Introdução
Introdução
Luciano Ambrosio Ferreira
Josemar Parreira Guimarães
INTRODUÇÃO
O termo Desordem Temporomandibular é utilizado abrangendo várias situações clínicas
que envolvem a musculatura mastigatória, os componentes da articulação temporomandibular
e estruturas adjacentes associadas. A DTM é um subgrupo de desordens músculo-esqueletais
e reumatológicas que se manifestam na região orofacial, sendo causa principal de dor não
odontogênica nessa região9, 10, 11.
Sua sintomatologia é ampla, sendo comuns as queixas de dor muscular facial, dor articular
e durante os movimentos mandibulares, cefaleia, otalgia, vertigem, zumbido, cervicalgia, dor
ocular, entre outras 3, 4, 10, 11, 17.
Sua etiologia é bastante discutida e relacionada a vários fatores, como desarmonia oclusal,
presença de hábitos parafuncionais, modificações posturais, condições psicossociais desfavoráveis,
macrotrauma orofacial e alterações hormonais 11, 17.
Estima-se que 58,3 a 83,5% dos pacientes com DTM padeçam de sintomas crônicos,
caracterizados por uma grande diversidade clínica e repercussão biopsicossocial desfavorável 2, 7, 14.
O diagnóstico e a abordagem terapêutica inicial das DTM são geralmente realizados por
profissionais da Odontologia e visam ao controle da dor e da disfunção, por meio de terapias
reversíveis. Para esse fim, usualmente são utilizados dispositivos oclusais denominados “placas
neuromiorrelaxantes”9, 10. Ainda assim, devido a sua etiologia multifatorial, a terapêutica
interdisciplinar é recomendada.
Para o atendimento clínico ou realização de pesquisas, o exame complementar por imagem
é o método visual que fornece dados minuciosos sobre as condições dos tecidos duros e moles das
ATM e estruturas associadas. Dentre os mais variados meios de diagnósticos utilizados na área da
saúde, podemos citar as imagens radiográficas, as tomografias computadorizadas e as imagens por
ressonância magnética como as mais comuns, utilizadas para diagnóstico das DTM. Adicionais
a esses exames, temos ainda as fotografias, modelos de estudo, modelos de trabalho montados em
articulador semiajustável e a própria placa neuromiorrelaxante.
As alterações de morfologia dos componentes ósseos da ATM podem ser avaliadas através
dos exames radiográficos e de tomografias. Por meio desses, verificamos também as alterações de
excursão condiliana e dos espaços articulares. Já a visualização dos tecidos moles e a informação
sobre a posição do disco articular é fornecida pelo exame de ressonância magnética.
FERREIRA, L. A.; GUIMARÃES, J. P
Sendo assim, os dados clínicos podem ser associados aos de imagens, permitindo constatar
alterações como fraturas de côndilo, formações neoplásicas, condições de hipo/hiperdesenvolvimento
do côndilo e processo coronoide, calcificações do ligamento estilo-hoideo, condições ósseodegenerativas, de deslocamentos do disco articular, aderências, anquiloses, dentre outras.
O diagnóstico das patologias que acometem o sistema estomatognático é motivo de pesquisa
em todo o mundo. Os primeiros estudos sobre essa temática e sua epidemiologia aconteceram nos
Estados Unidos da América e países escandinavos da Europa, sendo hoje linha de pesquisa em
cursos de mestrado e doutorado em faculdades de Odontologia e ciências afins.
Para a presente obra, foi realizado um criterioso estudo nos prontuários de atendimento do
Serviço de Diagnóstico e Orientação a Pacientes com Desordem Temporomandibular (SERVIÇO
ATM) da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Juiz de Fora (FO/UFJF). A busca
por características fisiológicas e patológicas nos prontuários de 3500 pacientes resultou em um
estudo epidemiológico fundamentado na interpretação de imagens de radiografias transcranianas,
panorâmicas e planigrafias, tomografias computadorizadas e imagens de ressonância magnética.
Foram descartados os prontuários incompletos ou com imagens não representativas, que
comprometeriam a avaliação, resultando em um total de 2844 prontuários analisados.
A maioria das imagens radiográficas desta obra consistiu de exames por planigrafia
em norma sagital, registrando a posição de máxima intercuspidação habitual e máxima
abertura bucal de ambas ATM .
Os dados sobre idade e gênero dos pacientes, bem como os obtidos pela análise das imagens,
foram registrados em planilhas, que contabilizaram a presença de alterações anatômicas dos
componentes articulares (aplainamentos, osteófitos, erosões e irregularidades corticais), as alterações
funcionais de abertura e excursão condiliana (hipoexcursão, hiperexcursão, excursão normal e abertura
bucal), a concentricidade condilar em MIH, além da ocorrência de fraturas, assimetrias e hiperplasia
do processo estiloide. Os resultados dos sinais radiográficos registrados pela análise dos prontuários
foram descritos em forma de gráficos e apresentados nos capítulos deste Atlas.
Exames de acervo dos próprios autores ou gentilmente cedidos por colaboradores
ilustraram as condições patológicas e fisiológicas encontradas na rotina de atendimento clínico ou
de diagnóstico de pacientes que procuraram atendimento para a DTM.
A grande maioria dos exames avaliados e aqui apresentados pertencia a pacientes do gênero
feminino (84%). A proporção de 5 mulheres para cada homem foi constatada - Gráfico 1 - e as
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Gráfico 1 Proporção entre os gêneros.
Gráfico 2 Distribuição entre idades.
faixas etárias mais acometidas pela DTM abrangiam dos 30 a 39 anos (22,19%), dos 20 aos 29
anos (20,99%) e dos 40 aos 49 anos (20,11%) – Gráfico 2. Esses dados caracterizam o perfil do
paciente atendido pelo Serviço ATM: mulheres em idade laboral ativa.
Apesar desses resultados concordarem com a maioria dos estudos epidemiológicos
descritos na literatura, podemos ainda encontrar valores discrepantes quanto à prevalência em
outras pesquisas, em virtude da natureza flutuante das DTM. Contudo, o fator primordial dessa
discrepância é justificado pelas diferenças metodológicas entre os estudos, pela diversidade da
população estudada, pela seleção de amostras não representativas, por técnicas de exames clínicos
não padronizadas ou com diferentes critérios diagnósticos.
De forma abrangente, alguns autores9,10 citam que a porcentagem da população geral com
algum tipo de DTM é de 40% a 60%, afetando preferencialmente indivíduos entre 21 e 40 anos
de idade13, conforme ilustram nossos resultados.
A maior frequência de DTM entre mulheres foi igualmente descrita na literatura
10, 13
,
revelando uma proporção de 5:1 em relação aos homens. Tal predileção pelo gênero feminino deve-
ATLAS DE DIAGNÓSTICO POR IMAGINOLOGIA DAS DESORDENS TEMPOROMANDIBULARES
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FERREIRA, L. A.; GUIMARÃES, J. P
se principalmente por estar a mulher mais sujeita ao estresse emocional, às mudanças hormonais
durante o ciclo menstrual, à presença de receptores para hormônios sexuais na ATM, às alterações
anatômicas decorrentes de uma anatomia menor e mais frágil, e também ao fato de as mulheres
procurarem com maior frequência a ajuda médica10, 13.
No que concerne à prevalência das DTM e sua distribuição em faixas etárias, há de se
notar que a literatura demonstra dados conflitantes. Alguns estudos indicam o aumento do
risco de DTM com o avançar da idade 5, 12 , ao passo que outros relatam sua baixa frequência
em indivíduos mais velhos 9, 10.
Em estudos epidemiológicos longitudinais e transversais, comumente é descrito que
pacientes com DTM estão situados entre as idades de 15 e 45 anos1. De certa forma, é explicado
que a prevalência dos sinais e sintomas aumenta a partir da adolescência, ficando mais presente na
idade adulta (entre a segunda e terceira décadas de vida), diminuindo após os 45 anos 12.
Obviamente, não se descarta a presença de DTM entre crianças. Sugere-se que o
comprometimento das estruturas músculo-articulares do sistema estomatognático acomete,
inclusive, indivíduos situados nas duas primeiras décadas de vida 6. Dessa forma, salienta-se
a importância de se investigar e avaliar a prevalência dessas desordens em todos os grupos
etários, de ambos os gêneros, incluindo as crianças e os idosos.
De maneira geral, outros dados sociodemográficos, como raça, estado civil, nível
escolar, remuneração, renda familiar, ou mesmo fatores genéticos e hereditários não são
conclusivos ao apontarem uma característica determinante para os pacientes com DTM 8, 12,
15
. Sugere-se que os fatores sociais, econômicos e culturais são influenciados pelas diferentes
características regionais de cada população, repercutindo nos mais variados números, citados
em diferentes pesquisas epidemiológicas 12 .
Independente do perfil socioeconômico, as DTM mostram uma grande variedade
de sinais e sintomas, que, na maioria das vezes, repercutem em consideráveis índices de
severidade e inabilidade9, 10, 11, 13.
Neste contexto, o papel dos exames de imaginologia é fornecer informações que
auxiliem no diagnóstico clínico e no estabelecimento do plano de tratamento dos pacientes
portadores de DTM, elucidando as principais etiologias envolvidas, permitindo o tratamento
adequado e o alívio da dor dos pacientes.
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