EDIFÍCIOS ESCOLARES EM CAMPO GRANDE NO SÉCULO XX: MEMÓRIAS DA EDUCAÇÃO Ângelo Marcos Vieira de Arruda Arquiteto e Urbanista, Doutorando em Educação UFMS/PPGEDU, Mestre em Arquitetura UFRGS e Professor da UFMS. RESUMO Campo Grande, capital do Estado de Mato Grosso do Sul desde 1979, atravessou grande parte do século XX como a mais importante cidade do interior do Estado de Mato Grosso. Cidade com riqueza oriunda da pecuária e do comércio, assistiu a construção de edifícios escolares primorosos em diversas épocas ao longo do século. Este artigo inicia a análise dessa produção que culmina no ano de 1954 com a construção de uma escola projetada por Oscar Niemeyer, o atual Colégio estadual Maria Constança de Barros Machado. ABSTRACT Campo Grande, capital of the State of Mato Grosso of the South since 1979, crossed great part of century XX as the most important city of the interior of the State of Mato Grosso. City with deriving wealth of the cattle one and the commerce, attended the construction of primorosos pertaining to school buildings at diverse times throughout the century. This article initiates the analysis of this production that culminates in the year of 1954 with the construction of a projected school for Oscar Niemeyer, the current state College Maria Constança de Barros Machado. A HISTÓRIA DOS EDIFÍCIOS ESCOLARES EM CAMPO GRANDE: DE 1914 A 1954. Paulo Coelho Machado, em seu livro A Rua Velha fala da primeira escola construída em Campo Grande, do primeiro professor, enfim dos pioneiros educadores, como a Prof. Umbelina, Maria Amada, Raimundo Nonato e José Rodrigues Benfica. Já a Prof. Maria da Glória Sá Rosa em seu trabalho Memória da Cultura e da Educação em MS, lembra de Luis Alexandre, Múcio Teixeira, Maria Constança e tantos outros. Entretanto, poucos historiadores tratam da evolução arquitetônica e da história dos edifícios escolares. 1 A arquitetura educacional vem, desde o início do século XX, experimentando constantes modificações no Brasil. Em algumas cidades mais antigas, os edifícios públicos escolares estavam presentes no contexto urbano, ocupando sempre espaços centrais, privilegiados, ao lado da praça principal, dotados de uma arquitetura imponente, resultado do padrão social da classe dirigente. Foi assim em Cuiabá (Palácio da Instrução, frente à Praça da Matriz), em Corumbá (Colégio estadual atual Instituto Luis Albuquerque), São Paulo (Escola Caetano de Campos, ao lado da Praça da República), Recife (Colégio Estadual de Recife) etc, onde os seus principais elementos da arquitetura presentes eram inspirados na arquitetura antiga, de motivos grecoromanos e, assim, em sua grande maioria, traduziam uma arquitetura em estilo eclético1, do seu tempo. É claro que eram escolas construídas para as elites sociais e a arquitetura tinha que representar o estilo da burguesia e seu status na sociedade. É claro, também, que eram prédios únicos, com grandes espaços projetados, para abrigar todos os alunos de alta renda do lugar. Uma de suas características tipológicas é que elas eram sempre escolas diferentes uma das outras, apesar de possuírem o mesmo estilo arquitetônico – a idéia de se construir escolas iguais, da mesma administração, é recente, do período militar em diante. No caso de Campo Grande, a história dos edifícios escolares foge um pouco dessa regra nacional, tendo em vista que a ocupação do solo de nossa cidade não se deu de forma organizada, planejada, mas espontânea, correspondendo sempre uma obra a um determinado grau de desenvolvimento. Foi assim que foi erguida nossa primeira escola estadual que se tem conhecimento, na Rua 26 de Agosto, antiga Rua Velha, com duas salas de aula e denominada de José Rodrigues Benfica, o primeiro professor da vila, cujo desenho da fachada frontal foi reproduzido no livro Álbum Gráphico de Mato Grosso e atribui-se o desenho 1a. Escola de Campo Grande ao projetista Plotino de Aragão Soares. 1 Em arquitetura, movimento característico do final do século XIX, período onde os estilos arquitetônicos até então existentes (segundo Carlos A.C. Lemos eram o neoclássico, néo-renascentista, art nouveau, eruditos, neocoloniais e as construções industriais e de estrutura de ferro) não conseguiram exprimir a realidade e não se fixaram como manifestação cultural. Exemplos desse período são os edifícios do Gabinete Português de Leitura , a Câmara Municipal e a Imprensa Nacional , no RJ e os edifícios públicos , a Estação da Luz e o Hospital da Benficiência Portuguesa , de Ramos de Azevedo em São Paulo e as obras de Victor Dubugras. 2 Muitas escolas foram sendo edificadas em nossa cidade e uma das mais bonitas era o Instituto Pestalozzi, projetada em 1920 pelo engenheiro geômetra e arquiteto Camillo Boni2, localizada na esquina da Rua 14 de Julho com a Av. Mato Grosso, demolida para a construção do Colégio Dom Bosco. Muitas escolas foram implantadas em edifícios alugados, cuja finalidade primeira era sempre educar e não construir e essa prática se repete até os dias de hoje. Um bom exemplo disso é o Colégio Osvaldo Cruz que ocupou o prédio de um antigo armazém de secos e molhados ou ainda do prédio da primeira Faculdade de Campo Grande, a de Odontologia, na Rua Cândido Mariano. Mas, no ano de 1926, foi construído o Colégio Joaquim Murtinho, projetado por Camillo Boni e edificado por José Luiz Louzinha, com nove salas de aula, na Avenida Afonso Pena e demolido nos anos 70. Já nos anos 30, com o novo estilo do Art Déco3, nossa cidade viu nascer dois belos edifícios escolares: o Dom Bosco e o Auxiliadora. O Colégio Dom Bosco, implantado na Av. Mato Grosso, esquina com a Rua 13 de Maio foi projetado pelo arquiteto alemão Frederico Urlass4 e inaugurado em 1934 com grande festa da Missão Salesiana. Seus detalhes construtivos são até hoje lembrados, como a escadaria de acesso e as amplas e ventiladas salas de aula. Já o Colégio Nossa Senhora Auxiliadora, teve as obras iniciadas em 1926, mas só foi concluído no início dos anos 40. Acredita-se que o desenho original e inicial tenha sido de Camillo Boni, mas em 1934 o engenheiro Joaquim Teodoro de Faria5 trabalhou com o arquiteto Frederico Urlass na confecção do edifício que hoje conhecemos. Seus detalhes são ricos, como os frisos geométricos verticais e as amplas janelas e varandas arredondadas das fachadas. Era o maior edifício 2 Nascido na Itália , especialista em geometria e cálculo, foi Secretário de Obras de Campo Grande na administração do Intendente Arnaldo Estevão de Figueiredo –1924/28. Em 1921 , projeta e constrói a residência de Arnaldo E. Figueiredo, atual Casa da Memória , na Rua Barão do Rio Branco, a primeira obra da Santa Casa , em 1926, obras para a Missão Salesiana em Mato Grosso, além de inúmeras residências na cidade. 3 O Art Déco foi um conjunto de manifestações artísticas originado na Europa e que se expande para as Américas do Norte e do Sul, inclusive para o Brasil, nos anos 20. Seu lançamento ocorre na Exposition Internacionalle de Arts Décoratives et Industrialles Moderns, ocorrida em Paris, em 1925. O Art Déco se definia como Decorativo , para se contrapor ao movimento moderno; como estilo internacional, ao lado do movimento moderno e contra as correntes que propugnavam por expressões nacionais; como estilo industrial , associado à sociedade nascente e como moderno, associando sua imagem aos arranha-céus , aviões , automóveis,cinema, rádio , moda, etc. 4 Nascido na cidade de Rothenbach , região da Saxônia na Alemanha em 4/11/ 1902, veio formado em arquitetura para o Brasil em 1927 e reside em São Paulo. Em 1929 trabalha com o Engº. Hyppolito Pujol Júnior na obra do Teatro Pedro II de Ribeirão Preto/SP. Chega em Campo Grande em 1930 e vai trabalhar em Miranda/MT onde assume a função de engenheiro da Prefeitura. Em Campo Grande vai ser o responsável técnico pela empresa construtora Thomé & Irmãos Ltda de 1931 a 1938. Urlass fez a base do Relógio da Rua 14 de Julho , o Obelisco e mais de outras 40 obras construídas por Thomé. Faleceu em 1960, depois de passar 13 anos , desde 1947, trabalhando na Comissão de Estradas de Rodagens de MT , em Cuiabá. 5 Joaquim Teodoro de Faria nasceu em Nioque/MT e ao chegar em Campo Grande vai trabalhar como engenheiro fiscal na Prefeitura. Em 1947, é nomeado prefeito de Campo Grande e elabora vários projetos na cidade. Atua como responsável técnico nas obras da Igreja dos Padres Redentoristas , de 1939 . 3 da cidade no seu tempo, pois ocupava todo o quarteirão da Av. Mato Grosso com a Pedro Celestino. Os edifícios educacionais de uma cidade, geralmente registram a evolução da sociedade e ao mesmo tempo e aqueles mais tradicionais, ainda se mantém nos nossos dias, com a mesma atividade. São raros esses edifícios – Osvaldo Cruz, Dom Bosco, Auxiliadora. Mas são os mesmos que formaram as gerações que hoje contribuem para a formação do conhecimento e da cultura local e regional. Preservar esses edifícios é tarefa de toda a sociedade e não apenas de seus proprietários e mantenedores, pois, os prédios eternizam a história e de suas salas e espaços interiores, nasceram e estudaram parcela da sociedade que conta a nossa história e o nosso importante passado. Na década de 506, um edifício público construído pelo Governo do Estado de Mato Grosso, em Campo Grande, daria início a modificações arquitetônicas na cidade o Colégio Estadual Campo - grandense, hoje conhecido como Colégio Maria Constança de Barros Machado, obra projetada pelo Oscar Niemeyer Soares Filho. Oscar Niemeyer elaborou o projeto para o governo do Estado de Mato Grosso, na gestão do governador Fernando Corrêa da Costa, a partir de uma solicitação de doação de um projeto de uma escola que seria construída na cidade de Corumbá, no oeste do Pantanal mato-grossense, fronteira com a Bolívia. Projeto entregue em 1952, imediatamente o governo determinou a licitação de duas escolas e a construção do mesmo projeto, também na cidade de Campo Grande. O lugar escolhido na cidade de Campo Grande foi a Rua Y Juca Pirama, no bairro Amambaí, região conhecida pelos moradores como “Cabeça de Boi”, de moradia operária. Hoje a rua onde se localiza o colégio denomina-se Marechal Cândido Mariano Rondon que, durante décadas, desde os anos 20, se constituiu num importante acesso de ligação da área central da cidade com a parte oeste, onde se situam os quartéis militares e mais recentemente a Base Aérea da Aeronáutica. A escola pública construída pelo governo do Estado veio atender os setores organizados da sociedade, que clamavam por mais espaços educacionais gratuitos. À época, uma das poucas escolas públicas existentes na cidade era o Colégio Normal 6 O censo de 1950 apurava 123 logradouros , dos quais 16 pavimentados sendo 52 servidos de iluminação pública; 112 possuiam iluminação domiciliar , com 5.110 ligações. Havia ainda 7.477 prédios sendo 3.508 servidos de abastecimento de água e 1.842 ligações de rede de esgoto. O “ bungalow” era predominante e ainda havia 10% das casas em madeira. Os edifícios mais importantes da cidade eram o Quartel-general, o Hospital, os Correios e Telégrafos, o Destacamento da Base Aérea, a estrada de ferro NOB, o Colégio Estadual Campograndense, o Joaquim Murtinho , a Prefeitura Municipal, o Fórum , a Biblioteca Pública , o Colégio e a Faculdade Dom Bosco, o Nossa Senhora Auxiliadora, o Noviciado, o Hospital da Santa Casa e o Rádio Clube, além das igrejas de Santo Antônio, Perpétuo Socorro, São Francisco e São José [ IBGE 1954] 4 Joaquim Murtinho, localizado na Av. Afonso Pena, construído em 1926, em estilo eclético. A necessidade de uma grande escola estadual pública moderna era um anseio social, visando atender aos alunos de famílias carentes. O terreno para construção da nova escola foi adquirido pelo Governo do Estado e possuía algumas características essenciais: era um quarteirão fechado, tendo como limite ao norte, os trilhos da ferrovia Noroeste do Brasil e ao sul a Rua Y Juca Pirama. Planta em croqui de Oscar Niemeyer do Colégio estadual. Essa foi definida com sendo a rua de acesso principal e, nessas condições topográficas, a implantação e orientação do projeto arquitetônico original seriam alteradas.Oscar Niemeyer elaborou o projeto para a cidade de Corumbá, que tinha quarteirão com frente principal norte e com essa condição, projetou um sistema de brise-soleil na área de recreação. Na implantação de Campo Grande, a frente principal escolhida para o acesso escolar tinha frente sul e com isso, o sistema de proteção solar estudado pelo arquiteto não tem função de proteção solar. Da licitação saiu vencedor a Construtora Comércio Ltda e a obra teve como responsáveis técnicos os engenheiros Hélio Baís Martins e José Garcia Neto e fiscalização do arquiteto João Thimóteo da Costa, do Departamento de Obras do Governo em Cuiabá. Resolvida à questão da implantação, a obra iniciou no ano de 1953. O que a escola deveria ter internamente foi o próprio Oscar Niemeyer que criou. Foram 2.665,00 m2 de área, distribuídas para o Pavilhão de Administração e Aulas, Recreio Coberto e Auditório, Salas Especiais, Refeitório e Sanitários e Entrada e Portaria, implantados em um terreno de 12.000 m2. A maior novidade deste programa da escola foi o Auditório com capacidade de abrigar 75% dos alunos matriculados e o Recreio Coberto. Esses dois itens do programa vão criar, no projeto, espaços que são mais trabalhados, não só na forma bidimensional quanto na volumetria. O Auditório, na forma de um trapézio com teto inclinado e o Recreio um retângulo coberto com uma estrutura em abóbada de concreto fechada, em 5 uma de suas faces, com brise-soleil de placas de concreto. A presença desses elementos de arquitetura no projeto e de outros – cobogó, pilares de seção circular, janelas em fita dupla nas salas de aula, teto-borboleta – eram a expressão da linguagem do modernismo brasileiro, que tinha Oscar Niemeyer como um dos seus maiores adeptos e difusores. A arquitetura do edifício do Colégio Estadual Campo-grandense já se apresentava como um estilo para Campo Grande. Depoimentos do nosso saudoso engenheiro Hélio Baís Martins, que atuou como fiscal da obra, confirmam essa afirmação. A obra do Colégio foi inaugurada no dia do aniversário da cidade, em 26 de agosto de 19547 e é um marco da arquitetura moderna em Campo Grande e até os dias de hoje, quase 50 anos depois, não há um só colégio público que se compare em qualidade arquitetônica, estrutura educativa e organização espacial. Essa escola é orgulho de nossa cidade, de nossa arquitetura moderna e é por isso que, em 1997, ela foi tombada como patrimônio histórico estadual. Fachada Principal para a Rua Cândido Mariano Estudando Conceitos “É possível ler e interpretar a história da educação brasileira pela arquitetura dos edifícios escolares. Não por acaso, a construção de edifícios próprios para o funcionamento de escolas públicas inicia com o processo de democratização do ensino no país a partir da Primeira República (Souza, 2004, in Bencosta, 2005)”. A história da arquitetura dos edifícios escolares em Campo Grande, como vimos, começa com o funcionamento da cidade no começo do século XX. No Estado de Mato 7 Nessa época Oscar Niemeyer estava projetando sua residência em Canoas e o Colégio de Belo Horizonte ; o Parque Ibirapuera estava sendo inaugurado no dia do aniversário de São Paulo. [ Bruand 1997] 6 Grosso, entretanto, o mérito pela implantação da instrução pública deduz-se, coube à administração do Capitão-General Luiz de Albuquerque de Mello e Cáceres (17721789). A educação em Mato Grosso toma ritmo com o advento da República: o Liceu Cuiabano de 1879 e a Escola Normal da Capital de 1874 ganham impulso. (Alves, 1986: 46). No caso da capital do antigo estado-mãe, a educação vem com a implantação de imensos edifícios escolares, pois, em alguns estados e cidades brasileiras, essa primeira arquitetura escolar de caráter monumental e imponente, foi erigida com a finalidade de enaltecer a ação do poder público. Ao longo do século XX, a persuasão retórica da arquitetura escolar sucumbiu às políticas públicas de atendimento à educação em face das pressões populares. A construção de edifícios escolares projetados para abrigar o antigo ensino primário é, em termos históricos, muito recente (Buffa, 2002,18). Em termos nacionais, eram sempre prédios de arquitetura em estilo art nouveau ou eclética pois, representavam seu tempo – final do século XIX e início do XX-, e essa tipologia veio se repetir em Campo Grande, com os colégios Osvaldo Cruz, Dom Bosco e Auxiliadora, principalmente, edifícios não-públicos. Nesse ritmo do século XX e aliada à pressão pela quantidade – número de edifícios construídos-, fez com que “um pequeno número de edifícios projetados de acordo com os princípios da arquitetura moderna, construídos como marcos simbólicos, pode ser encontrado em uma ou outra cidade, as constituem vestígios esparsos de iniciativas isoladas e descontínuas do Estado. Insuficiência e infra-estrutura inadequadas permaneceram como características dos sistemas estaduais e municipais de ensino. (Souza, 2004, in Bencosta 2005) Em Campo Grande, no geral, o que se via eram prédios construídos não pela iniciativa do poder público, mas da comunidade - seja ela religiosa, confessional ou comunitária-, que cobriam as necessidades educacionais da cidade e de seu povo pois, a distância para Cuiabá ou São Paulo, inibiam famílias de menor renda a conceder o direito a seus filhos de estudar fora. Com o passar do tempo, os edifícios existentes passaram a constituir a simbologia necessária para a construção de posturas sociais e outros elementos de natureza cultural. Assim, entender a arquitetura escolar como símbolo de uma época histórica e reveladora de programas de um período é de “suma importância para os estudos da 7 História da Educação e da Arquitetura e da Cultura Escolar, assim como é indispensável à análise dos espaços educacionais diferenciados,que vão desde os antigos seminários eclesiásticos até as arquiteturas mais modernas, traduzindo valores e a percepção da cultura nos diversos momentos da história. (Correia, 2004 ). Esse é um tema de grande complexidade na análise pois os conceitos devem ser muito estudados. A arquitetura escolar é pouco estudada e os estudos da arquitetura, ao contrário, são analisados em diversas formas. Vejamos o que diz Argan: Entre arquitetura e cultura não há relação entre termos distintos: o problema diz respeito apenas á função e ao funcionamento da arquitetura dentro do sistema. Por definição, é arquitetura tudo que concerne á construção e é com técnicas da construção que se intui e organiza em seu ser e em seu devir a entidade social e política que é a cidade. Não só a arquitetura lhe dá corpo e estrutura, mas também a torna significativa como simbolismo implícito em suas formas. Assim, como a pintura é figurativa, a arquitetura é por excelência representativa. (Argan, 1998: 243) Lúcio Costa, no tema também comenta: Arquitetura é construção concebida com o propósito de organizar e ordenar plasticamente o espaço e os volumes dele decorrentes, em função de uma determinada época, de um determinado meio, de uma determinada técnica, de um determinado programa e de uma determinada intenção. Arquitetura não é coisa suplementar usada para enriquecer mais ou menos o edifício, não é tampouco a simples satisfação de imposições de ordem técnica e funcional. (Costa, 2005: 21) Por fim, Hertzberger, a respeito da forma, na arquitetura, como instrumento e diz: ..... “não é de modo nenhum difícil criar uma arquitetura lúdica quando as exigências que ela em princípio deve enfrentar forem suficientemente não-explícitas. São as discrepâncias que nascem da necessidade individual de cada um de interpretar uma função específica, dependendo das circustâncias e do lugar, à sua maneira, que acabam fornecendo a cada um de nós uma identidade própria, e, já que é impossível (como sempre foi) adequar todos às mesmas circunstâncias,devemos criar esse potencial para a interpretação pessoal, projetando as coisas de tal maneira que 8 elas possam ser efetivamente interpretadas.”(Hertzberger, 1996, 176) A forma e as razões da forma do edifício vem sendo estudada por diversos críticos de arquitetura no mundo inteiro, em especial Geoffrey Baker, Franz Ching, Willian Curtis, Le Corbusier, Joseph Montaner, dentre outros e o simbolismo de sua interpretação, lugar comum de análises simplificadas do espaço construído ou dos elementos de construção existentes. Em alguns casos, como na arquitetura simbólica do espanhol Gaudi, muitas formas derivavam da natureza e se espalhavam pelos edifícios, dando denominações intuitivas dos usuários. Na arquitetura escolar esse processo também existiu, quando ouvimos falar do Colégio “Mata-borrão” de Oscar Niemeyer em Belo Horizonte – referindo-se ao Colégio estadual Milton Neves, cujo formato do auditório frontal se parecia com a peça “mata-borrão”, utilizado para apagar erros da escrita com tinta. Em Campo Grande, no Colégio estadual Maria Constança, a associação de formas construídas que lembram objetos ou artefatos da educação, foram sempre e imediatamente, comentadas quando da construção do edifício. Um livro aberto – o recreio coberto; um giz ou um lápis, referindo-se ao mastro e a caixa-dágua da escola, entre outras associações de formas, eram sempre muito comentadas. Claro que todo esse material construído obedecia, além das técnicas construtivas a influência dos elementos da arquitetura moderna brasileira (ver Arruda, 2002) e isso veio influenciar novas edificações, escolares ou não, implantadas na malha urbana de Campo Grande. Tudo isso é objeto de análise dessa pesquisa. Comentando o assunto, Pessanha (2004) diz que ao lado de cadernos, livros, relatórios, atas e outras fontes, oficiais ou não, a constituição do espaço físico da escola também se constitui em importante fonte para a cultura escolar. E ainda afirma: “Os edifícios escolares, como qualquer outro edifício, constituem-se como lócus à medida que seus ocupantes experimentam e interpretam esse espaço e dele apropriam-se, atribuindo-lhe significados e valores. Portadores de significados múltiplos, a arquitetura e o espaço escolar têm se constituído nos últimos anos em promissoras vertentes de investigação sobre a cultura escolar.” Entender a cultura como produto e processo - com entende o grupo da UFMS composto de Eurize Caldas Pessanha, Maria Adélia Menegazzo e Maria Emília Borges 9 Daniel-, é observar que há que se colocar significados ás práticas sociais e assim, entendermos a cultura escolar como um conjunto onde se deve observar e pesquisar as normas e práticas definidoras e a pauta de comportamento, associado aos atores – professores, familiares, alunos-; discursos e linguagens – modos de conversar, a comunicação-; instituições – organização escolar e sistema educativo e por fim incluir o espaço e a arquitetura escolar como variável de análise, principalmente os elementos de arquitetura e os de composição. Como devemos observar e analisar as influências do espaço no ensino e na cultura escolar – a escadaria do antigo Colégio Dom Bosco, o pátio interno do Colégio Auxiliadora, as grandes janelas do Colégio Osvaldo Cruz ou as imagens associadas dos elementos já citados do Colégio Maria Constança de Barros Machado e como devemos investigar as formas desse espaço e a sua correta aplicação em outros meios educacionais, se constitui, portanto, em importante elemento de pesquisa. REFERÊNCIAS ARGAN, G. C. A arte no contexto da cultura moderna. In História da arte como história da cidade. Tradução Piér Luigi Cabra. 2a. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. ARRUDA, Ângelo Marcos Vieira de (org.). Arquitetura em Campo Grande. Campo Grande: Uniderp, 1999. ARRUDA, Ângelo Marcos Vieira de. Campo Grande: arquitetura, urbanismo e memória. Campo Grande. UFMS, 2006. ARTE EM REVISTA. Arquitetura Nova. Org. Otília Arantes. São Paulo: Ano2, N. 2, 1980. BENCOSTA, Marcus Levy Albino (org). 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