Augusto Guzzo Revista Acadêmica
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Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Copyrigth: Augusto Guzzo Revista Acadêmica. - http://www.campossalles.edu.br - ISSN 1518-9597
Publicação Semestral das Faculdades Integradas "Campos Salles".
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Projeto gráfico, capa e TI – Flavio Antonio Saccardo - (FICS-SP).
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Editora: Profa. Dra. Monica Maria Martins de Souza – Jornalista (MTE).
Co-Editor: Prof. Ms Claudinei Senger (UNISANTOS-SP).
Augusto Guzzo Revista Acadêmica - http://www.campossalles.edu.br - é uma publicação semestral e
multidisciplinar vinculada às Faculdades Integradas “Campos Salles” – FICS.
No 9 – junho de 2012 - São Paulo: FICS, 2012. 28cm.
Semestral – ISSN 1518-9597 - Tiragem desta edição: virtual
Funcionário homenageado nesta edição por relevantes serviços prestados à instituição por mais de 40
anos: NEUSA E. ANSELMO.
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Augusto Guzzo Revista Acadêmica
ISSN 1518-9597
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
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São Paulo
No 9
Junho
2012
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Missão: proporcionar reflexões acerca de temáticas acadêmicas relevantes e principalmente ser um veículo de
comunicação científica para dar publicidade às ideias e pesquisas do mundo atual; ser, de fato, um espaço para
publicação de professores pesquisadores e alunos de iniciação científica divulgarem seus estudos e pesquisas.
Sem prejuízo de acolhimento e difusão de contribuições da engenharia do conhecimento, este veículo acolhe
todos os campos do conhecimento acadêmico e não elege nesta Edição, uma área temática preferencial.
Privilegia a multidisciplinaridade e compõe os temas em dossiês - artigos, resenhas e similares, nacionais e
internacionais, contribuindo para o debate intelectual.
Convidados desta Edição
Prof. Adriano Carlos A. de P. SOUSA (UFSC)
Pesquisadora: Daniela MARQUES – (USP)
Profa. Dra.Fernanda Cristina B. P. QUEIROZ (UFRN).
Prof. Dr.Hélio Roberto HÉKIS (UFSC).
Prof. Dr. Jamerson Viegas QUEIROZ (UFRN).
Prof. Dr. Jean LAUAND (USP)
Prof. Dr. Jorge Luis Risco BECERRA (USP)
Pesquisador: Juan Felipe R. NARANJO (USP)
Prof. Leonardo Dominguez DIAS (USP)
Prof. Lucas Ambrósio B. de OLIVEIRA
Prof. Dr.Marciano FURUKAVA
Prof. Esp. Pesquisador: Mauricio Pedro da SILVA
Pesquisadora: Mirelle Monique de O. FERNANDES (PUC-SP)
Profa. Natália Veloso C. de VASCONCELOS
Prof. Ms. Ricardo Araújo CAMARGO
Prof. Dr. Rudá B. Carlos de AMORIM
Prof. Ms. Ruy GUÉRIOS
Prof. Dr. Victor Silva ECHETO (ESPANHA)
Pesquisador: William Roberto DONDAS (PUC-SP)
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SUMÁRIO
Editorial ................................................................................................................................
8
Cambios en la temporatidad y en la espacialidad de la comunicación ...............................
10
Pedagogia medieval ocidental: corpo e educação em Tomás de Aquino ...........................
16
Pedagogia oriental: corpo e educação ................................................................................
24
Coordenação pedagógica e corpo docente: a importância da formação continuada .........
31
Contribuição dos Sistemas Integrados de Gestão para as Práticas de Ensino e
Aprendizagem .....................................................................................................................
.
45
Fundamentos de uma Fábrica de Software Orientada a Objetos Processos .....................
53
As políticas públicas para desenvolver a economia local do Rio Grande do Norte e a
contribuição do turismo no litoral norte ...............................................................................
.
62
O papel estratégico da cultura organizacional na construção da personalidade no
trabalho ...............................................................................................................................
.
75
Marketing e o conceito de ética: principais implicações no ambiente empresarial .............
86
Qualidade: ferramenta representativa e diferencial competitivo na prestação de serviços .
96
Universidade corporativa em bancos ...................................................................................
109
Andragogia: um novo olhar para a subjetividade ................................................................
121
Semântica, lexicometria e representação do conhecimento: congruências e aplicações ao
ensino de língua materna ....................................................................................................
.
131
As Inteligências Múltiplas: Uma Análise de Conteúdo de Pesquisa ....................................
148
Acesso a coleções de dados usando LINQ .........................................................................
157
Víctor Silva Echeto
Jean Lauand
Chie Hirose
Marcos Roberto Celestino
Fernanda Cristina Barbosa Pereira Queiroz, Hélio Roberto Hékis, Jamerson Viegas Queiroz, Lucas
Ambrósio B. de Oliveira, Natália Veloso Caldas de Vasconcelos
Leonardo Dominguez Dias, Juan Felipe Restrepo Naranjo, Daniela Marques e Jorge Luis Risco
Becerra
Adriano Carlos Amorim de Paiva Sousa, Fernanda Cristina Barbosa Pereira Queiroz, Marciano
Furukava, Jamerson Viegas Queiroz e Rudá Barros Carlos de Amorim
Claudinei Senger, Mauricio Pedro da Silva e Mônica Maria Martins de Souza
Mirelle Monique de Oliveira Fernandes, Paulo Roberto Alves e William Roberto Dondas
Mônica Maria M. de Souza, Ricardo Camargo de Araújo e Ruy Guérios
Paulo Roberto Alves
Cimara Apostolico
Elizabete Damasceno
Mauro Maia Laruccia e Sergio Roberto Cosmano
João Alexandre Magri
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EDITORIAL
A Revista Acadêmica Augusto Guzzo das Faculdades Integradas “Campos Salles” – FICS,
que nasceu em 2000, foi o resultado do árduo trabalho de pesquisa que se estruturou com o
incentivo, cobrança e desejo da então Presidente da Mantenedora, Profa. Jacyra Guzzo do Carmo
Curado. Após o último suspiro da sua criadora, como ela, a revista adormeceu, mas manteve-se viva,
pois quatro anos depois, ainda preserva o seu status Qualis C.
Ela hibernou por quatro anos até despertar pelas cobranças dos avaliadores do INEP/MEC, por
pesquisas do corpo docente e discente.
Diante da necessidade de melhorar a performance institucional, a coordenadora e o corpo docente
e administrativo se comprometeram com a pesquisa e Iniciação Científica, comprovada no número 9
desta revista, finalizada no primeiro semestre de 2012.
A revista coroa de êxito o esforço coletivo dos profissionais do ensino desta Faculdade.
Representa a vocação natural para a pesquisa e iniciação científica, que aqui sempre existiu, sem se
dar conta deste fazer, pois, não era pensada como tal. Sempre esteve inserida na metodologia de
ensino e presente no planejamento das aulas - no projeto integrador, multidisciplinar, que instiga aluno
e professor a pesquisar, elaborar ideias e construir textos.
Esta produção semestralmente apresentada em forma de banners e exposta no hall da faculdade
remonta o início dos cursos tecnológicos. A apresentação promove o desenvolvimento e a habilidade
do aluno em se comunicar com o público interno e a comunidade do entorno.
Para operacionalizar a teoria na prática e construir a competência técnica, professores alunos
organizam eventos semestrais com a participação de palestrantes internos e externos. Esse
movimento trata da interface da diversidade e reflete sobre os temas multidisciplinares.
A oficina de artigos, embora sempre tenha se mantido viva informalmente, foi revitalizada pela
coordenadora Monica Martins, no segundo bimestre de 2012, no formato oficial de Grupo Pesquisa, e
Iniciação Científica. Os projetos integradores geram papers, artigos e relatos de pesquisa e são
apresentados com os banners nos seminários semestrais por professores, alunos do colégio, do
técnico, tecnológico, Graduação e Pós-Graduação. Os melhores trabalhos que se destacam neste
evento são selecionados para a revista.
O projeto de pesquisa consolida, nesta instituição, o procedimento investigativo natural do ato de
estudar. Os Seminários fortaleceram a nona revista gráfica, agora digitalizada, e o lançamento do
primeiro número da Revista eletrônica no segundo semestre de 2012 dará muito mais visibilidade ao
ato de pesquisa desta instituição. Ela contempla a engenharia do conhecimento e privilegia todas as
áreas do ensino.
Paralelamente a essa produção, no mês de maio, a instituição realiza o Seminário Internacional:
Filosofia e Educação – Fundamentos e políticas desde a década 90. Evento promovido pela FICS,
Centro de Estudos Medievais Oriente & Ocidente CEMOrOc/EDF/FEUSP e Instituto
Interdisciplinar - IJI Universidade do Porto, organizado pelo Prof Dr. Jean Lauand, do Grupo de
Pesquisa USP/FICS.
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Augusto Guzzo Revista Acadêmica
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Víctor Silva Echeto 1
Cambios en la temporatidad y en la espacialidad de la
comunicación
1. Antecedentes de la “Ecología Gris”
Temprano es el análisis de Vilém Flusser
que podría llamarse “ecológico”, extrayéndole
a este comcepto la connotación simplemente de
lo “verde”, y trasladándolo a la “comunicación”, “la imagen visual” y la “filosofía”. La
tradicional separación antropológica entre
naturaleza y cultura, tan cara a una larga
tradición que, en algunos momentos, funciona
como perspectiva metodológica, es decir, la
facilidad estructuralista de separar en
clasificaciones las complejidades sócioculturales, y, en otros, como una deriva teóricoconceptual que, al intentar distanciarse para
mantener la “objetividad” concibe al otro como
una alteridad emparentada con la naturaleza, la
que, a su vez, le da sustento. La “mismidad”
del antropólogo lo aparta de la alteridad del
otro, natural y no cultural.
El “colegio invisible” o “escuela de Palo
Alto” ya había “visibilizado” que la naturaleza
y la cultura más que instancias separadas
confluyen en un enfoque ecológico,
cuestionando esa tradición antropológica que
planteaba la separación como clasificación
estructural. En fechas más recientes, Félix
Guattari (1996: 33), sostiene que “hoy menos
que nunca puede separarse la naturaleza de la
cultura, y hay que aprender a pensar
transversalmente” las interacciones entre
ecosistemas, maquinosfera y cultura.
Así las cosas, el ser humano, para el colegio
invisible, tiene una esencia biológica, diría
abusando de los conceptos que es “un mono
avanzado”. El origen y la base biológica se
encuentran aún presentes y tienen sus orígenes
miles de años atrás, desde el momento mismo
del inicio del proceso de hominización. Esto
significa que el ser humano conserva aún en su
esencia comportamientos, actitudes y manifestaciones ancestrales. Como indica Norval
Baitello jr (2005: 71), las investigaciones, de
los llamados siste-mas afectivos entre primates
superiores, de los cuales los humanos
formamos parte, permiten aclarar aspectos
fundamentales respecto de la naturaleza y de la
motivación de los vínculos primordiales de sus
sistemas comunicativos. “As ciências da
comunicação não terão nada a perder quando
deixarem de lado seu antropocentrismo e
pássarem a considerar, estudar e compreender
outros sistemas comunicativos não
humanos” (Baitello, 2005: 72). En términos de
Michel Serres (2011: 31), refiriéndose a la
experiencia de los trepadores de alta montaña,
“Homo erectus, el hombre de pie, reciente,
vuelve a aquel del que desciende, el
cuadrumano arcaico”. Mono, araña, molusco,
Analógicamen-te, trepan la alta montaña.
La comunicación, para la interdisciplinaria
Palo Alto (donde confluían comunicólogos,
antropólogos/as, psicólogos, cibernéticos), era
ese espacio de confluencia. Por ello, como
afirmaba Paul Watzlawick, no se puede no
comunicar. No obstante, para Palo Alto
(Bateson, Hall, Watzlawick), como fundamento
del “interaccionismo simbólico”, esas
Víctor Silva Echeto - Possui graduação em Licenciatura en Ciencias de la Comunicación - Universidad de La Republica Oriental
Del Uruguay (1999), mestrado en Comunicación pela Universidade Internacional de Andalucia (2000) e doutorado em Estudios
Culturales: Literatura y Comunicación - Universidad de Sevilla (2003). Atualmente é professor/investigador - Universidad de Playa
Ancha, professor - Universidad Austral de Chile e professor - Universidad de Artes y Ciencias Sociales, e professor/investigador
estrangeiro da FAPESP.
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Augusto Guzzo Revista Acadêmica
relaciones y vínculos (de última comunicar es
vincular) son la base de los intercambios
personales. Comunicación, en ese contexto, no
es unicamente mediaciones técnicas (como
sostenían el funcionalismo o la teoría
matemática de la información) sino,
fundamentalmente, mediaciones primarias (en
términos de Pross) e interpersonales.
El recorrido se inicia en 1959 cuando el
psiquiatra D. Jackson, funda el Mental
Research Institute, tres años después se integra
Paul Watzlawick, ambos, en esos años, inician
las investigaciones sobre la esquizofrenia y
diversas patologías relacionadas con la
comunicación. Desde esas pesquisas surgirá
una teoría de la comunicación interpersonal
que tendrá gran relevancia en las dos deca-das
siguientes.
El contexto del interaccionismo simbó-lico,
a su vez, no se reducía a las relaciones
interpersonales sino que, además, amplió el
concepto de cultura hacia el de
interculturalidad. Es así como Edward T. Hall,
quien formó parte del colegio invisible, en las
primeras décadas del siglo XX, propuso la
noción de interculturalidad, para referirse a las
distancias que se producen entre las culturas y
como éstas se amplían y extienden en
contextos de conflictividad cultural. Hoy, en el
siglo XXI, junto con las emociones, son
nociones principales para los estudios de la
comunicación (Rodrigo Alsina, 1999).
El discípulo de Marshall Mc Luhan,
Barrington Nevitt, escribe The ecology of
communication, entrados los años ‟80, donde
planteará un enfoque que vincula la ecología a
los aspectos técnicos de la comunicación. Por
la misma época, David L. Altheide publica An
ecology of commu-nication. Cultural formats
of control, donde se refiere a las relaciones de
poder y al control social producido por los
medios. Es el volumen colectivo del
International Institute of Communications,
Cultural ecology. The changing dynamics of
communication, que analiza las repercusiones
socio-cultu-rales de las Tecnologías de la
11
Información y de la Comunicación en diversas
regiones del mundo.
2. Ecología “gris”
Si se cruza el Atlántico, se encuentra con
que los estudios “ecológicos”, en Europa,
como en Estados Unidos, son tardíos. Hay que
destacar, al respecto, los aportes que se
producen tanto en Alemania como en Francia,
y, posteriormente en España por parte Vicente
Romano (2004).
En el primer país, se destacan las
contribuciones de Mathias Donath (1998),
quien extiende el concepto de Mit-Mensch al
de Mit-Welt, es decir, no solo se refiere al
prójimo humano sino, también, al prójimo
natural, al entorno. Barbara Mettler von
Meibom (1990), aborda la ecología, desde una
perspectiva sistémica, es decir, desde una
mirada integrada entre sistemas tecnológicos,
sociales, ecológicos. Radicalizando el
planteamiento y llegando a proponer, en
algunos momentos, “el derecho a la no
asequibilidad y a zonas o tiempos sin
tecnologías a fin” de protegerse “de la
omnipresente agresión medial” (Romano,
2004: 9).
La posibilidad de separar el enfoque
ecológico, simplemente, como protección de lo
verde, se le debe, entre otros, en Francia a Paul
Virilio. Este urbanista, la denomina la ecología
gris, porque no tiene color. Se presenta, así,
como un progreso.
“Todos se alegran y saltan de júbilo cuando se
anuncia un tren aún más rápido o un avión aún
más veloz que el anterior. Con el descubrimiento
de las armas atómicas todos gritaban que esto era
espantoso, repulsivo. Apenas si sucede esto
cuando se inventa un auto todavía más rápido, o
cualquier cosa que sea aún más rápida que
cualquier otra, porque es vitoreada casi
absolutamente por todos, sin importar que esta
contracción nos presione y asfixie” (Virilio, 1999:
s/p).
Todavía no hay una sensibilización por las
dimensiones de esta ecología gris, ni con sus,
para Virilio (1999: s/p), “devastadoras
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consecuencias”. Con frecuencia, el urbanista
francés, le ha planteado “a los verdes” que se
“pondría de su lado, tan pronto se interesasen
en la ecología gris”. Hasta estas décadas “sólo
han hablado del espacio, pero no del tiempo. Si
bien, todo espacio es un espacio de tiempo; y
toda condición de vida, todo espacio ecológico
ha de habérselas con tamaños y proporciones”.
Con esto, lo que hace Virilio (1999: s/p), es
moverse “en las proporciones de un arquitecto,
quien se halla en una cierta relación con las
cosas. Las proporciones y relaciones hoy se
han contraído, tele transmitido, van derecho a
su desaparición”. En la medida que “esto se
mantenga sin ser comprendido, tampoco se
habrán planteado todas las preguntas de las
ciencias (…) Los conocimientos técnicos son
un drama. En el siglo XIX, la ciencia técnica
parecía ser todavía un avance, comparándolo
con el diario vivir de los campesinos o de los
trabajadores. Un siglo más tarde esto es tan
sólo un drama, y símbolos de esto son ya el
hundimiento del Titanic o el accidente del
reactor de Chernobyl”. Décadas después de esa
entrevista realizada a Paul Virilio, en 2011, el
accidente en Japón de Fukushima, luego de un
terremoto y maremoto, volvió a poner frente a
frente al ser humano y sus técnicas y la
naturaleza y sus técnicas. La ecología gris
retornó. La catastrofe no fue producida por el
terremoto o maremoto sino por la radiación
emitida por la central de Fukushima.
La aceleración y la velocidad, llevan a la
pérdida de la geografía en detrimento de la
dromografía (dromo es velocidad), el espacio
se encoge y el tiempo se acelera. El entorno se
transforma en comtorno sobre el que se circula.
Paradójicamente, en las megalópolis se
produce el efecto inverso. En una megaciudad
como São Paulo, con más de 10 millones de
habitantes, 20 millones si se incluyen las
ciudades satélites y más de 7 millones de
coches, trasladarse de un sitio a otro lleva un
promedio de 3 horas diarias. La vida cotidiana
transita entre helicópteros (es la ciudad del
mundo que tiene la mayor cantidad) y metros o
subtes, sobre o bajo la tierra, como pájaros de
hierro o topos eléctricos. Paralelamente, en los
metros o subtes o en las fiestas masivas - como
la parada gay - de la megaciudad, se
experimenta la acumulación de cuerpos como
com-juntos de carnes masacradas por la falta
de espacio o, en algunos casos, por su
aniquilación.
3. De la ecología gris a la ecosofía
Gilles Deleuze y Félix Guattari (2000),
utilizan diversas terminologías de la naturaleza
para referirse a un pensamiento liberador pero,
t a m b i é n , o p r e s o r. M e s e t a s , r i z o m a s ,
enfrentados a árboles. Horizontalidad y redes a
jerarquías. También, son influenciados, a
diferencia de lo que se considera en América
Latina como pensamiento colonizador, por
teóricos de las Américas como Maturana y
Varela con nociones como las de autopoiesis,
es decir, como subjetividades inmanentes que
se auto-producen.
Guattari, posteriormente, continuará con
una deriva aún más ecológica, pasando de ésta
a la ecosofía. Es decir, en lugar de continuar
analizando la contaminación ambiental desde
una perspectiva tecnocrático económica o
funcional cuantitativa, asume su estudio desde
una óptica ético-política, la que llama,
ecosofía. De ahí su planteamiento sobre las tres
ecologías: del medioambiente, de la cultura y
de la subjetividad humana.
La respuesta a la crisis ecológica “sólo
podrá hacerse a escala planetaria y a condición
de que se realice una auténtica revolución
política, social y cultural que reoriente los
objetivos de la producción de los bienes
materiales e inmateriales”. Así las cosas, esa
“revolución no sólo deberá concernir a las
relaciones de fuerzas visibles a gran escala,
sino también a los campos moleculares de
sensibilidad, de inteligencia y de
deseo” (Guattari, 1996: 9).
Guattari destaca dos modos dominantes de
valoración de las colectividades humanas, el
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Augusto Guzzo Revista Acadêmica
primero, es “imperio de un mercado mundial”,
un Capitalismo Mundial Integrado, “que
lamina los sistemas particulares de valor, que
sitúa en un mismo plano de equivalencia: los
bienes materiales, los bienes culturales, los
espacios naturales”; el segundo, “sitúa el
conjunto de las relaciones sociales y de las
relaciones internacionales bajo el dominio de
las máquinas policiales y militares”. En esa
doble pinza, los Estados-naciones, ven “cómo
su papel tradicional de mediación se reduce
cada vez más, y a menudo se ponen al servicio
conjugado de las instancias del mercado
mundial y de los complejos militardoindustriales” (Guattari, 1996: 11- 12). En un
texto anterior, junto con Rodrigo Browne
(Silva- Browne, 2007), nos referíamos, en el
caso de las diversas crisis ecológicas producida
en el sur de Chile ante la instalación de una
planta de celulosa o al grito de que “se vayan
todos” que emanaba de las voces populares en
Quito o en La Paz, al “pensar - sinEstado” (Lewkowicz, 2004), o, el “pensar sin-comunicación”.
Para Guattari (1996: 12- 13), “el antiguo
igualitarismo de fachada de mundo comunista
da paso así al serialismo, massmediático‟ (el
mismo ideal de standing, las mismas modas, el
mismo tipo de música rock, etc.)”. En esas
palabras se escuchan los ecos Frankfurtianos
de las “industrias culturales”, concepto
transformado en “integrado” y en “positivo”
por la post-industria de la gestión y la
administración cultural. Este último es otro de
los tópicos que debería de cubrir críticamente
una nueva mirada sobre la ecología de la
comunicación y de la cultura.
Para esa mirada crítica, “es concebible, por
el contrario, que la nueva referencia ecosófica
indique líneas de recomposición de las praxis
humanas en los dominios más variados”. A las
más diversas escalas individuales y colectivas,
tanto en lo que respecta a la vida cotidiana
como a la reinvención de la democracia, en el
registro del urbanis-mo, de la creación artística,
del deporte, siempre se trata de interesarse por
13
lo que podrían ser dispositivos de producción
de subjetividad que van en el sentido de una
resingularización individual y/o colectiva más
bien que en el de una fabricación mediática
“sinonimo de angustia y de
desesperación” (Guattari, 1996: 18-19).
Estas perspectivas no excluyen la definición
de objetivos unificadores tales como la lucha
contra el hambre en el mundo, el freno de la
desforestación o la proliferación ciega de las
industrias nucleares. “Ahora bien, aquí ya no
puede tratarse de consignas estéreotipadas,
reduccionistas, que eliminan otras
problemáticas más singulares y que implican la
promoción de líderes carismáticos”, también,
pone en cuestionamiento la “industria de la
ecología” llevada adelante por algunas ONGs.
Una misma intención ético-política
atraviesa los problemas del racismo, del
falocentrismo, de los desastres legados por un
urbanismo pretendidamente moderno, de una
creación artística liberada del sistema del
mercado, de una pedagogía capaz de inventar
sus mediadores sociales. Estas problematicas
son, a fin de cuentas, la de la producción de
existencia humana en los nuevos contextos
históricos.
“La ecosofía social consistirá, pues, en
desarrollar prácticas especificas que tiendan a
modificar y a reinventar formas de ser en el
seno de la pareja, en el seno de la familia, del
contexto urbano, del trabajo”, entre otros
aspectos (Guattari, 1996: 19).
“Por su parte, la ecosofía mental se verá
obligada a reinventar la relación del sujeto con
el cuerpo, el fantasma, la finitud del tiempo,
los “mistérios” de la vida y de la muerte. Se
verá obligada a buscar antídotos” a la
uniformización mediática y telemática, “al
conformismo de las modas, a las
manipulaciones de la opinión por la publicidad,
los sondeos”. Su forma de actuar se aproximará
más a la del artista, la del performance, la del
intervencionista en contextos socioculturales,
“que a la de los profesionales
“psy” (psicoanalistas), “siempre obsesionados
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
por un ideal caduco de cientificidad” (Guattari,
1996: 19-20).
Guattari, siguiendo la lógica conceptual
iniciada junto con Deleuze, se refiere a los
“componentes de subjetivación”: que
“comduciría necesariamente a reexaminar la
relación entre el individuo y la subjetividad, y,
en primer lugar, a separar claramente los
comceptos”. Esos vectores de subjetivación no
pasan necesariamente por el individuo que está
en posición de “terminal” respecto a procesos
que implican grupos humanos, conjuntos
socioeconómicos o máquinas informáticas.
“Así, la interioridad se instaura en el cruce de
múltiples componentes relativamente
autónomos los unos en relación con los otros y,
llegado el caso, francamente
discordantes” (Guattari, 1996: 20).
Del paradigma cientificista, Guattari,
propone el pasaje al ético-estético.
“Temporalidades humanas y no huma-nas”.
Por estas últimas entiende “el desplegamiento
o, si se quiere, el dêspliegue, de devenires
animales, de deve-nires vegetales, cósmicos,
pero también de devenires maquínicos,
correlativos de la aceleración de las
revoluciones tecnológicas e
informáticas” (Guattari, 1996: 26).
Plantea reagrupar en cuatro principales
regímenes semióticos los instrumentos sobre
los que reposa el Capitalismo Mundial
Integrado:
- las semióticas económicas (instrumentos,
monetarios, financieros, contables, de decisión);
- las semióticas jurídicas (título de propiedad,
legislación y reglamentaciones diversas...);
- las semióticas técnico-científicas (planes,
diagramas, programas, estudios,
investigaciones...);
- las semióticas de subjetivación, algunas de las
cuales coinciden con las que acaban de ser
enumeradas, pero a las que convendría añadir
muchas otras, tales como las relativas a la
arquitectura, el urbanismo, los equipamientos
colectivos, (Guattari, 1996: 43-44).
Gregory Bateson propuso una “ecología de
las ideas” que no puede ser circunscrita al
dominio de la psicología de los individuos,
sino que se organiza en sistemas o
“espíritu” (minds) cuyas fronteras ya no
coinciden con los individuos que participan en
él.
Pero Guattari deja de estar de acuerdo con
Bateson, “cuando convierte la acción y la
enunciación en simples partes del subsistema
ecológico llamado contexto”. Por su parte,
considera que la “toma de contexto existencial”
depende de una praxis, que se instaura en
ruptura con el “pretexto” sistémico. No existe
una jerarquía de conjuntos que sitúe y localice
a un determinado nivel las componentes de
enunciación. Éstas se componen de elementos
heterogéneos que adquieren consistencia y
persistencia común cuando superan los
umbrales constitutivos de un mundo en
detrimento de otro.
El principio que guía a las tres ecologías
consiste, en que los Territorios existenciales a
los que se confrontan los componentes de
subjetividad “no se presentan como en-sí,
cerrados sobre sí mismos, sino como un para-sí
precario, acabado, finitizado, singular,
singularizado, capaz de bifurcarse, en
reiteraciones estratificadas y mortíferas o en
apertura procesual a partir de praxis que
permiten hacerlo „habitable‟ por un proyecto
humano”. Esa apertura práxica constituye la
esencia de ese arte de la eco o del oikos “que
subsume todas las maneras de domesticar”. No
se trata de erigir reglas universales como guía
de esas praxis, sino, a la inversa, de “extraer las
antinomias principales entre los niveles
ecosóficos o, si se prefiere, entre las tres
visiones ecológicas, los tres vasos
discriminantes”: ambientales, subjetivos y
socio-culturales (Guattari, 1996: 53).
Lógica que podría denominarse del “tercero
incluido”. En el caso particular de la ecología
del fantasma, lo que se requiere en cada
tentativa de anotación cartográfica es la
elaboración de un soporte expresivo singular o
más exactamente, singularizado. Ese soporte es
el cuerpo.
14
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Como indica Michel Serres (2011: 33), en
variaciones sobre el cuerpo, “el primerísimo
cogito fue un proyecto de refugio para
encontrar la bola perdida; por eso buscamos un
techo, por eso habitamos. El humano, de pie,
acaba de nacer”.
4. Habitar ambientes
- Oikos casa habitabilidad en Vicente
Romano.
- Midia primaria: presencial. Capilaridad 1:
Norval;
- Midia terciaria: electricidad. Serpientes.
Warburg.
- Los ambientes en Flusser: las tres
catástrofes.
- Crítica a Flusser a través del nomadismo
en Deleuze. Movimiento no significa
trayecto. Ejemplo en el cine
“Temos várias maneiras de relacionar-nos com a
natureza, algumas das quais podem ser
chamadas „sobrenaturais‟, „teóricas‟ ou
„perspectivas‟ (segundo os nossos vários
gostos). Uma de tais maneiras é encarar a
natureza como se fosse mapa”. Vilém Flusser.
- Midia secundaria: escritura. Capilaridad 2.
Jacques Derrida: Gramatología; Michel Serres
cuerpo de la escritura;
Referências Bibliográficas
BAITELLO, Norval. O animal que parou os relógios. 2ª, ed. S. Paulo: Annblume,1999.
________. “A cultura de ouvir”. In Bentes, I. Zaremba, L. Rádio Nova. Constelações da
radiofonia contemporânea. Rio de Janeiro: Publique, 2005.
FLUSSER, Vilém. A história do Diabo. São Paulo: Martins, 1965.
________. Die Schrift (A Escrita) 4ª ed. Göttingen: Immatrix, 1992.
________. Ficções Filosóficas. Editora da Universidade de São Paulo. 1998.
________. Natural:mente: Vários acessos ao significado de natureza. Ensaios brasileiros,
filosofia da natureza. São Paulo. Ed. D. cidades, 1979.
________. Pós-história: vinte instantâneos e um modo de usar. D. cidades, SP. 1983.
GUATTARI, Felix. Psychanalyse et Transversalité. Paris: François Maspero, 1996.
SERRES, Michel. Os Cinco Sentidos: filosofia dos corpos misturados. Rio de Janeiro, B. Brasil.
2011.
15
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
1
Jean Lauand1
Pedagogia Medieval Ocidental: corpo e educação em
Tomás de Aquino
Resumo
Abstract
A unidade matéria-espírito na antroplogia
medieval encontra seu lugar apropriado quando
Tomás de Aquino assume a postura de
Aristóteles de radical aceitação da realidade
concreta e, no homem, a intrínseca união de
alma e matéria. Alma e corpo agem juntos e
unificadamente em tudo o que é humano. E a
realidade material deixa de ser vista como
mera alegoria. A afirmação "Anima forma
corporis" está na própria essência da liturgia e
em muitos aspectos da educação, que sem o
reconhecimento dessa “in-formação”, tornarse-iam ininteligíveis, pois, no fundo, não são
compatíveis com o exagerado dualismo, que
estabelece alma e corpo como realidades
estanques. Embora geralmente negassem
teoricamente o "Anima forma corporis", muitas
práticas dos educadores medievais estão
baseadas nesse princípio.
The unity of spirit and matter in medieval
anthropology finds its proper place when
Thomas Aquinas takes Aristotle’s view of
reality concerning material realities and the
intrinsic union between soul and body. Aquinas
surpasses the traditional allegorical way of
looking at things. Soul and body work together
as a unified entity in every instance of human
life. "Anima forma corporis" is very key for
liturgy and many aspects of education that
otherwise would remain unintelligible because
- deep down, as a matter of fact - they are not
compatible with exaggerated dualism, which
set mind and body in isolation and contrast.
Most of medieval educators yet theoretically
denying the principle "Anima forma corporis",
have based many of their educational practices
on it.
Palavras-Chave: Alma e corpo. Tomás de
Aquino. Liturgia. Educação Medieval. Alegoria
Keywords: Soul and body. Thomas Aquinas.
Liturgy. Medieval Education. Allegory.
“Anima enim indiget corpore ad consecutionem sui finis: inquantum per corpus perfectionem acquirit et
in scientia et in virtute” (CG 3, 144)
Apresentação
1. Tomás de Aquino e um novo marco
no pensamento medieval
Examinaremos alguns aspectos de uma
contradição que se dá na antropologia e na
1
educação medieval, anteriores a Tomás de
Aquino. Certamente essas generalizações (“a
antropologia medieval”, a “educação
medieval”) costumam ser perigosas, mas nuances à parte - não são descabidas nesta
conferência, se as confrontarmos com a imensa
novidade levada a cabo por Tomás em seu
pensamento teológico e filosófico. Tomás, na
Jean Lauand - Prof. Titular Sênior FEUSP e do PPGE da Univ. Metodista de São Paulo. E-mail: [email protected]
16
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
esteira do mestre Alberto Magno, incorpora à
sua síntese pessoal – entre outros elementos – a
atitude de Aristóteles:
Aristóteles se recusa a afastar-se do real concreto,
a apartar-se do que está diante dos olhos. E é
precisamente essa atitude fundamental que Santo
Tomás aceita com toda a veemência. É uma
decidida aproximação do concreto, da realidade
experiencial do mundo: as coisas concretas que se
podem ver, ouvir, saborear, cheirar e tocar são
tomadas como algo propriamente real, como
realidade por direito próprio e não como mero
reflexo ou sombra, não como mero símbolo de
outra coisa invisível, do além, não como algo
espiritual. Tudo o que é visível e também o ver, o
próprio conhecimento sensível e a faculdade
desse conhecimento, tudo isso é afirmado e
reconhecido como algo válido em si. E isto
significa: o mundo corpóreo, a realidade material
e – no próprio homem – o corpo, os sentidos e o
que eles podem perceber, tudo isso é tomado a
sério de um modo inaudito até então (PIEPER,
1973, pp. 255-256).
De fato, nos quadros do pensamento
medieval, trata-se de uma aceitação inédita da
realidade material e, no homem, da intrínseca
união entre espírito e matéria no homem,
precisamente o que se expressa pelo conceito
aristotélico de alma.
Se no pensamento da Idade Média é com
Tomás que se afirma essa intrínseca união entre
alma e corpo; o Ocidente, na idade moderna,
retoma a tendência a um fragmentarismo, a
uma cisão espírito/corpo, desta vez movido por
um desmedido afã de clareza no pensamento.
Se a tentação medieval de um exagerado
dualismo, separando de modo mais ou menos
incomunicável e absoluto, por um lado, o
espírito (o intelecto, a mente, a “alma”...) e, por
outro o corpo e a matéria; a partir de Descartes
a dicotomia (res cogitans x res extensa) tornase dominante.
Dualismo e clareza: na verdade, a última
instância do pensamento moderno por detrás da
cisão espírito / matéria, está, segundo
Heidegger, na pretensão moderna de tornar o
ens certum um absoluto:
De bem outra espécie é aquela disposição que
levou o pensamento a colocar a questão
tradicional do que seja o ente enquanto é, de um
modo novo, e a começar assim uma nova época
da filosofia. Descartes em suas meditações não
17
pergunta apenas e em primeiro lugar ti tò ón - que
é o ente, enquanto é? Descartes pergunta: qual é
aquele ente que no sentido do ens certum é o ente
verdadeiro? Para Descartes, entretanto, se
transformou a essência da certitudo. Pois na
Idade Média certitudo não significava certeza,
mas a segura delimitação de um ente naquilo que
ele é. Aqui certitudo ainda coincide com a
significação de essentia. Mas, para Descartes,
aquilo que verdadeiramente é se mede de uma
outra maneira. Para ele a dúvida se torna aquela
dis-posição em que vibra o acordo com o ens
certum, o ente que é com toda certeza. A
certitudo torna-se aquela fixação do ens qua ens,
que resulta da indubitabilidade do cogito (ergo)
sum para o ego do homem. Assim o ego se
transforma no sub-iectum por excelência, e, desta
maneira, a essência do homem penetra pela
primeira vez na esfera da subjetividade no sentido
da egoidade. Do acordo com esta certitudo recebe
o dizer de Descartes a determinação de um clare
et distincte percipere. A disposição afetiva da
dúvida é o positivo acordo com a certeza. Daí em
diante a certeza se torna a medida determinante
da verdade. A disposição afetiva da confiança na
absoluta certeza do conhecimento a cada
momento acessível permanece o páthos e com
isso a arkhé da filosofia moderna.
(HEIDEGGER, 1973).
Desde Descartes a necessidade de distinguir
res cogitans de res extensa, torna-se um
imperativo.
Há duas substâncias finitas (res cogitans e res
extensa) e uma infinita (Deus). Substância (res)
adquiriu um conceito fundamental no século
XVII: de natureza simples, absoluta, concreta
(realidade intelectual) e completa. Somos
portanto uma substância (res) pensante (cogito) e
também uma substância (res) que possui corpo,
matéria (extensa). Este dualismo cartesiano
evidencia que cada indivíduo reconhece a própria
existência enquanto sujeito pensante: nossa
essência é a razão, o ser humano é racional. O
cogito é a consciência de que sou capaz de
produzir pensamentos, é um meio pragmático de
dar início ao conhecimento. Estamos afirmando,
portanto, uma verdade existencial. Há uma
coincidência entre meu pensamento e minha
existência. (...) O primeiro conceito de Descartes,
portanto, denomina-se “dualismo cartesiano”,
admitindo a existência de duas realidade: alma
(res cogitans) e corpo (res extensa). A
independência entre alma e corpo conduzirá a
uma nova separação: sujeito e objeto (FÉLIX,
2010).
Esse novo páthos era totalmente estranho
para um Tomás de Aquino, que afirma - no
começo da Suma Teológica - que a dignidade
do saber reside no objeto e não na clareza... E
recusa também a dicotomia: alma x corpo.
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Nada mais alheio ao pensamento de Tomás
do que uma incomunicação entre espírito e
matéria. O que Tomás, sim, afirma é o homem
total, a união espírito-corpo, pois a alma, para
o Aquinate é forma, ordenada para a intrínseca
união com a matéria. Por exemplo, Tomás,
indica os remédios para a tristeza, que reside
na alma e enfrenta esta questão na Suma
Teológica I-II 38 e no artigo 5 chega a
recomendar banho e sono como remédios
contra a tristeza! Pois, diz o Aquinate, tudo
aquilo que reconduz a natureza corporal a seu
devido estado, tudo aquilo que causa prazer é
remédio contra a tristeza. Tomás destrói assim
a objeção "espiritualista":
Objeção 1.: Parece que sono e banho não
mitigam a tristeza. Pois a tristeza reside na
alma; enquanto banho e sono dizem respeito ao
corpo, portanto, não teriam poder de mitigar a
tristeza.
Resposta à objeção 1: Sentir a devida
disposição do corpo causa prazer e, portanto,
mitiga a tristeza.
De resto, para os remédios contra a tristeza,
Tomás não fala de Deus nem de Satã, mas sim
recomenda: qualquer tipo de prazer, as
lágrimas, a solidariedade dos amigos, a
contemplação da verdade, banho e sono. E
ainda sobre a interação alma-corpo, Tomás
afirma em I-II, 37, 4: “A tristeza é, entre todas
as paixões da alma, a que mais causa dano ao
corpo [...] E como a alma move naturalmente o
corpo, uma mudança espiritual na alma é
naturalmente causa de mudanças no corpo”.
Agir no corpo para atingir a alma; agir na
alma para atingir o corpo. Tivesse prevalecido
a antropologia de Tomás teríamos estado,
desde o século XIII, em muito melhores
condições de compreender a natural e
necessária condição psicossomática (e
somatopsíquica: que o diga meu
acupunturista...) de nossa realidade. Tomás é
tão "materialista", que nas questões de
Quodlibet, tratando do jejum, dirá que o jejum
é sem dúvida pecado (absque dubio peccat)
(!!) quando debilita a natureza a ponto de
impedir as ações devidas: que o pregador
pregue, que o professor ensine, que o cantor
cante..., que o marido tenha potência sexual
para atender sua esposa! Quem assim se
abstém de comer ou de dormir, oferece a Deus
um holocausto, fruto de um roubo:
Et ideo huiusmodi sunt adhibenda cum quadam
mensura rationis: ut scilicet concupiscentia
devitetur, et natura non extinguatur; secundum
illud Ad Rom., XII, 1: "exhibeatis corpora vestra
hostiam viventem; et postea subdit: rationabile
obsequium vestrum”. Si vero aliquis in tantum
virtutem naturae debilitet per ieiunia et vigilias,
et alia huiusmodi, quod non sufficiat debita opera
exequi; puta praedicator praedicare, doctor
docere, cantor cantare, et sic de aliis; absque
dubio peccat; sicut etiam peccaret vir qui nimia
abstinentia se impotentem redderet ad debitum
uxori reddendum. Unde Hieronymus dicit: "De
rapina holocaustum offert qui vel ciborum nimia
egestate vel somni penuria immoderate corpus
affligit; et iterum rationalis hominis dignitatem
amittit qui ieiunium caritati, vigilias sensus
integritati praefert”. (Quodl. 5, q.9, a.2, c).
Como indicávamos, essa posição de Tomás
era excepcional, considerada, em sua época,
quase herética:
Na famosa disputa pública que Tomás de Aquino
e John Peckham travaram em 1270, diante dos
professores e estudantes de Paris, está em
discussão a opinião [divergente] de Tomás e
apaixonadamente recusada por seu oponente de
que no homem há um único princípio vital – a
alma espiritual. Isso é o mesmo, expressando-nos
de modo menos acadêmico, que afirmar ou
combater a afirmação de que o corpo pertence à
essência do homem (PIEPER, 1973, p. 148)
A teologia contemporânea recusava a
doutrina de uma única alma no homem e
afirmava a existência de três (naturalmente a
“alma espiritual”, independente da matéria é
que era considerada a decisiva, em detrimento
da “alma vegetativa” e da alma “sensitiva”).
2. Anima forma corporis
Essa dicotomia gera uma espécie de
esquizofrenia no cristianismo: por um lado,
propõe-se um cristianismo “espiritual”, onde a
matéria, o corpo, o sexo e as paixões são
maniqueisticamente consideradas “do mal”;
mas, por outro – e é o caso da pedagogia
18
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
medieval – aposta-se na matéria (na liturgia,
por exemplo) como o grande indutor de
atitudes espirituais.
exterior é ser supersticioso; não querer ajuntálo ao interior é ser soberbo3.
E aí tocamos um dos pontos chave da
educação moral, que é sempre, em boa medida,
auto-educação. A fórmula vem dada numa
aparentemente surpreendente sentença de João
Guimarães Rosa: "Tudo se finge primeiro;
germina autêntico é depois" (ROSA, 1985, p.
166).
3. A liturgia: o corpo induzindo a alma
É o caso da educação para as virtudes. Um
homem que reconheça um seu defeito moral,
digamos a ingratidão, e queira adquirir a
virtude correspondente, como deve proceder?
Fingindo. Quer dizer, começa-se por assumir
as formas externas, verbais da gratidão (que
não se sente): “fingir” reconhecer o cárater
indevido do favor recebido, “fingir” louvar o
benfeitor, “fingir” sentir-se na obrigação de
retribuir etc. E, um belo dia, germina autêntico
aquilo que se fingia...
“Fingir” é também a proposta de
Shakespeare: “Assume a virtue, if you have it
not”, diz Hamlet (III, 4) 2. O costume é monstro
que vai comendo o sentido de nossas ações.
Mas, o diabo do hábito, torna-se anjo quando
se volta para o bem: dando a capa que reveste
as ações boas - uma agora, outra depois e outra
ainda - e assim ir mudando a natureza e, com
prodigioso poder, exorcizar os demônios.
O “fingir” proposto nas Pensées (#250) de
Pascal oferece-nos o enlace com o grande tema
da Liturgia. No relacionamento com Deus:
É necessário que o exterior se una ao
interior, isto é, pôr-se de joelhos, rezar com os
lábios, etc. a fim de que o homem orgulhoso,
que não quis se submeter a Deus, seja
submetido à criatura. Esperar socorro desse
É dessa ação (inter-ação) do corpo no
espírito que trata o clássico Sinais Sagrados
(GUARDINI, 1962), afinal toda a liturgia,
como recorda o próprio Guardini, decorre do
“anima forma corporis”. Nesse pequeno
precioso livro, já quase centenário, o mestre
alemão vai mostrando o alcance espiritual das
realidades materiais: o sino, que - muito mais
do que um mero instrumento funcional
sinalizador sonoro (como a sirene de uma
escola ou o apito de uma fábrica) - despertanos a alma para a grandiosidade do mundo
como Criação; os degraus; a porta do templo; a
postura corporal na liturgia etc., etc., etc.
Fiquemos com um par de exemplos:
Os degraus Aqui temos, por exemplo, os degraus.
Vezes sem número os subiste já. Mas tomaste
consciência do que em ti se passava ao subi-los?
Sim, porque de facto acontece qualquer coisa em
nós mesmos quando subimos. Somente que é
coisa tão subtil e silenciosa que facilmente a
podemos deixar passar.
Manifesta-se aqui um profundo mistério. Um
daqueles fenómenos que procedem do
fundamento do nosso ser humano; enigmático
não o podemos resolver pela inteligência, e, no
entanto, cada qual compreende-o, porque o nosso
ser mais íntimo lhe corresponde.
Quando subimos os degraus, não sobe só o pé,
mas também todo o nosso ser. Subimos também
espiritual-mente. E se o fazemos
conscientemente, pressentimos uma ascensão até
aquela altura em que tudo é grande e acabado; o
céu onde mora Deus. (...) (pág. 43-44)
Ou a porta – a pesada porta - que marca a
ruptura entre o profano e o sagrado...
A Porta [A porta do templo] destina-se a cumprir
mais do que um simples fim; ela fala. Repara
2.
Assume a virtue, if you have it not. That monster, custom, who all sense doth eat. Of habits devil, is angel yet in this,
that to the use of actions fair and good He likewise gives a frock or livery, that aptly is put on. Refrain to-night, and that
shall lend a kind of easiness to the next abstinence: the next more easy. For use almost can change the stamp of nature.
And either.. the devil, or throw him out with wondrous potency.
3.
Il faut que l'extérieur soit joint a l'intérieur pour obtenir de Dieu; c'est-à-dire que l'on se mette à genoux, prier des
lèvres, etc. afin que l'homme orgueilleux, qui n'a voulu se soumettre à Dieu, soit maintenant soumis à la créature.
Attendre de cet extérieur le secours est être superstitieux, ne vouloir pas le joindre à l'intérieur est être superbe.
19
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
como ao transpô-la tens esta sensação: «Agora
deixo o que fica lá fora. Entro». Lá fora fica o
mundo belo, fervilhante de vida e poder criador.
De mistura, existe também muita coisa menos
digna: a busca dos seus interesses, por vezes
exageradamente. Anda tudo a correr de um lado
para o outro, procurando cada qual acomodar-se o
melhor que pode. Não queremos dizer que o
mundo não seja santo; mas alguma coisa de não
santo tem sem dúvida em si. Pela porta entramos
num recinto alheio a interesses, silencioso e
sagrado: no santuário. Certamente que tudo é
obra e dom de Deus. Em toda a parte Ele pode vir
ao nosso encontro. (...) E no entanto os homens
desde sempre souberam que determinados lugares
sao especialmente consagrados, reservados a
Deus. A porta está entre o interior e o exterior;
entre os interesses e o santuário; entre o que
pertence a toda a gente e o que é consagrado a
Deus. E diz a quem a tronspõe: «Deixa lá fora o
que não pertence cá dentro: pensamentos,
desejos, preocupações, vaidades. (pp. 46-47)
4. Tomás e as faculdades do homem
Começamos esta conferência, recordando
com Pieper que é com Tomás que a realidade
material é considerada “como algo
propriamente real, como realidade por direito
próprio e não como mero reflexo ou sombra,
não como mero símbolo de outra coisa
invisível (...) o mundo corpóreo, a realidade
material e – no próprio homem – o corpo, os
sentidos e o que eles podem perceber, tudo isso
é tomado a sério de um modo inaudito até
então”.
E é que a Idade Média anterior à
redescoberta de Aristóteles tinha uma visão
alegorizante – de dar inveja a nossos
carnavalescos... – do mundo criado – fato que,
pelo menos, contribuiu para valorizá-lo (não
em si, mas por sua relação como sagrado),
permitindo o estudo das realidades profanas e
das artes liberais para poder ascender ao
significado místico das coisas deste mundo.
Para essa mentalidade religiosa alegórica (tema
de minha conferência4 neste evento de 2008),
vinda já do cristianismo do mundo antigo - de
Alexandria ou de um Agostinho - as coisas são
sinais de Deus, pistas para a compreensão da
fala de Deus: como enigmas a serem
decifradas. Explicando o que é alegoria, diz
Agostinho:
Chama-se alegoria a palavra que soa de um
modo, mas acaba significando outra coisa
diferente. Por exemplo, Cristo é chamado
cordeiro (Jo 1,29); acaso é Ele animal? Cristo é
chamado leão (Apo 5,5); acaso é Ele fera? É
chamado pedra (ICor 10,4); acaso é Ele dureza?
É chamado monte (Dan 2,35); acaso é Ele
elevação de terra? E, assim, há muitas palavras
que soam de um modo, mas são entendidas de
outro e a isto se chama alegoria (En. 103, 13)
Assim, deve-se estudar o que são os animais
para entender a Cristo: “Vede que vos envio
como ovelhas em meio de lobos. Sede, pois,
prudentes como serpentes etc.”. O pregador
medieval explicará que a serpente passa por
entre as pedras para trocar de pele,
alegorizando que assim também o cristão deve
trocar “sua velha pele”, que, por sua vez,
alegoriza a vida no pecado etc.
Os famosos versos atribuídos a Alain de
Lille (PL 210:579) expressam essa mentalidade
alegorizante:
Omnis mundi creatura (Do mundo, toda a
criatura)
Quasi liber et pictura (Como livro e pintura)
Nobis est speculum. (É um espelho para nós)
Nostrae vitae, nostrae mortis (De nossa vida e
morte)
Nostrae status, nostrae sortis (De nosso estado e
destino)
Fidele signaculum (Um sinal confiável)
Dados da Bíblia para o cristão de hoje
totalmente secundários, são, para os antigos e
medievais, temas centrais de sua exegese. Os
números, por exemplo, como quando da pesca
milagrosa - no último capítulo de seu
evangelho - , João narra que Pedro trouxe em
sua rede 153 peixes grandes (Jo 21, 11). O
número 153, no caso, para o cristão de hoje
significa simplesmente uma grande quantidade
de peixes. Mas para os medievais, não: esse
número - como cada número mencionado na
4
“Enigmas, alegoria e religião na educação medieval”. Disponível em: <http://www.hottopos.com/notand18/
enigmas.pdf. Acesso em: 10 out. 2011.
20
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Bíblia - tem um significado místico: é uma
mensagem cifrada que deve ser esclarecida
pela inteligência cristã. Como era de esperar,
essa mentalidade leva a autênticos
contorcionismos alegóricos para fazer com que
as coisas se encaixem: no caso de nosso 153,
Agostinho, por exemplo, vai jogar com o
caráter perfeito dos números 10 (a perfeição da
lei) e 7 (perfeição do espírito), que somados
dão 17. Ora, a soma dos números de 1 a 17 dá
precisamente 153, o número da multidão dos
bem-aventurados (que, da barca de Pedro, que
alegoricamente é a Igreja, são levados a Jesus;
porque foram apanhados pela rede da atividade
evangelizadora etc.).
A explicação do fato de serem 153 peixes é a que
costumo fazer-vos [ao menos todos os anos na
missa de 6a. f. da Páscoa] e muitos tomam-me a
dianteira; no entanto, eu vou repeti-la
solenemente [...].
Estes 153 são 17. 10 mais 7. 10 por quê? 7 por
quê? 10 por causa da lei, 7 por causa do Espírito.
A forma septenária é por causa da perfeição que
se celebra nos dons do Espírito Santo. Descansará
- diz o santo profeta Isaías - sobre ele, o Espírito
Santo com seus 7 dons (Is 11,23) etc. Já a lei tem
10 mandamentos [...].
Se ao 10 ajuntarmos o 7 temos 17. E este é o
número em que está toda a multidão dos bemaventurados. Como se chega, porém, aos 153?
Como já vos expliquei outras vezes, já muitos me
tomam a dianteira. Mas não posso deixar de vos
expor cada ano este ponto. Muitos já o
esqueceram, alguns nunca o ouviram. Os que já o
ouviram e não o esqueceram tenham paciência
para que os outros ou reavivem a memória ou
recebam o ensino [...] Conta 17, começando por 1
até 17, de modo que faças a soma de todos os
números, e chegarás ao 153. Por que estais à
espera que o faça eu? Fazei vós a conta" (Sermão
250, 3)
Certamente, essas interpretações medievais
são, muitas vezes, forçadas: em alguns casos, o
6, por exemplo, será considerado um número
perfeito; em outros, um signo de imperfeição.
Pela Aritmética de Boécio, a Idade Média
absorve o critério grego: um número é perfeito
se a soma de seus divisores próprios perfaz
esse número. Assim, perfeito é o 6 (6 = 3 + 2 +
1), o 28 (28 = 14 + 7 + 4 + 2 + 1), o 496 etc.
Esse critério cai como uma luva para explicar a
plenitude dos 6 dias da Criação. Mas, no caso
21
do número da besta do Apocalipse (Apo 3, 18),
666, o 6 é a imperfeição (não atinge a plenitude
do - segundo outros critérios – perfeito por
excelência: o 7).
Rábano Mauro, no séc. IX, chega a escrever
um tratado explicando o significado místico de
cada número na Bíblia; e os bestiários
medievais se encarregarão dos animais - de
modo semelhante, mutatis mutandis, aos
nossos critérios de interpretação para jogo do
bicho: se se sonha com a sogra, vai dar cobra
na cabeça; com a homossexual, jacaré; etc.
Também para o caso dos animais, como em
tudo, cabem interpretações múltiplas e
elásticas: o leão é Cristo, mas pode também ser
o diabo, que, na epístola de Pedro (IPe 5, 8)
“anda rondando como leão que ruge, buscando
a quem devorar”.
O espaço alegórico diminui
consideravelmente em Tomás de Aquino. Por
exemplo, no tocante à memória: o jovem
Tomás, do Comentário às Sentenças, ainda fala
de três potências espirituais: memória,
inteligência e vontade. Segue assim, a tradição
alegorista do De Trinitate (sobretudo no livro
XV) de Agostinho, que apresenta a memória
como a primeira realidade do espírito, da qual
procedem o pensar e o querer: sendo portanto
um reflexo de Deus Pai, do qual procedem o
Verbo (inteligência) e o Espírito Santo
(vontade). Mas já nas obras de maturidade, na
Summa e no De Veritate, Tomás rompe com
essa visão, situando a memória como faculdade
sensível, tal como a têm os “outros animais”.
Por exemplo, quando na Suma, explica que a
memória é parte da Prudência, afirma: “A
prudência aplica o conhecimento universal aos
casos particulares, dos quais se ocupam os
sentidos. Daí que a prudência requer muito da
parte sensitiva, na qual se inclui a memória. (III, 49, 1 ad 1)
E Tomás não se preocupa nem um pouco se
com isto – o fato de só termos duas, e não três,
potências espirituais - perdemos a referência
alegórica à Trindade.
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Outro ponto importante é que Tomás centra
seu pensamento na Criação, em toda a sua
extensão. A Criação é obra de Deus e de sua
Inteligência: o mundo foi criado pelo Logos,
pelo Verbum e, portanto, conhecer o mundo é
conhecer sinais – não meramente alegóricos –
de Deus. E mais: cada criatura é porque é
criada inteligentemente por Deus, participa do
ser de Deus. E pode ser conhecida porque
recebeu seu ser da Inteligência criadora de
Deus. O Deus cristão é Emmanuel, Deus
conosco, e pela Encarnação, a eternidade de
Deus ingressa na temporalidade e Cristo
encabeça, re-capitula (como diz o Catecismo
da Igreja Católica) toda a realidade criada.
Tomás de Aquino, leva a sério e às últimas
consequências o Prólogo de João. Assim, se o
Logos criou todas as coisas, isto significa que
as coisas têm - por Criação - uma inteligência
fundante estruturando-as por dentro. Então, se
eu quiser, digamos, ganhar a vida plantando
castanhas, eu devo estudar “castanho-logia”,
conhecer a racionalidade natural das castanhas
(quando devo plantá-las, como adubar etc.) e
não procurar iluminações na religião ou nos
ministros religiosos. Se eu quero trabalhar com
fígado eu devo estudar hepatologia, o logosdo-fígado, e pretender invocar livros sagrados
ou autoridades clericais para o tema seria não
só descabido, mas até mesmo uma blasfêmia:
negar a ação criadora do Logos (e, para Tomás,
a compreensão natural dessa realidade com que
o homem se encontra é fundamental até para a
Teologia).
Isto tem consequências para a teoria do
conhecimento (e obviamente para a Pedagogia)
de Tomás. Para o Aquinate afirmar que a
inteligência é uma potência espiritual é dizer
que seu campo de relacionamento é a
totalidade do ser: todas as coisas - visíveis e
invisíveis são inteligíveis -; "calçam" bem,
combinam com a inteligência. Contudo, a
relação da inteligência humana com seus
objetos não é uniforme. Dentre os diversos
entes e modos de ser, há alguns que são mais
direta e imediatamente acessíveis à
inteligência. É o que Tomás chama de objeto
próprio de uma potência: aquela dimensão da
realidade que se ajusta, por assim dizer, "sob
medida" à potência (ou, melhor dito, é a
potência que se ajusta àquela realidade). Não
que a potência não incida sobre outros objetos,
mas o objeto próprio é sempre a base de
qualquer captação: se pela visão captamos, por
exemplo, número e movimento (e vemos,
digamos, sete pessoas correndo), é porque
vemos a cor, objeto próprio da visão. Ora,
próprio da inteligência humana - potência de
uma forma espiritual acoplada à matéria - é a
abstração: seu objeto próprio são as essências
abstratas das coisas sensíveis. Próprio da
inteligência humana é apreender a idéia
abstrata de "cão" por meio da experiência de
conhecer pelos sentidos diversos cães: Lulu,
Duque e Rex...
Assim, Tomás afirma: "O intelecto humano,
que está acoplado ao corpo, tem por objeto
próprio a natureza das coisas existentes
corporalmente na matéria. E, mediante a
natureza das coisas visíveis, ascende a algum
conhecimento das invisíveis" (S. Th.. I, 84, 7).
E nesta afirmação, como dizíamos, espelha-se
a própria estrutura ontológica do homem:
mesmo as realidades mais espirituais só são
alcançadas, por nós, através do sensível. "Ora prossegue Tomás -, tudo o que nesta vida
conhecemos, é conhecido por comparação com
as coisas sensíveis naturais". Esta é a razão
pela qual o sentido extensivo e metafórico está
presente na linguagem de modo muito mais
amplo e intenso do que, à primeira vista,
poderíamos supor.
Contra todo dualismo que tende a separar
exageradamente no homem a alma espiritual e
a matéria, Tomás afirma a intrínseca união e
mútua ordenação de ambos os princípios.
Contra todo "espiritualismo", Tomás conclui:
"É evidente que o homem não é só a alma, mas
um composto de alma e de corpo" (Summa
Theologiae I, 75, 4). E esta união se projeta na
operação espiritual que é o conhecimento: "A
alma necessita do corpo para conseguir o seu
22
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
fim, na medida em que é pelo corpo que
adquire a perfeição no conhecimento e na
virtude" (C.G. 3, 144.).
Para Tomás o conhecimento intelectual
(abstrato) requer o conhecimento sensível. É
sobre os dados do conhecimento sensível que
atua o intelecto, em suas duas funções:
intelecto agente e paciente.
Essa veemente afirmação do conhecimento
natural é também um antídoto contra a
pretensão – curiosamente revivida em diversas
posturas religiosas de hoje, com perigosas
consequências – de que o critério de verdade
seja a iluminação divina do líder religioso
(padre, pastor, medium, rabino, xeique etc.).
Para Tomás, a iluminação de Deus foi-nos dada
ao nos conceder o intelecto, com sua natureza
própria.
E Tomás propõe a virtude intelectual da
prudentia (tema de minha conferência5 em
outro desse nossos eventos), o exame da
realidade pela razão natural, como base de
nossas decisões. Sim, todo aquele que crê está
legitimado em pedir luzes a Deus para suas
decisões (é, segundo a doutrina católica,
“conselho”, dom do Espírito Santo); o que não
se pode é pretender avalizar com a autoridade
divina posições meramente temporais. Seja
como for, a iluminação sobrenatural deve ser,
caso queiramos fazer uso público dela, de tal
ordem que torne visíveis para qualquer um a
realidade de que se trata. Outra atitude
degeneraria em tirania, em teocracia.
Referências Bibliográficas
FÉLIX, L. “Descartes”. Disponível em: <http://www.esdc.com.br/CSF/artigo_descartes.htm>.
Acesso em: 10 nov.2010.
GUARDINI, R. Sinais sagrados Braga: Franciscana, 1962.
HEIDEGGER, Martin Que é isto – a Filosofia? São Paulo: Abril, 1973. Tradução e notas: PIEPER,
Josef Filosofía Medieval y Mundo Moderno Madrid: Rialp, 1973.
ROSA, João G. "Sobre a escova e a dúvida" in Tutaméia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 1985.
STEIN. E. Disponível em: <http://www.scribd.com/doc/3506403/Heiddeger-Que-e-isto-AFilosofia>. Acesso em 10 nov.2010.
5.
“Saber Decidir: a Virtude da Prudentia”. Disponivel em: <www.hottopos.com/notand11/jean_mauro.htm>. Acesso em
10 out, 2011.
23
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
1
Chie Hirose 1
Pedagogia Oriental: corpo e educação
Resumo
O artigo compara a educação oriental com
certas práticas do Oriente, ignoradas por nossa
pedagogia. O Ocidente, sobretudo na época
moderna, tende a um fragmentarismo, a uma
cisão espírito/corpo, que remete a um
desmedido afã de clareza no pensamento. E a
grande ruptura que o moderno pensamento
ocidental instituiu deu-se precisamente em
torno à concepção de corpo. Já o Oriente, que
“pensa” com o corpo, valoriza os ritos e as
cerimônias.
Abstract
The article compares Western and Eastern
educations and their practices. The Western
world, mainly in modern times, splits mind and
body and looks for exactness in thinking.
Eastern pedagogy proposes “thinking” with
the body, and so the importance of ceremonies.
Palavras Chave: Corpo e educação. Orientes e
Ocidente. Cerimônias
Keywords: Body and Education. East and
West. Ceremonies.
1. Atualidade do Oriente
Atualidade, nem sempre significa aquilo
que realmente está acontecendo hoje em dia:
como são atuais a violência urbana, a
comunicação virtual, os enormes problemas de
trânsito em São Paulo etc.
Nesse sentido, está a palavra inglesa actual,
verdadeira casca de banana para os redatores
de legendas, que, muitas vezes a traduzem
erradamente por atual. Nesse viés do actual,
actuality aponta para a realidade mais do que
para “atualidade” (se bem que a realidade
costuma dar-se hoje, contemporaneamente...).
Mas, aqui, estamos preocupados com outra
“atualidade”: a da oportunidade, conveniência,
ou mesmo necessidade; como quando dizemos:
nada mais atual para o Brasil do que um
projeto sério de erradicação da corrupção.
É nesse sentido que falaremos da atualidade
do Oriente (ou dos Orientes...) e de certas
práticas da educação oriental, ignoradas (ou
esquecidas, ou menosprezadas...) pela
pedagogia ocidental.
1.1. Cerimônias e ritos. O Oriente
Cerimônias como a do Chá, que condensa
em si toda uma cultura milenar e que só pode
ser compreendida nessa totalidade do
complexo alma-corpo; do corpo que é algo
mais do que matéria; do corpo entendido como
Mi, na tradição japonesa. Por isso que, advirtase desde já, estão fadadas ao fracasso as
tentativas de “importar” os “passos” da
Cerimônia do Chá (como erradamente insiste
em fazer a pedagogia americana), sem atentar
para essa totalidade, que aponta para o
espírito... É como querer ensinar, de modo
meramente operacional, uma sueca a ser
passista de escola de samba.
Em parceria com Jean Lauand – a quem,
aliás, devo a ideia acima da atualidade de falta,
Chie Hirose - Doutora pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Professora das Faculdades
Integradas “Campos Salles”. Professora da rede municipal de São Paulo. E-mail: [email protected]
1
24
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
de oportunidade – escrevemos um estudo
intitulado “Fingir para Germinar: Educação e
Antropologia”2 , em duas partes: a primeira de
Lauand; a segunda, de minha autoria.
que praticamente a mesma cena se encontre no
grande Heráclito e na tradição budista oriental.
A ideia básica para este estudo procede da
parte I, de Lauand3.
Desde Platão, tornou-se evidente o caráter
problemático do educar para a virtude; o que,
evidentemente, transcende o âmbito
meramente intelectual e envolve o homem
como um todo: alguém pode conhecer
profundamente as teorias morais, as
classificações das virtudes, as doutrinas
religiosas mais santas... e ser pessoalmente um
canalha. Não que não seja importante - e
mesmo uma valiosa ajuda - o estudo dos
clássicos da ética, mas sempre haverá algo
mais do que estudo, quando se trata de
aperfeiçoamento moral.
O Mercador de Óleo4
Um dia, quando o Mestre Ch'an Chao-chou
estava a caminho para o Distrito T'ung-cheng, ele
encontrou o Mestre Ch'an Ta-t'ung de T'ou-tzü
Shan e perguntou: "É você que é o Mestre de
T'ou-tzü Shan?".
Ta-t'ung, acenando com sua mão, apregoava:
"Sal, chá e óleo. Por favor, comprem!"
Chao-chou, ignorando-o, rapidamente continuou
seu caminho para o templo. O Mestre Ta-t'ung
seguiu atrás e chegou ao templo com uma garrafa
de óleo na mão. Chao-chou disse a ele
desdenhosamente: "Eu tenho ouvido falar do
nome do grande Mestre Ta-t'ung de T'ou-tzü Shan
por um longo tempo. Contudo, eu somente vejo
um mercador de óleo".
Ta-t'ung contestou: "Eu também tenho ouvido
falar que Chao-chou é um mestre Ch'an, mas de
fato ele não difere em nada de uma pessoa
comum. Você somente vê o mercador de óleo e
não vê o verdadeiro T'ou-tzü".
Neste ponto, tipicamente falando, os
Orientes levam uma vantagem sobre nós:
enquanto o Ocidente aposta na formação
intelectual; os Orientes, independentemente de
teorias que as legitimem, tendem a práticas que
consideram o homem como um todo: em sua
unidade espírito-corpo, ao menos em muitas de
suas propostas pedagógicas, que partem
precisamente de uma ação corporal, exterior,
para atingir um efeito espiritual, interior.
Chao-chou perguntou: "Por que você diz que eu
sou uma pessoa comum? O que é T'ou-tzü?".
É o “pensar com o corpo”, típico do Oriente
e – em algumas instâncias – também da
tradição ocidental.
Cem anos depois, quando os discípulos
consertavam a stupa, encontraram sharira5
vermelha.
Por mais acentuado que seja o racional nos
gregos, originariamente foi temperado pela
aceitação do mistério (baste recordar o discurso
de Diotima no Banquete de Platão) e da
comezinha realidade quotidiana, como base de
todo o pensamento. Assim, não é de estranhar
O Mestre Ta-t'ung levantou a garrafa de óleo e
gritou: "Óleo! Óleo!"
O que é "T'ou-tzü?", perguntou Chao-chou, para
quem a única resposta foi "Óleo! Óleo!". Arroz,
sal, chá e óleo — os alimentos básicos da vida
chinesa — tal é o ensinamento do Mestre T'outzü.
Tempos depois, antes de morrer, o mestre Tat'ung disse que voltaria se a stupa estivesse
vermelha.
Nesse tempo, veio morar no templo o mestre Yi
Tching. Todos diziam que ele era a reencarnação
do Mestre Ta-t'ung.
O mestre Yi Tching escreveu um poema na stupa:
As nuvens jamais podem ser aprisionadas
Grandes Montanhas Verdes não podem ser
cobertas
2.
Revista Internacional d’Humanitats No. 20, 2010 Disponível em: <http://www.hottopos.com/rih20/index.htm>
Acesso em: 01 jan. 2011.
3.
Lauand, Jean. Disponível em:<http://www.hottopos.com/rih20/jean.pdf > Acesso em: 01 jan. 2011.
4.
Hsing Yün Contos Ch’an vol. 1 São Paulo, Shakti, 2000, pág.50-51
5.
Relíquias do Buda Shakyamuni ou de outro Bodhisattva, comumente veneradas e preservadas em stupas.
25
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Nas noites frias a luz do luar circunda a stupa
Na profunda noite de outono ouve-se apenas o
sussurro dos pinheiros
Quem é T'ou-tzü?
É um mestre cujo ensinamento é tão próximo de
nós como o sal, o arroz, chá e o óleo,
indispensáveis à vida cotidiana.
Como dizíamos, episódio semelhante é
protagonizado por Heráclito de Éfeso, tal como
no-lo relata Aristóteles 6:
Diz-se que Heráclito assim teria respondido aos
estranhos vindos na intenção de observá-lo. Ao
chegarem, viram-no aquecendo-se junto ao forno.
Ali permaneceram, de pé (impressionados
sobretudo porque) ele os encorajou (eles ainda
hesitantes) a entrar, pronunciando as seguintes
palavras: "Mesmo aqui os deuses também estão
presentes"7
Também aqui o sábio não divaga por
regiões etéreas, desvendando os arcanos dos
deuses, mas encontra-se prosaicamente
aquecendo-se junto ao fogão. Heidegger
comenta:
Mesmo aqui, junto ao forno, mesmo neste lugar
cotidiano e comum onde cada coisa e situação,
cada ato e pensamento se oferecem de maneira
confiante, familiar e ordinária, "mesmo aqui",
nesta dimensão do ordinário, os deuses também
estão presentes. A essência dos deuses, tal como
apareceu para os gregos, é precisamente esse
aparecimento, entendido como um olhar a tal
ponto compenetrado no ordinário que,
atravessando-o e perpassando-o, é o próprio
extraordinário o que se expõe na dimensão do
ordinário 8. (...)
Quando o pensador diz "Mesmo aqui", junto ao
forno, vigora o extraordinário, quer dizer na
verdade: só aqui há vigência dos deuses. Onde
realmente? No inaparente do cotidiano9.
Voltando a “Fingir para Germinar...”,
Lauand começa explicando que o Ocidente,
sobretudo na época moderna, tende a um
fragmentarismo, a uma cisão espírito/corpo,
que remete a um desmedido afã de clareza no
pensamento. E que a grande ruptura que o
moderno pensamento ocidental instituiu deu-se
precisamente em torno à concepção de corpo.
Dessa convicção, e continuamos seguindo o
estudo citado de Lauand, brota a pedagogia do
“fingir” no sentido de que a repetição – ou se
quisermos seguir a tradição confuciana: o rito –
gera a atitude moral que se pretende adquirir. O
“fingir” material, do corpo, induz a virtude na
alma. Os exemplos apresentados desse “fingir”
são de Guimarães Rosa, Shakespeare e Pascal.
A fórmula mais enxuta nos vem de uma
sentença de João Guimarães Rosa: "Tudo se
finge primeiro; germina autêntico é depois".10
Lauand comenta:
Um homem que reconheça um seu defeito moral,
digamos a ingratidão, e queira adquirir a virtude
correspondente, como deve proceder? Fingindo. Quer
dizer, começa-se por assumir as formas externas, verbais
da gratidão (que não se sente): “fingir” reconhecer o
caráter indevido do favor recebido, “fingir” louvar o
benfeitor, “fingir” sentir-se na obrigação de retribuir etc.
E, um belo dia, germina autêntico aquilo que se fingia...
6
De part. anim., A5 645 a 17 e ss.
7
apud Heidegger, M. Heráclito, Rio de Janeiro, Relume Dumará, pág. 22.
8
Heidegger, M. Heráclito, Rio de Janeiro, Relume Dumará, pág. 23-24.
9
Heidegger, M. Heráclito, Rio de Janeiro, Relume Dumará, pág. 24. E Heidegger prossegue: "Não é preciso evitar o
conhecido e o ordinário e perseguir o extravagante, o excitante e o estimulante na esperança ilusória de, assim,
encontrar o extraordinário. Vocês devem simplesmente permanecer em seu cotidiano e ordinário, como eu aqui, que me
abrigo e aqueço junto ao forno. Não será isso que faço, e esse lugar em que me aconchego, já suficientemente rico em
sinais? O forno presenteia o pão. Como pode o homem viver sem a dádiva do pão? Essa dádiva do forno é o sinal
indicador do que são os theoí, os deuses. São os daíontes, os que se oferecem como extraordinário na intimidade do
ordinário." Etc.
10
"Sobre a escova e a dúvida" in Tutaméia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 1985, pág. 166.
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Augusto Guzzo Revista Acadêmica
E o “fingir” é também preconizado por
Shakespeare: “Assume a virtue, if you have it
not”, diz Hamlet (III, 4) 11.
Também Pascal situa-se na mesma direção.
Em Pensées #25012:
É necessário que o exterior se una ao interior, isto
é, pôr-se de joelhos, rezar com os lábios, etc., a
fim de que o homem orgulhoso, que não quis se
submeter a Deus, seja submetido à criatura.
Esperar socorro desse exterior é ser supersticioso;
não querer ajuntá-lo ao interior é ser soberbo.
Apesar desses tão importantes pensadores,
no Ocidente ainda predomina uma atitude
racionalista, que exclui o corpo – e, portanto,
os ritos – da educação. Se no Ocidente restam
apenas resquícios da educação por ritos, como
no caso da liturgia católica (também ela hoje
em processo de desritualização), as propostas
orientais são mais ligadas a ritos 13 e aos ritos.
2. Ao redor do fogo.
Como dizíamos, a educação oriental aposta
em ritos e ações corporais. É bem o caso da
Cerimônia do Chá, da qual destacaremos um
aspecto: o fogo.
A Cerimônia do Chá, em sua aparente
simplicidade, induz pelo corpo o espírito em
mil instâncias materiais: da porta de entrada ao
modo de servir a infusão; da decoração à
postura dos convivas. Não caberia aqui a
descrição e discussão desses passos, objeto de
meu livro Pesquisa em Cultura e Educação –
Uma investigação sobre a Cerimônia do Chá
(São Paulo: Cemoroc-Feusp, 2011).
Muito mais que o chá, interessa-nos as
possibilidades de transcendência oportunizadas
pela Cerimônia.
A Cerimônia do Chá ganha sua estrutura
definitiva com Sen-no-Rikyu (1522-1591) no
período Momoyama (séc. XVI), o mais
faustoso da história do Japão. Rikyu, homem
de grande poder, conselheiro predileto do
daimyo Hideyoshi, criou no Japão
esplendoroso da época Momoyama um novo
conceito de beleza, voltado para o simples, o
despojado, o essencial, estilo que se perpetuou
até nossos dias.
Rikyu, além de estabelecer as regras
definitivas da Cerimônia, criou o modelo da
chashitsu, ou Cabana de Chá, e de seu jardim.
Ligado à filosofia Zen - ele próprio era monge
zen -, imbuiu do espírito wabi
(desprendimento, simplicidade, eliminação do
supérfluo) tudo o que se refere à Cerimônia:
local que tem a simplicidade de uma cabana de
camponeses, com seu telhado rústico e teto de
bambu ou caniço, janelas de treliça e paredes
toscas; o jardim roji, que lembra uma paisagem
da montanha e induz à meditação; a decoração
sóbria etc.
11
Assume a virtue, if you have it not. That monster, custom, who all sense doth eat. Of habits devil, is angel yet in this,
that to the use of actions fair and good He likewise gives a frock or livery, that aptly is put on. Refrain to-night, and that
shall lend a kind of easiness to the next abstinence: the next more easy. For use almost can change the stamp of
nature.And either.. the devil, or throw him out with wondrous potency.
12
Il faut que l'extérieur soit joint a l'intérieur pour obtenir de Dieu; c'est-à-dire que l'on se mette à genoux, prier des
lèvres, etc. afin que l'homme orgueilleux, qui n'a voulu se soumettre à Dieu, soit maintenant soumis à la créature.
Attendre de cet extérieur le secours est être superstitieux, ne vouloir pas le joindre à l'intérieur est être superbe.
13
Aqui recorro uma vez mais às aulas de Jean Lauand, que nos narrava uma antiga lenda da comunidade judaica
polonesa: para afastar os perigos, a cada trinta anos, o rabino conduzia a comunidade a uma determinada clareira na
floresta, recitava certas orações e fazia gestos rituais e isso mantinha a comunidade segura. Tendo morrido o velho
rabino, ao chegar o ano certo alguém lembrou de que deveriam realizar o rito. O novo rabino não dominava tão bem o
rito, mas com ajuda dos mais velhos, acabaram achando a clareira, e (com muita dificuldade) lembraram-se das orações
e gestos e a comunidade respirou aliviada. Trinta anos depois, outro rabino. Mas desta vez nem havia clareira e ninguém
se lembrava das etapas rituais. Os membros da comunidade começavam a ficar aflitos e temerosos, porque não
poderiam contar com a cerimônia de proteção, quando o rabino sabiamente os tranquilizou: “Não se preocupem, só pelo
fato de lembrarmos que há um rito a comunidade está muito bem protegida...”. Há versão recente dessa lenda em JeanClaude Carrière, Le Cercle des menteurs, contes philosophiques du monde entier; Paris, Plon, 1998. pág. 430-431.
27
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Segundo Rikyu, o "Caminho do Chá" deve
ter na Harmonia (Wa), no Respeito (Kei), na
Pureza (Sei) e na Tranquilidade (Jaku) os seus
princípios basilares. O "homem de chá" (chajin) deve saber criar na sala de chá, por meio
do rígido ritual e de sua participação total, a
atmosfera adequada para que esses princípios
sejam sentidos e vividos intensamente, por um
momento, único e irrepetível, por todas as
pessoas participantes da Cerimônia.
Dentre as centenas de ações corporais que
induzem aos valores pretendidos pela
Cerimônia, limitar-nos-emos ao fogo, ao
fogareiro (ro ou furo) 14, prevista por Rikyu.
A antropologia nos revela que para várias
culturas, o fogo é representado como elemento
de purificação, mudança, transformação.
Cerimônias e ritos são realizados, invocando
na chama a luz do sagrado.
Muitos povos nativos acreditam que
sentados ao redor de uma fogueira, os
participantes ativam a intuição e a emoção e
eles podem se conectar com suas outras
dimensões: espirituais, temporais,
sobrenaturais, transcedentais. Neste lugar são
trocados conselhos e ensinamentos e tomadas
decisões relacionadas à comunidade, porque o
fogo é utilizado para ativar a luz da Sabedoria.
Por exemplo, os Mbyá-Guarani:
É ao redor da fogueira que ocorrem as principais
atividades femininas e onde se reúne a família
para fazer as refeições e recepcionar as visitas.
Logo nas primeiras horas da manhã os MbyáGuarani se reúnem em torno da fogueira para
tomar chimarrão e conversar sobre o que
sonharam durante a noite. Todos conversam
enquanto as mulheres preparam, ali mesmo, a
primeira refeição do dia. Sempre que possível
este “café-da-manhã” é tomado em grandes
grupos: pessoas de várias casas, vizinhos e/ou
parentes se reúnem em uma única casa. Ocorre
um revezamento das casas que oferecem o
“café”. Se para nós ocidentais é bonito uma mesa
cheia de gente, para os Mbyá-Guarani, que não se
valem de mesas, é bonito ter muitas pessoas
reunidas em torno da fogueira. 15
O que seria o “fogo” para a Cerimônia do
Chá? Desde há séculos, a sociedade japonesa
tem feito do irori, fogareiro embutido ao nível
do solo, o ponto centralizador, o lugar onde as
pessoas da casa se reunem. 16
O Chanoyu estipula o fogo como o ponto
central para reunir as pessoas e aí nasce o interrelacionamento entre os presentes.
Originalmente, o ro (fogareiro enbutido no
nível do tatami) que existia em casas de
agricultores, diz-se que foi trazido ao recinto
do Chá através de Jô-ô e Rikyu. Ro,
literalmente, é o “foco” ou ponto de
queima” (em japonês ambas palavras lêem-se
“shôten” mas de ideogramas diferentes) e sem
o fogo do carvão, de cor de rubi, como o centro
das coisas, não terá sentido a realização do
chakai.17
O Chanoyu que é também chamado de
cultura da hospitalidade revela-nos o modo
como é representado o fogo na antiga cultura
japonesa. O acolhimento, em princípio,
significa receber e acolher a Deus e é
representado pelo lugar do fogareiro. Assim,
Deus está no iroro. Até tal ponto, que Rikyu
14
Ro: pequeno fogareiro quadrado, com cerca de 0,30 m de lado, enterrado no solo, no nível dos tatame, e utilizado na
cerimonia de chá feita nos Chashitsu. Frédéric, Louis. O Japão - dicionário e civilização, São Paulo: Ed. Globo, 2008,
pág. 972. Furo: fogareiro portátil.
15
MÁRTIN, César Tempass. “O belo discreto: a estética alimentar mbyá-guarani” Espaço Ameríndio, Porto Alegre, v.
1, n. 1, pág. 170-194, jul./dez. 2007. Disponível em: <http://seer.ufrgs.br/index.php/EspacoAmerindio/article/viewFile/
2567/1568>. Acesso em: 01 nov. 2007.
16
irori: fogareiro aberto, geralmente quadrado, colocado entre a cozinha e a peça principal de uma casa, principalmente
na zona rual, em torno do qual os membros da família se reuniam durante as noites longas de inverno. Cada um tinha
seu lugar reservado. O irori, fixo, servia ao mesmo tempo como aquecedor e fonte de luz. Foi progressivamente
substituído pelos fogareiros portáteis, os hibachi, no século XIX. Frédéric, Louis. O Japão - dicionário e civilização,
São Paulo: Editora Globo, 2008, pág. 505.
17
Centro de Chado Urasenke do Brasil. Chanoyu : Arte e Filosofia São Paulo: Aliança Cultural Brasil-Japão, 1995,
pág. 140.
28
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
suprimiu as mesas da Cerimônia e introduziu o
chashitsu, consolidando a forma que se
prolonga até a atualidade: ritual feito em torno
do fogareiro.
O deus do fogo protege a comunidade e
também é aquele que protege a nossa casa.
Esse Deus despreza o kegare, que pode ser
traduzido como impuro. Kegare é um conceito
muito particular da antiga cultura misturada à
influência do shintoísmo18; não corresponde à
concepção de pecado que predomina na cultura
cristã. Podemos imaginar a impureza (kegare)
como a sujeira ou contaminação, que na
concepção japonesa se refere ao estado de
coisas em desequilibrio. Esse desequilíbrio
pode ser momentâneo de movimentos. Quando
existe desequilíbrio entre o céu e a terra, ocorre
o terremoto; quando há perturbação no
equilíbrio do corpo, ficamos doentes. Para
removermos o kegare, é necessário a kiyome
(purificação-harmonia). Podemos traduzir a
Cerimônia de Chá exatamente como cerimônia
da kiyome. 19
Assim, a Cerimônia de Chá valoriza a
harmonia. Harmonia entre pessoa e pessoa,
objeto e objeto, entre pessoa e objeto. A
harmonia é encontrada até nas cinzas
depositadas no fogareiro, que cuidadosamente
são arrumadas em forma de montanha. Em vez
de serem ignoradas no ritual como algo já
acabado, consumido pelo fogo, é incluído e
apreciado como parte da beleza do ambiente.
Uma bela observação:
Podemos ainda acrescentar que no Chanoyu até o
modo de se desfazer das cinzas do ro e furo se
resolve de forma artística. Observando bem a
forma das cinzas feitas com tanto empenho
espiritual, não se pode deixar de pensar na lenda
da Fênix no plano terreno. O resíduo branco do
carvão que parece realmente concluir a tarefa do
chakai não se projeta como um resíduo ósseo,
mas daí, sobretudo, faz-se sentir a sublimação do
imortal pássaro. 20
Acredita-se que todo procedimento que se
encontra no ritual do chá é em busca destas
harmonias e se prolonga para a harmonização
do nosso corpo, ou seja, que o nosso coração se
conecte com a mente e que o corpo atinja
assim o seu equilíbrio.
É uma cerimônia que dá ênfase ao
quotidiano, ao aqui e agora, aos gestos e
objetos do dia a dia. Como se evidencia na
passagem da descrição de uma “cerimônia”
privada, oferecida por Rikyu a um colega
Sokyu, mestre do chá, narrada por Burch:
O anfitrião e o visitante tinham trocado algumas
palavras quando ouviram a porta da cozinha se
abrir. Rikyu explicou tratar-se do criado que
enviara a Samegi, lugar famoso pela água, que
tinha acabado de voltar. Dizendo que agora iria
buscar a água, Rikyu ergueu a chaleira e foi para
a cozinha. Sakyu aproximou-se do fogo e o
observou, agora que a chaleira não estava ali. O
carvão, disposto de modo a saudar a alvorada, era
de uma beleza indizível. Erguendo os olhos,
Sakyu notou um suprimento de carvão
cuidadosamente guardado num recipiente, na
prateleira. Apanhou um pouco, jogou ao fogo e
limpou o braseiro com uma escova de penas.
Quando o idoso anfitrião reapareceu, vindo da
cozinha com a chaleira na mão, Sokyu explicou
que tinha adicionado mais carvão ao fogo, pois
achou que seria necessário para ferver a água
fresca, embora lamentasse ter sido obrigado a
desaparelhar o belo arranjo do anfitrião. Rikyu
ficou profundamente emocionado e
cumprimentou Sokyu, dizendo-se encantado por
18
Por exemplo: kiribi: “fogo sagrado” utilizado em algumas cerimônias shintô e produzido pelo atrito de dois pedaços
de madeira, geralmente de cipreste (hinoki), ou batendo pederneiras num ferro. Antigamente, acreditava-se que as
faíscas produzidas pelas pederneiras purificavam a pessoa que as recebia; essa tradição ainda é seguida, às vezes, para
purificar alguém que sai de uma casa e protegê-lo. Frédéric, Louis. O Japão - dicionário e civilização, São Paulo:
Editora Globo, 2008, pág. 660.
19
Disponível em: <http://www.omotesenke.jp/chanoyu/b_1.html>. Acesso em: 01. set. 2011
20
Centro de Chado Urasenke do Brasil. Chanoyu : Arte e Filosofia São Paulo: Aliança Cultural Brasil-Japão, 1995,
pág. 141.
29
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
receber visita tão atenciosa. Como a noite de
inverno fosse longa, ainda faltava algum tempo
para o raiar da aurora, Rikyu, dizendo que
gostaria de servir o chá enquanto durasse o fogo,
trouxe uma refeição ligeira. Enquanto comiam,
sentados, o dia rompeu. 21
Referências Bibliográficas
BURCH, Noël "Ozu Yasujiro" in Nagib, Lúcia e Parente, André (orgs.). Ozu: o extraordinário
cineasta do cotidiano. São Paulo: Ed. Marco Zero. 1990.
CENTRO DE CHADO URASENKE DO BRASIL. Chanoyu: Arte e Filosofia. São Paulo: Aliança
Cultural Brasil-Japão, 1995.
FRÉDÉRIC, Louis. O Japão - dicionário e civilização, São Paulo: Ed. Globo, 2008
HEIDEGGER, M. Heráclito, Rio de Janeiro, Relume Dumará,1998.
LAUAND, Jean. Fingir para Germinar: Educação e Antropologia. Disponível em:<http://http://
www.hottopos.com/rih20/jean.pdf> Acesso em: 01 jan. 2011.
MÁRTIN, César Tempass. O belo discreto: a estética alimentar mbyá-guarani. Espaço
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REVISTA INTERNACIONAL D’HUMANITATS. No. 20, 2010 Disponível em: <http://
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Sobre a escova e a dúvida. In: ROSA, Guimarães. Tutaméia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 1985
YÜN, Hsing. Contos Ch’an vol. 1. São Paulo, Shakti, 2000.
21.
Burch, Noël " Ozu Yasujiro " in Nagib, Lúcia e Parente, André (orgs.). Ozu: o extraordinário cineasta do cotidiano.
São Paulo: Ed. Marco Zero. 1990, p. 55.
30
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
1
Marcos Roberto Celestino1
Coordenação pedagógica e corpo docente: a importância
da formação continuada
Resumo
Na atual sociedade há facilidade de se
obter, através de diversos meios de
informação, em particular a Internet, notícias,
dados econômicos e sociais de todo o mundo
em tempo real. Faz-se necessário refletir
sobre a formação dos cidadãos e, em
particular, qual o papel da escola nesta
sociedade e, por conseguinte qual o papel do
professor nesse contexto.
Neste artigo, analisamos a formação de
professores como um elemento essencial
nesta sociedade de informação e o papel da
coordenação pedagógica na concretização do
projeto educacional e na formação continuada
do corpo docente.
Abstract
In the current society it is easy to obtain
news, economical and social data of everyone
in real time through several means of
information, mainly the Internet. It is
necessary to think about the citizens'
formation, especially, which role education
takes in this society and therefore what role
the teacher in this context.
In this article, we looked the teachers'
formation as an essential element in this
society of information and the role of the
pedagogical coordination in the concretion of
the educational project and in the continued
formation of the faculty.
Palavras-chave: Sociedade de informação,
formação de professores, papel da escola na
sociedade, formação continuada, coordenação
pedagógica.
Keywords: Information society, teacher
training, school's role in society, continuing
education, education supervision.
Apresentação
A educação brasileira, desde a educação
básica até o ensino superior, tem sido objeto
de grandes preocupações e discussões, seja
por educadores, estudantes ou políticos;
preocupações estas que revelam a
necessidade de se ter profissionais
capacitados para a tarefa social de educar.
As mudanças exigidas pelas reformas
educacionais, motivadas pelas mudanças
sociais, incidem também, como não poderiam
deixar de ser, na formação dos profissionais
da educação. O aprendizado contínuo é uma
exigência dos dias atuais, faz-se necessário
desenvolver a competência de “aprender a
aprender e continuar aprendendo” durante
toda a vida profissional. Essa competência é
exigida não só para os alunos da educação
básica, mas para todos os profissionais, todas
aquelas pessoas que estão inseridas no mundo
do trabalho.
Marcos Roberto Celestino - Doutor e Mestre em Educação em Matemática – PUC/SP. Especialista em Gestão Escolar
– UNICID/SP. Bacharel e Licenciado em Matemática – Universidade Presbiteriana Mackenzie – SP.
Email: [email protected]
1
31
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB - 9.394/96) reflete os anseios
de nossa sociedade a qual está impulsionada
pelas demandas de profissionais com uma
formação que ao mesmo tempo deve analítica
e crítica; demandas advindas do mundo
globalizado em que a informação se encontra
disponível e acessível a todos, porém essas
informações necessitam ser retrabalhadas por
todos os profissionais a fim de se tornarem
conhecimento, uma vez que a informação
recebe o status de conhecimento quando a
mesma torna-se significativa para o
indivíduo. Frade (2002) adverte que:
[...] um novo modelo de cidadania deve ir além
da esfera da informação, incorporando a
capacidade de interpretação da realidade e
construção de sentido por parte dos indivíduos.
O que importa na formação dos cidadãos, sob
essa perspectiva, é que sejam capazes de ser
construtores de significados (FRADE, 2002
apud SILVA et al., 2005, pág.30)
Dessa forma a escola continuará
desempenhando um importante papel na
sociedade, pois atendendo às demandas do
mundo atual, deverá construir um projeto
pedagógico que viabilize a formação de
cidadãos aptos a construírem significados às
informações que acessa e o professor,
mediador dessa formação também deverá
inserir-se nesse contexto.
É necessário refletir sobre o papel do
professor na sociedade moderna e de que
forma se deve dar essa formação, na qual a
articulação entre a técnica, o conhecimento e
a análise crítica devem ser elementos
presentes e imbricados; com vistas a formar
professores que sejam formadores de
cidadãos aptos a coletar informações de
diversas fontes e analisá-las de forma crítica e
eficaz.
A escola é o local privilegiado para a
formação continuada, processo que possibilita
ao professor continuar aprendendo enquanto
exerce seu ofício. Nesse contexto a
Coordenação Pedagógica desempenha uma
função importante na formação continuada
dos professores e de liderança intrínseca, pois
a mesma deve exercer influencia e estimular
inovações nos projetos escolares, bem como
contribuir para a formação continuada do
corpo docente. Esse último aspecto é
evidenciado pelas ações coordenadas a fim de
dirimir fraquezas e valorizar habilidades e
competências imprescindíveis ao educador.
O tema de nosso artigo: Coordenação
pedagógica e corpo docente – a
importância da formação continuada, está
inserido nesse contexto. E o objetivo de nosso
trabalho é apresentar um panorama sobre as
demandas atuais para a formação continuada
dos docentes e o papel da coordenação
pedagógica nessa formação.
É notório que o assunto é amplo, mas
analisaremos aspectos relevantes coletados
durante a revisão de literatura de autores
c o m o N ó v o a , P e r r e n o u d e Ta r d i f ,
evidentemente sem a pretensão de esgotar o
assunto ou efetuar um Estado da Arte.
Nossas motivações foram advindas da
análise de entrevista com duas coordenadoras
pedagógicas, uma atuante na rede pública e
outra na rede particular de ensino, que
dissertaram sobre a importância da formação
continuada do professor e o papel do
coordenador pedagógico nessa formação.
Após realização das entrevistas levantamos os
aspectos que julgamos mais relevantes e
analisamos de que maneira pesquisadores/
educadores vêem a formação docente, quer
formação inicial ou continuada, e o papel da
coordenação pedagógica na formação
continuada.
Esse artigo está divido da seguinte
maneira:
No Tópico 2 - A sociedade do
conhecimento e as novas demandas –
apresentamos os aspectos relevantes
encontrados na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional a respeito da formação
continuada.
No Tópico 3 – Formação Docente –
dissertamos a respeito da formação requerida
32
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
na sociedade atual, formação esta científica
que é analítica e crítica e descrevemos, nos
subitens as características desejáveis de serem
identificadas no professor, bem como seu
papel no processo de ensino-aprendizagem e,
consequentemente, sua atuação em sala de
aula.
No Tópico 4- A Coordenação
Pedagógica - projeto educacional e
formação de professores – apresentamos
uma reflexão a respeito da atuação da
Coordenação Pedagógica na formação
continuada, a atitude de liderança que essa
coordenação deve desempenhar e o estímulo
que deve propiciar à reflexão da prática
docente.
Em seguida apresentamos as
considerações finais, descrevendo de que
maneira a docente e a Coordenação
Pedagógica podem e devem estar
comprometidos e promover ações conjuntas
com vistas ao aprimoramento profissional
mediante a promoção da formação
continuada.
2. A sociedade do conhecimento e as
novas demandas
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), lei nº 9.394/96 (LDB), em
consonância com a demanda do mundo atual,
afirma que os sistemas de ensino deverão
promover a valorização dos profissionais da
educação, assegurando-lhes “aperfeiçoamento
profissional continuado inclusive com
licenciamento periódico remunerado para
esse fim” (artigo 67 – inciso II) e “período
reservado a estudos, planejamento e
avaliação, incluído na carga de
trabalho” (artigo 67 – inciso V).
A reforma educacional promovida no
Brasil exige um novo professor. São
necessárias novas competências e novos
33
conhecimentos e os professores não foram
preparados para isso. Algum tempo atrás, na
educação básica, não havia a preocupação de
realizar um trabalho de forma interdisciplinar
e contextualizado, logo, muitos dos
professores atuais não vivenciaram como
alunos esse contexto, nem mesmo em sua
formação profissional. Hoje sabemos quão
importante para a formação do professor é
experimentar situações de aprendizagem que
depois, como professor, deverá propiciar aos
seus alunos. Torna-se um desafio ao professor
promover o desenvolvimento daquilo que não
teve oportunidade de desenvolver.
A LDB apresenta a necessidade de
mudanças nas incumbências e, portanto, no
perfil do professor e evidencia a necessidade
de os profissionais e as instituições serem
flexíveis para poder acompanhá-las. Logo,
faz-se necessário rever a formação inicial dos
professores e promover atualização dos
projetos pedagógicos nas escolas e estimular
a formação continuada dos professores em
exercício a fim de atender às novas
demandas. Estamos, portanto, no âmbito da
formação continuada.
Diante desse contexto, realizamos uma
e ntr e vista c om dua s Coor de na d o r a s
Pedagógicas (CP) – uma atuante na rede
particular e outra na rede pública de ensino.
Nosso objetivo foi de verificar como essas
profissionais entendem a formação
continuada e o papel do Coordenador
Pedagógico nessa formação.
Na entrevista abordamos os seguintes
aspectos: (I) A relevância da formação
continuada (II) O papel do coordenador
pedagógico na formação continuada (III)
Obstáculos encontrados para desempenhar
sua função – com vistas ao papel de
formador.
A seguir apresentamos um quadro que
destaca os principais pontos dessa entrevista.
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Coordenadora 1
Coordenadora 2
Idade: 58 anos
Formação:
- Licenciatura Plena em Letras
(conclusão: 1972)
- Complementação Pedagógica com
Habilitação em Direção e Supervisão
Escolar (conclusão:1995)
Atuação no magistério: 40 anos
Atuação como CP: 13 anos
(rede particular)
Idade: 49 anos
Formação:
- Biologia (conclusão:1984)
- Psicopedagogia (conclusão: 1999)
- Pedagogia com Habilitação em Direção,
Coordenação Pedagógica e Supervisão Escolar
(conclusão:1995)
Atuação no magistério: 27 anos
Atuação como CP: 05 anos
(rede pública - SME/SP)
(I) A relevância da formação continuada
- As constantes mudanças sociais, impulsionadas
pelo avanço científico e tecnológico, traz dúvidas,
contradições e um número incalculável de
informações, o que a torna cada vez mais
exigente. Nesse panorama de dúvidas e incertezas
encontra-se a atividade docente que também é
influenciada por esse cenário, implicando em um
processo de mudança na formação do professor.
- A reflexão crítica permanente que deve orientar a
formação continuada dos professores em busca da
transformação de sua prática educativa.
- A formação continuada dos professores deve
levá-los à apropriação dos saberes rumo à
autonomia e levar a uma prática reflexiva,
abrangendo a vida cotidiana da escola e os saberes
derivados da experiência docente.
- São indicativos para essa formação: o estudo
compartilhado, o planejamento e o
desenvolvimento de ações conjuntas.
- Os professores deverão reconstruir suas práticas
– a legislação vigente é bastante significativa,
pois, reconhece e obriga a se criar e desenvolver
programas de formação inicial e continuada para
os docentes.
- O professor hoje tem que dar conta das
demandas da sociedade e além de sua formação
inicial, muitas vezes, insuficiente, necessita de
uma formação continuada que possibilite o
aperfeiçoamento constante, a reflexão sobre a
prática pedagógica, formação esta realizada em
serviço como objetivo de compensar as
deficiências da formação inicial e manter o
docente atualizado com relação às tendências
pedagógicas atuais.
- Para a escola se tornar o local de formação
continuada é necessária a promoção de
experiências internas de formação articulados com
o cotidiano escolar.
- Mediante análise dos resultados obtidos na Avaliação
Institucional, o Coordenador Pedagógico deve estimular
a reflexão de suas práticas docentes e envolver os
professores em torno do projeto pedagógico. A reflexão
sobre os resultados da Avaliação Institucional deve
motivar a formação em exercício em busca do
aprimoramento de sua prática.
- O Coordenador Pedagógico deve motivar o grupo de
professores a buscar, em consenso, novas alternativas de
ensino, adequando à realidade da demanda específica
daquela unidade escolar; analisar suas características e
necessidades, fazendo-os entender que não há receitas
prontas na educação. Nesse sentido a formação
continuada perpassa pela troca de experiências.
- A escolha do Projeto Especial de Ação (PÁG.E.A) que
é realizada a cada ano deve seguir todas as orientações
descritas no projeto político-pedagógico, e a reflexão
periódica dos resultados que estão sendo, ou não,
atingidos com as mudanças das práticas pedagógicas
também deve fazer parte das pautas de formação.
34
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
(II) O papel do coordenador pedagógico na formação continuada
O Coordenador Pedagógico deve:
O Coordenador Pedagógico deve:
-“criar um ambiente” propício à discussão e
encontros que possam progressivamente promover
a formação continuada dos professores;
- ter clareza de que está inserido no processo de
formação continuada, formando e sendo formado.
Portanto, para atender tal demanda, o C.PÁG. deve
manter-se atualizado, realizando leituras especificas da
sua área de atuação bem como a respeito de assuntos das
diversas disciplinas e/ou segmentos;
- promover a articulação dos diversos aspectos do
projeto político-pedagógico da escola e exercer
lembrar-se que seu trabalho é fundamentalmente
um trabalho de formação continuada em serviço;
- exercer uma tarefa formadora, articuladora e
transformadora, sendo necessário criar soluções
adequadas a cada realidade.
- desempenhar um papel importante como formador do
grupo de professores;
- elaborar as pautas de formação para os encontros
semanais considerando as Orientações de SME / DOT, o
Projeto Pedagógico e as metas da Unidade Escolar;
- elaborar um Plano de Formação dos Professores
visando aprimorar os seus conhecimentos a fim de
promover situações de aprendizagens realmente
significativas. Esse plano deve estar em consonância
com o documento “Orientações Curriculares e
Expectativas de Aprendizagem” da Secretaria Municipal
de Educação (SME/PMSP) a fim de implementá-lo.
(III) Obstáculos encontrados para desempenhar sua função – com vistas ao papel de formador
(a) vencer a resistência dos professores.
(b) trabalho burocrático e disciplinador que o
afasta das verdadeiras funções de coordenação
pedagógica.
(c) falta de tempo previsto na jornada de trabalho
que permita encontros de estudos e discussões.
(d) falta de formação adequada do coordenador
para ser formador de professores e/ou falta de
assessoria para realizar esse tipo de trabalho.
(e) formação continuada baseada em seminários e
palestras enfatizando a transmissão de informação
teórica sem a preocupação em avaliar a prática dos
professores em formação.
(a) resistência dos professores.
(b) trabalho burocrático ocupando maior parte do tempo
de trabalho.
(c) professores buscam “receitas” para utilizarem no
processo de ensino, não vêem os horários pedagógicos
como momentos de discussão, reflexão e construção
coletiva.
(d) levar o docente a enxergar a Avaliação Institucional
como indicador de aprimoramento.
Pode-se verificar no discurso das duas
coordenadoras a valorização a atitude reflexiva
da prática docente e, por conseguinte, incentivo
à formação continuada, sempre com a
consciência de que o Coordenador Pedagógico
desempenha um papel importante nessa
formação. As motivações para que a formação
continuada ocorra são muito similares, embora
o contexto em que elas ocorrem seja diferente,
pois enquanto na rede pública há horário
destinado para a reflexão sobre a prática
docente (reuniões semanais) a rede particular,
35
em sua maioria, não destina um tempo dentro
do horário do professor para essa finalidade.
Os obstáculos encontrados pelas
entrevistadas são bem semelhantes e devem
inquietar a muitos outros Coordenadores
Pedagógicos.
Motivados pelo panorama desenhado, quer
pela LDB que ressoa as tendências sociais,
quer pela pesquisa de campo que reforça
aspectos já citados na LDB e amplia a temática
em vários aspectos; propomos-nos a refletir
sobre a formação docente, em particular a
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
relevância da formação continuada, bem como
analisar o papel da coordenação pedagógica na
concretização do projeto educacional e na
formação continuada do corpo docente.
3. Formação Docente
Com vistas às necessidades do mercado de
trabalho, os professores (protagonistas do
elenco de educadores na sociedade) têm em
seu dia-a-dia a necessidade de elaborar
julgamentos, os quais requerem a articulação
entre seu conhecimento pessoal/profissional e
sua prática. Este é “um processo que necessita
de tempo. Um tempo para refazer identidades,
para acomodar inovações, para assimilar
mudanças” (NÓVOA, 1992, pág.16).
Não há lugar para uma formação dogmática,
pelo contrário, a sociedade atual requer uma
formação científica que é analítica e crítica.
Estes dois aspectos da formação científica são
essenciais para viabilizar uma qualidade no
ensino e conseqüentemente nos cidadãos
egressos do sistema escolar. No entanto, temos
que ter claro em mente que não é possível
formar professores sem fazer escolhas
ideológicas (PERRENOUD, 2000). Conforme
o modelo de sociedade e de ser humano que
defendemos, não atribuiremos as mesmas
finalidades à escola e, portanto, não
definiremos da mesma maneira o papel dos
professores.
As finalidades de um sistema educacional e
as competências não podem ser dissociadas. O
que será colocado em prática depende da visão
política e dos recursos econômicos. Isso não
nos impede de refletir sobre as competências
desejáveis para um profissional atuar na escola
de um futuro possível.
É uma utopia
necessária, no sentido de se definir aonde se
quer chegar, o que um professor deveria saber,
não para ensinar, mas para fazer aprender, não
transmitir o saber, mas para construir
competência e uma identidade, uma relação
com o mundo e com o saber. As competências
profissionais constroem-se em formação, ao
sabor da navegação diária de um professor, de
uma situação de trabalho à outra (LE BOTERF,
1997).
É natural que os profissionais se encontrem
em crise de identidade frente ao rápido
desenvolvimento científico e tecnológico, e
com as mudanças significativas dos sistemas
produtivos. Com os professores o processo não
é diferente e esta crise de identidade é
caracterizada, segundo Nóvoa, por três fases:
[...] a primeira distingue-se pela procura das
características intrínsecas ao bom professor; a
segunda define-se pela tentativa de encontrar o
melhor método de ensino; a terceira caracterizase pela importância concedida à análise do ensino
no contexto real de sala de aula, com base no
chamado paradigma processoproduto” (NÓVOA 1992, pág.14).
Analisaremos cada uma dessas fases mais
detalhadamente.
3.1. O professor e suas características
Quando refletimos sobre as características
de um professor, logo pensamos sobre a
relação entre o saber e a prática; como o
professor articula o saber de modo a torná-lo
mais acessível ao aluno. Chevallard (apud
FRANCHI, 2000; pág.16) ao falar sobre
transposição didática, escreve:
Um conteúdo do conhecimento, tendo sido
designado como saber a ensinar, sofre então um
conjunto de transformações adaptativas que vão
torná-lo apto a tomar lugar entre os ‘objetos de
ensino’. O ‘trabalho’, que de um objeto de saber a
ensinar faz um objeto de ensino, é chamado de
transposição didática. (pág.39)
Nessa perspectiva Tardif busca relacionar a
questão dos saberes com a prática dos
docentes. Inicialmente ele ressalta a
importância de considerar os professores como
sujeitos que possuem, utilizam e produzem
saberes específicos ao seu oficio e ao seu
trabalho. Nesse sentido, Tardif (2002, pág.36)
afirma que [...].”interessar-se pelos saberes e
pela subjetividade deles é tentar penetrar no
próprio cerne do processo concreto de
escolarização, tal como ele se realiza a partir
36
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
do trabalho cotidiano dos professores em
interação com os alunos e com outros atores
educacionais”.
orientar o currículo para a construção de
competências desde a escola fundamental
(PERRENOUD, 1998).
Tardif ressalta que é incontestável que
enquanto grupo social, e em virtude das
próprias funções que exercem, os professores
ocupam uma posição estratégica no interior das
relações que unem as sociedades
contemporâneas aos saberes que elas produzem
e mobilizam com diversos fins e que a relação
dos professores com os saberes não se reduz a
uma função de transmissão dos conhecimentos
já constituídos. Sua prática integra diferentes
saberes, com os quais o corpo docente mantém
diferentes relações. Propõe a seguinte definição
do saber docente: “[...] é um saber plural,
formado pelo amálgama, mais ou menos
coerente, de saberes oriundos da formação
profissional e de saberes disciplinares,
curriculares e experienciais” (Ibid, pág.36).
A noção de competência nos trabalhos de
Philippe Perrenoud designará uma capacidade
de mobilizar diversos recursos cognitivos para
enfrentar um tipo de situações. As
competências integram, mobilizam saberes,
savoir faire2 ou atitudes que são pertinentes em
situações de aprendizagem.
3.2. O processo de ensino-aprendizagem
A busca por um método de ensino que
minimize os obstáculos encontrados no
processo de ensino aprendizagem, como já
dissemos, é uma constante preocupação do
professor. O professor, profissional da
educação, deve desenvolver as competências
necessárias e intrínsecas ao seu ofício, essas
“[...] competências profissionais, constroem-se
em formação, ao sabor da navegação diária de
um professor, de uma situação de trabalho à
o u t r a ” ( L E B O T E R F, 1 9 9 7 a p u d
PERRENOUD, 2000, pág.15).
A idéia de competência não é nova, mas seu
uso está sendo difundido no atual contexto
político social, dando-lhe conotações de
inovação, com repercussões que vêm
demarcando novas posturas dos educadores
que atuam, tanto no âmbito da formação
profissional mais específica, quanto no âmbito
educacional da formação básica. Tal conceito
existe em vários países com tendência a
2
Saber fazer
37
O exercício da competência passa por
operações mentais complexas, esquemas de
pensamento (PERRENOUD, 2001).
A
natureza dos esquemas de pensamento é que
permitem a mobilização dos recursos
pertinentes em situação.
Perrenoud (2000) tem como objetivo
analisar o funcionamento das competências, a
fim de fazer um inventário dos conhecimentos
teóricos e metodológicos que elas mobilizam.
Apresentamos os dez domínios de
competências para ensinar bem numa
sociedade em que o conhecimento está cada
vez mais acessível.
Descreveremos algumas competências
citadas por Perrenoud, discorrendo sobre as
que julgarmos mais interessantes, sem a
intenção de esgotar o assunto e nem tão pouco
citar e/ou descrever todas as competências,
mesmo que isto fosse possível. São elas:
1. Organizar e dirigir situações de
aprendizagem
O ofício de professor “[...] hoje precisa
conceber uma postura de conceptores dirigentes de situações de
aprendizagem” (PERRENOUD, 2000, pág.23).
A busca de um ensino interativo,
possibilitando vivências para os alunos, faz
parte da prática do professor. O modelo de
ensino precisa ser centrado no aluno, para que
oportunidades de intervenções individuais
aconteçam na rotina da sala de aula.
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Para organizar e dirigir situações de
aprendizagem, é necessário
dispor das
competências profissionais necessárias, para
imaginar e criar outros tipos de situações de
aprendizagens amplas, abertas e carregadas de
sentido e de regulação.
A verdadeira competência pedagógica não
está centrada apenas em reconhecer bem os
conteúdos a serem ensinados, mas em os
relacionar a objetivos e a situações de
aprendizagem. Essa habilidade na
administração das situações e dos contextos
exige um domínio que Develay (1992) chama
de matriz disciplinar. São os conceitos e os
paradigmas que estruturam os saberes no seio
de uma disciplina.
Trabalhar a partir das representações dos
alunos exige uma competência essencialmente
didática. O professor precisa entender o que o
aluno pensa, como pensa e por que pensa
daquela maneira. Na prática da sala de aula,
abrir espaços para discussões e negociações de
idéias.
função de sua contribuição almejada à
progressão ótima das aprendizagens de cada
um.
Com a introdução de ciclos de
aprendizagem plurianuais, o movimento rumo
à individualização dos percursos de formação e
à pedagogia diferenciada leva a que se pense
na progressão de cada aluno.
3. Conceber e fazer evoluir os dispositivos
de diferenciação
Diferenciar é romper com a pedagogia
frontal, a mesma lição para todos, os mesmos
exercícios para todos, mas é criar uma
organização do trabalho e dos dispositivos
didáticos que coloque cada um dos alunos em
uma situação ótima, priorizando aqueles que
têm mais a aprender.
4. Envolver os alunos em suas
aprendizagens e em seu trabalho
A competência e a vontade de desenvolver o
desejo de saber e a decisão de aprender
encontram-se no centro do ofício de professor.
Bachelard (1996) observa que os
professores têm dificuldades para compreender
que seus alunos não compreendem, já que não
se lembram do caminho do conhecimento, dos
obstáculos, das incertezas, dos atalhos, dos
momentos de vazio pelos quais passaram
quando eram estudantes.
A competência profissional de desenvolver
esse desejo apela para dois recursos:
Entretanto, para Perrenoud (2000), não
basta que os professores tenham memórias de
suas próprias aprendizagens, é necessário
buscar uma cultura mais extensa em história da
matemática, em filosofia das ciências, em
antropologia, em psicologia genética e em
psicologia da aprendizagem.
b) habilidade no campo da transposição
didática, das situações, das competências, do
trabalho sobre a transferência dos
conhecimentos. Identificar os projetos pessoais
existentes, sob todas as suas forças, valorizálos e reforçá-los.
2. Administrar a progressão das
aprendizagens
A evolução da escola caminha para a
cooperação profissional. A divisão do trabalho
pedagógico aumenta na escola básica. Isso
suscita novas formas de cooperação: a
repartição igualitária das tarefas.
A escola é organizada para favorecer a
progressão das aprendizagens dos alunos ao
final de cada ciclo de estudos. Todo o ensino
deveria ser estratégico, no sentido dado por
Tardif (1992), concebido em uma perspectiva a
longo prazo, cada ação sendo decidida em
a) compreensão e um certo domínio dos
fatores e mecanismos sociológicos, didáticos e
psicológicos em jogo no surgimento e na
manutenção do desejo de saber e da decisão de
aprender;
5. Trabalhar em equipe
As competências específicas para o trabalho
em equipe são: saber trabalhar eficazmente em
equipe, saber discernir os problemas que
38
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
requerem uma cooperação intensiva. Saber é
perceber, analisar e combater resistências e
impasses ligados à cooperação. É saber se
autoavaliar.
6. Participar da administração da escola
O modo de gestão da escola permanece
arcaico, burocrático, baseado mais na
desconfiança, na liberdade clandestina do que
na autonomia assumida, na aparência do
controle do que na transparência das escolhas e
na obrigação de prestar contas.
Profissionalização, responsabilização,
participação, autonomia de gestão, projetos da
instituição e cooperação designam alternativas
desejáveis para um funcionamento da escola.
Uma nova organização em ciclos de
aprendizagem modifica o equilíbrio entre
responsabilidades individuais e
responsabilidades coletivas e torna necessário,
não somente um trabalho em equipe, mas
também uma cooperação da totalidade do
estabelecimento, de preferência baseada em um
projeto (CHARLIER e PERRENOUD, 1996).
7. Utilizar novas tecnologias
A escola não pode ignorar o que se passa no
mundo. As novas tecnologias da informação e
da comunicação transformam não só nossas
maneiras de comunicar, mas também de
trabalhar, de decidir, de pensar.
8. Administrar sua própria formação
contínua
Pode-se ver, com as competências
destacadas anteriormente, que Perrenoud foi
bastante detalhista e evidenciou as principais
características que devem estar presentes em
um professor, mas certamente poderíamos
transpor as fronteiras escolares e transferirmos
muitas destas competências aos profissionais
que a sociedade espera formar, seja qual for a
área de atuação.
Mas detendo-nos ao ofício de professor, fazse necessário analisar este profissional em seu
ambiente de trabalho: a sala de aula. É neste
ambiente que se dá o processo de ensinoaprendizagem, onde o saber é construído pelo
39
aluno com a orientação e auxílio da
transposição do saber realizada pelo professor.
3.3. O professor e a sala de aula
A construção do conhecimento é uma
trajetória coletiva que o professor orienta,
criando situações e dando auxílio, sem ser o
especialista que transmite o saber, nem o guia
que propõe a solução para o problema. Devemse conceber situações que estimulem o conflito
cognitivo entre alunos ou na mente de cada
um.
Trabalhar a partir dos erros e dos obstáculos
de aprendizagem é uma competência que se
baseia no princípio de que o aprender está na
reestruturação do sistema de compreensão de
mundo, não em estocar informações, nem em
só memorizar. Uma verdadeira situaçãoproblema obriga a transpor um obstáculo, quer
se trate de uma simples transferência, de uma
generalização ou da construção de um
conhecimento inteiramente novo . O s
obstáculos cognitivos são constituídos por
falhas de raciocínio, pistas falsas, erros de
estimativa ou de cálculo.
O obstáculo, conforme expressão de
Martinand (1986) torna-se, então, o objetivo do
momento. Deparar-se com o obstáculo é
enfrentar a ausência de qualquer solução num
primeiro momento, até mesmo de qualquer
pista, e uma sensação de que não se vai
conseguir encontrar a solução. Os alunos se
envolvem no problema, interagem, constroem
hipóteses e propõem alternativas. Em um
trabalho coletivo, socializa-se a discussão. O
choque das representações obriga cada um a
rever seu pensamento e a levar em conta o dos
outros.
A didática das disciplinas interessa-se cada
vez mais pelos erros e tenta compreendê-los.
Astolfi (1997) propõe considerar o erro como
uma ferramenta para ensinar, um revelador dos
mecanismos de aprendizagem do aluno.
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Dispositivos e seqüências didáticas buscam
fazer com que se aprenda a mobilizar os alunos
seja para compreenderem, seja para terem
êxito. Se possível, os dois (PIAGET, 1974).
múltiplas maneiras e em diversas fases do ciclo
da vida de um projeto” (THURLER, 2001, pág.
142), projeto este, construído com a
comunidade educativa.
Todo dispositivo repousa sobre hipóteses
relativas à aprendizagem e à relação com o
saber, o projeto, a ação, a cooperação, o erro, a
incerteza, com o êxito e o fracasso, com o
obstáculo, com o tempo.
Vemos que a liderança é ativa, deve-se ter
consciência de que tem inicio na construção do
projeto e estende-se durante todo o processo de
execução, ela “influencia a orientação do
projeto, a formulação dos objetivos, o justo
equilíbrio entre utopia e realismo” [...] exerce
sua influencia durante a aplicação do projeto
coletivo, especialmente quando ele tropeça em
algum obstáculo, em um dilema ou em um
problema tático ou estratégico” (ibid., pág.
142). Diante disso, pode-se evidenciar que a
influencia do Coordenador Pedagógico é de
grande valia e essencial para propiciar a
formação de um grupo docente coeso e que
trabalha com metas claras.
4. A Coordenação Pedagógica projeto educacional e formação de
professores
Difícil refletir a respeito dos desafios postos
à escola nos dias atuais e não se lembrar dos
atores envolvidos: coordenação pedagógica e
professores. Cada qual desempenha um papel
importante e imprescindível no processo
educacional, porém, é inegável que para se ter
um projeto educacional exeqüível faz-se
necessário envolver esses atores em ações que
mobilizem habilidades e competências
educacionais com foco em dirimir fraquezas e
superar obstáculos, quer sejam de ordem
coletiva ou individual.
Dessa maneira, buscaremos analisar
aspectos ligados à atuação da Coordenação
Pedagógica, nossa intenção não é esgotá-los,
mas apresentar pontos mais relevantes e
destacar aspectos ligados à condução do
projeto pedagógico e cooperação à formação
continuada do corpo docente.
Explanaremos a respeito de cada um desses
itens mais detalhadamente.
4.1. Coordenação Pedagógica como
liderança
É impossível não visualizar a Coordenação
Pedagógica como uma função de liderança
intrínseca. Ao perceber que a Coordenação
Pedagógica deve como liderança, “[...]
influenciar um processo de inovação de
As discussões sobre a importância do
projeto-político pedagógico, sobre a
valorização das ações coletivas, vinculadas ao
eixo pedagógico desenvolvido na escola e a
atuação do coordenador como gestor do
trabalho que oferece feedback, aquele que
“apresenta os objetivos de maneira a provocar
o engajamento da maioria, cria um clima de
tentativa coletiva, de resolução de problemas e
de aprendizagem permanente” (THURLER,
2001, pág.147); contribui para a constituição
de um grupo de professores engajados com a
proposta pedagógica, com os projetos
desenvolvidos (idealizados e traçados em
processo colaborativo).
4.2. O papel do projeto políticopedagógico na escola – sua interferência nas
atribuições do coordenador pedagógico
Inicialmente devemos nos perguntar o que é
o projeto político-pedagógico. Dizemos que
tem caráter político porque diz respeito à
organização, a governabilidade da escola; ele
prevê e dá uma direção à gestão da escola. Já o
caráter pedagógico faz-se presente nas
40
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
reflexões sistemáticas sobre as práticas
educativas: dá sentido e rumo às práticas
educativas, contextualizadas culturalmente.
Viabiliza a participação coletiva e reflexiva
dos atuantes da vida escolar (professores,
diretores, coordenadores). É a construção do
projeto político-pedagógico que dará as
diretrizes para a atuação do trabalho da
coordenação pedagógica, uma vez que, sua
função será viabilizar o trabalho do professor,
oferecendo condições à realização das
atividades pedagógicas, o que, sem dúvida,
reflete na dinâmica da sala de aula. As escolhas
realizadas pela coordenação pedagógica a fim
de implementação de gestões educativas,
perpassando pelas prioridades dos recursos
financeiros, deverão ser realizadas em
consonância com o que o projeto políticopedagógico norteia.
Sendo assim, cabe reforçar que o projeto
político-pedagógico representa a “[...]
oportunidade de a direção, a coordenação
pedagógica, os professores e a comunidade,
tomarem sua escola nas mãos, definir seu papel
estratégico na educação das crianças e jovens,
organizar suas ações, visando a atingir os
objetivos que se propõem” (LIBÂNEO,
TOSCHI e OLIVEIRA; 2003, pág. 125).
To d a e s c o l a p o s s u i a l g u m p r o j e t o
pedagógico, seja ele formalizado em um texto
ou vivido no dia-a-dia da sala de aula. A
formalização e institucionalização desse
projeto (político-pedagógico) auxiliam na
solução de questões fundamentais para vida
escolar, na construção da identidade da escola e
na diretriz de suas ações, viabilizando que a
escola se estruture e busque alcançar as metas
traçadas coletiva e participativamente.
4.3. Coordenação Pedagógica participação na formação continuada
Há também o aspecto de contribuir na
formação contínua do professor. Sem dúvida é
uma área importante de atuação da
41
Coordenação Pedagógica, pois é no seu fazer
diário que a coordenação evidencia e ratifica a
importância da formação continuada. É nos
momentos que “[...] se reúnem para discutir
questões e problemas pedagógicos, isto é,
pertinentes à sala de aula, ao conteúdo de
ensino, ao desempenho dos educandos e ao
relacionamento com os alunos” (GEGLIO,
2006, pág.117) que se está contribuindo para a
formação docente.
Não se pode olvidar que, conhecedor das
necessidades dos educandos e orquestrador das
ações necessárias para soluções de problemas
levantados pelos docentes (didáticopedagógicos, disciplinares ou de outra
natureza), o coordenador pedagógico deve
planejar a maneira que conduzirá os encontros
coletivos (selecionando as leituras e mediando
os debates), pois ele “deve ter observado as
necessidades dos professores, na relação com
os alunos, com o ensino, com a visão de
educação, com a concepção de aprendizagem e
avaliação” (SOUZA, 2005, pág.28). Como se
pode notar, o trabalho coletivo é parte
integrante dessa formação, uma vez que
viabiliza a troca de experiências e a reflexão da
p r á t i c a d o c e n t e ( C H R I S TO V, 2 0 0 5 ) .
Reiteramos que esses momentos de trabalho
coletivo acrescentam muito à formação do
professor, dado que o saber docente é plural e
um amalgama dos saberes profissionais e de
saberes disciplinares, curriculares e
experienciais (TARDIF, 2002).
O coordenador deve atentar às necessidades
especificas de seus liderados e, portanto,
empreender em seu planejamento momentos
em que, intencionalmente, aborde as fraquezas
dos componentes do grupo e do coletivo. O
coordenador pedagógico deve auxiliar os
professores na descoberta e construção de
habilidades e competências imprescindíveis à
sua atuação como educador, e, portanto, é
necessário que indique ou traga aos seus
liderados meios para essa qualificação, ou
ainda que se valha de meios próprios (atuando
como formador em um processo de
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
qualificação). Corrobora com esses aspectos
citados a necessidade de que o professor tenha
elementos para analisar sua própria pratica à
luz das contribuições dos pensadores da
educação (CHRISTOV, 2005).
4.4. Reflexão sobre sua prática
E por último, mas não menos importante a
reflexão sobre a metodologia de trabalho do
coordenador, a qual deve envolver: ação à
reflexão à ação. É um processo continuo e
dialético, uma vez que após cada ação
praticada requer que se faça uma reflexão
sobre as metas alcançadas, eficácia dos
procedimentos e posterior ação corretiva do
que pôde causar desvio e, consequentemente,
comprometer as metas traçadas, ou seja,
impedindo que as mesmas sejam alcançadas
satisfatoriamente. Libâneo (2003) corrobora
com essa necessidade de reflexão quando
afirma que:
[...] para enfrentar as mudanças, a ação e a
reflexão atuam simultameamente, porque elas
estão sempre entrelaçadas. Podemos refletir nossa
ação, transformando nossa ação em pensamento.
Ao mesmo tempo, podemos traduzir idéias em
ações. Propõe-se, assim, uma formação
profissional – tanto a inicial como a continuada –
baseada na articulação entre a prática e a reflexão
sobre a prática, de modo que o professor vá se
transformando em um profissional crítico e
reflexivo, isto é, um profissional que domina uma
prática refletida (pág.28).
Mas para que as ações surtam resultados
significativos, condizentes com a realidade de
trabalho e propicie a concretização das metas
traçadas no projeto político-pedagógico, é
imprescindível que o coordenador pedagógico
esteja inteirado do conhecimento e da
experiência pedagógica dos professores. É
necessário criar uma metodologia de trabalho
que possibilite aos professores e a si próprio
atuarem como protagonistas, sujeitos ativos no
processo de identificação, análise e reflexão
dos problemas existentes na escola e na
elaboração de propostas para sua superação.
Lembrando de estabelecer prioridades de plano
de ação a curto, médio e longo prazo.
Portanto o coordenador pedagógico deve:
(a) buscar compreender a realidade da escola
em que atua – conhecer o corpo discente e
docente, a comunidade e direção (b) identificar
os problemas prementes - analisar e investigar
suas raízes (origem) e causas; envolver o corpo
docente na reflexão crítica e (c) criar
metodologia para o trabalho – elaborar
propostas a fim de solucionar, ou quiçá
minimizar, os problemas levantados. Cabe ao
coordenador valorizar as experiências, projetos
positivos em desenvolvimento na escola e
compartilhar com todos, estimulando a
participação dos docentes e, por valer-se das
experiências positivas, criar outros projetos que
auxiliam alcançar as metas estabelecidas em
conjunto.
O coordenador pedagógico deve olhar a
escola a partir de seus professores, alunos e
suas condições materiais; tomar conhecimento
dos índices de evasão/repetência; localizar as
principais questões de ensino e aprendizagem;
inteirar-se de como está organizado os
trabalhos dos professores. Nos momentos de
trabalho coletivo direcionar discussões que
viabilizem refletir sobre a prática docente,
sobre processos de avaliação e teorias de
aprendizagem.
Considerações Finais
Vimos que a reflexão sobre a formação de
professores e sobre a escolha (ideológica) de
qual escola se quer e, então, qual sistema
educacional se adotará, é o único caminho
possível para educar cidadãos atuantes e
valorosos à sociedade moderna.
Cabe ao professor refletir sobre seu
importante papel nesta sociedade e, motivados
por sua atuação na construção da sociedade,
construir as competências necessárias para
tornar-se um agente transformador.
O dia-a-dia do ambiente escolar e o
processo de ensino-aprendizagem envolvem a
presença de indivíduos que ensinam e
42
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
aprendem ao mesmo tempo, assim sendo a
escola é vista como uma organização que
possui fins políticos, ideológicos e culturais na
qual os indivíduos e grupos (corpo diretivo,
corpo docente e discente) mobilizam poderes e
elaboram processos de negociações, pactos e
enfrentamentos. Com a finalidade e
intencionalidade de viabilizar meios pelos
quais a escola possa atingir suas finalidades e
objetivos, traçados no projeto políticopedagógico, construído, em conjunto pelos
principais atores do processo; faz-se necessário
que a escola determine papéis e
responsabilidades, juntamente com o
relacionamento entre os vários setores que
determina o sistema educacional.
Cabe a Coordenação Pedagógica a
incumbência, difícil e ao mesmo tempo
essencial, de coordenar, acompanhar,
assessorar, apoiar e avaliar as atividades
pedagógicas, sempre norteadas pela função
prioritária que é prestar assistência pedagógica
e didática aos professores em suas respectivas
disciplinas. Outra função importante da
coordenação é estabelecer um relacionamento
com os pais e com a comunidade, buscando
sempre o maior ideal que é a aprendizagem do
educando, visando suprir suas necessidades e
buscando um engrandecimento pessoal, com
responsabilidades, respeito, dignidade e apto a
fazer parte de uma sociedade sem frustrações e
preconceito.
A Coordenação Pedagógica deve como
liderança “influenciar um processo de inovação
de múltiplas maneiras e em diversas fases do
ciclo da vida de um projeto” (THURLER,
2001, pág.142), projeto este, como já foi dito,
construído com a comunidade educativa. Seu
papel inicia na construção do projeto e estende-
se durante todo o processo de execução, ela
“influencia a orientação do projeto, a
formulação dos objetivos, o justo equilíbrio
entre utopia e realismo [...] exerce sua
influencia durante a aplicação do projeto
coletivo, especialmente quando ele tropeça em
algum obstáculo, em um dilema ou em um
problema tático ou estratégico” (ibid, pág.142).
Pode-se ver que tal atuação tem influencia
significativa na constituição e atuação do grupo
de professores, uma vez que, o tom que a
coordenação dá ao trabalho pode vir a
estimular ou a cercear a participação dos
professores e dos lideres constituídos. A
coordenação pedagógica deve ter em mente a
necessidade de ter papel conciliador e
integrador, uma vez que suas ações podem
“mobilizar e canalizar o engajamento de todos
no sentido da mudança, como podem tornar-se
freios, ou mesmo adversários declarados do
projeto” (ibidem, pág.146).
A atuação da coordenação como conciliador
de conflitos, como gestor do trabalho que
oferece feedback, aquele que “apresenta os
objetivos de maneira a provocar o engajamento
da maioria, cria um clima de tentativa coletiva,
de resolução de problemas e de aprendizagem
permanente” (ibidem, pág.147); contribui para
a constituição de um grupo de professores
engajados com a proposta pedagógica, com os
projetos desenvolvidos (idealizados e traçados
em processo colaborativo).
Desempenhando com diligência e
compromisso seus papéis, coordenação
pedagógica e corpo docente atuarão de forma
orquestrada na formação de cidadãos aptos a
coletar informações de diversas fontes e
analisá-las de forma crítica e eficaz.
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44
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
12345
Fernanda Cristina Barbosa Pereira Queiroz 1
Hélio Roberto Hékis 2
Jamerson Viegas Queiroz 3
Lucas Ambrósio B. de Oliveira 4
Natália Veloso Caldas de Vasconcelos 5
Contribuição dos Sistemas Integrados de Gestão
para as Práticas de Ensino e Aprendizagem
Resumo
Este artigo tem como objetivo evidenciar a
importância que um sistema de gestão tem
para uma IES, e como este sistema, pode
colaborar com as práticas de ensino e
aprendizagem, e isto será feito através de um
estudo de caso na Universidade Federal do Rio
Grande do Norte. Como justificativa para o
estudo temos a universidade como um
ambiente nos quais muitas pessoas tem pouco
tempo para desenvolver as atividades, o uso de
ferramentas evoluídas tecnologicamente, neste
caso o sistema de gestão, facilitaria bastante o
cotidiano das pessoas. A problemática de
pesquisa gira em torno do seguinte
questionamento: como um sistema de
informação pode contribuir para as práticas de
ensino. A metodologia empregada consistiu
em duas etapas, revisão bibliográfica e estudo
de caso. Na Universidade Federal do Rio
Grande do Norte sendo que o objeto de estudo
foi o Sistema Integrado de Gestão de
Atividades Acadêmicas, o (SIGAA). Os
resultados encontrados evidenciaram a
importância de um sistema de gestão para a
prática do ensino e aprendizagem, e isso foi
feito através da descrição do sistema de
informação, mostrando a utilidade de seus
módulos. A conclusão que pode ser feita é que
o sistema de informação integrado a gestão
universitária, envolve processos mutuamente
dependentes de credibilidade, agilidade e
recuperação rápida das informações,
colaborando também para o relacionamento
professor-aluno, tornado os processos mais
eficientes.
Palavras-chave: Gestão Universitária;
Sistemas de gestão; Ensino.
Fernanda Cristina Barbosa Pereira Queiroz - Doutora e Mestre em Engenharia de Produção pela Universidade Federal
de Santa Catarina (2003). Email: [email protected]
1
Hélio Roberto Hékis - Doutor em Engenharia de Produção e Serviços. Mestre em Administração - Gestão Estratégica
das Organizações. Contador e Auditor CRC-SC 14.844; Professor do Programa de Pós-graduação em Engenharia de
Produção da - UFRN; Pesquisador do Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde (LAIS-UFRN); Avaliador
Institucional e de Cursos do INEP/MEC; Cel: +55(84) 8116-6096; Sites: http://lattes.cnpq.br/9599726799047515
http://www.docente.ufrn.br/hrhekis
2
Jamerson Viegas Queiroz - Doutor em Engenharia de Produção e mestre em Economia pela Universidade Federal de
Santa Catarina. Email: [email protected]
3
Lucas Ambrósio B. de Oliveira - Mestrando em Engenharia de Produção na Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. Email: [email protected]
4
Natália Veloso Caldas de Vasconcelos - Mestranda em Engenharia de Produção na Universidade Federal do Rio
Grande do Norte. Email: [email protected]
5
45
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
C O N T R I B U T I O N O F I N T E G R AT E D
SYSTEMS MANAGEMENT PRACTICES
FOR TEACHING AND LEARNING
Abstract
This article aims to highlight the
importance of a management system for an
HEI has, and how this system can work with
the practices of teaching and learning, and
this will be done through a case study at
Federal University of Rio Grande
do North. As justification for the study have
the university as an environment in which
many people have little time to develop the
activities, the use of technologically advanced
tools, case management system, greatly easing
the daily lives of people. The issue of research
revolves around the question: as an
information system can contribute to teaching
practices. The methodology used consisted of
two phases, literature review and case
study. At the Federal University of Rio Grande
do Norte and the object of which was to study
the Integrated Management of Academic
Activities, the (follow). The results showed the
importance of a management system for the
practice of teaching and learning, and this
was done through the description of the
information system, showing the usefulness of
its modules. The conclusion that can be made
is that the integrated information system to the
university administration, involves mutually
dependent processes of credibility, agility and
quick retrieval of information, also
c o n t r i b u t i n g t o t h e t e a c h e r- s t u d e n t
relationship, making processes more efficient.
Keywords: University Management, Systems
Management, Education.
1. Introdução
Tem sido notável o avanço da internet para
áreas diferenciadas do conhecimento a partir
de 1995. A ampliação da utilização da internet
do âmbito acadêmico para a sociedade em
geral, com sua posterior entrada na área
governamental, figurou o início do uso de
novas tecnologias da informação na prestação
de serviços, como também de oferta de
informações para cidadãos, fornecedores e
servidores.
Segundo Nascimento e Araújo (2006), o
ensino superior no país tem passado por
diversas dificuldades, sejam elas financeiras,
de planejamento, ou até de redefinição nas
metodologias de ensino, algumas instituições
encontram, por iniciativas próprias, formas
para dinamizar o ensino, auxiliando
diretamente na melhoria da qualidade na
formação dos acadêmicos.
A busca das instituições de ensino superior,
por melhores formas de gerenciamento de
informações, pode ser justificada pelo fato
entender como a construção de percepção de
qualidade de serviço é particularmente
fundamental na gestão de serviços
educacionais (RUBINSZTEJN e PALACIOS,
2010). Ainda conforme esses últimos autores,
essas iniciativas tornam-se possíveis através
de projetos, voltados para a melhoria do
ensino. Os objetivos desse tipo de projeto
visam, basicamente, dinamizar as aulas e
preparar o aluno para a realidade do mercado
de trabalho, tornando o estudo cada vez mais
prático, em vez do estilo tradicional de ensino,
que ainda é muito utilizado no país. Sendo
assim, tem-se uma reestruturação da
metodologia do ensino na graduação.
Conforme Burgarelle e Carvalho (2006) o
avanço das Tecnologias de Informação e
Comunicação (TICs) impactou toda a
sociedade com a perspectiva de acesso a
informações para melhoria de vida e trabalho.
O processo de globalização, aliada ao avanço
das TICs, transformou a forma de competição
no mercado, seja ela entre empresas, ou entre
Instituições de Ensino Superior (IES), essas
que passaram a depender da criação
impulsionadora de novos conhecimentos e da
inovação para otimização de processos,
46
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
buscando a melhoria de produtos e serviços
para satisfação dos clientes.
Devido à demanda por disseminação de
conhecimento, as IES estão buscando auxílio
junto às ferramentas tecnológicas, como
exemplo os sistemas de informação
acadêmica, que auxiliam e ampliam as
atividades de geração, organização e
transferência do conhecimento para fora do
limite físico da sala de aula.
De acordo com as informações explanadas
anteriormente, o pressente artigo tem como
objetivo evidenciar a importância que um
sistema de gestão tem para uma IES, e como
este sistema, pode colaborar com as práticas
de ensino e aprendizagem. Essa análise será
feita através de um estudo de caso na
Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Buscou-se ainda identificar as melhorias que
um sistema de gestão traz para as IES, no que
diz respeito à agilidade nos processos e
confiabilidade de dados.
Como justificativa para o estudo temos a
universidade como um ambiente nos quais
muitas pessoas tem pouco tempo para
desenvolver as atividades, o uso de
ferramentas evoluídas tecnologicamente, neste
caso o sistema de gestão, facilitaria bastante o
cotidiano das pessoas, facilitando o acesso à
informação e contribuindo também para a
comunicação efetiva de alunos e professores.
Considerando o que já foi explanado, o cerne
desta pesquisa gira em torno do seguinte
questionamento: como um sistema de
informação pode contribuir para as práticas de
ensino.
A organização do presente estudo inicia-se
com essa abordagem introdutória, seguida pela
seção 2, fundamentos teóricos, na qual se
aborda: práticas de ensino e aprendizagem,
tendo a intenção de aprimorar conceitos hoje
utilizados por estudiosos da área. A seção 3
ainda referente ao corpo teórico do estudo
aborda conceitos de sistema de informação
gerencial no escopo das práticas de ensino e
aprendizagem. Posteriormente, a seção 4,
47
metodologia, traz os métodos de pesquisas
utilizados durante o atual estudo. Na seção 5,
encontra-se o estudo de caso, mostrando como
o sistema de informação utilizado pela UFRN
colabora com as práticas de ensino. Em
seguida, os resultados dessas análises podem
ser observados na seção 6 e as considerações
finais encontram-se na seção 7. Finalizando na
seção Referências são apresentadas as
bibliografias utilizadas na pesquisa.
2. Práticas de ensino e aprendizagem
Conforme Miranda (2010), o processo de
Ensino-Aprendizagem é um dos campos mais
férteis de contribuições nos últimos anos no
Brasil. Nesse sentido, muitos focos de
preocupações já foram levantados no interior
do referido processo, bem como muitas foram
as descobertas no sentido de melhorar sua
qualidade.
Destarte, a preocupação sobre esse
processo não se limita ao Brasil, em um estudo
recente patrocinado pela Comissão Européia
reconhece que, nos últimos anos, numerosas
pesquisas mostraram uma preocupante queda
de interesse dos jovens para o estudo científico
(ROCARD et al., 2007 apud VILCHES,
2010). Ainda de acordo com esse autor, o
citado processo tem sido alvo de críticas, em
grande parte, devido ao seu distanciamento
das questões práticas do dia-a-dia, como
afirma Cole (1990). Para o referido autor,
numa perspectiva sócio-histórica, a atividade
prática está inserida no sistema de relações
sociais e dele é dependente (tais como a
aprendizagem), representando a unidade, e
sem a qual as ferramentas oferecidas pela
educação formal “enferrujam” e “caem em
desuso” (COLE, 1990).
De acordo com Vasconcelos (2006) as IES
são fontes multiplicadoras do saber e forte
formadoras de opinião, e, por conseguinte,
responsáveis por prepararem as pessoas para
aprenderem a agir e a pensar por conta
própria. As IES têm o compromisso de
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
promover, constantemente, a produção de
novos conhecimentos, o compartilhamento e o
uso desse conhecimento.
Segundo Burgarelle e Carvalho (2006)
existem várias tecnologias baseadas na Web
como o e-learning e o portal corporativo que
podem apoiar iniciativas de aprendizagem e
gestão do conhecimento no ambiente
acadêmico, pois essas ferramentas promovem
acesso, compartilhamento de informações
acadêmicas e conhecimentos de professores
para professores, entre alunos e, professores e
alunos.
Neste estudo será focado, no escopo da
tecnologia de informação, o papel do sistema
de informação acadêmico, dentro do processo
ensino-aprendizagem, bem como as
contribuições deste sistema, visando facilitar o
processo de ensino e aprendizagem. Na seção
seguinte, alguns conceitos sobre sistemas de
informações.
3. Sistema de informação gerencial
De acordo com Schimitt (2004) grande
parte das empresas está ciente da importância
das informações para o seu processo de gestão
e tomada de decisão, mas parece não se dar
conta que o valor da informação está no seu
uso e não na sua geração.
As transformações no ambiente empresarial
acarretam para as organizações reações mais
rápidas e mais inteligentes. A gestão da
informação reforça seu papel fundamental na
adequação às mudanças impostas pelo
mercado (ROSINI e PALMISANO, 2003).
De acordo com Ochoa e Ochoa (2010)
supõe-se que as tecnologias TIC’s devem ser
inseridas no mundo da educação através da
sua presença nas IES. Enormes esforços têm
sido feitos para integrá-los, seja através de
programas governamentais ou de esforços,
todas destinadas a proporcionar recursos para
IES, através de recursos materiais e humanos,
de forma visível, que vai resultar em
melhorias no processo de ensino, educação e
aprendizagem. Ainda conforme o autor, esta
suposição é explicada pelas necessidades
exigentes de sociedade de hoje, onde a
informação torna-se um recurso fundamental
para a integração cultural dos indivíduos,
resultando em necessidade de melhorar as
capacidades do seu acesso aos conhecimentos
e conhecimentos através dessas ferramentas
tecnológicas.
Buscando estreitar a relação entre sistema
de informação gerencial, e as IES, Almeida
(2002) diz que existem no mercado softwares
disponíveis para o controle integrado na
gestão de pequenas empresas, bem como para
organizações de serviços, no caso as
Instituições de Ensino Superior (IES),
considerando desde estoques, controles
financeiros, geração de faturas e pagamentos,
o que facilita o trabalho de gestores destas
organizações.
Segundo Tachizawa (2003) a gestão em
ensino compreende um conjunto de decisões
as quais propiciam um equilíbrio de interesses
e forças dinâmicas dentro de um universo de
pesquisa, ensino e extensão. A gestão passa a
ser enfocada de forma sistêmica, ou seja,
entendida como um conjunto de decisões
assumidas a fim de obter um equilíbrio
dinâmico entre missão, objetivos, meios e
atividades acadêmicas e administrativas.
Tachizawa (2003) também ressalta que o
enfoque sistêmico propicia uma visão
macroscópica da instituição de ensino, que é o
ponto de partida para concepção do modelo de
gestão que possibilitaria à IES responder
eficazmente à nova realidade, de concorrência
acirrada e de mudanças nas expectativas dos
clientes.
4. Metodologia
A pesquisa realizada teve uma abordagem
do tipo qualitativa. A classificação da pesquisa
levando em consideração os objetivos tem
caráter exploratório. Quanto ao planejamento
48
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
da pesquisa optou-se pela pesquisa
bibliográfica e pelo estudo de caso. A
instituição que escolhida para o estudo de caso
foi a Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, localizada em Natal, no nordeste do
Brasil, abordando o Sistema Integrado de
Gestão Acadêmica da IES desenvolvido pela
Instituição. A metodologia da pesquisa
descreve as etapas que serão utilizadas no
decorrer da pesquisa que o objetivo seja
cumprido, ou seja, compreender e conceituar
práticas de ensino e aprendizagem e sistema
informação gerencial; analisar o sistema
utilizado pela UFRN, bem como seus
relatórios e indicadores gerados pelo próprio
sistema; apresentar de que maneira o sistema
de informação contribui para a relação ensino
e aprendizagem.
4.1. Estudo de caso
Atualmente a UFRN oferece 75 cursos de
graduação presencial e 73 cursos de pósgraduação. Sua comunidade acadêmica é
formada por mais de 33.000 estudantes
(graduação e pós-graduação), 3.108 servidores
técnico-administrativos e 1.760 docentes. A
universidade está passando por um período de
crescimento acelerado, e parte desse
crescimento está associada ao Programa
REUNI, por meio do qual, no ano de 2008, o
projeto viabilizou a criação de 16 novos cursos
de graduação nos campi de Natal, Caicó,
Currais Novos, Santa Cruz e Macaíba
(Jundiaí).
A ampliação em cursos novos e em cursos
existentes gera 2.700 novas vagas até o ano de
2012. Tendo em vista esse cenário e a
necessidade de sistemas integrados cada vez
mais eficientes e que facilitem a tomada de
decisões, a Universidade desenvolveu um
Sistema Institucional Integrado de Gestão que
é composto por cinco sistemas, direcionados a
públicos diferentes, com utilidades diferentes
49
e com vários níveis de acesso, a saber: SIPAC
(Sistema Integrado de Patrimônio,
Administração e Contratos); SIGAA (Sistema
Integrado de Gestão de Atividades
Acadêmicas); SIGPRH (Sistema Integrado de
Gestão, Planejamento e Recursos Humanos);
SIGAdmin (Sistema de Administração dos
Sistemas - Técnica e Gestão); SIGED
(Gerenciador Eletrônico de Documentos).
Além desses sistemas, existe o iProject
(Sistema Integrado de Gerência de Projetos)
que foi desenvolvido com objetivo de
gerenciar os processos de desenvolvimento
dos demais sistemas (SINFO, 2011).
Porém o objeto deste estudo é o Sistema
Integrado de Gestão de Atividades
Acadêmicas (SIGAA). O SIGAA é o sistema
responsável pelos procedimentos ligados à
gestão acadêmica e possui trinta e um módulos
que estão relacionados com a natureza da
atividade que é oferecida, a saber: graduação,
pós-graduação (stricto e lato sensu), ensino
técnico, ensino médio e infantil, submissão e
controle de projetos e bolsistas de pesquisa,
submissão e controle de ações de extensão,
submissão e controle dos projetos de ensino
(monitoria e inovações), registro e relatórios
da produção acadêmica dos docentes,
atividades de ensino a distância e um ambiente
virtual de aprendizado (chamado de Turma
Virtual), dentre outros (SINFO, 2011).
Em face da importância desse módulo, para
o desenvolvimento de atividades acadêmicas,
envolvendo discentes, docentes e
coordenações de curso e departamentos,
justifica-se a escolha dos mesmos para análise
neste artigo: pelo fato de ser um dos principais
sistemas utilizados na Instituição, e o que
principal no que tangem a áreas de gestão
acadêmica da Universidade, de tal forma que
influência diretamente na relação professoraluno, e pode influenciar na relação de
aprendizagem dos estudantes. No capítulo
seguinte, serão apresentados os resultados
obtidos a partir da análise em questão.
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
5. Resultados
A pesquisa pode comprovar a relevância
que o Sistema Integrado de Gestão e
Atividades Acadêmicas tem para os alunos,
devido ao acesso às informações acadêmicas
como notas, freqüência, calendário e plano de
ensino. Para quantificar melhor esta
informação, abaixo segue a tabela 1, na qual
apresenta a quantidade de acesso que o
SIGAA tem por dia, sendo organizado de
acordo com os dias da semana, vale ressaltar
que não somente os alunos acessam os
sistemas, assim como professores, e
colaboradores de apoio, como as secretarias
dos departamentos e dos centros.
Média de Acesso/Dia
Dias
1.318.226
Segunda
1.255.088
Terça
1.230.030
Quarta
1.153.171
Quinta
978.386
Sexta
570.564
Sábado
519.711
Domingo
Tabela 1 – Média de acesso ao SIGAA, por dia.
Fonte: SINFO (2011).
Em posse das informações sobre o acesso
ao sistema, é possível identificar que o mesmo
é acessado por grande parte dos alunos,
professores e colaboradores da universidade,
sendo isto positivo para o desenvolvimento
das atividades da disciplina, visto o acesso ao
sistema pelos alunos é um indicativo de
interesse pelos assuntos da universidade.
Na figura 1, abaixo, é possível observar
quais campos o SIGAA possui, e como o
professor pode interagir com o aluno,
buscando modernizar esta relação,
contribuindo para a melhora da mesma.
O aluno ao se matricular em uma
disciplina, em qualquer que seja, tem um
ambiente como o descrito na figura 1, onde no
canto esquerdo, é possível observar campos
como, plano de curso, onde o professor
informa carga horária, ementa, objetivos e
cronograma da disciplina, o campo,
participantes, onde o aluno pode acessar quais
os componentes da turma, o fórum, onde é
permitida a criação de um ambiente de
interação entre alunos e professor, e o campo
chat, que é um bate-papo em tempo real.
Outro importante recurso que o SIGAA tem é
o de inserção de documentos, o professor pode
disponibilizar arquivos para os alunos,
independente do formato do arquivo. É válido
lembrar que esses recursos são disponíveis
somente aos alunos matriculados na disciplina
e ao professor ministrante da mesma.
Figura 1 - MODELO SIGAA.
Fonte: Site do SIGAA (2011)
50
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Para quantificar o que foi dito sobre os
recursos que o SIGAA oferece, a tabela 2
abaixo mostra a relação entre as disciplinas
oferecidas, disciplinas em que os professores
utilizam os recursos do SIGAA (em
específico, a parte de inserção de arquivos) e o
número de disciplinas que utilizam o fórum.
Total de Turmas Cadastradas
6.326
Turmas que utilizam inserção de
documentos
2.832
45%
Turmas que utilizam fóruns
15%
949
Tabela 2 - Informações sobre turmas que utilizam o
SIGAA.
Fonte: SINFO (2011)
O diagnóstico feito perante o SIGAA é que
o sistema contribui para a melhor interação
aluno e professor, assim como, através de seus
recursos, ajuda na aprendizagem do aluno ao
fornecer um contato mais fácil e rápido com
os professores por meio de suas ferramentas
(fórum e chat), e permitem ao professor uma
forma rápida e fácil de disseminar materiais e
arquivos que podem ajudar aos alunos, isso
tudo, através da internet: fonte de informação
mais utilizada hoje no mundo todo. Para
explicitar esta contribuição do sistema para a
relação de professor-alunos, a tabela 3 abaixo,
explana o volume de acesso ao sistema
acadêmico, por professores e por aluno, por
dia.
Volume de Acesso de Discentes
808.068
Volume de Acesso de Docentes
80.672
Total de Acesso
897.740
Tabela 3 - Informações sobre discentes e docentes que
utilizam o SIGAA.
Fonte: SINFO (2011)
6. Considerações Finais
Considerando o objetivo geral do presente
estudo, ou seja, evidenciar a importância que
um sistema de gestão tem para uma IES e
como este sistema pode colaborar com as
práticas de ensino e aprendizagem, isto foi
51
realizado por meio de um estudo de caso na
Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Apresentaremos, a seguir, os aspectos mais
marcantes nesta área de atuação.
Buscou-se identificar as melhorias que um
sistema de gestão traz para as IES, no que diz
respeito à agilidade nos processos e
confiabilidade de dados. Assim, o estudo
justificou-se pela possibilidade de podermos
analisar a Universidade Federal do Rio Grande
do Norte – UFRN, como um ambiente em que
muitas pessoas têm pouco tempo para
desenvolver as atividades, o uso de
ferramentas evoluídas tecnologicamente, neste
caso, o sistema de gestão facilitaria bastante o
cotidiano das pessoas, facilitando o acesso à
informação e contribuindo também para a
comunicação efetiva de alunos e professores.
Neste contexto, o objeto de estudo foi o
Sistema Integrado de Gestão de Atividades
Acadêmicas (SIGAA), do qual destacamos
que os resultados encontrados evidenciaram a
importância de um sistema de gestão para a
prática do ensino e aprendizagem, e isso foi
feito através da descrição do sistema de
informação, mostrando a utilidade de seus
módulos.
Conclui-se dessa maneira, que o sistema de
informação integrado à gestão universitária
envolve processos mutuamente dependentes
de credibilidade, agilidade e recuperação
rápida das informações, colaborando para o
relacionamento professor-aluno, tornado os
processos mais eficientes e eficazes.
Por fim, conclui-se também, que o
diagnóstico feito perante o SIGAA é que o
sistema contribui para a melhor interação
aluno e professor, assim como, através de seus
recursos, ajuda na aprendizagem do aluno ao
fornecer um contato mais fácil e rápido com
os professores por meio de suas ferramentas
(fórum e chat), e permite ao professor uma
forma rápida e fácil de disseminar materiais e
arquivos que podem ajudar aos alunos.
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
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52
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
1234
Leonardo Dominguez Dias 1
Juan Felipe Restrepo Naranjo 2
Daniela Marques 3
Jorge Luis Risco Becerra 4
Fundamentos de uma Fábrica de Software Orientada a
Objetos Processos
Resumo
Atualmente a demanda por softwares ou
serviços de tecnologia de informação e sua
complexidade têm aumentado, trazendo assim
novos desafios à engenharia de software. A
crescente demanda e complexidade também
exigem uma maior produtividade, sempre
aliada à qualidade nos softwares
desenvolvidos. Qualidade e produtividade
que podem ser melhoradas utilizando algum
modelo de qualidade ou de estruturas
organizadas como fábricas de softwares. A
fábrica de software é um modelo de produção
e uma alternativa para desenvolvimento de
software em diversas escalas. A comunidade
de software entende essa definição utilizando
o conceito de fábrica de manufatura,
entretanto, existem características especiais
na produção de software que o diferenciam
do processo de manufatura. Por essas razões,
este artigo apresenta os fundamentos
relacionados com a fábrica de software
baseada no conceito de objeto processo, em
que se levam em consideração um modelo de
qualidade e os requisitos específicos de
negócio da empresa.
Abstract
Nowadays the software engineering has
new challenges based on the increased
demand for software and technology services
and their complexity. The increasing demand
and complexity also ask for a bigger
productivity, along with a good quality of the
developed software. Quality and productivity
can be enhanced by the use of a quality model
or organized structures such as software
factories. The software factory is a
production model and works as an alternative
for software development in various scales.
The software community understands it by
using the concept of manufacturing factory,
but there are some special features in
software production that differentiate it from
the manufacturing process. For these
reasons, this paper presents the foundations
Leonardo Dominguez Dias - Mestre em Engenharia de Computação - fábrica de software USP. Engenheiro da
Computação USP, Gerente de TI da USP. Arquitetura de Sistemas de Computação e projetos de implantação de fábricas
de software.
1
Juan Felipe Restrepo Naranjo - Pesquisador do intercambio acadêmico engenharia de computação politécnica USP.
E-mail: [email protected]
2
Daniela Marques - Mestre em Ciências da Computação e Matemática Computacional USP. Graduação em Ciência da
Computação pela Escola de Engenharia de Piracicaba (1994), Profa. Pesquisadora IFECTSP
E-mail: [email protected]
3
Jorge Luis Risco Becerra - Prof. Doutor pesquisador do Laboratório de Tecnologia de Software (LTS) do DP
Engenharia de Computação e Sistemas Digitais da Escola Politécnica – USP. Consultor na área de engenharia de
software, SI, qualidade de software e automação. E-mail: [email protected]
4
53
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
of software factory based on the concept of
process object, in which a quality model and
the business requirements are taken into
consideration.
Palavras-chave: Fábrica de software,
Processo de software, Objeto processo,
Modelo de qualidade.
Keywords: Software factory, Software
process, Process object, Quality model
Este artigo apresenta os conceitos de
fábrica de software no contexto de
manufatura e o conceito básico de modelo de
fábrica e suas várias formas na Seção 2. Na
seção 3, é definido o conceito da visão
processo, em que são introduzidos os termos
objetos processos e arquiteturas de processos.
A Seção 4 mostra um exemplo da proposta do
artigo, descrevendo um estudo de caso
realizado em uma empresa de pequeno porte.
E, finalmente, a Seção 5 apresenta as
conclusões deste trabalho.
Apresentação
2.1.Fábrica de Software
Atualmente o mercado de software e
serviços vem crescendo amplamente: em
2010 o Brasil terminou em 11º lugar no
ranking mundial, movimentando 19,04
bilhões de dólares, equivalente a 1% do PIB
brasileiro naquele ano. Das empresas que
atuam no desenvolvimento e produção de
software, 94% são classificadas como micro e
pequenas empresas (ABES, 2011).
Entretanto, as médias e pequenas empresas
têm dificuldade em aplicar modelos de
qualidade em seus produtos. Não por falta de
incentivo, mas sim por falta de um processo
definido e controlado que ajude a inserir esse
conceito em seu ciclo de desenvolvimento de
software.
A falta de um método sistemático para
adaptar os modelos de qualidade aos
ambientes de desenvolvimento de software
também é observada por Pedreira et. al.
(2007). Esses autores fizeram uma revisão
sistemática em artigos científicos sobre a
adaptação de processos de software e
mostram que 33% de todas as pesquisas
analisadas não utilizaram abordagem formal.
Complementando essa problemática, observase a falta de uma estrutura de referência para
a formação de um ambiente de produção de
software, mas, principalmente, de um
consenso sobre o conceito de fábrica de
software.
Esta sessão apresenta a análise da relação
da fábrica de software com a fábrica de
manufatura, evidenciando o ponto central
desse relacionamento que inspira a definição
de fábrica de software integrada (FSI).
2.2. Fábrica na Manufatura
O termo fábrica é amplamente utilizado
para referenciar a produção em massa de
produtos não diferenciados em grandes
volumes (Maximiano, 2000). As fábricas
geralmente contam com processos
automatizados e têm como objetivo aumentar
a eficiência produtiva.
Henry Ford foi quem aplicou
primeiramente os conceitos de produção em
massa quando propôs e montou uma fábrica
para automóveis, onde o produto era
padronizado quanto a material, mão de obra,
desenho e ao mínimo custo possível
(Chiavenatto, 1983).
A história da
manufatura então continua e segue até a
inclusão de robôs e equipamentos específicos
de automação em grande escala, produzindo o
que se denomina de estrutura de automação
corporativa.
Dentro desse contexto corporativo,
aparece o conceito de CIM (Computer
Integrated Manufacturing) que visa a um
sistema corporativo integrado, onde existe
uma infraestrutura de interoperabilidade que
54
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
permite a integração das diversas áreas da
empresa como planejamento, chão de fábrica,
marketing, entre outros. CIM entende a
fábrica como uma corporação (enterprise) que
trabalha de forma corporativa e cooperativa.
Dessa forma, a produção torna-se eficiente
e flexível, como pode se ver em suas diversas
propostas: células flexíveis de manufatura,
produção sobre demanda, sistemas abertos de
automação, engenharia simultânea.
Neste artigo, a fábrica de software se
relaciona analogamente com conceito de
fábrica de software integrada, como foi
proposto no modelo CIM, com as devidas
adaptações, pois se considera que a produção
de software possui fortes diferenças se
comparada à produção da manufatura.
2.3. Fábrica de Software
Quando se fala em fábrica de software, a
primeira e mais intuitiva noção que ocorre
sobre o termo é a produção do software de
maneira análoga à produção de bens e
consumo (Cantone, 1992). Porém, é
importante ressaltar que a comunidade de
software, quando se refere à fábrica de
software, fazendo uma analogia com a
manufatura, utiliza apenas aos conceitos
referentes ao chão da fábrica.
Há, contudo, outras utilizações do termo
fábrica de software, que pode se referir à
terceirização de serviços de software, à
subcontratação ou à alocação de outras
empresas para se produzir serviço
especializado e produtivo na criação ou na
manutenção de software.
Ao se fazer uma pesquisa científica,
verifica-se que o termo fábrica de software
começou a ser utilizado pela indústria de
software nos anos 60 e 70, nos Estados
Unidos e no Japão (Cusumano, 1991).
A primeira fábrica de software foi da
Hitachi Software em 1969, quando os
executivos separaram as instalações de
desenvolvimento de software das demais
55
áreas devido à crescente demanda de
desenvolvimento. Os objetivos dessa fábrica
eram produtividade e confiabilidade,
atingidas através da padronização de
processos e controles, e também a
transformação de software em serviço
desestruturado para um produto com nível de
qualidade assegurado (Li et. al., 2001).
Esses esforços iniciais na direção de
fábricas de software têm como semelhanças a
criação de organizações centralizadas e
sistemas específicos de gerenciamento e
controle para famílias de produtos, métodos e
ferramentas padronizados para produção
desses produtos e suporte automatizado para
o desenvolvimento e o gerenciamento do
projeto.
Para Cantone (1992), uma fábrica de
software deve: ser flexível, capaz de produzir
produtos dentro de um segmento de mercado;
implementar os conceitos de engenharia de
software (metodologia e ferramentas); ser
capaz de analisar, projetar, implementar,
evoluir e melhorar os sistemas. Essa definição
se apresenta mais abrangente, considerando
fábricas de software empresas que
desenvolvem software através da linha de
montagem como também da montagem de
componentes.
A afirmação que uma fábrica de software
não deveria ser analisada como na
manufatura, já foi discutida por Rockwell e
Gera (1993). No entendimento desses autores,
não se pode utilizar o mesmo processo de
software para produtos diferentes. Assim, o
entendimento do produto a ser feito torna-se
indispensável.
Para Li et. al. (2001), a essência da fábrica
de software pode estar sintetizada nos
conceitos focados no método de
gerenciamento e de desenvolvimento.
Panigassi (2007) faz uso dessa definição. Para
o autor, a fábrica de software é a organização
previsível e controlada dos elementos que
compõem a produção de software. Esses
elementos são processos, recursos e
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
conhecimentos, ou seja, não limita a fábrica
de software a uma empresa destinada
somente à codificação, ou uma empresa que
execute todo o ciclo de vida do software. Na
definição se enquadram fábricas de
especificações, fábrica de arquiteturas,
fábrica de testes, entre outras, desde que
sejam organizadas e controladas.
Segundo Borsoi (2008), fábrica de
software é um ambiente de desenvolvimento
de software constituído por processos que
envolvem o ciclo de vida de software e que
são categorizados em níveis hierárquicos
corporativos: estratégico, gerencial e
operacional. Os processos são definidos de
acordo com normas e modelos de qualidade
de software.
A definição de fábrica de software
utilizada neste trabalho foi elaborada a partir
da definição de Borsoi (2008), incluindo
nessa definição que o ambiente de software
para ser chamado de fábrica deverá ser criado
a partir dos requisitos de negócio da empresa.
Essa definição abrangente envolve todas as
atividades ligadas à produção do software, às
atividades de gestão e controle, às ações
estratégicas de negócio (missão, metas,
objetivos) e envolve os sistemas de
informação. Essa fábrica de software deverá
ter seus processos controlados e organizados
em níveis hierárquicos como o modelo CIM
(Computer Integrated Manufactoring).
2.4. Modelo Integrado de Fábrica de
Software
Conceitua-se Fábrica de Software
Integrada (FSI) como uma empresa que
contém todos os departamentos
organizacionais necessários para a realização
de sua atividade.
Figura 1 - Visões da fábrica de software integrada (Borsoi 2008)
Nível Hierárquico
Processos
Estratégico
Reúne os processos ligados ao direcionamento e à tomada
de decisões do negócio; trabalham com a missão, visão e
metas da empresa. Processos estratégicos.
Gerencial
Reúne os processos que gerenciam os processos
operacionais. Processo da garantia da qualidade,
configuração, monitoração, entre outros.
Operacional
Reúne os processos que executam as atividades de
desenvolvimento dos produtos da organização. Processo de
desenvolvimento de software.
Tabela 1 – Processos por níveis hierárquicos
56
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
A Figura 1 apresenta níveis
hierárquicos, departamentos
organizacionais e as visões da FSI. O
primeiro elemento da FSI são os níveis
hierárquicos que agrupam os processos
como se apresentam na Tabela 1.
O segundo elemento da FSI, são os
departamentos organizacionais que
representam as divisões da empresa ou
modelo organizacional.
O terceiro e último elemento da FSI, e
o mais importante, são as visões. Elas são
abstrações que representam as diversas
características da fábrica de software
como é mostrado no RM-ODP (1996).
Cada visão possui modelos distintos que
facilitam o projeto de criação de uma
fábrica de software.
Seguindo o modelo de FSI, é possível
identificar os seguintes tipos de fábrica de
software:
a) Segundo a visão de processo e
observando o processo de
desenvolvimento, tem-se a fábrica de
programação, a fábrica de arquitetura,
a fábrica de especificações, ou a
fábrica completa, que tem todas as
atividades relacionadas ao ciclo de
produção de software, abrangendo
desde a definição dos requisitos até a
descontinuidade do produto, incluindo
suporte e manutenção;
b) S e g u n d o o s d e p a r t a m e n t o s
organizacionais, a fábrica de software
pode ser a empresa completa, como
uma empresa especializada de
produção de software, ou pode ser um
departamento de uma empresa,
responsável por produzir ou adquirir
software alinhado às necessidades de
negócio de uma organização.
Dentro desse contexto, a estruturação
de uma fábrica deve ser realizada
considerando todas as visões, mas
conclui-se que a visão processo será a
57
visão mais importante. A seguir,
apresentam-se os elementos da visão
processo.
3.Elementos da Visão Processo
A visão processo é uma abstração
conceitual dos processos que são
definidos pelos objetos processos que,
por sua vez, são agrupados em uma
arquitetura corporativa, como se vê a
seguir.
3.1. Objeto Processo
Segundo Panigassi (2007), um objeto
processo é composto de métodos e
propriedades. Os métodos são as
atividades e as tarefas do processo, as
propriedades são os atributos específicos
do processo. Esse conceito de objetos
processos também é adotado por outros
modelos como o SPEM (OMG, 2005) e o
BPDM (List e Korherr, 2006).
A Figura 2 apresenta o conceito de um
objeto processo com os elementos que o
compõem. O objeto é identificado pelo
nome. Seus atributos são artefato, papel,
recurso e política. E o objeto também
contém as operações que são
representadas pela ação das atividades
que se utiliza de papel, recurso e política
para gerar o artefato.
Figura 2 – Objeto processo
Desta maneira, o objeto processo
proposto é definido por identidade,
atributos e comportamento como nos
objetos computacionais. É bom ressaltar
que as operações do objeto processo e as
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
ações resultantes de relacionamento entre
objetos processos são observadas através
do recurso, papel e artefato.
Conclui-se que o objeto processo é o
elemento básico da visão processo e do
seguinte conceito, denominado de
arquitetura de processos.
3.2. Arquitetura de Processos
Segundo Borsoi e Becerra (2008), a
arquitetura de processos é um modelo
conceitual de fábrica de software
constituído de objetos processos. Esse
modelo representa uma estrutura de
processos que, por sua vez, são
representados por objetos processos em
termos de sua composição,
comportamentos e relacionamentos, de
acordo com um domínio e com um
contexto específico. A arquitetura de
processos é constituída pelos seguintes
modelos
a) Modelo estrutural: possui enfoque
na estrutura dos objetos processos e de
seus componentes. Os modelos são os
diagramas de objetos processos;
b) Modelo comportamental: possui
enfoque no comportamento dos objetos
de processo nas atividades da produção
de softwares. Os modelos a utilizar são
os diagramas de estado de processo.
A arquitetura de processos possui
diferentes níveis de abstração na sua
representação como se pode ver na Figura
3.
Figura 3 – Níveis de abstração entre arquiteturas de processo
A arquitetura de referência é gerada a
partir de um dos modelos de qualidade
como o CMMI, MPS.BR ou ISO 12207.
Arquitetura operacional é o resultado da
instanciação da arquitetura de referência,
considerando os requisitos de negócio de
uma empresa, ou seja, é a arquitetura de
processos representando uma fábrica de
software específica.
A arquitetura de projeto é o resultado
da instanciação da arquitetura
operacional, considerando os requisitos
específicos de um projeto de software, ou
seja, é a arquitetura de projeto
representando um projeto especifico.
A criação de uma arquitetura de
software segue uma metodologia de
definição de processos que foi
apresentada em Panigassi (2007), Borsoi
(2008) e Dias (2010). Na Seção 4 é
apresentado um exemplo de arquitetura
de processo.
4. Arquitetura de processos em
pequena empresa
Nesta seção mostra-se um exemplo
prático da proposta descrita. O estudo de
caso foi realizado em uma empresa de
58
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
pequeno porte, com sede em São Paulo.
Essa empresa atua no negócio do
desenvolvimento de software para o
mercado corporativo desde 1996. O seu
produto principal é um módulo comercial
(ERP) que é customizado para cada
cliente específico. A empresa possui
todos os elementos de uma FSI, contendo
nível hierárquico, visões e departamentos.
Sendo assim, essa microempresa é
considerada uma fábrica de software
completa.
Conforme explicado anteriormente, a
arquitetura de processos possui níveis de
abstração diferentes. Neste estudo de
caso, a arquitetura de referência foi
baseada no modelo de qualidade CMMI.
A arquitetura de processos de nível
operacional teve como base os requisitos
de negócio da empresa de
desenvolvimento de software. E, para o
nível de projeto, a instanciação deverá ser
realizada no nível de projeto, respeitando
suas particularidades.
O diagrama de objetos processos (vide
Figura 4) representa a arquitetura
operacional de processos da fábrica. Os
pacotes de objetos processos representam
a hierarquia, e nos objetos processos do
pacote de engenharia constam técnicas e
métodos para o desenvolvimento de
software no nível operacional, e no
pacote
de gerenciamento do projeto
encontram-se informações relevantes para
o nível gerencial.
Figura 4 – Arquitetura de Processos
Considerações finais
Motivado pela necessidade de se
produzir software com rapidez e
qualidade, este artigo apresenta uma
proposta de fábrica de software orientada
59
a objetos. Primeiramente, o conceito de
fábrica de software utilizado neste artigo
mostra que a fábrica de software deve
levar em consideração a empresa como
um todo, de maneira análoga ao conceito
de CIM utilizado na fábrica de
manufatura. A proposta de fábrica de
software entende que a produção de
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
software possui particularidades e, por
isso, adaptações devem ser feitas no
conceito CIM. No entanto, é evidente que
a fábrica trabalha de maneira corporativa
e cooperativa envolvendo todo o
ambiente integrado.
O objeto processo proposto no artigo
funciona de forma análoga ao
desenvolvimento de software orientado a
objeto. No desenvolvimento de software
primeiramente se identificam os objetos
e, posteriormente, se definem a estrutura
e o comportamento desses objetos. Para
definir processos, o processo seria o
objeto abstraindo os seus componentes,
que posteriormente serão detalhados
juntamente com seus atributos e
comportamentos.
Os objetos processos compõem a
arquitetura de processo, que permite
diferentes visões dependendo do nível de
abstração. Essas abstrações são
compostas por modelos que compõem a
arquitetura de processo.
A arquitetura de processo pode ser
detalhada em três níveis de abstrações,
que são representados por: arquitetura de
referência (leva em conta modelos de
qualidade), arquitetura operacional
(considera os requisitos de negócio) e
arquitetura de projeto (considera os
requisitos específicos de cada projeto de
software).
A arquitetura de referência é a base
para definição das demais arquiteturas e
sua criação tem como base um dos
modelos de qualidade, como CMMI,
MPS.BR e ISO12207. Essa prática é o
primeiro passo para se melhorar a
qualidade do produto, que é um dos
objetivos a serem atingidos na
implantação da fábrica de software
orientada a processos.
Com a aplicação desta proposta em
empresas reais, fica evidenciado que a
fábrica de software orientada a objetos
processos é flexível para se adaptar a
diferentes ambientes de desenvolvimento
de software, tipos de negócio e gestão.
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61
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
1234
Adriano Carlos Amorim de Paiva Sousa 1
Fernanda Cristina Barbosa Pereira Queiroz 2
Marciano Furukava
Jamerson Viegas Queiroz 3
Rudá Barros Carlos de Amorim 4
As políticas públicas para desenvolver a economia local do
Rio Grande do Norte e a contribuição do turismo no litoral
norte
Resumo
O turismo vem contribuindo de maneira
significativa para o desenvolvimento social e
econômico da sociedade, principalmente por
se tratar de uma atividade relativamente
sustentável e capaz de atingir áreas, na sua
maioria, descabidas de potencial para outras
atividades econômicas, em algumas praias do
Rio Grande do Norte essa é a principal fonte
de empregos e recursos para a população.
Com a proximidade de eventos de grande
visibilidade, tais como copa do mundo de
futebol da FIFA e olimpíadas, existe grande
especulação acerca oportunidades de negócios
no setor turístico. O poder público tem papel
fundamental para proporcionar a atração de
investidores e garantir a infra-estrutura
necessária para o desenvolvimento local. O
estudo de caso apresenta a análise de ambiente
na praia de Maracajaú, onde se avalia a
implantação de empreendimentos hoteleiros,
suas principais necessidades e a importância
de políticas públicas que fomentem a atividade
na região. A contribuição aos empreendedores
e gestores que se interessem por turismo,
desenvolvimento econômico e social com
sustentabilidade.
Palavras chave: turismo, estratégia,
economia, poder público, Maracajaú.
Resumen
El turismo viene contribuyendo de forma
significante para el desarrollo social y
econômico de una sociedad, principalmente
por tratar-se de una actividad relactivamente
sostenible y capaz de llegar en áreas, que em
su mayoria, no posuien ningún outro potencial
para actividades econômicas, en algunas
playas del Rio Grande do Norte ese és el
principal medio de emplear y captar recursos
la población. Con la proximidad de eventos de
grand visibilidad, así como el mundial de
futbol de FIFA y las Olimpíadas, existe una
grán visibilidad acerca de las oportunidades
de negócios en el setor turístico. El poder
público tiene um papel fundamental en buscar
1
Adriano Carlos Amorim de Paiva Sousa - Doutor em Engenharia de Produção e Serviços - Área de concentração Gestão de Negócios pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC (2004). Mestre em Administração
2
Fernanda Cristina Barbosa Pereira Queiroz. Doutora e Mestre em Engenharia de Produção pela Universidade Federal
de Santa Catarina (2003) E-mail: [email protected]
3
Jamerson Viegas Queiroz - Doutor em Engenharia de Produção e mestre em Economia pela Universidade Federal de
Santa Catarina. E-mail: [email protected]
4
Rudá Barros Carlos de Amorim - Doutor em Engenharia de Produção e Serviços - Área de concentração - Gestão de
Negócios pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC (2004). Mestre em Administração
62
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
investidores y garantir la infra-estructura
necesaria para el desarrollo local. Este
trabajo presenta una analise de ambiente en
la playa de Maracajaú, donde se avalua la
implantación de empreendimientos hoteleros,
sus principales necesidades y la importancia
de políticas publicas que incentiven a tal
actividad en la región. La contribuicion de los
empreendedores y gestores que se interesen
por el turismo como actividad sostenible
proporcionando el desarrollo economico y
social.
Palavras llaves: Turismo, estratégia,
economia, poder público, Maracajaú.
1. Introdução
A área de turismo vem ganhando
importância e ampliando seus horizontes de
forma acelerada no cenário nacional e
internacional, pois é uma atividade com
grande capacidade de geração de emprego e de
renda, contribuindo significativamente para o
crescimento e desenvolvimento das nações.
Essa atividade envolve uma diversidade muito
grande de negócios, desde aqueles
relacionados diretamente ao turismo até os
negócios indiretos necessários para a
viabilização da atividade.
Com clima tropical, rico em belezas
naturais e culturais, o Brasil atrai grande
número de turistas do mundo inteiro, durante
praticamente o ano todo. O aumento do
número de visitantes nos últimos anos,
crescimento do turismo doméstico e as
perspectivas otimistas de crescimento
econômico, impulsionam um crescimento
acelerado do setor turístico no país, que se
prepara para sediar a copa do mundo em 2014
e as Olimpíadas em 2016. De acordo com a
secretaria de turismo do Rio Grande do Norte
(R.N.): “Além da capital Natal, o estado tem
como destinos mais visitados a cidade de
63
Mossoró e as praias de Pipa, Genipabu e
Maracajaú”.
A base da oferta existente da indústria
hoteleira no Brasil é formada, ainda hoje, por
hotéis de pequeno e médio porte,
frequentemente de propriedade familiar
(RODRIGUES, 2002). Em geral, o aumento
de investimentos no setor hoteleiro está
correlacionada à situação econômica do país,
porém com certa defasagem. Já o crescimento
da demanda, diretamente associado ao
crescimento da renda, está correlacionada
mais prontamente ao crescimento da
economia.
As políticas públicas podem ser entendidas
como o “conjunto de ações e omissões do
Estado para resolver problemas que afligem a
sociedade” (FONSECA, 2005), porém, em
razão das demandas superarem a capacidade
do Estado de responder às mesmas, se faz
necessário estabelecer prioridades. Dessa
forma, as políticas de turismo, que podem ser
entendidas como os conjuntos de decisões em
matéria turística que, integradas
harmonicamente no contexto da política
nacional de desenvolvimento, orientam a
condução do “setor”.
O presente artigo tem como objetivo
analisar estrategicamente como o poder
público pode fomentar a atividade turística no
litoral norte do RN - Brasil. Associado ao
objetivo geral traçou-se os seguintes objetivos
específicos: (i) avaliar o mercado do turismo e
suas perspectivas; (ii) realizar análise
ambiental acerca da implantação de
empreendimento hoteleiro; e (iii) sugerir ações
que devam ser tomadas pelo poder público
para melhorar as condições do local, visando
fomentar a atividade turística.
Considerando tais proposições, norteamos
nossa pesquisa com foco no seguinte
questionamento: como o poder público pode
fomentar a atividade turística no litoral norte
do RN? Para responder à questão proposta,
objetivou-se entender a estrutura do mercado
turístico e suas perspectivas, além da análise
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
ambiental acerca da implantação de
empreendimento hoteleiro, juntamente com
suas oportunidades e limitações, a fim de
avaliar as principais necessidades dos
empresários em relação ao poder público.
A organização do presente estudo inicia-se
com essa abordagem introdutória, seguida pela
seção 2, fundamentos teóricos, na qual se
aborda a planejamento estratégico, políticas
públicas no estado e o turismo e suas
perspectivas para os próximos anos. A seção 3,
metodologia, traz os procedimentos
metodológicos utilizados durante o atual
estudo. Posteriormente, a seção 4 expõe os
estudos de caso realizados acerca da análise
ambiental do turismo na praia de Maracajaú e
as políticas públicas necessárias para fomentar
a atividade no local. Em seguida, os resultados
dessas análises podem ser observados na seção
5. Na seção 6, encontram-se as considerações
finais do estudo, além de sugestões para
possíveis trabalhos futuros e finalmente na
seção 7 Referências são apresentadas as
bibliografias utilizadas na pesquisa.
2. Referencial Teórico
2.1 Planejamento Estratégico
A partir do planejamento estratégico de
empreendimento hoteleiro de pequeno porte
na praia de Maracajaú, será avaliado o
ambiente ao qual este empreendimento estaria
situado, para assim, avaliar a relação do poder
público com o desenvolvimento do turismo
local. Nesse contexto, seu planejamento deve
ter um curso de ação, os planos estratégicos
podem possuir diferentes graus de
formalidade, abrangência, periodicidade de
preparação, e vários outros atributos.
Chiavenato (2000) propõe que
“planejamento é a tarefa de traçar as linhas
gerais das coisas que devem ser feitas e dos
métodos de fazê-las, a fim de atingir os
objetivos da empresa”. Os autores Woiler e
Mathias (apud LEMOS et al, 2006) destacam
que o planejamento é um processo de tomada
de decisões interdependentes, que procuram
conduzir a empresa para uma situação futura
desejada. Desta forma, o planejamento é uma
das únicas ferramentas que os gestores podem
utilizar para maximizar a gestão das
organizações, sendo que este processo
sistêmico permite a monitoração dos agentes,
forças e resultados, tanto internos quanto
externos.
Em geral os ambientes organizacionais
estão estruturados em três níveis: geral,
operacional e interno. A figura 1 ilustra os
níveis e seus componentes.
De acordo com Kotler, Keller e Lane
(2006), o processo de planejamento
estratégico de mercado integra a gestão
estratégica da organização, e contempla as
seguintes etapas: missão do negócio, análise
SWOT - análise do ambiente externo
(oportunidades e ameaças) e Análise do
ambiente interno (forças e fraquezas),
estabelecimento de metas, formulação de
estratégias, elaboração de programas,
implementação, feedback e controle. Este
trabalho irá limitar seu escopo à análise
ambiental, para avaliar a relação do poder
público com o desenvolvimento do turismo
local.
Portanto, o planejamento estratégico do
empreendimento é uma ferramenta que
permite que o gestor tenha uma visão
sistêmica do mercado e, permite que as
tomadas de decisão sejam orientadas por um
aparato de análise ambiental.
64
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Figura 1: Níveis de ambientes na organização e seus componentes.
Fonte: Adaptado de Certo (2005)
2.2 O turismo no RN e as políticas
públicas direcionadas para o setor
Segundo Cruz (2004), as regiões litorâneas,
que dispõem de belas praias ensolaradas e de
águas com temperaturas agradáveis (em torno
de 28° C), isso aliado ao clima quente, com
temperatura média entre 25 e 30° C
praticamente o ano inteiro, encontram-se os
espaços mais visitados do mundo pelos
turistas, as quais constituem um recurso
escasso do ponto de vista do uso pela
atividade. Apesar dessa escassez, os
governantes e as demais autoridades
responsáveis pelo planejamento de políticas
públicas no Brasil, até pouco tempo atrás, não
tinham despertado pra essa possibilidade de
uso do nosso litoral.
A atividade turística é uma importante
alternativa econômica para o litoral do
nordeste brasileiro, assim, passa a fazer parte
de um discurso que envolve questões voltadas
principalmente à economia, tal como o
desemprego, e de forma secundária a
problemas sociais como a má distribuição de
renda. Baseados neste discurso, diversos
investimentos foram realizados pelo governo
65
federal com o intuito de fomentar a atividade,
por meio de programas de estruturação do
território, como, por exemplo, a Política de
Mega Projetos Turísticos e o Programa de
Desenvolvimento do Turismo – PRODETUR.
De acordo com Gomes e Silva (2000), os
governos estaduais nordestinos, para
viabilizarem uma nova opção econômica a
partir do turismo, encontraram na paisagem
litorânea um grande recurso a ser explorado,
de modo que essa região do Brasil foi inserida
nos roteiros e pacotes turísticos passando a ser
vendida como um “Novo Caribe”, o “Novo
Mediterrâneo”, a “Nova Flórida”.
O turismo ganha maior relevância como
vetor de desenvolvimento para o Brasil a partir
da turbulência política e da recessão
econômica da década de 80, resultado da crise
do Fordismo. A grave situação
socioeconômica, com altas taxas de
desemprego, foi a justificativa para que nos
anos de 1990, a Empresa Brasileira de
Turismo - EMBRATUR elaborasse uma
política pública federal específica para o
turismo, a Política Nacional de Turismo –
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
PNT, que tinha como propósito alcançar
alguns resultados, tais como (FONSECA,
2005):
•
•
•
•
•
•
•
•
•
Melhoria da qualidade de vida da
população de cidades litorâneas, com
grande potencial turístico;
Diversificação qualitativa dos bens e
serviços produzidos e da infra-estrutura
receptiva do turismo nacional;
Geração de novos empregos e a
manutenção dos já existentes;
Qualificação e requalificação dos
recursos humanos;
Aproveitamento da mão de obra não
qualificada e sua conseqüente
capacitação;
Redução das desigualdades regionais;
Proteção ao meio ambiente e ao
patrimônio histórico e cultural;
Integração socioeconômica e cultural da
população;
Inserção do Brasil no cenário
internacional, construindo uma imagem
externa positiva.
O PRODETUR/NE foi financiado com
recursos do BID e teve no Banco do Nordeste
o seu órgão executor. Segundo Fonseca
(2005), no PRODETUR/NE, foram investidos
cerca de US$ 670 milhões, distribuídos nos
seguintes componentes: aeroportos (34%),
saneamento básico (24%), transportes (12%),
recuperação do patrimônio histórico (5%),
desenvolvimento institucional (4%),
preservação e proteção ambiental (3%) e
outros (18%). Ainda de acordo com o autor, o
Rio Grande do Norte, recebeu uma parcela de
9% desses recursos.
Os municípios selecionados pelo governo
do Estado para fazer parte do PRODETUR/
RN foram: Ceará-Mirim, Extremoz, Natal,
Parnamirim, Nísia Floresta e Tibau do Sul,
localizados no litoral oriental. Fonseca (2005).
O quadro seguinte aponta a distribuição dos
recursos no RN:
Tabela 1: Investimentos realizados pelo PRODETUR no Rio Grande do Norte (Brasil)
Fonte: FONSECA (2005)
Afinal, é possível diagnosticar que as
políticas públicas, deixaram de lado o litoral
Norte do estado, em especial a praia de
Maracajaú, que é um dos destinos mais
visitados por turistas, tendo concentrando os
investimentos em Natal e litoral Sul. Diante
dessa situação, é de grande importância a
atuação do poder público na região, com
66
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
políticas voltadas para as principais
necessidades, que serão apontadas nas
próximas páginas deste trabalho.
O próximo capítulo caracteriza o método
que a pesquisa segue para buscar cumprir seus
objetivos, relacionando as fontes de pesquisa e
as principais instituições que dispõem de
dados e informações acerca de turismo no
estado do Rio Grande do Norte e as políticas
públicas direcionadas para a atividade
econômica no local.
3. Procedimentos Metodológicos
3.1. Caracterização do Método da
Pesquisa
O presente trabalho é caracterizado, de
acordo com a Metodologia Científica, como
uma pesquisa qualitativa e quantitativa. O
estudo se fundamenta primeiro numa análise
quantitativa para avaliar aspectos
como: desempenho do turismo, taxa de
ocupação dos leitos, desembarque de
passageiros, visitantes a praia, entre outros
dados que ilustrem a situação e perspectivas
do turismo no estado do Rio Grande do Norte.
Em relação aos procedimentos utilizados,
classifica-se como uma pesquisa básica, um
estudo de múltiplos casos, com intuito de
obter informações relacionadas ao turismo e as
políticas públicas direcionadas para o setor, no
litoral norte do RN.
3.2. Universo e Amostra
O universo desta pesquisa é formado por
empreendimentos turísticos localizados na
praia de Maracajaú, o fluxo turístico no estado
e a revisão acerca de políticas públicas que
contemplam o litoral norte do Rio Grande do
Norte. A amostra selecionada para realizar esta
pesquisa consiste na análise dos principais
empreendimentos hoteleiros do local.
67
3.3. Procedimento de Pesquisa
O procedimento de p e s q u i s a desse
trabalho iniciou-se com uma revisão
bibliográfica em literatura especializada,
buscando dados e informações nos principais
institutos de pesquisa do Brasil, artigos
publicados em anais de congressos, livros,
dissertações e teses. Esta etapa do trabalho
teve como principal objetivo o levantamento
de informações sobre conceitos sobre o
turismo no RN, a evolução desse setor e as
políticas públicas do governo, conceitos sobre
estratégia, análise de ambiente e perspectivas.
A pesquisa está direcionada para
desenvolver o planejamento estratégico de um
empreendimento hoteleiro de pequeno porte,
assim, será avaliado o contexto ambiental e
estabelecidas as diretrizes estratégicas do
negócio. Além de estratégia e turismo, o
referencial teórico disserta acerca das políticas
públicas destinadas ao local.
A fim de realizar os objetivos propostos, o
trabalho será concluído, apresentando-se uma
série de medidas que devem ser contempladas
pelas políticas públicas, a fim de fomentar o
turismo na região.
Os aspectos metodológicos de análise do
tema concentram-se na busca de informações
em diversas fontes, tais como: (1) dados
coletados a partir de revisão bibliográfica na
literatura especializada, que inclui: artigos,
relatórios de pesquisas, matérias jornalísticas
publicadas em revistas e jornais, anuários que
tratam dos mecanismos de financiamento
voltados para o setor do turismo,
especificamente no ramo da hotelaria; além de
publicações do governo federal e estadual
acerca do turismo e suas perspectivas,
principalmente no RN; (2) Consultas a sites de
empreendimentos turísticos, institutos de
pesquisas e agências nacionais e regionais.
Anuários e indicadores do governo federal,
acerca do turismo no país. Ministério do
Turismo do Brasil, EMBRATUR, Secretaria
de Turismo do RN (SETUR-RN),
EMPROTUR, IBGE, INFRAERO, que são
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
instituições que contêm os principais dados e
informações do turismo no Brasil.
4. Estudo de caso – Planejamento
estratégico de empreendimento hoteleiro
na praia de Maracajaú/RN
4.1. Introdução
Há uma forma melhor de se pensar no
futuro. Planejar é a palavra apropriada para se
projetar um conjunto de ações para atingir um
resultado. Uma organização pode obter vários
benefícios praticando de forma correta a
administração estratégica. Talvez o mais
importante seja a tendência de tais
organizações aumentarem seus níveis de lucro.
4.2. Análise do ambiente
As informações coletadas nesta etapa serão
usadas posteriormente, na definição da diretriz
estratégica do empreendimento. Este processo
de monitoramento do ambiente organizacional
é primordial para que sejam identificadas as
oportunidades e riscos, atuais e futuros que
podem vir a influenciar a capacidade da
empresa de atingir suas metas; nesse contexto,
o ambiente organizacional engloba o conjunto
de fatores internos e externos.
4.2.1. Ambiente geral
O ambiente geral está a um nível externo a
organização, formado por componentes que
têm amplo escopo e sobre o qual a
organização não exerce controle, estes
componentes são destacados a seguir:
4.2.1.1. Componente econômico
O índice de visitação turística no Rio
Grande do Norte em 2010 cresceu 12,43% em
relação a 2009. A Secretaria de Estado do
Turismo calcula que uma média de 2,6
milhões de turistas visitou o Estado em 2010.
Deste total, 7% são visitantes provenientes de
outros países.
No aeroporto de Natal, em cinco anos, de
2006 a 2010, o número total de desembarques
teve um crescimento acima de 80%, como é
possível constatar na tabela a seguir:
Tabela 2: Movimento operacional – aeroporto Augusto Severo
Para entendermos o ambiente econômico
do setor acerca do qual o estudo se
desenvolve, inicialmente serão expostos dados
do produto interno bruto (PIB) do estado do
Local
Rio Grande do Norte
Natal
Maxaranguape
Rio Grande do Norte, este indicador aponta o
grau de desenvolvimento econômico, de Natal
a capital do estado e, do município onde o
empreendimento deverá ser implantado.
Dados da região
PIB
R$ 25.481.000,00
R$ 8.656.932,00
R$ 41.275,00
Tabela 3: Produto interno bruto (PIB) da região
Fonte IBGE (2008)
PIB per capita
R$ 8.203,00
R$ 10.847,40
R$ 4.461,66
68
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
O comparativo do PIB na tabela acima
apresenta o município de Maxaranguape com
um valor per capita bem abaixo da média
quando comparado com a média do país, da
capital e do estado, mostrando que o
município apresenta um baixo grau de
desenvolvimento econômico. Diante dessa
informação, é essencial compreender a
natureza das atividades econômicas geradoras
do PIB:
Gráfico 1: Caracterização do PIB.
Fonte: IBGE (2008)
A partir do gráfico é possível perceber que
no município onde o empreendimento deverá
ser implantado, assim como no estado e no
país, os serviços compõem a maior parcela de
recursos que compõem o PIB, entretanto,
percebe-se em particular uma participação
bem pequena da indústria no local.
4.2.1.2. Componente social
Este tópico trata da compreensão das
características da sociedade na qual o
empreendimento estará situado e do público
alvo, num primeiro momento, serão
apresentados dados em relação à educação no
município, mostrados na tabela abaixo, num
comparativo com o estado e o país:
Gráfico 2: Número de escolas por série.
Fonte: INEP, Censo Educacional (2009)
69
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
O gráfico apresenta dados curiosos, quando
se compara o município com o estado e o país,
é possível perceber que a educação local
contempla basicamente o ensino básico e que
o ensino médio está bastante defasado quando
no comparativo apresenta uma taxa pouco
acima de 4%, enquanto o estado apresenta
valores acima de 37%; esses valores podem
dimensionar o nível da formação da mão de
obra local.
Outro aspecto importante para entender as
condições que a população vive é a forma
como saúde é tratada no local, de que maneira
as instituições se comportam, o gráfico abaixo
oferece alguns dados importantes acerca do
assunto no município, mantendo a comparação
já apresentada em outros gráficos acima:
Gráfico 3: Estabelecimentos de saúde.
Fonte: DATASUS (2009)
Um dado curioso pode ser percebido no
gráfico: no município de Maxaranguape
existem apenas instituições municipais de
saúde, não havendo nenhuma instituição a
nível federal, municipal ou mesmo privada.
De acordo com o portal da transparência
do governo federal, em 2010 foi repassado ao
município de Maxaranguape à quantia de R$
10.354.982,05; dos quais apenas R$
20.000,00 foi destinado à estruturação da rede
de serviços de atenção básica de saúde, ou
seja, menos de 2% da verba total.
4.2.1.3. Componente político
É essencial a participação da iniciativa
pública para fortalecer o destino turístico
praia de Maracajaú, de acordo com o portal
da transparência, o governo federal destinou
mais de dez milhões no ano de 2010 para o
município de Maxaranguape, nesse montante
não existe nenhuma cota destinada
especificamente ao desenvolvimento do
turismo no local.
4.2.1.4. Componente legal
É necessário contratar um contador
profissional para legalizar a empresa nos
seguintes órgãos: junta comercial, secretaria
da receita federal (CNPJ), secretaria estadual
de fazenda, prefeitura do município para
obter o alvará de funcionamento,
cadastramento junto à caixa econômica
federal no sistema “Conectividade Social –
INSS/FGTS”, corpo de bombeiros militar.
4.2.1.5 Componente ambiental
Na praia de Maracajaú, existe uma área de
proteção ambiental (APA) dos recifes de
corais, que visa a preservação da pesca e
exploração do turismo submarino naquela
70
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
região litorânea. Dados de pesquisas (tabela
4) mostram que a visita aos parrachos para
realização de mergulho é o principal motivo
da visita dos turistas a praia, que possui outra
diversidade de belezas naturais como dunas e
lagoas que podem promover mais opções de
lazer para que os turistas pernoitem no local.
Apesar do apelo ecológico, o local não conta
com coleta de lixo frequente ou mesmo
possui saneamento básico.
4.2.2. Ambiente operacional
4.2.2.1. Componente cliente
A interpretação dos dados desse
componente pode ajudar a organização a se
posicionar de maneira adequada diante do
mercado consumidor. A partir de dados que
foram apresentados anteriormente, podemos
concluir que: 88,26% dos turistas que visitam
o estado são nacionais (tabela 3) e a praia de
Maracajaú está entre os cinco destinos
preferidos por eles, no estado. A tabela abaixo
mostra os principais motivos da visita dos
turistas ao local.
Tabela 4: Motivos da visita ao local.
Fonte: SILVA (2009, p.62)
A tabela apresenta que os turistas visitam a praia por suas atrações naturais, principalmente o
mergulho aos parrachos. A nível comportamental é possível avaliar o perfil sócio-demográfico das
pessoas que visitam o local, apresentado na tabela abaixo, em pesquisa realizada na própria praia no
ano de 2008:
Tabela 5: Características sócio-demográficas dos turistas.
Fonte: SILVA (2009, p.56)
71
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Importante destacar que 26,7% dos
entrevistados apresentam renda superior a
R$ 10.000,00 e 34,6% que apresentam renda
entre R$ 2.000,00 e R$ 6.000,00; esses dados
apresentam que os turistas que visitam o local
têm considerável poder aquisitivo. Vale
observar ainda que mais de 30% do público é
profissional liberal, seguido por 21% que são
estudantes. A respeito do nível educacional,
60% dos entrevistados possuem nível superior
completo, mostrando que a maioria dos
turistas possui bom grau de instrução.
5. Resultados Obtidos
Falta de incentivo financeiro: existe a
necessidade de crédito facilitado para
pequenas e micro empresas, redução de
alíquotas e isenções fiscais são
essenciais para incentivar os
empresários.
•
Divulgação do destino turístico: para
aumentar o número de visitantes, com
políticas específicas para o fator
sazonalidade.
Em relação às políticas internas, aquelas
que devem ser voltadas para o município em
questão, onde o empreendimento será
localizado, é possível relacionar as seguintes
necessidades:
•
•
O objetivo foi respondido na medida em
que foi possível propor uma série de ações que
devem ser direcionadas para diversas áreas, de
forma a contribuir para o desenvolvimento do
turismo no local, que é a principal atividade
econômica do local, o problema foi
solucionado apontando tais sugestões descritas
abaixo.
É uma realidade brasileira que as demandas
da população crescem em ritmo mais
acelerado do que o poder público tem
capacidade de atender, porém o que torna o
caso específico do local estudado mais
interessante é o fato de a praia de Maracajaú,
que, de acordo com a secretaria de turismo do
estado do Rio Grande do Norte, a praia está
entre os cinco destinos mais procurados no
estado, se trata da principal fonte geradora de
emprego e renda do local, sendo agente
propulsor econômico e social.
Para avaliar as políticas públicas
propriamente ditas, vamos realizar a análise
em dois níveis: externo e interno, que são
respectivamente, políticas gerais para
desenvolver a atividade e políticas específicas
para o local onde será estabelecido o negócio.
Em relação às políticas externas, é possível
relacionar as seguintes necessidades dos
empresários:
•
•
•
Qualificação da mão-de-obra local,
como pode ser percebido no estudo de
caso, 95% dos equipamentos de
educação do município são voltados
para pré-escola e ensino fundamental,
sendo a mão-de-obra local, carente de
treinamentos para atender bem o turista.
Estabelecimentos de saúde, conforme
apresentado no estudo de caso, o
município é carente de instituições de
saúde, o que é essencial para que o
destino turístico esteja capacitado a
receber pessoas de diversas partes do
mundo, quanto para os próprios
moradores e funcionários do
empreendimento.
Segurança pública, um fator essencial
para que os turistas sintam-se a vontade
durante sua estadia, atualmente a
presença da polícia na praia não é
constante e o risco é um fator que
contribui negativamente para a imagem
local.
Preservação do meio ambiente e
saneamento básico, é possível perceber à
contradição de um destino turístico que
oferece belezas naturais e tem nelas a
causa principal da visita dos turistas ao
local, onde há uma área de preservação
ambiental, porém não possui
saneamento básico na maioria das casas,
72
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
além de não existir coleta seletiva e lixo
freqüente no local.
Afinal, é possível perceber que, sem o
apoio de políticas públicas como as listadas
acima, voltadas para o desenvolvimento
estrutural e social, o poder econômico local
fica limitado, torna-se difícil a atração de
novos empreendedores. Uma vez realizados
os investimentos nas áreas propostas, o
empreendedor encontra um ambiente
favorável à instalação de novos
estabelecimentos de turismo. Investimento
significa desenvolvimento da economia e
sociedade local, aumentando a qualidade de
vida da população.
6. Considerações Finais
Quando uma pesquisa tem início, na
maioria das vezes não se tem a real idéia de
onde será possível chegar. No presente
trabalho, as expectativas acerca do assunto
estudado superaram as expectativas do autor,
no sentido de conseguir abranger resultados e
informações que antes não se imaginava que
seriam reunidas nestas páginas.
A revisão bibliográfica se fundamentou em
três assuntos chave: turismo, poder público e
planejamento estratégico. Em tese, a relação
desses assuntos foi tratada da seguinte forma:
apresentado o cenário turístico do Rio Grande
do Norte e suas perspectivas, diante de
algumas informações acerca deste ambiente,
são mensuradas as ações tomadas pelo poder
público para fomentar a atividade no Nordeste,
desde a sua inclusão nos planos do governo
federal, para desenvolver esta região
economicamente desprovida de indústrias e
onde o turismo é a fonte geradora de emprego
e renda, responsável pelo desenvolvimento
econômico daquela região. O estudo de caso
vem para fazer o link entre mercado,
empresários e gestores, permitindo sua visão
ao cenário real do ambiente competitivo ao
qual estaria imerso o empreendimento,
caracterizado por suas necessidades em
relação ao poder público, que fora o objetivo
principal do trabalho.
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74
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
123
Claudinei Senger1
Mauricio Pedro da Silva2
Mônica Maria Martins de Souza3
O papel estratégico da cultura organizacional na
construção da personalidade no trabalho
Resumo
A estratégia e a cultura organizacional
utilizam-se das normas organizacionais para
construir um novo sujeito - a personalidade
daquele que trabalha. A partir desta reflexão
pode-se pensar que o trabalho é uma mídia e a
empresa é um espaço que constrói e
desconstrói personas profissionais.
A investigação pressupõe a compreensão
entre a comunicação, cultura e missão
organizacional. Esses fatores dependem do
sujeito interpretante que se dirige à esse
espaço, para alimentar seus vínculos. A sua
comunicação com a empresa se faz por meio
da missão, e o trabalho torna-se a interface, a
representação do real. A missão funciona como
mentora da mídia “trabalho”, o seu discurso
atrai o nômade, seda-o, afastando-o do senso e
aproximando-o da loucura. Mantém-no refém,
doa-lhe competência e sanciona-o positiva ou
negativamente. Esse sistema de comunicação
conduz a existência do sujeito, em estado
alterado de consciência, e o seu corpo dá lugar
à identidade coletiva, ele coloca o seu poder no
fazer da empresa, espaço de construção e
desconstrução.
Palavras-chave: Comunicação e Cultura
Organizacional; Comunicação Estratégica;
Sistemas de Comunicação; Universo
Simbólico; Vínculos Comunicacionais.
Abstract
The strategy and organizational culture
make use of organizational standards to build
a new individual - the personality of him who
works. From this reflection one might think
that work is a medium and the company is a
space that constructs and deconstructs
professional personas.
The research assumes an understanding of
the connection between communication,
culture and organizational mission. These
factors depend on the interpreting subject who
comes to this space to strengthen his ties. His
1
Claudinei Senger - Mestre em Direito Internacional pela UNISANTOS/SP . Prof. das Faculdades integradas "Campos
Salles" – FICS-SP. Prof. Pesquisador do Grupo de Pesquisa da Faculdade ENIAC desde 2009. Compõe desde o início
de 2012 o grupo de pesquisa, orienta Iniciação Científica é co-editor da Revista Acadêmica Augusto Guzzo.
www.campossalles.edu.br /ISSN 1518-9597.
2
Mauricio Pedro da Silva - Graduado em Administração pela UNG. Especialista em Educação e Docência. Prof.
pesquisador do grupo de pesquisa da Faculdade ENIAC desde 2009. Compõe desde o início de 2012 a Comissão de
Edição, Revisão, diagramação e Editoração Eletrônica da Revista Revista Acadêmica Augusto Guzzo.
www.campossalles.edu.br /ISSN 1518-9597.
3
Mônica Maria Martins de Souza - Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP. Mestre em Administração de
Empresas pelo Mackenzie SP. Especialista em Administração de RH. Especialista em Tecnologia Educacional.
Psicóloga e jornalista. Atual Profa convidada Pós-graduação do Mackenzie. Desde 2006 é avaliadora INEP. Profa.
Pesquisadora da Faculdade ENIAC, coordena grupo de Pesquisa e Iniciação Científica, organiza Seminários Anuais
desde 2009 e da Revista Acadêmica ENIAC PESQUISA. É Profa. Pesquisadora, coordena Cursos e a Revista
Acadêmica Augusto Guzzo nas Faculdades Integradas Campos Salles – FICS – SP, desde agosto de 2010. Consultora da
Euroatlantica Ghesa Brasil Ltda.
75
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
communication with the company is made
possible through the mission, and work
becomes the interface, the representation of
reality. The mission operates as the media
mentor “work”, its discourse luring the
nomad, sedating him, drawing him away from
his senses and bringing him closer to madness.
Keeping him hostage, it gives him powers and
sanctions it positively or negatively. This
communication system leads to the existence of
the individual in an altered state of
consciousness, his body giving way to the
collective identity; he devotes his efforts to the
way of doing things of the company, a space of
construction and deconstruction.
Keywords: Communication and Organizational
C u l t u re , S t r a t e g i c C o m m u n i c a t i o n s ,
Communications Systems, Symbolic Universe;
Communicative Links
Introdução
Para compreendermos o sentido do trabalho
como mídia no contexto da cultura
organizacional pelo viés da semiótica,
buscamos em outras áreas, elementos e
conceitos que compõem a rede
interdisciplinar4. Consideramos que cultura é
um sistema de símbolos e significados
compartilhados, que necessitam ser
interpretados, e decifrados para serem
entendidos, pois é a mente humana que gera a
cultura. Sendo o trabalho um instrumento a
serviço das necessidades biológicas e
psicológicas do homem, ele funciona como um
mecanismo adaptativo-regulador e unifica os
indivíduos nas estruturas sociais, no caso desta
pesquisa as organizações. Lembramos que
organizações são organismos adaptativos
existentes nos processos de troca com o
ambiente. Sistema de conhecimento que
repousa na rede de significados dos membros
que compartilham esse espaço.
Nesta contextualização o trabalho
transforma-se em signo midiático e adquire
novo sentido e nova interpretação. Ele existe
para satisfazer o caráter insaciável do homem
na empresa, que o socializa e o capacita a criar
uma rede de signos sob seu domínio, que as
vezes o domina5. O homem e a empresa são
mutuamente dependentes desses signos, e uma
complexa rede destes, constituem o seu
universo6 . Neste espaço de limitações e
possibilidades o homem desenvolve relações
que promovem o seu reconhecimento ou
provoca a sua sanção. A sua interpretação do
trabalho é dependente da sua ideologia, sua
crença e dos fatores que o constitui. A forma
como vai designa-lo depende do seu
condicionamento social e sua rede significante,
positiva ou negativa. Entender sua relação
nesse espaço requer também compreender a
filosofia e a política organizacional, com a sua
estrutura simbólica de poder, e sua pratica
comunicativa. A cultura da empresa se reflete
em sua missão, seus objetivos e suas metas. E a
estratégia utilizada para conceituar suas
relações singulares com o homem fundamentase em sua história. Talvez esse seja o suporte
para compreender as construções e
desconstruções humanas, reais e metafóricas
das quais trataremos a seguir.
O tempo, o investimento e a mudança:
uma fratura ambivalente
Como trabalhar hoje, não é mais produzir
apenas, mas, entrar no sistema de ordem que é
a empresa, neste contexto vamos vislumbrar o
4
Segundo Nietzche – Todos os conceitos em que um processo se resume semioticamente escapam à definição,
porquanto só é definível o que não tem história.
5
Norval baitello. O animal que parou os relógios, 1997.
6
Harry Pross, Estructura Simbolica del poder, 1980:36.
76
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
trabalho como meio, veículo e canal de
comunicação entre o homem e a empresa.
Vislumbrar sim, e não iluminar, porque todo
objeto sobre o qual se deita o holofote, ofuscase. E nosso objetivo é aproximar-nos da
compreensão desse trabalho que media o
homem “sujeito” com o seu objeto valor, a
“empresa”. É o trabalho que anuncia e
denuncia esse sujeito para o objeto, através do
seu fazer, tendo como diretriz uma ferramenta
enigmática, persuasiva, sedutora e provocativa
que é a missão da empresa. Nessa relação, o
trabalho que propicia o estar conjunto no
sistema, é a ferramenta que também, dirigida
pela missão, conduzirá o homem por labirintos,
onde ele se desnudará de sua identidade
individual e se vestirá com outra roupagem, a
sua nova identidade, a identidade coletiva. A
missão enquanto mentora dessa mídia
“trabalho” doará ao sujeito a competência
adequada para que ele seja sancionado
positivamente pela empresa. Sendo o homem
um ser que vive de rituais, a sua comunicação é
uma representação. E neste caso, o trabalho a
representação que funciona como signo
midiático com a função de promover a
conjunção do homem com a empresa.
O próprio “nome” do homem não é o
homem, é o que o representa, existe por ele7. E
a missão é o instrumento utilizado para a
manipulação da sua mente, operação realizada
através das estratégias da comunicação. A
comunicação dirigida dessa mensagem incita o
contrato fiduciário que se consolida nesse
tempo/espaço (Oliveira, 2002, 149).
A costura que não se desfaz
Homem e empresa são enredados pelo lastro
do vínculo comunicativo, através da
comunicação que media a relação entre os
actantes, sujeito e objeto, instalados na relação
de doação e aquisição de competência. O
sujeito para adquirir pertença adota os valores
do objeto valor e com ele se compromete.
Consideramos aqui, que objeto, é aquele que
mantém laços com o sujeito e a relação entre
ambos é o que lhe proporciona a existência. A
sua existência, enquanto ponte entre sujeito e
objeto cria a natureza midiática. E são as
normas da missão que deflagram as atitudes
desejáveis que sutis a princípio que evoluem
para um exagero de fidelidade, e trabalho em
primeiro lugar, que faz do tempo do homem o
tempo da empresa e isso gradativamente
devora a sua existência enquanto indivíduo
(Barros, 2001:17).
Sabendo da sua dependencia do sistema de
ordem para alimentar seus vínculos a empresa
cria uma rotina que consome o homem e o seu
tempo. Sistema esse que é estabelecido a
priori, e do qual, o homem responde segundo
as suas expectativas. Neste espaço o sujeito
atua, “veste a camisa”, adota comportamentos
dirigidos, e a partir disso, delimita o seu
cotidiano. O seu fazer e o seu lazer é
programado pela empresa. Inserido e
comprometido nesse contexto, acredita que
pode realizar o propósito de ambos 8. Iludido
nesse jogo de faz de conta, aliena-se de seus
objetivos pessoais e abraça os da empresa
buscando a sua realização como se fossem os
seus proprios (Huizinga, 1996). E, a identidade
que precisa ser protegida para garantir a
sanidade do ser, nesse processo é esvaziada de
si mesma. Essa identidade extraviada provoca
7
Harry Pross, Estructura Simbolica del poder, 1980.
8
De acordo com Morin, essa convivência, só é possível em virtude da submissão dos indivíduos.
77
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
um movimento de afastamento do senso e a
aproximação da loucura segundo Kamper9 .
Esse fenômeno envolve uma mudança na
percepção da existência, pois, o homem deixa
de ver a realidade com a sua visão de mundo,
que é a soma dos seus conceitos e preconceitos
culturais. Ou seja, deixa de ver com os olhos
ingênuos do nômade montanhês de Flusser
(1979)10, isso é o que ocorre com o indivíduo
que entra na empresa. Uma vez, nela inserido,
ele adquire novos mapas mentais através das
normas organizacionais.
Essas normas nada mais são do que
discursos simbólicos da missão,
estrategicamente articulados que ditam os
valores que governam o coletivo. E nele não há
norma, axiologia, ou ética, desvinculada da
organização. A missão da empresa constrói
uma identidade como a escola, a família e a
sociedade, com visão e crenças compartilhadas
em sua micro-estrutura11 , a sua filosofia e sua
política posicionam-se a partir da sua visão.
Neste espaço ocorrem sucessivas palestras e
treinamentos com o intuito de operar mudanças
que gerem transformações no estado do sujeito,
como a aquisição da competência que o
qualifique ao poder, saber, fazer da empresa. A
sanção positiva do sujeito pela empresa
significa a sua aceitação, porém ai deflagra
uma fratura, pois a sua entrada neste “universo
mágico” implica na perda da liberdade e dos
valores individuais, ou seja, a disjunção com a
própria identidade. A busca da conjunção com
9
a empresa, custa ao sujeito a penitência de uma
nova performance. Ele abre mão da primeira
realidade12 e incorpora o novo modelo coletivo
para ajustar-se perfeitamente ao molde
oferecido. A sua construção neste sistema,
desconstrói o seu conjunto de hábitos e
convenções anteriormente reguladoras do seu
viver. No contexto organizacional o que
governa o homem, é o conjunto de ações
coletivas e as práticas sociais com as quais
todos dialogam. Essas práticas promovem um
conhecimento com o qual todos eleitos devem
se identificar. Neste espaço não se permite
desviar a energia da libido para outros objetos
que não seja a empresa (Barros 2001:14).
Podemos entender aí o conceito saussureano da
relação entre língua e fala, história, passado,
diacronia e sincronia, presente entre texto e
contexto. Na empresa não há a concepção de
língua isolada e individual, apenas a coletiva,
resultado de acordos sociais.
Consideramos que o que move as pessoas
em uma comunidade são suas crenças, valores,
superstições, e os emblemas criados. No caso
da empresa o que governa as pessoas nesse
espaço é a logomarca, que sintetiza a sua
missão. O signo emblemático da logomarca
traduz a idéia de coletividade da empresa. Os
fatos da sua cultura e a sua relação com as
metáforas que emergem desses signos podem
ser observados na missão da empresa. Essas
formas organizacionais são formas estéticas
com arranjos de maior ou menor teor de
No texto de Kamper sobre a loucura ele ressalta que: o que diferencia da loucura é o senso.
10
No livro Natural:mente, Flusser fala que o homem é nômade, nasce nos vales e vai até os cumes para adquirir
informações e construir outros mapas mentais e vive-versa.
11
Segundo Morin “A sociedade é o conjunto de homens com grupos de diversas dimensões e significados que
compõem a humanidade”.
12
O conceito de “Primeira realidade” de Bystrina, envolve a sobrevivência e a realidade das necessidades. O universo
da civilização, a educação do corpo e dos hábitos para a sociabilidade. Para a comunicação a “Primeira realidade” é o
lugar onde espaço e tempo intercruzam com a mitologia. Portanto, a “Primeira realidade” e “Segunda realidade”, se
contaminam reciprocamente para dar origem ao abstrato conceito de tempo/ espaço.
78
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
esteticidade, articulação, organização e
construção do enredo, um todo articulado de
sentido proposto pelo enunciador. Metáfora de
um enredo que em ação contínua, consciente
ou não os seus atores tecem, ignorando que é
escassa a possibilidade de desenredar. O
enredo da missão da empresa é seu constructo,
sua identidade, não importa o seu nome, mas o
seu papel social. Na conjunção com o outro a
empresa busca a sua existência de fato, a sua
visibilidade, e a realização do seu fazer através
do outro, pois, sem este que a constitua e lhe de
vida ela não existe13. Por isso numa ação
continua, ela acena para os homens com papéis
fixos; consagrados como os dos deuses,
míticos como os das lendas e funcionais como
os da sociedade (Serres 2001). Acena atraindo
o sujeito a sedar-se. E seduzido pela
mensagem, ele atende ao chamado, buscando
através dela a competência de um Deus para se
tornar um sujeito de fato e de direito. Ele
esquece ou ignora que os deuses são segunda
realidade, portanto imagem. Desta forma o que
ele busca é o modelo da completude da
imaginaria “normalidade”14 , prometida pelas
mensagens elaboradas a partir do repertório da
empresa que compõem a missão, metáforas
que o induz a estruturar intenções,
comportamentos e a formar a consciência
coletiva (Iasbeck, 2002). Ignorando que este é
o espaço que promove a sua construção ou
desconstrução.
identifica-se a tal ponto com os seus objetivos
e metas que tende a anular a sua
individualidade e criar uma comunicação
especifica mediada pelo trabalho. Podemos
observar que essa comunicação é visual e
cognitiva, ela denuncia uma ordem sensorial da
apreensão inteligível, e aqui toda a atitude do
sujeito é governada pela missão da empresa,
enquanto conhecimento, forma e sentido 15. Na
sua vontade de conjunção ele incorpora a
performance, o ideal de competência
idealizado pela empresa. Inserido no mundo
dessa cultura adota os seus valores e demonstra
novas atitudes16. Nessa relação ele encena e se
faz contemplar enquanto simulacro em um
mundo simbólico onde os signos falam das
relações sociais17. Na busca pela analise desse
simulacro buscamos em um site de domínio
público a missão de uma empresa de alimentos
e destacamos alguns fragmentos e seus
desdobramentos.
A leitura das ferramentas semióticas
eficientemente persuasivas nos permite analisar
no sujeito a incorporação de práticas culturais
exteriorizadas nas suas interações cotidianas.
Assumindo esse repertório, o individuo
A empresa iniciou o século 21 com um novo
desafio: “tornar-se na próxima década, a
principal provedora de soluções para nossos
clientes dos setores agrícolas e de
alimentos”. Reconhecemos que somente
obteríamos sucesso em nosso negócio se
Da primeira realidade à superfície da
imagem: uma trajetória sem retorno
Podemos observar que na narrativa da
missão, visão, objetivo, abordagem e medidas
de desempenho, a empresa busca a conjunção
com os atores do seu contexto. Confirmando os
tópicos até apresentados.
Um dos fragmentos do texto diz:
13
Para Morin, todo indivíduo tem importância na empresa para a qual colabora com sua própria complexidade, sua
visão do mundo, seus projetos pessoais, suas atitudes imprevisíveis, suas estratégias, sua dinâmica de evolução. Para ele
a empresa é "a sua" representação da empresa.
14
Morin considera que o mito do modelo ideal é um fantasma comum que leva empresas e funcionários a fracassarem.
15
Floch, 2001.
16
De acordo com Morin, presos em seu trabalho e em sua visão particular das coisas, as pessoas arriscam-se a não mais
considerar senão o ponto de vista da empresa, e se fecham em um reducionismo estreito.
17
Pressuposto sociológico de Cassirrer.
79
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
criássemos valores diferenciados para nossos
clientes. Levamos para esta jornada; nossos
tradicionais pontos fortes que são integridade
e confiabilidade. Também trazemos nosso
conhecimento e experiência, acumulados
pela nossa atuação nas mais diversas
localidades, produtos e serviços. A partir
desta base, formaremos relacionamentos
mais sólidos com cada cliente,
possibilitando:
Explorar necessidades não atendidas;
Descobrir juntos as melhores maneiras de
atendê-las;
Criar soluções únicas e valorizadas; e
Entregá-las de maneira confiável.
Adotamos, como empresa, esta missão e ela
reflete como vemos o futuro.
O nosso novo logotipo e o sistema de
identidade corporativa também representam
as aspirações da nossa companhia. Estas
mudanças são poderosos símbolos de uma
empresa mais dinâmica, acessível e
inovadora na qual estamos nos tornando.
O estilo da logomarca desta empresa dá a
impressão de movimento, ação, interação e
dinamismo, é a clara indicação de um
simulacro inscrito no espaço, o que equivale ao
ausente da imagem. Colocando-se em
perspectiva diacrônica, ele se inscreve como
agente e testemunha do seu próprio devir,
exaltando através da idéia de ação, o
investimento no crescimento para aumentar a
sua participação no mercado. Seguido do
enunciado da missão, reduzido ao estado de
mensagem, ele é o equivalente simbólico com
pretensão a uma prospecção. Sabemos que o
logo não é a empresa, mas está no lugar dela,
nos remete a ela, chama através da sua
visualidade todo o seu texto e o seu contexto,
mas é apenas a inscrição do real.
Com relação à visão da empresa o texto
relata:
A visão da empresa expressa as aspirações
coletivas das pessoas que aqui trabalham. Ela
nos unifica, dirige nossos esforços e nos
diferencia das outras empresas. Possui quatro
elementos:
18
Nosso Objetivo: é ser líder mundial em
alimentos.
Nossa Missão: é criar valores diferenciados.
Nossa Abordagem: é sermos dignos de
confiança, criativos e empreendedores.
Nossas Medidas De Desempenho: são
funcionários engajados, clientes satisfeitos,
comunidades enriquecidas e crescimento
rentável.
O nosso Objetivo: "Alimentar as pessoas"
reflete nosso enfoque agrícola e em
alimentos, e a idéia mais ampla de melhorar
a qualidade de vida das pessoas. Isto também
quer dizer que o nosso objetivo fundamental
é atrelar nosso conhecimento e energia para
oferecer produtos e serviços necessários para
a vida, saúde e crescimento. Implica em
cumprir um leque de expectativas, desde
aprimorar a produtividade agrícola até
melhorar os alimentos para promover um
desenvolvimento econômico sustentável.
Também transmite uma cultura de alimentar
com base na confiança, valorização das
relações e na realização de todo o seu
potencial.
A nossa Missão: "Valor diferenciado" está no
centro da Ação Estratégica. Encontra-se nos
pilares do foco do cliente, inovação e alto
desempenho. Enquanto o nosso objetivo de
longo prazo trata da busca por nossas metas,
nossa missão reflete a realidade competitiva
do mercado. Só obteremos sucesso nos
negócios criando valor agregado para nossos
clientes, nossos fornecedores, funcionários,
acionistas e vizinhos. Criar um valor
diferenciado significa construir relações mais
fortes com os clientes e apresentar
comportamentos orientados para a solução
do cliente que podem se resumir na frase:
Explorar, Descobrir, Criar e Entregar.
Podemos observar que na seqüência
narrativa da visão e da missão elas conferem
sentido ao enunciado18 . O jogo de sedução que
aqui se joga, é analisado como processo
recursivo, fundado na reprodução especular de
posturas, que se espera, sejam adotadas
alternadamente por uns e outros. Enunciação e
enunciado atualizam a competência, de um ser
que representa um papel, que não passa de um
simulacro. O apelo místico da visão exalta o
ser humano enquanto animal simbólico que age
Fiorin, 1996, Oliveira 2003.
80
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
dentro de uma ideologia. Se na cultura o mito
pode ser definido como a concretização de uma
verdade coletiva, aqui se não é a sua
concretização, tem a intenção de destruir as
dúvidas essenciais, individuais ou coletivas a
seu respeito. As pessoas inseridas nesse
contexto apresentam atitudes que denunciam
desejo de fazer dessa “verdade” uma
realidade19.
O enquadramento e a inserção das
informações acima, são elementos semióticos
capazes de promover ou fazer surgir efeito de
sentido. “Alimentar o mundo”, pelo
procedimento de textualização, o seu discurso
verbal procura ser atraente, o conteúdo enuncia
e define a disposição dos atores em uma
figuratividade sinestésica20 . Instaura uma
gestualidade no corpo desde o início da sua
inserção na empresa e vai adquirindo um
“ritmo”, comportamento, linguagem, postura,
forma de expressão verbal e não verbal,
deixam de ser mídia primária e transforma-se
em inscrição. Ambos, sujeito e objeto buscam a
conjunção para encontrar a plenitude que na
verdade é do domínio do imaginário, mesmo
que a encontrem por um momento, a ela
enquanto eterna construção pode se romper.
Mas essa informação a missão não explicita, e
busca afastar o desconhecido que é
figurativizado. Essa mensagem fica oculta, o
funcionário mantém-se na relação coletiva com
o desconhecido, o mundo do opressor e do
oprimido. Embriagado pelo desejo de poder,
saber, fazer ele trabalha para afastar a angustia
da não pertença21. Ávido pela possibilidade de
conjunção o sujeito se potencializa, exalta-se
em sua fidelidade, lealdade, e dedicação
incondicional. O conjunto das mensagens,
atinge a sua intenção de comunicação do
caráter, imagem e personalidade da empresa no
“caminho para privilegiar um sentido desejado
e intencional” (Barthes, 1974: 19), persuasiva e
carregada de intenções ideológicas22.
O repertório emotivo dos signos perfila
desde o século XVII, com o desenvolvimento
da industrialização. Dessa época a missão se
apropria do grau emotivo, com a pretensão de
empolgar o destinatário e sensibilizar sua
opinião. Utilizam-se de termos e expressões
que sugerem sedução, que no texto dessa
empresa fica muito evidente; “quer fazer parte
da nossa equipe?” “Nós alimentamos o
mundo” aqui encontramos apelo significativo
de linguagem afetiva. “Quer alimentar o
mundo? nós ajudamos você, desde que se
integre ao nosso corpo coletivo”. A mensagem
invoca conceitos culturais muito ligados aos
valores explorados na atualidade como a
ecologia, a solidariedade, a não violência e a
fraternidade, entre outros, como sugere o texto
a seguir:
Nossa Abordagem - "Ser digno de confiança"
inspira integridade na relação que
construímos com o cliente. "Ser criativo"
remonta à missão de desenvolver soluções
para o cliente. "Ser empreendedor" tem a
conotação de uma empresa que pensa à
frente e é orientada pela ação.
Nossas Medidas de Desempenho;
reconhecem que o alto desempenho começa
com funcionários engajados que enfocam os
esforços na satisfação do cliente, e que
testemunham nosso compromisso em
comunidades habitáveis e sustentáveis. E
19
Morin considera que: administrar diversidade de dinâmicas individuais imbricadas, querer fazer viver e trabalhar
juntas para a realização de objetivos comuns, pessoas também singulares e autônomas, é realmente um desafio que
causa vertigem, e suscita admiração ao mesmo tempo.
20
Greimas, 1993, Oliveira 2002
21
Morin diz que as pessoas em uma empresa, não vivem fora do tempo, fora de sua história, fora de seu ambiente.
Estão inseridas em um contexto cultural, econômico, social do qual dependem e onde se moldam. Esta dependência
recíproca introduz um fator suplementar de complexidade na administração. Os seres humanos são fruto de uma
linhagem, de um povo, de uma região que forjaram suas tradições e suas crenças.
22
Morin chama atenção para a cultura das empresas que de alguns anos para cá, tem uma tendência a se fechar e a
reproduzi-la.
81
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
elas refletem que organizações que
apresentam estes comportamentos terão o
crescimento lucrativo necessário para
sustentar o desempenho do tempo.
Construção imaginária
Convictos da possibilidade da conjunção,
empresa e funcionário, mediados pelo vínculo
“trabalho”, identificam-se. Nessa relação se
estabelece uma tipologia onde o “corpus”,
trabalho dirigido pelas mensagens da missão
atua como vinculação e mediação. A evolução
nessa relação atinge tamanha cumplicidade que
o papel do trabalho deixa de ser o direcionador
do sujeito em direção ao objeto valor, e passa a
transitar entre dois sujeitos como elo. Isso
permite ver que o papel do trabalho se constitui
como continuidade ou, se rompido,
descontinuidade. Enquanto continuidade o
trabalho enuncia, destaca e fala do sujeito que
agora coletivo, coloca o seu poder, no fazer da
empresa que define o seu existir. O poder da
missão que demarca para o sujeito, a hora de
fazer, e indica o que, como, quando e em que
direção ele deve caminhar. E se for
descontinuidade, a relação se rompe não há o
que caminhar.
O nomadismo e sedentarismo: um
divisor de águas
A partir do papel do trabalho, e da
construção do vínculo permanentemente
alimentado, homem e empresa unificam-se,
muito mais do que proximidade física eles
passam a viver em intima interação, facilitada
pela tecnologia da informação. Hoje, na
empresa, os homens não apenas manuseiam
uma ferramenta apertando um parafuso,
permitido pela liberação da mão com o advento
da hominização. Com as mãos livres eles
adquirem a competência e, metaforicamente
passa a ter o mundo nas mãos. Porém, a
manipulação não se limita às mãos, o seu
mundo de acesso vai muito além. O ser
destinado à liberdade, queda-se aprisionado
pelo sedentarismo, “agregado” na empresa e
seduzido pelo espaço organizacional. Espaço
de comunhão onde coexistem competências,
ineficiências e conflitos 23. Envolvidos, eles
exercitam o poder sobre si mesmos, gregários
da própria opressão, contaminados pela loucura
da vaidade, do desejo de status, que domina
neste cenário24 , possuídos pela ilusão dos
imortais no reino dos mortos, tentas aí fincar
seus pés. Condição ilusória e apaixonante
desses corpos inventados nesse tempo espaço
sujeito à ventura, destino da imagem (Kamper)
e razão da loucura, segundo Foucault.
Nos homens encontramos as mais diversas
características; oscilando de “stulticiae”
loucura, a “Kolaxia” avareza. A personalidade
humana é estudada desde os tempos mais
remotos, e os seus estereótipos são
estrategicamente pesquisados e desenhados
para se enquadrarem nos mais diversos estratos
das esferas sociais. Os homens possuídos pela
ambição são atraídos pelas equipes de seleção
que encaixam suas características passíveis de
adaptação aos perfis dos cargos das cavernas
da modernidade. Ao longo de sua caminhada,
alguns são sedados pela cultura organizacional,
e nesse espaço se estabelecem, exercem o
poder e acumulam bens. Nômades iludidos em
domesticar sua personalidade selvagem, caem
em armadilha auto-preparada, pois conscientes
ou não aceitam esse pacto de sedação,
acreditando estar no caminho adequado ao que
chamam de evolução e progresso. O sistema de
ordem seda aqueles que atendem a sua
23
Segundo Morin, os fenômenos de regulagem dos jogos dos atores nas organizações são extremamente entravados e
'récursivos’. Os conflitos, os incidentes, as desordens diversas que surgem, são fenômenos ligados entre si.
24
Flusser na obra “A História do Diabo”. São Paulo: Martins Fontes, 1965. Estabelece cenários com realismo
hipotético e bases antropológicas que lhe valem a alcunha de futurólogo da mídia. Ele fala que nesses cenários os
homens dançam, com as máscaras e alegorias de deuses e demônios, e aí sedam suas mentes.
82
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
necessidade potencializando a sua superfície
imagética, construindo seres coletivos que
possam permanecer devoráveis o mais longo
tempo possível. Aos que não se permitem
desconstruir, a empresa descarta sem carpir,
como seres humanos excrementais. Como bem
define Kamper, o que pode transformar em
imagem permanece, o resto naufraga.
Os indivíduos que entram na empresa, prado
mágico e mítico da cultura organizacional,
entram em contato com outros mapas
existenciais e adquirem uma identidade
coletiva. Mergulhados no abismo da superfície
da imagem, da alienação massificada eles
perdem definitivamente o contato com a mídia
primária, a primeira realidade de acordo com
Bystrina. E, como disse o Flusser; os homens
que sobem o caminho, em sentido contrario, ao
sentido que corre as águas dos rios, retornando
ou não, adquirem e armazenam informações
que os condenam a permanecerem
contaminados sem jamais voltarem a se
integrar. Eles experimentam o limite da loucura
do espírito humano25 , lugar de deciframento e
não de respostas.
Considerações Finais
Considerando a organização como o espaço
do trabalho “veículo midiático” dirigido pela
comunicação persuasiva da missão, podemos
pensar que essa ideologia uma vez absorvida
pelos indivíduos, dilacera vorazmente a sua
primeira realidade26 lançando-a em abismos
fantasmagóricos. Atormentados e incapazes de
identificarem seus corpos, e suas identidades, e
apropriarem-se de seus destroços para tecerem
novos vínculos, os homens permanecem
tateando a imagem. Perde o contato com o seu
ser e o seu corpo cede lugar ao outro. A este
processo Bateson chama de esquizofrenia,
Foucault e Erasmo de loucura. Dejours chama
de doença profissional, que é que o percurso do
viajante surpreendido pelas tabuletas invertidas
por Hermes, o deus alado da comunicação.
Para Bystrina é uma das raízes da cultura; os
estados alterados da consciência. Os
psiquiatras chamam de alteração ou desvio do
comportamento designado como padrão de
normalidade. Resta-nos então a pergunta: Qual
normalidade?
Nesta investigação observou-se que o
trabalho, enquanto veiculo midiático, a
comunicação é utilizada, como um artifício que
se propõe a desconstruir o individuo, para
trabalhar na linearidade engessando-o,
privando-o, e enquadrando-o às suas normas e
modelos. O pensamento do homem, porém, em
sua natureza nômade é livre e vive aos saltos,
muitos não se permitem entrar na linha. A
identidade corporativa cria sua cultura, e
através da missão enlaça e embriaga quem nela
se permite refém. Mas, os portadores de uma
expressão voraz, inflamados pela imaginação e
pela criatividade, surta, fazendo ponte com a
vanguarda do exército do espírito humano27
que alavancou a natureza, inventando o fogo,
através do atrito entre as pedras.
Refletindo sobre as palavras de Morin28 ; o
trabalho científico é sempre uma iniciação e
jamais uma conclusão. O estudo na verdade é
uma provocação e o seu fazer está sempre por
começar e jamais concluído definitivamente.
25
Flusser em Natural:mente, 1979, autor tcheco, judeu, brasileiro, que escreveu sobre o estrangeiro e sua incapacidade
de se integrar a outros paises por possuir outros mapas mentais compostos pela cultura do seu país de origem.
26
A primeira realidade é um conceito de Ivan Bystrina que envolve a sobrevivência, a realidade das necessidades, e a
“Primeira e a Segunda realidade”, se contaminam reciprocamente para dar origem ao abstrato conceito de tempo/
espaço.
27
Flusser, 1979
28
“...em tudo que escrevo (...) não há verdades senão parciais, relativas e temporárias. Imersos na complexidade, somos
obrigados a distinguir certos aspectos das situações, analisá-las localmente e simplificá-las para poder apreendê-las. Isto
é um fato que requer o máximo de descentralização e de delegação de responsabilidades.
83
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Amparando-se em Prigogine, em “O Fim das
Certezas”, sabe-se que mesmo que um dia se
possa fazer uma conclusão ela estará por ser
repensada, e contestada, pois, a ciência traz o
eterno retorno. É grande a complexidade e a
diversidade de idéias dos autores que dialogam
sobre os temas da comunicação que indicam o
caminho na direção da construção e
desconstrução do homem. Esse estado de
mudanças do nômade, que se queda sedado na
organização colocando o seu pé na loucura ou
atolando-se nela tem a natureza do fogo e da
pedra, do ar e da água, e esses elementos
estarão sempre interagindo e complexificando
a sua natureza. Cabe ao pesquisador resistir ao
poder da sedução ou vencer a sua astúcia.
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85
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
123
Mirelle Monique de Oliveira Fernandes 1
Paulo Roberto Alves 2
William Roberto Dondas 3
Marketing e o conceito de ética: principais implicações no
ambiente empresarial
Resumo
Abstract
Dentro da área do marketing, muitas são as
indagações sobre a ética no marketing e outros
negócios que o envolvem. Mas será que ela
realmente está presente neste contexto? A
pesquisa buscou responder a esta e outras
questões por meio de análises de materiais
teóricos da área e descobertas feitas ao longo
do tempo sobre o tema. Apresentamos uma
síntese do material coletado sobre um olhar
crítico acerca das indagações constatadas por
muitos estudiosos do tema e fizemos uma
análise, que ajuda a compreender a nova
tendência desta área, a preocupação com a
sociedade.
Within the area of marketing, there are
many questions about ethics in marketing. But
is it really it is present in this context? This
research sought to answer this and others
issues through analysis of a theoretical
material and discoveries made on time about
the subject. We also provide a summary of the
material collected on a critical view of the
questions found by many academics of the
subject. Finally we did an analysis that helps
to understand the new trend in this area, the
concern for society.
Keywords: marketing and ethics; ethics;
advertising and ethics.
Palavras-chave: marketing e ética; ética;
propaganda e ética.
1. Apresentação
“Que oportunidade tem a ética no mundo
globalizado de consumidores?”(BAUMAN,
2011, pág. 37).
Diante do acirrado cenário empresarial, em
que há uma busca incansável pelo consumidor
1
final em todas as esferas de serviços
oferecidos, podemos dar maior destaque ao
mercado comercial, que atua, principalmente
no Brasil, o Varejo. Tal segmento pode ser
ressaltado, ainda, pela constante presença em
todas as áreas da mídia, o que nos faz voltar
atenção especial para o tipo de Marketing
envolvido com os negócios.
Mirelle Monique de Oliveira Fernandes - Pesquisadora da PUC/SP
2
Paulo Roberto Alves - Mestre Prof. pesquisador da PUC/SP e Prof Pesquisador da FICS onde desde o primeiro
semestre de 2012 compõe a grupo de pesquisa – oficina de artigos e Iniciação Científica das Faculdades Integradas
Campos Salles – FICS. www.campossalles.edu.br
3
William Roberto Dondas - Pesquisador da PUC/SP
86
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Adentrando neste meio, e buscando
compreender as ações especificamente da área
de divulgação e promoção, surge um cenário
econômico e social que merece atenção
especial.
Necessitando trabalhar e desenvolver
estratégias que atinjam o consumidor final, o
intuito do Marketing, das propagandas e
promoções realizadas pela área é, justamente,
conseguir atrair consumidores. Até aqui, nada
parece estar errado. Porém, na prática,
inúmeras vezes deparamo-nos com algumas
situações em que o setor comercial não atua de
forma leal com seus clientes. Em um contexto
como este, em 1991, quando estava no poder
da República o Presidente Fernando Collor de
Mello, foi implantado, no Brasil, o Código de
Defesa do Consumidor (CDC). A partir de
então, as atividades desenvolvidas na área
comercial, especificamente na área do
Marketing Empresarial, começaram a ser
cuidadosamente planejadas, pois se entende
que qualquer ação que infrinja as leis postas
no CDC, pode levar as empresas a disputas
judiciais.
Exatamente neste ponto surge a
problemática: será que as empresas realmente
atuam de forma ética? Será que os direitos do
consumidor sempre são preservados e
respeitados?
Acreditamos nas hipóteses de que em
certos momentos de sua história, o Marketing
pode ter agregado alguns valores éticos em
suas práticas, os quais podem variar de acordo
com o contexto histórico. Porém, com o
surgimento de fortes valores capitalistas, o
“ter” passou a predominar nas ações de
Marketing, resultando em ações que podem
ser prejudiciais aos consumidores (PASSOS,
2011).
Procurando respostas para estas questões,
realizamos uma pesquisa inicialmente
bibliográfica que se desdobrou em uma
pesquisa descritiva do tema, culminando no
presente artigo, seguida de reflexões, que
apontaram o real caminho perseguido pelo
87
Marketing. Desenvolvemos um estudo sobre
essa área para entender seu funcionamento e
buscamos suas relações com a moral e a ética
envolvidas no tratamento dos consumidores
para tentar entender e explicar como são
tratados os princípios éticos dentro do
Marketing.
2. O Marketing
Em 1953, segundo NORMANHA FILHO
(2004), o Marketing começou a ser ensinado
nas Universidades Brasileiras, inicialmente na
Escola de Administração de Empresas da
Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo. No
exterior, teve início antes desta data. A partir
de então, as discussões e os estudos referentes
a esta área passaram a ser frequentes, como
ainda hoje se fazem necessários. Muitos
estudiosos buscaram definições desta prática
que abarcassem a sua importância e alcance
frente aos aspectos que envolvem o tratamento
das informações para que se possam
desenvolver as áreas que o Marketing visa
atender, como ferramenta empresarial de
grande valor (NORMANHA FILHO, 2004).
Segundo LAMB (2004, pág. 6), Marketing
é “o processo de planejamento e execução da
concepção, do preço, promoção, e distribuição
de ideias, mercadorias, e serviços para criar
trocas que satisfaçam os objetivos individuais
e das organizações”. Sendo assim, o
Marketing não se resume a atividades
relacionadas com promoção, pontos de venda,
e fidelização de clientes, e outros. A troca
também é um conceito fundamental, pois
significa que todo o processo engendrado para
apresentar os produtos aos clientes, realmente
foi realizado da melhor maneira. Entretanto, o
oposto não é verdadeiro, as pessoas, em sua
maioria, realizam trocas por necessidade, não
por simplesmente serem influenciadas a
adquirir determinado produto.
Para o desenvolvimento das atividades de
Marketing, são adotadas quatro filosofias. A
primeira, uma orientação para a produção, tem
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
um foco voltado mais para as capacidades
internas das empresas do que para as
necessidades dos clientes (LAMB, 2004).
Já a orientação para vendas, define que as
pessoas comprarão mais produtos se forem
adotadas técnicas agressivas neste ponto. E, a
orientação para o mercado define que as
vendas não ocorrem somente pelo fato da
força empregada nas vendas, mas depende do
processo de decisão do comprador. Assim, as
empresas devem compreender que o cliente é
quem define o valor daquilo que está
comprando, e não elas mesmas. Por fim, a
orientação para a sociedade, define que a
organização não pode disponibilizar para seus
clientes um produto que seja prejudicial para
as pessoas. Por mais que o mercado seja
competitivo, as empresas devem competir de
maneira ética (LAMB, 2004).
De acordo com LAMB (2004, p.57), “ética
comercial consiste, na realidade, em um
subconjunto de importantes valores de vida
aprendidos desde o nascimento. Os valores
que os executivos usam para tomar decisões
foram adquiridos por meio da família e das
instituições educacionais e religiosas”.
D’ANGELO (2003) diz que as ações
realizadas no contexto do Marketing sempre
foram alvo de questionamentos éticos, uma
vez que é a atividade empresarial que tem
mais visibilidade. Existem basicamente dois
tipos de questionamentos éticos. O primeiro
diz respeito ao estímulo materialista
despertado pelo Marketing. O segundo enfoca
atividades de Marketing, como precificação,
propaganda e vendas.
Mesmo que as definições formais de
Marketing alarguem sua abrangência,
popularmente, o Marketing é confundido com
propaganda pura e simples (D’ANGELO,
2003).
Um exame de algumas das atividades de
Marketing é suficiente para perceber a
frequência com que os profissionais da área se
deparam com questões éticas. Praticamente
todas as atividades de Marketing podem ser
interpretadas de acordo com uma visão
positiva ou negativa quanto a sua correlação
ética. Nesse contexto, a experiência tende a
conferir aos atores do mercado a capacidade
de desenvolver mecanismos que lhes garantam
alguma segurança. Não se sugere que as
práticas dos negócios são antiéticas, mas que a
maneira como os profissionais percebem seus
papéis podem colocar em risco a ética de suas
ações (D’ANGELO, 2003).
Percebemos que o Marketing é uma área
permeada por questões éticas, e são de grande
importância, pois é a atividade que tem o
papel de aproximar a empresa de seus clientes.
Sendo assim, os profissionais de Marketing
necessitam usar todos os métodos de que
dispõem, para realizar seu trabalho da melhor
maneira possível (NORMANHA FILHO,
2004). É nesse momento que começam a
aparecer os dilemas éticos. Até que ponto um
profissional deve ir para que possa realizar o
seu trabalho? Qual é o limite ético para as
ações de um profissional de Marketing?
Esses questionamentos levam a inúmeras
discussões, já que a ética não tem um conceito
igual para todas as pessoas. Pode-se dizer que
todos tentam agir dentro da ética de sua
sociedade, mas por haver diferentes visões
sobre o que é ético ou não, é difícil que se
chegue a um consenso total sobre quais ações
estão ou não dentro da ética (D’ANGELO,
2003).
3. A Ética
Como indica VALLS (2006), ética pode ser
um estudo ou uma reflexão, científica,
filosófica, ou até teológica sobre os costumes
ou sobre as ações humanas, e pode ser também
a realização de um tipo de comportamento. A
ética está presente, no seu sentido geral, em
todas as sociedades, em todos os momentos
históricos e sempre está em constante
mudança. As vivências diárias proporcionam
mudanças de percepções, que interferem nos
julgamentos que as pessoas fazem das coisas,
88
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
das ações, e até das visões das pessoas ao seu
redor, da sociedade onde vivem.
Percebemos, então, que as ideias sobre o
que é ética podem ser diferentes de acordo
com a época ou sociedade analisada. Porém,
em todas as situações, encontramos a presença
do bem e do mal. Agir com ética é agir de
acordo com o bem.
A maneira como se entende o que é o bem
pode variar, de acordo com o contexto
analisado, mas a ideia de bem está presente em
todas as formas de pensar éticas. (VALLS,
2006).
Atualmente, nossa sociedade vive uma
época de reivindicação, em que os seres
humanos buscam seu reconhecimento como
tal, perante a sociedade, que os menospreza e
impõe situações de opressão e de
manipulação. As pessoas querem ser
entendidas, compreendidas e aceitas por
inteiro; não desejam ser, meramente, mais uma
engrenagem deste sistema capitalista.
Presenciamos uma mudança de paradigmas
em curso na sociedade (PASSOS, 2011).
Neste sentido, surgem novos padrões,
novas maneiras de pensar, de definir, de viver
de forma ética dentro de nossa sociedade. No
momento em que se torna difícil a aceitação
das normas, das leis, e até das regras sociais de
forma pacífica, é latente a busca dos
indivíduos por serem reconhecidos como um
todo, não só como aqueles nos quais se inculca
padrões que devem ser aceitos e seguidos, mas
como aqueles que conhecem seus direitos e
têm poder e voz para defendê-los (PASSOS,
2011).
Para tanto precisamos ter ciência de que
moral e ética caminham lado a lado. Possuem
origens diferentes, mas significam o mesmo:
um modo de agir, um costume adotado
(PASSOS, 2011). Mas, são, no entanto,
distintas também. Podemos dizer que a moral
confere certa normatização e direção às ações
das pessoas, enquanto a ética seria destinada
ao estudo dessas práticas, dessas ações. Logo,
“a Ética é a ciência da moral” (PASSOS, 2011,
89
p.23). O alcance das práticas morais,
entretanto só pode ser feito pelos seres
humanos, pois este é responsável por suas
ações; seus atos decorrem livre e
conscientemente (PASSOS, 2011).
O ser humano é livre para fazer suas
escolhas e deve se responsabilizar por elas.
Porém, o momento histórico, as heranças de
outras gerações, os condicionamentos a que
são expostos, também ajudam a definir sua
maneira de agir, suas práticas morais. Ele é o
único que pode transformar a realidade a seu
favor. É livre para isto e essa liberdade
também depende do momento histórico,
quando o indivíduo transforma a realidade
para suprir suas necessidades. Os valores
morais são interiorizados e pregados
sutilmente. As crianças são “moldadas” por
seus pais, sua família, sua escola etc.. Nesse
sentido, os valores morais que predominam
cristalizam-se pela experiência do grupo, da
sociedade, pelos momentos de vida
compartilhados em determinado momento.
(PASSOS, 2011).
A prática moral em nossa sociedade é
pautada pelo culto do eu, do uso das pessoas
em benefício do sistema. Como todos nós
conhecemos, nossa sociedade vive a era do
“ter” que oprime o “ser”, assim as relações
interiores são totalmente oprimidas e
desconsideradas (PASSOS, 2011). “Dentro
dessa realidade, a concepção moral também se
orienta na exploração do ser humano pelo ser
humano: o egoísmo, a hipocrisia, o lucro e o
individualismo são incentivados e até
cultuados” (PASSOS, 2011, pág. 26).
Entretanto, pode haver uma “luz no fim do
túnel”. Uma mudança, neste cenário da prática
moral existente, necessita de reflexões
profundas, principalmente na esfera política
(PASSOS, 2011). É necessário que haja
mudanças de valores no que tange a
consciência coletiva, já que se trata de uma
mudança que afeta toda a sociedade, e não
apenas o indivíduo. Uma nova ordem moral,
acompanhada de novos valores, sugere que
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
haja respeito à liberdade e à pluralidade de
valores (PASSOS, 2011). Somente quando o
ser humano for livre para escolher, quando
deixar de ser alienado, e for tratado como fim
e não como meio, é que poderemos dizer que
estabelecemos uma nova ordem moral. Isto
quer dizer, “a substituição de critérios externos
por internos, pela escolha responsável, que é,
sem dúvida, o paradigma ético mais eficaz
para se assegurar a convivência pacífica entre
os indivíduos e reconhecer os
contrários” (PASSOS, 2011, pág. 29).
Podemos encontrar, mesmo diante de fortes
valores capitalistas, um pensamento voltado
para o lado espiritual, o surgimento de uma
maneira não mais mecânica de viver e de
“ter”, mas sim, um respeito e uma crença de
que é preciso “ser” feliz, ter relações sociais,
descansar após uma longa jornada de trabalho
e assim por diante. (PASSOS, 2011).
Para que uma moral agregue valores,
representativos de todos os seres humanos e
que respeite suas vidas em todas as esferas,
nós devemos operar em uma sociedade
conjunta, cooperativa e participativa em todos
os setores. (PASSOS, 2011).
3.1. Ética no Marketing
“Marketing e ética começam a caminhar juntas,
de forma identificável e como abordagem de
estudos a partir da Escola do Macromarketing,
quando se iniciaram as pesquisas dos impactos
das atividades de Marketing e das organizações
na sociedade e vice-versa” (NORMANHA
FILHO, 2004, pág. 8).
Assim, o Marketing influencia e é
influenciado pelo meio externo. Trabalha em
função deste e de suas mudanças, de forma
que as mudanças ocorridas durante, e no
tempo, afetam a maneira como são
desenvolvidos os estudos e as práticas
utilizadas pela área dentro das empresas, em
virtude da necessidade de atrair o público, os
clientes, as pessoas, e persuadi-las para que
adquiram seus produtos (NORMANHA
FILHO, 2004). Então, a ética, que está
presente dentro das empresas, tem obrigações
a cumprir perante a sociedade, não deve
somente contribuir para a satisfação das
necessidades, mas, fazê-la de forma ética.
Este fazer ético é influenciado pelo que é
considerado e validado como ético frente ao
tratamento das informações que são
externalizadas pelas empresas sobre seus
produtos e que atingem os consumidores
(NORMANHA FILHO, 2004).
Como foi exposto anteriormente, o
Marketing é uma atividade de negócios que
faz uso de muitas outras atividades, de ações,
que possibilitam a realização da aproximação
dos clientes com as empresas e,
principalmente, com seus produtos. Quando se
fala em ética no Marketing, o que nos surge
imediatamente, são as propagandas, os pontos
de venda, as promoções, a atividade da
logística da empresa, enfim, todas aquelas
partes do processo de realização do Marketing
que dizem respeito ao contato com o cliente.
Entretanto, pensar se o Marketing é uma
atividade que se preocupa com a ética ou não,
precisa ser atribuído não só as partes do
negócio (Marketing), mas ao todo que faz o
negócio existir. Logo, ética no Marketing
abarca, também, todas as atividades que
envolvem a área (NORMANHA FILHO,
2004).
Ora, se o Marketing é uma das muitas
atividades envolvidas no cenário empresarial
de todas as organizações, então ele está
diretamente ligado aos negócios das empresas.
A partir deste ponto podemos pressupor que a
ética parte de dentro para fora das
organizações, do tratamento, da cultura
organizacional, da missão, dos valores que
esta adota para si na constituição de seu
objetivo de existência no mercado
(NORMANHA FILHO, 2004).
ARRUDA (2002, pág.. 1-3) apud FILHO
(2004, p.11) tratando da conduta empresarial e
da ética diz que:
“[...] A instituição necessita definir como deseja
desenvolver-se, de tal forma que a postura ética,
a conduta moral, os seus valores e crenças
90
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
essenciais se tornem parte da cultura da
organização”.
Desta forma, é obrigação das empresas, na
sua constituição e formação, tomarem para si a
preocupação com o tratamento leal aos seus
clientes. Isso pode inicialmente, parecer uma
utopia frente ao atual cenário de
competitividade que se apresenta nos dias de
hoje, conforme acompanhamos em jornais e
revistas.
O consumidor adquire os produtos, num
pensamento simplista, para satisfazer suas
necessidades. O Marketing busca, na maioria
dos casos, tornar necessário o que é supérfluo
para vender suas ideias, seus produtos, gerar
lucro para as empresas. Porém, um dos
objetivos principais do Marketing é realizar
trocas, ou seja, a empresa abriria mão de seu
produto em troca de um valor monetário por
ele. Parece muito simples esta ideia. Mas, na
realidade, com o passar dos anos, a figura vem
mudando e a importância da ética pode ser
percebida junto com essas mudanças
(NORMANHA FILHO, 2004).
Com tantas empresas no mercado, aquela
que consegue se sobressair frente às demais,
consegue seu “lugar ao sol”, pelo menos,
durante algum tempo. Aí está o problema,
muitas vezes as empresas tomam partido de
ações que burlam algumas regras sobre
prestação de informações aos consumidores
ou, tentam mascarar o que o produto
realmente oferece para conseguir lucrar com
sua venda.
DURANDIN (1997, pág.13) diz que: “A
propaganda e a publicidade têm por objetivo
modificar a conduta das pessoas por meio da
persuasão, quer dizer, sem parecer obrigá-las”.
As empresas tentam persuadir os
consumidores de forma que não percebam que
estão sendo manipulados de alguma forma.
Assim, diretamente, elas não seriam as
responsáveis pela desinformação de seus
clientes na prática da disseminação de seus
produtos.
91
Na realidade, tratando-se da posse de
informações sobre determinado produto, o
consumidor é sempre aquele que desconhece
as reais qualidades de um produto que está
prestes a adquirir. Ele é, sendo isso usado de
má fé ou não, ingênuo frente aos donos do
poder, os que divulgam o produto. Esta
relação de poder entre consumidor e empresas
é marcada pela forte detenção daquele pelas
organizações. (DURANDIN, 1997).
Pesquisando sobre os direitos do
consumidor, chegamos ao conhecimento de
leis, que protegem os consumidores, quando
são vítimas da má fé no uso das informações
divulgadas na mídia.
4. O Código Brasileiro de Defesa do
Consumidor (CDC)
Criado para proteger os direitos dos
consumidores dentro do mercado de consumo,
nivelando suas relações com os fornecedores,
a leitura do CDC possibilitou a constatação e
destaque de alguns dos principais pontos e leis
que regem este Código, seguindo nossa linha
de análise.
Observamos que o CDC (cap. II, p.66 e 67,
2007), surgiu para regulamentar as ações entre
as partes envolvidas nos negócios, não para
causar desavenças ou discordâncias no cenário
comercial. Segundo algumas reflexões
anteriores que fizemos sobre o que tange a
vulnerabilidade do consumidor em relação aos
fornecedores de bens e serviços, esta deve ser,
segundo a citação das páginas acima,
reconhecida e devem-se utilizar ações
governamentais para a proteção do cliente,
além de estudos que permitam avaliar a
evolução do mercado consumidor.
Pensando na atuação, nas práticas dos
fornecedores relacionadas à promoção de seus
produtos, o CDC nos diz o seguinte:
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
DAS PRÁTICAS COMERCIAIS
Seção III – Da Publicidade
Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou
abusiva.
§ 1º É enganosa qualquer modalidade de
informação ou comunicação de caráter
publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou,
por qualquer outro modo, mesmo por ocasião,
capaz de induzir em erro o consumidor a respeito
da natureza, características, qualidade,
quantidade, propriedades, origem, preço e
quaisquer outros dados sobre produtos e
serviços.
§ 2º É abusiva, dentre outras, a publicidade
discriminatória de qualquer natureza, a que
incite à violência, explore o medo ou a
superstição, se aproveite da deficiência de
julgamento e experiência da criança, desrespeite
valores ambientais, ou que seja capaz de induzir
o consumidor a se comportar de forma
prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.
§3º Para os efeitos deste Código, a publicidade é
enganosa por omissão quando deixar de informar
sobre dado essencial do produto ou serviço.
(CÓDIGO BRASILEIRO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR, p.336, 2007)
Logo, o CDC proíbe a utilização de
publicidade enganosa ou abusiva perante os
consumidores. Embora muitas vezes possamos
nos deparar com algum tipo de irregularidade,
essas são passíveis de pena segundo o CDC
(2007, p.718 e 719). Nesse sentido, por que
será que ainda há casos em que são
constatadas essas irregularidades? De certo
ponto de vista, tratando-se da justiça
brasileira, podemos supor a facilidade que os
fornecedores podem ter em lidar com as leis.
Por outro lado, a falta de fiscalização, ou até
mesmo a passividade do consumidor, podem
acarretar estes vícios na área.
O CDC protege o consumidor das práticas
abusivas dos fornecedores nivelando as
relações fornecedor-consumidor, e pelas
nossas pesquisas, como já tínhamos
conhecimento prévio, podemos confirmar que,
como todas as outras áreas e profissões, o
Marketing possui códigos de ética profissional
a serem seguidos. O AMA (Associação
Americana de Marketing), abarca a ética que
deve ser seguida no contexto global pelos
profissionais da área, além de contar com
acadêmicos do tema. No Brasil, o CONAR
(Conselho Nacional de Auto-Regulamentação
Publicitária), une os anunciantes e os
profissionais de propaganda (O’BOYLE e
DAWSON JR., 1992 apud D’ANGELO, p.56,
2003).
Esses Códigos visam regulamentar,
direcionar as ações dos profissionais no
cenário em que atuam, levando em
consideração seu papel social, seu
comportamento e trazendo normatização às
suas atividades (D’ANGELO, 2003).
O conjunto formado pelo CDC e os
Códigos de Ética dos profissionais de
Marketing deveriam ser suficientes para que
as relações consumidor-fornecedor ocorressem
de forma harmoniosa. Entretanto, sempre
observamos novas maneiras encontradas pelas
empresas para “burlar” estas normatizações,
frequentemente, nos comerciais da mídia
televisiva.
5. Novas perspectivas sobre o
Marketing
O Marketing é uma das principais
ferramentas da Administração de Empresas, e
sua aplicação consiste basicamente, em
processos de troca, com o objetivo de gerar
lucro. Podemos perceber que hoje o
Marketing não se resume apenas a isto.
Percebemos uma mudança; o Marketing está
assumindo suas responsabilidades
econômicas, sociais e ambientais, isto é, está
reconhecendo a necessidade que as empresas
de hoje têm, em assumir suas
responsabilidades dentro da sociedade
(KOTLER, 2010).
Ao longo dos anos, o marketing evoluiu,
passando por três fases, às quais chamamos de
marketing 1.0, 2.0 e 3.0. Muitos profissionais de
marketing de hoje continuam praticando o
marketing 1.0, alguns praticam o marketing 2.0 e
outros ainda estão entrando na terceira fase, o
marketing 3.0. As maiores oportunidades se
abrirão aos profissionais que praticam o
marketing 3.0. (KOTLER, 2010, p.3) da
92
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
história do Marketing, podemos destacar
diferentes fases na sua evolução.
No início, tínhamos o Marketing centrado
no produto. Estes deveriam ser básicos e
padronizados, com o intuito de reduzir ao
máximo os custos de produção. Desse modo, o
preço seria mais baixo e um maior número de
pessoas poderiam adquirí-los. Não havia muita
opção à disposição dos consumidores, e com
produtos muito semelhantes, a melhor maneira
de ganhar clientes era o preço baixo
(KOTLER, 2010).
A segunda fase do Marketing é a fase atua
modificando o foco do produto para o
consumidor. O que o consumidor quer?
Atender os desejos e necessidades dos
consumidores se tornou a nova tarefa, e
considerando que o consumidor de hoje tem
acesso as mais diversas informações, e pode
comparar produtos com facilidade, não é uma
tarefa fácil (KOTLER, 2010).
Fidelizar consumidores exige muita
criatividade dos profissionais de Marketing,
que tentam, das mais variadas maneiras,
chegar à “mente” do consumidor, descobrir o
que ele quer, o que precisa, e assim satisfazêlo. (KOTLER, 2010)
A nova fase do Marketing, a qual KOTLER
chamou de Marketing 3.0, surge em
decorrência dos grandes avanços tecnológicos
recentes, que chamamos de “nova onda de
tecnologia”. Essa tecnologia permite que
indivíduos criem e consumam suas próprias
notícias. Dessa forma, os consumidores
tornam–se participativos, tendo poder de
exercer influência sobre outros consumidores
(KOTLER, 2010).
ela pode influenciar seus leitores a pensar da
mesma maneira. À medida que as mídias
sociais se tornarem mais expressivas - um
maior número de consumidores poderá
influenciar outros consumidores com suas
opiniões (KOTLER, 2010).
Em suma, a era do marketing 3.0 é aquela em
que as práticas de marketing são muito
influenciadas pelas mudanças no comportamento
e nas atitudes do consumidor. É a forma mais
sofisticada da era centrada no consumidor, em
que o consumidor demanda abordagens de
marketing mais colaborativas, culturais e
espirituais. (KOTLER, 2010, pág..22 )
O “Marketing 3.0” também é um
Marketing voltado para o consumidor. No
entanto, as empresas que o praticam, julgam
que elas têm mais a oferecer à sociedade do
que seus produtos e serviços. O objetivo é
oferecer soluções para os problemas. A
empresa enxerga e assume suas
responsabilidades sociais, econômicas e
ambientais, acredita que os consumidores são
seres humanos completos (KOTLER, 2010).
Em tempos difíceis, como a recente crise
econômica global, a sociedade enfrenta os
mais diversos tipos de problemas, e as
empresas não devem se preocupar apenas em
como a crise as afetou, mas devem se
preocupar em como a sociedade inteira foi
afetada, e oferecer soluções a esses problemas.
No “Marketing 3.0” as empresas se destacam
por seus valores, que se apresentam de
maneira diferenciada, comparados com os
anteriores (KOTLER, 2010).
6. Considerações Finais
Um bom exemplo dessa nova tecnologia
são as mídias sociais (Blogs, Facebook,
Twitter, etc.). A maioria dos Blogs, ou
comentários no Twitter é pessoal. As pessoas
compartilham suas ideias e opiniões umas com
as outras, sobre qualquer tipo de assunto.
Considerando-se a amplitude que nosso
problema de pesquisa poderia ter tomado e,
sabendo da complexidade envolvida neste
contexto, uma vez que envolve um dos
conceitos essenciais da sociedade em geral: a
ética, encontramos considerações plausíveis ao
nosso objetivo.
Se por acaso uma pessoa faz um
comentário ruim sobre um produto ou serviço,
É evidente que necessitamos dos serviços
das empresas e que precisamos estar cientes
93
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
dos produtos que elas podem nos oferecer e
que julgam resolver nossos problemas,
satisfazer nossas vontades. Porém, se antes as
empresas eram preocupadas em apenas vender
seus produtos, inculcando nos clientes, às
vezes, ideias inverídicas, hoje, por decorrência
das leis ou não, a prática está mudando o
cenário.
Constatamos uma evolução dentro do
Marketing que tem muito a oferecer para toda
a sociedade e, as empresas que estiverem
dispostas a adequar-se aos novos padrões de
exigência dos consumidores da “Era TIC”,
com certeza só terão a ganhar financeiramente
e serão registradas na área das mais confiáveis
e leais pelos seus clientes. O Marketing está
caminhando para uma nova perspectiva. As
pessoas não são mais vistas como clientes, a
empresa não busca apenas a satisfação
funcional do cliente. O cliente agora é visto
como um ser humano completo, e cabe à
empresa trazer satisfação emocional e
espiritual nos produtos e serviços que
oferecem.
Em um cenário onde a participação dos
clientes se tornou uma peça-chave, a empresa
se destaca por seus valores, e deve ter como
seu maior objetivo, estar preparada para
apresentar soluções para os problemas
enfrentados pela sociedade.
Encerrou-se a época em que apenas as
trocas de uns produtos por outros já era o
suficiente para satisfazer as expectativas das
pessoas, em geral. Agora, não basta oferecer
somente o que as pessoas precisam. Conhecer
os desejos os anseios, as reais necessidades de
cada cliente é a peça-chave para o sucesso de
qualquer negócio.
Os consumidores estão cada vez mais
perceptíveis às novas tendências, às ações
mercadológicas e às divulgações que as
empresas fazem na mídia. Ludibriar o cliente,
como algumas antes acreditavam ser possível
e julgavam ser fundamental para a promoção e
venda dos produtos, já não é mais possível. As
pessoas conhecem e buscam seus direitos,
sabem das possíveis penalidades para as ações
ilícitas das empresas. Elas têm poder para
alavancar ou destruir uma empresa na palma
de suas mãos, em suas próprias casas: as
mídias sociais!
Então, como tudo na vida é fluido, com o
Marketing com certeza não poderia ser de
outra maneira. O fato é que as coisas poderiam
evoluir de duas maneiras: positivamente ou
negativamente, dependendo do contexto e das
reais necessidades. Felizmente, o Marketing
vem demonstrando uma evolução positiva e
inovadora. Ter a capacidade de perceber as
constantes mudanças no macroambiente e
adaptar-se a elas é uma exigência para as
empresas que desejam perenidade em seus
negócios e sucesso em curto e longo prazo.
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Augusto Guzzo Revista Acadêmica
123
Mônica Maria M. de Souza 1
Ricardo Camargo de Araújo 2
Ruy Guérios 3
Qualidade: ferramenta representativa e diferencial
competitivo na prestação de serviços
Resumo
A terceirização é uma das características
da pós-modernidade acompanhada de
mudanças administrativas que revolucionam
a administração e a qualidade do trabalho das
pessoas que antes tinham a segurança de
empregos estáveis nas grandes empresas - as
que mais atividades terceirizam. O sistema
estabeleceu uma sociedade de risco que
distribui malefícios a toda a sociedade e
benefícios a poucos. O fato foi observado no
setor de alimentação industrial em quatro
unidades de uma empresa mineradora por
meio de entrevistas à funcionários, gestores e
prestadores de serviços que tiveram seus
salários continuamente diminuídos nas
sucessivas mudanças de contrato, após o
início da terceirização. Para a economia nas
últimas décadas o setor de serviços tem
destacado como fator significativo de
mudanças e geração de renda, mas na opinião
dos funcionários entrevistados essas
mudanças geraram continuamente menores
salários, conformismo, e submissão para
viabilizar a possibilidade do emprego de
subexistencia, sem perder a qualidade.
Abstract
The study addressed items related to the
quality standard desired and expressed at the
time of outsourcing, the focus direction of the
contractor, its priority between quality, cost
reduction, management control and other
factors when economic imperatives. Data
analysis in this study showed that the
outsourcing of food service units surveyed,
the excellent quality resulted in the average
satisfaction, showing an accommodation not
1
Monica Maria M. de Souza - Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP. (2005), Mestre em Administração
de empresas pelo Mackenzie/SP. (1999). Especialista em Administração. de RH pela UNA. União de Negócios Adm. de
BH, MG. (1995), e especialista em Tecnologia Educacional pela UNINOVE SP. (2000), é Psicóloga graduada Newton
Paiva de BH/ MG. (1991). Atualmente é Profa convidada pela Pós-graduação do Mackenzie. Desde 2006 é avaliadora
INEP. Profa. Dra, Pesquisadora da Faculdade ENIAC, coordena grupos de pesquisa e iniciação científica, organizadora
dos Seminários Anuais desde 2009 e da Revista Acadêmica ENIAC PESQUISA. É Profa. Dra. Pesquisadora,
coordenadora de Cursos e da Revista Acadêmica Augusto Guzzo das Faculdades Integradas Campos Salles - FICS
desde agosto de 2010. Consultora da Euroatlantica Ghesa Brasil Ltda.
2
Ricardo Camargo de Araújo - Mestre em Adm. Desde 2009 é Prof. Pesquisador da Faculdade ENIAC, onde coordena
o Curso de Finanças e a Revista Acadêmica ENIAC PESQUISA. Orientador do Grupo de Pesquisa e Iniciação
Científica, Orienta Monografias, TCC. Co- Organizador dos Seminários Anuais ENIAC desde 2009.
3
Ruy Guérios - Mestre em Engenharia da Produção pela Universidade Paulista. Graduado em Tecnologia de
Administração de Pequenas e Médias Empresas pela Universidade Norte do Paraná (2008). É mantenedor do Colégio
Eniac (Educação Básica) e diretor geral da Faculdade Eniac. Inovou com a utilização de crachas eletrônicos para acesso
e controle de frequencia em escolas em 1988 e com a utilização da biometria em IES (2007). Participa da AEG Associação das Escolas de Guarulhos, onde ocupou a vice-presidência, é diretor da ANET - Associação Nacional de
Educação Tecnológica e foi eleito delegado paulista representando São Paulo na Primeira Conferência Nacional da
Educação Profissional e Tecnológica em 2006/2007, idealizou e aplicou o sistema de gestão da qualidade aplicado na
gestão escolar .E-mail: [email protected]
96
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
to mention conformity in relation to the
service. To verify the quality of outsourced
services, we must consider the factors that
interfere with achieving this objective as the
way that quality is perceived by those who
hire the services, as the contractual process
and the reason it takes a company to hire a
third party. To evaluate the difference in
quality presented in outsourcing services, it
has been conducting a research on a large
mining company in the food industry by
comparing the services previously performed
by the company with direct administration,
with the outsourced services later. The
research question intended to check: How
was the satisfaction of employees before the
implementation process and how it was after
the outsourcing.
Palavras-chave: Qualidade, mudança social
e econômica, terceirização.
Keywords: Quality, social economic change,
outsourcing.
Introdução
O estudo analisou a qualidade nos serviços
terceirizados (especificamente o segmento da
alimentação industrial), como uma nova
forma de relação econômica e de contrato
social entre parceiros econômicos, a
contratante e a contratada. Procurou-se
identificar as características, a natureza, os
pressupostos e a lógica do novo contrato
social da terceirização, bem como a sua
forma gerencial.
Esta proposta remete à análise do contexto
socioeconômico atual, entendida de acordo
com Giddens (2011, p. 13), como um
processo de complexos. Esses processos
integram e atuam de maneira contraditória,
produzindo conflitos, disjunções e novas
formas de estratificação, resultando na
emergência de uma ordem social pós97
tradicional. Ao entender essa ordem social
pós-tradicional como uma mudança de status
da tradição, o autor pressupõe uma
reformulação e um repensar das tradições
através do processo de modernização. Neste
contexto de modernização está inserida a
terceirização.
Atualmente tem se questionado a
qualidade na prestação de serviços
terceirizados e sua importância nas empresas
brasileiras, considerando a sua relevância na
geração de renda, de empregos e aumento da
riqueza social. A terceirização da prestação
de serviços, embora seja tendência antiga, faz
parte de um movimento de mudança mundial
e em franco crescimento no Brasil. No estudo
foram abordados itens referentes ao padrão
de qualidade desejado e o expresso no
momento da contratação de terceiros, à
direção do foco da contratante, sua prioridade
entre qualidade, redução de custos, controle
administrativo e outros fatores imperativos
no momento econômico.
A análise dos dados neste estudo
demonstrou que, com a terceirização do
serviço de alimentação nas unidades
pesquisadas, a excelência da qualidade deu
lugar à satisfação média, demonstrando uma
acomodação para não dizer um conformismo
com relação ao serviço prestado.
Para se verificar a qualidade nos serviços
terceirizados, foram considerados os fatores
que interferem no alcance deste objetivo
como: a forma como essa qualidade é
percebida por quem contrata os serviços,
como acontece o processo contratual e a
razão que leva uma empresa a contratar
terceiros. Para se avaliar o diferencial de
qualidade apresentada nos serviços
terceirizados, foi realizada uma pesquisa em
uma grande empresa mineradora na área de
alimentação industrial comparando os
serviços anteriormente executados pela
própria empresa com administração direta,
com os serviços posteriormente terceirizados.
A questão de pesquisa pretendia verificar:
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Como estava a satisfação dos funcionários
antes da implantação do processo e como
ficou após a terceirização.
Giddens e Beck (2011:12) reafirmam a
necessidade de repensar, ou seja, de
reinventar a nossa civilização industrial
"agora que o velho sistema da sociedade
industrializada está se desmoronando no
decorrer do seu próprio sucesso e levanta a
questão do surgimento de novos contratos
sociais". Isto significa dizer que o sistema da
sociedade industrializada está sendo
questionado e repensado pela própria
sociedade, dando lugar a um novo sistema, o
da sociedade de risco.
Esta modernização "traz implicações
profundas uma vez que, modificadora da
estrutura, ela implica em insegurança de toda
a sociedade" Beck (2004:26). Esta
insegurança como acentua o autor, é de difícil
delimitação e, portanto, incontrolável. É
importante entender essas questões dentro de
um processo de mudanças econômicas, em
que as incertezas e os riscos são
maximizados, tornando o controle mais
complexo e, muitas vezes, inviável, porque as
implicações da modernidade reflexiva
apontam na sua ação modificadora da
estrutura implicando em insegurança de toda
a sociedade. Essa insegurança tem suas raízes
na dinamização do desenvolvimento ao
mesmo tempo em que intensifica o
dinamismo do conflito da sociedade de risco.
Antes a sociedade industrial distribuía bens,
na sociedade de risco distribui malefícios,
Beck (2011:26-32).
Esses riscos e conflitos estão presentes na
relação entre contratante e contratada, em
contínua dinâmica e a lógica dessa
redistribuição de "malefícios" está inserida
nesse contexto de transformação. Os riscos
da parceria econômica, ou seja, os riscos da
terceirização são distribuídos
inevitavelmente, por mais controlado e
legitimado que seja o processo, suas
estratégias ou mecanismos.
Nas últimas décadas, o setor de serviços
representa quase dois terços do emprego
urbano metropolitano, isso representa mais da
metade do PIB (Produto Interno Bruto) na
economia brasileira. Essa trajetória
assemelha-se à evolução econômica dos
países desenvolvidos (IPEA-1995:2). A
expansão das atividades de serviços constitui
uma das mais significativas mudanças
inseridas no cotidiano humano no século XX.
Nos últimos três séculos de desenvolvimento
econômico houve mudanças gradativas, mas
deu-se pouca atenção a elas.
Há que se considerar que no início da
revolução industrial a importância do setor
era infinitamente menor que a atual, embora
tenha sido fundamental o marco para o
desenvolvimento do mundo moderno. O
papel que os serviços representam na
economia merece atenção criteriosa, pois é
responsável pela geração de renda e de
emprego em todos os segmentos, provocando
consequentemente o aumento da riqueza
social.
A terceirização é uma tendência que traz
uma forma de parceria idealmente associada
à produtividade e à qualidade, devendo gerar
daí melhor resultado com liberdade de
pensamento, dentro de uma relação de
confiança com maior produção e menor
custo. A realidade mostra que ela também
pode ter outro lado, a anti-parceria com
interesse apenas econômico em curto prazo.
Muitos são os conceitos sobre
terceirização. Para Paulo Otto Romanoshi
(1994:41) “é, uma forma de se conduzir cada
vez mais a empresa nacional para o caminho
da especialização, agiliza/ção enfatizando
como princípio maior, o enfoque em sua
atividade principal”.
Não adianta terceirizar sem uma visão
estratégica das ações a serem desenvolvidas.
A terceirização consiste em uma ferramenta
do planejamento estratégico e, como tal,
integra o todo dos processos de uma
organização. Sem essa vinculação, a
98
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
terceirização poderá criar problemas, gerar
áreas de atrito, alimentar desvios e falhas.
Embora não haja mistério no seu conceito, a
realidade é que muitos se embaraçam ao
colocá-la em prática, principalmente no que
se refere às intrincadas questões trabalhistas,
Souto, (1997:22).
Para Queiroz (1992:16), dentro de uma
abordagem estratégica, a terceirização passa a
ser uma opção da empresa que, adotando essa
ferramenta, pratica uma nova filosofia
pautada nos argumentos anteriores e vista da
seguinte forma: revisão de missão, objetivos
e valores permanentes dentro de um plano
estratégico que contemple esse processo. Para
isso é necessário contar com todo o corpo
funcional e da alta administração engajado na
mudança da empresa que se reestrutura
internamente, redistribuindo as atividades e
funções, passando da execução para a
coordenação.
Os recursos financeiros serão revistos,
pois, com a terceirização o processo de
planejamento orçamentário (despesas e
receitas) alocará condições mais objetivas em
relação aos resultados esperados pela
empresa. Quanto aos recursos físicos
(imóveis, máquinas, equipamentos, e
materiais diversos) deverão merecer uma
ampla reavaliação para otimização de seu
uso.
Na prestação de serviços terceirizados, em
busca de qualidade, a empresa seleciona
todas as atividades que não fazem parte do
seu produto principal e entrega-as a outra
empresa especializada nessas atividades,
esperando que a empresa contratada tenha
capacidade de executar esses serviços com
qualidade igual ou superior ao que era
executado anteriormente pela própria
contratante. Dentro desse tipo de prestação de
serviços empregam-se pessoas muito
qualificadas como na engenharia eletrônica,
microinformática, e também mão de obra
sem qualificação, como é comum acontecer
nos serviços operacionais.
99
Na prestação de serviços operacionais é
comum encontrar-se pessoas com pouca ou
nenhuma escolaridade e muitas vezes sem
estabilidade, que cada dia está em uma
empresa diferente, exercendo uma função
diferente, porque migram de empresa com
frequência em consequência de término de
contrato, ou perda de concorrência que pode
acontecer em função de preço, política,
inadequação ou incompetência negocial ou
técnica. Considerando todos os pressupostos
básicos da terceirização e a emergente
sociedade em mutação, é que a mineradora
iniciou seu processo de sobrevivência no
novo e exigente mercado que despontava na
década de noventa.
Base conceitual
O conceito de terceirização embora sendo
antigo, consolidou-se durante a segunda
guerra mundial, atendendo a necessidade de
aumentar a produção de insumos bélicos nas
grandes indústrias. Foi buscando parceria
com indústrias menores e transferindo-lhes
parte das atividades que antes executavam é
que esta estratégia se consagrou.
Após a guerra, esta prática administrativa
difundiu-se nas indústrias automobilísticas
que passaram a funcionar como montadoras,
tamanha a expansão da terceirização de
peças. As montadoras logo após a guerra se
instalaram no Brasil e com elas o processo de
terceirização que revolucionou os sindicatos,
as normas e leis trabalhistas. Estas, diante de
um fator inquestionável, a evolução social e a
nova sociedade em transformação,
desenvolveu formas de adaptar-se e
acomodar os conflitos. Surgiram novos tipos
de contratos de trabalho, diversificaram-se os
tipos de sindicatos para atender as diferentes
categorias profissionais que despontavam
nesta sociedade emergencial, mutante e
competitiva, que distribui também riscos,
insegurança e malefícios segundo Beck
(2011:26-32).
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Essa nova ordem social exigia estratégias
até então desconhecidas ou irrelevantes no
antigo sistema. Surgiram então as teorias
sobre qualidade, excelência em serviços,
qualificação de mão de obra, fatores de
competitividade administrativa para enfrentar
o desafio.
Terceirização: Uma estratégia
competitiva
Fornecer serviços de elevada qualidade
com frequência não é fácil, mas é
compensador, não apenas financeiramente
como espiritualmente porque a excelência
alimenta a alma. Na opinião de Leonardo
Berry (1996:10), o serviço apenas bom, não é
bastante para garantir a diferenciação dos
concorrentes. Para alcançar a excelência é
preciso desenvolver relacionamentos
consistentes, tanto com os clientes para
competir em valor e não em preço, como para
motivar funcionários a se aprimorarem no
trabalho e em suas próprias vidas. Isso vai
garantir o fornecimento de um consistente
dividendo financeiro. Muitas empresas
precisam se converter para a religião da
qualidade em serviços, integrando-se a uma
melhoria holística interminável. As sementes
da excelência devem ser plantadas no
comprometimento coletivo à obtenção de
melhorias diárias. Para se implementar a
estratégia da excelência em serviços é
necessário fazer de cada pessoa uma força
competitiva, um talento.
Quando tanto os funcionários como o
dono, desenvolvem amor pelo negócio que
desempenham, fazem florescer o entusiasmo
e a excitação natural, que contribuem para a
energia emocional do prazer de servir clientes
internos e externos com envolvimento
intenso e diferenciado. O funcionário precisa
saber ajudar a melhorar a vida do cliente, a
aparência do cliente, não apenas servi-lo, mas
contagiá-lo. O cliente é a razão de viver de
qualquer negócio e precisa ser satisfeito,
precisa ser recebido como amigo, com ética,
confiança e deve ser envolvido na filosofia,
missão e objetivos da organização.
O compartilhamento de informações gera
confiabilidade e permite que o funcionário
demonstre a sua habilidade interpessoal e
conceitual com segurança e prazer, motivado
pela autonomia. Ouvir sistematicamente o
cliente direciona o funcionário para a
correção dos pontos fracos da organização,
proporcionando a correção dos erros e
a u m e n t a n d o o d e s e m p e n h o ( B e r r y,
1996:18-26).
O que é terceirização
"Terceirização é uma estratégia que se
reforça na modernidade e na
competitividade" (Luiz Coimbra, diretor
Industrial da Riocel S/A, Souto, 1997:45).
Uma prática antiga acompanhada de uma
expressão nova. A palavra era tão novidade
quanto à intensidade da aplicação do
fenômeno pós-moderno, que se refere à
voracidade imposta com a qual a sociedade é
obrigada a deglutir símbolos e conceitos que
mal nos chegam e já se transformam. Novas
práticas que impressionam pela intensidade e
novidade sem precedentes, que passam a
fazer parte da realidade (SOUTO 1997:129).
Terceirizar é uma atitude antiga, outsourcing,
ela remonta às primeiras atividades do homo
sedere, praticada pelos senhores feudais, mas
a sua prática massificada na década de 80 e
90 foi considerada ousadia diante do que
parecia novo e dos riscos de se procurar
soluções inovadoras fazendo frente à
legislação trabalhista da época. Significava
um enfrentamento dos medos que vinham
junto com uma pseudo novidade. O risco de
uma escolha consciente que levaria a empresa
a aumentar seus resultados positivos.
No entanto a ousadia pode conviver com
atitudes coerentes e programadas, à medida
que métodos ou procedimentos empíricos
sejam substituídos por outros, ditados pela
100
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
razão e pelo conhecimento. Minimizar perdas
e otimizar ganhos sempre foi o binômio do
empresário em todas as épocas e em todos os
lugares. No momento em que a antiga
administração, por surtos ou por ímpetos
transitórios, cede lugar ao planejamento e à
racionalização, chega-se ao desafio de hoje gerir para alcançar melhor produtividade e
melhor qualidade. Esta meta que integra o
conceito de modernidade passa,
forçosamente, pelo aperfeiçoamento e pela
racionalização do uso da mão de obra. Temse, pois, o momento ótimo para refletir e
planejar a transparência da negociação com
tarefas e serviços costumeiramente realizados
pela própria empresa.
A terceirização segundo Amando José
Farah Professor da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, (Souto, 1997:11) é uma
tendência universal. É um novo conceito para
uma prática moderna de administrar. Estando
à porta do novo milênio, o país encontra-se
diante de um novo e derradeiro desafio - ou
se lança em busca da modernidade - e a ideia
supõe basicamente condições dignas de vida
para todos os brasileiros, ou mantém uma
postura inerte, continuando como espectador
atônito do avanço do primeiro.
As empresas nacionais sensíveis à nova
postura vêm desempenhando um papel
fundamental nessa mudança. As provas mais
evidentes estão na busca por tecnologia e uso
da informática, visando à melhor qualidade e
garantia de mercado. No setor operacional da
indústria os avanços costumam ser mais
significativos que na administração. Grandes
indústrias já descobriram as vantagens de
adotar a contratação de terceiros. Para eles
não há mágica na terceirização, seu princípio
é simples e tudo que não constitui atividade
essencial de um negocio pode ser confiado a
terceiros.O enxugamento da mão de obra não
significa desemprego, o procedimento
simplifica a administração, economiza
recursos viabiliza investimento na
especialização, provocando aumento da
101
produtividade e qualidade superior do
produto quando se trabalha com especialistas
(Souto, 1997:32)
Terceirização: evolução e prática
administrativa
Segundo Souto Leiria (1997:23), no
período pós-segunda guerra mundial havia
uma necessidade de reestruturação total das
empresas e o mercado se mostrava ávido por
inovações. A economia mundial desfrutava de
um crescimento sem precedentes. A demanda
por novos produtos e nova tecnologia parecia
inesgotável. Junto a isto, dispunha-se de
recursos abundantes, tanto de insumos como
mão de obra, com o mercado em rápida
expansão, baixo custo de produção e
consumidores pouco preocupados com a
qualidade. A administração, nesse contexto,
estava apoiada em dois pilares: produzir e
vender. A crise do petróleo, na década de
setenta mudou radicalmente a economia
mundial. Não apenas a energia, como as
matérias-primas e também a mão de obra
tiveram seus custos aumentados. Junto com
isto o crescimento do número de empresas
pelo mundo todo criou uma concorrência
acirrada. Os meios de comunicação
evoluíram rapidamente, mudando o
comportamento do consumidor que começou
a receber informações e questionar cada
produto antes de adquiri-lo, buscar melhor
qualidade e menor preço, tomando estes
critérios como pré-requisitos.
As empresas dentro desta realidade
começaram a questionar suas formas de
administrar, buscando fórmulas e sistemas, o
que gerou diversas teorias com o propósito da
excelência organizacional. Temas como
automação industrial, qualidade,
produtividade, uso de informática e a
administração de recursos humanos passa a
fazer parte da pauta diária nas organizações.
Especialmente no Brasil com inúmeras crises
econômicas, as empresas passam a repensar a
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
sua realidade, diante de um mercado com
oportunidades escassas e ainda mais
competitivo. A revisão dos custos (fixos e
variáveis) veio como consequência,
buscando-se os meios de subtrair tudo que
fosse passível de ser cortado.
É inegável que o conceito e a prática da
terceirização estão vinculados à redução de
custos, mas não somente a isto. A
terceirização objetiva o aumento da
competitividade, servindo-se de melhores
tecnologias, buscando o desperdício zero e a
redução de custos. De forma errônea,
entretanto, alguns administradores
pretendem, com o sucesso, exclusivamente o
ganho imediato com a redução de custos,
diminuindo o quadro de pessoal e escolhendo
fornecedores que praticam o menor preço. Ao
longo dos anos, muitos estudiosos se
dedicaram à análise do comportamento
humano, mudando o enfoque de Taylor para
o de Elton Mayo. Quanto mais se avança no
campo das teorias mais se verifica que o
diferencial da empresa está no fator humano,
no comportamento de sua equipe de trabalho.
De nada adianta o avanço tecnológico e as
instalações físicas de primeira linha se não
existirem pessoas qualificadas e engajadas
nos objetivos da empresa.A administração
sem dúvida é um desafio, mexer com pessoas
é coisa séria e exige ações estratégicas.
A prática da terceirização no Brasil vem
acompanhada de muita polêmica e foi
enfocada durante o período de 1988 a 1992,
por sindicatos, empresários, juristas e
formadores de opinião em geral, como se
fosse algo concreto e não mais uma forma de
manejar valores.
A terceirização pode ser conduzida de
diversas maneiras e com diferentes objetivos;
o seu sucesso, entretanto, dependerá sempre
do correto encaminhamento do contrato entre
as partes, onde os aspectos jurídicotrabalhistas e a idoneidade da contratada
devem minimizar perdas e otimizar lucros,
este sempre foi o binômio de todo
empresário.
Anteriormente, a justiça do trabalho
considerava a empresa tomadora de serviços,
a fiadora "a priori", responsável pelos
encargos trabalhistas. Entretanto, com a
evolução dos tempos foram-se constituindo
jurisprudências a respeito de que o tomador
somente será responsável nos itens
trabalhistas não atendidos pela contratada
quando o trabalhador tiver sido prejudicado.
Então, não existindo a lesão econômica ao
trabalhador, a justiça do trabalho não
responsabiliza o contratante. Na justiça do
trabalho, existem muitos casos de reclamação
de ambas as partes (empregador e
empregado), que geraram jurisprudência a
respeito, ainda não transformadas em leis.
Com a revisão do enunciado 256, gerando o
enunciado 331, em 17/12/1993, o Tribunal
Superior do Trabalho (TST) esclarece mais
adequadamente o posicionamento das
empresas tomadoras de serviços, reduzindo o
aspecto interpretativo da legalidade da
terceirização, quando ali conceitua no item
III, as condições essenciais para a contratação
de fornecedores de serviços.
A Legislação Trabalhista aponta restrições
a esse tipo de prestação de serviços, pois
entende que o trabalhador pode ser lesado em
relação a benefícios e outras vantagens que o
vínculo empregatício com a empresa
tomadora lhe garantiria. Jurisprudência
recente gerou uma evolução importante, o
autor Queiroz (1992:12-32), retrata um
parágrafo importante de sua interpretação
sobre o parecer do Tribunal Superior do
Trabalho quanto ao Enunciado 331-IV. “O
inadimplemento das obrigações trabalhistas,
por parte do empregador, implica na
responsabilidade subsidiária do tomador de
serviços, quanto àquelas obrigações, desde
que este tenha participado da relação
processual e conste também do título do
executivo judicial.”
102
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Entende ainda a justiça que as empresas
prestadoras de serviço desenvolvem suas
atividades de maneira perfeitamente lícita,
administrando seus subordinados de maneira
correta, assumindo os riscos do negócio, que
são organizadas, especializadas e têm plenas
condições legais de exercerem essas
atividades.
estudo de caso tem como essência a tentativa
de tornar clara uma decisão ou conjunto de
decisões; por que foram tomadas; como
foram implementadas; e quais foram as suas
consequências. Inclui como foco, a estrutura
organizacional, os processos, programas,
contexto, instituições e suas normas, valores,
regras, procedimentos e acontecimentos.
Não existe lei que proíba o processo de
terceirização, desde que a empresa de
serviços forneça esses serviços como seu
produto final. Para isso, utilizarão de mão de
obra, equipamentos e materiais de sua
administração e propriedade. O prestador de
serviços executa suas tarefas, as quais são
pré-determinadas e de acordo com a sua
especialização.
O autor afirma que o estudo de caso é uma
investigação empírica que investiga a
contemporaneidade dos fenômenos dentro de
um contexto de vida real, quando as
fronteiras entre o contexto e o fenômeno não
são evidências claras e onde múltiplas fontes
de evidências foram usadas. Esta é a razão
pela qual se se optou pelo estudo de caso para
a pesquisa da qualidade da alimentação
industrial nos serviços terceirizados da
mineradora, Foram necessários estudos
exploratórios, para se trabalhar com os
diversos aspectos que compõem os processos
de mudança ou de concepção organizacional.
Metodologia
Nesta pesquisa, optou-se como estratégia
de pesquisa pelo estudo de caso de natureza
exploratória, usando-se o método qualitativo
com questões abertas e fechadas. O estudo de
caso focalizou a terceirização da alimentação
industrial em três unidades de uma
mineradora. A estratégia do estudo de caso
foi escolhida considerando que não foram
encontrados trabalhos semelhantes
anteriormente desenvolvidos acerca da
temática eleita, e pela necessidade de
compreender um fenômeno social complexo
de mudança organizacional dentro de um
contexto real. A empresa foi escolhida por
apresentar um universo de pesquisa com
características e foco definidos no assunto em
pauta e já apresentando resultados do
processo experimentado nas unidades durante
dez anos.
O método do estudo de caso, segundo Yin
(1989:17), surge com a necessidade de
compreender não apenas os fenômenos
sociais complexos, mas, também, a
administração dos processos organizacionais
de mudança das relações e dos processos de
amadurecimento da empresa. Para ele, o
103
Quando se definiu o problema a ser
estudado, ou seja, a qualidade na alimentação
industrial nos serviços terceirizados, tinha-se
presente os diversos elementos que
interagiam entre si e que deveriam ser
identificados e compreendidos. Foram
utilizados, como procedimentos e técnicas de
coleta de dados: entrevistas, questionários,
observação participante, relatórios e
documentos formais da organização.
As entrevistas foram feitas por meio de
perguntas abertas e direcionadas, com trinta
pessoas, representantes da empresa
contratante, funcionários operacionais da
empresa contratada, e os comensais das
diversas empresas prestadoras de serviço.
A partir dessas entrevistas foi elaborado
um checklist endereçado aos funcionários da
contratante, da contratada, aos comensais e
aos operacionais da prestadora de serviços.
As entrevistas e o preenchimento de
questionários foram realizados no local de
trabalho, ocasião em que foi possível o
contato direto com as pessoas que
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
constituíram o universo desse estudo e assim
observar in loco o processo em ação. A
possibilidade de observação direta funcionou
como um dos instrumentos utilizados para
identificar e compreender a interação dos
diferentes elementos.
O início da terceirização e os
primeiros resultados
A finalidade inicial de terceirizar, não era
naquele momento a melhoria da qualidade e
sim diminuir os problemas diretos com o
sindicato da empresa, sindicato dos
metalúrgicos, e em seguida a redução dos
custos do zinco se tornou uma questão de
sobrevivência, face à concorrência
internacional. No início a empresa ao
terceirizar exigia que a empresa contratada
admitisse o funcionário dispensado com um
salário equivalente ao que ganhava
anteriormente, o que naquele momento
gerava aumento e não redução dos custos.
Em caráter experimental foram terceirizados
em uma das unidades os serviços de portaria,
vigilância, limpeza e alimentação (restaurante
industrial), a manutenção mecânica,
borracharia, usinagem, transportes internos e
externos. Foram terceirizados em outra
unidade, além da portaria, vigilância, limpeza
e alimentação, a lavra a céu aberto, a
manutenção mecânica, a construção civil,
extração e transporte de minério e o serviço
de enfermagem.
Além destes, a terceira unidade
terceirizou também a extração subterrânea, a
manutenção elétrica e mecânica. Hoje além
de a empresa alcançar a redução dos custos e
diminuir significativamente o mal estar com
os sindicatos observam também a melhoria
na qualidade dos serviços e produtos, pois os
lingotes de zinco apresentam elevada pureza
especial de 99,995% registrado na London
Metal Exchange - LME.
No início, quando a empresa demitia em
função da sua automação, além de ajudar os
ex-funcionários a montarem as suas empresas
para terceirizar o serviço disponibilizado,
também exigia que empresas vindas de fora,
já estruturadas, contratassem o contingente
que havia sido demitido.
Os primeiros resultados não foram muito
lucrativos em função da inexperiência
negocial. A qualidade oscilou, em função da
própria situação experimental. Por estarem as
relações entre contratada e contratante, pouco
definidas, ocorriam muitas interferências da
contratante na administração da prestadora de
serviços, prática não mais verificada.
Nos últimos quatro anos a empresa vem
aumentando suas exigências com os
prestadores de serviços, cobrando
concorrência mais apuradas, tanto visando
menor preço, quanto melhor qualidade, com
treinamento de equipes especializadas em
serviços específicos. Os diretores consideram
ter adquirido experiência nas negociações
com terceiros. As experimentações iniciais
aconteceram em caráter de ensaio e erro e
afirmam ter dado certo, mas hoje os
procedimentos são feitos com muito critério.
Nas licitações, a empresa envia cartas
convite, para empresas de grande porte que
lhes interessa, aceita a participação de
empresas de pequeno porte, como as
empresas dos ex-funcionários formadas no
início do processo. Mas o resultado é
independe de qualquer fator. Fica com o
serviço quem apresentar todos os prérequisitos legais exigidos pela empresa no
momento em que formula as exigências para
a licitação, além do menor preço viável para
execução dos serviços.
Considerações finais
O sucesso da qualidade na terceirização,
segundo Alvarez (1996, pag. 33) pode ocorrer
se a contratante considerar a fragilidade dos
pequenos negócios e os riscos decorrentes
dos investimentos destes para sobreviver.
Como qualidade e parceria fundem-se num
104
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
único conceito a conscientização e apoio dos
funcionários e patrões é imprescindível para
o empreendimento. Assim é possível
minimizar a distribuição dos malefícios
gerados pela sociedade de risco otimizar
soluções.
Sob vários ângulos, a mineradora foi
analisada em sua qualidade nos serviços de
alimentação industrial terceirizados.
Explorou-se a visão dos funcionários da
contratante; dos funcionários da contratada,
dos responsáveis pela produção da
alimentação e dos comensais - funcionários
das várias empresas prestadoras de serviços
para a mineradora. Eles pertencem a diversas
categorias e hierarquias profissionais; tanto
os operacionais que trabalham nas
contratadas, quanto os funcionários que
trabalham na produção do alimento.
Dos funcionários que colaboraram na
pesquisa, 90,0% estão na empresa há mais de
dez anos. Eles tanto acompanharam como
participaram das decisões envolvendo os
processos da terceirização. Possuem
conhecimento, da filosofia, políticas, clima
da organização e também os resultados dos
processos aplicados, seus pontos fortes e
fracos, funcionamento da equipe e
necessidade de adaptação a cada mudança de
contrato.
Na visão deles, ficou claro que a empresa
terceirizou a alimentação não com foco na
qualidade e sim, considerando um escopo de
redirecionamento organizacional com o
objetivo de dedicar mais atenção à atividade
fim, (que é produzir zinco com qualidade e
pureza, a preço competitivo mundialmente
em função da globalização) e facilitar o
controle administrativo, além da redução de
custos.
A qualidade que se obtém nos serviços
contratados é uma consequência da forma
como escolhem os fornecedores de serviços.
Para alcançar qualidade destacam como
fatores significativos na hora de fechar um
contrato; a qualidade e idoneidade,
105
confiabilidade e credibilidade das empresas
prestadoras de serviços – elas representam
um dos riscos potenciais. A qualidade na
alimentação na opinião dos funcionários é
decorrente de um prestador de serviços
idôneo, ligado a fornecedores confiáveis,
trabalhando com insumos de boa qualidade,
com equipe e ambiente rigorosamente limpos
e higienizados, fornecendo alimentos bem
apresentados e saborosos, oferecendo dietas
equilibradas, e atendendo com atenção e
agilidade.
Eles sabem que esse padrão de qualidade é
exigido da empresa contratada no momento
em que selam uma negociação, tanto verbal
quanto formal.
Foi considerado fator gerador de
dificuldades para se alcançar qualidade, todos
os problemas referentes às equipes de
trabalho, desde falta de recursos para investir
em desenvolvimento e treinamento,
qualificação e alfabetização, até ausência de
incentivos, benefícios e supervisão para a
equipe. Foi considerada também como
dificultador, a visão de curto prazo da
contratante. Este pode ser, portanto, o fator
gerador das outras dificuldades, uma vez que
a própria contratante com uma visão de curto
prazo envolve-se em novas licitações
obrigatoriamente a cada ano, desestimulando
a contratada a investir em equipe, já que
corre o risco de perder o investimento ao
término de 12 (doze) meses.
Na analise da pesquisa, um fato que
chamou a atenção, foi a queda na preferência
pelo item muito satisfatório, com relação aos
serviços de alimentação após a terceirização,
para os funcionários. Considerando a
qualidade como excelência em serviços,
então para os funcionários, terceirizar
representa uma perda de qualidade, pois a
satisfação máxima caiu 13,7% do período
entre o antes e o pós-terceirização.
Outro aspecto explorado nesta pesquisa foi
a visão dos funcionários da contratada. Os
funcionários da contratada que responderam
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
aos questionários trabalham na empresa entre
dois e cinco anos e deixaram claro que têm
conhecimento do padrão de qualidade
exigido pela contratante, e assumem que
recebem essas informações tanto por escrito
quanto verbal.
Para eles qualidade em alimentação,
envolve insumos de qualidade provenientes
de fornecedores confiáveis para confeccionar
um cardápio variado com alimentos
saborosos, servidos em ambiente higienizado
com música ambiente.
Consideram que a negociação dos
contratos de alimentação, enfatizam fatores
referentes à qualidade, credibilidade,
eficiência e idoneidade da empresa
contratada. Destacaram como as maiores
dificuldades para se prestar serviços de
alimentação com a qualidade desejada pela
empresa, à adaptação à cultura desta, além
dos problemas referentes à equipe da
contratada como, remuneração baixa, baixa
escolaridade, cultura inadequada às
necessidades do trabalho, sem treinamento e,
consequentemente desmotivada. É
interessante ressaltar aqui, que a adaptação à
cultura é da liderança que vem de fora,
porque a equipe é comum aos contratos
anteriores.
Consideraram que para terceirizar a
alimentação, além de operar com baixo preço
e prestar serviços com boa qualidade,
precisam de apoio da contratante, investir
recursos no desenvolvimento da equipe e da
rápida adaptação da contratada à cultura da
contratante. Dos comensais que responderam
a pesquisa 48,4% trabalham na empresa entre
dois e cinco anos e consideram que os fatores
responsáveis pela qualidade nos serviços de
alimentação envolve a boa vontade dos
funcionários em atender com atenção e
agilidade e manter equipe e ambiente
higienizados, ou seja, a boa qualidade, para
os comensais, depende da equipe dos
prestadores de serviço. Esses aspectos são,
contudo, apontados por eles como os
melhores atendidos.
Com relação ao grau de satisfação antes e
depois da terceirização, a preferência pelo
item muito satisfatório caiu 4,1%; e o índice
de insatisfação aumentou 4,7%; item apenas
referido pelos comensais. Aqui há uma
evidente demonstração de queda na qualidade
em função da queda da preferência dos
comensais pela escolha do item pouco
satisfatório e insatisfatório após terceirizar,
comparado com o período anterior à
terceirização.
Pode-se concluir que não apenas a
qualidade na alimentação após a terceirização
dos serviços de alimentação caiu, mas caiu
também a satisfação das pessoas com relação
à alimentação e a satisfação com o seu
trabalho em consequência da queda de seus
salários e da sua qualidade de vida.
Aumentou o conformismo das pessoas
com relação à alimentação como ilustra o
aumento das respostas que migraram do item
muito satisfatório para o item - satisfação
média. Isso coincide também com o relato
que as pessoas fizeram em suas entrevistas,
alegando que aumentou muito o nível de
exigência, mas, não receberam treinamento
para atender a esta exigência, além do salário
ter diminuído. Mesmo assim executam o
trabalho com boa vontade e com o recurso de
seu próprio conhecimento.
Os operacionais foram os únicos que
denunciaram falta de treinamento e salário
baixo. Foram também esses que exaltaram a
importância de uma equipe integrada,
imbuída de boa vontade para que a
alimentação apresente qualidade.
O estudo levantou a hipótese de que a
contratante terceiriza centralizando mais
atenção à redução de custo e ao controle
administrativo do que à qualidade, esta
questão foi abordada na pesquisa e ambos
alcançaram nível significativo de preferência
segundo a tabela de Nihans, juntamente com
direcionamento gerencial para objetivos fins.
106
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Já o aumento da qualidade que também
constava da pesquisa não foi considerado
significativo como razões que levaram a
empresa a terceirizar os serviços de
alimentação. A satisfação dos clientes
internos e externos constou nas entrevistas,
mas não ganharam destaque, não sendo,
portanto essa hipótese confirmada nem
refutada nesta pesquisa.
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108
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
1
Paulo Roberto Alves1
Universidade corporativa em bancos
Resumo
Este artigo é um extrato de uma pesquisa
detalhada a respeito dos reflexos da
universidade corporativa na gestão do
conhecimento em empresas do setor financeiro
no Brasil. Tem por objetivo apresentar as
práticas que tem favorecido a integração entre
Universidade Corporativa (UC) e a Gestão do
Conhecimento (GC), partindo de uma hipótese
substantiva de que a UC deve, além dos
benefícios inerentes da educação, auxiliar as
corporações, que a implantaram, na GC. A
pesquisa fez uso do método survey com vistas
a identificar o número de bancos brasileiros
comerciais, com sede na cidade de São Paulo
que possuem UC e GC integrados e o tipo de
esforço que foi realizado para esta
harmonização, além disso evidencia as
facilidades para implementação da GC em
organizações que pratiquem a Educação
Corporativa (EC).
Abstract
This article is an extract from a detailed
survey about the consequences of the corporate
university in the knowledge management in the
financial sector in Brazil. Aims to present the
practices that have favored the integration of
Corporate University
and Knowledge
Management (KM), from a substantive
hypothesis that Corporate University should,
besides the inherent benefits of education,
helping corporations, which have embedded in
KM. The research used method survey with a
1
view to identifying the number of commercial
banks in Brazil, based in Sao Paulo that have
integrated Corporate University and KM and
the type of effort that was made for this
harmonization, further evidence for the
facilities to implement the KM in organizations
practicing Corporate Education.
Palavras-chave: GC, UC, Gestão do
Conhecimento, Universidade Corporativa,
Banco
Keywords: KM, Knoledge Management,
Corporate University, Bank
Introdução
Morin (2004) afirma que uma empresa
produz objetos e serviços para o consumo. Ao
produzir ela se autoproduz, produzindo
também os elementos necessários à sua
sobrevivência e organização, “se auto mantém,
se auto repara se necessário, e, se as coisas não
vão bem, auto desenvolve-se enquanto
desenvolve a sua produção. Aquele que produz
coisas, produz ao mesmo tempo a si próprio; o
produtor é o seu próprio produto.” (p. 18)
A sociedade, por exemplo, é feita das
interações dos indivíduos que a constituem.
Como uma organização e uma organizadora, a
própria sociedade retroage para produzir os
indivíduos por meio da educação, linguagem e
escola. Desta forma, os indivíduos produzem a
sociedade e esta produz os indivíduos que a
produzem, num ciclo espiral evolutivo. Assim,
Paulo Roberto Alves - Mestre Prof. pesquisador da PUCSP é Prof Pesquisador da FICS onde desde o primeiro
semestre de 2012 compõe a Grupo de Pesquisa, e Inicialção Científica e a Oficina de Artigos das Faculdades Integradas
Campos Salles – FICS. www.campossalles.edu.br
109
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
a universidade corporativa associada à gestão
do conhecimento pode, em muito, auxiliar na
organização desta complexidade produtoprodutor ou, ainda, indivíduo–empresa.
Paralelamente ao surgimento das teorias da
aprendizagem organizacional, assiste-se, no
campo da organização do trabalho, o
movimento de passagem da lógica do posto de
trabalho à lógica da competência (ZARIFAN
2001, p.25). A ligação entre aprendizagem e
competências, já presente em Argyris (1996),
aparece estabelecida em Drejer (2000), que
considera a aprendizagem organizacional como
o ponto de partida natural para a formulação de
um modelo de desenvolvimento de
competências. Para Argyris (1996), a teoria da
aprendizagem organizacional é a chave para a
compreensão do desenvolvimento de
competências.
A hipótese teórica que sustenta a associação
pretendida parte da constatação de que
aprendizagem e conhecimento são construtos
elaborados de maneira distinta. Tomando o
conhecimento como objeto, como “o que” dos
processos cognitivos, teria o desenvolvimento
das competências como intermediação
processual na busca do conhecimento. Porém,
tomando a competência como objeto, o
fenômeno da aprendizagem é que surge como o
processo, o “como” necessário à competência.
Algumas organizações têm usado recursos
próprios e específicos, orientados para os
objetivos estratégicos empresariais,
consubstanciados em programas sob a
designação de universidade corporativa. A
presente pesquisa argumenta que, pelas suas
especificidades, os programas das
universidades corporativas (UC) são efetivos e
colaboram para a gestão do conhecimento
(GC) e tem como objetivo identificar o quanto
a prática da UC influencia na GC de
instituições financeiras captadoras de depósito
à vista, mais especificamente bancos
comerciais e caixas econômicas, cujas sedes e
as mais significativas operações estão
localizadas na cidade de São Paulo, maior
centro financeiro do país, num determinado
instante, ela não tem pretende mostrar qualquer
mudança ou desenvolvimento sobre o tema.
Um fenômeno particular em um determinado
momento será estudado, o que torna o
horizonte de tempo cross-sectional, o mais
comum quando a estratégia de investigação é
survey.
1. Conhecendo os Bancos
Constituem elementos representativos do
universo populacional de pesquisa os dez
maiores Bancos por patrimônio (Nacionais,
Estrangeiros ou Mistos), listados no site da
Febraban (2008). Neste espaço apresento a
estratégia de contratação de colaboradores, a
distribuição por cargo e a escolaridade, dados
que nos auxiliarão no entendimento dos
resultados desta pesquisa.
1.1. Estratégia de contratação e
distribuição dos colaboradores por cargo
Os bancos têm como estratégia de atração e
retenção de colaboradores a contratação na
base para o desenvolvimento dos funcionários
dentro da própria instituição financeira. Uma
pesquisa realizada, pela Febraban (2009), com
15 bancos apresenta os cargos assim
distribuídos. Os administrativos e operacionais
somam 66% dos cargos, enquanto supervisão e
coordenação 21,3% e os restantes 12,7
distribuídos entre as gerências e as diretorias.
A figura 2.1 apresenta esta distribuição.
110
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Figura 2.1 Distribuição de cargos nos Bancos Fonte: Febraban (2009) Adaptado
de 18 anos de idade que supera 11 anos de
Escolaridade
instrução era de 27,2% no último levantamento
De acordo com a pesquisa da
populacional do IBGE, a PNAD 2005. Entre as
FEBRABAN, chega a 27,4% o número de
mulheres que trabalham nos bancos, 9,5%
funcionários que concluíram o ensino médio ou
possuem pós-graduação, enquanto entre os
profissional, e 18,7% estão cursando o terceiro
homens o indicador chega a 12,1%. Já a
grau, enquanto os com graduação completa
parcela de graduados é maior entre elas do que
totalizam 40,8%, e os pós-graduados, 10,9%.
entre eles: 42,9% e 38,8%. A figura 2.2 mostra
No Brasil, o percentual de pessoas com mais
a escolaridade dos profissionais do setor.
Figura 2.2 Escolaridade. Fonte: (FEBRABAN 2008).
2. Histórico da Educação Corporativa
As universidades nasceram nos centros do
saber que na Idade Média se restringiam à
111
Igreja, aos mosteiros, com origem fortemente
religiosa, porque os padres eram os únicos
alfabetizados, os únicos que publicavam livros,
e os únicos a organizarem bibliotecas. Foi
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
neste ambiente onde nasceu o conceito
universidade.
A Educação só se torna pública e de
responsabilidade do Estado, após a revolução
democrática na Inglaterra, com o
Parlamentarismo Democrático e a Revolução
Francesa. Este cenário dura todo o século XX.
Com a democratização do saber o mundo foi se
tornando mais inteligente, com necessidade de
se qualificar a população para que os anseios
dela mesma sejam atendidos. A sociedade, por
exemplo, é feita das interações dos indivíduos
que a constituem. Como uma organização e
uma organizadora, a própria sociedade retroage
para produzir os indivíduos por meio da
educação, linguagem e escola. Desta forma, os
indivíduos produzem a sociedade e esta produz
os indivíduos que a produzem, num ciclo
espiral evolutivo.
O mercado cada vez mais exigente e
competitivo abre a necessidade de funcionários
cada vez mais capazes sob todos os aspectos
técnicos, gerenciais e comportamentais. As
empresas atuais já perceberam o valor do
capital intelectual (CI) e estão investindo cada
vez mais nos seus recursos humanos. (SOUZA,
2000) afirma que o capital intelectual não
aparece no balanço financeiro da empresa, mas
que pode ser mensurado pela diferença entre o
valor patrimonial (VP) e valor de mercado
(VM). CI = VM-VP.
De acordo com Bayma (1994), as Empresas
são impulsionadas a atualizar o conhecimento
dos seus trabalhadores com o uso da educação
continuada ajustando as suas competências às
necessidades empresariais. Uma das maneiras
encontradas pelas organizações foi o uso de
recursos próprios e específicos, orientados para
os objetivos estratégicos empresariais,
consubstanciados em programas sob a
designação de universidade corporativa (UC).
Nos anos 50 em Crottonville a GE organiza
a primeira Universidade Corporativa mundial,
esta nova modalidade de educação tem sido
aderida por um número vultoso de empresas.
Em 2007, os Estados Unidos tinham
aproximadamente mais de três mil
universidades corporativas, com um
crescimento de 10% ao ano. Se este
crescimento se perdurar, em pouco tempo
teremos mais universidades corporativas do
que universidades tradicionais. Este
crescimento se dá principalmente em função da
validade do conhecimento que diminuiu e as
empresas não conseguem mais dar este tempo
que as universidades tradicionais necessitam
para formar este novo conhecimento.
Com a globalização e a Internet as empresas
não concorrem mais com as empresa do bairro,
da cidade ou do estado. O seu concorrente,
assim como o seu cliente, podem estar do outro
lado do mundo. Desta forma, as empresas
precisam estar constantemente atualizando os
seus colaboradores, para que possam reagir à
altura dos seus concorrentes e atender às
expectativas dos seus clientes, cada vez mais
exigentes.
Para Meister (1999, p.2) as empresas do
século XXI são diferentes das empresas da
metade do século XX. Elas são mais enxutas e
flexíveis, enfrentam uma obsolescência rápida
do conhecimento, estão em busca de mercados
globais e não somente os domésticos, focando
na necessidade do cliente ao invés do lucro em
curto prazo. O quadro 3.1 mostra as diferenças
entre o modelo antigo de empresa e a do século
XXI. Para a autora, as Universidades
Corporativas surgiram para compensar a
qualidade e o conteúdo da graduação e a
necessidade de um aprendizado permanente e
ágil. Ela não pode mais esperar pela aprovação
do Conselho Universitário e outras burocracias
que a concorrência atual já se livrou.
112
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Modelo Antigo
Protótipo do século XXI
Hierarquia
Organização
Redes de Parcerias e Alianças
Desenvolver a maneira
Atual de fazer negócios
Missão
Criar mudanças com Valor
Agregado
Autocrática
Liderança
Inspiradora
Domésticos
Mercados
Globais
Custo
Vantagem
Tempo
Ferramentas para
Desenvolver a mente
Tecnologia
Homogenia
Força de trabalho
Diversa
Funções de trabalho separadas
Processo de Trabalho
Equipes de Trab. interfuncionais
Segurança
Expectativas do Funcionário
Desenvolvimento Pessoal
Tarefa das IES
Educação & Treinamento
América Corporativa mais um
leque de Empresas Educacionais
com fins lucrativos.
Ferramentas para Desenvolver a
Colaboração
Quadro 3.1 mostra as diferenças entre o modelo antigo de empresa e a do século XXI - Extraído da © 1997
Corporate University Xchange, Inc. citado por Meister (1999).
Para Allen (2007, p.3) UC não é um
extravagante departamento de treinamento, a
melhor maneira para se distingui-los é só olhar
para a variedade de atividades que cada um
oferece. Um departamento tradicional de
treinamento realiza apenas treinamentos
enquanto uma UC realiza treinamentos e
muitas outras atividades. A UC tem por
objetivo principal adequar as competências
individuais às estratégias empresariais. Este
objetivo é muito mais abrangente e duradouro
do que o objetivo de um simples departamento.
As UCs são responsáveis pelo
desenvolvimento de pessoas e pelo
crescimento das aptidões de uma organização.
Allen (2007, p.6) apresenta algumas atividades
que a UC poderá estar envolvida, entre elas:
desenvolver e implantar programas de
treinamento; avaliar tecnologias; implantar elearning ou programas combinados; contratar
vendedores; gerenciar o relacionamento de
vendedores; disponibilizar programas de
113
treinamento interna e externamente à empresa;
avaliar programas; avaliar a UC; gerir de
parcerias; coaching de executivos; tutoria ou
mentoring; definir plano de carreira;
contratação estratégica; orientar a novos
empregados; definir plano de sucessão;
mudança de cultura; mudança estratégica;
gestão do conhecimento; gestão da sabedoria;
biblioteca e coleção eletrônica de informação e
pesquisa e desenvolvimento. Esta lista mostra,
em outras palavras, que existem várias
maneiras de se desenvolver pessoas além de
treinamento.
Meister in Eboli (2004) afirma que a UC
traz o colaborador para um envolvimento
maior com a organização, com a estratégia,
com as várias áreas da organização, enquanto
que os centros de treinamentos focam o
colaborador de uma forma individual. O
quadro 3.2 apresenta de forma sumarizada esta
mudança de paradigma dos centros de
treinamento para universidade corporativa.
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Mudança de Paradigma
Centro de treinamento
!
Educação corporativa
Desenvolver Habilidades
Objetivo
Desenvolver as competências críticas
Aprendizado Individual
Foco
Aprendizado organizacional
Tático
Escopo
Estratégico
Necessidades Individuais
Ênfase
Estratégias de negócios
Interno
Público
Interno e externo
Espaço real
Local
Espaço real e virtual
Aumento das habilidades
Resultado
Aumento da competitividade
Quadro 3.2 – Mudança de paradigma dos centros de treinamento para EC – extraído e adaptado de Meister in Eboli (2004).
Allen (2002, p.4) classifica universidade
corporativa em 4 níveis, a saber: o primeiro
nível, treinamento, onde as habilidades para
tarefas específicas são focadas; seguido pelo
nível 2, treinamento e desenvolvimento
gerencial, neste nível, além do treinamento
oferece, também, cursos para o
desenvolvimento gerencial de executivos, que
estão preparados para modificar
comportamentos; no nível 3, cursos são
oferecidos como créditos acadêmicos. Neste
nível as UCs oferecem cursos que são aceitos
como créditos acadêmicos, entretanto, poucas
empresas oferecem estes cursos por conta da
burocracia envolvida, e, finalmente, o nível 4,
universidades corporativas oferecem
programas de graduação e/ou pós-graduação.
Dificilmente uma UC ultrapassa os obstáculos
para receber uma autorização e trabalhar como
se fosse uma universidade tradicional.
3. A Gestão do Conhecimento
Conceitos básicos a respeito de dado,
informação e conhecimento são necessários
para que possamos melhor compreender a
Gestão do Conhecimento. De acordo com
Davenport (1998, p.18), dados são
observações do estado do mundo, podem ser
facilmente estruturados, obtidos por máquinas,
quantificados, transferíveis e processados por
computadores. Dado pode ser descrito por
meio de representações formais. Imagens, sons
e animações também são considerados dados.
Por exemplo: dados de uma pessoa como
nome, sexo e naturalidade ou, ainda,
temperatura ambiente (facilmente medido por
máquina). Informação é o dado trabalhado,
num determinado contexto, um conjunto de
dados relacionados entre si, por exemplo,
temperatura da sala de aula. De acordo com o
autor, informação é um conjunto de dados
dotados de relevância e propósito, requer
unidade de análise, exige consenso sobre o seu
significado e exige necessariamente medição
humana.
Já, o termo conhecimento, para
Davenport, é a informação valiosa da mente
humana, que inclui reflexão, síntese e contexto,
de difícil estruturação, de difícil obtenção por
máquinas, e por ser frequentemente tácito, é de
difícil transferência. O conhecimento no meio
empresarial envolve a percepção sistematizada
do que existe (aprendizado do passado e
experiências semelhantes). O conhecimento
envolve, também, o aprendizado e o contínuo
refinamento das noções do ambiente estudado.
Atualmente o sucesso de uma organização está
mais centrado no conhecimento organizacional
e no conhecimento individual de cada
colaborador do que nos ativos que ela possui.
O maior desafio está em administrar este
conhecimento; para tanto é necessário, num
primeiro momento, identificar o conhecimento
114
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
necessário para o negócio, extraí-lo,
democratizá-lo e posteriormente fomentá-lo.
Para Eboli (2004) um dado pode ser
transformado em conhecimento seguindo a
cadeia do conhecimento. A figura 4.1 mostra
que os dados num banco de dados podem ser
processados gerando informação; esta, por sua
vez, pode ser analisada, originando o
conhecimento, este comunicado gera
inteligência e a possibilidade do uso numa
aplicação cuja execução será decidida
(aplicação do conhecimento).
Banco de Dados
Processamento
Análise
Informação
Conhecimento
Comunicação
Aplicação do Conhecimento
Aplicação
Inteligência
Decisão
Execução
Figura 4.1– Cadeia do Conhecimento – Eboli (2004)
Nos serviços, mais do que na indústria, este
conhecimento organizacional e individual é
realçado, entretanto, é tão crítico para a
instituição de serviço como é para indústria. O
produto carrega consigo a cultura e a
inteligência da empresa, além da competência
essencial que nem sempre é identificada e
administrada por seus colaboradores. O valor
do produto não está na soma de cada uma das
partes que o compõem, mas sim no intelecto de
quem o produz.
O conhecimento é que faz a grande
diferença nas fábricas de software, nos bancos,
nas consultorias, mas o grande desafio está em
internalizar na organização este conhecimento
que aparece no indivíduo colaborador. Na
indústria, esta demanda não é menor,
principalmente nas áreas de pesquisa e
desenvolvimento, por exemplo. Quin et al
apud Klein (1998, p.130) conclui que o
intelecto de uma organização funciona em
quatro níveis, a saber: o primeiro, o
conhecimento cognitivo que é o conhecimento
115
básico e essencial conseguido através de
treinamento; o segundo nível, as habilidades
avançadas que de acordo com os autores é a
“capacidade de aplicar as regras de uma
disciplina a problemas complexos”; o terceiro
nível, a compreensão dos sistemas, que trata do
conhecimento abrangente, uma visão sistêmica
de “causa e efeito de uma disciplina” Neste
nível os colaboradores vão além da simples
execução de processos, possuem profundo
conhecimento de área, dos problemas e das
consequências e, por fim, o quarto nível, a
criatividade auto motivada que, conforme o
autor, é a “vontade, motivação e adaptabilidade
para o sucesso.”
Bateson apud Nonaka e Takeuchi (1997, p.
67) afirma que o conhecimento tácito está
associado à experiência e à subjetividade,
enquanto que o conhecimento explícito é
racional e objetivo. As distinções entre os dois
tipos de conhecimento, o tácito e o explícito,
são apresentadas na figura 4.2.
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
CONHECIMENTO
Tácito
Explícito
(Subjetivo)
(Objetivo)
Conhecimento da experiência (corpo)
Conhecimento da racionalidade (mente)
Conhecimento do simultâneo (aqui e agora)
Conhecimento sequencial (lá e então)
Conhecimento análogo (prática)
Conhecimento digital (teoria)
Figura 4.2 – Dois tipos de conhecimento. Extraído e adaptado de Nonaka e Takeuchi (1997, p.67)
O conhecimento pode ser transmigrado e
Nonaka e Takeuchi (1997, p.68) apresenta
quatro modos de conversão do conhecimento:
a) o conhecimento tácito quando é convertido
em conhecimento tácito, é chamado pelos
autores de socialização; b) o conhecimento
tácito em conhecimento explícito é
denominado externalização; c) o conhecimento
explícito em conhecimento explícito, chamado
de combinação e d) o conhecimento explícito
em conhecimento tácito, denominado de
internalização. Os autores assumem que o
conhecimento é criado pela interação entre o
conhecimento tácito e o conhecimento
explícito. A figura 4.3 ilustra os quatro modos
de conversão do conhecimento.
Conhecimento tácito
Conhecimento explícito
Conhecimento tácito
Socialização
Externalização
Conhecimento explícito
Internalização
Combinação
Figura 4.3. Quatro modos de conversão do conhecimento. Extraído e adaptado de Nonaka e Takeuchi (1997,p.
69)
Nonaka e Takeuchi (1997, p.69) consideram
socialização como o compartilhamento de
experiências, isto é a transferência do
conhecimento tácito em conhecimento tácito.
Os iniciantes aprendizes aprendem o trabalho
não através da linguagem dos seus mestres mas
através da observação imitação e prática. Ainda
para os mesmos autores, a externalização é um
processo de articulação do conhecimento tácito
em conhecimentos explícitos. A escrita é uma
forma de converter o conhecimento tácito em
conhecimento explícito. Uma imagem, por
exemplo, é conceitualizada através da
linguagem. Combinação, para Nonaka e
Takeuchi
(1997, p.75) é o conhecimento
formal e estruturado sendo transferido. É a
troca, a combinação do conhecimento por meio
de reuniões, documentos, redes de
computadores. Nas escolas e faculdades o
conhecimento, normalmente, é transferido
desta forma. E finalmente para os autores
internalização é a incorporação do
conhecimento explícito no conhecimento
tácito, está relacionada ao “aprender fazendo”.
As experiências através da socialização,
externalização e combinação se tornam
valiosos ativos quando são internalizadas nos
116
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
indivíduos sob modelos mentais ou Know-how
técnico compartilhado.
compartilhamento de conhecimento,
particularmente, aquele conhecimento que foi
adquirido por profissionais fora do ambiente de
trabalho, como advogados e engenheiros.
3.1 Criando conhecimento dentro da
organização
Klein (1998, p.1) afirma que as empresas
nos dias de hoje competem numa “economia
de conhecimento” e as empresas que crescem
com as experiências, são as “organizações que
aprendem”. Estas empresas que incentivam o
capital intelectual veem grande oportunidade
de melhoria frente aos concorrentes, e fazem a
gestão estratégica do capital intelectual – estas
empresas sabem que “conhecimento é poder”.
Estas empresas incentivam o desenvolvimento
e o compartilhamento de conhecimento.
Empresas que têm como estratégia o fomento
do capital intelectual devem ter iniciativas /
ações no nível operacional, coletando e
lapidando ideias e informações colhidas no diadia; estas iniciativas envolvem principalmente
os recursos humanos, ou seja, colaboradores e
tecnologia da informação necessária para a
captura, armazenamento e compartilhamento
de informações. O grande desafio está em
disseminar uma cultura que apoie e incentive o
Klein (1998, p.70) afirma que no início de
uma organização a aprendizagem
organizacional é normalmente o sinônimo ou
equivale à aprendizagem individual, reflexo de
pequeno grupo de pessoas que lá trabalham. À
medida que a organização cresce, aparece a
distinção entre aprendizagem individual e
organizacional. March e Olsen in Klein (1998,
p.73) apresentam na figura 4.4 o modelo de
aprendizagem organizacional. Os autores
afirmam que ações individuais são baseadas
em convicções individuais. A ação
o rg a n i z a c i o n a l é f o r m a d a p o r a ç õ e s
individuais. Se não houver resposta no
ambiente, isto significa que as convicções
individuais, a ação individual e a ação
organizacional permanecem inalteradas. Por
outro lado, se houver resposta ambiental,
significa que as convicções individuais
mudaram, influenciando em todo o resto do
círculo.
Aprendizagem Limitada pelo papel
1
Ação
Individual
Aprendizagem pela audiência
Convicções
2
4
Ação
Organizacional
Aprendizagem com ambiguidade
Resposta
3
Aprendizagem supersAciosa
Figura 4.4 – Modelo de Aprendizagem Organizacional - extraída e adaptada de March e Olsen in Klein
(1998,p73)
117
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Este modelo, também, aborda os ciclos de
aprendizagem incompletos, quando a
aprendizagem se prejudica por questões
ambientais. São quatro as situações que esse
evento pode ocorrer: (1) Aprendizagem
limitada pelo papel – acontece quando a
aprendizagem individual não tem efeito sobre a
ação individual; (2) Aprendizagem pela
audiência – quando o indivíduo afeta a
o rg a n i z a ç ã o d e f o r m a a m b í g u a ; ( 3 )
Aprendizagem supersticiosa – o elo entre a
ação organizacional e a resposta está rompido
(ações são tomadas, a aprendizagem acontece,
mas não há uma base real para conectar este
dois pontos) e (4) Aprendizagem com
ambiguidade – individuo afeta a ação
organizacional, que afeta o ambiente e
acontece a aprendizagem operacional, mas não
a aprendizagem conceitual. É importante que
haja um equilíbrio entre essas duas
aprendizagens para que a aprendizagem
organizacional seja eficaz.
Klein (1998, p.83) afirma que os ciclos de
aprendizagem podem não se completar e
acabam afetando a aprendizagem
organizacional. Os três ciclos incompletos de
Kim são: a) aprendizagem situacional, a qual
está relacionada às improvisações
momentâneas realizadas por indivíduos para
resolver problemas que não são codificados
para uso posterior, neste caso, nem o indivíduo
nem a organização absorvem o aprendizado; b)
aprendizagem fragmentada que são situações
quando o indivíduo aprende, mas a organização
não e, obviamente, quando a organização perde
este indivíduo, ela acaba perdendo também; e
c) a aprendizagem oportunista, quando
algumas tarefas específicas obrigam a
organização a realizar os seus procedimentos
de forma diferente, uma vez que os
estabelecidos não são adequados para a
oportunidade. Este compartilhamento do
conhecimento, para Allen (2007, p.384),
acontece nas discussões da comunidade; nos e-
mails / correio eletrônico; nas reuniões
presenciais e virtuais e finalmente na tutoria.
4. A Pesquisa e os resultados
alcançados
A pesquisa foi realizada entre os dez
maiores bancos comerciais em operação no
país dentre os 156 existentes, segundo dados da
Bacen (2007), no período de 7 a 18/04/2008,
na cidade de São Paulo. Dos dez maiores
bancos contatados oito responderam ao
questionário e apenas dois se negaram a
respondê-lo, alegando “deliberação interna”,
ou seja a instituição bancária não responde a
pesquisas externas. Entre os bancos
respondentes, pelo menos cinco responderam
sem colocar grandes empecilhos os outros três
tiveram que pedir orientação e permissão a
superiores ou a assessoria de imprensa. Isto
significa que a metade dos bancos contatados
não impôs restrições na divulgação do
andamento das suas atividades internas ao
mercado, com relação ao tema. Para o leitor
interessado no detalhamento desta pesquisa
sugiro acessa-la em http://www.unisantos.br/
upload/menu3niveis_1258487935688_2008_te
xto_completo_paulo_roberto_alves.pdf.
Reservo este espaço para a apresentação de
uma análise geral desta averiguação
acadêmica.
O objetivo geral desta pesquisa era
identificar o quanto a prática da educação
corporativa (EC) influencia na gestão do
conhecimento em empresas do setor financeiro
localizadas na cidade de São Paulo e apresentar
de forma descritiva, o resultado encontrado,
com o uso de uma pesquisa quantitativa e com
coleta de dados por meio de questionários.
Somente os bancos que possuem UC têm
também GC implantada de forma estruturada.
Apesar da representatividade dentro do
universo pesquisado, quase 40 por cento (tem
UC formalmente constituída), dentro de um
118
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
universo maior, ou seja, o número de bancos
em operação no país, estes bancos que
possuem UC e GC implantadas representam
pouco mais de 1 por cento. Entretanto, dito
pelos respondentes que a UC auxiliou em
muito a implantação da GC, ambas as práticas
são bastante recentes entre os pesquisados.
Além disso, a confirmação dos respondentes
afirmando que houve a contribuição da UC na
GC, explicitado várias vezes durante a
pesquisa que a GC muito se beneficiou após a
implantação das UC. Nas organizações, dito
pelos principais autores pesquisados,
particularmente, Davenport (1998) e Nonaka e
Takeuchi (1997) uma organização não
sobrevive sem informação em se tratando de
grandes corporações que tem a UC
implementada, esta prática auxilia a catalisar,
explicitar, organizar e multiplicar o
conhecimento dentro delas de forma
estruturada e organizada. A formalidade
estruturada da transferência do conhecimento
por meio de uma UC facilita a explicitação do
conhecimento podendo futuramente ser
transferido por meio de treinamentos formais,
documentos, normas e procedimentos além de
outros meios, assim como o conhecimento
tácito pode ser transferido na informalidade
entre os envolvidos com a UC e futuramente
explicitado. A implantação da GC é
influenciada de forma positiva após a
implantação da UC e os resultados apontados
neste estudo confirmam. Um ambiente formal
de conhecimento onde todos os colaboradores
têm acesso, que agrega conhecimento a cada
participante, também auxilia na diminuição da
informalidade da troca de conhecimento.
Paradoxalmente, somente os que possuíam UC
e GC implantadas reconhecem existência
barreiras para a transferência do conhecimento,
isto significa dizer que estas duas práticas
evidenciam as dificuldades nesta troca de
conhecimento. Os participantes da pesquisa
que não possuíam UC e GC evidenciaram
respostas categóricas que na organização em
questão a barreira para a transferência do
conhecimento era inexistente.
119
5. Considerações finais
É possível que muitas outras considerações
possam ser realizadas, mas as aqui
apresentadas, não só se embasam nas análises
feitas, mas, também, nas observações
realizadas pelo autor nas organizações.
Pode-se considerar, do ponto de vista
implementação, que é recomendável a
implantação de uma UC antes da estruturação
de uma GC, uma vez que esta segunda pode
muito se beneficiar. Vale a pena ressaltar que
segundo os autores pesquisados,
particularmente, Davenport (1998) e Nonaka e
Takeuchi (1997), o conhecimento é a alma da
organização sem ele a organização não
sobreviveria. Esta pesquisa tratou do
conhecimento estruturado organizado de forma
a melhorar o desempenho e apoiar a estratégia
empresarial e as competências essenciais de
uma organização. Foi comprovado por ela que
a gestão deste conhecimento com o apoio de
uma UC, é facilitada por se tratar de um local
formal e respeitado por todos os colaboradores
para a transferência do conhecimento e por ser
mais que um departamento de treinamento.
Meister in Eboli (2004) afirma que a UC traz o
colaborador para um envolvimento maior com
a organização, com a estratégia, com as várias
áreas da organização, desta forma auxiliando
na estruturação e multiplicação do
conhecimento de forma organizada. Allen
(2007, p.6) afirma que a GC é uma das
atividades que a UC poderá estar envolvida, e
esta pesquisa confirma a ocorrência entre os
bancos pesquisados e envolvidos, o mesmo
autor (p.372) enfatiza o papel da UC na gestão
e no compartilhamento do conhecimento. Eboli
(2002) reconhece que o conhecimento coletivo
e a cultura corporativa devem, também, ser
incentivados através da transferência do
conhecimento do indivíduo para a cadeia de
valor. Por se tratar de um aprendizado
organizacional a UC também pode influenciar.
Espera-se que este trabalho tenha
contribuído para possibilitar, aos gestores
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
bancários, o estabelecimento de um caminho
mais fácil para o sucesso dos mesmos. Esperase, também, que este trabalho tenha ampliado a
base empírica dos estudos relacionados com a
UC e a GC, uma vez que foi observado, entre o
universo pesquisado, que pouco foi realizado
nesta área.
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120
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
1
Cimara Apostolico 1
Andragogia: um olhar para o aluno adulto
Resumo
O presente artigo pretende destacar a
importância de um ensino direcionado ao
aluno adulto, não só pelo fato de adultos e
crianças aprenderem de formas diferentes,
mas principalmente pelas mudanças ocorridas
nos últimos dois séculos e que
revolucionaram a forma de o indivíduo
interagir com o entorno. Essas mudanças são
de ordem histórica, social e tecnológica e
representam a construção de um sujeito cuja
condição humana sofreu profundas
modificações. Ao referirmo-nos a alunos
adultos, podemos destacar diferentes
públicos, todavia, nosso olhar estará voltado
aos alunos do Ensino Superior, que cursam
instituições particulares.
Abstract
This article aims to highlight the
importance of an education directed to the
adult learner, not only because adults and
children learn in different ways, but mainly by
changes in the last two centuries that have
revolutionized the way individuals interact
with the environment. These changes are
historical, social and technological
developments and represent the construction
of a human subject whose condition has
undergone profound changes. When referring
to adult learners, we can highlight different
audiences; however, our attention will focus
on students in Higher Education, who attend
private institutions.
1
Palavras-chave: andragogia, educação,
ensino superior, aprendizagem.
Keywords: andragogy, education, higher
education, learning.
Apresentação
Apesar da urgência de um ensino
destinado ao público adulto, ainda há poucos
estudos a respeito de Andragogia.
Pretendemos discutir o assunto e apontar a
urgência de pesquisas nesse segmento,
especialmente pelo enfoque que é dado ao
conhecimento em nossa sociedade.
É
fundamental esclarecer que nosso objetivo
não é o de insinuar uma divisão entre
Pedagogia e Andragogia, mas apontar que
Andragogia faz parte dessa ciência, que é a
Pedagogia, ou seja, a questão primordial é
estabelecer distinção entre as formas de
aprender centradas na criança e no adulto e a
necessidade desse entendimento para
didáticas mais efetivas. A Andragogia
representa outro aspecto dos princípios da
aprendizagem.
Para isso, traçaremos um breve histórico
acerca da questão como subsídio para
entendimento de alguns aspectos dessa
ciência, principalmente pelo fato de a
condição humana ter mudado
significativamente, o que fez com que os
indivíduos alterassem a forma de participar
do processo de construção social, histórica e
tecnológica. Essa tríade requer o
estabelecimento de novas reflexões frente à
Cimara Apostólico - Mestre em Comunicação e Semiótica – PUC-SP. Corretora de dissertações e teses. Professora da
Fac. Guaianás. Profa. Pesquisadora da FICS onde desde o primeiro semestre de 2012 compõe a Grupo de Pesquisa –
Oficina de Artigos è orientadora de Iniciação Científica é menbro da Comissão de Edição, Revisão, diagramação e
Editoração Eletrônica Augusto Guzzo das Faculdades Integradas Campos Salles – FICS. www.campossalles.edu.br
121
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
maneira como entendemos a aprendizagem e
mais que isso, como nós – docentes - lidamos
com os diferentes públicos e as várias
expectativas.
Apoiaremos nossas ideias em alguns
pensadores para maior compreensão desse
novo sujeito agente, tentando vislumbrar os
caminhos pelos quais devemos nos imbricar
para alcançar e atingir este público. Neste
trabalho, direcionaremos nosso olhar para o
aluno do Ensino Superior dos cursos
Tecnológicos e Graduação, partilhando nossa
preocupação com relação à Didática
empregada para esse ensino.
1. Breve Histórico sobre Andragogia
Há concepções acerca de técnicas e
desenvolvimento de aprendizagem docente,
todavia, existem poucos estudos voltados
especificamente aos alunos adultos. Também
falta um olhar que contemple os aspectos
afetivos, motivacionais que possam favorecer
maior envolvimento entre professor e aluno.
Ao pensarmos em Educação, sabemos que
o desenvolvimento da sociedade está
associado à escolarização da população; isso
significa que é imprescindível investirmos
nesse segmento para formação dos
indivíduos, propiciando condições para
tomada de decisões mais conscientes e
assertivas nos diversos âmbitos da vida.
As pesquisas na área de Educação
demonstram preocupação e busca de
estratégias no sentido de aperfeiçoar a
maneira como os conteúdos são construídos.
Consideramos importante refletir até que
ponto essa transposição de conhecimentos
promoverá mudanças na maneira de agir e
interagir com os demais indivíduos. Não é
possível descartar o conhecimento como
ponte para um saber emancipatório,
entretanto, sabemos que essa construção
demanda atitudes, que precisam ser
desenvolvidas.
Também não apreciamos a ideia de
restringir determinados ensinamentos à
primeira infância ou a educação recebida
pelos pais, isso não significa que pretendemos
descartar a importância dessa base inicial,
mas nossa preocupação é de expandir a
discussão para a possibilidade de ensinarmos
mais do que conteúdo aos nossos alunos de
Ensino Superior.
Considerando o contexto atual – mudanças
nas demandas socioeconômicas e
mercadológicas, não é de se estranhar a
quantidade de cursos tecnológicos que
surgem, na última década, para suprir a
velocidade do mercado decorrentes das novas
tecnologias e da deficiência de formação
presente no Ensino Médio, que não prepara o
indivíduo para atuar como especialista. Dessa
maneira, podemos compreender o aumento do
ingresso de alunos na Educação Superior e,
portanto, a importância de falarmos sobre
Andragogia.
Retomando ao ponto inicial de nossa
discussão, entendemos que o conceito de
Pedagogia costuma ser relacionado
primeiramente com aprendizagem de
crianças, mas sabemos que essa área também
abrange o público adulto. Todavia, constatase que a valorização dada ao ensino de
adultos tem recebido tratamento secundário.
Vogt e Alves no Artigo Revisão Teórica sobre
a Educação de Jovens e Adultos para uma
aproximação com a pedagogia traçam um
breve histórico sobre o assunto:
O termo andragogia foi formulado
originalmente por Alexander Kapp, professor
alemão, em 1833; caiu em desuso e reapareceu
em 1921, no relatório de Rosenstok, sinalizando
que a educação de adulto requer professores,
métodos e filosofia diferenciados. Eduard
Lindeman, em 1927, adotou o termo de
Rosenstock e usou-o poucas vezes nos Estados
Unidos. O vocábulo andragogia foi utilizado
amplamente, desde a década de 60, na França,
Yugoslávia e Holanda para se referir à
disciplina que estuda o processo da instrução de
adulto ou a ciência da educação de adulto.
(VOGT e ALVES, 2005).
122
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Malcolm Knowles tornou-se referência no
assunto, após estudar distinções entre
Pedagogia e Andragogia, que é, de maneira
simplificada, o ensino para adultos;
aprendizes autônomos e professores como
facilitadores na aprendizagem.
Internacionalmente, a preocupação
também não é tão recente; em 1949 a
UNESCO realiza a primeira conferência
concernente à questão:
Desde a primeira conferência sobre Educação
de Adultos em 1949, a UNESCO tem
trabalhado com os Estados-membros para
assegurar que os adultos exerçam o direito
fundamental à Educação. Em 1976, a
Conferência Geral da UNESCO aprovou a
Recomendação de Nairóbi para o
desenvolvimento da educação de adultos, que
consagrou o compromisso dos governos em
promover a educação dos adultos como parte
integrante do sistema educacional, numa
perspectiva de aprendizagem ao longo da vida.
(UNESCO, 2010, pág.12)
Em Dezembro de 2009 foi realizada a
última, a sexta conferência sobre a questão,
CONFINTEA (Conferência Internacional de
Educação de Adultos) com o tema Elos
Perdidos das Metas das décadas do milênio.
A discussão priorizou a importância de
redobrar os esforços para reduzir o índice de
analfabetismo. O primeiro compromisso
estabelecido foi desenvolver “uma oferta de
alfabetização que conduza à obtenção de
conhecimentos, capacidades e competências
funcionais e sustentáveis pelos participantes,
empoderando-os para que continuem a
aprender ao longo da vida” (UNESCO, 2011,
pág. 4).
Sabe-se que Educação e Sociedade são
conceitos intrinsecamente ligados, ou seja,
considerando que as nações buscam manter o
status de civilização, torna-se prioritária a
alfabetização para que as pessoas tenham
condições de inserir-se socialmente, em busca
do saber emancipatório.
123
2. Em busca do saber emancipatório
A Andragogia é a ciência que se preocupa
com o aprendizado do adulto, buscando
pensar estratégias que o auxiliem a alcançar
esse saber emancipatório de que se tem
tratado com mais ênfase nos últimos anos.
Neste sentido, a Didática precisa ser
diferenciada e contemplar os aspectos do
indivíduo maduro. Knowles aponta cinco
premissas, que mudaram a perspectiva de
ensino voltado às crianças para o foco em
adultos.
O autoconceito, que é o primeiro
elemento, aponta a distinção entre dependente
e autodirigido. A criança estabelece uma
relação de dependência com o professor, já o
adulto ele precisa ser direcionado, orientado,
mas é ele quem deve fazer escolhas.
O segundo item relaciona-se a
experiências – o adulto obviamente tem muito
mais experiência que a criança. Nesse
sentido, ele será capaz de interpretar,
transformar e dar sentido às várias situações
de aprendizagem.
O terceiro ponto é a prontidão a aprender
centrada nos papéis sociais – a criança habita
seu mundo particular e ainda não consegue se
situar numa perspectiva de espaço e tempo
social.
O próximo é a perspectiva de tempo – os
adultos aprendem à medida que conseguem
vislumbrar aplicação prática e breve às
situações-problemas. O último é a motivação,
que no indivíduo amadurecido precisa ser
trabalhada com outros propósitos, em função
dos quatro primeiros itens apontados nessa
breve descrição. Knowles apontado na tabela
1 sumarização dessas distinções:
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Autoconceito
Ser de personalidade dependente para um autodirigido.
Reservatório de experiência
Acumula e se transforma em um recurso crescente para
aprender.
Prontidão a aprender
Torna-se orientada, cada vez mais, às tarefas de
desenvolvimento de seus papéis sociais.
Perspectiva de tempo
Muda de uma procrastinação do conhecimento à imediata
aplicação e orientação, sendo que a orientação da
aprendizagem desloca-se de uma aprendizagem centrada
nas disciplinas a uma centrada no problema.
Motivação
É interna no indivíduo amadurecido.
Tabela 1 - Diferenciação entre crianças e adultos
Fonte: Knowles, 1980, pág. 44-45
Compreendemos que o ser adulto está
preocupado com a aplicação imediata do
conteúdo aprendido; conforme dito, o ensino
deve estar centrado em situações-problema,
tendo que em vista que ele precisa vislumbrar
resultados em curto prazo, principalmente no
que tange à capacitação profissional e que
possam ajudá-lo na manutenção das
necessidades primárias e secundárias,
conceito mencionado por Maslow 2. O ensino
passa a ser uma moeda de troca “mercari” –
ele precisa ver finalidade, utilidade e retorno,
caso contrário prefere investir o tempo em
outras atividades. Gadotti realizou uma
pesquisa densa em relação ao aluno adulto
que ainda não é alfabetizado, corroborando ao
explicar:
O aluno adulto não pode ser tratado como uma
criança cuja história de vida apenas começa. Ele
quer ver a aplicação imediata do que está
aprendendo. Ao mesmo tempo, apresenta-se
temeroso, sente-se ameaçado, precisa ser
estimulado, criar autoestima, pois sua
“ignorância” lhe traz tensão, angústia,
complexo de inferioridade. Muitas vezes tem
vergonha de falar de si, de sua moradia, de sua
experiência frustrada da infância,
principalmente, em relação à escola. É preciso
que tudo isso seja verbalizado e analisado
(GADOTTI. 2003 pág.39).
O autor acrescenta: “A Andragogia tem
ensinado que a realidade do aluno adulto é
diferente da realidade da criança, mas ainda
não incorporamos esse princípio em nossas
metodologias. (GADOTTI, 2003, pág. 39)”.
Por meio de nossas experiências, é
possível constatar que esse discurso também é
aplicável ao aluno do ensino superior cuja
história de vida acompanha e interfere na
forma como ele recebe e interpreta o que lhe
é transmitido, além, é claro da pressão e
cobrança social para que desempenhe cada
vez melhor suas tarefas.
Nessa sociedade da informação, conforme
descreve Maria da Glória Gohn a dominação
e controle são referências. A autora amplia a
discussão por meio das métaforas das ondas
de Alvin Tofler; “a terceira onda se baseia na
substituição da força muscular pela força
mental como fator de produção. Ela
ultrapassa os limites da economia e da
tecnologia, provocando mudanças sociais
profundas, bem como mudanças culturais,
morais e institucionais” (GOHN, 2008, pág.
66).
Essas mudanças implicaram em valores
diferentes; o que antes estava centrado na
força bruta do homem e na valorização de
bens materiais como riqueza deixa de ser
relevante dando lugar ao conhecimento. As
competências passam por uma severa revisão,
assim, a necessidade de desenvolver
2 Segundo
Abraham Maslow as necessidades dos seres humanos estão colocadas em categorias. São elas: primárias –
necessidades fisiológicas e de segurança. Secundárias – necessidades sociais, de estima e de autorrealização.
124
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
operações mentais cada vez mais complexas
com vistas a delinear uma visão sistêmica,
imaginação e criatividade, consciência dos
aspectos éticos, inteligência ecológica e,
principalmente, o saber-fazer “savoirfaire” (articular) são condições essenciais
para aquisição da nova riqueza ou capital
cultural3 , conforme denominado por Pierre
Bourdieu.
O termo “articular” foi selecionado
propositadamente, uma vez que ‘o saber
precisa culminar em competências’, pois de
nada adianta uma sociedade repleta de
indivíduos obesos de cognição, imaginação
etc., que não conseguem colocá-los em
prática. E, sobretudo, fazê-lo de maneira
eficiente e eficaz.
Nessa breve passagem, podemos inferir a
importância de formar um indivíduo
competente do ponto de vista cognitivo, não
perdendo de vista que o saber emancipatório
é processual e depende dos valores e caminho
trilhados para a formação desse homem
integral, – formar e agir são palavras-chave
que devem permear o ensino superior, que
independe de faixa etária, conforme veremos
a seguir.
3. Plasticidade cerebral
Mas, o ágon entre homem e conhecimento
não é tão simples de desenlear; o homem é
um ser sócio-histórico permeado por
construções e desconstruções frequentes. O
estudante adulto não é uma folha em branco4,
ele já vem com uma bagagem, que se por um
lado é base para dar significado ao
aprendizado, por outro, torna-se limitante,
pois crenças, condicionamentos impedem a
revisão de ações enraizadas, restringindo seu
crescimento.
Reiterando o que já foi dito, as exigências
atuais requerem a revisão de alguns
conceitos, conforme podemos compreender
com Makeliny Oliveira (2009: pág.65 e 66).
O primeiro é o da inteligência, que durante
décadas se acreditou ser imutável e
mensurável, ou seja, o ser já nascia com um
nível de inteligência determinado. De maneira
reducionista, é o entendimento da inteligência
como dom.
O segundo conceito é o de criatividade,
que era considerada como ferramenta de
alguns privilegiados. O terceiro é o de
memória, que era tida como um receptáculo
cujo objetivo era acumular informações.
Vejamos, sem a consideração de que o
homem também aprende socialmente,
conforme o meio em que está inserido, não é
possível sobrepujar esses equívocos. O
conceito de plasticidade cerebral precisa ser
considerado, pois o homem tem condições de
aprender, independentemente de sua idade.
Esse conceito inclui também o aspecto
biológico:
Atualmente com o avanço dos estudos dos
neurocientistas, descobriu-se que o conceito de
inteligência como algo imutável não condiz
com a realidade humana. Dessa forma, esse
conceito foi reformulado, pois se acredita que é
na vivência que o homem vai se constituindo e
se transformando, podendo mudar não só o
meio sociocultural em que vive, mas também o
biológico (plasticidade cerebral). Assim, a
inteligência é compreendida atualmente como
um processo dinâmico, construído na interação
do sujeito com a cultura, e pode ser
desenvolvida independentemente da idade da
pessoa. (NOGUEIRA, 2009, pág. 65).
3 Por
recursos ou poderes, Bourdieu entende mais especificamente o capital econômico (renda, salários, imóveis), o
capital cultural (saberes e conhecimentos reconhecidos por diplomas e títulos), o capital social (relações sociais que
podem ser revertidas em capital, relações que podem ser capitalizadas) e por fim, mas não por ordem de importância, o
capital simbólico (o que vulgarmente chamamos prestígio e/ou honra). SETTON, Maria da Graça Jacinto. Disponível
em: <http://renatadbc.web.officelive.com/Pierrebourdieu.aspx>. Acesso em: 24 set.2011
4 Comenius
em seu livro Didactica Magna comenta sobre a importância de iniciar a Educação desde cedo, quando,
segundo ele a mente ainda não foi ocupada, principalmente por preconceitos e valores mundanos (COMENIUS,
1621-1657, pág. 35). 125
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Quando partimos do pressuposto inatista,
torna-se compreensível limitar o conceito de
ensinar à mera transposição de conteúdos ao
aluno. Naturalmente considerando que o
aluno já tem condições de aprender e
principalmente, que nessa concepção, o aluno
é o responsável pelo próprio aprendizado.
Não vamos entrar na discussão de
responsabilidades, mas apenas aproveitar a
ideia para poder aprofundar um pouco mais a
questão. Vejamos, se o aluno é responsável
pelo próprio aprendizado – ao professor cabe
o papel informativo. Nesse sentido, o aluno
que quiser, tiver interesse e principalmente
condições cognitivas para acompanhar obterá
sucesso; os demais, portanto, serão excluídos
do processo, pois nasceram sem o “dom”,
sem condições para entendimentos mais
complexos.
Apesar da obviedade, muitos de nós temos
agido dessa maneira com nossos alunos,
funcionários e inclusive pessoas próximas a
nós.
Consideramos que o outro não consegue
entender o que estamos tentando transmitir. É
raro alguém assumir que não sabe se
comunicar adequadamente, que entende as
informações de maneira distorcida ou que é
necessário verificar com mais profundidade o
assunto. O que é muito comum ouvir é “Não
falou coisa com coisa”, “não disse nada com
nada” etc.
Alguns generalizam afirmando que o ser
humano é assim mesmo, como se todas as
nossas experiências fossem similares e
passassem pelos mesmos processos de
desenvolvimento durante a vida. Nesse
sentido, devemos indagar como ficam as
nossas representações. A nossa capacidade
simbólica não interfere na percepção que
temos dos objetos? Devemos considerar,
portanto, que tudo tem a mesma
representação o tempo todo para os diversos
indivíduos?
4. Professor-Gestor
Dentre as necessidades de nossa
sociedade, citamos a busca por constante
atualização profissional e uma das formas de
fazê-lo é cursando o ensino superior:
tecnológico ou graduação.
O aluno que ingressa em um desses cursos,
não necessariamente atua na área escolhida,
por isso, a figura do professor é representativa
para aproximar os conceitos teóricos e
práticos.
O professor é um especialista na sua área
de atuação e possui pleno domínio dos
conteúdos, todavia, não é mais possível
considerar que o conhecimento, a bagagem
do mestre é suficiente para o entendimento do
aluno.
Muito se tem estudado sobre a Didática,
derivada do grego didaktiké, que tem o
significado de arte de ensinar e também está
relacionada ao termo techné – prática e como
ela pode favorecer as práticas em sala de aula.
No entanto, o estudo das técnicas só será
válido a partir do momento em que houver
uma reflexão por parte do grupo docente
sobre sua aplicação em suas práticas.
Infelizmente, essa questão nem sempre é bem
vista, pois alguns têm dificuldades em lidar
com autoavaliações e principalmente, rever
paradigmas.
Apesar de o aluno adulto aprender
diferente da criança, é preciso esclarecer que
ele precisa do professor que intermedeia o
entendimento dos diferentes conteúdos. O
professor é referência nos processos de
ensino-aprendizagem, pois seu papel é de
propiciar significado àquilo que está sendo
transmitido, caso contrário é preferível que o
aluno estude a distância e assuma para si
todas as representações possíveis do processo,
deslocando-se até a faculdade apenas para
realização das avaliações. Assim, a didática é
fundamental para facilitar a compreensão do
que se pretende alcançar. Não se trata,
portanto, apenas de conhecer o conteúdo, mas
126
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
de elaborar estratégias que auxiliem os
discentes.
As estratégias de ensino-aprendizagem
precisam ser conduzidas consciente e
eficazmente. Ainda há muitas dificuldades
neste sentido, pois a utilização, por exemplo,
de dinâmicas em sala de aula pode
caracterizar “passatempo”. Além disso, há
uma tendência a limitar dinâmica ao aspecto
motivacional. Não descartemos essa
possibilidade, mas é preciso abarcar todas as
possibilidades que a ferramenta oferece.
Também é necessário verbalizar os objetivos
a serem alcançados; as aplicações que podem
ser estabelecidas em outros âmbitos,
inclusive, colaborando com o aluno na
associação da atividade com o conceito que
se pretende demonstrar e assim por diante.
O planejamento sistêmico da
aprendizagem é o ponto-chave para evitar
improvisações dispersivas, sem ordem. Para
que esse seja bem realizado, são necessários
critérios que incluem revisão do programa
utilizado, bibliografias atualizadas, fixação
dos objetivos, avaliação diagnóstica para
saber o estágio do aluno, evitando desta
forma apriorismos. Devem ser consideradas
as demandas sociais para que o aluno não
aprenda de maneira dissociada do uso prático,
portanto, os problemas reais ou ainda a
representação desses problemas compõem o
aprendizado.
Hoje contamos com tecnologias, que
alteraram a maneira de apreensão dos saberes
– os sistemas estão complexos e dinâmicos,
havendo diversas opções mais atraentes que a
aula expositiva do professor, esse é um
agravante que exige uma revisão urgente. A
questão a ser respondida é diante de tantos
elementos interativos e mais atraentes, como
compartilharemos esses saberes com os
alunos adultos?
Ao estabelecermos uma analogia com
produtos, podemos afirmar que o
conhecimento tem uma vida útil
relativamente curta, requer atualizações
127
frequentes e velozes. Os indivíduos lidam
com a dificuldade em administrar o próprio
tempo, que parece cada vez mais limitado.
Nesse universo de informações sentimo-nos
dispersos e com dificuldades em ser mais
assertivos. Aliado a esses elementos, a
maioria dos indivíduos, ao longo da história,
sempre teve dificuldades em rever os
paradigmas – há uma tendência à
acomodação, em manter-se na zona de
conforto, que é um caminho delicioso, mas
que pode impedir, por exemplo, que
trabalhemos com práticas mais atrativas para
o nosso aluno.
A estratégia de ensino-aprendizagem
contribui efetivamente para a apreensão dos
saberes, por essa razão cabe ao professor
oferecer ao aluno oportunidade para
estruturar o conhecimento’. Essa estruturação
ocorre por meio da transformação do
conhecimento em um saber fazer.
Um elemento que favorece a estratégia é a
criatividade, que conforme comentado, não é
privilégio de poucos, mas pode ser
desenvolvida à medida que nos propomos a
utilizá-la. Somos nós que lucramos quando
procuramos meios de facilitar o aprendizado
para nosso aluno, não só pela gratificação em
vê-los aprendendo, mas porque nos tornamos
mais competentes, melhoramos a autoestima,
projetamos uma imagem positiva; em síntese,
há uma substancial melhora em termos da
percepção que temos a nosso respeito, de
nossos alunos e dos indivíduos que nos
cercam.
Dentre as técnicas, podemos citar:
tempestade cerebral, grupos de verbalização,
painéis, simpósios, seminários, debates,
estudos de casos, dramatizações, oficinas,
dinâmicas, excertos de textos para discussão
etc. Recursos como filmes, músicas, histórias
em quadrinhos também fazem parte dessas
técnicas e devem ser usados com coerência.
Lembramos que a técnica apoia a estratégia e
isso significa que não é simplesmente trazer o
filme, a música, fazer os simpósios, uma
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
dramatização etc. – esses são simplesmente
apoios da proposta maior que é o aprendizado
e que não deve ser perdido de vista, portanto,
o professor precisa aprender a ser gestor.
Gestar a sala de aula é uma tarefa
complexa, o profissional deve possuir
algumas características de liderança
educacional, dentre elas podemos citar o
envolvimento. Envolver-se é a capacidade de
reconhecer as questões que não estão claras,
não são óbvias e conseguir intervir para que
elas sejam solucionadas. Há muitos
problemas em sala de aula que não são
trazidos à superfície. Por experiência,
observamos que quando os alunos reclamam
a respeito de determinado item, nem sempre
expressam a causa. As raízes, muitas vezes,
ficam camufladas, sendo que os próprios
alunos podem não ter consciência a respeito.
O líder que desenvolve essa característica
busca aprofundar-se e evitar que a situação se
agrave.
O envolvimento também se relaciona à
mediação, ou seja, fazer com que alunos
tenham bons relacionamentos interpessoais.
O grupo precisa estar unido para conseguir
finalizar o curso. Em outras palavras, o aluno
que se sente isolado acaba desistindo da
jornada.
O bom-senso também é fator primordial,
pois a postura do professor é avaliada o
tempo todo; assim pequenos detalhes como
cuidar do vocabulário, evitar generalizações,
reducionismos ou crenças ultrapassadas
favorecerem a imagem profissional. A
imparcialidade é sempre favorável, pois é
complicado quando o aluno nota preferências
por parte do professor. Naturalmente,
sabemos que é do ser humano a tendência a
preferir um indivíduo a outro; por isso a
cautela deve permear as relações.
Julgamentos, preconceitos também
compõem esse olhar. Quando um aluno tem
preconceito em relação ao colega – todos
relevam, mas se o professor agir dessa
maneira, ele será alvo de avaliações
negativas, inclusive por parte do aluno, que
primeiramente manifestou o preconceito.
Envolver-se, portanto, não significa agir
como o aluno, mas interagir e, naturalmente,
não perder de foco sua atuação como gestor.
Outra característica é o de construtor de
aprendizagem – não simples transmissor de
conteúdo. Essa construção deve ser
compartilhada: o professor-gestor precisa
motivar o aluno por meio de estratégias
diversas, por exemplo, situações-problemas
que estimulem os estudantes em busca de
soluções. As pessoas precisam ter desafios,
que sejam possíveis de solucionar e
promovam crescimento individual. O ensino é
coletivo, mas a aprendizagem é individual –
não é possível assumir a premissa de que
todos que cursam o Ensino Superior têm os
mesmos níveis de entendimento. Nessa linha
de pensamento, ao elaborar a avaliação, devese ter cautela para que essa não se restrinja a
ideia de mensurar o quanto o aluno aprendeu,
mas que aponte para o caminho do que ainda
precisa ser ensinado para que ele alcance os
objetivos propostos.
A sociedade hoje tem escolha: professores
podem discutir assuntos antes considerados
tabus ou formas de expressão subversivas
como ideologias e seus aparatos, teorias
darwinistas, sistemas políticos, corrupção etc.
Não seremos envenenados com cicuta ou
queimados na fogueira por difundir ideias,
mas precisamos lembrar que estamos lidando
com seres humanos, que já chegam com seu
repertório moldado e por essa razão é sempre
importante planejar, pesquisar, analisar para
não ‘transmitir vírus, danificar a memória ou
o hardware’ do nosso aluno.
Existem muitas características não
mencionadas do professor-gestor e que
podem ser estudadas como forma de
aprimoramento. As observações dadas servem
para ajudar a memória, que já se esqueceu de
suas potencialidades, mas sabemos que o
entorno, as circunstâncias, a experiência, a
percepção é que determinam nossas opções e
128
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
quais caminhos devemos trilhar na sala de
aula.
Considerações finais
Sabemos da importância em estabelecer
bases consistentes para formação do público
infantil, apesar disso insistimos que enquanto
não é possível alcançar o patamar esperado
nas séries iniciais, devemos continuar nossa
jornada e investir nesse público adulto,
propiciando formação que esteja além do
tradicional banco escolar, buscando atender
as necessidades individuais que auxiliem a
sociedade como um todo.
Mais uma vez reiteramos que a Educação
precisa ser vista além de uma escolarização
voltada apenas a aspectos cognitivos – o
indivíduo precisa ter formação integral ou
holística, termo difundido na atualidade, para
saber o que fazer com o conhecimento
adquirido.
A Andragogia deve, urgentemente, ser
estudada em sua complexidade, para que
possamos encontrar caminhos de
aprendizagem mais favoráveis ao indivíduo
adulto, considerando sua subjetividade, pois o
pilar que sustenta a sociedade é a Educação,
por essa razão, ela não deve estar voltada
apenas a aspectos relacionados à
memorização de informações e/ou que se
volte para questões de ordem meramente
estruturais.
Propiciar condições para formação de um
indivíduo integral é considerá-lo como agente
no processo de construção e reconstrução, um
ser capaz de avaliar e rever seus valores, de
perceber-se como parte do sistema e,
principalmente agir de maneira imparcial.
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São Paulo, Moderna: 2008.
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GOHN, Maria da Glória. Educação não-formal e cultura política. 4. Ed. São Paulo: Cortez, 2008.
LIBÂNEO, José Carlos. Organização e gestão da escola: teoria e prática. 5.ed. Goiânia: Ed.
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NOGUEIRA, Makeliny Oliveira Gomes. Aprendizagem do aluno adulto: implicações para a
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PERRENOUD, Philippe. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens – entre duas
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129
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Acesso em: 21 set. 2011.
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130
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
1
Elizabete Damasceno 1
Semântica, lexicometria e representação do
conhecimento: congruências e aplicações ao ensino de
língua materna
Resumo
Os instrumentos de tratamento
informatizado de dados textuais abrem novas
perspectivas para os métodos de análises de
dados qualitativos. Este documento discute as
operações para a reorganização formal das
sequências textuais e das análises estatísticas
aliadas à análise de conteúdo, lexicometria e à
Semântica para estudar o vocabulário de um
corpus de textos, com aplicações ao ensino de
línguas.
Abstract
The statistics and textual data analysis
open new opportunities for content analysis.
This document discuss the operation to formal
reorganization of the texts sequences and of
the statistics analysis allied textual data
analysis, lexicometry and
Semantic for
studying the vocabulary of the textbody with
application to language education.
Palavras-chave: lexicometria; análise de
conteúdo; semântica e ensino de línguas.
Keywords: lexicometry; content analysis;
semantic and language education.
1
1. Introdução
Sabe-se que o sistema linguístico é um dos
sistemas de significação humana. Outros
sistemas de significar o mundo, o homem e o
conjunto de relações advindas existem e estão
em constante atuação nas práticas humanas
historicamente construídas. Nesse aspecto,
criar a si mesmo histórica e socialmente como
um ser dotado de sentido e de potencialidades,
parece-nos tarefa de um sujeito em
permanente construção e reconstrução de seu
saber e de seu saber-fazer, que, no complexo
social, linguístico e cultural, são ações
dinamizadas tanto por recortes e relações
conceptuais para a produção de novas
significações, quanto pelas articulações de
diferentes redes significativas em circulação
no cenário social, em semiose ilimitada.
Em sociedade, a dinamicidade dos
diferentes e múltiplos agrupamentos sociais
atesta a existência de uma variabilidade de
discursos-concretos, produzidos e
reproduzidos no quadro geral da comunicação
humana, que, pela correlação espaço <>
tempo, possibilita a apreensão de diferentes e
múltiplas significações, visão de mundo e
recortes culturais. Essa relação entre espaço
<> tempo motiva, constantemente, o
aparecimento e a troca de um número
considerável de construções léxico-sintáxicosemânticas propostas por um duplo
significante: sujeito de um fazer e também
espectador desse fazer.
Elizabete Damasceno - Professora Doutora de Língua Portuguesa, Prof . Pesquisador da FICS, onde desde o primeiro
semestre de 2012 compõe a grupo de pesquisa – oficina de artigos e Inicialção Científica das Faculdades Integradas
Campos Salles – FICS. www.campossalles.edu.br
131
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Duas ações - individual e coletiva –
possibilitam a existência de uma sintaxe das
significações humanas, em suas relações
interiores e exteriores, de que resultam a
integração e a interação dos sujeitos aos
espaços que lhe são correspondentes, pela
produção de mensagens plurissignificativas e,
por isso, plausíveis. Eis operações construtoras
de rede de leitura constituída de saberes
culturais, relações sensíveis e julgamentos
com os quais potencialidade de significação e
enunciados (re)encontram-se e são ajustados
por um “eu”, que coloca em movimento não
só projetos de ação e de interação e visadas de
saber, como também um conjunto de emoções,
sob a ordenação de uma configuração
complexa: a figurativização de objeto(s) de
valor para a construção do tecido discursivo.
Nesse cenário, constroem-se e consolidamse movimentos de participação,
responsabilidade e compromisso social, a fim
de que se possa atender à diversidade e às
diferenças, aos desejos, necessidades e
demandas da modernidade e da tradição, em
que conteúdos “conceptuais”, “factuais”,
“procedimentais” e “atitudinais” constituem
reflexo e seleção de aspectos da cultura, e
contribuem
para o
desenvolvimento da
individualização e socialização de
competências e habilidades em diversas e
diferentes “áreas” e “domínios de saber”, que
não podem se apresentar descontextualizadas
da construção e do desenvolvimento cultural,
para mais além da esfera individual ou
pessoal, no âmbito de finalidades e tarefas
compartilhadas, compromissos e implicações ,
considerados acordos e contratos consensuais,
a exemplo das línguas naturais.
2. Semântica e representação do
conhecimento
Dos diferentes discursos manifestos em
diferentes códigos produzidos e reproduzidos
socialmente, muitas significações são também
produzidas e, recuperadas pelos sistemas
semióticos, armazenadas como grandezassignos na memória do(s) falantes(s)
convertidas em modelos disponíveis para
atualização e em modelos para nova(s)
análises(s) dos dados da experiência,
caracterizado(s) por constantes movimentos de
reflexão, projeção, recepção e ação.
Dentre outros, o código linguístico,
considerada a sua natureza e o seu
funcionamento, apresenta-se como um sistema
de significação altamente produtivo: elabora,
constrói, estrutura e reformula,
permanentemente, os dados da experiência,
considerados os diferentes toπoi, cujos
resultados de recorte(s) sobre substância
amorfa são novos recortes conceptuais, tanto
em relação ao processo de estruturação de
novas funções semióticas e metassemióticas
(PAIS: 1993), como em relação à codificação
de novas informações, que, como já se
afirmou, são recuperadas pelo sistema e
armazenadas no banco de memória do(s)
falantes para suas novas atualizações,
constantes e ilimitadas.
Pela produção de atos comunicativos,
interativos, reconhece-se o dinamismo das
estruturas linguísticas, ou dito de outro modo,
reconhecem-se a estruturação e a
reestruturação de unidades léxicas, definidas
como unidades memorizadas, em
competência, pelo falante, uma exigência do
próprio meio sócio-cultural, em constante
evolução.
Entendemos que entre Universo Léxico de
uma comunidade considerada e estruturas
sócio-culturais há uma relação de
interdependência, que pode ser verificada,
compreendendo-se o conjunto dos elementos
efetivos e virtuais do sistema linguístico
considerado; a combinatória e as exigências da
distribuição semiotáxica; o processo e
condição da produção discursiva e seu próprio
funcionamento no espaço da vida social; a
norma e registros linguísticos empregados em
relação também ao contexto e à situação
vivenciados pelo(s) falante(s) em seus atos de
132
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
comunicação, considerados os vários tipos e
gêneros textuais em circulação na sociedade.
No espaço discursivo, vertentes figurativas
possibilitam o aparecimento do sentido como
conteúdo de um estado inicial a transformar-se
e de uma estado final transformado e
contextualizado, fundantes de significação e
de veridicção histórica, autorizados e
sustentados que são por uma competência
cultural. Eis rede de linguagem complexa, que
sustenta sistema de valores, relação
hierarquizada de diferentes códigos em
operação, segundo metassistema conceptual
concernente ao sistema de significação
produzido culturalmente e subjacente ao nível
pré- e transcódigo da comunidade
considerada.
Acrescentamos, ainda, que designações são
produzidas, recortes são elaborados no
continuum da existência (HJELMSLEV:1971),
a partir de sistemas precedentes compatíveis e
coerentes com a relação entre classes de
equivalência e domínios de experiência,
possíveis por uma metassemiótica cultural
(estrutura estruturante) e construídos por um
léxico e gramáticas conceptuais, que permitem
a produção e o relacionamento de recortes
culturais (RASTIER: 1987). A passagem de
um código a outro se dá graças à
intermediação desse metassistema conceptual,
subjacente – em nível de estrutura hiperprofunda – em relação aos Discursos e
Universos de Discursos e aos sistemas em
constante operação. O metassistema
conceptual apresenta-se, pois, como um
primeiro nível de análise dos dados da
experiência, configurado por um léxico
conceptual, segundo regras de sintaxe
conceptual de um lado, e um conjunto de
enunciados conceptuais de outro,
interdependentes.
Ora, isto conduz a pensar que a ligação
entre sémiosis e noésis é muito mais estreita e
mais profunda do que geralmente se admite.
Representações semióticas e representações
mentais não podem ser consideradas
133
independentes, embora pertençam a domínios
diferentes. O desenvolvimento das
representações mentais se efetua(m) como
uma interiorização das representações
semióticas ao mesmo título que as imagens
mentais são uma interiorização de perceptos
(VYGOTSKY:1985; PIAGET:1968a; DENIS:
1980 apud DUVAL:1995). A compreensão
conceptual, a diferenciação e a matriz de
diferentes formas de raciocínio, assim como as
interpretações de enunciados ligam-se,
inteiramente, à mobilização e à articulação
quase-imediata de muitos registros de
representação semiótica, cuja representação
depende de coordenação entre interiorização
de perceptos, imagens mentais, interiorização
de representações semióticas e de
desenvolvimento de representações mentais
efetuadas, elaboradas por um sujeito, imerso
na pluralidade dos sistemas semióticos que
permitem uma diversificação de
representações de um mesmo objeto e o
aumento das capacidades cognitivas dos
sujeitos e, em consequência disso, de suas
representações mentais, uma atividade
cognitiva primordial.(BENVENISTE:1998)
Desta feita, na perspectiva da semântica
interpretativa, e da semântica e mesmo da
análise da inteligência artificial, algumas
questões se apresentam, tais como:
a) que é ler um texto?
b) que instruções possibilitam atualizar o
conteúdo de um texto, desde os traços de
significado?
c) como acessar o sentido?
d) como representar o sentido ou os
sentidos de um
texto e descrever as
relações de sentido?
e) por quais operações de interpretação
pode-se chegar a produzir seu conteúdo?
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
3. Lexicometria, representação
gráfica do conhecimento e ensino de
Língua(s)
A análise lexical, textual e discursiva, com
o auxílio de instrumento da informática e
instrumentos matemático e estatístico
(estatística paramétrica), coloca-se à
disposição de uma análise objetiva, descritiva
e “científica”.
Do tratamento automatizado de um
inventário lexemático, constituído de 27.950
palavras-ocorrências, atualizadas em
discursos-concretos - as 180 redações de
alunos de série final de ciclo fundamental de
estudos, recolhidas ao longo de um ano de
letivo, distribuído em início, meio e fim de
processo de ensino-aprendizagem, de seis (06)
diferentes escolas de ensino fundamental,
representantes de três diferentes regiões da
Capital do Estado de São Paulo – foi-nos
possível configurar do vocabulário geral
avaliado, o vocabulário de base ou comum, o
vocabulário preferencial e o vocabulário
diferencial, um arsenal relativamente poderoso
que permite a seus possuidores enfrentar a
agressão dos objetos e das situações
nominalizadas, que, por sua vez, dependem de
um vocabulário muito mais amplo, inscrito
numa “memória” que faz aparecer, a todo
momento, eventuais sujeitos à procura de
predicação.
Do ponto de vista do processo, a análise
quali-quantitativa de textos, com o auxílio da
ferramenta STABLEX – instrumento
desenvolvido por André CAMLONG,(1991),
da Universidade de Toulouse – Le Mirail –
CRIC – permitiu-nos trabalhar com indivíduos
lexicais, constituintes do texto que veicula o
discurso, reter números de base para operar
com medidas comparativas e descritivas, a
fim de se caracterizar topológica e
combinatoriamente os elementos lexicais do
corpus dado e delimitado, de que já resultou
parte das reflexões sobre aspectos
relacionados ao ensino do vocabulário em
Língua Portuguesa (língua materna) em
escolas de ensino fundamental, apresentadas,
por nós, em dissertação de doutoramento, na
FFLCH/USP—Departamento de Linguística.
Dessa etapa, buscamos, agora, o
aprofundamento da avaliação, porque,
acreditamos, ser possível verificar a
possibilidade da produção de sistemas
axiológicos, e as performances emissivas e as
receptivas dos participantes de uma mesma
comunidade sóciolinguísticocultural para
poder situar a rede das comunicações sociais
generalizadas e a rede das formas e modos de
seu exercício, caracteres asseguradores do
estatuto social do indivíduo, segundo estratos
e estados definidos por exercícios de
correlação e covariação entre elementos. Por
certo uma tipologia de Universos Semânticos
deve, ainda, ser construída, uma vez que um
mesmo sujeito assume papéis
sóciossemióticos diferentes, porque
pertencente a grupos sociais diferentes e
participante de diferentes e várias situações de
comunicação.
Se, por um lado, a lexicometria, pelo
encadeamento de medidas e operações,
oferece a imagem do discurso – o peso de cada
um dos casos da matriz; as linhas de força que
nos permite descrever qualidades comuns,
preferenciais e diferenciais do vocabulário
efetivamente empregado; avaliar a tendência
(reta de Henri) e compreender a integridade do
discurso pela operação relação/valor (estrutura
ou não de conjunto, presença de vocabulário
rico ou pobre, e sua tendência ao
enriquecimento ou ao empobrecimento); por
outro, a representação gráfica do
conhecimento pode se beneficiar dessa análise
lexicométrica para deixar transparecer
propriedades e marcas características, dadas
por graus de variabilidade, tolerância e
liberdade, e por linhas de determinação.
Este estudo, em seu segundo momento,
teve então, como ponto de partida o
levantamento geral dos dados já recenseados e
tratados, numa primeira abordagem, para,
134
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
desse mesmo levantamento, aprofundar ainda
mais o estudo. E, num momento ainda
posterior, apoiado nos fundamentos de
Semiótica, Lexicologia e Semântica
Cognitiva, explorar, de forma gradual e mais
aprofundada, a manifestação sintagmática
aliada à forma de organização discursiva (tipos
e gêneros textuais), compreendendo-se
unidades frásticas e transfrásticas. Segue-se o
estudo da organização específica das unidades
constituídas, e, simultaneamente, da conotação
particular, determinada e delimitada de tal tipo
de organização textual, de que um ponto de
convergência se instala: um entremeado na
polissemia de todos os instantes-significações
pertencentes a n-metadiscursos, dos quais
planos isotópicos de ordem lingüística –
interdependentes e intercomplementares –
apresentam-se sob a forma de enunciados
qualificados e funcionais, evocadores,
certamente, de uma espécie de rede
(esquemas de entendimento), componente(s)
de uma taxeonomia gramatical, definidora de
um conjunto de interrelações e de interações,
que é necessário examinar, para que, em
seguida, seja possível a construção, então, de
mapas conceituais ou esquemas de
entendimento, segundo metarregras
interpretativas atualizadas e postas em jogo(s)
de linguagem, posto que um texto é produto
do encontro entre uma língua, um homem e
uma sociedade.
Dadas as características da sociedade
contemporânea, em que novas formas de
autonomia, de cooperação e de trabalho são
assumidas, assuntos relacionados à Ciência e
Tecnologias da Linguagem têm recebido
especial atenção. Progressos na área
técnicocientífica têm caracterizado a
contemporaneidade, no quadro das Ciências e
suas aplicações, considerados diferentes eixos
temáticos, relacionados a múltiplos assuntos,
particularmente vastos, em suas diversas
perspectivas.
No tocante às questões relacionadas à
Educação, área caracterizada por relações de
135
autonomia e cooperação, compartilhamento de
saberes em situação de interatividade social,
como processo permanente de construção e
busca de saber e de saber-fazer, a presença de
alternativas para dar conta de dificuldades,
vivenciadas tanto por educadores como por
alunos, têm motivado a adoção de novas
possibilidades pedagógicas, que,
contextualizadas, procuram a valorização da
atividade humana para a melhoria das
condições de vida do homem.
E no tocante, sobretudo, à Pedagogia de
Línguas, o desenvolvimento de competências
e habilidades cognitivas e metacognitivas
requer, tanto do professor quanto do aluno, um
conjunto de (novos) valores, relações,
interações e papeis para compreender
mecanismos e procedimentos de
processamento e reconhecimento de
regulamento e controle do próprio
conhecimento, sob diferentes dimensões e
formas de interação. E ou se considerem
características e princípios relacionados à
ordem
natural do mundo, refletidos na
linguagem, ou se considerem natureza e
dimensões constitutivas da faculdade de
simbolização, ou se considere o conjunto
dessas relações e princípios, por sua vez,
relacionados a sistemas de ensino versus
sistemas de aprendizagem, estão no centro das
discussões o homem,
o pensamento e o
simbólico; a imagem e o discurso no processo
das relações de identificação, o conhecimento
e o reconhecimento: o fio de Ariadne.
Diante do exposto, julgamos interessante o
levantamento de aspectos que possam
contribuir para a reflexão sobre a Pedagogia
de Línguas, notadamente para o Ensino de
Língua Portuguesa, considerados também os
documentos oficiais, levando-se em conta a
formação linguístico-cultural dos participantes
de uma comunidade considerada e critérios
lexemáticos e conceptuais, dentre outros, que
possam orientar a leitura, a interpretação e a
produção de textos, uma das áreas possíveis de
aplicação. A partir de situação de ensino-
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
aprendizagem de língua já amplamente
conhecida , constituem-se objetivos:
h) categorizar e construir mapa(s)
conceitual ou mapa(s) de competência;
a) mostrar a importância e o alcance de
um estudo de texto, do ponto de vista da
análise lexicográfica, como instrumento
capaz de medir e mapear conhecimento
para atingir propósitos produtivos;
i) promover considerações teóricas e
práticas que possam advir como
constructores e indicadores de inovação,
com base em conhecimento e tecnologia
apropriados para representar propriedades
do conhecimento;
b) analisar os impactos dessa base
tecnológica sob o número de aspectos de
desempenho e formação de redes de
inovação, indicativas de novas abordagens
e procedimentos metodológicos.
E no conjunto dessas reflexões gerais,
formalizam-se também:
a) desenvolver índices adequados para a
produção, seleção, armazenagem e
atualização de conhecimento por meio de
representações lexicais, textuais e
discursivas;
b) trabalhar com representações gráficas
do conhecimento, no domínio da
psicologia e da semântica cognitiva;
c) r e v i s a r , d e f o r m a g r a d u a l e
aprofundada, elementos de trabalho com
vistas à descrição e atualização de
instrumentos, mecanismos e
procedimentos;
d) avançar o estudo descritivo pela análise
dos dados por meio de exercícios de
correlação e covariação, através de
procedimento da estatística paramétrica,
objetiva, científica e indutiva;
e) analisar o funcionamento de aplicativos
disponíveis, e acessíveis, como
ferramentas , possíveis, embora não
imprescindíveis, de mapear
conhecimento;
f) padronizar documentação por meio de
processo de automação, de criação,
catalogação e reorientação com base em
regras pré-estabelecias;
g) estruturar o conhecimento para
representar um processo, a fim de se criar
uma base de conhecimento;
4.Esquemas de entendimento e
representação gráfica do conhecimento
Representações mentais e representações
semióticas não podem, pois, ser consideradas
independentes. Não há noésis sem sémiosis sem recorrer à pluralidade ao menos potencial
de sistemas semióticos, recurso que implica
sua coordenação pelo sujeito ele-mesmo. Isto
nos conduz a pensar que há uma ligação
estreita entre noésis e sémiosis e é sabido que
a compreensão conceptual, a diferenciação e a
matriz de diferentes formas de raciocínio, bem
como as interpretações de enunciados ligam-se
ao dinamismo e à articulação de muitos
registros de representação semiótica. È, pois,
uma atividade cognitiva primordial.
Trate-se de tarefa intelectual, de um
exercício de raciocínio, de explicação ou
cálculo, ou, ainda, de uma resolução de
problema, ou de uma atividade de
(re)textualização. Encontram-se, aí,
representações semióticas convertidas para
serem tratadas, cujo caminho consista em
distinguir não só o valor epistemológico e
valor de verdade de uma proposição, como seu
estatuto e conteúdo, caminhando-se da análise
funcional para a análise estrutural.
Nesta perspectiva, língua e fala
apresentam-se como duas instâncias
autônomas e instauradoras do lugar de
encontro para a produção de sentido, que,
aplicadas a uma comunidade cultural definida,
colocam em evidência a distância separadora
do que é coletivo e individual da existência
semiótica. A resultante da descrição de
136
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
mecanismos da língua natural e da construção
de conceitos epistemológicos que ela supõe
confronta-se com todas as outras formas de
existência social e individual.
Como já nos referimos, a compreensão
conceitual, a diferenciação e a matriz de
diferentes formas de raciocínio, assim como as
interpretações de enunciados ligam-se,
inteiramente, à mobilização e à articulação
quase-imediata de muitos registros de
representação simbólica, cuja representação
depende da coordenação entre interiorização
de perceptos, imagens mentais, interiorização
de representações semióticas e
desenvolvimento de representações mentais
efetuadas e elaboradas por um sujeito –
individual e coletivo – imerso na
multiplicidade de sistemas de significação,
que permitem a diversidade de formas de
representação de um mesmo objeto e
aumentam as capacidades cognitivas dos
sujeitos e, em consequência, as suas
representações mentais.
A forte ligação entre funcionamento
cognitivo do pensamento e a diversidade de
registros de representações, consideradas as
duas atividades – o raciocínio e a compreensão
de textos – poderia melhor descrever os
processos que lhe são subjacentes? E será,
pois, a forma figurativa – por meio da qual se
manifesta a participação mais geral dos
indivíduos que a compõem – uma das
características principais da dimensão
semiótica de uma sociedade considerada?
Considerando-se que as instruções
interpretativas são construídas, e não dadas, a
questão, então, poderia residir não na escolha
deste ou daquele método, mas na estratégia
adotada e na teoria de que ela procede. Desta
feita, a definição da unidade lexical numa
perspectiva enciclopédica, segundo uma
norma regente, e a construção de isotopias,
poderia permitir não só integrar aspectos
importantes relacionados à extensão do
corpus, ao conhecimento do sistema
linguístico e estruturas idioletais e o sistema
137
funcional da língua, como também atualizar
componente(s) semântico(s) do(s) texto(s)
considerado(s), observando-se as diferenças
diatópicas, diastráticas e diafásicas de uma
língua funcional e sintópicas, sintrásticas e
sinfásias, se considerado um só nível de língua
e sob uma só forma de um só estilo.
De acordo com NOVAK (1981), mapas
conceituais podem ser construídos de forma
uni, bi ou multidimensional, de acordo com: 1.
encadeamento linear de conceitos e, portanto,
esquematização linear de idéias; 2.
categorização de conceitos e ligações, segundo
associações das mais simples às mais
específicas, representadas por categorização
causal ou temporal; 3. ou sob o formato de
‘hipertextos’. Mapa conceitual constitui-se em
um conjunto de conceitos interrelacionados,
segundo uma estrutura hierárquica
proposicional, e permite, através de recursos
gráficos, enfatizar semelhanças entre conceitos
pela semiotização do percurso que conduziu à
sua construção.
E segundo AUSUBEL (1963), mapas
conceituais podem ser utilizados para a
promoção de diferenciação conceitual,
progressiva e integrativa, de sorte que cada
indivíduo reelabora o processo de
significação, atualizando sentidos em
conformidade com sua própria bagagem
cultural. Mapas conceituais aparecem também
como uma tecnologia para negociar
significados, o que é feito por meio de
propriedades, tal que a forma de representação
se fundamenta em:
a) tipificação dos conceitos e classes de
conceitos;
b) níveis e operações de abstração
envolvidos na categorização de
informações.
Colocamos, mais ainda, a construção de
uma microssemântica, como hipótese de
trabalho, segundo a qual a construção de
mapas conceituais, definidos como
representações mentais, seriam organizados,
de sorte que três percursos elementares de
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
atualização poderiam se realizados, a saber: 1.
de traços de significado inerente a um outro
traço de significado inerente; 2. de traço de
significado inerente a aferente; 3. de traço
aferente a um aferente, de acordo com
norma(s) e lei(s) de interpretação contextuais à
propósito da determinação da coesão textual.
Ora, se as condições de atualização de um
traço de significado depende de uma pertença
contextual, qual é a garantia desse
pertencimento? Uma análise textual deve
operar uma seleção por meio de traços
atualizados, de que a estratégia e a tática
interpretativas podem ser regradas por uma
racionalidade, e ser o objeto de uma descrição
científica, que, por sua vez, permita a
plausibilidade de diversos percursos
interpretativos, de sorte que se reconheça para
cada palavra os componentes próprios de uma
língua, que o contexto e a situação de
comunicação convocam ou virtualizam.
(RASTIER:1987b)
A construção de esquemas de entendimento
e/ou a representação gráfica do conhecimento
pode se beneficiar de estratégias e de
procedimentos tais que os sentidos de um
texto não sejam mais somente acessíveis à
intuição, mas também, e sobretudo, descritos
racionalmente.
5. Língua: sistema de possibilidades
ou de virtualidades
A historiografia da Lingüística é marcada
pela passagem de uma modelização referencial
à intensional. A gramática da Antiguidade
(perpetuada pelas gramáticas escolares)
desenvolveu formas descritivas, de modo que
categorias foram definidas em termos
referenciais, sob tipologia diversa; categorias
definidas, a exemplo, por referência a estados
psicológicos dos locutores (modos optativo e
dubitativo); por referência a tipos de objetos
designados (nomes e pronomes definidos e
indefinidos); por referência à posição da
própria categoria ou do seu substituto
(advérbio, interjeição e pronomes
substantivos); por relação ao contexto
gramatical (particípio - nome/adjetivo e verbo
- e conjunção - elementos de ligação de frases
ou sintagmas) e por referência ao uso e à
origem das formas (nomes - comum, próprio,
de ornamento, e neologia - compostos e
derivados).
A representação espacial permitiu a
descrição de objetos e sua correspondência a
dados exteriores; descrição, segundo uma
justaposição, que definiu a língua como
organismo estático, o que implica contexto
referencial imediato e apoio em regras
formuladas em termos de conteúdo, proposta
de constituição hierárquica sobre regras,
marcas flexionais e derivacionais, cuja base se
dá sobre conteúdos nocionais e não de acordo
com uma integração tipológica.
Disto dois fatos se apresentam
estreitamente relacionados: o desenvolvimento
de uma reflexão metodológica de um lado; e
de outro, o desenvolvimento de um trabalho
linguístico, que se portando sobre um objeto
disperso, a história de uma língua ou a
comparação de estados de língua, busca
estudar marcas flexionais para a constituição
da estrutura da palavra, pela busca de seu grau
de composição, ou pela semântica das relação
de actância ou por figuração morfogenética,
sustentada pela polaridade emissão-recepção.
No entanto, um estudo científico da
utilização da linguagem tem, como se sabe,
seu ponto de partida num ato metafórico, que é
um trabalho de conceptualização, em que são
apresentados como objeto direto os
enunciados teóricos, e como objeto indireto as
suas aplicações, segundo setores específicos
da realidade. Como exemplo, tem-se a criação
de termos ou palavras técnicas, dada por
modelo conceptual global, em que, por
exemplo, um termo é criado por associação a
um campo já conhecido, ou por modelo
conceptual ativo em que o termo criado se dá
segundo domínio adjacente, por meio da
138
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
associação de campos, ainda em termos
espaciais, como, por exemplo, os termos
‘extensão ou ampliação de sentidos’ e
‘restrição ou deslocamento de sentidos’.
Desse aspecto, interroga-se sobre as
expressões que, sem alguma relação
s i g n i f i c a n d o s u b s t â n c i a d o s e r, s ã o
categorizadas em substância; quantidade;
qualidade; relação; lugar; tempo; posição;
possessão; fazer, cuja organização retórica tem
base semântico-gramatical, e constituem um
quadro de descrição ou de exposição para a
definição funcional, tal qual as gramáticas
escolares. E, além deste, um outro fato é a
disposição de metaforização interna (ou
transferência interior) a partir da visada de
uma língua, em que a explicação de universais
linguísticos dá-se como correspondentes a um
jogo de estratégias.
Do ponto de vista, então, de uma
arqueologia do saber linguístico (Coseriu), um
modelo teórico se insere num contato social,
global e específico, cuja teoria deve ser
definida em razão de outras teorias e modelos
e cuja comercialização apresenta três
componentes internos, a saber: a)
formalização (ou conjunto de técnicas de
descrição, propondo-se um inventário não só
das regras descritivas ou eventualmente
normativas, bem como dos constituintes,
definidos como metarregras, em que regras
codificam estruturas linguísticas; e
constituintes, a representação formal de
extensibilidade do modelo, cuja variação
linguística deve ser explicada pelo próprio
universalismo do modelo; b) conceptualização
(ou nível de semântica articulado do modelo nível de formação das noções teóricas ou
estudo das macroestruturas do objeto descrito
e articulação das unidades da descrição, bem
como do processo típico de funcionamento da
língua ou do discurso); c) auto-imagem (ou
modelização do objeto e procedimentos da
descrição e da relação entre objeto/sujeito; na
linguística, o desdobramento do sujeito
linguístico e sujeito da descrição).
139
Todavia, o campo metodológico coloca em
foco questões epistemológicas, pois importam
as condições de possibilidade, uma vez que no
espaço do saber aparecem configurações que
dão lugar a formas diversas do conhecimento
empírico.
A linguagem, por sua vez, é determinada,
na sua essência e manifestação, por dimensões
universais, a saber: a) criatividade: atividade
livre e criativa; b) materialidade: realização
por formas materiais (fônica, gráficas etc); c)
semanticidade: a toda forma corresponde um
conteúdo e vice-versa; d) alteridade:
manifestação primária do ser-com-outro,
manifestação por outro e ao outro; e)
historicidade: a linguagem manifesta-se
sempre e necessariamente e sob a forma de
uma língua, na tradição linguística de uma
comunidade histórica.
A criatividade e materialidade são
universais de toda forma de cultura, atividades
criativas que se realizam por meio também de
formas criativas; a semanticidade é diferença
específica da linguagem dadas as formas
sócio-culturais; e a alteridade é o traço
distintivo do ato de significar linguístico em
relação às outras formas expressivas e,
consequentemente, o fundamento da
historicidade da linguagem, manifestação
constante da solidariedade com uma
comunidade de sujeitos-falantes, com tradição
e, pois, essência social e histórica intrínseca ao
universo humano.
Desta feita, a linguagem - atividade
histórica universal e realizada segundo as
tradições das comunidades históricas apresenta três níveis relativamente autônomos,
a saber: a) nível universal do falar em geral; b)
nível histórico das línguas; c) nível individual
e particular do(s) discurso(s) ou discurso(s)ocorrência(s) definido(s) como texto(s),
unidade(s) de significação.
A estes três níveis correspondem três tipos
de saber linguístico: a) saber elocucional ou
saber em geral; b) saber idiomático ou saber
falar tal ou qual língua; c) saber expressivo ou
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
saber construir tal ou qual discurso/textos. E a
esses saberes correspondem também três tipos
específicos de conteúdo: a) designação; b)
significado; c) sentido. Aos quais, por sua vez,
correspondem três tipos de conformidade do
falar com o saber linguístico ao que se
encontra correspondência a cada nível: a)
congruência; b) correção; c) adequação.
Disto decorre que a oposição corrente entre
linguistica descritiva e linguística histórica é
uma convenção terminológica, que se é
possível até admitir não sem uma oposição
entre descrição sistemática (ou estrutural) e
história da língua. Entende-se o saber
linguístico como um saber técnico, e que,
nesse sentido, o saber idiomático são as
técnicas históricas do falar. No entanto,
correspondente a uma língua histórica e não a
um sistema único e unitário; um conjunto de
tradições em parte análogas e em parte
divergentes.
Isto posto, a criatividade manifesta-se como
variedade (considerando-se um estado de
língua) e a alteridade como homogeneidade e
unidade. Quanto à variedade linguística, três
são os tipos fundamentais: a) variedade
diatópica ou espacial; b) variedade diastrática
ou sócio-cultural; c) variedade diafásica ou
estilística. E são também, no sentido contrário,
três os tipos de unidades, a saber: a) sintópica
ou dialeto; b) sintrática ou níveis de
linguagem; c) sinfásica ou estilos de
linguagem.
O que é comum? É a língua funcional, um
sistema delimitado cada vez mais como
sistema homogêneo. Define-se uma língua
histórica, então, como um conjunto complexo
de dialetos, níveis e estilos (dado que o
unitário só é segundo um só ponto de vista),
ou um conjunto ainda mais complexo de
línguas funcionais historicamente realizadas
entre si.
Significa isto que, na prática, todo falante é
um sujeito plurilíngue, porque conhece ativa
ou passivamente, sob diferentes graus, mais de
um dialeto e mais de um nível de língua e, por
definição, diversos estilos e, então, uma série
de línguas funcionais, que efetivamente usa
em seu falar, considerado um mesmo e único
sistema linguístico que o sujeito-falante
emprega em suas relações social e
historicamente construídas.
Considera-se que um estado de língua é
estático somente como uma técnica já
realizada e na projeção sincrônica sobre um
eixo imóvel, pois um sistema linguístico, de
fato, se acha num duplo movimento: no
sentido da variedade (difusão e recessão) e no
sentido da renovação dos sistemas idealmente
unitários. (COSERIU:1992)
Desse ponto de vista, uma língua não é algo
já feito, acabado (ergon), mas, ao contrário,
essencial e fundamentalmente, um sistema de
modos de agir: uma prática ou técnica aberta,
e, em consequência, um sistema de
possibilidades ou de virtualidades que se
realizam progressivamente no eixo da história;
um saber-fazer produtivo, que apresenta, por
sua vez, três níveis: a) sistema materialmente
realizado e tornado tradição tal qual uma
norma; b) conjunto dos modos de fazer
funcional, tal qual um sistema; c) conjunto
coerente das categorias funcionais e dos tipos
de procedimentos materiais, tal qual tipo
linguístico.
Assim, uma língua não é jamais feita: criase, faz-se e refaz-se continuamente (ainda que
sem mudança aparente). Criação e recriação
das tradições históricas linguísticas e
emergência da língua como uma tradição, de
modo que o ser da língua coincide com o vira-ser histórico. A redução convencional de
uma língua a um só sistema linguístico língua funcional- entende-se não só como uma
sincronia ou como uma descrição sistemática
ou estrutural e como uma diacronia ou estudo
do desenvolvimento histórico de uma
sincronia (ou gramática histórica). mas
também como história da língua.
Nesse último sentido, os termos não são
correlativos, posto que à sincronia
corresponde não somente a descrição de um
140
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
sistema unitário mas também a descrição
dialetológica, sociolinguística e estilística da
língua. À descrição, então, corresponde um
sistema não só sincrônico, mas sintópico,
sintrástico e sinfásico.
Estabelece-se que a sincronia está para
funcionamento, assim como mudança está
para diacronia, um só momento, uma vez que
as mudanças são “internas”, resultantes da
dinamicidade própria da técnica idiomática,
das realizações de virtualidades já dadas como
tais: o que é mudança da norma é
funcionamento do sistema e o que é mudança
do sistema é funcionamento do tipo
linguístico.
A norma se modifica exclusivamente pela
aplicação do sistema (real ou re-interpretado);
o sistema, pela aplicação do tipo ou pela
aplicação do sistema mesmo como uma
reinterpretação; e o tipo, somente pela
reinterpretação, motivada ou não pela copresença de dois ou mais tipos na mesma
língua histórica ou por influência de sistemas
linguísticos diferentes.
Diante do exposto, só a história pode
corresponder o ser real da língua,
considerando-se:
a) variedade e homogeneidade da língua a descrição sistemática não pode
considerar a variedade sem perder a sua
coerência, já que não é bem secundário,
mas um bem intrínseco à língua, refletor
da criatividade essencial da língua, dado
que uma língua não funciona somente por
meio de estruturas internas, mas também
pelo conhecimento dos falantes;
b) tensão entre estruturas diacrônicas
correntes (virtuais e nova) , já que
descrição sistemática de estruturas aparece
em sistemas diferenças, ou variantes nãofuncionais (ou estruturas opositivas
diferentes);
c) processo de permanente constituição:
realização progressiva na/da norma e do/
no sistema de um sistema linguístico já
141
dado tanto quanto de sistema como de
tipo.
A descrição sistemática considera a língua
como uma técnica aberta ou um sistema de
possibilidades, e, portanto, tenta dar conta da
dinâmica interna própria de toda técnica
idiomática. A história pode registrar a
realização efetiva das formas e construção
supostas como possíveis no momento da
descrição e confirmar também sua realidade.
Considera-se a língua em suas relações com
outras formas de cultura espiritual e material
da comunidade falante e pode também dar
conta de tudo isso que no falar (ou como
conteúdo ou como estrutura sintáxica) é
determinado não como um saber idiomático
mas como um saber extralinguístico. Uma
descrição sistemática limitar-se-ia à língua em
si mesma, e, assim, ou interpreta a língua
numa perspectiva deformada ou renuncia as
determinações extralinguísticas do falar.
Na realidade, uma descrição - estrutural e
funcional - não se acha fora da história, pois
toda descrição de um objeto é parte da
história, pois que dela não se sai. A história é,
pois, ciência linguística integral, que aspira
considerar seus objetos, por exemplo, a língua,
sob todos os seus aspectos e com todas as suas
determinações históricas internas e externas:
ciência das línguas e história linguística.
Descrever, então, uma estrutura é dar conta
das dependências e independências, sem
ignorar a problemática semântica, porque não
se pode reduzi-la a apenas um repertório de
significações diferentes, posto que uma
variante é sempre função de uma forma; uma
significação particular é sempre função da
significação fundamental. deduzida
logicamente de significações particulares,
posto que a própria função constitui o
princípio da dependência, inerente e
constitutivo da estrutura. (HJELMSLEV:1971)
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
6. A análise lexical, textual e
discursiva
textual dos alunos - período inicial, medial e
final do processo de ensino-aprendizagem de
um ano letivo.
A análise lexicométrica, auxiliada por
ferramenta tecnológica, no caso deste estudo
pela ferramenta STABLEX (CAMLONG &
BERTRAND - Stablex - Software PC2004),
permite descobrir co-relacionamentos e dados
implícitos nos registros de um corpus, pelo
estudo e desenvolvimento de um processo de
extração, pela:
O estudo não aponta considerações
especificamente sobre as escolas, mas
tendências, advindas da análise evolutiva da
produção textual escrita dos alunos, que
podem, por sua vez, representar aspectos a
serem considerados em uma discussão sobre
ensino de línguas, sobretudo, ensino de língua
materna.
a) detecção de dependências entre os
dados, para se identificar os atributos e
suas relações de interdependência;
Os textos coletados, segundo os três
diferentes períodos do processo de ensinoaprendizagem durante um ano letivo (períodos
inicial, medial e final coincidentes a início,
meio e final do ano letivo, respectivamente),
receberam tratamento especial para a
classificação dos objetos (palavras), desde a
aplicação de técnicas de análise de informação
de dados lexemáticos para a identificação de
padrões e relacionamento entre os objetos, de
sorte que os textos, depois de tratados,
puderam ser convertidos em formato TXT ou
ASC II, que é semi-estruturado ou
desestruturado por apresentar características
complexas.
b) detecção de desvios para que se
identifiquem elementos que se encontram
fora dos padrões estabelecidos ou
esperados;
c) identificação e análise de estruturas e
de objetos com características comuns;
d) descoberta de fórmulas ou modelos
capazes de descrever os objetos ou
conceitos envolvidos.
Para tal, constrói-se uma metodologia
adequada, que compreende etapas de préprocessamento (mineração que inclui
processos de análise, integração, reinformações e limpeza de dados);
processamento (processamento de dados,
predição, regressão, classificação, constituição
de conglomerados, associações,
visualizações), e pós-processamento
(aplicação de filtro, seleção e ordenação das
descobertas, elaboração de mapeamentos de
representação e elaboração de relatórios para a
apresentação da base de conhecimento).
A base de dados constituiu-se de redações
de alunos da última série do ciclo fundamental
de ensino, de seis diferentes escolas da rede
estadual paulista, selecionados aleatoriamente
dez alunos de cada uma das seis escolas, cujos
textos foram produzidos em três momentos
diferentes do processo de ensinoaprendizagem, totalizando, então, para cada
escola, três diferentes momentos da produção
D e v e - s e e s t a b e l e c e r, a q u i , u m a
diferenciação entre classificação de dados e a
descoberta de aglomerados (grupo de
entidades similares ou regiões contínuas de
um espaço contendo uma alta densidade
relativa de pontos, separada por outras regiões
como esta por regiões contendo baixa
densidade relativa de pontos).
A classificação de dados ocorre por
conhecimento do próprio objeto, pela
possibilidade de se estabelecer descrição para
a classe dos objetos, segundo uma análise do
objeto e atribuição do objeto a uma classe, o
que é, pois, uma definição apriorística.
Diferentemente desta metodologia, operouse com a descoberta de padrões, e de
associações entre os padrões para, daí, efetuarse a definição de classes ou de categorias, uma
vez que não se conhecia de antemão a
classificação a que os objetos (dados) seriam
142
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
rotulados. Identificou-se a melhor distribuição
ou configuração, não pela comparação dos
dados a objetos já conhecidos, mas com base
na identificação de similaridade entre objetos
segundo atributos em comum, cujas variáveis
analisadas geraram grupos homogêneos
segundo análise combinatória e de alta
complexidade.
Do corpus tratado, as primeiras extrações
ou a ordenação dos dados foram obtidas: a
confecção do léxico (léxico alfa e léxico
delta ) que consistiu na disposição das
palavras para a organização das ocorrências
segundo o critério da freqüência, a primeira
etapa do trabalho, e da indexação das palavras,
segundo a frequência absoluta, a que se seguiu
a apresentação da tabela de frequência, e desta
as operações subsequentes (tabela de desvios
reduzidos e tabela dos valores lexicais) .
6.1. Representação de objetos ou padrões
O esquema representativo levou em conta a
representação por vetores de palavras (seleção
e extração de características) pelo critério da
seleção de características, segundo
representabilidade, efetividade e relevância,
em que a freqüuncia absoluta (números de
vezes em que a palavra ocorre num corpus) é
uma medida importante, mas medida
insuficiente. É ainda necessário estabelecer-se
a frequência relativa dada pela relação de uma
palavra a todas as outras do documento
considerado, no caso deste estudo, o
agrupamento das redações por alunos/série/
período/escola/região. Necessita-se identificar
o peso ou a força de representabilidade de
cada palavra, para se operar uma normalização
do número de ocorrências em relação ao
número total de ocorrências de todas as
palavras presentes nos documentos
considerados, justamente porque palavras não
ocorrem eventualmente em um texto.
A repetição de uma palavra por parte do
enunciador pode ser um indicador da
significância das palavras-ocorrências, pois a
143
inclusão de um elemento (novo) em
enunciados demanda um esforço maior, e, por
isso o enunciador lança mão da repetição de
palavras, enquanto avança ou varia sua
produção textual. Tais medidas de frequência absoluta, relativa e inversa - selecionam as
palavras descriminantes em algoritmos de
classificação ou de recuperação de informação
com perspectivas de identificação de
centróides ou matrizes; o corte se faz a partir
do próprio peso, pela estipulação de um valor
mínimo e de um valor máximo.
Esta etapa do estudo trabalhou com a
confecção de tabelas de frequência e de
desvios reduzidos. A Tabela de Desvios
Reduzidos é considerada etapa fundamental
para os processos posteriores, que consistem
nos cálculos algébricos, a análise paramétrica
propriamente dita. A extração de dados ou de
informações é uma técnica importante que, ao
utilizar algoritmos e ferramentas da área,
objetiva a extração de dados e informações
contidas nos textos para dar conta da extração
de identidade de dados e informações
relevantes.
No caso deste estudo, a relevância das
imagens apontam informações sobre a
evolução da aprendizagem no processo de
ensino, considerados os conglomerados dos
textos elaborados por alunos das diferentes
seis escolas em seus respectivos períodos de
aprendizagem (1- início; 2- meio e 3- período
final de um ano letivo), como demonstram os
gráficos 1 a 6 correspondentes ao peso lexical
apresentado pelo conjunto de texto produzidos
pelo grupo de alunos/série final de ciclo
fundamental de cada uma das seis escolas,
fruto da análise paramétrica:
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Gráfico 1 – escola 1
Gráfico 2 – escola 2
Gráfico 3 – escola 3
Gráfico 4 – escola 4
Gráfico 5 – escola 5
Gráfico 6 – escola 6
A análise paramétrica, importante
ferramenta de análise e síntese – objetiva,
indutiva e científica - possibilitou observar,
decompor e manipular dados, com a ajuda do
s o f t w a r e S TA B L E X ( C A M L O N G &
BERTRAND:2004), e chegar, pela arquitetura
dos textos, à composição do discurso. A
análise da representação da situação textual
deu-se de forma controlada pela própria
especificidade, por planos de produção e
compatibilizações sêmicas e semêmicas
(BARBOSA:1996), em que elementos
linguísticos foram reduzidos a dados
mensurados e proporcionalmente
dimensionados (estudos de frequência e
desvios reduzidos), de tal modo que foi
possível examinar o índice nocional,
quantitativo e qualitativo.
Para a produção de novas características
mais salientes, ou mais descriminantes ou
mais descritivas, criaram-se novos descritores,
quer pelo mapeamento de conceitos, em que
palavras são transformadas em estruturas mais
complexas, quer pela análise fatorial em que
as palavras são reduzidas à dimensionalidade,
agrupando-se variáveis correlacionadas.
Essa operação conta com a medição da
proximidade, associação ou semelhança entre
padrões, que possibilitou a descrição dos
documentos por valores qualitativos e por
valores quantitativos. Tais valores de
proximidade (proximidade, associação e
semelhança) correlacionam-se à distância
(física, considerado o espaço euclidiano) entre
os objetos, em que, na operação, por se
relacionar mais ao valor quantitativo, o
conceito de distribuição foi substituído pelo
conceito de similaridade, dado por medidas de
distância, coeficientes de correlação,
coeficientes de associação e medidas
probabilísticas de similaridade.
Foram valores estabelecidos segundo uma
métrica, medida estabelecida de forma
objetiva, reaplicável e quantificada, de acordo
com a natureza das características do objeto
(palavra): simetria, densidade triangular,
densidade de não-identidades e
indistinguibilidade de identidades (ou
equivalentes). A medida de distância é
importante para a verificação da distribuição
dos objetos em espaço euclidiano, em que
cada ordenada corresponde a uma
característica. A similaridade é uma operação
dada pela proximidade, associação e
semelhança das palavras (objetos) nesse
espaço.
A etapa seguinte compreendeu a análise do
agrupamento de entidades similares, ou
análise de regiões contíguas de um espaço,
contendo alta densidade relativa de pontos, e
separada por outras regiões contendo baixa
densidade relativa de pontos. Operação que se
144
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
caracteriza por densidade, por variância (o
grau de dispersão dos pontos presentes no
agrupamento, em relação ao seu centro, ou os
pontos (ocorrências) em relação umas às
outras), por dimensão (indicativo do raio ou
diâmetro, indicativo do conceito de
conectividade entre os pontos de um
conglomerado) e por separação (grau de
sobreposição ou isolamento dos
conglomerados no espaço),
6.2. Identificação e análise dos
agrupamentos utilizando-se de conceitos
A adequação de uma metodologia é
fundamental para a identificação e análise de
agrupamentos, decorrência de que apenas o
critério da frequência é insuficiente, porque
apenas dá conta de palavras soltas e ainda
descontextualizadas, de sorte que nem idéias,
nem objetos e nem ações são asseguradamente
identificados, por não se oferecer a seleção de
representações e discriminações adequadas.
Para minimizar a questão, a lexicometria
oferece técnicas, como as sumariamente
descritas, que possibilitam um estudo
controlado e padronizado, de que a partir do
conjunto de textos de alunos (conglomerados)
foi possível para cada um dos agrupamentos
estudar os valores lexicais, e obter o
Vocabulário Preferencial, Vocabulário Comum
(de base positiva e de base negativa) e
Vocabulário Diferencial, caracterizadores e
identificadores de aspectos da produção
textual dos alunos não só em cada um dos três
períodos, como na globalidade do processo
evolutivo do processo de ensinoaprendizagem, considerados cada um dos
grupos de alunos de cada uma das seis escolas
durante um ano letivo.
Para, apenas, uma amostragem, os gráficos
7, 8 e 9 apresentam os dados - relacionados
tão-somente e apenas à Escola 4 , de cujos
valores o leitor poderá fazer sua própria
análise:
145
Gráfico 7
(período inicial)
Gráfico 8
(período medial)
Gráfico 9
(período final)
escola 4 - períodos e valores lexicais correspondentes, considerandose início, meio e fim do processo de ensino-aprendizagem durante um
ano letivo:
Há que se considerar, para a análise dos
agrupamentos, a presença também de
descritores específicos, como, por exemplo, a
presença de hápax ou ocorrências altamente
discriminantes de um dado aglomerado, que se
caracterizam pela especificidade, pois se
apresentam uma única vez no conglomerado e
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
especificamente num determinado e único
aglomerado, sendo, pois um forte índice de
significância de aspectos identitários do
próprio aglomerado em que ocorrem.
Há também outras ocorrências
caracterizadoras de aglomerados, como as
o c o r r ê n c i a s q u e a p a r e c e m x+1 n o
conglomerado e apenas num aglomerado
específico, mas, aí, ocorrendo, no entanto,
apenas uma única vez.
7. Conclusão
Vive-se hoje num ambiente sistêmico,
complexo e dinâmico. Há um volume de
informações que a recuperação ou a
identificação de informações relevantes e não
só a análise e a manipulação bem como a
descoberta de novas informações não se
constituem tarefa das mais simples ou fáceis.
Nesse sentido o processo da descoberta de
conhecimento apoiado por ferramenta
tecnológica é um processo de análise de dados
ou informações para a aquisição de novos
conhecimentos a partir da manipulação de
uma grande massa de dados ou informações.
Da análise de freqüência ao cálculo
algébrico, foi-nos possível a observação e o
estudo de tendências e convergências que
enriqueceram a compreensão tanto da natureza
dos elementos codificados quanto do
cruzamento das varáveis contextuais. Da
análise lexical e textual determinaram-se
valores, hábitos e força de certas cargas
emotivo-afetivas, e evidenciaram-se operações
lógicas da superfície discursiva e redes
produtoras de efeitos de sentidos. A
quantificação do vocabulário tornou possível
atingir três níveis fundamentais da linguagem:
vocabulário maciço ou preferencial (z ≥
+1,96); vocabulário comum, base média
(-1,96 ≤ z ≤ +1,96; e vocabulário único ou
diferencial (z ≤ -1,96), para cada uma das seis
escolas em seus respectivos períodos de
ensino-aprendizagem. (z = desvio reduzido)
Determinaram-se valores, hábitos e força
de certas cargas emotivo-afetivas,
evidenciaram-se operações lógicas da
superfície discursiva e redes produtoras de
efeitos de sentidos, atingindo-se três níveis
fundamentais: vocabulário maciço ou
comum ou zonas de intensidade,
conformismo, clichês e estereótipos
lingüístico-culturais; vocabulário comum ou
base média sobre a qual se estabelecem a
comunicação e o universo mental, implicações
de um dado grupo social e vocabulário único
ou diferencial, carregado de informações,
esperas e desventuras.
A identificação de redes de conhecimento,
dimensão de análise transversal torna possível
a revelação de perfis importantes para
redefinição de pré-requisitos e exigências para
desenvolvimento de competências e,
consequentemente, esforços num trabalho
conjunto, crucial no processo de interação,
inovação, desenvolvimento e gerenciamento
do potencial humano, em que novas formas e
abordagens de socialização do conhecimento
são indispensáveis às novas arquiteturas de
aprendizagem.
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147
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
12
Mauro Maia Laruccia1
Sergio Roberto Cosmano 2
As Inteligências Múltiplas: Uma Análise de Conteúdo de
Pesquisa
Resumo
Abstract
Este artigo trata de uma análise dos aspectos
cognitivos do pesquisador, a partir da teoria das
inteligências múltiplas. Na teoria das
inteligências múltiplas (IM) o conceito de
inteligência é compreendida como uma
capacidade geral, encontrada em graus
variáveis em todos os indivíduos e implica na
capacidade de resolver problemas ou elaborar
produtos que são importantes em determinado
ambiente ou comunidade cultural. Os diversos
tipos de inteligências estão localizados em
áreas distintas do cérebro e podem funcionar de
modo independente ou em conjunto estas
inteligências podem definir a espécie humana.
Embora estas inteligências sejam até certo
ponto independentes uma das outras, elas
raramente funcionam isoladamente. Faz-se
necessário o pesquisador ser um profissional
com ampla visão e conhecimento da vida, seus
aspectos cognitivos precisam ir além de um
raciocínio lógico, que compreenda o ser
humano os sentimentos, valores, crenças, e que
administre bem suas emoções, buscando o
autoconhecimento, além de ser sensível que
tenha habilidade para enfrentar as mais
profundas as questões humanas
This article is an analysis of the cognitive
aspects of the researcher, from the theory of
multiple intelligences. In the theory of multiple
intelligences the concept of intelligence is
understood as a general ability found in
varying degrees in all subjects and implies the
ability to solve problems or develop products
that are important in a particular environment
or cultural community. The various types of
intelligences are located in separate areas of
the brain and may act independently or
together these intelligences may define the
human species. Although these intelligences
are somewhat independent of one another, they
rarely work in isolation. If the researcher is
required to be a professional with broad vision
and knowledge of life, where their cognitive
aspects goes beyond logical reasoning, which
includes the human feelings, values, beliefs,
and manage their emotions well, seeking selfknowledge besides being sensitive that has the
ability to cope with the deeper human issues.
Keywords: Multiple intelligences; researcher,
cognitive aspects
Palavras-chave: Inteligências múltiplas;
Pesquisador; Aspectos cognitivos
1
Mauro Maia Laruccia - Professor Dr. Da Faculdade de Economia e Administração PUC/SP e Prof. Pesquisador do
Grupo de Pesquisa e Iniciação Científica, Orientador da Oficina de Artigos das Faculdades Integradas Campos Salles.
Rua Nossa Senhora da Lapa, 284, São Paulo 05072-000, Brasil. E-mail: [email protected]
2
Sergio Roberto Cosmano - Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho. Rua Capote
Valente, 710, São Paulo 05409-002, Brasil. E-mail: [email protected]
148
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
1. Apresentação
O presente artigo trata-se de uma reflexão a
respeito de aspectos cognitivos da atividade de
pesquisa, mais especificamente do pesquisador,
a partir da teoria das inteligências múltiplas. A
inquietação a respeito do tema resultou da
discussão em sala de aula a respeito das
inteligências relacionadas às diferentes
atividades profissionais. Nessa discussão ao ser
nomeada a atividade profissional cada aluno
propunha uma das inteligências, mas ao
falarmos do pesquisador a resposta foi unanime
lógico-matemática.
Realmente a atividade de pesquisa exige
uma lógica e uma organização presentes nessa
inteligência, mas ao nos depararmos com um
problema de pesquisa social, temos que nos
preocupar com aspectos que muitas vezes
passariam sem destaque para uma atuação
lógica e dita racional. Essa forma de
encararmos a ciência nos é um legado do
racionalismo, do método positivista de Comte,
e da visão cartesiana da ciência. A divisão, ou
melhor, segregação da razão e emoção, em que
a segunda não era valorizada nem reconhecida
como elementos importante da construção do
conhecimento.
Essa visão epistemológica fez com que
durante séculos a ciência, portanto, todas as
teorias anulassem este elemento. Esta reflexão
é perpassada por questões da história e filosofia
da ciência. Destacamos algumas contribuições
da teoria das Inteligências Múltiplas: o
repensar do conceito de inteligência, mudança
do paradigma da inteligência e da
aprendizagem, reconhecimentos das diferentes
individuais, consolidação de um pensar a
respeito da complementariedade ao falarmos de
inteligência e a complexidade dos aspectos
cognitivos e cognoscitivos.
149
2. O conceito de inteligência
A “inteligência” é uma capacidade geral,
encontrada em graus variáveis em todos os
indivíduos. Ela é a forma como o indivíduo
consegue resolver problemas. (GARDNER,
2000). A questão da definição de inteligência é
central em nossa investigação, na verdade é na
definição de inteligência que a teoria das
inteligências múltiplas diverge dos pontos de
vista tradicionais. Segundo Gardner (2000)
numa visão tradicional a inteligência é definida
operacionalmente como a capacidade de
responder a itens em testes de inteligência. A
influência, a partir dos resultados dos testes, de
alguma capacidade, de alguma capacidade
subjacente é apoiada por técnicas estatísticas
que comparam respostas de sujeitos em
diferentes idades, a aparente correlação desses
resultados de testes através das idades
corrobora a noção de que a faculdade geral da
inteligência, não muda muito com a idade ou
com o treinamento ou experiência, ela é um
atributo ou faculdade inata do individuo.
Ainda para este autor, a teoria das
inteligências múltiplas, por outro lado,
pluraliza o conceito tradicional. Uma
inteligência implica na capacidade de resolver
problemas ou elaborar produtos que são
importantes em determinado ambiente ou
comunidade cultural. A teoria das inteligências
múltiplas é elaborada à luz das origens
biológicas de cada capacidade de resolver
problemas, destacam-se as capacidades que são
universais na espécie humana. Cada
inteligência deve ter uma operação ou um
conjunto de operações identificáveis. Como um
sistema computacional com base neural, cada
inteligência é ativada ou “desencadeada” por
certos tipos de informação interna ou
externamente apresentados. Uma inteligência
também deve ser capaz de ser codificada num
sistema de símbolos, um sistema de
significados culturalmente criado, que captura
e transmite formas importantes de informação.
A linguagem, a pintura e a matemática são
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
apenas três sistemas de símbolos quase
universais, necessários a sobrevivência e
produtividade humana. Embora seja possível
que a inteligência prossiga sem um sistema
simbólico concomitante, uma característica
primaria da inteligência humana provavelmente
é a sua gravitação rumo a essa incorporação.
Segundo Gardner os seres humanos dispõem
de graus variados e inteligências e maneiras
diferentes, com elas se combinam, organizam e
se utilizam dessas capacidades intelectuais,
para resolver problemas e criar produtos,
embora estas inteligências sejam até certo
ponto independentes uma das outras, elas
raramente funcionam isoladamente.
A Teoria das Inteligências Múltiplas resulta
de anos de investigação para se conhecer as
capacidades cognitivas e cognoscitivas do
homem, constituindo-se em uma nova
concepção científica sobre a mente, uma visão
pluralista, que reconhece diferentes facetas de
cognição. Todo ser humano excluindo-se os
casos de lesões cerebrais, possui capacidades a
serem desenvolvidas, quais sejam, as
inteligências: lógico-matemática, espacial,
linguística, interpessoal, intrapessoal, musical,
corporal cenestésica (1993) com o possível
acréscimo das inteligências naturalista,
espiritual e existencial (2001)
Ao pensarmos na atividade científica nos
deteremos na reflexão sobre seu contexto, os
problemas científicos surgem do e no cotidiano
fazendo-se necessário realizar inúmeras
construções para podermos detectar os vários
aspectos da vida social cotidiana, pois o
cotidiano é a vida do homem, como aponta
Heller (2008). Esse cotidiano precisa ser
conhecido e reconhecido em sua complexidade
e plurifatorialidade.
Muitas vezes isso exige do pesquisador uma
atitude profissional com ampla visão e
conhecimento da vida, isso implica aspectos
para além do raciocínio lógico, faz se
necessária uma compreensão do ser humano
seus sentimentos, valores e crenças, para que
isso seja possível é necessário que ele
administre seus sentimentos e emoções,
buscando o autoconhecimento, para além do
visível e concreto atingindo o ser sensível e
tênue. Ao trabalhar com o cotidiano e com o
homem são exigidas do profissional,
habilidades para enfrentar as mais profundas
questões humanas e uma abertura para ver o
mundo e o universo em que vive a partir de um
olhar interdisciplinar e não apenas disciplinar.
Segundo Gardner os seres humanos dispõem
de graus variados e inteligências e maneiras
diferentes, com que elas se combinam e
organizam e se utilizam dessas capacidades
intelectuais, para resolver problemas e criar
produtos, embora estas inteligências sejam até
certo ponto independentes uma das outras, elas
raramente funcionam isoladamente.
Retomamos Inteligência Lógico-Matemática
Inteligência Lógico-Matemática: Possui a
capacidade lógica e matemática, com
competência mais diretamente associada ao
pensamento científico, como pesquisadores,
cientistas, engenheiros, etc. O estímulo para seu
desenvolvimento estrutura na pessoa novas
formas sobre o pensar de forma abstrata e
conceitual, e uma percepção apurada dos
elementos da grandeza, peso, distância, tempo e
outros que envolvem ação sobre o ambiente, com
habilidade para raciocínio dedutivo .
A inteligência é um atributo ou uma faculdade
inata do ser humano, Gardner procurou ampliar
este conceito de inteligência, para ele, é a
capacidade de solucionar problemas ou elaborar
produtos que são importantes em um determinado
ambiente ou comunidade cultural. A capacidade
de resolver problemas permite às pessoas abordar
situações, atingir objetivos e localizar caminhos
adequados a esse objetivo (TRAVASSOS, 2001).
Esta capacidade de solucionar problemas ou
elaborar produtos, abordar situações, atingir
objetivos e localizar caminhos adequados dos
mais diversos, é necessário muitas vezes que o
pesquisador seja um profissional não somente
racional e sim traga em seu perfil outros tipos
de inteligências que será fundamental na hora
de desenvolver seu projeto de pesquisa.
Segundo Gardner (2002) nos últimos
séculos, sobretudo, nas sociedades ocidentais,
difundiu-se um ideal, o da pessoa inteligente.
As dimensões exatas deste ideal evoluem com
150
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
o tempo e o cenário. Em escolas tradicionais,
inteligente era quem dominava as línguas
clássicas e a matemática, particularmente a
geometria. Em um cenário empresarial,
inteligente era quem previa oportunidades
comerciais, assumia riscos calculados,
construía uma organização, mantendo as contas
equilibradas e os acionistas satisfeitos.
3. Modelos da teoria das inteligências
múltiplas
Segundo Howard Gardner (2002) o primeiro
teste de sucesso escolar foi realizado e
desenvolvido pelo psicólogo Alfred Binet em
1900. Este teste tinha por finalidade
diagnosticar crianças retardadas e crianças
normais. Após a primeira Guerra Mundial este
teste foi aplicado nos soldados com a
finalidade de diagnosticar a inteligência dos
soldados. Com a propagação deste teste
pensou-se que era possível medir
quantitativamente a inteligência.
Gardner propôs projeto zero de Harvard,
iniciado por Nelson Goodman e co-dirigido por
Howard Gardner e David Perkins, realiza
pesquisas básicas sobre cognição,
aprendizagem e artes há 30 anos. A
Universidade Harvard, nos Estados Unidos,
desenhou o Projeto Zero, que reúne equipes
interdisciplinares com o objetivo de estudar as
relações entre a inteligência, a compreensão e o
ensino.
Segundo Gardner cada pessoa tem uma
composição diferente de inteligência, podemos
melhorar o ensino atuando nas múltiplas
inteligências; estes tipos de inteligência estão
localizados em áreas distintas do cérebro e
podem funcionar de modo independente ou em
conjunto estas inteligências podem definir a
espécie humana, embora estas inteligências
sejam até certo ponto independentes uma das
outras, elas raramente funcionam isoladamente,
todas as pessoas possuem todos os nove tipos
de inteligências em graus variados. Exceto em
151
indivíduos anormais, as inteligências sempre
funcionam combinadas, e qualquer papel
adulto sofisticado envolverá uma fusão de
varias delas
As pessoas criativas se destacam em termos
de determinadas inteligências, Einstein tinha
uma inteligência lógico-matemática
excepcional, mas suas capacidades espaciais
eram extraordinárias mesmo entre os físicos.
Freud se considerava um cientista e tinha
capacidade lógico-matemática adequada,
porém era mais genial na inteligência
linguística, isto contribuiu para o seu imenso
sucesso com o publico, mas também gerou uma
tensão permanente com cientistas com
formação convencional (GARDNER, 2002).
A inteligência musical de Stravinski era
excelente, mas ele também se destacou em
outras inteligências artísticas, e talvez isto
explique porque ele foi um grande compositor
de balés, era capaz de musicar um texto e
tornou-se um dos comentadores artísticos mais
incisivos de sua época. Os criadores
excepcionais também tem fraquezas
intelectuais, Freud, por exemplo, não tinha
inteligência musical, enquanto Picasso foi
péssimo aluno e mal dominava as primeiras
letras. Mas os criadores não se deixam vencer
por estas fraquezas intelectuais, aprendem a
ignorá-las e a procuram ajuda na área em que
são deficientes. Os indivíduos criativos acabam
conhecendo seus pontos fortes e identificam
seus nichos cognitivos ou culturais, que eles
buscam totalmente conscientes de suas
vantagens competitivas. Gardner descreve
diferentes inteligências num total de nove,
visto que todos os seres humanos possuem
potencialidades para desenvolvê-las, quais
sejam:
3.1 Inteligência musical
Para Gardner (2002), certas partes do
cérebro desempenham papeis importantes na
percepção e na produção da musica. Estas áreas
estão caracteristicamente localizadas no
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
hemisfério direito, embora a capacidade
musical não esteja claramente “localizada” em
uma área tão especifica como a linguagem. As
evidencias que apoiam a interpretação da
capacidade musical como a inteligência
“chegam” por varias fontes. Mesmo que a
capacidade musical não esteja tipicamente
considerada uma capacidade intelectual, como
a matemática, ele se qualifica a partir de nossos
critérios. Por definição, ela merece ser
considerada, e, tendo em vista os dados, na
inclusão está empiricamente justificada.
desenvolvimento nas crianças é surpreendente
constante em todas as culturas. Mesmo nas
populações surdas, em que uma linguagem
manual de sinais não é explicitamente
ensinada, as crianças, frequentemente
“inventam” sua própria linguagem manual e a
utilizam secretamente. Este perfil tem
habilidade lida com palavras de maneira
criativa, com habilidades verbais bem
desenvolvidas e tem sensibilidade para os sons
e significados das palavras, também é
desenvolvida esta habilidade nos poetas e
escritores etc.
3.2 Inteligência lógico-matemática
3.4 Inteligência espacial
O individuo talentoso, o processo de
resolução do problema geralmente é
surpreendente rápido – o cientista bem
sucedido lida com muitas variáveis ao mesmo
tempo e cria numerosas hipóteses que são
avaliadas e depois, por suas vez, aceita ou
rejeita. Juntamente com a associada capacidade
da linguagem, o raciocínio lógico-matemático,
proporciona a principal base para os testes de
QI. Certas áreas do cérebro são mais
importantes do que outras no calculo
matemático. Há idiotas sábios que realizam
grandes façanhas de calculo, mesmo que
continuem sendo tragicamente deficientes na
maioria de outras áreas. As criança prodígio na
matemática, existem em grande numero. O
desenvolvimento desta inteligência nas
crianças foi cuidadosamente documentado por
Jean Piaget e outros psicólogos. A pessoa
dotada de inteligência lógico – matemática tem
habilidade de discernir padrões lógicos e
numéricos, elementos da grandeza, peso,
distância, tempo, é a inteligência de um
cientista e pesquisador.
3.3 Inteligência linguista
A solução de problemas espaciais é
necessária na navegação e no uso do sistema
motivacional de mapas. Outros tipos de
problemas espaciais são convocados quando
visualizamos um objeto de um ângulo
diferente, e no jogo de xadrez. As artes visuais
também utilizam esta inteligência no uso do
espaço. Os pacientes com danos específicos
nas regiões do hemisfério direito tentarão
compensar suas falhas espaciais com
estratégias linguistas. Elas tentarão raciocinar
em voz alta, por em duvida a tarefa ou
inclusive inventar respostas. Mas essas
estratégias não espaciais raramente são bem
sucedidas. As populações cegas ilustram a
distinção entre a inteligência espacial e a
percepção visual. Uma pessoa cega pode
reconhecer formas através de um método
indireto. Passar a mão ao longo do objeto
traduz a duração do movimento que por sua
vez é traduzida no formato do objeto. Para a
pessoa cega, o sistema perceptivo da
modalidade tátil equivale a modalidade visual
na pessoa que enxergar. A analogia entre o
raciocínio espacial do cego e o raciocínio
linguístico do surdo é notável.
A capacidade linguista de “inteligência” é
consistente com a psicologia tradicional. A
habilidade da linguagem é universal, e seu
152
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
3.5 Inteligência interpessoal
A inteligência interpessoal está baseada
numa capacidade nuclear de perceber
distinções entre os outros, em especial,
contrastes em seus estados de animo,
temperamentos, motivações e intenções. Em
formas avançadas, esta inteligência permite que
o adulto experiente perceba as intenções e
desejos de outras pessoas, mesmo que elas os
escondam. Essa capacidade aparece numa
forma altamente sofisticada em lideres
religioso ou políticos, professores, terapeutas e
pais.
3.6 Inteligência intrapessoal
O conhecimento dos aspectos internos de
uma pessoa: o acesso ao sentimento da própria
vida, a gana das próprias emoções, a
capacidade de discriminar essas emoções e
eventualmente rotulá-las e utilizá-las como
uma maneira de entender e orientar o próprio
comportamento. A pessoa com boa inteligência
intrapessoal possui um modelo viável e efetivo
de si mesma. Uma vez que esta inteligência é a
mais privada, ela requer a evidencia a partir da
linguagem, da musica ou de alguma outra
forma mais expressiva de inteligência para que
o
observador a perceba funcionando. A
inteligência interpessoal nos permite
compreender a nós mesmos e trabalhar
conosco. No senso de eu dom individuo,
encontramos uma fusão de componentes e
intrapessoais.
153
3.7 Inteligência naturalista
As pessoas dotadas desta inteligência têm
habilidade de reconhecer a natureza plantas e
animais, entende o nascimento e a morte dos
seres vivos no mundo.
3.8 Inteligência existencial
Sensibilidade e habilidade para compreender
sobre as existência humana, o significado da
vida e morte. Questiona com facilidade sobre a
existência da vida e do mundo. Com este perfil
de inteligência convivemos no dia a dia, e
presenciamos nos homens em busca da religião
para terem paz de espírito muitas vezes devido
a amenizar os problemas, seja sentimental,
espiritual ou emocional.
4. Procedimentos metodológicos
O estudo foi realizado usando a técnica de
"análise de conteúdo". Nesta pesquisa, os
estudos sobre a teoria IM (ou seja, teses de
doutorado, dissertações de mestrado indexadas
no Banco de Teses da Capes, bem como artigos
publicados nas revistas indexadas na base de
dados do Periódicos Capes foram analisados
em relação às variáveis.
Os estudos que foram incluídos nesta
pesquisa foi baseado em 71 teses de mestrado,
8 teses de doutorado e 18 artigos de pesquisa
foram analisados segundo os seguintes 11
questões na próxima página:
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
1. Qual é a distribuição de estudos IM em termos de tipo de publicação?
2. Qual é a distribuição de estudos IM em termos de seus tópicos?
3. Qual é a distribuição de estudos IM em termos do seu ano de publicação?
4. Qual é a distribuição de estudos IM em termos de sexo dos pesquisadores?
5. Qual é a distribuição de estudos IM em termos de seu projeto de pesquisa?
6. Qual é a distribuição de estudos IM em termos de metodologia de pesquisa?
7. Qual é a distribuição de estudos IM em termos dos seus técnica de análise de dados?
8. Qual é a distribuição de estudos IM em termos de tipo de amostragem?
9. Qual é o número médio de participantes de estudos IM?
10. Qual é a distribuição de artigos de IM em termos de suas revistas?
11. Qual é o número médio de autores de artigos IM?
5. Resultados da pesquisa
1. Tipo de publicação: dissertações de
mestrado (73,2%), teses de doutorado (8,2%),
artigos de pesquisa (18,6%). A maioria dos
estudos IM foram conduzidos em nível de
mestrado.
2. Tema de pesquisa: - perfis de estudantes
IM (7,2%) - A relação entre IM e estilos de
aprendizagem e estratégias (3,1%), a relação
entre IM e desempenho acadêmico (2,1%),
desenvolvimento de IM para crianças (1%) - O
IM teoria e currículo (5,2%) - a teoria IM e
orientação escolar (2,1%) - a teoria IM e livros
didáticos (3,1%) - Percepções sobre as
implementações da teoria IM (12,4%) - O
efeito da teoria IM no desempenho acadêmico
e nas atitudes no jardim de infância (2,1%) - O
efeito da teoria IM em desempenho acadêmico
e as atitudes dos alunos do ensino fundamental
(45,4%) - O efeito da teoria IM no do ensino
médio (15,5%) - os efeito da teoria IM na
realização dos estudantes do ensino superior
acadêmico e atitudes (1%). A maioria dos
estudos IM enfoca nos alunos do ensino
fundamental.
3. Ano de publicação: - 1999 (2,1%) - 2000
(2,1%) - 2001 (5,2%) - 2002 (2,1%) - 2003
(6,2%) - 2004 (6,2%) - 2005 (13,4%) - 2006
(44,3% ) - 2007 (18,6%). A maioria dos
estudos IM foram concluídas no ano de 2006.
4. Sexo dos pesquisadores: - Masculino
(39,2%) - Feminino (60,8%). A maioria dos
estudos IM têm sido conduzidos por
investigadores do sexo feminino.
5. Projeto de pesquisa: - Revisão da literatura
(1%) - Modelo de desenvolvimento (2,1%) - A
análise de conteúdo (2,1%) - Descritiva
(34,7%) - empírica (65,3%). A maioria dos
estudos IM têm sido conduzidos
empiricamente.
6. Metodologia de pesquisa: - qualitativa
(12,4%) - Quantitativo (62,9%) - Misto
(23,7%) - Outros (1%). A maioria dos estudos
IM têm utilizado a metodologia de pesquisa
quantitativa.
7. Técnica de coleta de dados: - Observações
(24,7%) - entrevistas (24,7%) - análise de
documentos (13,4%) - Levantamentos (20,6%)
- Testes (60,8%) - Estoques (13,4%) - Escalas
(34%) - GPA ( 2,1%) - Outros (1%). A maioria
dos estudos IM usaram testes e escalas, como
procedimentos de coleta de dados.
8. Tipo de amostragem: - alunos do jardim de
infância (6,2%) - Menores alunos do ensino
fundamental (21,6%) - Alta alunos do ensino
fundamental (35,1%) - alunos do ensino
secundário (17,5%) - estudantes de ensino
154
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
superior (3,1%) - professores estagiários
(2,1%) - primário professores (7,2%) - Assunto
professores (7,2%) - os administradores (1%) Os pais (2,1%) - Documentos (6,2%) - outros
(1%). A maioria dos estudos IM têm sido
realizados com alunos do ensino fundamental.
9. O número médio de participantes dos
estudos IM: - Descritiva (n = 345) - empírica (n
= 73) - Total (n = 162). O número médio do
participante estudos IM é de cerca de 162.
10. O número médio de autores da artigos
IM: N = cerca de 2.
Considerações finais
Este estudo mostra que os pesquisadores
começaram a interessar-se na teoria IM desde
sua primeira apresentação em 1983. Parece que
o interesse para a teoria cada vez mais IM
continuou até o ano de 2006 e novamente
começou a diminuir depois de então. Entre os
anos de 1999 e 2007, em média, cerca de 10-11
IM estudos têm sido publicados anualmente.
Este número parece ser insuficiente para ter um
quadro completo sobre a projeção da teoria IM
no sistema de ensino. O estudo conclui que os
estudos mais qualitativos são necessários sobre
a questão do Como pode inteligências
múltiplas das crianças e adultos pode ser
desenvolvida?
Frente estes apontamentos é importante
ressaltar o pesquisador que mesmo tendo em
seu perfil sendo lógico-matemático há
necessidade de explorar outras inteligências.
Visto que é possível funcionar de modo
independente ou em conjunto estas
inteligências podendo definir melhor na
atuação de pesquisador na resolução de
problemas. E esta capacidade de solucionar
problemas ou elaborar produtos, abordar
situações, atingir objetivos e localizar
caminhos adequados dos mais diversos,
observamos se o pesquisador tiver além da
inteligência lógico-matemática a inteligência
intrapessoal e a inteligência existencial, terá a
probabilidade de terem um maior sucesso em
suas produções cientificas e facilidade em
resolver os problemas em vários aspectos na
sociedade. Muitas vezes se faz necessário o
pesquisador ser um profissional com ampla
visão e conhecimento da vida, onde os seus
aspectos cognitivos vá além de um raciocínio
lógico, compreenda o ser humano os
sentimentos, valores, crenças e seu semelhante,
e que administre bem seus sentimentos e
emoções, buscando o autoconhecimento, além
de ser sensível e tenha habilidade para
enfrentar as mais profundas as questões
humanas.
Referências Bibliográficas
ALMEIDA, E. Gardner e a teoria das inteligências múltiplas. [200?]. Disponível em:<http://
www.lincx.com.br/lincx/saude_a_z/saude_mental/gardner.asp>. Acesso em: 24 maio 2010.
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GARDNER, H. Inteligência: um conceito reformulado. Tradução: Adalgisa campos da Silva. 2
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MATTOS, C. P. Um estudo da importância das inteligências múltiplas para o desenvolvimento
155
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
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apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal
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TABACHNICK, B.; FIDELL, L. Using multivariate statistics. New York: Allyn and Bacon,
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TRAVASSOS, L. C. P. Inteligências múltiplas. Revista de Biologia e Ciências da Terra. v. 1, n. 2,
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VEENEMA, S.; GARDNER, H. Multimedia and multiple intelligences. The American Prospect,
v.27, n. 29, 1996.
156
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
1
João Alexandre Magri1
Acesso a coleções de dados usando LINQ
Resumo
O LINQ (Language INtegrated Query) é
um conjunto de extensões introduzido pela
Microsoft no .NET Framework 3.5 e nas
novas versões da linguagens Visual C# e
Visual Basic que tem como objetivo unificar
o modelo de acesso à dados armazenados na
memória principal de um computador ou em
um repositório de dados externo como um
banco de dados ou arquivos XML. Sua
sintaxe é equivalente à sintaxe da linguagem
SQL usada na comunicação com um sistema
gerenciador de banco de dados.Usando o
LINQ não é necessário escrever comandos
expressos na linguagem SQL embutidos no
código de acesso à dados escrito em Visual
C# ou Visual Basic, isto é, pode-se escrever
o código de acesso a dados diretamente em
Visual C# ou Visual Basic. Além disso, os
dados não precisam estar armazenados
somente em um banco de dados. O
processamento de uma coleção de dados
exige o uso de estruturas de repetição e de
comparação para separar os itens que
atendam a uma determinada condição de
seleção. Este tipo de programação é chamado
de programação imperativa porque especifica
as ações que devem ser executadas para
produzir determinado resultado. Usando
LINQ o programador deve especificar
somente as condições que os itens de
determinada coleção devem atender para
serem selecionados, isto é, usa-se a
programação declarativa.
Neste tipo de
programação não se especifica como obter o
resultado o compilador C# gera todo o código
que implementa a declaração
automaticamente diminuindo sensivelmente a
complexidade do código escrito pelo
programador.
Abstract
The LINQ (Language INtegrated Query) is
a set of extensions introduced by Microsoft in
the. NET Framework 3.5 and new versions of
the language Visual C# and Visual Basic that
aims to unify the model of access to data
stored in main memory of a computer or in an
external data repository as a database or
XML files. Its syntax is equivalent to the
syntax of the SQL language used in
communication with a database management
system. Using LINQ is not necessary to write
SQL commands expressed in the language
embedded in the data access code written in
Visual C# or Visual Basic, that is, you can
write code to access data directly in Visual C
# or Visual Basic. Furthermore, the data need
not be only stored in a data base. The
processing of a collection of data requires the
use of repetition and comparison structures to
separate the items that meet a certain
condition of selection. This type of
p ro g r a m m i n g i s c a l l e d i m p e r a t i v e
programming because it specifies the actions
that must be performed to produce a certain
result. Using LINQ the programmer must
specify only the conditions that the items
given collection must meet to be selected, that
is, he uses a declarative programming. In this
type of programming you didn’t specify how
João Alexandre Magri. Mestre em Engenharia. Professor e Coordenador do curso de Sistemas de Informação da FICS
onde, desde o primeiro semestre de 2012, compõe a Gupo de Pesquisa – Oficina de Artigos e Inicialção Científica das
Faculdades Integradas Campos Salles – FICS. www.campossalles.edu.br
1
157
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
to obtain the result: the C # compiler
generates all the code that implements the
s t a t e m e n t a u t o m a t i c a l l y re d u c i n g
substantially the complexity of the code
written by the programmer.
Apresentação
Determinadas aplicações exigem que os
dados armazenados nos objetos sejam
armazenados na memória auxiliar visando a
sua reutilização. Neste caso diz-se que os
dados devem ser persistidos e os objetos onde
eles estão armazenados são chamados de
objetos persistentes.
Em geral os dados são armazenados em
arquivos ou em um banco de dados. Nas
aplicações de sistemas de informação; por
exemplo, é necessário armazenar os dados de
um cliente, funcionário, produto, etc. para a
sua utilização posterior.
No caso das aplicações desenvolvidas com
o paradigma de orientação a objetos, pode-se
usar os sistemas gerenciadores de banco de
dados orientados a objetos na implementação
dos objetos persistentes, principalmente
aqueles que representam dados complexos
tais como as como figuras, entretanto esta
tecnologia ainda encontra-se em processo de
desenvolvimento sendo pouco utilizada.
Atualmente a tecnologia padrão
corresponde aos sistemas gerenciadores de
dados que usam o modelo relacional onde os
dados são armazenados em tabelas. Versões
mais recentes de alguns destes sistemas
gerenciadores de banco de dados relacionais
dispõem de extensões orientadas a objetos,
portanto tem-se uma tecnologia híbrida
chamada de objeto-relacional.
A maior desvantagem dos sistemas
gerenciadores de banco de dados
objetorelacionais é a total dependência do
fabricante o que certamente não é uma boa
solução.
Nestas condições, os sistemas
gerenciadores de banco de dados são usados
para o armazenamento dos objetos
persistentes usando-se um mecanismo de
montagem e desmontagem destes objetos. A
desmontagem permite o armazenamento dos
dados contidos em um objeto persistente em
determinada linha de uma tabela do modelo
relacional. No caso da montagem, usa-se a
operação inversa.
As diferenças entre os paradigmas:
relacional e orientado a objetos acarretam
várias dificuldades que são chamadas de
problemas de impedância, sendo que em
determinadas situações é necessário usar um
programa para fazer o mapeamento de um
objeto persistente para uma linha de uma
tabela, isto é, fazer o mapeamento objetorelacional. Estes programas são chamados de
ferramenta de O/RM (Object / Relational
Mapping).
No processo de mapeamento as classes são
representadas por tabelas do banco de dados e
os objetos persistentes por linhas da tabela
correspondente a uma determinada classe.
Um dos programas projetados para realizar
este mapeamento O / R é o Hibernate,
desenvolvido para a plataforma Java
(NHibernate para plataforma .NET).
Usando-se estas ferramentas não é
necessário escrever comandos SQL para
acessar os dados do banco de dados porque os
comandos são gerados em tempo de execução
pelo próprio NHibernate. Além disso, ele
suporta os principais sistemas gerenciadores
de banco de dados disponíveis no mercado,
facilitando o desenvolvimento
multiplataforma.
Com o objetivo de minimizar estes
problemas de impedância a Microsoft criou
uma camada de software intermediária
chamada Entity Framework (EF) que permite
converter os objetos da camada de negócios
da aplicação em linhas das tabelas de um
banco de dados relacional e vice versa.
158
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Ao garantir esta camada de abstração o EF
permite que o desenvolvedor se concentre na
camada de negócios da aplicação
simplificando sensivelmente o trabalho de
implementação de um sistema.
O EF possui três opções de consultas:
implementações específicas para poder
acessar dados armazenados em qualquer tipo
de memória.
Assim tem-se as seguintes
encarnações do LINQ:
LINQ para objetos
.LINQ para coleções
. Entity SQL (ESQL);
LINQ para SQL
. LINQ to Entities;
.LINQ para entidades
. Entity Client;
.LINQ para XML
O LINQ foi criado originalmente para
consultar objetos armazenados em memória
principal. Depois foi estendido com
Na figura 1.1 tem-se a arquitetura geral do
LINQ.
Figura 1.1 Arquitetura geral do LINQ
Fonte: http://msdn.microsoft.com/msdnmag/issues/07/06/CSharp30/pt/fig01.gif
2. Ferramenta O/R Designer
No caso das consultas aplicadas a um
conjunto de dados armazenados em disco
cujo acesso é controlado pelo sistema
gerenciador de banco de dados SQL Server
deve-se usar a encarnação do LINQ chamada
LINQ to SQL.
O mapeamento das tabelas do banco de
dados para classes de negócio do sistema
pode ser feito usando-se a ferramenta O/R
Designer que é fornecida gratuitamente pela
159
Microsoft no Visual Studio 2008 e portanto
também está disponível nas edições Express
das linguagens visual C# e visual Basic.
Nestas condições, em nível de
desenvolvimento do sistema usando
metodologia orientada a objetos, deve-se
entre outras coisas, desenvolver o diagrama
de classes e depois mapeá-lo para o modelo
lógico do banco de dados.
O mapeamento das tabelas do banco de
dados para as classes de negócio da aplicação
é feito usando-se a ferramenta O/R Designer:
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
neste processo é gerada automaticamente a
classe Datacontext: esta classe contém os
métodos para acessar as tabelas do banco de
dados, isto é, o código necessário para a
implementação das operações
CRUD
(cadastrar, consultar, atualizar, excluir) sobre
os dados armazenados nas tabelas do banco
de dados. Quando o banco de dados tiver
stored procedures elas serão mapeadas como
métodos da classe DataContext. O código de
acesso a dados é gerado considerando-se o
uso do acesso desconectado que tem grandes
vantagens em relação ao acesso conectado
quando o volume de conexões é alto, isto é, o
acesso conectado está sendo abandonado nos
produtos da Microsoft.
Nestas condições, os comandos LINQ
serão aplicados aos objetos instanciados a
partir da classe DataContext. Pode-se gerar
uma classe DataContext para todo o banco de
dados ou somente para algumas tabelas do
banco, isto é, em um projeto pode-se ter
várias classes DataContext portanto é
corrente usar o nome xxxDataContext onde
xxx identifica o seu conteúdo. Quando for
gerada uma classe DataContext para todas as
tabelas do banco de dados, xxx será o nome
do banco de dados.
A grande vantagem da ferramenta O/R
Designer é o recurso de geração das
operações CRUD automaticamente, isto é, o
programador não precisa codificar a camada
de acesso a dados do banco de dados,
devendo se preocupar somente com o
desenvolvimento das classes de negócio da
aplicação o que aumenta sensivelmente a sua
produtividade.
3. Montagem
xxxDataContext
da
classe
Na figura 3.1 tem-se as tabelas de um
banco de dados chamado Vendas Geral
composto pelas tabelas Cliente e Pedido.
Figura 3.1 – Tabelas que compõem o banco de dados Vendas Geral
Utilizando-se a ferramenta O/R Designer
estas tabelas foram mapeadas para as classes
de negócio cliente e Pedido, conforme pode
ser visto na figura 3.2
160
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Figura 3.2 - Diagrama de classes do sistema gerado com a ferramenta O/R Designer
Observar na janela Solution Explorer que
foi criada a classe Venda Geral Data Context
que contem todo o código de acesso a dados
do banco de dados gerado automaticamente
pela ferramenta O/R Designer.
4. Listagem de um conjunto de linhas
de uma tabela usando LINQ
Nos exemplos a seguir serão feitas
consultas às tabelas Cliente e Pedido do
banco de dados Vendas Geral. Elas serão
apresentadas em duas versões:
161
I. Versão expressa na linguagem SQL;
II. Versão expressa na linguagem LINQ;
É importante observar que no caso da
versão LINQ Cliente e Pedido são os nomes
das classes cujo código foi gerado
automaticamente pela ferramenta O/R
Designer: as tabelas do banco de dados foram
chamadas de Clientes e Pedidos, isto é, o O/R
Designer acrescentou automa-ticamente a
letras no final dos nomes das classes para
nomear as tabelas do banco de dados.
Exemplo 1 - Emitir a relação de clientes da
empresa
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
a) Versão SQL
select *
from cliente
b) Versão LINQ
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
VendasGeralDataContext objVGDC = new VendasGeralDataContext();
//
var objPesquisa = from j in objVGDC.Clientes
select j;
//
// Carrega a resposta do LINQ em uma grelha
//
dgCli.DataSource = objPesquisa;
//
// Looping para impressão em uma caixa de mensagem
//
foreach (var linhaTabela in objPesquisa)
{
linha = " \n" + linhaTabela.nrcli + " \t" + linhaTabela.nome +
" \t" + linhaTabela.limiCredito + " \t" + linhaTabela.tipo +
" \t" + linhaTabela.saMensal;
sai += linha;
}
MessageBox.Show(sai, titu, MessageBoxButtons.OK, MessageBoxIcon.Information);
Tabela 4.1. Exemplo
Ao ser executado este comando LINQ
obtém-se a resposta apresentada na Figura 3.3
Deve-se observar que antes de ser
executado o comando LINQ escrito nas linhas
3 e 4 foi instanciado um objeto da classe
ponte Vendas Geral Data Context na linha
número 1.
Este objeto contém todos os
métodos de acesso ao banco de dados Vendas
Geral. Conforme já foi explicado, os
comandos LINQ são executados sobre as
tabelas do projeto da aplicação e não sobre o
banco de dados físico. Assim na linha número
3 foi acessada a tabela Clientes cujo nome
está escrito no plural.
O resultado da execução de um comando
LINQ é um conjunto de objetos anônimos:
eles passam a ser a fonte de dados para o
objeto de tela ou controle Data Grid: na linha
número 8 este conjunto de objetos foi
vinculado ao objeto de tela visando apresentar
o resultado do processamento em uma grelha
conforme pode ser visto na Figura 3.3.
Opcionalmente pode-se processar cada um
dos objetos do conjunto de objetos resposta:
nas linhas de 14 a 21 os valores das variáveis
de instância dos objetos foram impressos em
uma caixa de mensagem conforme pode ser
visto na Figura 3.3. Neste caso foi montado
um looping usando-se a estrutura de repetição
foreach, aberta na linha número 14. A
variável de controle da estrutura de repetição
linha Tabela representa cada uma das
variáveis de referência do conjunto de objetos
resposta, portanto, para acessar determinado
162
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
valor de umas das variáveis de instância
destes objetos foi usada a sintaxe linha
Tabela. Nome da variável de instância
conforme está mostrado nas linhas números
16 a 18.
Figura 3.3 – Resultado da execução do comando LINQ para listar uma tabela.
Exemplo 2 - Listar os dados dos clientes
cujo limite de crédito é maior do que R
$1340,00 e o salário mensal maior do que R
$1800,00. A listagem deverá ser ordenada
pelos nomes dos funcionários.
a)Versão SQL
select *
from cliente
where limiCredito > 1340 and saMensal > 1800
order by nome
b) Versão LINQ
1
2
3
4
5
6
7
8
163
VendasGeralDataContext objVGDC = new VendasGeralDataContext();
//
var objPesquisa = from r in objVGDC.Clientes
where r.limiCredito > 1340 && r.saMensal > 1800
orderby r.nome
select r;
//
// Carrega a resposta do LINQ em uma grelha
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
//
dgCli.DataSource = objPesquisa;
//
// Looping para impressão em uma caixa de mensagem
//
foreach (var linhaTabela in objPesquisa)
{
linha = " \n" + linhaTabela.nrcli + " \t" + linhaTabela.nome +
" \t" + linhaTabela.limiCredito + " \t" + linhaTabela.tipo +
" \t" + linhaTabela.saMensal;
sai += linha;
}
MessageBox.Show(sai, titu, MessageBoxButtons.OK, MessageBoxIcon.Information);
Tabela 3.2 - Exemplo
Ao ser executado este comando LINQ
obtém-se a resposta apresentada na Figura 3.4.
Figura 3.4 – Resultado da execução do comando LINQ para listar parte de uma tabela.
Observar que o comando LINQ está
escrito nas linhas números 3 a 6: as outras
linhas correspondem à vinculação do
conjunto de objetos resposta a uma grelha de
apresentação de resultados (linha número 10)
e ao processamento de cada um dos objetos
do conjunto de objetos resposta: neste caso,
os valores de suas variáveis de instância
foram impressos em uma caixa de impressão
(linhas números 14 a 21).
Exemplo 3: - Emitir a listagem dos
pedidos (número do pedido, valor e prazo de
entrega). Criar mais uma coluna a ser
preenchida usando-se a seguinte regra do
negócio: se o prazo for menor do que três dias
esta coluna deverá ter o valor “Pedido
entregue”. Se não for deverá ter o valor “Em
processamento”. Os nomes das colunas da
grelha de apresentação deverão ser: Nro
Pedido, Valor, Prazo e Posição e não aqueles
adotados para as colunas da tabela Pedido.
O comando LINQ para a execução desta
consulta e a respectiva resposta estão
apresentados na figura 3.6.
164
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
Observar dadosSelecionados = from p in objVGDC.Pedidos
select new
{
NroPedido = p.nrPed,
Valor = p.valor,
Prazo = p.prazo,
Posicao = p.prazo < 3 ? "Pedido entregue" : "Em processamento"
};
//
// Carrega a resposta do LINQ em uma grelha
//
dgCli.DataSource = dadosSelecionados;
//
Figura 3.6 – Comando LINQ para alterar os nomes das colunas da grelha e criar uma nova coluna.
Para alterar os nomes das variáveis de
instância do conjunto de objetos resposta foi
criada uma classe anônima e instanciado um
objeto desta classe. As variáveis de instância
destes objetos foram iniciadas com os valores
das variáveis de instância do conjunto de
objetos resposta.
A nova coluna chamada Posição também é
uma variável de instância da classe anônima:
sua variável de instância é iniciada usando-se
a estrutura de comparação iif, conforme pode
ser visto na figura 3.6.
Considerações finais
A sintaxe da linguagem LINQ é muito
parecida com a sintaxe da linguagem SQL,
porém mais eficiente e explora o conceito de
objetos na composição dos comandos. Além
disso, ela é uma extensão das linguagens
visual C# e visual Basic e não uma nova
linguagem a ser embutida no interior de um
programa escrito em C#,
com sintaxe
própria.
165
Os comandos LINQ são executados sobre
um objeto instanciado a partir da classe Data
context que tem os métodos para executar as
operações CRUD automaticamente gerados
pelo Visual Studio, isto é, o programador não
precisa codificar a camada de acesso da
aplicação que é uma das mais extensas e
repetitivas. Ele precisa codificar apenas as
classes de negócio da aplicação o que
representa um ganho significativo em termos
de produtividade do programador.
Muitos profissionais têm dúvidas a
respeito da geração automática de modelos e
de parte do código, afirmando que os
resultados não são eficientes. Entretanto, eles
não avaliam o resultado da tradução de um
código fonte para linguagem de máquina ou
bytescodes gerados pela “compilação” de um
código escrito em Java. Basicamente
programa executável é gerado a partir do
código fonte.
No ambiente Microsoft está se observando
um amadurecimento no processo de
desenvolvimento de software.
O ganho em termos de tempo de
desenvolvimento é substancial.
Augusto Guzzo Revista Acadêmica
O Framework .NET 3.5 possui a maioria
das rotinas que os programadores eram
obrigados a codificar com freqüência,
evitando o clássico retrabalho. Além disso,
ferramentas com o visual Studio preocupamse em gerar, de forma automática, todo o
código que não tem a ver com o
desenvolvimento da aplicação em si.
Nessas condições, a geração de código e
modelos é uma tecnologia que está sendo
adotada por todas as empresas que
desenvolvem software.
Referências Bibliográficas
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MAGRI, J. A . e RODRIGUES, V. B. Princípios da Arquitetura Dirigida a Modelos (MDA).
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Ciência da Computação). Fundação Instituto
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166
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