UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA
ANDRÉA MARIA NARCISO ROCHA DE PAULA
INTEGRAÇÃO DOS MIGRANTES RURAIS NO MERCADO DE
TRABALHO EM MONTES CLAROS, NORTE DE MINAS GERAIS:
"A Esperança de Melhoria de Vida”
UBERLÂNDIA
2003
- 3 -ss
3
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA
ANDRÉA MARIA NARCISO ROCHA DE PAULA
INTEGRAÇÃO DOS MIGRANTES RURAIS NO MERCADO DE
TRABALHO EM MONTES CLAROS, NORTE DE MINAS GERAIS:
"A Esperança de Melhoria de Vida”
UBERLÂNDIA
2003
- 2 -ss
2
ANDRÉA MARIA NARCISO ROCHA DE PAULA
INTEGRAÇÃO DOS MIGRANTES RURAIS NO MERCADO DE
TRABALHO EM MONTES CLAROS, NORTE DE MINASGERAIS:
“A Esperança de Melhoria de Vida”.
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Geografia da Universidade Federal
de Uberlândia, como requisito para a obtenção do
Título de Mestre em Geografia.
Área de Concentração: Análise e Planejamento
Sócio-ambiental.
Orientador: Professor Dr. João Cleps Júnior.
UBERLÂNDIA-MG
2003
- 3 -ss
3
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA
INSTITUTO DE GEOGRAFIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM ANÁLISE E PLANEJAMENTO SÓCIOAMBIENTAL
BANCA EXAMINADORA:
___________________________________________________________________________
Professor Dr. João Cleps Júnior (Orientador)
Professor Dr. Júlio César de Lima Ramires
Professor Dr. Antônio Nivaldo Hespanhol
Data: 30 de maio de 2003
Resultado: APROVADA COM DISTINÇÃO.
- 4 -ss
4
Dedico esta dissertação a Fábio de Paula Silveira, que foi o principal
incentivador, apontando críticas, problemas e qualidades. Com certeza, foi quem
mais acreditou na viabilidade deste trabalho.
Aos meus filhos Mateus, Natália e Juliana. Não lhes peço desculpas por
minhas ausências, mas agradeço profundamente por estarem tão presentes. Que
minha persistência e meu prazer em realizar aquilo que acredito acompanhem vocês
na trajetória da vida...
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5
AGRADECIMENTOS:
Agradeço aos meus pais e irmãos que mesmo não entendendo o porque
de "tanto trabalho", não deixaram o desânimo impedir o crescimento. Alcione, minha
irmã que tanto acredita e vibra sempre comigo. Vó Detina que me ensinou a
acreditar nos sonhos.
Agradeço, profundamente, ao meu orientador Professor Dr.João Cleps
Júnior com quem aprendi tanto, não somente sobre o tema da pesquisa, mas que
determinação, rigor metodológico, seriedade e responsabilidade nos levam a fazer o
melhor possível. Obrigada João, a cada correção, obstáculos e satisfação das
publicações de nossos trabalhos crescia a certeza de estar na trilha correta. Talvez
você não tenha percebido, afinal sou apenas mais uma orientanda, mas este
encontro entre uma socióloga e um geógrafo foi muito agradável e importante para
minha carreira. Você mostrou o Norte para esta pesquisa. Tomara que haja mais
trilhas...
Á professora Geisa Cleps, pela disponibilidade e carinho de sempre. Ao
professor Júlio Ramires que foi fundamental para a execução e realização deste
trabalho através das orientações na defesa e qualificação desta pesquisa. As
professoras e amigas Luciene Rodrigues e Ângela Dumont pela sensibilidade, pelo
exemplo e carinho.
Ao escritor e educador popular Carlos Rodrigues Brandão que através de
seus livros de educação, antropologia, poemas, pesquisas de campo tem me
ensinado o fascínio e prazer pela pesquisa e pela “gente querida”.
O meu imenso carinho para minha irmã-amiga Ana Paula pela partilha e
acolhida em sua casa; a José Ribeiro da Secretaria de Planejamento da Prefeitura
de Montes Claros; a Suzana dos Anjos, gerente do SINE-Moc; as amigas Maria das
Graças Campolina Cunha Gama e Jaqueline Araújo.
Aos acadêmicos do curso de Geografia que auxiliaram na pesquisa de
campo: Rejane Soares Ruas, Tarcísio Lopes Lessa e Denise Mendes Veloso. Aos
acadêmicos que me auxiliaram com gráficos e tabulações: Elaine, Paola, Tatiane,
Joyce, Rodrigo, Veridiana, Dilma, Rosângela e Milena.
- 6 -ss
6
Agradeço imensamente todos os acadêmicos com quem divido dúvidas,
conhecimentos e satisfações no cotidiano da Universidade Estadual de Montes
Claros. Acredito em vocês e no desenvolvimento da ciência através da pesquisa,
ensino e extensão para transformação da realidade que vivemos.
Assino este trabalho, mas é importante ressaltar que esta pesquisa é
resultado do trabalho de muitas pessoas que apoiaram e acreditaram sempre.
Os versos de Adélia Prado são pertinentes para o expressar o meu
carinho e respeito a todos:
Eu sempre sonho uma coisa que gera,
nunca nada está morto.
O que parece vivo, aduba.
O que parece estático, espera.(...);
Minha mãe achava estudo a coisa mais fina do mundo.
não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
(PRADO, 1991:17)
- 7 -ss
7
Sertanejos, mire, veja: o sertão é uma espera enorme.
(João Guimarães Rosa)
- 8 -ss
8
SUMÁRIO
LISTA DE ILUSTRAÇÕES....................................................................................... X
LISTA DE TABELAS.............................................................................................. XII
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS............................................................... XIII
RESUMO .............................................................................................................. XIV
ABSTRACT ........................................................................................................... XV
INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 18
CAPÍTULO 1
VIDAS SECAS: MIGRAÇÕES INTERNAS E A EXPANSÃO CAPITALISTA NO
CAMPO BRASILEIRO........................................................................................ 25
1-1- A Modernização Agrícola e as Migrações em Busca de Trabalho ............... 29
1.2- As Migrações Campo-Cidade: diferentes enfoques interpretativos............... 35
1.3- A Problemática do Desemprego e as Transformações do Lugar ................. 41
CAPÍTULO 2
RAÍZES DO BRASIL: POLÍTICAS PÚBLICAS E DINÂMICA DO MERCADO DE
TRABALHO............................................................................................................ 46
2.1- As Concepções e Transformações no Mundo do Trabalho.......................... 47
2.2- Políticas Públicas de Emprego e Renda e as Mudanças no Mercado
de Trabalho no Brasil .................................................................................. 54
2.3- As Políticas de Combate às Secas no Nordeste: Uma breve revisão.......... 58
CAPÍTULO 3
GRANDE SERTÃO: A REGIÃO MINEIRA DO NORDESTE ............................... 65
3.1- A Ocupação e Desenvolvimento do Território do Sertão Norte Mineiro.......
65
3.2- A Organização Produtiva da Região Mineira do Nordeste............................ 69
3.3- A Casa e a Rua: norte-mineiros na busca por trabalho ............................... 76
3.3.1- O Caminho da Roça: o Lugar, a Ação Social, a Reprodução das Relações
Sociais de Produção.............................................................................................. 76
- 9 -ss
9
3.4- A procura por Trabalho: as diferenças entre o mundo da casa e o mundo da
rua......................................................................................................................... 81
3.5- - Admirável Mundo Novo, o pré-modernismo no mundo do migrante rural no
século XXI .............................................................................................. 88
CAPÍTULO 4
ESPERANÇA DE MELHORIA DE VIDA: O MIGRANTE RURAL NA BUSCA DE
TRABALHO NA CIDADE DE MONTES CLAROS (MG)...................................... 92
4.1- A Mudança de Rota da Migração: Montes Claros, de Cidade Sertão para
Centro Regional Urbano........................................................................................ 92
4.1.1- O Processo de Desenvolvimento do Município de Montes Claros............. 93
4.1.2- A Trajetória da Migração para Montes Claros............................................ 100
4.2- Quem são os Migrantes Rurais em Montes Claros: Marias, Josés, Franciscos,
Raimundos, Helenas ............................................................................................ 102
4.3- O Acréscimo de Mulheres e Jovens na Migração para Montes Claros........ 111
4.4- Política Pública de Emprego do SINE: Posto de Montes Claros- A Expectativa
de Trabalho ....................................................................................................... 115
4.5- A Integração dos Migrantes Rurais no Mercado de Trabalho:
As Possibilidades!................................................................................................ 120
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................. 124
6- BIBLIOGRAFIA................................................................................................ 132
7-- ANEXOS.......................................................................................................... 141
ANEXO A -Álbum de Fotografia: diferentes origens, desejos, colocações; Partilha
da Sobrevivência dos Migrantes na Cidade de Montes Claros (MG)....................142
ANEXO B-Questionário Utilizado na Pesquisa de Campo.................................. 152
ANEXO C-Texto/Depoimentos de funcionários em relação ao SINE ..................155
ANEXO D- Figura 31- Estado de Minas Gerais - Microrregião Geográfica do Norte
de Minas e Localização do Município de Montes Claros...................................... 158
ANEXO E-Figura 32 -Região Mineira do Nordeste - ADENE/2003.................... 159
- 10 -ss
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
GRÁFICO 1....................................................................................................... 28
Distribuição Percentual Dos Fluxos De Emigrantes Segundo Unidade
da Federação De Destino – Minas Gerais - 1960-1970, 1970-1980, 1980-1991
GRÁFICO 2...................................................................................................... 96
Evolução Demográfica de Montes Claros
GRÁFICO 3...................................................................................................... 103
Origem Racial do Migrante Rural em Montes Claros -2000/2001 e 2002
GRÁFICO 4 .................................................................................................... 103
Distribuição da População Migrante Rural por Tipo de Sexo
GRÁFICO 5..................................................................................................... 104
Forma de Moradia da População Rural Migrante de Montes Claros(MG)
GRÁFICO 6 ..................................................................................................... 104
Número de Pessoas na Família do Migrante Rura -Montes Claros(MG)
GRÁFICO 7..................................................................................................... 105
Percentual do Número de Filhos de Migrantes Rurais - Montes Claros(MG)
GRÁFICO 8 .................................................................................................... 106
Rendimento Mensal do Migrante Rural por faixas de SM
GRÁFICO 9..................................................................................................... 106
Migração Anterior do Migrante Rural à Montes Claros (MG)
GRÁFICO 10.................................................................................................... 107
Local de Nascimento dos Migrantes Rurais residentes em Montes Claros(MG)
GRÀFICO 11 .................................................................................................. 108
Relação de Migrante Rural com a Propriedade Rural em Montes Claros(MG.)
GRÁFICO 12 .................................................................................................. 108
Valor do aluguel pago pelo Migrante Rural -Montes Claros(MG)
GRÁFICO 13 ................................................................................................. 109
Grau de Escolaridade dos Migrantes Rurais em Montes Claros(MG)
GRÁFICO 14.................................................................................................. 110
Religião do Migrante Rural -Montes Claros(MG)
GRÁFICO15................................................................................................... 110
Maior Problema enfrentado pelos Migrantes Rurais em Montes Claros(MG)
GRÁFICO 16 .................................................................................................. 112
Número de Migrações Anteriores a Montes Claros(MG)
- 11 -ss
11
GRÁFICO 17................................................................................................... 113
Principal Motivo da Saída dos Migrantes Rurais do seu Local de Origem
GRÁFICO 18 .................................................................................................. 114
Faixa Etária dos Migrantes Rurais em Montes Claros(MG)
GRÁFICO 19................................................................................................... 116
Principais Dados do Atendimento no Posto do SINE de Montes Claros(MG)
GRÁFICO 20 ................................................................................................... 117
Opinião do Migrante Rural sobre o Atendimento do Posto do SINE
de Montes Claros(MG)
GRÁFICO 21............................................................................................. ..... 117
Frequência de procura dos Migrantes no Posto do SINE de Montes Claros(MG)
GRÁFICO 22 ................................................................................................... 118
Oportunidades de Empregos Oferecidas pelo SINE - Montes Claros(MG).
FIGURA 01............................................................................................................... 21
Mapa Urbano de Montes Claros: Localização da Pesquisa de Campo
FIGURA 02............................................................................................................. 24
Fotografias de Montes Claros (MG).
FIGURA 03-........................................................................................................ 29
Fotografia de Migrantes Rurais em direção a Montes Claros (MG)
FIGURA 04....................................................................................................... 34
Fotografia da chegada de Migrantes Rurais em Montes Claros (MG)
FIGURA 05......................................................................................................... 36
Mapa- Principal Unidade da Federação/Região de Origem dos
Imigrantes Interestaduais – Minas Gerais – 1986-1991
FIGURA 06......................................................................................................... 38
Esquema do Processo de Migração Interna
FIGURA 07......................................................................................................... 44
Meio Rural de Montes Claros (MG)- Moradia de trabalhadores de Carvoaria
FIGURA 08....................................................................................................... 53
Praça Dr. Carlos, local de concentração de trabalhadores ambulantes
do mercado informal.
FIGURA 09....................................................................................................
Mapa da Região do Polígono das Secas/ Brasil ano de 2002.
61
- 12 -ss
12
FIGURA 10..................................................................................................... 64
Ambulantes na Praça Dr. Carlos, Centro de Montes Claros (MG).
FIGURA 11..................................................................................................... 73
Mapa do IDH do Estado de Minas Gerais e dos Municípios da ADENE/RMNE
FIGURA 12..................................................................................................... 75
Fotografia de Migrantes Rurais do Norte de Minas partindo para outras
Regiões a procura de Trabalho
FIGURA 13.................................................................................................... 81
Fotografia das Festas de Agosto em Montes Claros(MG)- Catopês e Marujos
FIGURA 14................................................................................................... 85
Mapa com as Principais Rotas das Migrações de trabalhadores do Norte de Minas
Gerais2000 e 2001
FIGURA 15..................................................................................................... 91
Fotografia da cidade de Montes Claros - maio de 2002
FIGURA 16-.................................................................................................... 92
Fotografia de Migrantes rurais - Preenchendo fichas de cadastro no
SINE/MOC:Migrante Rural /Montes Claros(MG)
FIGURA 17..................................................................................................... 100
Fotografia da Cidade de Montes Claros (MG) - Morro Dois Irmãos.
FIGURA 18..................................................................................................... 114
Fotografia de Migrante Rural em Montes Claros
FIGURA 19...................................................................................................... 143
Fotografia: Esperança na Chegada de Migrante Rural em Montes Claros
FIGURA 20..................................................................................................... 144
Fotografia: Expectativa da trabalhadora à procura de emprego em
Montes Claros(MG)
FIGURA 21.................................................................................................... 145
Fotografia do Posto do SINE em Montes Claros (MG)
FIGURA 22.....................................................................................................146
Fotografia: a realidade o mercado informal de trabalho em Montes Claros(MG)
FIGURA 23.................................................................................................
Fotografia: O viver na favela de Montes Claros- migrante rural
147
- 13 -ss
13
FIGURA 24................................................................................................. 148
Fotografia: O viver na Cidade, a segregação sócio-espacial
FIGURA 25.................................................................................................. .. 149
Fotografia da pesquisa no Posto do SINE- Montes Claros- MG
FIGURA 26......................................................................................................150
Fotografia da Pesquisa de Campo: Acadêmico entrevistando migrante rural
em Montes Claros (MG)
FIGURA 27................................................................................................... 151
Fotografia do Shopping popular, na Praça Dr. Carlos em Montes Claros- MG
FIGURA 28 .................................................................................................... 158
Mapa do Estado de Minas Gerais com as Localizações do Norte de Minas
e de Montes Claros
FIGURA 29...................................................................................................... 159
Região Mineira do Nordeste- ADENE/2003
- 14 -ss
14
LISTA DE TABELAS E QUADROS
TABELA 1........................................................................................................... 33
Brasil - População residente, por situação do domicílio (1940-2000)
TABELA 2...................................................................................................... 35
Brasil -População Economicamente Ativa Ocupada, por Setor de Atividade
e Situação do Domicílio (1992 e 1995)
TABELA 3 .................................................................................................... 87
Variação da População dos Municípios do Norte de Minas Gerais:1996 a 2000
TABELA 4...................................................................................................... 93
Comparativos de Variação Populacional entre 1996 e 2000 em Montes Claros,
Minas Gerais e Brasil-.
TABELA 5 ...................................................................................................... 97
Evolução da População de Minas Gerais, RMNE e Montes Claros no Período
de 1970 a 2000.
TABELA 6....................................................................................................... 98
População Ocupada por Setores Econômicos em Montes Claros (MG)-1991
QUADRO 1-......................................................................................................84
Destino e Ocupação Pretendida pelos Migrantes do Sertão Mineiro
QUADRO 2 .....................................................................................................115
Atendimento do Posto do SINE- MOC no Período de 01/01/2001 a 31/12/2002
- 15 -ss
15
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS:
ADENE - Agência de Desenvolvimento do Nordeste.
AMANS - Associação dos Municípios da Área Mineira da SUDENE.
CODEVASF - Companhia de desenvolvimento do Vale do São Francisco.
CTPS- Carteira de Trabalho e Previdência Social.
FJP - Fundação João Pinheiro - Governo de Minas Gerais.
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
INDI - Instituto de Desenvolvimento Industrial de Minas Gerais.
MOC - Montes Claros.
MTB - Ministério do Trabalho.
PMMC - Prefeitura Municipal de Montes Claros.
PNAD - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio/IBGE.
RMNE - Região Mineira do Nordeste.
RURALMINAS - Fundação Rural Mineira.
SETASCAD - Secretaria de Estado do Trabalho, Assistência Social, Criança e
Adolescente de Minas Gerais.
SEDESE - Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Esporte de Minas
Gerais.
SEPLAN - Secretaria de Estado do Planejamento de Minas Gerais.
SINE - Sistema Nacional de Emprego.
SUDENE - Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste.
SUDENOR - Superintendência de Desenvolvimento do Norte de Minas.
- 16 -ss
16
RESUMO:
Este trabalho apresenta reflexões sobre a dinâmica interna rural no Brasil
com ênfase para o Norte de Minas Gerais. A reflexão sobre a migração rural na
cidade do sertão de Minas Gerais corrobora a hipótese das migrações estarem
ocorrendo cada vez mais dentro das próprias regiões, em função do crescimento
incentivado pelo Estado em algumas cidades e também a desilusão com as
metrópoles, conseqüência do processo de organização do trabalho que produz uma
combinação perversa cuja principal causa e conseqüência é o desrespeito aos
trabalhadores migrantes. A análise do perfil sócio-econômico do migrante rural e a
sua integração no mercado de trabalho, as possibilidades, colocações e o mercado
informal como via de sub-integração, revelam que as relações sócio espaciais
continuam marginalizando os trabalhadores oriundos do meio rural, limitando sua
inserção no mercado de trabalho. Esse fenômeno tem levado a profundas diferenças
sociais e econômicas, que são percebidas no espaço social, através da segregação
urbana. As entrevistas sobre a experiência de trabalho dos migrantes rurais em
Montes Claros revelam a formação da sociedade brasileira do terceiro milênio como
uma história da (re) produção de indignas condições de vida.
Palavras-chaves: migrações internas, políticas públicas, trabalho, mercado de
trabalho, desemprego, Montes Claros.
- 17 -ss
17
ABSTRACT:
This piece of work presents reflections about the rural internal dynamics in
Brazil with emphasis to the North of Minas Gerais. The reflection about the rural
migration in the city of the outback's of Minas Gerais proves the hipothesis that the
imigration is taking place more and more inside the regions, due to the growth
impelled by the state in some cities and also the delusion with the metropolis, as a
consequence of the process of organization of the work which produces a perverse
combination whose main cause and consequence is the disrespect to the migrant
workers. The analisys of the rural migrant sócio-economic profile and his integration
in the workmarket, the possibilities, placement and the informal market as via of de
sub integration, reveals that the social spacial relations keep segregating workers
coming from the rural áreas, limiting their insertion in the workmarket. This
fenomenon has led to deep social and economic differences, which are noticed in the
social space, through the urban segregation. The interviews about the work
experience of the rural migrants reveals the formation of the Brazilian society of the
third millenium as a history of the (re)production of unfair life conditions.
Key Words: internal migrations, public policies, work market, unemployment, market,
Montes Claros.
- 18 -ss
18
INTRODUÇÃO
Migrar (...) é viver, em espaços geográficos diferentes (...) é viver como
presente e sonhar como ausente. É, até mesmo, partir sempre e não chegar
nunca.
1
José de Souza Martins
Mais de um bilhão de pessoas, literalmente, não tem o que comer. A
fome, “mal do século”, é o grande paradoxo de nosso planeta: a criatividade
humana, as novas tecnologias e o fenomenal progresso científico convivem com a
inegável incompetência para combater a pobreza extrema.
Em nosso país, os indicadores econômicos e sociais confirmam e
denunciam a precariedade das condições de vida em que sobrevivem parcelas
significativas da população. A mobilidade espacial da população brasileira está
relacionada com a luta pela sobrevivência. As pessoas chegam e partem em função
da esperança de encontrar melhores oportunidades.
Estas indagações e incertezas que acompanham a trajetória dos
migrantes rurais para a cidade de Montes Claros, no sertão mineiro, são objeto de
investigação deste trabalho. Pretende-se discutir a migração rural para Montes
Claros no Norte de Minas Gerais, a busca de emprego na cidade e o processo de
inserção no mercado de trabalho local.
O Norte de Minas Gerais, embora pertença à região mais próspera do
País -o Sudeste, é reconhecidamente uma de suas áreas mais pobres, tendo
inclusive incentivo do poder público federal, como se do Nordeste fizesse parte. “O
Norte de Minas Gerais constitui região de transição entre o Sudeste e o
Nordeste”,(RODRIGUES,2000:108). Os processos de modernização da pequena
produção e a transferência de grande parte da população rural para as cidades
redefinem uma nova dinâmica da sociedade: campo e cidade, trabalhadores rurais
nas cidades, camponeses que se tornam operários, pequenos produtores que se
tornam assalariados, trabalhadores que se tornam migrantes sem ocupação, vivendo
de “bicos”; todos atores sociais diferentes que encontram no Estado e em suas
políticas a homogeneização de propostas, uma mesma denominação: populações
marginais migrantes sem ocupação. Os modelos de industrialização e urbanização
1
Conferir em MARTINS, José de Souza. Não há terra, para plantar neste verão. 2.ed.
Petrópolis:Vozes,1988.p-46.
- 19 -ss
19
vigentes são insuficientes para as necessidades das pessoas que estão no campo e
para a grande “massa” que ao longo dos anos foi inflando os centros urbanos.
O Estado tem sido inoperante diante das proposições que permitam
avanços para a população excluída. As homogeneizações das propostas referentes
a emprego/desemprego não levam em consideração a heterogeneidade dos
trabalhadores.
Das ações governamentais, relativas ao Trabalho e Geração de Renda,
destaca-se o Sistema Nacional de Emprego -SINE, que é gerenciado em todo o
Brasil pelo Ministério do Trabalho. Em Minas Gerais o SINE conta com 60 postos de
atendimento.
A
informatização
tornou
o
atendimento
rápido,
ampliado
e
modernizado, embora tais ações não apresentem resultados significativos no
combate ao desemprego que mereçam comemorações.
O Posto do SINE em Montes Claros é totalmente informatizado e possui
atendimento para os trabalhadores em todas as linhas de ações do sistema de
emprego, desde emissão de carteira de trabalho, seguro desemprego e programa de
intermediação de emprego, serviço que oferece aos trabalhadores desempregados,
por meio de colocação, "recolocação" e qualificação, possibilidades no mercado de
trabalho. São realizados ainda o Programa de Qualificação Profissional e o
Programa de Geração de Emprego e Renda. Em Montes Claros o atendimento do
SINE funciona integrado com outros serviços de órgãos públicos estaduais.
O referencial metodológico desta pesquisa vem da pesquisa dedutivaexploratória, baseada no universo de trabalhadores rurais inscritos no SISTEMA
NACIONAL DE EMPREGO (SINE) Posto de Montes Claros, nos anos de 2000 e
2001. Vale ressaltar que para conhecer as diferenças nas colocações dos
trabalhadores migrantes rurais em Montes Claros, foram pesquisados migrantes
rurais do mercado informal de trabalho, como ambulantes, “biscateiros”, e os
naturais e não provenientes do campo que freqüentam o Posto do SINE (sem serem
cadastrados) em busca de trabalho.
Com o objetivo de estudar o perfil do migrante rural em Montes Claros e
suas expectativas em relação ao mercado de trabalho formal, a partir da política
pública de emprego do SINE, foi elaborado um questionário semi-estruturado
(ANEXO B), aplicados nos períodos de novembro-dezembro/2000, janeiro-
- 20 -ss
20
fevereiro/2001 e abril-maio/2002. O questionário que foi utilizado nas entrevistas foi
estruturado em três blocos de perguntas contemplando: I) perguntas que procuraram
determinar o perfil sócio-econômico do migrante rural; II) questões sobre trabalho e
migração; III) perguntas abertas com o objetivo de colher expectativas e
experiências do migrante.
A população da pesquisa, de acordo com os dados do posto do SINE, é
composta de 917 (novecentos e dezessete) migrantes rurais, destacados de todas
as pessoas que procuraram o órgão em busca de trabalho nos anos de 2000 e
2001. Utilizou-se a amostragem probabilística proporcional, com seleção aleatória
dos migrantes rurais a serem entrevistados. A amostra apontou o número de 116
(cento e dezesseis) migrantes rurais como representativos do universo da pesquisa.
A pesquisa foi aplicada no Posto do SINE e nas residências dos entrevistados,
maioria moradores das favelas da periferia da cidade (Ver Figura 1).
Também se realizou entrevista complementar em alguns tradicionais
“pontos” da cidade onde ocorrem concentração de migrantes rurais, totalizando-se
trinta pessoas entrevistadas.
Através de médias aritméticas simples estabeleceu-se generalizações
para o universo a partir das respostas dos 116 questionários aplicados. Para as
questões abertas (relativas às experiências, situações das migrações e da busca por
trabalho) utilizou-se a análise e o aproveitamento das ocorrências com maior número
de repetições, de ponderações idênticas e/ou semelhantes2.
2
Aplicação dos questionários foram em número de 15 na Praça Dr. Carlos (centro de Montes Claros,
local de concentração de migrantes rurais ambulantes) e 15 no Terminal Rodoviário de Montes
Claros (MG). Para o cálculo da amostra utilizou-se a formula: n= N. P. Q. Z² / (N-1).e² + P.Q.Z², onde
N é população; e: erro máximo permitido; p: percentagem em que o fenômeno ocorre; Q:
percentagem complementar e Z: nível de confiança. Baseado em REZENDE, João Batista.Medidas
Estatísticas.Belo Horizonte:FJP,1983.
- 21 -ss
21
FIGURA 1- Mapa Urbano de Montes Claros- (MG), localização dos pontos de
Aplicação da Pesquisa de Campo.
Fonte: Adaptação do mapa urbano de 2002 – Secretaria Municipal de Planejamento/
Janeiro de 2003.
A elaboração do roteiro de entrevista correspondeu à etapa de
investigação relacionada às políticas públicas de emprego. Foram entrevistados o
gerente e os funcionários de atendimento do SINE, além de autoridades municipais
- 22 -ss
22
e estaduais. As entrevistas auxiliaram o processo de delimitação dos objetivos da
pesquisa, visando identificar os pontos essenciais a serem abordados no trabalho.
O trabalho divide-se em capítulos que trazem em seus títulos referências
as grandes obras literárias sobre o semi-árido brasileiro, que retratam a realidade do
povo sertanejo. O primeiro capítulo propõe traz a reflexão histórica da dinâmica
migratória brasileira e apresenta as novas discussões sobre o rural e urbano,
conseqüência da modernização agrícola que redefine os espaços urbanos e rurais,
entendidos como espaços subordinados pelas relações de capital. Discute-se ainda
as transformações na agricultura que contribuem para modificar as relações de
trabalho e os CAIs- complexos agroindustriais que concorrem para modificar as
relações de produção e expulsão do homem do campo.
O segundo capítulo discute as políticas públicas, as raízes históricas que
fazem com que o trabalhador passe a ser apenas uma peça da industrialização do
campo, não sendo mais o agente transformador do processo agrícola. São cada vez
mais utilizadas as máquinas e menos trabalhadores. O capitalismo no campo torna
inviável a permanência dos pequenos produtores e trabalhadores rurais.
No terceiro capítulo estuda-se a região Norte Mineira, território de
transição, pertencente geograficamente ao Sudeste do Brasil, “Polígono das Secas”,
considerada, para efeito de análise, como RMNE - Região Mineira do Nordeste,
onde os programas governamentais foram responsáveis pela riqueza de poucos e
pobreza de muitos. A RMNE é uma região migratória, exportadora para canaviais e
cafezais, de trabalhadores, que na maioria das vezes vivem em péssimas condições
de trabalho e não conseguem remuneração nem mesmo para o retorno.
Estuda-se também as migrações internas no Norte de Minas, como forma
de entender a mobilidade espacial, conseqüência do sonho de mobilidade social e
econômica dos trabalhadores. As diferenças entre o mundo da casa (o local de
origem) e o mundo da rua (o lugar de destino) que resulta na dura realidade da vida.
Entre o lugar de origem e o trecho a ser seguido, a escolha não é
possível. O lugar significa os laços de família, a afetividade, as tradições; O trecho
significa a possibilidade de ganho, o capital, o único caminho de retornar ao lugar ou
(re) construir um novo lugar.
- 23 -ss
23
O quarto capítulo refere-se à pesquisa de campo. Descreve-se o perfil do
migrante rural em Montes Claros e a mudança de rota da migração, ou seja, a
migração dentro da própria região.
Montes Claros é considerada como cidade “dique”, um local que barra as
migrações para o Sul, recebendo assim grande contingente de trabalhadores rurais
no espaço urbano. Analisa-se, principalmente nesse último capítulo, a política
pública do SINE - Sistema Nacional de Emprego/Posto de Montes Claros, as vagas
oferecidas, as ocupações conseguidas pelos trabalhadores oriundos do campo, as
expectativas dos migrantes rurais, o mercado informal de trabalho, os ambulantes e
as modificações no espaço urbano em função dos novos citadinos.
Realizada a pesquisa de campo, nas considerações finais há necessária
avaliações dos resultados obtidos, as expectativas levantadas, os anseios dos
trabalhadores e como tem sido a resposta do poder público para o homem do meio
rural que se encontra no meio urbano.
Sertanejo é todo homem que vive no sertão. Como sertaneja, espero que
este trabalho seja agradável na leitura, reflexivo nas abordagens e incentivador de
outros trabalhos que ofereçam, o conhecimento da realidade do povo do sertão
norte-mineiro.
(...) perguntas-e não foram poucas-que ficaram sem respostas pelo simples
fato de que então e até agora eu não sabia e não sei ainda respondê-las.
Que elas e outras se tornem, no espelho de nossos rostos refletidos uns nos
outros, respostas boas de serem de novo perguntadas.Haverá na natureza,
existirá dentro de nós e haverá entre nós algum rio com uma terceira
margem, como na bela história de João Guimarães Rosa? Não sabemos,
mas bem podemos suspeitar. Afinal, a vida e os rios são cheios de
surpresas.
(BRANDÃO, 2002:43).
\
- 24 -ss
24
FIGURA 2-Imagens de Montes Claros(MG)- Novembro de 2002
FONTE:Prefeitura Municipal de Montes Claros- Nov. 2002.
- 25 -ss
25
CAPÍTULO 1
VIDAS SECAS: MIGRAÇÕES INTERNAS E A EXPANSÃO CAPITALISTA NO
CAMPO BRASILEIRO
(...) E o sertão continuaria a mandar para a cidade homens fortes, brutos,
como Fabiano, sinhá Vitória e os dois meninos (...).
3
Graciliano Ramos .
No romance Vidas Secas, de Graciliano Ramos, o sertão era visto com a
vida muito movimentada em função da busca da sobrevivência. O livro inicia com o
capítulo "Mudanças" e termina com um título sugestivo de capítulo cujo nome é "A
fuga", revelando a realidade histórica do sertanejo que busca através da mobilidade
espacial escapar das perversas condições sociais de vida, conseqüência da grande
concentração de terra.
Ao longo da história do Brasil foi se consolidando uma estrutura fundiária
altamente concentradora. As capitanias hereditárias, as sesmarias, o fim da
escravidão e as leis de terras de 1850, incentivaram uma distribuição desigual da
terra. Grandes extensões de terra foram entregues a poucos proprietários. “O
cativeiro humano termina, começa o cativeiro da terra”.(FERNANDES, 2001:2).
Desde o século XVI os camponeses resistem contra a expropriação
produzida pelo capitalismo. Fernandes (2001) chama a atenção para entender que a
migração funcionava como forma de sobrevivência e resistência aos enfrentamentos
que geraram mortes e massacres. Quilombo dos Palmares, Canudos, Cangaço, são
alguns exemplos históricos de resistência e organização dos trabalhadores do
campo. Os trabalhadores colocam o pé na estrada migrando por florestas, caminhos
e sendo responsáveis pelo desbravamento de muitas regiões.
O modo de produção capitalista, desde o capitalismo mercantilista, já
privilegiava determinado produto de exportação em detrimento de outros produtos.
Estes períodos chamados de “ciclos econômicos” funcionavam como fator de
atração para a migração. Os ciclos da cana de açúcar, do ouro, do café e da
borracha são responsáveis por grandes correntes migratórias.4
3
4
Conferir em RAMOS, Graciliano.”Vidas Secas". São Paulo: Record, 2000.
- 26 -ss
26
O ciclo da cana-de-açúcar fez com que o Brasil fosse dividido em
capitanias hereditárias, beneficiando a pecuária através da grande disponibilidade
de terras e a concessão de sesmarias. O ciclo do ouro tem importância com as
descobertas de jazidas de ouro e diamantes pelas bandeiras paulistas, no final do
século XVII, nos Estados de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. As principais
correntes migratórias que partiram para estes Estados, principalmente para Minas
Gerais, foram portugueses, paulistas e nordestinos.
O café representou também mais uma estratégia de alavancar a
economia do país. Na metade do século XIX os cafezais representavam grande fator
econômico em Minas Gerais e no interior de São Paulo, terras estas conhecidas
como ”terras roxas”. É neste período que ocorre o avanço da ferrovia, que torna
mais fácil o escoamento da produção, o deslocamento das populações e também a
urbanização das cidades onde havia estações. Já o ciclo da coleta de látex
(borracha natural) tem seu apogeu com a revolução industrial no final do século XIX
e começo do século XX que, com a indústria automobilística descobriu a maior
reserva de seringais do mundo na Amazônia. São os nordestinos os principais
migrantes que foram para a extração da borracha na Amazônia.
Os ciclos econômicos são substituídos pela modernização agrícola a
partir da década de 1960 com o intenso processo de atividades agrícolas, baseadas
no paradigma da Revolução Verde. A principal característica desse processo
continua sendo a concentração de terras. Portanto, a migração campo-cidade se
intensifica, os nordestinos continuaram migrando para a região Sudeste em direção
ao Estado de São Paulo. Não é por acaso que a maior cidade do Brasil, São Paulo,
é conhecida também como capital dos migrantes nordestinos.
Já estive antes em São Paulo, umas cinco vezes. Quando a saudade
aperta, dou um pulo até minha terra, mas não posso mais morar lá. Depois
que a gente pisa São Paulo, e conhece os costumes daqui, não há meios
de se viver mais em qualquer outro lugar do Norte.(PIERSON, 1972:69).
O movimento migratório contextualizado demonstra que a origem da
maioria dos migrantes é do Nordeste. O objetivo do deslocamento espacial é sempre
a busca do trabalho. As disparidades econômicas regionais como dificuldades
Conferir no Livro “Migrações Internas no Brasil” de SOUZA, Itamar. Petrópolis, 1980: 47.
- 27 -ss
27
climáticas e estratificação social baseada no coronelismo concentraram a terra,
inviabilizando a permanência no campo de milhares de trabalhadores rurais.
No auge dos anos de 1960/1970 o “milagre econômico” na economia
urbana e a revolução verde atuando sobre a ocupação e emprego no campo,
fizeram com que os lavradores do Nordeste mineiro procurassem os destinos
urbanos na região Sudeste. Os trabalhadores (Gráfico 1) eram requisitados para um
mercado que exigia pouca escolaridade, dispensando capacitação prévia e registros
anteriores na carteira de trabalho.
Basicamente, os fluxos emigratórios, ou seja, o movimento das pessoas
para fora de Minas Gerais, na década de sessenta, tinham como destino os
estados de São Paulo (39%) e Rio de Janeiro (19%), em função do
potencial industrial crescente, Paraná (12%) e Goiás (11%), áreas em plena
expansão agrícola. Na década de setenta, Rio de Janeiro e Paraná perdem
importância relativa no que se refere a serem destino dos emigrantes de
Minas Gerais, de forma mais acentuada esse último, provavelmente pelo
esgotamento de sua capacidade de absorção de mão-de-obra pelo setor
agrícola. O Rio de Janeiro, apesar da queda relativa, continua respondendo
por cerca de 14% do destino dos emigrantes, caindo também à participação
de Goiás e dos demais estados da região Centro-Oeste. Em contrapartida,
aumenta significativamente o percentual de São Paulo, responsável pelo
destino da metade dos emigrantes que deixam o estado. Vale destacar
também a crescente participação das regiões Norte e Nordeste
(FJP, 2000: 4).
As décadas de 80 e 90 são marcadas pela intensificação da urbanização
brasileira. Embora com novas características, no final dos anos 80 e toda a década
de 90 as migrações intensificaram-se intra–regionalmente e continuaram a ocorrer
às migrações sazonais. Abramovay (1999) enfatiza que a saída do meio rural não
significa o acesso às condições mínimas próprias da vida urbana, ou seja:
”desruralização nem sempre é sinônimo, neste sentido, de urbanização”,
(ABRAMOVAY,1999:2).
Em função da “desruralização”, desde os anos de 1980 os trabalhadores
migrantes começam lento movimento de retorno. Regressam em virtude do
insucesso da experiência migratória.
- 28 -ss
28
GRÁFICO 1
Distribuição Percentual dos Fluxos de Emigrantes de Minas Gerais segundo
Unidade da Federação de Destino – 1960-1970, 1970-1980,
1980-1991.
100%
Outros
Reg. Norte
Reg. Nordeste
Paraná
Distrito Federal
Goiás
Espírito Santo
Rio de Janeiro
São Paulo
80%
60%
40%
Período
20%
0%
1960-1970
1970-1980
1980-1991
Os censos populacionais (1980-91) trabalhados pelo Núcleo de Estudos
da População da Unicamp indicam que São Paulo continuou a ser o Estado que
mais recebeu migrantes na última década e ao mesmo tempo, foi o que mais
perdeu, confirmando os dados da FJP, no gráfico 1. Entre os que deixaram o
Estado, destacam-se aqueles que voltaram para seu local de origem – a chamada
"migração de retorno".
As modificações tecnológicas na cidade e no campo expulsam o
trabalhador do campo, mas também o recusa nas metrópoles, uma vez que fica mais
difícil encontrar “serviço” nas cidades grandes para aqueles que têm pouca
escolaridade e quase nenhuma qualificação profissional. A construção civil e as
indústrias principalmente as automobilísticas, não contratam mais. Pelo contrário,
demitem em massa.
A população migrante retorna para sua região, o que não quer dizer
retornar para os seus municípios de origem, mas sim para as cidades de porte
médio que oferecem melhores condições de saúde, educação e trabalho. O
processo de desruralização persiste na virada do milênio em todo o Brasil, embora
concentre na região Nordeste e Norte de Minas Gerais suas maiores taxas.
- 29 -ss
29
A importância do êxodo rural é confirmada quando se examinam os dados
dos últimos 50 anos: desde 1950, a cada 10 anos, um em cada três
brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigração. Os anos 90 não
arreferam em muito esta tendência: se as taxas de evasão do meio rural
observada entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da década, quase
30% dos brasileiros que então viviam no campo em 1990 terão mudado seu
local de residência na virada do milênio.
(ABRAMOVAY,1999:1)
i
FIGURA 3: Migrantes rurais em direção à cidade de Montes Claros
Fonte: Revista Montes Claros em Foco, Novembro de 1979. (Rilson Santos).
1.1- A Modernização Agrícola e as Migrações em Busca de Trabalho
As relações capitalistas incentivam a mobilidade espacial da população.
Os trabalhadores migram em busca de trabalho em função do modo de produção
capitalista que unifica o mercado de trabalho urbano e o mercado de trabalho rural.
O capitalismo industrial, com a polarização em determinadas regiões,
aumentou as disparidades regionais elevando o fluxo migratório em direção aos
- 30 -ss
30
centros urbanos. A urbanização incentiva à modernização da agricultura, baseada
na produtividade, na melhoria da tecnologia agrícola, no uso de maquinaria e na
utilização de menor número de trabalhadores.
O desenvolvimento da agricultura passa a depender da dinâmica da
indústria. Nesse processo as modificações são irreversíveis na base técnica, tanto
no processo de trabalho através da passagem da subordinação indireta à
subordinação direta do trabalho ao capital.
Graziano da Silva (1998) resume a passagem da agricultura brasileira,
baseada no complexo rural para o agroindustrial a partir dos seguintes fatores: o
desenvolvimento do mercado interno no capitalismo; em 1850 a suspensão efetiva
do tráfico negreiro, a crise de 1929 e em 1950 a consolidação da constituição de um
mercado interno; as participações do Estado, através das formulações de políticas
específicas para os complexos agroindustriais com objetivo de regularização geral e
fixação de preços. Além da decomposição do complexo rural através dos seguintes
fatos: redução do trabalho escravo e a introdução do trabalho livre nas fazendas de
café, o complexo cafeeiro e a ampliação de atividades urbanas e em 1930/60integração dos mercados nacionais. Com a queda das exportações de café, surge a
necessidade de constantes desvalorizações cambiais e controle de mercados de
divisas que favoreceu a industrialização; em 1965 foi criado o SNCR-Sistema
Nacional de Crédito Rural - o principal veículo do projeto modernizador para a
agricultura; e levou a conglomeração empresarial ou territorialização da burguesia.
Os principais grupos empresariais com atividades rurais possuem também
empreendimentos em outras atividades: D1- Departamento produtor de bens de
capital e insumos para a agricultura; - A constituição dos CAIs e a industrialização da
agricultura tornam-se “os novos determinantes da dinâmica da agricultura”.
A Constituição dos “Complexos Agroindustriais”(CAIs),a partir da
implantação da “indústria para a agricultura” direciona para a lógica do
capital
interligada pelo capital financeiro, fortemente subsidiado pelo Estado, que promove a
integração dos capitais industriais, agrários, bancários, etc.
O Estado passa a desempenhar novos papéis visando financiar,
patrocinar, administrar e subsidiar as margens de lucro na agricultura, beneficiando
os capitais integrados e garantindo sua valorização.
- 31 -ss
31
Para Bernado Sorj (1986) o desenvolvimento agrícola brasileiro
caracteriza-se, cronologicamente da seguinte forma: no período de 1961 a 1964, as
estratégias estatais eram baseadas em dois projetos. O primeiro projeto favorecia
um caminho distributivista, ou pelo menos de eliminação dos setores latifundiários
mais atrasados. O segundo projeto orientou-se fundamentalmente para a integração
vertical (setores dependentes) e para o incremento da produção através do aumento
da produtividade. No período de 1964 a 1969 não houve efetivação de política de
reforma agrária; de 1970 a 1973 ocorreu à substituição de uma proposta de reforma
agrária por programas localizados, orientados para resolver problemas fundiários em
locais específicos. De 1973 a 1978, inverteram-se os termos do problema fundiário
como este sendo causado pelo minifúndio:
A forma específica pelo quais essas coordenadas se realizam, na
agricultura, está determinada pelo padrão de acumulação industrial,
centrado no desenvolvimento de um complexo agroindustrial liberado pelas
grandes empresas estrangeiras e pela correlação de forças sociais no
campo, totalmente favoráveis aos grandes proprietários,
(SORJ, 1986: 69).
O autor destaca que o sentido fundamental das políticas públicas tem
sido o de articular a expansão agrícola com o complexo agroindustrial e a
necessidade de abastecimento interno e a exportação através de um conjunto de
medidas entre as quais o crédito rural ocupa um lugar privilegiado.
Mas o avanço do capitalismo no campo não diminuiu as desigualdades
no meio rural, pelo contrário, continuou incentivando as velhas oligarquias, que
legitimadas pelo Estado em favor do “crescimento econômico” da nação expulsaram
o homem do campo. O avanço do capitalismo não modificou as antigas relações de
dominação e exploração, mas “balizaram, suscitaram, motivaram a consolidação
mundial do Estado”. (LEFEBVRE apud MARTINS, 1996:56).
A migração do homem do campo incentivada pelo Estado para as
cidades (Tabela 1) transformou o país agrícola em "nação urbana", causando êxodo
rural, ou seja, o abandono do campo em busca das cidades. A industrialização no
meio urbano “parece” oferecer melhores condições de trabalho e de qualidade de
vida. Os retirantes do campo abandonam o meio rural e sonham com o conforto da
cidade.
Carregados de familiares, muitos não conseguem o trabalho esperado,
- 32 -ss
32
vivendo em precárias condições. A busca por um território familiar, um lugar de vida
e de trabalho, faz com que famílias inteiras de trabalhadores percorram “longos,
constantes e sucessivos deslocamentos espaciais” (WANDERLEY, 1999:43).
As principais conseqüências do êxodo rural, para o meio rural, são: a
perda de população, de mão-de-obra e diminuição de agricultura de subsistência. No
espaço urbano, as conseqüências são os empregos e subempregos insuficientes
para a demanda de mão-de-obra, causando índices elevados de desemprego,
faltam habitações o que gera aumento de especulação imobiliária, formação de
favelas e bairros operários sem infra-estrutura básica, deficiência nos serviços
públicos, marginalidade social, prostituição infanto-juvenil, mendicância, aumento de
números de famílias abaixo da linha de pobreza e, ainda,
aparecimento de
trabalhadores rurais que moram nas periferias das cidades e que trabalham no
campo, os chamados bóias-frias5. Os deslocamentos desses trabalhadores entre o
espaço da cidade e do campo, na maioria das vezes, são feitos de forma arriscada,
em veículos sem regulamentação e sem segurança.
Conforme mostra a Tabela 1, desde a década de 60 observamos a
ocorrência de um intenso processo migratório campo-cidade no Brasil. Os dados
revelam que a década de 80 também chamada de “década perdida”, foi marcada por
intenso fluxo migratório rural-urbano em decorrência da estagnação econômica
aliada ao forte papel do Estado. A ocorrência mais significativa da industrialização do
campo foi a “mudança no processo de trabalho agrícola”. Graziano da Silva
(1998:34) entende que o trabalhador deixa de ser um agente ativo para se tornar um
apêndice das máquinas. Não é o homem do campo fundamental para a produção
agrícola, mas, sim, as máquinas agrícolas.
5
Os trabalhadores são chamados de BÓIA FRIA porque saem bem cedo de suas residências com a
comida pronta. Daí no horário de almoço, geralmente dentro das lavouras, a comida, ou seja, a bóia
está fria.
- 33 -ss
33
TABELA 1
Brasil- População residente, por situação do domicílio (1940-2000)
ANO
TOTAL
URBANA
RURAL
1940
41.236.315
12.880.182
28.356.133
1950
51.944.397
18.782.891
33.161.506
1960
70.070.457
31.303.034
38.767.423
1970
93.139.037
52.084.984
41.054.053
1980
119.002.706
80.436.409
38.566.297
1991
146.825.475
110.990.990
35.834.485
1996
157.070.163
123.076.831
33.993.332
2000
169.799.170
137.953.959
31.845.211
FONTE: População presente - BIBLIOGRAFIA: - "Estatísticas Históricas do Brasil" Volume3 - Rio de Janeiro: IBGE, 1987.
São novas formas de produção baseadas na tecnologia e no aumento da
produtividade, através de mais máquinas e menos trabalhadores; são velhas formas
de dominação onde os pequenos produtores e trabalhadores rurais tornam-se
subordinados ao capital, pressionados, incentivados e levados "A caminho da
Cidade". O discurso do desenvolvimento sustentável fica apenas nas teorias, que
ainda não se efetivou.
(...) desenvolvimento sustentável está intimamente relacionado à
necessidade de controle da população, eliminação da miséria e aumento da
capacidade das populações rurais de influenciar e controlar o seu futuro (...)
dessa forma, constata-se uma forte correlação entre manutenção da saúde,
e integridade do ecossistema e melhoria na condição de vida das
populações rurais pobres.
(CLEPS JR;DANTAS,1999:201)
- 34 -ss
34
FIGURA 4- Chegada de Migrantes em Montes Claros (MG)
FONTE: Revista Montes Claros em Foco (foto de Rilson Santos)- Novembro de 1979.
A industrialização do campo retira o homem do meio rural através da
diminuição das oportunidades de trabalho agrícola, incentivando o êxodo rural e a
procura constante pelo emprego urbano, (Tabela 2). Apesar das grandes
modificações introduzidas na estrutura produtiva do campo, o padrão de distribuição
fundiária preservou sua principal característica: a forte concentração das terras. Os
trabalhadores são expulsos da terra e migram para as cidades, onde esperam
encontrar melhores condições de vida (Ver Figura 4).
De acordo com Graziano da Silva ”eram milhares de pequenos
camponeses que, expulsos do campo, não conseguiam encontrar trabalho produtivo
na cidade” (1994:14). Reportagem do Jornal "Folha de São Paulo", de 26/11/2001,
constatou-se que apenas 45% dos moradores da maior cidade do País (São Paulo)
- 35 -ss
35
nasceram na metrópole e cerca de 70% das pessoas vindas de outros Estados
alimentam o sonho de regresso aos locais de nascimento.
TABELA 2
Brasil-População Economicamente Ativa Ocupada, por Setor de
Atividade e Situação do Domicílio: 1992 e 1995
AGRÍCOLA
BRASIL Rural
1992 (1)
13.51
5
13.32
1995 (1)
0
Taxa
Cresc.
-0,5
Urban
o
NÃO-AGRÍCOLA
Total Rural Urbano Total Rural
4.984 18.500 3.546 43.350 46.895
4.834 18.154 3.930 47.545 51.474
-1,0
TOTAL
-0,6
3,5
3,1
3,2
17.06
1
17.24
9
0,4
Urban
o
Total
48.334 65.395
52.379 69.629
2,7
2,1
1.2- As Migrações Campo-Cidade: Os diferentes enfoques interpretativos
Nos últimos anos as migrações campo-cidade continuaram a ocorrer,
embora apresentando novas características. Segundo dados do censo demográfico
de 2000, do IBGE, as pessoas passaram a migrar mais em suas próprias regiões. O
sonho da década de 70 de deixar a terra com destino à cidade grande em busca de
uma vida melhor não se realizou e a migração começa a revelar atualmente novos
movimentos. A cidade grande já não causa tanta esperança, os sonhos tornaram-se
impossíveis de serem realizados e os caminhos e os destinos se multiplicaram em
direções às cidades de porte médio localizadas em sua própria região.
As condições da industrialização e da urbanização impuseram ao campo
a expulsão dos seus moradores através de invasão de terras por parte de
fazendeiros, falsificadores de títulos de terra e pela própria transformação das
relações de trabalho no campo. O meio rural vem se modernizando e incorporando
novas técnicas de produção, o que levado inúmeros trabalhadores a se dirigirem
para os centros urbanos. Muitos terão as ruas como destino.
- 36 -ss
36
A migração campo-cidade precisa ser entendida como forma de exclusão
dos pobres que não encontram possibilidades de sobrevivência no lugar de origem e
também não encontram oportunidades no lugar de destino. O lugar de destino que
quase sempre é provisório, pois os migrantes são “incentivados” e “empurrados” a
continuar no trecho, sem saber para onde estão indo.
No início do século XXI, famílias inteiras de trabalhadores rurais,
camponeses e pequenos agricultores continuam “correndo trecho”, buscando fugir
da miséria, tentando manter a esperança de algum dia voltar ao campo, ao
município de origem. Sonhando com a possibilidade de ascensão social e
econômica na cidade, de um jeito ou de outro, chegam e partem ávidos por
condições dignas de vida (Figura 5). Para Wanderley (1999) a migração continua a
funcionar com duas faces: “esperança e fracasso”.
FIGURA 5- Estados de Origem dos Imigrantes - MG (acumulado 1986-1991)
Fonte: Fundação João Pinheiro (FJP), Centro de Estatística e Informações (CEI).
- 37 -ss
37
Entende-se por migração o deslocamento espacial das pessoas, este ir e
vir em busca de melhores oportunidades. Souza (1980:35) define o migrante como
“sendo aquele indivíduo de qualquer classe social, que resolve abandonar o seu
município de nascimento para fixar residência noutro".
A mobilidade espacial das populações sempre ocorreu ao longo da história
humana. O fenômeno migratório analisado por Ravenstein, geógrafo inglês
(1980:65), em 1885, apresentou “As Leis da Migração” considerando a distância, a
migração por etapas, fluxos e contrafluxos, tecnologia e motivos econômicos como
fatores de atração para as cidades. Essa teoria enfoca sempre o indivíduo,
desconsiderando as estruturas históricas do contexto social como fator de migração.
Becker (1997), chama a atenção para a necessidade de entender o
processo migratório, através dos enfoques neoclássico e neomarxista.
A autora
enfatiza que a mobilidade espacial neoclássica caracteriza-se pelos fatores pessoais
dos migrantes: o desejo pessoal de migrar, desconsiderando a complexidade social.
A mobilidade espacial neomarxista aborda o contexto "histórico-estrutural"
considerando o processo social e entendendo a migração como resultante da
introdução das relações capitalistas de produção no campo e da expropriação dos
trabalhadores rurais.
Fala-se agora da “mobilidade forçada” em oposição à visão neoclássica das
migrações como um ato de decisão pessoal. A migração passou a ser
entendida como a crescente sujeição do trabalho ao capital.
(BECKER, 1997:334).
A autora destaca que os enfoques neoclássico e neomarxista tendem a
explicações essencialmente gerais sendo, portanto, necessário o estudo dos níveis
microrregionais e locais. Faz-se também necessária a análise do “não migrar” como
forma de resistência dos trabalhadores aos conflitos sociais nas áreas de origem.
Singer (1998) caracteriza as migrações campo-cidade através de fatores
de expulsão e fatores de atração correlacionados com o modo de produção
capitalista que desemprega no campo e cria esperança de trabalho na cidade. Nesta
perspectiva, emerge o espaço não mais apenas como lugar de partida e destino ou
- 38 -ss
38
como superfície de medida entre estes dois pontos. O recorte espacial é o país
retomado como um todo.
A FIGURA 6 resume a proposta metodológica de Singer para a análise
das migrações internas, relacionando o capitalismo e a migração. Para o autor, as
migrações campo-cidade são resultantes da estagnação da agricultura familiar e do
avanço do capitalismo no campo, transformando a agricultura em um ramo da
indústria. As mudanças nas indústrias diminuíram o número de funcionários nos
mais diversos segmentos, sobrando como alternativa de ocupação os setores de
serviços e comércio, que não conseguem absover a mão-de-obra que estava
empregada no setor fabril.
ESQUEMA DO PROCESSO DE MIGRAÇÃO INTERNA
CAMPO
FATORES DE EXPULSÃO
CIDADE
FATORES DE ATRAÇÃO
MECANIZAÇÃO
AGRÍCOLA
MERCADO DE FORÇAS
PRODUTIVAS
ÊXODO RURAL
MUDANÇA:CONCENTRAÇÃO
URBANIZAÇÃO
DESORDENADA
DE
TERRAS,
DO
CAPITAL,CONCENTRAÇÃO ESPACIAL.
ESTAGNAÇÃO: INCAPACIDADE DA ECONOMIA DE
SUBSISTÊNCIA DE ELEVAR
A PRODUTIVIDADE
DAS TERRA
POLÍTICAS PÚBLICAS DESENVOLVIMENTISTAS GERAM MAIS MIGRAÇÕES
- 39 -ss
39
FIGURA 6 - Esquema do Processo de Migração Interna
FONTE: SINGER, Paul,1999,p.29-59-elaboração da autora.
Para Martins (2002) a migração é um problema social pela dificuldade da
inclusão dos trabalhadores, em função do "estreitamento das possibilidades de
ascensão social".
Talvez devamos entendê-las como deslocamentos sociais que se tornam
problemáticos para o próprio ser humano quando esses processos ocorrem
em sociedades que estão passando por demorado período de estreitamento
das oportunidades de vida, como a nossa. É preciso pensar o deslocamento
espacial, isto é, pensar nos fatores propriamente sociais, culturais e políticos
embutidos no processo de migração.
(MARTINS, 2002:133)
Portanto, as modificações no campo e na cidade introduzem novas
formas de contextualização do rural e do urbano. “As cidades não se transformam,
pois, em sua maioria, persistem como centro de organização do meio rural e não
possuem vida própria”, (QUEIRÓZ, 1969:15). Entre o meio rural e meio urbano
sempre haverá diferenças embora ”(...) não mais devido a sua localização no espaço
e a sua forma de habitat, e sim devido às peculiaridades da organização do
trabalho”,(Ibidem, 1969:6).
Para a geógrafa Ana Fani A. Carlos (1999) a cidade é a materialização
das condições gerais do processo de produção, dadas as seguintes características:
a segregação espacial; tendência do espaço urbano de (re) produzir e ampliar a
distância entre o local de moradia e o local de trabalho e o espaço urbano se
reproduzir na contradição e luta.
A reflexão sobre a concepção social de cidade, conforme Weber (1973),
remete a um local de comércio e inserção do excedente produzido, por meio de um
aparato legal e político que controla as atividades produtivas e a circulação das
mercadorias.
A urbanização brasileira transformou grandes centros urbanos com
características rurais e também áreas rurais com características urbanas: Pesquepague e hotéis-fazenda são exemplos de novas atividades não agrícolas no campo.
Mendras (1969:9) cita que o meio rural se define em função da cidade, sendo
- 40 -ss
40
necessário distinguir algumas características do meio rural como: submissão ao
espaço, confusão de papéis econômicos e sociais, mudança e penetração pela
sociedade global.
Tais características do meio rural sucita também a necessidade de
entender que no campo e na cidade existe um ambiente natural e um segundo
ambiente - o ambiente técnico- onde “(...) o indivíduo se vê encerrado numa rede de
técnicas complexas que tendem para a automatização”,(MENDRAS, 1969:69).
Ou seja, os conceitos de rural e urbano tendem a ser transformados
através da organização do trabalho. A automatização do campo prevê um ambiente
técnico não somente na cidade. Graziano da Silva (1999), enfoca a distinção entre o
rural e o urbano como uma divisão secundária, ressaltando que hoje a relação
passou a ser nos “espaços que dão suporte físico aos fluxos econômicos e sociais”6.
O autor afirma que a industrialização do campo é um processo dialético onde o
conhecimento e controle da natureza leva a uma submissão da agricultura pela
indústria.
São, portanto dois processos: um de destruição da economia natural, pela
retirada progressiva dos vários componentes que asseguravam a
“harmonia” da produção assentada na relação homem-natureza (e suas
contradições); e o outro, de uma nova síntese, de recomposição de uma
outra “harmonia” - também permeada por novas contradições baseadas no
conhecimento e no controle cada vez maior da natureza e na possibilidade
da reprodução artificial das condições naturais da produção agrícola. A esta
passagem se denomina industrialização da agricultura.
(GRAZIANO DA SILVA, 1998::3).
Na verdade, o capital modifica drasticamente a contextualização do que
seja rural e urbano. O ambiente natural e o ambiente técnico são definidores
também destas modificações que irão nortear os deslocamentos populacionais rurais
para a cidade, em função, principalmente, da organização do trabalho. Um exemplo
disto é citado por Andrade (1998:312) quando ressalta que a renda média do
habitante da cidade é superior à renda do habitante do campo, enfocando que existe
uma dominação da cidade sobre o campo. O lugar de produção do capital é visto
6
Maiores informações sobre este assunto no artigo “As Atividades Rurais não-agrícolas e as
Transformações do Espaço Rural: Perspectivas Recentes de Sérgio Schneider. O artigo se constitui
em um dos resultados do Projeto Caracterização do Novo Rural Brasileiro- Projeto Rurbano. Projeto
temático de equipe coordenado pelo Professor José Graziano da Silva, do Instituto de Economia da
UNICAMP.
Maiores
informações
estão
disponíveis
na
home-page
:http://www.eco.unicamp.br/projetos/rurbano.
- 41 -ss
41
pelos trabalhadores sempre no meio urbano: é este o lugar procurado para a
“melhoria de vida”.
1.3- A Problemática do Desemprego e as Transformações do Lugar
Os anos 90 foram marcados pela integração da economia ao processo de
globalização e pela busca da "estabilidade financeira"7. Em decorrência dessa
dinâmica, o emprego e a força de trabalho se deslocaram, essencialmente, do setor
secundário para o comércio e prestação de serviços (economia informal). O homem
do campo continuou a migrar para as grandes cidades (Tabela 1), configurando uma
nova forma de inserção no mercado de trabalho:categorias de empregadores e de
empregados transformam-se em “autônomos”, embora grande parte dos pequenos
negócios não consegue sobreviver ao primeiro ano de funcionamento.
Os
trabalhadores, sobrevivem então de “bicos”, pequenos serviços informais. O
desemprego cresce enormemente nestes anos chamados de “década do ajuste”.
Assim, no final do século XX e inicio do século XXI, o desemprego vem
elevando a cada dia o número de pessoas sem teto, sem terra, sem escola e sem
comida. São famílias inteiras nas ruas das grandes, médias e até pequenas cidades,
"empurradas" por falta de oportunidades e iludidas com falsas perspectivas. A
maioria desinstalada geograficamente, moralmente e com fome de comida e de
trabalho. Ativamente, ou como vítimas, passam a contribuir para elevar os índices de
violência e prostituição, alimentando outras discriminações sociais.
Pastore, citado por Jannuzzi (2000), chama a atenção para a mobilidade
social da migração, citando dois momentos: um primeiro momento nas décadas de
50, 60 e parte de 70, onde houve mobilidade ascendente para os migrantes e um
segundo momento, em meados de 70, onde a mobilidade social passa a ficar cada
vez mais difícil.
(...) Esses anos dourados passaram, e a realidade atual é bastante
diferente. A mobilidade ascendente é mais difícil por três motivos. Em
7
Milton Santos (1999) chama atenção para três tipos de globalização: a fábula (discurso político,
aldeia global); a perversidade (os excluídos, os sem-terra, os sem-teto, etc.) e a possibilidade
(construir um mundo melhor, a humanização, a resistência).
- 42 -ss
42
primeiro lugar, porque o ponto de partida é mais alto. Em segundo lugar,
porque as oportunidades de trabalho são menores. Em terceiro lugar,
porque para uma pessoa subir começa a ser necessário que outra desça,
morra ou se aposente.
(PASTORE apud JANNUZZI, 2000:25).
A migração, que foi incentivada pelo Estado para promover urbanização
e industrialização, encontra-se agora “barrada”, sendo considerada como grave
problema social. “Aqui reside a nosso ver a diferença fundamental do momento em
que vivemos hoje: a equação fordista mais investimentos = maior produção = maior
nível de emprego já é coisa do passado (...)”, (GRAZIANO DA SILVA, 1994:26).
A problemática do desemprego é um fenômeno global, mas que manifesta
suas particularidades no lugar. Considerando Santos (1999:12), "cada lugar é a sua
maneira, o mundo", ou seja, um fenômeno global, manifesta-se também no local (...).
A uma maior globalidade corresponde uma maior individualidade.
Os problemas locais são influenciados pelas decisões globais. Aos
pobres, os não-naturais das cidades, restam a tentativa apenas de sobreviver,
porque bem-estar é um sonho que vai ficando cada dia mais distante. A globalização
econômica, não vem auxiliando na resolução de problemas básicos para maioria da
população como alimentação, saúde, habitação e educação.
A alternativa tem sido as políticas sociais compensatórias, sem dúvida
necessárias nessa circunstância, por meio das quais se procura atenuar os
efeitos danosos do modelo econômico. Elas apenas confirmam e legitimam
a exclusão por meio de benefícios que não constituem legítima apropriação
social dos resultados da economia,
(MARTINS, 2002:14).
A sociedade moderna capitalista criou grandes desencontros entre o
social e o econômico. A visão antropocêntrica do homem não conseguiu combater
as desigualdades sociais. A crise agrária brasileira, liberando grande número de
população rural do campo, causou um aumento do desemprego provocando um
desequilíbrio na organização dos espaços sociais tanto nas cidades como no
campo8.
O modo de produção da vida material condiciona o processo da vida social,
política e espiritual em geral. Não é a consciência do homem que determina
8
GRAZIANO DA SILVA (1996) distingue “questão agrária” e “questão agrícola”. Para o autor, a
questão agrária está ligada às transformações nas relações de produção, como se produz, de que
forma se produz; a questão agrícola diz respeito às mudanças na produção em si mesmas, o que
produz e quanto produz.
- 43 -ss
43
o seu ser, mas, pelo contrário, o seu ser social é que determina a sua
consciência,
(MARX, 1977:301).
Os estratos empobrecidos da população não conseguem ter acesso ao
mercado de trabalho. Os obstáculos são às próprias políticas públicas do Estado, e
as barreiras sociais. A sociedade se fecha, restringindo as possibilidades de
mobilidade sócio-espacial das pessoas:
A produção e a reprodução do capital estão num lugar e a reprodução da
força de trabalho está fundamentalmente em outro lugar. A reprodução da
força de trabalho está parcialmente separada da produção e reprodução do
capital. A reprodução da força de trabalho não corresponde à recriação do
capital variável e não se dá, em grande parte, no mesmo processo de
trabalho e de valorização em que se reproduz o capital constante e se extrai
a mais-valia,
(MARTINS:1988:55).
Conseqüentemente, a migração continua a ocorrer em função da
reprodução do capital que cada dia mais se dá no “mercado de forças produtivas” na
cidade. As atividades vinculadas à agricultura familiar são poucas, impulsionando a
saída para o meio urbano como locus de produção de oportunidades de trabalho.
A pobreza rural e a miséria de grande parte da população urbana
encontram suas raízes novamente no desequilíbrio de propostas públicas que
sempre beneficiam pequenos grupos nacionais e multinacionais. Constata-se que o
programa de Reforma Agrária, que foi desenvolvido pelo Estado nas últimas
décadas, vem sendo executado em função da pressão dos movimentos sociais, mas
ainda não foi desvinculado dos interesses dos velhos coronéis da terra, que sempre
foram os grandes beneficiários do poder público. O campo se esvazia de famílias de
pobres e a cidade se metropoliza de miséria.
O “Estado Mínimo”, agora tenta viabilizar políticas públicas de emprego,
renda e agricultura para manter o homem no campo ou apoiá-lo na cidade.
Os “bicos”, pequenos trabalhos, domésticas que trabalham pela comida e
moradia e um número grande de bóias-frias que se “escravizam” em fazendas,
viajando em condições irregulares de trabalho, levados pelos ”gatos” e trabalhadores
- 44 -ss
44
de carvoarias (Ver Figura 7), fazem a realidade do migrante rural nos centros
urbanos9.
FIGURA 7- Meio Rural de Montes Claros (MG)- Moradia
Improvisada dos Trabalhadores de Carvoaria.
Fonte: Revista Montes Claros em Foco ( Rilson Santos)- Nov. 1979
O lugar se transforma através da práxis dos homens, que são totalmente
alienadas ao capital, através da ideologia de uma sociedade urbana, mundializada,
tecnificada e ilusoriamente “promissora”.
9
O "gato”, como é conhecido em diversas regiões, opera como um agenciador de trabalhadores.
- 45 -ss
45
A busca de trabalho provoca a mobilidade espacial de milhares de
famílias que sem muitas esperanças no campo seguem para a cidade em busca de
algo que não sabem aonde encontrar, mas sabendo que não podem aguardar no
meio rural. Incessantemente, permanecem chegando e partindo na procura de
trabalho, de bico, de alguma forma de sobreviver. Não escolhem ocupações,
aceitam qualquer tipo de serviço.
(...) Severino, retirante, o meu amigo é bem moço, sei que a miséria é mar
largo.Não sei como qualquer poço; Mas sei que para cruzá-la, vale bem
qualquer esforço (...).
(MELLO NETO, 1997:506).
O movimento da população é estimulado pela ação de integração do
Estado, através da expansão horizontal do capital, a utilização do espaço para o
crescimento econômico que não veio acompanhado do desenvolvimento social.
Mercados de terra, de mão-de-obra, fazem da população migrante "um exército
industrial de reserva, com grande mobilidade, que permite uma permanente
renovação da mão-de-obra e a manutenção de baixos salários” (ANDRADE,
1998:122).
(...) E andavam para o sul, metidos naquele sonho. Uma cidade grande,
cheia de pessoas fortes. Os meninos em escolas, aprendendo coisas
difíceis e necessárias. Eles dois velhinhos, acabando-se como Baleia. Que
iriam fazer? Retardaram-se, temerosos. Chegariam a uma terra
desconhecida e civilizada, ficariam presos nela,
(RAMOS, 2000:126).
Como os personagens do romance Vidas Secas, hoje muitas famílias
de trabalhadores rurais seguem migrando do campo para a cidade. Carregados de
sonhos, ansiedades, medos e principalmente esperança de enfim conseguir
trabalho.
- 46 -ss
46
CAPÍTULO 2
RAÍZES DO BRASIL: POLÍTICAS PÚBLICAS E DINÂMICA DO MERCADO DE
TRABALHO
"Para o empregador moderno o empregado é um simples número: a relação
humana desaparece (...).somos ainda hoje desterrados em nossa terra".
10
Sérgio Buarque de Hollanda
No livro Raízes do Brasil, Sérgio Buarque de Hollanda faz uma
diferenciação entre o trabalhador e o aventureiro desde a época da colonização do
Brasil. Os aventureiros eram os portugueses movidos pela audácia e instabilidade; já
os trabalhadores eram o povo brasileiro (negros e índios) que tinham a vida
conduzida através do método, racionalidade dominada. Portanto, assim começa a
desvalorização do trabalho no Brasil.
Arendt (1991), distinguindo labor e trabalho, faz uma reflexão da
sociedade moderna onde o barateamento e a exploração da mão-de-obra revela
uma concepção do trabalho convertido em uma forma de poder e de exploração. O
pensamento da filosofa alemã mostra que os gregos possuíam três concepções para
a idéia do trabalho: labor, poiesis e praxis.
Por labor, entendia-se o esforço físico voltado para a sobrevivência do
corpo, sendo, portanto, uma atividade passiva e submissa ao ritmo da natureza.
Em poiesis, a ênfase recai sobre o fazer, o ato de fabricar, de criar alguma
coisa ou produto, com o uso de algum instrumento ou com as próprias mãos.
10
Conferir em HOLLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. 19 ed. Rio de Janeiro, J. O: 1987.
- 47 -ss
47
Praxis, por sua vez, significava aquela atividade que tem a palavra como
seu principal instrumento, isto é, que utiliza o discurso como um meio para encontrar
soluções voltadas para o bem-estar dos cidadãos.
Desde os gregos, para quem o trabalho manual era algo penoso e vil,
devendo ser executado pelos escravos, passando pela tradição judaica até épocas
mais recentes, como o período feudal, em que a Igreja considerava o trabalho como
resultado do pecado original, o trabalho manual foi visto como uma verdadeira
tortura, conforme o significado da própria palavra latina (Tripallium-instrumento de
tortura-) que lhe dá origem. Entretanto, as mudanças ocorridas nas relações sociais,
em que o trabalho passou a ser visto como criador de toda a riqueza, resultou na
discussão sobre o significado do trabalho.
2.1- As Concepções e Transformações no Mundo do Trabalho
As concepções do trabalho como vocação e dever (WEBER: 1980) auxilia
a burguesia comercial e depois a industrial, que precisava de trabalhadores
dedicados, sóbrios, dóceis em relação as condições de trabalho e aos baixos
salários. A concepção da ciência, da técnica, das artes mecânica proposta pelos
iluministas de transformar a natureza através do domínio do homem sobre ela, por
meio do trabalho, seja ele manual ou intelectual.
A concepção de trabalho tem modificações fundamentais com o
aparecimento das cidades, o que já confirma que o rural e o urbano transformam
todas as relações de produção, os objetos, os instrumentos, as formas de produção
a organização do trabalho alteraram-se profundamente.
A primeira revolução industrial foi a da máquina a vapor, a segunda, a do
trabalho em larga escala, a terceira, a da microeletrônica, da inteligência artificial, de
empresas não mais mecânicas, mas mais inteligentes. Estas revoluções ressaltam a
importância do mundo do trabalho para a compreensão do atual quadro de
mudanças na sociedade contemporânea. A automação, a industrialização do século
XX modificou e diminuiu a quantidade de seres humanos no mercado de trabalho.
É o modo de produção que vai definir a forma, os meios e a força de
trabalho necessário para a produção. ”Mas o trabalhador livre se vende a si mesmo
e, ademais, vende-se em partes. Leiloa 8,10,12,15 horas de sua vida, dia após dia,”
(MARX,1975:75).
- 48 -ss
48
Alguns autores contemporâneos, como Habermas (1989), Offe (1989) e
Kurz (2001), falam do desaparecimento da categoria trabalho. São teóricos que
refletem sobre a perda da centralidade do trabalho. As abordagens enfocam que a
modernização tecnológica promoveu a desconstrução do mundo do trabalho. A
aparência necessária “da negação do trabalho” sob o capitalismo tardio promoveu a
desproletarização do trabalho industrial fabril, nos países de desenvolvimento de
capitalismo avançado e subproletarização do trabalho, em função do trabalho
parcial, precário, terceirizado, nos países em desenvolvimento, como é o caso do
Brasil.
Atualmente, grande parte da população vive e trabalha em condições
precárias, conduzidas pela lógica da produção de mercadorias e do supremo valor
do capital. O desenvolvimento do sistema fabril intensificou o modelo de acumulação
de capital. O modelo fordista caracterizava-se pela produção baseada na
concentração de decisão, padronização do trabalho, grande estoque, produtividade
do trabalho. Há, neste contexto, juntamente com o taylorismo, forte expansão de
empregos na indústria. Com o advento da cibernética, a sociedade contemporânea
sofre grandes transformações, principalmente, nas relações de trabalho. Passou a
haver a predominância do setor de serviços, envolvendo atividades das áreas de
comunicação, informação, finanças, saúde, educação, lazer, comércio, etc. O
cotidiano do homem transformou-se, passando a ser marcado pela automação em
todas as esferas da vida social. As máquinas constituem o intermediário constante
entre o homem e o mundo. Como conseqüência desta modernidade tecnológica,
milhões de pessoas não sabem o que farão amanhã.
”Será útil viver, quando não se é lucrativo ao lucro?” (FORRESTER,
1997:44). A solução seria então exterminar os pobres? Segundo Forrester, no seu
livro "O Horror Econômico”, mais de um terço da humanidade está excluída do
mercado de produção e de consumo, não sendo, portanto, necessários de existir
para a sociedade capitalista. O exército de reserva que se configura muito mais
como exércitos de excluídos, mas que se pensado sob a ótica da tendência à
ubiqüidade dos investimentos tem-se uma disponibilidade também ao mesmo tempo
- 49 -ss
49
em toda parte para atender à velocidade do fluxo de capitais e investimentos. O
novo contexto inclui precarização do trabalho, desemprego e uma "nova pobreza"11.
Um desempregado, hoje, não é mais objeto de uma marginalização;
provisória, ocasional, que atinge apenas alguns setores; agora, ele está às
voltas com uma implosão geral, com um fenômeno comparável com as
tempestades, ciclones e tornados, que não visam ninguém em particular,
mas aos quais ninguém pode resistir. Ele é objeto de uma lógica planetária
que supõe a supressão daquilo que se chama trabalho; vale dizer,
emprego,
(FORRESTER, 1997:11)
As transformações no mundo do trabalho provocam um desequilíbrio nas
relações sociais. Para Matoso (1989) surge um novo trabalhador, mais completo,
multifuncional e de outro lado, novas relações de trabalho baseadas na
desestruturação das relações salariais.
A situação do trabalho torna-se frágil. As alterações do novo cenário
produtivo levaram a flexibilização no mercado de trabalho e nas relações de
trabalho. Sofre-se com o desemprego e com a reestruturação da produção. Nos
locais de trabalho, ferramentas e máquinas evoluem com muita rapidez. Há uma
redução drástica no número de postos de trabalho. Nascem outras funções, muitas
desaparecem.
O Estado de Bem-Estar Social tornou-se uma lembrança, substituído pelo
inabalável e abstrato mercado do neoliberalismo. Os direitos sociais do trabalhador
são substituídos pela flexibilização de direitos, ou ausência de direitos.
Produtividade, qualidade e colaboração são lugares-comuns que entram no
repertório de todos que trabalham e também dos que não trabalham e querem
trabalhar.
Na dialética global/local, chama a atenção à redefinição do papel do
Estado, das fronteiras nacionais, das culturas locais. A reorganização e disputa dos
mercados, a divisão internacional do trabalho e o livre fluxo de capitais são
11
No livro O Horror Econômico, a autora Viviane Forrester faz uma análise deste novo mundo do
trabalho, onde tudo é descartável em função do lucro, chamando atenção para os milhões de
desempregados que são consideráveis não úteis, portanto aceitando assim qualquer coisa para fazer,
a qualquer preço, para autora sempre o menor.
- 50 -ss
50
problemas que aparecem, permitidos pelos avanços tecnológicos no mundo do
trabalho.
Antunes (2000) analisa as novas tendências no mundo do trabalho
relacionando à realidade econômica a partir da década de 1970. Para ele, a nova
realidade seria acompanhada de novas formas de gerenciamento da produção, além
de determinar mudanças nas relações de trabalho. Neste aspecto o movimento
sindical passou a ter uma postura defensiva, deixando de lado o confronto e
bandeiras anticapitalistas. O autor, situando o Brasil, argumenta que ocorreram
mudanças estruturais no mercado de trabalho, na década denominada de ajuste, em
substituição à chamada década perdida (os anos 80), como a deterioração da
qualidade do emprego.
Pode-se sintetizar as principais características em relação ao trabalho
durante a década de 90, da seguinte forma: 1º) maior concentração de trabalhadores
nos setores de comércio e serviços; 2º) deslocamento dos trabalhadores de
profissões formais para atividades sem relação com a qualificação anterior; 3º)
declínio no nível de emprego; 4º) aumento significativo do setor informal; 5º)
aumento de empregos atípicos, com contratos de curta duração ou emprego em
tempo parcial.
Portanto, as mudanças em curso configuram dois processos. De um lado,
a redução da classe operária tradicional e, de outro, a crescente heterogeneização e
subproletarização do trabalho decorrente das formas atípicas como o trabalho
parcial, o contrato temporário, precarizado, a subcontratação e a terceirização.
Conseqüentemente há uma fragmentação do trabalho .
Assim, pode-se considerar que o mundo do trabalho tem sofrido
mudanças substantivas que apresentam como conseqüência o que Offe (1989)
denomina de “fim da sociedade do pleno emprego”. As mudanças na organização do
processo produtivo são evidentes e, ao gerar a redução da oferta de postos de
trabalho formais, levam não só à perda da centralidade do trabalho, mas,
igualmente, à perda da centralidade do assalariamento.
O atual mundo do trabalho é caracterizado pelo trabalhador integrado,
polivalente, em equipe flexível e estressante. O volume de investimento é altíssimo,
com fortes tendências de terceirização e formação de megablocos comerciais e
- 51 -ss
51
monopólios em escala internacional, global. A produtividade acontece em ritmo
vertiginoso, de grande escala de elevação, embora não desencadeando ciclo de
crescimento.
O emprego sofre forte retração na indústria, aumentando o trabalho
parcial, precário, informal, sem as garantias sociais mínimas. O incremento da
produtividade do trabalho penetrou não somente na indústria, mas atingiu os
serviços, que não conseguem absorver a massa redundante de trabalho vivo, que
passa a constituir o desemprego estrutural. Os novos postos de trabalho
caracterizam-se por maior rotatividade de empregos.
O contexto social hoje aponta como tendência do capitalismo tardio em
crise, a precarização das relações de trabalho, como perspectiva dialética do
trabalho e a criação do valor tende a ser suprimida, mas não anulada pelo capital. O
desemprego estrutural que atinge grande parcela da força de trabalho instaura o que
Matoso (1989) chama de “desordem do trabalho”, caracterizado pela precarização e
insegurança no mercado de trabalho, no emprego e na representação do trabalho.
Entretanto, Antunes (2002) destaca a necessidade de compreender que
ao contrário de muitos autores contemporâneos que prevêem o fim do proletariado
(Gortz é um deles), o que está em mudança é o perfil da classe que vive do trabalho.
Para o autor, o que se pode verificar no mundo moderno é uma maior inter-relação e
maior interpenetração entre atividades produtivas e não produtivas, ou seja, trabalho
vivo e trabalho morto, entre atividades laborativas e de concepção que estão em
expansão neste contexto de reestruturação produtiva do capital.
Antunes (2000) continua sua análise através da distinção entre o trabalho
concreto e o trabalho abstrato, enfocando que o caráter útil do trabalho, a relação de
intercâmbio homem-natureza efetiva o trabalho concreto, em sua dimensão
qualitativa. Na dimensão abstrata, o trabalho é deixado de lado no caráter útil,
utilizando apenas da força humana produtiva, física ou intelectual em um universo
de sociabilidade produtora de mercadorias. Na sociedade capitalista o trabalho
concreto é subordinado pelo trabalho abstrato. O homem, cada vez mais, tem
encontrado dificuldades de inserção na busca por colocações. Aos trabalhadores
rurais resta o trabalho abstrato procurado nas cidades.
- 52 -ss
52
As divisões do trabalho intensificadas pelas modificações tecnológicas
incentivam o emprego urbano, provocando grandes aglomerações nos meios
urbanos. O capital, juntamente com a modernização tecnológica, auxilia as grandes
empresas e prejudica os pequenos produtores e agricultores. O Estado torna-se
também um aliado dos grandes grupos empresariais intensificando, através de
políticas públicas a modernização agrícola e a urbanização das cidades, mas não
auxiliando na distribuição das terras que, conseqüentemente, aumenta também as
disparidades sociais.
O emprego torna-se cada vez mais seletivo. Escolaridade e formação
profissional são determinantes para o ingresso no mercado de trabalho formal. Os
trabalhadores rurais não possuindo esses requisitos encontram maiores dificuldades
de inserção e permanência no mercado de trabalho:
Além disso, entre o emprego formal e o desemprego também cresce um
setor difuso, que já é velho conhecido dos países do Terceiro Mundo e que,
nas sociedades marcadas pelo “apartheid" social de uma minoria que toma
parte no mercado globalizado, ganhou o rótulo de "economia informal" dos
excluídos, os quais vegetam abaixo do nível de miséria. Os camelôs nas
calçadas, os garotos que limpam pára-brisas nos cruzamentos, a
prostituição infantil ou o sistema semilegal de reaproveitamento de sucata e
lixo compõem essa categoria,
(KURZ, 1999:18).
O mercado de trabalho formal exclui grande parte dos trabalhadores que,
para sobreviverem, são levados à informalidade, aos biscates, às baixas
remunerações, às péssimas condições de trabalho. Os trabalhadores do campo
ficam assim impedidos de integrarem ao mercado de trabalho formal em função das
imensas disparidades entre os trabalhadores urbanos e rurais. Para o sociólogo
Robert Kurz, os trabalhadores passam a ser “descartáveis e degradados”. O
desemprego passa a ser o principal fator motivação de deslocamento para as
cidades e ao mesmo tempo fator de repulsão nas cidades dos trabalhadores que
saem do meio rural. Os índices de desemprego urbano demonstram que o espaço
urbano não resolve o problema de emprego para as populações rurais, pelo
contrário, dificulta a vida de rurais e urbanos.
O processo migratório que troca o campo pela cidade é também uma
troca de problemas: dos velhos pelos novos. E a melhoria incondicional que todos
esperam, torna-se uma viagem arriscada e repleta de incertezas.
- 53 -ss
53
As oportunidades de trabalho ficam cada vez mais difíceis, necessitando
repensar políticas públicas para os espaços rurais e urbanos, considerando que as
atividades sejam não só agrícolas ou urbanas, mas, fundamentalmente, ocupações
que possibilitem a fixação das pessoas nos seus lugares de origem ou de residência.
E não apenas biscates e trabalho informal (Ver Figura 8).
Arendt (1991) defende a necessidade de pensar melhor o trabalho como
meio de liberdade e transformação, sendo importante entender a esfera pública.
A esfera pública, enquanto mundo comum, reúne-nos na companhia uns
dos outros e, contudo evita que colidamos uns com os outros, por assim
dizer. O que torna tão difícil suportar a sociedade de massas não é o
número de pessoas que ela abrange, ou pelo menos não é este o fator
fundamental; antes, é o fato de que o mundo entre elas perdeu a força de
mantê-las juntas, de relacioná-las umas às outras e de separá-las ,
(ARENDT, 1991:62).
A política pública tem sempre um caráter de Estado, ações políticas e
estratégias estabelecidas para fomentar o desenvolvimento de programas, projetos e
atividades que visa o desenvolvimento. O investimento público no setor primário
precisa ser entendido como alocação de recursos não só na agricultura e pecuária,
mas também em atividades que possibilitem a permanência do homem no campo.
Uma política pública que reflita sobre o trabalho, emprego e renda, têm que se
pautar na discussão do rural e do urbano.
As políticas públicas de emprego no Brasil possuem alvo duplo: as
necessidades do mercado de trabalho competitivo e as disparidades sociais da
população. A política pública de emprego define-se através de:
(...) políticas passivas para o mercado de trabalho, ou seja, tomam o nível
de desemprego como um dado e procuram minimizar os seus efeitos.(...)
políticas ativas, com o objetivo de modificar as condições de oferta e
procura.,
(TEIXEIRA, AZEREDO, 1999:96).
- 54 -ss
54
FIGURA 8- Praça Dr. Carlos, no Centro de Montes Claros-MG, local de
concentração de trabalhadores ambulantes do mercado informal.
FONTE: Secretaria Municipal de Planejamento da Prefeitura de Montes Claros/Assessoria de
Imprensa-(maio de 2002).
2.2- Políticas Públicas de Emprego e Renda e as Mudanças no Mercado de
Trabalho no Brasil
O desemprego é atualmente um problema de ordem mundial. Os países
industrializados têm enfrentado o desemprego aberto, através de contratos de tempo
parcial para aumentar a flexibilidade do trabalho. Na América Latina, com a
diminuição do trabalho formal, aumentou o emprego informal, o que contribuiu para a
precariedade das relações de trabalho. Os anos 80, de crescimento estagnado
deram lugar à "década de ajuste" dos anos 90.
A década de 90 foi rica em fatos que marcaram sobremaneira o destino
da economia mundial e nova hierarquização dos espaços envolvendo globalização,
formação de blocos econômicos, fragilização do Estado-nação, novos espaços subnacionais, transformação do papel da metrópole, reforço do papel das cidades e
uma gradual reconstituição dos espaços comunitários. Estes anos foram marcados
pelo deslocamento do trabalho de forma:1-setorial; 2- ocupacional e 3-regional.
Para Posthuma (1999), estas três tendências definem o novo momento do
emprego no Brasil onde,
(...) O trabalho está mudando da indústria para o comércio e os serviços.
Em segundo, os trabalhadores estão se deslocando de profissões
específicas e formalizadas para atividades sem relação com sua ocupação
anterior (...) Em terceiro lugar, os trabalhadores estão migrando das regiões
- 55 -ss
55
que passam por ajustes estruturais profundos para novos pólos de
crescimento“,
(POSTHUMA, 1999:16).
Estas novas tendências modificam os conceitos de qualidade de
emprego, emprego atípico, bem como, emprego padrão. A qualidade no emprego
define-se através de um forte impacto na vida do trabalhador. Hoje um emprego de
qualidade caracteriza-se pela renda, benefícios e proteção social, embora tal
ocupação diminua as horas de lazer e convívio familiar.
O emprego padrão definido por Reinecke (1999) é aquele com apenas um
empregador, contrato de trabalho, seguridade social e um único local de trabalho. O
emprego padrão diminuiu drasticamente na década do ajuste aumentando o
emprego atípico. “Emprego atípico, geralmente, implica um nível mais baixo de
proteção legal e de cobertura das conquistas sindicais históricas” (REINECKE,
1999:125).
Analisando os dados da PNAD-Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicilio, no ano de 1995, Reinecke traça um panorama do trabalho no Brasil: 51,1
milhões de pessoas estão ocupadas em empregos não agrícolas; 29,6 milhões são
homens e 21,5 são mulheres; 15% dos trabalhadores sem carteira assinada, deste
número, 22% são autônomos; 44% de trabalhadores assalariados possuem
emprego não agrícola.
Os dados comprovam o deslocamento do emprego do setor primário para
o setor secundário e, principalmente, para o terciário. Confirma ainda o aumento de
empregos sem carteira profissional. Hoje, cada vez mais com as entradas e saídas
do mercado de trabalho, existe o perfil de um trabalhador que está sempre em busca
de trabalho (MARTINS: 2002).
No Brasil, a principal política pública de emprego baseia-se em quatro
programas financiados pelo Fundo de Amparo do Trabalhador (FAT) e que são
coordenados pelo CODEFAT-Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo do
Trabalhador, através do Sistema Nacional de Emprego-(SINE)12:
12
O Sistema Nacional de Emprego foi criado em 8 de outubro de 1975, através do Decreto Lei N. º
76.409, ratificado na Constituição Federal de 1988, artigo 22, inciso XVI. A implantação, em Minas
Gerais, ocorreu em 1977. De lá para cá muita coisa mudou, com os serviços cada vez mais
informatizados e o atendimento ampliado e modernizado. Atualmente há 59 postos no Estado de
Minas Gerais. Dentre suas linhas de ação do SINE, destaca-se o Programa de Intermediação de
- 56 -ss
56
• Programa de Seguro Desemprego;
• Programa de Intermediação de Emprego;
• Programa de Qualificação Profissional;
• Programa de Geração de Emprego e Renda.
O Seguro desemprego foi instituído em 1996 e representou o “eixo
organizador de todo o processo de desenvolvimento de políticas ativas e passivas
para o mercado de trabalho”,(TEIXEIRA; AZEREDO, 1999:312). Mesmo com a
criação do programa de intermediação de emprego na década de 70 a política de
emprego continuou a funcionar de forma precária.
O PROGER-Programa de Geração de Emprego e Renda, instituído a
partir de 1994, torna-se um programa nacional com significativo volume de recursos.
Os investimentos são direcionados para o setor de serviços e comércio. O
PLANFOR-Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador é o mais novo dos
programas de política pública de emprego e renda. Em 1996, com a assinatura de
um plano plurianual com os Estados, efetivou-se o PLANFOR para um público de
desempregados, trabalhadores do mercado formal e informal e micro e pequenos
empresários.
A falta de articulação entre os programas tem impedido um melhor
desempenho do SINE, conforme se observa:
Pensar o atendimento ao trabalhador de forma integrada, incorporando o
seguro-desemprego, quando for o caso, a intermediação e à qualificação do
trabalhador, e também aos programas de geração de emprego e renda, a
partir dos governos locais, parece ser o caminho mais indicado para o
aumento da eficiência e da eficácia destes programas,
(AZEREDO; TEIXEIRA, 1999:314).
Nota-se que o desenvolvimento de políticas públicas no Brasil é marcado
pelas disparidades regionais. A região Sudeste é a maior beneficiária de recursos do
PROGER, comprovando que essa política pública não é executada da mesma forma
em todo o país. Observa-se também uma grande preocupação com o meio urbano,
não havendo os mesmos mecanismos de inserção de programas para o meio rural.
Emprego. O serviço oferece aos trabalhadores desempregados, por meio de colocação,
"recolocação" e qualificação, possibilidades no mercado de trabalho.
- 57 -ss
57
O PROGER rural e o PRONAF-Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura familiar são as propostas do governo para o desenvolvimento rural. Os
programas começaram a ser implantados em 1994, com incremento de recursos em
1997 e 1998.
O PRONAF utiliza recursos do FAT embora mantenha as
características de outras propostas de políticas públicas do Estado, como
desproporcionada distribuição de recursos entre as regiões.
(...) Mais de 80% dos recursos utilizados são provenientes do FAT. (...) A
participação das regiões na distribuição dos contratos coloca o Nordeste em
uma posição de nítida inferioridade. Dados comparativos mostram que a
região Nordeste obteve apenas 16,5% e 4,3% dos contratos, com 10,1% e
37,5% dos recursos, respectivamente, aos anos de 1997 e 1998. (...) Dados
preliminares preparados com base no censo 1985 pelo convênio
FAO/INCRA, conforme mencionado anteriormente, mostram que a região
Nordeste concentra a maior porcentagem de estabelecimentos familiares do
Brasil.
(GRAZIANO DA SILVA, 2000:97).
As políticas públicas implantadas no Brasil confirmam a concepção de
Furtado (1981) de desenvolvimento e subdesenvolvimento. Embora as políticas
busquem o desenvolvimento econômico, que não que dizer desenvolvimento social,
muitas são as áreas de subdesenvolvimento econômico social no Brasil. Para
Furtado (1981) a concepção de desenvolvimento possui três importâncias: a eficácia
do sistema social de produção, a satisfação das necessidades primárias da
população e a aspiração de grupos dominantes de uma sociedade que para isso
utilizam recursos escassos.
(...) a concepção de desenvolvimento de uma sociedade não é alheia a sua
estrutura social, e, tampouco as formulações, de umas políticas de
desenvolvimento e suas implantações são concebíveis sem preparação
ideológica. O aumento da eficácia do sistema de produção-comumente
apresentada como indicador principal do desenvolvimento – não é condição
suficiente para que sejam mais bem satisfeitas as necessidades
elementares da população,
(FURTADO, 1981:16 -17).
No Brasil de hoje, o modelo dos grandes fluxos e das grandes distâncias
parece acabado como predominância. Especialistas apontam para a situação de
"migrações de curta distância", predominantemente intra-regionais; podendo ser
sazonais em áreas de modernização agrícola ou intermunicipais em áreas de maior
urbanização. O controle territorial de populações visa progressivamente à
desocupação e não à ocupação de território, produzindo uma população de
trabalhadores errantes. Modelo disso é a região do semi-árido brasileiro que convive
- 58 -ss
58
com desenvolvimento e subdesenvolvimento. A região Nordeste e o Norte de Minas
Gerais fazem parte do semi-árido e pertencem ao Polígono das Secas. Portanto, são
regiões beneficiadas com políticas públicas compensatórias que tentam amenizar as
longas estiagens e o permanente movimento migratório de sua população.
Desenvolvimento e subdesenvolvimento, na região Nordeste e Norte de
Minas Gerais, referem-se também a uma minoria em desenvolvimento e uma
maioria excluída, com índices elevados de subdesenvolvimento social.
Desenvolvimento e subdesenvolvimento, como expressão de estruturas
sociais, viriam a ser as resultantes da prevalência de um ou outro desses
dois processos.(...) Portanto para compreender as causas da persistência
histórica do subdesenvolvimento, faz-se necessário observá-lo como parte
que é de um todo em movimento, como expressão da dinâmica do sistema
econômico mundial engendrado pelo capitalismo industrial,
(FURTADO,1981:23).
A disparidade entre dois mundos: desenvolvido e subdesenvolvido é a
realidade da região. Se, de um lado, houve um progresso intenso de industrialização
no campo e na cidade, beneficiando alguns, de outra parte, existem grandes
números de migrantes rurais. O alto índice de trabalhadores no mercado informal,
um número ainda crescente de trabalhadores sazonais em épocas de colheitas de
cana e café, o aumento das favelas, mendigos, crianças e famílias na rua, violência
e aumento de criminalidade indicam que o desenvolvimento baseado nas políticas
públicas, não conseguiu ainda extrair o Polígono das Secas da situação de
subdesenvolvimento.
Os incentivos fiscais e financeiros oriundos dos recursos federais
promoveram a expansão do capitalismo na região, determinando profundas
transformações na estrutura industrial, privilegiando o capital intensivo, em
detrimento da abundante mão-de-obra existente e da estrutura produtiva regional.
As propostas públicas sempre objetivaram o combate à seca, embora, sempre foram
políticas de acomodação.
2.3- Políticas de Combate às Secas no Nordeste: Uma breve revisão
O planejamento governamental começou a partir de 1958, devido às
disparidades de desenvolvimento entre as regiões no Brasil. As secas de 1952 e
1958, no Nordeste, levaram à necessidade de criação da SUDENE. Após vários
estudos sobre o Nordeste, o economista Celso Furtado, primeiro superintendente do
- 59 -ss
59
órgão, resolveu apontar uma política de reestruturação agrária, desenvolvimento
industrial e a implantação de infra-estrutura.
Em 1959, surgiu a SUDENE/Superintendência do Desenvolvimento do
Nordeste, englobando o Nordeste do Brasil e o Norte de Minas como área de
Polígono da Secas.13
(...) com a criação da SUDENE, surge um fato novo capaz de promover
modificações na estrutura produtiva regional, aos poucos, foram geradas as
condições para o desenvolvimento da indústria e para a instalação de
grandes projetos agropecuários, através da ampliação significativa da
atuação do Estado,
(REIS, 1997:38).
A SUDENE, foi parte de uma política pública que visava ações que
possibilitassem o desenvolvimento do Nordeste do Brasil e do Norte de Minas
Gerais. A SUDENE possuía dois objetivos principais: “coordenar a ação do Governo
Federal e administrar os recursos transferidos para a região”,(RODRIGUES,
2000:119).
Para industrializar a região foi criado um sistema de incentivos fiscais,
consolidados no FINOR - Fundo de Investimentos do Nordeste, por outro lado,
visando solucionar os problemas agrícolas da região, foi adotada a estratégia
formulada pelo GTDN - Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste. Os
pontos centrais desta política de desenvolvimento basearam-se em grandes projetos
agropecuários, industrialização, reflorestamento e projetos de irrigação.
Com o regime militar, a SUDENE e demais órgãos de fomento desviaram
seus objetivos e direcionaram suas ações para a “valorização do grande capital”,
(RODRIGUES, 2000:170).
A Ação da SUDENE determina um surto de crescimento, através da
instalação de Indústrias dinâmicas com as mais variadas ramificações, refletindo
muito mais a transferência de empresas não integradas ao potencial dos recursos
humanos e naturais e à estrutura produtiva da região. É o momento dos programas
localizados, com público alvo de pequenos produtores: os PDRIs-Programa de
13
De acordo com ANDRADE (1988:6) o Polígono da Secas muda a concepção de Nordeste,
envolvendo uma maior área da Bacia do São Francisco, englobando o território Nordestino e ampla
área do território de Minas Gerais,(Ver FIGURA 9).
- 60 -ss
60
Desenvolvimento Rural Integrado, e tantos outros programas de desenvolvimento
baseados nos recursos do Banco Mundial para a América Latina.
O Programa de Apoio ao Pequeno Produtor- PAPP- viabilizado para a
área da SUDENE e financiado pelo Banco Mundial, é um exemplo destes programas
específicos. O PAPP visava o fortalecimento da pequena produção através do
associativismo e cooperativismo, com o atendimento de demandas locais e política
de emprego e renda nas localidades rurais. Os trabalhadores, através de suas
representações, votavam nos projetos prioritários. Mas, o caráter assistencialista do
programa, foi aos poucos desarticulando os trabalhadores e concentrando o poder
decisório nos técnicos do Estado, responsáveis pela execução e avaliação.
O Norte de Minas Gerais (Ver Figura 9) é considerado também como
RMNE - Região Mineira do Nordeste - e pertence, para fins de planejamento e
alocação de recursos públicos, à região Nordeste do Brasil. As políticas públicas de
desenvolvimento para o Norte Minas não têm demonstrado eficiência, uma vez que
as empresas que se instalam na região, motivadas pela isenção de impostos e
demais facilidades oferecidas pelo poder público, instalam-se nos municípios nortemineiros por períodos determinados (enquanto vigoram os incentivos fiscais) e
depois “correm” para outras regiões do país.
Os grandes projetos implementados na região têm sido questionados,
reavaliados
e
não
conseguem
atender
à
população
carente
da
região.
Conseqüentemente a renda continua cada vez mais concentrada.
A caracterização da região norte mineira como área de transição, ou seja,
geograficamente localizada no Sudeste, mas com características da região
Nordeste, demonstra que “(...) a paisagem do Norte de Minas é muito mais próxima
dos hábitos do nordestino do que dos próprios mineiros (...)”, (GERSAISE apud
OLIVEIRA, 2000:176). O Sertão das Gerais representa a porção pobre do Sudeste,
embora com todos os incentivos públicos do Nordeste, para a maioria da população
sertaneja ainda não são visíveis a melhoria da qualidade de vida. Muitos são os
retirantes norte-mineiros que seguem migrando por rotas já conhecidas, para
canaviais de cana de açúcar ou percorrendo as cidades de porte médio da região
onde se concentram os pólos industriais, hoje incentivados pela ADENE/Agência de
desenvolvimento do Nordeste, em substituição à SUDENE.
- 61 -ss
61
A transformação da Sudene em Agência de Desenvolvimento do
Nordeste, envolta em escândalos de corrupção e favorecimento de empresas de
velhos coronéis da região, não traz boa nova para a maioria da população sertaneja.
Como em um túnel do tempo, continua-se a observar os deslocamentos de
trabalhadores do campo e suas famílias rumo ao município mais urbanizado de sua
região ou, então, para o Sudeste do Brasil. Mudam-se as relações de trabalho, na
medida que cada vez mais diminuem as ocupações com carteira profissional e
aumenta a informalidade.
FIGURA 09- Mapa da Região do Polígono das Secas, segundo:
susceptibilidade às Secas - Brasil / ano de 2002.
FONTE: Adaptação. Mapa Disponível em<www.desert.org.br>Acesso em 02/08/2002
De acordo com Martins (2002), continua-se a ver, no Brasil, a escravidão
de seres humanos em fazendas, em casas de família, em regime de semi-
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62
escravidão, trabalhando apenas para sobreviver: por comida, teto e despesas de
saúde. A maioria dos migrantes rurais não encontra vagas, de acordo com suas
habilidades. Então, buscam vagas desqualificadas, com baixa remuneração e sem
nenhuma regulamentação. Nota-se que a não qualificação dos trabalhadores rurais,
juntamente com pouca escolaridade, faz com que pareça ser “culpa” dos mesmos a
não colocação no mercado de trabalho urbano.
A precarização das relações de trabalho começa já na saída do homem
do campo, através da substituição dos trabalhadores por máquinas e continua com a
impossibilidade de acesso à terra para a agricultura familiar, através de
financiamentos com juros exorbitantes e, conseqüentemente, o abandono dos
oriundos do campo nas cidades, com a exclusão para as periferias e para o mercado
informal de trabalho. No contexto urbano, a impossibilidade de sobrevivência mesmo
nas periferias torna-se para muitos migrantes em incentivo para continuar na busca
de um lugar e também na aceitação de "qualquer trabalho" que possa garantir a
sobrevivência.
O tema do trabalho, especificamente do emprego, em suas múltiplas
dimensões, se inscreve, hoje, mais do que nunca, como questão vital para os
trabalhadores, suas famílias, sociedade civil e Estado. O trabalho, emprego e
ocupação deveriam ser questões centrais do planejamento público e da política
sócio-econômica.
O Estado continuou com políticas públicas baseadas nas velhas formas
de dominação. Na região do Norte de Minas continuam as políticas públicas de
dominação e paternalismo, que pouco modificam as estruturas sociais básicas. As
políticas públicas estão voltadas para um problema que se apresenta sem solução:
“as secas”. Como estratégia de sobrevivência os trabalhadores procuram o mercado
informal, o comércio ambulante, (Ver FIGURA 10).
O mercado ambulante cresce demasiadamente em todo o Brasil. Em
Montes Claros, são os migrantes rurais os principais trabalhadores desse setor. Na
sua maioria trabalham para terceiros, os médios e grandes empresários do comércio
local e regional; que colocam suas mercadorias em bancas para serem vendidas em
praças públicas.
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63
O trabalho exercido nas vias públicas coloca os camelôs em situação
diferente dos trabalhadores formais pois não aparecem nas estatísticas sobre
desemprego. "Os bicos" garantem a sobrevivência, mas são questionados não só
pelo poder público, em função da sonegação de impostos, mas também pela
população que vive "exprimida" nas ruas por estes mesmos trabalhadores.
O trabalho exercido nas vias públicas proporciona a visibilidade de
aspectos fundamentais do trabalho informal. A rua é local de quem não tem seus
direitos garantidos sob a proteção das leis trabalhistas ou dos sindicatos e que,
portanto, tem sua cidadania comprometida.14
O que a sociedade capitalista propõe hoje aos chamados excluídos está
nas formas crescentemente perversas de inclusão, na degradação da
pessoa e na desvalorização do trabalho como meio de inserção digna na
sociedade,
(MARTINS, 2002:124).
Para Martins(2002), os trabalhadores aceitam esta condição de
submissão pelo profundo estreitamento das oportunidades de vida que levam. A
cumplicidades dos trabalhadores com a questão da informalidade se dá na falta de
expectativa de melhores colocações no mercado de trabalho e na necessidade de
sobrevivência que leva a exploração e degradação dos mesmos.
A produção em larga escala, a organização de grandes massas de trabalho
e complicados mecanismo para colossais rendimentos, acentuou,
aparentemente, e exacerbou, a separação das classes produtoras, tornando
inevitável um sentimento de irresponsabilidade, da parte dos que dirigem,
pelas vidas dos trabalhadores manuais.(...) No Brasil, onde imperou, desde
tempos remotos, o tipo primitivo da família patriarcal, o desenvolvimento da
urbanização-que não resulta unicamente do crescimento das cidades, mas
também do crescimento dos meios de comunicação, atraindo vastas áreas
rurais para a esfera de influência das cidades - ia acarretar um desequilíbrio
social, cujos efeitos permanecem vivos ainda hoje,
(HOLLANDA,1987:102).
As raízes no Brasil deixam suas marcas na diferenciação entre os
trabalhadores rurais e urbanos e as oportunidades de trabalho. As cidades atraem
grande número de trabalhadores, mas não conseguem inseri-los no mercado de
trabalho. O desequilíbrio social causa efeitos perversos nas populações rurais e
urbanas e o Estado não consegue gerenciar e nem possibilitar políticas públicas que
diminuam estas disparidades.
14
A etimologia da palavra cidadania está associada há uma separação entre o homem urbano e o
homem rural, uma vez que a palavra vem substitui o termo burguês. Para Norberto Bobbio "o direito
do cidadão é a conversão universal, em direito positivo, dos direitos humanos”,(1995:17).
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O trabalho exercido nas vias públicas proporciona ua é local de quem não
FIGURA 10- Ambulantes- “Camelôs” na Praça Dr. Carlos, Centro de Montes
Claros (MG).
FONTE: Secretaria Municipal de Planejamento-Prefeitura Municipal de Montes Claros, (maio de 2002).
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CAPÍTULO 3
GRANDE SERTÃO: A REGIÃO MINEIRA DO NORDESTE
Senhor tolere, isto é o sertão. Uns querem que não seja: que situado sertão
é por campos-gerais o fora (...) sertão é onde o pensamento da gente se
forma mais forte do que o poder do lugar. Viver é muito perigoso...(...) Esses
gerais são sem tamanho. Enfim, cada um o que quer aprova, o senhor sabe:
pão ou pães é questão de opiniães.(sic). O sertão está em toda à parte.
15
João Guimarães Rosa .
Guimarães
Rosa,
no
livro
Grande
Sertão:
Veredas
propicia
o
entendimento da identidade sertaneja, descrevendo o povo do sertão como forte e
guerreiro. O personagem Riobaldo diz que lugar de ficar é a grota onde está a roça e
que lugar de passagem do homem e do demo é a chapada. O sertão norte mineiro
transforma-se a partir das novas relações campo-cidade que faz com que a chapada
seja o lugar de ir e o lugar de ficar, a cidade. O grande sertão passa então por
profundas transformações. O sertanejo deixa a roça e vai para a cidade.
Para
Santos (1994), tem sido o modelo econômico exportador ao incrementar culturas
agrícolas modernas e o conseqüente crescimento de aglomerações urbanas
correspondentes que introduz uma nova forma de regulação ao território.
15
GUIMARAES ROSA, João. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
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66
3.1- A Ocupação e Desenvolvimento do Território do Sertão Norte-Mineiro
O início do processo de desenvolvimento e povoamento do território norte
mineiro foi baseado em dois importantes fatos: a expansão da pecuária bovina
extensiva e a disponibilidade de terras livres. A vegetação original favorecia a
pecuária que fornecia o gado para as atividades da zona açucareira, a criação
bovina era criada em campo aberto, fora das plantações de cana de açúcar.
A formação do povo no Norte de Minas foi através dos indígenas, estes
em maioria, dos europeus, predominantemente portugueses, e dos africanos,
baseados na mão-de-obra escrava. Os fazendeiros eram os detentores do poder,
das riquezas e de grandes extensões de terra.
As bandeiras paulistas e baianas nos séculos XVI e XVII começaram a
desbravar a região em busca de riquezas e de posses das terras. Já no século XVIII,
originou-se um período de isolamento da região norte-mineira, com a dominação da
mineração em detrimento do ciclo da cana de açúcar. A atividade mineradora foi
importante para o Norte de Minas como região de fornecimento de produtos
agropecuários para as minas, mas com os contrabandos de ouro e a sonegação de
impostos, houve um período de restrição ao comércio da região.
Com a cultura algodoeira, no século XVIII, a região foi responsável por
uma parcela importante da produção para exportação. O algodão trouxe incremento
das atividades têxteis em alguns municípios. Mas, foi o advento da ferrovia, no início
do século XX, que permitiu uma grande difusão econômica, principalmente para as
cidades localizadas às margens do Rio São Francisco. A ferrovia proporcionou a
interação com o restante do país, auxiliando também no povoamento de áreas ainda
não ocupadas.
Em 1918 a ferrovia chegou à cidade de Pirapora e em 1926 à cidade de
Montes Claros. Estes dois municípios tornaram-se então os mais importantes da
região. A ferrovia beneficiava também a pecuária da região e auxiliava o escoamento
da produção.
No final dos anos 50, começou a intervenção efetiva do Estado, através
do investimento no problema da seca. As regiões Nordeste do Brasil e Norte de
Minas Gerais, já conhecidas como subdesenvolvidas, foram beneficiadas com
estratégias governamentais de combate a longos períodos de estiagens.
- 67 -ss
67
Em 1960 começou o grande incentivo governamental na região nortemineira. Até então, a região era apenas fornecedora de mão-de-obra e capital. Com
a criação da SUDENE e o desenvolvimento de planos diretores começou uma
expansão
capitalista
impulsionada
pelo
Estado.
A
política
federal
de
desenvolvimento da SUDENE era baseada em quatro pontos: 1)Colonizações das
terras
despovoadas existentes
no
Maranhão
e
no
Oeste
da
Bahia; 2)
Aproveitamento das bacias dos açudes e irrigação nos Vale dos rios São Francisco
e
Paraíba;
3)
Aproveitamento
dos
tabuleiros
costeiros
do
Nordeste;
4)
Reorganização fundiária do Semi-árido e da Zona da Mata.
O Norte de Minas, para efeito de planejamento16, abrange três regiões:
1-Bacia do São Francisco, que envolve sete unidades da federação (alguns
municípios do Norte de Minas);
2-Vale do São Francisco, que abrange parte da região Nordeste, parte do Polígono
das Secas e parte da região Sudeste;
3- Semi-árido Brasileiro, que compreende o Polígono das Secas.
O discurso estatal baseava-se na possibilidade de integração da região
com a economia nacional. O desenvolvimento almejado fez com que o Estado
facilitasse o ingresso de capitais nacionais e internacionais. Os pequenos
agricultores e produtores rurais eram os principais beneficiados dos Programas
Especiais.
Alguns órgãos como CODEVASF e SUDENE impulsionaram políticas que
viabilizavam incentivos fiscais e financeiros para o fomento da atividade econômica,
principalmente dos setores agroindustrial de reflorestamento e irrigação.
A política estatal reduziu a população rural, diminuindo as atividades do
setor primário, incrementando as atividades dos setores secundário e terciário. A
intervenção do Estado provocou a modernização tecnológica na agricultura e na
indústria e também aumento de serviços públicos, embora continuou concentrando
16
O Estado de Minas Gerais é dividido para o planejamento estadual em dez regiões, de acordo com
a Fundação João Pinheiro. São elas: I-Região central; II-Região da Mata; III-Sul de Minas; IVTriângulo; V-Alto Paranaíba VI--Centro-Oeste de Minas; VII-Noroeste de Minas; VIII-Norte de Minas;
IX-Jequitinhonha/ Mucuri e X-Rio Doce.
- 68 -ss
68
as terras, expulsando do campo pequenos produtores, trabalhadores rurais e
camponeses.
Os governos, municipais, estaduais e federal foram parceiros nos
incentivos de produção e reprodução do capital no Norte de Minas, expandindo as
empresas rurais e urbanas e explorando a força de trabalho humano.
Na década de 70 o governo mineiro concedeu muitas áreas de
propriedade estatal para empresas reflorestadoras, o que contribuiu para o êxodo
rural. O número de proprietários de terras no Norte de Minas foi maior em relação a
outras regiões do Estado, o que não aconteceu em relação à ocupação. "Verifica-se,
portanto, uma distribuição assimétrica entre o número de estabelecimentos e a área
correspondente, o que demonstra uma forte concentração de terras”, (RODRIGUES,
2001:14).
O processo de concentração de terras refletiu no crescimento da principal
atividade agropecuária da região: a pecuária bovina de corte juntamente com as
atividades reflorestadoras. Paralelamente ao reflorestamento surgiu a modernização
da agropecuária regional, dos projetos aprovados pela SUDENE, que contemplou
grandes unidades produtivas, o que contribuiu para a concentração da posse de
terras.
A modernização proposta pelo Estado, que levaria ao desenvolvimento da
região Norte Mineira, diminuiu a oferta de trabalho rural, aumentando os empregos
temporários. A região passou a ser palco de conflitos constantes por posses de
terras. As terras eram disputadas pelos trabalhadores e também pelos grileiros que
possuíam muitas vezes apoio do Estado.
Cada vez mais os minifúndios, propriedades de pequeno porte que
utilizam mão-de-obra familiar, não conseguiam conviver com os grandes
latifundiários, responsáveis pelos grandes projetos de reflorestamento, irrigação,
agroindústria e pecuária do território Norte Mineiro.
A concentração de terra liberou grande parcela da força de trabalho. No
ano de 1996, as terras eram ocupadas por grandes proprietários.
No Norte de Minas, 83,87% dos estabelecimentos no estrato até 100
hectares, ocupavam 16,26% da área. No estrato de 5.000 hectares ou mais,
tinha-se 0,23%, dos estabelecimentos ocupando 26,36% da área total.
Portanto os dados mostram uma quantidade relativamente maior de
minifúndios na região e concentração maior da área nos estabelecimentos
- 69 -ss
69
de grande porte. No estado de Minas Gerais, a concentração de área ocorre
nos estabelecimentos de médio porte,
(RODRIGUES,2001:50).
A forma de organização produtiva da região explica a subordinação dos
trabalhadores ao capital em condições precárias de vida. A intervenção
governamental na região através da SUDENE, embora, com o objetivo de superar o
desequilibro sócio-econômico, beneficiou os grandes proprietários em detrimento
dos trabalhadores rurais. A estrutura fundiária agravou a situação de opressão e
“escravidão” dos trabalhadores do campo.
3.2-Organização Produtiva da Região Mineira do Nordeste:
Como se demonstrou, a estrutura fundiária concentrada e o fluxo
migratório rural regional possuem vínculos históricos. No período de 1970 a 1980
houve um decréscimo de 0,96% na população rural da região e, no período de 1980
à
1990, um decréscimo de 0,32% de acordo com dados do INDI- Instituto de
Desenvolvimento Industrial de Minas Gerais. A população urbana começa a crescer
na década de 1970 com a incrementação da industrialização e modernização
agrícola.
Nos períodos correspondentes às décadas de 50 a 70 predominava a
pecuária no Norte de Minas como a maior fonte econômica produtiva. De acordo
com Stralen apud Cardoso (2001), as áreas regionais ocupadas com pastagens, na
região, eram de 52,69%, enquanto que as lavouras correspondiam a 4,56%, sendo
que restante das áreas (42,75 %) era ocupada por matas e florestas.
A pecuária trouxe ao mesmo tempo riqueza, prosperidade, problemas
ambientais e desigualdades sociais e econômicas. Poderosos grupos econômicos
faziam a exploração da atividade, conseqüentemente deixando sem terra e sem
trabalho grande número de posseiros, meeiros e arrendatários.
A SUDENE, na década de 60, incentivou a pecuária com recursos
públicos, principalmente entre os anos de 1966 e 1968, através de políticas de
crédito e financiamentos. As invernadas contribuíram para que a pecuária
mantivesse características tradicionais, como a prática extensiva e ausência de
especialização produtiva.
- 70 -ss
70
A partir da década de 70 e até meados de 1990, a pecuária continuou
representando uma das principais atividades da região, embora mesmo com novas
tecnologias, como melhorias genéticas e novas pastagens, a bovinocultura ganhou
mais espaço que a pecuária de corte.
Em estudo da Fundação João Pinheiro, em 1990, o Norte de Minas
continuou sendo caracterizado como “espaço econômico apoiado na pecuária de
corte extensiva e por uma cultura calçada em produtos alimentares básicos”,(FJP,
1990:53).
O carvão vegetal foi explorado em áreas de expansão da fronteira
agrícola e intensificou-se no decorrer da década de 70, principalmente em função do
parque siderúrgico mineiro e também da pecuária bovina. As matas nativas do Norte
de Minas, já em 1970, passam a ser exploradas para a produção de lenha e carvão,
incentivada
pela
quantidade
de
terras
disponíveis
aliado
aos
incentivos
governamentais.
O
reflorestamento/eucalipto
provocou
a
desarticulação
e
desmembramento de pequenas unidades produtivas, uma vez que eram os grandes
empresários urbanos e rurais responsáveis pela atividade, que também representou
a penetração de grandes empresas em áreas devolutas.
Além dos problemas ambientais causados pelo desmatamento e
reflorestamento, “a degradação ambiental no período de 1985-1989 chegava à cerca
de 990.000 hectares”,(OLIVEIRA,2000:33). As carvoarias também trouxeram
grandes problemas sociais para o Norte de Minas, como o trabalho infantil e as
péssimas condições de trabalho que famílias inteiras encontravam nos fornos de
carvão17.
Em relação ao setor industrial, é a partir da década de 60 que se tem o
grande impulso no Norte de Minas através da criação da SUDENE, com planos
diretores que previam criar infra-estrutura econômica, investir no setor de transporte,
aumentar a oferta de energia, água e saneamento e disponibilizar um grande
número de empresas para alguns municípios da região. Foi em 1970, implantada em
17
Ver Figura 5, com improvisação de moradia de trabalhadores de carvoarias no Norte de Minas
Gerais, a fotografia encontra-se no capítulo 1, como forma de retratar as Vidas Secas no contexto
geral no Brasil.
- 71 -ss
71
Montes Claros a primeira unidade financiada pela SUDENE: o FRIGONORTE Frigorífico Norte de Minas.
Nos anos 80, o setor secundário passa a ter mais importância econômica
regional que o setor primário. Os municípios que possuíam os maiores pólos
industriais foram Montes Claros, Pirapora, Várzea da Palma e Bocaiúva. Sendo que
todos os empreendimentos sempre contaram com os incentivos da SUDENE,
através do Fundo de Investimento do Nordeste-FINOR.
A industrialização proporcionou o processo de urbanização. Os migrantes
buscam, além do Sul do país, também os municípios com mais indústrias na região,
sempre em busca de emprego. Essa mobilidade espacial desorganiza os municípios
que
não
dispõem
de
infra-estrutura
para
receber
novos
habitantes.
Conseqüentemente, houve a concentração em alguns municípios dos setores de
melhor qualidade de serviços. Neste período, as microrregiões que apresentaram
maiores taxas de crescimento populacional foram as de Pirapora (73%) e Montes
Claros (43%), onde localizavam os dois únicos distritos industriais da “Área Mineira
de Atuação da SUDENE”. Montes Claros passa a ser o centro de serviços de saúde,
educação e concentração de órgãos públicos estaduais e federais, para a região
norte-mineira e para o sul da Bahia.
O IDH - Índice de Desenvolvimento Humano, criado pela UNESCO, desde
1990, é considerado como fator de referência para apontar a qualidade de vida dos
países. O Estado de Minas Gerais é considerado como faixa média de
desenvolvimento, embora o Norte de Minas apresenta-se como de baixo
desenvolvimento.18
O IDH para a região indica, ainda, índices que confirmam a permanência
da região entre as mais pobres do país, conforme mostra a FIGURA 11. Afirma a
Fundação João Pinheiro que: “As piores condições de vida do Estado concentramse nos municípios das regiões Norte e Nordeste de Minas Gerais e são similares
àqueles prevalecentes no Nordeste brasileiro”, (FJP, 1996:22-23).
Os projetos localizados e direcionados pelo Estado em parcerias com
organismos internacionais de capitais não modificam estruturas sociais tradicionais.
18
Consultar REIS. Geraldo, In: SANTOS, Gilmar. Trabalho, Cultura e Sociedade Norte /Nordeste de
Minas. Montes Claros: BEST, 1997:57.
- 72 -ss
72
Considerando Celso Furtado (1981), é necessário entender as causas, para se atuar
no local, percebendo todas as dimensões globais dos fenômenos sociais. Porém
alguns aspectos de desenvolvimento regional devem ser ressaltados, como o
avanço significativo que o Norte de Minas experimentou com relação à expectativa
de vida.
Entre 1960-1970 o habitante na região vivia, em média, apenas 56,2
anos, e na década seguinte, 63,7 anos; esperança de vida superior à média do
Nordeste (59,1 anos).
O avanço na educação também foi bastante significativo, segundo
OLIVEIRA19 (2000:81), o índice de analfabetismo em 1980 era de 45,27%,
semelhante ao do Nordeste e, na cidade de Montes Claros, a taxa era, na mesma
época, de 22,17%.
Estudo da Fundação João Pinheiro, instituição do Governo do Estado
de Minas Gerais, demonstram que o Norte de Minas continua a ser uma região com
disparidades em relação as outras regiões do Estado, embora, haja significativas
melhoras de indicadores sociais a partir de 1970 e em 1991. Nesse período, diminui
a mortalidade infantil e, conseqüentemente, cresce a esperança de vida.
Entre 1970 e 1991, observa-se que a taxa de crescimento da população
urbana aumentou em ritmo bem mais rápido à rural, (Gráfico 2). Em 1970, o
contingente urbano abrangia 27,6% da população total; em 1991, alcançou 54,7%,
evidenciando o rápido processo de urbanização da região, porém inferior à taxa de
urbanização do Nordeste (60,65%).
Tais condições, demonstradas por instituições do próprio Estado,
reforçam a mobilidade espacial e, para muitos, as expectativas das políticas públicas
só podem ser vislumbradas em alguns espaços urbanos na busca de inserção sócioeconômica. O IDH (Figura11) dos municípios reforça as diferenças nos índices de
qualidade de vida das populações.
- 73 -ss
73
ESCALA
1:10.000.00
0
Figura 11- Mapa do IDH do Estado de Minas Gerais (MG) Municípios da
ADENE/RMNE.
Fonte: Secretaria Municipal de Planejamento- Montes Claros- MG - Dezembro de 2002
Grande parte dos lavradores migrou para as cidades à procura de uma
oportunidade de trabalho, engrossando as massas marginalizadas que vivem em
condições sub-humanas nas favelas, alagados, em loteamentos clandestinos,
cortiços e nas senzalas modernas dos canteiros de obras da construção civil.
No caso brasileiro, computando unicamente os números relatados pelos
trabalhadores que fugiram das fazendas em que havia ou há trabalho
escravo, e que sobrevivem no caso da fuga, contei oitenta mil trabalhadores
cativos. Compra-se e vende-se trabalhador. Trabalhadores são surrados,
amarrados, castigados e até assassinados porque tentam fugir ou porque
não produzem o tanto que supostamente deveriam produzir,
(MARTINS, 2002:125).
19
Consultar OLIVEIRA (org).Formação Social e Econômica do Norte de Minas. Montes Claros:
Unimontes, 2000.
- 74 -ss
74
O desenraizamento do povo gera insegurança pelo rompimento dos
vínculos sociais e perda dos pontos de referência culturais, sociais e religiosos,
levando à dispersão e a perda de dignidade e identidade.
O migrante perde a paisagem natal, a roça, as águas, as matas, a caça, a
lenha, os animais, a casa, os vizinhos, as festas, a sua maneira de vestir, o
entoado nativo de falar, de viver, de louvar a seu deus. Suas múltiplas
raízes se partem. Na cidade, a sua fala é chamada “código restrito” pelos
lingüistas; seu jeito de viver, “carência cultural”; sua religião, crendice ou
folclore. Seria mais justo pensar a cultura de um povo migrante em termos
de desenraizamento. Não buscar o que se perdeu: as raízes já foram
arrancadas, mas procurar o que pode renascer nesta terra de erosão,
(BOSI, 2002:24).
É a busca de novos locais de destinos. Novos pólos de atração surgem
localizados tanto em novas cidades da fronteira agrícola, quanto pela redefinição
econômica e ampliação da prestação de serviços em cidades de porte médio do
interior dos Estados brasileiros. Estes núcleos urbanos surgem compondo um novo
cenário de oportunidades e melhor qualidade de vida que antes se restringiam, no
senso comum, às metrópoles e às principais capitais dos Estados mais
industrializados.
As migrações sazonais ocorrem na região, buscando trabalho e as
migrações intra-regionais buscando oportunidade da industrialização nos municípios
pólos, financiados pelos programas de incentivos fiscais do Estado, em especial,
Montes Claros. Os trabalhadores expulsos e explorados do sertão migram para a
cidade, caminhantes incessantes e permanentemente à procura da ”integração com
o mercado de trabalho”.
A família da figura 12 retrata a migração sazonal que continua a ocorrer
na região, estão partindo (mais uma vez) do meio rural de Montes Claros para o
interior de São Paulo, para trabalharem temporariamente, vão se submeter à mais
de 10 horas de trabalho diariamente, inclusive as crianças.
Vira Usinas comer.As terras que iam encontrando;
Com grandes canaviais.Todas as várzeas ocupando
O canavial é a boca.Com que primeiro vão devorando
Matas e capoeiras.Pastos e cerrados;
Com que devoram a terra.Onde um homem plantou seu roçado,
Depois os poucos metros.Onde ele plantou sua casa;
Depois o pouco espaço de que precisa um homem sentado;
Depois os sete palmos onde ele vai ser enterrado(...)
- 75 -ss
75
para trás vai ficando a triste povoação daquela usina.
(...) de gente que, cada ano,
o tempo da safra é que vive, que na braça da vida
tem marcado curto limite(...)
Poema o Rio de João Cabral de Mello Neto.
FIGURA 12- Migrantes rurais do Norte de Minas que estão de partida mais uma
vez para outra região em busca de trabalho temporário.
FONTE: Jornal Estado de Minas/Caderno Gerais de junho de 2001.
- 76 -ss
76
3.3- A casa e a rua: os norte-mineiros na busca de trabalho
(...) de fato, a categoria rua indica basicamente o mundo, com seus
imprevistos, acidentes e paixões, ao passo que casa remete a um universo
controlado, onde as coisas estão nos seus devidos lugares.(...) Mas a rua
implica uma certa falta de controle e um afastamento. É o local do castigo,
da “luta” e do trabalho. Numa palavra, a rua é o local daquilo que os
brasileiros chamam de dura realidade da vida.
20
Roberto da Matta
No livro a Casa e a Rua, Roberto da Matta faz uma reflexão sobre o que é
permanente e o temporário para as pessoas. Os permanentes são os laços da
família, o lugar de origem, as relações familiares e o temporário é à busca da
sobrevivência, o trabalho temporário que possibilita a volta para o permanente. As
migrações ocorrem sempre em função dos trabalhadores que vão procurar
sobrevivência dos que ficam. As típicas migrações do Norte de Minas Gerais, as
migrações sazonais, já são consideradas pelos trabalhadores como "caminho da
roça" de tantas idas e vindas.
3.3.1- O Caminho da Roça: o lugar, a ação social e a reprodução das relações
sociais de produção
É no local que as relações sociais capitalistas se manifestam, reproduzem
ou se transformam. O lugar apresenta a dimensão central da vida social. O lugar de
vida e de trabalho, esta é a busca constante dos migrantes. Todos partem e chegam
à procura de um lugar onde se possa encontrar condições dignas de vida.
O lugar da roça, do campo, torna-se cada vez mais difícil de fixar moradia,
pois a concentração da terra inviabiliza a permanência das famílias camponesas,
restando então, a possibilidade do lugar urbano, a cidade.
20
Conferir em DA MATTA, Roberto. A Casa e A Rua. Rio de Janeiro; Guanabara/Koogan, 1991.
- 77 -ss
77
A cidade grande é onde se instala a técnica, a modernidade, mas é o
“espaço onde os fracos podem subsistir” (SANTOS, 1999:58). No lugar está o global
e o local, o particular e o geral. É onde as ações sociais racionais apresentam-se e
os sujeitos produzem os fenômenos sociais no espaço. De acordo com Weber, todo
fenômeno social refere-se às ações que os constituem: "A ação social (incluindo
tolerância ou omissão) orienta-se pelas ações de outros, que podem ser passadas,
presentes ou esperadas como futuras" (WEBER,1999:139).
São as ações sociais de vários sujeitos que irão proporcionar as relações
sociais: “Por relação social deve-se entender uma conduta de vários -referida
reciprocamente conforme seu conteúdo significativo, orientando-se por essa
reciprocidade”, (WEBER,1999:42). Os conteúdos significativos das relações sociais
balizam a reprodução das relações. Assim, as relações sociais tornam-se a
produção e a re-produção das relações de mercado:
(...) uma relação, ao mesmo tempo, aparentemente igual entre pessoas
iguais, mas que produz resultados econômicos profundamente desiguais
entre si, que são o salário e o lucro (o valor a mais criado pelo trabalhador e
que não fica com ele, a chamada mais valia) personificado por pessoas, de
fato, desiguais, que são o trabalhador e o capitalista,
(MARTINS,1995:155).
As relações capitalistas geram as desigualdades sociais, perpetuando a
antiga relação de dominados e dominantes, expressa também na segregação do
espaço. Percebendo o espaço, de acordo com Lefébvre:
(...) do espaço não se pode dizer que seja um produto como qualquer outro,
um objeto ou uma soma de objetos...não se pode dizer que seja
simplesmente um instrumento, o mais importante de todos os instrumentos, o
pressuposto de toda a produção de todo o intercâmbio. Estaria
essencialmente vinculado com a reprodução das relações (sociais) de
produção.
(LEFEBVRE apud CORREA, 1995:25)
O espaço é um campo social, com grandes distorções entre os estratos
sociais e onde priorização das relações de produção, valorizam os mecanismos de
poder que sustentam uma minoria em condições de extremo bem-estar.
É a reprodução das relações desiguais sociais:
- 78 -ss
78
(...) não pode haver re-produção das relações sociais nem por simples
inércia, nem por recondução tácita. Esta re-produção não se dá sem
modificações que excluem tanto o processo automaticamente reprodutivo
no interior do modo de produção constituído (sistema) como a eficácia
imediata de um “núcleo gerador”. As contradições também se re-produzem,
não sem modificações. Antigas relações há que degeneram ou se dissolvem
(por exemplo: a cidade, o natural e a natureza, a nação, a miséria
quotidiana, a família, a cultura, a mercadoria e o “mundo dos signos”).
Outras há que se constituem de maneira que há produção de relações
sociais no seio da re-produção (por exemplo: o urbano, as possibilidades
do quotidiano, o diferencial). Estas novas relações emergem no seio das
que se dissolvem (...) É a marcha especifica das contradições
ampliadas.Ampliadas - a quê? Ao espaço. Ao mundo: ao mundial.
(LEFÉBVRE, 1999:252).
O espaço torna-se então capitalista; as contradições da re-produção das
relações sociais causam modificações na paisagem local e global; as modificações
no espaço em função dos sujeitos sociais irão determinar a manutenção ou a
transformação do espaço social. Portanto, são os sujeitos sociais que irão
implementar a realidade social.
O sujeito é o desejo do indivíduo de ser ator. A subjetivação é o desejo de
individualização, e esse processo pode desenvolver-se apenas se existir
uma interface suficiente entre o mundo da instrumentalidade e o da
identidade (...) se produz uma dupla exclusão, em relação ao meio de
partida que se afasta e ao meio de chegada que se recusa a integrar o
recém-chegado,
(TOURAINE, 2000:86).
A sociedade moderna capitalista vive um grande paradoxo: a criatividade
humana, as novas tecnologias e o fenomenal progresso científico convivem com a
inegável incompetência em combater a pobreza extrema. Para Cristóvam Buarque,
“Cada um dos seis bilhões de seres humanos é um ponto na geografia da
ignorância. Inteligência não falta, mas falta decência no uso dela”,(2001:3).
O mundo da técnica não consegue racionalizar o bem-estar material para
a maioria, promessa premente do modo de produção capitalista. O sujeito, através
de sua ação social racional, manifesta no lugar, modifica o espaço e transforma as
relações sociais em relações sociais de produção. Nesta paisagem de mercado,
imperam os competentes e os não competentes. Os sujeitos oriundos do campo são
considerados incompetentes e ficam fora do mercado de produção.
Um verdadeiro “apartheid social”, onde as contradições da re-produção
das relações sociais ficam cada vez mais evidentes: de um lado a tentativa de fixar a
- 79 -ss
79
população excedente no meio rural, dando condições de acesso a terra, para que se
possa garantir a sobrevivência do homem do campo, do outro lado tentar no meio
urbano a “integração da marginalidade”, daqueles que vivem à margem do processo
social capitalista. De acordo com o pensamento de Lefébvre: ”há produção de
relações sociais no seio da re-produção”, (ibidem,1999).
O espaço vivido das relações sociais de produção e reprodução do capital
imobiliza grande parte da população, fazendo com que a mobilidade espacial e
ocupacional sejam sempre transitórias. Neste contexto turbulento, inconstante e de
“falsa aparência” da culpa dos próprios trabalhadores, por não terem acompanhado
a modernização tecnológica no campo e não possuírem qualificação profissional
necessária na cidade, emerge a necessidade de uma revisão das políticas públicas
de desenvolvimento do meio rural, bem como de políticas públicas de emprego e
renda, principalmente nas regiões consideradas como exportadoras de força de
trabalho, hoje, trabalhadores completamente descartáveis.
O Polígono das Secas (ocorrência de secas periódicas), que faz parte do
semi-árido brasileiro (que representa 18% do território nacional), possui uma área
estimada em 1.083.709,7 Km².21 Engloba a região Nordeste do Brasil e o Norte e
Nordeste de Minas Gerais (Ver Figura 9). É lugar onde a migração rural-urbana tem
destaque em todo o país. É lugar do grande sertão, lugar de conflitos de terras, lugar
da indústria da seca. É também o lugar das políticas públicas desenvolvimentistas
que objetivaram a transformação da região e não transformaram a qualidade da vida
da população sertaneja.
Os sertanejos são pessoas que ocuparam o território nordestino e o
Polígono das Secas, sendo que a forma de estruturação de seu modo de vida,
através da criação do gado, a sobrevivência em ambientes naturais difíceis e a
vivência social intensa entre os grupos sociais locais caracterizam um povo
guerreiro, forte, religioso e perseverante.
O Polígono das Secas é o lugar deste povo sertanejo, onde a cultura
sertaneja é composta de lendas, tradições, saberes regionais, características rurais
e permanentes movimentos migratórios em busca de trabalho. É uma região do país
onde persistem baixos índices de qualidade de vida para a maioria da população e,
21
Conferir no site www.desert.org.br, acesso em 2/02/2002.
- 80 -ss
80
ao mesmo tempo, é o lugar de grandes proprietários de terra, de famílias oligarcas
que dominam os meios de comunicação e que fazem da política uma forma de
apadrinhamento e assistencialismo.
O povo sertanejo norte-mineiro, como o nordestino, é sofrido, guerreiro e
participante dos deslocamentos populacionais em direção ao Sul. É um povo que
resiste bravamente em abandonar suas raízes culturais independentemente de onde
estejam, mas que não conseguem melhores oportunidades de trabalho.
A cultura aqui denominada sertaneja será o resultado do caldeamento de
modo de comportamento, relações, saberes e fazeres de etnias
diferenciadas que se colocaram em contato no território norte-mineiro bem
como as transformações verificadas, com o passar do tempo, em função
das articulações das populações existentes com homens de outras regiões,
(COSTA, 1997:82).
Portanto, importante entender no processo migratório campo-cidade “o
não discutido” e formular o “não formulado”. A Pós-modernidade no capitalismo
levou milhares de pessoas em busca do meio urbano, que percorre a destruição que
também pode levar à construção. A realidade é um processo dinâmico e dialético.
Segundo Harvey (1992:307) “O capital é um processo, e não uma coisa. É
processo de reprodução da vida social por meio da produção de mercadorias em
que todas as pessoas do mundo capitalista avançado estão profundamente
implicadas”. No conceito de pós-modernidade é necessário entender o capital como
um processo não só de produção de bens, mas também de reprodução de
desigualdades. É necessário conhecer a lógica regional, perpassando pela cultura
regional (Ver FIGURA 13) para possibilitar o entender da dinâmica populacional,
agora, intra-regional.
Exemplo da cultura regional são as festas de Agosto (FIGURA 13), que
fazem parte do calendário turístico da cidade de Montes Claros. Em agosto, o mês
do folclore,pelas ruas de Montes Claros, os catopês, marujos e caboclinhos,
cantando e dançando, como a cinqüenta anos, prestam homenagem a Nossa
Senhora do Rosário, São Benedito, Divino Espírito Santo, ao balanço de fitas
coloridas, pela fé nos Santos de sua devoção.
- 81 -ss
81
FIGURA 13 -Festa de Agosto em Montes Claros (MG) Catopês, Marujos
e Caboclinhos
FONTE: Prefeitura Municipal de Montes Claros.Disponível em < ww.moc.gov.mg>.Acesso
02/12/2002.
No rosto de cada trabalhador na maioria oriundos do meio rural lê-se
nitidamente a história do sofrimento diário do povo humilde, que caleja almas e mãos
o ano todo, conduzindo carroças, trabalhando a madeira de sol a sol, construindo
casas alheias e pintando sonhos pálidos nas paredes frias e intermináveis,
esperando pacientemente agosto, quando ‘cumpre”, mais uma vez, a missão de
homenagear os Santos de sua devoção e o Divino Espírito Santo. Pelas ruas da
cidade em direção a Igreja do Rosário, mantém a tradição do cortejo, nas cores azul
para o 1° dia que é o da Nossa Senhora, rosa para o 2° dia – São Benedito e
finalmente o vermelho para o Divino Espírito Santo. Mas as festas de agosto acabam
sendo apenas uma atração turística, onde os principais personagens da festa, as
rainhas e reis, princesas e príncipes são filhos e filhas da elite local e regional.
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82
3.4- Procura por Trabalho: As diferenças entre mundo da casa e o mundo da
rua
O Estado de Minas Gerais foi considerado como maior exportador de
mão-de-obra no Brasil na década de 70 e 80, concentrando nas regiões Norte e
Nordeste do Estado, os lugares de maiores saídas de trabalhadores sazonais,
principalmente, para o interior do Estado de São Paulo e para região mineira do
Triângulo Mineiro.
Os trabalhadores sazonais, em sua maioria, são transportados em
condições irregulares e recebem míseros salários. Muitos são mantidos como
escravos, em cativeiros, trabalhando para pagarem dívidas de medicamentos,
alimentação e moradia. Deixam famílias inteiras para trás. As chamadas “viúvas de
maridos vivos”, que passam a tomar conta da terra, dos filhos e vivem a esperar pelo
marido e pelo rendimento que este espera receber.
No lugar de onde eu vim, a terra para plantar é pouca porque há muitas
fazendas de criação e o gado toma conta de toda a terra e bebe toda a
água. Mas o gado dá carne, dá dinheiro. E assim, as fazendas são grandes
e sobra pouca terra para os pobres plantar,
(PIERSON, 1972:63).
As migrações sempre ocorreram como forma de tentar reproduzir o capital
que, com a seca, a industrialização do campo, tornou-se inviável. Na tentativa de
permanecer no meio rural migra apenas o chefe da família, tornando, assim, a
mulher, responsável pela terra e filhos, enquanto o homem segue “correndo trecho”
em busca da “tar melhoria de vida”.22
Os constantes deslocamentos modificam as relações da família rural, por
tempo determinado. Enquanto o homem parte em “busca” da sobrevivência,
a
mulher assume posições tradicionalmente desempenhadas pelo “chefe” da família.
Mas, com a sua chegada, tudo retorna aos papéis antes desempenhados.
Para Da Matta (1983), a migração sazonal corresponde à busca do
mundo da rua, para possibilitar a melhoria no mundo da casa. Como se as relações
familiares ficassem estáticas durante todo o período de migração dos trabalhadores.
22
Frase repetida diversas vezes nos relatos dos migrantes rurais durante a pesquisa de campo, que
representa bem a esperança da vida melhorar na cidade. A melhora para a maioria deles é conseguir
um trabalho.
- 83 -ss
83
O período de concentração da migração sazonal no Norte de Minas
Gerais acontece entre os meses de abril a dezembro, geralmente quando o migrante
passa a desempenhar trabalhos de plantio e colheita agrícola, principalmente, nas
lavouras de café e cana-de-açúcar.
Os membros da família que permanecem, ficam para cultivar a terra,
cuidam do mundo da casa. Os que saem para o mundo da rua, sonham e buscam
retornarem para a casa, ou seja, tanto os que partem, como os que ficam, querem
estar no mundo da casa e a migração só acontece em função da necessidade de
enfrentar a ”dura realidade da vida”, quer seja a ausência dos entes queridos, quer
seja o trabalho quase sempre mal remunerado e em péssimas condições. A
concepção de lugar torna-se novamente importante para contextualizar a migração.
O lugar é a casa, as relações de família, a terra, o município de origem, as raízes,
enquanto o trecho, as idas e vindas, significam o mundo, o trabalho temporário, a
possibilidade, a expectativa, à vontade de retornar sempre para o lugar de origem23.
São 40 milhões de migrantes no Brasil-Pessoas que vivem fora do lugar em
que nasceram.Quantos desses saíram para voltar?Quantos são os que
pensam que chegaram a seu destino, como aqueles que encontrei, e que
estão partindo de novo?
(MARTINS, 1988:2).
O Jornal Estado de Minas, na edição de 08 de julho de 2001, divulgou o
que foi chamado de “Mapa da Fuga”. Os jornalistas chamam atenção para a
continuação da migração do Norte de Minas para outras regiões do País, em
situação irregular de trabalho, e com salários míseros, deixando também parentes
em extrema pobreza, aguardando a volta com “algum dinheiro”. A reportagem do
Jornalista e escritor Luiz Ribeiro analisando a fuga de milhares de migrantes rurais
do Norte de Minas para outras regiões do País demonstra que a principal rota é para
Palmas/Tocantins (Quadro 1).
Os dados sobre as rotas migratórias no período de dezembro de 2000 a
junho de 2001 divulgados pela Associação dos Municípios da Área Mineira da
Sudene AMANS, utilizados pela reportagem, demonstram também a diminuição da
população em vários municípios da região, ressaltando que no início do século XXI a
23
As noções de lugar de origem e lugar de destino associadas às categorias casa e rua, já foram
trabalhadas por Maia::2000.
- 84 -ss
84
migração continua ocorrendo, sempre em busca da integração com o mercado de
trabalho. Os trabalhadores oriundos do meio rural, camponeses, pequenos
produtores, cidadãos de aglomerados rurais de pequenos municípios do interior,
possuem mais dificuldades de inserção no mercado de trabalho, mas continuam no
trecho em “busca de algum tipo de rendimento”. A sobrevivência de milhares de
famílias ainda é os constantes deslocamentos espaciais, sem direito às escolhas de
para onde ir e quando voltar.
QUADRO 1
Destino e Ocupação pretendida pelos Migrantes do Sertão Mineiro
LOCAL DE DESTINO
OCUPAÇÃO PRETENTIDA
São Paulo (capital)
Qualquer trabalho
Ribeirão Preto e interior de SP
Corte de cana
Campinas-SP
Emprego em hortifrutigranjeiros
Brasília (DF)
Trabalho doméstico, sitiante
Goiás (Formosa)
Trabalho na agricultura
Mato Grosso do Sul (Rio Brilhante)
Corte de cana
Pará
Trabalho em fazendas de gado e retirada de madeira
Tocantins
Pessoas que querem investir em algum negócio
FONTE: Adaptação da autora, de acordo com o Jornal Estado de Minas, Encarte:
Gerais, do dia 8 de julho de 2001.
Conforme se observa na Figura 14, a rota da fuga acumula cerca de 80
mil pessoas, desde de dezembro de 2000, se deslocando do Norte de Minas para
outras regiões. Vários são os municípios que tiveram diminuição da população
(Tabela 3). A migração sazonal é uma estratégia dos trabalhadores de manutenção
na terra e de reproduzirem enquanto grupo social, permanecendo camponeses.
“Vão trabalhar em terras alheias para poderem continuar ligados à sua, viram
empregados por uns tempos para poderem continuar para sempre camponeses”.
(RIBEIRO,1996:32).
A migração sazonal sempre condicionada aos trabalhadores do Norte de
Minas, agora já não é a modalidade migratória mais freqüente nos municípios nortemineiros. Os trabalhadores rurais em suas idas e vindas começam a fazer a opção
de migrar dentro da própria região.
- 85 -ss
85
Ressalta-se que as migrações para as capitais, o interior de São Paulo e
novos pólos no Norte do Brasil, continuam a acorrer, mas as migrações intraregionais, confirmadas pelo censo 2000, tornaram-se mais constantes.
As migrações continuam a ocorrer em busca de trabalho, seja temporário
ou permanente (Figura 12). Muitos migrantes retornam para a região. Os
trabalhadores voltam ao sertão mineiro quase sempre desprovidos de recursos
financeiros e de motivação e não regressam aos seus municípios de origem (Ver
Tabela 3). Muitos permanecem em Montes Claros que, de cidade de passagem para
o Sul, torna-se. centro de serviços da região, centro receptor de migrantes,
principalmente rurais, aonde todos vem em busca de trabalho, de bico, do biscate,
de educação, de saúde, enfim, de qualidade de vida.
A urbanização do município se deve em grande parte aos deslocamentos
espaciais dos trabalhadores entre o rural e o urbano; tantos são os trabalhadores
que migram pela primeira vez do campo para a cidade, quanto aqueles que em sua
maioria já migraram antes para outras regiões e agora resolvem permanecer em sua
própria região, mas não em seus municípios de origem, conforme a tabela 3.
Nos últimos anos o grau de urbanização da cidade vem aumentando
significativamente. Em 1996 do total de 271.608 habitantes, 75% estavam no meio
urbano, ou seja, 253.082; já no ano de 2000 de acordo com o Censo do IBGE do
total de 306.730 habitantes, 289.006 estão no meio urbano e somente 17.724 estão
no meio rural, sendo que 85,63% da população residem no espaço urbano.
- 86 -ss
86
FIGURA 14- Principais Rotas das Migrações de Trabalhadores do Norte de
Minas Gerais-2000
Fonte: Adaptado do Jornal Estado de Minas Gerais (Cadernos Gerais.ed 08.jul.2000:16).
Ao migrante que retorna a sua região, sempre fica o desejo de que nesse
“novo” lugar, agora na sua própria região, haverá novas oportunidades. As políticas
públicas de emprego e renda no meio urbano transformam-se em esperança de
melhoria de vida e os programas do meio rural não passam de expectativas. As
expectativas e esperanças se confundem e muitos são os trabalhadores que sentem
- 87 -ss
87
grandes frustrações em permanecer na cidade. Procuram ficar em Montes Claros
que diferentemente de outros municípios da região aumenta o numero de habitantes
enquanto muitas são as cidades que registraram redução da população, conforme
mostra a Tabela 3.
TABELA 3
Variação da População dos Municípios do Norte de Minas Gerais: 1996- 2000
MUNICÍPIO
1996
2000
% variação
Cônego Marinho
6.497
6.484
Coração de Jesus
26.071
25.678
-1,50
Espinosa
31.550
30.979
-1,80
Francisco Sá
23.708
23.559
-0,62
Fruta de Leite
7.175
6.778
-5,53
Itacambira
4.816
4.558
-5,35
Januária
63.896
63.458
-0,68
Japonvar
8.549
8.119
-5,02
Joaquim Felício
4.063
3.854
-5,14
Lontra
7.012
6.768
-3,47
Mamonas
6.505
6.130
-5,76
Matias Cardoso
9.668
8.587
-11,18
Montalvânia
16.297
16.027
-1,65
Monte Azul
23.935
23.727
-0,86
Montezuma
6.656
6.572
-1,26
São João do Pacuí
3.682
3.670
-0,32
Serranópolis
4.141
3.979
-3,91
Ubaí
10.916
10.770
-1,33
TOTAL
272.720
269.959
-1,16
- 0,20
FONTE: Adaptação da autora, Jornal Estado de Minas, Encarte: Gerais edição de 8 de julho de 2001.
- 88 -ss
88
3.5- Admirável Mundo Novo, o pré-modernismo no mundo do migrante rural no
século XXI
Velhos mapas e cartas que guiaram
os seres humanos pela vida individual
e coletiva não mais representam a
paisagem na qual nos movemos,
o mar em que navegamos. Em que
não sabemos aonde nos leva, ou mesmo
aonde deve levar-nos, nossa viagem.
(HOBSBAWN, 1995:23).
As migrações rurais internas que continuam a ocorrer no Norte de Minas
Gerais em direção aos canaviais e lavouras de café, do interior de São Paulo, e na
própria região do Norte de Minas, em direção à cidade pólo de Montes Claros,
comprovam que a modernidade tecnológica do terceiro milênio revela uma
racionalidade instrumental, já vislumbrada por Max Weber. É uma racionalidade
técnica baseada na lógica do capital, onde a maioria dos trabalhadores encontra-se
sem oportunidades nos locais de origem e excluídos do mercado de trabalho.
Para Durham (1984), a migração se apresenta como um capítulo do
desenvolvimento do capitalismo industrial e agrícola. A racionalidade instrumental
associada à modernidade tecnológica resulta no incremento das desigualdades
regionais e na constituição de grandes metrópoles.
Os migrantes rurais em busca de sobrevivência, são forçados a desistirem
de sua “identidade”. Segundo Ortiz (1989), a identidade se define em relação a algo
que lhe é exterior. Ela é uma diferença. A identidade possui uma dimensão interna,
não basta sermos diferentes, é necessário nos identificarmos como diferentes.
Os norte-mineiros possuem tradições, credos, crenças que se apóiam na
transmissão de uma cultura regional baseada na construção simbólica de uma
pluralidade de identidades construídas por diferentes grupos sociais em diferentes
momentos históricos.
Esses contextos históricos são construídos através de relações culturais
que perpassam relações de poder. A região sempre foi definida por políticas
tradicionalistas para os grandes proprietários de terra que pressionaram e
- 89 -ss
89
pressionam os pequenos agricultores e trabalhadores rurais, através de péssimas
condições de trabalho e total impossibilidade de acesso à terra.
Aos pobres fica apenas a opção de migrar. Se nas décadas de 60 e 70 o
destino era principalmente São Paulo, hoje, o destino é a sua própria região.
A escolha de para onde migrar resulta da possibilidade da procura pelo
“desenvolvimento! Mais próximo de casa”. Como diz um migrante em um
depoimento:
“A gente procura na verdade é o moderno. A cidade tem médico, dentista,
luz, televisão, um montão de prédio (sic). Sei que tem muita gente, que tá
24
difici (sic), mas tem muita chance, prá quem quer vencer.”
O moderno é definido como a busca do desenvolvimento, a busca da
melhoria. Para Harvey, de acordo com Bermam, a modernidade é:
Uma modalidade de experiência vital - experiência do espaço e do tempo,
do eu e dos outros, das possibilidades e perigos da vida-que é partilhada
por homens e mulheres em todo mundo atual. Denominarei esse corpo de
experiência “modernidade”. (...) ser moderno é ser parte de um universo em
que como disse Marx, “tudo que é sólido desmancha no ar”,
(BERMAM In: HARVEY, 2001: 21).
Portanto, a procura do moderno leva os trabalhadores a percorrerem
trechos, caminhos na busca permanente da sobrevivência mínima. Segundo Harvey
“A única coisa segura na modernidade é a sua insegurança”,(2001:20).
O processo de mobilização de bens, pessoas e informações no interior
da sociedade, junto com a diferenciação da divisão social do trabalho, definem
status e papéis sociais que serão desempenhados de acordo com a qualificação e
de forma “livre” e racional pelos sujeitos sociais.
A racionalidade está sempre presente na discussão da modernidade.
Considerando Bourricaud (1993), a racionalidade é uma estratégia que garante risco
mínimo, dependendo da estrutura das situações. É uma crença, um mito, uma teoria
representando interpretações desenvolvidas ou, conforme o caso, aceitas pelos
24
Depoimento de migrante rural ambulante na Praça Dr.Carlos, vendedor de mercadorias do
Paraguai, para terceiros.
- 90 -ss
90
sujeitos, em função de sua situação, tal como a percebem e a interpretam. Essas
interpretações fornecem guias eficazes para a ação.
A ação de migrar, de partir, é racional no sentido das poucas
possibilidades de sobreviver no campo. Mas, a busca da modernidade é ilusória, a
partir da constatação do “simulacro” nas cidades.
A realidade brasileira e, especificamente, do Norte de Minas e dos
migrantes rurais, demonstra a miséria extrema que a maioria sobrevive no caos
urbano do progresso técnico da modernidade.
Ressalta-se que, na cidade, os trabalhadores oriundos do campo
conseguem afirmar as suas identidades culturais e regionais, haja vista as festas de
agosto (Ver figura13), as festas religiosas, as comidas típicas, etc., o que demonstra
uma resistência dos grupos populares contra a homogeneização culturais proposta
pelo capitalismo.
“O mais legal de São Paulo é voltar com aquele som, cheio de coisas, a
gente tem respeito quando chega aqui. Mas nóis não esquece as rezas, as
25
crenças e a vontade de volta."
Estas redescobertas das diferenças culturais não se manifestam quanto à
categoria trabalho. A inserção no mercado de trabalho urbano continua difícil. A
baixa escolaridade, qualificação deficiente e profunda discriminação social impedem
a entrada no mercado formal de trabalho. Neste contexto, a busca do moderno, na
perspectiva da racionalidade instrumental técnica, não se concretiza e, no inicio do
terceiro milênio, continua-se com trabalhadores e trabalhadoras em condições da
pré-modernidade.
O admirável mundo novo, proposto pelo projeto iluminista de fraternidade,
liberdade e igualdade não se concretizou, pelo contrário, a realidade é dura, fria. O
mundo novo para milhares de pessoas que buscam apenas o sobreviver nas
cidades torna-se um perverso drama social.
É neste espaço urbano (Ver FIGURA 15), construído e modificado
também por migrantes rurais, que iremos analisar as políticas públicas de emprego e
renda para o migrante, através do SINE e também, o perfil do migrante rural na
cidade e sua integração com o mercado de trabalho.
25
Depoimento de migrante rural retornando de São Paulo para "tentar a sorte" em Montes Claros.
- 91 -ss
91
Assim, tacitamente ameaçados, estamos imobilizados. Dentro de espaços
sociais condenados, locais anacrônicos.Que se autodestroem, mas onde
temos o estranho e apaixonado; desejo de permanecer, enquanto o futuro
se organiza, debaixo de nossos olhos, em função de nossa ausência já
programada de maneira mais ou menos consciente,
(FORRESTER,1999:135).
Montes Claros é a cidade pólo da região do Norte de Minas Gerais. Aqui,
muitos trabalhadores rurais migrantes chegam em busca da modernidade, do
desenvolvimento, da qualidade de vida. Como o personagem Riobaldo do Livro
Grande Sertão:Veredas, não desanimam, persistem, encaram com coragem as
dificuldades e incertezas da vida urbana.
O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e
daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é
coragem.
(GUIMARAES ROSA,1986: 278)
FIGURA 15- A Cidade de Montes Claros-maio de 2002
FONTE: Secretaria Municipal de Planejamento/Prefeitura de Montes Claros – Maio /2002).
- 92 -ss
92
CAPÍTULO 4
ESPERANÇA DE MELHORIA DE VIDA! O MIGRANTE RURAL NA BUSCA DE
TRABALHO NA CIDADE DE MONTES CLAROS (MG)
Que beleza, Montes Claros, como cresceu Montes Claros. Quanta indústria
em Montes Claros. Montes Claros cresceu tanto. Ficou urbe tão notória,
Prima-rica do Rio de Janeiro que já tem cinco favelas por enquanto, e mais
promete.
26
Carlos Drummond de Andrade.
Sentado à espera de atendimento no Posto do SINE- Sistema Nacional
de Emprego em Montes Claros, o Sr José relembra a “roça” de algodão deixada em
Janaúba. A seca fez com que nada fosse possível de colher. A informação de que
em Montes Claros teria um emprego, fez com que viesse com a família para a casa
do primo que está na cidade já alguns anos. O Sr. José tem 39 anos, 05 filhos e
uma companheira. Está há um mês na cidade e até agora “nada” de trabalho. Ele
vem todos os dias ao Posto do SINE para saber quais as vagas oferecidas. “Sabe
dona, não tenho estudo, mas tenho braços forte, de plantar roça”: Quando
perguntado porque veio para a cidade, ele responde: “Na roça acabou tudo, não tem
trabalho, não tem comida, e a terra já não é mais nossa, tivemos que sair. Falaram
prá esperar, que vai vim um programa, que vai ter melhora, mas... já é velha esta
história. De esperança a gente vévé, de expectativa não”.
FIGURA 16: Migrantes rurais – Preenchendo fichas de cadastro no SINE/
MOC -MG
FONTE: Foto da autora/novembro de 2002.
26
ANDRADE, Carlos Drummond de. O Corpo. Rio de Janeiro: Record, 1984.
- 93 -ss
93
4.1- A Mudança de Rota da Migração: Montes Claros, de Cidade Sertão para
Centro Regional Urbano.
O município de Montes Claros está situado na Bacia do Alto São
Francisco, classificado pelo IBGE como pertencente a macrorregião geográfica
Nordeste e microrregião Montes Claros. A vegetação varia entre o cerrado e a
caatinga; o clima é quente e seco. De acordo com resultados do Censo 2000, a
população residente é de 306.258 habitantes, com 288.534(94,21%) pessoas
residindo na área urbana e 17.724 pessoas (5,79%) na área rural. Com relação à
migração, considerando pessoas residentes no município em setembro/1991, são
19.835 pessoas, (dados do Censo 2000).
A cidade expandiu consideravelmente o seu tecido urbano (TABELA 4)
conseqüência do significativo aumento populacional, decorrente do crescimento
econômico e da migração campo-cidade determinada pela seca e pelo desemprego
existente na região e no Nordeste brasileiro.
TABELA 4
Montes Claros, Minas Gerais e Brasil - Comparativos de Variação
Populacional entre 1996 e 2000.
População
1996
2000
%
Brasil
157.079.573
169.544.443
(+)
7.36
Minas Gerais
16.673.097
17.835.488
(+)
6.52
Montes Claros
271.608
306.258
(+)11.46
FONTE: Adaptação do site disponível em<http: //www.montesclaros.mg.gov.br.> .Acesso
em: 25/09/2002
O processo de urbanização do município ampliou-se na última década,
concomitantemente a um aumento da industrialização. Paralelamente, formou-se
uma rede intra e inter-regional de transportes. Expandiu-se a malha vicinal
possibilitando o aumento da polarização de Montes Claros e o fortalecimento dos
vínculos da região e, conseqüentemente, da cidade com os mercados do Centro-Sul.
- 94 -ss
94
O fato de Montes Claros ser rota obrigatória de vários movimentos
migratórios, registrados ao longo da história, favoreceu a construção de uma
identidade própria e singular. O homem sertanejo gerou uma cultura rica e regional,
levando em consideração a religiosidade e a solidariedade, que perpassaram todas
as camadas sociais. As manifestações culturais sempre se guiaram pelos ciclos
agropecuários e vão perdendo espaço com a industrialização. Os eventos continuam
a ocorrer, embora agora não mais com caráter integrador da comunidade, mas como
manifestação de determinados segmentos da comunidade atual sem conseguir,
contudo, integrá-la como um todo. Montes Claros transforma-se em uma sociedade
urbana, mas ainda com fortes características culturais rurais.
4.1.1- O Processo de Desenvolvimento do Município de Montes Claros
A ocupação do Município de Montes Claros ocorreu a partir da expansão
da pecuária extensiva, que desde os séculos XVI e XVII começou a subir o rio São
Francisco. As populações originárias do Nordeste do país e do Sul do Estado, que
procuravam possibilidades de fixarem propriedades e expandir a área de criação de
gado, encontraram condições satisfatórias na região.
A cidade surgiu como um povoado e se desenvolveu em torno de uma
capela de fazenda à margem direita do rio Vieira, entre os córregos Vargem Grande
e Lages. Tropeiros, mineiros e toda sorte de aventureiros percorreram aqueles
sertões em busca de riquezas sem fim. Logo, a Fazenda dos Montes Claros
transformou-se no maior centro comercial de gado, no Norte de Minas Gerais.
Em 13 de outubro de 1831, foi criada a “Vila das Formigas” e em 03 de
Julho de 1857, a vila foi elevada à categoria de cidade, recebendo o nome de
Montes Claros. A economia baseava-se, à época, na criação de gado para atender à
demanda dos distritos especializados na extração de ouro no Estado, estando os
mineradores sujeitos a preços elevados de alimentos, o que explica, em parte, a
constituição de grandes fortunas naquele período.
Diversos caminhos de tropas interligavam Montes Claros à região de
mineração e dirigindo-se até o Nordeste do país. Rota vital para escoamento da
produção, definindo a cidade, desde seus primórdios, como centro regional de
comercialização e de serviços para os fazendeiros da área. A unidade econômica
- 95 -ss
95
era a grande fazenda de criação, em condições de muita rusticidade. O principal
fator de produção, a terra, era livre e apropriável.
A elevação de Montes Claros como centro regional, aconteceu de
maneira gradual e em decorrência de alguns fatores ocorridos no século XIX: 1) O
afastamento do eixo econômico do “rio para o sertão”; 2) A estrada para a Bahia, 3)
As jazidas minerais descobertas em Itacambira, Leste de Montes Claros; 4) A
mudança de eixo econômico para o Rio de Janeiro e Zona da Mata, sendo que as
ligações eram feitas por Montes Claros. Nesse período, a base econômica do
município era a pecuária extensiva, as atividades da cana de açúcar e o algodão,
(OLIVEIRA, 2000).
No final do século XIX, a cidade
era “o principal centro urbano e
comercial” (OLIVEIRA, 2000:26). Sua primeira indústria foi instalada em 1882 e
contava com 72 teares, 127 operários e produzia 30 mil metros de tecido por mês, a
fábrica do Cedro. O telégrafo chegou logo depois da República, em 1892. No
começo do século já havia luz elétrica, jornais e mesmo um cinema.
Mas o maior incremento para as atividades econômicas e comerciais
acontece em 1926, com a chegada da ferrovia.”(...) para Montes Claros a chegada
das paralelas de aço e sua interrupção aqui, por quase 20 anos, consolidou em
definitivo sua posição de centro coletor regional e distribuidor de bens
importados.(...)”. (FERREIRA apud OLIVEIRA, 2000: 27).
A importância da cidade como centro comercial e de serviços passa a ser
reforçada também como centro industrial com a chegada da SUDENE. “É a cidade
centro, polarizadora de atração dos recursos de Minas Gerais, não é Belo Horizonte,
que fica fora da área de jurisdição da SUDENE, mas justamente Montes Claros”,
(ANDRADE, 1982:402).
O fato de encontrar-se a mais de 420 Km da capital Belo Horizonte e não
ter próximas outras cidades de porte médio favoreceu para que a cidade tornasse:
(...) um ponto de convergência de pessoas e mercadorias que, de uma área muito
extensa do Norte de Minas, demandam Belo Horizonte e, em menor escala, o Rio de
Janeiro e São Paulo, “(ANDRADE, 1982:398)”.
A SUDENE, Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, incluiu a
área do Polígono das Secas de Minas Gerais em sua jurisdição e, na década de 60,
- 96 -ss
96
abriu seu escritório em Montes Claros, estimulando a vinda de dezenas de empresas
para o município.
É em Montes Claros que se concentram os melhores indicadores de
qualidade de vida da região, embora ainda sendo uma área considerada
subdesenvolvida (considerando o IDH). Uma cidade que cresce demasiadamente
em função do deslocamento dos trabalhadores que, para seguirem a rota do sul do
país, passam por Montes Claros, e muitos ficam na cidade (Ver gráfico 2).
GRÁFICO-2 Evolução Demográfica de Montes Claros- MG
2000
1990
Zona rural
Décadas 1980
Zona urbana
Z
1970*
1960
Habitantes 0
50.000
100.000
150.000
200.000
250.000
300.000
350.000
Fonte: Secretária Municipal de Planejamento de Montes Claros- MG /Nov.2002
Os incentivos da SUDENE, através do FINOR/Fundo de Investimento do
Nordeste, transformaram o espaço de Montes Claros. A industrialização provocou
uma grande migração para a cidade. OLIVEIRA (2000), demonstra que a taxa de
urbanização em 1960 era de 40,66%, em 1980 chegava há 87,60%. No período de
1970 a 1996, a população urbana aumentou 297% e a população rural diminuiu em
59% (Ver Tabela 5). Os dados da TABELA 5 demonstram um crescimento da
população de Montes Claros superior ao da região norte-mineira, confirmando a
característica da cidade como recebedora de contingente de trabalhadores oriundos
de outros lugares.
- 97 -ss
97
TABELA 5
Evolução da População de Minas Gerais, RMNE e Montes Claros no
Período 1970/ 2000
ANO /
Período
MINAS GERAIS
RMNE
MONTES
CLAROS
% em relação % em relação a
a MG
RMNE
POPULAÇÃO
1970
MONTES CLAROS
11.487.415
693.912
116.486
1,0
12,0
Urbana
6.060.300
268.226
85.154
0,7
31,7
Rural
5.427.115
695.686
31.332
0,5
4,5
1980
13.378.553
1.111.255
177.308
1,3
15,9
Urbana
8.892.134
485.105
155.313
5,4
32,0
Rural
4.396.419
626.150
21.995
0,5
3,5
1991
15.731.961
1.338.659
249.565
1,5
18,6
Urbana
11.776.538
736.072
227.295
1,9
30,8
Rural
3.955.423
602.587
22.270
0,5
3,6
1996
16.598.852
1.387.180
271.608
1,62
19,57
Urbana
13.074.245
893.960
253.082
1,9
28,3
Rural
3.598.852
493.220
18.526
0,5
3,7
2000
17.835.443
...
306.730
1,72
Urbana
...
...
289.006
...
Rural
...
...
17.724
...
...
...
...
FONTE: IBGE- Censo Demográfico/adaptação da autora.
RMNE: Região Mineira do Nordeste
... símbolo utilizado por não dispor dos dados segundo FRANÇA,2001:94
Montes Claros faz ligação direta com a rodovia Rio-Bahia, com o Norte,
com o Sul, com o Centro-Oeste e Nordeste do Brasil. A cidade funciona como ponto
de chegada e partida, principalmente para os sertanejos migrantes do Norte da
região e do Sul da Bahia. A industrialização recente de Montes Claros, baseada em
unidades produtivas intensivas em capital e, portanto, pouco absorvedoras da mãode-obra existente (Tabela 7), proporciona a marginalização de um considerável
contingente populacional do processo industrial, forçando a baixa dos salários.
- 98 -ss
98
As indústrias aqui instaladas se consolidaram e, entre elas destaca-se a
maior fábrica de Leite Condensado do Mundo (NESTLÉ), uma das três fábricas de
insulina da América Latina (BIOBRÁS), uma das mais modernas fábricas têxtil
(COTENOR) e a quinta maior fábrica de cimento do Brasil (MATSULFUR).
TABELA 6
População ocupada por setores econômicos em Montes Claros/MG
1991
SETORES
Nº. de PESSOAS
Agropecuário
10.489
Industrial (1)
23.300
Comércio de Mercadorias
16.279
Transporte, Comunicação e Armazenagem
4.165
Outros Serviços (2)
40.685
TOTAL
94.918
Fonte: Fundação João Pinheiro/Centro de Estatísticas e Informações - CEI
(1) Inclui indústria de transformação, mineração, construção e serviços industriais de utilidade pública
(2) Inclui prestação de serviços, atividades sociais, administração pública e outras atividades
Aliado à industrialização, ocorre um processo de concentração fundiária,
que determina a desestruturação e, até mesmo, o desaparecimento da pequena
produção, proporcionando a expulsão do homem do campo e um intenso fluxo
migratório, com uma parcela considerável da população regional concentrando-se
em Montes Claros e pressionando a demanda por equipamentos e serviços sociais
básicos.
O
dados
do
Censo
Agropecuário
em 1996
verificou
que
dos
estabelecimentos rurais existentes em 1996, 1.466 propriedades, ou seja, 77,33%
são pequenas propriedades, ocupando uma área de 42.654 ha, equivalente a
19,77% da área total.
Por outro lado, 430 grandes produtores ocupam uma área de 173.039, ha
equivalendo a 80,23% da área total, sendo a média de área ocupada pelas grandes
propriedades acima de 100 hectares.
A ação do Estado incentiva a migração do homem do campo para a
cidade, uma vez que nela está a escola, o emprego, o médico, enfim a melhoria de
- 99 -ss
99
vida esperada27. Depoimentos de pessoas da família ou amigos que vieram para a
cidade, incentivam que novos migrantes também venham, fazendo com que haja
uma rede de informação que funciona também para receber em suas casas os
novos moradores e apresentá-los à cidade.
Em Montes Claros os migrantes rurais auxiliam na transformação do
espaço urbano, trazendo grande diversidade cultural, introduzindo costumes,
modificando valores, fazendo história, mas muitos permanecem às margens do
mercado de trabalho. Enquanto suas festas, danças e músicas são referenciadas e
aplaudidas pelas camadas dominantes da população, como nas famosas “festas de
agosto” com seus catopês, caboclinhos e marujos, os trabalhadores e trabalhadoras
rurais continuam servindo de reserva de mão-de-obra.
As empregadas domésticas que trabalham pela comida e moradia,
trabalhadores da construção civil com precárias condições de trabalho, são alguns
dos muitos exemplos encontrados em depoimentos de trabalhadores rurais no Posto
SINE de MOC.
Os trabalhadores rurais ficam também segregados espacialmente,
morando sempre nas periferias da cidade e em favelas com poucas condições
básicas de saúde e educação. Montes Claros, segundo dados da Prefeitura
Municipal, possui 23 favelas.
Algumas delas concentram maior números de migrantes rurais de acordo
com depoimento de funcionário da Secretária Municipal de Planejamento da
Prefeitura Municipal de Montes Claros. São elas: Vila São Francisco de Assis
(conhecida como Morro do Frade); Alto dos Morrinhos; Cidade Cristo Rei (conhecida
com Feijão Semeado); Vila Itatiaia; Santa Cecília; Vila Alice; uma parte do Chiquinho
Guimarães; Vila Santa Luzia (em baixo da ponte saída para BH); Uma parte da Vila
Mauricéia (em baixo da rede de transmissão da Cemig); Vila Castelo Branco (em
baixo da rede de transmissão da Cemig); uma parte do Bairro Major Prates (entre os
bairros Major Prates e São Geraldo).
27
O Censo demográfico de 2000 confirma que a taxa de alfabetização de Montes Claros é de 91%,
maior que do Estado de Minas Gerais que atinge 89,1%.
- 100 -ss
100
FIGURA 17 - Cidade de Montes Claros/Morro Dois Irmãos - Vista da Periferia
FONTE: Secretaria Municipal de Planejamento/Prefeitura de Montes Claros/maio-2002
4.1.2- A Trajetória da Migração para Montes Claros
O processo de urbanização regional teve início com a migração para o
Sudeste, especialmente para a cidade de São Paulo. No Norte de Minas Gerais, a
cidade de Montes Claros foi o espaço urbano que mais desenvolveu em decorrência
da migração para o Sul e da industrialização regional incentivada pelo Estado.
As migrações dos nordestinos para o Sudeste ocorreram principalmente
nas décadas de 1930 e 1940 de duas formas: 1º) através da “estrada líquida” ou
seja, o Rio São Francisco; 2º) através da cidade de Montes Claros que já era o
maior ponto de concentração de trabalhadores com destino ao Sul do país.
- 101 -ss
101
De acordo com o Boletim do Serviço de Imigração e Colonização de 1941,
os municípios de Urandi e Condeúbas, no Estado da Bahia, eram os principais
municípios que exportavam trabalhadores, principalmente, para São Paulo, através
de Montes Claros: ”(...) nesta cidade, não só se modificam os meios de locomoção,
como também o indivíduo migrante começa a receber a assistência por parte do
governo” (DANTAS, 1941:84).
O trabalhador que se deslocava para Montes Claros, partia de sua
localidade para uma outra próxima, onde se reunia com outros trabalhadores e
continuavam a viagem alugando caminhões para levá-los para a cidade.
A viagem era feita sempre de forma muito desagradável, tumultuada e
perigosa, conforme relatos da época. No trajeto costumavam pernoitar em barracões
rústicos. Nessa época, as migrações ocorriam com grupos numerosos de famílias.
Quando chegavam a Montes Claros, os migrantes ficavam em pensões, quartos
alugados ou mesmo sob copas de árvores, enquanto aguardavam a ida para São
Paulo.
Há casos ainda, especialmente em Montes Claros em que os trabalhadores
alugam por alguns tostões a sombra de árvores situadas nos quintais das
casas, afim de não ficarem inteiramente desabrigados,
(DANTAS, 1941:86).
As décadas de 1960 e 1970 foram marcadas pelas migrações para o Sul
do Brasil. O campo se esvaziou. Montes Claros, além de cidade-rota para a
migração, começa a receber também seus novos citadinos.
Já na década de 70, com os incentivos públicos, os empresários rurais,
impulsionados pela industrialização do campo, culpavam as leis trabalhistas pelo
esvaziamento do meio rural. Em reportagem à revista “Montes Claros em Foco”,
edição de novembro de 1979, o Presidente da Sociedade Rural de Montes Claros,
citava que o Estatuto do Trabalhador Rural dificultava e onerava para os fazendeiros
a colocação de trabalhadores, impossibilitando, assim, que os mesmos mantivessem
muitos trabalhadores.
“A maioria dos fazendeiros não tem condição de comprar trator e precisa
mesmo é de mão-de-obra humana. Se não consegue quem trabalhe, não
pode produzir. Entre correr o risco de perder a fazenda em causas
trabalhistas e não produzir, ele prefere a segunda opção, pois sempre resta
a alternativa de engordar bois, que necessita de pouca mão-de-obra”.
(Entrevista com o Sr.Saul Dias, Revista Montes Claros em Foco, edição de
novembro de 1979).
- 102 -ss
102
O relato de uma trabalhadora migrante28 demonstra que para os
fazendeiros, importa apenas a produtividade, daí o grande incentivo para aquelas
famílias que não possuem terra ou possuem pouca terra, desfazerem destas e
partirem rumo à cidade. O depoimento corrobora as dificuldades dos migrantes
rurais em viver em Montes Claros.
“Saímos da roça porque o patrão mandou, não precisava mais da gente, aí
viemos pra cidade, tentar.Meu marido tem problema de diabete, mancha na
coluna e desgaste de osso, ele não trabalha há 15 anos, e, eu vivo naquela
batalha; um dia tem faxina, no outro não tem. A gente passa aquela vida
difícil. Eu trabalho na feira livre, só no domingo”.
-Você vende uma coisinha lá, o que você faz?
“Eu vendo só tempero, corante, é o que eu trabalho, mas agora tem muita
concorrência e caiu muito a venda pra mim. Aí eu passo uma dificuldade
muito grande, às vezes esses meninos mesmo, a gente tem vontade de
ajudar, mas, a vida da gente é de muita baixa renda”.
-Quantos filhos você tem?
“São oito”.
- Oito? E netos você tem quantos?
“Neto são onze”.
E os filhos estão todos aqui em volta ou foram...
“Os meus filhos estão tudo aqui”
4.2– Quem são os Migrantes Rurais em Montes Claros: Marias, Josés,
Franciscos, Raimundos, Helenas...
A pesquisa de campo realizada com migrantes rurais no Sistema Nacional
de Emprego (Posto de Montes Claros) e com migrantes rurais ambulantes do
mercado informal, procurou traçar um perfil do sujeito social migrante oriundo do
meio rural, que busca inserção na cidade de Montes Claros. De acordo com a
análisedos dados da pesquisa verificou-se velhos preconceitos, novos paradigmas e
antigas e urgentes indagações. A esperança do trabalhador é pelo mercado formal,
embora a realidade seja sempre o mercado informal.
A maioria dos migrantes são da etnia negra ( Gráfico 3), sendo ainda
maior o número de homens,embora há um grande aumento de mulheres, (Gráfico
4). Entre os entrevistados muitos consideraram-se pardos e não, negros. Cerca de
35% consideraram-se negros e 34% consideram-se pardos. Sendo que 22%
declararam-se brancos. Pode-se verificar que há uma grande quantidade de negros
entre os que se consideraram pardos e brancos.
28
Depoimento de Maria Ferreira ao Programa da Tv Cultura –Caminhos e Parcerias, disponível em:
<www.tvcultura.com.br>. Acesso em: 20/06/2002.
- 103 -ss
103
GRÁFICO 3 – Origem Étnica do Migrante Rural em Montes Claros ( MG)
3%
AMAR E LA
6%
IN D ÍG E N A
34%
P AR D A
B R ANC A
22%
NE GR A
35%
FONTE:Pesquisa de Campo/Montes Claros(MG)-anos 2000/2001e 2002
São ainda maior número de homens considerados “chefes da família” que
continuam migrando e trazendo consigo filhos, companheiras e demais parentes
(Gráfico 4). Nota-se, entretanto, um aumento do número de mulheres que migram
para Montes Claros, sozinhas ou seguindo com filhos na busca de qualidade de
vida, são cada vez mais jovens. Os homens ainda são os que decidem a migração,
embora não venham sozinhos e sim acompanhados de suas famílias. Estabelecem
na cidade, com a esperança de emprego para todos os membros da família. As
filhas adolescentes são oferecidas para serem domésticas em casa de conhecidos
e os filhos são encaminhados para trabalhos de prestação de serviços no comércio
ambulante.
GRAFICO 4- Distribuição da População Migrante por Sexo-Montes Claros (MG)
42%
F E M IN IN O
M A S C U L IN
O
58%
FONTE: Pesquisa de Campo/Montes Claros(MG)- anos de 2000/2001 e 2002.
- 104 -ss
104
Os migrantes são influenciados por parentes e amigos para virem para a
cidade e ficam hospedados em barracões cedidos por conhecidos da família ou com
os próprios parentes(Gráfico 5). Quando começam a trabalhar ou arranjar algum
”bico”, alugam casas ou cômodos, conforme mostra os dados do Gráfico 5.
GRÁFICO 5- Forma de Moradia da População Migrante de Montes Claros(MG)
30%
46%
PRÓPRIA
ALUGUEL
9%
PARENTE
12%
FAVOR
IMPROVISADA
3%
FONTE: Pesquisa de Campo/Montes Claros(MG)- Anos de 2000/2001 e 2002.
As famílias migram completas (Gráfico 6), o que demonstra a vontade de
permanecer em Montes Claros. São famílias extensas, com média de 6 a 10
pessoas, compostas geralmente de pai, mãe, filhos e muitas vezes primos e
parentes mais velhos(avós e avôs).
GRÁFICO 6- Número de Pessoas da Família do Migrante Rural em Montes
Claros(MG)
- 105 -ss
105
55%
S E IS A D E Z
C I NC O
Q UA T R O
TRÊS
D O IS
18%
15%
3%
9%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
FONTE: Pesquisa de Campo/Montes Claros(MG)- anos de 2000/2001 e 2002.
As famílias têm em média, 4 a 6 filhos (Gráfico 7). São na maioria
crianças e adolescentes que não frequentavam a escola quando estavam no meio
rural ou então que deixaram de estudar.
A maioria dos migrantes rurais já possuiram terras anteriormente e, hoje,
não possuem casa própria na cidade, mas a quase totalidade dos entrevistados
possuem televisão e geladeira, o que demonstra a vontade de estabelecer relações
urbanas através daquilo que foi caracterizado nos depoimentos como “moderno e
desenvolvido”.
GRÁFICO 7- Percentual de Números de Filhos por Família de Migrante-Montes
Claros (MG)
40%
Q U A T R O A S E IS
15%
TR ÊS
12%
D O IS
UM
9%
N EN H U M
24%
FONTE: Pesquisa de Campo/Montes Claros(MG)- anos de 2000/2001 e 2002.
- 106 -ss
106
Quando perguntados sobre o rendimento mensal do entrevistado, o valor
médio é de 2 salários mínimos (Gráfico 8).
As pessoas moram em comodos
pequenos e dividem com outras famílias o local de moradia, pagam aluguel no valor
médio de R$100,00 (Cem Reais), mesmo quando em casas de parentes.
GRÁFICO 8- Rendimento Mensal do Migrante Rural por faixas de Sálario em
Montes Claros (MG)
3%
C I Minterior
A D E de
5 SMinas
M
Dos migrantes
entrevistados, a maioria éA do
Ge
40%
33%
9%
rais e do
15%
2 a 4 S .M
1 S .M
M E N O S D E 1 S .M
S E M S A L À R IO
FONTE: Pesquisa de Campo/Montes Claros(MG)- anos de 2000/2001e 2002.
Nota: Valor Médio do Salário Miníno:ano 2000=R$ 150,00;ano 2001=R$180,00
e ano 2002=R$200,00.
Dos migrantes entrevistados, a maioria vem do interior de Minas Gerais e
A faixa etária entre 20 a 40 anos, a maioria portanto não é aposentada,
(Gráfico 18). Os dados demonstram também que todos os entrevistados votam nos
municípios de origem, forma de voltarem ali e, geralmente, têm as despesas de
transporte pagas pelos
candidatos. Consideram
desemprego como o maior
problema do momento, tanto na cidade quanto no campo. E muitos acreditam que é
possível resolver este problema através de algum ”candidato amigo”.
GRÁFICO 09- Local de Moradia Anterior do Migrante Rural de Montes Claros
(MG)
- 107 -ss
107
13%
C ID AD E D E O UTR O
ESTAD O
MEIO R UR AL/O UTR O
ESTAD O
C ID AD E MG
3%
26%
23%
MEIO R UR AL MG
35%
MEIO R UR AL MO C
FONTE: Pesquisa de Campo/Montes Claros(MG)- anos de 2000/2001e 2002.
Os trabalhadores saem de seu lugar de origem e buscam permanecer em
Montes Claros, impulsionados pela urbanização rápida do município e o aumento no
campo de atividades agrícolas e não agrícolas proporcionadas por grandes
empresários rurais (Gráfico 9). Observa-se também que 61% dos migrantes tem
proviniência rural e 39% vêem de outras cidades. As novas atividades no rural
brasileiro ainda não fizeram grandes diferenças para os trabalhadores do campo,
que por não terem qualificação e nem recursos para arcarem com seus próprios
negócios acabam saindo do campo. Em alguns relatos dos migrantes rurais, há
sempre uma grande saudade do lugar de nascimento e poucas boas lembranças
dos lugares aonde já moraram por terem que migrarem sempre.
Dos migrantes pesquisados 82% são nascidos em Minas Gerais, grande
parte destes são de Montes Claros do meio rural, como mostra os dados do gráfico
10.
GRÁFICO 10- Local de Nascimento dos Migrantes Rurais em Montes
Claros(MG)
6%
DF/CEARÁ
SP
3%
9%
BA
40%
42%
MG
MG(MOC)
- 108 -ss
108
e
A maioria dos entrevistados já possuiu pequenas extensões de terra,
sendo que poucos os que mantém as propriedades,( Gráfico 11). Vendem a terra e
mudam para a cidade, pagando aluguel sem conseguirem conquistar moradia
própria no meio urbano.
GRÁFICO 11- Relação do Migrante com a Propriedade Rural em Montes Claros
(MG)
20%
9%
P ossui
Não
71%
Já P ossuiu
FONTE: Pesquisa de Campo/Montes Claros(MG)- Anos de 2000/2001 e 200
Os números demonstram que os migrantes rurais são sujeitos do campo,
que viviam da agricultura familiar e por falta de opção, deixaram o meio rural. Os
recursos financeiros conseguidos com a venda da terra são insuficientes para
comprar uma moradia na cidade e acabmam servindo para abertura de pequenos
negócios que sem a devida orientação encerram as atividades no primeiro ano de
funcionamento. Os que ainda possuem terras no campo são porque ainda mantem
alguém da família no lugar ou são herdeiros. Os que nunca possuíram terras sempre
viveram no meio rural trabalhando para terceiros e, hoje, na busca de mehores
oportunidades estão no espaço urbano.
- 109 -ss
109
GRÁFICO 12- Valor do Aluguel(em R$) pago pelo Migrante Rural em Montes
Claros(MG)
14%
58%
Até R$ 50,00
Até R$ 100,00
Até R$ 150,00
14%
Até R$ 200,00
14 %
FONTE: Pesquisa de Campo /Montes Claros(MG)- Anos de 2000/2001 e 2002.
Os trabalhadores do campo buscam em Montes Claros uma ocupação
profissional permanente. Depois de tantas idas e vindas pelas metrópoles, canaviais,
cafezais e em
municípios de outras regiões do país, esperam que em Montes
Claros não precisem continuar partindo, e sim estabeler relações permanentes.
Mas a escolaridade é um fator inibidor da entrada no mercado formal.
Segundo os depoimentos, 40% dos migrantes possui ensino médio e 30% possui
ensino fundamental incompleto (Gráfico 13). As informações demonstram que
muitos migrantes tentam conseguir alguma vaga de emprego simulando um grau de
escolaridade maior, principalmente aqueles que preenchem fichas no Posto do
SINE.
GRAFICO 13- Grau de Escolaridade do Migrante Rural-Montes Claros (MG)
A n a lf a b e to
18%
N ív e l F u n d a m e n ta l C o m p le to
6%
30%
40%
6%
N ív e l F u n d a m e n ta l
In c o m p le to
N ív e l M é d io C o m p le to
N ív e l M é d io In c o m p le to
FONTE: Pesquisa de Campo /Montes Claros(MG)- Anos de 2000/2001 e 2002.
FONTE: Pesquisa de Campo/Montes Claros(MG)-Anos de 2000/2001 e 2002.
- 110 -ss
110
A tentativa de melhorar a vida na cidade faz com que os migrantes
procurem na religião um elo para conseguir enfrentar as perversas condições de
vida. Os dados mostram que a maioria dos migrantes são católicos, embora venha
crescendo o número de evangélicos(Gráfico 14). Quando vindos diretamente do
meio rural permanecem na religião católica. O credo, independemente de qual seja,
acaba sendo um apoio para os momentos de desesperança. Muitos depoimentos de
migrantes rurais que mudaram de religião acreditam que em razão dessa mudança
encontraram empregos.
Os católicos sentem maior resignação e são os que mantem maiores
laços culturais com suas crenças e ritos. Dentre aquels quee mudam de religião
alguns viram pastores e fazem disto sua profissão.
GRÁFICO 14- Religião do Migrante Rural-Montes Claros(MG)
E V A NGÉ LIC O
15%
OUTRA S
10%
C A TÓLIC O
69 %
C A ND OM B LÉ
6 %
Fonte: Pesquisa de Campo/Montes Claros (MG)- Anos de 200/2001 e 2002.
“O Viver na cidade não é fácil”, esta é uma afirmativa dos entrevistados,
mesmo com todas as promessas, penitências e devoções aos Santos, o emprego
continua sendo o maior problema enfrentado em Montes Claros. Sentem muita
insegurança em função dos locais de moradia e acreditam que a violência e todos os
demais problemas são frutos da falta de emprego.
GRÁFICO 15- Principal Problema Enfrentado na Cidade pelo Migrante RuralMontes Claros (MG)
24%
S E GURA NÇ A
- 111 -ss
111
De acordo com as entrevistas realizadas e dados coletados e analisados,
o que se verificou é que o migrante rural em Montes Claros, em sua maioria, possui
as seguintes características:
é negro, sem escolaridade básica, geralmente
proveniente da região-o Norte de Minas e geralmente já havia migrado antes.
Exemplo é o relato da “Dona Helena”, negra, mãe de 8 filhos, residente na
Vila Castelo Branco, periferia de Montes Claros, com 38 anos, está na cidade há 6
meses e ainda não conseguiu nenhum “bico”. O marido está na construção civil em
obra de “particular”. O rendimento mensal da família é de R$150,00 ( Cento e
cinquenta reais), conforme depoimento:
“O homem tira 100 reais na obra, e a minha menina mais véia(sic) de 14
anos mora na casa de uma dona lá de nosso município(São João do
Paraíso) aqui num bairro bom e uma vez por mês traz 50 real(sic). Prá ela tá
bom, tá estudando, tem, comida. A preocupação minha é com os outros
que tão pequeno não dá ainda prá trabalhar, mas tem dois que já tão na
praça pedindo.(...) A gente quando veio prá cá tinha fé que tudo ia ser
melhor. Deus ajuda. Os vizinhos ajuda. Pelo menos de fome aqui a gente
não morre. Lá na roça, o homem já tinha ido prá São Paulo, umas seis
vezes, mais nunca voltava com nada, então resolvemos vim todo mundo,
não sei se é pior ou meior, só sei que tô viva.”
4.3- O Acréscimo de Mulheres e Jovens na Migração para Montes Claros
Dentre os entrevistados, pelo menos o chefe da famiíia já havia migrado
pelo menos uma vez, ou com toda a familia, ou com algum membro da família. Um
aspecto interessante nas informações colhidas é que muitas mulheres já haviam
migrado sozinhas, deixando os filhos e companheiros para trás, a fim de trabalhar
por período determinado em casas de famílias, principalmente nas cidades de São
Paulo, Belo Horizonte e Brasília.
- 112 -ss
112
O motivo das mudanças anteriores sempre foi a busca por trabalho
temporário. Mas, quando questionados sobre o motivo de mudança para Montes
Claros, a resposta, em sua maioria, é a busca de trabalho permanente.
GRÁFICO 16- Número de Migrações Anterior à Montes Claros(MG)(Últimos 5 anos)
A c im a d e T rê s V e z e s
20%
TRÊS
27%
D UA S
19%
34%
UMA
FONTE: Pesquisa de Campo/Montes Claros(MG)- Anos de 2000/2001 e 2002
Os dados comprovam a grande evasão da população do meio rural para a
cidade, causando um processo que Abramovay (2000) chamou de “desruralização
da população”. No Norte de Minas, a consequência deste processo é o aumento do
número de mulheres e jovens nas áreas urbanas e a crescente masculinização do
meio rural.
Este dado
que não
é exclusivo da região norte-mineira,
vem
acentuando-se nas úlltimas décadas na região. O rejuvenescimento dos migrantes
rurais confirma à hipótese de que os programas rurais não têm contribuído para a
permanência dos jovens no campo. A falta de expectativas no meio rural faz com
que cada vez mais jovens deixem o campo. As atividades agrícolas e não agrícolas
são preenchidas por pessoas do meio urbano que vão para o campo e as vagas
menos especializadas são geralmente oferecidas aos homens.
- 113 -ss
113
GRÁFICO 17- Principal Motivo de Mudança dos Migrantes Rurais para Montes
Claros(MG)
Busca por condições de
saúde/educação
Trabalho temporário
5%
Influências de familiares/amigos
10%
Melhoria de vida
15%
Trabalho permanente
30%
40%
FONTE: Pesquisa de campo realizada entre 2000/2001 e 2002
Historicamente o estudo do êxodo rural demonstra, com Ravenstein, que
são os homens que partem para trabalhar fora. Mendras, citado por Abramovay
(1999), explicita vários exemplos na Europa, onde o êxodo rural
tem sido
compreendido como um movimento fundamentamente masculino. Abramovay(2000),
estudando o fenômeno migratório brasileiro, levanta três hipóteses para os
deslocamentos de mulheres e jovens para o meio urbano: 1) As migrações
relacionadas com a oferta de trabalho em residências e no setor de serviços; 2) As
mulheres jovens deixam a casa paterna no meio rural, procurando independência
econômica e sendo estimuladas pela própria familia; 3) Valorização do movimento
migratório das mulheres para a cidade para estudar em relação aos homens:
Dados da Cepal, mostram que o Brasil rural 55% dos rapazes tem menos
de quatro anos de estudo. A precariedade da situação educacional das
moças tambem é grave, mas menos que a dos rapazes: 42% das jovens
têm menos de quatro anos de estudo. Para que se tenha idéia da posição
- 114 -ss
114
do Brasil na América Latina quanto a este aspecto, no Chile apenas 5% dos
rapazes (4% das moças) estão nesta situação e mesmo no México as cifras
são bem menos graves que no Brasil :27% dos rapazes e 21% das moças.
(ABRAMOVAY,1999:14).
GRÁFICO 18- Faixa Etária dos Migrantes Rurais em Montes Claros(MG)
6%
10-14 anos
6%
15-19 anos
14%
20-24 anos
21%
25-29 anos
23%
30-39 anos
40-49 anos
19%
50-59 anos
5%
60 anos acima
6%
FONTE: Pesquisa de campo realizada entre 2000/2001 e 2002
O considerável número de jovens no meio urbano, reforça a falta de
expectativas no meio rural e a ansiedade por melhores condições de saúde e
educação, principalmente, no meio urbano( Gráfico 17). Ressalta-se que muitos são
os jovens que estão chegando à cidade de Montes Claros e aqui constituem família
muito cedo, demonstrando a falta de condições de educação e consequentemente
de informações sobre educação sexual. A s hipoteses estudadas por Abromovay
são confirmadas também no sertão das Gerais.
Esses “jovens, que não se limitarão a representar “os jovens”, mas que se
tornarão adultos, que envelhecerão se suas vidas lhes proporcionar vida,
terão que carregar, como todo ser humano, o peso cada vez maior dos dias
futuros.(...) Que podem esperar eles do futuro? Como será a sua velhice,
se chegarem até lá?
(FORRESTER,1997: 58)
- 115 -ss
115
4.4- Política Pública de Emprego do SINE: Posto de Montes ClarosA Expectativa de Trabalho!
O Posto do SINE/Moc, de acordo com dados fornecidos pelo próprio
órgão, no período de 1995-2000 (Ver gráfico 19), registrou uma grande procura de
trabalhadores rurais e urbanos em busca de trabalho, embora o órgão não tenha
conseguido colocações para a maioria dos inscritos.
O número de inscritos em 2000 no SINE, foi de 6.134 pessoas, sendo que
apenas 265 pessoas foram colocadas no mercado formal de trabalho. Entre 19952000, houve um aumento do número de trabalhadores que se inscreveram em
busca de colocações e também aumentou consideravelmente o número de
requerentes de seguro-desemprego e procura pela emissão de carteira profissional.
O número de vagas teve um crescimento lento, embora não houvesse nenhum
crescimento no número de colocados. No período de janeiro de 2001 a dezembro de
2002, o SINE/Moc inscreveu 22.347 trabalhadores, captou 2.220 vagas e colocou
654 trabalhadores no mercado de trabalho, conforme o Quadro 2.
QUADRO 2Atendimento do Posto do SINE em Montes Claros (MG)
Período: 01/01/2001 a 31/12/2002
Total de Trabalhadores Incluídos:
22.347
Total de Retornos ao Posto (Atendimentos):
15.198
Total de Convocações:
Total de Encaminhamentos:
Total de Colocações:
Total de Requisições de Seguro Desemprego:
176
5.748
654
8.610
- 116 -ss
116
Total Geral de Trabalhadores no Cadastro:
22.371
Total de Vagas Captadas:
2.220
Total de Atendimentos:
37.545
Fonte: Posto de atendimento do SINE/Montes Claros- Janeiro de 2003.Pesquisa de Campo-Anos
2000/2001 e 2002
A demanda por serviços no meio urbano tem aumentado, mas os dados
de emprego do SINE demonstram a falta de eficácia e eficiência do programa, que
funciona com recursos do trabalhador. Nota-se que
entre 1995 a 2002 as
propostas de integração entre inscrição, colocação, qualificação não se efetivaram,
sendo que os trabalhadores tornam-se pessimistas e desmotivados a procurar vagas
através do Sistema Nacional de Emprego.
GRÁFICO 19- Principais dados sobre o Atendimento de Pessoas no Posto
SINE/MOC(MG)-Período1995-2000
10.000
8.000
INSCRITOS
6.000
VAGAS
4.000
COLOCADOS
ENCAM INHADOS
2.000
REQUERENTES
0
CTPS
1995 1996 1997 1998 1999 2000
Fonte: Dados SINE- Montes Claros(MG)-.Novembro de 2002.
O objetivo da política de enfrentamento do desemprego, através de um
conjunto de ações preventivas e alternativas, não tem sido eficaz para a maioria dos
trabalhadores. Em relação aos trabalhadores oriundos do meio rural a situação é
- 117 -ss
117
ainda pior. Não existem dados, nem ações especificas, que possam auxiliá-los na
inserção no mercado de trabalho urbano.
GRÁFICO 20- Opinião do Migrante Rural sobre o Atendimento no Posto do
SINE de Montes Claros - MG
16%
b o m e r e s o lv e
46%
b o m , m a s n ã o r e s o lv e
3%
p é s s im o
35%
Pr o c u r o u p e la 1 ª v e z
FONTE: Pesquisa de Campo/Montes Claros(MG)- Anos de 2000/2001 e 2002.
Os trabalhadores, ao procurarem o Posto do SINE, esperam encontrar
colocações e cursos de qualificações, mas na realidade encontram um local onde as
expectativas não se tornam realidade. Mas continuam sempre indo ao SINE, na
esperança de qualquer emprego. Não reclamam do atendimento, mas não
conseguem resolver o problema do emprego,( Gráfico 20). Não mudam mais de
cidade, mas percorrem todos os dias o SINE na esperança que “quem sabe hoje
aparece alguma coisa”.
GRÁFICO 21- Frequência dos Migrantes Rurais no Posto do SINE/Montes
Claros(MG)- Período de 2000/2001 e 2002
Duas vezes
Três a dez
Acima de vinte
Uma vez
Nunca visitou
- 118 -ss
118
A política pública de emprego e renda não consegue reveter o quadro de
inserção no mercado de trabalho dos migrantes rurais; sendo também não
satisfatória para
a maioria dos
trabalhadores inscritos no programa. As
oportunidades de emprego
oferecidas não condizem com a qualificação dos trabalhadores rurais e os cursos
oferecidos também são dificéis e acabam não inserindo os trabalhadores rurais.
GRÁFICO 22- Oportunidade de Empregos oferecidas pelo SINE/MOC(MG)
38%
Nenhuma
34%
Apenas uma
28%
Nunca procurou o
SINE para emprego
0%
10%
20%
30%
40%
FONTE: Pesquisa de Campo/Montes Claros9MG)-Anos de 2000/2001 e 2002.
A falta de dados oficiais no SINE sobre a população migratória impede a
inserção dos trabalhadores rurais no mercado de trabalho formal. O Estado não
consegue operacionalizar o Sistema
para a qualificação e colocação dos
trabalhadores.
Os dados oficiais do Posto do SINE em Montes Claros demonstram que
no período de 2001/2002, do total de inscritos, 45 % são mulheres, na faixa etária
- 119 -ss
119
entre 18 a 29 anos. Dos que tem 2º grau completo, 57% são mulheres, sendo que
apenas 45% do total possuem 2º grau completo.
Embora as mulheres tenham escolaridade mais elevada, as vagas
oferecidas são, em sua maioria, para os homens. As vagas mais ofertadas surgem
do setor de comércio.
Em entrevista à analista de planejamento e gerente do Posto do SINE em
Montes Claros, ficou constatada que a falta de informações sobre a população
migrante rural faz com que o mesmo não seja prioridade para política pública de
emprego e renda:
“O SINE – Sistema Nacional de Emprego, programa do
Ministério do Trabalho e Emprego, mantido com o recurso do FAT – Fundo
de Amparo do Trabalhador, em Minas Gerais está vinculado a SEDESESecretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Esportes (antiga
SETASCAD), é hoje uma das políticas públicas mais importantes do país: A
POLÍTICA DO ENFRENTAMENTO DO DESEMPREGO”.
Essa política tem como objetivo amenizar os efeitos do
desemprego, como também tentar a (re) colocação do trabalhador no
mercado de trabalho e/ou criar alternativas para os trabalhadores
desocupados, criando um conjunto de ações preventivas, uma vez que não
basta conceder o benefício do Seguro-Desemprego, mas é preciso, com os
mesmos recursos facilitar o acesso dos trabalhadores ao emprego e à
renda, retirando do benefício qualquer conotação paternalista.
Em resposta a essas atribuições, o SINE disponibiliza,
gratuitamente, os seguintes serviços: Intermediação de Mão-de-obra;
Seguro-desemprego; Qualificação Profissional; Emissão de Carteira
Trabalho; Geração de Emprego e Renda, Tele-atendimento 0800 para
informações ao trabalhador.
Em Montes Claros, No período de maio/2001 a
dezembro/2002, no SINE/Montes Claros inscreveram 24.122 trabalhadores
a procura de emprego, o SINE captou 2.220 vagas e colocou 654
trabalhadores no mercado de trabalho.
Verificamos que do total do número de inscritos 45% são de
mulheres e a faixa etária predominante é de 18 a 29 anos.
Observamos também que somente 45% do total de trabalhadores
inscritos tem o 2º grau completo e, deste total 57% é do sexo feminino.
Constatamos que a maioria das vagas ofertada foi para o sexo
masculino, o que dificultou a colocação de um número maior de mulheres
no mercado de trabalho, neste período, apesar de estarem elas com a
escolaridade mais elevada.
Isto significa que as mulheres estão buscando seu espaço no
mercado de trabalho, e para tanto, melhoraram o seu grau de escolaridade,
mas o mercado continua tendencioso ao sexo masculino, talvez em função
dos tipos de vagas ofertadas.
Notamos que há uma urgente necessidade de se avaliar a questão dos
trabalhadores advindos do interior, para que se possa traçar uma política
específica de atendimento e acompanhamento dos trabalhadores rurais
migrantes para intermediação deste, ao trabalho e ao programa de
qualificação profissional, visto que a maioria dos cursos demandados no
- 120 -ss
120
município, não atendem esta clientela, e que nosso programa não possibilita
o levantamento e avaliação dos dados da procedência, e dados
quantitativos destes trabalhadores.
(Entrevista com a Gerente do Sistema Nacional de Emprego-Posto de
Montes
Claros em janeiro de 2003).
4.5- A Integração dos Migrantes Rurais no Mercado de Trabalho: As
Possibilidades!
Mas integrar-se a quê? Ao desemprego, à miséria?
a rejeição? Às vacuidades do tédio, ao sentimento
de ser inútil ou até mesmo parasita? Ao futuro sem
projetos? Integrar-se!
(...) Integrar-se a essa ordem que, de ofício, nega todo
direito ao respeito?
(...) aos pobres seja concebida vida de pobre, interesses
de pobre(isto é,nenhum interesse) e trabalhos de pobre
(se houver trabalho)?
FORRESTER,1997:59)
A migração representa para os trabalhadores a possibilidade de melhoria
de vida. Com a falta de oportunidades no campo, o migrante espera na cidade pela
integração no processo de trabalho urbano. A pesquisa demonstrou que os
familiares ajudam o migrante a estabelecer os primeiros contatos com a cidade, o
lugar para ficar, os principais pontos urbanos.
Porém, a permanência na cidade está sempre condicionada a “conseguir
logo um jeito de ganhar a vida”. Em Montes Claros, percebe-se que os migrantes
chegam já dispostos a permanecer, independemente de colocações. Os
depoimentos mostram que a maioria deseja retornar ao meio rural, mas na
impossibilidade preferem ficar em Montes Claros. Muitos continuam a seguir a rota
da migração para São Paulo e outras regiões por tempo determinado e depois
retornam à Montes Claros.
A justificativa dessa vontade de permancer na cidade, dá-se muito em
função da migração acontecer com toda a família, além do fato da cidade estar
situada em sua região. Outro fator é a desilusão com os grandes centros.
Não diferente de outras cidades, as principais ocupações encontradas
pelos trabalhadores oriundos do campo acontecem no setor terciário, embora a
expectativa dos mesmos é sempre pelo trabalho fabril.
- 121 -ss
121
As modificações no trabalho fabril e a falta de qualificação dos
trabalhadores dificultam a inserção no mercado de trabalho.
O migrante recém-chegado procura rapidamente algum curso de
qualificação que possa auxiliá-lo na busca por colocações, independemente de qual
seja.Quando questionado sobre qual colocação gostaria de obter, geralmente não
sabe responder.
Grande parte dos trabalhadores entrevistados desconhecem as leis
trabalhistas e quais os empregos
possivéis de
conseguir. O estudo realizado
comprovou que aos migrantes rurais são direcionadas as piores vagas de trabalho,
sem carteira assinada e na marginalidade ocupacional. Os homens conseguem
vagas, geralmente de vigias, frentistas e sitiantes e as mulheres, de domésticas e
babás.
O trabalhador que procura o SINE encontra como benefício um local onde
se emite carteira de identidade e carteira de trabalho, documentos necessários para
o reconhecimento legal do cidadão, e que muitos migrantes rurais ainda não
possuem. Mas, quanto ao sistema ocupacional, continua a dificuldades e
diferenciações entre os trabalhadores rurais e os trabalhadores urbanos.
“Nós temos que lutar muito”, diz uma migrante rural no Posto do SINE,
que todos os dias procura qualquer vaga de trabalho. Há dois meses ela não
trabalha. Veio do meio rural de Quanambi(BA) trabalhar como doméstica, mas nunca
recebeu nenhum salário pela alegação que o salário era a alimentação,
hospedagem e material escolar. Resolveu sair do “emprego” depois que conheceu
uma outra migrante e passou a dividir com ela um pequeno cômodo na periferia da
cidade. Aos 22 anos pretende se formar em auxiliar de enfermagem, está cursando
o ensino fundamental e tem “lavado umas trouxas de roupas” para “ganhar algum”.
Quando questionada se voltaria a viver no campo, a resposta é imediata: “não, lá a
gente não cresce, aqui tem muita labuta, mas acredito que vou ter uma vida melhor
que da minha mãe”.
A pesquisa de campo revelou que
60% dos migrantes rurais
entrevistados voltariam a morar no campo porque sentem como o “seu lugar.”29 “Por
29
Todas expressões em itálico são depoimentos de migrantes rurais no Posto do SINE- Montes
Claros, como também na Praça Dr. Carlos e em algumas favelas da cidade.Entrevistados durante a
pesquisa de campo.
- 122 -ss
122
causa da tranquilidade”. “Porque a vida piorou depois que veio para cidade” e
“porque na roça as pessoas são mais amigas”.
O restante que não voltaria para o meio rural (40 %), acha que a vida
está melhor em Montes Claros, já que todos tinham migrado antes e afirmam que
no campo “pior estava” e que na cidade “pelo menos aparece um bico para fazer” e
“para quem não exige, sempre tem algum serviço.”
A escolha pela cidade de Montes Claros é totalmente em função da
busca de trabalho em consequência de que “não tinha mais terra para plantar”. O
“trabalho na roça acabou”, “ir prá São Paulo, Uberlândia ou interior de São Paulo é
duro demais, tem gente que volta doente e uns que até morre por lá mesmo,”
“muitos da família já tinham vindo e melhoram muito,” “as indúsrtrias ainda podem
empregar muito.” O “atraso da roça é grande, só na cidade a vida pode ser boa,
ainda mais quando é uma cidade nossa, aqui do sertão mesmo”.
Os trabalhadores do campo expressam a profunda discriminação que
sentem na cidade em relação aos trabalhadores urbanos. “O preconceito contra
gente é muito, tenho até vergonha de falar que vim da roça, mas parece que tá na
nossa cara”. A falta de escolaridade e qualificação profissional é identificada por
eles como forma de discriminação: “Quando a gente chega aqui no SINE, ninguém
pergunta o que nós gostaríamos de aprender, quem sabe se eles escutassem a
gente a coisa melhorava. Eu sei fazer doces, é gostoso, mas não fica muito bonito.
Queria aprender mais”, (Mulher, 23 anos, migrante do meio rural de Salinas -MG).
A esperança na melhoria de vida através da integração com o mercado
do trabalho na cidade de Montes Claros é motor que move famílias rurais para o
meio urbano.
O estar na cidade não significa participar da cidade. O sair do campo,
não significa abandonar a miséria e sim falta de oportunidades.
Existem também relatos de pessoas bem sucedidas em Montes Claros
que foram migrantes rurais, conseguiram principalmente através do setor de serviços
em pequenos e médios negócios a “sonhada melhoria de vida”. Mas a maioria dos
trabalhadores rurais ainda vivem em condições de trabalho injustas e informais. O
SINE ao não conhecer a origem
e realidade dos migrantes rurais acaba
- 123 -ss
123
diferenciando os mesmos dos trabalhadores urbanos, embora o discurso oficial diga
que a “intencão é igualar todos os trabalhadores “.
Os migrantes rurais, quando mais jovens, não querem ser os
trabalhadores que foram seus pais e sabem que não o serão nunca. A vinda para
cidade, pretende deixar o “trabalho bruto” por um “trabalho melhor”, o que significa
estar “fora da roça”.
Ainda não há integração do migrante rural com o mercado de trabalho
formal, mas os trabalhadores já não querem continuar migrando, preferem ficar em
Montes Claros, pois na medida em que cada vez mais se abrem às fronteiras, mais
se produzem territórios, mais as relações sociais de produção também ficam mais
desiguais.
Para aqueles, cujo poder de aporte de investimentos na maioria das
vezes significa apenas a venda da força de trabalho, a migração é uma estratégia,
uma resistência, uma eterna possibilidade ou impossibilidade de ficar ou sair. Não
querem mais o “vôo das andorinhas” (MARTINS: 2000), isto é, na construção de
diferentes territorialidades nacionais, ficar indo e vindo não tem melhorado a
situação das famílias rurais, em um mundo cuja concepção corrente o trata como
cada vez mais desterritorializado e sem fronteiras. Mundo que desata referências e
reconstroem outras e, juntamente com elas, desata famílias e indivíduos que muitas
vezes são sua única referência.
Como o sertão é grande...Viver é muito perigoso..Querer o bem com demais
força, de incerto jeito, pode já estar sendo se querendo o mal, por principiar.
Esses homens! Todos puxavam o mundo para si, para o concertar
concertado. Mas cada um só vê e entende as coisas dum modo.(...).Sempre
nos gerais, é pobreza, à tristeza. Uma tristeza que até alegra. Mas, então,
para uma safra razoável (...) reconselho de o senhor entestar viagem mais
dilatada. Não fosse meu despoder (...) aí eu ia. Eu guiava o senhor até tudo.
(GUIMARÃES ROSA,1986:p.17 e 496).
- 124 -ss
124
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Que pena que tenho dele! Ele era um camponês
Que andava preso em liberdade pela cidade.
Mas o modo como olhava para as casas,
E o modo como reparava nas ruas,
E a maneira como dava pelas pessoas,
(...) E de quem desce os olhos pela estrada por onde vai andando.
(...) Por isso ele tinha aquela grande tristeza.
Que ele nunca disse bem que tinha,
Mas andava pela cidade como quem não anda no campo
E triste como esmagar flores em livros
E por plantas em jarros...
30
Fernando Pessoa/Alberto Caeiro
Este estudo analisou as migrações internas no Norte de Minas Gerais,
especificamente para a cidade de Montes Claros e a possibilidade de integração dos
trabalhadores rurais no mercado de trabalho nesta cidade. O mercado formal de
trabalho foi investigado, através da Política Pública de Emprego do Sistema Nacional
de Emprego-SINE/Posto de Montes Claros e as estratégias de introdução, colocação
e qualificação dos trabalhadores rurais no mercado de trabalho.
O mercado informal foi estudado através da aplicação de questionários
semi-estruturados e entrevistas com migrantes rurais ambulantes que trabalham na
Praça Dr. Carlos, constatando-se que, em sua maioria, os trabalhadores não são os
proprietários das bancas, mas prestam serviços para terceiros, que são médios e
grandes comerciantes.
Fica evidente que as relações de trabalho no meio rural são muito
menos antagônica do que às relações na cidade. A necessidade de sobrevivência
no meio urbano envolve opções, adaptações que quase sempre levam à submissão,
o que significa uma dependência direta com os mais variados processos de
produção do capital.
30
PESSOA, Fernando. Poesia/Alberto Caeiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
- 125 -ss
125
A opção de migrar para Montes Claros, um centro de serviços da
região Norte-Mineira, tem como principal motivo à possibilidade de ocupação com o
mercado de trabalho formal ou informal. A mobilidade social é a grande esperança
dos oriundos do campo na procura de um lugar de destino.
Os “antigos tempos”, como caracterizado nos depoimentos dos
trabalhadores, são retratados como tempos de fartura, de “boa vida”, de muita terra
e de “prato cheio”; o campo era o tempo anterior do passado. A cidade era local para
“fazer a feira” e, de vez em quando, para “ir ao médico” ou ver “novidades”. Os
espaços rurais e urbanos eram completamente separados, caracterizados e
delimitados.
“São tempos que não voltam. Hoje a gente vem, sabe onde termina a
cidade. A roça acho que nem existe mais. Pelo menos, aquela com gado,
comércio, professora. E minha família toda junta, criando galinha, porco,
fazendo queijo, plantando roça. Quando a seca vinha, sempre tinha um
patrão para empregar a gente como peão. Agora, tudo é máquina”.
Depoimento de um trabalhador rural, ao preencher o cadastro para emprego
no Posto do SINE-Moc.
As atividades de produção no tempo antigo eram caracterizadas como
atividades de subsistência e possibilidade de permanência no campo. As relações
de trabalho relatadas não se baseavam apenas nas leis de mercado. As ações
econômicas dos indivíduos baseavam-se também em trocas entre as famílias,
parentes, vizinhos, imbricando valores de cooperação, solidariedade e reciprocidade.
Os dias de hoje, como muitos chamam o presente, são “outros tempos”. De
acordo com os depoimentos dos trabalhadores já “não existe nenhuma”
possibilidade de permanecer no meio rural. A década de 60 e posteriores até 90
demonstraram grandes investimentos públicos na mecanização do campo, nos
projetos de grandes irrigações e reflorestamento, que expulsa as famílias de
pequenos produtores, trabalhadores do campo.
Os enfrentamentos desta perversa realidade foram vivenciados pelos
pequenos agricultores e trabalhadores rurais, através de uma primeira estratégia: a
migração sazonal. Os canaviais e cafezais no interior de São Paulo e Triângulo
Mineiro e as grandes construções nas metrópoles foram à forma encontrada pelo
chefe da família de “buscar dinheiro”, e depois retornar. Tal estratégia pode ser
definida como forma de resistência dos trabalhadores e vontade de permanecer no
campo e de permanecer rural.
- 126 -ss
126
As migrações sazonais sempre foram muito prejudiciais aos trabalhadores
que enfrentavam e, muitas vezes ainda enfrentam, péssimas condições de trabalho,
transporte e remuneração. Os intermediários, os chamados “gatos”, buscavam e
buscam ainda os trabalhadores e estes são iludidos com oportunidades de salário
que depois não se comprovam. Os meses entre abril e dezembro são os mais
comuns deste tipo de fenômeno migratório na região.
O movimento de retorno, iniciado na década de 90, de forma lenta, com a
volta dos trabalhadores das grandes capitais, aumentou as migrações intraregionais. A estratégia das migrações sazonais não conseguiu impedir a
industrialização rural, consequentemente, a população rural continuou a se deslocar
para as cidades. As migrações de retorno aumentaram, comprovadas pelo censo
2000, mas devem ser entendidas, pelo menos, em relação a este estudo, como um
movimento populacional de retorno à região e não necessariamente aos municípios
de origem.
Durante a pesquisa, em vários depoimentos, “os novos tempos”. como
também é chamado o presente, são “tempos ruins”, de pouca esperança, onde “não
é possível viver no campo”.
“A terra acabou, não dá para plantar, os fazendeiros empregam pouco,
dinheiro não tem quase nenhum, falta de tudo um pouco, o jeito é ir embora,
sair para fora (sic) em direção da cidade, sei lá o negócio é não morrer de
fome”.
(Depoimento de migrante rural, no Posto do SINE).
De acordo com os depoimentos colhidos e a análise dos dados da
pesquisa, constatou-se a intensa expectativa dos que acabam de chegar em Montes
Claros: a esperança de dias melhores sempre através do emprego. Em relação aos
que já estão na cidade há mais tempo, existe uma acomodação com a situação de
informalidade do mercado de trabalho. Não existem mais expectativas com as
políticas públicas de emprego e não existem mais esperanças de melhoria de vida.
Alegram-se em sobreviver, vivem um dia por vez, procuram biscates que promovam
o “sustento” do dia. Apostam as esperanças nas gerações futuras, nos filhos e
parentes mais novos.
O momento atual é representado pela saída do campo de toda a família.
São homens e mulheres do meio rural que estabelecem residência em Montes
- 127 -ss
127
Claros, sem pensar no retorno ao campo ou aos pequenos municípios de origem.
Não pretendem mais seguir migrando, mesmo com todas as dificuldades ainda
preferem permanecer, “pelo menos”, dentro da própria região.
O “tempo de hoje” mantém em todos os migrantes uma característica das
migrações sazonais e do tempo de antigamente: a intensa vontade de continuar
juntos pela unidade familiar. Antes, o tempo de presença se dava com o retorno
das migrações sazonais. Hoje, o tempo de presença é possibilitado pela migração
em família para Montes Claros.
A “dura realidade da vida” permanece no espaço urbano, mas os
trabalhadores rurais mantêm fortes laços com a cultura regional, com as crenças e
com o parentesco.
A urbanização e industrialização são processos ligados ao crescimento,
desenvolvimento, produção econômica e com toda a vida social. São processos que
estão permanentemente ligados e são ao mesmo tempo conflituosos. A realidade
urbana é totalmente diferente da realidade industrial. Índices de crescimento
econômico, taxas de produção e produtividade se chocam com índices de
desenvolvimento humano e taxas de criminalidade, pobreza e miséria.
Em suma, as migrações campo-cidade para Montes Claros analisadas, neste
estudo, comprovam algumas características básicas:
1) A cidade é a que mais atraí população, ao mesmo tempo ainda é
grande o número de pessoas que deixam o espaço urbano
temporariamente em função de trabalhos em outras regiões;
2) O
aumento
significativo
do
número
responsáveis pela família revelam
de
mulheres
migrantes
velhas formas de relações de
trabalho, baseadas no pagamento através de moradia e comida,
corroborando a hipótese da trajetória das famílias camponesas como
segregadas no espaço, nas periferias e favelas e, também, com
poucas chances de mobilidade social;
3) A crescente migração de retorno concentra-se nos trabalhadores rurais
na faixa de idade adulta jovem, sendo menor nas faixas de idade mais
avançada;
- 128 -ss
128
4) A maioria dos migrantes rurais são da própria região, que não vem
apenas do meio rural, mas também do meio rural dos municípios
vizinhos, além dos Estados geograficamente mais próximos, como o
caso da Bahia;
5) A mecanização do campo, incentivada pelas políticas públicas, foi
causa principal da migração do campo para a cidade de Montes
Claros, município que recebeu incentivos do Estado para a sua
industrialização e que promoveu rápida urbanização;
6) A falta de políticas propriamente voltadas para os trabalhadores
oriundos do campo faz com que os migrantes continuem segregados
no espaço urbano e na possibilidade da mobilidade social;
7) O Posto do Sine-Moc não diferencia os trabalhadores rurais dos
urbanos, não havendo estatísticas em relação aos mesmos quanto ao
Mercado de Trabalho: Portanto, implementa os mesmos cursos de
qualificação para heterogênea população à procura de trabalho. Os
migrantes rurais concorrem às mesmas vagas com total desvantagem
em escolaridade e qualificação profissional.
8) As vagas mais conseguidas pelos migrantes rurais na faixa de idade
adulta jovem, através do SINE-Montes Claros, são para mulheres, de
empregadas domésticas, babás e, para os homens, frentistas de
postos de gasolina, segurança do comércio local e sitiantes.
“Sertanejos, mirem e vejam o sertão é uma espera enorme”, dizia
Guimarães Rosa, comprovam os migrantes rurais em Montes Claros. O Estado,
através de políticas públicas, como o Sistema Nacional de Emprego, não conseguiu
diminuir as disparidades entre trabalhadores rurais e urbanos, muito menos integrálos no mercado de trabalho. O próprio Estado ”empurra” os migrantes para outros
municípios ou regiões através de recursos públicos como passagens, hospedagens
temporárias, etc.
“Ninguém quer mendigos ou biscateiros em nossa cidade, então auxiliamos
com a passagem para que eles continuem viajando. Às vezes não temos
passagem para a cidade que ele quer ir, então encaminhamos para uma
·”.
próxima.
- 129 -ss
129
Depoimento de funcionária do SINE/MOC em dezembro de 2002.
Este constante movimento populacional encontra, na cidade de Montes
Claros, a possibilidade de permanecer, de fixar, de “parar” de andar “sem rumo”. A
expectativa fica nos tempos de hoje, no dia-a-dia, nas idas e vindas ao Posto do
SINE, em busca de colocações.
A desruralização continua marcando o território norte-mineiro, sendo
necessário compreender que o discurso de “fixação do homem no campo”, necessita
de reformulações. A grande porcentagem de jovens e mulheres migrantes
caracteriza a necessidade de construir, no campo, alternativas de condições de vida
básicas em relação à saúde, educação, lazer e, principalmente, integração
econômica, através de atividades agrícolas e não agrícolas.
E necessário insistir que as atividades não-agrícolas não têm sido suficientes
para absorver todo o excedente de mão-de-obra disponível no meio rural, o que se
comprova pela quantidade crescente de pessoas desempregadas. As atividades
rurais não-agrícolas não são preenchidas “automaticamente” pelos trabalhadores
agrícolas que são desempregados pela crescente mecanização. Pelo contrário,
grande parte das novas atividades agrícolas, assim como a maioria das atividades
não-agrícolas, exigem níveis de qualificação e capacidade de empreendimento que
estão muito distantes do perfil dos desempregados rurais que antes se ocupavam
em atividades agropecuárias.
Por fim, concordando com os pesquisadores Mauro Eduardo Del Grossi,
José Graziano da Silva e Clayton Campanhola, é fundamental insistir na proposta
de que além de políticas de qualificação e requalificação de mão-de-obra rural, há
um grande espaço para políticas que estimulem o “empreendedorismo” das
populações locais para abrirem seus próprios negócios.
Ampliar chances de melhoria de vida no campo como um espaço que
desperte nos jovens o interesse de realizar seus projetos de vida, possivelmente
será a alternativa viável para a diminuição dos problemas urbanos e rurais,
garantindo que as famílias tenham o direito de escolher não migrar e\ou de
retornarem ao meio rural.
O meio rural está cada vez mais em contato com o meio urbano. Assim,
necessário se faz que esta proximidade seja entendida pelo Estado, através de
políticas públicas de interação que agreguem o tecido social existente.
- 130 -ss
130
As políticas de fixação do homem no campo, as políticas de emprego e
renda sem definições de prioridades e as diversidade dos trabalhadores, tornam
necessário o aprofundamento do conhecimento sobre as condições de vida das
famílias oriundas do campo que sobrevivem na cidade.
O enfrentamento desta perversa realidade das famílias migrantes rurais
em Montes Claros, conseqüência da histórica política governamental, só será
possível através da viabilização de políticas de desenvolvimento sustentável,
direcionadas para uma autêntica reforma agrária, com terra e condições para
produzir e comercializar.
A grande concentração de terra inviabiliza a permanência no campo das
famílias de pequenos agricultores, transferindo as mesmas para a cidade que não
tem condições de recebê-las. O sertanejo da região Norte Mineira almeja a terra,
mas as políticas públicas aliadas aos grandes complexos agroindustriais inviabilizam
a permanência no meio rural de milhares de famílias do campo, que sem alternativa
continuam “correndo trecho”, esperando, procurando a Melhoria de Vida.
Dos vários depoimentos colhidos no campo, talvez a melhor frase resuma
esta situação e pesquisa:É dona, de esperança a gente veve, de expectativa não.
A esperança de melhoria de vida, título deste trabalho, traduz em longa
espera de homens e mulheres no espaço urbano, na busca da reconstrução de suas
vidas, enquanto camponeses que foram, agora como cidadãos urbanos. A
esperança aqui foi utilizada através da formulação feita por José Souza Martins,
onde esperança não é apenas a possibilidade de consumo ou de privilégios, mas a
consciência social, crítica que construa condições sociais dignas através do esforço
de todos e não apenas de alguns.
É a integração com o mercado de trabalho o maior anseio dos
trabalhadores. É o trabalho, o fator que devolveria a auto-estima, o resgate da
cidadania. Por enquanto, ainda é uma expectativa que move uma esperança em
direção a Montes Claros.
Como dizia Guimarães Rosa: “é preciso sair do sertão, mas só se sai
do sertão, tomando conta dele adentro”. Que os migrantes rurais consigam sair
do sertão da miséria, que leva à expulsão do campo das famílias de trabalhadores
rurais, ao preconceito e condições perversas de trabalho na cidade sobre os que são
oriundos do meio rural e que tomem conta do sertão através da dignidade, das
- 131 -ss
131
possibilidades de acesso ao emprego, à educação, a terra, à saúde. Enfim, que não
sejam trabalhadores sem rumo, indo e vindo, mas que encontrem o lugar de destino,
onde almejam, dentro da sua região, preservando a cultura, a unidade familiar e o
principal: "a ter melhoria de vida”.
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- 140 -ss
140
7- ANEXOS:
ANEXO A –
Álbum de Fotografia: Diferentes origens, desejos, colocações; Partilha da
Sobrevivência dos Migrantes na Cidade de Montes Claros (MG)
ANEXO BQuestionário Utilizado na Pesquisa de Campo
ANEXO CTexto/Depoimentos de funcionários em relação ao SINE
ANEXO DFigura 28- Estado de Minas Gerais-Microrregião Geográficas do Norte de Minas e
Localização do Município de Montes Claros
ANEXO EFigura 29 -Região Mineira do Nordeste- ADENE/2003
- 141 -ss
141
ANEXO A-
ALBUM DE FOTOGRAFIAS:
Diferentes origens, desejos, colocações:
Partilha da Sobrevivência.
- 142 -ss
142
FIGURA 19- Esperança! Chegada de uma migrante
rural em Montes Claros (MG).
FONTE: Foto da autora/Fevereiro/2002.
- 143 -ss
143
FIGURA 2020- Expectativa.Trabalhadora a procura por trabalho
em Montes Claros (MG)
(MG
FONTE: Foto da autora/fevereiro/2002
- 144 -ss
144
FIGURA 2121- O Posto do SINE em
em Montes Claros (MG)(MG)A Busca pelo trabalho.
FONTE: Foto da autora/maio/2002.
- 145 -ss
145
FIGURA 22- A realidade: O mercado informal de
trabalho em Montes Claros (MG)
FONTE: Foto da autora/maio/2002.
- 146 -ss
146
FIGURA 23-Viver na Cidade; Migrante Rural,
moradora de Favela em Montes Claros (MG).
FONTE: Fotografia da autora/junho/2002.
- 147 -ss
147
FIGURA 2424- Viver na Cidade: aspectos de segregação sóciosócioespacial na cidade de Montes Claros (MG).
FONTE: Foto da autora/junho/2002
- 148 -ss
148
FIGURA 2525-A Pesquisa no Posto do SINE/Montes
Claros.(acadêmica do curso de Geografia da UnimontesUnimontesentrevistando migrante do meio rural de Montes Claros, que
reside a 06 meses na cidade e vivendo de ”favor dos parentes”
conforme suas palavras).
Fonte: Foto da autora, maio/2002
- 149 -ss
149
FIGURA 2626- Entrevistador Tarcísio Lopes Lessa (acadêmico curso de
Geografia), ao lado de um migrante rural em Montes Claros
(MG)
FONTE: Foto da autora/ junho/2002.
- 150 -ss
150
FIGURA 2727- O Shopping Popular,Local projetado para agregar os “camelôs” que
são na maioria migrantes rurais na Praça Dr.Carlos em Montes
Claros (MG).
FONTE: Fotografia da Assessoria de Comunicação da
Prefeitura Municipal de Montes Claros/maio/2002.
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dissertação prof. andrea narciso - LAGEA