
o serviço prepondera sobre a mercadoria e incide o ISS; no 2?, a mercadoria prepondera sobre o serviço e
incide o ICM.
que foi prolatado no RE 84 387, este
citado no acórdão impugnado, f. 186,
para fundamentar a concessão da
segurança.
II — Não conheço do recurso, é o
meu voto.
VOTO (PRELIMINAR)
O Sr. Ministro Clovis Ramalhete:
Senhor Presidente, entendo que na
obra gráfica encontra-se o fato gerador de imposto sobre serviço. Quando essa indústria repassa, com a
obra impressa, tal como os formulários oficiais, ela repassa um bem inNão é certo, pois, que o acórdão corpore°, uma resultante de obra inimpugnado haja ofendido as normas telectual. O papel, a tinta, apenas
federais a que se reporta, em seu re- dão suporte físico ã obra imaterial, e
curso extraordinário, o Estado de esta é a atividade mercantil dessa
indústria. 2 tal qual a música para a
Minas Gerais.
partitura, a música para o disco. O
Sim, porque o critério da utilidade fonograma e o papel com música impreponderante não é incompatível pressa, ambos são o suporte físico de
com as regras constitucionais e le- algo abstrato que fazem circular. A
gais definidas pelo Recorrente como atividade mercantil do industrial
gráfico não está na circulação do pavulneradas.
pel e da tinta, ainda que indispensáA tese do Fisco mineiro tem assen- vel a ela. Está na exposição à venda
to na literal aplicação dessas nor- da obra gráfica, obtida com papel e
mas, e não, como deve ser, pelo con- tinta, mas que é, em si, outra coisa,
siderar a finalidade perseguida por e é afinal o que se vende e o que se
quem as elaborou na inspiração de compra. Não há, portanto, fato gerador de imposto de circulação de
certa política tributária.
mercadoria, mas imposto sobre serRegistro que a controvérsia não viço, na atividade mercantil da inmerece atenção especial do STF, dústria gráfica. Bem andou a norma
porque a sua jurisprudência já se legal em dar-lhe esse tratamento trifirmou no adotar a mesma orienta- butário. — Acompanho V. Exa., não
ção que foi seguida pelo acórdão re- conheço do recurso.
corrido.
EXTRATO DA ATA
A eg. Procuradoria-Geral da República citou, no seu parecer que se
RE 93.053 — MG — Rel.: Min. Anacha transcrito no relatório, os acór- tonio Neder. Recte.: Estado de Midãos proferidos nestes casos: RE nas Gerais (Advs.: Maurício Ferrei92.927, RE 92.762, RE 92.761, RE ra de Carvalho, João Procópio de
92.161, RE 93.032.
Carvalho e outro). Recdos.: Libergráfica Editora Ltda. e outras (Advs.:
Outros precedentes podem ser Sylvio Oliván Neto e outros). e Grálembrados, como sejam os acórdãos fica Itacolomi Ltda. (Advs.: J. Milproferidos netes outros casos: RE ton Henrique, Carlos Augusto Jun91.562, RE 91.757, RE 92.138, além do queira Henrique e outro).
R.T.J. — 100
Decisão: Não se conheceu do recurso. Votação uniforme.
Presidência do Senhor Ministro
Antonio Neder. Presentes a Sessão
os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Mutioz, Rafael Mayer e
351
Clovis Ramalhete, SubprocuradorGeral da República, o Dr. Francisco
de Assis Toledo.
Brasília, 1? de maio de 1981 —
António Carlos de Azevedo Braga,
Secretário.
RECURSO EXTRAORDINARIO N? 93.108 — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves.
Recorrentes: Fibral S/A — Indústria, Comércio e Administração e outro
— Recorrida: Prefeitura Municipal de São Paulo.
Licença de construção. Indeferimento com base em critério da legislação municipal anterior que determinou, quanto a pedidos feitos
anteriormente a ela, que fossem examinados à luz da legislação vigente quando de sua apresentação.
Se a legislação local posterior determinou, como reconhece o
acórdão recorrido, que os requerimentos de licença de construção fosse:ri apreciados à luz da legislação vigente ao tempo de sua apresentação, não pode a Administração Pública sobrepor o seu critério de
avaliaçãO a esse respeito ao da própria lei.
Essa circunstancia afasta o argumento a fortIorl com base na
possibilidade de revogação de licença de construção, cuja obra não foi
iniciada, sob o fundamento de conveniência ditada pelo interesse póMoo, pois, neste caso, essa conveniência não foi apreciada nem afastada pela lei vigente.
Recurso extraordinário conhecido e provido.
ACORDA0
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os. Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, na conformidade da ata do
julgamento e das notas taqtrigráficas, por unanimidade de votos, conhecer do recurso e dar-lhe provimento.
Brasília, 07 cie novembro de 1980 —
Djaci Falcão, Presidente — Moreira
Alves, Relator.
RELATORIO
O Sr. Ministro Moreira Alves —
este o teor do acórdão recorrido (fls.
158/163):
Acordam, em Segunda Camara
Civil do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por votação
unânime, rejeitar as preliminares
de impossibilidade jurídica do pedido, de Ilegitimidade de parte e de
decadência e, no mérito, negar a
segurança.
Peter Muranyl Indústria e Comércio S/A, em dezembro de 1970,
apresentou à Municipalidade de
São Paulo projetos relativos à
construção de um conjunto de vários edifícios.
Os processos correspondentes, de
número 17.483 e 17.535/70, acabaram indeferidos pela Coordenadoria Geral de Planejamento —
352
R.T.J. — 100
Cogep — conforme despachos publicados no Diário Oficial do Município, de 24 de outubro a 21 de novembro de 1975, sob o fundamento
de que contrariavam o interesse
público, estando em desconformidade com as normas estabelecidas
na Lel n? 8.001/73, no Decreto n?
12.209/75 e na Instrução Normativa
Gogep 1/75.
Aduziram as informações, em
preliminares, a impossibilidade
jurídica do pedido, por reclamar a
aprovação do projeto; e a ilegitimidade de parte, por haver a impetrante vendido o imóvel ao assistente faltando-lhe, assim, interesse
de agir. Procuram, quanto ao mérito, sustentar a legalidade do ato.
Inconformada, a interessada ofereceu recurso à Comissão de Edificações e Uso do Solo (Ceuso) sem,
contudo, obter provimento, segundo publicação feita no Diário
Oficial do Município de 30.9.77.
A douta Procuradoria da Justiça
opinou no sentido de que houve decadência do direito de impetrar segurança e de que a impetrante é
realmente parte ilegítima. Quanto
ao mérito bateu-se pela denegação.
Essa decisão ensejou a interposição de dois recursos, desta feita ao
Sr. Prefeito Municipal: um, protocolado a 28.11.77, sob n? 159.459, e
outro, protocolado a 27 de dezembro de 1977, sob n? 167.563, ambos
já subscritos pela impetrante.
No primeiro recurso o chefe do
Executivo possibilitou o enquadramento da área denominada «AS»
na legislação atual, esclarecendo
que a decisão relacionada com a
outra parte do projeto, pertinente à
área «CD», seria objeto de apreciação e decisão em separado. O segundo recurso foi indeferido, sob o
fundamento de que «a construção
continua contrariando as normas
urbanísticas consubstanciadas nas
Leis n?s 7.805/72 e 8.001/73, justificando assim o seu indeferimento,
nos termos do Decreto n?
12.209/75» (DOM, de 17.1.79).
Daí a presente segurança, na
qual a impetrante e seu assistente
sustentam a ilegalidade do ato, e
pedem a entrega de uma das vias
das plantas com a devida aprovação ou, pelo menos, que se assegure seu direito de ver os projetos
examinados em consonância com a
legislação vigente ao tempo da
apresentação.
Inexiste a alegada impossibilidade jurídica do pedido, uma vez que
a pretensão da impetrante ficou
bem especificada na inicial. Consiste em obter, desde logo, a aprovação do projeto ou que lhe seja
assegurado o direito de vê-lo examinado segundo a legislação vigente ao tempo de sua apresentação.
Ainda que, quanto à primeira alternativa, realmente não fosse adequada a via eleita, pois o mandado
de segurança não transfere ao Judiciário as prerrogativas do Executivo, a segunda não contém defeito algum e encerra o fulcro da
questão. Se o impetrado indeferiu
em vigor, desde que se conclua pela inaplicabilidade desta, a solução
seria a anulação do ato, com o conseqüente exame desses projetos segundo a legislação pertinente. Esse
resultado é, em tese, juridicamente possível, faltando, assim, consistência à preliminar.
Igualmente deve ser afastada a
alegada ilegitimidade de parte.
Os projetos foram originariamente apresentados por Peter Muranyi Indústria e Comércio S/A,
pessoa jurídica da qual a impetrante Fibra S/A — indústria e
Comércio e Administração é suces-
R.T.J. — 100
sora. Aliás esta é que acompanhou
a maior parte da trem l itcaÇão dos
procedimentos administrativos, inclusive interpondo o recurso cujo
indeferimento ensejou esta impetração.
Pouco antes do ato impugnado a
Fibral vendeu o imóvel a Peter
Muranyi, transferindo-lhe todos os
direitos, inclusive o de edificar,
associando-se na realização do empreendimento, cabendo ao último
os ónus da execução e àquela os
resultados que virtualmente se verificarem.
Dai a razão por que aparece a
pessoa jurídica como impetrante e
Peter Muranyi como assistente.
A Municipalidade é estranha ao
negócio jurídico celebrado entre a
impetrante e seu assistente. Se
subsiste para aquela o Interesse na
aprovação do projeto, o único que
poderia se opor é o atual proprietário. Este, entretanto, ao contrário,
dá sua integral adesão, assistindo
processualmente à impetrante Essa reunião de interesses legitima a
impugnação.
A raciocinar como se fez nas informações, qualquer alienação anterior à aprovação do projeto de
construção tornaria prejudicado o
pedido; e se posterior à concessão
da licença impediria a edificação.
Não se verificou, outrossim, a
decadência do direito de impetrar
segurança conforme argumenta a
douta Procuradoria-Geral da Justiça.
O ato impugnado, no caso, foi publicado no Diário Oficial do Município de 17 de janeiro do corrente
ano, tendo sido ajuizado a impetração a 8 de maio.
Reconhece-se ser pacífico o entendimento de que o pedido de reconsideração não suspende nem in-
353
terrompe, o prazo decadencial, o
qual flui peremptoriamente a partir do ato lesivo.
Sucede, porém, que pedido de reconsideração é o que é dirigido à
própria autoridade que praticou o
ato, e não à que lhe é imediatamente superior. Desse modo, quando a legislação municipal autoriza
àquele que teve seu interesse desatendido pela autoridade subalterna
a dirigir «pedido de reconsideração» ao Sr. Prefeito Municipal, não
usou a expressão no sentido próprio, mas criou, na verdade, outra
instância administrativa, isto é,
mais um recurso, ainda que sem
efeito suspensivo.
Pode então o interessado, que
não está obrigado a esgotar a via
administrativa, desde logo reclamar ao Judiciário proteção correspondente ao direito violado, ou então, pedir reconsideração ao Prefeito, para depois, em caso de desatendimento, adotar aquela providência.
Os projetos indeferidos pela digna autoridade impetrada foram
apresentadas em dezembro de
1970, e consoante se infere do teor
da própria decisão impugnada, está conforme a legislação vigente
ao tempo em que foi protocolado.
A Lei n? 7.805, de 1972, porém,
modificou as condições de uso e
ocupação do solo no local das edificações projetadas. Assegurou, contudo, no art. 30, que «os expedientes administrativos, ainda sem
despacho decisório, protocolados
anteriormente à data da publicação da lel, que não se enquadram
nas disposições ora estatuídas, serão decididos de acordo com a legislação anterior». Posteriormente, a Lei n? 8.001, de 1973, repetiu
literalmente a norma, no art. 48.
354
R.T.J. — 100
Em perfeita coerência, estatuiu
o Decreto n? 11.106, de 1974, no art.
117: «os expedientes administrativos, ainda sem despacho decisório
protocolados anteriormente à data
da publicação da Lei n? 8.001, de
24.12.73 que não se enquadrem nas
disposições estatuídas nessa lei serão decididos de acordo com a legislação anterior».
O Código de Edificações do Município de São Paulo (Lei n? 8.260,
de 20 de junho de 1975), seguindo a
mesma linha de orientação, permitiu a opção pelo exame, em conformidade com a legislação anterior,
«de pedidos protocolados e numerados na Prefeitura até a data da
publicação desta Lei, ainda sem
despacho decisório ou com interposição de recurso dentro dos prazos
legais, referentes a licenciamentos
de construções...» (art. 567, I).
Não pode haver, portanto, a menor dúvida no sentido de que a legislação municipal tem assegurado, sistematicamente, o direito do
proprietário em ver seu projeto de
construção examinado em consonância com a norma vigente ao
tempo em que foi protocolado.
Sem embargo de tamanha clareza, o Decreto n? 12.209, de 9 de setembro de 1975, dispondo sobre pedidos de aprovação de plantas para construção ou edificação, estatuiu, no art. I?: «Os processos que
contenham pedidos de aprovação
de plantas para construção ou edificação, pendentes de decisão, serão apreciados à luz da legislação
vigente.»
A questão, porém, não se resolve
apenas nesse plano. Sucede que o
Colendo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário n? 85.002, rel. Min.
Moreira Alves, reconheceu, por
unanimidade de votos, que o direi-
to de construir não é mais do que
uma das faculdades jurídicas contidas no direito de propriedade, a
qual só pode ser exercitada quando
o Poder Público competente autoriza esse exercício, admitindo a revogação de licença para construção, ainda que deferida em conformidade com a legislação em vigor
e que o motivo seja mera conveniência (fls. 101/116).
O V Acórdão fez aplicação da
Súmula n? 473, segundo a qual pode a administração revogar seus
próprios atos, por motivos de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos. E ressaltou que direito adquirido só
existe quando a obra já tiver sido
iniciada.
Ora, se o Poder Público pode revogar seus atos, por mera conveniência, «a fortiori ratione», pode
deixar de conceder a autorização,
em nome do interesse público, tal
como se procedeu, no caso. Conforme decidiu este Egrégio Tribunal,
na Apelação Cível n? 258.781, de
São Paulo, «se a Administração pode, a todo tempo, fazer cessar as
obras particulares licenciadas,
que, por motivos supervenientes,
possam prejudicar o interesse público, revogando o alvará concedido, não se vê motivo para impedila de não conceder licença, desde
que esta não consulte o interesse
público» (fls. 128).
O que nessa hipótese se reserva
ao particular consoante se infere
das lições de Hely Lopes Meirelles
(Direito Administrativo Brasileiro,
pág. 171, 3? ed., RT, São Paulo,
1975) e Oswaldo Aranha Bandeira
de Mello (Princípios Gerais de Direito Administrativo, vol. I, pág.
567, Forense, Rio de Janeiro, 1969)
é o direito á reparação do dano.
Podia, portanto, a autoridade impetrada, ainda que atendidos os
R.T.J. — 100
pressupostos legais, indeferir a licença postulada pela interessada
em nome da conveniência ditada
pelo interesse público. Mas a Administração se sujeita ao dever de
indenizar, uma vez verificados os
pressupostos legais.
Ante o exposto, repelidas as preliminares, denegam a segurança.»
Interposto recurso extraordinário,
foi ele admitido pelo seguinte despacho (fls. 215/219):
rcI — Inconformada com ven.
acórdão de fls. 158/163, que denegou Mandado de Segurança impetrado contra ato do Prefeito Muni-
cipal de São Paulo, interpôs a recorrente o presente Recurso Extraordinário com fundamento no
art. 119, inciso Hl, letras a e d, da
Constituição Federal, alegando que
ven. acórdão recorrido vuinerou
art. 153, ff 2? e 3?, da Constituição Federal e art. 6? do Decreto-lei
Federal n? 4.657/42, divergindo,
ainda, de decisões proferidas pelo
evitando Supremo Tribunal Federal
(Recurso Extraordinário tf 88.4742).
Sustenta a recorrente que tinha
direito adquirido com o protocolamento dos projetos de construção
aludidos nos autos, uma vez que
estes estavam de acordo com a legislação então vigente, motivo pelo
qual não poderia ser revogado esse
direito por um simples decreto do
Poder Executivo.
II — O recurso foi impugnado pela Municipalidade de São Paulo,
que se manifestou peio indeferimento, porquanto a decisão recorrida limitou-se à aplicação de leis
municipais, não atingindo, em momento algum, qualquer disposição
constitucional ou lel federal.
III — O parecer da ProcuradoriaGeral da Justiça foi no sentido do
indeferimento, porquanto inocor-
355
reu ofensa a direito adquirido da
impetrante, uma vez que o Município não está obrigado a conceder alvará de construção, pleiteado
em consonância com a lei anterior,
quando, no ato da concessão do alvará, existe lei nova dispondo de
outra forma.
E o relatório.
IV — Os projetos de construção,
referidos na impetração e neste recurso, foram apresentados na Municipalidade em dezembro de 1970;
estavam eles elaborados de acordo
com a legislação municipal vigente
naquela época.
Em 1972, uma lei nova modificou
as condições de uso e ocupação do
solo no local das construções a serem levantadas, permitindo o art.
30 (lel n? 7.805) que os projetos ainda sem despacho decisório, protocolados anteriormente à lei nova,
fossem decididos de acordo com a
legislação anterior; isso mesmo foi
repetido pelo art. 48 da Lei n?
8.001, de 1973.
Contudo, o decreto n? 12.209, de
1975, estatuiu, em seu art. 1?, que
tais projetos seriam apreciados,
não á luz da legislação anterior,
como determinaram tais leis, mas,
sim, à luz da legislação vigente na
época de sua apreciação pelo Município.
Surge, então, a indagação formulada pelo acórdão recorrido e pelo
parecer do representante do Ministério Público, sobre se a autoridade municipal está obrigada a expedir o alvará de construção ou se
pode negá-lo, multo embora atenda
às normas regulamentares da época em que foi elaborado e apresentado à Municipalidade.
A resposta a esta indagação resolve o problema; o acórdão recorrido está fundamentado na tese es-
356
R.T.J. — 100
posada pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no acórdão prolatado no Recurso Extraordinário n?
85.002, de São Paulo, constante de
fls. 101 e seguintes, da lavra do
eminente Ministro Moreira Alves,
e no qual, apreciando os mesmos
dispositivos da legislação municipal, entendeu o Colendo Tribunal
que havendo sido expedida a licença para a construção e tendo sido
esta iniciada, a revogação da autorização ofendia o direito adquirido
pela impetrante em prosseguir na
construção; o eminente Relator
sustentou a tese de que, se a construção não foi iniciada, a licença já
concedida pode ser revogada, arcando a Municipalidade com a indenização porventura devida ao
prejudicado.
Mas, no Recurso Extraordinário
n? 88.474, o Colendo Supremo Tribunal Federal para não conhecer
do recurso, o eminente Relator
Djaci Falcão entendeu, em hipótese idêntica à dos autos, que a decisão recorrida, que concedera mandado de segurança à impetrante
para obter a expedição de alvará
de construção, simplesmente dera
razoável interpretação à legislação
local, ao reconhecer direito adquirido da impetrante à obtenção de
licença de acordo com a legislação
municipal anterior, mandava observar pelos arts. 30 da Lei n? 7.805
de 1972 e art. 48 da Lei n? 8.001, de
1973.
Face à indisfarçável divergência
na conceituação do direito adquirido na espécie, bem como a divergência jurisprudencial, defiro o
processamento do recurso. P. e L»
E o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator) 1. Conheço do recurso, porque
caracterizado o dissídio de jurisprudência com o RE 88.979, que, embora não conhecendo do recurso extraordinário então interposto (a
questão era a mesma, e a segurança
fora concedida), examinou o mérito
do litígio.
Passo, pois, a julgar a causa.
Entendeu o acórdão recorrido
que, não tendo sido iniciada a obra,
apesar de a licença ter sido concedida, esta pode ser revogada por motivo de conveniência ditada pelo interesse público, uma vez que não há
direito adquirido à autorização em
que se consubstancia a licença de
construção. E, com base nessa premissa — para a qual invoca o RE
85.002 de que fui relator —, argumenta, a fortiori, que, se o Estado
pode revogar licença já concedida
sem que a obra se haja iniciado, poderá também indeferir licença apenas requerida com base em vedações estabelecidas por lei nova, que,
no entanto, com relação aos requerimentos de licença já apresentados
antes dela, determinou fosse aplicado o regime da lei anterior.
A premissa de que partiu o acórdão é, a meu ver, correta (não há direito adquirido à licença, se a obra
não foi iniciada), mas não o é a conclusão fundada, equivocadamente,
no argumento a fortiori.
De fato, como salientei no voto que
proferi no RE 85.002, o denominado
direito de construir é simples faculdade jurídica — e não direito subjetivo —, faculdade essa que integra o
conteúdo do direito subjetivo de propriedade, e que, para ser exercitada,
depende de autorização (licença de
construção) pelo Poder Público competente. A licença, portanto, é mera
autorização para o exercido dessa
faculdade jurídica, e, enquanto esta
não for exercitada, com o inicio da
construção, daquela não nasce direi-
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to subjetivo — até porque não há direito subjetivo ao exercício de uma
faculdade que integra outro direito
subjetivo (o de propriedade) —,
pressuposto indispensável à existência de direito adquirido. Dai a razão
pela qual a licença, como simples
autorização que é para o exercício
de uma faculdade jurídica, pode ser
revogado por conveniência da Administração Pública, sem o obstáculo
do direito adquirido (que é o óbice
previsto na Súmula 473), embora se
admita a reparação do dano sofrido
pelo particular. E daí também a razão porque, no RE 85.002, não se admitiu a revogação de licença quando
a obra já se iniciou, uma vez que esta circunstância modifica a situação,
como acentuei naquele voto, verbis:
«Iniciada, porém, que seja a
obra autorizada, o problema muda
de feição, porquanto, neste caso,
há, inequivocamente, direito adquirido. Com efeito, tudo aquilo que
acede ao solo passa, por via de regra, a ser objeto do direito de propriedade do proprietário deste. Há,
pois, direito de propriedade sobre
a construção, ainda que apenas iniciada. E esse direito não pode ser
atingido por ato administrativo
que, com base em legislação nova,
vise a revogar a autorização em
virtude da qual se praticaram os
atos necessários a que ele surgisse.
Essa revogação é obstada pela
existência desse direito adquirido
(o direito de propriedade sobre a
construção). No caso, não há mais
uma simples faculdade jurídica
que pode ser exercitada porque o
ato administrativo de autorização
declarou a inexistência de qualquer restrição a esse exercício;
existe, sim, um direito subjetivo —
o direito de propriedade sobre 
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supremo tribunal federal revista trimestral jurisprudência