BNDES/FACE/CEDEPLAR/UFMG PROJETO PIS PERSPECTIVAS DOS INVESTIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL Módulo v.3 - Cultura Estudo 45 DIVERSIDADE CULTURAL: VALORIZAÇÃO E DIFUSÃO Coordenadora Ana Flávia Machado (Universidade Federal de Minas Gerais) Pesquisador Paulo César Miguez de Oliveira (Universidade Federal da Bahia) Maio de 2010 1. Parte 1 1.1 Atividade 1: Diagnóstico Socioeconômico Geral Análise dos indicadores IBGE e dos indicadores setoriais A temática em questão, Diversidade cultural: valorização e difusão enquadrase na categoria de estudo transversal. Daí que o seu desenvolvimento tenha privilegiado uma dimensão analítica da diversidade cultural focada nos seus aspectos histórico-contextuais e das políticas a ela dedicadas. Todavia, o estudo recorreu ao Sistema de Informações e Indicadores Culturais 20032005, estudo realizado pelo IBGE, e à RAIS - Relação Anual de Informações Sociais 2008, pesquisa publicada pelo Ministério do Emprego e Trabalho, com o objetivo de destacar a importância das atividades culturais realizadas por pequenas unidades (empresas e/ou organizações). Foi também utilizado o Suplemento de Cultura da MUNIC 2006, pesquisa publicada pelo IBGE, com o objetivo de identificar aspectos relacionados com as práticas culturais de indivíduos, grupos e comunidades nos municípios. 1.2. Atividade 2: Diagnóstico do Quadro Institucional Marcos Institucional e Legal O estudo faz referência a um conjunto diversificado de marcos políticoinstitucionais adotados pela UNESCO- Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, muito especialmente a “Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais”, aprovada, em outubro de 2005, em Paris, pela 33ª Conferência Geral desta organização do sistema ONU. Estrutura de Financiamento O financiamento é uma das questões-chave das políticas culturais no Brasil, hoje. Assim, o estudo aborda a necessidade de alteração da atual estrutura de financiamento à cultura no país, marcadamente assentada nos mecanismos de incentivos fiscais e que, pelas suas características, desfavorece enormemente as políticas dedicadas à diversidade cultural, na direção de um modelo em que o Estado tenha o protagonismo direto no 2 financiamento das atividades culturais. Nessa medida, o estudo registra a importância do Congresso Nacional vir a aprovar a Proposta de Emenda à Constituição 150/03 que estabelece um percentual fixo de investimento anual em cultura de 2% para a União, 1,5% para governos dos estados e do Distrito Federal e 1% para os municípios. Estrutura de Gestão A questão da gestão é abordada pelo estudo sob duas perspectivas. Uma, por conta da baixa capacidade gerencial das pequenas organizações do setor cultural, sejam elas unidades empresariais ou grupos e comunidades. A outra, as dificuldades de gestão do próprio aparelho de Estado na condução das políticas públicas. Falhas de mercado Ainda que a diversidade cultural brasileira tenha nas pequenas unidades produtoras que operam no mercado da cultura um ator relevante, o estudo compreende que parte expressiva da nossa diversidade cultural deriva do trabalho que realizam indivíduos, grupos e comunidades, cujas práticas e atividades culturais não necessariamente inscrevem-se na lógica de mercado. Falhas institucionais O estudo chama atenção para a incapacidade e despreparo do Estado brasileiro em termos político-institucionais para lidar com políticas que, a exemplo daquelas que pretendem alcançar a problemática da diversidade cultural, impõem processos compartilhados, participativos e de empoderamento envolvendo das comunidades, segmentos socioculturais e grupos. A seguir, é apresentado o texto do estudo referido na Atividade 2. Introdução: a cultura na circunstância contemporânea A cultura tem vindo a ocupar um lugar de destaque na circunstância contemporânea. A rigor, contudo, tal afirmação caberia perfeitamente se referida a outros momentos históricos. Ao século passado, por exemplo, cuja 3 caracterização seria por demais incompleta se não registrasse a explosão da cultura de massa e suas múltiplas imbricações. Ou, bem mais atrás ainda, às centúrias atravessadas pelo Renascimento, cujas revoluções nas artes e nas ciências, ao escancararem o mundo à intervenção do homem, refundaram a história do Ocidente. Todavia, tal afirmação, referida ao contexto atual, comporta uma novidade que faz a diferença. Trata-se do fato de que, na cena contemporânea, a cultura transbordou os limites do seu campo específico. Ou seja, se a Modernidade teve como um dos seus traços mais marcantes a emergência do campo da cultura – i.é., de um “espaço social de relações objetivas” (BOURDIEU,1989, p. 64), uma esfera social determinada e singular dotada de capital próprio (regras, normas, crenças, jogos de linguagem, disputas, tensões e relações de poder), resultado de longo e lento processo de constituição progressiva que, entre os séculos XV e XIX, vai se definindo “em oposição ao campo econômico, ao campo político e ao campo religioso” (BOURDIEU, 1992, p. 99) – a contemporaneidade apresenta como uma de suas características mais importantes o fato da cultura movimentar-se para além das fronteiras do campo cultural propriamente dito, alcançando, em força, outros campos da vida social, como, por exemplo, a política e a economia. É o que indica, por exemplo, Albino Rubim, chamando a devida atenção para o fato de que o espraiamento da cultura não significa, em qualquer hipótese, o seu desaparecimento enquanto campo social específico: “Na contemporaneidade, a cultura comparece como um campo social singular e, de modo simultâneo, perpassa transversalmente todas as outras esferas societárias, como figura quase onipresente” (RUBIM, 2007, p.148). Ou seja, às tensões que historicamente balizaram as relações entre a cultura e a sociedade, agregam-se, ampliando e redefinindo tais relações, fenômenos e elementos como as novas sócio-tecnologias da comunicação e da informação, interculturalidades, multiculturalidades, transculturalidades, hibridismos, espetacularização, turistização, localismos, globalismos, glocalismos que, no seu conjunto, dão forma a uma miríade complexa e 4 multifacetada de possibilidades e desafios num jogo que é próprio do mundo contemporâneo. Recorrendo à gramática das Relações Internacionais, pode-se dizer, portanto, que o lugar destacado de que desfruta a cultura no contexto contemporâneo sugere o deslocamento da cultura do amplo repertório das low politics (educação, saúde, emprego, segurança etc.) na direção das high politics, com sua exclusiva agenda de temas considerados vitais para os Estados, como política exterior, comércio internacional, defesa e segurança. É nesta direção que apontam, por exemplo, a premissa que informa o ponto de partida do relatório final do projeto Pensamento Renovado de Integração, desenvolvido pelo Convênio Andrés Bello, instituição sediada na Colômbia e com atuação em muitos países latino-americanos, segundo a qual “...el mundo en este siglo se contituirá no en torno a lo geopolítico, ni a lo geoeconómico, sino principalmente en torno a lo geocultural” (GARRETÓN, 2003, p.7) ou a afirmação antropóloga Lourdes Arizpe de que “A cultura será sem dúvida uma das principais questões da sustentabilidade, do desenvolvimento e da governabilidade no século XXI” (ARIZPE, 2001, p.13). Também na mesma direção, ainda que abandonando o espírito de promessa e adotando um perigoso tom de ameaça, comparecem as criticadas teses de Huntington (1997) sobre o “choque de civilizações“, segundo a qual, a fonte predominante dos conflitos internacionais deixarão de ser de base ideológica ou econômica e passarão a ser fundamentalmente culturais. A transversalidade da cultura e seus enlaces Aqui, a palavra-chave é, certamente, transversalidade. Ou seja, ao transitar fora das fronteiras do seu campo singular e específico, a cultura estabelece enlaces com outras dimensões da vida em sociedade. Impõe-se, sugere Edson Farias (2008, p.3), “... como uma espécie de fator transversal em planos e graus diferenciados, atravessando a política, a economia e os domínios da administração e da gestão, mas também na religião, no campo jurídico e das tecnologias, das agências que definem as agendas desenvolvimentistas e entre outros setores.” (FARIAS, 2008, p.3, grifo nosso). 5 Tomemos, por exemplo, o caso da relação entre a cultura e a política. Aqui, podemos falar, como propõe Rubim (2007) numa perspectiva gramsciana, na “politização da cultura”, ou seja, no papel da cultura como elemento indispensável à política por conta do processo de construção (e disputa) de hegemonias – processo que remete à modernidade mas cuja maturidade plena só é alcançada na sociedade contemporânea. Ou na “culturalização da política” (Rubim, 2007), isto é, na incorporação pela agenda política, ainda que de forma sempre tensionada pelo sabor de novidade que carrega, de demandas com claro teor cultural, como, por exemplo, ecologia; gênero; orientação sexual; modos de vida; estilos de sociabilidade e comportamentos; diferenças étnicas, religiosas e nacionais; diversidade cultural; etc. Ao transbordar seu campo específico e impor-se como “fator tranversal”, a cultura experimenta contemporaneamente, também, e por conseqüência, um outro movimento, digamos, de enlargamento, este, no campo da produção de conhecimento. Com efeito, para dar conta dos enlaces que constitui, a cultura abre um novo campo de reflexão, os chamados “estudos culturais”, deixa de ser objeto do exclusivo interesse da antropologia e da sociologia, disciplinas classicamente dedicadas às questões culturais, passa a ocupar espaço na agenda de pesquisas de áreas tais como os estudos comunicacionais, a ciência política, a história, a geografia, a crítica literária e, em anos mais recentes, invade territórios acadêmicos até então não só distantes como até mesmo hostis à temática cultural, a exemplo da economia, da gestão e dos saberes tecnológicos. Tal característica – a presença cada vez mais intensa e com maior poder de determinação, de elementos, categorias e lógicas típicas do campo cultural em outras dimensões da vida social – tem levado a que questões, por exemplo, como criatividade, estética e espetáculo, historicamente reconhecidas como monopólio exclusivo do mundo da cultura, tenham passado a integrar a reflexão em esferas tão diversas quanto distantes do campo cultural - discute-se, há muito, a “espetacularização da sociedade”1 e, 1 Cf. Guy DEBORD, A sociedade do espetáculo – Comentários sobre a sociedade do espetáculo (Rio de Janeiro, Contraponto, 1997), cuja primeira publicação data de 1967. 6 mais recentemente, o “espetáculo da política” 2 ; investiga-se a “gestão espetacularizada” e a “dimensão estética das organizações”3; ganham peso as reflexões sobre a “estetização do mundo do trabalho”4. Atento a este fenômeno, Eduardo Subirats, embora destacando que a invasão destes vários domínios pela cultura obedeça a uma lógica não propriamente cultural mas tão somente a ditames como objetividade, racionalidade e utilidade, reconhece que “toda a vida social parece convergir para o estímulo da inovação das formas e dos estilos como uma necessidade não só artística, mas, precisamente, vital” (SUBIRATS, 1989, p. 10). Um enlace-chave: cultura e economia Entretanto, ainda que por força deste seu caráter transversal a cultura compareça de forma relevante em várias esferas da vida social, é nos enlaces com o campo da economia que de forma mais acentuada a cultura tem vindo a a demandar a atenção do mundo científico-acadêmico, de instituições governamentais, de agências multilaterais, de bancos de desenvolvimento e de organizações não-governamentais. A relação entre cultura e economia não é, obviamente, recente. Resulta do desenvolvimento capitalista e deve ser percebida a partir de dois momentos específicos. Num primeiro momento, entre os séculos XVIII e XIX, o capitalismo avança sobre a esfera da circulação dos bens culturais que, dessa forma, transformam-se em mercadorias. Ou seja, liberta das imposições históricas do mecenato e dos ditames da igreja, a cultura 2 Cf. ex. Antonio Albino Canelas RUBIM, Comunicação e política (São Paulo, Hacker, 2000); Antonio FAUSTO NETO, José Luiz BRAGA e Sérgio Dayrell PORTO A encenação dos sentidos: mídia, cultura e política (Rio de Janeiro, Diadorim, 1995) e Brasil: comunicação, cultura & política (Rio de Janeiro, Diadorim, 1994). 3 Do conjunto de trabalhos mais recentes, devem ser destacados aqueles que compõem os três volumes do Handbook de estudos organizacionais organizados por Stewart CLEGG, Cynthia HARDY e Walter R.NORD e já publicados no Brasil (São Paulo, Atlas, 1999, 2001 e 2004). Da produção nacional podem ser citados, dentre outros, a coletânea organizada pelos professores Fernando Prestes MOTTA e Miguel CALDAS intitulada Cultura organizacional e cultura brasileira (São Paulo, Atlas, 1997) e o livro de autoria do professor Thomaz WOOD JR., Organizações espetaculares (Rio de Janeiro, FGV, 2001). 4 Cf. Domenico DE MASI, A emoção e a regra; os grupos criativos na Europa de 1850 a 1950 (Rio de Janeiro, José Olympio, 1997) e O futuro do trabalho; fadiga e ócio na sociedade pósindustrial (Rio de Janeiro, José Olympio, 1999). 7 estabelece uma relação direta com um público consumidor de seus produtos, os bens culturais, através de uma nova instância intermediadora, o mercado. Já o segundo momento, quando a partir da metade dos “oitocentos” o capitalismo ingressa na sua fase monopolista-oligopolista, corresponde à captura da cultura pela lógica mercantil capitalista no instante mesmo da sua produção, ou seja, os bens culturais passam a ser concebidos já como mercadorias no momento da sua criação, portanto, como produtos destinados à troca e ao consumo no mercado. E é exatamente sobre este processo de subsunção da cultura pelo capital que se debruçam Theodor Adorno e Max Horkheimer para desenvolverem a noção de “indústria cultural” (ADORNO, HORKHEIMER, 1997), constructo téorico seminal que dá conta do fato de que a expansão das relações mercantis do tipo capitalista pelo conjunto da vida social alcançou,também, a cultura. Albino Rubim (2007) observa que a instalação da lógica de indústria cultural vai potencializar outro dos enlaces da cultura de extrema relevância para a caracterização da contemporaneidade. Trata-se da “tecnologização da cultura”, ou seja, da aplicação da tecnologia industrial à produção de bens simbólico-culturais, fenômeno possibilitado pelo desenvolvimento, em finais do século XIX, das técnicas de reprodução de textos, imagens e sons, processo magistralmente descrito por Walter Benjamin (BENJAMIN, 1990). As novas linguagens daí decorrentes, como a fotografia e o cinema, que vêm juntar-se às formas culturais até então existentes, como a literatura, a música, as artes plásticas, abrem caminho para “a proliferação das mídias e, no seu rastro, das indústrias culturais” (RUBIM, 2007, p. 143). A partir de então, o público consumidor de cultura passa a ter a sua disposição, no mercado, uma cultura produzida industrialmente, pouco importando se subordinada ou não à lógica de indústria cultural, processo que cria a ambiência da cultura midiática e, mais presentemente, desemboca no universo da cibercultura, este, fruto dos desenvolvimentos advindos da tecnologia de base digital. 8 O fato é que se a “mercantilização da cultura” já no século XIX pôs em movimento uma “economia das artes”, à entrada deste novo século, os bens e serviços simbólico-culturais dão corpo a uma “economia da cultura” que, constituída ao longo do século passado, exibe um gigantesco mercado que é dominado por grandes conglomerados de produção e distribuição de conteúdos culturais, funciona em escala global e contabiliza cifras astronômicas. Alguns números da economia da cultura Com efeito, os números e resultados apresentados pelo mercado da cultura impressionam a tal ponto que alguns autores, inclusive, começam a referir-se a ele como o setor quaternário da economia (QUINTANA, 1990). Em termos do PIB global, por exemplo, as estimativas do Banco Mundial apontam para uma participação do mercado da cultura à volta de, aproximadamente, 7%, e para uma taxa média de crescimento em torno de 10% para os próximos anos, (PROMOVENDO..., 2007). Já do ponto de vista do comércio internacional é a UNESCO que, apoiada em dados da UNCTAD, estima um mercado para os produtos do mundo da cultura da ordem de US $ 1.3 trilhão (UNESCO, 2005). Os números, entretanto, não perdem a grandiosidade quando o foco deslocase da economia global para as economias nacionais, em que pesem as diferenças conceituais e metodológicas e suas implicações quanto à definição e mensuração do que constitui o setor da economia cultural. Observe-se, por exemplo, os casos dos EUA e Reino Unido. Nos Estados Unidos, país que controla a maior parte dos negócios do mercado cultural em todo mundo, mesmo deixando de fora vários dos setores (parques temáticos, cassinos, etc.) que conformam o que os norteamericanos definem como economia do entretenimento (a entertainment economy que europeus e japoneses costumam chamar de Mickey Mouse economy) e concentrando a atenção nos dados divulgados pela International Intellectual Property Alliance (IIPA), instituição que congrega as chamadas copyright industries, i.e., as indústrias que produzem e/ou distribuem bens que se caracterizam fundamentalmente por incorporar propriedade intelectual 9 (indústria editorial (livros, revistas, jornais e periódicos, impressos e eletrônicos), do audiovisual (cinema, rádio, TV, DVDs, etc.), fonográfica e do software (aplicações para negócios e de entretenimento) – os números revelados são absolutamente significativos. Segundo a IIPA (2009), este setor representou, em 2007, 11,05%, do PIB norte-americano, ou seja, U$ 1,52 trilhão. No Reino Unido, outro país com importante presença no mercado global da cultura, as cifras não são menos surpreendentes, com a participação do setor no PIB alcançando, em 2005, significativos 8,2% (BRITISH COUNCIL, 2005). São, certamente, números como estes que legitimam a inclusão da cultura no seleto grupo das high politics e justificam sua presença na agenda de organizações multilaterais como a OMC- Organização Mundial do Comércio, que, desde 1993, vem discutindo, no âmbito das negociações multilaterais sobre a liberalização do comércio internacional, a questão dos serviços audiovisuais, segmento do mercado cultural que representa negócios da ordem dos US$ 450 bilhões em todo o mundo (ABPITV, 2009) . O outro lado da economia da cultura: a “culturalização da economia” Mas as relações entre cultura e economia não se esgotam na existência de um mercado de bens e serviços simbólico-culturais. É que, e retomando a idéia de transbordamento, a cultura rompeu os limites do mercado (cultural) em que seus bens e serviços são produzidos e comercializados e alcançou outros mercados, “culturalizando” suas mercadorias. Assim, à “mercantilização da cultura”, vem juntar-se, contemporaneamente, a “culturalização da mercadoria”, ou seja, um fenômeno que expressa a secundarização dos aspectos estritamente físico-técnicos em favor do crescente papel de elementos simbólicos (design, marca, origem, etc.), portanto, “densos de conteúdo cultural” (RUBIM, 2007, p.145), na determinação do valor das mercadorias. Observa-se, por exemplo, que em inúmeros ramos da produção econômica clássica, das indústrias do vestuário e moveleira chegando até mesmo à indústria automobilística, artistas, estilistas e designers se tornaram 10 trabalhadores fundamentais pelo que agregam de valor simbólico aos bens produzidos. Sobre este aspecto da relação entre cultura e economia, Negri e Cocco afirmam que “O que é cultural no capitalismo globalizado das redes é o trabalho em geral. Ou seja, um trabalho que se torna intelectual, criativo, comunicativo – em uma palavra, imaterial. A cultura ‘gera valor’ (como diz o ‘management’) porque o que é incorporado aos produtos são formas de vida: estilos, preferências, status, subjetividades, informações, normas de consumo e até a produção de opinião pública. A mercadoria precisa ser dotada de valor cultural. O trabalho se torna, assim, ação cultural. O trabalho da cultura e na cultura se torna cada vez mais o paradigma da produção em seu conjunto.” (NEGRI e COCCO, 2006). Além de Antonio Negri e Giuseppe Cocco, para quem, hoje, “a cultura não tem só um expressivo peso econômico”, mas é a própria “economia como um todo [que] depende cada vez mais, em seu conjunto, das dimensões culturais (NEGRI, COCCO, 2006), outros autores têm destacado a importância que assumem na contemporaneidade os enlaces entre cultura e economia. Frederic Jameson, por exemplo, para quem a cultura se transformou na própria lógica do capitalismo contemporâneo, afirma que “O que ocorreu é que a produção estética hoje está integrada à produção das mercadorias em geral: a urgência desvairada da economia em produzir novas séries de produtos que cada vez mais pareçam novidades (de roupas a aviões), com um ritmo de turn over cada vez maior, atribui uma posição e uma função estrutural cada vez mais essenciais à inovação estética e ao experimentalismo” (JAMESON, 1997, p. 30). O geógrafo David Harvey, por seu turno, identifica nas singularidades culturais de uma região ou de um produto o componente fundamental à formação do que chama de “rendimento monopólico” contemporâneo, afirmando que “a idéia de ‘cultura’ está cada vez mais entrelaçada com as tentativas de reafirmar tais poderes monopólicos, exatamente porque alegações de singularidade e autenticidade podem ser mais bem articuladas como afirmações culturais distintas e não duplicáveis” (HARVEY, 2005, p. 149). Compreende-se, assim, a rigidez com que é tratada, atualmente, a questão da propriedade intelectual, seja no âmbito do direito autoral, que regula as 11 criações artístico-culturais, seja no que diz respeito as suas outras modalidades, como marcas e patentes, uma forma contemporânea de “rendimento monopólico” de que se beneficiam tanto os grandes conglomerados que controlam as indústrias culturais, quanto os oligopólios que dominam outros setores da produção de bens e serviços, a exemplo da indústria farmacêutica ou de desenvolvimento e produção de software. Ou seja, a defesa intransigente da propriedade intelectual empreendida pelos grandes conglomerados traduz a busca do capitalismo por novas fontes de privilégios monopolistas, neste caso remetida à centralidade a que foram alçados os atributos culturais que passaram a ser crescentemente incorporados nas mais distintas mercadorias. Daí, certamente, a indagação de David Harvey: “Se alegações de singularidade, autenticidade, particularidade e especialidade estão por trás da capacidade de captar rendimentos monopólicos, então em que melhor terreno é possível fazer tais alegações senão no campo dos artefatos e práticas culturais historicamente constituídos e das características ambientais especiais (inclusive os ambientes sociais e culturais construídos)?” (HARVEY, 2005, p. 158). A economia da cultura como campo de estudos e a novidade da economia criativa Estes (e outros tantos) autores, contudo, não são vozes isoladas no que se refere às reflexões quanto ao enlace entre cultura e economia. Muito ao contrário, nos anos mais recentes, o que pode ser nomeado como “economia da cultura” tem vindo a constituir-se como uma área específica de estudos e pesquisas. Até os anos 19605, as questões envolvendo a dimensão econômica das indústrias culturais compunham a agenda de estudos da economia industrial. Desde então, e certamente por conta do crescimento exponencial da importância econômica do mercado da cultura, ou seja, como informa 5 A constituição da economia da cultura enquanto uma área específica de estudos e investigações tem como marco fundador a publicação, em 1966, do artigo de William BAUMOL e William BOWEN intitulado Performing arts: the economic dilemma: a study of problems common to theater, opera, music and dance (New York, Twentieth Century Fund, 1966). 12 Benhamou (1997, p.21), devido ao “aumento de una propensión [da produção cultural] a generar flujos de remuneración y de empleo”, assistiu-se à constituição e desenvolvimento desta nova área de estudos, a “economia da cultura”, que já registra uma intensa produção científico-acadêmica6, conta com um significativo número de publicações especializadas, a exemplo do importante Journal of Cultural Economics, e com organizações, como a Association for Cultural Economics International (ACEI) e a Fédération Européenne des Associations pour l’Économie de la Culture (FEDAEC), ambas criadas em 1993, é objeto de um grande número de seminários, fóruns e congressos especializados e, também, desperta atenção crescente de governos, agências multilaterais e instituições não-governamentais. Mais recentemente ainda, acompanhando uma idéia posta em marcha pelos governos Australiano e Britânico7 na metade dos anos 19908, o enlace entre 6 Dentre os pesquisadores que atuam na área da economia da cultura, devem ser lembrados, dentre outros, David THORSBY (Economics and culture, Cambridge, Cambridge University Press, 2001); Ruth TOWSE (A handbook of cultural economics, Cheltenham (UK), Edward Elgar Publishing, 2003); Harold L. VOGEL (La industria de la cultura y el ocio: un análisis económico, Madrid, Fundación Autor, 2004); e Bruno S. FREY (Arts & economics: analysis & cultural policy, New York, Springer, 2000. Em 2008, foi publicado um livro organizado pelos professores Helmut K. ANHEIER e Yudhishthir Raj ISAR (The Cultural Economy: the cultures and globalization, Londres, Sage, 2008) que nas suas quase setecentas páginas apresenta o estado da arte na área da economia da cultura e conta com a colaboração dos principais estudiosos que se ocupam da temática em todo o mundo. No Brasil, os estudos e pesquisas na área da economia da cultura ainda são incipientes e, regra geral, costumam tratar de setores específicos como o cinema, a música ou a indústria editorial. Além da produção que vem sendo realizada em vários programas de pósgraduação, devem ser lembrados autores como Fábio Sá EARP (Pão e circo: fronteiras e perspectivas da economia do entretenimento, Rio de Janeiro, Palavra e Imagem, 2002); Frederico A. Barbosa da SILVA (Economia e política cultural: acesso, emprego e financiamento, Brasília, Ministério da Cultura; IPEA, 2007); Ana Carla Fonseca REIS (Economia da cultura e desenvolvimento sustentável: o caleidoscópio da cultura, Barueri, Manole, 2007); Alain HERSCOVICI (Economia da cultura e da comunicação; elementos para uma análise sócio-econômica da cultura no “capitalismo avançado”, Vitória, Fundação Ceciliano Abel de Almeida; UFES, 1995); e César BOLAÑO (Indústria cultural, informação e capitalismo, São Paulo, Hucitec; Polis, 2000). 7 Farta documentação sobre a temática das “indústrias criativas” no Reino Unido, está disponível no endereço do DCMS - Department for Culture, Media and Sport < http://www.culture.gov.uk/what_we_do/creative_industries/default.aspx>. Quanto à Austrália, pode ser consultado o endereço <http://archive.dcita.gov.au/2006/06/creative_industries>. 8 “A temática das indústrias criativas surgiu, a rigor, na Austrália, em 1994, a partir do desenvolvimento pelo governo daquele país do conceito de Creative Nation, idéia-base de uma política voltada para a requalificação do papel do Estado no desenvolvimento cultural do 13 cultura e economia passou, também, a trabalhar com as noções de “indústrias criativas” e “economia criativa”9. Cobrindo um grande número de atividades, que vão das indústrias culturais clássicas, como a do cinema, a da música e a editorial, a setores como propaganda, arquitetura, o mercado de artes e antiguidades, artesanato, design, moda, vídeo, softwares de lazer interativo, artes cênicas, softwares e jogos de computador, televisão e rádio, as “indústrias criativas” são definidas, regra geral, como sendo aquelas que utilizam insumos criativos e geram propriedade intelectual. Muito embora venha sendo objeto de críticas10, a novidade tem se espalhando rapidamente e merecido uma atenção muito especial de país. O conceito alcançou rapidamente o Reino Unido onde, em 1997, o New Labour, i.é., o novo Partido Trabalhista inglês, no seu manifesto pré-eleitoral, identificou as indústrias criativas como um setor particular da economia e reconheceu a necessidade de políticas públicas específicas que estimulassem seu já expressivo ritmo de crescimento.” (MIGUEZ, 2009, p. 63-64). 9 A literatura que trata das noções de “economia criativa” e “indústrias criativas” é bastante recente e foi inaugurada em 2001 com a publicação dos trabalhos de John HOWKINS (The creative economy. How people make money from ideas, London, Penguin Press, 2001), Richard E. CAVES (Creative industries; contracts between art and commerce, Cambridge, Harvard University Press, 2001) e Richard FLORIDA (The rise of the creative class... and how it’s transforming work, leisure, community, & everyday life, New York, Basic Books, 2002). Todavia, o primeiro esforço mais sistemático dedicado a esta temática data de dezembro de 2002, quando pesquisadores da Queensland University of Technology (Austrália), da London School of Economics, do Massachusetts Institute of Technology e da New York University organizaram, em Brisbane, na Austrália, o evento intitulado New Economy, Creativity and Consumption Symposium do qual resultou uma edição especial do International Journal of Cultural Studies (The new economy, creativity and consumption, London, SAGE Publications, v.7, n.1, mar.2004). No Brasil, o debate sobre a temática das “indústrias criativas” chegou através do Ministério da Cultura, na sequência da realização da XI Conferência Ministerial da UNCTAD realizada em junho de 2004, em São Paulo. Entretanto, a exemplo do que já foi registrado quanto à área de “economia da cultura”, os estudos sobre as “indústrias criativas” e a “economia criativa” entre nós ainda são pouco significativos. Neste particular, deve ser destacados o artigo de Miguez (2007) e duas publicações organizadas pela Fundação Getúlio Vargas no ano passado (KIRSCHBAUM et al, 2009; REVISTA…, 2009). 10 A principal crítica feita às noções de “indústrias criativas” e “economia criativa” é a sua forte ancoragem nos marcos da propriedade intelectual e o predomínio de lógicas de análise típicas das abordagens de organização industrial. Em 2008, Stuart Cunningham, John Hartley, Jason Potts e Paul Ormerod publicaram um artigo (Social network markets: a new definition of the creative industries, Journal of Cultural Economics, v.32, n.3, p.166-185, 2008) onde a lógica de economia industrial e a conseqüente utilização de sistemas de classificação industrial que têm caracterizado a noção de “indústrias criativas” são substituídas por uma compreensão segundo a qual as “indústrias criativas” são constituídas por complexas redes sociais, tanto na esfera de produção quanto na de consumo, que emergem de dinâmicas não-mercantis, mas que, frequentemente, se desenvolvem em regiões de fronteira entre mercados estabelecidos e redes sociais. 14 organizações do sistema das Nações Unidas11, de outros governos, como o da China, Coréia do Sul, Cingapura, Índia, África do Sul e Colômbia, e de estudiosos e centros de pesquisas12, no que pode se configurar como uma tendência de que o interesse sobre o tema deverá crescer bastante nos próximos anos. O fato é que, transbordando seu campo específico e, na qualidade de fator transversal, garantindo expressiva presença em múltiplas esferas sociais, a cultura vai estabelecer enlaces e experimentar transformações que, simultaneamente, deslocam, absorvem e requalificam distinções clássicas consagradas nos seus estudos, como alta cultura, cultura popular e cultura de massa. Emerge daí o que Canclini (2000) chama de “culturas híbridas” ou, de uma outra perspectiva, o que Yúdice (2004) compreende como uma nova condição prático-conceitual, a idéia de cultura como um “recurso” que é permanentemente acionado em várias direções. Cultura como um recurso para promover a inclusão social, para requalificar centros urbanos, para estimular a geração de emprego e renda, etc. Recurso, enfim, para ativar políticas que se ocupam do desenvolvimento. Cultura, desenvolvimento e diversidade cultural O protagonismo da cultura na contemporaneidade alcançou também, por óbvio, a questão do desenvolvimento. Aqui, se por um lado a relevância contemporânea da conjunção cultura e desenvolvimento pode ser creditada ao processo de transbordamento da cultura do seu campo específico, por outro, o tecimento desta conjunção resulta também das transformações 11 Em 2008, por exemplo, a UNCTAD – United Nations Conference on Trade and Development, dentre as agências da ONU aquela que mais vem trabalhando com a noção de “indústrias criativas”, publicou um relatório sobre a questão da economia criativa no mundo (Creative Economy Report 2008, Geneve & Nova York, United Nations, 2008. Disponível em: <http://stats.unctad.org/Creative/tableviewer/document.aspx?FileId=125>). 12 O principal centro de estudos e pesquisas dedicado à temática das “indústrias criativas” e da “economia criativa” é o ICI - The Institute for Creative Industries and Innovation, instituição vinculada à Creative Industries Faculty, instituição criada em 2001 na Queensland University of Technology, em Brisbane, na Austrália. Dentre os pesquisadores mais importantes vinculados a este centro estão Stuart Cunningham, John Hartley e Michael Keane. 15 experimentadas pela própria noção de desenvolvimento a partir da metade dos anos 1970. Com efeito, a constatação de que o modelo de desenvolvimento vigente desde o pós-Guerra, assentado exclusivamente num viés economicista, deteriorara em grau extremo as condições ambientais no planeta e, por conseqüência, a compreensão de que o imperativo da sustentabilidade exigia um meio ambiente saudável levaram à mobilização da comunidade internacional na direção da adoção de um conjunto de medidas voltadas para frear a degradação ambiental e proteger a biodiversidade. Marco substantivo deste processo foi a publicação, em 1975, pela fundação sueca Dag Hammarskjöld, do relatório sobre o desenvolvimento e a cooperação internacional intitulado “Que fazer”, documento que mobilizou os debates da 7a Sessão Extraordinária da Assembléia Geral das Nações Unidas convocada, neste mesmo ano, para discutir a Nova Ordem Econômica Internacional e que tornou-se um importante marco da emergência do conceito de desenvolvimento sustentável ao estabelecer que o desenvolvimento deveria “ser endógeno por oposição ao mimético, autoconfiante e autônomo no processo decisório por oposição ao dependente”, operar “a partir da lógica das necessidades e não do mercado (da demanda efetiva)”, refletir “diretamente sobre valores de uso sem passar pelos valores de troca, proceder em harmonia com a natureza e estar aberto ao câmbio institucional” (SACHS, 2005, p. 155, grifos do autor). Nos anos 1990, a idéia de desenvolvimento experimenta nova e importante inflexão ao redefinir-se como “efetivação e universalização do conjunto dos direitos humanos, das assim chamadas três gerações de direitos – direitos políticos, civis e cívicos; direitos econômicos, sociais e culturais; direitos coletivos como o direito ao meio- ambiente, à infância, etc.” (SACHS, 2005, p. 155). Ou seja, observa-se que ao longo das últimas décadas a idéia de desenvolvimento vem procurando se distanciar do receituário que a identificava, sem mais, com a idéia de crescimento econômico. 16 Enriquecendo-se e ganhando complexidade, o conceito de desenvolvimento tem buscado sua reinvenção numa perspectiva pluridimensional13, que se quer, também, histórica, processual e transdisciplinar, e submetida, simultaneamente, ao duplo imperativo ético da solidariedade sincrônica, em atenção à geração presente, e diacrônica, por conta do compromisso com as gerações futuras, um desenvolvimento que seja, portanto, conforme anota Ignacy Sachs, “(socialmente) includente, (ambientalmente) sustentável [e] (economicamente) sustentado” (SACHS, 2005, p.155, grifos do autor). Marcos da relação entre cultura, desenvolvimento e diversidade cultural A aprovação da Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais (UNESCO, 2006a), em 2005, veio reforçar substantivamente o protagonismo contemporâneo da esfera cultural, gerando impactos bastante positivos para a conjunção cultura e desenvolvimento. A rigor, deve ser registrado, este importante instrumento normativo internacional é o resultado de um processo de acumulação construído ao longo de mais de duas décadas de embates da cultura, em paralelo às transformações experimentadas no campo das teorias e políticas voltadas para a questão do desenvolvimento. Aqui, um marco fundamental é a Conferência Mundial sobre Políticas Culturais – MONDIACULT, realizada em 1982, sob a égide da UNESCO, na Cidade do México14. Tomando como base uma compreensão ampliada de cultura, compreendida, portanto, como “el conjunto de los rasgos distintivos, 13 O professor Ignacy Sachs sugere a expressão francesa “tout-développement” (desenvolvimento integral) que, segundo ele, é “uma maneira de reatar com uma belíssima definição do desenvolvimento proposta por Jacques Maritain e citada por Rubens Ricúpero na sua conferência Raul Prebisch, pronunciada na Unctad no dia 14 de setembro de 2004: «a promoção de todos os homens e do homem todo» (tous les hommes et tout l’homme)” (SACHS, 2005, p. ). 14 A realização da MONDIACULT, em 1982, representa o culminar de um processo iniciado a em 1968, quando a UNESCO, na sua 15 Conferência Geral, aprovou uma resolução a convocando a 1 . Conferência Intergovernamental sobre os Aspectos Institucionais, Administrativos e financeiros das Políticas Culturais, reunião que teve lugar em 1970, em Veneza. A seguir a esta foram realizadas conferências regionais sobre o mesmo tema: EUROCULT (Helsinque, 1972); ASIACULT (Jacarta, 1973); AFRICACULT (Accra, 1975); AMERICACULT (Bogotá, 1978); e ARABCULT (Bagdá, 1981). (KAUARK, 2009). 17 espirituales y materiales, intelectuales y afectivos que caracterizan a una sociedad o un grupo social” e que engloba, além “de las artes y las letras, los modos de vida, los derechos fundamentales al ser humano, los sistemas de valores, las tradiciones y las creencias” (UNESCO, 2006b), a Conferência, na sua declaração final, esboçou os primeiros contornos da compreensão acerca da relação entre cultura e desenvolvimento afirmando, categoricamente, que a “cultura constituye una dimensión fundamental del proceso de desarrollo” e que o “hombre es el principio y el fin del desarrollo”, cabendo às políticas culturais o dever de “rescatar el sentido profundo y humano del desarrollo” (UNESCO, 2006b). É interessante observar que ao tratar do que chamou de “dimensión cultural del desarrollo”, o documento expressa uma sintonia fina com os debates de que então se ocupavam teorias e políticas dedicadas à questão do desenvolvimento. Ou seja, recusando o viés economicista, ao chamar atenção para o fato de que o objetivo do desenvolvimento “no es la producción, la ganancia o el consumo per se, sino su plena realización individual y colectiva, y la preservación de la naturaleza”, o documento aponta para a necessidade de uma redefinição da noção de desenvolvimento como um processo equilibrado, alertando que mudança dessa envergadura só será possível na medida em que “los factores culturales” passem a integrar as estratégias de desenvolvimento e que tais estratégias tenham em conta “la dimensión histórica, social y cultural de cada sociedad” (UNESCO, 2006b). Em janeiro de 1988, na esteira das formulações aprovadas pela MONDIACULT, a ONU lança a Década Mundial do Desenvolvimento Cultural (1988-1997). De acordo com Javier Pérez de Cuéllar, então Secretário-Geral das Nações Unidas, o móvel desta importante iniciativa se deveu à compreensão de que “os esforços em favor do desenvolvimento haviam muitas vezes fracassado ‘porque a importância do fator humano – a teia complexa de relações, crenças, valores e motivações existente no centro de toda cultura – fora subestimada em muitos projetos de desenvolvimento’” (RELATÓRIO..., 1997, p. 9). 18 Simultaneamente ao lançamento da Década é criada a Comissão Mundial de Cultura e Desenvolvimento que, coordenada diretamente por Pérez de Cuéllar, conta, dentre outros renomados intelectuais, com a presença de Claude Lévi-Strauss e Celso Furtado. Do trabalho da Comissão resulta um relatório intitulado “Nossa Diversidade Criadora”, publicado em 1996, que na mesma linha das reflexões iniciadas em 1982, no México, reafirma a idéia de que “O desenvolvimento divorciado do seu contexto humano e cultural não é mais do que um crescimento sem alma” (RELATÓRIO..., 1997, p. 21) defende a tese de que “o desenvolvimento compreende não apenas o acesso a bens e serviços, mas também a possibilidade de escolher um estilo de coexistência satisfatório, pleno e agradável. Em uma palavra, o desabrochar da existência humana em suas várias formas” (RELATÓRIO..., 1997, p. 21). e formula uma agenda internacional com o propósito de mobilizar a comunidade internacional para o enfrentamento dos desafios envolvendo a conjunção cultura e desenvolvimento. Encerrada a Década Mundial do Desenvolvimento Cultural e na sequência da publicação do Relatório da Comissão Mundial de Cultura e Desenvolvimento, a UNESCO realiza, em 1998, em Estocolmo, a Conferência Intergovernamental sobre Políticas Culturais para o Desenvolvimento cujo plano de ação, focado em cinco pontos, reforça o papel das políticas culturais nas estratégias de desenvolvimento e afirma a necessidade de proteção e promoção da diversidade das culturas. (KAUARK, 2009) O espraiamento das questões envolvendo a relação cultura, desenvolvimento e diversidade cultural A significativa discussão sobre a relação entre cultura e desenvolvimento no período considerado não vai ficar, contudo, restrita ao ambiente e às organizações do campo cultural, a exemplo da UNESCO. Dentro do próprio Sistema das Nações Unidas, outras organizações passam a mobilizar esforços nesta direção, elaborando documentos, acionando programas, reunindo estatísticas e organizando eventos que apontam para a 19 incorporação às suas estratégias político-institucionais das imbricações entre cultura e desenvolvimento. O PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, por exemplo, a partir de 1993 adota o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), desenvolvido em 1990 pelos economistas Amartya Sen e Mahbub ul Haq, sinalizando uma compreensão mais abrangente da questão do desenvolvimento, ainda que o novo índice não considere como uma variável, no seu cálculo, a dimensão cultural. A partir de 2005, a unidade de Cooperação Sul-Sul do PNUD (UNDP Special Unit for South/South Cooperation) e a UNCTAD - Conferência das Nações Unidas sobre o Comércio e Desenvolvimento – órgão da Assembléia Geral da ONU que na sua XI Conferência Ministerial, realizada em junho de 2004, em São Paulo, organizou um painel dedicado exclusivamente à questão das indústrias criativas na perspectiva dos países em desenvolvimento – passam a estimular e a organizar ações relativas à economia criativa e às indústrias criativas, procurando articular os dois novos conceitos às questões do desenvolvimento nos países do Hemisfério Sul. A OIT - Organização Internacional do Trabalho, outra agência do Sistema ONU, ativa programas em países da África Austral focados na criação de empregos com base no fortalecimento das pequenas empresas a partir de setores como música, cinema e televisão, artes performáticas, artesanato, artes visuais e etno-turismo (ILO, 2003). A OMPI- Organização Mundial da Propriedade Intelectual, também vinculada às Nações Unidas, põe em discussão, a partir de outubro de 2004, um documento intitulado Agenda para o Desenvolvimento, onde a questão dos marcos regulatórios da propriedade intelectual passa a estar articulada diretamente às questões do desenvolvimento (WIPO, 2007). Para além das organizações do Sistema ONU, a discussão sobre as imbricações entre cultura e desenvolvimento alcança até mesmo organismos multilaterais dedicados à questão do desenvolvimento econômico e historicamente distantes das questões culturais. Em finais da década de 1990, o Banco Mundial organiza dois importantes eventos. Um, em 1998, intitulado “Conference on Culture in Sustainable Development – Investing in 20 Cultural and Natural Endowments” (CONFERENCE..., 2007) o outro, no ano seguinte, sob o título de “Culture Counts – Financing, Resources, and the Economics of Culture in Sustainable Development” (CULTURE..., 2000). Por seu turno, o BID – Banco InterAmericano de Desenvolvimento, cria, em 2005, uma fundação dedicada às questões que articulam a cultura ao desenvolvimento, a Inter-American Culture and Development Foundation. Da exceção cultural à diversidade cultural: a cultura na agenda das high politics Mas o processo que desemboca na aprovação da Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, em 2005, pela UNESCO, ainda que largamente tributário tanto dos câmbios experimentados pela noção de desenvolvimento quanto da acumulação político-institucional e conceitual envolvendo a conjunção cultura e desenvolvimento, não pode ser integralmente compreendido sem que sejam referidas as negociações multilaterais sobre comércio internacional da “Rodada Uruguai” do GATT - General Agreement on Trade and Tarriffs, entre os anos 1980 e início da década seguinte, quando a Comunidade Européia, sob forte impulso da França e com apoio do Canadá, obtém êxito na defesa da tese da “exceção cultural”, o que permitiu a retirada dos serviços audiovisuais da alçada dos acordos de livre comércio e a homologação do direito dos países à implementação de políticas nacionais de fomento à produção audiovisual. Os embates sobre a questão da “exceção cultural”, tema especialmente caro aos franceses desde o final da II Guerra Mundial (MATTELART, 2005), foram travados entre a posição norte-americana15, que advogava a proibição de qualquer forma de proteção nacional (subsídios à produção, cotas de telas, barreiras alfandegárias, etc.) ao cinema e a outros serviços audiovisuais sob A defesa da aplicação dos princípios livre cambistas aos bens e serviços simbólicoculturais pelos EUA, tenazmente defendida durante as negociações da “Rodada Uruguai”, continuou a ser esgrimida durante o processo de negociação da Convenção da UNESCO, levando a que a delegação norte-americana votasse contra a aprovação do documento final aprovado em outubro de 2005. 15 21 o argumento de serem eles formas de entretenimento de base industrial e, portanto, absolutamente iguais, por exemplo, a bicicletas, bolas, etc., e a posição da Comunidade Européia e do Canadá, defensoras da idéia de que tais serviços, por conta da sua dimensão cultural, deveriam ser objeto de um tratamento de “exceção”, ou seja, deveriam ser objeto de políticas culturais nacionais de apoio à sua produção. Sinal da presença da cultura no universo restrito das high politics pela via da agenda sobre comércio internacional, o debate sobre a “exceção cultural”, que ampliado política e conceitualmente vai dar lugar, na sequência, à tese da diversidade cultural, tem, na opinião Divina Frau-Meigs, um caráter estrategicamente emblemático. Segundo esta estudiosa, trata-se da El debate sobre la "excepción cultural" es una de las primeras crisis de la posguerra fría que pone a prueba la alianza entre los países de la esfera atlántica. Quizás sea eso lo que la hará pasar a la historia. Y es que, en efecto, la posguerra fría no puso en cuestión el poder político, estratégico y militar de los Estados Unidos; sin embargo, las tentativas de resistencia a la dominación norteamericana se dibujan en el eje diplomático y en el eje sociocultural. La excepción cultural constituye un ejemplo de ello: se trata de una estrategia de resistencia contenida, menos contra una América conquistadora que contra una América seductora, la América del síndrome HHMMS, "Harvard and Hollywood, McDonald's and Microsoft Syndrome" (Joffe). Es la primera conflagración de tamaño natural entre la idea de mundialización y la de americanización.” (FRAU-MEIGS, 2006, p.4) Certamente que impulsionada por fatos como esses a discussão sobre a adoção de um marco normativo internacional que acolhesse o repertório de questões envolvendo a diversidade cultural e sua incontornável imbricação com temas como políticas culturais e desenvolvimento ganhou força e velocidade a partir do ano 2000. Em 2001, a demanda por tal instrumento aparece nos documentos finais da reunião da Rede Internacional sobre Política Cultural (RIPC), liderada pelo Canadá e formada, então, por mais de 60 países. No ano seguinte, a 31ª Conferência Geral da UNESCO aprova a Declaração Universal sobre Diversidade Cultural (UNESCO, 2006c). Fora do âmbito estritamente cultural, o PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, na edição de 2004, adota como tema-título do seu Relatório do Desenvolvimento 22 Humano, “Liberdade Cultural num Mundo Diversificado”. Em outubro de 2005, em Paris, o processo é coroado com a aprovação16, pela 33ª Conferência Geral da UNESCO, da Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais. Dentre as várias questões tratadas nos seus trinta e cinco artigos, devem ser registradas, em especial, a compreensão da dupla natureza dos bens e serviços culturais, portanto, tanto sua dimensão simbólica quanto econômica; o reconhecimento do direito soberano dos Estados de aplicarem políticas culturais destinadas a proteger e promover suas indústrias culturais; o entendimento de que a Convenção não deve incluir compromissos adicionais em termos de propriedade intelectual nem deve estar subordinada a outros instrumentos internacionais (por exemplo, normas da área de comércio internacional ou de regulação da propriedade intelectual); a compreensão de que a diversidade cultural necessita de mecanismos internacionais de cooperação, inclusive financeiros; a demanda por um equilíbrio nas trocas internacionais de bens e serviços culturais; e o reconhecimento dos direitos das populações tradicionais sobre seus conhecimentos. Uma perspectiva substantiva para a relação cultura, desenvolvimento e diversidade cultural Mas, cabe agora indagar, qual o significado da relação entre a cultura, sua diversidade e o desenvolvimento? Certamente, de pouco interessa a esta relação, ao que ela encerra em termos de boas e novas promessas, uma compreensão balizada pelas teorias e modelos ancorados no reducionismo economicista que marcou, e ainda marca, grande parte das políticas de desenvolvimento. Aqui, evidentemente, a sedução não é pequena. Afinal, estamos diante de um setor econômico, o da produção cultural, que dá forma a um mercado de bens e serviços que, como já anotado, se caracteriza por sua escala global, pela presença de gigantescos conglomerados de produção 16 A Convenção foi aprovada com 148 votos a favor, dois contra (dos EUA e Israel) e quatro abstenções (da Austrália, Honduras, Nicarágua e Libéria). 23 e distribuição de conteúdos culturais, por seu extremo poder de fogo, tanto econômico quanto político-ideológico, e por números que traduzem uma geração de riqueza material de grande magnitude. No entanto, se for este o caminho a trilhar o que se verá é tão somente uma mudança do paradigma econômico-produtivo que, historicamente, vem dando sustentação ao desenvolvimento de viés economicista. Sairia de cena a produção industrial clássica, com suas chaminés, entraria, em seu lugar, a produção de bens e serviços simbólicos. É evidente, contudo, que as imensas possibilidades econômicas presentes no campo da cultura não podem ser esquecidas pelas políticas de desenvolvimento. Entretanto, o potencial de geração de riquezas e de empregos representado pela cultura não pode ser compreendido e operacionalizado por políticas dedicadas ao desenvolvimento sem que se tenha como referencia uma visão da cultura enquanto dimensão constitutiva da vida social, uma usina geradora de riquezas simbólicas. Ou seja, não se pode, tão somente, buscar o desenvolvimento tendo como eixo principal o crescimento econômico, neste caso, assentado no estímulo às atividades produtivas ligadas à cultura. Muito menos deve ser a cultura tomada como um simples “catalisador” do desenvolvimento, como sugere James Wolfensohn, ex-presidente do Banco Mundial (YÚDICE, 2004, p.30). Aqui, vale lembrar a advertência feita pelo Relatório da Comissão Mundial de Cultura e Desenvolvimento: a cultura “... não pode, em última instância, ser reduzida à posição subsidiária de mera promotora (ou freio) do desenvolvimento econômico. O papel da cultura não se esgota no de servir certas finalidades ...; constitui, de forma mais ampla, o fundamento social das próprias finalidades. O desenvolvimento e a economia são, pois, aspectos da cultura de um povo” (RELATÓRIO..., 1997, p.21-22) Portanto, uma relação entre cultura e desenvolvimento que pretenda avançar na direção de um modelo sustentável de desenvolvimento torna imperativa a necessidade da criação de condições propícias ao aumento da diversidade das manifestações culturais e a promoção da inclusão, simultaneamente cultural, social e econômica, de novos e múltiplos agentes criadores. É o caso, aqui, de compreender, como sugeriu Celso Furtado, que uma “política 24 de desenvolvimento deve ser posta a serviço do processo de enriquecimento cultural” (FURTADO, 1984, p.32) das sociedades, da firme recusa da adoção de uma visão meramente instrumental da relação entre cultura e desenvolvimento, cuja tendência é reforçar e proteger os interesses dos agentes culturais já estabelecidos (os grandes conglomerados das indústrias culturais), em favor do acionamento das oportunidades que se abrem quanto à expansão do espaço de criação e de circulação de manifestações culturais, com evidentes ganhos econômicos mas, também, com ganhos propriamente culturais, com a produção e a circulação ampliadas de repertórios simbólicos capazes de oferecer alternativas às produções simbólicas dominantes, incluindo-se aí diferentes modelos de desenvolvimento. Desafios da relação cultura, desenvolvimento e diversidade cultural Todavia, não deve haver dúvidas quanto à magnitude dos desafios que decorrem da desenvolvimento. imbricação Em entre primeiro cultura, lugar, por diversidade tratar-se de cultural um e diálogo absolutamente desafiador entre o domínio do simbólico, constitutivo da sociedade humana e esfera em que trafega a cultura, e o domínio da racionalidade, ao qual pertence a idéia de desenvolvimento, portanto uma noção que é datada historicamente, não sendo constitutiva da sociedade. (ORTIZ, 2008) Em segundo lugar, por não serem poucas as dificuldades que a relação encerra: os “purismos ideológicos” e as posturas românticas que costumam frequentar o campo da cultura; o economicismo que ainda reina em força nas teorias e políticas do desenvolvimento; a incipiência do campo cultural no que concerne aos seus números, indicadores e estatísticas; as barreiras disciplinares que atrasam o avanço do conhecimento quanto aos enlaces contemporâneos da cultura. Mas também não cabem dúvidas quanto ao fato de que a Convenção da UNESCO, assumindo como sua premissa básica a diversidade cultural como patrimônio comum da humanidade, sugere possibilidades para a relação cultura, diversidade cultural e desenvolvimento que, simultaneamente, tanto atendem ao imperativo de proteção demandado pela memória coletiva 25 construída ao longo da história com a contribuição de todos os povos do mundo, quanto avançam na compreensão de que tal riqueza exige políticas de promoção desenvolvimento capazes das de garantir-lhe sociedades, uma um vez lugar que estratégico sinaliza a no dupla determinação, simbólica e econômica, dos bens culturais. José Márcio de Barros, atento a estas possibilidades, e lembrando, contudo, que a relação entre cultura, diversidade e desenvolvimento “não pode ser encarada como uma questão imediata, linear e natural”, propõe, inspirado nas formulações de Edgar Morin sobre o “pensamento complexo”, uma articulação que parte do “reconhecimento do aspecto processual e dinâmico das idéias e das práticas contidas em cada um dos termos” (BARROS, 2008, p.15-16). Para este estudioso, o ponto de partida da articulação entre cultura, diversidade e desenvolvimento deve ser o reconhecimento de que a cultura expressa três dimensões básicas e complementares que são, necessariamente, indissociáveis: “sua dimensão humanizadora e educativa, sua dimensão coletiva e política, sua dimensão produtiva e econômica” (BARROS, 2008, p.18). Em segundo lugar, e como forma de superar o romantismo ingênuo que desperta a idéia de diversidade cultural e o inócuo celebracionismo com que (ainda) é recebida a aprovação da convenção da UNESCO, Barros (2008, p. 18) sugere que se reconheça a diversidade cultural não como um “mosaico harmônico” mas sim como um “conjunto de opostos, divergentes e contraditórios”, exatamente por conta de ser, a diversidade cultural, “cultural e não natural”, portanto, resultado dos jogos e trocas que sujeitos individuais e coletivos realizam com base nas suas diferenças e, também, nas suas desigualdades e tensões. Aqui, a perspectiva proposta por Barros (2008) é que a questão da diversidade cultural deixe de ser tão somente uma constatação antropológica a exigir um inventário de formas e manifestações culturais e se constitua, já agora por conta das possibilidades abertas pela Convenção da UNESCO, como uma resposta e um projeto efetivo. 26 A seguir, José Márcio Barros debruça-se sobre o terceiro dos termos da conjunção, o desenvolvimento (humano, acrescenta o autor), procurando identificar o lugar que aí cabe à cultura e sua diversidade de expressões. Partindo da compreensão de que ao “desenvolvimento humano sustentável” é indispensável a articulação equilibrada dos quatro tipos de capital presentes numa sociedade, num país ou numa comunidade – o capital natural, formado pelos recursos naturais disponíveis; o capital construído, gerado pela intervenção humana; o capital humano, determinado pelas condições de vida da população em termos de alimentação, saúde e educação; e o capital social, formado pelos valores e atitudes compartilhados que dão sustentação às relações de confiança e de cooperação entre os atores sociais – Barros (2008) conclui, acertadamente, que a cultura se revela como protagonista do processo de desenvolvimento posto que sua presença é fundamental ao acionamento das quatro modalidades de capital, particularmente no que concerne ao capital social, ao qual a cultura, com sua rica diversidade de repertórios, oferece-se como o território privilegiado dos jogos identitários, da modelagem dos comportamentos e da construção dos valores de uma sociedade. Daí que a cultura deva ser assumida não como mais uma ferramenta capaz de impulsionar o desenvolvimento mas, sim, como a própria argamassa dos pactos celebrados entre os vários atores sociais que servem de lastro legitimador das políticas de desenvolvimento, portanto, como o elementochave que deve marcar presença em todos os centros de decisão governamental, cortando, de maneira transversal, o conjunto das políticas públicas que se ocupam do desenvolvimento. Juntando os termos, cultura, diversidade cultural e desenvolvimento, na perspectiva proposta por Barros (2008), obtêm-se, portanto, uma equação que se organiza como possibilidade de um devir que seja marcado por um “crescimento auto-sustentado” que articula passado presente e futuro de maneira diacrônica e transformadora; que tenha a capacidade de harmonizar a dimensão simbólica e a lógica de mercado com um sentido mais afeito às trocas e à cooperação e colaboração e menos aos objetivos da acumulação de riquezas; que realize a interação entre patrimônio natural e patrimônio 27 cultural; e que aponte para um ideal de pluralismo cultural, portanto, para uma sociedade que, assegurando o direito à diferença, impeça que esta se traduza em desigualdades. No Brasil, que em 2007 ratificou a Convenção da UNESCO, o Ministério da Cultura vem acionando políticas e parcerias voltadas para a potencialização da conjunção cultura, diversidade cultural e desenvolvimento. Entretanto, neste aspecto, são ainda muitos os obstáculos a superar como são, também, muitas e distintas as dimensões, escalas e atores do campo cultural que demandam ações e políticas específicas. Nessa medida, a identificação de um foco de ação política parece ser um caminho que merece ser trilhado. Por outro lado, tanto mais produtivo será este caminho para garantir a sustentabilidade da relação entre cultura, diversidade cultural e desenvolvimento quanto mais atento for aos setores da produção de bens e serviços culturais que, caracterizados pela grande quantidade de atores, pela carência de recursos de toda ordem e pela fragilidade das condições em realiza suas atividades, enfrentam dificuldades em encontrar canais de distribuição, alcançar visibilidade e chegar ao mercado. A diversidade cultural em chave brasileira Parte expressiva da produção de bens e serviços culturais no Brasil é realizada por micro e pequenas empresas do setor cultural do país, um universo que representa mais de 90% das unidades formais que operam neste setor (IBGE 2007 a; MTE, 2009). A estas unidades empresariais de pequeno porte agregam-se, ainda, as práticas culturais envolvendo indivíduos, grupos e comunidades que operam em regime de informalidade e em condições de grande precariedade. Estas pequenas unidades produtivas do setor cultural, sejam as pequenas empresas ou as organizações de caráter comunitário com suas atividades que, regra geral, envolvem expressões culturais não consagradas, experimentam obstáculos variados. O enfrentamento desta problemática não é algo simples. Sua principal exigência é, certamente, o acionamento de políticas públicas que não apenas políticas culturais. Nesta medida, políticas que resultem da imbricação da 28 cultura com outras esferas governamentais são indispensáveis, pois parte expressiva dos desafios e obstáculos a enfrentar e superar transcendem a área de atuação específica das instituições governamentais que respondem pelo campo da cultura, a exemplo de questões que envolvem, por exemplo, aspectos tributários ou relacionados com crédito. A questão das estatísticas culturais Todavia, há ainda uma questão anterior à própria formulação e implementação de políticas que pretendam ocupar-se desta problemática. Trata-se da incipiência de métricas e metodologias que permitam o conhecimento de indicadores e estatísticas referentes ao campo cultural como um todo, ou seja, os números da cultura são praticamente desconhecidos e, por óbvio, sem números, a possibilidade de acionar políticas públicas se torna uma tarefa quase impossível. Não é outra a compreensão da UNESCO ao considerar que “Si el objetivo perseguido es formular políticas basadas en evidencia y medir y evaluar sus posibles impactos, se debe contar con información fiable.” (INSTITUTO…, 2009, p. iii). Daí o esforço que esta organização vem desenvolvendo, desde meados dos anos 1980, através do seu Instituto de Estatísticas sediado em Montreal, com o objetivo de “establecer una base conceptual que facilite un punto de vista común que, a su vez, permita realizar comparaciones internacionales que abarquen un espectro amplio de actividades relacionadas con la producción, difusión y usos de la cultura.” (INSTITUTO..., 2009, p.16) e, em simultâneo, de auxiliar os países no desenvolvimento de seus próprios marcos estatísticos para o campo cultural. Quanto a esta questão, lembram Rubim e Calabre (2009), os compromissos assumidos pelos países signatários da Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais põem em evidência a necessidade imperativa do conhecimento das estatísticas e indicadores relativos ao campo da cultura. Com efeito, proteger e promover a diversidade cultural, criar condições para o florescimento e a livre interação das culturas e estimular o diálogo intercultural, compromissos basilares da Convenção, são, praticamente, compromissos quase que inalcançáveis sem que os gestores 29 públicos disponham de informações sistematizadas sobre as práticas culturais presentes na realidade em que atuam, especialmente quanto às expressões culturais não consagradas, ou seja, aquelas realizadas pelos grupos comunitários e por pequenas unidades produtoras de bens e serviços culturais, as quais, em larga medida, respondem pela diversidade cultural dos países. A contribuição do IBGE para as políticas culturais No Brasil, só muito recentemente a questão das estatísticas culturais passou a ser objeto de preocupação e sistematização17. Seu marco são os acordos de cooperação técnica assinados em finais de 2004 pelo Ministério da Cultura com o IBGE e o IPEA, ação que, pelo seu caráter estruturante em termos de políticas para o campo cultural brasileiro, merece ser enfaticamente saudada como uma das mais significativas heranças da gestão de Gilberto Gil à frente da pasta da Cultura. Entretanto, e em que pesem os resultados já alcançados e as perspectivas de avanço dos trabalhos nesta área18, desafios de toda ordem estão colocados à produção dos números da cultura. Com efeito, aliado à recenticidade e pouca experiência internacional no trato desta problemática (INSTITUTO..., 2009), impõem-se, num primeiro plano, questões de “ordem 17 Deve ser registrado, aqui, o estudo realizado em 1998 pela Fundação João Pinheiro, por encomenda do Ministério da Cultura. Intitulado “Diagnóstico dos Investimentos em Cultura no Brasil” (DIAGNÓSTICO…, 1998; BALABAN, 1998), o estudo, que cobriu o período compreendido entre 1985 e 1994 com projeções para os três anos seguintes, 1995-97, teve como objetivos dotar o Governo Federal de uma ampla base de dados sobre o setor cultural e avaliar o impacto dos investimentos públicos e privados em cultura na economia brasileira. Todavia, em que pesem o pionerismo e importância do trabalho realizado para o trato da questão dos números da cultura em nosso país, a iniciativa não teve seguimento. 18 Dos acordos já resultaram, por exemplo, duas edições do “Sistema de informações e indicadores culturais” (IBGE, 2006, 2007a), o suplemento da Pesquisa de Informações Básicas Municipais dedicado inteiramente à cultura (IBGE, 2007b), alguns estudos realizados pelo IPEA (SILVA, 2007a; 2007b) e seminários nacionais e internacionais dedicados à temática das estatísticas e indicadores culturais envolvendo o IBGE e IPEA. Presentemente, o IBGE dedica-se ao desenvolvimento da “conta satélite” da cultura, que vai permitir a identificação da participação das atividades culturais no PIB nacional, e o IPEA desenvolve, em parceria com a UNESCO, estudos para a criação de um Indicador de Desenvolvimento da Economia da Cultura, com base na oferta e demanda cultural dos municípios brasileiros. 30 conceitual e metodológica” relativas à própria “delimitação preliminar das atividades culturais, tomadas em sua dimensão econômica” (IBGE, 2007a), às quais se seguem limitações no uso de bases de dados já existentes, a exemplo da CNAE – Classificação Nacional de Atividades Econômicas, por conta do nível de agregação das suas informações que dificultam a identificação e separação das atividades culturais. De todo modo, graças ao trabalho que vem sendo realizado pelo IBGE, já é possível, com dados a partir de 2003, traçar-se um panorama cobrindo vários aspectos do campo cultural brasileiro. O Suplemento de Cultura da Pesquisa de Informações Básicas Municipais MUNIC 2006 (IBGE, 2007b), por exemplo, traz um conjunto de informações sobre a cultura nos 5.564 municípios brasileiros de grande relevância para a formulação de políticas - identifica o órgão gestor de cultura, sua infraestrutura, os recursos humanos de que dispõe, os instrumentos de gestão, os mecanismos de financiamento e a legislação existente; mapeia a existência e a forma de funcionamento dos conselhos de cultura; inventaria meios de comunicação e equipamentos culturais; lista ações, projetos e atividades artístico-culturais desenvolvidas; etc. O Suplemento de Cultura da MUNIC 2006 e a diversidade cultural Ainda que focada na questão da gestão cultural realizada no âmbito municipal, o Suplemento de Cultura da MUNIC 2006 (IBGE, 2007b) levantou algumas informações que são de relevância fundamental para o conhecimento da diversidade cultural brasileira, a exemplo da existência de grupos artísticos no município, das práticas artesanais que aí são desenvolvidas e das atividades culturais realizadas por grupos e indivíduos. Todavia, certamente que um conjunto ainda maior de práticas e atividades culturais as mais diversas, particularmente aquelas que têm lugar nas áreas rurais e nos distritos dos municípios, portanto, que são realizadas fora do alcance imediato da gestão pública, ficou por ser mapeado pela pesquisa do IBGE (RUBIM; CALABRE, 2009). De qualquer maneira, os dados recolhidos e sistematizados pelo Suplemento Cultural da MUNIC 2006 já trazem elementos importantes para a formulação 31 de políticas culturais voltadas para as questões envolvendo a diversidade cultural. Além de atestar a significativa diversidade de manifestações culturais nos municípios brasileiros, a pesquisa identifica quais as atividades culturais com maior incidência nos municípios, no caso o artesanato, que aparece como a principal atividade cultural para 64,3% dos municípios, e confirma, também, que na sua imensa maioria, as práticas culturais ocorrem em ambiente marcado pela informalidade, o que, por si só, já sugere cuidados especiais na definição das políticas que pretendam incidir sobre a realidade cultural existente nos municípios. Já o Sistema de Informações e Indicadores Culturais (IBGE, 2006, 2007a) dá conta de importantes aspectos da produção cultural brasileira do ponto de vista da sua dinâmica econômica. São analisados os números referentes ao lado da oferta (número e caracterização das unidades produtoras, como tamanho, mão-de-obra empregada e remunerações pagas, e análise socioeconômica das pessoas ocupadas nas atividades culturais) e da demanda (gastos das famílias com consumo cultural e inventário de bens duráveis de uso doméstico que funcionam como suportes de conteúdos culturais) de bens e serviços culturais, bem como os gastos públicos nas três esferas de governo por região e por unidade da federação. O Sistema de Informações e Indicadores Culturais e as pequenas unidades de produção do setor cultural A publicação do Sistema de Informações e Indicadores Culturais 2003-2005 (IBGE, 2007a) é que vai permitir, pela primeira vez, uma aproximação sobre a importante presença pequenas unidades empresariais e outras organizações que desenvolvem atividades classificadas como culturais. Para a definição das atividades culturais nos ramos industrial, de comércio e de serviços, a pesquisa do IBGE utilizou a CNAE 1.0 (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) tendo chegado ao resultado apresentado no quadro a seguir. 32 Quadro 1- Descrição das atividades culturais por ramos Indústria Fabricação de artefatos diversos de madeira, palha, cortiça e material trançado exceto móveis Edição e impressão Impressão de jornais, revistas e livros e outros serviços gráficos Reprodução de materiais gravados Fabricação de computadores Fabricação de aparelhos telefônicos, sistemas de intercomunicação e semelhantes Fabricação de aparelhos receptores de rádio e televisão e de reprodução, gravação ou amplificação de som e vídeo Fabricação de produtos diversos Comércio Varejista de livros, jornais, revistas e papelaria Varejista de artigos usados Atacadista de artigos de escritório e de papelaria Atacadista de computadores, equipamentos de telefonia e comunicação Serviços Aluguel de objetos pessoais e domésticos Consultoria em software Publicidade e atividades fotográficas Outras atividades de ensino Atividades cinematográficas e de vídeo Atividades de rádio Atividades de televisão Outras atividades artísticas e de espetáculos Atividades de agências de notícias Telecomunicações Processamento e atividades de banco de dados e distribuição de conteúdo eletrônico Fonte: IBGE, 2007a Segundo esta pesquisa (IBGE, 2007a), em 2005, 321 mil empresas e outras organizações ocupavam-se de atividades classificadas como culturais empregando um total de 1,6 milhão de pessoas, 70% das quais assalariadas – números que correspondiam a 5,7% das 5,7 milhões de unidades registradas no seu Cadastro Geral de Empresas (CGE) e a 4,1% dos 40 milhões do total do pessoal ocupado (Tabelas 1 e 2) – interessante observar 33 que o crescimento registrado pelo atividades culturais entre 2003 e 2005, seja quanto ao número de empresas, seja, também, quanto ao pessoal ocupado, supera a evolução positiva experimentada pelo total das atividades. Tabela 1 - Número de empresas no total das atividades e nas atividades do setor cultural - Brasil - 2003-2005 Ano Número total de empresas Número de empresas do setor cultural Participação do setor cultural (a) (b) (b)/(a) 2003 5 185 573 269 074 5,2% 2004 5 371 291 291 321 5,4% 2005 5 668 003 321 395 5,7% 2005/2003 9,3% 19,4% - Fonte: IBGE, 2007a Tabela 2 - Pessoal ocupado total e assalariado no total das atividades e nas atividades do setor cultural - Brasil - 2003-2005 (em milhares) Ano Total das Atividades (a) Atividades do Setor Cultural Participação do setor cultural (b) (a)/(b) Total Assalariado Total Assalariado Total Assalariado 2003 35 674 28 473 1 431 1 007 4,0% 3,5% 2004 37 578 30 347 1 512 1 071 4,0% 3,5% 2005 39 586 32 224 1 635 1 159 4,1% 3,6% 2005/2003 11,0% 13,2% 14,3% 15,1% - - Fonte: IBGE, 2007a Para identificar o tamanho das empresas envolvidas com atividades culturais, a pesquisa distribuiu o total das unidades empresariais por cinco faixas de pessoal ocupado, conforme indicado na Tabela 3. 34 Tabela 3 - Tamanho das empresas por pessoal ocupado Faixa Pessoal Ocupado 1 até a 4 pessoas 2 5 a 19 pessoas 3 20 a 99 pessoas 4 100 a 499 pessoas 5 acima de 500 pessoas Fonte: IBGE, 2007a Observando-se os dados referentes a 2005, apresentados nos gráficos 1, 2 e 3 a seguir, percebe-se, de imediato, a importância das pequenas unidades (empresas e organizações) no conjunto da produção de bens e serviços culturais no Brasil. As menores unidades, ou seja, aquelas que ocupam até 4 pessoas, representaram 84,9% do total das 321 mil empresas dedicadas às atividades culturais. Somando-se a estes os 12,9% representados pelas unidades que ocupam entre 5 e 19 pessoas, tem-se que 97,5% (i.é, 313 mil unidades) das empresas e outras organizações que atuam na produção cultural brasileira são unidades que podem ser classificadas como micro e pequenas empresas (Gráfico 1). As unidades maiores, que empregam acima de 500 pessoas, representaram apenas 0,1% do total enquanto que unidades de porte, digamos, médio, que ocupam de 20 a 99 e de 100 a 499, representaram, respectivamente, 2,2% e 0,3%. Gráfico 1- Participação percentual do número de empresas e outras organizações do setor cultural por faixas de pessoal ocupado- Brasil - 2005 Fonte: IBGE, 2007a 35 Quanto ao pessoal total ocupado, é também relevante o desempenho das pequenas unidades. Nas unidades com até 4 pessoas trabalham 26,9% do total de pessoas ocupadas em atividades culturais, número que é superior aos 22,7% registrados para as unidades que ocupam 500 ou mais pessoas e que, também, supera os percentuais registrados para as demais faixas (Gráfico 2). Gráfico 2- Participação percentual do pessoal ocupado total no setor cultural por faixas de pessoal ocupado- Brasil - 2005 Fonte: IBGE, 2007a Todavia, embora em maior número, as unidades que ocupam até 4 pessoas apresentaram o grau mais baixo de assalariamento em relação ao total de pessoas ocupadas, 15,7%, percentual expressivamente abaixo daqueles verificados para as outras quatro faixas (Tabela 4). 36 Tabela 4- Participação do pessoal assalariado no total do pessoal ocupado em atividades culturais por tamanho das unidades empresariais e outras organizações Brasil - 2005 (em milhares) Faixa Pessoal Ocupado Total Pessoal Assalariado (a) (a) Participação dos Assalariados no Total do Pessoal Ocupado (b)/(a) 0 a 4 pessoas 433 986 67 951 15,7% 5 a 19 pessoas 349 074 265 432 76,0% 20 a 99 pessoas 257 933 244 350 94,7% 100 a 499 pessoas 203 841 200 470 98,4% acima de 500 pessoas 390 460 381 189 97,6% 1 635 294 1 159 392 70,9% Total Fonte: IBGE, 2007a Quanto ao salário médio, expresso em salários mínimos (SM), os dados da pesquisa mostram que, a exemplo do acontece com os outros setores econômicos, também no que diz respeito às atividades culturais, quanto maior o porte da empresa, maior é a media dos salários pagos (IBGE, 2007a). Todavia, vale registrar que as unidades com até 4 pessoas ocupadas que atuam no setor cultural pagam um salário médio, 3,6 SM, que é 63% superior ao salário médio pago pelas empresas do mesmo porte que atuam em outros setores, situação, aliás, que se verifica para todas as faixas e para o setor cultural como um todo (Gráfico 3). 37 Gráfico 3- Salário médio mensal expresso em salários mínimos no total de atividades e no setor cultural, segundo o tamanho das unidades - Brasil - 2005 Fonte: IBGE, 2007a Afora o trabalho que vem sendo desenvolvido pelo IBGE, praticamente inexistem informações disponíveis em outras bases de dados que permitam a identificação das empresas envolvidas com atividades culturais, muito menos informações que tratem especificamente da presença das unidades de pequeno porte neste setor. Entretanto, numa tentativa preliminar de fazer avançar o conhecimento sobre as pequenas unidades empresarias envolvidas com a produção cultural, são apresentados a seguir dados trabalhados a partir de informações disponíveis na RAIS para o período 2006- 2008. A RAIS e as pequenas unidades de produção do setor cultural A RAIS, Relação Anual de Informações Sociais, instituída pelo Decreto n° 76.900/75, é um registro administrativo de responsabilidade do Ministério Trabalho e Emprego de periodicidade anual que disponibiliza informações estatísticas sobre o mercado de trabalho formal no país. Suas informações são prestadas em caráter obrigatório por todos os estabelecimentos existentes no território nacional, inclusive por aqueles que não registraram vínculos empregatícios no exercício, e dão conta de todos os empregados formais celetistas, estatutários, temporários, avulsos, entre outros. Diferentemente da pesquisa do IBGE (2007a), que utiliza para a CNAE 1.0 38 para a classificação das atividades econômicas relacionadas com a cultura (Quadro 1), a RAIS trabalha com as agregações de classes da classificação da CNAE 2.0, conforme indicado no Quadro 2, a seguir. Quadro 2- Descrição das atividades culturais Atividades Culturais Atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte Artes cênicas, espetáculos e atividades complementares Criação artística Gestão de espaços para artes cênicas, espetáculos e outras atividades artísticas Atividades de produção cinematográfica, de vídeos e de programas de televisão Atividades de pós produção cinematográfica, de vídeos e de programas de televisão Distribuição cinematográfica, de vídeo e de programas de televisão Atividades de exibição cinematográfica Atividades de televisão aberta Programadoras e atividades relacionadas à televisão por assinatura Operadoras de televisão por assinatura por cabo Operadoras de televisão por assinatura por microondas Operadoras de televisão por assinatura por satélite Aluguel de fitas de vídeo, DVDs e similares Atividades de bibliotecas e arquivos Atividades de museus e de exploração, restauração artística e conservação de lugares e prédios históricos e atrações similares Comércio varejista de discos, CDs, DVDs e fitas Edição de livros Edição de jornais Edição de revistas Edição integrada à impressão de livros Edição integrada à impressão de jornais Edição integrada à impressão de revistas Atividades fotográficas e similares Atividades de gravação de som e de edição de música Atividades de rádio Atividades Criativas de Base Cultural Serviços de arquitetura Atividades técnicas relacionadas à arquitetura e engenharia Atividades paisagísticas Design e decoração de interiores 39 Agências de publicidade Agenciamento de espaços para publicidade, exceto em veículos de comunicação Atividades de publicidade não especificadas anteriormente Desenvolvimento de programas de computador sob encomenda Desenvolvimento e licenciamento de programas de computador customizáveis Desenvolvimento e licenciamento de programas de computador não customizáveis Consultoria em tecnologia da informação Tratamento de dados, provedores de serviços de aplicação e serviços de hospedagem na internet Portais, provedores de conteúdo e outros serviços de informação na internet Fonte: MTE (RAIS 2008), 2009. Em 2008, de acordo com dados extraídos da RAIS (MTE, 2009), havia 265 mil estabelecimentos ocupados em atividades do setor cultural, o correspondente a 3,7% do total de estabelecimentos registrados no país, quantidade 10,6% maior do que a observada em 2006 (Tabela 6). Tabela 5 - Número de estabelecimentos no total das atividades e nas atividades do setor cultural - Brasil - 2006-2008 Ano Número total de estabelecimentos (a) Número de estabelecimentos do setor cultural Participação do setor cultural (b)/(a) (b) 2006 6 717 110 239 932 3,6% 2007 6 887 958 252 455 3,7% 2008 7 143 401 265 237 3,7% 2008/2006 6,4% 10,6% - Fonte: MTE (RAIS 2008), 2009. Tabulação do autor. Quanto ao número de empregos formais, em 2008, o setor cultural apresentou um crescimento de 10,9% em relação a 2006, alcançando um total de 575 mil empregos, equivalentes a 1,5% do total de empregos formais registrados pela RAIS (MTE, 2009) em todo o país. 40 Tabela 6 - Número empregos formais no total de atividades e no setor cultural Brasil - 2006-2008 Ano Número empregos formais no total de atividades Número empregos formais no setor cultural Participação do setor cultural (a) (b) 2006 35 155 249 518 794 1,5% 2007 37 607 430 526 247 1,4% 2008 39 441 566 575 212 1,5% 2008/2006 12,2% 10,9% - (b)/(a) Fonte: MTE (RAIS 2008), 2009. Tabulação do autor. No que diz respeito ao tamanho dos estabelecimentos, a RAIS (MTE, 2009) classifica as unidades registradas em quatro faixas conforme o número de empregos formais, conforme indicado na Tabela 7. Tabela 7 - Tamanho das empresas por número de empregos Faixa Número de Empregos 1 até 9 2 10 a 49 3 50 a 99 4 acima de 99 Fonte: MTE (RAIS 2008), 2009. Conforme pode ser observado na Tabela 8, os estabelecimentos de menor porte, ou seja, aqueles que registram até 9 empregos formais, representavam, em 2008, 96,60% do total de estabelecimentos ocupados com atividades culturais, ou seja, 256 mil estabelecimentos. 41 Tabela 8 - Número de estabelecimentos no setor cultural por tamanho – Brasil -2008 Tamanho (pessoal ocupado) Número total de estabelecimentos % (a) até 9 256 206 96,60 10 a 49 7 471 2,82 50 a 99 824 0,31 acima de 99 736 0,27 265 237 100,0 Fonte: MTE (RAIS 2008), 2009. Tabulação do autor. Os números que emergem da pesquisa realizada com base nas informações da RAIS (MTE, 2009) são, obviamente, diferentes dos registrados pela pesquisa do IBGE (2007a). Todavia, em que pesem os distintos recortes conceituais e metodológicos que informam ambas as pesquisas e os períodos a que se reportam os dados, 2003 a 2005 para o IBGE e 2006-2008 para a RAIS, a comparação possível entre tais números permite que se conclua que ambas as pesquisas indicam resultados que, em termos gerais, se assemelham. Com efeito, ambas as pesquisas indicam, para os respectivos períodos considerados, o crescimento das unidades que se ocupam de atividades classificadas como culturais a taxas maiores que as observadas para o conjunto dos outros setores e o aumento do número de ocupações / empregos formais. Em ambas as pesquisas, também, pode-se observar que a quase totalidade das unidades produtivas são classificadas como de pequeno porte, 96,6% segundo a RAIS, em 2008. O Ministério da Cultura e as políticas para a diversidade cultural Desde 2003, o Ministério da Cultura (MinC) vem investindo num conceito abrangente de cultura para lastrear as ações estruturantes indispensáveis à reorganização do papel do Estado na área cultural e a formulação de políticas públicas fundadas no reconhecimento da diversidade cultural e inscritas na perspectiva do desenvolvimento nacional. Nessa medida, a análise atenta de dados como os revelados pelas pesquisas aqui referidas, o Suplemento Cultural da MUNIC 2006 (IBGE, 2007b), o Sistema de 42 Informações e Indicadores Culturais 2003-2005 (IBGE, 2007a) e, também, a RAIS, Relação Anual de Informações Sociais (MTE, 2009) – mesmo não sendo, esta, uma pesquisa que tenha o campo da cultura como foco específico –, são de importância fundamental para que políticas públicas, sejam elas de responsabilidade direta do Ministério da Cultura ou estejam sob a alçada de outras pastas ministeriais, alcancem o conjunto da produção cultural brasileira realizada tanto pelas pequenas unidades empresariais do setor cultural quanto pelos indivíduos, grupos e comunidades que respondem por ricos repertórios de práticas e atividades culturais, condição incontornável para a proteção e promoção da diversidade cultural em nosso país. A chegada de Gilberto Gil ao Ministério da Cultura do governo Lula, em 2003, rompe com o que Rubim (2009) considera como sendo as “três tristes tradições” das políticas culturais no Brasil. É que, segundo este estudioso, ao longo da história, a relação entre Estado e cultura no nosso país foi marcada ou pela “ausência” de políticas culturais – uma das “tristes tradições” – situação que vai do Brasil-Colônia até a República Velha passando pelo período do Império, e que se repete na experiência democrática entre 1945 e 1964, no governo Collor e nos oito anos do mandato de Fernando Henrique Cardoso, ou pelo “autoritarismo” – mais uma das “tristes tradições” – referido ao fato de que os regimes autoritários experimentados pelo país no século XX, o Estado Novo, com Vargas, e a ditadura civil-militar entre 1964-1985, formularam e implementaram políticas culturais, ou, ainda, pela “instabilidade” – a terceira das “tristes tradições” – expressa, por exemplo, na fragilidade institucional do Ministério e de suas instituições vinculadas – situação que chega ao limite máximo durante o governo de Collor de Mello, quando o Ministério é transformado em Secretaria e vários órgãos federais da área cultural são simplesmente extintos, a exemplo da EMBRAFILME – e na descontinuidade político-administrativa – em dez anos, entre 1985 e 1994, ocuparam a Pasta da Cultura dez ministros – característica que marca o período da redemocratização entre 1985 e 1994. Com efeito, a frente do MinC, Gilberto Gil dá início a um amplo processo de discussão e reorganização do papel do Estado na área da cultura e recupera para a Pasta a missão de ser, no plano federal, e pela primeira vez em 43 tempos de vida democrática no país, concordando com a avaliação de Rubim (2009), o órgão responsável pela formulação e implementação de políticas culturais. Ainda que não seja o caso, aqui, de uma descrição pormenorizada deste processo, interessa, contudo, registrar alguns dos seus aspectos mais relevantes e que foram de fundamental importância para que o MinC pudesse desenvolver, efetivamente, políticas na área de cultura. O Ministro Gil promove uma reformulação administrativa da Pasta, investe na recuperação do seu orçamento, estabelece o diálogo com outras pastas ministeriais e órgãos governamentais, atento, aqui, ao caráter transversal da cultura, e aposta na participação da sociedade civil nos processos de formulação de políticas, de que é um bom exemplo a realização das duas concorridas conferencias nacionais, ambas precedidas de ampla mobilização e debate nos estados e municípios. Mais importante ainda, Gil retoma, como baliza da atuação do Ministério, a noção abrangente de cultura, abandonada desde a década de 1980, considerando a cultura tanto em sua dimensão simbólica quanto no que diz respeito a sua articulação com o processo de construção da cidadania e as suas possibilidades e potencialidades em termos econômicos e, nessa medida, reinvindica para a cultura um lugar estratégico no desenvolvimento do país (BOTELHO, 2008). Daí têm resultado políticas estruturantes de grande importância para o campo da cultura. É o caso, por exemplo, do estabelecimento de um sistema permanente de estatísticas e indicadores culturais, materializado através de acordos de cooperação técnica celebrados pelo Ministério com o IBGE e o IPEA, anteriormente já referido. Na mesma linha se inscrevem, também, a criação do Conselho Nacional de Políticas Culturais; a estruturação, em articulação com o Congresso Nacional através de Projetos de Emenda Constitucional, do Sistema Nacional de Cultura e do Plano Nacional de Cultura; e a proposta, enviada recentemente ao Congresso Nacional, de reforma da legislação que regula o financiamento das atividades culturais, um dos gargalos das políticas culturais federais, haja visto a dependência extrema da Pasta dos recursos postos a sua disposição através dos 44 mecanismos de renúncia fiscal, modelo que, pelas suas características, limita significativamente o poder decisório do Ministério. Mas daí resultaram, também, um amplo e variado repertório de políticas, acionadas diretamente pelo Ministério, por suas instituições vinculadas, ou em regime de parceria com outros órgãos de governo. Também não é o caso, aqui, de se passar em revista o conjunto das políticas culturais postas em marcha pelo MinC desde 2003. Todavia, devem ser destacadas aquelas políticas cujo foco mais imediato tem sido a diversidade cultural. Nesta perspectiva, dois registros devem ser especialmente referidos. As políticas e programas postos em marcha pela Secretaria da Identidade e Diversidade Cultural e o Programa Cultura Viva da Secretaria de Cidadania Cultural (exSecretaria de Programa e Projetos Especiais), responsável pelos Pontos de Cultura, em ambos os casos, políticas que alcançam, diretamente, as práticas e atividades culturais realizadas por indivíduos, grupos e comunidades Brasil afora – e que compõem o levantamento do Suplemento de Cultura da MUNIC 2006, atrás referido. Duas políticas para a diversidade cultural A Secretaria da Identidade e Diversidade Cultural – SID, criada no processo de reorganização do MinC , em 2003, tem como marco fundamental do seu trabalho o Seminário Nacional de Políticas Públicas para as Culturas Populares, realizado em Brasília, em fevereiro de 2005, e cuja preparação envolveu, ao longo de 2004, um grande número de encontros e oficinas realizados por todo o país. Deste Seminário resultou um documento intitulado Carta das Culturais Populares que apontou as seguintes sete diretrizes para a formulação de políticas: “Criar fundos de incentivos públicos de apoio às culturas populares; Mapear, registrar e documentar as manifestações das culturas populares; Estabelecer instâncias de diálogo entre o Estado e a sociedade civil para a formulação e deliberação de políticas culturais; Criar mecanismos que favoreçam a inclusão das culturas 45 populares nos processos educativos formais e informais; Criar marcos legais de proteção aos conhecimentos tradicionais e aos direitos coletivos; Democratizar a distribuição de recursos nas várias regiões do Brasil; Facilitar o acesso e desburocratizar os instrumentos de financiamento, de modo a democratizá-los para os segmentos populares.” (SEMINÁRIO…, 2005, p. 181) Com base nestas diretrizes, a SID formulou o Programa Identidade e Diversidade Cultural: Brasil Plural, cuja a ação, desde 2005 e através de editais públicos, tem beneficiado, na forma de convênios e/ou premiações, variados projetos de grupos e segmentos socioculturais com base nos seguintes recortes identitários: a) marcas étnicas, marcas raciais, de classe social, marcas do universo laboral (identidades de trabalhadores do campo ou da cidade, estudantes etc.); marcas de grupo etário (idosos, crianças e jovens); marcas de gênero ou orientação sexual, como o feminismo e os movimentos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT); marcas de pessoas em sofrimento psíquico e de pessoas com deficiência.” (SID/MINC, 2009, p. 58) De acordo com balanço da SID (SID/MINC, 2009), entre 2005 e 2009, foram aportados R$ 20,9 milhões no apoio a 1.418 projetos, aproximadamente um terço dos 4.273 inscritos nos vários editais públicos. A avaliação dos resultados alcançados pelo Programa é, segundo a SID, bastante positiva, graças, particularmente, a alguns aspectos assumidos como orientações na construção dos editais: o diálogo com a sociedade civil para a identificação das prioridades de cada segmento; a definição público-alvo a ser beneficiado; a possibilidade de premiação de pessoa física (e de grupo ou comunidade representada por pessoa física); a possibilidade de inscrição oral, inovação de fundamental importância pois alcança as culturas indígenas, caracteristicamente ágrafas; a regionalização dos editais; a federalização dos editais, estimulando parcerias com órgões estaduais e municipais; e a adoção de um modelo simplificado de prestação de contas dos recursos recebidos. (SID/MINC, 2009). 46 O Programa Cultura Viva foi criado em 2004 com o objetivo de fortalecer o protagonismo cultural da sociedade brasileira através da valorização das iniciativas culturais de grupos e comunidades, historicamente excluídos dos meios de produção, fruição e difusão cultural, e da ampliação do acesso aos bens culturais. O Programa compõe-se de cinco eixos, Pontos de Cultura, Cultura Digital, Agentes Cultura Viva, Griôs (Mestres dos Saberes) e Escola Viva, mas, são os Pontos de Cultura, efetivamente, o eixo central que articula os demais componentes do Programa e sua ação prioritária. Sinteticamente, os Pontos de Cultura “são unidades de recepção e disseminação de bens culturais em comunidades que se encontram à margem dos circuitos culturais e artísticos convencionais” (BARBOSA, 2009, p.283). Do ponto de vista metodológico, o trabalho com os Pontos de Cultura parte de iniciativas associativistas e comunitárias preexistentes que são estimuladas “por meio de transferência de recursos e da doação de kits de cultura digital (equipamentos de informática, câmeras, kit multimídia e uma pequena ilha de edição)” que permitem a cada Ponto a realização de produções audiovisuais próprias e, também, a comunicação direta “entre as ações do poder público e as ações da comunidade, e destas entre si” através da sua interligação em rede, via internet banda larga (BARBOSA, 2009, p.283-284). O Programa, que de acordo com dados tornados públicos pelo MinC já reúne 2.500 unidades implantadas em todo o país (MINISTÉRIO DA CULTURA, 2010a), é, desde 2007, o maior programa finalístico da Pasta em termos orçamentários (SILVA; ARAÚJO, 2010). Sua novidade, que explica, inclusive, o interesse que o Programa tem despertado em vários países, na Europa, América Latina e, também, nos EUA, reside, certamente, em combinar dois objetivos. Um, a ampliação do acesso aos bens culturais, paradigma clássico das políticas culturais conhecido como democratização da cultura. O outro, a valorização das iniciativas culturais dos grupos e comunidades que atende, no que pode ser chamado de democracia cultural. A avaliação do Programa recentemente realizada pelo IPEA, com base em 526 Pontos de Cultura conveniados até dezembro de 2007, destaca alguns aspectos bastante positivos em termos de resultados alcançados. Segundo 47 esta avaliação, o Programa deflagrou um “processo de criação e realização de atividades artísticas e educacionais ... e também de organização de espaços públicos culturais” (SILVA; ARAÚJO, 2010, p.107), propiciando elementos importantes para o “amadurecimento de políticas públicas locais e estratégias flexíveis com vistas a ampliar os processos democráticos relativos ao mundo cultural” (SILVA; ARAÚJO, 2010, p.107), resultados que, por óbvio, atendem largamente às perspectivas das políticas culturais que se ocupam da diversidade cultural. Desafios das políticas para a diversidade cultural Não há dúvida que avanços e sucessos podem ser registrados pelas políticas com foco mais direto na questão da diversidade cultural acionadas pelo Ministério da Cultura. Contudo, neste particular, alguns problemas se oferecem como desafios a serem enfrentados. No que concerne às pequenas unidades produtoras do setor cultural, ou seja, aquelas que ocupam até quatro pessoas e que representam, aproximadamente, 85% do total das 321 mil empresas dedicadas às atividades culturais, segundo o IBGE (2007a) – percentual que alcança 96,6% de acordo com a RAIS (MTE, 2009), que considera unidade de menor porte aquela que emprega até nove pessoas – são ainda em pequeno número e muito pouco efetivas as políticas especialmente a elas dedicadas no âmbito do MinC, muito embora os problemas que enfrentam – bastante semelhantes àqueles que costumam freqüentar a agenda do conjunto das micro e pequenas empresas brasileiras mas acrescidos daqueles que decorrem das especificidades típicas do campo cultural – não sejam de pouca monta. Aqui, falta de capacidade gerencial, baixa capacitação técnica, inexistência ou inadequação de marcos regulatórios, dificuldades de acesso a fontes de financiamento, dentre outras questões, alimentam a desarticulação e fragilização dos elos das respectivas cadeias e/ou redes de produção e comprometem sua visibilidade e sustentabilidade. 48 Entretanto, atento a estas questões, o Plano Nacional de Cultura (PNC)19, que prevê, para um horizonte de dez anos com revisões quadrienais, diretrizes, objetivos e ações na área da Cultura para a União, os estados e os municípios, tornando a política cultural uma política de Estado, elegeu como uma de suas cinco diretrizes fundamentais “Ampliar a participação da cultura no desenvolvimento socioeconômico sustentável, promover as condições necessárias para a consolidação da economia da cultura e induzir estratégias de sustentabilidade nos processos culturais” (MINISTÉRIO..., 2008, p.87) Considerando que “Economia e Desenvolvimento são aspectos da cultura de um povo”, que a “cultura é parte do processo propulsor da criatividade, gerador de inovação econômica e tecnológica” e que a “diversidade cultural produz distintos modelos de geração de riqueza que devem ser reconhecidos e valorizados” (MINISTÉRIO..., 2008, p.87), o PNC buscou estabelecer “vínculos entre arte, ciência e economia na perspectiva da inclusão e do desenvolvimento”. Assim é que, “avalizando a inserção de produtos, práticas e bens artísticos e culturais nas dinâmicas econômicas contemporâneas, com vistas à geração de trabalho, renda e oportunidades de inclusão social” (MINISTÉRIO..., 2008, p.87), o PNC propôs, distribuídas por quatro diretrizes específicas – (i) capacitação e assistência ao trabalhador da cultura; (ii) estímulo ao desenvolvimento da economia da cultura; (iii) turismo cultural; e (iv) regulação econômica –, um conjunto expressivo de ações que contemplam, dentre outras, “a formação profissional; a regulamentação do mercado de trabalho para 19 O Plano Nacional de Cultura, Projeto de Lei nº 6.835/2006, aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCCJ) da Câmara dos Deputados no dia 16 de março de 2010, encontra-se, agora, tramitando no Senado Federal. Se aprovado nas Comissões de Educação e Cultura e de Constituição, Justiça e Cidadania desta Casa legislativa, o PNC segue direto para a sanção presidencial. Vale lembrar que a proposta de PNC, ao longo de 2008, foi objeto de debates em 27 seminários realizados nos estados e no Distrito Federal, com caráter de audiência pública, para aprimoramento do texto original do deputado Gilmar Machado (PT-MG). 49 as categorias envolvidas com a produção cultural; e o estímulo aos investimentos e ao empreendedorismo nas atividades econômicas de base cultural, entre elas o turismo, as comunicações, a indústria gráfica, a fonográfica, a arquitetura, a moda, dentre outras.” (MINISTÉRIO..., 2008, p.87) Na mesma direção do PNC posicionou-se a II Conferência Nacional de Cultura, realizada em Brasília, em março deste ano. Os delegados presentes à Conferência, em sintonia fina com as diretrizes do PNC, aprovaram um elenco significativo de propostas dedicadas a questões tais como financiamento da cultura, sustentatibilidade das cadeias produtivas da cultura e geração de emprego e renda por atividades culturais. Dentre estas, podem ser destacadas as propostas envolvendo a criação de programas de capacitação de agentes e empreendedores culturais em parceria com Instituições de Ensino Superior; o aumento do fluxo de recursos públicos e privados indispensáveis à sustentabilidade das cadeias criativas e produtivas da cultura com o objetivo de ampliar a circulação e a exportação dos produtos culturais brasileiros; a regulamentação das profissões da área cultural; o reconhecimento dos direitos trabalhistas e previdenciários dos artistas e trabalhadores da cultura; etc. (MINISTÉRIO..., 2010b) Especificamente quanto às políticas do MinC referidas mais atrás, o Programa Identidade e Diversidade Cultural: Brasil Plural e o Programa Cultura Viva, apesar dos resultados positivos contabilizados, alguns pontos merecem ser considerados. Quanto ao primeiro dos programas, os desafios inscrevem-se, particularmente, no que diz respeito ao conhecimento das práticas e atividades culturais realizadas pelos grupos e segmentos socioculturais beneficiados. Aqui, faz falta um mapeamento mais amplo e sistematizado que permita ao MinC alcançar um número maior seja de grupos e segmentos, seja das suas práticas e atividades – de resto uma lacuna histórica no rico e diversificado território das culturas populares brasileiras, apenas tangenciada pela pesquisa que resultou no Suplemento de Cultura da MUNIC 2006. Outro gargalo de peso que impede a ampliação deste Programa é, com certeza, a questão do financiamento, um dos nós das políticas culturais no Brasil, uma vez que o atual modelo depende largamente dos recursos 50 advindos dos mecanismos de incentivos fiscais, que pela suas características é pouco propício ao fomento da diversidade cultural. A superação desta limitação impõe, sem mais, que o Estado assuma o protagonismo direto no financiamento das atividades culturais. Nesta direção, tramita na Câmara de Deputados a Proposta de Emenda à Constituição 150/03 que estabelece um percentual fixo de investimento anual em cultura de 2% para a União, 1,5% para governos dos estados e do Distrito Federal e 1% para os municípios. Em relação ao Programa Cultura Viva, a avaliação levada a cabo pelo IPEA (SILVA; ARAÚJO, 2010) identifica questões de grande relevância que dizem respeito, particularmente, ao descompasso entre os objetivos perseguidos pela política, e a capacidade de resposta do Estado quanto aos aspectos institucionais, legais e administrativos, com prejuízos evidentes para os resultados esperados. Conforme o relatório de avaliação do IPEA, as dificuldades dái decorrentes “relacionam-se a atrasos nos repasses de recursos e ausência de informações padronizadas, consensuais e claras sobre as exigências que o Estado brasileiro faz para atender aos critérios de legalidade” (SILVA; ARAÚJO, 2010, p.108). Nessa medida, sugere o relatório, “Urge maior estruturação da institucionalidade destas políticas, que lhes confira densidade em termos de capacitação dos seus recursos humanos, protocolos claros no que se refere a procedimentos, e armação normativa e legal, dando-lhes maior estabilidade e segurança jurídica para que as instancias comunitárias e da sociedade civil possam agir com maior desenvoltura.” (SILVA; ARAÚJO, 2010, p.108) Corretamente, o relatório alerta para o fato de que estas dificuldades, que nomina como sendo “insuficiências dos processos participativos” (SILVA; ARAÚJO, 2010, p.108), são comuns a programas similares ao Cultura Viva, portanto, costumam frequentar a agenda de problemas de programas “voltados para práticas sociais solidárias baseadas nos dinamismos comunitários e da sociedade civil” (SILVA; ARAÚJO, 2010, p.108). Assim, o que se vê é que o avanço registrado com o acionamento de um programa interessado em empoderar comunidades em relação às suas práticas culturais, como é o caso do Programa Cultura Viva, especialmente a ação desenvolvida pelos Pontos de Cultura, esbarra na aparato burocrático- 51 legal do Estado, despreparado que está, política e institucionalmente, para acolher processos participativos envolvendo a sociedade civil organizada, o que, tratando-se do campo cultural, obstaculiza fortemente o acionamento de políticas voltadas para a construção de uma democracia cultural. E é nesta direção, a conclusão final do relatório de avaliação: “Em primeiro lugar, deve-se enunciar – e foi o que esta pesquisa avaliativa pôde constatar – que o Estado não tem instrumentos jurídicos e de gestão, ou eles não são adequados para suportar, de maneira efetiva, políticas com o desenho e a forma de execução do programa Arte, Cultura e Cidadania – Cultura Viva. Em segundo lugar, afirma-se que é necessário capacitar o programa, dotando-o de instrumentos propícios, de forma que ele persiga objetivos ancorados no texto constitucional e em princípios democráticos”. (SILVA; ARAÚJO, 2010, p.109) Da questão da diversidade cultural, na perspectiva das práticas culturais realizadas por indivíduos, grupos e comunidades, ocuparam-se, também, o PNC e a II Conferência Nacional de Cultura. O PNC debruçou-se sobre a questão elegendo como uma das suas cinco diretrizes fundamentais “Incentivar, proteger e valorizar a diversidade artística e cultural brasileira” (MINISTÉRIO..., 2008, p.69) através da “criação, conservação, preservação e valorização do patrimônio artístico e cultural diversificado” (MINISTÉRIO..., 2008, p.70); do “estímulo à reflexão sobre as artes e a cultura” (MINISTÉRIO..., 2008, p.73); e da “valorização da diversidade” (MINISTÉRIO..., 2008, p.75). Na Conferência, a problemática dá corpo a um eixo de propostas aprovadas intitulado “produção simbólica e diversidade cultural” que acolhe, como subeixos, a produção de arte e bens simbólicos, os diálogos interculturais e a implementação da Convenção da UNESCO, a relação entre cultura, educação e criatividade e entre cultura, comunicação e democracia (MINISTÉRIO..., 2010b). Alguns elementos para a formulação de políticas para a diversidade cultural 52 Todavia, não é, este, um caminho simples, como se pode depreender das observações até aqui registradas. Ao contrário, não são poucos nem de pequeno porte os desafios a enfrentar. E se muitos dependem diretamente de correções de rumo a serem realizadas pelo Ministério da Cultura em relação às suas políticas – e de novas políticas culturais, por óbvio -, outros tanto escapam à tutela da Pasta, localizando-se em outras órgãos e instâncias governamentais. Neste particular, lembra Frederico Barbosa da Silva (2007b), “O desenvolvimento de ações de valorização da diversidade significa também o desenvolvimento concomitante da intersetorialidade ou de ações articuladas entre órgãos governamentais que se direcionem à preservação das condições de vida que dão suporte às manifestações culturais. Essas condições envolvem desde ações de regularização fundiária, quando for o caso, até ações de desenvolvimento sustentável, e passam por iniciativas relação à qualidade de vida, entre as quais saneamento, segurança alimentar, saúde, educação, comunicações e meio ambiente, e todas as ações que concorrem para a preservação e o desenvolvimento cultural das mais diversas formas de expressão cultural, tradicionais ou não.” (SILVA, 2007b, p.110-111) Mas difícil ainda de superar são aqueles que dizem respeito à incapacidade e despreparo do Estado brasileiro, do seu aparato normativo-legal, burocráticoadministrativo e político-institucional em lidar com políticas que, a exemplo daquelas que pretendem alcançar a problemática da diversidade cultural, impõem processos compartilhados, participativos e de empoderamento envolvendo das comunidades, segmentos socioculturais e grupos. E não poderia ser diferente. Se o território das políticas públicas é, claramente, um terrritório de disputas e tensões, maiores são ainda as disputas e tensões quando em tela estão políticas públicas que pretendem ocupar-se da diversidade cultural pois, lembram Albino Rubim e Lia Calabre, “Existem muitos obstáculos à diversidade cultural, a exemplo de todas as concentrações de poder: conglomerados econômicos, típicos da globalização neoliberal; mídia orientada pela lógica do mercado; Estados poderosos; ideários machistas, racistas, homofóbicos; e religiões intolerantes; além das desigualdades sociais e dos desequilíbrios regionais, principalmente entre cidade e campo. Em suma, a sociedade capitalista em que nós vivemos não é propriamente um bom ambiente para a diversidade cultural.” (RUBIM; CALABRE, 2009, p. 36) 53 Se não é o melhor ambiente para a diversidade cultural é nele, entretanto, onde teremos que lidar com esta questão. E como o enfrentamento dos desafios da diversidade cultural demanda, incontornavelmente, políticas públicas, vale destacar algumas exigências elencadas por Rubim e Calabre (2009) como indispensáveis a sua formulação e implementação. A primeira exigência, é que uma política para a diversidade cultural deve ser pública, portanto, construída de forma participativa, com espaços garantidos para debate e, também, deliberação. A segunda, é ter políticas associadas à democratização da sociedade, ou seja, políticas atentas à incorporação de novos atores sociais e ao reforço da cidadania, preocupadas com a superação das desigualdades de toda ordem, ocupadas em considerar a pluralidade de interesses e visões. Neste aspecto, chamam atenção, o Estado tem o dever de associar-se a determinados valores, a exemplo da própria diversidade cultural, recusando-se a desempenhar um papel de mero “propiciador de meios e suportes à atividade cultural” (RUBIM; CALABRE, 2009, p.36). Os autores lembram, também, que as políticas devem levar em consideração a relação entre identidade e diversidade e a perspectiva das trocas e hibridações. Como já observado anteriormente, a questão da diversidade cultural não se esgota numa simples constatação antropológica. Muito menos a Convenção aprovada pela UNESCO satisfaz-se com um mero exercício celebracionista, que nada de prático produz. A diversidade cultural é, antes que tudo, um território de conflitos e disputas, portanto, um processo social. Equacionar as tensões que daí emergem é tarefa que impõe, de forma incontornável, a adoção de políticas públicas que, balizadas por condições como as referidas aqui, podem constituir-se no caminho mais seguro e produtivo para a efetivação das respostas demandadas pela diversidade cultural e sua relação com o desenvolvimento humano sustentável. 2. Parte 2 2.1. Atividade 1: Políticas e Melhores Práticas O estudo analisou duas das políticas do Ministério da Cultura focadas diretamente na diversidade cultural: o Programa Identidade e Diversidade 54 Cultural: Brasil Plural, implementado pela Secretaria da Identidade e Diversidade Cultural, e o Programa Arte, Cultura e Cidadania –Cultura Viva, da Secretaria de Cidadania Cultural (ex-Secretaria de Programa e Projetos Especiais), responsável pelos Pontos de Cultura, procurando identificar fatores de sucessos e dificuldades de implementação. 3. Parte 3 3.1. Atividade 1: Identificação de necessidades de modificações e inovações institucionais Em que pesem os avanços obtidos com as políticas tomadas para análise pelo estudo, desafios importantes estão colocados seja para a continuidade e expansão destas políticas, seja para a formulação e implementação de novas políticas. 3.2. Atividade 2: Identificação de oportunidades de investimento As políticas analisadas, uma vez que dispõem de poucos recursos a sua disposição, ainda requerem investimentos voltados para a real efetivação dos seus objetivos institucionais e, mais ainda, para sua necessária ampliação. 3.3. Atividade 3: Exercício prospectivo com superação de “gargalos” institucionais O estudo identificou os principais obstáculos a serem superados para uma mais adequada implementação das políticas analisadas: • desenvolvimento da intersetorialidade entre o Ministério da Cultura e outros órgãos governamentais de forma a garantir o ambiente e os mecanismos indispensáveis à preservação das condições de vida que dão suporte diversidade cultural; • revisões do aparato normativo-legal, burocrático-administrativo e político-institucional do Estado na perspectiva de dotá-lo das condições necessárias para lidar com políticas que, a exemplo daquelas que pretendem alcançar a problemática da diversidade cultural, impõem processos compartilhados, participativos e de empoderamento envolvendo das comunidades, segmentos socioculturais e grupos; 55 • revisão do modelo de financiamento da cultura na perspectiva do Estado assumir a condição de protagonista principal – neste paricular, é de fundamental importância a aprovação, pelo Congresso Nacional, da PEC 150/03 e do Projeto de Lei que institui o Programa Nacional de Fomento e Incentivo à Cultura – Profic, em substituição à Lei Rouanet; • aprovação, pelo Congresso Nacional, da Proposta de Emenda Constitucional no.416/2005, que institui o Sistema Nacional de Cultura, do Projeto de Lei nº 6.835/2006, que institui o Plano Nacional de Cultura, e da Proposta de Emenda Constitucional no.049/2007, que insere a cultura no rol dos direitos sociais da Constituição Federal; e • implementação de programas capazes de fazer frente aos fatores que respondem pela desarticulação e fragilização dos elos das cadeias e/ou redes de produção e que comprometem a visibilidade e sustentabilidade das pequenas unidades produtivas do setor cultural, a exemplo da falta de capacidade gerencial, baixa capacitação técnica, inexistência ou inadequação de marcos regulatórios e dificuldades de acesso a fontes de financiamento. 4. Anexos 4.1. Anexo 1 - Oportunidades e implicações para o BNDES O BNDES já tem uma atuação bastante significativa no campo da cultura. Além de financiar desde muito tempo, via Lei Rouanet, projetos na área de patrimônio, o Banco conta, também, com um programa voltado para o fomento à economia da cultura. O Programa BNDES para o Desenvolvimento da Economia da Cultura (BNDES Procult), até 2009 voltado apenas para o segmento do audiovisual, teve sua dotação aumentada de R$ 175 milhões para R$ 1 bilhão, a ser aplicado até o ano de 2012 em atividades culturais nos setores de audiovisual (cinema, TV e novas mídias), patrimônio histórico, música, jogos eletrônicos, fonográfico, editorial e dos espetáculos ao vivo (música, teatro, dança). Todavia, a partir do que foi analisado neste trabalho, a atuação do Banco no campo cultural poderia alcançar, também, programas dedicados à construção de capacidade do Estado no desenvolvimento de políticas e de entes da 56 sociedade civil na condução de suas práticas e atividades culturais, a exemplo de: • articulação intersetorial envolvendo o Ministério da Cultura, o IBGE e o IPEA com vistas ao financiamento da produção de estatísticas, indicadores e pesquisas no campo da cultura; • articulação com as Instituições Públicas de Ensino Superior com o objetivo de desenvolver pesquisas e programas de formação nas várias áreas da cultura. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABPITV- Associação Brasileira de Produtoras Independentes de Televisão. Apresentação - conteúdo audiovisual no mundo e no Brasil. São Paulo, [2008?]. Disponível em: <http://www.telebrasil.org.br/painel/52/palestras/7/fernando-de-souzadias.pdf>. Acesso em: 8 nov. 2009. ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max. 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