CARTA A UM AMIGO
Foi assim que eu aprendi, é assim
que eu faço, é assim que eu ensino
MOGI DE A AZ
Sob a luz do silibim
Meu estimado pai
Tenho me surpreendido, nestas últimas
semanas, em tempos de meditação que me
levam a um passeio por nossa convivência. Curioso: vejo-me, de um momento para
outro, a passear por eventos, viagens, encontros. Alguns muito distantes; outros
muito próximos. E m poucos deles estávamos sozinhos, mas minhas lembranças recentes nos isolam. Como naquela noite em
que, primeira das lembranças que me sobram, você e mamãe me levaram ao meu
primeiro filme. Foi no Cine Urupema, eu
deveria ter no máximo 2 anos - você me
carregava no colo. Não sei qual filme era,
sei apenas que era uma produção da
Metro-Goldwyn-Mayer porque, tão logo o
leão rugiu na tela, eu desandei no choro.
Voltamos. Eu chorava e continuei chorando pelos dois quarteirões da Avenida Pinheiro Franco que separavam o Urupema
de nossa casa na Rua Isabel de Bragança.
Esta cena me veio à mente anos atrás,
quando levei meus filhos a uma sessão que
exibia E T , em um cinema da R u a
Paraguassu, em São Paulo. Clarissa chorou e, de pronto, perguntei-lhe se queria ir
embora. Ela disse que não.
Algum tempo depois da sessão de
cinema que não houve, estávamos na
estação de M o g i esperando o Trem de
Aço, como conhecíamos o Santa Cruz
e o Vera Cruz que cobriam o trajeto RioSão Paulo e paravam em M o g i . Iríamos
novamente a São Paulo para mais um
dia de incursões por lojas, teatros, restaurantes. E o trem era o melhor transporte. Nesse dia, porém, algum motivo
atrasou a composição e vocês decidiram que nós iríamo^ de ônibus. Quando
entrei naquela jardinèira me apavorei de
pronto. No lugar do vagão com ar condicionado e poltronas beges e limpas,
me v i em um ônibus barulhento, de janelas que trepidavam. Você me acalmou, disse-me que seria uma nova
aventura. Acalmou tanto que eu dormi.
Acordei no Vale do Anhangabaú para
incursões pela Casa São Nicolau da
Praça do Patriarca, escala indispensável para um novo brinquedo. Depois era
só atravessar a praça e ir ter à Casa
José Silva para encontrar uma roupa.
Que, se não tivesse a contento, seria
encontrada do outro lado do Viaduto do
Chá, na Casa Los Angeles da Barão de
Itapetininga, ali ao lado do Restaurante
Fasano, onde almoçávamos quando a
opção não fosse pela Leiteria Americana da Xavier de Toledo. Depois do
almoço, tempo para uma vesperal de
teatro ou cinema, antes do lanche de
final de tarde no S a l ã o de C h á do
Mappin. Muitas vezes, com meus filhos
pequenos, fiz incursões semelhantes.
Por outros endereços, mas com o mesmo propósito - mostrar o mundo aos
pequenos.
Eu j á tinha 7 anos de idade quando o
telefone do nosso apartamento no Hotel Califórnia, em Copacabana, tocou.
Como fazíamos todas as férias de verão, estávamos no R i o . Era janeiro de
1955. Devia ser 5 horas da manhã. E m
pouco tempo, você e mamãe cuidaram
de nos acordar - eu, Guilherme e a babá
Adelina - , ajeitar as malas, acertar a
conta, pegar um táxi e rumar para o A e -
Washington Luís era presidente de São Paulo naqueles anos áureos da República Velha de triste lembrança,
na qual as testemunhas da época dizem que "se fazia
eleição desonesta para eleger homens honestos". Na
política local dominava o dr. Deodato Wertheimer, herdeiro político do coronel Francisco de Souza Franco, de
quem tornou-se genro ao se casar com sua filha Leonor.
Antes de sucumbir à gripe espanhola, o coronel Souza Franco era o dono da política local: o maior comerciante de secos e molhados da redondeza, tinha profundas
ügações de amizade com o poder de então, incluindo
Washington Luís, o deputado Melo Freire (pai de Ya Ya
Melo Freire) e o embaixador Macedo Soares, seu compadre. E não havia quem não o procurasse em qualquer
situação que fosse: para aplicar ou para tomar emprestado. Suas propriedades iam do quarteirão da Rua José
Bonifácio, ao lado da atual Catedral, às fazendas da Volta Fria (a mais cuidada delas) e da Capelinha, onde hoje
se instalou um loteamento, à beira da Mogi-Dutra. Em
São Paulo, incluíam um quarteirão no Braz, vizinho da
Estação Roosevelt. Seus herdeiros contavam que, quando adquiriu esta propriedade, Coronel Chiquinho, como
era conhecido, poderia ter adquirido um outro quarteirão,
na então nascente Avenida Paulista. Preferiu o Braz sob
a alegação de que "o futuro está perto da ferrovia". Nunca se perdoou
Jorge Bueno Ornellas nasceu em Rio Claro em 27 de agosto de 1911.
Aos 3 anos perdeu a mãe, aos 33 casou-se com Maria Leonor
Arouche Ornellas. Tem 4 filhos, 11 netos e 4 bisnetos. Vive em São
Paulo com a esposa. Um^casamento que já comemorou 60 anos
roporto Santos Dumont. E m um Scandia
(correspondente civil do DC-3) da Companhia Real (antecessora da Vasp) chegamos a São Paulo antes das 8 horas.
Esperava-nos em Congonhas o
Gerevini, chofer de táxi, como se dizia
então, que nos servia sempre. Viemos
direto para a Rua José Bonifácio 360,
casa de vô Leôncio e vó Nenê. Vô L e ôncio havia falecido, o velório era ali.
Foi nessa viagem que, pela primeira vez,
vi o Sol nascer lá do céu. Muitos anos
depois, voltando de Salvador com meus
filhos, coloquei-os na janela do avião
para verem o Sol nascer.
Alguns anos depois você me levou v i sitar um amigo, o Isidro, no bairro de
Santana. Eu deveria ter 10 ou 11 anos de
idade e você, com Isidro ao lado, colocoume no colo para que "dirigisse" o carro.
Não me lembro o modelo nem o ano, mas
desde que meus filhos nasceram sempre
cuidei para que, quando tivessem 10 ou 11
anos, saíssem comigo para algum descampado onde pudessem, no meu colo, "dirigir" o carro.
Aos 16 anos de idade, a minha mais
grave arte de adolescente: às escondidas
apanhei o Simca Chambord, branco, de
estofamento de couro branco e faixa branca nos pneus. Sai sozinho e andei não mais
do que meia hora. Quando voltei para a
garagem, não consegui evitar uma ralada
na lateral. Sem ter como esconder, corri
contar à mamãe. Não me lembro de uma
represália severa, lembro-me sim de um
recado seu: "Não adianta fazer nada es-
condido, a mentira tem perna curta". Se
você perguntar aos meus filhos, eles dirão
que esta frase é minha.
Com 18 anos incompletos, cheguei eufórico para o almoço em casa. Tinha novidades a contar: havia conseguido meu primeiro trabalho - repórter no Diário de
Mogi. Você reagiu com uma lição: "o trabalho da juventude é o estudo". Aprendi,
entendi que seu recado era o dè privilegiar
o estudo. Sempre.
Alguns anos depois, contei-lhes os meus
planos de casar. Apoiaram de pronto, você
e mamãe, sob uma condição: teriam de ir
à casa de Nanei para formalizar o pedido.
Você entendeu a piscada do olho que lhe
dei, há um mês, quando do noivado de
Clarissa e Fábio. Se foi assim com vocês,
assim comigo, por que não com eles?
Acho que esta carta está ficando longa. E seria interminável se eu fosse continuar relembrando detalhes de nossa convivência de 57 anos. O que eu queria lhe
dizer, na essência, é que lhe desejo muitas
felicidades pelos 93 anos completados esta
semana. E, junto ao forte abraço, seguem
também muitos agradecimentos. A você
por tudo que me fez, a Deus pelo privilégio de continuar tendo a sua companhia, o
seu apoio, os seus conselhos. Sobretudo,
as suas lições.
Foi assim que eu aprendi, é assim que
eu faço, é assim que eu ensino.
Para determinada noite - a de 16 de fevereiro de 1928
- , a família de Souza Franco empenhou o melhor de
seus esforços. Uma neta, filha de Nenê e de Leôncio
Arouche de Toledo, iria casar-se com Benedicto Alves
dos Anjos. Maria Apparecida, diziam, era a noiva do ano,
a primeira neta a casar-se. O baile no solar da família, na
Rua José Bonifácio, ia animado. Washington Luís valsava com Leonor, filha do Coronel Chiquinho, quando o
imprevisto aconteceu: faltou luz.
Corre daqui, corre dali, a festa não poderia ser comprometida. Acabou melhorada.
Todos os faróis dos carros disponíveis foram colocados à disposição dos convidados e, na falta da luz da
Light, valeu mesmo a luz dós silibins.
Beijo enorme do
Chico
Tomem cuidado com esta: não tem sido comum nas
0 Largo da Matriz, onde fica a Catedral de Santana.
É um dos pontos referenciais da Cidade que muito últimas semanas, mas já saiu naquilo que a Cidade
pouco mudou nos últimos 50 anos. Falta faz, na convencionou chamar de "parada de sucessos": a
publicação pelo Cartório de Protestos de cheque
Catedral, o altar mor, transferido há 40 anos para a
devolvido por falta de fundos e entregue em
Igreja Nossa Senhora do Brasil, no Bairro dos
pagamento no Sula's Night Club.
Jardins, em São Paulo.
urança
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Io atende • legislação ambiental. - CACC. 0800-702-4200
E-mail: [email protected]
e conforto
r r o . bori
mais a v a n ç a d o s l a b o r a t ó r i o s
de d e s e n v o l v i m e n t o e testes
'
Benedicto Alves dos Anjos e Maria Apparecida Arouc
Alves celebraram, em fevereiro de 1928, o casamento
ano em Mogi das Cruzes. Sob a luz de silibins
0 PIOR DE MOGI
0 MELHOR DE MOG
um ,
Arquivo Pessoal - Benedicto Alves dos Anjos
e pistas
C a m p o de P r ò v c r s
dtLSjuz
A l t a , Indaiatuba-SP.
CHEVROLET
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CONTE COMIGO
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Foi assim que eu aprendi, é assim que eu faço, é