UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CONSTRUÇÕES COM SE
Evidências da emergência da gramática do
Português Brasileiro
Elaine Alves Santos Melo
Março de 2012
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Letras Vernáculas da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do
título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa). Orientadora: Silvia Regina de
Oliveira Cavalcante
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CONSTRUÇÕES COM SE: EVIDÊNCIAS DA EMERGÊNCIA DA GRAMÁTICA
DO PORTUGUÊS BRASILEIRO
Elaine Alves Santos Melo
Rio de Janeiro, março de 2012.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CONSTRUÇÕES COM SE: EVIDÊNCIAS DA EMERGÊNCIA DA
GRAMÁTICA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO
Elaine Alves Santos Melo
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-graduação em
Letras
Vernáculas da Universidade Federal do Rio de
Janeiro, como parte dos requisitos necessários à
obtenção do título de Mestre em Letras
Vernáculas (Língua Portuguesa).
Orientadora: Silvia Regina de Oliveira Cavalcante
Rio de Janeiro
Março 2012.
CONSTRUÇÕES COM SE: EVIDÊNCIAS DA EMERGÊNCIA DA
GRAMÁTICA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO
Elaine Alves Santos Melo
Orientadora: Profa. Dra. Silvia Regina de Oliveira Cavalcante
Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Letras
Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos
requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas
(Língua Portuguesa)
Avaliada por:
_______________________________________________________________
Presidente, Prof. Doutora Silvia Regina de Oliveira Cavalcante (UFRJ)
_______________________________________________________________
Prof. Doutora Charlotte Marie Chambelland Galves (UNICAMP)
_______________________________________________________________
Prof. Doutora Maria Eugênia Lamoglia Duarte (UFRJ)
_______________________________________________________________
Prof. Doutora Célia Regina dos Santos Lopes (UFRJ)
_______________________________________________________________
Prof. Doutora Marcia Cristina de Brito Rumeu (UFMG)
Rio de Janeiro
Março, 2012
Melo, Elaine Alves Santos
Construções com SE: evidências da emergência da gramática do português
brasileiro/ Elaine Alves Santos Melo. Rio de Janeiro: UFRJ – FL, 2012
Orientador: Silvia Regina de Oliveira Cavalcante
Dissertação (mestrado) – UFRJ/ Programa de Pós – Graduação em Letras
Vernáculas, 2012
Referências Bibliográficas: 153-160
1. Mudança Linguística; 2. Construções com SE; 3. Português Brasileiro. I.
Cavalcante, Silvia Regina de Oliveira. II. Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Pós Graduação em Letras Vernáculas. III. Título.
MELO, Elaine Alves Santos. Construções com SE: evidências da emergência
da gramática do português brasileiro. Dissertação de Mestrado em Língua
Portuguesa. Rio de Janeiro, Faculdade de Letras/ UFRJ, 2012.
RESUMO
Pesquisas como as de Duarte (2002), Duarte e Lopes (2002), Cyrino (2007) têm
analisado o DP-argumento interno de construções com SE e verbo transitivo direto
que apresentam concordância verbal como um sujeito, como na sentença “Comprãose escravos para encommendas; na rua da Princeza dos Cajueiros número 100.”
Outra linha de análise, Raposo e Uriagereka (1996), Martins (2003), Cavalcante (2006,
2011a, 2011b), advoga que essas mesmas construções não são passivas, mas sim
ativas, em que o DP argumento interno, mesmo com concordância verbal, é um objeto
nominativo e o clítico SE ocupa a posição de sujeito.
Nesse sentido, propomos nessa dissertação observar não apenas a concordância,
mas também a posição do DP sujeito em construções passivas analíticas, construções
com SE-reflexivo/recíproco/inerente e a posição do DP objeto nas construções ativas a
fim de verificar se estas construções consideradas passivas sintéticas, que aqui
consideramos construções de SE-indefinido, são passivas ou ativas. A hipótese é de
que se o DP das construções de SE-indefinido apresentar um comportamento
estatístico semelhante aos DPs sujeitos das construções passivas analíticas e das
construções com SE-reflexivo/recíproco/inerente, então se trata de um sujeito;
contrariamente, se ele apresenta comportamento estatístico semelhante aos DPs
objetos, então se trata de um objeto-nominativo. Essa hipótese baseia-se nos
resultados da análise diacrônica de Cavalcante (2006, 2011a, 2011b) e na proposta de
Raposo e Uriagereka (1996), Martins (2003).
A amostra é constituída de anúncios, cartas de leitores e cartas de redatores
publicados em jornais cariocas ao longo do século XIX, que compõe parte dos Corpora
do Projeto Para a História do Português Brasileiro, equipe Rio de Janeiro (PHPB-RJ),
disponível em www.letras.ufrj.br / phpb-rj. Para a análise estatística dos dados,
utilizamos o programa Goldvarb-X (SANKOFF, D; TAGLIAMONTE, S. A, SMITH, E,
2001) que atuou como uma ferramenta para o tratamento estatístico.
Os resultados indicam dois padrões estatísticos diferentes: os DPs sujeitos das
construções passivas analíticas e das construções com SE reflexivo/ recíproco /
inerente apresentam-se preferencialmente antepostos; o DP das construções com SEindefinido se comportam estatisticamente como os DPs objetos diretos. Além disso,
pudemos observar o que Kroch (2001) chama de competição de gramáticas, pois
corroborando os resultados de Cavalcante (1999), Duarte (2002) e Duarte e Lopes
(2002) foram encontradas majoritariamente sentenças com concordância, constituindo
as estruturas que Raposo e Uriagereka (1996) nomeiam de construções com SEindefinido que para Cavalcante (2006) pertencem à gramática do Português Europeu.
A emergência da gramática do Português Brasileiro pode ser observada nas
construções sem concordância, ou seja, nas sentenças com SE-genérico (RAPOSO e
URIAGEREKA, 1996).
MELO, Elaine Alves Santos. Construções com SE: evidências da emergência
da gramática do português brasileiro. Dissertação de Mestrado em Língua
Portuguesa. Rio de Janeiro, Faculdade de Letras/ UFRJ, 2012.
ABSTRACT
In this work, we observe the order of the DP-internal argument of sentences like,
in order to verify its grammatical relation.
Recent research on SE-constructions in Brazilian Portuguese that present
agreement between the internal argument and the verb, such as “Comprão-se
escravos para encommendas; na rua da Princeza dos Cajueiros número 100.”, has
analized this DP “escravos” as a subject, because of the verbal agreement pattern (see
Duarte, 2002; Duarte & Lopes, 2002; Cyrino, 2007). Other studies, like Raposo &
Uriagereka (1996), Martins (2003) and Cavalcante (2006, 2011a, 2011b), analyze
these constructions as active ones, in which the internal argument DP is an object that
with nominative Case and the clitic SE lies in subject position.
In this thesis, we compare the statistical behavior of these constructions, named
as indefinite-SE constructions, in comparison with reflexive / reciprocal / inherent SE
constructions, canonical passives and active sentences, in order to show that this DP
can be analyzed as a nominative object. By hipothesis, assuming Kroch (2001), we
expect that if the DP in indefinite-SE constructions presents statistical behavior similar
to the subject DP of canonical passives, and other SE-constructions, then it is analyzed
as a subject; on the other side, if this DP presents similar statistical behavior as the
object-DP of transitive sentences, then it is analyzed as an object. These hypotheses
are based on the diachronic results of Cavalcante (2006, 2011a, 2011b) and the
theoretical analysis proposed by Raposo & Uriagereka (1996) and Martins (2003).
The analysis is based on data from advertisements, letters from the newspaper
editor and letters from readers that were published in newspapers in Rio de Janeiro
during the 19th century. This sample is part of the Projeto Para a História do Português
do Brasil (PHPB-RJ), available at www.letras.ufrj.br/phpb-rj. For the statistical analysis,
we used the software Goldvarb-X (SANKOFF, D; TAGLIAMONTE, S. A; SMITH, E,
2001).
Our hypotheses have been confirmed: the DP of indefinite-SE constructions
presented a statistical behavior similar to the object; whereas the subject DPs of
canonical passives, other SE-constructions behaved similar. Moreover, we could see
grammars in competition (Kroch, 2001), in SE-constructions because of the patterns of
verbal agreement: the emergence of Brazilian Portuguese grammar can be seen in
sentences without agreement, like the ones with generic SE (RAPOSO e
URIAGEREKA, 1996); whereas the sentences with agreement (indefinite-SE) belong to
the European Portuguese grammar.
Agradecimentos
O verbo “agradecer” tem origem no vocábulo latino Gratus, que significa
“agradecido” ou “agradável”, talvez por isso sejamos agradecidos a todos que
nos propiciaram momentos agradáveis, mas considero que temos de agradecer
também a aqueles que estiveram ao nosso lado nos intensos momentos de
dificuldade os quais nos fazem crescer. Por isso, quero agradecer.
Agradeço primeiramente a Deus, minha fonte de luz, de força, com
quem eu me agarrei nos momentos em que nada parecia estar correto,
naqueles instantes em que o corpo já exausto não reagia aos estímulos, mas
era preciso trabalhar.
Aos meus pais, não existem palavras capazes de descrever o quanto
agradeço a Eliane Melo e Beniz Melo, os primos que casados constituíram
uma família linda. Eles são o exemplo que levo para a vida, pessoas de
coragem, perseverança que abriram mão de uma vida mais confortável porque
acreditavam que educando adequadamente a mim e ao meu irmão, Beniz
Junior, dariam a nós muito mais oportunidades do que as obtidas por eles. A
vocês dois, tenho que dizer em caixa alta: OBRIGADA!
Ao meu irmão, Beniz Junior, que está unido a mim por laços de sangue
e a minha irmã, Tatiane Chuvas que é minha irmanzinha do coração preferida.
Aos dois, obrigada por existirem na minha vida. Obrigada por me fazerem dar
gargalhadas. Tatiane, obrigada por me ouvir, por estar sempre ao meu lado,
por ser a minha amiga para todas as horas, pois afinal nós somos a prova de
que não é preciso haver laços de sangue para que duas pessoas sejam irmãs.
A minha família: avós, avôs, tios, tias, madrinhas, padrinho, primos,
primas, amigos e amigas, afilhados que muito incentivaram essa longa
caminhada. Obrigada, por tudo, pois afinal sair de uma família em que os avós
são analfabetos e tornar-se Mestra requer muito esforço de todos.
Agradeço, especialmente, à professora Silvia Regina de Oliveira
Cavalcante, minha orientadora, o cuidado, a atenção, o carinho, a amizade
com que me recebeu e conduziu no mundo da pesquisa. Particularmente,
agradeço o seu constante estímulo na busca por novos conhecimentos
linguísticos, o seu interesse ímpar e motivante na construção de um saber que
possa auxiliar a desvendar o que são as gramáticas do português. Seu apoio
imensurável na vida acadêmica e a sua sempre atenciosa postura em relação à
vida pessoal me deram segurança, força, mas, sobretudo, exemplo de como
prosseguir nessa caminhada pelo mundo das Letras. OBRIGADA!
Aos meus amigos Caio Castro, Érica Nascimento e Ana Carolina Mrad,
agradeço cada sorriso, telefonema, bate-papo sérios e aleatórios, viagens,
congressos, lembranças de uma época da minha vida que ficará marcada. Ao
Caio Castro, agradeço a pergunta cabal, numa sexta-feira de 2008,
proporcionadora do início dessa caminhada que chega agora a Dissertação de
Mestrado. A Érica e a Ana por terem descoberto que a nova professora do
setor trabalhava com sintaxe histórica. Aos três por me ouvirem, aguentarem e
até lutarem para entender as construções com SE. Falta ainda agradecer ao
restante da grande família F-316: Janaína Pedreira, Rachel Oliveira, Leonardo
Marcotulio, Aline Santos, Mayara Nicolau, Jéssica Melo, Stephanie Vale que
sem dúvidas tornaram as tardes de trabalho momentos mais agradáveis.
Agradeço também a Priscila Santos que surgiu não sei de onde no dia do
resultado final do concurso para o Mestrado e ainda desconhecida comemorou
junto comigo a aprovação. Obrigada por me ouvir, por me fazer rir, por estar ao
meu lado em todos os momentos dessa caminhada.
Agradeço aos meus professores desde a Pré-escola até as disciplinas
da Pós-graduação, especialmente a Floraci Tavares, Roosevelt Espírito Santo,
Eduardo Póvoa, Célia Lopes, Dinah Callou, Filomena Varejão, Carlos
Alexandre Gonçalves, Kristine Stenzel, Mônica Orsini, Maria Eugênia L. Duarte,
Afrânio Barbosa, Silvia Cavalcante, entre tantos outros pelo incentivo durante
esse longo percurso de aprendizado que começou em 1992.
Agradeço às professoras Charlotte Galves, Maria Eugênia Duarte, Célia
Lopes e Márcia Rumeu que aceitaram participar da banca dessa dissertação.
De modo especial agradeço as considerações, na arguição, das professoras
Charlotte Galves e Maria Eugênia que muito acrescentaram na construção
deste trabalho, indicando caminhos que produzirão reflexões as quais com
certeza não cessaram nessa dissertação.
Finalmente, quero agradecer aos meus alunos que de modo geral
conviveram e convivem com uma professora estressada, mas que acredita na
força da educação como a propulsora das mudanças necessárias nesse país.
Agradeço a compreensão dos alunos do Estado que perderam uma professora
no meio do ano letivo, mas que perceberam a importância da atitude de pedir
exoneração na minha carreira. A eles, o meu obrigada por sempre que me
encontram na rua, educadamente me cumprimentar e perguntar se já sou
Mestre.
Falta ainda agradecer ao CNPq que por meio da concessão de uma
bolsa de Mestrado permitiu a mim que mais horas fossem dedicadas a
pesquisa que é discutida nessa dissertação. Agradeço ainda ao Programa de
Pós-Graduação em Letras Vernáculas da UFRJ que subsidiou por meio de um
auxilio financeiro algumas das viagens que fiz para apresentar trabalhos no
Brasil e no exterior.
Agradeço a todos que de alguma forma fizeram parte dessa história,
apesar de não estarem por nome citados aqui. Vocês sempre estarão
guardados em meu coração. Enfim, quero dizer a todos: OBRIGADA!
Este trabalho foi parcialmente financiado por uma bolsa do CNPq.
A
Francisco Alfredo Ferreira Santos (in memorian),
João Melo Neto (in memorian),
Antônio Alfredo Santos (in memorian),
Eliane Alves Santos Melo e
Beniz Santos Melo.
Pronominais
(Oswald de Andrade)
Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro
Índice de Figuras
Tabela 1: Distribuição dos PPs agente da passiva por tipo de construção (média por séculos)
(%) (Retirado de CAVALCANTE, 2011) ....................................................................................................... 30
Tabela 2: Frequência de uso da ordem verbo-sujeito, VS (Retirado de Berlinck, 1989:90) ... 33
Tabela 3: Fatores que favorecem a inversão do sujeito ao longo do tempo em textos de
brasileiros (Retirado de Berlinck, 1989:) .................................................................................................. 34
Tabela 4: Ordens SV e (X)VS na escrita catarinense dos séculos XIX e XX (Retirado de
COELHO e MARTINS, 2009) .............................................................................................................................. 35
Tabela 5: Contextos sintáticos de VS na escrita catarinense dos séculos XIX e XX em três
tempos (Retirado de COELHO e MARTINS, 2009:78) ............................................................................. 36
Tabela 6: Distribuição dos referentes de VS e SV pelas categorias informacionais principais
(Retirado de NARO E VOTRE, 1987:469) .................................................................................................... 39
Tabela 7: Frequência de ordem VS segundo o estatuto informacional do sujeito, no PB e no
PE modernos (Retirado de BERLINCK, 1997:65) ..................................................................................... 40
Tabela 8: Ocorrência de não concordância. (Retirado de DUARTE, 2002:163) ........................... 44
Tabela 9: Posição do SN x Não concordância (Retirado de DUARTE, 2002:165) ......................... 44
Tabela 10: Construções com “se” e a não concordância com o argumento interno em
sentenças finitas (Retirada de DUARTE e LOPES, 2002) ....................................................................... 45
Tabela 11: Realização do argumento interno com relação ao verbo infinitivo nas construções
com SE no Corpus TychoBrahe (Retirado de CAVALCANTE, 2006:94) ............................................ 51
Tabela 12: Presença x ausência de preposição em infinitivas com “se” e sem “se” (Adaptado
de DUARTE e LOPES, 2002: 163) .................................................................................................................... 52
Tabela 13: Uso de SE com infinitivo em relação à posição do argumento interno e tipo de
texto: Período 4 (Retirado de CAVALCANTE, 1999:95) ......................................................................... 53
Tabela 14: As cartas de redatores ao longo do tempo por periódico ............................................... 80
Tabela 15: As cartas de leitores ao longo do tempo por periódico ................................................... 80
Tabela 16: Os anúncios ao longo do tempo por periódico ................................................................... 81
Tabela 17: Distribuição dos dados por gênero textual .......................................................................... 81
Tabela 18: Realização do argumento (interno ou externo) por construção (sentenças finitas
e infinitivas)........................................................................................................................................................... 96
Tabela 19: A nova distribuição geral dos dados em sentenças finitas e não finitas. .................. 98
Tabela 20: A distribuição geral nas sentenças finitas. ........................................................................... 99
Tabela 21: A distribuição geral nas sentenças não finitas ................................................................... 99
Tabela 22: Anteposição x posposição ao longo do tempo por tipo de estruturas nas sentenças
finitas .................................................................................................................................................................... 101
Tabela 23: As sentenças não finitas ao longo do tempo por tipo de estrutura .......................... 104
Tabela 24: O argumento nulo nas sentenças finitas ............................................................................ 106
Tabela 25: Anteposição x Posposição nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo
finitas por tipo de sintagma. ......................................................................................................................... 109
Tabela 26: Anteposição x Posposição nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo
não finitas por tipo de sintagma. ................................................................................................................ 109
Tabela 27: Anteposição x Posposição nas sentenças finitas com SE-reflexivo por tipo de
sintagma. .............................................................................................................................................................. 115
Tabela 28: Anteposição x Posposição nas sentenças não finitas com SE-reflexivo por tipo de
sintagma. .............................................................................................................................................................. 115
Tabela 29: Distribuição do estatuto informacional dos referentes dos sujeitos em
construções VS finitas e não finitas com SE-reflexivo ......................................................................... 120
Tabela 30: Anteposição x Posposição nas sentenças finitas passivas por tipo de sintagma. 120
Tabela 31: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-reflexivo .......... 123
Tabela 32: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas Passivas .......................... 125
Tabela 33: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-genérico .......... 127
Tabela 34: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-indefinido ....... 127
Tabela 35: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-ambíguo .......... 128
Tabela 36: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com objeto direto ........ 129
Tabela 37: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças não finitas com SE-reflexivo . 129
Tabela 38: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças não finitas com SE-indefinido,
genérico ou ambíguo. ...................................................................................................................................... 130
Tabela 39: Traço de animacidade nas sentenças finitas com SE-indefinido, genérico ou
ambíguo................................................................................................................................................................ 132
Tabela 40: Concordância em sentenças finitas com SE-indefinido/genérico ............................ 138
Tabela 41: Concordância nas construções com SE-indefinido/genérico ao longo do tempo.
................................................................................................................................................................................. 141
Tabela 42: As sentenças com SE-genérico por gênero textual ......................................................... 145
Figura 1: Tipos de SE na diacronia do português (Retirado de CAVALCANTE, 2011a) .............. 22
Figura 2: Características do SE-genérico no PB. (Retirado de CAVALCANTE, 2006:186) ......... 48
Figura 3: Do que trata a linguística histórica? ( Retirado de MATTOS e SILVA, 2008:10) ........ 57
Figura 4: Proposta para repensar a periodização: revisitando a periodização da Língua
Portuguesa (Retirado de GALVES, NAMIUTTI e PAIXÃO DE SOUSA, 2005) .................................... 61
Figura 5: O redobramento do nível histórico da língua segundo Koch (1997:45) ...................... 72
Figura 6: Organização do ordenograma (Retirado de Melo, 2011) ............................................... 144
Gráfico 1: SV-cl versus XVS em sentenças ativas ao longo do tempo no Corpus Tycho Brahe
(%) (Retirado de PAIXÃO DE SOUSA, 2004:244) ..................................................................................... 26
Gráfico 2: Distribuição dos argumentos (Anteposto, Posposto e Nulo) por tipo de construção
ao longo do tempo (%) (Retirado de CAVALCANTE, 2011) ................................................................. 28
Gráfico 3: Distribuição dos argumentos antepostos por tipo de construção ao longo do tempo
em Paixão de Sousa (2004) e Cavalcante (2011). (%) .......................................................................... 29
Gráfico 4: Sujeitos plenos e a hierarquia referencial (Retirado de KATO, CYRINO, DUARTE e
BERLINCK, 2006:424) ........................................................................................................................................ 42
Gráfico 5: Verbo auxiliar “do” no Inglês em diferentes contextos (Retirado de KROCH
1989:22).................................................................................................................................................................. 69
Gráfico 6: A anteposição ao longo do tempo por tipo de construção em sentenças finitas. . 102
Gráfico 7: O argumento nulo nas sentenças finitas .............................................................................. 106
Gráfico 8: O argumento nulo nas sentenças não finitas ..................................................................... 107
Gráfico 9: A concordância ao longo do tempo nas sentenças com SE-indefinido/ genérico. 142
Gráfico 10: Ordenograma dos anúncios (Retirado de Melo, 2011) ................................................ 144
Sumário
Introdução ................................................................................................................................ 1
Capítulo 1: Construções com SE e posição do sujeito ................................................4
1.1 Apresentação.................................................................................................................4
1.2 As estruturas em análise ........................................................................................... 4
1.3 Análises diacrônicas quantitativas..................................................................... 22
1.4 A ordem do sujeito no PB e as construções com SE ...................................... 32
1.4.1 A ordem do sujeito no PB................................................................................ 33
1.4.2 As construções com SE no PB ........................................................................ 43
1.5 As sentenças não finitas ......................................................................................... 50
1.6 Concluindo o capítulo.............................................................................................. 54
Capítulo 2: Pressupostos Teóricos e Metodológicos ............................................... 56
2.1 A questão da mudança ............................................................................................ 56
2.2 A periodização ........................................................................................................... 59
2.3 O Modelo gerativista. ............................................................................................... 63
2.4 Competição de Gramáticas .................................................................................... 67
2.5 A Teoria de Tradição discursiva .......................................................................... 71
2.4 Metodologia e Hipóteses ........................................................................................ 74
2.4.1 Objetivos e Hipóteses ....................................................................................... 74
2.4.2 A amostra ............................................................................................................. 77
2.5 Concluindo o capítulo.............................................................................................. 82
Capítulo 3: Análise dos dados ......................................................................................... 83
3.1 3.1 Os contextos sintáticos em análise .............................................................. 83
3.1.1 As formas de realização do DP ...................................................................... 83
3.1.2 Os contextos sintáticos e as estruturas observadas em relação a
realização dos DPs ....................................................................................................... 84
3.1.2.1 Tipo de construção ........................................................................................ 85
3.1.2.2 Estrutura do núcleo do predicado ........................................................... 87
3.1.2.3 Marca de número no argumento e Marca de número no verbo .... 87
3.1.2.4 Realização do argumento ............................................................................ 88
3.1.2.5 Realização do referente ............................................................................... 89
3.1.2.6 Traço de animacidade................................................................................ 90
3.1.2.7 Realização do sintagma agentivo ............................................................. 91
3.1.2.8 Tipo sintático da oração .............................................................................. 92
3.1.2.9 Tempo e modo verbal com predicadores simples e complexos .... 93
3.1.2.10 Tempo.............................................................................................................. 94
3.1.2.11 Gênero textual .............................................................................................. 95
3.2 Distribuição geral dos dados. ............................................................................... 95
3.3 O DP das sentenças com SE que apresentam verbo transitivo direto:
sujeito ou objeto? ......................................................................................................... 99
3.4 O estatuto informacional e a ordem dos constituintes ............................ 108
3.5 O tipo de oração ..................................................................................................... 122
3.5.1 O tipo de oração e as sentenças finitas ................................................... 122
3.5.2 O tipo de oração e as sentenças não finitas ........................................... 129
3.6 Traço de animacidade .......................................................................................... 132
3.7 Competição de gramáticas ................................................................................. 137
3.7.1 A concordância ................................................................................................ 137
3.7.4 Anúncios e cartas: os gêneros textuais e a competição de gramáticas
......................................................................................................................................... 143
Considerações Finais ....................................................................................................... 146
Referências ......................................................................................................................... 150
Introdução
O objeto de estudo desse trabalho é a análise da ordem do DPargumento interno nas sentenças com SE, tradicionalmente classificadas como
passivas sintéticas por apresentarem concordância entre o verbo transitivo
direto e o argumento interno no plural como podemos ver no exemplo (1).
Diversos estudos, ((Duarte (2002), Duarte e Lopes (2002), Cyrino (2007),
Cinque (1988), Dobrovie-Sorin (1998), Mateus et alli (2003)), já observaram
essas construções sempre levando em consideração o fator concordância para
afirmar que o argumento interno era sujeito.
(1)
Vendem-se machinas de costura Singer e outras, a dinheiro e a prestações
de 5$ a 10$, e alugão-se por pequenos alugueis; na rua Larga de São
Joaquim número 116. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de
1881)
Observaremos essas mesmas construções a fim de provar que o DPargumento interno de sentenças como (1) não é o sujeito da sentença ainda
que exiba concordância com o verbo. Para tanto, compararemos a posição
desse argumento com o DP-sujeito de sentenças passivas analíticas e com SE
recíproco (2a), inerente (2b) ou reflexivo (2c). Além disso, observaremos o
comportamento do objeto direto (2d) em sentenças transitivas.
(2)
a) meu amigo, as minhas licenças eu as dou a um guarda da camara para as
tirar, porque só assim fico descançado de multas e outros incommodos,
embora pague por cada uma 3 ou 4 $ rs., porque elles lá se entendem uns
com os outros; (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de
1850)
b) O salão acha-se aberto todos os dias das 9 horas da manhã às 9 horas da
noite. Entrada Franca (Anúncios, Diário de Notícias, 29 de dezembro de
1885)
1
c) Infelizmente, ha bastante tempo que a nossa camara dos deputados se
resentia, da falta de um orador eloquente, calmo e que uzasse de uma
linguagem floreada e elegante; sem attenção a preconceitos ou ideiais de
partido, dissesse a verdade franca e nua.(Carta de Leitor, Correio da Noite,
22 de Janeiro de 1879)
d) V.Ex.ª é na verdade um ministro PREVARICADOR e CONCUCIONARIO a
vista do seu procedimento para com o Official maior Cunha Mattos, pois a voz
publica acuza esse funcionario publico V.Ex.ª não o manda justificar, o que
dizermos de V.Ex.ª? (Carta de Redator, O Guerreiro, 04 de Março de 1853)
Propomos esta comparação, pois a hipótese principal desse trabalho é
que se o DP-argumento interno das construções ditas “passivas sintéticas” for
o sujeito os padrões estatísticos de anteposição, posposição e argumento nulo
serão iguais aos apresentados pelos sujeitos das construções recíprocas,
reflexivas, inerentes e passivas analíticas. Entretanto, se for o objeto seu
comportamento será simétrico ao encontrado nas sentenças transitivas diretas
em que observo apenas o constituinte com a relação gramatical de objeto
direto. Essa hipótese fundamenta-se na proposta de Raposo e Uriagereka
(1996) e nos resultados quantitativos das análises diacrônicas de Cavalcante
(2006), Cavalcante e Paixão de Sousa (2009) e Cavalcante (2011a, b) que
indicam
ser
o
DP-argumento
interno
das
construções
com
SE,
preferencialmente, posposto.
A análise está pautada na Teoria de Principios e Parâmetros (Chomsky,
1986). O objeto de estudo de um gerativista é a Língua–I, que é uma
propriedade biológica capaz de gerar sentenças, sendo sinônimo de gramática
internalizada. Para se chegar à Língua-I, temos disponível a Língua-E, que
pode ser entendida como o desempenho do falante, ou seja, o produto da
Lingua-I. Numa pesquisa que utiliza os pressupostos da Teoria de Princípios e
2
Parâmetros é necessário trabalhar com os dados da Língua-E para checar as
pistas que indiquem a Língua-I.
A amostra é constituída por cartas de leitores, cartas de redatores e
anúncios publicados em jornais cariocas durante o século XIX. Esses textos
integram o Corpus do projeto Para uma História do Português Brasileiro –
RJ (PHPB-RJ), disponível em www.letras.ufrj.br/phpb-rj. A amostra está
dividida em três períodos: 1808-1840, 1841-1870 e 1871-1900. Faremos uso
do pacote de Programas Goldvarb-X (SANKOF, D; SMITH, E; TAGLIAMONTE,
2001) como uma ferramenta para o tratamento estatístico dos dados que foram
codificados de acordo com contextos sintáticos e ainda em relação ao tempo e
ao gênero textual.
Esta dissertação está organizada da seguinte forma: no primeiro
capítulo, traremos uma discussão acerca dos trabalhos empíricos que tratam
do nosso objeto de estudo. No segundo capítulo, apresentaremos o quadro
teórico metodológico, as hipóteses, os objetivos, a metodologia no qual
apoiamos a análise. No terceiro capítulo, apresentaremos os contextos
sintáticos que serão analisados nas seções seguintes deste capítulo.
Finalmente, encerraremos a dissertação com as considerações finais que os
resultados da pesquisa nos permitem apontar.
3
Capítulo 1: Construções com SE e posição do
sujeito
1.1 Apresentação
Neste capítulo, procuraremos abordar diferentes visões sobre as
construções com SE e a ordem do sujeito no PB, PE e Português Clássico.
Posteriormente, trago alguns resultados empíricos acerca dessas sentenças, a
partir de diferentes aportes teóricos. Em geral, os trabalhos que serão
discutidos tratam do tema a partir de um viés diacrônico num percurso histórico
que tem início no Português Arcaico e chega ao Português Brasileiro
(doravante PB), passando pelo Português Clássico e Português Europeu
(doravante PE).
1.2 As estruturas em análise
A amostra desse trabalho consta de objetos diretos, sentenças passivas
analíticas, com SE reflexivo, recíproco, inerente, “passivo”, ambíguo e
indeterminador1, conforme apresentado na introdução. Inicio esse capítulo
discutindo as características dessas oito estruturas, sendo a ordem de
apresentação a seguinte: passivas analíticas, SE-reflexivo, SE-recíproco, SE-
1
Os autores que serão apresentados ao longo do capítulo tratam com diferentes nomes o SEindeterminador. Assim, por vezes, durante a apresentação da revisão bibliográfica farei uso da
terminologia de cada autor. Vejamos a nomenclatura adotada por cada autor: Duarte, Brito e
Matos (2003): SE-indeterminador; Naro (1976): SE-impessoal; Raposo e Uriagereka (1996):
SE-genérico. No capítulo 3, especificamente, adotarei a nomenclatura proposta por Raposo e
Uriagereka (1996).
4
inerente, SE-passivo, SE-indefinido, SE-nominativo, SE-ambíguo e objeto
direto.
As passivas analíticas2 são, segundo Duarte (2003), sentenças em que
o constituinte com a função sintática de sujeito tem na voz ativa
correspondente a relação gramatical de objeto direto, enquanto que o sintagma
preposicionado, tradicionalmente classificado como agente da passiva, tem na
ativa a função de sujeito. Outra característica dessa estrutura é a manutenção
dos papeis temáticos entre o sujeito da passiva e o objeto direto da ativa e
entre o agente da passiva e o sujeito da ativa correspondente. O predicador da
sentença passiva é um verbo na forma de particípio que concorda em gênero e
número com o sujeito, além dele há o verbo auxiliar “ser”, como vemos com os
exemplos em (1):
(1)
a) O protesto que fiz sobre a apprehensão da carne não foi indeferido, nas
sim acceito, pois que foi mandado juntar ao processo enviado ao Sr. guardamor,que, sabendo que tal protesto não podia ser acceito pela alfandega,
devolveu-o á inspectoria, declarando que lhe parecia não ser isso regular.
(Carta de Leitor, Actualidade - Jornal da Tarde, 29 de Janeiro de 1869)
b) Os pontos mais difficeis do programma, taes como os que se referem á
Prehistoria, aos primeiros typossociaes, á sciencia da historia, da qual se
deduzem os dados cosmologicos, physicos e psychologicos, foram tratados
com toda a proficiencia e orientação didatica pelo Senhor Annibal
Mascarenhas que, sem resfolhos, explanou estes variados assuntos de modo
a facilitar sua comprehensão a todas as intelligencias. (Anúncios, A Bomba,
10 de Outubro de 1894)
2
Duarte (2003) afirma ainda que existem as passivas adjetivas que também podem ser
chamadas de passivas de estado ou resultativas. Elas compartilham com as passivas sintéticas
e as analíticas a propriedade de ter a relação gramatical de sujeito exercida pelo argumento
interno. Em passivas adjetivas podem ocorrer verbos copulativos como “ficar”, “estar”, “andar”,
entre outros e o predicador verbal que fica no particípio, segundo Mendes (2001), funciona
como adjetivo formado por um processo de conversão na morfologia, como se pode ver em (i)
e (ii):
(i) O carro está deteriorado
(ii) O carro ficou deteriorado
Em virtude de a literatura não apresentar uma classificação específica como passiva para
sentenças como (i), optamos por não tratar delas nesse trabalho.
5
Os clíticos SE recíproco (2a) e reflexivo (2b) apresentam conteúdo
argumental, pois ocupam a posição de objeto direto dos verbos transitivos,
sendo tratados como clíticos de referência anafórica. Eles admitem
construções de redobro, ou seja, estruturas em que um clítico pronominal átono
tem a mesma referência de um XP que marca a posição argumental a qual o
clítico está associado, tal como ocorre em (2a) em que o argumento interno SE
e o DP “uns com os outros” têm o mesmo referente, ou seja, o pronome
nominativo “elles”. Nas construções com SE-recíproco, o redobro é
parafraseado por expressões como “uns com os outros”, “um com o outro” e
suas variantes, como (2a). Já nas sentenças com SE-reflexivo a expressão é “a
si próprio”.
(2)
a) meu amigo, as minhas licenças eu as dou a um guarda da camara para as
tirar, porque só assim fico descançado de multas e outros incommodos,
embora pague por cada uma 3 ou 4 $ rs., porque elles lá se entendem uns
com os outros; (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de
1850)
b) Uma pessoa bastante habilitada encarrega-se de tratar questões
forenses, policiaes e particulares nesta Capital, e , bem assim, legalisa com
brevidade e por diminuta retribuição os papeis necessarios para enlaces
matrimoniaes no civil, e no religioso. Cartas nesta redacção a E. M.
(Anúncios, O Jacobino, 8 de agosto de 1896)
Segundo Brito, Duarte e Matos (2003), o SE-inerente caracteriza-se por
não apresentar conteúdo semântico ou morfossintático. Nessas construções o
clítico não pode ser retirado do verbo, sendo uma propriedade lexical do
predicador. Esse tipo de pronome ocorre em sentenças com verbos reflexos,
conforme os exemplos em (3):
(3)
a) Carvalho teve a fortuna de ganhar a opinião publica, sendo reeleito quatro
vezes por unanime acclamação dos Povos, quando o Sr. Barreto se fazia
aborrecido pela guerra civil, que promoveo, aliciando Povo, e a Tropa: elle se
6
dirigio a mim, que lhe respondi o que devia, que era esperar pela decisão
de S.M.I., a quem, já se achava affecto este negocio. (Carta de leitor, O
Propugnador, 13 de Junho de 1824)
b) porque os homens honestos se envergonhão de ler tantas sandices, que
desacreditão o Brasil !!! (Carta de Redator, O Brasileiro Imparcial, 27 de Abril
de 1830)
O SE-indeterminador, que recebe diversos nomes na literatura: SEgenérico (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996), SE-impessoal (NARO, 1976) ou
SE-nominativo (DUARTE, BRITO e MATOS, 2003), é aquele presente em
sentenças sem concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento
interno, como em (4):
(4)
Fornece-se comidas para fóra, de casa de familia, com proptidão e asseio,
tanto á portuguesa como á brazileira, mandando-se conduzir em casa; na rua
do Rosario, número 46, sobrado. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de
outubro de 1881)
Este é um clítico argumental de referência arbitrária. Sendo o sujeito
parafraseável por “alguém”. Esse clítico tem como característica o fato de não
admitir redobro, pois este só é possível quando se admite a ocorrência do
pronome forte. Tem-se então que sentenças como (5) são agramaticais
(5)
*Alguém aluga-se casas. (BRITO, DUARTE, e MATOS, 2003:837)
Outras propriedades deste clítico são que ele não pode ocupar uma
posição de expletivo, como mostram os exemplos em (6a) e (6b), e ocorre em
construções de extração simultânea de clítico, conforme (7a) .
(6)
a) *Há-se muitos livros nesta biblioteca. (BRITO, DUARTE e MATOS,
2003:837)
7
b) *Parece-se a toda a gente que os professores compram livros em excesso
(BRITO, DUARTE e MATOS, 2003:837)
(7)
a) Informa-se que se aluga apartamentos e vende moradias (BRITO,
DUARTE e MATOS, 2003:837)
O SE-passivo ocorre segundo Duarte (2003) nas passivas de –se em
sentenças que apresentam concordância entre o verbo transitivo direto e o
argumento interno no plural, como em (8):
(8)
a) Os artigos publicaram-se propositadamente no último número da revista.
(DUARTE, 2003:531)
b) O canivete usou-se para cortar o pão. (DUARTE, 2003:531)
Para Duarte (2003), o argumento interno de sentenças como (8) exerce
a função sintática de sujeito e por isso apresenta concordância verbal, tal como
exposto nos exemplos em (9), ele tem obrigatoriamente o traço de terceira
pessoa e mantém com o objeto direto da ativa correspondente a constância do
papel temático de paciente, conforme os exemplos em (10):
(9)
a) Esse artigo publicou-se no último número da revista. (DUARTE, 2003:531)
b) Os três canivetes usaram-se para cortar o pão (DUARTE, 2003:531)
(10)
a) Os artigos publicaram-se propositadamente no último número da revista
(DUARTE, 2003:531)
b) O canivete usou-se para cortar o pão (DUARTE, 2003:531)
c) Publicaram os artigos no último número da revista. (DUARTE, 2003:532)
d) Usaram o canivete para cortar o pão (DUARTE, 2003:532)
Nessas sentenças, o argumento externo com o papel temático de
agente, segundo a autora, não pode ser expresso por meio de um sintagma
8
preposicionado (11a) e (11b). Mas a presença de um agente está garantida
pelo fato de haver construções em que ocorre um advérbio orientado para o
agente, como em (10a), ou um adjunto final cujo sujeito é c-comandado pelo
argumento externo que está implícito na sentença, como em (10b). Este agente
recebe sempre uma interpretação arbitrária
(11)
a) *Os artigos publicaram-se no último número da revista pelo editor.
(DUARTE, 2003:52)
b) *O canivete usou-se por alguém para cortar o pão. (DUARTE, 2003:52)
Quanto à posição que esse clítico ocupa, Duarte argumenta que ele
recebe o papel temático externo, ficando em [SPEC-VP] e recebe caso
acusativo, fazendo com que o argumento interno só possa receber caso
nominativo, sendo tratado como o sujeito da sentença.
A autora ainda argumenta que sentenças com SE que apresentam verbo
transitivo direto no singular com argumento interno também no singular há uma
interpretação ambígua entre a leitura passiva ou indeterminada conforme
exemplificado em (12). É esse o tipo de clítico que denomino de SE-ambíguo.
(12)
a) Descobriu-se uma fuga no reactor nuclear. (DUARTE, 2003:533)
Int 1: Foi descoberta uma fuga no reactor nuclear. (DUARTE, 2003:533)
Int 2: Alguém descobriu uma fuga no reactor nuclear. (DUARTE, 2003:533)
b) Assaltou-se uma carrinha de transporte de valores. (DUARTE, 2003:533)
Int 1: Foi assaltada uma carrinha de transporte de valores. (DUARTE,
2003:533)
Int 2: Alguém assaltou uma carrinha de transporte de valores. (DUARTE,
2003:533)
9
Percebemos assim que estamos diante de vários tipos de SE – o
reflexivo, o recíproco e o inerente – que estão presentes em sentenças em que
o argumento externo é o sujeito. O indeterminador que é um argumento e, por
isso, recebe papel temático e ocupa a posição de sujeito, sendo seus traços [+
humano] e [– definido], o que possibilita a leitura arbitrária do clítico. O passivo
não é um argumento verbal e funciona como um morfema capaz de mudar a
diátese da voz verbal, ou seja, fazer com que uma sentença ativa passe à
passiva.
Outros trabalhos têm observado que, especificamente, no que concerne
a questão do SE-passivo e do SE-nominativo há análises que consideram
haver também o SE-indefinido que seria produto de uma gramática em que o
SE-passivo perde espaço. Vejamos a discussão acerca das características do
SE-indefinido (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996 e MARTINS, 2003) e da
reanálise proposta por Naro (1976) para o SE-impessoal e posteriormente a
figura retirada de Cavalcante (2011a) em que são apresentadas de forma
sintética as características dos tipos de SE na diacronia do português.
Naro (1976) apresenta a partir do quadro gerativista transformacional
uma análise diacrônica das construções com SE no português. Ele afirma que
existem tanto no PB quanto no PE construções com verbo transitivo direto +
SE sem concordância. O autor dá a essas construções o nome de “impersonalse”. Nelas, a posição de sujeito é ocupada pelo clítico SE e este argumento é
interpretado como um ser humano indefinido. Além disso, essas sentenças não
permitem, nas duas línguas citadas, a superficialização do sintagma agentivo
que na passiva analítica, como mostram os exemplos em (13a) e (13b), pode
ser omitido.
10
(13)
a) Os jovens foram levados pelo pai para casa.
b) Os jovens foram levados para casa
As construções do tipo (14) demonstram que no século XVI era possível
que um agente da passiva constasse nas sentenças com SE que
apresentavam concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento
interno. Este é um dos argumentos para se afirmar que nesse período ainda
havia SE-passivo
(14)
a) Vendem-se estas casas. (NARO, 1976:780)
b) “...o mar remoto navegamos que só dos feos focas se navega...(Lus, I,
52)” (NARO, 1976:781)
Sentenças com se impessoal, como (15), seriam uma inovação da
gramática do século XVI. Elas além de não poderem ter a superficialização do
sintagma agentivo e de terem um sujeito [+humano] e [+ indefinido] apresentam
certas restrições quanto ao tipo de verbo. Elas não ocorrem com verbos
impessoais e com verbos que não podem ter um sujeito humano. Observemos
os exemplos em (16):
(15)
Vende-se casas (NARO, 1976)
(16)
a) Estas teorias implicam as teorias de Einstein. (NARO, 1976)
b) *Alguém implica as teorias de Einstein. (NARO, 1976)
c) *Implica-se as teorias de Einstein. (NARO, 1976)
Entretanto, a inserção desse clítico em sentenças em que o pronome
indefinido “alguém” não pode aparecer é possível. Ainda assim, (17b) é
agramatical porque o pronome “alguém” não poder ocorrer em contextos que
exigem sujeito plural. Outra característica é que sentenças em que se faz
11
referência a humanos sem diferenciação dentro de um grupo são consideradas
agramaticais, mas naquelas em que a referência é feita sobre um elemento de
um grupo são consideradas gramaticais. Observe as sentenças em (18):
(17)
a) Trocou-se saudações (NARO, 1976:782)
b) *Alguém trocou saudações (NARO, 1976:782)
(18)
a) *Fala-se um após o outro (NARO, 1976:782)
b) Eles falam um após o outro (NARO, 1976:782)
Com isso podemos dizer que as principais características do SEimpessoal são: [- definido], [+ humano], [3ª pessoa], [+clítico], [+nominativo].
As construções com SE-impessoal surgiram, segundo Naro (1976), a
partir da reanálise das construções com SE-passivo. As sentenças com SEpassivo apresentavam concordância e agente da passiva como exemplificado
em (14) e (19):
(19)
a. Como Josep se conheceu pelos irmãaos. (séc. 14, NARO, 1976:789)
b. o mar remoto navegamos, que só dos feos focas se navega (séc. 16,
NARO, 1976:781)
Na passagem do século XIV para o XV há uma mudança tanto no
português (NARO, 1976) quanto no espanhol (LAPESA, 1981, 2000) em que
começam a ser produzidas sentenças sem concordância. É a existência de
construções como (20) que faz Naro afirmar que houve uma reanálise no
estatuto das construções com SE.
(20)
Trocou-se saudações (NARO, 1976:782)
A reanálise consiste na interpretação do argumento interno de sentenças
como (20) como o objeto da oração, sendo a função de sujeito exercida pelo
12
clítico SE. Para Naro (1976), exemplos ambíguos como (21) são a motivação
para o processo de reanálise do se-passivo em se-impessoal. Em sentenças
como (21) não há a presença do sintagma agentivo, mas há concordância
entre o verbo e o argumento interno, além disso, o sujeito está à direita do
verbo numa posição prototípica de objeto. É a convergência desses três fatores
que permite ao argumento interno ser interpretado como objeto da oração,
dando a ela um estatuto de sentença ativa com sujeito impessoal.
(21)
e porém se lee este evangelho na festa da trindade (NARO, 1976:802)
Como visto a posição defendida por Naro (1976) quanto às sentenças
sem concordância já é adotada por Duarte (2003), mas as análises acerca das
construções com concordância, até Raposo e Uriagereka (1996), continuavam
apontando que o clítico nessas sentenças era um morfema capaz de mudar a
diátese da voz verbal.
Raposo e Uriagereka (1996) preocupam-se em observar essas
construções advogando que também nelas o clítico SE exerce a função de
sujeito, cabendo ao argumento interno a relação gramatical de objeto. Nessas
sentenças a concordância ocorre porque este complemento verbal recebe
nominativo, sendo o clítico classificado como indefinido.
Baseando-se na comparação entre as passivas analíticas e as
construções com SE que apresentam concordância, os autores mostram que
se o DP argumento interno for movido, ele não ocupará a posição de sujeito,
mas sim a de tópico: [SPEC, F], ou seja, uma posição que é responsável, no
PE, segundo Uriagereka (1995), por codificar o estatuto informacional da
sentença: foco, ênfase, contraste, etc:
13
“F codifica ponto de vista. A assunção é que as
informações teóricas de toda informação precisam ser
mediadas através de um ponto de vista. Isto é, quando a
ênfase aparece na sentença, alguém é responsável por
essa ênfase. Informação nova ou velha é nova ou velha
para alguém. Até mesmo o uso de uma expressão
referencial necessita que se assuma a responsabilidade
de chamar alguém de o assassino de Smith ou Jones.
Desse modo, o constituinte que se move para [SPEC-FP]
tem que checar traços relacionados à força ilocucionária
da sentença. Essa checagem pode ser aberta (e aí se vê
o movimento) ou somente de traços (o elemento
permanece in situ)” (URIAGEREKA, 1995 apud
CAVALCANTE, 2011a:7)
Para Raposo e Uriagereka (1996) existe ainda outra posição à esquerda
dos verbos finitos que é ocupada pelos constituintes que têm a relação
gramatical de sujeito: [SPEC-TP]. Nela não há codificação de força
ilocucionária, mas há checagem de caso nominativo. Vejamos então como se
fundamenta a argumentação de Raposo e Uriagerka (1996) acerca do fato de o
argumento interno dessas sentenças ser um objeto direto.
Um primeiro dado de intuição que evidência o fato desse argumento
não ser o sujeito da oração é que, em sentenças infinitivas tanto na voz passiva
(22a) quanto na ativa (22b), o sujeito pode ocupar a posição pré-verbal, o que
não é possível nas sentenças com SE-Indefinido. Observemos os exemplos em
(23):
(22)
a) Vai ser difícil os tribunais aceitarem os documentos.
b) Vai ser difícil os documentos serem aceitos.
(23)
a) Vai ser difícil aceitarem-se os documentos.
b)* Vai ser difícil os documentos aceitarem-se.
14
Outros dados parecem mostrar que o DP da sentença com SE-indefinido
não pode aparecer numa posição pré-verbal em sentenças infinitivas,
diferentemente do DP sujeito da passiva. Em sentenças finitas encaixadas, é
possível o DP das construções de SE-indefinido aparecer numa posição préverbal, assim como, é possível aparecer um elemento topicalizado (24a), mas
não é possível haver topicalização do objeto numa sentença infinitiva, como
mostra (24b):
(24)
a) Vai ser difícil que esses documentos o tribunal (os) possa aceitar
b) *Vai se difícil esses documentos os tribunais aceitarem(-nos)]
Para os autores, nas sentenças infinitivas como em (22), (23) e (24b) só
existe uma posição à esquerda do verbo infinitivo disponível que é [SPEC, T], a
posição do sujeito. Entretanto, nas sentenças finitas encaixadas são possíveis
duas posições à esquerda do verbo finito [SPEC, F] e [SPEC, T], como
demonstra o exemplo em (24a).
Vejamos agora o contraste com sentenças com auxiliar ter:
(25)
a) Eu penso terem os soldados fuzilado os presos
b) *Eu penso terem-se os presos fuzilado.
c) Eu penso terem os presos sido fuzilados.
d) Eu penso terem sido fuzilados os presos.
e) Eu penso terem-se fuzilado os presos.
Em (25a), o DP com a função de sujeito “os soldados” está à direita do
verbo auxiliar, o mesmo ocorre em (25c), uma sentença passiva. A
gramaticalidade de ambas não é atestada na sentença com SE-indefinido
como podemos ver em (25b), ou seja, este DP não pode ocupar a posição de
sujeito, visto que o verbo auxiliar “ter” em todas as construções ocupa uma
15
posição acima de TP. Já (25d) e (25e) mostram que não há problema quando o
DP está na posição de objeto tanto na passiva analítica (25d) quanto na
sentença com SE-indefinido (25e). Temos, portanto, mais uma evidência de
que o DP das sentenças com SE-indefinido não é sujeito, mas sim
complemento verbal: objeto direto.
Outro argumento utilizado pelos autores está relacionado aos “nomes
nus”, ou seja, aqueles sintagmas nominais que não possuem determinante.
Sabemos que no PE os nomes nus só podem ocorrer numa posição de tópico
se o seu referente for o objeto direto da sentença, e não podem estar ligados a
uma posição de sujeito. Observemos o contraste em (26):
(26)
a) O Nestor compra salsichas no Talho Sanzot
b) *Salsichas são compradas no Talho Sanzot
c) *Salsichas custam caro no Talho Sanzot
d) Salsichasi, o Nestor compra] [-]i no Talho Sanzot.
e) *Salsichasi, [-]i são compradas no Talho Sanzot.
f) *Salsichasi, [-]i custam caro no Talho Sanzot
g) Vendem-se salsichas no talho Sanzot.
h) Salsichasi, [-]i vendem-se no Talho Sanzot.
Os exemplos em (26a), (26b) e (26c) demonstram que os nomes nus só
são admitidos na posição de objeto, visto que quando ocupa o lugar do sujeito
(26b) e (26c) as sentenças são agramaticais independente da voz verbal. Em
sentenças com tópico marcado, se o DP das construções com SE-indefinido
fosse o sujeito poderíamos esperar que as sentenças produzidas com o
deslocamento do argumento fossem agramaticais, mas (26h) mostra que há
gramaticalidade, assim como em (26a) e (26d), onde o argumento interno de
16
uma sentença transitiva direta está topicalizado. Entretanto, (26e) e (26f) são
agramaticais porque o nome nu deslocado para a periferia à esquerda da
sentença é o sujeito da oração.
Para confirmar a hipótese de que o DP dessas construções quando
anteposto não ocupa [SPEC, T], mas sim [SPEC, F], os autores propõem a
análise de duas sentenças, que serão apresentadas em (27), a primeira (27a)
apresenta o DP “os especialistas” à esquerda do verbo finito entretanto, não é
possível saber se esta posição é [SPEC, F] ou [SPEC, T], pois apenas este
constituinte aparece à esquerda. Em (27b), é possível observar exatamente as
posições que cada constituinte ocupa, pois o sintagma preposicionado com a
função de adjunto aparece deslocado na margem à esquerda da sentença em
[SPEC, F], ao argumento “os especialistas” só resta a posição de sujeito, ou
seja, [SPEC, T].
(27)
a) Os especialistas consultaram-se durante a operação
b) Em que momento da operação os especialistas se consultaram?
Assim, a interpretação dada a essas duas sentenças é distinta, pois
enquanto em (27b) só é possível a leitura reflexiva/recíproca visto que o
argumento está na posição de sujeito, em (27a) há ambiguidade entre a leitura
reflexiva que como (27b) teria o argumento na posição de [SPEC, T] ou
indefinida com o constituinte em [SPEC, F] no PE. No PB, ela só pode ser
reflexiva.
Cavalcante (2011a) apresenta a representação em colchetes das duas
possibilidades de interpretação para (27a). Observe:
(28)
a) [TP Os especialistas consultaram-se durante a operação]
b) [FP Os especialistas [TP [SE consultaram durante a operação]]
17
Assim aponto abaixo os cinco argumentos de Raposo e Uriagereka
(1996) que demonstram que o DP das sentenças com SE-indefinido não é o
sujeito da oração. São eles:

Nas sentenças infinitivas, o DP-sujeito pode ocupar a posição pré-verbal
nas ativas e nas passivas. Entretanto, o mesmo não é possível nas
sentenças com SE-indefinido.

Em sentenças finitas encaixadas existem duas posições à esquerda do
verbo finito. Uma desta é [SPEC, F] para onde se movimenta o
argumento interno das sentenças com SE-indefinido.

Os exemplos com verbos epistêmicos mostram que um DP-sujeito pode
ocorrer à direita do verbo auxiliar, entretanto o DP-objeto não pode
ocupar a mesma posição. As sentenças com SE-indefinido são
agramaticais.

Em PE, apenas os constituintes com a função de objeto direto admitem
“nomes nus”, tanto na posição de origem, quanto na posição de tópico.
Visto isto, as sentenças com SE-indefinido apresentam “nomes nus”.

O último argumento dos autores comprova a existência das duas
posições à esquerda do verbo finito e indica que quando só uma posição
é preenchida no PE há ambiguidade entre a leitura reflexiva/recíproca e
indefinida, pois não se sabe se o argumento está em [SPEC, F] ou
[SPEC, T].
Apresentados estes argumentos que comprovam ser este DP um objeto,
Raposo e Uriagereka (1996) propõem uma análise para explicar a
concordância entre um objeto e o verbo flexionado. Para tanto, os autores
fazem uso da Teoria de Checagem proposta por Chomsky (1995).
18
Cavalcante (2011a) retomando Raposo e Uriagereka (1996) mostra que
a proposta dos autores está atrelada a duas hipóteses: (1) “SE é um “DP
mínimo”, no sentido de possuir traços semânticos reduzidos [humano] e
[indefinido], assim como PRO. SE recebe como PRO, Caso nulo”; (2) “no PE
existem duas posições disponíveis para checar nominativo, [SPEC, T] e uma
outra [SPEC-F]. Essa posição F encontra-se à esquerda de T. É nessa posição
que o DP argumento interno vai checar o caso nominativo.”(CAVALCANTE,
2011a)
Com essa proposta os autores explicam a concordância das sentenças
indefinidas, mas não afirmam que o DP está na posição de sujeito ou ligado a
ela por cadeia conforme Cinque (1988), Dobrovie-Sorin (1998), Cyrino (2007),
entre outros. O sujeito da sentença é o clítico SE, assim como nas sentenças
impessoais/genéricas.
Outra autora, que também advoga em favor das construções com
concordância entre o verbo transitivo direto + SE e o argumento interno serem
ativas com sujeito de referência arbitrária é Ana Maria Martins, especialmente
em Martins (2003). Passemos, então, a análise da autora.
Martins (2003) nos apresenta uma proposta de análise similar a de
Raposo e Uriagereka (1996), apontando que as construções com SE que
apresentam concordância entre o verbo transitivo direto e argumento interno
plural são ativas, sendo a função de sujeito exercida pelo clítico SE. As
sentenças com SE-passivo seriam fósseis linguísticos de outras gramáticas
que aparecem em textos produzidos por falantes que têm o PE como língua
materna. A autora amplia a análise de Raposo e Uriagereka (1996) para as
sentenças com duplo sujeito em dialetos da Ilha da Madeira e de Porto Santo,
19
que constituem parte da amostra do projeto CORDIAL-SIN (Corpus Dialectal
com Anotação Sintáctica). Vejamos então quais são os argumentos para tratar
as sentenças passivas como fósseis.
Martins (2003) seguindo a proposta de Naro (1976) reafirma que o SEpassivo apresenta as seguintes restrições: só ocorre diante de verbos
transitivos, o argumento interno sempre concorda com o verbo e a presença do
agente da passiva é opcional. No PE, entretanto, há um clítico que pode
ocorrer em sentenças que possuam outro tipo de verbo: inergativo, ergativos,
cópula, em que não haja obrigatoriamente a concordância e finalmente sem a
expressão do agente da passiva.
Além disso, construções com SE que exibem duplo sujeito produzidas
nos dialetos da Ilha da Madeira e de Porto Santo, segundo Martins (2003),
poderiam ser analisadas a partir da proposta de Raposo e Uriagereka (1996),
sendo o clítico SE um argumento que recebe caso nulo em TP e o constituinte
que o duplica outro argumento, mas que nesse caso recebe nominativo em FP.
Observemos abaixo, alguns exemplos de sentenças produzidas na Ilha da
Madeira e em Porto Santo.
(29)
a) E depois, chegando ao tempo da poda, a gente sega-se esses olhos todos
e deixa-se este só (Camacha, Porto Santo) (MARTINS, 2003:30)
b) Oh, era um pano que a gente se punha na caixa do moinho
(Tanqueanque, Porto Santo) (MARTINS, 2003:30)
c) A gente não se come, mas os de Lisboa diz que comem daquele peixe.
(Câmara de Lobos, Madeira) (MARTINS, 2003:30)
Para a autora, independentemente de haver concordância ou não as
sentenças são ativas. E a diferença que se apresenta é em relação ao SEindefinido e ao SE-genérico, nas palavras de Raposo e Uriagereka (1996), o
20
primeiro SE recebe caso nulo e o argumento interno nominativo, já o segundo
SE recebe caso nominativo e o argumento interno acusativo. Martins (2003) vai
reafirmar a sua posição a partir da assunção de que o fato de existirem
construções em que não é possível a substituição do argumento interno que
recebe acusativo por um clítico de mesmo caso é resultado de uma restrição
morfofonológica. Assim o clítico acusativo não pode aparecer em sentenças
com SE-genérico e nem em construções com SE-indefinido (30a) e (30b), mas
nas construções com SE-indefinido, (30b), o DP-argumento interno pode
aparecer sob a forma de um pronome tônico nominativo quando em posição
pré-verbal e se houver uma construção de focalização, (30c), o pronome “ele”
pode aparece numa posição pós-verbal.
(30)
a. *Convidaram-se-os para a festa. (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996:777)
b. *Deu-se-o à Maria. (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996:777)
c. Eles convidaram-se para a festa. (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996:777)
d. Convidou-se até mesmo eles. (MARTINS, 2003:36-38)
Desse modo as construções com SE-indefinido, encontradas no PE,
seriam parecidas com as construções de duplo sujeito observadas nos dialetos
da Ilha da Madeira e de Porto Santo.
Mediante a análise de Naro (1976), Raposo e Uriagereka (1996) e
Martins (2003) é possível construir um quadro que sintetize as características
dos três tipos de SE em discussão para esses autores: SE-passivo, SEindefinido e SE-genérico. Vejamos então o quadro proposto por Cavalcante
(2011a) com as respectivas características de cada tipo de SE.
21
Passivo
Concordância
DP na posição de
sujeito
SE é um clítico a Infl
agente expresso como
PP
Só verbos transitivos
Indefinido
Concordância
sem DP na posição de
sujeito
SE ocupa a posição de
sujeito
não possui agente
Genérico
Não-concordância
sem DP na posição de
sujeito
SE ocupa a posição de
sujeito
-----------
Verbos transitivos
Todos os verbos
Figura 1: Tipos de SE na diacronia do português (Retirado de CAVALCANTE, 2011a)
Vistas as características dos tipos de SE passemos a tratar, na próxima
seção, de alguns trabalhos com análises diacrônicas quantitativas acerca da
ordem do sujeito no P. Clássico, no PE ou no PB.
1.3 Análises diacrônicas quantitativas
Muitos dos estudos propostos para as sentenças com SE têm
considerado a questão da concordância como fator preponderante para definir
se uma construção é passiva ou indeterminada. Como vimos nas seções
anteriores,
os
três
tipos
de
SE,
elencados
na
literatura
abrangem
características que vão muito além do fator concordância ou não concordância.
Por isso, proponho que nessa seção tratemos de alguns desses trabalhos e
seus resultados a fim de que possam indicar um caminho para a análise do
Corpus dessa pesquisa.
Alguns trabalhos relacionados ao Projeto Padrões Rítmicos, Fixação de
Parâmetros e Mudança Linguística (PAIXÃO DE SOUSA, 2004; GALVES,
BRITO e PAIXÃO DE SOUSA, 2005; CARNEIRO, 2005; CAVALCANTE, 2006;
FLORIPPI, 2008; GIBRAIL, 2009) têm mostrado que há uma mudança na
passagem do século XVII para o XVIII que caracteriza a emergência da
gramática do PE. Esses resultados em muitos casos envolvem a posição do
22
sujeito, e mostram que a mudança paramétrica que resulta na emergência do
PE tem relação com o fronteamento de constituintes.
Isto porque a gramática do Português Clássico, anterior ao PE, é
caracterizada
como
uma
língua
em
que
a
posição
de
sujeito
é
preferencialmente pós-verbal. No PE, ao contrário, os resultados apontam para
um sistema em que o sujeito ocupa uma posição pré-verbal. Essa diferença na
frequência de uso da anteposição e da posposição nas duas gramáticas, que
trataremos mais detalhadamente abaixo, tem relação com uma estrutura
sintática distinta.
No Português Clássico, segundo Paixão de Sousa (2004), o sistema VS
permitia inúmeras combinações: VS, XVS, XVSX, sendo a posição X,
anteposta
ao
verbo,
ocupada
por
um
constituinte
pragmaticamente
proeminente, ou seja, há nessa língua uma posição para onde se deslocam os
constituintes de acordo com seu estatuto informacional. No, PE, entretanto,
segundo a mesma autora, a posição X não é mais pragmaticamente
proeminente, na verdade, esta passa a ser a posição do sujeito havendo ainda
construções em que há outro constituinte numa margem mais à esquerda do
verbo. Relacionando essa característica às construções com SE, Cavalcante
(2011a), propõe que se no século XVI não havia uma posição à esquerda dos
verbos prototipicamente ocupada pelo sujeito, uma gramática como a do
Português Clássico não diferenciaria se um constituinte anteposto era o sujeito
da sentença ou qualquer outro elemento pragmaticamente proeminente, um
tópico, o que faz com que as construções com SE-passivo (o DP, quando
anteposto, se move para a posição de sujeito) ou SE-indefinido (o DP, quando
23
anteposto, se move para a posição de tópico) sejam ambíguas entre os séculos
XVI e XVII.
Além da ordem do sujeito o sistema de clítico também tem sido
apontado como diferenciador das duas gramáticas. Paixão de Sousa (2004),
observando-o do Português Arcaico, ou seja, a gramática do Português
Medieval, até o PE em sentenças ativas, nota que a posição do sujeito no
Português Arcaico e no Clássico era VS, constituindo um sistema conhecido
como V2, ou seja, em que o verbo ocupa preferencialmente a segunda posição
na sentença. A autora menciona que “importantes estudos sobre os textos
medievais e clássicos3 têm proposto que a perda da interpolação é o ponto de
distinção principal entre o português arcaico e o sistema que o segue.”
(PAIXÃO DE SOUSA, 2004:39). Como a distinção das duas gramáticas está
relacionada à perda da interpolação, o padrão V2 (31a), como dito
anteriormente, se mantém como a ordem preferencial, existindo sentenças em
que havia V1 (31b) ou V3 (31c) conforme exemplificado abaixo.
(31)
a) Agora o faco, dando todo o meu poder a estas regras e renunciando nelas
todo meu coracao: para que nao so signifique a Vossa Senhoria meu
sentimento em seu sentimento, mas para que me saiba tanto aproveitar da
causa dele, que traga dessas sombras claridades e dessas lagrimas avisos,
com que possa alumiar minhas trevas e advertir meus desconcertos. (Corpus
Tycho Brahe, Melo, 1608)
b) Julga-vos as obras, julga-vos as palavras, e ate o mais intimo pensamento
vos julga e vos condemna. (Corpus Tycho Brahe, Vieira, 1608)
c) Vendo tao rara e verdadeira amizade, el-rei Dionisio o mais velho disselhes: Eu perdoo o crime, a troco de que me admitais tambem por vosso
amigo. (Corpus Tycho Brahe, Bernardes, 1644)
As sentenças VS apresentavam preferencialmente propriedades das
chamadas Inversões Germânicas, ou seja, aquelas em que o sujeito aparece
3
Martins (1994), Torres Morais (1995) e Ribeiro (1995).
24
imediatamente posposto ao verbo e é comum a presença de outro elemento
em posição inicial, como em (32a).
(32)
a) Aos 22 de Setembro partiu de Lisboa; acompanhou-o ate a portaria toda a
comunidade; ao despedir-se, ou fosse lembrando-se que a viva forca deixava
a casa e a companhia com que nela se criara, ou que daquela hora em diante
entrava em cuidados tormentosos e cheios de perigo e desgostos, nos quais
se lhe trocara a quietação e descuido santo com que tantos anos entre
aqueles padres vivera, reconheceu a humanidade sua fraqueza e derramou
muitas lagrimas,por mais forca que fazia pólas dissimular. (Corpus Tycho
Brahe, Sousa, 1556)
b) Vossa Mercê terá ouvido dizer que os Alemães e gente muito romba de
juízo e a meu ver não lhe faz injuria quem o diz; eu ao menos achei-a tal,
mais do que esperava, porque supunha grande encarecimento nas
informações dos italianos, e outras nações que tem para si que fora delas não
ha juízo fino, com efeito estes homens são de pouquíssima viveza, de cabeça
e de coração no considerar as coisas, e senti-las; dá-lhe poucos passos o
espírito; pasmados e insensíveis fora de modo; donde Vossa Mercê pode
tirar facilmente que no seu coração há menos bondade, e menos maldade,
que não são outra coisa que movimentos do nosso espírito; mas nessa
bondade eu não vejo nada da que e digna de estimação considerável; quero
dizer daquilo que se chama virtudes finas, como sinceridade, rasgo, modéstia,
generosidade a latina, ou nobreza de ações, etc.; quanto a maldade,
confesso-lhe que com ela, ao que parece, se estender no coração desta
gente menos que no de outras, para mim e neles mais aborrecível e
insuportável pelas duas razoes de faltar-lhe a mistura de virtudes bonitas e de
ser verdadeiramente de pé de boi; quero dizer: que não arreia, diminue a vista
de olhos, como se vê as vezes entre nos. (Corpus Tycho Brahe, Costa, 1714)
Há também evidências de outro padrão de inversão, a chamada
inversão românica (32b) em que o sujeito não aparece contiguo ao verbo, que
é notada nos poucos casos que restam de inversão do sujeito no PE, segundo
Paixão de Sousa (2004). Na verdade, mesmo a frequência de uso de inversão
germânica cai ao longo do século XVIII e atinge uma inversão tornando a
língua emergente, ou seja, o PE preferencialmente com sujeito anteposto.
Quando há posposição esta se caracteriza como uma Inversão Românica.
Paixão de Sousa (2004) já salienta que em uma construção do tipo XVS, o
25
constituinte X é pragmaticamente proeminente, diferentemente do que ocorre
no PE em que este mesmo constituinte ocupa a posição canônica de sujeito.
No gráfico 1, verificamos a curva ascendente da ordem SV-cl entre os
séculos XVI e XIX. Paixão de Sousa (2008) propõe que estruturalmente o
constituinte fronteado no Português Clássico ocupa a posição de [SPEC-F], a
mesma que Uriagereka (1995) advoga ser a preenchida quando há um
constituinte fronteado.
Gráfico 1: SV-cl versus XVS em sentenças ativas ao longo do tempo no Corpus
Tycho Brahe (%) (Retirado de PAIXÃO DE SOUSA, 2004:244)
Observando as construções com SE-indefinido e as sentenças ativas
com clítico. Paixão de Sousa e Cavalcante (2009), também já haviam
observado argumentado que, baseando-se nos resultados de Paixão de Sousa
(2004), antes do século XVIII não há uma posição específica para o sujeito à
esquerda do verbo finito. As autoras afirmam que em XVS, o constituinte
fronteado é um elemento pragmaticamente proeminente que pode por vezes
ser o sujeito da oração:
“we take the combined findings of the aforementioned
studies, centrally, as revealing that up to the 18th century
26
there was not a preverbal position specific for subjects in
Portuguese. Instead, the preverbal position could be filled
by any fronted element, as we can see by the behavior of
XVS sentences in 16th-17th century texts. We assume,
following Paixão de Sousa (2008), that the immediate preverbal position in Classical Portuguese is a position for
pragmatically prominent constituents; crucially, this preverbal position is not a position for subjects, although a
pragmatically prominent constituent obviously can (and in
many instances naturally will) coincide with the
grammatical subject.” (CAVALCANTE e PAIXÃO DE
SOUSA, 2009)
Os trabalhos de Cavalcante (2011a e 2011b), com um corpus constituido
por textos escritos por autores portugueses nascidos entre os séculos XVI e
XIX que compõem o Corpus Tycho Brahe4, comparam o comportamento dos
DPs sujeitos de sentenças ativas (com SE-reflexivo/recíproco/inerente) e de
sentenças
passivas
com
o
DP
das
construções
com
SE-indefinido
considerando a frequência de argumentos nulos em relação à sua posição pré
ou pós-verbal.
No gráfico 2, adaptado de Cavalcante (2011a), os resultados
comprovam que o DP-argumento interno das sentenças com SE-indefinido no
século XVI tem praticamente a mesma taxa de anteposição que a verificada
nos sujeitos das sentenças com SE-reflexivo e passiva analítica. Na passagem
do século XVII para o XVIII, há uma grande diferenciação na frequência de
4
Os autores analisados em Cavalcante (2011) foram: Fernão Mendes Pinto (1510-1583)
Peregrinação; Diogo do Couto (1542-1606) Décadas; Luis de Sousa (1556-1632) Vida de Frei
Bertolameu dos Mártires; F. Rodrigues Lobo (1579-1621) Côrte na Aldeia e Noites de Inverno;
Manuel de Galhegos (1597-1665) Gazeta em que se relatam as novas todas que ouve nesta
corte; Manuel da Costa (1601-1667) A arte de furtar; Antonio Vieira (1608-1697) Cartas e
Sermões ; J. Cunha Brochado (1651-1735) Cartas; Maria do Céu (1658-1753) Rellaçaõ da Vida
e Morte da Serva de Deos a Veneravel Madre Ellena da Crus; Andre de Barros (1675-1754)
Obra; Cavaleiro de Oliveira (1702-1783) Cartas; Matias Aires (1705-1763) Reflexão sobre a
vaidade dos homens e Carta sobre a Fortuna; Antonio Verney (1713-1792) Verdadeiro Método
de Estudar; Antonio da Costa (n.1714) Cartas do Abade António da Costa; Correia Garção
(1724-1772) Obras Completas; Marquesa D‟Alorna (1750-1839) Cartas; Almeida Garrett (17991854) Viagens na Minha Terra; Marques de Fronteira e Alorna (1802-1881) Memórias do
Marquês de Fronteira e Alorna; Ramalho Ortigão (1836-1915) Cartas a Emilia. Os textos estão
disponíveis em <www.tycho.iel.unicamp.br/~tycho/corpus>.
27
anteposição, constituindo-se dois grupos: as sentenças com SE-indefinido e no
outro as sentenças com SE-reflexivo e passiva analítica.
Gráfico 2: Distribuição dos argumentos (Anteposto, Posposto e Nulo) por tipo de
construção ao longo do tempo (%) (Retirado de CAVALCANTE, 2011)
Vemos com o gráfico que nas construções com SE-indefinido ao longo
do tempo a frequência de uso de DPs antepostos, pospostos ou nulos se
mantém estável, sendo a maior frequência encontrada em sintagmas
pospostos com índices que chegam a alcançar 68%. Valores tão altos para a
posposição não são observados nas sentenças ativas e passivas, mesmo nos
séculos XVI e XVII que como vimos tinha uma gramática em que a ordem
preferencial era VS. Nesse período, a taxa de posposição de sujeito nas
sentenças ativas e passivas analíticas variava entre 24% e 46% nas primeiras
e 26% e 34% no segundo grupo.
Se observarmos a taxa do sujeito pré-verbal nas sentenças com SEreflexivo e passivas verificaremos que a queda na frequência de uso da
28
posposição na passagem do século XVII para o XVIII representa uma
ascensão na curva que indica a anteposição do DP sujeito nessas mesmas
construções. Observemos que nos dois primeiros séculos a anteposição não
supera a casa dos 50% variando entre 28% e 39% se considerarmos os dois
tipos de sentenças, a frequência de uso aumenta na virada do século XVII para
o XVIII, chegando a atingir 61% de DPs sujeito antepostos. Esta curva
encontrada assemelha-se ao padrão observado por Paixão de Sousa (2004)
com relação aos sujeitos pré-verbais em sentenças com ênclise. Vejamos o
gráfico5 abaixo em que são apresentados os resultados de Paixão de Sousa
(2004) e de Cavalcante (2011a) para as taxas de sujeito pré-verbal (com
ênclise, em sentenças ativas e passivas canônicas) em comparação com a
anteposição do DP das construções com SE-indefinido.
100%
95%
90%
80%
70%
72%
60%
61%
50%
59%
53%
46%
40%
39%
36%
30%
28%
31%
27%
26%
27%
26%
20%
11%
10%
3%
0%
XVI
SE-reflexivo (CV)
XVII
Passiva (CV)
XVIII
SE-indefinido (CV)
XIX
SV-cl (PS)
Gráfico 3: Distribuição dos argumentos antepostos por tipo de construção ao longo do
tempo em Paixão de Sousa (2004) e Cavalcante (2011). (%)
5
As legendas apresentadas no gráfico 1.3 têm respectivamente os seguintes significados:
SE-reflexivo (CV) = SE-reflexivo (Cavalcante, 2011); Passiva (CV) = Passiva (Cavalcante,
2011); SE-indefinido (CV) = SE-indefinido (Cavalcante, 2011); e SV-cl (PS) = SV-cl (Paixão de
Sousa, 2004)
29
O gráfico 3 deixa nítido o que já vínhamos advogando ao longo da
seção, ou seja, ser o padrão de ordenamento das sentenças com SE-indefinido
distinto do observado nas sentenças com SE-reflexivo, passivas e ainda em
sentenças ativas que apresentem clítico. É interessante observarmos que
nesses três tipos de estrutura é no século XVIII que a frequência de uso da
anteposição supera os 50% demonstrando que a nova gramática já havia se
estabelecido plenamente. Esses resultados, portanto, corroboram a proposta
de Raposo e Uriagereka (1996) de que o argumento interno das sentenças
com SE-indefinido não pode ser o sujeito da oração apesar de receber caso
nominativo.
Um dos fortes argumentos para ainda se tratar as sentenças com SE
que apresentam concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento
interno plural como passivas é a presença do sintagma agentivo que como
visto é facultativo nas passivas analíticas. Cavalcante (2011a) observa a
frequência de PP agente da passiva em sentenças com SE-indefinido e em
passivas analíticas, a fim de verificar se nas construções com o clítico este
sintagma preposicionado ainda faz parte da Gramática dos textos portugueses
entre os séculos XVI e XIX.
XVI
XVII
XVIII
XIX
Total
N-%
N-%
N-%
N-%
N-%
Ausente
193 – 99%
227- 99% 506 – 99% 67 – 100%
993- 99%
SE-indefinido
Presente
1 –1%
3 – 1%
5 – 1%
0 – 0%
9 – 1%
Total
194
230
511
67
1002
Ausente
53 – 77%
28 – 88%
36 – 67%
38 – 69%
155 – 74%
Passivas
Presente
16 – 23%
4 – 13%
18 – 33%
17 – 31%
55 – 26%
Total
69
32
54
55
210
Tabela 1: Distribuição dos PPs agente da passiva por tipo de construção (média por
séculos) (%) (Retirado de CAVALCANTE, 2011)
Tipo de Construção/Tempo
A diferença na frequência de uso de agente da passiva nas construções
acima se mostra bem clara, pois os índices de presença desse sintagma nas
30
sentenças com SE-indefinido não supera a marca de 1%, enquanto que nas
passivas analíticas (33a), ainda que de forma facultativa seu preenchimento
oscila entre 13% e 33%. Os resultados indicam que o agente da passiva nas
sentenças com SE-indefinido (33b) não faz parte da Gramática dos
portugueses.
(33)
a) Os livros de Aristóteles foram levados a França no século treze pelos
Franceses, que tinham ido a Constantinopla. (Corpus Tycho Brahe, Aires,
1705)
b) Mas os X, e principalmente os Portugueses, governam-se por outros
princípios. (Corpus Tycho Brahe, Verney, 1713)
Cavalcante (2011b) observando o padrão de concordância das
sentenças com SE no Corpus Tycho Brahe mostra que no Português Clássico
e no PE a construção preferencial é aquela que apresenta concordância, tendo
sido apenas encontrado um caso de não concordância em sentenças
encaixadas (34a) e (34b). Nos demais exemplos com falta de concordância em
matrizes, ou que poderiam ser tratados, como tal, a concordância é facultativa,
pois os DPs no singular constituem-se como sintagmas coordenados, como
vemos em (34c) e (34d):
(34)
a) Enquanto ao mais o mesmo que em Lisboa e em nada se conhece mais
as homogeneidades de raça.” – (Corpus Tycho Brahe, Ortigão, 1836).
b).Considerar a natureza e segui-la é a regra geral para acertar, porém,
havendo licença para ornar as cópias que se fazem dela, ajuntando à escolha
favorável que se elege os aparatos próprios que se apresentam, pode-se dar
alguma liberdade à imaginação, contanto que se não falte à verdade nem ao
natural inteiramente.” – (Corpus Tycho Brahe, Oliveira, 1702).
c) Naõ se vio mais pouca vergonha, nem mayor subtileza! (Corpus Tycho
Brahe, Costa, 1601).
31
d) Também se acha abutua, e a casca chamada Preciosa. – (Corpus Tycho
Brahe, Barros, 1675)
Para Cavalcante, esse padrão baixo de não concordância faz com que
seja propícia uma reflexão acerca de outros fatores como a ordem a fim de
investigar se uma construção apresenta SE-indefinido ou SE-passivo,
principalmente, se tomando as palavras de Naro (1976) a reanálise das
construções com SE-passivo como SE-impessoal está atrelada ao surgimento
de sentenças sem concordância. E nesse sentido a proposta de Raposo e
Uriagereka (1996) se torna importante, pois considera outros fatores além da
concordância que diferenciam um SE-passivo de um SE-indefinido.
Consideradas as análises de Naro (1976), Raposo e Uriagereka (1996),
Martins (2003) e as análises diacrônicas de Cavalcante (2011a, b), Paixão de
Sousa (2004) e Cavalcante e Paixão de Sousa (2009), é preciso observar
como essas construções são tratadas no PB e como os resultados empíricos
mostram o padrão de ordenamento do DP argumento interno.
1.4 A ordem do sujeito no PB e as construções com SE
Nesta seção discutiremos alguns trabalhos (TARALLO, 1993; COELHO
e MARTINS, 2009; BERLINCK, 1997; HAWAD, 2004; KATO, CYRINO,
DUARTE e BERLINCK, 2006, entre outros) que tratam da ordem do sujeito e
das construções com SE no PB. A seção está organizada da seguinte forma:
primeiramente trataremos dos trabalhos sobre a ordem do sujeito no PB e
posteriormente dos resultados acerca das construções com SE finitas e não
finitas em Corpora representativos do PB.
32
1.4.1 A ordem do sujeito no PB
Tarallo (1993), ao combinar diferentes resultados com base num mesmo
corpus, propõe que é na passagem do século XIX para o XX que surge uma
gramática brasileira, diferente da gramática do PE relacionando quatro
mudanças: a reorganização do sistema pronominal com a maior frequência de
sujeitos preenchidos e objetos nulos; a reorganização das estratégias de
relativização; a fixação de uma ordem SVO rígida que por consequência
enrijece o princípio da adjacência na marcação do acusativo; e, finalmente, a
distinção nos padrões sentenciais de perguntas diretas e indiretas. Apesar de
elencar as quatro mudanças apontadas por Tarallo (1993), interessa nessa
dissertação especificamente a terceira, ou seja, aquela em que são observadas
as posições ocupadas pelos DPs sujeito e objeto nas sentenças do PB, por
isso, a revisão se restringirá a ela.
A análise de Tarallo (1993) acerca da ordem baseia-se nos trabalhos de
Berlinck (1988 e 1989) que mostram estar o enrijecimento da ordem do sujeito,
SV, no PB, atrelado à mudança no sistema pronominal que passou a permitir
sujeitos preenchidos e objetos nulos. Berlinck (1989) encontra justamente um
padrão de ordenamento em textos de autores brasileiros variável entre o século
XVIII e o XX havendo diminuição na frequência de uso da ordem VS conforme
mostram os resultados da Tabela 3 abaixo, adaptada de Berlinck (1989:90).
Século
XVIII
XIX
XX
N/Total
203/486
144/469
263/1262
%
42%
31%
21%
Tabela 2: Frequência de uso da ordem verbo-sujeito, VS (Retirado de Berlinck, 1989:90)
A tabela 2 revela que enquanto no século XVIII o sujeito era posposto
em 42% das sentenças o índice cai para 21% no século XX. Além disso,
33
Berlinck (1989) também argumenta que não apenas diminui a frequência de
uso, mas também o tipo de estruturas em que essa ordem pode aparecer e
esse fato estaria relacionado a mudança no Parâmetro do Objeto Nulo no PB.
Mas antes de tratarmos da relação anterior é preciso fazer menção aos fatores
que ao longo do século propiciavam a inversão do sujeito no PB. Vejamos
então o quadro de Berlinck (1989):
XVIII
Estatuto informacional
Forma do SN
Distinção aspectual
Tipo de verbo
XIX
Tipo de verbo
Forma do SN
Forma sentencial
XX
Transitividade
Forma do SN
Animacidade do SN
Distinção aspectual
Concordância verbal
Tabela 3: Fatores que favorecem a inversão do sujeito ao longo do tempo em textos de
brasileiros (Retirado de Berlinck, 1989:)
Observe que no século XVIII o tipo do verbo é apenas a quarta
propriedade que favorece a ordem VS, no século XIX esta passa a ser a
primeira característica. Dessa forma torna possível que haja especificação
desse tipo de verbo e no século XX a transitividade verbal bloqueia a inversão
do sujeito. Este bloqueio é resultado, segundo Tarallo (1993), da mudança no
parâmetro do objeto nulo, pois como o PB o marca positivamente, sendo,
portanto, os objetos nulos traços sintáticos da emergente gramática brasileira,
a ordem VS é bloqueada para que não haja colisão entre o papel temático
interno ou externo que é atribuído ao DP à direita do verbo.
“Desde que os objetos nulos se tornaram um traço
sintático dessa emergente gramática brasileira, a ordem
VS deveria ser bloqueada com verbos transitivos a fim de
não colidir com o papel temático a ser atribuído ao
sintagma nominal ao redor do verbo” (Tarallo, 1993:92)
Coelho e Martins (2009) observando quantitativamente a ordem XV
numa amostra diacrônica de peças produzidas por catarinenses do século XIX
ao XX que já havia sido analisada por Coelho (2008) notam que em 1466
34
sentenças afirmativas apenas 151 apresentaram a ordem VS e dessas apenas
51 apresentaram verbo na primeira posição. Vejamos a tabela de Coelho e
Martins (2009) em que são apresentados os índices de SV, #VS e XVS nas
peças catarinenses.
Autor/ano de nascimento
Alvaro de Carvalho (1829-1865)
Antero dos Reis Dutra (1855-1911)
Horácio Nunes (1855-1919)
Ody Fraga (1927-1987)
Ademir Rosa (1949-1997)
Antônio Cunha (1961-)
Fábio Bruggemman (1962-)
Total
SV(O)
N/Total
206/235
177/212
107/127
29/33
325/363
289/303
182/193
1315/1466
%
88%
83%
84%
88%
90%
95%
94%
90%
#VS(O)
N/Total
%
8/235
3%
14/212
7%
4/127
3%
2/33
6%
17/363
4%
5/303
2%
1/193
1%
51/1466 3%
XVS(O)
N/Total
%
21/235
9%
21/212
10%
16/127
13%
2/33
6%
21/363
6%
9/303
3%
10/193
5%
100/1466 7%
Tabela 4: Ordens SV e (X)VS na escrita catarinense dos séculos XIX e XX (Retirado de
COELHO e MARTINS, 2009)
Observando a ordem na tabela 4 percebemos que a anteposição é
majoritária no século XIX quando considerados os sujeitos lexicais, mas
voltemos a análise das construções com inversão de sujeito visto que as
construções com SE apresentam DP majoritariamente posposto como destaca
Cavalcante (2006, 2011a, 2011b). No que concerne a ordem VS percebemos
que há mais inversão do tipo V2, portanto, XVS(O) (35a) do que #VS (35b). É
possível notar também que independente do tipo de inversão há sempre uma
curva descendente na passagem do século XIX para o XX, corroborando os
resultados de Berlinck (1989).
(34)
a) Não. Já jantei. Além d‟isso alli vem a posteridade dos palitos. [Brinquedos
de cupido (1898) de Antero Reis Dutra (1855-1911)]
b) quando todos fugiam do pobre velho, com medo da peste: morre o velhote,
que era pé de boi e nunca se tinha atravancado com rabos de saia, com
perdão da Sora Úrsula e do mais mulherio. [Raimundo (1868) de Álvaro
Augusto de Carvalho (1829-1865)]
35
A ordem apresentada na tabela 5 não separa as sentenças de acordo
com o material interveniente entre o verbo e o sujeito pós-verbal, uma
construção possível segundo Coelho e Martins (2009), Berlinck (1989) em
textos produzidos por brasileiros do século XIX. Vejamos então quais os
resultados encontrados por Coelho e Martins (2009) para esse tipo de
construção.
Contexto de mudança
#VS
XVS
VXS
VS
1808-1899
N/Total
%
26/51
51%
59/100
59%
37/48
79%
48/104
46%
1900-1949
N/Total
%
19/51
37%
23/100
23%
9/48
19%
33/104
32%
1950-1969
N/ Total
%
6/51
12%
18/100
18%
2/48
2%
23/104
22%
Tabela 5: Contextos sintáticos de VS na escrita catarinense dos séculos XIX e XX em três
tempos (Retirado de COELHO e MARTINS, 2009:78)
Novamente verificamos que há diminuição na frequência de uso do
sujeito invertido independente do contexto de VS e que os contextos de V2
favorecem a posposição do sujeito. Esses resultados indicam que havia na
gramática dos brasileiros do século XIX inversão românica e germânica, sendo
a primeiro não encontrado no século XX, segundo Coelho e Martins (2009).
Vejamos alguns exemplos de sentenças com inversão românica e germânica
nos dados de autores catarinenses.
(36)
a) Qual seu Bibiano, respondia-me elle, em eleições ninguém me passa a
perna, e além d‟ isso elle é da oposição. [Brinquedos de cupido (1898) de
Antero Reis Dutra (1855-1911)]
b) Pouco importa saber-se. Trata se de eleições; e aqui na roça, e em toda a
parte são innumeros os batalhadores magicos Chicos Hypollitos, n‟essas
ocasiões. A questão é sabermos de que modo caudinharam o Sr. Bibiano,
quando contava elle a victoria certa. [Brinquedos de cupido (1898) de Antero
Reis Dutra (1855-1911)]
c) Por mais estranhas cousas que nos relate o Sr. Bibiano creio que não nos
sorprehenderá. Ao mesmo tempo é fácil sermos interrompidos em meio da
história, portanto, acho mais conveniente que aguardemos outra ocasião. Isto
36
querendo o Sr. Bibiano. [Brinquedos de cupido (1898) de Antero Reis Dutra
(1855-1911)]
A sentença (36b) apresenta um padrão de inversão não observado na
tabela 6, ou seja, XVXS que também é tratado como inversão românica visto
que verbo e o sujeito não estão adjacentes, tal como em (36a). Nas sentenças
com inversão germânica (36c), o sujeito vem contíguo ao verbo.
Para Kato, Cyrino, Duarte e Berlinck (2006), em um trabalho sobre o PB
na passagem do século XIX para o XX considerando resultados das quatro
autoras em trabalhos anteriores acerca do PB, as construções com inversão
românica são mais restritas do que as com inversão germânica, sendo a
realização de sujeito posposto não contíguos ao verbo resultado do estatuto
informacional do SN ou do peso desse mesmo sintagma.
Observamos assim que as análises acima apresentadas têm em comum
o fato de que demonstram a diminuição na frequência de uso do sujeito
posposto ao longo do tempo e também que o fator estatuto informacional está
ao menos nos dados do século XIX sempre se fazendo presente no
favorecimento da posposição do sujeito. Além disso, o que todos os trabalhos
apontam é que a inversão do sujeito no século XX está restrita a sentenças não
transitivas. É então importante observarmos o que é dito na literatura acerca da
influência de fatores discursivos na ordem do sujeito no PB.
Berlinck (1997) observa justamente a associação tradicionalmente feita
na literatura de que sujeitos pospostos tendem a ser informação nova enquanto
que sujeitos antepostos tendem a ser casos de informação dada em virtude do
estatuto informacional no português que tem a posição à direita dos verbos
marcada com traços [+apresentativos]. A análise de Berlinck (1997) é pautada
37
inicialmente na proposta de Naro e Votre (1986) acerca do estatuto
informacional do sujeito, mas ao final a autora propõe uma nova análise.
Vejamos primeiro a proposta de Naro e Votre (1987) que utilizarei na análise
dos dados dessa dissertação.
Para Naro e Votre (1987) é necessário haver uma distinção que
demonstre o grau de novidade de uma informação em qualquer sentença, ou
seja, informações completamente novas, parcialmente novas ou mesmo
disponíveis, isto é, que pode rapidamente ser acessada pelo ouvinte/leitor,
ainda que não tenham sido mencionada no discurso, mas façam parte do
conhecimento compartilhado dos interlocutores, ou referentes únicos –
presidente da república brasileira, Sol, Lua - e ainda dados de informações
evocadas, ou seja, informações velhas. Os referentes parcialmente novos são
os que não estão no discurso, mas podem ser acessados por meio de um
referente acessível para o ouvinte. Os autores exemplificam os referentes
parcialmente novos com a sentença em (37) em que o referente “casa da
banha” é acessível para o ouvinte.
(37)
Aí, enche o estacionamento da "Casa da Banha".
Consideremos então a tabela 7, adaptada de Naro e Votre (1987:469),
em que os autores mostram a distribuição dos dados de SV x VS considerando
se as informações são evocadas, disponíveis, parcialmente novas ou
completamente novas.
Ordem/Categoria Informacional
Completamente novo
Parcialmente novo
Disponível
Evocado
SV
N
0
19
35
97
151
VS
%
0%
13%
23%
64%
N
5
54
67
50
176
%
3%
31%
38%
28%
38
Tabela 6: Distribuição dos referentes de VS e SV pelas categorias informacionais
principais (Retirado de NARO E VOTRE, 1987:469)
É interessante observar o fato de os resultados comprovarem que as
informações dadas, neste caso representadas pelas evocadas, tendem a ser
antepostas, mas no que concerne aos casos de inversão podemos notar que a
maior parte dos dados encontra-se no grupo dos DPs que têm referentes
disponíveis no texto, ou no conhecimento compartilhado, contrariando a
hipótese dos autores de que a posposição do sujeito estaria majoritariamente
relacionada
aos DPs
que
trouxessem
informação
completamente
ou
parcialmente nova. É fato também que os referentes completamente novos
atingem apenas 3% de posposição indicando que a segregação proposta por
Naro e Votre (1987) mostra que o DPs sujeitos pospostos não são tão novos.
Assim para Naro e Votre (1987) o estatuto informacional sozinho não pode ser
o responsável pela ordem que os DPs vão ocupar numa sentença é preciso
considerar outros fatores como o tipo de verbo, etc.
Berlinck (1997), analisando o PB e o PE, também propõe uma análise
similar a de Naro e Votre (1987) apresentando o grupo “evocado” de modo
distinto, ou seja, sendo formado pelos grupos: dados na situação, dado textual,
dado inferível. Os demais grupos se mantêm os mesmos. Vejamos a tabela
adaptada de Berlinck (1997:65).
PB
Dado na situação
Dado textual
Inferível
Disponível
Parcialmente novo
Completamente novo
Total
N/Total
8/69
59/501
97/568
78/486
73/267
92/149
408/2040
%
12%
12%
17%
16%
27%
62%
20%
PE
N/Total
6/24
41/348
56/341
176/357
78/260
37/76
394/1406
%
25%
12%
16%
49%
30%
49%
28%
39
Tabela 7: Frequência de ordem VS segundo o estatuto informacional do sujeito, no PB e
no PE modernos (Retirado de BERLINCK, 1997:65)
Os resultados da tabela 7 confirmam os apresentados por Naro e Votre
(1987), mostrando que em contextos com DP mais “dado” a posposição
também é possível. Este fato novamente indica que é preciso considerar outros
fatores além do estatuto informacional para tratar da ordem do sujeito no PB.
No que concerne especificamente ao estatuto informacional das
construções com SE, Hawad (2004), em um trabalho com textos publicados em
jornais já no século XXI, mostra que a posposição do DP-argumento interno
nesses casos pode ocorrer tanto com constituintes que representem uma
informação nova como também com informação dada no discurso. Assim
podemos dizer que nesses casos a posposição não está atrelada ao estatuto
informacional , ou seja, um traço discursivo, mas sim a sintaxe das construções
com SE.
Os resultados até agora apresentados revelam um sistema em que a
ordem VS cai em frequência de uso. Conforme Tarallo (1993), essa mudança
está atrelada a marcação do parâmetro do sujeito e do objeto no PB e o
resultado é que a queda no uso de VS no PB caminha junto com o aumento da
frequência de uso do sujeito lexical conforme mostram os resultados de Kato,
Cyrino, Duarte e Berlinck (2006). Para as autoras, durante o século XIX os
sujeitos
referenciais
na
primeira,
segunda
ou
terceira
pessoa
são
preferencialmente nulos, sendo o preenchimento desta posição relacionado a
critérios discursivos como a ênfase, ou a posição de foco da sentença. Como
demonstram os exemplos em (38) retirados de Kato, Cyrino, Duarte e Berlinck
(2006:415)
40
(38)
a) Quando (cv)i te vi pela primeira vez, (cv)i não sabia que (cv)j eras viúva e
rica. (1845)
b) Tua filha lamentar-se-á, (cv) chorará desesperada, não importa (...)
i
i
Depois que (cv) estiver no convento e acalmar-se esse primeiro fogo, (cv)
i
i
abençoará o teu nome e, junto ao altar, no êxtase de sua tranquilidade e
verdadeira felicidade, (cv) rogará a Deus por ti. (1845)
i
Para as autoras sentenças como as expostas em (38) demonstram que
o PB do século XIX apresenta um sistema compatível com uma língua de
sujeito nulo, sendo a segunda metade do século XX um período em que ocorre
uma mudança e os sujeitos referenciais passam a ser preferencialmente
preenchidos. Como mostram os exemplos abaixo em (39) que foram retirados
de Kato, Cyrino, Duarte e Berlinck (2006:416)
(39)
a. Se eu ficasse aqui eu ia querer ser a madrinha. (1992)
b. Você não entende meu coração porque você „tá sempre olhando pro céu e
procurando chuva. (1992)
c. Agora ele não vai mais poder dizer as coisas que ele queria dizer. (1992)
Essa mudança para Kato, Cyrino e Duarte (2000) obedece a uma
hierarquia de referencialidade em que argumentos sujeitos [+humano] tendem
a ser foneticamente realizados, ficando no outro extremo os sujeitos
proposicionais que tendem a absorver a mudança no parâmetro do sujeito nulo
de modo mais lento do que nos argumentos [+humanos]. Observemos como se
dá a distribuição ao longo do tempo numa amostra de peças teatrais do
aumento do sujeito preenchido no PB considerando o traço de animacidade do
referente de acordo com a escala de referencialidade de Kato, Cyrino e Duarte
(2000) que propõe que quanto mais referencial um argumento maior a
probabilidade dele ser foneticamente preenchido.
41
Escala de referencialidade
não-argumento
proposição
[-humano]
3 p.
[+humano]
3 p. 2 p. 1 p.
-espec.
+espec.
[-ref] < ---------------------------------------------------------------------------------- > [+ref.].
No gráfico 4 podemos observar a relação entre a escala de
referencialidade e o preenchimento do sujeito: a escala de referencialidade é
obedecida com os sujeitos [+humanos] e [+arbitrários] aumentando a
frequência de uso de sujeito pleno de modo mais acelerado do que nos demais
tipos de referente que se apresentam de modo mais resistente à mudança em
direção ao sujeito pleno.
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
[+hum]
[+arb]
[-hum]
[+prop]
Gráfico 4: Sujeitos plenos e a hierarquia referencial (Retirado de KATO, CYRINO,
DUARTE e BERLINCK, 2006:424)
Podemos concluir que a mudança que se processou segundo Tarallo
(1993) na passagem do século XIX para o XX nos parâmetros do sujeito nulo e
do objeto nulo fez com que houvesse uma reorganização do sistema que pode
ser compreendida a partir da análise de corpora diacrônicos. Essa
42
reorganização acarretou um maior preenchimento da posição de sujeito e a
menor probabilidade de inversão da ordem canônica SVO, estando esta
inversão
restrita
nos dados do
século XX a
contextos de
verbos
monoargumentais.
Passemos então, na próxima subseção, a tratar das análises acerca das
construções com SE no PB.
1.4.2 As construções com SE no PB
Duarte (2002) e Duarte e Lopes (2002) são dois trabalhos que
investigam o clítico SE em amostras do Projeto Para uma História do
Português do Brasil – PHPB. A primeira pesquisa trata apenas de sentenças
encontradas em anúncios publicados durante o século XIX nos estados de
Pernambuco, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa
Catarina. A segunda tem a amostra composta por cartas de redatores
publicadas no Rio de Janeiro e na Bahia e por cartas de leitores que circulavam
por Pernambuco, Minas Gerais, São Paulo e Paraná.
Duarte (2002) aponta, observando a concordância verbal, que o uso do
SE como indeterminador ou apassivador é variável nos anúncios com índices
de 50,2% de concordância e 49,8% para não concordância. Esta frequência de
uso varia de acordo com o estado por onde o jornal circulava. Santa Catarina é
o estado que mais favorece as construções com menor concordância,
enquanto que no Rio de Janeiro prevalece a variante com concordância.
Parece, portanto, que a relação entre a presença ou a ausência das marcas
flexionais está ligada a colonização e a ocupação do território pelos
portugueses e outros imigrantes. O Rio de Janeiro do século XIX é o grande
43
pólo cultural nacional, mas a região Sul, onde se encontra Santa Catarina, tem
um processo de colonização em que os portugueses não se fizeram tão
presentes. O que pode justificar a maior ausência das marcas flexionais.
Estado
Santa Catarina
Paraná
São Paulo
Minas Gerais
Pernambuco
Bahia
Rio de Janeiro
N/Total
12/13
8/12
60/98
6/15
4/
11/25
12/56
%
92%
67%
61%
40%
50%
44%
21%
P.R
.92
.67
.64
.43
.41
.40
.20
Tabela 8: Ocorrência de não concordância. (Retirado de DUARTE, 2002:163)
Ao considerar o contexto posição do sintagma nominal (posposto ou
anteposto), Duarte encontra 58% de posposição do argumento interno e 32%
de anteposição, como mostra a tabela 9 abaixo. Fato que nos leva a ressaltar
que este não é um comportamento padrão do PB, se este for o sujeito da
oração. Como o valor de aplicação da autora é a não concordância, os
resultados apresentados nesse parágrafo nos remetem por consequência ao
fato de que quando há concordância o sintagma nominal preferencialmente fica
anteposto, visto que os pesos relativos .56 (posposição) e .38 (anteposição)
para não concordância inversamente significam .44 (posposição) e .62
(anteposição) para concordância.
Anteposto
Posposto
N/Total
90/154
23/72
%
58%
32%
P.R
.56
.38
Tabela 9: Posição do SN x Não concordância (Retirado de DUARTE, 2002:165)
O trabalho de Duarte e Lopes (2002) pode ser considerado a
continuação do acima exposto com o acréscimo de novos dados, novo tipos de
textos que podem comprovar a hipótese de que no PB existem o SE passivo e
44
o indeterminador. O clítico sujeito para as autoras, em consonância com
Cavalcante (1999), estaria em variação com o pronome pessoal reto de 1ª
pessoa do plural nós. É interessante notar que a amostra de Duarte e Lopes
(2002) das cartas de leitores mostra que o uso do se como uma estratégia de
indeterminação supera a forma nós. Ocorre exatamente o inverso nas cartas
de redatores e as autoras justificam este fato a partir do tipo de texto.
“Enquanto os redatores preferem nós, o que se explicaria
pelo fato de geralmente transmitirem a voz do jornal, os
leitores, ao comentarem assuntos gerais e não
particulares utilizam-se do se como estratégia que veicula
o maior grau de indeterminação.” (DUARTE e LOPES,
2002:159)
Novamente, os índices de não-concordância atingem os maiores valores
na Região Sul, nesta pesquisa no Paraná. Dessa vez, entretanto, o Rio de
Janeiro
aparece
com
40%
de
não-concordância.
Cavalcante
(1999)
observando editoriais, crônicas e artigos encontra apenas 10% de não
concordância. Observemos a tabela 10 em que apresento, a partir de Duarte e
Lopes (2002), resultados da não-concordância em sentenças finitas com SE.
Estados
Paraná
São Paulo
Rio de Janeiro
Minas Gerais
Bahia
Pernambuco
Oco./Total
4/5
02/10
11/27
3/8
5/38
4/12
%
80%
20%
40%
37%
13%
33%
Tabela 10: Construções com “se” e a não concordância com o argumento interno em
sentenças finitas (Retirada de DUARTE e LOPES, 2002)
Em ambos os trabalhos, as autoras concluem que nas sentenças finitas
o clítico SE no século XIX ainda é majoritariamente um pronome apassivador.
Duarte, Kato e Barbosa (2001) afirmam que no português brasileiro falado há
45
ausência do se-apassivador e elas atribuem essa perda a mudança no
parâmetro do sujeito nulo. Os resultados, para as autoras, indicam que, na
escrita, entretanto, o SE-passivo continua presente.
Cyrino (2007) assume que no PB só há SE-genérico. A autora chega a
essa conclusão por meio de uma análise qualitativa de dados diacrônicos
coletados em uma amostra constituída por textos dos séculos XVIII, XIX e XX
que compõem parte dos Corpora do PHPB e ainda do Projeto temático: Projeto
de História do Português Paulista, subprojeto Mudança gramatical no
Português de São Paulo. Os textos são dos seguintes gêneros: anúncios,
cartas de leitores, cartas pessoais, cartas oficiais e dados de jornais da
imprensa negra paulista. Especificamente, os dados do século XVIII foram
produzidos por portugueses que moravam no Brasil.
Seguindo Cavalcante (2006), para Cyrino (2007), que a presença
apenas do SE-genérico no PB é resultado do fato de AGR ter um traço de
pessoa defectivo e por isso não ser capaz de licenciar o sujeito, mas apenas
identificá-lo. Assim, a análise proposta pela autora segue em consonância com
a hipótese de que o PB perde as marcas de flexão verbal em virtude de uma
mudança paramétrica.
É interessante observarmos o exemplo (41) produzido em uma carta
pelo Marquês de Lavradio em que há uma ocorrência de agente da passiva.
Esta é a evidência segundo a autora para que as sentenças com concordância,
que são tratadas como ativas por Raposo e Uriagereka (1996) e Cavalcante
(2006), sejam tratadas como passivas, estendendo assim a ocorrência do SEpassivo no PE até o século XVIII.
46
(41)
Ordena que viberes se vendão, pela meza da Inspeção, e se remeta o
dinheiro para os Coffres do fisco da Cidade de Lixboa. (CYRINO, 2007:97)
Este exemplo é considerado evidência para a existência de construções
passivas no PE por ter sido o texto produzido por um português que morava no
Rio de Janeiro setecentista, e por isso, não pode ser tomado como indicio da
gramática do PB.
O grande problema dessa análise de Cyrino (2007) é considerar que o
um dado, num texto escrito, é evidência suficiente para que haja um tipo de
estrutura que a literatura (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996; CAVALCANTE,
2006, 2011a,b) afirma, a partir de propriedades sintáticas e também com base
numa análise diacrônica, não fazer parte da gramática do PE, sendo os poucos
casos em que há agente da passiva considerados fósseis linguísticos como
aponta Martins (2003). Analiso este dado em consonância com a proposta de
Martins (2003), ou seja, ele seria um fóssil linguístico.
Mas voltemos às propriedades listadas por Cyrino (2007) para as
construções com SE-impessoal no PB. Quando considerado o século XIX
apenas
com
autores
brasileiros
são
encontradas
construções
sem
concordância. As características apontadas pela autora são: quando o
argumento interno é plural, o verbo fica no singular (42a); O DP argumento
interno é posposto ao predicador, exceto quando ocorrem quantificadores
(42b); o DP também aparece anteposto quando ocorrem sentenças relativas
(42c).
(42)
a. eu se podese vello lhe esclareceria a verdade porem por carta receio por
que escrevo e não sei por quem mando, e porem em liviaria [?] não [se
manda] sertas cartas. (CYRINO, 2007:98)
47
b. estiver conforme nada [se perde] devido a uma unanimidade dos
candidatos. Se mover o Silviano nova campanha eleitoras. (CYRINO,
2007:99)
c. e que o Sr do Bonfim queira dar-lhe [...] 10 muitos anos de vida com todas
as felicidades que [se pode ambicionar] na vida (CYRINO, 2007:98)
Sendo o PB, uma língua que só admite construções com SE-impessoal,
Cyrino (2007) corrobora a análise de Cavalcante (2006) acerca dos tipos de SE
na história do português. Vejamos parte do quadro adaptado de Cavalcante
(2006:186) com as características das construções com SE na gramática do
PB.
PB
SE-genérico
# [SENom Vinf DPAcu]
Não concordância entre V e DP argumento interno
SE ocupa a posição de sujeito
DP argumento interno checa acusativo
SE está em variação com os pronomes a gente e
você
Figura 2: Características do SE-genérico no PB. (Retirado de CAVALCANTE, 2006:186)
Apesar de Cyrino (2007) apontar, retomando Cavalcante (2006), que no
PB só há SE-genérico, ainda são encontradas sentenças em que há
concordância, portanto, construções que não fazem parte da gramática do PB.
E por isso a autora apontará para a questão da competição de gramáticas
entre a língua que emerge no final do século XIX e o PE. Cavalcante (2006)
também observa que há competição de gramáticas nas sentenças produzidas
por brasileiros do século XIX. Vejamos o que a autora salienta.
Podemos, portanto, considerar que este tipo de variação
observada em corpora de autores brasileiros está
relacionado ao que Kroch (1989) chama de “competição
de gramáticas”: a genuína gramática brasileira produz
enunciados de se-impessoal, mas os falantes, na
produção, se utilizam de seus “saberes linguísticos” que
são espelhados numa outra gramática. Desse modo,
podemos concluir que as construções com se que exibem
concordância entre o verbo e seu argumento interno no
plural, nos textos brasileiros, estão relacionadas a outra
48
gramática, a gramática que os falantes cultos se
espelham. (CAVALCANTE, 2006:194)
A variação observada por Cavalcante (2006), ou seja, entre construções
com e sem concordância pode ser observada nas sentenças de Cyrino (2007)
do século XX que apresentamos abaixo em (43) e ainda podemos perceber a
competição de gramáticas em construções com SE-médio, ou seja, aquelas em
que o clítico é interpretado de forma genérica (DOBROVIE-SORIN, 2006), pois
tais sentenças estariam restritas a gramática do PE.
(43)
a) batalha, ahi, diariamente realisam-se bailes de maxixe que na maioria
dançam mulheres brancas, que não se deixam de compartilhar as nossas
patrícias a nossa vergonha, e a nossa raça fica completamente
desmoralisada. (Projeto Temático – PHPP, século XX, CYRINO, 2007:100)
b) Quase sempre cortamos as columnas onde encontra-se taes artigos e
guardamos para de quando em vez relel-os. (Projeto Temático – PHPP,
século XX, CYRINO, 2007:100)
c) Não obstante haver-se perdido alguns de nossos amigos dançarinos, os
ensaios têm sido a frequência costumeira, o que nos prova que bastante
diminuta foi a perda que tivemos; oxa lá que menos fosse. (Projeto Temático
– PHPP, século XX, CYRINO, 2007:100)
d) me arrumar quanto antes, por| que de um momento para outro|podem as
cousas mudarem-se,| e presentemente a epoca não lhe| póde ser mais
favoravel do| que é. (Projeto Para a História do Português Brasileiro – PHPB,
século XIX, CYRINO, 2007:99)
Vistos alguns trabalhos acerca da ordem do sujeito no PB e das
construções com SE em sentenças finitas, é preciso observar como se dá o
ordenamento do sujeito e do DP argumento interno das sentenças com SE em
construções não finitas.
49
1.5 As sentenças não finitas
Para Galves (1987), uma das propriedades da Gramática do PB que a
distingue do PE é a possibilidade de inserção do SE em sentenças não-finitas,
exercendo, o clítico, a função de sujeito com interpretação arbitrária. Duarte
(2002) aponta que a construção prescrita pela gramática normativa, ou seja,
aquela que não apresenta o clítico é no século XIX majoritária, esse resultado é
corroborado por Cavalcante (2002 e 2006), Duarte e Lopes (2002). Os
exemplos em (44) mostram as diferentes sentenças que as duas línguas
podem produzir:
(44)
a) É impossível se achar alguém aqui (PB)
b) É impossível achar alguém aqui (PB e PE)
Galves trata essas sentenças de forma especial por considerar que elas
são muito representativas das diferenças encontradas nas gramáticas do PB e
do PE. Enquanto no PE, o sujeito nulo das infinitivas é interpretado como coindexado a um antecedente da sentença e como não é possível ocorrer
absorção de caso via co-indexação a leitura do sujeito da sentença só pode ser
indeterminada. No PB, algo distinto acontece: o sujeito das infinitivas pode ter
uma interpretação indeterminada quando o clítico SE se faz presente. Observe
os exemplos em (45) de Duarte e Lopes (2002)
(45)
a. Não é tempo de peneirar as causas secretas desse procedimento, não é
tempo de descobrir essa machina. (Diário de Pernambuco, 10/10/1871)
b. Pelo interior é muito comezinho encontrar-se frequentemente esses
infortunados a pedir o seu obolo (...) (O Correio Paulistano, 13/07/1854).
Cavalcante (2006) observa o percurso diacrônico do SE em sentenças
infinitivas no Corpus Tycho Brahe. Os resultados apontam para o fato de que
50
sentenças como (31) já faziam parte da gramática do Português Clássico. A
tabela 13 traz os resultados diacrônicos de Cavalcante (2006) com relação à
realização do DP argumento interno nas sentenças infinitivas com SE.
15501549
15501559
16001649
16501699
17001749
17501799
18001849
N-%
N-%
N-%
N-%
N-%
N-%
N-%
Nulo
2 – 33%
5 – 13%
30– 27%
5 – 14%
17– 28%
2 – 12%
1 – 25%
Posposto
4 – 67%
31– 84%
71– 64%
29– 80%
37– 62%
12– 71%
2 – 50%
Anteposto
-
-
1 – 1%
1 – 3%
-
-
-
Relativizado
-
-
5 – 5%
1 – 3%
1 – 2%
-
1 – 25%
Topicalizado
-
1 – 3%
3 – 3%
-
5 – 8%
3 – 17%
-
Total
6
37
110
36
60
17
4
Tabela 11: Realização do argumento interno com relação ao verbo infinitivo nas
construções com SE no Corpus TychoBrahe (Retirado de CAVALCANTE, 2006:94)
Os resultados indicam que também nas sentenças infinitivas a posição
canônica do argumento interno é pós-verbal, e que essas sentenças estão
presentes na amostra desde o Português Clássico, como pode ser visto em
(46a) e (46b).
(46)
a) Era chegada neste tempo ordem e mandato de Sua Santidade que no
votar dos preladosiguais em dignidade se tomasse a preferência da
antiguidade em promoção de cadaum, sem respeito de primacias, por evitar
as dúvidas que ali e em Roma se tinhamlevantado por parte dos
embaxadores e prelados castelhanos, sintidos do prejuízo quefazia `a
Cadeira toledana o favor que Sua Santidade, antes de se abrir o Concílio,
fizeraao Bracarense (Corpus Tycho Brahe, Sousa, 1556)
b. Christo Senhor nosso deu hoje signaes para se conhecer ao longe o dia
do Juiso: bem será que saibamos nós também algum signal por onde
possamos conhecer o logar que n‟elle havemos de ter, e que seja hoje, pois o
nosso Juiso está mais perto. (Corpus Tycho Brahe, Vieira, 1608)
Os resultados de Cavalcante (2006) também mostram que um dos
contextos favorecedores da inserção do SE é constituído pelas orações
51
introduzidas por preposições. Essa estrutura também favorece o uso de SE
diante de infinitivo no PB, conforme resultados de Duarte (2002), Duarte e
Lopes (2002) e Cavalcante (1999). Na tabela 14 apresentamos os resultados
estatísticos de Duarte e Lopes (2002).
Infinitivas
+ prep
- prep
Total
Com “se”
N-%
52 – 71%
21 – 29%
73
Sem “se”
N-%
87 – 44%
112 – 56%
199
Tabela 12: Presença x ausência de preposição em infinitivas com “se” e sem “se”
(Adaptado de DUARTE e LOPES, 2002: 163)
Na análise de Cavalcante (1999), com editoriais, textos de opinião,
crônicas publicados em jornais do século XIX e XX divididos em cinco períodos
(1848-1869; 1891-1910; 1935-1942; 1964-1968; 1996-1998) como dito,
também são encontradas sentenças com SE diante de verbo no infinitivo.
Nessa amostra há evidências que demonstram a variação entre o SE-genérico
e o SE-indefinido que Cavalcante (1999) chama de SE-passivo.
No primeiro período, a autora só obteve um dado de SE-genérico, (47),
retirado de um editorial:
(47)
“...para se achar sempre difficuldades em cousas comesinhas...” (Editorial,
período 1)
No terceiro e no quarto período, a autora encontra 2 dados que
apresentam concordância, sendo, portanto, exemplos que ela chama de SEapassivador, um deles obtido em uma crônica (48b) e o outro num artigo de
opinião (48a). No quinto e último período foram observados 25% de
concordância nas sentenças com se o que significa em números absolutos 2
dados, dos quais apresentamos apenas um, (48c).
52
(48)
a. “Respondendo a pergunta, começa ele assinalando o atual abuso praticado
principalmente em politica, de se empregarem a miude expressões de
sentido muito vago que cada partido interpreta segundo a sua fantasia, ou
conforme as necessidades da sua propaganda eleitoral.” (Artigo de opinião,
período 3)
b)“para se porem os primeiros muito, muitissimo acima da segunda.”
(Crônica, período 4)
c) “...comissões supervisoras criadas com o objetivo de se evitarem erros
cometidos no passado.” (Artigo de opinião, período 5)
Quanto à posição do argumento interno nessas sentenças, Cavalcante
(1999) encontra apenas 1 dado com DP anteposto. Vejamos a tabela abaixo
em que é apresentada a frequência de uso da anteposição X posposição em
sentenças com SE não finitas, considerando os três tipos de textos que
compõem a amostra da autora.
Anteposto
Editorial
Opinião
Crônica
Total
N/Total
1/4
0/0
0/0
1/4
Posposto
%
25%
0%
0%
N/Total
2/83
8/79
6/49
16/211
%
3%
10%
12%
Tabela 13: Uso de SE com infinitivo em relação à posição do argumento interno e tipo de
texto: Período 4 (Retirado de CAVALCANTE, 1999:95)
Em resumo, podemos dizer que no Português Clássico, no PE e no PB o
contexto de sentenças preposicionadas favorece a inserção do SE. Além disso,
a diminuição no uso de SE diante de infinitivo no PE pode ser resultado da
mudança que caracteriza a emergência dessa gramática no final do século
XVII. É interessante notar que duas línguas originadas do Português Clássico
tomaram caminhos distintos: o PB frequentemente utiliza o SE, enquanto que o
PE o faz menos vezes. Outro fator interessante a ser notado é que também
nessas construções o DP-argumento interno permanece posposto ao verbo.
53
1.6 Concluindo o capítulo
A discussão apresentada durante este primeiro capítulo evidência que
na Literatura já há um consenso de que as sentenças com SE que não
apresentam concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento interno
são ativas com sujeito indeterminado. A discussão é estabelecida, na verdade,
acerca das construções em que há concordância, havendo duas visões
possíveis: a primeira na qual se advoga que o argumento interno dessas
sentenças é o sujeito em virtude da presença das marcas de concordância; e a
segunda, em que é defendida a hipótese de que o argumento interno não é o
sujeito, mas sim o objeto da oração e que as marcas de concordância são
resultado do fato de este objeto receber caso nominativo.
Os resultados de pesquisas diacrônicas tanto no âmbito do Português
Clássico, Português Europeu e mesmo no PB têm apontado para o fato de que
a concordância não é suficiente para definir se o DP das sentenças com SE
que a apresentam é o sujeito da oração, pois este é um argumento que
preferencialmente se mantem posposto aos verbos finitos e não finitos, numa
posição prototípica de objeto direto tanto no PB quanto no PE.
Além disso, os resultados de Cavalcante (2011a, b), mostram que há
uma mudança na passagem do século XVII para o XVIII que indica a
emergência da gramática do PE que não se reflete nos resultados das
construções com SE, ou seja, a frequência de anteposição não aumenta. No
PB, Cavalcante (1999) também encontra mais argumento posposto do que
anteposto, indicando que também nessa gramática a posição do argumento
interno nas construções com SE também não segue a mudança pela qual
passa o sujeito.
54
São esses resultados que nos fazem apontar para a hipótese de que tais
construções são ativas com sujeito indeterminado tal como afirma Raposo e
Uriagereka (1996), se diferenciando das sentenças com SE-genérico em
virtude de nessas o DP receber acusativo e naquelas, nominativo, sendo
ambos o objeto direto da sentença.
Essa hipótese inicial precisa ser comprovada pela análise dos dados que
será apresentada no terceiro capítulo, mas antes tratemos dos pressupostos
teóricos, da metodologia, hipóteses, objetivos e constituição da amostra no
segundo capítulo.
55
Capítulo 2: Pressupostos Teóricos e
Metodológicos
Apresentarei nesse capítulo a discussão acerca dos pressupostos
teóricos que usarei no trabalho. O capítulo está organizado da seguinte forma:
apresento na introdução o conceito de linguística histórica, a fim de tornar claro
para o meu leitor como o tratamento dos dados é feito nas pesquisas
diacrônicas. Em seguida, discuto a Teoria de Principios e Parâmetros , a
questão da competição de gramáticas e a tradição discursiva. Finalmente, trato
da constituição da amostra, e da sua periodização em três fases: 1808-1840,
1841-1870 e 1871-1900.
2.1 A questão da mudança
Mattos e Silva (2008) define com as seguintes palavras a linguística
histórica, ou seja, a parte da Linguística preocupada com as mudanças:
Tradicionalmente, define-se a linguística histórica como o
campo da linguística que trata de interpretar mudanças –
fônicas, mórficas, sintáticas e semântico-lexicais – ao
longo do tempo histórico, em que uma língua ou uma
família de línguas é utilizada por seus utentes em
determinável espaço geográfico e em determinável
território, não necessariamente contínuo. (...) Considero a
linguística histórica stricto sensu a que se debruça sobre
o que muda e como muda nas línguas ao longo do tempo
em que tais línguas são usadas. (MATTOS e SILVA,
2008: 8-9)
Para a autora, a linguística histórica tem, basicamente, dois enfoques: o
primeiro considera os fatores intra e extralinguísticos, estando inserida nesse
grupo a teoria laboviana da variação e mudança. O outro é o que trata apenas
56
dos fatores intralinguísticos e sob este enfoque está inserido o gerativismo
diacrônico.
Reproduzo abaixo o quadro de Mattos e Silva (2008) que mostra de
FILOLOGIA
LINGUÍSTICA HISTÓRICA
modo sistemático do que trata a linguística histórica:
A “ciência do texto”,
base dos dados da
linguística histórica.
Lato Sensu
Stricto Sensu
Linguística histórica
Sócio-histórica
Considera
fatores
extralinguísticos ou
sociais
Todo tipo de linguística que
trabalha com corpora datados
e localizados
Linguística diacrônica
associal
Considera,
sobretudo,
fatores intralinguísticos
Figura 3: Do que trata a linguística histórica? ( Retirado de MATTOS e SILVA, 2008:10)
Observando o quadro acima, compreendemos que é intrínseca a relação
entre a linguística histórica e a filologia à medida que apenas nos textos
escritos, em pesquisas diacrônicas, é possível obter amostras que evidenciem
as mudanças6. Assim, numa visão mais ampla essa parte da Linguística é a
que se preocupa com a visão da mudança ao longo tempo.
6
Com o desenvolvimento das pesquisas e com o avanço da tecnologia, atualmente, é possível,
por exemplo, fazer uma análise de amostras com entrevistas gravadas na década de 1970,
portanto, que já ultrapassam no limiar do tempo o período de constituição de uma geração e
que poderiam ser tratadas como uma pesquisa diacrônica. Nesse sentido, as futuras gerações
57
A linguistica histórica diante da herança deixada pelo estruturalismo se
notabilizou por ser o campo de estudo preocupado com a “dinâmica temporalcronológico dos processos linguísticos: ou seja, desenvolveu-se como
„linguística diacrônica‟” (PAIXÃO DE SOUSA, 2006:21). E pode ser usada pelos
mais diversos arcabouços teóricos, desde que sejam respeitadas as
singularidades de cada teoria, tornando possível que as análises diacrônicas
concebam os distintos fenômenos linguísticos.
Os estudos diacrônicos por tratarem da mudança integram a esfera da
fala à medida que é apenas nela que é possível haver a heterogeneidade
linguística, ou seja, o mecanismo propulsor da mudança. É essa mesma
perspectiva que Chomsky (1986) assume quando afirma que a diacronia para o
gerativismo não se encontra na gramática, mas na performance do falante. Um
variacionista, ao contrário, afirma que a heterogeneidade se dá naquilo que
eles têm como objeto de estudo, ou seja, a língua nos seus planos geográficos,
sociais e temporais.
Como vimos, no quadro de Mattos e Silva (2008), a análise da linguística
histórica está estritamente interligada aos estudos filológicos que permitem
guardar as marcas deixadas na escrita pelos sistemas linguísticos e suas
mudanças ao longo do tempo. Mas isso, talvez, seja um dos problemas que
surjam quando há uma pesquisa diacrônica. A metodologia aplicada nesses
trabalhos pressupõe, como dito anteriormente, que seja possível a partir de
dados escritos observar a mudança, já que as formas conservadoras de algum
modo se farão presentes no sistema, indicando aquilo que os gerativistas
de lingüistas poderão ter acesso a dados diacrônicos que não estão extritamente em textos
escritos. Isto, se as pesquisas não necessitarem de uma sincronia tão passada. Entretanto,
para amostras anteriores a segunda metade do século XX sempre se fará necessário que o
pesquisador recorra as pistas da gramática deixadas em textos escritos e nesse sentido a
relação entre a Linguística Histórica e a Filologia continuará sendo intriseca.
58
chamam de pistas. Assim, como salienta Paixão de Sousa (2006), trabalhamos
com o que o tempo deixou, e não com a mudança que está transcorrendo.
“(...) trabalhamos com o que o tempo deixou e não com o
que aconteceu; em outros termos, nossa análise opera
no plano temporal do conhecimento, não no plano
temporal dos acontecimentos (...)” (PAIXÃO DE SOUSA,
2006:29)
Se a mudança se implementa, para um gerativista, no momento em que
surge a nova gramática, é necessário compreender quais os contextos
sintáticos, fonológicos, morfológicos
que condicionam a aumento na
frequência de uso de uma gramática B em detrimento da forma conservadora
expressa pela gramática A. Assim a mudança é abrupta, mas a aplicação dela
no sistema é lenta e gradual.
2.2 A periodização
Outro problema que se coloca nas pesquisas diacrônicas é a
periodização da mudança, ou seja, estabelecer o momento em que uma nova
construção passa a fazer parte do sistema. Nesse sentido, podemos pensar na
proposta de Tarallo (1993) quando o autor fazendo uso da Teoria de Variação
Paramétrica afirma que o PB emerge na passagem do século XIX para o XX,
valendo-se de quatro mudanças interligadas no sistema do PB para
estabelecer este marco: maior preenchimento da posição de sujeito, maior
frequência de categoria vazia na posição de objeto direto anafórico, perda da
inversão livre do sujeito e aumento dos tipos de estratégias de relativização.
Tarallo (1993) estabelece como periodização o ano em que a obra
consultada durante o processo de catalogação dos dados foi escrita. Essa
59
metodologia tem como consequência o fato de que seja relativizada a
tendência que o texto escrito tem de manter em uso as formas conservadoras,
ou seja, o que pretendemos dizer é que os primeiros dados encontrados que
indiquem uma mudança num texto escrito são sem dúvida indícios de que esta
já está amplamente implementada na oralidade e, portanto, teve inicio numa
fase anterior a data de publicação da obra.
É inegável que numa pesquisa diacrônica às vezes é impossível
estabelecer uma datação que seja distinta do ano em que a obra foi produzida,
mas quando possível, utilizar a data de nascimento do autor pode ser um
caminho. Galves, Namiuti e Paixão de Sousa (2005) propõem estabelecer uma
nova periodização para a língua portuguesa, incluindo o PB, utilizando esta
metodologia. A argumentação das autoras perpassa pelo conceito de
gramática da Teoria de Gerativa, bem como pela noção de mudança para o
mesmo arcabouço teórico que é assim entendida:
“a Mudança Gramatical é uma função da relação entre a
capacidade inata e a experiência linguística vivenciada
pelas sucessivas gerações de falantes. O estudo da
mudança depende, fundamentalmente, de uma teoria de
aquisição de linguagem. As perguntas centrais da teoria
da mudança serão: “Quais são as condições que levam,
na aquisição, a determinada fixação paramétrica?”; e
“Como e por que essas condições podem mudar, levando
determinada geração a fixar um parâmetro de modo
oposto ao que acontecia na geração anterior?”.
(GALVES, NAMIUTI e PAIXÃO DE SOUSA, 2005 :3)
Vemos por meio de Galves, Namiutti e Paixão de Sousa (2005) que a
mudança linguística na Teoria Gerativa está relacionada à fase de aquisição da
linguagem e, por isso, há a possibilidade de demarcar novas fases da língua
portuguesa, inclusive recalculando o período em que emergiu o PB. A
60
assunção de uma nova periodização está ligada ao fato de que a concepção da
língua como uma propriedade biológica implica que as mudanças ocorrem
preferencialmente quando a criança está adquirindo a linguagem, ou seja, nos
anos iniciais da vida.
Figura 4: Proposta para repensar a periodização: revisitando a periodização da Língua
Portuguesa (Retirado de GALVES, NAMIUTTI e PAIXÃO DE SOUSA, 2005)
Observemos que as autoras propõem uma periodização distinta da
tradicional para o português da Europa, e para tanto, se baseiam no fenômeno
da interpolação da negação. Aqui pretendo me deter apenas ao PB e nesse
sentido, é notável uma primeira diferenciação em relação à proposta de Tarallo
(1993): o PB teria emergido no século XVIII e não na passagem do século XIX
para o XX. Essa datação é interessante para a dissertação, pois se a
61
considerarmos estaremos tratando de um período em que já havia PB, o século
XIX.
É verdade que na amostra dessa dissertação, não é possível ter o
controle sobre a data de nascimento dos autores por isso optamos por
trabalhar com a periodização do projeto Para uma História do Português
Brasileiro, conforme será discutido na próxima seção. Entretanto, se os
resultados de Tarallo (1993) indicam que a frequência de sujeito pleno supera a
de sujeito nulo na passagem do século XIX para o XX, que há um aumento na
frequência de uso de objeto direto nulo anafórico, queda no uso de inversão do
sujeito, aumento de tipos de estratégias de relativização, isto significa que a
mudança se deu num período anterior a este, pois os fenômenos já estão
sendo encontrados nos textos escritos. Para Galves, Namiuti e Paixão de
Sousa (2006), já há PB no século XVIII e o que ocorre no século XIX é
competição de gramáticas, um assunto que será discutido ainda neste capítulo.
Como o PE só chegou com grande força no Brasil no inicio do século XIX com
a vinda da corte, pode-se dizer que o PB surgiu a partir de uma mudança na
gramática do Português Médio e não na gramática do Português Europeu.
Assim, a gramática do século XVI deixou duas “filhas” o PB, já no século XVIII
e o PE que também emerge nesse período.
Vejamos qual o arcabouço teórico que utilizarei para observar a
mudança linguística nas construções com SE e como ela se processa
considerando que no século XIX já há PB.
62
2.3 O Modelo gerativista.
2.3.1 A Teoria de Princípios e Parâmetros
Inserido no quadro da Teoria Gerativa, o modelo de Princípios e
Parâmetros traz consigo uma concepção de língua distinta da proposta pelos
Funcionalistas, Sociolinguistas, neogramáticos. Refiro-me a um arcabouço
teórico que entende a língua como um processo mental. Nesse sentido, esse
termo não se refere a uma língua particular, mas é a capacidade humana de
gerar estruturas linguísticas. Os falantes têm domínio da fonética, fonologia,
morfologia e semântica no que diz respeito à competência e perfomance.
Assim, Chomsky (1986) propõe que existem dois tipos de língua: a Língua-I é a
competência linguística do falante e a Língua-E é o resultado audível do
processamento sintático que ocorre na mente do falante durante a construção
de qualquer enunciado linguístico, portanto é a perfomance.
Outro conceito muito importante nessa Teoria é “Gramática”. Para um
gerativista, gramática e Língua-I são sinônimos e como propriedades mentais
biologicamente condicionadas tem que ser adquiridas pelos seres humanos
saudáveis. Mas isto só ocorre se no período crítico de aquisição da linguagem
a criança for exposta a Língua-E da sua comunidade de fala para que possa a
partir das poucas evidências que obtiver desse sistema internalizar a Língua-I.
Nesse sentido a proposição do modelo é que uma criança ao nascer é dotada
de uma capacidade biológica, a faculdade da linguagem, também chamada de
Gramática Universal, que é ativada no momento em que o pequeno ser
humano começa a ouvir a Língua-E da sua sociedade. Ele interpreta os dados
e codifica-os até que consiga internalizar a sua Gramática. Assim, a Gramática
sai de um estágio G0 em que há apenas a faculdade da linguagem dotada da
63
capacidade de internalizar qualquer Língua-I para G1 em que os falantes já
conseguem produzir todos os tipos de sentença.
Essa teoria linguística passou por vários estágios e foi sendo aprimorada
ao longo do tempo. Inicialmente, a proposta de Chomsky (1965) era que existia
um sistema de regras capazes de gerar qualquer sentença. Neste modelo, a
estrutura passiva, por exemplo, era interpretada como uma construção
resultante de transformação na estrutura ativa que apresentava um predicador
transitivo direto. Este modelo é o utilizado por Naro (1976) quando a autor trata
da reanálise das sentenças com SE que não apresentam concordância entre o
verbo transitivo direto e o argumento interno, por isso, em seu texto, Naro trata
das regras que seriam ou não obedecidas na construção de uma sentença
passiva, conforme discutido no primeiro capítulo. Já Raposo e Uriagereka
(1996), autores que tratam das sentenças com SE-indefinido, assumem outro
modelo de análise oriundo do desenvolvimento da Teoria Gerativa: o Programa
Minimalista.
A Teoria de Regência e Ligação ou também conhecida como Teoria de
Princípios e Parâmetros é o modelo de análise posterior ao sistema dotado de
regras como o utilizado por Naro (1976) e anterior ao Programa Minimalista do
qual fazem uso Raposo e Uriagereka (1996). Neste modelo, Chomsky (1986)
invalida uma das maiores críticas feitas até então ao Gerativismo que era a
noção de que o sistema de regras produzia línguas homogêneas. Na Teoria de
Regência e Ligação, é mantida a noção de que existem princípios invariáveis
que estão presentes em todas as línguas humanas, mas também há
parâmetros, ou seja, princípios variáveis e que são responsáveis por
singularizar cada gramática que só está internalizada quando todos os
64
parâmetros estão fixados de forma positiva ou negativa, visto que estes só
podem ter esses dois valores. Assim a gramática nuclear, internalizada é:
“Um sistema complexo de conexões entre os princípios
universais e rígidos e os parâmetros, o qual determina de
um modo altamente específico as propriedades de cada
língua particular. A aquisição é completamente
identificada com o crescimento e a maturação da
Gramática Universal, que passa de um estado apenas
parcialmente identificado (com parâmetros por fixar) a um
estado completamente especificado (com parâmetros
fixados).” (RAPOSO, 1992:55)
Nos estágios parcialmente identificados, ou seja, quando a língua está
sendo parametrizada estão em vigor na faculdade da linguagem todos os
princípios linguísticos, como, por exemplo, o Princípio da Projeção Estendida
que diz ser obrigatória, em todas as gramáticas, a existência de uma posição
para o sujeito que precisa ter suas propriedades definidas pelos parâmetros
que são os responsáveis por singularizar cada gramática. Um dos mais
discutidos na literatura linguística é o que trata do sujeito nulo. A partir dele
pode-se dizer que se todas as línguas têm o Princípio da Projeção Estendida o
que as diferencia é o preenchimento ou não dessa posição, ou seja, a
marcação positiva ou negativa do Parâmetro do Sujeito Nulo. Assim existirão
línguas que licenciam o sujeito nulo: italiano, português europeu, espanhol e
outras em que a posição estrutural de sujeito deve estar foneticamente
preenchida, como no francês e no inglês.
Nesse sentido a heterogeneidade do sistema é verificada quando um
único parâmetro apresenta-se de forma variada na gramática internalizada.
Para Galves (1998), a possibilidade de duas marcações paramétricas distintas
ocorrerem indica que há a emergência de uma nova Gramática internalizada.
65
“...a gramática de uma língua é o estado de saber
linguístico dos falantes que têm essa língua como
materna. Por sua vez, esse saber corresponde à
parametrização da faculdade da linguagem, ou Gramática
Universal (GU). É dentro dessa visão da gramática que
se coloca na Teoria da Gramática Gerativa a questão da
diferença das línguas.
Duas Línguas-I serão
consideradas
diferentes
se
contêm
na
sua
parametrização pelo menos um parâmetro fixado
diferentemente. Quando isso ocorre, não só as duas
gramáticas produzem enunciados diferentes, mas
também atribuem a enunciados superficialmente
idênticos (por exemplo no arranjo dos constituintes)
estruturas diferentes.” (GALVES, 1998:80)
Quando uma nova gramática emerge, é possível que uma criança dê
uma interpretação distinta ao dado de input transmitido pela geração anterior,
possibilitando uma mudança abrupta no sistema linguístico que provoca a
competição de gramáticas (Kroch, 2001), ou seja, duas gramáticas são
internalizadas e atuam no sistema linguístico de um modo que a inovadora vai
aumentando gradativamente a sua frequência de uso. Segundo Roberts
(1993), numa pesquisa diacrônica é preciso considerar o aumento da
frequência de uso de uma forma inovadora, mas também a reinterpretação de
enunciados estruturalmente idênticos, conforme advoga Galves (1998).
No Minimalismo, o modelo adotado por Raposo e Uriagereka (1996),
que pode ser considerado um desenvolvimento da Teoria de Regência e
Ligação, existem dois princípios: interpretação plena e economia linguística.
Esses princípios garantem que todas as informações necessárias para a
interpretação estejam visíveis durante a derivação sintática e da mesma forma
as informações não necessárias sejam eliminadas no curso do mesmo
processo. Além disso, especificamente o princípio da economia, assegura que
66
as línguas humanas atuam de tal modo que o sistema computacional tem um
custo mínimo durante a derivação.
Nessa linha teórica, a linguagem é composta pelo léxico e pelo sistema
computacional, estando no primeiro os itens sob a forma de traços não
redundantes que serão utilizados na computação das estruturas. Os traços, na
verdade, são os responsáveis por indicar o tipo de informação relevante para
cada língua e, portanto, são eles que garantem a distinção entre as gramáticas,
diferenciando-as a partir dos traços de gênero, número, caso, pessoa, entre
outros. São eles que podem sofrer variação na realização morfológica.
Neste trabalho, faremos uso dos pressupostos da Teoria de Regência e
Ligação na sua versão de Príncipios e Parâmetros.
2.4 Competição de Gramáticas
Kroch (1989) apresenta conceitos que serão de extrema importância
para o estudo da mudança linguística. A proposta do autor é relacionar o
aumento gradativo de uso de uma variante linguística com diferentes
gramáticas. No modelo de análise proposto por Kroch, a mudança linguística,
na sintaxe, por exemplo, se processa por meio da competição de gramáticas
que vão se substituindo em índices de uso através das gerações. Assim, o
pressuposto é que haja sempre duas gramáticas distintas competindo: a
gramática conservadora e a inovadora.
O reflexo dessas gramáticas pode ser visto nas análises empíricas a
partir das curvas em “S” que se delineiam ao longo do percurso histórico em
que a mudança se processa. Ou seja, as formas variantes competem entre si
de modo que enquanto a curva de uma é ascendente a da outra é
67
descendente. Segundo Kroch, a mudança que pode ser atestada a partir dos
textos é resultado da fixação de um parâmetro.
Kroch (2001) observa, então, o efeito da Taxa Constante, ou seja, nos
textos, que são a representação da Língua-E, o que aparece é o efeito da
mudança. A mudança em si ocorre na Língua-I. Ela é entendida como uma
falha no processo de aquisição da linguagem. O grande problema de conceber
a mudança como um “erro” na fixação de determinado parâmetro é que ela
passa a ser abrupta. De uma gramática G dos pais a criança fixa G 1.
Ocorre que se a gramática da criança fixar distintamente apenas um
parâmetro, quando comparada a Língua-I dos pais, há competição de
gramáticas, visto que conforme já destacava Galves (1998) a mudança de um
único Parâmetro constitui a emergência de uma nova Gramática. Nesse
sentido, a criança parametrizou estruturas que pertencem a duas gramáticas
distintas fazendo uso das mesmas de forma sistemática.
Estudando o verbo auxiliar “do” do inglês, Kroch nos mostra como é o
efeito da mudança que se processou no encaixamento desse verbo no sistema
linguístico do inglês médio e do inglês moderno que compreendem o período
de 1400 a 1700. Com base nesses resultados, o autor mostra como se dá o
efeito da taxa constante na implementação do auxiliar do em inglês. Vejamos o
gráfico.
68
Gráfico 5: Verbo auxiliar “do” no Inglês em diferentes contextos (Retirado de KROCH
1989:22)
Como pode ser visto no Gráfico 5 todas as curvas apresentam a forma
em “S” tanto nos contextos de interrogação quanto nos de negação. Para
Kroch, a mudança linguística que se evidencia neste gráfico está relacionada a
uma reanálise dos verbos auxiliares e a possibilidade ou não do núcleo do
sintagma verbal se movimentar no inglês ao longo dos séculos. O efeito da
taxa constante pode ser visto quando a razão entre a mudança em contextos
variados é a mesma. É exatamente isso que, segundo Kroch (2001),
encontramos quando estimamos a razão da mudança nas curvas expressas no
gráfico 5. Como afirma o autor, a taxa constante além de indicar um processo
de mudança linguística impreterivelmente mostra que há competição entre
duas gramáticas: a conservadora e a inovadora.
No PB, diversos estudos têm apontado para o fato de que o século XIX
se apresenta como um período em que há competição de gramáticas. No que
69
concerne especificamente às construções com SE, Cavalcante (2006) aponta
para o fato de que no século XIX o fenômeno de competição de gramáticas
também se fazia presente em amostras produzidas por brasileiros. A evidência
segundo a autora é o fato de haver sentenças com concordância, visto que a
gramática do PB produz apenas sentenças com SE-genérico. As sentenças
com concordância seriam produto da gramática do PE.
Para Cavalcante (2006), a gramática do PE tem o SE-indefinido e o
genérico. Portanto, possui AGR forte ao contrário do PB que tem AGR fraco.
No PB, há variação entre o SE-genérico e sujeitos nulos de terceira pessoa
com referência arbitrária, como vemos nos exemplos em (5) retirados de
Cavalcante (1999):
(5)
a. E como já se presumia tendências à medida insólita, não foi difícil
encontrar a porta de salvação ao estender a reeleição, que não podia ser um
privilégio exclusivo do atual ocupante do palácio presidencial. (Artigo de
opinião, período 5)
b. Em situações como estas, pode-se aplicar metodologias de antecipação
do cenário eleitoral. (Artigo de opinião, período 5)
c. Diz que vão inaugurar um restaurante em frente ao R9 do Ronaldinho. Vai
se chamar Amarelo. (Crônica, período 5)
d. O que fez a diferença foi harmonia e evolução, os princípios básicos de um
desfile de escolas de samba. Não pode deixar buraco, não pode sair
correndo para cumprir o tempo, não pode parar para deixar o relógio correr.
Tem que evoluir. Todo mundo tem que cantar o samba, uma ala não pode se
misturar à outra, não pode atravessar o samba. Tem que ter harmonia.
(Coluna do Artur Xexéo, Jornal do Brasil, 19, fev, 1999)
Assim a aparente variação entre construções com e sem concordância
em textos produzidos por autores brasileiros no século XIX evidencia aquilo
que Galves (1993) chama de competência gramatical. Para a autora um falante
tem a possibilidade de interpretar enunciados que não fazem parte da sua
70
gramática a partir dos seus saberes linguísticos aliado a sua competência
linguística.
É esse mesmo saber linguístico que segundo a autora torna estranhas
as sentenças em (6), visto que no PB a ordem OV não é natural, sendo a
interpretação mais natural para tais sentenças, a reflexiva e não a indefinida.
(6)
a) Aqui casacos de lã se vendem (CAVALCANTE, 2006:194)
b) Nesta escola, lindos filhotes de poodle se doam. (CAVALCANTE,
2006:194).
Assim, podemos dizer que a gramática brasileira produz sentenças com
SE-genérico, mas os falantes podem fazer uso dos seus saberes linguísticos
produzindo sentenças com concordância que pertencem a gramática do PE.
Uma das possíveis formas de observar o fenômeno de competição de
gramáticas está na verificação de gramáticas distintas num mesmo gênero
textual, nesse sentido torna-se interessante observarmos brevemente um
pouco da Teoria de Tradição discursiva da qual farei breve uso quando for
tratar da influência dos três gêneros que compõem a amostra: cartas de
leitores, cartas de redatores e anúncios nos resultados quantitativos e
qualitativos. Na próxima seção, discutiremos, portanto, um pouco da Teoria de
Tradição discursiva.
2.5 A Teoria de Tradição discursiva
A teoria da tradição discursiva possibilita que um dado fenômeno
linguístico seja analisado a partir da historicidade da língua e também do texto.
Os trabalhos embasados nela consideram a linguagem uma atividade humana
universal que é realizada por cada indivíduo o qual segue técnicas
historicamente determinadas, conforme já salientava Coseriu (1981).
71
Para o autor no nível universal encontram-se todas as atividades
humanas relacionadas à comunicação, ou seja, processos de predicação, de
referenciação, ordem de constituintes, entre outros. Já o nível histórico é
subdividido nas tradições discursivas e nas línguas históricas. Estas
compreendem todas as línguas humanas e suas particularidades lexicais,
fonológicas, morfológicas tanto na escrita quanto na oralidade. A tradição
discursiva diz respeito ao tipo de texto, ao gênero textual, ao estilo do autor, ou
seja, é o reflexo da situação comunicativa do emissor e seu interlocutor. Koch
(1997) propõem a partir da noção do universalismo linguístico um esquema que
demonstra os três níveis da língua, como se pode ver com o Figura 5, a seguir:
Nível
Universal
Histórico
Histórico
Individual/atual
Dominio
Competência Linguística
Língua Particular
Tradição Discursiva
Discurso
Tipo de Norma
Normas Linguísticas
Normas Discursivas
Tipo de Regra
Regras de Linguagem
Regras da Língua
Regras Discursivas
Figura 5: O redobramento do nível histórico da língua segundo Koch (1997:45)
Da forma como Koch propõe, fica evidente que existem duas
historicidades: a da língua e a tradição discursiva. O elo entre as duas permite
avaliar as mudanças linguísticas a partir das transformações nos textos. Esse
fato para uma pesquisa histórica torna-se extremamente relevante na medida
em que permite verificar as continuidades e descontinuidades da evolução
textual e de uma possível evolução linguística paralela (KABATEK, 2001,
p.100), ou seja, mudanças nas tradições discursivas podem ser reflexos de
mudanças no sistema linguístico, mas também podem ser os mecanismos
propulsores.
Para Kabatek (2004), a tradição discursiva se manifesta quando a
repetição de um texto, de uma forma textual, de um registro escrito ou oral
72
adquire um status do próprio, ou seja, é dotado de significado. Esse status só é
adquirido por meio da influência da sociedade na língua. Por este viés as
tradições discursivas são frutos da memória cultural de uma sociedade que é
transmitida às gerações mais novas por meio da televisão, do rádio, dos livros,
jornais, etc. O mesmo autor salienta ainda que o falante ao enunciar tem uma
finalidade comunicativa para a qual ele possui todas as possibilidades de
representação da língua nos registros orais e escritos que o sistema permite; é
a partir do seu objetivo de comunicação que será procedida a escolha da
tradição discursiva que elucidará a sua mensagem. Kabatek entende Tradição
Discursiva (TD) como:
“a repetição de um texto ou de uma forma textual ou de
uma maneira particular de escrever ou falar que adquire
valor de signo próprio (portanto é significável). Pode-se
formar em relação a qualquer finalidade de expressão ou
qualquer elemento de conteúdo, cuja repetição
estabelece uma relação de união entre atualização e
tradição; qualquer relação que se pode estabelecer
semioticamente entre dois elementos de tradição (atos de
enunciação ou elementos referenciais) que evocam uma
determinada forma textual ou determinados elementos
linguísticos empregados” (KABATEK, 2006:512).
Fica evidenciado que a TD não está relacionada somente ao gênero
textual, pois na proposta de Kabatek encontram-se palavras chaves como
repetição, evocação, atualização e tradição que juntas demonstram que nesta
nova teoria não há apenas a preocupação em analisar os elementos que
compõem o texto, mas também há o interesse por observar em que medida as
normas de um língua são afetadas pelas TDs. Isto porque um texto não tem
apenas as marcas da tradição, ou seja, em um documento oficial existem
73
características estruturais que constituem marcas desse gênero, mas não
obrigam o emissor a deixar de colocar no papel as marcas da sua língua.
Se observarmos a diferença entre documentos atuais e dos séculos
passados perceberemos que no século XIX a tentativa de rebuscamento da
língua era muito maior do que na atualidade; as “fórmulas”, atualmente, são
menos rígidas, isto porque apesar dos gêneros discursivos também seguirem
uma tradição, eles estão assim como qualquer outro integrante do sistema
sujeitos as mudanças intrínsecas às línguas.
O que ocorre nos estudos das mudanças linguísticas é que muitas vezes
um fenômeno é estudado a partir de diversos textos, apresentando, por vezes,
resultados diferentes que não permitem afirmar com convicção que já houve
uma mudança. A teoria da Tradição Discursiva permite solucionar esse
problema na medida em que se leva em consideração não apenas a história da
língua, mas também a história do texto analisado. Inevitavelmente, para um
pesquisador da história da língua, essa relação é essencial visto que o único
mecanismo para o estudo dos fenômenos na diacronia é a análise exaustiva
dos textos escritos.
2.4 Metodologia e Hipóteses
2.4.1 Objetivos e Hipóteses
A partir da discussão acerca das sentenças, indefinidas e impessoais
proposta no primeiro capítulo é possível verificar que há uma diferença entre o
estatuto do SE no PB e no PE e ainda que é preciso apresentar novos
argumentos que comprovem a hipótese de que no PB não há se-passivo.
74
Nesse sentido, apresento os objetivos do trabalho, considerando os
pressupostos teóricos discutidos nas seções anteriores.

Descrever e analisar o comportamento das construções com se
(inerente, indefinido, recíproco, reflexivo, genérico e ambíguo) além das
passivas analíticas e das transitivas no que se refere à ordem que o
argumento ocupa na sentença em relação ao verbo (anteposto /
posposto / nulo).

Analisar os alguns contextos linguísticos e extralinguísticos a fim de
determinar qual o padrão de ordem dos sujeitos e objetos no PB para
delimitar qual a relação gramatical do DP argumento interno das
sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo.

Analisar como essas sentenças se comportam em relação ao tipo de
oração em que ocorrem (matriz, encaixada, absoluta ou coordenada),
bem como em relação à finitude dos verbos.

Tratar da mudança linguística
Minha hipótese básica é que se o DP argumento interno das sentenças
com SE-indefinido, genérico ou ambíguo mantiver um padrão de ordenamento
preferencialmente posposto, bem como índices de argumento nulo que se
aproximem dos encontrados nos objetos, será um objeto direto. Pelo contrário,
se o padrão de ordem for similar ao encontrado nas sentenças passivas
analíticas, com SE reflexivo, recíproco e inerente o DP será o sujeito das
sentenças.
Cavalcante (2006) observando sentenças não finitas afirma que na
Gramática do PB estão presentes apenas as construções genéricas. Nesse
sentido, acredito que se forem encontradas sentenças com concordância,
75
portanto com SE-indefinido, estas serão resultado da Gramática do PE,
constituindo assim o fenômeno de Competição de Gramáticas.
Fatores linguísticos como o tipo de argumento (pronome, sintagma
nominal, sintagma oracional, entre outros) podem favorecer a anteposição do
DP das sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo. Nesses casos, ele
nunca ocupará a posição de sujeito e majoritariamente concordará com o verbo
finito.
A emergência da Gramática do PB estaria relacionada à interpretação
distinta dada a enunciados estruturalmente idênticos em relação ao PE. Por
hipótese, acredito que encontrarei sentenças como (7a) que não são possíveis
no PB, em virtude da posição ocupada pelo argumento interno, distinguindo
assim as duas gramáticas.
(7)
a) ESPECTACULOS
THETRO LYRICO FLUMINENSE
COMPANHIA HESPANHOLA DE RZUELA
DIRIGIDA POR Dom THOMAZ GALVAN
HOJE
TERÇA-FEIRA 16 DE JULHO
Recita extraordinariamente em beneficio de
HENRIQUETA QUINTANA
Depois que a orchestra tiver executadoasumphonia do estylo, subirá á scena
a linda zarzuela em 2 actos, original do sr.Serra, musica do maestro
rogelintitulada|AS AMAZONAS DO TORMES
CORO GERAL
Dará principio a linda zarzuela em 1 acto, intitulada.
UM PLEITO
Tomam parte os senhores Villanova, Barcena, Villareal e as sras.Pelaez e
Barredas.
Ás 7 ½ horas.
Os bilhetes de camarotes e cadeiras vendem-se por especial obséquio em
casa dos senhores Castellões, rua do Ouvidor número 116, e Aurelio, largo
de São Francisco de Paula. (Anúncios, Diário de Notícias, 16 de julho de
1869)
76
É necessário depois de tratarmos das hipóteses e dos objetivos dessa
dissertação passarmos a descrever a amostra a fim de deixar claro como se
procedeu a codificação dos dados que compõem esse trabalho.
2.4.2 A amostra
Uma das grandes dificuldades para os pesquisadores de linguística
histórica é a constituição da amostra considerada. Para esse trabalho faço uso
de parte dos corpora do Projeto PHPB-RJ, mais precisamente do material
coletado em jornais cariocas do século XIX. Portanto, trabalho contextos
impressos. A escolha dessas obras traz consequências para a pesquisa à
medida que podem ter sofrido algum tipo de edição textual e não serem o
espelho das gramáticas daqueles que escrevem para os jornais.
Conforme destacam Barbosa e Lopes (2006), a imprensa só chega ao
Brasil em 1808 quando a Família Real portuguesa desembarca no porto do Rio
de Janeiro fugida de Portugal que havia sido invadido por Napoleão Bonaparte,
o imperador francês. Os primeiros passos desse novo meio de comunicação
foram resultado da necessidade portuguesa de se comunicar com a Metrópole.
Com o passar do tempo e o crescente número de leitores, os jornais deixam de
ser apenas um mecanismo de comunicação da corte e se propõem a expor
ainda que minimamente o que é o Brasil. A partir do advento das assinaturas
dos principais jornais brasileiros, eles tornam-se um produto de exportação
conforme nos indica Barbosa (2011).
“Não se pode também esquecer da circulação física e
material que tinham estes periódicos, que tanto
transitavam pelo Brasil quanto eram exportados para
outros países. A circulação dos periódicos no século XIX
pode ser comparada, guardadas as devidas proporções,
ao que víamos no século passado com os jornais e
atualmente se revela em sites, o que amplia em muito a
77
relação do Brasil para além do mundo Ibérico.”
(BARBOSA, 2011:268)
A possibilidade de exportar os jornais, a diversificação dos temas das
reportagens que passaram a versar até sobre atividades domésticas, constitui
as características iniciais daquilo que seria a imprensa brasileira. No inicio, a
necessidade de atrair o público fez com que em determinados gêneros os
processos de edição não fossem tão rígidos, e neste grupo se inserem as
cartas de leitores (ANDRADE, 2008). Para Andrade (2008), essas cartas eram
tão importantes no século XIX que chegavam a ocupar uma página inteira.
As cartas de redatores, por sua vez, eram textos que tinham como
função responder às cartas de leitores ou atuar como editoriais. Nesse sentido,
os textos escritos pelos redatores tinham maior riqueza no processo de edição,
visto serem eles a “voz” dos jornais e por isso tratavam muitas vezes de temas
políticos, enquanto que os textos dos leitores eram escritos por médicos,
advogados, senhores de escravos, enfim pessoas comuns que traziam para os
jornais os problemas da sociedade brasileira que iam além da política pública.
O outro gênero textual que constitui essa amostra é o anúncio. Também
iniciante no Brasil, esse gênero caracterizava-se por ter textos pequenos, sem
ilustração, mas que por vezes tomavam um grande espaço da página do jornal,
como se pode observar em (8):
(8)
PILULAS DO DoutoR RADWAY
cobertas com gomma assucarada
autorisadas PELA JUNTA DE HYGIENE.
Purgam, regularisam, purificam, limpam e fortificam.
PRUSSIA PRUSSIAPRUSSIA
Estas pilulas são unicas adoptadas pela escola de pharmacia da Prussia, e
foram declaradas pelos rhimicos de Sua Majestade prussiana as mais puras
e melhores do mundo, não sendo falsas.
Deposito geral
78
46 Rua dos Pescadores 46 (Anúncio, Diário de Notícias,12 de julho de
1869)
A quantidade de anúncios era muito maior do que de cartas de leitores e
redatores, pois eram financeiramente rentáveis para as tipografias. Ao mesmo
tempo em que eram apresentados anúncios grandes como (8), também havia
anúncios pequenos como (9). Talvez, os padrões sejam semelhantes,
guardadas as devidas proporções, ao que encontramos hoje em anúncios de
grandes empresas de eletrodomésticos que tomam páginas inteiras das
revistas e dos jornais e anúncios de pequenas imóveis que são muito
pequenos.
(9)
Ama de leite
Aluga-se uma, de côr branca, na ladeira do Seminario número 8. (Anúncios,
Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881)
A amostra está dividida em três fases (1808-1840, 1841-1870 e 18711900), estando esta organização relacionada ao período de formação de uma
nova geração, por isso intervalos de aproximadamente 30 anos, e ainda a
importantes fatos históricos da sociedade brasileira, conforme afirmou Barbosa
(c.p) durante uma aula na Faculdade de Letras da UFRJ, como a chegada da
Família Real portuguesa em 1808, a coroação de Dom Pedro II como
Imperador do Brasil em 1841 e o fim da Guerra do Paraguai em 1871.
Como dito foram consultados 52 periódicos, os quais atingiam os mais
diversos públicos. E tratavam de assuntos como medicina, informes a
população, reivindicações políticas, notícias da sociedade, etc. Alguns desses
jornais encontram-se ainda hoje em circulação, por exemplo, o Jornal do Brasil,
de onde foram catalogados alguns anúncios. Observemos os títulos destes nas
tabelas 14 (carta de redator), 15 (carta de leitor) e 16 (anúncios).
79
Jornais
1808-1840
1841-1870
O Brasileiro Imparcial
x
O Carioca
x
O Carijó - jornal Político e Litterário
x
O Cathólico
x
Compilador Constitucional e Litterário Brasiliense
x
Gazeta do Rio de Janeiro
x
Luz Brasileira
x
O Sentinella da liberdade no Rio de Janeiro
x
O Espelho
x
O Guerreiro
x
Diário de Notícias
x
Arquivo de Medicina, Cirurgia e Pharmacia do Brazil
Correio Comercial
Diário do Brazil
Echo social
O Extravagante
Gazeta Suburbana
7
O Trabalho: revista histórica, literária
Tabela 14: As cartas de redatores ao longo do tempo por periódico
Jornais
1808-1840
1841-1870
O Carioca
x
O Cidadão
x
O Grito da Razão na Corte do Rio de Janeiro
x
O Macaco Brasileiro
x
O Papagaio
x
O Propugnador
x
A actualidade - Jornal da Tarde Constitucional
x
O Despertador Municipal
x
Diário do Rio de Janeiro
x
Filho da Joanna
x
Gazeta Médica do Rio de Janeiro
x
O Guarany - Jornal, Político, Litterário e Industrial
x
O Guerreiro
x
Novo Tempo
x
O Parayba
x
Correio da Noite
Diário Fluminense
O Jornal - Folha Diária
Jornal de Notícias
O Lazarista
Relâmpago: periódico de crítica e censura
República Brasileira
Salva Vidas
Tabela 15: As cartas de leitores ao longo do tempo por periódico
1871-1900
x
x
x
x
x
x
x
x
1871-1900
x
x
x
x
x
x
x
x
7
O nome completo do jornal é: O Trabalho: revista histórica, litterária e scientífica de artes e
officios, exclusivamente consagrada aos interesses das classes operárias
80
Jornais
1808-1840
Jornal do Commercio
x
Gazeta do Rio de Janeiro
x
Diário de Notícias
Atirador Franco
A Bomba
O Cacete - folha crítica, satyrica, humorística e literária
O Jacobino
O Caixeiro
Jornal do Brazil
O Liberalista
A Nação
Vespa
Tabela 16: Os anúncios ao longo do tempo por periódico
1841-1870
1871-1900
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Observando as tabelas 16, 17 e 18, percebe-se que nenhum jornal ou
revista teve periodicidade nas três fases estudadas. Entretanto, não considero
que este fato seja um problema em virtude da Teoria que me baseio, ou seja,
Teoria de Princípios e Parâmetros, visto que é possível perceber as
características das gramáticas dos autores por meio da análise dos dados de
distintos jornais.
A Tabela 17 a seguir traz o número de dados extraídos dos textos nos
períodos considerados:
1808-1840
1841-1870
1871-1900
Gênero
textual/Tempo
Texto
Dados
Textos
Dados
Textos
Dados
Carta de Redator
9
73
9
99
8
112
Carta de Leitor
11
130
14
261
9
77
Anúncio
63
57
16
28
87
173
Total
83
260
39
388
104
362
Tabela 17: Distribuição dos dados por gênero textual
81
Nesses periódicos ou revistas havia alguns dados que apresentavam
variação de grafias, comum ao sistema ortográfico vigente no século XIX como
podemos observar em (10):
(10)
Annuncia-se a sahida do 2º. Tomo das Memorias Historicasdo Rio de
Janeiro por Monsenhor Pizarro para que possão os Senhores subscritores
procurá-lo nos lugares , sem que fizerão as suas Assignaturas. Ficão no
prelo os Tomos 3º , 4º , 5º , que sahirão com a brevidade possível; e no 6º, e
7º se publicarão a lista de todos os Senhores; que cooperarão para a
impressão da Obra com a sua subscripção, a qual ainda continua nos lugares
8
de costumes. (Anúncios, Gazeta do Rio de Janeiro , 1821 )
Nesses casos, optei por manter a grafia conforme as normas de edição
estabelecidadas pela equipe do PHPB-RJ (LOPES e BARBOSA, 2006).
2.5 Concluindo o capítulo
Neste capítulo tratei dos pressupostos teóricos que nortearão esse
trabalho, bem como da constituição da amostra, periodização utilizada na
pesquisa, objetivos e hipóteses. Passemos a análise dos dados. Deixaremos
para a primeira seção do próximo capítulo a apresentação de todos os
contextos sintáticos que controlei a fim de alcançar os resultados dessa
pesquisa.
8
Não foram encontradas referências sobre do dia e do mês da publicação dos anúncios na.
Gazeta do Rio de Janeiro
82
Capítulo 3: Análise dos dados
3.1 3.1 Os contextos sintáticos em análise
Nesta seção apresento os contextos sintáticos e suas possíveis formas
de realização que foram codificados e submetidos ao pacote de programas
Goldvarb-X (SANKOFF, D; TAGLIAMONTE, S. A; e SMITH, E, 2001) a fim de
que fosse feita uma análise quantitativa da amostra. Todos os dados foram
rodados em função da forma de realização do argumento, ou seja, anteposto,
posposto ou nulo.
3.1.1 As formas de realização do DP
Considero três possíveis formas de realização dos DPs: anteposição
(1a) e (1b); posposição (2a) e (2b); argumento nulo (3a) e (3b). A hipótese é
que nas sentenças indefinidas, genéricas ou ambíguas, assim como nos dados
de objeto direto a ordem preferencial é a posposição do DP, enquanto que em
sentenças passivas analíticas, reflexivas, recíprocas, inerentes a preferência do
DP é pela anteposição. Com relação ao argumento nulo a hipótese é de que
eles estão mais presentes nas sentenças indefinidas, genéricas, ambíguas e
transitivas diretas, visto que os DPs considerados, por hipótese, são objetos.
(1)
a. Os viajantes devem sempre munir-se de um vidro de Prompto Allivio
Radway, pois poucas gottas em agua impedem doenças ou dôr causadas
pela mudança d‟água; é melho que cognac francez ou bitter, como
estimulante. (Anúncios, Diário de Notícias, 02 de janeiro de 1889)
b) e ninguem ainda se lembrou de censurar a concessão de taes beneficios,
como prejudiciais ás empresas; mas agora como foi vendido á sociedade de
beneficencia portuguesa, eis que já apparece um correspondente no “Diario
83
do Rio” censurando esse triste beneficio, e ridicularizando os portugueses!
(Carta de Leitor, Filho da Joana, 8 de Março de 1844)
(2)
a) Annibal Mascarenhas que, sem resfolhos, explanou estes variados
assuntos de modo a facilitar sua comprehensão a todas as intelligencias.
(Anúncios, A Bomba, 10 de Outubro de 1894)
b) Alugão-se, em casa de familia, quartos independentes, mobiliados; na
travessa de São Francisco de Paula, número 6. (Anúncios, Jornal do
Commercio, 01 de outubro de 1881)
(3)
800$000
10 RUA DA LAMPADOSA 10
AOS FENIANO
2592
Os individuos do kioske rio de Janeiro, quando [-] estabeleceram-se com a
tarraxa, propalaram que iam guerrear a casa dos fenianos, no entanto que
apresentam-se como victimas, para assim obterem a benevolencia do
publico. (Anúncios, A Nação, 15 de março de 1873)
b) do Papagaio não terão que dizer, porque he animal de boa memoria, e dá
bem a ver que estudou com proveito, pois [-] se explica como gente, e a
natureza o dotou de lingua propria para isso: porém o Macaco só tem
aprendido a fazer mogigangas. Leve-me o Diabo, se elle a fallar, e eu a zurrar
não espantamos todo mundo!! (Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de
1822)
3.1.2 Os contextos sintáticos e as estruturas observadas em relação a
realização dos DPs
Apresentada as possíveis formas apresentadas pelos DPs considerados
na análise, passo a tratar dos contextos sintáticos e das estruturas que foram
selecionadas a partir dos resultados apresentados na revisão bibliográfica e
serão analisadas ao longo da dissertação. O controle desses contextos
84
permitirá além de um tratamento estatístico, a análise qualitativa a medida que
teremos como quantificar até que ponto um tipo de estrutura favorece a
anteposição, a posposição ou a realização nula de um DP. Vejamos quais as
hipóteses para cada contexto sintático controlado.
3.1.2.1 Tipo de construção
Brito, Duarte e Matos (2003) afirmam que o clítico SE pode ser
classificado como: reflexivo (5a), recíproco (5b) e inerente (5c). Os dois
primeiros são tratados como clíticos de referência anafórica argumentais. Eles
admitem construções de redobro que marcam a posição argumental a que o
clítico está associado. Nas recíprocas o redobro é parafraseado por
expressões como “uns com os outros”, “um com o outro” e suas variantes, já
nas reflexivas a expressão é “ a si próprio”. Quanto ao clítico inerente as
autoras afirmam que ele caracteriza-se por não apresentar conteúdo semântico
ou morfo-sintático. Vejamos os exemplos:
(5)
a) uma pessoa bastante habilitada encarrega-se de tratar questões
forenses, policiaes e particulares nesta Capital, e , bem assim, legalisa com
brevidade e por diminuta retribuição os papeis necessarios para enlaces
matrimoniaes no civil, e no religioso. Cartas nesta redacção a E. M.
(Anúncios, O Jacobino, 8 de agosto de 1896)
b) meu amigo, as minhas licenças eu as dou a um guarda da camara para as
tirar, porque só assim fico descançado de multas e outros incommodos,
embora pague por cada uma 3 ou 4 $ rs., porque elles lá se entendem uns
com os outros; (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de
1850)
c) porque os homens honestos se envergonhão de ler tantas sandices, que
desacreditão o Brasil !!! (Carta de Redator, O Brasileiro Imparcial, 27 de Abril
de 1830)
A hipótese é que nesses três tipos de sentenças assim como nas
passivas analíticas (6), o DP ficará preferencialmente anteposto ao predicador,
85
pois se trata do sujeito das sentenças. Outra hipótese é que os resultados não
mostrarão diferença sintática entre as três construções exemplificadas em (5),
estando a distinção entre ambas restrita ao campo semântico. Nesse sentido,
por hipótese, será possível transformar os três tipos de construções em apenas
uma.
(6)
Todos comprehendem que as ataduras e tiras adhesivas podem ser
collocadas circularmente sem apertarem nem estrangularemos membros.
(Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de 1864)
Considero ainda o SE-indefinido, o SE-genérico e o SE-ambíguo que
estão respectivamente representados em (7). Em sentenças que apresentam
esses clíticos, a partir do que dizem Raposo e Uriagereka (1996), Naro (1976),
Martins (2003), a hipótese é de que o DP permanecerá posposto ao predicador
visto ser este um argumento com a relação gramatical de objeto. Da mesma
forma se comportarão os DPs que recebem acusativo em sentenças transitivas
como (8a).
(7)
a) Vendem-se machinas de costura Singer e outras, a dinheiro e a
prestações de 5$ a 10$, e alugão-se por pequenos alugueis; na rua Larga de
São Joaquim número 116. (Anúncios, Jornal do Commercio , 01 de outubro
de 1881)
b) Ourivesaria Halphen
Para evitar falsificações e usurpações de nome, deve-se exigir os dous
carimbos juntos
Talheres Alfénide metal branco prateado
Propriedade exclusiva da Societé des Couverts Alfenide (Anúncios, Jornal do
Commercio, 01 de outubro de 1881)
c) Ao agradecimento dos duos guardas pela imprensa seguiu-se um artigo
do Diário, attribuindo ao Sr. Conselheiro Ferraz a recusa, que só provinha de
V. Ex.; foi preciso declarar eu ao publico que nisso estva innocente o Sr.
Frraz. Publicado o caso, a guarda nacional tomou a peito desapprovar o
procedimento de V. Ex. cuja opposição e a de mais alguns de seus collegas
86
deram-me a presidencia da Illma. camara. municipal; o partido liberal, que se
tinha aproveitado do ensejo, unido-se á guarda nacional, venceu nas
seguintes. E é possível que V. Ex. esquecesse em tão pouco tempo tudo isso
devido em grande parte a um capricho de V. Ex.?(Carta de Leitor, Actualidade
- Jornal da Tarde, 29 de Janeiro de 1869)
(8)
Hoje porem, que o Governo a nosso ver tomou a melhor medida que podia
tomar em similhante crise, attendendo ao nosso estado, sobrecarregados de
huma divida enorme, em vesporas de outra, julgamos, que os Negociantes, e
os taberneiros querem só o bem para si, e o mal para todos os que
dependem d‟elles. (Carta de Leitor, O Carioca, 22 de Outubro de 1833)
3.1.2.2 Estrutura do núcleo do predicado
Nesta contexto observo se há uma perífrase verbal ou uma forma
simples. A hipótese a partir de Cavalcante (1999), Vieira (2007) é que as
sentenças com predicadores complexos favorecerão as construções com SEgenérico, ou seja, que não apresentam concordância entre o predicador e o
verbo transitivo. Tal como no exemplo em (9a). A sentença em (9b) exemplifica
os predicadores simples.
(9)
a) Mas, Sr. Redactor, eu disse que não dou credito a esta noticia; e eis aqui a
rasão. Tem sido governadores das armas da corte alguns Brasileiros natos, e
muitos adoptivos; e se estes, a quem se poderia revelar algumas
recordações do lugar do seo nascimento, nunca tiverão semelhante
lembrança , como hei de crêr que a tivesse o Sr.Chagas, Brasileiro nato.
(Carta de leitor, O Cidadão, 29 de Março de 1838)
b) Desejamos a v.Ex. immensas felicidades para augmento do Brasil, e que
de uma vez se estrangule essa oligarchia quanto antes, por ser isso o
mesmo que deseja. (Carta de Redator, O Guerreiro, 2 de Abril de 1853)
3.1.2.3 Marca de número no argumento e Marca de número no verbo
O cruzamento desses dois contextos foi importante para que eu pudesse
observar o fator concordância, especialmente nas sentenças com SEindefinido, genérico e ambíguo. A hipótese, a partir de Duarte (2002) e Duarte e
87
Lopes (2002), é que haja mais construções com SE-indefinido (10a) do que
com SE-genérico (10b) em virtude de a amostra ser constituída por textos
jornalísticos cariocas, pois nos trabalhos citados acima o Rio de Janeiro foi o
estado que apresentou mais concordância quando analisado em relação aos
demais estados que compõem o corpus do Projeto Para uma História do
Português do Brasil.
(10)
a) A esses homens humanos, só nas formas, deram-se espadas, deram-se
fardas, para com o titulo de agentes da segurança publica fiscalisarem e
velarem pela segurança e bem estar do povo. (Carta de Leitor,O Lazarista, 28
de outubro de 1875)
b) Mas, Sr. Redactor, eu disse que não dou credito a esta noticia; e eis aqui a
rasão. Tem sido governadores das armas da corte alguns Brasileiros natos, e
muitos adoptivos; e se estes, a quem se poderia revelar algumas
recordações do lugar do seo nascimento, nunca tiverão semelhante
lembrança , como hei de crêr que a tivesse o Sr.Chagas, Brasileiro nato.
(Carta de leitor, O Cidadão, 29 de Março de 1838)
3.1.2.4 Realização do argumento
Nesse contexto verifico sob quais formas o DP pode ser realizado:
argumento nulo (11a), sintagma nominal simples (11b), sintagma nominal
composto (11c), sintagma oracional (11d), pronome pessoal do caso reto (11e),
pronome indefinido ou demonstrativo (11f).
(11)
a) Portanto, V. Ex. tem abusado completamente da sua jurisdição, está
sacrificando o MONARCHA, o qual por não ter ao seu lado quem lhe faça ver
os desvaneios de V. Ex. e de seus collegas ministros, por isso [-] são
conservados em despeito a opinião publica; (Carta de Redator, O Guerreiro,
15 de Janeiro de 1853)
b) Sr. presidente, só quem não tem pratica, só quem não tem lido as obras de
cirurgia, pode afirmar tão cathegoricamente que as feridas contusas não se
reunem por 1a. intensão. (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro,
1 de Janeiro de 1864)
c) Alugão-se uma negrinha de 14 annos, duas pretas perfeitas cozinheiras,
lavadeiras e engommadeiras de roupa de senhora; informa-se por favor, á rua
88
Luiz de Camões número 14, antiga da Lampadosa, venda. (Anúncios, Jornal
do Commercio , 01 de outubro de 1881)
d) V. Ex. deve ter uma lembrança, que estamos ao facto de um soldado
invalido que estragou a sua saude no serviço da Nação, e tendo este isero
pedido a sua reforma, nenhuma decisão teve, e o desgraçado procurando o
abrigo do THRONO, o MONARCHA BRASILEIRO ordenou a V. Ex. que o
reformasse, e que lhe desse uma pensão, e este infeliz procurando a V. Ex.,
V. Ex. menoscabando o MONARCHA declarou na secretaria em altas e
intellegiveis vozes – S.M. ordenou-me que eu o reformasse, e que lhe desse
uma pensão, porém eu digo-lhe que não quero, e se você tornar a S.M. hei de
remettel-o para bordo de um navio de guerra preso. (Carta de Redator, O
Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853)
e) Declaram-se eles victimas, quando esta patente que eles são os
aggressores, dominados pela inveja, por verem como eles mesmos dizem a
casa dos fenianos com 300$ a vender premios de continuo. (Anúncios, A
Nação, 15 de março de 1873)
f) Este liquido, sem competidor pela sua efficacia e barateza, tem feito uma
verdadeira revolução na lavoura; a sua procura augmenta de dia em dia, e o
lavrador que o experimentar jamais quererá outro. (Anúncios, Jornal do
Commercio , 04 de outubro de 1881)
A hipótese para esse fator é de que os pronomes indefinidos e
demonstrativos favorecerão a anteposição do argumento interno das sentenças
com SE-indefinido, genérico e ambíguo.
3.1.2.5 Realização do referente
Nesse grupo controlei a relação gramatical do referente quando o
argumento era nulo, pronome indefinido/ demonstrativo ou pronome pessoal
do caso reto. A hipótese era de que os objetos nulos seriam majoritariamente
retomados por tópico conforme destaca Vasco (2005). Foram encontrados
referentes exercendo as funções sintáticas de sujeito (12a), objeto direto (12b),
tópico (12c) e (12d), predicativo do sujeito (12e).
89
(12)
a) Carvalho teve a fortuna de ganhar a opinião publica, sendo reeleito quatro
vezes por unanime acclamação dos Povos, quando o Sr. Barreto se fazia
aborrecido pela guerra civil, que promoveo, aliciando Povo, e a Tropa: elle se
dirigio a mim, que lhe respondi o que devia, que era esperar pela decisão de
S.M.I., a quem, já se achava affecto este negocio. (Carta de leitor, O
Propugnador, 13 de Junho de 1824)
b) meu amigo, as minhas licenças eu as dou a um guarda da camarai para as
tirar, porque só assim fico descançado de multas e outros incommodos,
embora pague por cada uma 3 ou 4 $ rs., porque ellesi lá se entendem uns
com os outros; (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de
1850)
c) Chapelaria do Globo Figueiredo & Irmão
Completo sortimento de chapeos para homens, meninos e meninas, tudo por
preços resumidosi.
Recebem tudoi directamente de Paris.
82 Rua Uruguayana 82
Proximo á Rua do Ouvidor (Anúncios, O Cacete, 16 de janeiro de 1881)
d) Ama de leite
Aluga-se uma, de côr branca, na ladeira do Seminario número 8. (Anúncios,
Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881)
e) He alli mesmo que pequenos e exhaustos Negociantes fazem ofertas, que
em poucos dias, já passavão de cem mil cruzados para se apromptar a
Tropa; a qual precizando de hum fardamento, foi em poucos dias apomptado
pelas Senhoras Paulistas de todas as classes, que espontaneamente se
oferecerão! (Carta de Redator, O Compilador Constitucional Político e
Litterário Brasiliense, 12 de Março de 1822)
f) Para que pessoa alguma se persuada que nós calumniamos a honra de V.
Ex., desde já envidamos a V. Ex. para que nos chame a responsabilidade, e
em quanto não o fizer será sempre a nossa mofina o art. 133 da constituição
para V. Ex. e seus collegas é letra morta, e que de há muito ella se acha
calcada aos pés. (Carta de Redator, O Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853)
3.1.2.6
Traço de animacidade
A hipótese para este fator é que em sentenças com SE indefinido ou
genérico no Português Brasileiro a anteposição do argumento interno só será
possível quando o traço de animacidade for [-animado].(14a). As sentenças
que apresentam esse argumento com traço [+animado] (14b) ou [+humano]
90
(14c) seriam resultado do processo de competição de gramáticas entre o PB e
o PE.
(14)
a) Olhe do Papagaio não terão que dizer, porque he animal de boa memoria,
e dá bem a ver que estudou com proveito, pois se explica [-] como gente, e
a natureza o dotou de lingua propria para isso: porém o Macaco só tem
aprendido a fazer mogigangas. Leve-me o Diabo, se elle a fallar, e eu a zurrar
não espantamos todo mundo!! (Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de
1822)
b) As mizeras crianças não se podendo conter, coagidas pelas
necessidades do estamago, aproveitando algum momento de distracção das
pobres mãis, metião os dedinhos nas panellas ferventes, a ver se conseguião
colher alguma migalha, sacrificando-se á dôr que sentirião pelas
queimaduras! (Carta de Redator, Correio Commercial, 18 de Junho de 1879)
c) As mesmas inconveniencias, o mesmo furor em me attacar notão-se nos
dois escriptos, construídos de maneira que sobresahem as insinuações, que
eu não sei tratar as feridas, que ignoro e modo porque obrão os corpos
contundentes, que sou ilogico etc, etc. Parece, Sr. presidente, que a cortezia
vai fugindo desta casa (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1
de Janeiro de 1864)
d) Festividade
Consta-nos que a devoção de Sant‟Anna de Icharay festejará seu orago nos
dias 27 e 28 do corrente, com alguma pompa, dando principio no dia 21, com
uma ladainha na sua capella havendo nessa tarde levantamento do mastro
com painel. (Anúncios, Diário de Notícias , 12 de julho de 1869)
3.1.2.7 Realização do sintagma agentivo
Esse contexto sintático foi proposto a fim de observar se ainda há
agente da passiva nas sentenças com SE-indefinido, e aí termos um caso de
SE-passivo que Martins (2003) chama de “fóssil”. A hipótese, a partir de
Cavalcante (2006 e 2011), é de que os sintagmas agentivos (15a) serão
encontrados apenas nas passivas analíticas. Sendo a sua realização em
sentenças com SE (15b) e (15c) agramatical.
(15)
a) PILULAS DO DoutoR RADWAY
cobertas com gomma assucarada
autorisadas PELA JUNTA DE HYGIENE.
91
Purgam, regularisam, purificam, limpam e fortificam.
PRUSSIA PRUSSIA PRUSSIA
Estas pilulas são unicas adoptadas pela escola de pharmacia da Prussia, e
foram declaradas pelos rhimicos de Sua Majestade prussiana as mais puras
e melhores do mundo, não sendo alsas.
Deposito geral
46 Rua dos Pescadores 46 (Anúncios, Diário de Notícias , 12 de julho de
1869)
b) Comprão-se escravos para encommendas; na rua da Princeza dos
Cajueiros número 100. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de
1881)
c) Ourivesaria Halphen
Para evitar falsificações e usurpações de nome, deve-se exigir os dous
carimbos juntos.
Talheres Alfénide
metal branco prateado
Propriedade exclusiva da Societé des Couverts Alfenid (Anúncios, Jornal do
Commercio , 01 de outubro de 1881)
3.1.2.8 Tipo sintático da oração
Considero
as
seguintes
possibilidades
de
realização:
primeira
coordenada (16a), matriz (16b), absoluta (16c), encaixadas (16d) e segunda
coordenada (16e). As três primeiras formaram um único grupo durante as
rodadas: primeira oração. A hipótese é que em sentenças encaixadas nãofinitas não haverá anteposição do DP-argumento interno das sentenças com
SE-indefinido, genérico ou ambíguo, pois segundo Raposo e Uriagereka
(1996), nessas construções só há uma posição à esquerda do verbo. Assim as
construções com anteposição poderão ocorrer no grupo das matrizes,
absolutas e coordenadas ou nas coordenadas e encaixadas finitas.
(16)
a) Pianosi
Afinão-se [-]i e concertão-se; para chamados, na rua da Uruguayana número
10 e Sete de Setembro número 112 A. (Anúncios, Jornal do Commercio , 01
de outubro de 1881)
b) Em torno delles via-se alguns colxões, dos quaes a maior parte em
pessimo estado, extendidos no chão talvez para seccarem-se das humildades
92
da noite precedente. (Carta de Redator,Correio Commercial, 18 de Junho de
1879)
c) E‟ o orgão perturbador do equilibrio das liberdades collectivas; arrasta a
alavanca que mina o edificio social. Pune-se. (Carta de Redator,Diário de
Notícias, 15 de Março de 1872)
d) Este macaco antes de ser gente já escrevinhava suas obras a fora as de
seu officio isto se sabe pela nota do 3 o N.º em que se menciona algumas
que deu á luz. (Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de 1822)
e) Pianosi
Afinão-se e concertão-se [-]i; para chamados, na rua da Uruguayana número
10 e Sete de Setembro número 112 A. (Anúncios, Jornal do Commercio , 01
de outubro de 1881)
3.1.2.9 Tempo e modo verbal com predicadores simples e complexos
A hipótese para esse contexto é que haverá diferença na interpretação
de gramaticalidade quando houver anteposição do DP argumento interno das
sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo em virtude do predicado
ser episódico ou genérico. Neste contexto, controlamos as seguintes
possibilidades: (17a) presente, (17b) pretérito perfeito, (17c) pretérito mais que
perfeito, (17d) pretérito imperfeito, (17e) futuro, (17f) infinitivo, (17g) gerúndio.
(17)
a) Modas, Chapeosi
A irmã de Madame Valle tem sempre chapéos modernos e elegantes, para
senhoras, de 10$ a 18 $; para crianças, de 4$ a 8$; e chapéos de luto, 12 $.
Lava, enforma e enfeita á moda, desde 6$000.
25 Rua De Gonçalves Dias 25
Leques
Concertão-se [-]i com perfeição e vende a preços baratissimos. (Anúncios,
Jornal do Commercio , 04 de outubro de 1881)
b) TINTA VIOLETA
Esta tinta veio operar uma completa revolução no artigo tintas para escrever.
O consumo extraordinário a que attingiu, é prova sufficiente de que o publico
reconheceu a sua superiridade entre a immensa multidão de tintas que por
ahi se vendem com titulos os mais ou menos pomposos, cuja durabilidade o
tempo não se encarregou de demonstrar, nem seus autores offerecem
garantia alguma por falta de conhecimentos proprios: previne-se, pois, aos
Senhores consumidores que quando tiverem de fazer as suas encommendas,
queiram pedir a LEGITIMA tinta extra-fina Monteiro.
93
Vende-se em todas as livrarias da corte e nas principaes localidades do
Imperio. (Anúncios, Diário de Notícias , 12 de julho de 1869)
c) V. Ex. deve lembrar-se que estamos ao facto de que um pretendente que
outr‟ora derramara seu sangue em defesa do THRONO pedira ao
MONARCHA o lugar de official archivista da secretaria da Guerra, cujo
requerimento fôra entregue pessoalmente ao MONARCHA (Carta de
Redator, O Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853)
d) Ao publico
Domingos Fernando Claro de Almeida, que outr‟ora se assignava Domingos
Claro Fernando de Almeida, faz publica esta declaração pra que não se lhe
continue a dar o nome que já não usa.
Restinga da Gávea, 5 de Outubro de 1881 – domingos Fernando Claro de
Almeida. (Anúncios, Jornal do Commercio , 06 de outubro de 1881)
e) e deixar aos meus sucessores uma recordação gloriosa, quero que mas
tarde leia-se o meu nome gravado em letras de ouro nos livros da litteratura, e
siencia, estou bem certo de que a briosa população desta capital não deixará
sem auxilio nos amigos das artes e defensores da patria digo porque todos os
dias se falla em termos uma guerra com os argentinos, pois bem se realizar
essa guerra não ezitarei em pegar na arma e correr ao encalce do inimigo
ainda mesmo que o meu sangue, tenha de servir-lhe de alimento. (Carta de
Redator, O Extravagante, 09 de Outubro de 1881)
f) Diz mais V. S. que não está de accordo com a nossa linguagem virulenta,
com o nosso modo de pensar e de dizer (Carta de Redator, Diário do Brazil,
08 de Dezembro de 1881)
g) Illm. o e Exm. o Sr.- Tendo o Exm. o Sr. presidente da provincia feito sentir
em seu relatorio do 1. o do corrente á assembléa provincial do Rio de Janeiro
a nessecidade de se elevar á cathegoria de villa o arraial do porto da Estrella,
comprehendendo-se no seu termo as freguezias de Inhomerim, Suruhy,
Guia e Pilar, e uma outra, que muito convêm crear-se hoje em Petropolis com
a invocação de S. Pedro d‟Alcantara, para a matriz da qual consta que S.M. o
Imperador e muitos particulares concorrem com donativos e subscripções
(Carta de Leitor, Diário do Rio de Janeiro, 26 de Março de 1846)
3.1.2.10 Tempo
A hipótese com relação a este fator é de que os resultados não
revelarão uma curva de mudança, mas competição de gramáticas entre o PB, o
PE.
94
3.1.2.11 Gênero textual
A hipótese é de que nos anúncios ocorrerão sentenças com tópico
discursivo que favorecerão os argumentos nulos em sentenças com SEindefinido/genérico (18a). Considero três gêneros textuais: anúncios (18a),
carta de leitor (18b) e carta de redator (18c).
(18)
a) Pianosi
M.N. Moreira Paranhos mudou seu estabelecimento da rua Sete de
Setembro número 68 para a mesma rua número 155 proximo á travessa de
São Francisco, onde aguarda seus amigos e freguezes; vendem-se [-]i,
alugão-se [-]i, trocão-se [-]i, concertão-se [-]i e afinão-se [-]i com toda a
perfeição. (Anúncios, Jornal do Brazil, 4 de setembro de 1891)
b) Asseverão-me que o muito illustre Sr. general Chagas Santos entre outras
reformas importantes que introdusio no quartel general da côrte, mandou que
ão fossem mais empregadas, como ali se usava, obreias verdes e amarellas,
porque S.exa. sympathisa mais om a côr encarnada. Ora, Sr. Redactor, a ser
isto verdade o que eu por ora não creio é preciso submetter á consideração
do digno generalissimo algumas reflexões. (Carta de leitor, O Cidadão, 29 de
Março de 1838)
c) Isto nada importa, mas será mais uma recommendação para o Sr. d.
Pedro II, quando tiver de viajar a custa do erario publico. (Carta de Redator,
Diário do Brasil, 08 de Dezembro de 1881)
3.2 Distribuição geral dos dados.
Foram encontradas 884 sentenças distribuídas conforme mostra a tabela
20. No total, temos 524 objetos diretos, 66 sentenças com SE-reflexivo, 4 com
SE-recíproco, 49 com SE-inerente, 60 passivas analíticas, 24 com SEgenérico, 55 com SE-indefinido e 137 sentenças ambíguas. Os números
obtidos nessa dissertação foram alcançados a partir de rodadas separadas
para cada tipo de construção em que foi observada a posição que o argumento
interno, nos objetos diretos, nas sentenças com SE-indefinido, SE-genérico,
SE-ambíguo e nas passivas analíticas, ou o argumento externo, nas sentenças
95
com SE-reflexivo, SE-recíproco ou SE-inerente, ocupa em relação aos verbos
finitos e não finitos. Vejamos como fica a distribuição geral das sentenças.
SEreflexivo
N-%
SErecíproco
N-%
SEinerente
N-%
Passiva
Analítica
N-%
SEgenérico
N-%
SEindefinido
N-%
SEambíguo
N-%
Objeto
direto
N-%
Antepos
to
Pospost
o
Nulo
31 - 47%
2 - 50%
25 - 51%
40 - 66%
0 - 0%
3 - 5%
12 - 8%
12 - 2%
8 - 12%
0 - 0%
6 - 12%
5 -8%
16 – 75%
31 - 56%
95 – 69%
437 - 83%
27 - 41%
2 - 50%
18 - 36%
15 - 26%
6 – 25%
21 - 38%
30 – 23%
75 - 15%
Total
66
4
49
60
22
55
137
524
Tabela 18: Realização do argumento (interno ou externo) por construção (sentenças
finitas e infinitivas)
Na primeira observação, podemos notar que há um leque maior de
construções com SE do que aquele mencionado pela tradição gramatical. Esse
maior de número de sentenças com SE, em parte defendido por Duarte (2003),
está relacionado a uma distinção das ditas construções com SE-reflexivo.
Como visto no primeiro capítulo, a separação em SE-reflexivo (19a), SErecíproco (19b) e SE-inerente (19c) tem relação com o tipo de referente do
clítico e com o redobro possível para este, mas não há nenhum critério
estritamente sintático, capaz de justificar essa distribuição.
(19)
a) Uma pessoa bastante habilitada encarrega-se de tratar questões forenses,
policiaes e particulares nesta Capital, e , bem assim, legalisa com brevidade e
por diminuta retribuição os papeis necessarios para enlaces matrimoniaes no
civil, e no religioso. Cartas nesta redacção a E. M. (Anúncios, O Jacobino, 8
de agosto de 1896)
b) meu amigo, as minhas licenças eu as dou a um guarda da camara para as
tirar, porque só assim fico descançado de multas e outros incommodos,
embora pague por cada uma 3 ou 4 $ rs., porque elles lá se entendem uns
com os outros; (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de
1850)
c) porque os homens honestos se envergonhão de ler tantas sandices, que
desacreditão o Brasil !!! (Carta de Redator, O Brasileiro Imparcial, 27 de Abril
de 1830)
96
A análise da ordem do argumento externo dessas sentenças, o sujeito,
mostra que sintaticamente em relação a este fator não há diferença na ordem
dos constituintes, ou seja, o que importa é que o sujeito majoritariamente,
independente da construção, fica a direita do verbo finito ou não finito.
Cavalcante (2011a) também faz menção a separação das construções com
SE-reflexivo, recíproco e inerente, acrescentando o SE-ergativo, que também
encontrei em um único dado, (20), entretanto a autora observando que os
resultados em relação a ordem do sujeito nessas sentenças se mostram
simétricos ao longo dos séculos no Português Clássico e Português Europeu,
opta por tratá-las como sentenças ativas com SE.
(20)
Tenho a honra de comprimentar os nossos colegas da imprensa os Illms.
Snrs. redactores da muito conseituada folha o Espectador e a grande
satisfação de declarar ao publico que abrirão-se hoje as portas do abysmo
para receber com glorias e cainhos mas um vulto do genero jornalistico
intitulado o Estravagante, vulto pouco visivel é certo porem digno de attenção
e merecimento visto ser o seu único fim horar a infancia e cultivar as artes.
Sinto deveras que a minha mesquinha e acanhada intelligencia, (Carta de
Redator,O Extravagante, 09 de Outubro de 1881)
Os resultados apresentados na tabela 20 mostram que, no PB, também
não há diferença e a preferência pela anteposição é categórica nessas
construções com índices respectivos de: 47% para as sentenças com SEreflexivo, 50% nas sentenças com SE-recíproco e 51% naquelas que
apresentam SE-inerente. Em virtude dessa disposição, opto por unir essas três
construções e tratá-las unicamente como sentenças com SE-reflexivo.
Há também na tabela 20 outros três grupos de sentenças com SE: SEindefinido (21a) e SE-genérico (21b) e SE-ambíguo (21c). Nessas construções,
ao contrário do grupo mencionado acima, há uma diferença sintática na medida
em que, para Raposo e Uriagereka (1996), o DP-argumento interno das
97
sentenças com SE-indefinido é o objeto da oração e recebe caso nominativo,
por isso concorda com o verbo. Nas construções com SE-genérico, o DPargumento interno também é o objeto da oração, mas neste caso recebe
acusativo e por isso não há o estabelecimento de uma relação de
concordância. Nas sentenças com SE-ambíguo, a discussão é se o DP recebe
caso nominativo ou acusativo.
(21)
a) Alugão-se, em casa de familia, quartos independentes, mobiliados; na
travessa de São Francisco de Paula, número 6. (Anúncios, Jornal do
Commercio, 01 de outubro de 1881)
b) Ourivesaria Halphen
Para evitar falsificações e usurpações de nome, deve-se exigir os dous
carimbos juntos.
Talheres Alfénide
metal branco prateado
Propriedade exclusiva da Societé des Couverts Alfenide (Anúncios, Jornal do
Commercio, 01 de outubro de 1881)
c) Tijuca|Aluga-se ou vende-se, por modico preço, o chalet do Alto da Boa
Vista número 16; as chaves estão no mesmo, e trata-se na rua do Ouvidor
número 79.(Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881)
Apesar de na análise de Raposo e Uriagereka (1996), nos três tipos de
sentenças apontar que o DP-argumento interno deve ser tratado como objeto
direto o que me permitiria juntá-los num único grupo, opto por deixar esses três
tipos de SE separados para poder tratar estatisticamente melhor os dados
referentes a cada um deles.
A tabela 19 traz a distribuição geral das construções analisadas:
SE-reflexivo
SEgenérico
N-%
SEindefinido
N-%
SE-ambíguo
Objeto direto
N-%
Passiva
Analítica
N-%
N-%
N-%
Anteposto
58 – 49%
40 - 66%
0 - 0%
3 - 5%
12 - 8%
12 - 2%
Posposto
14 – 9%
5 -8%
16 – 75%
31 - 57%
95 – 69%
437 - 83%
Nulo
47 – 42%
15 - 26%
6 – 25%
21 - 38%
30 – 23%
75 - 15%
Total
119
60
22
55
137
524
Tabela 19: A nova distribuição geral dos dados em sentenças finitas e não finitas.
98
A distribuição geral apresentada acima retrata todas as construções sem
separar as sentenças finitas e não finitas, entretanto nessa dissertação a
análise seguirá sempre de modo a compará-las. Portanto, inicio, na próxima
seção, a análise quantitativa dos dados considerando os contextos sintáticos
controlados, sempre expondo primeiramente os resultados referentes às
sentenças finitas e em seguidas os das não-finitas.
3.3 O DP das sentenças com SE que apresentam verbo transitivo direto:
sujeito ou objeto?
Esta seção está dividida em três partes: (1) apresentação geral dos
resultados; (2) a ordem dos constituintes ao longo do século XIX; e (3) a
distribuição, ao longo do tempo, do argumento nulo. Vejamos como ficou a
distribuição nas sentenças finitas e não finitas à luz das hipóteses levantadas, a
partir, inicialmente, da argumentação referente às tabelas 22 e 23.
Anteposto
Posposto
Nulo
Total
SEreflexivo
N-%
52 - 57%
10 - 11%
29 - 32%
91
Passiva
SE-genérico
SE-indefinido
N-%
40 - 67%
5 - 8%
15 - 25%
60
N-%
0 - 0%
16 – 73%
6 - 27%
22
N-%
3 – 5%
32 – 58%
20 – 36%
55
SEambíguo
N-%
12 -11%
75 -68%
23 – 21%
110
Objeto direto
N-%
11 - 2%
388 - 85%
57 - 13%
456
828
Tabela 20: A distribuição geral nas sentenças finitas.
N-%
SEgenérico
N -%
SEindefinido
N-%
6 - 21%
0 - 0%
0 – 0%
Posposto
4 - 14%
0 - 0%
Nulo
18 - 64%
Total
28
SE-reflexivo
Passiva
SE-ambíguo
Objeto direto
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 – 0%
0 - 0%
1 - 1%
0 – 0%
0 – 0%
20 - 74%
49 - 72%
0 - 0%
0 – 0%
0 – 0%
7 - 26%
18 - 27%
0
0
0
27
68
123
Tabela 21: A distribuição geral nas sentenças não finitas
99
À primeira vista podemos perceber que se formam dois grupos distintos
nos dados analisados, independente do verbo estar na forma finita ou não
finita. O primeiro deles, em que predomina a anteposição, é composto pelas
sentenças com SE-reflexivo e passivas. O segundo é formado pelos objetos
diretos e pelas sentenças com SE-genérico, indefinido ou ambíguo, nesses,
prototipicamente, o argumento interno fica posposto ao verbo finito e não finito.
Esse comportamento corrobora a hipótese inicial dessa dissertação de
que as construções com SE-indefinido, genérico ou ambíguo apresentariam um
padrão de ordem simétrico ao observado nos objetos diretos. Enquanto que as
sentenças com SE-reflexivo e passivas analíticas teriam um padrão de ordem
semelhante entre si. Isto porque por hipótese o DP-argumento interno das
sentenças com SE-indefinido, genérico e ambíguo é o objeto da oração. Este
resultado também foi encontrado por Cavalcante e Paixão de Sousa (2010),
Cavalcante (2011a; 2011b): trabalhos que observaram a ordem do DP das
construções com SE em textos de autores portugueses nascidos entre os
séculos XVI e XIX. Este comportamento nos leva a questionar a função
sintática do argumento interno das construções com SE. Para as autoras, a
sintaxe dessas construções não permite que o argumento interno seja o sujeito
da oração, especialmente a partir do século XVIII quando emerge a gramática
do PE. Antes, porém, no Português Clássico, construções em que esse DPargumento interno exercia a função de sujeito eram possíveis ainda que
fossem fósseis de outra gramática: o Português Arcaico.
Nesse sentido, os resultados das tabelas 22 e 23 são mais um indício do
que os trabalhos supracitados já indicavam, visto que se as análises das
autoras acima compreendiam textos do Português Clássico e do Português
100
Europeu, os dados dessa dissertação compreendem textos do PB, já que
seguindo a periodização de Galves, Namiutti e Paixão de Sousa (2005) que
adoto, a emergência do PB teria ocorrido no século XVIII.
Cavalcante (2011a)
menciona o fato de que os resultados não indicam uma mudança no estatuto
das sentenças com SE, mas revelam um padrão de ordem que evidência a
mudança na posição do sujeito que caracteriza a emergência do PE, frente ao
Português Clássico. Observemos como se dá a distribuição da anteposição e
da posposição nos seis tipos de estrutura analisados ao longo do século XIX:
1808-1840
1841-1870
1871-1900
N-%
N-%
N-%
Anteposto
15 - 78%
22 - 96%
15 - 75%
Posposto
4 - 22%
1 - 4%
5 - 25%
19
23
20
N-%
N-%
N-%
Anteposto
4 - 80%
29 - 91%
7 - 88%
Posposto
1 - 20%
3 - 9%
1 - 12%
5
32
8
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 – 0%
0 – 0%
0 – 0%
Posposto
5 – 100%
3 – 100%
8 – 100%
5
3
8
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 – 0%
2 – 50%
1 – 4%
Posposto
3 – 100%
2 -50%
27 – 96%
3
4
28
SE-ambíguo
N-%
N-%
N-%
Anteposto
2 - 9%
6 - 16%
4 - 16%
Posposto
21 - 91%
32 - 84%
21 - 84%
23
38
25
Objeto direto
N-%
N-%
N-%
Anteposto
1 - 1%
5 - 3%
5 - 4%
Posposto
115 - 99%
159 - 97%
114 - 96%
116
164
119
SE-reflexivo
Total
Passiva
Total
SE-genérico
Total
SE-indefinido
Total
Total
Total
62
45
16
35
86
399
Tabela 22: Anteposição x posposição ao longo do tempo por tipo de estruturas nas
sentenças finitas
101
A tabela 22 comprova que ao longo do século XIX considerando apenas
a anteposição e a posposição dos DPs argumentos externos ou internos, há
uma nítida distinção, novamente, entre as construções passivas analíticas e
com SE-reflexivo se comparada aos objetos diretos e as construções com SE.
Abaixo apresento o gráfico 6, em que o valor de aplicação é anteposição, com
os mesmos resultados da tabela acima, a fim de tornar mais claros os
resultados.
100%
96%
91%
90%
80%
80%
78%
88%
75%
70%
60%
50%
50%
40%
30%
20%
16%
10%
9%
0%
1%
0%
1808-1840
SE-reflexivo
SE-indefinido
3%
0%
1841-1870
Passiva
SE-ambíguo
16%
4%
0%
1871-1900
SE-genérico
Objeto direto
Gráfico 6: A anteposição ao longo do tempo por tipo de construção em sentenças finitas.
O gráfico 6 representa os resultados encontrados na tabela 24 indicando
que a variação na frequência de uso da anteposição nas construções com SE
em relação às sentenças com SE-reflexivos e passivas analíticas é muito alta.
No primeiro grupo, o maior índice alcançado pela anteposição é 50%. No
segundo grupo, apesar de ambos apresentarem uma queda na frequência de
102
uso dos DPs antepostos na passagem da segunda para a terceira fase, isto
não implica na maior frequência da posposição.
Em especial, quero observar o índice de 50% de anteposição na
segunda fase das construções com SE-indefinido, assim como o índice de 16%
de anteposição nas sentenças com SE-ambíguo.
O que podemos pensar em conjunto observando a tabela 24 e o gráfico
6 é que frente as análises que consideram serem as construções com SE, que
apresentam concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento interno
plural, passivas, a análise de Raposo e Uriagereka (1996) parece se sustentar
tanto no PB quanto no PE à medida que os resultados indicam ser o DP
dessas construções um argumento interno que tende a aparecer posposto ao
verbo finito, tal como um objeto direto.
Além disso, outro fator que parece influenciar a anteposição do DP nas
construções com SE-ambíguo ou indefinido é o seu estatuto informacional:
observando o exemplo em (22), percebemos que se trata de um tópico
contrastivo, o que favorece a sua posição pré-verbal:.
(22)
a) Marjolin só estabelece uma excepção á esta regra para as feridas da
cabeça e dos dedos; mas Follin na sua pathologia, recentemente publicada,
diz que nada se deve temer da reunião immedita das feridas contusas, uma
vez que se vigie com attenção a parte lesada e se renove todos os dias o
curativo. (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de
1864)
Se tal escandalo se observa na rua mais frequentada da Corte do Brasil, por
onde passeão a nossa aristocracia, as nossas bellesas, os nossos fidalgos de
chelpa!!! o que não irá pelos outros arrabaldes? Eu lho digo. (Carta de Leitor,
O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de 1850)
103
Sobre o estatuto informacional, tratarei especificamente na seção 3.4
quando mostrarei que corroborando os resultados de Berlinck (1997) nem tudo
o que é posposto é novo.
Com relação às sentenças não-finitas, encontramos o mesmo tipo de
padrão de ordem observado nas sentenças finitas, ou seja, quando há SEreflexivo prevalece a anteposição, sendo a posposição majoritária nos objetos
diretos e nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo.
1808-1840
1841-1870
1871-1900
N-%
N-%
N-%
Anteposto
1 - 33%
2 - 100%
3 - 60%
Posposto
2 - 67%
0 - 0%
2 - 40%
Total
3
2
5
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 - 0%
0 - 0%
0 - 0%
Posposto
1 - 100%
11 - 100%
8 - 100%
Total
1
11
8
N-%
N-%
N-%
Anteposto
1 - 4%
0 - 0%
0 - 0%
Posposto
20 - 96%
21 - 100%
8 - 100%
Total
21
21
8
SE-reflexivo
SE-ambíguo
Objeto direto
10
20
50
Tabela 23: As sentenças não finitas ao longo do tempo por tipo de estrutura
Ao contrário das finitas em que foram encontrados dados de DP
anteposto nas sentenças com SE-indefinido e ambíguo, não houve nas nãofinitas evidências da presença de construções com DP anteposto, talvez em
virtude da baixa quantidade de dados. Nessas sentenças, não houve dados de
passiva analítica nem de construções com SE-indefinido ou genérico. Chama a
atenção na verdade, que nos DPs argumento interno considerados haja
apenas 1 caso de anteposição. É interessante observarmos em que tipo de
oração essa construção ocorre visto que para Raposo e Uriagereka, conforme
104
exposto no primeiro capítulo, não há duas posições à esquerda dos verbos não
finitos em sentenças encaixadas.
Para
Kroch
(1989),
construções
independentes
sintaticamente
apresentam padrões estatísticos independentes, é exatamente este o
comportamento que encontramos na amostra dessa dissertação e também já
apresentado por Cavalcante (2006, 2011a, 2011b), Cavalcante e Paixão de
Sousa
(2010),
pois
“as
construções
com
SE-indefinido/genérico
não
apresentam um comportamento estatístico semelhante às construções que
envolvem sujeito” (Cavalcante, 2011b).
Visto como se dá o padrão de anteposição e da posposição nos seis
tipos de sentenças em análise, é preciso ainda tecer considerações acerca das
sentenças com argumento nulo, mantendo a hipótese inicial de que os objetos
diretos e as sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo apresentarão
comportamento semelhante enquanto que sentenças com SE-reflexivo e
passivas analíticas constituirão novamente um grupo destacado. Vejamos
então os resultados, iniciando a argumentação pela tabela 23 em que
apresento os resultados acerca dos argumentos nulos ao longo do tempo. No
gráfico 7, a oposição é feita em relação a argumentos plenos e nulos, sendo o
valor de aplicação o argumento nulo:
SE-reflexivo
Nulo
Pleno
Total
Passivas
Nulo
Pleno
Total
SE-genérico
Nulo
Pleno
Total
1808-1840
N-%
10 - 33%
20 - 67%
30
N-%
0 - 0%
5 - 100%
5
N-%
2 - 29%
5 - 71%
7
1841-1870
N-%
6 - 19%
23 - 81%
29
N-%
13 - 29%
32 – 71%
45
N-%
0 - 0%
3 - 100%
3
1871-1900
N-%
13 - 36%
26 - 64%
39
N-%
2 - 20%
8 - 80%
10
N-%
4 - 33%
8 - 67%
12
88
60
22
105
SE-indefinido
Nulo
Pleno
Total
SE-ambíguo
Nulo
Pleno
Total
Objeto direto
Nulo
Pleno
Total
N-%
1 - 8%
11 - 92%
12
N-%
3 - 12%
23 - 88%
26
N-%
13 - 10%
116 - 90%
129
N-%
3 - 18%
14 - 82%
17
N-%
10 - 29%
25 - 71%
35
N-%
23 - 12%
164 - 88%
187
N-%
16 - 29%
40 - 71%
56
N-%
10 - 21%
39 - 79%
49
N-%
21 - 15%
119 - 85%
140
85
110
456
Tabela 24: O argumento nulo nas sentenças finitas
A tabela 24 mostra que nos objetos diretos e nas sentenças com SEindefinido, genérico ou ambíguo há aumento da frequência de uso do
argumento nulo, como podemos observar também no gráfico 7 em que o valor
de aplicação é também o argumento nulo.
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
33%
29%
20%
10%
0%
12%
10%
8%
0%
1808-1840
36%
33%
29%
21%
20%
15%
29%
19%
18%
12%
0%
1841-1870
1871-1900
SE-reflexivo
Passiva
SE-genérico
SE-indefinido
SE-ambíguo
Objeto direto
Gráfico 7: O argumento nulo nas sentenças finitas
Passemos a tratar do argumento nulo nas sentenças não finitas.
Observemos o gráfico abaixo:
106
Gráfico 8: O argumento nulo nas sentenças não finitas
Nas sentenças não finitas, os resultados do gráfico acima indicam que a
mudança parece ter se processado um pouco antes do que ocorre nas
sentenças finitas, visto que na última fase do século XIX, os índices de objeto
nulo já se aproximam dos 50%. De modo inverso, a curva das sentenças com
SE-reflexivo assume um percurso descendente e encontra-se com a de objeto
direto. A linha que representa as sentenças com SE-ambíguo também assume
uma curva ascendente se comportando tal qual o objeto direto.
Observando os resultados referentes à anteposição x posposição e ao
argumento nulo nos seis tipos de construções em sentenças finitas e nãofinitas analisadas se evidencia um comportamento que indica duas mudanças
que caracterizam, segundo Tarallo (1993), a emergência do PB: no parâmetro
do sujeito nulo e no parâmetro do objeto nulo.
A mudança na marcação do valor do parâmetro do sujeito nulo tem
relação com a queda na frequência de uso de sujeito nulo no PB, a que se
realiza no parâmetro do objeto nulo é a operação inversa, ou seja, o aumento
107
na frequência de uso do objeto nulo. Os resultados, portanto, até a presente
seção indicam ser o DP-argumento interno das sentenças com SE que têm
verbo transitivo direto e concordância, bem como o daquelas que não
apresentam concordância, e também os das classificadas como ambíguas, um
objeto direto e não o sujeito da oração.
Vejamos como o estatuto informacional atua nos poucos dados em que
há anteposição do DP-argumento interno das sentenças com SE-indefinido ou
ambíguo e ainda nas sentenças com SE-reflexivo e passiva analíticas quando
o DP está posposto aos verbos finitos e não finitos.
3.4 O estatuto informacional e a ordem dos constituintes
Conforme apresentado no primeiro capítulo, pesquisas como as de
Paixão de Sousa (2004), Berlinck (1989), Haward (2004) têm apontado para o
fato de que por vezes, o estatuto informacional pode ser um fator capaz de
antepor ou pospor determinado constituinte. A hipótese dos trabalhos acima é
que as informações novas tendem a ser codificadas no final da sentença,
assim como os sintagmas pesados, enquanto que as informações dadas
tendem a ser expostas no inicio de cada oração. Vejamos o que ocorre nas
sentenças com SE-indefinido/ambíguo em que há anteposição a partir das
tabelas 25 e 26, bem como nas sentenças com SE-genérico em que há apenas
DPs pospostos.
108
Anteposto
Posposto
N-%
N-%
Sintagma nominal simples
7 - 8%
84 - 92%
Sintagma nominal composto
2 - 12%
14 - 88%
Pronome indefinido
6 - 37%
10 - 63%
Oração
0 - 0%
13 - 100%
Total
15
121
136
Tabela 25: Anteposição x Posposição nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou
ambíguo finitas por tipo de sintagma.
Anteposto
Posposto
N-%
N-%
Sintagma nominal simples
0 - 0%
16 - 100%
Sintagma nominal composto
0 - 0%
0 - 0%
Pronome indefinido
0 - 0%
0 - 0%
Oração
0 - 0%
3 - 100%
Total
0
19
19
Tabela 26: Anteposição x Posposição nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou
ambíguo não finitas por tipo de sintagma.
Os resultados evidenciam que nesses três tipos de sentenças
independente de haver um sintagma pesado a ordem preferencial é a
posposição. Foram encontradas 13 sentenças com sintagma oracional em
finitas e 3 em não finitas que se caracteriza como um sintagma pesado.
Vejamos alguns exemplos:
(23)
a) Portanto, V. Ex. tem abusado completamente da sua jurisdição, está
sacrificando o MONARCHA, o qual por não ter ao seu lado quem lhe faça ver
os desvaneios de V. Ex. e de seus collegas ministros, por isso são
conservados em despeito a opinião publica; porém recorde-se que temos o
bastante coragem de chaegarmos ante os degraos do THRONO e dizermos
ao MONARCHA – “SENHOR os ministros de V.M.I. arrede de S.I. esses
TRAIDORES: (Carta de Redator, O Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853)
b) Sabe-se perfeitamente que esse trabalho é uma mentira, porquanto os
fornecedores que quasi sempre moram para os lados de Nitheroy não acham
dificuldade em obter cousa ue pareça servir. (Carta de Redator, Echo Social,
08 de Março de 1879)
c) A voz publica geralmente accusa á Palhares por ter desfraudado a fasenda
publica na venda de pistolas, sapatos, correames para o arcenal de guerra
sendo estes generos de pessima qualidade, bem como tendo mandado
baetilha por casemira & quando na administração de um de seus
antecessores prohibiu-se que o arsenal comparsse genero algum na casa de
Lourenço & Comp.ª, e além disto foi o mesmo mandado processar,entretanto
V.Ex.ª consente que o Palhares continue a defraudar a fazenda publica com
109
um escandalo innaudito. (Carta de Redator, O Guerreiro, 04 de Março de
1853)
Ao mesmo tempo, nos sintagmas nominais, em 84 sentenças finitas, que
equivalem a 92% dos SNs, há posposição do DP argumento interno.
Observemos se estes DPs correspondem, em geral, a informações novas ou
dadas. Vejamos alguns exemplos em (24)
(24)
a) Quando se prohibe a existencia das casas de tavolagem como nocivas ás
fortunas, também se deve prohibir a existencia d‟esse genero de agenciar o
dinheiro alheio sem fazer correr subscripção. (Carta de Redator, Echo Social,
08 de Março de 1879)
b) Macaco humanisado tem de Camões. Diz elle, que El-Rey veio ao Brasil
Por mares nunca d‟antes navegados! Que tal Sr. Redactor! não lhe parece
rasgo de mestre? nem a martello alli se encaixava melhor aquelle verso!
(Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de 1822)
c) A esses homens humanos, só nas formas, deram-se espadas, deram-se
fardas, para com o titulo de agentes da segurança publica fiscalisarem e
velarem pela segurança e bem estar do povo. (Carta de Leitor,O Lazarista, 28
de outubro de 1875)
d) Comprão-se carroças, animaes e arreios; na rua do Rosario número 142,
escriptorio (Anúncios, Jornal do Commercio, 05 de outubro de 1881)
e) Comprão-se moveis e cautelas de penhor, na rua Sete de Setembro,
número 89. (Anúncios, Jornal do Commercio, 05 de outubro de 1881)
Nas sentenças (24a) e (24b), os DPs argumentos internos pospostos aos
respectivos verbos finitos são informações dadas. Em (24a), a presença do
pronome indefinido “esse” indica que há um caráter anafórico no DP “a
existência desse gênero de agenciar o dinheiro alheio” correferente a
„existência das casas de tavolagem”. Do mesmo modo, em (24b), “aquele
verso” é uma referência anafórica a “por mares nunca d‟antes navegados!”.
Para Haward (2004), sintagmas longos como o exposto em (24a) podem fazer
com que a posposição seja preferencial ainda que a informação seja dada.
110
Já nas sentenças (24c), (24d) e (24e), todas as informações são novas.
Segundo Haward (2004), em sentenças com SE que apresentam verbo
transitivo direto concordando com o predicador, em geral, na análise de uma
amostra de jornais do século XXI, o argumento interno é uma informação nova,
mas mesmo quando há informação dada, esta tende a ser posposta.
É importante mencionar que não foi feito um controle estatístico para
saber o estatuto informacional dos DP sintagmas nominais nessa dissertação,
o que podemos observar é que, em geral, principalmente, nos anúncios as
informações contidas nos argumentos internos são novas, vejamos mais
alguns exemplos em (25):
(25)
a) Vendem-se machinas de costura Singer e outras, a dinheiro e a
prestações de 5$ a 10$, e alugão-se por pequenos alugueis; na rua Larga de
São Joaquim número 116. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de
1881)
b) Comprão-se moveis, pianos, etc., paga-se bem; na rua da Alfandega
número 157, sobrado (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de
1881)
Quanto as informações dadas, na tabela 27, há 15 dados de DP
anteposto. Vejamos todos eles a fim de evidenciarmos o estatuto informacional.
Para facilitar a análise, tratarei primeiro dos exemplos em que há pronome
indefinido/ demonstrativo e posteriormente dois dados em que a anteposição
ocorre com um sintagma nominal. Observemos os exemplos em (26):
(26)
a Marjolin só estabelece uma excepção á esta regra para as feridas da
cabeça e dos dedos; mas Follin na sua pathologia, recentemente publicada,
diz que nada [se deve temer] da reunião immedita das feridas contusas, uma
vez que se vigie com attenção a parte lesada e se renove todos os dias o
curativo. (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de
1864)
111
b) Nada [se tem feito] nesse sentido e nem ao menos preparar as cousas de
modo a evitar um cataclismo na principal fonte de riqueza do paiz.(Carta de
Leitor,Jornal de Notícias, 26 de Novembro de 1875)
a) Este macaco antes de ser gente já escrevinhava suas obras a fora as de
seu officio isto se sabe pela nota do 3 o N.º em que se menciona algumas
que deu á luz. (Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de 1822)
b) Succedem-se um a outros, cada qual com as melhores promessas cada
qual offerecendo a melhor vontade e esperança, mas ao realisar essas
promessas, alias necessidades urgentissimas do paiz, tudo se esvae em
sonhos, em discursos ephemeros que de nada valem, em mentira social
enfim, que leva o desanimo ao coração do operario e indignação á sua alma
ao ver-se mais uma vez enganado.(Carta de Leitor,Jornal de Notícias, 26 de
Novembro de 1875)
c) Tudo se adia, tudo deixa-se para depois, e passa-se o tempo, e as
grandes questões do estado ficam cada vez em peiores condições, até que
venha a morte fazer impossível todo e qualquer remédio (Carta de
Leitor,Jornal de Notícias, 26 de Novembro de 1875)
d) Tudo se adia, tudo deixa-se para depois, e passa-se o tempo, e as
grandes questões do estado ficam cada vez em peiores condições, até que
venha a morte fazer impossível todo e qualquer remédio (Carta de Leitor,
Jornal de Notícias, 26 de Novembro de 1875)
As sentenças em (26) apresentam sempre um DP anteposto a verbos
finitos de modo que são sempre informações velhas caracterizadas pelo uso de
um pronome indefinido, nessas sentenças não está em evidência a ordem não
marcada para a posição do sujeito, mas sim o sentido potencial. E isto pode ser
comprovado pela possibilidade de se parafraseá-las da seguinte forma: tudo é
deixado para depois/ tudo é deixável, tudo é adiado/ tudo é adiável.
No que concerne aos sintagmas nominais antepostos, podemos verificar
que, em geral, há um foco contrastivo que favorece a anteposição dos SNs. Em
(27a) e (27b) há um determinante indefinido que favorece a anteposição por se
tratar de um pronome que marca que estas são informações já dadas no
discurso. Nas sentenças em (27c) e (27d), há um sintagma nominal após o
112
pronome relativo. Por fim, em (27e), (27f) e (27g), (27h) e (27i) há um foco
contrastivo que permite a anteposição dos SNs argumentos internos.
(28)
a) Se tal escandalo se observa na rua mais frequentada da Corte do Brasil,
por onde passeão a nossa aristocracia, as nossas bellesas, os nossos
fidalgos de chelpa!!! o que não irá pelos outros arrabaldes? Eu lho digo.
(Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de 1850)
b) O Brigadeiro Cunha homem de muita reconhecida probidade, e com quem
servimos, morreu pobre, deixando apenas um nome a prosperidade, e a seus
filhos por herdeiros desse mesmo nome, de uns pergaminhos de nobreza
adquiridos uns por si, e outros de seus maiores, e o Cunha Mattos seu filho
tem na verdade manchado as cinzas desse Illuste General, e completamente
desmentido o antigo proverbio de um tal pai, um tal filho se esperava. (Carta
de Redator, O Guerreiro, 04 de Março de 1853)
c) Decretaram a emancipação do elementeo servil, mas onde estão as
medidas reparadoras desses braços arrancadas á lavoura, e cuja falta já se
começa a sentir? (Carta de Leitor, Jornal de Notícias, 26 de Novembro de
1875)
d) Compareceu um dos redactores do Jornal, o qual depois de contar a seu
geito a historia da polemica concluiu: o Jornal foi provocado; nas palavras
cuja explicação se pede, nem ha calumnia nem injuria; não damos outra
explicação.Instei por intervenção do meu advogado, que não estando
saptisfeito o quesito para que fôra feita a intimação, pois que não estava
declarado si se afirmava, que dobrando me eu á vontade de alguem tinha
estabelecido o preço do café em mais do que devia, necessario era uma
resposta terminante n‟este sentido; e mandando o juiz que me fosse
respondido, a resposta tornou a ser a mesma:o Jornal foi procurado, e como
nem ha calumnia nem injuria, não damos outra alguma explicação.E por mais
que fosse instado i redactor do Jornal, declarou, que nada mais respondia, e
com effeito mudo ficou. (Carta de Leitor, O Diário do Rio de Janeiro, 26 de
Março de 1846)
e) As mesmas inconveniencias, o mesmo furor em me attacar notão-se nos
dois escriptos, construídos de maneira que sobresahem as insinuações, que
eu não sei tratar as feridas, que ignoro e modo porque obrão os corpos
contundentes, que sou ilogico etc, etc. Parece, Sr. presidente, que a cortezia
vai fugindo desta casa. (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1
de Janeiro de 1864)
f) ESPECTACULOS
THETRO LYRICO FLUMINENSE
COMPANHIA HESPANHOLA DE RZUELA
DIRIGIDA POR Dom THOMAZ GALVAN
113
HOJE
TERÇA-FEIRA 16 DE JULHO
Recita extraordinariamente em beneficio de HENRIQUETA QUINTANA
Depois que a orchestra tiver executadoa sumphonia do estylo, subirá á scena
a linda zarzuela em 2 actos, original do sr.Serra, musica do maestro rogel
intitulada
AS AMAZONAS DO TORMES
CORO GERAL
Dará principio a linda zarzuela em 1 acto, intitulada.
UM PLEITO
Tomam parte os senhores Villanova, Barcena, Villareal e as sras. Pelaez e
Barredas.
Ás 7 ½ horas.
Os bilhetes de camarotes e cadeiras vendem-se por especial obséquio em
casa dos senhores Castellões, rua do Ouvidor número 116, e Aurelio, largo
de São Francisco de Paula. (Anúncios, Diário de Notícias, 16 de julho de
1869)
g) Feridas
Antigas ou recentes, cancros venereos, frieiras e suores fetidos dos pés
curam-se com os Pós americanos Pacheco & Abreu.
Deposito, Rua da Lapa número 24 (Anúncios, A Bomba, 15 de setembro de
1894)
h) A obra já annunciada das Observações sobre o Commercio Franco no
Brazil. Parte I. e II. vende-se a 640 reis em brochura, e 800 sendo em papel
de Olanda, nas Cazas de Manoel Jorge da Silva, Livreiro, na rua do Rozario,
e de Paulo Martim, Filho, Mercador de Livros, na rua da Quitanda. (Anúncios,
Gazeta do Rio de Janeiro, 15 de outubro de 1808)
i) Lisboa Hotel
Esta casa recommenda-se ao respeitavel publico pelo asseio, promptidão e
preçps, tanto do serviço de mesa como em todas as bebidas que déllas se
sirvam os seus freguezes. (Anúncios, O Caixeiro, 23 de abril de 1899)
Mas a anteposição do DP argumento interno das sentenças com SEindefinido ou ambíguo não é prototípica nem mesmo quando a informação é
dada. Abaixo estão transcritos dados como (28a) e (28b) em que podemos
encontrar casos de DP-posposto com informação dada. Assim, verificamos que
as informações dadas favorecem a anteposição, mas não a tornam categórica.
(28)
a) Quando se prohibe a existencia das casas de tavolagem como nocivas ás
fortunas, também se deve prohibir a existencia d‟esse genero de agenciar o
dinheiro alheio sem fazer correr subscripção. (Carta de Redator, Echo Social,
08 de Março de 1879)
114
b) Macaco humanisado tem de Camões. Diz elle, que El-Rey veio ao Brasil
Por mares nunca d‟antes navegados! Que tal Sr. Redactor! não lhe parece
rasgo de mestre? nem a martello alli se encaixava melhor aquelle verso!
(Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de 1822)
Nas sentenças com SE-reflexivo o comportamento é exatamente o
contrário do observado nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou
ambíguo. Como visto nas seções anteriores, a anteposição é preferencial e ao
estatuto informacional cabe a função de por vezes pospor as informações
novas e ainda os sintagmas longos. Observemos as tabelas 27 e 28 em que
apresento a anteposição x posposição nas sentenças com SE-reflexivo em
relação ao tipo de sintagma:
Sintagma nominal simples
Sintagma nominal composto
Pronome indefinido
Pronome pessoal do caso
reto
Total
Anteposto
N
%
42
76%
0
0%
5
83%
Posposto
N
%
13
24%
0
0%
1
17%
7
1
54
88%
12%
15
69
Tabela 27: Anteposição x Posposição nas sentenças finitas com SE-reflexivo por tipo de
sintagma.
Sintagma nominal simples
Sintagma nominal composto
Pronome indefinido
Pronome pessoal do caso reto
Total
Anteposto
N
%
6
60%
0
0%
0
0%
0
0%
6
Posposto
N
%
4
40%
0
0%
0
0%
0
0%
4
10
Tabela 28: Anteposição x Posposição nas sentenças não finitas com SE-reflexivo por
tipo de sintagma.
Percebemos com as tabelas 27 e 28 que a posposição nas sentenças
com SE-reflexivos ocorre majoritariamente com os sintagmas nominais. Não há
casos de sintagmas oracionais e existem dois dados em que a informação
dada na forma de um pronome foi codificada à direito do verbo finito. Nas
115
sentenças com verbo não finito, não há outro tipo de DP posposto que não seja
um sintagma nominal simples. Vejamos primeiro, a partir de (29), (30) e (31),
em que contextos os SNs podem ser pospostos.
(29)
a) Ha factos n‟esta sociedade, a que o homem não póde assistir, sem que o
coração se lhe confranja encarando o estado de miseravel degradação, a que
se vê reduzido um certo número de creaturas, dotadas, como nós, é verdade
de uma alma capaz de raciocinar, de um coração capaz de sentir, mas cuja
alma não raciocina, embrutecida pela ignorancia; cujo coração não sente,pelo
menos moralmente, por se achar endurecido, embotado aos soffrimentos da
vida, pelo trabalho rude pelas dôres continuas, pela mizeria atroz que os vai
corroendo! (Carta de Redator, Correio Commercial, 18 de Junho de 1879)
b) No entanto, emquanto estas pobres victimas da sua má sorte, soffrem as
mais atrozes necessidades, repotreia-se, em macios coxins, S. Ex.o
Sr.Ministro da Agricultura sem se quer em um momento de ocio lançar os
olhos sobre tanta desgraça! (Carta de Redator,Correio Commercial, 18 de
Junho de 1879)
c) Melhor informará V. S. dizendo aos seus leitores que acham-se
arbitrariamente presos todos os meus empregados, entre elles os
compositores. (Carta de Redator, Diário do Brasil, 18 de Junho de 1879)
d) Diz V. S. que acham-se presos diversos vendedores da nossa folha.
(Carta de Redator, Diário do Brasil, 18 de Junho de 1879)
e) Além disso todos quanto imparciaes existem mui bem conhecem que a
causa de se tornar o partido moderado odiado, como vemos, foi o ser
composto de cegos adoradores de quantos actos maos, e arbitrarios partião
d‟esse homem, a quem nosso correspondente appelida republicano –
continua, e diz asseguro-lhe com amisade, que nada mais doe me, que ver
attacar a algum individuo por crimes que não commeteu nesta parte muito
concordamos com o pensar do nosso correspondente, (Carta de Redator, O
Sentinella da Liberdade no Rio de Janeiro, 06 de Dezembro de 1832)
f) e encarou fixamente esse sol tão apregoado e decantada, a quem elle
estava acostumado, a adorar inmente, e viu desvanecer-se pouco a pouco, à
proporção que o ouvia, essa aureola de magnitude que apparentemente
circumda o exm. sr. conselheiro Gaspar. (Carta de Leitor, Correio da Noite, 22
de Janeiro de 1879)
Todas as sentenças em (29) apresentam sintagmas pesados, longos
que como já dito favorecem a posposição. As sentenças em (30), pelo
116
contrário, têm SNs pequenos que tenderiam a ficar antepostos, mas o estatuto
de informação nova em (30a), (30b) e (30c) faz com que o DP
preferencialmente fique posposto. Vemos então que já foram mencionados dois
fatores que favorecem a posposição de sujeitos: informação nova e sintagmas
pesados. Esses resultados corroboram os obtidos por Berlinck (1989),
apresentados no capítulo 1, em que a autora afirma que a posposição do
sujeito no século XIX estava significativamente relacionada ao estatuto
informacional dos argumentos.
(30)
a) Quem entrar nos miseros cubiculos, em que se acouta o operario, ahi
pode avaliar ate que ponto tem chegado a incuria dos governos do paiz.
Muitos dirão que os governos não são culpados de que o operario vivia bem
ou mal;porem ninguem, absolutamente ninguem, é mais responsavel. (Carta
de Leitor, Jornal de Notícias, 26 de Novembro de 1875)
b) Quando lemos o dito notavel artigo, logo resolvemos condemnal-lo ao
despreso, que elle merece; e logo nos ocorreu á lembrança, hum facto
acontecido com o respeitavel Padre Oudino: apresentou-se-lhe hum
filosofante com aquella audacia, que a ignorancia costuma gerar, e se propoz
argumentar com elle sobre a existencia de Deos, declamando logo que hera
atheu. (Carta de Redator, O Cathólico, 24 de Fevereiro de 1838)
c) Mas tambem, é tão commodo: poder estabelecer-se negocio sem capital;
conseguir ganhar muito e gastar pouco, e finalmente proceder illegalmente e
nada soffrer?! (Carta de Redator, Echo Social, 08 de Março de 1879)
As sentenças em (31), pelo contrário, apresentam DP-posposto com
informação dada. Votre e Naro (1986), conforme discutido no capítulo 1,
afirmam que há diferente níveis de “dadicidade”, sendo o sujeito posposto
passível de ser caracterizado como evocado, disponível, parcialmente novo e
completamente novo. Vejamos alguns exemplos em (31)
(31)
a) Lisboa Hotel
Esta casa recommenda-se ao respeitavel publico pelo asseio, promptidão e
preços,tanto do serviço de mesa como em todas as bebidas que déllas se
117
sirvam os seus freguezes. O proprietario encarrega-se de apromptar com
urgencia e asseio jantares extraordinarios, banquetes, etc. no salão ou fora
para o que dispões de um pessoal habilitadissimo. (Anúncios, O Caixeiro, 23
de abril de 1899)
b) Os corpos contundentes obrão sobre os tecidos vivos de duas maneiras,
ou por pressão ou por percussão. O que actirou sobre o anti-braço de Manoel
José Fernandes foi por pressão. Neste caso, quando a acção do corpo
contundente é dirigida perpendicularmente á uma região, se a pelle é pouco
resistente e mais elastica que os tecidos subjacentes cede, e estes são mais
ou menos contusos segundo a quantidade da massa multiplicada pela
velocidade. Se, porém, a pelle é mais espessa e mais resistente do que a da
face anterior, e tem um apoio mais immediato nos ossos; por isso devia ser
mais contusa neste caso; mas segundo a theoria do collega foi o contrario
que succedeu.
Se o corpo contundente atua obliquamente, é outro o mechanismo porque se
alterão os tecidos. Os tegumentos são descolorados, e tem se visto os da
parte anterior do anti-braço serem dirigidos para a parte posterior, e viceversa. Neste caso, se os tecidos subcutaneos flexiveis alongão-se, e se são
poucos e elasticos, se rompem. Mas a pelle em geral não resiste, se rompe, e
fica ou não contusa. (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de
Janeiro de 1864)
c) A base mais forte sobre que se funda o escriptor livre he sem duvida a
imparcialidade, e baseado en tão incontestavel principio não hesitamos hum
momento em dar publicidade aos sentimentos de nosso correspondente;
sentimentos que alias são diametralmente oppostos de que estamos
possuidos, e por isso principiaremos a analysa los. (Carta de Redator, O
Sentinella da Liberdade no Rio de Janeiro, 06 de Dezembro de 1832)
d) Com bastante rasão se queixa o nosso Correspondente (Carta de
Redator, O Carioca, 22 de Outubro de 1833)
e) Quando o Sr. redactor do Guerreiro, quizer alguma informação a respeito
d‟alfandega, pode-se dirigir ao abaixo assignado, que o informara com toda
lealdade. Por esse maio estão simples, se livrara o Sr. Redactor de dar
noticias ao publico inteiramente falsas, como a de que se trata. (Carta de
Leitor, O Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853)
f) Esperamos que o Governo tomando em consideração o que acabamos de
espor faça girar a moeda de 40 rs. que ninguem quer aceitar, e como talvez
não esteja sciente destes males que todos nós soffremos, pela primeira vez
se queixa, em nome de todos, hum Fluminense que sem ser culpado dos
Srs. Negociantes, e Taberneiros que querem tudo para si, e sem que estejão
authorisados regeitão a moeda emitida na circulação pelo governo. Rogo-lhe,
Sr. Redactor, haja de dar lugar na sua imparcial folha a linhas, pelo que lhe
será eternamente grato. (Carta de leitor, O Carioca, 22 de Outubro de 1833)
118
g) He alli mesmo que pequenos e exhaustos Negociantes fazem ofertas, que
em poucos dias, já passavão de cem mil cruzados para se apromptar a
Tropa; a qual precizando de hum fardamento, foi em poucos dias apomptado
pelas Senhoras Paulistas de todas as classes, que spontaneamente se
oferecerão! (Carta de Redator, O Compilador Constitucional Político e
Litterário Brasiliense, 12 de Março de 1822)
Em sentenças como (31c) e (31d), o referente apesar de não aparecer
na oração está disponível seguindo a proposta de Naro e Votre (1986), pois os
referentes são compartilhados pelos interlocutores. Em (31f), o referente
também pode ser considerado disponível, pois trata-se do que os autores
nomeiam de um referente irrelevante para o prosseguimento do discurso que
caracteriza-se por aparecer na forma de um pronome indefinido. Em (31a) e
(31b), o referente é evocado, ou seja, dado, mas não necessariamente
idêntico. Em (31a), por exemplo, o referente do argumento externo é o
sintagma “ao respeitável público”, em (31b), o referente está, no parágrafo
anterior, no sintagma os “tecidos subjacentes” e, em (31e) e (31g), o referente
é idêntico ao argumento externo, sendo também considerado evocado.
Se estabelecermos o mesmo quadro comparativo com os dados em (30)
verificaremos que o quadro proposto por Naro e Votre (1986) se aplica na
amostra dessa dissertação. Apenas em (30b) o referente é novo, em (30a) o
referente pode ser tratado como parcialmente novo, pois a sua remissão só é
feita a partir de um SN que está vários parágrafos antes. E em (30c), o
referente está disponível, pois durante a carta são mencionados negociantes,
de modo implícito, onde há homens que negociam há negócios.Temos então o
seguinte quadro, descartando os casos em que a posposição é preferencial em
virtude do peso do sintagma conforme exposto em (29):
119
N
%
Novo
1
10%
Parcialmente Novo
1
10%
Disponível
4
40%
Evocado
4
40%
Total
10
100%
Tabela 29: Distribuição do estatuto informacional dos referentes dos sujeitos em
construções VS finitas e não finitas com SE-reflexivo
Os resultados convergem com os de Naro e Votre (1986) à medida que
sujeitos pospostos com informação nova constituíram aproximadamente 3% da
amostra, sendo a estratégia com menor frequência de uso. Na amostra da
dissertação, há apenas um caso de argumento externo posposto com
informação nova, o mesmo número obtido nas informações parcialmente
novas. Chama a atenção o fato de termos encontrado uma frequência de uso
de SN posposto com referente disponível muito próxima a estabelecida por
Naro e Votre (1986), tendo, eles, encontrado 38% e na amostra dessa
dissertação 40%.
Os resultados apontam para o que Naro e Votre (1987) e Berlinck (1997)
defendem, ou seja, nem tudo o que é posposto é novo. Berlinck (1997)
estabelecerá ainda outro viés de análise tratando especificamente da posição
de cada sintagma nas sentenças, mas este assunto será tratado em outra
seção. Proponho que observemos o estatuto informacional das passivas, a
partir da tabela 32 em que contraponho os índices de anteposição x
posposição ao tipo de sintagma nas sentenças finitas.
Anteposto
Posposto
N
%
N
%
Sintagma nominal simples
30
91%
3
9%
Sintagma nominal composto
3
60%
2
40%
Pronome indefinido
6
100%
0
0%
Pronome pessoal do caso reto
1
100%
0
0%
Total
40
5
Tabela 30: Anteposição x Posposição nas sentenças finitas passivas por tipo de
sintagma.
45
120
Com a tabela 32 percebemos que só há posposição com sintagma
nominal composto, como em (32a) e (32b), e com sintagma nominal simples
(32c) e (32d). Nas duas primeiras sentenças o peso do SN favorece a ordem
VS. Vejamos então como se aplica a proposta de Naro (1976) nas demais
sentenças. Observemos os dados.
(33)
a) Elixir Estomacal de W. Werneck
Este elixir reune em si poderosas propriedades tonicas e estomacaes do que
resultarão duas vantagens: preparar o estômago para o trabalho das
digestões e fornecer-lhe conjuntamente meios para fortalecer o organismo.
D‟ahi seu emprego em todos os casos de:
digestões difficeis
vômitos
dispepsias
azias
gastralgias
embaraço gástrico
perdas de apetite
indigestões
em que forem aconselhadas as preparações tonicas e estomacaes, pois os
resultados beneficos deste elixir garantem sua efficacia.
Dose: Um calice pequeno ao almoço e outro ao jantar.
75 Rua do Ourives
75 Rio de Janeiro (Anúncios, Jornal do Brazil , 01 de junho de 1881)
b) Asseverão-me que o muito illustre Sr. general Chagas Santos entre outras
reformas importantes que introdusio no quartel general da côrte, mandou que
não fossem mais empregadas, como ali se usava, obreias verdes e
amarellas, porque S.exa. sympathisa mais com a côr encarnada. (Carta de
Leitor, O Cidadão, 29 de Março de 1838)
c) Compareceu um dos redactores do Jornal, o qual depois de contar a seu
geito a historia da polemica concluiu:- o Jornal foi provocado; nas palavras
cuja explicação se pede, nem ha calumnia nem injuria; não damos outra
explicação.- Instei por intervenção do meu advogado, que não estando
saptisfeito o quesito para que fôra feita a intimação, pois que não estava
declarado si se afirmava, que dobrando me eu á vontade de alguem tinha
estabelecido o preço do café em mais do que devia, necessario era uma
resposta terminante n‟este sentido; e mandando o juiz que me fosse
respondido, a resposta tornou a ser a mesma:- o Jornal foi procurado, e
como nem ha calumnia nem injuria, não damos outra alguma explicação.- E
por mais que fosse instado o redactor do Jornal, declarou, que nada mais
respondia, e com effeito mudo ficou. (Carta de Leitor, Diário do Rio de
Janeiro, 26 de Março de 1846)
121
d) Compareceu um dos redactores do Jornal, o qual depois de contar a seu
geito a historia da polemica concluiu:- o Jornal foi provocado; nas palavras
cuja explicação se pede, nem ha calumnia nem injuria; não damos outra
explicação.- Instei por intervenção do meu advogado, que não estando
saptisfeito o quesito para que fôra feita a intimação, pois que não estava
declarado si se afirmava, que dobrando me eu á vontade de alguem tinha
estabelecido o preço do café em mais do que devia, necessario era uma
resposta terminante n‟este sentido; e mandando o juiz que me fosse
respondido, a resposta tornou a ser a mesma:- o Jornal foi procurado, e
como nem ha calumnia nem injuria, não damos outra alguma explicação.- E
por mais que fosse instado o redactor do Jornal, declarou, que nada mais
respondia, e com effeito mudo ficou. (Carta de Leitor, Diário do Rio de
Janeiro, 26 de Março de 1846)
Nas sentenças (32c) há um sintagma parcialmente novo à medida que o
referente pode ser recuperado se pensarmos que está sendo pedida uma
explicação acerca do assunto da intimação. Em (32d), o referente é evocado,
ou dado.
Observe que em todas as sentenças em (32) a posposição do
argumento interno sujeito implica na não realização do sintagma agentivo. Essa
constatação é interessante para pensarmos a proposta de Haward (2004). Para
a autora nas passivas analíticas quando há posposição do sujeito e do agente
da passiva, construção que não ocorre nessa amostra, pode-se afirmar que se
trata de um fenômeno de desfocalização, ou seja, a idéia é tirar o foco do
agente e passá-lo para o sujeito da ação. Nas sentenças em (32), o foco fica
sobre o SN posposto visto que estes não competem com o sintagma agentivo.
3.5 O tipo de oração
3.5.1 O tipo de oração e as sentenças finitas
Raposo e Uriagereka (1996) afirmam que em sentenças finitas
subordinadas existem duas posições à esquerda do verbo: [SPEC-FP] e
122
[SPEC-TP]. A primeira dessas posições é para onde vão os constituintes
deslocados em virtude do foco ou da ênfase, nesse sentido um objeto direto
quando anteposto ao verbo finito só pode ir para [SPEC-FP]. A posição de
[SPEC-TP] é ocupada pelo argumento que tem função de sujeito. Assim por
hipótese é esperado que nas sentenças finitas sejam encontrados dados de
DP-argumento interno anteposto nos objetos diretos e nas construções com
SE-indefinido/genérico.
A primeira tabela que apresento traz os resultados referentes ao tipo de
oração ao longo do tempo nas sentenças com SE-reflexivo. Nessas
construções,
apenas
nas
sentenças
matrizes
o
sujeito
manteve-se
preferencialmente anteposto durante todo o século XIX, alternando frequência
de 50% a 75%. Vejamos a tabela 31:
1808-1840
1841-1870
1871-1900
N-%
N-%
N-%
Anteposto
11 - 48%
15 - 88%
6 - 27%
Posposto
3 - 13%
0 - 0%
6 - 27%
Nulo
9 - 39%
2 - 12%
10 - 45%
Total
23
17
22
N-%
N-%
N-%
Anteposto
2 - 67%
6 - 55%
1 - 33%
Posposto
0 - 0%
1 - 9%
0 - 0%
Nulo
1 - 33%
4 - 36%
2 - 67%
Total
3
11
3
N-%
N-%
N-%
Anteposto
2 - 50%
3 - 75%
8 - 73%
Posposto
2 - 50%
1 - 25%
2 - 18%
Nulo
0 - 0%
0 - 0%
1 - 9%
Total
4
4
11
Subordinada
Coordenadas
Matriz
62
17
20
Tabela 31: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-reflexivo
Por hipótese, no século XIX, seriam encontrados indícios que
apontassem para o preenchimento da posição tal como observado nas
123
sentenças matrizes. Nas coordenadas, entretanto, os resultados apontam para
o aumento da frequência de sujeito nulo. Sem dúvida, a sentença coordenada
é um ambiente sintático favorecedor das categorias vazias, conforme destacam
Kato, Cyrino, Duarte e Berlinck (2006), Duarte (2003). O mesmo contexto foi
encontrado nas sentenças subordinadas, pois na terceira fase também há
preferência pelo argumento nulo. As sentenças abaixo exemplificam contextos
de sujeito nulo (33a), posposto (33b) e anteposto (33c) em sentenças
subordinadas.
(33)
a) Os individuos do kioske rio de Janeiroi, quando [-]i estabeleceram-se com
a tarraxa, propalaram que iam guerrear a casa dos fenianos, no entanto que
apresentam-se como victimas, para assim obterem a benevolencia do
publico.|Declaram-se eles victimas, quando esta ptente que eles são os
aggressores, dominados pela inveja, por verem como eles mesmos dizem a
casa dos fenianos com 300$ a vender premios de continuo.|A prova mais
exhuberante das malevolas intenções desses homens da tarraxa, está em
asseverar que os fenianos vendem apenas 300$, quando os Fenianos, só de
encomenda têm 390$ e a provincia 800$000.| Nada mais direi a esses
individuos porque o meu dinheiro não se gasta com tal plebe. - Salles.
(Anúncios, A Nação , 15 de março de 1873)
b) Lisboa Hotel
Esta casa recommenda-se ao respeitavel publico pelo asseio, promptidão e
preçps,tanto do serviço de mesa como em todas as bebidas que déllas se
sirvam os seus freguezes.
O proprietario encarrega-se de apromptar com urgencia e asseio jantares
extraordinarios, banquetes, etc. no salão ou fora para o que dispões de um
pessoal habilitadissimo. (Anúncios, O Caixeiro, 23 de abril de 1899)
c) TINTA VIOLETA
Esta tinta veio operar uma completa revolução no artigo tintas para escrever.
O consumo extraordinário a que attingiu, é prova sufficiente de que o publico
reconheceu a sua superiridade entre a immensa multidão de tintas que por
ahi se vendem com titulos os mais ou menos pomposos, cuja durabilidade o
tempo não se encarregou de demonstrar, nem seus autores offerecem
garantia alguma por falta de conhecimentos proprios: previne-se, pois, aos
Senhores consumidores que quando tiverem de fazer as suas encommendas,
queiram pedir a LEGITIMA tinta extra-fina Monteiro.
Vende-se em todas as livrarias da corte e nas principaes localidades do
Imperio. (Anúncios, Diário de Notícias , 12 de julho de 1869)
124
Nas passivas, as sentenças matrizes também se apresentaram
preferencialmente com o DP-sujeito anteposto. Nas coordenadas, foram
encontrados 11 dados de sujeito nulo, não havendo anteposição nem
posposição na terceira fase (1871-1900). Os resultados indicam que a estrutura
coordenada favorece a categoria vazia na posição de sujeito nas passivas.
Vejamos a tabela 34 em que apresento a distribuição ao longo do tempo por
tipo de sentença nas passivas e em seguida exemplos de sentenças passivas
com argumento nulo e sujeito anteposto.
1808-1840
1841-1870
1871-1900
Subordinadas
N-%
N-%
N-%
Anteposto
9 - 60%
25 - 69%
4 - 21%
Posposto
2 - 13%
2 - 6%
5 - 26%
Nulo
4 - 27%
9 - 25%
10 - 53%
Total
15
36
19
Coordenadas
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 - 0%
9 - 47%
0 - 0%
Posposto
0 - 0%
2 - 11%
0 - 0%
Nulo
1 - 100%
8 - 42%
2 - 100%
Total
1
19
2
Matriz
N-%
N-%
N-%
Anteposto
2 - 67%
10 - 91%
11 - 85%
Posposto
1 - 33%
1 - 9%
2 - 15%
Nulo
0 - 0%
0 - 0%
0 - 0%
Total
3
11
13
70
22
27
Tabela 32: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas Passivas
(34)
a) Lições de Historia Geral Organisadas de accordo com o actual programma
approvado pela Inspectoria Geral da Instrução Publica para os exames
geraes por Annibal Mascarenhas 1 Bello Vollume Encadernado 3$000. Este
trabalhoi, que ainda em manuscrito recebeu a approvação de numerosos e
habilitadissimos professores aos quaes [-]i foi apresentado, é o único que
pode servir aos examinados de historia, pois nele encontrarão claras
dissertações sobre todos os pontos do programma para os exames,
dissertações estas escriptas de accordo com o espirito que dictou aquelle
programma, e que tende a dar nova orientação aos estudos historicos.
(Anúncios, A Bomba, 10 de Outubro de 1894)
125
b) Ora se o Brigadeiro cunha Mattos não tendo ligado a seus filhos bens da
fortuna como é que seu filhoi Official maior da Secretaria da guerra não tendo
tido heranças, não constando que [-]i tenha sido favorecido das loterias não
se tendo casado rico se apresenta com uma fortuna colloçal? Teria o mesmo
descoberto a california dentro do arsenal? (Carta de Redator, O Guerreiro, 04
de Março de 1853)
c) PILULAS DO DoutoR RADWAY
cobertas com gomma assucarada
autorisadas PELA JUNTA DE HYGIENE.
Purgam, regularisam, purificam, limpam e fortificam.
PRUSSIA PRUSSIA PRUSSIA
Estas pilulasi são unicas adoptadas pela escola de pharmacia da Prussia, e []i foram declaradas pelos rhimicos de Sua Majestade prussiana as mais
puras e melhores do mundo, não sendo alsas.
Deposito geral
46 Rua dos Pescadores 46 (Anúncios, Diário de Notícias, 12 de julho de
1869)
(35)
a) Pastilhas de Clorato de Potassio e Cocaina de W.Werneck Aprovadas pela
Inspectoria de Hygienei.
[-]i São empregadas pelos mais distinctos medicos, com excelentes
resultados contra as dôres de garganta, rouquidão, extincção de voz,
pharingite, laringite, ulcerações tuberculosas, etc.Á venda na 75 Rua do
Ourives 75 (Anúncios, Jornal do Brazil , 01 de junho de 1881)
b) Os pontos mais difficeis do programma, taes como os que se referem á
Prehistoria, aos primeiros typos sociaes, á sciencia da historia, da qual se
deduzem os dados cosmologicos, physicos e psychologicos, foram tratados
com toda a proficiencia e orientação didatica pelo Senhor. Annibal
Mascarenhas que, sem resfolhos, explanou estes variados assuntos de modo
a facilitar sua comprehensão a todas as intelligencias. (Anúncios, A Bomba,
10 de Outubro de 1894)
c) Attenção
A redacção da Vespa, desejando tomar parte activa no actual movimento
litterario, vae sacrificar também á moda, perguntando ao contrario da Semana
e do Diario Portuguez: Qual é o peior dos poetas brasileiro que actualmente
existem? As respostas serão recebidas em cartas fechadas neste escritorio,
rua do Carmo número 40, 2 andar, e publicadas no proximo e susequentes
numeros de Vespa. (Anúncios, Vespa , 09 de maio de 1885)
Segundo Raposo e Uriagereka (1996) é possível a topicalização do DP
objeto, em sentenças subordinadas, se estas forem finitas. Há alguns exemplos
nesse contexto, conforme mostra a tabela 37 em que é apresentada a a forma
126
de realização de argumento interno das sentenças com SE-ambíguo por tipo
de oração. Nas tabelas 33 e 34, apresento os resultados referentes ao SEgenérico e ao SE-indefinido respectivamente.
SE-genérico
1808-1840
1841-1870
1871-1900
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 - 0%
0 - 0%
0 - 0%
Posposto
4 - 67%
2 - 100%
0 - 0%
Nulo
2 - 33%
0 - 0%
2 - 100%
Total
6
2
2
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 - 0%
0 - 0%
0 - 0%
Posposto
1 - 100%
0 - 0%
1 - 100%
Nulo
0 - 0%
0 - 0%
0 - 0%
Total
1
0
1
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 - 0%
0 - 0%
0 – 0%
Posposto
0 - 0%
1 - 0%
7 - 78%
Nulo
0 - 0%
0 - 0%
2 - 22%
Total
0
1
9
Subordinada
Coordenada
Matriz
10
2
10
Tabela 33: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-genérico
SE-indefinido
1808-1840
1841-1870
1871-1900
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 - 0%
0 - 0%
0 - 0%
Posposto
2 - 100%
2 - 50%
5 - 45%
Nulo
0 - 0%
2 - 50%
6 - 55%
Total
2
4
11
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 - 0%
0 - 0%
0 - 0%
Posposto
0 - 0%
0 - 0%
2 - 22%
Nulo
1 - 100%
0 - 0%
7 - 78%
Total
1
0
9
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 - 0%
2 - 67%
1 - 4%
Posposto
1 - 100%
0 - 0%
20 - 83%
Nulo
0 - 0%
1 - 33%
3 - 12%
Total
1
3
24
Subordinada
Coordenada
Matriz
17
10
28
Tabela 34: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-indefinido
127
SE-ambíguo
1808-1840
1841-1870
1871-1900
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 - 0%
4 - 19%
1 - 7%
Posposto
7 - 88%
12 - 57%
11 - 79%
Nulo
1 - 12%
5 - 24%
2 - 14%
Total
8
21
14
N-%
N-%
N-%
Anteposto
1 - 33%
0 - 0%
2 - 20%
Posposto
1 - 33%
7 - 75%
6 - 60%
Nulo
1 - 34%
2 - 25%
2 - 20%
Total
3
9
10
N-%
N-%
N-%
Anteposto
1 - 7%
0 - 0%
3 - 12%
Posposto
13 - 87%
3 - 50%
15 - 62%
Nulo
1 - 7%
3 - 50%
6 - 25%
Total
15
6
24
Subordinada
Coordenada
Matriz
43
22
45
Tabela 35: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-ambíguo
Os exemplos abaixo mostram as sentenças com SE-indefinido, genérico
ou ambíguo que têm o DP-objeto anteposto ao verbo finito. Em (36a), a
subordinada, em (36b), a coordenada e em (36c), a matriz.
(36)
a) O Brigadeiro Cunha homem de muita reconhecida probidade, e com quem
servimos, morreu pobre, deixando apenas um nome a prosperidade, e a seus
filhos por herdeiros desse mesmo nome, de uns pergaminhos de nobreza
adquiridos uns por si, e outros de seus maiores, e o Cunha Mattos seu filho
tem na verdade manchado as cinzas desse Illuste General, e completamente
desmentido o antigo proverbio de um tal pai, um tal filho se esperava. (Carta
de Redator, O Guerreiro, 04 de Março de 1853)
b) Tudo se adia, tudo deixa-se para depois, e passa-se o tempo, e as
grandes questões do estado ficam cada vez em peiores condições, até que
venha a morte fazer impossível todo e qualquer remédio (Carta de
Leitor,Jornal de Notícias, 26 de Novembro de 1875)
c) As mesmas inconveniencias, o mesmo furor em me attacar notão-se nos
dois escriptos, construídos de maneira que sobresahem as insinuações, que
eu não sei tratar as feridas, que ignoro e modo porque obrão os corpos
contundentes, que sou ilogico etc, etc. Parece, Sr. presidente, que a cortezia
vai fugindo desta casa (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1
de Janeiro de 1864)
128
O padrão de ordenamento dos objetos diretos, expostos na tabela 36,
indica que o comportamento desses é simétrico ao observado nas sentenças
com SE-indefinido, genérico ou ambíguo. Há predominância de posposição e
aumento dos argumentos nulos em sentenças coordenadas.
1808-1840
1841-1870
1871-1900
Subordinadas
N
%
N
%
N
%
Anteposto
1
1%
3
3%
4
5%
Posposto
61
85%
88
85%
60
81%
Nulo
10
14%
13
12%
10
14%
Total
72
104
74
250
Coordenadas
N
%
N
%
N
%
Anteposto
0
0%
2
6%
1
5%
Posposto
23
92%
30
86%
12
57%
Nulo
2
8%
3
9%
8
38%
Total
25
35
21
81
Matriz
N
%
N
%
N
%
Anteposto
0
0%
0
0%
0
0%
Posposto
31
97%
41
85%
42
93%
Nulo
1
3%
7
15%
3
7%
Total
32
48
45
125
Tabela 36: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com objeto direto
3.5.2 O tipo de oração e as sentenças não finitas
Raposo e Uriagreka (1996) afirmam que sentenças não finitas
encaixadas não admitem a anteposição do DP argumento interno das
sentenças com SE-indefinido/genérico, visto que há apenas uma posição à
esquerda do verbo não finito que é a de sujeito. Os nossos resultados
corroboram a análise dos autores visto que em 21 sentenças subordinadas não
finitas não foram encontrados DPs antepostos, como mostra a Tabela 37:
1808-1840
1841-1870
1871-1900
N-%
N-%
N-%
Anteposto
1 - 17%
0%
1 - 10%
Posposto
2 - 33%
0%
3 - 30%
Nulo
4 - 66%
8 – 100%
6 - 60%
Total
6
8
10
24
Tabela 37: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças não finitas com SE-reflexivo
129
(37)
a) Goyana estava em armas contra o Pro-Presidente Interino da Junta do
Governo passado o Sr. Francisco Paes Barreto, e no Grande Conselho de 13
de Dezembro do anno proximo passado por ordem delle convocado, eu
mesmo fui testemunha do Sr. Paes Barreto dimitir-se por ter perdido a força
e consideração moral, quando então eu em nada tinha concorrido para isto, e
nessa occasião fui elleito Commandante das Armas, depois de já estar elleito
Presidente da Provincia o actual, a quem prestei obediencia, segundo a
clausula do juramento, que deo o ex-Governador das Armas Almeida, ao qual
me referi na minha posse. (Carta de leitor, O Propugnador, 13 de Junho de
1824)
c) Quasi sempre os annuncios são phantasticos, de modo que o freguez, que
precisa de uma criada ou criado, nas condições annunciadas, ao obter a
resposta já está alugado, faz a encommenda, deixando como agencia 5$000,
para poder o agente dar-se ao trabalho de procurar o criado pedido. (Carta
de Redator, Echo Social, 08 de Março de 1879)
Nas sentenças com SE-indefinido/genérico, corroborando a análise de
Raposo e Uriagereka não foram encontradas sentenças encaixadas com
anteposição do argumento interno. Vejamos a tabela 38 em que apresento a
distribuição por tipo de oração das sentenças com SE-indefinido,genérico ou
ambíguo.
1808-1840
1841-1870
1871-1900
N-%
N-%
N-%
Anteposto
0 - 0%
0 - 0%
0 - 0%
Posposto
1 - 100%
11 - 79%
7 - 64%
Nulo
0 - 0%
3 - 21%
4 - 36%
Total
1
14
11
26
Tabela 38: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças não finitas com SEindefinido, genérico ou ambíguo.
Vejamos abaixo alguns exemplos de sentenças subordinadas.
(38)
a) O Prompto Allivio de Radway é inestimavel. Pode empregar-se com
certeza de obter-se feliz resultado em todos os casos que se sente dor ou
qualquer encommodo. Rheumatismo.
Esta dolorosa enfermidade tem
zombado dos esforços dos mais habeis medicos e dos melhores remedios. É
a molestia mais dificil de se tratar, comtudo com o Prompto Allivio de Radway
sempre se consegue um rapido allivio para o paciente, e em todos os casos
de rheumatismo agudo, inflammatorio ou nervoso obtem-se uma completa
130
cura. No rheumatismo chronico ou gottoso deve tomar-se o resolutivo e
pilulas reguladoras como auxiliares do Prompto Allivio.
Os tres medicamentos do Dr. Radway formam por si sós uma botica, com a
qual todos ficam prevenidos para acudir a maior parte das molestias.
DEPOSITO GERAL
46 RUA DOS PESCADORES 46
CASA COM A FRENTE PINTADA DE ENCARNA (Anúncios, A Nação, 15 de
março de 1873)
b) É preciso pois ser-se muito injusto para diser-se o que acabo de ler. (Carta
de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de 1864)
c) S. ex. não contava, de certo, com o rapido andamento, nem com o
desfecho que teve esse negocio, que aqui para nós, que ninguem nos ouça,
foi para s. ex. o caso de dizer-se – que cahiu-lhe a sôpa no mel! (Carta de
Leitor, Diário Fluminense, 5 de Setembro de 1884)
d) Illm. o e Exm. o Sr.- Tendo o Exm. o Sr. presidente da provincia feito sentir
em seu relatorio do 1. o do corrente á assembléa provincial do Rio de Janeiro
a nessecidade de se elevar á cathegoria de villa o arraial do porto da
Estrella,comprehendendo-se no seu termo as freguezias de Inhomerim,
Suruhy, Guia e Pilar, e uma outra, que muito convêm crear-se hoje em
Petropolis com a invocação de S. Pedro d‟Alcantara, para a matriz da qual
consta que S.M. o Imperador e muitos particulares concorrem com donativos
e subscripções. (Carta de Leitor, Diário do Rio de Janeiro, 26 de Março de
1846)
Fica evidente, portanto, que especialmente nas subordinadas não pode
haver anteposição do DP-argumento interno ao verbo não finito em sentenças
com SE-indefinido, genérico ou ambíguo, sendo a construção possível em
sentenças com SE-reflexivo. Nesse sentido, se a única posição disponível à
esquerda dos verbos não finitos é a de sujeito [SPEC-TP] e o DP das
sentenças com SE-indefinido/genérico não pode ocupá-la evidencia-se que
este não é o sujeito da oração, mas o objeto direto.
131
3.6 Traço de animacidade
A hipótese para esse contexto sintático é de que não serão encontrados
casos de DP anteposto a verbos finitos e não finitos que tenham traço
[+humano] no PB. Visto que esta língua apresentaria, segundo Raposo e
Uriagereka (1996), uma restrição a DPs com este tipo de traço de animacidade
anteposto. Vejamos então como fica a distribuição da anteposição x
posposição nas sentenças com SE-genérico, indefinido e ambíguo em relação
ao traço de animacidade.
Inanimado
Animado
Humano
N-%
N-%
N-%
0 – 0%
0 – 0%
0 – 0%
14 – 10%
1 – 100%
1 – 100%
14
1
1
16
Inanimado
Animado
Humano
SE-indefinido
N-%
N-%
N -%
Anteposto
3 -10%
0 – 0%
0 – 0%
Posposto
28 - 90%
0 – 0%
4 – 100%
Total
31
0
4
35
Inanimado
Animado
Humano
SE-ambíguo
N-%
N-%
N-%
Anteposto
11 – 14%
0 – 0%
1 – 14%
Posposto
68 – 86%
0 – 0%
6 – 86%
Total
79
0
7
86
Tabela 39: Traço de animacidade nas sentenças finitas com SE-indefinido, genérico ou
ambíguo.
SE-genérico
Anteposto
Posposto
Total
Ao contrário do que esperavamos foi encontrado um dado numa
sentença com SE-ambíguo que apresenta um DP [+humano] anteposto ao
verbo finito (39). Nessa sentença, pode se perceber que há um foco contrastivo
- “um tal pai” vs. “um tal filho” o que justifica a anteposição deste DP:
(39)
O Brigadeiro Cunha homem de muita reconhecida probidade, e com quem
servimos, morreu pobre, deixando apenas um nome a prosperidade, e a seus
filhos por herdeiros desse mesmo nome, de uns pergaminhos de nobreza
adquiridos uns por si, e outros de seus maiores, e o Cunha Mattos seu filho
tem na verdade manchado as cinzas desse Illuste General, e completamente
desmentido o antigo proverbio de um tal pai, um tal filho [se esperava].
(Carta de Redator, O Guerreiro, 04 de Março de 1853)
132
Nas demais sentenças o traço de animacidade do DP quando anteposto
é sempre [+inanimado] como vemos nos exemplos em (40)
(40)
a . lisboa Hoteli
Esta casai recommenda-se ao respeitavel publico pelo asseio, promptidão e
preçps, tanto do serviço de mesa como em todas as bebidas que déllas se
sirvam os seus freguezes. (Anúncios, O Caixeiro, 23 de abril de 1899)
b) ESPECTACULOS
THETRO LYRICO FLUMINENSE
COMPANHIA HESPANHOLA DE RZUELA
DIRIGIDA POR Dom THOMAZ GALVAN
HOJE
TERÇA-FEIRA 16 DE JULHO
Recita extraordinariamente em beneficio de HENRIQUETA QUINTANA
Depois que a orchestra tiver executadoa sumphonia do estylo, subirá á scena
a linda zarzuela em 2 actos, original do sr.Serra, musica do maestro rogel
intitulada
AS AMAZONAS DO TORMES
CORO GERAL
Dará principio a linda zarzuela em 1 acto, intitulada.
UM PLEITO
Tomam parte os senhoresVillanova, Barcena, Villareal e as sras. Pelaez e
Barredas.
Ás 7 ½ horas.
Os bilhetes de camarotes e cadeiras vendem-se por especial obséquio em
casa dos senhores Castellões, rua do Ouvidor número 116, e Aurelio, largo
de São Francisco de Paula. (Anúncios, Diário de Notícias , 16 de julho de
1869)
c) Feridas
Antigas ou recentes, cancros venereos, frieiras e suores fetidos dos pés
curam-se com os Pós americanos Pacheco & Abreu.
Deposito, Rua da Lapa número 24 (Anúncios, A Bomba, 15 de setembro de
1894)
d) A obra já annunciada das Observações sobre o Commercio Franco no
Brazil. Parte I. e II. vende-se a 640 reis em brochura, e 800 sendo em papel
de Olanda, nas Cazas de Manoel Jorge da Silva, Livreiro, na rua do Rozario,
e de Paulo (Anúncios, Gazeta do Rio de Janeiro, 15 de outubro de 1808)
e) As mesmas inconveniencias, o mesmo furor em me attacar notão-se nos
dois escriptos, construídos de maneira que sobresahem as insinuações, que
eu não sei tratar as feridas, que ignoro e modo porque obrão os corpos
contundentes, que sou ilogico etc, etc. Parece, Sr. presidente, que a cortezia
vai fugindo desta casa (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1
de Janeiro de 1864)
133
f) Se tal escandalo se observa na rua mais frequentada da Corte do Brasil,
por onde passeão a nossa aristocracia, as nossas bellesas, os nossos
fidalgos de chelpa!!! o que não irá pelos outros arrabaldes? Eu lho digo.
(Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de 1850)
Assim o que se observa nessa amostra é uma restrição que o Português
Brasileiro impõe as construções com SE-indefinido, genérico e ambíguo, que
possuem um DP anteposto. Esse DP, em geral, não pode ter traço [+humano]
visto que se isto ocorrer a interpretação da sentença é reflexiva, pois o DP não
subiria para [SPEC-FP] em virtude de precisar primeiro preencher a grade
temática de [SPEC-TP] para depois haver a subida de um nível e o DP atingir
[SPEC-FP].
Em sentenças com DP [+inanimado], a necessidade de preencher
[SPEC-TP] para depois alçar um DP para [SPEC-FP] faz com que no PB
sentenças como as expostas em (40) sejam interpretadas como agramaticais.
Essa pode ser uma diferença entre o PB e o PE. No PE, há a possibilidade de
que [SPEC-FP] seja preenchido sem que a grade temática de [SPEC-TP]
esteja ocupada e isso faz com que sentenças como (40) sejam gramaticais9.
Nesse sentido temos uma diferença nas construções com SE que marca
as gramáticas do PB e do PE. A produção de sentenças como (40) seria uma
evidência para o fenômeno de competição de gramáticas, visto que a presença
destas em jornais indica que os falantes do século XIX podiam interpretá-las
ainda que estas fossem produzidas por uma gramática do PE.
9
Seguindo a proposta de Uriagereka (1995), não haveria a posição de F(orce)P disponível no
PB, pois essa posição está intimamente relacionada, não só à força ilocucionária da sentença,
mas também à colocação pronominal. Assim, como os clíticos no PB não se movem para o
núcleo funcional mais alto, não haveria essa posição. A questão, como se pode perceber,
ainda está em aberto e pode ser objeto de estudo de futuros trabalhos com base na análise
desses mesmos dados.
134
Desse modo, sentenças como (41) abaixo podem ser representadas
como (42), pois estamos diante de uma sentença produzida por uma gramática
do PE, em que a posição de [Spec, FP] está disponível. O baixo índice dessas
construções pode ser mais uma evidência de que estamos diante de estruturas
distintas das produzidas pela gramática do PB:
(41)
Os bilhetes de camarotes e cadeiras [vendem-se] por especial obséquio em
casa dos senhores Castellões, rua do Ouvidor número 116, e Aurelio, largo
de São Francisco de Paula. (Anúncios, Diário de Notícias, 16 de julho de
1869)
(42)
FP
3
Os bilhetes e os camarotesk,
F‟
3
vendem
TP
3
T‟
SEj
3
VP
i
3
tj
V‟
3
ti
Assim,
a
categoria
vazia
das
construções
tk
com
SE-indefinido
apresentadas é gerada por movimento do objeto. A leitura arbitrária da
sentença se dá pelos traços inerentes do clítico SE [+humano], [-definido], que
ocupa a posição de sujeito e satisfaz o EPP, segundo Raposo e Uriagereka,
1996.
135
As construções com o DP em posição de tópico também podem ser
consideradas uma evidência da presença de pistas que revelam gramáticas em
competição na amostra. O exemplo em (43) revela a variação na concordância
entre o verbo e o tópico no plural, o que evidencia uma construção do PE (com
concordância) e uma construção do PB (sem concordância).
(43)
Ballanças, pesos, medidas, vasilhas de tabernas, de boticas, ferros velhos,
metaes, ditos novos e usadosi, comprão-se [-]i e vende-se [-]i na rua do
Conde D‟Eu número 146, em frente ao portão do chafariz do Lagarto.
(Anúncios, Diário de Notícias, 12 de julho de 1869)
Vemos nessa sentença um exemplo de duas gramática competindo:
primeiro SE-indefinido e depois SE-genérico. Vale observar também que esta
sentença ocorre em um anúncio, ou seja, no gênero textual em que
encontramos o maior número de sentenças com SE-genérico (sem
concordância) e também aquele em que majoritariamente foram encontrados
dados de construções com o DP em posição de tópico (pela própria estrutura
do anúncio).
Talvez, uma análise de sentenças como as expostas em (41) e (42) à luz
da proposta de Rizzi (1988) para a configuração de [SPEC-FP], nível que Rizzi
(1988) chama de CP, possa trazer uma visão um pouco mais ampla da
distinção entre as gramáticas do PB e do PE, visto que no nível [SPEC-FP]
haveria várias categorias cindidas que processam informações distintas, como
por exemplo, foco informacional, flexão,etc. Mas este é um trabalho que fica
pro futuro à medida que iria requerer outra dissertação. O que posso deixar
neste momento é a evidência de que sentenças como (41) diferenciam as
gramáticas do PB e do PE.
136
3.7 Competição de gramáticas
3.7.1 A concordância
O fator concordância é tratado na literatura como o diferenciador das
sentenças indeterminadas e passivas de SE. É esta, por exemplo, a posição
defendida por uma série de trabalhos que tomam os pressupostos da Teoria de
Regência e Ligação e que foram brevemente apresentados no capitulo de
revisão bibliográfica (MANZINI, 1986; CINQUE, 1988; DOBROVIE-SORIN,
1998; MATEUS et al., 2003; CYRINO, 2007), assim como os trabalhos de
Duarte (2002) e Duarte e Lopes (2002) que seguem a linha da Teoria de
Variação Paramétrica.
Nesses
trabalhos
as
construções
com
SE,
que
apresentam
concordância, são tratadas como passivas sendo semelhantes as construções
inacusativas em que o argumento interno recebe caso nominativo e exerce a
função de sujeito, podendo ocupar a posição estrutural de sujeito [SPEC-TP]
ou estar ligado a ela por meio de uma cadeia. Mas nessa dissertação,
conforme foi mostrado na seção 3.2 os resultados comprovam a argumentação
de Raposo e Uriagereka (1996), que se valem dos pressupostos da Teoria de
Regência e Ligação em sua versão Minimalista (CHOMSKY, 1995), de que o
argumento interno das sentenças com SE que exibem concordância não é o
sujeito da oração, mas sim um objeto direto que checa caso nominativo e por
isso pode concordar com o verbo finito ou não finito, sendo este clítico um SEindefinido.
Por isso, o que proponho fazer ao observar a concordância é verificar se
encontro pistas que evidenciem um quadro de competição de gramáticas, pois
segundo Cavalcante (2006, 2011a, 2011b), as construções com SE-indefinido
137
pertencem a gramática do PE, enquanto que no século XVI e XVII, ou seja, o
Português Clássico, ainda haveria SE-passivo. No PB, especificamente em
Cavalcante (2006), para a autora, há SE-genérico. Passemos, então, para a
análise dos resultados nas sentenças finitas. Ressalto antes, que no fator
concordância não observarei as sentenças não finitas visto que não foram
encontrados dados de verbo no plural. Observemos a tabela 40 em que
apresento o fator concordância, considerando apenas os verbos finitos no
plural.
Concorda
Não concorda
Total
N
3
0
3
Anteposto
%
100%
0%
N
31
16
47
Posposto
%
70%
30%
50
Tabela 40: Concordância em sentenças finitas com SE-indefinido/genérico
A primeira observação que podemos fazer é que quando o DP está
anteposto não há falta de concordância, quando há o DP está sempre posposto
ao verbo finito e estes casos se resumem a 30% dos dados, ou seja, a
frequência de sentenças com SE-indefinido é maior do que a de sentenças
com SE-genérico. Vejamos os exemplos em (44).
(44)
a) Alugão-se uma negrinha de 14 annos, duas pretas perfeitas cozinheiras,
lavadeiras e engommadeiras de roupa de senhora; informa-se por favor, á rua
Luiz de Camões número 14, antiga da Lampadosa, venda. (Anúncios, Jornal
do Commercio , 01 de outubro de 1881)
b) OS LEGITIMOS REMEDIOS DO Doutor AYER
Vendem-se á 15 Rua Sete de Setembro 15
Extracto de salsaparrilha
Remedio para sezões
Peitoral de cereja
Pilulas Catharticas
Vigor do cabelo e Agua florida de Murray
Tonico oriental
Perfumarias inglezas e das mais afamadas fabricas francezas (Anúncios,
Diário de Notícias , 12 de julho de 1869).
138
c) Compra-se ouro, prata e brilhantes; na rua Sete de Setembro número 229,
loja de Ourives. (Anúncios, Jornal do Commercio , 04 de outubro de 1881)
d) Annuncia-se a sahida do 2º. Tomo das Memorias Historicas do Rio de
Janeiro por Monsenhor Pizarro para que possão os Senhores subscritores
procurá-lo nos lugares , sem que fizerão as suas Assignaturas. Ficão no prelo
os Tomos 3º , 4º , 5º , que sahirão com a brevidade possível; e no 6º, e 7º se
publicarão a lista de todos os Senhores;que cooperarão para a impressão da
Obra com a sua subscripção, a qual ainda continua nos lugares de costumes.
(Anúncios, Gazeta do Rio de Janeiro, 1821)
As sentenças (44a-c) constituem dados em que a concordância é
facultativa visto que apesar de haver vários sintagmas coordenados o verbo
finito pode ou não ir para o plural, pois os núcleos dos DPs coordenados estão
no singular. Já em (44d), a falta de concordância pode ser interpretada como
um caso de hipercorreção, pois o emissor fez a concordância com o sintagma
“todos os senhores”.
Conforme exposto na tabela 42, são somente 16 as sentenças sem
concordância, vejamos treze destas em (45). Em geral, os contextos que
favorecem a falta de concordância são os predicadores complexos (45a) e
(45b), a distância entre o SN e o verbo finito (45c) e mesmo a posposição do
argumento interno (45d-l).
(45)
a) Mas, Sr. Redactor, eu disse que não dou credito a esta noticia; e eis aqui a
rasão. Tem sido governadores das armas da corte alguns Brasileiros natos, e
muitos adoptivos; e se estes, a quem [se poderia revelar] algumas
recordações do lugar do seo nascimento, nunca tiverão semelhante
lembrança , como hei de crêr que a tivesse o Sr.Chagas, Brasileiro nato.
Carioca, do que estacidade toda é testemunha, pois o vêrão criança na
companhia de seo pai, que vivia muito modicamente ali na rua do
Ouvidor!.Parece-me impossivel, até porque não quero suppôr que o Sr.
Chagas seja dos maniacos que gostão de passar por adoptivos. (Carta de
leitor, O Cidadão, 29 de Março de 1838)
b) Ourivesaria Halphen
Para evitar falsificações e usurpações de nome, deve-se exigir os dous
carimbos juntos.
Talheres Alfénide
metal branco prateado
139
Propriedade exclusiva da Societé des Couverts Alfenide. (Anúncios, Jornal do
Commercio, 01 de outubro de 1881)
c) Companhia Sorocabana
Paga-se no New London and Brasilian Bank Limited os juros vencidos hoje
dos debentures 50 e os debentures sorteados. Rio de Janeiro, 30 de
Setembro de 1881 – F.P. Mayrink, presidente. (Anúncios, Jornal do
Commercio, 01 de outubro de 1881)
d) Fornece-se comidas para fóra, de casa de familia, com proptidão e asseio,
tanto á portuguesa como á brazileira, mandando-se conduzir em casa; na rua
do Rosario, número 46, sobrado. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de
outubro de 1881)
e) Gruta Bahiana de I. F. dos Santos
Neste antigo estabelecimento, encontra-se sempre grande sortimento de
artigos especiaes da Bahia, como sejam: Louça de barro, Azeite de dendê
cheiro, camarões secos, doces, charutos, etc. Aceita-se também
encommendas de Vatapá, Caruru, Moqueca de Peixe, Firgideira e outros
partos especiaes da cosinha bahiana 37 Travessa do Ouvidor 37 (Anúncios,
O Caixeiro, 23 de abril de 1899)
f) Compra-se moveis, louças e crystaes de casa de familia; na rua Visconde
do Rio-Branco número 52, loja (Anúncios, Jornal do Commercio, 04 de
outubro de 1881)
g) Asseverão-me que o muito illustre Sr. general Chagas Santos entre outras
reformas importantes que introdusio no quartel general da côrte, mandou que
não fossem mais empregadas, como ali se usava, obreias verdes e
amarellas, porque S.exa. sympathisa mais om a côr encarnada. Ora, Sr.
Redactor, a ser isto verdade o que eu por ora não creio é preciso submetter á
consideração do digno generalissimo algumas reflexões. (Carta de leitor, O
Cidadão, 29 de Março de 1838)
h) Este macaco antes de ser gente já escrevinhava suas obras a fora as de
seu officio isto se sabe pela nota do 3 o N.º em que se menciona algumas
que deu á luz. (Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de 1822)
i) Sim a engratidão, a destruição, o atrazo, a mizeria foi com que se premiou
os grandes serviços, que fizestes como descobridores, conquistadores, e
Povoadores de tantas Provincias, que cedestes ao Rei:o Machiavelismo
temeo a Póvos tão emprehendedores, tão livres, tão constantes, patriotas e
valentes; (Carta de Redator, O Compilador Constitucional Político e Litterário
Brasiliense, 12 de Março de 1822)
j) já o devia ter feito, e muito mais quando o clamor publico, e a voz geral
accusão V. Ex. e seu official maior Cunha Mattos como os maiores criminosos
nesses escandalosos roubos, e mui principalmente quando se vê a honra de
um official general aballada, e sua reputação manchada no fim de trinta e
140
tantos annos de serviço, e sendo este demittido de chefe de uma repartição,
da qual se manifestou esses escandalosos roubos. (Carta de Redator, O
Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853)
l) Em torno delles via-se alguns colxões, dos quaes a maior parte em
pessimo estado, extendidos no chão talvez para seccarem-se das humildades
da noite precedente. (Carta de Redator, Correio Commercial, 18 de Junho de
1879)
As construções com SE-genérico revelam um sistema em que a não
concordância é justificada pela posição que o DP ocupa: posição de acusativo.
Observe que em nenhum dos casos o DP está anteposto ao verbo finito, numa
posição em que ele, em geral, receberia nominativo. Portanto, no PB, o DP
argumento interno de construções com SE que apresentam verbo transitivo
direto recebe caso acusativo.
Vejamos como se comporta a concordância nas sentenças com DP
argumento interno no plural ao longo do tempo a fim de que possamos
enxergar se esses dados revelam uma curva de ascensão das construções
com SE-genérico que indicaria o aumento da frequência de uso da gramática
do PB em detrimento da gramática do PE que seria caracterizada pelas
sentenças com SE-indefinido.
1808-1840
N-%
5 – 62%
3 – 38%
8
SE-genérico
SE-indefinido
Total
1841-1870
N-%
5 – 66%
4 – 44%
9
1871-1900
N-%
6 – 19%
27 – 81%
33
Tabela 41: Concordância nas construções com SE-indefinido/genérico ao longo do
tempo.
A tabela 41 mostra que da primeira para a segunda fase a um aumento
na
frequência
de
uso
das
construções
com
SE-genérico,
conforme
esperávamos a partir dos resultados de Cavalcante (2006), entretanto na
passagem da segunda para a terceira fase as construções com SE-indefinido
141
se tornam majoritárias. Observemos o gráfico de linha abaixo em que
apresento as curvas referentes aos dois tipos de sentenças.
100%
90%
81%
80%
70%
60%
66%
62%
50%
40%
44%
38%
30%
20%
19%
10%
0%
1808-1840
1841-1870
SE-genérico
1871-1900
SE-indefinido
Gráfico 9: A concordância ao longo do tempo nas sentenças com SE-indefinido/
genérico.
No gráfico acima, os valores apresentados na tabela 43 ficam mais
claramente expressos, revelando um contexto em que se tomada a hipótese de
que as sentenças com SE-indefinido são resultado da gramática do PE, esta,
no processo de competição de gramáticas, estaria com uma freqüência maior
de uso ao longo do tempo. Na verdade, esse pode ser um contexto em que a
pressão normativa, que Pagotto (1993) já havia detectado em relação à
colocação pronominal, pode estar agindo. A amostra dessa dissertação é
constituída por textos impressos que podem ter sofrido um processo de edição
à luz das normas prescritas pela gramática lusitana do século XIX.
A observação dessas sentenças ao longo do século XX pode revelar
qual a gramática que venceu esse processo de competição, acredito
por
intuição e por meio dos resultados de Cavalcante (2006) que tenha sido a do
142
PB e que, portanto, haja muito mais sentenças sem concordância do que com
presença das marcas flexionais.
3.7.4 Anúncios e cartas: os gêneros textuais e a competição de
gramáticas
Em um trabalho sobre as construções com SE-indefinido/genérico,
(MELO, 2011), utilizando parte da amostra dessa dissertação -- uma carta de
leitor publicada na Gazeta Médica do Rio de Janeiro e todos os anúncios da
segunda fase, ou seja, publicados entre (1840-1870) -- observei que a maior
parte das construções em que há uma categoria vazia nas sentenças com SEindefinido/genérico10, estando o referente numa posição de tópico, foi
encontrada nos anúncios.
Argumento, desse modo, que o aumento das taxas de DPs em posição
de tópico, e por conseguinte, argumentos nulos, nos anúncios pode estar
relacionado ao fato de haver a necessidade de colocar o produto em evidência.
Como nas sentenças com SE-indefinido/genérico o único DP é o argumento
interno, ele tenderia a ser topicalizado nos anúncios. Para explicar essa
diferença, utilizei a Teoria de Tradição discursiva e por meio de um gráfico
(ordenograma), procuro mostrar a ordem do argumento interno nos anúncios.
A leitura desse ordenograma deve ser feita considerando a coluna
vertical que se encontra numerada da seguinte forma (-1, -2, -3, 0, 1, 2, 3). Os
números positivos representam o tipo de sintagma em que a construção
ocorreu – sintagma nominal, sintagma oracional ou pronome – os números
negativos retratam a ordem que o DP ocupa na sentença, o índice -1
10
Em Melo (2011), não diferenciei as construções ambíguas que foram tratadas como
sentenças com SE-indefinido
143
representa a anteposição, o -2 a posposição e o -3 a topicalização. Para ficar
mais claro, a Figura 6 traz uma leitura do ordenograma.
Numeração
Estrutura
1
2
3
Oração
Pronome
Sintagma nominal
-1
-2
-3
Anteposição
Posposição
Topicalização
Figura 6: Organização do ordenograma (Retirado de Melo, 2011)
Vejamos então como fica o ordenograma dos anúncios, observando
apenas o eixo dos números negativos (em que observamos a anteposição,
posposição e topicalização dos argumentos), como mostra o Gráfico 11 a
seguir:
Gráfico 10: Ordenograma dos anúncios (Retirado de Melo, 2011)
Observe neste ordenograma que nos anúncios não há dúvida sobre a
posição do argumento interno, ou ele está topicalizado ou posposto aos verbos
finitos e não finitos. É interessante observar que, como vimos na seção
anterior, as construções com topicalização são uma forte evidência da
presença da gramática do PE nos textos do século XIX. Na seção 3.4, quando
144
tratei da concordância vimos que as construções com SE-genérico são
evidências da presença da gramática do PB. Observemos como se da a
distribuição nos anúncios de sentenças com SE-genérico.
Anúncios
Carta de redator
Carta de leitor
Total
Posposição
N -%
9 – 55%
4 – 25%
3 – 20%
16
Tabela 42: As sentenças com SE-genérico por gênero textual
Os resultados da tabela 42 comprovam que há sentenças com SEgenérico em todos os gêneros, entretanto é nos anúncios que encontramos o
maior número de dados, comprovando portanto que além de ser ele o gênero
que mais apresenta topicalização também há a gramática do PB com as
construções sem concordância.
145
Considerações Finais
O propósito desse trabalho foi examinar à luz dos pressupostos da Teoria
gerativista no modelo de Principios e Parâmetros a ordem do DP-argumento
interno nas construções com SE-indefinido, genérico e ambíguo em dados
produzidos durante o século XIX no Rio de Janeiro. Para tanto fizemos uso de
uma amostra constituída por anúncios, cartas de leitores e cartas de redatores
publicados em jornais cariocas que compõem parte do Corpus do projeto Para
a História do Português do Brasil (PHPB-RJ) de onde foram coletados dados
de objetos diretos, sentenças com SE-reflexivo, SE-indefinido, SE-genérico,
SE-ambíguo e passivas analíticas a fim de que fosse possível uma
comparação entre a ordem do sujeito e do objeto direto no PB.
Partimos dos resultados de diversas pesquisas que têm apontado para o
fato de que ao contrário do que diz a tradição gramatical, ou seja, ser o DP das
construções com SE que apresentam concordância entre o verbo transitivo
direto e o argumento interno plural, o sujeito da oração, o argumento interno
dessas sentenças é um objeto direto independente das marcas de
concordância. E assim fizemos o levantamento estatístico dos dados que foram
codificados a partir dos contextos sintáticos que se mostraram relevantes
durante a construção da revisão bibliográfica.
Os resultados dessa dissertação apontam para o fato de que o DP
dessas construções preferencialmente é posposto ao verbo finito ou não finito
ao contrário do que ocorre com o DP das sentenças com SE-reflexivo e com o
argumento interno das sentenças passivas analíticas. Esse resultado, portanto,
146
comprova a hipótese inicial de que o DP argumento interno das sentenças com
SE-indefinido, genérico e ambiguo manteria um padrão estatístico de ordem
preferencialmente posposta, bem como índices de argumento nulo que se
aproximassem dos encontrados nos objetos. Desse modo, os resultados
estatísticos indicam que nessas construções temos um objeto e não sujeito.
Ainda que não sejam majoritários, foram encontrados dados de DP
anteposto ao verbo finito. Em geral, os argumentos internos antepostos nas
sentenças com SE estavam sob a forma de pronomes indefinidos e
demonstrativos. Quando ocorreram como sintagma nominal havia sempre um
estatuto informacional de foco ou de ênfase que favorecia a anteposição do
DP. Nesses casos, a construção tinha em geral um sinal de pontuação ou uma
marca da edição que indicavam estar o DP numa posição mais à esquerda da
sentença que para Raposo e Uriagereka (1996) corresponde a [SPEC-FP].
Além disso, não foram encontrados dados em que esse DP estivesse
anteposto numa construção não-finita. Esse resultado é especialmente
importante, pois conforme afirmam Raposo e Uriagereka, nas sentenças não
finitas só há uma posição à esquerda do verbo: [SPEC-TP], a posição de
sujeito que não pode ser ocupada pelo DP das sentenças com SEindefinido/genérico.
Os resultados referentes aos DPs-sujeitos indicam que no PB a ordem
preferencial é SVO. O estatuto informacional favoreceu a posposição do sujeito
corroborando os resultados de Berlinck (1989) que indicavam ser este um fator
extremamente relevante para a posposição do sujeito durante o século XIX.
Também controlamos o estatuto das construções com SE e nesses casos a
posposição não está relacionada a esse fator.
147
O conjunto desses resultados evidenciou um comportamento de que o
DP das construções com SE indefinido, genérico e ambíguo não é o sujeito da
oração, mas sim o objeto direto. Entretanto, isso não significa que encontramos
uma mudança no estatuto das construções com SE, ou seja, a passagem de
um sistema em que há SE-passivo para outro em que há SE-indefinido. Na
verdade, os resultados indicam o aumento do uso do sujeito pleno e aumento
do objeto nulo, evidenciando as mudanças que, segundo Tarallo (1993),
caracterizam a emergência da gramática do PB.
Tratamos também da questão de competição de gramáticas, mostrando
que ao longo do século XIX havia ao menos duas gramáticas em competição:
PE e PB. A primeira pôde ser observada na maior frequência de uso das
sentenças com SE-indefinido e em algumas construções com topicalização.
Ainda em relação à concordância, a gramática do PB emerge como um sistema
que apresenta apenas o SE-genérico.
Finalmente podemos concluir que no século XIX com relação às
construções com SE o quadro de competição de gramáticas fazia com que
fossem possíveis sentenças com SE-indefinido e SE-genérico. Como vimos a
análise neste trabalho transcorreu mais diretamente a partir da comparação
entre o sujeito das sentenças com SE-reflexivo e passivas analíticas com o DPargumento interno das sentenças com SE-indefinido, genérico e ambiguo e
dessa forma estabelecemos um panorama que evidencia a distinção na função
sintática desses DPs. Esses resultados nos permitem apontar que as
construções com SE que chamei de sentenças com SE-ambíguo, são na
verdade ativas tal qual as construções com SE-genérico e SE-indefinido.
148
Assim, mais uma contribuição dessa dissertação é a possibilidade de
passarmos a inclui-la no grupo das sentenças com SE-genérico.
Brevemente, observamos também o objeto direto de sentenças
transitivas ativas, mas fica ainda a necessidade de comparar especificamente
os contextos sintáticos dos objetos diretos das transitivas com os DPs das
sentenças com SE-indefinido, genérico e ambíguo no PB. Observar por
exemplo, como se processa o aumento na frequência de uso de objetos nulos
nas sentenças com SE com relação à escala de referencialidade de Kato,
Cyrino, Duarte e Berlinck (2006). Por hipótese, acreditamos que o quadro de
mudança nos objetos nulos das construções com SE também respeitará a
escala de referencialidade.
Essas são idéias que mostram não estar esta pesquisa encerrada, mas
esperamos ter contribuído com mais um trabalho que evidencia a emergência
da gramática do PB e tenta desvendar ainda que minimamente as suas
características.
149
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CONSTRUÇÕES COM SE - Faculdade de Letras