ANALISTA TRE / TRF
Disciplina: Direito Processual Penal
Prof.: Nestor Távora
Data: 19.05.2009
Aula n°09
MATERIAL DE APOIO - MONITORIA
Índice
1. Artigos correlatos
1.1 Inafiançabilidade: a genalogia de um equívoco
1.2 A inutilidade atual da fiança
1.3 A autoridade policial pode conferir liberdade ao preso em flagrante que não tenha condição
econômica de pagar a fiança arbitrada.
1.4 O princípio da proibição da "reformatio in pejus" e seus princípios correlatos: "reformatio in
pejus" indireta e "reformatio in melius".
2. Jurisprudência correlata
2.1 AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS 111250 / SP
2.2 HABEAS CORPUS 94598 / RS - RIO GRANDE DO SUL
3. Assista!
3.1 O que se entende por dispensa da fiança?
3.2 O crime de tortura é inafiançável? Em caso afirmativo, cabe liberdade provisória?
1. ARTIGOS CORRELATOS
1.1 INAFIANÇABILIDADE: A GENALOGIA DE UM EQUÍVOCO
Autor: Eduardo Luiz Santos Cabette
Delegado de polícia, mestre em Direito Social, pós-graduado com especialização em Direito Penal e
Criminologia, professor da graduação e da pós-graduação da Unisal
1 – INTRODUÇÃO
A legislação não enumera os crimes afiançáveis e sim indica os inafiançáveis, de modo que se descobrem os primeiros por exclusão.
Ao intérprete cabe perscrutar na Constituição Federal, no Código de Processo Penal e nas leis ordinárias esparsas para verificar se o caso concreto sob análise se enquadra em alguma previsão de
inafiançabilidade, seja pela natureza da infração, seja devido a condições pessoais do preso (v.g.
aquele que ostenta condenação anterior por crime doloso – artigo 323, III, CPP).
A Constituição Federal e as legislações processuais penais especiais estabelecem diversos casos de
inafiançabilidade pela natureza da infração, sendo exemplos:
a) Os crimes de racismo – Artigo 5º., XLII, CF e Lei 7716/89, modificada pela Lei 9459/97;
b) Os crimes de tortura (Lei 9455/97), Tráfico de Drogas (Lei 11.343/06), Terrorismo (Lei
7170/83) [01] e os Crimes Hediondos (Lei 8072/90) – Artigo 5º., XLIII, CF;
c) A ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o estado democrático – Artigo 5º., XLIV, CF e Lei 7170/83;
d) Crimes de Lavagem de Dinheiro – Lei 9613/98;
e) Crimes praticados por agentes de Organizações Criminosas – Lei 9034/95.
Por seu turno, regula o Código de Processo Penal os casos de inafiançabilidade em geral nos seus
artigos 323 e 324, além de estabelecer no artigo 322 os casos em que a Autoridade Policial poderá
arbitrar fiança.
O presente trabalho tem dois objetivos bastante definidos:
1) Chamar a atenção para uma gritante distorção existente no sistema brasileiro de liberdade provisória, qual seja, o fato de que nossas normas processuais penais e constitucionais sobre a matéria são formatadas de modo a tornar mais fácil a obtenção da liberdade provisória sem fiança do
que a liberdade provisória com fiança, quando o mais correto e racional deveria ser o inverso.
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2) Diagnosticar as origens desse equívoco legislativo que acaba sendo contraproducente em relação aos objetivos de maior rigor almejados sempre que o legislador destaca alguma infração penal
como inafiançável.
Para a consecução desses desideratos, inicialmente proceder-se-á uma breve análise dos princípios
constitucionais que regem a liberdade provisória e depois analisar-se-á como a doutrina tem conceituado a liberdade provisória com fiança, demonstrando-se que uma equivocada visão do instituto da fiança pode ser um dos fatores atuantes para a configuração da distorção de nosso sistema
anteriormente destacada.
2 – A LIBERDADE PROVISÓRIA DE ACORDO COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Na atualidade torna-se imperioso formular e aplicar as normas processuais penais em consonância
com uma série de garantias individuais insculpidas na Constituição Federal. Não é mais concebível
um Processo Penal que prime pelo eficientismo e deixe de lado o garantismo. Exige-se um salutar
equilíbrio entre eficiência e garantias para que o Processo Penal possa alcançar o crivo do devido
processo legal constitucionalmente legitimado.
Essa concepção é tão arraigada no moderno processualismo que se reflete na própria estrutura
normativa e define o "locus" privilegiado das principais regulações do processo. A sede das mais
relevantes normatizações processuais não mais deve ser buscada nas leis processuais ordinárias,
mas no seio da própria Constituição.
Esse fenômeno não passa despercebido por Grinover, Cintra e Dinamarco, que assim se manifestam sobre o tema:
"Todo o direito processual, como ramo do direito público, tem suas linhas fundamentais traçadas
pelo direito constitucional, que fixa a estrutura dos órgãos jurisdicionais, que garante a distribuição
da justiça e a declaração do direito objetivo, que estabelece alguns princípios processuais; e o direito processual penal chega a ser apontado como o direito constitucional aplicado às relações entre autoridade e liberdade". [02]
Na verdade o processo, mais que apenas orientado por princípios e regras constitucionais gerais
como ocorre com outros ramos do Direito, "é fundamentalmente determinado pela Constituição em
muitos de seus aspectos e institutos característicos". [03]
Como observa Scarance Fernandes, na evolução do pensamento acerca da relação entre o indivíduo e o Estado, foi sentida a premência de normas garantidoras dos direitos fundamentais do homem em contraponto ao rigoroso intervencionismo do poder estatal. Com essa finalidade os países
passaram a inserir em suas Constituições regramentos de caráter garantista que obrigam o Estado
e a sociedade em geral ao respeito aos direitos individuais. Nesse quadro, o Brasil surge como "o
primeiro país a introduzir em seu texto normas desse teor". [04]
Assim sendo, a liberdade provisória somente pode ser regulada tendo em conta as diretrizes constitucionais que norteiam o devido processo legal (artigo 5º., LIV, CF). Este se caracteriza por uma
teia consistente, coerente e inter - relacional de princípios.
Sobrelevam nesse caso dois aspectos: a presunção de inocência e a regra da liberdade provisória
(CF, artigo 5º., LVII e LXVI). É visível que referidos princípios constitucionais se interpenetram e
completam, de maneira a constituírem um conjunto harmônico e inseparável. O indivíduo sob investigação ou processado não é considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença condenatória; disso decorre que antes da condenação não deve permanecer encarcerado, a não ser em
situações extremas devidamente justificadas por interesses processuais que não configurem antecipação indevida de pena.
Não é dada, portanto, ao legislador ordinário, a faculdade de restringir de forma absoluta o direito
à liberdade provisória, sob pena de incidir em flagrante inconstitucionalidade. A limitação da liberdade provisória só pode fundar-se na necessidade estrita para o regular andamento processual e
aplicação da lei penal, bem como para a manutenção da ordem pública ou econômica, de acordo
com os fundamentos da Prisão Preventiva elencados no artigos 312, CPP.
Em face disso a doutrina vem apontando insistentemente a inconstitucionalidade gritante de dispositivos legais que impedem peremptoriamente a liberdade provisória de acordo com a natureza da
infração, como se a gravidade da acusação implicasse em uma espúria "presunção de culpabilidade
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ou autoria". Como destaca Souza Netto, tais normatizações dispõem "de direitos fundamentais de
forma a suprimi-los totalmente, sem deixar margem de análise judicial à existência de real necessidade de cautela". [05]
É notável que a liberdade provisória é uma regra no Processo Penal, somente excepcionada por especiais circunstâncias a legitimarem a custódia antes da condenação definitiva, isso em obediência
aos princípios constitucionais do devido processo legal e da presunção de inocência.
Afora os casos em que presentes os fundamentos da Prisão Preventiva, a legislação ordinária, sob
pena de inconstitucionalidade, deve dispor ao investigado ou acusado a liberdade provisória com
ou sem fiança. Isso implica em que quando o legislador veda a fiança, resta sempre ao investigado
ou acusado a possibilidade da liberdade provisória sem fiança, desde que não satisfeitos os requisitos para a custódia preventiva (vide artigo 310, Parágrafo Único, CPP).
Decorre desse fato que quando o legislador, com ares de rigor, afirma a inafiançabilidade de uma
infração penal, está, na verdade, conferindo ao imputado a possibilidade de obter a mesma liberdade provisória sem a necessidade de prestar qualquer espécie de caução.
Ocorre uma situação que até seria cômica se não fosse trágica: o legislador afirma ao imputado de
forma autoritária e imponente:
"__ Não tens o direito de livrar-te solto pagando fiança!"
E a seguir, com um fio de voz, responde ao implicado que pode permanecer solto sem pagar nada,
como no seguinte diálogo:
"__ Mas, e se eu nada pagar?
__Bom,...assim podes livrar-te solto..."
Essa é uma distorção incrível que norteia todo nosso sistema de liberdade provisória, tendo como
honrosa exceção o tratamento dado no artigo 325, § 2º., I a III, CPP, aos crimes contra a economia popular e aos crimes de sonegação fiscal. [06] Nessas infrações penais é vedada a liberdade
provisória sem fiança, sendo, porém, permitida a liberdade provisória com fiança a ser arbitrada
exclusivamente pelo Juiz.
É visível que um sistema racionalmente estruturado com relação ao tema da liberdade provisória e
atento aos limites traçados constitucionalmente somente poderia nortear-se por um dos seguintes
critérios:
1) A regra seria a concessão da liberdade provisória com ou sem fiança aos investigados e processados, regra esta que somente seria excepcionada pela necessidade da Prisão Preventiva (artigo
312, CPP). Em geral, a liberdade provisória deveria ser concedida independentemente de fiança,
apenas tendo em conta o devido processo legal e a presunção de inocência. Entretanto, em casos
excepcionais, em que o legislador considerasse tratar-se de infrações mais gravosas ou que por
sua natureza necessitem de alguma caução, estabeleceria a necessidade de fiança para a concessão da liberdade provisória, vedando a liberdade provisória sem fiança.
2) Outra opção viável ainda poderia ser a possibilidade da concessão da liberdade provisória com
fiança aos delitos em geral, sendo a liberdade provisória sem fiança reservada somente àqueles
economicamente hipossuficientes, conforme já prevê o artigo 350, CPP. É claro que a liberdade
provisória com ou sem fiança continuaria podendo ser negada nos casos de necessidade da Prisão
Preventiva (artigo 312, CPP).
O questionamento que nos resta é por que a legislação brasileira promove a conformação de um
sistema de liberdade provisória claramente distorcido e até pervertido, o qual, a cada nova legislação processual penal ganha reforço?
3 – A GENEALOGIA DE UM EQUÍVOCO
Essa perversão obtusa a que tem sido submetido o sistema de liberdade provisória brasileiro certamente tem raízes no despreparo e desconhecimento do legislador. Mas, nem toda a responsabilidade deve ser atribuída ao legislador e sua parca cultura jurídica. Deve-se atentar para o fato de
que parcela da doutrina também contribui substancialmente para a conformação dessa sistemática
equivocada.
O nó górdio da questão acha-se em algo extremamente simples, ou seja, definir em que consiste a
fiança e saber distingui-la do instituto da liberdade provisória. É uma inconveniente confusão des-
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ses conceitos que tem sido um importante ingrediente para o tratamento equivocado da inafiançabilidade na legislação brasileira.
Walter P. Acosta assim redige suas primeiras linhas acerca do tema da fiança:
"Preso o indiciado ou réu, em flagrante ou por motivo de sentença de pronúncia ou de condenação
recorrível, casos há em que lhe assiste o direito de recuperar a liberdade, mediante certas condições, entre as quais poderá figurar a de depositar certa quantia em dinheiro, títulos ou valores,
como caução. Quando houver esta obrigação econômica com o fim de sustar a prisão legal, estaremos em face do instituto da fiança.
A fiança criminal, como meio de fazer cessar ou evitar a prisão legal, é, pois, um direito subjetivo
do réu, em algumas infrações, mediante uma caução e determinadas obrigações, de manter-se em
liberdade para, no gozo dela, cuidar com amplitude de sua defesa". [07]
Semelhante é o ensinamento de Edgard Magalhães Noronha ao asseverar que a fiança é "meio de
liberdade provisória" e a conceituando como "um direito subjetivo do acusado, que lhe permite,
mediante caução e cumprimento de certas obrigações, conservar sua liberdade até a sentença condenatória irrecorrível". [08]
Acontece que se tem dado muita ênfase apenas a uma parcela desses tradicionais ensinamentos,
propiciando uma noção parcial e errônea do instituto da fiança. A afirmação de que a fiança é um
"direito subjetivo do indiciado ou réu" tem se sobreposto à real natureza do instituto sob comento
e ensejado uma verdadeira miscelânea em que "liberdade provisória" e "fiança" se confundem.
Autores como Capez [09] e Mirabete [10], embora não deixem de indicar a fiança como caução e meio
para a obtenção da liberdade provisória, acabam atribuindo-lhe a "natureza jurídica" de "direito
subjetivo constitucional do acusado".
Esta é uma espécie de exposição que conduz a equívocos quanto ao modo de encarar o instituto da
fiança no Processo Penal. Na realidade o que é um "direito subjetivo do acusado ou indiciado" não
é propriamente a fiança e sim a liberdade provisória. A fiança é apenas um meio para a obtenção
do direito à liberdade provisória. Longe de ser um direito do imputado, a fiança emerge no Processo Penal como uma condição, um ônus ou encargo a ser cumprido pelo imputado para que possa
gozar de seu verdadeiro direito à liberdade provisória.
Poucos são aqueles que, a exemplo de José Frederico Marques, dão o necessário destaque à característica de ônus da fiança como requisito para a obtenção da liberdade provisória:
"A fiança criminal é ônus imposto ao réu ou indiciado em quase todos os casos de liberdade provisória, para que assim ele possa defender-se solto em processo penal condenatório. Consiste o referido ônus em caução prestada em juízo para garantia da liberdade provisória. Tal ônus é um acessório da liberdade provisória que o réu obtém. Todavia, nos casos em que a caução é exigida, não
pode a liberdade provisória ser concedida sem que essa caução seja prestada". [11]
Heráclito Antonio Mossin acata abertamente o entendimento exposto por Frederico Marques, apontando-o como modelo ideal de conceituação do instituto da fiança. [12]
Também Eduardo Espínola Filho apresenta a fiança como uma caução ou garantia exigível do imputado como meio para sua liberdade provisória, portanto, com a característica de encargo, condição
ou ônus e não com a feição de um direito. Em suas palavras:
"Assim, configurado, nos seus principais característicos, o instituto, é de ser definida a fiança como
a caução, prestada em favor do acusado, para obter a sua liberdade provisória, até o pronunciamento final da causa, em decisão passada em julgado, dando a garantia de que cumprirá as obrigações fixadas pela lei, atenderá às intimações para os atos do inquérito, da instrução criminal e
do julgamento, se sujeitará à execução da condenação, se lhe for imposta, e satisfará as obrigações pecuniárias cuja responsabilidade, em tal caso, lhe for atribuída". [13]
Por seu turno, Bento de Faria colabora para a confusão entre a fiança e a liberdade provisória ao
conceituar a primeira como "a permissão deferida ao acusado, em certos crimes, de conservar provisoriamente a liberdade para, assim, tratar do seu livramento mediante a prestação de uma garantia, observadas as obrigações que lhe forem impostas". [14]
Novamente a doutrina enseja uma mistura indevida entre os conceitos de "liberdade provisória" e
"fiança" e, portanto, entre um "direito" e um "ônus" do imputado. A fiança não é a "permissão deferida ao acusado" de livrar-se solto das imputações, isso é a liberdade provisória. A fiança propri-
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amente dita é, na verdade, "a prestação de uma garantia" imposta ao imputado para assegurar o
cumprimento de suas obrigações.
Mais esclarecedor é o autor contemporâneo, Denílson Feitosa Pacheco, que conceitua a fiança como
uma "caução" prestada pelo increpado e "destinada a garantir o cumprimento das obrigações processuais". No seguimento, afirma, distintamente, o "direito público subjetivo constitucional" do
preso à "liberdade provisória com fiança", de forma que, nos casos legalmente previstos, o arbitramento não é uma faculdade do Delegado de Polícia ou do Juiz, mas sim um verdadeiro poder –
dever das autoridades. [15] Dessa forma fica clara a necessária distinção entre a "fiança" como garantia do processo e ônus do imputado e a "liberdade provisória", direito do acusado ou investigado, eventualmente condicionado à prestação da fiança.
Percebe-se, de acordo com o exposto, que a doutrina em geral, embora certamente vislumbre, ao
menos em sua maioria, a distinção existente entre os institutos da "fiança" e da "liberdade provisória com fiança", não traduz com a devida clareza essa importante noção. A maneira muitas vezes
confusa com que os conceitos são expostos é certamente fonte de equívocos interpretativos, especialmente aquele de pensar a fiança como um direito subjetivo do imputado quando é ela, na realidade, um ônus, sendo o verdadeiro direito aquele à liberdade provisória, que pode ser com ou sem
fiança.
Eis, portanto, a gênese da errônea postura do legislador pátrio ao acenar com a inafiançabilidade
sempre que pretende ser rigoroso com o tratamento de certas infrações penais. Pensa ele estar retirando do imputado um "direito" quando, na realidade, o está aliviando de um ônus.
4 – CONCLUSÃO
O presente trabalho teve por objeto a análise da sistemática adotada pelo legislador brasileiro para
regulamentar os casos de inafiançabilidade de acordo com as normas constitucionais e ordinárias a
respeito da matéria.
Constatou-se uma notável distorção em que é muito mais fácil obter a liberdade provisória sem fiança do que aquela com fiança, mesmo nas infrações penais de maior gravidade.
Tal distorção decorre da insistência legislativa, seja em nível constitucional ou infraconstitucional,
em prodigalizar os casos de inafiançabilidade com ares de suposto rigor legal. Olvida-se, porém, o
legislador, de que princípios constitucionais como o devido processo legal e a presunção de inocência, impõem a regra da liberdade provisória, o que torna a atuação legislativa supra mencionada
pífia e contraproducente.
Por fim, diagnosticou-se que a origem dessa equivocada regulamentação da liberdade provisória
encontra-se não somente no despreparo jurídico do legislador, mas também na confusão reinante
na doutrina quanto à devida distinção entre os institutos da "fiança" e da "liberdade provisória com
fiança", o que induz ao erro de encarar a primeira como sinônima da segunda e, por isso, como um
"direito" e não como aquilo que realmente é, um "ônus" imposto ao imputado como "meio" para a
obtenção de um "direito", qual seja, o da "liberdade provisória. Esse erro faz com que as iniciativas
legislativas se contaminem por uma noção equivocada de que a inafiançabilidade suprime um "direito" do imputado quando, na maioria das vezes, o alivia de um fardo, obrigação ou ônus.
Diz-se "na maioria das vezes" porque eventualmente a inafiançabilidade pode acarretar um retardamento na concessão da liberdade provisória ao implicado. Tratam-se dos casos em que a fiança
poderia ser arbitrada imediatamente pela Autoridade Policial nos termos do artigo 322, CPP. Erigida
a infração penal à categoria de inafiançável, somente ao Juiz seria dado conceder a liberdade provisória sem fiança (artigo 310, Parágrafo Único, CPP).
Não obstante, parca é a relevância desse aspecto, pois que a maioria das infrações penais inafiançáveis não permitiria mesmo arbitramento pela Autoridade Policial, eis que normalmente apenadas
com reclusão.
Seria oportuna uma reforma na sistemática legal da liberdade provisória no Brasil, adotando-se um
sistema mais racional que reabilitasse a função da fiança como garantia processual, passando inclusive por uma revisão dos seus valores hoje irrisórios e meramente simbólicos, sem esquecer, é
claro, a realidade social, de maneira a não deixar ao desabrigo os financeiramente hipossuficientes,
do que é corolário o disposto no artigo 350, CPP.
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Por derradeiro deve-se observar, porém, que uma reforma nessa matéria enfrenta um grave entrave. É que boa parte dos casos de inafiançabilidade produzidos com base em uma interpretação
equivocada do instituto da fiança criminal, encontram assento no texto constitucional na condição
de Cláusulas Pétreas (artigo 5º. c/c art. 60, § 4º. IV, CF). Infelizmente, trata-se de um erro que se
cristalizou de tal forma que não há outro remédio senão conviver com suas distorções e lamentálas, ao menos até o advento de uma nova ordem constitucional. Por agora pode ao menos o legislador abster-se de alimentar e agigantar essa inútil e falaciosa criação de mais e mais casos de inafiançabilidade na legislação brasileira.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ACOSTA, Walter P. O Processo Penal. 4ª. ed. Porto Alegre: Editora do Autor, 1962.
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
CINTRA, Antonio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria
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ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado. Volume III. Campinas:
Bookseller, 2000.
FARIA, Bento de. Código de Processo Penal. Volume II. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Record, 1960.
FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. São Paulo: RT, 1999.
MARQUES, José Frederico. Elementos de Direito Processual Penal. Volume IV. Campinas: Bookseller, 1997.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 18ª. ed. São Paulo: Atlas, 2006.
MOSSIN, Heráclito Antonio. Comentários ao Código de Processo Penal à luz da doutrina e da jurisprudência. Barueri: Manole, 2005.
NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de Direito Processual Penal. 13ª. ed. São Paulo: Saraiva,
1989.
PACHECO, Denílson Feitosa. Direito Processual Penal. 3ª. ed. Niterói: Impetus, 2005.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 6ª. ed. São Paulo: RT, 1990.
SOUZA NETTO, José Laurindo da. Processo Penal Sistemas e Princípios. Curitiba: Juruá, 2004.
NOTAS
Destaque-se ser discutível na doutrina se realmente o crime previsto no artigo 20 da Lei de Segurança Nacional (Lei 7170/83) constitui o crime de terrorismo previsto constitucionalmente como
equiparado a hediondo. Entretanto, o desenvolvimento dessa polêmica não cabe nos estritos moldes deste trabalho.
02
CINTRA, Antonio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 8ª. ed. São Paulo: RT, 1991, p. 75.
03
Op. Cit., p. 75.
04
FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. São Paulo: RT, 1999, p. 11. Ver
também, conforme indicado pelo autor em destaque: SILVA, José Afonso da. Curso de Direito
Constitucional Positivo. 6ª. ed. São Paulo: RT, 1990, p. 149 – 151.
05
SOUZA NETTO, José Laurindo de. Processo Penal Sistemas e Princípios. Curitiba: Juruá, 2004, p.
171. Atente-se para o fato de que essa constatação acabou dando origem a recente alteração da
Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8072/90) pela Lei 11.464/07, permitindo a liberdade provisória sem
fiança para tais infrações penais, como já ocorria com o crime de tortura por força da Lei 9455/97.
06
Mais tecnicamente denominados de Crimes contra a ordem tributária na Lei 8137/90.
07
O Processo Penal. 4ª. ed. Porto Alegre: Editora do Autor, 1962, p. 98 – 99.
08
Curso de Direito Processual Penal. 19ª. ed. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 185.
09
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 273.
10
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 18ª. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 415.
11
Elementos de Direito Processual Penal.Volume IV. Campinas: Bookseller, 1997, p. 132. Anote-se
que a afirmação do autor quanto ao fato de ser a fiança criminal exigida em "quase todos os casos
de liberdade provisória", deve ser acolhida com a cautela de atentar para a ulterior redação do artigo 310, Parágrafo Único, CPP, que ampliou sobremaneira as hipóteses de concessão da liberdade
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provisória sem fiança. Tal mudança legislativa, porém, somente fez reforçar a constatação do autor
de que a fiança é mesmo um ônus imposto ao imputado.
12
Comentários ao Código de Processo Penal à luz da doutrina e da jurisprudência. Barueri: Manole,
2005, p. 322.
13
Código de Processo Penal Brasileiro Anotado. Volume III. Campinas: Bookseller, 2000, p. 565 –
566. Ver ainda no mesmo sentido: BONFIM, Edílson Mongenot. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 399. CARVALHO, Djalma Eutímio de. Curso de Processo Penal. Rio de Janeiro:
Forense, 2007, p. 201.
14
Código de Processo Penal. Volume II. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Record, 1960, p. 64 – 65.
15
Direito Processual Penal. 3ª. ed. Niterói: Impetus, 2005, p. 1065.
Fonte: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10044
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1.2 A INUTILIDADE ATUAL DA FIANÇA
Autor: Rogério Schietti Machado Cruz
Promotor de Justiça do MPDFT e Mestrando em Direito Processual Penal na USP.
"Ages de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer
outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca simplesmente como meio" (Kant)
I. Em dois crimes ocorridos recentemente, que nos servem de exemplo para desenvolver as linhas
seguintes, os autores das respectivas condutas, presos em flagrante, foram beneficiados com liberdade provisória, mediante fiança arbitrada pela autoridade policial. No primeiro caso, o cidadão fora preso por estar conduzindo o seu automóvel sob a influência de álcool; no segundo exemplo,
conquanto sóbrio, causou, por imprudência, a morte de um pedestre.
Inobstante a evidente maior gravidade do segundo comportamento, a fiança arbitrada ao motorista
homicida, que possuía similares condições econômicas em relação ao motorista embriagado, foi de
apenas R$250,00 ao passo que este último foi posto em liberdade pagando mais, i.e., R$300,00.
II. Por que se decidiu por tais valores? Quais critérios devem ser usados para se fixar uma fiança?
É justo "comprar" a liberdade?
Estas são algumas das perguntas que o estudo da fiança suscita ao atento observador. E levam-no
à convicção de que muito precisa ser feito para revitalizar esse instituto, se é que deve ele ser preservado.
III. O modelo processual penal brasileiro consagra a fiança como uma medida de contracautela à
prisão em flagrante, permitindo ao indigitado autor da conduta criminosa responder ao inquérito
policial e ao processo em liberdade, mediante o pagamento de determinada importância e sob obrigações impostas pela lei.
A conjugação dos inúmeros artigos do Código de Processo Penal inseridos no seu Título IX - Prisão
e Liberdade Provisória - permite extrair, inter alia, as seguintes regras:
1º Quem pratica infração penal punida com pena privativa de liberdade não superior a 3 (três) meses, deve ser imediatamente solto, sem qualquer obrigação processual. Ressalve-se a competência
do Juizado Especial Criminal, onde, mesmo em penas superiores àquele limite (desde que não excedente a um ano de privação de liberdade), a única obrigação a que se sujeitará o "autor do fato"
será a de comparecer à futura audiência preliminar em juízo. Note-se, porém, que para o descumprimento dessa obrigação a lei (nº 9.099/95) não previu qualquer conseqüência;
2º Quem pratica infração penal punida com pena mínima privativa de liberdade inferior ou igual a 2
(dois) anos poderá ser posto em liberdade provisória mediante o pagamento de fiança, arbitrada
quer pela própria autoridade policial (somente em relação a crimes punidos com pena de detenção), quer pela autoridade judiciária;
3º nos demais casos, i.e., crimes com pena mínima superior a 2 (dois) anos, não será cabível a fiança, o que, todavia, não evitará a colocação do infrator em liberdade provisória pelo juiz, median-
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te o simples compromisso de comparecer aos futuros atos processuais, desde que ausente motivo
para a prisão preventiva ou presente causa excludente de criminalidade.
IV. Deixando de lado os questionamentos sobre as hipóteses de inafiançabilidade decorrente de
previsão constitucional, podemos facilmente apontar algumas graves incoerências e falhas do nosso sistema de liberdade provisória, tais como:
a) Quem pratica infração penal punida severamente, como, v.g., um roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo, pode, in thesis, receber liberdade provisória sem necessitar pagar fiança, obrigando-se apenas a comparecer aos atos processuais; já o autor de um pequeno furto poderá ter
a sua liberdade provisória condicionada a não apenas comparecer aos futuros atos processuais,
mas, também, ao pagamento de uma quantia a título de fiança, além de outras obrigações elencadas na lei processual penal (não mudar de endereço sem prévia autorização judicial, não ausentarse de sua residência por mais de oito dias sem comunicação ao juízo e não praticar outra infração
penal no curso do benefício). Em suma, inobstante haver praticado crime menos grave, arcará com
ônus mais pesados.
b) Sendo pobre o infrator, e mesmo havendo praticado crime punido com pena mínima de detenção não superior a dois anos - hipótese em que a própria autoridade policial poderia arbitrar fiança
- a lei impõe que somente o juiz de direito poderá conceder-lhe a liberdade, o que implica a necessidade de permanecer o infrator recolhido na prisão por vários dias. Em outras palavras, permanece preso simplesmente porque é pobre e não tem alguém para socorrê-lo com a mesma presteza e
eficiência comuns quando se cuida de infratores bem assistidos.
V. Não são essas, contudo, as questões centrais que pretendemos suscitar, mas sim a que diz respeito à própria validade e utilidade do instituto e a que pertine aos critérios para o arbitramento do
valor da fiança.
VI. No tocante a este último questionamento, releva destacar a total ausência de controle sobre os
parâmetros legais concretos para fixação do valor da fiança. Deveras, embora diga o art. 326 do
CPP que, para essa tarefa, "a autoridade terá em consideração a natureza da infração, as condições
pessoais de fortuna e vida pregressa do acusado, as circunstâncias indicativas de sua periculosidade, bem como a importância provável das custas do processo, até final julgamento", somos levados, com o devido respeito, a afirmar que, em boa parte dos casos, não se seguem tais parâmetros, como o demonstram os exemplos citados no início da exposição.
Decerto que muitos Delegados de Polícia e Juízes de Direito buscam no art. 326 do CPP inspiração
para determinarem o valor da fiança, mas, no momento seguinte, vêem-se diante de um vazio legal, criado pela sucessiva e instável política monetária do Brasil, que, no espaço de 15 anos, conviveu com várias moedas e índices de correção e atualização monetárias. O fato é que o art. 325 do
CPP, indicando o quantum da fiança, de acordo com a gravidade da infração e a situação econômica do infrator, tornou-se letra morta, porquanto assenta-se em índices monetários inexistentes
(salário mínimo de referência e Bônus do Tesouro Nacional).
O que se vê, então, é um "arbitrário arbitramento" (o pleonasmo é proposital) do valor da fiança,
sem qualquer motivação ou fundamentação, impedindo às partes (Ministério Público e acusado) de
exercerem um controle sobre o ato, seja ele administrativo ou judicial.
É bem verdade que a lei prevê recurso para tal decisão (art. 581, inc. V, do CPP), além de mecanismos para a revisão do valor arbitrado (art. 340 do CPP), mas os interessados não os usamos,
talvez por não confiarmos na sua eficácia, quiçá por mero comodismo.
VII. Chega-se, então, à principal reflexão a ser feita: a liberdade pode ser comprada?
Essa indagação não se tem colocado tanto na doutrina brasileira quanto, por exemplo, na doutrina
dos EUA, onde o assunto já vem merecendo alguma atenção, mercê de um sistema que, na prática, parece não respeitar o princípio da presunção de inocência. Deveras, uma vez formada uma
prova mínima de autoria de crime contra alguém, a sua liberdade estará condicionada ao pagamento de uma fiança, tornando a prisão processual a regra, e a liberdade provisória a exceção.
Nos EUA, o cidadão, logo após ser preso, deve ser levado à presença do juiz, para uma audiência
em que se discutirá o valor da fiança (bail hearing), a qual, uma vez paga, será restituída ao acusado após seu julgamento, desde que, evidentemente, tenha comparecido aos atos processuais. O
grave problema do sistema criminal norte-americano, nesse particular, é que os juízes, muito em-
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bora tenham, via de regra, critérios objetivos para a fixação do quantum da fiança, arbitram valores exorbitantes quando não desejam colocar em liberdade o acusado , sendo raras, a propósito,
as hipóteses em que se permite a liberdade provisória sem o pagamento de fiança (release on own
recognizance). O resultado é, além de injusto em sua essência, discriminatório em relação aos acusados mais pobres, que, por não disporem da importância fixada, e por não estarem aptos a se socorrerem dos bail bondsmen - uma nefasta espécie de "agiotas legalizados" que são autorizados a
cobrarem taxas do preso para honrar o valor da fiança diretamente ao tribunal, na hipótese do desaparecimento do afiançado - permanecem presos, mesmo quando se mostre desnecessária ou
abusiva a prisão provisória.
O mais inusitado, porém, é que, dentro desse sistema monetário de administrar a justiça criminal,
o dinheiro, e não a racional avaliação da necessidade da custódia, acaba por determinar a soltura
ou a manutenção do acusado no cárcere. Deste modo, assim como se mostra extremamente injusto manter preso até seu julgamento, v.g., um motorista não habilitado, porque não teve condições
para pagar a fiança, é ainda mais preocupante a soltura de perigosos violadores da lei que, por
disporem de lastro financeiro, compram sua liberdade, colocando em sérios riscos a sociedade.
Nesse sentido, observa DAVID NEUBAUER que "America’s system of monetary bail has been the
subject of extensive debate for decades. The fairness and effectiveness of pretrial release and detention have been questioned from two conflicting perspectives. The bail reform movement of the
1960s and 1970s was largely concerned with correcting inequities. Requiring suspects to buy their
freedom was viewed as unfairly discriminatory against the poor. To make bail fairer, reformers advocated adopting a 10 percent bail deposit and institutionalizing pretrial service programs. These
programs offered new ways to accomplish the purpose of bail: to guarantee appearance for trial.
During the 1980s, concern shifted to the linkage between bail and crime. Allowing dangerous defendants to post bail was viewed as unnecessarily jeopardizing the public. Critics urged the adoption of preventive detention.
VIII. Fácil constatar, portanto, que temos, sob certa ótica, um sistema menos injusto, à medida em
que, entre nós, a liberdade provisória de alguém que foi preso em flagrante define-se, em última
análise, não pela fiança, mas sim pela verificação da desnecessidade da prisão, único meio de
compatibilizar a prisão cautelar com o princípio da presunção de não culpabilidade.
Por outro lado, como o valor da fiança pode ser elevado a patamares realmente expressivos, o sistema criminal americano tem como manter presos, também, os delinqüentes do colarinho branco ,
ao contrário do que ocorre em nosso país, onde esse tipo de infrator, nas raras vezes em que não
consegue a liberdade provisória, costuma ser agraciado com uma "prisão especial", com direito a
inúmeros bens e serviços não oferecidos aos de colarinho marrom.
IX. Talvez fosse o caso de pensar-se na extinção da fiança, já que não se mostra sensato negociar
a liberdade individual, bem de inestimável valor ao ser humano. Há estatísticas nos EUA indicando
que uma pessoa permanece presa, em média, três dias antes de obter o dinheiro para pagar a fiança arbitrada . No Brasil, a situação pode ser até pior . Ora, que sistema é esse que permite a
uma pessoa, porque é pobre, permanecer no mórbido e estigmatizante ambiente carcerário, simplesmente porque não dispõe de dinheiro para comprar sua liberdade? Há humanidade nesse sistema? Será que o processo penal do próximo século abrigará essas normas que imprimem ao sistema da liberdade provisória um cariz tão mercantil?
X. Até que saibamos responder a essas perguntas e encontrar soluções mais racionais e menos dolorosas para o trato da liberdade humana, há que se trabalhar para um uso mais lógico e equânime
da fiança, que deve ser aplicada com critérios bem definidos, orientados pelo princípio da proporcionalidade , e sem jamais perder de vista o categórico de Kant referido no início.
Parece-nos, portanto, que, por ora, algumas medidas poderiam ser estudadas, ao propósito de otimizar o uso desse instituto.
No âmbito do Poder Legislativo, certas sugestões mereceriam reflexão, tais como:
1º A eliminação de limites mínimo e máximo para a fiança, deixando à autoridade judiciária, de acordo com a motivada análise do caso concreto e com critérios claros e objetivos previstos em lei,
a fixação do quantum da fiança.
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2º A possibilidade de conceder-se fiança para toda e qualquer infração, acima de um patamar mínimo de gravidade (as mais leves continuariam a permitir ao réu "livrar-se solto"), de tal sorte a
poder o juiz, mediante decisão motivada, sujeita ao controle das partes, e ponderando as circunstâncias do caso concreto (situação econômica do réu, gravidade do fato etc), arbitrar fiança, que se
juntaria ao dever de comparecimento aos atos processuais como contracautela à prisão provisória.
Desse modo, o autor de um pequeno furto poderia ser posto em liberdade sem fiança (quando, digamos, não tivesse recursos para pagar a fiança), ao passo que ao autor de um roubo (inafiançável, pelo critério atual), se poderia conceder liberdade provisória, desde que ausente motivo para a
preventiva, mas com o pagamento de uma certa quantia, a título de fiança.
3º A atribuição de competência exclusiva à autoridade judiciária para a concessão da fiança, por
ser o Fórum o ambiente mais adequado e seguro para a prática de tão importante ato processual.
Para obviar eventual e justa crítica de que tal medida redundaria em atraso na soltura do autuado,
quando cabível, bastaria que se estabelecesse o direito do réu em ser conduzido, tão logo lavrado o
auto de prisão em flagrante, à presença da autoridade judicial, para ser ouvido informalmente e
para avaliar-se o cabimento, ou não, de liberdade provisória, com ou sem fiança. Esta medida, aliás, já poderia ser colocada em prática, bastando aos juízes dar cumprimento ao disposto no art.
7º, item 5 do Pacto de San Jose (incorporado ao direito positivo brasileiro por força do Decreto
678/92), o qual determina que "Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à
presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que
prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo."
4º A criação de outras medidas de contracautela processual, a exemplo do que se fez em Portugal,
onde se prevêem diversas medidas coercitivas (além da fiança) a serem usadas de acordo com a
situação concreta, tais como "obrigação de apresentação periódica", "suspensão do exercício de
funções, de profissão e de direitos", "proibição de permanência, de ausência e de contatos", "obrigação de permanência na habitação" (artigos 198 a 201 do CPP português). Tal inovação legislativa
abriria o leque de opções para que o juiz escolhesse a medida ou as medidas mais apropriadas ao
caso concreto, obviando a situação atual em que o juiz, nos crimes mais graves, tão somente pode
ou conceder a liberdade provisória mediante a isolada obrigação de comparecimento aos atos processuais, ou manter a prisão cautelar.
Do Poder Judiciário, além da providência sugerida ao final do item 3º, retro , anseia-se que as decisões relativas à fiança sejam tomadas em respeito ao dever de motivação do ato judicial, elevado
à categoria de norma constitucional (art. 93, inc. IX da CF), permitindo-se ao Ministério Público e
ao acusado saber de que modo a autoridade concluiu pelo valor arbitrado a título de fiança.
Enfim, do Ministério Público e da Polícia Judiciária (estadual e federal), espera-se um cuidado maior
na fiscalização e no arbitramento, respectivamente, dos valores fixados a título da fiança, cuidando-se para que a liberdade provisória não seja simplesmente comprada, mas outorgada a quem a
mereça.
Fonte: http://www.geocities.com/CapitolHill/Lobby/1647/artecron/artigo22.htm
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1.3 A AUTORIDADE POLICIAL PODE CONFERIR LIBERDADE AO PRESO EM FLAGRANTE
QUE NÃO TENHA CONDIÇÃO ECONÔMICA DE PAGAR A FIANÇA ARBITRADA. Aplicação
analógica do art. 350 do CPP na esfera policial (arts. 350 c/c 322, na forma do art. 3º,
CPP.
Autor: Renato Ferrare Ramos
Advogado
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Consoante o disposto no art. 322 do Código de Processo Penal, após a lavratura do auto de prisão
em flagrante, a Autoridade Policial "poderá" conceder fiança nos casos de infração punida com detenção ou prisão simples. Muito embora o verbo entre aspas pareça indicar faculdade, a fiança representa direito subjetivo do flagranciado, de sorte que a autoridade tem obrigação de concederlhe. Isso, pois, não o fazendo (recusando ou retardando), o preso, ou alguém por ele, poderá prestá-la mediante simples petição dirigida ao juiz (art. 335, CPP) ou ainda impetrar habeas corpus
(art. 648, V, CPP). Além disso, a manutenção de uma prisão quando a lei admitir liberdade, com ou
sem fiança, é inconciliável com os princípios republicanos (art. 5º, LXVI, CF/88).
Há casos, não raro, em que mesmo com o arbitramento da fiança pela autoridade policial, o custodiado não tem condições financeiras de prestá-la sem prejuízo do seu próprio sustento e de sua
família. Como conseqüência de praxe, ele continuará no cárcere por falta de pagamento do respectivo valor e a Autoridade Policial se limitará a remeter o auto de prisão em flagrante ao Poder Judiciário, que só então decidirá nos termos do art. 350 do CPP: "nos casos em que couber fiança, o
juiz, verificando ser impossível ao réu prestá-la, por motivo de pobreza, poderá conceder-lhe a liberdade provisória, sujeitando-o às obrigações constantes dos arts. 327 e 328". Isso na melhor das
hipóteses, pois, também não raro, a aplicação do dispositivo legal em referência pode ser indevidamente negada pelo juiz de primeiro grau, ocasião em que o preso em flagrante somente alcançaria sua liberdade na segunda ou até mesmo nas superiores instâncias (STF, RTJ 122/58 e RT,
544/468).
Nesse ínterim, isto é, entre o não recolhimento da fiança na esfera policial e a concessão de liberdade provisória pelo Poder Judiciário, fatalmente o preso juridicamente pobre amargará dias ou
meses encarcerado, o que é inadmissível para um Estado Democrático de Direito que estabelece a
igualdade de todos independentemente de qualquer condição, inclusive suas posses (art. 5º, caput,
CF/88).
Alguns doutrinadores dissertam no sentido de que somente o juiz pode conferir "liberdade provisória" ao preso em flagrante quando este não tiver condições de prestar fiança, nos termos do art.
350 do CPP (Neste sentido: FERNANDO CAPEZ, Curso de Processo penal. Ed. Saraiva, 9ª ed. São
Paulo; e FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO, Manual de Processo Penal. Ed. Saraiva, 2ª ed.).
A maioria, contudo, silencia quanto à possibilidade da Autoridade Policial, mutatis mutandis, proceder de forma equivalente nas hipóteses de sua atribuição (art. 322, CPP).
Porém, com respeito a esses doutrinadores, a interpretação sugerida deve ser ponderada, pois os
precitados dispositivos legais (arts. 322 e 350, CPP), cuja redação data de 1941 (Decreto-lei nº
3.689), devem se submeter a uma releitura em face da nova ordem constitucional inaugurada em
1988.
A análise da natureza jurídica e da finalidade do instituto "fiança" demonstra que o entendimento
comentado carece de interpretação conforme a Constituição Federal vigente. Vejamos.
Para TOURINHO FILHO fiança "é uma garantia real, ou caução. Consiste em depósito em dinheiro,
pedras, objetos ou metais preciosos, títulos da dívida pública federal, estadual ou municipal, ou até
mesmo hipoteca inscrita em primeiro lugar." e "visa a assegurar, no caso de condenação, o pagamento das custas processuais, a satisfação do dano ex delito e eventual multa". (ob. cit., p. 471).
No mesmo sentido, JÚLIO FABBRINI MIRABETE esclarece que a fiança "é uma garantia real de
cumprimento das obrigações processuais do réu." (Código de Processo Penal Interpretado, Ed. Atlas, 9ª ed., p. 848).
Diante dessas definições doutrinárias, pode-se concluir que a fiança, a rigor, SE trata de uma garantia vinculada a um eventual crédito tributário, no que tange às custas processuais, que, segundo a doutrina e jurisprudência, ostentam natureza jurídico-tributária de taxa. Nesse sentido: MARCO AURÉLIO GRECO, A natureza Jurídica das Custas Judiciais, Resenha Tributária, OAB/SP, p.
37/128; GERALDO ATALIBA, Sistema Tributário na Constituição de 1988, Revista de Direito Tributário, v. 51, p. 140; ALIOMAR BALEEIRO, Direito Tributário Brasileiro, Ed. Forense, 10ª ed. p. 330331, 353-354; STF, ADI nº 2040-PR, ADI nº 3694-DF, ADI nº 948-GO, ADI nº 1709-MT, ADIMC nº
1378-ES, ADMIC nº 1.444-PR, ADMIC nº 1778-MG.
Assim, manter preso o flagranciado que não tenha condições econômicas de prestar fiança até que
somente o juiz decida por libertá-lo com fulcro no art. 350 equivale à prisão por dívida civil e vi-
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olação da dignidade da pessoa humana, circunstância que importa em ofensa aos arts. 5º, LXVII, e 1º, III, do Pacto Supremo. Isso porque o preso teria sua liberdade momentaneamente cerceada por impossibilidade de antecipar custas processuais referente a um processo que nem se
quer foi instaurado e nem se sabe se resultará condenação, o que, por outro lado, revela-se incompatível com o mandamento constitucional da presunção de inocência, (art. 5º, LVII, CF/88).
Com efeito, conclui-se que, à luz da Constituição Federal de 1988, a Autoridade Policial
pode conferir liberdade ao preso em flagrante independentemente do recolhimento de fiança nas hipóteses em que ela é admitida na esfera policial e o custodiado não tenha
condições financeiras de prestá-la. Para concretizar essa tarefa, o aplicador do direito,
com vistas nos dispositivos constitucionais acima referidos, deverá se valer da aplicação
analógica do art. 350, CPP, necessária para, mutatis mutandis, suprir a omissão legislativa verificada no art. 322, CPP (art. 322 c/c 350, na forma do art. 3º do CPP), considerando a inequívoca semelhança existente entre o caso previsto e o não previsto, além de
igualdade de valor jurídico e igualdade de razão entre ambos (ubi idem ratio, ubi idem
ius), conforme enfatiza JÚLIO FABBRINI MIRABETE (Ob. cit., p. 85).
Nesse contexto, o preso em flagrante que afirmasse sua impossibilidade de pagar a fiança, seria, in
continteni,posto em liberdade, mas com ônus de posteriormente comprovar em juízo sua hipossuficiência. Não o fazendo e em caso de condenação definitiva, o débito estaria constituído e a fiança
não paga poderia ser considerada dívida de valor, a ser cobrada de acordo com as normas relativas
à dívida ativa da Fazenda Pública, por aplicação analógica do art. 51 do Código Penal, com redação
determinada na Lei nº 9.268/96, referente à multa penal.
O que não se admite é que a impossibilidade financeira de pagar antecipadamente um crédito tributário (custas processuais/taxa), ou mesmo civil (reparação civil ex delito), ainda na esfera policial, seja utilizada contra o flagranciado juridicamente pobre para justificar sua manutenção no cárcere até que finalmente o Judiciário lhe conceda liberdade.
Fonte: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12541
_______________________________________________________________________________
1.4 O PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA "REFORMATIO IN PEJUS" E SEUS PRINCÍPIOS
CORRELATOS: "REFORMATIO IN PEJUS" INDIRETA E "REFORMATIO IN MELIUS"
Autor: Anne Cristiny dos Reis Henrique
Advogada em Fortaleza, ós-graduanda em Direito Processual Penal pela Universidade de Fortaleza
(UNIFOR)
RESUMO
O objeto desta pesquisa é o princípio da proibição da reformatio in pejus e seus princípios correlatos: reformatio in pejus indireta e reformatio in melius. O estudo apresenta, inicialmente, a definição do princípio da proibição da reformatio in pejus, o seu alcance e as justificativas apresentadas
pela doutrina para o seu aproveitamento no ordenamento jurídico brasileiro. Aborda-se, outrossim,
a possibilidade de sua aplicação em caso de reconhecimento de nulidades processuais desfavoráveis ao réu. Desenvolvem-se comentários ao sub-princípio da reformatio in pejus indireta, no que
concerne ao seu conceito, aos aspectos em torno dos quais recaem as discussões na doutrina e na
jurisprudência acerca de sua admissibilidade no sistema processual vigente, além de analisar a sua
aplicação no procedimento do Tribunal do Júri e em caso de proferimento de sentenças inexistentes. Define-se, também, o sub-princípio da reformatio in melius, destacando-se a divergência existente entre os doutrinadores e os Tribunais Superiores quanto ao manejo do referido postulado no
ordenamento processual penal pátrio. Por fim, conclui-se que o direito processual penal brasileiro
veda a aplicação da reformatio in pejus e da reformatio in pejus indireta, porém, admite a ocorrência da reformatio in melius.
INTRODUÇÃO
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É de suma importância, antes de se desenvolver um estudo sobre determinado princípio, traçar
breves linhas acerca da definição da palavra "princípio". Conceitua Mello apud Pontes Filho:
...Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de
critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico". [01]
Os princípios são, portanto, postulados, premissas básicas, que calcam o sistema normativo. O direito processual penal brasileiro é balizado por uma série de postulados próprios – além dos princípios gerais do direito –, a qual norteia toda a dogmática jurídico-processual penal.
O Código de Processo Penal trouxe, em seu art. 617, um dos seus princípios, qual seja: o princípio
da proibição da reformatio in pejus. Deste postulado, decorrem outros dois princípios: o da reformatio in pejus indireta e o da reformatio in melius, os quais têm propiciado aguerridos debates no
mundo jurídico, havendo uma divergência na doutrina e na jurisprudência, mormente quando diz
respeito à sua admissibilidade.
Desta forma, no decorrer deste estudo, são respondidos os seguintes questionamentos: (1) É possível ocorrer reformatio in pejus indireta e reformatio in melius no ordenamento processual brasileiro?; (2) Qual o posicionamento da doutrina e da jurisprudência?
O tema foi escolhido diante da sua importância dentro dos novos rumos a que se tem dado ao sistema processualista brasileiro. Várias reformas foram e continuam sendo realizadas no Código de
Processo Penal, visando a dar maiores garantias ao acusado, preservando, sobretudo, os seus direitos constitucionais de ampla defesa e de contraditório. E a vedação da ocorrência de reformatio
in pejus e de reformatio in pejus indireta, além da admissibilidade da reformatio in melius, só corroboram com essa nova perspectiva processualista.
O presente trabalho teve como objetivo geral estudar e analisar o princípio da proibição da reformatio in pejus e seus princípios correlatos: reformatio in pejus indireta e reformatio in melius, no
que se refere à sua admissibilidade no ordenamento pátrio. E como objetivos específicos: trazer à
baila os posicionamentos dos mais renomados e respeitados doutrinadores brasileiros acerca do
tema, além de entendimentos jurisprudenciais emanados dos tribunais pátrios; e confrontar, ainda,
os pontos divergentes pelos quais os doutrinadores e os tribunais entendem ser ou não possível a
ocorrência de tais reformas.
No que se refere aos aspectos metodológicos, as hipóteses foram investigadas através de pesquisa
doutrinária e jurisprudencial referentes ao assunto. Realizou-se, outrossim, uma vasta pesquisa
documental em artigos disponíveis em sites jurídicos e revistas especializadas, reportando-se, assim, a uma pesquisa bibliográfica. Em relação à tipologia da pesquisa, segundo a abordagem, é
qualitativa, posto que se trata de uma pesquisa de opiniões; e, segundo a utilização dos resultados, pura, uma vez que visa engrandecer o conhecimento intelectual, sem a intenção de modificar
a realidade. Por fim, quanto aos objetivos, trata-se de um estudo descritivo, já que "Não há interferência do pesquisador, cabendo-lhe tão-somente descrever o objeto da pesquisa" [02], e exploratório, pois busca-se o aprimoramento de idéias, limitando-se a definir objetivos e a procurar maiores informações sobre o tema.
Para facilitar a compreensão do tema, aborda-se no primeiro tópico os aspectos gerais a respeito
do princípio da proibição da reformatio in pejus, evidenciando seu conceito, seu alcance e as justificativas apresentadas pela doutrina para o seu aproveitamento no ordenamento jurídico brasileiro.
Aborda-se, outrossim, a possibilidade de sua aplicação em caso de reconhecimento de nulidades
processuais desfavoráveis ao réu.
No segundo tópico, desenvolvem-se comentários ao sub-princípio da reformatio in pejus indireta,
no que concerne ao seu conceito, aos aspectos em torno dos quais recaem as discussões na doutrina e na jurisprudência acerca de sua admissibilidade no sistema processual vigente, além de
analisar a sua aplicação no procedimento do Tribunal do Júri e em caso de proferimento de sentenças inexistentes.
Define-se, por fim, também no segundo tópico, o sub-princípio da reformatio in melius, destacando-se a divergência existente entre os doutrinadores e os Tribunais Superiores quanto ao manejo
do referido postulado no ordenamento processual penal pátrio.
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PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA REFORMATIO IN PEJUS
1.1 Definição
O Código de Processo Penal pátrio estabelece, em seu art. 617, que: "O tribunal, câmara ou turma
atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença".
Trata-se do princípio da proibição da reformatio in pejus, o qual significa que não pode haver reforma da decisão para pior. Em outras palavras, havendo apenas recurso da defesa, o juízo ad
quem não poderá agravar a situação do réu. Em contrapartida, se houver recurso interposto pela
acusação (Parquet, querelante ou assistente de acusação), poderá a instância superior impor gravame maior ao condenado, uma vez que há pedido nesse sentido.
Esclarece Azevedo apud Mossin, in verbis, que:
...dentro destes limites, sendo o apelante o Ministério Público, ou o querelante, ou o assistente da
acusação, é admitida a reformatio in pejus, isto é, o tribunal superior pode pronunciar decisão condenatória, em lugar da absolvição; pode condenar a pena mais grave do que a aplicada na primeira
instância, revogar os benefícios, aplicar medidas de segurança etc. Noutros termos: a sentença não
passa em julgado para a acusação. [03]
Para corroborar com o acima exposto, traz-se à colação recente (1º de julho de 2005) julgado da
6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça:
PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. CONDENAÇÃO. SENTENÇA. EXECUÇÃO DA PENA
CONDICIONADA AO TRÂNSITO EM JULGADO. APELAÇÃO EXCLUSIVA DO RÉU. TRIBUNAL A QUO.
SANÇÃO. DETERMINAÇÃO. EXECUÇÃO. REFORMATIO IN PEJUS. IMPOSSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA. Diante dos princípios constitucionais do estado de inocência e devido processo legal e Lei
7.210/84 (Lei de Execuções Penais), não é possível executar provisoriamente a pena, exceto quando, v. g., os recursos interpostos não objetivem afastar - em qualquer aspecto – a sanção imposta;
2. Dispondo a sentença condenatória – transitada em julgado para a acusação – que o
réu pode recorrer em liberdade, condicionando a execução da pena ao trânsito em julgado, não pode o Tribunal a quo, em apelação exclusiva da defesa, piorar a situação do
condenado, para determinar a imediata execução da reprimenda, pois caracteriza reformatio in pejus; (grifo nosso) 3. Ainda que o Tribunal de 2º grau não esteja vinculado ao juízo de
primeira instância, não está autorizado a reformá-lo, em qualquer de seus dispositivos, sem motivada fundamentação (art. 93, IX, CRFB); 4. Ordem concedida para determinar a suspensão da execução da pena até o trânsito em julgado. [04]
Registre-se que, quando o art. 617 do Codex de Ritos Penais proíbe a agravação da "pena" do réu,
na realidade, veda a atribuição de qualquer gravame. Se a primeira condenação definiu o cumprimento da pena em regime semi-aberto, v.g., no julgamento de recurso exclusivo da defesa, não
poderá o juízo ad quem impor o regime fechado.
Ademais, a doutrina é uníssona em admitir que esse princípio não se aplica apenas ao recurso de
apelação, mas a todas as espécies recursais previstas no CPP. Assevera Rangel que "a lei refere-se
apenas ao recurso de apelação, porém não temos dúvida em afirmar que, tratando-se de recurso
em sentido estrito (ou qualquer outro recurso), também não poderá ser agravada a situação do
réu." [05]
O ilustre Mirabete faz observação importante: "...a proibição da reformatio in pejus não vincula o
Tribunal aos critérios adotados pelo juiz de primeiro grau, nas várias etapas de aplicação da pena,
impedindo-o, tão-somente, de agravar a sanção final." [06]
1.2.Justificativas para a proibição
A vedação da reformatio in pejus em recurso exclusivo da defesa se justifica uma vez que o órgão
colegiado ad quem deve se pronunciar em conformidade com o postulado no recurso, ou seja, consagra a proibição do julgamento extra e ultra petitum, a que se refere os arts. 128 [07] e 460 [08] do
Código de Processo Civil. A nova decisão não pode extrapolar os limites do que foi pedido no recurso.
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Esse postulado busca, também, garantir o respeito ao princípio constitucional do contraditório, tendo em vista que, se houvesse tal permissão, o recorrente não teria a oportunidade de aduzir argumentos no sentido de impedir a imposição de eventual condenação mais gravosa.
Outra causa justificante da existência da proibição da reformatio in pejus é a adoção, pelo ordenamento pátrio, do sistema acusatório, em que as funções de acusar, defender e julgar são atribuídas
a órgãos distintos. Portanto, de acordo com a máxima latina nemo judex sine actore (ou, então, ne
procedat judex ex officio), o magistrado não pode exercer sua atividade jurisdicional sem que haja
sido provocado.
Conclui Tourinho Filho que "...Se não há alguém postulando a exasperação da pena – pelo contrário até –, como poderia o juízo ad quem fazê-lo? Assim, a proibição da reformatio in pejus é conseqüência lógica do sistema acusatório." [09]
Por derradeiro, defende o douto professor Mossin [10] que, havendo modificação da decisão prejudicial ao condenado, por ocasião de interposição de recurso unicamente seu, estar-se-ia diante de
uma revisão criminal de ofício e pro societate, o que é vedado pelo legislador (art. 621, CPP). Em
que pese a opinião do renomado autor, não há que se falar em revisão criminal nesse contexto,
uma vez que há recurso (ainda que exclusivamente da defesa), não existindo ainda decisão transitada em julgado.
1.3 Reformatio in pejus x nulidades
Importante a análise da Súmula 160 do Supremo Tribunal Federal, in verbis: "É nula a decisão do
tribunal que acolhe contra o réu nulidade não argüida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício."
Um ato processual praticado em desacordo com os ditames legais pode ser considerado ato nulo,
somente declarado através de decisão judicial. Cabe ao magistrado, por ocasião da sentença, pronunciar-se sobre todas as nulidades (ainda não sanadas) suscitadas pelas partes e reconhecer as
de caráter absoluto (insanáveis). Caso isso não seja feito, deverá o órgão ad quem se pronunciar a
respeito das referidas nulidades.
Ocorre que, como já exaustivamente mencionado, o art. 617 do CPP proíbe que, em sendo caso de
recurso exclusivo da defesa, as decisões proferidas em primeira instância sejam modificadas na
instância superior, de modo a prejudicar o réu. Portanto, havendo uma nulidade absoluta, neste
caso, o tribunal deverá analisar se a mesma favorece ou não o recorrente. Se favorecer, deverá reconhecer a mesma; caso prejudique, não poderá declarar tal vício, sob pena de macular o princípio
da proibição da reformatio in pejus.
Registre-se que, mesmo havendo recurso da acusação, se a nulidade de caráter absoluto prejudicial ao réu não for argüida, não poderá o condenado ter sua situação agravada. Exemplificam Grinover, Fernandes e Gomes Filho:
...se a invalidação favorecer ao réu, como, v.g., na hipótese de estar condenado e não ter sido regularmente citado, mesmo que a defesa não tenha argüido a nulidade, caberá ao órgão julgador
proclamar a nulidade e ordenar a renovação do feito, a partir da citação, pois isso favorece o réu;
se, ao contrário, tratar-se de nulidade não argüida pela acusação, mas cujo reconhecimento poderá
prejudicar a defesa (como ocorreria, por exemplo, se o réu está absolvido e com a renovação do
feito poderá ser condenado, diante de novas provas), aí nada restará ao tribunal senão confirmar a
absolvição. [11]
2 DESDOBRAMENTOS DO PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA REFORMATIO IN PEJUS
Como decorrência do princípio da proibição da reformatio in pejus, têm-se os princípios da proibição da reformatio in pejus indireta e da reformatio in melius, os quais serão abordados a seguir.
2.1 Reformatio in pejus indireta
Quando o tribunal anula uma sentença proferida pelo juízo de primeiro grau, os autos são devolvidos à instância inferior para que se prolate nova decisão desprovida de nulidade. A doutrina e a jurisprudência brasileiras buscam responder se é possível haver reformatio in pejus indireta nesta hipótese, isto é, se o juiz a quo poderá proferir nova decisão agora condenando o réu a pena maior
que a anterior, quando o recurso que resultou na anulação da primeira sentença fora exclusivamente impetrado pelo condenado?
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Verifique-se o exemplo citado por Rangel para ilustrar o questionamento supracitado:
...o réu foi condenado a uma pena de cinco anos de reclusão. Recorre, alegando error in procedendo na sentença. O tribunal dá provimento ao recurso, cassando a sentença e remetendo o processo
ao juízo a quo para que profira outra em seu lugar. O juiz, ao dar outra sentença, poderá condenar a uma pena superior a cinco anos ou estará limitado a este quantum? [12] (grifo nosso)
2.1.1 Corrente desfavorável
Razão assiste ao posicionamento defendido pela doutrina majoritária, a qual entende não poder
haver reformatio in pejus indireta, ou seja, o juiz não pode condenar o réu a uma pena superior à
que foi estabelecida na primeira sentença. Defendem os doutos dessa corrente que, como houve
apenas recurso da defesa, a decisão questionada já transitara em julgado para o órgão acusador,
razão pela qual, conforme já explicitado [13], não pode haver prejuízo para o condenado em virtude
de reconhecimento de quaisquer nulidades. A esse posicionamento filia-se Tourinho Filho:
De fato, se a decisão transitou em julgado para a Acusação, não havendo possibilidade de agravamento da pena, não teria sentido, diante de uma decisão do Tribunal anulando o feito, pudesse o
juiz, na nova sentença, piorar-lhe a situação. Do contrário, os réus ficariam receosos de apelar e
essa intimidação funcionaria como um freio a angustiar a interposição de recursos. [14]
Comunga, outrossim, do mesmo pensamento Capez:
Anulada sentença condenatória em recurso exclusivo da defesa, não pode ser prolatada nova decisão mais gravosa do que a anulada. Por exemplo: réu condenado a um ano de reclusão apela e obtém a nulidade da sentença; a nova decisão poderá impor-lhe, no máximo, a pena de um ano, pois
do contrário o réu estaria sendo prejudicado indiretamente pelo seu recurso. [15]
Além de Tourinho Filho e Capez, corroboram com essa idéia Mossin [16] e Mirabete [17]. É esse, também, o entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal:
Reformatio in pejus
indireta: aplicação à hipótese de consumação da prescrição segundo a pena concretizada na sentença anulada, em recurso exclusivo da defesa, ainda que por incompetência absoluta da Justiça de
que promanou. I. Anulada uma sentença mediante recurso exclusivo da defesa, da renovação do ato não pode resultar para o réu situação mais desfavorável que a que lhe resultaria do trânsito em julgado da decisão de que somente ele recorreu: é o que resulta da
vedação da reformatio in pejus indireta, de há muito consolidada na jurisprudência do
Tribunal. (grifo nosso) II. Aceito o princípio, é ele de aplicar-se ainda quando a anulação da primeira sentença decorra da incompetência constitucional da Justiça da qual emanou. [18]
2.1.2 Corrente favorável
Há quem defenda, embora seja corrente minoritária, a possibilidade do juiz de primeiro grau aplicar, na segunda decisão, pena maior ao réu. Justificam que não há proibição legal para tal, uma
vez que o legislador somente proibiu o tribunal de reformar para pior, conforme já analisado (art.
617, CPP). Asseveram, também, que não se pode reconhecer a força de uma decisão que fora invalidada, expurgada do ordenamento jurídico, em detrimento de outra exarada validamente.
Argumenta, ainda, Rangel que "...o recurso, como vimos, é voluntário, ou seja, o réu recorre se
quiser. Portanto, carrega o ônus do seu recurso com os resultados que lhe são previsíveis e possíveis: provimento, improvimento ou não conhecimento." [19]
2.1.3 Reformatio in pejus indireta x Tribunal do Júri
Importante observar que essa regra da proibição da reformatio in pejus indireta não se aplica ao
Tribunal do Júri, uma vez que se trata de órgão soberano, ou seja, essa vedação não pode prevalecer sobre o princípio constitucional da soberania dos veredictos do Conselho de Sentença. Logo,
caso o julgamento realizado pelo Júri seja anulado, poderão os jurados decidir de modo mais gravoso para o réu.
Conforme, Mirabete:
A regra, porém, não tem aplicação para limitar a soberania do Tribunal do Júri, decorrente de preceito constitucional. Não pode a lei ordinária impor-lhe limitações que lhe retirem a liberdade de
julgar a procedência ou a improcedência da acusação, bem como a ocorrência, ou não, de circuns-
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tâncias que aumentem ou diminuem a responsabilidade do réu, em virtude de anulação do veredicto anterior por decisão da Justiça togada. [20]
Entretanto, caso o segundo veredicto seja igual ao primeiro, ficará o juiz-presidente limitado ao
quantum da pena inicialmente aplicada, isto é, a vedação da reformatio in pejus indireta se aplica
ao magistrado, apenas. É o que entende o STF, in verbis:
HABEAS CORPUS - TRIBUNAL DO JÚRI - REFORMATIO IN PEJUS INDIRETA - RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA - EXASPERAÇÃO DA PENA DETERMINADA PELO JUIZ-PRESIDENTE INADMISSIBILIDADE - PEDIDO DEFERIDO. - O Juiz-Presidente do Tribunal do Júri,
quando do segundo julgamento, realizado em função do provimento dado a recurso exclusivo do réu, não pode aplicar pena mais grave do que aquela que resultou da anterior
decisão, (grifo nosso) desde que estejam presentes - reconhecidos pelo novo Júri - os mesmos fatos e as mesmas circunstâncias admitidos no julgamento anterior. Em tal situação, aplica-se, ao
Juiz-Presidente, a vedação imposta pelo art. 617 do CPP. [21]
2.1.4 Reformatio in pejus X sentença inexistente
Se houver declaração de nulidade da sentença, em razão da mesma haver sido prolatada por juiz
constitucionalmente incompetente (sentença inexistente), poderá o juiz competente atribuir ao réu
pena mais severa?
A doutrina é divergente. Melhor é o entendimento da maioria dos doutos brasileiros, os quais não
aceitam a regra da proibição da reformatio in pejus indireta. Para essa corrente, portanto, pode o
juiz competente condenar o réu a uma pena de quantum maior que a aplicada na primeira sentença (que fora anulada), pois não se pode limitar a atividade jurisdicional a uma decisão inexistente,
ou seja, proferida por juiz incompetente, e que não produz efeito algum.
Segundo Tourinho Filho:
...se a nulidade decorrer de incompetência absoluta, a decisão funcionará como ato inexistente e, então, o Juiz competente terá inteira liberdade na dosimetria da pena, (grifo
nosso) mesmo porque a primeira decisão foi proferida por um órgão desvestido do poder de julgar.
Se assim é na incompetência ratione materiae, com muito mais razão na ratione personae... [22]
É a tese sustentada, também, por Mirabete [23] e Capez, o qual assevera:
...No caso de sentença condenatória ter sido anulada em virtude de recurso da defesa, mas, pelo
vício da incompetência absoluta, a jurisprudência não tem aceito (sic) a regra da proibição da reformatio in pejus indireta, uma vez que o vício é de tal gravidade que não se poderia, em hipótese
alguma, admitir que uma sentença proferida por juiz absolutamente incompetente, tivesse o condão de limitar a pena na nova decisão. [24]
Questionam Grinover, Fernandes e Gomes Filho que:
...em se tratando de sentença inexistente (proferida por juiz constitucionalmente incompetente, em
contraste com o art. 5º, LIII, da CF), esta simplesmente não transitaria em julgado, sendo nenhuma sua eficácia. Poderia o vício ser declarado pro societate, formulando a acusação nova
pretensão punitiva e, na argüição de coisa julgada oferecida pela defesa (art. 95, V, e
110 do CPP), argumentar com a não ocorrência desta, por ser a sentença inexistente? [25]
(grifo nosso)
Respondem os autores, defendendo posição contrária:
Não. Em se tratando de processo penal, o rigor técnico da ciência processual há de ceder perante
os princípios maiores do favor rei e do favor libertatis, E o dogma do ne bis in idem deverá prevalecer, impedindo nova persecução penal a respeito de fato delituoso que foi objeto de outra ação penal. [26]
Para eles, apesar da sentença ser inexistente e não constituir coisa julgada (o que, em tese, permitiria ao juiz competente proferir nova decisão e mais gravosa), na esfera do jus puniendi, em que
se protegem valores essenciais como a vida, a liberdade e a dignidade humana, o non bis in idem
"...assume dimensão de proteção autônoma, sendo reconhecido mesmo naqueles casos em que
não se poderia falar, tecnicamente, em coisa julgada." [27] Em suma, o réu não poderá ser novamente processado pelo mesmo fato delituoso.
2.2 Reformatio in melius
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Outro princípio decorrente do postulado da proibição da reformatio in pejus é o princípio da reformatio in melius, o qual significa, simplificadamente, "reformar para melhor".
A polêmica é a seguinte: é possível melhorar a situação do réu, caso haja apenas recurso interposto pela acusação? É outra indagação que a doutrina e a jurisprudência tentam responder.
2.2.1 Corrente favorável
Parte majoritária da doutrina brasileira defende a possibilidade do condenado ter sua situação melhorada, mesmo havendo recurso exclusivo do órgão acusador. Destarte, de acordo com essa corrente, a qual se mostra mais pertinente, o tribunal ad quem poderá, por exemplo, diminuir a pena
aplicada ao réu na sentença recorrida, ainda que o recurso tenha sido impetrado apenas pela acusação.
Corroboram com esse entendimento, dentre outros autores, Tourinho Filho, Rangel [28] e Mossin [29].
De acordo com Tourinho Filho:
...Entendemos que, interposta apelação, apenas pelo Ministério Público, não pode o Tribunal ficar
adstrito à regra do tantum devolutum quantum appelatum. Se o Ministério Público apela para agravar a pena, nada obsta possa o órgão ad quem agrava-la, mantê-la, diminuí-la ou, então, absolver o réu. [30]
Os fundamentos apresentados por essa parcela (majoritária) da doutrina são os seguintes:
1º) Conforme preconiza o art. 127 da Constituição Federal, o Parquet "...é instituição permanente,
essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime
democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis." Deste modo, como o Ministério
Público não funciona apenas como órgão acusador, e sim como fiscal da lei, seria incoerente não se
admitir que o seu recurso pudesse melhorar a situação do réu, ainda que não houvesse pedido
neste sentido;
2º) O art. 617 do CPP, já amplamente analisado, apenas proibiu a reformatio in pejus e não a reforma para melhor, portanto, se o legislador não proibiu, não caberá ao intérprete restringir, ainda
por cima, em desfavor ao réu;
3º) O sistema processualista penal baseia-se nos princípios da verdade real e do favor rei, devendo
seus institutos ser interpretados em consonância com esses postulados, ou seja, de modo que favoreça ao acusado;
4º) Por fim, deve-se atender, também, aos princípios da economia e da celeridade processual [31],
ou seja, deve-se conceder, por ocasião do julgamento do recurso exclusivo da acusação, qualquer
benefício ao réu que seria, do mesmo modo, conquistado através de uma futura revisão criminal ou
habeas corpus.
Essa, também, é a orientação do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA ACUSAÇÃO. REFORMATIO IN MELIUS. POSSIBILIDADE. CPP, ART. 617. CONDENADO REINCIDENTE. PENA INFERIOR A QUATRO
ANOS. REGIME PRISIONAL. CP, ART. 33, § 2º. Em sede de recurso exclusivo da acusação, o
Tribunal não está impedido de, ao constatar patente erro na condenação, corrigir a sentença, amenizando a situação do réu, dada a relevância que a Justiça deve conferir à liberdade humana. O que é vedado no sistema processual penal é a reformatio in pejus,
como inscrito no art. 617, do CPP, sendo admissível a reformatio in melius, (grifo nosso) o
que ocorre na hipótese em que o Tribunal, ao julgar recurso da acusação, diminui a pena prevista
do réu. A fixação do regime inicial integra o processo de individualização da pena, regulando-se pela compreensão sistemática do art. 33, § 2º, e do art. 59, ambos do Código Penal, com integração
do critério relativo ao quantum da pena e critério pertinente às circunstâncias judiciais. Na compreensão sistemática das alíneas do § 2º do art. 33, do Código Penal, a melhor exegese aponta no
sentido de ser admissível a imposição do regime semi-aberto aos condenados reincidentes cuja pena seja inferior a quatro anos. Recurso especial conhecido e desprovido. [32]
2.2.2 Corrente desfavorável
O entendimento de que não seria possível haver reformatio in melius, no caso de recurso unicamente interposto pela acusação, é comungado pela parcela minoritária da doutrina.
Adere a essa posição Capez:
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...Entendemos que não é possível, em recurso exclusivo da acusação, reformar-se a decisão em
favor do réu, em face do princípio do tantum devolutum quantum appellatum... O tribunal estaria
julgando extra petita, sem que tivesse competência recursal para tanto. [33]
Para essa corrente, ao se admitir que o órgão ad quem julgue de modo a beneficiar o réu, mesmo
não tendo este interposto recurso, seria admitir julgamento extra petita, ou seja, além do que foi
postulado pelo recorrente. Além desse argumento, seria também uma espécie de reformatio in pejus para a acusação.
Acrescenta Mirabete:
De acordo com o princípio ne eat judex ultra petita partum, não pode o tribunal ad quem, em recurso exclusivo da acusação, reformar a decisão em favor do réu seja atenuando-lhe a pena, seja
beneficiando-o de outra forma. É a orientação do STF que não é possível a reformatio in melius,
pois há coisa julgada para o réu, o que afasta essa possibilidade diante do princípio tantum devolutum quantum appellatum. [34]
Como informou o ilustre professor Mirabete, esse é o posicionamento do Supremo Tribunal Federal
(em que pese só haver se manifestado há muito tempo, não tendo recentes decisões a respeito):
Roubo. Consumação. Reformatio in melius. É firme a jurisprudência do STF. no sentido de que ofende o artigo 574 do Código de Processo Penal a decisão que, na ausência de recurso do réu, se
serve do da acusação, que visa a exasperar a pena, para minorá-la. Por outro lado, o plenário desta corte, ao julgar, em 17.9.87, o RECR. 102.490, decidiu, por ampla maioria, que o roubo já esta
consumado se o ladrão é preso em decorrência de perseguição imediatamente após a subtração da
coisa, não importando assim que tenha, ou não, posse tranqüila desta. Recurso Extraordinário conhecido e provido. [35]
CONCLUSÃO
Diante do exposto, conclui-se que o ordenamento jurídico brasileiro adotou o princípio da proibição
da reformatio in pejus (Código de Processo Penal, art. 617), isto é, em havendo apenas recurso da
defesa, o juízo ad quem está proibido de decidir de modo a piorar a condenação do réu. A proibição
diz respeito à atribuição de qualquer gravame ao condenado, e não só ao aumento da pena, além
de se aplicar a todas as espécies recursais previstas no CPP.
As justificativas para a adoção desse postulado são: 1ª) o ordenamento pátrio consagra a proibição
do julgamento extra e ultra petitum; 2ª) busca-se garantir o princípio constitucional do contraditório; 3ª) como se adotou no Brasil o sistema acusatório, o magistrado não pode exercer sua atividade jurisdicional sem que haja sido provocado.
Em que pese opinião em sentido contrário, conclui-se que não há de se falar em revisão criminal
nesse contexto, uma vez que há recurso (ainda que exclusivamente da defesa), não existindo ainda decisão transitada em julgado.
Quanto à aplicação do princípio da proibição da reformatio in pejus em caso de nulidades, a Súmula 160 do Supremo Tribunal Federal disciplina, em suma, que havendo nulidade absoluta, o tribunal
deverá analisar se a mesma favorece ou não ao recorrente, só devendo reconhecê-la se favorável.
Decorre do postulado supracitado o princípio da proibição da reformatio in pejus indireta. A corrente majoritária, a qual assiste razão, defende que não pode haver reformatio in pejus indireta, ou
seja, que o juiz que teve sua decisão anulada pelo tribunal não pode condenar novamente o réu a
uma pena superior à que foi estabelecida na primeira sentença. Defendem os doutos dessa corrente que, como houve apenas recurso da defesa, a decisão questionada já transitara em julgado para
o órgão acusador. A corrente minoritária admite a possibilidade, tendo em vista que não há proibição legal para tal e, também, por não se poder reconhecer a força de uma decisão que fora invalidada, em detrimento de outra exarada validamente.
Essa regra da proibição da reformatio in pejus indireta não se aplica ao Conselho de Sentença do
Tribunal do Júri, uma vez que se trata de órgão soberano. Somente se aplica ao juiz-presidente, no
caso do segundo veredicto ser igual ao primeiro, ocasião em que a pena ficará limitada ao quantum
da inicialmente aplicada.
Na hipótese da primeira decisão ser proferida por juiz constitucionalmente incompetente (sentença
inexistente), a doutrina é divergente. Conclui-se, conforme a maioria, que não se aplica a regra da
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proibição da reformatio in pejus indireta, admitindo, portanto, que o juiz competente condene o
réu a uma pena de quantum maior que a aplicada na primeira sentença que fora anulada. Argumenta-se que o juiz competente não pode se limitar a uma decisão inexistente. Para a corrente
minoritária, apesar da sentença ser inexistente e não constituir coisa julgada, na esfera do jus puniendi, o princípio do non bis in idem não permite que o réu seja novamente processado e condenado pelo mesmo fato delituoso.
O outro princípio decorrente do postulado da proibição da reformatio in pejus é o princípio da reformatio in melius, o qual significa reformar para melhor. Discute-se se é possível melhorar a situação do réu, caso haja apenas recurso interposto pela acusação. Melhor é o entendimento defendido pela doutrina majoritária e o pelo STJ, ou seja, que é possível. Os argumentos utilizados são os
seguintes: o Ministério Público é fiscal da lei, portanto, seria incoerente não se admitir que o seu
recurso pudesse melhorar a situação do réu, ainda que não houvesse pedido neste sentido; o art.
617 do CPP não proibiu a reforma para melhor, portanto, não cabe ao intérprete restringir; o sistema processualista penal baseia-se nos princípios da verdade real e do favor rei, devendo seus
institutos ser interpretados em consonância com esses postulados; e, por fim, deve-se atender,
também, aos princípios da economia e da celeridade processual, isto é, deve-se conceder, por ocasião do julgamento do recurso exclusivo da acusação, qualquer benefício ao réu que seria, do
mesmo modo, conquistado através de uma futura revisão criminal ou habeas corpus.
A minoria da doutrina e o STF entendem que não é possível haver reformatio in melius, pois, ao se
admitir que o órgão ad quem julgue de modo a beneficiar o réu, mesmo não tendo este interposto
recurso, seria admitir julgamento extra petita, ou seja, decisão além do que foi postulado pelo recorrente-acusador, e, também, uma espécie de reformatio in pejus para a acusação.
Diante do exposto, conclui-se que o ordenamento processual brasileiro veda o manejo da reformatio in pejus e da reformatio in pejus indireta, porém, admite a reformatio in melius.
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TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. São Paulo: Saraiva, 2002, vol. 4.
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NOTAS
01
MELLO, Celso Antônio Bandeira de apud PONTES FILHO, Valmir. Curso fundamental de direito
constitucional. São Paulo: Dialética, 2001, p. 71.
02
BASTOS, Núbia M. Garcia. Introdução à metodologia do trabalho acadêmico. Fortaleza: [s.n.],
2003, p. 35.
03
AZEVEDO, Vicente Paulo Vicente de apud MOSSIN, Heráclito Antônio. Curso de Processo Penal.
São Paulo: Atlas, 1998, vol. 3, p. 218.
04
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (6ª Turma). Habeas corpus nº 34794/RJ. Relator: Min. Paulo Medina. Brasília-DF, DJ 01/07/2005, p. 627. Disponível em: . Acesso em: 01 ago. 2005.
05
RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 8. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2004, p. 719.
06
MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de Processo Penal interpretado. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2001,
p. 1331.
07
Art. 128. O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de
questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte.
08
Art. 460. É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida,
bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
09
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. São Paulo: Saraiva, 2002, vol. 4, p. 404.
09
MOSSIN, Heráclito Antônio. op. cit., 1998, vol. 4, p. 219.
10
GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães.
As nulidades no processo penal. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 38.
11
RANGEL, Paulo. op. cit., 2004, p. 720.
12
Vide item 1.3.
13
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. op. cit., 2002, vol. 4, p. 409.
14
CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 416.
15
MOSSIN, Heráclito Antônio. op. cit., 1998, vol.4, p. 219.
16
MIRABETE, Julio Fabbrini. op. cit., 2001, p. 1335.
17
BRASIL. Supremo Tribunal Federal (1ª Turma). Habeas corpus nº 75907/RJ. Relator: Min. Sepúlveda Pertence. Brasília-DF, DJ 09/04/1999, p. 02, ementário vol. 01945-01, p. 126. Disponível em:
. Acesso em: 04 ago. 2005.
18
RANGEL, Paulo. op. cit., 2004, p. 722.
19
MIRABETE, Julio Fabbrini. op. cit., 2001, p. 1335.
20
BRASIL. Supremo Tribunal Federal (1ª Turma). Habeas corpus nº 73367/MG. Relator: Min. Celso
de Mello. Brasília-DF, DJ 29/06/2001, p. 34, ementário vol. 02037-03, p. 555. Disponível em: . Acesso em: 04 ago. 2005.
21
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. op. cit., 2002, vol. 4, p. 410.
22
MIRABETE, Julio Fabbrini. op. cit., 2001, p. 1336.
23
CAPEZ, Fernando. op. cit, 2003, p. 416.
24
GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães.
op. cit., 2001, p. 51.
25
Id. ibid., 2001, p. 51.
26
Id. ibid., 2001, p. 51.
27
RANGEL, Paulo. op. cit., 2004, p. 726.
28
MOSSIN, Heráclito Antônio. op. cit., 1998, vol.4, p. 221
29
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. op. cit., 2002, vol. 4, p. 421.
30
Com a Emenda Constitucional nº 45, de 08 de dezembro de 2005, foi acrescentado ao art. 5º o
inciso LXXVIII, o qual veio assegurar a todos, no âmbito judicial e administrativo, um processo com
duração razoável e através de meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
31
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (6ª Turma). Recurso Especial 437181/SP. Relator: Min. Vicente Leal. Brasília-DF, DJ 28/04/2003, p. 269. Disponível em: . Acesso em: 07 ago. 2005.
32
CAPEZ, Fernando. op. cit, 2003, p. 417.
33
MIRABETE, Julio Fabbrini. op. cit., 2001, p. 1339.
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ANALISTA TRE / TRF
Disciplina: Direito Processual Penal
Prof.: Nestor Távora
Data: 19.05.2009
Aula n°09
34
BRASIL. Supremo Tribunal Federal (1ª Turma). Recurso Extraordinário nº 108479/SP. Relator: Min. Moreira Alves. Brasília-DF, DJ 05/02/1988, p. 1383, ementário vol. 1488-02, p. 289. Disponível em: . Acesso em: 07 ago. 2005.
Fonte: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7289
2. JURISPRUDÊNCIA CORRELATA
2.1 Processo AgRg no HC 111250 / SP
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS
2008/0158535-0
Relator: Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) (8175)
Órgão julgador: T6 - SEXTA TURMA
Data do julgamento: 19/02/2009
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE ENTORPECENTES –
LIBERDADE PROVISÓRIA – PROIBIÇÃO CONSTITUCIONAL DE LIBERDADE PROVISÓRIA COM
FIANÇA QUE NÃO SE ESTENDE ÀS DEMAIS FORMAS DE LIBERDADE PROVISÓRIA – LEI 11.464/07
QUE SÓ PROÍBE A FIANÇA, REVOGANDO IMPLICITAMENTE A PROIBIÇÃO CONTIDA NA LEI
11.343/06, DADA SUA APLICAÇÃO GERAL EM RELAÇÃO AOS CRIMES HEDIONDOS PREVISTOS EM
QUALQUER ESTATUTO. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO.
1- O princípio constitucional de inocência impede a prisão cautelar quando não se encontrarem
presentes os seus requisitos, fundados em fatores concretos.
2- A proibição da liberdade provisória com fiança não compreende a da liberdade provisória sem a
fiança.
3- A Lei 11.464/07 não impede a concessão da liberdade provisória nos crimes hediondos, sendo
de alcance geral em relação a todos os crimes dessa natureza.
4- Na decisão que nega a liberdade provisória, a ausência de enunciação de fatos concretos, indicadores dos fundamentos de cautelaridade previstos no art. 312 do Código de Processo Penal,
revelam constrangimento ilegal.
5- Negado provimento ao recurso.
Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os
Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao
agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Nilson Naves, Paulo Gallotti, Maria Thereza de Assis Moura e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.
2.2 HC 94598 / RS - RIO GRANDE DO SUL
HABEAS CORPUS
Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI
Julgamento: 21/10/2008
Órgão Julgador: Primeira Turma, STF
Parte(s):
PACTE.(S): VITELIO LEMOS DAMACENO
IMPTE.(S): DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Ementa: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. DECISÃO FUNDAMENTADA
NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. PRESSUPOSTOS DO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DEMONSTRAÇAO. ORDEM DENEGADA. I - A decretação da prisão preventiva baseada na garantia da ordem pública e na conveniência da instrução criminal está devidamente fundamentada
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ANALISTA TRE / TRF
Disciplina: Direito Processual Penal
Prof.: Nestor Távora
Data: 19.05.2009
Aula n°09
em fatos concretos a justificar a segregação cautelar, em especial diante da reiteração da conduta.
II - Habeas corpus denegado.
Decisão: A Turma indeferiu o pedido de habeas corpus. Unânime. Não participou, justificadamente,
deste julgamento o Ministro Carlos Britto. 1ª Turma, 21.10.2008.
3. ASSISTA!
3.1 O que se entende por dispensa da fiança?
Disponível em: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20081209091722756
3.2 O crime de tortura é inafiançável? Em caso afirmativo, cabe liberdade provisória?
Disponível em: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=2008092915021841
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ANALISTA TRE / TRF Disciplina: Direito Processual Penal Prof