Pró-Reitoria de Graduação
Serviço Social
Trabalho de Conclusão de Curso
ABUSO SEXUAL INTRAFAMILIAR: UM ESTUDO A PARTIR
DOS DADOS ELABORADOS PELO CENTRO DE
REFERÊNCIA PARA A PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA
E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA SEXUAL
– CEREVS.
Autora: Maria Aparecida de Oliveira Gaspio
Orientador: Luciana de Castro Álvares
Brasília-DF
2014
2013
MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA GASPIO
O ABUSO SEXUAL INTRAFAMILIAR: UM ESTUDO A PARTIR DOS DADOS
ELABORADOS PELO CENTRO DE REFERÊNCIA PARA A PROTEÇÃO
INTEGRAL DA CRIANÇA E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA
SEXUAL – CEREVS.
Artigo apresentado ao Curso de
graduação em Serviço Social da
Universidade Católica de Brasília (UCB),
como requisito parcial para a obtenção do
título de Bacharel em Serviço Social.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Luciana de Castro
Álvares
Brasília
2014
Artigo de autoria de Maria Aparecida de Oliveira Gaspio, intitulado “O ABUSO
SEXUAL INTRAFAMILIAR: UM ESTUDO A PARTIR DOS DADOS
ELABORADOS PELO CENTRO DE REFERÊNCIA PARA A PROTEÇÃO
INTEGRAL DA CRIANÇA E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA
SEXUAL – CEREVS’’, apresentado como requisito parcial para obtenção do grau
de Bacharel em Serviço Social da Universidade Católica de Brasília, em 11 de
Junho de 2014, defendido e aprovado pela banca examinadora abaixo assinada:
_______________________________________________
Prof.ª Dr.ª Luciana de Castro Álvares
Orientadora
Curso Serviço Social – UCB
_______________________________________________
Prof.ª Msc. Karina Aparecida Figueiredo
Banca Examinadora
Curso Serviço Social – UCB
_______________________________________________
Prof.ª Esp. Erci Ribeiro Moura
Banca Examinadora
Curso Serviço Social – UCB
Brasília
2014
Dedico este trabalho de Conclusão de
Curso ao meu Deus que me proporcionou
fé, força e coragem para acreditar e
continuar, não deixando que o desânimo
interferisse
em
minha
caminhada
acadêmica. Dedico também ao meu
esposo presente em todos os momentos,
sempre confiando e acreditando em mim
e no meu potencial. Aos meus queridos
filhos e netos e minha querida mãe que
são fonte de amor e alegria para minha
vida e a minha formação.
AGRADECIMENTO
Este é um momento especial para agradecer a Deus por me fortalecer nos
momentos mais difíceis, no processo da minha formação e por acreditar que tudo
daria certo. Um momento especial para dizer muito obrigado às pessoas que fizeram
parte de minha vida ao longo dessa história acadêmica e pessoal, que me apoiaram,
ajudaram e permitiram que este trabalho pudesse ser realizado.
Agradeço em especial a minha mãezinha, uma pessoa importantíssima para
esta realização, que me compreendeu e aceitou a minha ausência, falta de tempo
para visitá-la e ficar ao seu lado.
Também agradeço as três pessoas importantes que sempre acreditaram em
mim: meu esposo, companheiro e grande incentivador, obrigado por tudo que fez e
faz por mim, principalmente nos momento em que me encontrava ansiosa,
angustiada devido à tensão para a elaboração desse artigo, sempre me deu apoio,
carinho e ajuda, motivando-me a acreditar que tudo daria certo; Aos meus filhos,
Daniela e Rafael que estiveram presente, me apoiando e dando forças, fortalecendome com carinho e amor nos momentos em que eu mais precisava, sempre
acreditando no meu potencial e na construção desse desafio na minha vida; E com
carinho agradeço a Deus a existência dos meus três netos, Felipe, Hugo e Cauã,
que são a fonte de minhas alegrias.
A você Jayne dos Anjos, não poderia deixar de te agradecer, pois você é uma
pessoa muito especial e querida, colega de trabalho, amiga e incentivadora que me
fez acreditar que tudo era possível e que iria conseguir, “era só dar o primeiro
passo”, lembro-me com carinho destas palavras que foram importantes para eu
iniciar meus estudos acadêmicos.
Agradeço a todo o corpo docente da Universidade Católica, o qual fez parte
para minha formação acadêmica, em especial a minha professora e orientadora
Luciana Álvares, que com seu conhecimento e sua formação de Doutorado, me
possibilitou a elaboração e em especial a conclusão do meu Trabalho de Conclusão
de Curso.
Com carinho agradeço as Assistentes Sociais Cecy Alcântara e Viviane
Faleiros do CEREVS, que com especial dedicação e seu trabalho TeóricoMetodológico e prático me forneceu dados estatísticos elaborados por esta seção da
1ª Vara da Infância e Juventude- TJDFT.
Agradeço a toda a minha família e amigos que fizeram parte da minha vida
nos momentos felizes e difíceis, mais que estavam sempre presentes para me
ajudar e me apoiar na construção do meu sonho.
O mundo é perigoso não por causa
daqueles que fazem o mal, mas por causa
daqueles que veem e deixam o mal ser
feito.
(Albert Einstein)
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O ABUSO SEXUAL INTRAFAMILIAR: UM ESTUDO A PARTIR DOS DADOS
ELABORADOS PELO CENTRO DE REFERÊNCIA PARA A PROTEÇÃO
INTEGRAL DA CRIANÇA E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA
SEXUAL – CEREVS.
MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA GASPIO
Resumo:
A violência sexual vivenciada por criança e adolescente é um fenômeno
caracterizado como complexo, que envolve vários aspectos, sociais, psicológicos e
legais, exigindo maior atenção e proteção por parte das autoridades e da sociedade
em geral a este público infanto-juvenil. Este estudo busca identificar se ocorrem
outras formas de violência associadas ao abuso sexual. Para isso, foram usados os
dados estatísticos elaborados pelo CEREVS nos anos de 2009 e 2011, referentes
aos atendimentos de crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual. Trata-se de
uma pesquisa quali-quantitativa realizada por meio de levantamento bibliográfico e
documental. Como resultado verificou-se que os dados analisados estão em
consonância com a literatura especializada e que o abuso sexual intrafamiliar,
perpetrado no contexto doméstico contra criança e adolescente, está associado a
outros tipos de violências, causando a este público Infanto-Juvenil consequências
psicológicas, físicas e sociais.
Palavras-chave: Crianças. Adolescentes. Violência sexual.
1 INTRODUÇÃO
A violência sexual intrafamiliar contra criança e adolescente é um problema
social relevante, pois é considerado como um problema de saúde, sendo um
fenômeno que aflige e causa vários danos, sociais, morais e de saúde à vítima. É
um fenômeno que está presente na história da sociedade por longa data.
O abuso sexual intrafamiliar contra criança e adolescente geralmente ocorre
no seio da família, em ambiente privado, praticado na maioria das vezes por
pessoas próximas e de confiança da criança ou do adolescente, com grau de
parentesco, podendo ser pais, padrastos, irmãos, tios. É marcado pelo domínio do
mais forte sobre o mais fraco, com as mais diversas formas de poder e nas
diferentes esferas da sociedade.
As crianças e adolescentes vítimas dessa prática de violência sexual sofrem
com as consequências e maus-tratos dos adultos sobre elas. É notório que mesmo
com as mudanças de paradigma e a mobilização da sociedade brasileira, com a
evolução dos princípios morais e legais em defesa das crianças e adolescentes, os
casos de abuso sexual contra criança e adolescente não deixaram de existir, sendo
ainda hoje um fenômeno universal que atinge todas as idades e classes sociais,
etnias, religiões e culturas, envolvendo também a questão de gênero, causando
dano e sofrimento físico, sexual e emocional à vítima e a todo grupo familiar.
O abuso sexual contra crianças e adolescentes é de natureza complexa, pois
implica na violação dos direitos e tabus sociais envolvendo todos os membros
7
familiares, devido seu caráter coercitivo e manipulador, utilizando-se do silêncio, do
poder e da dominação para se perpetuar no contexto familiar.
Dessa forma, dentro da complexidade que a violência sexual se apresenta, o
objetivo deste trabalho foi identificar as ocorrências de outras formas de violência à
criança e adolescente que foram vítimas de abuso sexual. Para alcançar os
objetivos foram analisados os dados estatísticos das demandas atendidas pelo
Centro de Referência para a Proteção Integral da Criança e Adolescente – CEREVS
no ano de 2009 e 2011.
O interesse por este tema se deu através de estudos e debates, jornais,
palestras, leituras bibliográficas e participações em seminários sobre o tema Criança
e Adolescente – Seminário 20 Anos do ECA, realizados na Câmara dos Deputados.
A metodologia utilizada foram as pesquisas quali-quantitativa, bibliográfica e
documental. Em discussão encontrada em Minayo (2011) observa-se que a
pesquisa quali-quantitativa pode ser entendida enquanto a combinação entre a
estatística da pesquisa quantitativa com a busca de abordagem do mundo dos
significados, enquanto parte da realidade não visível, interpretando tudo o que pode
ser mensurado, classificado e analisado em números.
A pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base no material já elaborado,
constituído principalmente por livros e artigos científicos (GIL, 2005). E a pesquisa
documental assemelha-se muito a pesquisa bibliográfica. Ela se vale de materiais
que não receberam ainda um tratamento analítico, ou ainda podem ser reelaborados
de acordo os objetivos da pesquisa (Gil, 2005).
O artigo foi dividido em 8 tópicos (contados desde introdução até as
referências), considerando-se a sequencia abaixo: Iniciou-se com abordagem da
família e sua organização na sociedade brasileira, sua evolução histórica e os
arranjos que envolvem esta instituição na contemporaneidade; em sequência,
enfatizou-se a violência contra criança e adolescente e suas tipificações;
prosseguindo com a abordagem da particularidade do sobre o abuso sexual contra
criança e adolescente; depois seguiu-se com o enfoque da sociedade e o Estado no
processo de mobilização e enfrentamento da violência sexual contra criança e
adolescente e por último o tópico do abuso sexual contra criança e adolescente a
partir dos dados do CEREVS – 1ª VIJ e fechando com as considerações finais.
2 FAMÍLIA E SUA ORGANIZAÇÃO NA SOCIEDADE BRASILEIRA
A família em seu desenvolvimento ao longo da história sofreu grandes
mudanças com a evolução e organização da sociedade. O presente estudo
pretendeu inicialmente fazer uma análise da evolução e etapas em que se
configurou e se estruturou as famílias brasileiras. A família em seu processo
evolutivo se deparou com importantes impactos internos e mutações externas que
marcaram sua história.
A história da família brasileira aponta que no período colonial, por exemplo, o
modelo patriarcal teve influência no processo de colonização no Brasil, representado
pelo latifúndio, escravidão e uma economia agroexportadora. A historiografia
assinala que o modelo patriarcal é baseado numa visão de sociedade dividida em
senhores e escravos. Este modelo representa um núcleo econômico e todos os seus
membros são subordinados ao patriarca.
O modelo de família patriarcal foi tradicionalmente utilizado como parâmetro
através do tempo e tem como referência o modelo senhorial e os clãs parentais. Era
8
definido como uma família numerosa, em que seus membros, além de um núcleo
conjugal e seus filhos, também incluíam um grande número de criados, parentes,
aderentes, agregados e escravos, onde todos eram submetidos ao poder absoluto
do chefe do clã, que era ao mesmo tempo marido, pai, patriarca e senhor de
engenho.
Segundo a literatura o termo patriarcalismo designa a prática desse modelo
como forma de vida própria ao patriarca, seus familiares e seus agregados. A família
patriarcal configurava-se um modelo em que o homem representava o poder e o
autoritarismo.
A família burguesa no Brasil surgiu no período do século XIX com o advento
do capitalismo, o qual ocasionou a urbanização e a industrialização. Neste período
surgiram as máquinas industriais, tendo como consequência a diminuição da
produção manual, ocasionando profundas transformações e mudanças na estrutura
e no funcionamento das famílias.
Guerra (1993) retrata que a partir do século XX, a família é restaurada em
torno de sua função como unidade de consumo. A vida se torna privatizada, a
família extensa cede importância à nuclear e, dentro do casamento, os papéis
sexuais se tornam segregados. A mulher é objeto dessa transformação, cabendo-lhe
a tarefa de transmitir culturas aos filhos através da educação, como também
responsável pelos afazeres do lar e cuidar do cônjuge.
O homem tinha como papel utilizar de sua força do trabalho para obter a
subsistência familiar. Para Wagner (2005), tal configuração familiar começou a
abrigar, aos poucos, a afetividade entre seus membros e a preocupar-se mais com o
bem-estar das crianças.
Em nossa sociedade ainda se pode ver essa força simbólica do modelo
patriarcal e tradicional que marcaram a história da família brasileira, mesmo com o
processo de transformação a que foi submetido às famílias na história da
humanidade. Na atualidade percebe-se que existem famílias que conservam traços
e conceitos que marcaram as famílias anteriores. Estas estruturas perpassaram a
história da família e ainda evidenciam em seu contexto atual, influenciando a forma
de ser e de se pensá-las na contemporaneidade.
Mas, o que é pensar em família? Falar em família leva a uma reflexão de
naturalização que a família foi construída na percepção de parentesco e da divisão
de papéis de seus membros, sendo um grupo social concreto delimitado com sua
representação cultural construída.
No entanto, sabe-se que a família não é algo inerte na sociedade e modifica a
sua estrutura segundo os aspectos sociais, culturais e históricos. A família em seu
processo evolutivo se deparou com importantes impactos internos e mutações
externas que marcaram sua história. (SARTI, 2011).
Sarti (2011, p. 21) destaca que,
a família, além de sofrer importantes abalos internos tem sido alvo de
marcantes interferências externas. Estas dificultam sustentar a ideologia
que associa a família à ideia de natureza, ao evidenciarem que os
acontecimentos a ela ligados vão além de respostas biológica universais às
necessidades humanas, mas configuram diferentes respostas sociais e
culturais, disponíveis a homens e mulheres em contextos históricos
específicos.
Segundo Guerra (1993, p. 77),
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a família é também um grupo social composto de indivíduos diferenciados
por sexo e por idade, que se relacionam cotidianamente, gerando uma
complexa e dinâmica trama de emoções; ela não é uma soma de
indivíduos, mas um conjunto vivo, contraditório e cambiante de pessoas
com sua própria individualidade e personalidade.
Mioto (1997, p. 120) “considera que a família pode ser definida como um
núcleo de pessoas que convivem em determinado lugar, durante um lapso de tempo
mais ou menos longo e que se acham unidas (ou não) por laços consanguíneos”. A
família segundo essa autora “tem como tarefa primordial o cuidado e a proteção de
seus membros, e se encontra dialeticamente articulada com a estrutura social na
qual está inserida” (IDEM, IBIDEM). É importante pensar que este espaço privado
tem suas contradições, diferenças sociais, individualidade e autonomia de seus
membros que são reflexos de condições históricas e culturais da evolução da
família.
Good (1964), assinala que a família, então, é constituída de indivíduos, mas
ao mesmo tempo é parte integrante da trama social. Uma sociedade se organiza
através das relações sociais dos seus atores, indivíduos que se interagem através
de papeis sociais no qual assumem status sociais como pai, mãe, filho etc. Cada um
desses atores exerce comportamentos e relações sociais distintas em seu meio
social.
Mioto (1997) enfatiza que a família brasileira hoje apresenta mudanças
significativas em todos os seguimentos da população, mudanças essas decorrentes
do processo de modernização da sociedade na segunda metade do século XX. Tal
processo gerou um novo padrão demográfico na realidade brasileira. Esta autora
elenca algumas configurações da família dos anos 90 de acordo com o PNAD
(Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio-IBGE, 1994).
1Número de filhos reduzidos;
2Concentração da vida reprodutiva das mulheres nas idades mais
jovens;
3Aumento da concepção em idade precoce;
4Aumento da co-habitação e da união consensual. Este aspecto tem
como consequência o fato de a co-habitação não ser mais considerado
como sinal de pobreza;
5Predomínio das famílias nucleares (pai, mãe, filhos);
6Aumento
significativo
das
famílias
monoparentais,
com
predominância das mulheres chefes da casa;
7Aumento das famílias recompostas. Este fato é consequência do
aumento de separações e dos divórcios nos últimos anos;
8População proporcionalmente mais velha.
A família contemporânea está ancorada na privacidade. O número de
integrantes que compõe este modelo familiar foram limitados e seus espaços e
relações afetivas sofreram transformações e restrições. Para Freitas (2011), pensar
a família contemporânea significa ter como horizonte em que se vive, um mundo
cada vez mais globalizado. A autora ainda acrescenta que as transformações
demográficas constituem-se de um outro fator indispensável para pensar família
hoje.
A sociedade em seu processo de mutação ocasionou vários arranjos e
rearranjos nas entidades familiares. Se partido dos pressupostos de que a
sociedade está em constante mutação, ocasionada com o advento da globalização e
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o avanço tecnológico, compreende-se também o motivo pelo qual a família é reflexo
dessas mudanças.
Freitas (2011, p.26) assinala que,
a legislação sobre família mudou: o casamento não é mais o único
mecanismo de reconhecimento legal das relações familiares. Nossa
constituição prevê como famílias a comunidade formada por qualquer um
dos cônjuges e seus descendentes (artigo 226). O reconhecimento se dá
pela união formada pelo casamento, a união estável entre um homem e
uma mulher, incluindo ainda a possibilidade da família monoparental.
Hoje se tem as mais variadas formas e tipos de organização familiar. Hoje é
formada por casais sem filhos, monoparentais chefiadas por mulheres, famílias
extensas dividindo a mesma casa; outras são formadas por segundas uniões, nas
quais pelo menos um dos cônjuges pode ser proveniente de separação e divórcios.
Freitas (2011) acrescenta que o reconhecimento de casais composto por pessoas
do mesmo sexo traz outro elemento inovador na definição de famílias modernas.
Nesta análise percebe-se a multiplicidade da organização familiar
contemporânea. Diante dessas mudanças, o contexto familiar gera novas relações
de poder e inter-relações, com suas diversidades e dificuldades, a qual envolve seus
membros pai, mãe e filhos.
Na contemporaneidade ainda é permeada por um fator devastador que
envolve as famílias brasileiras: A violência contra a criança e adolescente, nas suas
mais variadas formas e casualidades. A violência sexual, as quais estão inseridas o
abuso sexual intrafamiliar e a exploração sexual são fenômenos que permeiam as
famílias brasileiras nas mais variadas classes sociais da atualidade. Este estudo não
abordou a exploração sexual, pois o foco de abordagem é o abuso sexual
intrafamiliar contra criança e o adolescente.
3 A VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇA E ADOLESCENTE E SUAS TIPIFICAÇÕES
A história nos aponta que a violência contra criança e adolescente é um
fenômeno complexo e de difícil enfrentamento. Segundo a literatura especializada é
uma forma de relação social, estando atada ao modo pelo qual os homens
produzem e reproduzem suas condições sociais de existência.
A literatura indica que violência é uma expressão que envolve padrões
sociais, modo de vida, comportamentos atuais de uma sociedade em um
determinado processo histórico e se expressa nas relações entre classes sociais,
nas relações interpessoais e nas relações intersubjetivas. A violência é a negação
dos valores universais presentes em uma sociedade, do direito à liberdade, da
igualdade e da vida (ADORNO, 1988 apud GUERRA, 2011, p. 31).
O objetivo deste trabalho foi adentrar nos conceitos e nas multifacetadas
formas de violência contra criança e adolescente, aprofundando sobre o abuso
sexual à criança e ao adolescente.
A criança e adolescente vítima de violência se encontram em situação de
risco pessoal e social, seja por transgressão ou omissão dos seus direitos básicos,
por aqueles que deveriam proteger e cuidar: a família, a sociedade e o Estado.
A violência doméstica presente em todas classes sociais é uma violência de
natureza interpessoal. A criança ou adolescente sente-se coagido ao poder do
adulto para satisfazer suas vontades num pacto de silêncio.
11
Guerra (2011, p.32) destaca que,
a violência doméstica contra criança e adolescente representa todo ato ou
omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra crianças e/ou
adolescentes que – sendo capaz de causar dano físico, sexual e/ou
psicológico à vítima – implica, de um lado uma transgressão de poder/dever
de proteção do adulto e, de outro, uma coisificação da infância, isto é, uma
negação do direito que crianças e adolescentes têm de ser tratadas como
sujeitos e pessoas peculiar de desenvolvimento.
Segundo Guerra (2011), a violência doméstica se divide em cinco tipos: a
física, psicológica, a negligência, a violência estrutural e a sexual.
A violência física segundo Gelles (1979 apud Azevedo 2011, p. 35),
é considerada como um ato executado com intenção, ou intenção
percebida, de causar dano físico a outra pessoa. O dano físico pode ir
desde a imposição de uma leve dor, passando por um tapa até o
assassinato. A motivação para este ato pode ir desde uma preocupação
com a segurança da criança (quando ela é espancada por ter ido para a
rua) até uma hostilidade tão intensa que a morte da criança é desejada.
Esta violência se manifesta de várias formas no ambiente privado ou público,
no qual a criança e o adolescente no seu cotidiano são objetos de agressões por
parte daqueles que deveriam cuidar e zelar do seu bem estar. Se expressa através
de tapas, empurrões, socos, mordidas, queimaduras, cortes, amarras, dentre outros.
Esta violência não só causa danos, mas também dor física.
A violência psicológica tem em sua ação o poder de causar danos (BRASIL,
2001, p. 20). Esta violência se expressa com atitudes e condutas que ameaçam ou
causam medo à criança e ao adolescente, sendo frustrações, ameaças verbais com
conteúdo violento e emocional, rejeição, preconizando a humilhação pública através
de apelidos depreciativos, negando à criança seu reconhecimento como sujeito de
direito. Azevedo (2011) designa a violência psicológica como tortura psicológica que
ocorre quando um adulto constantemente deprecia a criança, bloqueiando seus
esforços de auto aceitação, causando-lhe grande sofrimento mental. Ameaças de
abandono também podem tornar uma criança medrosa e ansiosa representando
formas de sofrimento psicológico.
Já a negligência se caracteriza pela omissão ao prover as necessidades
físicas e emocionais para o desenvolvimento de uma criança ou adolescente,
considerada como falhas de pais ou responsáveis no tocante à alimentação, no
vestir adequadamente e no bem estar dos mesmos.
Faleiros e Faleiros (2008, p. 33) consideram que,
a negligência é um tipo de relação entre adultos e crianças ou adolescentes
baseada na omissão, na rejeição, no descaso, na indiferença, no
descompromisso, no desinteresse, na negação da existência. Dados
estatísticos de serviços de proteção e assistência a crianças e
adolescentes, disque-denúncia e SOS vêm revelando que a negligência é
uma das formas de violência mais frequente.
A violência estrutural é reflexo da sociedade capitalista neoliberal, que produz
a desigualdade estrutural e o consumismo como ideologia, ocasionando
desemprego, miséria e opressão à maioria da população que está mais vulnerável a
este sistema opressor. Esta violência se relaciona e articula com outras violências
Segundo Minayo (1994, p. 8), entende-se como violência estrutural
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aquela que oferece um marco à violência do comportamento e se aplica
tanto às estruturas organizadas e institucionais da família como os sistemas
econômicos, culturais e políticos que conduzem à opressão de grupos,
classes, nações e indivíduos.
Por fim, a violência sexual contra criança e adolescente, foco deste estudo,
produz marcas profundas nas vidas e no cotidiano das vítimas. Para Azevedo e
Guerra (2011, p. 33)
a violência sexual se configura como todo ato ou jogo sexual, relação hetero
ou homossexual entre um ou mais adulto e uma criança ou adolescente,
tendo por finalidade estimular sexualmente esta criança ou adolescente ou
utilizá-los para obter uma estimulação sexual sobre sua pessoa ou de outra
pessoa.
A violência sexual contra criança e adolescente é um fenômeno complexo,
que envolve vários aspectos: Político, econômico, social, entre outros, nas relações
sociais e interpessoais e produz destruições nas vítimas, independentemente da
idade, etnia, cor, religião ou gênero.
De acordo com Faleiros (2000, p.17)
A violência sexual contra crianças e adolescentes sempre se manifestou em
todas as classes sociais de forma articulada ao nível de desenvolvimento
civilizatório da sociedade, relacionando-se com a concepção de sexualidade
humana, compreensão sobre as relações de gênero, posição da criança e o
papel das famílias no interior das estruturas sociais e familiares. Desta
forma, devemos entendê-la em seu contexto histórico, econômico, cultural e
ético.
A violência sexual se caracteriza como uma relação de poder que não faz
parte da natureza humana, mas é cultural e se desenvolve e dissemina nas relações
sociais, interpessoais e em todas as camadas sociais. É um tabu em nossa
sociedade, protegida pelo silêncio e laços familiares de tradições conservadoras.
Faleiros e Faleiros (2008, p. 29) definem como uma relação violenta por ser
desigual, estruturando-se num processo de dominação, através do qual o
dominador, utilizando-se de coação e agressões, faz do dominado um objeto para
seus “ganhos”. A relação violenta nega os direitos do dominado e desestrutura sua
identidade.
Nos últimos anos a violência sexual contra criança e adolescente tem
adquirido visibilidade e passou a ser discutida em diversos setores de nossa
sociedade. Também é considerada uma expressão que atinge várias camadas
sociais independente de culturas, raças, religião, gêneros e etnias, podendo
acontecer em diferentes lugares do mundo. Esta ação considerada como relação
social está configurada na maneira como o ser humano produz e reproduz suas
relações em sociedade.
Faleiros (2005, p.111) destaca:
Na manifestação da violência sexual estão implicadas tanto as dimensões
do poder intrafamiliar, do contexto social e cultural como a dimensão do (ab)
uso ou manifestação da sexualidade humana nessas relações. Expressão
da violência física está inserida na lógica da obediência, de obrigar o outro a
fazer aquilo que o mais forte determina. A violência expressa uma ameaça à
integridade do outro, uma negação do outro, uma imposição de si e de seu
poder ao outro.
13
A prática da violência sexual viola as regras sociais e os papéis familiares,
desrespeitando o desenvolvimento emocional, físico e social da vítima. A criança e
adolescente “vitimizado” pela violência sexual, sofre nas suas relações familiares ou
extra-familiares, nos mais diversos contextos e fases de suas vidas, como será
apresentado posteriormente.
4 O ABUSO SEXUAL CONTRA CRIANÇA E ADOLESCENTE – ASPECTOS
PECULIARES QUE ENVOLVEM ESTA PROBLEMÁTICA NA ATUALIDADE
O mundo globalizado e o avanço tecnológico trazem tendências na sociedade
atual – a produção de pessoas cada vez mais individualizadas, menos humanizadas,
vivendo uma política ideológica consumista, neoliberal, onde os valores e a
dignidade humana são violentados, atingindo e trazendo prejuízos a crianças e
adolescentes, na sua condição peculiar como pessoas em desenvolvimento.
Este capítulo objetivou examinar o abuso sexual contra criança e adolescente
no que tange sua definição e particularidade, sua natureza e as taxas de incidências.
Para este estudo utilizou-se a definição de criança e adolescente nos termos da Lei
8.069/90 – Estatuto da Criança e adolescente (ECA) art. 2º – que considera criança
a pessoa até doze anos de idade incompletos e adolescente aquela entre doze e
dezoito anos de idade.
O abuso sexual contra criança e adolescente, violência que está presente na
atualidade nos mais diversos contextos familiares, tem sido considerado um
problema de saúde pública em vários países, inclusive no Brasil. As vítimas do
abuso sexual são crianças e adolescentes de ambos os sexos, sendo um número
maior de casos registrados com meninas. Segundo Sanderson (2005), o abuso
sexual é de natureza social, tendo em vista que é influenciado de maneira intensa
pela cultura e pelo tempo histórico. Esse autor define o abuso sexual como
O envolvimento de criança e adolescentes em atividades sexuais com um
adulto ou com qualquer pessoa um pouco mais velha ou maior, em que haja
uma diferença de idade, de tamanho ou de poder, em que a criança é usada
como objeto sexual para a gratificação das necessidades ou dos desejos,
para a qual ela é incapaz de dar um consentimento consciente por causa do
desequilíbrio no poder, ou de qualquer incapacidade mental ou física.
(SANDERSON 2005, p.17).
O autor destaca nesta definição elementos cruciais como: Diferença de idade
entre o agressor e a vítima; a desigualdade na relação; a impossibilidade da criança
se defender; o desejo sexual que é só do adulto e as relações violentas no âmbito
social e familiar, que são elementos que estampam a situação da violência sexual
contra criança e adolescente, tornando-os como objetos “coisificados” de prazer
sexual. Para Sanderson (2005, p.17) incorporado a esta definição estão todos os
tipos de encontro sexuais e comportamentos que abrangem
aliciamento sexual, linguagem ou gestos sexualmente sugestivos, uso de
pornografia, voyeuarismo, exibicionismo, carícias, masturbações e
penetração com dedos ou pênis. Ela inclui quaisquer atos sexuais impostos
à criança ou ao adolescente por qualquer pessoa dentro do âmbito da
família, ou fora dela, que abuse de sua posição de poder e confiança.
14
A literatura aponta que o abuso sexual em crianças tem um imenso impacto
tanto a curto como em longo prazo, pois não causam apenas danos no corpo, mas
também na mente. Os estudos apontam que os impactos nas crianças e
adolescentes ocasionados pelo abuso sexual, são influenciados pela idade na época
do abuso, a duração e a frequência do abuso sexual, tipos de atos sexuais, o uso da
força ou da violência, o relacionamento da criança com o abusador, a idade e o sexo
do abusador e os efeitos da revelação.
As modalidades quais se expressam o abuso sexual contra criança e
adolescente são: intrafamiliar, extrafamiliar e o abuso sexual em instituições de
atendimento à criança e ao adolescente.
A violência do abuso sexual contra criança e adolescente pode ser
intrafamiliar, quando ocorre no contexto privado, tendo caráter social por violar os
direitos humanos básicos e a dignidade da criança e adolescente como sujeito de
direito de decidir por sua sexualidade que ainda está em desenvolvimento.
A diferença entre o abuso intrafamiliar e o extrafamiliar está na relação social.
O primeiro ocorre com laços de parentescos (alguém da família) e o segundo se
passa com vizinhos, amigos da família, educadores, responsáveis por lazer, etc.
Ambos têm como características alguém que a criança conhece e confia.
O abuso sexual em instituições de atendimento à criança e ao adolescente
ocorre
dentro das instituições governamentais e não governamentais encarregadas
de prover, proteger, defender, cuidar deles e lhes aplicar medidas sócioeducativas e que dispensem atendimento psicossocial, educacional, saúde
e outros espaços de socialização. (GUIA ESCOLAR, p. 37).
O abuso sexual intrafamiliar é considerado como incestuoso quando ocorre o
abuso de pai ou mãe contra filho, entre irmãos e outros familiares com laços de
parentesco que possuem a interdição do matrimônio. Como destaca Faleiros (2011),
em muitos casos, as pessoas que praticam o incesto mesmo sabendo de sua
interdição, possuem uma visão peculiar a respeito da questão. Cohen (1993) define
o incesto como um abuso sexual intrafamiliar com ou sem violência explícita,
caracterizado pela estimulação sexual intencional por parte de algum dos membros
do grupo que possui um vínculo parental pelo qual lhe é proibido o matrimônio.
Portanto, as características do incesto são: o abuso sexual e o vínculo familiar.
A literatura registra que a maior recorrência da prática do abuso sexual,
acontece entre pai e filha, padrasto e enteada ou irmão e irmã. Geralmente o autor
do abuso são pessoas que a criança ama e/ou confia. O abusador quase sempre
possui uma relação de parentesco com a vítima e tem certo poder sobre ela, tanto
do ponto de vista hierárquico e econômico (pai, mãe, padrasto), como do ponto de
vista afetivo (avós, tios, primos e irmãos).
O abuso sexual contra criança e adolescente é de natureza complexa, pois
implica na violação dos direitos e tabus sociais. É um assunto perturbador, que
causa desconforto em todos os membros familiares. Estudos revelam que em virtude
da preponderância do caráter intrafamiliar, bem como pelo domínio e poder de
coação do agressor sobre as vítimas, os casos que envolvem tais práticas, são
pouco denunciados. Cohen (1993) acredita que o silêncio frente à sociedade ocorra
por vários motivos: temor pela reação da própria família; para manter a aparência de
“sagrada família”; por conivência entre as pessoas que sabem do fato e não o
denunciam; por uma ideia de que nada pode ser feito para resolvê-lo; por ser um
assunto de tabu; por não se saber o que fazer.
15
Hamon (1997, p. 178) pontua que o segredo da relação incestuosa encerra
várias peculiaridades:
a)
É um segredo que implica a violação da lei num triplo nível simbólico,
moral e social (jurídico);
b)
É um segredo forçosamente partilhado, pois uma revelação sexual
implica por definição duas pessoas;
c)
É um segredo partilhado, mas impingido por um dos protagonistas, a
saber, o pai, com relações sexuais impostas pela violência ou não.
A criança ou adolescente vítima do abuso sexual se sente coagida, regada
pelo medo e as ameaças do abusador, culpando-a das possíveis consequências que
a família tende a sofrer com a revelação. Estudos apontam que o abuso sexual pode
produzir vários tipos de comportamento na vítima abusada, que carrega consigo a
culpa por ter participado de experiências abusivas e medo das consequências da
revelação dentro da família, temendo o castigo, o descrédito, mantendo a omissão
do abuso de forma consciente.
Sanderson (2005, p. 237), salienta o poder que o abusador tem sobre a
criança para silenciá-la: “mesmo conseguindo o silêncio por meio de ameaças de
violência e/ou de morte, ou envolvendo a criança em atividades criminosas, o mais
comum é que esse silêncio seja alcançado por meio da manipulação da realidade e
de suas emoções”.
Outras situações para manter o segredo do abuso sexual no seio da família
implicam na relação da vítima com abusador que caracteriza por vínculo afetivo e
um forte apego pelo abusador, que é uma pessoa da família que ama e confia. Estes
fatores possibilitam a não revelação e o silêncio levando estas vítimas do abuso
sexual intrafamiliar a negarem ou omitirem o sofrimento vivenciado.
As crianças e adolescentes em situação de abuso sexual se deparam com
várias mudanças e prejuízos em suas vidas. A revelação da violência sexual muda
às condições de sobrevivência, a relação social. A condição financeira se altera
quando o agressor é o provedor (pai), pois é submetido ao sistema de justiça e
afastado do grupo familiar. A literatura aponta que essa situação é um paradoxo,
pois após a denúncia e o afastamento da pessoa que se constituía um perigo para a
segurança da criança, a família pode ampliar uma situação de vulnerabilidade.
Segundo Faleiros e Faleiros (2001), as famílias as quais perpetram o abuso
sexual assumem posição de negação e silêncio, mantidos por familiares, amigos,
vizinhos, comunidades, profissionais e outros, que a encobertam, desqualificando
revelações verbais e não verbais das vítimas, negando evidências e sinais, em
nome de fidelidades, interesses de diversas ordens, além de medo, sigilos
profissionais e de justiça.
O abuso sexual é permeado de efeitos e manipulações, produzindo várias
consequências, pois envolve todos os membros familiares. Estudos mostram que a
criança e o adolescente vítima do abuso sexual tem dificuldades em seu cotidiano
de se relacionar com as pessoas, comportamento sexual inadequado com
brinquedos e objetos, são isoladas e retraídas, são silenciosas e cheias de
segredos, tem mudanças de personalidades, apresenta sinas físicos, como dor e
feridas sem explicação nos genitais, vergonha, alto nível de ansiedade, tristeza
profunda, agressividade, instabilidade emocional, confusão de sentimento em
relação à figura agressora (medo e ódio), regressão no desenvolvimento escolar,
envolvimento com drogas e dependência do álcool, culpa, medo, constrangimento,
16
afastamento do convívio social, raiva, hostilidade e falta de poder, etc.
(SANDERSON, 2005).
Consideram-se fatores de riscos em situação de abuso sexual
- Famílias baseadas numa distribuição desigual de autoridade e poder,
conforme papéis de gênero, sociais ou sexuais, idade, etc., atribuídos a
seus membros.
- Famílias cujas relações são centradas em papéis e funções rigidamente
definidos
- famílias em que não há nenhuma diferenciação de papéis, levando ao
apagamento de limites entre seus membros.
- famílias com nível de tensão permanente, que se manifesta através da
dificuldade de diálogo e descontrole da agressividade.
- famílias com estrutura de funcionamento fechada, onde não há abertura
para contatos externos, levando a padrões repetitivos de conduta.
- famílias que se encontram em situação de crise, perdas (separação do
casal, desemprego, morte, migração e outros).
- baixo nível de desenvolvimento da autonomia dos membros da família
- presença de um modelo familiar violento na história de origem das
pessoas envolvidas (maus-tratos, abuso na infância e abandono).
- maior incidência de abuso de drogas
- história de antecedentes criminais ou uso de armas.
- comprometimento psicológico/psiquiátrico dos indivíduos
- dependência econômica/emocional e baixa autoestima da parte de alguns
de seus membros, levando à impotência e/ou fracasso em lidar com a
situação de violência. (BRASIL, 2001, p. 23).
5 A SOCIEDADE E O ESTADO NO PROCESSO DE MOBILIZAÇÃO E
ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇA E
ADOLESCENTE
O objetivo desse capítulo foi identificar a mobilização da sociedade e do
Estado na implementação dos direitos da criança e do adolescente no Brasil no que
confere ao enfrentamento e combate à violência sexual contra criança e
adolescente.
A literatura mostra que para a afirmação do Direito do Menor dois episódios
internacionais foram fundamentais: O Congresso Internacional de Menores, em
Paris em 29 de junho a 01 de julho de 1911 e a Declaração de Gênova de Direitos
da Criança, que foi adotada pela Liga das Nações em 1924, constituindo-se o
primeiro instrumento internacional que reconhecia o Direito da Criança.
No Brasil a Lei 4.242 de 05 de janeiro de 1921 em seu art. 3º, autorizava o
governo a organizar o “serviço de assistência infância abandonada e delinquente”. O
Decreto nº 17.943-A, de 12 de outubro de 1927 estabelecia o primeiro Código de
Menores do Brasil, conhecido como código de Mello Mattos, que consolidou as leis
de assistência e proteção aos menores. Instrumento de proteção e vigilância da
infância e adolescência, vítima da omissão e transgressão da família, em seus
direitos básicos. A visão que se tinha do Menor se concebia em abandonado ou
delinquência, objeto de vigilância da autoridade pública, competência do juiz.
Estudos indicam que em 1943 foi formada uma comissão revisora do código de
menores, criando o Departamento Nacional da Criança. A intenção era criar um
Código de Menores com caráter social. A década de 1940 foi marcada pelo
processo de macha pelos Direitos Humanos, destacando-se em 1948 a Declaração
dos Direitos do Homem – ONU. Em 1958 a ONU cria a Declaração dos Direitos da
17
Criança, ratificada pelo Brasil, que constituiu um marco fundamental para o
ordenamento jurídico internacional relativo aos direitos da criança, evoluiu na
década de 1980 para a formulação da Doutrina da Proteção Integral a criança e
adolescente.
A Lei 6.697 de 10 de outubro de 1979 estabelece o novo Código de Menores,
consagrando a Doutrina da Situação Irregular, tendo como caráter tutelar da
legislação a ideia de criminalização da pobreza. Este código de 1979 se destinava
as crianças e adolescentes considerados em situação irregular, era um instrumento
de controle social da infância e da adolescência vítima da omissão e transgressão
da família, da sociedade e do Estado em seus direitos básicos.
Essa doutrina não fazia distinção entre “menor” abandonado e delinquente,
pois na condição de “menores” em situação irregular enquadravam-se tanto os
infratores quanto os abandonados. E ocorria nessa época violações de direitos a
esse público, a criminalização da pobreza e a judicialização da questão social na
ótica do Direito do Menor.
Os avanços da abertura política no Brasil nos anos de 1980 foram marcados
com vários movimentos de diferentes seguimentos para denunciar as violações de
direitos que eram cometidas contra as crianças e adolescentes. Este avanço político
através de movimento da sociedade civil questionava o tratamento dado às crianças
em situação irregular e as frequentes internações determinadas pelos Juizados de
menores. Estas denúncias eram a forma de dar visibilidade à problemática que
crianças pobres não tinham sequer direito à infância.
O período que antecedeu a Constituição Federação de 1988 (CF/88),
denominada “Constituição Cidadã”, promulgada em 05 de outubro de 1988, foi muito
importante e determinante no tocante as mudanças de paradigmas na área da
garantia de direitos das crianças e adolescentes. Esta constituição introduziu em seu
texto à Doutrina de Proteção Integral dos direitos da criança e do adolescente com
absoluta prioridade.
Estudos revelam que o Brasil foi o primeiro país a adequar sua legislação com
a Doutrina de Proteção Integral, preconizada pela ONU através da Convenção
Internacional sobre os Direitos da Criança. A Constituição Federal de 1988 em seu
artigo 227 preconiza a importância ao enfrentamento a toda forma de violência
contra criança e adolescente no qual estabelece:
Art. 227 – É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança
e adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.
O Estatuto da Criança e Adolescente (Lei nº 8.069 de 13/07/1990) é um
instrumento que materializou e regulamentou a Doutrina de Proteção Integral. Um
dos pontos fundamentais deste Estatuto é que ele rompe com os paradigmas do
Código de Menores de 1979 da Doutrina de Situação Irregular, criando condições
dignas e liberdade de expressão e de direito para as crianças e adolescentes. O seu
artigo 3º preconiza o Direito da Proteção Integral a criança e adolescente e a
efetivação dos direitos fundamentais que passam a ser de toda a infância e
adolescência e não apenas dos que se encontram em situação irregular.
Na década de 1990 a violência sexual começou a ter expressão política,
sendo uma luta nacional e internacional na busca e efetivação dos direitos humanos
18
conforme preconizados na Constituição Federal Brasileira de 1998. Santos e Ippolito
(2004, p. 11) pontuam:
Foi nessa mesma década que se assegurou juridicamente à infância
brasileira a condição de sujeito de direito, ao mesmo tempo em que se
desvelou a dificuldade de garantir um ambiente justo e protetor para um
desenvolvimento integral e integrado. No contexto histórico-social de
violência endêmica, no qual se insere a violência sexual, prevalece uma
cultura de dominação e de discriminação social, econômica, de gênero e de
raça. O novo paradigma de uma sociedade de direito rompe com padrões
antigos, exige a construção de uma nova cultura de proteção e respeito aos
direitos humanos da criança e do adolescente, implica tecer relações de
trocas afetivas e de aprendizagem, coibir abusos, enfrentar ameaças,
proteger os vulneráveis e as testemunhas e responsabilizar os agressores.
No início do ano 1991 o Brasil aprova a criação do Conselho Nacional dos
Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), que representou significativos
avanços para o enfrentamento da violência sexual contra criança e adolescente. Em
2000 cria-se o Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-juvenil.
Este plano foi construído através de muitas lutas e um amplo processo de
mobilização social. O encontro nacional realizado em Natal-RN, em 2000, foi
fundamental para a elaboração desse Plano Nacional de Enfrentamento da Violência
Infanto-Juvenil. Com a criação do Plano Nacional o Brasil vivencia grandes avanços
importantes no reconhecimento e enfrentamento da violência sexual contra criança e
adolescente.
Segundo Santos (2004, p. 99),
o Plano foi apresentado, discutido, e aprovado na Assembleia Ordinária do
Conselho Nacional da Criança e do Adolescente – CONANDA, em 12 de
julho de 2000. A partir desse momento, tornaram-se diretrizes de
enfrentamento da violência sexual contra criança e adolescente no âmbito
das políticas públicas e sociais.
A criação do Plano Nacional proporcionou ao Brasil grandes e importantes
avanços no reconhecimento e enfrentamento da violência sexual contra criança e
adolescente. O plano serviu como referência para organizações não
governamentais, especialmente no âmbito da mobilização social e do monitoramento
de políticas na perspectiva de formulação e efetiva implementação de ações nesta
área por parte das esferas estatais. (CONANDA, 2013).
O Plano Nacional tem como embasamento fundamental o Estatuto da Criança
e do Adolescente e também como diretriz os princípios da proteção integral da
criança e adolescente, da sua condição de sujeito de direito e de pessoa em
desenvolvimento como também a prioridade absoluta da criança e adolescente.
Estudos nos mostram que o Plano Nacional em 2000, tornou-se referência e
ofereceu uma síntese metodológica para a estruturação de políticas, programas e
serviços para o enfrentamento à violência sexual, a partir de seis eixos estratégicos:
Análise da Situação, Mobilização e Articulação, Defesa e Responsabilização,
Atendimento, Prevenção, Protagonismo Infanto-juvenil.
Em 2008, o Brasil sediou o III Congresso Mundial de Enfrentamento da
Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. Este Congresso possibilitou várias
discussões que alertaram sobre a necessidade de atualização e revisão do Plano
Nacional, principalmente no que diz respeito ao aparecimento de novas formas de
19
violência sexual. Em 2010, o Brasil produziu o Plano Decenal de Direitos Humanos
de Criança e Adolescente, no âmbito do Conanda.
O Plano Nacional em seu processo de revisão teve como coordenadores do
Comitê Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e
Adolescentes, a Coordenação do Programa Nacional de Enfrentamento da Violência
Sexual contra Crianças e Adolescentes da Secretaria Nacional de Promoção dos
Direitos da Criança e do Adolescente, Secretaria de Direitos Humanos/PR. Nesta
perspectiva, houve um amplo e detalhado processo de mobilização e debates devido
às várias diversidades das regiões brasileiras.
O Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e
Adolescente, segundo o CONANDA, tem interface direta com as diretrizes do Plano
Decenal dos Direitos de Criança e Adolescentes. Destacando-se as seguintes
diretrizes: Eixo 1 - Promoção dos Direitos de criança e Adolescente; Eixo 2 Proteção e Defesa dos Direitos; Eixo 3 – Protagonismo e Participação de Criança e
Adolescente; Eixo 4 – Gestão da Política Nacional dos Direitos Humanos de Criança
e Adolescentes. O Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Contra
Criança e Adolescente tornou-se referência e ofereceu uma síntese metodológica
para a estruturação de políticas, programas e serviços para o enfrentamento à
violência sexual, estabelecendo seis eixos:
Análise da Situação – conhecer o fenômeno da violência sexual contra
crianças e adolescentes por meio de diagnósticos, levantamento de dados,
pesquisas.
Mobilização e Articulação – fortalecer as articulações nacionais, regionais
e locais de combate e pela eliminação da violência sexual; envolve redes,
fóruns, comissões, conselhos e etc.
Defesa e Responsabilização – atualizar a legislação sobre crimes sexuais,
combater a impunidade, disponibilizar serviços de notificação e
responsabilização qualificados.
Atendimento - garantir o atendimento especializado, e em rede, às crianças
e aos adolescentes em situação de violência sexual e às suas famílias,
realizado por profissionais especializados e capacitados.
Prevenção - assegurar ações preventivas contra a violência sexual. Ações
de educação, sensibilização e de autodefesa.
Protagonismo Infanto-juvenil – promover a participação ativa de crianças
e adolescentes pela defesa de seus direitos e na execução de políticas de
proteção de seus direitos. (COMITÊ NACIONAL DE ENFRENTAMENTO À
VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES et al.,
2013, p. 8-9).
A política de enfrentamento e combate à violência no Brasil obteve alguns
avanços com a mobilização e pressão de alguns seguimentos da sociedade civil.
Mas ainda são grandes os desafios para profissionais do Estado e da Sociedade em
geral para combater a prática da violência sexual contra criança e adolescente.
Embora os direitos humanos fundamentais das crianças e dos adolescentes
estejam definidos em declarações universais, acordos internacionais e legislações
nacionais, no Brasil, verifica-se que esses direitos estão longe de serem garantidos
(FALEIROS E FALEIROS, 2001).
Mesmo com as políticas de enfrentamento vigentes percebe-se dificuldades
na proteção e prevenção da violência sexual praticada contra crianças e
adolescentes. Entre elas aponta-se a contribuição de Faleiros e Faleiros (2001), que
aborda que o combate e o desmonte da violência sexual implicam a
20
responsabilização legal dos abusadores, a denúncia, a instauração do devido
processo e julgamento.
Para o autor a legislação vigente é limitada e desatualizada quanto aos
crimes de violência sexual contra criança e adolescente, como também há uma
lentidão na justiça. A sociedade age com tolerância e a impunidade dificulta a
responsabilização dos culpados e isso contribui para a violação dos direitos da
criança e adolescente.
Quanto ao Direito Penal, em maio de 2014, o Brasil deu mais um passo
decisivo para o enfrentamento do Abuso sexual e exploração sexual contra criança e
adolescente, quando caracteriza como crime hediondo toda forma de abuso sexual e
exploração sexual, segundo Borges (2014, p. 1).
Faleiros e Faleiros (2001) sinalizam que o abuso sexual perpetrado contra
criança e adolescente é uma transgressão da lei, uma violação de direitos e da
cidadania, um crime, pelo qual o autor deve ser julgado e responder socialmente
perante a justiça.
As políticas de enfrentamento estão alcançando marco legal para a
condenação pelo crime do abuso sexual e exploração cometidos pelo agressor,
caracterizando-se como hediondo. Segundo a criminologia estes são entendidos
como crimes mais graves, mais revoltantes, que causam maior aversão à sociedade
e não comportam favorecimento como fiança, graça e anistia. Esse entendimento é
importante na luta contra as atrocidades cometidas contra as crianças e
adolescentes.
A sociedade e o Estado tem como responsabilidade denunciar esta prática
que destrói vidas e famílias, combatendo a violência sexual, no sentido que, no
momento que houver a situação de suspeita, acionar uma das instituições que
atuam na investigação, diagnóstico, enfrentamento e atendimento à vítima e suas
famílias: Conselhos Tutelares, Delegacia de Proteção à Criança e Adolescente
(DPCA), Promotoria de Justiça de defesa da Infância e da Juventude (PJDIJ), 1ª
Vara da Infância e da Juventude (1ªVIJ) , Disque 100 ou 156.
6 O ABUSO SEXUAL CONTRA CRIANÇA E ADOLESCENTE A PARTIR DOS
DADOS DO CEREVS – 1ª VIJ-TJDFT
A Vara da Infância e da Juventude, com jurisdição em todo o Distrito Federal,
tem como instrumento norteador de seu trabalho o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre a
proteção integral da criança e do adolescente. Por meio de suas equipes
administrativa, jurídica e técnica, a Vara da Infância e Juventude/DF, promove a
resolução de conflitos e a regularização de situações que envolvam os interesses
infanto-juvenis, buscando também parcerias com entidades diversas, a fim de
possibilitar o atendimento mais completo e humano de seus usuários.
Dentre os aparatos que compõem a Vara da Infância e Juventude, destaca-se
o Centro de Referência para Proteção Integral de Crianças e Adolescentes em
Situação de Violência Sexual – CEREVS, cujos dados estatísticos de atendimento
serviram para subsidiar esta pesquisa.
O CEREVS tem como objetivo principal realizar estudos psicossociais com as
famílias cujas crianças ou adolescentes encontram-se em situação de risco e/ou
tiveram o direito ao desenvolvimento sexual saudável, à liberdade e à dignidade
violados por terem sido vítimas de abuso sexual. Os estudos são feitos por meio de
21
atendimentos que objetivam ampliar a compreensão de cada caso em particular,
promover pequenas intervenções para mudanças no ciclo da violência e, ao final,
oferecer subsídios ao Magistrado para uma intervenção que vise à proteção integral
das crianças e adolescentes vítimas.
O CEREVS dispõe-se a promover a articulação das instituições que compõem
a rede de atenção à criança e ao adolescente, governamentais ou da sociedade
civil, realizando um trabalho de parceria para a vinculação das famílias aos serviços
que possam garantir que crianças, adolescentes e familiares que tenham seus
direitos violados possam ser resgatados bem como favorecer as condições de
proteção das famílias. O CEREVS não atende demanda espontânea, só faz estudos
e atendimentos mediante determinação judicial.
A fim de conseguir alcançar o objetivo deste estudo, foi enviado um ofício
para o Juiz da 1ª VIJ, solicitando a autorização para acesso aos dados estatísticos
elaborados pelo CEREVS. Após a autorização judicial, realizou-se um encontro com
a assistente social do CEREVS, ocasião em que foi apresentado o objetivo da
pesquisa, e posteriormente, fornecidos os dados estatísticos que fundamentam este
estudo.
A pesquisa realizada foi quali-quantitativa feita por meio de análises de dados
e documentos. O estudo aponta que a violência sexual se apresenta numa dinâmica
complexa, pois envolvem laços consanguíneos, aspectos psicológicos, sociais e
legais.
Observou-se que no ano de 2009 foram realizados 123 atendimentos pelo
CEREVS e no ano de 2011, 46 atendimentos. O perfil dos casos estudados e
apresentados verificou-se que em relação ao sexo da vítima:
Tabela 1 - Gênero da Vítima 2009.
Ano de 2009
Masculino
Ano de 2009
Feminino
TOTAL
FREQUÊNCIA
35
138
173
%
20%
80%
100%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em
Violência Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2009).
Tabela 2 - Gênero da Vítima 2011.
Ano de 2011
Masculino
Ano de 2011
Feminino
TOTAL
FREQUENCIA
7
39
46
%
15%
85%
100%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em
Violência Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2011).
Os dados de atendimentos do CEREVS, tanto em 2009 quanto em 2011,
demonstram que a maioria das vítimas de abuso sexual são do sexo feminino. As
tabelas abaixo apresentam natureza da violência.
Tabela 3 - Natureza da Violência – 2009.
Extrafamiliar
Intrafamiliar
Exploração Sex.
Comercial
TOTAL
22
42
130
1
173
24%
75%
1%
100%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em
Violência Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2009).
Tabela 4 - Natureza da Violência – 2011.
Extrafamiliar
6
13%
Exploração Sex.
Comercial
0
0%
Intrafamiliar
40
87%
TOTAL
46
100%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em
Violência Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2011).
Estes dados demonstram que a maior ocorrência do abuso sexual é na
modalidade intrafamiliar. A literatura aponta que o abuso sexual intrafamiliar ocorre
em maior amplitude. Nesta modalidade de abuso a vítima possui grau de confiança
e afinidade com o abusador, pois ele ocorre nas relações com laços consanguíneos,
afetivos e de confiança (pai, irmão, padrasto, entre outros) tendo caráter social por
violar os direitos humanos básicos e a dignidade da criança e adolescente.
Em relação as consequências da violência sexual para a vítima, os dados
apontados pelo CEREVES apontam:
Tabela 5 - Consequências da Violência Sexual – 2009.
Não foram
observadas
Sem
Interaciona Desenvolviment
Consequência
informaçã
l
o Sexual
s
o
TOTA
L
Físic
a
Emociona
l
29
135
46
6
16
2
234
12%
58%
20%
3%
7%
1%
100%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em Violência
Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2009).
Física
Tabela 6 - Consequências da Violência Sexual – 2009.
Não foram
Desenvolvimento
observadas
Emocional
Interacional
Sexual
Consequências
TOTAL
8
41
18
11
5
83
10%
49%
22%
13%
6%
100%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em
Violência Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2011).
As análises dos dados de 2009 e 2011 demonstram a prevalência das
consequências decorrentes da violência sexual para as vítimas é de ordem
emocional sexual. Verificou-se também que ocorrem outras consequências para as
vítimas de abuso sexual, tais como: dificuldade de se relacionar socialmente
(interacional) e consequências físicas e no desenvolvimento sexual. Em uma
porcentagem mínima das vítimas de abuso sexual não foram observadas
consequências pela equipe do CEREVS.
23
Concernente ao item outras violências associadas à violência sexual, segue
tabelas:
Tabela 7 - Outras violências associadas à violência sexual – 2009.
Física
61
23%
Psicológica
88
33%
Negligência
40
15%
Institucional
7
3%
Socioeconômica
25
9%
Sem Viol.
Associada
39
15%
Sem
informação
4
2%
TOTAL
264
100%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em
Violência Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2009).
Tabela 8 - Outras violências associadas à violência sexual – 2011.
Física
14
17%
Socioeconômica
10
12%
Psicológica
35
42%
Sem Viol.
Associada
8
10%
Negligência
12
14%
Institucional
4
5%
TOTAL
83
100%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em
Violência Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2011).
O estudo mostra a presença de outras violências associadas à violência
sexual: A psicológica que se apresenta em primeiro lugar, isso evidencia o que foi
explicitado na literatura especializada; o medo, a vergonha, a ansiedade, a falta de
poder, raiva, hostilidade, impotência, agressividade e a violência física vem segundo
lugar. Também foram observadas a ocorrência de negligência, violência
socioeconômica e violência institucional.
Um número minoritário de vítimas de abuso sexual não tiveram outras
violências associadas, sendo 15% das vítimas em 2009 e 10% em 2011. Os dados
demonstram então, que a maior parte dos abusos sexuais ocorridos são
acompanhados por outras formas de violência.
Sobre a recorrência do abuso sexual, apresentaram-se os dados abaixo:
Tabela 9 – Recorrência do Abuso Sexual, dados de 2009.
Episódio
único
51
29%
Episódio Eventual (2 a 3
vezes)
22
12%
Episódio
recorrente
(mais de
três vezes)
100
57%
TOTAL
24
100%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em Violência
Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2009).
24
Tabela 10 – Recorrência do Abuso Sexual, dados de 2011.
Episódio
único
Episódio Eventual
(2 a 3 vezes)
Episódio recorrente
(mais de três vezes)
TOTAL
13
8
25
46
28%
17%
54%
100%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em Violência
Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2011).
Os dados demonstram a dificuldade de se romper com o abuso sexual, sendo
que a maior parte das vítimas estão inseridas na categoria de episódio recorrentes,
ou seja, foram abusadas sexualmente por mais de três vezes. Sobre o local em que
foi perpetrada a violência sexual tem-se a prevalência da residência da vítima,
conforme as tabelas a seguir:
Tabela 11 - Local em que foi perpetrada a violência sexual, dados de 2009.
Res da vítima
Res de outros
familiares
Res do Autor
Local Público
82
40
20
10
47%
23%
12%
Sem
Informação
4
2%
6%
Abrigo
6
3%
Escola
7
4%
Outros Locais
4
2%
TOTAL
173
100%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em Violência
Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2009).
Tabela 12 - Local em que foi perpetrada a violência sexual, dados de 2011.
Res da
vítima
Res de outros
familiares
Res do
Autor
Local
Público
Abrigo
TOTAL
30
6
11
1
1
49
61%
12%
22%
2%
2%
100%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em Violência
Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2011).
Os números apontam que as maior parte dos abusos sexuais ocorrem no lar
da criança. A literatura especializada aponta que a violência sexual no contexto
familiar ocorre com um número maior de casos. Tal constatação sugere a
necessidade de se desconstruir o mito de que a família é somente um espaço de
aconchego, de amor e de proteção. E revela que o seio familiar pode ser um espaço
de risco onde acontece em grande escala a violência sexual.
Em relação ao vínculo do autor da violência sexual com a criança e
adolescente, segue os dados abaixo:
Tabela 13 - Vínculo do Autor da Violência Sexual com a Criança e/ou Adolescente, dados de 2009.
25
Irmão
Pai
Padrastr
o
39
24,07
%
30
18,52
%
Primo
Tio
Mã
e
Avó
s
Outros
familiar
es
Conhecid
os e
amigos
família
5
3
8
0
4
5
21
3,09
%
1,85
%
4,94
%
0
%
8,7
%
3,09%
12,96%
Sem
Vínculo
18
11,11
%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em Violência
Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2009).
Tabela 14 - Vínculo do Autor da Violência Sexual com a Criança e/ou Adolescente, dados de 2011.
Outros
Conhecidos
Sem
Padra Irmão Primo
Tio
Mãe
Avó
familiar
e amigos
Víncul
Pai
stro
s
es
família
o
10
11
1
7
3
1
4
4
3
2
21,74
23,91
2,17%
15,22
6,52
2,17% 8,7%
%
%
%
%
8,7%
3,65%
4,35%
(Fonte: 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF - 1ª VIJ/DF Centro de Referência em Violência
Sexual – CEREVS. Dados Consolidados - Ano 2011).
Em 2009, sobre o vínculo com o autor da violência sexual com a criança e
adolescente, verificou-se que o pai apresentou número maior como autor da
violência sexual, sendo o padrasto o segundo maior entre os abusadores. Em 2011,
verificou-se que o padrasto apresentou número maior como autor da violência, vindo
em seguida o pai como segundo autor da violência.
Os dados demonstram a prevalência da violência sexual realizada por
pessoas com vínculo de parentesco com a criança e adolescente, o que coaduna
com a literatura estudada. Outro fator importante que os estudos apontam e foram
implicados na pesquisa é que a residência se apresenta como o primeiro lugar que
mais ocorreu a violência sexual, e segundo a residência do autor e em terceiro a
residência de outros familiares.
Os dados de 2009 também apontam a porcentagem de abusos sexuais que
foram cometidos pelo namorado da mãe, 2, 47% (representando 4 casos) do total de
atendimentos e também pelo namorado da criança e do adolescente, 11, 73%
(representando 19 casos), categorias que não aparecem nos dados de 2011.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O abuso sexual é fenômeno social e de saúde perpetrado contra criança e
adolescente independente de classe, de etnia,cultura e religião e apresenta nas
mais variadas formas de violências, causando danos devastadores a este público
infanto-juvenil.
A partir dos dados estatísticos de 2009 e 2011, elaborados pela 1ª Vara da
Infância e Juventude do Distrito Federal- CEREVS verificou-se que a violência
sexual, analisada os dados estão em consonância com a literatura especializada. A
maioria dos estudos indica que o abuso sexual a crianças e adolescentes vem
associado a outras violências, ocasionando impacto de várias maneiras e muitas
vezes prejudiciais ao desenvolvimento físico, emocional e mental, sendo este
impacto ainda maior quando o relacionamento é próximo a criança ou adolescente
26
que tenha vínculo consanguíneo ou não (pai, Irmão, padrasto), quebrando os laços
afetivos ou não, transformando em ódio/amor ou repúdio nesta relação.
A criança em sua condição peculiar de desenvolvimento, segundo o ECA, se
depara com risco em seu seio familiar, onde deveria ser um espaço de proteção,
guarda, aconchego, educação, e amor, pode ser um espaço inseguro, com
violências sexuais, “maus-tratos”, onde se promove a desconfiança e a descrença
por aqueles que são do seu convívio e fazem parte de sua história.
Neste sentido, o combate ao abuso sexual intrafamiliar deve ser de dimensão
coletiva abrangendo toda a sociedade e o Estado, pois muitas vezes este último
possui uma dificuldade especial em atuar no espaço privado do lar, por questões
jurídicas associadas a fatores culturais e históricos da formação cultural brasileira.
Os dados que puderam ser vistos nas tabelas reforçam esta afirmativa e
demonstraram o quão sensível, contundente e urgente é o assunto, tanto pelas
consequências para as vítimas que entram em cena quanto para os abusadores,
enquanto sujeitos que precisam de acompanhamento psicossocial; e para a
sociedade em geral, pela característica das informações.
Neste contexto, urge a importância da denúncia daqueles que presenciarem
ou suspeitarem dessas violações bem como aparece o papel do Assistente Social
enquanto aquele que pode adentrar neste espaço através das visitas domiciliares,
por exemplo, além de ser indicado no trabalho do empoderamento dessas vítimas e
informação de seus direitos e demais trabalhos com famílias, sempre na perspectiva
de direitos, visando o melhor em termos de cidadania e protagonismo para as
crianças e adolescentes.
Diante dessa problemática da violência sexual contra criança e adolescente e
as demandas existente, o Assistente Social com seu conhecimento teóricometodológico e prático, exerce um papel fundamental no atendimento, prevenção e
combate à todas as formas de violências sexuais contra criança e adolescente,
procurando no seu exercício profissional, embasamento no que esta preconizado no
Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) e no Plano Nacional de Enfrentamento da
Violência Sexual Contra Criança e Adolescente (PNEVSCA), além de ter como
fundamento o seu Código de Ética Profissional de 1993.
THE INTRAFAMILY SEXUAL ABUSE: A STUDY BASED ON THE DATA
PREPARED BY REFERENCE CENTER FOR INTEGRAL PROTECTION OF
CHILDREN AND TEENAGERS IN A SITUATION OF SEXUAL VIOLENCE CEREVS.
Abstract:
Sexual violence experienced by children and adolescents, is a phenomenon
characterized as complex, involving several aspects, social, psychological and legal,
requiring greater care and protection from the authorities and society in general to
this juvenile population. This study aims to identify whether they occur other forms of
violence associated with sexual abuse. For this, the statistical data compiled by
CEREVS the years 2009 and 2011, relating to the attendance of children and
adolescents victims of sexual abuse were used. This is a bibliographic, document
and quantitative research. As a result it was found that the data analyzed are
consistent with the literature, that the intra-family sexual abuse, perpetrated in the
domestic context against children and adolescents, is associated with other types of
27
violence, causing this public Children and Youth psychological consequences,
physical and social.
Keywords: Children. Teens. Sexual violence.
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violência doméstica: fronteiras do conhecimento – São Paulo: Cortez, 1993.
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Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2001.
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CRIANÇAS E ADOLESCENTES et al. Plano Nacional de Enfrentamento da
Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes. Disponível em:
<http://www.comitenacional.org.br/files/anexos/08-2013_PNEVSCA2013_f19r39h.pdf> Acesso em: 23 Jun. 2014.
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tragédia revisitada. São Paulo: Cortez, 2011.
28
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Portuguesa. Rio de Janeiro: objetiva, 2009.
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criatividade. Petrópolis: Vozes, 2011.
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Técnica. Brasília; Secretaria Especial dos Direitos Humanos e Ministério da
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-WAGNER, Adriana. Como se perpetua a família? A transmissão dos modelos
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Maria Aparecida de Oliveira Gaspio