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ETNOMETODOLOGIA E A PESQUISA CIENTÍFICA ACADÊMICA: O QUE AS PESSOAS
PENSAM SOBRE SUAS PRÁTICAS SOCIAIS?
Camila Borges da Silva (G - CCHE-UENP/CJ)
Antonio Donizeti Fernandes (Orientador-CCHE-UENP/CJ)
RESUMO: Esta comunicação busca apresentar o resultado de minhas leituras e investigações
primeiras sobre uma metodologia de pesquisa pouco conhecida, mas de grande importância
para se compreender a prática educacional em face das concepções sobre a construção social
da realidade e a vida cotidiana na escola. É desenvolvida em Chicago a partir de problemas
sociais provocados com o deslocamento migratório e as relações étnicas, tornando-se campo e
objeto de investigação em face dos efeitos múltiplos da industrialização e da urbanização.
Neste sentido, contrariando a ideia de que a marginalidade e a criminalidade sejam fenômenos
sociais resultantes em exclusivo do desvio a ordem normativa, a etnometodologia –
desdobramento do interacionismo simbólico - propunha como prática teórica poder identificar e
compreender a realidade vivida a partir daqueles que em tais condições encontrar-se-iam.
Quais sentidos os sujeitos de tais ações delegavam às suas atitudes e confrontando-os com
outros dados exteriores ao indivíduo, estes estudos constataram que as falas dos delinquentes
eram muito próximas em sua essência, transformando dados estatísticos, assim, em dados
qualitativos. Portanto, por mais que os fatos sociais possam pesar sobre o indivíduo, esses
exercem influência sobre a organização social e a comunidade em que vivem. Do ponto de
vista da prática do ensino e da aprendizagem, mediante a esta perspectiva teóricometodológica, a busca pela compreensão dos motivos e a natureza de seus conhecimentos
apresentam-se de fundamental importância para se pensar as questões em torno da
negociação em sala de aula e com ela o que seja a ação pedagógica.
Palavras-chave: Etnometodologia. Desvio. Realidade. Sentido.
INTRODUÇÃO
O presente artigo vem apresentar os resultados de leituras e investigações primeiras
sobre a etnometodologia, ou seja, uma proposta de métodos de pesquisa baseados na
compreensão do vivido e não em sua mera explicação. A etnometodologia encara os atores
sociais como sendo ativos e não passivos frente às normas convencionadas ou até mesmo
impostas pela sociedade. Busca desvendar as significações que os indivíduos atribuem às
situações mais rotineiras do cotidiano, as quais passam despercebidas pela maioria das
pessoas. Realizando a transposição da etnometodologia para o contexto escolar, sobretudo da
sala de aula, denota-se a importância de se considerar e analisar o significado das ações do
indivíduo em face da escola.
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Dessa forma, faz-se necessário compreender a prática educacional a partir da
concepção de que a realidade é uma construção social cotidiana, logo os sujeitos são
construtores de sua realidade social. Portanto, como cada indivíduo é único, os sentidos a que
desferem a certos símbolos, ações e pessoas são também heterogêneos, o que pode levar a
conflitos devido ao fato de cada um fazer uma leitura de mundo diferente.
Tratando-se do contexto educacional, ainda autoritário e coercitivo, aparentemente não
sobra espaço e conhecimento etnometodológico suficientes para que o professor considere e
analise o processo pelo qual seus alunos atuam em sala de aula. Em outras palavras, o
professor não se atenta para os significados que os estudantes atribuem a suas ações, o que
seria algo de extrema relevância para se repensar sua práxis pedagógica.
REFERENCIAL TEÓRICO
A etnometodologia é um método de pesquisa qualitativo recente e pouco conhecido
devida a sua pequena disseminação, em face da preferência de muitos pesquisadores pelos
métodos de pesquisa quantitativos. Surgiu e se desenvolveu na Escola de Chicago, nos
Estados Unidos, no início do século XX, cujo estudo-chave foi a questão dos imigrantes que
estavam chegando nesta cidade. Chicago foi na época considerada um grande laboratório,
onde quem a estudava, estava também estudando o mundo. Com a divulgação de suas ideias,
foi tomando proporções cada vez maiores, alastrando-se por quase todo os Estados Unidos.
Esta metodologia tem relação estreita com o interacionismo simbólico, o que significa estudar
a partir das falas do indivíduo o que ele pensa sobre sua realidade e que sentido atribui, pois o
sujeito age conforme pensa ser sua realidade social. Assim sendo, foi possível aos sociólogos
daquele contexto verificar qual a relação entre os imigrantes que chegavam a Chicago e o
crescimento da criminalidade, quais fatores contribuíam para tal e de que forma se dava a
assimilação de identidade com sua nova terra (COULON, 1995a).
Assim, a etnometodologia inicialmente se propôs a estudar o impacto da chegada de
várias etnias de imigrantes, sobretudo em Chicago, no que diz respeito ao crescimento da
criminalidade e em como esses mesmos criminosos descreviam sua realidade social.
A etnometodologia de certa forma revoluciona a maneira de se pensar a investigação
sociológica na medida em que diferentemente de outras abordagens sociológicas, tais como a
de Emile Durkheim, onde o fato social “pesa” sobre o indivíduo em suas ações, propõe um
olhar voltado sim para as circunstâncias objetivas dos acontecimentos, mas também não deixa
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de considerar o que o indivíduo pensa sobre sua ação ou sobre o que está se passando com
ele:
Ao contrário de Durkheim, que considerava que só era preciso explicar os
fenômenos sociais pela influência de outros fenômenos sociais e não pela
intervenção do nível individual, Thomas e Znaniecki afirmavam que um fato
social é uma combinação íntima dos valores coletivos e das atitudes individuais
(COULON, 1995a, p. 31)
Dessa forma, define-se o termo “situação”, ou seja, a junção entre a ordem social tal
qual se apresenta e a história pessoal do indivíduo, tornando extremamente necessária uma
coleta de dados de documentos pessoais, tais como autobiografias, cartas, entre outros
(COULON, 1995a, p. 41). Este termo leva, então, em consideração também o aspecto
subjetivo da pessoa, através de seus relatos de vida.
Logo se denota que uma pessoa pode colocar sua subjetividade acima dos preceitos
morais da sociedade, o que pode gerar uma desorganização social:
Uma organização social é um conjunto de convenções, atitudes e valores que se
impõem sobre os interesses individuais de um grupo social. Ao contrário, a
desorganização social, que corresponde a um declínio da influência dos grupos
sociais sobre os indivíduos, manifesta-se por um enfraquecimento dos valores
coletivos e por um crescimento e uma valorização das práticas individuais
(COULON, 1995a, p. 34-35)
Ainda segundo Coulon (1995a, p. 42-43), a desorganização social é um processo que
ocorre com imigrantes em contato com indivíduos próprios do local. Acontece em quatro fases:
rivalidade, conflito, adaptação e assimilação.
A rivalidade caracteriza-se pela “interação sem o contato social”, ou seja, é uma
interação que se dá somente pela via econômica. Já o conflito ocorre quando os dois grupos se
deparam e o grupo que está chegando começa a se instalar em seu novo ambiente. Criam-se
assim condições favoráveis ao surgimento de uma solidariedade entre a minoria. A adaptação
é uma fase em que o grupo minoritário esforça-se para se ajustar as situações sociais de seu
novo ambiente, prezando pela segurança das pessoas. Na última fase, ocorre a assimilação,
onde as diferenças existentes entre os grupos são substituídas por uma identificação dos
costumes e da vida cultural do grupo majoritário (COULON, 1995a, p. 43-44).
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É possível perceber que a desorganização social é um período natural de transição, de
instabilidade e incerteza sobre quanto se deve manter da terra de onde se veio e o quanto se
pode mudar a fim de se parecer com as pessoas nascidas e criadas no local.
Assim, continua o autor (COULON, 1995a) quando o estrangeiro instala-se na
comunidade,
pode
ficar
à
margem,
não
apreendendo
seus
mecanismos
íntimos
e
permanecendo de certo modo de fora do grupo social. Sua vontade de emergir o faz ter
atitudes marginais: usa com intimidade suas duas culturas, mas não é aceito por nenhuma
delas.
Consequentemente surgem as gangues, mas apenas em condições favoráveis e em
um meio definido; elas não são incorrigíveis e podem ser controladas. A gangue é uma
resposta à desorganização social, e desenvolve a sua moral por meio da ação coletiva e do
conflito, criando uma consciência de grupo e uma ligação a um território.
As gangues são uma manifestação da ausência de assimilação em meio a esse
processo de desorganização social.
Dessa forma, acrescenta COULON, que não são a cultura e as normas que determinam
as ações dos sujeitos, mas sim suas interpretações frente às diversas situações (1987, p.13)
a etnometodologia colocará de outra forma o problema: a relação entre ator e
situação não estará baseada no aspecto cultural e nem nas regras, mas sim que
nasceram a partir de processos de interpretação. Há então uma troca de
paradigma sociológico: com a etnometodologia passamos de um paradigma
normativo para um paradigma interpretativo
Alfred Schutz (apud COULON, 1987, p.14) continua dizendo que “Este mundo é um
mundo intersubjetivo, um mundo de rotina em que os atos da vida cotidiana são realizados,
em sua maioria, maquinalmente. A realidade parece natural e sem problemas”. Os rituais de
todos os dias, sua estabilidade e impermutabilidade, faz com que se perca a capacidade de
olhar e analisar as situações do ponto de vista da construção social, pois a realidade se
apresenta de maneira pronta e acabada.
Fazer essa leitura da substância das situações, e não simplesmente ficar em sua
aparência,
e
significa-las
são
o
que
propõe
o
interacionismo
simbólico,
fonte
da
etnometodologia. É uma contraposição às ideias sociológicas durkheimianas, as quais não
toleram a subjetividade do indivíduo como parte do fazer sociologia. Assim, segundo Coulon
(1987, p.16-17):
Outra fonte da etnometodologia é o interacionismo simbólico. Encontra sua
primeira origem na Escola de Chicago, cujos principais representantes são
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Robert Park, Ernest Burgess e William Thomas. [...] O interacionismo simbólico
defende a opinião contrária à formulada por Durkheim sobre o ator. Durkheim,
ao reconhecer a capacidade do ator para descobrir os atos sociais que o rodeia,
considera que essas descrições são demasiado vagas, ambíguas, para que o
investigador possa usá-las cientificamente, dado que, além disso, estas
manifestações subjetivas não competem ao âmbito da sociologia. Pelo contrário,
o interacionismo simbólico sustenta que a concepção que se fazem dos atores
sobre o mundo social constitui, no fundo, o objeto essencial da busca
sociológica.
A subjetividade dos indivíduos se traduz em atos, dentro de interações sociais. Tais
atos, fenômeno concreto, não deixa de ser entendido como algo objetivo: “[...] Em primeiro
lugar, há que se ter em conta o ponto de vista dos atores, seja qual for o objeto de estudo,
porque precisamente através do sentido que dão aos objetos, às pessoas, aos símbolos que os
rodeiam, os atores fabricam seu mundo social” (COULON, 1987, p.17-18).
Com isso, compreende-se que as interações sociais também são construídas pelas
pessoas nelas inseridas. Tem caráter instável; logo, para que o indivíduo permaneça nessa
interação, ele deve aprender e utilizar a linguagem natural do grupo, ou seja, é carregada de
indicialidade:
As expressões que os atores empregam nos seus atos interacionais estão
carregadas de indicialidade, ou seja, são formadas de expressões que somente
ganham significado a partir do conhecimento do contexto local onde elas são
produzidas. A indicialidade é assim essa incompletude que toda palavra possui.
Ela precisa estar situada num contexto específico para revestir-se de significado
(VOTRE; FIGUEIREDO apud GUESSER, 2003, P.160).
Dessa forma, “a interação se define como uma ordem negociada, temporal, frágil, que
deve ser reconstruída permanentemente com o fim de interpretar o mundo” (COULON, 1987,
p.19).
Para o interacionismo simbólico, a sociologia realmente cumpre seu papel quando se
utiliza do momento imediato. Assim uma pessoa é para outra tal qual ela é rotulada (teoria de
atribuição de rótulos ou Labelling Theory). Os adeptos do Labelling Theory acreditam que o
mujndo social é construído aqui e agora, assim como quando se rotula uma pessoa: ela passa
a ser tal qual é descrita, na medida em que seus comportamentos confirmam seu rótulo inicial
(FIGUEIREDO, online). Quando um indivíduo rotula o outro, este outro passa a agir como tal,
pelo menos segundo a interpretação do primeiro.
Coulon (1987, p.19) dá prosseguimento ao assunto, informando que o mesmo processo
ocorre com aquele considerado (rotulado) como desviante:
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As pessoas, por exemplo, são rotuladas como desviantes (Labelling Theory). O
desvio já não é considerado como uma qualidade, uma característica própria da
pessoa. Pelo contrário, considera-se que o desvio é produzido por um conjunto
de definições instituídas pela reação da sociedade ante aos atos mais ou menos
marginais.
Willard Waller, aluno de Park, na escola de Chicago, nos anos 20, publicou um estudo
sobre o interacionismo na educação: “o mundo da escola é um mundo social, repleto de
significações que devem ser exploradas, [...] de tal modo que os personagens não percam
suas qualidades de pessoas [...]” (apud COULON, 1995b, p.63).
Coulon ressalta também a importância de se estudar empiricamente a vida cotidiana da
escola, as interações sociais, elos da escola com a comunidade, descrevendo de forma mais
precisa possível a vida dos atores da escola, com a finalidade de identificar os mecanismos que
são as causas dessas interações. Os maiores colaboradores dessa experiência social foram os
professores, por meio do empiricismo (COULON, 1995b). Ao se analisar a vida dos atores da
escola, descobrem-se as raízes do processo que levam os sujeitos a agirem de determinada
forma dentro da escola.
O autor prossegue dizendo que Waller, com a finalidade de analisar a vida dos atores
sociais, utilizou-se de diversos tipos de documentos primários, tais como histórias de vida,
estudos de caso, diários íntimos, cartas, entre outros documentos pessoais. Realizou uma
pesquisa qualitativa aplicada a um tema da vida cotidiana. Assim, os atores sociais diziam
coisas que pensavam que não valessem a pena ou que não estavam sendo vistas por serem
muito evidentes, óbvias (1987, p.64). É nesse sentido que a etnometodologia trabalha: que a
partir de falas consideradas banais, triviais, o sociólogo possa analisar as motivações que
levam o sujeito a agir de tal maneira.
A escola é um local de rituais complexos que regem as relações pessoais, onde é fácil
perceber que o mundo da criança é muito diferente do mundo do adulto, desencadeando
conflitos. Existem duas espécies de conflitos: os que opõem os professores aos alunos e o
conflito clássico de geração (adultos – crianças). A cultura da criança manifesta-se nas
diversas atividades da escola e na maneira de tratar o adulto.
A situação (possibilidades de ação) da escola é aquela em que predomina a dominação
dos professores e a subordinação dos alunos. Entretanto, a subordinação às definições do
professor não dá absolutamente qualquer preparação e tampouco uma formação real e de
criticidade à criança, pois são esvaziadas de significação (COULON, 1995b). A única
possibilidade de ação dos alunos na escola é serem passivos; paradoxalmente, as relações
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sociais e o próprio mundo do trabalho exigem cada vez mais pessoas ativas e criativas, de
forma que a formação escolar de fato não prepara o estudante para a vida.
São diversos os conflitos na escola. Quando os alunos definem suas possibilidades de
ação de maneiras diferentes, acontece a indisciplina. A resistência dos alunos perante a escola
acontece porque estes a frequentam obrigados pelos pais, ou seja, a vontade de aprender não
é algo intrínseco a eles. Há também a desobediência e busca incessante por incidentes,
condutas que se traduzem em uma regra geral do conflitante. Logo depois vem a rejeição do
trabalho escolar.
A autoridade dos professores e a pressão da família causam revolta. O
sistema de notas, classificatório e exclusivo, leva o aluno a praticar fraudes, plágios.
Com todas essas informações acerca da escola, o autor chega à conclusão de que o
fracasso escolar ocorre devido à burocratização e às aulas rotineiras adotadas pelos
professores.
A escola é o ambiente onde se cristaliza quatro desejos: o desejo de resposta, que tem
relação com as interações sociais, ou seja, amizade, desejo de estar próximo, sexual - embora
reprimido pela escola; o desejo de reconhecimento, através do sistema de recompensas e
medalhas; o desejo de uma nova experiência, como resultado da monotonia da rotina; o
desejo de segurança, afinal a sala de aula é o lugar onde paira o medo: medo do professor de
perder o controle da sala, e o medo do aluno das punições, das provas ou de parecer estúpido
(COULON, 1987).
O ambiente escolar não cumpre seu papel de emancipador, pois toda sua “engrenagem”
não funciona: dominação, geradora dos mais variados conflitos; burocratização; aulas
rotineiras, sem nenhum atrativo que possa desencadear o interesse pelo aprender. Sem esses
pré-requisitos, a escola não consegue desenvolver eficientemente um trabalho com vistas aos
quatro desejos.
MATERIAL E MÉTODOS
O método de abordagem utilizado na confecção deste artigo foi o fenomenológico,
caracterizado por buscar o sentido do fenômeno, o qual precisa ser mostrado:
Tal abordagem filosófica identifica-se por assegurar o sentido dado ao
fenômeno. Vai mostrar que o mundo é o fenômeno, o que se mostra, embora
precise ser desvelado. Busca chegar ao fenômeno, desvelar o sentido deste que
se mostra, para chegar àquilo que a coisa é. O fundamental nesta corrente está
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na descrição. A direção primeira que Husserl deu à fenomenologia foi a de ir às
coisas mesmas (SILVA; LOPES; DINIZ, 2006, p.255).
Quanto ao método de procedimento, constitui-se como sendo histórico, pois faz-se
necessário pesquisar a história do indivíduo para compreender o desenrolar e a construção de
suas ações, “[...] por isso é importante pesquisar suas raízes para compreender sua natureza
e sua função” (QUADROS, 2012, p.66). Pesquisar as raízes do problema é desvendar os
motivos que desencadeiam as atividades humanas.
TIPOLOGIA DA PESQUISA
A forma de abordagem do problema deste artigo é a qualitativa, pois a própria
etnometodologia se configura em métodos de pesquisa qualitativa, pois compreende
fenômenos que devem ser interpretados, analisados. Sobre isso, Quadros diz que uma
pesquisa é qualitativa quando “há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, isto é,
um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito que não pode ser
traduzido em números” (2012, p. 39).
Segundo os objetivos, este artigo se delineia como uma pesquisa explicativa, visto que
pretende explicar, por meio da interpretação do significado que o ator social atribui à realidade
social, quais e como se dão os mecanismos que levam o sujeito a agir e construir a sua
realidade. Quadros complementa informando que “As pesquisas explicativas são mais
complexas, pois, além de registrar, classificar e interpretar os fenômenos estudados, tem
como preocupação central identificar seus fatores determinantes” (2012, p. 43-44).
Já segundo os procedimentos técnicos, o presente artigo se consolidou através de
pesquisa bibliográfica de obras na área estudada, ou seja, sociologia, especificamente com
relação à etnometodologia e sua relação com a educação.
RESULTADOS
Quanto aos resultados, observou-se que o emprego da pesquisa da história de vida do
aluno e a observação de suas ações no meio escolar proporcionam ao professor uma
percepção de como esta criança significa a realidade social e atua nela. Quando o professor
tem essa prévia de que a realidade é uma construção e não algo dado como pronto e natural,
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ele pode intervir de modo que o aluno possa ressignificar suas vivências e experiências na
escola.
DISCUSSÃO
O método de pesquisa qualitativo conhecido como etnometodologia busca compreender
quais são as percepções que o indivíduo tem sobre sua realidade social, pois acredita que a
partir daí concretiza seus atos. Os alunos, sujeitos do mundo escolar, também são
construtores da realidade do mesmo. Sendo assim, o professor preocupado com uma prática
pedagógica democrática e progressista, pode se utilizar da etnometodologia na gestão da sala
de aula, procurando entender através dos registros e falas das crianças, como elas percebem
as situações a sua volta. A partir dessas reflexões, pensar em estratégias que levem os
estudantes “desviantes” a reconstruir sua visão sobre a realidade social.
Algumas dessas estratégias podem ter como ponto de partida os quatro desejos
cristalizados pela escola, ou seja, o professor deve propiciar interações sociais sadias entre ele
e os alunos e também entre os próprios alunos; dar foco no reconhecimento daquilo que ele
faz de positivo, por menor que seja, e não ficar somente ressaltando as más ações do aluno;
proporcionar aulas dinâmicas que podem se configurar um meio fértil de canalização de
energias e aprendizagens significativas; e acabar com o autoritarismo, privilegiando que os
alunos ajam segundo valores que vão sendo construídos dia a dia, e não regras desprovidas de
significação.
Frente a todo esse contexto de conflitos no ambiente escolar, também é mister se
pensar sobre a questão dos rótulos, pois uma pessoa age tal qual o outro a interpreta. Logo,
se o professor compreende certo aluno como desviante, todas as ações que esse executar
serão interpretadas como desviantes da mesma forma, o que pode não ser uma compreensão
verídica da realidade, sendo apenas um estudante com qualidades diferentes da maioria.
A ausência da investigação sociológica é então causadora de preconceitos e barreiras,
as quais devem ser quebradas e superadas, através de análises e reflexões das atitudes
cotidianas. Sem aproximação, diálogo e observação crítica não é possível compreender as
interpretações do indivíduo, portanto ficam impossibilitadas as tentativas de se transformar
positivamente as interações sociais em sala de aula.
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REFERÊNCIAS
BECKER, H. Conferência A Escola de Chicago. In: Mana – estudos de Antropologia Social, vol.
2, no. 2, out/ 1996, snt
COULON, Alain. A escola de Chicago. Campinas: Papirus, 1995.
______________. Etnometodologia e educação. Petrópolis: Vozes, 1995.
______________. La etnometodologia. Madrid: Cátedra, 1987.
GUESSER, Adalto H. A etnometodologia e a análise da conversação e da fala. Em tese,
ago./dez. 2003. Disponível em: <http://www.emtese.ufsc.br>. Acesso em: 02 abr. 2013.
FIGUEIREDO,
Carlos.
Etnometodologia.
Disponível
em:
<http://www.carlosfigueiredo.org/?pag=lavie&acao=ler&idla=8>. Acesso em: 25 mar. 2013.
QUADROS, Marivete Basseto de. Projeto de pesquisa: texto em re-construção. Jacarezinho:
UENP – Universidade Estadual do Norte do Paraná – Centro de Ciência Humanas e da Educação
/ CJ. Pedagogia, Jacarezinho, 2012.
SILVA, Jovânia Marques de Oliveira e; LOPES, Regina Lúcia Mendonça; DINIZ, Normélia Maria
Freire. Fenomenologia. Revista Brasileira de Enfermagem, mar./abr. 2008. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672008000200018>.
Acesso em: 24 maio, 2013.
Para citar este artigo:
SILVA, Camila Borges da. Etnometodologia e a pesquisa científica acadêmica: o que as
pessoas pensam sobre suas práticas sociais? . In: XIII CONGRESSO DE EDUCAÇÃO DO NORTE
PIONEIRO Jacarezinho. 2013. Anais...UENP – Universidade Estadual do Norte do Paraná –
Centro de Ciências Humanas e da Educação e Centro de Letras Comunicação e Artes.
Jacarezinho, 2013. ISSN – 18083579. p.199 - 208.
208
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