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PCNS E O ENSINO DE HISTÓRIA: UMA ANALISE REFLEXIVA
Profa. Ms. Janaina Jácome dos Santos1
RESUMO
Esse artigo tem como foco refletir sobre as transformações nas propostas curriculares para o
ensino fundamental e médio na disciplina de História, especificamente o item História do
Brasil, nos nas últimas décadas, essas mudanças podem ser analisadas e identificadas a partir
dos documentos disponibilizados no pelo Governo Federal. Como metodologia para essa
analise, faremos uma reflexão sobre os Parâmetros Curriculares Nacionais, os PCNs (1998).
Como suporte teórico, utilizaremos as análises de Bittencourt (2004), Martins (2009),
Carretero, Rosa e Gonzáles (2007).
PALAVRA CHAVE: Ensino. História. Parâmetros Curriculares Nacionais
ABSTRACT
This article focuses on reflecting on the changes in the curriculum proposals for primary and
secondary education in the discipline of history, specifically the item History of Brazil, in the
last decades, these changes can be analyzed and identified from the documents provided by
the Government Federal. The methodology for this analysis, we will reflect on the National
Curriculum Parameters, PCNs (1998). Theoretical support, we will use the analyzes of
Bittencourt (2004), Martins (2009), Carretero, Rosa and Gonzales (2007).
KEY WORD: Education. History. National Curriculum Standards
INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas o Governo Federal brasileiro elaborou parâmetros para o ensino
das diversas disciplinas, eles são de âmbito nacional. Denominados de Parâmetros
Curriculares Nacionais, os PCNs, disponibilizam orientações aos profissionais da educação.
Neste artigo trataremos especificamente do item que trabalha o ensino de História do Brasil
nas diversas séries do ensino fundamental e médio.
Bittencourt (2004) é a uma das pesquisadoras que nos dá suporte teórico para realizar
tal reflexão. Professora da área da educação, nos aponta que o ensino de História faz parte do
plano nacional de estudos desde 1837 com a fundação da primeira escola publica brasileira.
Ao longo dos anos diversas transformações ocorreram na forma de ensinar, contundo o que
nos chama a atenção são as mudanças ocorridas durante a década de 1970.
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Doutoranda em História pela Universidade Federal de Uberlândia. Professora Mestre da Faculdade Shalom de
Ensino Superior - Fases. E-mail: [email protected].
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O Brasil, durante esse período, vivenciava o estabelecimento da ditadura militar, onde
vivenciamos o “milagre econômico”, os desdobramentos do plano AI-5 e também as reformas
educacionais, tanto no ensino primário quanto secundário. No decurso aconteceram mudanças
relativas aos métodos e técnicas de ensino que procuram adequar o ensino em conjunto ao
currículo escolar, especialmente a disciplina História, que tornou-se cada vez mais
simplificado e reduzido. Dessa forma os conteúdos eram esvaziados, tornando-se resumidos.
O movimento de reformulação dos currículos aconteceu a nível internacional e
também nacional, no Brasil as reformulações pautaram-se na formação política das camadas
populares e tinha como suposto a participação de todos os setores sociais no processo de
democratização, cabendo ao Ministério da Educação – MEC - a reformulação curricular,
passando por todos os níveis escolarização, desde ensino infantil ao superior. Para isso foram
organizados os Parâmetros Curriculares Nacionais, os PCNs que abarcam todas as disciplinas.
Segundo Bittencourt (2004) essa reformulação é oriunda de um pressuposto da
psicologia da aprendizagem Piagetiana2. Os PCNs trazem as propostas de ensino de História
desde a década de 1980 sendo poucas vezes alterados, sendo a mais recente as alterações
instituídas por meio das leis 10.639/2013 e 11.645/2008. A primeira institui a obrigatoriedade
do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira, e a ultima altera a primeira instituindo a
obrigatoriedade do estudo História e Cultura Afro-Brasileira, Africana e dos povos Indígenas
Brasileiros.
De acordo com Bittencourt (2004) as propostas recentes tem procurado concentrar-se
na relação entre ensino e aprendizagem e não mais exclusivamente no ensino. Para ensino de
História, a autora aponta que não se deve ter como apreensão do conteúdo somente a
capacidade de dominar informações, conceitos de determinado período histórico, mas também
a capacidade de fazer comparações com outras épocas, períodos usando novos dados, como
tabelas, imagens, mapas e interpretações de textos.
Os PCNs, especialmente para ensino de História, apontam para uma reformulação
técnicas dos textos, onde passaram a demonstrar os fundamentos do conhecimento histórico;
houve também a legitimação do currículo junto ao professor, junto a isso a redefinição do
papel do docente, aumentando sua autonomia na escolha do seu método pedagógico. Outros
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Jean Piaget pesquisador da área da psicologia e pedagogia que realizou estudos sobre as características do
pensamento infantil, tecendo a teoria que o professor deve orientar os alunos no caminho da aprendizagem
autônoma, criando indivíduos capazes e criativos, evitando repetir os erros da geração passada. Pois o principal
foco da educação é criar sujeitos capazes de realizar coisas novas. Suas obras apontam para uma nova
metodologia de ensino. Alguns de seus trabalhos são: A Linguagem e o Pensamento na Criança (1923), A
representação do mundo na criança (1926), A noção de tempo na criança (1946), Da lógica da criança à lógica
do adolescente (1955) dentre outras.
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pontos foram acrescentados como uma fundamentação pedagógica focada no construtivismo,
onde o aluno passa a ser sujeito ativo no processo de aprendizagem e não mero receptor de
conhecimentos, pois o aluno não é uma folha em branco pronta para ser escrita, ele possui
conhecimentos prévios de mundo e de sociedade. Partindo deste pressuposto os PCNs trazem
propostas para o ensino-aprendizagem em diversos níveis.
As propostas para o ensino de História estão presentes em todos os níveis de ensino e
juntamente com a geografia formam a base do conhecimento das ciências humanas, a seguir
apresentaremos as propostas apresentadas no currículo de História a partir dos apontamentos
de Bittencourt (2004).
De acordo com autora, as formulações para o ensino de História partem desde a
primeira série do ensino fundamental até o terceiro ano do ensino médio. Para as primeiras
séries ou ciclos a disciplina visa ultrapassar as bases de nos feitos dos grandes heróis e dos
grandes personagens. As comemorações de datas cívicas permanecem, entretanto outras que
até o momento não estavam presentes começam a ganhar destaque, como o dia do índio e da
consciência negra. O método de ensino é pautado em eixos temáticos e há preocupação em
introduzir noções e conceitos históricosque serão trabalhados continuamente até o fim do
ensino médio. Para Bittencourt eles têm como conceito básico a cultura, a organização social
do trabalho e noções de tempo e espaço histórico. Outra noção apresentada é a concepção de
História local que estabelece a ligação entre o que é próximo e a História nacional.
Para os alunos de quinta a oitava série, umas das características é que a disciplina
passa a ser ministrada por um especialista, ou seja, um professor com conhecimentos
específicos de História. Dando continuidade ao aprendizado nos primeiros ciclos busca-se
trabalhar conceitos considerados base para o conhecimento histórico, assim procura-se
coerência entre os objetivos da disciplina e os fundamentos historiográficos. Bittencourt
(2004) afirma que os conteúdos privilegiados são os trazidos pela História sociocultural onde
destaca-se cultural, trabalho, organização social e relações de poder.
Nesse ínterim entra o conceito de cultura que substituirá aos poucos o conceito de
civilização, com o objetivo de levar aos alunos a compreensão de que os homens para
sobreviver se relacionam com a natureza e consigo mesmo e nesse processo produzem
cultura, que são todas as manifestações históricas dos grupos. Outro ponto que é reafirmando
aos longos do ensino fundamental é a noção de que a disciplina História não deverá ser vista
de forma fragmentada, mas como um processo que é constituído ao longo do tempo.
Para os anos do ensino médio os PCNs apontam uma reflexão aprofundada sobre as
temáticas e conceitos que já apareceram em outros anos, contudo tem como objetivo central a
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preparação para a cidadania, ou seja há uma preocupação em articular a formação da
cidadania com o conhecimento e domínio dos conceitos históricos. Não a intenção em
profissionalizar o aluno, mas é necessário que eles tenham conhecimento sobre os fatos e
acontecimentos históricos. Uma das intenções é forçar o trabalho pedagógico com propostas
de leitura de bibliografia especifica sobre os temas estudados.
LEIS 10.639/2013 E 11.645/2008
Ao longo dos anos o ensino de História tem se alterado constantemente, os Parâmetros
Curriculares Nacionais são o aporte para a inclusão de temas significativos para a sociedade
brasileira. Os currículos tradicionalmente eurocêntricos apresentam uma História onde se
marca a presença de grandes nomes e de marcos específicos da História nacional, entretanto
essa situação tem se alterado a partir da aprovação de duas leis especificas: a lei 10.639/2013
e a lei 11.645/2008.
A lei 10.639/2003 especifica o ensino de História e cultura africana e afro-brasileira
desde o ensino fundamental até o médio, sendo obrigatória nas escolas publicas e particulares.
O texto estabelece que aspectos como o estudo da História da África e dos africanos, a luta
dos negros, a cultura negra deve ser incluído no ensino de História, demonstrando que essa
cultura também faz parte da formação da sociedade nacional.
A lei 11.645/2008 procura complementar as orientações dadas pela lei 10.639,
acrescentando a História e cultura indígena. Assim o conteúdo programático deverá incluir
diversos aspectos da História e da cultura indígena que caracterizam a formação da população
brasileira, a partir desses dois grupos étnicos. Tais estudos procuram resgatar as suas
contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à História do Brasil.
Para Bittencourt (2004), um dos objetivos da lei é ultrapassar a limitação de uma
disciplina apreendida com base nos feitos heróicos e dos grandes personagens, trazendo a tona
a cultura e História de grupos étnicos que constituem a formação do brasil. Para ela ao estudar
as populações indígenas fundamenta-se o conceito e a noção de diferença e semelhança, além
da valorização das diversas culturas presentes no país.
A implementação destes conteúdos nos livros didáticos de História proporciona uma
reflexão por parte do aluno mais aprofundada sobre as questões étnicas, pois segundo
Bittencourt (2004) os discursos apresentados nestes livros ainda procuram manter estereótipos
sobre esses grupos. Existe uma preocupação na permanência de visões deformadorase
incompletas sobre esses povos. Essa manutenção é problemática, pois leva a uma visão
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homogênea sobre as culturas ou em algumas vezes mantém-se uma visão discriminatória e
preconceituosa, tanto da população indígena quanto da população negra.
De acordo com Bittencourt (2004) analises recentes dos livros didáticos de História
apresentam a História da população de origem africana somente no período dedicado a
colônia e a escravidão no Brasil e pouco aparece sobre o que aconteceu com os negros no pósabolição.
Outra pesquisadora, Martins (2009) evidencia essa mesma visão na questão indígena.
Segundo ela a História que ensinamos sobre as populações indígenas mantém-se com bases
eurocêntricas, onde não aparece a especificidade de etnia. As sociedades indígenas continuam
aparecendo nos livros didáticos com temas inadequadose na maioria das vezes vinculado a
imagens de um índio genérico e estereotipado. A História das sociedades indígenas são
relegadas as primeiras páginas dos livros didáticos de História, especialmente nos anos
iniciais dos conteúdos de História do brasil. Mas, ao logo das temática acabam por
desaparecer, mantém assim a versão de povos relegados única e exclusivamente ao passado.
A noção é que não existem sociedades indígenas no presente.
PCNS: O ENSINO DE HISTÓRIA E A CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADES
Existe uma relação intrínseca entre o ensino de História e a construção de identidades.
De acordo com os PCNs ao longo da História da educação brasileira e também dos currículos
existe uma grande importância do ensino de História para formação de identidades, sendo ela
concebida como formação do “cidadão patriótico”, do “homem civilizado” ou da “pessoa que
é ajustada no seu meio”. Desta forma caberia a História desenvolver identidade das pessoas
que compõe a nação brasileira, partido dos conhecimentos históricos, especialmente dos
grandes feitos e dos grandes homens da História nacional. Essa tradição ainda continua,
entretanto é preciso analisar como é concebida o sentido de identidade e qual é a sua
relevância para a formação do cidadão e consequentemente para a sociedade brasileira.
De acordo com os PCNs a atual realidade da sociedade brasileira vivencia momentos
de transformação, marcado pelos processos migratórios que transformam as relações entre os
sujeitos e o mundo, como também a assimilação entre as tradições de trabalhos, sociais e
culturais. Esses deslocamentos juntamente com a expansão econômica proporcionam
mudanças culturais, criando novas situações para a identidade local, regional e nacional “na
medida em que desestruturam relações historicamente estabelecidas e desagregam valores,
situações cujo alcance ainda não se pode avaliar” (BRASIL, 1998, p. 34).
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O ensino de História tem seu papel fundamental nesta construção, por meio destas
novas situações o professor deve orientar a formação da identidade nacional, mas como fazer?
As orientações dos PCNs é sobre a escolha de praticas pedagógicas que possibilitem o aluno
refletir sobre seus valores e práticas cotidianas, relacionando-as com as problemática
históricas que não constituem seu grupo de convívio, mas que fazem parte da composição da
História local, regional e nacional.
Neste sentido é possível despertar no aluno noções importantes para construção da
identidade, como semelhança, diferença, transformação e permanência. Por essas noções o
aluno passa a identificar e distinguir que sou “eu” e quem é o “outro” compreendendo que as
práticas e valores dos grupos diversos na sociedade são coletivos de determinadas épocas e
que essas relações não harmoniosas, mas conflitantes e que existem culturas diversas. Dessa
forma o aluno tem uma noção de como é constituído o todo nacional, de que a História é
marcada por conflitos, que existem continuidade e também descontinuidades das práticas e
valores ao longo das transformações históricas.
Contribuindo com as orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais trazemos os
apontamentos de Mario Carretero, Alberto Rosa e Maria Fernanda Gonzáles, no artigo
Ensinar História em tempos de Memória, presente no livro Ensino de História e Memória
Coletiva (2007).
De acordo com os autores a disciplina História tem sido ao longo dos anos um espaço
de disputa, disputa da memória que se quer manter e qual deve ser relegada ao esquecimento,
portanto a escola – lugar de ensino – é um cenário de disputa de memórias. Essas memórias
são parte fundamental da formação da identidade da sociedade nacional.
Para Carretero, Rosa e Gonzáles (2007) a disciplina História é definida por “objetivos
como cognitivos, dirigidos a formação do conhecimento das disciplinas e sociais ou de
identidade, destinado a formação da identidade nacional” (2007, p. 20). Para eles o próprio
ensino de História virou tema para um debate acalorado: onde a discussão central é qual a
memória que se quer para formar uma identidade nacional. Vários pesquisadores e em
diversos países se debruçaram sobre essa temática chegando ao seguinte ponto: os conteúdos
presentes nos currículos de História são fundamentais na formação de uma identidade
nacional.
Dentro dos dois tipos de objetivos apontados pelos autores, o segundo dirige para
formação nacional, que conta com os seguintes princípios: a) valorização positiva do passado,
presente e futuro dos grupos, sejam locais, regionais e nacionais; b) valorização das
transformações políticas; c) identificação com os personagens, eventos e características do
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passado. Esses princípios são pouco estudados e apresentam uma reflexão tímida, pois ainda é
recente as discussões. Entretanto, os autores fazem apontamentos sobre como tratar essas
questões.
A formação nacional é composta pela memória coletiva, pela História e pela política.
Esta ultima é definida como a “harmonização das vontades que torna possível um
funcionamento social com efetividade aceitável” (Carretero; Rosa; Gonzáles, 2007, p. 22).
Nessa mistura compreendemos que não é possível que exista uma identidade comum sem uma
memória compartilhada que é reiterada pela História e que é determinada pelo viés político
que vivencia o país.
A História, segundo os autores, chegou a escola como um procedimento de “[...]
formação de identidade, que se mostrou de grande efetividade para a formação da fidelidade
aos estados modernos, fidelidade que vincula tanto aos que estão sujeitos ao poder como a
quem exerce, pois essa memória coletiva afeta a todos por igual”. (CARRETERO; ROSA;
GONZÁLES, 2007, p. 25)
É nessa perspectiva que se relaciona memória, construção de identidade e o ensino de
História. Percebemos que a História possui um grande poder de coesão e de formação de uma
identidade de um povo. É nesse sentido, também, que se inclui as temáticas africanas e afrodescendentes, assim como a indígena. Contudo, é necessário deixar estereótipos e apresentar
as culturas e a realidade deste povo. Esse artigo teve como foco realizar uma breve reflexão
sobre as mudanças nos PCNs, trazendo à tona a inclusão de outras temáticas importantes para
o ensino de História, pois esta disciplina torna-se de fundamental importância para a
construção da nação brasileira.
REFERENCIAS
BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos. São
Paulo: Cortez, 2004.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:
história /Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC / SEF, 1998.
CARRETERO Mario. ROSA, Alberto. GONZÁLES, Maria Fernanda (org.). Ensino de
Historia e Memória Coletiva. São Paulo: Artmed editora, 2007.
MARTINS, Maria Cristina Bohn. As sociedades indígenas, a história e a escola. Antíteses,
vol.
2,
n.
3,
jan.-jun.
de
2009,
pp.
153-167.
Disponível
em:
http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/antiteses. Acesso em 01 dez. de 2014.
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