Antologia Poética
Poeta significativo da 2ª geração modernista;
 foi também compositor muito popular;
 um dos fundadores, na década de 1950, da Bossa
Nova;
 integra o grupo dos poetas religiosos das décadas
de 1930 e 1940.

Cenário mundial
1929: “Crack” (quebra) da Bolsa de Nova Iorque
– abalo do mercado financeiro mundial,
instabilidade;
 1939: Hitler invade a Polônia;
 1939-1945: Segunda Guerra Mundial:
 bomba atômica;
 destruição em massa;
 campos de concentração;
 barbárie, intolerância, preconceito, desejo
desmedido de poder – perversidade humana.

Cenário nacional











Brasil: realidade desigual, diversidade regional e cultural;
crise do café: preço despenca em virtude da queda do consumo
mundial;
Revolução de 1930: políticos e militares contra as oligarquias
cafeeiras;
Getúlio Vargas sobe ao poder;
Revolução Constitucionalista (1932): paulistas se revoltam com a
perda de poder político e são derrotados;
Constituição de 1934: consolidação de Vargas no poder;
ALN: união da esquerda contra a centralização do poder;
Lei de Segurança Nacional: poderes para o Estado perseguir a
esquerda;
1937: o Congresso Nacional é fechado;
Estado Novo: Vargas assume poderes ditatoriais, inspirado no
fascismo europeu;
DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda): órgão do governo
especializado na repressão à oposição (Luís Carlos Prestes).
Projeto literário

Poesia brasileira: atinge sua fase áurea por volta de 1930
(Alguma poesia, Drummond);

segue rumos diferentes do romance de 30: regionalismo x
abordagem mais universal;

a fase do nacionalismo crítico e do combate à poesia acadêmica
é superada;

as conquistas da 1ª fase estão consolidadas, os autores da 2ª fase
livram-se do compromisso de combater o passado;

período de instabilidade social e política: gera a reflexão sobre o
sentido de “estar no mundo”;

mantém-se a preocupação com a renovação da linguagem da fase
anterior;

atrocidades da 2ª Guerra: necessidade de resgatar a crença de
que nossa espécie possa ser realmente “humana”;







Espiritualidade: dificuldade de compreender Deus e a
humanidade diante das atrocidades da guerra;
momento de crise: relações entre indivíduo e
sociedade, análise do ser humano e suas angústias no
contexto da época;
introspecção: a arte torna-se intimista, busca
respostas para as dúvidas desencadeadas pelo cenário
de horror e destruição com a experiência da guerra;
presente nos textos a reflexão sobre os
acontecimentos da época, para os quais buscam uma
explicação;
poetas: reflexão sobre o mundo contemporâneo;
dimensão social: contexto sociopolítico define o foco
para a poesia do momento;
uso da palavra: carregado do sentido da modernidade
e da contemporaneidade.
Linguagem
Liberdade para explorar todo tipo de recurso
formal;
 seleção das palavras: opção pela simplicidade;
 estrutura sintática dos versos: mais elaborada;
 complexidade sintática: equivalente ao momento
em que a humanidade está diante de questões
complicadas;
 liberdade formal: versos livres e brancos
convivem com versos rimados e de métrica fixa;
 formas poéticas fixas, como o soneto, são
retomadas pelos autores.

 Lirismo:
tom sentimental, subjetivo,
revelação de estados de alma;
 presença da natureza, principalmente do
mar e da praia;
 musicalidade sempre presente;
 preocupação com a forma dos poemas.
Forma: versos longos, linguagem
abstrata e alegórica;
 temas: poesia transcendental,
religiosa, com influências
simbolistas;
 espiritualidade católica e visionária.

Forma: linguagem simples, vocábulos do
cotidiano;
 poesia sensual: aproximação do mundo
material, temas cotidianos e forte
erotismo;
 recriação do soneto: à moda de Camões e
Shakespeare, trata das contradições do
amor e da vida;
 poesia social: linguagem simples e direta.

Agonia
No teu grande corpo branco depois eu fiquei.
Tinha os olhos lívidos e tive medo.
Já não havia sombra em ti – eras como um grande deserto de areia
Onde eu houvesse tombado após uma longa caminhada sem noites.
Na minha angústia eu buscava a paisagem calma
Que me havias dado tanto tempo
Mas tudo era estéril e monstruoso e sem vida
E teus seios eram dunas desfeitas pelo vendaval que passara.
Eu estremecia agonizando e procurava me erguer
Mas teu ventre era como areia movediça para os meus dedos.
Procurei ficar imóvel e orar, mas fui me afogando em ti mesma
Desaparecendo no teu ser disperso que se contraía como a voragem.
Depois foi o sono, o escuro, a morte.
Quando despertei era claro e eu tinha brotado novamente
Vinha cheio do pavor das tuas entranhas.
Rio de Janeiro, 1935
 Linguagem
alegórica: o corpo da mulher é
comparado a um deserto, os seios são dunas,
o ato sexual é a peregrinação do eu lírico por
esse deserto;
 sugestividade simbolista: “corpo branco”,
“escuro”;
 musicalidade: assonâncias e aliterações;
 desejo e gozo sexual identificados à agonia;
 ato sexual: identificado ao pecado e à
morte.
Ausência
Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo
[da noite
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.
Rio de Janeiro, 1935
 Angústia
do eu lírico: desejo e amor vistos
como pecado;
 amor platônico e misticismo: recusa de ter a
mulher amada;
 mulher amada vista de maneira idealizada;
 lembranças finais: identificadas aos
elementos da natureza, de maneira que se
tornem infinitas.
A música das almas
"Le mal est dans le monde comme un esclave qui fait monter l’eau."
Claudel
Na manhã infinita as nuvens surgiram como a Ioucura numa alma
E o vento como o instinto desceu os braços das árvores que
[estrangularam a terra
Depois veio a claridade, o grande céu, a paz dos campos...
Mas nos caminhos todos choravam com os rostos levados para o alto
Porque a vida tinha misteriosamente passado na tormenta.
Rio de Janeiro, 1935
 Poema
simbolista: sugestões musicais a partir
do título;
 elementos da natureza: manhã, nuvens,
ventos, árvores, terra, céu, campos;
 sugestividade: elementos da natureza
representam fases da vida.
Marina
Lembras-te das pescarias
Nas pedras das Três-Marias
Lembras-te, Marina?
Na navalha dos mariscos
Teus pés corriam ariscos
Valente menina!
Crescia na beira-luz
O papo dos baiacus
Que pescávamos
E nas vagas matutinas
Chupávamos tangerinas
E vagávamos...
Tinhas uns peitinhos duros
E teus beicinhos escuros
Flauteavam valsas
Valsas ilhoas! vadio
Eu procurava, no frio
De tuas calças
E te adorava; sentia
Teu cheiro a peixe, bebia
Teu bafo de sal
E quantas vezes, precoce
Em vão, pela tua posse
Não me saí mal...
Deixavas-me dessa luta
Uma adstringência de fruta
De suor, de alga
Mas sempre te libertavas
Com doidas dentadas bravas
Menina fidalga!
Foste minha companheira
Foste minha derradeira
Única aventura?
Que nas outras criaturas
Não vi mais meninas puras
Menina pura.
 Versos
rimados e de forma fixa (redondilhas
maiores e menores);
 forte conteúdo erótico;
 perde-se a noção de pecado em relação à
sensualidade e ao ato sexual;
 presença de vocábulos mais simples para
descrever também um cenário mais singelo;
 elementos do mundo material, cotidiano.
Soneto do maior amor
Maior amor nem mais estranho existe
Que o meu, que não sossega a coisa amada
E quando a sente alegre, fica triste
E se a vê descontente, dá risada.
E que só fica em paz se lhe resiste
O amado coração, e que se agrada
Mais da eterna aventura em que persiste
Que de uma vida mal-aventurada.
Louco amor meu, que quando toca, fere
E quando fere vibra, mas prefere
Ferir a fenecer – e vive a esmo.
Fiel à sua lei de cada instante
Desassombrado, doido, delirante
Numa paixão de tudo e de si mesmo.
Oxford, 1938
 Soneto
tradicional: versos decassílabos e
rimas alternadas;
 vocabulário despojado e simples;
 tema cotidiano: vicissitudes do
relacionamento a dois;
 tematiza as contradições do eu lírico em
face do amor.
A rosa de Hiroxima
Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas oh não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada
 Rimas
toantes e versos pentassílabos;
 conteúdo social, voltado aos acontecimentos
do seu tempo;
 metáfora da bomba: rosa, mas vista de
maneira negativa (estúpida, inválida, sem
cor, sem perfume);
 função social da poesia: alertar para os
horrores da guerra;
 questionamento acerca dos rumos que toma
a humanidade, a partir da experiência da
guerra.
Download

Vinicius de Moraes