Rodrigo Tarcha Amaral de Souza
A INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS REFERENCIAIS
SALESIANOS NA PRÁTICA DO EDUCADOR DOCENTE DO
CENTRO PROFISSIONAL DOM BOSCO (CPDB) - CAMPINAS
Centro Universitário Salesiano de São Paulo - UNISAL
Americana – SP Campus Maria Auxiliadora – 2013
Rodrigo Tarcha Amaral de Souza
A INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS REFERENCIAIS
SALESIANOS NA PRÁTICA DO EDUCADOR DOCENTE DO
CENTRO PROFISSIONAL DOM BOSCO (CPDB) - CAMPINAS
Dissertação apresentada como
exigência parcial para obtenção do
grau de Mestre em Educação
Sociocomunitária
à
Comissão
Julgadora do Centro Universitário
Salesiano de São Paulo – UNISAL
– sob a orientação da Profª. Drª.
Renata Sieiro Fernandes.
Centro Universitário Salesiano de São Paulo - UNISAL
Americana – SP Campus Maria Auxiliadora – 2013
S718i
Souza, Rodrigo Tarcha Amaral de
A Incidência dos princípios referenciais salesianos na
prática do educador docente do Centro Profissional Dom
Bosco (CPDB) - Campinas. – Americana: UNISAL, 2013.
215f.
Dissertação (Mestrado em Educação) – Centro
Universitário Salesiano - UNISAL – SP
Orientador (a): Profª Drª Renata Sieiro Fernandes. Inclui
Bibliografia.
1. Ensino Profissional - CPDB. 2. Dom Bosco. 3.
Pedagogia Salesiana. I. Título. II. Autor
CDD 370.1
Catalogação: Bibliotecária Carla Cristina do Valle Faganelli CRB 04/2012
UNISAL: Unidade de Ensino de Americana
Rodrigo Tarcha Amaral de Souza
A Incidência dos princípios referenciais salesianos na prática do educador
docente do Centro Profissional Dom Bosco (CPDB) – Campinas
Dissertação apresentada como
exigência parcial para obtenção do
grau de Mestre em Educação
Sociocomunitária
à
Comissão
Julgadora do Centro Universitário
Salesiano de São Paulo – UNISAL
– sob a orientação da Profª. Drª.
Renata Sieiro Fernandes.
Trabalho de Conclusão de Curso defendido e aprovado em __/__/__, pela
comissão julgadora:
Banca examinadora
___________________________________________
Prof. Dr.: Fábio José Garcia dos Reis / UNISAL
___________________________________________
Prof. Dr.: Francisco Evangelista / UNISAL
__________________________________________
Prof. Dr.: Antônio Carlos Miranda / UNISAL
__________________________________________
Profª Drª Renata Sieiro Fernandes (Orientadora) / UNISAL
Americana, 2013
“Quando entra na sala de aula, o professor pode estar apenas interessado em
ensinar, transmitir conhecimentos e informações, esclarecer sobre assuntos de
sua matéria. Mas existe um outro ensinamento que ele comunica, quer queira
ou não: a lição de si mesmo como pessoa. Isso significa que, quando vai dar
aula, mais do que a notícia de sua matéria, ele está inevitavelmente se
anunciando aos seus alunos, quer deseje ou não, pelo seu modo de ser, de
falar e de agir, imbuídos na entonação de voz, na maneira de gesticular, no
modo como trata os alunos, na forma de encarar suas obrigações profissionais,
nos comentários que faz sobre o mundo e as pessoas, nas opiniões sobre
valores como felicidade, amor, religião, etc. E é justamente aí que, de maneira
mais profunda, se torna educador”
Franz Víctor Rúdio (1983)
DEDICATÓRIA
Aos meus pais Marco Antônio e Jussara que em sua demonstração de amor
me proporcionaram elementos para um dia compartilhá-los.
Àqueles membros da Congregação Salesiana que me incentivaram o ingresso
no mestrado e me apoiaram nas pesquisas.
Ao Salesiano irmão, Alcides Venturi, símbolo de todo o trabalho salesiano
desenvolvido pelo CPDB ao longo dos anos.
AGRADECIMENTO
À Professora Doutora Renata Sieiro Fernandes, pela competência e atenção
no processo de orientação, pelos ensinamentos e amizade, pela paciência e
dedicação em ajudar-me a construir esta dissertação. Além de ser uma pessoa
‘legal e gente boa’.
Ao Professor Doutor Luís Antônio Groppo e colegas mestrandos, pelo
enriquecimento intelectual de conversas em momentos de refeição e final de
aula.
Ao Professor Doutor Dílson Passos Júnior, diretor da comunidade religiosa a
qual pertenço, pelos inúmeros momentos de conversa e partilha de minhas
ansiedades, angústias existenciais e auxílio na correção da dissertação.
A banca examinadora de qualificação e defesa de mestrado, Professores
Doutores Francisco Evangelista, Antônio Carlos Miranda e Fábio José Garcia
dos Reis que, compromissados com a Pedagogia Salesiana, puderam
enriquecer o trabalho.
Aos educadores docentes e alunos do Centro Profissional Dom Bosco (CPDB)
que, solícitos em ajudar, tornaram possível a concretização deste trabalho.
Aos meus familiares e comunidade religiosa salesiana que souberam
compreender-me nos momentos de ausência.
RESUMO
Este trabalho investiga como são entendidos e desenvolvidos os princípios
educacionais salesianos elaborados por Dom Bosco e que servem de
referencial para os educadores-docentes do Centro Profissional Dom Bosco
(CPDB) da Escola Salesiana São José de Campinas. Adotar-se-á o referencial
teórico historicista, investigativo e analítico de tipo qualitativo e estudo de caso
com uso metodológico das técnicas de observação participante, questionário
(quali – quanti) e entrevista aberta. Fundamentado em literatura salesiana, o
texto contempla o período de fundação, implantação e expansão da
congregação salesiana na Itália e no mundo, bem como a reprodução e
ressignificação dos procedimentos educativos legados por João Bosco no
CPDB de Campinas. Com a chegada dos salesianos no Brasil, em 1883, foram
construídas unidades educacionais em várias regiões do país. Na cidade de
Campinas fundou-se em 1897 o Liceu Nossa Senhora Auxiliadora. Tempos
depois, em 1953, a Escola Salesiana São José e o CPDB, este último, objeto
de análise deste estudo. O objetivo deste trabalho é de pesquisar como são
interpretados e desenvolvidos os princípios educacionais salesianos na práxis
dos educadores-docentes no CPDB. A questão é tratada por meio de análise
dialética entre a perspectiva historicista dos fundamentos salesianos e o
discurso institucional aliado à prática docente no CPDB. Essa pesquisa procura
verificar se há incidência desses princípios salesianos na práxis docente do
CPDB, constatação que permitirá avaliar o grau de fidelidade do projeto e da
práxis educativa desta instituição com o ideal educativo proposto pelo fundador
Dom Bosco na Itália do século XIX e que, transplantado para o Brasil, se
apresenta como marco referencial desta Instituição.
Palavras-chave: Ensino Profissional; Dom Bosco; Sistema Preventivo;
Pedagogia Salesiana; CPDB.
ABSTRACT
This work investigates how the educational salesian principles elaborated by
Don Bosco are understood and developed that serve as a reference for
educators-teachers of the Professional Center Don Bosco (CPDB) of St. Joseph
Salesian School from Campinas. The historic, investigative and analytic
theoretical reference will be adopt as qualitative approach and case study with
methodological use of participant observation, questionnaire (qualitative quantitative) and open interview. Grounded in Salesian literature, the text
contemplates the period from foundation, introduction and expansion of the
Salesian Congregation in Italy and worldwide, as well as the reproduction and
reinterpretation of educational procedures bequeathed by John Bosco in the
CPDB from Campinas. Starting from the arrival of the Salesians in Brazil in
1881, educational units were built in various regions of the country. The Our
Lady Help of Christians School was founded in 1897 at the city of Campinas.
Later, in 1953, the St. Joseph Salesian School and CPDB, this last one is the
object of analysis of this study. The objective of this work is to investigate how
the Salesian educational principles are interpreted and developed in the praxis
of educators-teachers in the CPDB. The matter is addressed by the dialectic
analysis between the historic perspective of the salesian fundamentals and the
institutional discourse combined with teaching practice in the CPDB. This
research seeks to ascertain whether there is an incidence of these salesian
principles in teaching praxis of the CPDB, finding that would allow to assess the
degree of fidelity of the project and educational practice of this institution with
the educational ideal proposed by founder Don Bosco in Italy in the nineteenth
century, tha transplanted for Brazil, presents itself as a reference point of this
Institution.
Keywords: Professional Teaching, Don Bosco; Preventive System; Salesian
Pedagogy, CPDB.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...……….…………………………………..…………………. 11
CAPÍTULO 1………………………………………………………..... 14
1.1 – Os primórdios da história salesiana………………………………………....... 14
1.2 - Gênese e revelação de João Bosco Educador………………………………... 17
1.3 – As obras salesianas…………………………………………………………… 26
1.3.1 – Na Itália, o período da fundação…………………………………… 30
1.3.2 – No mundo, a caminho da interculturalidade……………………….. 34
1.4 – Princípios referenciais da práxis educativa salesiana…………………………38
1.4.1 – Razão……………………………………………………………….. 43
1.4.2 – Religião…………………………………………………………….. 44
1.4.3 – Bondade…………………………………………………………….. 45
1.4.4 – Os sonhos…………………………..………………………………. 49
CAPÍTULO 2…………………………………………………………. 56
2.1 – Implantação e expansão da obra salesiana no Brasil………………………… 56
2.2 – Em Campinas………………………………………………………………… 70
2.2.1 – Escolas……………………………………………………………… 73
2.2.2 – Escola Agrícola…………………………………………………….. 81
2.2.3 – CPDB, tempo e lugar………………………………………………..85
2.2.3.1 – O CPDB na esfera da gestão............................................... 95
2.2.3.2 - O ensino profissional como educação
não formal, sociocomunitária e regular……………………. 99
CAPÍTULO 3…………………………………………………………. 109
3.1 - Uma abordagem localizada (a problematização)…………………………….. 109
3.2 – A pesquisa de campo………………………………………………………… 114
3.2.1 – A observação participante…………………………………………. 117
3.2.2 – O questionário com os alunos……………………………………… 123
3.2.2.1 – Análise de dados: categoria ambos os gêneros…………… 130
3.2.2.2 – Análise de dados: categoria curso………………………... 133
3.2.2.3 – Análise de dados: categoria série………………………… 136
3.2.3 – As entrevistas com os educadores docentes……………………….. 144
3.3 – Os educadores docentes no CPDB: Desafios e perspectivas………………… 166
CONSIDERAÇÕES FINAIS.……………………………………...... 172
REFERENCIAS……………………………………………………… 178
APÊNDICE
A – Autorização para pesquisa e uso de voz e imagem ..…...………....................... 191
B – Atividades de campo........................................................................................... 192
ANEXOS
A – Lei Nº 8.069, de 13 DE JULHO DE 1990………………………...................... 196
B – Proposta de Resolução………….………………………………….................... 202
C – Carta de Roma.......………………………….……………………..................... 209
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Ilustração 1 – A casa dos Becchi…….…………………………………………….. 18
Ilustração 2 – A cidade de Turim…………………………………………………... 21
Ilustração 3 – Mapa do império napoleônico………………………………………. 34
Ilustração 4 – Mapa da Europa após o Congresso de Viena…..…………………… 35
Ilustração 5 – Esquema salesiano e pilares da educação…………………………… 55
Ilustração 6 – Primeira Expedição Salesiana………………………………………. 57
Ilustração 7 – Década de 1890…..…………………………………………………. 71
Ilustração 8 – Pátio interno do Liceu em 1919…………………………………….. 77
Ilustração 9 – Oficina de Mecânica do CPDB em 1988..………………………….. 93
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Educação Profissional….………………………………………………. 100
Tabela 2 – Análise descritiva do banco de dados………………………………….. 128
Tabela 3 – Quadro expositivo da questão número nove…………………………… 140
Tabela 4 – Questões semiestruturadas aos educadores docentes..…………………. 147
Tabela 5 – Categorias de análise e critérios para a entrevista……………………… 148
11
INTRODUÇÃO
De inspiração cristã e caráter católico, a educação salesiana tem sua
origem nas proposições teóricas, intuitivas e experienciais de João Bosco, que
hoje se constituem numa verdadeira Escola de Educação: a salesiana.
É nosso objetivo retomar os fundamentos educacionais elaborados no
século XIX por Dom Bosco e legados aos seus discípulos como instrumento de
educação para suas obras espalhadas pelo mundo. Isso nos permitirá verificar
se as práticas educacionais do Centro Profissional Dom Bosco (CPDB) de
Campinas estão alinhadas, neste século XXI, com os princípios educacionais
elaborados por Dom Bosco como educador e fundador.
Pretendo, por meio de pesquisa investigativa e analítica de abordagem
qualitativa, apontar elementos que permitam visualizar como são interpretados
e desenvolvidos os princípios referenciais salesianos pelos educadores
docentes no CPDB, em Campinas.
Somente
uma
docência
efetivamente
pautada
por
elementos
pedagógicos salesianos garantirá e consolidará a identidade desta obra como
desejavam seus fundadores. Cabe-nos questionar e verificar neste trabalho
investigativo, em que medida é hoje compreendida, integrada e desenvolvida a
pedagogia salesiana pelos educadores docentes no Centro Profissional Dom
Bosco (CPDB).
Na condição de membro da equipe de gestão da Escola Salesiana São
José e do CPDB, foi desafiador integrar o trabalho escolar cotidiano com o
material acadêmico por mim desenvolvido. O que me sensibilizou para esta
pesquisa foi minha primeira participação na reunião com a equipe pedagógica
e corpo docente do CPDB, ano de 2012. Percebi que o espaço, lugar e
problema de pesquisa estavam ali, no corpo docente como ponto de partida de
minhas hipóteses e sondagens. A realização desta pesquisa é não só de
relevância pessoal, por me trazer as memórias e experiências de aluno que fui
12
do CPDB de Pindamonhangaba, mas também institucional, pois acredito ser do
interesse dos salesianos e da equipe de gestão envolvidos nesta frente de
trabalho escolar, verificar a qualidade e a articulação dos princípios referenciais
salesianos na práxis dos docentes deste setor.
Para produzir um diagnóstico confiável e que nos permita aquilatar a
intensidade, o alcance e a incidência dos princípios referenciais salesianos na
práxis dos educadores docentes do CPDB, buscarei construir essa verificação,
por meio das técnicas de pesquisa de observação participante em sala de aula
e espaços adjacentes, questionário (quali – quanti) e entrevista aberta.
Entendo que se trata de um trabalho viável, sabendo que essa pesquisa
proporcionará elementos para uma maior compreensão do grau de incidência
dos princípios referenciais salesianos na práxis do educador docente no CPDB.
Pautar-me-ei em fundamentação literária atualizada. O referencial
teórico perpassa nomes como Braido, Wirth, Passos Júnior, Ferreira, Lenti e
outros autores que norteiam, conceitualmente, este trabalho.
Neste sentido, a pesquisa será apresentada em três capítulos que,
sinteticamente, perpassam os pressupostos históricos e teóricos da pedagogia
salesiana: o período de consolidação e expansão da congregação e o estudo e
análise da realidade atual do CPDB como forma de medir o grau de incidência
salesiana no setor pela práxis docente.
No primeiro capítulo, trato do fundamento pedagógico conhecido como
Sistema Preventivo que nasceu das práticas educacionais de João Bosco e de
seus primeiros discípulos, construído em meio às crises econômica, política,
social e religiosa da Península Itálica do século XIX.
No segundo capítulo, apresento o processo de implantação da obra
salesiana no Brasil com seu impacto e ressonância na sociedade do final do
século XIX e início do XX, implantando-se nas cidades do Rio de Janeiro, São
Paulo, Lorena e Campinas. É no cenário histórico de Campinas que se funda a
Escola Agrícola, ponto de partida para a atual Escola Salesiana São José e o
Centro profissional Dom Bosco, objeto primeiro de nossa pesquisa.
13
No terceiro capítulo, apresento a metodologia e as técnicas de pesquisa
sendo esta do tipo estudo de caso e abordagem qualitativa. Discorro sobre os
desafios e perspectivas da pedagogia salesiana no CPDB, a partir dos dados
coletados na pesquisa de campo com as técnicas de observação participante,
questionário e entrevista.
Cabe mencionar que o desenvolvimento de tais técnicas e síntese de
dados coletados, não têm por objetivo uma intervenção direta e imediata na
obra, mas sim, visualizar a conjuntura do trabalho e pesquisa no processo de
aprendizado acadêmico do mestrado em Educação Sociocomunitária. Nada
impede, porém, que ele seja uma contribuição à direção e ao corpo docente da
obra com a oferta de elementos que lhes permitam uma avaliação do seu nível
de fidelidade aos princípios que a configuram enquanto instituição salesiana.
14
CAPÍTULO 1
Este capítulo apresenta os primórdios da história da educação salesiana,
sua expansão, inicialmente, pela Itália e, posteriormente, pelo resto do mundo,
considerando-se o contexto sócio-político e econômico no qual viveu o
fundador João Bosco. São referências deste trabalho as obras de Braido,
Wirth,
Passos Júnior, Lenti,
Santos,
Castilho,
Rodríguez,
Buccellato,
Villanueva, Ferreira e autores complementares da educação salesiana.
A estrutura do capítulo apresenta João Bosco como educador e os
elementos basilares de sua prática educativa: razão, religião e amorevollezza1,
que são princípios referenciais da práxis da educação salesiana. O
Entendimento destes princípios referenciais permite avaliar o nível de fidelidade
das obras que nasceram sob sua inspiração religiosa-pedagógica.
1.1
Os primórdios da história salesiana
Ao discorrer sobre a história da educação salesiana, devem-se levar em
conta os contextos político, econômico, social e religioso, que contribuíram
para a configuração desta moderna congregação da era industrial.
A vida de João Bosco e os primórdios da congregação salesiana
acontecem no período pós-napoleônico2, tempo de guerras entre as potências
europeias e revoluções na península itálica, num contexto de disputas
dinásticas e entre as monarquias europeias dos últimos séculos. “Era o período
da Restauração em que os poderes legítimos depostos por Napoleão eram
1
Palavra italiana sem tradução plena, mas que se aproxima da ideia de carinho, amabilidade,
amor demonstrado, solidariedade e bondade.
2
Período napoleônico (1799 – 1815) que, politicamente, pode ser dividido em três partes:
Consulado (1799 – 1804), Império (1804 – 1815) e governo dos cem dias, também em 1815.
15
restabelecidos em seus domínios, voltando-se ao antigo regime3 (Ancien
Régime)” (LENTI, 2012, p. 125).
É um período de ruptura da ordem feudal em vista da construção de um
novo modelo de sociedade, embasado em fundamentos filosóficos de justiça e
soberania popular, construindo um conceito de política fundamentada no
Iluminismo e na Revolução Francesa.
Este período foi catastrófico na Península Itálica ao impor aos jovens,
tanto campesinos como urbanos, o alistamento militar e sobrecarregar as
populações com pesados impostos para cobrir os custos de guerra. Apesar
destes problemas, não se pode ignorar que o período napoleônico teve
também o mérito de introduzir medidas administrativas positivas como a
exigência de experiência, competência e talento para o exercício dos cargos
administrativos, não prevalecendo somente a influência. Combateram-se
também atos que infringissem a ordem e a moral.
Essas reformas napoleônicas não tiveram, porém, os mesmos
resultados em toda a península itálica. O sul, menos desenvolvido, não aderiu
às propostas de Napoleão por conta dos ideais revolucionários que defendiam
uma nação independente e unificada. Enquanto que o norte4, representado
pelo reinado de Sardenha, prosperou, assumindo reformas importantes e
duradouras, com a adesão de intelectuais, políticos e clérigos que optaram por
permanecerem ligados ao império napoleônico.
Desta forma, os decretos e reformas napoleônicas transformaram a vida
italiana, ao abolir as leis feudais de propriedade e de restrição aos judeus.
Separou as jurisdições civil e criminal. Reorganizou o sistema judicial, com o
apoio de armas francesas. “A consequência mais importante do domínio
francês foi ter semeado na mente do povo a ideia de que uma revolução liberal
3
O Antigo Regime se caracterizava por uma monarquia absoluta e de direitos divinos e uma
desigualdade social, baseada em privilégios de nascimento para a nobreza e o importante
papel desempenhado pelo clero. Não há constituição escrita e é o rei que personifica o Estado.
(Tradução nossa). “L'Ancien Régime se caractérise par une monarchie absolue et de droit divin
et une inégalité sociale fondée sur des privilèges de naissance pour la Noblesse et le rôle
important joué par le Clergé. Il n'y a pas de constitution écrite et c'est le roi qui incarne l'Etat”.
Disponível em: http://www.toupie.org/Dictionnaire/Ancien_regime.htm. Acesso em: 23-jan-2013.
4
O vale do rio Pó, ao assumir a política napoleônica, converteu-se numa extraordinária zona
econômica têxtil, de calçados e de materiais de construção, prosperando comercialmente.
16
poderia ter sucesso e que a Itália poderia se converter numa nação unida”
(Idem, ibidem, p. 127).
O ideal napoleônico de um império forte e estruturado se concretizou na
reorganização da península itálica em âmbito político e administrativo, servindo
para reduzir a fragmentação regionalista e alimentar o ideal de um país
unificado5.
Com a prisão de Napoleão na ilha de Elba (1814), as principais
potências europeias, Áustria, Rússia, Inglaterra, Prússia e França, reuniram-se
em Viena (Áustria), restaurando a antiga ordem política da Europa (l´ancien
regim). Dentre os muitos acordos, os Estados regionais italianos foram
restaurados, tornando a península, novamente, num mosaico político. Somente
o reino da Sardenha, conhecido também como reino de Sabóia e Piemonte, era
o único Estado independente na península itálica e foi onde João Bosco
desenvolverá parte de sua vida de estudos e trabalho.
Esta região, embora independente, abastada e desenvolvida, em
comparação com outras partes da península, não tardou a entrar em colapso
sob a pressão das ideias liberais de unificação nacional e à revolução do
rissorgimento6 em 1848. Após um curto período de estabilidade nas primeiras
décadas do século XIX, tanto na península itálica como nos países adjacentes,
Alemanha, Império Austro-húngaro e França, eclodiu um conjunto de
revoluções contra as políticas monárquicas nas principais cidades europeias,
como Paris, Viena, Berlim, Milão, etc.
Ainda no período napoleônico começava a se configurar a mentalidade
pré-industrial e liberal, sobretudo nas potências colonialistas europeias, como
Alemanha, Reino Unido e a própria França.
Conforme nos diz Passos Júnior (2011, p.40):
Será neste lastro de revoluções que também na península itálica se
articularão os movimentos liberais buscando superar o poder da
5
“A revolução Francesa, cujas ideias básicas foram transmitidas por Napoleão ao resto da
Europa ocidental, junto com a experiência da Itália sob o governo de Napoleão no campo
político, social, militar, econômico e ideológico, influenciaram o pensamento italiano e a
evolução futura e a evolução futura do Ressurgimento” (LENTI, 2012, p. 126).
6
Movimento revolucionário que buscou unificar o país.
17
Igreja e dos príncipes pela unificação dos diversos reinos na
constituição de um estado-nacional burguês. A península itálica
viverá com intensidade esses momentos com grupos que procuram
subverter a ordem vigente [...].
É neste complexo cenário sociopolítico e económico, entre novos e
antigos regimes, republicano e monárquico, que se desenvolve a história
salesiana iniciada com o nascimento de João Bosco e onde, posteriormente, se
desenvolverão suas ações educativas, religiosas e sociais.
1.2
Gênese e revelação de João Bosco educador
João Melchior Bosco nasceu no dia 16 de agosto, em 1815, nas
proximidades de Turim num bucólico aglomerado de casas, chamado Becchi.
Conforme Lenti, (2012, p. 146):
A pequena casa era, na realidade, um galpão malconservado,
que se apoiava na parede de trás da casa grande; constava, no
momento da compra, de um ambiente mais baixo e um
pequeno estábulo contíguo, com um depósito de feno, também
pequeno, sobre ele. O galpão carecia, logicamente, de
reformas e ampliação, pois devia converter-se em moradia da
numerosa família de Francisco, o que era, sem dúvida,
desejado por ele.
Seus pais Francisco Bosco (1784 – 1817), Margarida Occhiena (1788 –
1856) eram camponeses. Aos dois anos perde o pai, assumindo sua mãe a
manutenção da casa e a educação dos filhos. João, o menor, José e Antônio, o
mais velho, fruto do primeiro casamento de Francisco Bosco.
Sobre o falecimento do pai, Bosco (apud, Wirth, 2000, p. 25) descreve:
Eu não tinha ainda dois anos, quando Deus misericordioso nos feriu
com terrível desgraça. Com essas palavras, Dom Bosco comentava a
morte de seu pai, ocorrida a 11 de maio de 1817. Ao voltar do
trabalho, banhado de suor, cometera Francisco à imprudência de
entrar na adega. Tomado de violenta febre, sucumbia poucos dias
depois. Contava trinta e três anos. Por toda a vida, João ouvirá
ressoar aos ouvidos as palavras de sua mãe ao retirá-lo do quarto do
falecido: Pobre filhinho vem comigo, já não tens pai.
Era um período em que já palpitavam os ideais do liberalismo e
patriotismo italiano, culminando no ressurgimento, movimento revolucionário de
18
1848. Tais ideais sociopolíticos germinavam de forma intensa, sobretudo na
região sul da Itália não unificada. Na região de João Bosco, o Piemonte, o reino
de Savóia permanecia sólido por meio e em defesa do legado napoleônico.
Ilustração 1- A casa dos Becchi7
Extraído de (LENTI, 2012, p. 149).
Em 1831, João Bosco entra para o colégio em Chieri, sendo pensionista
em casa de famílias das redondezas. No tempo contrário às aulas, torna-se
aprendiz de ofícios como ferreiro, carpinteiro, sapateiro, etc. que lhe foi útil nas
décadas seguintes quando, com conhecimento e experiência suficientes, pode
promover oficinas de ofício. Segundo descreve Wirth, (2000, p. 29):
Os estudos correram bem. No primeiro ano (1831 – 1832) recuperou
quase totalmente o atraso, superando sucessivamente as três
classes inferiores dos estudos secundários. O resto continuou
regularmente: classe de gramática em 1832 – 1833, humanidades em
7
Na ilustração 1 percebe-se a rústica casa num ambiente bucólico. Nestes tempos difíceis,
havia escassez de materiais e de recursos para o trabalho no campo. Como todas as crianças
de áreas campesinas, João auxiliava sua mãe, prestando pequenos serviços em casa e no
campo cuidando de vacas e perus.
19
1833 – 1834, retórica em 1834 – 1835. Bosco era um excelente
aluno, dotado de memória felicíssima. Apaixonado pelos estudos
literários clássicos, devorava – de preferência à noite – os autores
italianos e latinos de uma “Biblioteca popular”. Entre seus professores
sua admiração recaía em Petro Banaudi, “um verdadeiro modelo dos
professores”, que “conseguia fazer-se temer e amar sem nunca infligir
nenhum castigo”.
Desde o início de sua infância e adolescência, alimentou o desejo de ser
padre para as crianças e adolescentes8 (SANTOS; CASTILHO, 2003). Em
1835 entra para o seminário maior, em Chieri, tendo sido ordenado sacerdote
no dia 05 de junho de 1841, em Turim. No mesmo ano, em 08 de dezembro,
funda seu primeiro Oratório9 Festivo. Cabe lembrar que já existiam outros
oratórios nessa época (FERREIRA, 2000).
Segundo Gomes (2008, p. 238):
O que Dom Bosco viu, então, em 1841, foi a cidade de Turim no
momento de seu despertar para a Revolução Industrial, com uma
nascente malha ferroviária e a implantação tardia, em relação à
Inglaterra, de uma indústria têxtil incipiente. A força de trabalho se
constituía, entre outros, de meninos e de jovens, sobretudo órfãos em
virtude de guerras e da fome, os quais já trabalhavam a partir dos oito
anos de idade.
8
[...] Dom Bosco sonhou com os jovens. A coisa é tão óbvia que, às vezes, naturalmente, fazia
declarações óbvias: Porque eu amo meus jovens, então eu sempre sonho de estar em sua
companhia, [...] a matéria-prima da humanidade! (Tradução nossa). “[...] Don Bosco sognò i
giovani. La cosa è tanto ovvia che talora con naturalezza ne faceva palese dichiarazione:
Siccome io amo i miei giovani, quindi sogno sempre di essere in loro compagnia, [...] la materia
prima dell'umanità!” (CICCARELLI, 1981, p. 11 – 12). Desde pequeno, sentiu inclinação para
trabalhar pelos meninos de seu ambiente rural e em condições similares as suas, com quem
manteria sempre uma singular sintonia pastoral [...] “Reuni-los, dar-lhes catecismo, era uma
inspiração que sentia em mim desde quando tinha cinco anos. Era meu maior desejo. Pareciame ser a única coisa que eu tinha que fazer na minha vida”. Era um impulso inato, um gérmen
de graça, inconsciente ainda para ele, que terá de evidenciar-se, pouco a pouco, até formar
uma aspiração explícita e um modo de ser assumido como próprio [...]. (Tradução nossa).
“Desde muy pequeño siente inclinación a trabajar por los chicos de su ambiente rural y en
condiciones similares a las suyas, con quienes mantendrá siempre una singular sintonía
pastoral […] “Reunirlos, darles catecismo, era una inspiración que sentía en mí desde cuando
tendría cinco años. Era mi mayor deseo. Me parecía ser la única cosa que tendría que hacer yo
en mi vida”. Era un impulso innato, un germen de gracia, inconsciente aun para él, que habrá
de evidenciarse, poco a poco, hasta formar una aspiración explícita y un modo de ser asumido
como propio […]” (LEAL, 2003, p.13).
9
Reunião educativa, de cunho social-religioso, estabelecida por São João Bosco, na
congregação dos salesianos, que criou. In: Dicionário on-line Michaelis. Oratório. Disponível
em:
http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portuguesportugues&palavra=oratório. Acesso em: 09-jan-2013.
20
Em 1846, Bosco10 consegue firmar sua obra11 no bairro turinense de
Valdocco, época de turbulências política e ideológica com embates entre a
monarquia e a república, o conservadorismo e o liberalismo.
A cidade vivia todas as consequências da revolução industrial,
particularmente o êxodo rural, exploração demográfica, exploração de
12
mão de obra, desemprego e subemprego. Os jovens “agora de Dom
Bosco”, são os mais atingidos pelos graves problemas (SANTOS;
CASTILHO, 2003, p. 251).
Neste contexto e em contato com a realidade juvenil, amadure sua
opção pelos jovens, percebendo-os frágeis e fragilizados frente às mazelas
econômicas, políticas e sociais. Volta-se para os jovens abandonados e órfãos,
entendendo suas desventuras e procurando dar soluções para suas
necessidades neste mundo em transformação. Mostra-se sensível aos
problemas sociais, humanos e religiosos deste momento histórico com suas
contradições e injustiças (SOFNER; SANDRINI, 2012).
10
Neste momento, de acordo com o período cronológico que representa a fase adulta e
madura de João Bosco, passo a identificá-lo como Bosco e não mais como João que faz jus à
infância.
11
“Para todos os efeitos, pode ser considerada histórica a já citada carta com que, em 13 de
março de 1846, Dom Bosco apresentava o Oratório ao autorizado e autoritário marquês
Michele Benso de Cavour (1781 – 1850), Vigário da Cidade, isto é, titular da mais alta e
complexa magistratura civil, administrativa, alfandegária, policial. Na carta, Dom Bosco revela
traços pessoais típicos que o acompanharão por toda a vida: dedicação à missão juvenil fora
das estruturas canônicas, concepção do oratório como instituição de finalidade religiosa e
humana, insistência nos valores de promoção moral e social (político) da obra, capacidade de
produzir envolvimento e consenso de quem detém o poder”. (BRAIDO, 2008, p. 200).
12
Palavra de origem italiana que, na tradução para o idioma português, significa padre. Devido
à presença da Sociedade de São Francisco de Sales em muitas nações se tornou cultural
manter a palavra dom em referência à pessoa de Dom Bosco. Dicionário italiano – português.
Disponível
em:
http://palavrasitalianas.wiki.br/ricerca_pt.php?espressione=dom&lingua_espressione=pt.
Acesso em: 09-jan-2013.
21
Ilustração 2 – A cidade de Turim13
Extraído de (LENTI, 2012, p.139).
Em 1853 Bosco dá início às primeiras oficinas de ensino profissional,
procurando preparar jovens para essa nova realidade das cidades industriais.
Essas oficinas são a origem dos centros profissionais salesianos, como é hoje
o CPDB14 de Campinas, tendo variações apenas naquilo que lhe é exigido para
se adequarem às leis, normas e cultura de cada país. Sua ousadia, não
obstante, na busca de soluções para os problemas da juventude, granjeara-lhe
várias situações de desconfiança de segmentos conservadores da Igreja e da
sociedade.15
Para consolidar este serviço de educação da juventude, funda em 1859,
a Sociedade São Francisco de Sales, em favor da juventude vulnerável e
desamparada. A Congregação, num primeiro momento, se expande para a
Espanha, França Argentina. Já em 1883, os salesianos chegam ao Brasil na
cidade de Niterói. Em 1888, com sua obra já consolidada e respeitada, Bosco
13
Conforme a ilustração 2, a cidade de Turim, consolidada como reino do Piemonte, sofre forte
inchaço demográfico já no século XIX, época de vital importância para a economia da
península itálica.
14
O Centro Profissional Dom Bosco (CPDB) é uma obra social profissionalizante, atendendo
jovens entre 14 a 18 anos. Os cursos oferecidos são definidos pelas necessidades da indústria
regional. O CPDB é a dimensão filantrópica das escolas salesianas.
15
O clero mais capacitado da Itália do século XIX, normalmente, voltava-se para as classes
mais abastadas, tanto para o atendimento religioso como para o ensino. Quando Bosco, tendo
oportunidade de receber um seguro provento da Marquesa Barolo, rica dama da sociedade
turinense e que mantinha obras sócias na cidade, opta por trabalhar com jovens desprovidos
de fortuna, rompe com essa lógica que buscava, antes de tudo, segurança.
22
falece em Turim com 72 anos desgastado pelo seu intenso empenho físico em
favor dos jovens. Sua ação como educador foi fruto de seus dotes e
habilidades humanas (PASSOS JÚNIOR, 2004).
Após sua morte, seus seguidores, os salesianos consagrados16 e
leigos17 colaboradores que partilhavam os princípios e práticas do trabalho
salesiano, viveram um natural processo de idealização de sua pessoa como
costuma acontecer com os grandes líderes. Há hoje um significativo esforço
dos centros históricos18 salesianos de ressignificar a real dimensão humana e
histórica de Bosco, superando-se uma historiografia inicial marcada por forte
idealização.
Lenti (2012), sinaliza uma metodologia acrítica na produção das
memórias de Bosco pelos primeiros salesianos, entre eles: Julio Barberis (1847
– 1927), Joaquim Berto (1847 – 1914), João Bonetti (1838 – 1891), João
Batista Lemoyne (1839 – 1916), Domingos Ruffino (1840 – 1865) e Carlos
Vigliez (1864 – 1915), cujas narrações estavam permeadas pela mentalidade
pré-científica. É compreensível a postura de parcialidade dos primeiros
biógrafos e cronistas na mitologização e idealização de Bosco nos seus
escritos, sobretudo pela proximidade e relação afetiva.
Somente a partir da década de 1960, as gerações de novos salesianos
começaram a manifestar inquietação quanto à leitura hagiográfica do passado,
sentindo a necessidade de promover a revisão histórica de Bosco, que fosse
filologicamente atenta, endossada pelas fontes e feita historicamente, segundo
uma metodologia atualizada. Atualmente, há uma vasta gama de intérpretes e
comentaristas da história salesiana e do próprio Bosco, que se pontuam pelas
mais modernas técnicas da historiografia.
16
Consagrado: que se doa, dedica, consagra ao serviço de Deus ou da Igreja. Disponível em:
http://www.priberam.pt/dlpo/. Acesso em: 24-jan-2013.
17
Por leigos entendem-se aqui todos os cristãos que não são membros da sagrada Ordem ou
do estado religioso reconhecido pela Igreja, isto é, os fiéis que, incorporados em Cristo pelo
Baptismo, constituídos em Povo de Deus e tornados participantes, a seu modo, da função
sacerdotal, profética e real de Cristo, exercem, pela parte que lhes toca, a missão de todo o
povo cristão na Igreja e no mundo. Carta encíclica Lumen Gentium nº: 31.
18
O principal Centro Histórico encontra-se em Roma. No Brasil, na cidade de Barbacena – MG,
está o centro nacional, articulado com os centros regionais e locais em obras mais antigas.
23
Lenti (2012) esclarece que tal parcialidade pré-científica nos escritos dos
primeiros biógrafos e cronistas, explica-se por estarem imersos e envoltos de
uma “meta-história” de Bosco, a serviço de uma mensagem idealizada para o
futuro dos salesianos. Meta-história, mais para compreender a mentalidade, a
espiritualidade e o estilo educativo de Bosco, do que pelos seus outros
aspectos, o que, obviamente, cria problemas aos historiadores e biógrafos
atuais.
O verdadeiro personagem Bosco pode ser observado e entendido a
partir do contexto histórico, cultural, místico, religioso, psicológico e social do
seu tempo. No plano histórico e cultural, percebe-se um homem real, concreto
de vivência familiar tradicional, um camponês que tinha como concepção de
educação a sabedoria popular (PASSOS JÚNIOR, 2004). Quando se sentiu
impulsionado a buscar condições de estudo e trabalho no centro urbano de
Turim, vivenciou na prática a experiência do êxodo rural, algo natural nesses
tempos de carestia nos campos. Sua personalidade forte, enérgica e dinâmica
trazia os traços do camponês Piemontes afeito às rudes lidas do campo. Seus
laços familiares eram sólidos, embora o quadro de muitas famílias da época
era instável pelas guerras, êxodos19 e falecimentos precoces20, já que a
medicina não usufruía de recursos adequados.
Bosco é filho do seu tempo e é à luz da história e da cultura de sua
época que se pode entender sua formação humana.
Sua experiência mística e religiosa, amadurecida ao longo de sua vida é
o fruto de sua natureza camponesa, confrontada com este período histórico de
19
“No século XIX ir para uma cidade em início de industrialização era mais que percorrer
alguns quilômetros entre o campo e a urbe, mas sim transpor no percurso de uma pequena
viagem à barreira de vários séculos com a quebra de paradigmas culturais, religiosos e sociais.
Sua história pessoal é como a de tantos adolescentes e jovens que saíram dos campos para
se integrarem no ambiente urbano-industrial que começa a se organizar em algumas cidades
da península, acreditando-se que nelas as oportunidades seriam melhores. João Bosco, na
cidade, busca sua subsistência como aprendiz” (PASSOS JÚNIOR, 2011, p. 62).
20
“De fato, “em 1815, uma extraordinária carestia afligia o Piemonte, assim como toda a Itália,
consequência das agitações de 1814 e de condições atmosféricas que fizeram faltar as
colheitas de cereais, e perdurou em 1816 e até 1817”, sentida obviamente também nas terras e
na casa dos Bosco. Os preços dos cereais chegaram a alturas vertiginosas, precipitando no
decênio sucessivo” (BRAIDO, 2008, p. 114).
24
mudanças. É filho de uma cultura tridentina21 e de uma Itália, berço do
catolicismo, envolta num processo anticlerical e liberal.
A religiosidade de cada um está ligada ao contexto em que se vive.
Bosco foi capaz de amalgamar, não sem dificuldades e conflitos22, sua
religiosidade subjetiva com a institucional da Igreja, adequando-a a sua
realidade sociocultural. Conforme Passos Júnior (2004, p. 20):
João Bosco, mentor da Pedagogia Salesiana, foi marcado por sólida
formação filosófica clássica. Ainda que no século XIX a Igreja
Católica continuasse a seguir as instruções do Concílio de Trento,
onde o pensamento tomista havia sido eleito como filosofia oficial da
cristandade, o pensamento agostiniano, com marcante influência
platônica, não deixava de ter grande simpatia pelo seu aspecto
espiritual e intuitivo. Mística e racionalidade, agostianismo de matriz
platônica e tomismo de matriz aristotélica eram objetos de estudos
aprofundados dos clérigos do século XIX e se constituem no
embasamento filosófico da pedagogia salesiana.
Sua religiosidade, entre o popular e o institucional, favoreceu a
educação religiosa e moral dos jovens de seu tempo aproximando-os da Igreja.
Tanto seus estudos filosóficos como teológicos não ofereciam bases de
aproximação com uma sociedade em passagem de um mundo agrícola feudal
para um mundo urbano e industrial. Desta forma, terminado o curso de teologia
e ordenado sacerdote, Bosco procurou ampliar seus estudos teológicos no
colégio eclesiástico23 enquanto trabalhava com a juventude de Turim.
21
O Concílio de Trento, realizado de 1545 a 1563, foi o 19º concílio ecuménico. É considerado
um dos três concílios fundamentais na Igreja Católica. Foi convocado pelo Papa Paulo III para
assegurar a unidade da fé (sagrada escritura histórica) e a disciplina eclesiástica, no contexto
da Reforma da Igreja Católica e a reação à divisão então vivida na Europa devido à Reforma
Protestante, razão pela qual é denominado como Concílio da Contra-Reforma. In. Referência:
AQUINO,
[S/D],
Disponível
em:
http://www.cleofas.com.br/virtual/texto.php?doc=IGREJA&id=igr0501. Acesso em: 13-jan-2013.
Citação de documento eletrônico avulso.
22
Na década de 1870, Bosco teve dificuldades para institucionalizar seus oratórios como sendo
seminários. A aplicação da formação religiosa em seus seminários era vista pela cúria romana
com certa apreensão. Sabe-se que, em 1871, quando o bispo Lorenzo Galtaldi assumiu a
diocese de Turim, encontrando-a em uma desordem, justamente por estar vacante por muitos
anos, tentou restringir as novas iniciativas do clero que não estivessem em concordância com
as tradicionais práticas religiosas (BRAIDO, 2008).
23
“No preâmbulo do Regulamento, formulam-se as ‘Razões para a existência do Colégio’,
aludindo à necessidade de os padres recém-ordenados terem formação mais específica em
moral e maior preparação para a pregação. Resultado dessa insuficiente formação sacerdotal é
a falta de espírito sacerdotal, unida ao desânimo ou à perda de motivação, o que explicaria a
deplorável falta de confessores experientes e a fuga generalizada dos sacramentos entre os
fiéis. O colégio é, portanto, uma tentativa de abordar esses problemas” (LENTI, 2012, p. 343).
25
Bosco, visto pelo aspecto psicossocial24, recebeu influência dos laços
familiares na fase da infância. Teve carências e faltas materiais, desafetos
familiares, sobretudo pela relação instável com o irmão mais velho e
falecimento precoce do pai.
Obviamente que Bosco, personagem histórico, é compreendido em seu
conjunto de elementos políticos, sociais, religiosos e psicológicos (PASSOS
JÚNIOR, 2011). Seus exemplos, feitos e ensinamentos tornaram-se a coluna
vertebral de um sistema pedagógico ancorado no humanismo cristão. Como
sinaliza Papes (1989, p. 57):
A originalidade de Dom Bosco é, provavelmente, identificada na
riqueza potencial de suas intuições de educador, fundador e
organizador operante em um tecido onde as forças da sua
industriosidade estão ao serviço daqueles que o Espírito de Deus vai
25
aprofundando . (Tradução nossa).
Bosco foi reconhecido como alguém vocacionado à Educação. Ainda
criança se utilizava de suas habilidades lúdicas e de trabalhos manuais com o
chamariz para ter ao seu redor seus coetâneos que, implicitamente, lhe
reconheciam a liderança.
Após algumas experiências de trabalho formativo e educacional no
oratório, Bosco “formava-se, na vida e na história, não só padre em atividade
pastoral, pregador e confessor, mas, ao mesmo tempo, educador e agente
social em favor da juventude e do povo” (BRAIDO, 2008, p. 197).
Muitas experiências de sua infância e adolescência contribuíram para a
elaboração do seu método pedagógico.
Merece destaque sua capacidade de agir, dialeticamente, entre
modernidade e tradição. Neste sentido, Braido (2004, p. 154) referenda:
Modernidade e tradição determinam uma dualidade de atitudes que,
por mais que distintas e distintivas com relação a outros padres e
católicos do tempo, geralmente se fundem em Dom Bosco com
extrema naturalidade. Efetivamente, nele a dependência do ambiente
24
Para maior aprofundamento, conferir a abordagem psicossocial de Bosco feita,
exponencialmente, por Ferreira (2010).
25
Nota de tradução: “L´originalitá di Don Bosco va probabilmente individuata nella ricchezza
potenziale delle sue intuizioni di educatore, fondatore e organizzatore operanti in un tessuto
dove le forze della sua industriosità sono al servizio di quelle que lo Spirito di dio gli va
profondendo” (PAPES, 1989, p. 57).
26
espiritual do qual provém, às vezes fortemente conservador, se
concilia quase sempre com um realismo que o faz aderir a novas
situações e exigências com moderada ousadia: tradicional sem ser
reacionário, moderno, sem alinhar-se com nenhuma forma de
liberalismo católico.
Seu labor social, assistencial e educativo, permite-nos perceber o quão
perspicaz ele era, que “[...] encontrava crescentes oportunidades de
aperfeiçoar hábitos e comportamentos e adquirir conhecimentos e capacidades
úteis à realização de sua missão específica” (Idem, 2008, p. 202).
Participava de encontros com educadores profissionais, não raras vezes
interagindo com a chamada província pedagógica, grupo de educadores que se
manifestavam na imprensa e jornais. Tais ações dizem de sua presteza e
dedicação no campo educativo.
Segundo Braido (idem, 208 – 209):
Dom Bosco encontrou-se bem cedo também com algumas
expressões explícitas, tanto escritos como pessoas, da “província
pedagógica”, levando a certa interação entre esta e suas experiências
educativas. [...] Dois anos depois, em junho de 1846, a revista
popular de Lorenzo Valério, Leituras de família, tornava público o que
se assinalava sobre a iniciativa oratoriana de Dom Bosco em
Valdocco através de um anônimo – quem é e quem pode tê-lo
solicitado? – acenando brevemente às finalidades, conteúdos e
métodos. Dom Bosco era associado à figura do padre Giovanni
Cocchi, promotor de obra semelhante.
1.3
As obras salesianas
A historiografia salesiana estabeleceu o dia 8 de dezembro de 1841
como início do oratório salesiano; encontro com um jovem de 17 anos,
Bartolomeu Garelli, com Bosco (BRAIDO, 2004). Imediatamente, ele entendeu
o quão importante era criar e consolidar um oratório para os jovens
desamparados, não só da família, mas da própria igreja. O seu primeiro
oratório estará localizado no bairro de Valdocco, oferecendo atividades lúdicas
e religiosas para esses jovens. Sua experiência entre 1841 e 1846, provou que
essa concentração de jovens carentes financeira, afetiva e familiar, somente
27
nos fins de semana, permitia apenas uma formação em ‘gotas’ não
correspondendo aos seus propósitos de uma sólida formação moral e religiosa.
Um importante fator que começou a favorecer uma educação mais
original foi a fundação do primeiro internato salesiano com jovens provindos de
áreas rurais do Piemonte, em busca de trabalho assalariado, que não tinham
onde residir. Bosco, sensibilizado por tal situação, os acolhe no espaço do
oratório. Era o ano de 1847, data de fundação da chamada casa anexa de
Valdocco, uma novidade na época26. Nesse período, fundou também as
chamadas escolas noturnas e escolas dominicais que atendiam a jovens do
internato que trabalhavam em empreiteiras, durante o dia, e, à noite, tinham
oportunidade de estudar.
A assistência às aulas dominicais beneficiava a muitos, mas não
bastava: porque muitos, de bem pouca inteligência, esqueciam
totalmente quanto haviam aprendido no domingo anterior. Foi quando
introduzimos as escolas noturnas que, começadas no Refúgio,
continuaram com maior regularidade na casa Moretta, e melhor ainda
quando pudemos dispor de um local estável, em Valdocco. As
escolas noturnas produziam dois bons efeitos: animavam os rapazes
a vir aprender a leitura, da qual sentiam grande necessidade e, ao
mesmo tempo, nos ensejavam a oportunidade de instrui-los na
religião, que era a finalidade de nossa instituição (BOSCO, 2012, p.
181 – 183).
Já no início dos anos 50, cresceu o número de internos chegando a 80.
Com um bom número de jovens residentes na casa anexa de Valdocco, tornou-se necessário a busca de colaboração financeira para manter essa estrutura,
ainda incipiente. Recebeu, então, recursos de beneficência pública e privada,
além da presença de seminaristas da diocese local para serviços de vigilância,
assistência e docência. A iniciativa do ensino neste local foram os germens das
futuras escolas salesianas.
Bosco, percebendo a exploração em que os jovens se encontravam,
entende que era necessário proporcionar condições de trabalho digno. Assim
fez parcerias com comerciantes e artesãos, intermediando contratos de
trabalho com os mestres de ofício, em que se definiam direitos e deveres de
26
“As condições de aceitação exigiam que o candidato fosse isento de doenças ‘asquerosas ou
infecciosas’, como sarna, tinha escrófula e semelhantes, com atestado médico, obedecendo às
normas legais das autoridades sanitárias e escolares. O sistema antigo de educação das
escolas era disciplinado pelo rosto severo do professor e pelo chicote. As inovações de Dom
Bosco arejavam em demasia a liberdade e causavam preocupação, principalmente, por serem
novidades” (SANTOS, 2000, p. 141 – 142).
28
patrões e aprendizes. Assim, de um lado, estes ensinavam o ofício aos jovens
e, de outro, os mesmos produziam com vantagens para o empregador. Isso
funcionou por certo tempo, sobretudo na área de tipografia.
Em 1853, foram fundadas as oficinas de carpintaria, sapataria, tipografia
e outras. Tinham como trabalhadores os próprios jovens residentes do
internato. Era uma combinação de ensino, trabalho e moradia, tendo como viés
a perspectiva religiosa. Para Bosco, o ato de trabalhar e inserir-se com
qualidade e dignidade na sociedade, de ter moradia e estudar um ofício era um
ato educativo de ordem moral para alcançar uma finalidade escatológica: a
própria salvação (FERREIRA, 2008). Conforme Saviani (2008, p. 13): “[…] o
trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada
indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente
pelo conjunto dos homens”.
Pelos bons resultados das aulas em formato de internato, no ano de
1862, Bosco pede ao Ministério da Instrução Pública a aprovação das escolas
secundárias do oratório como ginásio privado (BRAIDO, 2008).
Com o êxito do ensino da escola secundária em Valdocco, foi solicitado,
por parte do Arcebispo Dom Lorenzo Gastaldi, que Bosco e sua congregação,
já fundada no ano de 1859, assumissem colégios particulares em situação
pedagógica e financeira debilitada. Isto foi motivo de muitas discussões
internas entre os salesianos. Por se tratar de um pedido do arcebispo Dom
Lorenzo
Gastaldi,
(BUCCELLATO,
Bosco
aceita
a
direção
2009). Posteriormente, o
do
prédio
colégio
de
Valsalice
foi comprado
pelos
salesianos, passando a ser patrimônio da Sociedade de São Francisco de
Sales.
Conforme Braido (2004, p. 150):
Depois, a partir dos anos 60, vários colégios-internatos foram
assumidos por Dom Bosco com base em vários convênios com
municípios desejosos de oferecer estudos secundários aos filhos de
boa família do lugar. De Turim, as instituições se espalham
rapidamente pela Itália, fora da Itália, na Europa e além-mar, em uma
cadeia que não cessou de se desenvolver em ritmo ininterrupto e
veloz: [...].
29
Bosco foi também um exímio construtor de edifícios para culto, Igrejas e
capelas27. Ocupou-se de grandes empreendimentos, tanto em Turim como em
Roma.
De forma resumida, Santos (2000, p. 147) explica que:
Para entender o desenvolvimento da obra de Dom Bosco, após 1860,
é necessário examinar a situação da Itália nessa época, envolvida
como estava no esforço de conseguir a unidade política sob o modelo
liberal, que, aliás, se estendia por toda a Europa. O Oratório de
Valdocco fervilhava de atividades nas oficinas, especialmente,
tipográficas que publicavam uma grande quantidade de livros
populares com o objetivo de atender à melhoria da cultura cristã do
povo e também limitar o avanço do protestantismo (considerado por
Dom Bosco como subversivo por tentar eliminar a autoridade) e do
iluminismo, procedente do século anterior.
Igrejas, Oratórios, Escolas e Oficinas profissionais são para Bosco
instituições e ambientes inseparáveis. Muitas destas escolas, passado século e
meio, existem atualizadas pedagógica e cientificamente até hoje28. Além disso,
novas frentes de trabalho educacional foram incorporadas ao contexto
salesiano, como as instituições de ensino universitário (IES), as medidas
socioeducativas com jovens que cometeram atos infracionais e, mais
recentemente, o início de reflexão sobre os novos pátios, entendidos como o
mundo virtual, televisivo, elementos e aparatos de comunicação em geral.
Conformam realidades distintas com públicos diferentes. Esses trabalhos não
foram idealizados por Bosco, embora haja a compreensão que, se vivesse
hoje, seria o primeiro a promover essas modalidades educacionais por
corresponderem às necessidades do nosso tempo, além de estarem arraigadas
no sistema salesiano de educação.
27
“Dom Bosco, financeiramente, partira do nada. Edifícios e terrenos não eram de sua
propriedade, mas alugados. Em Valdocco começara logo a adquirir e ampliar. A primeira
construção relevante, por dimensões e custos em dinheiro, foi a de uma igreja dedicada,
obviamente, a São Francisco de Sales: ‘primeira – escrevia a Rosmini – elevada no Piemonte
em favor da juventude abandonada’ ” (BRAIDO, 2008, p. 243).
28
Torna-se importante esclarecer que, distante de uma tentativa de reforçar a figura de Bosco
como um mito, são elencadas as referências históricas de seus trabalhos e obras realizadas.
30
1.3.1 Na Itália, o período da fundação
No ano de 1859 é fundada a Sociedade de São Francisco de Sales 29.
Após dez anos de reformas, atualizações e acomodações às exigências de
Roma, a fundação salesiana recebe a aprovação definitiva em 1869.
Alguns anos antes, em 1854, Bosco se dirige a alguns jovens
comprometidos30 com o serviço do Oratório e lhes propõe um exercício prático
de caridade e um voto a Deus, sendo as premissas do ato de fundação, que
tinha por finalidade: a colaboração na salvação da juventude, a vivência
virtuosa dos sócios e no bom cumprimento da missão, encontro do caminho da
santificação (CONSTITUIÇÕES SALESIANAS art. 2, p. 20).
A
criação
desta
estrutura
institucional
religiosa
favoreceria
a
continuidade do trabalho realizado por ele e seus colaboradores. Assim não se
perderiam os oratórios, colégios, centros profissionais e Igrejas que estavam
sob sua responsabilidade e administração. Era uma preocupação não só com o
fator administrativo, mas, sobretudo, com o método educativo e catequético
vivenciado em cada ambiente: o Sistema Preventivo.
O período de fundação e expansão inicial da obra salesiana aconteceu,
conforme
elucidações
anteriores,
num
cenário
político
instável,
de
transformações socioeconômicas e de intensos e acalorados debates
29
Francisco de Sales, primogênito entre os 13 filhos dos Barões de Boisy, nasceu no castelo
de Sales, na Sabóia, em 21 de agosto de 1567. Por devoção dos pais ao Poverello de Assis,
recebeu seu nome e, chegado ao uso da razão, o menino escolheu-o por patrono e guia.
Baluarte da Contrarreforma e Doutor da Igreja. Uma das maiores figuras da Contrarreforma
católica na França, tido pelos seus contemporâneos — incluído o grande São Vicente de Paulo
— como a mais perfeita imagem do Salvador então existente na Terra. Disponível em:
http://www.lepanto.com.br/catolicismo/vida-de-santos/sao-francisco-de-sales/. Acesso em: 23jan-2013. Documento avulso. Bosco no século XIX o teve como santo inspirador. A bondade do
trinômio salesiano é reflexo da vida virtuosa de amabilidade e brandura de São Francisco de
Sales. A Congregação salesiana recebe o nome do santo, haja vista a simpatia que Bosco
tinha por este, sem contar que almejava que os membros da nascente fundação tivessem
como guia o estilo de vida de São Francisco de Sales.
30
“Um testemunho escrito pelo padre Miguel Rua, que tinha ido viver no Oratório em 1852 aos
17 anos de idade, recebendo pouco depois a veste clerical, faz remontar a 1854 o empenho
que já contém as premissas de uma consagração com vistas a um ‘exercício prático da
caridade’. Ele escreve: ‘Na noite de 26 de janeiro de 1854, reunimo-nos no quarto de Dom
Bosco: além dele próprio, estavam presentes Rocchietti, Artiglia, Cagliero e Rua. E foi-nos
proposto fazer, com a ajuda de Deus e de São Francisco de Sales, uma experiência de
exercício prático da caridade para com o próximo, a fim de chegar depois a uma promessa e,
em seguida, se fosse conveniente, fazer um voto a Deus. Desde aquela noite, deu-se o nome
de Salesianos aos que se propuseram e, no futuro, propuserem fazer tal exercício”
(BUCCELLATO, 2009, p. 125).
31
educativos e escolares. A religião se via enfraquecida pelos interesses políticos
marcados pelo anticlericalismo e pelas revoluções.
Segundo Lenti (2012, p. 502):
A República Romana terminou com a intervenção francesa. Pio IX
retornou a Roma em abril de 1850. Entretanto, não acabaram os
problemas políticos do Papa. No início e em meados da década de
1850, continuou a secularização da vida italiana; fecharam-se
conventos e mosteiros; decretaram-se leis contra a Igreja.
Roma passou a ser a capital da Itália em 1870, indicando o fim do poder
temporal do Papa. Pio IX, não aceitando tal situação, contestou a lei das
garantias e todas as propostas do governo italiano que buscavam acordo com
a Igreja e se retirou a um confinamento autoimposto no Vaticano (Idem,
ibidem).
Quanto ao cenário político, destaca-se a sucessão de reinados no
Piemonte: Vítor Emanuel I (1802 – 1821), Carlos Félix (1821 – 1831), Carlos
Alberto (1831 – 1849), Vítor Emanuel II (1849 – 1878), Humberto I (1878 –
1900), que tomaram parte na revolução nacional (BRAIDO, 2004).
No período da fundação da obra salesiana, progridem ideias liberais 31,
espalham-se movimentos e sociedades quase sempre secretas, como
maçonaria, as ligas estudantis e as federações decididas em promover
movimentos radicais de inspiração democrática frente à soberania dos regimes
monárquicos.
Conforme Santos (2000, p. 136):
Era a época do Ressurgimento italiano e também de messianismo
educativo, em que fermentavam ideias e projetos de intensa
renovação civil e política do povo, através da criação de escolas,
inclusive filantrópicas, da publicação de livros, jornais e revistas em
que se discutiram os problemas e métodos educativos, especialmente
na Lombardia, no Piemonte e na Toscana. Ao mesmo tempo,
nasciam numerosas congregações religiosas para providenciar a
educação tanto feminina como masculina, quase sempre em regime
de internato (asilos ou os chamados “ospizi”, pensionatos).
31
“O decênio 1852 – 1861 é dominado pelo presidente do conselho, Camillo Benso di Cavour
(ministro desde outubro de 1950). Apoiado em uma coligação de liberais moderados e de
democráticos não extremistas, comandados por Urbano Rattazzi, que conduz uma enérgica
política de liberalização leiga do Estado, com base no princípio ‘Igreja livre em Estado livre’,
unida a uma intensa atividade, visando internacionalizar o problema da unidade da Itália”
(BRAIDO, 2004, p. 20).
32
No ano de 1861, Vítor Emanuel II é proclamado rei da Itália e Roma
declarada formalmente capital, tornando-se capital de fato em 1871, quando
houve a transferência de governo e corte de Florença, capital provisória de
1865 a 1871, para Roma. A configuração política da Itália atual que
conhecemos se dá neste período.
Bosco, embora de matriz conservadora do ponto de vista eclesial e
político32, não se envolveu, porém, nos embates políticos e ideológicos, tendo
diálogo e influência, tanto com conservadores como os liberais33, embora, por
necessidade, tenha recorrido diversas vezes ao auxílio da monarquia e da
Igreja.
O desenvolvimento de suas obras com a tônica dada ao trabalho
educativo e catequético acontece inicialmente no período monárquico, quando
predomina uma política civil conservadora e uma Igreja tradicional. Quando os
ventos da política liberal, e até anticlerical, surgem, Bosco se vê na
necessidade de se adaptar e reelaborar seus planos de fundação e
evangelização34.
32
A literatura salesiana apresenta Bosco como uma pessoa fiel à figura papal, inclusive em
assuntos que envolviam a Igreja e o Estado. No processo de unificação italiana em que parte
do Estado Pontifício foi tomado pela nova república, Bosco permaneceu ao lado dos
posicionamentos e posturas papais (BRAIDO, 2008).
33
Vale ressaltar que o cenário religioso e político da península itálica teve diferentes
configurações no século XIX. Na década de 1840, Bosco e o clero turinês foram perseguidos
por radicais liberais. “[...] também em Turim, houve perquirições e prisões de eclesiásticos fiéis
ao Pontífice. Dom Bosco não foi uma exceção. Estava em boas relações com o Arcebispo no
exílio. Quando o Arcebispo de Pisa foi aprisionado e conduzido a Turim, na casa dos
Lazaristas, Dom Bosco teve um encontro com ele que durou umas duas horas” (FERREIRA,
2009, p. 34). Já na década de 1850, tornou-se intermediário entre figuras políticas como o
primeiro ministro Cavour e o cardeal Antonelli. “Quando Dom Bosco foi a Roma pela primeira
vez, em 1858, recebeu uma carta de Camilo Benso de Cavour. A diocese de Turim estava sem
bispo há muitos anos; Dom Fransoni continuava no exílio e não renunciava ao cargo. Impunha-se encontrar uma solução para o problema. Cavour propunha como saída, que a S. Sé
nomeasse para Turim um coadjutor com direito à sucessão. Em compensação, que fizesse
cardeal a Dom Fransoni, reconhecendo-lhe assim publicamente os méritos. Dom Bosco tratou
do assunto com o Cardeal Antonelli, Secretário de Estado. Voltando a Turim, falou com cavour
e com o Núncio Apostólico, Abade Caetano Tortone. Mas a questão infelizmente não encontrou
uma solução que satisfizesse a todas as partes e as tratativas terminaram em nada” (Idem,
Ididem, p. 33).
34
“O processo de institucionalização provavelmente foi acelerado pela intervenção de fatores
externos. Particularmente um colóquio com o ministro Rattazzi em 1857 teria feito intuir a Dom
Bosco a necessidade de dar continuidade à sua obra e à específica forma jurídica a ser
conferida à nova Congregação, para evitar disposições governamentais e qualquer possível
sequestro dos bens eclesiásticos. Uma viagem a Roma em 1858 e as audiências do papa Pio
IX entre 9 de março e 6 de abril daquele ano teriam finalmente contribuído a estabelecer as
bases da nova Sociedade” (BUCCELLATO, 2009, p. 126).
33
Neste contexto, no Piemonte, há gradual interesse pela cultura e pela
escola popular. Por outro lado, o poder executivo foi pondo limites sempre mais
apertados às escolas particulares. Quanto a isso, Braido (2008, p. 403)
esclarece:
É óbvio que as maiores e mais imediatas preocupações de Dom
Bosco tinham como objeto primordial o Oratório de Valdocco, que se
encaminhava para se tornar, por precedência cronológica, amplitude
e prestígio, a casa mãe tanto das suas obras juvenis como da
congregação religiosa. E o Oratório, por antonomásia, era o arquétipo
e o centro de irradiação de um novo tipo de obras que começavam a
ter prioridade na atividade educativa: as escolas e os aprendizes,
preferivelmente organizados no interior de colégios ou de internatos,
com oratório anexo, festivo e quotidiano.
No ano de 1863, Bosco inaugura a primeira casa salesiana fora de
Turim, Mirabello Monferrato, colégio que abriu as portas com o número de 90
alunos. Seguidamente, colégios e obras foram abertos e/ou passaram à
direção de Bosco junto aos seus salesianos. Tratou-se dum fenômeno notável
de colegialização que se alargou posteriormente. Foram feitos sucessivos
convênios com os municípios de Cherasco (1869 – 1871), Alassio (1870) e
Varazze (1871) para gestão de colégios civis e ainda a aceitação do colégio
dos nobres, de Valsalice – Turim (Idem, ibidem). Também nos anos 1870,
Bosco assume a responsabilidade de construções de Igrejas como a de Nossa
Senhora Auxiliadora, São Segundo, São João Evangelista e outras,
entendendo que a educação sem religião é manca.
Estes empreendimentos foram fruto de uma Itália ainda não unificada,
com diversos problemas: êxodo rural e inchaço demográfico urbano com préindustrialização no Piemonte. Apesar dos problemas econômicos políticos e
sociais, as obras de Bosco: internato – escolas, centros de ofícios profissionais
e Igrejas se expandiram e prosperaram em variadas localidades da Itália,
mostrando já uma vocação de expansão para além dos territórios da península
itálica.
34
1.3.2 No mundo, a caminho da interculturalidade
O
continente
europeu,
representado
pelas
principais
potências
econômicas, vivia no início do século XIX o contexto da restauração da antiga
ordem política deliberada no Congresso de Viena, no dia 1º de setembro de
1814 a 9 de junho de 1815. De todas as deliberações e acordos recolhidos nas
atas do Congresso, eis as mais importantes:
1.
As monarquias da Áustria e Prússia foram restauradas com
numerosas adições e ajustes. Por exemplo, na Itália, com o domínio
sobre Milão (Lombardia), a Áustria recebeu a região de Veneza,
formando o Reino Lombrado-Vêneto.
2.
O Reino dos Países Baixos, integrado por Holanda e Bélgica,
foi formado no quadro do antigo governo hereditário, reinando então
Guilherme I.
3.
Uma Confederação alemã foi criada para substituir a
Confederação do Rin (Rheindund) do tempo de Napoleão e o antigo
Império que compreendia 39 estados soberanos.
4.
A Rússia recebeu a maior parte do Grão-ducado de Varsóvia
(Reino da Polônia), enquanto Cracóvia, ao sul, tornou-se um estado
independente.
5.
O Reino Unido manteve Malta, Helgoland (pequena ilha no mar
do Norte), uma parte das colônias da França e dos Países Baixos e a
República das Sete Ilhas Jônicas, posteriormente cedidas à Grécia.
6.
A Suécia manteve a Noruega, adquirida anteriormente por
força de um tratado.
7.
Os 19 cantões da Suíça passaram a 22, mediante a adição de
Genebra, Neuchâtel e Wallis.
8.
As dinastias da Espanha e dos estados regionais italianos
foram restauradas.
9.
A Grã-Bretanha, Alemanha, Áustria, Prússia e Rússia
mantiveram a fórmula congressual na “Quádrupla Aliança”. (LENTI,
2012, p. 129).
Ilustração 3 – Mapa do império napoleônico
35
Disponível
em:
http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/imperio-napoleonico/periodonapoleonico.php. Acesso em: 19-jan-2013.
O retorno à antiga ordem política representava o retorno à monarquia. A
Itália volta a ser uma ‘colcha de retalhos’, dividida em reinados, ducados e
jurisdições de países vizinhos. Anterior ao Congresso de Viena, entre o período
do consulado, império e o governo de cem dias da era napoleônica, a Europa
recebera outra configuração de ordem política. A França (Cf. ilustração 3) tinha
sob seus domínios, países anexados por força do exército e países vassalos
como o caso da Espanha, havendo sujeição por motivos de herança familiar e
reinado.
Ilustração 4 - Mapa da Europa após o Congresso de Viena (1814 – 1815).
Disponível em: http://www.unificado.com.br/calendario/10/congr_viena.htm. Acesso em: 19-jan2013.
O Reino Unido e a Confederação alemã (Cf. ilustração 4), potências
econômicas expressivas pós Congresso de Viena, tiveram no contexto da
revolução industrial, relevante projeção no cenário mundial. A estável relação
diplomática com a península itálica favoreceu que esta angariasse recursos
para a incipiente pré-industrialização da época de Bosco, e não somente nesta
36
região, mas em todas as futuras nações e países subjacentes como Espanha,
países baixos, França, etc.
A industrialização proporcionou às nações europeias o desenvolvimento
econômico, como seus benefícios e mazelas como inchaço demográfico
urbano, e com crescimento de problemas como a violência, a falta de moradia,
a baixa e/ou inexistente qualidade de escolarização dos imigrantes e das
pessoas provindas de áreas rurais, etc. Neste contexto 35, muitas Ordens e
Congregações religiosas foram interpeladas a assumir o trabalho com
internatos, abrigos, obras sociais, escolas profissionais, gráficas e oratórios
festivos (PASSOS JÚNIOR, 2011).
Os salesianos de Dom Bosco (SDB), já estabelecidos e consolidados
como Congregação na Itália, partem para expedições missionárias. Em 1875,
ano do impulso missionário, desenvolvem e constroem obras em Bordighera –
Vallecrosia (Itália), Nice (França), Almagro (Argentina), Buenos Aires
(Argentina), Montevidéu (Uruguai) Marselha (França), Utrera (Espanha), Paris
(França) (BRAIDO, 2004).
Como nos diz Ferreira (1995, p. 55 - 56):
Desde 1875, a congregação começou a sua expansão na Europa e
na América. Na França, ele tinha fundado a casa de Nice. E de Turim
tinha deixado para a Argentina a primeira expedição missionária
salesiana. Guiado por Dom Cagliero, chegou ao porto de Montevidéu.
[...] Os salesianos no momento prosseguiram a viagem para Buenos
Aires e no ano seguinte aceitou o colégio Villa Colón. Depois, veio o
pedido de ajuda pelo Delegado Apostólico, Mons. Angelo Di Pietro,
para resolver a grave situação em que se encontrava depois da
Guerra do Paraguai da Tríplice Aliança. Dom Bosco aceitou o convite
da Santa Sé para enviar missionários e nomeou o inspetor de Buenos
Aires encarregado de prover. Mas no final vieram os lazaristas,
enquanto os salesianos os substituíam na Patagônia. [...] A
congregação tinha propostas para abrir missões no Oriente e nos
35
“Com o declínio das corporações de ofício, no século XIX, floresceram na América e,
sobretudo na Europa congregações religiosas masculinas e femininas preocupadas com o
ensino profissional, tais como Salesianos, Lassalistas, Irmãs da Congregação de São José,
etc. São congregações que estruturam suas atividades pedagógicas à luz das necessidades
sociais criadas pela industrialização e urbanização. O estudo do ensino profissional dessas
congregações é muito importante para se entender as escolas técnicas e profissionais do
século XIX, uma vez que aquele ensino constitui, de certa forma, o embrião dessas escolas”
(BUFFA, NOSELLA, 1998, p. 35).
37
Estados Unidos: as negociações entravam em porto após a morte do
36
fundador (Tradução nossa).
Tal expansão missionária ultrapassou fronteiras do além mar. Desde o
primeiro envio missionário pelas mãos de Bosco, em 1875, a tantos países,
também ao Uruguai, o mais distante nesse período, fincou raízes em solo sulamericano37.
A expansão missionária, no final do século XIX, e da congregação, no
século XX, tem como causa não somente o êxito e eficiência do método
educativo, mas também os esforços de adaptação38 dos sócios salesianos às
realidades das nações que os requisitaram como missionários.
Não é fácil adequar-se a uma cultura. Portanto, o aculturar-se, tornou-se
ao longo dos tempos, o primeiro passo para a vivência da pedagogia da
bondade de Bosco. O êxito da rápida expansão se deu de acordo com a
capacidade de se integrar e interagir dos salesianos39 com os povos de
36
Nota de tradução. “Dal 1875 la congregazione aveva iniziato la sua espansione in Europa e
in America. In Francia si era fondata la casa di Nice. E da Torino era partita per l'Argentina la
prima spedizione missionaria salesiana. guidata da don Cagliero, aveva toccato il porto di
Montevideo. [...] I salesiani al momento proseguirono il viaggio per Buenos Aires e l'anno
successivo accettarono il collegio di Villa Colón. Venne poi la richiesta di aiuto da parte del
delegato apostolico, mons. Angelo Di Pietro, per tentare di risolvere la grave situazione in cui si
trovava il Paraguay dopo la guerra della triplice Alleanza. Don Bosco accettò l'invito della Santa
Sede di inviarvi missionari e diede all'ispettore di Buenos Aires l'incarico di provvedere. Ma alla
fine vi andarono i lazzaristi, mentre i salesiani li sostituivano in Patagonia. [...] Alla
congregazione arrivavano proposte di aprire missioni anche in Oriente e negli Stati Uniti: le
trattative sarebbero arrivate in porto dopo la morte del fondatore”.
37
No final do ano de 2012, os salesianos no mundo somam um contingente de
aproximadamente dezesseis mil membros em cento e trinta e uma nações.
38
É importante mencionar que a palavra “adaptação” deve ser entendida como capacidade de
operacionalizar os recursos materiais e logísticos da época. Por outro lado, do ponto de vista
ideológico e religioso, Passos Júnior (2011, p. 107) afirma que, fruto de um processo de
romanização; “[...] a grande missão que lhes cabe é civilizatória que como europeus, se
entendem portadores de uma cultura superior que deve ser passada para um povo bárbaro.
Como educadores devem passar o saber para ignorantes. Como sacerdotes devem converter
a pecadores devassos. Como católicos devem restaurar verdadeira religião fiel ao papa. Da
nova terra nada têm a receber e tudo tem a dar. Transplantar, literalmente a Europa, seus
costumes, mentalidade, hábitos e práticas são um ato de caridade cristã e civilizatório. Daí, os
colégios se fecharem como ilhas para o mundo ‘lá fora’ e se constituírem ‘cidades’ perfeitas de
sabedoria, ciência, saber e conhecimento. Ignora-se a realidade dos autóctones que serão
educados quando forem europeizados e serão evangelizados quando forem romanizados”.
39
Nós, Salesianos de Dom Bosco, oficialmente pertencidos à Sociedade de São Francisco de
Sales, somos reconhecidos na Igreja como um instituto religioso clerical de direito pontifício,
dedicados às obras de apostolado. Somos uma congregação religiosa masculina dedicada à
atividade apostólica e missionária e para os muitos trabalhos diferentes, inspirados pela
caridade cristã, mas, acima de tudo, a serviço dos jovens, especialmente os mais pobres e
abandonados (Tradução nossa). “Noi salesiani di Don Bosco, conosciuti ufficialmente come la
Società di San Francesco di Sales, siamo riconosciuti nella Chiesa come istituto religioso
clericale, di diritto pontificio, dedito alle opere di apostolato. Siamo una Congregazione religiosa
38
variadas nações com seus respectivos costumes, culturas e contextos
particulares. Villanueva (2012, p. 12) ressalta que a aculturação é:
[...] marcada também pela crescente mentalidade intercultural. A
globalização, a migração crescente e a fusão de culturas criam
possibilidades de encontro, provocando certa purificação das
mesmas estruturas e convidando à valorização das diferenças.
As obras salesianas, desde sua origem até os dias atuais, tiveram papel
definido em sua ação.
Fazer ver o Sistema Preventivo na ótica da promoção de cada
menino ou menina a educar, a resgatar na totalidade de sua vida, no
sentido da antropologia cristã, mas com uma referência precisa à
transformação da sociedade, para que já não sejam marginalizados
(Idem, 2008, p. 32).
Desde sua fundação, os salesianos sabem que sua fidelidade a Bosco
está condicionada à fidelidade aos princípios cristãos e à prática do sistema
preventivo que tem na presença do educador entre os educandos o sinal mais
visível de que é discípulo deste educador piemontês.
1.4
Princípios referenciais da práxis educativa salesiana
Bosco não foi apenas um teórico da educação. Sua práxis pedagógica
se condensa num conjunto emaranhado de princípios e valores religiosos e
humanos de base intuitiva, experiencial, de sua inteligência arguta e
observadora (PASSOS JÚNIOR, 2011).
Neste sentido, Sofner e Sandrini (2012, p. 13) afirmam:
João Bosco trabalha o conceito de práxis em sua pedagogia quando
se preocupa com a autonomia que os jovens deverão apresentar em
relação à vida, no difícil momento histórico em que vivem. Não basta
o oferecimento da educação formal, há que se preparar os
educandos para as questões e conflitos da vida. Sua proposta de
emancipação das pessoas chega ao nível de prepará-los para os
ofícios, o que pode parecer paradoxal, mas no contexto do
industrialismo europeu é pertinente. Sua interpretação do que seja a
pedagogia, não apenas a forma pela qual um conteúdo ou lição seja
maschile dedita all'attività apostolica e missionaria ed alle molteplici opere che la carità cristiana
ha suscitato, ma soprattutto al servizio dei giovani, specialmente i più poveri e abbandonati”.
Disponível em: http://www.salesianos.com.br/links-salesianos/congregacao.html. Acesso em:
19-jan-2013.
39
transmitida aos aprendentes, mas algo a ser executado e praticado
em vida, transformando-se em experiência vivida com valor de
reflexão do processo como um todo, é ainda perseguido em nossos
tempos por teóricos e pensadores da educação.
Bosco “[...] visava o progresso do educando na formação de sua
consciência e na consolidação de suas convicções para que fosse adquirida
plena autonomia no querer e praticar o bem” (SOUZA, 2008, p. 263). Uma
consciência livre, convicta e autônoma, articulada com princípios e valores,
favorece uma educação integral40 em seu quadro de potencialidades e
dimensões.
O método pedagógico de Bosco tem como elemento central a pessoa
numa perspectiva antropológica cristã: educadores e educandos num ambiente
salesiano vivenciam, por meio de práticas pedagógicas e pastorais cotidianas,
elementos considerados afetivos e religiosos. Habermas (1996) define essa
relação de alteridade no quadro educativo de simetria de convivência. Esta
equiparação da categoria pessoas e não funções e cargos permite criar um
ambiente afetuoso, pautado no entendimento da alteridade de respeito ao
outro.
Outro fator que corrobora neste argumento é que para Villanueva (2008,
p. 15) “Os jovens devem ser provados na responsabilidade, no cumprimento
dos valores41 que proclamam, na solidariedade, na autogestão”. Promover a
responsabilidade do jovem não é buscar um ‘produto’ final mercadológico, e
sim, a lapidação de uma vida. Na educação salesiana, o jovem não é
conhecido com testes psicológicos ou no desenvolvimento de áreas específicas
de trabalho ou estudo, mas sim, no pátio 42, e ambiente em que ele é
espontâneo.
40
Em um enquadramento geral de dimensões do ser humano, se faz referência ao intelectual,
espiritual, humano, afetivo, psicológico, etc.
41
A ideia de valor está direcionada a vertente psicológica, por tratar dos comportamentos e
atitudes das pessoas, no caso deste texto, o jovem.
42
“A expressão ‘vida do pátio’ foi criada por Alberto Caviglia, o primeiro estudioso que tentou
uma ampla síntese do pensamento pedagógico de Dom Bosco. A ‘vida do pátio’ deve ser
entendida em sentido amplo, pois inclui passeios, encontros espontâneos pelas estradas e nos
vários ambientes, as reuniões alegres e descontraídas. Enfim, tudo aquilo que não é
determinado pelo regulamento e não depende da administração ordinária. Deve-se incluir,
portanto, o teatro, o canto e a música, entendidos, porém, não como aula e, sim, como recreio,
isto é, diversão livre e criativa, e, por fim, também as grandes ‘festas’, com sua coreografia,
semelhança às competições esportivas” (PERINI, 2012, p. 93).
40
“Por vida de pátio, Dom Bosco não entendia nem a ginástica, concebida
como aula, que exige atenção e trabalho, nem o esforço cansativo, e sim, um
divertir-se com jogos, livre de qualquer preocupação exagerada” (PERINI,
2012, p. 93). Estratégia permeada pelo princípio da assistência salesiana. Estar
presente43, afetuosa e responsavelmente é uma orientação e ensinamento vital.
Exige disciplina e empenho. Processo educativo que relaciona o amor e a
autoridade (VILLANUEVA, 2008).
O núcleo fundamental da pedagogia de Bosco é o sistema preventivo 44,
pautado pela razão, religião e amorevollezza 45. Portanto, sua proposta
educativa é um estilo singular de educação pastoral, uma espiritualidade vivida
na ação, pois não está e não se constitui nos moldes de um sistema científico
(FERREIRA, 2008).
O sistema preventivo, tal como é conhecido por nós hoje, tem elementos
originários da primeira parte do século XIX, provenientes da política escolar
francesa. O afloramento da discussão do termo preventivo coexistia com o
método repressivo, vigente na época.
Braido (2004, p. 69) referenda:
Na França, o “sistema preventivo” era sustentado pelos fautores, em
sua maioria leigos, do monopólio estatal da escola, como era
consagrado pelo sistema napoleônico da “Universidade”. Este excluía
“preventivamente” toda possibilidade de “escola livre”, não – estatal,
ou então sustentava a imprescindibilidade de uma “autorização
preventiva”. Era, na realidade, um sistema preventivo-opressivo”. [...]
O “sistema repressivo”, ao contrário, era próprio de quantos
propugnavam, de vários modos, a liberdade de ensino, sancionada
em linha de princípio pela Carta constitucional promulgada por Luís
Filipe I de Orléans, em 14 de agosto de 1830. O sistema era
chamado “repressivo” porque a lei Guizot, de 28 de junho de 1833,
que aplicava o texto constitucional, previa vários tipos de controle
sobre os institutos privados, até a eventual supressão no caso de
graves inadimplências de caráter jurídico, moral e didático.
43
“A carta de Roma, de 1884, insiste nesse ponto. ‘Onde estão os nossos salesianos?’
questiona o ex-aluno. E Dom Bosco conclui: os superiores já não eram a alma dos recreios”
(FERREIRA, 2008, p. 27).
44
“O princípio preventivo inspira os participantes do Congresso de Viena, reunidos para
redesenhar o mapa político da Europa, após a tempestade napoleônica, com o fim de restaurar
o antigo, conservando o que de positivo haviam trazido as novas ideias e os novos tempos”
(BRAIDO, 2004, p. 29). Na educação, ampliou-se a discussão de propostas e alinhamentos.
Bosco recebeu forte influência deste contexto.
45
Para uma melhor assimilação do termo e fluidez na compreensão do conceito amorevollezza,
no transcorrer do texto será utilizada a palavra bondade.
41
O sistema repressivo sempre vigorou na história da educação. Ele se
apoia na exigência arbitrária dos educadores e na repressão inconteste.
Mantém a hierarquia e distanciamento entre educador e educando, gerando
desafetos, ressentimentos e rancores. Neste sentido, entende-se que “[...] a
educação é analisada como uma prática disciplinar de normalização e de
controle social” (LARROSA, 1994, p. 52). A estrutura hierárquica é própria da
área militar, nem tanto na educação, embora se reconheçam papéis e o
mínimo de regramento para que ocorra a educação, respeitando processos e
itinerários de formação.
O Sistema Repressivo consiste em fazer conhecer a lei aos súbditos,
depois vigiar para conhecer os transgressores e infligir, quando
necessário, o castigo merecido. Neste sistema, as palavras e o
aspecto do superior devem ser sempre severos e, até ameaçadores,
e ele mesmo evitar qualquer familiaridade com os dependentes [...].
(SANTOS, 2000, p. 118)
Os autores Costa e Filho (2002) afirmam que, além do já conhecido
modelo repressivo que assumiu no século XX, formas ainda mais degradantes
e perversas do que aquelas vivenciadas em outros períodos da história, há
também, como forma de classificação, o modelo preventivo clássico. Tem
como vértice, o ambiente educativo, embora tenha surgido na área da saúde.
Trata-se de possibilitar ao educando uma confrontação com resultados
danosos, de modo que ele venha adquirir consciência da realidade. Os autores
reconhecem que tal abordagem tem seu efeito dissuador, gerando sentimentos
de medo e temor. Larrosa e Skliar (2001, p. 11), em forma de contestação,
apresentam a ideia de que “[...] o problema já não é a dominação e tem-se a
impressão de que os homens não devem aprender a viver livres, mas a viver
juntos e a comunicar-se ordenadamente”, para administrar as diferenças em
suas modalidades de representação do outro. Para estes, o cerne da educação
está nas relações humanas, e, não tanto nas estruturas, programas e recursos.
Costa e Filho fazem, ainda, menção à chamada educação no paradigma
do desenvolvimento humano, que aborda a formação do jovem, partindo do
critério do querer formar e não do evitar dano. São trabalhados elementos que
favorecem o desenvolvimento e crescimento do educando em detrimento de
aspectos de risco à sua pessoa e ao social. Este modelo se apoia na força do
jovem e não na consideração de suas vulnerabilidades.
42
Com uma descrição analítica e cronológica de atitudes de abordagem
educativa, reconhece-se um último modelo, visto como neopreventivo, em
outras palavras, a preventidade de Bosco sob uma nova roupagem. Neste
sentido, conforme Costa e Filho (2002, p. 78):
[...] na relação entre jovens e riscos ao seu normal desenvolvimento
como pessoas, cidadãos e futuros profissionais, ocorre no modelo
neopreventivo. Esse modelo, ao invés de enfatizar os danos, procura
incentivar o jovem a assumir uma atitude de autoafirmação de sua
identidade e de sua autoestima. Assim, no marco desse paradigma,
vemos os adultos incentivarem os jovens a serem eles próprios e a
gostarem mais de si mesmos, como forma de incentivo à adoção de
condutas que evitam os riscos. Hoje em dia, esse é o modelo mais
praticado pelas escolas, paróquias e obras sociais populares quando
se trata de evitar o envolvimento dos jovens com produtos e
situações que podem ser lesivas ao seu normal desenvolvimento
pessoal e social.
Com a junção de elementos culturais, sociais, acadêmicos e tantos
outros, Bosco deu forma ao seu sistema preventivo, com princípios de
religiosidade, moralidade e de ordem que inspiravam as práticas educativas de
suas obras. O jovem educando, preventivamente avisado e consciente das
orientações estabelecidas, não se surpreende e nem se sente humilhado pela
advertência por uma falta cometida. “O Sistema Preventivo torna avisado o
aluno de modo que o educador sempre possa falar com a linguagem do
coração, seja na fase educativa, seja depois dela” (SANTOS, 2000, p. 119).
Atualmente, trabalha-se o retorno aos princípios originais elaborados e
legados por Bosco. Não se trata mais de fazer do modo como ele fazia, já que
o contexto de época era outro, mas capturar os critérios por ele elaborados,
adequando-os à realidade juvenil do hoje.
Para Ferreira (2008, p. 31):
A preventividade, no entender de Dom Bosco, não pode ser
concebida como simples proteção ou defesa exterior do educando.
Seu verdadeiro sentido é positivo. O sistema preventivo, desde o
ponto de vista etimológico, revela-se muito rico de conteúdo: o
sentido de chegar com antecedência.
À luz do pensamento de Bosco, tal procedimento preventivo é guiado
pela razão, moldado pela religião e sentido pela bondade.
43
1.4.1 Razão
A Razão era entendida por Bosco como razoabilidade entre a análise
dos diversos fatos e aspectos do cotidiano e o bom senso no uso moral e ético.
Ressaltando o mesmo aspecto, embora sejam com outras palavras e contexto,
Gramsci, nas palavras de Jesus (2005, p. 37), diz que “[...] não se deve apontar
para um ‘espontaneísmo’ cultural, que deixaria a formação do indivíduo à
mercê do acaso. Fica o exercício do pensamento, adquirido por ideias gerais e
pelo hábito de ligar causa e efeito”.
Não há dúvidas que há uma visão metafísica que é apreendida de forma
subjetiva por cada educando que experiencia a salesianidade, na medida em
que é o objeto deste sistema educativo.
Quando este jovem é convencido da relevância de tais princípios
educativos, transforma, assumindo-os. Uma forma profícua de se alcançar
essa razoabilidade é o diálogo, fruto do respeito e confiança entre educadores
e educandos, promovendo o equilíbrio entre a sabedoria popular e
intelectualidade.
Para Ferreira (2008, p. 17), entende-se que:
Ao diálogo unia-se a convivência. Se o educador entrava no meio dos
jovens e falava com eles, acabava vendo o mundo deles com uma
nova sensibilidade. Era com o diálogo e a convivência que o
educador conseguia colocar-se no lugar social dos jovens. O
educador tomava o jovem onde se encontrava e começava daí. Era
puro bom senso e o segredo de todo auxílio.
No período de Bosco, cabia ao educador mostrar a racionalidade das
normas, em uma perspectiva diretiva, semelhante ao que entendemos por
educação bancária46, segundo Paulo Freire, associando este modelo
pedagógico tradicional. Nos salesianos atuais prevalece o conceito de
‘protagonismo’ entendendo uma ação ativa do educando no seu processo
educativo, reconhecendo que ele é capaz de contribuir de forma ativa na
própria educação, cabendo ao educador neste processo, o papel de facilitador
e articulador, não só da aprendizagem, mas, sobretudo da educação.
46
Termo desenvolvido por Paulo Freire e faz alusão a ideia do aluno como depositário de
conteúdo (FREIRE, 1987).
44
1.4.2 Religião
Quanto à religião, pela sua própria natureza dá ensinamentos e
preceitos de que Bosco procurava contextualizá-la para o cotidiano da urbe, o
diferente das práticas religiosas do campo (PASSOS JÚNIOR, 2011).
Para ele não havia sentido o trabalho educativo, se não tivesse como
vértice a figura divina47. Entendido e integrado este princípio, o educando
poderia então, por meio da pessoa do educador, moderar seus ideais de
mundo. “Entende-se assim, que o ser humano possui uma propensão a buscar
significado para a vida por meio de conceitos que transcendem o tangível”
(GIOVELLI et al, 2008, [S/P]). Desta forma, o jovem, quando percebido e
entendido de forma explícita e radical o sentido de sua existência, passa a
demonstrar corresponsabilidade na vida de fé.
Estar com o jovem é educá-lo implícita e suavemente. A religião
desenvolve não só a consciência do transcendente, mas também promove a
responsabilidade das ações. É neste sentido que a ação educativa e religiosa
se complementam. Desta visão surge a máxima salesiana de evangelizar
educando e educar evangelizando. Duas faces indeléveis do legado de Bosco,
que ainda que distintas, complementam-se.
Entende-se a partir de Ferreira (2008, p. 22) que:
A religião não tinha para Dom Bosco uma função puramente exterior
ou instrumental. Não desejara que se fizessem práticas de piedade,
nem queria, em si e por si, a frequência aos sacramentos pelo
simples fato de que são eficazes para a educação. Viver a religião era
tornar mais robusta a vida de graça, prevenindo em tempo as insídias
do mal.
Não eram impostas práticas devocionais ou de piedade, ainda que fosse
sob uma ótica reforçadora da religiosidade popular (SANTOS; CASTILHO,
2003). Na tentativa de favorecer condições de crescimento espiritual e religioso
aos seus jovens, sempre oportunizou a conversa pessoal e o aconselhamento.
47
Figura divina pautada em um modelo de Igreja Católica Apostólica Romana institucional e
não como comunhão, concepção eclesial atual. Deus é entendido como figura masculina,
cultuado em instituições específicas como ordens e congregações religiosas. A relação do
divino com o humano era mediada por um sacerdote.
45
Como nos diz Leal (2010, p. 40): “Acompanhar era para ele uma necessidade
do amor pastoral e educativo próprio de sua vocação”.
Sobre o tema de acompanhamento e redirecionamento existencial 48,
Pieri (apud Souza 2012, p. 11) nos diz que: “Na orientação, há de fato, uma
importância fundamental não somente aos diretamente interessados, os
jovens, mas também aos pais, professores, educadores, instituições de ensino,
locais de trabalho, a realidade social”.
O direcionamento existencial do jovem para o catolicismo acontece não
somente pelo diálogo, mas também, na vida cotidiana, no transcorrer de
atividades recreativas, festivas na comunidade educativa, ambientes de relação
social que proporcionem experiências significativas de vida. Este ambiente
católico pode suscitar um redirecionamento existencial, conscientização e
capacidades de mobilização.
1.4.3 Bondade
A bondade é o terceiro elemento da ação educativa de Bosco. Ainda que
citado por último, após a razão e religião, é, porém, o primeiro elemento a ser
sentido pelo jovem pelo respeito e amor percebido nos educadores. Não é nem
uma cordialidade pegajosa e muito menos uma ‘técnica pedagógica’. Trata-se
de um real e perceptível afeto (SANTOS; CASTILHO, 2003).
Amar é mostrar apreço pelos outros e é neste sentido que o educador
demonstra por suas ações, gestos e palavras, que o jovem é importante,
querido e capaz. “Tal amor tornava o educador presente no coração do
educando, até mesmo nos momentos em que a presença física não era
possível” (FERREIRA, 2008, p. 12).
Bosco valorizava o que o jovem gosta, facilitando uma aproximação
amistosa, para que, por meio de mista intenção, o educador pudesse passar a
48
“O programa articulou-se a partir de uma tendência humanista existencial cristã” (MARTINS,
2010, p. 51).
46
valer para o educando. Era gostar do que o jovem gosta para que este também
goste do que o educador gosta. Não é um jogo de manipulação, mas o
reconhecimento da realidade juvenil. Tanto é que, anterior ao ponto de dar o
primeiro passo em direção ao jovem, ainda que seja difícil, o educador deve se
despojar de seus preconceitos e juízos de valor, em preparação para esse
encontro, para que a relação entre educador e educando seja válida, autêntica
e sustentável (SOUZA, 2008).
É neste sentido que Ferreira (2008, p. 12) referenda:
Para Dom Bosco, a pessoa do educador exprime de maneira
encarnada a amorevollezza: presença significativa de caridade
pastoral, de equilibrado e profundo amor, de afeto demonstrado.
Afeto racional, jamais conturbado pelo egoísmo sensual ou por
atitudes doentias. Afeto incondicional pelos jovens, que permanece
apesar das faltas que acontecem, que se manifesta no compreendê-los, no sentir os fatos do ponto de vista deles, no permitir que eles
mesmos encontrem o caminho para a sua correção e o próprio
crescimento. “Esquecer e fazer [o jovem] esquecer os tristes dias de
seus erros é a arte suprema do bom educador”.
Trabalhar com jovens é dar vez a sonhos e confiar em projetos a médio
e longo prazo. Essa bondade tem suas bases na razão. Guiado por ela, a
bondade desperta a sensibilidade à criatividade, o sentimento da dignidade
pessoal e da confiança em si (Idem, ibidem). Mais do que uma metodologia, ela
é uma pedagogia em seu sentido de ordenar métodos, uma pedagogia do
amor, que respeita e promove os direitos dos jovens. A educação salesiana
está pautada nesta ideia de bondade que se constrói nas relações de respeito
e empatia com os jovens.
Hoje estes princípios educativos e pedagógicos de Bosco encontram eco
no Estatuto da Criança e Adolescente49 (ECA), que traz como disposição
preliminar, no artigo primeiro que “Esta lei dispõe sobre a proteção integral à
criança e ao adolescente”, afirmando os direitos fundamentais de liberdade,
respeito, dignidade, convivência familiar e comunitária.
Neste sentido, os princípios referenciais salesianos asseguram ao
jovem, formação integral em uma ótica antropológica. As relações afetuosas
favorecem o desenvolvimento das potencialidades do jovem educando. Método
49
Cf. Lei Nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente e dá outras providências. Anexo A, p: 196.
47
e abordagem que não se contradiz ao inferido no ECA, mas o concretiza com
um tinte salesiano.
O método preventivo de Bosco, tendo sido, sistematicamente, aplicado
nos colégios e no pequeno seminário nos idos de 1863 – 1864, foi robustecido
e consolidado quando mais colégios salesianos eram abertos. Os resultados
desta pedagogia se fizeram também pela difusão de escritos biográficos de
alunos de Bosco, tais como Domíngos Sávio50, Miguel Magone51 e Francisco
Besucco52. Estes jovens, descritos como virtuosos53 por Bosco, representam
para ele a concretização e êxito de seu método educativo e pedagógico.
50
Domingos nasceu 02 de abril de 1842 em San Giovanni di Riva próximo à Chieri, na
Província de Turim. Morre em 1857 no Oratório de Valdocco - Turim.
Cresceu em uma família rica de valores. Quando pequeno impressionou muito por sua
maturidade
humana
e
cristã.
Esperando
o
padre
fora
da
igreja,
mesmo sob a neve, para servir na missa. Ele estava sempre alegre. Levou a vida com
seriedade, de modo que apenas com sete anos foi admitido a fazer a Primeira Comunhão.
Traçou
em
um
caderno
seu
projeto
de
vida:
Confessarei-me
muitas vezes e farei a comunhão todas as vezes que o confessor me permitir. Quero ser santo
e tornar os dias festivos (Tradução nossa). “Domenico nacque il 2 aprile 1842 a San Giovanni
di Riva, presso Chieri, in provincia di Torino. Muere en 1857 en el oratorio de Valdocco – Turim.
Cresciuto in una famiglia ricca di valori, _n da piccolo impressionò moltissimo per la sua
maturità umana e cristiana. Attendeva il sacerdote fuori dalla Chiesa, anche sotto la neve, per
servire alla santa Messa. Era sempre allegro. Aveva preso con serietà la vita, tanto che _
ammesso a soli sette anni alla Prima Comunione _ tracciò in un quadernetto il suo progetto di
vita: _Mi confesserò molto sovente e farò la comunione tutte le volte che il confessore me lo
permetter
à.
Voglio
santi_care
i
giorni
festivi”.
Disponível
em:
http://sdl.sdb.org/greenstone/collect/italian/index/assoc/HASH01ca.dir/doc.pdf. Acesso em: 23jan-2013. Citação de documento eletrônico avulso.
51
Miguel Magone, ou o “rueiro de Deus”, (1845 – 1859). Dom Bosco definiu a vida como uma
vida única e romântica. A biografia de Dom Bosco agradou muito aos colegas que o tinham
conhecido. Agradará também aos meninos de hoje, dado que a história de Miguel poderia ser a
historia de qualquer moleque das ruas (Tradução nossa). “Miguel Magone, o ‘el pandillero de
Dios’, (1845 – 1859). Don Bosco definió la vida de Magone como ‘una vida singular y
romántica’. La biografía escrita por Don Bosco agradó sobremanera a los compañeros que lo
habían conocido y amado. Y agradará también a los muchachos de hoy, dado que la historia
de Miguel podría ser la historia de cualquier chico de la calle”. Disponível em:
http://www.salesianosaqp.edu.pe/site/iMiguelmagone.html. Acesso em: 23-jan-2013. Citação de
documento eletrônico avulso.
52
Francisco Besucco (1850 – 1864) Muito piedoso, tímido, sensível, impressionante. De
inteligência normal. Foi acompanhado antes de seu ingresso no Oratório. Quer ser padre
(Tradução nossa). “Francisco Besucco (1850 – 1864) Muy piadoso, tímido, sencillo,
impresionable. Inteligencia normal. Muy trabajado antes de su ingreso en el Oratorio. Quiere
ser
sacerdote”.
Disponível
em:
http://www.conoceadonbosco.com/descargas/estudios/Acompa%C3%B1amiento%20en%20bio
grafias%20juveniles%20Don%20Bosco.pdf. Acesso em: 23-jan-2013. Citação de documento
eletrônico avulso.
53
Qualidade moral de cunho subjetivo com certa inclinação para o bem. Na época de Bosco, a
Igreja romana perde os poderes de regente civil, perde também certa incidência religiosa sobre
o povo. Até esse momento de passagem de poderes da Igreja para o Estado, era exigido dos
fiéis leigos apenas o cumprimento das leis e ritos eclesiais. Hoje, esperam-se do fiel leigo a
48
Bosco divulgou sua obra, utilizando dum marketing de seu tempo: as
cartas enviadas a jovens familiares, a amigos e a jornais. Criou e popularizou
fascículos populares, escritos em estilo jornalístico.
Segundo Braido (2008, p. 551):
[...] Dom Bosco continuava a atividade de escritor e editor no decênio,
dedicando a mesma solicitude pela continuação e difusão das
Leituras Católicas, com atenção maior às regiões recentemente
anexadas ao Reino da Itália. A Cultura popular, religiosa e de
entretenimento continuava um de seus principais cuidados e, em
base às Constituições, tornava-se um dos fins operativos primários da
Sociedade de São Francisco de Sales.
Esse trabalho de difícil divulgação de suas ideias educativas ampliou
seus resultados com a implantação de uma tipografia em Valdocco,
intensificando a estamparia e edições de livros, o que fez com que o seu
trabalho educacional fosse divulgado e prosperasse54.
consciência e a disposição de reconhecer a manifestação do transcendente em sua vida, bem
como entender sua missão, segundo suas condições humanas e culturais.
54
“A progressiva fundação de escolas secundárias e dos respectivos colégios-internatos abria
novo campo de empenho cultural em benefício de um público, sobretudo católico, mais vasto: a
produção didática e paradidática, em especial no setor das línguas e literaturas italiana, latina e
grega. A este fim, enquanto trabalhava pela liberdade de ensino, Dom Bosco exortava os
professores mais apreciados e capazes a qualificar-se com a preparação de textos escolares,
comentários de autores latinos, edições de textos clássicos italianos, dicionários. Era também
uma exigência imposta pelos novos programas introduzidos na escola com a Itália unificada.
Assim, em 1866, tendo como responsável o neo-laureado padre Frencesia e contando com a
colaboração de Tommaso Vallauri, da Universidade de Turim, nascia a coleção Selecta ex
latinis scriptoribus in usum scholarum. No primeiro biênio a coleção atingiu vinte e quatro
títulos, colocando-se no nível das outras principais editoras escolares turinesas, Loescher e
paravia. A partir de 1869, a coleção acolheu também obras destinadas aos liceus. Em 1884 era
atualizada quanto aos textos críticos adotados e ao tipo dos comentários, ampliando o arco dos
colaboradores e dos destinatários, escolas privadas e públicas. A atividade continuou com
ritmo intensificado nos anos sucessivos até atingir, em 1910, os setenta e cinco mil volumes”
(BRAIDO, 2008, p. 554).
49
1.4.4 Os sonhos
Na tradição da educação salesiana ganham destaque os “sonhos” de
Bosco. Não nos importa se foram sonhos ou se um método de dramatização de
sua pedagogia, ou ainda que tenham sido simples parábolas. O fato é que
essas narrações materializam de forma explícita o seu ideário educacional.
O “sonho”55 dos nove anos é fundamental para quem estuda a educação
salesiana, visto que seus objetivos e métodos estão aí explícitos. Neste sonho,
Bosco expressa sua missão de educador, como estilo de vida e base da
espiritualidade salesiana56.
Padre Lemoyne, um de seus biógrafos, afirma que as palavras “sonho e
Bosco” são correlatas, pois é admirável a repetição do fenômeno durante sua
vida. Como nos diz Ferreira (2008, p. 33), por meio do sonho,
Propõe-se uma meta a ser atingida ou norma de vida a ser seguida.
Mas não se indicam os meios concretos para se atingir essa meta.
Essa tarefa fica entregue à industriosidade do sonhador. A vida vivida
pelo santo confirmará a proposta de sonho e levará à realização de
quanto ali contido.
55
João Bosco foi chamado de homem dos sonhos. Começando do sonho vocacional tido aos
nove anos até os sonhos grandiosos sobre o futuro das missões salesianas, toda sua vida e
apostolado foram iluminados por estas manifestações psíquicas que o faziam viver num nível
acima de seu cotidiano e que indicavam um além para a suas aspirações (FERREIRA, 2010).
56
Com o termo ‘salesiano’ compreendemos toda a família salesiana, composta por grupos
institucionais oficialmente similares ao carisma salesiano. Dom Bosco inspirou o início de um
vasto movimento de pessoas que trabalham de maneiras diferentes para o benefício da
juventude. Ele mesmo fundou não só a Sociedade de São Francisco de Sales (Salesianos de
Dom Bosco), mas também o Instituto das Filhas de Maria Auxiliadora e a Associação dos
Salesianos Cooperadores. Incluindo estes e outros que foram originados em diferentes partes
do mundo, a Família Salesiana tem agora 28 grupos oficialmente reconhecidos, que têm um
total de 402.500 membros. Estes grupos vivem em comunhão uns com os outros,
compartilham o mesmo espírito e com vocações especificamente distintas, continuando a
missão que ele começou. O carisma de Dom Bosco continua a inspirar pessoas de boa
vontade. Existem atualmente 27 outros grupos que estão tentando tornarem-se membros da
Família Salesiana (Tradução nossa). “Don Bosco ha ispirato l’inizio di un vasto movimento di
persone che in differenti modi lavorano a vantaggio della gioventù. Egli stesso ha fondato non
solo la Società di San Francesco di Sales (Salesiani di Don Bosco), ma anche l’Istituto delle
Figlie di Maria Ausiliatrice e l’Associazione dei Salesiani Cooperatori. Includendo questi e altri
che sono stati originati in differenti parti del mondo, la Famiglia salesiana oggi comprende 28
gruppi ufficialmente riconosciuti che hanno un totale di 402.500 membri. Questi gruppi vivono in
comunione reciproca, condividono lo stesso spirito e con vocazioni specificatamente distinte
continuano la missione che egli ha iniziato. Il carisma di don Bosco continua a ispirare persone
di buona volontà. Ci sono attualmente altri 27 gruppi, che stanno cercando di diventare membri
della
Famiglia
salesiana”.
Disponível
em:
http://www.salesianos.com.br/linkssalesianos/congregacao.html. Acesso em: 13-jan-2013. Citação de documento eletrônico
avulso. Conferir também a Carta de Identidade Carismática da Família Salesiana de Dom
Bosco. Brasília: Editora Dom Bosco, 2012.
50
Relato do sonho57:
Nessa idade tive um sonho, que me ficou profundamente impresso na
mente por toda a vida. Pareceu-me estar perto de casa, numa área
bastante espaçosa, onde uma multidão de meninos estava a brincar.
Alguns riam, outros divertiam-se, não poucos blasfemavam. Ao ouvir
as blasfêmias, lancei-me de pronto no meio deles, tentando, com
socos e palavras, fazê-los calar. Nesse momento apareceu um
homem venerando, de aspecto varonil, nobremente vestido. Um
manto branco cobria-lhe o corpo; seu rosto, porém, era tão luminoso
que eu não conseguia fitá-lo. Chamou-me pelo nome e mandou que
me pusesse à frente daqueles meninos, acrescentando estas
palavras:
- Não é com pancadas, mas com a mansidão e a caridade que
deverás ganhar esses teus amigos. Põe-te imediatamente a instruí-los sobre a fealdade do pecado e a preciosidade da virtude.
Confuso e assustado repliquei que eu era um menino pobre e
ignorante, incapaz de lhes falar de religião. Senão quando aqueles
meninos, parando de brigar, de gritar e blasfemar, juntaram-se ao
redor do personagem que estava a falar. Quase sem saber o que
dizer, acrescentei:
- Quem sois vós que me ordenais coisas impossíveis?
- Justamente porque te parecem impossíveis, deves torná-las
possíveis com a obediência e a aquisição da ciência.
- Onde, com que meios poderei adquirir a ciência?
- Eu te darei a mestra, sob cuja orientação poderás tornar-te sábio, e
sem a qual toda sabedoria se converte em estultice.
- Mas quem sois vós que assim falais?
- Sou filho daquela que tua mãe te ensinou a saudar três vezes ao
dia.
- Minha mãe diz que sem sua licença não devo estar com gente que
não conheço; dizei-me, pois, vosso nome.
- Pergunta-o a minha mãe.
Nesse momento vi a seu lado uma senhora de aspecto majestoso,
vestida de um manto todo resplandecente, como se cada uma de
suas partes fosse fulgidíssima estrela. Percebendo-me cada vez mais
confuso em minhas perguntas e respostas, acenou para que me
aproximasse e, tornando-me com bondade pela mão, disse:
- Olha.
Vi então que todos os meninos haviam fugido e, em lugar deles,
estava uma multidão de cabritos, cães, gatos, ursos e outros animais.
- Eis o teu campo, onde deves trabalhar. Torna-te humilde, forte,
robusto; e o que agora vês acontecer a esses animais, deve fazê-lo
aos meus filhos.
57
Sonho relatado por Bosco em seu livro Memórias do Oratório de São Francisco de Sales,
2012, p. 28 – 30.
51
Tornei então a olhar e, em vez de animais ferozes, apareceram
mansos cordeirinhos que, saltitando e balindo, corriam ao redor
daquele homem e daquela senhora, como a fazer-lhes festa.
Neste ponto, sempre no sonho, desatei a chorar, e pedi que falassem
de maneira que pudesse compreender, porque não sabia o que
significava tudo aquilo. A senhora descansou a mão em minha
cabeça, dizendo:
- A seu tempo tudo compreenderás.
Após essas palavras, um ruído qualquer me acordou, e tudo
desapareceu.
Fiquei transtornado. Parecia-me ter as mãos doloridas pelos socos
que desferira e doer-me o rosto pelos tapas recebidos; além disso,
aquele personagem, a senhora, as coisas ditas e ouvidas, de tal
modo, me encheram a cabeça que naquela noite não pude mais
conciliar o sono.
P. João Bosco
Neste sentido, Bosco se sente chamado por Deus a realizar seu trabalho
de educador, confiando que a providência divina, expressa, no sonho, pelas
figuras de Jesus e Maria, não lhe faltaria com recursos espirituais e materiais.
Promessa que servia de ânimo a seus seguidores quando se sentiam
esgotados pelo trabalho.
Há também a Carta de Roma, originada de um dos sonhos de Bosco 58.
No sonho, colocado no ano de 1884, o pátio do Oratório de Valdocco não tem
mais a mesma dinamicidade e alegria. Os educandos estão tristes e isolados.
Os educadores, seus salesianos, estão preocupados com outras coisas, outros
afazeres que não o estar com os jovens. Um sonho revelador do momento
presente da época sobre a estrutura salesiana, bem como sinalizador dos
perigos futuros ao carisma salesiano. “Presença não se delega, e sem ela não
se educa” (PASSOS JÚNIOR, 2011, p. 94).
Segundo Ferreira (2010, p.06):
Com a palavra “sonho” Dom Bosco exprime uma série de relatos de
não igual natureza. Na maioria dos casos, trata-se realmente da
exposição de material onírico. Outras vezes são apólogos, parábolas,
meios enfim de tornar clara e interessante a apresentação de
ensinamentos diversos.
58
Carta de Roma de 1884 (CASTRO, 2007). Anexo C, p. 209.
52
Os
elementos
apresentados
em
cada
sonho
são
reveladores.
Interpretados isoladamente, são insípidos e mancos, mas agrupados, tornam-se um programa metodológico operacional.
Bosco quis que suas obras fossem marcadas pelo espírito de família,
pela sensibilidade e gestos da acolhida, pelo relacionamento amigo e simpático
entre educador e educando. Construiu ambientes físicos com amplos espaços
para esportes e recreações que dessem a sensação de liberdade e autonomia.
Enfim, um ambiente verdadeiramente educativo, favorecendo a seus jovens a
experiência do associacionismo59, visto que é natural do ser humano agrupar-se; sobretudo o jovem.
[...] a primeira dimensão da proteção tutelar de Dom Bosco para seus
meninos foi “a criação de um ambiente educativo rico de humanidade,
de alegria e de esforço, que é já por si mesmo, veículo e expressão
de valores e de propostas”. Era óbvio para Dom Bosco que não
bastava tirá-los das circunstâncias em que se achavam. Havia de
colocá-los em outra dimensão que lhes pusesse em evidência ante os
olhos dos meninos o que sua situação afogava” (RODRÍGUEZ, 2000,
p. 132 – 133).
Na década de 1850 – 1860, Bosco, por intuição, soube reconhecer e
aproveitar o momento de pré-industrialização a favor de seus destinatários.
Percebia que o trabalho e estudo dos jovens de seus Oratórios, oficinas e
internatos não avançavam significativamente em qualidade, tanto conteudista
como moral. Utilizou dos serviços de mestres e professores externos da sua
obra. No entanto, apartados dos anseios e proposta educacional de Bosco, não
assumiram a máxima salesiana: ensinar com o coração. Acredita-se que as
exigências de Bosco em reduzir a carga horária de trabalho nas oficinas de
doze para oito horas, tratar os jovens com dignidade e respeitar as condições
físicas de cada adolescente foram entendidas como incorretas por mestres de
ofício numa cultura de exploração do trabalho juvenil.
Havia ainda aqueles mestres de oficina que blasfemavam, outros que
eram desleixados, sem contar aqueles que não ensinavam corretamente os
59
Bosco, em tenra idade, fundou um grupo de jovens chamado Sociedade da Alegria. Sua
finalidade era o encontro, a brincadeira. “O nome vinha a calhar, porque cada sócio tinha a
obrigação estrita de arranjar livros e brinquedos e provocar assuntos, que pudessem contribuir
para estarmos alegres” (BOSCO, 2012, p. 56).
53
ofícios de carpintaria, sapataria, tipografia e outras funções, por medo de que
os jovens os suplantassem no futuro. Com o tempo aconteceu que os mestres,
sendo substituídos pelos jovens por inabilidade no ensinar e serem maus
exemplos de conduta moral aos jovens aprendizes, estes assumiram as
oficinas na condição de mestres de ofício provindo das bases do Oratório.
Bosco os tinha animado ao estudo e trabalho, bem como contribuído com sua
formação humana, religiosa e integral. Estes jovens foram denominados
salesianos coadjutores60.
O histórico do salesiano leigo61 se funda, exclusivamente, sobre as
práticas e estilo de vivência de Bosco que nos deixa seu pensamento,
anunciando para o hoje a figura do educador salesiano.
Dom Bosco não se contenta com que seu coadjutor seja bom e hábil
em seu trabalho, quer que seja capaz de conduzir moralmente seus
empregados e guiá-los com ordem à moral e ao bem, ou seja, à
virtude. Por isso, disse que a competência em assistir e conduzir seus
funcionários deve ser tamanha que inspire confiança e dê segurança
aos superiores de que, no local de trabalho, no dormitório e na escola
onde estiver o irmão, reinará a ordem, o dever, a moral nas palavras,
nos atos, nas relações entre alunos e no bem que engloba toda a
virtude e tudo aquilo que se pode desejar em uma casa de educação
62
(BOSCO apud RINALDI, 2008, p. 40. Tradução nossa) .
Ao longo da história da fundação salesiana, a figura do salesiano leigo
foi entendida em sentido literal como coadjuvante na educação dos jovens.
Hoje se contesta essa visão, pois se configura como agente imprescindível no
ato educativo de prisma salesiano (LEAL; SOUZA, 2010).
60
Hoje são compreendidos como salesianos leigos. Há também variações de nomenclatura
conforme o regionalismo. “Torna-se, contudo difícil precisar se a figura do coadjutor surgiu, em
seu espírito, ao mesmo tempo em que a ideia de Congregação ou se foi fruto de sua
experiência. Na elaboração da ideia do Salesiano leigo notam-se mesmo algumas incertezas
em Dom Bosco, e até contradições, talvez também propositais para não dar muito na vista para
os detratores dos frades. Não parece, todavia falso afirmar que a necessidade de homens
qualificados no plano profissional desempenhou papel não insignificante nessa iniciativa. Basta
lembrar as dificuldades e incertezas que surgiram quando do lançamento das primeiras oficinas
dentro do Oratório” (WIRTH, 2000, p. 94).
61
Para um maior aprofundamento sobre a vocação leiga consagrada salesiana consultar as
obras de BRAIDO, 1961. DICASTÉRIO DA FORMAÇÃO, 1990.
62
Non si contenta dunque Don Bosco che il suo Coadiutore sia buono ed abile nel suo
mestiere, ma vuole che sia capace di dirigere moralmente i suoi dipendenti e di guidarli con
ordine nella moralità e nel bene, cioè nella virtù. Perciò dice che la competenza in assistere e
diriggere i suoi subalterni deve essere tale che ispiri confidenza e dia sicurezza ai superiori che
in quel laboratório, in quel dormitório, in quella scuola dove c‟è il Confratello, regni l‟ordine, cioè
disciplina, dovere, moralità nelle parole, negli atti, nelle relazioni tra gli alunni, ed il bene, che
comprende ogni virtù, e tutto quello che può desiderarsi in una casa di educazione [...]. Nota de
tradução.
54
[...] faz-se necessário uma ação personalizada no mundo, de forma
que atenda e atue nos diversos contextos que se apresentem de
acordo com a singularidade de cada pessoa e sobretudo dos jovens
educandos. Esta é uma postura dialogal frente às diferenças e
mesmo uma prática testemunhal de ‘ordem, moralidade e bem’.
Palavras que atualizadas e ressignificadas à atualidade nos permite
entender a ordem como a práxis responsável de abertura ao novo, a
moralidade como a fidelidade aos princípios de humanização de
contextos particulares e o bem entendido como a busca pessoal e
comunitária de sentido que supere o tangível a partir de uma
espiritualidade antropológica (Idem, ibidem, p. 541).
Historicamente, esta figura vocacional, lapidada por Bosco, favoreceu e
robusteceu a aceleração de ritmo do caminho educacional. Hoje, com o
número reduzido de salesianos, educadores pagos realizam o trabalho
educacional legado por Bosco.
Caliman (2009, p. 262) traz a observação de que:
O humanismo pedagógico de Dom Bosco já contemplava, em
meados do século XIX, as quatro dimensões (racional, existencial,
afetiva e operacional), muito próxima daqueles que se tornaram
política educacional mundial no final de século XX (conhecer, fazer,
ser e conviver).
A qualidade da educação depende da boa articulação dessas dimensões.
Em âmbito salesiano, é destacado sobremaneira o diálogo para conhecer, o
estar presente para fazer, o transcender-se para ser e o querer para conviver.
Aproximação de conceitos amplos e não tão ajustáveis, mas quando
articulados, projetam o ser humano em sua integralidade (DELORS, 2010).
De forma esquemática, Caliman (2009, p. 262) sintetiza a relação
metodológica de Bosco com os pilares da educação referendados pela
UNESCO.
55
Ilustração 5 - Esquema salesiano e pilares da educação
Os princípios referenciais e a práxis salesiana condensam a vida e a
experiência de Bosco. A atualização de conceitos da história salesiana não
representa o desvio do legado do fundador, mas uma fidelidade robusta e
criativa a este método eficaz: o sistema preventivo, consolidado e aplicado nas
obras salesianas.
56
CAPÍTULO 2
Consolidada a presença salesiana em Niterói, São Paulo e Lorena, os
salesianos estendem suas obras por diversos Estados. Este capítulo pretende
demonstrar o processo de implantação e expansão da obra salesiana no Brasil,
recorrendo ao histórico missionário na Argentina e no Uruguai, a partir dos
historiadores
interpretes
Wirth,
Azzi,
Santos,
Passos
Júnior,
Cunha,
Evangelista, Negrão e Pacheco, das depoências de educadores envolvidos no
Centro Profissional Dom Bosco e autores complementares que discutem a
estrutura salesiana em contextos diversos de política, sociedade e Igreja na
realidade campineira do século XX.
2.1
Implantação e expansão da obra salesiana no Brasil
A expansão salesiana na Europa e continente sul-americano se deu com
Bosco ainda vivo. O êxito do trabalho salesiano na educação de jovens tornara-se cada vez mais visível e bem sucedido, crescendo os pedidos de
autoridades civis e eclesiásticas a Bosco para que enviasse salesianos a
trabalharem com os jovens. Em alguns casos, tratava-se de assumir
pedagógica e administrativamente estabelecimentos educativos.
A 14 de dezembro de 1875, desembarcava em Buenos Aires a primeira
expedição missionária salesiana para além da fronteira europeia. Os
salesianos contavam com a generosidade e acolhida dos compatriotas italianos
que, na Argentina, já conheciam a fama de Bosco e dos salesianos. De fato, os
missionários salesianos “puderam verificar com os próprios olhos que a
solicitude de Dom Bosco os havia precedido” (WIRTH, 2000, p. 167).
57
Ilustração 6 – Primeira Expedição Salesiana63
Extraído de (AZZI, 1982, p. 34)
Quando Bosco os enviou para Buenos Aires, bem como missionários a
outras nações, sob o incentivo da Santa Sé64, incumbiu-os, principalmente, de
dar assistência religiosa aos compatriotas italianos que se viam fragilizados do
ponto de vista religioso em terras estrangeiras.
Conforme Braido (2008, p. 376):
A ação pastoral em favor dos imigrantes italianos ele colocava em
primeiro lugar, em ordem de tempo e de empenho. Como se viu, essa
ação foi iniciada com extrema abnegação pelo padre Baccino e
continuada com idêntica força pelo padre Bodrato. O caráter popular
das instituições, sobretudo das escolas profissionais, e a instrução
das classes inferiores e médias, da juventude pobre e periclitante, era
o primeiro em ordem ao próprio salesiano, e como tal era tenazmente
defendido. As urgências do trabalho em Buenos Aires, no primeiro
momento, colocavam em segunda linha as perspectivas propriamente
missionárias, mas também estas permaneciam no horizonte mental
do padre Bodrato. Com efeito, seis meses antes de morrer, conseguia
finalmente organizar a entrada dos salesianos em Carmen de
Patagónes, na Patagônia Setentrional. [...] Tornava-se, também,
sempre mais vivaz e concreto o empenho para a projeção missionária
em direção a zonas que ele considerava mais vastas e ricas de futuro
63
Conforme a ilustração 6 na primeira fila João Cagliero tornou-se cardeal na Igreja Católica,
João Bosco, comendador João B. Gazzolo e José Fagnano.
64
“Segundo o pensamento de Pio IX, os salesianos deviam ter duas metas principais em suas
atividades no novo Continente: em primeiro lugar, dar assistência aos filhos de imigrantes
italianos que para lá haviam afluído em grande número; em segundo lugar, ocupar-se da
evangelização dos indígenas” (AZZI, 1982, p. 53).
58
que as missões patagônicas: as regiões habitadas pelos aborígenes
do Brasil.
Acolhidos pela comunidade italiana, os salesianos construíram, de
imediato, Oratórios e realizaram atendimento religioso na Igreja Mater
Misericordiae que congregava quase trinta mil compatriotas. Este trabalho
trouxe prosperidade para as localidades urbanas e rurais por eles atendidas,
gerando satisfação no clero local e favorecendo a expansão e consolidação
das obras salesianas na Argentina.
Wirth (2000, p. 167) esclarece que:
Um mês após a chegada, o arcebispo congratulava-se pelo
grandíssimo bem que faziam na capital. [...] lá o enérgico diretor
conseguiu em pouco tempo transformar uma pequena casa em
colégio, juntar-lhe um oratório, organizar missões para as estâncias
disseminadas pelos campos. Em carta a Dom Bosco, datada de 10
de junho de 1876, o protetor deles, Ceccarelli lhes dizia:
estimadíssimos na cidade, e acrescentava com lirismo que seu nome
já ressoava em toda a América do Sul.
Os pedidos de fundações se multiplicavam, mas faltavam salesianos
para atender a todos. Para a Argentina foram enviadas três expedições
missionárias, sendo que, parte da terceira, em 1880, foi destinada a atender as
urgências religiosas e educacionais dos compatriotas italianos no Uruguai, em
Las Piedras.
Os salesianos conquistaram prestígio e fama tanto pelo êxito do projeto
expansionista romano em que contou com o apoio eclesial e, em alguns casos,
de Estados monárquicos, como por sua significatividade na educação,
sobretudo pela estrutura e aparato pedagógico nos observatórios, colégios e
obras. Wirth (idem, p. 168) explica que: “Mais tarde, em 1885, quando foi
votada uma lei que proibia as congregações religiosas no Uruguai, tamanha
era a fama do observatório de Villa Collón que o governo desistiu de molestar
os salesianos”.
Quando a urgência de assistência religiosa aos compatriotas italianos se
fez menor tanto em solo argentino quanto uruguaio, foi dada vez à aspiração
missionária aos povos indígenas, inicialmente, na Patagônia e, posteriormente,
em terras brasileiras. Sabe-se que, desde 1549, os religiosos jesuítas já
estavam presentes em solo brasileiro, império de Portugal. Tanto estes como
59
os salesianos foram movidos, cada qual em seu período histórico, pelo ímpeto
missionário de espalhar a fé católica pelo mundo que, segundo o pensamento
europeu, os indígenas eram os povos que se apresentavam com mais
necessidade de catequese, sendo o período de colonização propício para o
contato de religiosos com os indígenas (VAINFAS, 1995). Tanto para os
colonizadores portugueses e espanhóis do século XVI, com a presença de
religiosos jesuítas65 no território sul americano, assim como para os interesses
modernizadores no século XIX, a presença dos religiosos salesianos nas
missões brasileiras tinha idêntica utilidade, pois, em ambas as circunstâncias,
ofereciam doutrina religiosa e educação aos indígenas, colonos e imigrantes,
pela necessidade de civilizar e evangelizar, principalmente, os autóctones,
caracterizando, obviamente, uma prática etnocêntrica.
A partir de Buenos Aires, na primavera de 1878, os salesianos padres 66
Costamagna, Fagnano e Lasagna fazem a primeira expedição missionária em
terras patagônicas que não teve êxito pelas más condições climáticas para
navegação com quase um naufrágio devido ao mar revolto e fortes ventos.
No ano seguinte, em 1879, surge uma segunda possibilidade de
investida missionária, desta vez por terra, quando da indesejada confrontação
entre militares e indígenas mapuches67 da região patagônica. A incursão militar
de conquista do deserto pampa68 era justificada pelo temor de invasão indígena
nas fronteiras da região sul e oeste.
65
Os Jesuítas dominam no Brasil o campo intelectual do século XVII e exerciam a gerência da
estrutura colonial, conforme a lógica dos latifúndios monocultores. Com o tempo, “[…]
passaram a ser acusados pelos empreendedores seculares de concorrência desleal, de
exploração dos indígenas e de serem lesivos aos interesses da Coroa” (SAVIANI, 2008, p. 69).
66
Missionários pioneiros da Sociedade de São Francisco de Sales. De naturalidade italiana,
todos se formaram sob a orientação de Bosco, no Oratório de Valdocco, em Turim.
67
“Mapu” significa Terra e “Che” significa Gente. “O povo mapuche é originário da América do
Sul. Se encontra assentado desde suas origens na zona que hoje ocupa a zona central do
Chile e as províncias argentinas de Neuquén, Rio Negro e parte de Buenos Aires”. Tradução
nossa. “Mapu” significa tierra e “Che” significa Gente. (“El pueblo mapuche, es originario de
América del Sur. Se encuentra asentado desde sus orígenes, en la zona que hoy ocupa la
zona central de Chile y las provincias argentinas de Neuquén, Río Negro y parte de Buenos
Aires. Disponível em: http://pueblos-originarios-argetnina.wikispaces.com/Mapuches.
Acesso em: 06-fev-2013. Citação de documento eletrônico avulso).
68
Ampla planície seca, arenosa e desértica que se estende entre a região de Santa Fé ao
norte e Bahía Blanca ao sul, no território argentino.
60
Os salesianos, em acordo com o general Roca, ministro da Guerra,
puderam acompanhar o exército como capelães. Situação compreendida pela
próxima relação de poderes entre Igreja e o Estado. À medida que cavalgavam
pelos pampas, os salesianos entravam por fim, em contato com os indígenas.
Segundo Wirth (idem, p. 169):
Um primeiro destacamento, em que se achava o padre Costamagna
chegava às margens do Rio Negro, nas fronteiras da Patagônia, no
dia 24 de maio de 1879. Após semanas a cavalo, durante as quais
haviam sofrido cruelmente pelo cansaço, pelo frio e pelo espetáculo
de brutalidade da soldadesca contra os índios, os missionários foram
tomados de profunda comoção. Ao ler as notícias entusiastas do
padre Costamagna, Dom Bosco também exultava: “As portas da
imensa Patagônia estão abertas aos Salesianos!”.
Depois desta expedição, os salesianos puderam se organizar e instalar
dois centros de trabalho missionário: um em Carmen de Patagónes, na
margem esquerda do Rio Negro, e o outro na margem oposta, em Viedma. O
sucesso do trabalho missionário na Patagônia fortaleceu na Europa o
entusiasmo missionário salesiano nas terras distantes como o Brasil.
Os salesianos, em trânsito pelo Rio de Janeiro para chegar ao Uruguai e
Buenos Aires, puderam conhecer e saudar as autoridades eclesiásticas; ação
sempre recomendada por Bosco. Em uma dessas ocasiões, padre Lasagna
conheceu Dom Pedro Maria de Lacerda, bispo da diocese do Rio de Janeiro,
que foi, posteriormente, o responsável pelos primeiros contatos e negociações
com Bosco, entre 1876 até 1882, para a vinda dos salesianos ao Brasil. Sobre
este assunto, Santos (2000, p. 202) afirma que:
O sucesso do trabalho dos salesianos chegava ao Brasil, de onde
começavam a chegar pedidos de bispos ao novo provincial no sentido
de abrir instituições semelhantes em suas dioceses. Dom Bosco tinha
se tornado conhecido no Brasil, graças à imprensa francesa, que
falava de suas viagens e de suas realizações. Deve-se, entretanto, a
D. Pedro Maria de Lacerda, bispo do Rio de janeiro, o início das
69
negociações com ele. Por ocasião do Concílio Vaticano I , houve a
visita do bispo, pessoalmente, no Oratório de Valdocco, onde passou
uma semana e tomou contato com sua experiência educativa. Ficou
vivamente impressionado com o ambiente ali reinante. Daí para
frente, não descansou enquanto não trouxe os salesianos para sua
diocese. Sua atividade contagiava os demais bispos brasileiros.
69
O Concílio do Vaticano I foi o acontecimento de maior relevo na História da Igreja do século
XIX. Foi convocado pelo Papa Pio IX, em 1869, e tratou sobre o racionalismo, o liberalismo e o
materialismo. Disponível em: http://www.universocatolico.com.br/index.php?/historia-doconcilio-vaticano-i.html. Acesso em: 07-fev-2013. Citação de documento eletrônico avulso.
61
Em 1877, Dom Lacerda fora a Turim para convencer Bosco que
enviasse missionários para sua diocese do Rio de Janeiro. Apresentou
argumentos como a escassez do clero local, urgência da missão entre as tribos
das florestas equatoriais, além do abandono aos jovens, após a lei do ventre
livre de 1871. Bosco se sensibiliza com a realidade de abandono e
marginalização dos jovens, principalmente, negros que enfrentavam a rejeição
por parte de uma parcela da sociedade. Escolhe, então, o padre Lasagna,
salesiano superior em terras uruguaias, para conduzir o processo de
negociação com Dom Lacerda no Brasil, nação imperial que constituía um
mistério para os salesianos. Nesse período vigorava no Brasil uma sociedade
semifeudal, em que o sistema patriarcal era a nota dominante. “De um lado,
estavam os senhores, cercados de um mundo de escravos e de servos e, de
outro, o povo simples, pobre, bom, sofredor e marginalizado” (SANTOS, 1999,
p. 38).
Padre Lasagna, encorajado por Dom Pedro II, imperador do Brasil,
empreende uma viagem exploratória pelas costas do Brasil, a partir do Rio de
Janeiro até Belém do Pará, percorrendo diversos Estados e ouvindo as
lamentações dos bispos que pediam ajuda para suas dioceses carentes de
educação. Ao retornar ao Rio de Janeiro, propôs ao governo imperial criar um
vicariato apostólico na Amazônia. Prometeu a abertura de uma casa nas
colinas de Niterói que dominavam a capital. “Em São Paulo, onde eram
numerosos os italianos, prometeu uma paróquia e um colégio. Seu
pensamento voltava-se já para os índios70 do Mato Grosso71” (WIRTH, 2000, p.
171).
70
O ímpeto missionário europeu, desde o século XVI com os jesuítas, até os salesianos no
século XIX, foram catastróficos do ponto de vista da aculturação. Entendendo que seu trabalho
educacional e religioso foi uma transplantação de crenças e verdades estabelecidas no
continente europeu à realidade ameríndia, não se proporcionou um processo de confrontação
de conceitos locais indígenas com os europeus (PASSOS JÚNIOR, 2004).
71
Embora houvesse entusiasmo missionário para com o trabalho indígena, os salesianos
entraram em território mato grossense apenas em 18 de junho de 1894, doze anos da chegada
no Brasil (DUROURE, 1977). “No Brasil, a situação era muito mais delicada. A escolha de um
bispo para os povos indígenas do Brasil não tinha passado pela prática normal de consultas
aos bispos brasileiros e à respectiva nunciatura. No Rio de Janeiro, a sede episcopal estava
vacante. Em Minas Gerais, o governo de Ouro Preto e do bispo coadjutor de Mariana tinham
bom relacionamento com os inspetores-bispos salesianos. Eram esperados com ansiedade em
Cuiabá, Mato Grosso. [...] Depois de visitar Botucatu, Mons. Lasagna decidiu fazer, em Mato
Grosso, um verdadeiro centro missionário salesiano do Brasil” Nota de tradução. (“In Brasile la
62
Após tratativas e negociações, no dia 14 de julho de 1883, sete
salesianos72 chegavam a Niterói - RJ. Deram início à fundação do colégio
Santa Rosa73 e das escolas profissionais que em pouco tempo foram
reconhecidas de alto nível profissional, chegando a ganhar prêmios que
variavam entre troféus e certificados de parabenização em várias exposições
das áreas esportiva e profissional, como mecânica e elétrica, organizadas pelo
Estado e outras escolas (SANTOS; CASTILHO, 2003).
O período da chegada dos salesianos no Brasil, ao final do século XIX, é
marcado pelo descompasso de alinhamento ideológico nas questões do
padroado74 e beneplácito75 entre Igreja e governo imperial. Segundo Passos
Júnior (2004, p. 68):
Formam-se duas vertentes. De um lado um clero com visão bastante
independente, aliado ao imperador e marcado pelas ideias da
revolução francesa e do iluminismo, de outro, o movimento de
reforma intitulado de restauração, visando que Roma retomasse o
controle do clero, combalido então pela ignorância, imoralidade e
dependência política e econômica do Império. Esse longo processo
envolveu de um lado, a formação de um clero brasileiro educado em
situazione era molto più delicata. La scelta di un vescovo per gli indigeni del Brasile non era
passata attraverso la normale prassi delle consultazioni ai vescovi brasiliani e alla rispettiva
nunziatura. A Rio de Janeiro la sede vescovile era vacante. A Minas Gerais il governo di Ouro
Preto e il vescovo coadiutore di Mariana erano in ottimi rapporti coll’ispettore-vescovo dei
salesiani. Lo si aspettava pure con ansia a Cuiabá, nel Mato Grosso. [...] Dopo aver visitato
Botucatú, mons. Lasagna decise di fare del Mato Grosso il vero centro missionario dei salesiani
nel Brasile”) (FERREIRA, 1995, p. 26 – 27).
72
Pe. Miguel Borghino (1855-1929), Pe. Carlos Peretto (1860-1923), Seminarista Miguel
Foligno (1858-1938), Seminarista Bernardino Monti (deixou posteriormente a Congregação),
Irmão Domingos Delpiano (1844-1920), Irmão José Daneri (1849-1907), Irmão João Batista
Cornélio (1852-1921) (SANTOS, 2000).
73
“No dia 26 de julho de 1882, foi comprada uma ‘modesta casa’, em Niterói, no bairro Santa
Rosa, juntamente com o terreno anexo, planejada para ser ‘grande asilo de meninos pobres e
abandonados e talvez um viveiro de novos missionários’, à imitação do Oratório de Valdocco,
para levar a cruz e a civilização cristã ao centro da América Meridional. Sonhava Pe. Luís
Lasagna daí partir para o Pará, Cuiabá, esta ‘na terra mais desconhecida da América’ (Idem,
ibidem, p. 204).
74
O Padroado foi um tratado administrativo e religioso impulsionado pelo Papa Calisto III no
século XV entre a Igreja Católica e o reino de Portugal. Posteriormente, o tratado passou a ser
válido para o reino espanhol e seus domínios. Os monarcas destes reinos tinham o direito de
nomear bispos e construir Igrejas e em um segundo momento, receberia aprovação papal.
(COSTA, 1999).
75
O Beneplácito, inverso do padroado, era um preceito em que a Igreja Católica deliberava e
determinava orientações aos fiéis católicos e ao clero, contando, em um segundo momento,
com a aprovação do monarca português (Idem, ibidem).
63
Roma, com matizes de profunda fidelidade ao papado, procurando
neutralizar na Igreja brasileira, não só o clero iluminista, como
também o catolicismo popular, com suas devoções, irmandades e
confrarias, então muito independente da Igreja.
Quando informado do trabalho salesiano, em seus oratórios, escolas
profissionais e obras, tanto nas missões na Patagônia como nos pampas, o
imperador exprimiu vivo desejo de que o quanto antes, esses se
transplantassem para o império brasileiro. “O governo imperial, que se
dispusera a pagar a viagem dos salesianos de Montevidéu até Cuiabá, acedeu
também em cobrir os gastos de viagem do primeiro grupo que deveria vir de
Montevidéu para o Rio de Janeiro” (AZZI, 1982).
Os
salesianos
tiveram
significativo
acolhimento
do
episcopado
reformador ultramontano76 que, somado aos empenhos e colaboração de
religiosos Lazaristas77, Capuchinhos78, Jesuítas79, congregações femininas e
outros institutos religiosos, fortaleceram no Brasil a Reforma Católica80 de
inspiração romana e tridentina (Idem, ibidem, p. 63). Reforma, aliás, almejada
também pelo imperador que considerava, juntamente com seus ministros, que
as ordens monásticas vigentes no país eram irrecuperáveis devido à falta de
elementos religiosos, culturais e humanos suficientes no clero brasileiro,
inviabilizando a reforma católica. Neste sentido, abriam-se, então, as portas
para a vinda de religiosos estrangeiros81.
Recém-chegados no Brasil, os salesianos sofreram também oposições.
Se de um lado recebiam apoio do governo imperial e de uma parcela do
76
O ultramontanismo é uma nomenclatura associada ao processo de romanização eclesial,
mais fortemente marcado nos últimos séculos. Consistiu na tentativa de fortalecer o clero em
sua jurisdição local, podendo autogerir-se frente aos Estados, de carátar monárquico e
republicano.
77
Lazaristas ou ainda padres e irmãos vicentinos são uma sociedade de vida apostólica
masculina católica. Disponível em: http://www.pbcm.com.br/inicio.php. Acesso em: 07-fev-3013.
78
Ordem religiosa que tem como ramo os frades franciscanos conventuais. Disponível em:
http://www.capuchinho.org.br/. Acesso em: 07-fev-2013.
79
Ordem religiosa denominada Companhia de Jesus, conhecida como Jesuítas. Foi fundada
em
1534
por
Inácio
de
Loyola.
Disponível
em:
http://www.jesuitasbrasil.com/jst/conteudo/visualiza_lo12A.php?pag=;portaljesuitas;paginas;vis
ualizaFixo&cod=2801&secao=32. Acesso em: 07-fev-2013.
80
Reforma interna da Igreja no Brasil no final do século XIX. Movimento eclesiástico,
especialmente na classe sacerdotal.
81
“Em seu diário de 1862, ao traçar as diretrizes que norteavam a sua administração, o próprio
D. Pedro II escrevia a 2 de janeiro: Não sou contrário à instrução religiosa e missão de padres
estrangeiros, sob a vigilante inspeção dos bispos e do governo, enquanto não se habilitem os
padres nacionais”. (AZZI, 1982, p. 61).
64
episcopado reformador, por outro eram atacados pela imprensa anticlerical de
influência iluminista, que lhes atribuía preconceitos transferidos das antigas
ordens religiosas presentes no império. “Os primeiros tempos em Niterói foram
difíceis para os primeiros salesianos que encontram toda a forma de oposição
e perseguição por alas do pensamento liberal” (PASSOS JÚNIOR, 2004, p.
72).
Para esses liberais, defensores da modernização da nação e desejosos
de um estado republicano, o poder clerical sempre se fizera presente no
império. Acreditavam que, com a vinda de novas ordens religiosas, inclusive os
salesianos, seria reforçada a influência de Roma na política nacional, tornando-a mais tradicional e conservadora. Denunciaram então a chegada dos
salesianos como verdadeira invasão do ultramontanismo82 no Brasil.
Após alguns anos de presença salesiana no Brasil, ficara claro que
vieram para trabalhar com os jovens, oferecendo assim “elementos capazes de
lhes prover as oportunidades de promoção social, ascensão econômica e
libertação política e cultural” (COSTA; FILHO, 2002, p. 52). Vieram ainda para
contribuir com a educação juvenil, popular, social e moral de matriz religiosa
católica. Este último, não se aplicou de modo tradicional, mas moderno com
novas frentes de atividade religiosa. Neste sentido, Azzi (1983, p. 74) afirma
que:
Foi essa uma das razões que levou D. Lacerda a preferir os
83
Salesianos aos Dominicanos , temendo a posição negativa do
governo com relação a esses últimos. O próprio prelado afirmava ao
P. Bodrato, em dezembro de 1876: “O governo não quer frades. O
senhor me inspirou para chamar os Salesianos, porque apenas eles
podem ser aceitos”.
82
Doutrina política católica. “A própria razão do nome indica claramente esse esforço no
sentido de se resgatar o primado de Roma sobre o mundo ocidental, irradiando a nova doutrina
para além das montanhas, isto é, das fronteiras eclesiásticas e espirituais do mundo romano,
mas que reafirmasse, em contrapartida, a autoridade do papa e dos fundamentos eclesiásticos
estabelecidos pelo Direito Canônico e consagrado nas bulas para todos os povos e culturas
onde houvessem indivíduos que professassem a fé católica”. Disponível em:
http://comunidadewesleyana.blogspot.com.br/2012/05/dicionario-teologicoultramontanismo.html. Acesso em: 07-fev-2013. Citação de documento eletrônico avulso.
83
Ordem religiosa fundada em Toulouse, França no ano de 1216 por São Domingos de
Gusmão. Disponível em: http://www.dominicanos.org.br/index.php/dominicanos. Acesso
em: 13-fev-2013.
65
Os salesianos eram considerados a vanguarda no âmbito da inserção no
mundo do trabalho em comparação a outros institutos religiosos. Eram bem
vistos e aceitos pelo seu trabalho nas escolas de artes e ofícios e pela maior
facilidade em assimilar os valores da cultura moderna, embora a maioria
desses religiosos europeus carecesse de espírito crítico da realidade brasileira
(SANTOS, 1983). Aliás, existia carência de criticidade e de participação política
também por parte do povo brasileiro, que assistiu, com pouco ou nenhum
interesse, a alteração de regime imperial para o republicano. “Nesse período,
apenas as oligarquias rurais dos senhores de engenho e fazendeiros dirigiam
os destinos do país, enquanto a população conservava-se alheia ao sistema
político de governo” (AZZI, 1983b. p. 18).
No contexto de passagem de regime político imperial para o republicano,
os salesianos, embora identificados com o espírito da reforma católica e sob o
apoio e proteção imperial, tiveram apoio e colaboração também dos novos
líderes políticos nos primórdios da república84. Fator que permitiu a
consolidação e a expansão da obra de Bosco.
Consolidada a obra salesiana no Rio de Janeiro, o colégio Santa Rosa
implantou
cursos
de
monotipia,
encadernação,
sapataria,
marcenaria,
mecânica e eletricidade. Tratavam-se de áreas e técnicas que muitos
salesianos se especializaram na Itália, além de que no contexto do Brasil
imperial, ainda que de forma tardia, estas áreas estavam em desenvolvimento,
atendendo o anseio iluminista de que a capital Rio de Janeiro pudesse
assemelhar-se ao nível de beleza e nobreza das potências econômicas
europeias como França e Alemanha (SANTOS; CASTILHO, 2003). Este
formato de ensino perdurou até 1969, quando surgiu a secundarização, modelo
de ginásio industrial. Não obstante, nos idos 1885, ano de fundação da obra
salesiana na cidade de São Paulo, o ensino de escolas de artes e ofícios eram
84
“Com a proclamação da República em 1889 e a promulgação da Constituição de 1891,
resultado de uma tensa aliança de liberais e positivistas, a Igreja Católica foi declarada
separada do Estado” (CUNHA, 2000, p. 21). Os religiosos salesianos passaram a gozar das
boas graças dos novos líderes políticos republicanos devido ao formato institucional da
sociedade salesiana que se adequava à legislação e exigências governamentais, não
permanecendo alheio ao Estado e nem tanto, porém subserviente como outras ordens
religiosas no governo imperial.
66
a técnica mais moderna de desenvolvimento social e educação juvenil no
Brasil.
Antes mesmo que os salesianos chegassem ao Rio de Janeiro, já havia
negociações para a abertura de uma segunda casa em São Paulo 85. A
proposta de fundação pareceu viável aos superiores salesianos, considerando
a posição estratégica de São Paulo, pelo clima agradável e mais ameno em
comparação ao Rio de Janeiro, além da proximidade com o colégio Santa
Rosa, quebrando seu isolamento.
Conforme Santos (1985, p. 19):
Os salesianos foram os primeiros religiosos a instalarem na Capital
86
bandeirante seus colégios. Os maristas
chegaram em 1897,
assumindo a direção do Arquidiocesano. Os missionários de S.
87
Carlos abriram suas escolas profissionais em 1895. Os beneditinos
88
fundaram o Colégio São Bento em 1903 e os carmelitas iniciaram
suas escolas somente em 1909. Os jesuítas, que possuíam o famoso
colégio de Itu, transladaram-se para São Paulo mais tarde.
Os salesianos chegam a São Paulo em 1885, assumindo a
administração da capela anexa ao Liceu de Comércio, Artes e Ofícios que foi
projetada pela Conferência Vicentina do Sagrado Coração de Jesus. No ano
seguinte, em 1886, fundavam o Liceu Coração de Jesus com suas escolas
profissionais que foram até quase a metade do século XX, uma das maiores
escolas do gênero, respondendo aos sinais de desenvolvimento industrial que
necessitava de mão de obra especializada para o trabalho. Por outro lado, por
parte da imprensa local e movimentos partidários, havia críticas quanto à
85
“A viabilidade do projeto pareceu-lhe evidente e aceitável pelas seguintes razões: 1) a
posição estratégica de São Paulo, cidade emergente na época, de clima mais ameno e mais
agradável que o do Rio de Janeiro; 2) a proximidade da primeira casa salesiana do Rio de
Janeiro, quebrando-lhe o isolamento e o assédio da imprensa liberal; 3) o apoio unânime
encontrado em São Paulo à obra nascente. Pe. Luís Lasagna aceitou, imediatamente, na
expectativa de que Dom Bosco não lhe recusasse o aval” (SANTOS, 2000, p. 223).
86
A congregação dos irmãos maristas foi fundada por São Marcelino Champagnat, em 1817,
na França. Tratam-se de religiosos leigos não ordenados. Disponível em:
http://maristas.org.br/. Acesso em: 13-fev-2013.
87
Ordem religiosa fundada por S. Bento, nascido em Núrsia, Itália, no ano de 480. Disponível
em:
http://www.ourladyoffatimachurch.net/ENCICLOPEDIA(B)BENEDITINOS.html.
Acesso em: 13-fev-2013. Citação de documento eletrônico avulso.
88
Ordem religiosa do século XI na antiga Porfíria, atual Estado de Israel. Disponível em:
http://www.carmelo.com.br/default.asp?ml1=4&ml2=0&ml3=0. Acesso em: 13-fev-2013.
Citação de documento eletrônico avulso.
67
organização, proposta pedagógica e clientela atendida pelos religiosos
salesianos. Cunha (2000, p. 30) explica que:
[...] houve fortes críticas ao apoio que o governo prestou ao Liceu.
Republicanos e maçons protestaram contra o que seria o reforço do
controle clerical no ensino paulista. Além dos jesuítas, que já
dominavam o ensino secundário para as classes ricas, os salesianos
viriam a dominar a formação de uma classe que vai ser poderosa, a
que fica entre o operário e o capitalista, isto é: o mestre de ofício.
Evidentemente são críticas e observações pertinentes em um contexto
de adversidade política e consolidação de regime político republicano. Não
obstante, para além das críticas de favorecimento estatal à obra de Bosco na
cidade de São Paulo, evidenciou-se a eficácia do método pedagógico salesiano
em relação à prática pedagógica vigente em estabelecimentos estatais89 de
atendimento educacional à população de baixo poder aquisitivo, sendo
adolescentes financeiramente pobres.
Em 1887 é fundada, na cidade de Lorena, a terceira obra salesiana, o
colégio São Joaquim, marcado por significativa receptividade. As negociações
de fundação desta obra, feitas entre padre Lasagna e o bispo de São Paulo,
contou com o completo apoio do Conde de Moreira Lima90, figura importante da
cidade de Lorena. Sua influência favoreceu que o colégio salesiano “gozasse
não só do respeito da sociedade local, mas também estivesse cotado entre os
melhores do Brasil” (PASSOS JÚNIOR, 2004, p. 73).
A decisão dos religiosos salesianos em optar pela cidade de Lorena se
deu pela localização da obra na cidade que facilitava o intercâmbio por via
férrea com os Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais com suas
posteriores fundações. Neste período, a cidade de Lorena como região agrária
89
“O ensino industrial dado nas Escolas de Aprendizes Artífices, desde a sua criação até o
Regulamento de 1918, manteve a feição assistencial. Era ministrado por professores
normalistas – e nisso não se diferenciava muito do ensino nas escolas primárias – e por
mestres diretamente retirados das fábricas e das oficinas – mestres sem a base teórica, o
conhecimento técnico e a formação pedagógica” (NAGLE, 1974, p. 165).
90
“Joaquim José de Moreira Lima – nasceu em Lorena, no dia 11 de junho de 1842, filho do
negociante e capitalista Joaquim José Moreira Lima, natural de Portugal e de Carlota
Leopoldina de Castro Lima, filha do capitão-mor de Lorena, Manoel Pereira de castro e Ana
Maria de São José. Foi comerciante, agente dos correios, fazendeiro, político, titular do
Império, mecenas e capitalista. Na guarda nacional de Lorena, obteve as patentes de Alferes
Secretário e Major ajudante de Ordens. Fundador da Santa Casa de Misericórdia de Lorena e
seu provedor por mais de cinquenta anos” (PASIN, 2001, p. 70).
68
com uma economia ancorada nos fazendeiros cafeicultores, ainda não havia se
ressentido fortemente pela crise do café.
Segundo Santos (2000, p. 225):
O conde, com a anuência do Bispo de São Paulo, cedeu, em
perpétuo, à Congregação Salesiana, o uso da Igreja de São Benedito
e a propriedade do chalé anexo. Foi comprado, de um major, um
grande terreno vizinho. Pretendia-se fundar um Colégio de Artes e
Ofícios, que foi imediatamente aceito.
A região do Vale do Paraíba e mais precisamente na cidade de Lorena,
diferente de São Paulo, não havia se implantado a industrialização. Seu
contexto agrário não foi favorável ao ensino profissional por falta de ambiente
adequado às oficinas e demanda de jovens que justificassem tal investimento.
Por outro lado, a obra abrigava seminaristas, motivo pelo qual se investiu no
ensino secundário em forma de internato, já reconhecido em 1906.
Na tradição salesiana, o internato era visto como a melhor forma para se
consolidar um projeto educacional. Em Lorena observou-se que havia potencial
para um público para os estudos colegiais: filhos de fazendeiros pagantes e
filhos de agricultores não pagantes, pois o colégio atendia a ambas as classes
sociais (SANTOS, 2000). A partir desta realidade foi possível implantar o
colégio salesiano em Lorena. Desta forma, Evangelista (1991, p. 290)
referenda:
O colégio São Joaquim conseguiu formar-se como sólida escola da
segunda década do novo século, terceiro de sua existência,
91
equiparado ao Pedro II , o que garantia aos seus alunos a prestação
de todos os exames de conjunto como eram chamados, na própria
casa, embora diante de bancas de professores nomeados pelo
governo federal, com ótimas instalações e orientação de ponta do
padre Mourão, o colégio tinha que conquistar renome e boa fama [...].
Em pouco tempo, as escolas de Niterói, São Paulo e Lorena tornam-se
referência para a Igreja e para o poder político. Nas primeiras décadas de
presença no Brasil, os salesianos são reconhecidos como educadores
eficientes e modernos (PASSOS JÚNIOR, 2004).
Estas três obras salesianas se configuram em contextos diferenciados. A
primeira, no Rio de Janeiro, foi marcada por contradições: de um lado o apoio
91
Cf. Evangelista, 1991.
69
imperial e eclesiástico e de outro a resistência e dureza da imprensa liberal e
iluminista. A prática pedagógica salesiana foi realizada não sem desgaste por
parte desta primeira comunidade.
A segunda, em São Paulo, o Liceu de Artes e Ofícios, granjeou simpatia
tanto do governo como da população atendida, pois a atividade salesiana de
preparação de mão de obra e trabalho industrial era bem quista, haja vista que
a
cidade estava
em
processo de industrialização
(SANTOS,
1985).
Desenvolveu seus trabalhos não sem farpas e fagulhas com a imprensa local,
porém não de forma comparável com as dificuldades enfrentadas pelos
salesianos no Rio de Janeiro.
Há na cidade de Lorena, num ambiente bucólico e agrário, o colégio São
Joaquim que atendia às elites agrárias e políticas da república velha.
Para Passos Júnior (2004, p. 76):
A expansão dos salesianos no Brasil é muito rápida, porque seu
método de ensino, a seriedade com que assumiam a educação, o
estilo de seus colégios e suas obras sociais tinham, no sistema
preventivo, um referencial que respondia aos anseios do século que
começava, diferentes dos que tinham configurado os internatos
tradicionais, marcados então por rígida disciplina, nem sempre
acompanhada de certa doçura com os alunos.
O processo de implantação das obras salesianas no Brasil contou com a
ressonância do trabalho educativo na Argentina e no Uruguai. Havendo
fundado as três primeiras obras no Brasil, sendo o Colégio de Santa Rosa no
Rio de Janeiro, Liceu de Artes e Ofícios em São Paulo e Colégio São Joaquim
em Lorena, dá-se por consolidado a presença salesiana no Brasil. As obras
que foram fundadas após estas três primeiras, caracterizam o período da
expansão salesiana. No Estado de São Paulo, os salesianos ampliaram o
número de obras, sequencialmente, para a região, hoje, conhecida como
Paulista.
70
2.2
Em Campinas
Consolidada a presença salesiana no Brasil, com a implantação do
colégios Santa Rosa no Rio de Janeiro, o Liceu de Artes e Ofícios em São
Paulo e o São Joaquim em Lorena, os salesianos iniciam o período da
expansão92, com fundação de unidades nas cidades de Cuiabá, Campinas,
Recife, Salvador e Rio Grande (RS) (CUNHA, 2000). Na cidade de Campinas,
os salesianos chegaram em 1897, fundando sucessivamente três obras
educativas: Liceu Nossa Senhora Auxiliadora, Escola Agrícola, hoje Escola
Salesiana São José e Externato São João, atual Obra Social São João
Bosco93.
O núcleo urbano tem sua origem de um caminho de passagem de
bandeirantes. Em 1732 começavam a surgir esparsas choupanas, precursoras
da Freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Campinas (MARTINS,
2010), que se consolidam quando da abertura do caminho de Goiases 94 em
1772 até 1774. Campinas permaneceu subordinada à comarca de Jundiaí até
1797, quando conquistou autonomia, elevando-se a Vila de São Carlos. Para
Negrão (1997, p. 14) “A recém-nascida Freguesia mostrava-se tímida, mas
prometia crescer forte e tornar-se um grande polo agrícola95, comercial,
político, industrial e cultural”. Região a Centro Oeste de São Paulo,
apresentava privilegiada condições naturais de clima ameno e solo hábil para
plantio de café, tendo seu auge de produção no século XIX (Idem, 1997).
Confirmando as palavras de Negrão sobre os aspectos econômicos e
políticos históricos da cidade de Campinas, Lapa (1983, p. 28) explica:
92
No ano de 1904, os salesianos já dispunham de dezesseis estabelecimentos de ensino no
Brasil, dos quais catorze tinham escolas profissionais. “As escolas salesianas não se
destinavam exclusivamente ao ensino profissional, embora essa fosse a prioridade conferida
pelo fundador da congregação” (CUNHA, 2000, p. 30).
93
Unidade
salesiana
de
trabalho
social.
Cf.
http://www.ossjb.org.br/controller.php?ac=historico. Acesso em: 25-fev-2013.
94
Passagem para caminhantes. Compreendia o trecho entre a então Vila de Jundiaí e Mogi
Mirim. Disponível em: http://www.sp-turismo.com/campinas/historia.htm. Acesso em: 21fev-2013.
95
Uma visão mais aprofundada sobre a questão agrária pode ser encontrada em (Cf.
SOARES, 1976).
71
No Oeste Velho de São Paulo, onde as primeiras lavouras foram
estabelecidas no primeiro quartel do século XIX, a cidade de
Campinas será o grande polo de expansão, em terrenos
sedimentares, tendo duas irradiações marcadas pelas estradas de
ferro que antecedem ou sucedem os fatos urbanos que, por sua vez,
continuam surgindo ou tendo grande desenvolvimento graças ao
café.
A Freguesia foi idealizada e fundada oficialmente por Barreto Leme96
que planejou praças, arruamentos e condições de habitação para o
povoamento que passou significativamente de 350 habitantes no período da
fundação em 1774 para 7.369 habitantes em 1822, ano de emancipação
brasileira do domínio lusitano (PUPO, 1983). Em 1842, ainda conhecida como
Freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Campinas, foi alçada à
categoria de cidade, resgatando o nome de Campinas (MARTINS, 2010).
Ilustração 7- Década de 1890
96
“Francisco Barreto Leme, o fundador de Campinas, nasceu na então Vila de Taubaté, em
1704, e ali se casou aos 26 anos com Rosa Maria de Gusmão. Veio estabelecer-se com a
família no termo de Jundiaí e, ouvindo falar da uberdade do solo entre a cidade e a Vila de
Mogi-Mirim, passou a residir num lugar chamado de Campinas de Mato Grosso”. Citação de
documento
eletrônico
avulso.
Disponível
em:
http://pro-memoria-de-campinassp.blogspot.com.br/2006/08/personagem-francisco-barreto-leme-uma.html. Acesso em:
21-fev-2013. Cf. também http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-.
Acesso em: 08-mar-2013.
72
“Em primeiro plano o teto da Catedral de Campinas. Logo atrás o Teatro São Carlos,
construído em 1850. As ruas que margeiam o Teatro são a 13 de maio e a Costa Aguiar. Ao
fundo a torre do relógio da Estação”. Cf. O Teatro Municipal de Campinas e a sua Demolição.
Disponível em: http://www.getuliogrigoletto.cng.br/teatrodemolicao.htm. Acesso em: 22fev-2013. Citação de documento eletrônico avulso.
Em 1890, a cidade já possuia cerca de 60 mil habitantes e sólida
estrutura socioeconômica com estabelecimentos comerciais, ferrovias, teatros
e correios (Cf. ilustração 7). Quadro histórico e social que, conforme Negrão
(1997, p. 15), são entendidos pela:
97
[…] expansão da lavoura cafeeira , a transformação material do país,
o crescimento industrial, o fim do regime da escravidão e o início do
trabalho assalariado motivaram a vinda de muitos imigrantes
portugueses, espanhóis, italianos e franceses, dando origem ao
proletariado urbano no início do século XX.
Silva (1995, p.75) esclarece que a robustez sócia econômica da cidade
de Campinas, no final do século XIX, é explicada pelas transformações das
relações de produção:
A partir do último quartel do século XIX, apesar da agricultura manter-se como a atividade dominante, as transformações das relações de
produção determinam um novo período que, por suas características
básicas, está muito mais ligado aos períodos posteriores, em
particular à industrialização, do que aos períodos anteriores onde a
acumulação se apoiava no trabalho escravo.
De forma complementar quanto ao panorama histórico do Oeste Velho
de São Paulo, precisamente a cidade de Campinas, Lapa (1983, p. 32-33)
afirma que a elite agrária e política paulista tiveram participação ativa no
desenvolvimento da região:
[...] reconheça-se que a oligarquia paulista e sua vanguarda
empreendedora, como setor privilegiado das classes dominantes,
conseguem desenvolver certas formas de pressão ou ação,
manipuladoras dos aparelhos do Estado, acionando mecanismos de
domínio político e mandonismo local. Essa vanguarda, graças à sua
experiência e acumulação, bem como estimulada também pelo
declínio da produtividade nas áreas mais velhas, arremetia para as
frentes pioneiras, sabendo aproveitar-se das condições favoráveis do
mercado.
97
O Brasil, no século XIX, teve o café como principal produto de exportação e consumo
interno, sendo que o trabalho cafeeiro era o fator que caracterizava a economia como agrária.
“O consumo do café dentro do próprio país é considerável, pois todo mundo saboreia várias
vezes por dia essa bebida nacional, seja rico ou pobre, moço ou velho, patrão ou empregado.
[…] a produção de café chegou no Brasil ao seu ponto culminante, e que, sob as condições
administrativas e agrícolas atuais, a soma de dois e meio milhões de sacas de café representa
o máximo daquilo que o Brasil pode produzir para a exportação, sendo que neste século, tal
número não representará a média das colheitas a serem obtidas” (TSCHUDI, S/D, p. 47).
73
Estes breves apontamentos históricos sobre Campinas constituem o
pano de fundo para o entendimento do processo de fundação da presença
salesiana nestas paragens.
2.2.1 Escolas
Desde a chegada dos salesianos ao Brasil, em 1883, até se
estabelecerem em Campinas, em 1897, a sociedade brasileira passara do
sistema imperial para o republicano, em 1889. Essa mudança política atingiu a
Igreja, pois o catolicismo deixou de ser a religião oficial do Estado, deixando o
clero de ser funcionário público. Neste contexto, proliferaram os colégios
privados, principalmente, os protestantes metodistas.
Há também uma mudança nos modelos educacionais, quando se
defende que os métodos e conteúdos para a instrução sejam elaborados de
acordo o regime político, que é laico. Segundo Negrão (idem, p. 17):
Entre 1837 e 1838, com a fundação do Colegio Pedro II, no Rio de
Janeiro, houve a uniformização dos currículos nas províncias. Como
modelo oficial de ensino no Brasil Império, esse colégio destinava-se
à sociedade agrária, patriarcal e escravagista. Seu ensino
caracterizava-se por ser informativo e enciclopédico, bem diferente da
instrução dos jesuítas, de cunho clássico-humanístico-formativo. […]
Nos moldes do Colégio Pedro II, criaram-se Liceus provinciais e
colégios leigos e religiosos. […] No segundo reinado, surgiu a
preocupação com o ensino profissionalizante, pois já se vislumbrava
o movimento pela abolição da escravatura. A sociedade brasileira
passava por transformações, principalmente, pelo surto migratório e o
desenvolvimento industrial, trazendo consigo a urbanização.
No final do século XIX, o parâmetro de programa educacional ideal era o
do Colégio Pedro II que atendia a elite de população no Rio de Janeiro
(SANTOS, 1976). Os colégios e liceus que seguissem programa semelhante
teriam seus exames reconhecidos e validados pelo Estado após fiscalização
pública.
Após a proclamação da República em 1889, os princípios positivistas de
Ordem e Progresso eram um referencial para a educação estatal, valorizando
uma proposta educativa científica, sem dimensões místicas ou sobrenaturais.
74
Sob influência do positivismo de Augusto Comte, fundou-se em Campinas o
Colégio Estadual Culto à Ciência, a primeira escola laica da cidade, mas não
sem grande repercussão por atender um ideal maçônico de personalidades de
destaque no cenário social e político como Campos Sales, Visconde de
Indaiatuba, etc. (NEGRÃO, 1997).
Este modelo de escola estava sendo cogitado por políticos e
administradores do ensino público na década de 1890. Neste mesmo caminho
de desenvolvimento escolar, no final do século XIX, em Campinas, Souza
(1997, p. 24-25) explica:
No dia 7 de fevereiro de 1897 foi inaugurado oficialmente o Grupo
Escolar de Campinas. A ata de inauguração da escola foi transcrita
pelo diretor Chistiano Volkart no primeiro relatório encaminhado à
98
Inspetoria do ensino Público em 1897 . Nesse relatório o diretor
deixava evidenciado o significado político da criação dessa escola
primária como obra republicana:
“Antes, porém, de fazer a exposição dos fatos referentes à instituição
que tenho a honra de dirigir, seja-me permitido congratular-me com o
Governo pelos notáveis progressos que nestes últimos anos, a partir
do dia 15 de novembro de 1889 tem feito a instrução pública no
nosso Estado devendo isso aos esforços do nosso patriótico Governo
e à feição nova que o mesmo tem sabido dar a esse importante ramo
da administração pública.
A educação da juventude é quase sempre o objetivo dos que
elevados pela confiança de um povo inteiro, tem sobre si o encargo
sublime de dirigir os destinos desse mesmo povo.
Em nosso país onde durante muitos anos se descuidou desse
importante fator do progresso, já agora os benéficos resultados do
regímen adotado não se fazendo sentir, pois que diariamente vemos
aparecerem novos estabelecimentos de instrução onde o ensino é
ministrado com proveito e vazado nos moldes dos mais modernos
processos pedagógicos.
Quem observa o desenvolvimento que tem tido o ensino público
nestes últimos anos e fizer um confronto com as antigas escolas
régias do regime decaído e as novas escolas da República, de certo
não deixará de encher-se de entusiasmo e levantar este brado: - Viva
99
a república !”
A proposta educacional republicana não estava direcionada para a
massa popular, e sim à elite intelectual e financeira das principais cidades do
país. Em Campinas esta realidade não era diferente. Os jovens desvalidos da
98
A ata de inauguração do edifício do grupo Escolar de Campinas. Grifo em itálico do autor. Cf.
SOUZA, 1997.
99
Relatório apresentado pelo diretor Christiano Volkart, do Grupo Escolar de Campinas, em
novembro de 1897. Arquivo do Estado de São Paulo, Setor de Manuscritos, ordem 6.815. Cf.
SOUZA, 1997.
75
fortuna não tinham meios de conciliar o trabalho e estudo formal. Na década de
1880 para 1890 foi fundado a Escola do Povo, custeada pelo Barão de Itatiba.
Tratou-se de um gesto de benemerência que não era usual para a época,
sobretudo relacionado à educação. Neste mesmo caminho de auxílio à
realidade de jovens desafortunados de oportunidade de estudo formal “[…] o
liceu surgiu com o objetivo específico de acolher os órfãos abandonados. Além
disso, desde a sua fundação, foi também um colégio, ofertando educação
salesiana aos filhos da sociedade campineira e regiões circunvizinhas”
(NEGRÃO, 1997, p.18).
A história da chegada dos salesianos, em Campinas, coincide com dois
acontecimentos em 1889: a Proclamação da República e a febre amarela que
ceifou, só em Campinas, mais de mil vidas. Muitas famílias abandonaram suas
casas, buscando refúgio nas fazendas e municípios vizinhos. Os serviços
públicos e privados ficaram parados, os estabelecimentos comerciais fechados
e objetos pessoais eram incinerados.
A epidemia de febre amarela foi um abalo no projeto de modernização
em curso. Conforme Lapa (1996, p. 04):
A epidemia forçou intervenções abruptas das autoridades e a criação
de políticas públicas visando à higienização e saúde das pessoas. [...]
a aspiração à modernidade que se espraiava pela ainda senhorial
sociedade campineira racionalizou as práticas filantrópicas e
esforçou-se por confinar os sofrimentos humanos, pois dor, pobreza e
fragilidade não coadunavam com a imagem de civilidade e
imponência que se buscava. Portanto cabia à Santa Casa de
Misericórdia atender os desvalidos, regrando a assistência com a
disciplinarização moral e social.
Frente a esta situação de calamidade pública, algumas pessoas
dispuseram de seu tempo para ajudar nos serviços de enfermagem e
higienização da cidade (NEGRÃO, 1997). Pessoas beneméritas como Dona
Maria Umbelina Alves Couto100 e do Cônego (depois bispo) João Batista
Corrêa Nery101 realizaram o projeto da casa beneficente, com a finalidade de
100
Idealizadora do asilo para os órfãos desamparados da Cidade de Campinas. “Campineira de
nascimento, casada com o comerciante Antônio Francisco de Andrade Couto” (NEGRÃO,
1997, p. 30).
101
Cônego Nery, como era conhecido, nasceu no dia 6 de outubro de 1863, filho de Benedito
Correa Alves e de dona Maria do Carmo Neves. Em 1896, aos 33 anos, recebeu por decreto
do Papa leão XIII, o título de bispo e assumiu a Diocese do Espírito Santo. “Criado o bispado
em Campinas, Dom Nery retorna a sua terra natal, em 1908. Querido pelos campineiros e,
76
socorrer os órfãos da longa epidemia de febre amarela que assolou a cidade
(SANTOS, 2000).
Uma vez idealizado o projeto da casa beneficente, esforços não foram
poupados tanto por parte do Cônego Nery como pela população de Campinas,
assolada pela febre amarela. Neste sentido, conforme Negrão (1997, p. 21):
102
Os beneméritos barão e baronesa Geraldo de Resende, Francisco
Bueno de Miranda e sua esposa, dona Amélia Alves Bueno de
Miranda, doaram ao cônego Nery a área de 43.443 m² no bairro do
Guanabara, subúrbio de Campinas, que fazia limite com as
propriedades dos doadores e a estrada pública do Taquaral, tendo na
frente uma rua, ainda sem nome. O local era afastado do centro, mas
muito aprazível, e a planta do edifício ficou aos cuidados do
103
engenheiro salesiano Domingos Delpiano .
No dia 09 de outubro de 1892 lançou-se a pedra fundamental do edifício
denominado Liceu de Artes e Ofícios. Neste mesmo dia, ocorreu o acordo entre
padre Lasagna e o cônego Nery de que, depois de inaugurada a construção do
edifício, a administração seria entregue aos salesianos. Negrão (idem, p. 2223) destaca:
O Correio de Campinas, cujo diretor era o sr. Henrique de
104
Barcelos , assim se espressou, no dia 9 de outubro de 1892:
“Dá-se hoje a cerimônia do lançamento da pedra fundamental do
Lyceu de Artes e Offícios. Esta cerimônia constitui um acontecimento
para Campinas, porque realiza uma aspiração há muito sentida entre
nós. À excelentíssima Sra. Dona Maria Umbelina Alves Couto não
principalmente, pelos pobres; sua vinda representava uma esperança em relação a obras de
benemerência” (Idem, ibidem, p. 29).
102
“Francisco Bueno de Miranda nasceu em Itu, em 1º de maio de 1840, filho de Francisco
Bueno de Miranda e dona Úrsula Ferraz de Camargo, de estirpe genuinamente paulista.
Conhecido como “Bueninho”, casou-se com dona Amélia Leopoldina Alves Bueno de Miranda,
com quem teve nove filhos: Inácio, Elisa, Francisco, Luís, Anna, Joaquim, Amélia, Suzanna e
Antonio. Bueninho era abastado fazendeiro e capitalista. […] Sofreu, porém as consequências
da crise do café, que levou o produto a preços ínfimos e fez a Fazenda Santa Genebra decair.
Em 16 de julho de 1902 faleceu a baronesa e, anos depois, no dia 1º de outubro de 1907,
morreria o barão, deixando a cidade consternada” (Idem, ibidem, p. 32).
103
Salesiano irmão de origem italiana. Chegou ao Brasil no dia 14 de julho de 1883 sendo um
dos sete missionários vindos para o continente sul-americano na primeira expedição
missionária para além do continente europeu. Desempenhava função de engenheiro e
arquiteto. Foi responsável por obras monumentais no Brasil, tendo como exemplo o Colégio
Santa Rosa, no Rio de Janeiro, e o Liceu Nossa Senhora Auxiliadora, em Campinas.
Disponível em: http://www.salesiano.org.br/dombosco/historia.html. Acesso em: 25-fev2013.
104
Foi
diretor
do
Diário
popular
de
Campinas
por
vinte
anos.
Cf.
http://www.liceu.com.br/downloads/Coletanea_concurso_Liceu_115_anos.pdf. Acesso em: 25fev-2013.
77
pode haver dia mais grato do que este, em que ela vê concretizada a
sua ideia.
Ao cônego Corrêa Nery cabe a honra de ter lançado esse
pensamento no coração campineiro e lá vê-lo frutificar com inaudito
entusiasmo.
A pedra fundamental do Lyceu de artes e Officios é a pedra angular
da instrução dos filhos do povo de Campinas.
O que vai ser este estabelecimento de educação eminentemente
popular pode-se desde já prever, sabendo-se que sua Direção vai ser
entregue aos padres salesianos, que no ensino manual não encontra
termo de comparação com nenhum outro educador da mocidade, nas
artes e nos oficios, por meio dos quais, os meninos conquistam
facilmente o meio seguro de ganhar o pão”.
Pelas palavras desse fragmento fica evidente que a vinda dos
salesianos para Campinas estava já gravada no coração dos
campineiros. Certos dos benefícios que trariam à cidade, através da
educação profissional.
Ilustração 8 – Pátio interno do Liceu em 1919105
Extraído de: (NEGRÃO, 1997, p. 47)
A obra foi inaugurada no dia 23 de maio de 1897, mas o internato
começou somente em 1898, com sessenta e quatro alunos internos, atingindo
logo, em 1899, cento e cinquenta. Triênio em que “[…] as artes e ofícios foram
instalados e, depois, o curso comercial, com uma grade curricular semelhante à
do Liceu Coração de Jesus […]” (SANTOS, 2000, p. 227).
105
Pode-se observar na ilustração 8 as divisões de alunos divertindo-se no pátio interno do
Liceu, dado que nos permite entender sobre a realidade espacial deste colégio.
78
Passados três anos de inauguração da obra em Campinas, Dom Nery,
recém nomeado bispo da diocese do Espírito Santo, oficializou a doação do
Liceu de Artes e Ofícios de Nossa Senhora Auxiliadora aos salesianos, no valor
de cem contos de réis.
Negrão (1997, p. 47) afirma que:
As oficinas ofereciam aos alunos roupas, calçado, moradia, alimento
e educação em tempo integral. O Lyceu de Artes e Officios era um
lar. Os aprendizes lidavam com as máquinas e se dedicavam a
trabalhos manuais. Frequentavam aulas de instrução especial
complementar, aprendendo a ler, escrever, fazer as quatro
operações, um pouco de teoria musical, catecismo e educação moral.
Eram submetidos, a cada seis meses, a um exame prático. Os
produtos feitos nas diversas oficinas eram vendidos à população,
para cobrir os custos com a matéria-prima utilizada. Com o passar
dos anos, os alunos aprendizes transformaram-se em monitores e
mestres.
Passados os primeiros anos de receptividade aos salesianos, o Liceu de
Artes e Ofícios de Campinas começou a receber questionamentos e críticas
por parte de famílias de alunos internos, quanto à estrutura formativa e
curricular do curso secundário, a demora da construção do prédio que estava
em expansão e rigidez das normas disciplinares como no caso da proibição
dos alunos106 de visitarem os pais na semana santa e em sábado de Aleluia.
Os progenitores exigiam o respeito a seus direitos paternos, enquanto que os
salesianos diziam obedecer às normas da congregação, tratando-se de um
modelo da escola de Valdocco (Turim – Piemonte – Itália), criados pelo próprio
Bosco (SANTOS, 2000).
Para Passos Júnior (2004, p. 64):
Os colégios em todo o mundo assumem o mesmo formato e estilo
das escolas italianas, não existindo inculturação. A nacionalidade
italiana é condição para se ocupar os postos chaves na obra em todo
o mundo, prevalecendo a mentalidade da superioridade da cultura
europeia. A fidelidade ao ideário educacional se estende aos
costumes, hábitos e até horários da própria Itália.
A situação se agrava quando as famílias abastadas de Campinas
passaram a exigir ensino secundário exclusivo e não ensino nos moldes
106
“O problema foi desencadeado devido à proibição, por parte do Diretor, da saída de alunos
no sábado de aleluia, praxe então comum adotada em todos os Colégios Salesianos, segundo
a qual os alunos não podiam sair para a casa de seus pais durante a Semana Santa. O debate
está publicado no Diário de Campinas, de 6 de abril de 1898 (uma das cartas dos pais) e de 7
de abril de 1898 (resposta do Pe. Alexandre Fia)” (SANTOS, 2000, p. 226).
79
salesianos, sendo secundário e Artes e Ofício. Para Cunha (2000, p.31)
comenta:
A pressão da demanda das famílias abastadas por ensino secundário
exclusivo e de boa qualidade para seus filhos fez que o ensino
secundário salesiano se hipertrofiasse. Enquanto até 1910 as escolas
profissionais salesianas formavam um quase sistema de ensino
profissional, a partir dessa data elas entraram num período de
decadência, quando passaram a ser meros “anexos” dos liceus, que
nada mais tinham de artes nem de ofícios.
Chega-se ao ponto de não se ter quase nada de Artes e Ofícios no
Liceu, ainda que tenha sido construído para esta finalidade, constatando-se
uma percepção míope e errônea da realidade dos salesianos, pois, não havia
público e demanda de jovens que pudessem acessar os cursos oferecidos.
Além de que a ausência de rendas, pela não absorção da mão de obra
formada pelas poucas indústrias campineiras, era prejudicial a todos os jovens
aprendizes que não conseguiam emprego, não sendo absorvidos integralmente
pelo mercado (SANTOS; CASTILHO, 2003). A localização do Liceu num
contexto agrário aproximava-o mais da realidade de Lorena, agrária e de
população abastada que procurava ambientes para uma educação de
qualidade (EVANGELISTA, 1991). Tanto as casas salesianas de Lorena como
de Campinas apresentaram dificuldades semelhantes em seus inícios com a
oferta de cursos de Artes e Ofícios107. Por este motivo mudaram o foco
educacional para o ensino formal secundário exclusivo 108. Negrão (1997, p.53)
107
Feita uma breve aproximação dos contextos das realidades dos colégios salesianos nas
cidades de Lorena e Campinas em âmbito educacional, Lapa (1983, p. 29) apresenta um
quadro de aproximação contextual das cidades, considerando as diferenças de modelos
econômicos, sociais e culturais:
1850 - 1910
Vale do Paraíba
Velho Oeste Paulista
1. Formas tradicionais de ocupação e uso da 1. Formas capitalistas de ocupação e uso da
terra
terra
2. Fracionamento dos latifúndios
2. Predomínio da grande propriedade
3. Estagnação econômica
3. Progresso
4. Mentalidade tradicional na administração 4. Mentalidade empresarial capitalista
da fazenda
5. Investimento improdutivo dos lucros
5. Investimento produtivo dos lucros
108
Santos (2000) afirma que o ponto determinante da mudança de ensino Artes e Ofícios para
ensino secundário exclusivo no Liceu ocorreu devido à exigência da Reforma Epitáfio Pessoa,
promulgada em 1901, além das situações particulares existentes nesse período como alto
custo de manutenção das máquinas, ausência de renda e de demanda de jovens para realizar
os cursos oferecidos, etc. As afirmações de Santos (2000) e Negrão (1997) são
complementares quanto à mudança de modalidade educativa.
80
afirma da realidade do Liceu, podendo ser estendido à casa salesiana de
Lorena que apresentava quadro social semelhante.
As oficinas profissionalizantes não prosperaram e acabaram falindo.
Isso se deu por vários motivos. Sua montagem e manutenção
exigiam grandes despesas e a distância do Liceu ao centro urbano
comprometia a demanda de encomendas e a venda dos produtos. O
Guanabara, bairro de difícil acesso, sem arruamentos e caminhos
poeirentos, dificultava a vinda de pessoas. Ademais, era problemática
a integração dos estudantes mais favorecidos com os aprendizes,
provindos de classe socioeconômica mais baixa. Além disso, o ensino
profissionalizante, por enfatizar a atividade manual, não encontrou
acollhida numa sociedade eivada de preconceitos.
Entende-se que tanto na cidade de Lorena como em Campinas, a
mudança de Artes e Ofícios para o Ensino Secundário, exclusivo em formato
de internato, dá-se mais pela necessidade de se oferecer resposta eficaz à
condição das pessoas e sociedade agrária, do que pela crítica de inadequação
social dos cursos e pressão, sobretudo das famílias abastadas.
A partir desta experiência de trabalho educacional infrutífera, a diretoria
do Liceu Nossa Senhora Auxiliadora entrara em contato com Dom Nery, bispo
de Campinas e resolvera transferir as atividades de Artes e Ofícios para o
centro da cidade. Com recursos financeiros do Liceu, adquiriam, em 1909, uma
propriedade109 para sediar o ensino profissionalizante. Nasce o Externato São
João, que havia funcionado nas dependências do Liceu até 1911. No ano
seguinte, passou a ter autonomia enquanto unidade de ensino formal, segundo
regulamentação da congregação salesiana, mas não quanto à Reforma110
educacional de Epitáfio Pessoa, cujo cumprimento dos requisitos oferecia
garantias de ginásio à escola. Curiosamente, tanto o Liceu Nossa Senhora
109
“Em 1905, os salesianos conseguiram um acordo com Barão Geraldo de Rezende, que fez
uma doação inicial de 400.000m² para a realização do projeto. A região de Campinas estava
coberta de fazendas de café, daí o interesse de se criar uma escola agrícola para fornecer mão
de obra semi especializada preparada para atender aos trabalhos das fazendas. Com o
falecimento inesperado do Barão, a escola só pôde tornar-se realidade em 1909” (SANTOS;
CASTILHO, 2003, p. 34).
110
“Em 1º de janeiro de 1901, ocorreu a Reforma de Epitáfio Pessoa, então ministro da Justiça,
cuja pasta estava anexada ao Ministério da Educação. O presidente da República, Campos
Sales, aprovou o código dos institutos oficiais dos ensinos superior e secundário, do qual o
artigo 361 mostrou-se decisivo para as mudanças educacionais da sociedade: Aos
estabelecimentos de ensino superior ou secundários fundados pelos Estados, pelo Distrito
Federal ou por qualquer associação de indivíduo, poderá o governo conceder os privilégios dos
estabelecimentos federais congêneres” (NEGRÃO, 1997, p. 53).
81
Auxiliadora como o recém-fundado Externato São João111, não buscaram,
inicialmente, a equiparação de grade curricular com as exigências da Reforma
Epitáfio Pessoa, permanecendo com a grade de estudos de orientação italiana
(Idem, ibidem).
De forma concomitante à fundação do Externato São João, no centro de
Campinas, os salesianos decidiram transformar os espaços destinados às
oficinas de Arte e Ofício numa Escola Agrícola, sendo os germens do que é
hoje a Escola Salesiana São José. Tais transformações, menos rentáveis,
dirigiam-se para os jovens pobres, demonstrando o desejo da fidelidade às
origens com o trabalho social e profissional, voltado para a população juvenil à
margem da sociedade.
2.2.2 Escola Agrícola
O projeto de fundação da Escola Agrícola floresceu quando, em 1905, o
Barão Geraldo de Resende doou 4 mil m² de terras ao Liceu. Tratava-se da
Fazenda Santa Genebra que não oferecia renda com a produção e venda de
café devido aos preços ínfimos praticados durante a crise do café. Por
intermédio do Senador General Francisco Glicério que solicitou do Congresso o
benefício de cotas lotéricas anuais, a fazenda Santa Genebra foi transformada
em Escola Agrícola.
Com o êxito das cotas lotéricas, os salesianos alugaram uma fazenda
chamada Santa Amélia, pertencente à família do Barão Geraldo. Adquiriram
máquinas agrícolas, ferramentas e animais de tração e iniciaram um pavilhão
como casa de máquinas. Entretanto, segundo Negrão (1997, p. 54):
Apesar dos esforços e independentemente da vontade de todos, a
escola não se consolidou por embargo da escritura de compra e
111
Desde sua fundação, o externato São João desenvolveu atividades educacionais formais
como escola particular para meninos, e também Artes e Ofícios, principalmente, para filhos de
operários, vindo a interromper suas atividades em 1994. Hoje é a atual Obra Social São João
Bosco, oferecendo atendimento a crianças e adolescentes em situação de rua num bairro
nascido de invasão, Vida Nova.
82
venda. Parte da fazenda foi provisoriamente alugada ao Liceu por
112
500 mil réis, até sua compra definitiva .
Neste contexto de investimento na compra de imóveis, P. Carlos Peretto,
diretor da escola, em nome dos salesianos, preocupava-se cada vez mais com
a temerosa ideia de confisco público das propriedades religiosas, realidade
vivenciada pelos salesianos em Portugal.
Santos e Castilho (2003, p. 35) referendam:
[…] Carlos Peretto, recém-chegado de Portugal, vítima da revolução
que derrubou a monarquia e a casa de Bragança. Assistira ele a
confiscação de todos os bens das congregações religiosas. Para
evitar a repetição de fatos semelhantes, insistia padre Carlos que se
cassassem as propriedades e imóveis das comunidades religiosas à
sociedade dos cooperadores que fossem católicos praticantes.
Exemplos análogos a esses acabava de dar o Uruguai.
Na tentativa de evitar tal desfecho de confisco, os salesianos, junto com
Dom Nery, bispo de Campinas, somaram forças para dar suporte, estrutura e
personalidade jurídica a esta sociedade de cooperadores. Foi a alternativa
encontrada de dar início às almejadas atividades de ensino agrícola sem o
risco de perder a propriedade para o governo, a exemplo do acontecimento em
Portugal.
Conforme Negrão (1997, p. 55):
Coube ao padre Manoel Gomes de Oliveira, sucessor do padre
Peretto, a constituição de uma sociedade de cooperadores, com
personalidade jurídica, estatutos e contrato com a inspetoria
salesiana. Com Dom Nery na presidência consolidou-se, em 1912, a
Associação Agrícola de Educação e Assistência, em cujo nome
lavrou-se a escritura das terras e benfeitorias da fazenda. Os sócios
nada dispenderam, pois ao Liceu coube o encargo da administração
geral da escola, através das verbas, subvenções e cotas lotéricas do
governo federal.
A inauguração da Escola Agrícola aconteceu no dia 1º de julho de 1914,
nove anos após a doação dos terrenos da Fazenda Santa Genebra, feito pelo
Barão Geraldo de Resende. No primeiro ano de funcionamento oficial,
matricularam-se apenas dez alunos. No ano seguinte o número subiu para
112
A Escola Agrícola não iniciou suas atividades anterior ao ano de 1914 devido à morte de
Barão Geraldo, ocorrida em 1907, complicando assim a parte jurídica da doação do terreno,
realizada em 1905 (SANTOS; CASTILHO, 2003).
83
vinte113. “Os 62 alqueires da Escola Agrícola tornaram-se o celeiro provedor do
sustento liceano” (Idem, ibidem, p. 57).
Se por um lado, parte da produção de hortaliças, legumes e frutas era
revertida para o Liceu, de outro o Liceu ajudava nos custos gerais da escola,
pois os recursos financeiros previstos por lei a favor da escola chegavam
parcialmente. Santos e Castilho (2003, p. 36) atestam:
O Liceu soube honrar seus compromissos com o presidente da
Associação, apesar dos sacrifícios e pesados encargos que foi
obrigado a arcar, tais como alimentação de quase todos os
trabalhadores braçais por anos a fio, adiantamentos e capital próprio,
sem juro algum, entre outros.
A cobertura de gastos, na Escola Agrícola, por parte do Liceu, tornou-se
maior na década de 1930, quando a situação ficou mais difícil pela queda da
produção de café, hortaliças e legumes na lavoura e pomares, somados a
problemas como ausência de controle de venda a estranhos, pouca
honestidade na administração, contabilidade e balancetes (NEGRÃO, 1997).
Diante desse quadro de infraestrutura comprometida e ausência de recursos
financeiros para refazer os pomares, lavouras e máquinas, a Associação
Agrícola de Educação e Assistência resolveu passar para os salesianos a
propriedade. Segundo Amêndola (apud NEGRÃO, 1997, p. 59):
A transmissão da Escola ao Lyceu não prejudica a quem quer que
seja e só traz vantagens. Aos meninos pobres não prejudica porque o
seu número seria conservado e elevado para resolver o caso das
aulas antie-conômicas; 25, 30 ou 35 seriam elles, em vez dos 20 do
contrato em vigor. Traz vantagens: porque incorporados ao Lyceu,
formando uma secção desse estabelecimento, teriam de maneira
permanente a mesa farta dos lyceanos, teriam bem vastos e
confortáveis dormitórios, salas de aula amplas e arejadas, fornecidas
de copiosos material escolar, grandes pátios, jogos de diversão e
educacionais, teriam, enfim, as installações e o mesmo bem-estar do
Lyceu Nossa Senhora Auxiliadora, que muitos julgam – modelares.
Nas casas de Dom Bosco, os alunos são tratados igualmente, e não
se distinguem os pensionistas dos não-pensionistas, a bem da
caridade e do brio dos alunos.
Passada uma década de ausência de dispêndios e infortúnios 114, a
Escola Agrícola se viu cercada pela repentina urbanização. Arruamentos foram
113
Santos e Castilho (2003) fazem notar que as matrículas dos alunos só puderam ser feitas
em 1918, quatro anos após a inauguração da escola agrícola, devido a mal entendidos com
autoridades que pretendiam ter sobre a escola poderes exagerados.
114
Apesar de não haver moléstias e problemas maiores relacionados à escola após a
passagem da escritura da Escola Agrícola aos salesianos, estes não conseguiram promovê-la.
84
feitos e prolongou-se a rua Barão de Itapura até a lagoa do Taquaral. Diante da
expansão da cidade para área do campo, os salesianos elaboraram um projeto
de venda dos terrenos, até porque estavam vulneráveis a invasores. A Escola
Agrícola estava condenada.
O espaço pegava da rua Carolina Florença, a rua Barão de Itapura e
dava volta atrás do Liceu, descia para o bairro Taquaral, e subia aqui
outra vez. Depois começou a lotear. A inspetoria começou, mas como
não é do ramo, passou para a prefeitura. Loteamento não era nosso
115
ramo, e estava indo para trás. A prefeitura assumiu , loteou, trouxe
os serviços de luz, esgoto, toda a infraestruturua de praças e jardins.
A inspetoria não estava preparada para isso. Então, a prefeitura
assumiu no mandato político do prefeito Joaquim de Castro Tibiriçá.
[Pergunto em que ano foi isso. E ele:] 1945 e 1946. Por isso puseram
o nome de jardim Nossa Senhora Auxiliadora, pelos salesianos. Este
loteamento aqui em baixo, muitos compraram. (Testoni, E
29/08/2012).
Com a renda da venda das terras da antiga Escola Agrícola, orçada em
5 milhões de cruzeiros, somado a doação da prefeitura municipal de Campinas
de quinhentos títulos da dívida pública, chegou-se ao montante de 12 milhões
de cruzeiros, o suficiente para a construção de um novo edifício para ensino
agrícola profissional, hoje a Escola Salesiana São José, inaugurada em 1953.
“Em 1931, por exemplo, só houve um diplomado. No ano seguinte, quatro e, em 1935, sete.
Nesse ano não houve 1º e 2º ano. Em 1937, contavam-se 17 alunos na 1ª série, mas não
funcionaram as demais séries. Daí em diante, não mais apareceram alunos. […] Em 1937, os
primitivos membros da Associação Agrícola de Educação e Assistência já haviam
desaparecido todos” (Iden, ibidem, p. 43).
115
“Um ofício do então Prefeito de Campinas, Dr. Joaquim de Castro Tibiriça, passava às mãos
do Diretor do Liceu N. S. Auxiliadora o processo protocolado de nº 5879, de 7 de junho de
1945, sobre a construção de um parque municipal, solicitando a manifestação positiva sobre
esse plano e cessão da área para o parque. Em resposta adenda ao referido Ofício, à mão,
dizia-se que os Salesianos não se opunham, contanto que houvesse indenização justa, em
benefício da Escola Agrícola, uma vez que se tratava de patrimônio beneficente dessa Escola.
Em carta ao padre José Joaquim Santana, o Provincial salesiano, padre Orlando Chaves,
manifestava a opinião de não ceder a título gratuito os terrenos da Escola Agrícola, porque não
pertencia aos Salesianos, e sim a essa instituição, que os Salesianos deviam ‘defender e
desenvolver em benefício dos pobres’, mas autorizava a cessão dos terrenos se as
compensações fossem as melhores possíveis, exigindo indenização da cocheira uma vez que
a construção de outra seria bastante elevada. O cumprimento da cláusula imposta pela
Resolução 1.141/1946 começava assim a realizar-se com a construção da Escola São José”
(Iden, ibidem, p. 49-50).
85
2.2.3 CPDB: tempo e lugar
A construção da Escola Salesiana São José teve seu início em 1948.
Embora tenha admitido alunos no segundo semestre de 1952, sua inauguração
oficial aconteceu somente em 25 de maio de 1953 (VIEIRA, 2002). Sua origem
remonta à “Associação Agrícola de Educação e Assistência com o objetivo de
ministrar cursos profissionais na modalidade de internato” (MIRANDA, 2002, p.
139).
No ano de inauguração da Escola, eram 214 internos nas oficinas de
mecânica, carpintaria, sapataria, alfaiataria, tipografia e nas suas plantações.
Do total de alunos internos, 68 procediam do serviço social de menores da
Capital Paulista, sendo que muitos destes jovens traziam uma carga de maus
costumes difíceis de erradicar, causando dificuldades à manutenção de uma
disciplina tranquila (CASTRO, 2002).
Santos e Castilho (2003, p. 75) trazem o relato do diretor da Escola São
José, Pe. Alfredo Bona, como encontrou a escola:
Em 1953 quando fui nomeado diretor, mais que depressa, procurou-se voltar ao sistema preventivo. Procurou-se eliminar as célebres
“carolinas”. Criou-se um clima de liberdade. Incutiu-se que ninguém
estava obrigado a permanecer na Escola, mas nem por isso
precisava fugir. A diretoria se encarregaria de levá-lo à casa ou
devolvê-lo à FEBEM. Foi o suficiente para que se eliminassem as
fugas. Com a abertura da Escola São José, ouviram-se comentários
por parte da sociedade, estas palavras: que beleza, os salesianos
116
voltaram a tomar conta das crianças pobres !
Na condição de escola confessional, contou desde o início com um
grupo de Salesianos Irmãos117 e Padres para a operacionalização e efetivação
116
Deve ser recordado que o Liceu Nossa Senhora Auxiliadora, casa mais próxima da então
Escola São José atendia à elite agrária da cidade (Cf. Negrão, 1997).
117
“Depois, emancipamos e ficamos com as escolas profissionais. Tinha sapataria, alfaiataria,
encadernação, tipografia, mecânica, marcenaria e todos os chefes de oficinas eram salesianos
irmãos. Competentes com o ofício. Não foi fácil. Mas está aí a obra. A parte salesiana, nós
fizemos, os irmãos. Veio nosso superior Pe. Orlando Chaves realizar a visita canônica e pediu
que marcássemos o terreno da Escola. Nós descemos a marcação com arame farpado e
ocupamos toda a área. Toda ela estava ocupada” (TESTONI, E 29/08/2012). Relato do período
que vai do fim da Escola Agrícola de Educação e Assistência, em 1945 a 1953, com a
construção da Escola Salesiana São José.
Esta escola também tinha a finalidade de oferecer formação adequada ao mundo do trabalho,
segundo sua própria temporalidade aos jovens salesianos irmãos. Estavam presentes nessa
obra em 1953, ano de inauguração, Anibal Ranguetti, Antonio Testoni, Walderino Andreatta e
Silvio Wagner. Tal finalidade de formação se decompôs com o tempo, caindo em desuso sua
aplicação. Já na década de 1980 não se enviavam mais salesianos irmãos a esta obra, haja
86
do ensino profissional. Entretanto, havia queixas dos salesianos pela falta de
apoio governamental118. Esta situação pode ser compreendida e justificada
pelo contexto da época, sendo que o Estado119 passou a emitir certificação
como controle das entidades confessionais e particulares filantrópicas. Parte da
verba estatal era direcionada às escolas profissionais federais, implantadas e
robustecidas em concomitância com a criação do SENAI120 (Serviço Nacional
de Aprendizagem Industrial), quando a Indústria se encarregaria do preparo do
pessoal necessário para suas atividades de produção. Neste sentido, Santos
(1974, p. 157) explica:
Os Decretos-Leis que criaram o SENAI e o Ensino Industrial vêm
assinados por personalidades que conheciam as Escolas
Profissionais Salesianas: Getúlio Vargas, Gustavo Capanema e
Alexandre Marcondes Filho, respectivamente, Presidente da
República, Ministro da Educação e Saúde e Ministro do Trabalho, em
1942.
Inicialmente,
algumas
escolas
do
SENAI
funcionaram
em
estabelecimentos salesianos, como o Instituto Dom Bosco no bairro do Bom
Retiro, em São Paulo. Santos (idem, p. 161) ainda afirma que:
Os cursos do SENAI, plásticos, ajustados, flexíveis, revisionistas,
cresciam aceleradamente no período 1943/1952 de 572,60% […]. A
criação pelo Governo de suas Escolas Técnicas, bem equipadas, e
do SENAI, sob responsabilidade das indústrias deixou os Salesianos
sem condições de realizar um trabalho idêntico, o que talvez os tenha
desestimulado, uma vez que suas escolas profissionais dependiam
também de verbas e auxílios governamentais, nem sempre fáceis de
adquirir. Como é que o Governo iria sustentar as escolas particulares
vista o declínio vocacional dos salesianos irmãos e a nova configuração provincial, abrindo o
leque de profissionalização a outras áreas e lugares, diversas das ofertadas na Escola São
José (SANTOS; CASTILHO, 2003).
118
Recorde-se que os salesianos não tinham autonomia para modificar sua estrutura
administrativa e funcional, já que qualquer modificação deveria receber aprovação do conselho
superior dos salesianos. O não apoio governamental pode ter como uma das causas, a não
adequação imediata da Escola São José aos parâmetros e critérios educacionais do governo.
Situação semelhante fora relatada sobre o Liceu Nossa Senhora Auxiliadora, em Campinas,
(Cf. NEGRÃO, 1997) e sobre o Liceu Coração de Jesus, em São Paulo (Cf. Santos, 2000). “No
exame que Manoel Esaú fez dos documentos do Liceu Coração de Jesus, não foi encontrado
sinal algum do interesse dos padres em adaptar as escolas profissionais à ‘lei’ orgânica do
ensino industrial, visando à equiparação dos seus cursos aos das escolas federais” (CUNHA,
2000, p. 32).
119
Período conhecido como era Vargas de 1935 a 1960.
120
Kochem (1999, p. 49) observa em seu estudo sobre o SENAI que há um viés utilitarista em
sua articulação. “Esta visão utilitarista se torna mais clara quando o Ministério da Educação
manda em 1938 um anteprojeto sobre a aprendizagem industrial de adolescentes a entidades
patronais. Em 1942 é criado, por meio do Decreto – Lei n.º 4.048, o Serviço Nacional de
Aprendizagem dos Industriários que, só mais tarde, passa a ser chamado Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial (SENAI), sob a tutela da Confederação Nacional da Indústria (CNI)”.
Sobre a Confederação Nacional da Indústria, (Cf.SANTOS, 2008).
87
de ensino técnico-profissional, se estava ele empenhado em equipar
e fazer funcionar suas escolas técnicas que consumiam verbas
consideráveis?
Enquanto o SENAI se desenvolvia e conquistava a hegemonia no campo
do ensino profissional, o Ministério da Educação empreendia o reforço do
ensino propriamente escolar. Em 1942, com a lei orgânica, o ensino técnico
industrial “[…] foi organizado como um sistema, isto é, passou a fazer parte dos
cursos reconhecidos pelo Ministério da Educação, articulando-se com os
demais cursos” (CUNHA, 2000, p. 38).
A educação profissional foi um dos elementos motores da incipiente
indústria nacional, que, de forma tardia, centrou-se na produção de bens
duráveis e semiduráveis, tendo como exemplo as indústrias têxtil, alimentar, de
couro, de peles, etc. Em Campinas, que tinha sido uma grande produtora de
café, justificando-se assim a fundação do Instituto Agronômico do Café no final
do século XIX, após os anos de 1930, verificou-se uma lenta passagem para a
atividade industrial (SANTOS, 2000). Na década de 1950, o cenário político foi
marcado pelo populismo nacionalista, alimentado ainda pelo cinema novo, pela
Bossa Nova e pela Copa de 1958 (SANTOS; CASTILHO, 2003).
Cenário que Costa (1971, p. 128) explica:
A popularidade de JK, com seu plano de metas, dobrou a produção
industrial através da instalação do parque automobilisto, da
inauguração de 20 mil quilômetros de estradas de rodagem e da
construção de Brasília. Mas tudo isso levou à elevação vertiginosa da
dívida externa, da inflação, provocando numerosos conflitos sociais.
Ao lado da industrialização, a educação aparecia como elemento chave,
segundo o modelo urbano industrial do programa de metas do governo de
Juscelino Kubitschek. Ventilado por esta proposição, Santos e Castilho (2003,
p. 88) referendam:
Um grupo do Ministério, dentro da Diretoria do ensino industrial,
ligado aos setores progressistas, conseguiu concretizar uma proposta
da qual saiu o Decreto nº 50.942, de 25 de abril de 1961. Tal Decreto
dispunha sobre a organização e funcionamento do ginásio industrial,
que mantinha seu caráter de cultura geral, permitindo, entretanto,
uma iniciação em atividades nos ramos industriais predominantes na
região da escola.
Com campo aberto para o avanço industrial em âmbito escolar, no
mesmo ano de promulgação do Decreto nº 50.942 do ensino industrial no
88
ginásio, celebrou-se o acordo entre a Inspetoria Salesiana e o Serviço Social
do Estado que liberou os recursos necessários para a ampliação das oficinas,
inauguradas no dia 1º de maio de 1962.
Conforme explica Miranda (2002, p. 140):
Em 1961 a escola abriu suas portas à comunidade local, ampliando o
atendimento para os alunos externos (ensino particular), que
frequentavam o curso primário ou o ginásio industrial, compondo com
os alunos internos que residiam na própria escola (obra social) o
corpo discente da instituição. Dos 283 aprendizes, 72 frequentavam a
mecânica e 24 a marcenaria, sendo que a primeira turma formou-se
em 1964, ano da abertura do curso de eletromecânica.
Com a instalação do curso de eletrônica no ginásio industrial, a Escola
Salesiana São José foi pioneira, em Campinas e na região, conferindo
excelência a essa unidade salesiana campineira.
No início da década de 1970, com o crescimento econômico, há forte
enfoque nos aspectos técnico e científico. Realidade apresentada por Santos e
Castilho (2003, p. 117):
O DIÁRIO DO POVO de Campina publicava, em 21 de janeiro de
1973, um artigo de uma página inteira com ilustrações, com este título
em manchete: “Formar técnicos, desafio das telecomunicações que
Campinas precisa vencer”. Campinas firmava-se então como sede de
microeletrônica.
Fruto desta demanda de mercado, em 1972, foram construídas as
instalações da ETEC (Escola Técnica de Telecomunicações de Campinas) e
do 2º grau técnico de Eletrônica e Telecomunicações, precursores da criação
da Faculdade Salesiana de Tecnologia (FASTEC), em 1987, e do Centro
Universitário Salesiano (UNISAL), em 1997121. Com este ritmo de crescimento,
a escola fechou o ano de 1975 entre as cinco maiores escolas técnicas do
país, tornando-se modelo em Campinas e região. “Em 1976 a escola abriu
121
Decreto de 24 de novembro de 1997. Art. 1º - Fica credenciado, pelo prazo de três anos, por
transformação das Faculdades Salesianas, o Centro Universitário Salesiano de São Paulo,
mantido pelo Liceu Coração de Jesus, com sede na cidade de Americana, e unidades de
ensino fora de sede nas cidades de São Paulo, Campinas e Lorena, todas no Estado de São
Paulo. Art. 2º - Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 24 de
novembro de 1997; 176º da Independência e 109º da República. FERNANDO HENRIQUE
CARDOSO.
Disponível
em:
http://unisal.br/wpcontent/uploads/2013/08/regimento_geral_2013.pdf. Acesso em: 10-jun- 2013. Acrescente-se
que a PORTARIA Nº 1.654, DE JUNHO DE 2004 resolve: Art. 1º - Recredenciar, pelo prazo de
cinco anos, o Centro Universitário Salesiano de São Paulo, com sede na cidade de São Paulo,
mantido pelo Liceu Coração de Jesus, com sede na cidade de São Paulo, no Estado de São
Paulo. Diário Oficial da União – Seção 1, Nº 109, terça feria, 8 de junho de 2004.
89
suas portas aos adolescentes de baixa renda122 da periferia de Campinas para
a promoção social local, oferecendo cursos de profissionalização” (MIRANDA,
2002, p. 141).
Se de um lado o modelo e estrutura de ensino técnico fluíam bem, de
outro o ginásio, em formato de internato, pautado numa tradição de disciplina,
rigor e fuga do mundo, desgastou-se frente os ventos da modernidade,
impulsionada
pelo
rompimento
de
tradicionais
costumes
familiares
e
institucionais, entendidos como verdadeiros e certos (VILLANUEVA, 2013).
Desta forma, em 1977 o internato foi fechado e, no ano seguinte, o ginásio
industrial.
Vecchi (apud SANTOS; CASTILHO, 2003, p. 140) desmistifica o ideal
que foi o modelo educacional em formato de internato:
No passado, quando era só internato, a escola chegou a ter mais de
200 alunos internos. Porém, naquela época, a Escola estava
propriamente afastada da cidade e a mentalidade do tempo facilitava
o ambiente do internato. Hoje, o progresso avançou e a escola está
cercada de bairros populosos e que necessitam de atendimento,
também do ponto de vista escolar. Esta necessidade da população,
aos poucos, foi forçando a Escola a se abrir para o bairro, aceitando
alunos externos.
É bom esclarecer que o internato foi diminuindo, não devido ao
aumento de alunos externos, mas porque os jovens, hoje, e
principalmente os que estão em regime de internato, manifestam um
desejo muito grande de liberdade em todos os sentidos, o que é
incompatível com o internato. Eles exigem coisas que são
perfeitamente válidas e normais para a idade, mas que de nenhuma
forma se pode permitir ao jovem dentro do internato.
Com o fechamento do internato, a educação básica, hoje compreendida
como Educação Infantil, Fundamental I, II e Ensino Médio, passou a atender
somente um público externo e pagante na condição de escola particular
confessional católica.
Quanto aos cursos profissionais sob a Lei Nº 5.692/71 de 1976, que
criou o ensino profissionalizante, foram, gradativamente, de 4 para 2 anos nas
áreas de marcenaria, mecânica e eletricidade (CASTRO, 2002). Por
122
Para um maior aprofundamento no assunto sobre o trabalho com adolescentes de baixa
renda, consultar o trabalho monográfico de CONCON, 2002 que desenvolve uma reflexão
bastante ampla a respeito desse tema, abrangendo, inclusive, o tema circunscrito do mercado
de trabalho.
90
consequência, os pavilhões destes cursos passaram por total adaptação ao
ensino de 1º grau.
Passada uma década, em 1986, atendendo as alterações da política
educacional, a escola deixou de oferecer os cursos profissionalizantes aos
alunos regulares da educação fundamental (MIRANDA, 2002). Entretanto
esses cursos passaram a ser oferecidos, exclusivamente, a adolescentes de
baixa renda. Critério basilar evidenciado nas palavras de Miranda (E
21/11/2012):
Nós precisamos fazer a seleção de forma que privilegie os mais
desprivilegiados financeiramente, os mais pobres. Houve uma
ocasião de que uma menina ficou contente em ver o nome dela no
primeiro lugar de classificação para cursar o CPDB, mas, mal sabia
ela que, no fundo, ela era a mais pobre de todas, porque o critério é a
pobreza, a necessidade. Trazem essas famílias para dentro da
escola. O sentido que acho maravilhoso que tem no CPDB é o
seguinte: a família e o aluno têm gratidão por aquilo ali, sendo que é
de alguma forma o direito deles, mas quando ele vai à escola
123
salesiana, a família
se sente grata dele ter sido tratado de forma
digna.
Em 1988 foi celebrado um convênio com o Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial (SENAI) para a profissionalização de adolescentes de
baixo poder aquisitivo, ampliando assim a prestação de serviços. Após novo
convênio com o SENAI, em 1990, abriu-se o curso de desenho de máquinas e
costura industrial para adultos no período noturno. Realizou-se também
parceria com a Federação das Entidades Assistenciais de Campinas (FEAC) e
suas afiliadas. “Deste período em diante, já com 732 alunos matriculados,
convencionou-se a chamar de Centro Profissional Dom Bosco (CPDB)”
(CASTRO, 2002, p. 08).
Com um considerável número de candidatos aos cursos, para fins de
seleção, eram usados critérios de escolaridade, idade e renda per capita
familiar, somente depois de realizadas as sessões de orientação profissional e
entrevista com a família pela assistente social, “[…] a classificação estava
condicionada ao atendimento dos candidatos de menor renda para o
preenchimento das vagas” (MIRANDA, 2002, p. 144). Para tanto, os objetivos
do Centro Profissional Dom Bosco consistiam em formar bons cristãos e
123
Para maior aprofundamento sobre a relação entre família, aluno e escola, consultar
(KOCHEM, 2003).
91
honestos cidadãos, além de oferecer a seus alunos a oportunidade de adquirir
conhecimentos técnicos básicos, a fim de que tivessem condições de buscar
um trabalho digno para uma sobrevivência e realização pessoal.
O setor foi se desenvolvendo, ampliando sua estrutura, também
alavancado pelo êxito dos cursos universitários com o qual o CPDB se
beneficiou, ocorrendo assim uma simbiose com os cursos técnicos de nível
médio e os da FASTEC, hoje UNISAL, por meio do uso das aulas práticas de
oficina, máquinas convencionais e CNCs, entre outras. No CPDB, até o ano de
2009124
foram
ofertados
cursos
de
mecânica
industrial,
eletricidade,
marcenaria, costura industrial e desenho de máquinas (CASTRO, 2002).
A área em que a Escola Salesiana São José está localizada se
desenvolveu, tornando-se assim de classe média. Este quadro complicava a
frequência do público-alvo do Centro Profissional Dom Bosco que era
composto por 90% por pessoas de classe média baixa e 10% por pessoas em
condições de risco social, que procediam de bairros periféricos de Campinas e
da Região Metropolitana, especialmente Sumaré e Hortolândia, o que
demandava, em média, quatro conduções por pessoa (VIEIRA, 2002).
Neste sentido, Santos e Castilho (2003, p. 218) evidenciam que os
planos de ação de 1994 e 1995 apresentam uma série de problemas que
desafiavam a escola e ao CPDB:
[…] Queimas de etapas de desenvolvimento humano prejudicavam o
desempenho nos cursos desejados; heterogeneidade da procedência
escolar que redundava na dificuldade de rendimento satisfatório
dentro do processo de aprendizagem; ocorrência de acidentes nas
124
Os cursos ofertados no CPDB até o ano de 2009 estavam na condição de ensino
profissionalizante, categorizados como ação social pela Lei Orgânica da Assistência Social
(LOAS) LEI 8742/93 que dispõe sobre a organização da Assistência Social, alterada pela LEI
nº 12.101/2009 conhecida como “lei da filantropia” em que “transfere a responsabilidade da
concessão e renovação dos Certificados de Entidade Beneficente de Assistência Social para
os ministérios do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, da Saúde e da Educação”.
Disponível em: http://direitodoterceirosetor-lei121012009.blogspot.com.br/. Acesso em: 20-mar2013. (Citação de documento eletrônico avulso). Também em 2009, homologou-se a proposta
de instituição do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos de Nível Médio PARECER CNE/CEB
Nº: 11/2008. O CPDB torna-se assim parte integrante da Escola Salesiana São José na
condição de ação educacional, ofertando cursos técnicos e não mais profissionalizantes.
Disponível
em:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12683%3Atecnico-denivel-medio&catid=190%3Asetec&Itemid=861. Acesso em: 20-mar-2013. Este tema será
desenvolvido com mais profundidade a seguir.
92
oficinas durante a aprendizagem em virtude do baixo
desenvolvimento da atenção, percepção, agilidade e concentração
dos alunos; ausência de um seguro contra acidentes pessoais para
alunos e funcionários onerava a responsabilidade da Escola;
inexistência de um programa específico de orientação profissional
para
capacitar
melhor
as
pessoas;
impossibilidade
de
encaminhamento ao mercado de trabalho imediato após a conclusão
do curso devido à recessão industrial que atingia o País.
Por estes fatores, em 1994, no CPDB, começou um processo de
reestruturação, com o intuito de otimizar o trabalho realizado e dar novas
diretrizes no âmbito da profissionalização.
Conforme Miranda (2002, p. 143):
A nova coordenação pedagógica redirecionou as atividades técnicas,
pedagógicas e o processo de seleção dos candidatos usado até
então no CPDB. As atividades técnicas e pedagógicas foram
direcionadas, considerando a mudança nos padrões tecnológicos
incorporados pelo centro, através de laboratórios de simulação
(tecnologias CAD, CAM e CAE) e na aquisição de equipamento de
manufatura computadorizado.
Tal processo de reestruturação foi realizado com êxito e é evidenciado
por meio das entrevistas concedidas para fins de desenvolvimento acadêmico:
Era outro momento na educação, em 1994, quando assumi a
coordenação. Nós tínhamos algumas preocupações, principalmente
com o avanço tecnológico. A gente não poderia ficar só com
equipamento convencional. Aí, nós começamos a fazer um trabalho.
Conseguimos um convênio da Bélgica para ter o material. Demorou
um tempo. Quando chegou parte do material, em 1996, conversamos
com os professores e dizíamos que era preciso investir em máquinas
CNC. Escrevemos uma carta para a Bélgica, pois eles não queriam
mandar o dinheiro. Vieram até a escola para ver o que era tudo.
Nesse período, nós conseguimos um convênio com a empresa de
DPaschoal. A DPaschoal, na soma de tudo, fez uma doação de mais
de R$ 500.000,00 para o CPDB (MIRANDA, E 21/11/2012).
93
Ilustração 09 – Oficina de Mecânica do CPDB em 1988125
Extraído de: (SANTOS; CASTILHO, 2003, p. 190)
O projeto pedagógico do CPDB se desenvolve paralelo com o Projeto
Político Pedagógico Pastoral da Escola Salesiana São José, possibilitando uma
interação de ideias e propostas aplicáveis no ensino profissional (CASTRO,
2002). Tem seu vértice conceitual salesiano na aplicação de disciplinas que,
embora tenham sofrido alterações de nomenclatura por motivos de legislação,
desdobram elementos de fundamentação religiosa e valores salesianos que,
segundo Menão (2003, p. 59):
O Ensino Religioso, caracterizado como área de conhecimento, pode
contribuir
com
o
desenvolvimento
da
religiosidade
do
jovem/adolescente e com a sua formação humanística quando tem
como enfoque, no processo ensino-aprendizagem, o fenômeno
religioso entendido como sendo o processo de busca que o ser
humano realiza na procura da transcendência e sentido para a vida.
Essa disciplina não tem como proposta doutrinar o aluno para a
religião católica, mas de aprofundar em temas que abordam a
religiosidade humana e que contribuam para a formação de cidadãos
e cidadãs capazes de terem uma visão crítica e intervir na sociedade
em que vivem.
Desde seu início, na década de 1950, a escola já prezava pela
competência profissional, humana e salesiana de seu corpo docente. Em vista
125
A educação profissional básica, expresso na ilustração 09 de oficina mecânica do CPDB, em
1988, tem como referência a metodologia e a didática desenvolvidas pelo SENAI, que, até
então, ditara um modelo de educação profissional na esfera industrial no Brasil.
94
disto, a docência era, inicialmente, reservada aos religiosos salesianos, padres
e irmãos que lecionavam no internato e no ginásio industrial, quadro este que
perdurou até a década de 1970.
Quando a escola deixou de ser unicamente assistencial com o internato
e passou a prestar serviços educacionais pagos como de escola particular
confessional, aumentou a clientela. Consequentemente foi necessário requerer
os serviços de professores externos que, inicialmente, superaram o número de
religiosos, os quais hoje estão voltados para trabalhos de direção pedagógica e
administrativa da obra.
No pensamento de Bosco, todos os que atuam em suas obras são
educadores. Contando com um grande número de professores e funcionários,
torna-se cada vez mais necessário a realização de itinerários formativos sobre
os elementos basilares da Pedagogia Salesiana para todos esses profissionais.
Quanto ao processo de iniciação ao conhecimento e à proposta de educação
salesiana de candidatos às funções remuneradas, comenta a supervisora de
Recursos Humanos da Escola Salesiana São José:
Os novos já fizeram o curso em Campos do Jordão. Eu procuro,
quando faço as entrevistas, deixar uma noção bem rápida e clara do
que é a pedagogia salesiana, logicamente é importante você fazer o
curso de Pedagogia Salesiana. Não é somente pelo conteúdo a ser
dado, mas pela oportunidade de troca de experiências, pois são todos
novos. Estão entrando para uma realidade diferente, uma obra
126
salesiana. Então, as trocas de ideias entre si
e com quem está
ministrando o curso em um ambiente diferente é interessante. Então,
todas as vezes que há professores ou mesmo auxiliares novos, eles
vão para Campos do Jordão, talvez não no mesmo ano, porque há
um número reduzido de vagas, mas todos vão porque é importante
que eles tenham uma visão bem correta do que seja a pedagogia
salesiana (MELO, E 05/11/2012).
Tendo mencionado a preocupação da equipe de gestão da Escola
Salesiana São José com a formação de seus colaboradores, embora não de
forma sistemática, cabe comentar que o quadro administrativo e pedagógico
passou nos últimos anos, por mudanças na esfera contratual e salarial.
126
No Capítulo Geral 24 dos salesianos de Dom Bosco, realizado em 1996, trabalhou-se o
tema “Salesianos e Leigos: Comunhão e partilha no espírito e na missão de Dom Bosco”.
Requer-se-ia uma mudança de mentalidade para viver e trabalhar juntos, salesianos e leigos.
“O primeiro passo para nós, salesianos SDB e leigos, é conhecermo-nos, apreciando-nos quer
no que temos em comum quer nas nossas diferenças. O ponto de encontro é a partilha do
coração oratoriano e do estilo do Bom Pastor” (Documento Capitular, 1996, p. 95).
95
2.2.3.1 O CPDB na esfera da gestão
Trabalhou-se no item anterior o tempo e lugar do CPDB na história e
na tradição. Fruto da inserção como pesquisador junto ao CPDB, bem como
por meio de entrevista com pessoas relacionadas à administração da
instituição, abordam-se, agora, aspectos da gestão da Escola Salesiana São
José naquilo que ela se relaciona com o CPDB.
A Escola Salesiana São José de Campinas, ao longo dos anos, tem se
consolidado como uma unidade de ensino que possui não só qualidade, mas
também valores humanos e cristãos.
Nos últimos anos tem havido significativo crescimento de alunos
pagantes da Educação Infantil até o Ensino Médio, com a natural
necessidade do aumento de salas de aula, laboratórios e outros
espaços, assim como a contratação de um maior número de
funcionários para atender as necessidades administrativas e
pedagógicas desta instituição de Ensino (BELLETI, E 16/09/2013).
Com os sucessivos aumentos de salário e reajustes anuais da
convenção coletiva, percebeu-se, no início da década de 2000, por parte da
equipe de gestão da escola, o risco de uma folha de pagamento superior à
receita mensal.
Perdia-se receita e havia reajuste salarial que normalmente vinha
sendo superior. Percebíamos que a despesa da escola aumentava
em uma proporção maior que a receita. A folha de pagamento com
todos os encargos gerais chegava a ultrapassar a 100% da receita.
Só para pagar a folha, a escola gastava mais que recebia. Ela tinha
que pagar as demais despesas que havia. Uma escola deste porte,
tem manutenção mensal. Constante e muitas. Não são poucas as
situações que envolvem manutenção. Não havia caminho a não ser
mexer de forma bastante significativa na folha de pagamento
(BELLETI, E 16/09/2013).
A equipe de gestão da escola, juntamente com a mantenedora, Liceu
Coração de Jesus, elaboraram então estratégias e processos para dirimir os
riscos de déficit financeiro para os anos seguintes, já que encargos e folha de
pagamento haviam ultrapassado o 100% da receita. Por meio de entrevista,
relatou-se que, uma escola com o porte desta unidade de ensino, deveria
trabalhar com uma folha de 50% a 60% da receita. Hoje, a Escola trabalha com
70% da receita.
96
[...] a obra está passando por um processo de saneamento
econômico que comporta redução de pessoal e de salários. Estes
procedimentos são dolorosos tanto para os salesianos como para os
educadores, mas que, muitas vezes, são necessários para garantir a
continuidade da obra. (ATA DE REUNIÃO, 2003).
Em 2005, a equipe de gestão, tendo se reunido com os setores,
administrativo e pedagógico, expôs a delicada realidade financeira da obra.
Buscando amparo legal, realizou-se a proposta de rescisão de contrato e,
vencido o tempo mínimo permitido por lei, houvera a recontratação com uma
nova faixa salarial, compatível com a receita. Tratava-se naturalmente de uma
faixa salarial mais baixa. Houve aceitação e adesão da proposta por uma
considerável parcela de colaboradores127.
Segundo informações obtidas por meio de entrevista, a rescisão de
contrato ocorreu de forma processual e por setores. No CPDB não houve
necessidade deste processo rescisório, pois os salários já eram compatíveis
com a nova faixa salarial adotada128. Não obstante, a equipe de gestão129 da
Escola, em 2008, ofereceu ao setor CPDB indenização por meio de processo
rescisório, assegurando a todos o direito de retorno à instituição após o tempo
mínimo permitido em lei. Vale frisar que, no período de 2005 a 2008, quando
ocorreram as rescisões de contrato em todos os setores, os colaboradores e
docentes que aceitaram os termos de rescisão e recontratação com a nova
faixa salarial continuaram, por meio de amparo legal, em suas funções
administrativas e pedagógicas, já que eram contratados pelo UNISAL.
Concluído, entre 2005 e 2008, o processo de rescisão e recontratação
do administrativo e pedagógico, assumiu-se que, logo que a escola alcançasse
estabilidade financeira, voltar-se-ia a um aumento real130 de salário, além dos
reajustes anuais estabelecidos por convenção coletiva de sindicato. Este
127
Houve também recusas da proposta de nova faixa salarial que culminou em rescisão de
contrato.
128
Neste contexto de economia, remanejou-se a auxiliar do setor para a secretaria central da
Escola, fazendo que tanto a assistente social como o coordenador se desdobrassem para
cobrir as funções de secretaria do CPDB, havendo sobreposição de funções.
129
A equipe de gestão ofereceu os direitos de indenização ao setor CPDB, mesmo não sendo
necessário realizar demissões para readequação à nova faixa salarial. Havia entendido que era
um fator de justiça e igualdade com os outros setores.
130
Diferente da porcentagem estabelecida pela convenção coletiva de sindicato, a unidade
escolar tem a autonomia para determinar o aumento real de salário com base na receita.
97
aumento real vem acontecendo de forma gradativa por setores conforme
ordem de rescisão contratual realizada a partir de 2005. Tendo sido o CPDB o
último setor a passar pelo processo de rescisão, deverá ser o último setor a
passar pela análise de aumento real de salário de acordo com a receita ao
período de estudo131.
Os discursos oficiais ao longo dos anos sempre foram marcados pela
valorização do CPDB por ter sido ele a origem da Escola Salesiana São José.
Constata-se, porém dicotomia entre o discurso e a efetiva operacionalização de
ações que, por parte da instituição, de fato, não privilegiam o setor. Tanto é
que, embora este tenha explícita identidade salesiana, antes da padronização
da nova faixa salarial em 2005, o administrativo e pedagógico do CPDB,
recebiam um tratamento salarial de obra social mais baixos que os outros
setores.
A faixa salarial do CPDB era o menor dos setores. Era menor por
fatores históricos, sempre foi assim por ser um setor que não tem
132
receita . Na época não era técnico e sim profissionalizante. A
estrutura sempre foi mais enxuta no CPDB (BELLETI, E 16/09/2013).
Considerando que a maior parte da filantropia praticada pela Escola é
por meio das bolsas de estudo integrais para os alunos do CPDB, conclui-se
que o aumento e a diminuição de alunos no CPDB estão atrelados ao aumento
e diminuição dos alunos pagantes. Tal realidade permite questionar que real
valor dá ao CPDB a equipe de gestão. Há preocupação do setor econômico em
detrimento do pedagógico e pastoral. Nos últimos anos, sob o manto de temas
como parceria e trabalho conjunto, o CPDB tem perdido espaço de oficinas,
131
Recentemente, todos os coordenadores tiveram um aumento real de 10%, inclusive do
CPDB. Também a assistente social, por força de lei, teve um reajuste, representando um
aumento salarial. Já houve um início de processo. Lento, mas está ocorrendo.
132
Embora o conceito de receita esteja atrelado aos rendimentos e ganhos líquidos financeiros
pelo serviço educacional prestado, entende-se que o CPDB é um setor que gera receita
indireta pela imunidade patronal concedida pelos governos federal, estadual e municipal à
Escola Salesiana São José que preenche os requisitos de “[...] associação civil de natureza
confessional, beneficente, filantrópica, sem fins econômicos e lucrativos, de caráter
assistencial, educacional, religioso e cultural, constituída sob a inspiração dos ensinamentos e
do carisma de São João Bosco, conforme Decreto de Ereção Canônica n.º 662, de 28 de junho
de 1952 estando regularmente registrada e inscrita no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica
(CNPJ) do Ministério da Fazenda sob o nº 46.066.296/0001-44”. (ESTATUTO SOCIAL DA
ESCOLA SALESIANA SÃO JOSÉ, 2013). Não contar com o benefício de imunidade patronal
pelo cadastro de associação civil seria mais oneroso à Escola pelos numerosos impostos
governamentais. O CPDB, portanto, visto nesta óptica, gera receita à Escola.
98
salas de aula e laboratórios para a ETEC133 e UNISAL que, muitas vezes,
guiam-se por motivos não pastorais, ampliando sua máquina universitária como
é próprio de grandes instituições.
[...] há um grande empenho da comunidade educativa na condução
deste campus do Centro UNISAL. Nos últimos anos cresceu
significativamente o número de cursos e de alunos. Financeiramente
conseguiu progredir bastante. Além de apoiar financeiramente a
Escola, até como retribuição de todo apoio financeiro recebido no
início de sua caminhada [...] (ATA DE REUNIÃO, 2005).
[...] o CPDB constitui um serviço consolidado, competente e
significativo para os jovens menos favorecidos da cidade. Este
trabalho, seja no sentido pastoral quanto técnico, é apreciado e tem
134
recebido reconhecimento da sociedade. Esta CEP ressente e está
procurando se adaptar às mudanças exigidas pelo tempo e pelo
crescimento do Centro UNISAL. Passar de uma situação hegemônica
para dividir espaços, privilégios e conquistas tem sido um pouco
traumatizante para algumas lideranças da escola (ATA DE REUNIÃO,
2006).
Defendeu-se a opção que propôs o compartilhamento de espaços.
Foram pensados meios e estratégias que favorecessem o uso dos espaços às
duas instituições. O que existiu de fato foi uma espécie de ‘invasão territorial’
em que o UNISAL utiliza oficinas, maquinário e ferramentas do CPDB para fins
de ensino, agindo com hegemonia. Sendo o CPDB o setor que não gera receita
direta, há resistência em se oferecer melhores salários ao corpo docente 135,
que, com certa facilidade, migram para a ETEC. Até continuam no CPDB,
porém com menor carga horária. Entende-se que, o docente migra para a
ETEC reconhecendo o benefício de um salário mais alto do que o oferecido
pela Escola. O fato deste profissional permanecer no CPDB, embora com
menor carga horária, representa o apreço e adesão à proposta pedagógica
salesiana.
Não se pode ignorar que a articulação das dimensões jurídicas,
trabalhistas, pedagógicas e pastorais é indissociável. Situações de salários
menores geram áreas de desconforto tanto para o contratante como para o
133
Escola Técnica ligada ao UNISAL.
Comunidade Educativo Pastoral.
135
Anterior ao período de 2005 em que a Escola Salesiana São José necessitou apresentar
uma nova faixa salarial, havia diferenças salariais por setores em que os menores salários,
estes pagos ao administrativo e pedagógico do CPDB eram justificados por se tratar de um
setor que não gera receita direta. Percebe-se, porém, por meio de observação participante que,
tanto a equipe de gestão como os demais setores da Escola, creem, ideologicamente, que o
fato de trabalhar com jovens de baixo poder aquisito e vulnerabilidade social, seja um trabalho
por ‘vocação’, justificando assim um menor salário.
134
99
contratado, com desgaste para ambas as partes. Não obstante, para além dos
percalços apresentados ao CPDB, percebe-se que, por motivos afetivos, o
corpo docente que opta por permanecer no setor136 confirma sua fidelidade à
identidade salesiana e ao trabalho com jovens de baixo poder aquisitivo.
Neste sentido, coordenação e equipe de professores do CPDB, em
conformação com a grade curricular de ensino profissionalizante e os princípios
educacionais salesianos, procuram estar articuladas como comunidade
educativa numa ação unitária, promovendo uma educação profissional,
integrando a legislação do MEC, com os princípios da Pedagogia Salesiana.
2.2.3.2 O ensino profissional como educação não formal,
sociocomunitária e regular
Sendo o braço social da Escola Salesiana São José, o Centro
Profissional Dom Bosco esteve sujeito às leis do Estado, desde seu início com
a antiga Associação de Educação e Assistência Beneficente e, depois como
Escola Agrícola. A lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1961 foi um
marco na história da Educação no Brasil, trazendo avanços, principalmente
quantitativos. Universalizou-se o ensino fundamental e foram atraídos mais
alunos para as escolas, em todos os níveis e modalidades, ainda que a
qualidade do ensino não tenha sido preservada com a expansão quantitativa
de alunos, caracterizando um divórcio entre o ideal pedagógico e a instituição
escolar (BUFFA, 1979).
Novas leis surgiram nas décadas seguintes, como a LDB 5.692 de 1971
que estabelece o ensino profissionalizante obrigatório para todos os alunos do
2º grau (atual ensino médio), mas que fracassou na pretensão de capacitar
profissionais necessários para atender à demanda de trabalho (PACHECO,
2012). Em 1996, a LDB 9.394 permite que o curso profissional técnico de nível
médio possa ser realizado concomitantemente com o ensino médio.
136
Em pesquisa de campo, no próximo capítulo, será melhor aprofundado este assunto.
100
Com aprovação do Congresso Nacional, em 1996, a LDB, no que
corresponde à educação profissional, segundo Pacheco (idem, p. 19):
[…] se encontra estruturada em dois níveis – educação básica e
educação superior -, por não localizar a educação profissional em
nenhum deles, o texto explicita e assume uma concepção dual em
que a educação profissional é posta fora da estrutura da educação
regular brasileira, considerada algo que vem em paralelo ou como um
137
apêndice .
Niskier (1996, p. 92 – 93) traz, em forma de estudo comparativo, a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional no que diz respeito à educação
profissional:
Tabela 1 – Educação Profissional
ANTIGA LEGISLAÇÃO
A NOVA LEI Nº 9394/96
CAPÍTULO IV
CAPÍTULO III
Dos Serviços Nacionais de
Da Educação Profissional
Aprendizagem
Art. 159. (Dec.-Lei 4.936, art. 2º O Serviço
Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI)
deverá organizar e administrar escolas de
aprendizagem
não
somente
para
trabalhadores industriários, mas também para
trabalhadores
dos
transportes,
das
comunicações e da pesca.
Parágrafo único. Todas as escolas de
aprendizagem
ministrarão
ensino
de
continuação e de aperfeiçoamento e
especialização.
Art. 39. A educação profissional, integrada às
diferentes formas de educação, ao trabalho, à
ciência e à tecnologia, conduz ao permanente
desenvolvimento de aptidões para a vida
produtiva.
Parágrafo único. O aluno matriculado ou
egresso do ensino fundamental, médio e
superior, jovem ou adulto, contará com a
possibilidade de acesso à educação
profissional.
Art. 160. (Dec.-Lei 4.048/42, art. 3º e Dec.-Lei
4.936/42, art. 1º) O Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial será organizado e
dirigido pela Confederação Nacional da
Indústria.
Art. 161. (Dec.-Lei 8.621/46, art. 1º) Fica
atribuído à Confederação Nacional do
Comércio o encargo de organizar e
administrar, no território nacional, escolas de
137
Art. 40. A educação profissional será
desenvolvida em articulação com o ensino
regular ou por diferentes estratégias de
educação
continuada,
em
instituições
especializadas ou no ambiente de trabalho.
Art. 41. O conhecimento adquirido na
educação profissional, inclusive no trabalho,
poderá ser objeto de avaliação, ao
reconhecimento
e
certificação
para
A Lei 11.741/08, ao alterar a LDB, localiza a educação profissional técnica de nível médio no
Capítulo I – Da Educação Básica, explicitando que essa oferta educacional é integrante desse
nível de ensino (PACHECO, 2012).
101
aprendizagem comercial.
Parágrafo único. As escolas de aprendizagem
comercial manterão também cursos de
continuação ou práticos e de especialização
para os empregados adultos do comércio,
não sujeitos à aprendizagem.
Art. 162. (Dec.-Lei 8.621/46, art. 2º) A
Confederação Nacional do Comércio, para o
fim de que trata o artigo anterior, criará e
organizará
o
Serviço
Nacional
de
aprendizagem Comercial (SENAC).
prosseguimento ou conclusão de estudos.
Parágrafo único. Os diplomas de cursos de
educação profissional de nível médio, quando
registrados, terão validade nacional.
Art. 42. As pessoas técnicas e profissionais,
além dos seus cursos regulares, oferecerão
cursos especiais, abertos à comunidade,
condicionada a matrícula à capacidade de
aproveitamento e não necessariamente ao
nível de escolaridade.
Art. 163. (De.-Lei 8.621/46, art.3º) O SENAC
deverá também colaborar na obra de difusão
e aperfeiçoamento do ensino comercial de
formação e do ensino imediato que com ele
se relacionar diretamente, para o que
promoverá
os
acordos
necessários,
especialmente com estabelecimentos de
ensino comercial reconhecidos pelo Governo
Federal, exigindo sempre, em troca do auxílio
financeiro
que
der,
melhoria
do
aparelhamento escolar e determinado número
de matrícula gratuitas para comerciários, seus
filhos ou estudantes a que, provadamente,
faltarem os recursos necessários.
Parágrafo único. (Dec.-Lei 8.621/46, art. 3º)
Nas
localidades
onde
não
existir
estabelecimento
de
ensino
comercial
reconhecido, ou onde a capacidade dos
cursos de formação em funcionamento não
atender às necessidades do meio, o SENAC
providenciará a satisfação das exigências
regulamentares para que na sua escola de
aprendizagem funcionem os cursos de
formação e aperfeiçoamento necessários, ou
promoverá os meios indispensáveis a
incentivar a iniciativa particular a criá-los.
Para além das divergências entre especialistas sobre os aspectos de
melhorias e/ou retrocessos das leis sancionadas em vários períodos, é
relevante perceber o enquadramento do Centro Profissional Dom Bosco a
essas leis.
Castro (2002, p. 12) a respeito do Centro Profissional Dom Bosco afirma:
Todas as diretrizes pedagógicas são de responsabilidade do
coordenador pedagógico dos cursos, que faz um acompanhamento
dos programas que está sendo desenvolvido. Este acompanhamento
acontece através de reuniões pedagógicas mensais, observações
diárias, acompanhamento do planejamento de cada professor,
entrevistas individuais com os professores, com pessoal
administrativo, orientação educacional e serviço social.
102
Os programas de cada componente curricular são, periodicamente,
avaliados, a fim de se determinar qual deverá ser a estratégia de
ação para que os objetivos sejam alcançados com sucesso. Este
nível de ensino profissional não formal e gratuito oferece condições
favoráveis a uma avaliação de processo, com turmas relativamente
pequenas (21 a 30 alunos) e torna possível o acompanhamento
individual do trabalho realizado pelo aluno.
O Centro Profissional Dom Bosco elaborou seu quadro curricular dos
cursos profissionais, considerando a prática de oficina, desenho técnico,
tecnologia aplicada, cálculo técnico, associados a conteúdos salesianos como
o ensino religioso escolar e a educação física138. Esta estrutura é aplicada aos
alunos dos cursos de mecânica industrial, eletricidade, marcenaria e desenho
de máquinas, tendo como referência a metodologia e didática desenvolvidas
pelo SENAI.
Estes cursos foram oferecidos no formato de ensino profissionalizante
até o ano de 2009. De forma pormenorizada, o programa do curso de mecânica
industrial consistia em formar o aluno para desenvolver atividades nas áreas
industriais de usinagem convencional e assistida por computador. Foi um dos
cursos mais procurados, chegando a ter cinco candidatos disputando uma vaga
(MENÃO, 2003).
No curso de eletricidade, o aluno era formado para desenvolver
atividades nas áreas industriais de manutenção e instalações elétricas, como
também comandos elétricos e automação industrial (CASTRO, 2002). No curso
de marcenaria, o aluno era formado para desenvolver atividades nas áreas
industriais de fabricação e montagem de móveis. Já no curso de costura
industrial, o aluno era formado para desenvolver atividades nas áreas
industriais de confecção de vestimentas.
No curso de máquinas, o aluno desenvolvia atividades nas áreas
industriais de projeto e desenho de componentes de máquinas, assistido por
computador.
Posteriormente, ao ano de 2009, por motivos de legislação, na
passagem do formato profissionalizante para técnico, não se abriram mais
138
A educação física, no curso de corte e costura, com carga horária reduzida, não tinha
caráter obrigatório.
103
cursos de costura e marcenaria139, havendo então espaços de oficinas não
utilizáveis140. Por outro lado, com a crescente demanda de alunos do UNISAL,
a equipe de gestão da Escola Salesiana São José, em diálogo com a equipe de
gestão do UNISAL, acordaram de reformar as antigas oficinas para salas de
aula. Por meio de observação participante, constata-se, no CPDB, que tal
realidade de mudança logística de espaços, representa, aos olhos dos
docentes e membros funcionários do setor, não somente uma readequação
legislativa, mas também uma inclinação mercadológica das gestões, sobretudo
do UNISAL.
No âmbito pedagógico e pastoral, de acordo com os conteúdos
programáticos dos cursos e grade curricular como profissionalizante, os
docentes, até então com a nomenclatura de instrutores141, tinham uma carga
horária de disciplinas que favorecia um maior tempo de contato com os alunos
de cada curso. Com competência e profissionalismo, ministravam as aulas
práticas e teóricas referentes à sua área de curso. Neste sentido, do ponto de
vista pedagógico e pastoral, havia o benefício de exercer influência moral e
afetiva aos alunos.
Embora o CPDB esteja integrado a uma escola de ensino regular, sua
estrutura interna e operacionalização dos cursos profissionais e proposta
pedagógica se enquadrava até 2008142, na educação não formal.
Referendado por Trilla (apud Fernandes; Park, 2007, p. 132):
[…] A educação não formal é definida como aquela que não tem uma
legislação nacional que regula e que incide sobre ela; portanto seu
foco é na parte legislativa que, ao ser adotada de forma generalizada,
conforma as possibilidades do fazer educativo e pedagógico.
139
Seria necessário um alto investimento para a readequação de oficinas e maquinário, além
da baixa procura de alunos que havia no anterior formato de CPDB.
140
Parte do maquinário do curso de costura industrial foi doado para o Centro Profissional Dom
Bosco de Lorena e a outra parte para o Centro Profissional Dom Bosco de São Carlos,
juntamente com o maquinário do curso de marcenaria.
141
Os docentes do CPDB, no formato de profissionalizante, eram registrados como instrutores.
No formato de ensino técnico, por força de lei, foram, em 2008, registrados como professores.
Ambas categorias na Escola tinham a mesma faixa salarial.
142
Ano que o CPDB teve seus programas curriculares legislados pelo MEC. Anterior a essa
data, a coordenação pedagógica realizava os programas curriculares com certa aproximação
da estrutura do SENAI.
104
Na modalidade de educação não formal, compreendemos que, segundo
Gohn (2008, p. 128):
[...] esta ocorre em ambientes e situações interativas construídas
coletivamente, segundo diretrizes de dados grupos – usualmente a
participação dos indivíduos é optativa, mas ela também poderá
ocorrer por forças de certas circunstâncias da vivência histórica de
cada um.
Se ampliarmos a discussão sobre a educação não formal, perceberemos
que esta modalidade, em sua ampla compreensão, tem proporcionado certa
integração entre casa/família e escola/educador/educando. Considerem-se,
para isso, projetos extracurriculares no período de férias ou mesmo projetos
sociais que integrem a família, educadores e educandos, favorecendo uma
maior interação social e cultural de entendimento comunitário143 (SOUZA,
2011).
Observamos que: “O espaço educativo ocupado pela práxis comunitária
não é o da educação formal, mas preponderantemente o da denominada não
formal [...]” (MARTINS, 2007, p. 23). Modalidade não formal que, segundo nos
orienta Lima; Dias (2008, p. 05), “[...] propicia a reflexão sobre as
desigualdades sociais e possíveis encaminhamentos para sua superação [...]”.
A descrição da modalidade não formal, compreendida também como
formação complementar e cultura geral, tem potencial para aplicação no campo
laboral. Desta forma, salientamos que a parte educativa profissional, com suas
devidas competências e habilidades, está em total correlação com valores e
princípios humanos e salesianos, podendo assim, no CPDB, ser articulada a
formação profissional com as práticas pedagógicas salesianas que são
permeadas pelas dimensões social e comunitária, visando não somente a
preparação dos jovens para o mundo do trabalho, mas também sua formação
integral (VILLANUEVA, 2012).
Conforme Fernandes (2007, p. 125):
Uma educação integral visa desenvolver todas as facetas humanas,
facilitando e descobrindo habilidades. Uma educação em tempo
integral visa promover novas e ousadas formas de se ensinar,
aprender e construir o conhecimento, em diferentes espaços e
143
Para maior aprofundamento da perspectiva comunitária de âmbito social e cultural (Cf.
BAUMAN, 2001; GROPPO, 2011).
105
termporalidades, valendo-se da contribuição de variados sujeitos com
seus repertórios geracionais, sociais, históricos e culturais, ou seja,
do intercâmbio entre contextos sociais e culturais e da mistura da
idade, gênero, etnia etc.
Neste sentido, o CPDB, setor genuíno do trabalho salesiano, faz jus ao
termo sociocomunitário, tendo uma perspectiva comunitária de cunho social
que tem suas raízes pautadas em Bosco, na sua história e formas de
intervenção educativa. Neste sentido, reportamo-nos a Gomes (2008, p. 52 –
53):
[...] a proposta da investigação em educação sociocomunitária surgiu
do estudo da identidade histórica de uma prática educativa, a
educação salesiana. Em suas origens históricas, ela se fundava na
144
articulação de uma comunidade civil
de religiosos e cidadãos
comuns – em torno de um projeto educacional, que participou e
promoveu transformações sociais em seu tempo e lugar histórico.
A educação sociocomunitária salesiana é o pano de fundo do programa
educativo do CPDB que procura favorecer e garantir a centralidade da pessoa
em relação à economia, haja vista que é um setor de preparação para a
inserção ao mundo do trabalho145. Procura também salvaguardar a dimensão
da gratuidade contra o poder incontestável do lucro, e “[…] a promoção de
modelos mais justos de desenvolvimento, impedindo o alargamento da
disparidade das desigualdades presentes no sistema” (VILLANUEVA, 2012, p.
10). Que outra educação se pode fazer para o trabalho que não deva ser uma
educação para a esperança e para o sonho? “Que outra forma existe de o ser
humano se realizar que não através do trabalho, na amplitude das suas
formulações possíveis?” (AZEVEDO, 2012, p. 86).
Com uma estrutura de curso de dois anos, o CPDB pretende apresentar
uma prática pedagógica que busque harmonizar e integrar valores humanos e
salesianos com a dimensão do trabalho e da profissionalização. Um elemento
da prática pedagógica salesiana é o denominado ‘bom dia’ ou ‘boa tarde’. É
uma mensagem de cunho humanístico e motivacional dirigida aos alunos no
144
Para maior aprofundamento do termo comunidade e sociedade civil, consultar (Cf.
MARTINS; GROPPO, 2010; VOLTOLINI, 2004).
145
GRACIANI (1995) discute os princípios geradores da educação pelo trabalho que implicam
a familiarização com os valores, hábitos e atitudes relacionados com o trabalho. Há também
um valor atrativo para os jovens participantes desses projetos coletivos, além de um irrecusável
valor formativo do caráter.
106
início de cada período de aula com duração média de cinco minutos. Esta
mensagem é emitida pelos docentes146, por meio de escala organizada pela
coordenação pedagógica.
Eu observei nesses dois anos, dando aulas no CPDB, uma coisa
muito linda. Eu nunca tinha participado antes porque sempre trabalhei
no Unisal e no Unisal não há a dinâmica de bom dia, boa tarde e boa
noite. Aliás, acho que bons dias, boas tardes e boas noites são
imprescindíveis e obrigatórios em todos os lugares. Já fiz e faço bom
dia e boa tarde no CPDB quando sou convidada. Antes na escola
tinha o dia certo. Então, há oportunidade para todos. Acho isso
fantástico. (D1, E 10/10/2012).
[Pergunto o que poderia ser potencializado e fortalecido em âmbito de
salesianidade no CPDB. E ele:] olha, a vivência dentro da escola, já
faz toda uma diferença. O que a gente não pode perder é o princípio,
deixar as coisas caírem no esquecimento, embora sempre
trabalhemos com as palestras que envolvam a questão da
salesianidade, com os vídeos, com os bons dias e boas tardes. São
muito importantes, pois, sempre se passam uma mensagem. Não
necessariamente você precisa colocar o nome de Dom Bosco no
meio das coisas. O sistema preventivo é independente de Dom
Bosco. Acho que quando você trabalha com o jovem, mostra para ele
o caminho certo, como as coisas devem ser. Quando ele está ali,
prestando atenção no que você faz, já estamos aplicando o que Dom
Bosco fez. Você não precisa levar o nome dele, embora sempre o
façamos de alguma forma (D2, E 19/10/2012).
A estratégia e dinâmica de ‘bom dia’ e ‘boa tarde’ foram mantidas na
ocasião da adaptação da estrutura do CPDB às leis Nº 12.101/2009 da
transferência da responsabilidade da concessão e renovação dos certificados
de Entidade Beneficente de Assistência Social para os Ministérios do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, da Saúde e da Educação.
Adequação de estrutura também feita ao Parecer CNE/CEB Nº 11/2008 da
homologação da Proposta de Instituição do Catálogo Nacional de Cursos
Técnicos de Nível Médio.
Pacheco (2012, p. 29) referenda:
Ao alterar a LDB, a Lei 11.741/08 localiza a educação profissional
técnica de nível médio como seção IV – A do Capítulo II Da Educação
Básica. Essa disposição no texto legal procura ressaltar a concepção
de que esses cursos são da Educação Básica e encontram-se,
portanto, no âmbito das políticas educacionais.
146
Os depoentes membros do corpo docente terão suas identidades preservadas por opção do
autor. A identificação será feita pela letra D, abreviação de docente, seguido de numeração dos
depoentes.
107
Surgem então diferenças em comparação ao ensino profissionalizante,
enquadrado no modelo de educação não formal, quanto ao formato e condução
da gestão e exigências normativas em lei. Todavia Castro (E 06/12/2012,
destaque nosso) ressalta que, no CPDB, o procedimento educativo
extracurricular, denominado ‘bom dia e boa tarde’, não sofreram corrosão:
Há essa preocupação de realizarmos o bom dia e o boa tarde e não
se perder a característica de passar sempre os princípios salesianos
de Dom Bosco. Trazer os jovens aqui para que sintam que é uma
escola de preventividade. Penso que o bom dia e a boa tarde não os
perdemos. É uma característica bem forte no CPDB e não deixamos
de realizá-lo.
Embora esta estratégia didática, ‘bom dia e boa tarde’, aconteça,
efetivamente, no CPDB, o pesquisador tem constatado, por meio de
observação participante que, tanto no ano de 2012 como no primeiro semestre
de 2013, certa fragilidade e desconformidade entre o ideal e princípio salesiano
e a prática do bom dia e boa tarde. Consiste em que o docente, entendido
como educador, deve, por meio de escala elaborada pela coordenação
pedagógica, transmitir a mensagem humanista cristã de cunho motivacional ao
aluno. Porém, em geral, os professores não participam desta atividade, não se
fazendo
presentes
neste
momento147,
salvo
quando
solicitados.
A
operacionalização do ‘bom dia e boa tarde’, por parte do quadro docente, não
tem funcionado.
Em suma, o CPDB, ao longo de sua história de trabalho social e
educacional, fortaleceu a malha industrial da cidade de Campinas e região,
preparando para atender as demandas industriais e tecnológicas.
O CPDB, como obra salesiana, preocupa-se com a formação humana,
profissional e religiosa de seus destinatários. Elementos fundamentais para que
os objetivos institucionais salesianos sejam alcançados, que seu corpo docente
e funcionários estejam afinados e comprometidos com a formação salesiana
dos jovens. O CPDB é herdeiro da tradição educacional e pedagógica que
legou o educador Bosco, especialmente, voltada para a formação dos jovens
de baixo poder aquisitivo.
147
Constata-se, por meio de observação participante, que, tanto no período da manhã como da
tarde, os docentes procuram ‘ganhar’ tempo em sala de aula escrevendo a matéria na lousa.
Tal realidade é entendida pelo curto período de aula restante após os ‘bons dias e boas tardes’
que, em alguns dias, ultrapassam o limite do tempo.
108
A estrutura salesiana, em obras, recursos humanos e financeiros pauta-se na convicção e fidelidade criativa, por parte de seus seguidores, aos
princípios educacionais salesianos, originários de Bosco. Seu entendimento,
aplicação e vivência são requisitos basilares a todos os educadores salesianos
para a eficácia da educação salesiana, como já visto ao longo da história
salesiana, manifesto nestes breves e concisos recortes temáticos sobre o
trajeto histórico salesiano até o Centro Profissional Dom Bosco, sendo este,
pano de fundo da pesquisa de campo e investigação do seguinte capítulo.
109
CAPÍTULO 3
3.1
Uma abordagem localizada (a problematização)
Tendo percorrido o trajeto da história dos referenciais salesianos, sua
sistematização como procedimento educativo e sua aplicação temporal e
espacial, na Itália e no mundo, desde o início com Bosco até hoje, a
abordagem neste tópico se centrará sobre o processo de entendimento dos
princípios referenciais salesianos no corpo docente do Centro Profissional Dom
Bosco (CPDB).
Consta, no Estatuto Social da Escola Salesiana São José – Campinas,
ano de 2012, que “A dissolução ou extinção desta Associação se dará quando
não mais puder levar a efeito as suas finalidades institucionais” (ARTIGO 81).
Desde a fundação da antiga Associação Beneficente de Educação e
Assistência Social, no início do século XX, e depois da Escola Agrícola, os
estatutos sempre asseguraram a finalidade social, sem a qual, os salesianos
perderiam o direito outorgado pelo Estado de se manterem em funcionamento.
Neste sentido, o atual CPDB, configurado como ensino técnico profissional,
mantido pela Escola Salesiana São José (ESSJ), assegura à mesma o caráter
filantrópico e assistencial de natureza confessional.
Nos últimos anos e, especialmente, a partir de 2009, o CPDB passou a
apresentar, por motivos de legislação, uma estrutura diferenciada em formato,
currículo e público atendido. Tornou-se ensino técnico regular e não mais
profissionalizante de ensino não formal148, tendo o currículo fixado pelo MEC
com suas respectivas portarias149 e pareceres educacionais, em detrimento
dum currículo pautado em orientações internas da Escola Salesiana São José.
Por meio de entrevistas realizadas com os depoentes do CPDB,
entende-se que, na condição de curso técnico, a demanda de candidatos
aumentou, tornando-se necessário o aumento do nível de elaboração do
148
Cf. Trilla, 1985 que identifica o ensino não formal como não legislado pelo Estado.
Cursos técnicos de eletroeletrônica, fabricação mecânica e informática, autorizados pela
Portaria DREC de 28/12/2010, publicada no D.O.E. de 29/12/2010.
149
110
exame teórico para os candidatos aos cursos técnicos. Os critérios de seleção
continuaram os mesmos, embora passaram a ser mais exigentes na seguinte
ordem: 1) número de vagas fechadas com seleção por meio de exame teórico;
2) constatação de carência socioeconômica, por meio de entrevista com a
orientação educacional e coordenação pedagógica; 3) os jovens deviam ter
entre os quatorze e dezessete anos; 4) frequência à escola regular estadual e
municipal (PPPP150, 2009).
Evidencia-se que os jovens com menor rendimento escolar não mais
conseguiriam atingir a pontuação necessária para pleitear o segundo passo de
acesso a vagas no curso, que é a entrevista. Considerando o aspecto da
escolaridade, o CPDB, em seu novo formato de ensino regular, tornou-se mais
seletivo e, consequentemente, mais elitizado151, não sem críticas e resistências
de pessoas próximas à realidade do CPDB, como ex-alunos, professores e a
própria coordenação:
Só lamento que tivemos que passar para o ensino técnico. É simples,
nós atendíamos alunos de sétima série. A gente profissionalizava
curso de duração de três anos. Com o técnico, você tem que pegar
alunos do 2º ano do ensino médio para frente. Então, a maioria dos
nossos alunos não chegam (sic) aqui. Nós deixamos de atender, não
por nossa vontade. A briga foi grande nesse sentido. Eu queria que
permanecesse a profissionalização vinculada com a educação para
aqueles que precisam mais, para aqueles com atraso de escola, pois
aí, na hora que você mostra a profissionalização, ele vê a
necessidade de aprender outras coisas que não via como importante.
Se você pega no ensino médio, você já tem que fazer uma seleção.
Sim, o governo quer assim, e não podemos fazer muita coisa […] (E,
MIRANDA, 21/11/2012).
No novo formato de CPDB, a fim de cumprir seus objetivos legais de
ensino profissional, com cursos técnicos de informática, eletroeletrônica e
fabricação
mecânica,
são
pertencentes,
respectivamente
aos
eixos
tecnológicos de informática e comunicação e os dois últimos ao eixo de
controle e processos industriais.
150
Projeto
Político,
Pedagógico
e
Pastoral,
ano
de
2013.
Disponível
em:
http://www.essj.com.br/site/arquivos_pdf/pppp2013.pdf
151
Embora o CPDB tenha hoje um público de alunos com perfil socioeconômico aproximado
dos alunos do anterior formato de CPDB, percebe-se um distanciamento institucional das
escolhas feitas por Bosco quanto à escolha de público e trabalho com jovens.
111
Conforme o plano do curso técnico em informática, o principal objetivo é
atender ao perfil de um profissional que combine o conhecimento técnico e
visão mercadológica, com os pressupostos humanísticos e culturais, formando
profissionais capazes de exercer atividades técnicas com habilidades e atitudes
que lhes permitam participar de forma responsável, ativa, crítica e criativa na
solução de problemas na área de informática, sendo capaz ainda de continuar
aprendendo e adaptando-se com a flexibilidade às diferentes condições do
mercado de trabalho.
O curso de eletroeletrônica tem como objetivo possibilitar ao aluno o
acesso a conhecimentos, desenvolvimento de competências, oportunidades
práticas e de pesquisas que, dentro do conceito de ‘aprender a aprender’,
proporcionem-lhe subsídios para identificar e enfrentar os desafios impostos
pelas rápidas transformações que ocorrem no setor elétrico, por meio de uma
visão ampla dos processos industriais, gerando e aplicando de forma
sustentável os recursos disponíveis, observando e atendendo às normas e
procedimentos de qualidade, saúde, segurança e meio ambiente vigentes.
O curso de fabricação mecânica está alinhado ao mesmo eixo
tecnológico que a eletroeletrônica, apresentando, portanto, semelhanças nos
objetivos. Acrescenta-se como elemento próprio do curso, a ampla visão do
processo industrial que envolva a fabricação mecânica, utilizando-se de
maneira sistêmica os conhecimentos adquiridos, por meio dos componentes
curriculares desenvolvidos durante o curso, no sentido de atuar na melhoria e
desenvolvimento de técnicas e procedimentos voltados aos sistemas de
produção.
Percebe-se, no entanto, que os três planos do curso técnico assumiram
uma abordagem tecnicista, em resposta às exigências do mercado da região
metropolitana de Campinas (RMC).
Na justificativa e nos objetivos dos planos de curso, observa-se um
alinhamento teórico voltado para a busca da competência profissional
produtiva, como evidenciado nos planos de curso do ano de 2013.
Nossa região está servida por muitas indústrias de grande, médio e
pequeno porte que respondem por grande volume de produção
112
industrial direcionada ao mercado nacional e internacional, com alto
grau de produtividade e competitividade, não sendo diferentes nos
setores de comércio e serviços. Campinas possui, segundo o Instituto
brasileiro de geografia e estatística (IBGE), os seguintes índices:
Índice de desenvolvimento humano (IDH – M): 0,852, índice de
educação (IDHM – E): 0,925, índice de renda (IDHM – R): 0,845,
assim havendo grande potencial de demanda nos variados ramos de
atividades, por profissionais do mercado.
Preparar-se teórica e tecnicamente para os desafios do mercado de
trabalho não é um objetivo equivocado, salvo quando o conceito de produção e
consumo é massificado e absolutizado em detrimento do ser humano que
trabalha e produz (VILLANUEVA, 2012).
Jesus (2005, p. 76 – 77) alerta, a partir do alinhamento teórico
educacional gramisciano, do perigo da ausência de dialética nos estudos e sua
consequente ideologização no currículo acadêmico:
Gramsci não negava o momento “ativo” da escola, mas queria que
ele fosse superado pelo momento “criativo”. Escola criadora, em seu
pensamento, “é o coroamento da escola ativa”. A escola ativa,
embora o nome implique ação, movimento, poderia existir sem que
fosse comprometida a formação do aluno. Gramsci queria se
precaver contra as teorias das escolas “novas” (do movimento
“escolanovista”) que viam, em primeiro plano, a atividade da criança.
Seu objetivo era superar o estágio de atividade da escola pelo da
criatividade, pois sabia que em uma escola sem criatividade o aluno
poderia ser uma marionete muito ativo.
Nosella (1992) menciona a dualidade do trabalho intelectual da escola e
do trabalho material da indústria que, necessariamente, complementam-se,
harmonizados como princípio pedagógico até o momento em que um se
sobreponha ao outro, seja como ideologia ou como produção.
Gramsci, nas palavras de Mochovitch (1990, p. 18,) traz a luz o risco de
que a dimensão intelectual, em seu aspecto crítico e dialógico, seja dominado
pela ideologia produtivista, desenvolvendo assim o conceito de intelectual
orgânico:
São aqueles que se imiscuem na vida prática das massas e
trabalham sobre o bom senso, procurando elevar a consciência
dispersa e fragmentária das massas ao nível de uma concepção de
mundo coerente e homogênea – os intelectuais orgânicos são
dirigentes e organizadores.
Desta forma, os autores acima alertam para os riscos do alinhamento
unilateral, especialmente, para os modelos econômicos de enveredamento
113
para produção mercantil que, de certa forma, evidencia-se nos planos de curso
do CPDB, neste novo formato de ensino profissional.
Em contrapartida aos planos de curso que apresentam um alinhamento
mercadológico, o Projeto Político Pedagógico e Pastoral (PPPP) apresenta de
forma abrangente, a integração dos elementos: aprendizado técnico, humano e
salesiano, expresso em objetivos, finalidades, currículo e, inclusive, na
demonstração de recursos materiais e caracterização da Escola e setor CPDB,
disponíveis para a consecução das propostas de ensino. “Neste contexto,
contemplam-se as matrizes do currículo institucional, contribuindo para um
novo tempo onde o nosso educando possa praticar e lutar pelos direitos
universais do ser humano” (PPPP, 2013, p. 52).
Entende-se que a prática pedagógica do CPDB é desenvolvida em
conjunto com o Projeto Político Pedagógico e Pastoral da Escola Salesiana
São José, entretanto não havendo uma demarcação clara dos limites de
atuação pedagógica e pastoral do PPPP no CPDB. Pode vir a acontecer que a
dicotomia entre planos de curso com destaque ao trabalho pragmático e PPPP
da Escola Salesiana São José que enfoca, efusivamente, o humanismo cristão
e a formação integral da pessoa, tenha o pêndulo voltado para uma das partes,
de acordo com a tomada de decisão da equipe de gestão da Escola Salesiana
São José, em detrimento ao equilíbrio das propostas técnica e humanista
salesiana. Não obstante, percebe-se, na equipe de gestão, a preocupação em
alinhar e homogeneizar os critérios de trabalho salesiano, por meio da
pedagogia salesiana legada por Bosco.
Tendo apresentado a estrutura do CPDB como elemento teórico,
embasado no Projeto Político Pedagógico e Pastoral da Escola São José e
planos de cursos do CPDB, cabe refletir sobre como os princípios referenciais
salesianos são assimilados, vividos e integrados pelos educadores docentes na
prática de ensino. Surge então a necessidade de uma melhor visualização da
incidência dos princípios referenciais salesianos, entendidos, concisamente,
pelo chamado sistema preventivo que se pauta pela Razão, Religião e
bondade, na prática dos educadores docentes no CPDB, além de se buscar
114
saber se o conhecimento técnico é ensinado na perspectiva dos valores
salesianos.
Para tais questionamentos e problematizações, a pesquisa de campo
apresenta-se como instrumental metodológico imprescindível no entendimento
e visualização da realidade do CPDB, em âmbito de pedagogia salesiana.
3.2
A pesquisa de campo
Tendo
definido
quais
ferramentas,
técnicas
e
métodos seriam
necessários para se entender a intensidade, alcance e incidência dos princípios
educacionais salesianos na prática do educador docente no CPDB,
apresentou-se ao pesquisador uma primeira dificuldade: a demarcação do
objeto e sujeito de pesquisa. Estar muito próximo dos sujeitos pesquisados, no
caso, pelo acesso obtido no cotidiano, possibilitou ao pesquisador questionar o
limite da parcialidade e imparcialidade nas observações. Recorrendo a Ludke e
André (1986, p. 14) entende-se que “O pesquisador deve exercer o papel
subjetivo de participante e o papel objetivo de observador, colocando-se numa
posição ímpar para compreender e explicar o comportamento humano”.
A posição do pesquisador, bem como os conceitos por ele trabalhados,
são importantes para a delimitação, abordagem e desenvolvimento do trabalho.
Se, por acaso, o pesquisador se enveredar pela corrente positivista que
referenda a procedência de conhecimentos já estabelecidos (MARTINS;
GROPPO, 2006), dificilmente, haverá espaço para a singularidade e a riqueza
do excêntrico, sobretudo relacionado à pessoa humana. Não se tenta neste
trabalho reduzir tal corrente científica, referendada por avanços e feitos
científicos pautados na exatidão e precisão quantitativa, mas apenas trazê-la
como forma de conceber a realidade.
A pesquisa também pode ter um alinhamento fenomenológico na
interpretação de fatos e configuração de mundo (GARNICA, 1997). A visão de
115
um ponto não passa de um anglo de visão que se soma a uma miríade de
anglos e perspectivas do mesmo fenômeno.
Frente à riqueza de correntes e métodos existentes, este trabalho
dissertativo de cunho qualitativo e historicista, evidenciado nos capítulos
primeiro e segundo, referenda, neste terceiro capítulo, o uso de técnicas de
investigação para coleta e análise de dados particulares, caracterizando-se
como um estudo de caso. Neste sentido, a pesquisa está calcada em conceitos
defendidos pela etnografia152 que, nas palavras de Fonseca (1999, p. 58),
entende-se que:
A Etnografia é calcada numa ciência, por excelência, do concreto. O
ponto de partida desse método é a interação entre o pesquisador e
seus objetos de estudo, “nativos em carne e osso”. É, de certa forma,
o protótipo do “qualitativo”. E melhor ainda – com sua ênfase no
cotidiano e no subjetivo, parece uma técnica ao alcance de
praticamente todo mundo, uma técnica investigativa, enfim, inteligível
para combater os males da quantificação.
O trabalho de pesquisa do tipo etnográfico na área de Educação visa
compreender na cotidianidade os projetos do dia a dia (SEVERINO, 2007). A
oportunidade de estar com o outro, no caso específico desta investigação, o
corpo docente do CPDB, em diálogo e convivência, favorece o entendimento e
interpretação do como a Pedagogia Salesiana é interpretada e sua decorrente
aplicação docente.
De forma específica a respeito da abordagem etnográfica na pesquisa
educacional, conceitua Ludke e André (1986, p.13):
Até muito recentemente as técnicas etnográficas eram utilizadas
quase que exclusivamente pelos antropólogos e sociólogos. No início
da década de 70, entretanto, os pesquisadores da área de educação
começaram também a fazer uso dessas técnicas, o que deu origem a
uma nova linha de pesquisas, que tem recebido o nome de
‘antropológica ‘ou ‘etnográfica’.
Entendido que o pesquisador pertence à comunidade educativa e
religiosa da Escola Salesiana São José, presente como membro responsável
do setor CPDB, com convivência e contato direto com o fenômeno pesquisado:
os educadores docentes, torna-se desafiador, portanto, ao pesquisador,
152
Na virada do século XIX para o XX, localiza-se o projeto de uma Antropologia do indivíduo e
da singularidade cultural, projeto que se opõe à anterior tendência de buscar a universalidade
do homem nos estudos comparativos das diferentes culturas. É, ainda, nesta virada de séculos
que a Antropologia moderna se institui como ciência (SCHIMITDT, 2005).
116
encontrar o estranhamento necessário para buscar o novo naquilo que lhe já é
familiar.
Também foi feito o uso da abordagem quantitativa como ferramental
complementar às hipóteses levantadas no trabalho. Entendendo que ambas as
abordagens, qualitativa e quantitativa, têm suas referências epistemológicas e
metodológicas,
cabe,
brevemente,
distingui-las
para
complementá-las.
Segundo Gunther (2006, p. 03):
O contraponto feito entre a pesquisa qualitativa e a pesquisa
quantitativa é o de estudar um determinado fenômeno no seu
contexto natural versus estudá-lo no laboratório. A primeira estratégia
– da pesquisa qualitativa – implica em relativa falta de controle de
variáveis estranhas ou, ainda, a constatação de que não existem
variáveis interferentes e irrelevantes. Todas as variáveis do contexto
são consideradas como importantes. Na segunda estratégia – da
pesquisa quantitativa – tenta-se obter um controle máximo sobre o
contexto, inclusive produzindo ambientes artificiais com o objetivo de
reduzir ou eliminar a interferência de variáveis interferentes e
irrelevantes. Entre as variáveis irrelevantes e potencialmente
interferentes, seus valores, quanto variáveis contextuais ou atributos
do objeto de estudo que não interessam naquele momento da
pesquisa.
A complementação das abordagens “quali – quanti” dentro de suas
especificidades se dará pela comparação das informações obtidas pelas
técnicas de ambas as abordagens, por meio de aplicação de questionário
quantitativo e qualitativo aos alunos, realização de entrevistas semiestruturadas
com os educadores docentes do CPDB e observação participante, entendida
como contato direto do pesquisador com o fenômeno observado. “Trata-se de
compreender criticamente o mundo manifesto ou oculto das comunicações”
(SEVERINO, 2007, p. 121). Por meio de uma criteriosa análise de conteúdo
das entrevistas semiestruturadas, observação participante, diário de campo e a
parte qualitativa do questionário, foi possível coadunar com as informações
levantadas no questionário de abordagem quantitativa na tentativa de
responder os questionamentos manifestos: Como os educadores docentes
interpretam e põem em prática os princípios referenciais salesianos no CPDB?
Sabe-se que a pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como sua
fonte direta de dados e o pesquisador como o principal instrumento. Conforme
Martins (2004, p. 292) outra característica importante da abordagem qualitativa
consiste:
117
[…] na heterodoxia no momento da análise dos dados. A variedade
de material obtido qualitativamente exige do pesquisador uma
capacidade integrativa e analítica que, por sua vez, depende do
desenvolvimento de uma capacidade criadora e intuitiva.
Para tanto, percebe-se a necessidade de uma longa e intensa imersão
na realidade para entender as regras, os costumes e as convenções que
governam a vida do grupo estudado (Ludke; André, 1986). Compreendidos os
mecanismos que conformam a pesquisa de campo, iniciou-se a aplicação das
técnicas de trabalho metodológico: observação participante desenvolvida como
tópico, embora o material coletado seja utilizado como elemento fundamental
no decorrer da dissertação, questionário “quali – quanti” e entrevistas
semiestruturadas e a posterior análise de dados.
3.2.1
A observação participante
Pelo acesso ao setor Centro Profissional Dom Bosco (CPDB), na
condição de membro efetivo da Associação Civil, de natureza confessional,
beneficente e filantrópica (Escola Salesiana São José), foi possível realizar a
observação participante com consistência, em termos de atividades e tempo,
investido nesta técnica de pesquisa.
Conforme Groppo e Martins (2006, p. 28):
Na observação participante há um contato direto do pesquisador com
o fenômeno observado, recolhendo as ações dos atores no seu
contexto natural, com base nos pontos de vista dos atores. Ou seja,
em vez de se portar como elemento externo à situação, o
pesquisador encontra uma posição dentro do grupo pesquisado e o
observa desde dentro, em situações cotidianas.
Da mesma forma, Schimidt (2005, p. 14) afirma que:
O termo participante sugere a controversa inserção de um
pesquisador num campo de investigação formado pela vida social e
cultural de outro, próximo ou distante, que, por sua vez, é convocado
a participar da investigação na qualidade de informante, colaborador
ou interlocutor.
Trata-se de uma técnica sujeita a constantes críticas pela validade e
rigor em sua utilização para posterior verificação
(PAULILO, 1999).
118
Reconhecida a argumentação quanto a real validação da técnica ‘observação
participante’, entende-se que as hipóteses e conclusões do pesquisador são
decorrentes da interferência no fenômeno pesquisado, caracterizando seu
caráter parcial de abordagens e perspectivas. São integradas pelo pesquisador
que pertence à equipe de gestão da realidade pesquisada, que foi aluno do
CPDB, em outra unidade escolar, e está imerso no setor como observador. Ter
vivido a realidade de aluno e estar diretamente ligado à área da gestão e setor
de pesquisa, no caso, o CPDB, amplia o quadro de possibilidades de hipóteses
e conclusões. Além de responder a problemática do trabalho do ponto de vista
metodológico, há que considerar a história pessoal do pesquisador no
envolvimento com o fenômeno de pesquisa e a atual conjuntura de diálogo
entre a área da gestão e o CPDB, no que competem a condições de trabalho,
currículos
formativo
e
contrato
salarial,
não
permitindo,
portanto,
posicionamentos unilaterais e imparciais.
O pesquisador usufrui de privilegiada condição para a pesquisa teórica e
de campo, pois outros pesquisadores não teriam acesso a estas condições.
Ser religioso salesiano possibilitou ao pesquisador acesso irrestrito aos
documentos como atas e crônicas da instituição salesiana e setor CPDB, bem
como contato direto e constante com o fenômeno pesquisado, sendo os
educadores
docentes
do
CPDB
como
amostra
e
demais
sujeitos
investigados153. Neste sentido, o objeto da pesquisa passa a ser também um
importante sujeito da pesquisa (GROPPO; MARTINS, 2006).
A observação participante exige condições pontuais para a inserção no
grupo pesquisado, como atividades e tempo para observação, elaboração e
combinação de ideias em forma de registro, a partir das representações sociais
apresentadas ao interlocutor. Conforme Ludke e Marli (1986), o trabalho de
campo deve durar pelo menos um ano escolar; em outras palavras, exige
constância e sistematicidade na confrontação de ideias, cruzamento de
153
Com a aplicação de questionário aos alunos do CPDB de abordagem quantitativa e
qualitativa foi possível, a partir das questões qualitativas com respostas explicativas que fazem
menção aos educadores docentes, elencar critérios de escolha e categorias para análise de
conteúdo das entrevistas. O questionário e as entrevistas serão desenvolvidos em tópicos
seguintes.
119
informações adquiridas, tanto oralmente como pela vivência cultural do
ambiente pesquisado.
Neste sentido, frente à necessidade de obter elementos suficientes do
quadro docente do CPDB quanto à forma que os mesmos compreendem e
põem em prática os princípios referenciais salesianos, a partir da técnica de
observação participante (totalizando 128 horas), iniciaram-se, no mês de maio
de 2012, as primeiras anotações no diário de campo. Embora, no mês de
janeiro, com o início do ano letivo escolar, já existisse contato e, inclusive, uma
relação de amizade entre o pesquisador e os educadores docentes do CPDB,
configurando assim uma imersão não intencional, mas espontânea e
automática; por ser o local de trabalho do pesquisador.
Compreendendo
que
os
princípios
referenciais
salesianos
são
vivenciados não somente na prática docente em sala de aula, mas também em
todos os espaços e momentos de convívio com os educandos, considerou-se
necessário destacar, no diário de campo, não somente as observações da
prática docente em aula, mas também os momentos que vão além desta, nos
espaços adjacentes da sala de aula em que os docentes, foco do trabalho,
estiveram presentes154.
Com o início da aplicação da técnica da observação participante,
principalmente, por meio da convivência com os educadores docentes do
CPDB, numa relação de amizade estabelecida pelo vínculo do carisma
salesiano, favoreceu-se para que a sensação interior de engano e erro, por
parte do observador, ao dedicar-se a estar com o grupo pesquisado, não se
tornasse um peso psicológico, mas sereno, pois bastou registrar a experiência
do cotidiano.
Severino (2007, p. 120) esclarece que o ato de observar, participando
dos ritmos e costumes do fenômeno pesquisado são traduzidos pelo
compartilhamento das vivências: “[…] para realizar a observação dos
154
Para tanto, a coleta de dados desta técnica de pesquisa, observação participante, abrangeu
doze meses. Realizaram-se 56 atividades com um tempo geral de 128 horas de observação
participante. Quadro de atividades assim distribuídas no Apêndice B. Cf. p. 192.
120
fenômenos, compartilha a vivência dos sujeitos pesquisados, participando, de
forma sistemática e permanente, ao longo do tempo da pesquisa, de suas
atividades”.
Muitas atividades em campo são corriqueiras não trazendo novidades
que pudessem revelar a forma de compreensão e prática docente quanto aos
princípios salesianos. Uma destas atividades foi a convivência com os
docentes no horário do intervalo na sala dos professores.
Nesse período, normalmente, os professores conversam sobre casos
e episódios de aula, especificamente, sobre aqueles alunos que são
mais travessos. Futebol, já que a maior parte dos professores são
homens e sentem prazer em discutir lances polêmicos. Essas
conversas são sempre descontraídas e num ambiente de
camaradagem e até amizade (DC, 02/04/2013).
Embora, nos primeiros contatos do pesquisador com os educadores
docentes, não houvesse confiança e proximidade suficientes, ainda por serem
construídas, ao longo da aplicação da técnica de observação participante,
convivência e momentos espontâneos, como um churrasco entre alunos e
professores do CPDB, aos poucos estes elementos foram construídos.
A ideia foi realizar um passeio final para os alunos do 2º ano do
CPDB que estavam concluindo os estudos em suas respectivas
áreas: fabricação mecânica, eletroeletrônica e informática. Foi um dia
ensolarado sendo possível utilizar de todos os recursos oferecidos na
chácara para diversão e confraternização, como o campo de futebol,
a quadra de cimento, a piscina e o pátio. Estavam presentes todos os
professores e os 45 alunos concluintes. Os professores participaram
dos jogos, das rodas de conversas, deram atenção aos alunos com
os quais construíram ao longo do curso laços de amizade (DC,
13/12/2012).
A confiança cresceu na medida em que a convivência entre pesquisador
e educadores docentes se ampliou a ponto do pesquisador ter sido convidado
para participar da confraternização de fim de ano entre os docentes e
coordenação pedagógica na residência de um dos docentes.
Iniciou-se o churrasco às 12h00. Estavam presentes todos os
professores, mais coordenação e assistente social, assim como os
salesianos da instituição que também compareceram para prestigiar o
momento de fraternidade. Ao som de músicas de pagode tocadas por
alguns dos professores, tomando cerveja e saboreando o churrasco,
a descontração foi longe. Relembravam os muitos anos que
trabalhavam juntos: o futebol, a participação em encenações teatrais,
os saraus, realizados na escola nos dias de ação de graças, as
situações engraçadas. Realmente, trata-se de um excelente grupo
(DC, 20/12/2012).
121
Houve também oportunidade para observar atividades de caráter
pastoral e pedagógico da Escola Salesiana São José expressas nas formações
humanas e celebrações ecumênicas, destacando os valores do humanismo
cristão presente na instituição escolar. Os profissionais docentes se faziam
presentes nestas celebrações quando elas correspondiam aos seus horários
de aula.
As atividades de cunho pastoral eram realizadas nos horários das
7h00 às 8h00 para os alunos do período da manhã e das 13h30 às
14h30 para os alunos do período da tarde, consistindo em dinâmica
de ação de graças. O animador motivava os alunos, no salão de
jogos, para o sentido de gratidão pelas experiências positivas vividas,
assim como as não tão agradáveis. Os alunos eram divididos por
grupos de curso: informática, fabricação mecânica e eletroeletrônica,
sendo convidados a preencher com mensagens de agradecimento
um tecido branco que simbolizava a paz. Após preenchimento, todos
se dirigiram à capela, onde expunham a mensagem do grupo e
cantavam algumas músicas que enfocassem gratidão a Deus. Os
professores estiveram sempre presentes participando de todos estes
momentos (DC, 21/12/2012).
O pesquisador participou de inúmeras atividades da instituição, como as
mencionadas acima, assim como das reuniões pedagógicas, manifestações
culturais, semanas de planejamento, festas de homenagem aos pais e nas
atividades formativo-recreativas do DDT (Dia da Turma), realizadas numa
chácara. Além destas atividades extracurriculares, o pesquisador se fez
presente na sala de aula, na qualidade de observador participante.
Por meio do diário de campo são narradas as sensações, os ambientes,
gestos, etc. Tudo, obviamente, sob a óptica do próprio pesquisador.
Quando entrei em classe, nas primeiras vezes, senti certo
desconforto de alunos e docentes, marcado pelo silêncio por alguns
segundos, tanto de alunos, como do professor que escrevia na lousa.
Fiquei imaginando o quanto era realmente desconfortável para ambas
as partes, alunos e professores minha presença, que, certamente, no
seu entender, se questionavam se eu não estaria ali para vigiá-los.
Com o tempo, porém, após algumas aulas, percebi que o ambiente
se serenou, acredito que entendendo que eu estava ali só para
realizar uma investigação acadêmica (DC, 19/02/2013).
Com as primeiras observações sistemáticas em salas de aula com os
seis docentes, pude perceber que a compreensão da pedagogia salesiana era
expressa de forma diferente por cada um, um misto de compreensão pessoal e
propostas institucionais dos princípios referenciais salesianos.
122
Os registros que se seguem mostram os contextos e experiências do
cotidiano em sala de aula.
No início da aula, alguns alunos se aproximaram de D1 e tiraram
suas dúvidas. Conversaram rapidamente e iniciou-se a aula.
Novamente, a mesma coisa, D1 passando matéria na lousa e os
alunos conversando, em baixo tom, mas conversando (DC,
18/04/2013).
Era uma sexta feira chuvosa, os alunos estavam inquietos. D2
passava a matéria na lousa e os alunos copiavam, uns rápido e
outros menos. Após passar a matéria na lousa, D2 disse: “Agora
prestem a atenção, escutem para entender”. Fiquei pensando e
meditando na estratégia de D2. Dar liberdade por instantes e depois
retomar o controle do grupo. Ele apontava os detalhes na lousa com
firmeza. Representava a convicção e confiança na importância do
conteúdo e da necessidade de que aprendessem (DC, 05/04/2013).
Os alunos estavam jogando no salão de jogos. Estavam divididos
entre as mesas de pebolim, ping-pong e sinuca. Quando terminou
este momento de jogos lúdicos, começou o chamado ‘bom dia’. Na
escala do dia estava indicado D3. Sorridente, começou a dizer sua
mensagem e, na sequência, conduziu a oração do Pai Nosso. Foi
bastante enfática a necessidade de estudar. “Quem não estuda fica
para trás”. Destacou que a concorrência no mercado de trabalho está
cada vez mais acirrada (DC, 18/03/2013).
Na aula, pairava certa tensão. Era dia de prova. A voz de D4 soava
imponente, firme e confiante. De repente, o silêncio imperou. Podia
se escutar os sons de outros setores, carros transitando nas ruas,
pássaros cantando nas árvores próximas. Quando os primeiros
alunos terminaram as provas, rompeu-se o silêncio por meio da
despedida dos alunos e D4 (DC, 03/04/2013).
Pude entrar na sala de aula, conversando com D5. Os alunos já
estavam em seus lugares, conversando entre si e com seus
computadores ligados, esperando o início da aula. O instante de
conversa com o professor foi interessante. Pudemos retomar um
assunto que nos encanta, o futebol. Argumentei que ainda não pude
conciliar meus horários pessoais com os programados para o jogo
dos funcionários da Escola Salesiana São José. Ele riu e eu também.
Me afastei e ele assumiu a classe saudando-os com o chamado ‘boa
tarde’ (DC, 11/03/2013).
Na oficina do curso de fabricação mecânica fazia calor. O barulho me
incomodava. Os alunos estavam protegidos com equipamentos de
segurança: óculos, jalecos e fones de ouvido. Era uma aula prática,
colocando em prática o conteúdo daquela semana. D6 caminhava
vigilante, atencioso e preocupado com alguns alunos que já
demonstram sinais de desatenção no uso das máquinas. Quando um
dos alunos terminou sua peça, levou-a até D6. Este a esquadrejou e
sorriu dizendo, está certa. O garoto também sorriu e voltou ao seu
torno. Entendi que a vitória na vida é uma construção de curtos e
profundos sorrisos (DC, 15/03/2013).
123
Observando posturas, atitudes e colocações dos docentes como
educadores, o pesquisador teve dificuldade em distinguir o que era habilidade
profissional, singular de cada um deles e o que era procedimento nascido da
pedagogia salesiana e integrada por esses educadores. Como já foi sinalizada,
a observação participante é uma técnica auxiliar na interpretação da realidade
e cultura do fenômeno pesquisado. Porém é necessária a aplicação de outras
técnicas que corroborem para consolidar se os princípios referenciais
salesianos fazem parte efetiva ou não das práticas docentes destes
educadores.
3.2.2
O questionário com os alunos
A técnica da observação participante permite-nos compreender a
maneira como os docentes entendem e põem em prática os princípios
educacionais salesianos, em sua totalidade ou parcialmente. O acesso ao
fenômeno pesquisado, com a aplicação da técnica da observação participante,
permite também ampliar novas perspectivas e olhares complementares com a
aplicação de outras técnicas como questionários e entrevistas.
Na fase de estruturação de projeto de pesquisa, optou-se por contemplar
o uso do questionário como forma de construção de dados dentro da
abordagem quantitativa e qualitativa para fim de comparação de informações,
observações e hipóteses, levantadas ao proposto questionamento de como são
entendidos e colocados em prática os princípios educacionais salesianos pelo
corpo docente do CPDB.
Conforme a observação participante acontecia, aprimorando o olhar do
pesquisador, ao descrever palavras, expressões, gestos, percepções pessoais,
foi possível elaborar um questionário, embasado em conceitos e orientações
técnicas.
124
Para Chagas (2010, p.02): “[…] um questionário é tão somente um
conjunto de questões, feito para gerar os dados necessários para se atingir os
objetivos do projeto”.
De forma complementar, mas com destaque ao aspecto do problema e
não ao objetivo como o fazem Chagas, Groppo e Martins (2006, p. 28) o
“questionário é uma relação de questões a ser apresentada a alguém que
guarda informações sobre o tema e que, conhecidas, poderão ajudar a
responder o questionamento manifesto pelo problema”.
Optou-se por elaborar dez questões de abordagem ‘quali – quanti’ que,
na condição de complementares, suprirão a desvantagem de uma e de outra
abordagem. São nove questões fechadas e a última é aberta, e que, na
interpretação e análise de conteúdo, dará margem para a escolha dos
docentes depoentes em um quadro de amostragem.
De forma geral, o questionário deve ter estrutura lógica, uma linguagem
simples,
eliminando
assim
o
máximo
possível
as
ambiguidades
na
interpretação (CHIZZOTTI, 2000). Outro elemento entendido como princípio de
estruturação, de acordo com Gunther (2006, p. 06):
[…] é direcionar-se do mais geral para o mais específico; do menos
delicado, menos pessoal, para o mais delicado, mais pessoal. Esta
ordem se aplica a conjuntos temáticos de itens e a um grupo de itens
que tratam de uma temática em comum.
Seguindo o embasamento teórico de Gunther, as quatro primeiras
questões elaboradas para os alunos do CPDB possuem um cunho geral, sendo
questões fechadas com alternativas opostas. A primeira trata do curso, a
segunda sobre o gênero, a terceira sobre a série que o aluno está cursando e a
quarta sobre a idade. Todas as quatro são para a caracterização do aluno. Já
as questões de cinco a dez são específicas do quadro docente do CPDB.
1. Curso ?
2. Sexo ?
a.  Eletroeletrônica
a.  Masculino
b.  Fabricação Mecânica
b.  Feminino
125
c.  Informática
3. Série que está cursando ?
4. Idade ?
a.  1º Ano
a.  15 anos
b.  2º Ano
b.  16 anos
c.  17 anos
d.  18 anos
Formuladas as dez questões embasadas em referencial teórico e
observação participante com o fenômeno de pesquisa, seguiu-se o processo
de avaliação de qualidade do questionário com o pré-teste visando eliminar
possíveis erros que invalidassem este instrumento de pesquisa bem como o
êxito da pesquisa.
Segundo Chagas (2010, p. 11):
É importante a realização de um pré-teste porque é provável que não
se consiga prever todos os problemas e/ou dúvidas que podem surgir
durante a aplicação do questionário. Sem o pré-teste, pode haver
grande perda de tempo, dinheiro e credibilidade caso se constate
algum problema grave com o questionário já na fase da aplicação.
Foram 7 respondentes na fase pré teste que puderam, além de
responder o questionário, tecer comentários críticos sobre a estrutura do
questionário. O alinhamento lógico e sequencial das perguntas, a ligação do
problema com os objetivos da pesquisa, a linguagem e estética do
questionário. Neste sentido, o questionário sofreu completa reformulação e,
seguidamente, foi submetido a novo parecer em escala de orientação que,
conformado às observações da fase pré-teste, tornou-se compacto e coeso
para aplicação com os alunos do CPDB.
Em meados do mês de julho do ano de 2012, as primeiras perguntas
para enquete foram elaboradas. Após revistas e analisadas pela
orientadora, foram estruturadas e conformadas à fase de teste que
consiste em repassar o questionário às pessoas afins, com o qual se
126
relate criticamente a aplicabilidade, coerência e clareza dos
enunciados, coesão, linguagem e alinhamento lógico de ideias a
partir do preenchimento do mesmo.
No mês de agosto de 2012, o questionário foi revisto pela 2ª vez, já
com as observações alheias e parecer final da orientadora. No final
do mês de agosto e início de setembro foi aplicado o questionário
com os alunos do Centro Profissional Dom Bosco (CPDB). Eram
alunos dos cursos técnicos de informática, eletroeletrônica e
fabricação mecânica entre 1º e 2º anos. Dos 182 alunos inscritos nos
cursos, foram preenchidos 159 formulários, sendo que 23 alunos
faltaram nos dias de aplicação. Dentre as dez questões, nove eram
objetivas para análise quantitativa e a última era explicativa. (DC, 3008 e 03-09/2012).
O questionário foi aplicado com os alunos do CPDB pelo próprio
pesquisador que contou com a adesão de 159 alunos respondentes. Estar
presente em meio aos alunos no ato de resposta do questionário permitiu
esclarecimentos sobre algumas dúvidas e, a partir destas, percebeu-se certo
descompasso entre a linguagem das perguntas e o nível cultural dos alunos.
Esclarecidas
as
dúvidas,
o
questionário
pode
ser
respondido
sem
comprometimento.
Com o auxílio de um software SPSS, um programa com recursos de
armazenamento, análise e cruzamento de dados, os 159 questionários foram
quantificados, primeiramente, isoladamente por questão da primeira a nona, e,
em seguida por cruzamento das questões a partir das categorias de gênero,
cursos e série.
Na análise descritiva do banco de dados constam 48 alunos (30,2%) do
curso de eletroeletrônica, 63 (39,6%) de fabricação mecânica e 48 (30,2%) do
curso de informática, sendo que do conjunto de 159 (100%) alunos, 120
(75,5%) são homens e 39 (24,5%) mulheres. 87 alunos (54,7%) são do 1º ano
e 72 (45,3%) do 2º ano. No quadro etário dos alunos respondentes,
predominou a idade dos 16 e 17 anos, respectivamente, 59 (37.1%) e 58
(36,5%) alunos. Estas descrições gerais mostram a caracterização dos
respondentes que também responderam às questões específicas de múltipla
escolha.
A descrição que se segue se relaciona às questões cinco e nove de
abordagem quantitativa, seguido da análise e cruzamento dos dados das
127
questões de cinco a nove, por meio das categorias de gênero, curso e série. A
décima questão de abordagem qualitativa será descrita ao final do tópico.
Na questão cinco perguntou-se se os alunos visualizavam a integração
da proposta do ensino técnico com o enviezamento institucional salesiano. 150
(94,3%) alunos respondentes afirmativamente, que percebiam essa relação.
Embora para o pesquisador esta questão parcialmente poderia induzir o aluno
a responder afirmativamente, os resultados não foram prejudicados.
Na questão de número seis, perguntou-se se cada aluno identifica e
percebe aspectos da Pedagogia Salesiana nos educadores docentes do
CPDB. 92 (57,9%) dos alunos respondentes perceberam elementos da
Pedagogia Salesiana em todos os educadores docentes. 62 (39%) identificam
e percebem elementos da Pedagogia Salesiana em apenas
alguns
educadores. Na constatação de que 39% dos respondentes não percebem
elementos de Pedagogia Salesiana nos educadores docentes, ficou a dúvida
ao pesquisador sobre a quantidade e a que docentes se referiam os
respondentes ao não indicá-los.
Na questão sétima, perguntou-se se o aluno vê a mesma postura de
Bosco nos educadores do CPDB. 102 (64,2%) respondentes visualizam a
figura de Bosco em todos os educadores. 52 (32,7%) mostram que visualizam
a figura de Bosco em apenas alguns educadores docentes. Este descompasso
de respostas também sinaliza a dúvida sobre quantidade e a quais educadores
docentes se referiam os respondentes quando eram comparados à figura
histórica de Bosco.
Embora as questões seis e sete sejam similares, a questão seis busca
visualizar os princípios educacionais salesianos nos educadores, já a questão
sete busca associar a figura histórica de Bosco aos educadores do CPDB. As
questões são aproximadas em ideias, não obstante, os respondentes
apresentaram um quadro diverso de respostas entre a questão seis e sete. O
pesquisador entende, como hipótese, que os alunos, possivelmente, não
compreendem, com profundidade, os princípios educacionais salesianos ao
ponto de percebê-los nos educadores ou, simplesmente, a figura de Bosco é
apresentada aos alunos no CPDB.
128
A diferença numérica de dez indicações e/ou afirmativas da questão seis
para sete nas alternativas ‘Em todos e em alguns’ equivale a 7% dos
respondentes (Cf. Tabela nº 2). Quadro que deixa a dúvida da clareza da
linguagem das questões elaboradas pelo pesquisador, bem como a
profundidade de conhecimento do alunado sobre os princípios educacionais
salesianos e da figura de Bosco.
Tabela nº 2 Análise descritiva do banco de dados - Questões 6 e 7
Você consegue identif icar e perceber aspectos de Salesianidade nos educadores do CPDB?
Valid
Frequency
92
Percent
57,9
Valid Percent
57,9
Cumulat ive
Percent
57,9
62
39,0
39,0
96,9
Somente na part e
profissional
2
1,3
1,3
98,1
Somente na part e pastoral
1
,6
,6
98,7
Mais ou menos
2
1,3
1,3
100,0
159
100,0
100,0
Em t odos
Em alguns
Total
Você vê a mesma postura de Dom Bosco nos educadores do CPDB?
Valid
Frequency
102
Percent
64,2
Valid Percent
64,2
Cumulat ive
Percent
64,2
52
32,7
32,7
96,9
Somente na part e
profissional
1
,6
,6
97,5
Somente na part e pastoral
4
2,5
2,5
100,0
159
100,0
100,0
Em t odos
Em alguns
Total
Na questão de número oito pediu-se que o aluno apontasse aspectos da
Pedagogia Salesiana, a partir das características profissionais de seus
educadores docentes. 51 (32,1%) respondentes afirmam que seus educadores
buscam trazer novos conhecimentos; 45 (28,3%) afirmam que seus
educadores são comprometidos com o trabalho; 39 (24,8%) afirmam que seus
educadores são capazes e didáticos.
129
Para complementar as características profissionais desenvolvidas na
questão de número oito, pediu-se na questão número nove que, a partir da
singularidade e característica pessoal de cada educador, os alunos
apontassem as manifestações de salesianidade mais marcantes. 72 (45, 3%)
respondentes mencionaram a alternativa envolvimento e empenho. 36 (22,6%)
mencionaram a alternativa religiosidade, companheirismo e amizade; 25
(15,7%) mencionaram a acolhida. Tratam-se de elementos de ordem prática
vividos e experienciados pelos alunos no cotidiano do CPDB. Essas
características profissionais e pessoais expressas como princípios salesianos,
quando agrupados, conformam a Pedagogia Salesiana que para Ferreira
(2008, p. 31) “[…] é genuinamente um estilo de educação, um tipo particular de
ação
educativo-pastoral,
uma
espiritualidade
vivida
na
ação.
Possui
consistência orgânica, convicções e conteúdos precisos, atitudes, estruturas,
metodologia e forma próprias”.
De forma geral as questões de cinco a nove buscam delimitar o foco de
pesquisa, questionando especificidades do fenômeno: o educador docente no
CPDB e seu entendimento e a prática da Pedagogia Salesiana.
5. Você percebe que, no ”Centro Profissional Dom Bosco”, a proposta de
profissionalizar e formar técnicos está sendo feita com as qualidades
carismáticas da Instituição, pautadas na presença ou mescla da
pedagogia de Dom Bosco como principal qualidade do carisma da
instituição?
a.
b.
c.
d.
e.
 Sim
 Não
 Somente na parte profissional
 Somente na parte pastoral

Mais
ou
Explique:_________________________________________
menos.
6. O sistema Salesiano de educação também é marcado pela manifestação e
expressão da alegria, empatia, acolhida, generosidade, bondade e tantos
outros adjetivos que qualificam a salesianidade. Você consegue identificar e
perceber estes aspectos da Salesianidade nos Educadores do “Centro
Profissional Dom Bosco”?
a.  Em todos
b.  Em alguns
130
c.  Somente na parte profissional
d.  Somente na parte pastoral
e. 
Mais
ou
Explique:_________________________________________
menos.
7. Dom Bosco, como grande Educador que foi, procurou sempre proporcionar
aos seus jovens condições para que estes desenvolvessem, da melhor
forma, suas capacidades Profissionais e Humanas. Você vê esta mesma
postura de Dom Bosco nos Educadores do “Centro Profissional Dom Bosco”
?
a.
b.
c.
d.
e.
 Em todos
 Em alguns
 Somente na parte profissional
 Somente na parte pastoral

Mais
ou
Explique:_________________________________________
menos.
8. Observando as características Profissionais dos seus professores aqui do
“Centro Profissional Dom Bosco” aponte. Quais são as manifestações de
salesianidade mais marcantes?
a.
b.
c.
d.
e.
 Capacidade e Didatica
 Atenção com o conteúdo
 Busca trazer novos conhecimentos
 Comprometimento com o trabalho
 Sensibilidade para a realidade do aluno
9. Observando as características Pessoais dos seus professores aqui do
“Centro Profissional Dom Bosco”, aponte quais são as manifestações de
salesianidade mais marcantes?
a.
b.
c.
d.
e.
 Alegria
 Acolhida
 Bondade
 Envolvimentos e empenho
 Religiosidade, companheirismo e amizade
3.2.2.1
Análise de dados: Categoria ambos os gêneros
Para melhor compreensão dos dados apresentados nas questões
específicas de cinco a nove, o pesquisador optou por realizar a análise das
131
mesmas também pela categoria de gênero, embora a proporção numérica seja,
preponderantemente, masculina, não comprometendo e invalidando esta
categoria.
A partir da categoria de gênero, na questão de número cinco, 112
(93,3%) respondentes do gênero masculino atestam que a proposta de ensino
técnico no CPDB está sendo realizada de acordo com a proposta pedagógica
da Instituição Salesiana Escola São José. 38 (97,4%) feminino, também
afirmam o mesmo.
Na questão de número seis, 70 (58,3%) respondentes masculinos
afirmam que conseguem identificar e perceber aspectos da Pedagogia
Salesiana em todos os educadores docentes do CPDB. 48 (40%) também do
gênero masculino, visualizam aspectos da pedagogia salesiana em apenas
alguns educadores. Do gênero feminino, 22 (56,4%) conseguem visualizar
aspectos da pedagogia salesiana em todos os educadores docentes; 14
(35,9%) respondentes, apenas em alguns educadores. Tanto a questão de
número cinco como a de número seis mantém uma conformidade nas
respostas de acordo com a proporção numérica no gênero, o que demonstra a
visibilidade da proposta pedagógica
salesiana no setor. Não
houve
desequilíbrio nas observações dos respondentes para as alternativas ‘todos e
alguns’ das questões cinco e seis.
Constata-se que, na questão de número sete, 78 (65%) respondentes do
gênero masculino atestam que vêm a mesma postura de Bosco em todos os
educadores do CPDB. 39 (32,5%) em apenas alguns educadores. Para o
gênero feminino, 24 (61,5%) visualizam a mesma postura de Bosco em todos
os educadores; 13 (33,3%) em apenas alguns. Houve, de acordo com os
números, um aumento considerável do gênero masculino quanto à afirmativa
de perceber a figura de Bosco nos educadores. Para o pesquisador esses
dados são explicados pelo fato de, no CPDB, conter maior número de docentes
homens somado a percepção do pesquisador de que os alunos não conhecem
a figura de Bosco com profundidade, associando os professores homens a
figura de Bosco por meio de características básicas e elementos evidenciados
no CPDB como amizade, religiosidade, etc.
132
Na questão de número oito, 40 (33,3%) respondentes masculinos
afirmam que a alternativa “comprometimento com o trabalho” é a principal
manifestação salesiana dentro das características profissionais de cada
educador
docente.
36
(30%)
indicaram
a
alternativa
“trazer
novos
conhecimentos”. Para o gênero feminino, 15 (38,5%) respondentes destacam a
alternativa “busca trazer novos conhecimentos”; 14 (35,9%) a alternativa
“capacidade e didática” e, em terceiro lugar, com 5 (12,8%) indicações, a
alternativa “comprometimento com o trabalho”. Observa-se que a alternativa
mais destacada pelo gênero masculino “comprometimento com o trabalho” sob
o olhar feminino aparece como periférico. Ponto fundamental a ser descrito é a
complementaridade de visões de gênero dos mesmos educadores. Se para o
gênero masculino é destacada a perspectiva do trabalho, no feminino,
destacam-se o conhecimento e a didática. Destaques entendidos pelo fato do
gênero masculino ser preponderante no curso de fabricação mecânica, que,
embora trabalhe com alta tecnologia e manuseio de maquinário, envolve o
trabalho de esforço físico, associando assim, a ideia do trabalho com o gênero
masculino. O gênero feminino tem preponderância no curso de informática que,
ao abordar ferramentas como softwares e programas, necessitam de
criatividade e didática para manter o ritmo do ensino. Quando integrados,
esses elementos robustecem a figura docente em competência profissional e
habilidades pessoais.
A questão de número nove apresenta similaridade nas respostas de
acordo com a proporção numérica de gênero. A alternativa mais destacada
para ambos os gêneros foi o envolvimento e empenho dos educadores como
manifestação da Pedagogia Salesiana, a partir das características pessoais de
cada educador docente. O destaque desta alternativa “envolvimento e
empenho” é entendida pelo fato da Escola Salesiana São José e o setor CPDB
realizarem, de acordo com o calendário de atividades civis e religiosas, eventos
que proporcionem o trabalho conjunto entre alunos e docentes.
Realizou-se também um cruzamento de dados por gênero no software
SPSS entre a questão de número seis, tendo como pergunta a percepção e
identificação dos aspectos da pedagogia salesiana nos educadores do CPDB
com a questão de número sete: sobre a visualização da postura de Bosco nos
133
educadores do CPDB. Os resultados foram bastante consistentes. 54 (77,1%)
respondentes masculinos mostram que identificam os princípios educacionais
salesianos nos educadores e visualizam a figura histórica de Bosco nos
mesmos. 19 (86,4%) respondentes do sexo feminino identificam os princípios
educacionais salesianos nos educadores e também visualizam a figura
histórica de Bosco nos mesmos e 3 (13,6%) respondentes em apenas alguns
educadores docentes. Os dados são de ordem prática e percebidos na vivência
do cotidiano, não sendo, por assim dizer, menos importantes que a abstração e
compreensão teórica dos fundamentos da proposta pedagógica salesiana.
3.2.2.2
Análise de dados: Categoria curso
Apresentados os dados das questões específicas de cinco a nove por
meio da categoria gênero, continuamos a descrição de abordagem quantitativa,
desta vez com base na categoria curso.
Na questão de número cinco, 44 (91,7%) respondentes do curso de
eletroeletrônica afirmam que percebem a proposta de estudo profissional com
as qualidades carismáticas da instituição salesiana. 60 (95,2%) respondentes
do curso de fabricação mecânica afirmam o mesmo. 46 (95,8%) respondentes
do curso de informática confirmam a percepção da realização da proposta de
ensino e aprendizagem de curso técnico com aspectos da pedagogia
salesiana. Tanto no curso de eletroeletrônica como informática, 2 (4,2%)
respondentes afirmaram que a proposta de profissionalizar com as qualidades
carismáticas da instituição salesiana são percebidas somente em atividades
extra curriculares como passeios, convivências e não em sala de aula. Para o
pesquisador, este último dado apresenta-se bastante significativo, pois, embora
seja mínimo numericamente, demonstra um rigor crítico apurado e consistente
frente à pergunta do formulário com tendência indutiva à alternativa mais
ajustada à questão.
A questão de número seis apresentou equilíbrio nas indicações de
alternativas por curso. 21 (43,8%) respondentes do curso de eletroeletrônica
134
afirmam que identificam e percebem os aspectos da pedagogia salesiana em
todos os educadores do CPDB e 25 (52%) respondentes em apenas alguns. 39
(61,9%) respondentes do curso de fabricação mecânica indicaram a alternativa
“todos” e 24 (38,1%) respondentes apontaram a alternativa “alguns”. 32
(66,7%) respondentes do curso de informática consideram a alternativa “todos”
e 13 (27,1%) a alternativa “alguns”. Embora os três cursos apresentem certo
equilíbrio nas respostas, no curso de eletroeletrônica elevou-se a alternativa
“alguns”, deixando a dúvida do grau de percepção e entendimento que os
alunos têm sobre os princípios educacionais salesianos expressos pelos
educadores docentes deste curso, bem como a quantidade e quais educadores
foram imaginados em tal deferência e seu contrário na alternativa “alguns”.
Este quadro demonstra que apenas alguns educadores docentes expressam
elementos e aspectos da pedagogia salesiana.
Perguntou-se na questão de número sete sobre a visualização da
proximidade da postura e figura de Bosco nos educadores do CPDB. A
alternativa “todos” foi sobremaneira expressiva em comparação à alternativa
“alguns”. A alternativa “todos” atingiu 28 (58,3%) indicações no curso de
eletroeletrônica, 43 (68,3%) no curso de fabricação mecânica e 31 (64,6%) no
curso de informática. Para a alternativa “alguns” 18 (37,5%) indicações no
curso de eletroeletrônica, 19 (30,2%) no curso de fabricação mecânica e 15
(31,3%) no curso de informática. O destaque da alternativa “alguns” apresenta-se questionador ao pesquisador por não saber do porquê tal descompasso
pedagógico na percepção dos respondentes, embora os dados da alternativa
“todos” tenham consistência.
Na questão de número oito, perguntou-se sobre as manifestações de
salesianidade a partir das características profissionais de cada educador. 15
(31,3%) respondentes do curso de eletroeletrônica destacam a alternativa
“capacidade e didática”. 14 (29,2%) também do curso de eletroeletrônica
destacam a alternativa “busca trazer novos conhecimentos”. No curso de
fabricação mecânica, 27 (42,9%) respondentes destacam a alternativa
“comprometimento com o trabalho” e 13 (20,6%) destacam a alternativa “busca
trazer novos conhecimentos”. No curso de informática 24 (50%) respondentes
destacam a alternativa “busca trazer novos conhecimentos” e 13 (27,1%)
135
afirmam a alternativa “capacidade e didática”. Para o pesquisador, parece
interessante a constatação de que no curso de fabricação mecânica, com
predominância de alunos homens, haja mais indicações para a alternativa
“comprometimento com o trabalho” e, nos outros cursos, com uma margem
numérica maior de mulheres, tenham destacado mais as alternativas
“capacidade e didática” e “busca trazer novos conhecimentos”. Quadro
semelhante foi descrito por meio da categoria “ambos os gêneros”. Na
categoria “curso” tornou-se mais evidente a associação de que os alunos do
curso fabricação mecânica fizeram entre “gênero masculino” e a alternativa
“trabalho”, pois, neste curso, o estudo prático exige significativo esforço físico.
Obviamente que tratam de elementos de forte expressão na prática docente
destes cursos.
Na questão de número nove, a respeito das manifestações de aspectos
salesianos a partir das características pessoais dos educadores docentes no
CPDB,
os
respondentes
dos
três
cursos
destacaram
a
alternativa
“envolvimento e empenho”. 22 (45,8%) do curso de eletroeletrônica, 32 (50,8%)
respondentes do curso de fabricação mecânica e 18 (37,5%) do curso de
informática, tornando assim, as alternativas como “alegria”, “acolhida”,
“bondade” e “religiosidade”, em condição periférica. O curso de informática,
porém, com equivalência numérica de gênero, apontou certo equilíbrio nas
indicações das alternativas apresentadas. 14 (29,2%) respondentes destacam
a alternativa “religiosidade”, 7 (14,6%) a “acolhida” e 6 (12,5%) a “alegria”. Por
meio de observação participante, o pesquisador entende que neste curso há
equidade de gênero que, somado ao dado de que há número elevado de
jovens deste curso que participam de atividades extraclasses, como
convivências, atividades lúdicas e esportivas fora dos espaços da escola
Salesiana São José e em períodos de férias, estes alunos tornam-se, por
assim dizer, aptos e com melhores condições de elaborar um parecer crítico
distintivo dos respondentes dos outros cursos.
Realizou-se, por parte do pesquisador, um cruzamento de dados da
questão de número oito que trata das manifestações de salesianidade a partir
das características profissionais de cada docente, com a questão de número
seis que trata da identificação e percepção dos aspectos salesianos nos
136
educadores do CPDB. De forma equivalente, a alternativa “comprometimento
com o trabalho” foi destacada nos três cursos, sinalizando a eficiência e
credibilidade do ensino e processo pedagógico vivenciado na sala de aula e
oficina de operacionalização de maquinário.
3.2.2.3
Análise de dados: Categoria série
Apresentados os dados das questões específicas de cinco a nove, por
meio da categoria curso, continuamos a descrição de abordagem quantitativa,
com base na categoria série, que permite distinguir o grau de adesão dos
alunos à proposta pedagógica salesiana no CPDB.
Na questão de número cinco, 80 (92%) respondentes do 1º ano dos três
cursos, eletroeletrônica, fabricação mecânica e informática, indicaram a
alternativa “sim”, que percebem no CPDB a concretização da proposta de
profissionalizar com as qualidades carismáticas da instituição salesiana. 4
(4,6%) afirmaram que os aspectos educacionais salesianos são perceptíveis
somente em atividades extraclasses. Com relação aos alunos do 2º ano, 70
(97,2%) respondentes destacam a alternativa “sim” que também percebem a
integração da Educação Profissional com a Pedagogia Salesiana.
Na questão de número seis, 50 (57,5%) respondentes do 1º ano afirmam
que identificam e percebem aspectos educacionais salesianos em todos os
educadores do CPDB. 35 (40,2%), em apenas alguns educadores. No grupo de
alunos do 2º ano, 42 (58,3%) respondentes destacam a alternativa “todos” e 27
(37,5%) a alternativa “alguns”. O quadro geral que representa a similaridade
dos grupos nos dados apresentados e revela, de certa forma, o olhar crítico
dos respondentes quanto ao discurso de integração da parte profissional com a
pedagógica, evidenciado nas questões de número cinco e seis, sobretudo por
parte dos alunos do 2º ano que estão no CPDB há mais tempo que o grupo do
1º ano.
137
A questão de número sete apresentou um quadro semelhante à questão
de número seis, exceto pelo fato do grupo do 2º ano ter apresentado maior
criticidade na dissociação da figura de Bosco com os educadores ou menor
percepção nessa aproximação de papéis. Para o grupo de alunos do 1º ano, 58
(66,7%) respondentes destacaram que visualizam a figura de Bosco em todos
os educadores do CPDB e 27 (31%) visualizam a figura de Bosco em apenas
alguns educadores. No grupo de alunos do 2º ano, 44 (61,1%) destacaram a
alternativa “todos” e 25 (34,7%) a alternativa “alguns”.
Na questão de número oito que trata das manifestações de
salesianidade a partir das características profissionais de cada educador
docente no CPDB, o grupo de alunos do 1º ano com 28 (32,2%) respondentes
destacaram
a
alternativa
“capacidade
e
didática”,
24
(27,6%)
“comprometimento com o trabalho” e 20 (23%) a alternativa “busca trazer
novos conhecimentos”. Para o grupo de alunos do 2º ano, 31 (43,1%) optaram
pela
alternativa
“busca
trazer
novos
conhecimentos”,
21
(29,2%)
“comprometimento com o trabalho” e 11 (15,3%) “capacidade e didática”.
Torna-se evidente que a alternativa “capacidade e didática”, bastante
destacada pelo grupo de alunos do 1º ano tornou-se periférica no grupo de
alunos do 2º ano pela ausência de novidades nas metodologias, expressões e
gestos dos educadores docentes. Além de que, em análise de dados pela
categoria “gênero” a alternativa “capacidade e didática” é destacada pelo
gênero feminino que na categoria “série” permanece em desvantagem
numérica.
Na questão de número nove, perguntou-se sobre as manifestações de
salesianidade mais marcantes ao aluno a partir das características pessoais de
cada educador docente. Para o grupo de alunos do 1º ano, 39 (44,8%)
respondentes destacaram a alternativa “envolvimento e empenho”, 20 (23%) a
alternativa “religiosidade, companheirismo e amizade” e 16 (18,4%) a
“acolhida”. Para o grupo de alunos do 2º ano, 33 (45,8%) respondentes
optaram pela alternativa “envolvimento e empenho”, 16 (22,2%) destacaram a
alternativa “religiosidade, companheirismo e amizade” e 9 (12,5%) as
alternativas “alegria” e “acolhida”. De acordo com os dados, tanto no grupo de
alunos do 1º como do 2º ano, a alternativa “envolvimento e empenho” por parte
138
dos educadores docentes com o alunado é marcante. O que facilita a
consecução do trabalho docente de ministrar aula, mas, não somente, de
lapidar seres humanos. As alternativas de principal destaque da questão
número oito “busca trazer novos conhecimentos”, “capacidade e didática”,
articuladas com as alternativas de maior destaque na questão número nove
“envolvimento e empenho” e “religiosidade, companheirismo e amizade”
revelam a competência profissional, desenvoltura humana e pertença
institucional salesiana do quadro docente do CPDB.
A análise descritiva dos dados, por meio das categorias gênero, curso e
série, permitiu ao pesquisador visualizar, embora não em sua totalidade, o
como é percebido e entendido pelos alunos a proposta pedagógica salesiana e
sua aplicação no CPDB pelos educadores docentes.
Passada a última questão do questionário, a de número dez, o
pesquisador, em sua elaboração de pergunta, tentou especificar melhor a
relação do quadro docente do CPDB com as características salesianas. Para
isso utilizou de uma tabela com três quadrantes verticais e horizontais em que
o respondente pôde mencionar o educador docente que, em sua percepção,
integra mais fortemente as características salesianas. No segundo quadrante
horizontal, pôde mencionar os aspectos salesianos de destaque do respectivo
educador e, no último quadrante horizontal, uma cena vivenciada relacionada a
este educador.
10. Mencione Três Professores do “Centro Profissional Dom Bosco” que, para
você, se destacam como Educadores (as) /Docentes, porque integram em si,
de forma mais evidente e forte, as características Salesianas. Mencione
também qual é a característica salesiana a que você se refere como de
maior destaque do professor mencionado, descrevendo uma cena
vivenciada que seja representativa disso.
Nossos Profs.: Aline, Elizete, Gale, Gerson, Janilson, João Nelson,
Marcelo, Menão, Nelson, Paula, Reinaldo, Santana, Teston,
Tizzei.
Aspectos
Salesianos.: Razão, Religião, Bondade, Preventividade,
Acolhida, Aconselhamento, (Cabe aqui uma lista para ajudar
na contribuição do aluno).
139
Educador/Docente
Aspecto
Salesiano de
destaque
Respectiva cena vivenciada
1)
2)
3)
Por se tratar de uma questão bastante específica e subjetiva aos alunos,
o pesquisador percebeu, no momento da aplicação do questionário, que alguns
respondentes
se
detiveram
em
responder
livremente,
continuando
o
preenchimento do formulário somente após a orientação do pesquisador
afirmando dos fins acadêmicos e esclarecimento do como responder a
questão.
Esta última questão requereu mais tempo aos respondentes, ainda mais
por serem três colunas, ou seja, três nomes de educadores, três aspectos
salesianos e três cenas vivenciadas. Desta forma, dos 159 respondentes do
formulário, 91 responderam esta última questão por completo. Os outros alunos
responderam uma ou duas colunas verticais e horizontais, fator que não
invalida a questão e não compromete a análise do pesquisador, pois a
quantidade e qualidade das respostas são satisfatórias.
Todos os educadores docentes mencionados na questão foram
referendados nas respostas em maior ou menor grau como quem integrou
fortemente algum tipo de característica salesiana. Cabe aqui uma menção155, a
cada
educador
docente
a
partir
das
respostas
apresentadas
pelos
respondentes156.
155
O todo do material coletado é de uso do pesquisador para análise de dados de abordagem
“quali – quanti”.
156
As menções aos educadores docentes e seus respectivos aspectos salesianos não estão
em escala de importância, apenas em âmbito demonstrativo com identificação fictícia,
conforme quadro abaixo.
140
Tabela 3 – Quadro expositivo da questão número nove
Educador A
Aspecto
Salesiano de
destaque
Bondade
Educador B
Religião
“Ela aconselhou seus alunos a fazer
crisma e comunhão para aqueles que
não fizeram” (Respondente).
Educador C
Aconselhamento
“Ele é muito bom para explicar e tem
bastante paciência com a gente”
(Respondente).
Educador D
Aconselhamento
“Nos aconselha a prestar atenção
nas aulas e é bem descontraído”
(Respondente).
Educador E
Aconselhamento
“Quando estava com dificuldade, ele
me deu conselhos e me reanimou”
(Respondente).
Educador F
Bondade
“Ele é 10. Sempre nos ajuda nos
laboratórios” (Respondente).
Educador/Docente
Respectiva Cena vivenciada
“Faz de tudo para não ficarmos com
nota vermelha. Explica muito bem, dá
exercícios para aprofundarmos o
conhecimento” (Respondente).
141
Educador G
Aconselhamento
“Nos aconselha a melhorar para o
nosso próprio bem, e que lá na frente
colheremos
bons
frutos”
(Respondente).
Educador H
Inteligência,
postura
“A capacidade de nos ensinar uma
matéria não entendida, pois sabemos
que se precisarmos de cinco
explicações
ele
explica”
(Respondente).
Educador I
Razão e
aconselhamento
“Dá atenção a todos na sala de aula
e ajuda com as dúvidas na matéria”
(Respondente).
Educador J
Aconselhamento
“Ela está sempre aconselhando para
as provas” (Respondente).
Educador K
Aconselhamento
“Todas as aulas, ele nos aconselha a
não desistir e sim, persistir e estudar
mais” (Respondente).
Educador L
Razão
“Ensina em sala e fora dela a sermos
pessoas melhores. Seus conceitos
são bons. Ensina muito bem pelo
seus trabalhos, por exemplo: valores
humanos” (Respondente).
Educador M
Bondade
“Ele sempre é bem alegre na sala de
aula e trata a gente bem”
(Respondente).
142
Educador N
Bondade
“Um professor excelente que sempre
nos ajuda e muitas vezes nos faz rir,
o que é até bom para descontrair um
pouco a aula” (Respondente).
Os comentários dos respondentes sobre as cenas vivenciadas com cada
educador apresenta certa similaridade de ideias, haja vista que os cenários são
os mesmos para todos: a sala de aula. Se por um lado os comentários dos
respondentes são positivos, por outro, o pesquisador informa de que a vivência
a partir da Pedagogia Salesiana não se resume ao espaço da sala de aula,
mas se estende para as relações espontâneas no pátio e espaços adjacentes à
sala de aula.
Por meio da técnica de observação participante, o pesquisador constata
que, da mesma forma que o momento denominado ‘bom dia e boa tarde’
apresenta certa corrosão em sua operacionalização, também a convivência
docente e discente, no momento de intervalo de aula, apresenta uma
desconexão com a Pedagogia Salesiana, não havendo assim a presença de
docentes no pátio nos momentos de intervalo dos alunos.
Muitos aspectos da Pedagogia Salesiana foram destacados na condição
de princípios educacionais salesianos fortemente integrados no quadro docente
do CPDB. Respectivamente a palavra “bondade” com 23 indicações;
“aconselhamento”, 20 indicações; “razão”, 12 indicações; “acolhida’, 10
indicações; “descontraído”, 8 indicações; “alegria”, 5 indicações; “didática”, 5
indicações; “religião”, 4 indicações; “atualizado”, 4 indicações; somando, ao
todo, 91 afirmações de características salesianas aos docentes do CPDB.
Estas palavras são de ordem prática, tratando-se de constatações que
os alunos fazem no cotidiano na vivência com/dos educadores docentes.
Palavras que sendo complementares se estreitam em suas definições e
significados. Temos, como exemplo, as palavras “bondade, acolhida,
descontraído, alegria”, que se apresentam aos olhos dos alunos como símbolo
143
de um afeto demonstrado. Uma vez percebido o afeto, este passa a ser
definido e conceituado em várias expressões, como as citadas acima.
Palavras como “aconselhamento, razão, didática e atualizado (no
sentido de atualização)” são próximas em uma dimensão intelectual e denotam,
na compreensão dos alunos, as capacidades técnicas e lógicas do ensino nos
cursos do CPDB. São palavras que demonstram a surpresa do aluno em
deparar-se com conteúdos, experiências e aprendizados entendidos como
novos e significativos. A palavra “aconselhamento”, no entanto, pertencente ao
bloco da dimensão racional, rompe com este quadro quando permeia a relação
de amizade entre docente e aluno. O “aconselhamento” passa a ter um
segmento de cunho existencial, particularizando a relação, não mais contratual
de professor e aluno, mas pelo estreitamento da amizade.
A palavra “religião” expressa para o pesquisador o respeito dos alunos
aos educadores que, de alguma forma, demonstram sua crença religiosa. A
palavra “religião”, embora seja um dos pontos basilares da Pedagogia
Salesiana, é apresentada com certa timidez pelos alunos, haja vista que há
variadas denominações evangélicas no CPDB que, hipoteticamente, podem
reconhecer e validar o Projeto Político Pedagógico e Pastoral da instituição de
caráter cristão católico, bem como o seu contrário de agir com indiferença.
Para o pesquisador, a palavra “religião” não é precisa ou, no mínimo
confusa, pois, por meio da observação participante, constata-se que uma parte
significativa
dos
alunos
não
participam
livremente
das
atividades
extracurriculares que enfatizem o aspecto religioso e pastoral.
Tais palavras quando agrupadas, conformam o tripé pedagógico
salesiano: razão, religião e bondade, sendo a base da Pedagogia Salesiana.
Conforme os dados foram apresentados, o pesquisador pôde visualizar
a realidade do CPDB, buscando elementos para compreender a forma de
entendimento e aplicação dos princípios referenciais salesianos por parte dos
educadores docentes no CPDB.
144
Terminadas a análise e descrição dos dados da técnica questionário, se
faz necessária uma abordagem direta aos sujeitos pesquisados em escala de
amostragem: os educadores docentes do CPDB.
3.2.3
As entrevistas com os educadores docentes
A apresentação da descrição de dados da técnica questionário
possibilitou
visualizar
como
os princípios
referenciais salesianos são
entendidos e aplicados no CPDB. Visando buscar mais informações para o
desenvolvimento da pesquisa, utilizou-se a técnica de entrevista aberta com
questões semiestruturadas.
Para Trivinos (1990 p. 146), a entrevista semiaberta é entendida como
um modelo que tem origem em uma matriz, um roteiro de questões que dá
cobertura ao interesse de pesquisa.
[…] parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e
hipóteses que interessam à pesquisa, e que, em seguida, oferecem
amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão
surgindo à medida que se recebem as respostas do informante.
A opção por este modelo de entrevista tem por finalidade complementar
as informações da técnica do questionário e da observação participante,
permitindo a criação de uma estrutura para cotejamento de respostas e
interpretação
dos
resultados,
“[…]
auxiliando
na
sistematização
das
informações fornecidas por diferentes informantes” (DUARTE 2006, [S/P]).
A partir dos dados da última questão, pediu-se aos alunos que
mencionassem o nome de três educadores docentes que tenham integrados
em si, de forma evidente e forte, as características salesianas. Essa indicação
foi variada, levando o pesquisador a estabelecer como estratégia, critérios para
a escolha dos docentes depoentes como quadro de amostragem, bem como
pensar as categorias de análise das entrevistas.
Os critérios de escolha dos depoentes são: 1) elevada carga horária e
elevada menção dos respondentes no questionário; 2) baixa carga horária e
145
elevada menção dos respondentes; 3) elevada carga horária e baixa menção
dos respondentes.
Estabelecidos os critérios157, foram convidados seis depoentes158 que,
entendendo a importância da pesquisa, dispuseram-se a ajudar e favorecer o
pesquisador a obter os elementos e informações necessários para a
investigação.
Entende-se que a técnica entrevista possui inúmeras vantagens,
principalmente, por expressar dados referentes ao comportamento humano
(PÁDUA, 2000), ainda que o pesquisador esteja ciente dos limites e riscos
desta técnica, tal como afirma Groppo e Martins (2006, p. 29):
É preciso levar em conta que os entrevistados podem omitir ou
distorcer informações, bem como se sentir inibidos ao apresentar a
informação verdadeira. Do mesmo modo, por outro lado, também o
entrevistador pode compreender e avaliar de forma equivocada tais
informações.
O risco de informações equivocadas foi preocupação constante do
pesquisador, seja pela possibilidade de má interpretação ou pela inibição dos
depoentes, visto que o pesquisador é membro da equipe de gestão da Escola
Salesiana São José. Todavia não houve relutância do corpo docente em
participar deste processo.
Segundo Ludke e André (1986, p. 33):
De início, é importante atentar para o caráter de interação que
permeia a entrevista. Mais do que outros instrumentos de pesquisa,
que em geral estabelecem uma relação hierárquica entre o
pesquisador e o pesquisado, como na observação unidirecional, por
exemplo, ou na aplicação de questionários ou de técnicas projetivas,
na entrevista a relação que se cria é de interação, havendo uma
atmosfera de influência recíproca entre quem pergunta e quem
responde. Especialmente nas entrevistas não totalmente
estruturadas, onde não há a imposição de uma ordem rígida de
questões, o entrevistado discorre sobre o tema proposto com base
nas informações que ele detém e que no fundo são a verdadeira
razão da entrevista. Na medida em que houver um clima de estímulo
e de aceitação mútua, as informações fluirão de maneira notável e
autêntica.
157
A relação dos docentes convidados para fornecer depoimentos será comentado adiante em
formato de tabela. Cf. Tabela 5.
158
Os docentes na condição de depoentes serão identificados pela letra ‘D’ seguida de número
crescente de um a seis. A ordem numérica representa a sequência de análise do intérprete,
sendo este, o próprio pesquisador.
146
Em cada entrevista com questões semiestruturadas, houve um período
de tempo de ocorrência e de experiências diversas. Por falta de experiência do
entrevistador, as duas primeiras foram mais curtas, com tempo aproximado de
quarenta minutos. As demais tiveram maior duração com um tempo
aproximado de uma hora e meia.
Essas entrevistas foram realizadas pelo próprio pesquisador e tiveram
como ponto de partida três questões semiestruturadas, suficientemente,
amplas para serem discutidas em profundidade sem que houvesse
interferência entre elas ou redundâncias (DUARTE, 2006). Todas foram
gravadas em áudio para posterior transcrição, trabalho que exigiu do
pesquisador dedicação e paciência. Para melhor caracterização das entrevistas
e depoentes, seguem algumas anotações de diário de campo que o
pesquisador denominou como impressão do intérprete.
D1. E comprometida com o trabalho salesiano. Desde o início, a
depoente contribuiu com os objetivos da entrevista que era o de
coletar informações. Demonstrou sua paixão com o trabalho
salesiano visto que já participa de um grupo ligado ao projeto
salesiano. Demonstrou profundo conhecimento da história salesiana.
Mostrou-se serena e à vontade, expresso pela postura de sentar e
deixar os braços soltos (DC, 10/10/2012).
D2. Passado a primeira pergunta, desenvolveu-se um diálogo de
amizade. O depoente se expressou com naturalidade e
espontaneidade. Durante a entrevista semiaberta, o entrevistado se
posicionou com disponibilidade e amabilidade, visando colaborar com
o entrevistador. Respondeu as perguntas com confiança e
tranquilidade. Terminada a entrevista, desligou-se o aparelho
gravador. […] O depoente e entrevistador continuaram a conversa em
tom de informalidade. Houve um momento em que o depoente se
emocionou ao ponto de derramar lágrimas, quando partilhou de sua
história o envolvimento e significatividade de Nossa Senhora
Auxiliadora em sua vida e de sua família. […] Partilhou também seus
sentimentos e impressões quanto aos percalços da instituição: não
valorização da estrutura geral, sendo direção e colegas de trabalho
de outros setores, entendendo que o CPDB é um setor complexo.
Redução de salário pela metade desde o ano de 2008. Redução da
equipe do CPDB. Reestruturação do setor enquanto legislação,
currículos de curso, reforma de prediação, com o qual, parte da
prediação do CPDB, passou a pertencer a outro setor (Unisal) (DC,
19/10/2012).
D3. A entrevista ocorreu com tranquilidade. A depoente se dispôs a
participar com entusiasmo e generosidade. O lugar foi o escritório do
entrevistador. A depoente foi muito franca, abordando aspectos
delicados no setor CPDB e instituição geral. Sua franqueza se deve à
sua personalidade. Dispôs-se a contribuir com o que for necessário
para que o projeto do entrevistador possa ser concretizado (DC,
07/11/2012).
147
D4. Final de outubro, dia quente, praticamente insuportável. O
depoente e o entrevistador procuraram um lugar de clima agradável
para a realização da entrevista. Encontramos o ar condicionado
ligado em um dos laboratórios de informática. Desta forma a
entrevista começou, com tranquilidade e em um clima de confiança.
De jargão e perfil acadêmico, o depoente manifestou seu ânimo pela
entrevista, instituição e trabalho realizado no setor. […] Além de
corresponder ao anseio do entrevistador de que respondesse as
perguntas, o depoente demonstrava o carinho e preocupação com a
pedagogia salesiana no setor CPDB (DC, 31/10/2012).
D5. A entrevista transcorreu com serenidade. Foi feita no momento
do intervalo do período da noite. O professor foi atencioso e objetivo
em suas respostas. Quando parou, mais para pensar em responder
uma das questões, denotou atenção e carinho à identidade salesiana,
sobretudo no setor CPDB. A pergunta feita tratava do que deveria ser
mais robustecido enquanto elemento salesiano. Sua demora em
responder denotou satisfação com as características presentes. O
depoente expressou serenidade nas respostas e mencionou
verbalmente a confiança que tem no entrevistador. […] O professor
tem característica humorística e cômica. Suas palavras estavam
repletas de risos (DC, 24/10/2012).
D6. Pessoa amiga, sorridente e disponível ao diálogo em entrevista.
O tempo de diálogo ocorreu com tranquilidade. O depoente pensou
um pouco em suas palavras, tornando a entrevista um pouco formal.
Partilhou sua história de vida salesiana com naturalidade. Sentiu
confiança no entrevistador. Demonstrou emoção para com sua
história de vida e de sua história salesiana. Demonstrou profundo
conhecimento da história salesiana (DC, 18/10/2012).
As anotações de diário de campo sobre as entrevistas e depoentes
demonstram certa sintonia e similaridade na ótica do intérprete, o que exige um
olhar mais crítico na análise e interpretação das entrevistas, confrontando
convergências e divergências no entendimento e desenvolvimento da
pedagogia salesiana no setor CPDB.
Tabela 4 – Questões semiestruturadas aos educadores docentes
1) Quem foi e o que significa a pessoa/personagem de Dom Bosco para você?
2) Dos elementos e características salesianas, qual você considera que tenha mais
significatividade e vivência no Centro Profissional Dom Bosco (CPDB)?
3) Através de sua prática docente, você consegue transmitir algum tipo de princípio
salesiano? Explique como:
148
Ao transcrever as entrevistas, tendo por base as categorias de ambos os
gêneros, idades diferenciadas e tempo de vivência159 e conhecimento
salesiano, o pesquisador se deparou com sua própria sensibilidade ao
rememorar a sensação vivida no ato de entrevista com cada depoente. Essas
entrevistas se trataram de uma experiência singular pela riqueza da partilha de
vida do ‘outro’, de um ser humano. Neste sentido, a partir da análise de
conteúdo, tanto a percepção e entendimento do intérprete, como a
subjetividade e sensibilidade dos depoentes serão descritas como forma de
caracterização geral dos mesmos e demonstração do teor de cada entrevista.
Tabela 5 – Categorias de análise e critérios estabelecidos a partir dos
dados da técnica questionário
Categorias
Depoente
Ambos
os
gêneros
Idades
diferenciadas
D1
Feminino
60 Anos
Tempo de
vivência,
conhecimento
e trabalho
salesiano
22 Anos
D2
Masculino
42 Anos
34 Anos
D3
Feminino
28 Anos
10 Anos
D4
Masculino
50 Anos
30 Anos
159
Critérios
estabelecidos
para convite à
depoência160
(2) – Alta
significatividade
em referência
salesiana com
baixa carga horária
(3) – Baixa
significatividade
em referência
salesiana com alta
carga horária.
(2) - Alta
significatividade
em referência
salesiana com
baixa carga horária
(1) – Alta
significatividade
A palavra vivência é entendida pelo autor em sua abrangência temporal. O tempo total em
anos de envolvimento direto ou indireto com a estrutura salesiana permeia o período de aluno,
a condição de membro de grupos apostólicos de capelania, docência remunerada e voluntária.
160
Os critérios estabelecidos têm por base a descrição de dados da técnica questionário,
precisamente, a questão de número nove de abordagem qualitativa e cunho investigativo
aplicado aos alunos do CPDB.
149
D5
Masculino
40 Anos
36 Anos
D6
Masculino
56 Anos
41 Anos
em referência
salesiana com alta
carga horária.
(1) – Alta
significatividade
em referência
salesiana com alta
carga horária.
(3) - Baixa
significatividade
em referência
salesiana com
alta carga
horária.
D1 de gênero feminino, sessenta anos, participa há vinte e dois anos da
vivência salesiana, sendo há dez anos como professora no Unisal e, há dois
anos professora voluntária, no CPDB. É membro de grupos apostólicos e
participante assídua de atos religiosos salesianos. Sua entrevista revela um
sentimento de pertença à instituição salesiana, além de preocupação com a
finalidade, público atendido e atualização dos princípios e referenciais
salesianos. Entretanto suas palavras soam como salvacionistas, quando
referidas à pedagogia salesiana.
No CPDB, trabalho há 2 anos como professora voluntária por opção,
ensinando inglês. [Pergunto sobre um possível programa de
formação à salesianidade. E ela:] Programas de formação aos
docentes, inclusive de formação salesiana é fundamental porque o
professor é o modelo do carisma salesiano na sala de aula. Há a
necessidade de que exista uma formação salesiana para que este
professor possa levar Jesus Cristo que é nossa meta principal ao
jovem. Então, há de ter formação salesiana, não somente em
Campos do Jordão, mas, em todo o lugar do mundo: dentro da
escola, onde tiver a chance de haver um encontro e juntar esses
professores para entretenimento também. Por que não? A vida
também é um ‘ludens’. A gente precisa ter diversão, mas precisa
haver a formação salesiana. É fundamental. Como salesiana
cooperadora, acho isso essencial na vida do professor salesiano. Não
pode ter professor salesiano na sala de aula que não conheça Dom
Bosco, a própria vivência, a própria estrutura, a chegada deles no
Brasil, os porquês de ser salesiano, o tripé de Dom Bosco, o método
de educação em comparação com outros métodos de educação. É
impossível trabalhar em uma casa salesiana fora dessas condições.
Acho muito complicado (D1, E 10/10/2012).
D2 de gênero masculino, quarenta e dois anos, tem trinta e seis anos de
vivência e trabalho salesiano, começando da época de aluno da educação
150
básica até os dias de hoje como docente no CPDB. Sua história está
relacionada à estrutura salesiana. D2 apresenta um memorial afetuoso sobre a
história salesiana, podendo comprometer, na ótica do pesquisador, a análise
do real entendimento e aplicação dos referenciais salesianos no CPDB.
Todo meu trabalho hoje está relacionado com a Pedagogia Salesiana
de Dom Bosco. Toda a minha vida, praticamente, até mesmo antes
de conhecer a Dom Bosco. Eu comecei aqui como aluno salesiano.
Então, na época, entrei no primário, fiz o 1º ano, 2º ano, participei das
4 horas como era antigamente. Agora que aumentou a carga horária.
[…] Desde muito pequeno, quando vim para cá, a gente começou a
conhecer um pouquinho sobre a história. Quando os professores
falavam isso em sala de aula. Pouco a pouco fui interagindo nessa
questão do que é a Escola Salesiana em seu todo, como ela nasceu.
Fui um dos integrantes dos escoteiros salesianos. Então, essa
história começa desde muito tempo atrás. Entrei na escola tinha 6
anos e hoje estou com 42 anos de idade (D2, E 19/10/2012).
D3 de gênero feminino, vinte e oito anos, tendo dez anos de
envolvimento com a instituição salesiana. Apresentou, na entrevista, um quadro
panorâmico de seu entendimento sobre os princípios referenciais salesianos.
Com clareza, a depoente comentou sobre a necessidade de saber relacionar
os princípios referenciais salesianos com a realidade e público atendido no
CPDB. Embora em determinado momento, suas palavras tenham soado como
salvacionistas.
Professora no CPDB faz três anos. Eu comecei a lecionar nos dias de
sábado dando aula para os alunos de Americana que vêm para nossa
escola ter aulas de oficina mecânica. Aí, no primeiro ano, somente
nos dias de sábado. No segundo ano, o professor Innocenzo, deixou
algumas aulas por motivo de carga horária excessiva e eu peguei as
aulas de oficina. No terceiro ano que é esse de 2012, já peguei
disciplinas de cálculo e metrologia. [Pergunto sobre o tempo total de
casa salesiana. E ela:] Fiz faculdade de tecnologia e administração
aqui. Estou aqui há dez anos. Já fui aluna no Unisal. Do CPDB, sabia
de alguns eventos que aconteciam via informação. Já conhecia, sem
antes trabalhar aqui. […] Para mim, vejo Dom Bosco como uma
pessoa que viu uma luz no final do túnel para muitos jovens, porque
os jovens não tinham um caminho. Estava tudo desnorteado. Ele,
com muita persistência, muita perseverança, muita calma, conseguiu
trazer essas crianças e jovens que estavam perdidos. Pode dar uma
orientação. Pode dizer: estou aqui, eu te ajudo. Você precisa de mim,
estou aqui. Você está indo para um caminho errado (D3, E
07/11/2012).
D4 de gênero masculino, cinquenta anos, com trinta anos de vivência e
trabalho salesiano. A entrevista é permeada por palavras que manifestam o
sentido de pertença e paternidade com os jovens. Comentou sua percepção
151
sobre a estrutura salesiana e a aplicação real dos princípios referenciais
salesianos no CPDB.
[Pergunto quanto tempo está trabalhando na ‘casa’ salesiana. E ele:]
na casa, 20 anos na escola São José e Unisal. CPDB, 2 anos. Como
aluno, se contar o tempo de aluno do Liceu, desde 1982, depois
aluno da FASTEC. No liceu, no colégio técnico e depois aqui a
FASTEC. Já faz um tempão, um bom tempo. [Pergunto sobre o
procedimento de contratação para o setor CPDB. E ele:] Fui
contratado pela escola São José, depois fui para a ETEC-UNISAL,
uma época que desmembrou o colégio técnico do ensino médio.
Agora voltei para o São José por conta dos cursos técnicos de
Informática. O coordenador Reinaldo precisava de alguns professores
de informática em específico. Foi quando vim para cá (D4, E
31/10/2012).
D5 de gênero masculino, quarenta anos, com trinta e seis anos de
vivência e trabalho salesiano, desde o período de aluno até os dias de hoje
como professor no CPDB e Unisal. Sua história de vida está fortemente ligada
aos salesianos. Do início ao fim da entrevista, mencionou euforicamente os
nomes de salesianos que fizeram parte de sua história de vida. Sua vivência e
conhecimento
salesiano
aparentaram
ser
profundos,
embora
tenha
manifestado forte tendência em traduzir os princípios referenciais salesianos
como sendo salvacionistas.
Tenho 40 anos. Eu estudei aqui desde o pré na escola São José. Fui
aluno do São José desde o pré. Formei-me aqui. Fiz o curso na
ETEC na época que funcionava o curso técnico e médio junto. Depois
disso comecei a trabalhar aqui dentro. Fui monitor aqui e depois
comecei a ser professor do curso técnico. Nesse meio tempo, eu tive
contato com o pessoal do CPDB há muito tempo, mas, eu não
lecionava para eles. Por que eu não lecionava para eles ainda?
Porque no curso do CPDB antigo [...] nessa nova reformulação que
houve, entrou agora o curso de informática. Antigamente, eles tinham
o curso de mecânica, curso de elétrica, desenho técnico, não era
minha área. Faz dois anos que estou trabalhando junto ao CPDB,
mas, de casa, aqui, como profissional sou da (sic) UNISAL desde
1999. Na escola São José, estou desde 1990 na condição de
professor. [Pergunto quanto tempo está na instituição somado o
período de aluno. E ele:] em 1989 me formei na ETEC. Como aluno,
entrei aqui com cinco anos e meio, pois, faço aniversário em junho. O
ano foi 1977 (D5, E 24/10/2012).
D6 de gênero masculino, cinquenta e seis anos de idade, com quarenta
e um anos de vivência e trabalho salesiano. Demonstrou profundo sentimento
de pertença e agradecimento à instituição salesiana por tê-lo acolhido como
aluno em seus inícios de vida e estudo.
[Pergunto quanto tempo está trabalhando na casa salesiana. E ele:]
Há bastante tempo. Comecei em 1972. Aí, acho que fui até 1985. Saí,
152
fiquei uns sete, oito anos fora. Voltei em 1993. Estou até hoje.
[Pergunto se foi aluno na casa salesiana. E ele:] Sim, fui aluno aqui
na casa salesiana. Comecei aqui na primeira série, antigo primário.
Fiz até a quarte série. Depois tinha a admissão. Fiz o ginásio
industrial. Consistia em parte prática em um período e no outro as
aulas acadêmicas. Estou com 56 anos. Comecei com 7 anos aqui na
primeira séria, mas antes dos 7 anos, eu frequentava o Liceu Nossa
Senhora Auxiliadora como oratoriano. Ia toda noite para participar da
boa noite. Aos finais de semana eu participava da missa e jogava
futebol. Depois disso, vim para a escola São José começar os
estudos na primeira série. Deixei o Liceu e passei a ficar somente no
São José. Conhecia a presença dos salesianos desde pequeno (D6,
E 18/10/2012).
A caracterização geral dos depoentes e o teor das respostas
demonstram certa similaridade de ideias, como tempo de envolvimento e
sentido de pertença na comunidade salesiana, embora se saiba que cada
realidade e história sejam únicas. Tendo presente as categorias de ambos os
gêneros, idades diferenciadas e tempo de vivência, conhecimento e trabalho
salesiano, serão escritos e comentados os depoimentos das três questões
semiestruturadas.
Tendo perguntado na questão número um aos depoentes sobre a figura
de Bosco, D1 demonstrou apreço e afeto à sua, destacando sua dimensão
religiosa e racional como religioso, sacerdote e educador. Sua pertença e
adesão à proposta educativa salesiana tem reflexos nos âmbitos pedagógico e
religioso, favorecendo, por um lado a busca de atualização e conhecimento
sobre a pedagogia salesiana, mas, por outro, correndo o risco da
generalização, e queda em um discurso salvacionista.
Nossa, me arrepia, fico até muito emocionada, porque para mim,
Dom Bosco é tudo. 22 anos de conhecimento, encontro e de
admiração com ele. Por todas as bênçãos recebidas e por ser uma
pessoa além de santo, ser uma pessoa que deu sua própria vida em
doação daqueles meninos. Já assisti aos filmes de Dom Bosco
muitas vezes e tenho uma admiração profunda. Tenho uma
comunhão com Dom Bosco, peço a intercessão dele a Jesus Cristo,
sendo esta a de agradar o jovem, fazer o jovem pobre feliz. […] Dom
Bosco era a pessoa que casava a razão com a religiosidade na
condição de sacerdote, mas, era um ser humano e, como ser
humano, tinha a temperança, o amor incondicional, o amor ágape por
aqueles jovens. […] Na casa salesiana, não é possível, de professor
e aluno não conhecerem a pessoa tão especial e tão maravilhosa que
era Dom Bosco, bem como o método de educação preventiva de
Dom Bosco. Um método que para mim é inigualável. Conheço muitos
outros, já estudei, já vi, já comparei (D1, E 10/10/2012).
D2 relatou sua história com relação a Bosco. Seu contato com ele
começou ainda pequeno, ao ser convidado por um salesiano para participar de
153
um grupo de escoteiros. Em sua juventude, ao aprofundar seus estudos
técnicos e profissionais na antiga Faculdade Salesiana de Americana, hoje
UNISAL, permitiu-lhe um contato mais sistemático. E, finalmente, aprofundou
mais os valores humanos e sociais de Dom Bosco ao se integrar no corpo
docente do CPDB, em 1977.
O depoente manifestou sua intuição de creditar a Bosco a influência, em
determinados momentos de sucesso e felizes de sua vida, numa perspectiva
devocional, atribuindo-lhe sua ascensão social pelo estudo e pelo trabalho e
sua união conjugal feliz. Acredita que seu rompimento com o trabalho na
indústria para inserir-se na área educacional escolar salesiana, pode ser
compreendido como resultado
sua
vivência
salesiana
na infância e
adolescência.
Passei a conhecer Dom Bosco, a partir do salesiano padre João Dec,
quando fui escoteiro. Depois, lá em Americana, na escola salesiana,
fui entendendo um pouquinho da história, como as coisas foram
acontecendo. […] Tinha a intenção de continuar meus estudos, fazer
a faculdade. Acabei voltando para Americana. Na época, abriu a
faculdade lá e fiquei cinco anos em Americana. Nesse meio período,
trabalhei em outras empresas, mas, o que acontece: por todas as
empresas que passei, a minha grande vontade, meu grande desejo
sempre foi a área educacional. Era passar, transmitir conhecimento
que adquiri na vida para outras pessoas. Por que dentro da empresa,
onde você está acostumado com produção, máquinas, peças, eu me
sentia mais um parafuso, uma máquina, como se fosse um número a
mais para essa empresa e, então, o que eu estaria fazendo de bom
para outra pessoa, se eu só estou produzindo parafuso ou
trabalhando com equipamentos? Enfim, eu queria juntar esse meu
conhecimento e transmitir para outras pessoas. […] Aí deu certo de
eu ficar sabendo de uma vaga na escola, porque tinha conhecimento
de alguns professores que trabalhavam aqui. Um professor que
trabalhava aqui, um grande amigo meu, falou assim para mim: Está
precisando de um professor lá. Ele já sabia que eu tinha muita
vontade de dar aula, principalmente para esse tipo de clientela nossa
aqui. Foi de 1997 para 1998. Foi um grande marco na minha vida. Foi
no ano que veio meu casamento. Conheci minha esposa em
Americana. Às vezes costumo brincar que santo casamenteiro é Dom
Bosco, não é santo Antônio (D2, E 19/10/2012).
D3 apresentou a figura de Bosco numa perspectiva solidária,
assistencial e educativa. Embora tenha menos tempo de envolvimento
salesiano que os demais docentes, sua compreensão sobre Bosco parece ser
ampla e atualizada. Neste sentido, o pesquisador percebe certa similaridade de
informações entre as técnicas de entrevista aberta, técnica de questionário e
154
observação participante com destaque para os vocábulos: companheira,
afetuosa e compreensiva.
Quando a pessoa caía, ele apoiava e não o crucificava. Ele levantava
e mostrava o caminho. Então, vejo que Dom Bosco foi uma pessoa
que veio, não somente na época que veio, porque vai fazer 200 anos
atrás que veio, mas, desde quando ele veio até hoje, isso precisa.
Que sempre esteja ali, erguendo, sustentando. É como se fosse o
alicerce da casa, porque não adianta ter uma casa bela, bonita se
você não tem um alicerce bem feito. Ela vai cair. Então, vejo que Dom
Bosco dá esse alicerce para os jovens. Por mais que eles estejam
erguendo as casas erradas, ele vai falar: espere meu filho, venha cá,
vamos reestruturar esse alicerce, vamos pegar esse caminho, porque
senão teremos tal problema. […] Ele deu o apoio, não os crucificando
e sim auxiliando. Deixava que caíssem, mas, os levantava. Mostrava
caminhos. Não criticava, pois, a maioria das pessoas, hoje em dia
são (sic) assim, criticam, crucificam e colocam a culpa nos outros.
Não deve ser assim. Dom Bosco dizia: Você está errado por causa
disso, disso e disso. É isso o que a imagem dele reflete para mim,
uma pessoa reestruturada (D3, E 07/11/2012).
D4 apresentou sua compreensão sobre a figura de Bosco de forma
objetiva, destacando suas capacidades empreendedoras e de conselheiro dos
jovens. Com conhecimento atualizado e profundo sobre ele, respondeu a
questão com simplicidade, colocando-se dentro da resposta. Seu otimismo ao
referir-se a Bosco surpreendeu o pesquisador.
A pessoa de Dom Bosco significa muitas coisas, existem muitos
significados na imagem dele. Acho que o principal mesmo foi ser
empreendedor. Preocupado com os jovens. Ele deu a vida pelos
jovens. Ele negou sua própria vida. Não tinha uma vida própria que
permitisse fazer o que queria a exemplo de qualquer um de nós.
Abriu mão disto tudo para cuidar e orientar os jovens. […] Hoje
tentamos fazer um pouquinho, um pedacinho do que ele fez.
[Pergunto sobre a fonte de conhecimento de tais conclusões
afirmadas acima. E ele:] Acho que por um pouco de cada: estudo,
livros, vivências salesianas. Isso aí. Os ensinamentos dos salesianos
dando exemplos, fazendo, conversando, etc. Nós adquirimos um
pouco disso. Faz-nos sentir parte deste processo diferenciado de
educação (D4, E 31/10/2012).
D5 comentou de sua relação de amizade com alguns salesianos em seu
período de infância e adolescência. Pôde aprender e integrar os princípios
referenciais salesianos a partir da convivência direta com esses religiosos
educadores. Respondeu, todavia, a pergunta sobre Bosco de forma indireta,
valorizando as qualidades dos salesianos de outrora e não definindo
objetivamente o que representava para ele a figura de Bosco.
Dom Bosco foi um cara que podemos chamar assim, que participou
muito de minha vida e participa até hoje. Então, onde (eu) vivia (a
figura) de Dom Bosco? Eu vivia no dia a dia aqui. O maior
155
incentivador de Dom Bosco era o salesiano irmão Alcides. Tive um
contato muito próximo com ele. Ele era muito próximo dos alunos,
principalmente do grupo do setor infantil. Crescemos com ele. Havia
também o salesiano irmão Godoy. Aprendi a jogar xadrez com esse
salesiano. Infelizmente não participa de nosso meio, mas, foram
pessoas que nos envolveram e com certeza aqui sempre foi minha
segunda casa. Muitas vezes a primeira, pois, vivemos mais aqui
dentro do que fora. O que a imagem de Dom Bosco me traz hoje? Me
traz uma tranquilidade, inclusive, há uma brincadeira de que eu e
outro professor do CPDB parecemos com os dois meninos em forma
de estátua ao lado da estátua de Dom Bosco na praça central do
colégio (D5, E 24/10/2012).
D6 destacou o aspecto empreendedor e social de Bosco que se
materializara na ajuda direta e em incentivar o estudo e buscar trabalho para
jovens em situação de vulnerabilidade social. Aos olhos do pesquisador, tratou-se de uma descrição genérica de Bosco.
Foi um educador que tinha uma visão bem para o futuro, embora
tenha enfrentado bastante dificuldade na época, pois, era um cara
que tinha uma visão do que poderia fazer para a juventude no futuro.
A juventude na época já precisava bastante dele, mas, ele não
somente pensou na situação do momento, e, sim nas condições do
futuro. Prova disso são as obras salesianas que cuidam dos jovens,
da educação, da profissionalização. Tudo isso é reduto de um cara
que teve uma visão além do momento. Para frente mesmo. Para
séculos na frente, não somente ali naquele momento histórico (D6, E
18/10/2012).
Percebeu-se que há similitudes no modo de compreender a figura de
Bosco pelo apreço e respeito manifestado nos depoimentos, embora não sejam
consensuais.
Perguntados na questão de número dois sobre as características
salesianas mais evidentes e significativas no CPDB, D1 comentou que os
lanches para a alimentação dos alunos no momento do intervalo são fornecidos
pela Escola Salesiana São José. Desenvolveu também o tema do chamado
“bom dia e boa tarde”, tratando-se de um momento de acolhida dos alunos por
parte da equipe pedagógica no início de cada período de aula. Os elementos
“comida” e “acolhida” retratam uma visão assistencial e social da instituição. Há
também no discurso de D1 uma carga emocional de realização pessoal em
suprir as necessidades básicas dos alunos. Em síntese, a depoente
apresentou-se religiosa e com sensibilidade ao público atendido.
Uma característica muito forte são os lanches que são dados aos
meninos. Os ambientes acolhedores são muito bons. […] Vejo essas
coisas muito presentes, mas, o bom dia e boa tarde são
156
características fortemente salesianas e fundamentais no CPDB. Acho
que isso ajuda a atrair o jovem a conhecer Jesus Cristo, levar Dom
Bosco ao jovem. Ele não conhece, não tem como participar, ele faz
dois cursos. O menino é de ouro, embora brinquem, fiquemos bravos
com eles, mas, faz dois cursos, imagina. Pode acontecer de ele vir a
ficar fumando maconha na rua, de roubar, de buscar o caminho mais
fácil. Então, estamos trazendo esse aluno aqui dentro, dando todas
as chances possíveis. Ajude-me professora, estou te ajudando filho.
Já te dei um trabalho valendo nota de 07 a 10 pontos (D1, E
10/10/2012).
D2 manifestou sua preocupação e estima pelo público de jovens
atendidos no CPDB. Preocupação justificada pela realidade de vulnerabilidade
social onde vivem e que os torna frágeis para descaminhos, mas que pode ser
amenizada pela construção de estima e amizade com os educadores
construídas durante o curso. Afirmou ainda que o CPDB sinaliza e aplica os
princípios referenciais salesianos, embora o pesquisador tenha observado e
entendido que estes princípios salesianos, nas palavras do depoente, tenham
sido reduzidos à preocupação com o trabalho e inserção no mercado de
trabalho. A ênfase no discurso de inserção no mercado de trabalho e não em
outros aspectos da Pedagogia Salesiana pode ser entendida pela ausência de
profundidade de D2 sobre a pedagogia salesiana.
Bom, primeiro que no nosso setor CPDB é um setor que realmente
atinge diretamente o propósito da pedagogia salesiana de Dom
Bosco que é a questão da preventividade. Os nossos alunos que de
repente não têm oportunidade no mercado de trabalho por uma
questão social, que já vêm com certa deficiência onde os pais não
têm um poder aquisitivo satisfatórios ao ponto de poder pagar uma
escola particular, onde esse aluno de repente, ou esse jovem que
está em casa e justamente pela casa e falta de recursos na família,
acaba buscando esse recurso de maneira ilícita ou talvez por algum
emprego que podemos chamar de subemprego. De repente, esse
jovem não consiga se potencializar e estudar, crescer
profissionalmente e possa no futuro ficar na condição de um
subemprego para o resto da vida. Então, esse recurso, essa dinâmica
que o setor pode disponibilizar para esse tipo de aluno, tipo de
clientela é fundamental, porque ele pode se profissionalizar sem o
custo, porque nossa escola, ao menos neste setor, há uma
gratuidade ao aluno. Fazer esse aluno crescer, se profissionalizar,
conseguir um emprego de melhor qualificação, e com isso, conseguir
realmente dar toda oportunidade que qualquer outro jovem de classe
média, classe alta poderia ter, não somente na questão profissional,
mas, na questão social, educacional, toda política salesiana do bom
cristão e honesto cidadão, conforme sempre colocamos nas
entrelinhas, mas é isso mesmo. Talvez seja o setor de enfoque
mesmo (D2, E 19/10/2012).
D3 apresentou uma síntese dos referenciais salesianos a partir da
vivência de trabalho e relação de amizade com os alunos no CPDB. Destacou
157
a característica do acolhimento, presente na ação educativa dos educadores
docentes. Partiu de sua sensibilidade pelos alunos, revelando suas
características de conselheira e educadora que compreende a proposta
pedagógica salesiana.
O acolhimento. Acho que é o acolhimento. Porque se você pegar
algumas fichas de alguns alunos, são pai e mãe que abandonam, é a
avó que cria. São pais que estão presos, são pais que usam drogas,
estão envolvidos com o tráfico de drogas. Na maioria dos casos é
avó, tia, amigo que cuidam. Então, acho que no CPDB se evidencia
uma característica forte de acolhimento. Porque não adianta o aluno
tirar nota dez nas provas se o psicológico dele está abalado. Não
adianta o aluno vir para a aula, se este mesmo aluno não tem
interesse em ser ajudado. Então, acho que esse é o perfil aqui no
CPDB, de alunos que têm problemas, deficiências estruturais para
uma vida de qualidade. O CPDB trabalha com a amorevollezza, a
demonstração de carinho aos alunos para que eles percebam que
não estão sozinhos e perdidos. Que percebam que estão em um
lugar que há como prevenir o problema de cada um. Há como acolhê-los com muito amor. Assim, as coisas mudam. Então, penso que o
CPDB é mais carinho e maior do que tecnológico em si. O
tecnológico vem depois, com o decorrer. O carinho, penso ser maior
e mais necessário (D3, E 07/11/2012).
D4 creditou à instituição salesiana o trabalho benemérito de ajuda aos
jovens desprovidos de melhores condições de vida por falta de trabalho e
estudo. Manifestou seu sentimento de pertença ao projeto salesiano de
proporcionar formação humana e salesiana para além da Educação
Profissional. Em síntese, a característica salesiana de destaque em suas
palavras foi a “orientação” em seu sentido existencial e profissional. No CPDB,
segundo D4, a coordenação pedagógica e equipe de docentes orientam e
aconselham os alunos com conversas amigáveis, a partir de suas experiências
de estudo e trabalho.
O elemento salesiano mais presente no CPDB é proporcionar uma
orientação, um novo caminho, sendo até um único caminho a jovens
carentes que não teriam e poderiam pagar um curso técnico e
profissionalizante. Então, acho que a formação, mesmo do jovem,
sempre foi a preocupação com os mais carentes por parte de Dom
Bosco. A formação favorece uma oportunidade a ele. [Pergunto sobre
o que significa estar e pertencer ao CPDB na condição de professor
de um público diferenciado. E ele:] Estar aqui, trabalhar aqui, fazer
parte desta obra, para mim é um privilégio. É uma oportunidade que
tenho de contribuir com a formação desses jovens. Não deixar que
ele fique na rua sem opção e se entregue a outras coisas que façam
mal a ele. Então, pensando na condição de cidadão e ex-aluno,
entendo que é sempre bom pôr em prática o que aprendemos e
temos de vivência (D4, E 31/10/2012).
158
D5 apresentou um quadro amplo de características salesianas presentes
no CPDB, dando destaque à “acolhida” como principal expressão da pedagogia
salesiana no setor. Característica que se remete à atenção, ao esforço e
trabalho da equipe pedagógica em proporcionar aos alunos, condições de se
sentirem pertencentes a instituição salesiana. Enfatizou o trabalho da equipe
pedagógica composta pelo coordenador, assistente social e professores
comprometidos com o processo pedagógico do setor, não apenas como
profissionais, mas motivados pelo comprometimento com a Pedagogia
Salesiana.
Há mil e uma qualidades de Dom Bosco. Eu vou falar o seguinte. O
principal no CPDB acho que é a acolhida. A gente pode perceber, por
exemplo, o que Dom Bosco fazia com aquelas pessoas, aqueles que
estavam brigando. Eram ovelhas desgarradas e perdidas. Um
querendo brigar com o outro. Ele acolhia esse pessoal. Acho que a
imagem do CPDB é justamente essa, uma imagem de acolhida. Não
é à toa que é interessante frisar que muitas vezes esses alunos vêm
perguntar para mim: vocês não faltam aqui? Porque na escola deles
dá a impressão que um professor não vai e tanto faz, tanto fez se foi
ou se não foi. Se deu aula, se não deu. Então, temos o compromisso,
mas, não somente com a aula, mas com o aluno como pessoa. Não é
só esse negócio de dar aula. Por exemplo: tem um aluno faltando, o
que está acontecendo com ele? Então, esse comprometimento no
CPDB, essa acolhida realizada é o que mais me chama a atenção em
Dom Bosco. Existem muitos elementos, mas, o principal que vejo é
esse ponto de acolhida expresso na ação de muitos professores,
coordenador e assistente social. Chamam o aluno para conversar,
também os pais. Aqui os alunos são mais próximos. Aqui eles não
pagam, é um curso gratuito. Eles dão um hiper valor. Quanto aos
professores, os alunos os vêm como uns pais, com um forte carinho.
Esse cara aí, vou seguir porque são pessoas boas, acredito eu (D5, E
24/10/2012).
D6 destacou a amizade e o respeito entre os educadores, gerando nos
alunos uma atitude de confiança. Suas palavras revelam a compreensão dos
princípios referenciais salesianos como pano de fundo da Educação
Profissional e humana desenvolvida no CPDB.
Acho que são a amizade e o respeito, tanto entre os professores,
educadores, coordenação e, principalmente, com os alunos. Saber
respeitar o aluno, ser amigo do aluno sem ser aquele amigo que
encobre algo errado, mas, o amigo que participa da formação do
aluno. Ele te respeita e sabe que pode confiar. Acho que esse
respeito e essa amizade que podem provocar todo esse movimento
com os alunos de querer participar do CPDB e querer ter uma
profissionalização. Por consequência disto aí, há uma vida humana
cristã alinhada com o tempo (D6, E 18/10/2012).
As questões um e dois abordaram a figura de Bosco e as características
da Pedagogia Salesiana presentes no CPDB. Havendo similitudes, no modo de
159
compreender alguns aspectos da figura de Bosco, bem como a visualização
das características salesianas no setor. Salta-nos aos olhos, os dados obtidos
na categoria gênero que apontou elementos de dimensão afetiva com razoável
carga emocional na relação aluno e professor para o gênero feminino e
elementos da dimensão social como trabalho para o gênero masculino.
Entende-se que há um ranço de história e tradição enraizado nos docentes
quanto à configuração social dos gêneros: o homem se preocupando com o
espaço público e a mulher com o privado.
Na questão três, perguntou-se aos depoentes sobre sua vivência e
aplicação dos princípios referenciais salesianos na prática docente. Esta
questão, por exigir informações diretas e concretas da prática docente e sua
relação com os referenciais salesianos, fez com que os depoimentos se
ampliassem em volume.
D1 comentou com entusiasmo sobre seu trabalho no CPDB. Percebe-se,
em suas palavras, a junção de elementos pedagógicos e salesianos como
exigência do processo de ensino e aprendizagem. Apresentou sua situação no
setor como profissional, sendo professora voluntária por opção. Dedica-se ao
projeto educacional salesiano pelo princípio de solidariedade. A partir de suas
habilidades profissionais exerce a função de educadora.
Com certeza. Foi para isso que vim aqui. Só para isso. Foi
intencionalmente trabalhar como voluntária mesmo. Quero ser isso,
enquanto tiver vida e Deus me deixar fazer isso, levar Jesus Cristo a
eles e levar salesianidade acolhedora, amorevollezza. Meu negócio é
trabalhar com o amor. Pode perguntar a quem quiser. Vivo abraçando
esses jovens, agrado e faço carinho verdadeiro, natural. Porque é
realmente o que sinto. Os amo demais. Dias de quarta-feira venho
três vezes à escola. É um dia de sacrifício. Venho de manhã, de tarde
e de noite, por causa do CPDB, de coração e gosto. Agradeço isso
todos os dias de minha vida. Ter essa oportunidade de poder trazer
Jesus Cristo, poder trazer essa salesianidade, mostrar Dom Bosco.
Puxa, esta professora é assim, assim e assado. Ela me proporciona
isso. Mostro o carisma, o agrado, o carinho, a acolhida de Dom
Bosco. Acho que faço isso sim, não estou tentando, estou fazendo, e,
muito claramente. Percebo e sinto-me muito amada. É o que Dom
Bosco dizia: você dá amor, você só recebe amor, no olhar, no abraço,
em todas as condições. É entendê-lo e ser entendido. Agora, com
relação à própria disciplina do inglês, é muito difícil para eles. Eu
estou sabendo que é difícil para eles devido ao meio de vida. A
história que trazem não favorece a aprendizagem. Então, o
coordenador colocou a gente dentro de um laboratório lindo. A gente
tem todas as condições de trabalhar com a máquina, com os
vocabulários, dicionários, textos, temos tudo lá dentro. É uma
oportunidade a mais. Não deixo que coloquem um lixinho no chão.
160
Estou sempre cobrando para que peguem o lixinho, para que não
percamos o direito de usar o laboratório. Deixar limpinho. Insisto em
que desliguem as máquinas, os monitores, que prestem atenção em
tudo, que existem regras, existem métodos a serem seguidos. Temos
conseguido melhorar. O amor de Dom Bosco está sendo vivido e
demonstrado, mas, sinceramente, o conteúdo de inglês está bem
baixo. Eles têm muita dificuldade (D1, E 10/10/2012).
D2 apresentou um quadro de características salesianas bastante
amplas. Demonstrou, contudo, dificuldade em pormenorizar a relação dos
referenciais salesianos e sua prática docente. Para o pesquisador, subentende-se que o depoente tenha optado por mencionar os elementos salesianos
teóricos como resposta do que o mesmo, possivelmente, aplica e pratica no
CPDB. Hipótese não manifesta diretamente. Outra hipótese sobre a dificuldade
de D2 em pormenorizar a relação dos referenciais salesianos e sua prática
docente pode ser a de que, embora tenha mencionado algumas características
salesianas, não domine os conceitos da Pedagogia Salesiana, dificultando
essa relação de teoria e prática. Além de se poder pensar que o intérprete já
tivesse compreendido e julgado suficiente a resposta dada.
Não necessariamente você precisa colocar o nome de Dom Bosco no
meio das coisas. O sistema preventivo é independente de Dom
Bosco. Acho que quando você trabalha com o jovem, mostra para ele
o caminho certo, como as coisas devem ser, quando ele está ali,
prestando atenção no que você faz, já estamos aplicando o que Dom
Bosco fez. Você não precisa levar o nome dele, embora sempre o
façamos de alguma forma. O que precisamos estar fazendo é isso,
constantemente, trabalhando nossos próprios conceitos, nossa
perspectivas, vendo onde estão nossos erros, e, tentar melhorá-los.
Então, a gente tem que ser efetivo nessa parte, cada vez mais (D2, E
19/10/2012).
D3 comentou de sua história como professora quando foi contratada
para ministrar aulas no CPDB. Revelou certa mudança de compreensão sobre
o ato de educar diferente da sua concepção anterior de avaliar os alunos de
acordo com o desempenho em notas e comportamento. Manifestou otimismo
com seu trabalho de docente. Em seu depoimento demonstrou fortes
elementos da Pedagogia Salesiana. Como hipótese pode-se pensar que as
informações e prática pedagógicas manifestadas pela depoente sejam
originárias de suas convicções e características pessoais, tendo sido lapidadas
no seu processo de formação e capacitação salesiana após sua contratação.
Formação esta ampliada pela experiência do cotidiano aliada à sua já
mencionada capacitação quando de sua contratação.
161
No começo que peguei as turmas, tive bastante dificuldade. Então, eu
olhava com um olhar padrão. Todo aluno bom deve tirar notas 10, 9,
8 e acabou. Aí, comecei a perceber que não é assim. Havia alunos
que tinham certa dificuldade, e, precisamos auxiliá-los. Há aluno que
na prova escrita merece nota 6, mas, pela dedicação que está tendo
em aprender, este quadro passa a valer uma nota 8 e não mais nota
6. Então, faço assim, não observo cada aluno de forma pontual,
observo cada aluno em suas particularidades. […] Já aconteceu
comigo umas 3, 4 vezes de chegar à sala de aula para aplicar prova e
de 2, 3 alunos se aproximarem e partilhar alguma situação complexa.
Devido tal situação, cancelo a imediata prova e transfiro para a
próxima aula. Tem alunos que no dia de prova, eu mudo de lugar
para que fiquem mais próximos de mim. Passo no lugar e digo: olhe,
acho que este raciocínio não está muito bom. Não digo que está certo
e nem errado. Dou essa dica porque ele está tão nervoso que trava a
mente. Então, se não houver uma compreensão e atenção com esse
aluno em fazê-lo aprender e se dedicar, pelo contrário, não será a
ferro e fogo que ele vai aprender. É necessário ir com jeitinho,
dobrando de um lado, dobrando de outro. Sim, exercícios são
necessários. Mando listas e listas para praticar. Na matemática é
necessário praticar para aprender. Mas, se não houver carinho e
compreensão, não caminha. Em conversa, às vezes digo a um: hoje
seu comportamento não foi bom, fiquei triste com o que você fez.
Você demonstra para a pessoa que você ficou triste. Cheguei para
um aluno e disse: Hoje estou triste com você. Você não colaborou
com a aula, não fez a lição, fiquei triste porque você não é um aluno
assim. Então, ele viu que simplesmente não é a nota que está
influenciando na relação, é o ato de eu ficar triste. Indo com carinho e
amor, o aluno se abre e se modifica. […] Um exemplo é que casei
recentemente e teve aluno que veio trazer-me um guardanapo de
presente. Teve gente que disse; mas, um guardanapo? Só que foi de
coração. […] É isso que importa. Se fosse um aluno do colégio
normal, não sendo o CPDB, você acha que ia surgir um guardanapo
de presente para uma professora? Não ia. Então, isso é o amor que
circula. Se você tem amor pelos alunos, estes retribuem. Quem
planta amor, colhe amor. Quem planta tempestade, irá colher
tempestade (D3, E 07/11/2012).
D4 comentou como entende e aplica os referenciais salesianos em sua
prática docente. Argumentou da qualidade e abrangência de viver em sua
integralidade suas convicções e princípios, pois, quando isso é percebido pelos
alunos, o professor torna-se referência e crível como educador. Exemplo citado
pelo depoente consiste que, em dias de festa na Escola São José, os alunos
veem os professores com seus familiares. Ficam admirados por visualizar
como se respeitam e se querem bem, fator que credita a figura do docente
como educador. Por outro lado, uma vez tendo recebido o crédito moral de
educador digno pela visibilidade dos atos tidos como corretos, pode ocorrer
que este educador, se falhe, gere decepção nos seus educandos.
Acho que essa transmissão se dá automaticamente. Nós não ficamos
a todo tempo citando e falando de Dom Bosco, mas, acredito que
pela atitude de educador, não somente minha, mas de todos que
trabalhamos aqui, a gente acaba transmitindo a estes jovens toda
162
essa bagagem que temos de aprendizado em Dom Bosco. Acho que
a transmissão e vivência não se dá (sic) somente aqui dentro, mas
também no convívio familiar nosso em casa. Porque eles, os jovens,
sempre me perguntam algo. Vêm a gente nas festas das escolas.
Vêm nossos filhos, a forma que são tratados. Nós, professores,
naturalmente fazemos isso, tanto em ambiente de sala de aula como
pátio e nas festas. O principal elemento salesiano é o estar junto. O
estar junto, participar, ouvir, também cobrar, colocar um limite, uma
luz para ser seguida. Então, o principal é isso (D4, E 31/10/2012).
D5 descreveu a maneira como aplica e alinha na sala sua prática
docente com os referenciais salesianos. Por meio de relação de amizade, o
educador exerce influência positiva ao aluno, favorecendo com que este se
interesse e se esforce em aprender o que o educador considere como
necessário, tanto conteúdos programáticos como experiências em atividades
extracurriculares oferecidas pela Escola.
Acho que é a maneira de você tratar o aluno. É a conversa que você
tem. Quando você não tem a barreira professor – aluno, você estoura
essa barreira. O aluno deixa de ser aquela pessoa que só te olha
como professor e começa a te ver como um companheiro, um cara
que quer passar uma informação para você. Acho que o jeito que se
entra em sala de aula, a maneira como se fala, se expressa, é uma
forma de conquistar o aluno no bom sentido. Então, você conquista o
aluno e traz o aluno para perto de você, você faz o que quiser. Quem
que não aprende quando está com alguém que se gosta? Ou é
preferível estar com alguém que não se gosta para aprender? Com
certeza, há esta afinidade. Você tem afinidade. Tornam-se pessoas
boas, mais próximas umas das outras. E a gente vai andando bem.
(D5, E 24/10/2012).
D6 demonstrou segurança e convicção em suas palavras. Comentou de
sua formação salesiana desde sua educação básica, que continua e se
aperfeiçoa como professor remunerado. No depoimento, demonstrou-se
atualizado. Por meio da observação participante e do questionário, porém tais
conceitos não se alinharam à entrevista. Entende que há dificuldade de pôr em
prática os conceitos e referenciais salesianos.
Acho que é esta amizade, respeito, o posicionamento, o jeito de ser.
Não ser um jeito que não condiga com sua vida normal. Você não
está sendo um artista, interpretando. Você é aquilo que você
aprendeu a ser. Como já fui aluno salesiano, então já vivenciei o
espírito salesiano, espírito de Dom Bosco desde os 7 anos, até um
pouquinho antes. Então, toda essa formação é a minha postura hoje
em dia como professor. Lógico que aprimorando o que a gente vem
aprendendo, mas a postura tem que ser essa daí. Não tem como
mudar. Se você se engajou nisso, temos isso nas veias. Faz parte da
sua vida, do seu cotidiano. É isso que procuro transmitir para os
alunos (D6, E 18/10/2012).
163
A entrevista aberta dificulta estabelecer um parâmetro preciso de
comparação, exigindo do pesquisador a interpretação dos conteúdos e
realizando aproximações das informações coletadas. As ideias e falas dos
depoentes que convergem e divergem entre si, não foram pontuadas em uma
perspectiva quantitativa, mas qualitativa por estarem localizadas em momentos
variados nas questões. Os elementos convergentes e divergentes foram
expressos de maneira não organizada.
Os depoentes apresentam certas semelhanças no conhecimento da
Pedagogia Salesiana na história, desde os tempos de Bosco até o momento
presente
no
CPDB
como
professores
remunerados.
Os
depoentes
apresentaram conhecimento e experiência de trabalho e vivência salesiana,
embora cada um tenha diferente “tempo de casa” e vivência salesiana. Como
exemplificado no quadro quatro de categorias de análise dos depoentes, sabe-se que todos os educadores entrevistados têm significativo “tempo de casa”:
D1 com 22 anos; D2, 34 anos; D3, 10 anos; D4, 30 anos; D5, 36 anos e D6, 41
anos. Esses números mostram um caminho de construção de identidade,
baseada num ideal de comportamento, com pouco espaço para se inventar
outras formas de ser e estar, exceto para D3 que tem pouco “tempo de casa”.
A categoria “tempo de casa”, porém, não confirmou a lógica de que isso
representa mais conhecimento e/ou vivência dos princípios referenciais
salesianos. Isto é sinalizado pelo fato que tiveram baixa indicação dos alunos,
sendo convidados ao depoimento pelo critério (3) de baixa referência salesiana
contra alta carga horária. O que confirma que a categoria “tempo de casa” não
deve ser absolutizada.
Os depoentes convergem quanto ao modo como se colocam na
entrevista. São profissionais capacitados e generosos, buscando atender esses
jovens desprovidos de condições básicas para inserção social com qualidade.
A homogeneização de base conceitual sobre a Pedagogia Salesiana apresenta
diversificação na ordem prática do cotidiano, ou seja, os docentes aplicam, de
formas diversas, os princípios referenciais salesianos.
Os depoimentos tiveram como ponto de partida o público atendido. No
entanto, analisando expressões, palavras e gestos dos depoentes com relação
164
ao público atendido, por meio da categoria “ambos os gêneros”, percebe-se
que D1 e D3, do sexo feminino, desenvolveram um discurso mais afetivo,
emocional e de pontuação direta na relação de amizade com os alunos,
expressando carinho, atenção e compreensão que se afinam aos princípios
referenciais salesianos.
Na análise de conjuntura das técnicas aplicadas, sendo observação
participante, questionário (quali – quanti) e entrevista aberta, D1 e D3 foram os
depoentes que se destacaram. Com relação ao critério de escolha para
entrevista, enquadram-se no critério (2) de alta referência salesiana com baixa
carga horária.
A categoria de idades diferenciadas também foi considerada como
parâmetro de análise de conteúdo das entrevistas. Evidenciou-se que D4 e D5,
respectivamente, com cinquenta e quarenta anos, não levaram vantagem para
melhor vivência e aplicação dos princípios e referenciais salesianos. Ambos do
sexo masculino e com muito tempo de trabalho e vivência salesiana foram
escolhidos para entrevista pelo critério (1) de alta referência salesiana e alta
carga horária.
As categorias “tempo de vivência, conhecimento e trabalho salesiano” e
“idades diferenciadas” não são determinantes para qualquer qualificação
salesiana dos educadores. Ter mais ou menos “tempo de casa”, ser jovem, de
idade mediana ou avançada, segundo análise de conjuntura das técnicas
aplicadas, não confere ipso facto a integração dos princípios referenciais
salesianos. Neste sentido, evidenciou-se que D1 e D3 com menos “tempo de
casa” são mais influentes e representativos dos princípios referenciais
salesianos. Evidenciou-se também que D3, D4 e D5 de idades medianas entre
28 e 50 anos apresentam alto índice de referência salesiana de acordo com a
técnica questionário e também na análise de conteúdo das entrevistas. A
exceção da categoria “idade diferenciada” se aplica a D2 com idade mediana
de 42 anos que teve baixa indicação dos alunos na técnica questionário, mas
demonstrou conhecimento teórico salesiano e profundo sentimento de pertença
como adesão e entrega na técnica entrevista aberta.
165
A categoria “ambos os gêneros” apresentou um quadro consistente de
elementos e informações confirmando o gênero feminino como mais incidente
em vivência e representatividade dos princípios referenciais salesianos no
CPDB. Consiste no fato de que D1, de sessenta anos de idade, vinte e dois de
“tempo de casa”, e D3, de vinte e oito anos de idade, dez anos de “tempo de
casa”, apresentaram, nas três técnicas abordadas, observação participante,
questionário e entrevista aberta, elementos basilares da Pedagogia Salesiana,
especialmente relacionados à dimensão afetiva e emocional. Diferente dos
demais depoentes, D2, D4, D5 e D6, que, na condição de homens,
manifestaram-se mais resistentes e menos desenvoltos na demonstração
direta de afeto, conformando assim um estereótipo histórico social de que há
divisões de funções por gênero.
Os depoentes, de maneira geral, manifestaram cada um ao seu modo,
sentimentos de carinho e pertença à instituição salesiana. Demonstraram ter
integrado os princípios referenciais salesianos, devoção à figura religiosa de
Bosco e preocupação com o público atendido no CPDB. Revelaram que
provêm de “berço salesiano”, ou seja, procedem de alguma unidade salesiana,
desde a adolescência. Apresentam características salesianas como acolhida,
bondade, amizade, atenção, etc. De forma geral são ideias que procuram
vivenciar no CPDB.
Há semelhanças nas informações coletadas, embora alguns depoentes
difiram na intensidade de adesão e olhar da proposta pedagógica salesiana.
Com exceção de D4 e D5, os demais depoentes tendem a aderir a ela como
salvacionista.
Outro ponto que possui diferenças entre os depoentes são as dimensões
de destaque da Pedagogia Salesiana. D1 enfatizou a perspectiva religiosa; D2,
do trabalho; D3, a orientação e aconselhamento; D4, sua face paterna; D5, a
amizade e D6, a disciplina e responsabilidade. São elementos complementares
e necessários na formação integral do ser humano. Neste sentido, ciente dos
riscos de abordagens unilaterais, também no âmbito pedagógico salesiano, fazse necessária uma revisão pessoal e coletiva das capacidades, propostas e
aplicação pedagógica no CPDB.
166
3.3
Os educadores docentes no CPDB: desafios e
perspectivas
A descrição e análise dos depoimentos permitiram visualizar, com mais
precisão, como são compreendidos e desenvolvidos os princípios e referenciais
salesianos no CPDB. Tratar-se-á neste tópico da análise conjuntural do quadro
docente no CPDB pautado pelos desafios apontados na observação
participante, questionário (quali – quanti) e entrevista aberta. Além da
configuração que o CPDB recebe na esfera da gestão, lida na fala dos
depoentes. Aspectos como rescisões contratuais, relação CPDB e UNISAL
quanto ao compartilhamento de espaços e a concepção de trabalho
assistencial no CPDB.
De cunho historicista, discorreu-se nos dois primeiros capítulos sobre a
história salesiana como um modelo pedagógico legado pelo educador Bosco,
que assumiu para si, ações e comportamentos em âmbito educacional como a
atenção, respeito e empatia na relação aluno e professor. Neste sentido,
atualizar, resignificar e pôr em prática a Pedagogia Salesiana são desafios para
os educadores salesianos, exigindo, além das capacidades pessoais, uma
formação e capacitação salesiana, que inclui um tempo de vivência em
ambientes salesianos para compreender e apreender a dinâmica da instituição.
Por fim, não menos importante, é a disposição de integrar-se e assumir o
Projeto Político Pedagógico e Pastoral da instituição (PPPP) que vai além da
ação meramente profissional. Aproxima-se do pertencimento comunitário de
enraizamento filosófico e geográfico. Além do sentido religioso como pano de
fundo.
Ferreira (2008, p.17) referenda que:
Ao diálogo unia-se a convivência. Se o educador entrava no meio dos
jovens e falava com eles, acabava vendo o mundo deles com uma
nova sensibilidade. Era com o diálogo e a convivência que o
educador conseguia colocar-se no lugar social dos jovens. O
educador tomava o jovem onde se encontrava e começava daí. Era
puro bom senso e o segredo de todo auxílio.
Neste sentido, o trabalho do educador salesiano consiste numa
dedicação aos educandos que se expressa pela amizade, relação afetuosa e
participação em atividades extracurriculares etc. Para Braido (2004, p. 267):
167
O educador é chamado a se apresentar operativamente como modelo
que vive ativamente tudo aquilo que, segundo a razão, a religião e a
amorevollezza, é válido em si e ao mesmo tempo é por ele tornado
amável e atraente, motivante e envolvente para o aluno. O educador
tem de apresentar em forma dinâmica, com relação a todos os
possíveis fins educativos, aquilo que Dom Bosco afirma dele como
‘modelo de moralidade’.
Por meio do questionário, a descrição dos dados demonstra que há forte
incidência salesiana dos educadores sobre os alunos no CPDB, já que o
questionário aplicado aos alunos apresentou um quadro favorável aos
docentes no critério “semelhança à figura de Bosco” e “integração das
características salesianas”. Entretanto os alunos não compreendem, com
profundidade, a proposta educacional salesiana, visto que uma parcela
significativa de alunos está no meio salesiano sem conhecimento de qualquer
elemento e característica da Pedagogia Salesiana.
A técnica de entrevista aberta revelou, nos depoimentos, amplo
conhecimento da história salesiana e da figura do educador Bosco, não de
forma sistemática e linear, mas afetiva, sinalizando a proposta pedagógica
salesiana como salvacionista161 e mitológica que ora é reconfigurada e ora é
mantida, percebida de acordo com a conjuntura dos tempos em suas nuances
sociais, educacionais, políticas e religiosas. Em contrapartida aos dados
apresentados no questionário que pergunta se os educadores incidem
pedagógica e salesianamente nos alunos do CPDB, somado ao conhecimento
da pedagogia salesiana revelado nos depoimentos, constata-se por meio da
observação participante, que há incidência destes educadores docentes sobre
os alunos. Não ultrapassando, porém, os limites da sala de aula por motivos de
operacionalização de horários ajustados. Ambas as partes, docentes e
educandos, têm poucos momentos de convivência para além do ambiente
escolar.
Não se pode ignorar que embora houvera há alguns anos um
desconforto de âmbito salarial por parte de alguns docentes, há adesão ao
161
Embora próximo do final da escrita da dissertação, cabe aqui o esclarecimento de que o
termo “salvacionista” se assemelha à ideia de mitologização da figura e método educativo de
Bosco. Passos Júnior (2011) traz em sua tese de doutorado “Centro Universitário Salesiano,
discutindo sua identidade” uma reflexão sobre a configuração do rito, mito e símbolo da figura e
método educativo de Bosco. Entende-se, porém, que a postura salvacionista está incorporada
na Sociedade por uma cultura cristã católica propagada. Integrada de forma equilibrada, traz
seu aspecto positivo de encantamento, tornando a vida dinâmica.
168
projeto educativo salesiano e pertencimento a esta instituição educacional,
confirmando sua fidelidade à identidade salesiana.
As estratégias operativas, como, por exemplo, a escala de docentes
para realização do chamado “bom dia e boa tarde” e a presença dos docentes
com os alunos em eventos externos à escola apresentam-se frágeis.
Momentos oportunos para contato com os alunos, como convivência e
assistência
nos
intervalos
de
aula,
são
ignorados
por
conta
da
operacionalização de horários ajustados. Além da lenta adequação dos
docentes nessa práxis pedagógica salesiana no novo formato do CPDB, que
passou de ensino profissionalizante para ensino técnico, aumentando a
distância na relação professor e aluno numa perspectiva familiar.
Olha, procura-se (...) perdeu-se um pouquinho quando nós passamos
de profissionalizante para técnico, porque houve uma fragmentação
na questão das aulas. Os professores dão uma aula aqui, outra aula
ali. Antes eles tinham o grupo de alunos na palma da mão. Então,
passavam exemplos, sempre com a mesma turma (CASTRO, E
06/12/2012).
No anterior formato da práxis do CPDB, cada professor era responsável
por um grupo de alunos, permanecendo com eles longos períodos de aulas. No
atual formato, os professores têm aulas de acordo com a grade curricular,
tendo pouco contato com o alunado, o que gera uma relação funcional em que
o professor apenas transmite o conteúdo e o aluno o assimila. A mesma
situação se percebe entre os professores e coordenação pedagógica que não
encontram meios e formas fáceis para se reunir como equipe. Por meio da
técnica da observação participante, constatou-se que, no primeiro semestre de
2013, puderam agendar algumas datas com a finalidade de se reunirem como
equipe pedagógica.
A gente não consegue tomar um café juntos. Nossas reuniões, por
conta de ser fragmentado, pois, os professores daqui também
lecionam na ETEC, e, não conseguimos ainda realizar reunião com
todos. Não temos tempo de nos reunirmos, de fazermos o resgate do
grupo, da salesianidade, de falar de Dom Bosco. Então, isso está um
pouco difícil depois que o curso passou a ser técnico, mas estamos
nos adequando para ver o que é possível fazer (CASTRO, E
06/12/2012).
A presença dos educadores no pátio, chave mestra da pedagogia
salesiana, tem se apresentado débil e desafiadora, pois, embora a entrevista
169
aberta revele que os docentes compreendam este princípio de presença e
assistência no pátio com os alunos, não a praticam pela massificação da carga
horária de trabalho que é estendida a outra instituição jurídica, o UNISAL.
Como ambas as unidades salesianas, Centro Universitário Salesiano e a
Escola São José oferecem cursos técnicos semelhantes e ambas se utilizam
dos mesmos espaços e dos serviços dos mesmos professores. Isto representa
uma sobrecarga para os docentes que se restringem às aulas que devem ser
ministradas.
Essa
situação
de
trabalho,
em
ambas
as
unidades,
compartilhando os mesmos espaços, com bases salariais diferentes, tem
gerado um desconforto nestes profissionais ao ponto de não assumirem por
completo o projeto pedagógico pastoral salesiano na unidade salesiana que
oferece menor remuneração, no caso, o CPDB da Escola São José. Ainda em
âmbito salarial, por meio da observação participante, sabe-se que em 2005, por
necessidade de reconfiguração administrativa nos setores, a instituição
introduziu uma nova faixa salarial aos funcionários, acordando que, num futuro
próximo, quando o quadro financeiro da Escola alcançasse estabilidade, seriam
realizados estudos para reajustes e aumento real de salário. No CPDB, em
2013, houve aumento salarial de 10% para o coordenador. Também a
assistente social, por força de lei, teve um aumento salarial.
Os professores da ETEC – UNISAL são melhor remunerados que os
professores da Escola, pois a universidade é maior, tem mais público
e o nível de ensino exige maior salário, embora a grade curricular dos
cursos técnicos sejam as mesmas. O que muda é a abordagem de
acordo com o público. No CPDB são jovens que ainda realizam o
ensino médio. Na ETEC são jovens adultos que trabalham e custeiam
o próprio curso. Existe o descontentamento salarial, pois o curso é o
mesmo. A diferença salarial pode vir a gerar uma desmotivação na
equipe do CPDB (DC, 05/03/2013).
Entende-se também que o CPDB trabalha com um público diferenciado,
ponto chave do trabalho e identidade salesiana, mas que, na prática, recebe
pouco destaque interno na escola. Tal cenário representa uma dicotomia entre
o discurso e a efetiva prática de ações.
Uma coisa importante também é sempre valorizar o professor que
trabalha com esse tipo de jovem, clientela. É um trabalho difícil. Não
é igual a uma escola normal que o professor vai lá, da sua matéria,
depois acaba a aula, apaga luz, fecha a porta e acabou ali. Temos
muito mais do que isso. Acho que falta um pouco isso, das pessoas
como um todo, como os nossos colegas de trabalho, profissionais de
até outra área saber mais sobre o CPDB, o tipo de trabalho feito aqui,
170
porque é um trabalho que é a menina dos olhos de Dom Bosco. Se
nós perdermos a referência, perder isso, a nossa instituição perde
sua essência, seu princípio. Hoje, temos muito poucos professores.
Aparentemente, as pessoas têm certo receio, vamos colocar uma
faixa aqui e falar de outra fase, de outro lugar e se esquece que aqui
é o princípio, a essência. Acho que se deve valorizar mais isso aqui.
Temos um trabalho muito bonito. O tipo de trabalho que essa escola
faz é muito bonito para ser escondido, para ser colocado um pano em
cima. Acho que deve ser mais divulgado, falado. Não tem que ter
vergonha, pelo contrário, ter orgulho do trabalho feito aqui dentro (D2,
E 19/10/2012).
Para além dos entraves e desafios sinalizados na operacionalização das
estratégias políticas, pedagógicas e pastorais no CPDB, percebe-se, por meio
da observação participante, questionário (quali – quanti) e entrevista aberta,
que os educadores docentes demonstram ter integrado, de razoável para
elevado grau da Pedagogia Salesiana, somado a um apreço e respeito pela
instituição salesiana.
Interessante que são professores que se preocupam em fechar a
janela, em apagar a luz, desligar o ar condicionado e computadores,
em cuidar daquilo como manifestação de carinho e pertença. Então
aquele equipamento está no estado em que está hoje, acredito que
esteja em bom estado, porque sempre fizemos manutenção. Por
cuidado dos professores para mostrar para os alunos, qual era a
importância daquele equipamento. Todo esse cuidado que o
professor tem é a mostra do comprometimento que ele tem com a
instituição salesiana (MIRANDA, E 21/12/2012).
Então, a gente percebe sim, que é comum neles essa atenção com o
aluno. Eles ficam até mais tarde, entendem o que é necessário, são
atenciosos, não está mecânico a coisa. Percebo isso (CASTRO, E
06/12/2012).
O conhecimento e entendimento que os educadores docentes
apresentam dos princípios referenciais salesianos são decorrentes da vivência
salesiana que têm, seja na condição de ex-alunos ou docentes remunerados e
voluntários. Situação que, equivocadamente, isenta e desobriga a instituição
salesiana de preocupar-se com a Pedagogia Salesiana em seu caráter
sistemático, assegurando assim, apenas os elementos básicos aos novos
profissionais contratados em uma formação realizada em Campos do Jordão.
[Pergunto sobre cursos de capacitação para os novos docentes em
âmbito de salesianidade. E ela:] eles realizam o curso uma única vez
em Campos do Jordão. O professor faz uma vez só, mesmo que fique
muito tempo aqui. Então, a maioria deles já fez há muito tempo, logo
que entraram […] (MELO, E 05/11/2012).
O olhar do alunado, como já descrito, inclinou-se à aprovação do
alinhamento docente com as características salesianas. Por parte do
171
professorado, há um significativo respeito e sentido de pertença à dimensão
salesiana em suas nuances religioso, profissional, educacional, etc. Embora,
em muitos aspectos, a proposta pedagógica tenha sido manifestada como
salvacionista. Para além do conhecimento integrado e aplicação dos
referenciais salesianos pelos educadores docentes no CPDB, observa-se a
ausência de estratégias que permitam dirimir os desafios sinalizados. Uma vez
tendo observado, descrito e desenvolvido reflexões sobre os desafios e
perspectivas do quadro docente no CPDB, entende-se que a carta de Roma,
escrita por Bosco, em 1884, a seus seguidores, afirmando que a realidade
pedagógica de seu chamado oratório, como espaço educacional não estava
operacionalizando os procedimentos educativos por ele sinalizados, se faz
atual como alerta à instituição salesiana de que o setor CPDB, bem como seu
corpo docente, devem receber atenção e acompanhamento no processo de
condução da Pedagogia Salesiana. Além da concretização do aumento real de
salário do corpo docente com base na receita, somado ao necessário
esclarecimento do compartilhamento de espaços como oficinas e laboratórios
entre Escola Salesiana São José e UNISAL e as condições de trabalho para os
docentes que são membros das duas instituições jurídicas.
Em suma, faz-se necessário mencionar que, para além dos percalços, a
instituição salesiana Escola Salesiana São José, realiza como CPDB, desde
1977, um imensurável bem social, humano e religioso. Possível por meio de
cursos profissionais via instituição e formação técnica, humana e salesiana via
educadores.
172
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa, de abordagem historicista, investigativa e analítica,
discorreu sobre os primórdios da história salesiana, sua expansão para além
do continente europeu e os impactos e as ressonâncias dos princípios
referenciais salesianos no cenário atual do CPDB em Campinas.
Procurou-se, ao longo desta dissertação, apresentar elementos dos
fundamentos e princípios da Pedagogia Salesiana, assim como sua
operacionalização na prática docente do Centro Profissional Dom Bosco
(CPDB) em Campinas.
De forma crítica, procurou-se verificar como são interpretados,
entendidos e desenvolvidos os princípios referenciais salesianos pelos
educadores docentes do CPDB, a partir de abordagem qualitativa, utilizando-se
da observação participante, questionário e entrevista. Técnicas de pesquisa
que, agrupadas, proporcionaram uma melhor visualização da realidade do
CPDB, oferecendo respostas ao questionamento propulsor da pesquisa: Como
são entendidos, integrados e colocados em prática os princípios referenciais
salesianos pelos educadores docentes no CPDB? A resposta ao problema
desta pesquisa apresentou um amplo quadro de situações que são desafios
nos campos operacionais na gestão, nas perspectivas educacionais de ênfase
salesiana e profissional, nos limites burocráticos e caráteres históricos na área
da gestão escolar.
Deve-se evidenciar que a questão de como são interpretados e
desenvolvidos esses princípios referenciais salesianos pelos educadores
docentes não foram esgotados, sabendo-se que o problema desta pesquisa
requereria elementos que vão além dos espaços salesianos. A pesquisa seria
mais completa se pudéssemos acompanhar o fenômeno pesquisado, no caso
os educadores do CPDB, em seus ambientes familiares, sociais e de
relacionamentos, captando se os valores salesianos permeariam suas vidas.
Este processo, porém, abrangente, poderia fugir dos limites desta pesquisa,
propostos inicialmente. Mas é certo que, por meio do material coletado,
173
interpretado e analisado, foi possível apontar, num quadro reduzido de
ambiente de trabalho, elementos que sinalizam o modo e medida da
interpretação e desenvolvimento da Pedagogia Salesiana pelos educadores
docentes no CPDB. Em suma, a aplicação metodológica apresentou-se
adequada à investigação, viabilizando o trabalho de coleta de dados, análise e
interpretação.
Tal investigação tem como modelo o estilo, os fundamentos e os
referenciais salesianos legados pelo educador Bosco, explicitados na literatura
salesiana que iluminam toda a práxis salesiana e que são referencial teórico do
CPDB. Em nenhum trabalho anterior consultado sobre a Pedagogia Salesiana,
encontrou-se algo semelhante no que compete à relação da abordagem
metodológica historicista e temática focada em um estudo de caso, tratando-se
da análise do entendimento e práxis dos princípios referenciais salesianos no
CPDB. Torna-se assim, a partir dos critérios mencionados, material de consulta
a futuros pesquisadores da educação salesiana.
Cabe uma digressão em relação aos princípios referenciais salesianos
legados por Bosco como parâmetro de análise da atual conjuntura da
operacionalização educacional salesiana no CPDB.
Concebe-se a práxis educativa assumida por Bosco como um
emaranhado de princípios, valores religiosos e humanos de base intuitiva,
experiencial, de sua inteligência arguta e observadora. Elementos que
compõem e caracterizam a abertura e possibilidade de atualização do processo
pedagógico salesiano que integra as condições plurais de temporalidades,
contextos, legislações e a sensibilidade de cada educador.
Bosco teve por meta o desenvolvimento do educando na formação de
sua consciência, por meio de orientação religiosa, moral e cívica. No processo
psicomotor e social, valoriza os estudos, a vivência lúdica, esportiva e a
inserção no mercado de trabalho. O ponto central da práxis educativa de Bosco
é a abordagem integral do jovem nas suas potencialidades e dimensões
humanas, e os salesianos, ao se expandirem pelo mundo, o fizeram nessa
óptica. Para tanto, utilizaram do ferramental conhecido como Sistema
Preventivo, um conglomerado de elementos educativos sintetizados pelo
174
trinômio Razão, Religião e Bondade, elementos indissociáveis que não são
escalonados em ordem de importância, mas articulados organicamente no
processo pedagógico salesiano.
Os
elementos
pétreos
da
Pedagogia
Salesiana
devem
ser
ressignificados e atualizados de acordo com o contexto plural contemporâneo.
O educador salesiano articula a perspectiva da Razão como um passo além de
sua concepção histórica de erudição, atrelando a ciência e o homem. Quanto à
Religião, tal ressignificação perpassa por um processo dialógico entre a
crescente secularização da sociedade e as diversas orientações religiosas.
Entendido este novo contexto, educador e educando podem confrontar seus
ideais de mundo, buscando significados no âmbito existencial e espiritual por
meio de conceitos que transcendem o tangível.
Ressignificar ainda a perspectiva da Bondade, em que o entendimento
de amor demonstrado seja mútuo entre educadores e alunos, proporcionando
significado e sentido ao projeto educacional salesiano, que em outras palavras,
segundo Passos Júnior (2011, p. 304):
É, em suma, uma presença competente no âmbito da racionalidade,
digna na sua coerência de homem religioso, que dá o primeiro passo
que, em suma, ama e se faz amar. O pensamento educacional
salesiano elaborado por João Bosco literalmente se encarna na
pessoa do educador. É uma presença física e espiritual que não é
captada em livros com princípios e propostas, mas se encarna e se
transmite num modo de ser e num estilo de vida. Dois conceitos
sinalizam se ela é praticada: amor e clima de família.
Por meio de técnicas de pesquisa observação participante, questionário
e entrevista, constatou-se que os elementos pétreos da educação salesiana,
razão, religião e bondade, são privilegiados no desenvolvimento pedagógico do
CPDB, não, porém, em sua profundidade conceitual.
A simples reprodução da Pedagogia Salesiana como era praticada nas
décadas anteriores é um risco de desconformidade, enquanto desfiguraria as
características e o espírito do educador Bosco que sempre foi dinâmico e
atento aos sinais dos tempos nunca tendo medo de inovar e assumir novos
caminhos frente aos sempre novos desafios do seu tempo. Não se atualizar,
frente a questões plurais de âmbito político, econômico, religioso e
antropológico é indispor-se ipso facto, como esse educador e com a Pedagogia
175
Salesiana legada por ele. Espera-se que os educadores docentes do CPDB
sejam um grupo de seguidores da Pedagogia Salesiana nas suas várias
nuances: religioso, assistencial, existencial, cidadão, político etc.
O entendimento e desenvolvimento de suas práticas educativas
correspondem à longa história dos ambientes salesianos, sempre capazes de
se adequarem aos tempos. Não há espaço para a tendência de reprodução de
práticas pedagógicas antigas com seus bordões tradicionais e marketings hoje
ultrapassados.
A pesquisa constatou elevado grau de pertença dos educadores
docentes à instituição tendo como eixo o trabalho assistencial com os alunos
com vulnerabilidade social. Para além dos percalços que vivem e que foram
apresentados ao longo da pesquisa, os docentes optam por permanecer na
instituição porque gostam e se identificam com o trabalho educativo salesiano.
O fato de alguns pertencerem à instituição salesiana de maneira distinta no
modo e no tempo, proporcionou a cada um, meios de integrar a Pedagogia
Salesiana de modos diferenciados, ainda que a ausência sistemática de
formação e atualização salesiana tenha corroído sua dinamicidade e
criticidade. Tal postura, embora entendida como salvacionista por estar
incorporada na sociedade como cultura cristã católica propagada, tem sua real
dose de encantamento na figura histórica e mítica de Bosco para manter a vida
dinâmica.
Em síntese, a pesquisa revela considerável grau de entendimento e
desenvolvimento dos princípios referenciais salesianos, haja vista que os
educadores docentes têm elevado “tempo de casa”. As dificuldades e desafios
evidenciados estão em âmbito de operacionalização de estratégias que
equacionem, tanto para a equipe de gestão da Escola Salesiana São José,
como para os educadores da Pedagogia Salesiana com o perfil e realidade do
alunado.
Embora as conclusões tenham sido sinalizadas ao longo da dissertação
pelo destaque dos desafios operacionais no CPDB, seja na esfera da gestão
como na da pedagógica, apresento agora algumas proposições de forma mais
objetiva:
176
Quanto à esfera pedagógica:
 Elaborar e acompanhar a escala da estratégia didática “bom dia e
boa tarde” no início de cada período de aula, de modo que os
educadores docentes possam incidir, mais pedagógica, salesiana
e pastoralmente, junto dos alunos.
 Retomar, nas reuniões pedagógicas, o discurso do valor da
presença dos educadores docentes nos intervalos de aula e
cotidiano escolar, a fim de oferecer ao alunado uma melhor
experiência da Pedagogia Salesiana.
 Pensar estratégias didáticas em que se favoreça uma melhor
adequação da equipe pedagógica ao novo formato de ensino
técnico no âmbito pastoral e salesiano. Consolidando, portanto, a
equipe pedagógica neste novo formato de ensino.
 Acrescentar os conceitos referenciais da Pedagogia Salesiana
nas ementas dos cursos do CPDB, a fim de homogeneizar a
teoria com sua aplicação prática no curso.
 Equalizar e alinhar as ementas de curso técnico do CPDB com o
Projeto Político, Pedagógico e Pastoral da Escola Salesiana São
José, ainda que as diretrizes dependam da análise e aprovação
da Secretaria da Educação - MEC.
Quanto à esfera da gestão:
 Elaborar um itinerário formativo sistemático em Pedagogia
Salesiana para o corpo docente da escola e CPDB na medida que
se perceba os limites da compreensão conceitual da história, da
estrutura e da Pedagogia Salesiana.
 Continuar os esforços para elaborar estratégias e meios que
favoreçam o uso e compartilhamento dos espaços das duas
instituições: Escola Salesiana São José e UNISAL.
 Encontrar meios que ofereçam um real destaque ao CPDB,
compatível com o discurso oficial da instituição, a fim de fazer
justiça à sua história de relevância social e pastoral.
177
 Promover aumento real de salário, conforme processo histórico de
rescisões de contrato e análise de estabilidade financeira da
receita.
 Unificar critérios ideológicos como competência profissional e
vocacional no que compete à remuneração do administrativo e
pedagógico do CPDB que trabalha com jovens de baixo poder
aquisitivo.
Uma
vez
apresentadas
as
proposições
para
uma
melhor
operacionalização da proposta educacional salesiana no CPDB tanto na esfera
da gestão como pedagógica, entende-se que é um processo a ser assumido
pelas equipes de gestão escolar, pedagógica e corpo docente de redirecionar
os caminhos legados e encetados pelo educador Bosco. É um longo trabalho
por se tratar de uma prática reflexiva, religiosa e afetiva, sendo preciso, porém,
coragem para assumi-lo. Este é um grande desafio.
178
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191
APÊNDICE A
Autorização para pesquisa e uso de voz e imagem
Eu, Rodrigo Tarcha Amaral de Souza, RG 42.703.215-5, sou aluno
regular do Curso de Pós-Graduação (Mestrado em Educação) do
Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL), unidade
Americana e orientando da Profª. Drª. Renata Sieiro Fernandes,
docente deste curso e desta instituição.
Como parte de material necessário para obtenção do grau de Mestre
em Educação, necessito desenvolver uma pesquisa e venho solicitar a
autorização para realizar o trabalho de campo, utilizando a técnica de
entrevista com os educadores(as) docentes, coletar depoimentos orais
e imagens para fins estritamente acadêmicos, durante o período de
agosto/2012 a dezembro/2012. Para tanto, necessitarei realizar
observações participantes em sala de aula no Centro Profissional
Dom Bosco (CPDB) – Campinas.
Comprometo-me a, ao final do desenvolvimento do trabalho de
pesquisa, fazer o retorno dos resultados para todos os envolvidos
diretamente no processo da investigação.
Americana, 28 de agosto de 2012
¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨
Autorização para pesquisa e uso de voz e imagem
Eu,_____________________________,Rg_____________________
_______, autorizo o trabalho de campo de pesquisa através da técnica
de entrevista, coleta de depoimento oral e imagem para fins
estritamente acadêmicos do aluno Rodrigo Tarcha Amaral de
Souza.
Data____/______/2012
Assinatura______________________________________
192
APÊNDICE B
Atividades de campo
Nº
29
1
1
1
1
Atividade
Convivência
no horário do
intervalo na
sala
dos
professores.
Data
2º semestre de
2012:
13/09,
20/09,
10/10,
11/10,
14/11
19/11,
21/11,
07/12.
1º semestre de
2013: Todas as
3º feiras nos
horários das 9:25
às 9:45 e 15:10
às 15:30.
Total de 18h
Convivência
Dia 13/12/2012
com
Horário das 7:00
churrasco
às 17:00
entre alunos Total de 10h
e professores
do CPDB
Participação
20/12/2012
na
Horário das 12:00
confraterniza às 17:00
ção com os Total de 5 horas
professores
Presença no 21/11/2012
dia de ação Horário das 7:00
de
graças às 8:00 e das
(atividade
13:30 às 14:30
pastoral)
Total de 2 horas
Presença na Dia 07/12/2012
confraterniza Horário: 18:00 às
ção
dos 22:00
colaboradore Total de 4 horas
s da ESSJ
(ação
de
graças)
Descrição
Em cada intervalo, há professores de
acordo com as disciplinas dos dias.
Momento de integração entre alunos
e professores. Joga-se futebol e
conversa-se bastante em um clima de
familiaridade.
A confraternização realizou-se na
casa de um dos docentes. Evidenciose bastante amizade entre os
presentes.
Presença dos docentes que tinham
horário de aula com as respectivas
turmas, pois a atividade entendida
como aula dada.
A festa foi preparada para 350
pessoas, entre funcionários de todos
os setores da Escola São José e
Unisal. Contou também com a
presença dos voluntários do Oratório
Dom Bosco. Os professores do
CPDB estavam presentes em número
quase completo. Como sempre, foi
um momento descontraído. Com o
grupo de professores do CPDB,
pudemos
conversar,
divertir-nos
também pelos comes e bebes. Muitos
se animaram a participar do baile
193
7
Participação
na
reunião
com
os
professores e
coordenação
pedagógica
(conselho de
classe)
1
Pauta:
- preparação da acolhida aos alunos.
Sempre no período da manhã.
- distribuição das aulas por setor.
28/01 – manhã de acolhida com os
alunos, orientações iniciais.
29/01 – integração dos alunos do 1º
ano com o 2º ano, tanto as turmas da
manhã como da tarde. Será passado
o filme de Dom Bosco (fortalecer o
espírito de família).
30 - 31/01 – Palestra com os
embaixadores da prevenção, 1º e 2º
ano, tanto as turmas da manhã como
da tarde.
1º/02 – Manhã esportiva aos alunos.
Presença em 05-12-19/02/2013 A observação participante consistiu
sala de aula 50 min cada aula em estar presente em sala de aula
na condição Total de 2h30
para observação geral da prática
de
docente.
observador
participante.
Com o critério de número de
Docente
1
menções mais expressivas e menos
(D1)
expressivas de nomes de educadores
Presença em 04-11-18/03/2013 docentes no CPDB, feita por alunos
sala de aula 50 min cada aula em questionário qualitativo, foram
escolhidos seis docentes para
na condição Total de 2h30
estudo. Estão identificados na
de
pesquisa pela letra D seguido de
observador
numeração.
participante.
Docente
2
(D2)
3
3
2º semestre de
2012:
29/09,
07/12;
1º
semestre
de
2013:
23/02,
23/03,
20/04,
18/05, 22/06;
Horário: 8:00 às
12:00
Participação
1º semestre de
na
semana 2013:
de
28/01,
29/01,
planejamento 30/01,
31/01,
do
setor 01/02.
(CPDB)
Horário: 9:00 às
12:00
Total de 28h
final, uma quase danceteria interna.
Foi mais um momento oportuno de
fortalecimento da familiaridade entre
todos
os
funcionários
dessas
instituições. Quanto ao CPDB, podese dizer que os professores deram
um passo a mais na consolidação da
harmonia grupal.
Reunião mensal com o conselho de
professores para análise da situação
dos alunos por áreas de curso:
Informática, Fabricação Mecânica e
Eletroeletrônica.
194
3
3
3
3
4
1
1
Presença em
sala de aula
na condição
de
observador
participante.
Docente
3
(D3)
Presença em
sala de aula
na condição
de
observador
participante.
Docente
4
(D4)
Presença em
sala de aula
na condição
de
observador
participante.
Docente
5
(D5
Presença em
sala de aula
na condição
de
observador
participante.
Docente
6
(D6)
Participação
nas
atividades
externas,
denominadas
DDT (Dia da
Turma) com
os alunos e
professores
Participação
da festa dos
pais
Exposição
cultural
08-15-22/03/2013
50 min cada aula
Total de 2h30
02-03-05/04/2013
50 min cada aula
Total de 2h30
9-16-23/04/2013
50 min cada aula
Total de 2h30
10-17
e
24/04/2013
50 min cada aula
Total de 2h30
2º semestre de
2012
15/04 e 16/04.
1º semestre de
2013
08/04 e 09/04
Horário:
9:00 às 17:00
Total de 32h
11/08/2012
Horário: 8:00 às
13:00
Total de 5 horas
15/09/2012
Horário: 8:00 às
17:00
Total de 9 horas
Atividades lúdicas, esportivas e
formativas, visando maior integração
entre os alunos e professores.
Confraternização da comunidade
educativa com a motivação da
festividade do Dia dos Pais.
Exposição cultural de materiais
artísticos e técnicos de cada etapa
formativa da ESSJ.
O evento contou com a presença dos
professores do CPDB na condição de
195
organizadores e orientadores dos
alunos expositores.
Total de atividades
56
Tempo geral de observação participante
128h
196
ANEXO A
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990.
Texto compilado
Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA: Faço saber que o Congresso Nacional
decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Título I
Das Disposições Preliminares
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao
adolescente.
Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze
anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de
idade.
Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente
este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade.
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais
inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata
esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as
oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico,
mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do
poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos
referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância
pública;
197
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas
com a proteção à infância e à juventude.
Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido
na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos
fundamentais.
Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a
que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres
individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como
pessoas em desenvolvimento.
Título II
Dos Direitos Fundamentais
Capítulo I
Do Direito à Vida e à Saúde
Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde,
mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento
e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.
Art. 8º É assegurado à gestante, através do Sistema Único de Saúde, o
atendimento pré e perinatal.
§ 1º A gestante será encaminhada aos diferentes níveis de atendimento,
segundo critérios médicos específicos, obedecendo-se aos princípios de
regionalização e hierarquização do Sistema.
§ 2º A parturiente será atendida preferencialmente pelo mesmo médico
que a acompanhou na fase pré-natal.
§ 3º Incumbe ao poder público propiciar apoio alimentar à gestante e à
nutriz que dele necessitem.
§ 4o Incumbe ao poder público proporcionar assistência psicológica à gestante
e à mãe, no período pré e pós-natal, inclusive como forma de prevenir ou
minorar as consequências do estado puerperal. (Incluído pela Lei nº 12.010, de
2009) Vigência
§ 5o A assistência referida no § 4o deste artigo deverá ser também prestada a
gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para
adoção. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
198
Art. 9º O poder público, as instituições e os empregadores propiciarão
condições adequadas ao aleitamento materno, inclusive aos filhos de mães
submetidas a medida privativa de liberdade.
Art. 10. Os hospitais e demais estabelecimentos de atenção à saúde de
gestantes, públicos e particulares, são obrigados a:
I - manter registro das atividades desenvolvidas, através de prontuários
individuais, pelo prazo de dezoito anos;
II - identificar o recém-nascido mediante o registro de sua impressão
plantar e digital e da impressão digital da mãe, sem prejuízo de outras formas
normatizadas pela autoridade administrativa competente;
III - proceder a exames visando ao diagnóstico e terapêutica de
anormalidades no metabolismo do recém-nascido, bem como prestar
orientação aos pais;
IV - fornecer declaração de nascimento onde constem necessariamente as
intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato;
V - manter alojamento conjunto, possibilitando ao neonato a permanência
junto à mãe.
Art. 11. É assegurado atendimento médico à criança e ao adolescente,
através do Sistema Único de Saúde, garantido o acesso universal e igualitário
às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde.
Art. 11. É assegurado atendimento integral à saúde da criança e do
adolescente, por intermédio do Sistema Único de Saúde, garantido o acesso
universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e
recuperação da saúde. (Redação dada pela Lei nº 11.185, de 2005)
§ 1º A criança e o adolescente portadores de deficiência receberão
atendimento especializado.
§ 2º Incumbe ao poder público fornecer gratuitamente àqueles que
necessitarem os medicamentos, próteses e outros recursos relativos ao
tratamento, habilitação ou reabilitação.
Art. 12. Os estabelecimentos de atendimento à saúde deverão
proporcionar condições para a permanência em tempo integral de um dos pais
ou responsável, nos casos de internação de criança ou adolescente.
Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos contra
criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho
Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais.
Parágrafo único. As gestantes ou mães que manifestem interesse em
entregar seus filhos para adoção serão obrigatoriamente encaminhadas à
199
Justiça da Infância e da Juventude. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
Vigência
Art. 14. O Sistema Único de Saúde promoverá programas de assistência
médica e odontológica para a prevenção das enfermidades que ordinariamente
afetam a população infantil, e campanhas de educação sanitária para pais,
educadores e alunos.
Parágrafo único. É obrigatória a vacinação das crianças nos casos
recomendados pelas autoridades sanitárias.
Capítulo II
Do Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade
Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à
dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como
sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas
leis.
Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:
I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários,
ressalvadas as restrições legais;
II - opinião e expressão;
III - crença e culto religioso;
IV - brincar, praticar esportes e divertir-se;
V - participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;
VI - participar da vida política, na forma da lei;
VII - buscar refúgio, auxílio e orientação.
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade
física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a
preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e
crenças, dos espaços e objetos pessoais.
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do
adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento,
aterrorizante, vexatório ou constrangedor.
Capítulo III
Do Direito à Convivência Familiar e Comunitária
200
Seção I
Disposições Gerais
Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no
seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a
convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas
dependentes de substâncias entorpecentes.
§ 1o Toda criança ou adolescente que estiver inserido em programa de
acolhimento familiar ou institucional terá sua situação reavaliada, no máximo, a
cada 6 (seis) meses, devendo a autoridade judiciária competente, com base
em relatório elaborado por equipe interprofissional ou multidisciplinar, decidir de
forma fundamentada pela possibilidade de reintegração familiar ou colocação
em família substituta, em quaisquer das modalidades previstas no art. 28 desta
Lei. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
§ 2o A permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento
institucional não se prolongará por mais de 2 (dois) anos, salvo comprovada
necessidade que atenda ao seu superior interesse, devidamente fundamentada
pela autoridade judiciária. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
§ 3o A manutenção ou reintegração de criança ou adolescente à sua família
terá preferência em relação a qualquer outra providência, caso em que será
esta incluída em programas de orientação e auxílio, nos termos do parágrafo
único do art. 23, dos incisos I e IV do caput do art. 101 e dos incisos I a IV do
caput do art. 129 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por
adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer
designações discriminatórias relativas à filiação.
Art. 21. O pátrio poder poder familiar será exercido, em igualdade de
condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil,
assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à
autoridade judiciária competente para a solução da divergência. (Expressão
substituída pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos
filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de
cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.
Art. 23. A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo
suficiente para a perda ou a suspensão do pátrio poder poder familiar.
(Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
Parágrafo único. Não existindo outro motivo que por si só autorize a
decretação da medida, a criança ou o adolescente será mantido em sua família
de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em programas oficiais
de auxílio.
201
Art. 24. A perda e a suspensão do pátrio poder poder familiar serão
decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos
na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos
deveres e obrigações a que alude o art. 22. (Expressão substituída pela Lei nº
12.010, de 2009) Vigência
202
ANEXO B
Proposta de Resolução
Definem as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Profissional Técnica de Nível Médio, nos termos da Lei 9.394/96, alterada pela
Lei 11.741/08:
Art. 1º. A presente Resolução sistematiza o conjunto de Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio
nos termos da Lei 9.394/96, alterada pela Lei 11.741/08.
Art. 2º. A Educação Profissional Técnica de Nível Médio, no
cumprimento dos objetivos da Educação Nacional, integra-se, em suas
diferentes formas – concomitante, integrada e subsequente – às diversas
modalidades de educação, às dimensões do trabalho, da ciência, da tecnologia
e da cultura e regula-se por esta Resolução.
Parágrafo único. No caso dos cursos de Educação a Distância, a oferta
poderá ocorrer nas formas subsequentes e concomitantes garantidas as
especificidades dos cursos em seus respectivos eixos tecnológicos e
observadas a legislação específica da Educação a Distância e as normas
complementares dos sistemas de ensino.
Art. 3º. Os cursos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio
visarão proporcionar ao estudante o domínio dos fundamentos científicotecnológicos, sócio-históricos e culturais de processos produtivos, em geral e
específicos, de bens e serviços, assim como a apropriação de conhecimentos e
técnicas necessários ao exercício profissional e da cidadania.
Art. 4º. Os cursos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio
serão organizados por eixos tecnológicos, constantes do Catálogo Nacional de
Cursos Técnicos de Nível Médio instituído pela Portaria Ministerial 870/08,
aprovado pela Resolução CNE/CEB 3/08, com base no Parecer CNE/CEB
11/08.
Art. 5º. A oferta dos cursos de Educação Profissional Técnica de Nível
Médio, inclusive na modalidade de Educação a Distância, será precedida de
autorização à instituição de ensino pelo órgão regulador competente.
Parágrafo único. Os órgãos reguladores deverão observar no ato de
autorização da instituição e dos cursos a serem ofertados se estes
correspondem às especificidades e demandas socio-econômico-ambientais do
território para os quais se destinam, de modo a potencializar os processos
produtivos e a inclusão social.
Art. 6º. A Educação Profissional Técnica de Nível Médio em todas as
suas formas de oferta nos termos da Lei, inclusive nas modalidades Educação
203
de Jovens e Adultos e Educação a Distância, baseia-se nos seguintes
pressupostos:
I.
II.
III.
IV.
V.
VI.
VII.
VIII.
IX.
X.
Formação integral do educando;
Trabalho como princípio educativo;
Indissociabilidade entre formação geral e educação profissional;
Indissociabilidade entre educação e prática social, considerandose a historicidade dos conhecimentos e dos sujeitos da
aprendizagem;
Integração entre educação, trabalho, ciência, tecnologia e cultura
como base da proposta e do desenvolvimento curricular;
Integração de conhecimentos gerais e profissionais realizada na
perspectiva da interdisciplinaridade, tendo a pesquisa como
princípio pedagógico;
Indissociabilidade entre teoria e prática no processo de ensinoaprendizagem;
Articulação com o desenvolvimento socioeconômico-ambiental
dos territórios onde os cursos ocorrem;
Valorização da diversidade humana, das formas de produção, dos
processos de trabalho e das culturas a eles subjacentes.
Inclusão educacional e acessibilidade como base para acesso ao
currículo.
Art. 7º. A estruturação dos cursos da Educação Profissional Técnica de
Nível Médio, orientada pela concepção de eixo tecnológico, implica considerar
em seus conteúdos e métodos:
a) A matriz tecnológica, que inclui as tecnologias relativas aos cursos
sobre as quais repousam suas finaldiades e seus objetivos
educacionais;
b) O núcleo politécnico comum relativo ao eixo tecnológico em que se
situa o curso, que compreende os fundamentos científicos, sociais,
organizacionais, econômicos, estéticos e éticos que informam e
alicerçam as tecnologias (materiais, meios, métodos etc.) e a
contextualização do referido eixo tecnológico no contexto do sistema
da produção social;
c) Os conhecimentos nas áreas de linguagem, ciências humanas,
ciências da natureza e matemática vinculados à educação básica e à
educação para o mundo do trabalho, necessários à formação e ao
desenvolvimento profissional do cidadão;
d) A pertinência, coerência, coesão e consistência de conteúdos,
articulados do ponto de vista lógico e histórico, contemplando as
ferramentas conceituais e as metodologias;
Parágrafo único. Na forma subsequente, conhecimentos e habilidades
inerentes à educação básica deverão ser introduzidos na forma de
complementação e atualização de estudos, caso diagnóstico avaliativo
evidencie necessidade de atender requerimentos dessa ordem em
consonância com o eixo tecnológico.
Art. 8º. As cargas horárias dos cursos de Educação Profissional Técnica
de Nível Médio na forma integrada ao Ensino Médio deverão ter 3.200 horas,
204
no mínimo, atendidas as diretrizes curriculares nacionais estabelecidas para o
Ensino Médio e para os cursos técnicos, em conformidade com o que requer
cada eixo tecnológico e a legislação pertinente aos sistemas de ensino.
§ 1º A duração e as características dos cursos de Educação Profissional
Técnica de Nível Médio integrados ao Ensino Médio, na modalidade Educação
de Jovens e Adultos, considerarão, ainda, as diretrizes curriculares nacionais
dispostas no Parecer CNE/CEB 11/00, no Decreto 5.840/06 e na legislação
pertinente aos sistemas de ensino.
§ 2º Os cursos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio
oferecidos na forma subsequente, observado o disposto no artigo 5º, terão
carga horária mínima correspondente à requerida pelo respectivo eixo
tecnológico, garantido o disposto no artigo 6º desta Resolução.
Art. 9º. Poderão ser organizados cursos de especialização técnica de
nível médio, vinculados a uma habilitação profissional, para o atendimento de
demandas específicas.
§ 1º A instituição ofertante dos cursos previstos no caput deste artigo
deverão ter em sua oferta regular o curso técnico de nível médio
correspondente;
§ 2º A carga horária mínima dos cursos previstos no caput deste artigo
será de 20% da carga horária mínima do curso técnico de nível médio a que se
vincula;
§ 3º Ao detentor de diploma de curso técnico de nível médio ou de
graduação em áreas correlatas que cursar com aproveitamento os cursos
previstos no caput deste artigo conferir-se-á a certificação de especialista
técnico e, aos demais, a de formação continuada, observada, para os sistemas
estaduais, a legislação estadual específica.
Art. 10. As instituições terão autonomia na concepção, elaboração,
execução, avaliação e revisão do seu projeto pedagógico, observados:
I.
II.
III.
IV.
V.
VI.
VII.
As exigências do caráter contraditório da produção social, como
esfera e espaço de atividades de onde os sujeitos retiram os
meios de reprodução de suas vidas;
Os processos sócio-históricos e culturais que caracterizam a
formação social brasileira, bem como sua relação com o contexto
mundial;
As características e identidades dos sujeitos adolescentes, jovens
e adultos, considerando-se as diferenças humans;
A participação ativa de gestores e educadores responsáveis pela
formação geral e específica, bem como da comunidade em geral;
A articulação da instituição com os familiares dos estudantes, com
a comunidade local e a sociedade em geral;
As necessidades socioeconômicas, culturais, educacionais e
afetivas dos estudantes;
As condições didático-pedagógicas necessárias à qualidade do
ensino e a valorização do trabalho docente;
205
VIII.
IX.
A escola como um lugar de memória, construindo-se de práticas
que incentivem o vínculo entre os sujeitos que a constituem.
A promoção das condições de acessibilidade e o desenvolvimento
de práticas educacionais inclusivas.
Art. 11. Os currículos dos cursos de Educação Profissional Técnica de
Nível Médio deverão proporcionar aos estudantes:
I.
II.
III.
IV.
V.
Os elementos para compreender e discutir as relações sociais de
produção e de trabalho, bem como as especificidades históricas
da vida nas sociedades contemporâneas;
Os recursos para sua profissão com idoneidade intelectual,
tecnológica e moral, autonomia e responsabilidade, orientados
por princípios ético-políticos e compromissos com a construção
de uma sociedade justa e fraterna;
O domínio intelectual das tecnologias pertinentes ao núcleo
politécnico do eixo tecnológico do curso e a sua matriz
tecnológica de modo a permitir seu progressivo desenvolvimento
profissional e sua capacidade de construir novos conhecimentos;
O diálogo com diversos campos da ciência e da cultura como
referências fundamentais a uma formação integral;
Os instrumentais de cada habilitação, por meio da vivência de
situações práticas de estudo e trabalho, experimentos, oficinas,
simulações, observações e estágios, sempre referenciados e
associados aos processos descritos nas alíneas anteriores.
Art. 12. O Ministério da Educação e o Ministério do Trabalho e Emprego,
em cooperação com os demais ministérios, subsidiarão os sistemas de ensino
na regulação de processos de formação e certificação profissional que
possibilitem aos cidadãos o aproveitamento e a validação de saberes
profissionais adquiridos em experiências de trabalho e de estudos formais e
não formais e a orientação para a educação ao longo da vida, dentro de
itinerários formativos coerentes com suas respectivas histórias profissionais.
§ 1º Para o cumprimento do disposto neste artigo, entende-se por
itinerário formativo a identificação das possibildiades de formação que se
encontram articuladas, considerando a estrutura sócio-ocupacional e os
fundamentos científico-tecnológicos de um dado processo produtivo de bens ou
serviços, capaz de orientar o estudante na construção de uma trajetória
educacional consistente.
§ 2º para fins de aproveitamento de conhecimentos, experiências e
saberes anteriores de jovens e adultos trabalhadores, as instituições de
educação profissional deverão:
I.
II.
Elaborar instrumentos metodológicos de avaliação e validação de
conhecimentos, experiências e saberes, a partir da concepção do
trabalho como princípio educativo;
Realizar avaliação diagnóstica para identificar os conhecimentos,
experiências e saberes resultantes de sua trajetória profissional e
de vida e, também, as suas insuficiências formativas;
206
III.
Reconhecer os conhecimentos, experiências e saberes
acumulados com a finalidade de permitir ao trabalhador o
prosseguimento nos estudos e exercício profissional;
§ 3º Somente poderá realizar processos de certificação a instituição
devidamente credenciada que apresente em sua oferta o curso técnico de nível
médio correspondente previamente autorizado.
I.
As instituições oficiais dos sistemas públicos de ensino que não
tenham o curso técnico correspondente, mas possuam oferta de
curso técnico, inscrito no mesmo eixo tecnológico, cujos
conteúdos da formação mantenham estreita relação com o perfil
profissional a ser certificado, poderão ser credenciadas para a
realização dos processos previstos no § 2º deste artigo, a critério
do órgão regulador de seu respectivo sistema de ensino.
Art. 13. A prática na educação profissional é entendida como o
aprendizado necessário ao exercício da profissão, compreendendo atividades
específicas em laboratório, investigação sobre as atividades profissionais,
projetos de pesquisa e/ou intervenção, visitas técnicas e outras, que se somam
à realização do estágio profissional supervisionado como ato educativo,
quando este estiver previsto no projeto pedagógico do curso.
Art. 14. Os cursos da Educação Profissional Técnica de Nível Médio, de
estabelecimentos de ensino oficiais, devidamente autorizados pelos órgãos
reguladores de seu sistema de ensino, podem ser reconhecidos como
programas de aprendizagem profissional pelo TEM, observado o disposto nas
Leis 10.097/00 e 11.788/08 e atos normativos específicos.
Art. 15. A realização do estágio profissional supervisionado, quando
previsto no projeto pedagógico, deverá estar em consonância com as Diretrizes
específicas ditadas pelo Conselho Nacional de Educação, à luz da Lei 11.
788/08.
§ 1º A carga horária destinada ao estágio supervisionado deverá ser
acrescida ao mínimo estabelecido para o respectivo curso, nos termos da
legislação e normas específicas.
§ 2º A carga horária e o plano de realização do estágio supervisionado
deverão ser explicitados na organização curricular constante do plano de curso,
uma vez que são atos educativos da instituição educacional.
§ 3º O estágio profissional supervisionado não caracteriza vínculo
empregatício do aluno com o órgão concedente e, por extensão, não cria
contradição entre o direito do adolescente à educação profissional e sua
proteção no trabalho.
Art. 16. Os planos de curso, coerentes com os respectivos projetos
pedagógicos institucionais, serão submetidos à aprovação dos órgãos
competentes dos sistemas de ensino, contendo obrigatoriamente, no mínimo:
I.
II.
Justificativas e objetivos;
Requisitos de acesso;
207
III.
IV.
V.
VI.
VII.
VIII.
Organização curricular;
Critérios de aproveitamento de conhecimentos e experiências
anteriores;
Critérios de avaliação;
Instalações e equipamentos;
Pessoal docente e técnico;
Certificados e diplomas.
Art. 17. O Ministério da Educação organizará e divulgará em nível
nacional, no âmbito do Sistec – Sistema Nacional de Informações da Educação
Profissional e Tecnológica, o cadastro nacional de instituições educacionais da
educação profissional e tecnológica, e respectivos cursos de Educação
Profissional Técnica de Nível Médio, e alunos matriculados e certificados ou
diplomados.
Art. 18. A expedição e registro dos diplomas de técnico de nível médio é
de responsabilidade da instituição educacional credenciada e autorizada pelo
órgão competente do sistema de ensino a que pertence, devendo a instituição,
o curso e a turma estarem devidamente cadastrados no Sistec para que os
diplomas tenham validade nacional.
§ 1º Os diplomas de técnico, correspondentes à habilitação profissional,
deverão mencionar a forma de oferta do curso e o eixo tecnológico ao qual este
se vincula.
§ 2º Os diplomas dos cursos realizados na forma integrada deverão
incluir o certificado de conclusão do Ensino Médio, para fins de prosseguimento
de estudos.
Art. 19. Na formulação e no desenvolvimento da política pública, o
Ministério da Educação, por intermédio de sua Secretaria de Educação
Profissional e Tecnológica – Setec e do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais – Inep, em regime de colaboração com os Conselhos
Nacional e Estaduais de Educação e demais órgãos dos respectivos sistemas
de ensino, promoverá, periodicamente, processo nacional de pesquisa sobre a
Educação Profissional Técnica de Nível Médio com as seguintes finaldiades:
a) Melhoria da qualidade da Educação Profissional Técnica de Nível
Médio;
b) Orientação da expansão de sua oferta, para cada eixo tecnológico;
c) Promoção da qualidade pedagógica e efetividade social, com ênfase
nos aspectos relacionados ao acesso, à permanência, ao êxito no
percurso formativo e à inserção socio-profissional;
d) Cumprimento das responsabilidades sociais das instituições por meio
da valorização de sua missão, da promoção dos valores
democráticos, da valorização das diferenças e da diversidade, da
afirmação da autonomia e da identidade institucional.
Art. 20. A formação inicial para o magistério na Educação Profissional
Técnica de Nível Médio realizar-se-á em cursos de licenciatura em
consonância com a legislação específica e atos normativos emanados pelo
Conselho Nacional de Educação.
208
§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão o processo de transição
para viabilizar a formação em licenciatura dos profissionais que atuam na
Educação Profissional Técnica de Nível Médio.
§ 2º A formação em licenciatura a que se refere o parágrafo anterior
poderá ser organizada em cooperação com o Ministério da Educação, os
Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, as universidades
públicas e demais instituições de ensino superior públicas.
Art. 21. A formação inicial, nos cursos de licenciatura, não esgota o
desenvolvimento dos conhecimentos necessários à docência, cabendo aos
sistemas e às instituições de ensino a organização e viabilização de planos de
formação continuada aos professores da Educação Profissional Técnica de
Nível Médio.
Art. 22. A formação inicial e continuada dos professores da Educação
Profissional Técnica de Nível Médio contemplará, pelo menos, os seguintes
eixos:
I.
II.
III.
IV.
Formação científica, com atenção às necessidades educacionais
em cada eixo tecnológico de integração entre ensino-pesquisaextensão, da perspectiva interdisciplinar, do diálogo das ciências
do pensamento, humanas, sociais e da natureza com a cultura e
com os conhecimentos tecnológicos.
Formação tecnológica, considerando a interação entre teoria e
prática, a atual complexidade do mundo do trabalho, o aumento
das exigências de qualidade na produção e nos serviços, a
exigência de maior atenção à justiça social, questões éticas e de
sustentabilidade ambiental, necessidades sociais e alternativas
tecnológicas.
Formação didático-pedagógica, tendo em boa conta as
especificidades históricas, sociológicas, filosóficas, econômicas,
organizacionais e políticas da educação profissional e
tecnológica, incluindo seus conteúdos, métodos, processos de
avaliação, identidade de docentes e discentes, gestão de
sistemas, redes e instituições e suas relações com o contexto
econômico e social, com as políticas sociais e de
desenvolvimento.
Conhecimentos sobre o desenvolvimento socioecômico-ambiental
dos territórios e sobre a diversidade dos sujeitos, das formas de
produção e dos processos de trabalho dos diferentes loci onde os
cursos ocorrem.
Art. 23. Esta Resolução entre em vigor na data de sua publicação,
revogadas as disposições em contrário e as Resoluções CNE//CEB 4/99 e
1/2005.
Fonte: PACHECO, Eliezer. (Org). Perspectivas da Educação Profissional
Técnica de Nível Médio: Proposta de Diretrizes Curriculares. Brasília:
Fundação Santillana; Moderna, 2012. Pág (s) 125-135.
209
ANEXO C
Carta de Roma escrita por João Bosco a seus seguidores
salesianos
Perto ou longe, eu penso sempre em vós. Meu único desejo é ver-vos felizes
no tempo e na eternidade. Esse pensamento e esse desejo é que me levaram
a escrever-vos esta carta. Sinto, meus caros, o peso do afastamento, e o fato
de não vos ver nem ouvir me aflige como não podeis imaginar. Desejaria por
isso escrever-vos estas linhas há uma semana, mas as contínuas ocupações
me impediram. Todavia, embora faltem poucos dias para minha volta, quero
antecipar minha chegada ao menos por carta, já que não posso fazê-lo
pessoalmente. São palavras de quem vos ama carinhosamente em Jesus
Cristo e tem obrigação de falar-vos com a liberdade de um pai. Haveis de
permiti-lo, não é verdade? E me prestareis atenção e poreis em prática o que
vou dizer-vos.
Afirmei que sois o único e contínuo pensamento de minha mente. Ora, numa
das noites passadas, havia-me recolhido ao quarto, e, enquanto me dispunha a
repousar, tinha começado a rezar as orações que minha boa mãe me ensinou.
Nesse momento, não sei bem se dominado pelo sono ou fora de mim por uma
distração, pareceu-me ver dois dos antigos jovens do Oratório virem ao meu
encontro.
Um deles aproximou-se e saudando-me afetuosamente me disse:
— Dom Bosco, não me conhece?
— Se te conheço, respondi.
— E lembra-se ainda de mim? — acrescentou o homem.
— De ti e de todos os outros. És Valfrè e estavas no Oratório antes de 1870.
— Diga — continuou Valfrè —, quer ver os jovens que estavam no Oratório no
meu tempo?
— Sih, mostra-me — respondi —, isso vai dar-me grande prazer.
Então Valfrè mostrou-me todos os jovens com o mesmo semblante, estatura e
idade daquele tempo. Parecia-me estar no antigo Oratório na hora do recreio.
Era uma cena cheia de vida, movimento, alegria. Quem corria, quem pulava,
quem fazia pular. Aqui brincava-se de rã, de barra, ou com bola. Num lugar
uma roda de jovens pendia dos lábios de um padre, que lhes contava uma
história. Noutro, um clérigo no meio de outros meninos brincava de burro voa e
de jerônimo. Cantava-se, ria-se por todos os cantos e em toda parte
encontravam-se padres e clérigos, e ao redor deles jovens brincando e gritando
alegremente. Via-se que entre jovens e superiores reinava a maior cordialidade
210
e confiança. Eu estava encantado com o espetáculo. Valfrè me disse então:
— Veja, a familiaridade gera o afeto e o afeto produz confiança. Isto é que abre
os corações, e os jovens manifestam tudo sem temor aos mestres, assistentes
e superiores, Tornam-se sinceros na confissão e fora da confissão e se
prestam docilmente a tudo o que porventura lhes mandar aquele de quem têm
certeza de serem amados.
Nesse instante aproximou-se de mim o outro ex-aluno, de barba toda branca, e
me disse:
— Dom Bosco, quer conhecer e ver agora os jovens que atualmente estão no
Oratório? (Era José Buzzetti).
— Sim, respondi; porque há já um mês que não os vejo!
E apontou-os para mim: vi o Oratório e todos vós no recreio. Mas já não ouvia
gritos de alegria e cantos, não via o movimento e a vida da cena anterior.
Nos modos e nos rostos de muitos jovens lia-se enfado, cansaço, mau humor,
desconfiança que me fazia sofrer o coração. Vi, é verdade, muitos a correr,
brincar, agitar-se, com feliz despreocupação, mas muitos outros estavam sós,
encostados às colunas, dominados por pensamentos desalentadores;
encontravam-se outros pelas escadas e nos corredores ou na sacada perto do
jardim para evitar o recreio comum; outros passeavam lentamente em grupos
falando em voz baixa, lançando ao derredor olhares desconfiados e maliciosos.
Sorriam de vez em quando, mas com um sorriso acompanhado de olhares que
faziam suspeitar e até mesmo acreditar que S. Luis haveria de corar se
andasse em tal companhia; mesmo entre os que brincavam alguns havia tão
enfarados, que mostravam claramente não achar nenhum gosto nos
divertimentos.
— Viu seus jovens? — perguntou-me o ex-aluno.
— Vejo-os —, respondi suspirando.
— Como são diferentes do que éramos nós em nosso tempo! — exclamou o
ex-aluno.
— É Pena! Quanta falta de vontade nesse recreio!
— De aí é que vem a frieza de tantos meninos na freqüência dos santos
Sacramentos, o desleixo das práticas de piedade na igreja e fora; o estar de
má vontade num lugar onde a Divina Providência os cumula,de todo bem para
o corpo, para a alma, para a inteligência. De aí não corresponderem muitos à
sua vocação; de aí a ingratidão para com os superiores; de aí os segredinhos e
as murmurações, com todas as demais deploráveis conseqüências.
— Compreendo, entendo — respondi —. Mas como reanimar estes meus caros
jovens, para que retomem a antiga vivacidade, alegria, expansão?
211
— Com o amor!
— Com o amor? Mas os meus jovens não são bastante amados? Sabes
quanto os amo. Sabes quanto por eles sofri e tolerei no decorrer de bem
quarenta anos, e quanto suporto e sofro mesmo agora. Quantas privações,
quantas humilhações, quantas oposições, quantas perseguições para dar-lhes
pão, casa, professores e especialmente para garantir-lhes a salvação da alma.
Fiz tudo quanto soube e pude por eles, que são o amor de toda a minha vida.
— Não falo do senhor!
— De quem então? Dos que me fazem as vezes? Dos diretores, prefeitos,
professores, assistentes? Não vês como são mártires do estudo e do trabalho?
Como consomem sua juventude por aqueles que a Divina Providência lhes
confiou?
— Vejo, sei perfeitamente; mas isso não basta. Falta o melhor.
— Que é que falta, então?
— Que os jovens não somente sejam amados, mas que eles próprios saibam
que são amados.
— Mas, afinal, não têm olhos? Não têm a luz da inteligência? Não vêem que
tudo o que por eles se faz é por amor deles?
— Não, repito, isso não basta.
— Que é preciso, então?
— Que sendo amados nas coisas que lhes agradam, com participar em suas
inclinações infantis, aprendam a ver o amor nas coisas que naturalmente pouco
lhes agradam, como a disciplina, o estudo, a mortificação de si mesmos; e
aprendam a fazer essas coisas com entusiasmo e amor.
— Explica-te melhor.
— Observe os jovens no recreio.
Observei e respondi: — E que há de especial para ver?
— Há já tantos anos que vive a educar os jovens e não entende? Olhe melhor!
Onde estão os nossos salesianos?
Observei e vi que bem poucos padres e clérigos se misturavam com os jovens
e bem menos ainda eram os que tomavam parte em seus divertimentos. Os
superiores já não eram a alma do recreio. A maior parte deles passeava
conversando entre si, sem ligar ao que faziam os alunos; outros olhavam o
recreio sem se preocuparem absolutamente com os jovens; outros vigiavam,
212
mas tão de longe que não poderiam perceber se os jovens cometiam alguma
falta; um ou outro avisava mas em atitude ameaçadora e bem de raro. Ainda
havia um ou outro salesiano que gostaria de intrometer-se no meio dos jovens;
vi, porém, que estes procuravam propositalmente afastar-se dos professores e
superiores.
Então meu amigo continuou: — Nos velhos tempos do Oratório o senhor não
estava sempre no meio dos jovens, especialmente na hora do recreio? Lembra
aqueles belos anos? Era um santo alvoroço, um tempo que lembramos sempre
com saudade, porque o afeto é que nos servia de regra, e nós não tínhamos
segredos para o senhor.
— Certamente. Tudo então era alegria para mim. Os jovens corriam ao meu
encontro, para falar-me; ansiavam por ouvir meus conselhos e pô-los em
prática. Vês, porém, que agora as contínuas audiências, os muitos afazeres e
minha saúde não o permitem.
— Está bem: mas se o senhor não pode, por que seus salesianos não o
imitam? Por que não insiste, não exige que tratem os jovens como o senhor os
tratava?
— Eu falo, canso-me de falar, entretanto muitos não se sentem dispostos a
enfrentar os trabalhos como outrora.
— E então descuidando o menos, perdem o mais, e esse “mais” são seus
trabalhos. Amem o que agrada aos jovens e os jovens amarão o que aos
superiores agrada. E assim ser-lhes-á fácil o trabalho. A causa da mudança
atual no Oratório é que bom número de jovens não tem confiança nos
superiores. Antigamente os corações estavam todos abertos aos superiores, a
quem os jovens amavam e obedeciam prontamente. Mas agora os superiores
são considerados como superiores e não como pais, irmãos e amigos; são pois
temidos e pouco amados. Por isso, se se quiser formar um só coração e uma
só alma, é preciso que por amor de Jesus se rompa a barreira fatal da
desconfiança e se lhe substitua uma confiança cordial. Guie pois a obediência
o aluno como a mãe guia o filhinho; reinará então no Oratório a paz e a antiga
alegria.
— Como fazer então para romper a barreira?
— Familiaridade com os jovens especialmente no recreio. Sem familiaridade
não se demonstra afeto e sem essa demonstração não pode haver confiança.
Quem quer ser amado deve demonstrar que ama. Jesus Cristo fez-se pequeno
com os pequenos e carregou as nossas fraquezas. Aí está o mestre da
familiaridade! O professor visto apenas na cátedra é professor e nada mais,
mas se está no recreio com os jovens torna-se irmão.
Se alguém é visto somente a pregar do púlpito, dir-se-á que está fazendo
apenas o próprio dever; mas se diz uma palavra no recreio, é palavra de
alguém que ama. Quantas conversões não provocaram algumas palavras suas
ditas ocasionalmente aos ouvidos de um jovem enquanto brincava!
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Quem sabe que é amado, ama; e quem é amado alcança tudo, especialmente
dos jovens. A confiança estabelece uma corrente elétrica entre jovens e
superiores. Os corações se abrem e dão a conhecer suas necessidades e
manifestam seus defeitos. Esse amor faz os superiores suportarem canseiras,
aborrecimentos, ingratidões, desordens, faltas e negligências dos meninos.
Jesus Cristo não quebrou a cana já partida, nem apagou a mecha que fumega.
Eis vosso modelo. Então não se verá ninguém mais trabalhar apenas por
vanglória; punir somente para satisfazer o amor próprio ofendido, retirar-se do
campo da vigilância tão-somente por ciúme de temida preponderância alheia;
murmurar dos outros querendo ser amado e estimado pelos jovens, com
exclusão de todos os demais superiores, ganhando nada mais que desprezo e
falsas manifestações de carinho; deixar-se roubar o coração por uma criatura
e, para fazer-lhe corte, descuidar todos os outros meninos; por amor da própria
comodidade julgar de somenos importância o dever importantíssimo da
vigilância; por vão respeito humano deixar de advertir quem deve ser advertido.
Se houver esse verdadeiro amor, não se haverá de procurar senão a glória de
Deus e a salvação das almas. Se vier a definhar, então é que as coisas já não
vão bem. Por que se quer substituir à caridade a frieza de um regulamento?
Por que se afastam os superiores da maneira de educar que Dom Bosco
ensinou? Por que ao sistema de prevenir com a vigilância e amorosamente as
desordens, se vai substituindo pouco a pouco o sistema, menos pesado e mais
cômodo para quem manda, de impor leis que se mantêm com castigos,
acendem ódios e geram desgostos, e se não se cuida de as fazer observar,
geram desprezo aos superiores e causam gravíssimas desordens?
É o que acontece necessariamente se faltar a familiaridade. Se se quiser, pois,
que o Oratório volte à antiga felicidade, reponha-se em vigor o antigo sistema:
O superior seja tudo para todos, sempre disposto a ouvir qualquer dúvida ou
queixa dos jovens, todo olhos para vigiar-lhes paternamente a conduta, todo
coração para procurar o bem espiritual e temporal dos que a Providência lhe
confiou.
Então, já não haverá corações fechados e não se alastrarão mais certos
segredinhos que acabam matando. Somente em caso de imoralidade os
superiores sejam inexoráveis. É melhor correr perigo de expulsar de casa um
inocente, que conservar um escandaloso. Os assistentes considerem
gravíssimo dever de consciência relatar aos superiores tudo o que souberem
ser de algum modo ofensa de Deus.
Então indaguei:
— Qual é o meio mais indicado para que reine essa familiaridade, esse amor e
confiança?
— A observância exata das regras da casa.
— E nada mais?
— O melhor prato de um jantar é o bom humor.
Enquanto meu antigo aluno acabava de falar e eu continuava a observar com
vivo desprazer o recreio, pouco a pouco senti-me abatido por grande canseira,
que ia crescendo cada vez mais. E chegou a tal ponto que não podendo mais
resistir, estremeci e acordei.
Encontrei-me de pé junto à cama. As pernas estavam tão inchadas e me doíam
tanto que não podia ficar de pé. A hora já ia muito adiantada, de modo que me
deitei resolvido a escrever estas linhas a meus filhos.
Desejo não ter sonhos assim, por que me cansam demais. No dia seguinte
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sentia-me todo moído e não via a hora de descansar na próxima noite. Eis,
porém, que, apenas me deitei, o sonho recomeçou. Reaparece o pátio, os
jovens que atualmente estão no Oratório, e o mesmo aluno do Oratório.
Comecei a interrogá-lo:
— Comunicarei aos salesianos o que me disseste; mas que devo dizer aos
jovens do Oratório?
Respondeu-me:
— Que reconheçam quanto superiores, mestres e assistentes trabalham e
estudam por amor deles, pois se não fosse pelo bem deles não se haviam de
sujeitar a tantos sacrifícios; que se lembrem ser a humildade a fonte de toda
tranqüilidade; que saibam suportar os defeitos dos outros, porque a perfeição
não é deste mundo, mas somente do paraíso; que deixem de murmurar,
porque as murmurações esfriam os corações; e sobretudo que procurem viver
na santa graça de Deus. Quem não tem paz com Deus, não tem paz nem
consigo nem com os outros.
— Queres dizer então que há entre meus jovens alguns que não estão em paz
com Deus?
— Entre as causas do mal-estar que Dom Bosco conhece, e não vou recordar
agora, e às quais deve pôr remédio, esta é a principal. Com efeito, não
desconfia senão quem tem segredos a guardar, senão quem teme que tais
segredos venham a ser conhecidos, porque sabe que isso lhes traria vergonha
e desgraça. Ao mesmo tempo se o coração não está em paz com Deus, fica
angustiado, irrequieto, rebelde à obediência, irrita-se por um nonada, parecelhe que tudo vai mal, e por não ter amor, julga que os superiores não o amam.
— Entretanto, meu caro, não vês quanta freqüência de confissões e
comunhões há no Oratório?
— É verdade que é grande a freqüência das confissões, mas o que falta
radicalmente em muitos meninos que se confessam é a firmeza nos propósitos.
Confessam-se, mas sempre das mesmas faltas, das mesmas ocasiões
próximas, dos mesmos maus hábitos, das mesmas desobediências, das
mesmas transgressões dos deveres. E vai-se assim para a frente meses e
meses, e também por vários anos, e alguns chegam assim até o fim do curso
secundário. São confissões que pouco ou nada valem; conseqüentemente não
trazem a paz. Se o menino fosse chamado nesse estado ao tribunal de Deus,
que desgraça não seria.
— E há muitos assim no Oratório?
— Poucos em comparação com o grande número de jovens que se encontram
na casa. Veja. E apontava.
Olhei e vi os tais jovens um por um. Nesses poucos, porém, vi coisas que me
amarguraram profundamente o coração. Não quero pô-las no papel, mas
quando voltar quero contar a cada um dos interessados. Aqui apenas vos direi
que é tempo de rezar e de tomar firmes resoluções: tomar propósitos não com
palavras, mas com fatos, e demonstrar que os Comolos, os Domingos Sávios,
os Besuccos e os Saccardis ainda vivem entre nós.
Perguntei por fim ao meu amigo: — Não tens mais nada a dizer-me?
— Pregue a todos, grandes e pequenos, que se lembrem sempre de Maria SS.
Auxiliadora. Que ela os reuniu aqui para tirá-los dos perigos do mundo, para
que se amassem como irmãos, e para que dessem glória a Deus e a ela, com
o bom procedimento; que é Nossa Senhora que lhes providencia pão e meios
para estudar mediante graças e portentos. Lembrem-se de que estão na vigília
215
da festa de sua Mãe S., e com sua ajuda deve cair a barreira da desconfiança
que o demônio soube erguer entre jovens e superiores, e da qual se aproveita
para ruína de certas almas.
— E conseguiremos destruir essa barreira?
— Sim, certamente, contanto que grandes e pequenos estejam dispostos a
sofrer alguma pequena mortificação por amor de Maria e ponham em prática o
que eu disse.
Entremente, eu continuava a olhar meus jovenzinhos, ante o espetáculo dos
que via encaminhar-se para a eterna perdição senti tamanho aperto no coração
que acordei. Muitas coisas importantíssimas que eu vi gostaria de contar-vos,
mas o tempo e as conveniências não permitem.
Vou concluir. Sabeis o que deseja de vós este pobre velho, que gastou toda a
vida por seus caros jovens? Nada mais do que, feitas as devidas proporções,
retornem os dias felizes do Oratório primitivo. Os dias do afeto e da confiança
cristã entre jovens e superiores; os dias do espírito de condescendência e
tolerância por amor de Jesus Cristo de uns para com outros; os dias dos
corações abertos com toda a simplicidade e candura; os dias da caridade e da
verdadeira alegria para todos. Tenho necessidade de que me consoleis, dandome a esperança e a promessa de que fareis tudo o que desejo para o bem de
vossas almas. Não conheceis suficientemente que felicidade é a vossa de
haverdes sido recebidos no Oratório. Diante de Deus declaro: Basta que um
jovem entre numa casa salesiana, para que a Virgem SS. o tome
imediatamente debaixo de sua especial proteção, Ponhamo-nos, pois, todos de
acordo. A caridade dos que mandam, a caridade dos que devem obedecer faça
reinar entre nós o espírito de S. Francisco de Sales. Ó meus caros filhinhos,
aproxima-se o tempo em que me deverei separar de vós e partir para a minha
eternidade. (Nota do secretário: Neste ponto Dom Bosco suspendeu o ditado;
os olhos se lhe encheram de lágrimas, não por desgosto, mas por inefável
ternura que ressumava de seu olhar e do tom de sua voz; depois de alguns
instantes continuou). Desejo, portanto, deixar-vos a todos, padres, clérigos,
jovens caríssimos, no caminho do Senhor, em que Ele próprio vos deseja.
Para tal fim, o Santo Padre, que vi sexta-feira, 9 de maio, vos manda de todo o
coração sua bênção.
No dia da festa de Nossa Senhora Auxiliadora estarei convosco ante a imagem
de nossa amorosíssima Mãe. Quero que essa grande festa se celebre com
toda a solenidade, e o Pe. Lazzero e o Pe. Marchisio providenciem para que
estejamos todos alegres também no refeitório. A festa de Maria Auxiliadora
deve ser o prelúdio da festa eterna que deveremos celebrar um dia, todos
juntos, no paraíso.
Vosso af.mo amigo em J. C.
Sac. João Bosco.
Data da carta: 10 de maio de 1884
Fonte:
© Direzione Generale Opere Don Bosco, via della Pisana, 1111 - 00163 Roma,
Italia
No Brasil: A Pedagogia de Dom Bosco em seus escritos", Editora Salesiana,
2004, São Paulo, pág. 14 - 22.
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