Curso Online A Escola no Combate ao Trabalho Infantil
Professor Antonio Carlos Gomes da Costa 1
Vídeo Aula 12
A Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente
O contexto da Constituição Federal de 1988 foi inspirado nau ‘ideia força’ de
reconstrução democrática da vida nacional, depois de duas décadas de regime militar.
Neste momento o Fundo das Nações Unidas para a Infância - UNICEF e as demais
organizações, Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil - CNBB, Sociedade Brasileira de Pediatria, Movimento Nacional de Meninos e
Meninas de Rua, Pastoral do Menor fizeram duas emendas apresentadas na Constituinte.
As emendas Criança Prioridade Nacional e a emenda Criança e Constituinte. Estas
duas emendas populares obtiveram o número de assinaturas necessárias para que fossem
apresentadas à Constituinte como emenda de iniciativa popular.
Do conteúdo destas duas emendas é que nasceu o artigo 227 da Constituição
Federal. O conteúdo delas veio do projeto de Convenção Internacional dos Direitos da
Criança, que vinha sendo discutido pela Assembleia Geral da Organização das Nações
Unidas - ONU desde 1979, que foi o Ano Internacional da Criança. A Constituição Federal
brasileira é de 05 de outubro de 1988 e a Convenção Internacional foi aprovada em 20 de
novembro de 1989, ou seja, o artigo 227 da Constituição trouxe o que havia de melhor no
direito internacional, ainda não aprovado pela Assembleia Geral, era um projeto de
Convenção Internacional. Dos 54 artigos da Convenção, tirando a parte procedimental,
introdutória, ficavam cerca de 40 artigos com conteúdos substantivos, e estes foram todos
resumidos no artigo 227 da Constituição:
“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
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Antonio Carlos Gomes da Costa, falecido em 2011 foi um dos maiores especialistas que o Brasil já tece
na área da infância e adolescência. Autor de diversos livros, o pedagogo participou da redação do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) e foi oficial de projetos do Fundo das Nações Unidas para a Infância
(UNICEF).
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Esta aula foi gravada originalmente para o Curso ECA na Escola, promovido pela Fundação Telefônica
entre 208 e 2010. Trata-se, porém, de conteúdo absolutamente atual. Foram feitas apenas as adaptações
necessárias à transposição do texto falado para o texto escrito.
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de
toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão”.
A doutrina da proteção integral pode ser resumida em três palavras:
Sobrevivência = Direito à vida, à saúde e à alimentação;
Desenvolvimento Pessoal e Social = Direito à educação, à cultura, ao lazer e à
profissionalização;
Respeito e Integridade Física, Psicológica e Moral = direito à liberdade, respeito,
dignidade, convivência familiar e comunitária.
O professor Alessandro Barata, um dos maiores juristas e filósofos do direito no
mundo, disse que o artigo 227 da Constituição Brasileira era extraordinário e seminal,
porque era uma síntese muito feliz de todo o conteúdo da Convenção Internacional dos
Direitos da Criança. Este artigo fez, em termos de direitos da criança, com que o Brasil
acertasse o passo com as democracias modernas do mundo ocidental.
Princípios do ECA
O Código de Menores, que era a lei que antecedeu o ECA, tinha no texto do seu
artigo primeiro a seguinte afirmação “esta lei trata da proteção e vigilância dos menores em
situação irregular”. Quem eram os menores em situação irregular? Eram os abandonados,
os carentes, os inadaptados e os infratores, ou seja, era um recorte dentro do universo da
população infanto-juvenil brasileira.
O ECA, por sua vez, trata da proteção integral, conforme colocado acima, por meio
do direito à sobrevivência, aos desenvolvimento pessoal e social e o direito à liberdade,
respeito, dignidade, convivência familiar e comunitária. Este conjunto de direitos formam a
proteção integral. A palavra “integral” é se inspirada no espírito da Convenção Internacional
dos Direitos da Criança. Na verdade é a doutrina jurídica que preside a construção da
normativa internacional para a infância e juventude no âmbito das nações unidas. Dizemos
que a proteção integral se refere à garantia de todos os direitos para todas as crianças,
sem exceção alguma.
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O principal, quando se fala em princípios fundamentais do ECA, está no seu artigo
sexto, que é um artigo maravilhoso, pois é a única lei que traz no seu texto a regra para a
sua interpretação.
“Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais e a que
ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e
coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em
desenvolvimento”.
Estas são as concepções sustentadoras do ECA. Todos o articulado do ECA deriva
daí. Eu digo que este artigo é como se fosse o leite, os outros são como se fossem a
manteiga, o queijo, o requeijão, os derivados do leite.
Criança e Adolescentes: Prioridades Absolutas
Porque a Criança e o adolescente são prioridade absoluta?
1. Porque eles não conhecem os seus direitos,
2. Porque eles não possuem meios para satisfazerem por si mesmo as suas
necessidades básicas,
3. Porque a criança e o adolescente têm um valor prospectivo, ou seja,
representam o futuro da sua família, do seu povo e da humanidade. Uma
família que não tem crianças ou adolescentes, por exemplo, quando aquele
casal desaparece, aquela família desaparece também. Um povo que não tem
crianças e adolescentes está com o seu futuro em risco, e a humanidade se
renova com as crianças os adolescentes e os jovens. Por isso este valor
prospectivo é muito importante.
4. Além destes, existe o valor essencial de cada criança e adolescente, porque,
em todas as fases de seu desenvolvimento, sejam crianças, adolescentes ou
jovens, estes são seres humanos completos.
A relação entre os conceitos de Sujeito de Direitos e Sujeito em Condição
Peculiar de Desenvolvimento
Esta relação traz um conceito amplo e profundo. Significa que as crianças e
adolescentes têm direitos, mas eles não se aplicam sempre da mesma forma. Por exemplo,
o direito de ir e vir não se aplica aos bebês. A gente não pode dizer a um bebê: “eu vou sair
quando você estiver com fome, vá à geladeira e pegue a mamadeira”. O bebê não exerce o
direito de ir e vir.
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O direito ao trabalho não se aplica à criança. A criança não pode trabalhar, nos
ensina o Dr. Urias de Oliveira, o adolescente deve estudar e pode trabalhar, dentro do que
dispõe a lei: dos 14 aos 16 anos na condição de aprendiz, e a partir do 16 anos no trabalho
regular e remunerado, mas o primeiro direito é que ele deve estudar e pode trabalhar, e o
adulto deve trabalhar e pode estudar. Temos três condições peculiares de desenvolvimento
e o trabalho se aplica a cada uma delas de forma diferenciada.
A condição de sujeito de direitos é iluminada pelo conceito de pessoa em condição
peculiar de desenvolvimento. Isso significa, repito, que os direitos não se aplicam a
crianças, adolescentes e adultos da mesma forma, a cada condição de desenvolvimento o
direito assume uma configuração. Por exemplo, no ato infracional, a criança é irresponsável
e inimputável penalmente, o adolescente é responsabilizado penalmente, mas não é
imputável penalmente, porque não são aplicadas a ele as penas do Código Penal e sim as
Medidas Socioeducativas; e nós, adultos, somos responsáveis e imputáveis penalmente.
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Então a gente vê como o conceito de condição peculiar de desenvolvimento serve
como uma moldura para o conceito de sujeito de direitos, exigíveis com base na lei.
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