REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
INSTITUCIONAL
EDITORIAL
DIRETORIA
Presidente: Ronaldo Fredolino Wendland
Vice-Presidente: Hordi Felten
1ª Secretária: Lurdi Bender
2º Secretário: Mara Tesche Meincke
1º Tesoureiro: Valdemar Blum
2º Tesoureiro: Flávio Fleck
CONSELHO FISCAL
Laudomir Lampert
Ivo Novotny
Dalva Lenz de Souza
Nelsi Eichelberger
CONSELHO DELIBERATIVO
Ernani Krause
Ronald Kirchhof
Erni Drehmer
É TEMPO DE LEITURA,
PALAVRA, EDUCAÇÃO...
As novas tecnologias, sem dúvida, ampliam
possibilidades e renovam as mentes das
pessoas. As instituições de ensino, entre elas a
SETREM, desenvolvem seu trabalho somando
conteúdo com as transformações do mundo.
Através de ações, estudos, pesquisas,
publicações, atividades e serviços propõem o
rompimento das fronteiras do conhecimento e
discussões acerca da realidade, assim como a
melhor maneira de participar da comunidade
local e regional com olhos voltados para o futuro.
Diretor geral – Flávio Magedanz
Vice-diretor Faculdade Três de Maio – Paulo
Renato Manetzeder Aires
Vice-diretora Centro de Ensino Médio – Zenaide
Tesche Heimerdinger
A diversidade dos artigos desta revista nos
remeta para tal. Todos eles frutos de muita leitura,
pesquisa e busca pelo novo, mas sempre com o
propósito de contribuir para o crescimento das
pessoas. Novas posturas diante de temas tão
conhecidos, como o uso do livro didático de
matemática. Ou então a perturbadora pergunta
pela situação e destino dos idosos. Estes, e
outros assuntos são tema e desafio nas páginas
seguintes.
Conselho Editorial: Adalberto Lovato, Cláudia
Verdum Viegas, Cristiano Henrique Antonelli da Veiga, Fauzi
de Moraes Schubeita, Gilberto Souto Caramão, Jorge Antônio
Rambo, Liane Beatriz Tesche Roedel, Mário Luiz Santos
Evangelista, Rafael Marcelo Soder, Renata Amélia Roos,
Roque Ismael da Costa Güllich, Valmir Heckler, Vera Lúcia
Lorenset Benedetti, Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber
e Zenaide Heinsch
É desejo que a leitura dessa edição permita
ao leitor conhecer melhor os trabalhos realizados
por professores e estudantes, enfim
pesquisadores, da SETREM, possibilitando
desta forma, participar do debate acerca dos
temas propostos.
Comissão Científica Interna (avaliadores):
Ms Adalberto Lovato, Ms Cláudia Verdum Viegas, Ms
Cristiano Henrique Antonelli da Veiga, Ms Evandir Bueno
Barasuol, Ms Fauzi de Moraes Schubeita, Ms Gilberto Souto
Caramão, Dr Mário Luiz Santos Evangelista, Ms Rafael
Marcelo Soder, Drdo Roque Ismael da Costa Güllich, Ms
Valmir Heckler, Ms Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber,
Ms Vera Lúcia Lorenset Benedetti e Ms Zenaide Heinsch.
Flávio Magedanz
Diretor Geral / SETREM
Comissão Científica Externa (avaliadores)
Ms Tagli Dorval Mairesse Mallmann - FGV, Dr Carlos
Ricardo Rossetto – UNIVALI (SC), Dr Sedinei Nardelli Beber
– PUC/RS, Dra Cláudia Regina Bonfá – UFSC (SC), Dra
Soraia Napoleão Freitas – UFSM (RS), Dra Olgamir
Francisco de Carvalho – UNB (DF), Dra Cristiane Koehler –
FATEC SENAC (RS), Dr João Bosco Mangueira Sobral –
UFSC (SC), Dra Marlene Gomes Terra – UFSM (RS) e Ms
Vera Lúcia Fortunato Fortes – UPF (RS).
Capa e Diagramação: Assessoria de Comunicação SETREM
Revisão: Carla Matzembacher
Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Revista SETREM: Revista de Ensino e Pesquisa/
Sociedade Educacional Três de Maio
Três de Maio: Editora SETREM.
Publicação Semestral
1
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
ADMINISTRAÇÃO
A INOVAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS EM GESTÃO
EDUCACIONAL: O CASO REDE SINODAL DE EDUCAÇÃO ....................... 4
Mário Luiz Evangelista
André Sträher
ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE AS ABORDAGENS DA INOVAÇÃO
DISRUPTIVA E A ESTRATÉGIA DO OCEANO AZUL .................................. 12
Luis Carlos Zucatto
ESTUDO DO POTENCIAL DE MERCADO DE UMA EMPRESA NO RAMO DO
COMÉRCIO E DISTRIBUIÇÃO DE PRODUTOS DE BELEZA .................... 21
Cristina Schmitz
Elisandro Ferretti Berti
Jesildo Moura de Lima
Jorge Antonio Rambo
Sandro Ergang
EDUCAÇÃO
ANÁLISE DO LIVRO DIDÁTICO DE MATEMÁTICA UTILIZADO EM ESCOLAS
PÚBLICAS .................................................................................................... 29
Elizangela Weber
ANÁLISE PSICOSSOCIAL DOS ENCAMINHADOS PARA ATENDIMENTO
CLÍNICO PSICOLÓGICO DA DEMANDA ESCOLAR .................................. 39
Renata Amélia Roos
Taiana Elise W. Sperotto
AS TEORIAS EDUCACIONAIS E SUA RELEVÂNCIA NO PROCESSO DE
PRODUÇAO DO CONHECIMENTO ............................................................ 47
Adriane Helena Dutra Quaresma
Elisandra Rasia
Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber
ENTRE A ARMA E O SOFRIMENTO PSÍQUICO: CARTOGRAFANDO
TERRITÓRIOS POLICIAIS .......................................................................... 54
Fábio Parise
Carmen S. de Oliveira
REFORMAS UNIVERSITARIAS EN VENEZUELA ...................................... 64
Cátia Raquel Felden
Francesca Sacco Oviedo
Williams V. Aguilera
2
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
SAÚDE
DOAÇÃO DE ÓRGÃOS: POSICIONAMENTO DE ESTUDANTES DE ENSINO
MÉDIO ......................................................................................................... 75
Daiana Polippo
Dalva Maria Pomatti
Helenice de Moura Scortegagna
Vera Lucia Fortunato Fortes
PERFIL DA POPULAÇÃO VÍTIMA DE ACIDENTE DE TRÂNSITO: UM OLHAR
SOBRE O JOVEM NESTE CONTEXTO ...................................................... 81
Carlos Eduardo Hermann
Rafael Marcelo Soder
Andréa Regina Nagorny
RECREAÇÃO NA TERCEIRA IDADE:
DIFERENÇA PARA UMA VIDA SAUDÁVEL ................................................. 92
Daiane Zambon
Seloi da Rosa Weber
Rafael Marcelo Soder
UM ESBOÇO CURRICULAR DO ENSINO
DE ENFERMAGEM NO BRASIL .................................................................. 99
Gilmara Vessozi
Roque Ismael da Costa Güllich
Gilberto Souto Caramão
A CONTRIBUIÇÃO DOS ENFERMEIROS PARA O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE
NAS UNIDADES BÁSICAS DE SAÚDE ...................................................... 110
Seloi da Rosa Weber
Mirian Herath Rascovetzki
3
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
A INOVAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DE
COMPETÊNCIAS EM GESTÃO EDUCACIONAL: O
CASO REDE SINODAL DE EDUCAÇÃO
Mário Luiz Evangelista 1
André Sträher 2
adopted, and to the procedures, bibliographical research
and study of case. The results had been of that the
education institution conceives as an “alive company”, for
preserving its values and the professional ethics. Thus,
the pertaining to school manager, will be prepared to learn
to innovate, managing changes, a time that to construct
the direction of the change of collective and gradual form
is one of the requirements for the survival, maintenance
and development of the Educational Institutions. The new
paradigms defy the managers to demonstrate to new
abilities, adapted its profile, becoming them capable to
face the complexity of the environment and promoting the
culture of the learning and the innovation.
RESUMO
O presente estudo apresenta a intersecção entre
princípios pedagógicos, administrativos e os fundamentos
de uma gestão adequada às escolas que integram a Rede
Sinodal de Educação. Concebe a instituição escolar como
uma organização aprendente, como lócus privilegiado do
desenvolvimento de competências gestoras através da
reflexão sobre a práxis no diálogo entre os pares. Neste
trabalho, adotou-se uma abordagem metodológica
qualitativa e, quanto aos procedimentos, pesquisa
bibliográfica e estudo de caso. Os resultados obtidos foram
de que se conceba a instituição de ensino como uma
“empresa viva”, por preservar seus valores e a ética
profissional. Assim, o gestor escolar estará preparado para
aprender a inovar, gerindo mudanças, uma vez que construir
o sentido da mudança de forma coletiva e progressiva é
um dos requisitos para a sobrevivência, manutenção e
desenvolvimento das Instituições Educacionais. Os novos
paradigmas desafiam os gestores a demonstrarem novas
competências, adaptando seu perfil, tornando-os capazes
de enfrentar a complexidade do ambiente e promovendo a
cultura da aprendizagem e da inovação.
Key-words: Development of Abilities - School
management -; Organizational learning.
1. INTRODUÇÃO
As últimas duas décadas têm se caracterizado por
mudanças estruturais que demandam reformas
significativas nas instituições particulares de ensino. Essas
alterações dizem respeito à forma administrativa e também
na garantia da formação acadêmica que capacite os
estudantes a enfrentar com criatividade e espírito
empreendedor os problemas cada vez mais complexos da
sociedade.
Palavras-Chave:
Desenvolvimento
de
Competências; Gestão Escolar; Aprendizagem
Organizacional.
ABSTRACT
As mudanças de ordem social são marcadas por
uma forte tendência à adoção de concepções e práticas
interativas, participativas e democráticas. Não apenas a
escola desenvolve esta consciência, mas também a
sociedade cobra uma maior participação na definição das
políticas escolares, na elaboração de seu projeto
pedagógico e no estabelecimento de alianças e parcerias.
As mudanças de ordem econômica, por sua vez, também
apresentam um cenário desafiador para o futuro destas
instituições. Em um mercado potencial retraído, cresce, a
cada dia, a pressão por menor preço e maior qualidade.
This study presents the intercession between
pedagogical, administrative principles and the beddings
of an adequate management to the schools that integrate
the Rede Sinodal de Educação. It concedes the school
institution is as an organization learning, as local privileged
of the development of managing abilities through the
reflection on the practice in the dialogue between the pairs.
In this work a qualitative methodological approach was
1 Doutor, Faculdade Três de Maio – SETREM - Três de Maio – RS – Brasil. Universidade Regional do Noroeste do Estado do RS – UNIJUÍ
- Brasil
2 Especialista, Faculdade Três de Maio – SETREM. Três de Maio – RS – Brasil
4
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Nesse sentido, as instituições particulares
comunitárias de ensino no Brasil, em geral, conviveram
durante certo tempo com um confortável ambiente nãocompetitivo. A partir da década de 90 o mercado
educacional entrou em crise pela oferta excessiva e
acentuada queda da demanda. Os estabelecimentos
particulares gaúchos, por exemplo, perderam em torno de
15% das matrículas para as escolas públicas entre os
anos de 1996 e 2002 (CRUZ e COPETTI, 2003). Esta queda
deve-se ao fato de que a escola particular atende às
retraídas classes média e alta, do ponto de vista de poder
aquisitivo, que vêm mostrando mudanças no padrão de
comportamento. Fatores como redução no número de
filhos, realocação de moradia e incorporação de outros
hábitos que implicam gastos concorrentes ao investimento
na escolarização dos filhos afetam diretamente o setor
privado da educação básica. Soma-se a estes fatores a
melhoria na qualidade de ensino nas escolas públicas e
as novas instituições que surgiram no segmento
educacional, gerando um ambiente de competitividade.
em termos de possibilidades gerenciais, analisando os
fatos e fenômenos que ocorrem em seu ambiente de
trabalho.
A pesquisa realizada na Rede Sinodal de Educação
também se caracteriza com estudo de caso, pois, para
Yin (2005, p. 42), os estudos de casos apresentam cinco
componentes fundamentais para a realização de um projeto
de pesquisa, como: as questões de estudo; as proposições
se houver; a(s) unidade(s) de análise; a lógica que une
dados às proposições e os critérios de interpretação das
constatações. Assim, como se classifica como exploratória
e bibliográfica quanto aos objetivos propostos.
3. REFERENCIAL TEÓRICO
A tradição educacional evangélico-luterana, da qual
a Rede Sinodal de Educação é herdeira, tem sua origem e
sua orientação no movimento filosófico-teológico
reformatório de Martin Lutero no século XVI. Desde o início
da obra reformatória, o professor, a educação, e a escola
estão presentes nas preocupações de Lutero com o
objetivo de propor um acesso mais amplo da sociedade e
de promover mudanças na educação. Em alguns de seus
escritos, Lutero conclamou as pessoas e o poder público
a criarem e manterem escolas, assim como incentivou os
pais para que mandassem seus filhos à escola (LUTERO,
2000).
Diante deste cenário cambiante, apresentam-se
novos desafios ao gestor escolar que requerem uma
análise aprofundada de questões fundamentais, como
forma de conceber a escola, seu paradigma de gestão e a
continuidade de sua formação e qualificação profissional.
Este artigo tem como foco a inovação e o desenvolvimento
de competências gerenciais no âmbito das escolas
comunitárias-confessionais que integram a Rede Sinodal
de Educação, tendo como característica um estudo de
caso, de uma Instituição de Ensino que atua nos níveis
infantil, fundamental e médio, cuja denominação doravante
será Escola “A”. Este trabalho tem como objetivo investigar
a relação entre a inovação nas instituições escolares que
integram a Rede Sinodal de Educação e o desenvolvimento
das competências de seus gestores a partir da reflexão
sobre sua práxis.
A partir de 1824, os imigrantes germânicos que
foram trazidos para o então denominado, Império do Brasil,
com a finalidade de colonizar as terras do sul, construíram
as primeiras escolas comunitárias luteranas, em vista da
ausência de escolas públicas. A generalização da escola
pública já era uma realidade em algumas nações da
Europa, enquanto que no Brasil inexistiam. A necessidade
de construir e manter escolas eram uma demanda de
preservação da bagagem cultural germânica tão importante
quanto a língua e a religião.
Normalmente nas instituições de ensino, encontramse gestores que têm por formação básica o magistério, a
pedagogia ou a licenciatura. Embora ser professor não seja
uma função exclusivamente pedagógica, ser gestor exige
algumas competências e habilidades distintas daquelas
que são necessárias para o exercício do magistério, não
de natureza, mas de grau. Por não se perceberem como
gestores, muitos continuam a preocupar-se prioritariamente
com a continuidade de sua formação pedagógica, pois não
refletem sobre sua práxis gerencial e não buscam
qualificarem-se como gestores educacionais.
Para continuarem a atender o seu propósito, as
escolas comunitárias, então categorizadas pelo Estado
como particulares, passaram a oferecer um currículo mais
extenso do que a escola pública. Além de atenderem a
base curricular comum, ofereciam disciplinas que
valorizavam a cultura religiosa, atividades esportivas e a
sensibilização para as artes. Voltadas para a capacitação
de lideranças comunitárias e integradas à comunidade civil
e religiosa na qual estão inseridas. Cada uma destas
escolas confessionais luteranas desenvolveu sua autogestão e uma identidade pedagógica própria, atenta às
necessidades do seu meio.
2. METODOLOGIA
Neste trabalho, adotou-se por uma abordagem
metodológica qualitativa, a partir da corrente teórica
fenomenológica, visto que o objeto de estudo é o processo
de formação de gestores educacionais e sua implicação
com a práxis destes sujeitos em suas funções gerenciais.
O texto é apresentado na forma de discurso argumentativo
por serem os dados empíricos restritos à memória das
reuniões da Equipe Diretiva da escola “A”. Nesta
abordagem, o pesquisador percebe a realidade que o cerca
Atualmente 57 destas escolas comunitárias
luteranas integram a Rede Sinodal de Educação e atendem
a cerca de 30 mil alunos. Unidas na diversidade, estas
escolas mantêm viva a filosofia e a ética luterana nas
localidades onde atuam, conforme descritos no documento
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Princípios Pedagógicos da Rede Sinodal de Educação
(2005b).
entidade e pouco desejo de dar tudo de si em prol da
empresa.
Também é marco da identidade desta rede de
escolas, os princípios expressos no 5º Plano de Trabalho:
“autonomia; conhecimento; ética; busca da excelência;
humildade; abertura ao novo; solidariedade e referencial
luterano” (Rede Sinodal de Educação, 2005a, p. 9).
Mas, em uma ampla pesquisa em que Geus realizou
pela Schell em 1983 (Geus, 1998) descobriu que a
expectativa média de vida destas organizações é muito
curta porque diante das crises se faz necessário um alto
grau de inventividade, capacidade de mudança,
flexibilidade, motivação e coesão. Estes elementos
inexistem em trabalhadores que não criam uma forte
identificação com a empresa.
A dinâmica intensa da realidade social e as
transformações do cenário da educação demandam um
modelo renovado de escola particular e um novo perfil de
gestores. A demanda por desenvolver outras competências
entre os gestores de escolas está intimamente ligada à
leitura do contexto atual e a concepção de escola, visto
que a gestão de uma escola pode ser desenvolvida de
forma distinta de acordo com a concepção de organização
da qual partilha a alta direção. Ou, como afirma Lück, (2000,
p. 14), onde “... a escola e seus dirigentes se defrontam
com a necessidade de desenvolver novos conhecimentos,
habilidades e atitudes para o que não dispõem mais de
modelos e sim de concepções”.
Já na empresa viva os propósitos são a longevidade
e o desenvolvimento do potencial da organização. A
rentabilidade é um meio para se chegar a um fim. Na
pesquisa mencionada, Geus (1998) destaca quatro fatores
principais em comum nas empresas que sobreviveram mais
de cem anos: sensibilidade ao ambiente, coesão e
identidade, tolerância e descentralização e
conservadorismo financeiro.
Como em todos os organismos, a empresa viva
existe, primeiramente, para procurar sua própria
sobrevivência e desenvolvimento, para realizar seu potencial
e crescer o máximo possível. Ela não existe unicamente
para fornecer produtos aos clientes ou para dar retorno de
investimento aos acionistas. A rentabilidade é sintoma de
saúde corporativa, não um indicador ou um determinante
desta saúde. O retorno sobre o investimento continua
sendo importante, mas os gerentes vêem a otimização do
capital como complemento da otimização das pessoas. A
empresa em si é, principalmente, uma comunidade de
pessoas.
O caráter empresarial das instituições de ensino
tem sido discutido com freqüência nas escolas particulares
comunitárias brasileiras. Enquanto algumas instituições
buscam aprender novos modelos de gestão, marketing e
ferramentas estratégicas, outros negam com veemência
olhar a escola como uma empresa prestadora de serviços
educacionais. Esta persistente resistência em aceitar e
legitimar a visão de escola enquanto organização inserida
em um mercado competitivo pode estar relacionada com
a concepção de empresa construída no imaginário da
comunidade escolar, em especial dos docentes. Partindo
do pressuposto de que a escola precisa perceber-se como
uma empresa para que possa perpetuar-se na atual
conjuntura econômica e social, é de fundamental
importância que uma pergunta seja respondida: Qual
concepção de empresa é adequada às escolas
particulares confessionais e, em especial, às que integram
a Rede Sinodal de Educação?
O que as pessoas realmente desejam em seus
locais de trabalho é ver que o resultado de suas decisões
e esforços teve um impacto positivo, na manutenção da
ordem, da qualidade e dos propósitos da organização, não
sendo tratadas apenas como “mãos” ou “cérebros” a serviço
da rentabilidade da empresa. Esta perspectiva reflete
significativamente no entendimento da função dos gestores.
Pois, como afirma Bergamini (1994, p. 22): “liderar é, antes
de mais nada, ser capaz de administrar o sentido que as
pessoas dão àquilo que estão fazendo” .
Nesse sentido, buscou-se embasamento sobre tipos
de empresas e verificou-se em Geus (1998), que existem
fundamentalmente dois tipos de empresas, distinguíveis
por sua principal razão de existir: as empresas econômicas
e as empresas vivas.
O estabelecimento escolar é um lugar de construção
do sentido das práticas profissionais e de suas eventuais
transformações. Cada escola tem sua própria atmosfera,
possui um clima que é reflexo de sua cultura, como
expressão dos valores coletivos. Por isso, organizar uma
ação eficaz e intencional no estabelecimento escolar é
considerar sua cultura, a maneira como os habitus são
orquestrados, a forma como os atores percebem a
realidade, reagem à organização, aos acontecimentos, às
palavras e às ações, interpretam-nas e lhe dão sentido.
O primeiro tipo de empresa é regido por um propósito
puramente “econômico”: gerar o máximo de resultados com
o mínimo de recursos. Gerenciadas em função do lucro,
neste tipo de empresas as pessoas são vistas como
“ativos” e o investimento nelas é mantido no nível mínimo
para gerar o maior retorno possível no mais curto espaço
de tempo. Os empregados são recrutados por suas
qualificações e trocam seu tempo e preparo por dinheiro.
As pessoas se percebem como acessórios da máquina
de gerar riquezas para um pequeno grupo de indivíduos, o
que promove pouca lealdade para com a empresa como
Segundo Thurler (2001, p.89), a cultura de uma
organização pode ser definida em termos de
“conhecimentos socialmente compartilhados e transmitidos
daquilo que é e deveria ser”. Já Schein (1982, apud
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Lacombe e Heilborn, 2003) define cultura organizacional
como padrão de suposição e valores básicos de um
determinado grupo que aprende e repassa os
ensinamentos aos novos membros da equipe, como forma
de perceber, agir e pensar em relação aos problemas.
mudança e o conhecimento como fator crucial de produção
e de desenvolvimento de qualquer sociedade. No ambiente
de negócios, a migração de um mundo dominado pelo
capital para um mundo dominado pelo conhecimento
explica o interesse pela aprendizagem organizacional que
tem emergido entre as empresas nos últimos anos.
Sua construção é inconsciente e é transmitida,
muitas vezes, de modo involuntário e implícito. É como
um iceberg, pois apenas uma pequena parte é tangível,
simbolizada por meio de atos e produtos, bem como
ocorrem nas interações mediadas pela linguagem: a
maneira como as pessoas falam de seu mundo, do que
falam e não falam, com quem e onde falam.
Segundo Drucker (2001), o conhecimento formal é
visto tanto como recurso pessoal fundamental, quanto
econômico. Ao tomar o lugar do capital como fator escasso
de produção, o conhecimento passou a ser a chave do
sucesso corporativo. O conhecimento que antes era
aplicado a ferramentas, a processos, a produtos e ao
trabalho humano, passa a ser aplicado ao próprio
conhecimento e à inovação sistemática.
A cultura pode ser explicitada por meio de códigos
de ética, declarações de princípios, credos ou,
simplesmente, por meio do conjunto das políticas e normas
da organização. Quando se explicita a cultura, tem-se uma
cultura oficial, que são os valores e os ideais estabelecidos
pela alta administração, os quais podem coincidir ou não
com o que é praticado.
Assim, Geus (1998) propõe que, para restabelecer
a harmonia com o mundo externo, as empresas precisam
adaptar-se ao novo cenário, fazer mudanças fundamentais
e contínuas em suas estruturas internas.
Ao apresentar a aprendizagem sob a perspectiva
de adaptação, harmonia ou sintonia a uma realidade
mutante, Geus (1998) concebe a aprendizagem de forma
limitada a um processo de acomodação a novos contextos,
apresentando a inovação como uma reação às pressões
do mundo exterior. A aprendizagem associada à idéia de
adaptação, onde o ser humano reage frente às pressões
do meio, é inspirada em uma concepção ambientalista
(REGO, 2001). Motta (2001) define o aprendizado gerencial
como um processo pelo qual o indivíduo aprende e gera
novos conhecimentos a partir da convivência em
determinado ambiente organizacional.
Mudar a cultura significará mudar a forma de pensar
e de agir das pessoas. A mudança de cultura desafia
hábitos enraizados de pensamento e ação. Também os
sentimentos dão suporte ao pensamento habitual. Quando
se quer mudar a cultura, é preciso mudar o sistema que a
gerou a partir das tradições e dos hábitos. Para possibilitar
práticas diferentes, é preciso criar as condições
necessárias para que um jogo diferente possa emergir.
Há, pois, razões para pensar que a cultura, a
dinâmica, o clima e o funcionamento do estabelecimento
têm grande influência na maneira como o colaborador
constrói o sentido da mudança. Nas instituições escolares,
em especial, é notória a resistência dos docentes a
inovações, sejam elas de ordem pedagógica ou
administrativa. Com freqüência, observa-se a frustração
de gestores educacionais que, portadores de idéias
revolucionárias, não conseguem aplicá-las em suas
escolas por não conseguirem construir o sentido da
mudança com sua equipe de trabalho.
Por sua vez, Senge (2004), apresenta cinco
dimensões vitais na construção de organizações capazes
de aprender: a capacidade de pensar sistemicamente, de
perceber a inter-relação dos fatos e das ações; o domínio
pessoal comprometido com o próprio aprendizado ao longo
da vida; a consciência e a crítica dos próprios modelos
mentais; a construção de uma visão compartilhada e a
aprendizagem em equipe.
A empresa também possui a faculdade de estar
consciente da própria situação e posicionar-se frente ao
mundo. Possui seus valores e crenças e está
freqüentemente questionando-as em relação à ética do
mundo em que ela vive.
Com o tempo, a prática da congregação contribui
para reforçar a interdependência, a divisão das
responsabilidades, o engajamento coletivo, a
disponibilidade para lançar-se na auto-avaliação e na
autocrítica, elementos estes fundamentais para que haja
aprendizagem, para que se promova a inovação.
Provavelmente os gestores prefeririam que as
organizações fossem como “coisas”: sempre em harmonia
com o seu meio, passivas, à espera de um empurrão que
geraria resultados previsíveis e mensuráveis, conforme
concebe o paradigma da administração científica (LÜCK,
2000).
Nas organizações, a essência do ato de aprender é
a capacidade de gerir a mudança mediante a transformação
em si mesmo. Não basta que um estabelecimento escolar
tenha uma cultura favorável à mudança para que essa
abertura seja sistematicamente transformada em inovações
efetivas e duráveis. Os estabelecimentos inovadores não
são apenas organizações cuja cultura “dá uma oportunidade
à mudança”, mas aqueles cuja mudança é, de certa forma,
fonte de identidade, fator de coesão, motor, modo de vida,
e não apenas uma resultante involuntária de ação coletiva.
Há duas importantes forças que agem sobre as
organizações na atualidade: o mundo em constante
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Mudança pressupõe novas aprendizagens, riscos
de fracasso, perda provisória de rotinas e referências, o
luto de certos hábitos, uma fase de mínima eficiência. Por
isso, a mudança dentro do estabelecimento escolar só é
possível se ela tiver mais significado do que manter o status
quo. Construir o sentido da transformação é um desafio
para todos os colaboradores, mas em especial, para os
gestores.
a elementos decisivos para a competitividade da empresa,
visto que têm por função diferenciar a companhia de seus
competidores, criar utilidade e valor aos clientes, construir
uma plataforma para o crescimento e promover direção e
foco estratégico. Esta concepção de competências,
excessivamente utilitarista, serve à concepção de empresa
econômica (Geus, 2000), visto que parte do princípio de
que devem, de alguma forma, agregar valor à organização,
ou melhor, devem promover lucro para a empresa. Por sua
vez, Perrenoud (2001, p. 20) define competência como:
“faculdade de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos
– como saberes, habilidades e informações – para
solucionar com pertinência e eficácia uma série de
situações”.
O estabelecimento escolar só pode tornar-se um
lugar onde a mudança é construída, coletiva e
progressivamente, se os atores que dela fazem parte
dispuserem de flexibilização suficiente para conceber seu
projeto e para inventar dispositivos suscetíveis de resolver
os problemas encontrados.
Já a categoria de competências gerenciais possui
uma variação ainda maior de concepção entre os autores
que utilizam ou desenvolvem este conceito. Segundo Ruas
(2001), competência gerencial é “a capacidade de mobilizar,
integrar e colocar em ação conhecimentos, habilidades e
formas de atuar (recursos de competências) a fim de atingir/
superar desempenhos configurados na missão da empresa
e da área”. Assim, a competência pertence à ordem do
saber mobilizar. Mas, para haver competência, é preciso
que esteja em jogo um repertório de recursos
(conhecimentos, capacidades cognitivas, capacidades
relacionais).
Uma das chaves do êxito da inovação passa pela
capacidade dos sistemas de criar dispositivos que
permitam aos atores pôr em rede suas competências
profissionais e reconstruir o vínculo que deve existir entre
suas crenças, seus ideais, suas práticas cotidianas e as
missões gerais do sistema educacional. Como afirma
Thurler (in PERRENOUD et al., 2002, p.96), que os
sistemas escolares transformam e se transformam em
estabelecimentos inovadores à medida que aprendem e
se organizam em redes.
Quando as escolas funcionam de acordo com uma
lógica flexível e em redes, os professores são levados a
desenvolverem uma série de competências que lhes
permitem transformar as pedagogias.
A concepção de competência gerencial, enquanto
ação através da qual se mobilizam conhecimentos,
habilidades e aptidões pessoais e profissionais, aproximase significativamente do conceito empregado na educação.
Nesta área este conceito divulgou-se a partir da Conferência
Mundial em Jomtien (Tailândia) no ano de 1990, ocasião
na qual foi elaborada a Declaração Mundial sobre Educação
para Todos. No decorrer dos anos noventa, a noção de
competências inspirou uma reescrita nos programas de
educação em diversos países como o Canadá, a França,
a Bélgica, a Suíça, a Espanha e o Brasil.
O destino de uma inovação educativa depende do
que os professores pensam e fazem. São eles que põem
em prática, junto com seus alunos e por sua maneira de
conceber e gerir cotidianamente situações de ensino e de
aprendizagem, as novas idéias obtidas das pesquisas ou
dos movimentos pedagógicos. O desenvolvimento
profissional deve assentar-se no princípio de que os
professores continuam sendo atores e responsáveis por
sua formação contínua, pois decidem de maneira autônoma
seus objetivos e seus planejamentos. Para que isso ocorra
há necessidade de haver competências.
Em educação, a abordagem por competências
surge como uma proposta pedagógica para quebrar com o
antigo paradigma da transferência de conhecimentos, com
o modelo de educação bancária (FREIRE, 2005) em que o
aluno acumula saberes, passa em exames, mas não
consegue mobilizar o que aprendeu em situações reais,
no trabalho, na resolução de problemas diários, ou no
exercício da cidadania. A transferência de conhecimentos
não é automática, adquire-se por meio do exercício e de
uma prática reflexiva, em situações que possibilitam
mobilizar saberes, transpô-los, combiná-los, inventar uma
estratégia original a partir de recursos que não a contêm e
não a ditam.
O conceito de competências tem sido um dos mais
empregados e mais controversos no jargão da
administração contemporânea. Diferentes percepções e
usos têm marcado sua apropriação tanto nas
organizações, quanto no mundo acadêmico.
É possível definir duas categorias amplas de
entendimento do conceito de competências no meio
empresarial: a estratégica, que possui uma dimensão
corporativa; e a individual, que inclui a dimensão gerencial.
4. DISCUSSÃO E APRESENTAÇÃO
DOS RESULTADOS
A primeira categoria trata das competências
organizacionais e se refere à empresa como um todo. É o
caso das competências essenciais, ou core competencies,
conforme (Ruas, 2001). As competências essenciais
aparecem sob a forma de competências coletivas e aportam
A concepção de empresa viva parece mais adequada
às instituições educacionais do que a concepção de
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empresa econômica, especialmente às escolas que
integram a Rede Sinodal de Educação. Como estas
escolas confessionais não têm a rentabilidade como
objetivo primeiro, por seu caráter comunitário (e filantrópico
para algumas), parte do excedente financeiro é revertido
em investimentos na própria instituição, financiando sua
manutenção e desenvolvimento, e parte em benefício da
comunidade onde está inserida, na forma de subsídio ao
estudo de alunos carentes e de promoção do
desenvolvimento comunitário.
promover uma cultura de aprendizagem e inovação em sua
instituição escolar.
De um lado, pode-se tratar a gerência como algo
científico, racional, enfatizando as análises e as relações
de causa e efeito, para se prever e antecipar ações de
forma eficiente e eficaz. Pode-se valer dos conhecimentos
sistematizados pelas teorias gerenciais. De outro, tem-se
que aceitar a existência, na gestão, de uma face de
imprevisibilidade e de interação humana que lhe confere a
dimensão do ilógico, do intuitivo, do emocional, do
espontâneo e do irracional.
Outra aproximação significativa desta concepção de
empresa com as escolas confessionais evangélicoluteranas é a compreensão das pessoas quanto ao
conceito. Ao definir a empresa como uma comunidade de
trabalho, onde se aposta na aprendizagem contínua e
coletiva, assim como na capacidade de cada indivíduo
desenvolver seu potencial, a concepção de empresa viva
confere ao colaborador a condição de sujeito constituidor
do sentido de seu labor.
Diante desta acepção, o aprendizado gerencial não
pode ser pautado exclusivamente na concepção do
administrador escolar. Administrar é, sem dúvida, uma
dimensão essencial da gestão. Envolve gerenciar recursos
financeiros; desenhar, implementar, acompanhar e avaliar
planos; organizar, prover e facilitar; criar condições
favoráveis ao aproveitamento dos alunos. Uma boa
administração promove a organização e a sustentabilidade
financeira das instituições, mas não basta para fazer com
que uma escola se aperfeiçoe e mude. Administradores
escolares intervêm apenas de maneira indireta no trabalho
dos professores. Para que transformações na qualidade
do ensino ocorram, é preciso que atuem como líderes
educacionais e influenciem diretamente o comportamento
profissional dos educadores. É preciso que se constituam
gestores educacionais, desenvolvam um saber que
transcenda o conhecimento técnico, enfim, que
desenvolvam competências gerenciais.
Estas constatações também puderam ser feitas na
Equipe Diretiva de uma escola que integra a Rede Sinodal
de Educação, denominada neste estudo de escola “A”, e
cujos problemas enfrentados em seu cotidiano são o ponto
de partida das reflexões deste estudo. Os estudos na
escola referida permitiram concluir que no cenário da
educação estão ocorrendo mudanças importantes de toda
a ordem, tais como: a qualificação docente, a proposta
pedagógica e os recursos que a escola dispõe. Identificar
as ameaças e as oportunidades é um exercício
fundamental de percepção para os estabelecimentos
escolares, mas que por si só não basta. A organização
escolar deve se renovar, absorver novos saberes, novos
programas, novos métodos e novas tecnologias sem deixar
entender o que ocorreu no passado. Inovar no interior da
escola para fazer frente à complexidade do mundo atual e
da educação não significa simplesmente fazer mudanças,
mas criar na escola uma cultura da aprendizagem, uma
cultura favorável à mudança a ponto da escola criar uma
identidade com a inovação.
Diante dos recursos que são mobilizados em uma
competência, é possível observar que a aprendizagem em
gestão transcende o conhecimento de ferramentas,
técnicas ou programas para a idéia de saberes integrados.
Os sistemas convencionais de formação são centralizados
no conhecimento. Através da aprendizagem organizacional
é possível atuar no desenvolvimento do saber-fazer e do
saber-agir/ser, pois estes se desenvolvem no ambiente de
trabalho.
Os novos paradigmas organizacionais sugerem uma
reforma no modo de pensar e propõe um grande desafio à
escola: afrontar e assumir a complexidade. Diferente de
adaptar-se às mudanças do contexto, a idéia é criar na
escola um ambiente flexível, ciente da complexidade da
educação, aberto a mudanças na busca incessante de
melhores respostas aos problemas dos alunos, dos pais
e dos professores. A escola como lugar de vida e de trabalho
é uma escola em movimento, assim como o contexto está
em movimento.
As competências devem ser uma forma de resposta
profissional a fenômenos, a situações de determinado
contexto escolar. Portanto, este trabalho apresentou as
seguintes sugestões e que estão em fase de
implementação para os gestores escolares da Rede
Sinodal, onde deverão ser capazes de:
- Refletir sobre sua práxis: implica o
reconhecimento de que os gestores são responsáveis pela
formulação de seus propósitos e, portanto, o processo de
compreensão e melhoria de sua ação deve iniciar pela
reflexão sobre sua própria experiência, no diálogo com seus
pares. Saber avaliar e valorizar suas capacidades, seus
limites e suas necessidades são atitudes fundamentais
para as relações interpessoais do gestor e para que possa
fazer opções corretas de formação continuada.
Diante da concepção de escola como uma
comunidade de trabalho, como uma organização viva, cujo
propósito é a perpetuação, o perfil do gestor escolar muda
radicalmente. Não para um novo modelo, mas para uma
nova concepção. As transformações no cenário da
educação demandam um gestor educacional capaz de
enfrentar a complexidade, de desenvolver novas
competências a partir da reflexão sobre sua práxis, e de
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
- Dominar sua própria formação: a identidade
profissional do gestor é freqüentemente abalada pela
natureza complexa de suas atribuições. A função de
representar a escola, de estar em permanente contato com
os colaboradores e motivá-los, de buscar alianças, de gerir
os recursos financeiros, de estabelecer uma visão de futuro
para a instituição exige uma busca constante por formação
e qualificação em distintas áreas. É preciso desenvolver
saberes técnicos, habilidades de relacionamento,
conhecimentos conceituais, operacionais e estar
permanentemente atento às mudanças do ambiente.
- Desenvolver uma visão sistêmica: visualizar a
escola como um conjunto integrado, como uma instituição
em movimento. Implica a capacidade de perceber a
interdependência entre as várias funções e como uma
alteração em uma delas afeta as demais.
- Criar propósito: a atividade docente é ambígua e
repleta de contradições. Diante da falta de reconhecimento
social, é preciso auxiliar a equipe docente a buscar o
sentido de sua práxis. Buscar a finalidade da educação e
estabelecer uma visão de futuro para a organização como
um todo é condição fundamental para a cooperação, para
que haja sinergia no compartilhar um objetivo. É preciso
articular os interesses comuns para que os objetivos
coletivamente estipulados possam ser alcançados da
maneira mais adequada.
- Promover a ação colaborativa, pôr em rede
as competências profissionais: significa transformar a
escola em uma comunidade de trabalho, onde profissionais
aprendem uns com os outros, cooperando para solucionar
problemas pedagógicos. Liderar é estimular a criatividade,
mas ao mesmo tempo estabelecer padrões, confrontar,
corrigir, capacitar. É fazer com que a equipe sinta que tem
potencial para realizar e transformar, auxiliando os
profissionais a melhor compreender a realidade educacional
em que atuam.
- Descentralizar o processo decisório: mais que
delegar tarefas, é delegar poderes de auto-gestão na
solução dos problemas, é promover uma práxis autônoma.
Consiste na ampliação do espaço de decisão, voltada para
a participação e para o fortalecimento da escola como
organização social. Abrange a mudança de um princípio
de uniformidade, ditada por regras e regulamentos, para o
princípio de unidade, orientada por princípios e diretrizes.
à tona o potencial de cada pessoa ou instituição
estimulando o aprendizado contínuo.
- Buscar parcerias, fazer alianças: os gestores
assumem boa parte das relações externas da instituição
escolar. A comunidade local deve ver na instituição uma
entidade parceira no desenvolvimento da região. Grandes
projetos necessitam agregar forças que transcendem os
limites da instituição, pois são mais difíceis de serem
desenvolvidos sozinhos.
5. CONCLUSÃO
Buscar a excelência é um imperativo a todos que
trabalham em escolas da Rede Sinodal de Educação, não
tanto por uma questão de sobrevivência no mercado, mas
principalmente por uma questão de filosofia de trabalho.
Este princípio traduz-se pelo desenvolvimento máximo do
potencial da organização como um todo na busca da
melhoria da educação e da formação humana. A concepção
evangélico-luterana de educação só pode ser compreendida
a partir da leitura da intersecção dialógica entre teologia e
pedagogia. Qualquer conceito de gestão para as escolas
de confissão luterana deve integrar estas duas dimensões
em um todo harmônico. Assim, a excelência em gestão
consiste em criar as condições para que o projeto
pedagógico, elaborado pela comunidade escolar, se torne
possível e perpetue os princípios que animam e concedem
propósito ao fazer educativo.
Em vista à conjuntura econômica, com freqüência
os gestores de escolas evangélico-luteranas deparam-se
com o dilema de fazer opções entre projetos que
antagonizam o fomento ao projeto pedagógico idealizado
pela comunidade escolar e a sobrevivência da instituição.
Manter uma proposta de escola comunitária e confessional
nestes tempos, em que as relações entre os indivíduos
são mediadas por práticas clientelistas e a condição de
cidadania está vinculada ao poder de consumo, já é por si
só um desafio ao contra-senso. Por isso a inovação,
enquanto processo de aprendizagem organizacional, tornase um movimento a ser buscado na exploração
colaborativa.
- Promover clima dialógico: é preciso abrir canais
para o diálogo com as famílias, com os alunos e com os
professores. Todos devem perceber que sua opinião é
importante, assim como também é importante ouvir e
entender as demais pessoas que fazem parte da
comunidade escolar.
As escolas que integram a Rede Sinodal de
Educação têm a inovação enquanto princípio.
Fundamentado na concepção “Igreja reformada – em
constante reforma”, contido no fundamento teológicoconfessional desenvolvido no documento – Diretrizes da
Política Educacional da IECLB, esta permanente abertura
ao novo não significa a implementação de modelos
impostos por modismos, mas sim conceber a escola como
uma organização capaz de aprender, como uma empresa
viva.
- Desenvolver o potencial de cada colaborador:
a frente de uma equipe, o gestor deve ser capaz de trazer
Tal afirmativa demanda uma concepção dinâmica
de gestor escolar e um processo permanente de
qualificação de sua ação. O gestor escolar contemporâneo
precisa perceber-se enquanto gestor e refletir sobre sua
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
práxis a fim de desenvolver competências capazes de dar
conta da complexidade de suas atribuições. O conceito
de competências gerenciais transcende os conhecimentos
formais e propõe que o gestor desenvolva aptidões que o
tornem capaz de mobilizar múltiplos recursos diante das
diversas situações complexas do cotidiano escolar, diante
da necessidade de agir na urgência e decidir na incerteza.
A escola, enquanto espaço de mediação de saberes,
é lócus privilegiado de formação continuada das equipes
diretivas e dos demais colaboradores. É no âmbito da
organização que os colaboradores constroem o sentido
de suas práticas profissionais pelo processo de
compreensão e melhoria de sua ação na reflexão dialogada
sobre suas próprias experiências.
A capacidade de inovar implica a construção de uma
visão e uma ação compartilhada. Ao gestor cabe
proporcionar espaços-tempos para que os colaboradores
possam pôr em rede suas competências profissionais e
reconstruam, coletivamente, suas crenças, seus ideais e
suas práticas cotidianas.
Esta constatação coloca as pessoas no centro do
desenvolvimento das instituições escolares e demanda do
gestor uma atuação de liderança e articulação para
promover a cooperação profissional. Para coordenar os
esforços investidos pelas pessoas, é preciso reconhecer
a diversidade e a divergência das maneiras de pensar e
fazer, bem como, compreender a questão dinâmica,
conflitiva e contraditória das relações interpessoais na
organização.
As perspectivas elaboradas durante este estudo não
esgotam, sobremaneira, a amplitude e a complexidade da
gestão educacional. A dificuldade em identificar, selecionar
e apresentar dados empíricos delimitaram a pesquisa a
um diálogo argumentativo com pesquisadores de diversas
áreas do conhecimento. A contribuição deste trabalho para
a ação gestores de escolas integrantes da Rede Sinodal
de Educação se efetiva na elaboração de possibilidades
de intersecção entre princípios pedagógicos,
administrativos e os fundamentos da confessionalidade
luterana. Este desafio dialético demanda novas
competências aos gestores escolares para os quais não
servem mais modelos, mas sim uma nova concepção.
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ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE AS
ABORDAGENS DA INOVAÇÃO DISRUPTIVA E A
ESTRATÉGIA DO OCEANO AZUL
Luis Carlos Zucatto1
Faculdade Três de Maio - SETREM2
RESUMO
Este estudo busca desenvolver uma análise
comparativa entre as abordagens da Inovação Disruptiva e
a Estratégia do Oceano Azul, procurando identificar como
a utilização simultânea destas pode criar sinergia,
potencializando as competências de inovação das
empresas. Em seus resultados, o trabalho mostra o quão
relevantes são as abordagens analisadas, à medida que
evidenciam como podem ser estruturados novos mercados
quando os gestores das empresas conseguem interpretar
demandas latentes e focam em potenciais consumidores,
satisfazendo suas expectativas.
PALAVRAS-CHAVE: Inovações Disruptivas Estratégia do Oceano Azul - Inovação.
espaço acadêmico, estudiosos e pesquisadores se
debruçam sobre pesquisas, a discussão sobre inovações
como atributos de diferenciação para uma empresa se
tornar competitiva e construir sustentabilidade ganham
mais corpo a cada dia. Gestores de empresas se debatem
em busca de alternativas que levem suas organizações a
novos patamares de competitividade, procurando
estabelecer diferenciais que lhes possibilitem angariar
lucros extraordinários. A inovação é, de fato, crítica para o
crescimento de uma empresa, de uma região, de um País,
pois a possibilidade de mudar o rumo de uma indústria, de
um segmento da economia está relacionada à sua
capacidade de inovar. As formas de inovar podem ser tanto
através de novos modelos de negócios como de
tecnologias aperfeiçoadas (business model innovation e
technology innovation). Raramente uma mudança na
tecnologia ocorre sem causar uma mudança também nos
processos (e vice-versa) (DAVILA et al., 2003).
ABSTRACT
This study tries to develop a comparative analysis
between the approaches of the Disruptive Innovation and
the Strategy of the Blue Ocean, trying to identify how the
simultaneous use of these ones can create synergy,
potentializing the abilities of the companies’ innovation. In
its results, the work shows how excellent the analyzed
approaches are while they evidence how new markets can
be structuralized when the managers of the companies
are able to interpret latent demands and they focus on the
potential consumers, satisfying their expectations.
KEY WORDS: Disruptive Innovation – Startegy of
the Blue Ocean – Innovation.
1 INTRODUÇÃO
A agenda das discussões e produções acadêmicocientíficas sobre inovação é vasta, estendendo-se, com
importância não menor, ao universo corporativo. Se no
1
2
No século XX a inovação foi institucionalizada,
tornando-se uma característica específica desse período
da história, ligada às atividades de pesquisa (MOWERY
& ROSEMBERG, 2006). A própria inovação se reduziu à
rotina. O progresso tecnológico está se tornando
progressivamente o negócio de muitas equipes de
especialistas treinados que produzem o que é requerido e
o fazem funcionar de modo previsível (SCHUMPETER,
1942). O resultado disso é que as inovações tecnológicas
freqüentemente criam novas indústrias, inteiramente novas,
dedicadas à produção de novos bens, com crescimento
rápido e superação de tecnologias, desafiando os
competidores a buscarem o desenvolvimento de novas
tecnologias, aliadas a novos modelos de negócios, gerando
impactos econômicos.
No estudo da inovação, o processo de decisão
das estratégias empresariais centra a busca pelos
elementos analíticos relevantes à compreensão da
competitividade. A este processo decisório, por sua vez,
aliam-se avaliações de executabilidade da estratégia, em
função de capabilidades (capacitações próprias
Mestrando PPGA/EA – UFRGS e Professor da Faculdade Três de Maio – SETREM - [email protected]
Sociedade Educacional Três de Maio – Av. Santa Rosa 2.400, Três de Maio, RS. www.setrem.com.br
12
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acumuladas) e da possibilidade de retornos financeiros
esperados, via de regra, determinados pelos investimentos
demandados e riscos que envolvem as atividades de
inovação. Tais avaliações devem ser feitas de forma
rigorosa, estruturadas por aspectos que caracterizem o
ambiente e relacionem-se com o mercado e setor de
atuação. Por isso, as transformações e os impactos
esperados nas tecnologias dominantes devem levar em
conta as transformações esperadas nas formas de
competição, uma vez que a firma inovadora irá estabelecer
um diferencial em relação aos competidores e esses
buscarão formas de se equipararem ou de ultrapassá-la.
As inovações, de fato, levam as empresas a novos
patamares de competição e a competição que realmente
interessa é a da nova mercadoria, da nova tecnologia, sendo
muito mais eficiente que a outra, da mesma forma que um
bombardeio para arrombar uma porta (SCHUMPETER,
1912).
Contudo, nem todas as inovações conseguem
imprimir transformações radicais sobre os paradigmas
tecnológicos vigentes e nem sobre a realidade econômica
em que impactam; outras, no entanto, suplantam
paradigmas tecnológicos de forma radical. Quando há
superação de um paradigma, também a sociedade muda,
mudam os comportamentos, mudam os padrões, pois a
tecnologia é uma construção social, é uma conquista da
sociedade, sob o aspecto de que nos dias atuais, podese tomar as inovações tecnológicas impulsionadas pela
microeletrônica com exemplo de quebra de paradigmas
tecnológicos. A partir de 1945-50, o surgimento e introdução
de semicondutores e circuitos integrados provocaram uma
mudança radical em toda economia, associando-se ao
advento e um paradigma tecnológico extremamente
poderoso, alicerçado sobre o que se convencionou chamar
de tecnologia da informação – final dos anos 90. Este
paradigma se caracteriza pela extrema capilaridade, que
lhe confere grande poder de penetrar em todos os
segmentos da economia, particularmente no pós-advento
da internet.
É possível a convivência de mais de um paradigma
tecnológico, porém a tendência é de que os novos
predominem sobre os antigos e, ainda, sobre as gerações
mais maduras de produtos e serviços. No mercado, isso
se observa nos diferentes ritmos e dinamismo de
crescimento. Na sociedade, um novo paradigma pode
alterar as formas e padrões de consumo e comportamentos
dos consumidores, no deslocamento de sistemas
produtivos, padrões de reprodução de forças de trabalho
e, sobremaneira, nas condições de vida das populações,
impactando profundamente nas instituições. As inovações
tecnológicas e mudanças de paradigmas são temas que
permeiam os ambientes acadêmico e corporativo, além
de órgãos governamentais que têm interesses na pauta
devido às novas oportunidades de geração de emprego e
renda que as inovações possibilitam e estudados à
exaustão por um sem número de interessados na área,
pelo que não será tratado aqui. O intuito com este estudo
é oferecer uma contribuição sobre as abordagens das
inovações em modelos de negócios, estabelecendo uma
comparação entre as Inovações Disruptivas e a Estratégia
do Oceano Azul, a partir do cruzamento de variáveis
definidas como relevantes no contexto da Inovação. E,
ainda, a carência de estudos nesta perspectiva se converte
na justificativa deste trabalho.
Por estes pressupostos, colocou-se como objetivo
deste estudo a comparação entre Inovações Disruptivas e
a Estratégia do Oceano Azul, através de uma profunda
análise de cada uma e posterior cruzamento de variáveis
consideradas relevantes em uma ou outra ou, ainda, nas
duas. Para tanto, partiu-se da hipótese que as inovações
disruptivas em modelos de negócios, além de suplantar
os paradigmas vigentes, geram lucro e crescimento
sustentável quando as empresas chegam aos não-clientes
e conseguem trabalhar a custos que lhes possibilite atingir
as faixas de baixo do mercado e a Estratégia do Oceano
Azul ao criar diferenciação, gerando valor e reduzindo
custos, proporcionam maior competividade e geram
sustentabilidade às organizações.
Este trabalho é um ensaio teórico, construído a partir
da análise das teorias envolvidas e posterior exposição
lógico-reflexiva, enfatizando a argumentação e
interpretação pessoal (SEVERINO, 2000). O método de
procedimento do estudo é o método comparativo, pois, a
partir da análise de cada um dos critérios – Inovações
Disruptivas e Estratégia do Oceano Azul, estabeleceu-se
uma primeira aproximação entre os temas pesquisados,
através de uma comparação baseada em variáveis que
buscam evidências de similaridades e/ou diferenças entres
esses critérios (OLIVEIRA,2007). Para materializar a
comparação entre as Inovações Disruptivas e A Estratégia
do Oceano Azul foi elaborado um quadro foram dispostas
as variáveis que servem de parâmetro no cruzamento dos
dois critérios analisados, onde são pontuados aspectos
de cada um dos critérios.
2 REVISÃO DA LITERATURA
2.1 Tecnologia
Tecnológicos
e
Paradigmas
Usualmente a tecnologia é concebida como um
conjunto de fatores, muito mais ligados a máquinas e
equipamentos que, combinados, relacionam-se a
determinados produtos ou serviços. Contudo, tecnologia
compreende e exige muito mais que isso, contemplando
um conjunto de parcelas de conhecimento acumulado,
tanto teórico quanto prático de know-how, métodos,
procedimentos, experiências de sucessos e de fracassos
– dispositivos intangíveis e também dispositivos físicos.
Os dispositivos físicos compõem a parte que pode ser
denominada “incorporada” da tecnologia. A parte “nãoincorporada” compõe-se de expertise específica, da
experiência acumulada por esforços tecnológicos que se
caracterizam como a assimilação, adaptação e/ou criação
de tecnologia. Para Kim (2006), a capacidade tecnológica
está definida como a acumulação de conhecimento
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tecnológico que gera um processo de aprendizagem
organizacional; por isso, é necessário o desenvolvimento
de habilidades na utilização e transformação das
tecnologias para implementação de melhorias nos
processos da organização.
Com o desenvolvimento das capacidades
tecnológicas, promove-se internamente o aprimoramento
nas diferentes funções tecnológicas, como por exemplo,
processos de organização e controle, atividades de
engenharia e gestão de projetos, atividades relacionadas
à produção e equipamentos (ARIFFIN & BELL, 1999). Sob
este aspecto, a tecnologia inclui a percepção de um
conjunto limitado de alternativas tecnológicas e de futuros
desenvolvimentos nocionais (DOSI, 2006). De acordo com
Christensen (1997) as tecnologias são processos que na
organização transformam trabalho, capital, materiais e
informações em produtos e serviços. A esse conceito,
Sahal, (1981); Burgelman et al. (1995), acrescentam, além
dos processos de engenharia e manufatura, processos de
negócios à conceituação de tecnologia que será a
perspectiva aqui adotada. Utilizou-se este conceito porque
o caso abordado neste estudo trata de um modelo de
negócio, ou seja, uma tecnologia de negócio. Christensen
& Bower (1996) ainda definem tecnologias disruptivas como
as que destroem uma trajetória estabelecida de
performances de melhorias ou redefinem o que performance
significa.
Pelo acúmulo de conhecimentos, as tecnologias
evoluem e, ao evoluírem, apresentam novos paradigmas
tecnológicos em substituição aos vigentes. Um paradigma
tecnológico pode ser definido como o “padrão” ou “modelo”
de solução de problemas tecnológicos selecionados,
baseados em princípios selecionados, derivados de
conhecimentos das ciências naturais e da tecnologia
existente que define o campo de investigação para resolvêlos (DOSI, 1982, 2006). Dentro de um paradigma
tecnológico se desenvolvem trajetórias tecnológicas,
definidas como o padrão da atividade normal de solução
de problemas colocados pelo paradigma. A trajetória
tecnológica pode ser representada pelo movimento de
trocas multidimensionais entre as variáveis tecnológicas
definidas como relevantes pelo paradigma.
A mudança de um paradigma geralmente implica
na mudança da trajetória tecnológica (DOSI, 1982; 1988).
Um paradigma tecnológico, portanto, age como um
“direcionador” do progresso técnico, definindo ex-ante as
oportunidades a serem perseguidas e aquelas a serem
abandonadas. É dotado, portanto, de “poderoso efeito de
exclusão” (DOSI, 2006), pois os esforços e a imaginação
tecnológica dos profissionais envolvidos e das
organizações às quais pertencem focalizam-se em
direções precisas, cegando-se a outras direções ou
possibilidades tecnológicas ao permitir a redução à priori
do número de alternativas de desenvolvimento tecnológico.
Ainda, os paradigmas tecnológicos definem certa idéia de
progresso, não como medida absoluta, mas como
significado preciso de determinada tecnologia, pois se
identifica com o esforço genérico a que está aplicado, com
a tecnologia material aplicada, com as propriedades
exploradas e com as dimensões e os equilíbrios
tecnológicos e econômicos focalizados.
O ciclo de vida de um paradigma tecnológico é
delimitado em quatro períodos: i) difusão inicial, quando
surgem as inovações radicais em produtos e processos,
proporcionando múltiplas oportunidades de novos
investimentos e surgimento de novas indústrias e novos
sistemas tecnológicos; ii) crescimento rápido (prematuro)
quando as novas indústrias vão se firmando e explorando
inovações sucessivas; iii) um crescimento tardio, quando
o crescimento das novas indústrias começa a desacelerarse e o paradigma difunde-se para os setores menos
receptivos; iv) fase de maturação, ou a última fase do ciclo
de vida do paradigma, na qual os mercados começam a
saturar-se, os produtos e processos se padronizam, o
conjunto de produtos chegam a um ponto de esgotamento
e as inovações incrementais nos processos trazem pouco
aumento de produtividade. Nesta última fase, a experiência
acumulada em cada indústria e no mercado é tal que cada
novo produto alcança a maturidade cada vez mais rápido
(PEREZ, 1992). Ao atingir a última fase do paradigma, as
firmas não permanecem inativas: buscam adotar
estratégias que as mantenham no mercado, através de
uma vantagem competitiva. Dentre as estratégias
possíveis, a busca por novas tecnologias que possibilite a
criação de novos produtos pode provocar uma mudança
de tão longo alcance que implica em um novo paradigma
tecnológico (PEREZ, 1992).
Da perspectiva puramente econômica, um novo
paradigma surge em um ambiente ainda dominado pelo
paradigma anterior e, para se consolidar, precisa satisfazer
alguns pressupostos: i) redução de custos; ii) crescimento
rápido da oferta, explicitando a inexistência de barreiras
no longo prazo aos investidores; e, iii) apresentar
claramente um potencial para uso ou incorporação desta
tecnologia em vários processos e produtos dentro do
sistema econômico. Se o novo paradigma cumpre estas
condições, ele prova suas vantagens comparativas. Iniciase, portanto, um processo de reestruturação das variáveischave até que o novo paradigma seja o predominante
(FREEMAN e PEREZ, 1988). Essas variáveis são: (i) os
interesses econômicos das organizações envolvidas em
P&D nessas novas áreas tecnológicas; (ii) a história
tecnológica das mesmas, seus campos de especialização,
etc.; e, (iii) variáveis institucionais stricto-sensu, como as
de órgãos públicos (DOSI, 2006).
2.2 Inovação e Competitividade
A inovação tem sido vista como uma atividade difícil
e cara e, freqüentemente, ainda como a chave de
sobrevivência e uma fonte de crescimento sustentável para
as empresas (SCHUMPETER, 1942; PENROSE, 2006).
Por outro lado, apresentam potenciais de geração lucros
extraordinários às empresas, além do desenvolvimento de
capabilidades e competências como vantagens
competitivas às firmas inovadoras (TEECE et al., 1997;
EISENHARDT & MARTIN, 2000; ZOLLO & WINTER, 2002),
14
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
podendo, ainda, ser transformada em uma competência
destruidora (TUSHMAN & ANDERSON, 1986) ou disruptiva
(CHRISTENSEN, 1997).
Contudo, ao se falar em inovação, deve-se ter em
mente que, mais do que uma definição ou atribuição de
alguma característica, dois aspectos devem ser
considerados: aplicação e novidade. Uma nova idéia,
portanto, para gerar inovação, necessita que haja demanda
- necessidade a ser satisfeita – para que a invenção se
transforme em inovação. A inovação, dessa forma, é a
transação no mercado de um produto ou serviço em que
os consumidores perceberam valor e adquiriram,
incrementando o lucro da empresa que a gerou (COTEC,
2001). É necessário, também, esclarecer que inovação é
diferente de invenção, pois a segunda representa uma
idéia, um esboço ou mesmo um modelo para um novo
dispositivo, produto, processo ou sistema; uma invenção
não necessariamente se transforma em inovação
(SCHUMPETER, 1912, 1942).
A dimensão das inovações tecnológicas impacta
diretamente na competitividade, havendo uma relação
estreita com a natureza e convergência dos processos de
inovação em cada setor da economia (KAPLINSKY, 1989).
Assim, um país sem uma posição interessante em
inovação perde cada vez mais renda nacional e, ainda,
vantagem competitiva em diversas indústrias (PORTER,
1989). Outros autores como Aaker (1998), Schewe & Hiam
(1998), Engel et al.(2000), Ansoff & McDonnell (1993),
Porter (1989), Ohmae (1988), Grant (1998) e Fahey (1994)
sustentam, também, que a inovação confere maior
competitividade às empresas e que a sustentabilidade no
longo prazo está relacionada com sua capacidade
inovadora. Esses autores defendem, ainda, que o retorno
dos investimentos no desenvolvimento e introdução de
produtos e serviços inovadores é incerto. Relacionada à
competitividade, está a capacidade de gerir o processo de
desenvolvimento tecnológico e a inovação, ligada a
produtos, processos e serviços é, portanto, a chave para
a obtenção e manutenção da competitividade (WAACK,
2005).
as titulares serão as vencedoras, caracterizando-se uma
circunstância sustentadora.
A inovação sustentadora atende a uma necessidade
explícita, com foco nas melhorias dos processos de
negócios; porém, não alterando os modelos ou padrões
dos processos de negócios. E quando o desafio é
comercializar produtos mais simples e convenientes,
vendáveis a preços mais baixos, a clientes menos
atraentes, as desafiantes têm maior probabilidade de
superar as titulares, o que caracteriza uma situação
disruptiva. Esse tipo de inovação altera radicalmente os
padrões existentes, criando novos produtos e serviços,
com aplicações e experiências sem precedentes.
A modelização da inovação disruptiva apresenta três
elementos críticos: primeiro, em todo mercado há uma
possibilidade de melhoria a ser utilizada pelos clientes na figura 01, é representada pelas linhas pontilhadas que
apresentam uma tênue ascendência. O segundo elemento
é que em todo mercado há uma trajetória própria de
melhorias desenvolvidas por empresas inovadoras, quando
lançam novos produtos com qualidade superior. Essa
tendência é mostrada pelas linhas que apresentam
inclinação acentuada na figura 01. E o terceiro elemento
crítico é a distinção entre a inovação disruptiva e a inovação
sustentadora: a inovação sustentadora busca atingir
clientes mais sofisticados, por meio de desempenhos
superiores aos disponíveis, podendo oferecer melhorias
incrementais em seus produtos ou por avanços
desbravadores, que ultrapassem os produtos concorrentes.
As inovações disruptivas não buscam disponibilizar
produtos melhores aos clientes atuais e em mercados já
existentes. Rompendo e redefinindo os modelos vigentes,
com novos produtos e serviços que talvez nem sejam tão
bons quanto os existentes, mas que, pelas tecnologias
disruptivas oferecem outros benefícios, pois se tornam
mais simples, mais convenientes e mais econômicos,
focando, sobretudo, em clientes novos ou menos
exigentes. Feita esta distinção, apresenta-se a figura 01
que representa os elementos críticos das inovações
disruptivas.
Des emp en ho
2.3 Inovação Disruptiva
medidas
desempenho
Estratégia de sustentação
Lançar produto melhor em
mercado tradicional
Disrupção de baixo mercado
Procurar clientes saciados com
modelos d e negócios de baixo custo
Diferentes
de
Tempo
Disrupção em novo mercado
Co ncorrer contra o não-consumo
N
oc ão
as -c
iõ on
es su
de mi
nã dor
oe
co s o
ns
u
um
o
Tradicionalmente, as inovações eram vistas como
resultados de combinações felizes entre os elementos:
produto certo, no lugar certo e na hora certa. Simplificar a
esse nível a combinação de esforços, investimentos,
planejamentos, pesquisas e outros fatores imprescindíveis
à inovação, quiçá, seja aceitar que a inovação resulte mais
do acaso que de aspectos administráveis ou, ainda, negar
que as inovações são passíveis de pré-diagnosticação.
Segundo Christensen & Raynor (2003), de fato o sucesso
ou o fracasso no desenvolvimento de um produto ou serviço
pode ser pré-diagnosticado. Ainda, de acordo com
Christensen & Raynor (2003), a inovação disruptiva e a
sustentadora, permitem prever se as empresas líderes
terão sucesso ou se as desafiantes superarão as empresas
maduras. Quando a corrida redunda em produtos melhores,
vendáveis a preços mais altos, a clientes mais atraentes,
Fonte: Adaptado de Christensen, 2003.
Figura 01 – modelo da inovação disruptiva.
15
Tempo
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
As inovações disruptivas apontam para um efeito
paralisante sobre os líderes setoriais, pelo fato destes
estarem voltados às inovações sustentadoras, o que os
torna incapazes de reagir em tempo hábil. Os líderes dos
setores, por estarem voltados à conquista do mercado,
raramente se proporão a defender o novo ou baixo mercado,
foco das inovações disruptivas, caracterizando esse
fenômeno a motivação assimétrica, tornando-se o cerne
do dilema da inovação e o começo da solução da inovação
(CHRISTENSEN, 2003). As inovações disruptivas se
subdividem em dois tipos: o primeiro que busca um novo
mercado, ou seja, os não-consumidores e o segundo, que
busca a parte de baixo do mercado, onde se localizam
consumidores não tão exigentes. As disrupções de baixos
mercados são exemplos diretos do que Schumpeter
denominava destruição criativa, pois provocam reduções
bruscas nos custos, sendo promovidas por firmas
estreantes que destroem as titulares. Por sua vez, as de
novo mercado, iniciam uma construção criativa – um
consumo novo – antes de provocar a destruição do antigo.
que captura a situação atual do mercado e permite à
empresa identificar em quais atributos pode se diferenciar
e criar o oceano azul. A curva de valor é o componente
básico da matriz de avaliação de valor, ela demonstra quais
são os atributos que diferenciam a empresa do restante
das empresas do setor. É a representação gráfica da
atuação de cada atributo de valor da empresa e dos
concorrentes. Os atributos de valor se localizam no eixo
horizontal e, no eixo vertical, demonstra o nível de oferta
de cada atributo segundo a percepção dos compradores
(KIM e MAUBORGNE, 2005).
Depois de situar cada atributo (da empresa e dos
concorrentes) na matriz de avaliação de valor, deve-se
proceder a uma análise e determinar as ações de: eliminar,
reduzir, criar e elevar. Essas quatro ações permitem que
se explorem sistematicamente maneiras de se rearranjar
os atributos que geram valor para os clientes de modo a
oferecer experiências inteiramente novas, enquanto
mantêm baixa sua estrutura de custos (KIM e
MAUBORGNE, 2005).
2.4 A Estratégia do Oceano Azul
Estratégia é definida por Mintzberg e Quinn (2001)
como um padrão ou um plano onde são integradas as
principais metas, políticas e seqüências de ações de uma
organização obedecendo a critérios de coerência. As
estratégias bem formuladas ajudam a ordenação e
alocação dos recursos organizacionais com viabilidade e
singularidade, em conformidade com as competências e
deficiências internas relativas, atentando-se às mudanças
ambientais de forma antecipada e provendo contingentes
realizados por oponentes inteligentes.
Conforme Porter (1989), a vantagem competitiva
surge do valor criado pela organização e percebido pelos
seus clientes. Existem duas formas de obter a vantagem
competitiva: por meio da liderança de custos ou pela
diferenciação. No modelo de Porter, as empresas deveriam
assumir ou a liderança de custos ou a liderança pela
diferenciação. Porém, a estratégia do oceano azul busca
ambas lideranças. Este modelo foi idealizado por Kim e
Mauborgne (2005).
Para diferenciar os dois tipos de mercado, os autores
chamaram de oceanos vermelhos todos os setores
existentes, o espaço de mercado conhecido, e de oceanos
azuis todos os setores não existentes hoje, é o mercado
desconhecido (KIM e MAUBORGNE, 2005). O foco de
análise é os movimentos estratégicos (decisões e ações
gerenciais). Os autores encontraram um padrão comum e
constante entre os movimentos estratégicos para a criação
e exploração de oceanos azuis. A inovação de valor ocorre
apenas quando as empresas alinham inovação com
utilidade, preço e ganhos de custo. As empresas que
buscam criar oceanos azuis perseguem ambas ao mesmo
tempo (KIM e MAUBORGNE, 2005).
Após definir as ações, é preciso ter muito bem
definido o foco, a singularidade e a mensagem consistente.
Os autores identificaram seis condições básicas para
reformular as fronteiras do mercado chamado de modelo
das seis fronteiras (KIM e MAUBORGNE, 2005):
- primeira fronteira - examinar os setores alternativos
cujas formas e funções são diferentes, mas têm o mesmo
propósito;
- segunda fronteira - examinar os grupos estratégicos
dentro dos setores que podem adotar estratégias
semelhantes;
- terceira fronteira - examinar a cadeia de
compradores;
- quarta fronteira - examinar as ofertas de produtos
e serviços complementares, pensando no que acontece
antes, durante e depois do uso do produto ou serviço;
- quinta fronteira - examinar os apelos funcionais e
emocionais dos compradores; e,
- sexta fronteira - examinar o transcurso do tempo,
como especulações sobre como a tendência pode mudar
o valor para os clientes e como impactará o modelo de
negócios da empresa. A figura 02 mostra a Matriz de
Avaliação de Valor, proposta por Kim e Maugborne (2005).
Para iniciar a elaboração da estratégia do oceano
azul, é preciso construir uma matriz de avaliação de valor,
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
em valor e quando persistir na estratégia vigente, fazendo
soar o alarme de que chegou a hora de desbravar novo
oceano azul no momento em que a curva de valor começa
a convergir com as dos concorrentes (KIM e
MAUBORGNE, 2005).
REDUZIR
Quais atributos devem ser
reduzido s Bem abaixo dos
padrões setoriais?
3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS
RESULTADOS
CRIAR
ELIMINAR
Quais atributos considerado s
indispensáveis pelo setor
devem ser eliminados?
NOVA
CURVA DE
VAL OR
Qu ais atributo s nunca oferecidos
pelo setor devem ser criados?
Neste tópico são estabelecidas e caracterizadas
as variáveis para análise e comparação entre as Inovações
Disruptivas e A Estratégia do Oceano Azul.
ELEVAR
Quais atributos devem ser elevado s
bem acima dos padrões setoriais?
3.1 Variáveis para Análise e Comparação
entre Inovações Disruptivas e Estratégia do
Oceano Azul
Figura 02 – Matriz de Avaliação de Valor.
Fonte: Adaptado de Kim e Mauborgne (2005).
O próximo passo é alinhar o processo de
planejamento estratégico para concentrar-se no panorama
geral e aplicar essas idéias no desenho da matriz de
avaliação de valor de sua empresa a fim de desenvolver
uma estratégia do oceano azul (KIM e MAUBORGNE,
2005). A visualização da estratégia do oceano azul em
toda a organização também torna muito mais esclarecedor
o diálogo entre cada uma das áreas da empresa (KIM e
MAUBORGNE, 2005). Para ir além da demanda existente,
é preciso pensar nos não-clientes antes de pensar nos
clientes; nos pontos em comum antes de nas diferenças;
e na de-segmentação antes de estreitar a segmentação
(KIM e MAUBORGNE, 2005).
A estratégia do oceano azul representa uma ruptura
muito mais drástica com o status quo, pois consiste em
substituir a convergência pela divergência através das
curvas de valor a custos mais baixos e, por essa
característica, a execução se torna mais difícil (KIM e
MAUBORGNE, 2005). Em se tratando das barreiras, uma
é cognitiva: despertar os empregados para a necessidade
da mudança de fundamentos. A segunda é a limitação de
recursos: quanto maior for a mudança na estratégia, mais
se necessitará de recursos para executá-la. A terceira é a
motivação: como motivar as principais empresas do
mercado a agir com rapidez e tenacidade para promover
uma ruptura com o status quo? A última barreira é a política
organizacional que precisa ser repensada estrategicamente
(KIM e MAUBORGNE, 2005).
A empresa se destaca dos concorrentes por sua
capacidade de execução somente quando todos os
membros da organização estão alinhados com a estratégia
e sempre estão dispostos a apoiá-la em todas as
circunstâncias. Para desenvolver a confiança e
comprometimento das pessoas que atuam na organização
e inspirar a cooperação voluntária de todos, as empresas
precisam introduzir a execução na própria elaboração da
estratégia desde o início. A presença ou ausência do
processo justo pode construir ou destruir as melhores
iniciativas de execução da estratégia (KIM e
MAUBORGNE, 2005). A empresa precisa monitorar as
curvas de valor para evitar a armadilha da concorrência. O
monitoramento das curvas de valor sinaliza quando inovar
A estratégia do oceano azul e as inovações
disruptivas, abordadas anteriormente, apesar de suas
particularidades, evidenciam aspectos relevantes. As
diferentes abordagens de cada uma apresentam graus de
abrangência e focos diversos, desde aspectos como
condições básicas para reformulação de fronteiras do
mercado até elementos críticos. Porém, as duas
apresentam aspectos comuns, quais sejam, tornar a
concorrência irrelevante e criação de novos mercados,
sendo isto o mote mais forte para o desenvolvimento e
estruturação deste quadro.
Na tentativa de formular uma análise para comparar
a inovação disruptiva e a estratégia do oceano azul, surge
a necessidade de identificação de alguns critérios mínimos
que permitam uma referência, sobre a qual cada uma possa
ser comparada. Assim, parece-nos relevante avaliar sobre
os seguintes aspectos:
· TECNOLOGIA – apesar das evidências da
relevância do papel da tecnologia no que tange à inovação
e às formulações de estratégias organizacionais, nosso
intuito aqui é de investigar se essa variável é fundamental
para o desenvolvimento de inovações e estratégias.
· INOVAÇÃO – um dos tópicos trata diretamente
dessa variável – inovações disruptivas, porém investigouse se isso se torna relevante também no que diz respeito
à estratégia do oceano azul.
· ESTRATÉGIA – verificar se cada um dos aspectos
analisados possibilita uma definição clara das estratégias
envolvidas nas organizações que os implementam.
· MERCADOS – averiguar se cada um dos critérios
sob análise leva em conta, e em que medida, os mercados
para formular suas táticas.
· CLIENTES – investigar se os critérios analisados
levam em conta em que grau, os clientes estão para instituir
suas estratégias.
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· NÃO-CLIENTES – analisar se os critérios
pesquisados levam em conta e em que grau, os nãoclientes estão, na formulação de suas estratégias.
· CUSTOS – avaliar se os custos interferem nas
formulações das estratégias a ponto de serem diferenciais
competitivos e
· EMPRESAS LÍDERES – avaliar se as empresas
líderes são ameaçadas ou não em suas posições pelas
empresas estreantes e se essas são o alvo das estreantes.
· DIFERENCIAÇÃO – verificar se a diferenciação é
uma variável que influencia na formulação das estratégias
nos critérios analisados e até que ponto o grau de
diferenciação pode ser uma vantagem competitiva.
· EMPRESAS ESTREANTES – verificar se as
empresas estreantes têm possibilidade de derrotar as
empresas líderes e se esse é seu objetivo.
No quadro 01 é feita a comparação entre as duas
abordagens, a partir das variáveis definidas para análise.
· PRODUTOS – investigar como os produtos serão
aceitos pelos clientes e não-clientes.
VARIÁVEIS PARA
ANÁLISE
TECN OL OGIA
ABORD AGENS
INOVAÇÃO DISRU PTIVA
ESTR AT ÉGIA D O OCEANO AZUL
Quand o as inovações são em p rodu tos,
Quan do as empresa s procuram
têm g ra u de importância e levado; se as
estab elecer um ocean o azu l a pa rtir de
inovaç ões sã o e m mo de lo s de n egócio s, produtos ou serviços ofere cid os, a
seu grau de impo rtância é re lativame nte imp ortância é eleva da, decrescend o
me no r.
qua ndo se trata de m od elo de negóci os.
Ne sta aborda gem é fundamen al, pa rtindo D epende , p ois qua nd o se trata de
do pressuposto que so me nte as
INOVAÇ ÃO
inovaç ões é que contam . T ornam-se
destruiçõe s criativa s na lóg ica
redução d e cu stos pa ra criar u m ocenao
azul, nem semp re a s inovaçõ es sã o tão
imp ortante s. Porém, q ua ndo se tra ta de
dife rencia ção , a i no vação po de assu mir
pap el fu nd amen tal. As emp re sas b uscam
des en volve r a inovação de valor.
A de fini ção de e stratégia s para d istanciarse do s compe ti do res permite criar
de inovação a emp re sa irá de sen vol ver.
esp aço s onde, pe la d ificulda de de
imitação, a emp re sa p ossa "navegue" em
Gra u de importâ nci a el eva do .
seu Ocenao Azul.
Co nsidera os mercados, sob re tu do a
C ria mercad os busca nd o setore s
alternativos e e xam ina nd o fornecedores e
parte de b aixo, mui to imp ortante . Por
grupos estra tégicos d en tro d os seto res.
veze s, cria no vos m ercad os, bu scando os Ve rifica as ofe rtas de preço s e prod utos e
os ap elos fun cionais d e potenciais
não-consumidore s.
com prado res.
Os cl ientes meno s exigentes são o foco.
Sch ump eteriana.
Parte da e stratégia para d efin ir que tipo
ESTRATÉGIA
MERC ADOS
C LIEN TES
N ÃO-C LIEN TES
Poré m, consid era qu e em tod o merca do
há po ssibi lida des de melho ria s a serem
utili za das pelos cli entes.
Busca os não-clien tes e clientes me nos
exi gentes.
As emp resas líde res sofre m efeito
Os cliente s ma is exig en te s são o foco.
Bu sca os não-clie ntes, mas d as fai xas de
cima do m ercad o.
paralisante, po is se vol ta m às i novaçõ es
EMPRESAS L ÍD ERES
sustenta do ras, que redun da m em em
Sã o ig no radas, tornand o-se irrelevantes.
produto s mel ho res e a preço s m ais a ltos
para clientes ma is atraentes.
Ma ior p ro ba bi lida de de vencer quand o o
EMPRESAS ESTREANTESdesafio é co me rcia lizar pro dutos ma is
simple s e con ven ie ntes.
PRODUTOS
Parte de p rodutos no vos e mais sim ple s.
Parte da lógic a de oferece r p roduto s de
Estabel ecem seu Ocea no Azul.
Pa rte de produtos n ovo s, mas mais
sofistica do s.
Pro cura a liar a estratég ia de lid eran ça e m
custos co m difere nci ação. Po rém, nã o
C UST OS
D IFERENCIAÇÃO
estab elece a precificação ma is ba rata
me no re s custos.
A diferenciação consiste de simplificar,
ofe recendo , p or vezes, menos atrib utos
com maior fu ncionalid ad e.
com fator p rincipa l de com peti tivi dade.
Pro cura "captura r" a situa ção d o mercado
para d escobrir quais a tributos são
essencia is à d ifere nci ação.
Quadro 01 – Análise comparativa entre Inovação Disruptiva e Estratégia do Oceano Azul.
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Salienta-se que a proposta de análise apresentada
não objetiva exaurir o tema em estudo; pelo contrário, busca
apresentar questões incipientes para fomentar o debate a
partir de aspectos considerados relevantes. As variáveis
colocadas para a comparação entre as Inovações
Disruptivas e A Estratégia do Oceano Azul também poderão
sofrer alterações e mais outras variáveis poderão ser
adicionadas, conforme novos estudos se associarem a
este.
4 CONSIDERÇÕES FINAIS
A realização deste estudo possibilitou a
identificação de aspectos relevantes na análise da Inovação
como fator de competitividade e sustentabilidade
organizacional. Primeiro, a caracterização da tecnologia
como resultado do acúmulo do conhecimento em indivíduos
e na organização que, associado aos dispositivos
intangíveis e físicos, proporciona evoluções nas
capacidades da firma em desenvolver novos produtos e
serviços ou melhorar os existentes.
Segundo, os não clientes que geralmente não são
considerados pelas organizações ou se o são,
caracterizam-se como um “peso.” Neste estudo, percebeuse que os não clientes formam mercados interessantes e
que podem gerar parcelas significativas de faturamento
quando as empresas conseguirem chegar até eles, seja
através de produtos menos sofisticados com preços mais
atrativos ou pela diferenciação.
Por fim, este estudo poderá contribuir e desafiar a
realização de outras pesquisas, procurando aplicar esta
ferramenta comparativa em estudos de caso em empresas
que se diferenciaram ou desenvolveram Inovações
Disruptivas, investigando como este processo se deu e,
ainda, como as empresas poderão criar seus Oceanos
Azuis, através da inovação pela geração de valor e
diferenciação em custos. Considera-se, também, que as
duas estratégias poderão ser utilizadas conjuntamente para
análise em estudos conforme referido e também para o
desenvolvimento de estratégias que possibilitem às
empresas abandonar a arena da competição dos Oceanos
Vermelhos, navegando, pelo menos temporariamente, em
Oceanos Azuis, criando uma cultura de inovação
permanente. Entende-se que os Oceanos Azuis podem
ser passageiros,;entretanto, acredita-se que a cultura de
inovação inserida na estrutura das organizações lhes
permita se reinventar para criar novos e repetidos Oceanos
Azuis com e/ou através de Inovações Disruptivas.
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20
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
ESTUDO DO POTENCIAL DE MERCADO DE UMA
EMPRESA NO RAMO DO COMÉRCIO E
DISTRIBUIÇÃO DE PRODUTOS DE BELEZA
Cristina Schmitz1
Elisandro Ferretti Berti2
Jesildo Moura de Lima3
Jorge Antonio Rambo4
Sandro Ergang4
RESUMO
O presente artigo trata do estudo do potencial de
mercado de uma empresa no comércio e distribuição de
cosméticos. Para este estudo foram utilizados quatro
municípios da Região Noroeste do estado do Rio Grande
do Sul: Três de Maio, Santa Rosa, Santo Ângelo e Ijuí.
Estes municípios foram tomados por base porque a
empresa franqueaodra exige um número mínimo de
habitantes para a área de atuação de suas franqueadas.
Os produtos a serem comercializados são distribuídos em
todo o país, sendo que a sede da fábrica se situa no
Nordeste. Em relação à concorrência, se comparados, os
produtos podem ser considerados como equivalentes em
qualidade, mas o preço final ao consumidor é mais
interessante. O trabalho trata do estudo de mercado em
sua maior abrangência para assim definir suas
potencialidades e meios de inserção desta nova empresa.
Para este estudo foi utilizada a coleta de dados das fontes
oficiais e posteriormente analisados, obtendo-se, desta
forma, o consumo per capita dos produtos, a previsão de
quanto a empresa poderia faturar de acordo com a fatia de
mercado a ser atingida e quantas consultoras de vendas
seriam necessárias para a inserção da empresa.
been chosen from the Northwest Regionof the state of
the Rio Grande do Sul:Três de Maio, Santa Rosa, Santo
Ângelo and Ijuí. These cities had been taken by base
because the franked company demands a minimum
number of inhabitants for the area of performance to make
it available. The products to be commercialized are
distributed through the country and the headquarter is in
the North-eastern region. In relation to the competition, if
compared, the products can be considered as equivalents
in quality, but the final price to the consumer is more
interesting. The work deals with the study of market in its
bigger enclose to define its potentialities and ways of
insertion of this new company. For this study the collection
of data of the official sources was used and later analyzed,
getting itself, in such a way, the per capita consumption of
the products, the forecast of how much the company could
invoice in accordance with the slice of market to be reached
and how many consulting of sales would be necessary for
the insertion of the company
KEYWORDS: Potential of Market – Sales Foresight
- Sales Force.
INTRODUÇÃO
Palavras-chave: Potencial de Mercado – Previsão
de Vendas – Força de Vendas.
ABSTRACT
The present article is about a study of the potential
of market of a company in the commerce and cosmetic
distribution. For this study four cities of the Region had
Com o aumento da competitividade, as empresas
sentem necessidade de planejar suas ações e se
adaptarem rapidamente às modificações, tornando-se cada
vez mais competitivas, garantindo sua permanência no
mercado. Conhecer o mercado é reconhecer que a
concorrência está aí e, se as empresas não estiverem
atentas às ações das mesmas, muitos esforços de
conquista de seu espaço podem deixar de ter o efeito
desejado.
1
Acadêmica do Curso de Bacharelado em Administração da SETREM.
Acadêmico do Curso de Bacharelado em Administração da SETREM
3
Acadêmico do Curso de Bacharelado em Administração da SETREM
4
Mestres, professores orientadores do Trabalho de Conclusão de Curso do Bacharelado em Administração da Sociedade Educacional
Três de Maio – SETREM.
2
21
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
O marketing é responsável por impulsionar toda a
empresa para ser orientada para o consumidor e para o
mercado, tendo em vista que devem ser estabelecidos
planos para conquistar e manter consumidores. Em razão
de muitos fatores afetarem a satisfação do consumidor, o
marketing deve trabalhar muito para assegurar-se de que
o restante da empresa atenda às expectativas dos
consumidores. O trabalho do marketing é analisar o
mercado, identificar oportunidades, formular estratégias,
desenvolver táticas e ações específicas, propor orçamento
e estabelecer um conjunto de controles.
Tendo em vista que o setor de cosméticos no Brasil
cresceu, em média, 6% ao ano nos últimos dez anos, e
que tem uma alta capacidade de geração de empregos
relacionados com a comercialização dos produtos, o
presente trabalho, baseado no marketing, foi desenvolvido
com o objetivo de analisar o mercado de produtos de beleza
do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, para identificar
o potencial desse mercado, seu potencial de vendas, a
previsão de vendas e, a partir daí, formular uma estratégia
ampla de penetração do mercado, definindo um composto
de marketing específico, incluindo a necessidade de força
de vendas, para otimizar desempenho a longo prazo.
SETOR E MERCADO DE COSMÉTICOS
NO BRASIL
A seguir será apresentado o setor do mercado de
cosméticos no Brasil conforme informações da Associação
Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e
Cosméticos – ABIHPEC, conforme o site: http://
w w w. a b i h p e c . o r g . b r / c o n t e u d o / m a t e r i a l /
apresentacaosetor_2005_2006.pdf .
A Indústria Brasileira de Higiene Pessoal, Perfumaria
e Cosméticos apresentou um crescimento médio
deflacionado composto de 11,5% nos últimos cinco anos,
tendo passado de um faturamento líquido de impostos
sobre vendas de R$ 9,7 bilhões em 2002 para R$ 17,5
bilhões em 2006. O crescimento em dólares em 2004 e
2005 foi influenciado pela desvalorização do real, na média
do ano, em relação ao dólar de 3,9% em 2004 e 17,7% em
2005, além do crescimento real vigoroso do mercado interno
de 13,4% e 14,2%, respectivamente, em 2005 e 2006.
DESEMPENHO DO SETOR DE HIGIENE
PESSOAL, PERFUMARIA E COSMÉTICOS; R$ X US$
O estudo apresenta a empresa franqueadora como
escolhida para a penetração de mercado, sendo que a
decisão por esta empresa ocorreu por causa de seu
espírito empreendedor e ser destaque nacional no setor.
Eis alguns fatores:
- Baixo investimento na compra e manutenção de
franquia.
- Sistema misto de vendas, permitindo venda direta
e lojas.
- Destaque nacional e reconhecimento através do
recebimento de prêmios de qualidade e
empreendedorismo.
- Produtos diferenciados focados nas classe de
população em estudo.
- Sistema diferenciado de acompanhamento e
gestão ao distribuidor.
- Marca não conhecida na região e com total
preferência e exclusividade.
- Diferencial de acompanhamento, capacitação e
flexibilidade de negociação ao distribuidor e consultoras
finais.
- Estabelecimento de plano de crescimento,
incentivos e carreira de forma clara e atingíveis.
Fonte:
http://www.abihpec.org.br/conteudo/material/
APRESENTACAO_2006_2005.pdf
Vários fatores têm contribuído para este excelente
crescimento do setor, dentre os quais se destacam:
- Participação crescente da mulher brasileira no
mercado de trabalho.
- Utilização de tecnologia de ponta e o conseqüente
aumento da produtividade, favorecendo os preços
praticados pelo setor, que tem aumentos menores do que
os índices de preços da economia em geral.
- Lançamentos constantes de novos produtos
atendendo cada vez mais às necessidades do mercado.
- Aumento da expectativa de vida, o que traz a
necessidade de conservar uma impressão de juventude.
CRESCIMENTO DO SETOR VERSUS
CRESCIMENTO DA ECONOMIA
Com exceção do ano 2004, o País apresentou
índices baixos de crescimento econômico nos últimos
22
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
anos. O quadro a seguir compara a evolução do Produto
Interno Bruto com a da indústria em geral e com os índices
da Indústria de Produtos de Higiene Pessoal, Perfumaria
e Cosméticos, demonstrando que o setor apresentou, neste
período, crescimento bem mais vigoroso que o restante
da indústria (11,5% de crescimento médio no setor contra
2,5% do PIB Total e 3,4% da Indústria Geral):
VARIAÇÃO
PERCENTAGEM
ANUAL
DO
SETOR
EM
Fragrâncias
As fragrâncias possuem o maior faturamento no
segmento feminino. Desta forma, reforça-se o conceito de
que as mulheres são as grandes consumidoras em função
de sua vaidade e cuidados especiais com sua estética,
contribuindo de forma expressiva no desempenho deste
segmento.
Fonte:
http://www.abihpec.org.br/conteudo/material/
APRESENTACAO_2006_2005.pdf
DIAGNÓSTICO DO SETOR
O setor de cosméticos no Brasil tem uma
representação significativa no mercado internacional em
que a cada ano que passa o crescimento surpreende os
analistas. Em 2006 o país passou a ocupar a terceira
colocação e vem aos poucos tendo reconhecimento não
apenas em volumes de produtos, mas sim em qualidade
também.
Em conjunto com o crescimento do setor em volume
de produtos vem junto o aumento de oportunidades de
trabalho, ao qual propicia às pessoas uma outra fonte de
renda, sendo esta, a venda direta, que mais tem
crescimento nos últimos anos.
Tanto no volume de produtos, quanto no valor, a venda
direta ao consumidor ultrapassa os 70%, sendo este o
principal canal de participação na categoria de fragrâncias.
Faturamento entre o público masculino,
feminino e infantil
Fonte: http://www.abihpec.org.br/conteudo/material/fragrancias.pdf
23
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Categoria masculina
A maquiagem em termos de volumes
comercializados apresenta maior freqüência na venda
tradicional, porém a venda direta representa uma grande
fatia deste mercado e há expectativas de franco
crescimento ano após ano. Em termos de valores, a venda
direta é que tem maior participação, ultrapassando a casa
dos 60%; isso representa maiores oportunidades de ganhos
financeiros das pessoas envolvidas em relação às outras
categorias.
Cuidados com a pele
De acordo com a ABIHPEC, conforme o site: http:/
/ w w w. a b i h p e c . o r g . b r / c o n t e u d o / m a t e r i a l /
apresentacaosetor_2005_2006.pdf no item cuidados com
a pele a venda tradicional tem maior participação, mas a
venda direta tem participação importante, ultrapassando
os 40%.
O canal de distribuição em volume de produtos
ocorre com maior freqüência de forma tradicional, porém a
venda direta também contribui significativamente, chegando
próximo na casa dos 40%. Em termos de volumes
financeiros, é na venda direta ao consumidor que está a
maior representatividade; para tanto, analisa-se que para
a empresa em estudo reforça as expectativas na
formulação de seu plano de marketing, visto que são
comercializados poucos produtos, mas com uma margem
de lucratividade alta.
Categoria infantil
Os valores comercializados na venda direta
correspondem a uma fatia expressiva, ressaltando que
esse tipo de comércio tem destaque importantíssimo na
participação do giro financeiro que ocorre nesta categoria.
Na categoria infantil os perfumes e colônias
possuem uma concentração de faturamento expressiva.
Como o direcionamento da empresa está de acordo com
esta linha, torna-se importante ressaltar que geralmente
são as mães das crianças que efetuam as compras destes
produtos.
24
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Fonte: Site: www.sbc.org.br; capturado em 23 de março de 2007;
www.ipea.gov.br; capturado em 13 de março da 2007; www.ibge.gov.br
capturado em 12 de março de 2007.
Fonte: Site: www.sbc.org.br; capturado em 23 de março de 2007;
www.ipea.gov.br; capturado em 13 de março da 2007; www.ibge.gov.br
capturado em 12 de março de 2007.
É por meio da venda tradicional que ocorre o maior
volume em vendas e valores comercializados; isto ocorre
em função de existirem ainda poucas opções disponíveis
nas outras formas de comercialização, tanto de venda
direta quanto na forma de franquia. No presente estudo a
categoria infantil também possui significância, em função
de que a empresa em estudo comercializa produtos para
este público.
Fonte: Site: www.sbc.org.br; capturado em 23 de março de 2007;
www.ipea.gov.br; capturado em 13 de março da 2007; www.ibge.gov.br
capturado em 12 de março de 2007.
DISCUSSÃO E APRESENTAÇÃO DOS
RESULTADOS
DIAGNÓSTICO DO POTENCIAL DE
VENDAS DO SETOR DE COSMÉTICOS
Inicialmente, efetuou-se um estudo sobre os dados
demográficos e econômicos dos quatro municípios
escolhidos, baseado em dados oficiais. Esta análise é
importante para o diagnóstico e análise de potencial. Estes
são os números:
Segundo dados oficiais do IBGE, o Produto Interno
Bruto (PIB) apresentado em 2006 pelos quatro municípios
em estudo apresenta valores diferentes, demonstrando
potenciais diversos para um estudo mercadológico. Neste
estudo, levou-se em conta o cálculo de potencial de vendas
descrito por DIAS (2006) que envolve o cruzamento dos
seguintes dados:
- População X Renda Per Capita
Fonte: Site: www.sbc.org.br; capturado em 23 de março de 2007;
www.ipea.gov.br; capturado em 13 de março da 2007; www.ibge.gov.br
capturado em 12 de março de 2007.
Para a previsão de vendas, utilizou-se o cruzamento
de dados da figura seguinte, de acordo com o site: http://
www.ipib.com.br/ranking/pesquisavalestados. asp e http:/
/www.abihpec.org.br/noticias_ultimas_noticias.php, onde
se encontram os dados de origem para a formulação do
cálculo.
25
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
PREVISÃO DE VENDAS
F aturamento do Setor de Cosméticos
no estado do Rio Grande do Sul
P opulação do Rio Grande do Sul
P opulação da Região
Três de Maio, Santa Rosa, Santo Ângelo e Ijuí
P ercentual de Participação de Mercado
Cuidados de Pele 9%
Maquilagens 6%
R$
233,99
2.509.835.413,65
=
10.726.063
Valor de Consumo Per Capita
240.813 = R$
56.347.833,87
x
233,99
P revisão de Vendas
15.777.393,48
28% = R$
x
R$ 56.347.833,87
P revisão de Vendas
Fragrâncias 13%
F atia de Mercado a ser Atingida
3%
R$
473.321,80
x =
R$ 15.777.393,48
F aturamento A nual
Conforme análise, os quatro municípios em estudo são tomados por base em função de suas localizações e por
serem cidades referência para uma possível expansão da empresa.
Na descrição e quantificação da fatia de mercado a ser atingida, dotada de 3%, destaca como necessária e
atingível. Uma penetração menor de 3% não resultaria em visualização e reconhecimento da marca e seus produtos no
mercado. A colocação de um percentual maior traria maiores investimentos demandando a inviabilidade financeira
inicial prevista.
POTENCIAL DE MERCADO E PERSPECTIVA DE VENDAS
*O valor base adotado como parâmetro de vendas a ser considerado na venda por consultoras/mês leva em
conta índices da franquia. Segundo e empresa, a média estabelecida no país pelas empresas no setor é que a partir da
“maturação” da vendedora estabelecido em seis meses, esta passa a viabilizar com um venda de R$1.000,00/mês.
Para dados iniciais, considera um valor menor de R$ 545,00.
De acordo com toda a população da região que é de 240.813 pessoas, a cidade de Três de Maio corresponde a
10%, Santa Rosa 27%, Santo Ângelo 31% e Ijuí 32%. Conforme a renda per capita de cada município que distribuída
seria de 24%, 33%, 18% e 25%, respectivamente, o cálculo do potencial de mercado é a soma da população mais a
renda per capita dividida por dois. Para tanto, verificou-se que o maior potencial de mercado está nas cidades de Santa
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Rosa e Ijuí, com 30% e 29%, respectivamente. Com uma estimativa modesta, as 72 consultoras necessitam vender
produtos no valor de R$ 545,98 para atingir a fatia de mercado projetada de 3% para esta marca de cosméticos nos
quatro municípios em estudo.
ESTABELECIMENTO DA FORÇA DE VENDAS
Conforme análises realizadas com o cenário nacional, no presente trabalho foram levadas em conta o volume
total de vendas no Brasil no setor em estudo. A partir da definição de atuação com um percentual de participação de
mercado em 3%, realizou-se o cálculo a seguir descrito.
A definição do número de consultoras se procedeu
a partir da multiplicação do número de habitantes pelo
percentual da fatia de mercado dividido por cem. Conforme
a figura anterior, deverá haver 72 consultoras a fim de atingir
os 3% do mercado de cosméticos nos municípios
mencionados. Esta força de venda, embasada nas
ferramentas de inserção e desenvolvimento, garantirá uma
atuação visível e viável para os produtos da marca.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desenvolver um negócio desafia administradores em
seus estudos através de alternativas, mercado e índices
financeiros e econômicos para a tomada de decisão. Uma
empresa gerida de uma idéia, e por mais empreendedora
que sejam seus criadores, sempre existe mesmo que
implicitamente, um estudo de probabilidades de resultados
e cenários. Apresentar um projeto através de um estudo
de mercado mune o administrador para a sua tomada de
decisão com ferramentas reais de análise de investimento
e opções para ingresso no mercado. Avaliar o cenário em
estudo através da busca de dados secundários,
responsabiliza a coleta para obter confiabilidade através
de dados oficiais e capazes de satisfazer as necessidades
demandadas.
No referido estudo realizado, através do
conhecimento do mercado, a instalação de uma empresa
prescinde finalmente do grau empreendedor de seus
idealizadores. O estudo levantou o tamanho do mercado e
potencial de venda para a empresa na área geográfica
avaliada. O trabalho estudou a força de venda necessária
apresentando um plano de ação para a sua inserção na
região estudada.
Analisar, adaptar e realizar cada ação até a
concretização de um negócio leva tempo, agilidade,
habilidade e conhecimento. O trabalho buscou reunir
informações confiáveis e reais com uma proposta
consciente de implantação da empresa no mercado
estudado. A efetiva realização da proposta parte do
empreendedorismo administrativo de seus interessados,
mas as ferramentas buscadas tornam fonte de
argumentação e decisão para o negócio se tornar real.
Quanto mais forem tomadas decisões de forma
profissional, argumentada em dados concretos e com
ações de gestão administrativa, cada administrador torna
um elo mais importante no mercado. Cabe a cada
profissional da área absorver e contribuir para a
assertividade e desenvolvimento de suas organizações e
implantar novas idéias.
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28
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
ANÁLISE DO LIVRO DIDÁTICO DE MATEMÁTICA
UTILIZADO EM ESCOLAS PÚBLICAS
Elizangela Weber 1
UNIJUÍ 2
RESUMO
O trabalho expõe a problemática do livro didático e
como este foi inserido na sala de aula, bem como um
estudo teórico sobre o tema. Foi pesquisado nas escolas
públicas de Ensino Fundamental, a importância do livro
para a aprendizagem, como é feita sua escolha, e se é o
único recurso utilizado em sala de aula ou é
complementado de outros meios, entre outras observações
relevantes. Por fim, a análise documental se deu com base
nos livros utilizados pelos professores, quanto a seu
conteúdo, a adequação de sua linguagem, erros
ortográficos, de concordância, erros conceituais e
metodológicos e, principalmente, se este condiz com a
realidade da sociedade em que está inserido, levando em
consideração os aspectos pedagógicos, ideológicos,
econômicos, políticos e religiosos. Sendo assim, está
apresentada a polêmica com relação ao livro didático, que
certamente não resolverá suas eventuais falhas, porém
possibilitará a sugestão de novas propostas tanto para a
sua elaboração quanto sua utilização em sala de aula.
Palavras Chave: Livro didático, ensinoaprendizagem, análise.
ABSTRACT
The work exposes the problem of the textbook and
as how it was inserted in the classroom, as well as a
theoretical study on the theme. It was researched at the
public schools of Elementary Level, the importance of the
book for the learning, as its choice is made, and if it is the
only resource used in the classroom or it is complemented
of other ways, among other relevant observations. Finally,
the documental analysis was done with base in the books
used by the teachers, as its content, the adaptation of its
language, spelling, agreement, conceptual and
methodological mistakes, and, mainly if it appropriate with
the reality of the society in which it is inserted, taking into
account the pedagogic, ideological, economical, political
and religious aspects. Being like this, the controversy is
presented regarding to the textbook, that certainly won’t
solve their eventual fails, but it will make possible the
suggestion of new proposed as to its elaboration as its
use in classroom.
Key words: Textbook, teaching-learning, analysis.
1 INTRODUÇÃO
Este texto debate o uso do livro didático nas aulas
de Matemática, devido à grande quantidade de erros
encontrados em análise de coleções de livros utilizados
na escola pública.
O ensino da matemática incentiva o aluno a construir
suas idéias, refletir, concluir; enfim, contribui para sua
formação intelectual e, portanto, equipando-o para exercer
a cidadania. Todavia, para que os aprendizes sejam
cativados pela educação matemática é preciso aumentar
a participação destes na produção do conhecimento,
atendo-se menos a regras e técnicas sem sentido. Para
isso, o professor precisa passar por uma prática reflexiva
de seus métodos e pela formação continuada.
O educador precisa ter uma postura reflexiva e
crítica, capaz de mostrar que não basta adotar um livro
didático em sala de aula para que as crianças aprendam.
É preciso tomar decisões particulares e coletivas,
baseadas em uma sólida bagagem conceitual,
possibilitando a formação de crianças autônomas, capazes
de diferenciar formas de apresentação e de elaborar idéias
para novos problemas diferentes dos trabalhados na escola.
Para tanto, o Ministério da Educação e Desporto
elaborou, em 1998, os Parâmetros Curriculares Nacionais
- PCNs, propostas educacionais para orientar os
professores mediante a apresentação de formas e
currículos, embasados nos pressupostos básicos da Lei
1
Licenciada em Matemática pela URI, Especialista em Metodologia do Ensino de Ciências e Matemática pela EDUCON, Mestranda em
Modelagem Matemática, Bolsista da CAPES pela UNIJUÍ, [email protected].
2
Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ, Rua São Francisco, 501 – Bairro São Geraldo, Ijuí – RS,
e-mail: [email protected]
29
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB nº9.394/
96).
No contexto da inovação curricular proposta pelos
PCNs, Brasil (1998), uma questão importante é a
possibilidade de implementação de algumas de suas
orientações conceituais e procedimentais quando o livro
didático é assumido pelos professores como fonte quase
única de preparação de aulas, influenciando no processo
de aprendizagem do aluno. Desta forma, dar-se-á nesta
monografia ênfase para a questão acima apresentada,
referindo-se ao ensino da matemática de 5ª a 8ª séries.
“insere-se em um rol de medidas visando à reestruturação
e o controle ideológico de todo o sistema educacional
brasileiro” (1989, p.24).
Conforme Freitag; Costa; Motta (1989, p. 131), o
decreto refletiu no trabalho do professor, fazendo com que:
[...] o professor não somente se contenta com
o que tem como ainda o idealiza, fazendo do
livro didático não um entre outros, mas o seu
único instrumento de trabalho. [...] Os
professores passam a respeitar a palavra
escrita do livro como árbitro último,
submetendo-se docilmente ao seu conteúdo
psicopedagógico e ideológico.
2 METODOLOGIA
Güllich (2004, p. 43-44) complementa:
As decisões e escolhas metodológicas e didáticas,
bem como as opções acerca do conteúdo a ser estudado,
a determinação dos objetivos e das metas a serem
alcançados na pesquisa pedagógica e as formas de análise
do livro didático estão sempre ancoradas no contexto
educacional da escola.
Na busca de uma pesquisa que nos permite uma
visão mais ampla do papel do livro didático na sala de aula
e possibilite uma análise comparativa das concepções de
ensino-aprendizagem do livro didático com as propostas
pelos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs, optouse por realizar uma revisão bibliográfica sobre a história e
implantação do livro didático no Brasil e as avaliações do
livro ao longo dos anos. Em seguida foi realizada a pesquisa
das coleções utilizadas nas escolas públicas de Ensino
Fundamental – séries finais do município de Giruá-RS.
Após conseguir as coleções, foi realizada a análise
destas, onde foram encontrados erros ortográficos,
inadequações de conteúdos e linguagem, concordância,
erros conceituais e metodológicos.
Nesta proposta, analisou-se, ainda, se os conteúdos
contidos nos livros condizem com as propostas dos
Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs para cada ciclo
e se estes alcançam os objetivos do mesmo.
3 A AVALIAÇÃO DO LIVRO DIDÁTICO
No mesmo período em que surgiu o Livro Didático,
cria-se também a Comissão Nacional do Livro Didático –
CNLD, à qual cabia julgar, examinar e indicar os livros
didáticos a serem adquiridos pelo governo e usados nas
escolas. Isto ocorria sem a participação efetiva da
comunidade escolar e/ou de profissionais da área da
educação. Tratava-se de algo imposto de forma hierárquica.
No Estado Novo, essa Comissão tinha mais o objetivo de
ratificar a ideologia nacionalista e a função de um controle
político e ideológico, do que propriamente a função didática.
Freitag; Costa; Motta consideram que a criação da CNLD
[...] os livros didáticos são documentos que
expressam de forma oficial o ensino no Brasil,
pois, têm o aval do PNLD (Programa Nacional
do Livro Didático), o que lhes permite na maioria
das vezes ditar o currículo ensinado nas
escolas de todo o país.
Em 1960 ocorre o acordo MEC/USAID (este último,
representante dos interesses estadunidenses), que faz com
que o MEC passe a ter o controle do mercado dos livros
didáticos em termos de distribuição e consumo, ao passo
que o governo estadunidense adquire o controle ideológico
do material produzido. Esse era um contrato de
colaboração e participação na produção de livro didático.
Com isso, há uma forte estatização na política e no
mercado destes livros.
Percebe-se que, na época, as diversas instituições
não têm forças para influenciar na política estatal do livro
didático, totalmente dependente e controlado pelo Estado,
que escolhia o conteúdo, indicava, encomendava e
distribuía os livros. Já em outros países associações de
pais, professores, alunos, enfim pessoas da comunidade
escolar, participavam ativamente na escolha do conteúdo
do livro didático.
É pertinente discutir a natureza da política que
envolvia o livro didático. Nesse período ela era centralizada
no poder estatal. A questão da centralização ou não da
política do livro didático tem diversos pontos positivos e
negativos. Os que defendem a centralização estatal
argumentam que há vantagem da racionalização do
material e distribuição. Já os que defendem a
descentralização colocam que o processo centralizador é
mais passível de corrupção, pois fica restrito a pequenas
esferas de decisão sem um maior controle social efetivo;
é mais burocrático, pois para ser gerenciado em nível tão
grande como o nacional, requer uma forte organização,
visto que a realidade demonstra uma tendência à
burocratização. Estes últimos também argumentam que
a descentralização possibilita uma maior democratização
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
na seleção do material didático, seu conteúdo, forma de
distribuição, uso.
Com essa democratização, há tendência à
regionalização, respeitando as especificidades lingüísticas,
culturais e sociais da comunidade que dele se utiliza.
Porém, com isso, corre-se o risco de aumentar as
desigualdades regionais existentes, segundo a postura dos
que defendem a centralização.
Por outro lado, os que defendem a descentralização
afirmam que esta permitiria, facilitaria a sua adaptação às
realidades regionais e às necessidades de aprendizagem
dos alunos dentro da região em que vivem.
Sobre a regionalização e aproximação do livro
didático à realidade do aluno, Silva (2000, p. 38) afirma:
Diante da concepção de que as editoras são
simplesmente empresas capitalistas, que
colocam o lucro acima de tudo e que, por isso,
se beneficiam com a produção do livro
descartável ou consumível e até com produção
de livros não consumíveis, seria temerário
imaginar um LD regional, saído das editoras,
com qualidades física e pedagógica
satisfatórias. Também seria temerário imaginar
que, por iniciativa das mesmas editoras, os
livros viessem a ter formulação do seu
conteúdo entregue à responsabilidade de
equipes técnicas e de autores locais.
Em relação à qualidade do livro didático, é
importante remeter a 1938, 1969 e 1984, quando foram
criadas comissões para avaliar os livros produzidos pelas
editoras. Essas comissões se deram em âmbito nacional
e estadual. Quanto às primeiras comissões, vale ressaltar
que não havia critérios estabelecidos de avaliação, o que
dificulta qualquer processo avaliativo.
Os membros dessas comissões eram especialistas
contratados pelo governo, podendo, assim, assumir a
função de censores do Estado, por questões políticas, uma
vez que dependem de uma indicação política para
assumirem essa função. Em termos de competência
técnico-científica, esses assessores não são melhores que
professores, pesquisadores e alunos, tendo estes outros
a vantagem de estar inseridos no processo educativo, no
contato diário com o material didático e na realidade em
que a escola está posta; portanto, mais aptos para falar
dessa realidade, interferir e adequar o material didático às
reais necessidades.
O livro didático deve ser um material de apoio, ter
espaço e abrir espaço para a reflexão e o questionamento
da realidade e dos conhecimentos já adquiridos e
sistematizados pela sociedade no decorrer histórico para,
a partir dessa reflexão, construir novos conhecimentos e
avançar nos já existentes.
Atendendo em parte a sugestão de Freitag; Costa;
Motta é instituído pelo Decreto 91.542, de 19 de agosto
de 1985, o PNLD, Programa Nacional do Livro Didático:
As duas posturas requerem uma série de cuidados,
mas a que se mostra mais democrática e passível de
atender às necessidades da comunidade escolar e da
comunidade como um todo, já que uma das funções da
escola é formar ou possibilitar a formação de cidadãos
críticos e conscientes, de respeitar as especificidades de
cada região ou grupos sociais é a postura
descentralizadora. Experiência esta tentada em alguns
países europeus e que tem mostrado resultados frutíferos.
Art. 1º - Fica instituído o Programa Nacional do
Livro Didático, com a finalidade de distribuir
livros escolares aos estudantes matriculados
nas escolas públicas de 1º Grau.
Art. 2º - O Programa Nacional do Livro Didático
será desenvolvido com a participação de
professores do ensino de 1º Grau, mediante
análise e indicação de títulos dos livros a serem
adotados.(DECRETO 91.542/1985)
Enquanto esta postura não é inserida em nosso
cronograma, observa-se a necessidade da substituição do
livro didático ou de sua complementação com outros
recursos alternativos, na sala de aula:
Este sistema foi implantado para analisar os livros
didáticos, seguindo normas definidas por pesquisadores
de diferentes áreas da educação escolar e regimentadas
pelos órgãos competentes, tais avaliações têm influenciado
na formação de professores, na reorganização das
estratégias de ensino e no trabalho pedagógico da escola.
Enfim, entende-se que esta análise deve abranger desde
os parâmetros curriculares até a prática em sala de aula.
[...] contudo, os desentendimentos sobre a
política de regionalização e suas modalidades
e sobre as condições reais de criação,
produção e utilização de novos recursos
didático-pedagógico aumentam as dificuldades
de dispensa do LD tradicional na sala de aula
da rede pública do ensino fundamental, onde o
livro continuará tendo, não se sabe até quando,
o seu lugar garantido.(SILVA, 2000, p.39)
Além do objetivo de buscar a melhoria da qualidade
do ensino, o PNLD direciona-se a aprimorar a qualidade
pedagógica e física dos livros utilizados pela rede de ensino
e promover a reutilização dos livros de 2ª a 8ª séries.
As editoras justificam o uso do livro didático
descartável argumentando que possuem um baixo custo
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
em altas tiragens; têm maior adequação ao professor;
possuem atualidade pedagógica, já que são refeitos e
podem ser revistos a cada ano. Quanto a esse último
argumento, pode-se observar, analisando diversas edições
de um mesmo título do livro didático, que o texto parece
invulnerável ao dever histórico, logo não se altera nem se
atualiza da forma como as editoras estão argumentando.
Como o livro didático brasileiro é uma das poucas
formas de documentação e consultas empregadas por
professores e alunos, e a maioria destes apresentavam
baixa qualidade, o MEC – Ministério da Educação cria
uma comissão para avaliação, em 1993, formada por
professores do Ensino Fundamental e por pesquisadores
universitários. Comissão esta, que tinha como principais
objetivos, avaliar a qualidade dos livros mais solicitados e
estabelecer critérios gerais para avaliação das novas
aquisições (lançamentos).
As avaliações feitas pelo MEC, ou melhor, pela
comissão destinada a ler, corrigir, apresentar soluções,
enfim avaliar a qualidade do livro didático pelo seu caráter
ideológico e discriminatório, sua atualização à realidade,
incorreções teóricas e metodológicas, têm como tarefa
classificar os livros em: excluído, não recomendado,
recomendado com restrições e recomendado; porém, esta
classificação não é apresentada ao professor na hora de
este efetuar sua escolha.
Após a primeira avaliação dos livros didáticos, feita
pela comissão destinada pelo MEC no ano de 1994, o
MEC modifica o processo de seleção e escolha do livro
didático pelo PNLD – Programa Nacional do Livro Didático,
criando em 1996 o Guia do Livro Didático, o qual apresenta
as resenhas críticas que evidenciam os problemas e as
qualidades do livro, avaliando assim sistemática e
continuamente o livro didático brasileiro e ainda oportuniza
debates entre os autores envolvidos em sua produção e
consumo, em relação a suas características, funções e
qualidades.
Depois da instalação da comissão de avaliação e a
criação do Guia do Livro Didático, as editoras têm
selecionado melhor seus exemplares, as mudanças foram
notórias tanto nos conteúdos quanto na maneira como estes
são abordados.
alcance dos alunos. Esta afirmação nos reporta ao contexto
de discussão do uso do livro didático num país com pouco
acesso à informação por alunos e professores, a qualidade
da formação do professor, entre outros, que tornam o livro
didático de fundamental importância na sala de aula e no
processo de ensino-aprendizagem.
Ao discutir o uso do livro didático, faz-se necessário
apontar para a adequação da proposta por ele apresentada
e à forma de utilização pelo professor. Ao utilizá-lo ou
explorá-lo em planejamentos ou aulas propriamente ditas,
o professor precisa fazê-lo com a consciência de que este
é auxiliar ao processo e não pré-determinante deste.
O professor, ao ensinar matemática, envolve
métodos coerentes com o que acredita em termos de
aprendizagem; isto é, métodos que permitem construir o
conhecimento são desenvolvidos por professores que
acreditam que aprender implica participação efetiva do aluno
no processo. Este alicerçado na investigação, na
comunicação entre os sujeitos e na argumentação,
buscando compreensões. Quando os métodos utilizados
são alicerçados na crença de que o aluno aprende ouvindo
o que o professor fala ou simplesmente reproduzindo
ações, os métodos serão coerentes com isso e o ensino
terá ênfase no objeto do saber, chamando de ensino
tradicional.
O professor, ao realizar uma reflexão sobre o que é
apresentado teoricamente na fonte de pesquisa em
questão, estabelecerá a dimensão de sua influência na
prática. Então, a adequação da proposta do livro, de
exemplos e de exercícios, poderá ser feita mediante uma
ação docente que valorize a significação dos conteúdos
apresentados, mesmo que tal significação não seja
evidenciada na fonte de pesquisa, no livro didático.
Assim, de forma coerente com a concepção de
ensino defendida pelo professor, o livro didático pode servir
como um material de ajuda e consulta, sem prejudicar a
autonomia do professor na gestão da sala de aula, sendo
usado como um recurso pedagógico integrado a um
processo de ensino e aprendizagem próprio e com
características definidas pelos saberes docentes
construídos e em constante construção.
Sabe-se das reais condições das escolas,
4 A UTILIZAÇÃO DO LIVRO EM SALA DE principalmente as públicas, que não possuem um acervo
AULA
bibliográfico disponível, nem salas de estudo, materiais
O livro didático deve ter o potencial de instruir,
informar e divertir. Pode auxiliar no processo de ensinar e
aprender, com uma orientação adequada para o
desenvolvimento de habilidades que tornem o aluno sujeito
de sua aprendizagem, considerando-o em sua
integralidade.
O livro didático é adotado em várias regiões de nosso
país, em muitas delas é o único material de apoio utilizado
pelos professores e fonte de conhecimento que está ao
pedagógicos, enfim tanto as escolas se encontram em
situação precária, quanto as condições de trabalho do
professor, que geralmente possuem uma vida de correria
e improvisações, carga horária excessiva, desvalorização
salarial, afinal os professores se tornam escravos do
trabalho.
Em alguns estabelecimentos de ensino o educador
deve seguir fielmente os “programas oficiais” impostos
pelas autoridades, os quais muitas vezes, estão distantes
das práticas escolares, dificultando a aplicação de didáticas
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
(ou o seu desvelamento) pela confrontação
entre ela e a realidade (como de fato está
sendo e não como o discurso oficial diz que ela
é), realidade vivida pelos educandos e pelos
educadores, percebemos a inviabilidade de
uma educação neutra. A partir deste momento,
falar da impossível neutralidade da educação
já não nos assusta ou intimida. É que o fato de
não ser o educador um agente neutro não
significa, necessariamente, que deva ser
manipulador (...). O que temos de fazer, então,
enquanto educadoras ou educadores, é aclarar,
assumindo a nossa posição, que é política, e
ser coerentes com ela, na prática (FREIRE,
1987, p.28-9).
diferentes de interesse dos alunos; além disso, ainda tem
as editoras com suas estratégias de venda, exibindo
“versão atualizada e ampliada” ou “contextualizado segundo
os PCNs”.
Diante de toda essa problemática, o livro didático
passa a ser a opção de planejamento utilizada pelo
professor, uma vez que apresenta facilidades, tais como
apresentação dos conteúdos previamente distribuídos,
apresentando orientações didático-metodológicas, com
sugestões de como se pode trabalhar um determinado
conteúdo, com respostas e soluções de exercícios
propostos.
Observa-se que nem sempre a boa vontade do
professor é suficiente para que ele possa prescindir do
uso do livro didático, pois é a realidade social e educacional
do país, incluindo a falta de condições de trabalho do
professor, que praticamente o obriga a utilizar o livro didático
em suas aulas.
Apesar da maioria dos professores não terem tempo
para ler, pesquisar e atualizar-se com um número muito
grande de aulas por dia, sem muito parâmetro para analisar
os conteúdos de ensino, com muitas turmas para atender,
eles devem conscientizar-se de que o livro didático é
apenas um complemento de seu trabalho em sala de aula
e não pré-determinante deste. E mesmo usando este
somente como auxílio, antes devem analisar as atividades
propostas, bem como os defeitos presentes no circuito de
produção, circulação e consumo de livros didáticos.
Quando a presença do livro didático na sala de aula
é inevitável, ele pode exercer um papel mais importante
do que o do professor, do jeito que querem as classes
dominantes, reproduzindo os conhecimentos e valores
adequados às classes socialmente privilegiadas.
Freire (1987, p. 31) ainda adverte ao professor/
educador que supere sua ingenuidade diante do conteúdo
ideológico dos textos didáticos:
Temos de respeitar os níveis de compreensão
que os educandos – não importa quem sejam
– estão tendo da sua própria realidade. Impor
a eles a nossa compreensão em nome da sua
liberdade é aceitar soluções autoritárias como
caminhos de liberdade. Mas assumir a
ingenuidade dis educandos demanda de nós
a humildade necessária para assumir também
sua criticidade, superando, com ela, a nossa
ingenuidade.
Em síntese, Freire (1987) recomenda aos
professores/educadores que assumam, conscientemente,
a sua posição que é naturalmente política, mas não se
tornem dominadores e pautem a sua ação pelo bom senso.
Todos os cuidados no uso do livro didático são
necessários porque, conforme a opinião de vários autores
de obras sobre o livro didático, este é um livro que tem um
espaço garantido por longo tempo, na escola.
Silva (2000, p. 42), complementa:
De acordo com Silva (2000), o professor é
pressionado de tal forma que, quase sempre, não tem
consciência da sua inferioridade em relação ao livro que
adota e também não percebe a ideologia subjacente aos
textos e exercícios das suas lições.
O professor não exerce plenamente seu direito de
escolha do livro didático a ser adotado em suas aulas
porque, além de faltar formação adequada, é muitas vezes
influenciado pela oferta das editoras, que como cortesia
oferecem o Livro do Professor, e, ao acatar passivamente
como verdadeiras as informações contidas no livro didático,
o professor assume uma atitude ingênua. E, agindo com
ingenuidade o professor colabora com a intenção ideológica
da editora e/ou do autor. Entretanto, como adverte Paulo
Freire, o professor, por não ser um agente neutro, não pode
passar a ser manipulador:
Na medida em que compreendemos a
educação, de um lado, reproduzindo a
ideologia dominante, mas, de outro,
proporcionando, independente da intenção de
quem tem o poder, a negação daquela ideologia
Em face das deficiências do LD, cabe ao
professor que acredita na sua capacidade de
utilizar outros recursos didáticos sugerir aos
seus alunos as atividades que os levem a
desenvolver as suas próprias capacidades
cognoscitivas, para poderem lidar criticamente
com os conteúdos.
A inquietação diante deste quadro da realidade
escolar se justifica sobremaneira porque depende da melhor
qualificação e valorização do professor a escolha do livro
didático de melhor qualidade e a sua adequada utilização
na sala de aula e, conseqüentemente, a redução dos
índices de fracasso escolar de crianças carentes.
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
5 ANÁLISE DAS COLEÇÕES DE
5.1 RESPONSABILIDADE
LIVROS DIDÁTICOS
ESCOLHA DO LIVRO DIDÁTICO
A análise de coleções de livros didáticos utilizados
nas escolas e o trabalho do professor foi realizada em
escolas públicas do município de Giruá, noroeste do
Estado do Rio Grande do Sul, em que se buscou
compreender a prática docente, envolvendo a maneira como
esta trabalha com o livro didático na sala de aula, a
metodologia e as técnicas de ensino no decorrer das aulas.
O município de Giruá-RS possui 17.070 habitantes,
segundo o IBGE (2007) e um território de 835,04 km2; em
sua área rural, possui seis escolas, duas da rede estadual
e quatro da rede municipal, sendo que três apresentam
Ensino Fundamental completo (duas da rede estadual e
uma da rede municipal). Na área urbana, há nove escolas
da rede municipal, quatro da rede estadual e uma da rede
particular. A rede municipal possui cinco escolas de Ensino
Fundamental completo e cinco escolas de Educação
Infantil; a rede estadual possui quatro escolas de Ensino
Fundamental completo, dentre estas, uma possui o Ensino
Médio. Há, ainda, uma escola da rede particular de
Educação Básica.
Escolheu-se abordar o livro didático porque este é
adquirido por todas as escolas da rede pública, uma vez
que é distribuído gratuitamente em todo o Brasil, estando
presente na realidade da escola há muitos anos. O
professor atualmente o adota conforme suas preferências,
levando em consideração a realidade na qual sua escola
está inserida e a metodologia que melhor atende suas
perspectivas de ensino.
Abrangeram-se as séries finais do Ensino
Fundamental, porque é neste período que o livro didático
tem sido o principal, ou único, referencial utilizado pelo
professor. O livro didático geralmente é o único material
de estudo que crianças e jovens oriundos de famílias de
baixa renda têm acesso durante os estudos ou até por
toda a vida. Crianças estas que se concentram nas escolas
públicas. Coloca-se em evidência as séries finais, porque
a quinta série marca o início de uma nova etapa na vida
escolar, um salto extraordinário. O educando sofre com a
diversidade de metodologias, um grande número de estilos
docentes e, principalmente, um livro didático para cada
disciplina.
Conhecer a metodologia desenvolvida nos conteúdos
propostos na disciplina de Matemática pelo professor e
como os alunos estão captando essa metodologia no
sentido em que ele consiga ligar esse conteúdo com a
sua vida, com seu dia-a-dia, dando um sentido mais real
entre o conteúdo e a prática, como são avaliados e como
gostariam que fossem as avaliações; enfim, conhecer a
realidade entre ensinar e aprender e ver que entre esses
dois conceitos existem muitas barreiras que vão depender
muito do conhecimento, da vontade, do entusiasmo do
professor para que essas barreiras sejam transpostas sem
que possam interferir na busca do conhecimento.
PELA
O tema “Livro Didático”, sua qualidade, seu uso
pelo professor e aluno insere-se num contexto mais amplo
da economia e política educacionais e da sociedade como
um todo. Não se tem a intenção de discutir essa questão
de forma tão ampla, porém analisar o conteúdo e
metodologia em relação ao problema específico do livro
de matemática adotado nas escolas públicas, nas séries
finais do Ensino Fundamental.
O aluno é o usuário por excelência. Mas não é ele,
pelo menos na maioria dos casos, quem decide pela
escolha do título adotado. Essa escolha é do professor,
que tem a “liberdade” e a “responsabilidade” para a adoção
do livro.
Reclama-se muito da qualidade do livro didático; no
entanto a sua adoção maciça estimula a sua reprodução.
De acordo com Elza Yasuko Passini (1994), “a escolha é
feita muitas vezes de forma ingênua, pois os professores
são atraídos pela maquiagem das ilustrações e frases de
efeito, qual propaganda televisiva” (p.44).
O professor pode ser responsabilizado no momento
da escolha ou no momento da utilização, pela forma como
o faz. É possível escolher-se um livro de péssima qualidade,
contendo inclusive erros em seu conteúdo, porém que se
faça bom uso dele, permitindo aos alunos uma crítica,
utilizando o livro como um dos instrumentos e não como o
único e inquestionável. Assim como se pode tomar o texto
do livro didático como ponto de partida para uma discussão
aberta com os alunos.
5.2 A ANÁLISE DOS LIVROS
Segundo o Guia do Programa Nacional do Livro
Didático – PNLD, Brasil (2007), o recurso mais eficaz à
disposição dos professores é o livro didático. Este fornece
informações, conteúdos, propõe exercícios, desafios de
diversos níveis de dificuldade, propostas pedagógicas,
auxilia na avaliação da aprendizagem do aluno, entre
outros.
Isso não significa que o professor deve acatar o livro
didático como único recurso e submeter-se a todas suas
atividades sem contestá-las. Afinal, ninguém melhor que
o educador para conhecer melhor as táticas de
aprendizagem de seus alunos, a realidade da escola e do
bairro onde está inserido. Sendo, assim, o mais indicado
para definir o planejamento, os métodos e as propostas
de ensino coerente com sua necessidade.
Não se pode ignorar que, entre as coleções
disponíveis, há algumas mais próximas da concepção e
prática de ensino-aprendizagem praticada pelo professor
e, muitas vezes, melhor se ajustam ao projeto políticopedagógico da escola. Assim, tendo presente algumas
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
coleções de livros adotadas nas escolas, investigou-se os
erros abordados nos livros e a possibilidade de desenvolver
a matemática no Ensino Fundamental mais coerentemente
com a proposta dos PCNs, a partir da adoção do livro
didático pelo professor.
Nos livros didáticos de matemática, de 5ª a 8ª séries,
adotados na escola pesquisada, não se percebeu uma
preocupação metodológica para um trabalho eficaz de
leitura e interpretação da linguagem matemática.
A coleção de livro didático mais utilizada na escola
para o ensino da matemática de 5ª a 8ª séries é: Matemática
na Medida Certa, dos autores José Jakubovic e Marcelo
Lellis, da editora Scipione. A forma de utilização destas
bibliografias se caracteriza como determinante no processo
ensino-aprendizagem nas aulas de matemática, uma vez
que estes livros são utilizados diariamente por professor e
alunos.
Porém, vale ressaltar que o professor utiliza ainda
outras coleções como forma de complementação e ainda
realiza atividades extraclasse, que não se encontram nos
livros didáticos.
Os livros foram lidos para analisar a proposta das
coleções. Para tanto, é relevante rever, observar e interpretar
os conteúdos que constituem o programa de cada volume
(associado às respectivas séries) e, em seguida, efetuar
uma análise dos erros encontrados e a ligação com as
sugestões dos PCNs.
Dentre um e outro livro didático analisado, percebese que a estrutura de cada capítulo está basicamente
disposta em: um exemplo, em seguida o raciocínio da
matemática geral, as “fórmulas”, e finaliza com exercícios.
Em alguns, encontrou-se, ao final dos capítulos, propostas
de atividades participativas, o que possibilita ao aluno a
interação do conhecimento adquirido com a prática.
Na análise, deparou-se com erros algébricos, tais
como: em um exemplo de simplificações de frações
encontra-se “2 x 5 = 40” (JAKUBOVIC - 5ª série, p.154).
Sabe-se que dois multiplicado por cinco não resulta em
quarenta, mas oito multiplicado por cinco, sim. Em outro
exemplo, de divisão de polinômios, dividem somente a
parte numérica da expressão e esquecem da parte literal;
porém a resposta se apresenta certa. A revisão da ortografia
seria um método necessário para que erros como estes
não interfiram no processo de aprendizagem do aluno.
No estudo da geometria, autores confundem a
utilidade dos materiais para desenho geométrico, tais como:
régua, compasso, transferidor e esquadro, fazendo
algumas trocas na ordem do exercício: “medir o ângulo
com o esquadro” (JAKUBOVIC - 5ª série, p. 79), o esquadro
possui somente ângulos que medem: 90º, 60º, 45º e 30º,
e ainda estes não possuem medidas. O aluno necessitará
do auxilio de uma outra ferramenta para verificar o ângulo
do esquadro. “Desenhar uma circunferência com o auxílio
da régua” (JAKUBOVIC - 5ª série, p. 89), e o compasso e
transferidor para que servem?
Ainda no estudo da geometria: “Os matemáticos
consideram que os pontos são tão pequenos que não
chegam a ter tamanho algum” (JAKUBOVIC - 5ª série, p.
68). Por mais que em algumas situações o tamanho do
ponto é desprezível, não se pode afirmar que este não
possui tamanho. “A reta AB não tem começo nem fim”
(JAKUBOVIC - 5ª série, p. 69). Deve-se, neste caso,
conceituar o infinito. “As retas r e s, que não se cortam,
são paralelas” (JAKUBOVIC - 5ª série, p. 70). As retas
não se cortam, se interceptam, pois o verbo cortar, segundo
o dicionário Aurélio, significa: dividir com instrumento de
gume; separar (uma parte) de um todo com instrumento
cortante..., e em nenhum destes casos podem-se inserir
as retas paralelas.
Em relação aos números racionais, encontrou-se:
“Vamos considerar que frações também são números”
(JAKUBOVIC - 5ª série, p.150). Não é que vamos
considerar, frações são números racionais absolutos.
Continuando nos números racionais, no estudo da
multiplicação e divisão: “depois, colocamos o sinal”
(JAKUBOVIC - 6ª série, p.74), porém em qualquer operação
devemos trabalhar com o sinal simultaneamente e não
simplesmente, ao final do cálculo, “colocar” o sinal.
No estudo das propriedades das raízes, alguns
exemplares
não apresentam a propriedade:
m
*
n
m
n
a = a a ∈ ℜ, m ∈ Ν, n ∈ Ν , esta também é muito
importante, além de facilitar os cálculos. Ainda no estudo
da radiciação, este muitas vezes não é apresentado como
operação inversa da potenciação; porém, para o
desenvolvimento das equações do 2º grau será necessário
para o aluno observar por que uma equação é resolvida
desta forma: (x − 2 )2 = 9 → x − 2 = ± 9 → x − 2 = ±3 .
Erros ortográficos são também freqüentes em
coleções, especialmente as mais antigas. No decorrer da
análise, pode-se perceber palavras grafadas erroneamente,
(“sobvre”, “tranportamos”) (JAKUBOVIC - 7ª série, p. 34),
capítulos numerados de forma incorreta, resolução de
expressões numéricas incompletas (incógnitas são
esquecidas no decorrer do cálculo, parênteses não são
utilizados em substituições da multiplicação em uma
equação), representar numericamente um número e por
extenso escrever outro (“10º20’5" (dez graus, vinte minutos
e dez segundos”)) (JAKUBOVIC - 6ª série, p.192).
Encontram-se, ainda, expressões de sentido ambíguo,
como: “dar zero” (JAKUBOVIC - 7ª série, p.85) ou resultar
em zero, “o lado do triângulo cai sobre” (JAKUBOVIC - 7ª
série, p.141) ou sobrepõe, “o método inventado”
(JAKUBOVIC - 7ª série, p. 191) ou descoberto.
Redundância de termos, pois se o triângulo é retângulo, é
obvio que não terá nenhum ângulo obtuso, entre outros
equívocos cometidos no decorrer dos livros.
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Os livros, geralmente são ilustrados com figuras,
diálogos, gráficos e exemplos, entre os quais se percebe
predominantemente a razão feminina. Geralmente as
meninas têm razão e os meninos é que estão errados,
fazendo prevalecer a idéia de que as meninas são mais
estudiosas que os meninos. Durante o diálogo, em alguns
balões, personagens desvalorizam a importância das
equações ou cálculos, referindo-se a estes desta maneira:
“isto”, “o resultado disso” (JAKUBOVIC - 6ª série, p. 87),
tornando o cálculo pejorativo.
As possibilidades de seqüenciar os conteúdos
são múltiplas e decorrem mais das conexões
que se estabelece e dos conhecimentos já
construídos pelos alunos do que da idéia de
pré-requisito ou de uma sucessão de tópicos
estabelecida a priori. Embora existam
conhecimentos que precedam outros, a
hierarquização entre eles não é tão rígida como
tradicionalmente é apresentada (BRASIL, 1998,
p.53).
Apresentam ainda desproporcionalidade das
gravuras (por exemplo, uma figura deve ter lados iguais a
3cm e 0,5cm, mas no retângulo apresentado pode-se
perceber que um lado é apenas o dobro do outro)
(JAKUBOVIC - 7ª série, p. 49) e na representação de
ângulos (JAKUBOVIC - 6ª série, p. 196), o que acarreta
imprecisão de desenhos matemáticos.
A concepção adotada para a abordagem dos
conteúdos e para a distribuição dos mesmos no livro
didático não considera o acima exposto, uma vez que é
apresentada uma fragmentação e uma linearidade para os
conteúdos, decorrente da valorização de pré-requisitos no
estudo da série precedente. A par da caracterização feita
para os tópicos específicos de cada volume, bem como
do conhecimento da coleção na sua totalidade, é possível
afirmar que a proposta para a concepção da aprendizagem
é facilitada com a exploração do conteúdo em suas partes,
e não diretamente como um todo.
Analisando alguns exemplares da mesma coleção,
deparou-se com homogeneidade de capítulos de um livro
para outro, em edições distintas, páginas idênticas.
Confirmando o desleixo de editoras para com a atualização
anual, que estas julgam necessária.
Percebe-se, ainda, uma descontextualização com
a realidade da escola onde os livros estão inseridos. Fatos
históricos, ligações entre o conteúdo e os povos antigos,
origens do conteúdo não são abordadas com pouca
freqüência no decorrer do livro. Os capítulos iniciam nos
exemplos, sem abranger maiores explicações de por que
se estuda tal conteúdo, por exemplo, e das
demonstrações, dos teoremas e fórmulas.
Vale ressaltar que alguns livros abordam com êxito
modelos de gráficos e a importância destes para a vida
cotidiana dos educandos, uma vez que este conteúdo pode
ser visualizado em jornais, revistas, folhetos informativos,
meios de comunicação, além de ser um instrumento
essencial para a constituição da atitude crítica dos alunos
diante das questões sociais, políticas, culturais, cientificas
da atualidade. Mas, infelizmente, só é apresentado no
último capítulo do livro, o qual a maioria dos professores
não trabalha, devido à carga horária reduzida.
A ordem na abordagem dos conteúdos não se
justifica pela consideração de pré-requisitos, pois não é
mostrada sua utilização enquanto conhecimentos prévios
na evolução dos conteúdos. Além dos conteúdos já
trabalhados, deve-se levar em consideração os
conhecimentos adquiridos no cotidiano, abordando os que
apresentam relevância social e contribuem para o
desenvolvimento intelectual e pessoal do aluno.
Não obstante a valorização da conexão entre os
conteúdos é importante salientar que nestes ciclos precisase desenvolver o raciocínio matemático e o afeto dos
estudantes para com a disciplina em questão:
[...] é preciso desenvolver o trabalho
matemático ancorado em relações de confiança
entre o aluno e o professor e entre os próprios
alunos, fazendo com que a aprendizagem seja
vivenciada como uma experiência progressiva,
interessante e formativa, apoiada na ação, na
descoberta, na reflexão, na comunicação. É
preciso ainda que essa aprendizagem esteja
conectada à realidade, tanto para extrair dela
as situações-problema para desenvolver os
conteúdos como para voltar a ela para aplicar
os conhecimentos construídos. (BRASIL, 1998.
p.63)
Em alguns livros a fórmula de Bhaskara é
demonstrada analiticamente, o que é importante para o
entendimento da mesma pelo educando. Porém, esta
deveria ser demonstrada geometricamente também, para
que o aluno visualize a praticidade da mesma.
5.2
PCNS
OS LIVROS DIDÁTICOS E OS
Analisando a caracterização anterior dos conteúdos
presentes nos livros didáticos em análise, com a proposta
dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para o
terceiro e quarto ciclo, é interessante trazer o proposto a
seguir:
Além das aprendizagens por meio das experiências
ligadas à vida diária dos educandos, nos volumes de livro
didático não são valorizados os objetivos que, segundo os
PCNs, Brasil (1998), visam o desenvolvimento do aluno.
Quanto ao desenvolvimento do pensamento numérico, não
analisam o aspecto dos problemas históricos para motivar
a construção do significado nos números, nem é feita uma
conexão dos números a contextos não-matemáticos.
36
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Em consideração ao desenvolvimento do
pensamento algébrico, não estimula o estabelecimento de
relações entre figuras espaciais e suas representações
planas. Aborda de forma hipotética o deslocamento e
localização de pontos no espaço, para obter noções de
direção e sentido, de ângulo, paralelismo e de
perpendicularismo. Salienta-se, ainda, o uso de
instrumentos de medição, a utilização se dá de modo
confuso e formal, isto é, não se relaciona com a
necessidade de representações de ângulos e construção
de figuras.
inequações e sistemas, mas não explora as diferentes
escritas algébricas.
Quanto aos objetivos de atingir o raciocínio algébrico,
raciocínio de proporcionalidade, da competência métrica,
do raciocínio combinatório, estatístico e probabilístico,
percebeu-se maior relevância às questões, desenvolvendoas a partir de informações suficientes para o educando
construir seu conhecimento.
Em relação ao desenvolvimento dos raciocínios:
proporcional, estatístico e probabilístico, pode-se afirmar
que estes foram valorizados pelo autor, que busca atingir
os objetivos propostos com êxito.
No quarto ciclo, além do processo de inquietações
emocionais, psicológicas e sexuais que os alunos estão
enfrentando, é neste período que surge a preocupação com
a continuidade de seus estudos e com o futuro profissional.
É nesta perspectiva de crescimento que o ensino da
matemática pode interferir com êxito, através da relação
com os contextos sociais, o conhecimento matemático e
o trabalho.
De acordo com os PCNs, Brasil (1998), é nesse
ponto que o professor deve despertar o caráter especulativo
do aluno, refletir sobre a história da matemática, a
coincidência e a convergência na construção do
conhecimento, para que o educando supra suas
necessidades e amplie suas experiências.
[...] é preciso fazer uso de todas essas
situações para mostrar aos alunos que a
Matemática é parte do saber cientifico e que
tem um papel central na cultura moderna,
assim como também para mostrar que algum
conhecimento básico da natureza dessa área
e uma certa familiaridade com suas idéiaschave são requisitos para ter acesso a outros
conhecimentos, em especial à literatura
cientifica e tecnológica.(BRASIL, 1998, p.80)
O ensino de matemática contempla várias áreas do
conhecimento e, segundo os PCNs, Brasil (1998), deve
desenvolver os pensamentos numérico, algébrico,
geométrico, de competência métrica, os raciocínios
proporcional, estatístico e probabilístico.
Quanto ao desenvolvimento do pensamento
numérico, os livros didáticos analisados propõem o estudo
dos números irracionais, porém não consolidam os
significados a partir do contexto social e, ainda, a maioria
dos exercícios sugeridos para ampliar os conhecimentos
das operações é mecânica. O pensamento algébrico é
desenvolvido através da identificação de equações,
Analisando o pensamento geométrico na sétima e
oitava séries, este aprofunda noções geométricas, analisa
transformações, ampliações e reduções, todavia não
interpreta o deslocamento de uma figura no plano
cartesiano. Referente à competência métrica, pode-se dizer
que o livro não trabalha com volume de figuras planas,
conforme indica os PCNs, Brasil (1998) para este ciclo e
nem com aproximação de medidas.
Certamente, a análise de coleções de livro didático,
mesmo com sugestões e correções, não aborda todos os
aspectos dos conteúdos, objetivos, orientações a serem
desenvolvidas no terceiro e quarto ciclo e, portanto, devese complementar a aula com leitura de documentos,
realizar trabalhos de pesquisa, utilizar recursos como
vídeos, meios de comunicação, calculadora, computador,
jogos e outros materiais que integram as situações
corriqueiras e que levam ao exercício da análise e reflexão,
adequando desta maneira o trabalho escolar a uma nova
realidade, pois a matemática está presente em diversos
campos da atividade humana.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na história da educação brasileira, o livro didático
se impôs na sala de aula de tal forma que se tornou o
único ponto de referência para muitos professores, tanto
na aplicação da teoria quanto na metodologia utilizada, o
que o caracteriza como grande colaborador ou inibidor da
implementação das propostas e inovações curriculares.
A análise feita de coleções de livros didáticos, em
confronto com a proposta curricular atualmente em vigor
(PCNs), mostra que o livro didático traz contribuições para
a implementação de algumas inovações curriculares,
especialmente na oferta de sugestões para uma possível
contextualização e para uma possível exploração de
determinados conteúdos de forma a obter um envolvimento
do aluno em atividades de construção e investigação. No
entanto, as sugestões precisam ser reconhecidas pelo
professor como sugestões ao planejamento das aulas, e
não como determinação destas. Pois, da forma como estão
no livro didático, não permitem um ensino inovador se o
livro for utilizado como única fonte de informação, mas
sim como fonte de pesquisa e auxiliar no processo de
potencializar a construção do conhecimento.
Nesse contexto, faz-se necessário o professor ter
clareza da proposta de ensino que quer desenvolver, e
dentro de suas perspectivas de eficácia de sua aula fazer
37
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
uso das sugestões apresentadas no livro didático que
atendam às reais necessidades de sua metodologia e que
satisfaçam os interesses e a realidade de seu educandário.
Para tanto, é necessário que o educador conheça e
aplique as propostas de ensino dos PCNs, Brasil (1998),
e, embora o professor de hoje disponha de recursos com
o Guia Nacional do Livro Didático, dentro do contexto
educacional atual não existe critério absoluto para
assegurar ao professor que sua opção por determinado
livro é a melhor.
Portanto, o livro didático deve ser mais uma
alternativa para a aula e o professor deve lutar por um novo
livro didático, com conteúdo informativo, atividades
intradisciplinares, incentivo à pesquisa, história, enfim um
livro que ensine, prepare o aluno para enfrentar os desafios
do mundo e eduque-o com uma formação crítica.
OFICIAL, Diário. Decreto nº 91.542 de 19 de agosto de 1985.
Brasília: 1985. Disponível em: <www.abrelivros.org.br/
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expectativa. Campinas, SP: Editora Alínea, 2000.
SKOVSMOSE, Ole. Educação matemática crítica: a questão
da democracia. Campinas, SP: Papiros, 2001.
Não obstante a análise dos livros didáticos e as
propostas de mudanças pelos PCNs, são necessárias
investigações que se preocupem com a forma como a
matemática é rotulada, ensinada e produzida a partir do
livro didático.
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Curriculares Nacionais: Matemática / Secretaria de
Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998. Disponível
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Paulo: Scipione, 1995.
JAKUBOVIC, José; LELLIS, Marcelo; CENTURION, Marília.
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MOYSES, Lucia. Aplicações de Vygotsky à educação
matemática. Campinas, SP: Papiros, 1997.
38
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
ANÁLISE PSICOSSOCIAL DOS ENCAMINHADOS
PARA ATENDIMENTO CLÍNICO PSICOLÓGICO DA
DEMANDA ESCOLAR
Renata Amélia Roos1
Taiana Elise W. Sperotto2
Sociedade Educacional Três de Maio3
RESUMO
O estudo parte de uma pesquisa que analisa o perfil
dos escolares encaminhados para atendimento psicológico
pelas escolas municipais de uma cidade do estado do Rio
Grande do Sul no ano de 2003. Através da análise de
conteúdo do total das fichas de encaminhamento, oitenta
e duas, identificou-se que o estudante encaminhado é na
sua maioria do sexo masculino, freqüenta as séries iniciais
do Ensino Fundamental e apresenta disparidade entre a
idade cronológica e a idade escolar, sendo descrito com
algum tipo de comportamento indesejado, problemas na
área pedagógica e questões de ordem familiar. Com o
objetivo de analisar a produção social desse perfil e de
possibilitar questionamentos referentes ao modo como
esses escolares são atendidos, este estudo propõe pensar
em possibilidades de intervenção na área da Psicologia e
da Educação, que não reproduzam ou fortaleçam o
encaminhamento de estudantes para atendimento sem uma
leitura crítica e social dessa prática.
PALAVRAS-CHAVE: Psicologia Escolar, Demanda
Escolar
ABSTRACT
The study starts from a research that analyzes the
profile of the students referred for psychological care for
public schools of a city in the state of Rio Grande do Sul
in 2003. Through the analysis of contents of the forms for
attendance, eighty-two, it was identified that the students
are in their majority males and attend the first series of
Elementary School and present disparity between
chronological age and school age being described as some
type of undesirable behavior, problems in the pedagogical
area and questions of familiar order. With the objective of
analyzing the social production of this profile and to enable
the possibility of referring to how these schools are taken
care of it this study suggests thinking about possibilities
for intervention in the field of Psychology and Education,
which do not repeat or strengthen the delivery of service to
students without reading and social criticism of this practice.
KEYWORDS: Scholar Psychology, Student
Demand
1. INTRODUÇÃO
Através de um convênio entre o curso de
Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria e a
Secretaria de Educação do Município, foi possível oferecer
atendimento especializado para os estudantes da rede
municipal de ensino. Tal oferta gerou uma demanda
acentuada de solicitações de atendimentos, de forma a
gerar lista de espera e certo anacronismo entre demanda
escolar e serviço psicológico. Diante desse quadro, foi
proposto um estudo que tinha como objetivo pensar
questões referentes a essa demanda, ou seja, questões
que fizessem tanto a comunidade escolar quanto
psicólogos pensar criticamente sobre suas implicações
nesse contexto. Traçar o perfil ou tendência de
encaminhamentos foi uma alternativa para provocar um
estranhamento dessa realidade e do modo como ela vinha
sendo trabalhada.
Tanto no sentido de identificar que demanda é essa,
quanto de questionar como surge e para que trabalha, fezse uma análise quantitativa e qualitativa do total, oitenta e
duas, das fichas de solicitação de atendimento psicológico
emitidas por 15 escolas municipais de Santa Maria ao
Serviço de Atendimento Clínico Institucional do
Departamento de Psicologia da Universidade Federal de
Santa Maria. Na época, esse era o total de fichas
1
Psicóloga, Mestre em Psicologia Social e Institucional, Professora dos cursos de Graduação em Pedagogia, Normal Superior e
Psicologia na SETREM. E-mail - [email protected]
2
Psicóloga, Especialista em Educação Infantil, Coordenadora do Serviço de Psicologia da ONG CEDEDICA-SM e da ONG Royale Escola
de Dança e Integração Social.
3
Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM, Av. Santa Rosa, 2504, Três de Maio – RS, e-mail: [email protected]);
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
existentes no Serviço e continham informações como: nome
do aluno, escola, data de nascimento, série e parecer
descritivo do aluno (este último item trata-se de um espaço
no qual a escola descreve o motivo do encaminhamento).
Verificou-se que o estudante encaminhado é, na sua
maioria, do sexo masculino, (sessenta e duas solicitações
de atendimento), freqüenta da pré-escola à quarta série
do Ensino Fundamental e apresenta disparidade entre a
idade cronológica e a idade escolar (trinta e uma das fichas
de encaminhamento). Quanto aos pareceres descritivos,
este estudante é narrado como um aluno que apresenta
algum tipo de comportamento indesejado (setenta e nove
pareceres), problemas na área pedagógica (quarenta e sete
pareceres) e questões de ordem familiar (trinta e cinco
pareceres). Os meninos apresentam maior proporção de
pareceres que as meninas no que se refere ao
Comportamento (meninos sessenta e dois e as meninas
dezessete) e Aprendizagem (meninos com trinta e sete
pareceres e meninas com dez). Enquanto as meninas
somente superam em proporção, no que se refere às
indicações de problemas familiares (meninos com vinte
seis, proporção = 0,42; meninas com nove pareceres,
proporção = 0,45).
Dessa forma, esse estudo parte de uma análise das
informações oferecidas nas fichas de encaminhamento
para atendimento psicológico produzidas pelas escolas,
buscando questionar esse perfil a partir de estudos
bibliográficos no que se refere à produção sócio-histórica
dessa demanda. Traçando a história das crenças que
sustentaram teorias e iniciativas no campo educacional,
responsáveis por uma série de práticas e discursos com
relação ao atendimento à demanda escolar, para então
pensar quais suas implicações e problemáticas atuais.
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
2.1 Breve história da Psicologia Clínica
e Demanda Escolar
O aumento da demanda e oferta social de escolas
nos países industriais capitalistas da Europa e da América
trouxe consigo dois problemas para os educadores e
gestores: de um lado, a necessidade de explicar as
diferenças de rendimento da clientela escolar; de outro, a
de justificar o acesso desigual desta clientela aos graus
escolares mais avançados. No final do século XIX, os
pesquisadores de Psicologia, principalmente os
americanos, passaram a se interessar pela Educação e
desenvolver estudos na área. Neste sentido, Schultz
descreve que a primeira clínica de Psicologia, assim
chamada, foi inaugurada em 1896 por Lightner Witmer, e
tinha como objetivo avaliar e tratar problemas de
aprendizagem das crianças em idade escolar. Desta forma,
o termo psicologia clínica, antes de corresponder ao que
se conhece hoje, esteve primeiramente relacionada aos
interesses educacionais (Schultz; 2005, p. 208).
A medicina, juntamente com a Psicologia da
criança, que estava nascendo no fim do século XIX,
desenvolveu um sistema teórico que procurava as origens
dos problemas nas características das crianças. Datam
desta época as rígidas classificações dos “anormais” e os
estudos de neurologia, neurofisiologia e neuropsiquiatria
conduzidos em laboratórios anexos a hospícios. Quando
os problemas de aprendizagem escolar começaram a tomar
corpo, os progressos da nosologia já haviam recomendado
a criação de pavilhões especiais para os “duros da cabeça”
ou “idiotas”. Categorias que foram transpostas para o
contexto escolar, de forma que as crianças que não
acompanhavam seus colegas na aprendizagem escolar
passaram a ser designadas como anormais escolares e
as causas de seu fracasso procuradas em alguma
anormalidade orgânica (Patto, 1999).
Os trabalhos de Galton, desenvolvidos na Inglaterra,
na segunda metade do século XIX, parecem se constituir
em importante marco da psicologia ligada à educação.
Galton buscava medir as diferenças individuais, através
da seleção dos psicologicamente mais capazes. Foi um
dos mais conhecidos adeptos de Darwin, sendo que
transferiu seus princípios evolucionistas de variação,
seleção e adaptação para o estudo das capacidades
humanas, criando instrumentos que permitiram a
mensuração de diversos aspectos de aprendizagem como:
acuidade visual, auditiva, tempo de reação e discriminação.
Preocupado em medir a inteligência e a personalidade, foi
um dos precursores das escalas, baterias, testes e provas
que, posteriormente, constituíram o principal instrumento
de trabalho dos psicólogos nas escolas e nas fábricas.
“O objetivo de Galton era incentivar o nascimento
de indivíduos mais notáveis ou mais aptos na sociedade e
desencorajar o nascimento dos inaptos” (Schultz; 2005,
p.138). Para essa finalidade, fundou a ciência da eugenia,
palavra por ele cunhada. Eugenia, isto é, de boa estirpe,
hereditariamente dotado, de qualidades nobres. Seu
argumento era de que a hereditariedade era determinante
no sucesso, de forma que as oportunidades e vantagens
sociais não eram levadas a sério por ele.
O período pós - revolução industrial, com a
vitória da burguesia liberal, é o pano de fundo
sobre o qual Galton desenvolveu sua teoria.
Num contexto em que a burguesia emergente
reafirmava seu poder tendo como base o
liberalismo, pautado num ideal de igualdade
de oportunidades para todos, as diferenças
entre classes sociais eram concebidas a partir
da explicação de que uns eram mais capazes
do que outros, recebendo respaldo nos
instrumentos de medida de inteligência e
personalidade criados por Galton (LIMA, 2005;
p.19).
No início do século XX é elaborada a primeira escala
métrica da inteligência infantil quando, em 1904, o governo
francês encarrega Alfred Binet e Théophile Simon a criarem
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
instrumentos que ajudassem a detectar as crianças
escolares que necessitassem de educação especializada.
Esta escala constitui o primeiro método da Psicologia
Escolar: a psicometria. Em 1912, um psicólogo americano
chamado Terman, aperfeiçoa os testes de Binet, o que
acaba permitindo que se calcule o Quociente Intelectual
(QI), ou seja, a “idade mental”.
A avaliação dos anormais escolares se tornou,
durante os trinta primeiros anos do século XX,
praticamente sinônimo de avaliação intelectual, sendo que
os testes de QI adquiriram um grande peso nas avaliações
dos educadores a respeito do destino escolar das crianças.
Medir as aptidões naturais se tornara o grande desafio
dos psicólogos na virada do século.
Já vinham ocorrendo mudanças não só na visão
dominante de doença mental como nas concepções
correntes sobre as causas das dificuldades de
aprendizagem. A incorporação de alguns conceitos
psicanalíticos, nesta época, acabou sendo um dispositivo
a mais na flexibilização das nosologias psiquiátricas. Com
a psicanálise, houve uma maior consideração da influência
ambiental sobre o desenvolvimento da personalidade nos
primeiros anos de vida e atribuiu-se maior importância à
dimensão afetivo-emocional na determinação do
comportamento e seus desvios. Isto provocou uma
mudança terminológica no discurso da psicologia
educacional: de anormal, a criança que apresentava
problemas de aprendizagem escolar passou a ser
designada como criança problema. Quanto às causas, se
antes se falava em anormalidades genéticas e orgânicas,
agora são buscadas no ambiente sócio-familiar. Ampliase, assim, o quadro de possíveis problemas do escolar
que, supostamente, explicariam seu insucesso escolar.
Agora, as causa vão desde físicas até as emocionais e de
personalidade, passando pelas intelectuais.
2.2 Discursos e encaminhamentos de
estudantes para atendimento Psicológico
São muitos os estudos já realizados que
demonstram que a clientela infantil tem representado a
imensa maioria da população atendida pelos serviços de
saúde mental da rede pública. Estas pesquisas indicam
ainda que os encaminhamentos contenham, em sua
maioria, queixas referentes a “problemas de aprendizagem”
ou outras queixas relacionadas com a performance do
estudante. O que chama atenção é a sensação de que
este fato não provoca grandes questionamentos. Na maioria
das vezes, “esta prática, nada recente, inquietante pelo
volume de trabalho que produz e pelos parcos resultados
conseguidos, é reconhecida como um fato natural,
cotidiano” (Boarini, 1993, p. 22).
Há outros estudos na literatura indicando que as
dificuldades escolares se constituem no problema mais
freqüentemente apresentado pela clientela infantil de
serviços de saúde mental (Lopes, 1984; Santos, 1990;
Graminha e Martins, 1994) e que as crianças com essas
dificuldades comumente apresentam, paralelamente,
outros problemas de ordem emocional/comportamental.
Esse conjunto de dados sugere uma associação entre
saúde mental infantil e problemas escolares e a
necessidade de se considerar estes dois aspectos como
interligados (Graminha, Martins e Miura, 1996, p. 167).
As idéias atualmente em vigor no Brasil a respeito
das dificuldades de aprendizagem escolar, dificuldades que
se manifestam predominantemente entre crianças de
segmentos mais empobrecidos da população, têm uma
história. É importante destacar que alguns autores, como
Costa (1993) e Patto (1999), têm pensado que o surgimento
das práticas, no que concerne ao atendimento à demanda
escolar, estaria relacionado com as dificuldades e
transtornos ocasionados pela escolarização obrigatória.
Estes autores argumentam que a escola não estaria
preparada para receber tantos alunos, principalmente das
camadas populares, o que a levou a enfrentar sérios
problemas. Diante dos fracassos freqüentes e da
dificuldade de lidar com esta nova clientela, a escola se
sente impotente, recorrendo a especialistas.
Desde o início da escolarização obrigatória até os
dias de hoje, muitas dúvidas ainda permanecem em relação
à formação da demanda escolar. Costa (1993) verifica, em
suas pesquisas sobre Unidades Psicopedagógicas, que
estas não foram criadas a partir da necessidade e demanda
das escolas públicas. “Foi por iniciativa médica que,
partindo-se da preocupação com a saúde mental das
crianças de classes “desfavorecidas”, procurou-se, com o
intuito de “prevenção” contra futuros problemas
psiquiátricos, oferecer, através de uma instituição
especializada, “serviços” à escola” (Costa, 1993, p.33).
Segundo Yazlle (1997), o que acabou ocorrendo,
em grande parte dos casos, foi a transposição de práticas
de consultório para o espaço escolar por parte de
profissionais que, efetivamente, tinham na área clínica seu
maior interesse.
Esta influência da psicologia clínica dentro das
escolas pode ser confirmada se nos remetermos,
atentamente, aos conceitos de “problemas de
comportamento” e “problemas de aprendizagem”, alguns
dos principais motivos de encaminhamento de estudantes.
Constatamos que eles se referem apenas a um dos
protagonistas do processo de escolarização: o aluno. É o
aluno que “não pára sentado”, “não obedece a ordens”,
“não traz a lição de casa” ou, ainda, “não consegue
escrever”, “é cabeça dura”, “só faz cópia”, etc.
Essas constantes afirmações presentes na vida
escolar diária, aliadas ao trabalho clínico dentro das escolas
que efetiva a idéia de que é a criança que deve ser “tratada”,
reforçam uma visão determinista de criança, que ora é
avaliada pelo seu desempenho, ora é reduzida a inúmeros
problemas emocionais e familiares.
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Souza (2000) ressalta que os conhecimentos da
Psicologia, de maneira geral, têm sido utilizados muito
mais para manter mitos e práticas de segregação e de
discriminação das crianças na escola, do que para
possibilitar o avanço dessas crianças no processo de
escolarização. A maioria dos profissionais, até hoje,
encampou estas queixas, procurando dar-lhes resposta
por meio da orientação do aluno e de sua família, deixando
de lado os mecanismos institucionais, sociais e políticos
que propiciam a produção de “problemas”.
Assim, o que se tem verificado é que muitos
psicólogos que atuam na rede pública de ensino têm
oferecido um trabalho que se restringe às práticas
individualizadas, mantendo os modelos clínicos
tradicionais, oriundos das práticas higienistas e,
conseqüentemente, contribuindo para que tanto a
Psicologia quanto a Educação se apresentem como meros
veículos de ajustamento (Yazlle, 1997).
Pesquisa realizada por Freller (1997) constatou que
a maioria dos profissionais propõe o mesmo procedimento
diagnóstico, seguido pelo mesmo tratamento, para todas
as crianças que procuram atendimento psicológico,
independentemente da queixa ou do agente de
encaminhamento. O processo psicodiagnóstico consiste
em entrevistas de anamnese com a família, sessões de
ludodiagnóstico e aplicação de testes de inteligência e
projetivos. Para finalizar, é marcada uma entrevista
devolutiva com a família, em que geralmente é recomendada
uma psicoterapia para a criança e orientação para a mãe.
Freller (1997) ressalta ainda que este padrão de atendimento
tem sido considerado insatisfatório pelas crianças, pais,
professores e até pelos psicólogos que o praticam.
O nosso objetivo está em desvelar os
processos de escolarização que produziram
esta criança que tem na apatia uma forma de
comunicação ou na agressividade a sua
maneira de se defender de práticas
pedagógicas produzidas em uma escola cujas
relações são atravessadas por preconceitos e
estereótipos em relação à criança pobre e a
sua família. Ou seja, a existência de
mecanismos institucionais e de ações
cristalizadas produzem na criança e no
professor a impossibilidade de pensar a sua
própria condição de submissão e de exclusão
no processo educacional (Souza, 2000, p.127).
O problema é que as idéias de “falta”, “anormalidade”,
“doenças” e “carência” dominam a formulação das queixas
a respeito das inúmeras crianças que são encaminhadas
pelas escolas aos serviços de psicologia. Como nos diz
Machado:
Essas idéias ganharam vida própria, pois
muitas vezes deparamo-nos com cenas do diaa-dia escolar nas quais ouvimos que as
crianças têm ‘distúrbios de aprendizagem’,
‘desnutrição’, ‘família muito pobre’, como se
essas idéias não tivessem sido produzidas
historicamente. Elas tornaram-se mitos e
rompê-los, tem sido um de nossos desafios
no trabalho com educadores (Machado, 2000,
p. 145).
É interessante notar que, já nesta época, existia a
preocupação de relacionar a “anormalidade” da criança com
sua origem social, não no sentido de compreender sua
situação real de vida, mas no sentido depreciativo de
considerar o seu meio “pernicioso”, “imoral”; enfim, propício
ao desenvolvimento de patologias. A “infância anormal”
passa, então, a ser vista como “caso social”.
Ainda é comum ouvirmos o professor dizer que o
aluno é “fraquinho”, que “não tem prontidão”, que “não
consegue aprender porque os pais são ignorantes” ou,
ainda, que a criança não aprende porque “é traumatizada
por viver num ambiente familiar muito agressivo” ou porque
“vive num ambiente pobre em estímulos”.
Muitos alunos são encaminhados para classes
especiais porque, durante o processo de alfabetização,
se comportaram de maneira diferente da estabelecida pela
escola e apresentaram divergências com relação ao
desempenho esperado por essa mesma escola. Em geral,
a escola dá ao erro, representação do não saber, a
conotação de fracasso. O erro marca o aluno como “aquele
que não consegue aprender”, aquele que é estigmatizado
e, portanto, ganha o rótulo de incompetente. O erro,
inevitável ao processo de aprendizagem, torna-se negativo,
inviabilizando que a criança vivencie e expresse seu real
processo de aprendizagem/desenvolvimento. Tal visão é
decorrente da impossibilidade de se visualizar o erro como
parte do processo de construção de conhecimentos;
portanto, potencialmente articulador de novos saberes.
Preso a um único padrão de resposta (o certo), o professor
não consegue apreender do material produzido por seus
alunos os diversos indicadores de aprendizagem ali
presentes.
Um professor que coloca as crianças com
dificuldade em aprender a ler e a escrever em uma
específica fileira das carteiras da classe, ou uma equipe
de professores que decide formar uma classe com os
alunos lentos, deveriam perceber as produções de
subjetividade que essas práticas inventam. É comum a
criança que está indo bem na escola, que está aprendendo,
sentir que aquele que não aprende não tem nada a ver
com ela. É comum a criança encaminhada para classe
especial encarar o problema que motivou seu
encaminhamento ser um problema apenas individual. Não
é a “fileira dos alunos lentos” que é em si boa ou má,
assim como não é a “classe especial”, ou “repetir”, que
são em si bons ou maus. O problema é que certas práticas
potencializam a diferença ser vivida como negação, como
algo qualitativamente inferior (Machado e Souza, 1997).
42
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
2.3 A infância e os encaminhamentos
Outra possível explicação para o alto número de
encaminhamentos de estudantes é proveniente dos
estudos de Boarini (1998). A autora ressalta que quando
um grande contingente de crianças “bate à porta” dos
serviços de saúde mental, isso é indicação de que algo
não vai bem com a infância. Para ela, o projeto moderno
de infância, marcado pela imagem da criança bonita,
saudável, alegre, cheia de energia e imaginação, esbarra,
nos dias de hoje, em condições concretas de vida,
permeadas por extremas desigualdades sociais e por
crescentes manifestações de violência fora e dentro de
casa. O sonho e a fantasia são cada vez mais articulados
às práticas de consumo.
Kupfer (1997), ao falar dos encaminhamentos de
escolares aos serviços de psicologia, argumenta que há
uma prática indiscriminada de diagnosticar e tratar os
problemas de aprendizagem, sem levar em conta a
necessidade individual do caso e a necessidade social
(demanda excessiva gerando filas de espera enormes).
Além disso, conforme a autora, muitas vezes o aumento
do número de encaminhamentos decorre do pensamento
que “mal não faz” e que “terapia é sempre útil para o
autoconhecimento e para a elaboração de conflitos”.
Concomitantemente, o fato de que as escolas não
estão levando em conta a fase de adaptação da criança
ao processo de escolarização, só veio aumentar os
encaminhamentos, principalmente para as séries iniciais.
Parece ocorrer o que Souza (2000) chama de caráter
“preventivo” ou caráter “apressado” dos encaminhamentos.
A escola desconsidera que o início do processo de
escolarização é um momento extremamente importante
para a criança e para os pais, onde fantasias e expectativas
em relação à capacidade de cada indivíduo e de sua família
podem se concretizar em função do desempenho escolar,
e acaba encaminhando crianças para atendimento
psicológico, em muitos casos, ainda nos primeiros anos
da sua caminhada estudantil (no caso dos
encaminhamentos pesquisados, encontramos uma
proporção de 0,40 estudantes da pré-escola à segunda
série, sendo que na primeira série observamos dezesseis
encaminhamentos, o que corresponde a uma proporção
de 0,20 pareceres).
Assim, para López (2004), não seria fácil definir o
que seria um problema na infância. Afinal, “não são os
menores que pedem ajuda ou vêm à consulta, mas os
pais e os professores que expressam suas preocupações,
as quais dependem muito das concepções que estes têm
dos filhos e de seu comportamento” (López; 2004, p. 114).
A natureza da relação que pais e professores estabelecem
com o que evidenciam como sendo um problema da criança
também vai marcar a suposição de que a criança apresenta
um problema, ou seja, “o grau de tolerância aos problemas
e a forma de julgar o que ocorre é extremamente variável”
e influencia o modo de perceber o que está acontecendo
como problemático ou não. Ainda, segundo o autor, muitos
dos problemas descritos pelos professores que poderiam
ser interpretados como um déficit de atenção por
hiperatividade, como a inquietação e a distração, são
evidenciados em 50% das crianças entre 3 e 7 anos.
Cunha (1997), em sua pesquisa com professores,
constatou na fala destes, cinco temas principais: questões
relativas aos alunos, às famílias, às classes, aos aspectos
pessoais dos professores e ao trabalho do psicólogo.
Segundo ela, as questões relativas aos alunos foram as
mais freqüentes, havendo um grande número de falas que
retratavam o comportamento do aluno como indesejado
ou incompatível com o esperado em sala de aula. Eram
queixas que genericamente eram denominadas de
“indisciplina”, mas que dificilmente se apresentavam
isoladamente, sempre se associavam a alguma outra
característica indesejada, como o aluno ser: irrequieto,
agressivo, birrento, manifestar-se de forma indecorosa,
fazer gestos obscenos, brigar com os colegas, etc.
Comumente, os professores traziam outras informações
com o objetivo de explicar melhor o que consideravam
desvio. Estes outros comentários quase sempre se
reportavam às famílias de seus alunos.
Nesta mesma pesquisa, Cunha comenta que a
apatia de algumas crianças foi apontada como um
comportamento preocupante. As atitudes de rebeldia e/ou
apatia, que poderiam significar condições escolares
inadequadas, tenderam a ser interpretadas como
desinteresse do aluno, preguiça, mimo dos pais ou conflito
de ordem familiar. Geralmente, nada é feito no sentido de
examinar as condições institucionais, mais do que a
criança e sua família, que contribuem para os problemas
observados. Muitos entendem que se a criança está
apresentando problemas de comportamento é porque esta
contém dentro dela a causa dos problemas (problemas
emocionais, traumas, bloqueios), e é nela que se encontra
a fonte potencial para sua resolução. Dessa forma, a
psicoterapia acaba sendo freqüentemente recomendada.
Aquino (1996) chama este modo de operar de
perspectiva psicologizante. Esta seria uma das principais
maneiras de pensar os problemas (seja de ordem
disciplinar, seja de aprendizagem) dos alunos nas escolas.
Segundo o autor, não se deveria situar a gênese de
determinada problemática em torno de um núcleo
conceitual abstrato como o de “personalidade”, “identidade”,
“perfil”, “maturidade”, uma vez que, se procurarmos pensar
institucionalmente, idéias como “desestruturação da
personalidade” ou “déficit em alguma fase de
desenvolvimento” deixam de fazer sentido.
A disciplina implicaria na obediência a
preceitos ou normas estabelecidas. No caso da
escola, encontramos alguns destes preceitos
observando os pareceres que ilustram o ideal de aluno
que a instituição exige. O bom aluno é aquele que: aceita
e realiza com êxito as atividades propostas, tem bom
relacionamento com os colegas e professores, sendo
solícito com estes, calmo, tranqüilo, educado, etc.
43
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
A instituição escolar exige uma série de condutas
em seu cotidiano que seus alunos precisam seguir. Estes
comportamentos não são comportamentos naturais, como
a escola poderia acreditar. Estes foram produzidos através
de instruções e mecanismos de disciplina. É preciso
problematizar o modelo de aluno padronizado e idealizado,
localizá-lo no tempo dando a ele o caráter histórico que
merece. Calligaris (1994) complementa dizendo que o
“reino encantado” da infância já não encontra mais espaço
para existir enquanto projeto da modernidade, pois já não
possui enquadramento possível dentro do contexto social
moderno: o contexto que o criou. Como tantos outros ideais
imaginados nos últimos 200 anos, o do mundo maravilhoso
das crianças também entra em crise na era pós-industrial
e pós-moderna.
No entanto, Boarini (1998) verifica a inexistência da
infância isenta de violências, do trabalho, de
responsabilidades do mundo adulto, ou seja, a inexistência
da “infância feliz”. Para esse segmento social, não é
apenas uma questão da atualidade; dessa forma, o que
parece novo, na verdade se revela como reedição de
situações similares já vivenciadas pela criança desde o
início da modernidade.
Cada vez mais condicionada à aquisição de
objetos (que não garantem a satisfação
almejada), a imagem da criança feliz vai-se
esvaindo e sendo aos poucos substituída pela
realidade da criança sujeita a atos de violência
e/ou abusos sexuais, abandonada fora e dentro
de casa, delinqüente e exterminada nas ruas e
praças públicas, da criança depositária dos
conflitos e tensões sociais de uma sociedade
em crise (Jerusalinski e Tavares, 1994, p. 5).
É como se existisse, em nossa sociedade, um
comportamento ideal e esperado pelo grupo. Aqueles
indivíduos que não conseguem corresponder a este modelo
ficam sendo rotulados como desviantes. No caso da
educação, mais especificamente do “aluno-problema”,
procurou-se naturalizar a idéia de patologização do fracasso
escolar para que, após a identificação e confirmação da
“patologia”, se partisse na busca de ajuda especializada.
Assim, a escola solicita o encaminhamento e avaliação
desta criança na expectativa de que um profissional de
saúde venha confirmar esta primeira identificação
(desviante), aliviando sua ansiedade e eximindo de qualquer
responsabilidade. (Arpini,1995)
A educação de crianças pequenas a coloca no
espaço público, que não deveria ser um espaço
fraternal, nem doméstico, nem familiar. Desta
forma expõe e possibilita à criança outros
agenciamentos, afetos e amizades. É preciso
saber aproveitar as possibilidades de
acontecimentos que se inauguram na cena
pública e escolar. A professora não é a mãe,
nem a tia; a colega não é a irmã; brincar da
casinha não é imitar papai e mamãe; as
histórias infantis não precisam remeter a um
final feliz nem à idéia de mulher, de casal e de
povo. Nessa educação a professora está
fortemente empenhada em entender o que as
crianças falam, o que querem estudar, o que
querem deixar pra lá, em que desejam pensar,
o que há de interessante pra visitar, que novas
formas de brincar podem ser elaboradas, que
músicas e que danças podem ser inventadas
(Abramowicz e Levcovitz, 2005, p. 84).
2.4 A questão de gênero e os
encaminhamentos
Enfim, além da pouca idade destes estudantes e
do número acentuado de encaminhamentos, fica ainda a
questão da desproporção entre meninos e meninas (os
meninos com sessenta e dois pedidos de atendimento,
numa proporção de 0,76) encaminhados. Tal discrepância
em relação às meninas não se evidencia apenas nas
escolas pesquisadas, mas é responsável por estudos em
outras áreas, como a Neurociência e Antropologia.
Com o objetivo de entender o porquê das meninas
se tornarem invisíveis para a escola e os meninos aqueles
que estabelecem a pior relação institucional, seja por conta
da indisciplina, seja por não atingir o desempenho
esperado.
Pesquisas apontam que os meninos
teriam uma trajetória escolar mais difícil e cheia de
obstáculos, pois “colocam mais problemas de ordem e
disciplina na família e nas salas de aula” (López; 2004, p.
115). A expectativa quanto a sua masculinidade, e podese ler também neste caso agressividade, é responsável
por estabelecerem modos de ser no ambiente escolar.
Afinal, se o menino se comporta de forma dócil, estudando
e se interessando nas aulas, tal comportamento pode
colocar em suspeita a sua identidade sexual e assim sua
socialização. Mas se, por outro lado, ele resolver assumir
o papel de rebelde, estará criando problemas e entrando
em atrito com a escola e os estudos.
Neste viés, recente pesquisa buscou associar o
comportamento e o desempenho escolar de meninos e
meninas na educação infantil, entendendo que a qualidade
das relações estabelecidas na escola pode afetar o
aprendizado. Os professores responderam uma escala
avaliando a relação do aluno com a tarefa, com os colegas
e com o professor. De acordo com os resultados, os
professores avaliaram o comportamento das meninas mais
positivamente. Com isso, indicando que os professores
têm maior dificuldade em relação ao comportamento dos
meninos, o que poderia estar colocando-os em uma
situação escolar de maior vulnerabilidade.
44
Há indícios de que os professores respondem
mais, e com mais atenção negativa, aos
problemas de comportamento dos meninos
que das meninas. Essas diferenças de
atenção podem tornar as situações de ensinoaprendizagem mais aversivas para os meninos,
reduzindo
suas
oportunidades
de
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
aprendizagem na sala de aula. Elas também
podem contribuir para tornar os problemas de
aprendizagem dos meninos mais visíveis que
os das meninas, já que os meninos são alvo
de mais atenção do professor quando
apresentam problemas de comportamento
(Gardial e Marturano; 2007, p. 550).
(pulando, jogando bola, andando de bicicleta, tendo
expectativas quanto a seu futuro), e as meninas de maneira
delicada, frágil e passiva (Felipe, 1998, p. 114).
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Outro fator que pode favorecer essa configuração é
o da escola ser um ambiente majoritariamente feminino
no que tange aos professores e funcionários. A figura
masculina na escola é numericamente menos presente,
dificultando ainda mais identificações e aproximações entre
esses dois gêneros. Além disso, as professoras, por conta
de sua vida e história, acreditam estarem mais preparadas
para entender e discriminar os sentimentos e
comportamentos femininos do que os masculinos.
A educação em nossa sociedade é entendida como
a única alternativa de realização na vida. Quando algo não
vai bem, todos se mobilizam a fim de entender o que
acontece com aquele estudante que poderá ter seu futuro
comprometido. Nestes casos, o que vemos é uma
enxurrada de encaminhamentos a especialistas que teriam
a responsabilidade de restituir a boa aprendizagem e boa
conduta daqueles que estão com seus futuros
comprometidos.
A partir desse cenário, pode-se projetar uma
trajetória hipotética, em que os companheiros
tendem a reagir com rejeição e a professora
tende a perceber os problemas de
comportamento como uma sobrecarga, em
termos de tempo e recursos. Instala-se assim
o contexto para relacionamentos negativos.
Essas experiências interpessoais negativas
precoces, em se repetindo cotidianamente,
tendem a ser incorporadas pela criança aos
seus modelos internos de relacionamento, em
construção, o que explicaria a persistência do
padrão
desadaptativo
nos
anos
subseqüentes... (Gardial e Marturano; 2007, p.
550).
Mas a complexidade da realidade escolar, sua
história, suas políticas, interesses sociais, compõe o que,
à primeira vista, parece ser um problema unicamente
daquele estudante. Desse modo, o atendimento a essa
demanda precisa ser pensado levando em conta mais do
que o atendimento isolado dos estudantes – responsável,
muitas vezes, pelo repassar de responsabilidades e
propagação de mitos e estereotipias, mesmo sabendo que,
para isso, outros tempos e outros modos de implicação
precisarão ser agenciados.
A questão seria observar como as relações se
estabelecem. A história do modo como aprendemos a olhar
para as questões pertinentes à escola é uma forma de
problematizar as demandas de atendimento,
individualizantes e culpabilizantes. As redes de relações
que são naturalizadas e postas como normais e
inquestionáveis deveriam ser discutidas e revistas para que
não produzam essa discrepância e discriminação
referentes aos papéis desempenhados por meninos e
meninas no contexto educacional que prejudicam a
aprendizagem.
Afinal, não se deve esquecer que, mesmo no seu
aparente silêncio, a escola está atravessada por
proposições de gênero, o que significa dizer que em seus
livros didáticos, nas brincadeiras propostas, nas escolhas
pedagógicas diferenciadas para meninos e meninas, nas
formas de avaliação estabelecidas, que priorizam a
organização e o capricho, há sempre um modelo feminino
e masculino sendo traçado e sugerido e quase nunca
discutido. Um exemplo é o estudo proposto por Felipe no
qual ela observou os discursos presentes em alguns livros
dirigidos ao público infantil e pré-adolescente, que visam
explicar questões ligadas ao sexo e sexualidade. Ela
percebeu, quanto às relações de gênero estabelecidas,
que os meninos eram colocados de forma mais ativa
O trabalho com o coletivo exige que se saiba
trabalhar com o outro em sua diferença e no incômodo
que ele possa suscitar. Ou seja, não é tão simples a
problematização da instituição escolar. A tendência à
personificação e à procura de “culpados” é grande em
nossa sociedade que, provavelmente, prefira indicar a
criança, os professores, o governo, a comunidade, a família
como os responsáveis, isoladamente, pelo alto índice de
fracasso existente. Provocando, em todos, a sensação
de impotência e desânimo frente aos problemas. A busca
por culpados, quem sabe é uma maneira de entender o
problema, mas que impede que possamos realmente
avaliar o que acontece e produzir mudanças.
Fica a ressalva de que se deve investir na criação
de espaços nos quais as pessoas envolvidas possam
formular questões, expressar seus conflitos e repensar
vínculos. Pensando em promover ambientes com ações
integradas, a partir de projetos, que transformem as
relações estabelecidas entre especialistas, comunidade,
professores, pais e estudantes.
Quanto ao psicólogo, independentemente dos
motivos que geram os encaminhamentos de crianças aos
serviços de psicologia, cabe a ele obter uma compreensão
mais ampla da realidade escolar. É claro que num primeiro
contato com a escola, a expectativa inicial é a de que o
psicólogo fará diagnóstico e oferecerá tratamento para
“problemas psicológicos dos alunos”. Mas, a partir de um
trabalho conjunto, pode surgir a sensibilização para outros
45
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
aspectos da questão e tanto a escola como a comunidade
possam se dispor a rever suas próprias práticas.
Assim, a análise das fichas de encaminhamento
dos estudantes a atendimento psicológico buscou
identificar as diferentes linhas que compõem essa realidade
de fracasso escolar. Mesmo que tais linhas pareçam
inúmeras e de nós bastante fechados, outras práticas vêm
sendo evocadas nos estudos dos autores citados neste
espaço. E o que cada vez se torna mais unânime entre
eles é que para se trabalhar com essa demanda, além de
uma formação específica na área da educação e nos
processos de aquisição do conhecimento, são necessários
espaços para a promoção de ambientes nos quais todos
se sintam co-responsáveis e atuantes nas mudanças que
precisam ser pensadas e realizadas no que se refere ao
modo como pensamos e entendemos o “bom estudante”.
Mais uma vez pensar a diferença!
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46
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
AS TEORIAS EDUCACIONAIS E SUA RELEVÂNCIA
NO PROCESSO DE PRODUÇAO DO CONHECIMENTO
Adriane Helena Dutra Quaresma 1
Elisandra Rasia 1
Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber 2
Faculdade Três de Maio SETREM 3
RESUMO
Na sociedade atual exige-se a cada dia com mais
intensidade uma educação de qualidade. Partindo desse
pensamento, a pesquisa inicial que realizamos sobre as
teorias da aprendizagem, identificamos quais são as
teorias seguidas pelos professores da 6ª série do Ensino
Fundamental de uma escola comunitária da região. Para
a realização deste trabalho, utilizamos o diagnóstico
situacional e abordagem qualiquantitativa através de
questionário aberto. A análise que emergiu da pesquisas
de campo foi fundamentada e discutida com diversos
autores da área da educação. O texto apresenta uma
discussão sobre quais as teorias que fundamentam o
processo de produção de conhecimento nas instituições
de ensino atualmente e constatamos que 37,5%
fundamentam sua prática pedagógica na teoria
construtivista tendo Piaget como mentor; 50% na teoria
sócio-cultural preconizada por Vigotski; 62,5% utilizamse também de outros teóricos e 12,5% disseram não usar
nenhum autor, nem teoria específica. Conclui-se que a
maioria dos entrevistados utiliza alguma teoria, sendo que
alguns não seguem nenhum teórico específico. Ë
importante perceber que a teoria interacionista, que é a
mais adequada no processo da aprendizagem, somente
quatro dos entrevistados faz uso dela, visto que o indivíduo
cresce num ambiente social e a interação com o outro é
essencial a sua aprendizagem.
Palavras-chaves: Teorias da aprendizagem.
Educação. Interação professor-estudante.
ABSTRACT
In the current society it is demanded a quality in
education with more intensity every day. From that thought
the text exposes an initial research that we accomplished
on the theories of the learning and it identifies which are
the theories followed by teachers of the 6th grade of
Elementary School of a community school of the area. For
the accomplishment of this research, we used the situational
diagnosis and qualiquantitative approach and an open
questionnaire. The analysis that came out from the field
research was built up and discussed with a lot of authors
from the education area. The text presents a discussion
on which theories that base the process of knowledge
production in the teaching institutions, and we verified that
37,5% base their pedagogic practice in the constructivist
theory of Piage; 50% in the socio-cultural theory of
Vygostky, 62,5% are also used of other theoretical ones
and 12,5% said not to use any author, nor specific theory.
It is concluded that most of the interviewees use some
theory, and some don’t follow any theoretical one specific.
It is important to notice that the integrationist approach,
that is the most adapted in the learning process, only four
of the interviewees make use of it because the person
grows in a social atmosphere and the interaction with the
another one is essential to his learning.
keywords: Learning theories. Education. Teacher–
student interaction
CONSIDERAÇOES INICIAIS
Muitas são as teorias que se voltam para a produção
do conhecimento e esta pesquisa se propõe a refletir sobre
diferentes posições teóricas de modo a compreender como
cada uma delas encara o papel do social, enquanto
condição de facilitadora e determinante na apropriação e
superação do conhecimento socialmente disponível sendo
que, após observações e discussões feitas em aula e tendo
em vista as diversas linhas pedagógicas existentes no meio
Educacional, sentimos a necessidade de pesquisar qual
1 Acadêmicas do 5° semestre do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia – Administração Escolar - SETREM; aq0064653@ setrem.com.br
e [email protected]
2 Mestre em Educação nas Ciências, professora do Instituto Superior de Educação da SETREM e do componente curricular “Teorias e
Paradigmas Educacionais”, [email protected]
3 Avenida Santa Rosa, 2405; Três de Maio RS [email protected]
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
é a teoria da educação seguida pelos professores
atualmente.
1 PRESSUPOSTO DAS TEORIAS DA
EDUCACÃO
Segundo Palangana (1998), há várias formas de
conceber o desenvolvimento e a aprendizagem enquanto
propriedades fundamentais do indivíduo que se apresentam
com uma multiplicidade de fatores tanto intra como
interindividuais e também os que o meio material dispõe.
Existe, porém, um aspecto básico: “a aprendizagem e o
desenvolvimento do pensamento pressupõem, sempre, uma
relação entre o sujeito e o objeto de conhecimento”
(PALANGANA, 1998, p. 7), visto que a aprendizagem é
uma construção coletiva e se constrói a partir das
aprendizagem individuais e grupais.
As formas de conceber a ação educativa são várias
e não há uma realidade acabada, única. A aproximação
desta ação pode ser considerada como mediações
historicamente possíveis e, por esta razão, dignas de serem
analisadas, pesquisadas. Partindo deste pressuposto,
foram consideradas as seguintes Teorias: a inatistamaturacionista, a comportamentalista, a interacionista
construtivista e a histórico-cultural.
CAMINHOS METODOLÓGICOS
Esta pesquisa se tratou de um diagnóstico
situacional e teve uma abordagem qualitativa. Foi realizada
através de questionário aberto aplicado a profissionais da
área da educação. Baseou-se também em fundamentos
do método bibliográfico.
Segundo Oliveira (1999), o método qualitativo é
utilizado no desenvolvimento das pesquisas que visam
descrever a complexidade de uma determinada hipótese
ou problema, compreendendo e classificando processos
dinâmicos experimentados por grupos sociais,
apresentando contribuição no processo de mudança,
criação ou formação de opiniões de determinado grupo.
A abordagem qualitativa nos leva, entretanto, a
uma série de leituras sobre o assunto da
pesquisa, para efeito da apresentação de
resenhas, ou seja, descrever pormenorizada
ou relatar minuciosamente o que os diferentes
autores ou especialistas escrevem sobre o
assunto e, a partir daí, estabelecer uma série
de correlações para, ao final, darmos nosso
ponto de vista conclusivo (OLIVEIRA, 1999,
p.117).
Segundo Moreira (1999), teoria de aprendizagem é
uma construção humana para interpretar sistematicamente
a área de conhecimento que chamamos aprendizagem e
tenta explicar por que e como ela funciona. “As teorias
também expressam relações entre conceitos, porém são
mais abrangentes, envolvendo muitos conceitos e
princípios” (MOREIRA, 1999, p. 13). São muitas as
definições para teorias de aprendizagem, mas, de modo
geral, se refere à aprendizagem cognitiva, àquela que
resulta no armazenamento organizado de informações, de
conhecimentos, na memória do que aprende. Uma teoria
é uma interpretação sistemática de uma referida área do
conhecimento e é usada para significar uma maneira
particular de ver as coisas.
Assim, para a elucidação do trabalho, passaremos
a discorrer sobre as quatro teorias da aprendizagem que
são: inatista-maturacionista, comportamentalista,
construtivista e histórico-cultural.
1.1
A
TEORIA
MATURACIONISTA
Na Teoria Inatista-Maturacionista tudo se aprende
naturalmente, atribui-se um papel central a fatores
biológicos no desenvolvimento humano. Segundo Fontana
(1997), o inatismo-maturacionismo parte do princípio de
que os fatores hereditários ou de maturação são mais
importantes para o desenvolvimento do indivíduo e para a
determinação de suas capacidades do que os fatores
relacionados à aprendizagem e à experiência.
A hereditariedade pode ser entendida como um
conjunto de qualidades ou características que
estão fixadas... já no nascimento... ou seja,
quando falamos em hereditariedade estamos
nos referindo à herança genética individual que
a criança recebe de seus pais A idéia de
maturação refere-se a um padrão de mudanças
comum a todos os membros de determinada
espécie, que se verifica durante a vida de cada
indivíduo (FONTANA, 1997, p. 11).
Depois de coletadas as informações através da
aplicação do questionário, os dados foram examinados
através da análise de conteúdo para sua socialização.
Aos entrevistados foram garantidos os preceitos
éticos e direitos previstos na Resolução 196 do Conselho
Nacional de Saúde, do Ministério da Saúde, de 10/10/1996,
sendo que todos consentiram de forma livre esclarecida
com a pesquisa.
A pesquisa contou com a participação de 08
profissionais da educação – professores das 6ª série do
Ensino Fundamental de uma escola comunitária - de um
município da região do grande Santa Rosa- RS.
INATISTA-
Conforme Fontana (1997), Binet concebia a
inteligência como uma aptidão geral que não depende das
informações ou das experiências adquiridas no decorrer
da vida do indivíduo. Porém, sabemos ser a inteligência a
habilidade do indivíduo de julgar, compreender e raciocinar.
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Segundo Fontana (1997), Gesell explica que a
existência de um padrão de desenvolvimento comum à
maioria dos indivíduos é o processo de maturação biológica
inerente às transformações por que passa o
comportamento do ser humano.
Tanto Binet quanto Gesell, acreditando que a
inteligência e o desenvolvimento psíquico da
criança são biologicamente determinados,
preocuparam-se
em
descrever
comportamentos e habilidades típicos de cada
faixa etária. (FONTANA, 1997, p. 15).
De acordo com esta perspectiva, Fontana (1997)
afirma que a aprendizagem é que dependo do
desenvolvimento. Esta concepção teve o objetivo de chamar
a atenção para as especificidades do indivíduo, suas
características, para as habilidades dos estudantes,
destacando pontos como prontidão, maturidade, aptidão.
Essa teoria tem tido muita influência na escola. O
inatismo-maturacionismo configura o início da relação entre
a psicologia e a educação.
1.2 A TEORIA COMPORTAMENTALISTA
A Teoria comportamentalista ou behaviorista trata
da aprendizagem - que é o tema central - como uma
questão de conexões entre estímulos e respostas.
Segundo explica Fontana (1997), esta abordagem destaca
a importância da influência de fatores externos, do ambiente
e da experiência sobre o comportamento do indivíduo. O
comportamentalismo se origina das ações e as habilidades
do indivíduo que são determinadas por suas relações com
o meio em que se encontra.
Skinner é o mais famoso psicólogo defensor da
hipótese behaviorista. Um dos seus principais preceitos,
e de seus seguidores, é que o aprendizado se dá através
de dois processos denominados: condicionamento
clássico e condicionamento operante.
O condicionamento clássico envolve um tipo de
comportamento determinado, que é sempre provocado por
um estímulo também determinado e envolve uma reação
do organismo ao meio e não da ação do organismo sobre
o meio. Segundo a concepção de Skinner, a maioria dos
comportamentos dos indivíduos é aprendida por
condicionamento operante, onde a aprendizagem se dá
de forma muito diferente, através de comportamentos
emitidos pelo próprio organismo e tem algum tipo de
conseqüência. Se a conseqüência for agradável, o
comportamento tende a se repetir; caso contrário, o
comportamento tem menos chance de se repetir. Esse
tipo de comportamento é responsável pela criação dos
hábitos.
Mas não são apenas os padrões de estímulo que
chamam a atenção dos behavioristas. A imitação também
exerce uma função importante na aquisição de linguagem
pela criança. O padrão de imitação segue um princípio
fixo: o adulto fala uma palavra, a criança imita essa
produção e o adulto recompensa a criança por essa
repetição, mesmo que ela não seja fiel ao que foi dito
inicialmente. Com o passar do tempo, a criança passa a
falar mais parecido com o adulto, aprendendo como
combinar as palavras da mesma maneira que aprendeu a
reproduzi-las, através da imitação e posterior aproximação
ao modelo adulto.
A crítica a essa visão é que os behavioristas tendem
a enfatizar a influência do meio e ver a criança com um
receptor passivo da linguagem, desprezando o seu papel
no processo de aprendizagem. Não explicam o fato das
crianças produzirem construções que nunca foram ouvidas
por elas anteriormente, assim como o fato da aquisição
dos padrões gramaticais, já que as construções
agramaticais nem sempre são corrigidas pelos pais e as
gramaticais elogiadas, não podendo, assim, serem
explicadas pelo reforço paterno.
Segundo Moreira (1999), o behaviorismo de que se
refere Watson não se interessava pelo reforço ou pela
conseqüência como causa da aprendizagem. Ele
considerava tais conceitos “muito subjetivos para uma teoria
objetiva do comportamento” (MOREIRA, 1999, p. 22).
Para Watson, não existem aptidões, disposições
intelectuais ou temperamentos inatos ou hereditários, mas
sim, a propensão para responder a certos estímulos de
uma maneira determinada.
Conforme explica Fontana (1997), a questão da
aprendizagem é resultado do pressuposto de que o
ambiente e a experiência são determinantes do
comportamento. “Ela envolve uma reação do organismo
ao meio e não uma ação do organismo sobre o meio”
(FONTANA, 1997, p 26).
De acordo com o comportamentalismo, o processo
ensino-aprendizagem se tornou mais eficiente, respeitando
o ritmo de cada indivíduo, valorizando o planejamento do
ensino.
1.3 A TEORIA CONSTRUTIVISTA
A idéia central do construtivismo é que o individuo
passa por etapas de desenvolvimento e nessas etapas
ele sente a necessidade de descobrir ou construir o saber.
As peculiaridades do pensamento e da lógica das
crianças despertaram o interesse do epistemólogo suíço
Jean Piaget, que se preocupou principalmente com a
questão de como o ser humano elabora seus
conhecimentos sobre a realidade, chegando a construir,
no decorrer de sua história, o seu próprio conhecimento.
Para Moreira (1999), Piaget considera as ações
humanas como base do comportamento humano. Tudo
no comportamento humano parte da ação. O crescimento
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cognitivo do indivíduo acontece por assimilação e
acomodação. O indivíduo constrói esquemas de
assimilações mentais para abordar a realidade. Não há
acomodação sem assimilação, pois acomodação é
reestruturação da assimilação. O equilíbrio entre
assimilação e acomodação é a adaptação à situação.
Experiências acomodadas dão origem, posteriormente, a
novos esquemas de assimilação e um novo estado de
equilíbrio é atingido. Este estado de equilibração
prossegue até a vida adulta, em alguma área de experiência
do indivíduo.
As implicações dessas proposições para o ensino
são óbvias e de grande importância: ensinar significa, pois,
provocar o desequilíbrio do indivíduo para que ele,
procurando o reequilíbrio, reestruture-se cognitivamente e
aprenda.
Jean Piaget foi responsável pela criação do
cognitivismo construtivista ou hipergenético. Segundo ele,
a aquisição da linguagem depende do desenvolvimento da
inteligência na criança e se dá na superação do estágio
sensório-motor, por volta dos 18 meses.
“Nesse estágio de desenvolvimento cognitivo,
numa espécie de ‘revolução coperniciana’,
usando as palavras do próprio Piaget (1979),
dá-se o desenvolvimento da função simbólica,
por meio da qual um significante (ou um sinal)
pode representar um objeto significado, além
do desenvolvimento da representação, pela
qual a experiência pode ser armazenada e
recuperada”. (CASTORINA; OLIVEIRA, 2000,
p.210)
Quando as conquistas cognitivas se unem, o sujeito
passa da inteligência sensória e motora à inteligência préoperatória e surge a possibilidade da adoção de símbolos
públicos da comunidade ao invés dos seus significantes
pessoais, ou seja, a linguagem se torna possível, assim
como outros processos da função simbólica geral, como
desenhar. Através do desenvolvimento cognitivo gradativo,
a criança adquire cada vez mais a capacidade adulta em
relação aos aspectos da linguagem.
Em oposição ao modelo inatista, a aquisição é vista
como resultado da interação entre o ambiente e o
organismo, através de assimilações e acomodações,
responsáveis pelo desenvolvimento da inteligência em
geral, e não como resultado do desencadear de módulo ou um órgão - específico para a linguagem. Daí se diz que
a visão de Piaget sobre a linguagem é não-modularista.
Assim também, a visão behaviorista é rechaçada, com a
crença de que as crianças não esperam passivamente que
o conhecimento de qualquer espécie seja transmitido, mas
constroem sue próprio conhecimento (PALANGANA, 1998).
As pesquisas de inspiração piagetiana foram
desenvolvidas nas décadas de 1970 e 1980, época que
também começaram a surgir as críticas ao seu trabalho.
Elas se baseavam, principalmente, na ausência do aspecto
social nas suas pesquisas.
1.4 A TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL
Essas funções se juntam a outros três processos
na superação do que Piaget chama de “egocentrismo
radical”, presente no período sensório-motor, segundo o
qual não existe uma diferenciação entre sujeito e objeto, a
ponto do sujeito não se reconhecer nem mesmo como
fonte de suas ações. Estes três processos são
relacionados a seguir:
O interesse em explicar como se formaram, ao longo
da história do homem, as características tipicamente
humanas de seu comportamento e como elas se
desenvolvem em cada indivíduo constitui a base da
abordagem histórico-cultural em psicologia, desenvolvida
por um grupo de psicólogos soviéticos liderados por L. S.
Vigotski.
- o da descentralização das ações em relação ao
corpo próprio; isto é, entre sujeito e objeto. O sujeito passa
a se identificar como agente de suas ações;
Vigotski morreu prematuramente em 1934, mas a
maior parte das traduções das suas obras para o francês
e o inglês foi feita a partir de 1960. No entanto, foi só nos
anos 1970 que sua obra começou a exercer influência
sobre os estudos de aquisição de linguagem. Representou
uma alternativa ao construtivismo piagetiano, questionando
o inativismo chomskiano. Explica o desenvolvimento da
linguagem e do pensamento como tendo origens sociais
externas (CASTORINA; OLIVEIRA, 2000).
- o da coordenação gradual das ações, a fim de
constituir uma conexão entre meios e fins;
- o da permanência do objeto, mesmo quando ele
está ausente do espaço perceptual da criança.
Por meio desses processos, torna-se possível o uso
efetivo do símbolo e da representação de um sinal por outro,
utilizando o princípio da arbitrariedade do símbolo. No
campo da linguagem, o jogo simbólico, a imagem mental,
as sucessivas coordenações entre as ações e entre estas
e o sujeito, a possibilidade de internalizar e conceptualizar
as ações passam a fazer parte de sua realidade.
Para Vigotski, conforme afirma Rego (2000), o uso
da linguagem é as condições mais importantes para o
desenvolvimento das estruturas psicológicas superiores (a
consciência) da criança. A experiência histórica do homem
se reflete nas formas verbais de sua comunicação. Esse
conteúdo histórico também foi interiorizado por meio da
linguagem, logo, a natureza social das pessoas se torna
igualmente sua natureza psicológica.
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Nesta visão, o mesmo aconteceria com a criança.
O seu desenvolvimento cultural aconteceria primeiro em
nível social e mais tarde em nível individual. Esse processo
implicaria a utilização de signos e suporia uma evolução
através de uma série de transformações qualitativas na
consciência da criança. Assim, a consciência de cada
criança retrataria a sua interação com a realidade.
contribuições para a prática pedagógica das abordagens
educacionais.
O processo de internalização seria uma reconstrução
interna de uma operação externa, mas diferente de Piaget,
ressalta a importância da atividade do outro no processo,
já que o sucesso deste depende da reação daquele. As
transformações que ocorrem nesse processo são as
seguintes:
- uma operação que a princípio representa uma
atividade externa é reconstruída e passa a ocorrer
internamente;
- as funções do desenvolvimento da criança passam
do interpessoal (nível social) para o intrapessoal (nível
individual). Assim, todas as funções superiores (memória
lógica, formação de conceitos, entre outras) se originam
das relações reais entre as pessoas;
- o processo de internalização é resultado da história
das relações reais entre as pessoas.
Vigotski (2001) considera que o significado da palavra
é a chave de compreensão da relação pensamento e
linguagem; logo, sendo também da consciência e da
subjetividade. Desse modo, seria possível analisar as
transformações semânticas da língua ao longo do
desenvolvimento da criança.
Os trabalhos da linha vigotskiana entendem que a
criança é o sujeito no processo de aquisição da linguagem,
construindo seu conhecimento de mundo com a ajuda do
outro. Os trabalhos nessa linha são conhecidos com
“interacionismo social”.
Na perspectiva interacionista de Vigotski que, por
sua vez, refere-se ao meio social como sendo o contexto
das relações que os homens, diariamente, estabelecem
entre si e com a natureza na luta por garantir a satisfação
de suas necessidades básicas, ou seja, na luta pela
sobrevivência. É nesse ambiente social e historicamente
organizado que o sujeito se e insere e se constitui como
tal.
Na tabela abaixo, apresentamos um quadro
comparativo que diferenciam as quatro teorias
educacionais que embasam esse texto..
Tabela 1 – Quadro comparativo que explica
resumidamente o papel dos fatores internos e externos no
desenvolvimento do sujeito; a relação entre desenvolvimento
e aprendizagem; os principais representantes e as
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Abordagem
Inatistamaturacionista
Abordagem
comportamentalista
Papel dos
fatores
internos e
externos no
desenvolvimento
É determinado
pelos fatores
biológicos, como a
hereditariedade e
a maturação. É
inerente às
transformações
pelas quais passa
o indivíduo.
O desenvolvimento é
visto como resultado
da aprendizagem. E
enfatiza a influência
dos fatores externos,
do ambiente e da
experiência sobre o
comportamento do
indivíduo.
Relação entre
desenvolvimento
e aprendizagem
A aprendizagem
depende do
desenvolvimento,
isto é, o que a
criança é capaz ou
não de aprender é
determinado pelo
nível de maturação
de suas
habilidades e do
seu pensamento
através de seu
nível de
inteligência.
Alfred Binet,
Arnold Gesell
Desenvolvimento e
aprendizagem são
processos
coincidentes. O
desenvolvimento é o
resultado das
aprendizagens
acumuladas no
decorrer da vida do
indivíduo.
Principais
representantes
Contribuições
para a prática
pedagógica
Sua influência foi
muito pertinente
na escola, pois
marcou o começo
da relação entre a
psicologia
científica e a
educação.
Joahn Broadus
Watson,
Burrhus Frederic
Skinner
A idéia de que os
comportamentos
humanos são
aprendidos em
decorrência de
contingências
ambientais e a noção
de modelagem do
comportamento.
Abordagem
piagetiana
Abordagem
histórico-cultural
Destaca o papel de
Enfatiza as
fatores internos
relações com o
ligados à maturação,
outro e a
da experiência
reconstrução
adquirida pelo
internamente das
indivíduo em seu
formas culturais
contato com o
de ação e
ambiente e da
pensamento, suas
equilibração
significações e os
sucessiva que
usos da palavra
conduzem a maneiras que foram com ela
de agir e de pensar
compartilhados.
cada vez mais
elaboradas e
complexas.
O aprendizado e o
A aprendizagem
desenvolvimento
depende do
andam juntos
desenvolvimento, ou
desde o primeiro
seja, aquilo que o
indivíduo pode ou não
dia de vida do
indivíduo, sendo
aprender é
que o aprendizado
determinado pelo
suscita e
nível de
impulsiona o
desenvolvimento de
desenvolvimento.
suas estruturas
cognitivas.
Jean Piaget
Lev Semeiotic
Vygotsky
Oportuniza ao
indivíduo a sua
própria ação sobre o
objeto do
conhecimento; o
professor é um
agente facilitador, o
indivíduo é quem
constrói seu próprio
conhecimento.
O professor é o
mediador à
medida que seus
conhecimentos
teóricos o ajudam
a compreender o
que ocorre em
sala de aula,
marcando suas
decisões e seu
modo de agir.
Fonte: WEBER; QUARESMA; RASIA, 2006.
2 AUTORES QUE FUNDAMENTAM A
Na pergunta sobre em que autor o professor baseia
PRÁTICA PEDAGÓGICA
sua prática pedagógica e que justifique a sua resposta,
Na análise dos dados coletados, observamos os
seguintes resultados:
verificamos que 50%, ou seja, 4 dos professores
entrevistados disseram fazer uso da teoria histórico-cultural
na sua prática de ensino. Os que fundamentam sua prática
no construtivismo, somaram 37,5%, ou seja, 3 dos
entrevistados. Os que argumentaram não usar nenhum
autor, nem teoria específica foram 12,5%, ou seja, um dos
entrevistados. E 62,5%, ou seja, 5 dos professores
entrevistados disseram que, além desses autores já
citados, utilizam-se de outros autores não mencionados.
Segundo o que estudamos, a teoria construtivista
oportuniza o indivíduo a sua própria ação sobre o objeto
do conhecimento. O professor é um agente facilitador e o
indivíduo é quem constrói seu próprio conhecimento, a partir
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de seu conhecimento prévio sobre a realidade, chegando
a construir sua própria história.
Conforme a teoria Histórico-Cultural, o professor é
o mediador à medida que conhecimentos teóricos ajudam
o sujeito a compreender o que ocorre em sua realidade
marcando suas decisões e seu modo de agir. Os processos
de aprendizado movimentam os processos de
desenvolvimento e a atuação dos outros membros do grupo
cultural é essencial na mediação entre a cultura e o
indivíduo.
A consciência individual e os aspectos subjetivos
que substituem cada pessoa são, para Vigotski, elementos
essenciais no desenvolvimento do ser humano, dos
processos psicológicos superiores. A constante recriação
da cultura por parte de cada um de seus membros é a
base do processo histórico, sempre em transformação,
das sociedades humanas, sendo uma relação mediadora
e produzida de fora para dentro, ou seja, extrapessoal para
intrapsíquica.
Paulo. Atual, 1997.
GOULART, Iris Barbasa. Piaget – Experiências Básicas para
a Utilização Pelo Professor. Editora Vozes, Petrópolis, 2000.
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Paulo, EPU, 1999.
MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. Temas Básicos de
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Aprendizagem em Piaget e Vygotsky ( A Relevância do
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PIAGET, VYGOTSKY, WALLON: Teorias Psicogenéticas em
discussão. Summus, São Paulo, 1992.
CONSIDERAÇOES FINAIS
Conclui-se que a maioria dos entrevistados utiliza
alguma teoria, sendo que alguns não seguem nenhum
teórico específico. Percebeu-se, porém, que a teoria
interacionista, que é a mais adequada no processo da
aprendizagem, somente quatro dos entrevistados fazem
uso dela, visto que o indivíduo cresce num ambiente social
e a interação com o outro é essencial a sua aprendizagem.
É interessante perceber que as análises de cunho
teórico e prático das teorias educacionais se encaminham,
direta ou indiretamente, no sentido de oferecer alternativas
para uma atuação pedagógica que melhor responda à
realidade sócio-educacional condicionada pelo momento
histórico. Esperamos que não encerremos nossas
discussões, mas que prossigamos nas nossas reflexões
educacionais na “construção de um novo homem, numa
nova sociedade” (PALANGANA, 1998, p. 164), sabendo
que, para Vigotski, as origens e as explicações dos
relacionamentos humanos devem ser buscadas nas
interações sociais e é aí que o sujeito tem acesso aos
instrumentos que possibilitam o desenvolvimento e a
formação da sua própria realidade e pensamento.
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DEHEINZELIN, Monique. Construtivismo– A Poética das
Transformações. Editora Ática, São Paulo, 1997.
FONTANA, Roseli. Psicologia e Trabalho Pedagógico. São
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ENTRE A ARMA E O SOFRIMENTO PSÍQUICO:
CARTOGRAFANDO TERRITÓRIOS POLICIAIS
Fábio Parise1
Carmen S. de Oliveira2
Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS3
of intervention in which the aim is to contemplate the police
worker’s mental health.
RESUMO
Problematiza o trabalho da polícia civil através da
escuta clínica e do recurso metodológico da cartografia.
O levantamento foi realizado em um departamento
especializado no combate ao tráfico de drogas no Estado
do Rio Grande do Sul, durante os anos de 2003 e 2004.
São analisadas três situações que se identificou como
associadas ao sofrimento psíquico destes trabalhadores:
o imperativo fálico (e suas ressonâncias entre os homens
e as mulheres policiais), os estados de tensão pelos quais
estes sujeitos possam vir a sofrer durante a execução de
suas tarefas e a burocratização. Por último, são feitas
considerações com vistas a produzir agenciamentos, em
vários níveis de intervenção, e que contemplem a saúde
mental do trabalhador nas polícias.
Palavras-chave: policial - sofrimento psíquico –
subjetividade
ABSTRACT
According to this article, it is proposed question the
civil police work through the clinical listening and the
methodological cartography resource. This research was
done from 2003 to 2004 in a specialized department which
fights against drug trafficking in the state of Rio Grande
do Sul, Brazil. Three situations are linked to the
psychological suffering of these workers: the strong male
empire (differences between policemen and policewomen),
the mental strain that these people might suffer during
this period of work and the bureaucracy. Hence,
considerations are made in this research in different levels
Keywords: policeman - psychological suffering subjectivity
INTRODUÇÃO
“Basta!” Cansado de ouvir falar sobre a crise na
Segurança Pública, nosso cartógrafo decidiu que era o
momento de se deixar levar pelas intensidades e pelos
afetos que emergiam desta instituição. Para tanto, escolheu
como área de (re)pouso a Polícia Civil, mais precisamente,
o departamento responsável pelo combate ao narcotráfico
e seus respectivos trabalhadores, os policiais. Sabendo
que a estadia neste micro universo seria, ao mesmo tempo,
desgastante e instigante, nosso personagem decidiu levar
consigo alguns “companheiros de viagem”, entre os quais,
uma mochila na qual coubessem, além de um bloco de
anotações, alguns livros para eventuais consultas; alguns
cds que serviram de trilha sonora em sua estadia e, ainda,
um filme que serviu como fonte de inspiração na elaboração
de sua cartografia.
Pretendendo dar corpo e fala ao sofrimento psíquico
ao qual estão submetidos esses trabalhadores, nosso
cartógrafo se lançou nesta viagem também para identificar
prováveis linhas de fuga aos modos dominantes de
subjetivação naquela instituição. Portanto, para uma melhor
visibilidade deste corpo vivo chamado Polícia Civil e,
especialmente, do trabalhador que transita por entre os
meandros desses espaços de trabalho, esta viagem foi
dividida em cinco escalas. Na primeira, o cartógrafo
evidencia algumas características do departamento da
Polícia Civil escolhido para este mapeamento. Na escala
seguinte, explora algumas questões acerca da construção
1
Psicólogo. Ex-estagiário da Polícia Civil do Governo do Estado do RS. E-mail: [email protected]
Psicóloga. Doutora em Psicologia Clínica (PUCSP). Subsecretária de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente da Secretaria
Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República. Pesquisadora na área de Violência Juvenil. Ex-presidente da FEBEM/RS.
E-mail: [email protected]
3
Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS. Av. Unisinos, 950; São Leopoldo – RS. E-mail: http://www.unisinos.br
2
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do masculino em nossa sociedade, pois percebeu que tais
questões atravessam a todo instante esses servidores.
Na terceira, aborda o cotidiano deste trabalhador e seus
desdobramentos. Na seqüência, analisa a questão da
subjetividade feminina tentando não se despotencializar
em um ambiente predominantemente masculino, como é
o caso do território policial. Já na última escala, cartografa
as possibilidades destes sujeitos em romper com os
territórios burocráticos, bem como alguns possíveis focos
de intervenção psicológica em tal contexto.
PRIMEIRA ESCALA: FAZENDO UMA
“RECUNHA” 4 NO LOCAL
Devidamente instalado no departamento policial em
questão, nosso cartógrafo decidiu circular um pouco na
instituição. Durante sua “ronda”, passou a sentir na pele
os afetos metalizados por uma instituição que potencializa
a idéia do não-sentir. Curiosamente, nosso protagonista
havia lido algo sobre produção litográfica em Ferreira (1998),
que consiste em um “processo de gravar sobre pedra
calcária ou placa de metal”, e pensou que a frieza e dureza
daquele ambiente não seriam, necessariamente,
impedimentos na construção de um outro solo – agenciador
de vidas exuberantes – diferente deste, um magma
institucional.
Proclamado como a elite da Polícia Civil gaúcha
nos últimos tempos, este departamento opera em nível
estadual no combate e repressão ao narcotráfico. Também
faz parte da sua esfera de atuação a repressão aos usuários
de droga. Para isto, nosso cartógrafo constatou que
operam neste órgão quatro delegacias, além de três
setores administrativos. Nestes locais trabalham 92
funcionários, sendo que 69 são homens e 23 mulheres5,
ou seja, para cada mulher há três homens em trabalho.
Vale salientar que entre elas, apenas seis trabalham na
investigação, e as demais exercem cargos administrativos.
Embora este predomínio masculino esteja mudando – haja
vista a última turma de delegados formados, onde mais de
50% são mulheres6 -, observa-se que o poder de decisão
e a ocupação de cargos estratégicos ainda pertencem aos
homens.
Subindo e descendo morro, entrando e saindo de
vilas, este é em grande parte o cotidiano dos trabalhadores
deste local. “Andando por entre os becos, andando em
coletivos, ninguém foge ao cheiro sujo”7, cantarolou o
cartógrafo. “Mas que estranho” - constatou ele -,
“dificilmente há uma operação em áreas nobres da cidade”.
Contudo, pensando melhor, lembrou que a Organização
Policial está vinculada à emergência e à expansão do poder
de Estado (TAVARES dos SANTOS, 1997) e, nesta
medida, não seria tão surpreendente que sua ação
estivesse mais voltada para o controle das classes
subalternas e que o corpo policial passaria a ser investido
por relações de poder e dominação, além de táticas de
sujeição sutis, como afirma Amador (2002).
Observou que os próprios policiais caracterizam seu
trabalho pelo paradoxal exercício da coerção física legítima
e o estabelecimento do bem-estar social e, portanto,
mesmo que eles não referissem isto diretamente, ficou
claro que a tarefa policial participa da governabilidade,
auxiliando na instituição do poder do Estado sobre as
coletividades, transformando-se em tecnologia de poder
(FOUCAULT, 1982).
Ainda sobre o corpo policial, o cartógrafo registrou
que existiam alguns atravessamentos institucionais
peculiares e que faziam surgir um outro corpo: o de policial
civil. É como se o sujeito que existisse antes do policial
acabasse sendo preterido pela construção de uma figura
identitária enrijecida. Através da fabricação de corpos
submissos pela disciplina, o bom policial é aquele que
obedece: quanto mais obediente e viril for, mais útil será
considerado, e vice-versa. Perante o reconhecimento da
aquisição de um “novo corpo” assumido pelo policial, nosso
viajante se pôs a pensar de que forma uma mulher
conseguia “sobreviver” neste universo de traços
visivelmente masculinos. Além dessa, outra dúvida: por
que as características fálicas de virilidade, força e
insensibilidade fizeram do homem o modelo de policial para
a modernidade?
SEGUNDA ESCALA: O MASCULINO E
O FEMININO NA ORGANIZAÇÃO POLICIAL
Para tentar responder a estas questões, o nosso
protagonista resolveu recorrer à Sociologia e à História
para conhecer mais sobre a construção das subjetividades
masculina e feminina. Foi assim que aprendeu com Kimmel
(1998) que as masculinidades são socialmente
construídas, não sendo propriedade de alguma espécie
de essência eterna ou mítica, muito menos biológica. De
outro lado, são produzidas simultaneamente em dois
campos inter-relacionados de relações de poder – nas
relações de homens com mulheres (desigualdade de
gênero) e nas relações dos homens com outros homens
(desigualdades baseadas em raça, etnicidade,
sexualidade, idade, etc). Por último, o autor nos faz
compreender que devido à imersão da masculinidade nas
relações de poder, esta é freqüentemente algo invisível aos
homens, cuja ordem de gênero é mais privilegiada. O autor
também refere que no século XIX uma nova versão emergiu,
a do self-made-man, onde o modo masculino deveria ser
demonstrado e provado no mercado, exigindo dos homens
uma comprovação constante e incluindo sempre o risco
de falhar. Neste sentido, Kimmel analisa três padrões
4
Gíria policial usada para reconhecer uma pessoa ou ambientar-se com um lugar.
Dados obtidos durante a aplicação do Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de Lipp (ISSL), no período de abril a setembro de
2004.
6
Jornal Zero Hora, 02 de outubro de 2004.
7
Chico Science & Nação Zumbi, “Manguetown”, Afrociberdelia, SONY MUSIC/CAOS, 1996.
5
55
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básicos de provas ou demonstrações: o autocontrole, a
fuga para longe das influências femininas e a desvalorização
de outras formas de masculinidade.
Agora, depois de cartografar um pouco acerca da
construção histórico-social da masculinidade, o nosso
explorador decidiu respirar outros ares, deixando-se tocar
pela construção do feminino no Brasil. Observou que no
início do século XX, conforme aponta Neumann (2001),
instaura-se no país a sociedade industrializada e
urbanizada, consolidando o modelo de família nuclear, onde
os valores estão no bom ambiente do lar, e a mulher é a
dedicada esposa e mãe. De acordo com a autora, para
ser uma mulher bondosa, ela deveria ser desprovida de
erotismo e não ter uma conduta duvidosa perante a
sociedade. Assim, era no casamento que as mulheres
seriam reconhecidas, sendo este também o único espaço
aceito para o exercício de sua sexualidade (CORREA,
1994).
Após essas leituras, nosso incansável cartógrafo
decidiu que era o momento de desacelerar. “Mesmo quando
tudo pede um pouco mais de calma, até quando o corpo
pede um pouco mais de alma, a vida não pára. Enquanto
o tempo pede pressa eu me recuso e faço hora na valsa”8.
De posse de seus cds e de seu bloco de anotações, iniciou
o registro das intensidades vividas nos últimos momentos.
Em seguida, pôs-se a assistir ao filme “Dia de
Treinamento” 9, que, como veremos logo adiante, foi
essencial na produção de sua cartografia e na
compreensão da subjetivação policial neste departamento.
TERCEIRA ESCALA: O CHAPADO, O
CHEIRADO E O TOMADO.
Nos últimos anos, a Segurança Pública e as
conseqüentes atuações das polícias vêm sendo
freqüentemente veiculadas pela mídia. Muitas vezes, estes
trabalhadores da Segurança Pública são colocados como
legítimos vilões; em outras situações, ao mencionarem
suas péssimas condições de trabalho e o risco diário ao
qual estão expostos, são considerados vítimas. Na medida
em que eles operam no paradoxo contenção/produção da
violência, são tanto sujeitos de opressão quanto de
reprodução dessa violência.
Para além desta configuração em heróis ou vilões,
o que o cartógrafo desejou foi abrir fissuras nestas
referências identitárias para que as falas, as angústias,
os medos e espectros destes sujeitos ganhassem
expressão. Já que não se tratava de naturalizar estes
papéis, o ponto de partida seria indagar acerca dos
possíveis agenciamentos que vêm consolidando tais
territórios policiais. Neste sentido, o nosso aventureiro
decidiu seguir uma pista deixada em uma entrevista pelo
escritor David Ayer, que inspirou o filme “Dia de Treinamento”
(uma produção cinematográfica que retrata o dia-a-dia de
dois policiais da Divisão de Narcóticos de Los Angeles):
“O diabo não aparece de chifre e rabo, ele é muito mais
sedutor”. Quais seriam, então, as nuances do diabólico
no território policial e suas estratégias de sedução? Nesta
perspectiva, Freitas & Fischer (2002) alertam para o fato
de que a Segurança Pública carrega consigo o peso das
funções mais duras do Estado, devido a dois fatores: o
agravamento das questões sociais e a sua esfera de
atuação.
Isto ficou muito claro para o nosso investigador
quando ele foi conferir o enredo daquele filme que trata do
encontro de Alonzo, um policial veterano e corrupto, e de
Jake, um agente recém-chegado da Academia e que sonha
em ser detetive. Os scripts desses personagens permitiram
ao cartógrafo identificar várias semelhanças com os
depoimentos coletados durante sua estadia naquele
departamento policial. Dessa forma, decidiu nomear os
três estados de tensão pelos quais os policiais deste local
estão sujeitos a vivenciar ao longo de suas carreiras: o
chapado, o cheirado e o tomado.
O estado de chapado tem relação com a maconha,
geralmente a primeira droga ilícita experimentada por um
drogadito, e que serve como via de entrada na dependência
química. Pensando assim, o cartógrafo concluiu que o
servidor público, ao ingressar na Polícia Civil, pode ser
acometido por um efeito semelhante ao da maconha. Isto
é, ele fica chapado por uma instituição que o obriga a inalar
durante 24 horas os ares de identidade policial. Essa
constante pressão sequer se encerra quando eles voltam
para suas casas, pois a desvinculação desta referência
identitária é praticamente impossível, conforme relatou esse
funcionário: “Depois que tu entrou pra polícia, é como se
tu tivesse uma segunda pele que de forma alguma sai de
ti. Parece escama, nem mesmo embaixo d’água sai.”10
Ou seja, onde quer que esteja e em qualquer
condição, o policial estará sendo pressionado por alguma
norma que o induz a incorporar a instituição “polícia civil” o
tempo todo. Se este policial trabalha com escuta
telefônica11, por exemplo, a desvinculação do trabalho é
quase inviável, posto que não pode desligar o celular em
momento algum do dia, pois precisa escutar seu suspeito:
“Agora, além de armados o tempo todo, andamos
‘celulados’12 durante todo o dia”.
Além da pressão jurídica e institucional, o cartógrafo
constatou que os policiais são cobrados a agir como tais,
o tempo todo, também pela sociedade: “As pessoas
cobram que você seja polícia em qualquer hora do dia,
seja de madrugada, quando tu chega do trabalho, ou até
Lenine, “Paciência”, Na Pressão, BMG, 1999.
“Dia de Treinamento”, direção de Antonie Fuqua, WARNER BROS, 2001.
10
Nos depoimentos policiais colhidos, foi mantida uma linguagem coloquial com o intuito de preservar a veracidade dos fatos.
11
Interceptação telefônica, expedida pelo juiz, segundo a lei 9296/96.
12
Expressão usada pelo policial para indicar o uso constante do telefone celular.
8
9
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mesmo nos raros domingos de descanso. Assim, fica
difícil de nós sairmos deste papel de polícia, mesmo
quando não se está em serviço. O outro não consegue te
desvincular. O cara vai te ver como rato (policial) o tempo
todo”. Ao que um outro colega seu agrega: “Mesmo após
o fim do expediente a sociedade vê a gente como policial.
Até bronca13 que nada tem a ver contigo ou com o teu
trabalho eles pedem pra ti resolver. Tu acaba virando
referência de todos na vila”.
Por outro lado, agrava-se o fato de que o policial
lida com questões com as quais nossa sociedade insiste
em esconder, excluir e negar: morte, crimes, drogas e
miséria. Para Bittner (2003), a essência do trabalho diário
policial é enfrentar situações que outras pessoas
respondem com medo, raiva ou repugnância, como essa
que o cartógrafo registrou em seu bloco a partir do
depoimento de um policial: “Quando eu entrei na casa para
cumprir o mandado, eu não acreditei no que vi... Parecia
um filme de terror. Havia umas cinco ou seis crianças,
nem lembro mais o número correto, mas todas estavam
sobre uma cama, com suas roupas sujas, com fraldas
cheias de merda por toda a casa, inclusive sobre a mesa.
A mãe, completamente chapada, gritava muito, agarrandose aos seus filhos que, desesperados e chorando muito,
davam-nos chutes na pífia tentativa de que não levássemos
sua mãe presa... Olha, te confesso que quase vomitei e
por pouco não chorei de tão mal que fiquei. Aquela noite
passei em claro”.
Por isso, é como se este sujeito devesse ser um
policial total, mesmo que isto comporte uma grande carga
de sofrimento psíquico, visto que carrega consigo, durante
todo o tempo, as adversidades emergentes do trabalho.
O segundo estado de tensão que pode acometer o
policial durante sua jornada de trabalho foi considerado
pelo cartógrafo como o estado de cheirado, cuja referência
nos remete à cocaína. É um estado intensificado pelo
cotidiano das ruas, pela pressão institucional e social e,
sobretudo, pela adrenalina produzida pela própria profissão.
O que chama a atenção é uma forte fissura desses policiais
por suas atividades nas ruas, bem como um grande
sentimento de desconfiança (um dos principais sintomas
do dependente de cocaína).
Ao pensar no encantamento desses trabalhadores
pela circulação urbana e ao lembrar de algumas cenas do
filme “Dia de Treinamento”, nosso aventureiro sentiu
vestígios do corpo vibrátil que, segundo Rolnik (1989), é
capaz de intensificar afetos. O primeiro desses registros
evoca o diálogo que ocorre entre Alonzo (veterano) e Jake
(novato). Quando os dois saem da lanchonete – era o
primeiro dia de Jake na Divisão de Narcóticos -, ao entrar
no carro este pergunta:
- “Alonzo, onde é o escritório? Na Divisão?”.
13
Algum caso a ser investigado.
O veterano policial sorri e, depois de alguns segundos
olhando para seu colega, responde:
- “Você está no escritório, cara”.
Em seguida, arranca com o carro partindo para as
ruas.
É esclarecedor também outro diálogo entre os dois
policiais, ocorrido na rua, com o carro em movimento:
Alonzo: - “Se não gosta da Narcóticos, cai fora do
meu carro. Volte pro escritório. Vá investigar cheques sem
fundo. Entendeu?
Depois de alguns segundos, indaga:
- “Por que escolheu a Narcóticos?”.
Jake: - “Quero ser detetive”.
Alonzo: - “Legal. Vá por mim, você consegue.
Esqueça aquelas besteiras da Academia. Não use aqui,
você vai acabar morto. Abaixe o vidro. Comece por aí.
Ouça a rua, cheire, sinta o gosto. Ela é sexy”.
Ao resgatar essas duas inusitadas cenas do filme,
o cartógrafo procura trazer à luz do conhecimento o que é
ser policial, especialmente neste órgão de combate ao
narcotráfico. Estendendo um pouco mais seu pensamento,
ele questiona: “Que adrenalina e paranóia são essas
produzidas no contato com as ruas?” Para tentar responder
a essa indagação, o nosso viajante realizou alguns
deslocamentos pela instituição a fim de cartografar
aspectos da formação policial.
Na medida em que nosso sistema penitenciário e
jurídico se revela incapaz de dar conta da problemática da
criminalidade e da “reabilitação” social dos criminosos, os
policiais se sentem alvo preferencial da violência que esses
sujeitos dirigem à instituição enquanto agente opressor.
Mesmo sem usar fardas, como os policiais militares, eles
corporificam e materializam essa instituição perante toda
a sociedade. É preciso, então, manter-se sempre atento,
especialmente quando se está nas ruas: “Eu só me sinto
seguro quando ponho o pé dentro de casa. Quando estou
na rua fico nervoso o tempo todo”. Essa angústia gerada
pela necessidade de estar sempre alerta é fortemente
agravada após alguma situação em que se sentiu
intimidado por criminosos: “Depois que o policial passa
por uma situação desta, ele passa a desconfiar de todo
mundo...” Tampouco em companhia de familiares isto é
amenizado: “A gente nunca tá tranqüilo, principalmente
quando estamos com nossa família. Ficamos o tempo todo
observando. É muita paranóia... Quando tu vê, já tá
repetindo em casa o mesmo funcionamento que tu tem na
delegacia. É automático... Tu começa a desconfiar de tudo
e de todos. Nem mesmo a tua esposa e teus filhos
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escapam disso. O problema é que tu vai lá, te esforça pra
prender o cara e quando não dá nem uma semana o cara
já está aprontando de novo. Os vagabundos nunca ficam
preso, quem dirá os peixões.”14
verdade” em sua execução concreta: “É somente na rua
que eu me sinto policial. Ser policial é estar nas ruas, no
movimento, e não trancado dentro de uma sala. A rua
possibilita que a aprendizagem ocorra in loco”.
Conforme Amador (2002), a esfera de trabalho dos
policiais evidencia muitos elementos de pressão do
trabalho; entre eles, o contexto diário de perigo e risco.
Em face dessa realidade, a atividade policial exige atenção
difusa, pois necessitam estar constantemente
sintonizados com a possibilidade de confronto: “Tu ta
sempre em ponto de, a qualquer momento, explodir. A
pressão é muito grande”.
De um modo geral, nota-se que os futuros policiais
entram na Academia de Polícia com a idéia de uma
instituição eficaz, equipada e preparada, no estilo FBI de
alguns filmes norte-americanos16. Isto faz lembrar ao
cartógrafo um argumento de Freud (1913) em “Totem e
Tabu”, de que o objeto tabu tem o sentido paradoxal de
sagrado e também de horror. Transportando essa noção
para o meio policial, presenciamos que o vínculo com a
instituição também repousa em um paradoxo, porque
pertencer a uma instituição requer destes policiais uma
grande elasticidade para suportar o choque entre o que
lhes foi passado na Academia (o sagrado/idealizado) e a
realidade institucional (o horror da falta/carência).
Por isto, em suas falas, observamos uma certa
apologia ao “discurso da adrenalina”, que parece cumprir
uma função de justifica e de valorizar o esforço desmedido,
muitas vezes representado pela desconsideração da falta
de condições de trabalho: “Tem os problemas materiais
que atrapalham tudo, mas na hora de cumprir o mandado
a gente nem pensa nisso”. Também os riscos que o
trabalho em certas situações impõem às suas vidas são
secundarizados: “Às vezes a gente entra com tudo na vila,
troca tiro com os traficantes e só depois é que percebe
que se um tiro daqueles tivesse encontrado o seu destino,
que é a gente, tinha tudo acabado.Mas na hora a gente
nem pára pra pensar que não vale a pena morrer por causa
dos vago...”15
Nesse sentido ser policial é, para eles, algo que
corre nas veias, um impulso, uma vocação, muito embora
eles próprios digam que isso surge depois que ingressam
na instituição, reforçando a idéia da “fissura”. Contudo,
podemos apreender esse discurso como uma verdadeira
“ideologia ocupacional defensiva” (Dejours, 1992, p.69), na
medida em que atenua o medo e a ansiedade decorrente
da percepção do risco inerente ao trabalho policial, o qual
é muitas vezes exarcebado pela falta de condições
materiais apropriadas (coletes, armas, carros adequados,
etc.). Tal hipótese consolida-se quando observamos que
esse discurso permeia a fala de grande parte dos
trabalhadores que vivem o cotidiano da rua, os quais estão
mais expostos a esse tipo de ocorrência. Considerando
todos esses aspectos é possível dizer que essa defesa
assegura a execução do trabalho, minimizando a relação
destes trabalhadores com essas contradições e seus
aspectos paralisantes.
Quanto à formação do policial, a maioria afirma ser
bastante deficitária. Apesar de reconhecerem um
aperfeiçoamento nos últimos anos, sentem uma distância
de seu cotidiano: “O treinamento não mudou: Hoje tem
Psicologia, Sociologia, mas, no fundo, a gente é preparado
para a guerra, e depois vai para a rua fazer trabalho
comunitário, assistencial. Mas de que jeito?” Por isto, ainda
hoje, concebem o trabalho como algo que se aprende “de
Portanto, chegamos agora no último estado
tensional identificado pelo nosso protagonista. Este, sem
sombra de dúvida, é apontado como o mais perigoso de
todos. É o chamado estado da tomada, em outras palavras,
“tomada nos canos”17. Se nos dois estados anteriores nós
tínhamos como referência, respectivamente, a maconha e
a cocaína; neste, a referência é a heroína (substância
geralmente injetável).
Este é o resultado da pulsão de morte, do poder
ilimitado que o policial julga possuir e, sobretudo, o da
linha tênue que, segundo os policiais, separam-nos dos
traficantes. Assim como um dependente químico que, ao
atingir este nível de drogadição, praticamente aniquila com
qualquer possibilidade de recuperação, o policial que
atravessa uma vez a linha dificilmente deixará de atravessála em outras oportunidades: “Aqui é muito fácil de tu passar
pr’outro lado. Aqui, tu lida com muito poder. E não é só de
dinheiro que eu tô falando... É maconha, cocaína, ecstasy,
crack... É muita grana... É muito fácil se corromper... Só
que quando tu começa a cruzar a linha, onde irá parar
nem Deus sabe”.
De acordo com Amador (2002), esse limite tênue
parece existir por dois aspectos. O primeiro diz respeito à
realidade de exercício de uma profissão que se vê cortada
por aspectos marginais, que influencia cotidianamente os
policiais, caso não possuem uma boa estrutura psíquica
e uma sólida formação. O segundo fala de uma profissão
que os coloca frente a frente com o perigo, levando-os ao
poder de decisão de matar ou morrer, de prender ou soltar.
Ainda, segundo essa autora, a linha tênue representa o
centro do sofrimento policial, pois revela a tentativa dos
policiais “para se manterem em equilíbrio sobre uma linha
frágil (o sofrimento) que separa o controle do descontrole
(a saúde da loucura)”.
14
O grande traficante.
Abreviação de vagabundo, termo usado pelos policiais na identificação do traficante.
16
Local de reforço dos bíceps e tríceps narcísicos.
17
Gíria policial que identifica, geralmente, o dependente em heroína injetável.
15
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A respeito da linha tênue, o cartógrafo lembra deste
depoimento: “Às vezes as coisas estão todas certas, no
seu devido lugar. Daí, quando surge um pequeno
empecilho, tu resolve não seguir os ditames institucionais
de praxe. N’outro dia tu repete a transgressão, porém a
situação era mais delicada, por exemplo, que a do dia
anterior. E assim, sucessivamente, tu vai pegando gosto
pela coisa. Ou seja, tu percebe que cruzando a linha um
pouco, resolve o caso. Aí, diariamente, tu avança um
centímetro, um metro, e quando percebe, já está do outro
lado”.
De uma certa forma, isto se confirma na expressão
do personagem Alonzo no filme: “Se não gosta da
Narcóticos, cai fora (...). Volte pro escritório, vá investigar
cheques sem fundo. Entendeu?”. Em outras palavras, o
que ele quis dizer é que nesta instituição não há espaços
para medos, receios e vacilações. E é exatamente isso
que o nosso instigante cartógrafo vivenciou durante sua
estadia neste órgão policial. Dessa maneira, evitando o
medo através de uma posição de autoconfiança, o
trabalhador deste local se coloca, muitas vezes, como o
“todo poderoso” ou, então, como afirma Alonzo: “Eu sou a
polícia! O King Kong não pode comigo!” Tal frase ganha
notoriedade maior ainda quando comparada com essa
proferida por um outro servidor: “A gente quando é polícia
vê algumas coisas de outra forma. Isso porque existe uma
mentalidade própria na polícia que faz com que
internalizamos e detectamos as coisas de outro jeito...
Daí você se torna aquele cara policial, superior. É a solução
para o problema”.
Nesta última frase podemos perceber não só a
personificação de uma identidade policial, que tal como
uma tatuagem marca o corpo deste trabalhador, mas
principalmente uma sensação de poder ilimitado, que pode
ser mais bem visualizada no filme, nestas palavras de
Alonzo para Jake: “Para proteger as ovelhas, você precisa
pegar o lobo. E é preciso um lobo para pegar o lobo,
entendeu? Eu estou num nível superior, filho. Tenho todas
as chaves de todas as portas”. Ou, então, neste
depoimento feito por um policial: “Nós, enquanto policiais,
muitas vezes nos deixamos levar por uma sensação
poderosa de que podemos tudo e de que quase nada
devemos. Nas ruas, então, especialmente durante a noite,
agimos como os justiceiros do mal.”
Por mais antagônica que possa parecer essa
expressão, “justiceiros do mal”, ela reflete um anseio que
a sociedade projeta sobre o policial, que é o de fazer justiça
com as próprias mãos, independentemente das categorias
e canais legais de resolução de conflitos (PAIXÃO E
BEATO, 1997). Nesse sentido, verifica-se freqüentemente
a aprovação de ações arbitrárias e mesmo violentas da
polícia por parte da opinião pública. Deste modo, o trabalho
policial se defronta usualmente com uma clara contradição.
Se, por um lado, podemos verificar o crescimento da
fiscalização da sua atuação pelas instituições
democráticas, por outro, temos demandas por parte da
sociedade civil de uma atuação arbitrária e muitas vezes
violenta para que se faça justiça.
É assim que, concomitantemente ao “discurso da
adrenalina”, vemos surgir o “discurso da naturalização da
morte” servindo como mais uma defesa coletiva. Para os
policiais, o risco se torna uma rotina. Matar ou morrer é
algo natural. Consideram mesmo que dentre as funções
da polícia se destaca o “matar ou morrer”. “Nós temos mil
funções na rua, não só a de prender. Há casos em que os
traficantes não querem nem saber, eles te tocam fogo
mesmo. Daí é tu ou eles. Daí é matar ou morrer”.
Para finalizar esta parte de sua produção litográfica,
o nosso aventureiro buscou nas palavras desta canção
um pouco da síntese do que foi cartografado nesta escala:
“Às vezes eu falo com a vida, às vezes é ela quem diz:
qual é a paz que eu não quero conservar pra tentar ser
feliz?”18
QUARTA ESCALA: ENTRE A 7.65 E O
BATOM
Após uma pausa entre uma escala e outra, nosso
aventureiro voltou a se perguntar: “Será que tais estados
citados na escala anterior podem ser encontrados também
entre as mulheres policiais? De que forma a mulher
consegue inserir-se neste universo masculino sem que para
isso precise usar de subterfúgios que a capture em
territórios nos quais os desejos e afetos não pulsam mais
como agentes potencializadores da vida?”
Para tentar responder a estas questões, o nosso
protagonista recorreu novamente ao filme já referido
anteriormente; desta vez para focalizar o diálogo inicial
entre seus dois principais personagens. No caso, Jake
comenta com Alonzo uma ação empreendida junto com
sua treinadora. Deste relato, o que mais chama a atenção
de Alonzo é o fato de seu colega ter uma treinadora mulher,
seguindo-se várias perguntas: “Ela era negra? Branca?
Franchona? Sapatão? Lésbica? Gostosa?” Diante deste
interrogatório, Jake evita qualquer resposta e tenta retomar
sua narrativa do patrulhamento feito, ao que Alonzo comenta
ao final: “Verdade? Incrível... Você fica um ano com uma
gostosa e a melhor história que me conta é a prisão de
um bêbado?” E volta a indagar ao perplexo Jake: “Mas
não acredito em você. Você comeu, não comeu?” Como o
colega, encabulado, responde que tem esposa, ele
pergunta, indignado: “Você tem pau, não tem? O seu pau
fica no meio. Dos lados tem os bolsos, certo? Nesses
bolsos têm dinheiro. Procure num deles e pague a conta”.
Diante desta cena cinematográfica e dos
depoimentos colhidos em termos de masculinidade e
feminilidade no departamento policial cartografado, o nosso
explorador de intensidades constatou que o
reconhecimento da mulher naquele local se constrói, via
de regra, pelo conteúdo sexual. No decorrer do diálogo
acima reproduzido, Alonzo em momento algum, depois de
saber que Jake trabalhava com uma mulher, fez menção
18
59
O Rappa, “Minha Alma”, Lado B, Lado A, WARNER MUSIC, 1999.
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ao desempenho desta em termos profissionais. Em vista
disso, o cartógrafo deflagrou três papéis devidamente
“oferecidos” pelos homens policiais às suas colegas de
departamento: o “mandado quente”, o “mandado frio” e o
“sem mandado”.
vocabulário geralmente utilizado pelos homens, observase que algumas policiais masculinizam seu corpo, assim
como seu modo de agir, de sentir e de falar: “A mulher
policial tem que saber pedalar porta19, dar tiro, saber fazer
a retaguarda, não dar mole pros vago”.
O primeiro papel é o de mandado quente, quando
se associa à mulher termos como “gostosa” e “frágil”,
reduzida a objeto de prazer masculino. O que parece
imperar nesta lógica é aquilo que Guattari (1987)
denominou como alienação sexual, uma vez que um dos
pilares do capitalismo implica na polarização do corpo
social na masculinidade, sobrando para o corpo feminino
a transformação em objeto de cobiça, em mercadoria.
Porém, trata-se de uma saída custosa, conforme
se pode visualizar neste desabafo: “E daí tu tá na vila. E tu
precisa entrar naquela casa. Teu colega está ao teu lado...
posso sentir ele falando: - ‘Agora quero ver como irás fazer!’
Então é como se tu ligasse um piloto automático, pra usar
toda a tua força, não só física, mas mental também, e
entrar naquele casebre, ignorando o choro da criança, o
desespero da mãe, o latido do cachorro, o miado do gato...
Enfim de toda aquela realidade. Nessas horas tu tem que
te sentir como um homem... Frieza e força são destas
coisas que tu precisa. Senão tu só será mais um corpo a
ser comido”.
A esta mulher policial está designado também um
papel doméstico, semelhante ao da mulher burguesa do
início do século XX que, como já cartografado
anteriormente, era o exemplo da boa dona-de-casa,
dedicada aos filhos e ao marido. A chamar suas colegas
de “fogão”, os homens deste departamento fazem uma
alusão a um objeto que, a grosso modo, serve para
esquentar e comer. Logo, ao assumir um papel de
“mandado quente” – aquele que se efetua –, tal mulher
está sendo “esquentada para ser comida”.
Em outras palavras, o que se agencia é o papel da
“noivinha-que-gora-e-gruda” (ROLNIK, 1989) e que vivencia
os movimentos do desejo como caos. Segundo a autora,
ao boicotar o fluxo contínuo das conexões de seus desejos,
restringindo ao máximo seus agenciamentos, essa
noivinha acaba experimentando uma constante perda de
sentido pela vida. Mas nosso explorador de afetos observou
que também o policial acaba cristalizando uma
masculinidade do tipo self-made-man, aquela do policial
machão, que “traça todas” e não tem medo de nada,
conforme as palavras do personagem Alonzo: “Fale a
verdade, você comeu a garota. No banco de trás!... Você
tem pau, não tem?”.
O segundo papel destinado às mulheres neste
departamento foi nomeado pelo cartógrafo como o
mandado frio. A mulher que ocupa este papel é
considerada, pelos homens, lésbica ou “machorra”.
Diferentemente da noivinha-que-gora-e-gruda, esta descola
dessa imagem fragilizada: “Pra uma mulher que não é
gostosa ser reconhecida aqui, somente com muito tempo
de trabalho na rua, sendo pau-ferro no que faz, onde até
os vago a respeitem”.
A expressão “pau-ferro” utilizada naquele
departamento para designar a melhor policial, a mais
preparada, a que “não te deixa na mão”, é a principal
evidência de uma subjetividade feminina seduzida por uma
virilidade potente, pois, além de indicar significados de um
Dito de outra maneira deflagra-se não somente um
fazer masculino para essa mulher ser respeitada como
trabalhadora, mas, sobretudo, uma imposição de que
policial é somente aquele que faz do seu corpo e de sua
agressividade seus instrumentos de trabalho.
Por último temos o papel ocupado pela mulher sem
mandado, que de tão insignificante que ela é para os
homens, nem mesmo demandas masculinas ela consegue
suscitar. Ela não é nem quente e nem fria; nem sensual/
frágil e nem machorra/rude; não gruda e nem descola. Ou
seja, ela é um ser assexuado, vivendo em um limbo
existencial que a torna praticamente invisível: “Polícia que
é polícia trabalha na rua, prendendo vago, não socado atrás
de um computador fazendo papel20. Nem mesmo policial
ela pode ser considerada. É funcionária pública, não
policial”.
Assim, o próximo relato, registrado no bloco do
cartógrafo, sintetiza os três papéis que as mulheres estão
sujeitas a ocuparem neste ambiente: “Aqui, nós mulheres,
embora isto tenha mudado um pouco atualmente, vivemos
a lógica do se ficar o bicho come, se correr o bicho pega,
visto que ainda hoje somos reconhecidas, pelo olhar
masculino, como fogões. Assim sendo, ou somos gostosas
e frágeis, sempre necessitando da proteção masculina,
ou somos lésbicas e mal vistas ou, então, somos
burocráticas e, o que é pior, nem vistas”.
A partir disto, o que reverberou em nosso cartógrafo
foi a melancólica constatação de que os homens e
mulheres acabam, muitas vezes, despontecializados em
seus devires na atividade policial, uma vez que se
encontram colados a territórios fixos e delimitados. Seus
corpos ficam incapazes de afetar ou de serem afetados,
contribuindo, com isso, para a transformação instantânea
de toda e qualquer manifestação de força ativa em força
19
No cumprimento dos mandados policiais, em caso de suspeita de tráfico, é preciso, muitas vezes, invadir a casa do suposto traficante.
Para isso, quando o suspeito não se entrega ou não tem ninguém em casa, os policiais, ao lado de uma testemunha, invadem a casa, tendo
que, na maioria dos casos, por a porta abaixo com um pontapé.
20
Trabalhar em setor administrativo, como cartórios e secretarias.
60
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
reativa. Tal constatação fez o nosso protagonista buscar
em Nietzsche (2001, p.28) um contraponto a este
contexto: “ser ativo é parte necessária da felicidade”.
Bem, se por um lado o nosso agenciador de afetos
encontrou em sua caminhada nômade muitas
subjetividades desvitalizadas, também registrou encontros
que foram extremamente potencializadores, como um certo
devir “noivinha-que-gora-e-descola” (ROLNIK, 1989) em
meio a este viril departamento. Foi assim que enquanto
para algumas mulheres o mais viável foi deixar-se prender
em existências erótico-domésticas ou burocráticas,
intimidando-se perante os músculos do self made-man,
para outras a desterritorialização abriu espaço para a
circulação dos fluxos esquizo, propulsores de novos
agenciamentos coletivos de desejo (GUATTARI, 1987),
como afirma uma das policiais: “A instituição e os homens
que a fazem, já possuem em suas mentes lugares
certinhos para ocuparmos assim que chegamos. Entre os
favoritos estão a gostosona, a puta e a machorra. Cabe a
nós, mulheres, não ocuparmos tais lugares. É dolorido,
mas é preciso resistir e se impor entre a agilidade da 7.65
e a suavidade do batom”.
QUINTA ESCALA: TODO POLICIAL TEM
UM POUCO DE GREGOR SAMSA?
Durante seu processo cartográfico, nosso
protagonista nos deixou a par da densa realidade da
instituição Policia Civil, mais precisamente deste órgão
responsável pelo combate ao narcotráfico. Agora, pretende
colocar em análise a burocracia e seus modos de
subjetivação no departamento.
Geralmente burocracia é uma palavra que coloca
os seres humanos a serviço das organizações. O burocrata
do serviço público, segundo Costa (1991) é imobilista,
girando em torno da “máquina”. Sem ela não há sentido,
não há ação, não há satisfação e nem tampouco gozo.
Seu objetivo é manter as coisas como estão, ou seja, em
ordem e, quando possível, retroceder no que era antes.
Levando em consideração os estudos de Arendt
(1989) sobre o Totalitarismo, esta salientou algumas
manobras utilizadas pelos burocratas contra as mudanças.
Dentre elas, existe a do mito do preguiçoso, cujo resultado
é a auto vitimação do burocrata. Outra manobra burocrática
contra as transformações é a mistificação do passado,
cuja ativação opera na lógica da omissão da
responsabilidade individual (a culpa é sempre do outro).
Como última manobra, mantenedora do status quo
burocrata, temos a dissuasão pelo desdém. Ou seja, é o
ataque à modalidade do trabalho, tendo como meta a
destruição dos sujeitos encarregados pelas mudanças.
Parafraseando Arendt (2001), na medida em que a
vida pública é burocratizada, mais a violência se faz
presente. Dessa forma, a burocracia nada mais é do que
um sistema de gestão da vida das pessoas, cuja
característica principal é a de privá-las de sua liberdade
política e de seu poder de ação. Portanto, a engrenagem
burocrática opera na divisão entre quem comanda, pensa
e deseja, por intermédio da violência, autoridade e
persuasão, sobre a passividade daqueles que apenas a
observam acontecer.
Entretanto, como refere Guattari (1986), o modo pelo
qual os indivíduos vivem a subjetividade oscila entre dois
extremos: uma relação de opressão e alienação, na qual
o indivíduo se submete à subjetividade tal qual recebe, ou
uma relação de expressão e de criação, na qual o indivíduo
se reapropria dos componentes da subjetividade,
produzindo um processo que o autor chama de
singularização.
O que o nosso cartógrafo constatou entre os policiais
foi uma forte concentração de forças para o lado do “homem
da moral” (ROLNIK, 1994). Em tal situação se cultua a
ordem, a disciplina e o dever, mas como vimos isto não
cria novos agenciamentos e, por vezes, leve esses
trabalhadores a oscilar entre uma amoralidade e uma
imoralidade, e a visualizar o mundo de forma dicotômica,
como nas divisões de gênero, por exemplo. O que se
cartografou também foram subjetividades do tipo “sentinelazumbi”, que se conservam o tempo todo em estado de
alerta, conforme os três estados anteriormente descritos
(chapado, cheirado e tomado). Neste conjunto de
situações, no entanto, os policiais acabam desvigorados,
vivendo em cavernas platônicas da existência, idealizando
o dia em que alguém sairá de uma destas para ver o que
há do lado de fora.
Portanto, nesta etapa final da cartografia caberia
indagar acerca das possibilidades de se promover
revoluções moleculares neste meio institucional denso e
burocrático da polícia civil. Isto remeteu o cartógrafo a uma
leitura em Kafka (2000): “Quando em certa manhã Gregor
Samsa acordou de sonhos intranqüilos, encontrou-se em
sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso. Estava
deitado sobre suas costas duras como uma couraça e, ao
levantar um pouco a cabeça, viu seu ventre abaulado,
marrom (...) - ‘O que aconteceu comigo?’ – pensou (p.
07)”.
Nesta problematização da burocracia, Kafka dá
início a uma metáfora do lugar que ocupou o funcionário
frente ao Estado. Com efeito, Gregor Samsa reflete o
destino de milhões de “insetos” subordinados a um Estado
paternalista e assistencialista. O cartógrafo considerou
muito interessante esta análise, pois permitiu elucidar não
apenas as metamorfoses impostas aos policiais, no caso,
mas as transformações que vão se operando em seus
vínculos pessoais (família, vizinhança, chefia, etc.). Em
síntese, Kafka define a subjetividade do homem perante o
Estado paternalista como profundamente degradante e
degradada, envolvendo nela não apenas Gregor Samsa,
mas todo o conjunto social que o rodeia.
61
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
O cartógrafo ficou pensando o quanto o policial civil
é realmente colocado e tirado do lugar de uma forma tão
simples dentro da instituição pública. O Estado exerce
seu poder não importando se neste instante a pessoa está
pronta para a mudança ou não, como nas situações de
relotação funcional, quando os servidores simplesmente
são intimados para trocar de setor e, algumas vezes, de
cargo, sem consulta se isto corresponde ao seu desejo.
Que espécie de paternalismo é este? - “Perverso” –
pareceu ao cartógrafo. “Sem escrúpulo algum, sem
respeito, sem cuidado”. Um paternalismo que não vê um
sujeito, e sim um indivíduo na definição guattariana; isto
é, um indivíduo serializado, registrado e modelado, ou seja,
engrenagem de uma máquina de produção, que não pode
parar, que não pode sentir.
Portanto, ao recorrer a Kafka, o cartógrafo busca a
noção de uma metamorfose capaz de romper e transformar
com o que está instituído. Talvez o símbolo dessa
metamorfose kafkiana, a que se refere o explorador de
intensidades, não seja um inseto nojento e rasteiro,
sujeitado a se alimentar das sobras do Estado, como nos
mostra em sua obra o escritor tcheco. Mas sim a borboleta
que, após um tempo enclausurada, sofrendo todo tipo de
perigo e pressão, transforma-se em um dos animais mais
belos da natureza. É no bater de suas asas, mesclado
com a beleza de seus movimentos, que ela suavemente
ganha vôo. E voar é querer a vida em seu sentimento
máximo de potência, em suas possibilidades múltiplas de
expansão e produção de mais vida.
Depois de ter mergulhado intensamente no universo
da Polícia Civil, o cartógrafo pensou em deixar registrada
uma última nota em seu diário: a importância da
consolidação de programas preventivos e promotores de
saúde mental para estes trabalhadores. Concluiu que seria
urgente que os gestores públicos absorvessem sua
responsabilidade com a saúde de seus servidores, visto
que já não se trata apenas de um “caso de polícia”, mas,
sim, de uma questão de saúde pública, onde os efeitos do
sofrimento psíquico destes policiais atingem também a
sociedade como um todo.
Pensando nessa direção, o cartógrafo visualizou
algumas iniciativas visando a saúde mental do trabalhador
na Polícia Civil. Em primeiro lugar é preciso criar um
processo de democratização nestes espaços de trabalho,
o que pressupõe um convite a esses trabalhadores para
que participem das decisões que são tomadas quanto às
políticas a serem adotadas no departamento do qual fazem
parte. Também o investimento na contratação de
profissionais das áreas das ciências humanas e da saúde
que possam atuar juntos às delegacias e aos
departamentos, aproximando-se, desse modo, do cotidiano
dos policiais. E, por último, o estabelecimento de políticas
públicas que amparem programas sistemáticos em saúde
do trabalhador junto aos espaços do trabalho policial.
apaixonado cartógrafo, a fim de romper com o instituído
que burocratiza as subjetividades, faz uso da metáfora da
borboleta para elucidar alguns aspectos que considera
importantes em uma análise final. No que pese a delicadeza
e a fragilidade da borboleta, seu processo metamórfico é
de uma potência quase sem comparações na natureza.
Ficou evidente para o cartógrafo a necessidade que esses
policiais possuem em romper com os casulos impostos
pela instituição no qual estão inseridos, buscando, através
desta ruptura, uma apropriação artística dos seus sentidos,
afetos e corpos. Fato que consiste em estarem implicados
numa ética e estética que contemple a vida em todos os
seus sentidos, potencializando-a em cada coração afetado
pela ânsia de viver.
Mais do que saber manusear uma arma, “pedalar
uma porta”, prender “os vagos”, cumprir mandados, estar
“celulado”, estar em alerta, ser fissurado pelas ruas, é
preciso saber, também, quando é o momento de suspender
as ações, prevenir, desacelerar e, principalmente, saber o
caminho de volta para casa.
Entre a arma e o sofrimento psíquico existe uma
espiral imaginária de acontecimentos que, ao se comprimir,
parece que irá se romper. No entanto, a força tensional
exercida sobre essa espiral não é maior do que seu poder
de resistência. Mais do que resistir à fissura pelas ruas, à
linha tênue, ao imperativo fálico, às pressões institucionais,
o policial precisa saber exercer um poder de resiliência21
que lhe proporcione, no meio de toda essa loucura, um
momento de lucidez. Isto é claro, antes que o gatilho seja
acionado e o sofrimento abreviado.
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sofrimento. Santa Cruz do Sul, EDUNISC, 2002.
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FREITAS, Isabel & FISCHER, Maria de Fátima B. Sujeitos e
instituições: modos de cuidar e tratar. Porto Alegre, Gráfica
da UFRGS, 2002.
FREUD, S. Totem e Tabu In: Edição Standard Brasileira das
21
Sendo assim, chegando ao fim de sua aventura
cartográfica pelos meandros da Polícia Civil, nosso
Conceito advindo da Física e utilizado pela Engenharia. Referese a capacidade de um material sofrer tensão e recuperar seu estado
normal após ultrapassado o “estado de risco”.
62
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Obras Completas de Sigmund Freud. V. XII. Rio de Janeiro,
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A cidadania em construção: uma reflexão transdiciplinar.
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organização policial, consenso e violência. Revista de
Sociologia Tempo Social, Porto Alegre: p., 155-167, jan/abr
1997.
63
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
REFORMAS UNIVERSITARIAS EN VENEZUELA
1
Cátia Raquel Felden 2
Francesca Sacco Oviedo 3
Williams V. Aguilera 4
Sociedade Educacional Três de Maio (SETREM/ Brasil)
Universidade de Carabobo (Venezuela)
RESUMO
De acuerdo al informe presentado por la UNESCO
en el año 2002, titulado: “La educación superior en
Venezuela”, se evidencian diversas deficiencias, en
respuesta a éstas, a nivel del gobierno central han surgido
propuestas, entre ellas se encuentran las de carácter legal
como: el decreto 3444, la ley de servicio comunitario del
estudiante de Educación Superior y la Ley Orgánica de
Ciencia, Tecnología e Innovación. Desde esta tríada, el
objetivo de la presente investigación es conocer la
perspectiva que asumen las autoridades de la Universidad
de Carabobo frente a la necesidad de repensar las
instituciones universitarias y replantearse la gestión
universitaria, y de esta forma desentrañar los
procedimientos que articularán el sector empresarial, la
sociedad venezolana y la Universidad. La presente
investigación constituye una primera etapa de una
investigación más general y fue abordada de forma
documental y de campo y el nivel de estudio fue descriptivo.
La población estuvo conformada por las cuatro autoridades
de la Universidad de Carabobo, los cuales constituyeron
la unidad de análisis. La recolección de datos se realizó a
través de entrevistas semiestructuradas. Los datos
recolectados se analizaron según su frecuencia y del
análisis se realizaron las descripciones que generaron
información pertinente a la Universidad de Carabobo. Los
resultados reflejaron la necesidad de continuar con
reformas universitarias que permitan ampliar la formación
de profesionales, recuperando una visión auténticamente
“social” en su estudiantado e incorporando a la empresa
en el quehacer científico y tecnológico de las
universidades. El estudio en cuestión no queda concluido,
sino que al contrario se abren puertas para continuar
observando los efectos que provocará la tríada
anteriormente identificada así como también otros factores
de semejante índole que pudieran permitir la reforma
universitaria venezolana.
Palabras clave: Reforma, Universidades,
Venezuela.
ABSTRACT
According to the report presented by UNESCO in
2002, entitled “The Higher Education in Venezuela,” we
can highlight several weaknesses. In response to this report
the government has drafted some measures, such as the
3444 decree, the law of community service for students in
higher education, the organic law of science, technology
and innovation. The purpose of this study is to know the
stance that the University of Carabobo adopted, given the
need to rethink and redesign the joints between the
business sector, society and academia. Data collection
was through semi-structured, because it is a descriptive
study. After analyzing the data we can conclude that there
is a latent need to continue with the reforms university,
with an alignment between universities, corporations and
businesses.
1
Keywords: Reform, University, Venezuela.
Grupo de Investigación “La responsabilidad social en las Universidades”.
Catia Raquel Felden ([email protected]). Licenciada en Administración de Empresas (URI-Santo Ângelo), Postgrado en
Finanzas (URI-Santo Ângelo), Maestría en Desarrollo (UNIJUI/Ijui), Doctoranda en Contabilidad y Finanzas (UNIZAR-Zaragoza/ España).Prof.
SETREM.
3
Francesca Sacco Oviedo ([email protected]) Licenciada en Contaduría Pública. (Univ de Carabobo./Venezuela). Postgrado
en Ciencias Contables (Univ de Carabobo./Venezuela). Magíster on line en Comunicación en las Organizaciones (Univ Complutense de
Madrid/España). Doctoranda en Contabilidad y Finanzas (UNIZAR-Zaragoza/España).Prof. Univ de Carabobo
4
Williams V. Aguilar ([email protected]) Licenciatura Economía (Univ. de Carabobo, Venezuela) Postgrado: Especialización en
Cooperación Internacional para el Desarrollo (Univ Simón Bolívar/Venezuela). Postgrado Magíster en Economía de Empresas (Univ. de
Carabobo/Venezuela). Doctorado Integración y Desarrollo Económico. Univ. Autónoma de Madrid (Madrid). Prof. Univ de Carabobo.
2
64
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1 INTRODUCCIÓN
En la Constitución Nacional de la República
Bolivariana de Venezuela, se promueven los valores de la
vida, la libertad, la justicia, la igualdad, la solidaridad, la
democracia, la Responsabilidad Social, y la preeminencia
de los derechos humanos, la ética y el pluralismo político,
en concordancia con estos valores y especialmente con
el de la Responsabilidad Social; durante el año 2005 se
decretaron dos leyes: la Ley de Servicio Comunitario del
Estudiante de Educación Superior y la Ley Orgánica de
Ciencia, Tecnología e Innovación que se encargan de
vincular las Universidades con las empresas y la sociedad
venezolana. Inicialmente durante el año 2002 se dicta en
Gaceta oficial el decreto Nº 3444: “Reforma parcial del
reglamento orgánico del Ministerio de Educación Superior”,
normativas de carácter legal que afectan la educación
superior venezolana y que buscan combatir:
uno de los problemas más apremiantes... los
recursos, ...la manera de aumentarlos, de
diversificar su fuentes, de mejorar su
asignación y gestión interna y, por último, el
modo de asumir las funciones que la sociedad
les encomienda conservando al mismo tiempo
la reconocida tradición de autonomía y de
servicio desinteresado. (IEASALC-UNESCO,
2003)
En este sentido, conocer la perspectiva que asumen
las autoridades de la Universidad de Carabobo frente a la
necesidad de repensar las instituciones universitarias y
replantearse la gestión universitaria constituye el objetivo
general de la presente investigación.
El estudio en cuestión está estructurado en dos
partes: la primera la constituye el fundamento teórico de
Autonomía Universitaria, Responsabilidad Social
Universitaria y las actividades empresariales / Ciencia y
Tecnología; y una segunda, constituida por un análisis de
la posición asumida por las autoridades de la Universidad
de Carabobo al respecto.
América Latina experimenta una pobreza muy aguda
y diversos autores (Kliksberg, 2004; Machado y Alvarado,
2005) han expresado su opinión: Uno de cada dos
Latinoamericanos es pobre y la pobreza es un flagelo que
atenta contra los derechos humanos más elementales del
ser humano, crea inestabilidad en los sistemas
democráticos, produce efectos económicos y sociales
regresivos y por su naturaleza y complejidad amerita
políticas que trasciendan los usuales enfoques
economicistas y que apunten hacia el diseño de acciones
más sistémicas e integrales, donde el fin último sea el
desarrollo de las capacidades humanas y el bienestar
social.
Por otro lado, la desigualdad existente en esta región
entre ricos y pobres, siendo la mayor del planeta,
(Kliksberg, 2004); no se reduce al ámbito de la justicia
social, sino que determina que un gran número de personas
queden relegadas de la actividad educativa y productiva,
por lo tanto son pocos los que contribuyan de manera
relevante en la creación de la riqueza y desarrollo.
Venezuela, no escapa de esta realidad, y la pobreza,
agobia a un alto índice de la población venezolana, así lo
confirma el informe de desarrollo humano 2005, en donde
se especifica que Venezuela a pesar de ser un país con
mayor crecimiento del PIB per capita en Latinoamérica,
es el que mayor pobreza extrema tiene (15% del total de
su población).
En las investigaciones de Vásquez, por un lado se
observa que en Venezuela la producción científica y
académica de las Universidades se encuentra muy por
debajo de los niveles encontrados en los países
desarrollados5, y por otro lado se muestran las cifras de
matriculación en educación superior (a nivel de pregrado)
que a pesar de su tendencia creciente durante la última
década, éste no ha sido en las áreas científicas y
tecnológicas.
Ante esta situación el país ha iniciado un proceso
de reformas que buscan encaminar al país hacia un
desarrollo más equitativo. Dentro de estas reformas, la
universitaria se constituye de forma manifiesta como líder
de este proceso. En concordancia a esta reforma, el
gobierno central de Venezuela, ha entendido la necesidad
de vincular la Universidad con la sociedad y la empresa,
creándose en el 2005 la ley de servicio comunitario del
estudiante de Educación Superior y la Ley Orgánica de
Ciencia, Tecnología e Innovación, como una manera de
coaccionar al estudiantado y al gran empresario e
involucrarlos en el desarrollo social, científico y tecnológico
de la nación.
Sin embargo el papel que juegan las autoridades
para llevar a cabo las transformaciones necesarias en la
Universidad es fundamental, por lo que resulta de interés
para los autores conocer: ¿Cuál es la perspectiva que
asumen las autoridades de la Universidad de Carabobo,
ante el escenario de las reformas legales propuesto por el
Gobierno Central?
Para alcanzar el objetivo del artículo que es “Conocer
la perspectiva que asumen las autoridades de la
Universidad de Carabobo frente a la necesidad de repensar
las instituciones universitarias”, planteamos tres objetivos
específicos. (1) Conocer la perspectiva que asumen las
autoridades de la Universidad de Carabobo frente al
Decreto 3444.; (2) Conocer la perspectiva que asumen las
autoridades de la Universidad de Carabobo frente a la Ley
de Servicio Comunitario del Estudiante de Educación
5
Contrariamente a esta situación en los países de reciente industrialización para ampliar sus capacidades tecnológicas han tenido como
política: incrementar el número de matriculados en las áreas técnicas y científicas, mostrando fuertes correlaciones entre la competitividad
de las empresas manufactureras y la magnitud de las matrículas en áreas tecnológicas
65
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Superior; (3) Conocer la perspectiva que asumen las autoridades de la Universidad de Carabobo frente a la Ley
Orgánica de Ciencia, Tecnología e Innovación.
2 FUNDAMENTOS TEÓRICOS
La presente investigación fundamentó su base teórica primeramente en el Debate temático titulado: Autonomía,
Responsabilidad social y Libertad, el cual se fundamenta en 4 pilares y se encuentra especificado en el cuadro Nº 1:
CUADRO Nº 1: Autonomía y Libertad
Autonomía
universitaria y
rendición de cuenta
Se refiere a que las
instituciones
universitarias deberán
ajustarse a las
normativas legales, y
de esta forma ser m ás
transparentes y
demostrar sus logros,
rindiéndole cuentas al
Estado o a los
consejos de
administración que
representaban al
público o a
los
propietarios.
En este pilar el debate
se centra en la
reflexión sobre la
autonomía y la
rendición de cuentas.
En Venezuela, este
debate se encuentra
en la ley de
Universidades, El
reglamento Orgánico
del Ministerio de
Educación Superior y
el decreto 3444.
Autonomía universitaria y
Libertad académica:
partes interesadas: Estado, consecuencias éticas
Sociedad y Universidad
y responsabilidades
cívicas.
La búsqueda de la
La educación superior
verdad es uno de los
impulsada está por una
objetivos de
las
economía de mercado,
Instituciones
posee muchos intereses
Universitarias, sin
externos, con los que se
deberá enfrentar y buscar su embargo los conflictos
apoyo y hasta dependerá de éticos y las
responsabilidades ante
ellos. En este sentido la
la comunidad entran en
relación entre universidad y
la sociedad se intensi ficará, juego e incluso pueden
ser contrarias a la ética
pero ahora el compromiso
es responsabilidad moral con personal de los
académicos. Los
la sociedad, implica ir mas
progresos tecnológicos,
allá del apoyo financiero, la
biológicos y médicos y
Universidad deberá estar al
el desarrollo de campos
“servicio a la comunidad”,
que ayuden a la comunidad transdisciplinarios
entran en este campo
a protagonizar su propio
de dilemas éticos.
desarrollo.
Se hace entonces evidente la
necesidad de diversificar el
apoyo y la financiación.
En Venezuela, este debate
se ha iniciado a partir de la
creación de la Ley de
Servicio Comunitario del
Estudiante de Educación
Superior.
Libertad académica
y actividades
empresariales.
Las universidades
tratan de buscar otras
fuentes de
financiamiento
distintas al Estado, en
este sentido tratan de
establecer relaciones
con la empresa.
En relación a esta
situación, el debate se
centra en “¿cómo
conservar la libertad
de investigación y
difusión cumpliendo al
mismo tiempo las
condiciones de
confidencialidad que
suele exigir una
relación
empresarial?”
En Venezuela, este
debate recientemente
se está iniciando a
partir de la Ley
Orgánica de Ciencia
y Tecnología.
Fuente: IESALC-UNESCO. Autonomía, Responsabilidad social y Libertad Académica. Asociación Internacional de Universidades.
Adaptación: propia
Ante el debate anterior, donde se hace referencia a
la Responsabilidad Social Universitaria, se hace
impostergable su definición, al respecto diversos autores
han manifestado su posición, sin embargo la asumida por
Luis Eduardo Bacigalupo6, constituye la más pertinente
para la actual investigación.
6
La Responsabilidad Social Universitaria es un
enfoque ético del vínculo mutuo entre
universidad y sociedad. Se trata de un
compromiso moral irrenunciable que, a la par
que genera nuevo conocimiento relevante para
la solución de los problemas sociales, permite
la aplicación directa del saber científico y
tecnológico, así como una formación
profesional más humanitaria. (p.1)
Director de la Académico de proyección social y extensión universitaria de la Pontificia Universidad Católica del Perú (PUCP) Filósofo
en la Freie Universität Berlin, Alemania y tiene un Doctorado en Filosofía de esta misma Universidad. Es Profesor de la PUCP en los cursos
de Ética, Filosofía Medieval y Filosofía de la Religión como Profesor Principal desde 2000. También es el Vicepresidente del Consejo de
Lima del Intercambio Cultural Alemán Latinoamericano (ICALA) y de la Agencia Católica Alemana de Intercambio Académico (KAAD).
Miembro del Consejo Académico del Fondo Edito-rial de la PUCP. Presidente del Consejo Directivo del Consorcio de Universidades
66
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El autor de este concepto, se fundamenta en cinco
pilares básicos:
I- Implicación del cambio de terminología:
Proyección Social de la Universidad por
Responsabilidad Social Universitaria: la Universidad de
hoy debe asumir un rol protagónico en la sociedad, no es
de lo que le sobre a la Universidad lo que destinará para la
sociedad, sino que debe responder a demandas sociales
específicas y mas a sabiendas de que el Estado se
encuentra atravesando por una crisis. Le corresponde a
las Universidades “injerencia política orientada al cambio
de estructuras y hábitos sociales que impiden el bienestar
y el desarrollo humano”.
A continuación en el cuadro Nº 2 se muestran las
diferencias entre Proyección social de la Universidad y
Responsabilidad Social Universitaria.
Como se observa en el cuadro anterior, las
características detalladas de Responsabilidad Social
Universitaria abarcan la presencia implícita de los seis
ejes estratégicos de la educación, a los que hace referencia
Morin, en su libro: “Educar en la era planetaria”7, en cambio
la proyección social voluntaria, es simplista no abarca la
trasversalidad que implica el otro concepto en comparación,
lo relevante en todo caso es buscar los mecanismos que
conlleven a la acción.
II- La función política que debe asumir la
Universidad como institución de asociación
voluntaria: Primeramente habrá que aclarar que la
universidad es una asociación voluntaria, ya que una de
sus características es su ámbito de libertad: “libre ingreso
y libre egreso”.
La Universidad deberá realizar investigación aplicada
que permita interpretar las demandas de la sociedad para
posteriormente proponer propuestas de acción viables y
sostenibles, deberá conjugar un diálogo democrático con
los distintos actores políticos y, sobre todo: “ser capaz de
apoyar mediante el conocimiento y la racionalidad ética el
diálogo entre el Estado y la Sociedad Civil”.
La racionalidad técnica está basada sobre el
conocimiento científico y técnico, la racionalidad
pragmática está relacionada con el sistema político, que
por su vez se busca obtener el poder sobre las distintas
instituciones, y aquí entran en juego la negociación y la
percepción, y no menos importante la racionalidad ética,
que para Fantoni “es una racionalidad intersubjetiva” ya
que se encuentra sustentada en principios éticos y no en
dogmas. Salvaguarda el valor de la persona humana y
“funda sus bases para la responsabilidad por las acciones
comunes de los hombres”, se encuentra ligada con “el
mundo de la vida”.
La racionalidad política es una racionalidad
pragmática, que incluye principios éticos dictados por la
sociedad civil.
Lo que distingue la acción política de las
organizaciones de la Sociedad Civil es que luchan por
garantizar la libertad personal y las libertades cívicas de
sus colectividades sin pretender la obtención del poder en
el aparato del Estado. Su orientación es contribuir a la
realización colectiva de mejores condiciones de vida en el
ámbito de acción social más directo, lo cual puede solo
lograrse a través de la acción coordinada de esfuerzos
con el estado y los propios ciudadanos.
No sustituyen a la Sociedad Política, no se separan
de la Sociedad Económica, sino que buscan convertirse
en el elemento articulador de éstas sociedades.
En ese sentido es que la Sociedad Civil es la
mediadora de ambas, porque ambas sociedades, la
económica y la política, cuando pierden la dimensión ética
de su acción, entran en una vorágine autodestructiva; lo
que, dicho de otra manera, significa que ambas
racionalidades, la técnica y la pragmática, tienden a
enajenar a las personas, convirtiéndolas en simples medios
para sus fines. Si hacen eso sin ningún tipo de
autolimitación, en esa misma medida minan el suelo por
el que ellas mismas transitan. El supuesto es que en el
caso de que los principios de responsabilidad sean
extralimitados por alguna de ellas sería la sociedad civil a
través de las redes organizacionales e institucionales quien
obligue pacíficamente a la reconstitución de los principios
básicos de actuación moral, social y ética.
III- La racionalidad ética como labor intrínseca
de la Universidad y su relación con otras
racionalidades: El tener dos conceptos de sociedad: el
económico y el político implica distintas formas de
racionalizar: sea técnica, pragmática o ética.
7
Los seis ejes al que hace referencia Edgar Morin, en su libro son: el eje estratégico directriz conservador /revolucionante, el eje
estratégico directriz para progresar resistiendo, el eje estratégico directriz que permita problematizar y repensar el desarrollo y criticar
la idea subdesarrollada de subdesarrollo, el eje estratégico directriz que permite el regreso (reinvención) del futuro y la reinvención
(regreso) del pasado, el eje estratégico directriz para la complejización de la política y para una política de la complejidad del devenir
planetario de la humanidad, el eje estratégico directriz para civilizar la civilización
67
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Cuadro Nº 2: Proyección Social y Responsabilidad Universitaria
Fuente: BID. Documento conceptual de referencia del concurso regional: Programa de apoyo a iniciativas de Responsabilidad Social
Universitaria, ética y Desarrollo.
IV- La compatibilidad de la misión de la Universidad: “difundir la racionalidad ética” con la misión
clásica de la Universidad: “la ciencia y la investigación”.
Aunque la Universidad no constituye el espacio para movimientos y partidos políticos, si constituye el espacio
para una nueva forma de hacer política: “que no sea partidista”, su papel no puede reducirse exclusivamente a lo
científico, porque las Universidades desde sus más remotos orígenes, siempre han tenido repercusión, en la configuración
de la vida política de su entorno.
Este vínculo, es lo que ha llevado a que hoy se esté replanteando la idea de una responsabilidad ante la
sociedad que la Universidad no se puede seguir eludiendo.
68
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
V- La Responsabilidad Social Universitaria ante la escasez de recursos económicos y baja calidad en
contraposición con el gran número existente de ellas.
La Sociedad Civil necesita el apoyo de la Universidad, sin embargo primeramente hay que fortalecer a las
universidades, y es a través de la investigación. Si bien hacer investigación pura constituye la presencia de presupuestos
muy altos para las universidades, la investigación aplicada es la opción, para posteriormente trasmitir este conocimiento
a las aulas.
Por otra parte Morin, en su libro: Los siete saberes necesarios a la educación del futuro, presenta los fundamentos
necesarios para construir una educación pertinente al momento en que se encentra atravesando la sociedad actual,
caracterizada por un “Mundo de creciente complejidad”. A continuación se presenta el cuadro Nº 3 el cual presenta de
forma resumida su fundamento:
Cuadro Nº 3: Los siete saberes necesarios a la educación del futuro
Fuente: Edgar Morin. Adaptación: propia.
69
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
3 FUNDAMENTOS LEGALES
La fundamentación legal de la presente investigación se encuentra en tres leyes, que en a continuación se
resumen en el cuadro Nº 4
Cuadro Nº 4: Fundamentos Legales
La ley de Universidades
Decretada en el mes
Septiembre de 1970
Ley de Servicio Comunitario
del Estudiante de Educación
Superior.
de Decretada en el mes de
Agosto de 2005.
Objeto: Las Universidades son
Instituciones al servicio de la
Nación y a ellas corresponde
colaborar en la orientación de
la vida del país mediante su
contribución doctrinaria en el
esclarecimiento
de
los
problemas nacionales.
La enseñanza universitaria se
inspirará en un definido
espíritu de democracia, de
justicia social y de solidaridad
humana, y estará abierta a
todas las corrientes del
pensamiento universal, las
cuales
se
expondrán
y
analizarán
de
manera
rigurosamente científica.
Objeto: normar la prestación
del servicio comunitario del
estudiante
de
educación
superior, que a nivel de pre
grado aspire al ejercicio de
cualquier profesión.
Se regirá por los principios
constitucionales
de
solidaridad,
responsabilidad
social, igualdad, cooperación,
corresponsabilidad,
participación
ciudadana,
asistencia
humanitaria
y
alteridad
la Ley Orgánica de Ciencia
y Tecnología
Decretada en el
Agosto de 2005.
mes
de
Objeto de la Ley: Desarrollar
los principios orientadores que
en
materia
de
ciencia,
tecnología e innovación y sus
aplicaciones, establece la
constitución de la República
Bolivariana de Venezuela,
organizar el Sistema Nacional
de Ciencia, Tecnología e
Innovación,
definir
los
lineamientos que orientarán
las políticas y estrategias para
la
actividad
científica,
tecnológica y de innovación,
con
la
implantación
de
mecanismos institucionales y
operativos para la promoción,
estímulo y fomento de la
investigación científica, la
apropiación
social
del
conocimiento
y
la
transferencia e innovación
tecnológica, a fin de fomentar
la
capacidad
para
la
generación, uso y circulación
del
conocimiento y de
impulsar
el
desarrollo
nacional.
Las actividades de ciencia,
tecnología e innovación y la
utilización de los resultados,
deben estar encaminadas a
contribuir con el bienestar de
la humanidad, la reducción de
la pobreza, el respeto a la
dignidad y los derechos
humanos y la preservación del
ambiente.
Fuente: Ley de Universidades, Ley de Servicio Comunitario y Ley Orgánica de Ciencia, Tecnología e Innovación. Diseño: Propio.
70
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
4 ASPECTOS METODOLÓGICOS
Cuadro Nº 4: Descripción de la Metodología
Tipo de Investigación
Documental y de campo
Nivel de Investigación
Descriptiva
Población y Muestra
La población está conformada por las cuatro Autoridades de
la Universidad de Carabobo. Por ser la población tan
pequeña, la muestra es el 100% de la población.
Se utilizó como técnica la observación y la revisión
documental.
Se utilizó como instrumentos las entrevistas no estructuradas.
Técnicas e Instrumentos de
Recolección de Datos:
Técnicas de Análisis de Datos
Validez
El análisis de datos se hizo con carácter cuantitativo; para el
tratamiento de los datos se utilizaron técnicas de estadística
descriptiva, tomándose en cuenta la frecuencia de cada
indicador, la cual además de expresarse mediante
cantidades porcentuales, fueron representados gráficamente,
con el propósito de interpretar y analizar los resultados
obtenidos.
La validez se realizó a través del juicio de tres expertos: en
metodología, en educación superior y en estadística.
Elaborado por: Sacco y Vásquez (2007)
4.1
ANÁLISIS DE LOS RESULTADOS
Con relación al objetivo específico Nº 1: Conocer la perspectiva que asumen las autoridades de la Universidad de
Carabobo frente al Decreto 3444, los resultados obtenidos fueron los siguientes:
Cuadro Næ% 5: Resultados
SI
En relación a si decreto 3444 constituye una violación a la
autonomía universitaria
En relación a las funciones que pertenecían al CNU y a la
OPSU. ¿Ahora pasan a al viceministro de Asuntos
Académicos?
Con este decreto ¿el viceministro de Asuntos Académicos se
encargará de la creación de nuevas carreras universitarias
El viceministro de Asuntos Académicos ¿se encargará de 4
planificar, coordinar planes, proyectos y de supervisar el
trabajo que se haga en el CNU?
Considera que ¿el decreto está por encima de la Ley de
Universidades?
Considera que ¿el decreto está por encima de la
Constitución Nacional?
NO
4
TOTAL
4
4
4
4
Se observa que las autoridades de la Universidad de Carabobo tienen una posición de mayor apertura hacia el
decreto 3444, que la visión inicial de considerar dicho decreto en “una violación a la Constitución Nacional”, en relación
a la Autonomía Universitaria, e incluso llegan a considerar que “Ha existido mucha mitología en torno a este decreto,
que esencialmente busca la aplicación del reglamento de funcionamiento del Ministerio de Educación Superior de
Venezuela...el CNU sigue funcionando con sus tareas inherentes; la OPSU también, con las modificaciones que se
aspiran implantar en relación a las políticas de ingreso a la educación superior; y el vice ministerio de asuntos académicos
tiene sus propias funciones y tareas de acuerdo a dicho reglamento... el decreto 3.444 es la aplicación de un reglamento
interno de funcionamiento del ministerio, que no se había aplicado nunca, pese a estar aprobado desde hace tiempo.
Es razonable pensar que el ministerio tiene toda la potestad de aplicar su reglamento interno, en función de cumplir
con sus objetivos de institución que rige la educación superior en Venezuela”
71
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
La Oficina de Planificación Superior Universitaria
(OPSU), fue creada en principio para planificar el sector
universitario, sin embargo con el tiempo esa misma
organización degeneró en un organismo financiero, que
no era su principio, con ello las autoridades quieren aclarar
que las funciones del Concejo Nacional de Universidades
(CNU) y la OPSU no van a pasar a manos del viceministro
de Asuntos Académicos, ni que se encargará de la
creación de nuevas carreras, sin embargo si se encargará
de planificar, coordinar y supervisar planes y proyectos
que se hagan en el CNU, el proceso de creación de nuevas
carreras sigue su curso tradicional: consejo de escuela,
consejo de facultad, consejo universitario, CNU, Ministerio
de Educación Superior.
Hacen referencia que el vice ministerio se encuentra
facultado por la Ley para planificar y coordinar planes y
proyectos donde invierta recursos el Estado venezolano,
puede, igualmente, supervisar la efectividad del CNU.
debate hacia su reforma en la Asamblea Nacional e incluso
llegan a afirmar que la ley actual amerita una reforma
integral, pues fue elaborada en un país distinto al actual.
Consideran que “el verdadero debate: es nueva Ley, donde
nosotros, los universitarios, debemos participar... para
hacer conocer nuestras ideas sobre la universidad que
queremos. Allí es donde debemos expresar al gobierno en representación del Estado- que tenemos ideas y
propuestas sobre la universidad venezolana; que tenemos
divergencias y coincidencias, pero que es en el debate
con mesura y altura de miras, que debemos construir una
nueva ley de universidades que se corresponda con la
voluntad consensual de todos los universitarios”.
Con relación al objetivo específico Nº 2:
Conocer la perspectiva que asumen las autoridades
de la Universidad de Carabobo frente a la Ley de
Servicio Comunitario del Estudiante de Educación
Superior.
Cuadro Næ% 6: Resultados
No consideran que el decreto esté por encima de la
Ley de Universidades. La propia ley de universidades se
SI
Considera que esta Ley ¿constituye una oportunidad para 4
Reformar a las Universidades al asumir como un deber de
los estudiantes de educación superior la Responsabilidad
Social?
Usted, ¿ha encontrado debilidades a la presente Ley?
4
Las autoridades ven esta Ley como “una oportunidad
para fortalecer el sentido humanista que debe prevalecer
en la reflexión y la acción de todo universitario respecto a
la sociedad donde coexiste”. Como actores principales
están los estudiantes, y el escenario: la sociedad. Aclaran
que desde los orígenes de la Universidad de Carabobo,
siempre se ha tenido Responsabilidad Social, hoy la
diferencia radica en que el estudiantado será el
protagonista, y no como antes, cuando todo lo que hacia
el estudiante era voluntariado, porque ahora es un requisito
para la obtención del título universitario y tendrá una
duración mínima de 120 horas académicas.
Las autoridades de la Universidad de Carabobo,
pretenden cumplir con esta Ley a través de la Dirección
de Extensión y Servicios a la Comunidad (DESCO) “es la
unidad organizativa administrativa con adscripción a la
Rectoría de la Institución, la cual realiza funciones de
naturaleza técnica y de servicios para beneficio de la
colectividad; dirigiendo, coordinando y ejecutando
actividades intra y extrauniversitaria, en las áreas de
NO
TOTAL
asesoría jurídica, salud comunitaria, orientación y
educación, recreación y cultura, con el propósito de
cooperar con las comunidades en la formulación de
propuestas para el desarrollo social, a la vez que contribuye
en la solución de sus problemas”, esta dirección para la
fecha de la creación de la ley ya existía y ya tenía proyectos
sociales de excelente envergadura.
Aclaran también que por ser una Ley bastante nueva
(2005) la consideran perfectible y que es en este año
cuando se están iniciando la aplicación de los proyectos,
por lo que aún no existen resultados de la aplicabilidad de
esta Ley.
Con relación al objetivo específico nº 3: Conocer la
perspectiva que asumen las autoridades de la Universidad
de Carabobo frente a la Ley Orgánica de Ciencia,
Tecnología e Innovación.
Cuadro Næ% 6: Resultados
¿Con la Ley Orgánica de Ciencia, Tecnología e Innovación se están
incrementando las posibilidades de iniciar las reformas académicas necesarias?
¿Existe capacidad de respuesta para res
olver problemas que se plantean en el
sector productivo visto desde la óptica anterior?
¿La actividad científica y tecnológica que se realiza en las universidades y
centros de investigación es transferible al sector privado?
¿Está la estructura universitaria en capacidad de responder a estos retos?
¿Se plantea la heterologación salarial donde a mayor trabajo, mayores ingresos?
Existen previsiones doctrinales, organizativas, administrativas y de seguimiento
que garanticen la correcta uti lización de estos recursos?
72
SI NO
4
4
4
4
4
4
TOTAL
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Las autoridades universitarias ven positiva la creación
de la Orgánica de Ciencia, Tecnología e Innovación, porque
la consideran “un canal de comunicación entre sectores
productivos (públicos y privados) y sectores de
investigación, radicados fundamentalmente en nuestras
universidades. Un canal de comunicación de ganar-ganar,
por cuanto permite a las universidades mostrar sus
posibilidades y a los sectores productivos repensar la
relación con las casas de estudio y poder utilizar
experiencias que contribuyan a mejorar su productividad.
Y todo por un recurso fiscal que permite a las empresas
aportar un porcentaje de sus ganancias brutas a financiar
proyectos de ciencia, tecnología e innovación. Consideran
que con esta Ley se puede avanzar mucho, primero en la
relación y en el contacto de problemáticas y soluciones
propias de ambos sectores; y seguidamente, más en el
mediano plazo, la propulsión de posibilidades de reformar
aspectos de las universidades, que decididamente deben
mejorarse”.
En esta Ley se prevé taxativamente, que las
empresas cuya facturación excede 100.000 unidades
tributarias (Bs. 3 millardos anuales) en empresas de
hidrocarburos, mineras y eléctricas, y de otros sectores,
el aporte será del 2%, 1%, y 0,5%, respectivamente, de
sus ingresos brutos para ser invertido en el sector de
ciencia, tecnología e innovación en el entendido de que
estas actividades son transferibles al sector productivo.
Las autoridades consideran que esta situación
constituirá, un fondo de financiamiento extraordinario que
le hacía falta para el progreso académico de las
Universidades ya que junto con la planta productiva del
país se aprecian niveles de obsolescencia de tecnologías
o de importaciones de éstas, aunque reconocen estar
académicamente preparados para afrontar los retos en
materia de ciencia, tecnología e innovación que exige el
empresariado.
Por otra parte, las autoridades se encuentran
conscientes de la existencia de debilidades administrativas
que pueden afectar la motivación del profesor, tales como:
ausencia de heterologación salarial donde a mayor trabajo,
mayores ingresos, previsiones doctrinales, organizativas,
administrativas y de seguimiento que garanticen la correcta
utilización de estos recursos.
En relación a las previsiones doctrinales,
organizativas, administrativas y de seguimiento que
garanticen la correcta utilización de estos recursos,
manifestaron que la universidad venezolana tiene diversos
mecanismos para la recepción de fondos destinados al
desarrollo de proyectos de ciencia, tecnología e innovación.
En nuestras universidades, han existido los Consejos de
Fomento, con una visión orientada a la recolección de
recursos económicos. En el caso de la Universidad de
Carabobo, se ha creado la Fundación para la Promoción y
Desarrollo de la Investigación de la Universidad de Carabobo
(FUNPROINDES), con el objetivo de desarrollar proyectos
con la plantilla de docentes e investigadores que tenemos
y ofrecer soluciones que demandan los sectores
productivos públicos y privados de nuestro país.
REFLEXIONES FINALES
El conjunto de acontecimientos que conforman el
escenario mundial afectan las instituciones universitarias,
en este sentido se trata de “Conocer lo humano... situarlo
en el universo y a la vez prepararlo de él”8. Para ello en
primer lugar las instituciones universitarias deberán dar
respuesta a las necesidades en materia de ciencia,
tecnología e innovación, -que en general han mejorado la
vida- a través de la promoción de la “Sociedad del
Conocimiento” que está vinculada estrechamente con el
desarrollo de la sociedad, donde las características sean:
“La solidaridad y el sentido humano”, se trata de humanizar
la tecnología, y no de cómo afirma Mayz Ballenilla citado
por Morales “en convertir al hombre en tecnita” (p.70).
Las Universidades venezolanas deben dar respuesta
a la necesidad de efectuar cambios profundos, por tanto
deben servir en mayor cantidad y calidad, su campo de
acción deberá ir más allá de su espacio geográfico, deberá
ser pionera en tecnología de punta y ser la protagonista
de las innovaciones, su apertura debe dar cabida a
ciudadanos que estén interesados en su desarrollo
personal o profesional pero también deberá crear en el
ciudadano la necesidad de ser partícipe del mundo
universitario, por tanto la Universidad debe asumir la
responsabilidad de la educación formal e informal, es decir
su apertura debe incluir una relación entre el gobierno, las
empresas y la sociedad .
En cuanto a la gestión, las Universidades deben
tener un sistema de autoevaluación, de motivación a la
calidad y creatividad, las asociaciones con distintas
instituciones deberán ser a nivel nacional e internacional
así como también el asumir la interdisciplinariedad y la
transdisciplinariedad como la esencia del ser Universidad.
En cuanto al sentido académico debe promover la
libertad y respetar las distintas posturas e ideales.
En este sentido, las leyes de servicio Comunitario
del Estudiante de Educación Superior y la Ley Orgánica
de Ciencia, Tecnología e Innovación buscan implícitamente
situar contextualmente al estudiante y al empresario en la
sociedad venezolana.
Dentro de éste ámbito de reformas legales, las
autoridades universitarias constituyen un factor
fundamental, ya que sus perspectivas servirán de
legitimación o no de las reformas iniciadas, y serán ellos
quienes tendrán en sus manos el poder a través de su
8 Morin. Los siete saberes necesarios a la educación del futuro. 2000 p.51
73
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
ética de no relegar a un segundo plano el problema
fundamental: lo social.
económico, autonomía de la innovación y mejora tecnológica
en Venezuela. Trabajo de ascenso no publicado Universidad
de Carabobo, 2005
Serán precisamente las autoridades universitarias
quienes deben asumir una preocupación prioritaria hacia
una labor educativa y de promoción que permita a los
estudiantes participar en el desarrollo social, científico y
tecnológico del país, pero a su vez, en sus manos está la
canalización de los proyectos sociales, científicos y
tecnológicos así como el seguimiento y control desde el
punto de vista administrativo y académico, una “Contraloría
de los proyectos sociales, científicos y tecnológicos” que
permitan analizar (desde el punto de vista social) y
promulgar (desde el punto de vista científico y tecnológico)
los resultados obtenidos.
Las autoridades universitarias a través de su gestión
pueden promover mayor justicia social, así como también
pueden promover la libertad, por medio de la creación de
ciencia y tecnología que lleve al desarrollo de la nación, si
bien “la dominación...es un problema para el cual no hay
solución a priori, pero que tienen mejoras posibles que
podrían tratar el proceso multidimensional que nos
civilizaría a cada uno de nosotros, a nuestras sociedades,
a la tierra”9.
REFERENCIAS
BACIGALUPO, Luis Eduardo. La Responsabilidad Social
Universitaria: Transformaciones para el Perú y América
Latina. Artículo Publicado por: Pontificia Universidad Católica
del Perú, 2003.
Constitución Nacional de la República Bolivariana de
Venezuela. Caracas. Decreto 3444 Caracas, 1999.
IESALC-UNESCO (1998). Autonomía, Responsabilidad
Social y Libertad Académica. Paris. Disponible en: http://
w w w. i e s a l c . u n e s c o . o r g . v e / s i d / d o c u m e n t o s u n e s c o /
autonom%C3%ADa%20y%20responsabilidad%20social.pdf.
IESALC-UNESCO. La educación Superior en Venezuela.
Caracas, 2003.. Disponible:http://www.iesalc.unesco.org.ve/
programas/nacionales/venezuela/infnac_ve.pdf
KLIKSBERG, Bernard. La Ética y el Capital Social Cuentan.
Venezuela. Ediciones Universidad de Carabobo. FACES de la
Universidad de Carabobo. Venezuela, 2004.
Ley de Servicio Comunitario del estudiante de Educación
Superior. Caracas, 2005.
Ley Orgánica de Ciencia, Tecnología e Innovación. Caracas,
2005.
Ley de Universidades. Caracas, 1970.
MORALES, Víctor. La universidad latinoamericana actual:
necesidad de replantear su misión. La universidad se
reforma II. UCV IESALC-UNESCO, 2004.
MORIN Edgar. Los siete saberes necesarios a la educación
del futuro. Venezuela, 2006.
MORIN Edgar. Educar en la era planetaria. España. Editorial
GEDISA, 2003.
Reglamento Orgánico del Ministerio de Educación Superior.
Caracas (2002).
VÁSQUEZ, Williams. Nuevos modelos de crecimiento
9
Morin. Los siete saberes necesarios a la educación del futuro. 2000. P.122
74
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
DOAÇÃO DE ÓRGÃOS: POSICIONAMENTO DE
ESTUDANTES DE ENSINO MÉDIO
Daiana Polippo1
Dalva Maria Pomatti2
Helenice de Moura Scortegagna 3
Vera Lucia Fortunato Fortes4
Universidade de Passo Fundo5
ORGANS DONATION: POSITION OF
HIGH-SCHOOL STUDENTS
RESUMO
Estudo descritivo com abordagem quantitativa,
realizado em duas unidades de uma escola privada dos
municípios de Passo Fundo e Casca (RS), com estudantes
das três turmas do 3o ano do Ensino Médio matriculados
no segundo semestre de 2005. O objetivo foi conhecer o
posicionamento de estudantes de Ensino Médio em relação
à doação de órgãos. A amostra compreendeu 46 educandos
de ambos os sexos, menores de 21 anos, que estavam na
escola no dia agendado e autorizaram a coleta de dados.
O estudo atendeu à resolução 196/96 do Conselho Nacional
de Saúde. Utilizou-se a estatística descritiva para descrever
as categorias de dados semelhantes. Para verificar a
independência entre as variáveis de posicionamento próprio
quanto à doação com as sociodemográficas foi utilizado o
teste qui-quadrado para um nível de significância de 5%. A
maioria dos estudantes não é doador de órgãos ou não
sabe responder se é (43,5% e 28,3%, respectivamente).
O assunto é de certa forma comentado na família (65,2%),
pouco na escola durante o Ensino Fundamental (30,4%) e
mais abordado no Ensino Médio (45,7%); conteúdos
desenvolvidos nesta última fase do período estudantil
demonstram o favorecimento à doação de órgãos (p=
0,029). Os resultados apontam que o Ensino Médio
fortaleceu o posicionamento positivo à doação de órgãos.
Campanhas continuadas e a progressiva abordagem na
vida estudantil incrementariam a decisão por ser um doador.
Estudos posteriores poderiam mostrar resultados mais
favoráveis à decisão de doar.
Palavras-chave: Doação de órgãos. Transplantes.
Ensino Médio.
ABSTRACT
Descriptive study with quantitative approach, carried
out in two units of a private school in the cities of Passo
Fundo and Casca (RS), with students from the three thirdyear groups in the second semester of 2005. The objective
was to know high school students’ position regarding to
organs donation. The sample comprised 46 male and
female students, under the age of 21, who were in school
on the scheduled day and had agreed with the data
collection. The study fulfilled the 196/96 resolution of the
National Health Council. Descriptive statistics was used
to describe the categories of similar data. The qui-square
test for a significance level of 5% was used to verify the
independence among the own positioning variables
regarding to donation with the sociodemographics. Most
of the students are not donors or they can’t tell if they are
(43,5% and 28,3%, respectively). The subject is, in a way,
discussed in the family (65,2%), very little in elementary
school (30,4%) and more often addressed in high school
(45,7%); subjects developed in this last phase of the
learning period show support to organs donation (p=0,029).
The results show that the high school education
strengthened the positive positioning regarding to organs
donation. Continued campaigns and the ongoing approach
in the student life would help in the decision of being a
donor. Posterior studies could show more favorable
outcomes regarding to donation.
Keywords: Organs donation. Transplants. High
School.
1
Acadêmica do IX semestre do curso de Enfermagem – UPF – Rua Teixeira Soares 817, Passo Fundo, RS. [email protected].
Mestre, professora Adjunta do Curso de Enfermagem - UPF. Rua Sete de Setembro 234/703 Centro – 99010-121 – Passo Fundo, RS.
[email protected].
3
Mestre, doutoranda. Professora Titular do Curso de Enfermagem - UPF. Rua Carlos Gomes 462/402, Passo Fundo RS. [email protected].
4
Mestre, professora Assistente III da UPF. Rua Uruguai 1140/401 - Centro - 99010-111 – Passo Fundo, RS. [email protected].
5
Universidade de Passo Fundo – UPF, Rua Teixeira Soares 817 – 99010-080 – Passo Fundo, RS. [email protected].
2
75
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
1 INTRODUÇÃO
Existe uma desinformação geral acerca da doação
de órgãos, assunto que não é efetivamente trabalhado na
formação escolar ou intrafamiliar. Diante do déficit de
informações ou da carência de um firme posicionamento
das pessoas quanto à doação, lançou-se o desafio de
abordar o tema com alunos de escolas de Ensino Médio.
Para que as pessoas entendam a problemática e
se posicionem quanto à doação de órgãos, é necessário
atuar quando as opiniões se formam no ser humano, o
que geralmente acontece na fase da adolescência, período
frutífero para sustentar um posicionamento quanto aos
cuidados com a própria saúde e ao compromisso social.
As escolas de Ensino Médio se constituem,
basicamente, de adolescentes, sendo um campo ideal para
possíveis discussões férteis acerca da temática “doação
de órgãos”, pois os adolescentes apreciam assuntos
polêmicos e buscam assumir um posicionamento que
caracterize seu papel na sociedade.
Este estudo é resultado de pesquisa realizada na
disciplina de Iniciação Científica e teve por objetivo conhecer
como o estudante de Ensino Médio se posiciona perante
a doação de órgãos, testando as seguintes hipóteses: a)
as famílias não discutem a temática doação de órgãos; b)
as escolas de Ensino Médio e Ensino Fundamental não
desenvolvem efetivamente conteúdos relacionados a
doenças dependentes de transplantes de órgãos; c) não
existem campanhas de divulgação de doação de órgãos
na comunidade e escolas; d) os estudantes de Ensino
Médio não têm um posicionamento firmado quanto a ser
ou não ser doador.
REVISÃO DE LITERATURA
Muitos pacientes acabam morrendo na fila de espera
de transplante. O número de doações no Brasil é
insuficiente, sendo dez vezes menor que em países
desenvolvidos. O grande desafio é conscientizar e educar
a população em geral sobre o tema “Doação de órgãos”
(PESSINI; BARCHIFONTAINE, 1995). No Rio Grande do
Sul a lista de espera é infindável. Em janeiro de 2005
estavam aguardando na fila de espera por uma doação de
órgãos 2583 pessoas, incluindo rim, córnea, fígado, pulmão,
pâncreas e coração (ADOTE, 2005; BRASIL, 2005).
A Lei dos Transplantes, n o 9.434/97, sofreu
alterações em alguns dispositivos em 23 de março de 2001
pela lei no 10.211, no que se refere ao art. 4º, quanto à
retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas
falecidas para transplante ou outra finalidade terapêutica,
extinguindo definitivamente a doação presumida. Fica
estabelecido que, para ser doador após a morte, é
necessária a autorização do cônjuge ou parente, maior de
idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até
o segundo grau inclusive, firmada em documento subscrito
por duas testemunhas presentes à verificação da morte
(BRASIL, 2001). A partir da promulgação da lei 10.211, o
número de doações aumentou, contudo a necessidade se
sobrepõe à demanda de órgãos efetivamente doados. É
preciso que esse número cresça em razão da grande perda
de potenciais doadores.
Transplante de doador cadáver consiste no
aproveitamento de alguns órgãos de uma pessoa falecida,
utilizando-os em outras pessoas que dependam do
funcionamento desses órgãos para sobreviver ou melhorar
a qualidade de vida. Dentre as indicações, incluem-se a
insuficiência cardíaca intratável, a cirrose hepática, a
insuficiência pulmonar, o diabetes mellitus e a insuficiência
renal crônica. Também é possível transplantar córneas,
ossos, músculos/tendões, vasos sangüíneos, pele, medula
e intestino (LEONARDELLI, 2003).
Doador vivo é aquela pessoa que apresenta saúde
normal, sem doenças infecciosas prévias e que deseja
doar um órgão ou parte desse para um parente, mediante
autorização judicial; para isso, exames de compatibilidade
são essenciais para evitar a rejeição (LEONARDELLI,
2003). No Brasil, a história de transplantes teve início no
Hospital das Clínicas de São Paulo, quando se realizou,
na década de 60, o primeiro transplante de rim de doador
vivo (LIMA; MAGALHÃES; NAKAMAE, 1997).
O Ensino Médio tem a finalidade de formar o indivíduo
de maneira a desenvolver nele valores e competências
necessários para integrar seu projeto individual ao da
sociedade, aperfeiçoar o estudante como pessoa humana,
incluindo a formação ética e o desenvolvimento da
autonomia intelectual e do pensamento crítico, prepará-lo
e fornecer-lhe orientação básica para sua integração ao
mundo do trabalho e o desenvolvimento da capacidade para
continuar aprendendo de maneira autônoma e crítica
(BRASIL, 1999).
O caminho mais eficaz para se concretizar a doação
de órgãos é a pessoa manifestar em vida aos seus
familiares o desejo de ser um doador. Provavelmente, se
essa pessoa passar por situações adversas que a levarão
ao coma e subseqüente morte cerebral, os familiares
lembrarão e respeitarão o seu pedido. Depoimento de
familiar confirma que, mesmo diante da dor da perda de
seu ente, a doação foi concedida, pois era de desejo do
doador; com a confirmação diagnóstica da morte
encefálica, prevaleceu a vontade de doar (ADOTE, 2005).
METODOLOGIA
Trata-se de um estudo descritivo-analítico realizado
com alunos que freqüentavam, no ano de 2005, o 3º ano
do Ensino Médio de duas escolas privadas de uma mesma
mantenedora, nos municípios de Passo Fundo e de Casca.
Foram incluídos no estudo alunos do 3º ano do turno
da manhã, do Centro de Ensino Médio Integrado da
76
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Fundação Universidade de Passo Fundo, Campus Passo
Fundo e Campus Casca, ambos municípios do norte do
Rio Grande do Sul, separados por uma distância de
aproximadamente 100 km. O primeiro é de médio porte,
com uma população de 182.233 habitantes, e o segundo,
um pequeno município, com 8.683 habitantes (IBGE,
2005). Os alunos eram de ambos os sexos, com idade
inferior a 21 anos e que estavam presentes no dia agendado
para a coleta de dados. Foram excluídos os alunos que
necessitavam de ou tinham se submetido a algum
transplante e aqueles com familiar na mesma situação.
A população do estudo totalizou 63 alunos nas duas
turmas da Escola A e 21 da única turma da Escola B.
Aceitaram participar da pesquisa 29 e 17 estudantes,
respectivamente, resultando numa amostra de 46 sujeitos,
os quais responderam a um questionário que buscou
identificar brevemente o perfil desses alunos e,
principalmente, seus posicionamentos quanto à doação
de órgãos. A coleta de dados foi realizada por meio de um
questionário com perguntas estruturadas e semiestruturadas, respondidas de forma individual em sala de
aula, com o fornecimento de orientações prévias da
pesquisadora e com a colaboração e a participação da
coordenadora pedagógica da escola. A aplicação do
questionário ocorreu no mês de setembro de 2005, em
dias e horários agendados com a direção da escola.
Os dados obtidos em ambas escolas foram
agrupados, codificados e digitados num banco de dados
do programa Excel e, para a análise, foi utilizado o software
SPSS 10.0. Foi utilizada a estatística descritiva para
descrever as categorias de dados semelhantes. Para
verificar a independência entre as variáveis foi utilizado o
teste qui-quadrado para um nível de significância de 5%.
O projeto de pesquisa observou os dispositivos da
resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (BRASIL,
1996) e foi aprovado pela direção do Centro de Ensino Médio
Integrado da Fundação Universidade de Passo Fundo,
Campus Passo Fundo e Casca e pelo Comitê de Ética em
Pesquisa da Universidade de Passo Fundo (registro n. 646/
2005). Os estudantes e seus responsáveis legais que
concordaram em participar da pesquisa assinaram o Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido.
RESULTADOS
A idade média dos alunos foi de 16,8 anos [DP =
0,39 anos, IC=16,6; 17,1]. Quanto ao sexo, foram 63% do
feminino e 37% do masculino. A raça branca foi
predominante, com 93,5%, e outras com 6,5% . A religião
católica correspondeu a 82,6%; outras crenças ficaram
com 6,5% e ignoraram a questão 10,9%.
campanha a respeito. A maioria, 91,3%, não conhece
alguma pessoa que necessite de um órgão e 8,7%
afirmaram conhecer alguém que precise de transplante.
Para 65,2% dos alunos em algum momento o tema
doação de órgãos foi abordado em sua família e para 34,8%
o assunto nunca foi discutido em casa. Na escola, durante
o Ensino Fundamental, 69,6% dos alunos afirmaram nunca
terem ouvido comentários sobre doação de órgãos; para
30,4% o assunto foi abordado. No Ensino Médio, 45,7%
responderam que o tema foi discutido e 54,3%, que não
ouviram falar do assunto durante as aulas.
Com relação ao posicionamento sobre ser ou não
doador de órgãos, apenas 26,1% dos estudantes
responderam que são doadores; 43,5% referiram que não
o são, 28,3% estavam em dúvida quanto a essa decisão e
2,2% ignoram a questão.
Dos alunos entrevistados, 91,3% afirmaram saber
o que é morte cerebral e 8,7% desconhecem esse
conceito. Da mesma forma, 84,8% afirmaram ser possível
a doação a partir de uma pessoa com morte cerebral, ao
passo que 15,2% ignoravam tal possibilidade.
Questionados sobre se sabiam que o transplante pode
ser a partir de um doador vivo, 95,7% responderam
afirmativamente e 4,3% consideraram não ser possível
esse tipo de doação.
Indagados sobre se conheciam alguém que tenha
recebido um órgão de outra pessoa, 19,6% afirmaram
conhecer e 80,4% não conhecer ninguém que seja
transplantado. Quanto aos órgãos que consideram ser
possível a doação, as respostas foram múltiplas, mas
predominaram o rim e o fígado.
Ao optarem pela forma que define o que é necessário
para a pessoa ser um doador de órgãos, a maioria dos
alunos, 63%, assinalou a opção correta e amparada pela
legislação, ou seja, que é necessário avisar a família, porém
37% desconhecem essa forma de encaminhamento.
Ao se questionar sobre a existência de algum
hospital que realiza transplante na região, grande parte
dos estudantes, 89,1%, afirmou que conhece, mas 10,9%
desconhecem qualquer serviço que faça esse
procedimento.
A Tabela 1 apresenta as variáveis entre ser, não ser
e não saber ser um doador de órgãos com as variáveis
sociodemográficas, incluindo sexo, campanhas de doação,
conhecimento de alguém que precise de um transplante,
conteúdos no Ensino Fundamental e conteúdos no Ensino
Médio.
Todos os alunos responderam de forma afirmativa
que já ouviram falar de doação de órgãos em algum
momento de suas vidas; 82,6% presenciaram campanhas
sobre esse assunto, a maior parte por meio da televisão,
ao passo que 17,4% nunca viram qualquer tipo de
77
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Tabela 1 – Doação de órgãos entre alunos de Ensino Médio - Passo Fundo, RS 2005.
Variáveis
Categorias
Doador
Não Não sei
10
10
9
3
Total
P
28
16
0,362
Feminino
Masculino
Sim
8
4
Campanhas
Sim
Não
10
2
17
3
10
3
37
8
0,833
Conhecimento de alguém que
precisa de transplante
Sim
Não
2
10
1
19
1
12
4
41
0,524
Conteúdos no Ensino
Fundamental
Sim
Não
5
7
5
15
3
10
13
32
0,518
Conteúdos no Ensino Médio
Sim
Não
9
3
8
12
3
10
20
25
0,029
Sexo
Cruzamento das variáveis entre ser doador de órgãos; não ser doador de órgãos e não saber ser um doador de órgãos com as variáveis:
sexo, campanhas de doação de órgãos, conhecer alguém que necessite de um transplante, conteúdos sobre doação de órgãos no Ensino
Fundamental e conteúdos sobre doação de órgãos no Ensino Médio. Fonte: Polippo et al., 2005.
Constata-se que as campanhas falada e escrita não
estão surtindo o efeito desejado, pois os argumentos
utilizados não estão sensibilizando as pessoas. Deduzse que, junto à infância e pré-adolescência, durante o
desenvolvimento do Ensino Fundamental, o assunto doação
de órgãos também não vem sendo trabalhado efetivamente.
Os resultados apontam que a única variável que
influenciou no posicionamento favorável à doação de órgãos
foi comentários desenvolvidos no Ensino Médio, mostrando
que existe uma subdivulgação tanto nas campanhas quanto
na infância e no início da adolescência durante o Ensino
Fundamental e que, provavelmente, o fato de não
conhecerem alguém que necessite de um transplante é
fator determinante para não serem doadores.
DISCUSSÕES
O posicionamento em relação a ser um doador de
órgãos mostrou que a maioria dos alunos não é ou tem
dúvidas quanto a essa decisão e uma minoria afirmou ser
doador. Isso demonstra que existe uma subdivulgação da
importância do tema no cotidiano das pessoas,
possivelmente porque as campanhas ainda não são
efetivas.
No Brasil os avanços científicos e tecnológicos têm
colaborado para o aumento expressivo do número de
transplantes, embora ainda insuficientes em face da enorme
demanda de necessidade de órgãos. A taxa obtida é de
5,4 doadores por milhão de habitantes/ano (SANTOS;
MASSAROLLO, 2005). O número de potenciais doadores
estabelecidos pela estatística é de 50–60 por milhão de
habitante (LEONARDELLI, 2003).
Evidenciou-se que, mesmo discutindo o assunto
doação de órgãos dentro das famílias, esse fato não
sensibilizou os jovens a serem doadores, possivelmente
porque as discussões são superficiais e não envolvem fatos
polêmicos, como doenças, sofrimento e morte cerebral. É
bem provável que os pais não tenham preparo para realizar
essa discussão em casa, pois esse processo é
relativamente recente e vem sofrendo alterações na sua
legislação, mas, principalmente, porque sempre o assunto
doação de órgãos é acompanhado de um tema ainda mais
nebuloso, a morte.
É profícuo que a temática doação de órgãos tenha
sido tratada no Ensino Médio e revelado um favorecimento
à doação (Tabela 1), porém ainda é insuficiente,
necessitando-se que os conteúdos abordem esse assunto
nas discussões desde a infância, iniciando no Ensino
Fundamental. Uma possibilidade seria por meio de oficinas
lúdicas nas quais as crianças começariam a entender que
existem doenças que prejudicam alguns órgãos, os quais
precisam ser substituídos por outros, doados por pessoas.
No Ensino Médio, os alunos deveriam ter acesso aos dados
regionais que mostram o contingente de pessoas que
necessitam de um órgão para viver e também conhecer os
tipos de doador e os encaminhamentos para a efetivação
da doação. A construção desse processo ao longo da vida
possibilitaria à pessoa, autonomamente, tomar decisões.
A autonomia se refere à capacidade de tomada de
decisão pelo indivíduo, como também exige da sociedade
o respeito a essa determinação própria. Decidir sobre algo
exige entendimento e conhecimento do assunto para que
o processo de análise seja realizado de forma mais inteirada
da realidade, reduzindo os erros provenientes de uma
conduta ou atitude insensata, o que muitas vezes é
irreversível (ALMEIDA et al., 2003).
78
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
A maioria dos alunos sabe que, para ser um doador
de órgãos, é necessário avisar a família, porém ao marcar
também as outras duas opções, que eram fazer um
documento e colocar um selo na identidade, eles
demonstraram que ainda existem dúvidas quanto ao correto
encaminhamento dessa decisão. A lei n o 10.211
estabeleceu que as manifestações de vontade relativas à
doação de órgãos, constantes na carteira de identidade e
de habilitação, não teriam validade a partir de dezembro
de 2000 (ALMEIDA et al., 2003).
Os estudantes sabem que são realizados
transplantes nos hospitais da região, possivelmente pelo
fato de que fígado e rim são transplantados com freqüência,
sendo esses bastante divulgados nos meios de
comunicação local. Apesar de todos os alunos terem
respondido afirmativamente que sabem o que é morte
cerebral, acredita-se que as pessoas, no geral, não tenham
muita clareza desse conceito, pois existe confusão entre
a paralisação da circulação cerebral e a manutenção dos
batimentos cardíacos.
Os resultados mostram que as campanhas de
doação de órgãos efetivamente não influenciaram no
posicionamento em ser doador. É possível que a mídia
não esteja conseguindo estimular as pessoas a serem
doadoras; assim, a televisão, forte instrumento de
influência, deveria realizar campanhas continuadas e em
horário nobre, amparada pelo Ministério da Saúde.
As comissões intra-hospitalares de transplantes
são as principais articuladoras em prol da doação de
órgãos, pois “detêm o conhecimento, devendo
responsabilizar-se pela educação e conscientização da
sociedade em geral”. Precisam desenvolver inúmeras
ações sociais, incluindo estar sempre disponível à imprensa
em geral, com dados estatísticos e informações; manter
projeto de palestras em escolas e empresas; participar de
programas de rádio e TV; convidar os demais hospitais da
cidade e região para participar dos treinamentos; estar
presente em eventos da comunidade; apresentar seu
trabalho por meio de palestras, sempre que solicitadas;
organizar e participar de campanhas de doação de órgãos
e contagiar as pessoas com a “cultura da doação” como
tarefa nobre e privilegiada (LEONARDELLI, 2003, p. 27).
O enfermeiro não pode se eximir da problemática
da insuficiência de doações de órgãos. Atuando em
hospitais, especificamente em terapia intensiva e
emergência, necessita reconhecer o potencial doador.
Trabalhando na rede básica, deve informar a população
quanto às doenças dependentes de um transplante e
apontar estratégias para sanar dúvidas e mitos que
envolvem o processo de doação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A morte cerebral é um assunto que continua
permeado por dúvidas entre as pessoas. Os critérios que
definem essa situação de irreversibilidade devem ser mais
compreendidos pela população, pois, diante dessa
evidência com um familiar, potencial doador, a menção à
doação de órgãos surge como algo obscuro, somado ao
momento crítico vivido pelo seu ente. Se esse assunto
tivesse sido mencionado no decorrer da vida da pessoa
que se encontra em estado crítico, ficaria mais fácil um
posicionamento dos familiares e, provavelmente, se a
doação fosse um desejo, ocorreria com mais tranqüilidade
o consentimento à mesma.
Os resultados mostram que, infelizmente, as
pessoas não estão decididas a serem doadores de órgãos
e que, possivelmente, se essa decisão for tomada na
juventude, o posicionamento se manterá para o resto da
vida. Torna-se imprescindível, portanto, que os profissionais
de saúde e educação incorporem nos seus conteúdos com
maior ênfase essa temática, pois muitas doenças vêm se
tornando epidemias e dependem de órgãos para diminuir
sua incidência.
Campanhas em nível nacional, somadas às ações
das comissões intra-hospitalares, possivelmente, sejam
os maiores esclarecedores e incentivadores das doações,
pois suas proposições influenciariam diferentes âmbitos e
permitiriam obter um resultado mais significativo quanto à
doação de órgãos.
Devem-se aumentar as campanhas de divulgação,
mobilizando os profissionais da área da saúde a orientar e
incentivar a população, fornecendo informações quanto às
causas que levam uma pessoa a depender de um órgão,
esclarecendo as estatísticas das principais doenças
indicativas de transplante e mostrando a dimensão das
listas de espera. É preciso aumentar a confiança da
população para que tenha condições de postar-se
criticamente decidindo sua posição diante da doação.
O empenho dos profissionais em discutir acerca
da doação de órgãos em diferentes contextos sociais,
sustentados na convicção da melhoria na qualidade de
vida após o transplante, possibilita despertar um
posicionamento particular quanto a ser um doador e, o
que é mais importante, tornar pública tal decisão diante
de seus familiares.
Não basta apenas dizer que “doar órgãos é um
ato de amor”. Esse gesto deve extrapolar o romantismo e
revestir-se do compromisso social com as pessoas que
sofrem durante anos com uma doença crônica, estão na
lista de espera por um transplante ou morrem antes de
consolidar esse desejo.
Se durante a formação do adolescente for
incentivada a participação na comunidade, amplifica-se o
seu olhar e possibilita-se que reflita frente à situação que
se apresenta. Envolver-se com as questões da sociedade
é o principal desafio da educação, pois isso o deixa
comprometido com os problemas do meio em que vive,
tornando-se mais responsável e mais participativo no
contexto atual.
79
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Silenciar quanto à doação de órgãos junto aos
adolescentes seria menos exaustivo, mas embrenhar-se
em defesa da outra vida quando a própria vida já não existe
mais denota um compromisso social e reflete um ato de
solidariedade.
Para se ter um panorama mais amplo quanto ao
posicionamento sobre a doação de órgãos, outros estudos
poderiam ser implementados com diferentes amostras,
incluindo crianças, estudantes de graduação e
trabalhadores.
REFERÊNCIAS
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em: <http://www.adote.org.br>. Acesso em: 30 mar. 2005.
ALMEIDA, Kelly C. et al. Doação de órgãos e bioética:
construindo uma interface. Rev. Bras Enfer,. Brasília, v. 56, n.
1, p. 19-23, jan./fev. 2003.
FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E
ESTATÍSTICA (IBGE): Cidades. Disponível em: <http://
www.ibge.gov.br/cidadesat/default.php>. Acesso em: 31 out.
2005.
LEONARDELLI, Luciana do A. et al. Manual de captação de
órgãos e tecidos. Caxias do Sul: Dinâmica Comunicação
Empresarial, 2003.
LIMA, Elenice D. R; MAGALHÃES, Myrian B. B; NAKAMAE, Djair
D. Aspectos éticos-legais de retirada e transplantes de tecido,
órgãos e partes do corpo humano. Rev. Latino-am
Enfermagem, São Paulo, v. 5 n. 4, p. 5-12, out. 1997.
BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros curriculares
nacionais: ensino médio. Brasília: Secretaria da Educação
Média e Tecnológica. 1999.
BRASIL. Lei nº 10.211, de 23 de março de 2001. Altera
dispositivos da Lei 9.434, de 4 de fevereiro de 1997. Dispõe
sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo
humano para fins de transplante e tratamento. Presidência
da República. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10211.htm>. Acesso em: 8 abr.
2005.
BRASIL. Ministério da Saúde. Associação Brasileira de
Transplantes
de
Órgãos.
Disponível:<http://
p o r t a l . s a u d e . g o v. b r / p o r ta l / s a u d e /
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BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde.
Diretrizes e normas regulamentadoras da pesquisa
envolvendo seres humanos: Resolução n. 196/96. Brasília
(DF); 1996. 12 f.
PESSINI, Leo; BARCHIFONTAINE, Cristian de P. de. Segunda
chance de vida: transplantes e doação de órgãos. In:_____.
Problemas atuais de bioética. 6. ed. São Paulo: Loyola, 1995.
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SANTOS, Marcela J. dos; MASSAROLLO, Maria. C. K. B.
Processo de doação de órgãos: percepções de familiares
de doadores cadáveres. Rev. Latino-am Enfermagem, São
Paulo, V.13, n 3, p. 382-387, maio/jun. 2005.
80
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
PERFIL DA POPULAÇÃO VÍTIMA DE ACIDENTE DE
TRÂNSITO: UM OLHAR SOBRE O JOVEM NESTE
CONTEXTO
Carlos Eduardo Hermann1
Rafael Marcelo Soder2
Andréa Regina Nagorny3
ABSTRACT
RESUMO
O artigo é referente à investigação quanto ao
aumento dos acidentes de trânsito com jovens, que está
ocorrendo neste país, bem como a identificação dos tipos
de acidentes de trânsito e o levantamento de dados
estatísticos acerca do tema, quais os fatores que
contribuem para a ocorrência de acidentes de trânsito com
jovens, identificar o dia e a hora da semana de maior
ocorrência dos acidentes, identificação do número de
jovens envolvidos por acidentes. A pesquisa caracterizase como sendo de cunho quantitativo, do tipo documental,
a coleta dos dados deu-se por meio das informações
contidas nos Boletins de Ocorrências de todos os acidentes
ocorridos no período de Julho de 2006 a Junho de 2007
fornecidos pela Polícia Rodoviária Estadual. Após a análise
dos dados, evidenciou-se que no período analisado
ocorreram 84 acidentes com envolvimento de jovens, sendo
maio de 2007 com 13 acidentes e outubro de 2006 com 11
acidentes os meses que mais ocorreram. Verificou-se o
horário que ocorreu o maior número de acidente foi entre
16:01h e 20:00h com 28% dos casos. Em relação aos
dias da semana, domingo com 29% dos acidentes e
sábado com 21% foram os dias em que houve o maior
número de vítimas. Outro dado impressionante é a faixa
etária dos envolvidos, sendo que 73% das pessoas
envolvidas em acidentes de trânsito estão na faixa etária
dos 18 aos 27 anos. Frente a estas considerações foi
possível verificar que os jovens devem ter um maior cuidado
no trânsito tornando-o mais seguro, e assim diminuir o
número de casos de acidentes envolvendo os jovens
motoristas.
The article is about the investigation related to
the increasing number of traffic accidents with young people
that are happening in this country as well as the
identification of the types of statistical data-collecting and
traffic accidents concerning to the subject, which the
factors that contribute for the occurrence of traffic
accidents with them, to identify to the day and the hour of
the week of bigger occurrence of the accidents,
identification of the number of involved young people per
accidents. The research is characterized as being
quantitative, of documentary type, the data collection
happened through information contained in Bulletins of
Occurrences of all the accidents occurred in the period of
July 2006 to June 2007 supplied by the ‘Polícia Rodoviária
Estadual’. After the analysis of the data, it was in May of
2007 with 13 accidents and October of 2006 with 11 proven
that in the analyzed period 84 accidents were detected
with young people involved, being the months with more
numbers of accidents. The schedule was verified that
occurred the biggest number of accident was between
16:01 and 20:00 with 28% of the cases. In relation to the
days of the week, Sunday with 29% of the accidents and
Saturday with 21% had been the days where it had the
biggest number of victims. Another impressive data is the
age of the involved ones, being that 73% of the involved
people in traffic accidents are at the ages from 18 to 27.
Facing these considerations it was possible to verify that
the young people must have a well-taken care in traffic
becoming it safer and thus to decrease the number of
accidents cases involving the young drivers.
Palavras-chaves: Acidentes, Jovens, Trânsito,
Vítimas.
Keywords; Accidents. Young People. Traffic. Victims
1
Acadêmico do Curso Bacharelado em Enfermagem, da Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM. [email protected].
Orientador, Mestre em Enfermagem, Professor do Bacharelado em Enfermagem da Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM.
[email protected].
3
Acadêmica do Curso Bacharelado em Enfermagem, da Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM. [email protected]
2
81
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo teve seu desenvolvimento durante
o segundo semestre do ano de 2007, com a análise de
Boletins de Ocorrências (BO) dos acidentes de trânsito
que aconteceram no período de julho de 2006 a julho de
2007 em uma microrregião do Estado do Rio Grande do
Sul, sustentado pelo elevado número de acidentes
automobilísticos evidenciados subjetivamente nesta região
em estudo.
Neste quadro, o elevado índice de mortalidade por
acidentes de trânsito representa um problema de saúde
pública tanto no Brasil como em outros países. Acidentes
e mortes no trânsito são problemas fruto do aumento do
número de carros, do estresse cotidiano e de outros
fatores. Todos os cidadãos vivenciam direta ou
indiretamente os problemas causados pelo trânsito.
Quantitativamente, os acidentes de trânsito
representam em nosso país o segundo maior
problema de saúde pública, só perdendo para
a desnutrição. Anualmente, milhares de
pessoas morrem ou se ferem em acidentes
de trânsito, e mais da metade dos feridos ficam
com lesões ou seqüelas permanentes
(MARTÍN; QUEIRÓZ, 2000, p. 12).
Os acidentes de trânsito, principalmente com
jovens, sendo um fenômeno que vem aumento a cada dia
e que está presente em nossa volta, vêm tornando-se um
grave problema de saúde pública a ser enfrentado pelos
administradores de todo o país. Estes são responsáveis
por buscar meios de diminuir o impacto que os acidentes
de trânsito estão ocasionando em nossas vidas.
Tendo em vista uma verdadeira epidemia de acidentes
com a população jovem, possivelmente esses acidentes
podem ser considerados como eventos evitáveis, portanto
preveníveis. Por isso, surgiu a necessidade do presente
estudo de analisar e conhecer melhor as causas e
circunstâncias dos acidentes de trânsito, permitindo
elaborar planos preventivos eficazes baseados nos dados
reais.
2 METODOLOGIA
O presente artigo teve uma abordagem quantitativa,
do tipo documental, através da análise de BO dos acidentes
de trânsito de uma microrregião do Noroeste do Estado
do Rio Grande do Sul. Segundo Gil (2004 p. 45): “a
pesquisa documental vale-se de materiais que não
recebem ainda um tratamento analítico, ou que ainda
podem ser reelaborados de acordo com os objetos da
pesquisa”.
A coleta dos dados para a pesquisa se deu no mês
de agosto de 2007 através das informações contidas nos
Boletins de Ocorrência da Polícia Rodoviária Estadual
envolvendo Acidentes de Trânsito durante o período de Julho
de 2006 a junho de 2007.
A análise dos resultados se deu por meio da análise
de conteúdos que segundo Minayo (2004), refere-se ao
encontro de respostas que se darão para as questões
formuladas, podendo ou não serem confirmadas as
afirmações estabelecidas antes de se iniciar o trabalho de
investigação e também foi utilizada a análise estatística
para fazer o levantamento em percentagem do número de
casos dos acidentes, bem como poder traçar um perfil
dos acidentes de trânsito e das vítimas. O referido trabalho
está embasado nas normas e diretrizes da resolução nº
196/96, do Conselho Nacional da Saúde (CNS) que envolve
ética na pesquisa com seres humanos. Havendo com isso
a privacidade da identificação dos indivíduos-alvo da
pesquisa.
3 OS JOVENS E O TRÂNSITO
As pesquisas sobre os acidentes de trânsitos
começaram a ser estudadas nos países desenvolvidos a
partir dos anos 60, isso devido ao aumento da mortalidade
e gravidade das lesões provocadas por esses acidentes.
No Brasil há poucas pesquisas sobre os acidentes de
trânsito, sendo as primeiras nos anos 80.
3.1 ASPECTOS GERAIS SOBRE OS
ACIDENTES DE TRÂNSITO
Pela Classificação Internacional de Doenças (CID),
os acidentes de trânsito são denominados como causas
externas. Estes têm sido causas constantes de procura,
atendimentos e de internações nos Hospitais de todo o
Brasil, resultando em grande demanda aos serviços de
saúde e em angústia para as vítimas e seus familiares,
além de elevados custos diretos e indiretos e de seqüelas
que danificam a qualidade de vida dos que sofreram estas
lesões (MARTINS; ANDRADE, 2005).
Os acidentes de trânsito estão entre as principais
causas de morte no Brasil e no mundo, segundo a OMS
(1997), os acidentes de trânsito devem saltar de 9º lugar
em 1990 para 3º lugar em 2020 em causa de morte no
mundo, perdendo apenas para doenças coronárias e
depressão.
Segundo Plonka (2004, p. 02): “no Brasil, US$ 5
bilhões por ano são gastos com os acidentes de trânsito,
o que corresponde a 70% dos recursos do Sistema de
Previdência referentes aos acidentes de trabalho”. Para
um país subdesenvolvido é um alto custo os acidentes de
trânsito, pois com estes recursos gastos em tratamento
poderia ter outros fins como melhoria das condições das
82
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
rodovias, do policiamento e com isso prevenir futuros
acidentes.
Outro fator que traz preocupação à saúde é as
internações hospitalares devido aos acidentes de trânsito,
que em alguns lugares chega a ocupar 60% dos leitos
reservados a pacientes com traumatismo dos hospitais
deixando muitas pessoas em filas de espera ou morrendo
por falta de leitos e atendimento médico (PLONKA, 2004).
Para Mello Jorge (2002, p. 02):
Do ponto de vista econômico, a violência no
trânsito representa um custo não mensurável,
mas, com certeza, bastante elevado, visto que
incide prioritariamente sobre uma população
de idade produtiva que é, abruptamente retirada
do meio em que vive, seja pela morte precoce,
seja pela ocorrência de seqüelas, em grande
número de vezes, graves e irreversíveis.
Outro dado que é relevante discutir é o aumento
desenfreado de automóveis que são colocados em
circulação anualmente no país, dados mostram que no
ano de 2005 o Brasil possuía uma frota de 42.071.961
veículos, para uma população de 189.001.971 habitantes,
cerca de 1 veículo para cada 5 pessoas, tornando cada
vez mais difícil a prevenção dos acidentes de trânsito
(DENATRAN, 2005).
3.2 Os jovens e os acidentes de trânsito
Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente
do Brasil (ECA) (1991), “é considerado adolescente, aquela
pessoa entre 12 e 18 anos”. Já a Organização Mundial de
Saúde preconiza que seja considerado adolescente dos
10 aos 19 anos de idade e, juventude, aquele que decorre
entre os 15 e os 24 anos.
tidos como o futuro, como uma mão de obra mais
qualificada, tornando a sociedade mais deficiente com
tantas mortes nesta fase da vida.
Atualmente, os jovens estão tendo mais liberdades
dentro da sociedade em que vivem e, com essa liberdade,
acabam cometendo alguns descasos com a sua segurança
assim como com as pessoas que convivem com eles.
Dentre as várias questões que os jovens estão se
envolvendo, uma delas é os acidentes de trânsito que vêm
aumentando cada vez mais em todo país.
Segundo Minayo; Souza (1993, p. 74), “no Brasil, o
fenômeno da mortalidade por acidente de trânsito também
segue a tendência mundial em termos de maior incidência
sobre o sexo masculino e em faixas etárias jovens”. O
sexo masculino é maior acometido pelos acidentes de
trânsito em todo o mundo, assim como a faixa etária que
ocorre o maior índice dos acidentes é a juventude.
Conforme a Fundação Nacional da Saúde, no Brasil,
o acidente de trânsito é apontado como a segunda causa
de mortes entre os jovens, sendo a primeira na região Sul
(FUNASA, 2000). Nestes acidentes muitas vezes não são
apenas os jovens que são as vítimas, podendo envolver
também familiares, amigos e demais pessoas que estavam
no local.
Várias pesquisas relatam que cerca de 70% das
vítimas de acidente de trânsito têm idade entre 10 e 39
anos. Portanto, pertencem ao grupo de adolescentes e
adultos jovens. Os jovens estão cada vez mais se
envolvendo em acidentes devido a várias causas como a
inexperiência no trânsito, uso abusivo de álcool e outras
drogas, a busca de novas emoções e a impulsividade de
viver sob riscos, fatos estes que vêm contribuindo com o
aumento das estatísticas acerca dos acidentes de trânsito.
Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde
(OPS, 1994), a cada jovem que morre por acidente de
trânsito, entre 10 e 15 apresentam seqüelas e 30 a 40
sofrem ferimentos graves e utilizam o serviço de
emergência.
Para Vermelho; Mello Jorge (1996):
3.3 Principais causas dos acidentes de
trÂnsito entre jovens
A juventude, por outro lado, é uma categoria
fundamentalmente sociológica e se refere ao
processo de preparação para que os indivíduos
assumam o papel social do adulto, tanto do
ponto de vista familiar, quanto profissional, com
plenos direitos e responsabilidades.
Os acidentes de trânsito entre jovens estão cada
vez mais comuns nos dias de hoje e são vários os fatores
contribuintes para que ocorra esse tipo de violência, como
a pouca experiência na condução do veículo, uso de álcool
e drogas, agressividade e busca de adrenalina, bem como
o abuso da alta velocidade.
Para OMS (2006): “cada ano morrem cerca de
400.000 jovens menores de 25 anos como conseqüência
de acidentes de trânsito e vários milhões sofrem lesões
ou ficam incapacitados de alguma forma”. Com todas estas
mortes e lesões que ocorrem com jovens, faz com que
haja um problema ainda maior, visto que os jovens são
83
Hakkinen (1976), apud Martins; Queiroz (2000):
observou que, em todas as faixas etárias, a
freqüência de acidentes é uma vez e meia maior
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
nos três primeiros anos em que o motorista
adquire sua carteira (licença) para dirigir, do
que nos anos subseqüentes. Uma vez que
juventude pouco pratica na condução de
veículos e falta de adaptação geral no trânsito
estão fortemente associadas ao maior risco
de acidente de trânsito.
3.4 CÓdigo de trânsito brasileiro
Com a implantação do novo Código de Trânsito
Brasileiro (CTB), aprovado pela lei nº 9.503, contendo 341
artigos que foi publicado no dia 23 de setembro de 1997 e
entrou em vigor em janeiro de 22 de janeiro de 1998, surgiu
um novo aliado ao combate da violência no trânsito.
Os jovens como referem os autores, mesmo
possuindo licença para dirigir, ainda não estão preparados
para o trânsito, são mais vulneráveis, tem menos habilidade
no controle do veículo, tomam decisões de forma
precipitada ou inconsciente, não sabendo ou não
conhecendo as ruas ou rodovias por onde trafega, e, com
isso, levando muitas vezes a ocasionar um acidente.
Segundo Traumann (1998), os efeitos do novo CBT
começaram a ser sentidos já no carnaval do ano em que
entrou em vigor, pois nesse período considerado de risco
para a ocorrência de acidentes de trânsito, teve uma
redução de 45% no número de acidentes em relação ao
mesmo período de 1997.
Outro fator agravante é a tomada de decisão que
deve ser feita no trânsito, algumas vezes frações de
segundos. Muitos acidentes ocorrem não tanto pela falta
de habilidade do condutor, e sim pelo julgamento e tomada
de decisão na hora de controlar o automóvel.
Com a implantação do novo CTB ocorreram
melhorias em relação ao meio ambiente, às sinalizações,
tanto para condutores como para pedestres, melhoria no
sistema de fiscalização, como radares, semáforos, bem
como repressão aos maus condutores que geram riscos
de acidentes de trânsito (TRAUMANN, 1998).
Para Carrer (1992) apud Martín; Queiroz (2000) existe
três tipos de tomada de decisão:
a tomada de decisão racional caracteriza-se
por destacar a informação relevante, observar
cuidadosamente as conseqüências futuras e
atuar de forma intencional e lógica. A intuitiva
mostra
pequena
antecipação
às
conseqüências futuras, ou pequena procura
sistemática de informação. A dependente tem
como características não se mostrar
responsável por suas decisões, que são
tomadas em virtude da aprovação social.
O abuso da velocidade no trânsito é uma das
principais causas dos acidentes envolvendo os jovens, pois
permite experimentar sentimentos de adrenalina,
superioridade, onipotência, independência. Segundo a
OMS (2006), “freqüentemente veiculam-se anúncios que
associam carros velozes e alta velocidade com virilidade”.
Esses anúncios têm sua maior influência na população
jovem, sendo esta mais vulnerável e em busca de novas
situações de emoção.
Mas a redução no número de acidentes não se
manteve com o passar dos anos, possivelmente pela falta
de ativa fiscalização, com a não aplicação de punições
devidas, assim como o atraso no recebimento das multas.
E com isso ocorreu um novo aumento no número de
acidentes.
3.5 Acidentes de trânsito, um problema
de saúde pública
Os acidentes de trânsito são fenômenos de natureza
multicausal que interessam muito a área da saúde por
razão do elevado número de mortes que ocasionam, bem
como a necessidade do atendimento a equipes de saúdes.
Segundo Mello Jorge (2002), “no Brasil, a violência
vem manifestando-se em números elevados e crescentes,
provocando indicadores de saúde absolutamente negativos
para a sua população”. Dos anos 70 até os anos 90 a
mortalidade por acidente de trânsito cresceu cerca de 50%
.
Outro fator preocupante em todas as idades, mas
principalmente entre os jovens, é o consumo drogas,
sobretudo o álcool. Várias pesquisas apontam o álcool
como tendo uma forte relação com os acidentes de trânsito.
Em vários países, o álcool é responsável por 30% a 50%
dos acidentes graves ou fatais (OMS, 2006).
A área da saúde está deixando de ter a função
principal na forma curativa e dando espaço ao modo da
saúde preventiva como modo de diminuir os riscos à saúde
que estão acometendo a todos, como exemplo, os
acidentes de trânsito. É neste contexto que a saúde pública
age de maneira mais eficiente.
No Brasil, existe um limite de álcool no sangue para
poder dirigir com segurança, sendo este até 0,06
decigramas por litro de sangue. Após este valor o condutor
terá a suspensão do direito de dirigir, além de multa e
retenção do veículo.
Os acidentes de trânsito representam, há vários
anos, um problema de saúde pública de grande magnitude
e transcendência, já que vêm provocando forte impacto na
morbimortalidade das populações e existem métodos para
a sua prevenção e controle. Caracteriza-se como problema
importante, visto que esses métodos, ou não estão sendo
84
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
aplicados ou, apesar das ações realizadas com o objetivo
de reduzir sua força, têm mantido os índices além do nível
esperado (FORATTINI, 1992).
reforça sua importância em termos de saúde pública
(SAUER; WAGNER, 2003).
Segundo Kerr-Pontes; Rouquayrol (1999):
Do ponto de vista econômico, Mello Jorge (2002)
acredita que os acidentes de trânsito representam um
custo imensurável e, com certeza, bastante elevado, visto
que ocorre prioritariamente sobre uma população em idade
produtiva, como os jovens, que é retirada do meio em que
vive, seja pela morte precoce, seja pela ocorrência de
seqüelas, em grande número de vezes, graves e
irreversíveis.
é fato comprovado que há uma relação entre o
desenvolvimento e as condições de vida de uma
população e a sua mortalidade na infância. O
indicador de saúde “taxa de mortalidade
infantil”, universalmente conhecido como
marcador não apenas da mortalidade, mas
também do nível socioeconômico de uma
população, é um exemplo desta relação. Nas
últimas décadas, a concepção de
desenvolvimento de uma população superou
a dimensão tradicional da riqueza para assumir
uma visão integral que engloba o
desenvolvimento das pessoas, para as
pessoas e pelas pessoas.
Para Yunes (2001):
quanto aos gastos que os serviços de saúde
têm com o tratamento de lesões,
traumatizados, algumas observações são
importantes. As internações decorrentes de
lesões provocadas por causas externas nos
hospitais próprios ou conveniados com o
Sistema Único de Saúde, no Brasil,
representam cerca de 6% do total de
hospitalizações (dados de 2000). Esse valor
pode parecer baixo, mas totaliza algo como 700
mil internações/ano. Ainda do ponto de vista de
gastos hospitalares, foi possível mostrar que,
em São Paulo, esse valor corresponde a,
aproximadamente, 8% do total despendido, o
que evidencia que o paciente traumatizado é
mais oneroso, com gasto/dia 60% mais elevado
que o de pacientes internados por causas
naturais.
Essa
diferença
decorre,
provavelmente, de maior número de dias de
hospitalização em Unidades de Terapia
Intensiva e procedimentos mais dispendiosos,
como cirurgias e diagnósticos por imagem.
2.6 Anos potenciais de vida perdidos
(APVP)
A morbimortalidade causada pela violência no
trânsito entre os jovens está adquirindo importância em
todo o mundo, tanto por sua repercussão imediata, quanto
por sua projeção nas idades mais produtivas da vida.
Quando se analisa o indicador Anos Potenciais de Vida
Perdidos (APVP), ressalta-se que os óbitos por acidentes
de trânsito representam um dos mais terríveis grupos de
causas de morte.
Afinal, conhecendo a grande importância dos
acidentes de trânsito fatais no país, especialmente pelo
predomínio em populações jovens e/ou economicamente
ativas, maior será a perda de anos de vida produtiva, assim
como o elevado custo direto e indireto para a sociedade.
4. ANÁLISE DOS DADOS E
APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS
OBTIDOS
Esta parte do estudo foi desenvolvida com a intenção
de relatar os resultados obtidos após a análise dos dados
coletados. A coleta dos dados foi realizada na Polícia
Rodoviária Estadual durante o mês de Agosto de 2007,
sendo coletado dados dos BO’s de acidente de trânsito
do período de Junho de 2006 a Julho de 2007, totalizando
84 BO’s analisados, visando conhecer o perfil
epidemiológico dos jovens vítimas de acidentes no trânsito.
Serão debatidos os resultados da pesquisa após a
análise dos dados; desta forma será possível conhecer o
perfil dos jovens vítimas de acidente de trânsito. A partir da
tabulação e análise dos dados coletados foi possível
construir várias tabelas e gráficos promovendo assim o
melhor entendimento dos dados obtidos.
O indicador APVP vem sendo utilizado para
comparar as diferenças no padrão de mortalidade,
ordenando as principais causas de óbito, uma vez que ele
combina a magnitude das causas com a idade em que
ocorreram os óbitos. Segundo a previsão da Organização
Mundial da Saúde (OMS) para o ano de 2020, acidentes
de trânsito ocuparão o segundo lugar em causas por APVP
em todo o mundo. Neste sentido, adolescentes e adultos
jovens apresentam um elevado número de mortes por
causas externas, especialmente em acidentes de trânsito,
contribuindo com um contingente maior de APVP, o que
85
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Na tabela 2, que expõe sobre o horário em que
Tabela 1: Distribuição dos acidentes de
aconteceram os acidentes de trânsito, nota-se um maior
Julho de 2006 a Junho de 2007.
Meses
Julho
Agosto
Setembro
Outubro
Novembro
Dezembro
Janeiro
Fevereiro
Março
Abril
Maio
Junho
Total
Nº acidentes
8
5
5
11
7
5
3
7
10
3
13
7
84
número de casos, 23 acidentes, no horário entre as 16:01
e 20:00, e também entre as 04:01 e 08:00 com um total
de 16 acidentes. Enquanto que na tabela 3 os dados
expõem os dias da semana em que mais ocorreram os
acidentes de trânsito, revela que o domingo, com 29%
dos acidentes e sábado com 21%, são os dias em que
ocorre o maior número de acidentes. Pode-se notar, então,
que a metade dos acidentes ocorridos no período de 12
meses foi durante os fins de semana.
Percentual
10%
6%
6%
13%
8%
6%
4%
8%
12%
4%
15%
8%
100%
Observando a tabela 2, pode-se acreditar que no
horário entre 16:01h 20:00h ocorram acidentes em razão
do deslocamento de pessoas que saem do trabalho em
uma cidade e retornam para suas casas em outras
cidades. Divergindo destes dados, ao observar a tabela 3,
verifica-se que as maiores ocorrências foram no sábado e
no domingo, tornando difícil a afirmação de que o número
de acidentes neste horário seja em decorrência do
deslocamento para o trabalho.
Fonte: Hermann, Nagorny, Soder, 2007.
Na tabela acima, que demonstra os meses do ano
em estudo com o respectivo número de acidentes, observase que nos meses de Maio, Outubro e Março foram os
meses com maior número de acidentes registrados, com
um total de 40% dos acidentes ocorridos no período
analisado.
Tabela 2: Distribuição dos acidentes
segundo o horário do sinistro de Julho de
2006 a Junho de 2007.
Hora
00:01 - 04:00
04:01 - 08:00
08:01 - 12:00
12:01 - 16:00
16:01 - 20:00
20:01 - 00:00
Total:
Nº acidentes
12
16
12
13
23
8
84
Percentual
14%
19%
14%
15%
28%
10%
100%
Outro horário em que ocorreu um número maior de
acidentes foi entre as 04:01h e 08:00h, podendo este
também ser um horário de deslocamento para ir ao trabalho,
mas, como novamente se depara com a tabela 3, nota-se
que ocorreram no sábado e domingo, podendo assim
relacionar estes acidentes com a saída de festas, bailes,
encontro com amigos entre outros.
Segundo a pesquisa de Barros et al (2003), “os
horários e dias preferenciais para a ocorrência de acidentes
são entre 18 e 22 horas e fins de semana”. Este dado se
aproxima muito da realidade vivenciada nesta região, não
diferenciando muito da realidade brasileira encontrada
atualmente.
Tabela 4:Distribuição dos acidentes
segundo a idade das vítimas dos sinistros de
Julho de 2006 a Junho de 2007.
Idade
Nº acidentes
18 - 22
42
23 - 27
41
28 - 32
13
33 - 37
3
38 - 42
3
43 - 47
2
48 - 52
2
53 ou +
8
Não
Identificado
1
Total
115
Fonte: Hermann, Nagorny, Soder, 2007.
Tabela 3: Distribuição dos acidentes
segundo o dia da semana do sinistro de Julho
de 2006 a Junho de 2007.
Dia da
semana
Domingo
Segunda
Terça
Quarta
Quinta
Sexta
Sábado
Total
Nº acidentes
25
7
8
8
10
8
18
84
Percentual
29%
8%
10%
10%
12%
10%
21%
100%
Fonte: Hermann, Nagorny, Soder, 2007.
Fonte: Hermann, Nagorny, Soder, 2007.
86
Percentual
37%
36%
10%
3%
3%
1.5%
1.5%
7%
1%
100%
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Tabela 7: Distribuição dos acidentes
Tabela 5: Distribuição dos acidentes
segundo
a causa do sinistro de Julho de
segundo dia da semana, horário e idade das
2006
a
Junho
de 2007.
vítimas dos sinistros de Julho de 2006 a
Nº
Junho de 2007.
Causa
Acidentes Percentual
Horário
Dia da
Nº
que mais
ocorreu
Semana acidentes
Domingo
25
16:01-20:00
Segunda
7
12:00-16:00
Terça
8
08:01-12:00
Quarta
8
16:01-20:00
Quinta
10
16:01-20:00
Sexta
8
16:01-20:00
Sábado
18
04:01-08:00
Idade
que mais
se
Nº
acidentes envolveu
8
18-22
3
18-22
4
23-27
3
23-27
5
23-27
3
18-22
5
18-22
Condutor
Veículo
Não Identificado
Animal na Pista
Aquaplanagem
Rodovia
Escorregadia
Total
72
3
5
2
1
86%
4%
6%
2%
1%
1
84
1%
100%
Fonte: Hermann, Nagorny, Soder, 2007.
Fonte: Hermann, Nagorny, Soder, 2007.
A tabela 4 demonstra as faixas etárias que se
encontravam os condutores envolvidos nos acidentes de
trânsito, sendo que entre 18 e 22 anos eram 42 pessoas
envolvidas e entre 23 e 27 anos 41 pessoas envolvidas,
evidenciando que os jovens foram a maioria dos envolvidos
dos acidentes, chegando a 73% dos casos.
Na tabela acima é possível identificar que a grande
maioria dos acidentes não ocorre por alguma falha
mecânica ou algum problema na rodovia como buracos,
falta de acostamento, mas a grande parte dos acidentes
de trânsito acontece por causa dos condutores, em 86%
dos casos. Concordando com este assunto, Barros et al
(2003), afirma que “os acidentes de trânsito não ocorrem
“por acaso”, mas são decorrentes de deficiências das vias,
dos veículos e, principalmente, das falhas humanas”.
Esse número elevado de jovens envolvidos em
acidentes de trânsito como se vê na tabela 5, pode-se
relacionar com o horário em que os acidentes mais
ocorreram, entre 04:01h e 08:00h de sábado e 16:01-20:00h
de domingo, evidenciando que nesses dias e horários os
jovens estão se deslocando, saindo ou voltando de festas,
bares e boates em outros municípios, tornando o trânsito
mais perigoso.
Segundo Rozestraten; Dotta (1996):
Dentre os elementos que se relacionam com
as causas dos acidentes, sabe-se que mais
de 90% deles estão associados a fatores
humanos. Apenas 10% têm suas causas
relacionadas às condições ambientais,
condições da via ou condições do veículo.
Tabela 6: Distribuição dos acidentes
Assim, evidencia-se que a maioria das causas dos
segundo o sexo e a média de idade das acidentes é culpa do condutor do veículo, sendo os jovens
vítimas dos sinistros de Julho de 2006 a os maiores envolvidos nos acidentes, principalmente do
Junho de 2007.
sexo masculino.
Sexo vitimas
envolvidas
Masculino
Feminino
Total
Nº
120
23
143
Percentual
84%
16%
100%
Sexo
Masculino
Feminino
Média
Idade
27 anos
25 anos
Fonte: Hermann, Nagorny, Soder, 2007.
Na tabela 6 que revela o sexo e a média de idade
das pessoas envolvidas nos acidentes de trânsito,
identifica-se que 120 pessoas envolvidas são do sexo
masculino e 23 pessoas do sexo feminino, mostrando que
o sexo masculino é o maior envolvido nos acidentes de
trânsito. Em relação à média de idade, nota-se que no
sexo masculino a média de idade é de 27 anos, enquanto
no sexo feminino a média é 25 anos.
87
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Tabela 8: Distribuição dos acidentes segundo o sexo do condutor dos sinistros de
Julho de 2006 a Junho de 2007.
Sexo
Cond
V1
Masc
Fem.
Não
Ident.
Total
Nº
acid.
Perc.
73
11
0
87%
13%
0%
84
100%
Sexo
Cond.
V2
Masc.
Fem.
Não
Ident.
Nº
acid.
25
4
1
30
Perc. Sexo
Nº Perc. Total
Cond. acid.
V3
84% Masc.
1 100% 100
5% Fem.
0 0%
15
1% Não
0 0%
1
Ident.
1 100% 115
100%
Fonte: Hermann, Nagorny, Soder, 2007.
Na tabela 8 identificou-se o sexo dos condutores e foram separados em condutores do veículo 1, do veículo 2 e
do veículo 3, de acordo com o que conduziam.
Quanto ao sexo do condutor do veículo 1, nota-se que 87% dos condutores são do sexo masculino e apenas
13% do sexo feminino. Em relação ao condutor do veículo 3, observa-se que 84% dos condutores são do sexo
masculino e 5% do sexo feminino. E condutor do veículo 3 é de 100% do sexo masculino.
Portanto, fica evidenciado que na grande maioria dos acidentes que ocorreram no período analisado, os condutores
eram do sexo masculino, não importando se eram condutores do veículo 1, 2 ou 3.
Tabela 9: Distribuição dos acidentes segundo o uso de álcool e uso de cinto de
segurança/capacete dos sinistros de Julho de 2006 a Junho de 2007.
Nº
Embriaguez
acidentes
Sim
15
Não
62
Desconhecido
7
Total
84
Percentual
18%
74%
8%
100%
Uso cinto ou
Nº
capacete
acidentes
Sim
61
Não
15
Desconhecido
8
84
Percentual
73%
18%
9%
100%
Fonte: Hermann, Nagorny, Soder, 2007.
A tabela 9, que expõe sobre o uso de bebida alcoólica e o uso de cinto de segurança ou capacete, revela que em
18% dos acidentes houve sinal de embriaguez em envolvidos e outros 18% não usavam capacete ou cinto de segurança.
Tabela 10: Distribuição dos acidentes segundo o uso de álcool, sexo, idade e horário
dos sinistros de Julho de 2006 a Junho de 2007.
Embriaguez
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sexo
M
M
M
M
M
M
M
M
M
M
M
M
F
M
M
Idade
29
20
19
22
29
28
21
20
24
18
19
20
18
27
24
Fonte: Hermann, Nagorny, Soder, 2007.
88
Horário que
mais ocorreu
04:01-08:00
04:01-08:00
08:01-12:00
04:01-08:00
00:01-04:00
04:01-08:00
04:01-08:00
20:01-00:00
20:01-00:00
00:01-04:00
04:01-08:00
08:01-12:00
16:01-20:00
20:01-00:00
00:01-04:00
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
A tabela acima mostra mais detalhadamente o perfil
do motorista que sofreu acidente de trânsito e constatou
uso de bebida alcoólica, sendo a grande maioria do sexo
masculino, jovens entre 18 e 29 anos e em horários
variados, mas com o maior número de casos entre 04:01
e 08:00 da madrugada; com isso, nota-se que estes
acidentes aconteceram devido à mistura álcool, direção,
imprudência e irresponsabilidade por parte dos motoristas.
Tabela 11: Distribuição dos acidentes
segundo o uso de cinto de segurança/
capacete, sexo e idade dos sinistros de Julho
de 2006 a Junho de 2007.
Segundo Quadro (2006, p. 02),
a Abramet (Associação Brasileira de Acidentes
e Medicina de Tráfego) informou que cerca de
35% dos acidentes de trânsito com vítimas são
causados pelo álcool. [...] A Santa Casa de São
Paulo comprova que 80% das pessoas lá
atendidas com traumatismos graves
decorrentes de acidentes de trânsito entram
no hospital alcoolizadas.
Acidente
com mortos
Embriaguez
Idade
Colisão
Sim
20
Colisão
Não
60
Colisão
Não
59
Capotamento
Não
18
Condição
da pista
Asfalto
(seca)
Asfalto
(seca)
Asfalto
(seca)
Asfalto
(seca)
Fonte: Hermann, Nagorny, Soder, 2007.
Na tabela15, onde mostra os acidentes em que
ocorreram as mortes, é possível identificar que três mortes
ocorreram em colisões, sendo elas um dos tipos de
acidentes que menos ocorreu durante o período analisado,
demonstrando que apesar de ser baixo este tipo de
acidente, ele tem maiores complicações devido à violência
com que acontece. Quanto à embriaguez, uma morte
aconteceu com motorista alcoolizado.
As idades das vítimas que foram a óbito são de
dois jovens, 18 e 20 anos, e de duas pessoas com mais
idade, 59 e 60 anos, mas vale lembrar que na morte das
pessoas com mais idade teve o envolvimento um jovem
motorista. No caso da condição da pista é possível verificar
que todos os acidentes com mortos foram em superfície
de asfalto e com pista seca, demonstrando que mesmo
com pista seca se deve ter o mínimo de cuidado no trânsito.
Tabela 16: Distribuição dos acidentes segundo o tempo, a superfície e a condição da
pista dos sinistros de Julho de 2006 a Junho de 2007.
Tempo
Bom
Chuva
Nº
acid.
67
9
Perc.
80%
11%
Nublado
Total
8
84
9%
100%
Nº
acid.
80
4
Superfície
Asfalto
Não pavim.
84
Condição
Perc. Pista
95% Seca
5% Molhada
Queda de
barreira
100%
Nº
acid.
67
16
Perc.
80%
19%
1
84
1%
100%
Fonte: Hermann, Nagorny, Soder, 2007.
Na tabela 16, identifica-se o tempo em que ocorreu
o acidente, a superfície onde os veículos trafegavam e qual
era a condição da pista no momento do acidente.
Teoricamente, quando um veículo trafega pela rodovia
em condições de chuva e pista molhada fica mais propício
para que ocorra o acidente. A via pavimentada tem melhor
condição de tráfego, assim terá uma maior velocidade e,
quanto maior a velocidade, mais chance de sofrer acidentes
enquanto que as rodovias não pavimentadas, com desníveis
e mais buracos, terá tráfego em menor velocidade e com
isso menos acidente. Mas ficou evidenciado que a maioria
dos acidentes aconteceu em tempo bom, com pista seca.
Quanto ao tempo no momento do acidente, nota-se
que a maioria dos acidentes, 80% dos casos, ocorreu com
tempo bom, onde a superfície de rodagem dos veículos
era, em 95% dos casos, em pista asfaltada e a condição
da pista no momento do acidente era seca em 80% dos
acidentes.
89
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
5 CONCLUSÃO
O desígnio deste artigo foi iniciar uma reflexão sobre
o elevado número de acidentes de trânsito com jovens que
está ocorrendo em todo país, assim como na região em
que o estudo foi realizado, buscando identificar qual o perfil
epidemiológico dos jovens vítimas de acidentes de trânsito
e usar este estudo como sendo uma forma de conscientizar
tanto os jovens como toda a sociedade para o perigo que
é o trânsito.
O Brasil é um dos países que mais acontece
acidente de trânsito, principalmente com envolvimento de
jovens. Os acidentes de trânsito estão aumentando tanto
cada ano que dentro de alguns anos só terá menos vítimas
que as doenças coronárias e a depressão.
Um dos desafios da saúde pública é de fazer com
que estes números tão elevados não continuem
aumentando, pois os acidentes fazem com que seja gasto
muito dinheiro entre hospitais, tratamentos e reabilitação
das vítimas que sobrevivem ao acidente, assim como em
campanhas de conscientização a toda população sobre o
perigo que é estar dirigindo em uma rodovia sem ter
experiência ou atenção mínima necessária para ter uma
viagem tranqüila.
O enfoque deste estudo se concentrou em identificar
qual é o perfil dos jovens que estão se acidentando no
trânsito fazendo com que possa ocorrer uma maior
aproximação das pessoas que trabalham na saúde
diretamente nas faixas etárias mais atingidas. Através da
abordagem do referido tema assim como do restante do
estudo, evidencia-se que os objetivos propostos foram
atingidos proporcionando às pessoas que terão acesso a
este trabalho uma forma de poder orientar-se bem como
passar este conhecimento a outras pessoas,
principalmente aos jovens.
Neste sentido, vale advertir que os papéis dos
profissionais da área da saúde vão além da curativa,
tornando-se muitas vezes educadores em saúde. Desta
forma, este artigo vem a contribuir para com esta função
educativa, trazendo dados estatísticos sobre os acidentes
de trânsito, proporcionando aos educandos uma maior
conscientização, pois são dados concretos da realidade
em que se vive.
Vivencia-se hoje um aumento do número de vítimas
dos acidentes de trânsito, principalmente com jovens,
fazendo com que ocorra uma demanda maior aos serviços
e saúde e, conseqüentemente, a enfermagem se vê ligada
a esta realidade, então é de grande importância que haja
uma maior capacitação destes profissionais perante a
questão de fornecer informações sobre os acidentes.
Com a realização deste trabalho, além de todo
conhecimento adquirido durante as fases do estudo,
confirmou-se a importância de fomentar as pesquisas,
pois em temáticas com referências teóricas dirimidas, a
produção de conhecimento se torna essencial para o
desenvolvimento social, servindo de subsídio para futuros
estudos e, certamente, contribuirá para promover a
conscientização das pessoas a respeito da violência no
trânsito, direcionado principalmente à população jovem.
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91
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
RECREAÇÃO N
A TER
CEIRA ID
ADE:
NA
TERCEIRA
IDADE:
DIFERENÇA P
ARA UMA VID
A SA
UDÁVEL
PARA
VIDA
SAUDÁVEL
Daiane Zambon1
Seloi da Rosa Weber1
Rafael Marcelo Soder2
Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM3
RESUMO
O presente estudo teve como objetivo melhorar a
qualidade de vida das pessoas residentes em uma
instituição de idosos por meio de atividades físicas,
dinâmicas e conversas acerca das suas necessidades
pessoais. Os pesquisadores analisaram os aspectos
pertinentes à temática através de observação das
expressões e interpretações de falas, desenhos e atitudes
dos idosos durante as atividades realizadas. Na medida
em que as atividades foram sendo desenvolvidas pelos
participantes, atentava-se aos aspectos que poderiam
transmitir informações acerca dos sentimentos presentes
em cada idoso. De acordo com os resultados encontrados
a partir dos relatos e também da interpretação das
atividades realizadas pelos mesmos, percebeu-se que os
idosos residentes nesta instituição sentem-se bem e felizes
mesmo estando longe dos seus familiares. Observou-se,
ainda, que participam ativamente do cotidiano social deste
ambiente, aceitando de forma acolhedora todas as pessoas
que vão visitá-los. Enfatiza-se que a cada nova visita, foi
sendo desenvolvido maior vínculo, quando conseguiam
expressar todo o carinho e dedicação através de gestos e
palavras. Isto se pode caracterizar de forma representativa
que muitos idosos se sentem carentes de afeição e, com
o desenvolvimento deste estudo, pode-se compreender a
dimensão da importância do trabalho voluntário na
sociedade atual.
Palavras-chave: Idosos institucionalizados,
atividades recreativas, qualidade de vida.
ABSTRACT
The present study had as its main purpose to improve
the life quality of the resident people in an institution of
seniors through physical, dynamics activities and
conversations concerning their personal needs. It was
analyzed the pertinent aspects to the theme through
observation of he expressions and interpretations of seniors’
speeches, drawings and attitudes during the accomplished
activities. As the activities were being accomplished by
the participants it was attempted to the aspects that could
transmit information concerning to the emotions present
in each senior. According to the results from the reports
and also from the activities interpretation accomplished
by them, it was noticed that the resident seniors in this
institution feel well and happy even if they are far away
from their relatives. It was still observed that they participate
actively in the daily life of this social environment, accepting
so welcoming all people who will visit them. It is
emphasized that the each new visit was being developed
greater bond, when got to express all the love and dedication
through gestures and words. This can be characterized as
representative that many seniors feel lacking of affection,
and with the development of this study, the dimension of
the importance of the voluntary work can be understood in
the current society.
Key words: Institutionalized seniors, recreational
activities, quality of life.
1 INTRODUÇÃO
Atualmente são muitos os desafios que povos e
governos enfrentam para construir uma sociedade mais
humana e digna, levando-se em consideração que o
envelhecimento da população, decorrente do aumento do
tempo de vida, tem transpassado ao dia-a-dia a questão
de todos os idosos, sabendo-se que a longevidade constitui
uma notável conquista da ciência, e que a maioria das
pessoas afirma que o mais importante não é somente ter
uma vida longa, mas sim, tê-la com dignidade e qualidade.
1
Acadêmica do 8º semestre do Curso Bacharelado em Enfermagem SETREM
Enfermeiro e Docente do Curso Bacharelado em Enfermagem SETREM.
3
Av. Santa Rosa, 5405, Três de Maio – RS [email protected]
2
92
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
O envelhecimento da população é conseqüência do
desenvolvimento econômico e social, sintoma de riqueza
e cultura. É no campo da saúde e das pensões que mais
se nota esse mal denominado problema. Com os anos, o
organismo vai perdendo a qualidade e podem aparecer
doenças e invalidez que levam à necessidade de
assistência e cuidados (RUIPÉREZ; LIORENTE, 1998).
Com o aumento da população idosa, surge como
pauta para discussão, tanto política como social, a questão
da institucionalização dos idosos, sendo que a partir disso,
surge um acréscimo de instituições que nem sempre estão
preparadas para atender os idosos, seja pela estrutura física
ou pela qualificação dos profissionais que prestam
atendimento a essas pessoas. Estes profissionais devem
aguçar seu talento e atualizar seu conhecimento, não
somente técnico, mas também com um atendimento mais
humanizado para tentar minimizar a falta que os idosos
sentem do aconchego familiar (SILVA; SCHORN;
CAVALHEIRO, 2006).
A instituição para idosos é um estabelecimento no
qual as necessidades devem ser supridas de maneira que
esses idosos se sintam acolhidos da melhor maneira
possível, respeitando a individualidade de cada um como
ser humano único que é. Pois nem sempre os idosos que
permanecem nessas instituições estão por vontade própria.
Muitas vezes estão pela necessidade, visto que não têm
quem os cuide e acabam sofrendo com esta situação por
estarem separados dos familiares e terem de se adaptar a
um ambiente estranho, convivendo com pessoas até então
desconhecidas.
A necessidade e o interesse de estudar e conhecer
um pouco mais os idosos institucionalizados, assim como
suas vivências, quer sejam individuais ou coletivas, e uma
vez que muitas lacunas ainda são percebidas, sendo
imprescindível o preenchimento delas, foram os motivos
que levaram as pesquisadoras à realização deste estudo.
Após conhecer a instituição em evidência, localizada
em um município da região Noroeste do estado do Rio
Grande do Sul, busca-se implementar ações que melhorem
a qualidade de vida dos idosos que vivem nessa instituição,
levando-se em consideração que essas ações devem ter
caráter humanizador, considerando que a instituição,
segundo Terra; Dornelles (2003), não pode ser um lugar
público, mas sim como uma residência coletiva, onde as
individualidades dos que lá moram devem ser preservadas.
Este trabalho buscou proporcionar aos idosos
institucionalizados um bem-estar físico, mental e social,
a partir de atividades físicas, recreativas, dinâmicas de
grupo, auto-estima e cuidados pessoais, proporcionando
assim uma diversificação no dia-a-dia dos mesmos. Dentro
das limitações de cada um, procurou-se abrir espaço para
as realizações das atividades como também de um maior
conhecimento entre todos os participantes para uma
melhor interação.
2 METODOLOGIA
A presente pesquisa foi realizada com os idosos
que fazem parte da instituição estudada, desenvolvida no
decorrer do 2º semestre de 2007 por acadêmicas do curso
Bacharelado em Enfermagem – SETREM. A pesquisa
utilizou-se da observação dos pesquisadores por meio das
expressões, interpretações de falas, desenhos e atitudes.
Na medida em que as atividades foram sendo realizadas,
atentava-se para os aspectos que poderiam transmitir
informações acerca dos sentimentos presentes em cada
idoso.
A instituição onde a pesquisa foi realizada abriga
23 idosos institucionalizados em tempo integral. Porém,
por motivos de limitação física e interesse particular de
cada um dos idosos presentes, a amostragem se deu entre
sete a quatorze participantes dependendo da atividade
realizada. Buscou-se abrir espaço para que todos tivessem
oportunidade de executar as atividades, dependendo, como
já mencionado, das limitações físicas e emocionais de
cada um.
As atividades foram desenvolvidas três vezes por
semana, no período de agosto a novembro de 2007, sendo
que cada encontro teve duração aproximada de duas horas,
estendendo-se conforme aproveitamento dos participantes.
3 ENVELHECIMENTO
3.1 PROCESSO DO ENVELHECIMENTO
HUMANO
O envelhecimento é um processo fisiológico e não
está necessariamente ligado à idade cronológica.
Antigamente os idosos eram mais considerados por
possuírem grande sabedoria. Hoje não são vistos desta
forma. Muitas vezes são tratados com descaso e desprezo,
sendo excluídos da sociedade, que os julga improdutivos,
sendo comum encontrar idosos abandonados e ignorados
dentro de suas próprias famílias (PIRES et al. 2006).
A população vem envelhecendo em ritmo acelerado,
mas idade não é sinônimo de inutilidade, pois,
principalmente com os avanços da saúde, houve um
aumento da longevidade, de forma gradual, com um
significativo aumento na qualidade de vida. Para isso, é
necessário aceitar as mudanças que ocorrem tanto exterior
como interiormente, buscando motivação e evoluindo
sempre.
A maturidade e a velhice representam desafios
individuais e socioculturais permanentes para conseguir
atingir o bem-estar dos idosos. O envelhecimento não
começa aos 60 anos, mas sim é o acúmulo de interações
sociais, biológicas e de comportamento durante toda a
93
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
vida, sendo que a aceitação dos mesmos pela sociedade
e a sua adequação ao envelhecimento e ao grupo social
em que vivem são fundamentais para uma vida mais
saudável (COSTA; CARBONE, 2004).
O processo do envelhecimento e a velhice sempre
foram motivos de preocupações para a humanidade, pois,
de acordo com Figueiredo; Tonini (2006), delimitam
mudanças expressivas de ordem individual, familiar e social,
cada uma com seus significados e relevâncias, sendo que
para uma velhice tranqüila é necessário um somatório de
tudo que traga benefícios ao organismo, desde uma
alimentação saudável, um bom relacionamento familiar,
atividades físicas em um espaço de lazer adequado, mas,
acima de tudo, é preciso investir em uma melhor qualidade
de vida.
3.2
HÁBITOS
INADEQUADOS
CONTRIBUINDO PARA O SURGIMENTO DE
PATOLOGIAS
Até o século XX as doenças que diminuíam a
longevidade eram as infecciosas, sendo agravadas pelas
deficiências nutricionais, saneamento, entre outras. Hoje,
as enfermidades, na maioria das vezes, são causadas por
uma má alimentação (calorias, gordura, álcool), níveis
nocivos de colesterol, juntamente com uma prática de
hábitos pouco saudáveis como tabagismo e sedentarismo.
Essas enfermidades respondem hoje por grande número
de mortes que poderiam ser prevenidas anteriormente
(COSTA; CARBONE, 2004).
A maior parte das alterações celulares resulta de
fatores externos, como sedentarismo e má alimentação,
e não por fatores genéticos. Atividades físicas regulares e
adequadas a cada pessoa reduzem o risco cardíaco,
ajudam a prevenir diabetes, câncer de mama e da próstata,
obesidade, depressão, entre outras patologias,
proporcionando assim uma melhor qualidade de vida
(COSTA; CARBONE, 2004).
3.3 NEGAÇÃO AO ENVELHECIMENTO
autocuidado ou buscando uma nova alternativa de vida em
instituições para idosos.
O envelhecimento, por ser a última etapa do ciclo
normal da vida humana, entendido como um processo em
desenvolvimento, tanto na parte de aprendizagem,
adaptação, participação, deveria ser encarado com mais
naturalidade pelas pessoas e não como uma derrota. As
pessoas se baseiam muito no padrão de beleza que a
mídia expõe, preocupando-se mais em seguir estes perfis,
deixando de valorizar seus próprios potenciais, qualidades
e atitudes nas mais variadas esferas da vida humana.
3.4 POLÍTICAS DE SAÚDE PÚBLICA DA
ASSISTÊNCIA AO IDOSO
As questões relativas à melhoria da qualidade de
vida do idoso têm crescido nos últimos tempos, já que o
aumento da longevidade se tornou algo importante no que
tange às políticas de saúde do idoso. Na sociedade atual
o processo de envelhecimento é acompanhado de várias
mudanças sociais que podem interferir de forma negativa
nas condições de vida dos idosos.
Conforme o Estatuto do Idoso (2003), as instituições
que abrigam idosos são obrigadas a manter padrões de
habitação compatíveis com a necessidade de cada um,
bem como oferecer alimentação regular e cuidados com a
higiene pessoal adequada.
A política nacional de saúde do idoso tem como
propósito a promoção de um melhor estado de saúde às
pessoas em idade avançada, aumentando assim a
expectativa de vida, associada a altos níveis de função e
autonomia. Portanto, envelhecer é um fenômeno natural,
inerente à finitude biológica do organismo humano,
tornando-se necessário pensar em garantir um envelhecer
com segurança e dignidade, considerando-se os idosos
cidadãos de plenos direitos (SILVA; SCHORN;
CAVALHEIRO, 2006).
De acordo com o Estatuto do Idoso (2003), o Poder
Público, a família, comunidade e a sociedade, são
responsáveis pela efetivação do direito à vida, e todas as
qualidades pertinentes para a vivência familiar e
comunitária.
As pessoas, em geral, querem ter uma longevidade,
mas não querem ser velhos; porém, quando alcançada,
ela passa a ser uma questão social, sendo que viver muito
e bem é um direito de todos.
Os idosos encontram dificuldades em achar quem
os cuide, pois muitas vezes são apontados como estorvo
pela família ou sociedade da qual fazem parte, ou ainda
por eles próprios. No entanto, faz-se necessário aprender
a vigiar a própria saúde, seguindo uma rotina adequada de
3.5 IDOSO INSTITUCIONALIZADO
Muitos são os fatores que contribuem para o
aumento da população idosa. Este novo perfil populacional
trouxe a questão da institucionalização de idosos. Nas
últimas décadas, viu-se crescer estabelecimentos voltados
a oferecer cuidados a pessoas idosas. A população
envelhece rapidamente e sem um planejamento adequado
por parte dos setores sociais e de saúde (VIEIRA, 2003).
94
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
As instituições definidas como grupos sociais
oficiais que formalizam um sistema de regras
próprio, que determina a vida desses grupos,
são asilares à medida que assumem um
caráter de custódia sobre quem reside nelas.
Esse caráter é visto, com freqüência, como a
perda de autonomia civil; seria a morte da
sociedade do indivíduo, já que quem responde
pelo asilado é a instituição que o tutela (VIEIRA,
2003, p.22).
Ainda, de acordo com Vieira (2003), as instituições
têm função social indiscutível na organização e no
funcionamento da sociedade, pois elas surgem para
atender às necessidades sociais de várias formas. Toda
instituição tem um referencial social que a explique, mas
ela não pode se justificar como imprescindível, não pode
se bastar puramente pela correspondência social de sua
utilidade.
participantes iam passando de um para o outro um ursinho
de pelúcia. Quando a música era interrompida por uma
das monitoras, o participante que se encontrava com o
urso era quem se apresentava, e assim sucessivamente.
Caso um dos participantes já houvesse falado, o próximo
a se apresentar seria o companheiro do lado direito.
Nesta primeira atividade, por meio dos relatos dos
participantes, pôde-se perceber como são importantes e
gratificantes para os idosos essas atividades de
descontração, pois lhes proporcionam momentos de
reflexão e alegria. Neste primeiro momento, observou-se
a carência de afeto que a maioria dos idosos possui.
Encontravam-se também introspectivos, sendo isto
justificável pelo fato das acadêmicas serem desconhecidas
a eles. Pôde-se notar no decorrer da atividade como as
expressões faciais de cada um se modificavam,
expressando a alegria de participar de uma atividade fora
das suas rotinas diárias.
Um relato que nos chamou a atenção foi:
O apoio da família ao idoso tem sido visto como a
melhor alternativa para o seu cuidado. Pensa-se que em
nenhum outro lugar a não ser no âmbito familiar, o idoso
terá suas necessidades e expectativas atendidas, mas,
talvez isto não deva ser generalizado, pois muitos familiares
têm optado por viverem separados de seus
familiares.(VIEIRA, 2003).
Para muitos idosos, nem sempre a família é aquela
que tem laços sangüíneos. Isto por alguns idosos não terem
parentes, por viverem afastados ou ainda por serem
rejeitados pela família, acabando, assim, sendo cuidados
por outras pessoas, criando com estas, fortes laços de
amizade e confiança (ZIMERMAN, 2005).
[...] esta atividade foi muito importante, não
somente para vocês nos conhecerem, mas
também para nos conhecermos melhor e
sabermos um pouco mais da história de cada
um (Sujeito 1).
Percebe-se a falta de afeto dos participantes pelo
fato de ter um urso de pelúcia fazendo parte da dinâmica,
sendo que os participantes não queriam se desfazer do
urso, mostrando gestos carinhosos com o mesmo, até
mesmo os que se encontravam mais isolados do grupo.
4.2 RESSURGINDO
FEMININA
4 ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
4.1 CONHECENDO UNS AOS OUTROS
COM DESCONTRAÇÃO
Como primeira atividade desenvolvida, foi realizada
uma dinâmica de apresentação para que houvesse uma
interação entre as acadêmicas e as pessoas residentes
na instituição, contando com quatorze participantes. Nesta
atividade, cada sujeito foi estimulado a se apresentar e a
falar um pouco de sua vida, contando como era antes de
morar nesta instituição e como se sente atualmente, com
a liberdade de sugerir outras atividades que gostariam de
desenvolver.
Para isso, realizou-se uma dinâmica na qual foi
reproduzida uma música bem alegre e no seu decorrer os
A
VAIDADE
A pedido dos próprios idosos, a segunda atividade
realizada foi manicure e pedicure, em cujo transcurso
percebia-se ansiedade por parte dos mesmos para a
realização da mesma. Ao chegar ao lar, pôde-se perceber
que muitas das mulheres já estavam aguardando as
acadêmicas, impacientes para começar a arrumar as
unhas. Após concluir a atividade, notou-se o olhar alegre e
entusiasmado em cada sujeito participante, pois, através
de um ato tão simples conseguiu-se melhorar a auto-estima
e proporcionar um bem-estar interior e exterior, fazendo
ressurgir a vaidade presente em cada pessoa.
No decorrer desta atividade, teve-se a oportunidade
de conhecer melhor cada idoso por meio de conversas
descontraídas. Em uma dessas conversas ouviu-se o
seguinte:
95
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
[..] é muito bom ter pessoas assim como vocês,
com disposição para ajudar a gente, e fazer
com que a gente se sinta melhor. Espero que
vocês continuem [...] (Sujeito2).
Foi muito gratificante ouvir este tipo de comentário,
pois motivou a continuar estas atividades com mais afinco.
sentem bem na instituição em que vivem, conforme o que
se ouviu no decorrer da realização desta atividade.
Vários desenhos chamaram atenção, dentre os quais
se pode citar o do Sujeito 3, que escreveu por várias folhas
os mesmos traços, que podem ser vagos, mas para ele
simbolizam muita coisa, pois, de acordo com seu relato,
apesar da dificuldade de expressão, pode-se entender que
ele gostaria muito de ter freqüentado a escola, mas não
teve oportunidade, devido às suas necessidades especiais.
4.3 ATIVIDADE FÍSICA: SINÔNIMO DE
VIDA SAUDÁVEL
Esta atividade foi realizada com o intuito de
proporcionar aos idosos um momento de descontração e
movimentos corpóreos para alívio das tensões musculares
e psicológicas, extraindo a monotonia do dia-a-dia e
fazendo com que os mesmos percebessem o quanto eles
ainda são capazes de executar tais movimentos,
respeitando o limite físico de cada um. A atividade foi
realizada com a participação de onze idosos. Para isto,
ouviu-se uma música relaxante, sendo que os exercícios
foram feitos por uma das monitoras e repetidos por todos
os participantes que tinham condições. Estas atividades
eram leves, sem a necessidade de grandes esforços.
Pôde-se perceber no início da realização desta
atividade certa resistência, mas no decorrer da mesma
foram interagindo, ficando mais à vontade e executando
os movimentos conforme a capacidade individual, sendo
que no fim da atividade todos os que tinham condições
estavam realizando com empolgação os exercícios. Ao
fim da atividade, percebeu-se na expressão da maioria dos
participantes uma grande motivação e alegria por estarem
realizando uma diversificação no seu dia-a-dia.
Figura 1: Desenho realizado pelo Sujeito 3 durante o período da
pesquisa.
Outro desenho que chamou a atenção foi o realizado
por um senhor que vive nesta instituição há
aproximadamente 2 anos. Segundo o relato dele:
4.4 TRABALHOS ARTÍSTICOS MANUAIS
[...] apesar de aqui ser bom de se viver, ainda
sinto muita saudade da época em que vivia com
toda a minha família [...] (Sujeito 4).
Esta atividade teve como propósito identificar,
através dos desenhos realizados, os sentimentos que os
idosos possuem. Após ter sido dada a explicação de como
ocorreria a atividade, sentiu-se, por parte de vários idosos,
uma resistência, pois muitos deles nunca haviam realizado
algo parecido, não se achando capazes de realizar a
mesma. Depois de incentivados, muitos começaram a
fazer conforme explicado, uns com mais entusiasmo que
outros. Ao término da atividade havia ainda nove
participantes.
Foram várias as vivências expressadas através dos
desenhos, deixando transparecer através dos rabiscos
muito dos sentimentos. Percebeu-se também o uso de
várias cores nos desenhos; em sua maior parte, cores
claras e vivas, simbolizando a alegria e bem-estar neles
existentes. O que pode representar que estas pessoas se
Figura 2: Desenho realizado pelo Sujeito 4 durante o período da
pesquisa
96
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
4.6 CORTE DE CABELO
Esta atividade foi realizada a pedido da maioria dos
idosos, pois a solicitaram desde o início da implantação
deste projeto. Neste dia, pôde-se perceber a euforia dos
mesmos pela pressa que tinham em mudar o visual e se
sentirem mais bonitos. Observou-se a partir disso a vaidade
existente em cada um, pois um queria passar à frente do
outro e ser atendido primeiro. Para a realização desta
atividade, contou-se com a colaboração de uma profissional
cabeleireira, que no transcorrer da manhã conseguiu fazer
os cortes de cabelo de todos os que estavam
necessitando.
5 CONCLUSÃO
A partir da realidade vivenciada pelos idosos da
referida instituição, percebeu-se a necessidade de
intervenções no que tange à melhoria da qualidade de vida,
aspectos que podem ser melhorados através de atividades
recreativas que podem ser introduzidas no dia-a-dia, de
forma leve e gradativa, conforme o limite de cada um,
proporcionando momentos de lazer e descontração,
beneficiando assim a saúde.
Figura 3: Desenho realizado pelo Sujeito 5 durante o período da
pesquisa
A figura 3, ou seja, o desenho logo acima, também
foi realizado por outra participante desta dinâmica o qual
chamou atenção por passar tranqüilidade, serenidade e
vontade de viver, tanto pelas cores utilizadas, como pelas
formas desenhadas, com complementação de figuras
coladas. Percebeu-se, também, lucidez e criatividade, pois
desenhou a árvore e não esqueceu de fazer o solo.
4.5 PINTURA COM MOLDES EM TECIDO
Para a realização desta atividade, contou-se com o
auxílio de uma professora de pintura que já havia realizado
esta tarefa outras vezes, observando-se assim maior
participação dos idosos, pois eles já haviam criado um
vínculo com ela. A atividade contou com sete participantes.
No seu decorrer, observou-se grande empenho por parte
dos sujeitos, deixando de lado as barreiras que muitos
possuem, relacionadas à coordenação motora, déficit da
acuidade visual, entre outras. Apesar de tudo, realizam
trabalhos muito bonitos, trabalhos estes que são
posteriormente expostos e comercializados, mostrando
assim a persistência, força de vontade e a certeza de que
todos são capazes, independentemente de qualquer
barreira encontrada.
De acordo com os resultados encontrados, a partir
dos relatos e também da interpretação dos desenhos
realizados pelos mesmos, percebeu-se que os idosos
residentes nesta instituição se sentem bem e felizes
mesmo estando longe dos seus familiares. Observou-se
também que gostam de participar da vida social, aceitando
todas as pessoas que vão visitá-los; em especial os que
realizam atividades voluntárias.
Enfatiza-se que a cada nova visita realizada, foi-se
criando maior vínculo com os idosos conseguindo
expressar todo carinho existente, através de gestos e
palavras. Isto representa que muitos sentem carência
afetiva e, com interação contínua, pôde-se amenizar este
sentimento.
Apesar de apresentarem, em sua grande maioria,
uma vida cercada de várias histórias, suas satisfações
estão mais ligadas às superações das dificuldades e
obstáculos impostos, pois se percebe que os mesmos
não ignoram os seus problemas e sofrimentos, mas, ao
contrário, encaram-nos com naturalidade.
Pôde-se perceber por meio das atividades realizadas
que as pessoas residentes nesta instituição se sentiam
mais felizes, visto que estavam realizando atividades
motivadoras tanto para sua auto-estima quanto para o seu
bem-estar físico e mental, deixando de lado a monotonia
do dia-a-dia.
Foi muito gratificante realizar este trabalho, pois se
aprende muito por meio das trocas de experiências e
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REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
relatos da vida de cada um, assim como o reconhecimento
deles pelo trabalho realizado. Pôde-se tirar muito proveito,
não somente como graduandas em enfermagem, mas
também para a vida pessoal. Por tudo isso, acredita-se
que se pôde proporcionar através dessas ações momentos
mais alegres à vida de cada residente desta instituição,
reconhecendo mais um amplo campo profissional para
atuação da enfermagem.
6 REFERÊNCIAS
BRASIL, Ministério da Saúde. Estatuto do Idoso. Disponível
em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/2003/L10.741.htm>.
Acesso em: 20 out 2007.
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FIGUEIREDO, N. M. A.; TONINI, T. Gerontologia: atuação da
enfermagem no processo de envelhecimento. São Paulo:
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conclusão de curso. Sociedade Educacional Três de Maio,
2006.
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EDIPUCRS, 2003
TONTINI, J. A.; SCHORN, S. C.; GABATZ, R. I. B. A (des) ventura
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VIEIRA, E. B. Instituições Geriátricas: Avanços ou
retrocessos? Rio de Janeiro: Revinter, 2003.
ZIMERMAN, G.I. Velhice: aspectos biopsicossociais. Porto
Alegre: Artmed, 2005.
98
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
UM ESBOÇO CURRICULAR DO ENSINO DE
ENFERMAGEM NO BRASIL
Gilmara Vessozi1
Roque Ismael da Costa Güllich2
Gilberto Souto Caramão3
Sociedade Educacional Três de Maio4
RESUMO
ABSTRACT
Ao longo da História surgiram diferentes concepções
de currículo e, sendo assim, parte-se, neste trabalho, do
pressuposto de que tais concepções trazem subjacentes
diferentes teorias de justiça social, bem como incorporam
contribuições filosóficas, sociológicas, psicológicas,
antropológicas em avanços para própria área educacional.
No que tange à Enfermagem e sua prática de ensino, cada
vez mais se tornam necessárias discussões acerca das
Diretrizes Nacionais dos Cursos de Graduação em
Enfermagem (DCGENF), e suas contribuições para a
estruturação de uma prática de ensino de Enfermagem
condizente com a realidade que se vislumbra para a
profissão. Assim, o presente estudo se preocupa em
perceber de que forma o currículo, suas teorias e a
importância destas para o ensino, é percebido dentro do
discurso presente na produção científica em Enfermagem
publicada nos Congressos Brasileiros de Enfermagem
CBEns dos últimos 5 anos, visando delinear as
perspectivas do seu ensino no que se refere à discussão
e estruturação de um currículo em Enfermagem. Percebese, então, ante a análise do enredo do CBEn, que o currículo
é discutido como sendo fundamental numa prática mais
crítica e reflexiva frente a sua atuação profissional;
entretanto, a maior parte dos trabalhos traz a preocupação
com as metodologias utilizadas nas formas de ensinar, o
que denota a face do currículo tradicional, muito centrado
no tecnicismo; já o currículo crítico e pós-crítico, que busca
a significação de conteúdos, aparece como preocupação
pungente no ensino de Enfermagem; entretanto, em menor
número e de forma menos densa, o que instiga novos e
maiores estudos centrados nesta temática.
Palavras-chave: Ensino de Enfermagem. Currículo.
Diretrizes curriculares.
Throughout History appeared different concepts of
curriculum, and thus, this work cleaved of the purpose
underlying such concepts brought different theories of
social justice, and incorporated philosophical, sociological,
psychological, anthropological contributions, in advances
to the appropriate educational area. Regarding to nursing
and its practice of teaching, increasingly becomes
necessary discussions on the National Guidelines Nursing
Graduation Curriculum (DCGENF), and their contributions
to the structuring of a practice of Nursing teaching
consistent with the reality that begins to appear for the
profession. Thus, the present study is concerned to
understand how the curriculum, its theories, and the
importance of them for education, is noticed within the
discourse in this scientific production in Nursing published
in the Brazilian Congress of Nursing CBEns in the last 5
years, aiming to delineate the prospects of its teaching
regarding to the discussion and development of a curriculum
in Nursing. It is known then, facing the analysis of the plot
of CBEn, that the curriculum is discussed as to be basic
in the more critical and reflective practice front of their
professional performance; however, most of the works
brings at concern about the methodologies used in forms
of teaching, which denotes the face of the traditional
curriculum, very focused on technicality, now the curriculum
critical and post-critical, that searches signification of
contents, appears as pungent concern in the teaching of
nursing, though in smaller number and less dense , which
incited new and larger studies focusing on this issue.
Key words: Teaching of Nursing. Curriculum.
Guidelines curriculum.
1
Bacharel em Enfermagem (SETREM); Mestranda em Educação nas Ciências (UNIJUÍ) [email protected].
Biólogo, Mestre em Educação nas Ciências (UNIJUÍ). Doutorando em Botânica – ENBT/ Jardim Botânico do Rio de Janeiro, Professor
Titular do Instituto Superior de Educação da Faculdade Três de Maio (SETREM); [email protected]
3
Bacharel e Licenciado em Enfermagem (UNIFRA); Psicopedagogo (UNIFRA); Mestre em Educação (UFSM); Membro dos Grupos de
pesquisa do CNPq: Educação Especial: Interação e Inclusão Social (UFSM) e Educação em Saúde Coletiva (SETREM); Rua Avaí, nº 900
– Centro – 98910-000 – Três de Maio – RS–BR ; [email protected].
4
Avenida Santa Rosa, 2405, Três de Maio –RS. [email protected].
2
99
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1 INTRODUÇÃO
O conceito de currículo, desde sua etimologia até
a constituição das suas teorias que o têm influenciado ao
longo dos anos, mostra que este é resultante de ideologias
que envolvem aspectos filosóficos, políticos, históricos,
religiosos e morais, presentes em nossa sociedade.
Ao se declinar sobre a história do currículo, percebese o hábito de se chamar currículo, os planos de estudo,
os programas, ou de um modo geral, os documentos em
que se definem a estrutura e o funcionamento dos cursos;
isto é, documentos escritos onde, para uns, denota-se a
afirmação dos planos, projetos ou propósitos educativos
e, para outros, significa as próprias atividades educativas.
O currículo designa-se, então, por plano de
ação pedagógica que compreende não
somente os programas para as diferentes
matérias, mas também a definição das
finalidades de educação pretendidas, uma
especificação das atividades de ensino e de
aprendizagem e finalmente, indicações
precisas sobre as maneiras como o ensino ou
o aluno serão avaliados (SAVIANI, 2006, p. 42).
A diversidade de estudos neste campo decorre do
caráter conflitual das diversas concepções de currículo e
frente a esta constatação este estudo se destina a delinear
a preocupação com o currículo e a aplicação das teorias
curriculares dentro do movimento discursivo do Congresso
Brasileiro de Enfermagem (CBEn), vislumbrando novos
horizontes na prática de ensino em Enfermagem.
Nesse propósito, utilizou-se da pesquisa qualitativa
de cunho documental, da produção científica de
Enfermagem dentro da área de Formação Profissional e
Ensino/Educação publicada nos Anais dos últimos 5 anos
do CBEn, identificar por meio da análise do conteúdo do
discurso destes, as interfaces da prática pedagógica e
curricular do ensino de Enfermagem brasileiro atual e as
mudanças que esta propicia na prática profissional e
social.
Tal proposta de estudo permitiu perceber que a
Enfermagem brasileira atém sua prática de ensino ainda
muito centrada na teoria Tradicional do currículo, com
poucas pretensões para uma proposta curricular mais
crítica, onde sejam consideradas outras perspectivas no
processo de ensino-aprendizagem,
Desta forma, elucida-se que a prática de ensino
de Enfermagem atualmente no âmbito dos processos de
ensino-aprendizagem, ainda se preocupa mais com os
meios de ensinar, ou seja, com as “metodologias”,
esquecendo-se de fomentar concepções dentro de outras
perspectivas, calcadas na reflexão e no conhecer da ação
profissional e de ensino.
Diante do exposto, nota-se a falta de incorporar e
internalizar a noção de um currículo-formação voltado para
a consciência crítica, emancipação e humanização do
indivíduo, assumindo questões de natureza ética, política,
social e não apenas as de ordem técnica-instrumental, é
que se vislumbra a reflexão do que se faz e porque se faz,
exercitando o pensamento, buscando a reflexão-na-ação
(SCHÖN, 2000).
Acredita-se ainda que, conforme preconizam as
diretrizes curriculares do curso superior no que tange à
flexibilização dos currículos, uma revisão mais aprofundada
dos conteúdos se faz indispensável na busca de uma
formação que propicie ao aluno a possibilidade de
transformar realidades, contribuindo para o desenvolvimento
social da profissão.
2 METODOLOGIA
Para o desenvolvimento do estudo em questão,
adotou-se a abordagem qualitativa. A pesquisa qualitativa
busca entender a subjetividade das informações, sejam
elas faladas, escritas, documentais ou observadas. Este
estudo se preocupa com o nível da realidade e abrange
inúmeros significados, motivos, aspirações, crenças,
valores e atitudes (MINAYO, 2007).
Como método de investigação que possibilitasse
uma análise da congruência entre o ensino de enfermagem
e as interfaces que interpõem a mudança da práxis
profissional na sociedade brasileira atual, optou-se pela
pesquisa documental que Lüdke; André (2001, p. 38)
“aponta se constituir numa técnica valiosa de abordagem
de dados qualitativos seja complementando as informações
obtidas por outras técnicas, seja desvelando aspectos
novos de um tema ou problema”.
Concordante com Lüdke; André (2001), o uso de
documentos alicerça os objetivos da pesquisa quando o
intuito do pesquisador é a análise da expressão de cada
indivíduo, do mesmo modo que a sua linguagem na
obtenção de dados que reafirmam, justificam e reforçam
as declarações do pesquisador.
Estes constituem uma fonte poderosa de onde
podem ser retiradas evidências que
fundamentem afirmações e declarações do
pesquisador. Representam ainda uma fonte
“natural” de informação, não sendo apenas
uma fonte de informação contextualizada, mas
surge num determinado contexto e fornecem
informações sobre esse mesmo contexto
(LÜDKE; ANDRÉ, 2001, p. 39).
Como instrumento da coleta de dados utilizou-se
os resumos publicados no 54º, 55º, 56º, 57º, e 58º Anais
do CBEn, cujo tema satisfazia ao objetivo da pesquisa,
compreendendo o período de 2002 a 2006. Para a
interpretação dos resultados e o tratamento destes,
empregou-se a análise do conteúdo do discurso constituinte
dos resumos analisados.
100
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
[...] um artefato social e cultural. Isto significa
que ele é colocado na moldura mais ampla de
suas determinações sociais, de sua história,
de sua produção contextual. O currículo não é
um elemento inocente e neutro de transmissão
desinteressada do conhecimento social. O
currículo está implicado em relações de poder,
o currículo transmite visões sociais particulares
e interessadas, o currículo produz identidades
individuais e sócias particulares. O currículo
não é um elemento transcendente e atemporal,
ele tem uma história vinculada a formas
específicas e contingentes de organização de
sociedade e da educação.
Segundo Minayo (1999) a análise de conteúdo parte
de uma literatura de primeiro plano para atingir um nível
mais aprofundado: aquele que ultrapassa os significados
manifestos. Em termos gerais, relaciona estruturas
semânticas (significantes) com estruturas sociológicas
(significados) dos enunciados. Articula a superfície dos
textos descrita e analisada com os fatores que determinam
suas características: variáveis psicossociais, contexto
cultural, contexto e processo de produção da mensagem.
Embora a proposta de estudo ora aqui apresentada
se destine à análise de documentos que são de domínio
público, respeitaram-se os princípios e aspectos éticos
elencados na Resolução Nº. 196 de 10 de outubro de 1996,
do Conselho Nacional de Saúde.
3 CURRÍCULO E A CONSTITUIÇÃO DE
SUAS TEORIAS
Pela etimologia da palavra currículo, deparou-se com
um emaranhado de significados; em latim, por exemplo,
pode ser entendido como proveniente de currere que
significa correr, decorrendo as derivações substantivas do
próprio latim como cursus, que significa carreira, ou
mesmo, curriculum no sentido de caminho e ainda pista
de corrida, assim, “podemos dizer que no curso desta
corrida que é o currículo, acabamos por nos tornar o que
somos” (MOREIRA; SILVA, 2005, p.15).
O currículo surgiu na década de 20, adjunto ao
processo de industrialização e urbanização da sociedade
norte americana como uma forma de preservação da cultura
e de valores frente aos processos imigratórios que
intensificavam a massificação da escolarização. Nessa
época, o currículo era visto como um processo de
racionalização dos resultados educacionais, cuidadosa e
rigorosamente especificados e mesurados (MOREIRA;
SILVA, 2005, p. 12).
Baseando-se nesses pressupostos e que se
constata que o currículo é o que respalda toda educação
e, desta forma, toda e qualquer prática educativa,
transformando suas metas básicas em estratégias que
permeiem o ensino, comprovando e concretizando na
prática seu verdadeiro valor. “Na mediação da dinâmica
curricular importa se articulem as práticas e as teorias
que as informam e as impulsionam esclarecendo-as e as
dando sentindo” (MARQUES, 2006, p. 115).
Desta forma, aos apontamentos de Silva (2001), o
que serve de pano de fundo na tentativa de compreensão
de qualquer teoria do currículo é a de saber qual
conhecimento deve ser ensinado, ou melhor, o que deve
ser ensinado e, para isso, as teorias curriculares recorrem
a discussões sobre a natureza humana, sobre a natureza
da aprendizagem ou sobre a natureza do conhecimento,
da cultura e da sociedade.
Concernente, Silva (2001, p. 11) afirma:
[...] uma teoria do currículo começaria por supor
que existe, “lá fora”, esperando para ser
descoberta, descrita e explicada, uma coisa
chamada “currículo”. O currículo seria um objeto
que precederia a teoria, a qual só entraria em
cena para descobri-lo, descrevê-lo, explicá-lo.
Ao se declinar sobre a história do currículo,
concordante com Silva (2001), percebe-se que este não
pode ser analisado fora de sua constituição social e
histórica que o circunda desde o seu surgimento, no início
servindo como instrumento de controle social, depois devido
aos interesses e necessidades da economia surge o
vislumbre de uma reestruturação que o confira ordem,
racionalidade e eficiência.
Assim, as teorias do currículo estão intimamente
envolvidas em questões de poder no momento que
enfatizam como o currículo deve ser e, desta forma, situamse num campo epistemológico social, envolvidas na
obtenção de consenso e hegemonia, do mesmo modo que
é o poder capaz de ditar uma identidade ou subjetividade
como sendo ideal, que reflete no currículo o indivíduo a ser
formado.
Anos depois, como nova tendência, busca-se
reconceituar o campo, com intenção de identificar e
eliminar aspectos contribuintes da restrição da liberdade
de indivíduos e grupos. Hoje se apresenta como um campo
de estudo, indispensável para aqueles que buscam
compreender os processos de seleção, distribuição,
organização e ensino dos conteúdos curriculares e a
estrutura de poder em todo o seu contexto social.
Ainda nesse ínterim é que a questão do poder se
relaciona com a diferenciação das teorias curriculares,
podendo ser assim melhor exemplificadas:
Explicitando melhor a importância do currículo, fazse respeitável os apontamentos de Moreira; Silva (2005,
p.08) que o definem como sendo:
101
as teorias tradicionais pretendem ser apenas
isso:
“teorias”
neutras,
científicas,
desinteressadas. As teorias críticas e as
teorias pós-críticas, em contraste, argumentam
que nenhuma teoria é neutra, científica ou
desinteressada,
mas
que
está,
inevitavelmente, implicada em relações de
poder (Id., 2001,p.16).
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Em breve análise, constata-se que as teorias tradicionais acabam por se concentrar em questões técnicas, não
questionam o que ensinar e sim se preocupam com a organização, concentrando-se em como fazer o currículo, tendo
esse como veiculador de ideologias, em geral elas dão a questão “o que?” como dada, como óbvia e desta forma se
preocupam a responder outra questão, “como?”. Já as teorias críticas e pós-críticas, não se limitam a perguntar “o
quê?” e sim “o porquê?”, estando preocupadas com as conexões entre saber, identidade e poder (SILVA, 2001).
Apoiando-se em Silva (2001), os conceitos oriundos de uma teoria direcionam a atenção para algumas coisas
que normalmente não se veria, sendo que deste ponto de vista pode-se dizer que estas possuem a capacidade de
estruturar e organizar a forma como vemos a realidade; desta forma, a distinção das diferentes teorias curriculares se
dá pela análise dos conceitos que estas empregam e a reação humana frente a estes.
Desta forma, o quadro abaixo apresenta as Teorias do currículo e suas concepções a fim de facilitar o entendimento
e sedimentar suas contribuições no estudo.
Tabela 1: Categorias conceituais do currículo
Teorias Tradicionais
Teorias Críticas
Teorias Pós-Críticas
Ensino
Ideologia
Identidade, alteridade, diferença
Aprendizagem
Reprodução cultural e social
Subjetividade
Avaliação
Poder
Significação e discurso
Metodologia
Classe social
Saber-poder
Didática
Capitalismo
Representação
Organização
Relações sociais de produção
Cultura
Planejamento
Conscientização
Gênero, raça, etnia e sexualidade
Eficiência
Emancipação e Libertação
Multiculturalismo
Objetivos
Currículo oculto
Currículo*
Resistência
Fonte: Vessozi; Güllich; Caramão, 2007. Adaptado de Silva, 2001. Nota: * Categoria extraída de Moreira (2005)
4 PROPOSTAS CURRICULARES NA
TRAJETÓRIA DO ENSINO EM ENFERMAGEM
Os debates sobre as bases curriculares de ensino
em Enfermagem se instituem praticamente desde o
surgimento da Enfermagem como prática profissional; ao
se analisar numa perspectiva histórico-cultural evidenciase uma grande preocupação referente a um currículoformação voltado para a consciência crítica, emancipação
e humanização, assumindo questões de natureza ética,
política, social e não apenas as de ordem técnicainstrumental.
Nesse sentido, Marques (2006, p.114) acrescenta:
“os projetos da construção do conhecimento são, ao
mesmo passo, projetos de construção da sociedade. O
universal não se opõe ao particular, mas dele faz parte”.
Com vista a tal explanação é que se percebe a importância
de currículos que atendam a formação profissional a que
se almeja atualmente, onde a academia se estabeleça
em um local acima de tudo de formação de cidadãos
capazes de atender às expectativas da sociedade,
produzindo e (re)construindo saberes e assim
transformando a sociedade em que vive.
Voltando à temática do currículo de ensino em
Enfermagem, em todas as mudanças curriculares no
ensino de enfermagem no Brasil, denuncia-se a
predominância do modelo médico/hospitalar no ensino de
graduação. A legislação sobre o ensino de enfermagem
desde a criação da Escola Anna Nery, compreendendo os
currículos de 1923, 1949, 1962 e 1972, revela que a
formação do enfermeiro era centrada no pólo indivíduo/
doença/cura e na assistência hospitalar, seguindo o
mercado de trabalho específico de cada época.
As mudanças surgidas nos anos 80 referentes à
saúde trazem o intuito de melhoria do sistema vigente,
102
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
permeada pelos pressupostos de equidade, integralidade
e universalidade, como princípios norteadores das políticas
no setor saúde, exigindo profissionais com formação
generalista, capazes de atuar em diferentes níveis de
atenção à saúde.
Assim, esta época foi marcada por constantes
discussões entre entidades de classe, escolas e
instituições de saúde a respeito da necessidade de
reformulação do currículo de 1972, pois o mesmo não seria
mais capaz de atender às necessidades impostas pelo
setor da saúde no Brasil.
As reformas curriculares nos sistemas
educativos
desenvolvidos
obedecem
pretensamente à lógica de que através delas
se realiza uma melhor adequação entre os
currículos e as finalidades da instituição escolar,
ou a de que com elas se pode dar uma resposta
mais adequada à melhora das oportunidades
dos alunos e dos grupos sociais (SACRISTÁN,
1998, p. 18).
Resultante desta problemática, a ABEn, como um
dos autores firmemente engajados nesse processo de luta,
desencadeia um amplo debate a respeito da reformulação
do currículo de Enfermagem por meio de Seminários
Nacionais e Regionais, mobilizando docentes, discentes
e profissionais dos serviços objetivando, a construção
coletiva de um projeto educacional para a Enfermagem.
Como resultado, a troca de experiências e a riqueza
das discussões geradas nesse movimento subsidiaram o
Parecer 314/94 do então CFE, homologado pela portaria
1.721 do Ministério da Educação que, em 15/12/1994,
concluiu uma nova proposta curricular sendo que este prevê
a formação do enfermeiro em quatro áreas: assistência,
gerência, ensino e pesquisa. Tem como pressuposto a
educação como possibilidade de transformação, centrada
no desenvolvimento da consciência crítica, levando o
enfermeiro à reflexão sobre a prática profissional e ao
compromisso com a sociedade (TEIXEIRA et al., 2006).
Em 1994, a ABEn cria os Seminários Nacionais de
Diretrizes para a Educação em Enfermagem (SENADEns),
que trouxeram significativas contribuições na construção
DCGENF. Estes, além de constituírem novos espaços para
o aprofundamento das discussões, ainda auxiliam na
construção das políticas e propostas que dizem respeito
à Enfermagem.
Desde o seu invento, o SENADEn contribui
significativamente para as discussões acerca das bases
curriculares que sedimentam o ensino de Enfermagem e
as novas perspectivas para o seu ensino e sua prática
profissional, antes realizado bienalmente desde 2002.
Devido a sua importância e contribuição para o processo
de formação do(a) enfermeiro (a), a categoria solicitou sua
realização anual.
Em 1996 é aprovada a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional-(LDBEN), Lei 9.394 de 20 de dezembro
de 1996, esta estabelece as diretrizes e bases da educação
no país, abrindo espaço para a flexibilização dos currículos
de graduação, para a expansão de cursos e vagas na
educação superior, além de direcionar a construção de
Diretrizes Curriculares para cada curso de graduação
(BRASIL, 1996).
Segundo Galleguillos; Oliveira (2001) a LDBEN
assegura às instituições de ensino superior autonomia
didático-científica, autonomia em fixar os currículos dos
seus cursos e programas; assim, estas não têm a
obrigatoriedade em seguir a regulamentação do currículo
mínimo determinada pela Portaria 1721/94. Entretanto, esta
trouxe novas responsabilidades para as IES, docentes,
discentes e sociedade, pois permitiu a formação de
diferentes perfis profissionais a partir da vocação de cada
curso/escola, esperando melhor adaptação ao “mundo do
trabalho”.
Desta forma, o currículo não é mais o único
determinante, mas base para direcionar e orientar o ensino
de graduação em enfermagem. A atual LDBEN oferece às
escolas as bases filosóficas, conceituais, políticas e
metodológicas que devem orientar a elaboração dos
projetos pedagógicos, visando à formação de profissionais
que possam vir a ser críticos, reflexivos, dinâmicos e ativos,
diante das demandas do mercado de trabalho, a assumir
os direitos de liberdade e cidadania, compreendendo as
tendências do mundo atual e as necessidades de
desenvolvimento do país.
Cabe citar aqui os argumentos de Sacristán (1998,
p. 22):
O primeiro evento promoveu a discussão acerca das
necessidades de se propor e implantar Diretrizes
Curriculares capazes de viabilizar o desenvolvimento de
competências e habilidades que extrapolassem o simples
domínio do saber, contribuindo no processo de construção
de projetos pedagógicos que, além da organização
curricular, contemplassem a formação de profissionais
capazes de atender as demandas sociais (VALE;
FERNANDES, 2006).
103
[...] o currículo faz parte na realidade, de múltiplos
tipos de práticas que não podem reduzir-se
unicamente à prática pedagógica de ensino;
ações que são de ordem política,
administrativa, de supervisão, de produção de
meios, de criação intelectual [...], e que
enquanto são subsistemas em parte
autônomos e em parte interdependentes,
geram forças diversas que coincidem com a
prática pedagógica. Âmbitos que evoluem
historicamente, de um sistema político e social
a outro, de um sistema educativo a outro
diferente. Todos esses usos geram
mecanismos de decisão, tradições, crenças,
conceitualizações que de uma forma mais ou
menos coerente, vão penetrando nos usos
pedagógicos e podem ser apreciados com
maior clareza em processos de mudança.
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
A LDBEN trouxe novas responsabilidades para as
IES docentes, discentes e sociedade, pois permite a
formação de diferentes perfis profissionais a partir da
vocação de cada curso/escola, esperando melhor
adaptação ao mercado de trabalho, já que as instituições
de ensino terão a liberdade para definir parte considerável
de seus currículos plenos.
A partir da LDBEN (9394/960), o Parecer 1133 do
CNE/CES reforça a necessidade de articulação entre
educação superior e saúde, objetivando a formação geral
e específica dos egressos/profissionais, com ênfase na
promoção, prevenção, recuperação e reabilitação da
saúde; após este, foi aprovada a Resolução CNE/CES Nº
3 de 7 de novembro de 2001, que definiu as DCGENF,
elaborada tanto nos documentos encaminhados pelas IES
e pela ABEn como, principalmente, pelo documento
“modelo de enquadramento das propostas de diretrizes
curriculares” formulado pelo Departamento de Políticas de
Ensino Superior SESu/ MEC.
A proposta privilegia a formação do enfermeiro
critico e reflexivo com competência técnico-científico-éticopolítico social-educativa, o que se percebe em breve análise
ao fragmento do Parecer 1133 do CNE/CES de 2001, que
define o perfil/egresso dos estudantes de Enfermagem:
- atuar profissionalmente compreendendo a
natureza humana em suas diferentes
expressões e fases evolutivas; -incorporar a
ciência/arte do cuidar como instrumento de
interpretação e de intervenção profissional; estabelecer novas relações com o contexto
social, reconhecendo a estrutura e as formas
de organização social, suas transformações e
expressões; -compreender a política de saúde
no contexto das políticas sociais, reconhecendo
os perfis epidemiológicos das populações; reconhecer as relações de trabalho e sua
influencia na saúde; -reconhecer-se como
sujeito no processo de formação de recursos
humanos; -dar respostas às especificidades
regionais de saúde através de intervenções
planejadas estrategicamente; -comprometerse com os investimentos voltados à solução
de problemas sociais; -sentir-se membro do
seu grupo profissional.- reconhecer-se
responsável pela coordenação do trabalho da
equipe de enfermagem. -identificar fontes,
buscar e produzir conhecimentos para o
desenvolvimento da prática profissional; buscar sua constante capacitação e atualização
(BRASIL, 2001, p. 18).
associando o máximo de qualificação acadêmica com o
máximo de compromisso social, sinalizando na direção
da superação da fragmentação do conhecimento até então
presente (SCHERER; SCHERER; CARVALHO, 2006).
Complementando, para Santana et al. (2005, p.298):
na área da enfermagem, o desafio do contexto
social requer competências profissionais que
implicam novos modos de saber, fazer e ser do
(a) enfermeiro (a) e de sua equipe nos serviços
de saúde em todos os níveis de atenção. O
desenvolvimento dessas competências
possibilita a ampliação da capacidade de
leitura da realidade e a compreensão do
processo saúde-doença como prática
socialmente determinada.
Em síntese, ao analisar toda a trajetória da
constituição do ensino de Enfermagem no Brasil descrita
aqui, percebe-se que o ensino de enfermagem está inserido
no atual momento educacional brasileiro em que as
oportunidades para a produção do conhecimento devem
somar-se à consciência crítica do aluno, considerando
todos os aspectos de ensino, tanto formal como também
o aprendizado adquirido e produzido no contexto do
indivíduo, pesquisa ou extensão para a aprendizagem.
5 ANÁLISES INICIAIS
5.1 O CBEN E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA
A ENFERMAGEM BRASILEIRA E AS TEORIAS
CURRICULARES PRESENTES NO SEU
ENREDO
O CBEn desde sua criação em 1947, é até hoje o
principal e maior evento da categoria, reportado como uma
das mais importantes realizações da ABEn e fonte de
inspiração do desenvolvimento da enfermagem brasileira.
As discussões originadas em cada edição do congresso
são notórias, direcionando ações em benefício da
Enfermagem, fomentando assim o desenvolvimento desta
no país.
Fica claro o compromisso e a responsabilidade da
educação superior com a formação de profissionais
competentes, engajados na busca de transformação e de
cidadãos que possam atuar, não apenas em sua área de
formação, mas também no processo de transformação da
sociedade.
Nesse sentido, as novas diretrizes curriculares para
o curso de enfermagem têm adotado perspectivas mais
humanistas. É esperado que a instituição universitária
esteja comprometida com o destino dos homens,
104
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Tabela 2: Demonstrativo dos trabalhos apresentados e analisados
Total de
Trabalhos
Anos
2002
2003
2004
2005
2006
Número de trabalhos apresentados
39
*
**
23
*
**
32
*
**
26
*
**
25
*
**
144
Números de trabalhos analisados no
estudo
26
19
18
21
18
102
Fonte: Vessozi; Güllich; Caramão, 2007.
Nota: * Sessão Ensino/Educação; ** Sessão Formação Profissional. Resumos extraídos da Sessão Ensino/Educação e de Formação
Profissional dos Congressos Brasileiros de Enfermagem de 2002 até 2006.
As edições do CBEn se realizam anualmente,
exceto nos anos de 1953 e 1961, reunindo os enfermeiros
de todas regiões do país, promovendo desta forma um
espaço de produção, reflexão e corroboração no saberfazer da Enfermagem. Felizmente hoje o CBEn recebe
grande número de trabalhos nas mais diferentes áreas
favorecendo e instigando cada vez mais a pesquisa. As
sessões de Formação Profissional e Ensino/Educação são
as que congregam os estudos no âmbito do ensino de
Enfermagem propriamente dito e suas inter-relações
(profissão, academia e docência), favorecendo, deste
modo, discussões acerca de novos saberes e novas
perspectivas para a área.
Tal fato se faz significante, pois, de acordo com Polit;
Beck; Hungler (2004), espera-se que as enfermeiras
mantenham um bom nível de envolvimento com a pesquisa,
bem como a utilização destas em sua prática, percebendo
e explicando fenômenos que devem ser considerados no
planejamento e atendimento de Enfermagem.
A demarcação realizada na Tabela 3 tem como
desígnio reforçar a estrutura metodológica que constitui o
modo de análise temática, facilitando o reconhecimento
das categorias encontradas dentro do discurso de cada
trabalho, para que delas possa ser feito a corroboração
com as categorias bases do currículo, à luz da teoria de
Silva (2001), possibilitando assim a compreensão dos
trabalhos, suas lógicas e processos através da teorização.
Deste modo, torna-se possível tracejar o currículo e
as bases que fundamentam e ou expressam os modos de
sua produção e de seu processo: constructo históricocultural em essência, percebidos dentro nos trabalhos
publicados nesses últimos 5 anos no CBEn.
Nesse ínterim, a análise que valida este estudo se
consolidou a partir dos trabalhos apresentados e publicados
nos Anais do CBEn de 2002 a 2006, dentro das sessões
Ensino/Educação e Formação Profissional, totalizando um
montante de 144 trabalhos, sendo que destes somente
102 convieram aos propósitos do estudo, como exposto
na Tabela 2.
A apreciação da Tabela 2 evidencia de forma clara
que os trabalhos apresentados sobre o ensino de
Enfermagem apresentam uma constância no que se refere
à quantidade dentro do período de análise, podendo-se
destacar somente o ano de 2002, onde houve uma maior
publicação sobre a temática, da mesma forma que foi o
ano que mais apresentou trabalhos que se enquadraram
ao estudo.
Posteriormente à averiguação da totalidade da
amostra, buscou-se, dentro do enredo do CBEn presente
nos trabalhos analisados sobre o ensino de Enfermagem,
categorizar os trabalhos por temática, através da leitura
minuciosa de cada resumo, no intuito de identificar a quais
teorias curriculares estes pertenciam.
105
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Tabela 3: Temáticas e teorias curriculares encontradas no discurso dos trabalhos
analisados do CBEn
Ano
Nº de trabalhos
por Tema
Temática
Teoria Curricular Base
2002
10
Processos Ensino-Aprendizagem
Tradicional
02
As Relações Humanas e Trabalho
Pós-crítica
06
Novas perspectivas
Pós-crítica
04
A pesquisa
Pós-crítica
04
Prática Profissional
Crítica/Tradicional
08
Processos Ensino-Aprendizagem
Crítica/Tradicional
02
As Relações Humanas e Trabalho
Tradicional/Crítico
03
Novas perspectivas
Pós-crítica/Tradicional
02
A pesquisa
Crítico/Tradicional
04
Prática Profissional
Histórico-cultural/Crítico
09
Processos Ensino-Aprendizagem
Tradicional/Históricocultural/Crítico
04
As Relações Humanas e Trabalho
Tradicional/Crítico
02
Novas perspectivas
Tradicional
0
A pesquisa
-
03
Prática Profissional
Tradicional
10
Processos Ensino-Aprendizagem
Tradicional/Pós-crítico/Crítico
03
As Relações Humanas e Trabalho
Crítico/Tradicional
03
Novas perspectivas
Tradicional
04
A Pesquisa
Crítico/Histórico-cultural
01
Prática Profissional
Tradicional
04
Processos Ensino-Aprendizagem
Tradicional
02
As Relações Humanas e Trabalho
Pós-crítico/Crítico
03
Novas Perspectivas
Crítico/Pós-crítico/Tradicional
05
A Pesquisa
Tradicional/Pós-crítico
04
Prática Profissional
Crítico/Tradicional
2003
2004
2005
2006
106
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Desta forma, evidencia-se que dentro dos trabalhos
analisados, cinco temáticas base, as quais denotam a
preocupação com diferentes áreas: processos de ensinoaprendizagem, as relações humanas e trabalho, novas
perspectivas, a pesquisa e a prática social.
Nesse contexto, pode-se verificar que aqueles
preocupados com os processos de ensino-aprendizagem
ainda são maioria, apresentando-se em maior número em
cada ano analisado na amostra.
Tais trabalhos se caracterizam dentro do currículo
Tradicional, prevalecendo a concepção tecnicista da
educação com aporte na perspectiva positivista de ciência,
Maldaner (2003), a qual se sedimenta na racionalidade
técnica, em que ainda predomina a preocupação em
diversificar as metodologias de ensino e não em constituir
investigações sobre a dinâmica deste processo (GÜLLICH,
2003).
Segundo Maldaner (2003), currículos de formação
profissional, com base na racionalidade técnica derivada
do positivismo, tendem, exatamente, a separar o mundo
acadêmico de mundo da prática e, assim, manter o
monopólio da pesquisa.
Nestes currículos, separa-se pensamento e ação,
teoria e prática, mundo acadêmico e mundo do dia-a-dia;
para tanto, as raízes destas dicotomias devem ser
buscadas em uma visão particular de ciência e de profissão
e não na ciência em geral ou nas profissões em geral
(SCHÖN, 2000), desfazendo-se estes enganos que
estruturam o atual ensino/currículo de Enfermagem.
Os problemas dentro de tais currículos se abstraem
das circunstâncias concretas e da vivência da prática
profissional, situação indispensável na constituição dos
conhecimentos no que se refere à Enfermagem, mas estes
não permitem a prática reflexiva dentro da própria prática,
dedicam-se apenas ao observado, ao sentido, ao
conhecido, esquecem-se do pensar, do refletir, tornandose frágeis e inseguros frente às necessidades de conhecer
e refletir nas situações de vivências e práticas.
Sacristán (1998) respalda que é a crítica ao que
está aí posto, como meio de opor-se ao tradicional, ao
não discutível, não negociável, que permeia uma alternativa
e uma perspectiva reflexiva, capaz de entender que o
conhecimento admitido no currículo deve ser o resultado
de um consenso, objeto de revisões e críticas, resultando
de uma deliberação democrática constante.
Percebem que um currículo que se diz crítico deve
permear produção do conhecimento no ato de criar e
(re)criar o coletivo e, assim, a constituição crítica da
realidade.
mas desenvolver conceitos que nos permitam
compreender o que o currículo faz (SILVA, 2001,
p. 30).
Esta explanação vem ao encontro do que se busca
dentro do Ensino de Enfermagem, a reflexão sobre a
prática, no intuito de (re)transformá-las, de se perceber,
de estar presente-na-ação (SCHÖN, 2000), indo além,
envolvendo-se na ação, exercitando o pensamento,
compreendendo que o pensar durante a ação possibilita
alterá-la sem interrompê-la, mesmo que nem sempre.
Diferenciam, ainda, da perspectiva crítica do
currículo, os estudos que se estabelecem como
possibilidades de categorias, tais como: significação,
subjetividade, identidade, diferença e saber-poder; nestes,
percebe-se a busca pelo discurso e pela contextualização,
na ânsia de atribuir um significado ao ensino de Enfermagem
e sua prática, do mesmo modo que buscam a reflexão, a
inter-locução e subjetivação, através da mediatização
(VIGOTSKI, 2001).
Concernente ao exposto, pode-se dizer que eis a
busca pela fundamentação e validação dos conhecimentos
e, desta forma, tomar para si o saber como forma de poder
de outrora, de constituir, de recriar. Então, quando os atores
sociais de ensino de Enfermagem compreendem que esse
ensinar e todas as suas relações que o circundam,
diferencia-se daquele entendido dentro da concepção
mecanicista/tradicional, apoderam-se dele, concebendose outras e novas expressões, e, por conseguinte, outras
formas de produzir e pensar o currículo formador (GÜLLICH,
2003).
Percebe-se, então, que as teorias pós-críticas do
currículo apontam para um novo campo, o das
representações e subjetividades na relação dialógica entre
os sujeitos e destes com o meio, com o senso comum e
com a cultura. Deixam-se de lado as críticas apenas por
se fazer criticar e descobre-se a diferença, as
subjetividades, o discurso da ação (HABERMAS, 1989;) e
seus inter-relacionamentos dentro do processo de
conhecimento, “assume-se a cultura como significação,
na certeza que todo conhecimento, na medida em que se
constitui num sistema de significação, é cultural” (SILVA,
2001, p.139), assim o currículo é perspectivas que
direcionam à discussão e, sendo assim, a andar, a
percorrer, incursionando erros e, desta forma, aprendendo
a refazer.
O currículo faz história, narra aprendizagens, fazse social, instigando a aprender com ele, a compreender
sua totalidade histórica e pedagógica e a lê-lo como um
documento de identidade (GÜLLICH, 2003).
As teorias críticas são teorias de desconfiança,
questionamento e transformação radical. Para
as teorias críticas o importante não é
desenvolver técnicas de como fazer o currículo,
107
O currículo é lugar, espaço, território. O currículo
é relação de poder. O currículo é trajetória,
viagem, percurso. O currículo é autobiografia,
nossa vida; Curriculum Vitae: No currículo se
forja a nossa identidade. O currículo é texto,
discurso, documento. O currículo é documento
de identidade (SILVA, 2001, s.p).
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
Baseando-se nesse argumento, serve ainda, como
referência para outras áreas do conhecimento, como um
arquétipo de como se modela um currículo, e como se
delineia enquanto elo formador e como constitui suas
representações, enquanto instituído e instituinte. Deste
modo, Enfermagem, ensino e currículo, conversam/
dialogam de uma forma mais estreita, discutem, por assim
dizer e, discutindo, edificam formação e história.
O movimento discursivo emergente desta análise
apresenta uma descontinuidade característica, ou seja,
percebe-se que este não se trata de um movimento ventral
e/ou, horizontal; muito pelo contrário, verifica-se que este
se processa de maneira ondular dentro da cada ano
analisado, o que demonstra que o enredo dos discursos
oscila dentro das diferentes tipologias de currículo e suas
abordagens (Tradicional, Crítica e Pós-Critica) como define,
Silva (2001).
Perceber o movimento discursivo em profundidade
e em perspectiva permite levantar novos olhares, novas
perguntas e possibilidades, perceber e reforçar que é
assim, pois não há teoria que extermine outra teoria, são
diferentes teorias, diferentes olhares, diferentes
intencionalidades que coexistem, permanecem, dialogam
e se refazem e, neste embate, podem se (re)produzir outras
possibilidades, outra teorias, outras práticas.
em fixar os currículos dos seus cursos e programas. Assim,
as universidades não têm a obrigatoriedade em seguir a
regulamentação do currículo mínimo determinada pela
Portaria 1721/94. No momento atual, o currículo não é mais
o único determinante, mas base para direcionar e orientar
o ensino de graduação em enfermagem. A atual LDBEN
oferece às escolas as bases filosóficas, conceituais,
políticas e metodológicas que devem orientar a elaboração
dos projetos pedagógicos. A LDB visa à formação de
profissionais que possam vir a ser críticos, reflexivos,
dinâmicos, ativos, diante das demandas do mercado de
trabalho.
Perceber a preocupação com o currículo no ensino
de Enfermagem e igualmente com as DCGENF e seus
desígnios dentro do movimento discursivo do CBEn se faz
gratificante, pois denota a inquietação de profissionais,
docentes e discentes ante a constituição de um currículo
que permeie a socialização da profissão.
É também válido afirmar que, além das discussões
acerca das diretrizes presentes nos trabalhos analisados,
os docentes brasileiros e as instituições da área de
Enfermagem têm discutido as diretrizes e seu papel
performático, identitário e curricular na formação de
Enfermagem nos CBEns e igualmente nos SENADEns,
afim de discutir a pertinência, rumos e aplicações destas
na perspectiva da práxis de Enfermagem.
6 CONCLUSÃO
O ensino de enfermagem no país passou por várias
fases de desenvolvimento ao longo dos anos, tendo como
reflexo de cada mudança o contexto histórico da
enfermagem e da sociedade brasileira; logo, o perfil de
enfermeiros apresenta significativas mudanças em
decorrência das transformações no quadro políticoeconômico-social da educação e da saúde no Brasil e no
mundo.
Em todas as mudanças curriculares no ensino de
enfermagem no Brasil, apreende-se e se denuncia a
predominância do modelo médico/hospitalar no ensino de
graduação. A legislação sobre o ensino de enfermagem
desde a criação da Escola de Enfermagem Anna Nery,
compreendendo os currículos de 1923, 1949, 1962 e 1972,
revela que a formação do enfermeiro se centrava no pólo
indivíduo/doença/cura e na assistência hospitalar, seguindo
o mercado de trabalho específico de cada época.
No contexto histórico do ensino de enfermagem no
Brasil é importante ressaltar que, em virtude da nova Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) –
Lei n° 9.394 de 20 de dezembro de 1996, há inovações e
mudanças na educação nacional, onde é prevista uma
reestruturação dos cursos de graduação, com a extinção
dos currículos mínimos e a adoção de diretrizes curriculares
específicas para cada curso.
A nova LDBEN assegura às instituições de ensino
superior autonomia didático-científica, bem como autonomia
A teoria curricular e a educacional apontam a
necessidade de se compreender o currículo além de suas
dimensões técnico-pedagógicas, entendendo-o como um
ato de renovação e compromisso social (SILVA, 2001).
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109
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
A CONTRIBUIÇÃO DOS ENFERMEIROS PARA O
SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE NAS UNIDADES
BÁSICAS DE SAÚDE
Seloi da Rosa Weber1
Mirian Herath Rascovetzki2
Sociedade Educacional Três de Maio3
ABSTRACT
RESUMO
Esta pesquisa objetiva identificar as contribuições
dos enfermeiros ao Sistema Único de Saúde. Utilizou-se
delineamento qualitativo, tipo exploratório, sendo que a
produção dos dados realizou-se por meio de entrevista
estruturada com questões abertas, gravadas e transcritas
posteriormente, empregando-se o universo existente. Os
resultados foram avaliados pela análise de conteúdo,
buscando-se abrir espaço ao conhecimento do processo
de trabalho. Constatou-se que a finalidade das ações é o
bem-estar do usuário e que, além de todo o material
específico utilizado, a bagagem intelectual foi considerada
o instrumento mais importante à realização do trabalho,
objetivando-se a co-responsabilidade por parte do usuário
quando se trata dos produtos esperados. A contribuição
ocorre tanto pela coordenação das equipes como pelo
atendimento educacional e assistencial, sendo que para
isso utilizam-se da prática da clínica ampliada. Apesar da
distorção do valor de uso entre os profissionais de saúde
acham que isso não os põe em situação de desprestígio.
A maior lacuna é a questão da referência e contrareferência, ainda não consolidada. Como proposta para
melhoria, acha-se necessário mudar o perfil acadêmico,
visando acompanhar as mudanças que vêm ocorrendo no
setor saúde e uma maior aproximação das universidades
à prática realizada. Desta forma, a discussão sobre a
temática evidencia a atuação do enfermeiro como agente
de transformação social.
Palavras-chave: Contribuição. Enfermeiros. Sistema
Único de Saúde. Unidades Básicas de Saúde.
This study intends to identify the contributions of
the nurses to the Sistema Único de Saúde (SUS). A
qualitative delineation of exploratory type and data
production through structuralized interview with open
questions was used, recorded and transcribed later, making
use of the existing universe. The results had been evaluated
by the content analysis, trying to open a space to the
knowledge of the work process. It was evidenced that the
purpose of the actions of the welfare of the user and that
beyond all the used material, the intellectual knowledge
was considered the most important instrument to the work
done, objectifying the co-responsibility on the part of the
user when it is about of expected products. The contribution
occurs as of the staff coordination as the educational and
assistant attendance, being that for this they use the
extended clinic practice. Despite the distortion of the value
of use existing among the health professionals they think
that this doesn’t put them in lack of prestige situation. The
biggest gap is the question of the reference and counter
reference that are not consolidated yet. As proposal for
improvement it is necessary to change the academic
profile, aiming at to follow the changes that are occurring
in the health sector and a bigger approach of the universities
to the performed practice. Thus, the discussion about the
thematic evidences the performance of the nurse as a
social transformation agent.
Key words: Contribution. Nurses. Sistema Único de
Saúde. Basic Health Units.
1
Acadêmica do 8º semestre do Curso Bacharelado em Enfermagem SETREM.
Enfermeira e Docente do Curso Bacharelado em Enfermagem SETREM.
3
Av. Santa Rosa, 2504, Três de Maio – RS [email protected]
2
110
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
1 INTRODUÇÃO
de uma hipótese e aprofunda seu estudo nos limites de
uma realidade específica, buscando maior conhecimento.
A presente pesquisa se constitui de um estudo
acerca das contribuições dos enfermeiros para o Sistema
Único de Saúde (SUS) nas Unidades Básicas de Saúde
(UBS) no intuito de poder demonstrar informações
pertinentes aos profissionais da área da saúde, buscandose promover um repensar crítico sobre a prática e papel
do enfermeiro frente ao sistema vigente.
Leva-se em conta que o processo de
redemocratização do país na década de 80, com a
ampliação da organização popular e a emergência de
novos atores sociais, produziu o aumento das demandas
sobre o Estado e desencadeou um forte movimento social
pela universalização do acesso e pelo reconhecimento da
saúde como direito universal e dever do Estado, sendo
que o Movimento da Reforma Sanitária reuniu atores
diversificados em uma batalha política pelo reconhecimento
da saúde como direito social, pela universalização do
acesso aos seus serviços e pela integralidade da atenção
à saúde. As mudanças sucessivas, nessa época,
terminaram com a aprovação, na Assembléia Nacional
Constituinte, da Constituição Federal (CF) de 1988, no
SUS.
A pesquisa visou conhecer o processo de trabalho
dos enfermeiros que atuam na saúde coletiva. Assim sendo,
este estudo se apoiou na pesquisa qualitativa que, de
acordo com Minayo (2007), “responde a questões muito
particulares. Ela se preocupa nas Ciências Sociais, com
um nível de realidade que não pode ou não deveria ser
quantificado” (p.21).
A produção dos dados foi realizada por meio de
entrevista estruturada, organizada com questões abertas,
permitindo ao entrevistado transcorrer livremente sobre o
tema. O questionário foi gravado e transcrito com posterior
análise do conteúdo. As entrevistas aconteceram nas
Unidades de Saúde da Família e UBS de um município da
região Noroeste do estado do Rio Grande do Sul (RS).
Levando-se em consideração que o número de
sujeitos participantes da pesquisa foi pequeno, utilizou-se
o universo existente, para que com este campo amostral
se conseguisse representar com maior fidedignidade as
características estabelecidas. Foram denominados de Enf.
e classificados numericamente (1,2,3...), objetivando-se
manter o anonimato mesmos.
Assim sendo, sabe-se que é nos campos práticos
onde de fato se acompanha o trabalho dos enfermeiros da
saúde coletiva e, seguindo a linha de pensamento voltada
ao modelo preventivo da forma assistencialista, percebese a importância da realização de um estudo no que tange
ao conhecimento do processo de trabalho, o que realmente
é feito por estes profissionais, quais os instrumentos de
trabalho, objetos, objetivos, finalidade e se os resultados
realmente são efetivos.
No que tange às precauções éticas relacionadas
às pesquisas que envolvem seres humanos, foi respeitado
o que propõe a resolução 196/96 do Conselho Nacional de
Saúde (CNS) e do Ministério da Saúde (MS). Foi realizado
também um termo de consentimento à instituição municipal
de saúde, tendo em vista as considerações dos aspectos
éticos e legais nas pesquisas.
Nesta perspectiva, acredita-se que a
presente pesquisa possibilite um conhecimento mais
amplo do desenvolvimento da história das políticas de
saúde, bem como do processo de trabalho do enfermeiro.
E, além do mais, servirá como subsídio aos profissionais
de saúde que, ao exercerem suas funções, poderão
reorganizar-se na realização do seu processo de trabalho
com a adoção de políticas públicas que invistam na
população, contribuindo à qualidade do atendimento
empregado aos usuários.
3 AS POLÍTICAS DE SAÚDE NO BRASIL
2 METODOLOGIA
Este estudo teve um delineamento qualitativo, do
tipo exploratório, com o intento de se obter maior clareza,
brevidade e aproveitamento dos dados produzidos de
acordo com os objetivos propostos anteriormente. Segundo
Trivinõs (1987), o estudo exploratório permite ao investigador
aumentar sua experiência em torno do problema, pois parte
As políticas de saúde, enquanto ações objetivas
sob responsabilidade do Estado, começaram a existir
somente no início do século XX, pois naquela época a
principal fonte de renda da economia brasileira era a
agricultura e a exportação. As cidades onde se localizavam
os portos tinham papel de destaque, uma vez que a
exportação era realizada através de navios. É nesse quadro
que o governo começa a atuar na saúde pública,
preocupado com os trabalhadores das capitais, das
cidades portuárias e com aqueles que trabalhavam nos
portos (MELO; CUNHA; TONINI, 2004).
Conforme os autores supracitados, foi a partir da
Revolução de 1930, quando Getúlio Vargas assumiu a
presidência da República, que começou a se intensificar
o processo de industrialização e urbanização. Surgiram
muitas fábricas e com elas empregos. As indústrias
trouxeram um rápido crescimento às cidades em que se
instalavam. Nessa época, começou-se a observar um novo
111
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
tipo de direito à saúde, voltado às pessoas com trabalho
formal.
De acordo com Costa; Carbone (2004), expressando
o conceito assinalado, a CF de 1988 criou o SUS, formado
por uma rede de serviços regionalizada, hierarquizada e
descentralizada, integrado pelas três esferas de governo,
onde a comunidade também teve sua participação
regulamentada através das Leis Orgânicas da Saúde (LOS),
Leis 8.080/90 e 8.142/90.
Com a NOB/96 ficaram definidos os papéis em
nível municipal, estadual e federal no que tange ao SUS.
Reafirmado também o papel das comissões intergestoras
no processo de articulação entre os gestores, além de
oferecer tetos financeiros para todas as esferas de governo.
3.1 UNIDADES BÁSICAS DE SAÚDE
As UBS foram criadas para atender a crescente
necessidade de saúde da população, produzidos pelos
diversos problemas que afetavam as suas vidas. Pensados
como “porta de entrada” do sistema público de serviços
de saúde a partir de 1970, como proposta de atenção
primária a saúde, pois até então somente tinham acesso
as pessoas vinculadas ao mercado de trabalho formal.
Nesse contexto, percebia-se a necessidade de estender
a assistência à saúde para toda a população (BERTUSSI;
OLIVEIRA; LIMA, 2001).
A intenção era organizar o Sistema de Saúde a
partir da atenção básica à saúde, principalmente a partir
da rede de UBS, rompendo com a idéia de atenção
centrada no baixo custo, simplificada e com poucos
equipamentos. Cabendo ao nível municipal as
responsabilidades de atenção básicas à saúde e de gestão
de serviços de atenção à saúde, percebendo que a
proximidade com a população permite reconhecer melhor
as verdadeiras necessidades.
territorialização, vinculação com a população, garantia de
integridade na atenção, trabalho em equipe com enfoque
interdisciplinar, estímulo à participação da comunidade,
ênfase na promoção da saúde, com fortalecimento das
ações intersetoriais. (PEREIRA et al. 2004).
A USF pode atuar com uma ou mais equipes,
sendo composta, no mínimo, por um médico generalista,
enfermeiro, auxiliar de enfermagem e agentes comunitários
de saúde (ACS). E como assinala Bertussi; Oliveira; Lima
(2001) tem o objetivo de ser resolutiva, com profissionais
capazes de identificar e propor intervenções aos problemas
de saúde mais comuns e manejar novos saberes e, a partir
destes, promover hábitos de vida saudáveis.
No entanto, para conseguir dar conta das diversas
demandas, é necessária a inclusão de equipes de
multiprofissionais e a interação com outros setores, pois
conforme Brasil (2003), não atuará somente como porta
de entrada, será responsável, também, por todo o plano
terapêutico, mesmo que este seja realizado por serviço
especializado.
3.3
O PROCESSO DE TRABALHO
DO ENFERMEIRO
Rocha; Almeida (1997) descrevem o processo de
trabalho como sendo o modo que o homem utiliza para
produzir e reproduzir sua existência. Ao fazê-lo, estabelece
relações sociais e objetiva sua atividade. Para D’Innocenzo;
Adami; Cunha (2006):
o componente processo corresponde à
prestação da assistência segundo padrões
técnico científicos, estabelecidos e aceitos na
comunidade científica sobre determinado
assunto e, a utilização dos recursos nos seus
aspectos quanti-qualitativos. Inclui o
reconhecimento de problemas, métodos
diagnósticos, diagnóstico e os cuidados
prestados (p. 85).
3.2 PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA
Com os avanços na construção do SUS houve um
aumento da cobertura dos serviços em todos os níveis de
complexidade, com ênfase especial na Atenção Básica,
por intermédio do Programa de Agentes Comunitários de
Saúde (PACS) e do Programa Saúde da Família (PSF),
abrindo mais um espaço de mudança do modelo de
atenção, possibilitando passar do atendimento de demanda
ao atendimento por responsabilidade sanitária.
Após o surgimento da idéia de descentralização e
a municipalização dos serviços de saúde, em 1994 nasceu
a proposta do PSF, pois era um desafio a implementação
efetiva do SUS, valorizando os princípios de
Por isso é muito importante a enfermagem
identificar e entender o seu processo de trabalho, o que
ela identifica como sendo objeto e finalidade, pois, de
acordo com Fracolli; Granja (2005), a análise do processo
de trabalho em saúde, das características e condições de
inserção da enfermagem neste processo, possibilita
desenhar com clareza qual o objeto de intervenção da
enfermagem, seja ele um indivíduo, uma família ou uma
comunidade.
Conhecer mais profundamente a área da
enfermagem implica em compreender a prática dos seus
múltiplos agentes e as articulações existentes entre elas,
112
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
bem como a articulação da enfermagem com as práticas
da saúde (MENDES; GONÇALVES apud PEDUZZI;
ANSELMI, 2002).
Como finalidade/objetivo das ações entende-se o
resultado futuro desejado, os quais definem o escopo de
todas as ações. Conforme assinala Peduzzi; Anselmi
(2002), quando dizem que é o aspecto específico, recortado
da realidade sobre o qual incide a atividade do trabalho,
não existe enquanto objeto de intervenção por si só, mas
é recortado por um “olhar” que contém uma finalidade.
De acordo com Peduzzi; Anselmi (2002), os
instrumentos de trabalho tampouco são naturais, mas
construídos historicamente pelo sujeito que estende a sua
possibilidade de intervenção sobre o objeto. Encontramse tanto instrumentos materiais quanto intelectuais, tais
como os saberes técnicos que informam e fundamentam
imediatamente a ação realizada.
Segundo D’Innocenzo; Adami; Cunha (2006), o
componente resultados correlaciona-se às conseqüências
das atividades realizadas nos serviços de saúde ou pelo
profissional em termos de mudanças percebidas no estado
de saúde dos usuários, considerando também as
mudanças relacionadas a conhecimentos e
comportamentos, bem como a satisfação do usuário e do
trabalhador ligada ao recebimento e prestação dos
cuidados.
Para a clínica ampliada é fundamental expandir o
objeto, agregando não somente as doenças, mas também
as situações de risco ou vulnerabilidade das pessoas, pois
se considera essencial a ampliação da finalidade do
trabalho clínico, buscando a produção de saúde por
distintos meios, objetivando o aumento do grau de
autonomia dos usuários (CAMPOS; AMARAL, 2007).
Assim sendo, a clínica ampliada se baseia na
construção de responsabilidade singular e de vínculo
estável entre equipe de saúde e usuário, abandonando a
tradição parcelar de especialização e responsabilidade por
procedimento, reorganizando o trabalho em equipe.
Conforme Campos (2000), o resultado do trabalho
se materializa em produtos e estes assumem a forma de
bens ou serviços. No capitalismo, os produtos têm um
duplo valor: valor de troca e de uso, sendo que o valor de
troca garante que os produtos circulem como mercadorias
e o valor de uso expressa a utilidade do produto e permite
sua realização, isto é, seu consumo.
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS
RESULTADOS
4.1 PERFIL DOS ENTREVISTADOS
Por meio dos dados produzidos foi possível traçar o
perfil da população-objeto do campo amostral, onde se
percebe a existência de trabalhadores nas mais diversas
faixas etárias, demonstrando que existem diferenças e que
estas podem trazer benefícios ao sistema, levando-se em
consideração o ano de formação de cada participante e a
história de vida de cada um.
Dos sete participantes da pesquisa, seis são do
sexo feminino e um do sexo masculino, o que ainda
demonstra a feminilização no trabalho de enfermeiro, ou
seja, uma tendência do mercado de trabalho, imprimindo
uma dinâmica própria ao setor saúde. Perpassando pelos
contextos históricos ainda percebe-se características da
formação profissional que ocorrem em conseqüência da
superposição de modelos determinados por sua história.
No município em questão existem profissionais
enfermeiros que atuam há mais de vinte anos e os que
atuam há menos tempo são os que tiveram seus contratos
mais recentes, adequando-se ao mercado de saúde
coletiva, sendo isto justificável pelo evento do PSF, pois,
através do mesmo, ocorreu um aumento no mercado de
trabalho dos enfermeiros.
Somente dois dos entrevistados não possuem curso
de pós-graduação. Um participante da pesquisa está
concluindo a especialização em Saúde Pública. E o
restante dos entrevistados possui pós-graduação em nível
de especialização, cursos relacionados à Saúde Coletiva,
demonstrando que a maioria dos entrevistados está em
busca de uma adequação ao mercado de trabalho ao qual
estão inseridos.
Evidencia-se através disso, de forma clara, nas
várias modalidades existentes, que a universidade exerce
a sua responsabilidade no processo de produção social,
como assinala Desaulniers (2004), que o profissional, ao
produzir e reproduzir o capital intelectual, além de ter a
garantia poderá criar novos caminhos ao campo científico,
aliado aos demais campos sociais em que atua ou está
inserido. Um processo que dá oportunidade às
universidades para uma participação pró-ativa na relação
estabelecida com os demais campos, visando o
enfrentamento dos desafios da atualidade, no que tangem
as suas atribuições quanto à responsabilidade social.
Todos os entrevistados costumam fazer cursos de
atualização, em sua maioria oferecidos pelo MS,
ministrados por profissionais que atuam na área pública.
Cursos com exigência dentro do mercado de trabalho, e o
profissional, por sua vez, capacitado retorna ao seu local
113
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
de trabalho, tendo o compromisso de implantar as
normatizações, socializando os conhecimentos referidos.
áreas a fim de assegurar atendimento livre de riscos ao
usuário.
4.2 FINALIDADE/OBJETIVO DAS
Na enfermagem, onde o cuidar é a essência da
AÇÕES
profissão, pode-se parafrasear D’Innocenzo; Adami; Cunha
Enf.1
Enf.2
Enf.3
Enf.4
Enf.5
Enf.6
Enf.7
(2006) quando dizem que a concentração de esforços em
direção aos objetivos propostos deverá levar à melhoria
contínua desta assistência, implicando na conscientização
de toda a equipe quanto à sua importância e ao valor de
suas ações.
[...] o usuário [...] proporcionar resolutividade
frente àquilo que ele nos procura.
Promover uma melhor saúde e com isso
reduzir os riscos de doença na população.
[...] atendimento qualificado, que seja integral,
que valorize as necessidades das pessoas,
observando a sua realidade [...]
[...] melhoria de qualidade de vida de saúde da
população [...] nós não queremos somente
trabalhar a parte curativa, mas a prevenção,
né [...]
[...]
principalmente
trabalhar
o
desenvolvimento do autocuidado [...]
[...] o objetivo das ações é a prevenção, né [...]
Cuidar.
O trabalho em saúde, para ser eficaz, deve
responder a essa complexidade e dar sentido à intervenção
nos diversos campos da saúde. Por conta disso, tem-se
um leque de possibilidades de uso de diversas tecnologias
de trabalho para a produção do cuidado.
4.3 INSTRUMENTOS DE TRABALHO
Fonte: Weber; Rascovetzki, 2007.
FIGURA 1: Quadro referente à finalidade/objetivo das ações.
O trabalho é uma atividade que tem sempre uma
finalidade para que ele se realize, a qual está ligada ao
atendimento à determinada necessidade da pessoa. Para
Merhy (2006), a finalidade do trabalho em saúde é a
produção do cuidado individual ou coletivo, resultando na
cura e na saúde do cidadão e a produção do trabalho em
saúde se dá no momento exato do consumo; por isso, a
sua dinamicidade.
Dentre as falas dos enfermeiros, percebe-se que
eles ficam divididos entre a busca da resolução do
problema, atendimento qualificado, prevenção, promoção
de saúde e autocuidado. Mas, ao se analisar esta questão
mais profundamente, pode-se perceber que para haver
plenitude na produção de saúde da população deve ocorrer
a fusão de todas estas características.
Concorda-se com Campos (2003) quando o mesmo
fala que a saúde não é considerada objeto da Saúde
Coletiva ou da Clínica, mas sim uma finalidade, algo que
se procura defender ou construir, sendo que o objeto de
estudo e de intervenção dessas práticas é o risco de
adoecer, a doença, sendo que esta vulnerabilidade pode
ser induzida por situações inerentes às pessoas ou ao
contexto em que vivem, então é aí que a Saúde Coletiva
deve agir, na possibilidade dela acontecer, usando técnicas
de educação, prevenção e promoção de saúde.
Os instrumentos de trabalho utilizados pelos
enfermeiros compreendem o material de rotina,
instrumentos específicos de uso na profissão, o carro e a
bagagem intelectual agregada ao trabalho interdisciplinar,
pois é através dele, com uma equipe multiprofissional, que
se consegue desenvolver ações que vêm de encontro à
promoção de saúde da população.
Do universo das pessoas entrevistadas, a maioria
citou o conhecimento concomitante a outras, pois de nada
adianta uma infinidade de instrumentos se não tiver o
conhecimento. Pensando assim, pode-se citar Merhy
(1997), que descreve a produção do cuidado e suas
tecnologias de trabalho em saúde, complementando o que
foi dito por uma das entrevistadas.
Tecnologias duras são as que estão inscritas nas
máquinas e instrumentos; leve-duras as que se referem
ao conhecimento, por ter uma parte dura que é a técnica,
e uma leve que é o próprio modo como o trabalhador a
aplica, podendo assumir formas diferentes dependendo
sempre de como cada um trabalha e cuida do usuário; e
as tecnologias leves que dizem respeito às relações,
fundamentais para a produção do cuidado e se referem ao
jeito ou atitude próprios do profissional (MERHY, 1997).
Quando se fala em qualidade da assistência da
enfermagem como um fator para o benefício do usuário, é
importante esclarecer o que se entende por qualidade da
assistência e o que é esperado dos profissionais envolvidos
para atingi-la (D’INNOCENZO; ADAMI; CUNHA, 2006).
Assim, o movimento pela qualidade nos serviços de saúde
é hoje uma necessidade incorporada à gestão dessas
114
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
4.4
PRODUTOS/RESULTADOS enfermeiro com o cliente (D’INNOCENZO; ADAMI; CUNHA,
ESPERADOS
2006).
Enf.1 [...] a necessidade do paciente [...] aplicar
realmente uma forma de saúde coletiva [...]
mudar indicadores [...] fazer com que o
paciente seja co-responsável [...]
Enf.2 Melhora dos indicadores de saúde do
município [...]
Enf.3 [...] atendimento qualificado [...] que as
comunidades tenham mais saúde [...] onde o
paciente tenha autonomia [...] que ele tenha
a segurança de procurar uma equipe de
saúde e saber que pode contar com ela.
Enf.4 É que as pessoas entendam melhor qual é o
seu papel para cuidar de sua saúde [...]
Enf.5 [...] que essa pessoa se cuide [...] quando o
sujeito não faz do jeito que você pensou,
você tem que ter outras alternativas [...]
Enf.6 [...] que os pacientes sigam aquilo que a
gente recomenda, né [...]
Enf.7 Satisfação.
4.5 A IMPORTÂNCIA DO ENFERMEIRO
À SOLIDIFICAÇÃO DO SUS
Os enfermeiros foram unânimes ao afirmarem a sua
importância na execução e efetivação do SUS, atuando
como agentes de transformação social na produção de
saúde, pois, de acordo com um dos participantes, possuem
um olhar diferenciado, principalmente na prevenção.
Além do cuidado ao ser humano, que é a essência
da enfermagem, tem várias outras atividades que ele vem
realizando, tais como gerenciamento do serviço de
enfermagem, do PACS, consultas, prescrições de exames,
medicamentos, orientações, atividades de prevenção e
promoção. Dessa forma, pela resolutividade obtida, tornase clara a contribuição à solidificação do SUS, pois têm a
capacidade de construir o sistema, estando presentes em
todos os atendimentos do SUS.
Fonte: Weber; Rascovetzki, 2007.
FIGURA 2: Quadro referente aos produtos/resultados esperados.
Como resultado no trabalho em saúde obtém-se a
construção do espaço intercessor entre o usuário e o
trabalhador de saúde, onde o mesmo deve satisfazer as
necessidades do usuário, sendo que estas muitas vezes
são vistas como uma carência de saúde ou ainda como
um meio de ser mais autônomo no seu modo de caminhar
no mundo (MERHY, 2006).
Para Kurcgant et a.l (1991) “o produto final das
instituições de saúde é a prestação de serviços de saúde
aos clientes que recebem ações terapêuticas que não
devem sofrer qualquer interrupção” (p. 75). Ao analisar as
respostas, percebe-se a mesma linha de pensamento, ou
seja, a autonomia do sujeito, pois o que mais almejam é
provocar a co-responsabilidade do paciente. Juntamente
a isso fica evidente nas falas, que ensejam resolutividade
às necessidades do usuário, podendo realmente aplicar
uma forma de saúde coletiva.
Sabe-se que para ter uma melhora nos indicadores
do município é necessário que se tenha resolutividade nas
ações, mas, para que isso aconteça, torna-se indubitável
um atendimento qualificado, como também foi falado por
um dos participantes, que o usuário possa se sentir seguro
ao procurar o serviço de saúde.
A qualidade da assistência da enfermagem envolve
aspectos primordiais como os conhecimentos e as
habilidades, as crenças e os valores individuais,
profissionais e institucionais. Os conhecimentos que
fundamentam as ações de enfermagem constituem um
conjunto teórico, a habilidade envolve a capacidade de
cuidar, constituindo um dos alicerces da qualidade
assistencial, influenciando o padrão estabelecido para a
assistência de enfermagem que se fundamenta na
qualidade dos resultados desejados da interação do
De acordo com Sakai et al. (2001) os recursos
humanos em saúde devem manter a organização produtiva
e estarem mobilizados para o processo de transformação
do modelo assistencial que ainda vem ocorrendo e da
prática sanitária vigente, no intuito de ofertar à população
um serviço com todos os princípios e diretrizes propostos
pelo SUS. Assim sendo, percebe-se que o enfermeiro é
um facilitador de acesso entre as equipes de saúde e as
famílias, pois consegue perceber o usuário no contexto
em que o mesmo se encontra inserido.
Bernardino; Oliveira; Ciampone (2006) argumentam
que, com a Reforma Sanitária, o enfermeiro ampliou seu
campo de ação, assumindo um papel de destaque,
favorecendo a ampla participação da sociedade civil na
gestão deste processo, enquanto membro da equipe de
saúde, engajado no atual momento político brasileiro.
O papel do enfermeiro não se restringe à prestação
direta dos cuidados ou à supervisão de pessoal auxiliar ou
ainda à administração de unidades, é importante um
conhecimento bem amplo, o qual qualificará o mesmo para
desempenhar com aptidão as múltiplas funções,
contribuindo para a implantação de uma assistência de
qualidade em todos os níveis da assistência em saúde.
4.6
AMPLIADA
A PRÁTICA DA CLÍNICA
A opinião foi unânime quando questionados acerca
da prática da clínica ampliada, pois, de acordo com Cunha
(2005) ela é a transformação da atenção individual e
coletiva, de forma a possibilitar que outros aspectos do
sujeito, não apenas o biológico, possam ser
compreendidos e trabalhados pelos profissionais de saúde.
115
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
A implantação do SUS trouxe o desafio de
redirecionar as práticas, não somente as de enfermagem,
mas as práticas de toda a equipe para o atendimento
integral à saúde da população. Assim sendo, concorda-se
com Campos (2003) quando o mesmo fala que clínica
ampliada é a redefinição ampliada do objeto, do objetivo e
dos meios de trabalho da assistência individual, familiar
ou a grupos. No entanto, dependem do trabalho em equipe,
particularmente da interação interdisciplinar entre as
distintas formas de exercício clínico existentes.
Frente ao exposto e ainda de acordo com o mesmo
autor, percebe-se que tanto no diagnóstico quanto na
terapêutica, tomar elementos orgânicos, subjetivos e
sociais do processo saúde doença, implica ampliar os
meios de trabalho, modificando a escuta, a entrevista, as
intervenções, ou seja, uma reversão do modelo assistencial,
voltado à prevenção. Reformulando a clínica, tomando não
apenas a doença, mas o sujeito enfermo, o biológico, o
subjetivo e o social do processo saúde e doença,
estendendo as práticas de promoção de saúde e equipes
interdisciplinares.
Frente ao que foi mencionado, percebe-se a
importância da existência do vínculo continuado entre
profissionais e pacientes e, de acordo com o autor
supracitado, pode ser considerado um recurso terapêutico,
o qual conceitua o vínculo como sendo a circulação de
afeto entre as pessoas.
4.7
DISTORÇÃO DO VALOR DE
USO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE
Os enfermeiros, quando abordados acerca da
distorção do valor de uso, no sentido de que ela venha a
colocá-los em posição de desprestígio à efetivação do SUS,
se comparada às demais profissões de nível superior,
acreditam que existe uma distorção, principalmente em
nível salarial, mas no geral pensam que isso não os põe
em posição de desprestígio.
Apesar do desnivelamento salarial existente,
percebe-se que os enfermeiros estão bem comprometidos
com o sistema em si, pois possuem uma gama de
conhecimentos e habilidades técnicas, compromissada
com a qualidade de assistência. Desta forma, atuam como
agente de mudanças e contribuem para a melhoria dos
serviços prestados à população (D’INNOCENZO; ADAMI;
CUNHA, 2006).
integrantes da equipe de saúde, diferenciados pela natureza
específica na contribuição de cada um no processo de
trabalho, deve integrar-se para bem realizar os objetivos
finais da produção do serviço de saúde.
Frente ao exposto, nota-se que na dimensão
econômica, isto é, a permuta entre capacidade de trabalho
e salário, onde a capacidade de trabalho é entendida como
potencial de utilidade, podendo ser designada
simplesmente enquanto trabalho e tratada como
mercadoria, onde o elemento central a ser considerado
diz respeito à notável diferenciação entre as categorias
que integram a equipe, em termos da capacidade de ação
das parcelas de trabalho que entram na produção do
resultado final esperado no processo de atendimento, tem
provocado o surgimento de impasses ou situações de difícil
superação, envolvendo tanto a questão salarial como outras
formas de retribuição do trabalho ou do tempo de serviço
(SANTANA, 1993).
4.8
LACUNAS
PREENCHIDAS NO SUS
A
SEREM
Pela variedade das respostas, fica evidente a
existência de inúmeras lacunas, e o que mais chama a
atenção é a questão da intersetorialidade, pois, segundo
uma das entrevistadas, não possui no município; dessa
forma, concorda-se com Campos (2003) quando o mesmo
reconhece ser de suma importância o agir intersetorial,
procurando envolver vários organismos da sociedade civil
e do Estado na resolução dos problemas de saúde.
Outra lacuna existente é a questão da referência e
contra-referência, pois, de acordo com os entrevistados, é
feita a referência, mas a contra-referência na maioria das
vezes não volta e, de acordo com Juliani; Ciampone (1999),
“é um dos pontos mais importantes para viabilizar a
implantação do SUS, uma vez que é a partir de sua
estruturação que o encaminhamento de pacientes aos
diversos níveis de atenção torna-se possível” (p. 323).
O sistema de referência e contra-referência é a
articulação entre os níveis de complexidade. Se este fluxo
estiver bem definido pode ocorrer diminuição na demanda
dos níveis secundários e terciários, bem como diminuição
das internações hospitalares.
Conforme falado por uma das enfermeiras, existe
culturalmente uma desvalorização da enfermagem, a qual
acaba privilegiando algumas profissões, mas sabe-se que
o conhecimento em saúde não é monopólio de
determinadas categorias profissionais, e que o enfermeiro
tem um forte componente de ação transformadora da
realidade em que atua.
De acordo com Santana (1993), no âmbito do
processo de trabalho, no trato das relações entre os
116
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4.9
AO SUS
PROPOSTAS PARA MELHORIA
Enf.1 Precisamos registrar mais tudo o que for feito
[...] Que as universidades consigam trabalhar
seus egressos, com o perfil para o atendimento
em saúde coletiva [...] pra conseguir mobilizar a
população, no sentido de fazer com que eles
sejam co-responsáveis e tenham também uma
participação para qualidade e proteção de vida.
Enf.2 Na organização, desde o nível central até os
municípios e principalmente o cumprimento das
leis existentes, uma reformulação se for
necessário.
Enf.3 [...] aumentar a proximidade das instituições de
ensino superior juntamente aos profissionais de
saúde [...] É importante também à efetivação dos
profissionais no sistema [...] Pensar numa
política que valorize os métodos alternativos [...]
Pensar numa reforma da lei da responsabilidade
fiscal e também mecanismos para financiar as
alternativas ou mesmo possibilidades do SUS.
Enf.4 [...] que os profissionais trabalhem com
dedicação, vendo seu trabalho pelo SUS da
mesma forma como se estivesse em uma
instituição privada [...] Os profissionais
registrarem seus procedimentos [...]
Enf.5 [...] mais educação do povo, para entender
melhor a proposta do SUS [...] Ter algumas
coisas definidas, qual é a função do estado [...]
qual é a função dos municípios [...]
Enf.6 [...] momentos de participação da comunidade
[...] discutir juntos para que as pessoas também
se sintam envolvidas [...] Criar critérios de
utilização para o uso de medicamentos do SUS
[...]
Enf.7 [...] padronização de algumas coisas, não de
uma maneira engessada, mas de uma maneira
que seja contínua [...] A questão da
intersetorialidade [...] pra gente defender o ser
humano de maneira integral tem que ter os
outros setores envolvidos no desenvolvimento
de nossas ações [...]
Fonte: Weber; Rascovetzki, 2007.
Alguns dos profissionais também acham importante
uma melhor organização desde o nível central até o
municipal, de realmente fazerem se cumprir as leis
existentes para, nesta época de municipalização, saber
realmente qual é a função do Estado e qual é a função do
Município.
Neste mesmo questionamento, enfatizam a
necessidade dos profissionais enfermeiros registrarem
todos os procedimentos realizados, objetivando-se que isso
chegue ao conhecimento de gerenciamentos, ou seja, ao
poder de decisão, em nível de Estado ou de Ministério,
pois, a partir do momento do registro é que se conseguem
muitas melhorias, e isso demonstra que determinado
procedimento foi feito e foi feito de tal maneira, valorizando
o serviço e o sistema.
Discorrem acerca de modificações que podem ser
feitas para melhorar o sistema, como a padronização de
determinados procedimentos e o desenvolvimento de
protocolos de serviço, pois se percebe essa diferenciação
em cada unidade, mas desejam que seja de uma forma
contínua, não engessada.
A definição dos perfis profissionais, segundo uma
das entrevistadas, também é algo que deva ser definido,
pois existem profissionais atuando no sistema, sem perfil
para o mesmo. Com isso, torna-se urgente ampliar essa
rede de recursos humanos em saúde, agindo enquanto
sujeitos nesse processo de transformação das práticas
vigentes.
Uma das falas que surgiu foi a necessidade de as
universidades trabalharem os graduandos com perfil para
atuarem em saúde coletiva, como também uma
aproximação das instituições de ensino superior aos
profissionais que estão atuando, para que estes futuros
trabalhadores tenham uma visão mais prática e não fiquem
somente na teoria. Pois para Sakai et al. (2001):
FIGURA 3: Quadro demonstrativo das alternativas de melhoria ao
SUS.
[...] o desafio que as universidades enfrentam,
na educação dos profissionais de saúde, é o
de rever o seu papel na formação dos
profissionais de saúde, através de uma
mudança nos currículos dos cursos da área
da saúde e com um modelo pedagógico que
permita ao aluno aprender, seja ético, humano
e que seja competente, beneficiando a
população (p. 121).
No quadro acima, apresentam-se alguns
discursos dos enfermeiros no que tange às propostas para
melhoria do SUS, levando-se em consideração que o
sistema de saúde brasileiro vem sofrendo constantes
mudanças desde o século passado, acompanhando as
transformações socioculturais, econômicas e políticas. .
Várias foram as considerações dos entrevistados
no que se referem às alternativas de melhoria no SUS,
apesar de muito já ter sido feito, persistem as lacunas.
Percebe-se que os mesmos sentem falta de um melhor
entendimento da maioria da população, apesar de todos
os momentos de conferência oferecidos, existe pouca
participação da comunidade; como conseqüência, tem-se
um não entendimento da real proposta do SUS.
Assim sendo, percebe-se a importância de um
modelo pedagógico centrado no aluno, para que ele se
torne ativo no processo de ensino-aprendizagem e seja
inserido precocemente na realidade.
No contexto atual, é fundamental que as
universidades estejam preparadas para responder às
demandas e exigências da sociedade. Sociedade essa,
117
REVISTA SETREM - Ano VII nº12 Jan/Jun 2008 ISSN 1678-1252
em que a educação ganha novo e fundamental papel, a
qual continuará sendo prioridade, preparando o cidadão
para o mundo da vida e do trabalho, instigando o profissional
a agir crítica e produtivamente nos serviços construindo e
descobrindo oportunidades. É hora de trazer a prática
universitária, trazer as novas concepções de mundo e
sociedade, os novos desafios, revendo os paradigmas do
processo de formação, desde os currículos, os planos de
estudo, os métodos e técnicas que sustentam a
aprendizagem (ZAINKO, 2006).
Frente aos dados produzidos, constata-se a
existência de várias lacunas, mas o que mais chama a
atenção é a questão da referência e contra-referência,
parecendo incipiente, pois, na maioria dos casos, os
enfermeiros não recebem a contra-referência, sendo que
a mesma é um dos pontos mais valiosos para viabilizar a
implantação do SUS. Cabe ressaltar também outro objeto
de discussão, a intersetorialidade, sendo que a mesma
muitas vezes é necessária para prestar um atendimento
integral e resolutivo.
Cabe ainda ressaltar a importância da
intersetorialidade, pois, de acordo com uma das
participantes da pesquisa, para dar um atendimento integral
é necessário que tenha o envolvimento de outras
secretarias; caso contrário, muitas vezes não tem como
dar resolutividade ao problema, sabendo-se que o PSF
surgiu para a reversão do modelo assistencial.
Como propostas para melhoria do SUS, sente-se a
necessidade da mudança de cenário, é preciso que haja
não apenas reflexões, porém ações concretas para a
melhoria na questão do ensino na saúde, que as
universidades consigam trabalhar os egressos, abarcando
qualidades para trabalharem em saúde coletiva,
acompanhando as mudanças que ainda vêm ocorrendo no
setor. Como também maior participação da comunidade
nos momentos de conferência que são proporcionados e
imprescindíveis para que elas se sintam protagonistas da
sua história.
Frente a estas considerações, é necessário levar
em conta que, para atuar nesse cenário, os profissionais
precisam estar preparados, ter sensibilidade e
conscientização dos problemas da realidade e incorporar
no seu dia-a-dia uma perspectiva de trabalho conjunto
utilizando outros saberes.
5 CONCLUSÃO
Frente aos dados produzidos, pontuam-se as
seguintes considerações acerca do processo de trabalho
dos enfermeiros, o qual possui como finalidade o bemestar do usuário. E que, além de todo o material específico
utilizado, a bagagem intelectual foi considerada o
instrumento mais importante à realização do trabalho,
percebendo-se o uso das tecnologias leve, leve-dura e dura,
objetivando-se a co-responsabilidade por parte do usuário
quando se trata dos produtos/resultados esperados.
Conseguindo, desta forma, mudar os indicadores de saúde,
aplicando realmente uma forma de saúde coletiva.
Evidencia-se que o enfermeiro, além de todo
atendimento assistencial e educacional, é também
responsável pela coordenação das equipes, conseguindo
atuar como agente de transformação social na produção
de saúde. Principalmente pela realização da clínica
ampliada, percebendo-se que no município, apesar das
particularidades existentes em cada unidade, existe um
trabalho homogêneo, atendendo ao usuário no contexto
em que o mesmo se encontra inserido.
Apesar da existência de uma pequena distorção no
valor de uso, enfatiza-se que isso não os desprestigia em
relação à efetivação do SUS, pois como a enfermagem é
uma profissão que ainda está conquistando seu espaço,
quando o usuário sabe que existem outras formas de
atendimento, com certeza estará buscando, na direção
de que ela venha dar-lhe resolutividade.
Esta pesquisa reafirma a hipótese que se tinha em
relação à contribuição do enfermeiro à solidificação do SUS
e a tão almejada produção em saúde, que, em muitos
casos, ainda segue a antiga forma de medicina
previdenciária em certos programas e ações. Como
também a não co-responsabilização do usuário na adesão
do seu tratamento, que ainda tem um longo caminho a ser
percorrido.
Pode-se sentir ao final desse o trajeto que, para
realizar um trabalho permanente, com vistas à efetivação
do SUS, é essencial um profissional enfermeiro sensível,
qualificado, cônscio das necessidades de saúde da
população, capaz de transformar-se e transformar a
realidade pela prática eficiente e responsável, é preciso
muito mais do que bases, diretrizes e projetos
pedagógicos. É preciso haver um compromisso de toda
equipe, envolver todos os atores neste processo como
sujeitos protagonistas de ações e mudanças.
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