HOMILIA DA SOLENIDADE DE SANTA MARIA, MÃE DE DEUS
01 Janeiro 2015 – Sé Catedral de Braga
Rev.mo Senhor Deão,
Rev.mos Senhores Cónegos e demais Concelebrantes
Minhas irmãs, meus irmãos,
A Liturgia dedica o primeiro dia do ano civil a Maria, evocando-A como
Theotokos, «Mãe de Deus».
Desde 8 de Dezembro de 1967, que o 1º dia de Janeiro foi proclamado também
Dia Mundial da Paz. A primeira mensagem a favor da Paz foi apresentada pelo Papa
Paulo VI a 1 de Janeiro de 1968; hoje celebramos o 48º Dia Mundial da Paz. Com o
Salmista rezamos: «Deus se compadeça de nós e nos dê a Sua bênção, a sua Paz» (Sl
66). Procurarei desenvolver esta reflexão em três momentos: O Ministério da
maternidade Divina de Maria, a Palavra de Deus proposta pela Sagrada Liturgia e a
Mensagem de Sua Santidade o Papa Francisco para este dia Mundial da Paz.
1 – Foi em Éfeso, no terceiro Concílio Ecuménico, realizado no ano 431, que a
Virgem Santa Maria foi (…) proclamada pelos Patriarcas, Metropolitas e Bispos ali
presentes, «Mãe de Deus». O Concílio convocado pelo Imperador Teodósio II,
destinava-se a resolver as heterodoxias ensinadas por Nestório, que tendia a admitir
duas pessoas distintas em Jesus Cristo, sendo Maria a Mãe do homem Jesus, mas não a
Mãe de Cristo, o Unigénito Filho de Deus feito homem, por isso recusava a Nossa
Senhora a designação de Mãe de Deus.
S. Cirilo de Alexandria foi o teólogo que apoiado no Papa Celestino II, ajudou os
Padres Conciliares a definirem correctamente a Fé de sempre: Maria, a Mãe do Verbo
de Deus Encarnado, que veio ao Mundo para cumprir uma missão: a redenção da
Humanidade. A Sua natureza humana está intrinsecamente destinada a regenerar a
Humanidade: Cada homem, os homens todos, todo o Homem. Ao escolher Maria para
Sua Mãe, Cristo associou-A intimamente à Sua missão, à obra da Redenção.
Como recorda o Concílio Vaticano II, na Constituição Dogmática Lumen
Gentium, nº 60, «o nosso Mediador é um só (…), Jesus Cristo. Mas a função maternal
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de Maria em relação aos homens de modo algum ofusca ou diminuiu esta única
mediação de Cristo, manifesta antes a Sua eficácia». Pelo Seu «Sim», Maria entrou
definitivamente no Ministério da Salvação: gerou no Seu seio a humanidade do Filho,
que o Pai havia gerado, desde toda a eternidade. Maria participa na regeneração de
todos os Homens, por isso A invocamos como Mãe da Igreja e Mãe de todos os
Homens!
2 – A Palavra de Deus proposta pela Liturgia para esta Solenidade e Dia
Mundial da Paz conforta-nos na Primeira Leitura, retirada do livro dos Números (6, 2227), com a certeza da providência de Deus. Ele está continuamente presente em nossas
vidas; Ele salva e liberta com a Sua bênção e proteção. No prenúncio do Emanuel, Ele
«faz brilhar sobre nós a luz do Seu rosto e concede-nos a Sua Paz». Esta é uma bênção
própria da liturgia judaica que se apresenta numa tríplice invocação e apela de modo
crescente à Misericórdia de Deus: «O Senhor te abençoe e proteja»; «O Senhor faça
brilhar sobre ti a Sua face e te seja favorável»; «O Senhor volte para ti os Seus olhos e te
conceda a paz». Ao iniciarmos o Ano Civil, eis as bênçãos que o Senhor nos endereça
através da Sua Igreja!
A Bênção de Deus oferecida ao Seu Povo, na «plenitude dos tempos» fez-se
Homem, encarnou. Deus passou a falar-nos por Seu próprio Filho, que assumiu a nossa
humanidade para nos tornar participantes da Sua divindade.
Ao fixarmo-nos nesta cena descrita por São Lucas (2, 16-21), percebemos que a
reacção dos pastores de Belém perante o anúncio do nascimento de Jesus, bem pode
sugerir a nossa atitude de também nós nos dirigirmos a Belém, pois lá está a «Luz que
ilumina todos os Povos»: a quem foi dado o nome de Jesus, indicado pelo Anjo, antes
de ter sido concebido no seio materno». Jesus o nome designado por Deus,
etimologicamente significa aquilo que Jesus é na realidade, «Yahweh que salva».
Perante a beleza do Mistério de Encarnação, Lucas mostra-nos Maria como
Mãe-educadora: Ela ensina-nos a viver este mistério no recolhimento, na intimidade e
na partilha acolhedora perante aqueles que chegam e procuram a Luz.
Na Segunda Leitura, extraída da Carta de São Paulo aos Gálatas (4, 4-7), o
Apóstolo recorda-nos que somos realmente filhos de Deus, podendo cada um de nós
dirigir-se a Ele com a confiança das criancinhas: «Papá», «Abbá». S. Paulo, redigindo
em Grego, mantém a expressão carinhosa e familiar «Abbá» na língua original, para
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perpetuar o impacto que o modo de Jesus se dirigir ao Pai, causou nos próprios
discípulos, pois jamais um judeu se atrevera a dirigir a Deus com esta familiaridade e
proximidade.
Este texto guarda a única vez que S. Paulo, em todas as suas cartas, menciona a
Virgem Maria: «nascido de uma mulher». Ao referir-se à Mãe de Jesus, sem qualquer
alusão a um pai carnal, parece insinuar a maternidade Virginal de Maria, a Mãe de
Deus que hoje celebramos. Pela reflexão teológica de Paulo de Tarso, concluímos com
alegria que ao celebrarmos neste Tempo de Natal o Nascimento do Filho de Deus,
também celebramos a nossa filiação divina.
3 – Na sua mensagem para o Dia Mundial da Paz, intitulada «Já não escravos,
mas irmãos», o Papa Francisco extrai todas as consequências da filiação divina
anunciada pelo Apóstolo de Tarso aos cristãos da Galácia e assumidos nos deveres
fraternais anunciados na Carta a Filémon perante o escravo Onésimo, agora seu irmão
porque batizado do Sangue de Cristo (Flm. 1,8-22).
Francisco lembra que «sendo o homem um ser relacional, destinado a realizarse no contexto de relações interpessoais inspirados pela justiça e pela caridade, é
fundamental para o seu desenvolvimento que sejam reconhecidas e respeitadas a sua
dignidade, liberdade e autonomia». É perante estas dimensões antropológicas que o
Papa apela a que «saibamos resistir à tentação de nos comportarmos de forma não
digna da nossa humanidade» e que «a fraternidade constitui a rede de relações
fundamentais para a construção da família humana».
Olhando para as múltiplas facetas da escravatura de ontem e de hoje, o Bispo de
Roma aponta algumas das suas causas: «(…) Na raiz da escravatura, diz o Papa, está
uma conceção da pessoa humana que admite a possibilidade de a tratar como um
objeto».
Esta
manipulação
da
pessoa
humana
exprime-se
na
pobreza,
no
subdesenvolvimento, na exclusão, na falta de acesso à educação e nos escassos ou até
inexistentes oportunidades de emprego.
Francisco lembra que: «Não raro, as vítimas de tráfico e servidão são pessoas
que procuravam uma forma de sair da condição de pobreza extrema e, dando crédito a
falsas promessas de trabalho, caíram nas mãos de redes criminosas que gerem o tráfico
de seres humanos. Estas redes utilizam habilmente as tecnologias informáticas
modernas para atrair jovens e adolescentes de todos os cantos do mundo».
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Perante a «corrupção daqueles que para enriquecer estão dispostos a tudo»;
perante a corrupção dos intermediários, de alguns membros das forças da polícia, de
outros atores do Estado ou de variadas instituições civis e militares» e perante os
conflitos armados, as violências, a criminalidade e o terrorismo que também são outras
causas da escravidão, o Bispo de Roma apela ao compromisso comum para vencer a
escravatura através da prevenção, da protecção das vítimas e da ação judicial contra os
responsáveis. O Papa lembra que «a ação para vencer este fenómeno requer um esforço
comum e igualmente global por parte dos diferentes atores que compõe a sociedade».
O Santo Padre sintetiza na sua Mensagem alguns aspectos implicados com as
novas formas de escravatura, como: legislações nacionais sobre o trabalho, as
migrações, as adoções, a transferência das empresas e a comercialização de produtos
feitos por meio da exploração do trabalho, a impunidade da corrupção, o papel da
mulher na sociedade, o papel da Comunicação Social e a responsabilidade social do
consumidor, pois «comprar é sempre um ato moral, para além de económico» (Bento
XVI, Caritas in Veritate, 66).
Perante os desafios lançados pelo Papa, a Arquidiocese de Braga sente renovada
responsabilidade de assumir os desafios do seu plano pastoral, “Fé Vivida”, «A Fé: se
ela não tiver obras, está completamente morta» (Tiago 2, 17). Como nos lembra
Francisco: «A globalização da indiferença, que hoje passa sobre a vida de tantas irmãs e
de tantos irmãos, requer de todos nós que nos façamos artífices duma globalização da
solidariedade e da fraternidade (…)». Eis o nosso desafio: Redescobrir a beleza da
identidade cristã, para que «a comunidade cristã seja o lugar da comunhão vivida no
amor entre os irmãos».
Frutuoso e fecundo Ano Novo para todos. Que seja novo, porque renovado na
alegria do Evangelho, na Fé Vivida em compromisso social.
+ Francisco José, Bispo Auxiliar de Braga
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