MAURÍCIO DE FRAGA ALVES MARIA
CRÔNICAS DA ALTA SOCIEDADE:
DISCURSOS, REPRESENTAÇÕES E COTIDIANO NAS COLUNAS SOCIAIS DO
JORNAL FOLHA DO OESTE
(GUARAPUAVA, PR, 1959-1964)
ASSIS
2011
MAURÍCIO DE FRAGA ALVES MARIA
CRÔNICAS DA ALTA SOCIEDADE:
DISCURSOS, REPRESENTAÇÕES E COTIDIANO NAS COLUNAS SOCIAIS DO
JORNAL FOLHA DO OESTE
(GUARAPUAVA, PR, 1959-1964)
Dissertação apresentada a Faculdade de
Ciências e Letras de Assis – UNESP –
Universidade Estadual Paulista para a
obtenção do título de Mestre em
História (Área de conhecimento:
História e Sociedade).
Orientadora: Profª. Drª. Flávia Arlanch
Martins de Oliveira
ASSIS
2011
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Bibliotecária: Milene Rosa de Almeida – CRB-8/ 8264
M332
Maria, Maurício de Fraga Alves.
Crônicas da alta sociedade : Discursos, representações e
cotidiano nas colunas sociais do jornal Folha do Oeste
(Guarapuava, PR, 1959 – 1964).
Assis : [s. n], 2011.
137 p. : il.
Dissertação (mestrado em História) – Faculdade de
Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, câmpus
de Assis.
Orientadora: Drª. Flávia Arlanch Martins de Oliveira
1. História – vida social e costumes. 2. Colunas sociais.
3. Elites. I. Título.
CDD 907.2
“Começava ela a ler o popular órgão carioca [Correio da
Manhã] pelas notas sociais. A seção de mundanismo, naquele
tempo, abrangia do aniversário ao obituário, informando tudo
sobre casamentos, festas, bailes, recepções falecimentos e missas.
Minha mãe explicava o seu interesse pela vida social como um
dos meios pelos quais volta e meia tinha notícia de amigas da sua
geração que se dispersaram depois que contraíram casamentos.”
(Jornalista Coelho Neto, citado por Marialva Barbosa em Os
Donos do Rio: Imprensa, poder e público. Rio de Janeiro: Vício
de Leitura, 2000, 202-203).
AGRADECIMENTOS
Agradecer a todos que estiveram envolvidos diretamente ou indiretamente a este
trabalho não é uma tarefa fácil. Alguns, mesmo que desconhecendo as motivações e questões
que levaram a realização desse trabalho foram fundamentais porque estiveram envolvidos na
minha vida de tal maneira que, sem sua participação, a realização deste não seria possível.
Desta forma, em primeiro lugar agradeço a minha família que, mesmo a distância, sempre
esteve presente em todos os passos da minha vida, me apoiando, me ajudando e me dedicando
um amor incondicional. È a minha mãe, Lucia, meu pai, João, minha irmã, Guga e a minha
sobrinha, Edooarda, que dedico este trabalho de coração. Agradecimento especial vai também
aos meus amigos Alexsandro Pedroso, Eliane de Proêncio (pai e mãe por carinho e adoção),
Messias Fontanive, Liniane Fontanive e Juliano Deitos que sempre muito me apoiaram. Para
a Universidade Estadual do Centro-Oeste, representada nos nomes das Professoras Márcia
Tembil, Beatriz Anselmo Olinto, Terezinha Saldanha e demais professores do Departamento
de História e do Centro de Documentação pelo apoio constante e incentivo que me dedicaram
nesses anos. À minha orientadora Flávia Arlanch Martins que me dedicou precioso tempo,
paciência e profissionalismo, me dando apoio em todas as dificuldades possibilitando a
realização deste trabalho. A ela de coração meu agradecimento e a certeza de que sempre a
admirarei. E finalmente à Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo, FAPESP,
que financiou este trabalho. A todos meus mais sinceros agradecimentos.
MARIA, Maurício de Fraga A. Crônicas da alta sociedade: discursos, representações e
cotidiano nas colunas sociais do jornal Folha do Oeste (Guarapuava, PR, 1959-1964). 2011.
137f. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de Ciências e Letras de Assis,
Universidade Estadual Paulista, Assis, 2011
RESUMO
O objetivo dessa dissertação será interpretar os discursos e representações presentes na coluna
social “Rumores Sociais”, editada entre 1959 e 1964 no periódico guarapuavano Folha do
Oeste. Neste percurso, buscamos compreender quem eram os seus produtores e quais as
estratégias utilizadas para difundir estes discursos entre as elites guarapuavanas, bem como a
que prática estes estavam ligados. A partir desse objetivo, poderemos perceber as
especificidades nas interpretações sobre as transformações vividas pela cidade tendo em vista
os sujeitos que as inscreveram. Analisando estas representações, poderemos perceber os
limites e papéis impostos pelas elites a si e aos demais integrantes do espaço urbano,
delimitando quais as atitudes aceitáveis, quais as depreciáveis e de que forma estabeleciam os
espaços a serem ocupados por cada grupo dentro da vida social citadina
PALAVRAS-CHAVE
Colunas sociais; elites; discursos; representações; cotidiano.
MARIA, Maurício de Fraga A. Chronicles of high society: discourses, representations and
everyday life in gossip columns of newspaper Folha do Oeste (Guarapuava, PR, 1959-1964).
2011. 137f. Thesis (MA in History) - College of Letters and Science of Assis, Universidade
Estadual Paulista, Assis, 2011
ABSTRACT
The objective of this dissertation is to interpret the discourses and representations in the
gossip column “Rumores Sociais”, published between 1959 and 1964 in the Guarapuava’s
newspaper Folha do Oeste. In this course, we understand who the producers and the strategies
used to disseminate these discourses among Guarapuava’s elites and the practice that
transformations experienced by the city in order that the subjects enrolled. Analyzing these
representations we realize the limits and roles imposed by the elites themselves and other
members of the urban space, limiting what actions acceptable, depreciable and which
established how the spaces to be occupied by each group within the city social life.
KEY-WORDS
Gossip columns; elites; discourses and representations; daily.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Mapas
Mapa nº 1 – Divisão Política do Estado do Paraná – 1940. 20
Fotos e periódicos
Figura 2 – Casa Comercial Missino s/d.......................................................................... 23
Figura 3 - Clube Guairá – s/d ........................................................................................ 24
Figura 4 – Teatro Santo Antonio s/d .............................................................................. 25
Figura 5 – Caminhões carregados de madeira na rua Senador Pinheiro Machado - 195728
Figura 6 – O Guayra 23 de Abril de 1898 (não mais redatoriado por Cleve)................ 36
Figura 7 – Antonio Lustosa de Oliveira - 1920 .............................................................. 37
Figura 8 – O Pharol - 30 de Julho de 1922 .................................................................... 38
Figura 9 – Programação do cine Guará 2 de setembro de 1962 ..................................... 51
Figura 10 – A esquerda, “Vinte anos de crônica social: Gilberto Tropowski – Jacinto de
Thormes” ; A direita “Crônica social de Jacinto0 de Thormes – O Cruzeiro................59
Figura 11 – “O beijo de Mangabeira” – O Globo, 1946................................................. 60
Figura 12– “Vida Social” – Jornal A Cidade, 03 de junho de 1934, p.4. ....................... 64
Figura 13 – Revista Flash, julho de 1985....................................................................... 67
Figura 14 – “Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 24 de maio de 1959. ......................... 69
Figura 15 – “Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 4 de dezembro de 1960. ................... 71
Figura 16 – “Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 18 de março de 1962. ....................... 72
Figura 17 – “Jacinto de Thormes apresenta Sociedade e Adjacências”, Ultima Hora, 17 de
setembro de 1961, p.11................................................................................................... 73
Figura 18 – “Ibrahim Sued Informa”, Diário Carioca, 31 de dezembro de 1963.......... 74
Figura 19 – “Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 3 de maio de 1964. ........................... 77
Figura 20 – “Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 28 de fevereiro de 1962.................... 76
SUMÁRIO
Introdução ...............................................................................................................................10
Capítulo I
Guarapuava: cotidiano e as mudanças do cenário citadino na segunda metade do século XX.
..................................................................................................................................................19
1.1 – Tempos de mudança: o fim da década de 1940 e as transformações no cenário
citadino .................................................................................................................................19
1.2. – Guarapuava e a década de 1950: um espaço de disputas. ..........................................31
1.3 – Observadores e difusores de idéias: os jornais em Guarapuava..................................33
Capítulo II
Na cidade rumores: colunas sociais e colunistas em Guarapuava............................................52
2.1 – As colunas sociais no Brasil: algumas considerações .................................................52
2.2 – “Rumores Sociais”: as colunas sociais em Guarapuava..............................................63
2.3 – O público leitor: diálogos e negociações.....................................................................80
Capítulo III
Crônicas da alta sociedade: discursos e representações nas colunas sociais do Folha do Oeste
..................................................................................................................................................96
3.1 – Importância: uma questão de ponto de vista ...............................................................97
3.2 – Moldando padrões, difundindo representações: os “Dez mais da sociedade
guarapuavana”. ...................................................................................................................103
3.3– Crônicas da Fidalguia: os limites da visibilidade social.............................................118
Considerações finais .............................................................................................................128
Relação de Fontes .................................................................................................................131
Referências bibliográficas....................................................................................................134
INTRODUÇÃO
O objetivo dessa dissertação será interpretar os discursos e representações
presentes na coluna social “Rumores Sociais”, editada entre 1959 e 1964 no periódico
guarapuavano Folha do Oeste. Neste percurso, buscamos compreender quem eram os
seus produtores e quais as estratégias utilizadas para difundir estes discursos entre as
elites guarapuavanas, bem como a que prática estes estavam ligados
Desta forma, entendendo-os como interpretes de seu momento, pretendemos
mostrar em que sentido os colunistas sociais contribuíram ou visualizaram as mudanças
sociais em Guarapuava na medida em que também difundiam novas representações e ao
mesmo tempo ratificavam as já estabelecidas socialmente.
A partir desse objetivo, buscamos perceber as especificidades nas interpretações
sobre as transformações vividas pela cidade na década de 1950 e os sujeitos que as
inscreveram. Neste período, as transformações desencadeadas após a chegada de grupos
madeireiros na cidade foram fundamentais na definição das transformações que
marcaram o espaço urbano guarapuavano pós 1950, tendo em vista que a presença de
tais madeireiros não apenas estimulou a chegada na cidade de novos contingentes
populacionais, mas também alterou as relações de poder, uma vez que estes, ao se
estabeleceram na cidade acabaram disputando politicamente e socialmente o poder com
as elites mais antigas. Entre estas antigas elites da cidade estava a denominada “elite
campeira”, um grupo de fazendeiros ligados familiarmente aos fundadores da cidade e
que por longo tempo hegemonicamente dominaram a política local.
Analisando as representações presentes na coluna “Rumores Sociais”, foi
possível também perceber os limites e papéis impostos pelas elites a si e aos demais
integrantes do espaço urbano, delimitando quais as atitudes aceitáveis, quais as
depreciáveis e de que forma estabeleciam os espaços a serem ocupados por cada grupo
dentro da vida social citadina. Portanto, ao observar estas práticas, levou-se em conta o
fato de “não haver prática ou estrutura que não seja produzida pelas representações,
contraditórias e em confronto, pelas quais os indivíduos e grupos dão sentido ao mundo
que é o deles”. 1
As balizas temporais foram delimitadas levando-se em conta o início e o fim da
publicação da coluna social “Rumores Sociais” (1959-1964), editada no maior e mais
1
CHARTIER, Roger. O mundo como representação. São Paulo: Estudos Avançados, 1991, p.177.
11
duradouro jornal guarapuavano, o Folha do Oeste.2
O jornal, criado em 28 de fevereiro 1937 pelo fazendeiro Antonio Lustosa de
Oliveira, foi o periódico que se manteve em circulação pelo maior tempo em
Guarapuava, sendo publicado por mais de 40 anos. Este jornal representava as
aspirações de seu fundador, bem como do grupo ao qual ele pertencia, a “Elite
Campeira” que, segundo Ruy Wachowicz, teve o início do seu declínio no fim do
século XIX, devido à queda das vendas de gado.3
Nessa perspectiva, estudar tais colunas sociais justifica-se na medida em que
essas não servem apenas à difusão de discursos ligados a grupos locais, mas também
podemos dialogar com discursos que circulavam em contextos mais amplos. Para este
estudo delimitamos nossas observações nos padrões de comportamento, estratégias
políticas de legitimação, ligadas as relações de poder e prestígio, vendo nesses fatores
aspectos fundamentais para a construção das identidades locais e regionais.4
Dessa forma o objetivo principal estabelecido para este trabalho foi analisar, no
período compreendido entre 1959 a 1964, as colunas sociais editadas nos jornais
guarapuavanos, bem como aspectos da produção jornalística da época, ou seja, procurar
interpretar os discursos enunciados pelos periódicos, as representações constituídas, os
conflitos em que estão inseridos bem como o papel que cada um deles desempenha
nestes.
Também se pretendeu refletir também sobre as representações criadas por esses
periódicos, com o objetivo de buscar detectar e analisar as peculiaridades nas relações
de poder, prestígio e construções identitárias em Guarapuava no período delimitado.
Nesta perspectiva, entendemos estas colunas sociais como campos de produção e
difusão de representações. Segundo Roger Chartier, percebemos que as representações
são “esquemas intelectuais incorporados que criam as figuras graças às quais o presente
2
Semanário publicado entre 1937 e 1981.
A elite campeira é, segundo Ruy Wachowicz, um grupo de fazendeiros criadores de gado que haviam
vindo da Província de São Paulo os campos paranaenses, constituindo-se nos grandes responsáveis pela
administração da Província, tendo seu em fins do séc. XIX, devido ao declínio nas vendas de gado (Cf.
WACHOWICZ, Ruy. História do Paraná. Curitiba: Imprensa Oficial, 2002, p. 84). Em Guarapuava,
este grupo é representado pelas famílias Lustosa, Camargo, Marcondes, Siqueira Cortes, Ribas, Chagas
Lima, Rocha Loures, entre outras, articulando-se na denominada “Tradicional Sociedade Campeira” (Cf.
MARCONDES, Gracita Gruber. Guarapuava: História de Luta e Trabalho. Guarapuava: Editora da
UNICENTRO, 1998, p. 68).
4
Para a discussão sobre identidades, adotamos a perspectiva apontada por Stuart Hall, entendendo as
identidades enquanto categorias imaginadas, ou seja, criadas por grupos com uma função social
específica, a de diferenciação HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 10. ed. Rio de
Janeiro: DP&A, 2005.
3
12
pode adquirir sentido”
5
, sendo que as representações do mundo social, assim
construídas, são sempre determinadas pelos interesses do grupo que as forjam, bem
como do lugar que estes as proferem, dentro de gestos, atos atitudes, práticas criadas por
este grupo. Nessa perspectiva, esta investigação pressupõe que as representações estão
em um campo de concorrências, de competições, fabricando respeito e submissão, cujos
desafios se enunciam em termos de “poder e de dominação”.
6
Ou seja, abre-se uma
dupla via em que se pensa a construção das identidades sociais como resultado sempre
de uma relação de força entre as representações impostas por aqueles que têm o poder
de classificar e de nomear. 7
Da mesma forma, as representações coletivas somente são verdadeiras quando
comandam atos, atitudes, práticas sociais, incorporando-se assim ao imaginário social
de determinado grupo. Constituído através das suas representações, o grupo exprime a
suas aspirações, justifica moral e juridicamente os seus objetivos, concebe o passado e
imagina o futuro8. Nesta perspectiva, o imaginário social é deste modo, uma das “forças
reguladoras da vida coletiva”. 9
Ainda neste enfoque, através do imaginário social, entendemos que o grupo
constrói sua identidade, se representa, fala sobre si e sobre os outros. Sistematiza os
papéis e posições sociais articulando, códigos de conduta, ou seja, designa modelos,
elegem “guardiões”, enunciadores de seus discursos.
O levantamento das fontes foi realizado Centro de Documentação e Memória da
Universidade Estadual do Centro-Oeste do Paraná (CEDOC/G - UNICENTRO),
localizado no Campus Santa Cruz, em Guarapuava, onde os periódicos estão localizados
em um acervo específico, catalogados e separados em encadernações anuais, divididas
por décadas e pelo nome do periódico.
Além disso, uma grande parte do acervo de jornais consultados que a princípio
estava localizada na Biblioteca Pública Municipal Antonio Ruiz de Montoya,
encadernados em edições anuais pelo proprietário do Jornal Folha do Oeste, Antonio
Lustosa de Oliveira, doados após sua morte em atendimento ao que fora estipulado no
seu testamento, encontrando-se também disponível no Centro de Documentação e
5
CHARTIER, Roger. História cultural: entre práticas e representações. Lisboa: DIFEL, 1990, p.17.
Idem – mesmo autor-Id.
7
CHARTIER, Roger. À beira da falésia: a história entre incertezas e inquietude. Porto Alegre: Ed.
Universidade/UFRGS, 2002, p.73.
8
BACZKO, Bronislau. A Imaginação social. In: ROMANO, Ruggiero. Enciclopédia Einaudi. Lisboa:
Imprensa Nacional, 1985, p.304.
9
Idem – mesmo autor, p.309.
6
13
Memória da UNICENTRO. Além disso, outras consultas foram necessárias no acervo
de documentação do Clube Guaíra, na Biblioteca da Universidade Estadual do CentroOeste, ambos também localizados em Guarapuava. Ainda, foi necessária a realização de
consultas aos jornais da Biblioteca Pública de Curitiba, PR, além do acervo online de
jornais do Arquivo Público do Estado de São Paulo.
No âmbito da metodologia de pesquisa, a coleta de dados nos jornais organizouse por meio de fichas padrão, onde foram relacionadas às várias informações de
interesse, permitindo a tabulação das informações, tais como menção de famílias
específicas, eventos noticiados, espaços de sociabilidade, entre outros, organizados
numericamente conforme o grau de incidência e relevância, contendo número
respectivo das edições e data.
De acordo com as pesquisas realizadas buscou-se mapear os processos históricos
vividos pela cidade, sobretudo atentando às transformações ocorridas no princípio da
década de 1950, procurando visualizar de forma mais panorâmica a situação da cidade
neste período.
Ainda, fez-se necessário o mapeamento e breve construção da tradição
jornalística da cidade, em especial, observando o lugar ocupado pelo jornal Folha do
Oeste, principal fonte para este trabalho. Nessa perspectiva, perceber quais as
características da produção jornalística da cidade, bem como as dificuldades
encontradas em se estabelecer uma imprensa em um local distante dos grandes centros e
do material necessário para a construção de um jornal foi observado no intuito de
perceber qual a proposta do jornal Folha do Oeste, quais suas características e suas
condições de produção. Desta forma, foi necessário levar em conta a conjuntura em que
estava inserido, quais eram seus emissores, quais interesses puderam ser identificados e
para que público era destinado. Portanto, pode-se perceber sua eficácia simbólica, tendo
em vista que derivam esta eficácia “do fato de que parecem encerrar em si mesmas o
princípio de um poder que reside efetivamente nas condições institucionais de sua
produção e de sua recepção”. 10
Em seguida, tentou-se observar as colunas sociais na cidade, qual o lugar que
elas ocupavam nos jornais locais, em que sentido e sob que medida essas colunas
buscavam atualizar-se com os grandes centros, no conteúdo, na estética, e até que ponto
isso era possível e quais as dificuldades características deste tipo de publicação na
10
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas lingüísticas: o que falar quer dizer. Trad. Sérgio Miceli.
São Paulo: EDUSP, 1998, p.91.
14
cidade de Guarapuava. Assim, para realizar tal empreitada, foi necessário compreender
como se deu a publicação das colunas sociais em Guarapuava, buscando captar seus
pontos de vista e levantar as condições históricas de sua produção. Desta forma, ao
observar tal tipo de publicação tentou-se perceber quais seus limites, com que discursos
dialogavam, qual o seu lugar social de produção em meio ao cotidiano guarapuavano,
percebendo esse cotidiano como dinâmico, lugar de ação onde os personagens estão em
constante conflito e negociação.
Com relação as colunas sociais, estas ainda configuram-se como fontes pouco
exploradas pelos historiadores, tendo em vista que estes a pouquíssimo tempo têm
voltado seu olhar para a possibilidade do uso das mesmas como fontes históricas. Dessa
forma, raros são os trabalhos de historiadores utilizando as referidas fontes, sendo que
grande parte das análises encontradas foram produzidas por jornalistas. Daí a decorrente
especificidade dos trabalhos, mais preocupados com as características estéticas da
produção das colunas do que com os discursos e representações por elas difundidas.
Entre os pesquisadores, pode-se apontar para os jornalistas Murilo Cesar Ramos
e Davi Emerich, que analisaram as colunas sociais cariocas nos respectivos capítulos
“Intrigas da corte: Jornalismo político nas colunas sociais” e “O beijo de Mangabeira –
o jornalismo político das colunas de notas”, publicados no livro organizado pelo
também jornalista Luiz Gonzaga Motta, intitulado Imprensa e Poder
11
. Dedicados à
reflexão sobre a política nas colunas sociais brasileiras a partir da década de 1970, onde,
segundo estes autores, pouco vigiadas pela ditadura militar, identificou-se o
desenvolvimento de um jornalismo político próprio das colunas sociais. Como pequenas
fofocas, a política e alguns dos principais personagens políticos brasileiros do período
ditatorial brasileiro pós 1964, eram alvo de críticas, elogios, e diversos comentários que
passavam despercebidos à censura imposta, sobretudo após 1968 com a instituição do
AI-5. Colunistas como Joyce Pascowitch, Nirlando Beirão, Swann/Ricardo Boechat,
Ibrahim Sued, Zózimo Barroso, Marcone Formiga e Gilberto Amaral, Ancelmo Góis e
Joaquim Ferreira dos Santos, do O Globo e Márcia Peltier do Jornal do Brasil são por
estes autores reconhecidos como figuras importantes do jornalismo político pós-1964.
Referenciados por Rogério Martins de Souza 12 (2006: s/p; 2007: s/p), os últimos
11
MOTTA, Luiz Gonzaga (org.). Imprensa e Poder. Brasília: Editora da Universidade de Brasília; São
Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 2002 (coleção comunicação).
12
SOUZA, Rogério Martins de. A sedução do colunismo: uma análise das colunas de Ancelmo Góis e
Ricardo
Boechat.
Disponível
em:
<http://reposcom.portcom.intercom.org.br/dspace/bitstream/1904/17065/1/r06901.pdf>. Acesso em: 15
15
três colunistas tem recebido grande atenção nos vários artigos publicados desde 2005
por esse jornalista que tem buscado “estudar as razões e motivações históricas que
levaram o jornalismo brasileiro a investir ostensivamente em colunas de notas” em seu
doutorado na Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Para Souza, também não se pode esquecer, mesmo que em São Paulo,
comparado com o Rio de Janeiro, a tradição do colunismo social seja menor, as colunas
de Mônica Bergamo, no jornal Folha de S.Paulo – que dedica uma das duas colunas que
compõe sua crônica social a política e a economia –, e as de Cesar Giobbi, em O Estado
de S. Paulo, que atualmente, segundo o autor, são sucesso entre os leitores.
Outro trabalho a ser referenciado é o livro da jornalista Iluska Coutinho
Colunismo e poder: representação nas páginas de Jornal
13
, onde a autora procurou
identificar as representações e os discursos políticos em torno da publicação da coluna
social “Victor Hugo”, do jornal capixaba A Gazeta, de Vitória, criada há 18 anos,
assinada pelos colunistas Maura Fraga, Luiz Trevisan e em 2007 pelo jornalista Sérgio
Egito. Em geral, estes trabalhos, como afirmado, são pautados na intenção de perceber o
papel desempenhado pelas colunas sociais em meio a imprensa brasileira pós década de
1950, buscando mapear o estilo desenvolvido bem como algumas das temáticas
presentes neste tipo de publicação.
Mesmo que o interesse neste tipo de publicação ainda seja pequeno entre os
próprios jornalistas, alguns esforços em organizar tal tipo de documentação acaba
acontecendo esporadicamente. Um exemplo deste tipo de trabalho é a seleção das
crônicas escritas e publicadas pelo colunista Ibrahim Sued em livro organizado por sua
Filha Isabel Sued e pela jornalista Isabel Travancas, intitulado “Ibrahim Sued: em
sociedade tudo se sabe
14
, que conta também com prefácio de um antigo auxiliar de
Ibrahim Sued e hoje conhecido jornalista Elio Gaspari.
Entre os historiadores ainda é pequena a utilização das colunas sociais. Entre os
trabalhos que as utilizaram, mesmo que brevemente, está o livro de Ana Luiza Martins
mai. 20007; SOUZA, Rogério Martins. Colunistas entre o sim e o não: o referendo sobre as armas de fogo
segundo as colunas de notas de jornais cariocas. In: Anais do Congresso Brasileiro de Ciências da
Comunicação, n. 29, 2006, Brasília. São Paulo: Intercom, 2006; SOUZA, Rogério Martins. O cavalheiro
e o Canalha: Maneco Muller, Walter Winchell e o apogeu dos colunistas sociais após a Segunda Guerra
Mundial. In: Revista Pauta Geral, Vol. 1, n. 9, Florianópolis, 2007.
13
COUTINHO, Iluska. Colunismo e poder: representação nas páginas de Jornal. Rio de Janeiro: Editora
Sotese, 2005.
14
SUED, Isabel (org.). Ibrahim Sued: em sociedade tudo se sabe. Rio de Janeiro: Rocco, 2001.
16
intitulado Revistas em revista: imprensa e práticas culturais em tempos de República 15,
que busca examinar as revistas publicadas em São Paulo no início da República, onde a
presença das colunas sociais ainda iniciava-se.
Outro trabalho que abordou brevemente a temática das colunas sociais é a tese
defendida no programa de história da Universidade Federal Fluminense pela jornalista
Marialva Barbosa intitulado Os donos do rio: imprensa, poder e publico
16
, que
buscando examinar as publicações e o público leitor no Rio de Janeiro do início do séc.
XX acaba apontando para a presença das colunas sociais entre a publicação dos
periódicos da capital carioca.
Alem dos trabalhos referenciados, o historiador Nicolau Sevcenko também se
utilizou das crônicas e dos relatos de cronistas sociais da década de 1920, buscando
perceber como estas visualizaram as transformações ocorridas na cidade de São Paulo,
em Orfeu extático na metrópole: São Paulo, sociedade e cultura nos frementes anos 20
17
.
No Paraná, podemos destacar o artigo escrito pelo historiador e professora José
Henrique Rollo Gonçalves, da Universidade Estadual de Maringá, intitulado Escavando
o chão da futilidade18 e publicado na Revista de História Regional, da Universidade
Estadual de Ponta Grossa – PR, que trata especificamente de algumas das colunas
sociais produzidas no Norte do Paraná. Neste trabalho, Gonçalves traça algumas
anotações essencialmente metodológicas sobre esta temática. O autor, além de apontar
para a pouca ou nenhuma utilização desta tipologia de fontes pelos historiadores,
demonstra o material fornecido por essas sobre a vida cotidiana das classes dominantes,
indicando preferências, modas e padrões de conduta que, em muitos casos, não
demoravam a ser redefinidos ou disseminados por outros segmentos sociais. Ainda
nessa reflexão, Gonçalves aponta também para a existência de critérios de demarcação
existentes e limites colocados para poder se integrar aqueles meios, juntamente a
interação entre os grupos e ciclos de prestígio.
Para essa missão, o autor elencou alguns jornais para sua investigação empírica,
15
MARTINS, Ana Luiza. Revistas em Revista: imprensa e práticas culturais em tempos de República,
São Paulo (1890-1922). São Paulo: EDUSP: FAPESP: Imprensa Oficial do Estado, 2001.
16
BARBOSA, Marialva. Os donos do Rio: imprensa, poder e público. Rio de Janeiro: Vício de Leitura,
2000.
17
SEVCENKO, Nicolau. Orfeu extático na metrópole: São Paulo, sociedade e cultura nos frementes
anos 20. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
18
GONÇALVES, José Henrique Rollo. Escavando o chão da futilidade: colunas sociais, fontes para o
estudo de elites locais. In: Revista de História Regional, Universidade Estadual de Ponta Grossa, Pronta
Grossa, PR, v. 4, 1999, p.35-59
17
tais como a Tribuna do Norte (Apucarana, PR); O Diário do Norte do Paraná e O
Jornal do Povo (Maringá, PR); a Folha de Londrina, Folha do Paraná e o Jornal de
Londrina (PR); o Jornal do Paraná (Cascavel, PR); Oeste Notícias (Presidente
Prudente, SP) e A Voz da Terra (Assis, SP), demonstrando que, mesmo que de forma e
abrangência diferentes, tais jornais, bem como as colunas sociais neles editadas,
possuíam fortes vínculos com as cidades em que foram criadas, “contendo farto
material empírico para os pesquisadores das relações sociais em âmbitos locais”
19
.
Como fontes para a percepção das atitudes e das práticas cotidianas dessas elites locais,
segundo Gonçalves o papel dessas colunas vai além, podendo servir como uma fonte
importante para a percepção das disputas políticas locais.
Ainda, utilizando as colunas sociais como fonte pode-se também destacar a
dissertação de mestrado defendida em 2009 por Rafael Damaceno Dias, no Programa de
Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Paraná. Este trabalho, intitulado
Que invasão é essa? Leituras sobre conflitos socioculturais em Florianópolis (1970 2000)
20
buscou perceber através de fontes como as colunas sociais, publicadas no
respectivo período, a visão dos seus escritores sobre as mudanças vividas pela cidade
desencadeadas pela chegada de grupos vindos “de fora”. Segundo o autor, o sentimento
de nostalgia e a forte crítica aos moradores vindos do continente para a ilha era uma das
constantes nas colunas sociais dos periódicos de Florianópolis, interpretando a chegada
deste contingente populacional como uma invasão degradante da vida social na capital
catarinense.
O levantamento desta bibliografia foi fundamental para perceber as perspectivas
quanto a esta documentação, seus usos e características, a fim de compreender as
especificidades regionais.
Dessa forma, procurando perceber tais especificidades, no primeiro capítulo
optamos por tentar captar as transformações vividas pela cidade em décadas anteriores a
de 1950, buscando contemplar os processos históricos vivenciados pela cidade e que
acabaram desencadeando-se no cenário urbano visualizado no período de recorte da
pesquisa. Dessa forma, nesse breve retorno, procurou-se estabelecer as bases para as
transformações vividas pela cidade que a moldaram, dando lhe a forma presente nos
relatos dos colunistas das décadas seguintes. Como se deram estas transformações?
19
GONÇALVES, José Henrique Rollo. Op. Cit., v. 4, 1999, p.35.
DIAS, Rafael Damaceno. Que invasão é essa? Leituras sobre conflitos socioculturais em Florianópolis
(1970-2000). 2009. 137f. Dissertação (Mestrado em História), Universidade Federal do Paraná, Curitiba,
2009.
20
18
Quais as disputas delas decorrentes? E qual o papel desempenhado pelos periódicos
guarapuavanos em meio a esse cotidiano? Foram algumas das questões presentes nesse
primeiro capítulo.
No capítulo seguinte tentamos compreender a publicação das colunas sociais no
contexto brasileiro pós década de 1950, buscando perceber suas formas e discursos.
Dessa forma, partindo dos grandes centros para Guarapuava, buscou-se perceber as
especificidades e as condições de sua produção em meio aos periódicos guarapuavanos,
qual o seu formato, o espaço conquistado e a relação que estas estabeleceram entre si e
com o seu público leitor.
Por fim, no terceiro capítulo procuramos perceber estas colunas sociais enquanto
crônicas da alta sociedade, como difusoras de discursos que definiam noções como a de
importância, quais os papeis estabelecidos, códigos de conduta, modelos a serem
seguidos que moldavam as práticas cotidianas entre as elites guarapuavanas, apontando
para os limites por estes impostos no cenário citadino, seus espaços particulares e/ou
espaços apropriados e seus ideais.
19
CAPÍTULO I
Guarapuava: cotidiano e as mudanças do cenário citadino na segunda metade do
século XX
A preocupação da sociedade guarapuavana em consumir e se
comportar de acordo com os padrões de cidades maiores, a
exemplo do Rio de Janeiro, ilumina a compreensão de que se
estava frente à construção de uma nova dinâmica urbana que
buscava estar em sintonia com a vida moderna
(TEMBIL, Márcia. Em busca da cidade moderna: Guarapuava – recompondo
histórias, tecendo memórias. Guarapuava: UNICENTRO Editora, 2007, p.76)
1.1 – Tempos de mudança: o fim da década de 1940 e as transformações no cenário
citadino
O fim da década de 1940 anunciou para Guarapuava a chegada de ventos de
mudança para a cidade que a mais de um século havia se formado no terceiro planalto
paranaense, decorrente dos processos de ocupação do Oeste do Paraná, então
pertencente à província de São Paulo.
No início da referida década, a cidade de Guarapuava ainda lembrava em muito
a “Freguesia” que havia surgido no interior dos antigos “Campos de Guarapuava” por
volta de 1810, território localizado na região do atual terceiro planalto paranaense e que
se estendia até a fronteira com o território de ocupação espanhola.
Distante dos grandes centros, inclusive da capital paranaense, a cidade
sustentava-se economicamente do extrativismo da erva-mate, da madeira, e do
desenvolvimento da agricultura e da pecuária. Integrando uma região de riquíssimos
pastos e constituindo-se em uma passagem quase obrigatória no transporte de muares e
do gado vindo do Rio Grande do Sul para São Paulo. Desta forma, os fazendeiros locais
enriqueceram com a prática da invernada e da criação de gado.
20
Mapa nº1 – Divisão Política do Estado do Paraná – 1940.
Fonte: ABREU, Alcioly Therezinha Gruber. A Posse e o Uso da Terra: Modernização
Agropecuária de Guarapuava. Curitiba: Biblioteca Pública do Paraná/Secretaria de Estado da
Cultura e do Esporte, 1986, p.370.
Nesse sentido, o empenho do governo português em ocupar a região dos
“Campos de Guarapuava”, deveu-se, segundo Silva21 de um lado à sua posição
estratégica em relação a proximidade com a fronteira das colônias espanholas, fronteira
ainda não firmemente delimitada e, de outro, à expansão da atividade tropeira no atual
espaço paranaense que dava suporte à mineração do ouro. Segundo a autora,
a expansão da sociedade campeira para o terceiro planalto através do
sistema de sesmarias deu origem às propriedades da região e ao
modelo de ocupação inicial. A sociedade que se instalou na região
dedicou-se à lavoura de subsistência, à pecuária extensiva e á
extração da erva mate. 22
21
SILVA, Joseli Maria. Processos econômico-sociais regionais e seus impactos sobre a estrutura urbana
de Guarapuava-PR. In: Revista de História Regional, Universidade Estadual de Ponta Grossa, Pronta
Grossa, PR, vol. 2, nº1, 1997, p.12.
22
Idem – mesmo autor, p.12.
21
Desta forma, o sucesso efetivo da atividade pecuária na região se deu com a
inauguração do “Caminho das Missões”, ligando o Rio Grande do Sul ao mercado de
Sorocaba na província de São Paulo23. A inauguração de tal estrada possibilitou superar
em parte a posição “insular” da cidade de Guarapuava, inaugurando o que a historiadora
Márcia Tembil chamou de “Idade de Ouro” na história da cidade, uma vez que
favoreceu as transformações da vida modesta na cidade e das fazendas dispersas pelo
vasto território 24.
A modesta antiga “Freguesia de Nossa Senhora de Belém” viu-se ascender ao
posto de Vila ainda no início da segunda metade do século XIX. Em 1871, a vila
tornava-se cidade e passou a desfrutar das benesses da atividade tropeira, visualizada,
segundo Tembil, nos frondosos casarões dos fazendeiros que se erguiam na porção
central da cidade
25
. A cidade, com novos contornos, passou a abrigar hábitos de
consumo e socialização que cresciam à medida que se ampliava o número da população,
refletindo também os lucros obtidos pelos fazendeiros, mesmo que esses ainda
permanecessem grande parte de seu tempo nas fazendas.
Entretanto, com o declínio da atividade tropeira, entre o final do século XIX e as
primeiras décadas de século XX, a sociedade campeira que havia se estabelecido na
região começa a se desagregar. Nesse sentido, a Guarapuava do início da década de
1940 ainda vivia uma situação de crise da atividade pecuária, que havia substituído a
atividade tropeira na região ainda no início do século XX.
Quanto às atividades extrativas, principalmente as que haviam se desenvolvido
paralelamente a atividade tropeira como a extração da erva-mate ainda garantia certa
estabilidade na economia local, tendo em vista que o governo paranaense buscou
promover a abertura de estradas para o escoamento deste produto. Porém, mesmo com
as grandes reservas do produto existentes na região, os lucros ainda ficavam com os
comerciantes de Curitiba e Paranaguá que faziam o beneficiamento da erva-mate. Tendo
isso em vista, a comercialização da erva-mate em Curitiba e Paranaguá não permitiu a
23
TEMBIL, Márcia. Em busca da cidade moderna: Guarapuava - recompondo histórias, tecendo
memórias. Guarapuava: Editora da UNICENTRO, 2007, p.73, e SILVA, Joseli Maria. Processos
econômico-sociais regionais e seus impactos sobre a estrutura urbana de Guarapuava-PR. In: Revista de
História Regional, Universidade Estadual de Ponta Grossa, Pronta Grossa, PR, vol. 2, nº1, 1997, p.1213.
24
Idem, mesmo autor, p.73.
25
Idem, mesmo autor, p.74.
22
retenção de capitais em Guarapuava 26.
A outra atividade extrativa vegetal da região foi a exploração da madeira.
Praticada em pequena escala nas décadas anteriores, esta atividade, a partir de 1940
passou a ganhar impulso com a mão-de-obra abundante, advinda, sobretudo, da
produção ervateira e com o desenvolvimento das novas redes viárias dela decorrentes.
A estrada de ferro, que em 1937 chegou até a cidade de Irati, distante
aproximadamente 100 km de Guarapuava, contribuiu para o transporte da madeira,
complementada pela utilização dos caminhões. Porém, devido às dificuldades
encontradas em se transpor a “Serra da Esperança”, localizada entre Irati e Guarapuava,
a chegada da estrada de ferro demorou mais de uma década, ou seja, apenas em 1954,
embora o terminal ferroviário já estivesse pronto na década de 1940.27 Desta forma, a
espera da chegada da estrada de ferro representou por décadas o desejo de ver a cidade
inserida no contexto de crescimento das grandes cidades brasileiras, buscando assim
superar aquele momento de crise.
A freqüência e a variedade das atividades sociais e culturais que em tempos de
maior
riqueza
aconteciam
no
cotidiano
da
cidade
passaram
a
diminuir
progressivamente, devido ao quadro de crise econômica das elites locais. Até a década
de 1930, quando os fazendeiros ainda desfrutavam das rendas acumuladas durante
períodos de maior lucratividade, a cidade havia, segundo Tembil desfrutado da presença
de alguns dos elementos que “encarnavam” o sentido de urbanidade e progresso, como
os automóveis, artigos de luxo, gramofones, o rádio e as máquinas de sorvete. A
intensificação da vida social na cidade durante o final do século XIX e início do século
XX haviam alterado os hábitos da população citadina, sobretudo entre a elite campeira,
que passou a cultivar padrões de sociabilidade encontrados nos grandes centros,
estimulando o consumo de produtos antes apenas encontrados nestas cidades.28
Firmas como a Casa Missino, um dos primeiros estabelecimentos comerciais e
bancários da cidade, abasteciam a elite campeira com os produtos requintados que
representavam uma forma de ligação dos habitantes da distante cidade, ainda mais
isolada nos períodos chuvosos, com o estilo de vida dos grandes núcleos urbanos:
As vitrines e variedade de produtos num mesmo estabelecimento
colocavam Guarapuava, que até então vivia insulada, em sintonia
26
Idem, mesmo autor, p.89.
Idem, mesmo autor, p.96.
28
Idem, mesmo autor, p.77.
27
23
com as idéias que compunham o senso de progresso difundido no
Brasil em fins do século XIX e nas primeiras décadas do século
XX.29
Figura 2 – Casa Comercial Missino s/d
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G).
Símbolo do progresso vivido pela elite campeira em sua “época dourada”, a
Casa Missino também sobreviveu aos períodos de crise, porém, cedeu espaço as novas
dinâmicas urbanas surgidas na década de 1960, sendo demolida e transformada em
estacionamento30.
Além dos padrões de consumo surgidos nos anos de poderio econômico da elite
campeira, espaços reservados a atividade social e cultural surgiram na cidade, entre eles
o Clube Guaíra, criado em 1904 e com sede inaugurada em 1909 31. O Clube tornou-se
palco nos dos principais festejos, bailes, sabatinas de arte e concertos da cidade32. O
“Aristocrático”, como era conhecido na cidade, era o ponto de encontro da elite
campeira guarapuavana. Ali, além das atividades sociais comuns em agremiações da
29
Idem – mesmo autor-Id.
Idem, mesmo autor, p.77.
31
Idem, mesmo autor, p.31.
32
Idem, mesmo autor, p.80.
30
24
época como bailes e carnavais, eram realizadas reuniões e palestras onde se reuniam a
liderança política da cidade.
Mesmo em períodos de crise o clube sobreviveu e continuou abrigando grande
parte das atividades sociais da elite citadina como descreve o senhor Luiz Cleve
Teixeira:
Na noite de 18 de janeiro de 1936 o Clube Guairá abria seus sacões
para mais um grandioso baile, o qual teve a denominação de Baile
Zíngaro com os trajes a caráter, e como não poderia deixar de ser foi
um sucesso sem precedentes [...]. Ainda neste mesmo ano, no mês de
setembro, era efetivado o Baile da Primavera, no qual compareceu
quase a totalidade de associados do clube. Durante o evento foram
eleitas a Rainha e Princesa entre as inúmeras senhoritas presentes,
sendo eleita a Rainha da Primavera. 33
No ano de 1942 o Clube ainda se uniu ao Cassino Guarapuavano, entidade
surgida em décadas anteriores de uma dissidência de alguns sócios do Clube Guaíra,
devido à oposição política entre Pica Paus e Maragatos no período da Revolução
Federalista que se disseminou entre os estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e
Paraná.
Figura 3 - Clube Guairá – s/d
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G)
33
TEIXEIRA, Luiz Cleve. Reminiscências do passado. Guarapuava: Esquema Edições e Artes Gráficas,
1993, p. 31-32.
25
A construção imponente, vista na foto anterior, é fruto do período de apogeu da
atividade pecuária. Nesse sentido, os freqüentadores do clube, sobretudo até a década de
1940, era a elite campeira bem como suas famílias.
Além do clube, segundo Tembil
34
, outros espaços passaram a compor a vida
social da cidade, o Teatro Santo Antônio, era palco, além das peças de teatro, também
para conferências e sessões musicais. Com vários camarins, cento e vinte assentos e oito
camarotes o Teatro Santo Antonio representava, um ícone moderno para a cidade ainda
erigido no final do século XIX
35
. Porém, o clube não resistiu os períodos de crise que
se seguiram ao declínio econômico da elite campeira da cidade, sendo destruído na
década de 1940.
Figura 4 – Teatro Santo Antonio s/d
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G).
Além do comércio de produtos considerados modernos, do clube e do teatro,
palcos de acontecimentos sociais reservados a elite fazendeira, na cidade também
34
35
TEMBIL, Márcia. Op. Cit., 2007, p.81.
Idem – mesmo autor-Id.:.
26
aconteciam os festejos da religião católica, principalmente os ligados a Nossa Senhora
de Belém, padroeira da cidade. As procissões, os festejos religiosos e as missas
integravam a vida social cotidiano mesclando as novas formas de sociabilidade as mais
antigas e tradicionais, movimentando socialmente a cidade.
É nesse período de apogeu cultural, no início do século XX que a cidade vê
também a substituição dos lampiões pela energia elétrica, fruto das novas necessidades
locais no sentido de acompanhar a modernização em voga no país, que entre outros
benefícios, possibilitou a instalação do cinema mudo, apresentado no mesmo local do
Teatro, também chamado de Cine Santo Antonio. 36
Porém, como apontado anteriormente, estas práticas ver-se-iam enfraquecidas ao
mesmo tempo em que a desarticulação das atividades econômicas então dominantes na
cidade. A crise econômica que se faria presente na cidade entre as décadas de 1930 e
1940, fariam com que lugares como o Teatro e Cinema Santo Antonio fossem fechados
37
. O Cine Pimpão, criado alguns anos depois e que por alguns anos representou um
importante espaço de diversão do guarapuavano também fechou. Em termos culturais o
fim destes espaços de sociabilidade impôs à cidade um cenário bastante desolador.
No fim da segunda década do século XX, Guarapuava passou ainda mais a sentir
os indícios da decadência da elite fazendeira, com reflexos em sua vida social. “Afinal,
de acordo com Balhana, ‘a cidade existia em função das fazendas de criação de gado e
do movimento das tropas de muares que vinha do sul de Sorocaba’”.38 Dessa forma, a
década de 1940 apresentou, devido a crise da sociedade campeira na região, o
enfraquecimento das atividades sociais de elite, tornando algumas esporádicas e
forçando o desaparecimento de outras.
Nessa perspectiva, entende-se a ansiedade pela chegada da estrada de ferro em
Guarapuava, tendo em vista que a mesma viabilizou o escoamento de produtos e
dinamizou o comércio, entendida pelos membros da elite como uma forma de vencer a
estagnação e progredir.
Para Guarapuava dos anos de 1920 a 1950, significava, antes de tudo,
o renascimento. Sua população, que havia adquirido hábitos de
consumo mais exigentes, não queria mais se submeter ao ostracismo
a que era relegada a antiga Freguesia de Nossa Senhora de Belém. A
‘antiga elite’ guarapuavana, que se ressentia da perda de poder
36
Idem, mesmo autor, p.86.
Idem, mesmo autor, p.87
38
Idem – mesmo autor-Id.
37
27
aquisitivo e das condições de vida da ‘idade de ouro’ da cidade,
passou, então, a veicular um discurso que traduzia o desejo de ver
Guarapuava novamente em sintonia com os ideais da modernidade. 39
Neste ambiente apresentado em fins da década de 1940, não eram apenas os
problemas de acesso a cidade, a decadência econômica das elites fazendeiras que
relegavam a cidade a certo “ostracismo”. A ausência de capitais mobilizáveis instituía
também a crise da economia guarapuavana. 40
Sob esse prisma, a atividade madeireira que, como descrita anteriormente até a
década de 1940 representava uma pequena atividade na região, tornou-se, a partir
daquele momento em uma atividade econômica responsável pelo capital necessário a
dinamização das atividades econômicas na região. Com o aumento do grupo de
madeireiros instalados na região a partir de 1940 e com as iniciativas do governo em
aumentar e melhorar a rede viária paranaense esta atividade tornou-se extremamente
rentável, tendo em vista que Guarapuava detinha uma das maiores reservas florestais do
Paraná.
Atraindo madeireiros de outras regiões do país, essa atividade impulsionada no
contexto de substituição de importações efetivadas pelo governo brasileiro na política
de industrialização iniciada após a Primeira Guerra Mundial,41 acabou por reunir o novo
contingente que compôs outra “elite” na cidade, tendo em vista que, uma vez que não
faziam parte da antiga classe dominante guarapuavana, composto por membros da
sociedade campeira.
A presença, então, desse novo segmento modificou substancialmente as relações
de poder e conseqüentemente as relações sociais da cidade42·. Papel importante dessa
nova elite foi propiciar uma reurbanização de Guarapuava na década de 1950.
39
Idem – mesmo autor-Id.
Idem – mesmo autor-Id.
41
TAVARES, Maria da Conceição. Da substituição de importação ao capitalismo financeiro. 2 ed.
Rio de Janeiro: Zahar, 1973, p.73.
42
TEMBIL, Márcia. Op. Cit., 2007, p.92.
40
28
Figura 5 – caminhões carregados de madeira na rua Senador Pinheiro Machado 1957
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G)
As serrarias geralmente não integravam o cenário citadino, tendo em vista que se
compunham em núcleos distantes de povoamento irregular e temporário fora do
perímetro urbano, somado ao fato que grande parte das empresas vinha de fora, não
criavam raízes na região e geravam uma mão-de-obra ociosa quando de sua retirada43.
Contudo, a atividade exploratória da madeira expandiu o comércio local e,
paralelamente expandiu o crescimento urbano e impôs a expansão das vias de
transporte, como a estrada de ferro e de estradas de rodagem que contribuíram para o
acesso à cidade.
Portanto, no final da década de 1940, a cidade passou por uma profunda
remodelação depois de vários anos de crise econômica, estabelecendo entre os anos de
1950 e 1960 um novo cenário citadino, não apenas no que diz respeito as
transformações do espaço urbano, mas quanto as sociabilidades, sobretudo entre as
elites.
43
Esse quadro tornar-se-ia mais claro posteriormente na década de 1980 quando muitas serrarias
encerraram suas atividades e se transferiram para outros locais, deixando uma grande massa de mão-deobra desalojada que aumentaria a densidade demográfica da cidade e acarretando em uma massa de
desempregados (TEMBIL, Márcia. Op. Cit., p.93).
29
Por outro lado é importante deixar claro que Guarapuava não deixava de
integrar-se nas transformações de ordem geral que o Brasil começou a passar no pós
Segunda Guerra Mundial. Outros hábitos de consumo, uma configuração urbana
diferenciada, o surgimento de casas de comércio, instituições financeiras, pequenas
indústrias, que agradavam as elites tradicionais da cidade ao mesmo tempo em que lhes
custavam um alto preço em termos de poder político.
Segundo Álvaro de Oliveira Borges Filho, os madeireiros desencadearam uma
mudança nas relações de status e de poder na região, pois, “antes praticamente só nas
mãos dos fazendeiros ou pessoas de sua influência, estes surgiram como uma classe
emergente em relação aos quais os fazendeiros tinham pouco controle, surgindo dai uma
rivalidade entre os “de fora”, representados pelos madeireiros, e aqueles que até então
detinham o poder político local.
44
Essa rivalidade sobreviveu várias décadas, pelo
menos até os madeireiros mesclarem-se com a elite local. Porém esse não foi um
processo rápido, tendo em vista que vários elementos da elite campeira dispuseram-se
contra essa “invasão”, sobretudo em períodos de pleito eleitoral, onde a valorização dos
candidatos “nativos” se fazia muito presente. Além disso, a resistência ao papel dos
madeireiros e da atividade na cidade é passível de observação em livros de caráter
histórico/didático publicados no âmbito local como é o caso da obra Guarapuava:
história de luta e trabalho de autoria de Gracita Gruber Marcondes, membro de família
tradicional guarapuavana que, ao escrever sobre o desenvolvimento da economia na
cidade afirmou que os tropeiros transportaram o progresso no casco das mulas,
enquanto que a atividade madeireira não é destacada. Desta forma, é muito importante
apontar que este silêncio por parte da referida autora representa uma crítica aquele tipo
de atividade e ao papel desempenhado por ele no desenvolvimento da cidade,
demonstrando que algumas lutas simbólicas ainda permaneciam no imaginário de
algumas pessoas ainda na década de 1990, época da publicação da obra. Desta forma,
aos madeireiros, segundo a autora, coube apenas o papel de desmatar muitas regiões do
município, devido a extração em grandes quantidades de madeira nativa e não o de
trazer o progresso para a cidade, como haviam feito os tropeiros e os fazendeiros 45.
Além dos madeireiros, a intensificação do fluxo imigratório resultante da vinda
44
BORGES FILHO, Álvaro de Oliveira Borges. Estrutura de Referência aplicada à Gestão
Estratégica capaz de promover o Desenvolvimento Regional Sustentável na região de GuarapuavaPR. 2005,. 225F. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção), Universidade Federal de Santa Catarina,
Florianópolis, 2005, p.167.
45
MARCONDES, Gracita Gruber. Op. Cit., 1998, 79-85.
30
principalmente dos Suábios do Danúbio46 e da formação da Colônia de “Entre Rios” na
década de 195047 também contribuiu para as transformações nas bases produtivas e na
posse da terra que, até então se fundava na relação “latifundiário-proprietário rural” 48.
Contudo, o fluxo imigratório na região não se deu exclusivamente com os Suábios,
tendo em vista que em períodos anteriores, principalmente na década de 1930, outros
contingentes de imigrantes como alemães, sírios, suecos, franceses, holandeses,
poloneses, entre outros, estabeleceram-se na região. Porém, não prosperou na mesma
medida que o grupo posterior dos Suábios, tendo em vista que esses imigrantes
obtiveram maiores oportunidades de ajuda financeira por parte do governo brasileiro.
Além disso, contaram também com o apoio de organismos internacionais. Nesse
momento, a política agrícola brasileira estimulava a produção de gêneros alimentícios
para a exportação e a auto-suficiência alimentar49. Todavia, esses grupos Suábios não
disputaram por status social e político na cidade assim como os madeireiros. Ao
contrário, construíram seu próprio núcleo urbano, que além de buscar preservar algumas
de suas manifestações culturais, manteve-se ainda mais fechado que os dos
fazendeiros50.
Ainda na década de 1950 outros contingentes populacionais do Rio Grande do
Sul, Santa Catarina, São Paulo e de outras cidades do Paraná vieram para a região
devido ao alargamento das fronteiras agrícolas nas décadas de 1960 e 1970, o que
intensificou ainda mais as transformações no contexto de produção refletindo na
movimentação do cotidiano guarapuavano. Uma nova classe média consumidora e ativa
socialmente cresceu na cidade.
Os fatores de crescimento populacional, aliados a melhoria das estradas
46
Refugiados da Segunda Guerra Mundial, na sua maioria oriundos da Iugoslávia (STEIN, Marcos
Nestor. Memória e identidade: produção de discursos de identificação na colônia Entre Rios (1950-1997).
In: OLINTO, Beatriz (org.) [et. al]. Colóquio cultura, etnias e identificações: historiografia e região.
Guarapuava: Gráfica da UNICENTRO, 2005, p.93).
47
A Colônia de “Entre Rios” formada na década de 1950 com os Suábios remanescentes da 2ª Guerra
Mundial estabeleceu-se e hoje forma um conjunto de seis colônias que formando uma grande cooperativa,
Cooperativa Agrária, que hoje detém a maioria das terras produtivas da região, inserindo a cultura da
batata inglesa e da cevada, hoje alguns dos principais produtos exportados pela região, além da soja e do
milho.
48
TEMBIL, Márcia. Op. Cit., 2007, p.93.
49
SILVA, Joseli Maria. Op. Cit., 1997, p.21.
50
Esses núcleos urbanos construídos pelos Suábios são chamados ainda hoje de “Colônia Entre Rios”.,
dividida em cinco vilas: Vitória, Jordãozinho, Cachoeira, Socorro e Samambaia (STEIN, Marcos Nestor.
Memória e identidade: produção de discursos de identificação na colônia Entre Rios (1950-1997). In:
OLINTO, Beatriz (org.) [et. al]. Colóquio cultura, etnias e identificações: historiografia e região.
Guarapuava: Gráfica da UNICENTRO, 2005, p.93).
31
existentes e a criação de novas, como a Estrada Estratégica BR 35
51
, bem como da
construção do prolongamento da estrada de ferro de Irati para Guarapuava facilitaram o
escoamento da produção.
Portanto, nos anos em que seguiu o início da década de 1950, representou para a
cidade o começo de uma nova fase. Uma nova fase de progresso e que, até certo ponto,
desencadeou entre as elites locais a rememoração de períodos de crescimento
econômicos anteriores.
A década de 1950 destacou-se como um momento em que o Brasil viveu a
euforia de seu processo desenvolvimentista atingindo os centros maiores com os ideais
de consumo e encetando uma nova dinâmica urbana. Desenvolvida pelo sucesso da
atividade madeireira a euforia do progresso também atingia Guarapuava
52
. Por outro
lado, a disputa por quem deveria estar à frente desse progresso tornou Guarapuava em
um espaço de luta pelo poder.
1.2. – Guarapuava e a década de 1950: um espaço de disputas.
O desenvolvimento da cidade iniciado a partir de 1950 trouxe para a elite
campeira a perda da hegemonia política da cidade. Ou seja, o acesso à modernização
trazia como conseqüência o fim do domínio e a desestruturação das bases de poder
fixadas nas mãos dos fazendeiros.
Nessa perspectiva, a ambição pelo progresso para a elite campeira, vinha
também carregada de um discurso presente na imprensa local, que buscava autolegitimação através da valorização do trabalho na construção de uma nova ordem e na
afirmação da sua “ancestralidade” como meio de legitimação para colocar-se a frente
destas transformações. 53
A alusão ao trabalho e aos povos que formaram Guarapuava assume nas falas
dessa elite fazendeira a sua representação na figura do bandeirante paulista. Assim, para
essa elite, os bandeirantes, ancestrais dos fazendeiros, legaram aos paulistas o
“empreendedorismo” e seriam responsáveis também pelo espírito corajoso e laborioso
dos primeiros guarapuavanos.
51
Reformada e mais tarde renomeada para Rodovia Federal 277, hoje uma das principais rodovias do
Estado, ligando o litoral a Foz do Iguaçu.
52
TEMBIL, Márcia. Op. Cit., 2007, p.100.
53
Idem, mesmo autor, p.103.
32
Tal discurso não era novo e nem havia surgido na cidade. Discurso semelhante a
esse dominou a intelectualidade paulista durante o final do século XIX e início do
século XX.54 Esta identidade dos responsáveis pelo progresso guarapuavano, portanto,
passa pelo crivo dos “laços de ancestralidade”, restringindo-se a uma pequena parte da
população.
Desta forma, semelhante ao ocorrido em São Paulo, essa afirmação por parte da
elite campeira Guarapuava de serem os verdadeiros construtores da cidade, tinha por
objetivo controlar a política e legitimar seus discursos em torno das benesses do
progresso. Portanto, esse segmento tradicional da cidade, expressava seus desejos de
modernidade elaboraram um discurso dicotômico, o progresso e a mudança eram
aceitáveis desde que amparados no passado. Nesse sentido, a exaltação aos
bandeirantes, reconhecidos como ancestrais desta elite, no sentido de que a “ordem das
coisas” estabelecida desde outros tempos da a entender que essa elite campeira deveria
assumir o poder político, e não “os de fora”, ou os “novos ricos”, como era conhecida a
elite madeireira. Portanto, o verdadeiro guarapuavano, segundo esse grupo, era aquele
que se via como herdeiro da ação dos pioneiros.
Nesta perspectiva, o guarapuavano legítimo, segundo Marcondes, era aquele que
se dedicava as atividades de “fazendeiro criador de gado e tropeiro”, também associado
à figura de bandeirante por desbravar e abrir novos caminhos
55
. Assim sendo, a elite
campeira, reconhecendo-se como descendentes e herdeiros dos antigos tropeiros e dos
bandeirantes percebia-se dotada de todas as condições para conduzir a cidade ao
progresso. Construía-se para essa elite, não apenas um legado de tradição e de herança
do espírito desbravador dos antepassados, mas firmava-se a idéia da existência de uma
“Aristocracia Guarapuavana”, um grupo formado pelas famílias de fazendeiros
destacadas pelos sobrenomes Rocha Loures, Chagas Lima, França, Alves, Mendes de
Araújo, Caldas, Mendes, Abreu, Siqueira Cortes, Lacerda, Camargo, Roseira, Virmond,
Lustosa, Sá, Ribas, Martins, Lopes Branco, Ayres, Silvério, Sampaio, Gonçalves,
Almeida, Guimarães, Ferreira Maciel, Werneck, Queiroz, Cleve, Santa Maria, incluindo
os Marcondes. 56
Os madeireiros que fixaram residência na cidade, gradativamente acabaram por
54
LUCA, Tania Regina de. A Revista do Brasil: Um Diagnóstico para a (N) ação. São Paulo: Fundação
Editora da UNESP, 1999.
55
MARCONDES, Gracita Gruber. Op. Cit., 1998, p.67)
56
Fica claro referencia ao próprio nome da autora da lista, a senhora Gracita Gruber Marcondes
(MARCONDES, Gracita Gruber. Op. Cit., 1998, p.38).
33
conquistar uma posição social privilegiada nesse espaço ocupando nos anos posteriores
a sua chegada cargos administrativos, inclusive o cargo de prefeito. O maior exemplo
dessa situação é a eleição do catarinense Nivaldo Passos Krüger, que chegou à região
ainda no princípio da atividade madeireira com seu pai, ao cargo de vereador em 1959 e
eleito três vezes à prefeito da cidade, sendo o primeiro em 1964, o segundo em 1974, já
aliado as forças políticas da oposição, tendo como seu vice-prefeito um representante
dos fazendeiros, o senhor Cândido Pacheco Bastos 57 e o terceiro em 1984. Desta forma,
a ascensão política dos madeireiros no início da década de 1950 é um importante indício
de ventos de mudança que alteraram o cotidiano da cidade em suas múltiplas vivências
e com as quais mais tarde a elite campeira teve que conviver.
Este cenário, bastante paradoxal pode ser percebido na imprensa da cidade que
ocupou um papel fundamental na sua vida social desde os chamados “anos de ouro”.
1.3 – Observadores e difusores de idéias: os jornais em Guarapuava
Juntamente com as transformações culturais do início do século XX estava o
aparecimento dos jornais, principal canal de divulgação da vida social da cidade,
sobrevivendo aos momentos de crise enfrentados durante as décadas de 1930 e 1940, e à
mudança das elites no poder, tornando-se parte do cotidiano da cidade até os dias atuais.
Instrumentos de difusão de valores políticos, culturais e sociais esses jornais
representaram não apenas um elemento moderno presente no cotidiano da cidade, mas
também formas de contribuir para o progresso e para o crescimento da cidade, mesmo
que as dificuldades em se manter um jornal em Guarapuava fossem extremamente
grandes, como ressalta Planalto, um dos cronistas locais:
Poucos são os que sabem das mil e uma dificuldades a serem
vencidas para a orientação e manutenção de um jornal em cidade do
interior. É preciso o seu diretor “contar até sete”, possuir verdadeiro
espírito de renúncia e de sólida vontade de ser útil ao município e à
sua gente. Só assim, o jornal local, poderá ser autêntico veículo
orientador da opinião pública, usando linguagem comedida, atendose unicamente a exercitar a defesa intransigente dos problemas que
interessem, direta ou indiretamente, a coletividade. Nada de
manchetes escandalosas, de linguagem desabrida, tendenciosa,
57
IZIDORO, Heitor Francisco. Guarapuava: das Sesmarias a Itaipu. Curitiba: Vicentina, 1976, p.43.
34
indigna de penetrar no recesso de um lar honrado, de família 58
Mesmo com as dificuldades vários foram os jornais que circularam no cotidiano
da cidade, alguns de duração efêmera outros, porém, com maior freqüência e maior
duração.
O primeiro jornal criado em Guarapuava foi O Guayra. Fundado em 4 de abril
de 1893 e redatoriado pelo Cel. Luiz Daniel Cleve, fazendeiro abastado da região. O
jornal era editado, segundo Planalto em um antigo e pesado prelo que chegou a cidade
transportado de Curitiba até Guarapuava em lombo de muares pelo seu proprietário
Serafim de Oliveira Ribas.59
Foram publicados ainda na cidade uma série de outros jornais, em sua grande
maioria de curta duração, como o Jornal das Crianças (1893), O Paraná (1894), A Lide
(1894), O Guarapuavano (1902), O Guayra (fase de 1917), O Pharol (1919), O
Momento (1924), A Cidade (1932), O Independente (1935), Brasilidade (da Propaganda
Integralista Brasileira - 1935), Folha do Oeste (1937), O Liberal (órgão da Revolução
de 1930), A Época (1958), O Combate, O Carrapicho, O Jacobino, O Paraná Matutino,
Ideal, O Trevo, Alerta, O Arauto, O Marrete, O Independente, Alfinete, Carga,
Torpedo, O Planalto, O leão da Serra da Esperança, Oeste Paraná, Jornal de
Guarapuava, Sentinela do Oeste, Jornal de Notícias, Tribuna Paranaense, Folha de
Guarapuava, Comarca, A Columna, O Paraná, Correio do Oeste, em sua grande
maioria com data de fundação e de duração desconhecida. Além disso, também foram
editados na cidade uma série de jornais literários e críticos como A Alvorada (1896) O
Lyrio, A Pena, O Serrote e O Farolete (1928/1929), entre outros.60
Não existem exemplares disponíveis em Guarapuava de grande parte destes
periódicos, com raras exceções também aos exemplares disponíveis na Biblioteca
Pública do Paraná em Curitiba. Entretanto, alguns exemplares do jornal O Guayra estão
disponíveis no acervo do Centro de Documentação da Universidade Estadual do CentroOeste do Paraná. Segundo as memórias de um de seus redatores, o Fazendeiro Cel. Luiz
Daniel Cleve, o isolamento da cidade e a falta de boas estradas foram fatores decisivos
na produção dos periódicos locais, dificultando a produção jornalística na cidade em
58
PLANALTO, João do. Do meu canto (recordações de outros tempos): v. 2. Curitiba: O Formigueiro,
1981, p.51.
59
PLANALTO, João do. Op. Cit.1981, p.234.
60
Fontes: CARDOSO, Rosy de Sá. “Breves notas sobre a imprensa do Paraná”. In: História do Paraná.
v.3, Curitiba: Grafipar, 1969, p.207-237; PLANALTO, “Do meu Canto”, Folha do Oeste, 19 de janeiro
de 1941, p.3; MARCONDES, Op. Cit., 1998, p.129.
35
seus primeiros tempos61:
O Guayra que tinha como seu redactor chefe o venerado cidadão Luiz
Daniel Cleve iniciou sua publicação a 4 de abril de 1893, causando
extraordinário sucesso por ser o documento vivo de uma grande e
assignalada vitória contra as maiores dificuldades consideradas então
como insuperáveis, pois que Guarapuava não dispunha naquella
época nem siquer de uma estrada de rodagem que a ligasse aos outros
centros civilizados do paiz (sic) 62
61
As dificuldades de acesso a cidade acabou por incorporar entre as primeiras décadas do século XX no
imaginário local o isolamento como fator a ser superado. Este sentimento foi recorrente entre os discursos
veiculados pela imprensa local e encontrou o auge de sua discussão na questão do atraso na chegada da
estrada de ferro de Irati a Guarapuava.
62
CLEVE, Jeorling J. Cordeiro. Coronel Luiz Daniel Cleve – Memória Histórica. Curitiba: Juruá, 2005,
p.30.
36
Figura 6 – O Guayra 23 de Abril de 1898 (não mais redatoriado por Cleve)
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G).
Além de O Guayra, outros jornais também tiveram duração não tão curta, como
foi o caso do hebdomadário O Pharol, fundado em 1919 por um membro da elite
campeira guarapuavana, Antonio Lustosa de Oliveira, na época com apenas 18 anos.
Segundo a historiadora Walderez Pohl da Silva, pertencer à sociedade campeira
de Guarapuava era estar no topo da hierarquia social e econômica da cidade. Portanto,
Lustosa era também o portador de um imaginário povoado de histórias de coragem e
37
feitos heróicos ancestrais, nutrindo o sentimento que este possuía de estar qualificado a
dirigir e negociar questões de interesse da coletividade.63
Como o próprio Lustosa afirma em seus “traços biográficos do guarapuavano
Antonio Lustosa de Oliveira”, publicado por Heitor Francisco Izidoro, ele instalou uma
oficina tipográfica para confecção de impressos comerciais em 1918. Em seguida depois
de uma conversa com um amigo, Mário Edmundo de Barros, combinou fundar um
jornal que ressoasse o progresso vivido pela cidade naquele momento.64 Desta forma em
10 de Abril de 1919 o primeiro número de O Pharol foi posto em circulação, sendo que
o jornal surgiu como hebdomadário. Depois de seis meses de seu lançamento, o jornal
passou a circular como semanário durante nove anos, sendo extinto em 1929.
Figura 7 – Antonio Lustosa de Oliveira - 1920
Fonte: Acervo Arquivo Benjamin Teixeira, Guarapuava/PR.
63
SILVA, Walderez Pohl da. Entre Lustosa e João do Planalto: a arte da política na cidade de
Guarapuava (1930-1970). 2008. 209f. Tese (Doutorado em História Social), Universidade Federal
Fluminense, Niterói, 2008, p.21.
64
IZIDORO, Heitor Francisco. Op. Cit., 1976, p.165-166.
38
Este jornal seria o marco inicial da vida jornalística de Lustosa. Durante a
década em que o jornal foi editado a questão do já referido isolamento da cidade viveu
sua fase mais aguda. Nesse sentido, não é estranho notar que a maioria dos editorais
estavam voltados à questão da estrada de ferro. A estrada de ferro se consubstanciou no
grande ideal a ser perseguido, uma vez que se apresentava como a grande solução para
as mazelas da cidade. Segundo Lustosa, a estrada de ferro era uma promessa desde a
época do Brasil- Império. 65
Em 1922, depois de alguns problemas enfrentados pela redação do jornal, os
quais se mantêm para nós obscuros, Lustosa reassume integralmente O Pharol, “jornal
consagrado aos interesses gerais”, e para tanto alegando ter como princípio os ideais de
profissionalismo, justiça e moral, “em prol do nosso progresso futuro” (O Pharol, 30 de
Julho de 1922).
Figura 8 – O Pharol - 30 de Julho de 1922
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G)
65
SILVA, Walderez Pohl da. Op. Cit., 2008, p.54.
39
Paralelamente a produção de O Pharol, Lustosa também editou um jornal
literário denominado A Alvorada. Enquanto o primeiro era voltado aos assuntos ditos de
interesse do município, o segundo dirigia-se a um publico mais jovem, trazendo poesias,
recados amorosos e capítulos de folhetins. 66
Com uma vida jornalística extremamente ativa, ainda antes do fim de O Pharol,
Lustosa publicou outro jornal denominado O Movimento. Após o fim de O Movimento,
O Pharol e A Alvorada, Lustosa, com mais dois amigos, David Moscalesque e Amarilio
Rezende, que pertenciam ao Movimento Integralista Brasileiro, fundou um pequeno
jornal chamado A Brasilidade (1935-1936). Os objetivos deste pequeno jornal estavam
em difundir os valores do Integralismo, que haviam adquirido um grande sucesso entre
a juventude da cidade, sobretudo entre os fazendeiros, dentro dos princípios de defesa
da propriedade, da família e da religião católica, muito caros as famílias mais
tradicionais da cidade. Nesse sentido, o “Estado Integral”, idealizado por Plínio
Salgado, líder da Aliança Integralista Brasileira, representava para os amigos e para o
próprio Lustosa um ideal a ser buscado. Além disso, por esses companheiros trazerem
uma bagagem cultural acima da média para o Guarapuavano, expressavam um ideário
de “ser moderno” para Lustosa. Sob esse prisma, para Lustosa o “Ideal Integralista” de
David e Amarílio representava estar em sintonia com os acontecimentos que agitavam o
cenário nacional. 67
Os motivos do fim de A Brasilidade em 1936 são obscuros. Nenhum exemplar
do jornal foi encontrado e as únicas informações sobre o mesmo encontram-se nas
memórias de Lustosa. 68
A importância da vida jornalística de Lustosa não se faz apenas pela sua intensa
atividade jornalística na cidade. Lustosa, além de jornalista, cronista (suas crônicas
intituladas “Do meu canto” e assinadas com o pseudônimo de João do Planalto foram
publicadas por mais de 30 anos), também foi presidente do Clube Guaíra, um político
influente na cidade, sendo prefeito municipal na década de 1940, mais especificamente
entre 1944 a 1946 e por três vezes eleito deputado estadual e primeiro suplente a
deputado federal pelo Partido Social Democrático, PSD. Ainda foi presidente do
Conselho Administrativo da Caixa Econômica Federal do Paraná, até 1964 quando foi
preso e levado a depor no DOPS por acusações diversas, sendo inocentado das
66
SILVA, Op. Cit., 2008, p.50.
SILVA, Op. Cit., 2008, p.69.
68
OLIVEIRA, Antonio Lustosa de. Passos de uma longa caminhada (Reminiscências). Curitiba: O
Formigueiro, 1978.
67
40
acusações.69
Além disso, Lustosa foi um dos maiores representantes e defensores da elite
fazendeira em Guarapuava. Em suas crônicas, ficam explícitos os ideais dicotômicos
daquela elite em buscar o progresso sem romper com as tradições, ou seja, sem retirar
da elite campeira o status de fundadores da cidade, divulgando a idéia de que, assim
como no passado, estes seriam no presente as pessoas ideais para guiarem a cidade para
o progresso.
Nessa perspectiva, Lustosa foi um defensor convicto de que Guarapuava deveria
ser governada pelos guarapuavanos natos, como fica explícito em uma de suas crônicas
editadas sobre o nome de “Do meu canto” e assinadas sob o pseudônimo de João do
Planalto70 e publicadas no jornal Folha do Oeste:
Do regime ditatorial implantado no país, em 1930, para cá, isto há 46
anos, Guarapuava teve somente quatro Prefeitos ‘guarapuavanos
natos’: o cel. Aníbal Virmond, Generoso de Paula Bastos (por poucos
dias), Antonio Lustosa de Oliveira e Juvenal de Assis Machado, este,
já no regime constitucional (1947/1951). De 1959 até janeiro de
1977, portanto, há 18 anos, a terra guarapuavana vem sendo
administrada por dois guarapuavanos por afeição: Moacir Júlio
Silvestre e Nivaldo Passos Krüger, tendo nesse lapso de tempo,
havido um mandato tampão, em 1963, exercido pelo também
guarapuavano por afeição, Dr. Elói Pimentel. Pois bem. Agora, o
povo guarapuavano acaba de eleger um guarapuavano nato,
descendente da sesquicentenária cepa dos Alves-Rocha LouresPacheco Bastos. Guarapuava de outros tempos, pacata, semi-colonial,
sem estradas que permitissem boas e rápidas comunicações para fora
do município, vivia feliz e tranqüila, aguardando, esperançosamente,
pela chegada do sonhado progresso, o qual começou a chegar, aqui,
após serem ouvidos em 1954, os estridentes apitos das locomotivas
do Ramal Ferroviário Riosinho-Guarapuava, da construção da
Rodovia 277, da fixação da Colônia Agrária dos Suábios, nos
magníficos campos de Entre Rios, em 1951, partindo desses
auspiciosos eventos, o extraordinário surto expansionista que, neste
último quarto de século, acabou transformando a sesquicentenária e
histórica Guarapuava do Padre Chagas e do Capitão Rocha Loures,
nesta atual Guarapuava, verdadeira forja de trabalho construtivo, com
os seus campos verdejantes, outrora de pastagens nativas, pejados de
gado de diferentes espécies e raças e hoje, também verdejantes, com
suas infindas plantações de trigo, de arroz, de batata, de soja e de
outros inúmeros cereais, ensejando ao privilegiado planalto
guarapuavano, ser transformado em uma nova Canaan, na opulenta
região ocidental do Paraná. E é essa Guarapuava intensamente
69
SILVA, Walderez Pohl da. Op. Cit., 2008.
A escolha do nome João não é aleatória, para Lustosa, João representava um nome comum, logo
assinar como João do Planalto era tornar-se porta-voz do cidadão comum do planalto, no caso, do terceiro
planalto paranaense, onde encontra-se Guarapuava.
70
41
progressista, que vai de janeiro de 1977 até janeiro de 1981, ter como
seu governante, um seu filho nato, a quem por essa mesma razão, tem
uma enorme responsabilidade moral e administrativa e,
principalmente, de exemplar austeridade e dignificação da função
púbica, governando com o povo e para o povo” (“Do meu Canto”,
Folha do Oeste, 28 de novembro de 1976).
No trecho transcrito quase que na íntegra, justamente pela riqueza de
informações presentes no mesmo, Lustosa faz uma intensa defesa e elogio a eleição do
que ele chama de “Guarapuavano nato”, ou seja, não apenas a uma pessoa nascida na
cidade, mas a um descendente direto dos primeiros povoadores da região. O prefeito
eleito em questão foi Cândido Pacheco Bastos, que havia concorrido com outros três
candidatos a prefeitura da cidade no ano de 1976. Lustosa articula genealogicamente o
prefeito eleito a algumas das principais famílias de fazendeiros da cidade, a família
Alves, a família Rocha Loures e os Pacheco Bastos, ligando-o inclusive ao considerado
conquistador da região e construtor da vila de Nossa Senhora do Belém de Guarapuava
o Capitão Rocha Loures. Para Lustosa, a eleição de Candido Pacheco Bastos,
representava o “retorno” do poder local da elite campeira da qual ele fazia parte, mas,
ao mesmo tempo, simboliza o retorno do poder local às mãos do povo guarapuavano,
mesmo que, segundo Lustosa, os estrangeiros Moacir Júlio Silvestre, Nivaldo Passos
Krüger e Elói Pimentel fossem considerados guarapuavanos “por afeição”.
Ainda na continuação do trecho acima, Lustosa aponto ao prefeito eleito uma
tarefa: “Você é o herdeiro de uma tradição histórica, legada pelo seu denodado ancestral
Capitão Rocha Loures, fundador desta nossa mui nobre cidade, que foi, é e sempre será
‘Rainha do Oeste do Paraná’” e, por essa razão, uma enorme responsabilidade. Herdeiro
da tradição histórica, ao prefeito eleito caberia a função exercida pelos demais
guarapuavanos natos, inclusive o próprio Lustosa, que pela administração passaram e
buscaram levar a cidade ao progresso.
Esse discurso pode ser mais claramente demonstrado observando uma pequena
nota publicada na parte inferior da “página social”, segunda página do Folha do Oeste
de 12 de Agosto de 1962 na qual está escrito: “Raciocínio sensato” votar em
‘candidatos de fora’, é a mesma cousa que ‘brasileiros votassem em candidatos russos’,
para estes, defenderem as causas do Brasil. Por isso, é aconselhável que sufraguemos
em 7 de outubro os ‘candidatos do lugar’, para o bem de Guarapuava.”.
Nesse caso, em outra nota semelhante a anterior publicada em 26 de Agosto de
1962 na segunda página do Folha do Oeste o anúncio é complementado: “valorizemos o
42
que é nosso! Votando em LUSTOSA DE OLIVEIRA – para Deputado Federal – e, em
JOÃO DE MATTOS LEÃO para Deputado Estadual”. È importante apontar para o fato
de que, no referido anúncio, a presença de Mattos Leão demonstra como as famílias de
madeireiros foram se estabelecendo em posições de mando e prestígio local, ocupando
inclusive espaço entre os jornais das elites mais tradicionais, como é o caso do Folha do
Oeste.
Este trecho não apenas deixa claro a posição do jornal e conseqüentemente a de
Lustosa sobre a eleição de ‘candidatos de fora’, mas ainda estabelece uma comparação
de grande significado para a época: “é a mesma cousa que brasileiros votassem em
candidatos russos”, ou seja, os discursos sobre o comunismo desde os tempos do
integralismo na cidade criticavam abertamente o comunismo como o fim da família, da
propriedade e da religião. È importante destacar que os russos naquele momento
representavam a extrema esquerda abominada pelas elites brasileiras. Em 1962, dentro
do contexto da Guerra Fria, entende-se que esse tipo de comparação teria um peso ainda
mais degradante sobre os “vindos de fora”.
O trecho anterior, mesmo sendo bem posterior ao recorte escolhido pela
pesquisa é valido por apontar resumidamente para as transformações ocorridas na
cidade na década de 1950 e 1960. O trecho pontua algumas das questões vivenciadas
pelos guarapuavanos tais como o isolamento da cidade, a vinda da estrada de ferro, a
construção da Rodovia 277, a vinda dos Suábios e a formação da Colônia Entre Rios,
com destaque a grande produção agrícola do município no momento da escrita da
crônica. Além disso, a exaltação ultrapassa a figura do prefeito eleito para exaltar as
terras de Guarapuava, sobretudo as pastagens nativas “pejados de gado de diferentes
espécies e raças”, ou seja, novamente exaltando a lide pecuária, símbolo das antigas
famílias.
É interessante notar como houve nesse artigo um silêncio em torno da atividade
madeireira que, segundo informações obtidas de trabalhos que tratam dessa atividade
econômica mostram que ela foi a desencadeadora das mudanças vividas pela cidade no
final da década de 1940. Portanto, não foi por desconhecimento que Lustosa
notavelmente ignora ou simplesmente apaga a ação das madeireiras no trecho transcrito.
Por outro lado, não consegue eliminar a presença dos “de fora”, como João de Mattos
Leão, além do político Nivaldo Krüger.
O silêncio de Lustosa com relação aos madeireiros não se fez presente em outra
crônica do mesmo ano, assinadas com o pseudônimo de João do Planalto:
43
Há tempos, tive a oportunidade de lançar um apelo ao dinâmico
Prefeito Nivaldo Krüger, para que fosse colocado na Praça 9 de
Dezembro, de nossa Guarapuava, uns três troncos de imbuia, a fim de
que as próximas vindouras gerações de guarapuavanos ou de quem
quer que seja, que visitarem esta terra, que outrora, foi o maior
parque florestal do Brasil, [...] hoje, em fase de completo extermínio,
antigamente pelas criminosas queimadas das matas, depois pelo
machado e pelas serrarias devastadoras dessa valiosa árvore secular,
que leva 500 anos para crescer e tornar-se grossa, com até dois
metros de diâmetro, como existiam em nossas matas (“Do meu
canto”, Folha do Oeste, 7 de dezembro de 1976 – grifos nossos).
Embora faça um elogia a Krüger, o texto de Lustosa embute uma crítica aos
madeireiros. Segundo Lustosa, a presença dos troncos de imbuia, representando as
grandes árvores que se erguiam pelo território guarapuavano serviria para que as
próximas gerações tivessem a consciência da grandiosidade da natureza local e do
estrago causado pelas serrarias devastadoras. Desta forma, simbolicamente buscou-se
inscrever no imaginário local a noção de que as madeireiras trouxeram muito mais
estragos do que benesses para a cidade.
Nessa perspectiva, seguindo os relatos encontrados nos dois trechos transcritos,
o período que compreende as décadas de 1950 e 1960 foram momentos em que estavam
a frente da cidade pessoas vindas de fora. Tempos guiados por pessoas não herdeiras da
tradição pioneira e que trouxeram progresso a cidade, porém não sem grandes perdas.
Ambos os trechos foram retirados do maior e mais duradouro periódico de
propriedade de Antonio Lustosa, o jornal Folha do Oeste. Criado em 28 de fevereiro de
1937, pelos mesmos componentes do antigo jornal A Brasilidade, David Moscalesque
(gerente), Amarílio Rezende (Redator-chefe) e o próprio Lustosa (Diretor). Não é a toa
que em seu ano inicial o jornal persistisse em reservar a página 3 à campanha
Integralista. Porém, a diversidade e o sucesso alcançado pelo Folha do Oeste estendeuse a diversas outras áreas tanto que, com o fim da publicação das páginas sobre o
Integralismo no mesmo ano, devido a abolição dos partidos decretada por Vargas em 2
de dezembro de 1937, não esmoreceram nem prejudicaram o jornal. Além disso, o
Folha do Oeste, assim como O Pharol, insistia na questão da estrada de ferro, entre
outros assuntos de interesse do município.
As grandes dificuldades encontravam-se efetivamente na produção do jornal.
Para produzir o jornal, Lustosa comprou uma Lynotipe que, segundo ele, teria sido a
primeira a subir a serra da Esperança, especialmente para a confecção do semanário.
44
Esse tipo de equipamento, moderno para a região, facilitava em muito o trabalho dos
gráficos, para o barateamento da produção do jornal e contribuiu para a durabilidade do
Folha do Oeste. Enquanto os métodos de confecção dos jornais até então existentes na
cidade eram demorados, a Lynotipe com apenas um empregado fazia o trabalho
aproximadamente de seis. Além disso, dispunha também da habilidade gráfica de David
Moscalesque, que segundo Lustosa era um primoroso artífice gráfico (Folha do Oeste,
3 de março de 1974, p. 2). O jornal era produzido na mesma gráfica onde O Pharol
havia sido editado, gráfica esta, que havia surgido inicialmente com o intuito de
produzir material publicitário, recebeu o nome de “Gráfica Guairacá”, localizada na rua
Dr. Vicente Machado, 1068, próxima ao centro da cidade.
O jornal inicialmente não dispunha de uma composição estética muito
aprimorada, porém, superava em muito as publicações até então existentes na cidade,
inclusive sendo dificilmente acompanhada por outros jornais contemporâneos durante
os seus anos de duração.
Além de uma edição mais clara e mais organizada, Lustosa ainda buscou trazer
para o jornal outros aprimoramentos técnicos, como as clicherias. É óbvio que não
existiam na cidade condições de se construir uma clicheria para a publicação de fotos no
jornal. Para realizar esse trabalho, Lustosa comprava os clichês em São Paulo ou em
Curitiba, onde esses eram produzidos. Desta forma, era algo inédito para a cidade a
Folha do Oeste publicar fotografias. Durante toda a existência do jornal sua publicação
deu-se em preto e branco e a presença das fotografias tornou-se cada vez mais
freqüente.
Geralmente na sua primeira página trazia uma matéria de cunho político,
discutindo os problemas do município, em seguida, matérias econômicas, policiais ,
sociais, religiosas, integravam aleatoriamente as páginas seguintes. Não existia uma
organização dos conteúdos por assuntos. Nesse sentido, o Folha do Oeste inicialmente
distribuía os assuntos de acordo com o tamanho dos textos, tendo em vista que o espaço
de publicação era pequeno, de apenas quatro páginas.
Os ideais de Lustosa quando da fundação do jornal eram muito claros. Para ele o
jornal deveria ser pautado na atitude imparcial e noticiosa, sem ligações partidárias e
intransigente na defesa dos interesses do município e sua gente. Ao mesmo tempo, o
jornal claramente deveria assumir uma postura, “dentro dos elevados postulados da
doutrina cristã, batendo-se pela integridade e amor à pátria, intangibilidade da família
numa sociedade onde imperem os bons costumes, sob a égide protetora do Supremo
45
Arquiteto do Universo” (“Aniversário da Folha”, Folha do Oeste, 3 de março de 1974,
p.2) 71. Além da clara opção religiosa, ao ideal de intangibilidade da família bem como
dos “bons costumes”, o jornal entrava em grande contradição com a idéia de ser “sem
ligações partidárias”, tendo em vista que o espaço ocupado pela Aliança Integralista
Brasileira era no mínimo privilegiado. Mais tarde, os espaços dados a campanha dos
partidários do PSD, partido de Lustosa durante o período democrático, também
atestariam essa contradição.
Contradição esta é também encontrada na primeira edição do jornal no editorial:
“é no conflito das horas inquietantes que vivemos, a imprensa não poderá ser jamais um
campo radicalmente neutro, fechado à ressonância dos clamores que agitam os ares”
(Folha do Oeste, 28 de fevereiro de 1937, p.1). Na continuidade ao trecho acima
Lustosa demonstra delinear o seu ideal jornalístico:
O jornal sempre foi, desde os mais recuados tempos, um elemento
constante de cooperação no meio guarapuavano. A história de
Guarapuava é, por assim dizer, a história de sua imprensa. Na
verdade, as páginas envelhecidas das gazetas locais ainda hoje
retratam, ao vivo, o tumulto de todos os acontecimentos, de que
foram contemporâneos, na sucessão ininterrupta dos fatos e dos
homens. Nada justificava, portanto, o silêncio que, ao jornalismo
guarapuavano, trouxera o desaparecimento do último semanário. E
muito menos a prolongação desse silêncio, por tempo que viesse
significar a morte da imprensa local. Daí a inevitabilidade do impulso
que lança à publicidade esta folha. Pelo seu destino ela vem reatar a
série de publicações que intermitentes ou efêmeras, asseguravam a
perenidade do periodismo guarapuavano. Pelo seu programa, ela
pretende ser o órgão interessado das aspirações de Guarapuava e
servir ao mesmo tempo à causa sagrada da renovação nacional. Folha
do Oeste surge numa época de profunda inquietação. O vulcão das
reformas sociais e políticas incendeia e avassala as consciências
dividindo os homens. Todos os valores morais e espirituais sofrem a
mais angustiosa das revisões” (Folha do Oeste, 28 de fevereiro de
1937, p,1).
Portanto, o que se insere nesse trecho é que, segundo Lustosa, “a história de
Guarapuava é, por assim dizer, a história de sua imprensa”. Para ele, a existência de um
jornal era fundamental para a cidade e representava a continuidade dos jornais antes
71
A presença no texto a elementos que remetem ao Integralismo e a prática da Maçonaria não são fruto
do acaso. Lustosa, mesmo após o fim da Ação Integralista, sempre se posicionou em relação a alguns dos
elementos que moldaram sua vida política e jornalística em períodos anteriores, tendo em vista sua ativa
participação na campanha do “Sigma” presente nos primeiros anos do Folha do Oeste. Quanto a
maçonaria, esta não apenas foi presente na vida de Lustosa, um de seus membros ativos, mas até hoje
configura-se como um grupo importante e numeroso na cidade.
46
editados, um instrumento do progresso com o objetivo de também assegurar a
perenidade da obras realizadas no passado em tempos de mudança, como eram aqueles
dias da fundação do jornal, não apenas para a cidade, mas para o Brasil no ano de
efetivação do Estado Novo e que se estenderia por longos anos.
O Folha do Oeste acabou conquistando em seus quarenta anos de existência uma
circulação razoável. Era distribuído a praticamente todo o Oeste do Estado. Além disso,
possuía também representantes no Rio de Janeiro e São Paulo, administrados por uma
empresa denominada A.S. Lara Ltda., que provavelmente atendia pessoas que haviam
deixado Guarapuava, mas que ainda buscavam obter informações sobre sua a cidade.
Os meios de sustentação do jornal eram variados, sobretudo fixados sobre a
propaganda e as assinaturas. As propagandas ocupavam grande espaço no jornal, sendo
distribuídas aleatoriamente pelas páginas. Grande parte dos anúncios referia-se a
serviços de profissionais autônomos como médicos e advogados, à publicidade político
partidária, a prestação de serviços gerais e aos produtos comercializados pelas lojas que
se espalhavam pela cidade, trazendo ao público a oportunidade de comprar
eletrodomésticos, automóveis e as roupas da moda nos grandes centros, que novamente
tornavam-se bens possíveis de serem adquiridos na cidade, a exemplo do que acontecia
anteriormente na Casa Missino. Porém, até o final da década de 1950 elas
concentravam-se mais na segunda página do jornal ou em colunas ou box localizados na
lateral direita ou na parte inferior das páginas. Os anúncios eram cobrados
antecipadamente e eram regulados por tabela. Segundo Lustosa, a dificuldade de
sobrevivência do jornal era agravada nas cidades interioranas. Para ele,
para que um jornal interiorano possa ter sua circulação normal
efetiva, é imprescindível contar com o apoio populacional do
município, principalmente, sob a modalidade de assinaturas anuais,
visto que a venda avulsa do exemplar somente poderá ser efetuada na
sede municipal, e a notícia, o edital, o anúncio comercial, deverão ser
amplamente divulgados, para conhecimento das pessoas que passam
a maior parte do tempo vivendo nas Fazendas, cuidando das suas
labutas do campo ou do amanho da terra (Folha do Oeste, 25 de
junho de 1978, p.2)
Nessa perspectiva, existia uma necessidade muito grande da adoção do periódico
pela população local, tendo em vista as dificuldades financeiras em torno de sua
publicação. Dessa forma, as assinaturas, além de agilizarem a distribuição do jornal e a
47
sua amplitude de circulação, também favoreciam a venda de propaganda, que se tornava
um bom negócio para o comércio local.
O Folha do Oeste sofreu grandes transformações a partir da década de 1950,
sobretudo nos anúncios, uma indicação da expansão do comércio local. Outros
semanários também surgem nesse período, como é o caso do jornal A Época de
propriedade do então vereador Nivaldo Passos Krüger. De formato mais simples e
rudimentar frente ao Folha do Oeste, contribuiu para o estabelecimento de Krüger em
meio a opinião pública, divulgando suas atitudes enquanto vereador e viabilizando suas
opiniões em torno da política local, tendo em vista o seu pouco acesso a jornais como o
Folha do Oeste. Desta forma, ao criar o seu próprio jornal, Krüger adquiria um meio
político eficaz de oposição a idéias que viessem a ser vinculados em outros periódicos
contra suas ações e ideais.
Desta forma, a concorrência pela legitimidade nas notícias foi uma constante na
cidade e envolveria outros periódicos como a Tribuna Paranaense fundado em 1956
pelo também político local João Ferreira Neves. Desta forma, o início da década de
1950 representou um novo cenário jornalístico na cidade, tendo em vista que por mais
de uma década o Folha do Oeste foi o único jornal constante na cidade. Além disso,
estabeleceu-se na cidade uma “batalha em letras de forma”
72
, onde políticos de
oposição, madeireiros e fazendeiros, puderam expressar suas idéias políticas e suas
posições frente aos caminhos que o desenvolvimento da cidade deveria tomar,
sobretudo quanto a quem deveria guiar o povo Guarapuavano: aqueles que adotaram
Guarapuava de coração e buscavam uma visão mais desprendida e autônoma do
progresso ou aqueles que viam na contemplação das atitudes do passado a melhor forma
para se estabelecer os passos rumo ao progresso? . 73
Da mesma forma, a década de 1950 anunciava um período de desenvolvimento
tecnológico para a imprensa brasileira. Segundo Barbosa, a imprensa nos anos 1950,
fase em que se consolida o “mito da modernização”, era caracterizada
72
Referência ao capítulo escrito pela jornalista Ana Maria de Abreu Laurenza – “Batalhas em letra de
forma: Chatô, Wainer e Lacerda” – presente no livro História da Imprensa no Brasil, organizado pelas
historiadoras Ana Luisa Martins e Tânia Regina de Luca (MARTINS, Ana Luiza; LUCA, Tânia Regina
de (orgs). História da Imprensa no Brasil. São Paulo: Contexto, 2008, p. 179-205).
73
Enquanto os madeireiros e outros políticos de oposição aos políticos fazendeiros representados pelo A
Época e o Tribuna Paranaense buscavam romper com poder nas mãos das elites tradicionais da cidade,
os fazendeiros buscavam legitimarem-se no passado e na afirmação dos valores dos pioneiros da cidade
presentes no imaginário local.
48
como um momento de construção, pelos próprios profissionais, do
marco fundamental de um jornalismo que se fazia moderno e
permeado por uma neutralidade fundamental para espelhar o mundo.
A mítica da objetividade – imposta pelos padrões redacionais e
editoriais – é fundamental para dar ao campo lugar autônomo e
reconhecido, construindo o jornalismo como a única atividade capaz
de decifrar o mundo para o leitor [...] portanto, analisar as
transformações por que passa a imprensa no período é visualizar o
discurso memorável dos que se autodenominam agentes dessas
mudanças e promover uma discussão em torno das relações entre
imprensa e poder .74
Desta forma,
o que os jornais pretendem é não apenas atuar no campo político [...]
mas, sobretudo, conseguir mobilização cada vez maior do público.
Quanto maior a sua audiência, maior o seu poder de divulgação e a
lógica da conquista do próprio poder. E nada mais condizente com o
momento social da década de 1950 do que se transformar mais do
que em porta vozes da modernização, mas em seu próprio emblema,
produzindo um jornalismo em padrões completamente diversos do
que fora feito até então, pelo menos no discurso com que referendam
este processo. Nada melhor também para conseguir audiência do que
divulgar ao extremo que produzem um discurso que apenas espelha o
mundo. E conseguir audiência é sempre poder. 75
Portanto, vemos uma imprensa que, para divulgar o mito da modernização teve
que se apresentar neutra, apenas como um “veículo de notícias”, mesmo que presença
desse discurso de neutralidade não fosse novo no país. A fala de Lustosa na fundação do
Folha do Oeste já exemplificava essa busca pelo que entendiam como “a verdade dos
fatos”, mesmo que essa não seja possível.
Portanto, pode-se afirmar que mesmo estando já presentes no Brasil os ideais de
“objetividade”, “neutralidade” e “imparcialidade”, frutos desse contato com a imprensa
norte-americana desde o início do século XX, foi somente na década de 1950 que elas
se afirmaram e foram incorporadas ao ideário/imaginário jornalístico:
Foi somente na década de 1950 – e de forma alguma antes – que as idéias de
neutralidade e imparcialidade se formalizaram (através de manuais de
redação) e passaram a reger e a guiar como regra básica, a prática
profissional dos jornalistas. Foi apenas na década de 1950 que a objetividade
ganhou forma de técnica e o lead passou a ser a fórmula hegemônica de
abertura dos textos informativos. Foi nos anos 50, e não antes, que sobre o
seu mito se construiu toda uma deontologia, todo um ideário que justificava,
74
BARBOSA, Marialva. História cultural da imprensa - Brasil 1900-2000. Rio de Janeiro: Mauad,
2007, p.150-151.
75
BARBOSA, Op. Cit.2007, p.153.
49
legitimava e dava sentido ao jornalismo.76
É importante destacar que, na fase da imprensa brasileira iniciada nos anos 50 do
século XX é marcada também por jornais de forte caráter empresarial que muitas vezes
dependiam de investidores e capital externo e, conseqüentemente, não possuíam ideais
políticos neutros. Logo a subjetividade e a parcialidade existiam e ainda faz-se presente.
77
Neste momento, além da busca por essa neutralidade, ampliavam-se os jornais,
aumentando a oferta de informação e entretenimento, sobretudo, a partir do
afrouxamento vivido pela imprensa após a extinção do DIP (Departamento de Imprensa
e Propaganda) em 1945 e de seu sucessor o DNI (Departamento Nacional de
Informação), em 1946. 78
Além disso, a imprensa brasileira vivenciava uma notável impulsão iniciada a
partir dos investimentos do capital estadunidense. Os Estados Unidos não apenas
agiram economicamente sobre os jornais brasileiros, através da propaganda, do
marketing, mas também inspirando os jornalistas brasileiros com suas técnicas e
modelos de imprensa, contribuindo também para a profissionalização do jornalismo.
Técnicas tais como o lead e a “pirâmide invertida”, a implantação de novos cargos nas
redações dos jornais, tais como o copy-desk79, e a adoção e criação de manuais de
76
RIBEIRO, Ana Paula Goulart. Imprensa e História no Rio de Janeiro dos anos 1950. Rio de Janeiro:
E-Papers, 2007, p.28.
77
Entre os pesquisadores, a idéia de “objetividade” e “imparcialidade” buscada pela imprensa deste
período é notavelmente criticada, sobretudo pelos historiadores a partir da década de 1980, como Arnaldo
Contier, Maria Helena Capelato e Maria Ligia Prado (Discussão presente em LUCA, Tania Regina de.
História dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.). Fontes históricas. São
Paulo: Contexto, 2005, p.111-153, fazendo menção as obras: CONTIER, Arnaldo Daraya. Imprensa e
ideologia em São Paulo, 1822-1842: matizes do vocabulário político e social. Petrópolis: Vozes;
Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 1979; CAPELATO, Maria Helena Rolim. Imprensa e
História do Brasil. São Paulo: Contexto/EDUSP, 1998; CAPELATO, Maria Helena Rolim. Os Arautos
do Liberalismo: imprensa paulista. 1920 – 1945. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1989: PRADO, Maria
Ligia; CAPELATO, Maria Helena. O bravo matutino: imprensa e ideologia no Jornal O Estado de São
Paulo. São Paulo: Alfa e Omega, 1980.
78
Cf. MARTINS, Ana Luiza; LUCA, Tania Regina de. Imprensa e cidade. São Paulo: Editora UNESP,
2006.
79
O lead era a abertura do texto, o primeiro parágrafo, que devia resumir o relato do fato principal,
respondendo a seis perguntas básicas: quem?, fez o quê?, quando?, onde?, como?, e por quê?. Símbolo
máximo do jornalismo moderno, o lead veio substituir o “nariz de cera”, texto introdutório longo e
rebuscado, normalmente opinativo. A pirâmide invertida consistia em uma técnica narrativa onde o texto
noticioso deveria ser estruturado segundo a ordem decrescente de interesse e relevância das informações,
de maneira que o leitor tivesse acesso aos dados essenciais sobre o acontecimento nos parágrafos iniciais.
Os fatos seriam expostos por ordem de importância. Além de atender a lógica da leitura rápida facilitava
também o processo de edição, permitindo que, na hora da montagem da página, se cortasse o texto pelo
final, sem lhe causar danos. O copy-desk, um grupo de redatores, era responsável pela padronização e
revisão das notícias, sendo que, se necessário, poderiam reescrever as matérias para dar-lhes unidade de
estilo (Cf. RIBEIRO, Ana Paula Goulart. Op. cit., p. 2-4).
50
redação80 passaram a moldar a prática jornalística dos grandes centros brasileiros, sendo
somente décadas mais tarde difundido para as capitais menores e outras cidades
brasileiras.
No entanto, neste contexto, vemos em Guarapuava uma imprensa ainda bastante
precária, com poucos recursos técnicos, pouca mão de obra especializada e, sobretudo
com pouca regularidade. Entretanto, a busca por desempenhar o papel de “veículo de
informações” fazia-se presente. Jornais “a serviço da coletividade” foi um ideal que
permeou a produção dos jornais locais, como apontado anteriormente nas falas de
Lustosa, mesmo que nem sempre cumprido. Todavia, a presença dos jornais na cidade
não foi a única coisa a mudar.
As atividades sociais também sofrem um grande impulso a partir do
crescimento urbano e do comércio local. Novas ofertas de lazer apresentam-se. Cinemas
foram criados, como é o caso do Cine Guará. Maior que seus antecessores o cinema
constitui num dos principais lazeres da cidade.
As matinês geralmente lotadas nos fins de semana tornam-se palco de encontros
de crianças e adolescentes que iniciavam suas socializações. Cabia ao jornal divulgar a
programação do cinema geralmente apresentada na segunda página do jornal. Uma
avaliação da mesma demonstra uma grande quantidade de títulos apresentados, desde
filmes de temas religiosos, bang bang, além de diversos outros títulos nacionais, como
por exemplo os filmes de Mazzaropi, como o filme Jeca Tatú.
80
Os manuais de redação nos Estados Unidos já eram utilizados desde o final do século XIX, a exemplo
de manuais como o The Style Book of the New York Times, o manual de redação do jornal New York
Times. No Brasil, o primeiro a ser implantado vai ser o Manual de Redação do jornal Diário Carioca,
implantado pelo jornalista Pompeu de Souza no início da década de 1950.
51
Figura 9 – programação do cine Guará 2 de setembro de 1962
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G)
O Clube Guaíra, que havia sobrevivido aos tempos de crise, foi reformado e
passou a ser palco de novas festas, desfiles, concertos e etc. Além do Clube Guaíra,
novos clubes foram abertos ou restaurados, como o Clube Operário, o Clube Rio
Branco, o Clube Cruzeiro do Sul, dentre outros, que estavam ligados a diversos grupos
políticos e étnicos que compunham a cidade, como membros das elites tradicionais e
das novas elites, negros e poloneses, respectivamente.
Eram os jornais os divulgadores dessa ampliação no quadro de eventos sociais
na cidade. Eles informavam em espaços específicos relatos desses eventos. Foi nesse
momento que os jornais alteram um pouco o seu formato e abriram mais espaço para
uma diversidade de colunas e colunistas.
A crônica social, presente em alguns jornais da cidade já na primeira metade do
século XX, ganharam mais espaço, além de que, inspirados nas transformações das
colunas sociais dos grandes centros, passam a relatar a vida social citadina de forma
mais minuciosa, como será visto no capítulo seguinte.
52
CAPÍTULO II
Na cidade rumores: colunas sociais e colunistas em Guarapuava
Doutor em anedotas e em champanhota/ estou
acontecendo no café-soçaite/ só digo echanté,
muito merci e all right/ troquei a luz do dia pela luz
da Light/ agora estou somente contra a Dama de
Preto/ nos dez mais elegantes eu estou também/
adoro Riverside/ só pesco em Cabo Frio/
decididamente eu sou “gente bem”./ Enquanto a
plebe rude da cidade dorme/ eu ando com Jacinto
que é também de Thormes/ Tereza e Dolores falam
bem de mim/ eu sou até citado na Coluna do
Ibrahim/ e quando alguém pergunta como é que
pode, papai de Black Tié, jantando com Didu/ eu
peço um outro uísque, embora esteja pronto/ como
é que pode? Depois eu conto...
(Acontecendo no café-soçaite, samba de Miguel Gustavo)
2.1 – As Colunas sociais no Brasil: algumas considerações
A crônica social ou coluna social, segundo a historiografia, desde o final do
século XIX dedica-se a listar os acontecimentos sociais nas cidades brasileiras como
casamentos, aniversários, desfiles e eventos onde as elites se encontravam.
Segundo a historiadora Ana Luiza Martins, ao analisar a diversidade de revistas
produzidas bem como as várias práticas sociais a elas ligadas na cidade de São Paulo
nos primeiros anos de República Brasileira, “ainda em 1896 a ida ao velódromo da
Consolação era programa atraente, com presença da jeunesse dorée local, onde o
iniciante colunismo social ‘clicava’, em flashes de Kodaks, os figurinos da moda” 81, ou
como afirma a historiadora e jornalista Marialva Barbosa, em sua pesquisa sobre a
81
MARTINS, Ana Luiza. Revistas em Revista: imprensa e práticas culturais em tempos de República,
São Paulo (1890-1922). São Paulo: EDUSP: FAPESP: Imprensa Oficial do Estado, 2001, p.340.
53
leitura dos períodos cariocas no início do século XX: “as notícias ‘mundanas’, ou seja, a
crônica social, proliferavam nos jornais”. 82
Para a mesma autora, também citando um trecho das memórias de Luiz
Edmundo, intituladas “O Rio de Janeiro do meu tempo”,
A partir de 1900, uma série de inovações redacionais passa a fazer
parte do periódico [Gazeta de Notícias]. A de maior sucesso de
público é a introdução da coluna “binóculo”, uma espécie de “crônica
da sociedade”, escrita por Figueiredo Pimentel e que se transforma,
no dizer dos cronistas da época na “bíblia dos elegantes da terra”.
“Não há quem o não leia. A elite devora-o. é nesse plano de prosa
que o Sr. Ataulfo de Paiva vai aprender a melhor maneira de colocar
a cartola na cabeça; onde o Sr Humberto Gatuzzo toma conhecimento
da cor da moda para as suas gravatas e onde os smarts urbanos e
suburbanos aprende, a propósito de elegância e de chic, coisas
edificantes”. 83
Dedicado ao relato da vida cotidiana das elites, as colunas sociais emergem
como um local onde as próprias elites se vêem e onde os outros podem vê-las
delineando seus espaços.
Estruturalmente, atualmente a coluna social define-se como tal por ser uma
seção especializada do jornal ou revista reservada aos acontecimentos sociais de
determinado sociedade, entendidos como significativos não somente para o colunista,
mas para o grupo que lhe garante este status.
Elaborada em formato de bloco de texto, a coluna social tem seu tamanho de
acordo com interesse do periódico. Porém nem sempre foi assim. Ainda nos seus
primeiros passos ao final do século XIX e início do XX apresentavam-se como notas
curtas, muito mais parecidas com curtos anúncios espalhados nas confusões que ainda
representavam esteticamente os jornais naquele momento. Mesmo presentes, o espaço a
elas reservado era pequeno e pouco regular.
Entretanto, sobretudo a partir da década de 1950 a situação mudou. As colunas
sociais ou crônicas sociais como também eram conhecidas passaram a apresentar-se de
forma diferente, tanto em seu formato como em sua linguagem. Ganharam mais espaço
e tornaram-se organizadas e esteticamente aprimoradas, certamente fruto do
desenvolvimento
técnico
vivido
pela
imprensa
naquele
período
e
pelo
“desenvolvimentismo” que não se apresentava apenas no campo político e econômico
82
BARBOSA, Marialva. Os donos do Rio: imprensa, poder e público. Rio de Janeiro: Vício de Leitura,
2000, p.14
83
BARBOSA, Marialva. Op. Cit., 2000, p.47.
54
em algumas cidades brasileiras, mas também provocava reflexos nas sociabilidades
sobretudo das elites brasileiras.
Portanto, evocando a iniciante questão do colunista Moacir Werneck de Castro,
“que se deve fazer para aparecer nas colunas sociais?” (“De colunas e colunáveis”,
Jornal do Brasil, 18 de março de 1995, p.11). O próprio colunista se propõe a
responder tão inquietante questão: “ser razoavelmente conhecido é exigência
fundamental”, e complementa, “uma estrela de cinema e TV, um prêmio Nobel ou um
guitarrista de banda de rock, basta dar um espirro para ganhar registro” (“De colunas e
colunáveis”, Jornal do Brasil, 18 de março de 1995, p.11). Ou seja, se em seus
primeiros passos em solo brasileiro as crônicas sociais já apresentavam, como transcrito
anteriormente na fala de Luiz Edmundo, como a “bíblia dos elegantes da terra”, no
início da década de 1950 ela consagrava-se na imprensa nacional.
Certamente a consagração das crônicas sociais aconteceu mesmo com Manuel
Bernardes Müller, que ficaria conhecido na imprensa carioca como o “Maneco”, ou
então como o colunista social Jacinto de Thormes em 1945, ainda no jornal Diário
Carioca. Em suas colunas, Maneco, além de escrever sobre moda, comportamento,
festas e demais acontecimentos sociais, a comentar os acontecimentos com certo teor
irônico, muitas vezes jocoso e que ganhou sucesso, o que diferenciaram suas colunas
das então presentes em outros jornais brasileiros.
Segundo Maneco, quando Prudente de Moraes, redator-chefe do Diário Carioca,
o convidou para escrever a coluna social, “era tudo muito francês – tout em bleu, tout
em rouge. Eu achava aquilo uma frescura, mas como precisava ganhar dinheiro, não
pude recusar” 84.
Segundo Luiz Maklouf Carvalho, Maneco,
Carioca de Copacabana, nasceu em 7 de novembro de 23, filho e neto
de diplomatas. Entrou no jornalismo em 1944 no Diário Carioca, a
convite de Prudente de Moraes, neto. Queria que ele fizesse uma
crônica social – quando mal se falava nisso. Maneco jogava futebol,
lutava boxe, e achou que era “viadagem”. Mas topou, desde que com
pseudônimo. Prudente escolheu Jacinto de Thormes – do personagem
Jacinto e da cidade de Thormes, do romance A cidade e as serras, de
Eça de Queirós. Os agás foram acrescentados pela revisão. Assim
ficou, e pegou. Foi no Diário Carioca que Maneco inovou o
colunismo social, com o lançamento da lista das dez mais elegantes,
84
Depoimento concedido em 2004 pelo colunista ao jornalista Geneton Moraes Neto, disponível no site
http://www.geneton.com.br/archives/000030.html>. Acesso em: 15 Mai. 2009.
55
sempre estampada com grandes fotos de primeira página.. 85
Segundo “Maneco” essa inovação nas crônicas surgiu como fruto das leituras
das colunas sociais de jornais estadunidenses:
Eu lia sobretudo o New York Times e o Washington Post e – de vez
em quando – os jornais de Los Angeles, porque traziam a cobertura
de cinema. As colunas que me influenciaram eram publicadas por
esses jornais. Mas eu não podia fazer igual. Tinha de adaptar. Porque
nos Estados Unidos havia colunistas que tinham um poder terrível:
derrubavam fábricas, derrubavam shows, derrubavam pessoas. Aqui,
fiz então a brincadeira de inventar o Jacinto de Thormes. As colunas
americanas já tinham o formato de notas sincopadas. Devo dizer que
o Rio de Janeiro tinha uma personalidade. Se estivessem no Rio,
aqueles colunistas não escreveriam como escreviam nos Estados
Unidos. O Rio era uma das cidades mais divertidas do mundo. 86
Fruto dessas leituras, que segundo ele o “influenciaram” Manuel Bernardes
Müller exacerbavam o papel vivido pelas colunas nos Estados Unidos. Segundo ele os
colunistas naquele país desfrutavam de um poder “terrível”. Mesmo que essa situação
possa ser fruto de um exagero, a presença das colunas sociais, ou Gossip columns como
são conhecidas nos Estados Unidos, foi constante nos jornais desde a década de 1920,
sobretudo na Yellow Press, ou “Imprensa Marrom”
87
como ficou conhecida no Brasil,
fugindo ao “amarelo” da versão estadunidense, que apelava para o sensacionalismo
como forma de conquistar e atrair o público leitor. 88 Lá, nomes como Walter Winchell
e outros sobre pseudônimos como o de Cholly Knickerbocker conquistaram um grande
espaço, tornando-se figuras célebres.
Maneco realmente acabou inovando também na apresentação de novos
85
CARVALHO, Luiz Maklouf. Cobras criadas: David Nasser e O Cruzeiro. São Paulo: Editora SENAC
São Paulo, 2001, p.301.
86
NETO, Geneton Moraes. Jacinto de Thormes: o dia em que o criador do moderno colunismo social
enganou
a
rainha
da
Inglaterra
no
Maracanã.
Disponível
em:
<http://www.geneton.com.br/archives/000030.html>. Acesso em: 15 Mai. 2007.
87
Segundo Alberto Dines, o termo “marrom” em atribuição ao tipo de imprensa que nos Estados Unidos
era chamado de “Yellow Press” foi criado pelo jornalista Calazans Fernandes. Ao referir-se sobre a cor
utilizada pelos estadunidenses Calazans afirmou ser esta uma cor muito bonita, sugerindo no Brasil a
mudança da cor para marrom, tendo em vista que, segundo ele, “marrom é cor de merda!” (ABREU,
Alzira Alves de; LATTMAN-WELTMAN, Fernando; ROCHA, Dora (orgs). Eles mudaram a
imprensa: depoimentos ao CPDOC, Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003, p.83).
88
É importante apontar que em 2 de Julho de 1956 começavam a ser publicadas no jornal Ultima Hora de
propriedade do jornalista Samuel Wainer a coluna The international Set composta pela coluna de Walter
Winchell e pela coluna The nova York informa Cholly Knickerbocker, as duas principais colunas norteamericanas, traduzidas em português, colocadas logo após a coluna Ronda Social, na época assinada pelo
jornalista João Rezende.
56
personagens do cenário social e político que tinham em suas colunas espaço que antes
não possuíam na mídia. Políticos e novas celebridades “viravam notícia”, ao mesmo
tempo em que o colunista percebia o sucesso e a segmentação pelas quais as colunas
sociais haviam sofrido desde o início de sua carreira, como na passagem a seguir:
As colunas assinadas em diversos jornais registram anualmente
milhares de nomes que fazem parte dos diversos acontecimentos de
sua cidade, do País e do mundo. Existem colunas especializadas que
se ocupam de determinados setores e por isso mesmo falam mais da
gente do seu setor. As colunas ainda chamadas sociais, na verdade já
não se ocupam somente deste tipo de noticiário. Tornaram-se um
tanto ecléticas e tratam de todos assuntos, falam de todas as figuras
desde que elas dêem motivo para ser notícia. Nestes últimos
aparecem nomes que pertencem à sociedade, ao “café-society”, à
política, às artes etc. nesta mistura geral, alguns nomes de um ano
para outro começam a desaparecer, outros a aparecer e outros ainda
mantêm-se no noticiário. Nesta “Coluna de Jacinto de Thormes” de
hoje, não vamos nos ocupar dos velhos nomes mais citados, mas dos
que surgiram com mais freqüência em 1963, por terem virado notícia
constante. Vejamos quem e por quê [...] (“Coluna de Jacinto de
Thormes”, Ultima Hora, 4 de dezembro de 1963, caderno 2, p.1).
Os campos das novas celebridades eram muitos. A “sociedade”, na maioria das
vezes não representava a população, mas um grupo seleto de personagens e de espaços
específicos, a política, as artes, ou seja, em todos os campos de possibilidades onde
pudessem emergir “celebridades”, alvos constantes da mídia e dos noticiários
radiofônicos e televisivos. Alvos dos holofotes e da publicidade, nas palavras do
colunista carioca Moacir Werneck de Castro:
Ter nome no jornal é um emblema dos tempos modernos. Proust já
tratou do assunto em alto nível literário, desvendando os matizes sutis
das mutações do prestígio mundano, através tanto das oscilações da
fortuna e dos caprichos do boca-a-boca como de seus reflexos no
noticiário dos jornais [...] Em nosso país, as credenciais para penetrar
no hall da fama representado pelas colunas sociais estão sofrendo um
acentuado processo de... flexibilização [...] A culpa por tais passos
em falso não é (pelo menos exclusivamente) dos colunistas, que
registram na pressa da redação fatos, festas, filigranas e fofocas, mas
sobretudo de uma sociedade que gera um conceito de fama à sua
imagem, e que produz em seu ventre deteriorado essas figuras
marginais com direito aos holofotes da publicidade (“De colunas e
colunáveis”, Jornal do Brasil, 18 de março de 1995, p.11).
57
Realmente, apresentando ou não novas personalidades do cenário social
brasileiro, os colunistas como Maneco não deixavam escapar celebrações, sejam elas
públicas ou privadas de pessoas pertencentes ao High society
Na sua bonita casa o banqueiro, ex-embaixador e muito atual
Ministro da Fazenda, Senhor Walther, que é Moreira além de ser
Salles, ofereceu um almoço de despedida ao não menos Embaixador
Roberto Campos, que embarca para Washington. Comida de
dezesseis pessos entre os quais, nomes como Lucas Lopes, João
Batista Pinheiro, Sarmento Barata e San Tiago Dantas. Falaram, o
dono da casa e o Ministro do Exterior, do que tirou partido o Senhor
Roberto Campos, para dizer, referendo-se aos dois Ministros de
Estado: “Segundo o adagio mineiro é melhor ter amigos fortes no
governo do que ser o governo” (“Jacinto de Thormes apresenta
Sociedade & Adjacências”, Ultima Hora, 28 de Setembro de 1961,
p.11, grifos nossos).
Na passagem acima, Jacinto de Thormes não apenas relata os acontecimentos,
mas atribui a eles alguns sentidos importantes para a compreensão dos mesmos, seja na
ênfase atribuída a origem dos participantes, cargos políticos que exerciam, nos
sobrenomes que geralmente remetem a grandes famílias – “que é Moreira além de ser
Salles” –, senão ricas, dotadas de capital simbólico advindo de laços familiares
tradicionais. Além disso, nunca deixava de fazer alusão a algo que tenha sido dito e que
possuiria uma grande repercussão no cenário político regional ou nacional, “é melhor
ter amigos fortes no governo do que ser o governo”.
Entretanto, a grande cartada de Maneco foi promover a eleição dos “Dez Mais”
da sociedade carioca. Após conquistar fama escrevendo crônicas da alta sociedade
carioca, adquirindo prestígio nesse meio, a idéia de sugerir uma lista que apontaria as
pessoas mais importantes e elegantes daquela sociedade e que seria publicada em alguns
dos principais jornais da então capital nacional além de revistas de âmbito nacional,
como a Revista O Cruzeiro, tornava-se uma forma de conseguir ou manter a fama
tentadora.
De periodicidade anual, estas listas acabaram difundindo-se em vários jornais de
diversas cidades brasileiras, além de tornarem-se uma estratégia bastante recorrente
entre os colunistas sociais.
Além de toda a fama conquistada por intermédio das colunas sociais publicadas
em jornais como o Diário Carioca e o Ultima Hora89, Jacinto de Thormes ainda,
89
As colunas publicadas no segundo jornal acabavam tendo um alcance ainda maior, devido a
58
segundo o escritor Luiz Maklouf Carvalho, teria se tornado o “símbolo da mudança
editorial” no final de 1953 na revista O Cruzeiro, integrante dos “Diários Associados”
de Assis Chateaubriand:
O símbolo da mudança editorial foi a estréia, no final de 53, do colunista
Jacintho de Thormes, pseudônimo de Manoel Bernardez Müller, o Maneco.
[...] Foi no Diário Carioca que Maneco inovou o colunismo social, com o
lançamento da lista das dez mais elegantes, sempre estampada com grandes
fotos de primeira página. Wainer o levou para a Última Hora – e de lá ele se
foi para O Cruzeiro. Debutou em matéria de gala com pijama de listras, ao
lado do cachorro William Shakespeare Junior, o popular Willy. Logo estava
apresentando a lista famosa. A primeira de O Cruzeiro saiu em 9 de janeiro
de 54. [...] “eu fui convidado porque o Amádio queria modernizar e arejar a
revista”, diz Maneco aos 77, com quatro pontes de safena, bem-disposto e às
voltas com solicitações para que escreva sua autobiografia. Maneco e a sua
coluna de grande sucesso foram a resposta da revista ao crescimento da
concorrente Manchete, na qual o colunismo também pontificava, ao lado da
excelência gráfica, aspecto em que O Cruzeiro perdia de goleada. A
reportagem perdeu espaço – e parte dos rapazes não gostou, por enquanto de
leve.”. 90
Realmente, senão símbolo da mudança editorial de O Cruzeiro, a fama
alcançada por Maneco é incontestável. Além disso, efetivamente até o cachorro de
Maneco ganhou fama, tornado-se personagem freqüente em suas colunas, como na
imagem a seguir:
republicação das mesmas nas edições do jornal em São Paulo, Curitiba e Porto Alegre.
90
CARVALHO, Luiz Maklouf Op. Cit., 2001, p.301.
59
Figura 10 – A esquerda, “Vinte anos de crônica social: Gilberto Tropowski –
Jacinto de Thormes”; A direita “Crônica social de Jacinto0 de Thormes – O
Cruzeiro
Fonte: Acervo Centro de Documentação e Memória – CEDOC/G, Guarapuava, PR.
A Esquerda, na edição de O Cruzeiro de 09 de Junho de 1956, p. 42 Jacinto de
Thormes faz uma homenagem ao também cronista Gilberto Trompowsky. À direita, O
Cruzeiro de 31 de Março de 1956, p. 42 onde Jacinto de Thormes fala de uma festa,
intitulada “A Recepção no River”. O aspecto interessante nas duas imagens é a presença
do William Shakespeare Jr., ou seja, do cão pertencente a Maneco.
O “Jacinto de Thormes” exerceu a profissão de colunista social por mais de 15
anos, encerrando, porém, sua carreira na crônica esportiva, também no jornal Ultima
Hora. Após ele, outros nomes surgiram, sobretudo no Rio de Janeiro, naquele momento
Capital Federal e uma das principais cidades do país.
Outro colunista conhecido no meio jornalístico carioca e nacional, pelo seu
estilo e pelo sucesso alcançado por suas crônicas sociais foi Ibrahim Sued, também
conhecido por seus colegas de redação como o “turco”.
Ibrahim Sued, filho de imigrante árabe, nasceu no Botafogo, Rio de Janeiro, a 23
60
de junho de 1924. Ainda jovem, transferiu-se para Copacabana, segundo ele “com uma
máquina fotográfica a tiracolo e muita ‘garra’”
91
. Segundo Ibrahim conta em uma de
suas autobiografias, começou sua carreira jornalística como fotógrafo free-lancer,
freqüentando a redação de diversos jornais e revistas como a Folha Carioca, Diretrizes
(de Samuel Wainer) e o Jornal do Brasil, porém, sem conseguir emprego fixo.92
A primeira vez que Ibrahim teve seu nome impresso nos jornais foi quando, em
1946, o então fotógrafo acabou “flagrando” o momento em que Otávio Mangabeira
cumprimentou o general estadunidense Eisenhower, que acabara de comandar as tropas
aliadas vencedoras da Segunda Grande Guerra. Mangabeira segurou a mão do general e
baixou a cabeça. Deu a impressão de que beijou a mão do general. Esse ato provocou
um escândalo. A cena clicada por Ibrahim Sued foi publicada na primeira página do
jornal O Globo.
Figura 11 – “o beijo de Mangabeira” – O Globo, 1946.
Fonte: http://politicaegroselha.blogspot.com/2007/08/o-beija-mo-e-o-ministro-do-futuro.html.
Sua primeira oportunidade de escrever uma coluna diária foi no jornal A
Vanguarda, em 1952, tendo, logo em seguida, surgido outras oportunidades, inclusive
mais bem remuneradas:
Um dia, finalmente, em 1952, nem sei como, alguém acreditou em mim.
91
92
SUED, Ibrahim. 20 anos de caviar. Rio de Janeiro: Edições Bloch, 1972., p.11.
SUED, Op. Cit., 1972. p.7.
61
Barros Vidal dirigia A Vanguarda e me deu uma coluna chamada “ZumZum”. Ordenado: mil cruzeiros velhos mensais. Depois ganhei outra coluna
na Gazeta de Notícias. Mais quinhentos cruzeiros por mês. Em seguida, saiu
Manchete. Hélio Fernandes era seu diretor, então, e Adolpho aceitou-me
como colaborador. Comecei a fazer reportagens sociais “Melhores
Partidos”, “Mais Elegantes”, etc. ganhando a modesta soma de cem
cruzeiros por peça. Antes da Vanguarda eu escrevia uma crônica no Diário
Carioca aos domingos levado por Pompeu de Souza, onde me fiz amigo de
Horácio de Carvalho, Prudente de Moraes Neto e Evandro de Andrade [...]
Agosto de 1954. [...] para mim foi o início de uma nova fase profissional.
Recebi, sem surpresa, um convite de Roberto Marinho para trabalhar em O
Globo. O salário era fabuloso: 3 mil cruzeiros. O Jornal de Roberto era a
minha meta. 93
O Globo de Roberto Marinho, segundo Ibrahim, o teria apadrinhado como
colunista
94
. Tempos depois, Adolpho Bloch transformou-se em um dos grandes
empresários da imprensa brasileira, Manchete em uma revista revolucionária, principal
concorrente da então famosa O Cruzeiro, e Ibrahim em um dos colunistas mais lidos no
Brasil.
As notas de Ibrahim eram cobertas de erros de português, o que lhe rendia
muitas críticas e perseguições dentro das redações, tendo em vista que a presença dos
copy-desks, padronizadores e revisores das notícias, já havia se efetivado. Para os copydesks, Ibrahim costumava mandar um recado carimbado em suas colunas: “Esqueça
Camões. Favor não mexer no meu estilo”; segundo ele, respeitar o estilo era uma coisa
que sempre recomendava a seus copy-desks, pedindo para os mesmos deixarem os seus
erros de concordância, porque para ele era isso que atraia o público, a idéia de que ele
“escrevia como se estivesse falando”. 95
Algumas expressões eram comuns em suas crônicas, como "Sorry, periferia",
"Os cães ladram e a caravana passa" e "Sábado, dia de pernas de fora”, “De Leve”,
“Very Very Kar”, “Shangay”, entre outras.
Assim como Manuel Bernardes Müller, Ibrahim Sued também afirmava ter
sofrido “influência” da leitura das colunas sociais estadunidenses:
Meu colunismo sofreu forte influência de duas pessoas: Walter
Winchell e Elza Maxwell. Com Winchell, principalmente, e desde
muito cedo, aprendi que o campo de ação do colunismo não se
restringe apenas ao das “bonecas e deslumbradas” – quando bem
exercido, ele influencia os principais setores de atividade de um país.
Com Elza, decididamente, vi que o lado ameno da vida não implica,
93
Idem, mesmo autor, p.21.
Idem, mesmo autor, p.11.
95
Idem, mesmo autor, p.27.
94
62
necessariamente, em futilidade: Winchell está registrado nos anais do
Senado Americano; ele e o Presidente Roosevelt “foram os homens
que mais atuaram para que os States entrassem na II Grande Guerra”;
Elza, um dia, foi visitar a então Rainha Frederica da Grécia e esta lhe
pedi que fizesse alguma coisa pelos pobres de seu país. A colunista,
na ocasião com força total, para atrair turistas às ilhas gregas pediu ao
iate de Stravos Niarchos emprestado e organizou um badaladíssimo
cruzeiro pelo arquipélago grego. O cruzeiro deu capa do Time e o
roteiro, hoje, é uma das atrações turísticas da Europa. No meu
colunismo, aproveitando as lições herdadas e utilizando-as de acordo
com as necessidades e contradições nacionais, já atuei ao lado de
presidentes da República, fiz campanhas contra metas de governo –
como no caso de Brasília quando fui dos raros jornalistas a declarar
que Juscelino estava abandonando o Rio e construindo uma capital às
pressas – colaborei com o ex-Presidente Jango Goulart, de quem
antes fora terrível inimigo político tendo, posteriormente, conspirado
para derrubá-lo na Revolução de 31 de Março. Depois da Revolução,
entre outros episódios, participei da popularização de um candidato à
presidência: o Marechal Arthur da Costa e Silva, então ministro da
Guerra e que disputava com outro general, Cordeiro de Farias, a
preferência dos militares à sucessão de Castello Branco. Nesta
campanha, o meu poder de comunicação foi de grande importância. E
o carinhoso apelido de “Seu Arthur” que popularizei consolidou a
imagem do falecido presidente [sic]. 96
Ao mesmo tempo em que buscava ligar-se a fama que os colunistas
estadunidenses possuíam Ibrahim ainda buscava afirmar-se como uma espécie de
discípulo dos colunistas estadunidenses, apresentando-se, inclusive, como um homem
de poder, capaz de contribuir para derrubar o presidente João Goulart. Afinado com os
militares, referia-se ao Golpe como a Revolução de 31 de Março de 1964, o qual
Ibrahim via com bons olhos, tendo em vista que acreditava tratar-se de uma revolução
que havia libertado o país da “ameaça comunista”. Tal ameaça, para Ibrahim,
representava algo mais do que em teoria o “fim da propriedade privada”, mas
representava uma vida sem graça e sem luxo, tendo em vista que, em viagem por
Moscou, teve essa impressão da então U.R.S.S, símbolo do comunismo mundial. Essas
experiências foram relatadas, além de suas autobiografias de 1972 e 1976, em um
romance escrito pelo colunista em 1965 e publicado pela Bloch Editora97 com o nome
de 000 contra moscou98.
Além de colunista, Ibrahim Sued foi também apresentador de programa de rádio,
de TV, inclusive na TV GLOBO, além de promover um grande número de festas,
96
Idem, mesmo autor, p.21-22.
Editora da Revista Manchete, de propriedade do empresário Adolfo Bloch.
98
Nome sugerido pelo escritor Sérgio Porto. O livro foi recorde de venda em 1965 (SUED, Ibrahim. Op.
Cit. 1972, p.23).
97
63
planejar viagens de celebridades estadunidenses ao carnaval brasileiro, organizar e
julgar concursos misses e concursos de beleza, como o “Glamour Girl”, e desfiles como
“Desfiles Bangu”, patrocinado fábrica de tecidos Bangu, do Rio de Janeiro99. Em 2004
o colunista chegou a ganhar estátua na praia de Copacabana em frente ao Copacabana
Palace, que não chegou a ver, pois faleceu em 1995.
Em síntese, as colunas sociais conquistaram, sobretudo durante as décadas de
1950 e 1960 um grande público leitor, principalmente entre os membros advindos das
elites. Nesse momento, possuir uma Coluna Social demonstrava ser uma obrigação para
todo jornal, inclusive para os do interior.
2.2 – “Rumores Sociais” as colunas sociais em Guarapuava
Em Guarapuava a necessidade de uma coluna social também era visível. As
crônicas sociais já estavam presentes na imprensa local pelo menos desde a década de
1930, como é possível observar em jornais como o A Cidade, que circulou na cidade de
1932 a 1934.
Dirigido por Paulo Demário, o jornal A Cidade, apresentava em uma de suas
quatro páginas regulares a coluna “Vida Social”, de autoria anônima. Apesar de
aparecer nas páginas desse jornal com regularidade, a coluna “Vida Social” não possuía
um lugar específico de publicação dentro do jornal. Em algumas edições ela era
publicada na primeira página e em outras nas páginas seguintes. Provavelmente não
tinha um colunista fixo, ou pelo menos, no que se pode perceber, o colunista não
assinava a coluna, com exceção da coluna de 03 de junho de 1934, onde o colunista
denomina-se Marcelo.
99
O concurso e baile da “Glamour Girl” foi criado pela carioca Lea Afonseca Duvivier em 1944, sendo
dez anos depois organizado pelo colunista Ibrahim Sued ganhou fama sendo realizado em várias cidades
do país além do Rio de Janeiro, como São Paulo, Recife, Salvador, Porto Alegre além de diversas cidades
do interior do Brasil. O último “Glamour Girl” organizado por Ibrahim aconteceu em 1966. Quanto aos
“Desfiles Bangu”, surgido na década de 1950, teve como idealizadores os irmãos Silveira, na época
membros da diretoria da fábrica carioca de tecidos Bangu, com de escolher moças da sociedade para que
apresentassem modelos em tecidos de algodão. A idéia foi muito bem recebida pela “alta sociedade”
carioca, tendo em vista que se via como revolucionária a idéia de moças da “nata” carioca assumirem o
papel de modelos. O primeiro desfile foi realizado em 1952 no “Golden Room” do Copacabana Palace
Hotel. Ibrahim Sued passou a compor o júri do desfile em 1953, tornando-se posteriormente um de seus
organizadores. O desfile, que tinha fins filantrópicos, era formado por representantes escolhidas em todos
os Estados Brasileiros, que escolhiam suas candidatas conforme o sistema das escolhas de “misses”, ou
seja, por etapas municipais e, posteriormente, a nível estadual. Entre as premiações estava a participação
da vencedora em capas de revistas além de uma viagem a Paris ou Hollywood, além de ser considerada
um padrão de elegância e bom gosto (SUED, Ibrahim. 20 anos de caviar. Op. cit., p.89-91).
64
Figura 12– “Vida Social” – Jornal A Cidade, 03 de junho de 1934, p.4.
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G)
Na imagem acima, pode-se observar que a coluna “Vida Social” ocupava um
pouco mais que um quarto da página do jornal, dividindo seu espaço com anúncios,
notas da prefeitura, avisos aos assinantes, ao público leitor e outras colunas freqüentes
naquele jornal como “A Cidade nos Distritos”, que se ocupava de relatar
acontecimentos e problemas de alguns dos distritos pertencentes a Guarapuava.
65
Na imagem da página do jornal acima mostrada, verifica-se que “Vida Social”
ocupava duas colunas, geralmente composto por cinco colunas padrões. Nela aparece
uma lista de aniversariantes, notas de falecimentos, noivados além de um breve
comentário de seu colunista que aparece nos seguintes termos - “o título está ai em
cima. E para uma crônica social. Falta unicamente, o corpo da crônica. Mas, como o
título é o principal fiquemos por ai. Agora, vou ao Cinema. Quando voltar terminarei.
MARCELO” (A Cidade, 03 de junho de 1934, p.4). O comentário, o único encontrado
em todos os exemplares examinados, aparece com tom irônico. Para apresentar a
crônica, brinca com o termo “Vida Social” e para tanto ao invés de narrar a vida social,
como seria esperado, o autor dedicou-se a simplesmente listar alguns acontecimentos da
vida social citadina. Nota-se, portanto, que nesse momento não era necessário que a
narrativa dos fatos fosse realizada de forma mais completa ou mesmo opinativa, tendo
em vista que o autor afirmava que sua tarefa se completava possuindo apenas o título
indicando que tratava-se de uma “Crônica Social”.
Em 1934, o nome da coluna seria alterado para “A Cidade Social”. Entretanto,
permanece trazendo como característica fundamental as listas de aniversariantes,
casamentos sem a presença de comentários sobre os mesmos. Ainda, não possuía um
espaço exclusivo e dividia-se entre as cinco colunas gráficas padrões do periódico,
acompanhada de outras matérias e propagandas, como a que indicava os serviços
prestados pelo diretor do jornal, Paulo Demário, engenheiro e arquiteto de formação. 100
A “Página Social” da Folha do Oeste, presente no jornal desde sua fundação em
1937, não se diferenciava muito da “Vida Social” ou da “A Cidade Social” do jornal A
Cidade. Porém, no período delimitado por nós (1959-1964), ou seja, a partir de 1959 a
página receberia uma coluna social assinada. Esta nova coluna denominada “Rumores
Sociais” teve como seu principal colunista e provável criador Wilde Martini.
As informações disponíveis a respeito de Wilde Martini são de que ele nasceu
em Imbituva, cidade à aproximadamente 110 km de Guarapuava, em direção a Capital.
Chegou a cidade na década de 1950 como representante comercial do jornal curitibano
Diário do Paraná, pertencente ao grupo Diários Associados do empresário Assis
Chateaubriand (Folha do Oeste, 5 de abril de 1964, p.4).
100
Foi muito comum em Guarapuava, sobretudo até a década de 1960 a presença de jornalistas que não
dedicavam-se integralmente a tal prática, em geral, possuíam trabalhos e praticavam o jornalismo como
trabalho complementar ou como atividade diletante. A exceção conhecida é do jornalista Nabor Ferraz,
diretor do jornal Folha do Oeste de 1960 a 1962 além de diretor da Rádio ZyP4, Rádio Difusora de
Guarapuava na mesma época.
66
De 1959 a 1964, Wilde Martini, além de representante comercial foi cronista
social e ocupou o cargo de “Diretor Social” do Clube Operário (Sociedade Operária
Beneficente)
101
. Além disso, possuía um programa semanal desde 1958, na rádio
guarapuavana “ZYP-4” (Rádio Difusora de Guarapuava), denominado “Ronda Social”.
Neste programa comentavam-se alguns dos eventos presentes na coluna e dava conta de
outros que, por algum motivo, não haviam aparecido na coluna (“Rumores Sociais”,
Folha do Oeste, 13 de Setembro de 1959, p.2). Este programa também recebeu em
1959 o nome de “Cock-tail das 5”, posteriormente retornando ao nome de Ronda Social
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 1 de Maio de 1960, p.2).
Wilde Martini trabalhava como consultor de moda, decorador, além de jurado de
diversos concursos, entre eles os de misses. Durante os anos de existência da coluna, foi
o maior promotor destes concursos em Guarapuava, com destaque a eleição em 1963,
da miss a Tânia Mara Franco, já rainha do Matte do Sul do Brasil e posteriormente Miss
Paraná e em seguida Miss Brasil 2º lugar (Folha do Oeste, 5 de abril de 1964).
A revista guarapuavana Flash de julho de 1985, na matéria intitulada “a mais
bela de nossa história”, traz informações a respeito da participação de Tânia Mara
Franco no concurso Miss Brasil além de apontar para Wilde Martini como preparador
da candidata e que também acabou acompanhando a mesma na viagem de prêmio do
Miss Brasil para Miami Beach nos Estados Unidos. No retorno, participou com essa
miss na carreata pela Avenida 15 de Novembro.
101
Fundado em 1920 , a construção do Clube Operário, conhecido também como SORB (Sociedade
Operária Beneficente), se dá nos últimos anos de agitação social antes de um período de crise econômica
(TEIXEIRA, Luiz Cleve. Reminiscências do passado. Guarapuava: Esquema, 1993, p.52-53). Naquele
momento, via-se necessária a construção de novas agremiações que pudessem proporcionar horas de lazer
e novas festividades sociais. Seguindo os passos do Clube Guaíra, a agremiação comportou em seus anos
de existência grande parte das elites tradicionais e endinheiradas da cidade. Porém, diferente de seu
antecessor, possuía estatutos menos rígidos e por isso possuía um público mais amplo. Viveu seu auge
como agremiação na década de 1960 (TEIXEIRA, Op. Cit. p. 53.).
67
Figura 13 – revista Flash, julho de 1985
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G)
Wilde Martini não foi o único a assinar “Rumores Sociais”. Outros colunistas a
assinariam durante quase a metade da existência dessa coluna, sendo que, próximo ao
final da coluna em 1964, Wilde passou a assiná-la novamente. O mais provável é que
durante esse período o colunista estivesse ocupado com outras atividades sociais, tais
como os concursos por ele promovidos.
Entre os colunistas estavam Elias Farah (1961), que começa com um pequeno
68
box junto a coluna de Wilde Martini e assume a coluna durante algumas semanas. Filho
de Cartorário da cidade, Elias Farah também era diretor de um dos clubes da cidade, o
“Clube da Amizade” (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 3 de junho de 1961). Além
disso, foi o fundador e proprietário no final da década de 1960 do jornal Esquema Oeste
que trouxe para a cidade um novo padrão de impressão, como a publicação de imagens
coloridas.
Durante o ano de 1962 a coluna teve como responsáveis duas duplas, primeiro
Temístocles e Kátia e em seguida Sydney e Samyra. Além dos nomes não encontramos
informações sobre estes colunistas. Há indícios de que esses nomes seriam pseudônimos
utilizados, e que não seriam dois colunistas, tendo em vista que em vários momentos de
suas crônicas o texto freqüentemente aparece escrito em primeira pessoa do singular.
Outro colunista de Folha do Oeste foi Ruy Sérgio (1963), que além de ter feito parte do
corpo da redação do jornal, fora também Gerente Comercial e Gerente do jornal no
respectivo ano de 1963.102
Quando de sua fundação em 24 de maio de 1959, a coluna “Rumores Sociais”,
assinada por Wilde Martini iniciou ocupando uma estreita coluna de cerca de dez
centímetros de largura por trinta centímetros de comprimento, publicada na segunda
página do jornal, ainda com o título de “Página Social”.
102
Todas essas informações foram encontradas nos box de “Expediente” do jornais Folha do Oeste entre
os anos de 1962 e 1964).
69
Figura 14 – “Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 24 de maio de 1959.
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G).
Nessa primeira coluna, Wilde Martini comentou vários acontecimentos
ocorridos em Curitiba e reproduziu trechos de colunas de jornais da capital. Este
70
procedimento frequentemente esteve presente na coluna “Rumores Sociais” que trazia
informações recolhidas de colunas sociais de outras cidades informando sobre eventos
ocorridos na região.
Observando a imagem da página anterior, que traz a reprodução da primeira
publicação de “Rumores Sociais”, verifica que sua composição estética é bastante
simples, configurada por uma única coluna, dividida do resto da página por linhas
negras.
Tudo indica que essa coluna social veio ao encontro dos anseios das elites locais
que com grande número de eventos surgidos em face do crescimento econômico do
município encontrou um canal para se ver e ser vista no âmbito da cidade. Tanto que em
poucos meses a coluna passou a ganhar mais espaço, devido ao grande interesse
depositado pelo público leitor nesse tipo de publicação.
71
Figura 15 – “Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 4 de dezembro de 1960.
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G).
Como pode ser visto na imagem acima, “Rumores Sociais” já ocupava duas
colunas, ou seja, mais de metade da página dois. Na mesma página da coluna também
era publicada a lista de aniversariantes e a programação do Cine Guará. Além das
novidades da cidade, como sugere um subtítulo presente na coluna, “news of city”, esta
igualmente trazia informações sobre a cidade de Imbituva, que como foi visto era a
72
cidade natal de Martini. Os fortes laços do colunista com sua cidade eram demonstrados
frequentemente em suas crônicas, além disso, amiúde Wilde Martini colaborava ajudado
pelo colunista daquela cidade, Mr. Witt. Nesse momento o diálogo entre essas duas
cidades é constante. Entre os outros colunistas que assinaram “Rumores Sociais” a
presença de notas sobre Imbituva é ínfima e muito esporádica.
Em Março de 1962, o tamanho da coluna mantém-se o mesmo, porém, o
colunista ganha uma “foto oficial” e assinatura estilizada.
Figura 16 – “Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 18 de março de 1962.
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G).
73
A prática de publicar uma foto do colunista iniciou-se com o colunista carioca
“Jacinto de Thormes”. Em sua coluna no jornal carioca Ultima Hora, de propriedade do
empresário Samuel Wainer, regularmente trazia uma foto do colunista fumando
cachimbo, como no exemplo a seguir.
Figura 17 – “Jacinto de Thormes apresenta Sociedade e Adjacências”, Ultima
Hora, 17 de setembro de 1961, p.11.
Fonte: Arquivo Público do Estado de São Paulo.
Ibrahim Sued, outro colunista carioca, também trazia suas fotos publicadas em
suas colunas sociais.
74
Figura 18 – “Ibrahim Sued Informa”, Diário Carioca, 31 de dezembro de 1963.
Fonte: Arquivo Ibrahim Sued – Rio de Janeiro
Em Guarapuava a “foto oficial” seria adotada também por Elias Farah nos
75
poucos números por ele assinados. Os demais colunistas não lançaram mão de fotos,
provavelmente para preservar suas identidades e, assim, atuarem com mais liberdade.
A presença dessa foto oficial visava aproximar o colunista do seu público leitor
tornando-o uma figura conhecida, o que também demonstra a importância que ele
ganhou no jornal, tendo em vista que não existiam clicherias para a publicação de fotos
na cidade. Além da foto oficial do colunista, “Rumores Sociais” também passou a
reproduzir fotos de eventos noticiados.
Entretanto, a impressão de fotografias em “Rumores Sociais” dispôs uma
considerável periodicidade em relação a outros espaços do jornal. Porém, ocorriam
grandes atrasos na publicação de algumas notas em face da demora da chegada de
alguns clichês. Por exemplo, em 3 de dezembro de 1961, o colunista Wilde Martini
justificava o atraso de notícias referentes ao V Festival do Mate do Brasil devido à
demora na vinda dos clichês (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 3 de Dezembro de
1961).
Em geral, “Rumores Sociais” ocupava duas colunas, mesmo nos períodos em
que era assinada por outros colunistas. Porém, existiram exceções, como no caso da
edição 28 de fevereiro de 1962, edição comemorativa do “Jubileu de Prata” do jornal
Folha do Oeste.
Nessa edição a coluna ocupou a 2ª página inteira do jornal. Além disso, pode-se
notar a presença de várias fotos, uma de Wilde Martini, outra de Elias Farah no pequeno
box no canto direito da página, além das fotos de três jovens mulheres de famílias
tradicionais da cidade. A do canto esquerdo inferior, Laura Marta Pacheco Bastos, tinha
sido eleita “miss brotinho” de Guarapuava naquele ano, reservado exclusivamente as
adolescentes da cidade pertencentes à alta sociedade.
No canto esquerdo superior, se observará a foto de Claire Anunziatto,
representante de Guarapuava no V Festival do Mate, um concurso de beleza regional.
Ela também fazia parte da “Lista das dez mais elegantes de 1962”, lista produzida
anualmente e que destacava, na visão do colunista, as mulheres mais elegantes e bonitas
da cidade. Além disso, o colunista ainda aponta para o fato de Claire Anunziatto estar
noiva de Sebastião Martins um membro da elite pontagrossense. As colunas sociais
sempre reservavam um espaço substancial aos romances e casamentos.
A ultima foto, localizada no canto superior direito da coluna é a da jovem Tânia
Mara, relatando sobre sua vitória no concurso Rainha do Mate de 1961 e concorrente ao
título de rainha do mate nacional.
76
Figura 20 – “Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 28 de fevereiro de 1962.
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G).
Ao final de suas publicações a coluna “Rumores Sociais” já ocupava
77
regularmente mais da metade de uma das páginas do periódico, como na edição abaixo,
de 3 de maio de 1964:
Figura 19 – “Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 3 de maio de 1964.
Fonte: Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste
(CEDOC/G).
Na edição acima, o nome da coluna passou a ser resumido para “Rumores”, seu
78
formato não lembrava em nada as colunas anteriores assinadas por Martini. O relato é
mais longo, apenas limitado a descrever acontecimentos sociais sem comentários. Esse
fato ocorreu na publicação de apenas uma coluna social.
Esta coluna marca o fim de “Rumores Sociais” no jornal Folha do Oeste. O ano
de 1964 marca um período complicado para o jornal, sobretudo pelos fatos que
envolveram a prisão de seu proprietário, Antonio Lustosa de Oliveira, que, mesmo
morando na época em Curitiba, tinha uma participação assídua no jornal com a crônica
“Do meu canto”, onde utilizava o pseudônimo de João do Planalto, e ainda tinha uma
grande influência sobre a direção do mesmo. Segundo Silva103, na época da prisão de
Lustosa o mesmo era Diretor Presidente do Conselho Administrativo da Caixa
Econômica Federal do Paraná, nomeado anteriormente pelo então Presidente Juscelino
Kubitschek em 1960. O que para Lustosa representou uma ótima oportunidade para
tornar-se ainda mais popular como político na verdade foi um caminho frustrante. Dessa
forma, o Golpe Militar de 1964 contribuiu decisivamente para o término da carreira
política de Lustosa. Assim,
No mesmo mês de junho de 1964, em que o ex-presidente Juscelino
Kubitschek fora cassado em seus direitos políticos, denunciado por
corrupção pela Associação de Tesoureiros e Economiários e dos
Oficiais Economiários de Administração do Paraná, ele foi exonerado
da função pelo presidente Castelo Branco. Isso, antes mesmo da
conclusão do Inquérito Policial Militar que fora instaurado para
apurar as denúncias. Seguiu-se um calvário longo e penoso. Sua
prisão foi decretada pelo comando da 5a Região Militar, “por indícios
de culpabilidade”.104
Segundo Silva, o cotidiano da prisão foi minuciosamente descrito por Lustosa
em sua autobiografia:
O cotidiano dessa prisão foi registrado cuidadosamente por ele. No dia
25 de junho de 1964, fora levado ao Hospital Militar do Paraná. Não
sabia ao certo o motivo. Os parentes lhe levaram “cobertores, roupas de
lã, guloseimas, livros e um bloco de anotações”. A esposa não havia
sido informada da prisão, estava há dois dias em São Paulo, cuidando
da filha que iria dar à luz o terceiro filho. O Coronel Domingues, autor
da prisão, ia visitá-lo com freqüência, mantinham longas conversas.
Muitas outras visitas de solidariedade foram registradas nesses três dias
103
SILVA, Walderez Pohl da. Entre Lustosa e João do Planalto: a arte da política na cidade de
Guarapuava (1930-1970). 2008. 209f. Tese (Doutorado em História Social), Universidade Federal
Fluminense, Niterói, 2008, p. 19.
104
Idem – mesmo autor-Id.
79
de prisão, inclusive a do ex-governador Bento Munhoz da Rocha Neto.
Libertado, foi ao encontro da esposa e da filha. Não lhes contou sobre a
prisão. Assim, disse ele, “foi muito melhor”
Mesmo sendo curto período de sua prisão, já que foi inocentado no Inquérito
Policial Militar, tendo sido arquivado o caso em seguida. Entretanto, tal acontecimento
teve um peso muito grande sobre a vida de Lustosa, tendo em vista que, nos dois anos
seguintes ao de sua prisão candidatou-se novamente à Câmara Federal, filiado não mais
ao PSD (Partido Social Democrático), mas ao MDB (Movimento Democrático
Brasileiro), tendo sido eleito 4º suplente. Mesmo com mais de quatro mil votos esta
derrota marcou o fim da vida político partidária de Lustosa, tendo em vista que o
mesmo afirmou ter sido aquele o seu “Canto do Cisne”, alegando inclusive o
favorecimento dado aos candidatos apoiados pelo regime Militar.
Nesse sentido, Lustosa passa a fixar seu olhar ainda mais para Guarapuava.
105
Reativa a publicação do jornal que havia passado por um hiato de vários meses sem vir
a público, dedicando-lhe grande parte de suas energias e um número crescente de
crônicas assinadas como João do Planalto. Mesmo com a afirmação de Silva de que o
Folha do Oeste a partir daquele momento distanciou-se das correntes partidárias locais,
passando a reproduzir as notícias publicadas pelos jornais estaduais de grande
circulação e abrindo também espaço considerável para as colunas sociais106, as mesmas
só voltaram a ser publicadas no periódico no início da década de 1970, porém sem
contar com a presença das características nem com o sucesso anteriormente apontado.
Nesta perspectiva, junto aos problemas enfrentados pelo jornal, o ano de 1964
marca o fim da publicação de “Rumores Sociais” no Folha do Oeste. Além disso,
quanto a Wilde Martini, que havia assumido novamente a coluna, foi embora para
Curitiba, a fim de garantir o seu trabalho no Diário do Paraná, periódico de que era
representante em Guarapuava. (Folha do Oeste, 3 de Maio de 1964, p.3) Sob esse
prisma, entendemos que a instabilidade do seu trabalho no Folha do Oeste a partir da
prisão de Lustosa levaram-no a optar por ir a Curitiba e continuar no Diário do Paraná.
Além disso, é provável que o seu desligamento do Folha do Oeste também objetivasse
não ser envolvido nas investigações que rondavam naquele momento a vida de Lustosa
e de tudo que lhe fazia referência.
105
106
SILVA, Walderez Pohl da. Op. Cit. 2008, p. 154.
Idem, mesmo autor, p. 156.
80
2.3 – O público leitor: diálogos e negociações
A importância adquirida pelas colunas em Guarapuava era clara, não apenas
pelo crescimento da coluna, mas pela repercussão da mesma no cotidiano
guarapuavano. Desta forma, explorando períodos diferenciados da publicação da coluna
pode-se compreender de que forma se deu esse sucesso, qual a sua repercussão e de que
forma publico leitor e colunista dialogavam e negociavam na afirmação dos valores e
dos personagens sociais que eram apontados pela coluna.
O carinho e o reconhecimento do colunista muitas vezes era representado pelas
homenagens que recebia de seu público leitor, como a que consta na quarta página da
edição de 23 de abril de 1961 do Folha do Oeste, em uma matéria intitulada “Senhoras
e Senhores da Lista das 10 Miss Elegantes Homenagearam o Cronista Social Wilde
Martini”. Esse artigo relata uma homenagem feita ao cronista social onde o mesmo era
reconhecido como
jovem de espírito elevado, batalhador, idealizador e realizados dos
maiores acontecimentos sociais dos últimos tempos em nossa cidade.
Temos como exemplo: os desfiles Bangu, e outras festas
inesquecíveis [...] (Folha do Oeste, 23 de abril de 1961)
Martini, além de colunista, também era considerado pelo público leitor como
uma pessoa engajada socialmente com as elites, sendo idealizador e promotor de alguns
grandes eventos sociais da cidade. Dessa forma, alguns eventos já famosos nos grandes
centros como os “Desfiles Bangu” eram por ele realizados na cidade com grande
sucesso, fazendo com que as elites guarapuavanas se sentissem a par das tendências e
dos grandes eventos nacionais. Como apontado anteriormente, os “Desfiles Bangu”
foram originalmente promovidos por Ibrahim Sued, porém, versões interioranas do
evento espalharam-se por todo o Brasil sendo também patrocinada pela fábrica de
tecidos carioca Bangu.
Outro concurso produzido na cidade e originalmente criado por Ibrahim Sued
era o “Glamour Girl”. Dirigido em Guarapuava também por Wilde Martini teve grande
repercussão na imprensa guarapuavana, sendo que o próprio Folha do Oeste dedicou
vários espaços em sua publicação para fazer propaganda do referido concurso e apontar
as candidatas de tal pleito. Portanto, a difusão desse tipo de evento pelos colunistas de
81
várias regiões do Brasil contribuiu para que elites interioranas seguissem os passos das
elites cariocas e paulistas. Em Guarapuava, essa relação de semelhança com o que
ocorria nos grandes centros contribuía para a diminuição do sentimento de “isolamento”
da cidade, presente no imaginário das elites locais.
Geralmente, estes colunistas dispunham de uma série de regalias pelo serviço
executado, além de favores e presentes. Muitos representantes das elites locais, não
mediam esforços para que seus nomes aparecessem na coluna. É provável que o
colunista em questão tivesse alguns percalços nesse posto valorizador de pessoas das
elites nas disputas por espaços, inclusive pelo próprio jornal. Porém, nem sempre a
relação se dava de forma tão vantajosa para os colunistas. As pressões podiam ser
exercidas também pelos donos dos jornais, ou por pessoas em posições mais elevadas
dentro das redações dos mesmos.
Não temos nenhum exemplo relatado por Martini ou pelos outros colunistas de
“Rumores sociais”, entretanto, Dino Almeida, na década de 1950, colunista do Diário
do Paraná, jornal dos Diários Associados de Assis Chateaubriand em Curitiba, relatou
que pelo menos duas vezes o diretor daquele jornal havia lhe pedido, ou melhor, exigido
para que algumas pessoas não fossem citadas, entre elas, o General Ítalo Conti, na época
Secretário de Segurança Pública de Curitiba, tendo em vista que o mesmo não havia
propiciado a segurança necessária para os jornalistas que continuaram trabalhando
mesmo em uma greve de sua classe. 107
No geral, a relação entre os colunistas e os “colunáveis” eram mais amigáveis.
Entre os colunáveis havia aqueles que mantinham um relacionamento mais próximo
com o colunista a ponto de contribuir com este encaminhando sugestões e informações.
Isso ponde ser constatado no Folha do Oeste no trecho abaixo:
Falando ainda sobre a lista dos 10 Mais da soçaite guarapuavana,
temos a afirmar que muitas são as colaborações e sugestões que
estamos recebendo por parte de muitos grupos de pessoas da alta,
sugerindo-nos esta ou aquela pessoa para que figure em uma das
listas. Muito agradecemos as colaborações enviadas que além de nos
auxiliarem no desempenho desta árdua tarefa provam que estamos
tendo o integral apoio da sociedade local (“Rumores Sociais”, Folha
do Oeste, 20 de maio de 1962, p.2).
A citação acima faz referência a um dos principais eventos realizados pelos
107
O relato de Dino Almeida está presente nas memórias do jornalista curitibano Danilo Costa Cortes (Cf.
CORTES, Carlos Danilo Costa. O Diário do Paraná na imprensa e sociedade paranaenses. Curitiba:
Editora Paranaense, 2000, p.199).
82
colunistas, a eleição dos “10 Mais” da sociedade guarapuavana. Tal evento, realizado
por colunistas de todo Brasil108, era muito esperado pelas elites da cidade, pois, a partir
dela, apontava-se para pessoas que, ao ver dos colunistas109 e da alta sociedade,
apresentavam-se como as pessoas mais elegantes, mais cultas ou que, envolvidas em
alguma outra atividade destacavam-se, sendo, conseqüentemente, considerados como os
“melhores”. Realizadas anualmente, estas eleições indicavam, através da escolha de
atributos, sobretudos ligados aos bons costumes e a elegância quem, naquele respectivo
ano, havia se destacado nos eventos sociais citadinos. Em Guarapuava, essas eleições
aconteceram com certa regularidade eram muito aguardadas pelo público leitor.
Na ocasião das eleições dos “Dez Mais” iniciava-se uma mobilização que
instigava o público leitor através de anúncios publicados na coluna durante meses
antecipando o evento. Lendo as colunas observa-se que esse tipo de estratégia atraia o
público leitor, possivelmente contribuía para a vendagem do jornal e criava uma grande
expectativa em relação aos eventos onde eram selecionados os eleitos, lotando os
clubes.
Dessa forma, dadas as expectativas das elites, alarmadas pelo desejo de
pertencerem a tais listas, com certeza esse trabalho configurava-se em uma árdua tarefa
para o colunista, pois mexia diretamente com os egos das elites locais.
Ser escolhido representava tornar-se um modelo de elegância a ser seguido por
outros membros da elite que ficavam de fora da lista e por pessoas de outros grupos
urbanos. Dessa forma, fica evidente o porquê do apoio “integral dado pela sociedade
local”, tanto na decoração dos eventos, na seção de espaço dado pelas agremiações e
pelas sugestões enviadas ao colunista.
A eleição dos “10 Mais” repercutiu de forma muito favorável no reconhecimento
dos colunistas em Guarapuava, tanto que, na edição anteriormente citada de 23 de Abril
de 1961, na matéria intitulada “Senhoras e Senhores da Lista das 10 Mais Elegantes
Homenagearam o Cronista Social WILDE MARTINI” (Folha do Oeste, 23 de Abril de
1961, p.3), estabelece-se um relato de como ocorreu coquetel promovido pelas
“senhoras e senhoritas mais elegantes de Guarapuava” em homenagem ao cronista
social Wilde Martini.
Na reunião, estavam presentes as “10 Mais Elegantes” e grande número de
108
Neste caso, demonstra-se a difusão da estratégia criada por Manuel Bernardes Müller, o Jacinto de
Thormes, ainda em seus primeiros anos como colunista social de O Diário Carioca na década de 1940.
109
Diz-se “colunistas” pois esta coluna é referente ao período em que assumiram “Rumores Sociais”
Temístocles e Kátia, responsáveis pela coluna até metade de 1962. Esta citação também é um dos únicos
exemplos em que os colunistas dirigem-se ao público na 1ª pessoa do plural.
83
“pessoas de projeção e destaque na sociedade guarapuavana”. Em discurso, a Sra. Célia
Demário Virmond, uma das escolhidas como “Mais Elegantes” por Martini, afirmou
que os esforços do colunista representavam a busca para que se torne mais conhecido o
nome da mulher guarapuavana, em realizações “que servem de estímulo e incentivam a
vaidade, elegância e feminilidade à mulher da “Perola do Oeste” 110 (Folha do Oeste, 23
de Abril de 1961, p.3). Tendo em vista as homenagens prestadas ao colunista, nota-se a
sintonia entre colunista e colunáveis em meio à sociedade guarapuavana.
A referente sintonia entre colunista e colunáveis também pode ser constatada nas
notas publicadas onde o colunista comenta sobre cartas que recebia de alguns destes. Na
maioria das vezes essas cartas expressavam o contentamento dos escolhidos para
ocuparem os lugares de “Mais Elegantes” da sociedade guarapuavana, como em 1960
onde o Tenente Sérgio Mastek, devido a sua inclusão na referida lista, envia um cartão
de agradecimentos ao colunista Wilde Martini (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 4
de Dezembro de 1960).
Entretanto, mexer com as vaidades das elites nem sempre era uma tarefa fácil,
tendo em vista que ao publicar suas notas, os colunistas acabavam muitas vezes
excluindo pessoas que se viam fora da lista de maneira injusta, como pode ser
observado na nota publicada na coluna de 8 de Maio de 1960. Nela Martini reclama
sobre algumas críticas que a coluna havia recebido, tendo em vista a publicação da lista
das “10 mais Cultas”:
Me contaram que certa senhora referindo-se sobre a lista das 10 mais
Cultas, disse: O Wilde elegeu as 10 Mais Burras (perdoem-me o
termo, mas, foi assim mesmo). Essa pessoa talvez queira ser incluída
n’alguma lista, que poderia ser a lista das 10 menos instruídas, ou
mais deselegantes (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 8 de Maio de
1960, p.2).
A crítica de Martini não é feita abertamente, pois, mesmo sendo severa, deixa
um espaço para a dúvida a não apontar para o nome da pessoa a quem ela é endereçada.
No entanto, provavelmente em meio as elites essa informação vazava. Outro exemplo
aparece na edição de 8 de agosto de 1959, ainda nos primeiros meses da publicação da
coluna, Martini abre um espaço em suas notas para dar um “puxão de orelha” em
leitores que o haviam criticado:
110
Termo recorrente no Folha do Oeste para designar Guarapuava, considerada por escritores, como
Lustosa, a jóia localizada a Oeste do Estado do Paraná.
84
Muitas pessoas vem me criticando porque deixo de comentar
algumas festas importantes. De fato, isso acontece devido somente
porque não compareço a festas quando não sou convidado pois, não
desejo tirar proveito ou vantagens da posição de cronista social que
ora ocupo. [...] Outras vezes até esqueço de puxar o caderninho e,
quando no dia seguinte ponho o papel branco na máquina, só me vêm
à lembrança os nomes das pessoas que, no meu fraco entender, mais
se destacaram durante a reunião. Estas foram, para mim as mais
importantes. Reconheço que o ponto de vista é meu, mas esta coluna
não é paga para vermos pessoas e fatos através de prismas de outros.
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 8 de Agosto de 1959, p.2).
Como pode ser observado, aqui também Martini também não indica os autores
das críticas, porém, é enfático em sua afirmação “essa coluna não é paga para vermos
pessoas e fatos através de prismas de outros”. Estava defendendo sua liberdade de ação.
Portanto, as pressões por parte da diretoria do jornal, ou mesmo as pressões também
exercidas pelo público não deveriam ser explicitadas e sim ocultadas e/ou negadas, para
que não acabassem por deteriorar essa imagem de integridade da coluna. Da mesma
forma, ao não indicar os autores a quem a crítica era dirigida visava não minar o espaço
que era fonte da sua coluna.
Essa noção de “integridade da coluna” é defendida também por Ibrahim Sued
que, em suas memórias afirma que “é bom saber frisar que capitalizei as minhas
amizades apenas nos negócios, via jornalismo, é verdade, mas jamais vendendo a
notícia. Porque o importante no jornalismo é a integridade, e não vender a notícia”
111
.
Portanto as colunas só funcionam efetivamente porque apresentavam e davam essa
impressão de credibilidade.
A referida nota publicada em “Rumores Sociais” de 8 de Agosto de 1959
explicita outras características das colunas sociais, ou seja, como as notícias chegam ao
colunista e como funcionava a entrada do colunista nos eventos sociais citadinos.
Na primeira, onde diz “outras vezes até esqueço-me de puxar o caderninho e
quando no dia seguinte ponho o papel branco na máquina, só me vêm à lembrança os
nomes das pessoas que, no meu fraco entender, mais se destacaram durante a reunião”,
como convidado das reuniões sociais ia tomando nota dos presentes. No entanto, indica
que em determinadas ocasiões o caderninho era dispensado – o destaque que algumas
111
SUED, Ibrahim. Ibrahim Sued: O segredo do meu SU...CESSO. Rio de Janeiro: Editora Top
Promoções e Publicidade, 1976, p.23.
85
pessoas haviam conseguido na festa era mais importante que as anotações.
A presença do caderninho entre os colunistas é constante. Em 1962 os
colunistas Temístocles e Katia expunham na coluna o critério usado na coleta de
informações dos caderninhos, ou seja, um vermelho e outro azul, vermelho para as notas
mais satíricas, azul para as de caráter mais elogioso.
Enquanto o caderno azul representava um lado da coluna possivelmente mais
amigável o vermelho nem sempre agradava aos olhos dos “colunáveis” que nele eram
citados:
Ainda a poucos dias ouvi certo comentário sobre uma das seções de
RUMORES o tão discutido CADERNO VERMELHO... Tinha gente
muito zangada, bem, aquela seção jamais citou nomes só apontava
fatos e... deixava a carapuça para que usasse quem achasse que a
servia... não é isso mesmo??? Bem meu amigo, mesmo assim ficamos
como está... eu não vi nada... e.... você?????? (“Rumores Sociais”,
Folha do Oeste, 02 de Setembro de 1962).
A seção “Caderno Vermelho”, escrita pelos colunistas Temístocles e Katia
possuía uma linguagem mais satírica e abusava da fofoca como instrumento de atração
do público. Em várias ocasiões, como na passagem acima citada, utilizavam-se da
estratégia de não nomear os alvos de seus comentários como meio de não
comprometerem a coluna, porém essa sonegação de informação é que despertava o
interesse do público. A freqüente indicação de que os cronistas possuíam algumas
“bombas” a respeito de pessoas da alta sociedade também era uma estratégia recorrente
no “Caderno Vermelho” para instigar o público leitor:
Meu caderninho vermelho não tem mais “ENCOMODADO”
“alguém” porque nós estamos esperando acumular matéria para uma
“BOMBA”. E... afirmo, anotamos tanto do “RABINHO DE
PALHA” que dá até dó...” (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 17
de Junho de 1962).
Essa ameaça a pessoas anônimas nunca foi concretizada uma vez que em
nenhuma das colunas lidas foi encontrada alguma denúncia mais séria com indicação do
nome da pessoa a quem o comentário se dirigia. No entanto, como afirmado
anteriormente, em meio as elites da época provavelmente sabia-se a quem as críticas
eram endereçadas.
Como dito anteriormente, o fato de não nomear os alvos de comentários não
elogiosos funcionava como uma forma de privar a coluna de problemas com o seu
86
público. Ao mesmo tempo, esse tipo de notícia instigava o publico leitor a exemplo do
ocorrido no Rio de Janeiro a respeito de uma fictícia personagem criada por Ibrahim
Sued e por ele denominada “Dama de Preto” que encarnava todos os aspectos negativos
definidos ou reproduzidos pelo colunista. A dúvida da alta sociedade residia em quem
seria a inspiradora de tal personagem. Ao mesmo tempo em que esses grupos são
sedentos por informações elogiosas ao seu respeito notícias comprometedoras ou
fofocas que pudessem gerar algum escândalo também instigavam os leitores dessas
crônicas112.
Além da presença dos “cadernos” como forma de recolher informações que
comporiam a crônica social, a entrada do mesmo nos eventos sociais funcionava a partir
de convites: “de fato, isso acontece devido somente porque não compareço as festas
quando não sou convidado [...]” (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 8 de Agosto de
1959, p.2). Esses convites poderiam ser feitos diretamente ao colunista ou enviados
para o jornal, como atesta a coluna social de 21 de Abril de 1963:
Esta coluna social comunica as entidades sociais, estabelecimentos de
ensino e demais interessados em servir-se da mesma, quando ao
dirigirem ofícios de comunicação, solicitações ou convites o façam
dirigindo ao Departamento de Reportagens do Jornal Folha do Oeste,
cujo departamento é agora o encarregado desta secção e os atenderá
prontamente (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 21 de Abril de
1963, p.2).
Neste exemplo, único na história da coluna “Rumores Sociais”, quem assinava a
era o Departamento de Reportagens do Folha do Oeste, na época composto pelo
jornalista Genésio A. Decorégio, também responsável pelo Departamento de
Fotografia113. Esse fato ilustra a ausência de Martini que já completava quase um ano de
112
Segundo a coletânia de Crônicas de Ibrahim Sued, organizada pela sua filha Isabel Sued, a “Dama de
Preto”, personagem inventada pelo jornalista despertou muita curiosidade entre o público leitor da coluna.
A personagem tornou-se figura do Carnaval e tema de fantasia. Várias mulheres da alta sociedade foram
erroneamente identificadas com a personagem, como Beki Kablin e Elisinha Moreira Salles. Ibrahim
nunca a identificou. Mais tarde, em seu livro 20 anos de caviar (Rio de Janeiro, Bloch Editores, 1972),
afirmou que a Dama de Preto nunca tinha existido. (SUED, Isabel (org.). Ibrahim Sued: Em sociedade
tudo se sabe. Rio de Janeiro: Rocco, 2001, p.253).
113
Informação retirada do box referente ao “Expediente” do jornal. Após essa coluna assinada pelo
referido departamento, quem assume a coluna por curto tempo é o jornalista e, naquele momento gerente
do jornal, Ruy Sérgio, assinando a coluna durante o mês de Abril de 1963. Entre os meses de Abril e
Novembro de 1963 não existem os jornais na coleção encomendada por Antonio Lustosa. Não sabe-se se
o jornal teria interrompido sua publicação entre esses meses ou se simplesmente estas edições foram
perdidas. O mais provável é que, mesmo a coleção sendo organizada pelo proprietário do jornal, os
exemplares correspondentes aos meses de Maio a Outubro foram perdidos, tendo em vista que na
primeira edição de Novembro não foi publicada nenhuma nota explicando sobre uma possível interrupção
do jornal, nem Lustosa comenta tal fato em suas memórias, além de que grande parte das matérias do
87
duração, devido a sua participação constante na organização e condução dos concursos
de misses que aconteciam na região e que levavam o mesmo a acompanhar as
candidatas à capital paranaense e até mesmo ao Rio de Janeiro e a fora do país. Ainda,
também indica a transição da direção da coluna “Rumores Sociais” de Temístocles e
Kátia para Sidney e Samyra. No entanto, mais do que esse período de transição, pode-se
notar através de tal nota que muitos dos convites chegavam na forma de ofício ou de
carta a redação do jornal, localizada na rua Dr. Vicente Machado, 1068, próximo ao
centro da cidade. Além disso, também eram enviadas solicitações e comunicações de
interesse da coluna.
Além do público leitor em grande parte composto da “alta sociedade”, que era o
principal alvo das crônicas “114, vários comentários eram tecidos nas crônicas a respeito
de outros colunistas. Entre os colunistas lidos pelos escritores de “Rumores Sociais”
destacamos nomes como Aramis Millarch, que escrevia uma coluna social denominada
“Luzes da cidade” no jornal Ultima Hora do Rio de Janeiro, Dino Almeida, colunista do
jornal Diário do Paraná de Curitiba, Eddy Franciosi, do jornal O Dia também de
Curitiba, além de colunistas de cidades mais próximas como Irati, Imbituva (Mr. Witt)
e, sobretudo dos cronistas de outros jornais guarapuavanos, como é o caso de
Wanderley Silva, colunista do jornal A Época, jornal de oposição ao Folha do Oeste,
também da cidade de Guarapuava e de propriedade do então vereador municipal
Nivaldo Passos Krüger.
Em 8 de Maio de 1960 em “Rumores Sociais” Martini afirmou ter escrito
provisoriamente a coluna do jornal A Época, tendo em vista que o mesmo periódico não
dispunha de um colunista próprio. Entretanto, após ter deixado de assinar a respectiva
coluna, fato que se evidencia pela rivalidade entre ambos os periódicos, Martini indicou
que aquele semanário apresentaria no mesmo dia 8 de Maio de 1960 um novo colunista
mesmo dão a impressão da ausência dos números anteriores pelo teor das notícias publicadas.
114
Certamente, mesmo sendo voltadas para a “alta sociedade”, as colunas representavam uma forma do
restante da população letrada ter acesso a informações e notícias sobre eventos e espaços que muitas
vezes não podiam freqüentar. Desta forma, podiam participar sem “realmente” participar. Não é a toa que
um grande mercado editorial formou-se a partir da busca por tal tipo de informação. Segundo a
pesquisadora Maria Celeste Mira, revistas como a Contigo e a Caras apresentam enfoques positivos e
divertidos configurando-se em grandes colunas sociais. Para a autora, as revistas de fofocas ou que tratam
da vida das celebridades recriam estabelecem uma relação ciumenta do público leitor com àqueles
presentes nas páginas dos periódicos, tendo em vista que o público quer saber onde foram, com quem
foram e a que horas chegaram, entre outras informações. (MIRA, Maria Celeste.O leitor e a banca de
revistas: a segmentação da cultura no século XX. São Paulo: Olho d’água/FAPESP, 2001, p.208-211).
Entre a população não letrada, o rádio apresentava-se como uma alternativa, tendo em vista que tanto
colunistas mais famosos como Ibrahim Sued e mesmo os colunistas de Folha do Oeste de Guarapuava
possuíam versões radiofônicas de suas crônicas sociais.
88
social a fim de substituí-lo na escrita da coluna “Resenha Social”, desejando ao colega
boa sorte (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 8 de Maio de 1960, p.2)
Porém, na coluna de 22 de Maio de 1960, Wilde Martini demonstra que as
relações entre ele e o seu substituto em A Época, denominado Wanderley Silva, não
tornaram-se amigáveis tendo em vista desempenharem o mesmo papel de colunistas
sociais:
Causou sensação a uns e desagrado a outros a coluna Social de A
Época que vinha sendo escrita provisoriamente por mim e agora com
o Título de Resenha Social, é apresentada pelo Ser. Wanderley Silva.
A pessoa que esconde-se sob o pseudônimo de Wanderley Silva,
(digo pseudônimo porque ninguém o conhece), acha que eu estou
sentido e vou perder cartaz. Estar eu sentido, não é verdade e creio
que o colunista em pauta irá alcançar um cartaz verdadeiramente
fabuloso, sua coluna será das mais lidas, seu nome será dos mais
comentados, devido certo público, adorar o sensacionalismo” (sic)
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 22 de Maio de 1960).
As afirmações de Martini demonstram que a utilização de pseudônimos era uma
possibilidade entre os colunistas brasileiros. A exemplo de colunistas como Manuel
Bernardes Müller, que assinava suas colunas com o pseudônimo de Jacinto de Thormes,
a utilização de nomes fictícios favorecia o colunista caso não quisessem envolver seu
nome a alguns dos comentários que publicavam115.
Além da utilização dos pseudônimos, Martini também reconhece que existia
entre o público leitor pessoas que gostavam do sensacionalismo, sobretudo se
envolvessem pessoas e fatos da “alta sociedade”, tendo em vista que essas acabavam
por tornarem-se celebridades entre as sociabilidades de elite. Nesse sentido, o colunista
de Folha do Oeste não apenas põe em dúvida a identidade do colunista de A Época, mas
também o descaracteriza enquanto colunista sério e comprometido, chamando-o de
“sensacionalista”.
No jornal A Época, as crônicas assinadas por Wanderley Silva dedicavam um
maior espaço para notas mais sarcásticas, sobretudo na seção denominada “Venenos de
um minuto”, muito semelhante ao “Caderno Vermelho” encontrado na coluna
“Rumores Sociais” de 1962
115
116
. Entretanto, diferente das notas publicadas na seção
O nome Jacinto de Thormes foi retirado de um romance, no caso de um livro do escritor português Eça
de Queirós, A Cidade e as Serras.
116
Diferente da coluna social de Folha do Oeste, “Resenha social” não tinha um espaço estilizado e
reservado exclusivamente para sua publicação. Sua publicação eram mais esporádicas e tiveram curta
duração, sendo publicadas apenas em alguns meses de 1960. Alem disso, as condições de apresentação
89
“Caderno Vermelho” que não nomeavam os destinatários dos comentários, “Venenos de
um minuto” eram mais diretas:
O Deputado Lustosa diz... Estou pensando sériamente em patrocinar
um desfile estudantil na capital do Estado; pois para tal o povo entra
com a “gaita” e eu entro com a conversa e fico com a glória!
ººº
O W. Martini está bem cansado de dar cartaz, alguns até injustos, a
muitas beldades do nosso “society”, pondo o batalhador em sérios
apuros na realização do se desfile “Bangu”...
ººº
Outro que muda-se com armas e bagagens para o Society do Clube
Operário é o Sr. Arno Amaral Presidente do Grêmio Blue Star, já que
ali pretende levar a efeito grande baile no dia 10 (“Resenha Social”,
A Época, 04 de Setembro de 1960, p.3).
Os “venenos” de Wanderley Silva, acima citados, são dirigidos explicitamente a
três pessoas conhecidas na sociedade guarapuavana. O primeiro alvo dos comentários é
o então Deputado Antonio Lustosa, também proprietário do jornal concorrente, o Folha
do Oeste. Sobre ele, o colunista afirma que, ao promover um desfile com estudantes
guarapuavanos em Curitiba, Lustosa estaria buscando fazer pouco e ficar com a glória.
Não foi encontrada nenhuma resposta de Lustosa ao colunista, tendo em vista que
Lustosa, além de Deputado, compunha o conselho Diretivo da Caixa Econômica
Federal, além de residir em Curitiba.
O segundo “Veneno” é dirigido ao colunista Wilde Martini, afirmando que este
estava dando muito “cartaz” a algumas candidatas do desfile de roupas Bangu que seria
promovido na cidade. Segundo Wanderley, além de ter muito trabalho o “batalhador”
Wilde Martini ao agradar tanta gente, ainda o fazia com pessoas que não mereciam.
Wilde não responde a crítica feita, tendo em vista que já havia se posicionado em
relação aos comentários de Wanderley Silva.
O terceiro “Veneno”, porém, dirigido ao então presidente de uma das mais novas
agremiações da cidade, o “Clube Blue Star” afirmava que o mesmo havia se mudado
com “armas e bagagens” para o Clube Operário, onde aconteceria nos salões do mesmo
um baile promovido pelo “Blue Star”. O baile, como anunciava Wanderley Silva
realmente foi a efeito no dia 10 do mês de setembro de 1960, sendo publicada uma nota
no dia seguinte em “Rumores Sociais” sobre o sucesso do baile realizado nos salões do
estética do jornal A Época não eram tão boas como as do jornal Folha do Oeste que possuía maiores
recursos e uma melhor organização. A Época ainda seguia padrões de composição semelhantes a jornais
como o já extinto na década de 1930 A Cidade.
90
Clube Operário e que contou com a presença também de uma caravana vinda da cidade
de Irati (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 11 de Setembro 1960, p.2). Entretanto, na
mesma página da crônica social do Folha do Oeste de 11 de setembro de 1960 o então
presidente do clube Blue Star, o senhor Arno Amaral escreveu e mandou publicar um
artigo comentando a nota escrita por Wanderley Silva em “Resenha Social” de 2 de
Setembro de 1960. O artigo, intitulado “Bilhete ao Wanderley”, comentava sobre a
seção “Venenos de um minuto” afirmando não ter fundamentos os comentários
realizados pelo seu referido autor. Segundo o presidente do Blue Star, o clube não
estava se juntando ao Clube Operário e ainda justificou que, sendo o Blue Star ainda
uma agremiação caçula, necessitava do apoio da sociedade guarapuavana, nesse caso
representada pelo Clube Operário.
Sob esse prisma, não é difícil de entender a pouca regularidade e a curta duração
da coluna “Resenha Social” tendo em vista que o colunista faltasse com alguns cuidados
necessários para sua manutenção, sobretudo a ênfase em agradar o público, presente em
“Rumores Sociais”, o que explicaria sua longevidade.
Nessa perspectiva, a participação do público era constante e importante para
alimentar as colunas sociais em meio aos periódicos na cidade de Guarapuava. Porém,
esse diálogo do público leitor com o colunista não se fazia apenas em forma de
comentários, críticas ou opiniões, mas também como uma troca de favores. Sob esse
prisma é importante destacar essa interatividade entre o publico leitor e o colunista que
em grande parte eram baseados em relações de negociação, sendo em nenhum momento
imparciais. Pelo contrário, essa participação do público leitor que dava legitimidade a
coluna era exercida a partir de pressões e pelo uso do poder, seja ele econômico ou
simbólico, ou de ambos.
Tendo em vista o papel desempenhado pelos colunistas na sociedade
guarapuavana na promoção de eventos, enviavam-se convites aos colunistas para que
participassem ou colaborassem na suas realizações. Certamente a presença do colunista
em tais eventos era chamariz para contar com a presença das elites locais que somariam
as colaborações como em exemplo de 23 de setembro de 1962 em nota publicada por
Temístocles e Katia:
Inúmeras são as solicitações de nossos leitores e ouvintes do
programa RONDA SOCIAL para que colaboremos para
programações e promoções das várias entidades sociais de
Guarapuava. Respondemos: - aqui estamos ao inteiro dispor de todas
91
(indistintamente), porque a finalidade é prestigiar da melhor maneira
os acontecimentos sociais de importância para nossa “society”
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 23 de Setembro de 1962, p.2)
Portanto, percebe-se que a partir de 1959 através da coluna “Rumores Sociais”
um aumento significativo nas sociabilidades das elites locais, rememorando décadas
anteriores onde o poderio econômico dos fazendeiros possibilitava a freqüência dos
eventos sociais. Como um mapa desses eventos, a coluna “Rumores Sociais” entre os
anos de 1959 e 1964, não apenas permitiu que um maior número de indícios desses
acontecimentos chegasse até nós, mas nos permite também perceber a grande freqüência
em que estes acontecem após as transformações iniciadas na cidade a partir da presença
das madeireiras e dos contingentes populacionais chegados na cidade naquele momento.
Dessa forma, o capital mobilizador gerado pelas madeireiras não apenas movimentou o
comércio local e gerou as transformações na configuração urbana de Guarapuava, mas
incentivou o reavivamento das sociabilidades culturais das elites que haviam passado
por momentos de dificuldade e pouca freqüência. Nesse sentido, esse capital também
mobilizou as reformas de alguns clubes locais, que passaram a investir também em
decoração dos salões, como no caso do baile de carnaval de 1963, onde o clube Guaíra
contratou uma empresa para fazer a decoração interna, chamada Líder Neon de Santa
Catarina, gastando o equivalente a 156 mil cruzeiros117.
Com grande frequência, os eventos sociais tinham interrupções agora somente
temporárias, não por falta de recursos, mas por causa de outros compromissos como as
eleições, locais ou nacionais, que despertavam as paixões políticas da “alta sociedade”
na cidade, como na campanha política de 1963, que elegeu Nivaldo Passos Krüger para
seu primeiro mandato como prefeito local. Uma semana após a realização da referida
eleição, os colunistas de “Rumores sociais” afirmaram que “com o pleito da semana
passada nada aconteceu em nossa soci, que ficou completamente tomada daquela febre
política também, o que não... permitiu que algo acontecesse” (sic) (“Rumores Sociais”,
Folha do Oeste, 20 de Janeiro 1963).
Entretanto, grande parte destes eventos era restrita a população em geral.
Somente associados podiam participar das atividades, como indica a coluna de 21 de
Junho de 1959, ao afirmar que visitantes somente podiam entrar se forem apresentados
117
Livro Caixa (Clube Guaíra), Lv 26, Folha 853. A decoração ainda recebeu nota de elogio na coluna
“Rumores Sociais” de 21 de Abril de 1963.
92
por um dos sócios do clube.
A restrição a pessoas “desconhecidas” e não associadas não era dada apenas pelo
título das agremiações, mas também pelas próprias práticas de sociabilidade das elites
guarapuavanas que criavam restrições simbólicas e materiais para a participação nestes
eventos, como indica a fala da senhora Florisbela Bittencourt Stange, recolhida pela
historiadora Márcia Tembil, ao se referir ao Clube Guaíra, e na coluna social do Folha
do Oeste de 28 de Setembro de 1961:
O Clube Guairá era um clube muito tradicional, da aristocracia
guarapuavana, como era chamado na época. Aristocracia era a
denominação dada às famílias tradicionais de Guarapuava. Hoje, eu
relaciono o nome aristocracia àquelas com um grande poder
aquisitivo pelo que se falava na época: fulano é a maior fortuna de
Guarapuava. Assim, para ir a um baile no Guairá, que era um clube
selecionado, as moças faziam vestidos maravilhosos que eram usados
uma única vez, caso contrário alguém poderia dizer> no baile tal ela
já usou esse vestido, e isso não pegava bem. O mesmo vestido só
podia ser usado no Clube Operário. Por isso, era tudo muito chique, o
clube era chique, não entrava qualquer um [...] 118
GALA
Para o maior “finesse” do Baile das Debutantes, só será permitido
dançar com traje de gala (comprido), não sendo tolerado (mesmo de
luxo) o vestido curto (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 28 de
Setembro de 1961).
Segundo a fala da senhora Florisbela Bittencourt Stange, pode se perceber que
grande parte dos eventos comentados pelas colunas pertenciam exclusivamente a uma
pequena parcela da população que tinha autorização para delas participarem e também
possuíam condições financeiras. Além disso, os clubes, como percebe-se na passagem
do Folha do Oeste realizavam imposições ao seus convidados que nesse caso exigiam
certa boa condição financeira, além de também buscar prevenir certos “inconvenientes”
com roupas femininas.
A representação da riqueza, também presente na fala de Stange, atesta para um
dos modos de como as novas elites citadinas, no caso, sobretudo a madeireira,
conseguiram acesso a estes espaços, ou seja, pelo dinheiro, obviamente aliado ao poder
que dele provém.
118
TEMBIL, Márcia. Op. Cit., 2007, 183.
93
Desta forma, ao longo da publicação de “Rumores sociais”, percebe-se que
juntamente aos nomes de tradicionais famílias da cidade, como Marcondes, Rocha,
Bastos entre outros se mesclam a famílias a nós desconhecidos. Ou seja, a própria
dificuldade em relacionar os “colunáveis” a partir do final da década de 1950 está
intrinsecamente relacionada ao aumento populacional e as alterações nos quadros das
elites da cidade, a exemplo da eleição das 10 senhoras “Mais” de Guarapuava em 1959,
publicada em “Rumores Sociais”:
As 10 senhoras “MAIS” de 1959:
Sra. Jamile Wakim Haick
Sra. Arice Fleury Rocha
Sra. Nadir Marcassa
Sra. Elizabeth Giancotti Moro
Sra. Gracita Gruber Marcondes
Sra. Adair Souza
Sra. Jacy Bastos
Sra. Míriam Ribeiro
Sra. Terezinha Carvalho
Sra. Irecê Ersinger
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 27 de Dezembro de 1959,
grifos nossos)
Entre os nomes que compõe as escolhidas para o título de senhoras mais
elegantes podem-se notar sobrenomes tradicionais como os Rocha, Souza, Bastos,
Ribeiro, Carvalho e Marcondes, referenciados no primeiro capítulo deste trabalho na
fala de Gracita Gruber Marcondes, eleita também uma das “Dez mais” pela lista acima
citada. Dessa forma, percebe-se que, mesmo com as mudanças geradas pela presença
dos madeireiros na cidade no início da década de 1950, as famílias tradicionais na
cidade ligados aos antigos fazendeiros ainda prevaleciam como portadores de maior
poder simbólicos que os demais componentes das elites citadinas. Ainda, essa
predominância inicial, nos ajuda a esclarecer os ressentimentos quanto ao papel das
madeireiras na cidade, evidenciada nas afirmações da senhora Gracita ao afirmar, como
citado também no primeiro capítulo desse trabalho, que as mesmas haviam acabado
com a riqueza das matas nativas da região, tendo em vista que, mais tarde, essa
predominância diminui gradativamente frente a imposição no cenário social das elites
madeireiras e das demais que passam a se formar naquele momento em Guarapuava,
conquistando o lugar que anteriormente pertencia as famílias da elite campeira.
94
Entre os demais componentes da lista, dadas as transformações ocorridas em
Guarapuava e o fluxo de novos integrantes às elites locais, a dificuldade na identificação
é muito grande. Inclusive, alguns sobrenomes são desconhecidos dado o fato de não
terem sido encontrados e descritos em outras fontes. Desta forma, os indícios existentes
não dão conta de perceber o momento exato de sua chegada, apesar de que indicam a
permanência de sua visibilidade social entre as elites, já que alguns dos sobrenomes
citados na lista das “Dez mais” de 1959 não aparecem em outros momentos da coluna
“Rumores Sociais”, como a Sra Nadir Marcassa, não mais encontrada na referida
coluna.
A presença desses novos elementos compondo as elites da cidade também
podem ser percebidos em outra entrevista realizada pela historiadora Márcia Tembil,
agora com o senhor Vitoldo Lourival Prestes, conhecido na cidade como senhor Vavá:
[...] eu não quero dizer que Guarapuava está melhor ou pior, ela está
na sua época. Agora ela teve uma modificação muito grande, a gente
já não conhece as pessoas como antigamente, pois, antigamente todo
mundo se conhecia, era amigo. Agora é tudo gente estranha. Mas isso
é natural. A cidade cresceu, veio muita gente de fora. A cidade já
começou a mudar de 50 pra cá, quando começaram a vir para cá os
madeireiros e com eles as serrarias que trouxeram muita gente nova.
Ai tudo começou a mudar .119
A fala do senhor Vavá, reafirma que a chegada dos madeireiros foi uma das
responsáveis pelas mudanças na cidade. Essas mudanças acabariam implicando em
alterações no quadro das elites ao mesmo tempo em que oferecia para estas novas
oportunidades de lazer, presentes com freqüência nas colunas sociais, possibilitando a
mesma o seu aumento de espaço e importância dentro dos periódicos, como o Folha do
Oeste.
De certa forma, o crescimento percebido em “Rumores Sociais” entre os anos de
1959 e 1964, indica o impacto dessas transformações e da presença do capital financeiro
que gera o crescimento urbano de Guarapuava, bem como a intensificação da freqüência
dos eventos sociais das elites citadinas. Sob esse prisma, mesmo a elite campeira
possuindo maior capital cultural e simbólico em relação as novas elites citadinas, teve
de buscar formas de manter-se em visibilidade social. Acompanhar as condições
financeiras de seus concorrentes não era uma tarefa fácil, tendo em vista que participar
119
TEMBIL, Márcia. Op. Cit., 2007, p.185.
95
das sociabilidades da “alta sociedade” guarapuavana demandava tempo e dinheiro.
Nessa perspectiva, as situações por nós evidenciadas necessitavam uma
negociação constante entre os colunistas, seu público leitor e os periódicos locais. Dessa
forma, a trama que compunha essas sociabilidades e as oportunidades de visibilidade
social estavam ligadas intrinsecamente aos fatores econômicos e políticos que
envolviam as relações entre as elites locais.
Esses jogos de negociação e as lutas simbólicas que delas eram originadas
levavam a criação constante de estratégias de auto-afirmação, provindas das próprias
elites ou criadas e veiculadas pelas colunas sociais, no intuito de garantir a perpetuação
de determinados códigos e valores estabelecidos naquele meio. Ou seja, quem define se
um evento é importante ou não? Quem deve ser reconhecido com um modelo a ser
seguido? Que comportamentos são aceitáveis e quais não o são? Como permanecer com
uma visibilidade socialmente positiva?
Percebe-se, portanto, que ao buscar delimitar as regras de pertencimento à “alta
sociedade”, as colunas sociais acabavam contribuindo na difusão de valores,
representações, discursos que dividiam o espaço urbano quanto aos seus usos, quanto a
quem devia ocupá-los e quais os valores político/sociais neles envolvidos.
Sob esse prisma, entre os anos de 1959-1964 a coluna “Rumores Sociais” não
apenas delimitou e instituiu na cidade padrões a serem seguidos dentro do espaço
urbano, mas também em relação ao métier do colunista social, possibilitando ao mesmo
a conquista de um espaço representativo em meio aos periódicos locais. “Rumores
Sociais” instituiu também um padrão estético que buscava a consonância com as
colunas dos grandes centros, obviamente limitada pelas condições técnicas de sua
produção que, no entanto, eram superiores aos demais encontrados na cidade de
Guarapuava. Nenhuma outra coluna social na cidade já havia conquistado tal espaço e
nem mesmo as suas contemporâneas obtiveram a mesma notabilidade, sendo
esporádicas, mais apelativas, pouco legitimadas.
Mas como crônicas da alta sociedade, além de presenciar as lutas simbólicas
ocorridas na cidade, consciente ou inconscientemente as evidenciando em alguns de
seus aspectos como contribuiu para as mudanças do imaginário local? Quais as
representações por ela difundidas? Quais as suas estratégias? É o que pretendemos
apontar a seguir.
96
CAPÍTULO III
Crônicas da alta sociedade: discursos e representações nas colunas sociais do Folha
do Oeste
“Ter o nome no jornal é um emblema dos tempos
modernos. Proust já tratou do assunto em alto nível
literário, desvendando os matizes sutis das mutações do
prestígio mundano, através tanto das oscilações da fortuna
e dos caprichos do boca-a-boca, como de seus reflexos no
noticiário dos jornais”
(“De Colunas e Colunáveis”, Jornal do Brasil, 18 de Março de 1995, p.11).
A epígrafe, trecho de um artigo escrito em 1995, pelo colunista Moacir Werneck
de Castro, ilustra um dos desejos constantes entre as elites brasileiras entre os anos 50 e
60 do século passado.
Verem seus próprios nomes publicados em jornais e revistas ainda representa um
sinal de reconhecimento para muitos. Na década de 1950 e 1960 essa afirmativa era
uma constante. A presença de nomes nos jornais e revistas da época entre as elites
representava algo a ser conquistado, um ideal, um símbolo de reconhecimento e glória.
Nesse sentido, as colunas sociais contribuíram com esse papel. Os colunistas
contribuíam para estabelecer quem as elites acreditavam que deviam “aparecer”, e dessa
forma instituir as qualificações necessárias para “ser visto na sociedade”. Tornaram-se
meios eficazes de manutenção de visibilidade social de grupos tradicionais a muito em
foco no “society”. Também contribuíram para as transformações das altas rodas
brasileiras ao acompanhar a emergência de novos personagens às “altas rodas”
brasileiras.
Nessa perspectiva, o capítulo que segue, tem como objetivo principal buscar
mapear e desconstruir os discursos e representações difundidos pela coluna “Rumores
Sociais” entre os anos de 1959 a 1964, período em que estas foram publicadas no jornal
Folha do Oeste em Guarapuava.
O que era preciso para ser um colunável? Qual a “importância” necessária ou
97
assumida ao tornar-se um alvo das colunas sociais? Estas são algumas das questões que
nos instigaram à realização deste trabalho e que serão à frente apresentadas.
3.1 – Importância: uma questão de ponto de vista
A coluna social foi privilégio de poucos, quando esta situação começou
gradativamente a mudar ao final da década de 1950. Anteriormente, os quesitos para
tornar-se um colunável eram muito mais rígidos e menos acessíveis para os que
ansiavam aparecer nas colunas.
Ser membro de uma família importante era fundamental. Contudo essa
importância não advinha somente de uma posição financeira privilegiada, embora
muitas vezes na prática isso acontecesse com os colunáveis. Ter “berço de ouro”, como
costumeiramente se identificava esses membros, significava também ser herdeiro de
uma tradição que poderia ser ligada ao seu pioneiro na cidade, relacionando os nomes
próprios àqueles que fundaram e desenvolveram a cidade e aos valores simbólicos
atribuídos aos mesmos pelo imaginário local. Além disso, representava também ser
portador de uma série de atributos que não podiam ser comprados pelo mero dinheiro.
Atributos estes que levavam os indivíduos a terem comportamentos distintos, elogiáveis
e possivelmente inspiradores para outros grupos. As belas roupas, as maneiras de andar,
comer, falar e o que falar representavam não apenas atos cotidianos, mas apontavam
para representações muito amplas no sentido de construir ideais de condutas, modelos a
serem seguidos, hábitos de refinamento e que deviam ser praticados, apreciados e
copiados por todos. Nesse sentido, as colunas representavam uma maneira de divulgar
todos esses códigos, tornando os colunáveis em modelos sociais ao mesmo tempo em
que permitiam ao publico leitor, não pertencente a esse mundo, participar
artificialmente, ou seja, vislumbrá-lo. Segundo José Marques de Melo,
já que a maioria das pessoas está excluída do reduzido círculo dos
colunáveis (poder/estrelato), dá-se-lhe a sensação de participar desse
mundo, através dos colunistas. Trata-se de uma forma de participação
artificial, abstrata. Participam sem fazer parte. Acompanham à
distância. 120
Estes “códigos de crenças”, como os chamou Richard Sennett, significa como as
120
MELO, José Marques de. A opinião no jornalismo. Petrópolis: Vozes, 1994, p.140.
98
pessoas levam a serio determinados comportamentos e as situações em que estão
envolvidas, ou seja, as atitudes que instituem papeis a serem desempenhados. Além
disso, Sennett aponta para a existência de comportamentos específicos para
determinadas situações que envolvem a vida em público. Como nos palcos, esses
“padrões de comportamento”, de hábitos, estão intrinsecamente envolvidos com os
papeis que cada “personagem” da vida real desempenha nas “artes públicas”, ou seja, na
vida publica. 121
Para Bourdieu, tal situação representa não apenas um “código de crenças”, mas
um sistema de disposições para a prática social. Essas atitudes fundamentam condutas
regulares. Dessa forma, o habitus do grupo, como o chamou Bourdieu, faz com que os
agentes que o possuem comportem-se de uma determinada maneira em determinadas
circunstâncias. 122
Para ilustrar melhor essa situação, podemos notar nas colunas sociais
guarapuavanas que as polêmicas em torno dos comentários veiculados pelas crônicas
colocavam não apenas em xeque os comportamentos reconhecidos como desejáveis e
“importantes” para o reconhecimento social, mas também o papel do colunista como
enunciador desses hábitos e as normas pelas quais escolhia-se algo ao mesmo tempo em
que deixava-se eventos e pessoas de lado, como no trecho citado anteriormente no
segundo capítulo:
IMPORTÂNCIA
Muitas pessoas vem me criticando porque deixo de comentar
algumas festas importantes. De fato, isso acontece devido somente
porque não compareço a festas quando não sou convidado pois, não
desejo tirar proveito ou vantagens da posição de cronista social que
ora ocupo. Outros me criticam porque, nos comentários das festas
que vou, esqueço-me, ou deixo de citar pessoas ‘bem mais
importantes’ do que as que relaciono. Na verdade, quando me sinto
bem numa recepção, é devido ao acúmulo de simpatia e gentilezas
que me são dispensadas pelos donos da festa o que, geralmente não
mereço e, assim é, que esqueço-me de anotar alguns nomes. Outras
vezes até esqueço de puxar o caderninho e, quando no dia seguinte
ponho o papel branco na máquina, só me vêm à lembrança os nomes
das pessoas que, no meu fraco entender, mais se destacaram durante a
reunião.. Reconheço que o ponto de vista é meu, mas esta coluna não
é paga para vermos pessoas e fatos através de prismas de outros.
121
SENETT, Richard. O declínio do homem público: as tiranias da intimidade. Trad. Lygia Araujo
Watanabe. São Paulo: Companhia das Letras, 1988, p.51.
122
BOURDIEU, Pierre. Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 2004, p.98.
99
Além do mais, importância é uma questão muito relativa. Há sujeitos
que se consideram importantíssimos e pouco significam; há cidadãos
que só são importantes por força de um cargo, mas eles, mui
vaidosamente, confundem o cargo com a sua própria pessoa e quando
lhes tiram o cargo se surpreendem com a própria nudez; também a
pessoas que tem a importância que o dinheiro lhes veste. Dinheiro,
sem dúvida, dá importância. Mas, as pessoas importantes pelo
dinheiro não costumam saber que um botão desabrocha numa linda
rosa, que há um instante de mágica beleza em todo pôr-do-sol, não
sabem como é belo os raios de luar refletidos nas águas calmas de um
lago, na poesia das ondas batendo na areia branca, na volta das
andorinhas, e que você sorri com os olhos baixos (“Rumores
Sociais”, Folha do Oeste, 08 de agosto de 1959).
Este trecho, além de demonstrar um dos critérios pelos quais o colunista tem
acesso às festas, ou seja, via convite de pessoas que almejam ser citados na coluna, ele
também demonstra a importância adquirida pelas colunas no sentido de apontar para os
destaques dos eventos sociais, mesmo que nem sempre seu “ponto de vista” seja aceito
por todos. Ao enfatizar, “estas foram, para mim as mais importantes”, indica uma
afirmação da escolha e da liberdade do colunista. Entretanto, não seria cauteloso afirmar
que a simples escolha do colunista seria o suficiente para que seus enunciados fossem
aceitos pela opinião pública ou mesmo pelos membros das elites. Várias instâncias da
opinião pública têm papel na instituição desses discursos enquanto “verdades”. A
começar pela aprovação da hierarquia do jornal: proprietário e diretor. Sem essa
aprovação as opiniões do colunista não seriam aceitas. Entretanto, a liberdade alcançada
pelo colunista também resultou da aprovação das elites, ou seja, ele sabia até onde essa
liberdade podia ir. Como afirmou Foucault, em sua aula inaugural no Collége de
France, os discursos e seus enunciadores ou divulgadores estão sujeitos a uma série de
regras que determinam o seu emprego, além de determinar quem pode e quem não pode
pronunciá-lo. 123
Além disso, na passagem anterior o colunista acabou por colocar em xeque os
critérios de importância a serem nomeados naquele meio. Portanto não era necessário
um cargo, profissão ou dinheiro de determinadas pessoas que proporcionavam o
destaque. Uma afirmação semelhante a essa é encontrada em alguns textos do também
colunista Ibrahim Sued. Segundo Sued, “não é dinheiro (ou alfaiate) que torna os
homens elegantes”
124
. A importância fundamental dada ao indivíduo, desta forma, está
ligada á sua elegância, esse atributo que para Sued é intangível, inato, não pode ser
123
124
FOUCAULT, M. A ordem do Discurso. São Paulo: Edições Loyola, 1996
SUED, Ibrahim. Op. Cit., 1972, p.95.
100
comprado.
Portanto, havia uma sintonia entre os discursos presentes nas colunas sociais de
Guarapuava com aqueles que circulavam nas esferas mais importantes das capitais
brasileiras, como Rio de Janeiro e São Paulo. Dessa forma, entende-se que o colunista
dialogava com situações e discursos que extrapolavam os limites do convívio
guarapuavano abarcando situações que envolviam âmbitos maiores.
A distinção entre a importância adquirida pelo dinheiro e os atributos que se
entendiam ser restritos a poucos indicam traços de um desenho, fios de uma trama que
compunham o cotidiano das elites guarapuavanas, bem como sua eficácia simbólica.
Como foi dito, embora o dinheiro não fosse fundamental, era preciso que o
colunável dispusesse de certos atributos. Um dos critérios para que aparecessem nas
colunas era saber acompanhar a moda e, para tanto, dispor de um guarda-roupa
diversificado. O colunista local, Wilde Martini, não elimina a moda como um fator
importante para a obtenção de prestígio social. “Dinheiro, sem dúvida, dá importância”,
é ele que permitia às mulheres não repetirem seus vestidos. O depoimento de uma das
colunáveis Florisbela Stange125 afirmava que “as moças faziam vestidos maravilhosos
que eram usados uma única vez, caso contrário alguém poderia dizer ‘no baile tal ela já
usou esse vestido, e isso não pegava bem’
126
. Outro critério estava nos bens que as
pessoas podiam demonstrar, como fica evidente no comentário do colunista sobre o
sucesso alcançado pelo Dr. William Buffara, pessoa “bem” que passeava sua elegância
num moderno e luxuoso carro Aero Willys, “despertando a admiração do ‘high
society’” (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 25 de Junho de 1961). O carro no início
da década de 1960 era um bem que poucos podiam adquirir.
Contudo, haviam atributos que não se adquiriam com o dinheiro. Refinamento
social, o bom gosto no vestir-se, nos comportamentos, como sentar, andar, comer e etc.
Estes dependiam do convívio diferenciado e/ou da sensibilidade inata de algumas
pessoas. Saber admirar o belo dependia desse aprimoramento. É nesse sentido que o
colunista afirmou:
Mas, as pessoas importantes pelo dinheiro não costumam saber que
um botão desabrocha numa linda rosa, que há um instante de mágica
beleza em todo pôr-do-sol, não sabem como é belo os raios de luar
125
TEMBIL, Márcia. Op. Cit., 2007.
O colunista Ibrahim Sued também comentou esse fato reafirmando a fala de Stange de que as mulheres
não podiam repetir vestido, ao menos se não quisessem cair na boca do povo (SUED, Ibrahim. Op. Cit.,
1972, p.94).
126
101
refletidos nas águas calmas de um lago, na poesia das ondas batendo
na areia branca, na volta das andorinhas, e que você sorri com os
olhos baixos (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 08 de agosto de
1959).
De certa forma, essas afirmações devem ter soado mais agradáveis, sobretudo as
famílias fazendeiras que não possuíam mais a riqueza de outros tempos, mas que ainda
dispunham de refinamento e, portanto, de um grande “capital simbólico”. Esta forma de
capital, como argumentou Pierre Bourdieu, diferentemente das outras modalidades de
capital, inclusive do econômico anteriormente citado, não é imediatamente perceptível
como tal e os efeitos de sua duração também obedecem a lógicas diferentes, muito mais
ligados ao poder de "fazer ver" e "fazer crer” 127. Grosso modo uma medida do prestígio
e/ou do carisma que um indivíduo ou instituição possui em determinado campo. Deste
modo, a partir desta marca quase invisível de distinção o capital simbólico permite que
um indivíduo desfrute de uma posição de proeminência frente a um campo. Por isso, é
possível afirmar que o capital simbólico é também um elemento indicador de prestígio
entre as elites fazendeiras mesmo que o seu capital econômico não representava o
mesmo de outros tempos.
Esta “aristocracia guarapuavana” geralmente figurava com destaque nas colunas.
Representavam um grupo com grande capital simbólico, advindo de suas relações de
parentesco com os fundadores da cidade, ao mesmo tempo em que participavam
ativamente da política local, mesmo que nos primeiros anos da década de 1950 essa
situação passou a mudar. A partir desse momento houve certo lapso em relação ao antes
predomínio da elite campeira sobre a política da cidade tendo em vista que nenhum
“guarapuavano nato” assumiu a prefeitura da cidade, mesmo que os fazendeiros e seus
descendentes continuassem exercendo cargos de importância na cidade. Eram a maioria
entre os vereadores, dirigiam os clubes sociais, haviam enviado seus filhos para estudar
fora da cidade, formando uma nova geração de professores, advogados, médicos e
empresários na cidade. Eram os proprietários dos principais jornais e ainda compunham
a maioria entre os redatores. As casas comerciais mais renomadas também eram suas.
Portanto embora tivessem perdido o status de elite econômica, eram modelos de
comportamento e conduta e ainda dispunham de grande capital simbólico. Grande parte
dos padrões instituídos naquele meio haviam sido por eles criados ou neles inspirados.
Dentre a categoria dos colunáveis estavam tanto as pessoas mais velhas, já com
127
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas lingüísticas: o que falar quer dizer. Trad. Sérgio Miceli.
São Paulo: EDUSP, 1998.
102
um lugar no âmbito da vida econômica e social da cidade, bem como seus filhos
considerados os jovens colunáveis. Como se percebe no texto abaixo, a referencia a esse
grupo era dada em inglês, Young society, termo que por si só já dava distinção:
“SOCIETY COMEMORA NIVER”
Dia 31 o “young society” fez ponto na bela residência do Sr. Antenor
Sprenger, para comemorar o “nat” da Sra. Laureana Pimpão
Sprenger. O casal Sprenger recebeu com simpatia distinção e suas
maneiras “bem”, encantaram os presentes entre os quais o caderninho
anotou: Sra. Romana Rodrigues Lisboa, Sr. e Sra. Osman Caldas, Sr.
Arthur Bahls Souza e Sra. Sra. Irene Virmond, Sr. Eduardo Mahfuz e
Sra., Srtas. Eulina Lisboa, Prudence Neves, América Mandu, Carmen
Teixeira, Zilma e Vera Lúcia Haick, Inez Guedes, Raquel Teixeira,
Maria Conceição Roseira, Cemidocéia Camargo, Arilda Ersinger,
Marlene Jacob, Cléia Oliveira, Helena Abicalaf, Leoní Teixeira,
Aninha Mandu. Pontificando em estilo a simpatia da Srta. Odilair
Sprenger, A beleza Tânia Franco Souza Rainha do Mate e o
brotíssimo Yara Virmond. O acontecimento contou ainda com a
presença dos jovens: Dillon Sauer, Welson Lacerda, Nery Saraiva,
Elias Farah, Fernando Virmond, Oswaldo Folda, Glazito Taques,
Silvio Silva e o sempre disputado Roberto Dalla Vecchia (sic)
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 03 de Setembro de 1961).
Entre os nomes apontados no trecho não é difícil de distinguir a presença e
reincidência de famílias tradicionais fazendeiras como os Virmond, Teixeira, Sousa,
Oliveira, Camargo, Taques, entre outros. Além da identificação das pessoas citadas com
“a sociedade” guarapuavana, destacava-se o modo como o colunista aponta o padrão
econômico e social dos donos da festa, ou seja, a “bela residência”, e a forma como
foram recebidos os convidados, com a “simpatia e distinção e suas maneiras ‘bem’”,
que, segundo o colunista, haviam encantado os presentes.
Ser colunável, portanto, era uma graça destinada a poucos. Aparecer no jornal
era uma forma de ser classificado no ápice da pirâmide social, como dos jovens que
adentravam no panteão da mitologia social que para alguns grupos começava cedo e que
nos tempos de auge das colunas sociais encontrou nas “listas sociais” a sua principal
estratégia.
103
3.2 – Moldando padrões, difundindo representações: os “Dez mais da sociedade
guarapuavana”.
O ponto alto da demonstração pública do pertencimento ao Society eram as
eleições anuais das “Dez mais” da alta sociedade. Estratégia já referenciada no segundo
capítulo desse trabalho, teve seu auge entre as décadas de 1950 e 1960, tornando-se uma
prática comum entre os colunistas sociais de diversas cidades brasileiras.
Criadas pelo colunista Jacinto de Thormes ainda na década de 1940 no Diário
Carioca e que, segundo o autor, foram copiadas das colunas sociais norte-americanas:
“A lista das dez mais elegantes era coisa americana, mas as listas americanas não
tinham a dimensão que estas ganharam aqui no Brasil” 128.
Entretanto, foi com Ibrahim Sued que estas listas ganharam maior sucesso e
amplitude, sobretudo pelo estilo polêmico deste colunista. Esta prática surge nas
colunas de Ibrahim ainda na década de 1950, inicialmente apresentando a lista dos “Dez
Mais Elegantes”, em que figuravam nomes de homens conhecidos na sociedade carioca.
Em seguida, foi a vez das listas das “Dez mais Elegantes”, selecionadas segundo
Ibrahim sob critérios rigorosos, o que proporcionou o seu sucesso. Eleger as “Dez
mais”, era apontar para aquelas que representavam símbolo de beleza e elegância, fato
que deixava muita mulher da alta sociedade sem dormir enquanto outras dormiam
tranquilamente. Ao apontar pessoas e atribuir a elas características “elogiosas”,
criavam-se modelos de comportamento, gosto e moda.
Estas listas difundiram-se entre colunistas sociais de todo o Brasil, que copiavam
critérios estabelecidos por Ibrahim para avaliar a society carioca. No Paraná, a presença
destas listas era constante, seja na capital ou no interior. Próximas a Guarapuava,
cidades como Imbituva e Ponta Grossa também traziam em seus periódicos colunistas
com suas listas. A society em Imbituva, a cidade natal do colunista do Folha do Oeste
Wilde Martini, localizada a Leste de Guarapuava, sempre era alvo de comentários por
parte do colunista que mantinha uma estreita ligação com o colunista daquela cidade,
Mr. Witt. Este em diversas ocasiões era auxiliado por Wilde Martini na confecção das
listas naquela cidade. No intervalo de aproximadamente dois anos em que Martini parou
128
NETO, Geneton Moraes. Jacinto de Thormes: o dia em que o criador do moderno colunismo social
enganou
a
rainha
da
Inglaterra
no
Maracanã.
Disponível
em:
<http://www.geneton.com.br/archives/000030.html>. Acesso em: 15 Mai. 2007.
104
de assinar as colunas no jornal Folha do Oeste (1962-1964), provavelmente por estar
envolvido em concursos de moda e acompanhando “misses” em eventos, as notas sobre
a cidade de Imbituva deixaram de ser publicadas. Com Ponta Grossa, a relação foi mais
duradoura e persistiu a ausência de Martini.
Em Guarapuava, essas listas começaram a ser anunciadas via rádio, nos
programas “Ronda Social” e “Cock-Tail das Cinco”, da Rádio Difusora de Guarapuava
em 1958. No ano seguinte, passou a ser anunciada, alem da Rádio Difusora, no Folha
do Oeste.
Ao longo dos seis anos de coluna no jornal Folha do Oeste mais de 10 listas
foram produzidas129, concentradas, sobretudo, entre os anos de 1959-1962. Entre elas
estavam as listas mais tradicionais como as “senhoras mais elegantes” “os senhores
mais elegantes”, os “moços mais elegantes”, as “senhoritas mais elegantes”, além de
listas menos comuns como a das “mais cultas”, dos “Dez cavalheiros mais” ou mesmo
dos “dez mais do comércio local” (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 17 de junho de
1962).
A escolha dos componentes das listas apareceu em momentos diferentes.
Algumas eram publicadas entre janeiro e fevereiro, enquanto outras apareciam em
setembro ou novembro. As mais tradicionais como a lista dos “Dez mais” e das “Dez
mais” eram sempre marcada por grandes festas. No período em que o colunista Wilde
Martini assinava a coluna, as festas aconteciam com maior regularidade no Clube
Operário, tendo em vista que este colunista era o Diretor Social desse clube.
Notadamente o principal alvo das colunas eram as mulheres, fruto do grande
interesse destas nas atividades que envolviam a alta sociedade. Alguns colunistas
reservavam espaços extremamente grandes em suas colunas para elas. Nisto, um dos
modelos era também a coluna do jornal Ultima Hora escrita por Stanislaw Ponte Preta,
pseudônimo do jornalista Sérgio Porto, que seguidamente estampava uma bela mulher
ao centro de sua coluna, lançando inclusive “as certinhas do lalau”. É importante
destacar que nem sempre as imagens e representações criadas sobre as mulheres eram
positivas.
Ibrahim Sued foi o principal divulgador da imagem feminina negativa por
129
Devido às lacunas existentes na documentação não se teve acesso a todas as listas, porém há fortes
indicações ao longo das publicações existentes que indiquem esse número aproximado de listas. Além
disso, muitas listas eram comentadas, mas não chegavam a ser descritas na coluna, pois geralmente o
comentário encontrado referia-se ao evento onde as mesmas haviam sido anunciadas publicamente,
sobretudo a partir de 1962.
105
excelência: “A Dama de Preto”. Essa personagem, nunca revelada pelo colunista
recebeu versos no samba de Miguel Gustavo “Acontecendo no café soçaite”, onde o
autor e interprete reverberava “agora estou somente contra a Dama de Preto. Essa
personagem representava a falta de elegância e bons modos, então entendidos neste
momento como fundamentais a uma mulher: dotes, submissão ao marido, feminilidade,
apreço pela educação dos filhos, temperamento calmo. Todas essas eram características
não eram apenas apontadas pelas colunas sociais, mas também por revistas
especializadas direcionados à mulher
130
. A “Dama de Preto” também representava as
mulheres fáceis, levianas, escandalosas, “maçanetas”, “vassourinhas”, mulheres que
segundo o vocabulário da época representavam o fato “passarem de mão em mão”. 131
Os homens, embora com menos freqüência, ocupavam um espaço relativo na
coluna, seja como políticos, homens de negócio ou como pais dedicados, como em 20
de agosto de 1961 na eleição do “Pai do ano”. O escolhido pela coluna “Rumores
Sociais” o Sr. Francisco Cardoso Teixeira. Além disso, jovens solteiros eram
apresentados pelas colunas sociais como bons partidos. As agremiações masculinas
também ganhavam algum destaque, como “Clube dos Solteiros” e “Clube dos Vinte”.
A primeira lista publicada no Folha do Oeste veio à público no primeiro ano da
coluna social e ilustra a predominância das mulheres sobre os homens na composição
do quadro dos colunáveis:
As 10 senhoras “MAIS” de 1959:
Sra. Jamile Wakim Haick
Sra. Arice Fleury Rocha
Sra. Nadir Marcassa
Sra. Elizabeth Giancotti Moro
Sra. Gracita Grubber Marcondes
Sra. Adair Souza
Sra. Jacy Bastos
Sra. Miriam Ribeiro
Sra. Terezinha Carvalho
Sra. Irecê Ersinger
... e ainda citação especial a Sra. Olivia Mattos Leão de Oliveira.
As 10 Senhoritas “MAIS” de 1959:
Snrta. Ezyl Maria Turra
Snrta. Marilda Lacerda
Snrta. Alba Keinert
Snrta. Alcioly Grubber
Snrta. Leda Machado
130
BASSANEZI, Carla. Mulheres dos Anos Dourados. In: PRIORE, Mary Del (org.), História das
mulheres no Brasil. 7. ed.- São Paulo: Contexto, 2004, p.607-639.
131
BASSANEZI, Carla. Op. Cit., 2004, p.612.
106
Snrta. Maria Dalla Vécchia
Snrta. Lucia Ruczy
Snrta. Nelsy Scheidt Boska
Snrta. Solange Ribas
Snrta. Claire Anunziatto
Os 10 Cavalheiros “MAIS” de 1959
O “mais” cavalheiro: Snr. João Bettega Sobrinho
O “mais” distinto: Snr. Cap. Ary Carracho Horne.
O “mais” colaborador: Snr. Victor Marcassa
O “mais” social: Snr. Manoel Romeu Laures Bastos
O “mais” elegante: Snr. Sólon Keinert.
O “mais” comercial: Snr. Trajano Bastos de Oliveira
O “mais” popular: Snr. Francisco Teixeira Junior (Francinha)
O “mais” Eficiente: Snr. Oscar Klüppel
O “mais” simpático: Snr. Antonio Santi (Ico)
O “mais” difícil: Snr. Conrado de Olvieira
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 27 de Dezembro de 1959).
A presença de duas listas voltadas ao público feminino ilustra de maneira clara a
predominância delas no quadro de colunáveis. Além disso, a presença de senhoras e
senhoritas demonstra que, para as mulheres, a vida de colunável começava sempre mais
cedo, sobretudo a partir dos 15 anos, quando estas figuravam com destaque nos “bailes
de primavera”, bailes de debutantes que aconteciam regularmente na cidade.
Outras passagens presentes nas colunas também indicam que, esporadicamente,
realizavam-se concursos infantis, entretanto as indicações quanto ao gênero dos
participantes raramente aconteciam. Tendo isso em vista, pode-se afirmar, portanto, que
a ligação entre as temáticas presentes na coluna, o bom comportamento, a etiqueta e
principalmente a moda, refletem a constante participação e leitura do público feminino
nas colunas. De certa forma, as colunas sociais acabam se configurando como um
espaço preponderantemente feminino nos jornais, tendo em vista que em periódicos
como o Folha do Oeste não existiam outros espaços voltados exclusivamente a esse
público. Tal afirmativa pode também ratificar a presença de certos preconceitos quanto
à sexualidade dos colunistas e a tal prática, presentes em afirmações como a de Manoel
Bernardes Muller, o Jacinto de Thormes das colunas sociais cariocas, que afirmou em
2004 em entrevista ao site do jornalista Geneton Moraes Neto que ficou com receios em
começar a assinar a coluna social do Diário Carioca ainda na década de 1940, tendo em
vista que achava que aquilo era “coisa de viado”.132
Entretanto, mesmo que menos constante, os homens também figuravam nas
132
NETO, Geneton Moraes. Op. Cit. 2007.
107
colunas, como ilustra a mesma coluna social de 27 de dezembro de 1959, indicando
inclusive as características que tornavam os homens dignos de serem colunáveis: o
cavalheirismo, a distinção, o fato de ser colaborador, sociável, elegante, bem sucedido
comercialmente, popular, eficiente, simpático e inclusive difícil, característica que
geralmente eram bem vistas no público feminino.
Mas as listas femininas não ficavam atrás. Para a mais frequente das listas, as
das “Dez Senhoras Mais” geralmente seguiam-se quesitos bastante rígidos na seleção
das colunáveis, também indicando-as segundo características atribuidoras de distinção
social. Cada uma das escolhidas era referida como exemplo de algum atributo elogiável,
tornando-se um modelo na aplicação de tais adjetivos como: simpática, charmosa,
refinada, agradável, distinta, encantadora, glamourosa, elegante além de valorizar-se na
prática de bem receber, característica fundamental às mulheres.
É importante notar que geralmente esses atributos eram abstratos, referiam-se a
características simbólicas, ligadas mais á certo caráter do que a posição social ocupada
pela participante. No entanto, os clubes onde estas pessoas são selecionadas sempre
configuravam-se em espaços seletos, proibidos à maioria da população. Ou seja, os
eleitos reuniam, além dos atributos apontados, as características necessárias para a
visibilidade social: dinheiro, o pertencimento a famílias já socialmente conhecidas e
reconhecidas como importantes, que tinham uma atuação constante nos acontecimentos
da cidade. Desta forma, pertencer a uma dessas listas não era apenas possuir tais
atributos considerados elogiáveis, mas ganhar visibilidade social a partir destes.
Sobre a etiqueta, foi também o colunista Ibrahim Sued ainda na década de 1950
em suas colunas apontava as regras de boa maneira e elegância a serem seguidas
socialmente:
Respondendo hoje a centenas de cartas acumuladas, com consultas a
respeito de etiqueta e elegância, dedicaremos a metade do nosso
espaço a essas perguntas:
1. Moça solteira faz uso de cartão-de-visita apenas no meio feminino,
abrindo exceção para os seus professores, o padre e o médico da
família. [...]
3. No casamento, o noivo nunca poderá usar smoking, gravata de cor,
sapato “marrom” etc.
4. As noivas não devem nunca usar jóias. A simplicidade e o mais
chic adorno de uma jovem noiva.
5. A roupa clara nunca deve ser usada em reuniões à noite.
6. Nas festas dos quinze anos, os pais da jovem devem presentear a
debutante, que pela primeira vez se apresenta vestida de baile, com
uma jóia. É o que manda a tradição. [...]
108
10. Quando se chega a um restaurante acompanhado de uma dama,
aguarda-se à entrada a aproximação do maître que indicará a mesa a
ser ocupada. A senhora ou senhorita deverá seguir em frente. [...]
12. Uma senhora acompanhada de um cavalheiro jamais se dirige ao
garçom. [...]
23. Falar em voz alta e dar estridentes gargalhadas nunca é elegante
para uma mulher.
24. Uma mulher nunca deve, na rua, dirigir cumprimento a um
homem. Aguarde que a iniciativa seja deste, mesmo que haja toda a
intimidade. [...]
26. O homem deve evitar ao máximo o uso de jóias. Um homem
sóbrio e elegante usa apenas cigarreira e abotoaduras.133
Essas regras não apenas representavam os papéis de gênero estabelecidos
socialmente, mas demonstravam quais atitudes deveriam ser consideradas aceitáveis.
Estas atitudes indicam claramente a que grupo eram endereçadas, tendo em vista que se
referem a atividades específicas da chamada “alta sociedade”. Todavia, algumas das
normas tinham um alcance maior, pois tais formalidades podiam ser postas em prática
por outros grupos sociais. A importância adquirida por Ibrahim Sued na década de 1950
influenciava de perto o colunista de Guarapuava, ou seja, nos discursos enunciados
como no vocabulário e as estratégias utilizadas
Nos atributos indicados aos colunáveis de Guarapuava que aparecem nas
colunas sociais, cada eleito era valorizado de acordo com o gênero dos escolhidos. Para
os homens, era fundamental ser cavalheiro, distinto, colaborador, “social”, elegante,
comercial, popular, eficiente, simpático, ao mesmo tempo em que difícil. Para as
mulheres a beleza selvagem, aliada a simpatia, charme, elegância, quietude, animação,
graça, beleza, glamour faziam-se fundamentais para serem incluídos nestas listas
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 08 de Maio de 1960).
Além destas características, as colunas também incluíam mulheres consideradas
cultas. O conhecimento como indicador de certa superioridade, também era um critério
de acesso dessas mulheres as colunas. Dessa forma, mulheres que desempenhavam
atividades ligadas ao magistério ou que se destacavam por terem dotes artísticos como a
pintura e a música, e as detentoras de grande conhecimento eram também consideradas
modelos sociais a serem seguidos134. A valorização destes atributos das mulheres da alta
sociedade é indicada no surgimento de uma nova eleição anual, as “Mais cultas” do ano,
133
SUED, Isabel (org.). Ibrahim Sued: em sociedade tudo se sabe. Rio de Janeiro: Rocco, 2001, p.65-
66.
134
Clubes como o Guaíra, em Guarapuava, disponibilizavam aos seus associados um número
considerável de obras de literatura clássica e política, pertencentes a biblioteca da agremiação.
109
ocorrida em 17 de Abril de 1960:
Ouvindo e acatando opiniões das mais credenciadas o colunista
chegou ao resultado que segue:
Senhorita ALBA KEINERT
Senhora TEREZINHA KLOSTER CINIELLO
Senhora MAIL MARQUES AZEVEDO
Senhora ELIZABETH GIANCOTTI MORO
Senhora GRACITA GRUBER MARCONDES
Senhora ANTECLÉIA DE MASI DO VALE
Senhorita LUCIA RICZY
Senhora LAURA PACHECO BASTOS
Senhorita JULIA PEREIRA
Senhora SILVANIRA PENHA
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 17 de Abril de 1960).
Diferente das tradicionais colunas, a eleição indicada acima não separava as
Senhoras das Senhoritas, mesmo que o estado civil da eleita tenha sido indicado pelo
colunista. Além disso, pode-se observar que, em relação a lista das 10 “Mais” de 1959,
poucas mulheres permaneceram na lista, como a senhora Gracita Gruber Marcondes,
Alba Keiner, Elizabeth Giancotti Moro e Lucia Riczy, demonstrando que quase 50% da
nova lista era composta por mulheres que já faziam parte do hall das socialites,
evidenciando a visibilidade social garantida pela referida eleição. Além disso, algumas
das eleitas, como Gracita e Julia Pereira atuavam no magistério, daí um dos argumentos
para sua indicação na referida lista.
Enquanto algumas senhoras agradeciam a sua inclusão na lista das mais cultas,
outras criticavam as escolhas em atitude de ressentimento, como comentado por Wilde
Martini na coluna de 08 de maio de 1960:
Me contaram que certa senhora, referindo-se sobre a lista das 10mais
cultas disse: - O Wilde elegeu as 10 Mais Burras (perdoem-me o
termo, mas, foi assim mesmo). Essa pessoa talvez queira ser incluída
n’alguma lista, que poderia ser a lista das 10 menos instruídas, ou
mais deselegantes (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 08 de Maio
de 1960)
“Me contaram” indica os burburinhos e fofocas que circulavam em torno de tais
publicações, sendo que o colunista não apenas faz uso do “boato” mas ele mesmo acaba
enunciando vários deles. Da mesma forma, além de não agradar todos os membros das
elites quanto a suas escolhas, gerava-se certo ressentimento por parte de algumas
mulheres que almejavam fazer parte das listas das “Dez” mas que por algum motivo
110
nunca eram nestas incluídas. Esse tipo de comentário não tornou-se freqüente nas
colunas, tendo em vista que provavelmente, se existiram, o colunista não os levou a
público.
Ser escolhida uma das “Dez mais” representava, sobretudo para as mulheres,
uma posição consolidada e um convite certo para grandes eventos sociais, como indica
Wilde Martini no trecho abaixo:
Dia 13 será realizado “coctail” em homenagem as desfilantes. A
reunião será das mais marcantes e contará com a presença das 10
mais cultas do ano, as 10 senhoras e 10 senhoritas mais elegantes do
“high society” e personalidades do mundo elegante guarapuavano, e
ainda a presença do cronista social Naylor Bianco [...] (“Rumores
Sociais”, Folha do Oeste, 07 de agosto de 1960).
O desfile a que se refere Martini foi promovido pelo Clube dos Solteiros,
agremiação masculina da cidade que costumeiramente realizava essa forma de evento.
Além disso, a presença de outro cronista social, como o imbituvense Naylor Bianco135 e
dos “Dez Mais”, punha em evidência o que Martini chamava de “mundo elegante
guarapuavano”, uma seleta classe, liderados pelos colunistas e pelos ainda mais seletos
componentes das listas sociais.
A lista dos “mais” da sociedade guarapuavana de 1960 teve sua publicação
apenas no início de 1961. Porém, ainda em 1960 o colunista, devido a sua ligação com a
cidade de Imbituva e sua amizade com o cronista Mr. Witt do jornal O Imbituvense
indicou uma lista composta por aquelas que mais se destacaram em seu caderno de
135
De certa forma, mesmo distante dos grandes centros, os colunistas do Folha do Oeste mantinham
contato com colunistas de outras cidades. Entre os contatos vistos nas páginas das colunas pode-se
apontar para colunistas como Dino Almeida (Martini era representando do jornal onde era publicado a
coluna de Dino Almeida na região de Guarapuava, além de apontar para a leitura do mesmo na edição de
“Rumores Sociais” de 24 de maio de 1959), do Diário do Paraná, Mr. Witt, do jornal O Imbituvense de
Imbituva, Eddy Franciosi – Jornal O Dia, de Curitiba, Naylor Helon Bianco, também do O Imbituvense
de Imbituva, além de Aramis Millarch redator da coluna “Luzes da Cidade” do jornal Ultima Hora de São
Paulo. A leitura das colunas de Aramis Millarch pareceu bastante freqüente, tendo em vista que em
muitos momentos, sobretudo nas crônicas de Wilde Martini, o colunista afirma ter lido o referido
colunista, inclusive apontando para notas sobre a cidade de Guarapuava como na edição do Folha do
Oeste de 4 de junho de 1961, onde Martini afirma que “a sociedade guarapuavana está em pauta com
freqüência na coluna Luzes da Cidade de “ULTIMA HORA” (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste,04 de
junho de 1961). Além disso, expressões como “caderninho vermelho”, Kar, gente-bem, niver, e Belacap,
expressão utilizada por Ibrahim para designar o Rio de Janeiro, eram utilizadas pelos colunistas de
“Rumores Sociais”, além da criação do termo com o objetivo de designar Guarapuava, Perolacap, tendo
em vista que Guarapuava também era conhecida como Pérola do Oeste, assim como a utilização do termo
“adjacências” em títulos de notas, lembra o clássico título das colunas de Jacinto de Thormes no jornal
Última Hora “Sociedade & Adjacências (“ Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 23 de abril de 1961).
111
anotações das festas em que esse assistiu na referida cidade:
Snrta. Karime Chuchene
Snrta. Lis de Mattos
Snrta. Eneida Sponholz
Snrta.Cléia Bastos
Snrta. Lia Hilgenberg
Snrta. Vera Guimarães
Snrta. Eunice Motta
Snrta. Marly Dietrichs
Snrta. Dalva Maria de Brito
Snrta. Gilse Penteado
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 13 de Novembro de 1960).
Além da lista das 10 senhoritas “mais”, nas semanas seguintes dessa publicação,
o colunista também publicou as listas dos “Dez Cavalheiros Mais” e das “Dez Senhoras
Mais” daquela referida sociedade, nos possibilitando assim comparar as listas anteriores
criadas por Martini e as listas de Imbituva:
O mais “SOCIALLY” – Luiz de Mattos
O mais “SYMPATIC” – Antônio Pedroso
O mais “POPULARITY” – Sergio Masteck Ramos
O mais “REFINED” – Eduardo Scheidt
O mais “POLISHED” – Ary Nora Guimarães
O mais “PERSONALITY” – Miguel Schroeder
O mais “DARLING” – Adroaldo Carlos Pedroso
O mais “ADMINISTER” – Theodoro N. Diedrichs
O mais “ENTRETAINER-HOST” – José Nilo Pupo
O mais “ELEGANT” – Naylor Helon Bianco
O mais “LOVING” – João Gilberto M. Ramos
O mais “GENTLEMANLY” – Carlos Scheidt
O mais “EFFICIENT” – Vicente Bobato
O mais “DISTINCT” – Garly Grollmann.
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 20 de Novembro de 1960).
Nota-se na lista anterior a presença naquela cidade da valorização de atributos
semelhantes aos encontrados nas listas masculinas de Guarapuava, seja pela
participação de Wilde Martini ou pelo fato de serem atributos importantes para o
reconhecimento masculino, como o fato de serem populares, gentis, distintos, refinados
e principalmente administradores e eficientes. Além disso, nota-se na lista a tradução
dos termos para o inglês. A presença de termos em outros idiomas foi constante nas
colunas e buscavam certa indicação de refinamento e cultura por parte do colunista além
de restringir a compreensão dos atributos a pessoas a que caberiam os mesmos
adjetivos. Ou seja, os pertencentes à lista são seletos assim como o público leitor.
112
A lista das 10 “Senhoras Mais” de Imbituva do ano de 1960, foi publicada na
semana seguinte a dos cavalheiros, de 20 de Novembro de 1960, e apresenta
características muito semelhantes à masculina como também das anteriormente
publicadas em Guarapuava, atribuindo as eleitas adjetivos como “sympatique”,
“patronesse”, “charmingly”, “hostésse”, “Refinement”, “distinction”, “enchantement”,
“glamourosa”, “elegante”. Além também da presença do que poderíamos chamar de
“estrangeirismos”, em inglês e francês, a lista também indica características específicas
quanto ao reconhecimento feminino, com exceção da distinção e da elegância, que
parecem ser necessárias para ambos os sexos
A participação nas listas dos mais elegantes possibilitava, além do destaque em
eventos sociais da cidade, outras oportunidades de visibilidade social de maior alcance,
como por exemplo, a participação e a indicação em revistas de âmbito estadual:
“CLUBE e as 10 mais”
Chegarão dia 11 a Guarapuava os cronistas sociais Dino Almeida e
Nelso Faria, Diretores da Revista Clube, para assistirem a lista das 10
mais elegantes, ocasião em que será lançada em Guarapuava a revista
da Alta Sociedade (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 05 de Março
de 1961).
Em 29 de Março de 1961, finalmente seria publicada a lista dos 10 “Mais” da
sociedade guarapuavana de 1960 com algumas semanas de atraso. Apesar da espera, a
coluna do referido dia apresentava não apenas as listas mais tradicionais, mas incluía
também a lista dos “10 maiores anfitriões”, elegendo os casais da alta sociedade
guarapuavana que não apenas promoveram algum evento social, mas que, segundo o
colunista, destacaram-se nas maneiras de “bem receber”. Essas novas listas ampliavam
o leque dos eleitos socialmente e provavelmente satisfaziam um público maior, pois
quanto maior o número de listas maior a possibilidade de estar incluído em uma delas.
Desta forma, a lista das “Dez senhoras mais”, das “Dez senhoritas mais”, dos “Dez
cavalheiros mais” e dos “Dez Maiores anfitriões” reuniam um número considerável de
pessoas, algumas novas nas listas outras já anteriormente citadas:
AS 10 SENHORAS MAIS ELEGANTES
Sra. TEREZINHA CARVALHO, esposa do Sr. Alberto Carvalho
Filho.
Sra. ARICE FLEURY DA ROCHA, esposa do Sr. Dr. João Fleury da
Rocha Junior.
113
Sra. GRACITA GRUBER MARCONDES, esposa do Sr. Norberto
Marcondes.
Sra. ADAIR SOUZA, esposa do Sr. Idavino Souza.
Sra. TEREZINHA KLOSTER CINIELLO, esposa do Dr. Ary Walter
Ciniello.
Sra. CELIA DEMARIO VIRMOND, esposa do Sr. Leônidas
Virmond.
Sra. TEREZINHA CARRACHO HORNE, esposa do Sr.Capitão Ary
Rodolfo Carracho Horne.
Sra. BENY ARAUJO, esposa do Sr. Dari Martins Araujo.
Sra. ISABEL SANCHES, esposa do Sr. Dr. Edson Sanches
Sra. CLEONICE BUFFARA, esposa do Sr. Dr. William Buffara.
AS 10 SENHORITAS MAIS ELEGANTES
Srta. CLAIRE ANUNZIATTO
Srta. ZULMEA MULLER
Srta. ALBA KEINERT
Srta. MARILDA LACERDA
Srta. EZYL MARIA TURRA
Srta. LOURDES BUZATTO
Srta. EUCARIS DURSKI SILVA
Srta. LETICIA PIMENTEL
Srta. WALDEREZ TEBINKA
Srta. SONIA MARIA BARDELLI SILVA
OS 10 CAVALHEIROS MAIS ELEGANTES
Sr. Cap. ARY RODOLFO C. HORNE
Sr. LEONIDAS KAMINSKI
Sr. AMAURY SEBASTIÃO
Sr. OSWALDO MENDES
Sr. NIVALDO PASSOS KRUGER
Sr. OSCAR CAVALIN
Sr. Dr. EDSON SANCHES
Sr. LUIZ CLEVE TEIXEIRA
Sr. Dr. AFFONSO ANTONIUK
Sr. ALEXANDRE WALTER
OS 10 MAIORES ANFITRIÕES
Sr. LEONIDAS VIRMOND e Sra. CELIA DEMARIO VIRMOND
Sr. MICHEL MISHALANY e Sra. JULIETA MASHALANY
Sr. ABRAHAO HAICK e Sra. JAMILE HAICK
Sr. Dr. ELOY PIMENTEL e Sra. FLORA MARQUES PIMENTEL
Sr. RENATO KUSTER e Sra. ANITA KUSTER
Sr. ALBERTO CARVALHO FILHO e Sra. TEREZINHA
CARVALHO
Sr. GASTÃO SILVA e Sra. ODALÉA SILVA
Sr. DIÓGENES GUIMARÃES PUPO e Sra. CARLITA PUPO
Sr. ILDO ANTONIO SILVESTRI e Sra. DORACY SILVESTRI
Sr. RUTILIO RIBAS e Sra. JUDITH ROSEIRA RIBAS
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 29 de Março de 1961).
114
A busca pelo reconhecimento renovava-se ano a ano. Havia os reincidentes,
entretanto, a presença em uma lista anterior não era o suficiente para garantir o acesso a
lista seguinte. Era necessário estar em constante aprimoramento pessoal e da
visibilidade social, o que se tornava mais difícil ano a ano devido aos novos
personagens que chegavam a cidade, fruto do crescimento urbano vivido entre os anos
1950-1970, estimulado pela presença das madeireiras. A exemplo disso, a inclusão na
lista do nome de Nivaldo Passos Krüger esta ligado devido a sua ascensão social em
Guarapuava. Começou como jornalista e conseguiu ser o proprietário do jornal A
Época. Além disso elegeu-se vereador em 1959, representando a classe operária
guarapuavana e em 1964 seria eleito prefeito da cidade
136
. Pelo espaço conquistado,
Nivaldo P. Krüger passou a ser chamado por Antonio Lustosa de “Guarapuavano de
coração”.
Importante destacar que a elite guarapuavana era composta por dois segmentos
distintos. De um lado a elite tradicional e do outro aqueles que obtiveram fortunas
recentemente. Portanto o colunista, sempre cercava-se de cuidados no momento de
eleger a lista dos “Dez mais”.
Desta forma, para a elite tradicional, concorrer com o dinheiro conquistado pelos
recentes grupos empreendedores da cidade tornava-se uma tarefa difícil. Os modos
“bem” competiam com as fortunas recentes acumuladas pelos novos grupos sociais que
competiam na economia da cidade, na política e em meio às sociabilidades elitistas.
Algumas revistas surgiam apenas com esse propósito, realizar estas eleições,
como a revista Planalto. Segundo Wilde Martini, a revista teria seu primeiro número
publicado em dezembro de 1961, contando inclusive com a presença dos colunistas
criadores da revista Calil Simão e Alfeu Medeiros no referido mês em Guarapuava, para
eleger as 10 “mais” sendo que, uma delas iria participar da festa que os colunistas iriam
realizar em Curitiba para apontar as “10 Mais Elegantes do Paraná” (“Rumores
Sociais”, Folha do Oeste, 29 de Outubro de 1961).
Chama a atenção, no entanto, que nenhuma notícia da eleição das 10 mais que
seria realizada pelos referidos colunistas foi publicada em “Rumores Sociais”, nem
mesmo a lista criada por Martini. Os únicos indícios encontrados sobre um destes
colunistas aparece em 24 de Dezembro de 1961, na página 3 do jornal Folha do Oeste
136
IZIDORO, Heitor Francisco. Op. Cit., 1976, p.40.
115
indicando que seria realizado nas cidades de Porto-União e União da Vitória o
“Concurso Imperial da Glamour Girl”, entre os dias 12 e 15 de Janeiro de 1962,
contando com a presença de Calil Simão, Martini e diversos outros colunistas da capital
paranaense, do Rio grande do Sul, de Santa Catarina e São Paulo, com o objetivo de
elegerem a “Glamour Girl do Sul-1962”.
Nos meses anteriores, várias notas publicadas em “Rumores Sociais”, indicavam
a realização do concurso “1ª Glamour Girl” de Guarapuava no dia 9 de Dezembro de
1961, marcando o encerramento dos festejos do aniversário da cidade. O concurso,
como previsto, ocorreu na referida data, com programação que envolvia desfile de
misses no Cine Guará, jantar no seleto Perola Bar e baile no Clube Operário, tudo
coordenado pelo colunista Wilde Martini, sendo eleita a senhorita Zaclis Rocha 1ª
Glamour Girl de Guarapuava.137 Somente em 18 de fevereiro de 1962 a coluna
“Rumores Sociais” fez menção novamente a revista Planalto, informando que Wilde
Martini tinha ido para Curitiba a fim de tratar assuntos referentes à lista dos 10 Mais
deste periódico. Entretanto nenhuma nota sobre a citada presença dos colunistas deste
periódico foi encontrada no Folha do Oeste até a edição do “Jubileu de Prata” do jornal,
em 28 de Fevereiro de 1962, indicando que no dia 10 de Dezembro de 1961 estiveram
presentes na cidade os colunistas Calil Simão e Alfeu Medeiros para o lançamento de
Planalto sendo realizado marcante almoço no Clube Operário, porém sem fazer menção
a escolha dos componentes das “listas dos dez”.
Vale à pena destacar que essas listas não funcionavam apenas como uma entrada
certa para eventos importantes e para dar uma maior visibilidade social no que se refere
à elegância e aos bons modos. Elas também funcionavam como uma propaganda
pessoal e comercial, tendo em vista a publicação em “Rumores Sociais” de 1962 da
primeira lista dos “dez do comércio local”:
Pela primeira vez lançamos por esta coluna aqueles que representam
os “DEZ MAIS DO COMÉRCIO LOCAL”:
JURANDIR DURSKI o mais PONTUAL
OSVALDO CAMILO MENDES o mais ATENCIOSO
RAULINO CORDOVA o mais CAPAZ
ACYR LOURES PACHECO o mais AMÁVEL
JOSÉ DEMARIO (Juca) o mais FILANTROPO
137
Inicialmente organizado por Lea Duvivier, sob a organização de Ibrahim Sued, devido ao sucesso de
suas crônicas, o concurso “Glamour Girl” tomou proporções nacionais (SUED, Ibrahim, Op. Cit., 1972,
p.19).
116
NAGIB HADADD o mais PROGRESSISTA
OSVALDO ROCHA o mais CRITERIOSO
ROBERIO MARCONDES o mais DEDICADO
ABRÃO HAICK o mais TRADICIONAL
SOLON KEINERT o mais CONCEITUADO
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 17 de Junho de 1962).
Enquanto na maioria das vezes os atributos escolhidos para definir as “Dez
Mais” da sociedade local estavam ligados a aspectos indicados como fundamentais para
uma dama, seja ela uma senhora ou uma senhorita, para os homens as características
divulgadas eram aquelas que definiam como um bom partido ou um empreendedor de
destaque. Dessa forma, não é por acaso que na lista dos 10 mais do comércio local
elegeram homens vistos como responsáveis pelas atividades comerciais e de sustento da
casa. Entre as mulheres cabia o cuidado da casa e dos filhos, ou seja, ser mãe, esposa e
dona de casa era considerado o destino natural das mulheres
138
. Entre as mulheres da
alta sociedade, também figuravam como prática comum a filantropia.
A importância das referidas listas cresciam a cada ano. Em 1962 até ganharam
uma versão caricata, a lista dos “Dez Menos”, criada por uma figura anônima e
contundente do jornal Folha do Oeste, o “Tezoura”, escritor de uma coluna denominada
“Cortando pano”, publicada geralmente na 3ª página daquele periódico. O “Tezoura”
era uma figura bastante polêmica, pois utilizando da ironia e do bom humor tecia
comentários sobre figuras da política municipal. Entretanto, esses comentários
geralmente eram pequenas brincadeiras, notas de humor que geravam muito mais
risadas do que propriamente algum desconforto por parte dos componentes da referida
lista (“Rumores sociais”, Folha do Oeste, 24 de Junho de 1962).
Em torno destas listas criava-se uma grande expectativa, muito explorada pelos
colunistas que ficavam anunciando as respectivas eleições durante semanas ou mesmo
meses, muitas vezes sem indicar exatamente o dia de sua publicação. É provável que
esta tenha se tornada uma estratégia recorrente devido ao fato de prender a atenção do
público leitor semanalmente na coluna, tendo em vista que estes esperavam conhecer os
eleitos:
Grande sensação vem proporcionando a incógnita da apresentação
das listas das DEZ MAIS (senhoras e senhoritas). Segundo
informações que obtivemos vem causando verdadeiro “suspense” na
HIGH-SOCIETY local. Mas, aguardemos, oportunamente estaremos
divulgando e... para surpresa de todos... (“Rumores Sociais”, Folha
138
BASSANEZI, Carla. Op. Cit., 2004, p.609.
117
do Oeste, 26 de Agosto de 1962).
As ultimas listas criadas por “Rumores Sociais”, de acordo com a documentação
disponível foram as listas das dez senhoras e senhoritas “mais” de 1962. A lista dos 10
cavalheiros “mais” já era anunciada desde 10 de junho de 1962 e inclusive já levantava
os atributos necessários para pertencer a tal lista: simpático, elegante, correto, gentil,
eficiente, comentado, inteligente, culto, disputado e popular. Entretanto, não foi
encontrada a referida lista e nem alguma indicação de que ela teria realmente sido
criada, tendo em vista que as outras listas foram publicadas mesmo que com atraso:
As senhoras e senhoritas apontadas por Temístocles e Kátia foram as
seguintes:
SENHORAS
ANITA SCHEIDT, esposa do Dr. Arthur Scheidt;
LEONOR BUCH, esposa do Sr. Álvaro Buch;
ARICE FLEURY DA ROCHA, esposa do Sr. Dr. João Fleury da
Rocha;
ISA RAUEN, esposa do Dr. Eurípio Rauen;
ADAIL SOUZA, esposa do Sr. Idavino Oliveira Souza;
TEREZINHA CARVALHO, esposa do Sr. Alberto Carvalho Filho;
RENI ARAUJO, esposa do Sr. Dari Araujo;
IVETE CAROLLO, esposa do Sr. Darci Carollo;
CLEONICE BUFFARA, esposa do Dr. William Buffara;
IZIL PIMPÃO, esposa do Sr. Lineu Pimpão.
Muito bem recebida pelo seleto público presente, esta lista das DEZ
MAIS, aliás, a primeira apresentada pela crônica especializada de
F.O. e Rádio Difusora. Também muito aplaudida a Lista das Dez
Senhoritas “Mais” apresentada no baile do dia 1º p.p. É a seguinte:
ALBA KEINERT
EUCARIS DURSKI
ROSELI GOES
GENI LACERDA ROSEIRA
ZACLIS ROCHA
ZULMEIA MULLER
MARIA JULIA ARAUJO
EDNA MARTINS QUEIROZ
GUIOMAR ARRUDA e
VIRGINIA MISHALANY
(“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 16 de Setembro de 1962)
A maior reincidência de nomes acontece efetivamente na coluna das Dez
Senhoras “mais”. Pelo menos quatro das dez componentes das listas já haviam sido
eleitas em listas anteriores, a exemplo da senhora Terezinha Carvalho, já eleita uma das
118
“dez senhoras mais” e “dez melhores anfitriões”. Entre as jovens a reincidência não foi
constante, com exceção da senhorita Alba Keinert, presente em outras listas de “dez
senhoritas mais” além de ser uma das poucas solteiras presentes na lista das “dez mais
cultas”. Desta forma, é provável que para as jovens a visibilidade social fosse mais
difícil tendo em vista a grande concorrência entre as novas gerações, o que pode indicar
também que apenas poucas moças ainda seguiam piamente os padrões estabelecidos
pela geração passada.
A partir de 1963 a documentação não existe ou é incompleta, com uma lacuna
entre abril de 1963 e novembro de 1963. Esse hiato é devido à inexistência dos jornais
referentes a este momento, o que nos impossibilita de afirmarmos a existência de novas
listas no referido período. Entretanto, é certo afirmar que as listas eram ponto alto nas
colunas assinadas por Wilde Martini, enquanto que nos demais colunistas outras
estratégias estão presentes e ocupam maior espaço, como o já citado “caderno
vermelho”. Parece que o burburinho e a fofoca carregados de ironia nos anos finais da
coluna tornam-se prioridade entre os colunistas, diferente do estilo mais comedido de
Martini. Ao mesmo tempo, é inegável o papel desempenhado pelas listas, explicando
inclusive a proporção que estas tomaram em todo o país, publicadas e republicadas por
todos os cantos, em pequenos e grandes periódicos.
Em Guarapuava as listas ocuparam grande destaque em meio ao conjunto de
sociabilidades das elites levadas a cabo entre 1959-1964. Entretanto, compunham
apenas uma parcela das representações criadas ou difundidas pelas colunas sociais
mesmo que, entre estas, ocupasse um papel bastante explicito de afirmação.
Os eventos sociais, sobretudo os tradicionais, compunham um leque de
oportunidades para as elites guarapuavanas reforçarem sua visibilidade social,
dinstinguirem-se dos demais, de crianças a adultos, e afirmarem-se como membros de
uma fidalguia guarapuavana que criava seus espaços e usos.
3.3– Crônicas da Fidalguia: os limites da visibilidade social
Pertencer ao “high society” não era uma tarefa tão fácil. Além de existir, como já
afirmado, a necessidade de certo status social, conquistado a partir de relações
familiares ou mesmo da importância de cargos ou que o dinheiro lhe dava, era
necessário estabelecer relações com pessoas já pertencentes ao society que lhe
119
garantissem “sinal verde” para adentrar nesse meio. A presença constante no jornal
Folha do Oeste dos avisos sobre como conseguir ingressos para participar dos eventos
de visibilidade social indicava esses meios: “Ingressos para pessoas estranhas ao quadro
social, somente serão fornecidos quando solicitados com antecedência de 24 horas e
mediante os emolumentos regulamentares (Folha do Oeste, 17 de maio de 1959, p.3)”.
O trecho, referente a um evento que acontecera no Clube Guairá indicava a necessidade
do reconhecimento das pessoas que poderiam participar. Segundo os emolumentos
regulamentares, toda pessoa estranha deveria ser indicada por um sócio, sendo que o
mesmo deveria se responsabilizar pela pessoa convidada. Esse tipo de tática tinha como
objetivo fiscalizar e controlar os usos dos espaços do clube, evitando assim que
qualquer sorte de gente pudesse freqüentar o clube desmerecendo o mesmo e garantindo
a reputação do clube de um espaço seleto na cidade, um clube fidalgo, aristocrático.
Além do Clube Guaíra, entre os anos de 1950-1960 diversas agremiações
surgiram na cidade a fim de garantir a vários grupos citadinos o acesso as diversões
sociais e esportivas, possibilitando assim acesso a reuniões artísticas e literárias e a
convivência social. Pertencer a um grupo social era fundamental. Nessa perspectiva,
clubes como a Sociedade Recreativa Operária, o clube Rio Branco, o clube Cruzeiro do
Sul, o Guarapuava Esporte Clube e grêmios menores como o Recreativo Esperança
possibilitavam a uma gama variada de associados o acesso a esses meios de recreação
social.
Por exemplo, o quadro de sócios da Sociedade Recreativa Operária era
composto também por membros do Clube Guaíra, além de outras pessoas de maior
destaque na sociedade local, configurando-se igualmente um clube seleto, porém mais
liberal que seu antecessor. Daí seu decorrente sucesso entre os anos da década de 1950 e
1960, por garantir um acesso mais amplo a associados, além de uma diretoria mais
jovem e dinâmica, promotora de uma gama muito variada de eventos de sucesso que
possibilitaram ao clube crescer socialmente. “Não foi o clube Guairá que caiu, foi a
Sociedade Recreativa que subiu”, afirmava o colunista Wilde Martini em 11 de
fevereiro de 1962, em “Rumores Sociais”.
Clubes como o Rio Branco e a Sociedade Cruzeiro do sul, sociedades de porte
mediano na cidade, acabavam agregando entre seus quadros de associados grupos que
acabavam sendo restringidos nos Clubes como Guaíra e o Clube Operário, como os
negros, freqüentadores do Rio Branco e os poloneses da Sociedade Cruzeiro do sul.
Entretanto, o Clube Rio Branco, via suas fronteiras de participação com o “high society”
120
diminuir em períodos como o carnaval, onde a presença de sua escola de samba era
constante nas agremiações maiores, devido a sua alta qualidade.
Dentro dos clubes, também era possível visualizar grêmios fundados com o
objetivo de organizar socialmente determinados grupos. Foi o caso de mulheres, que no
Clube Guaíra compunham o grêmio “Filhas do Guaíra”, grupo que reunia mulheres da
alta sociedade guarapuavana e que, diferente da fama conquistada na primeira metade
do século XX entrou em decadência na década de 1950, perdendo a sua autonomia na
organização dos bailes. Martini afirmou que esse segmento social havia sido
completamente lançado ao ostracismo pelo Clube (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste,
30 de Agosto de 1959).
De certa forma, a cidade era repleta de espaços delimitados, fronteiras que
separavam os limites entre a população e o “grand monde guarapuavano”. Os bares
seletos como o “bar América”, local de reunião masculina frequentado pelo seu público
elegante o que o diferenciava-se de outros espaços mais populares como o “bar do
Walter”, também freqüentado por pessoas da elite, mas que acabava reunindo pessoas
que, segundo Martini, eram de “mentalidades medíocres que longe estão de poder fazer
parte de um ambiente elevado e desprovido de malícia” (“Rumores Sociais”, Folha do
Oeste, 22 de Maio de 1960). As lojas de moda como a Modas Clipper eram referidas
com freqüência na coluna social. Essa loja elegia também sua mais elegante,
apresentando-se como boutique de modas da alta sociedade, organizando desfiles
realizados em clubes como o Guaíra e o Clube Operário, que apresentavam crianças,
adolescentes e jovens das elites com trajes de gala. Pode citar-se também como espaço
destinado a pessoas da alta sociedade a Confeitaria Ipê, onde membros das elites
podiam como afirmou Martini, desfilar os melhores figurinos (“Rumores Sociais”,
Folha do Oeste, 28 de Agosto de 1960). Entre outros espaços estavam também as belas
residências, palco de vários eventos que reuniam o high society local.
Havia momentos em que as elites se apresentavam também nas ruas, tomando o
espaço público como palco de visibilidade, como no Carnaval. Entre os anos estudados,
o carnaval sempre vigorou com destaque na coluna social do Folha do Oeste. Desde os
concursos de fantasias infantis, que aconteciam com regularidade em clubes como o
Guaíra, até a escolha dos rei e da rainha do Carnaval, que motivavam as agremiações a
escolherem seus candidatos, sempre ocuparam destaque na referida coluna.
Em geral, o carnaval acontecia seguindo um roteiro padronizado, que iniciava
com os preparativos e reunião dos blocos carnavalescos, geralmente organizados em
121
torno dos clubes sociais, em seguida tomando a rua em desfiles a pé ou em automóveis,
para retornarem novamente aos clubes para a continuidade e encerramento dos festejos.
Mesmo em sua passagem pelos espaços públicos, possibilitavam através de
simbolismos a sua visibilidade para os demais segmentos da população guarapuavana.
Dessa forma, impondo limites, a “alta sociedade” desfilava para a cidade, apresentando
suas fantasias, sua elegância e sua distinção para a platéia anônima. Depois, nos salões
dos clubes, retornavam ao seu carnaval longe do olhar popular. Todo o evento era
marcado pela seleção, ou seja, quem entra quem pode participar e dentre os
participantes quem são os que se destacavam, as melhores fantasias, o rei e a rainha, e
que constituíam estratégias de afirmação que marcavam aquele meio – estar no society é
estar em constante busca por evidência e visibilidade social.
A busca por visibilidade social começava cedo, sobretudo para as mulheres. A
entrada feminina para o “high society” era marcada por ritos que as apresentavam à
sociedade, delimitando os caminhos para as apresentar ao “mercado matrimonial”,
como o chamou Bourdieu. O objetivo era assegurar um bom casamento para as moças.
O casamento figurava como um dos objetivos da vida feminina, vigorando como uma
via legítima de transferência de riqueza e de bens simbólicos. 139
Entre esses ritos parece-nos que o principal era o baile de debutantes, ou “baile
de primavera”, como conhecido em Guarapuava, onde os clubes selecionavam entre seu
quadro de sócios, meninas de 15 anos que deveriam em trajes brancos apresentar sua
pureza iniciando-se assim na vida social como jovens casadoiras. Aos demais
associados não era permitido o uso de trajes que não fossem de gala, como no caso das
mulheres, que só poderiam “dançar com traje de gala (comprido) não sendo tolerado
(mesmo de luxo) o vestido curto” (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 29 de Outubro
de 1961), tendo em vista que os trajes curtos poderiam gerar constrangimentos entre os
passos da dança.
Estas festas eram tradicionais e foram tratadas em “Rumores Sociais” em todo o
período de sua existência entre 1959-1964, sempre ocupando lugar de destaque, além de
anúncios em outras páginas do mesmo periódico.
O baile de debutantes marcava a entrada das meninas-moças nas relações de
visibilidade social entre as elites e seguia-se à mesma uma série de oportunidades de
139
BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. 1ª ed., São Paulo: EDUSP; Porto
Alegre, Editora Zouk, 2007, p.55-56.
122
aparecer socialmente. Entre essas oportunidades estavam o concurso de “miss
brotinho”, elegendo em períodos irregulares os principais “brotinhos” ou o título de
reconhecimento de como uma bela moça das “altas rodas”. Em “Rumores Sociais”, a
miss brotinho era considerada “um dos títulos mais cobiçados pelas meninas-moças de
nossa cidade” (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 20 de maio de 1963). De certa
forma, esses concursos, como legitimadores das figuras femininas no palco social
citadino, representavam como que degraus a serem conquistados para o reconhecimento
social, passos da caminhada rumo ao panteão social. De meros figurantes a
coadjuvantes, como o exemplo da então senhorita Laura Pacheco Bastos, membro de
uma família importante de fazendeiros da cidade, eleita primeira miss brotinho de
Guarapuava em 1960 e posteriormente, já casada, figurando entre as 10 Senhoras mais
cultas da sociedade Guarapuavana.
Desfilarem em algum evento, seja ele promovido pelas boutiques ou pelas
agremiações, também se configuravam em meios das jovens alcançarem visibilidade
social. Entretanto, nenhum deles chegava a uma amplitude tão grande quanto os
concursos de misses. Estes ocorriam em várias cidades e as vencedoras locais
encaminhavam-se para as eleições estaduais, para a nacional que por sua vez poderiam
representar o país na “Miss Universo”, que elegeria a mulher mais bonita do planeta.
Estes concursos não alcançam hoje a mesma visibilidade de outrora, entretanto, a
permanência dos mesmos até os dias atuais evidencia a importância e a força de tal tipo
de evento no roteiro de acontecimentos “top” das altas sociedades. Além disso, às
eleitas misses estendiam-se as oportunidades de figurar com destaque em outros eventos
sociais, sejam eles de sua cidade ou em outras, como no caso do convite feito a miss
Paraná de 1959, Shirley Tempski, pelos Clubs Guaíra e Operário para que a mesma
realiza-se a coroação da Rainha de Primavera do Clube Operário (“Rumores Sociais”,
Folha do Oeste, 25 de Agosto de 1959).
Em meio aos vários concursos de beldades destacados, o concurso de misses
passa a ser um dos pontos altos da coluna social a partir de 1960. A coluna mostra o
processo de seleção das candidatas, tendo em vista as características necessárias para
participar do concurso: idade mínima, 18 a 25 anos; altura mínima: 1,60.
Martini era um dos promotores destes concursos participando desde as
inscrições até como jurado. Era também um dos treinadores das misses e acompanhante
das vitoriosas na seqüência de eventos que se sucediam a escolha da representante local,
como por exemplo, a Miss Paraná.
123
Dada a relevância do concurso de misses, grande era a sua repercussão entre as
moças da sociedade guarapuavana. Além disso, as notas constantes na coluna
estimulavam ainda mais a curiosidade e o desejo feminino:
A grande repercussão e interesse em torno do Concurso de Miss
Guarapuava - Miss Paraná, está empolgando as belas guarapuavanas.
A comissão organizadora do certame composta pelo Snr. Nabor
Ferraz, Luiz Cleve Teixeira e este colunista, está nomeando as
diversas comissões que integrarão o concurso, tendo já, convidado os
Clubes, entidades e agremiações esportivas para apresentarem
candidatas. No decorrer do pleito, as candidatas serão apresentadas
em várias reuniões e lugares elegantes, onde a beleza terá expressão
“top”, sendo ainda apresentadas e entrevistadas por este colunista, na
coluna Ronda Social todas as semanas, tão logo sejam encerradas as
inscrições (“Rumores Sociais”, Folha do Oeste, 13 de Novembro de
1960).
Além de despertar o desejo feminino, tendo em vista as várias atividades que
envolveriam as candidatas, as quais garantiriam um grande status social, percebe-se que
em geral as candidatas já possuíam alguma forma de visibilidade social, principalmente
a partir da sua participação em alguma agremiação seleta na sociedade, sobretudo dos
Clubes anteriormente citados que, por si só, já faziam-se em espaços restritos
socialmente. Dessa forma, como um meio de reconhecimento, a participação e a eleição
da miss acabavam apenas reafirmando padrões e membros das elites guarapuavanas
que, de outras formas, já possuíam alguma visibilidade social. Ainda, o fato da
organização do evento ser promovido por três membros da imprensa guarapuavana,
Nabor Ferraz, diretor da Rádio Difusora Guarapuava, Luiz Cleve Teixeira, jornalista do
Folha do Oeste e o colunista Wilde Martini indicam a participação ativa da imprensa
local em meio às sociabilidades das elites. Além disso, a ligação entre a Rádio Difusora,
o Folha do Oeste e as elites fazendeiras da cidade indicava a quem pertenciam
geralmente o poder de distinção na cidade, ou seja, a aristocracia rural guarapuavana.
Desta forma, esses eventos e a busca por visibilidade social estavam, antes de tudo,
fixados sobre lutas simbólicas que envolviam as elites citadinas pela busca de poder
simbólico e status social.
Porém, mesmo com a importância atribuída ao concurso de miss em
Guarapuava, nem sempre o concurso era realizado no município. Em longa nota
publicada na coluna “Rumores Sociais” de 18 de março de 1962, o colunista Martini
124
estabelece uma crítica ao fato da cidade ainda não ter eleito sua representante ao miss
Paraná, enquanto cidades vizinhas menores já haviam realizado tal concurso:
Sim, caros leitores, a vizinha cidade de Imbituva elegeu por
unanimidade para representar o Município, no concurso de Miss
Paraná, Miss Brasil de 1962. Em Imbituva o concurso está tendo o
apoio desejado; pela Prefeitura Municipal, cujo prefeito e Câmara de
Vereadores estão dando seu integral apoio para que o Município seja
condignamente representado; o, que infelizmente não está
acontecendo em Guarapuava, pois até o momento, apesar dos grandes
esforços feitos pelo Colunista Wilde Martini, não temos ainda quem
nos represente, e, vejam só que isto é inacreditável e até parece piada,
tratando-se de Guarapuava, ser o maior Município do Estado, e
deveria ter sido o primeiro a apresentar sua candidata. Sim caros
leitores. Somos o maior município do Paraná, o que quer dizer que
deveríamos ser os primeiros e estamos sendo passados para traz, por
municípios pequenos, no caso Imbituva e São José dos Pinhais, para
não citarmos outros. Mas voltemos à Miss Imbituva, já inscrita em
Curitiba, por aquela cidade cuja Sociedade evolui cada vez mais. A
primeira Miss Imbituva é a nossa muito conhecida e muito popular
em nossa Sociedade, senhorita Letícia Bastos, de tradicional família
Imbituvense. A moça Miss além de ser uma grande beleza é ainda de
uma grande modéstia, pois somente há poucos dias é que viemos
descobrir ser ela a eleita de Imbituva, para representar a beleza da
mulher Imbituvense no grande pleito. Letícia Bastos, Miss Imbituva
1962, seguiu, dia 15 para Curitiba, a fim de ser entrevistada pela
revista O CRUZEIRO, que veio à capital do Paraná fazer entrevistas
com as candidatas já inscritas. Também a candidata de Guarapuava
deveria ser entrevistada pelo O CRUZEIRO, mas, infelizmente, isto
não aconteceu, devido ainda não termos Miss (“Rumores Sociais”,
Folha do Oeste, 18 de Março de 1962).
A clara insatisfação de Martini na referida crônica acaba apontando para
discursos que permeavam as relações entre Guarapuava e as cidades vizinhas, sobretudo
quanto ao fato da cidade ser o maior município do Paraná e ainda ficar atrás de outros
menores. De certa forma, esse sentimento era constante na cidade de Guarapuava, tendo
em vista as dificuldades de acesso e a distância da cidade de Curitiba que ainda em
meados do século XX representavam uma grande dificuldade de acesso aos elementos
naquele momento considerados modernos como a estrada de ferro, apontada no capítulo
inicial desse trabalho, que só chegou a cidade em 1954, enquanto havia sido instalada
em Irati, a cerca de 100 km em 1938. Dessa forma, em vários momentos, como na
referida coluna de Martini, esse sentimento de inferioridade volta a tona. Segundo
Martini, esse tipo de problema acabava impossibilitando a cidade de conseguir a
visibilidade merecida. O texto acima transcrito, aparentemente uma depreciação dos
municípios vizinhos, transpira uma crítica severa as lutas entre as elites guarapuavanas
125
na medida em que dificultavam a realização de tal tipo de evento, tendo em vista a falta
de consenso e a presença das rivalidades. Além disso, impossibilitava “evolução da
Sociedade” guarapuavana, de forma que cidade a deixava crescer em visibilidade, o que
Martini não tolerava, visto que alguns municípios menores haviam crescido nesse
sentido. O fato de não figurar em entrevista na revista O Cruzeiro gerava um grande
sentimento de frustração, tendo em vista que, através desta, podia-se obter um lugar de
visibilidade nacional, espaço antes reservado apenas a pessoas dos grandes centros.
Além disso, o trecho transcrito, apontando Letícia Bastos como a eleita em
Imbituva, indica que determinadas famílias como Bastos, constantes tanto em Imbituva
quanto Guarapuava aponta para o fato de algumas famílias expandiam seu
reconhecimento no âmbito regional, uma vez que se tratava de famílias tradicionais
responsáveis pelo “desbravamento” da região em épocas anteriores e geralmente ligadas
à fundação de mais de uma cidade.
Foi em 1963, depois de tantas críticas realizadas, que Martini via o potencial da
mulher Guarapuavana ser expresso através da figura de Tânia Mara Franco Souza, eleita
miss Guarapuava em 1963 e que, como representante da cidade no mesmo ano, foi
eleita Miss Paraná e, em seguida, concorrendo ao Miss Brasil, obtendo o segundo lugar.
Dessa forma, alcançou o status de mito social, figurando como a mulher mais bonita da
história guarapuavana (Flash, junho de 1985). Martini dedicou entre os anos de 1962 e
1963 grande parte de seu tempo a promover essas misses, hora como conselheiro ou
como acompanhante da candidata. Assim, passou longo tempo afastado da cidade e de
suas atividades como colunista, deixando outras pessoas assinarem “Rumores Sociais”.
Tânia como miss em 1963, deu visibilidade à cidade de Guarapuava uma vez
que ocupou várias matérias do Folha do Oeste que enfatizavam a beleza da referida
senhorita. Em 5 de Abril de 1964, ela figurou em uma matéria de meia página, intitulada
“Tânia Mara: Miss Paraná 64 será de Guarapuava”, expressando a importância do
referido concurso e a felicidade da imprensa local em apontar para o “currículo” de
Tânia:
Em sua trajetória de sucesso Tânia Mara, tornou-se o símbolo da
beleza paranaense, para orgulho de Guarapuava, que ela tão bem
soube representar. De sucesso em sucesso, Tânia arrebatou todos os
títulos de beleza nos concursos em que tomou parte: “Rainha do Mate
de Guarapuava” em 1961, e “Rainha do Mate do Brasil” em 1962;
“Miss Guarapuava”, “Miss Paraná” e “Miss Brasil nº 2”, “Miss
Fotogenia Nacional”, “Rainha da Beleza Nacional” e “Miss Simpatia
126
do Brasil” e a mais elegante do concurso “Miss Brasil” em 1963. Em
Lima, Bogotá, Panamá e México, foi admirada por milhares de
pessoas que queriam ver de perto a beleza da moça de Guarapuava.
No concurso de Miss Beleza Internacional, realizado em Long Beach,
Califórnia, Tânia foi classificada em 6º lugar e apontada por mais de
uma centena de jornalistas, fotógrafos e “experts” em beleza, como
Miss mais perfeita que apareceu num concurso de beleza nos Estados
Unidos da América e a melhor desfilante do universo. Ostentando
hoje o título de Miss Brasil, a 6º Mais Bela do Mundo afirma que a
nova “Miss Paraná, poderá ser de Guarapuava, pois todas as
candidatas que tomarão parte do próximo dia 11 ao Concurso de que
vai eleger nossa representante para este ano ao Concurso “Miss
Paraná- Miss Brasil” são todas lindas e irão fazer muito sucesso,
dizendo ainda que vai acompanhar de perto Miss Guarapuava, afim
de torcer pela vitória da beleza da mulher guarapuavana (Folha do
Oeste, 5 de Abril de 1964, p.3)
Como
expressão
idealizada
da
mulher
Guarapuavana,
carregada
de
representações sobre a beleza da mulher local, Tânia Mara alcança o ápice da
visibilidade social que Guarapuava a longo tempo almejava. Como símbolo dos ideais
buscados naquele meio, a jovem miss era alçada ao ponto alto do pertencimento ao
Society que, como sempre desejado, extrapolava os limites citadinos, elevando
Guarapuava há um lugar de representação nacional. Todo o discurso idealizador do
jornalista simbolicamente expressava um desejo constante das elites citadinas: ser
visível, ser modelo e referência, lutas que estabeleciam-se entre as sociabilidades das
elites locais e que criavam um espaço propício à fama alcançada pelas colunas sociais e
seus colunistas como enunciadores desses espaços ocupados socialmente. Finalmente
essas elites podiam ver a possibilidade de alçar degraus maiores e esperados há várias
décadas, o reconhecimento do valor da cidade, seja pelo seu tamanho, seja pela elevação
das mulheres á um “patrimônio local”. Como representante desse sonho, Tânia Mara,
como aquela que internacionalmente era acompanhada por milhares de pessoas “que
queriam ver a beleza Guarapuavana”, mesmo que provavelmente a grande maioria não
soubesse onde esta ficava ou mesmo ignorava tal informação, representava para os
habitantes da cidade a divulgação de algo que lhes era particular e o desejo constante de
que, pertencendo ao “Grand Monde” guarapuavano, se poderia realizar vôos ainda mais
altos. Não é a toa que a participação de grupos antes estranhos ou mesmo “vindos de
fora” compondo as sociabilidades das elites guarapuavanas tornou-se constante a partir
de 1950.
Ter dinheiro não era o suficiente, participar e viver como elite era algo maior do
que possuir bens econômicos. Era a possibilidade de pertencer a algo maior, ser
127
reconhecido, mesmo que isso não acontecesse sem luta. Essas lutas, simbólicas,
acabaram por romper decisivamente com representações que compunham o imaginário
local e que naquele momento passavam a ser reconstruídas, transformadas. Os valores
estabelecidos foram revistos, metamorfoseados pelas transformações que cada vez mais
se faziam constantes na cidade e que, não sem resistência, mas inevitáveis, alterariam
bruscamente as sociabilidades das elites guarapuavanas.
128
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao contemplar as fontes elencadas e analisadas, pode-se perceber os colunistas
como interpretes do cotidiano das elites guarapuavanas. Através de suas crônicas, não
apenas retratavam as sociabilidades deste grupo, mas lhe davam sentido e visibilidade.
Dessa forma, cada uma dessas crônicas representou uma percepção histórica, um olhar
sobre um momento onde a cidade passava por fortes transformações e pela
modernização da vida social ao mesmo tempo em que se lutava pela permanência de
alguns valores e atitudes. Desta forma, como interpretes de seu momento, os colunistas
sociais contribuíram para essas mudanças na medida em que também difundiram novas
representações ao mesmo tempo em que ratificavam as já estabelecidas socialmente.
Portanto, a análise dos textos das colunas, bem como de outros trechos dos
periódicos guarapuavanos, juntamente as fontes memorialísticas, nos possibilitou
refletir sobre essas práticas, discursos e representações que compunham o imaginário
local no período delimitado. A partir da especificidade dessas interpretações podem-se
perceber as transformações vividas pela cidade tendo em vista os sujeitos que as
inscreveram.
As representações analisadas nos permitiram perceber os limites e papéis
impostos pelas elites a si e aos demais integrantes do espaço urbano, delimitando quais
as atitudes aceitáveis, quais as depreciáveis e estabelecendo os espaços a serem
ocupados por cada grupo dentro da vida social citadina. Dessa forma, construíam os
códigos que moldavam o cotidiano da “alta sociedade” ao mesmo tempo em que os
difundias para os outros grupos, que participavam atentamente como observadores.
A produção destes discursos e modelos que circulavam na cidade foi possível a
partir da legitimidade alcançada pelos seus enunciadores, fundamentados sobre o
orgulho e o desejo constante da alta sociedade em alcançar destaque e visibilidade
social e impor limites ao círculo de ação. Dessa forma, ao eleger os personagens que
compuseram o panteão social naquele momento histórico específico, delimitaram as
características necessárias para não apenas ter condições para adentrar nas “altas rodas”,
mas para permanecer nelas e ser reconhecido como legítimo participante, mesmo que
esse discurso fosse por muitas vezes ambíguo, pois tinha que conviver com as relações e
129
disputas constantes vivenciadas naquele momento, onde o antigo e tradicional, o fidalgo
e aristocrático, como eles mesmos se autodenominavam, deparava-se com o novo, com
a transformação, com “os de fora”, que traziam novos ares para a cidade, nem sempre
agradáveis para aqueles que há muito já ocupavam aquele espaço.
Dessa forma, essas disputas que se evidenciavam no cenário político e nas
características urbanas da cidade, aonde os recentes grupos chegados impunham uma
nova lógica de ação, fazia-se como espaço de resistência, onde a partir de uma série de
estratégias e de códigos os grupos mais tradicionais, sobretudo a aristocracia rural,
também denominada Sociedade Campeira, ainda impunha o seu domínio sobre o
mercado de bens simbólicos e a quem eles deviam ser atribuídos. Dessa forma, mesmo
dominando a economia e a política local, os grupos “outsiders”
140
tiveram que adotar
alguns valores e atitudes a fim de serem aceitos nas relações sociais das altas rodas,
participando e constantemente os reinterpretando.
Nesse sentido, a percepção desses valores e desse momento só foram possíveis a
partir da contextualização cultural e social das fontes visitadas, percebendo o momento
e as condições de sua produção. As características técnicas dos seus veículos de difusão,
no caso os jornais, sobretudo o Folha do Oeste, demonstraram a importância adquirida
pelos periódicos e pelos meios de comunicação em geral naquele meio, sendo
constantemente vistos e utilizados como meios de poder, “fazer ver” e “fazer crer” no
cotidiano guarapuavano.
Mesmo com as dificuldades em sua produção, derivadas dos ainda rudimentares
meios de transportes e acesso a recursos que poderiam ter impulsionado ainda mais a
sua produção, esses periódicos extrapolaram os limites do município e alcançaram
espaços mais amplos regionalmente, sobretudo por que estavam em constante contato
com valores, atitudes e discursos que circulavam a níveis maiores. Dessa forma,
percebeu-se que, de modo geral, todos esses discursos construídos por periódicos como
o Folha do Oeste e sua coluna social “Rumores Sociais”, estavam inscritos em uma rede
ampla de significados, relacionando constantemente o local/regional/nacional, o
particular e o universal. Sob essa perspectiva, ao apontar e evidenciar os grupos sociais
construtores dessa discursividade, pode perceber-se que dialogavam constantemente
com valores difundidos por outros grupos de outros espaços, muitas vezes buscando ser
semelhantes a estes.
140
ELIAS, Norbert & SCOTSON, John L. Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das relações de
poder a partir de uma pequena comunidade. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2000.
130
Refletir sobre a discursividade construída por esses grupos e que davam sentido
aos usos e práticas sociais, demandou um grande esforço de interpretação das fontes
arroladas, suas controvérsias, sentidos, lógicas próprias, possibilitando-nos adentrar nos
ideais e valores que permeavam aquele meio.
Dessa forma, também como uma interpretação sobre o vivido naquele momento,
esta dissertação buscou suscitar questões a cerca das relações de sentido e poder que
permeavam as produções da colunas sociais locais, buscando assim abrir caminho para
novas abordagens que tomem essa fonte não mais com visões preconceituosas ou que
desmereçam o potencial das mesmas. Dessa forma, como fonte importante para
perceber as relações sociais das elites brasileiras, as colunas sociais constituem-se em
um campo profícuo, porém quase inexplorado. Como monumentos construídos sobre as
práticas sociais as quais estavam ligadas abrem-se como um campo ainda a ser
desvendado historicamente.
Esperamos ter contribuído para essa tarefa, mesmo que, conscientemente
saibamos dos riscos inevitáveis quanto às generalizações e da possibilidade de termos
realizado uma visão superficial ou esquematicamente excessiva.
131
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Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste –
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UNICENTRO, Guarapuava, PR
Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual do Centro-Oeste –
UNICENTRO – Irati, PR.
Acervo Arquivo Benjamin Teixeira, Guarapuava/PR.
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