MECANISMOS GERADORES E CONDUTORES DO POTENCIAL DE AÇÃO
No cone e ao longo de todo o axônio há canais com comporta para o Na e K. Durante o
repouso esses canais estão fechados e a membrana está polarizada (cargas negativas na face
interna e cargas positivas na face externa). Se o segmento inicial do axônio for despolarizado até o
potencial limiar, os canais de Na+ com comporta, sensíveis a voltagem, se abrem e o íon difunde-se
passivamente para dentro do axônio. A entrada de cargas positivas despolariza a membrana ainda
mais, abrindo mais canais de Na+ voltagem dependentes num ciclo de retro-alimentação positiva
a ponto de inverter completamente a polaridade da membrana (mais cargas positivas na face
interna). A despolarização continua até que o Em alcance valores próximos ao potencial de
equilíbrio do Na+ (ENa). O novo Em se opõe ao fluxo passivo de Na e a entrada do cátion diminui. Ao
mesmo tempo, os canais de Na voltagem dependentes fecham-se tão rapidamente quanto se
abriram, tornando-se temporariamente inativos. Até aqui ficou claro como se dá a fase de
despolarização do PA.
E como ocorre a repolarizaçâo? Para que o Em volte ao estado de repouso, uma solução
seria a de reduzir as cargas positivas da face interna da membrana por meio da saída de K. De fato
é isso que acontece. Diferente dos canais de Na voltagem dependentes que se abrem e se fecham
rapidamente os canais de K voltagem dependentes se abrem e se fecham lentamente. O K pode
agora se difundir passivamente para fora da célula, a favor do seu gradiente elétrico e químico
causando a repolarizaçâo sem qualquer gasto de energia. Como os canais de K+ fecharem-se
lentamente, a face interna da membrana chega a acumular mais cargas negativas do que na
condição de repouso, tornando-se momentaneamente hiperpolararizada.
Estudos com os canais unitários de Na e de K deixam claro que durante a despolarização ocorre
entrada de corrente (íons) e durante a repolarização, saída em outras palavras movimentos de
íons.
É importante salientar que a quantidade de Na e de K que atravessa a membrana durante o
PA não causa qualquer alteração na concentração dos respectivos íons nos dois lados da
membrana.
A prova de que a entrada de íon Na é o responsável pelo desencadeamento do PA é
reforçado pelos seguintes dados: se houver um grande aumento na concentração de Na
extracelular, o neurônio se tornará facialmente excitável e se houver redução, ficará bastante
inexcitável. O modo de ação dos anestésicos locais é um bom exemplo: a lidocaina inibe
especificamente os canais de Na voltagem dependentes, impedindo a geração de PA nas células
sensoriais causando a analgesia. Já a TTX é um potente veneno age do mesmo modo.
Na figura ao lado um segmento do axônio possui um
eletrodo de estimulação (s) e dois eletrodos de registros R1 (mais
próximo) e R2 (mais distante). Logo abaixo são mostrados os diferentes pulsos
de correntes e os respectivos registros do Em.
Repare que o PA só foi gerado apenas quando o estimulo indicado pela
seta foi aplicado. Repare ainda que o PA foi registrado em R1 e em R2, isto
é, ele se propagou de um ponto para outro e sem alterar a sua amplitude.
A intensidade de estimulo capaz de gerar o PA é
denominado estímulo limiar e o valor do potencial de membrana
é denominado de potencial limiar.
Os estímulos que só provocaram alterações de baixa
voltagem (potenciais subliminares) são denominados
estímulos subliminares. As intensidades acima do estímulo
limiar são conhecidas como supralimiares.
Propriedades do PA
Se o axônio fosse bem curto, a condução da informação poderia ser feita por condução
eletrotônica, mas como as mensagens neuronais percorrem distâncias longas, é essencial um
mecanismo que garanta a total fidelidade da informação. Por exemplo, a condução de eletricidade
através de cabos elétricos é bem rápida, mas a intensidade do sinal sofre um decaimento
exponencial com a distância. Como então contornar a perda de sinal com a distância? A solução foi
produzir um evento elétrico auto-regenerativo e auto-propagável como o PA cuja duração e
amplitude se propagam imutavelmente ao longo do axônio.
Lei do Tudo-ou-Nada: Se um estímulo limiar for aplicado a uma célula excitável, a célula
responderá com um PA e nada impedirá que o fenômeno seja adulterado. É por isso que o PA é
conhecido como um fenômeno tudo-ou-nada. Isso ocorre por causa das propriedades intrínsecas
dos canais voltagem-dependente que se abrem e se fecham. O seu fechamento é automático, isto
é, não depende de um estimulo. Assim, quando ocorre uma despolarização da membrana até o
limiar, todos os canais se abrem e se fecham automaticamente.
Decodificação de intensidade do estímulo. Se o PA é um
fenômeno cuja amplitude não varia, como os neurônios decodificam
variações de intensidade? A intensidade é codificada em função da
freqüência dos PA gerados no axônio (numero de PA / unidade de
tempo). A decodificação da variação de intensidade é realizada do
estímulo limiar até um máximo.
Período refratário: Se um segundo estímulo limiar for aplicado, enquanto o primeiro PA já está
em curso, não será possível desencadear outro PA, pois os canais de Na não estarão
completamente inativados, isto é, fechados. Este período corresponde ao período refratário
absoluto (PRA). A aplicação de um estímulo limiar em uma fase posterior, no curso final da
repolarização será possível desencadear um PA, ainda que de
menor amplitude. A este período denominamos período refratário
relativo (PRR).
Esta propriedade é também decorrente das
propriedades dos canais voltagem dependente e indica que um novo
PA só pode ser gerado quando a membrana estiver completamente
repolarizada aos níveis de repouso.
Curva Intensidade-Duração. Um estímulo forte despolariza
rapidamente a membrana até o limiar e precisa de pouco tempo para
causar um PA. Já um estímulo mais fraco requer mais tempo para
que a mesma quantidade crítica de corrente flua através da
membrana para despolarizar o limiar. O gráfico curva intensidadeduração descreve esta relação. Isto quer dizer que além da
intensidade, a duração do estímulo aplicado também é igualmente
importante para a manifestação do PA. A intensidade mínima de
estímulo capaz de causar um PA é denominada reobase e o tempo
necessário para sua aplicação, tempo de utilização. A duração que
equivale ao dobro da reobase é denominada de cronaxia.
Acomodação: uma célula excitável quando é despolarizada muito lentamente, mesmo até o limiar,
não manifestará PA. Isto acontece porque os canais de Na abertos pela despolarização se tornam
inativos antes de atingir o potencial limiar, limitando o número de canais críticos necessários para
deflagrar o PA. Além disso, como os canais de K voltagem dependentes também se abrem, a
membrana se torna refratária.
Mecanismo de condução do impulso nervoso
A figura ilustra a condução do PA em um axônio sem mielina. Repare que o PA está se propagando da esquerda pela
direita: assim, primeiro vemos o influxo de Na (despolarização) seguido do efluxo tardio de K (repolarização)
Assim que o PA é gerado no cone de
implantação ele se propaga ao longo do axônio até o terminal axônico, como se fosse um rastilho
de pólvora em combustão. Como o PA se propaga da zona de gatilho até o seu terminal sem
depender de novo estimulo e mantendo a sua amplitude e duração?
A membrana citoplasmática é um mal condutor de cargas elétricas, ao contrário dos fluidos
extra e intracelulares. Quando uma região da membrana sofre uma despolarização (zona ativa), as
correntes iônicas se propagam longitudinal e transversalmente fechando o circuito. Estas correntes
eletrotônicas despolarizam a membrana adjacente que se encontra em repouso. Assim, quando
ocorre entrada de Na durante o PA, a região adjacente, “empurra” passivamente corrente negativa
para a superfície da membrana, despolarizando-a passivamente. Esta resposta local despolariza a
membrana até o seu limiar, ou seja, ativando canais iônicos vizinhos de Na e de K voltagem
dependentes, gerando novo PA e assim sucessivamente. Desta maneira o próprio PA serve de
estímulo do PA sucessivo, garantindo a sua propagação autoregenerativa, sem qualquer custo
adicional de energia metabólica.
O PA é conduzido sempre do segmento inicial para o terminal
axônico (anterogradamente) e isto não é devido a uma
propriedade inerente à membrana ou ao mecanismo de
propagação. O sentido da condução não é revertido porque a
membrana do axônio onde o PA acabou de ocorrer se torna
refratária, i e, os canais de Na se encontram ainda inativos e os
de K abertos. Portanto existe um efluxo de K que hiperpolariza a
membrana, barrando qualquer despolarização eletrotônica
anterógrada.
O neurônio sensitivo periférico (neurônio pseudounipolar), entretanto possui um prolongamento mais longo na
periferia que embriologicamente corresponde ao neurito dendritico, mas que especialmente podem
gerar PA à semelhança dos axonios.
Velocidade de Condução do PA
Tipos de fibras nervosas de um nervo de mamífero
Diâmetro
(m)
Velocidade
(m/s)
Propriocepção; Motor somático
10-20
70-120
Tato, pressão
5-12
30-70
Motor
3-6
15-30
Dor, temperatura, tato
2-5
12-30
Neurônio pré-ganglionar autonômico
<3
0,4 – 1,2
0,3 – 1,3
Tipo de Fibra
A



B
C
Raízes dorsais
Simpático
Função
Dor, respostas reflexas
Neurônios pós-ganglionares
Duração do
PA (ms)
PRA
(ms)
0,4 –0,5
0,4-1,0
3-15
1,2
1,2
0,5 –2,0
0,7 – 2,3
2
2
2
2
A tabela acima mostra que a velocidade
de propagação dos impulsos depende de dois
fatores: do calibre e se o axônio é mielinizado ou
não.
O gráfico
informações.
ao
lado
resume
estas
1) Diâmetro do axônio. Quanto maior o diâmetro,
menor será a resistência ao fluxo de corrente
no axoplasma e como conseqüência, maior a
veleocidade.
2) Mielinização da fibra. Uma outra maneira de
aumentar a velocidade da condução é o de
isolar o axônio eletricamente a intervalos fixos.
Os gliócitos encapam os axônios com mielina
com exceção dos nodos de Ranvier. O PA
iniciado no cone é conduzido de nodo a nodo, onde os canais de Na e de K voltagem
dependentes estão presentes. O PA no nodo seguinte é causado pela propagação eletrotônica
de corrente gerado pelo PA anterior. Assim, ao invés do PA se
propagar continuamente como acontece na fibra sem mielina,
ocorre aos saltos, gastando menos tempo até os terminais
nervosos. O aumento na velocidade de condução nervosa
propicia rapidez na transmissão de informações sensoriais, na
emissão de comandos motores para os órgãos efetuadores, bem
como no processamento de sinais neurais pelo SNC.
Potencial de ação de um nervo composto
Um nervo periférico é constituído de várias fibras nervosas,
tanto motoras como sensitivas (com a exceção de alguns nervos
cranianos que possuem ou nervos sensitivos ou motores) e pode
conter fibras mielinizadas como não mielinizadas. Tomando-se um nervo composto, é possível
registrar o PA composto do nervo, estimulando-o experimentalmente. Na figura abaixo, os registros
dos PA do nervo a partir de 3 eletrodos colocados a várias distâncias do eletrodo de estimulação.
Note que o PA composto parece ser constituído de vários picos. O que se vê na verdade é a
resultante de vários PA unitários das fibras nervosas que compõe o nervo; daí ser denominado de
potencial de ação composto. O gráfico ilustra a reconstrução do PA composto mostrando o
tamanho relativo dos PA unitários conforme o calibre das fibras e a duração do impulso. Repare
que a amplitude e a duração dos PA unitários são diferentes para cada tipo de fibra.
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Período Refratário Absoluto