Intervenção no dia Internacional das Cooperativas
Exmo Senhor Presidente do INSCOOP,
Exmo Senhor Presidente da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim,
Exmo Senhor Presidente da Câmara Municipal de Vila do Conde,
Exmo Senhor Presidente da CONFAGRI,
Exmos representantes dos Partidos Políticos,
Exmos representantes de outros Órgãos do Estado ou da Administração,
Exmas Senhoras e Senhores convidados,
Caros Dirigentes e Companheiros Cooperativistas,
Em nome da CONFECOOP, Confederação Cooperativa Portuguesa, saúdo e agradeço a
participação de V. Excelências, nesta sessão solene, comemorativa do Dia Internacional das
Cooperativas.
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Para nós cooperativistas, a vossa presença representa o reconhecimento do trabalho realizado
em todo o Mundo, e em particular em Portugal, pelo Sector Cooperativo, em prol das
comunidades em que se insere e que serve pela sua acção quotidiana. Trabalho mais de
formiga que de cigarra e exactamente porque tem essas características, torna mais necessário
valorizar actos deste tipo.
Estamos na Póvoa de Varzim, paredes meias com Vila do Conde, ambas terras de pescadores
e, sendo eu do Norte e trabalhando há 25 anos na Mútua dos Pescadores, única cooperativa
de seguros portuguesa, permitam-me uma saudação particular à significativa e laboriosa
comunidade piscatória.
Este ano, a mensagem da Aliança Cooperativa Internacional (ACI), conduz-nos a uma reflexão
que em síntese aponta três linhas que muito valorizamos e por isso aqui destacamos:
1ª. “A empresa cooperativa é um modelo alternativo que, em lugar de se concentrar no
lucro, se concentra nas pessoas”
É esta noção de modelo alternativo, que desde 1844 os Pioneiros de Rochdale
lançaram e que milhões de cooperativistas em todo o Mundo procuram desenvolver,
em condições diferenciadas e por vezes muito difíceis, quer do ponto de vista social,
económico ou político.
E se nuns casos são as barreiras sociais e culturais a maior dificuldade, noutros são os
meios económicos e financeiros que escasseiam e impedem a formação ou o
crescimento deste modelo, mas não faltam também situações em que são razões
políticas que dificultam o desenvolvimento do modelo cooperativo.
Há poucos meses, o mundo global foi abalado pelo terramoto que começando pela
crise no sector imobiliário dos Estados Unidos da América, rapidamente fez desabar as
bolsas de todo o Mundo, e, porque não se trata de uma crise cíclica, como as inúmeras
que no século XX se podem identificar, não demorou a produzir profundos efeitos
económicos, e, estão também aí já alguns dos malefícios e danos sociais, que
penalizando mais depressa os estratos sociais mais débeis, através do desemprego e
do encerramento de empresas, atingirá cada vez mais pessoas e famílias de estratos
mais elevados.
Não é certamente por deleite teórico, ou masoquismo, que especialistas em história
económica consideram que é preciso recuar ao século XIX, para encontrar uma crise
que seja comparável na profundidade, efeitos e tempo previsível para a sua
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superação. Isto é, consideram que estamos a viver uma situação mais grave que a
grande depressão dos anos 30 do século XX.
E numa coisa parece que economistas e políticos em geral concordam, chegámos a
esta situação pelo efeito da desregulação e falta de mecanismos de controlo e
intervenção do Estado e aproveitamento, mesmo criminoso, do quadro de relações
jurídicas, económicas e políticas que o permitiram.
Foi a ocasião para reconhecer que as teorias ultra liberais falharam, mas o risco de
pouco ou nada mudar é real.
Grandes empresas, bancos, seguradoras, construtores automóveis tiveram que
estender a mão ao Estado, tendo recebido valores obscenos, que farão falta para
obras estruturantes, apoios a sectores estratégicos ou economicamente mais débeis, à
acção social imediata e aos sistemas de saúde pública, educação e reformas dos
pensionistas.
É por tudo isto que faz sentido afirmar que as cooperativas são um modelo diferente
de empresa, realizando o papel económico numa lógica de serviço à comunidade e
garantindo a realização individual dos seus membros e trabalhadores, sem exploração
e sem apropriação e acumulação capitalista.
2ª. “A ACI faz apelo aos cooperadores do mundo inteiro para que reforcem o seu
compromisso nos valores e princípios cooperativos”
Este apelo faz sentido, porque também no movimento cooperativo há dificuldades e a
ACI reconhece-as quando afirma “numerosas cooperativas serão tentadas a
sobreviver a qualquer preço, incluindo renunciando à sua natureza”.
Ora, só por desorientação ideológica estes fenómenos acontecem, mas são reais e não
será avisado ignorá-los.
Dirigentes de grandes ou pequenas cooperativas ou mútuas de seguros, são por vezes
tentados a seguir um caminho que claramente não é o do cooperativismo ou
mutualismo. São conhecidos casos de transformação em empresas cotadas na bolsa,
ou fusões com empresas privadas.
Só a efectiva participação dos membros, o permanente respeito pela democracia
interna, o rigor da gestão, a inteligência na escolha das linhas estratégicas e uma acção
prática no respeito da ética, princípios e valores cooperativos, asseguram o futuro de
cada cooperativa.
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Não pode ser mero discurso, tem que ser coerência permanente entre a palavra e a
acção.
3ª. “O Movimento Cooperativo deverá trabalhar com os responsáveis políticos para
assegurar que reconheçam a particular natureza das cooperativas”
Esta é a última linha de orientação que queremos destacar da Mensagem da ACI.
E ao fazê-lo, assumimos os nossos compromissos históricos e conjunturais, mas
igualmente afirmamos ser credores de reconhecimento pela acção quotidiana
enquanto cooperativistas e dos efeitos sociais, culturais e económicos que as nossas
organizações repercutem e ampliam nas comunidades.
É por isso que não podemos aceitar passivamente que desde a aprovação do Estatuto
Fiscal Cooperativo em 1998, que estabeleceu certas diferenciações positivas para as
cooperativas, até aos dias de hoje, as alterações legislativas que foram sendo
produzidas vêm sempre no sentido de reduzir ou eliminar tais diferenciações.
Apenas um exemplo elucidativo.
O IRC para as empresas privadas era em 1998 de 34% e foi fixado para as
cooperativas em 20%. Isto é, as cooperativas pagavam 58,8% da taxa de IRC das
empresas. Mas em 2000 o IRC das empresas é reduzido para 32%, em 2002 para 30% e
em 2004 para 25% e nunca o IRC das cooperativas foi mexido. Temos hoje uma
diferenciação em que as cooperativas pagam 80% da taxa das empresas. Se se
mantivesse a diferenciação de 1998, a taxa das cooperativas seria hoje de 15,2% e não
os 20% que se mantêm desde 1998.
Mas neste momento as cooperativas têm outra ameaça ainda mais grave, que importa
corrigir antes da sua consagração legal.
A Proposta de Lei nº 270/X/4ª que cria o Código dos Regimes Contributivos da
Segurança Social, já aprovado na generalidade e neste momento em discussão na
especialidade na Assembleia da República, aponta para que a taxa contributiva de
entidades sem fins lucrativos seja de 33,3%, sendo 22,3% para a entidade
empregadora e 11,0% para o trabalhador. Actualmente as cooperativas, na
generalidade têm uma taxa de 31,6% e as cerci’s, equiparadas a ipss, uma taxa de
30,6%, sendo as taxas das entidades empregadoras respectivamente de 20,6% e
19,6%. Isto significa, que a ser aprovada tal disposição se verificará um aumento da
contribuição para a segurança social, das cooperativas em geral de 8,25% e das
cerci’s e ipss de 13,78%.
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E o regime transitório que apenas atrasa a aplicação da taxa definitiva, não evita o
grave erro estratégico desta medida, ao arrepio da orientação constitucional e da
recente posição assumida pelo Parlamento Europeu ao aprovar a Resolução de
19/Fev/2009, em que “Insta a Comissão a zelar para que as características da
economia social (objectivos, valores e métodos de trabalho) sejam tidas em conta na
elaboração das políticas da UE e, em particular a integrar a economia social nas suas
outras
políticas
e
estratégias
de
desenvolvimento
social,
económico
e
empresarial...”, e “Solicita à Comissão que analise a reactivação da rubrica
orçamental específica para a economia social”.
Sobre esta Proposta de Lei, entregámos ontem à AR, e INSCOOP o parecer da
CONFECOOP, depois de uma audição que a Comissão de Trabalho, Segurança Social e
Administração Pública nos concedeu no passado dia 24 de Junho.
Referimos por fim, que aguardamos desde Abril, uma resposta do Governo a um
conjunto de propostas que apresentámos e que certamente permitiriam que as
cooperativas ficassem mais aptas a dar contributos, ainda mais relevantes, no combate
às dificuldades e crise actual e ainda, que pouco conhecemos do processo de criação
da Régie Cooperativa para a Economia Social, que visa substituir o INSCOOP, apesar do
nosso acordo de princípio e da colaboração que sempre disponibilizámos.
Queremos reafirmar a nossa disponibilidade e vontade de mobilizar as estruturas e
cooperativas nossas associadas, para o combate à crise, às suas consequências
nefastas, para trabalhar lealmente com os poderes públicos nos projectos e parcerias
em que estejam envolvidas.
Na nossa liberdade de escolha, aceitamos os desafios de hoje e do futuro.
E como maravilhosamente nos disse o grande poeta de Vila do Conde, José Régio:
“Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!”
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Nas cooperativas, sabemos que trabalhamos e lutamos por um futuro melhor para
os nossos cooperadores e para Portugal.
Viva o Movimento Cooperativo!
O Presidente da CONFECOOP
Jerónimo Teixeira
Póvoa de Varzim, 4/Julho/2009
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